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ESTÁGIOS DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Piaget (1896-1980) formulou uma teoria que descrevia como crianças e adolescentes pensam e
adquirem conhecimento, ou seja, a gênese (nascimento) e a evolução do conhecimento humano.
Percebendo que Lógica de funcionamento mental da criança difere (qualitativamente) do
funcionamento do adulto, Piaget investigou como a lógica infantil amadurece se transformando
em lógica do adulto.
O desenvolvimento cognitivo da criança matura através de constantes desequilíbrios e
equilibrações. Dois mecanismos aparecem para alcançar um novo estado de equilíbrio: a
assimilação, no qual o ser desenvolve ações destinadas a atribuir significações, a partir de um fato
anterior e aos elementos do ambiente com os quais dialoga; e a acomodação surge quando o
organismo tenta restabelecer um equilíbrio superior com o meio ambiente, agora, o ser é
impelido a se modificar, e se metamorfosear para se ajustas ao meio.
Piaget propôs método da observação para a educação da criança. Daí a necessidade de uma
pedagogia experimental que colocasse claramente como a criança organiza o real. Criticou a
escola tradicional que ensinava a copiar e não a pensar. Para obter bons resultados, o professor
deveria respeitar as leis e as etapas do desenvolvimento da criança. O objetivo da educação não
deveria ser repetir ou conservar verdades acabadas, mas aprender por si próprio a conquista do
verdadeiro. (GADOTI 2004, pg 146)
Como dito anteriormente, no ato de amadurecimento da gênese do conhecimento a criança
passa por estágios de desenvolvimento psicológico. Apesar das características peculiares,
apresentam uma ligação de desenvolvimento do saber.
Assim, pode-se distinguir quatro estágios de desenvolvimento lógico:
O estágio sensório-motor: de 0 a aproximadamente 18 ou 24 meses
O estágio pré-operatório: aproximadamente de 2 a 6/7 anos
O estágio operatório-concreto: de cerca de 7 até aproximadamente 11/12 anos
O estágio formal: a parti de 11/12 anos.

Sensório Motor (0-2 anos)


Tratando-se da fase inicial do desenvolvimento da vida, este nível é caracterizado como pré-
verbal constituída pela organização reflexiva e pela a inteligência prática. Neste estágio a criança
baseia-se em esquemas motores para resolver seus problemas, que são essencialmente práticos.
Além disso, o indivíduo vive o momento presente sendo incapaz de referir-se ao futuro, ou evocar
o passado.

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Durante esta fase os bebês começam a desenvolver símbolos mentais e utilizar palavras, um
processo conhecido como simbolização. O bebê relaciona tudo ao seu próprio corpo como se
fosse o centro do mundo.

Pré-operatório (2-7 anos)


Este período é o que mais teve atenção de Piaget. É caracterizado pela explosão linguística e a
utilização de símbolos. Dada a esta capacidade da linguagem, os esquemas de ação são
interiorizados (esquemas representativos ou simbólicos). Nota-se ainda a ausência de esquemas
conceituais, assim como o predomínio da tendência lúdica. Prevalece nesta fase a transdução,
modelo primitivo de raciocínio, que se orienta de particular para particular.
A partir dos quatro anos o tipo dominante de raciocínio é o denominado intuição, fundamentado
na percepção e que desconhece a reversibilidade e a conservação.
A criança ainda é incapaz de lidar como dilemas morais, embora possua senso do que é bom ou
mal. O indivíduo apresenta um comportamento egocêntrico, tendo um papel limitado e a
impossibilidade assumir o papel de outras pessoas, é rígido (não flexível) que tem como ponto de
referência a própria criança. Ainda é latente a incapacidade de analisar vários aspectos de uma
dada situação.
O egocentrismo traz algumas manifestações características. Aparece neste período o
pensamento animista – tendência de atribuir características psicológicas, como sentimentos ou
intenções a eventos e objetos físicos; o antropomorfismo– que é a atribuição de uma forma
humana a objetos ou animais (nuvens como grandes rostos, por exemplo; o artificialismo– que
atribui uma origem artesanal humana a todas as coisas (a montanha foi esculpida por um homem
muito grande); o finalismo é a tendência egocêntrica na qual a criança acho que todos os objetos
tem a finalidade de servi-la.
Uma consequência deste egocentrismo é a incapacidade da criança de colocar seu próprio ponto
de vista como igual aos demais. Desconhecendo a opinião alheia, o indivíduo não sente
necessidade de justificar seus raciocínios perante outros.
Aparece a incapacidade de descentração- a criança fixa apenas em um aspecto particular da
realidade, geralmente o dela.

Operatório concreto (7-11 anos)


Recebe este nome, já que a criança age sobre o mundo concreto, real e visível. Surge o declínio
do egocentrismo, sendo substituído pelo pensamento operatório (envolvendo vasta gama de
informações externas à criança). O indivíduo pode, desde já, ver as coisas a partir da perspectiva
dos outros. Surge os processos de pensamento lógico, limitados, sendo capazes de serializar,

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ordenar e agrupar coisas em classes, com base em características comuns. Assim como a
capacidade de conservação e reversibilidade através da observação real (o pensamento da
criança ainda é de natureza concreta).
O pensamento operatório é denominado concreto, pois a criança somente pensa corretamente
se os exemplos ou materiais que ela utiliza para apoiar o pensamento existem mesmo e podem
ser observados. Ela ainda não consegue pensar abstratamente, tendo como base proposições e
enunciados. Com o desenvolvimento destas habilidades notamos aparecimento de esquemas
conceituais.
As crianças começam a desenvolver um senso moral, juntamente com um código de valores.

Operatório formal (12 anos em diante)


Característica essencial a distinção entre o real e o possível.
A criança se torna capaz de raciocinar logicamente, mesmo se o conteúdo do seu raciocínio é
falso. Logo, surge a determinação da realidade tendo como base o caráter hipotético-dedutivo,
representando a última aquisição mental quando o adolescente se liberta do concreto. Assim o
jovem obtém a capacidade de pensar abstratamente e compreender o conceito de probabilidade.
Aparecimento da reversibilidade e sua explicação mediante inversão ou negação e comparada à
reciprocidade de relações.

Promoção da Saúde
Estratégias de Ações de Promoção, Proteção e Recuperação da Saúde

Promoção da saúde consiste em políticas, planos e programas de saúde pública com ações
voltadas em evitar que as pessoas se exponham a fatores condicionantes e determinantes de
doenças, a exemplo dos programas de educação em saúde que se propõem a ensinar a população
a cuidar de sua saúde. Além disso, incentiva condutas adequadas à melhoria da qualidade de vida,
distinguindo-se da atenção primária ou ações da medicina preventiva que identificam
precocemente o dano e ou controlam a exposição do hospedeiro ao agente causal em um dado
meio-ambiente
No dia 30 de março de 2006, foi aprovada a Política Nacional de Promoção a Saúde, pela portaria
de número 687, que validou o compromisso da atual gestão do Ministério da Saúde na ampliação
das ações de promoção, nos serviços e na gestão do Sistema Único. Constituindo um instrumento
de fortalecimento e implantação de ações transversais, integradas e intersetoriais que objetivam
o diálogo entre as diversas áreas do setor sanitário, governamental, privado e sociedade geral,
para compor redes de compromisso em que todos auxiliem na proteção e no cuidado com a vida.

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Segundo Arouca cada um desses elementos é determinado por um conjunto de características
que lhe são atribuídas, na História Natural da Doença", como, por exemplo, em relação à história
natural da sífilis adquirida: sendo os determinantes sociais ou condicionantes.
Fatores do Agente - características biológicas, pré-requisitos de unidade, baixa resistência;
Fatores do Ambiente - geografia, clima, instabilidade familiar, baixo ingresso, moradia, facilidades
inadequadas de recreação, facilidades diagnósticas; personalidade, ética e educação sexual,
promiscuidade, profilaxia. (Leavell & Clarck, 1965)
O modelo teórico de explicação/intervenção denominado promoção da saúde substitui
(redefinindo) aquele modelo triádico agente- hospedeiro-ambiente (tido como ecológico) por um
esquema quadripolar constituído por: biologia humana, ambiente, estilo de vida e sistema de
serviços de saúde. Mais eficaz sobretudo para "dar conta" da elevação das doenças crônico-
degenerativas ou não - transmissíveis que caracterizam o mundo moderno.

Contexto Histórico
No período de Guerra Fria, com o final da guerra, os países capitalistas e soviéticos estavam
disputando entre o mesmo e o avanço tecnológico e o desenvolvimento de suas nações. Para
isso, ocorriam várias conferências internacionais para discutirem problemas mundiais e
estratégias para melhorar o desenvolvimento dos países.
Em uma dessas conferências, em específico a de Alma Ata perceberam a necessidade da saúde
no desenvolvimento de qualquer nação. Não há uma nação desenvolvida sem ter uma saúde
desenvolvida. O conceito de promoção à saúde foi definido como uma etapa a ser focado na
prevenção da doença; esse cuidado proposto na declaração de Alma Ata é o provedor da saúde,
com isso um novo conceito foi atentado aos condicionantes da saúde pública e a atenção básica.
A partir das conferências mundiais de saúde foram delimitados objetivos para a equidade da
saúde mundial e também ações para a prevenção de doenças de acordo com as localidades e
com ênfase em doenças endêmicas, portanto a partir das influências mundiais, no Brasil
ocorreram por parte do governo incentivos maiores para o combate de doença e com maior
prioridade a atenção básica em saúde.
A partir das conferências mundiais de saúde foram delimitados objetivos para a equidade da
saúde mundial e também ações para a prevenção de doenças de acordo com as localidades e
com ênfase em doenças endêmicas, portanto a partir das influências mundiais, no Brasil
ocorreram por parte do governo incentivos maiores para o combate de doença e com maior
prioridade a atenção básica em saúde.
Pós à declaração de Alma Ata criou-se base para as Políticas Públicas que são o aparato civil da
preservação dos Direitos Humanos.

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O principal documento, pós "Declaração de Alma-Ata" (1978), com essas recomendações surgiu
na Primeira Conferência Internacional Sobre Promoção da Saúde realizada em novembro de 1986
em Ottawa, Canadá. Onde a promoção da saúde foi definida como: o processo de capacitação da
comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior
participação no controle deste processo. Para atingir um estado de completo bem-estar físico,
mental e social os indivíduos e grupos devem saber identificar aspirações, satisfazer necessidades
e modificar favoravelmente o meio ambiente. A saúde deve ser vista como um recurso para a
vida, e não como objetivo de viver. Nesse sentido, a saúde é um conceito positivo, que enfatiza
os recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas. Assim, a promoção da saúde não
é responsabilidade exclusiva do setor saúde, e vai para além de um estilo de vida saudável, na
direção de um bem-estar global.
Observe-se a ênfase no sujeito coletivo - a comunidade e a "criação" (implícita) do conceito de
empoderamento (empowerment) como requisito de sua atuação para melhoria de sua qualidade
de vida e saúde. Após essa conferência se sucederam algumas outras conferências internacionais
sobre a "promoção da saúde" com contribuições específicas para as dificuldades encontradas
seja na organização das comunidades (responsabilidade individual e social), nos instrumentos e
condições para modificações do meio - ambiente como na administração dos recursos disponíveis
para serviços de saúde.
Rabello assinala ainda que a promoção da saúde é uma proposta pública mundial contemporânea
na saúde pública disseminada pela Organização Mundial da Saúde desde 1984, constituindo-se
como um novo paradigma e que este se contrapõe ao modelo flexeneriano que se expressa
através do individualismo (atenção individual), da especialização, da tecnologização e do
curativismo na atenção à saúde, predominantes, até então, nas práticas de saúde.
No Brasil, mesmo não oferecendo, na maior parte das vezes, um atendimento com a qualidade
necessária para os brasileiros, o SUS ainda é um dos sistemas mais avançados, mas sua fragilidade
coloca sua autenticidade política e social em risco. Para o SUS ter seu funcionamento de
qualidade, depende diretamente de recursos das políticas econômicas e a insuficiência de
hospitais públicos resulta no sucateamento da saúde.

