Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
O ponto de partida destas reflexões situa- grada como tipo de intervenção, defenden-
-se no domínio da teorização sobre as prá- do-se a necessidade de considerar, com rigor,
ticas de intervenção em psicossociologia. O a problemática metodológica associada às
próprio termo de intervenção tem vindo a ser diversas práticas de formação.
utilizado na literatura especializada com
alguma ambiguidade (Dubost, 1987),
havendo a necessidade de o clarificar tanto 1. OS TIPOS DE PRÁTICAS DE INTERVENÇÃO
do ponto de vista conceptual como no que PSICOSSOCIOL~GICA
diz respeito a sua potencialidade heurística,
enquanto ordenador de práticas de interven- O conceito de intervenção psicossocioló-
ção. Procurando sobretudo uma definição gica presta-se, com frequência, a algumas
clarificadora das diferentes práticas, defendo ambiguidades conceptuais, sendo por vezes
aqui a existência de uma linha de continui- utilizado sem uma cuidadosa análise dos
dade entre elas, orientada para a natureza referenciais teóricos e metodológicos que a
dos objectos de mudança subjacentes e para suportam.
a localização dos indivíduos nesse processo Na ausência destes, as práticas de inter-
de mudança. venção podem resvalar para uma praxeolo-
As diferentes localizações das práticas de gia sem uma representação coerente (Raim-
intervenção relativamente a estes dois univer- bault & Saussois, 1983), da realidade onde
sos, delimitam o espaço da sua classificação. intervém, daí resultando opções metodoló-
A Formação enquanto prática orientada gicas por vezes ofuscadas com a produção
para um processo de mudança é, aqui, inte- de efeitos visíveis imediatos, que possam
satisfazer o sistema cliente, onde a interven-
(*) Psicólogo Social. Consultor de Recursos ção toma lugar. Não se pretende, dizendo
Humanos da CEGOC-TEA. Assistente no ISPA. isto, assumir os referenciais teóricos como
199
elementos ((purificadores))das intervenções da formação e o carácter não directivo da
«todo-o-terreno«, contaminados pela «epis- intervenção.
temologia de acção)),mas tão somente assu- Segundo esta perspectiva, A formação
mir que a crítica teórica é um elemento compete directamente influenciar os sujeitos
indispensável para preverter a tendência do relativamente a matérias que configuram
interventor a se tornar naquilo que Manuel opções (de gestão, sobretudo) de mudança
Tavares da Silva (1983) designou por um já formuladas previamente, enqúanto que a
asuper-ego fomentador paranóico-genético)). intervenção é o acto preparatório das opções
O esforço de conceptualização de uma de mudança pressupostas nos actos forma-
ideia ou de um «corpus» teórico é um ele- tivos. Não se exclui, naturalmente, a possi-
mento fundamental para o ordenamento de bilidade de utilizar práticas de formação
uma prática; correlativamente, a ausência de como viabilizadoras de um projecto de inter-
clarificação dos conceitos é igualmente res- venção. Mas, enquanto que na formação, os
ponsável pela imprecisão das práticas. objectivos de mudança são enunciados como
Ao pretender abordar, nesta comunicação, pré-requisitos básicos para que os actos for-
a problemática da formação enquanto prá- mativos se tornem possíveis, na intervenção,
tica psicossociológica ,o primeiro momento contrariamente, os objectivos de mudança
da minha reflexão é justamente tentar brotam directamente da relação dinâmica
enquadrar o conceito de formação numa das forças psicossociais presentes nos dispo-
tipologia possível das práticas de interven- sitivos de intervenção.
