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Sofrimento, Finitude e Moralidade

II Ciclo de Cinema e Filosofia


Comentário sobre o Filme Uma Lição de Vida de Mike Nichols.
Prof. Flavio Williges- Curso de Filosofia- UNISC.
25 de Maio de 2006.

O filme Uma Lição de Vida apresenta uma série de desafios ao espectador.


Alguns desses desafios dizem respeito à questões mais práticas como, por exemplo,
questões de ética médica e humanização das relações em ambientes profissionais
(Universidade, Hospital, etc). Outros tem uma raiz mais profunda e tratam,
especialmente, da capacidade humana de lidar com a própria finitude, com a dor, o
sofrimento e a morte.
Começarei este comentário fazendo algumas observações sobre estes pontos
mais gerais (que são temas de grande interesse filosófico) e avançarei para as questões
mais específicas (ética das relações, especialmente no cuidado). .
Em primeiro lugar, é relevante notar que certos aspectos da linguagem fílmica
são explorados pelo diretor para fazer o próprio espectador experimentar em si mesmo
os dramas da vida da paciente. As tomadas em primeiro plano, onde a atriz (Emma
Thompson) fala diretamente para a câmera remetem, invariavelmente, à idéia de que
alguém está falando conosco e o efeito produzido é o reconhecimento de que quem está
sofrendo e dá-se conta de sua própria mortalidade não é apenas a personagem, mas o
próprio espectador. Assim, os temas abordados aparecem claramente como temas
exemplares para nós, pois a impressão produzida é que o enredo, a história contada não
é de alguém distante; a história inteira ou a tragédia é uma tragédia humana, nossa
também.
Em segundo lugar, o filme trata de dois personagens que possuem um “caráter”
muito próximo, apesar de atuarem em áreas distintas (pesquisa médica e poesia). Os
dois (o Médico Kelekian, depois substituído na trama pelo médico residente e a Profa.
Vivian) representam, de certo modo, celebridades em suas áreas de trabalho. Essa
notoriedade adveio especialmente do modo inflexível como ambos desenvolveram suas
carreiras profissionais. São, nesse sentido, dois profissionais brilhantes e o filme sugere
que isso se deve, em boa medida, à inflexibilidade, rigor e frieza no trabalho. Ambos
operam no interior de um esquema produtivo e competente, com ênfase no estudo
minucioso e rigoroso de seus diferentes objetos. O Dr. mantém essa postura firme até o
final, a postura de alguém que vê na doença a oportunidade de novas descobertas e de
fazer a ciência médica progredir. No caso da professora, o “espírito forte” oferece
inicialmente a idéia de que a mesma inflexibilidade revelada noutros contextos da vida
poderia ser transportada para o contexto do enfrentamento da doença e garantir, no
final, a cura. A razão disso é que, mesmo na doença, a fortaleza nos permite assumir a
posição de atores, de guiar, controlar e comandar, ao invés de ver as coisas se
desenrolarem sem sermos capazes de fazer nada. No entanto, aos poucos vai sendo
mostrado que, nas doenças incuráveis, como o câncer em estágio avançado, até o ser
humano mais forte é jogado diante da inevitável, diante de uma realidade que é parte da
vida, mas que a ultrapassa, que não podemos resolver, pois não há luta, nem caminho
pelo qual avançar. É diante do reconhecimento dessa fatalidade que a inflexibilidade vai
dando lugar ao medo, a necessidade do calor e contato humano. Nesse sentido, o filme
revela duas diferentes representações de nosso lugar no mundo que são de grande
interesse filosófico:
a) de um lado temos a indicação de uma representação onde a vida aparece como
sendo aquilo que é revelado através das ciências naturais, onde o homem
aparece como alguém que estabelece com o mundo relações de conhecimento,
de cognição. Segundo tal visão, os humanos são parte da natureza e, assim, a
idéia de examinar ou estudar e, especialmente, “tratar” um humano se aproxima
da idéia de tratar um outro objeto ou coisa qualquer do mundo, como uma
laranja com fungo ou um motor encrencado. No interior dessa visão aparece
também o papel que a razão instrumental assume na questão da conduta da vida.
Com o avanço da ciência, a idéia de uma razão baseada em cálculos de meios-
fins, tornou-se largamente aceite. Através de um procedimento formalizado
podemos analisar as coisas de modo a atingir nossos objetivos. Essa
possibilidade de cálculo estratégico é muito aplicada até hoje inclusive em
terapias de desenvolvimento pessoal e programas de auto-ajuda. Ela inclui
especialmente imagens como da vida como um jogo de xadrez no qual nós
temos diante de nós um tabuleiro e onde o movimento planejado das peças
garantem o sucesso no jogo. Essa imagem não estava presente claramente em
nenhum dos dois personagens centrais, mas ela é útil para entender uma visão
redutiva da vida que era parte da imagem de ambos do mundo. Em cada um
deles, parecia pesar a idéia do desenvolvimento de um projeto racional da vida,
que envolvia o controle e a idéia de vencer os desafios (esse ponto aparece
também na aposta do médico residente e da professora, quando jovem
pesquisadora, de voltar para a biblioteca e estudar).

