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Universidade Federal da Paraíba

Centro de Ciências Exatas e da Natureza


Departamento de Matemática

Uma Introdução Axiomática dos


Conjuntos

Antônio de Andrade e Silva


Silva, Antônio de Andrade e
S586u Uma introdução axiomática dos conjuntos/
Antônio de Andrade e Silva –João Pessoa,
Editora Universitária da UFPB, 2011.
p.328
1. Álgebra. (Matemática)
I. Universidade Federal da Paraíba. -+ II. Título.
CDU - 512
PREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃO

A presente edição difere da primeira edição na correção de todos os erros co-


nhecidos, e na adição de dois capítulos, um sobre números ordinais e outro sobre a
construção dos números reais.
O que nos motiva escrever esta edição é o aspecto marcante da pesquisa em ma-
temático no último século e no papel crescente que a abordagem axiomática vem
representando. O método axiomático certamente não é novo em matemática, tendo
sido empregado por Euclides em seus Elementos. No entanto, apenas em anos re-
lativamente recentes tem sido adotado em partes da matemática além da geometria.
Isso tornou-se possível por causa de um completo compreensão da natureza dos
axiomas e da axiomatização da lógica.
Para desenvolver a capacidade do leitor de pensar por si mesmo em termos das
novas definições, mantivemos no final de cada seção uma extensa lista de exercícios,
onde a maioria dos exercícios dessas listas foram selecionados dos livros citados
no final do texto, cujas respostas e/ou sugestões estão incluídas no final do texto.
Devemos, porém, alertar aos leitores que os exercícios variam muito em grau de
dificuldade, sendo assim, não é necessário resolver todos numa primeira leitura.
Os capítulos 1-6 da primeira edição foram todos revisados e reorganizados. No
capítulo 7 apresentaremos o conceito formal de números ordinais via método axio-
mático. Também, veremos que o conjunto dos números ordinais possui quase todas
as propriedades algébricas do conjunto dos números naturais.
No Capítulo 8 dedicaremos a uma introdução do conjunto dos números reais via
o método axiomáico de Dedekind a partir do conjunto dos números racionais, a qual
está em consonância com a construção do conjunto dos números naturais. Além

i
disso, apresentaremos a representação de um número real em uma base qualquer.
Agradecemos aos colegas e alunos do Departamento de Matemática que, direta
ou indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho. Em particular, aos
professores Miriam da Silva Pereira e Nacib André Gurgel e Albuquerque.

Antônio de Andrade e Silva


PREFÁCIO À PRIMEIRA EDIÇÃO

Este texto surgiu da experiência do autor quando este ministrou algumas ve-
zes a disciplina para os cursos de Matemática e na Licenciatura em Matemática a
Distância.
O principal objetivo deste texto é levar o leitor a compreender os axiomas da
Teoria dos Conjuntos, segundo “Zermelo-Fraenkel”, a ponto de aplicá-los em dife-
rentes contextos tais como o axioma da escolha, modelagem de situações-problema
envolvendo o princípio do máximo de Hausdorff, Lema de Zorn, conjuntos bem
ordenados, construção dos números naturais e números cardinais.
O texto é dividido em seis capítulos, dos quais o primeiro é responsável pela
introdução do método axiomático e resultados utilizados em todo o texto. Em cada
estudo específico, busca-se a caracterização do objeto por meio de propriedades que
possibilitem ao leitor estabelecer correspondências entre determinadas situações-
problema da vida real e a espécie de função focalizada, objetivando sua utilização
na construção de uma tradução matemática da respectiva situação.
É nossa expectativa que este texto assuma o carater de espinha dorsal de uma
experiência permanentemente renovável, sendo, portanto, bem vindas às críticas
e/ou sugestões apresentadas por todos - professores ou alunos quantos dele fizerem
uso.
Para desenvolver a capacidade do leitor de pensar por si mesmo em termos das
novas definições, incluímos no final de cada seção uma extensa lista de exercícios,
onde a maioria dos exercícios dessas listas foram selecionados dos livros citados no
final do texto. Devemos, porém, alertar aos leitores que os exercícios variam muito
em grau de dificuldade, sendo assim, não é necessário resolver todos numa primeira

iii
leitura.
No capítulo 1 apresentaremos um pouco da história do surgimento do método
axiomático na matemática, que serão necessárias para o entendimento dos próximos
capítulos.
No capítulo 2 apresentaremos, via método axiomático, os elementos básicos da
Teoria dos Conjuntos através dos sete primeiros axiomas. Além disso, definimos
as operações com conjuntos: união, interseção, complementar, diferença, gráficos,
famílias, produto cartesiano e algumas propriedades algébricas.
No capítulo 3 estudaremos os problemas de aplicações ordinárias de matemática
tais como: relação de ordem, conjuntos parcialmente ordenados, elementos maxi-
mais e minimais, maior e menor elemento, supremo e ínfimo de um conjunto. Além
disso, estudaremos reticulados e conjuntos bem ordenados.
No capítulo 4 apresentaremos as formulações clássicas do axioma da escolha
dada por Zermelo e suas principais consequências.
No capítulo 5 construiremos, formalmente, o conjunto dos números naturais, o
qual será munido com todas as propriedades que são associadas com os números
naturais do nosso pensamento. Além disso, com o “axioma da infinidade” comple-
taremos a Teoria Axiomática dos Conjuntos, segundo Zermelo.
Finalmente, no capítulo 6 apresentaremos o conceito de conjuntos equipotentes
e o conceito formal de números cardinais via método axiomático. Também, ve-
remos que o conjunto dos números cardinais possui quase todas as propriedades
algébricas do conjunto dos números naturais.
Agradecemos aos colegas e alunos do Departamento de Matemática que, direta
ou indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho. Em particular, aos
professores João Bosco Nogueira e Glauber Dantas Morais.

Antônio de Andrade e Silva


SUMÁRIO

Prefácio à Segunda Edição i

Prefácio à Primeira Edição iii

1 O Método Axiomático 1
1.1 Introdução Histórica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
1.2 Modelos Axiomáticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
1.3 Caracterização de um Sistema de Axiomas . . . . . . . . . . . . . . 15
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

2 Conjuntos 27
2.1 Introdução Histórica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
2.2 Conjuntos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
2.3 Gráficos e Famílias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
2.4 Funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64

3 Conjuntos Parcialmente Ordenados 69


3.1 Conjuntos Ordenados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76

v
3.2 Isomorfismos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82
3.3 Elementos Notáveis e Dualidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 98
3.4 Conjuntos Bem Ordenados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114

4 Axioma da Escolha e Aplicações 117


4.1 Axioma da Escolha . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128
4.2 Aplicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 143
4.3 Princípio da Boa Ordenação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 145
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 148

5 Os Números Naturais 151


5.1 Os Números Naturais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161
5.2 Aritmética dos Números Naturais . . . . . . . . . . . . . . . . . . 162
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 175

6 Números Cardinais 177


6.1 Conjuntos Equipotentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 178
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 187
6.2 Números Cardinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 188
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 195
6.3 Aritmética dos Números Cardinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . 196
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 202

7 Números Ordinais 205


7.1 Números Ordinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 207
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 217
7.2 Aritmética dos Números Ordinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . 218
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 227
8 Construção dos Números Reais 229
8.1 Os Números Inteiros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 229
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 236
8.2 Os Números Racionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 237
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 243
8.3 Os Números Reais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 243
Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 253
8.4 Representação de Números Reais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 253

Bibliografia 259

Respostas e Sugestões 261

Índice Remissivo 313

vii
CAPÍTULO 1

O MÉTODO AXIOMÁTICO

Quando falamos que um objeto pertence a outro objeto, queremos dizer, sim-
plesmente, que o primeiro deles depende do segundo. Situações de pertinência
aparecem frequentemente em nossa vida. Por exemplo, um ponto pertence a uma
reta.

A partir de agora, você está convidado a nos acompanhar neste passeio pelo
mundo dos axiomas e postulados. Juntos analisaremos detalhadamente as caracte-
rizações de um sistema de axiomas e a independência de um axioma.

É importante salientar que alguma familiaridade com conceitos tais como: con-
juntos, conjuntos numéricos, espaço vetorial, grupo, dentre outros. É necessário
para uma boa leitura deste capítulo.

Axiomas e postulados aparecem com mais frequência na Geometria Plana. Con-


sidere, por exemplo, o seguinte postulado:

“Se uma linha reta intercepta duas outras linhas retas formando ângulos inte-
riores no mesmo lado menor do que dois ângulos retos, as duas linhas retas, se
prolongadas indefinidamente se interceptarão no lado em que a soma é menor que
dois ângulos retos.”

Este e outros axiomas da Geometria Plana serão tratados neste capítulo.

1
1.1. Introdução Histórica

1.1 Introdução Histórica


Nesta seção apresentaremos um pouco da história do surgimento do método
axiomático na matemática. O leitor interessado em mais detalhes pode consultar
Tarski, A. [13] e/ou Wilder, R. L. [14].
Nos textos de Geometria Plana, visto no ensino fundamental, encontramos dois
grupos fundamentais de afirmações, um chamado de axiomas e outro chamado de
postulados. Formalmente:
Um axioma é uma afirmação que dispensa explicação, ou seja, é uma verdade
universal.

Exemplo 1.1 Noçẽs comuns:

1. O todo é maior do que cada uma de suas partes.

2. O todo é a soma de suas partes.

3. Coisas iguais a uma outra coisa são iguais entre si.

Um postulado é um fato geométrico simples e óbvio que podemos supor sua


validade.

Exemplo 1.2 Postulados:

1. Dois pontos distintos determinam uma e somente uma reta.

2. Uma reta pode ser estendida indefinidamente.

3. Se r é uma reta e P é um ponto fora de r, então existe uma única reta s


paralela à reta r e passando por P .

Um teorema é uma verdade que não se torna evidente senão por meio de uma
prova.

Observação 1.3 Um teorema é composto de duas partes:

1.a Hipótese - é o conjunto de suposições.

2.a Tese - é a consequência que o raciocínio deduz da hipótese, por meio de


verdades já conhecidas.

2
Capítulo 1. O Método Axiomático

Exemplo 1.4 (Teorema de Pitágoras) 1 Em qualquer triângulo retângulo, a área


do quadrado cujo lado é a hipotenusa é igual à soma das áreas dos quadrados que
têm como lados cada um dos catetos.

Um lema é um teorema auxiliar. Finalmente, um corolário é uma proposição


que é uma consequência de um teorema previamente provado.
Esses agrupamentos de axiomas e postulados já eram conhecidos em Aristóte-
les e em Euclides3 como noções comuns e postulados. A partir dessas afirmações
2

e de um certo número de definições, Euclides demonstrou 465 teoremas em uma


sequência lógica. Por exemplo, o quinto postulado de Euclides, em sua forma ori-
ginal, foi enunciado como:
E5 - Se uma linha reta intercepta duas outras linhas retas formando ângulos
interiores no mesmo lado menor do que dois ângulos retos, as duas linhas retas, se
prolongadas indefinidamente se interceptarão no lado em que a soma é menor que
dois ângulos retos, confira Figura 1.1.

Figura 1.1: Quinto postulado de Euclides.

Proclus4 descreveu a controvérsia que estava se formando com relação a esse


postulado mesmo nessa época, sendo ele próprio a favor da eliminação do postulado
por classificá-lo de ingênuo, plausível e sem caráter de necessidade lógica.
1
Pitágoras de Samos, 580-500, a.C., matemático e filósofo grego.
2
Aristóteles, 384-322, a.C., filósofo grego.
3
Euclides de Alexandria, 330-260, a.C., matemático grego.
4
Proclus Lycaeus, 410-485, d.C, filósofo grego.

3
1.1. Introdução Histórica

No período Renascentista (séculos XV e XV I) iniciou-se novo período de con-


trovérsias com relação ao quinto postulado a partir dos outros postulados, ou seja,
demonstrá-lo a partir dos outros postulados e axiomas da geometria usando princí-
pios da lógica. Vamos dar uma pausa para relembrar a definição de retas paralelas.
Duas retas distintas r e s, em Geometria Plana, são chamadas de paralelas se
elas não se interceptam, isto é, r = s e r ∩ s = ∅. Assim, atualmente, o quinto
postulado de Euclides é enunciado como:
E5 - Dada uma reta r e um ponto P fora de r, existe uma e somente uma reta s
que contém P e é paralela à reta r, confira Figura 1.2.

Figura 1.2: Geometria Euclidiana.

Note que esse postulado afirma que retas paralelas existem.


No século dezenove, Lobachevsky5 em 1820, Gauss6 e Bolyai7 em 1823, des-
cobriam que poderiam obter uma teoria matemática “consistente” partindo de um
postulado que afirma a existência de infinidade de retas paralelas contendo P .
Postulado de Lobachevsky-Gauss-Bolyai - Dada uma reta r e um ponto P
fora de r, existem pelo menos duas retas s e t que contém P e são paralelas à reta
r.

Figura 1.3: Geometria Hiperbólica.

Um “modelo” para esta geometria é dado pelo o semiplano H, em que as retas são
5
Nikolai Ivanovich Lobachevsky, 1792-1856, matemático russo.
6
Carl Friedrich Gauss 1777-1855, matemático alemão.
7
János Bolyai, 1802-1860, matemático húngaro.

4
Capítulo 1. O Método Axiomático

semirretas e semicírculos perpendiculares à reta que determina o semiplano, confira


Figura 1.3.
Riemann8 , descobriu uma nova geometria partindo de um postulado que nega a
existência de retas paralelas.
Postulado de Riemann - Duas retas nunca são paralelas.

Figura 1.4: Geometria Esférica.

Um modelo para esta geometria é dado pela esfera S 2 , em que as retas são os cír-
culos máximos, ou seja, as interseções de S 2 com os planos π contendo o centro de
S 2 , confira Figura 1.4.
Com esses postulados temos três tipos de geometrias. Em cada uma dessas
geometrias é claro que precisamos de muitos outros postulados.
Hilbert9 , em 1899, no seu célebre trabalho “Fundamentos da Geometria”, apre-
senta a ideia de que apenas um nome - axiomas - deve ser usado com relação às
proposições fundamentais, e que certos termos básicos como ponto e reta são dei-
xados completamente indefinidos.
Embora esse trabalho de Hilbert seja reconhecido por muitos como sendo o
primeiro a tratar de método axiomático em sua forma moderna, devemos reconhe-
cer que ideias análogas também apareceram em trabalhos de outros estudiosos da
época.
Em 1882 apareceu a primeira edição do livro de Pasch10 “Vorlesungen über
Neuere Geometrie.” Pasch baseou seu tratamento da geometria em um pequeno
número de “conceitos nucleares” e “proposições nucleares” que são introduzidas
respectivamente sem definição e sem demonstrações, mas que ele acredita ter uma
base comum de aceitação pela nossa experiência. Depois que o sistema básico de
8
Georg Friedrich Bernhard Riemann, 1826-1866, matemático alemão.
9
David Hilbert, 1862-1943, matemático alemão.
10
Moritz Pasch, 1843-1930, matemático alemão.

5
1.2. Modelos Axiomáticos

proposições (axiomas) é introduzido, a dedução lógica das outras proposições do


sistema são obtidas de forma rigorosa. Suas ideias foram descritas por ele mesmo
como segue:
“Na realidade, se a geometria deve ser dedutiva, a dedução deve ser indepen-
dente do significado dos conceitos geométricos, da mesma forma que deve ser in-
dependente de diagramas; somente as relações especificadas nas proposições e de-
finições (teoremas) empregadas podem ser usadas. Durante a demonstração é útil
e correto, mas de modo algum necessário, pensar no significado dos termos; aliás,
se for necessário proceder desse modo a ineficiência da prova está clara. Se, en-
tretanto, um teorema é rigorosamente derivado de um conjunto de proposições (os
axiomas), a demonstração tem um valor que transcende o objetivo inicial. Pois se
substituirmos os termos geométricos nos axiomas por outros termos certos, propo-
sições verdadeiras serão obtidas, então fazendo substituições análogas nos teoremas
obteremos um novo teorema sem termos que repetir a demonstração.”

1.2 Modelos Axiomáticos


Nesta seção apresentaremos alguns modelos axiomáticos que serão necessários
para o desenvolvimento deste texto.
O modelo axiomático organiza as teorias de um modo sistemático a partir de
proposições primitivas e definições, procedendo ao desenvolvimento por via dedu-
tiva.
Um sistema de axiomas é uma coleção formada pelos termos indefinidos, rela-
ções indefinidas, axiomas e “teoremas.”
Intuitivamente, um sistema de axiomas é construído como segue: primeiro esco-
lhemos os conceitos básicos e procuramos explicar sua natureza da melhor maneira
possível, em seguida escrevemos os axiomas para os conceitos. Formalmente, um
sistema de axiomas é um par Σ = (P, R), em que P é um conjunto e R é um con-
junto de partes de P . Em particular, se P é um conjuno finito, diremos que Σ é
modelo finito.
Agora, apresentaremos um sistema “parcial” de axiomas como uma amostra do
modelo axiomático.

Exemplo 1.5 O sistema de axiomas E = (P, R), em que P é um conjunto de pontos


e R é um conjunto de retas, da Geometria Plana (Euclides).

6
Capítulo 1. O Método Axiomático

Termos indefinidos: Ponto e Reta.

E1 - Toda reta é uma coleção de pontos.

E2 - Existem pelo menos dois pontos.

E3 - Se P e Q são pontos distintos, então existe uma e somente uma reta


contendo P e Q.

E4 - Se r é uma reta, então existe um ponto fora de r.

E5 - Se r é uma reta e P um ponto fora de r, então existe uma e somente uma


reta s contendo P e paralela à reta r.

Observação 1.6 Seja E o sistema de axiomas da Geometria Plana ( Euclides)

1. Ponto e reta em E desempenham o mesmo papel que as variáveis em equações


algébricas, por exemplo,

(x + y)2 = x2 + xy + yx + y 2 ,

com x e y representando qualquer objeto (número, matriz, etc.) de um certo


conjunto especificado.

2. Note que o axioma E1 em E estabelece uma relação entre os termos indefini-


dos ponto e reta.

3. O fato de que E não é um sistema de axiomas adequado para a geometria


Euclides pode ser mostrado como segue: desde que ponto e reta são deixados
indefinidos, temos a liberdade de atribuir vários significados para eles, desde
que eles satisfaçam as restrições impostas pelos axiomas.

4. Seja C uma cidade com duas bibliotecas distintas, C = {b1 , b2 }, em que os


termos indefinidos são: “livro = ponto” e “biblioteca = reta.” Note que o
axioma E3 não é satisfeito, pois se P e Q são livros de bibliotecas distintas,
então não existe uma biblioteca contendo P e Q. Não obstante, os outros o
são. Portanto, o par (P, C) não é um modelo para E.

7
1.2. Modelos Axiomáticos

5. Seja Z uma comunidade formada de quatro pessoas Z = {a, b, c, d} e seis


clubes C = {ab, ac, ad, bc, bd, cd}, em que os termos indefinidos são: “pessoa
= ponto” e “clube = reta.” Então todos os axiomas são satisfeitos. Portanto,
o par (P, C) é um modelo finito para E.

6. Sejam T = {1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9} um conjunto qualquer de pontos e as retas

S = {123, 456, 789, 147, 258, 369, 159, 267, 348, 357, 249, 168}.

Então todos os axiomas são satisfeitos. Portanto, o par (T, S) é um modelo


finito para E. É pertinente notar que se identificarmos T com uma matriz
3 × 3, então as retas são: as linhas, as colunas e as diagonais dadas, de modo
análogo à Regra de Sarrus11 .

Teorema 1.7 Todo ponto pertence a pelo menos duas retas distintas.
Prova. Seja P um ponto qualquer. Pelo axioma E2 existe um ponto Q distinto de
P . Pelo axioma E3 existe uma e somente uma reta r contendo P e Q. Além disso,
pelo axioma E4 existe um ponto R fora de r. Novamente, pelo axioma E3 existe
uma reta s contendo P e R. Finalmente, pelo axioma E1 temos que r = s, com
r ∩ s = {P }.

Figura 1.5: Esboço da prova do Teorema 1.7.

Corolário 1.8 Toda reta contém pelo menos um ponto.


Prova. Primeiro note que pelo axioma E2 existe um ponto P e pelo Teorema 1.7
existem duas retas distintas r e s contendo P . Suponhamos, por absurdo, que exista
uma reta t sem pontos. Então, por definição, r e s são paralelas à reta t. Como P
está fora de t temos, pelo axioma E5 que existe uma e somente uma reta u contendo
P e paralela à reta t, o que contradiz o fato de r e s serem paralelas à reta t.
11
Pierre Frédéric Sarrus, 1798-1842, matemático francês.

8
Capítulo 1. O Método Axiomático

Teorema 1.9 Toda reta contém pelo menos dois pontos.


Prova. Seja r uma reta qualquer. Então, pelo Corolário 1.8, r contém um ponto P
e pelo Teorema 1.7, existe uma reta s distinta de r contendo P . Logo, pelo axioma
E1 , existe um ponto Q tal que

(Q ∈ r e Q ∈
/ s) ou (Q ∈
/ r e Q ∈ s).

Se Q ∈ r, então o Teorema está provado. Se Q ∈ s, então, pelo axioma E4 existe


um ponto R fora de s. Assim, temos duas possibilidades: se R ∈ r, então o Teorema
está provado. Se R ∈ / r ∪ s, então pelo axioma E5 existe uma e somente uma reta t
contendo R e paralela à reta s.
Afirmação. r ∩ t = ∅.
De fato, se r ∩ t = ∅, então a reta t é paralela à reta r. Logo, r e s são retas contendo
P e paralelas à reta t, o que contradiz o axioma E5 . Seja X ∈ r ∩ t. Então X = P ,
pois P ∈/ t. Portanto, r contém pelo menos dois pontos P e X.

Figura 1.6: Esboço da prova do Teorema 1.9.

Corolário 1.10 Toda reta fica completamente determinada por quaisquer dois de
seus pontos que sejam distintos.
Prova. Seja r uma reta qualquer. Então, pelo Teorema 1.9, a reta r contém dois
pontos distintos P e Q. Portanto, pelo axioma E3 , a reta r é completamente deter-
minada pelos pontos P e Q.

Teorema 1.11 Existem pelo menos quatro pontos distintos.


Prova. Pelo axioma E2 existem pelo menos dois pontos distintos P e Q. Pelo
axioma E3 existe uma única reta r contendo P e Q. Além disso, pelo axioma E4
existe um ponto R fora de r e, pelo axioma E5 , existe uma única reta s contendo R
e paralela à reta r. Finalmente, pelo Teorema 1.9, s contém um ponto S distinto de
R. Portanto, existem pelo menos quatro pontos P , Q, R e S.

9
1.2. Modelos Axiomáticos

Figura 1.7: Esboço da prova do Teorema 1.11.

Teorema 1.12 Existem pelo menos seis retas distintas.


Prova. Pela prova do Teorema 1.11, existe uma reta r contendo P e Q; uma reta s
paralela à reta r contendo pontos distintos R e S. Logo, pelo axioma E3 existem
retas u, v contendo Q e S, P e R, respectivamente. Note que Q ∈ / v, pois se Q ∈ v,
então v = r e R ∈ r, o que é impossível. De modo inteiramente análogo, prova-se
que S ∈/ v e P, R ∈ / u. Novamente, pelo axioma E3 existem retas t e x contendo P
e S; Q e R, respectivamente. Observe que Q ∈ / teS ∈/ x. Portanto, r, s, t, u, v e x
são retas distintas.

Figura 1.8: Esboço da prova do Teorema 1.12.

Note, nas provas dos resultados acima, que as Figuras nos ajudam a memorizar
os vários símbolos
(r, s, P, Q, . . .)
bem como, seus significados de maneira mais fácil. Não obstante, nenhum sig-
nificado especial foi dado aos termos “ponto” e “reta”, e, consequentemente, são
válidas se substituirmos pessoas por pontos e duas pessoas por reta. Além disso, é
claro que não provamos acima todos os teoremas possíveis.

10
Capítulo 1. O Método Axiomático

É muito importante, de um ponto de vista teórico e didático, avaliarmos a relação


entre o número de pontos e o de retas. Se n é o número de pontos e k é o número
de retas, então  
n n(n − 1)
k≤ = .
2 2
Por outro lado, existe uma reta contendo n − 1 pontos e um ponto fora dela, ou seja,
os n − 1 pontos produz apenas uma reta ao invés de
 
n−1 (n − 1)(n − 2)
= .
2 2

Assim,    
n n−1
− + 1 = n ≤ k.
2 2
Portanto,
n(n − 1)
n≤k≤ .
2
Finalizaremos esta seção apresentado mais um exemplo de um sistema de axio-
mas para definirmos um “corpo.”

Exemplo 1.13 O sistema de axiomas F = (K, +, ·) formado por um conjunto não


vazio K de objetos ou elementos.

Termos indefinidos: Um conjunto K e duas operações binárias sobre K.

O conjunto K é munido com duas operações binárias:

+ : K × K −→ K · : K × K −→ K
e
(a, b) −→ a + b (a, b) −→ a · b

chamadas adição e multiplicação, as quais satisfazem os seguintes axiomas:

F1 - Sejam a, b, c, d ∈ K. Se (a, b) = (c, d), então a + b = c + d, isto é, a


operação + está bem definida.

F2 - a + (b + c) = (a + b) + c, para todos a, b, c ∈ K.

F3 - Existe um 0 ∈ K tal que a + 0 = 0 + a = a, para todo a ∈ K.

F4 - Para cada a ∈ K, existe um −a ∈ K tal que a + (−a) = (−a) + a = 0.

11
1.2. Modelos Axiomáticos

F5 - a + b = b + a, para todos a, b ∈ K.

F6 - Sejam a, b, c, d ∈ K. Se (a, b) = (c, d), então a · b = c · d, isto é, a


operação · está bem definida

F7 - a · (b · c) = (a · b) · c, para todos a, b, c ∈ K.

F8 - Existe um 1 ∈ K tal que a · 1 = 1 · a = a, para todo a ∈ K.

F9 - K possui pelo menos dois elementos. Neste caso, o elemento 0 é diferente


do elemento 1.

F10 - Para cada a ∈ K ∗ = K − {0}, existe um a−1 ∈ K tal que a · a−1 =


a−1 · a = 1.

F11 - a · b = b · a, para todos a, b ∈ K.

F12 - A operação binária + é distributiva sobre a operação binária ·, isto é,

a · (b + c) = a · c + a · b e (a + b) · c = a · c + b · c, ∀ a, b, c ∈ K.

Teorema 1.14 Sejam K um corpo e a, b, x ∈ K.

1. Se a + x = a, então x = 0.

2. Se b = 0 e b · x = b, então x = 1.

3. Se a + b = 0, então b = −a.

4. A equação a + x = b possui uma única solução x = (−a) + b.

5. Se b = 0, então a equação b · x = a possui uma única solução x = b−1 · a.

6. x · 0 = 0 · x = 0.

7. −x = (−1)x.

8. −(a + b) = (−a) + (−b).

9. −(−x) = x.

10. (−1) · (−1) = 1.

12
Capítulo 1. O Método Axiomático

11. Não existe y ∈ K tal que 0 · y = 1.

Prova. Vamos provar apenas os itens (1), (6), (8) e (11): (1) Usando sucessiva-
mente, os axiomas F3 , F4 e F2 , obtemos

x = 0 + x = [(−a) + a] + x = (−a) + (a + x) hipótese


= (−a) + a = 0.

(6) Pelo axioma F3 , 1 = 1 + 0. Logo, pelo axioma F6 , x · 1 = x · (1 + 0). Assim,


pelos axiomas F8 e F12 , x = x + x · 0. Portanto, pelo item (1), x · 0 = 0.
(8) Pelo item (7), −(a + b) = (−1)(a + b). Pelo axioma F12 ,

(−1)(a + b) = (−1)a + (−1)b.

Novamente, pelo item (7),

(−1)a + (−1)b = (−a) + (−b).

Portanto, −(a + b) = (−a) + (−b).


(11) Pelo item (6), 0 · x = 0, para todo x ∈ K. Suponhamos, por absurdo, que
exista y ∈ K tal que 0 · y = 1. Então 0 = 0 · y = 1, o que contradiz o axioma F9 .

Exercícios
1. O sistema de axiomas V = (V, +, ·) formado por um conjunto não vazio V
de “vetores” (espaço vetorial).

Termos indefinidos: Dois conjuntos V e K, uma operação binária e uma


multiplicação por escalar sobre V .
O conjunto V é munido com duas operações:

+ : V × V −→ V · : K × V −→ V
e
(u, v) −→ u + v (a, u) −→ a · u

chamadas adição e multiplicação por escalar, as quais satisfazem os


seguintes axiomas:

13
1.2. Modelos Axiomáticos

V1 - Sejam u, v, w, t ∈ V . Se (u, v) = (w, t), então u + v = w + t, isto


é, a operação + está bem definida.
V2 - u + (v + w) = (u + v) + w, para todos u, v, w ∈ V .
V3 - Existe um 0 ∈ V tal que u + 0 = 0 + u = u, para todo u ∈ V .
V4 - Para cada u ∈ V , existe um −u ∈ V tal que

u + (−u) = (−u) + u = 0.

V5 - u + v = v + u, para todos u, v ∈ V .
V6 - Sejam a, b ∈ K e u, v ∈ V , em que K é um corpo. Se (a, u) =
(b, v), então a · u = b · v, isto é, a operação · está bem definida.
V7 - a(b · u) = (ab) · u, para todo u ∈ V e a, b ∈ K .
V8 - (a + b) · u = a · u + b · u, para todo u ∈ V e a, b ∈ K.
V9 - a · (u + v) = a · u + a · v, para todos u, v ∈ V e a ∈ K.
V10 - 1 · u = u, para todo u ∈ V e 1 o elemento identidade de K.

(a) Mostre que o vetor 0 é único em V .


(b) Mostre que o vetor −u é único em V .
(c) Mostre que existe um único x ∈ V tal que u + x = v, para todos
u, v ∈ V .
(d) Mostre que se u + u = u, então u = 0.
(e) Mostre que a · 0 = 0, para todo 0 ∈ V e a ∈ K.
(f) Mostre que 0 · u = 0, para todo u ∈ V e 0 ∈ K.
(g) Mostre que se a · u = 0, então a = 0 ou u = 0, onde u ∈ V e a ∈ K.
(h) Mostre que −u = (−1)u, para todo u ∈ V .
(i) Mostre que (−a) · u = a · (−u) = −(a · u), para todo u ∈ V e a ∈ K.

2. Mostre que o conjunto dos números complexos

C = {a + bi : a, b ∈ R e i2 = −1}

satisfaz o sistema de axiomas V com as operações usuais, onde K = R.

14
Capítulo 1. O Método Axiomático

3. O sistema de axiomas G = (G, ·) formado por um conjunto não vazio G de


objetos (grupo).

Termos indefinidos: Um conjunto G e uma operação binária sobre G.


O conjunto G é munido com uma operação binária:

· : G × G −→ G
(a, b) −→ a · b

chamada produto, a qual satisfaz os seguintes axiomas:


G1 - Sejam a, b, c, d ∈ G. Se (a, b) = (c, d), então a · b = c · d, isto é, a
operação · está bem definida.
G2 - a · (b · c) = (a · b) · c, para todos a, b, c ∈ G.
G3 - Existe um e ∈ G tal que a · e = e · a = a, para todo a ∈ G.
G4 - Para cada a ∈ G, existe um a−1 ∈ G tal que a · a−1 = a−1 · a = e.

(a) Mostre que o elemento e é único em G.


(b) Mostre que o elemento a−1 é único em G.
(c) Mostre que para quaisquer a, b ∈ G, as equações a · x = b e y · a = b
possuem soluções únicas x, y ∈ G.
(d) Mostre que as funções Lc : G −→ G e Rc : G −→ G definidas como
Lc (x) = c · x e Rc (x) = x · c, respectivamente, são bijetoras, para todo
c ∈ G fixado.

4. Seja M2 (R) o conjunto das matrizes 2 × 2 com entradas em R. Mostre que o


conjunto das matrizes invertíveis

GL2 (R) = {A ∈ M2 (R) : det(A) = 0}

satisfaz o sistema de axiomas G, com a operação usual de multiplicação de


matrizes.

1.3 Caracterização de um Sistema de Axiomas


Quando os termos indefinidos, as relações indefinidas e os axiomas forem se-
lecionados, como poderemos garantir que o sistema de axiomas obtido é adequado

15
1.3. Caracterização de um Sistema de Axiomas

aos propósitos para que foi estabelecido? Se, por exemplo, ele foi estabelecido para
servir de base para os fundamentos da Geometria Plana, então desejaríamos saber
de alguma maneira se de fato os axiomas estabelecidos são suficientes. Outra ques-
tão que poderíamos abordar, é sobre a “independência” dos axiomas; algum dos
axiomas pode ser provado a partir dos outros, e caso isto ocorra, não deveríamos
enunciá-lo como um teorema para ser depois demonstrado?
A experiência tem mostrado, entretanto, que uma questão mais fundamental
é a seguinte: o sistema implica teoremas contraditórios? Se isto ocorre, então é
claro que alguma coisa está errada, e teremos então que eliminar este defeito antes
de abordarmos qualquer outro aspecto. Consideraremos portanto esta questão em
primeiro lugar.
Seja Σ um sistema de axiomas. Diremos que Σ é consistente se ele não implicar
teoremas contraditórios. Caso contrário, diremos que Σ é inconsistente.

Observação 1.15 Como cada axioma é implicado pelo sistema de axiomas temos,
em particular, que um sistema de axiomas consistentes não pode ter axiomas con-
traditórios.

Exemplo 1.16 Se acrescentarmos o axioma, E6 - “Existe no máximo três pontos”,


ao sistema de axiomas E da Observação 1.6, então E é inconsistente, pois, contradiz
o Teorema 1.11, “Existem pelo menos quatro pontos.”
Seja Σ um sistema de axiomas. Uma interpretação de Σ é uma atribuição de
significados aos termos indefinidos do sistema, de modo que os axiomas se tor-
nem simultaneamente proposições verdadeiras para todos os valores variáveis (por
exemplo, pontos e retas no sistema E).

Exemplo 1.17 O conjunto Z (e/ou T ) de quatro pessoas é uma interpretação para


o sistema de axiomas E = (Z, C) da Observação 1.6.

Exemplo 1.18 O conjunto dos números reais R é uma interpretação para o sistema
de axiomas F = (K, +, ·) do Exemplo 1.13.
Seja Σ um sistema de axiomas. Um modelo para Σ é o resultado de uma in-
terpretação. Assim, o conjunto dos números reais R é um modelo do sistema de
axiomas F, e a coleção de quatro pessoas Z é também um modelo para o sistema
E. Em geral, quando fazemos uma interpretação I de um sistema de axiomas Σ, o
modelo resultante da interpretação será representado por M (I).

16
Capítulo 1. O Método Axiomático

Para alguns modelos de um sistema de axiomas Σ, alguns axiomas do sis-


tema podem ser verdadeiros por vacuidade, isto é, axiomas da forma “se . . . , então
. . . ” (p → q), que chamaremos de “axiomas condicionais”, podem ser verdadei-
ros quando interpretados simplesmente porque a parte condicional “se . . . ” não é
satisfeita pelo modelo.

Figura 1.9: Tabela de Verdade do Exemplo 1.19.

Exemplo 1.19 Sejam p a sentença “dois ângulos opostos pelo vértice” e q a sen-
tença “dois ângulos congruentes.” Então comprove intuitivamente a tabela da sen-
tença p → q sendo verdadeira se pudermos desenhar o diagrama dos ângulos, caso
contrário, falsa, confira Figura 1.9 e/ou Tabela de Verdade abaixo.

p q p→q (¬p) ∨ q
V V V V
V F F F
F V V V
F F V V

Seja Σ um sistema de axiomas. Diremos que Σ é satisfatório se ele admitir uma


interpretação.

Exemplo 1.20 Os sistemas de axiomas E e F da Observação 1.6 e do Exemplo


1.13, respectivamente, são satisfatórios.
Vamos determinar um método de verificarmos a consistência de um sistema de
axiomas Σ. Para isso, vamos relembrar dois princípios da lógica clássica (Aristote-
liana). Seja p uma sentença (ou proposição). Então:

1. Princípio da contradição. Se p é verdadeira, então ¬p é falsa, isto é, dadas


duas proposições contraditórias uma delas é falsa. Em símbolos,

¬[p ∧ (¬p)].

17
1.3. Caracterização de um Sistema de Axiomas

2. Princípio do terceiro excluído. p ou ¬p é sempre verdadeira, isto é, dadas


duas proposições contraditórias pelo menos uma delas é sempre verdadeira.
Em símbolos,
p ∨ (¬p).

Exemplo 1.21 Seja p a proposição “ hoje é quarta-feira.” O princípio da contra-


dição vale, pois hoje não pode ser ambos quarta-feira e quinta-feira. O princípio
do terceiro excluído afirma p ou ¬p é sempre verdadeira.

Exemplo 1.22 Seja A um conjunto e P (x) uma propriedade “a qual é significativa


para cada elemento x em A.” O princípio do terceiro excluído afirma ou existe um
x ∈ A tal que P (x) é verdadeira ou ao contrário, P (x) é falsa, para todo x ∈ A.
Seja Σ um sistema de axiomas. Uma Σ-proposição é uma proposição que pode
ser expressa com base nos termos indefinidos, relações indefinidas e universais de
Σ.

Exemplo 1.23 Os axiomas e teoremas de Σ são Σ-proposições.


Vamos enunciar mais dois princípios da lógica aplicados ao nosso sistema de
axiomas Σ.

L1 Todas as proposições implicadas pelos axiomas de Σ, são verdadeiras para


todos os modelos de Σ.

L2 O princípio da contradição se aplica a todas as proposições sobre um modelo


de Σ, desde que elas sejam Σ-proposições cujos termos técnicos tenham os
significados dados na interpretação.

Sejam Σ um sistema de axiomas e I uma interpretação de Σ. Uma (Σ, I)-


proposicão é o resultado de atribuirmos aos termos técnicos de uma Σ-proposição
seus significados em I. Assim, os princípios (L1 ) e (L2 ) podem ser enunciados
como seguem:

L1 Toda (Σ, I)-proposição, tal que a correspondente Σ-proposição é implicada
por Σ, é verdadeira para M (I).

L2 (Σ, I)-proposições contraditórias não podem ser ambas verdadeiras para
M (I).

18
Capítulo 1. O Método Axiomático

Teorema 1.24 Seja Σ um sistema de axiomas. Se Σ é satisfatório, então ele é


consistente.
Prova. Suponhamos, por absurdo, que Σ seja inconsistente. Então existem duas
Σ-proposições contraditórias em Σ. Como Σ é satisfatório temos que existe uma

interpretação I para Σ. Logo, pelo princípio (L1 ), essas proposições podem ser
vistas como (Σ, I)-proposições e são ambas verdadeiras para M (I), o que contradiz

o princípio (L2 ). Portanto, Σ é um sistema consistente.

Observação 1.25 Seja Σ um sistema de axiomas. A existência de uma interpretaç


ão em Σ garante a sua consistência.