ção em psicossociologia. Curiosamente, é no mesmo autor (M.T.S.,
A revisão sobre a literatura variada neste 1983) que encontramos, todavia, um contri-
domínio leva-nos a localizar duas linhas de buto fundamental para a ultrapassagem da
clivagem entre Formação e Intervenção, oposição formação-intervenção.
orientadas em torno de duas dimensões fun- Na sua sistemática da intervenção, referida
damentais das práticas psicossociológicas: como um «ordenamento das acções de inter-
venção)), (M.T.S., 1983) apresenta-nos uma
- A natureza dos objectivos de transfor- definição de intervenção suficientemente
mação (ou mudança) veiculados nes- ampla para cobrir uma imensa diversidade
sas práticas de práticas.
- A localização dos sujeitos da interven- Assim, para o autor, a intervenção é con-
ção no seu contexto social cebida como «qualquer interferência volun-
tária que pode afectar, global ou parcial-
Mais adiante, caracterizaremos melhor mente, o outro ou outros seres humanos))
estas duas dimensões. (MTS,1983).
Retenhamos, por agora, que é referido, Decorre desta definição que a caracteriza-
que enquanto a formação veicula objectos ção das diferentes práticas de intervenção
exteriores aos indivíduos que são considera- depende, sobretudo, dos sistemas que são
dos fora do seu contexto profissional, a afectados e do modo como essa «afectação»
intervenção é um processo que parte do indi- se produz.
víduo e é especificamente orientada para o A partir da leitura que faço da «sistemá-
próprio processo de interacção social. tica de intervenção)) em Manuel %vares da
Esta demarcação nítida entre formação e Silva, considero poder caracterizar a inter-
intervenção aparece também em alguns venção como toda a prática ou conjunto de
momentos dos trabalhos de Manuel %vares práticas que visam a transformação dos indi-
da Silva (1983), designadamente no que con- víduos numa determinada situação, recor-
cerne í l oposição entre o carácter directivo rendo a métodos ou técnicas especificamente
200
psicológicos ou inspirados na psicologia. Assumindo que as práticas de intervenção
Este processo de transformação admite, visam a transformação dos indivíduos den-
como exigência metodológica, um espaço de tro de um determinado contexto social,
interação social, onde um dos pólos assume poderei precisar, dizendo que essa transfor-
o carácter de intencionalidade, manifesta ou mação se exprime em padrões de compor-
oculta, em relação a determinados objecti- tamento social a que chamarei os objectos
vos de transformação. de transformação ou de mudança. São,
Neste contexto, a intervenção é, eminen- então, estes objectos de transformação que
temente, um acto psicossocial, pleno de se constituem como os sistemas que se des-
sentido e enquadra-se num contexto sócio- tinam a ser afectados pelas intervenções.
-institucional determinado. O objectivo da infervencão será, assim,
Esta perspectiva permite identificar os produzir uma transformação expressa ao
dois elementos básicos a partir dos quais é nível dos padrões de comportamento social
sustentável um quadro unificador das dife- pertinentes no contexto sócio-institucional
rentes práticas de intervenção: onde a intervenção se desenvolve.
Sendo o contexto sócio-profissional aquele
- A natureza dos sistemas que são afec- que dominantemente ocupa a minha refle-
tados na intervenção xão, poderei classificar os padrões de com-
I - A localização dos indivíduos no con- portamento social, segundo o modo
texto sócio-institucional apresentado no quadro 1.
QUADRO 1
Padrões de Comportamento Social em Contexto Sócio-Prcfmional
201
TERVENÇÃO OU PRÁTICASPSICOSSO- * 3 - INTERVENÇÃO PROPRIA-
CIOL~GICAS. MENTE DITA - onde os objec-
tos são elaborados pelos indiví-
* 1 - FORMAÇÃO INTER - Acto psi- duos ou grupos reais dentro do seu
cossociológico onde os objectos a contexto organizacional.
transformar são exteriores aos indi-
víduos e veiculados fora do seu * 4 - ACONSELHAMENTO/TERA-
contexto profissional. PIA - Acto psicossociológico
onde os objectos são elaborados
* 2 - FORMAÇÃO INTM - ~ c t psi-
o pelos sujeitos, individualmente ou
cossociológico em que os objectos em grupo, fora do seu contexto
são exteriores aos indivíduos, mas sócio-profissional.
veiculados para grupos reais no
quadro do seu contexto sócio- No Quadro 2 estão referidos os quatro
-profissional. tipos de práticas psicossociológicas.
