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Introdução
Este Trabalho de Conclusão de Curso pretende ir além da teoria,
pois almeja alcançar uma nova visão sobre o crime passional e os
sentimentos que o envolvem, entre eles a paixão.
Para tanto, encontra-se em seu desenvolvimento alguns conceitos
importantes para a compreensão que o trabalho propõe ao leitor,
uma compreensão que vai além do mero formalismo do direito penal,
além das teorias de defesa que lotam as sustentações orais, além dos
relatos que são notícias todos os dias. Este trabalho é um
instrumento e pretende ser usado como tal.
Paixão, por muitas vezes confundida com o tão sonhado amor, é
sentimento doloroso, forte, intenso e dominador que toma rumos
desconhecidos e pode surpreender de forma benéfica ou prejudicial a
quem está dominado por ele, e ao seu alvo. No decorrer do primeiro
capítulo são utilizados alguns poemas que expressam muito bem o
que sente um indivíduo apaixonado. Também será visto o conceito de
amor e poemas que demonstram a verdade sobre ele.
Além do amor e da paixão, não poderia este trabalho deixar de
descrever um pouco sobre o ciúme, que está diretamente ligado aos
dois últimos, mas é encontrado com mais força na paixão.
De extrema relevância, assim como o primeiro capítulo, é o
segundo com uma fundamentação mais teórica do crime passional e
seus detalhes jurídicos.
E, por fim, um breve estudo sobre as possíveis causas do crime
passional, com enfoque em alguns fatores que corroboram para que
um indivíduo venha a cometer este crime e algumas possíveis formas
de prevenção, baseadas em todo o conteúdo deste trabalho.
Foi de propósito esta forma de mesclar a poesia com a teoria crua
e a criminologia com a psiquiatria forense, pois quem consegue
explicar um crime tão complexo, que envolve sentimentos tão
intensos, sem adentrar em caminhos mais profundos e perigosos,
dentro da mente humana?
Quem pode julgar um homicida passional utilizando apenas o
código penal e o que a doutrina diz sobre este delito?
O ser humano merece esta atenção e este espaço será utilizado
para oferecer idéias e pensamentos baseados em fatos e estudos que
podem abrir caminhos para novas perspectivas ou simplesmente
ocupar espaço na prateleira de monografias das Faculdades Alves
Faria – Campus Perimetral Norte.
Para este trabalho buscou-se a finalidade aplicada, voltada para a
solução de um problema, com objetivo explicativo analisando e
buscando a interpretação de alguns fenômenos, a abordagem
qualitativa, a pesquisa bibliográfica e a observação da autora deste
trabalho a respeito do tema.
1.3 O Ciúme
De acordo com o Dicionário Aurélio ciúme é “sentimento doloroso
causado pela suspeita de infidelidade da pessoa amada; zelos.
Angústia provocada por sentimento exacerbado de posse” (AURÉLIO,
2001, p. 157).
Roque de Brito Alves, em seu livro Ciúme e Crime, entende que :
(...) o ciúme é uma manifestação de um profundo complexo de
inferioridade de uma certa personalidade, sintoma de imaturidade
afetiva e de um excessivo amor próprio. O ciumento não se sente
somente incapaz de manter o amor e o domínio sobre a pessoa
amada, de vencer ou afastar qualquer tipo de rival como, sobretudo,
sente-se ferido ou humilhado em seu amor-próprio. (...) O ciúme já
na sua antiga origem etimológica grega, em sua terminologia em tal
idioma, bem indicava tal estado psíquico de tormento pois significava
‘ardor’, ‘ferver’, ‘fermentar’, considerando-o os gregos, como um
‘amor excessivo’, enquanto os romanos identificavam-no mais como
sentimento de inveja (Sokoloff). O próprio Santo Agostinho, em suas
‘Confissões’ proclamou que era ‘flagelado pela férrea e abrasadora
tortura dos ciúmes’. A sabedoria popular diz que o ciumento fica
‘cego’ pelo seu tormento, pelo inferno que vive pois a verdadeira
realidade não existe para ele, somente a realidade que ‘imagina’
ilusoriamente, alucinadamente, falsamente (apud NUCCI, 2009, p.