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Doenças de Notificação Compulsória
ADVERTÊNCIA
Ministério da Saúde
Gabinete do Ministro

PORTARIA NO - 204, DE 17 DE FEVEREIRO DE 2016


Define a Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde
pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território nacional, nos termos do
anexo, e dá outras providências.
O MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE, INTERINO, no uso das atribuições que lhe conferem os incisos
I e II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e
Considerando a Lei nº 6.259, de 30 de outubro de 1975, que dispõe sobre a organização das ações
de Vigilância Epidemiológica, sobre o Programa Nacional de Imunizações, estabelece normas
relativas à notificação compulsória de doenças, e dá outras providências;
Considerando o art. 10, incisos VI a IX, da Lei nº 6.437, de 20 de agosto de 1977, que configura
infrações à legislação sanitária federal, estabelece as sanções respectivas, e dá outras
providências; considerando a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto
da Criança e do Adolescente;
Considerando a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para a
promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços
correspondentes e dá outras providências;
Considerando a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, que dispõe sobre o Estatuto do Idoso,
alterada pela Lei nº 12.461, de 26 de julho de 2011, que determina a notificação compulsória dos
atos de violência praticados contra o idoso atendido em estabelecimentos de saúde públicos ou
privados;
Considerando a Lei nº 10.778, de 24 de novembro de 2003, que estabelece a notificação
compulsória, no território nacional, do caso de violência contra a mulher que for atendida em
serviços de saúde, públicos ou privados;
Considerando a Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, que regula o acesso às informações
previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da
Constituição Federal; altera a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei nº 11.111,
de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras
providências;

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Considerando o Decreto Legislativo nº 395, publicado no Diário do Senado Federal em 13 de
março de 2009, que aprova o texto revisado do Regulamento Sanitário Internacional, acordado
na 58ª Assembleia Geral da Organização Mundial de Saúde, em 23 de maio de 2005;
Considerando o Decreto nº 7.616, de 17 de novembro de 2011, que dispõe sobre a declaração
de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN) e institui a Força Nacional do
Sistema Único de Saúde (FN-SUS); e
Considerando a necessidade de padronizar os procedimentos normativos relacionados à
notificação compulsória no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), resolve:

CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES INICIAIS
Art. 1º Esta Portaria define a Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças, agravos e
eventos de saúde pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território nacional,
nos termos do anexo.
Art. 2º Para fins de notificação compulsória de importância nacional, serão considerados os
seguintes conceitos:
I - Agravo: qualquer dano à integridade física ou mental do indivíduo, provocado por
circunstâncias nocivas, tais como acidentes, intoxicações por substâncias químicas, abuso de
drogas ou lesões decorrentes de violências interpessoais, como agressões e maus tratos, e lesão
autoprovocada;
II - Autoridades de saúde: o Ministério da Saúde e as Secretarias de Saúde dos Estados, Distrito
Federal e Municípios, responsáveis pela vigilância em saúde em cada esfera de gestão do Sistema
Único de Saúde (SUS);
III - doença: enfermidade ou estado clínico, independente de origem ou fonte, que represente ou
possa representar um dano significativo para os seres humanos;
IV - Epizootia: doença ou morte de animal ou de grupo de animais que possa apresentar riscos à
saúde pública;
V - Evento de saúde pública (ESP): situação que pode constituir potencial ameaça à saúde pública,
como a ocorrência de surto ou epidemia, doença ou agravo de causa desconhecida, alteração no
padrão clínico epidemiológico das doenças conhecidas, considerando o potencial de
disseminação, a magnitude, a gravidade, a severidade, a transcendência e a vulnerabilidade, bem
como epizootias ou agravos decorrentes de desastres ou acidentes;
VI - Notificação compulsória: comunicação obrigatória à autoridade de saúde, realizada pelos
médicos, profissionais de saúde ou responsáveis pelos estabelecimentos de saúde, públicos ou

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privados, sobre a ocorrência de suspeita ou confirmação de doença, agravo ou evento de saúde
pública, descritos no anexo, podendo ser imediata ou semanal;
VII - notificação compulsória imediata (NCI): notificação compulsória realizada em até 24 (vinte e
quatro) horas, a partir do conhecimento da ocorrência de doença, agravo ou evento de saúde
pública, pelo meio de comunicação mais rápido disponível;
VIII - notificação compulsória semanal (NCS): notificação compulsória realizada em até 7 (sete)
dias, a partir do conhecimento da ocorrência de doença ou agravo;
IX - Notificação compulsória negativa: comunicação semanal realizada pelo responsável pelo
estabelecimento de saúde à autoridade de saúde, informando que na semana epidemiológica
não foi identificado nenhuma doença, agravo ou evento de saúde pública constante da Lista de
Notificação Compulsória; e
X - Vigilância sentinela: modelo de vigilância realizada a partir de estabelecimento de saúde
estratégico para a vigilância de morbidade, mortalidade ou agentes etiológicos de interesse para
a saúde pública, com participação facultativa, segundo norma técnica específica estabelecida pela
Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS).

CAPÍTULO II
DA NOTIFICAÇÃO COMPULSÓRIA
Art. 3º A notificação compulsória é obrigatória para os médicos, outros profissionais de saúde ou
responsáveis pelos serviços públicos e privados de saúde, que prestam assistência ao paciente,
em conformidade com o art. 8º da Lei nº 6.259, de 30 de outubro de 1975.
§ 1º A notificação compulsória será realizada diante da suspeita ou confirmação de doença ou
agravo, de acordo com o estabelecido no anexo, observando-se, também, as normas técnicas
estabelecidas pela SVS/MS.
§ 2º A comunicação de doença, agravo ou evento de saúde pública de notificação compulsória à
autoridade de saúde competente também será realizada pelos responsáveis por
estabelecimentos públicos ou privados educacionais, de cuidado coletivo, além de serviços de
hemoterapia, unidades laboratoriais e instituições de pesquisa.
§ 3º A comunicação de doença, agravo ou evento de saúde pública de notificação compulsória
pode ser realizada à autoridade de saúde por qualquer cidadão que deles tenha conhecimento.
Art. 4º A notificação compulsória imediata deve ser realizada pelo profissional de saúde ou
responsável pelo serviço assistencial que prestar o primeiro atendimento ao paciente, em até 24
(vinte e quatro) horas desse atendimento, pelo meio mais rápido disponível.

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Parágrafo único. A autoridade de saúde que receber a notificação compulsória imediata deverá
informa-la, em até 24 (vinte e quatro) horas desse recebimento, às demais esferas de gestão do
SUS, o conhecimento de qualquer uma das doenças ou agravos constantes no anexo.
Art. 5º A notificação compulsória semanal será feita à Secretaria de Saúde do Município do local
de atendimento do paciente com suspeita ou confirmação de doença ou agravo de notificação
compulsória. Parágrafo único. No Distrito Federal, a notificação será feita à Secretaria de Saúde
do Distrito Federal.
Art. 6º A notificação compulsória, independente da forma como realizada, também será
registrada em sistema de informação em saúde e seguirá o fluxo de compartilhamento entre as
esferas de gestão do SUS estabelecido pela SVS/MS.

CAPÍTULO III
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 7º As autoridades de saúde garantirão o sigilo das informações pessoais integrantes da
notificação compulsória que estejam sob sua responsabilidade
Art. 8º As autoridades de saúde garantirão a divulgação atualizada dos dados públicos da
notificação compulsória para profissionais de saúde, órgãos de controle social e população em
geral.
Art. 9º A SVS/MS e as Secretarias de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
divulgarão, em endereço eletrônico oficial, o número de telefone, fax, endereço de e-mail
institucional ou formulário para notificação compulsória.
Art. 10. A SVS/MS publicará normas técnicas complementares relativas aos fluxos, prazos,
instrumentos, definições de casos suspeitos e confirmados, funcionamento dos sistemas de
informação em saúde e demais diretrizes técnicas para o cumprimento e operacionalização desta
Portaria, no prazo de até 90 (noventa) dias, contados a partir da sua publicação.
Art. 11. A relação das doenças e agravos monitorados por meio da estratégia de vigilância em
unidades sentinelas e suas diretrizes constarão em ato específico do Ministro de Estado da Saúde.
Art. 12. A relação das epizootias e suas diretrizes de notificação constarão em ato específico do
Ministro de Estado da Saúde.
Art. 13. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação. Art. 14.
Fica revogada a Portaria nº 1.271/GM/MS, de 06 de junho de 2014, publicada no Diário Oficial da
União, nº 108, Seção 1, do dia 09 de junho de 2014, p. 37.
Art. 14. Fica revogada a Portaria nº 1.271/GM/MS, de 06 de junho de 2014, publicada no Diário
Oficial da União, nº 108, Seção 1, do dia 09 de junho de 2014, p. 37.
JOSÉ AGENOR ÁLVARES DA SILVA

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Atuação do Psicólogo nos Programas de Proteção à Mulher
Durante muitos anos a mulher encarou a violência sofrida por ela como um fenômeno natural,
principalmente quando acontecia na relação conjugal ou no ambiente doméstico, que, até pouco
tempo, era vista como um problema da esfera privada, onde o Estado não poderia intervir, pois
predominava a ideia de que: “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”. Através dos
movimentos feministas, na década de 1970, a violência contra a mulher ganhou visibilidade e
passou a ser tratada como um problema social, desmistificando o dito popular, pois, em brigada
de marido e mulher, o Estado mete a colher, sim (CORTIZO & GOYENECHE, 2010).
Para se falar de violência doméstica contra a mulher é necessário relembrar alguns conceitos
relevantes para a compreensão deste fenômeno. Nesse tipo de violência está implícita a relação
de poder e dominação do homem sobre a mulher, gerada pela hierarquização dos papéis de
gênero decorrente de uma construção sociocultural baseada no patriarcado.
O patriarcado pode ser compreendido como um sistema que propicia a desigualdade hierárquica
dos sexos através de ideias e valores que fundamentam a dominação do homem sobre a mulher.
É um sistema cuja finalidade consiste em manter a supremacia do homem “através de dois
artifícios básicos: afirmar a superioridade masculina e reforçar a inferioridade correlata da
mulher” (AZEVEDO, 1985, p. 47).
A sociedade e a cultura determinam a função da mulher e do homem, delimitando os papéis de
gênero. O que determina os gêneros masculino e feminino, não são as características biológicas
inerentes ao homem e à mulher, mas sim “os aspectos psicológicos, sociais e culturais
constituintes da feminilidade e masculinidade [...]” (MARODIN, 2000, p. 9). A noção de gênero,
portanto, enfatiza a dinâmica relacional e a influência dos padrões sociais na formação das
identidades masculina e feminina, indicando que apenas as características biológicas são
insuficientes para definir as identidades de gênero uma vez que a construção dessas identidades
é um fenômeno biopsicossocial (HEILBORN, 1996 apud OLIVEIRA & SOUZA). Neste sentido,
gênero é um conceito que deve ser compreendido a partir de uma perspectiva biopsicossocial,
onde o biológico, o psicológico e o social se encontram em uma relação dialética na constituição
da masculinidade e feminilidade. (SAFFIOTI, 2004). Beauvoir (1987) explicou este conceito através
de uma frase célebre “[...]ninguém nasce mulher, torna-se mulher.” (p.13).
Segundo Bourdieu (1994) é a partir do próprio corpo que formamos uma primeira identidade
(homens ou mulheres) e como consequência desta que é marcada e determinada pelo nosso
sexo (biológico), é definido se seremos dominados (feminino) ou dominadores (masculino), cada
qual desempenhando seu papel construído pela sociedade. E, desta forma, o corpo é o lugar do
exercício do poder.

