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ALDEIA DE ANGORÔ A ROXO MUCUMBO: CANDOMBLÉ E TRADIÇÃO

ANGOLA EM ILHÉUS (1885 – 1941)

Sílvio Pinto de ANDRADE*[1]

No final do século XIX, surgiu no interior da Bahia uma forte economia baseada na cultura
do cacau, tendo a cidade de Ilhéus como pólo, atraindo gente de todas as regiões do Estado e
também de outros, em busca do trabalho assalariado e da ascensão financeira. Foi nesse fluxo
migratório para a região cacaueira que veio da cidade de Castro Alves, nas últimas décadas do
século XlX, a família de Teodolina Félix Rodrigues. A Néngua de Inquice (Babalorixá, Mãe-de-
santo) Yá Tidú, como era conhecida, teria fundado o terreiro Aldeia de Angorô nas proximidades da
região do Catongo, zona rural de Ilhéus, em 1885, segundo a tradição oral de seus descendentes.
Com o falecimento de D. Teodolina, em 1912, seu filho Euzébio transferiu o terreiro para uma
chácara nos arredores de Ilhéus, onde mais tarde viria a se formar o bairro da Conquista,
atualmente, um dos mais populosos de Ilhéus. Este novo terreiro recebeu o nome de Roxo
Mucumbo. Euzébio o conduziu até 1941, quando faleceu.
Em 1942, os trabalhos do terreiro passaram a ser exercidos pela irmã de Euzébio, Isabel –
conhecida como D.Roxa – que realizou suas “obrigações” para a “feitura de seu santo” com
Marcelina Plácida (D. Maçu), filha-de-santo de Maria Jenoveva Bomfim, a Maria Neném, do
Terreiro Tombeci da cidade de Salvador. Para Esmeraldo Emetério Santana, no livro Encontro de
Nações do Candomblé, de 1981, o Tombeci é o terreiro de nação angola mais antigo da Bahia,
assim, todos os candomblés de angola são filhos ou netos-de-santo de Maria Neném.
Hoje, o Terreiro Matamba Tombenci Neto tem como guardiã das tradições angola a Nengua
de Inquice Hilsa Rodrigues (Mãe Hilsa), filha carnal de D. Roxa. Do período da administração de
D. Roxa até a atualidade, existe um grande número de informações, fontes documentais,
fotográficas e jornalísticas, o que não acontece em relação ao período dos Terreiros Aldeia de
Angorô e Roxo Mucumbo, onde prevalece a oralidade dos mais velhos.
O grande número de casas de culto afro-brasileiro no município de Ilhéus sinaliza para uma
forte presença e influência da religiosidade africana na comunidade local. Resgatar os primórdios da
história do Terreiro Matamba Tombenci Neto nos tempos da Aldeia de Angorô e do Roxo
Mucumbo é importante para compreender as relações entre a comunidade e as religiões afro-
brasileiras. Pretende-se também conhecer como se davam as perseguições impetradas pela polícia
local (fato corriqueiro na primeira metade do século XX na cidade de Salvador) e as táticas

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Cultura Afro-brasileira e a contribuição das populações de matrizes africanas no Brasil. 1
utilizadas pelos adeptos do candomblé para continuar cultuando seus deuses. Como exemplo, D.
Hilsa conta que na época do terreiro Roxo Mucumbo havia um cabo da polícia que costumava
invadir os terreiros de candomblé e quebrar todos os instrumentos utilizados no culto e, por isso, era
comum nos terreiros da cidade que as pessoas tocassem na “cabaça” e com as mãos para “esconder
a zuada dos atabaques”.
A vila de São Jorge dos Ilhéus foi fundada no início da colonização brasileira, em 1534, e
sempre teve uma forte ligação com a religião cristã. O catolicismo, além de religião oficial, foi
religião obrigatória. Professar outra fé que não fosse a cristã era correr o risco de ser considerado
herege. Com a independência do Brasil, a constituição de 1824 garantiu a liberdade de culto, desde
que o templo não ostentasse símbolos na fachada. Esta atitude visava favorecer, principalmente, os
estrangeiros não católicos, mas, de uma certa maneira, criou também um dispositivo legal de
proteção à religião dos negros. A igreja, depois de uma longa história de repressão religiosa aos
cultos populares de origem africana, com o declínio do poder dos tribunais da inquisição, deixou de
persegui-los, substituindo a repressão pelo sentimento de superioridade que separou a fé católica
das práticas consideradas rudes e ignorantes do povo.
Os cultos afro-brasileiros, por serem religiões de transe, de sacrifício animal e de culto aos
espíritos – portanto, distanciados do modelo oficial de religiosidade dominante em nossa sociedade
–, têm sido associados a certos estereótipos como ‘magia negra’, ‘superstições de gente ignorante’,
‘práticas diabólicas’ etc. Alguns desses atributos foram reforçados pelos primeiros estudiosos do
assunto que, influenciados pelo pensamento evolucionista do século XIX (cujo modelo de religião
“superior” era o monoteísmo cristão), viam as religiões de transe como formas ‘primitivas’ ou
‘atrasadas’ de culto. Esses conceitos há muito tempo foram revistos e não existem religiões do bem
ou do mal, superiores ou inferiores, pois essas diferenciações são provenientes de juízos éticos ou
julgamento subjetivos para os quais não há consenso possível, sempre fruto do etnocentrismo.*[2]
Durante três séculos de intenso tráfico de escravos negros, inúmeras etnias africanas foram
trazidas para o Brasil; estima-se que 45% de toda população exilada para a América tenha sido
destinada a terras brasileiras. Dos escravos vindos para o Brasil, destacaram-se dois grupos: os
sudaneses e os bantos. Os bantos (das regiões ao sul da África) englobam os angolas, caçanjes,
congos, bengelas, cambindas etc. Desse grupo, calcula-se que tenha vindo o maior número de
escravos. Os sudaneses (das regiões da África Ocidental) englobam os nagôs-iorubás (oyós, ijexás,
ketos, efans etc.), os jejes (ewe ou fon) e os fanti-achantis, haussás, nupes (tapas), peuls, fulas,
mandingas etc. Os negros introduzidos na sociedade colonial com a diáspora forçada pela
escravidão, trouxeram suas crenças e tradições religiosas, que apesar das adversidades do cativeiro