596).
Ciúme é medo, insegurança, angústia, posse... existem várias
definições para este sentimento, podendo este ser de forma
moderada - acomete grande parte da população-, mesmo sem
perceber as pessoas manifestam esta forma de ciúme em seu dia-a-
dia e é absolutamente normal. E existe ainda o ciúme crônico que
trás consigo muitos sentimentos que envolvem e tomam os
pensamentos do ser que os carrega. Este tipo de ciúme cega,
confunde e pode sim levar alguém a cometer um crime passional.
Percebe-se facilmente a angústia e oscilação de pensamentos de
um apaixonado doente de ciúmes. Durante este estado de
inconsciência momentânea o indivíduo está vulnerável e tomado pela
emoção o que o torna muito perigoso.
Segundo Buss (2000), existem três principais formas de
demonstração de ciúmes, sendo elas a tática da ocultação, a tática da
vigilância e a tática de minar a autoestima.
A tática da ocultação, segundo o autor, consiste na tentativa de
limitar o contato da pessoa amada com amigos e família, pois sente
muito medo de haver qualquer interferência em seu relacionamento e
não gosta que o outro fique longe de seu controle.
A tática da vigilância é a insistência em saber onde está o ser
amado em todos os momentos em que não estão juntos.
E a tática de minar a autoestima é dolorosa e muito comum, pois
o ser apaixonado e provocado pelo ciúme é capaz de xingar e atribuir
defeitos, pois costuma saber os pontos fracos do outro para que este
se sinta muito inferior e não tenha confiança suficiente para sair
desta relação porque sente que estará perdendo alguém muito bom e
que ninguém mais vai querer alguém tão inferior.
O ciúme pode então ser definido como uma espécie de ácido
emocional que corrói os casamentos, mina a auto-estima,
desencadeia espancamentos e pode sim levar à prática de crime
passional.
A cobrança desagradável sobre o sentimento do outro, a exigência
de frases e expressões amorosas a todo instante, a obsessão da
fidelidade também mostram que alguma coisa não está certa. Ser
passivo e tolerante em excesso, do mesmo modo, não é bom sinal.
Isso porque o co-dependente aceita tudo em nome do amor, menos o
abandono.
Sobre este sentimento, Wilhelm Stekel disse:
Alguém já contabilizou as vítimas do ciúme? Diariamente um revolver
é disparado em algum lugar por causa do ciúme; diariamente uma
faca encontra entrada num corpo quente; diariamente alguns
infelizes atormentados pelo ciúme e pelo cansaço da vida, afundam
em profundezas insondáveis. O que são todas as medonhas batalhas
narradas pela história, comparadas a essa terrível paixão, o ciúme?
(apud BUSS, 2000, p. 119)
Pode ser então facilmente percebido que a paixão e o ciúme se
entrelaçam e juntos podem interferir de forma tão devastadora no
inconsciente de alguém a ponto de fazer esta pessoa perder
totalmente a razão, restando apenas a emoção e ocasionando em
tantos crimes passionais.
Fato é que a paixão, na grande maioria das vezes é carregada de
ciúme, atingindo uma aguda inflamação dos sentimentos. Existem
diferentes formas de lidar com a paixão e com a rejeição do outro.
Alguns apaixonados se entregam ao silêncio, à depressão, às
bebidas, cigarros, baladas, e diversos tipos de distrações e drogas
que podem levá-lo a uma situação ainda pior. Outros buscam refúgio
em diversos cultos religiosos, praticando as mais variadas liturgias. E
existe ainda a uma minoria que reage de forma brutal e fria, estes
são impulsivos e explosivos, e aqueles possíveis sujeitos ativos de
homicídios passionais. O que acontece nestes casos é que, por ser
um sentimento muito forte e intenso, com o surgimento de uma
grande paixão cumulada com o seu companheiro de todas as horas, o
ciúme, surge no homem uma espécie de natureza paralela, uma
forma de segunda natureza, e todas as normas que o guiavam em
seus atos e sua forma de pensar sobre vários aspectos da vida
perdem o valor.
