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Carta de Apresentação

Olá a todas, me chamo Céu e apesar de este não ser um nome oficialmente reconhecido pelo
Estado, é a partir dele que venho construindo territórios de vida ao longo dos últimos anos. Sou
psicóloga, sou pernambucana, me considero feminista interseccional e antiproibicionista e
como vetor que atravessa todas as outras vivências, sou uma mulher trans. Pensar sobre
políticas específicas e atuar junto ao segmento de pessoas trans sempre foi inerente ao meu
próprio processo de transição. Durante o mestrado em psicologia, me engajei na construção da
política de nome social da UFPE e, desde então, fui percebendo que era impossível separar
reflexão de ação prática que gere efeitos diretos no cotidiano. Saindo do mestrado fui trabalhar,
ainda em Recife, em dois locais que foram fundamentais para as perspectivas que tenho hoje.
Um deles foi o Grupo de Trabalho em Prevenção Posithivo (GTP+) Ong existente em Recife que
trabalha alinhando os temas de cidadania, direitos humanos e saúde sexual e reprodutiva. Nesse
contexto, entro como assistente de coordenação de um projeto na época denominado
“Mercadores de ilusões”, cujo objetivo foi o de mapear e acompanhar sistematicamente no
período de um ano os principais pontos de prostituição de rua do Recife. O foco era pontos de
prostituição de mulheres trans. Uma vez traçado o mapa, passamos a acompanhar
semanalmente as mulheres que trabalhavam nesses locais na perspectiva de oferecer um
suporte e garantir um registro das principais violências sofridas por elas. O projeto tinha duas
frentes – acompanhamento itinerante na rua sempre nas sextas a noite e grupo de formação
política nas quintas a tarde com algumas que, no inicio do semestre demonstraram interesse
com temas que atravessavam noções de gênero e sexualidade, cidadania, direitos humanos,
redução de danos, metodologias de educação popular, entre outros. Paralelo a esse vínculo,
trabalhei num projeto existente em Pernambuco que tem o nome: Programa ATITUDE –
Acolhimento Integral a Usuários de Crack e outras drogas. Sendo este um programa vinculado à
secretaria de desenvolvimento social, funciona como um espaço operante pela lógica do SUAS
que oferece acolhimento e inserção de pessoas em vulnerabilidade decorrente do uso
desorganizado de crack, nas redes SUAS e SUS. O foco principal do programa é atuar junto a
população na iminência de ser vítima de CVLI (Crime Violento, Letal e Intencional). Desse modo,
sendo um serviço de demanda espontânea em formato de casa de passagem, em suma éramos
procuradas por população em situação de rua usuária de crack e com ameaça de morte devido
a dívidas não pagas com o mercado de crack. Nosso objetivo era então traçar um plano junto
com a pessoa e pensar estratégias como deslocamento de território, fortalecimento de redes
de apoio, garantia de direitos e de acesso às redes intersetoriais, estratégias de geração de renda
etc. O público do programa era misto e diverso e, ao ser contratada como primeira psicóloga
trans que passou pelo serviço, as várias mulheres trans que buscavam acolhimento passaram a
ter uma identificação direta comigo, fato que fazia com que fosse eu a técnica de referência de
boa parte delas.

Nessas duas experiências, o sistema prisional era sempre uma sombra a atravessar as narrativas
e as vivências. Boa parte das pessoas tanto acessadas pelo GTP, quanto pelo programa ATITUDE
tinham passagens muito marcantes pelos vários espaços de aprisionamento do Estado.
Enquanto GTP+, pleiteamos assento no comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura de
Pernambuco, e deste lugar, passamos a intensificar ações de controle social visando
principalmente o público de mulheres trans encarceradas. Enquanto suplente, acompanhei este
espaço mensalmente durante meu tempo de estadia no GTP, elemento fundamental para me
ajudar a pensar sobre as complexidades que atravessam os dispositivos das políticas de
segurança pública.
Passei a sentir necessidade de refletir mais intensamente sobre estes cotidianos, fato que
ganhou corpo quando fui me inserindo no conselho regional de psicologia de Pernambuco e,
com o tempo, passe a coordenar a comissão temática em gênero e sexualidade. Desse lugar,
poderíamos tencionar toda a categoria de profissionais psis do Estado em relação aos temas de
nossa comissão. Por estar nesse lugar, acabo sendo convidada a compor uma mesa sobre
violência, gênero e direitos humanos na américa latina no último encontro da União Latino-
Americana de Psicologia -ULAPSI, ocorrido em junho do ano passado no Paraguai. Na ocasião,
conheço o Pedro Paulo Bicalho que, trabalhando aqui na UFRJ com subjetividade e políticas de
encarceramento, me mobiliza a tentar seleção de doutorado no Rio e, passando, ele de fato veio
a ser meu orientador de tese.

Como anteprojeto, somei uma série de narrativas que várias mulheres que conheci me
compartilharam e me propus a pensar como três campos parecem de alguma forma se
atravessar na experiência de mulheres trans, elementos chamados no projeto de O “azuelo”
(práticas de pequenos furtos ou assalto), a “colocação” (uso de substâncias variadas, em suma
para lidar com o trabalho sexual precarizado) e a própria tranca (a política prisional como uma
rota em trajetórias precarizadas desde muito antes). Acabo de chegar no rio com minha
companheira e vou começando a tatear esses pontos ao mesmo tempo em que juntas, vamos
tentando entender as dinâmicas dessa cidade espetacularizada que passa por uma intervenção
militar.

Sobre o Elas

Conheci a associação pouco depois que cheguei, em minha primeira conversa com a Jaqueline
de Jesus. Quando conto para ela o meu tema de trabalho aqui no Rio, ela automaticamente me
fala da associação e me passa o contato. Logo em seguida vejo que a associação organiza um
evento de debate e lançamento do livro Encarceramento em massa e indo, acabo conhecendo
um pouco melhor os rostos e as perspectivas de parte do grupo.

Penso o cárcere como enormes chagas abertas em todas as cidades e como dispositivo central
do processo de apagamento de algumas populações. Para mim, dentro deste universo, pensar
sobre níveis absurdos de violência a que mulheres trans são expostas em presídios masculinos
me arrepia pelos da nuca e me nutre “sangue nos olhos”. As violações variadas vividas por
mulheres que hoje considero amigas, volta e meia me assombram a memória e guiam meus
pontos de reflexão e possibilidades de atuação. Desse modo, trocar estratégias e conhecimento
com as integrantes da Associação, para mim seria extremamente rico. Vejo as possibilidades de
atuação junto a estas mulheres como múltiplas, desde oficinas, a rodas de conversas ou mesmo
grupos de trocas mais intimistas, de modo que, podemos pensar as estratégias e a metodologia
do encontro a depender do nosso objetivo com cada grupo e espaço de mulheres. Sobre o
tempo, atualmente minha única atividade é o doutorado ainda no início, o que, diferente de
quando eu tinha dois vínculos empregatícios em Recife, me dá bastante tempo livre. Minhas
atividades fixas durante todo esse semestre se resumem a apenas algumas tardes na semana.

Sem mais para esta carta, espero que possamos continuar as conversas aqui abertas.

Agradeço a possibilidade de diálogo

Céu Cavalcanti

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