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Esses papéis normalmente são transmitidos ao indivíduo através da sua família, desde o seu
nascimento. Ele é educado e direcionado a agir de determinada maneira, conforme seu sexo. A
família transmite ao sujeito seus valores, crenças e regras formando uma “identidade familiar”
que auxilia na formação da identidade do indivíduo. A formação dos valores de cada família
recebe influência do meio em que ela está inserida, o qual está em constante modificação
(MARODIN, 2000).
A educação que meninos e meninas recebem de suas famílias ocorre de forma diferenciada,
devido às influências dos meios de comunicação de massa. A televisão, os jornais e revistas, o
tempo inteiro estão veiculando e contribuindo para a formação de estereótipos sobre o que é ser
mulher/menina e homem/menino, criando essa imensa dicotomia entre os sexos. Homem não
pode agir como mulher, tem que se diferenciar em comportamentos e emoções, caso o contrário,
a sociedade coloca sua masculinidade em dúvida, pois ele precisa demonstrar mais força,
virilidade e poder do que a mulher (AZEVEDO, 1985).
O indivíduo, a partir da experiência na sua família de origem, casamento, namoro e na
comunidade no qual está inserido, aprende valores e crenças, bem como expectativas sobre
como deve ser e agir um marido e uma esposa. Esse aprendizado vai contribuir com a
determinação dos papéis de gênero, que tanto o homem como a mulher devem desempenhar
no contexto social, familiar e conjugal (MARODIN, 2000).
Os estudos sobre os papéis de gênero trouxeram contribuições importantes, pois, a partir deles,
é possível distinguir diferentes formas de interação entre os casais. Marodin (2000) descreve
quatro tipos de casais, sendo o casal “tradicional patriarcal” o mais relevante para a compreensão
da violência contra a mulher.
O casal tradicional patriarcal mantém um relacionamento baseado na “dominação de um sexo
sobre o outro”. Nesse tipo de casal os homens assumem o papel de provedor e chefe de família.
Enquanto as mulheres ficam encarregadas das tarefas domésticas e educação dos filhos, trabalho
pelo qual elas não são remuneradas, tornando-se economicamente dependentes de seus
maridos, “[...] aumentando o poder dos homens e a impotência, infantilização, dependência das
mulheres” (MARODIN, 2000, p. 11). No modelo patriarcal de família os problemas domésticos
devem ser tratados em casa, passando para a comunidade a ideia de família harmoniosa
(AZEVEDO, 1985).

TIPOS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER


É nesse contexto de desigualdade hierárquica entre os papéis de gênero que se desenvolve a
violência doméstica contra a mulher. Segundo Saffioti (2004) a violência se caracteriza pela

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“ruptura de qualquer forma de integridade da vítima: integridade física, integridade psíquica,
integridade sexual, integridade moral.” (p. 17).
Para Chauí (1984) a violência é entendida: “Em primeiro lugar, como conversão de uma diferença
e de uma assimetria numa relação hierárquica de desigualdade, com fins de dominação,
exploração e de opressão. Isto é, a conversão dos diferentes em desiguais e a desigualdade em
relação entre superior e inferior. Em segundo lugar, como a ação que trata um ser humano não
como um sujeito, mas como coisa. Esta caracteriza-se pela inércia, pela passividade e pelo
silêncio, de modo que, quando a atividade e a fala de outrem são impedidos ou anuladas, há
violência.” (p.35).
No caso da mulher, essa violência é marcada pela sua desvalorização dentro da sociedade. Essa
desvalorização está atrelada aos papéis de gênero, nos quais o homem é o detentor do poder e
a mulher aquela que deve obedecer a ele, mesmo que para isso, ela tenha que ir contra as
próprias vontades. Nesse contexto, a mulher deixa de ser uma pessoa que possui desejos e passa
a ser tratada como “coisa” (CHAUÍ, 1984).
A violência contra a mulher se dá através de ações e atitudes do homem, e pode assumir formas
diferentes: psicológica, sexual, moral, patrimonial e física (BRASIL, 2012). A violência psicológica
faz parte de uma dinâmica relacional, onde o homem possui a necessidade de controlar a mulher,
abrindo portas para que outras agressões surjam no relacionamento, já que, na maioria dos
casos, a violência começa de forma mais sutil, com xingamentos, ameaças, humilhações, até se
agravar em frequência e intensidade, culminando em agressões físicas. Assim, é possível concluir
que a violência psicológica possibilita que as outras violências se instaurem no relacionamento
(HIRIGOYEN, 2006; PIMENTEL, 2011).
Na violência psicológica o outro é visto como objeto, desse modo, o agressor não possui
reconhecimento sobre as emoções e sentimentos da vítima. A pessoa que pratica este tipo de
violência tem como objetivo subtrair a vontade do outro, fazendo com que ele perca a sua própria
identidade. A finalidade do agressor é manter a submissão do outro, garantir e afirmar sua
posição de poder dentro da relação (HIRIGOYEN, 2006; PIMENTEL, 2011).
Este é um tipo de violência muito sutil e, por este motivo, muitas mulheres demoram a perceber
que se encontram dentro de uma relação violenta. Quando percebem, o nível de violência
psicológica já se intensificou. A fim de demonstrar quem detém o poder e fazer com que o outro
se sinta amedrontado e rebaixado, o agressor se utiliza de um olhar que despreza, de um tom de
voz que ameaça e uma palavra que humilha. Neste tipo de violência a vítima acaba internalizando
aquilo que o outro diz sobre ela, desse modo, ela passa a se sentir merecedora das agressões,
considerando justa ou natural a forma pela qual é tratada pelo parceiro (HIRIGOYEN, 2006;
PIMENTEL, 2011).

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Alguns comportamentos emitidos por um dos parceiros, que se enquadram na violência
psicológica, por se tornarem atitudes corriqueiras do dia a dia dos casais, foram naturalizados
pela sociedade, dificultando a percepção das mulheres que se encontram em uma relação
marcada pela violência psicológica (HIRIGOYEN, 2006; PIMENTEL, 2011; SOARES, 2005).
O controle, dependendo da forma como é utilizado, pode ser enquadrado como um dos tipos de
violência psicológica. No início do relacionamento, o controle é encarado como forma de cuidado
e preocupação, o que faz com que a pessoa não perceba que na verdade está sendo violentada.
O controle pode estar relacionado à ideia de posse. O controlador vigia e domina o outro como
se este fosse um objeto que ele possui, impedindo-o de agir livremente, crescer
profissionalmente, ou estudar e se capacitar (HIRIGOYEN, 2006; PIMENTEL, 2011; SOARES, 2005).
O isolamento da mulher imposto pelo parceiro é outra forma de violência psicológica. O objetivo
do isolamento é fazer com que a mulher não tenha mais ninguém a não ser o homem. Desta
forma, ela acaba se tornando totalmente dependente do agressor, tanto financeiramente, como
socialmente e emocionalmente, instituindo-se uma verdadeira prisão psicológica. São vários os
meios que o agressor se utiliza para isolar a vítima. Pode ser tirando-lhe o telefone, proibindo-a
de realizar ligações, de manter contato com outras pessoas e até colocando-a contra pessoas
próximas a ela, como amigos e familiares. O isolamento pode ser entendido como causa e
consequência dos maus tratos, pois a mulher encontra-se sem saída e sem apoio para sair dessa
situação (HIRIGOYEN, 2006; PIMENTEL, 2011; SOARES, 2005).
Outra forma de violência psicológica é o ciúme patológico, que pode ser compreendido como
desconfianças infundadas por parte do outro. Na realidade o que o ciumento deseja através do
ciúme patológico é que a mulher seja e viva exclusivamente para ele. Assim como o controle, o
ciúme está relacionado com o sentimento de posse. A mulher vive numa situação de vigilância
constante (HIRIGOYEN, 2006)
Existe também, como forma de violência psicológica, o assédio. Normalmente o assédio se dá a
partir da necessidade de perseguir e vigiar a mulher, interrogando-a a fim de obter confissões de
alguns atos, e mesmo quando respondidos, o interrogatório continua até que seja dito o que se
quer ouvir. Em geral, o assédio ocorre quando acontece a separação (HIRIGOYEN, 2006;
PIMENTEL, 2011).
O aviltamento também é uma forma de violência, o objetivo é rebaixar o outro, atingir sua
autoestima de maneira negativa, fazendo com que a pessoa se sinta sem valor. É um tipo de
violência que se dá a partir de palavras depreciativas e desdenhosas para com o outro
(HIRIGOYEN, 2006; PIMENTEL, 2011; SOARES, 2005).
Semelhante ao aviltamento existe a humilhação que pode ser entendida como o desrespeito por
parte do homem para com a parceira, podendo ser motivada pela necessidade de descontar na

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mulher todas as suas frustações, funcionando como uma válvula de escape. Na maioria dos casos
de violência psicológica com atitudes que visam humilhar o outro, existe um componente sexual,
o que gera na vítima muita vergonha em denunciar esse tipo de violência, porque de certa forma,
ela precisa se expor e muitas preferem evitar essa situação (HIRIGOYEN, 2006; PIMENTEL, 2011).
A intimidação, a fim de despertar no outro o medo, também se caracteriza como um tipo de
violência psicológica. Como também, a indiferença às suas demandas afetivas. Neste caso, o
objetivo é recusar a demonstração de qualquer tipo de sentimento e interesse em relação ao
outro. É uma forma de demonstrar total desprezo, criando uma situação de total insegurança
para o outro. É não respeitar a mulher como pessoa, com sentimentos e emoções, não respeitar
seu estado de saúde, etc. (HIRIGOYEN, 2006; PIMENTEL, 2011; SOARES, 2005).
E por último, existe a ameaça como uma das formas de violência psicológica. O objetivo é atingir
o ponto fraco da mulher, ameaçando-a com a possibilidade de pedir a guarda das crianças, não
pagar pensão, de matá-la, cometer suicídio, entre várias outras (HIRIGOYEN, 2006; SOARES,
2005).
Como foi mencionado antes, a violência psicológica tem como objetivo primordial reforçar o
poder exercido sobre o outro dentro de uma relação. Ela tende a se repetir e se intensificar com
o tempo, fragilizando e transformando a vítima em um objeto sem valor. Como está, não é uma
violência visível aos outros, a vítima tem inúmeras dificuldades para provar que está sofrendo
agressões. Com isto, a vítima pode chegar a um estado em que duvida daquilo que está
vivenciando (HIRIGOYEN, 2006).
Outro tipo de violência contra a mulher é a própria agressão física. Como já foi comentado
anteriormente, quando ocorre este tipo de agressão dentro um relacionamento, a vítima já vinha
sendo mantida sob controle através da violência psicológica (HIRIGOYEN, 2006).
A violência física pode ser entendida como qualquer ato de outrem que possua a intenção de
prejudicar fisicamente a vítima. Nos casos em que a violência é cometida contra a mulher, este
tipo de agressão tende a ocorrer quando o homem se sente contrariado, ou seja, quando ele
percebe que não está conseguindo manter o controle da relação, e como consequência, o
controle da mulher.
Como forma de mostrar para a vítima que detém o poder da relação ele utiliza-se da agressão
física (BRASIL, 2012; HIRIGOYEN, 2006)
A violência física, como as outras formas de violência, pode ocorrer várias vezes em uma mesma
relação, no entanto, se a mulher denuncia seu agressor, o ciclo da violência pode ser
interrompido. Caso ela não denuncie, a violência pode aumentar em frequência e intensidade, o
que faz com que a mulher que continua dentro desta relação violenta se encontre em uma
situação de risco cada vez maior. Assim, como na violência psicológica, o objetivo da agressão

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física é anular o outro, através da imposição do poder e da força (HIRIGOYEN, 2006; BRASIL,
2009).
Existe ainda, a violência sexual. Neste tipo de violência, a mulher é forçada a manter relações
sexuais, através do uso da força, sugestão e ameaça. Existem várias formas de cometer este tipo
de violência, como por exemplo, não admitir o uso de contraceptivo, obrigar a mulher a
engravidar, ou exigir que ela tenha relação sexual com outras pessoas. Esse tipo de violência tem
consequências psicológicas, na medida em que a vítima é dominada, rebaixada e humilhada
(HIRIGOYEN, 2006; BRASIL, 2009).

