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A arte africana e as múltiplas histórias de África

José Renato Teixeira1


Graduando em História da UFMG

Resumo
O texto procura mostrar como a cultura material africana, principalmente a nominada arte
africana vem sendo estuda e analisa nos últimos anos. Aborda também alguns aspectos sobre
sua obtenção e de como as ideias e saberes circulantes entre os dois lados do Atlântico, na
diáspora, contribuíram para ampliar os horizontes de análises da cultura material africana e para
um novo olhar sobre as múltiplas histórias de África.
Palavras chave: Arte, História da África, Cultura material, Benin, Diáspora,

Durante muitos anos a historiografia ocidental tratou o continente africano somente como
fornecedor de mão de obra e como uma extensão de terra a ser explorada. Conforme argumenta
Marta Heloísa Leuba Salum (2005), em virtude da concepção eurocêntrica de mundo, julgava-
se que pela falta de registros escritos, as sociedades africanas não possuíam uma história, ou
antes, não possuíam uma história digna de ser escrita. Este modelo de pensamento, nascido de
uma sociedade europeia, cristã e branca, tinha em si o ideal de humanidade, de civilidade.
Qualquer diferença era, e ainda o é em grande medida, creditava ao outro o caráter de
subalterno, de inferior.

Esta forma de ver e escrever a história das sociedades africanas começa lentamente a tomar
uma nova direção, conforme aborda José d’Assunção Barros (2010) ao discorrer sobre os
aspectos intra e interdisciplinares da escrita da história. Vários foram os motivos para esta
mudança, porem aos escritos e pensamentos diaspóricos se deve creditar a maior importância.
As memórias dos que partiram e as múltiplas formas de circulação das ideias e pensamentos
dos dois lados do Atlântico foram fundamentais para a manutenção, difusão e apropriação da
cultura africana.

Pode-se inferir que o interesse pela cultura africana, mais especificamente pela arte, se inicia,
ou ganha impulso, com os gabinetes de curiosidades espalhados pela Europa e pelos Estados
Unidos. Tais ambientes constituíam-se como espaços para acondicionamento e exibição de

1
Trabalho apresentado à disciplina Arte Africana: introdução aos conceitos, usos e colecionismos, ofertada pela
profa. Vanicléia Silva Santos, no 1 º semestre de 2018. 16 de abril de 2018.
objetos considerados exóticos, diferente ou estranhos à sociedade local, obtidos em sua quase
totalidade através de saques e subtrações a sociedades africanas. Estes espaços, todos
pertencentes a proeminentes e abastadas personalidades, se constituíram “vitrines” para a
cultura e para a arte africanas, podendo-se afirmar que estes gabinetes são os precursores dos
museus e, em certa medida, das galerias de arte.

Foi neste ambiente que a produção cultural africana, mais especificamente sua parcela material
é acessada por outros olhares diferentes do dos colecionadores e dos colonizadores.
Inicialmente observadas ou taxadas como pitorescas e exóticas as peças exibidas passam a ser
comparadas com as obras do cânone cultural europeu e começam a causar um certo incomodo
ou inquietação nos observadores. O questionamento de então se dá em torno da qualidade
técnica e estética das obras expostas. Muitas são tentativas de vincula-las ou leva-las a uma
origem diversa da africana, culminando por servir de “inspiração”, sem o devido
reconhecimento, a grandes artistas europeus e americanos.

Um aspecto que sem dúvida não pode deixar de ser lembrado é que o que comumente ficou
conhecido como a cultura e arte africana, representa a arte e a cultura de sociedades distintas,
que ocupavam o espaço que hoje conhecemos como África. Em sua avidez de recolher objetos
e relatos dos povos africanos, o colonizador europeu, movido pelo sentimento eurocêntrico e
pelo desconhecimento da língua e da cultura, nominou praticamente todos os objetos como
“africanos”. Como se houvesse dentro daquele território/continente somente uma cultura e, que
esta cultura única imperasse e moldasse os modos de vida de todas as pessoas daquelas terras.