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e da imposição da religião cristã, conseguiram preservar sua religiosidade através do sistema de
transmissão “boca-ouvido”. Até o século XVIII, o termo “calundu” (terminologia banta) era usado
para designar toda forma de dança coletiva, cantos e músicas acompanhadas por instrumentos
percussivos, invocações de espíritos, sessões de possessão, adivinhação e cura mágica de origem
africana, antecedendo as casas de candomblé, que só vieram a existir no século XIX.

As investigações nos arquivos públicos sobre as visitações do tribunal do Santo Ofício


demonstram que as representações religiosas de origem africana estiveram presentes no universo
colonial de uma maneira mais intensa, diferente do que se imaginava, não ficando restritas e
confinadas aos espaços das fazendas. Como exemplo, cito o caso da negra Luzia Pinto, angola,
muito bem sucedida na freguesia de Sabará, nas Minas Gerais entre 1720 e 1740. Segundo
documentação da época, ela era “calunduzeira, curandeira e adivinhadeira”, e fazia “aparições
diabólicas por meio de umas danças, a que chamam vulgarmente Calundus”. No seu ritual para
adivinhar coisas, ela se vestia “em certos trajes não usados naquela terra”, e cantava e dançava ao
som de tambores tocados por negros, até ficar fora de si, falando coisas que ninguém entendia.*[3]

Esses personagens, além de oficiantes religiosos, sabiam preparar tisanas (infusão


medicamentosa, garrafada), cataplasmas (papa medicamentosa para aplicação externa envolvida
entre panos) e ungüentos que aliviavam os males corriqueiros dos habitantes da colônia; eram
também capazes de curar doenças mais graves como a tuberculose, a varíola e a lepra, usando
recursos da farmacopéia tradicional e participando inclusive do combate às epidemias que
assolavam a Bahia em meados do século XIX. Também sabiam curar distúrbios mentais ou
espirituais, usando tratamentos combinados e complexos. Como o escravismo configurava-se como
um regime de opressão, sempre se pensou que os calundus tivessem sido duramente perseguidos.
Mas, de fato, se isso fosse realidade, seus líderes jamais poderiam ter se estabelecido estavelmente,
como, por exemplo, Luzia Pinto, que se manteve atuante durante vinte anos na cidade mineira de
Sabará. Na verdade, existia no seio da classe governante um debate constante a respeito da melhor
maneira de controlar a massa escrava e liberta. Se a política tirânica parece ter dominado no período
de crise, em grande parte do tempo foi a política moderada a predominante. Os calundus
funcionavam normalmente no Brasil, pelo menos até que seus líderes se tornassem muito visíveis,
angariassem clientela branca ou se envolvessem em revoltas. Faziam parte da paisagem social
porque eram funcionais, respondiam a várias necessidades de uma população carente e não
pretendiam ser seitas secretas. Sua vocação era se tornar, como na África, instituições públicas
reconhecidas.*[4]