O PAPEL DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO DA CLÍNICA AMPLIADA


No final dos anos setenta e início dos anos oitenta ocorreu a entrada do psicólogo no serviço
público de saúde, fazendo com que o profissional da psicologia adentrasse ao campo social,
abrindo novas oportunidades de atuação para o psicólogo, que até então, se restringia às práticas
clínicas. (DUTRA, 2008).
A violência doméstica é um fenômeno social, isto significa dizer, que não se pode reduzir esta
problemática para o campo individual ou privado. Portanto, a atuação do profissional nessa área
deve ter embasamento teórico tanto da psicologia social como também da psicologia clínica. De
acordo com Dutra (2008) não se pode pensar no sujeito sem levar em consideração sua história
de vida e o meio no qual ele se insere. A partir deste ponto de vista, surgiu o conceito de clínica
ampliada, com o intuito de ampliar as diversas formas de atuação do psicólogo clínico, bem como
diversificar sua metodologia em diferentes espaços físicos
O conceito de clínica ampliada traz ao psicólogo a possibilidade de diversificar seu trabalho
clínico, ampliando seu foco de intervenção, passando do indivíduo para a comunidade, saindo do
seu consultório para introduzir-se em diversas instituições e comunidades, atendendo pessoas
de várias classes sociais, criando e adaptando suas estratégias de intervenção. O psicólogo
atuante nessa área intervém para além da psicoterapia individual, utilizando-se da terapia
comunitária e de campanhas socioeducativas. Neste caso, portanto, não é o sujeito quem procura
o psicólogo e sim o contrário. A clínica ampliada visa o alcance de toda comunidade. (MURTA &
MARINHO, 2009).
Sendo assim, a postura clínica se relaciona muito mais com a atitude do profissional, do que com
os espaços físicos no qual ele atua. O psicólogo deve saber adaptar a postura clínica aos contextos
nos quais ele atua, seja nos consultórios, nos hospitais, ou nas instituições governamentais,
desenvolvendo um método no qual a escuta clínica deve ser ativa, possibilitando a criação de um
ambiente terapêutico em diversos contextos, estando preparado para acolher o sujeito que se

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encontra imerso no sofrimento psíquico, independente do espaço físico no qual ele se encontra.
(DUTRA, 2008).
Trabalhar com a temática da violência doméstica e familiar contra a mulher é uma maneira
diferenciada de atuação do profissional da psicologia, pois se difere do modelo da clínica privada,
no qual o trabalho é feito em um consultório, através de psicoterapia individual. No caso da
intervenção profissional em casos de violência doméstica contra a mulher, o trabalho do
psicólogo está vinculado à intervenção da justiça e, portanto, não se limita ao consultório privado,
sendo feito em um ambiente diferenciado com intervenções individuais ou grupais de caráter
socioeducativos. Como o trabalho é feito em conjunto com a justiça, o psicólogo atuante nessa
área acaba realizando um trabalho multidisciplinar. (COSTA & BRANDÃO, 2005).
Para se obter sucesso no atendimento às vítimas e autores de violência doméstica, é necessário
articular o conhecimento e a atuação da Psicologia com outros campos do conhecimento e outras
instituições envolvidas nesse processo. É preciso realizar intervenções mantendo relação com o
contexto jurídico e social no qual a vítima e o autor estão inseridos criando um espaço terapêutico
e estratégias de intervenção psicossocial a fim de facilitar as mudanças subjetivas. (COSTA,
BRANDÃO, 2005).

O PAPEL DO PSICÓLOGO NO ATENDIMENTO ÀS MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA


A mulher que convive ou já conviveu, durante algum tempo, com a violência perpetrada pelo
parceiro, geralmente, tem um comprometimento psicológico, como a dificuldade de mudar sua
realidade, uma vez que “a pessoa sob jugo não é mais senhora de seus pensamentos, está
literalmente invadida pelo psiquismo do parceiro e não tem mais um espaço mental próprio”
(HIRIGOYEN, 2006, p. 182). Por esta razão ela necessita de uma ajuda externa que a auxilie a criar
mecanismos para mudar sua realidade e superar as sequelas deixadas pelo processo de
submissão às situações de violência. (HIRIGOYEN, 2006).
O psicólogo, independente, da abordagem ou método escolhido para realizar esse tipo de
atendimento, deverá primeiramente criar um “rapport” e um vínculo terapêutico com a vítima,
fazendo com que ela se sinta num ambiente seguro e confiável, pois, somente desta forma, ela
conseguirá compartilhar as experiências vividas que lhe causaram sofrimento. (SOARES, 2005;
PIMENTEL, 2011).
Outro objetivo do atendimento psicológico às vítimas é fazer com que elas resgatem sua condição
de sujeito, bem como sua autoestima, seus desejos e vontades, que ficaram encobertos e
anulados durante todo o período em que conviveram em uma relação marcada pela violência.
Desta forma, elas poderão ter coragem para sair da relação que, durante muito tempo, tirou delas
a condição de ser humano, tornando-as alienadas de si mesmas. Este é um processo que continua

16
ativo durante um longo período no psiquismo da mulher, mesmo que ela já tenha colocado um
ponto final na relação. Pois, no período em que sofreu as violências, o parceiro a desqualificava
de todas as formas, através da violência psicológica e moral. (HIRIGOYEN, 2006; SOARES, 2005).
A introjeção das mensagens impostas pelo seu agressor fez com que sua autoestima se tornasse
cada vez menor, fazendo-a se sentir cada vez mais como um objeto, deixando de ser um sujeito
dotado de vontades e saberes (HIRIGOYEN, 2006; SOARES, 2005).
De acordo com Bastos (2009) a escuta do terapeuta quando feita de forma adequada e ativa, é
um fator de facilitação da auto expressão da pessoa em atendimento psicológico, mas escutar
não é o mesmo que ouvir. Quando a pessoa diz estar ouvindo algo, isto se remete, ao próprio
fato de estar conseguindo a partir do seu aparelho auditivo assimilar sons. Quando se fala em
escuta, fala-se mais do que simplesmente ouvir. A escuta é quando, além de ouvir, nós prestamos
atenção naquilo que está sendo dito, esta é uma atenção flutuante, ou seja, que não se prende a
um determinado ponto da fala do outro, mas sim, no todo do que está sendo dito. A escuta ativa
prende a atenção do profissional que o faz prestar mais atenção e curiosidade sobre o que está
por vir na fala do sujeito. Quando se utiliza a escuta ativa o psicólogo pode fazer intervenções
inesperadas, que faça com que o sujeito pense de forma diferente da que havia pensado até
então.
No trabalho feito com as mulheres vítimas de violência é fundamental que o psicólogo faça uma
escuta ativa. “É preciso ajudá-las a verbalizar, a compreender sua experiência e, então, levá-las a
criticar essa experiência” (p. 183). Pois, a partir da compreensão e da ampliação da consciência
de suas experiências, a mulher conseguirá se proteger da violência, bem como resgatar sua
identidade. (HIRIGOYEN, 2006).
É necessário que o profissional tenha paciência e saiba ou aprenda a lidar com a frustração. Se
ele possui um papel muito ativo na psicoterapia, querendo que a mulher elabore e realize
mudanças, a seu modo e seu tempo, poderá encontrar dificuldades para conduzir o tratamento
e, inclusive, fazer que com que a mulher se sinta pressionada a ponto de desistir do processo
terapêutico. O ritmo do trabalho feito com mulheres vítimas de violência, muitas vezes, é mais
lento, e marcado por altos e baixos. As mulheres, mesmo durante o tratamento, podem vir a
reatar o relacionamento com o agressor. Neste momento, o psicólogo deverá tomar cuidado para
não julgar esta decisão a seu próprio modo. É um trabalho que exige do profissional muita
paciência, pois a mulher precisa mudar sua visão a respeito de fenômenos que foram
naturalizados por ela. (HIRIGOYEN, 2006).
Segundo Hirigoyen (2006), existem algumas etapas que devem ser seguidas no processo
terapêutico com mulheres que já foram ou são vítimas de violência doméstica. O primeiro passo
da psicoterapia é fazer com que a mulher enxergue a violência sofrida tal qual ela é. Muitas

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mulheres possuem dificuldades para perceber que se encontram numa relação perpetuada pela
violência. Até pelo fato de já terem tomado a violência sofrida como algo natural, principalmente,
quando se trata da violência psicológica, que ocorre de forma mais sutil o que dificulta sua
identificação. A partir do momento em que a mulher reconhece a violência sofrida, que este tipo
de comportamento é abusivo e traz sofrimentos para sua pessoa ela terá capacidade de mobilizar
recursos para sair dessa situação.
A mulher que foi vítima de violência, em muitos casos, é transformada em abjeto pelo seu
companheiro e depois por ela mesma que aceita e introjeta de forma passiva aquilo que o homem
diz a seu respeito. O psicólogo fará o papel de auxiliar a mulher a perceber que ela experienciou
uma situação de violência praticada pelo seu companheiro ou ex-companheiro, mas que a culpa
não foi dela. Muitas mulheres justificam a ação praticada pelo homem culpando-se ou atribuindo
a causa da violência a fatores externos a ele. Contudo, isto é um dos objetivos dos homens
violentos. Eles negam a responsabilidade pelo ato agressivo e tentam de todas as formas fazer
com que a mulher acredite que a culpa foi dela. (HIRIGOYEN, 2006).
Muitas vítimas possuem dificuldade para reconhecer a violência como algo fora do padrão normal
de relacionamento. Muitas se perguntam se a atitude do parceiro foi uma violência ou não. Uma
das intervenções que o psicólogo poderia fazer seria questionar a pergunta da vítima, a fim de
fazer com que ela mesma pense e chegue a sua conclusão. Uma boa pergunta seria: “Se você
fizesse a mesma coisa, como é que seu cônjuge reagiria?”. (HIRIGOYEN, 2006).
A psicoterapia se diferencia do atendimento psicossocial em grupo ou individual, pois, na
psicoterapia, o principal objetivo é ampliar a consciência da significação dada pela vítima às
agressões do parceiro, do processo de negação e repressão de experiências, que podem acirrar
o sofrimento e o conflito com o outro. Já na intervenção psicossocial o objetivo é empoderar a
vítima para transformar ou sair da situação de violência, descobrindo formas de lutar pelos seus
direitos, realizar seus desejos e objetivos de vida. (TENÓRIO, comunicação pessoal, 28/10/2012).
Na psicoterapia, o psicólogo precisa adotar uma postura ativa e mostrar para a mulher de maneira
clara, que as atitudes aparentemente normais do parceiro, que lhe causaram algum tipo de
vergonha, ou insegurança, ne verdade são de caráter violento. (TENÓRIO, comunicação pessoal,
28/10/2012).
Nesse contexto, o psicólogo não deve adotar uma postura neutra, pois as mulheres vítimas de
violência buscam apoio e assistência. O terapeuta pode intervir solicitando ao paciente que
nomeie aquilo que é agressivo para ele e fale como se sente diante de um comportamento
agressivo, sem negar suas emoções, pois, assim, o paciente consegue sair do bloqueio emocional.
Esta intervenção auxilia o paciente a dar nome à violência sofrida, bem como, a reconhecer suas