Exemplo 1.26 A interpretação I = R garante a consistência do sistema de axio-


mas F = (K, +, ·) do Exemplo 1.13.
Sejam Σ um sistema de axiomas satisfatório e A1 , . . . , An os axiomas de Σ.
Diremos que um axioma Aj é independente em Σ se o sistema de axiomas

(Σ − Aj ) + (¬Aj )

for satisfatório, ou seja, o sistema de axiomas Σ excluindo o axioma Aj mais a


negação do axioma Aj é satisfatório, ou ainda, existe um modelo que satisfaz os
axiomas A1 , . . . , Aj−1 , ¬Aj , Aj+1 , . . . , An , mas Aj não é satisfeito.

Observação 1.27 Sejam Σ um sistema de axiomas e A1 , . . . , An os axiomas de Σ.


Se Aj for provado pelo sistema de axiomas Σ − Aj , então Aj não é independente.
Neste caso, todo modelo que satisfaça Σ − Aj satisfaz necessariamente Aj (prove
isso!) e, portanto, não podemos achar uma interpretação para Σ−Aj , que não seja
interpretação de Aj .

Exemplo 1.28 O axioma E5 do sistema de axiomas E = (P, R) do Exemplo 1.5 é


independente.
Solução. Seja E6 o seguinte axioma: “existe uma reta r e um ponto P fora de r tal
que não existe nenhuma reta s contendo P e paralela à reta r.”
Afirmação. E6 = ¬E5 e (E − E5 ) + E6 é um sistema de axiomas satisfatório.
De fato, sejam P = {A, B, C} um conjunto qualquer e R = {AB, AC, BC} um
conjunto de retas. Então é fácil verificar que os axiomas E1 , E2 , E3 e E4 de E são
satisfeitos, mas o axioma E5 não é satisfeito, pois C ∈
/ AB, mas não existe uma reta

19
1.3. Caracterização de um Sistema de Axiomas

contendo C e paralela à reta AB. Assim, P é uma interpretação para (E − E5 )+E6 .


Portanto, (E − E5 ) + E6 é satisfatório e E5 é independente em E.

Exemplo 1.29 O axioma F10 do sistema de axiomas F = (K, +, ·) do Exemplo


1.13 é independente.

Solução. Seja F13 o axioma: “para algum a ∈ K ∗ , não existe a−1 ∈ K tal que
a · a−1 = a−1 · a = 1.”
Afirmação. F13 = ¬F10 e (F −F10 )+F13 é um sistema de axiomas satisfatório.
De fato, o conjunto dos números inteiros (Z, +, ·) é uma interpretação para (F −
F10 ) + F13 . Portanto, (F − F10 ) + F13 é satisfatório e F10 é independente em F.
Uma outra interpretação para (F − F10 ) + F13 é (R2 , +, ·), onde

(a, b) · (c, d) = (ac, bd),

pois existe um A = (1, 0) ∈ R2 sem elemento inverso. Com efeito, se existisse


A−1 = (a, b) ∈ R2 tal que A · A−1 = A−1 · A = (1, 1), então 0 = 1, o que é
impossível.

Exemplo 1.30 O axioma F5 do sistema de axiomas F = (K, +, ·) do Exemplo 1.13


não é independente, ou seja, F − F5 implica F5 .

Solução. Devemos provar que F5 é uma consequência do sistema de axiomas F −


F5 . Primeiro vamos desenvolver (a + b)(1 + 1) de duas maneiras: Pelos axiomas
F12 , F8 e F2 , obtemos

(a + b)(1 + 1) = (a + b) · 1 + (a + b) · 1 = (a + b) + (a + b)
= a + (b + a) + b.

Por outro lado, pelos axiomas F12 , F8 e F2 , obtemos

(a + b)(1 + 1) = a(1 + 1) + b(1 + 1) = (a + a) + (b + b)


= a + (a + b) + b.

Logo, a + (b + a) + b = a + (a + b) + b. Portanto, pelos axiomas F3 , F4 e F2 ,


obtemos

20
Capítulo 1. O Método Axiomático

a + b = [0 + (a + b)] + 0 = (−a) + [a + (a + b) + b] + (−b)


= (−a) + [a + (b + a) + b] + (−b) = [0 + (b + a)] + 0
= b + a.

Faça outra prova desenvolvendo (1 + a)(1 + b) de duas maneiras.

Sabemos que com o sistema de axiomas E não podemos provar todos os teore-
mas da Geometria Plana. Na realidade vimos uma interpretação para o sistema E
com apenas um número finito de pontos. É claro que isto não deveria ocorrer se
fosse um sistema adequado para o estudo da Geometria Plana.
Agora, vamos iniciar a noção de completividade de um sistema de axiomas,
com a ideia de serem os axiomas desses sistemas suficientes para provarmos todos
os teoremas, podemos afirmar que se encontrarmos um teorema tal que, tanto ele
como sua negação não podem ser provados no sistema, então esse “teorema” é um
candidato a um novo axioma do sistema.
Seja Σ um sistema de axiomas. Diremos que Σ é independente se todos os
axiomas de Σ o são.

Exemplo 1.31 O sistema de axiomas F = (K, +, ·) do Exemplo 1.13 não é inde-


pendente.
Seja Σ um sistema de axiomas. Diremos que Σ é completo se não existir uma
Σ-proposição p tal que p seja um axioma independente em Σ + p, isto é, os sistemas
de axiomas Σ + p e Σ + (¬p) sejam satisfatórios.

Observação 1.32 Seja Σ um sistema de axiomas. Vimos que Σ é completo se for


impossível adicioná-lo um novo axioma independente. Neste caso, os termos inde-
finidos devem permanecer os mesmos.

Exemplo 1.33 O sistema de axiomas E = (P, R) do Exemplo 1.5 não é completo.


Pois se E6 é o axioma: “existe no máximo quatro pontos”, então E +E6 e E +(¬E6 )
são satisfatórios, um vez que, o primeiro admite a interpretação das quatro pessoas
e o segundo admite a interpretação da Geometria Plana.
Sejam Σ um sistema de axiomas e M1 , M2 dois modelos para Σ. Diremos que
M1 é isomorfo a M2 se existir uma função bijetora de M1 sobre M2 que preserva as
Σ-proposições.

21
1.3. Caracterização de um Sistema de Axiomas

Exemplo 1.34 Sejam E6 o axioma: “existe no máximo quatro pontos” e E  = E +


E6 um sistema de axiomas. Então os modelos M1 = M (I1 ) e M2 = M (I2 ) para
E  são isomorfos, onde I1 = conjunto de quatro pessoas e I2 = conjunto de quatro
moedas.
Com a definição de isomorfismo à nossa disposição, podemos determinar um
método que nos permita verificar a completividade de um sistema de axiomas. Este
método baseia-se no seguinte conceito:
Seja Σ um sistema de axiomas. Diremos que Σ é categórico se quaisquer dois
modelos para Σ são isomorfos com relação a Σ.

Teorema 1.35 Seja Σ um sistema de axiomas. Se Σ é categórico, então ele é com-


pleto.
Prova. Suponhamos, por absurdo, que Σ não seja completo. Então existe uma
Σ-proposição p tal que Σ + p e Σ + (¬p) sejam satisfatórios. Logo, existe uma
interpretação I1 para Σ + p e uma interpretação I2 para Σ + (¬p). Como Σ é
categórico temos que existe uma função bijetora

ϕ : M (I1 ) → M (I2 )

que preserva Σ-proposições, o que é uma contradição, pois p é verdadeira em M (I1 )


e falsa em M (I2 ). .

Para finalizarmos esta seção vamos fazer alguns comentários sobre as vantagens
do método axiomático: o primeiro é a “economia” que obtemos quando um sistema
de axiomas Σ possui muitos modelos em diferentes ramos da matemática; pois um
único teorema em Σ fornece um teorema em cada intepretação; sem que seja neces-
sário uma prova especial uma vez que o teorema foi provado no sistema Σ. Outra
grande vantagem do método axiomático que merece especial atenção é o caráter de
definição implícita. Embora a origem e o desenvolvimento matemático pode ocorrer
por linhas inteiramente diversas, uma vez o conceito estabelecido, a sua caracteri-
zação axiomática é extremamente vantajosa. Por exemplo, o desenvolvimento do
sistema de todos os números reais, que forma os fundamentos da moderna Análise,
e evoluiu vagarosamente durante muitos séculos.
Atualmente, como veremos neste texto, podemos dar uma definição axiomática
precisa e estudarmos suas propriedades através de teoremas baseados nos axiomas.
Muitos outros conceitos matemáticos se desenvolveram de modo análogo.

22
Capítulo 1. O Método Axiomático

Exercícios
1. Mostre que o axioma F9 do sistema de axiomas F = (K, +, ·) do Exemplo
1.13 é independente.

2. Seja V = (V, +, ·) o sistema de axiomas do Exercício 1 da Seção 1.2.

(a) Mostre que V não é independente.


(b) Mostre que o axioma V10 de V é independente.

3. Seja G = (G, ·) o sistema de axiomas do Exercício 3 da Seção 1.2.

(a) Mostre que o conjunto dos números reais não nulos R∗ com a multipli-
cação usual é um modelo para G.
(b) Mostre que o conjunto dos números racionais Q com a soma usual é um
modelo para G.
(c) O sistema de axiomas G é consistente?
(d) O sistema de axiomas G é categórico?
(e) Mostre que cada axioma de G é independente.

4. O sistema de axiomas A = (A, +, ·) formado por um conjunto não vazio A


de objetos (anel).

Termos indefinidos: Um conjunto A e duas operações binárias sobre A.


O conjunto A é munido com duas operações binárias:

+ : A × A −→ A · : A × A −→ A
e
(a, b) −→ a + b (a, b) −→ a · b

chamadas adição e multipicação tais que os seguintes axiomas são sa-


tisfeitos:
A1 - Sejam a, b, c, d ∈ A. Se a = c e b = d, então a + b = c + d, isto é,
a operação + está bem definida.
A2 - a + (b + c) = (a + b) + c, para todos a, b, c ∈ A.
A3 - Existe 0 ∈ A tal que a + 0 = 0 + a = a, para todo a ∈ A.

23
1.3. Caracterização de um Sistema de Axiomas

A4 - Para cada a ∈ A, existe −a ∈ A tal que a + (−a) = (−a) + a = 0.


A5 - a + b = b + a, para todos a, b ∈ A.
A6 - Sejam a, b, c, d ∈ A. Se a = c e b = d, então a · b = c · d, isto é, a
operação · está bem definida
A7 - a · (b · c) = (a · b) · c, para todos a, b, c ∈ A.
A8 - As operações binárias + e · são distributivas, isto é, para todos
a, b, c ∈ A,

a · (b + c) = a · c + a · b e (a + b) · c = a · c + b · c.

(a) Mostre que o conjunto dos números inteiros Z com a soma e a multipli-
cação usual é um modelo para A.
(b) Mostre que o conjunto das matrizes M2 (R) com a soma e a multiplica-
ção usual é um modelo para A.
(c) Mostre que cada axioma de A é independente.
(d) O sistema de axiomas A é consistente?
(e) O sistema de axiomas A é categórico?
(f) O sistema de axiomas A é completo?

5. Seja X um conjunto não vazio qualquer. Uma relação binária sobre X é uma
função R : X × X −→ {0, 1} definida como

1, se x está relacionado com y
R(x, y) = rxy =
0, se x não está relacionado com y.

Quando R(x, y) = 1 é conveniente escrever xRy. Uma relação de equiva-


lência sobre X é uma par R = (X, R), em que R é uma relação binária sobre
X (Termos indefinidos: Um conjunto X e uma relação binária sobre X), tal
que os seguintes axiomas são satisfeitos:

R1 - xRx, para todo x ∈ X.


R2 - Se xRy, então yRx, para todos x, y ∈ X.
R3 - Se xRy e yRz, então xRz, para todos x, y, z ∈ X.

24
Capítulo 1. O Método Axiomático

(a) Seja X = Z × Z∗ . Para (a, b), (c, d) ∈ X, definimos a relação binária


(a, b)R(c, d) se, e somente, ad = bc. Mostre que X é um modelo para
R.
(b) Seja Y = {1, 2, 3}. Definimos a relação binária

R = {(1, 1), (2, 2), (3, 3), (1, 2), (2, 1), (1, 3), (3, 1), (2, 3), (3, 2)}.

Ou na forma matricial
⎛ ⎞ ⎛ ⎞
r11 r12 r13 1 1 1
R = (rij ) = ⎝ r21 r22 r23 ⎠ = ⎝ 1 1 1 ⎠ .
r31 r32 r33 1 1 1

Mostre que Y é um modelo para R.


(c) O sistema de axiomas R é consistente?
(d) O sistema de axiomas R é categórico?
(e) Mostre que cada axioma de R é independente.

6. Seja X um conjunto não vazio qualquer. Uma relação de ordem (parcial)


sobre X é uma par P = (X, P ) (Termos indefinidos: Um conjunto X e uma
relação de ordem sobre X), em que P é uma relação binária sobre X, tal que
os seguintes axiomas são satisfeitos:

P1 - xP x, para todo x ∈ X.
P2 - Se xP y e yP x, então x = y, para todos x, y ∈ X.
P3 - Se xP y e yP z, então xP z, para todos x, y, z ∈ X.

(a) Seja X = N. Para x, y ∈ X, definimos xP y se, e somente se, x divide


y. Mostre que X é um modelo para P.
(b) Sejam Y = {1, 2, 3} um conjunto e P(Y ) o conjunto das potências de
Y . Para A, B ∈ P(Y ), definimos AP B se, e somente se, A ⊆ B.
Mostre que P(Y ) é um modelo para P.
(c) O sistema de axiomas P é consistente?
(d) O sistema de axiomas P é categórico?

25
1.3. Caracterização de um Sistema de Axiomas

(e) Mostre que cada axioma de P é independente.

7. Seja X um conjunto não vazio qualquer. Uma ordem simples sobre X é uma
par S = (X, ≺), em que ≺ é uma relação binária sobre X, tal que os seguintes
axiomas são satisfeitos:

S1 - Se x, y ∈ X, com x = y, então x ≺ y ou y ≺ x.
S2 - Se x ≺ y, então x = y, para todos x, y ∈ X.
S3 - Se x ≺ y e y ≺ z, então x ≺ z, para todos x, y, z ∈ X.

(a) Mostre que se x, y ∈ X, então x ≺ y ou y ≺ x e não ambos


(b) Sejam X = R e x < y significa que “x está à esquerda de y.” Mostre
que X é um modelo para S.
(c) Sejam X = N e x < y significa que “x é menor do que y.” Mostre que
X é um modelo para S.
(d) O sistema S é consistente?
(e) O sistema de axiomas S é categórico?

8. Seja X um conjunto não vazio qualquer. Uma coleção T de subconjuntos de


X, chamados abertos de X, é uma topologia sobre X se os seguintes axiomas
são satisfeitas:

T1 - ∅, X ∈ T .
T2 - A união de um número qualquer de conjuntos de T pertence a T .
T3 - A interseção de dois conjuntos quaisquer de T pertence a T .

(a) Mostre que o conjunto dos intervalos abertos da reta real R é um modelo
para T .
(b) Sejam

X = {1, 2, 3, 4, 5} e B = {∅, {1}, {3, 4}, {1, 3, 4}, {2, 3, 4, 5}, X}.

Mostre que B é um modelo para T .


(c) O sistema T é consistente?
(d) O sistema de axiomas T é categórico?

26
CAPÍTULO 2

CONJUNTOS

A teoria avançada dos conjuntos foi desenvolvida por volta do ano 1872 por
Cantor1 , quando investigava o problema de unicidade da representação de funções
por séries trigonométricas. Foi aperfeiçoada no início do século XX por outros
matemáticos, entre eles, Zermelo2 , Skolem3 , Fraenkel4 , Gödel5 , von Neumann6 ,
entre outros. O que se estuda deste assunto no ensino fundamental, é tão somente
uma introdução elementar à teoria dos conjuntos, base para o desenvolvimento de
temas futuros, a exemplo de relações, funções, análise combinatória, probabilidades
etc.
Neste capítulo vamos nos dedicar ao estudo dos conjuntos via método axiomá-
tico. É comum na Teoria dos Conjuntos, se ouvirem frases como:
(...) um “conjunto” é qualquer coleção, dentro de um todo de objetos definidos
e distinguíveis, chamados de elementos ou membros, de nossa intuição ou pensa-
mento. G. Cantor (1895).
(...) por “conjunto” nada mais do que um objeto do qual se sabe não mais e
quer-se saber não mais do que aquilo que se segue dos postulados.
J. von Neumann (1928).
1
Georg Cantor, 1845-1918, matemático alemão.
2
Ernst Zermelo, 1871-1956, matemático alemão.
3
Thoralf Albert Skolem, 1887-1963, matemático norueguês.
4
Adolf Fraenkel, 1891-1965, matemático alemão.
5
Kurt Gödel, 1906-1978, matemático austríaco.
6
John von Neumann, 1903-1957, matemático húngaro.

27
2.1. Introdução Histórica

Estas e outras afirmações sobre definições de conjuntos vão ser contornadas via
método axiomático, em que “conjunto” é um termo indefinido.

2.1 Introdução Histórica


É importante observar que o matemático usa a palavra “definição” em um sen-
tido diferente daquele do dicionário, ou seja, quando um matemático dá uma defi-
nição, pretende-se que não será um mero sinônimo que o leitor possa saber o signi-
ficado, mas um critério para identificação; uma “caracterização” da coisa definida.
Um paradoxo ou antinomia é uma contradição entre duas proposições ou prin-
cípios. Tomando uma abordagem informal ou ingênua que qualquer coleção de
objetos é um conjunto, podem ocorrer os seguintes fatos:

- Se A é o conjunto de todos os animais, então A ∈


/ A “conjunto.”

- Se N é o conjunto de todos os “números naturais”, então N ∈


/ N “conjunto.”

- Se B é o conjunto de todas as coisas abstratas, então B ∈ B “classe. ”

- Se C é o conjunto de todos os conjuntos, então C ∈ C “classe.”

Pelos fatos acima vimos que um conjunto de objetos é bem definido, desde que seja
sempre possível determinar se ou não um elemento particular pertence ao conjunto.
Vamos apresentar os paradoxos de Russell7 .
Paradoxo Lógico (1902) - Sejam C um conjunto e

R = {A ∈ C : A ∈
/ A}.

Então:

1. R ∈ R.

2. R ∈
/ R.

Solução. Primeiro note que como A pode assumir qualquer objeto da teoria temos,
em particular, que ele pode assumir o “conjunto” R. (1) R ∈ R é impossível, pois
se R ∈ R, então, por definição, R ∈ / R, o que é uma contradição. (2) R ∈ / Ré
7
Bertrand Arthur William Russell, 1872-1970, matemático e filósofo inglês.

28
Capítulo 2. Conjuntos

impossível, pois se R ∈
/ R, então, por definição, R ∈ R, o que é uma contradição.
Portanto,
R∈R⇔R∈ / R,
o que contradiz o princípio do terceiro excluído.

O paradoxo Russell é equivalente a: em uma cidade tem um barbeiro que faz a


barba somente dos homens que não se barbeiam a si mesmo. Pergunta:
Quem faz a barba do barbeiro?

Paradoxo Semântico (1906, atribuído por Russell a G. G. Berry, um livreiro)


- Seja T = {x : x é um número inteiro positivo que pode ser descrito por uma
frase com menos de vinte palavras da língua portuguesa}. Então existe um inteiro
positivo x0 tal que

1. x0 ∈
/ T.

2. x0 ∈ T .

Solução. Suponhamos que as palavras da língua portuguesa estejam catalogadas


em um dicionário. Então T é finito, pois um dicionário contém apenas um número
finito de palavras e o número de frases envolvendo menos de vinte palavras é finito.
Assim, existem inteiros positivos (infinitos) que são maiores do que todos os outros
inteiros positivos de T . Portanto, existe um menor inteiro positivo x0 que é maior
do que todos os inteiros positivos de T . Então x0 ∈ / T . Por outro lado, como x0
é igual ao menor inteiro positivo que não pode ser descrito por uma frase com
menos de vinte palavras da língua portuguesa (19 palavras) temos que x0 ∈ T ,
o que contradiz o princípio do terceiro excluído.

Com o surgimento dos paradoxos houve muita controvérsia por parte dos mate-
máticos da época. Mas, com o trabalho de Dedekind8 em 1888 mostrando que os
nossos “números naturais” podem ser construídos por meio da teoria elementar dos
conjuntos:
0 = ∅, 1 = {∅}, 2 = {∅, {∅}} . . .
a teoria passou a ser aceita.
Enunciaram-se, em 1905, várias correntes para contornar os paradoxos, as quais
podemos classificar em três grupos: Axiomático, Logicista e Intuicionista.
8
Julius Wilhelm Richard Dedekind, 1831- 1916, matemático alemão.

29
2.2. Conjuntos

A primeira axiomatização da Teoria dos Conjuntos foi dada por Zermelo em


1908, com certas modificações em 1922 devidas a Skolem e Fraenkel. No sistema de
axiomas ZF os termos indefinidos e relações indefinidas são: conjunto, pertinência
e igualdade.

2.2 Conjuntos
Embora a ideia intuitiva de conjunto dada, no curso de Matemática Elementar,
seja suficiente para os nossos propósitos, uma exposição geral da Teoria dos Con-
juntos requer mais precisão, pois a não axiomatização da Teoria dos Conjuntos nos
leva a várias contradições. Sendo assim, nesta seção iniciaremos o estudo formal da
Teoria dos Conjuntos segundo Zermelo-Fraenkel. Neste contexto formal, o termo
indefinido classe é qualquer coleção de objetos (conjuntos) C tal que dado qualquer
objeto X é possível determinar se X ∈ C ou se X ∈ / C, ou seja,

C = {X : X é um conjunto com a propriedade P }.

Uma classe que não é um conjunto é chamada de classe própria. Por exemplo,

R = {A : A é um conjunto e A ∈
/ A}.

Portanto, uma classe A é um conjunto se existir uma classe C tal que A ∈ C. Salvo
menção explícita em contrário, os objetos considerados neste texto são conjuntos.
Antes de iniciarmos o estudo formal da Toeria de Conjuntos vamos rever os
sinais (relações indefinidas) em uma Teoria Matemática M:

Os sinais lógicos: ¬, ∼, ∨, ∧ . . .

As letras: a, b, c, d . . .; A, B, C, D . . .

Os sinais específicos: =, ∈, ⊆ . . .

O símbolo ∃! significa existe um(a) único(a).

O símbolo := significa por definição.

Uma sentença (ou uma fórmula) em M é uma sucessão de sinais de M do tipo

∀ x ∃ y ∀ z : p(x, y, z).

30
Capítulo 2. Conjuntos

Lê-se “para cada x existe um y tal que, para cada z, p(x, y, z) é verdadeira”, sua
negação é
∃ x ∀ y ∃ z : ¬p(x, y, z).
Lê-se “existe um x para cada y tal que, existe z, p(x, y, z) é falsa.” Note que na
negação mantivemos a ordem das variáveis. O principal objetivo de introdução de
símbolos, é facilitar a escrita e a leitura das definições e resultados em Matemática,
ou seja, são imprescindíveis para uma boa compreenção de M.
Finalmente, é pertinente lembrar que a construção de M (vista no Capítulo 1) é
do seguinte modo:

1. Definimos os axiomas explícitos (relações) em M;

2. Definimos uma ou mais regras (axiomas implícitos) sobre M, chamadas ope-


rações sobre M.

As letras a, b, c, d, . . . serão usadas, preferencialmente, para indicar elementos


e A, B, C, D, . . . elementos e/ou conjuntos. Assim, se x é um elemento e existe
um conjunto A tal que x ∈ A, diremos que x é um elemento de A. (um objeto que
não é uma coleção, por exemplo, um ponto sobre uma reta de Euclides)
Sejam A e B conjuntos. Diremos que A e B são iguais se, e somente se, eles
têm os mesmos elementos. Em símbolos,

∀ A ∀ B [A = B ⇔ ∀ x [x ∈ A ⇒ x ∈ B e x ∈ B ⇒ x ∈ A]]

ou, simplesmente,
A = B ⇔ ∀ x [x ∈ A ⇔ x ∈ B].
Esta definição implica a seguinte propriedade:

∀ A ∀ B [∀ x [x ∈ A e A = B] ⇒ x ∈ B.

Essa propriedade é nosso primeiro axioma.

ZF1 - Axioma da extensão. ∀ A ∀ x [[x ∈ A e x = y] ⇒ y ∈ A].

O axioma ZF1 é também conhecido como Axioma da individualidade e significa


que um conjunto é completamente determinado pelos seus elementos.

31
2.2. Conjuntos

É importante observar que o axioma ZF1 pode ser visto como uma lei que rela-
ciona o conceito indefinido de pertinência com o conceito indefinido de igualdade.
Além disso, ele garante a unicidade dos conjuntos.
Sejam A e B conjuntos. Diremos que A está contido em B ou A é um subcon-
junto de B ou que B é uma extensão de A se qualquer elemento de A é um elemento
de B, em símbolos,

∀ A ∀ B [A ⊆ B ⇔ ∀ x [x ∈ A ⇒ x ∈ B]]

ou, simplesmente,
A ⊆ B ⇔ ∀ x [x ∈ A ⇒ x ∈ B]
Neste caso, A = B significa que A ⊆ B e B ⊆ A.
Se A ⊆ B e A = B (¬[A = B]), diremos que A está contido propriamente em
B ou A é um subconjunto próprio de B e denotaremos por A ⊂ B.

Teorema 2.1 Sejam A, B e C conjuntos. Então:

1. A = A.

2. A = B ⇒ B = A.

3. A = B e B = C ⇒ A = C.

4. A ⊆ A.

5. A ⊆ B e B ⊆ A ⇒ B = A.

6. A ⊆ B e B ⊆ C ⇒ A ⊆ C.

Prova. Vamos provar apenas o item (3).

A = B ⇔ ∀ x [x ∈ A ⇒ x ∈ B e x ∈ B ⇒ x ∈ A]

e
B = C ⇔ ∀ x [x ∈ B ⇒ x ∈ C e x ∈ C ⇒ x ∈ B].
Pela primeira e terceira dessas afirmações, obtemos

∀ x [x ∈ A ⇒ x ∈ C] ⇔ A ⊆ C.

32
Capítulo 2. Conjuntos

Pela quarta e segunda dessas afirmações, obtemos

∀ x [x ∈ C ⇒ x ∈ A] ⇔ C ⊆ A.

Portanto, A = C.

ZF2 - Axioma da construção de conjuntos. Seja P (x) uma propriedade ou


uma afirmação com relação a x, a qual pode ser expressa inteiramente em termos
dos símbolos

∈, =, ∨, ∧, ¬, ∼, ⇒, ∃, ∀, colchetes e variáveis livres x, y, z, A, B, C . . .

Então existe um conjunto C que consiste de todos os elementos x que satisfazem


P (x), que denotaremos por
C = {x : P (x)}.
e lê-se : “o conjunto de todos os elementos x que satisfazem a propriedade P (x).“
Formalmente,
∀ A ∃ C [∀ x [x ∈ C ⇔ x ∈ A ∧ P (x)]].

Observação 2.2 Sobre o axioma ZF2 :

1. O axioma ZF2 é também conhecido como Axioma do subconjunto, Axioma


da separação, Axioma da compreensão, ou ainda, Axioma de especificação.
Esse axioma é na verdade uma “família” de axiomas, pois para cada propri-
edade P (x) temos um axioma.

2. Note que o axioma ZF1 , garante que o conjunto C é unicamente determi-


nado, pois se D é o conjunto de todos os elementos x que satisfazem P (x),
então qualquer elemento de C é um elemento de D e vice-versa. Portanto,
C = D.

3. Em geral, a propriedade P (x) é uma fórmula.

4. O axioma ZF2 nos permite formar o conjunto de todos os “elementos” x que


satisfazem P (x), mas não o conjunto de todas os “conjuntos” x que satisfa-
zem P (x). Assim, eliminamos todos os paradoxos lógicos. Formalmente, se
P (x) é a afirmaç ão
¬[x ∈ x] = x ∈ / x,

33
2.2. Conjuntos

então
∃ C ∀ x [x ∈ C ⇔ x ∈
/ x].
Em particular, se x = C, então

C∈C⇔C∈
/ C,

o que é impossível. Portanto, C é uma classe própria. Consequentemente, a


classe de Russell não é um conjunto.

5. O axioma ZF2 admite somente as afirmações P (x) que podem ser escritas
inteiramente em forma de símbolos

∈, =, ∨, ∧, ¬, ∼, ⇒, ∃, ∀, colchetes e variáveis livres x, y, z, A, B, C . . .

Assim, eliminamos todos os paradoxos semânticos.

Agora vamos apresentar as operações Boolianas9 . Sejam A e B conjuntos. A


união ou a reunião de A e B é o conjunto de todos os elementos que pertencem a A
ou B ou ambos. Em símbolos,

∀ A ∀ B [∀ x [x ∈ A ∪ B ⇔ x ∈ A ou x ∈ B]]

ou, simplesmente,

A ∪ B = {x : x ∈ A ou x ∈ B} = {x : x ∈ A ∨ x ∈ B}.

A interseção de A e B é o conjunto de todos os elementos que pertencem a ambos


os conjuntos A e B. Em símbolos,

∀ A ∀ B [∀ x [x ∈ A ∩ B ⇔ x ∈ A e x ∈ B]]

ou, simplesmente,

A ∩ B = {x : x ∈ A e x ∈ B} = {x : x ∈ A ∧ x ∈ B}.

Note, pelo axioma ZF2 , que os conjuntos A ∪ B e A ∩ B estão bem definidos.


9
George Boole, 1815-1864, matemático e lógico inglês.

34
Capítulo 2. Conjuntos

O “conjunto” universal U é um conjunto que tem a propriedade de conter como


subconjuntos todos os conjuntos em pauta. Em símbolos,

∀ A ∃ U [∀ x [x ∈ U ⇔ x ∈ A e x = x]]

ou, simplesmente,
U = {x : x = x}.
Neste caso, P (x) é a afirmação x = x. É importante lembrar que o conjunto univer-
sal não existe, mas a “classe universal” é a classe de todos os conjuntos. Por isso,
adotamos esta convensão de conjunto universal.

O conjunto vazio ∅ é o conjunto sem nenhum elemento. Em símbolos,

∀ A ∃ ∅ [∀ x [x ∈ ∅ ⇔ x ∈ A e x = x]]

ou, simplesmente,
∅ = {x : x = x}.
Neste caso, P (x) é a afirmação x = x. A existência do conjunto vazio será dada
pelo axioma ZF9 . Note que se existem conjuntos A e B sem elementos, então
A = B. De fato,
∀ A ∀ x [x ∈ A ⇒ x ∈ B],
é uma afirmação verdadeira, pois é uma implicação com um antecedente falso (con-
fira Exemplo 1.19). De modo inteiramente análogo, prova-se a outra inclusão.

Sejam A e B conjuntos. Diremos que A e B são disjuntos se eles não têm


elementos em comum. Em símbolos, A ∩ B = ∅. Neste caso, o símbolo ∪˙ significa
união disjunta. O complementar de A é o conjunto de todos os elementos que não
pertencem a A. Em símbolos,

A = {x : x ∈
/ A}.

Assim,
∀ A ∀ x [x ∈ A ⇔ x ∈
/ A].
A diferença de A e B é o conjunto de todos os elementos de A que não pertencem
a B. Em símbolos,
A − B = {x : x ∈ A e x ∈ / B}.

35
2.2. Conjuntos

Logo,
∀ A ∀ B [∀ x [x ∈ A − B ⇔ x ∈ A e x ∈
/ B]].
Note que A − B = A ∩ B  e, pelo axioma ZF2 , que o conjunto A − B está bem
definido. Além disso, pelo o axioma ZF1 ,

A = B ⇒ ∃ x [x ∈ A − B ou x ∈ B − A] ⇔ (A − B) ∩ (B − A) = ∅.

Como
(A ∪ A) − A = A ∪ (A − A)
temos que a localização dos parênteses na diferença de conjuntos é importante.
É instrutivo observar que o relacionamento entre os conjuntos pode ser repre-
sentado graficamente por meio de uma linha fechada e não entrelaçada, quando a
linha fechada for um círculo, chama-se diagrama de Venn10 .

Teorema 2.3 Sejam A, B e C conjuntos. Então:

1. ∅ ⊆ A e A ⊆ U .

2. A ⊆ A ∪ B e B ⊆ A ∪ B.

3. A ∩ B ⊆ A e A ∩ B ⊆ B.

4. A ⊆ B se, e somente se, A ∪ B = B se, e somente se, A ∩ B = A.

5. A ∪ (A ∩ B) = A e A ∩ (A ∪ B) = A.

6. (A ∪ B) = A ∩ B  e (A ∩ B) = A ∪ B  (Lei de De Morgan).

7. A ∪ (B ∪ C) = (A ∪ B) ∪ C e A ∩ (B ∩ C) = (A ∩ B) ∩ C.

8. A ∩ (B ∪ C) = (A ∩ B) ∪ (A ∩ C) e A ∪ (B ∩ C) = (A ∪ B) ∩ (A ∪ C).

Prova. Vamos provar apenas uma afirmação do item (6).

∀ x [x ∈ (A ∪ B) ⇔ x ∈
/ A∪B ⇔x∈ /A e x∈
/B
   
⇔ x ∈ A e x ∈ B ⇔ x ∈ A ∩ B ],

que é o resultado desejado.


10
John Venn, 1834-1923, matemático inglês.

36
Capítulo 2. Conjuntos

Exercícios
1. Sejam A, B subconjuntos de U e X um subconjunto de U com as seguintes
propriedades:

(a) A ⊆ X e B ⊆ X.
(b) Se A ⊆ Y e B ⊆ Y , então X ⊆ Y , para todo Y ⊆ U .

Mostre que X = A ∪ B.

2. Enuncie e demonstre um resultado análogo ao Exercício (1), caracterizando


A ∩ B.

3. Sejam A, B, C e D conjuntos.

(a) Mostre que se A ⊆ B e C ⊆ D, então (A ∪ C) ⊆ (B ∪ D) e (A ∩ C) ⊆


(B ∩ D).
(b) Mostre que se A = B e C = D, então (A ∪ C) = (B ∪ D) e (A ∩ C) =
(B ∩ D).

4. Sejam A e B conjuntos. Mostre que:

(a) A − A = ∅.
(b) A − B = A − (A ∩ B) = (A ∪ B) − B.
(c) (A − B) ∩ (B − A) = ∅.
(d) A − B = B − A .
(e) A = (A ∩ B) ∪ (A − B).
(f) A ∪ B = (A ∩ B) ∪ (A − B) ∪ (B − A).
(g) (A − B) − C = A − (B ∪ C).
(h) A − (B − C) = (A − B) ∪ (A ∩ C).
(i) A ∪ (B − C) = (A ∪ B) − (C − A).
(j) A ∩ (B − C) = (A ∩ B) − (C ∩ A).

5. Sejam A e B conjuntos.

37
2.2. Conjuntos

(a) Mostre que A ∪ B = A ∪ (B − A), com A ∩ (B − A) = ∅.


(b) Mostre que B = (A ∩ B) ∪ (B − A), com (A ∩ B) ∩ (B − A) = ∅.

6. Vamos definir a operação de “+” em conjuntos como segue: se A e B são


conjuntos, então

A + B = (A ∩ B  ) ∪ (A ∩ B) = (A − B) ∪ (B − A).

Mostre que:

(a) A + ∅ = A.
(b) A + B = ∅ ⇔ A = B.
(c) A + B = (A ∪ B) − (B ∩ A).
(d) A + B = B + A.
(e) A + B = A + C ⇒ B = C.
(f) (A + B) = (A ∩ B) ∪ (A ∩ B  ).
(g) A + (B + C) = (A + B) + C.
(h) A ∩ (B + C) = (A ∩ B) + (A ∩ C).
(i) A ∪ C = B ∪ C ⇔ A + B ⊆ C.
(j) (A ∪ C) + (B ∪ C) = (A + B) − C.

7. Sejam A um conjunto qualquer e

R = {x ∈ A : x ∈
/ x}.

Mostre que R é um conjunto e R ∈


/ A. Conclua que a coleção de todos os
conjuntos não é um conjunto.

8. Mostre que o conjunto ∅ é caracterizado pelas seguintes condições:

(a) ∅ ⊆ A, para todo conjunto A.


(b) Se B é um conjunto tal que B ⊆ A, para todo conjunto A, então B = ∅.

38
Capítulo 2. Conjuntos

2.3 Gráficos e Famílias


Seja a um elemento. Então, pelo axioma ZF2 , obtemos o conjunto

{a} = {x : x = a}

Assim, a é o único elemento do conjunto {a} e x ∈ {a} significa que x = a.


Sejam a e b elementos. Então, pelo axioma ZF2 , obtemos o conjunto

{a, b} = {x : x = a ou x = b} = {a} ∪ {b}.

Note que {a, b} = {b, a}. De modo inteiramente análogo, obtemos os conjuntos

{a, b, c}, {a, b, c, d}

e, assim por diante. Isto motiva o axioma.

ZF3 - Axioma do par (não ordenado). Se a e b são elementos, então {a, b} é


um elemento. Em símbolos,

∀ a ∀ b ∃ c [c = {a, b}]

Observação 2.4 Sobre o axioma ZF3 :

1. O axioma ZF3 é equivalente a: dados conjuntos quaisquer existe um conjunto


ao qual eles pertencem. Mais precisamente, dados conjuntos quaisquer A e
B, existe um conjunto C tal que

∀ x [x ∈ C ⇔ x ∈ A ou x ∈ B],

ou seja,

∀ A ∀ B ∃ C [∀ x [x ∈ C ⇔ x ∈ A ou x ∈ B]].

Neste caso, A = C, caso contrário, A ∈ A, o que é impossível.

2. É claro que {a, a} = {a}. Assim, fazendo a = b no axioma ZF3 , obtemos


“se a é um elemento, então {a} é um elemento”, ou seja, existem conjuntos

39
2.3. Gráficos e Famílias

unitários. Em particular, ∅ e {∅} são conjuntos distintos. Neste caso, existe


uma “infinidade” de conjuntos.

3. Note que a ∈ A se, e somente se, {a} ⊆ A.

4. Se A é um conjunto, então

{x ∈ A : x = x} = {x : x ∈ A} = A.

Teorema 2.5 Se {x, y} = {u, v}, então [x = u e y = v] ou [x = v e y = u].

Prova. Há dois casos a serem considerados:


1.o Caso. Se x = y, então, pelo axioma ZF1 , {x, y} = {x}. Portanto, por
hipótese, x = u = v = y.
2.o Caso. Se x = y, então, pelo axioma ZF1 , [x = u ou x = v] e [y = u ou
y = v]. Se x = u e y ∈ {u, y} = {u, v}, então y = v, pois x = y. Se x = v e
y ∈ {v, y} = {u, v}, então y = u, pois x = y. Portanto, em qualquer caso,

[x = u e y = v] ou [x = v e y = u],

que é o resultado desejado.

Sejam a e b elementos. Então, aplicando o axioma ZF3 três vezes, temos que

{{a}, {a, b}}

é um conjunto o qual, devido a Kuratowski11 , chama-se par ordenado. Em símbo-


los,
(a, b) = {{a}, {a, b}}.
Note que
(b, a) = {{b}, {b, a}} = {{b}, {a, b}}.
Neste caso, fica clara a distinção entre os pares ordenados (a, b) e (b, a).