Não é difícil compreender a confusão que estes sentimentos
podem causar, basta um olhar que vá um pouco além do que dizem
os telejornais para perceber que tais tragédias não são cometidas por
seres de “outro mundo”, mas por pessoas comuns, seres humanos e
que qualquer pessoa a sua volta pode ser tragado por estes
sentimentos.
1.4 O Amor
Falar de amor não é tarefa fácil e não existe uma opinião
universalmente aceita sobre ele.
Existem vários tipos de amor, temos, por exemplo, o amor
materno, o amor de amigos, o amor por coisas ou por animais e
aquele, alvo deste trabalho, que encontramos nos relacionamentos
amorosos.
Um dos mais belos textos sobre o amor está na bíblia, em I
Coríntios, capítulo 13. Vale a pena ler o capítulo inteiro, contudo a
partir do versículo 4 diz:
O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria,
não se orgulha. Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira
facilmente, não guarda rancor. O amor não se alegra com a injustiça,
mas se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo
suporta. O amor nunca perece [...] (BÍBLIA DE ESTUDO, 2000, p.
1501)
É paciente... o amor é paciente... a maioria das pessoas se
esquece disso, aliás, muitos nem sabem. As pessoas têm vivido
amores platônicos que vêm e vão sem acrescentar algo de positivo e
os perdem por não saber que sem paciência não existe amor. Um
sentimento tão cheio de segredos não pode ser desvendado nem
vivido verdadeiramente se não houver, dos indivíduos envolvidos
neste sentimento, a paciência de viver um dia de cada vez, superar
um problema de cada vez e a cada dia descobrir no ser amado mais
um motivo para amá-lo e para acreditar no amor.
O amor é bondoso... ora, se o amor é bondoso, não há que se
falar em amor que mata o ser amado, pois onde está a bondade
desta conduta? Não existe amor quando um sujeito mata sua ex-
namorada porque ela não queria mais estar com ele. O que existe é o
egoísmo e sentimento de posse, geralmente encontrado na paixão.
O amor não é orgulhoso, é humilde, é manso. O amor não inveja e
não se vangloria, mas luta e torce para que o ser amado conquiste
seus sonhos e que seja feliz, pois só assim se sente feliz também.
E o texto de I Coríntios continua dando características belíssimas a
respeito do amor. Estas deveriam ser impressas e pregadas nas
paredes de cada casa, pois afinal, quantos casais vivem um amor
assim nos dias de hoje?
Hoje não há mais paciência, há intolerância; não há mais bondade,
há arrogância; E tudo aquilo o que não deveria existir dentro dos
relacionamentos têm sido considerado normal.
Ainda sobre o amor, vale a pena citar o que diz o dicionário
Aurélio:
Sentimento que predispõe alguém a desejar o bem de outrem;
Sentimento de dedicação absoluta de um ser a outro, ou a uma
coisa; Inclinação ditada por laços de família. Inclinação sexual forte
por outra pessoa. Afeição, amizade, simpatia. O objeto do amor (1 a
5). (MINI AURELIO, 2001, p. 39)
As definições de amor sempre envolvem a bondade,
diferentemente da paixão que sempre envolve sofrimento. No
entanto, é notável que algumas definições são comuns aos dois
sentimentos, como por exemplo o desejo e atração física, contudo o
aspecto que leva um ser que diz amar alguém a matar o ser amado
só existe no chamado amor-paixão e é exatamente esta a distinção
pretendida neste capítulo.