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emoções que durante muitos anos foram negadas e reprimidas. Auxilia no processo de
construção do sujeito, como ser no mundo. (HIRIGOYEN, 2006).
Outra etapa do processo terapêutico é fazer com que a mulher não se sinta responsável ou
culpada pela violência sofrida. Pois o parceiro, utilizando-se de vários tipos de manipulação, a fez
acreditar que a culpa é dela. Na psicoterapia o caminho é fazer com que a pessoa se sinta
responsável pelo próprio destino. No atendimento à vítima, o trabalho também será feito desta
forma, evidenciando as possibilidades de mudança que a pessoa vitimada pode fazer em relação
ao agressor e isso só depende dela. (HIRIGOYEN, 2006).
Na psicoterapia, o objetivo é trabalhar para que as vítimas se sintam livres de uma culpa que não
é delas. Para que isso seja feito, a vítima deve saber que quando se encontra numa relação de
violência a dificuldade de reagir é maior, porque ela se encontra sob influência e manipulação do
outro, o que impede a percepção da realidade tal como ela é. Quando a mulher consegue
enxergar que ela não é culpada, que na verdade é vítima e quem deve se responsabilizar pela
relação violenta é o parceiro, as soluções começam a aparecer. (HIRIGOYEN, 2006).
No entanto, a atuação do psicólogo deve ter esse formato quando a relação conjugal violenta é
assimétrica. Isto é, o homem assume, visivelmente, o papel de dominador e a mulher de
dominada. Nesse papel, a mulher se sente frágil e impotente diante de seu agressor,
submetendo-se a este e introjetando a culpa que é dele. Nesse contexto, a mulher vivencia uma
situação de impasse, pois embora esteja sofrendo na relação, a possibilidade de separação
também é insuportável, devido ao sentimento de incapacidade para reconstruir sua vida sem o
parceiro. Na violência conjugal assimétrica, a vítima, geralmente, mantém uma relação de
codependência em relação ao agressor, tornando-se indispensável o resgate da autoestima,
autoconfiança e autonomia através de um processo de conscientização de si mesma, de suas
necessidades, desejos, potencialidades e capacidade para transformar sua vida e promover sua
autorrealização independente do outro. (TENÓRIO, comunicação pessoal, 28/10/2012).
No contexto da violência a mulher possui uma autoestima baixa, não acredita em si mesma, pois
aprendeu durante anos a ser submissa, sem autonomia para tomar decisões e fazer escolhas por
conta própria. É esse o fenômeno do assujeitamento que deverá ser trabalhado na psicoterapia.
Uma das possibilidades de realizar esse trabalho é pedir para que ela faça listas contendo seus
pontos positivos e suas conquistas diante da vida. Desta forma, ela perceberá que é capaz de
alcançar novos objetivos, terá possibilidades de pensar em novos sonhos e metas para sua vida.
É um processo de libertação, de reconquista e reconhecimento. A pessoa consegue superar o
sofrimento psíquico quando possui uma boa autoimagem, quando tiveram na infância boas
experiências afetivas, produzindo o sentimento de segurança e confiança em si mesma. Para
conseguir mudar sua história a mulher precisa, primeiramente, aceitar a história que construiu

19
até o momento. É a partir da aceitação de si mesma e da sua história que ocorrem as
possibilidades de mudança subjetiva. (HIRIGOYEN, 2006).
Outro aspecto importante a ser trabalhado durante o processo terapêutico é aprender a
estabelecer limites. Em um relacionamento marcado pela violência, onde o homem exerce seu
poder e dominação sobre a mulher, esta fica impossibilitada de reagir e colocar seus limites.
Portanto, uma etapa importante do processo é ensinar a mulher a impor suas vontades. Quando
a mulher demarca seus limites de forma clara, o parceiro os compreende e percebe que não pode
ultrapassá-los. Na terapia, isso não acontece do dia para a noite, é um processo longo, no qual as
mudanças podem ser percebidas aos poucos. “Dizer eu não quero permite retomar o poder. É
importante ser senhora das suas escolhas.” (p.187). A mulher precisa reconhecer seu próprio
limite para estabelecê-los. Algumas se perguntam se amam o agressor o suficiente. Contudo, a
questão não é o amor. A questão é se apesar do amor, o relacionamento nos faz bem. Se amamos
algo que para nossa saúde física, psíquica e mental nos é destrutivo, qual caminho devemos
escolher? (HIRIGOYEN, 2006).
Quando a mulher se encontra num processo de psicoterapia ela começa a recuperar sua
capacidade crítica sobre as coisas que são boas ou ruins para ela. Percebem quando começa a
ocorrer uma violência e quando o homem é violento e percebe também que estes
comportamentos do homem servem para esconder seus próprios medos e fragilidades. “A
submissão cessa quando a vítima se conscientiza de que, se não ceder, o outro não terá nenhum
poder”. (HIRIGOYEN, 2006, p.188).
Trabalhado esses aspectos acima, poderá ser feito com o paciente, uma análise da sua história
individual, a fim de compreender em quais momentos da sua vida ela se tornou vulnerável a este
tipo de relacionamento e criar possibilidades de mudanças subjetivas.
É importante analisar e compreender se existem na mulher traços de codependência emocional.
Assim como uma pessoa pode torna-se dependente de substâncias entorpecentes como álcool
ou drogas. A mulher pode se tornar dependente do parceiro agressor. A codependência pode ser
compreendida como “uma condição emocional, psicológica e comportamental que se desenvolve
como resultado da exposição prolongada de um indivíduo a – e a prática de – um conjunto de
regras opressivas que evitam a manifestação aberta de sentimentos e a discussão direta de
problemas pessoais e interpessoais”. É importante compreender se a mulher possui
características codependentes porque quando se descobre o problema é possível encontrar uma
solução, bem como direcionar o tratamento da psicoterapia. (BEATTIE, 1992).
Muitos desses procedimentos também são aplicados no atendimento psicossocial individual e de
grupo, a diferença é que nesse tipo de atendimento as questões emocionais ligadas a situações
mal resolvidas no passado e os mecanismos de defesa que dificultam a consciência dos motivos

20
que a fazem permanecer na relação violenta não são trabalhados, como acontece no
atendimento psicoterápico individual.
No acompanhamento psicológico com a mulher, vítima de violência doméstica, o psicólogo deve
ajudá-la a transformar sua autoimagem e a resgatar sua autoestima, que durante a relação
violenta pode ter sido minada com sentimentos de menos valia, impotência, incapacidade, culpa
e insegurança. Outra questão importante que o psicólogo deve trabalhar com a vítima é a
ampliação da consciência, para que ela perceba os motivos que a fazem continuar na relação,
que a fazem permanecer fixada no algoz. O profissional deve ajudá-la a identificar quais são as
perdas e os ganhos que ela tem ao continuar fixada na relação. Outro aspecto importante a ser
trabalhado é auxiliar a vítima a mobilizar energia, para sair da situação de submissão e do papel
de dominada no qual se encontra. Para isso a vítima precisa mudar sua postura diante do agressor
ou reconstruir sua vida longe dele. (TENÓRIO, 2012).

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Nova Lógica Assistencial em Saúde Mental
Falar em políticas de saúde mental no Brasil é uma possibilidade recente, conquistada a partir do
processo de reforma psiquiátrica. A assistência psiquiátrica brasileira surgiu da função saneadora
dos primeiros hospícios, assumindo um papel excludente, sem fazer-se acompanhar dos
psiquiatras. É em 1890 que é criada sob administração pública a Assistência Médico-Legal aos
Alienados, de caráter predominantemente asilar.
Nos anos 1960, inicia-se o debate sobre a necessidade de mudanças na assistência e a
incorporação de propostas desenvolvidas na Europa, como a psiquiatria preventiva e comunitária
– expandindo serviços intermediários; e as comunidades terapêuticas – buscando a humanização
dos hospitais.
Só em 1978 começa a ser constituído o movimento de reforma psiquiátrica brasileiro, ganhando
expressão o Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental (MTSM), que num primeiro
momento incorpora críticas ao hospitalocentrismo, às más condições de trabalho e de
tratamento e à privatização da assistência psiquiátrica, marcando sua entrada no aparelho
público.
Em aliança com o Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (CEBES), articulador político-ideológico
da reforma sanitária, o MTSM fortaleceu seu discurso técnico e desenvolveu sua postura política.
No final da década de 1980, ocorre uma inflexão em sua trajetória com a incorporação da noção
de desinstitucionalização na tradição Basagliana, ou seja, uma ruptura com o paradigma
psiquiátrico, denunciando seu fracasso em agir na cura, sua aparente neutralidade científica, sua
função normalizadora e excludente, e a irrecuperabilidade do hospital como dispositivo
assistencial 4. O MTSM passa a apostar na desconstrução da instituição manicômio, entendida
como todo aparato disciplinar, institucional, ideológico, técnico, jurídico etc., que lhe confere
sustentação, e em 1987, adota o lema "por uma sociedade sem manicômios", que alimenta novas
propostas de cuidado na I Conferência Nacional de Saúde Mental (I CNSM).
Das importantes experiências desenvolvidas nesse processo, uma delas ganha destaque pela
aproximação com a experiência Basagliana: em 1989 o Município de Santos, São Paulo, implanta
uma rede essencialmente pública de atenção territorial, de caráter substitutivo ao hospital e
composto de uma estrutura complexa, capaz de responder a qualquer tipo de demanda
psiquiátrico-psicológica e de caráter social. No mesmo ano é apresentado pelo Dep. Paulo
Delgado, o Projeto de Lei nº. 3.657/89, dispondo "sobre a extinção progressiva dos manicômios
e sua substituição por outros recursos assistenciais e regulamentava a internação psiquiátrica
compulsória".
Num contexto de rediscussão do papel do Estado na saúde, de redemocratização e de
desenvolvimento dos ideais da reforma sanitária, a Constituição Federal, de 1988, institui o

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Sistema Único de Saúde (SUS) com seus princípios – universalização, integralidade,
descentralização e participação popular, e seu processo de implementação inicia-se com as Leis
nº. 8.080/90 e nº. 8.142/90. Criam-se condições de possibilidade para a instituição no Ministério
da Saúde, em 1991, da Coordenação Nacional de Saúde Mental, instância inédita no Brasil,
responsável pela formulação e implementação política na área.
Tais inflexões – a criação dessa coordenação e a institucionalização do SUS – são o ponto de
partida desta análise, cujo objetivo é traçar a trajetória de construção da política nacional de
saúde mental no período de 1990 a 2004 e identificar as linhas de atuação priorizadas em cada
momento – nomeados momento germinativo, de latência, de retomada e de expansão, e a
construção do modelo assistencial.

As Bases de uma Política Nascente


Em 1991 a Coordenação Nacional de Saúde Mental e a Organização Pan-Americana da Saúde
(OPAS) patrocinaram um encontro com objetivo de construir um documento/instrumento de
referência para a política a ser adotada no Brasil e para o trabalho cotidiano na área 5. A política
de saúde mental do Ministério da Saúde então divulgada apresentava a necessidade de superar
uma assistência de má qualidade, custosa financeira e socialmente, superando o modelo
iatrogênico através da diversificação dos recursos terapêuticos com financiamento dos mesmos
e "equacionamento da questão 'saúde mental' como problema do município" 5 (p. 216).
Declarava-se a aposta na descentralização como potencializadora de novas relações políticas e
culturais.
Foi salientada a questão do resgate da cidadania, e em apoio ao Projeto de Lei nº. 3.657/89, do
Dep. Paulo Delgado, buscava-se desvincular a internação da interdição civil, além de possibilitar
ao portador de transtorno mental a participação na condução de seu tratamento e uma vida
ativa.
Esse encontro foi marcado pela articulação das propostas Basaglianas com os princípios da
Declaração de Caracas, que pede a retirada do hospital de seu papel hegemônico, a
reestruturação da assistência ligada ao atendimento em nível primário, o respeito aos direitos
humanos dos portadores de transtornos mentais, a formação de recursos humanos voltada para
o atendimento comunitário e a revisão da legislação dos países.
Essa articulação abria possibilidade de dubiedade da ação que passaria a ser desenvolvida pela
Coordenação Nacional de Saúde Mental. Os pressupostos que embasam cada vertente
apresentam incongruências que, se num primeiro momento passam despercebidas, brevemente
ganham materialidade em torno de questões como: o conceito de Atenção Primária em Saúde
em contraposição ao de Atenção Básica e seus efeitos sobre a responsabilização territorial com a

23
organização de múltiplos e complexos dispositivos de assistência; a participação do Estado e seu
envolvimento com a comunidade na produção de saúde; e a lógica que informa a proposta de
descentralização que pode servir tanto a propósitos normatizadores, ligados a uma racionalização
econômica e administrativa, ou a propósitos de caráter político, voltados para a participação da
sociedade nos processos locais potencialmente promotores da desinstitucionalização. Ademais,
a Declaração de Caracas não toca no aspecto da desconstrução do saber psiquiátrico que está no
cerne das experiências vividas em Trieste (na Itália) e em Santos (Estado de São Paulo, Brasil).
Em suma, esse é um contexto de efervescência teórico-ideológica em torno do direcionamento
da reforma psiquiátrica brasileira, e no que tange ao sistema de saúde, o momento é de
regulamentação e implementação das leis que regem o SUS. Sua organização é marcada pela
diretriz da descentralização, que tem sido coordenada pelas Normas Operacionais Básicas (NOBs)
desde 1991, e seu conteúdo, voltado preferencialmente para os aspectos de financiamento e
prestação de serviços, impactam na construção do modelo assistencial em saúde mental.
Entendido o contexto no qual tem início a política brasileira de saúde mental, podemos
apresentar uma breve análise dessa produção.