Teorema 2.6 Se (a, b) = (c, d), então a = c e b = d.


11
Kazimierz Kuratowski, 1896-1980, matemático e lógico polonês.

40
Capítulo 2. Conjuntos

Prova. Por definição, obtemos

{{a}, {a, b}} = {{c}, {c, d}}.

Então, pelo Teorema 2.5,

[{a} = {c} e {a, b} = {c, d}] ou [{a} = {c, d} e {a, b} = {c}].

Se {a} = {c} e {a, b} = {c, d}, então a = c e, pelo Teorema 2.5, [a = c e b = d]


ou [a = d e b = c]. Assim, a = c e b = d ou b = c = a = d. Se {a} = {c, d}
e {a, b} = {c}, então a = c = d, pois c, d ∈ {c, d}. Por outro lado, b = c, pois
b ∈ {a, b}. Portanto, a = b = c = d.

Sejam A e B conjuntos. O produto cartesiano de A e B é a classe de todos os


pares ordenados (a, b), onde a ∈ A e b ∈ B. Em símbolos,

A × B = {(a, b) : a ∈ A e b ∈ B}
= {x : x = (a, b), para algum a ∈ A e b ∈ B}.

Teorema 2.7 Sejam A, B, C e D conjuntos. Então:

1. A × (B ∩ C) = (A × B) ∩ (A × C).

2. A × (B ∪ C) = (A × B) ∪ (A × C).

3. (A × B) ∩ (C × D) = (A ∩ C) × (B ∩ D).

Prova. Vamos provar apenas o item (3).

∀ (x, y) [(x, y) ∈ (A × B) ∩ (C × D)
⇔ (x, y) ∈ A × B e (x, y) ∈ C × D
⇔ (x ∈ A e y ∈ B) e (x ∈ C e y ∈ D)
⇔ (x ∈ A e x ∈ C) e (y ∈ B e y ∈ D)
⇔ x∈A∩C e y ∈B∩D
⇔ (x, y) ∈ (A ∩ C) × (B ∩ D)],

que é o resultado desejado.

Um gráfico é qualquer conjunto de pares ordenados (x, y), isto é, qualquer sub-

41
2.3. Gráficos e Famílias

conjunto de U × U . Isto significa que

∃ G ∀ z [z ∈ G ⇒ z = (x, y)].

Note que a relação (x, y) ∈ G significa que y está relacionado com x sob G, ou
seja,
G = {(x, y) : (x, y) ∈ G}.

Observação 2.8 Intuitivamente, uma relação sobre um conjunto A é uma afirma-


ção R(x, y) que é verdadeira ou falsa, para cada par ordenado (x, y) de elementos
de A. No entanto, a representação gráfica de uma relação sobre A é um gráfico
G ⊆ A × A que consiste de todos os pares (x, y) tal que R(x, y) é verdadeira.
Reciprocamente, qualquer gráfico G ⊆ A × A define uma relação sobre A, a saber,
a relação R tal que R(x, y) é verdadeira se, e somente se, (x, y) ∈ G.

Se G é um gráfico, então G−1 é o gráfico definido como

G−1 = {(x, y) : (y, x) ∈ G}.

O domínio do gráfico G é definido como

Dom(G) = {x : ∃ y tal que (x, y) ∈ G}

e a imagem do gráfico G é definida como

Im(G) = {y : ∃ x tal que (x, y) ∈ G}.

Portanto,
G ⊆ Dom(G) × Im(G).
Neste caso, se Dom(G) = ∅ ou Im(G) = ∅, então G = ∅.
Note que se A e B são conjuntos, então A × B é um gráfico, pois qualquer
elemento de A está relacionado com qualquer elemento de B.
O gráfico identidade ou gráfico diagonal sobre A é definido como

IA = {(x, y) ∈ A × A : y = x}.

42
Capítulo 2. Conjuntos

Sejam G e H dois gráficos. Então o gráfico G ◦ H é definido como

G ◦ H = {(x, y) : ∃ z tal que (x, z) ∈ H e (z, y) ∈ G}.

Note, em geral, que G ◦ H = H ◦ G, pois se G = {(1, 2)} e H = {(0, 1)}, então


G ◦ H = {(0, 2)} e H ◦ G = ∅.

Teorema 2.9 Sejam G, H e J gráficos. Então:

1. G ◦ (H ◦ J) = (G ◦ H) ◦ J.
−1
2. (G−1 ) = G.

3. (G ◦ H)−1 = H −1 ◦ G−1 .

4. Dom(G) = Im(G−1 ) e Im(G) = Dom(G−1 ).

5. Dom(G ◦ H) ⊆ Dom H e Im(G ◦ H) ⊆ Im(G).

Prova. Vamos provar apenas o item (3).

∀ (x, y) [(x, y) ∈ (G ◦ H)−1 ⇔ (y, x) ∈ G ◦ H


⇔ ∃ z tal que (y, z) ∈ H e (z, x) ∈ G
⇔ ∃ z tal que (x, z) ∈ G−1 e (z, y) ∈ H −1
⇔ (x, y) ∈ H −1 ◦ G−1 ],

que é o resultado desejado.

Seja I um conjunto não vazio qualquer. Se a cada elemento i ∈ I associarmos


um subconjunto Ai de um dado conjunto C, o conjunto

{Ai }i∈I = {Ai : i ∈ I}

chama-se a família de conjuntos (indexada por I) e I chama-se o conjunto de índi-


ces para a família, sem nenhuma condição de que os conjuntos com índices distintos
sejam diferentes ou não.
Observe que qualquer conjunto C cujos elementos são conjuntos pode ser con-
vertido para uma família de conjuntos pelo autoíndice, ou seja, usaremos o conjunto
C como conjunto de índices e associaremos a cada elemento do conjunto o conjunto

43
2.3. Gráficos e Famílias

que o representa. Mais precisamente, pondo I = C e Ai = i, para todo i ∈ I, obte-


mos
{i : i ∈ I} = {Ai : i ∈ I} ou {A}A∈C = {A : A ∈ C}.
Note que a família de conjuntos

{1, 2}, {3, 4}, {5, 6}, . . . , {2n − 1, 2n}, . . .

pode ser considerada como uma família de conjuntos indexada pelo conjunto dos
números naturais N, em que An = {2n − 1, 2n}, para todo n ∈ N. Portanto,

{An }n∈N = {An : n ∈ N} = {A1 , A2 , . . . , An , . . .}.

Neste caso, diremos que a família {An }n∈N é uma sequência e An o n-ésimo con-
junto da sequência. É importante ressaltar que uma família é diferente de um con-
junto de conjuntos, pois os elementos da família podem ser todos iguais, enquanto
em um conjunto não. Por exemplo, se An = R, para todo n ∈ N, então {An }n∈N é
uma família, mas como um conjunto possui apenas um elemento.

Observação 2.10 Formalmente, uma família de conjuntos {Ai }i∈I é um gráfico G,


com Dom(G) = I e

Ai = {y : ∃ i ∈ I tal que (i, y) ∈ G} = Im(G).

Por exemplo, se I = {1, 2}, A1 = {a, b} e A2 = {c, d}, então

{Ai }i∈I = G = {(1, a), (1, b), (2, c), (2, d)}.

Exemplo 2.11 Sejam b ∈ R fixado e

Rb = {(x, y) ∈ R × R : y = x + b}

Então {Rb }b∈R é uma família de retas paralelas do plano R × R. Note que a família
{Rb }b∈R é uma “partição” de R × R, ou seja,


·
R= Rb .
b∈R

44
Capítulo 2. Conjuntos

Seja {Ai }i∈I uma família de subconjuntos de U . A união dos conjuntos Ai é o


“conjunto” de todos os elementos que pertencem a pelo menos uma conjunto Ai da
família. Em símbolos,

Ai = {x ∈ U : ∃ i ∈ I tal que x ∈ Ai },
i∈I

ou ainda,
Ai = {x ∈ U : x ∈ Ai , para algum i ∈ I}
i∈I

Note, em particular, que se A é um conjunto, então



{x} = ∪{{x} : x ∈ A} = A.
x∈A

A interseção dos conjuntos Ai é o “conjunto” de todos os elementos que pertencem


a todos os conjuntos Ai da família. Em símbolos,

Ai = {x ∈ U : ∀ i ∈ I, x ∈ Ai },
i∈I

ou ainda,

Ai = {x ∈ U : x ∈ Ai , para todo i ∈ I}.


i∈I

Exemplo 2.12 Sejam i ∈ R e Ai = {x ∈ R : x > i}, ou seja, a cada número real


i ∈ R associamos um subconjunto Ai de R. Neste caso, obtemos a família {Ai }i∈R
de subconjuntos de R. É fácil verificar que

Ai1 ∪ Ai2 = Ai , em que i = min{i1 , i2 },


Ai1 ∩ Ai2 = Aj , em que j = max{i1 , i2 },
∪i∈I Ai = A0 e ∩i∈I Ai = A1 ,

com I = [0, 1] um intervalo fechado de R.

ZF4 - Axioma de peneiração. Se A é um conjunto, então A ∩ C é um conjunto


para toda classe C, ou seja, qualquer subclasse de um conjunto é um conjunto. Em
símbolos,
∀ C ∀ A [C ∩ A é um conjunto],

45
2.3. Gráficos e Famílias

É pertinente notar que o axioma ZF4 nos fornece, formalmente, a construção


de subconjuntos. Observe que se A é um conjunto e P (x) é uma propriedade, em
que x representa um conjunto, então C = {x ∈ A : P (x)} é um conjunto. Caso
contrário, o conjunto

A ∩ C = {x : x ∈ A ∧ (x é um conjunto) ∧ P (x)}

implica que a afirmação “x é um conjunto” seria redundante, pois x ∈ A. Além


disso, se A e B são conjuntos, então pelo item (3) do Teorema 2.3, A ∩ B ⊆ A.
Portanto, pelo axioma ZF4 , a interseção A ∩ B é um conjunto.

ZF5 - Axioma de união. Se C é um conjunto cujos elementos são conjuntos,


então

∪C = {x : x ∈ A, para algum A ∈ C} = ∪{A : A ∈ C} = A
A∈C

é um conjunto. Formalmente,

∀ C [C = ∅ ⇒ ∃ D [D = ∪C]].

Por exemplo,
∪∅ = ∅ e ∪ {x} = x.

Observação 2.13 Seja C um conjunto cujos elementos são conjuntos:

1. Note que x ∈ ∪C significa que existe um A ∈ C tal que x ∈ A. Em particu-


lar, se A ∈ C, então A ⊆ ∪C. Portanto, ∪C representa a união de todos os
conjuntos em C.

2. Se A e B são elementos de C, então, pelo axioma ZF3 , {A, B} é um conjunto.


Assim, por definição,

∪{A, B} = {x : x ∈ X, para algum X ∈ {A, B}}


= {x : x ∈ X, com X = A ou X = B}
= A ∪ B.

Portanto, pelo axioma ZF5 , A ∪ B é um conjunto.

46
Capítulo 2. Conjuntos

Seja A um conjunto. O conjunto das potências de A é a família (classe) de todos


os subconjuntos de A. Em símbolos,

P(A) = {B : B ⊆ A}.

Note que P(A) é a família de todos os subconjuntos B que satisfazem a propriedade


B ⊆ A. Portanto, pelo axioma ZF2 , a classe P(A) está bem definido.

ZF6 - Axioma das potências. Se A é um conjunto, então P(A) é um conjunto.


Formalmente,
∀ A ∃ C [C = P(A)].

Observação 2.14 Seja A um conjunto qualquer.

1. Se Q(X) é uma propriedade com relação à um subconjunto X de A, então,


pelos axiomas ZF4 e ZF2 ,

B = {X : X ⊆ A e Q(X)}

é um conjunto. Assim, se X ∈ B, então X ∈ P(A). Logo, B ⊆ P(A).


Portanto, pelos axiomas ZF6 e ZF4 , B é um conjunto, ou seja, se A é um
conjunto e Q(X) é uma propriedade de X, então a conjunto de todos os
subconjuntos de A é um conjunto. Por exemplo, se C é um subconjunto de
P(A), então

∪C = B = {x ∈ A : x ∈ B, para algum B ∈ C}
B∈C

é um conjunto. Em particular,

∩C = {x ∈ ∪C : ∀ B [B ∈ C ⇒ x ∈ B]}, ∪P(A) = A e ∩ P(A) = ∅.

são conjuntos.

2. Se A é um conjunto, então {A} é um conjunto. De fato, se A = ∅, então, pelo


axioma ZF6 , P(∅) = {∅} é um conjunto. Se A = ∅, então, pelo axioma ZF3 ,
{A, ∅} é um conjunto. Assim, se C = {x : x = A} é uma classe, então, pelo
axioma ZF4 , {A, ∅} ∩ C = {A} é um conjunto.

47
2.3. Gráficos e Famílias

3. A união e a interseção são operações binárias sobre P(A). Além disso, se A


é um conjunto não vazio, então

P(A)∗ = P(A) − {∅}

é uma família de conjuntos não vazios.

4. A classe universal U é caracterizada por:

(a) Se A ∈ U , então A ⊆ U .
(b) Se A ∈ U , então P(A) ⊆ U .

Exemplo 2.15 Se A = {1, 2}, então P(A) = {∅, {1}, {2}, A} é um conjunto. Note
que X ⊆ A significa que X ∈ P(A) e x ∈ A significa que {x} ∈ P(A).

Exemplo 2.16 Sejam A um conjunto e a, b ∈ A. Mostre que

(a, b) ∈ P(P({a, b}) e a, b ∈ ∪(a, b).

Conclua que (a, b) ∈ P(P(A)).

Solução. Como {a}, {a, b} ⊆ {a, b} temos que {a}, {a, b} ∈ P({a, b}). Portanto,

{{a}, {a, b}} ⊆ P({a, b}) ⇒ (a, b) = {{a}, {a, b}} ∈ P(P({a, b})).

Note que como a ∈ {a} e b ∈ {a, b} temos que a, b ∈ (a, b). Logo,

a, b ∈ ∪(a, b) = {x : x ∈ B, para algum B ∈ (a, b)},

que é o resultado desejado.

Exemplo 2.17 Seja G um gráfico. Mostre que se G é um conjunto, então Dom(G)


e Im(G) são conjuntos.

Solução. Seja x ∈ Dom(G). Então existe um y tal que (x, y) ∈ G. Assim,

(x, y) ∈ ∪G = {a : a ∈ A, para algum A ∈ G},

48
Capítulo 2. Conjuntos

Em particular, {x} ∈ ∪G. De modo inteiramente análogo, prova-se que x ∈


∪(∪G). Portanto, Dom(G) = {x ∈ ∪(∪G) : ∃ y tal que (x, y) ∈ G} ⊆ ∪ (∪G),
ou seja, pelo axioma ZF5 , Dom(G) é um conjunto.

Teorema 2.18 Se A e B são conjuntos, então A × B é um conjunto.

Prova. Note, pelos axiomas ZF5 e ZF6 , que P(A ∪ B) é um conjunto. Novamente,
pelo axioma ZF6 , P(P(A ∪ B)) é um conjunto.
Afirmação. A × B ⊆ P(P(A ∪ B)).
De fato, seja (x, y) ∈ A × B. Então x ∈ A ∪ B e y ∈ A ∪ B. Logo, {x} ⊆ A ∪ B
e {x, y} ⊆ A ∪ B. Assim, {x}, {x, y} ∈ P(A ∪ B). Portanto,

{{x}, {x, y}} ⊆ P(A ∪ B) ⇒ (x, y) = {{x}, {x, y}} ∈ P(P(A ∪ B)),

ou seja, A × B ⊆ P(P(A ∪ B)). Consequentemente, pelo axioma ZF4 , A × B é


um conjunto.

Observação 2.19 Se A e B são conjuntos, então, pelo axioma ZF4 , qualquer grá-
fico G de A × B é um conjunto e

A × B = {(x, y) ∈ P(P(A ∪ B)) : x ∈ A e y ∈ B}.

Exercícios
1. Mostre que os conjuntos ∅, {∅}, {∅, {∅}} . . . são todos distintos.

2. Sejam A, B, C e D conjuntos não vazios.

(a) Mostre que A e B são disjuntos se, e somente se, A × E e B × E são


disjuntos, para qualquer conjunto E.
(b) Mostre que A ⊆ B e C ⊆ D se, e somente se, A × C ⊆ B × D.
(c) Mostre que A × B = C × D se, e somente se, A = C e B = D.
(d) Mostre que A × B e A × C são disjuntos.
(e) Mostre que B × A e C × A são disjuntos.

3. Sejam G e H gráficos.

49
2.3. Gráficos e Famílias

(a) Mostre que se G ⊆ A × B, então G−1 ⊆ B × A.


(b) Mostre que se G ⊆ A × B e H ⊆ B × C, então H ◦ G ⊆ A × C.

4. Sejam G, H gráficos e B, C subconjuntos de Dom(G). Vamos definir a


restrição de G a B como

G|B = {(x, y) : (x, y) ∈ G e x ∈ B}.

Note que G|B = G ◦ I, em que I é o gráfico (inclusão) I ⊆ B × Dom(G).


Mostre que:

(a) G|B = G ∩ (B × Im(G)).


(b) G|(B∪C) = G|B ∪ G|C .
(c) G|(B∩C) = G|B ∩ G|C .
(d) (H ◦ G)|B = H ◦ (G|B ).

5. Sejam G e H gráficos. Mostre que se G e H são conjuntos, então G−1 e G◦H


são conjuntos.

6. Sejam A e B conjuntos. Mostre que A − B e A + B são conjuntos.

7. Sejam {Ai }i∈I , {Bj }j∈J famílias de subconjuntos de U e B um subconjunto


qualquer de U .

(a) Mostre que se Ai ⊆ B, para todo i ∈ I, então ∪i∈I Ai ⊆ B.


(b) Mostre que se B ⊆ Ai , para todo i ∈ I, então B ⊆ ∩i∈I Ai .
(c) Mostre que se Ai ⊆ Bi , para todo i ∈ I, então ∪i∈I Ai ⊆ ∪i∈I Bi
(d) Mostre que se Ai ⊆ Bi , para todo i ∈ I, então ∩i∈I Ai ⊆ ∩i∈I Bi .

8. Sejam {Ai }i∈I uma família de subconjuntos de U e X um subconjunto de U


com as seguintes propriedades:

(a) Para todo i ∈ I, tem-se X ⊆ Ai .


(b) Se Y ⊆ Ai para todo i ∈ I, então Y ⊆ X.

Mostre que X = ∩i∈I Ai .

50
Capítulo 2. Conjuntos

9. Enuncie e demonstre um resultado análogo ao Exercício (8), caracterizando


∪i∈I Ai .

10. Seja {Ai }i∈I uma família de subconjuntos de U . Mostre que:

(a) (∪i∈I Ai ) = ∩i∈I Ai .


(b) (∩i∈I Ai ) = ∪i∈I Ai .

11. Sejam {Ai }i∈I e {Bj }j∈J famílias de subconjuntos de U . Mostre que:

(a) (∪i∈I Ai ) ∩ (∩j∈J Bj ) = ∪(i,j)∈I×J (Ai ∩ Bj ).


(b) (∩i∈I Ai ) ∪ (∩j∈J Bj ) = ∩(i,j)∈I×J (Ai ∪ Bj ).
(c) (∩i∈I Ai ) × (∩j∈J Bj ) = ∩(i,j)∈I×J (Ai × Bj ).
(d) (∪i∈I Ai ) × (∪j∈J Bj ) = ∪(i,j)∈I×J (Ai × Bj ).

12. Sejam {Ai }i∈I uma família de subconjuntos de U e A um subconjunto de U .


Mostre que:

(a) ∪i∈I P(Ai ) ⊆ P(∪i∈I Ai ).


(b) ∩i∈I P(Ai ) = P(∩i∈I Ai ).
(c) A ∪ (∩i∈I Ai ) = ∩i∈I (A ∪ Ai ).
(d) A ∩ (∪i∈I Ai ) = ∪i∈I (A ∩ Ai ).

13. Sejam A e B conjuntos.

(a) Mostre que A ⊆ B se, e somente se, P(A) ⊆ P(B).


(b) Mostre que A = B se, e somente se, P(A) = P(B).
(c) Mostre que A ∩ B = ∅ se, e somente se, P(A) ∩ P(B) = {∅}.

14. Determine explicitamente os conjuntos P(P(∅)) e P(P(P(∅))).

2.4 Funções
O conceito de função é um dos mais básicos em toda a Matemática. Assim,
nesta seção, vamos apresentar formalmente o conceito de função via gráfico. Mas,
antes de iniciarmos o estudo funções, vamos fazer alguns comentários históricos.

51
2.4. Funções

A origem do conceito de funções (transformações) vem da Geometria, conforme


exemplos a seguir:

• Geometria Projetiva - Sejam r, s retas e O ∈ / r ∩ s. Então transformamos


(perspectiva) o ponto P sobre s no ponto Q (representação de P ) de interseção
da reta passando por O e P com a reta r, confira Figura 2.1. Portanto, a
transformação consiste de dois conjuntos r e s e um subconjunto de pares
ordenados (P, Q) de r × s.

• Geometria de Euclides - Sejam E um plano e r uma reta em E Então trans-


formamos (projeção ortogonal) cada ponto R do plano E sobre o pé S da
perpendicular (projeção de R) de R sobre à reta r, confira Figura 2.1. Por-
tanto, a transformação consiste de dois conjuntos E e E e um subconjunto de
pares ordenados (R, S) de E × E.

Figura 2.1: Perspectiva e projeção.

Estes exemplos geométricos motiva a seguinte definição:


Sejam A e B conjuntos. Uma função de A em B é um subconjunto f de A × B
que satisfaz as seguintes propriedades:

F1 - Para cada x ∈ A, existe y ∈ B tal que (x, y) ∈ f .

F2 - Para cada x ∈ A e y1 , y2 ∈ B, se (x, y1 ) ∈ f e (x, y2 ) ∈ f , então y1 = y2 .

Em símbolos,

∃A ∃B [f ⊆ A × B e ∀ x ∀ y ∀ z [(x, y) ∈ f ∧ (x, z) ∈ f ⇒ y = z]].

52
Capítulo 2. Conjuntos

Observação 2.20 As condições F1 e F2 significam que para cada x ∈ A existe um


único y ∈ B tal que (x, y) ∈ f , em símbolos,

∀ x ∈ A ∃! y ∈ B [(x, y) ∈ f ].

Em particular, F2 afirma que a função f está bem definida. Além disso, se A = ∅,


então existe uma única função ∅ de A em B, pois ∅ = ∅ × B é um subconjunto com
as propriedades desejadas. Não obstante, se A = ∅ e B = ∅, então ∅ não é uma
função. É importante notar que f ∈ P(A × B).

Teorema 2.21 Sejam A, B conjuntos e f um gráfico. Então f é uma função de A


em B se, e somante se,
1. F2 está satisfeita.

2. Dom(f ) = A.

3. Im(f ) ⊆ B.
Prova. Suponhamos que f seja uma função. Então, por definição, F2 está satisfeita.
Além disso,

∀ x [x ∈ Dom(f ) ⇒ ∃ y tal que (x, y) ∈ f ⇒ (x, y) ∈ A × B ⇒ x ∈ A].

Por outro lado, pela condição F1 ,

∀ x [x ∈ A ⇒ ∃ y ∈ B tal que (x, y) ∈ f ⇒ x ∈ Dom(f )].

Logo, Dom(f ) = A. Finalmente,

∀ y [y ∈ Im(f ) ⇒ ∃ x ∈ A tal que (x, y) ∈ f ⇒ (x, y) ∈ A × B ⇒ y ∈ B].

Assim, Im(f ) ⊆ B.
Reciprocamente,

∀ (x, y) [(x, y) ∈ f ⇒ x ∈ Dom(f ) e y ∈ Im(f )


⇒ x ∈ A e y ∈ B ⇒ (x, y) ∈ A × B].

Portanto, f ⊆ A × B. Dado x ∈ A = Dom(f ), existe y tal que (x, y) ∈ f . Como


y ∈ Im(f ) ⊆ B temos que y ∈ B. Portanto, a condição F1 está satisfeita.

53
2.4. Funções

Seja f uma função, com A = Dom(f ) e Im(f ) ⊆ B. Então é comum usar as


notações para representar (x, y) ∈ f :

f : A→B
(f (x) : x ∈ A), (fx : x ∈ A) ou (fx )x∈A .
x → f (x),

A notação f (x) foi introduzida por Euler12 . A imagem de f pode ser denotada por
{fx : x ∈ A} ou {fx }x∈A . Como (x, y) ∈ f significa que y = f (x) ou x −→ y,
diremos que f (x) é o valor que f assume no elemento x. Neste caso, diremos que
{fx }x∈A é uma família de elementos de B.
É importante lembrar que duas funções são iguais se elas possuem o mesmo
domínio, o mesmo contradomínio e o mesmo gráfico, ou seja, se f : A → B e
g : A → B são funções, então f = g se, e somente se f (x) = g(x), para todo
x ∈ A. Como uma ilustração, se f = g, então

∀ x [y = f (x) ⇔ (x, y) ∈ f ⇔ (x, y) ∈ g ⇔ y = g(x)].

Portanto,f (x) = g(x), para todo x ∈ A. A família de todas as funções de A em B


será denotada por

B A = {f ∈ P(A × B) : f é uma função}.

Corolário 2.22 Sejam f : A → B uma função e C um conjunto não vazio qualquer


tal que Im(f ) ⊆ C. Então f : A → C é uma função.

Prova. Como f : A → B é uma função temos que a condição F2 está satisfeita e


Dom(f ) = A. Portanto,f : A → C é uma função, pois Im(f ) ⊆ C.

Figura 2.2: Diagrama de flechas.

Sejam A, B, C conjuntos e f : A → B, g : B → C funções. Diremos que o


diagrama comuta se h = g ◦ f , confira Figura 2.2.
12
Leonhard Paul Euler, 1707-1783, matemático e físico suíço.

54
Capítulo 2. Conjuntos

Teorema 2.23 Sejam A, B conjuntos e f : A → B uma função. Então:

1. F : P(A) → P(B) definida como F (X) = f (X) é uma função induzida por
f , com

f (X) = {y ∈ B : ∃ x ∈ X tal que y = f (x)} = ∪x∈X {f (x)}.

2. G : P(B) → P(A) definida como G(Y ) = f −1 (Y ) é uma função induzida


por f −1 , com

f −1 (Y ) = {x ∈ A : f (x) ∈ Y } = ∪y∈Y f −1 (y)

e f −1 (y) = f −1 ({y}).

3. Se f é uma função bijetora, então F é uma função bijetora, com inversa G.

Prova. Vamos provar apenas o item (1). Note que

(X, Y1 ) ∈ F e (X, Y2 ) ∈ F ⇒ Y1 = Y2 ,

pois

∀ y [y ∈ Y1 = f (X) ⇔ ∃ x ∈ X tal que y = f (x) ⇔ y ∈ Y2 = f (X)].

Note que

∀ X [X ∈ Dom(F ) ⇒ ∃ Y tal que (X, Y ) ∈ F


⇒ (X, Y ) ∈ P(A) × P(B) ⇒ X ∈ P(A)].

Por outro lado,

∀ X [X ∈ P(A) ⇒ ∃ Y = f (X) ⊆ B tal que (X, Y ) ∈ F ⇒ X ∈ Dom(F )].

Logo, Dom(F ) = P(A). É fácil verificar que Im(F ) ⊆ P(B). Portanto, F é uma
função.

Exemplo 2.24 Sejam A, B conjuntos e f : A → B uma função. Mostre que f é


injetora se, e somente se, f (X − Y ) = f (X) − f (Y ), para todos X, Y ⊆ A.

55
2.4. Funções

Solução. Note que a inclusão f (X) − f (Y ) ⊆ f (X − Y ) é sempre verdadeira para


qualquer função f , pois

∀ y [y ∈ f (X) − f (Y ) ⇒ y ∈ f (X) e y ∈
/ f (Y )
⇒ ∃ x ∈ X tal que y = f (x) e y = f (z), ∀ z ∈ Y,
⇒ ∃ x ∈ X − Y tal que y = f (x) ⇒ y ∈ f (X − Y )].

Suponhamos que f seja injetora. Então

∀ y [y ∈ f (X − Y ) ⇒ ∃ x ∈ X − Y tal que y = f (x)


⇒ ∃ x ∈ X tal que y = f (x) e y ∈
/ f (Y )
⇒ y ∈ f (X) − f (Y )],

pois se y ∈ f (Y ), então existiria um x1 ∈ Y tal que y = f (x1 ) = f (x), ou seja,


x1 = x ∈ X − Y , o que é impossível.
Reciprocamente, suponhamos, por absurdo, que f não seja injetora. Então exis-
tem x, y ∈ A, com x = y e f (x) = f (y). Pondo X = {x} e Y = {y}, obtemos
X − Y = X. Logo,

{f (x)} = f (X) = f (X − Y ) = f (X) − f (Y ) = {f (x)} − {f (y)} = ∅,

o que é impossível. Portanto, f é injetora.

Observação 2.25 A condição sobre f ser injetora, no Exemplo 2.24, é necessária


para que ocorra a igualdade. Por exemplo, se f : R2 → R é a função definida
como f (x, y) = x. Então claramente f não é injetora. Se

X = {(x, y) ∈ R2 : y = x} e Y = {(x, y) ∈ R2 : y = x + 1}

são duas retas paralelas, então X − Y = X ∩ Y  = X e f (X) = R = f (Y ).


Assim,
R = f (X) = f (X − Y ) = f (X) − f (Y ) = ∅.

Sejam {Ai }i∈I uma família de conjuntos e A = ∪i∈I Ai . O produto cartesiano


dos conjuntos Ai é a família

P = Ai = {f ∈ AI : f (i) ∈ Ai , ∀ i ∈ I}.
i∈I

56
Capítulo 2. Conjuntos

É conveniente representar o elemento f do produto cartesiano pela “sequência”


(ai )i∈I , onde f (i) = ai , para todo i ∈ I, para distinguir da imagem da função
(conjunto dos termos da sequência)

Im(f ) = {ai : i ∈ I} = {ai }i∈I

que é um subconjunto de A.

Observação 2.26 Se Aj = ∅, para algum j ∈ I, então P = i∈I Ai = ∅, pois não
existe uma função f : I → A tal que f (j) ∈ Aj . Se I = ∅, então P = {∅}.

Exemplo 2.27 Sejam I = Z e Ai = ]i, i + 1[ um intervalo aberto em R. Então


 
1
f = i+
5 i∈I

é um elemento de i∈I Ai . Note que f : I → R − Z.

Exemplo 2.28 Se I = {1, 2}, A1 = {a, b} e A2 = {c, d}, então



P = Ai = {f ∈ (A1 ∪ A2 )I : f (1) ∈ A1 e f (2) ∈ A2 }.
i∈I

Logo, os elementos de P são:

i f (i) i f (i) i f (i) i f (i)


1 a 1 a 1 b 1 b
2 c 2 d 2 c 2 d

Note a diferença entre os conjuntos A1 × A2 e i∈I Ai , pois já vimos que os ele-
mentos de A1 × A2 são {{x}, {x, y}}, onde x ∈ A1 , y ∈ A2 e

{{x}, {x, y}} ⊆ P(A1 ∪ A2 ),



mas os elementos de i∈I Ai são funções f : I → A1 ∪ A2 , ou seja,

f ⊆ I × (A1 ∪ A2 ).

Não obstante, como qualquer função f : I → A1 ∪ A2 é completamente determi-

57
2.4. Funções

nada pelo par ordenado (f (1), f (2)) ∈ A1 × A2 temos que a função

σ : (A1 ∪ A2 )I → A1 × A2

definida como σ(f ) = (f (1), f (2)) é bijetora. Portanto, podemos identificar o



produto cartesiano i∈I Ai com o conjunto

A1 × A2 = {(a, c), (a, d), (b, c), (b, d)}.



Se f = (ai )i∈I ∈ i∈I Ai é um elemento de i∈I Ai tal que ai ∈ Ai , para todo

i ∈ I, diremos que Ai é a i-ésima componente de i∈I Ai e ai ∈ Ai é a i-ésima
coordenada da família. Para cada j ∈ I, definimos uma função pj de A em Aj
como
pj (f ) = pj ((ai )i∈I ) = aj , ∀ f = (ai )i∈I ∈ A.
A função pj chama-se a j-ésima projeção de A sobre Aj . Mostraremos no Capítulo
4 que se cada Ai = ∅, então cada pj é sobrejetora. Note que se X = Ai , para

todo i ∈ I, então i∈I Ai = X I . Assim, a função d : X → X I definida como
d(x) = fx , em que fx (I) = x, é claramente injetora e chama-se imersão diagonal.
Neste caso,
pj ◦ d = I X ,
para todo j ∈ I. A função E : X I × I → X definida como E(f, i) = f (i),
chama-se função avaliação. Portanto,

pj (f ) = E(f, j).

Teorema 2.29 Seja {Ai }i∈I uma família de conjuntos. Então existe um conjunto P
e uma família de funções {pi : P → Ai }i∈I com a seguinte propriedade universal:
dado qualquer conjunto C e qualquer família de funções {gi : C → Ai }i∈I , existe
uma única função f : C → P tal que pi ◦ f = gi , para todo i ∈ I. Além disso, P é
unicamente determinado, a menos, de bijeção.

Prova. (Existência) Sejam P = i∈I Ai e pi as projeções canônicas sobre as i-
ésimas componentes. Então dado C e a função gi : C → Ai , definimos f : C → P
como f (c) = gc , em que f (c)(i) = gc (i) = gi (c), para todo i ∈ I. Assim,

(pi ◦ f )(c) = pi (f (c)) = pi (gc ) = gi (c), ∀ i ∈ I,

58
Capítulo 2. Conjuntos

ou seja, pi ◦f = gi , para todo i ∈ I. Seja g : C → P outra função tal que pi ◦g = gi ,


para todo i ∈ I. Então, para um c ∈ C fixado temos, por definição de pi , que

g(c)(i) = pi (g(c)(i)) = (pi ◦ g)(c) = gi (c) = gc (i) = f (c)(i), ∀ i ∈ I.

Logo, g(c) = f (c), para todo c ∈ C. Portanto, g = f , ou seja, f é única.


(Unicidade) Sejam Q um conjunto e {hi : Q → Ai }i∈I uma família de funções
com a mesma propriedade universal. Então vamos primeiro considerar o diagrama
da Figura 2.3. No diagrama (a) fizemos C = Q e no diagrama (b) fizemos C = P .
Assim,
pi ◦ f = hi e hi ◦ g = pi , ∀ i ∈ I.
Logo,
pi = hi ◦ g = (pi ◦ f ) ◦ g = pi ◦ (f ◦ g), ∀ i ∈ I.
Mas, pela comutatividade do diagrama (c), temos que IP : P −→ P é a única
função tal que pi ◦ IP = pi , para todo i ∈ I. Portanto, f ◦ g = IP . Por um
argumento simétrico, prova-se que g ◦ f = IQ .

Figura 2.3: Visualização da unicidade do produto cartesiano.


Observação 2.30 Sejam {Ai }i∈I uma família de conjuntos, P = i∈I Ai e B um
conjunto não vazio qualquer. Pondo

F = {ϕ : B → P : ϕ é uma função}

um conjunto de funções e

S = {{ϕi }i∈I : ϕi é uma função de B em Ai }

um conjunto de “sequências.” Então:

59
2.4. Funções

1. F : F → S definida como F (ϕ) = {(pi ◦ ϕ)}i∈I é uma função, em que pi é


a i-ésima projeção de P sobre Ai .

2. G : S → F definida como G({ϕi }i∈I ) = ϕ é uma função, com ϕ(b) =


{ϕi (b)}i∈I , para todo b ∈ B.

Então é fácil verificar que F é bijetora com inversa G.

Sejam A e B conjuntos quaisquer. Já vimos que B A ou F(A, B) representa o


conjunto de todas as funções com domínio A e contradomínio B, isto é,

B A = {f : f é uma função de A em B}.

Neste caso, se f ∈ B A , então podemos escrever f como um gráfico

G = {(x, f (x)) : x ∈ A} ⊆ A × B.

Portanto, a função ϕ : A → G definida como ϕ(x) = (x, f (x)) é bijetora. Além


disso, se I, A são conjuntos e f : I → P(A) é uma função, então a imagem
Ai = f (i) é um subconjunto de A, para todo i ∈ I. Portanto, a função f pode ser
escrita como
f = {Ai : i ∈ I},
ou seja, f é uma família de conjuntos indexada por I.
No que segue vamos denotar o conjunto {0, 1} por 2. Sejam A um conjunto e B
um subconjunto de A. A função característica de B em A é a função χB : A → 2
definida como 
1, se x ∈ B
χB (x) =
0, se x ∈/B
é claro que χB = χC se, e somente se, B = C. Note que χA (x) = 1, para todo
x ∈ A, e χ∅ (x) = 0, para todo x ∈ A. Portanto, a função característica χB é
·
sobrejetora se, e somente se, B ∈/ {∅, A}, pois A = B ∪ (A − B) é uma união
disjunta. É importante observar que B = {x ∈ A : χB (x) = 1}.

Teorema 2.31 Se A é um conjunto não vazio qualquer, então existe uma correspon-
dência biunívoca entre 2A e P(A). Portanto, 2A é um conjunto, confira o axioma
ZF7 a seguir.

60
Capítulo 2. Conjuntos

Prova. Consideremos a função F : P(A) → 2A definida como

F (B) = χB : A → 2.

Note que ϕ está bem definida, pois dados B, C ∈ P(A),

B = C ⇒ χB = χC ⇒ F (B) = F (C).

A função F é injetora, pois dados B, C ∈ P(A),

F (B) = F (C) ⇒ χB = χC ⇒ {x ∈ A : χB (x) = 1}


= {x ∈ A : χC (x) = 1} ⇒ B = C.

Finalmente, a função F é sobrejetora, pois dado f ∈ 2A , existe um

B = f −1 (1) = {x ∈ A : f (x) = 1} ∈ P(A)

tal que f = χB = F (B). Neste caso, a função G : 2A → P(A) definida como


G(f ) = f −1 (1) = {x ∈ A : f (x) = 1} é a inversa de F .

Observação 2.32 Se A = Z+ , então a função F : P(A) → 2A do Teorema 2.31 é


definida como

1, se n ∈ B
F (B) = (xn )n∈Z+ , em que xn =
0, se n ∈
/ B.

Note que se A é um conjunto qualquer, então, pelo Axioma ZF6 , P(A) é um


conjunto, e novamente P(P(A)) é um conjunto, e assim sucessivamente. Portanto,
é intuitivamente razoável, considerarmos o conjunto

{A, P(A), P(P(A)), . . .}.

Mas, não existe um modo de provarmos dos axiomas acima que existe um conjunto
com esses elementos. Neste caso, a inadequação dos axiomas, vista por Fraenkel em
1922 e outros, foi porque eles não permitiram construir conjuntos com a seguinte
propriedade: se B é um conjunto qualquer e todo elemento de B for substituído
por um objeto de um domínio qualquer A, então B continua sendo um conjunto ou,
equivalentemente, se alguma regra f , quando aplicada ao conjunto A, tem a “cara”

61
2.4. Funções

de uma função, então existe um conjunto f (x). Mais precisamente temos o seguinte
axioma.

