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2017­6­28 O novo conceito de família ­ evolução histórica e repercussão no ordenamento jurídico brasileiro ­ Artigos ­ Conteúdo Jurídico

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Quinta, 04 de Novembro de 2010 08h43

CONSULTAS JURÍDICAS ANA PAULA DE JESUS PASSOS LUNA: Analista do Ministério Público do Estado de Sergipe ­ especialidade Direito.

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ISSN ­ 1984­0454
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Enveredando­se  no  surgimento  da  família  ao  longo  da  história,  vislumbra­se  a  sua  formação  desde  as
Publicações Oficiais
sociedades primitivas, onde era normal a prática da poligamia, pelos homens e da poliandria, pelas suas mulheres.
Súmulas Organizadas
Com efeito, consideravam­se comuns os filhos havidos dessas práticas.
Vade Mecum Brasileiro
Vade Mecum Estrangeiro
Imperava nessas sociedades, o que Engels (1984) designou de matrimônio por grupos, de modo que cada
CONCURSOS PÚBLICOS
mulher  pertencia  a  todos  os  homens  e  cada  homem  a  todas  as  mulheres.  O  matrimônio  por  grupos  decorria  da
Apostilas e Resumos
tolerância entre os machos adultos e da falta de ciúmes desses últimos em relação às suas companheiras.
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Questões Comentadas Com a origem daquele sentimento e da idéia de incesto, práticas antes aceitas passaram a ser combatidas,
SERVIÇOS como  o  relacionamento  sexual  entre  irmãos  e  entre  pais  e  filhos.  Dessa  forma,  do  estado  primitivo  de
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promiscuidade,  formaram­se,  gradativamente,  as  famílias  consangüínea,  punaluana,  sindiásmica  e  monogâmica.
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(ENGELS, 1984).
Sobre o Portal

Links Úteis Considerada  precursora  do  desenvolvimento  familiar,  a  família  consangüínea  apresentou  como  principal
característica, a classificação dos grupos conjugais por gerações. Nessa espécie de família, só eram excluídos do
regime matrimonial, os ascendentes e descendentes; irmãos e irmãs, primos e primas de diferentes gerações, no
limite  da  família,  eram  todos  considerados  irmãos  e,  por  conseguinte,  maridos  e  mulheres,  já  que  se  permitia  o
casamento entre os mesmos (ENGELS, 1984).

Da  evolução  da  família  consangüínea,  surgiu  a  punaluana,  designação  advinda  do  termo  “punalua”  que
queria  dizer,  companheiro  íntimo  (ENGELS,1984).  Nesse  tipo  de  organização  familiar  proibiu­se  a  união  sexual
entre irmãos carnais.

A família punaluana indicou os graus de parentesco, apresentando as designações sobrinhos e sobrinhas,
primos e primas, uma vez que não poderia existir união sexual entre irmãos e irmãs.

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Acrescente­se, ainda, que nessa espécie de organização familiar, por ser desconhecido o pai, reconheceu­
se  a  descendência  por  meio  da  linhagem  materna,  de  modo  que  as  relações  de  herança,  existentes  na  época,
provinham do direito materno. (ENGELS, 1984)

Diversamente  da  punaluana,  a  família  sindiásmica  apresentou  a  extinção  do  chamado  casamento  por
  grupos,  como  principal  característica.  Nesse  estágio  de  evolução  familiar,  cada  mulher  vivia  com  apenas  um
homem, devendo ao mesmo, respeito e fidelidade; a infidelidade conjugal era, por sua vez, apenas um direito dos
varões.

Na  família  sindiásmica,  o  vínculo  conjugal  poderia  ser  dissolvido  por  ambos  os  cônjuges  com  facilidade,
sendo que os filhos continuariam a pertencer exclusivamente à mãe.

Outro  traço  característico  dessa  família  condiz  com  o  matriarcalismo,  uma  vez  que  a  mulher  era  a
responsável pelos encargos da família, afigurando­se como a grande força dentro dos clãs (ENGELS, 1984)

A  criação  de  gado  e  o  desenvolvimento  das  atividades  agrícolas  implicaram  o  surgimento  de  novas
riquezas,  bem  como  da  propriedade  particular.  Nesse  contexto,  surge  a  figura  do  “pai”  como  o  chefe  da  casa,
responsável pela alimentação e pelo sustento de sua família.

Essa supremacia masculina repercutiu no estado de filiação e, consequentemente, no direito hereditário, de
modo que, os descendentes que outrora somente herdavam de suas genitoras passaram a herdar do genitor. De
igual forma, os laços conjugais consolidaram­se, excluindo de ambos os cônjuges, o direito a dissolver o vínculo.

Nesse estágio de evolução familiar, a família matriarcal substitui­se pela patriarcal, onde o homem apodera­
se também da direção da casa e a mulher, por sua vez, vê­se degradada, convertida em servidora, em um mero
instrumento de reprodução. (ENGELS, 1984).