9
‘UT
2 4 - Aconselhamento/Terapia
- Objectos elaborados pelos
3 - “Zntervençáo”
- Objectos elaborados pelos
õ
32.- indivíduos fora do seu contexto indivíduos no interior do seu
34 sócio-profissional contexto sócio-profissional
O 8
E
:. 3 1 - Formação hter 2 - Formação Intra
‘0
- Objectos exteriores aos - Objectos exteriores aos
3 .E indivíduos e fora do seu contexto indivíduos, dentro do seu contexto
gs
0.A sócio-profissional sócio-profissional
O
~~ ~
202
QUADRO 3
Modelo tridimensional do comportamento humano
\
SISTEMA EMERGENTE
Comportamento que emerge das
necessidades individuais dentro dos
limites e das oportunidades propiciadas
pelo sistema requerido
203
Ao referir anteriormente que um dos ele- é ((qualquer coisa imposta do exterior, que
mentos caracterizadores das práticas de o obriga a modificar a sua maneira de tra-
intervenção é a natureza dos sistemas que balhar, de se comportar ou as suas represen-
são afectados e ao localizar, nesta base, os tações sobre as suas relações com a
quatro tipos fundamentais de intervenção organização))(Raimbault e Saussois, 1983).
psicossociológica, poderei agora analisar jus- Nesta acepção, a mudança tem justamente
tamente a expressão dos diferentes tipos de expressão relativamente aos objectos de
intervenção, relativamente aos 3 sistemas de transformação que anteriormente loca-
comportamento humano. lizei.
A intervenção psicossociológica visa a Reunidos estes elementos, lançarei como
mudança, já o disse. Não sendo possível, hipótese que cada um dos tipos de interven-
nesta comunicação, deter-me alongadamente ção assume, como seu objectivo imediato, a
sobre o conceito de mudança, retenho, a par- transformação de determinados padrões de
tir de Raimbault e Saussois (1983) que, para comportamento, conforme é mostrado no
uma pessoa ou para um grupo, a mudança Quadro 4.
QUADRO 4
Relações entre as práticas Psicossocioldgicas e os padrões de comportamento a transformar
4 - Aconselhamento/Tempia 3 - Intervenção
«Insight» de atitudes e valores Relações profissionais
profissionais Reelaboraçáo de novas estxatégias de
Auto-análise relacionamento
Reconhecimento das fantasma
tizações associadas ao
exercício dos papéis
204
QUADRO 5
Objectivos de tmmformação Transformação
nas práticas psicossociológicas do sistema
emergente
- 1
Fraca Forte
Transformações ao nível do sistema requerido
205
+ Atitudes e opiniões profissionais
Relações profissionais
j Conhecimentos profissionais
Saberes técnicos
-
- Dificuldade +
206
zacional, tornam-se, presumivelmente, per- nismos de relacionamento dos sujeitos com
tença dos sujeitos da intervenção. o espaço e as dinâmicas das organizações,
Neste tipo de intervenção, a acentuação 6 mediatizada pela reflexão crítica e activa dos
feita no sistema requerido. As intervenções próprios sujeitos relativamente ii significa-
intra, sendo realizadas com grupos homogé- ção dos modos de relacionamento reificados
neos de uma mesma empresa, optimizam as nas diversas manifestações do comporta-
potencialidades dos efeitos da dinâmica de mento organizacional.
grupo através de uma acção incitativa 2i Neste tipo de intervenção, as pessoas e as
mudança onde os objectos de transformação estruturas estão presentes enquanto reflexão
são dominantemente constituídos por atitu- sobre os processos da sua intersecção.