Manoel Bandeira em seu poema Madrigal Melancólico
disse:
O que eu adoro em ti; Não é a tua beleza; A beleza é em nós que
existe; A beleza é um conceito; E a beleza é triste; Não é triste em
si; Mas pelo que há nela; De fragilidade e incerteza; O que eu adoro
em ti; Não é a tua inteligência; Não é o teu espírito sutil; Tão ágil e
tão luminoso; Ave solta no céu matinal da montanha; Nem é a tua
ciência; Do coração dos homens e das coisas. O que eu adoro em ti;
Não é a tua graça musical; Sucessiva e renovada a cada momento;
Graça aérea como teu próprio momento; Graça que perturba e que
satisfaz; O que eu adoro em ti; Não é a mãe que já perdi; E nem
meu pai; O que eu adoro em tua natureza; Não é o profundo instinto
matinal; Em teu flanco aberto como uma ferida; Nem a tua pureza.
Nem a tua impureza. O que adoro em ti lastima-me e consola-me: O
que eu adoro em ti é A VIDA!( BANDEIRA, 1988, p. 66)
O poeta fala do amor e das razões de amar. Deixa claro que não
ama pela beleza ou por qualquer qualidade que ele admire, por
melhores que sejam estas, mas o fato de a pessoa amada estar viva
é o que o consola e lastima, pois acaba sendo também um medo da
morte deste mesmo ser amado. O amor não tem um motivo, só o
sentimento de proteção cuidado e admiração.
Além da profunda admiração e respeito que o poeta demonstra
ainda tem a preocupação e felicidade pela vida de sua amada. A
beleza dessa poesia está no amor inexplicável, em somente amar e
se dar de graça, ser feliz quando faz o outro feliz e profundamente
infeliz se fizer qualquer coisa que machuque seu amor.
Esse é o amor, muito diferente da paixão que faz sofrer, que mata
por egoísmo. O indivíduo que ama, ao contrario do apaixonado é
capaz de dar sua própria vida em troca da vida do outro.
Fizeram as pessoas acreditarem que este tipo de amor é coisa de
conto de fadas, que não existe e que por isso qualquer coisa basta.
Convenceram a todos de que quem acredita no amor é tolo, mas
também tentam todos os dias, por vários meios diferentes convencer
a sociedade de que honestidade é tolice, afinal, qualquer um em seu
lugar faria o mesmo. É tudo normal!
Este estudo pretende mostrar a verdade, o que cada um fará com
ela é decisão individual e se você acredita ou não também é
particular. O fato é que a paixão é a realidade e o amor tornou-se
uma utopia. Pare e pense; reflita e compare para perceber se o que
você vive ou o que você vê a sua volta é amor. Com certeza vai notar
que a normalidade é tristemente desanimadora, mas é real.
O amor é simples, tranquilo e sereno, apesar de ser envolvente,
forte e de ter em sua essência o instinto humano da atração carnal,
que faz com que esse mesmo amor se firme e se complete sem
necessidade de dominação sob o outro. Na verdade funciona como
uma troca contínua de todas as melhores qualidades que cada um
possa ter.
Afinal, mata-se por amor? Essa pergunta é feita repetidamente a
cada vez que ocorre um crime passional. Pode o amor desencadear
reação tão brusca a ponto de eliminar a pessoa amada?
Quem ama não mata, mas sente prazer em fazer o outro feliz e
respeita suas decisões até mesmo quando esta decisão implicar em
distanciamento, pois como disse Manoel Bandeira no poema já citado
“o que eu adoro em ti é a vida”, ou seja, se você vive, eu vivo.
A teoria diferencia vários tipos de amor e explica a parte histórica
que, apesar de ser bela, não interessa a este estudo que pretende
levar o leitor a uma distinção simples e objetiva entre a paixão (que
pode matar) e o amor (que prefere morrer a ter que fazer algum mau
a seu amado). É este o objeto deste trabalho.
A verdade é que nos tempos em que vivemos é muito mais
comum ver e sentir a paixão e extremamente raro ver e muito mais
ainda viver um amor em sua forma mais completa.