Do interesse pelo inusitado criou-se o desejo de possuir os objetos africanos expostos nos
gabinetes. Este desejo, por menos nobre que fosse, acabou por levar ao ocidente civilizado o
conhecimento da existência de uma cultura e também da possibilidade de uma história da
África. Este desejo adicionado às ideias e memórias da diáspora, como discorre John Peffer
(2003), que mostravam a existência de um passado, fizeram com que um olhar mais criterioso
e metódico fosse utilizado para o estudo e entendimento do continente africano e de suas várias
sociedades.

É possível atribuir à cultura material africana um papel primordial na mudança do paradigma


de uma África sem memória, sem história e una. O estudo da cultura material, da arte em
especial mostrou, e as pesquisas continuam a mostrar, que as culturas na África eram múltiplas
e variadas e que estas variações ocorriam muitas vezes, em espaços territoriais não muito
grandes. Mostrou também, e principalmente, que a arte africana, inúmeras vezes nominada
como primitiva, tosca ou exótica trazia consigo além de uma historicidade, saberes e memórias
de todo um povo. Muito mais que os aspetos estéticos e práticos das obras estudas a arte africana
apresenta/retrata as bases constitutivas da sociedade a que pertence, abrindo caminho para a
interpretação e o entendimento das sociedades africanas.

Ainda sobre a importância da cultura material para o estudo das sociedades africanas é
fundamental observar que foram aspectos de cultura, sobremaneira os objetos (que acabaram
nomeados com “de arte”, mas que em suas origens tinham usos e aplicações que iam além da
ornamentação), que ajudaram a levar a África para o centro de um outro debate, no qual uma
memória e uma história existiam e, por conseguinte, poderiam e deveriam ser escritas e
ensinadas.

Da evolução dos estudos sobre África, suas múltiplas culturas e suas artes, sobressaem as que
contemplam o Benin, o Daomé e o Congo. Inúmeros são os estudiosos e pesquisadores que se
debruçaram sobes estas sociedades para estudar, entender e escrever sobre suas obras. Apoiado
nas palavras de Kabengele Munanga (2004), temos que a grande maioria destes estudos
analisou as obras destas sociedades basicamente sobre três perspectivas.

Munanga, em sua reflexão, aponta que uma parcela dos estudiosos manteve seu olhar para as
obras atendo-se apenas aos aspectos estéticos. Suas observações buscavam interpretar as obras
estritamente sobre suas características físicos, palpáveis e visuais. E muitos neste sentido
buscaram traçar ligações ou comparações com o cânone artístico e cultural europeu. Outra
forma que conduzir as análises foi se ater aos usos atribuídos aos objetos, etnográfico. Desta
forma o que era levado em conta nos estudos era a finalidade prática do objeto, para a sociedade
que o concebera. Os usos religiosos, cerimoniais ou mesmo do dia a dia eram levados em
consideração para se entender e, em grande medida, classificar o objeto. O que se buscava com
esta forma de avaliação, de certa maneira, era não fomentar a ideia de que as sociedades
africanas poderiam produzir objetos que não fossem exclusivamente para o uso cotidiano. Por
fim, as análises começaram a abordar as duas formas anteriores buscando um entendimento que
abarcasse as duas óticas de observação. Os estudos realizados durante anos por Suzanne Preston
Blier (2003), uma das mais importantes pesquisadoras da arte e da cultura do Benin, caminham
nesta perspectiva. Blier busca compreender e capturar em suas pesquisas os múltiplos sentidos
dos objetos nas sociedades nas quais estão inseridos, partindo dos usos comuns até os religiosos
e legitimadores de força e poder. Em grande medida esta evolução das formas de análise
corroboram a ideia que a arte das sociedades áfricas trafega por todas as nuances da percepção
humana, mostrando que os objetos estudados constituem e são constituídos na sociedade onde
estão inseridos.