b) Há, no entanto, e essa ressalva deve ser muito bem apreciada, um tema
moral no filme que, mesmo dentro da visão esboçada anteriormente, deve ser
considerado. Nas concepções mais antigas da vida se fazia a distinção entre (1)
mera vivência, a existência fundada na satisfação das necessidades práticas
(casa, comida, etc.) e (2) uma mais elevada ou melhor forma de existência que
podemos atingir se compreendermos o nosso objetivo correto na vida. A Profa
Vivian (e todos os personagens do filme), desde os princípios de sua carreira,
manifestam a preocupação pela pergunta acerca do tipo de características que
uma vida boa deve ser capaz de incorporar. A maioria delas responde essa
pergunta na direção da excelência nas suas diferentes áreas de trabalho. No
entanto, é possível reconhecer que a personagem passa por uma transformação
que significou colocar, dentro desse modelo de uma vida perfeita ou da melhor
vida para o homem, os temas do amor, da presença, do afeto e da atenção. É
irônico, nesse sentido, notar que o alvo dessa descoberta seja alguém que sempre
esteve próxima da morte e da temática da perda, dos temas humanos, mas
sempre procurou tratar desses temas como um cirurgião que disseca um cadáver.
Assim, o descobrimento e a transformação vivida pela personagem acaba por
oferecer uma imagem (contrariamente à imagem científica, instrumentalista da
vida traçada acima) muito mais encorpada do humano, um sentido onde o
homem não se reduz a uma rede de relações técnico-cognitivas e num espaço de
manipulação de resultados. O que a transformação mostra é, nesse sentido, que o
homem estabelece relações existenciais-afetivas e fruitivas com o mundo. Nós
não apreendemos e experimentamos o mundo apenas como alguém que o
conhece e calcula estrategicamente seus passos sobre ele. Nós também
sofremos ou sentimos alegria com a vida e com o fato de termos ser, existência.
Essa presença humorada no mundo mostra que ele não é, para nós, apenas o
lugar onde estamos, um lugar que conhecemos, examinamos friamente e
vencemos como um desafio. Estar no mundo tem, como dizia o filósofo
Heidegger, não o sentido de “estar” como a água está no copo, mas de morar,
estar junto, no sentido de ser algo que vivenciamos como alguém que tem de
tomar conta de si mesmo, com todo o sentido da afetividade que essa noção
pode ter.
É no interior da imagem do humano esboçada em (b), que o tema da morte
adquire seu significado mais profundo. Paradoxalmente, assim como representa o
fim das possibilidades, como um horizonte onde o homem não pode mais escolher
ou a anulação da necessidade de tomar conta de seu ser, a morte aparece,
especialmente pelo recurso ao soneto de John Donne, como uma benção, pois se,
por um lado, a morte representa um enigma para quem vive, morrendo, a morte não
mais conviverá conosco. “Morte morrerás”, é um tema que atravessa todo o filme.

Oh! Morte, que alguns dizem assombrosa


E forte, não te orgulhes, não és assim;
Mesmo aquele a quem visastes o fim,
Não morre; não te vejo vitoriosa.
Vens em sono e repouso disfarçada,
Prazeres para os que tu surpreendes;
E o bom ao conhecer o que pretendes
Descansa o corpo, a alma libertada.
Serves aos reis, ao azar e às agonias,
A ti, doença e guerra se acasalam;
Também os ópios e magias nos embalam,
Como o sono. De que te vanglorias?
Um breve sono que a vida eterna traz,
Golpeia a morte, Morte morrerás.

Nesse sentido, a morte não é representada como um tema revelador de


desespero. Ela revela um certo alento, uma certa tranqüilidade, não apenas para
alguém que está doente, mas na própria linha geral sobre a qual transcorre a vida.
Morrer se assemelha um pouco, pelo menos conforme podemos ler nos últimos
momentos do filme, com as mãos afetuosas da enfermeira atenciosa que traduzem
silêncio e tranqüilidade; pode significar a orientadora já velhinha lendo a belíssima
história infantil do The Runaway Bunny de Margareth Wise Brown. Ao morrer, em
parte, parece-me que isso é sugerido, ingressamos no reino da inocência e a vida
pode transcorrer sem os cuidados e desafios que enfrentamos no turbilhão social. É
verdade que o sofrimento e a morte não podem ser reduzidos a uma experiência
poética sublime, mas o filme parece indicar claramente que a finitude humana não
precisa ser necessariamente encarada como uma ameaça e que, vista desse modo, a
própria morte pode representar uma condição de libertação de um sofrimento
associado com o fato de sermos finitos. “Descansa o corpo, a alma libertada”, diz o
soneto de John Donne. Lembremos o que Sócrates diz sobre a morte: “pensemos
agora na grande esperança que há de que a morte seja um bem. Na realidade, com a
morte tem de acontecer uma de duas coisas: ou o que morre se converte em nada e,
portanto, fica privado para sempre de qualquer sentimento, ou, segundo se diz, a
alma sofre uma mudança e passa deste para outro lugar. Se todo o sentimento cessa
e o que há é como um sono, em que nada se vê, nem em sonho, então a morte será
um benefício maravilhoso” (Platão, Apologia de Sócrates, p. 40)
Por último, gostaria de indicar um tema que é abordado no artigo “A profissão
sob Risco” do Professor Dr. Marco Antônio Oliveira de Azevedo. Nesse artigo ele
afirma que “...o valor que centraliza a atividade médica é a saúde humana. Se é
assim, então ‘aliviar o sofrimento’ e ‘salvar vidas’ são missões importantes, porém,
subordinadas à meta principal: proteger, promover e recuperar a saúde das pessoas.
Desse modo, entender o que significa ‘saúde’ de um ponto-de-vista médico é vital
para a própria ética médica” (2206, p. 13). Creio que Uma lição de Vida (Wit) traz
uma contribuição importante para este tema, pois a idéia de uma medicina curativa,
voltada para o tratamento da doença, em geral provocando grande sofrimento, é um
indício de que a saúde deve ser buscada primordialmente fora do registro dos
processos de cura (na prevenção, especialmente), cuidando, sobretudo, do nosso
modo de vida.

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