Por isso tanta amargura, tantos crimes, tanto ódio e
possessividade. Tudo isso tornou-se tão comum que já é visto como
certo, como um exemplo a ser seguido, como verdade.
Não é triste pensar que a evolução humana pretende extinguir o
sentimento mais belo que pode existir? Olhe a sua volta. É comum, é
normal trair e se um homem perde uma boa chance de fazê-lo passa
a ser injuriado e é considerado “gay”. Se as mulheres não forem
como todas as outras, usando roupas insinuantes, sendo vulgar,
cedendo às “normalidades” ou frequentando lugares “badalados”, são
caretas e antiquadas. O conceito de amor tem mudado, pois os
valores mudaram. Hoje se vê mais crimes passionais devido às trocas
contínuas de desafetos camuflados de “amor-moderno”, afinal
carinho e respeito estão fora de moda!
Como alguém que não valoriza nem a si mesmo pode dar algum
valor à vida de alguém?
Os relacionamentos têm nascido mortos e este é um problema
cultural que só tende a piorar, pois de geração em geração têm sido
transmitidos os traumas e frustrações que ficam impregnados nas
cabeças destas crianças que provavelmente serão adultos frustrados
e passíveis de ter inúmeros relacionamentos problemáticos,
confirmando tudo aquilo o que cresceu ouvindo de seus pais.
É muito fácil condenar, atribuindo várias qualificadoras a um
homicida passional e é fácil trancá-lo em um sistema prisional
indiscutivelmente falido e fazer desse doente um morto vivo que
jamais será reabilitado, ao contrário só fará crescer sua sede de
sangue. Mas porque ninguém quer saber da raiz desse mau?
A resposta é simples. Todos estão envolvidos. Fazem parte de um
mesmo mau, por isso não conseguem vê-lo, porque ele cresce dentro
de cada um fazendo o amor, o tão sonhado amor, ser cada vez mais
impossível, posto que a cada dia fica mais distante do que as pessoas
podem viver.
2.1 Culpabilidade
Culpabilidade é um dos elementos do crime e, por tanto, seria
tema para um trabalho extenso que envolvesse só este tema.
Contudo sobre o tema em questão, a culpabilidade trás alguns
esclarecimentos a cerca da imputabilidade do sujeito que comete um
crime passional.
Welzel define culpabilidade como sendo “a reprovabilidade da
configuração da vontade. Portanto, toda culpabilidade é culpabilidade
de vontade, ou seja, somente se pode reprovar ao agente, como
culpabilidade, aquilo a respeito do qual pode algo voluntariamente”
(Apud BITENCOURT, 2011, p. 405).
Mirabete apresenta um conceito claro e adequado do que vem a
ser a culpabilidade no qual diz que:
As palavras culpa e culpado têm sentido lexical comum de indicar que
uma pessoa é responsável por uma falta, uma transgressão, ou seja,
por ter praticado um ato condenável. Somos “culpados” de nossas
más ações, de termos causado dano, uma lesão. Esse resultado
lesivo entretanto, só pode ser atribuído a quem lhe deu causa se essa
pessoa pudesse ter procidido de outra forma, se pudesse com seu
comportamento ter evitado a lesão” (MIRABETE ; FABBRINI, 2009, p.
181).
Assim sendo, para ser considerado culpado de um crime o agente
causador precisa ter consciência da sua conduta lesiva e deve ser
avaliado se ele poderia de alguma forma evitar aquele
comportamento e a lesão causada.
Para definir a culpabilidade existem três teorias principais, quais
sejam a Teoria Psicológica da Culpabilidade, a Teoria Psicológico-
Normativa da Culpabilidade e a Teoria Normativa Pura da
Culpabilidade. Para tratar do tema em questão será utilizada apenas
esta última teoria, posto que as demais seriam alvo de estudo mais
aprofundado sobre este tópico.
A Culpabilidade possui três elementos, que são: imputabilidade,
possibilidade de conhecimento do injusto (potencial consciência da
ilicitude), e exigibilidade de conduta diversa.