A política de saúde mental na década expandida (1990 a 2004)


A produção normativa está organizada temporalmente em quatro momentos – germinativo, de
latência, de retomada e de expansão – com características específicas e duração variada. Em cada
um são explicitados os principais elementos que norteiam a ação política, buscando correlação
com o contexto mais geral do SUS bem como com os argumentos que a princípio respaldavam o
movimento de reforma psiquiátrica.
Momento germinativo: 1990 a 1996
O ano de 1990 vivencia a extinção da Divisão Nacional de Saúde Mental (DINSAM), responsável
pela Campanha Nacional de Saúde Mental e pelo pagamento de alguns hospitais psiquiátricos
públicos, mas sem atuação de proposição 6. Em 1991 é criada a Coordenação Nacional de Saúde
Mental, tendo como primeiro coordenador um funcionário de carreira do Ministério da Saúde e
militante da reforma psiquiátrica. O coordenador permanece no cargo durante cinco anos,
atravessando cinco mandatos ministeriais com forte articulação política tanto internamente
quanto externamente ao Ministério da Saúde, mas principalmente com gestores de outros níveis
de governo, quando é organizado o Colegiado dos Coordenadores Estaduais.
Configura-se nesse período da política nacional de saúde mental o que denominamos o momento
germinativo. Primeiro, porque é a partir deste que há uma grande articulação de atores na
discussão dessa política, com a constituição de grupos de trabalho diferenciados, parcerias
formais e informais, diálogo com consultores etc. – o que se expressa com a realização da II

24
CNSM. Segundo, pela ascensão de debates e audiências promovidas em torno do Projeto de Lei
nº. 3.657/89, possibilitando a explicitação de personagens e grupos de interesse e o
desenvolvimento de propostas de atuação política.
O caráter germinativo também é atribuído à atuação da coordenação na organização da
assistência hospitalar, com o viés da desospitalização, fundamentada em ações de avaliação e
acreditação hospitalar. O primeiro documento normativo nesse sentido foi editado em 1991: a
Portaria SNAS nº. 189/91 (Tabela 1), normatizava grupos de procedimentos do Sistema de
Informações Hospitalares (SIH) e do Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA) possibilitando o
custeio de ações e serviços alternativos 6.
Seu ponto forte é a alteração do financiamento, mas estão presentes também a especificação de
rotinas e os prazos para apresentação de Autorização de Internação Hospitalar (AIH), bem como
normatização para internações e hospital-dia. Essa Portaria desdobra-se em quatro linhas de
atuação que terão prosseguimento diferenciado nos documentos normativos seguintes: (1)
qualificação/desospitalização; (2) avaliação; (3) Autorização de Internação Hospitalar (AIH); (4)
Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e SIA.
• Qualificação/Desospitalização
Essa linha de atuação é composta das Portarias voltadas para organização de grupos e
procedimentos do SIH, referente aos serviços hospitalares e de hospital-dia. Em sequência ao
item 1 da Portaria germinativa (Portaria SNAS nº. 189/91), as outras editadas nos anos de 1992 a
1996 organizam a classificação das unidades hospitalares com vistas a um processo de
acreditação com prazos e sanções estabelecidos. O objetivo é melhorar as condições hospitalares
e ao mesmo tempo induzir a desospitalização, na medida em que, não atendidos os prazos, as
unidades são descredenciadas. Para os acreditados é previsto reajuste de pagamento
diferenciado. Dezoito Portarias compõem a linha de atuação durante esse período (Tabela 1).
• Avaliação
Apenas duas Portarias compõem esta linha de atuação, e, apesar de a primeira ter sido publicada
apenas em 1993 (Portaria SAS nº. 63/93; Tabela 1), a avaliação é um processo que subsidia a
qualificação e a desospitalização, enfocando a correta aplicação das normas dessa linha de
atuação. Neste momento, a avaliação era feita por um grupo de composição multiprofissional e
de diversos níveis de gestão, bem como por representantes de diferentes entidades interessadas.
A segunda Portaria desta linha (Portaria SAS nº. 145/94) indica a criação do grupo de avaliação
nas três esferas de governo, e possibilita a inspeção de unidades do SIA ou do SIH, mas prioriza
os hospitais, que são selecionados via sorteio, denúncias ou solicitações, e atribui as atividades
de elaboração de formulário de indicadores e de relatórios, e aplicação das sanções previstas.
•Autorização de Internação Hospitalar (AIH)

25
Essa linha de atuação também tem origem na Portaria SNAS nº. 189/91, tendo gerado mais duas:
Portaria SAS nº. 22/94 e Portaria SAS nº. 119/96. Visa à regulamentação da sistemática de
pagamento de AIH, determinando sobre duração de internação e prazos. Este é um ramo menos
expressivo, mas que traz implicações importantes para o manejo das internações, e, como a
avaliação, é diretamente relacionada com o processo de qualificação e desospitalização.
Ilustrativa é a ocorrência de portarias que se enquadram simultaneamente em mais de uma
dessas três linhas de atuação, ilustrando tanto o potencial germinativo quanto o fato de
comporem um bloco único e indissociável referido ao sistema hospitalar.
• Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA)
Linha que visa à organização de grupos e procedimentos do SIA, incluindo atendimento em CAPS
e Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS), atendimento em oficinas terapêuticas e em grupo,
visita domiciliar e psicodiagnóstico, abarcando ações e serviços para conformação de um modelo
assistencial de base comunitária. Apenas duas portarias compõem este ramo: Portaria SNAS nº.
189/91 e Portaria SNAS nº. 224/92. O pequeno desdobramento desta linhagem neste momento
pode ser atribuído a alguns fatores: primeiro, o SUS ainda não dispunha de recursos significativos
para a implantação de novas unidades, garantindo apenas custeio. As NOBs de 1991 e 1993, que
entre outras coisas normatizam a descentralização financeira do SUS, são expedidas em contexto
de arrocho financeiro, e apenas a partir de 1994 logram construir condições de gestão e de
repasse de recursos que, segundo as prioridades municipais e/ou estaduais, podem ser usados
na construção de novas unidades. Nesse caso, a construção de CAPS fica na dependência de sua
entrada na agenda do gestor local. Segundo, neste momento o debate político acirrava-se em
torno do Projeto de Lei nº. 3.657/89, direcionando esforços para as tensões relacionadas ao setor
hospitalar.
Acompanhando o cenário de produção normativa constata-se o avanço no processo de
desospitalização, que contou ainda com o descadastramento de leitos de cobrança que não
existiam de fato, enquanto a expansão dos CAPS não encontrou seu momento mais forte.
Ressalte-se o potencial germinativo da produção normativa de 1991 a 1996, pois, apesar de não
haver configurado um desenho de modelo assistencial que vislumbrasse o que o movimento pela
reforma psiquiátrica ansiava, ou seja, uma rede de serviços de complexidade e territorializada tal
qual aquela composta em Trieste ou em Santos, preparava terreno para a construção de uma
rede ampla através do enfrentamento da questão da desospitalização e da abertura do
financiamento, bem como através da construção de consensos e de legitimidade em torno da
política de saúde mental.
Em meados de 1996 o então coordenador deixa o cargo, e logo em seguida ocorre mudança de
Ministro da Saúde.

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Momento de latência: 1997 a 1999
Neste período a coordenação foi assumida pelo vice do coordenador anterior. Importava manter
no cargo uma pessoa afinada com a estratégia desenvolvida até então. O novo Ministro da Saúde
entraria com um perfil de atuação voltada para harmonização com as teses econômicas do
governo e efetuou mudanças na estrutura do Ministério da Saúde que repercutiram na condução
política da saúde mental. Em 1997 foi instituída a Secretaria de Políticas de Saúde (SPS),
responsável pela coordenação da formulação política e da avaliação no âmbito do SUS 7. Essa
mudança levou a um enfraquecimento da SAS, que abrigava a Coordenação Nacional de Saúde
Mental. E esta foi desarticulada enquanto estrutura de formulação política, sendo alocada na SPS
com um caráter mais consultivo que propositivo, e sem poder de articulação interna ou externa.
Com isso, os anos de 1997 e 1998 são vazios de Portarias. É ilustrativa a Resolução nº. 272/98 do
CNS que propõe "criar a comissão visando estabelecer interlocução com o Ministério da Saúde
para análise dos fatores que têm determinado o não cumprimento adequado das metas e
estratégias da reforma psiquiátrica uma vez que o próprio conselho já havia se pronunciado sobre
a matéria" 8. Desde a criação da Comissão Nacional de Reforma Psiquiátrica (CNRP) do CNS, este
tem se mostrado um importante interlocutor tanto na articulação de interesses quanto na
formulação de propostas e na cobrança de ações na área.
Em 1999 é publicada apenas uma Portaria, que não chega a promover uma linha de atuação: a
GM nº. 1.077/99 6 (Tabela 1). Esta implanta o Programa para Aquisição dos Medicamentos
Essenciais para a Área de Saúde Mental e constitui um grupo técnico-assessor para avaliar o
impacto na reestruturação do modelo de atenção. Também é promulgada a Lei nº. 9.867/99, que
cria as Cooperativas Sociais, beneficiando inclusive a clientela psiquiátrica 6.
É provável que essa breve produção em 1999 se deva à entrada, no ano anterior, quando também
há mudança de Ministro da Saúde, do novo coordenador da política de saúde mental, também
militante da reforma psiquiátrica. No entanto, mantinha-se a estrutura ministerial que pouco
privilegiava o andamento do que estava sendo construído anteriormente. Por outro lado, o CNS
mostra-se atuante, produzindo Resoluções coerentes com o projeto do movimento da reforma
psiquiátrica. Por essa queda de produção normativa, pelo fato de o cargo de coordenador ter se
mantido nas mãos de militantes da reforma psiquiátrica, e pela manutenção de propostas
compatíveis por parte do CNS é que chamamos este de momento de latência, quando a coerência
interna da condução política é subentendida.
Momento de retomada: 2000 a 2001
Em 2000, nova estrutura ministerial é adotada, e as coordenações de áreas técnicas, como a de
saúde mental, voltam para a SAS, significando o retorno a um ambiente propício à alavancagem
da política da área.