des e comportamentos requeridos. Conforme é referido por Jean Claude
O desenvolvimento da cumplicidade no Rouchy (1987), sempre que o termo de inter-
grupo pode facilitar o processo de progres- venção é referido, estamos em presença de
siva homogeneização, naturalmente poten-
uma acção que implica a evolução das pes-
ciando uma boa integração no intra-grupo,
feita na base dos valores fundamentais que soas e das estruturas. Neste contexto, refere
terão estado subjacentes li negociação do ainda J. C. Rouchy que «elle sera conduite
objectivo de intervenção. Por esta razão, a dans une perspective ou le changement ne
potencialidade de mudança é relativamente s’elabore pas seulement par un ajustement
forte neste tipo de intervenção, sobretudo des personnes h des situations nouvelles, ou
numa acentuação do sistema requerido sobre par un changement interne, mais aussi par
o sistema pessoal. leur agencement reciproque, dans leur com-
As questões metodológicas são, neste tipo plementarité en rapport aux fonctions, aux
de intervenção, particularmente relevantes: finalités, du groupe et non plus seulement de
uma metodologia de tipo incitativo (Lesne, celle des individus dans le groupe» (Rouchy,
1977) facilita a produção dos mecanismos de 1987).
vinculação afectiva, fazendo sobretudo apelo Pelo atrás exposto, o domínio especifico
a vivência imediata do «elan» grupal. Esta do tipo 3 de intervenção é o sistema emer-
vivência associada a objectivos de interven- gente.
ção formulados a partir de uma forte acen-
tuação do sistema requerido, pode conduzir
a uma associação apriorística e acrítica, por
parte das populações participantes nas Tipo 4: AconselhamentoRerapia
acções, do estar-ali vivido como a imanação
directa da moralidade organizacional, faci- É o tipo de intervenções orientado espe-
litando a aderência aos valores e às normas cificamente para o sistema pessoal, onde os
do sistema requerido por mecanismos mani- objectos de transformação se situam ao nível
pulatórios. do «insight», das vivências pessoais, resul-
Uma metodologia de tipo apropriativo tantes da interiorização dos valores e da
(Lesne, 1977), parece, assim, ser aquela que,
no contexto deste tipo de intervenção poderá fenomenologia das vivências dos papéis
potenciar a dinamização de um sistema sociais.
emergente tendencialmente a apontar para Tendo a pessoa como centro e a sua auto-
as intervenções do tipo 3. -percepção como objectivo de acção, este
tipo de intervenção assume o contexto como
pano de fundo, onde, como as sombras chi-
Tipo 3: Intervenção propriamente dita
nesas, os contornos imprecisos delimitam
Estão incluídas neste tipo de intervenções apenas as fronteiras das fantasmatizações
orientadas para uma reorientação dos meca- sociais projectadas pelos indivíduos.
207
CONCLUSÃO dos objectivos a atingir e da natureza dos
objectos de transformação em presença.
Com esta tipologia de intervenção, apenas Ao interventor compete a formulação de
esboçado nesta comunicação, pretendo uma visão coerente e integrada do pedido de
salientar os elementos diferenciadores das intervenção, estruturante de uma relação
diferentes práticas de intervenção psicosso- com o sistema-clientedemarcado das ambi-
ciológica e as fronteiras no interior das quais valências do ((quase-desejo))das ((quase-mu-
as reflexões se revelam pertinentes. Por esta danças)), de qualquer das partes considera-
leitura, podemos inferir o carácter não uni- das, individualmente, antes orientas para a
versal e absoluto de qualquer das quatro prá- clarificação tão precisa quanto possível das
ticas consideradas, mas, pelo contrário, a estratégias do conjunto dos interlocutores
necessidade de as articular numa perspectiva envolvidos e dos elementos de significação
metodológica integrada onde justamente as que brotam na sua intersecção, como ele-
opções de construção dos dispositivos de mentos expressivos da fenomenologia psicos-
intervenção sejam orientados pela definição sociológica.
208