Sobre a imputabilidade Mirabete e Fabbrini disseram que:
Em primeiro lugar, é preciso estabelecer se o sujeito tem certo grau
de capacidade psíquica que lhe permitia ter consciência e vontade
dentro do que se denomina autodeterminação, ou seja, se tem ele a
capacidade de entender, diante de suas condições psíquicas, a
antijudicidade de sua conduta e de adequar essa conduta à sua
compreensão. Essa capacidade psíquica denomina-
se imputabilidade. Esta é, portanto, a condição pessoal de
maturidade e sanidade mental que confere ao agente a capacidade de
entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se segundo esse
entendimento (MIRABETE; FABBRINI, 2009, p. 183).
Ainda sobre a imputabilidade, Bitencourt afirma que é “ a
capacidade ou aptidão para ser culpável, embora, convém destacar,
não se confunda com responsabilidade, que é o princípio segundo o
qual o imputável deve responder por suas ações” (BITENCOURT,
2011, p. 408).
Segundo Capez (2011), excluem a imputabilidade a doença
mental, o desenvolvimento mental incompleto, o desenvolvimento
mental retardado e a embriaguez completa proveniente de caso
fortuito ou força maior. Para este autor:
Todo agente é imputável, a não ser que ocorra causa excludente da
imputabilidade (chamada de causa dirimente). A capacidade penal é,
portanto, obtida por exclusão, ou seja, sempre que não se verificar a
existência de alguma causa que a afaste. Dessa constatação ressalta
a importância das causas dirimentes (CAPEZ, 2011, p. 333).
Sobre a emoção e a paixão, Capez afirma que não excluem a
imputabilidade, de acordo com o art. 28, I do Código Penal. Isto
ocorre porque o CP adotou o sistema biopsicológico, ou seja, a causa
excludente da culpabilidade precisa estar prevista em lei e este não é
o caso da paixão nem tão pouco da emoção (CAPEZ, 2011).
Contudo, existem casos em que a paixão e o ciúme são
equiparados a uma doença mental e este trabalho entende,
reafirmando as palavras de Capez, que mesmo se a paixão for
extremamente forte e o ciúme extremamente doentio, se não houver
doença mental, não há que se falar em mais uma causa de
excludente da imputabilidade (Capez, 2011).
A emoção pode dar causa a uma diminuição de pena, levando em
conta alguns aspectos que deverão ser avaliados em cada caso
concreto, mas a paixão, na grande maioria das vezes não merece
sequer esta diminuição.
Merecem destaque estas observações feitas por Capez a respeito
da paixão e da emoção por serem relevante ao desdobramento deste
trabalho. Fica, portanto esclarecido que o indivíduo apaixonado não
tem excluída sua imputabilidade a não ser que seja
comprovadamente um doente mental. Assim sendo não pode um
sujeito alegar que estava doente de ciúme e por isso matou sua
esposa, se não for comprovada a existência da doença mental.
Já a emoção, em alguns casos pode ser causa de diminuição de
pena, e sobre isso se verá a seguir no tópico 2.3, que trará mais
detalhes sobre o tema.
A imputabilidade, segundo Damásio de Jesus, “deve existir ao
tempo da prática do fato (ação ou omissão), de modo que não cabe
uma imputabilidade subsequente” (DAMASIO DE JESUS, 2011, p.
516).
Trata-se da teoria da actio libera in causa. Esta teoria é bastante
discutida, mas em síntese diz que se um indivíduo comete um crime
em momento de insanidade mental completa e depois do delito vem
a ter sua normalidade psíquica alcançada, não poderá ser
considerado imputável pelo crime ocorrido no passado. Há
divergências doutrinárias e é tema amplo, de bastante discussão.
Para que se possa fazer um juízo de reprovação é necessário
também que o indivíduo conheça o caráter antijurídico de sua
conduta.