ZF7 - Axioma da substituição. Seja P (x, y) a seguinte afirmação: para qual-


quer x existe um único y tal que P (x, y) é verdadeira. Então, para qualquer con-
junto A, existe um conjunto B tal que, para qualquer x ∈ A, existe um y ∈ B para
que P (x, y) seja verdadeira.

Observação 2.33 O axioma ZF7 completa a parte essencial e básica para o estudo
da teoria dos conjuntos e da matemática em geral.

1. O axioma ZF7 é equivalente a: para qualquer conjunto A, existe uma função


f : A → C tal que f (A) é um conjunto, ou seja, a partir de um conjunto
velho A criamos um conjunto novo f (A). Note que

f (x) = {y ∈ B : P (x, y) é verdadeira}.

Em particular, a função f : N → C definida como f (1) = A e f (n) =


P n−1 (A) implica que Im(f ) = {A, P(A), P(P(A)), . . .} é um conjunto.

2. Se {Ai }i∈I é uma família de conjuntos, então a função

f : I → {Ai : i ∈ I} = {Ai }i∈I

definida como f (i) = Ai é sobrejetora. Logo, pelo axioma ZF7 , {Ai }i∈I é
um conjunto. Portanto, pelo axioma ZF5 , ∪i∈I Ai é um conjunto.

3. Se I, A são conjuntos e f : I → A é uma função, então, pelo axioma ZF4 ,


f é um conjunto, pois f é uma subclasse de I × A. Isto mostra que nossa
definição de função é legítima.

Teorema 2.34 Seja {Ai }i∈I uma família de conjuntos. Então P = i∈I Ai é um
conjunto.

Prova. Note, pelo item (3) da Observação 2.33, que f : I → ∪i∈I Ai é um conjunto.

Como i∈I Ai ⊆ P (I × ∪i∈I A) temos, pelos axiomas ZF6 e ZF4 , que i∈I Ai é
um conjunto.

62
Capítulo 2. Conjuntos

Teorema 2.35 Sejam {Ai }i∈I uma família de conjuntos, A = ∪i∈I Ai e {fi : Ai →
B}i∈I uma família de funções tais que

fi |(Ai ∩Aj ) = fj |(Ai ∩Aj ) , ∀ i, j ∈ I.

Então existe uma única função f : A → B tal que f |Ai = fi , para todo i ∈ I.
Neste caso, diremos que {fi : Ai → B}i∈I é uma família compatível de funções.

Prova. (Existência) Seja f = ∪i∈I fi . Se (x, y1 ) ∈ f e (x, y2 ) ∈ f , então existem


i, j ∈ I tais que (x, y1 ) ∈ fi e (x, y2 ) ∈ fj . Logo, x ∈ Ai e y1 = fi (x), x ∈ Aj e
y2 = fj (x). Como x ∈ Ai ∩ Aj temos que y1 = fi (x) = fj (x) = y2 . Finalmente,
dado x ∈ A, existe um i ∈ I tal que x ∈ Ai = Dom(fi ). Logo, x ∈ ∪i∈I Dom(fi ).
Por outro lado, se x ∈ ∪i∈I Dom(fi ), então existe um i ∈ I tal que x ∈ Dom(fi ) =
Ai . Logo, x ∈ A. Portanto, f : A → B é uma função tal que f |Ai = fi , para todo
i ∈ I.
(Unicidade) Seja g : A → B outra função tal que g|Ai = fi , para todo i ∈ I.
Então, dado x ∈ A, existe um i ∈ I tal que x ∈ Ai . Logo, g(x) = fi (x) = f (x).
Portanto, f = g.

Sejam A um conjunto e {Ai }i∈I uma família de subconjuntos não vazios de A.


Diremos que ela é uma partição de A se os seguintes axiomas são satisfeitas:

1. A = ∪i∈I Ai .

2. Ai ∩ Aj = ∅ ou Ai = Aj , para todos i, j ∈ I.

Corolário 2.36 Se A é um conjunto, {Ai }i∈I é uma partição de A e existe uma


função fi : Ai → B, para todo i ∈ I, então existe uma única função f : A → B tal
que f |Ai = fi , para todo i ∈ I.

Prova. Basta observar que Ai ∩ Aj = ∅ ou Ai = Aj , para todos i, j ∈ I, implica


que
fi |(Ai ∩Aj ) = fj |(Ai ∩Aj ) .
Enão o resultado segue do Teorema 2.35.

63
2.4. Funções

Exercícios
1. Sejam A, B conjuntos, f : A → B uma função, {Ci }i∈I uma família de
subconjuntos de A e {Di }i∈I uma família de subconjuntos de B.

(a) Mostre que f (∪i∈I Ci ) = ∪i∈I f (Ci ).


(b) Mostre que f −1 (∪i∈I Di ) = ∪i∈I f −1 (Di ).
(c) Mostre que f −1 (∩i∈I Di ) = ∩i∈I f −1 (Di ).
(d) Mostre que f (∩i∈I Ci ) ⊆ ∩i∈I f (Ci ). Mostre que se f é injetora, então
ocorre a igualdade.
n
2. Sejam {An }n∈N uma sequência de conjuntos e Bn = i=1 Ai . Mostre que

An = A1 ∪ (An+1 − Bn )
n∈N n∈N

é uma união disjunta.

3. Sejam {Ai }i∈I e {Bi }i∈I duas famílias tais que Bi ⊆ Ai , para todo i ∈ I.

Mostre que i∈I Bi ⊆ i∈I Ai .

4. Sejam {Ai }i∈I e {Bi }i∈I duas famílias tais que Ai ⊆ Bi , para todo i ∈ I.

Mostre que i∈I Ai = ∩i∈I p−1i (Ai ), em que pi é a i-ésima projeção de B =

i∈I Bi sobre Bi .

5. Seja A um conjunto. Diremos que uma família {Ai }i∈I é uma cobertura de
A se A ⊆ ∪i∈I Ai . Sejam {Ai }i∈I e {Bj }j∈J duas coberturas distintas de A.
Mostre que a família {Ai ∩ Bj }(i,j)∈I×J é uma cobertura de A.

6. Sejam {Ai }i∈I e {Bj }j∈J partições de A e B, respectivamente. Mostre que a


família {Ai × Bj }(i,j)∈I×J é uma partição de A × B.

7. Sejam f : A → B uma função sobrejetora e {Bj }j∈J uma partição de B.


Mostre que {f −1 (Bj )}j∈J é uma partição de A.

8. Sejam f : A → B uma função injetora e {Ai }i∈I uma partição de A. Mostre


que {f (Ai )}i∈I é uma partição de f (A).

64
Capítulo 2. Conjuntos

9. Mostre que o axioma ZF2 é uma consequência do axioma ZF7 . Assim, o


axioma ZF2 pode ser agora eliminado.

10. Mostre que o axioma ZF3 é uma consequência do axioma ZF7 . Assim, o
axioma ZF3 pode ser agora eliminado.

11. Sejam A e B conjuntos. Use o axioma ZF7 para mostrar que A × B é um


conjunto.

12. Sejam A e B conjuntos. Mostre que a família B A é um conjunto.

13. Sejam A, B e C conjuntos.

(a) Mostre que AC ∪ B C ⊆ (A ∪ B)C .


(b) Mostre que AC ∩ B C = (A ∩ B)C .
(c) Mostre que AC − B C = (A − B)C .

14. Seja f : A → B uma função sobrejetora. Dados x, y ∈ A, definimos xRy


se, e somente se, f (x) = f (y) ou R = f −1 ◦ f . Mostre que R é uma relação
de equivalência sobre A, cujas classes de equivalências x são as imagens
inversas de f . Além disso, mostre que se RA = {x : x ∈ A}, então a função
g : RA → B definida como g(x) = f (x) é bijetora e f = g ◦ π, em que
π : A → RA é a função definida como π(x) = x. A relação R chama-se o
núcleo de f .

15. Sejam f : A → A uma função e R uma relação de equivalência sobre A


determinada por f . Mostre que f ◦ f = f se, e somente se, y ∈ x implica que
f (y) ∈ x, para todos x, y ∈ A.

16. Seja A = NN . Dados f, g ∈ A, definimos

f ∼ g ⇔ S = {n ∈ N : f (n) = g(n)}

é um conjunto finito. Mostre que ∼ é uma relação de equivalência sobre A.

17. Seja {Ri }i∈I uma família de relações de equivalência sobre A. Mostre que
∩i∈I Ri é uma relação de equivalência sobre A.

65
2.4. Funções

18. Seja A ⊆ B fixado. Dados X, Y ∈ P(B), definimos XRY se, e somente se,
A ∩ X = A ∩ Y . Mostre que R é uma relação de equivalência sobre P(B).

19. Sejam A um conjunto e para cada subconjunto B ⊆ A a função característica


de B em A, χB : A → 2. Mostre que:

(a) χB∩C = χB · χC , para todos B, C ⊆ A.


(b) χB∪C = χB + χC − χB · χC , para todos B, C ⊆ A.
(c) χB∪C = χB + χC se, e somente se, B ∩ C = ∅, para todos B, C ⊆ A.
(d) χA−B = 1 − χB , para todo B ⊆ A.
(e) B ⊆ C ⇔ χB ≤ χC , para todos B, C ⊆ A.

20. Sejam {Ai }i∈I uma família, com I = ∅, e f : J → I uma função sobrejetora.

(a) Mostre que ∪j∈J Af (j) = ∪i∈I Ai .


(b) Mostre que ∩j∈J Af (j) = ∩i∈I Ai .

21. Seja f : A → B uma função, com A um conjunto não vazio. Mostre que:
f : A → B é injetora se, e somente se, existir uma função g : B → A tal que
g ◦ f = IA . A função g chama-se retração de f .

22. Seja f : N → N definida como f (n) = n + 1. Mostre que existem infinitas


funções g : N → N tais que g ◦ f = IN , mas não existe inversa à direita.

23. Seja f : A → B uma função. Mostre que: f : A → B é sobrejetora se, e


somente se, existir uma função g : B → A tal que f ◦ g = IB . A função g
chama-se seção de f .

24. Seja f : N → N definida como f (n) = n2 se n é par e f (n) = n+1 2


se n é
ímpar. Mostre que existem infinitas funções g : N → N tais que f ◦ g = IN ,
mas não existe inversa à esquerda.

25. Seja I = ] − 1, 1[ um intervalo aberto de R.

(a) Mostre que a função f : I → R definida como


x
f (x) =
1 − x2
é bijetora. Defina sua inversa.

66
Capítulo 2. Conjuntos

(b) Mostre que a função f : I → R definida como


x
f (x) =
1 − |x|

é bijetora. Defina sua inversa.


(c) Mostre que a função f : R → I definida como
x
f (x) = √
1 + x2
é bijetora. Defina sua inversa.
(d) Mostre que a função f : I → R definida como f (x) = tan( πx
2

bijetora. Defina sua inversa.

26. Sejam g : B → C e h : B → C duas funções. Mostre que se g ◦ f = h ◦ f ,


para qualquer função f : A → B, então g = h.

27. Sejam g : A → B e h : A → B duas funções. Mostre que se C é um


conjunto com pelo menos dois elementos e f ◦ g = f ◦ h, para qualquer
função f : B → C, então g = h.

28. Mostre que as seguintes afirmações são equivalentes:

(a) f : A → B é sobrejetora;
(b) Para todas as funções g, h : B → C, g ◦ f = h ◦ f implica que g = h;
(c) Para qualquer subconjunto X ⊆ A, B − f (X) ⊆ f (A − X).

29. Mostre que as seguintes afirmações são equivalentes:

(a) f : A → B é injetora;
(b) Para todas as funções g, h : C → A, f ◦ g = f ◦ h implica que g = h;
(c) Para qualquer subconjunto X ⊆ A, f (A − X) ⊆ B − f (X).

30. Sejam f : A → B, g : B → A duas funções e X ⊆ A, Y ⊆ B.

(a) Mostre que (g ◦ f ) |X = g ◦ (f |X ).


(b) Mostre que (f |X )−1 (Y ) = X ∩ f −1 (Y ).

67
2.4. Funções

31. Sejam f : A → C e g : A → B duas funções. Mostre que existe uma função


h : B → C tal que f = h ◦ g se, e somente se,

g(x) = g(y) ⇒ f (x) = f (y), ∀ x, y ∈ A.

Conclua que h é única.

32. Sejam f : C → A e g : B → A duas funções, com g bijetora. Mostre


que existe uma função h : C → B tal que f = g ◦ h se, e somente se,
Im(f ) ⊆ Im(g). Conclua que h é única.

33. Seja f : Z → Z uma função que preserva as operações Z, ou seja, tal que:

(a) f (x + y) = f (x) + f (y), para todos x, y ∈ Z.


(b) f (x · y) = f (x) · f (y), para todos x, y ∈ Z.

Mostre que f = IZ ou f = 0.

34. Seja f : Q → Q uma função que preserva as operações Q, ou seja, tal que:

(a) f (x + y) = f (x) + f (y), para todos x, y ∈ Q.


(b) f (x · y) = f (x) · f (y), para todos x, y ∈ Q.

Mostre que f = IQ ou f = 0.

35. Seja f : A → A uma função injetora e f (A) = A. Mostre que os conjuntos

f (A − f (A)), f 2 (A − f (A)) = f (f (A − f (A))), f 3 (A − f (A)) . . .

são mutualmente disjuntos. Conclua que se x ∈ A − f (A), então x, f (x),


f (f (x)) . . . são mutualmente distintos.

36. Seja f : A → A uma função injetora, com A um conjunto finito. Mostre que
f é sobrejetora.

68
CAPÍTULO 3

CONJUNTOS PARCIALMENTE ORDENADOS

Com os conhecimentos dos axiomas essenciais e básicos da Teoria dos Conjun-


tos estudaremos os problemas de aplicações ordinárias de matemática tais como:
relação de ordem, conjuntos parcialmente ordenados, elementos maximais e mi-
nimais, maior e menor elemento, supremo e ínfimo de um conjunto. Além disso,
estudaremos reticulados e conjuntos bem ordenados.
Já vimos que a ideia intuitiva de uma “coleção ordenada de elementos” era signi-
ficativa para qualquer coleção A quando A era um conjunto. Neste capítulo, porém,
estaremos interessados nos conceitos formais de conjuntos parcialmente ordenados
e suas consequências.
Da mesma forma que o conjunto de todos os números reais é o modelo para
todos os conceitos nos cursos de Análise Real, o conceito de conjuntos parcialmente
ordenados pode ser utilizado como eficiente ferramenta de modelagem em diversas
situações-problema, principalmente aquelas que possuem como objetivo a limitação
de determinados conjuntos. Vejamos um exemplo de uma situação dessa natureza.
Mostraremos a Princípio de Arquimedes:1
Provaremos, no Capítulo 8, que o conjunto dos números reais R, com a ordem
usual, é “completo”. Dados a, b ∈ R, com a > 0, existe um n ∈ Z tal que na > b.
Em bem pouco tempo estaremos aptos a efetuar os cálculos necessários à ob-
tenção da resposta a essa questão.

Archimedes de Syracuse, 287 a.C.-212 a.C., matemático, físico, engenheiro, inventor e astrô-
1

nomo grego.

69
3.1. Conjuntos Ordenados

3.1 Conjuntos Ordenados


É importante lembrarmos que uma relação R é qualquer conjuntos de pares
ordenado.
Seja A um conjunto. Diremos que uma relação ≤ sobre A é uma pré-ordem se
os seguintes axiomas são satisfeitos:

1. x ≤ x, para todo x ∈ A. (reflexividade)

2. Se x ≤ y e y ≤ z, então x ≤ z, para todos x, y, z ∈ A. (transitividade)

Se uma pré-ordem ≤ sobre A satisfaz o axioma:

3. Se x ≤ y e y ≤ x, então x = y, para todos x, y ∈ A, (antissimétrica)


diremos que ≤ é uma ordem (parcial) sobre A.

Se uma ordem ≤ sobre A satisfaz o axioma:

4. x ≤ y ou y ≤ x, para todos x, y ∈ A, (x e y são comparáveis)


diremos que ≤ é uma ordem total (ou ordem linear) sobre A.

5. Diremos que uma ordem ≤ sobre A é uma ordem densa se, e somente se,
dados x, z ∈ A, x ≤ z implica que x ≤ y e y ≤ z, para algum y ∈ A.

Observe que os axiomas (1) e (3) são equivalentes ao axioma (1 ) x ≤ y e y ≤ x


se, e somente se, x = y, para todos x, y ∈ A. O axioma (4) é equivalente ao axioma
(4 ) existe um z ∈ A tal que z ≤ x e z ≤ y.
Notações e terminologias:

• y ≥ x significa que x ≤ y.

• x < y significa que x ≤ y e x = y.

• y > x significa que x < y.

A notação x ≤ y lê-se “x é menor do que ou igual a y ou x precede y ou y segue


x.”

Exemplo 3.1 Seja A um conjunto qualquer. Dados a, b ∈ A, definimos a ≤ b se, e


somente se, a = b. Então ≤ é uma ordem sobre A.

70
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Exemplo 3.2 Para quaisquer r, s ∈ Q, diremos que r divide s em Q se existir um


n ∈ Z tal que s = nr. Dados r, s ∈ Q, definimos r ≤ s se, e somente se, r
divide s. Note que se r = 0, então r divide s significa que s · r−1 ∈ Z. Então ≤ é
claramente uma pré-ordem sobre Q, mas não é uma ordem, pois r ≤ −r e −r ≤ r,
com r = −r. Outro exemplo, dados z, w ∈ C, definimos z  w se, e somente se,
|z| ≤ |w|. Então  é uma pré-ordem sobre C, mas não é uma ordem.

Exemplo 3.3 Seja Z+ = {0, 1, 2, 3, . . .} o conjunto de todos os números inteiros


positivos. Dados m, n ∈ Z+ , definimos m  n se, e somente se, m divide n. Mostre
que  é uma ordem sobre Z+ .

Solução. Dados k, m, n ∈ Z+ . É claro que k  k, pois k = 1 · k. Se k  m e


m  k, então k divide m e m divide k. Logo, em relação a ordem usual de Z+ ,
obtemos k ≤ m e m ≤ k. Assim, k = m. Finalmente, se k  m e m  n, então
existem r, s ∈ Z+ tais que m = rk e n = sm. Logo,

n = sm = s(rk) = (rs)k,

ou seja, k  n. Portanto,  é uma ordem sobre Z+ .

Um conjunto parcialmente ordenado - poset (partially ordered set) é um con-


junto A munido de uma ordem ≤ (R), em símbolos, o par ordenado

(A, ≤) ou (A, R).

Observe que ≤, R ∈ P(A × A), ou seja, ≤ é um conjunto.


Sejam A um poset e B um subconjunto de A. Então A induz uma ordem sobre
B do seguinte modo:

∀ x, y ∈ B [x ≤ y ⇔ x ≤ y sobre A].

Ou, equivalentemente, se R é uma ordem sobre A, então

R0 = R ∩ (B × B) = {(x, y) : x, y ∈ B e xRy} = R|B

é uma ordem sobre B. Neste caso, diremos que R0 é a ordem induzida por R.
Sejam A um poset e B um subconjunto de A. Diremos que B é um subconjunto
totalmente ordenado ou uma cadeia de A se a ordem induzida por A for total. Em

71
3.1. Conjuntos Ordenados

particular, se quaisquer dois elementos de A são comparáveis, isto é, x ≤ y ou


x ≥ y, para todos x, y ∈ A, diremos que A é um conjunto totalmente ordenado ou
um conjunto ordenado linearmente. Assim, um conjunto A é totalmente ordenado
se uma e apenas uma das condições ocorre:

∀ x, y ∈ A [x < y, x = y ou x > y],

ou seja, A satisfaz a Lei da Tricotomia. Note que se em um poset (A, ≤) nenhum


par de elementos é comparável, então ≤ é a igualdade.

Observação 3.4 O conjunto de todos os números reais R, com a ordem usual, é


totalmente ordenado. Consequentemente, os subconjuntos N, Z e Q, com a ordem
induzida, são totalmente ordenados. Note que C = R − Q é uma cadeia em R. Em
particular, se N é munido com a ordem r divide s em N, então o conjunto

{20 , 21 , 22 , . . . , 2n−1 , . . .}

é uma cadeia de N (prove isto!).

Exemplo 3.5 Sejam A um conjunto qualquer com pelo menos dois elementos e
P(A) o conjunto das potências de A. Dados X, Y ∈ P(A), definimos X ≤ Y se, e
somente se, X ⊆ Y . Mostre que ≤ é uma ordem sobre P(A) e chama-se ordenação
pela inclusão. Note que esta ordem não é total. No entanto, se C é uma cadeia de
P(A), digamos

C = {X1 , X1 ∪ X2 , . . . , X1 ∪ · · · ∪ Xn , . . .},

então X ⊆ Y ou Y ⊆ X, para todos X, Y ∈ C.

Solução. Para provar que ≤ é uma ordem, confira o Teorema 2.1. Finalmente,
se X = {x} ∈ P(A) e Y = {y} ∈ P(A), com x = y, então X e Y não são
comparáveis. Portanto, ≤ não é uma ordem total sobre P(A).

Observe que se A é um conjunto e E é o conjunto de todas as relações de


equivalência sobre A, então E é um poset com a ordem induzida por P(A × A).

Exemplo 3.6 Sejam A e B dois posets disjuntos. Mostre que A ∪ B é um poset,

72
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

com a seguinte ordenação: dados x, y ∈ A ∪ B, definimos



⎨ x, y ∈ A e x ≤A y ou
xy⇔ x, y ∈ B e x ≤B y ou

x ∈ A e y ∈ B.

Por exemplo, x  x, para todo x ∈ A ∪ B, pois x ∈ A ou x ∈ B implica que


x ≤A x ou x ≤B x.

Sejam A um poset e a, b ∈ A fixados. O segmento inicial ou o intervalo aberto


não limitado à esquerda de A determinado por a é o conjunto

Sa = {x ∈ A : x < a}.

Note que Sa = A. O segmento final ou o intervalo aberto não limitado à direita de


A determinado por a é o conjunto

S a = {x ∈ A : a < x}.

O intervalo aberto de A determinado por a e b é o conjunto

]a, b[ = {x ∈ A : a < x < b} = S a ∩ Sb .

O intervalo fechado de A determinado por a e b é o conjunto

[a, b] = {x ∈ A : a ≤ x ≤ b}.

Exemplo 3.7 Sejam N munido com a ordem usual. Então Sn = {k ∈ N : k < n}


e S n = {n + k : k ∈ N}. Em particular, S1 = ∅ e S 0 = N.

Teorema 3.8 Seja A um poset. Se P é um segmento inicial de A e Q é um segmento


inicial de P , então Q é um segmento inicial de A.

Prova. Por hipótese, existe um a ∈ A e b ∈ P tal que

P = {x ∈ A : x < a} e Q = {y ∈ P : y < b}.

Seja Sb = {x ∈ A : x < b}. Então, por definição, Sb é um segmento inicial de A.


Afirmação. Q = Sb

73
3.1. Conjuntos Ordenados

De fato, é claro que Q ⊆ Sb . Por outro lado, se x ∈ Sb , então x ∈ A e x < b. Como


b ∈ P temos que x ∈ P , pois b < a. Assim, x ∈ Q, pois x < b e x ∈ P . Portanto,
Sb ⊆ Q.

Seja A um poset. Um corte (cut) de A é um par ordenado (E, D) de subconjun-


tos não vazios de A com as seguintes propriedades:

1. E ∩ D = ∅ e E ∪ D = A.

2. Se a ∈ E e x ≤ a, então x ∈ E.

3. Se a ∈ D e a ≤ x, então x ∈ D.

Exemplo 3.9 Seja Q munido com a ordem usual. Mostre que o par

E = {x ∈ Q : x ≤ 0 ou [x > 0 e x2 < 2]} e D = {x ∈ Q : x > 0 e x2 > 2}

é um corte de Q. Note que D = Q − E.

Solução. É fácil verificar que E, D são subconjuntos não vazios de Q, E ∩ D = ∅


e E ∪ D = Q. Suponhamos que a ∈ E e x ≤ a. Então há dois casos a serem
considerados: se x ≤ 0, então automaticamente x ∈ E. Se x > 0, então a2 −x2 ≥ 0,
pois
a2 − x2 = (a − x)(a + x) ≥ 0.
Assim, x2 ≤ a2 < 2. Logo, x ∈ E. Portanto, em qualquer caso, x ∈ E. De modo
inteiramente análogo, prova-se o item (3)

Seja A um poset. Diremos que A é um poset finito se o conjunto A for “finito”.


A cardinalidade do conjunto A chama-se comprimento do poset.
Seja A um poset finito. Um diagrama de linha ou um diagrama de Hasse2 para
A é um diagrama em que os elementos de A são representados por vértices e as
comparações entre dois elementos a, b ∈ A são representadas por arestas, com a
seguinte convenção: um elemento a está abaixo de um elemento b se, e somente se,
a < b e não existe um c ∈ A − {a, b} tal que a < c < b.

Exemplo 3.10 Sejam A = {a, b, c, d, e, f } e B = {1, 2, 3, 4, 5, 6} dois conjuntos


ordenados pelos diagramas de Hasse, confira Figura 3.1 Então:
2
Helmut Hasse, 1898-1979, matemático alemão.

74
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

1. Os subconjuntos {a, b, c} e {a, b, e, f } são cadeias de A, pois quaisquer dois


elementos são comparáveis. Enquanto, o subconjunto {1, 2, 3, 4, 6} não é
uma cadeia de B, por exemplo, 2 e 3 não são comparáveis.

2. Note que Se = {a, b, d} é um segmento inicial de A. Enquanto, S5 = {1} é


um segmento inicial de B.

3. Se E = {a, b, c} e D = {d, e, f }, então (E, D) é um corte de A.

Figura 3.1: Diagramas de Hasse.

Exemplo 3.11 (Poset Coroa) Seja A = {1, 2, 3, . . . , 2n}, com n > 1, um con-
junto. Dado a ∈ A, definimos

a ≤ a + n e a + 1 ≤ a + n, ∀ a ∈ {1, 2, . . . , n − 1}, n ≤ 2n e 1 ≤ 2n.

Note que A é um poset, mas não é totalmente ordenado. Confira diagrama de Hasse
dado pela Figura 3.2 (b), com n = 5.

Figura 3.2: Diagrama de Hasse.

75
3.1. Conjuntos Ordenados

Exercícios
1. Seja A um conjunto. Mostre que se R é uma relação de ordem sobre A, então
a relação de ordem simples E sobre A, isto é, (x, x) ∈
/ E, para todo x ∈ A,
(irreflexiva) possui as seguintes propriedades:

(a) Se xEy e yEz, então xEz, para todos x, y, z ∈ A.


(b) No máximo uma das condições ocorre: xEy ou x = y ou yEx. (assi-
métrica)

Reciprocamente, mostre se E é uma relação sobre A satisfazendo às propri-


edades (a) e (b), então uma relação de ordem sobre A é definida como xRy
se, e somente se, xEy ou x = y. Conclua que a função ϕ(E) = E ∪ D, com
D = {(x, x) : x ∈ A} a diagonal de A, é uma correspondência biunívoca
entre as ordens R e E sobre A, com inversa ψ(R) = R − D

2. Sejam A, B dois conjuntos e C o conjunto de todos os pares (X, f ), onde


X ⊆ A e f : X → B é uma função. Dados (X, f ), (Y, g) ∈ C, definimos

(X, f ) ≤ (Y, g) ⇔ X ⊆ Y e f (x) = g(x), ∀ x ∈ X (f = g|X ).

Mostre que ≤ é uma ordem sobre C.

3. Sejam A e B dois posets. Dados (a, b), (c, d) ∈ A × B, definimos (a, b) 


(c, d) se, e somente se, a < c ou a = c e b ≤ d. Mostre que  é uma ordem
sobre A × B e chama-se ordem lexicográfica.

4. Seja A = {(a, b) ∈ R2 : b ≤ 0}. Dados (a, b), (c, d) ∈ A, definimos


(a, b) ≤ (c, d) se, e somente se, a = c e b ≤ d. Mostre que ≤ é uma
ordem sobre A.

5. Seja f : N × N → N uma função injetora. Dados (a, b), (c, d) ∈ N × N,


definimos (a, b)  (c, d) se, e somente se, f (a, b) ≤ f (c, d). Mostre que  é
uma ordem sobre N × N.

6. Seja {Ri }i∈I uma família de ordens sobre A. Mostre que ∩i∈I Ri é uma
ordem sobre A.

76
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

7. Sejam A, B dois posets e F = {f : A → B : f é uma função}. Dados


f, g ∈ F, definimos f  g se, e somente se, f (x) ≤ g(x), para todo x ∈ A.
Mostre que  é uma ordem sobre F que não é total. Em particular, se A =
B = R e F é o conjunto de todas as funções “contínuas”, então  significa
que o gráfico de g nunca fica abaixo do gráfico de f .

8. Sejam I = {1, 2, . . . , n} e conjunto Mn (R) das matrizes n × n e veremos


uma matriz A = [aij ] como uma função f : I × I → R definida como
f (i, j) = aij . Mostre que A  B se, e somente se, aij ≤ bij , para todo
(i, j) ∈ I × I, é uma ordem sobre Mn (R).

9. Sejam A e B dois posets. Dados (a, b), (c, d) ∈ A × B, definimos (a, b) 


(c, d) se, e somente se, b < d ou b = d e a ≤ c. Mostre que  é uma ordem
sobre A × B e chama-se ordem antilexicográfica.

10. Sejam A, B dois posets e C, D cadeias de A e B, respectivamente. Mostre


que se A × B é ordenado lexicograficamente, então C × D é uma cadeia de
A × B.

11. Sejam A, B dois posets e A × B ordenado antilexicograficamente. Mostre


que se (E, D) é um corte de B, então (A × E, A × D) é um corte de A × B.

12. Sejam A um conjunto não vazio e P(A) o conjunto das potências de A. Dados
X, Y ∈ P(A), definimos X ≤ Y se, e somente se, Y ⊆ X. Mostre que ≤ é
uma ordem sobre P(A) e chama-se de ordem inversa.

13. Dados r = a · b−1 , s = c · d−1 ∈ Q, definimos r  s se, e somente se, ad ≤ bc


e b, d ∈ N. Mostre que  é uma ordem total sobre Q.

14. Seja {Ai }i∈I uma família de posets. Dados f = (ai ), g = (bi ) ∈ P =

i∈I Ai , definimos f  g se, e somente se, ai ≤ bi , para todo i ∈ I. Mostre
que  é uma ordem cartesiana sobre P .

15. Sejam I um conjunto totalmente ordenado, {Ai }i∈I uma família de conjuntos
totalmente ordenados disjuntos aos pares. Neste caso, diremos que {Ai }i∈I é
uma família totalmente ordenada. Seja A = ∪i∈I Ai . Dados a, b ∈ A, existem
únicos i, j ∈ I tais que a ∈ Ai e b ∈ Aj , definimos [a  b, se i < j] e [a ≤ b
sobre Ai , se i = j]. Mostre que  é uma ordem total sobre A.

77
3.2. Isomorfismos

3.2 Isomorfismos
É importante lembrar que todos os resultados sobre funções vistos no curso de
Matemática Elementar podem ser usados em tudo que segue.
Sejam A, B dois posets e f : A → B uma função. Diremos que f é crescente
ou preserva ordem se

∀ x, y ∈ A [x ≤ y ⇒ f (x) ≤ f (y)],

e f é decrescente ou inverte ordem se

∀ x, y ∈ A [x ≤ y ⇒ f (x) ≥ f (y)].

Por exemplo, se A um conjunto não vazio e B ⊆ A, então a função fB : P(A) →


P(A) definida como
fB (X) = B ∩ X
preserva ordem. Enquanto, a função λA : P(A) → P(A) definida como

λA (X) = A − X

inverte ordem e λA ◦ λA = IA .
Sejam A, B dois poset e f : A → B uma função. Diremos que f é estritamente
crescente se
∀ x, y ∈ A [x < y ⇒ f (x) < f (y)].
e f é um isomorfismo se f é bijetora e

∀ x, y ∈ A [x ≤ y ⇔ f (x) ≤ f (y)].

Exemplo 3.12 Sejam R munido com a ordem usual e a, b ∈ R fixados, com a = 0.


1. Mostre que se a > 0, então a função f : R → R definida como f (x) = ax + b
é um isomorfismo.

2. Mostre que se a < 0, então a função f : R → R definida como f (x) = ax + b


não é um isomorfismo.
Solução. Dados x, y ∈ R, se f (x) = f (y), então ax + b = ay + b implica que
ax = ay, ou seja, x = y, pois a = 0. Logo, f é injetora. Para provar que f é

78
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

sobrejetora, dado y ∈ R, devemos resolver a equação y = f (x) para obter x como


função de y, ou seja,
y = ax + b ⇔ x = a−1 (y − b).
Assim, dado y ∈ R, existe x = a−1 (y − b) ∈ R tal que y = f (x). Portanto, f é
bijetora.
(1) Se a > 0, então

∀ x, y ∈ R [x ≤ y ⇔ ax ≤ ay ⇔ ax + b ≤ ay + b ⇔ f (x) ≤ f (y)],

ou seja, f preserva ordem. Portanto, f é um isomorfismo.


(2) Se a < 0, então

∀ x, y ∈ R [x ≤ y ⇔ ax ≥ ay ⇔ ax + b ≥ ay + b ⇔ f (x) ≥ f (y)],

ou seja, f inverte ordem. Portanto, f não é um isomorfismo. No entanto, f é


bijetora.

Exemplo 3.13 Sejam A = {n ∈ N : n ≥ 2}, ordenado por m ≤ n se, e somente


se, m divide n e B = {n ∈ N : n ≥ 2}, com a ordem usual induzida por N. Então
a função f : A → B definida como f (x) = x claramente preserva ordem, mas não
é um isomorfismo, pois f (3) < f (5), sem 3 dividir 5.

Teorema 3.14 Sejam A, B dois posets e f : A → B uma função. Então f é um


isomorfismo se, e somente se, f é sobrejetora e

∀ x, y ∈ A [x ≤ y ⇔ f (x) ≤ f (y)].

Prova. Dados x, y ∈ A, se f (x) = f (y), então f (x) ≤ f (y) implica que x ≤ y e


f (x) ≥ f (y) implica que x ≥ y. Portanto, x = y e f é injetora. Consequentemente
f é um isomorfismo.

Proposição 3.15 Sejam A, B dois posets e f : A → B uma função. Se f é um


isomorfismo, então

∀ x, y ∈ A [x < y ⇔ f (x) < f (y)].

Prova. Dados x, y ∈ A, se x < y, então x ≤ y. Assim, por hipótese, f (x) ≤ f (y).

79
3.2. Isomorfismos

Portanto, f (x) < f (y), pois se f (x) = f (y), então, pela injetividade de f , x = y, o
que é impossível.
Reciprocamente, se f (x) < f (y), então f (x) ≤ f (y). Logo, por hipótese, x ≤
y. Portanto, x < y, pois se x = y, então, pela definição de função, f (x) = f (y), o
que é impossível.

Teorema 3.16 Sejam A, B dois posets e f : A → B uma função bijetora. Então f


é um isomorfismo se, e somente se, f e f −1 são crescentes.

Prova. Note que como f é bijetora temos que

∀ x ∈ A [(f −1 ◦ f )(x) = x].

Dados z, w ∈ B, existem únicos x, y ∈ A tais que z = f (x) e w = f (y). Assim,


por hipótese, z ≤ w se, e somente se, x ≤ y. Logo,

(f −1 ◦ f )(x) = x ≤ y = (f −1 ◦ f )(y) ⇒ f −1 (z) ≤ f −1 (w).

Portanto, f −1 é crescente.
Reciprocamente, como f é crescente temos que

∀ x, y ∈ A [x ≤ y ⇒ f (x) ≤ f (y)].

Por outro lado, sendo f −1 crescente, obtemos

f (x) ≤ f (y) ⇒ f −1 (f (x)) ≤ f −1 (f (y))


⇒ x = (f −1 ◦ f )(x) ≤ (f −1 ◦ f )(y) = y.

Portanto, f é um isomorfismo.

Teorema 3.17 Sejam A, B e C três posets. Então:

1. IA : A → A é um isomorfismo.

2. Se f : A → B é um isomorfismo, então f −1 : B → A é um isomorfismo.

3. Se f : A → B e g : B → C são isomorfismos, então g ◦ f : A → C é um


isomorfismo.

80
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Prova. Vamos provar apenas o item (3). É claro que g ◦ f é uma função bijetora.
Note, para quaisquer x, y ∈ A, que

[x ≤ y ⇔ f (x) ≤ f (y) ⇔ g(f (x)) ≤ g(f (y)) ⇔ (g ◦ f )(x) ≤ (g ◦ f )(y)].

Portanto, g ◦ f é um isomorfismo.

Sejam A, B dois poset. Diremos que A e B são isomorfos ou ordem isomorfos


se existir um isomorfismo f : A → B e denotaremos por A  B ou A 0 B. O
Teorema 3.17 prova que a relação de ser isomorfo é uma relação de equivalência.
Note que os conjuntos A e B dados no Exemplo 3.10, não são isomorfos, pois
eles possuem diagramas de Hasse diferentes. No entanto, é fácil exibir uma cor-
respondência biunívoca entre eles. Portanto, é pertinente lembrar de que apenas a
existência de uma função bijetora entre dois posets, em geral, não é suficiente para
concluirmos que os conjuntos são isomorfos.

Exemplo 3.18 O conjunto R, munido com a ordem usual, e o intervalo aberto


I = ] − 1, 1[, com a ordem induzida por R, são isomorfos.

Solução. Seja f : I → R a função definida como


x
f (x) = .
1 − |x|

Afirmação. f é um isomorfismo.
De fato, dados x, y ∈ I, se f (x) = f (y), então
x y
= .
1 − |x| 1 − |y|

Como os denominadores destas frações são positivos temos as seguintes possibili-


dades: x = y = 0 ou x > 0 e y > 0 ou x < 0 e y < 0. A primeira possibilidade é
clara. Se x > 0 e y > 0, então
x x y y
= = = ⇒ x = y.
1−x 1 − |x| 1 − |y| 1−y

A possibilidade x < 0 e y < 0 é tratada de modo inteiramente análogo. Portanto,


f é injetora. Para provar que f é sobrejetora, dado y ∈ R, devemos resolver a
equação y = f (x) para obter x como função de y. Para isso, devemos considerar

81
3.2. Isomorfismos

as seguintes possibilidades: y = 0 ou y > 0 ou y < 0. Se y = 0, então existe um


x = 0 ∈ I tal que 0 = f (0). Se y > 0, então x > 0 e
x x y
y= = ⇒x= ,
1 − |x| 1−x 1+y
y
ou seja, se y > 0, então existe um x = 1+y ∈ I tal que y = f (x). A possibilidade
y < 0 é tratada de modo inteiramente análogo. Portanto, f é bijetora e
x
f −1 (x) = .
1 + |x|

Note que
lim f (x) = −∞ e lim− f (x) = +∞.
x→−1+ x→1

Finalmente, dados x, y ∈ I, então basta considerar as seguintes possibilidades:


x ≤ 0 e y ≤ 0 ou x ≥ 0 e y ≥ 0 ou x ≤ 0 e y ≥ 0. Como

y(1 − |x|) − x(1 − |y|)


f (y) − f (x) =
(1 − |x|)(1 − |y|)

temos que x ≤ y se, e somente se, f (x) ≤ f (y). Por exemplo, se x ≤ y, x ≤ 0 e


y ≥ 0, então y(1 + x) + (−x)(1 − y) ≥ 0 implica que

y(1 + x) − x(1 − y)
f (y) − f (x) = ≥ 0.
(1 + x)(1 − y)

Portanto, em qualquer caso, f é um isomorfismo.