Às três vertentes metodológicas apontadas se soma uma quarta. Denominada “arte de


aeroporto” foca seu olhar no que foi e vem sendo produzido na África para o atendimento de
uma demanda por “arte primitiva”, como vulgarmente se denomina a arte africana, criada por
colecionadores, museus e caçadores de antiguidades. Muito embora esta produção não remontes
a um passado distante ela contribui para a afirmação do que hoje se considera a arte africana,
haja vista a possibilidade destas obras antigas, não tão antigas, receberem a chancela de
importantes instituições (a grande maioria por ignorância quanto à procedência das peças).

Alguns dos objetos mais importantes e representativos da cultura material africana podem ser
apreciados em alguns prestigiosos museus europeus e americanos. Dentre tantas obras
impressionantes, uma estatueta do Rei Ewuakpe – Benin (r.c. 1690-1713), exposta no Museun
fur Volkerkunde, em Berlim (figura 1) e uma Cabeça do Rei (sem identificação do rei, mas
provavelmente do século XV) (figura 2) se destacam.

A estatueta, utilizada sobre um altar, mostra em seus


detalhes a grandiosidade do Rei. As voltas do colar de
contas, o chapéu, o cetro ou bastão do poder e o fato de
estar ladeado por duas figuras menores apontam o
prestigio, o poder e a nobreza. Aspetos da estrutura da
obra também são importantes para o entendimento e
localização da cultura no âmbito espacial. Os membros
inferiores menores que o tronco, os olhos amendoados, o
formato do nariz e da boca facilitam a identificação desta
obra com oriunda do Benin.

Figura 1- Altarpiece Representing King Ewuakpe (c.


1690-1713) Africa, Nigeria Kingdom of Benin -
Museun fur Volkerkunde, Berlim – Créditos imagem
- Modern Ghana - Disponível em
https://cdn.modernghana.com/thumb/XGltYWdlc1xjb250ZW
50XG9iYV9ha2VuenVhX2lfYmVuaW4uanBnfDMwMHwxO
DB8NC84LzIwMTg=.jpg – Acesso em 18/04/2018.
Esta cabeça também é uma outra obra fantástica. Os
detalhes observados nesta obra também possibilitam sua
identificação com pertencente à região do Benim, ou
produzida conforme técnicas utilizadas por esta
sociedade. O formato dos olhos, do nariz e da boca não
deixam dúvidas quanto à procedência. É também
importante observar a quantidade de voltas do colar que
a peça ostenta no pescoço. Este adorno feito com contas
de coral (usualmente na cor vermelha, para a realeza)
mostra o poder e o prestígio que o governante tinha
perante seu povo. Outra característica que chama a
atenção são as marcas rituais sobre os olhos, elas
Figura 2 Altar Head,” 16th century, Benin Kingdom,
Nigeria (University of Pennsylvania Museum of
atestam o pertencimento do rei à sociedade de que faz
Archaeology and Anthropology, Philadelphia:
parte e que cumpriu as etapas sua trajetória social.
Purchased from W. O. Oldman. Image courtesy of the
Penn 2-Figura– 2-
FiguraMuseum) ArtistImagem
Crédio the Penn
unknown, Porem a característica que mais chama atenção é a
Royal Head from an Altar, Benin, c. 15th century,
Museum - Disponível em
University of Pennsylvania Museun, Philadelphia
http://philamuseum.tumblr.com/post/153434928968/cl cavidade que a peça tem em sua parte superior (no alto
osing-soon-experience-historical-works-in-new -
Acesso em 18/04/2018 da cabeça). Esta peça era utilizada no altar real para
receber uma presa de elefante (marfim) onde estaria esculpida a história do rei ancestral, como
um memorial ao antecessor.