Sobre a possibilidade de conhecimento da antijuridicidade do fato,
Mirabete e Fabbrini disseram que:
É imprescindível apurar se o sujeito poderia estruturar, em lugar da
vontade antijurídica da ação praticada, outra conforme o direito, ou
seja, se conhecia a ilicitude do fato ou se podia reconhecê-la. Só
assim há falta ao dever imposto pelo ordenamento jurídico. Essa
condição intelectual é chamada possibilidade de conhecimento da
antijudicidade do fato [...]” (MIRABETE E FABBRINI, 2011, p. 183).
Isto significa que antes de reprovar determinada conduta do autor
é necessário que este conheça ou possa conhecer a ilicitude, o tipo
penal.
Mas, ainda deve ser levado em conta se o autor do delito, em
determinada situação podia ou não ter agido de outra maneira, se
havia a exigibilidade de obediência ao direito.
Welzel acredita que:
Uma vez configuradas a imputabilidade e a possibilidade de
conhecimento do injusto, fica caracterizada materialmente a
culpabilidade, o que não quer dizer, no entanto, que o ordenamento
jurídico-penal tenha de fazer a reprovação de culpabilidade. Em
determinadas circunstâncias, poderá recunciar a dita reprovação e,
por conseguinte, exculpar e absolver o agente (Apud BITENCOURT,
2011, p. 410).
Assim sendo, só podem ser punidas as condutas que poderiam ser
evitadas. Nesse contexto, no caso concreto deverá ser observado se
ocorreram alguma das hipóteses que levam à exclusão da
exigibilidade de conduta diversa, quais sejam a coação moral
irresistível e a obediência hierárquicas (Capez, 2011).
Levando em consideração o contexto deste trabalho e a finalidade
do mesmo, fica por aqui a breve passagem pela culpabilidade, posto
que o objetivo desta era de esclarecer acerca da imputabilidade do
indivíduo que comete o delito movido por paixão (ciúme) ou emoção,
o que já foi visto.
Vale ressaltar que a regra é a não exclusão da imputabilidade nos
casos de paixão e emoção, porém, no direito nada é absoluto e, por
tanto, diante de um caso em que houver sido comprovada a
insanidade mental do sujeito ativo de um crime passional,
demonstrando paixão ou ciúme tão violentos e de grau patológico tão
evoluídos que tornem o indivíduo incapaz de discernir e o caráter
ilícito de sua conduta, poderá haver a constatação da
inimputabilidade ou semi-imputabilidade.
Conclusão
Este foi um trabalho que buscou ter uma visão um pouco mais
humana e menos legalista sobre o crime passional e os sentimentos
que o envolve.
Foi feita uma distinção entre o amor e a paixão para que ficasse
entendido que um não se confunde com o outro e que o amor, por
sua própria natureza e essência não mata, não maltrata.
Em contrapartida, com fulcro em tudo o que foi exposto sobre a
paixão, pode ser concluído que é um sentimento doloroso, forte,
confuso, avassalador e que tudo isso misturado ao ciúme, outro
sentimento inerente à paixão, perturba o ser humano de tal maneira
que os faz perder a noção de realidade.
A vida do sujeito enamorado passa a girar em torno de sua
paixão, ainda que o sujeito por quem esta pessoa está apaixonada
não possua a grande maioria das “qualidades” que levam o
apaixonado a lutar tão desesperadamente para não perdê-lo.
O fato é que quem se deixa dominar por uma forte paixão muitas
vezes não é feliz no relacionamento, mas simplesmente não consegue
deixar a relação porque não se vê, longe daquela pessoa. É uma
espécie de dependência química da alma, uma fraqueza emocional.
Mas, quem nunca se apaixonou? Alguns várias e várias vezes...
alguns neste exato momento encontram-se terrivelmente
apaixonados! Não quer dizer que são criminosos, assassinos
passionais.
Apaixonar-se é humano e mais do que isso, necessário! Quantas
paixões não se transformam em amor? Muitas. E quantos
apaixonados por sua profissão ou por um sonho, um alvo, conseguem
inspirar outros a lutar e perseverar? São vários os nomes de sujeitos
apaixonados que entraram para a história com suas invenções,
canções, inspirações, lutas e vitórias.