Exercícios
1. Sejam A e B dois posets. Mostre que se f : A → B é uma função crescente
e injetora, então f é estritamente crescente. Neste caso, diremos que f é uma
imersão crescente.

2. Dê pelo menos duas imersões crescente de N em Z.

3. Mostre que o conjunto Z+ , munido com a ordem usual, e o conjunto

A = {1 − (n + 1)−1 : n ∈ Z+ } ⊆ [0, 1[,

82
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

com a ordem induzida por R, são isomorfos.

4. Sejam A e B dois posets.

(a) Mostre que se A×B é ordenado lexicograficamente, então p1 : A×B →


A é uma função crescente.
(b) Mostre que se A × B é ordenado antilexicograficamente, então p2 :
A × B → B é uma função crescente.

5. Sejam A, B dois posets e f : A → B uma função crescente. Mostre que se


C é uma cadeia em A, então f (C) é uma cadeia em B.

6. Sejam D um poset e C um subconjunto de D. Diremos que C é convexo se a


seguinte condição for satisfeita:

∀ x ∈ D ∀ a, b ∈ C [a ≤ x ≤ b ⇒ x ∈ C].

Mostre que f : A → B é uma função crescente se, somente se, f −1 (C) é um


subconjunto convexo de A, para todo subconjunto convexo C de B.

7. Sejam A, B dois posets, f : A → B uma função crescente e R uma relação


de equivalência sobre A determinada por f . Mostre que cada classe x é um
subconjunto convexo de A.

8. Sejam A, B dois posets e f : A → B uma função crescente e sobrejetora.


Mostre que se (E, D) é um corte de B, então (f −1 (E), f −1 (D)) é um corte
de A.

9. Sejam A, B dois posets e f : A → B um isomorfismo.

(a) Mostre que se C é um subconjunto convexo de A, então f (C) é um


subconjunto convexo de B.
(b) Mostre que se (E, D) é um corte de A, então (f (E), f (D)) é um corte
de B.
(c) Mostre que se [a, b] é um intervalo fechado de A, então f ([a, b]) é um
intervalo fechado de B.

10. Sejam A, B dois posets e f : A → B um isomorfismo. Mostre que f (Sa ) =


Sf (a) , para todo a ∈ A. Conclua que Sa  Sf (a) .

83
3.3. Elementos Notáveis e Dualidade

11. Sejam A um poset e Ia = {x ∈ A : x ≤ a}, para cada a ∈ A. Mostre que se


a família F = {Ia }a∈A é ordenada pela inclusão, então F é isomorfo a A.

12. Sejam A um poset, Ea = {x ∈ A : x ≤ a} e Da = {x ∈ A : x  a}.

(a) Mostre que (Ea , Da ) é um corte de A, para todo a ∈ A.


(b) Seja C = {(Ea , Da )}a∈A a família de todos os cortes de A. Mostre que
a função ϕ : A → C definida por ϕ(a) = (Ea , Da ) é um isomorfismo.

13. Mostre que se A é um conjunto totalmente ordenado e f : A → B é um


isomorfismo, então B é um conjunto totalmente ordenado.

14. Sejam A, B dois posets, f : A → B uma função e Ia = {x ∈ A : x ≤ a},


para cada a ∈ A. Mostre que as seguintes condições são equivalentes:

(a) Para cada b ∈ B, existe um a ∈ A tal que f −1 (Ib ) = Ia ;


(b) Se f preserva ordem, então existe uma única função g : B → A tal que
f ◦ g ≤ IB e IA ≤ g ◦ f . A função f chama-se residuada e g a função
residual de f .

3.3 Elementos Notáveis e Dualidade


Nesta seção apresentaremos os conjuntos “reticulados”, introduzidos por Dede-
kind. Podemos salientar que os reticulados são de grande importância sobre outras
estruturas tais como: grupos, anéis, espaços vetoriais etc.
Seja A um poset. Um elemento M ∈ A chama-se um elemento maximal de A
se nenhum dos elementos de A são estritamente maiores do que M . Em símbolos,

∀ x ∈ A [M ≤ x ⇒ M = x].

Ou, equivalentemente, não existe elemento x ∈ A, com M < x. Analogamente, um


elemento m ∈ A chama-se um elemento minimal de A se nenhum dos elementos
de A são estritamente menores do que m. Em símbolos,

∀ x ∈ A [x ≤ m ⇒ m = x].

Ou, equivalentemente, não existe elemento x ∈ A, com x < m.

84
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Exemplo 3.19 Seja A = {2, 3, 4, 5, 7, 8, 9, 12, 15, 16, 24} um conjunto ordenado
pelo diagrama de Hasse, confira Figura 3.3. Então 7, 9, 15, 16 e 24 são elementos
maximais, enquanto 2, 3, 5 e 7 são elementos minimais.

Figura 3.3: Diagrama de Hasse.

Exemplo 3.20 Sejam A um conjunto não vazio e B = P(A) − {∅, A} ordenado


pela inclusão. Então os elementos minimais de B são os subconjuntos unitários,
enquanto os elementos maximais de B são os subconjuntos A − {a}, para todo
a ∈ A, pois o único elemento em P(A) que contém propriamente A − {a} é A,
mas A ∈ / B. Quando A = {a, b, c}, por meio do diagrama de Hasse, verifique o
resultado.

Exemplo 3.21 Seja I = ]0, 1[ o intervalo aberto com a ordem induzida por R.
Mostre que I não possui elemento maximal e nem minimal.
Solução. Se M e m são elementos maximal e minimal de I, então pelos itens (a) e
(b) do Exercício (1) abaixo, obtemos

M +1 m
0<M < <1 e 0< < m < 1,
2 2
o que é impossível. Enquanto, o intervalo fechado [0, 1] com a ordem induzida por
R possui elemento maximal 1 e elemento minimal 0.

Seja A uma poset. Um elemento M ∈ A chama-se o maior elemento de A se

∀ x ∈ A [x ≤ M ].

85
3.3. Elementos Notáveis e Dualidade

Analogamente, um elemento m ∈ A chama-se o menor elemento de A se

∀ x ∈ A [m ≤ x].

Observe que se o maior ou o menor elemento, existir, ele é único. Além disso,
qualquer menor (maior) elemento é um elemento minimal (maximal), mas não reci-
procamente. É muito importante o seguinte: se m ∈ A, então m é o menor elemento
de A − Sm .

Exemplo 3.22 O conjunto Z+ , com a ordenação dada pelo Exemplo 3.3, possui 1
como menor elemento e 0 como maior elemento,

Exemplo 3.23 O conjunto A do Exemplo 3.19 não possui maior e nem menor ele-
mento. Não obstante, possui elementos maximais e minimais.

Exemplo 3.24 Seja A = ]0, 1] ∪ [2, 3[ o conjunto ordenado por



x, y ∈ ]0, 1] e x ≤ y ou
xy⇔
x, y ∈ [2, 3[ e x ≤ y.

Então 1 é o único elemento maximal de A, mas 1  2, ou seja, 1 não é o maior


elemento de A. Por outro lado, 2 é o único elemento minimal de A, mas 2  1, ou
seja, 2 não é o menor elemento de A.

Exemplo 3.25 Seja A = {2, 3, 4, . . .} o conjunto ordenado por x divide y. Então


A não possui menor elemento, pois 2 não divide 3, mas possui infinitos elementos
minimais, a saber, os números primos, pois se p é um número primo, então p é o
único elemento em A que divide p. Por outro lado, se a ∈ A não é um número
primo, então existe b ∈ A, com b = a, tal que b divide a. Note que A não possui
maior elemento e nem elementos maximais, pois para um k ∈ A fixado, temos que
x divide kx, para todo x ∈ A.
Sejam A um poset e B um subconjunto de A. Uma cota superior de B em A é
um elemento a ∈ A tal que
∀ x ∈ B [x ≤ a].
Analogamente, uma cota inferior de B em A é um elemento a ∈ A tal que

∀ x ∈ B [a ≤ x].

86
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Denotaremos por

S(B) = {a ∈ A : a é uma cota superior de B}


= {a ∈ A : x ≤ a, ∀ x ∈ B}

e
s(B) = {a ∈ A : a é uma cota inferior de B}
= {a ∈ A : a ≤ x, ∀ x ∈ B}.

Observação 3.26 Sejam A um poset e B um subconjunto de A.

1. Cada elemento b ∈ B é uma cota superior de s(B), pois x ≤ b, para todo


x ∈ s(B). Analogamente, cada elemento c ∈ B é uma cota inferior de S(B),
pois c ≤ x, para todo x ∈ S(B).

2. É importante notar a diferença entre menor (maior) elemento de B e cota


inferior (superior) de B, pois o primeiro deve pertencer a B, enquanto o
segundo não necessita pertencer a B.

3. Um elemento a ∈ A não é uma cota superior de B se, e somente se, existir


um b0 ∈ B − {a} tal que a < b0 .

4. Um elemento a ∈ A não é uma cota inferior de B se, e somente se, existir um


b0 ∈ B tal que b0 < a.

Sejam A um poset e B um subconjunto de A. Diremos que B é limitado infe-


riormente (superiormente) se s(B) = ∅ (S(B) = ∅). Finalmente, diremos que B
é limitado se B for simultaneamente limitado inferiormente e superiormente. Caso
contrário, diremos que B é não limitado.

Exemplo 3.27 Seja I = ]0, 1[ o intervalo aberto com a ordem induzida por R.
Então s(I) = {x ∈ R : x ≤ 0} e S(I) = {x ∈ R : x ≥ 1}. No entanto, 0, 1 ∈
/ I.
Neste caso, I é um conjunto limitado.

Sejam A um poset e B um subconjunto de A. O supremo de B em A é o


elemento b ∈ A que satisfaz as seguintes condições:

1. b ∈ S(B). (b é uma cota superior de B)

2. Se x ∈ S(B), então b ≤ x. (b é a menor das cotas superiores de B)

87
3.3. Elementos Notáveis e Dualidade

Analogamente, o ínfimo de B em A é o elemento a ∈ A que satisfaz as seguintes


condições:

1. a ∈ s(B). (a é uma cota inferior de B)

2. Se x ∈ s(B), então x ≤ a. (a é a maior das cotas inferiores de B)

Denotaremos o supremo de B em A por supA (B) ou simplesmente sup(B) e o


ínfimo de B em A por inf A (B) ou simplesmente inf(B). Note que se o supremo (o
ínfimo) existir, ele é único.

Observação 3.28 Sejam A um poset e B um subconjunto de A.

1. Note que a condição (2) da definição de supremo é equivalente a: para qual-


quer c ∈ A tal que c < b, não existe um x ∈ B tal que c < x ≤ b, ou seja,
nenhum elemento c ∈ A, com c < b, é uma cota superior de B. Portanto, b é
o elemento minimal de S(B).

2. Note que a condição (2) da definição de ínfimo é equivalente a: para qualquer


c ∈ A tal que a < c, não existe um x ∈ B tal que a ≤ x < c, ou seja, nenhum
elemento c ∈ A, com a < c, é uma cota inferior de B. Portanto, a é o
elemento maximal de s(B).

Exemplo 3.29 Sejam A o poset do Exemplo 3.19 e B = {2, 3, 4, 8, 12} um sub-


conjunto de A. Então S(B) = {12, 24}, mas sup(B) não existe em A. Agora,
sejam C = {2, 3, 4, 8, 12, 16} e D = {2, 3, 4, 8, 12, 24} subconjuntos de A. Então
supC (B) = {16} e supD (B) = {24}. Portanto, o supremo (o ínfimo) depende do
conjunto.

Exemplo 3.30 Sejam A um conjunto qualquer, P(A) o conjunto das potências de


A, ordenado pela inclusão, e B um subconjunto qualquer de P(A). Mostre que
sup(B) = ∪X∈B X e inf(B) = ∩X∈B X. Em particular, A é o maior elemento de
P(A) e ∅ é o menor elemento de P(A).

Solução. É claro que ∪X∈B X ∈ S(B), pois cada X ⊆ ∪X∈B X. Por outro lado, se
C é qualquer elemento de S(B), então X ⊆ C, para todo X ∈ B. Logo, ∪X∈B X ⊆
C. Assim, ∪X∈B X é a menor das cotas superiores. Portanto, sup(B) = ∪X∈B X.

88
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Exemplo 3.31 Sejam R munido com a ordem usual e B um subconjunto não vazio
de R. Mostre que a ∈ S(B) é o supremo de B se, e somente se, para qualquer
 ∈ R, com  > 0, existir um b = b() ∈ B tal que a −  < b ≤ a < a + .
Solução. Suponhamos que a = sup(B) e  > 0. Então a −  < a. Assim,
a−∈ / S(B). Portanto, existe um b = b() ∈ B tal que a −  < b ≤ a < a + .
Reciprocamente, suponhamos que a ∈ S(B) e para qualquer  ∈ R, com  > 0,
exista um b = b() ∈ B tal que a −  < b ≤ a < a + . Dado x ∈ R, se x < a,
então  = a − x > 0. Assim, existe um b = b() ∈ B tal que x = a −  < b ≤ a.
Logo, x ∈/ S(B). Portanto, a = sup(B), pois x foi escolhido arbitrariamente.

Exemplo 3.32 Seja A um poset. Mostre que s(∅) = A e S(∅) = A. Conclua que
A possui um maior elemento a ∈ A se, e somente se, sup(A) = a = inf(∅).
Solução. É claro que s(∅) ⊆ A. Por outro lado, já vimos que um elemento a ∈ A
não é uma cota inferior de B se existir um b0 ∈ B tal que b0 < a. Se B = ∅, então
não existe um elemento b0 ∈ B que satisfaça esta condição, ou seja, se a ∈ A, então

∀ x [x ∈ ∅ ⇒ a ≤ x],

pois é uma implicação com um antecedente falso. Portanto, A ⊆ s(∅) e inf(∅) é


o maior elemento de s(∅). Assim, se A possui um maior elemento a ∈ A, então
a = inf(∅). Reciprocamente, é claro que a = inf(∅) é o maior elemento de A, pois
x ∈ s(∅), para todo x ∈ A. De modo inteiramente análogo, A possui um menor
elemento b ∈ A se, e somente se, inf(A) = b = sup(∅).

Seja A um poset. Se R é uma ordem sobre A, então é fácil verificar que R−1
também é uma ordem sobre A, a qual é chamada de ordem inversa ou ordem dual.
Neste caso, existe um isomorfismo dual entre o conjunto de todas as ordens sobre
A e o conjunto de todas as ordens inversas sobre A.

Exemplo 3.33 Sejam R munido com a ordem usual e a, b ∈ R, com a < 0. Mostre
que a função f : (R, ≤) → (R, ≥) definida como f (x) = ax + b é um isomorfismo.
Solução. Já vimos que f é bijetora. Como a < 0 temos que

∀ x, y ∈ R [x ≤ y ⇔ ax ≥ ay ⇔ ax + b ≥ ay + b ⇔ f (x) ≥ f (y)].

Portanto, f é um isomorfismo dual.

89
3.3. Elementos Notáveis e Dualidade

Se intercalarmos ∪ e ∩; R e R−1 ; A e ∅ etc. em qualquer afirmação sobre


conjuntos, a nova afirmação é chamada de dual da original (Princípio da Duali-
dade). Este conceito de dualidade é de grande importância econômica na prova
dos teoremas, pois provando um teorema sabemos que o dual do teorema é também
verdadeiro.

Teorema 3.34 Sejam A um poset e B um subconjunto de A. Então B ⊆ S(s(B)).


Afirmação dual: B ⊆ s(S(B)).
Prova. Dado x ∈ B, obtemos y ≤ x, para todo y ∈ s(B). Portanto, por definição,
x ∈ S(s(B)), ou seja, B ⊆ S(s(B)).

Lema 3.35 Sejam A um poset e B um subconjunto de A. Suponhamos que s(B)


possua um supremo em A. Então B possui um ínfimo em A e inf(B) = sup(s(B)).
Afirmação dual: Suponhamos que S(B) possua um ínfimo em A. Então B possui
um supremo em A e sup(B) = inf(S(B)).
Prova. Pondo a = sup(s(B)) em A. Seja b ∈ B. Então x ≤ b, para todo x ∈ s(B)
em A. Assim, b é uma cota superior de s(B). Logo, por definição, a ≤ b. Portanto,
a é uma cota inferior de B, pois b foi escolhido arbitrariamente. Por outro lado,
se d é qualquer cota inferior de B, então d ∈ s(B) e d ≤ a, pois a = sup(s(B)).
Portanto, a = inf(B).

Teorema 3.36 Seja A um poset. Então as seguintes condições são equivalentes:

1. Qualquer subconjunto não vazio de A que é limitado superiormente possui


um supremo em A.

2. Qualquer subconjunto não vazio de A que é limitado inferiormente possui


um ínfimo em A.

Prova. (1 ⇒ 2) Seja B um subconjunto não vazio de A que seja limitado inferior-


mente. Então s(B) = ∅. Como cada elemento de B é uma cota superior de s(B)
temos que s(B) é limitado superiormente. Assim, por hipótese, s(B) possui um
supremo em A. Portanto, pelo Lema 3.35, B possui um ínfimo em A.
A recíproca é a afirmação dual de (1 ⇒ 2).

Seja A um poset. Diremos que A é um conjunto completo se qualquer uma das


condições do Teorema 3.36 for satisfeita. Por exemplo, o Exemplo 3.30, prova que

90
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

P(A) é um conjunto completo, para qualquer conjunto A. O teorema seguinte sobre


conjuntos completos é devido a Knaster3 .
Sejam A um conjunto e f : A → A uma função. Diremos que f possui um
ponto fixo em A se existir um a ∈ A tal que f (a) = a.

Teorema 3.37 (Teorema do Ponto Fixo de Knaster) Sejam A um conjunto com-


pleto, com um maior e um menor elemento, e f : A → A uma função crescente.
Então f possui pelo menos um ponto fixo.

Prova. Consideremos o conjunto B = {x ∈ A : x ≤ f (x)}. Então B = ∅, pois B


contém o menor elemento de A e B é limitado superiormente pelo maior elemento
de A. Assim, s = sup(B) ∈ A.
Afirmação. s ∈ B.
De fato, como x ≤ s, para todo x ∈ B, temos, por hipótese, que x ≤ f (x) ≤ f (s).
Logo, f (s) é uma cota superior de B. Portanto, s = sup(B) ≤ f (s) e s ∈ B.
Sendo s ≤ f (s) temos, por hipótese, que f (s) ≤ f (f (s)). Assim, f (s) ∈ B e
f (s) ≤ s = sup(B). Portanto, f (s) = s.

Observação 3.38 Quando A = [0, 1], com a ordem induzida por R, o Teorema
3.37, afirma que qualquer funçõa f : A → A crescente possui pelo menos um
ponto fixo, ou seja, o gráfico de f intercepta a diagonal

D = {(x, x) : 0 ≤ x ≤ 1}.

em pelo menos um ponto. Note, também, que o Teorema 3.37 afirma que f possui
um maior e um menor ponto fixo.

Exemplo 3.39 (Princípio de Arquimedes) Supondo que o conjunto de todos os


números reais R, com a ordem usual, seja completo. Mostre que para quaisquer
a, b ∈ R, com a > 0, existe um n ∈ Z tal que na > b.

Solução. Suponhamos, por absurdo, que na ≤ b, para todo n ∈ Z. Então o


subconjunto B = {na : n ∈ Z} é não vazio e limitado superiormente em R. Assim,
c = sup(B) existe. Logo, na ≤ c, para todo n ∈ Z, de modo que (m + 1)a ≤ c,
para todo m ∈ Z. Portanto, ma ≤ c−a, para todo m ∈ Z, o que é uma contradição,
pois c − a < c.
3
Bronislaw Knaster, 1893-1980, matemático e lógico polonês.

91
3.3. Elementos Notáveis e Dualidade

Exemplo 3.40 Seja Q munido com a ordem usual. Mostre que o conjunto

E = {x ∈ Q : xleq0 ou x2 < 2}

não possui elemento maximal. Neste caso, diremos que E é um corte de Dedekind
à esquerda e o par (E, D) é um corte de Dedekind, em que D = Q − E.
Solução. Já vimos, pelo Exemplo 3.9, que o par (E, D) é um corte de Q. Assim,
resta provar que para cada M ∈ E, existe um x0 ∈ E tal que M < x0 . Se M < 0,
então existe, por exemplo, um x0 = 1 ∈ E tal que M < x0 . Se M ≥ 0, então

2 − M > 0. Logo, pela Princípio de Arquimedes, existe um n0 ∈ N tal que
√ √
n0 ( 2 − M ) > 1 ou n−1
0 +M < 2 ⇒ (n−1 2
0 + M ) < 2.

Portanto, existe um x0 = n−1


0 + M ∈ E tal que M < x0 .

Seja (A, ) um poset. Diremos que A é um reticulado se quaisquer dois elemen-


tos de A possuem um supremo e um ínfimo. Mais precisamente, dados a, b ∈ A, o
conjunto U = {x ∈ A : a  x e b  x} possui um menor elemento e o conjunto
L = {x ∈ A : x  a e x  b} possui um maior elemento. Quando lidamos com
reticulados é conveniente escrevermos

sup{a, b} = a ∨ b e inf{a, b} = a ∧ b,

pois U = S({a, b}) e L = s({a, b}). Por exemplo, A = R × R ordenado como


(a, b)  (c, d) se, e somente se, a ≤ c e b ≤ d, é um reticulado, pois dados
P = (a, b), Q = (c, d) ∈ A, é fácil verificar que

P ∨ Q = (max{a, c}, max{b, d}) e P ∧ Q = (min{a, c}, min{b, d}).

Por outro lado, A = Z × Z ordenado como (a, b)  (c, d) se, e somente se, a = c e
b ≤ d, não é um reticulado, pois se a = x, então os pontos P = (a, b) e Q = (x, y),
para todos b, y ∈ Z, não possui cota superior e nem inferior (prove isto!).
Seja A um reticulado. Diremos que A é um reticulado distributivo se as seguin-
tes condições são satisfeita:

1. a ∧ (b ∨ c) = (a ∧ b) ∨ (a ∧ c), para todos a, b, c ∈ A.

2. a ∨ (b ∧ c) = (a ∨ b) ∧ (a ∨ c), para todos a, b, c ∈ A.

92
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Exemplo 3.41 Sejam A um conjunto qualquer e P(A) ordenado pela inclusão.


Mostre que P(A) é um reticulado distributivo. Por outro lado, A = {a, b, c, d, e}
ordenada pelo diagrama de Hasse, confira Figura 3.2 (a), é um reticulado não
distributivo, pois c ∨ (b ∧ d) = c ∨ a = c, mas (c ∨ b) ∧ (c ∨ d) = e ∧ e = e.

Solução. Dados X, Y ∈ P(A), o conjunto U = {B ∈ P(A) : X ⊆ B e Y ⊆ B}


possui o menor elemento sup{X, Y } = X ∪ Y , pois se C ∈ U , então X ⊆ C
e Y ⊆ C. Assim, X ∪ Y ⊆ C. De modo inteiramente análogo, prova-se que
o conjunto L = {B ∈ P(A) : B ⊆ X e B ⊆ Y } possui o maior elemento
inf{X, Y } = X ∩ Y . Portanto, P(A) é um reticulado.

Proposição 3.42 Sejam A um reticulado e a, b, c ∈ A. Então:

1. a ≤ a ∨ b e b ≤ a ∨ b.

2. a ∧ b ≤ a e a ∧ b ≤ b.

3. Se a ≤ c e b ≤ c, então a ∨ b ≤ c.

4. Se c ≤ a e c ≤ b, então c ≤ a ∧ b.

Prova. Vamos provar apenas o item (3). Seja U = {x ∈ A : a ≤ x e b ≤ x}.


Então c ∈ U . Portanto, a ∨ b ≤ c.

Teorema 3.43 Sejam A um reticulado e a, b, c ∈ A. Então:

1. a ∨ a = a e a ∧ a = a. (Idempotência)

2. a ∨ b = b ∨ a e a ∧ b = b ∧ a. (comutatividade)

3. (a ∨ b) ∨ c = a ∨ (b ∨ c) e (a ∧ b) ∧ c = a ∧ (b ∧ c). (associatividade)

4. (a ∨ b) ∧ a = a e (a ∧ b) ∨ a = a. (absorção)

5. Se a ≤ c, então a ∨ (b ∧ c) = (a ∨ b) ∧ c. (Lei Modular)

Prova. Vamos provar apenas os itens (3) e (4): (3) Como a ≤ a ∨ (b ∨ c) e


b ≤ b ∨ c ≤ a ∨ (b ∨ c) temos que

a ∨ b ≤ a ∨ (b ∨ c) e c ≤ b ∨ c ≤ a ∨ (b ∨ c).

93
3.3. Elementos Notáveis e Dualidade

Assim, (a ∨ b) ∨ c ≤ a ∨ (b ∨ c). Por um argumento simétrico, prova-se que


a ∨ (b ∨ c) ≤ (a ∨ b) ∨ c.
(4) O conjunto L = {x ∈ A : x ≤ a e x ≤ a ∨ b} possui um maior elemento
a, pois se c ∈ L, então c ≤ a e c ≤ a ∨ b. Portanto, (a ∨ b) ∧ a = a.

Teorema 3.44 (Consistência) Sejam A um conjunto munido de duas operações ∨


e ∧ satisfazendo as condições (1 à 4) do Teorema 3.43. Dados a, b ∈ A, definimos
a ≤ b se, e somente se, a ∨ b = b ou a ∧ b = a. Então ≤ é uma ordem sobre A e A
é um reticulado.

Prova. Como a ∨ a = a temos que a ≤ a. Dados a, b ∈ A, se a ≤ b e b ≤ a, então,


por definição, a ∨ b = b e b ∨ a = a. Assim, pelo item (2), a = b ∨ a = a ∨ b = b.
Dados a, b, c ∈ A, se a ≤ b e b ≤ c, então, por definição, a ∨ b = b e b ∨ c = c.
Logo, pelo item (3),

a = a ∨ b ≤ (a ∨ b) ∨ c = a ∨ (b ∨ c) = a ∨ c ⇒ a ≤ c.

Portanto, ≤ é uma ordem sobre A. Dados a, b ∈ A, devemos provar que o conjunto


U = {x ∈ A : a ≤ x e b ≤ x} possui um menor elemento a ∨ b. Como

a ∨ (a ∨ b) = (a ∨ a) ∨ b = a ∨ b

temos, por definição, que a ≤ a∨b. Por um argumento simétrico, obtemos b ≤ a∨b,
ou seja, a ∨ b ∈ U . Por outro lado, se c ∈ U , então a ≤ c e b ≤ c. Assim, por
definição, a ∨ c = a e b ∨ c = b. Logo, pelo item (3),

(a ∨ b) ∨ c = a ∨ (b ∨ c) = a ∨ b.

Portanto, por definição, a ∨ b ≤ c. Consequentemente, a ∨ b é o menor elemento


de U , isto é, a ∨ b = sup{a, b}. De modo inteiramente análogo, prova-se que
a ∧ b = inf{a, b}.

Corolário 3.45 Sejam A um reticulado e a, b, c ∈ A. Então:

1. Se b ≤ c, então a ∧ b ≤ a ∧ c e a ∨ b ≤ a ∨ c.

2. a ∧ (b ∨ c) ≥ (a ∧ b) ∨ (a ∧ c) e a ∨ (b ∧ c) ≤ (a ∨ b) ∧ (a ∨ c).

3. Se b ≤ c, então a ∨ (b ∧ c) ≤ (a ∨ b) ∧ c.

94
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Prova. (1) Como b ≤ c temos que

a ∧ b = (a ∧ a) ∧ (b ∧ c) = (a ∧ b) ∧ (a ∧ c).

Portanto, a ∧ b ≤ a ∧ c. A segunda desigualdade é a afirmação dual.


(2) Como a ∧ b ≤ a e a ∧ b ≤ b ≤ b ∨ c temos que a ∧ b ≤ a ∧ (b ∨ c). De modo
inteiramente análogo, a ∧ c ≤ a ∧ (b ∨ c). Portanto, a ∧ (b ∨ c) ≥ (a ∧ b) ∨ (a ∧ c).
A segunda desigualdade é a afirmação dual.
(3) Como a ≤ a ∨ b e a ≤ c temos que a ≤ (a ∨ b) ∧ c. Por outro lado, b ∧ c ≤ c
e b ∧ c ≤ b ≤ a ∨ b implicam que b ∧ c ≤ (a ∨ b) ∧ c. Portanto, pela definição, segue
que a ∨ (b ∧ c) ≤ (a ∨ b) ∧ c.

Sejam A um reticulado e I, F subconjuntos não vazios de A. Diremos que I é


um ideal de A se as seguintes condições são satisfeita:

1. a ∨ b ∈ I, para todos a, b ∈ I.

2. a ≤ b implica que a ∈ I, para todo b ∈ I e a ∈ A ou, equivalentemente,


a ∧ b = b ∧ a ∈ I, para todo b ∈ I e a ∈ A.

Diremos que F é um filtro de A se as seguintes condições são satisfeita:

1. a ∧ b ∈ I, para todos a, b ∈ F .

2. a ≥ b implica que a ∈ F , para todo b ∈ F e a ∈ A.

Observe que filtro é a afirmação dual de ideal. Note que se A contém um menor
elemento m, então m ∈ I, para todo ideal I de A. Além disso, dados a, b ∈ I,
a∧b ≤ b implica que a∧b ∈ I. Portanto, qualquer ideal é ele próprio um reticulado.
Para qualquer reticulado distributivo A e a ∈ A fixado, é faácil verificar que

Ia = {x ∈ A : x ≤ a} = Sa ∪ {a}

é um ideal de A chamado de ideal principal gerado por a. Enquanto, se X é um


conjunto não vazio e A = P(X), então

Ix = {B ⊆ X : x ∈
/ B},

para cada x ∈ X fixado, é um ideal de A.

95
3.3. Elementos Notáveis e Dualidade

Teorema 3.46 Seja A um poset. Então as seguintes condições são equivalentes:

1. Qualquer subconjunto de A possui um supremo em A.

2. Qualquer subconjunto de A possui um ínfimo em A.

Prova. (1 ⇒ 2) Suponhamos que qualquer subconjunto de A tenha um supremo


em A. Então A possui um supremo, o qual é necessariamente o maior elemento de
A. Pelo Exemplo 3.32, ∅ possui um supremo, o qual é necessariamente o menor
elemento de A. Sejam M , m o maior e menor elemento de A, respectivamente, e
B qualquer subconjunto de A. Se B = ∅, então inf(B) = M . Se B = ∅, então B é
limitado inferiormente por m. Assim, pelo Teorema 3.36, B tem um ínfimo em A.
A recíproca é a afirmação dual de (1 ⇒ 2).

Sejam A um reticulado e B um subconjunto de A. Diremos que B é um sub-


reticulado de A se a ∨ b ∈ B e a ∧ b ∈ B, para todos a, b ∈ B. Diremos que A
é um reticulado completo se qualquer subconjunto de A possui um supremo em A.
Portanto, qualquer reticulado completo possui um menor elemento m = inf(A) e
um maior elemento M = sup(A).

Exemplo 3.47 Sejam A um conjunto qualquer e R o conjunto de todas as relações


de equivalências sobre A, ordenado pela inclusão. Mostre que R é um reticulado
completo.
Solução. É claro que

IA = {(x, x) : x ∈ A}, ou seja, x ∼ y ⇔ x = y

é o menor elemento de R e A × A é o maior elemento de R. Além disso, se


R = {Ri }i∈I é um subconjunto de R, então ∩i∈I Ri ∈ R e ∩i∈I Ri = inf(R).
Portanto, R é um reticulado completo.

Note que se

x = {y ∈ A : xRy} = {y ∈ A : (x, y) ∈ R}

é a classe de equivalência de x e F = {x : x ∈ A} é a família de todas as classes


de equivalência de A, então R = ∪x∈F (x × x), pois como R é reflexiva temos que
se (x, x) ∈ R, então (x, x) ∈ x × x, ou seja, R ⊆ ∪x∈F (x × x). A recíproca é

96
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

clara. Por outro lado, seja {Ai }i∈I uma partição de A. Então é fácil verificar que
R = ∪i∈I Ai × Ai é uma relação de equivalência sobre A.

Exemplo 3.48 Seja A = Q ∪ {−∞, ∞}, com a ordem usual de Q, sendo −∞ e


∞, respectivamente, o menor e o maior elemento de A. Mostre que A não é um
reticulado completo.
Solução. Consideremos o conjunto B = {x ∈ Q : x2 ≤ 2}. Então, pelo Exemplo
3.40, sup(B) não existe em A. Portanto, A não é um reticulado completo.

Vamos finalizarmos esta seção com o seguinte teorema sobre reticulado com-
pleto devido a Tarski4 .

Teorema 3.49 (Teorema do Ponto Fixo de Tarski) Sejam A um reticulado com-


pleto e f : A → A uma função crescente. Então f possui pelo menos um ponto
fixo.
Prova. Consideremos o conjunto B = {x ∈ A : x ≤ f (x)}. Então B = ∅, pois
m = sup(∅) ∈ A e m ∈ B. Assim, s = sup(B) ∈ A.
Afirmação. s ∈ B.
De fato, como x ≤ s, para todo x ∈ B, temos, por hipótese, que x ≤ f (x) ≤ f (s).
Assim, f (s) é uma cota superior de B. Portanto, s = sup(B) ≤ f (s) e s ∈ B.
Sendo s ≤ f (s) temos, por hipótese, que f (s) ≤ f (f (s)). Logo, f (s) ∈ B e
f (s) ≤ s = sup(B). Portanto, f (s) = s.

Como uma aplicação do Teorema 3.49 provaremos o celebre teorema devido


aos matemáticos Cantor-Schröder-Bernstein5 .

Corolário 3.50 (Teorema de Cantor-Schröder-Bernstein) Sejam A e B conjun-


tos quaisquer. Se existirem funções injetoras f : A → B e g : B → A, então existe
uma função bijetora de A sobre B.
Prova. Primeiro note, pelo Exemplo 3.30, que P(C) ordenado pela inclusão é um
reticulado completo e a função λC : P(C) → P(C) definida como λC (X) = C −X
claramente inverte ordem. Segundo temos, pelo Teorema 2.23, que as funções F :
P(A) → P(B) definida como F (X) = f (X) e G : P(B) → P(A) definida
4
Alfred Tarski, 1901-1983, matemático e lógico polonês.
5
Felix Bernstein, 1878-1956; Friedrich Wilhelm Karl Ernst Schröder, 1841-1902, matemáticos
alemães.

97
3.3. Elementos Notáveis e Dualidade

como G(Y ) = g(Y ) preservam ordem. Consideremos a função ϕ : P(A) → P(A)


definida como

ϕ(X) = (λA ◦ G ◦ λB ◦ F )(X) = A − g(B − f (X)).

Então ϕ preserva ordem, pois dados X, Y ∈ P(A), se X ⊆ Y , então

F (X) ⊆ F (Y ) ⇒ λB (F (Y )) ⊆ λB (F (X))
⇒ G(λB (F (Y ))) ⊆ G(λB (F (X)))
⇒ λA (G(λB (F (X)))) ⊆ λA (G(λB (F (Y ))))
⇒ ϕ(X) ⊆ ϕ(Y ).

Assim, pelo Teorema 3.49, existe um Z ∈ P(A) tal que ϕ(Z) = Z. Portanto,

λA (Z) = (G ◦ λB ◦ F )(Z) ⇔ A − Z = g(B − f (Z)).

Esses resultados podem ser representados pela Figura 3.4. Neste caso, g −1 é uma
função bijetora de A − Z sobre B − f (Z) e f uma função bijetora de Z sobre f (Z).
Vamos definir a função h : A → B como

f (x), se x ∈ Z
h(x) =
g −1 (x), se x ∈
/ Z.

Então h é bijetora (prove isto!).

Figura 3.4: Representação Gráfica da Prova do Corolário.

Exercícios
1. Sejam R munido com a ordem usual e a, b ∈ R.

98
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

(a) Mostre que se a < b, então a < 2−1 · (a + b) < b.


(b) Mostre que se b > 0, então 0 < 2−1 · b < b.
(c) Mostre que se 0 ≤ a < , para todo  ∈ R, com  > 0, então a = 0.
(d) Mostre que se a −  < b, para todo  ∈ R, com  > 0, então a ≤ b.
(e) Mostre que se 0 < a < 1, então 0 < a2 < a < 1.

2. Sejam N ordenado por x divide y e A = {a1 , a2 , . . . , an } um subconjunto


finito de N. Mostre que inf(B) e sup(B) existem em N.

3. Seja A = {1, 2, 3, 4, 6, 8, 9, 12, 18, 24}. Dados x, y ∈ A, definimos x  y se,


somente se, x divide y.

(a) Faça o diagrama de Hasse para A.


(b) A possui maior e menor elemento?
(c) A possui elemento minimal e maximal?

4. Seja F um subconjunto de P(N) − {∅, N}, ordenado pela inclusão.

(a) Determine, se existirem, cotas superiores do conjunto

A = {{2n, 2n + 4} ∈ F : n ∈ N}.

(b) Determine, se existirem, cotas superiores do conjunto

B = {{n, n + 2} ∈ F : n ∈ N}.

5. Sejam A e B dois posets. Mostre cada uma das afirmações abaixo e enuncie
a dual.

(a) Se A contém um maior elemento a, B contém um maior elemento b e


A ⊆ B, então a ≤ b.
(b) Se C, D são subconjuntos de A e C ⊆ D, então S(D) ⊆ S(C).
(c) Se C, D são subconjuntos de A, C ⊆ D e cada C e D possui supremo
em A, então sup(C) ≤ sup(D).

99
3.3. Elementos Notáveis e Dualidade

6. Sejam A, B dois posets e f : A → B uma função estritamente crescente.


Mostre que se b é um elemento maximal de B, então cada elemento de f −1 (b)
é um elemento maximal de A.

7. Sejam A, B dois posets e f : A → B uma função crescente. Mostre que se a


é o maior elemento de A, então f (a) é o maior elemento de f (A).

8. Sejam A, B dois posets e f : A → B uma função crescente. Mostre que se


C ⊆ A e a é uma cota superior de C, então f (a) é uma cota superior de f (C).

9. Sejam A, B dois posets e f : A → B um isomorfismo.

(a) Mostre que a é um elemento maximal (minimal) de A se, e somente se,


f (a) é um elemento maximal (minimal) de B.
(b) Mostre que a é o maior (menor) elemento de A se, e somente se, f (a) é
o maior (menor) elemento de B.
(c) Suponhamos que C seja um subconjunto de A. Mostre que x ∈ A é
uma cota superior (inferior) de C se, e somente se, f (x) ∈ B é uma
cota superior (inferior) de f (C).
(d) Suponhamos que C seja um subconjunto de A. Mostre que a = sup(C)
(a = inf(C)) se, e somente se, f (a) = sup(f (C)) (f (a) = inf(f (C))).