O advento do patriarcalismo assinalou a passagem da família sindiásmica à família monogâmica. Nesta fase
ascende  o  predomínio  do  homem,  como  procriador  dos  seus  filhos,  os  quais,  quando  da  morte  do  seu  genitor,
tomariam posse dos bens herdados.

Como  exemplo  dessa  família  patriarcalista,  insere­se  a  família  romana,  na  qual  servos,  esposa  e  filhos
deviam submissão ao pater familias.

Consoante expõe Engels (1984):

A princípio a família não se aplicava ao par de cônjuges e aos seus filhos, mas somente aos
escravos.  Famulus  quer  dizer  escravo  doméstico  e  família  é  o  conjunto  dos  escravos
pertencentes  a  um  mesmo  homem.  [...]  a  expressão  foi  inventada  pelos  romanos  para
designar um novo organismo social, cujo chefe mantinha sob o seu poder a mulher, os filhos
e  certo  número  de  escravos,  com  o  pátrio  poder  romano  e  o  direito  de  vida  e  morte  sobre
todos eles (ENGELS, 1984, p.96, grifo do autor)

Destarte, percebe­se que, em um primeiro momento, o sistema familiar condizia com uma relação de poder
e propriedade, onde seus integrantes estavam subjugados às ordens do pater familias.

Com a expansão da doutrina cristã, mormente dos dogmas da Igreja Católica, a família passou a ser vista
como aquela constituída através dos laços do casamento. O matrimônio ganhou o status de sacramento, por meio
do qual homem e mulher relacionavam­se sexualmente a fim de gerar filhos.

Frise­se  que  a  conjunção  carnal  entre  homem  e  mulher  só  não  era  considerada  pecado,  pela  Igreja,  se
praticada após o casamento e com o único fito de procriar.

No  decorrer  dos  anos,  com  as  transformações  sociais  advindas  da  expansão  capitalista,  o  conceito  de
família,  anteriormente  ligado  à  figura  do  homem  como  chefe  da  família  e  da  mulher  como  mera  procriadora  e
responsável pelos cuidados domésticos, começou a fragilizar­se.

O  advento  da  Revolução  Industrial,  em  meados  do  século  XVIII,  impeliu  as  mulheres  a  integrarem  o
mercado de trabalho, a fim de auxiliar no sustento da casa, uma vez que a renda percebida pelo homem já não era
suficiente  para  suprir  os  anseios  da  família.  Os  maridos,  por  sua  vez,  em  razão  do  afastamento  da  mulher  dos
afazeres domésticos, viram­se obrigados a assumir as atividades domésticas, bem como a ajudar no cuidado dos
filhos.

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Ademais,  a  descoberta  de  métodos  contraceptivos,  o  início  dos  movimentos  feministas,  o  trabalho  nas
indústrias e as dificuldades na criação dos filhos trouxeram, também, profundas mudanças no seio familiar, como a
necessidade de controle da natalidade.

Desse  modo,  em  virtude  da  independência  das  mulheres  em  relação  aos  homens,  estas  começaram  a
formar  famílias  sem  a  presença  daqueles,  haja  vista  não  mais  necessitarem  do  casamento  para  sobreviver.
Almejaram, portanto, ter filhos e viver somente com eles, independente da figura paterna .

Por  outro  lado,  a  desvinculação  entre  o  Estado  e  a  Igreja  ensejou  no  meio  social  a  reformulação  dos
padrões de moralidade. Noutras palavras:

Os paradigmas estruturadores da organização jurídica sobre a família, o sexo, o casamento e
a  reprodução  desentrelaram­se.  Não  é  mais  necessário  o  sexo  para  a  reprodução  e  o
casamento  não  é  mais  a  única  maneira  de  se  legitimar  as  relações  sexuais.  (LEONARDO;
PEREIRA, 2000, p.07)

Com efeito, à margem do casamento, começaram a surgir novas famílias, desta vez formadas por pessoas
que haviam saído de outros relacionamentos, o que acabou por exigir do Judiciário a criação de alternativas para
resolver as contendas advindas desses vínculos.

No  Brasil,  até  o  advento  da  Constituição  Federal  de  1988,  as  Cartas  Magnas  precedentes  consideraram
como legítima e, por conseguinte, merecedora de proteção estatal, a família oriunda do casamento. Com efeito, a
legislação infraconstitucional civil tutelava, apenas, as relações advindas do matrimônio.

Vislumbra­se tal assertiva ao fazer­se uma breve análise do artigo 229 do Código Civil de 1916, ao dispor, 
litteris:  “criando  a  família  legítima,  o  casamento  legitima  os  filhos  comuns  antes  dele  nascidos  ou
concebidos.” (BRASIL, 2003, p. 613, sem grifo no original).