O problema não é se apaixonar, é a forma como cada um conduz a
paixão, se é que se pode conduzi-la.
Normalmente as paixões vêm e passam, mas aquela que fica e
vira ferida na alma, como um mau colesterol que entope as veias e
não deixa o sangue chegar ao coração, essa pode matar.
De acordo com o que foi visto no terceiro capítulo deste trabalho,
a paixão pode ter grau mais violento quando a criança e o
adolescente são expostos à influência negativa da TV, quando sofrem
violência familiar, ou outras violências graves ou quando a
personalidade do indivíduo não teve desenvolvimento saudável, por
diversos motivos.
Neste caso o sujeito já trás em si estigmas que só pioram como o
decorrer dos anos. Estes indivíduos vêem na pessoa por quem estão
apaixonados uma solução para os seus problemas entregando a elas
o peso de ser responsáveis diretas por sua “felicidade”.
Daí a não aceitação do fim. Por isso não consideram um não ou
um adeus, como resposta. E por isso matam e ainda se acham no
direito de fazer isso.
Pessoas que tem um bom desenvolvimento quando crianças e
adolescentes, que tem equilíbrio familiar e não são tão influenciáveis
pela mídia também se apaixonam, mas, se chegarem a cometer o
crime passional terá sido, na grande maioria das vezes, por impulso,
os chamados criminosos eventuais, causado muitas vezes pela
violenta emoção (também objeto de estudo deste trabalho).
Nos dias de hoje a tese de legítima defesa da honra não é mais
bem aceita pelos tribunais, pois com o advento da Constituição de
1988 que trouxe em seu texto a igualdade entre homens e mulheres,
acredita-se que a mulher não porta a honra do homem e vice-versa,
por isso se sua honra for manchada não tem o direito de matar para
defendê-la.
Em outro sentido, buscando uma forma privilegiada e uma
possível diminuição de pena, têm sido aceita a justificativa da
violenta emoção logo em seguida à injusta provocação da vítima.
Contudo uma observação deve ser feita: a violenta emoção deve ser
causada por “injusta provocação da vítima”, e este é um fator
subjetivo, ou seja, deve ser avaliado em cada caso concreto, com
muito cuidado. Se houve, por exemplo a premeditação, não há que
se falar em homicídio privilegiado, assim como não haverá atenuante,
pelo contrário agravará a pena se o homicida passional atuou com
extrema maldade, matou por motivo fútil, torpe, ou sem motivo
algum. Também será majorada a pena do indivíduo que matou com
emprego de meio insidioso ou cruel, ou usando de traição,
emboscada, dissimulação ou outros modos que dificultem ou tornem
impossível a fuga da vítima.
Todos os detalhes do crime deverão ser avaliados para uma justa
adequação da pena ao fato.
Mas o que este trabalho buscou e o que ele conclui é que o
criminoso passional exige atenção, pois dentro dele podem ser
encontradas soluções para diversos problemas culturais.
A sociedade tem, todos os dias, por diversos meios, criado novos
homicidas passionais a medida em que julga de forma cega e não
busca saber o que está causando este tipo de crime de cunho
emocional.
O homicida passional, em geral, não é um psicopata que mata por
prazer, por fetiche, é um indivíduo emocionalmente doente que
sofreu e fez sofrer muito antes de matar e que continuará sofrendo e
fazendo sofrer até morrer.
Mas a doença cultural vai continuar e outros virão e passarão isto
a seus filhos... Afinal, quando vai parar?
Não há conclusão concreta. As perguntas levam a possíveis
descobertas e é justamente este o objetivo desta monografia: buscar
e incitar pessoas que gostam de pensar a buscar novas respostas e
novas descobertas.
Referências
ARISTÓTELES, Cássio M. Fonseca [trad.]. Ètica de Nicômaco. São
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