10. Seja A um poset. Mostre que se qualquer subconjunto de A possui um su-


premo e um ínfimo, então A possui um menor e um maior elemento.

11. Seja A um reticulado. Mostre que se [a, b] e [c, d] são intervalos fechados de
A, então
[a, b] ∩ [c, d] = [sup{a, c}, inf{b, d}].

12. Seja A um reticulado. Mostre que qualquer intervalo fechado [a, b] de A é um


sub-reticulado de A.

13. Seja A um conjunto totalmente ordenado. Mostre que qualquer elemento


minimal (maximal) é um menor (maior) elemento de A.

14. Mostre que qualquer conjunto parcialmente ordenado finito possui um ele-
mento maximal (minimal).

100
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

15. Seja A um poset com um único elemento maximal M . É verdade ou falsa a


afirmação M é o maior elemento de A?

16. Sejam F um corpo, V um espaço vetorial sobre F e

F = {W ⊆ V : W é um subespaço de V }.

(a) Mostre que F é um conjunto ordenado pela inclusão.


(b) Mostre que F possui menor e maior elemento.
(c) Mostre que inf{U, W } = U ∩ W e sup{U, W } = U + W , para todos
U, W ∈ F.
(d) Mostre que F é um reticulado.

17. Mostre que Z com a ordem usual é um reticulado distributivo.

18. Seja F uma família de conjuntos ordenado pela inclusão com a seguinte pro-
priedade: A ∪ B ∈ F e A ∩ B ∈ F, para todos A, B ∈ F. Mostre que F é
um reticulado distributivo, chamado de um reticulado de conjuntos.

19. Seja A um reticulado. Um ideal P de A chama-se ideal primo se P = A e


dados a, b ∈ A, a ∧ b ∈ P implica que a ∈ P ou b ∈ P . Mostre que Z+ ,
com a ordenação: dados a, b ∈ Z+ , b  a se, e somente se, a divide b, é um
reticulado distributivo. Determine todos os ideais primos de Z+ . Note que 
é a ordem inversa do Exemplo 3.3.

20. Mostre que qualquer reticulado distributivo é isomorfo a um reticulado de


conjuntos

3.4 Conjuntos Bem Ordenados


O principal objetivo desta seção é provar os Princípios de Induções Transfinitas
e a Fórmula de Recorrência.
Seja A uma poset. Diremos que A é um conjunto bem ordenado ou um ordinal
se qualquer subconjunto não vazio de A contém um menor elemento.
Notação. CBO - significa conjunto bem ordenado.

Observação 3.51 Seja A um poset qualquer.

101
3.4. Conjuntos Bem Ordenados

1. Se B é um subconjunto de A e A é um CBO, então B é um CBO.

2. Se A é um CBO, então A é totalmente ordenado.

3. Se A é um CBO, então A é um reticulado completo.

4. Se A é um CBO e ∞ ∈ / A, então A ∪ {∞} é um CBO, com a seguinte


ordenação: dados a, b ∈ A ∪ {∞}, definimos

a  b ⇔ (a, b ∈ A e a ≤ b) ou (a ∈ A e ∞ = b),

pois para qualquer subconjunto não vazio S de A ∪ {∞}, obtemos S = {∞}


ou S ∩A = ∅. Se S = {∞}, então ∞ é o menor elemento de S. Se S ∩A = ∅,
então S ∩A contém o menor elemento de S ⊆ A∪{∞}, digamos m ∈ S ∩A.
É fácil verificar que m é o menor elemento de S. Neste caso, ∞ é o maior
elemento de A ∪ {∞}.

Sejam A um CBO e a ∈ A. Diremos que b ∈ A é um sucessor imediato de a


ou é uma cobertura de a se a < b e não existir um c ∈ A tal que a < c < b, ou seja,
para qualquer c ∈ A, se a < c, então b = c ou b < c. Neste caso, diremos que a é
um predecessor imediato ou é um antecessor de b. Ou, equivalentemente,

b = min{x ∈ A : a < x} = min(S a ) e a = max{x ∈ A : x < b} = max(Sb ).

Note, para provar, que um elemento c ∈ A não possui predecessor imediato, de-
vemos, para cada x ∈ A, com x < c, encontrar um d ∈ A, com d = x, tal que
x < d < c. Neste caso, adjuntando a c o maior elemento ∞, temos que ∞ não
possui predecessor imediato. Portanto, nem todo elemento necessita ter um prede-
cessor imediato. É muito importante o seguinte: dados x, y ∈ A, se x < y, então
existem x1 , x2 , . . . , xn ∈ A tais que x = x1 < x2 < · · · < xn = y e cada xi+1 é um
sucessor imediato de xi . Reciprocamente, se uma tal sequência existir, então x < y.

Exemplo 3.52 Seja Q munido com a ordem usual. Mostre que nenhum elemento
de Q possui sucessor imediato.

Solução. Se a, b ∈ Q, digamos a < b, então a < 2−1 ·(a+b) < b. Portanto, nenhum
elemento de Q possui sucessor imediato. Não obstante, o conjunto Z, munido com
a ordem usual, cada elemento n possui um sucessor imediato n + 1.

102
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Exemplo 3.53 Sejam A um CBO e M ∈ A. Mostre que M é um elemento maximal


de A ou M possui um sucessor imediato.
Solução. Se M não é um elemento maximal de A, então S M é não vazio. Assim,
por hipótese, S M contém um menor elemento, digamos a ∈ S M . Portanto, a é o
sucessor imediato de M , pois se existisse um b ∈ A tal que M < b < a, então
b ∈ S M , o que contradiz a minimalidade de a.

Note que se A é um CBO, então A contém um menor elemento, digamos x1 .


Assim, se A−{x1 } =  ∅ ou S x1 = ∅, então x1 possui um sucessor imediato, digamos
x2 . Se A−{x1 , x2 } = ∅, então x2 possui um sucessor imediato, digamos x3 , e assim
sucessivamente. Neste caso,

x 1 < x 2 < x3 < · · ·

Observe que se A for um conjunto finito, então obtemos o elemento minimal e o


maximal de A.

Exemplo 3.54 O conjunto N munido com a ordem usual é um CBO. Enquanto, os


conjuntos Z, Q e R, munidos com a ordem usual, não são CBO, pois nenhum deles
possui menor elemento.

Exemplo 3.55 Seja a 


Q∗+ = : a, b ∈ Z∗+
b
ordenado por: dados r = b · a, s = d−1 · c ∈ Q∗+ , com mdc(a, b) = 1 = mdc(c, d)
−1

(para evitar as repetições), definimos



a+b<c+d
rs⇔
a + b = c + d e a < c,

é um CBO.
Solução. É fácil verificar que  é uma ordem sobre Q∗+ e que
 
1 1 2 1 3 1 2 3 4 1 5
Q∗+ = , , , , , , , , , , ,... .
1 2 1 3 1 4 3 2 1 5 1

Neste caso, a função f : Q∗+ → N definida como f (b−1 · a) = 2b−1 (2a − 1)


é um isomorfismo (prove isto!). Portanto, Q∗+ é um CBO, pois N é um CBO.

103
3.4. Conjuntos Bem Ordenados

Consequentemente,
 
1 1 1 1 2 2 1 1
Q= 0, , − , , − , , − , , − , . . .
1 1 2 2 1 1 3 3

é um CBO.

Exemplo 3.56 Seja A = ∪2m=0 {m + 2−n (2n − 1) : n ∈ Z+ }, com a ordem induzida


por R. Determine todos os sucessores imediatos de A.

Solução. Como A é uma união de três sequências crescentes temos que qualquer
subconjunto não vazio de A possui um menor elemento em uma das três. Portanto,
A é um CBO. É fácil verificar que os elementos m + 2−n (2n − 1), com n > 0,
são os sucessores imediatos de A. Note que 0, 1 e 2 não possuem predecessores
imediatos.

Exemplo 3.57 Seja R munido com a ordem usual. Mostre que dados a, b ∈ R,
com a < b, existe um r ∈ Q tal que a < r < b. Neste caso, diremos que Q é um
subconjunto denso em R.

Solução. Como b − a > 0 temos, pela Princípio de Arquimedes, que existe um


n0 ∈ N tal que n0 (b − a) > 1 ou n−1 0 < b − a. Note que existe um k0 ∈ N tal
que k0 > n0 a, pois isto é claro se a ≤ 0 e se a > 0, então aplicamos novamente
Princípio de Arquimedes. Assim, o conjunto

S = {k ∈ N : n0 a < k}

é não vazio. Logo, S contém um menor elemento, digamos m0 ∈ S, pois N é um


CBO. Neste caso,
m0 − 1 m0
m0 − 1 ≤ n0 a < m 0 ⇒ ≤a< ,
n0 n0

pois m0 − 1 ∈
/ S. Portanto,

m0 1 m0 − 1
r= = + < (b − a) + a = b,
n0 n0 n0

ou seja, existe um r = n−1


0 · m0 ∈ Q tal que a < r < b.

104
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Observação 3.58 Qualquer número real é o supremo de algum conjunto de núme-


ros racionais. De fato, dado a ∈ R. Consideremos o segmento inicial
m m 
Sa = ∈Q: <a
n n
Então, pelo Exemplo 3.57, é fácil verificar que a = sup(Sa ).
Seja A um poset. Diremos que um subconjunto B de A é uma seção de A se

∀ x ∈ A [y ∈ B e x ≤ y ⇒ x ∈ B]

ou, equivalentemente, Sb ⊆ B, para todo b ∈ B.

Exemplo 3.59 Seja R munido com a ordem usual. Mostre, para um a ∈ R fixado,
que B = {x ∈ R : x < a} é uma seção de R.

Teorema 3.60 Sejam A um CBO e B um subconjunto de A. Então B é uma seção


de A se, e somente se, B = A ou B é um segmento inicial de A.
Prova. Suponhamos que B seja uma seção. Se B = A, nada há para ser provado.
Se A = B, então A − B = ∅. Assim, por hipótese, A − B contém um menor
elemento, digamos m ∈ A − B.
Afirmação. B = Sm .
De fato, se x ∈ Sm , então x < m. Logo, x ∈
/ A − B, isto é, x ∈ B. Portanto,
Sm ⊆ B. Por outro lado, dado x ∈ B, devemos provar que x < m. Se m ≤ x,
então m ∈ B. Logo, m ∈ B ∩ (A − B) = ∅, o que é impossível. Portanto, x < m
e B ⊆ Sm , ou seja, B = Sm .
A recíproca é clara.

Corolário 3.61 Seja A um conjunto totalmente ordenado. Se qualquer segmento


inicial em A é um CBO, então A é um CBO.
Prova. Suponhamos, por absurdo, que A não seja um CBO. Então podemos cons-
truir uma cadeia descendente (prove isto!).

x 1 > x 2 > x3 > · · ·

ou seja, existe uma função f : N → A tal que f (n + 1) < f (n), para todo n ∈ N.
Assim, o segmento inicial Sx1 não é um CBO, o que é uma contradição.

105
3.4. Conjuntos Bem Ordenados

Exemplo 3.62 Se A = {3, 4, 8, 10} com a ordem induzida por N, então S3 = ∅,


{3}, {3, 4}, {3, 4, 8} e A são todas as seções de A. Note que qualquer elemento de
A, exceto 3, possui um predecessor imediato.
Sejam N munido com a ordem usual e E = 2N = {2, 4, 6, . . .} o conjunto
de todos os números naturais pares, com a ordem induzida por N. Então a função
f : N → E definida como f (x) = 2x é claramente um isomorfismo. Além disso,
ela satisfaz a propriedade:

∀ x ∈ N [x ≤ f (x)].

Mais geralmente, temos o seguinte resultado.

Lema 3.63 Sejam A um CBO e f : A → A uma função crescente. Então

∀ x ∈ A [x ≤ f (x)].

Prova. Consideremos o conjunto S = {x ∈ A : x > f (x)}. Suponhamos, por


absurdo, que S = ∅. Então, por hipótese, S contém um menor elemento, digamos
m ∈ S. Em particular, f (m) < m. Assim, f (f (m)) < f (m) < m implica que
f (m) ∈ S, o que contradiz a minimalidade de m. Portanto, S = ∅.

Exemplo 3.64 Sejam A um CBO e f : A → A uma função que inverte ordem


(decrescente). Mostre que existe um x0 ∈ A tal que f (x) é constante, para todo
x ∈ A, com x ≥ x0 .
Solução. Consideremos o conjunto S = f (A) = {f (x) : x ∈ A}. Então S = ∅.
Assim, por hipótese, S contém um menor elemento, digamos y0 ∈ S. Em particular,
y0 ≤ f (x), para todo x ∈ A. Por outro lado, como y0 ∈ S temos que existe um
x0 ∈ A tal que f (x0 ) = y0 . Assim, por hipótese, f (x0 ) ≥ f (x), para todo x ∈ A,
com x ≥ x0 . Portanto, f (x) = y0 , para todo x ∈ A, com x ≥ x0 .

Lema 3.65 Seja A um CBO. Então não existe um isomorfismo de A sobre um


subconjunto de um segmento inicial de A.
Prova. Suponhamos, por absurdo, que exista um isomorfismo f : A → B, em
que B ⊆ Sa , para algum a ∈ A. Então, pelo Lema 3.63, x ≤ f (x), para todo
x ∈ A. Em particular, a ≤ f (a) impica que f (a) ∈
/ Sa , o que é uma contradição,
pois.f (a) ∈ B ⊆ Sa .

106
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Corolário 3.66 Nenhum CBO é isomorfo a um de seus segmentos inicias.

Prova. Fica como um exercício.

Lema 3.67 Sejam A e B dois CBO. Se A é isomorfo a um segmento inicial de B,


então B não é isomorfo a qualquer subconjunto de A.

Prova. Suponhamos que f : A → Sb , para algum b ∈ B, seja um isomorfismo e


que exista um isomorfismo g : B → C, em que C é um subconjunto de A. Então
g : B → A é uma função. Além disso, f e g são injetoras e crescentes. Assim,
f ◦ g : B → Sb é injetora e crescente. Logo, f ◦ g é um isomorfismo de B sobre
um subconjunto de Sb (prove isto!), o que é impossível, pelo Lema 3.65.

Exemplo 3.68 Consideremos o conjunto

A = {1, 3, 5, . . . ; 2, 4, 6, . . .}
= {2n − 1 : n ∈ N} ∪ {2n : n ∈ N}

ordenado por: dados a, b ∈ A, definimos a  b se, e somente se, a é ímpar e b é par


ou b − a é par. Mostre que N munido com a ordem usual é isomorfo a um segmento
inicial de A.

Solução. Note que a função f : N → S2 definida como f (n) = 2n − 1 é um


isomorfismo, em que S2 = {x ∈ A : x ≺ 2} = {1, 3, 5, . . .}. Assim, N é isomorfo
ao segmento inicial S2 de A. Portanto, pelo Lema 3.67, A não é isomorfo a qualquer
subconjunto de N.

Lema 3.69 Seja A uma CBO. Se a = b, então Sa não é isomorfo a Sb .

Prova. Como a = b temos, por hipótese, que a < b ou b < a. Assim, basta
considerar o caso a < b. Logo, Sa é uma seção de Sb , pois para um x ∈ Sb fixado,
y ∈ Sa e x ≤ y implica que x ≤ a e x ∈ Sa . Logo, pelo Teorema 3.60, Sa é um
segmento inicial de Sb e, pelo Corolário 3.66, Sa não é isomorfo com Sb .

Lema 3.70 Sejam A e B dois CBO. Se Sa ⊆ A é isomorfo com um segmento


inicial de B, então Sa é isomorfo a um único Sb de B.

Prova. Suponhamos que Sa  Sb e Sa  Sc , onde b, c ∈ B. Então, pelo Teorema


3.60, Sb  Sc . Assim, pelo Lema 3.69, b = c.

107
3.4. Conjuntos Bem Ordenados

Lema 3.71 Sejam A e B dois CBO tais que cada Sa de A é isomorfo a um Sb de


B. Então cada segmento inicial de Sa é isomorfo a um segmento inicial de Sb , isto
é, x ≤ a implica que Sx  Sy , com y ≤ b. Além disso, se f : Sa → Sb é um
isomorfismo, então g = f |Sx : Sx → Sy é um isomorfismo, em que Sy = f (Sx ).
Prova. Seja f (x) = y. Então é fácil verificar que g é injetora e crescente. Assim,
Sx  f (Sx ). Por outro lado, como f um isomorfismo temos que

x < y ⇔ f (x) < y e a ∈ Sx ⇔ a < x ⇔ f (a) < y ⇔ f (a) ∈ Sy .

Portanto, f (Sx ) = Sy , isto é, Sx  Sy .

Lema 3.72 Sejam A, B dois CBO e C o conjunto de todos os elementos x em A


tal que Sx  Sy , para algum y ∈ B. Então C é uma seção de A.
Prova. Para um x ∈ A fixado, a ∈ C e x ≤ a, obtemos x ∈ C, pois, pelo Lema
3.71, Sx é isomorfo a um segmento inicial de B. Portanto, C é uma seção de A.

Lema 3.73 Sejam A, B dois CBO, C o conjunto de todos os elementos x em A tal


que Sx  Sy , para algum y ∈ B e D o conjunto de todos os elementos y em B tal
que Sy  Sx , para algum x ∈ A. Então C  D.
Prova. Dado x ∈ C, pelo Lema 3.70, existe um único y ∈ B tal que Sx  Sy e
vice-versa. Vamos definir f : C → D como f (x) = y. É claro pela definição que
f bijetora. Dados x1 , x2 ∈ C, suponhamos que x1 ≤ x2 , em que f (x1 ) = y1 e
f (x2 ) = y2 . Então devemos provar que y1 ≤ y2 . Assim, pela definição, Sx1  Sy1
e Sx2  Sy2 . Suponhamos, por absurdo, que y2 < y1 . Então Sy2 é um segmento
inicial de Sy1 . Como Sx1 ⊆ Sx2 temos as seguintes possibilidades:
1.a Possibilidade. Sx2  Sy2 é isomorfo a um segmento inicial de Sy1 .
2.a Possibilidade. Sy1  Sx1 é isomorfo a um segmento inicial de Sx2 ,
o que é impossível, pelo Lema 3.67.

Teorema 3.74 (Teorema da Comparabilidade) Sejam A e B dois CBO. Então


exatamente uma e apenas uma das afirmações a seguir pode ocorrer:

1. A  B;

2. A é isomorfo a um segmento inicial de B;

3. B é isomorfo a um segmento inicial de A.

108
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Prova. Sejam C e D os conjuntos definidos no Lema 3.73. Então C  D. Assim,


pelo Lema 3.72, existem quatro possibilidades:
1.a Possibilidade. Se C = A e D = B, então A  B.
2.a Possibilidade. Se C = A e D = Sy ⊆ B, então A  Sy .
3.a Possibilidade. Se C = Sx ⊆ A e D = B, então Sx  B.
4.a Possibilidade. Se C = Sx ⊆ A e D = Sy ⊆ B, então Sx  Sy .
Note que a quarta possibilidade não pode ocorrer, caso contrário, x ∈ C = Sx , o
que é impossível.

Corolário 3.75 Seja A um CBO. Então qualquer subconjunto de A é isomorfo a


A ou a um segmento inicial de A. Conclua que a classe de todos os CBO s é bem
ordenada: A  B se, e somente se, A  Sb , onde b ∈ B, e (A = B significa que
A  B).

Prova. Fica como um exercício.

Exemplo 3.76 Sejam Z+ = {0, 1, 2, 3, . . .} munido com a ordem usual e o conjunto


A = ∪2m=1 {m − (n + 1)−1 : n ∈ Z+ } ⊆ [0, 2[ com a ordem induzida por R. Mostre
que Z+ é isomorfos ao segmento inicial S1 de A.

Solução. Note que a função f : Z+ → S1 definida como f (n) = 1 − (n + 1)−1 é


claramente injetora (prove isto!), f (Z+ ) = S1 e f preserva ordem.

Exemplo 3.77 Seja N munido com a ordem usual e A um subconjunto de N. Mostre


que A é isomorfo a N ou a um segmento inicial de N.

Solução. Se A é um conjunto finito e não vazio, então A contém um menor ele-


mento, digamos x1 . Assim, se A−{x1 } =  ∅, então x1 possui um sucessor imediato,
digamos x2 . Se A − {x1 , x2 } =
 ∅, então x2 possui um sucessor imediato, digamos
x3 , e assim sucessivamente. Como A é finito temos que a cadeia crescente

x 1 < x 2 < x3 < · · ·

para, digamos em xn Logo, A = {x1 , x2 , . . . , xn }. Portanto, A é isomorfo ao seg-


mento inicial Sn+1 = {1, 2, . . . , n} de N. Caso contrário, definimos, indutivamente,
a função “escolha” f : N → A como

f (n) = min(A − Im(f |Sn ) = min(A − {f (1), f (2), . . . , f (n − 1)}), ∀ n ∈ N.

109
3.4. Conjuntos Bem Ordenados

Note que f (n) ∈ A − Im(f |Sn ), para todo n ∈ N. Dados k, m ∈ N, com k = m,


digamos k < m. Assim, Sk ⊂ Sm implica que A − Im(f |Sm ) ⊂ A − Im(f |Sk ),
de modo que f (m) ∈ A − Im(f |Sk ) e f (k) < f (m), pois f (k) ∈ Im(f |Sm ), mas
f (m) ∈/ Im(f |Sm ). Logo, f é injetora. Além disso, indutivamente, f (n) ≥ n,
para todo n ∈ N. Suponhamos, por absurdo, que exista um k ∈ A − Im(f ).
Então k ≤ f (k) e f (k) = min(A − Im(f |Sk ), de modo que f (k) ≤ m, para todo
m ∈ A − Im(f |Sk . Assim, k ∈
/ Im(f |Sk ). Por outro lado, como k ∈ A − Im(f |Sk )
temos que f (k) ≤ k. Portanto, f (k) = k e k ∈ Im(f ), o que é uma contradição.
Consequentemente Im(f ) = A, f é sobrejetora e A  N.

Teorema 3.78 (Primeiro Princípio de Indução Transfinita) Sejam A um CBO e


S um subconjunto de A com as seguintes propriedades:

1. a0 ∈ S, com a0 o menor elemento (base de indução).

2. Se a ∈ A e Sa ⊆ S, então a ∈ S (P IT ).

Então S = A.
Solução. Suponhamos, por absurdo, que S = A. Então T = A − S = ∅. Logo,
por hipótese, T contém um menor elemento, digamos t0 ∈ T . Assim, x < t0 , para
todo x ∈ St0 , isto implica que x ∈
/ T , ou seja, St0 ⊆ S. Logo, pela propriedade (2),
t0 ∈ S. Portanto, t0 ∈ S ∩ T = ∅, o que é uma contradição. Neste caso, S = A.

Observação 3.79 Neste ponto é essencial apresentar as diferenças entre o Princí-


pio de Indução Finita “Completo” (P IF ) e o P IT .

1. A propriedade (1) é uma consequência da propriedade (2), pois ∅ = Sa0 ⊆ S


implica que a0 ∈ S.

2. O P IF é equivalente ao P IT sobre o conjunto dos números naturais N, pois


dado n ∈ N, se Sn ⊆ S, então n ∈ S implica que S = N.

3. Pelo item (1) no P IT não há necessidade do elemento inicial. Enquanto, no


P IF sim.

4. Seja A = N ∪ {∞}. Então, pelo item (4) da Observação 3.51, A é um CBO.


Assim, S = N é um subconjunto não vazio de A tal que n ∈ S implica que
n + 1 ∈ S, mas S = A. Portanto, o P IF não implica o P IT em um CBO
qualquer.

110
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Teorema 3.80 (Segundo Princípio de Indução Transfinita) Sejam A um CBO e


P (x) uma afirmação que é verdadeira ou falsa, para cada x ∈ A. Suponhamos que
a seguinte propriedade seja satisfeita:

Se P (y) é verdadeira para cada y ∈ Sx , então P (x) é verdadeira. (P IT )

Então P (x) é verdadeira, para todo x ∈ A.

Prova. Consideremos o conjunto S = {x ∈ A : P (x) é falsa}. Suponhamos, por


absurdo, que S = ∅. Assim, por hipótese, S contém um menor elemento, digamos
m ∈ S. Como P (y) é verdadeira para cada y ∈ Sm temos, pela propriedade P IT ,
que P (m) é verdadeira, o que contradiz a minimalidade de m. Portanto, P (x) é
verdadeira, para todo x ∈ A.

Seja X um conjunto qualquer. Para cada n ∈ N, consideremos o conjunto de


sequências

Seq(X) = {h : In → X : In = Sn+1 ⊆ N} = X In ⊆ P(N × X).
n∈N

O comprimento da sequências é seu domínio. Assim, pelo Exemplo 2.28, podemos


identificar X In com

X n = X × X × · · · × X = {(x1 , x2 , . . . , xn ) : xi ∈ X}.

Então, para cada x ∈ Seq(X), existe um único n ∈ N tal que x ∈ X n , isto é,


x = (h(1), h(2), . . . , h(n)) = (x1 , x2 , . . . , xn ). Vamos provar abaixo que dada uma
função qualquer g : Seq(X) → X, existe uma única função f : N → X tal que

∀ n ∈ N [f (n + 1) = g(f |In ) = g(x)]

em que f |In = f ∩ (In × X). Mais geralmente, temos o seguinte teorema.

Teorema 3.81 (Fórmula de Recorrência de Dedekind) Sejam A um CBO qual-


quer, X um conjunto qualquer e F a família de todas as funções fa : Sa → X,
para cada a ∈ A, ou seja, F = ∪a∈A X Sa ⊆ P(A × X). Seja g : F → X uma
função qualquer. Então existe uma única função f : A → X tal que

∀ a ∈ A [f (a) = g(f |Sa ) = g(fa )].

111
3.4. Conjuntos Bem Ordenados

Prova. (Existência) Se A = ∅, então f = ∅. Note que f é um subconjunto de


A × X com as seguintes propriedades:

1. Para qualquer a ∈ A, existe um x ∈ X tal que (a, x) ∈ f .

2. Se (a, x1 ) ∈ f e (a, x2 ) ∈ f , então x1 = x2 .

3. (c, fa (c)) ∈ f , para todo c ∈ Sa . (Base de Recorrência)

4. Se (c, fa (c)) ∈ f , então (c, g(fa )) ∈ f , para todo c ∈ Sa e a ∈ A (Fórmula


de Recorrência).

Seja C o conjunto de todos os subconjuntos B de A × X tais que

(c, fa (c)) ∈ B ⇒ (c, g(fa )) ∈ B, ∀ c ∈ Sa e a ∈ A.

Então C = ∅, pois A × X ∈ C. Pondo


f= B,
B∈C

é fácil verificar que f ∈ C. Assim, basta provar que f é a função desejada. Para
isto, seja S o conjunto de todos os elementos c ∈ A tais que (c, x1 ) ∈ f e (c, x2 ) ∈ f
implicam que x1 = x2 ou, equivalentemente, S é o conjunto de todos os elementos
c ∈ A tal que existe no máximo um x ∈ X, com (c, x) ∈ f . Logo, devemos provar
que se Sa ⊆ S, então a ∈ S (P IT ). Note que Sa ⊆ S significa que se c ∈ Sa , então
existe um único elemento x ∈ X tal que (c, x) ∈ f , de modo que a correspondência
c → x define uma função fa : Sa → X tal que fa ⊆ f . Suponhamos, por absurdo,
que a ∈ / S. Então (a, y) ∈ f , para algum y ∈ X, com y = g(fa ).
Afirmação. f − {(a, y)} ∈ C ou, equivalentemente, se b ∈ A e fb ⊆ f −
{(a, y)}, então (b, g(fb )) ∈ f − {(a, y)}.
De fato, se a = b, então fa = fb . Assim, (b, g(fb )) ∈ f −{(a, y)}, pois y = g(fa ) =
g(fb ). Logo, f − {(a, y)} ∈ C e f ⊆ f − {(a, y)}, o que é uma contradição. Se
a = b, então (b, g(fb )) ∈ f −{(a, y)}, pois f ∈ C e a = b. Assim, f −{(a, y)} ∈ C
e f ⊆ f − {(a, y)}, o que é uma contradição. Portanto, S = A.
(Unicidade) Seja h : A → X outra função tal que

∀ a ∈ A [h(a) = g(h|Sa ) = g(ha )].

112
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

Consideremos o conjunto T = {b ∈ A : f (b) = h(b)}. Suponhamos que a ∈ A e


Sa ⊆ T , então a ∈ T , pois f (a) = g(f |Sa ) = g(h|Sa ) = h(a). Portanto, T = A e
f = h.

Observação 3.82 Seja a0 o menor elemento de A. Então Sa0 = ∅. Como existe


uma única função fa0 : ∅ → X temos que g(fa0 ) é unicamente determinado. Assim,
dado x0 ∈ X, existe uma única função f : A → X tal que f (a0 ) = x0 e

∀ a ∈ A − {a0 } [f (a) = g(f |Sa ) = g(fa )].

Em particular, se A = N, então a Fórmula de Recorrência torna-se mais simples,


pois qualquer elemento possui um predecessor imediato, ou seja, dado x0 ∈ X,
existe uma única função f : A → X tal que f (1) = x0 e

∀ n ∈ A [f (n + 1) = g(fn )].

Corolário 3.83 Sejam X um conjunto qualquer, c ∈ X e h : N × X → X uma


função qualquer. Então existe uma única função f : N → X tal que

f (1) = c e ∀ n ∈ N [f (n + 1) = h(n, f (n))].

Prova. Sejam g(∅) = c e fn : In → X, para cada n ∈ N. Então n = max(In ) e


g(fn ) = h(n, fn (n)) está bem definida para toda função fn . Assim, pela Fórmula
de Recorrência, existe uma única função f : N → X tal que

f (1) = c e ∀ n ∈ A [f (n + 1) = g(f |Sn+1 ) = g(fn ) = h(n, f (n))],

que é o resultado desejado.

Exemplo 3.84 Seja {xn }n∈N uma sequância em R (uma função de N em R). Mos-
tre que existe uma única função f : N → R tal que

f (1) = x1 , f (2) = x1 x2 e f (n + 1) = f (n)xn+1 , ∀ n ∈ N.

Em particular, se xn = a, para todo n ∈ N, então an+1 = an a, isto é, definimos a


potência n-ésima de a.
Solução. Note que A = N, X = R e Seq(R) = ∪n∈N Rn . Vamos definir uma
função qualquer fn : In → R como fn (n) = x1 x2 · · · xn . Então, pela Fórmula de

113
3.4. Conjuntos Bem Ordenados

Recorrência, existe uma única função f : N → R com as propriedades desejadas.


Mais precisamente, sejam c = x1 , h(n, x) = xxn+1 e g : Seq(R) → R definida
como g(fn ) = h(n, fn (n)) = fn (n)xn+1 . Então f (1) = x1 e

f (n + 1) = g(fn (n)) = h(n, fn (n)) = f (n)xn+1 ,

para todo n ∈ N.

Exercícios

1. Mostre que 2 é um número irracional.

2. Seja R munido com a ordem usual. Mostre que dados a, b ∈ R, com a < b,
existe um número irracional x tal que a < x < b.

3. Supondo que R munido com a ordem usual seja completo.

(a) Mostre que se a ∈ R, então existe n = n(a) ∈ Z tal que a < n.


1
(b) Mostre que se a ∈ R, com a > 0, então existe n ∈ N tal que 0 < n
< a.
(c) Mostre que se a ∈ R, com a > 0, então R = ∪n∈Z [na, (n + 1)a[, é uma
união disjunta de intervalos.
(d) Mostre que para quaisquer a, b ∈ R, com a > 0, existe um único q ∈ Z
tal que b = qa + r, com 0 ≤ r < a.

4. Seja A = {1, 3, 5, . . . ; 2, 4, 6, . . .}, com a ordenação dada no Exemplo 3.68.


Mostre que 1 e 2 não possuem predecessores imediados. Além disso, deter-
mine os segmentos iniciais S1 , S5 , S2 e S8 .

5. Seja A um CBO. Dado a ∈ A, vamos denotar por a− e a+ o predecessor


imediato (se ele existir) e o sucessor imediato de a, respectivamente.

(a) Mostre que a ≤ b se, e somente se, a+ ≤ b+ .


(b) Mostre que a = b se, e somente se, a+ = b+ .
(c) Mostre que a < b se, e somente se, a− < b− .
(d) Mostre que a = b se, e somente se, a− = b− .
(e) Mostre que a = b+ se, e somente se, a− = b.

114
Capítulo 3. Conjuntos Parcialmente Ordenados

6. Seja A um CBO. Diremos que q ∈ A é um elemento limite de A se q


não é o menor elemento de A e nem possui um predecessor imediato ou,
equivalentemente, q = a+ , para todo a ∈ A. Neste caso, Sq = ∅ e para
qualquer a ∈ Sq , existe um b ∈ A tal que b < a < q.

(a) Mostre que R munido com a ordem usual, qualquer elemento é um ele-
mento limite.
(b) Mostre que q é um elemento limite de A se, e somente se, a < q se, e
somente se, a+ < q, em que a+ representa o sucessor imediato de a.
(c) Mostre que q é um elemento limite de A se, e somente se, q = sup(Sq ).

7. Seja A = {m + (n + 1)−1 n : m, n ∈ Z+ } com a ordem induzida por R.


Determine, se existir, os elementos limites de A.

8. Seja A um CBO. Mostre que S = ∪a∈B Sa é um segmento inicial de A, em


que B ⊆ A. Conclua que Sa ∪ {a} é um segmento inicial de A, para cada
a ∈ A, fixado.

9. Mostre que se A é um CBO e f : A → B é um isomorfismo, então B é um


CBO.

10. Sejam A e B conjuntos enumeráveis disjuntos. Mostre que A∪B é um CBO.

11. Seja A um CBO. Mostre que a família de todas os segmentos iniciais de A


ordenado pela inclusão é um CBO.

12. Seja A um conjunto totalmente ordenado. Mostre que a família de todas as


seções de A ordenado pela inclusão é totalmente ordenada.

13. Sejam A um conjunto totalmente ordenado, B um poset e f : A → B uma


função crescente. Mostre que f é injetora se, e somente se, f é estritamente
crescente.

14. Sejam A um conjunto totalmente ordenado e {E, D} uma partição de A.


Mostre que (E, D) é um corte de A se, e somente se, para todo x ∈ E e
y ∈ D, x ≤ y.

15. Seja A um poset. Mostre que se B é uma seção de A se, e somente se,
(B, A − B) é um corte de A.

115
3.4. Conjuntos Bem Ordenados

16. Sejam A, B dois posets e f : A → B uma função. Mostre que f crescente


se, somente se, f −1 (C) é um seção de A, para toda seção C de B.

17. Sejam A um conjunto totalmente ordenado, B um subconjunto de A e b ∈ B.


Mostre que B possui um menor elemento se, e somente se, Sb ∩ B possui um
menor elemento.

18. Seja A um conjunto totalmente ordenado. Mostre que A é um CBO se, e


somente se, qualquer segmento inicial de A é bem ordenado.

19. Seja A um conjunto totalmente ordenado. Mostre que A é um CBO se, e


somente se, não existir cadeia descendente infinita em A, isto é, uma família
{xn : n ∈ Z+ }, com xn > xn+1 , para todo n ∈ Z+ . Conclua que [0, 1] não é
um CBO.

20. Sejam A um CBO e f : A → A uma função crescente. Mostre que se


qualquer subconjunto não vazio de A possui um supremo, então existe um
a ∈ A tal que f (a) = a.

21. Seja A um CBO. Mostre que IA é o único isomorfismo de A sobre A.

22. Sejam A e B dois CBO. Mostre que se f : A → B e g : B → A são


isomorfismos, então g = f −1 .

23. Sejam A e B dois CBO. Mostre que existe no máximo um isomorfismo


f : A → B.

24. Sejam A e B dois CBO. Mostre que se A é isomorfo a um subconjunto de B


e B é isomorfo a um subconjunto de A, então A é isomorfo com B.

25. Sejam A e B dois CBO. Mostre que se A é isomorfo a um conjunto contendo


B e B é isomorfo a um conjunto contendo A, então A é isomorfo com B.

26. Sejam g : A → A uma função injetora e c ∈ A−Im(g). Definido f : N → A,


recursivamente, como f (1) = c e f (n + 1) = g(f (n)), para todo n ∈ N,
mostre que f é injetora.

116
CAPÍTULO 4

AXIOMA DA ESCOLHA E APLICAÇÕES

Zermelo, em 1904, em uma análise mais criteriosa da prova da conjectura de


Cantor, “todo conjunto pode ser bem ordenado”, observou que uma suposição que
foi usada implicitamente na prova não era consequência dos postulados da mate-
mática ou da lógica. Assim, ele tomou como um axioma e chamou de Axioma da
Escolha, denotado por ZF8 , o qual intuitivamente é: escolhendo arbitrariamente
conjuntos não vazios A, B. . . , uma “função escolha” significa uma função que a
cada conjunto A, B . . . associa um elemento a, b . . . do próprio conjunto.
Gödel, em 1935, mostrou que se os axiomas da Teoria dos Conjuntos ZF eram
consistentes, então ZF + ZF8 era consistente. Assim, é natural que este resultado
de Gödel deixe aberta a possibilidade ZF8 de ser derivado de outros axiomas. Mas,
Cohen1 , em 1963, mostrou que ZF + (∼ ZF8 ) era consistente se ZF também o
era. Portanto, ZF8 é independente de ZF .
Uma outra forma do axioma da escolha pode ser enunciada como: “seja P um
conjunto não vazio, de subconjuntos não vazios de um conjunto dado A. Então
existe um subconjunto C de A tal que, para todo B ∈ P, C ∩ B é um conjunto
unitário.”
Da mesma forma que o Princípio da Boa Ordenação, o Axioma da Escolha
pode ser utilizado como eficiente ferramenta de modelagem em diversas situações-
problema, principalmente aquelas que possuem como objetivo a existência de de-
terminados objetos. Vejamos um exemplo de uma situação dessa natureza.
1
Paul Joseph Cohen, 1934-2007, matemático americano

117
4.1. Axioma da Escolha

Qualquer espaço vetorial possui uma base.


Em bem pouco tempo estaremos aptos a responder esta e outras questões semelhan-
tes, onde veremos que a existência de base para um espaço vetorial não decorre da
Teoria dos Conjuntos de Zermelo-Fraenkel sem o axioma da escolha.
Finalmente, neste capítulo apresentaremos o axioma da escolha e suas principais
consequências.

4.1 Axioma da Escolha


Nesta seção discutiremos um conceito que é um dos mais importantes, e ao
mesmo tempo um dos mais controversos, princípios da matemática.

ZF8 - Axioma da escolha (Forma Multiplicativa). Seja {Ai }i∈I uma família
não vazia de conjuntos não vazios. Então

P = Ai = ∅.
i∈I

Equivalentemente, seja F uma função, com Dom(F ) = I, tal que F (i) = ∅, para
todo i ∈ I. Então existe uma função f : I → ∪i∈I F (i) tal que f (i) ∈ F (i), para
todo i ∈ I.