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Ainda como fruto da coordenação assumida em 1998, é publicada a GM nº. 106/00, que cria a
linha de atuação dos Serviços Residenciais Terapêuticos, proposta que se encontrava em
maturação desde o início da Coordenação Nacional de Saúde Mental, contando com o CNS para
não deixar ficar apenas como ideia, e objetiva tornar mais exequível a desospitalização de
pacientes que passaram por longas internações. É possível discutir se esse serviço seria uma
modalidade assistencial e terapêutica, ou se se trata de uma estratégia de fortalecimento do
modelo assistencial.
Desde 1999, denúncias de maus tratos e negligência em hospitais psiquiátricos foram ganhando
espaço na mídia levando a forte comoção da sociedade. Uma questão de tamanha visibilidade,
cobrada por um movimento social atuante, requeria uma resposta urgente do Ministério da
Saúde, que foi a publicação da GM nº. 799/00, que retoma a linha de atuação da desospitalização
com uma outra conotação, mais próxima da avaliação 6. Produzida no curto intervalo entre a
entrada de um coordenador e a saída de outro, essa portaria instituiu o Programa Permanente
de Organização e Acompanhamento das Ações Assistenciais em Saúde Mental. A composição do
grupo de avaliação conta com um representante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara
dos Deputados, que neste ano realizou a I Caravana Nacional de Direitos Humanos, percorrendo
os hospitais psiquiátricos do país, e retomou a discussão do Projeto de Lei da reforma psiquiátrica.
Não foi estabelecida avaliação sistemática que englobasse todas as unidades do SUS, mas
respondeu a uma situação emergencial.
Neste ano 2000, um novo Coordenador de Saúde Mental – que permanece no cargo até os dias
atuais, militante da reforma psiquiátrica e do Partido dos Trabalhadores (PT), e envolvido com a
formulação do Projeto de Lei nº. 3.657/89, assume o cargo num contexto da gestão ministerial e
do governo do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Isso ilustra que a escolha do novo
coordenador é norteada principalmente pelo seu perfil técnico e pelo seu envolvimento histórico
com os movimentos sociais que embasam a reforma psiquiátrica brasileira. Isso nos permite
chegar a esse momento afirmando que desde o nascimento da política de saúde mental, sua
coordenação não tem sofrido intempéries de outros critérios de nomeação que não aqueles de
um alinhamento com o movimento informante da reforma psiquiátrica. Se os ideais deste
movimento ainda não gozam do status de hegemônico, por outro lado conseguiram firmar sua
legitimidade na sociedade e no aparelho público.
A primeira portaria dessa coordenação, GM nº. 1.220/00, faz a inclusão na tabela SIA do Serviço
Residencial Terapêutico e do código para cuidador em saúde, sendo a segunda portaria dessa
linha de atuação que será seguida por apenas mais uma em 2001: GM nº. 175/01 6. Esse
dispositivo assistencial inaugura, para a saúde mental, o uso do Fundo de Ações Estratégicas e de
Compensação (FAEC). Criado a partir de algumas alterações da NOB de 1996, o FAEC é parte da

28
estratégia do Ministério da Saúde de arregimentar maior fonte de recursos e tem sido empregado
em ações de indução de modelo assistencial 7,9.
Duas portarias em 2001 retomam a linha de atuação da AIH: SAS nº. 111/01 e GM nº. 469/01
(Tabela 1). Esta segunda foi gestada fora da Coordenação Nacional de Saúde Mental e propõe um
mecanismo de classificação hospitalar perverso de acordo com a quantidade de internação
paciente/mês. Com um discurso de otimização do aparato hospitalar, quanto maior a quantidade
de AIH emitidas, maior a remuneração. A coordenação logra revogá-la com a GM nº. 251/02.
O ano de 2001 é marcado por dois eventos cruciais para a política de saúde mental: a aprovação,
em abril, da Lei nº. 10.216 6, a lei da reforma psiquiátrica; e a realização da III CNSM, com ampla
participação e a elaboração de um relatório final extenso, com propostas variadas, às vezes
conflitantes, mas certamente voltadas entre outras coisas para inovação do modelo assistencial
e expansão da rede de serviços alternativos. Esse processo deixa marca através das portarias
produzidas no momento seguinte: a maioria delas tem ligação direta com o relatório da III CNSM
ou com seminários que passaram a ser mais frequentemente organizados pela Coordenação
Nacional de Saúde Mental.
Em suma, justifica a nomeação deste como momento de retomada: a entrada do novo
coordenador, o retorno da Coordenação Nacional de Saúde Mental à SAS, a aprovação da Lei nº.
10.216 e a realização da III CNSM, e a retomada propositiva com a inauguração de uma nova linha
de atuação – Serviços Residenciais Terapêuticos – e a recuperação de outras – avaliação e AIH.
Momento de expansão: 2002 a 2004
Esse momento expande o desenho de um modelo assistencial diversificando suas linhas de
atuação: (1) avaliação/desospitalização; (2) Programa De Volta para Casa; (3) CAPS.
• Avaliação/Desospitalização
Essa linha foi retomada com a GM nº. 799/00 (Tabela 1), portando uma inflexão – o processo de
qualificação perdeu peso em relação ao de avaliação dos serviços hospitalares, por isso a
recomposição da linha de atuação. Fica cada vez mais explícita a política de redução do porte
hospitalar, culminando com o Programa Anual de Reestruturação da Assistência Psiquiátrica
Hospitalar no SUS, apresentado em 2004 (GM nº. 52/04). Desde a GM nº. 251/02, o processo de
avaliação torna-se significativamente diferenciado do que era realizado até então com a entrada
do Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares (PNASH-Psiquiatria), de cunho mais
técnico e com vistorias mais regulares. Essa linha é representada por nove Portarias (Tabela 1).
• Programa De Volta Para Casa
Apesar de ganhar oficialidade apenas em 2003, essa linha de atuação já vinha sendo maturada,
ora pela Coordenação Nacional de Saúde Mental, ora pelo CNS, ora nos espaços de conferências
e seminários, desde o início da década de 1990. Esse ramo normatiza o Auxílio-Reabilitação

29
Psicossocial, que além de tornar mais exequível a desospitalização de pessoas que passaram por
internações longas e não dispõem de trabalho ou outra fonte de renda, é um facilitador no
processo de inserção social. A construção desse grupo de Portarias foi possível mediante
alteração no reconhecimento civil dos portadores de transtornos mentais e instituição do Auxílio-
Reabilitação Psicossocial pela Lei nº. 10.708/03. A aprovação da Lei nº. 10.216/01 e a III CNSM
foram decisivas no desengavetar dessa proposta. Não se trata de um dispositivo assistencial
propriamente dito, mas de um dispositivo que vem fortalecer os demais recursos do modelo
assistencial. A produção de Portarias dessa linha é pontual e concentrada, contando com apenas
duas (Tabela 1).
• Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)
Linha de atuação diretamente sensível à III CNSM, que tirou a recomendação de nova
regulamentação e ênfase na expansão dessa modalidade assistencial. Os procedimentos do CAPS
passam a ser remunerados de acordo com a frequência dos usuários, e cria-se a classificação em
CAPS I, II ou III de acordo com a abrangência populacional. Mais uma vez a área da saúde mental
é contemplada com recursos do FAEC, o que contribuiu sobremaneira para a expansão da rede,
já que houve verba para implantar novas unidades, para fazer o custeio dos procedimentos extra-
teto e para alguns programas de formação/capacitação. Surgiram os Centros de Atenção
Psicossocial Infantil (CAPSi), voltados para crianças e adolescentes, e os Centros de Atenção
Psicossocial para Álcool e Outras Drogas (CAPSad), voltados para pacientes com transtornos
decorrentes do uso e dependência de substâncias psicoativas. Todos os tipos de CAPS encontram
uma normatização comum nas Portarias GM nº. 336 e SAS nº. 189, ambas de 2002. Neste ano e
em 2003 são produzidas mais oito normativas, mas o desdobramento desta linha de atuação
configura um total de três destinadas aos CAPSi, quatro aos CAPSad e duas aos CAPS I, II e III,
conforme expresso na Tabela 2.
O FAEC, pela expansão de seu montante desde 2001, pôde incorporar novas ações programáticas
e expandir políticas mais específicas no bojo da nova tipologia dos CAPS. Com isso foi possível,
em 2003, passar a tratar a política de saúde voltada para usuários de álcool e outras drogas como
uma política e não como um programa. Além disso, a Norma Operacional da Assistência à Saúde
(NOAS) 01/01 induz um enfoque na abrangência populacional, e as portarias de incentivos para
CAPS apresentam planos de expansão que contemplam municípios de grande porte.
Apesar de não formarem uma linha de atuação, outras normas importantes foram publicadas
neste momento de expansão. A GM nº. 2.391/02 regulamenta a Lei da reforma psiquiátrica no
que diz respeito ao tratamento das internações voluntárias e involuntárias e os procedimentos
de notificação ao Ministério Público 6. Com as Portarias GM nº. 1.635/02 e SAS nº. 728/02, aos

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pacientes com deficiência mental e autismo passaram ser oferecidos serviços e procedimentos
específicos 6.
Este período consagra a retomada da aceleração da desospitalização e da expansão de serviços
extra-hospitalares. Por outro lado, é possível falar de certa especialização dos dispositivos
assistenciais – como as tipologias de CAPS, e das frentes de cuidado – como a regulamentação
voltada para deficiência mental e autismo. Acompanha isso a construção de dispositivos não
assistenciais que veem fortalecer o modelo de cuidado em saúde mental, como o Auxílio-
Reabilitação Psicossocial do Programa De Volta Para Casa e os Serviços Residenciais Terapêuticos.
Se no começo da década de 1990 o discurso oficial era mais voltado para a qualificação da
assistência psiquiátrica, mais recentemente volta-se para a constituição de uma rede de cuidado
em saúde mental, logrando o desenho de um novo modelo assistencial.
Considerações finais: reflexões sobre o modelo assistencial em saúde mental
Se a psiquiatria, assim como outras especialidades envolvidas no tratamento do transtorno
mental, assume a dimensão política de seu saber, sua insuficiência, e também a incurabilidade da
doença mental 3, abre-se espaço para olhar o doente como um cidadão de existência complexa,
multidimensional, portador de história e construtor de sentidos e valores. Abre-se espaço para
buscar o cuidado ao invés da cura. Quanto ao cuidado é pressuposto não ser operado
exclusivamente pelo psiquiatra, mas por todo profissional do campo da saúde mental, pelo meio
social e pelo próprio paciente. A despeito da incurabilidade da doença, a proposta do cuidado
encontra fundamento no entendimento de que é possível produzir saúde. Canguilhem 10 já nos
mostrou essa inflexão: saúde e doença não são fenômenos opostos perfeitos se compreendemos
a saúde como uma produção cotidiana de mais saúde e por melhores formas de vida.
Sob essa perspectiva, justifica-se, na construção de um modelo assistencial complexo e integral,
recorrer tanto a dispositivos assistenciais quanto não assistenciais. Nesse sentido, hoje dispomos
de várias possibilidades que visam constituir uma rede articulada.
No entanto, como já apontamos, a heterogeneidade dos embasamentos que informam a política
de saúde mental brasileira nos impõe certo impasse. Até agora essa política tem se construído
em torno da proposta da Declaração de Caracas 6 de "reestruturação" da assistência,
configurando o que sugerimos denominar, como recurso didático, "aspecto externo" do modelo
assistencial, ou seja, aquele que diz respeito à constituição dos serviços enquanto uma rede
dinâmica, coesa, articulada e complexa, tanto internamente quanto na relação com a
comunidade.
Mas a proposta Basagliana nos impele a refletir sobre o que propomos reconhecer como "aspecto
interno" do modelo, aquele voltado para gestão do trabalho de cuidado, para o espaço que os
usuários e a comunidade ocupam nessa gestão, para a porosidade do técnico e de sua ação às