Ao comentar o artigo supra, Carvalho Santos (1937) enfatiza:

[...] a família, em geral, não deriva do casamento; mas a família legitima é, fora (sic) de duvida
(sic), uma consequencia immediata delle (sic).
O  casamento  crêa  (sic)  a  família  (sic)  legitima  (sic),  preceitua  o  Código  (sic).  E  acrescenta:
legitima os filhos communs (sic) [...]. (CARVALHO SANTOS, 1937, p.806)

Ademais,  a  doutrina  conceituava  o  Direito  de  Família  com  fulcro  no  instituto  do  casamento,  de  modo  que
aquele era considerado:

[...] um complexo das normas, que regulam a celebração do casamento, sua validade e
os effeitos (sic), que delle (sic) resultam, as relações pessoaes (sic) e economicas (sic)
da sociedade conjugal, a dissolução desta, as relações entre paes (sic) e filhos, o vinculo
do  parentesco  e  os  institutos  complementares  da  tutela  e  da  curatela.  (BEVILÁQUA,  1952,
p.7, sem grifo no original)

Percebe­se, desse modo, a influência judaico­cristã no ordenamento jurídico pátrio, mormente no Direito de
Família, haja vista atribuir juridicidade somente aos efeitos decorrentes da relação matrimonial.

Insta mencionar que, nem mesmo o surgimento de novos núcleos familiares fora suficiente para promover o
reconhecimento dessas relações pelo poder legiferante, posto que subsistia, na época, total aversão aos vínculos
surgidos fora do casamento. Nesse diapasão, a fim de evitar possíveis injustiças, os juízes viram­se obrigados a
buscar alternativas que solucionassem os conflitos oriundos de relações extramatrimoniais.

Promulgada  a  Constituição  Federal  de  1988,  o  Direito  de  Família  passou  por  uma  grande  transformação.
Inseriu­se no texto constitucional a expressão entidade familiar, considerada como aquela legitimada não só pelo
casamento, mas também por vínculos afetivos outros, como a união estável entre homem e mulher, e as relações
entre um dos ascendentes com a sua prole, sendo estas chamadas de famílias monoparentais.

Outrossim,  em  face  do  princípio  da  igualdade,  derrogaram­se  as  distinções  entre  homem  e  mulher,  e  as
referências entre filhos legítimos (considerados os havidos na constância do casamento) e ilegítimos (considerados
os havidos em relacionamentos extramatrimoniais, além dos adotivos).

Desse modo, como bem acentua Maria Berenice Dias (2001):

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Alargou­se o conceito de família, que, além da relação matrimonializada, passou a albergar
tanto  a  união  estável  entre  um  homem  e  uma  mulher  como  o  vínculo  de  um  dos  pais  com
seus filhos. Para configuração de uma entidade familiar, não mais é exigida, como elemento
constitutivo,  a  existência  de  um  casal  heterossexual,  com  capacidade  reprodutiva,  pois
dessas características não dispõe a família monoparental (DIAS, 2001, p.66)

Subjaz, portanto, que o advento da Carta Magna de 1988 promoveu profundas mudanças na concepção da
palavra  família.  A  estrita  aceitação  do  matrimônio  na  órbita  familiar  cedeu  lugar  ao  reconhecimento  de  novas
entidades familiares surgidas à margem daquele, legitimando o verdadeiro sentido da família com base nos laços
da afetividade, do companheirismo e do respeito.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado. 9. ed. Rio de Janeiro: Paulo
de Azevedo LTDA, 1952. 485 p. v.II.
BRASIL.  Código  Civil.  Código  de  Processo  Civil  e  Constituição  Federal.  Organização  por  Yussef  Said
Cahali. 5. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. 1725 p

CARVALHO SANTOS, J. M. de. Código Civil Brasileiro Interpretado: direito de família (arts. 180­254). 2. ed.
Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1937. 490 p. vol IV.
CZAJKWOSKI, Rainer. União livre à luz das Leis 8.971/94 e 9.278/96, 1. ed. Curitiba: Juruá, 1996. 206 p.

DIAS,  Maria  Berenice.  União  homossexual:  o  preconceito  e  a  justiça  .  2.  ed.  rev.  e  atual.  Porto  Alegre:
Livraria do Advogado, 2001. 304 p.

DINIZ, Maria Helena de. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de família. 18. ed. aum. e atual. de acordo
com o novo Código Civil (Lei n° 10.406, de 10­01­2002). São Paulo: Saraiva, 2002. 572 p. vol. V.
ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade e do Estado. Tradução de José Silveira Paes. São
Paulo: Global, 1984. 237 p.

LEONARDO,  M.;  PEREIRA,  R.  da  C.  A  família  na  virada  do  século.  In:.  A  FAMÍLIA  NA  TRAVESSIA  DO
MILÊNIO,  1999,  Belo  Horizonte.  Anais  do  II  Congresso  Brasileiro  de  Direito  de  Família.  Belo  Horizonte:  Del
Rey, 2000. p.7­8.

NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 3. ed. rev., atual e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:
Método, 2009. 783 p.

Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser
citado da seguinte forma: LUNA, Ana Paula de Jesus Passos. O novo conceito de família ­ evolução histórica e repercussão no ordenamento jurídico
brasileiro. Conteudo Juridico, Brasilia­DF: 04 nov. 2010. Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.29529&seo=1>. Acesso
em: 28 jun. 2017.

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