Observação 4.1 Sejam {Ai }i∈I uma família não vazia de conjuntos não vazios e

P = i∈I Ai .

1. Um objeto de P chama-se uma função escolha associada a família {Ai }i∈I ,


ou seja, é uma função f : I → ∪i∈I Ai tal que f (i) ∈ Ai , para todo i ∈ I.
Note que Dom(f ) = I e f (i) ∈ Ai , para todo i ∈ I.

2. Intuitivamente, o axioma ZF8 diz que podemos simultaneamente escolher


algum elemento de cada subconjunto não vazio de um dado conjunto.

3. Se Ai = B, para todo i ∈ I, então P é simplesmente o conjunto de todas as


funções f : I → B, isto é, P = B I .

4. Se I é um conjunto finito, então, não há a necessidade de usar o axioma ZF8 ,


para provar que P = ∅. De fato, se A1 = ∅ e A2 = ∅, então existe um
x1 ∈ A1 e x2 ∈ A2 . Assim, (x1 , x2 ) ∈ A1 × A2 e A1 × A2 = ∅. Agora, use

118
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

indução sobre n, com I = {1, 2, . . . , n}. Neste caso, a cada função escolha
f : I → ∪ni=1 Ai corresponde a uma única n-upla

f → (x1 , . . . , xn ),

onde f (i) = xi ∈ Ai , para todo i ∈ I. Reciprocamente, dado uma n-upla

(x1 , . . . , xn ),

onde xi ∈ Ai , para todo i ∈ I. Então existe uma única função escolha


f : I → ∪ni=1 Ai associada a ela, a saber, f (i) = xi , para todo i ∈ I.
Portanto, existe uma correspondência biunívoca entre as n-uplas ordenadas

e os elementos de ni=1 Ai , explicitamente,


n
ϕ: Ai → A1 × · · · × An
i=1

definida como ϕ(f ) = (f (1), . . . , f (n)). Por isto, denotaremos por

A1 × · · · × An

o produto cartesiano e escreveremos os elementos como n-uplas ordenadas.


Assim, concluímos que o axioma ZF8 é significativo se I for um conjunto
infinito.

5. Se cada Ai é um grupo Gi , com elemento identidade ei , então podemos definir


a função f : I → ∪i∈I Ai por f (i) = ei sem usar o axioma ZF8 . Não
obstante, se escolhermos ai ∈ Ai , com ai = ei , então a função h : I →
∪i∈I Ai definida por h(i) = ai pode não está bem definida, pode não ser
injetora.

6. Se cada Ai é um CBO, então podemos definir a função f : I → ∪i∈I Ai por


f (i) = min(Ai ) ∈ Ai , sem usar o axioma ZF8 .

Exemplo 4.2 Seja A um subconjunto de R. Diremos que p ∈ R é um ponto limite


de A se dado  > 0, existir um x ∈ A tal que 0 < |x − p| <  ou, equivalentemente,
]p − , p + [ ∩(A − {p}) = ∅. Se p ∈ A e p não é um ponto limite de A, diremos
que ele é um ponto isolado de A ou, equivalentemente, ]p − , p + [ ∩A = {p}.

119
4.1. Axioma da Escolha

Mostre que p ∈ R é um ponto limite de A se, e somente se, existir uma sequência
{xn }n∈N em A, com xn = p, para todo n ∈ N, tal que limn→∞ xn = p. Conclua
que cada p ∈ R é um ponto limite de Q.

Solução. Suponhamos que p ∈ R seja um ponto limite de A. Então dado  > 0,


existe um x ∈ A tal que 0 < |x − p| < . Em particular, para cada n ∈ N, pondo
 = n1 , temos uma família

1
An = In ∩ A, com In = {x ∈ R : 0 < |x − p| < },
n

não vazia de conjuntos não vazios. Assim, pelo axioma ZF8 , P = n∈N An = ∅,
ou seja, existe uma função escolha f : N → ∪n∈N An tal que f (n) ∈ An , para todo
n ∈ N. Portanto, obtemos uma sequência {xn = f (n)}n∈N em A, com xn = p,
para todo n ∈ N, tal que limn→∞ xn = p.
Reciprocamente, seja {xn }n∈N uma sequência em A tal que limn→∞ xn = p.
Então dado  > 0, existe um n0 ∈ N tal que

|xn − p| < , ∀ n ∈ N, com n ≥ n0 .

Assim, 0 < |xn − p| < , para algum n ∈ N, com n ≥ n0 . Portanto, p é om ponto


limite de A. Para provar a última afirmação, confira Exemplo 3.57.

Exemplo 4.3 Sejam f : R → R uma função e a ∈ R fixado. Mostre que f é


contínua em a se, e somente se, para qualquer sequência {xn }n∈N em R tal que
limn→∞ xn = a implicar que limn→∞ f (xn ) = f (a).

Solução. Suponhamos que f seja contínua em a. Então dado  > 0, existe um


δ > 0 tal que
|x − a| < δ ⇒ |f (x) − f (a)| < , ∀ x ∈ R.
Seja {xn }n∈N uma sequência em R tal que limn→∞ xn = a. Então existe um nδ ∈ N
tal que
|xn − a| < δ, ∀ n ∈ N, com n ≥ nδ .
Assim,
|f (xn ) − f (a)| < , ∀ n ∈ N, com n ≥ nδ .
Portanto, limn→∞ f (xn ) = f (a).

120
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

Reciprocamente, suponhamos, por absurdo, que f não seja contínua em a. En-


tão existe um  > 0, com a seguinte propriedade: para qualquer δ > 0, existe um
xδ ∈ R tal que
|xδ − a| < δ e |f (xδ ) − f (a)| ≥ .
Em particular, para cada n ∈ N, pondo δ = n1 , teremos uma família

1
An = {x ∈ R : |x − a| < e |f (x) − f (a)| ≥ } =
 ∅,
n

Logo, pelo axioma ZF8 , P = n∈N An = ∅. Portanto, existe uma sequência
{xn }n∈N em P ⊆ R tal que xn ∈ An , para todo n ∈ N, ou seja, limn→∞ xn = a,
mas limn→∞ f (xn ) = f (a), o que é uma contradição.

Observação 4.4 Note que a existência de uma sequência em R não decorre da


Teoria dos Conjuntos de Zermelo-Fraenkel sem o uso do axioma ZF8 .

Exemplo 4.5 Seja f : A → B uma função sobrejetora. Mostre que existe uma
função g : B → A tal que f ◦ g = IB . Esta afirmação é equivalente ao axioma
ZF8 .

Solução. Suponhamos que f : A → B seja uma função sobrejetora. Então para


cada b ∈ B, Ab = f −1 (b) é um subconjunto não vazio de A. Assim,

F = {Ab : b ∈ B} = {Ab }b∈B

é uma família não vazia de conjuntos não vazios. Neste caso, A = ∪F


˙ = ∪˙ b∈B Ab
e X ∈ F significa que X = f −1 (b) = Ab , para algum b ∈ B. Logo, pelo axioma

ZF8 , P = b∈B Ab = ∅. Assim, existe um h ∈ P tal que h(X) ∈ X, para todo
X ∈ F. Vamos definir g : B → A como

g(b) = h(Ab ) = h(f −1 (b)), ∀ b ∈ B.

Portanto, é fácil verificar que f ◦ g = IB .


Reciprocamente, podemos supor, sem perda de generalidade, que F = {Ai }i∈I
seja uma família não vazia de conjuntos disjuntos e não vazios. Caso contrário,
tome F = {Ai × {i}}i∈I . Então a função f : ∪F → F definida como f (x) = Ai ,
quando x ∈ Ai , é claramente bem definida e sobrejetora. Assim, existe uma função

121
4.1. Axioma da Escolha


g : F → ∪F tal que f ◦ g = IF . Portanto, g ∈ P = i∈I Ai e P = i∈I Ai = ∅,
ou seja, o axioma ZF8 está satisfeito.

Sejam A um conjunto qualquer e P(A)∗ = P(A) − {∅}. Uma função escolha


para A é uma função r : P(A)∗ → A tal que r(B) ∈ B, para todo B ∈ P(A)∗ . Se
rB = r(B), diremos que rB é o representante de B.

Exemplo 4.6 Seja A = {a, b, c}. Então uma função escolha para A é definida pela
tabela. Note que existem 24 tais funções.

B A {a, b} {a, c} {b, c} {a} {b} {c}


r(B) a a a b a b c

Observe, por exemplo, que se B = {a, b}, então rB = r(B) = a.

Exemplo 4.7 Seja A um CBO. Então uma função escolha r : P(A)∗ → A para A
é definida como r(B) = min(B) ∈ B.

Exemplo 4.8 Qualquer conjunto finito possui uma função escolha.


Solução. Vamos usar indução sobre o número de elementos do conjunto. Suponha-
mos que o resultado seja válido para n, isto é, se C é um conjunto com n elementos,
então existe uma função escolha r : P(C)∗ → C. Sejam A um conjunto qualquer,
com n + 1 elementos, e a ∈ A fixado. Então o conjunto B = A − {a} possui n
elementos. Assim, existe uma função escolha ra : P(B)∗ → B. Como A = {a}∪B ˙
temos que os subconjuntos de A que não contém a são precisamente os subconjun-
tos de B. Portanto, a função r : P(A)∗ → A definida como

ra (X), se a ∈
/X
r(X) =
a, se a ∈ X

é claramente uma função escolha para A, pois qualquer subconjunto de A que con-
tém a é da forma X ∪ {a}, com X ⊆ B.

Teorema 4.9 As seguintes condições são equivalentes:


1. Vale o axioma ZF8 ;

2. F1 - (Forma de Potência) - Qualquer conjunto não vazio possui uma função


escolha.

122
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

Prova. Sejam A um conjunto não vazio qualquer, I = P(A)∗ e Ai = i, para todo


i ∈ I. Então {B}B∈P(A)∗ = {Ai }i∈I é uma família não vazia de conjuntos não

vazios. Assim, P = B∈P(A)∗ B = i∈I Ai = ∅. Logo, existe um f ∈ P , onde
f (Ai ) ∈ Ai , para todo i ∈ I, isto é, f é uma função escolha para A. Portanto, F1
está satisfeita.
Reciprocamente, sejam {Ai }i∈I uma família não vazia de conjuntos não vazios,

A = ∪i∈I Ai e P = i∈I Ai . Então, por hipótese, existe uma função escolha
r : P(A)∗ → A para A, isto é, r(B) ∈ B, para todo B ∈ A. Em particular,
r(Ai ) ∈ Ai , para todo i ∈ I. A função f : I → A definida como f (i) = r(Ai ) ∈ Ai
é um elemento de P . Portanto, o axioma ZF8 está satisfeito.

Consideremos a seguinte afirmação: F2 - (Forma de Partição) - Sejam F um


conjunto cujos elementos são conjuntos não vazios e disjuntos aos pares. Então
existe um conjunto C que consiste de exatamente um elemento de cada A ∈ F,
isto é, C ∩ A = {a}, para cada A ∈ F, ou, equivalentemente, existe uma função
f : F → ∪F tal que f (B) ∈ B, para todo B ∈ F. O conjunto C chama-se
conjunto escolha da família. Note que pondo I = F e Ai = i, para todo i ∈ I,
obtemos

A = {Ai }i∈I = {Ai : i ∈ I} ou F = {B}B∈F = {B : B ∈ F}.

Neste caso, C ⊆ ∪i∈I Ai = ∪B∈F B e C ∩ B = {a}, para cada B ∈ F. Observe


que F2 significa que a cada relação de equivalência corresponde a um sistema de
representantes.

Exemplo 4.10 Sejam A um CBO e f : A → B uma função sobrejetora. Mostre


que A possui um conjunto escolha.

Solução. Suponhamos que f : A → B seja uma função sobrejetora. Então Ab =


f −1 (b) é um subconjunto não vazio de A, para todo b ∈ B.
Afirmação. A família {Ab }b∈B é uma partição de A.
De fato, se x ∈ A, então f (x) ∈ B. Logo, x ∈ Ab , para algum b = f (x) ∈ B.
Portanto, A ⊆ ∪b∈B Ab , ou seja, A = ∪b∈B Ab . Dados b, c ∈ B, se Ab = Ac ,
digamos existe um x ∈ A tal que x ∈ Ab e x ∈ / Ac , então Ab ∩ Ac = ∅, pois se
y ∈ Ab ∩ Ac , então x = f (b) = y = f (c). Assim, x ∈ Ac , o que é impossível.

123
4.1. Axioma da Escolha

Como A é um CBO e Ab = ∅, para todo b ∈ B, temos que o conjunto

C = {m ∈ A : m = min(Ab )}

está bem definido. É claro que C ∩ Ab = {m}, para cada b ∈ B. Portanto, C é um


conjunto escolha para A. Neste caso, o conjunto C chama-se um sistema minimal
de representantes para a partição de A. Note que não houve a necessidade de usar
o axioma ZF8 para provar a existência de C.

Exemplo 4.11 Seja f : A ⊆ N → B uma função sobrejetora. Mostre que B é um


conjunto enumerável.

Solução. Já vimos, no Exemplo 4.10, que o conjunto A possui um conjunto escolha


C. Então é fácil verificar que a função g = f |C : C → B é bijetora. Portanto, B é
um conjunto enumerável.

Teorema 4.12 As afirmações F1 e F2 são equivalentes.

Prova. Sejam F um conjunto cujos elementos são conjuntos não vazios, disjuntos
aos pares e X = ∪F = ∪A∈A A. Então F ⊆ P(X)∗ . Assim, por hipótese, existe
uma função escolha r : P(X)∗ → X para X tal que r(A) ∈ A, para todo A ∈
P(X)∗ . Logo, o conjunto C = r(F) = {r(A) : A ∈ F} tem as propriedades
desejadas, pois C ∩ A = {a}, para cada A ∈ F.
Reciprocamente, sejam A um conjunto não vazio, B ⊆ A não vazio e XB =
{(B, x) : x ∈ B} ou XB = {B} × B. Então se B, C são não vazios e B ∩
C = ∅, então XB ∩ XC = ∅. Assim, F = {XB }B∈P(A)∗ é uma família não
vazia de conjuntos não vazios disjuntos aos pares, pois XB ⊆ P(A) × A implica
que F ⊆ P(P(A) × A) e pelos axiomas ZF3 , ZF6 e o Teorema 2.18, a família
F é um conjunto. Logo, existe um conjunto escolha C para A, isto é, para cada
B ∈ P(A)∗ existe um único x ∈ B tal que (B, x) ∈ C ∩ XB . Portanto, a função
r : P(A)∗ → A definida como r(B) = x é uma função escolha para A. Mais
precisamente, r(B) = p2 (B, x) = x, com p2 : P(A) × A → A.

Consideremos a seguinte afirmação: F3 - (Função Escolha) - Seja {Ai : i ∈ I}


uma família não vazia de conjuntos não vazios. Então existe uma função f : I →
∪i∈I Ai , onde f (i) ∈ Ai , para todo i ∈ I, ou, equivalentemente, se F é uma família

124
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

não vazia de conjuntos não vazios, então existe uma função

f : F → ∪F = {x : x ∈ A, para algum A ∈ F},

onde f (A) ∈ A, para todo A ∈ F.


Note que a afirmação F2 é equivalente a afirmação F3 . De fato, se {Ai : i ∈ I} é
uma família não vazia de conjuntos não vazios, então o conjunto F = {Ai ×{i}}i∈I
é uma família não vazia de conjuntos não vazios e disjuntos aos pares. Assim, existe
um conjunto escolha C para F, isto é, para cada i ∈ I, existe um único ai ∈ Ai tal
que (ai , i) ∈ C ∩ (Ai × {i}). Portanto, a função f : I → ∪i∈I Ai definida como
f (i) = p1 (ai , i) = ai ∈ Ai , com p1 : Ai ×{i} → Ai , tem as propriedades desejadas.
Reciprocamente, se F = {Ai : i ∈ I} é uma família não vazia de conjuntos
não vazios e disjuntos aos pares. Então existe uma função f : I → ∪i∈I Ai tal que
f (i) ∈ Ai , para todo i ∈ I. Portanto, C = f (I) = {f (i) : i ∈ I} é um conjunto
escolha para F, pois C ∩ Ai = {f (i)}, para todo i ∈ I.

Exemplo 4.13 Consideremos a família F = {An }n∈N = {An : n ∈ N}, em que


An = {2n − 1, 2n}. É claro que F é uma família não vazia de conjuntos não
vazios e disjuntos aos pares. Então existe uma função escolha f : N → ∪n∈N An
definida como f (n) = 2n ∈ An , para todo n ∈ N. Portanto, é fácil verificar
que C = f (N) = {2, 4, 6, . . .} é um conjunto escolha para F. Mais geralmente,
sejam A um conjunto qualquer e F = {{x} : x ∈ A} uma família não vazia
de conjuntos não vazios e disjuntos aos pares. Então existe uma função escolha
f : A → ∪x∈A {x} = A tal que f (x) = x, para todo x ∈ A.

Teorema 4.14 O axioma ZF8 é equivalente à afirmação F3 .

Prova. Fica como um exercício.

É importante observar, em tudo que segue, que a palavra axioma da escolha


significa qualquer uma das afirmações equivalentes dadas acima.

Exemplo 4.15 Seja A um conjunto infinito. Mostre que existe uma função inje-
tora f : N → A. Em particular, A contém um subconjunto enumerável (contável
infinito).

Solução. Como A = ∅, podemos escolher x1 ∈ A. Sendo A = {x1 }∪(A


˙ − {x1 })
uma partição de A, podemos escolher x2 ∈ A − {x1 }, e assim sucessivamente.

125
4.1. Axioma da Escolha

Portanto, a função f : N → A definida como f (1) = x1 e f (n) = xn é claramente


injetora. Mas nada garante que ela esteja bem definida. Para contornarmos esta
situação vamos usar a afirmação F2 . Consideremos o conjunto não vazio Bn = A −
{x1 , . . . , xn−1 }. Seja F = {An }n∈N = {{Bn } × Bn }n∈N . Então F é uma família
não vazia de conjuntos não vazios e disjuntos aos pares. Assim, pela afirmação F2 ,
existe um conjunto escolha C para F, isto é, para cada n ∈ N existe um único
xn ∈ Bn tal que (Bn , xn ) ∈ C ∩ An . Vamos definir f : N → A como f (n) = xn =
p2 (Bn , xn ), com p2 : P(A) × A → A. Portanto, f está bem definida e é injetora.

Observação 4.16 Sejam A um conjunto infinito e r : P(A)∗ → A uma função


escolha para A. Então vamos definir, indutivamente, uma função f : N → A como

f (n) = r (A − {f (1), . . . , f (n − 1)}) = r(Bn ) ∈ Bn .

Portanto, f está bem definida e é injetora, pois A é um conjunto infinito. É muito


útil o seguinte. Seja h : N → A definida, recursivamente, como

h(1) = ∅ e h(n + 1) = h(n) ∪ {r(A − h(n))}, com h(n) = {f (1), . . . , f (n − 1)}.

Então F = {h(n) : n ∈ N} = {(f (1), . . . , f (n − 1)) : f (k) ∈ A} é o conjunto de


todas as sequências finitas de elementos de A. Portanto,

f (n) = r(A − h(n)).

Exemplo 4.17 Dados conjuntos quaisquer A e B. Mostre que existe uma função
sobrejetora f : A → B se, e somente se, existir uma função g : B → A tal que
f ◦ g = IB . Em particular, f é sobrejetora se, e somente se, g é injetora.

Solução. Suponhamos que f seja sobrejetora. Então Xb = f −1 (b) é um subcon-


junto não vazio de A, para todo b ∈ B. Seja r : P(A)∗ → A uma função escolha
para A, isto é, r(X) ∈ X, para todo X ∈ P(A)∗ . Então a função g : B → A
definida como g(b) = r(Xb ), para todo b ∈ B, tem as propriedades desejadas. Com
efeito,
(f ◦ g)(b) = f (g(b)) = f (r(Xb )) = b = IB (b),
pois r(Xb ) ∈ Xb = f −1 (b). Além disso, dados b, c ∈ B, se b = c, então Xb = Xc .
Logo, g(b) = g(c), isto é, g é injetora.
Reciprocamente, suponhamos que exista uma função g : B → A tal que f ◦ g =

126
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

IB . Então dado y ∈ B, existe um x = g(y) ∈ A tal que

y = IB (y) = (f ◦ g)(y) = f (g(y)) = f (x),

isto é, f é uma função sobrejetora. Finalmente, se g : B → A é uma função


injetora. Então g : B → C é uma função bijetora, com C = Im(g) ⊆ A. Assim,
g −1 : C → B é uma função. Seja b ∈ B fixado. Então f : A → B definida como

g −1 (x), se x ∈ C
f (x) =
b, se x ∈
/C

é uma função sobrejetora, pois dado y ∈ B existe um x ∈ C tal que y = g −1 (x),


ou seja, existe um x ∈ C ⊆ A tal que y = g −1 (x) = f (x). Note que não houve a
necessidade de usar o axioma da escolha na última afirmação.

Exemplo 4.18 (Método da Diagonal de Cantor) Seja A um conjunto com pelo


menos dois elementos. Mostre que não existe uma função sobrejetora de A sobre
AA . Conclua que não existe função sobrejetora de B sobre AB , para qualquer
conjunto B.

Solução. Seja f : A → AA uma função qualquer. Vamos provar que f não pode
ser sobrejetora. Caso contrário, dado h ∈ AA , existe um a ∈ A tal que h = f (a)
e denotamos por fa o valor de f em a. Assim, fa (x) ∈ A, para todo x ∈ A.
Consideremos os conjuntos

f (A) = {fa : a ∈ A} ⊆ AA e Xa = A − {fa (a)} ⊆ A.

Note que Xa = ∅, para todo a ∈ A, pois A contém pelo menos dois elementos.
Então F = {Xa }a∈A é uma família não vazia de conjuntos não vazios. Logo, existe
uma função escolha r para F tal que r(Xa ) ∈ Xa , para todo a ∈ A. Em particular,
r(Xa ) = fa (a), para todo a ∈ A. Vamos definir uma função g : A → A como
g(x) = r(Xx ), para todo x ∈ A.
Afirmação. g ∈ AA e g = fa , para todo a ∈ A.
De fato, suponhamos, por absurdo, que exista um a ∈ A tal que g = fa . Então para
cada x ∈ A, g(x) = r(Xx ) = fa (x), Em particular, r(Xa ) = g(a) = fa (a), o que é
uma contradição. Portanto, f não é sobrejetora.

127
4.1. Axioma da Escolha

Exercícios
1. Sejam A e B dois CBO. Mostre que a ordem lexicográfica sobre A × B é
bem ordenada.

2. Sejam {Ai }i∈I uma família não vazia de conjuntos não vazios e P = i∈I Ai .
Mostre que a j-ésima projeção pj : P → Aj é uma função sobrejetora.

3. Sejam I, J conjuntos quaisquer de índices e A um conjunto qualquer. Para



cada função ϕ : J → I, considere a função ϕ∗ : i∈I A → j∈J A definida

como ϕ∗ (f ) = f ◦ ϕ, para toda função escolha f ∈ i∈I A.

(a) Se I = {1, 2}, J = {1, 2, 3} e ϕ : J → I é definida como ϕ(1) = 2,


ϕ(2) = 2 e ϕ(3) = 1. Descreva explicitamente como um terno ordenado
em A × A × A é aplicado em um par ordenado de A × A sob ϕ∗ .
(b) Se I = J = {1, . . . , n} e ϕ : I → I é uma função bijetora. Descreva
em termos de n-uplas em A × · · · × A a função ϕ∗ .

4. Sejam A um conjunto e f : A → B uma função sobrejetora. Mostre que


existe um subconjunto C de A tal que C está em correspondência biunívoca
com B.

5. Sejam A um conjunto, f : B → C e g : A → C funções tais que Im(f ) ⊆


Im(g). Mostre que existe uma função h : B → A tal que g ◦ h = f .

6. Mostre que o axioma da escolha é equivalente a: Sejam A, B conjuntos e


F : A → P(B) uma função qualquer tal que F (x) ∈ P(B)∗ , para todo
x ∈ A. Então existe uma função f : A → B tal que f (x) ∈ F (x), para todo
x ∈ A.

7. Mostre que o axioma da escolha é equivalente a: Sejam A, B conjuntos não


vazios quaisquer e G ⊆ A × B um gráfico (uma relação). Então existe uma
função f : A → B tal que f ⊆ G e (Dom(f ) = Dom(G)).

8. (Princípio das Escolhas Dependentes) Sejam A conjuntos não vazio qual-


quer e R uma relação sobre A com a seguinte propriedade: para cada x ∈ A,
existe um y ∈ A tal que (x, y) ∈ R. Mostre que existe uma função f : N → A
tal que (f (n), f (n + 1)) ∈ R, para todo n ∈ N.

128
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

4.2 Aplicações
Nesta seção provaremos, como consequência do axioma da escolha, os princí-
pios maximais. Além disso, provaremos que eles são equivalentes ao axioma da
escolha.
Com o objetivo de provarmos o Lema de Zorn primeiro provaremos o teorema
4.21 devido Bourbaki. Nicolas Bourbaki é o pseudônimo coletivo sob o qual um
grupo de matemáticos, na sua maioria franceses, escreveram uma série de livros que
expunham a matemática avançada moderna, que começaram a ser editados em 1935.
Com o objetivo de fundamentar toda a matemática na Teoria dos Conjuntos, o grupo
lutou por mais rigor e simplicidade, criando uma nova terminologia e conceitos ao
longo dos tempos.
Seja A um poset. Diremos que A é indutivamente ordenado se qualquer cadeia
de A possui uma cota superior em A. Diremos que A é estritamente indutivamente
ordenado se qualquer cadeia de A possui um supremo em A.

Exemplo 4.19 Se A é uma cadeia e S = {x1 , . . . , xn } é um subconjunto de A.


Mostre que existe um xj , com 1 ≤ j ≤ n, tal que xi ≤ xj , para todo xi ∈ S.
Portanto, qualquer subconjunto finito de uma cadeia possui uma cota superior
(inferior).
Solução. Vamos usar indução sobre n. Se n = 1, nada há para ser provado. Sejam

S = {x1 , . . . , xn , xn+1 } e T = {x1 , . . . , xn }.

Então, pela hipótese de indução, existe um xj ∈ T tal que xi ≤ xj , para todo


xi ∈ T . Como A é uma cadeia temos que xj ≤ xn+1 ou xn+1 ≤ xj . Portanto, em
qualquer caso, existe um xj ∈ S tal que xi ≤ xj , para todo xi ∈ S.

Exemplo 4.20 Sejam A um conjunto não vazio qualquer e P(A) ordenado pela
inclusão. Se F é um subconjunto de P(A) tal que B = ∪X∈C X ∈ F, para qualquer
cadeia C de F, então F é um conjunto estritamente indutivamente ordenado, pois
B = sup(C).
Daqui em diante lidaremos fortemente com um poset não vazio e estritamente
indutivamente ordenado A e uma função qualquer f : A → A tal que

∀ x ∈ A [x ≤ f (x)].

129
4.2. Aplicações

Seja p ∈ A fixado. Um subconjunto B de A é uma p-sequência ou uma p-torre ou


é p-admissível de A se as seguintes condições são satisfeitas:

1. p ∈ B.

2. Se x ∈ B, então f (x) ∈ B (f (B) ⊂ B).

3. Se C é uma cadeia de B, então sup(C) ∈ B (f (sup(C)) = sup(C).

Note que p-sequências existem. Por exemplo, A é uma p-sequência.

Teorema 4.21 (Teorema de Bourbaki) Seja A um poset tal que:

1. A contém um menor elemento p.

2. Qualquer cadeia de A possui um supremo em A.

Então existe x ∈ A sem sucessor imediato (f (x) = x).

Prova. Suponhamos, por absurdo, que qualquer elemento x ∈ A tenha um sucessor


imediato. Então o conjunto

Tx = {y ∈ A : y é um sucessor imediato de x} =
 ∅,

Asim, pelo axioma da escolha, existe uma função escolha r para A tal que r(Tx ) ∈
Tx , para todo x ∈ A. Vamos definir f : A → A como f (x) = r(Tx ). Então é claro
que f (x) é um sucessor de x, isto é, x < f (x).

O restante da prova do Teorema 4.21 é baseada na sequência de resultados sobre


p-sequências:

Lema 4.22 A interseção qualquer de p-sequências é uma p-sequência.

Prova. Seja P = ∩B∈P(A) B a interseção de todas as p-sequências de A. Então


P = ∅, pois p ∈ P . Se x ∈ P , então x ∈ B, para todo B ⊆ A. Assim, f (x) ∈ B,
para todo B ⊆ A. Portanto, f (x) ∈ P . Se C é uma cadeia de P , então C é uma
cadeia de B, para todo B ⊆ A. Logo, sup(C) ∈ B, para todo B ⊆ A. Portanto,
sup(C) ∈ P .

130
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

Sejam P a interseção de todas as p-sequências de A e x ∈ P . Diremos que x é


um elemento normal (ou uma escolha extrema) se

∀ y ∈ P [x ≤ y ou y ≤ x],

ou seja, x é comparável com qualquer elemento de P .

Lema 4.23 Suponhamos que x ∈ P seja um elemento normal, y ∈ P e y < x.


Então f (y) ≤ x.

Prova. Como P é uma p-sequência e y ∈ P temos que f (y) ∈ P . Assim, f (y) ≤ x


ou x < f (y). Se x < f (y), então y < x < f (y), o que é impossível, pois qualquer
y ∈ A possui um sucessor imediato. Portanto, f (y) ≤ x.

Lema 4.24 Suponhamos que x ∈ P seja um elemento normal e

Bx = {y ∈ P : y ≤ x ou y ≥ f (x)} ⊆ P.

Então Bx é uma p-sequência.

Prova. Como p é o menor elemento de A temos que p ∈ Bx . Se y ∈ Bx , então


devemos provar que f (y) ∈ Bx . Sendo y ∈ Bx , teremos y ≤ x ou y ≥ f (x).
Assim, há três casos a serem considerados:
1.o Caso. Se y < x, então, pelo Lema 4.23, f (y) ≤ x. Logo, f (y) ∈ Bx .
2.o Caso. Se y = x, então f (y) = f (x). Assim, f (y) ≥ f (x) e f (y) ∈ Bx .
3.o Caso. Se y ≥ f (x), então f (y) > f (x), pois y < f (y). Logo, f (y) ∈ B.
Se C é uma cadeia de Bx e m = sup(C), então devemos provar que m ∈ Bx . Dado
y ∈ Bx , obtemos y ≤ x ou y  f (x). Se existir um y ∈ C tal que y  f (x), então
m  f (x), pois m  y. Assim, m ∈ Bx . Caso contrário, y ≤ x, para todo y ∈ C.
Logo, m ≤ x e m ∈ Bx .

Corolário 4.25 Suponhamos que x ∈ P seja um elemento normal. Então y ≤ x


ou y  f (x), para todo y ∈ P .

Prova. Como P é a interseção de todas as p-sequências temos que P ⊆ Bx . Por


outro lado, Bx ⊆ P . Assim, P = Bx . Portanto, y ≤ x ou y ≥ f (x), para todo
y ∈ P.

Lema 4.26 O conjunto de todos os elementos normais é uma p-sequ ência.

131
4.2. Aplicações

Prova. Seja
B = {x ∈ P : x é um elemento normal} ⊆ P.
Então p ∈ B, pois p ≤ y, para todo y ∈ A, em particular, para todo y ∈ P .
Se x ∈ B, então, pelo Corolário 4.25, y ≤ x ou y ≥ f (x), para todo y ∈ P .
Assim, y ≤ f (x) ou y ≥ f (x). Portanto, f (x) ∈ B. Sejam C uma cadeia de B e
m = sup(C). Então, para cada y ∈ P , se existir um x ∈ C tal que y ≤ x, então
y ≤ m, pois x ≤ m. Caso contrário, x ≤ y, para todo x ∈ C. Logo, m ≤ y.
Portanto, m ∈ B.

Corolário 4.27 P é um conjunto totalmente ordenado.


Prova. Como

B = {x ∈ P : x é um elemento normal} ⊆ P

é uma p-sequência temos que P ⊆ B. Assim, P = B. Portanto, qualquer elemento


de P é normal, isto é, P é um conjunto totalmente ordenado.

Finalmente, para completarmos a prova do Teorema 4.21. Seja m = sup(P ).


Então m ∈ P , pois P é uma p-sequência e uma cadeia. Assim, f (m) ∈ P , pois P
é uma p-sequência. Logo, f (m) ≤ m, o que é uma contradição.

Dados (x, y), (z, w) ∈ R2 , definimos

(x, y)  (z, w) ⇔ x ≤ z e y = w.

Então é fácil verificar que  é uma ordem parcial e para cada a ∈ R fixado, o
conjunto Ca = {(x, a) : x ∈ R} é uma cadeia maximal de R2 . De fato, dado
(x, y) ∈ R2 , com y = a, então Ca ∪ {(x, y)} não é uma cadeia de R2 , pois os
elementos (x, a) e (x, y) não são comparáveis. Portanto, Ca é uma cadeia maximal
de R2 . Isto motiva o seguinte resultado:
2
Teorema 4.28 (Princípio Maximal de Hausdorff) Qualquer poset possui pelo
menos uma cadeia maximal.
Prova. Sejam A um poset não vazio qualquer e

F = {C ⊆ A : C é uma cadeia não vazia de A}.


2
Felix Hausdorff, 1868-1942, matemático alemão.

132
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

Então F =  ∅, pois {x} ∈ F, para todo x ∈ A (menor elemento em F). Dados


C1 , C2 ∈ F, definimos C1 ≤ C2 se, e somente se, C1 ⊆ C2 . Então F é um poset.
Sejam C uma cadeia qualquer de F e M = ∪C∈C C. Então é claro que M ⊆ A.
Afirmação. M ∈ F e M = sup(C) ∈ F.
De fato, dados x, y ∈ M , existem C1 , C2 ∈ C tal que x ∈ C1 e y ∈ C2 . Como C é
uma cadeia temos que C1 ⊆ C2 ou C2 ⊆ C1 , digamos C1 ⊆ C2 . Assim, x, y ∈ C2
e x ≤ y ou y ≤ x. Logo, M é uma cadeia. É fácil verificar que M = sup(C).
Portanto, F é um poset estritamente indutivamente ordenado. Seja f : F → F uma
função qualquer tal que C ≤ f (C), para todo C ∈ F, por exemplo, f (C) = sup(C).
Então, pelo Teorema 4.21, existe um C ∈ F sem sucessor imediato, isto é, não
existe um x ∈ A − C tal que C ∪ {x} seja uma cadeia de A. Portanto, C é uma
cadeia maximal de A.

Apresentaremos a seguir um dos teoremas mais importante em Matemática so-


bre a existência de objetos que pertencem a um dado conjunto e satisfazem certas
propriedades.

Teorema 4.29 (Lema de Zorn) 3 Qualquer conjunto indutivamente ordenado pos-


sui pelo menos um elemento maximal.

Prova. Seja A um conjunto indutivamente ordenado. Então A = ∅, pois ∅ é uma


cadeia e ∅ = ∪∅ ∈ A. Pelo Princípio Maximal de Hausdorff, A contém uma cadeia
maximal C. Assim, por definição, C contém uma cota superior m.
Afirmação. m é um elemento maximal de A.
De fato, suponhamos, por absurdo, que exista um x ∈ A tal que m < x. Então
x ∈
/ C, mas y < x, para todo y ∈ C. Assim, C ∪ {x} é uma cadeia de A, com
C ⊂ C ∪ {x}, o que contradiz a maximalidade de C. Portanto, m é um elemento
maximal de A.

Exemplo 4.30 (Lei da Tricotomia de Cantor) Sejam A e B conjuntos. Mostre


que existe uma função injetora f : A → B ou uma função injetora g : B → A.

Solução. Seja

F = {f ⊆ A × B : f é uma função injetora, com Dom(f ) ⊆ A e Im(f ) ⊆ B}.


3
Max August Zorn, 1906-1993, matemático alemão.

133
4.2. Aplicações

Então F = ∅, pois ∅ = ∅ × B ∈ F. Dados f, g ∈ F, definimos f ≤ g se, e somente


se, f ⊆ g. Então F é um poset. Sejam C uma cadeia qualquer de F e f0 = ∪g∈C g.
Então é claro que f0 ⊆ A × B.
Afirmação. f0 ∈ F e f0 = sup(C) ∈ F.
De fato, dados (x, y), (x, z) ∈ f0 , existem g, h ∈ C tal que (x, y) ∈ g e (x, z) ∈ h.
Como C é uma cadeia temos que g ⊆ h ou h ⊆ g, digamos g ⊆ h. Assim,
(x, y) ∈ h e (x, z) ∈ h implica que y = z. Logo, f0 é uma função. Dados
(x1 , y), (x2 , y) ∈ f0 , é fácil verificar que x1 = x2 , ou seja, f0 é injetora. Portanto,
f0 ∈ F e claramente f0 = sup(C) ∈ F. Consequentemente, pelo Lema de Zorn,
F contém um elemento maximal, digamos f ∈ F. Note que Dom(f ) = A ou
Im(f ) = B. Caso contrário, existiriam um x ∈ A − Dom(f ) e um y ∈ B − Im(f ).
Então g = f ∪ {(x, y)} ∈ F, com f < g, o que contradiz a maximalidade de
f . Se Dom(f ) = A, então f : A → B é injetora ou se Im(f ) = B, então
g = f −1 : B → A é injetora.

No que segue vamos admitir que o leitor esteja familiarizado com a noção de
um espaço vetorial sobre um corpo, por exemplo, o corpo R.

Lema 4.31 Sejam V um espaço vetorial sobre um corpo K e α um subconjunto de


vetores LI em V . Então u ∈ V − [α] se, e somente se, α ∪ {u} é um conjunto de
vetores LI em V , em que

[α] = {x1 u1 + · · · + xn un : n ∈ N, xi ∈ K e ui ∈ α}

é o subespaço de V gerado por α.

Prova. Sejam u1 , . . . , um vetores distintos em α e x1 , . . . , xm , y escalares em K


tais que
x1 u1 + · · · + xm um + yu = 0.
Então y = 0, pois se y = 0, então

u = (−y −1 x1 )u1 + · · · + (−y −1 xm )um ⇒ u ∈ [α],

o que é impossível. Assim, y = 0 e x1 u1 + · · · + xm um = 0, de modo que


x1 = · · · = xm = 0. Portanto, α ∪ {u} é um conjunto de vetores LI em V .
A recíproca é clara.

134
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

Teorema 4.32 (Existência de Base) Qualquer espaço vetorial possui uma base.
Mais geralmente, qualquer subconjunto de vetores LI de um espaço vetorial é parte
de uma base.