31
singularidades espaço-temporais. E para isso o manicômio deve ser destruído, visto que sua
existência invalida "o resultado do trabalho do técnico na medida em que ele já é previsível, em
certas condições, e o restringem a um âmbito de ação no qual os próprios 'sucessos terapêuticos'
são garantidos (...) pela precisão com que se articula o complexo mecanismo de distribuição de
clientela" 4 (p. 257).
O desenho do aspecto interno visa garantir que as formas de cuidado não sejam pré-concebidas,
que atendam às especificidades do sujeito singular sem o "respaldo" do hospital psiquiátrico em
caso de "fracasso terapêutico". Assim, não deve haver fracasso, mas a necessidade de investir em
formas de cuidado mais adequadas, mesmo que estas nasçam e se dissolvam ininterruptamente.
Importa que o cuidado seja adequado às necessidades de quem as determina.
Esse modo de olhar internamente corresponderia ao uso das crises como Basaglia 4 (p. 255)
propõe: "os processos de crise e desestabilização que se vão produzindo dentro desses aparatos,
nas normas que os regulam e que regulam seu uso, correspondem, para os novos serviços
territoriais, a outros tantos espaços de intervenção ainda abertos...".
Isso implica uma forma sistemática de avaliação cotidiana da prestação de cuidado que deve ser
integrada com a ação de um órgão propositivo de políticas oficiais – a Coordenação Nacional de
Saúde Mental – na construção do modelo assistencial voltado para desinstitucionalização.
Fundamento disso é a compreensão de que a formulação de políticas por um nível central não é
um processo de mão única, ou pelo menos não deve ser, mas envolve o retorno, envolve a ideia
de processo 11, a ação questionadora e propositiva nesses espaços onde se dá o cuidado. A
formulação da política de saúde mental deve estar sempre no gerúndio em qualquer desses
espaços ora chamados de níveis de gestão, ora chamados de "ponta". Enfim, devem ocorrer em
espaços diferenciados sempre compondo um processo uno.
A constatação mais clara diante da análise dos documentos normativos é o fato de o modelo
assistencial em saúde mental ser recém-nascido enquanto um conjunto diversificado de
dispositivos que contemplem mais que o binômio hospital-ambulatório. A expansão dos CAPS e
a criação de financiamento para outras estruturas, tanto assistenciais quanto não assistenciais,
são ainda recentes. Seria cedo para fazermos críticas a esse modelo e para concluir se tem ou
não funcionado como uma rede complexa e articulada, se não fosse uma das premissas primeiras
da proposta da desinstitucionalização: a do questionamento como processo cotidiano de análise
do trabalho.
Com a preocupação de fazer acompanhar a maturação desse modelo assistencial de um processo
avaliativo são vários os autores dedicados ao tema 12,13, mas Barreto 14 (p. 24) nos alerta
coerentemente de que "das avaliações de qualidade não se deve esperar mais do que podem
cumprir", e que são desejáveis exatamente pelo que são e não pelo que desejariam cumprir

32
convertendo conceitos em indicadores. Ou seja, há aspectos tradicionalmente apreendidos por
pesquisas científicas e de grande interesse administrativo para avaliações qualitativas, mas, no
outro pólo, há aspectos mais avessos a sistematizações avaliativas que envolvem entre outras
coisas "efemeridades da expressão subjetiva" 14 (p. 27).
A compreensão dessa polaridade permite que identifiquemos o segundo grupo de aspectos como
constituinte dos aspectos internos do modelo assistencial. O trabalho de desinstitucionalização
não pode remeter apenas ao político, jurídico, teórico-conceitual e sócio-cultural. Não pode
esquecer de dar visibilidade e conferir concretude ao técnico-assistencial – atravessado pelas
outras dimensões, o que implica diferentes modos de olhar para a organização dos dispositivos
assistenciais, externamente e internamente.
As Portarias analisadas mostram que se cumpre a função normativa referente ao aspecto de
organização externa dos dispositivos assistenciais. No entanto, também deve ser cotidiano e
sistemático o levantamento de perguntas sobre a função da Coordenação Nacional de Saúde
Mental. Caberia fazer mais? Quais os limites, inferiores e superiores, do papel da coordenação?
Qual tem sido sua atuação na gestão, nos aspectos internos ao modelo assistencial proposto? É
função da coordenação atuar nesses aspectos? Qual tem sido a inserção dos dispositivos
assistenciais no processo de formulação política e intervenção sobre a coordenação?
O peso da atuação da Coordenação Nacional de Saúde Mental é reflexo não apenas da concepção
de qual seria seu papel, mas também do contexto político-ideológico no qual se insere. Assim, é
importante pesar o grau de institucionalidade da política e o grau de hegemonia do pensamento
que a ancora. O enfrentamento de oposições à reforma psiquiátrica e à política de saúde mental
brasileira também ajuda a desenhar o perfil de atuação da coordenação. Atualmente, sem dúvida,
é centrado em aspectos mais internos, como por exemplo, a constituição da Comissão Revisora
da Internação Involuntária. Os aliados desta reforma e desta política também se voltam para a
construção de uma agenda diferenciada, preocupada com processos avaliativos.
É certo que o espaço de construção de uma política ultrapassa o perímetro da produção
normativa, ultrapassa a oficialidade de uma política de governo expressa em Portarias, e constrói-
se em interlocuções mais ou menos formais, mais ou menos perenes, mas certamente
concorrentes com este processo. Não obstante, a produção normativa age na interlocução e na
configuração tanto do modelo assistencial quanto no cenário de debates e mostra-se um rico
recurso de análise, apontando inclusive para a necessidade de uma inflexão na agenda da política
de saúde mental.

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Psicologia Social
A psicologia social aborda as relações entre os membros de um grupo social, portanto se encontra
na fronteira entre a psicologia e a sociologia. Ela busca compreender como o homem se comporta
nas suas interações sociais. Para alguns estudiosos, porém, a comparação entre a Psicologia Social
e a Sociologia não é assim tão simples, pois ambas constituem campos independentes, que
partem de ângulos teóricos diversos. Há, portanto, uma distância considerável entre as duas,
porque enquanto a psicologia destaca o aspecto individual, a sociologia se atém à esfera social.
O que a Psicologia Social faz é revelar os graus de conexão existentes entre o ser e a sociedade à
qual ele pertence, desconstruindo a imagem de um indivíduo oposto ao grupo social. Um
postulado básico dessa disciplina é que as pessoas, por mais diversificadas que sejam,
apresentam socialmente um comportamento distinto do que expressariam se estivessem
isoladas, pois imersas na massa elas se encontram imbuídas de uma mente coletiva. É esta
instância que as leva a agir de uma forma diferente da que assumiriam individualmente. Este
ponto de vista é desenvolvido pelo cientista social Gustave Le Bon, em sua obra Psicologia das
Multidões. Este pesquisador esteve em contato com Freud e, desse debate entre ambos, surgiu
no alemão o conceito de ‘massa’, que por problemas de tradução ele interpretou como ‘grupo’,
abordando-o em suas pesquisas, que culminariam com a publicação de Psicologia de Grupo, em
1921.
A Psicologia Social também estuda o condicionamento – processo pelo qual uma resposta é
provocada por um estímulo, um objeto ou um contexto, distinta da réplica original – que os
mecanismos mentais conferem à esfera social humana, enquanto por sua vez a vivência em
sociedade igualmente interfere nos padrões de pensamento do Homem. Esse ramo da psicologia
pesquisa, assim, as relações sociais, a dependência recíproca entre as pessoas e o encontro social.
Estas investigações teóricas tornam-se mais profundas ao longo da Segunda Guerra Mundial, com
a contribuição de Kurt Lewin, hoje concebido por muitos pesquisadores como o criador da
Psicologia Social.
No Brasil, destacam-se nesta esfera dois psicólogos que trilham caminhos opostos: Aroldo
Rodrigues – que tem um ponto de vista mais empirista, ou seja, acredita nas experiências como
fonte única do conhecimento -, e Silvia Lane – que adota uma linha marxista e sócio-histórica. Ela
tem discípulos conhecidos nos meios psicológicos, entre eles Ana Bock, influenciada pelo bielo-
russo Vigotski, e Bader Sawaia, que realizou importantes estudos sobre a exclusão e a inclusão.
Estes psicólogos acreditam que a economia neoliberal e o Estado que o alimenta criam
subjetividades moldadas segundo as suas características próprias, ou seja, têm grande influência
sobre o desenvolvimento emocional dos indivíduos. Esta linha de pensamento é mais aplicada
em discussões teóricas do que no interior dos consultórios.

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Esta teoria psicológica tem sido alvo de muitas críticas atualmente. Algumas delas dão conta de
que ela se restringe a descrever fatos, apenas nomeando os mecanismos sociais visíveis; foi criada
no contexto de uma sociedade norte-americana que, no final da guerra, precisava recuperar sua
economia, valendo-se para isso de recursos teóricos que lhe permitissem interferir na realidade
social e então intensificar a produção econômica, assim investiu em pesquisas sobre processos
comunicativos de convencimento, modificações nas ações pessoais, etc., tentando moldar os
procedimentos individuais à conjuntura social; alimenta uma visão restrita da vida social, reduzida
apenas à interação entre indivíduos, deixando de lado uma totalidade mais complexa e dinâmica
das criações humanas, que simultaneamente edifica o real social e cria o indivíduo, conceito que
se torna ponto de partida para a elaboração de uma Psicologia Social nova. Esta linha de
pensamento adota uma postura mais crítica no que tange à vida social, e defende uma
colaboração mais ativa da ciência para modificar a sociedade. Assim, ela busca transcender os
limites de sua antecessora.

Princípios da Intersetorialidade
É uma junta contendo as políticas públicas através do desenvolvimento de ações conjuntas
destinadas a proteção, inclusão e promoção da família vítima do processo de exclusão social.
Ocorre para orientar as práticas de construção de redes municipais: “até algumas décadas atrás,
usávamos o termo rede na administração pública ou privada para designar uma cadeia de
serviços similares, subordinados em geral a uma organização-mãe que exercia a gestão de forma
centralizada e hierárquica” (GUARÁ et al. 1998, p. 12); “uma rede pode ser o resultado do
processo de agregação de várias organizações afins em torno de um interesse comum, seja na
prestação de serviços, seja na produção de bens. Neste caso, dizemos que as unidades
operacionais independentes são ‘credenciadas’ e interdependentes com relação aos processos
operacionais que compartilham.” (GONÇALVES apud GUARÁ et al. 1998, p. 13)
Pensar rede nesta perspectiva exige sintonia com a realidade local, com sua cultura de
organização social, bem como uma sociedade civil forte e organizada, capaz de se fazer ativa e
participativa diante da administração pública.
O termo rede sugere a ideia de articulação, conexão, vínculos, ações complementares, relações
horizontais entre parceiros, interdependência de serviços para garantir a integralidade da
atenção aos segmentos sociais vulnerabilizados ou em situação de risco social e pessoal.
Assim na área da criança e do adolescente entende-se rede como “conjunto integrado de
instituições governamentais, não governamentais e informais, ações, informações, profissionais,
serviços e programas que priorizem o atendimento integral à criança e adolescente na realidade
local de forma descentralizada e participativa.” (HOFFMANN et al, 2000, p. 6). GUARÁ et al (1998,

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p. 18 – 32) classifica os tipos de redes que podem ser observadas no espaço local, como: a rede
social espontânea; redes sócio – comunitárias; rede social movimentalista; redes setoriais
públicas; e redes de serviços privados. Porém a esta classificação acrescenta-se duas outras que
retratam com maior dinamicidade as possibilidades de articulação às já existentes, como as redes
regionais e as redes intersetoriais*. Observe abaixo a classificação organizada por GUARA et ALL,
veja,
ESPONTÂNEA: constituída pelo núcleo familiar, pela vizinhança, pela comunidade e pela Igreja.
São consideradas as redes primárias, sustentadas em princípios como cooperação, afetividade e
solidariedade.
REDES SÓCIO – COMUNITÁRIAS: constituída por agentes filantrópicos, organizações
comunitárias, associações de bairros, entre outros que objetivam oferecer serviços assistenciais,
organizar comunidades e grupos sociais.
REDE SOCIAL MOVIMENTALISTA: constituída por movimentos sociais de luta pela garantia dos
direitos sociais (creche, saúde, educação, habitação, terra…). Caracteriza-se por defender a
democracia e a participação popular.
REDES SETORIAIS PÚBLICAS: são aquelas que prestam serviços e programas sociais consagrados
pelas políticas públicas como educação, saúde, assistência social, previdência social, habitação,
cultura, lazer, etc.
REDES DE SERVIÇOS PRIVADOS: constituída por serviços especializados na área de educação,
saúde, habitação, previdência, e outros que se destinam a atender aos que podem pagar por eles.
REDES REGIONAIS: constituídas pela articulação entre serviços em diversas áreas da política
pública e entre municípios de uma mesma região.
REDES INTERSETORIAIS*: são aquelas que articulam o conjunto das organizações
governamentais, não governamentais e informais, comunidades, profissionais, serviços,
programas sociais, setor privado, bem como as redes setoriais, priorizando o atendimento
integral às necessidades dos segmentos vulnerabilizados socialmente.

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