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O candomblé surge como uma reinvenção de religiões africanas no Brasil. Quando se fala de
candomblé, geralmente a referência é o candomblé Keto, da Bahia, vertente em que predominam os
orixás e ritos de iniciação de origem iorubá. Seus antigos terreiros são os mais conhecidos: Casa
Branca do Engenho Velho da Federação (Ilê Axé Iyá Nassô Oká), o candomblé do Alaketo (Ilê
Maroialaje), o Gantois (Axé Iaomin Iamassé) e o Axé Opô Afonjá. As mães-de-santo desses
terreiros alcançaram grande prestígio e visibilidade, como Pulquéria e Menininha do Gantois, Olga
do Alaketo e Aninha, Senhora e Stella do Opô Afonjá. Para Vagner Gonçalves Silva (1994), a
“estrutura religiosa dos povos de língua iorubá forneceu ao candomblé sua infra-estrutura de
organização, influenciada pelas contribuições dos demais grupos étnicos”. A história do candomblé
é a história de sua mistura étnica e, logo, social. Um processo que ocorreu em diversas frentes: a
reunião de africanos de diferentes origens étnicas para, juntos, celebrarem seus diferentes deuses, a
atração dos descendentes de africanos nascidos na Bahia e a difusão de todo tipo de serviço
espiritual entre clientes de diversas origens étnicas e sociais. Apesar de tentarem reproduzir os
padrões de culto africanos, reformulados pelo encontro das diversas etnias negras, os terreiros não
deixaram de representar uma memória da identidade étnica, expressando-a na forma de cultuar os
deuses, distinguindo segundo modelos de ritos chamados de “nação”, como nagô, jeje, angola. O
rito angola difere das demais nações pela maneira de tocar os atabaques (com as mãos, ao invés das
varetas), pelos ritmos, pelo idioma dos cânticos e orações, pelas vestes litúrgicas, pelos nomes das
divindades, enfim, por certos traços rituais.

Abaixo apresento uma comparação com os nomes das divindades nagô (Orixás) com as
correlações no candomblé angola (Inquice).

Nação Nagõ-Keto
Atributos Nação Angola
Deus Zambi Olorum

Divindade das encruzilhadas Bambojira Exu

Divindade suprema Lemba, Lancarenganga Oxalá, Obatalá

Divindade da tempestade Zazi, Luango Xangô

Divindade das ervas e das folhas Catendê Ossaim

Divindade das doenças Cavungo Omulo, Obaluaê

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Divindade da guerra Roxo Mucumbo, Incoce Ogum

Divindade da caça Congombira Oxóssi

Divindade das águas doce Quissambo Oxum

Divindade do mar, a mãe d’água Dandalunda Iemanjá

Divindade da tempestade Matamba, Bamburucema Iansã

Divindade do arco-íris Angorô Oxumaré

A coleta de dados para a elaboração deste projeto tem início com a análise de fontes orais,
obtidas através de entrevistas com os descendentes familiares e religiosos dos fundadores dos
terreiros em estudo, tendo como referência da oralidade a administradora do terreiro Matamba
Tombenci Neto, Hilsa Rodrigues, neta de Teodolina Félix Rodrigues e sobrinha de Euzébio Félix
Rodrigues. A investigação das fontes documentais será realizada no acervo do terreiro Matamba
Tombenci Neto, no arquivo público municipal de Ilhéus, no CEDOC da UESC, no cartório de
registro de imóveis de Ilhéus e no arquivo da delegacia de polícia de Ilhéus, pois até 1976 as casas
de candomblé ficavam sob a tutela da Delegacia de Jogos e Costumes e para funcionar
necessitavam de um registro obtida pela mesma. Também pretendo realizar a investigação no
arquivo público do Estado, em Salvador; e no CEAO (Centro de Estudo Afro-orientais) da UFBA.
Todo tipo de fonte deverá ser levada em consideração na análise, tais como: fotos, gravações,
iconografia, artefatos, que deverão ser obtidas nas visitas aos locais acima citados. A pesquisa
bibliográfica será utilizada como fonte complementar de informações, tanto sobre o candomblé
quanto a cidade de Ilhéus no período em estudo.
Na Bahia a hegemonia dos candomblés nagôs contrasta com a predominância dos
candomblés de angola do município de Ilhéus. O grande número de filhos e filhas-de-santo
“iniciados” na tradição angola pelas sucessivas gerações da família de D. Teodolina Félix
Rodrigues, contribuiu para essa realidade ao abrir seus próprios terreiros.

Os terreiros Aldeia de Angorô e o Roxo Mucumbo, representam o passado de um dos mais


respeitados e conhecidos candomblés da cidade de Ilhéus, o Matamba Tombenci Neto.

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* Graduando em Licenciatura em História pela Universidade Estadual de Santa Cruz.
[2] SILVA, Vagner Gonçalves. Candomblé e Umbanda: caminhos da devoção brasileira. São Paulo:
Ática, 1994.
[3] SILVEIRA, Renato. Candomblé: um mito de origem. Revista de História da Biblioteca
Nacional. Rio de Janeiro, ano 1, nº6, p. 18-23, dez.2005.
[4] idem SILVEIRA, Renato.

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