Dramatergência como escritura cênica processual e emergente
Joevan Oliveira Universidade Federal da Paraíba
Desde o século XX, é possível verificar a expansão significativa que o termo
dramaturgia tem assumido, se desvinculando da palavra escrita e se reposicionando no âmbito do funcionamento e articulação dos diversos elementos presentes na cena. A recorrência de análises sobre dramaturgias diversas, a exemplo dos objetos, da música e de sonoridades, do espaço, do figurino, do ator, do espectador corrobora a ideia de que, atualmente, o termo pode ser entendido como o estudo da organização dos estímulos e práticas geradoras do discurso cênico. Considerando um contexto de cena expandida, marcado pela processualidade e interatividade, proponho pensar numa escritura cênica enquanto sistema de textos em relação que se auto organizam por meio de intensa interação entre indivíduos singulares que assumem o papel de cocriadores da obra. Esse tipo de proposição cuja ação é compartilhada por sujeitos num contexto social, igualmente, compartilhado, poder ser identificado como Site Specific Performance, Intervenção Urbana, Deriva, Teatro de Invasão, Enviroment Theatre. E muitos são os artistas cujo trabalho pauta-se pela interatividade, a exemplo dos estadunidenses do Living Theatre, os espanhóis do La Fura Dels Baus e os Brasileiros Augusto Boal e Erro Grupo. Parto da perspectiva de que nesse tipo de proposição a cena se configura como zona de contaminação e trânsito, na qual a interação entre sujeitos e ambiente se intensifica suspendendo modelos de recepção predeterminados, transformando todos os participantes em agentes compositores. Ao dialogar com a materialidade do lugar, entendida em sua existência concreta, subjetiva e fluxos anteriores e independentes da intencionalidade e códigos estabelecidos para a recepção, as situações criadas funcionam como dispositivos propositores capazes de mobilizar os interatores a produzir uma série de micronarrativas que formam o todo da cena. Discursos que se confrontam, situações inesperadas, uma série de diferentes falas que terminam por compor um todo que poderíamos chamar “dramatergência”, ou dramaturgia de emergências. Nesse tipo de proposição é possível verificar que parte-se de um dispositivo cênico relativamente simples que ganha em inteligência e complexidade a partir do jogo de interação entre os atuantes dentro de um processo horizontalizado e colaborativo, assim como nos sistemas emergentes.