Estas duas obras, hoje vistas como legítimos representantes da cultura material africana, durante
muitos séculos se posicionaram sobre ou ao lado de alteres cerimoniais. Tinham por objetivo
principal fazer a ligação entre o mundo dos vivos e o dos partiram dele. Eram, a grosso modo,
instrumentos de contato entre os dois mundos para a manutenção de uma ordem social existente
ou desejada. Traziam as narrativas que guiavam os que permaneciam entre os vivos com a
função de liderar e de guiar o povo. Era um elo de continuidade. A maioria destes objetos eram
enterrados com o rei após sua morte, cabendo ao sucessor refazer o processo. Produzindo novos
instrumentos para manter a ligação entre os mundos e dar prosseguimento à história, renovando
assim o ciclo.

Estas representações além de cumprirem uma função cerimonial e religiosa também tinham a
importante função política de legitimar, via ligação com os ancestrais divinos, o poder terreno
e prático do rei. Quanto maior e maios ostentoso os objetos do culto e adoração real maior o
seu poder e sua aceitação pelos seus governados.

É indiscutível que o interesse e o estudo da cultura material africana tenha contribuído para o
entendimento, divulgação e, em grande medida, para conhecimento de divulgação da arte
africana. Mas suas duas maiores contribuições foram a compreensão de que são múltiplas as
artes africanas, assim com suas sociedades. E que com a descoberta e ressignificação desta
produção artística a própria escrita da história da África ganha no novo impulso, caráter e atores,
que passam a interpretá-la sob uma nova perspectiva. Mesmo tendo em mente que muitas das
obras, hoje exibidas em grandes museus, foram obtidas através de saques a palácios e
profanação de túmulos reais, elas parecem continuar cumprindo sua função de nos ligar ao
ancestrais e nos fornecendo subsídios para pensar o passado.

Bibliografia

BARROS, José D’Assunção. História da cultura material: Notas sobre um campo histórico em
suas relações intradisciplinares e interdisciplinares. p. 1-17, 2010 b.

BLIER, Suzanne Preston. The Royal Arts of Africa: the Majesty of Form. republication.
London: Lawrence King, 2012.

______. “Assemblage: Dahomey Art and the Politics of Dynasty”. Res: Anthropology and Art.
Vol. 45. (2003): , Vol. 45. , 186 ff. Print.

MENESES, J. N. C.. Introdução: Cultura material no universo dos Impérios europeus


modernos. )”. Anais do Museu Paulista, História e Cultura Material, Universidade de S. Paulo,
v. 25, p. 9-12, 2017.

MUNANGA, Kabengele. “A Dimensão Estética na Arte Negro-Africana Tradicional”. In:


AJZENBERG, Elza (org.). Arteconhecimento. São Paulo: PGEHA, 2004, p.p. 29-44.

PEFFER, John. A diáspora como objeto. Laurie Ann Farrell (ed.), Looking Both Ways. Art of
the Contemporary African Diaspora, Nova Iorque, Museum for African Art, 2003. Disponível
em: http://artafrica.letras.ulisboa.pt/uploads/docs/2016/04/18/5714e87070f5e.pdf.

SALUM, Marta Heloísa Leuba (Lisy). África: culturas e sociedades. Texto do guia temático
para professores África: culturas e sociedades, da série Formas de Humanidade, do Museu de
Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo. Escrito em janeiro de 1999 e revisto e
adaptado em julho de 2005. Link -
http://www.arteafricana.usp.br/codigos/textos_didaticos/002/africa_culturas_e_sociedades.html

______. Considerações sobre o perfil da coleção africana e afro-brasileira no MAE-USP.


Estudo visa a reunindo dados sobre o acervo referente à África no MAE - Museu de
Arqueologia e Etnologia (Universidade de São Paulo), relacionando-o ao seu aproveitamento
educacional e científico com a Coleção no período de 1981 a 1992. Disponível em:
http://www.journals.usp.br/revmae/article/view/109174

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