Prova. Seja V um espaço vetorial sobre um corpo K. Se V = {0}, então ∅ é uma


base de V . Se V = {0}, então a família

F = {β : β é um subconjunto LI em V }

é não vazia, pois {v} ∈ F, para todo v ∈ V − {0}. Dados α, β ∈ F, definimos


α ≤ β se, e somente se, α ⊆ β. Assim, F é um poset. Sejam C uma cadeia qualquer
de F e L = ∪β∈C β. Então é claro que L ⊆ V .
Afirmação. L ∈ F e L = sup(C) ∈ F.
De fato, sejam u1 , . . . , un vetores distintos de L e x1 , . . . , xn escalares de K tais
que
x1 u1 + · · · + xn un = 0.
Como ui ∈ L temos que existe um βi ∈ C tal que ui ∈ βi . Logo, pelo Exemplo
4.19, existe um βj , com 1 ≤ j ≤ n, tal que βi ⊆ βj , para todo i = 1, . . . n. Assim,
u1 , . . . , un ∈ βj . Logo, x1 = · · · = xn = 0. É claro que L é uma cota superior
de C. Portanto, pelo Lema de Zorn, F contém um elemento maximal, digamos M .
Consequentemente, pelo Lema 4.31, V = [M ] e M é uma base de V .

Observação 4.33 Note que a existência de uma base para um espaço vetorial não
decorre da Teoria dos Conjuntos de Zermelo-Fraenkel sem o uso do Lema de Zorn.

É fácil verificar que o corpo R com a soma usual e a multiplicação q · x, para


todo x ∈ R e q ∈ Q, é um espaço vetorial sobre Q. Assim, pelo Teorema 4.32,
podemos escolher uma base de R, a qual chama-se base de Hamel4 . Em outras
palavras, um subconjunto S de R é uma base de Hamel de R se cada x ∈ R pode
ser escrito de modo único sob a forma

x = r1 x 1 + · · · + r n x n ,

para alguns vetores distintos x1 , . . . , xn ∈ S e escalares não nulos r1 , . . . , rn ∈ Q.


Neste caso, por um lado, S é um conjunto maximal de vetores LI de R e, por outro
lado, um conjunto minimal de geradores de R.
4
Georg Hamel, 1877-1954, matemático alemão.

135
4.2. Aplicações

Seja T : R → R uma função. Diremos que T é uma função aditiva sobre R se


ela satisfaz o seguinte axioma (equação de Cauchy5 ):

T (x + y) = T (x) + T (y), ∀ x, y ∈ R,

Por exemplo, para cada a ∈ R fixado, a função Ta : R → R definida como Ta (x) =


ax é claramente aditiva.

Exemplo 4.34 Seja T : R → R uma função.

1. Mostre que T é linear sobre Q se, e somente se, T é aditiva.

2. Mostre que existe uma função aditiva T tal que T = Ta , para todo a ∈ R.

Solução. (1) Se T é linear sobre Q, então claramente T é aditiva. Reciprocamente,


suponhamos que T seja aditiva. Então, dado x ∈ R, T (2x) = T (x)+T (x) = 2T (x)
e, indutivamente, T (nx) = nT (x), para todo n ∈ N. Como T (0) = T (0 + 0) =
T (0) + T (0) temos que T (0) = 0 e T (−y) = −T (y), para todo y ∈ R. Assim,
T (nx) = nT (x), para todo n ∈ Z. Para cada n ∈ N,

T (x) = T (n(n−1 x)) = T (n−1 x + · · · + n−1 x) = nT (n−1 x)

implica que T (n−1 x) = n−1 T (x). Portanto, T (rx) = rT (x), para todo r ∈ Q.
(2) Seja S uma base de Hamel de R e escolhendo x0 ∈ S. Então vamos definir
T : R → R como

ri , se x = r1 x1 + · · · + ri xi + · · · + rn xn e xi = x0
T (x) =
0, caso contrário.

Então T é aditiva. Por exemplo, se x0 ocorre na representação básica de x e y, então


T (x + y) = ri + sj = T (x) + T (y). Em particular, T (x0 ) = 1 e T (xi ) = 0, para
todo xi ∈ S, com i = 0. Se T (x) = ax, para algum a ∈ R, então

1 = T (x0 ) = ax0 ⇒ a = 0.

Por outro lado, 0 = T (xi ) = axi implica que a = 0, pois 0 ∈


/ S, o que é impossível.
Portanto, T (x) = ax, para todo a ∈ R.
5
Augustin-Louis Cauchy, 1789-1857, matemático francês.

136
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

Observe que o Exemplo 4.34 nos mostra que o axioma da homogeneidade de


uma transformação linear, T (ax) = aT (x), é independente. Por outro lado, a fun-
ção T : R2 → R2 definida como
  
x cos( xy ), x + y , se x = 0
T (x, y) =
(0, y), x=0

satisfaz o axioma da homogeneidade T (ax, ay) = aT (x, y), mas não o axioma
da linearidade. Portanto, o axioma da linearidade de uma transformação linear é
independente. É importante ressaltar o seguinte: como T (r) = T (1)r, para todo
r ∈ Q, temos, quando T é contínua, que T (x) = T (1)x, para todo x ∈ R, ou seja,
T é uma transformação linear.
Seja X um conjunto não vazio. Já vimos que (P(X), ∪, ∩), ordenado pela
inclusão, era um reticulado distributivo. Além disso, P(X) possui menor elemento
∅ e maior elemento X, e a seguinte propriedade: para cada A ∈ P(X), existe um
único A ∈ P(X) tal que A∩A = ∅ e A∪A = X. Isto motiva a seguinte definição.
Seja (A, ≤, ∨, ∧) um reticulado distributivo. Diremos que A é uma álgebra
Booliano se os seguintes axiomas são satisfeitos:

1. Existe 0 ∈ A tal que 0 ∨ a = a ∨ 0 = a, para todo a ∈ A. (menor elemento)

2. Existe 1 ∈ A tal que 1 ∧ a = a ∧ 1 = a, para todo a ∈ A. (maior elemento)

3. Para cada a ∈ A, existe um único a ∈ A tal que a ∧ a = 0 e a ∨ a = 1. (a


chama-se complementar de a)

Por exemplo, seja A = {X ⊆ Z : X ou Z − X é finito} ordenado pela inclusão.


Então A é uma álgebra Booliano. Observe que se A é uma álgebra Booliano e I é
um ideal de A tal que a, a ∈ I, então I = A, pois a ∨ a = 1 ∈ I e dado x ∈ A,
x ≤ 1 implica que x ∈ I. Portanto, I = A.
Sejam A um reticulado e M um ideal de A. Diremos que M é um ideal maximal
se M = A e para qualquer ideal J de A tal que M ⊆ J ⊆ A implica que M = J
ou J = A.

Exemplo 4.35 Sejam A uma álgebra Booliano e P um ideal de A.

1. Mostre que P é um ideal maximal se,e somente se, para cada a ∈ A, a ∈ P


ou a ∈ P .

137
4.2. Aplicações

2. Mostre que P é um ideal primo se, e somente se, ele é um ideal maximal.
Solução. (1) Suponhamos que P seja um ideal maximal e que a ∈
/ P . Então o
conjunto
J = {b ∨ x ∈ A : b ≤ a e x ∈ P }
é um ideal de A, com P ⊂ J (prove isto!). Assim, J = A. Logo, existe um x ∈ P
e b ∈ A, com b ≤ a, tal que b ∨ x = 1. Portanto,

a ∨ x = (a ∨ b) ∨ x = a ∨ (b ∨ x) = a ∨ 1 = 1,

de modo que

a = a ∧ 1 = a ∧ (a ∨ x) = (a ∧ a) ∨ (a ∧ x) = 0 ∨ (a ∧ x) = a ∧ x.

Como a ∧ x ≤ x temos que a ≤ x e x ∈ P implicam que a ∈ P .


Reciprocamente, suponhamos que, para cada a ∈ A, a ∈ P ou a ∈ P e J um
ideal de A tal que P ⊂ J. Então existe um x ∈ J tal que x ∈ / P . Assim, x ∈ P
implica que x ∈ P ⊂ J, de modo que x, x ∈ J. Portanto, J = A e P é um ideal
maximal.
(2) Suponhamos que P seja um ideal primo e J um ideal de A tal que P ⊂ J.
Então existe um x ∈ J tal que x ∈ / P . Assim, x ∧ x = 0 ∈ P implica que
x ∈ P ⊂ J, de modo que x, x ∈ J. Portanto, J = A e P é um ideal maximal.
Reciprocamente, suponhamos que P seja um ideal maximal e dados a, b ∈ P ,
com a ∧ b ∈ P . Se a ∈ / P , então, pelo item (1), a , b ∈ P . Assim,
/ P eb ∈
(a ∧ b) = a ∨ b ∈ P , pois

(a ∧ b) ∨ (a ∨ b ) = [a ∨ (a ∨ b )] ∧ [b ∨ (a ∨ b )] = 1 ∧ 1 = 1

e, de modo inteiramente análogo, (a ∧ b) ∧ (a ∨ b ) = 0. Logo, a ∧ b, (a ∧ b) ∈ P ,


de modo que P = A, o que é impossível. Portanto, a ∈ P ou b ∈ P e P é um ideal
primo de A.

É muito importante ressaltar que existem reticulados sem ideais primos e nem
maximais. Por exemplo, seja

A = {X : X = ]a, b[ ⊂ R, a < b} ∪ {∅}.

Então A ordenado pela inclusão, X ∧ Y = X ∩ Y e X ∨ Y = I, com I o menor

138
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

intervalo aberto tal que X, Y ⊆ I, é um reticulado (prove isto!). Suponhamos que


P seja um ideal primo de A e P = A. Então existe um X = ]a, b[ ∈ A tal que
X∈ / P . Assim, Y ∈ P , para cada Y ∈ A, tal que X ∧ Y = ∅ ∈ P . Logo, podemos
escolher Y = ]c, y[, Z = ]z, d[ ∈ A, com y < a e b < z, tais que X ∧ Y = ∅ e
X ∧ Z = ∅. Portanto, Y ∨ Z ∈ P e X ≤ Y ∨ Z = ]c, d[, de modo que X ∈ P , o
que é impossível. Por outro lado, suponhamos que M seja um ideal maximal de A e
M = A. Então existe um X = ]a, b[ ∈ A tal que X ∈ / M . Assim, Y ∈ M implica
que Y ∈ ] − ∞, b[ ou Y ∈ ]a, ∞[. Se M ⊂ ] − ∞, b[, então é fácil verificar que o
conjunto
J = {Y ∈ A : Y ⊂ ] − ∞, b + 1[}
é ideal de A, com M ⊂ J, o que é impossível.

Exemplo 4.36 Qualquer álgebra Booliano possui um ideal primo (maximal).

Solução. Sejam A uma álgebra Booliana e

F = {I ⊆ A : I é um ideal próprio de A}.

Então F = ∅, pois I = {0} ∈ F. Dados I, J ∈ F, definimos I ≤ J se, e somente


se, I ⊆ J. Assim, F é um poset. Sejam C uma cadeia qualquer de F e M = ∪I∈C I.
Então é claro que M ⊆ A e M = A.
Afirmação. M ∈ F e M = sup(C) ∈ F.
De fato, dados a, b ∈ M e x ∈ A tal que x ≤ a, existem I, J ∈ C tais que a ∈ I
e b ∈ J. Como C é uma cadeia temos que I ⊆ J ou J ⊆ I, digamos I ⊆ J.
Assim, a, b ∈ J e x ≤ a implicam que a ∨ b, x ∈ J. Logo, a ∨ b, x ∈ M , de modo
que M ∈ F e claramente M = sup(C) ∈ F. Portanto, pelo Lema de Zorn, F
contém um elemento maximal, digamos P ∈ F. Consequentemente, pelo item (2)
do Exemplo 4.35, P é um ideal primo de A.

É muito importante o seguinte: seja A = (A, ≤, ∨, ∧) uma álgebra Booliana.


Então é fácil verificar que o reticulado dual B = (A, ≥, ∧, ∨) é também uma ál-
gebra Booliana. Assim, a função f : A → B definida como f (a) = a é um
isomorfismo dual. Portanto, f (I) é um filtro de B, para todo ideal I de A. Recipro-
camente, f −1 (F ) é um ideal de A, para todo filtro F de B. Em particular, f (P ) é
um ultrafiltro de B, para todo ideal primo P de A.

139
4.2. Aplicações

Exemplo 4.37 (Teorema de Hahn-Banach) 6 Sejam V um espaço vetorial sobre


R e p : V → R um funcional sublinear sobre V , ou seja, p(u + v) ≤ p(u) + p(v) e
p(xu) = xp(u), para todos u, v ∈ V e x ∈ R+ . Mostre que se U é um subespaço
de V e f0 : U → R um funcional linear tal que f0 (u) ≤ p(u), para todo u ∈ U ,
então existe um funcional linear f : V → R tal que f0 ⊆ f e f (u) ≤ p(u), para
todo u ∈ V .

Solução. Seja

F = {g ⊆ V × R : g é linear, comf0 ⊆ g e g(u) ≤ p(u), ∀ u ∈ Dom(g)}.

Então F = ∅, pois f0 ∈ F. Dados f, g ∈ F, definimos f ≤ g se, e somente se,


f ⊆ g. Então F é um poset. Sejam C uma cadeia qualquer de F e g0 = ∪g∈C g.
Então é claro que g0 ⊆ V × R.
Afirmação. g0 ∈ F e g0 = sup(C) ∈ F.
De fato, dados (u, y), (u, z) ∈ g0 , existem g, h ∈ C tal que (u, y) ∈ g e (u, z) ∈ h.
Como C é uma cadeia temos que g ⊆ h ou h ⊆ g, digamos g ⊆ h. Assim,
(u, y) ∈ h e (u, z) ∈ h implica que y = z. Logo, g0 é uma função e f0 ⊆ g0 .
Note que Dom(g0 ) = ∪g∈C Dom(g). Dados u, v ∈ Dom(g0 ) e a ∈ R, de modo
inteiramente análogo, u, v ∈ Dom(h) e au + v ∈ Dom(h), para algum h ∈ C, isto
implica que au + v ∈ Dom(g0 ) e

g0 (au + v) = h(au + v) = ah(u) + h(v) = ag0 (u) + g0 (v),

ou seja, g0 é linear. Finalmente, g0 (u) = g(u) ≤ p(u), para todo u ∈ Dom(g0 )


e g ∈ C tal que u ∈ Dom(g). Portanto, g0 ∈ F e claramente g0 = sup(C) ∈ F.
Consequentemente, pelo Lema de Zorn, F contém um elemento maximal, digamos
f ∈ F. Resta provar que Dom(f ) = V . Caso contrário, existiria um v ∈ V −
Dom(f ). Então

W = [Dom(f ) ∪ {v}] = {u + av : u ∈ Dom(f ) e a ∈ R}

é um subespaço de V . Para cada c ∈ R fixado, a função fc : W → R definido como


fc (u + av) = f (u) + ac, está bem definida, é linear e f ⊂ fc . Vamos provar que é

6
Hans Hahn, 1879-1954, matemático australiano; Stefan Banach, 1892-1945, matemático polo-
nês.

140
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

possível escolher um c ∈ R tal que

fc (u + av) = f (u) + ac ≤ p(u + av), (4.1)

para todo u ∈ Dom(f ) e a ∈ R. Se a = 0, então a equação (4.1) está satisfeita. Se


a > 0, então

c ≤ −a−1 f (u) + a−1 p(u + av) = −f (a−1 u) + p(a−1 u + v),

de modo que c ≤ −f (z) + p(z + v), para todo z = a−1 u ∈ Dom(f ) e a > 0. Se
a < 0, então

c ≥ −a−1 f (u) + a−1 p(u + av) = f (−a−1 u) − p(−a−1 u − v),

de modo que c ≥ f (w) − p(w − v), para todo w = −a−1 u ∈ Dom(f ) e a < 0.
Mas, para todos z, w ∈ Dom(f ),

f (z) + f (w) = f (z + w) ≤ p(z + w) ≤ p(z + v) + p(w − v)

implica que f (w) − p(w − v) ≤ p(z + v) − f (z). Assim, pondo

s= sup {f (w) − p(w − v)} e t = inf {p(z + v) − f (z)}


w∈Dom(f ) z∈Dom(f )

temos que s ≤ t e podemos escolher um c0 ∈ R tal que s ≤ c0 ≤ t. Portanto,


fc0 ∈ F, o que contradiz a maximalidade de f .

Observação 4.38 Note que se {ui }i∈I é uma base de Hamel de U , então, pelo
Teorema 4.32, ela pode ser estendida a uma base de Hamel {ui }i∈I ∪ {vj }j∈J de
V . Assim, a função f : V → R definido como


m 
n 
m 
n
f( xi ui + yj v j ) = f 0 ( x i ui ) + yj v j
i=1 j=1 i=1 j=1

é claramente um funcional linear tal que f |U = f0 . Mas, nada garante que f seja
dominado por p. Portanto, a existência de um funcional linear f não decorre da
Teoria dos Conjuntos de Zermelo-Fraenkel sem o uso do Lema de Zorn.

Seja μ : P(R) → R+ ∪ {∞} uma função. Diremos que μ é uma medida sobre

141
4.2. Aplicações

P(R) se ela satisfaz os seguintes axiomas:

1. μ([a, b]) = b − a, para todos a, b ∈ R, com a < b.

2. μ(∅) = 0 e μ(R) = ∞.

3. (Aditividade Contável) Se {An }n∈N é uma família de subconjuntos disjuntos


aos pares de R, então

μ( An ) = μ(An ).
n∈N n∈N

4. Se a ∈ R e X ⊆ R, então μ(a + X) = μ(X); a + X = {a + x : x ∈ X}.

Como uma consequência direta, podemos provar que:

5 Se X, Y ⊆ R e X ∩ Y = ∅, então μ(X ∪ Y ) = μ(X) + μ(Y ).

6 Se X, Y ⊆ R e X ⊆ Y , então μ(X) ≤ μ(Y ).

Exemplo 4.39 (Não Existência de Medida) Existe pelo menos uma função μ de
P(R) em R+ ∪ {∞} que não satisfaz os axiomas de 1 à 6.

Solução. Dados x, y ∈ R, definimos x ∼ y se, e somente se, y − x ∈ Q. Então


é fácil verificar que ∼ é uma relação de equivalência sobre R. Assim, cada classe
de equivalência Ax = {y ∈ R : y ∼ x} é não vazia e densa em R, de modo que
[a, b] ∩ Ax = ∅, para cada [a, b] ∈ P(R) e algum x ∈ R. Por outro lado, sendo
P = {Ax }x∈R uma família não vazia de conjuntos não vazios e disjuntos aos pares
temos, pelo axioma da escolha, que existe um conjunto escolha C para P, isto é,
para cada x ∈ R, existe um único c ∈ C e um único r ∈ Q tal que x = r + c.
Pondo Cr = r + C = {r + x : x ∈ C}, para cada r ∈ Q, obtemos R = ∪r∈Q Cr e
se r = s, então Cr ∩ Cs = ∅, pois Cr ∩ Cs = ∅ implica que existem x, y ∈ C tais
que r + x = s + y, de modo que y − x ∈ Q e x = y. Assim, r = s e Cr = Cs .
Dado a ∈ R, existe, pelo Prinípio de Arquimedes, um x ∈ [0, 1] e m ∈ Z tal que
a = x + m. Por outro lado, existe um r ∈ C tal que x = y + r, para algum
r ∈ Q, de modo que a = y + m + r e a ∈ Cm+r . Suponhamos que uma tal medida
μ : P(R) → R+ ∪ {∞} exista. Então μ(C) > 0. Caso contrário, pelo itens (3) e
(4), μ(R) = 0, o que é impossível. Portanto, pelo item (3), existe um [a, b] ⊆ R tal

142
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

que μ(C ∩ [a, b]) > 0. Pondo B = C ∩ [a, b], obtemos



X= Br ⊆ [a, b + 1],
r∈[0,1]∩Q

de modo que ∞ = μ(X) ≤ b + 1 − a, o que é impossível (X é uma união contável


infinita de conjuntos com a mesma medida). Neste caso, diremos C é um conjunto
não “μ-mensurável”.

Exercícios
1. Seja A = I × J, com a ordem cartesiana induzida por R2 , em que I = [0, 1]
e J = [0, 1] ∩ Q.

(a) Mostre que o conjunto D = {(x, x) ∈ A : 0 ≤ x ≤ 1} é uma cadeia


maximal de A.
(b) Mostre que o conjunto C = {(x, y) ∈ A : x = 0 ou y = 1} é uma
cadeia maximal de A.

2. Seja R2 munido com a ordem cartesiana.

(a) Mostre que o conjunto C = {(x, x) ∈ R2 : x < 0} é uma cadeia de R2 .


(b) Exiba pelo menos duas cadeias maximais de R2 que contêm C.

3. Mostre que o Lema de Zorn implica o Princípio Maximal de Hausdorff.

4. Mostre que o Lema de Zorn é equivalente a: Sejam A um conjunto indutiva-


mente ordenado e a ∈ A. Então A possui pelo menos um elemento maximal
b tal que b ≥ a.

5. Mostre que o Princípio Maximal de Hausdorff é equivalente a: Sejam A um


poset e B uma cadeia de A. Então A contém uma cadeia maximal C tal que
B ⊆ C.

6. Seja A um conjunto infinito qualquer. Mostre que A é a união disjunta de


conjuntos que são cada contável infinito ou, equivalentemente, existe uma
cobertura disjunta de A formada por conjuntos enumeráveis.

143
4.2. Aplicações

7. Sejam A um conjunto e F ⊆ P(A). Diremos que F é de caráter finito


quando B ∈ F se, e somente se, qualquer subconjunto finito de B pertence a
F. Seja F ordenado pela inclusão e suponhamos que F seja de caráter finito.

(a) Mostre que F é um conjunto indutivamente ordenado.


(b) Mostre que F possui um elemento maximal.

8. Mostre que o axioma da escolha implica o Lema de Zorn.

9. Mostre que para qualquer conjunto A e qualquer f ∈ AA , existe g ∈ AA tal


que f ◦ g ◦ f = f .

10. Sejam G um grupo e S um subconjunto de G tal que eG ∈ S. Mostre que a


família
G = {H : H é um subgrupo de G e H ⊆ S}
possui pelo menos um elemento maximal.

11. Mostre que qualquer grupo não abeliano contém um subgrupo abeliano ma-
ximal.

12. (Teorema de Krull)7 Mostre que qualquer ideal próprio I de um anel comu-
tativo com identidade R está contido em um ideal maximal.

13. Seja V um espaço vetorial sobre um corpo K.

(a) Mostre que se α ⊆ β ⊆ V , com α um subconjunto de vetores LI e β


um subconjunto de vetores geradores, então existe uma base γ de V tal
que α ⊆ γ ⊆ β.
(b) Mostre que qualquer subconjunto α de vetores LI de V é parte de uma
base de V .
(c) Mostre que qualquer subconjunto de vetores geradores β de V pode ser
reduzido à uma base de V .

14. Mostre que se Rn e R são espaços vetoriais sobre Q, então Rn é isomorfo a


R.
7
Wolfgang Krull, 1899-1971, matemático alemão.

144
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

15. Sejam A uma álgebra Booliana e a, b ∈ A. Mostre que (a ) = a e x ∧ a = 0


se, e somente se, x ≤ a , para todo x ∈ A. Conclua que a ≤ b se, e somente
se, b ≤ a .

16. Mostre que existem reticulados com ideais primos, mas sem ideais maximais
e vice versa.

17. Sejam A uma álgebra Booliana e S um subconjunto de A, com 0 ∈


/ S. Mostre
que existe um ideal primo P de A tal que P ∩ S = ∅.

18. Mostre que qualquer reticulado com um maior elemento e pelo menos um
outro elemento contém um ideal maximal.

4.3 Princípio da Boa Ordenação


Nesta seção vamos provar que, se A é um conjunto qualquer, então existe pelo
menos uma relação de ordem R sobre A tal que A, ordenado por R, é um conjunto
bem ordenado.

Exemplo 4.40 Qualquer conjunto finito é bem ordenado.


Solução. Seja A um conjunto finito. Se A contém exatamente um elemento nada
há para ser provado. Suponhamos que A possua n elementos. Então, pelo Exemplo
4.19, A possui um maior elemento, digamos, M ∈ A. Assim, por indução, existe
um isomorfismo g : A−{M } → {1, . . . , n−1}, para algum n ∈ N. Logo, a função
f : A → {1, . . . , n} definida como

g(x), se x = M
f (x) =
x, se x = M,

para algum n ∈ N, é um isomorfismo. Neste caso, a boa ordenação para A é dada


por
∀ x, y ∈ A [x  y ⇔ f (x) ≤ f (y)].
Em particular, se A = {a, b, c}, então

a < b < c, b < c < a, c < a < b, b < a < c, a < c < b e c < b < a

são boas ordenações diferentes de A.

145
4.3. Princípio da Boa Ordenação

Exemplo 4.41 Qualquer conjunto contável A pode ser bem ordenado.

Solução. Se f : A → N é uma bijeção qualquer, então existe uma ordem  sobre


A definida como
∀ x, y ∈ A [x  y ⇔ f (x) ≤ f (y)].
Em particular, se A = Z, então as funções f : A → N e g : N → A definidas como

2x, se x > 0
f (x) =
−2x + 1, se x ≤ 0

e  x
2
, se x é um número par
g(x) = 1−x
2
, se x é um número ímpar
são inversas. Neste caso, uma boa ordenação para Z é dada por

{0, 1, −1, 2, −2, . . . , n, −n, . . .}.

Por exemplo, 1 < 2 implica que 0 = g(1) < g(2) = 1 etc. Neste caso, qualquer
elemento Z possui um sucessor imediato.

Exemplo 4.42 O intervalo fechado I = [0, 1], com a ordem induzida por R, não é
bem ordenado.

Solução. Note que (0, 1] é um subconjunto não vazio de I sem menor elemento,
pois dado x ∈ (0, 1], obtemos 0 < 2−1 · x < x. Portanto, I não é bem ordenado.
No entanto, I é totalmente ordenado.

Seja A um conjunto arbitrário. Consideremos o par (B, R), com B ⊆ A e


R uma relação de ordem sobre B que bem ordena B. Seja F a família de todos
os pares (B, R), com esta propriedade. Note que F =  ∅, pois qualquer sub-
conjunto contável de A pode ser bem ordenado, confira Exemplo 4.41. Dados
(B1 , R1 ), (B2 , R2 ) ∈ F, definimos (B1 , R1 )  (B2 , R2 ) se, e somente se, as se-
guintes condições são satisfeitas:

1. B1 ⊆ B2 .

2. Se (x, y) ∈ R1 , então (x, y) ∈ R2 , para todos x, y ∈ B1 . (R1 ⊆ R2 )

3. Se x ∈ B1 e y ∈ B2 − B1 , então (x, y) ∈ R2 . (B1 é uma seção de B2 )

146
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

Então  é uma ordem sobre F. De fato, dados (B1 , R1 ), (B2 , R2 ), (B3 , R3 ) ∈ F,


é claro que (B1 , R1 )  (B1 , R1 ). Se (B1 , R1 )  (B2 , R2 ) e (B2 , R2 )  (B1 , R1 ),
então, pelo itens (1) e (2), B1 = B2 e R1 = R2 . Assim, (B1 , R1 ) = (B2 , R2 ). Se
(B1 , R1 )  (B2 , R2 ) e (B2 , R2 )  (B3 , R3 ), então, pelo itens (1) e (2), B1 ⊆ B2 e
R1 ⊆ R2 , B2 ⊆ B3 e R2 ⊆ R3 . Em particular, B1 ⊆ B3 e R1 ⊆ R3 . Finalmente,
pelo Teorema 3.8, B1 é uma seção de B3 , ou seja, se x ∈ B1 e y ∈ B3 − B1 , então
(x, y) ∈ R3 . Assim, (B1 , R1 )  (B3 , R3 ). Portanto,  é uma ordem sobre F.

Lema 4.43 Sejam C = {(Bi , Ri ) : i ∈ I} uma cadeia qualquer em F, B = ∪i∈I Bi


e R = ∪i∈I Ri . Então (B, R) ∈ F.
Prova. Sendo B ⊆ A, basta provar que R bem ordena B. Note que dados x, y ∈ B,
existem i, j ∈ I tais que x ∈ Bi e y ∈ Bj . Como C é uma cadeia temos que
(Bi , Ri )  (Bj , Rj ) ou (Bj , Rj )  (Bi , Ri ), digamos (Bi , Ri )  (Bj , Rj ). Em
particular, Bi ⊆ Bj . Assim, x, y ∈ Bj . Logo, pelo item (2), se (x, y) ∈ Ri , então
(x, y) ∈ R ou se (x, y) ∈ Rj , então (x, y) ∈ R . Portanto, R é uma ordem sobre B.
De modo inteiramente análogo, prova-se que R é uma ordem total sobre B. Seja
S ⊆ B, com S = ∅. Então existe i ∈ I tal que Si = S ∩ Bi = ∅. Como Si ⊆ Bi
temos, por hipótese, que Si contém um menor elemento m relativo a Ri , isto é,
(m, y) ∈ Ri , para todo y ∈ Si .
Afirmação. m é o menor elemento de S relativo a R, ou seja, (m, z) ∈ R, para
todo z ∈ S.
De fato, dado x ∈ S. Se x ∈ Bi , então x ∈ S e (m, x) ∈ Ri implica que (m, x) ∈
R. Se x ∈ / Bi , então existe um j ∈ I tal que x ∈ Bj . Assim, Bj ⊂ Bi e (Bj , Rj ) <
(Bi , Ri ). Logo, por hipótese, (Bi , Ri )  (Bj , Rj ). Como m ∈ Bi e x ∈ Bj − Bi
temos, pelo item (3), que (m, x) ∈ Rj e (m, x) ∈ R. Portanto, m é o menor
elemento de S relativo a R. Consequentemente, B é bem ordenado por R.

Lema 4.44 Sejam C, B e R definidos no Lema 4.43. Então (B, R) é uma cota
superior de C.
Prova. Seja (Bi , Ri ) ∈ C. Então Bi ⊆ B e Ri ⊆ R. Se x ∈ Bi e y ∈ B − Bi , então
existe um j ∈ I tal que y ∈ Bj . Assim, Bj ⊂ Bi (Bj , Rj ) < (Bi , Ri ). Logo, por
hipótese, (Bi , Ri )  (Bj , Rj ). Como x ∈ Bi e y ∈ Bj − Bi temos, pelo item (3),
que (x, y) ∈ Rj e (x, y) ∈ R. Portanto, (Bi , Ri )  (B, R).

Teorema 4.45 (Princípio da Boa Ordenação) Qualquer conjunto pode ser bem or-
denado.

147
4.3. Princípio da Boa Ordenação

Prova. Se A = ∅, nada há para ser provado. Suponhamos que A = ∅ e

F = {(B, R) : B ⊆ A e R uma boa ordenação para B}.

Então, pelos Lemas 4.43 e 4.44, F é um conjunto indutivamente ordenado. Assim,


pelo Lema de Zorn, F contém um elemento maximal (B, R).
Afirmação. A = B.
De fato, suponhamos, por absurdo, que A − B = ∅. Então existe um y ∈ A tal que
y∈/ B. Logo, (x, y) ∈ R, para todo x ∈ B. Sejam

B ∗ = B ∪ {y} e R∗ = R ∪ {(x, y) : x ∈ B}.

Então (B ∗ , R∗ ) ∈ F, com (B, R)  (B ∗ , R∗ ), o que contradiz a maximalidade de


(B, R). Portanto, A = B.

Observação 4.46 O Teorema de Zermelo assegura que qualquer conjunto pose ser
bem ordenado. Não obstante, não especifica nenhuma construção de uma boa or-
denação de qualquer conjunto não contável.

Teorema 4.47 Seja A um conjunto não vazio qualquer. Então as seguintes condi-
ções são equivalentes:

1. O oxioma da escolha;

2. O Princípio Maximal de Hausdorff;

3. O Lema de Zorn;

4. O Princípio da Boa Ordenação.

Prova. Resta provar que (4 ⇒ 1). Suponhamos que A seja bem ordenado. Então a
função r : P(A)∗ → A definida como r(B) = min(B) ∈ B é uma função escolha
para A.

Exercícios
1. Sejam I = [0, 1[ um intervalo com a ordem induzida por R e N com a ordem
usual. Mostre que N × I com a ordem lexicográfica é isomorfo a R+ , mas
I × N com a ordem lexicográfica não.

148
Capítulo 4. Axioma da Escolha e Aplicações

2. Mostre que qualquer poset não vazio possui um subconjunto bem ordenado
maximal.

3. Seja A um poset não vazio tal que qualquer subconjunto bem ordenado possui
uma cota superior. Mostre que A possui pelo menos um elemento maximal.

4. Sejam A um conjunto qualquer e R uma relação sobre A com a seguinte


propriedade: não existe uma sequência infinita {xn : n ∈ N} de elementos
de A tal que xn+1 Rxn , para todo n ∈ N (R-decrescente). Mostre que R bem
ordena A.

5. Mostre que se A pode ser bem ordenado, então P(A) pode ser totalmente
ordenado.

6. Um filtro sobre um conjunto A é uma família F de subconjuntos de P(A)


que satisfaz as seguintes condições:

(a) Se X, Y ∈ F, então X ∩ Y ∈ F.
(b) Se X ∈ F e X ⊆ Y , então Y ∈ F.
(c) ∅ ∈
/ F.
(i) Mostre que se B é um subconjunto não vazio de A, então

F = {X ⊆ A : B ⊆ X}

é um filtro sobre A e chama-se filtro principal gerado por B. Em parti-


cular, quando B = {a}, F é um filtro maximal.
(ii) Mostre que se A é infinito, então

F = {X ⊆ A : A − X = X  é finito}

é um filtro não principal dos subconjuntos cofinitos de A.


(iii) Mostre que qualquer filtro está contido em um filtro maximal (ultrafil-
tro).

7. Um ideal sobre um conjunto A é uma família I de subconjuntos de P(A) que


satisfaz as seguintes condições:

(a) Se X, Y ∈ I, então X ∪ Y ∈ I.

149
4.3. Princípio da Boa Ordenação

(b) Se Y ∈ I e X ⊆ Y , então X ∈ I.
(c) ∅ ∈ I e A ∈
/ I.

Mostre que F é um filtro sobre A se, e somente se, I = {A − X : X ∈ F} é


ideal sobre A. Conclua que ideal é a afirmação dual de filtro.

150
CAPÍTULO 5

OS NÚMEROS NATURAIS

Com o objetivo de desenvolver a Matemática dentro da ferramenta da Teoria


dos Conjuntos, via método axiomática, construiremos, neste capítulo, um conjunto
de objetos, chamados “números naturais”, o qual será munido com todas as propri-
edades que são associadas com os números naturais do nosso pensamento.
Além disso, com o “axioma da infinidade” completaremos a Teoria Axiomática
dos Conjuntos, segundo Zermelo, ou seja, são os axiomas apresentados (Bernays-
Gödel-von Neumann) menos os axiomas ZF7 , ZF8 e
Axioma da fundação. Em cada conjunto não vazio A existe um elemento u ∈ A
tal que u ∩ A = ∅. Em símbolos,

∀ A [∃ x ∈ A ⇒ ∃ u [u ∈ A e u ∩ A = ∅]].

Este axioma nos garante que nenhum conjunto não vazio é membro de si próprio,
ou seja, A ∩ {A} = ∅. Por exemplo, se o conjunto A = {xn : n ∈ N} possui a
propriedade: xn+1 ∈ xn , para todo n ∈ N, então, pelo axioma, existe um elemento
u ∈ A tal que u ∩ A = ∅. Como u ∈ A temos que u = xk , para algum k ∈ N.
Por outro lado, xk+1 ∈ xk e xk+1 ∈ A implicam que xk+1 ∈ u ∩ A, o que contradiz
a conclusão do axioma. Portanto, um tal conjunto não existe. Consequentemente,
a impossibilidade A ∈ A. Não obstante, o conjunto A = {An : n ∈ N}, com
An = {k + n − 1 : k ∈ N}, possui a propriedade: An+1 ⊂ An , para todo n ∈ N.
A importância da construção dos números “conjuntos infinitos” é refletida por
frases como:

151
5.1. Os Números Naturais

(. . . ) a conquista do infinito atual pode ser considerada uma expansão do nosso


horizonte científico não menos revolucionária do que o sistema Copernicano ou do
que a teoria da relatividade, ou mesmo da teoria quântica e da física nuclear.(. . . )
A. A. Fraenkel, 1966.
1
Além disso, provaremos os axiomas de Peano para o conjunto dos números
naturais como consequência do axioma da infinidade.
Em bem pouco tempo estaremos aptos para enunciar o axioma da infinidade.
Finalmente, nas palavras de Kronecker2 , Deus criou os “números naturais”. O resto
é trabalho do homem.

5.1 Os Números Naturais


Seja A um conjunto qualquer. O sucessor de A é definido como

A+ = A ∪ {A}.

Note que A+ é obtido por adjuntar a A um novo elemento, a saber, A, e pelo axioma
da fundação A+ = A. Assim, um conjunto B é um sucessor se B = A ∪ {A}, para
algum conjunto A. Definimos

0 = ∅
1 = ∅ ∪ {∅} = {∅} = {0}
2 = {∅} ∪ {{∅}} = {∅, {∅}} = {0, 1}
3 = {∅, {∅}} ∪ {{∅, {∅}}} = {∅, {∅}, {∅, {∅}}} = {0, 1, 2}
.. ..
. = .

A ideia é simplesmente definir um número natural como o conjunto de todos os


números naturais menores, isto é, n = {0, 1, 2, . . . , n − 1}. Mas essa definição
ainda é deficiente e possui propriedades estanhas. Por exemplo,

0 ∈ 1 ∈ 2 ∈ 3 ∈ ··· e 0 ⊂ 1 ⊂ 2 ⊂ 3 ⊂ ···

Por isso, vamos obter uma definição mais precisa, devida a von Neumann.

1
Giuseppe Peano, 1858-1932, matemático italiano.
2
Leobold Kronecker, 1823-1891, matemático alemão.

152
Capítulo 5. Os Números Naturais

Seja A um conjunto qualquer. Diremos que A é um conjunto indutivo ou um


conjunto sucessor se ele satisfaz as seguintes condições:

1. ∅ ∈ A.

2. Se x ∈ A, então x+ ∈ A.

ZF9 - Axioma da infinidade. Existe um conjunto indutivo. Em símbolos,

∃ A [∅ ∈ A e ∀ x [x ∈ A ⇒ x+ ∈ A]].

Observação 5.1 O axioma ZF9 garante a existência do conjunto vazio ∅. Portanto,


se ∅ = 0 for um conjunto, então, pelo axioma ZF5 ,

n+ = n ∪ {n} = {0, 1, 2, . . . , n − 1, n}
(n+ )+ = n+ ∪ {n+ } = {0, 1, 2, . . . , n − 1, n, n+ }
..
.

são conjuntos. Além disso, é claro que qualquer conjunto indutivo contém os nossos
números naturais, os quais são construídos a partir do conjunto vazio.
Seja {Ai }i∈I uma família de conjuntos indutivos. Então

A= Ai
i∈I

é um conjunto indutivo. De fato, 0 ∈ A, pois 0 ∈ Ai , para todo i ∈ I. Se x ∈ A,


então x ∈ Ai , para todo i ∈ I. Assim, x+ ∈ Ai , para todo i ∈ I. Portanto, x+ ∈ A.
Neste caso, A é o maior conjunto indutivo contido em cada Ai . Em particular, seja
F a família de todos os conjuntos indutíveis. Então

B= A
A∈F

é um conjunto indutivo. Seja C qualquer conjunto indutivo. Então C ∈ F e B ⊆ C.


Portanto, B é o menor conjunto indutivo.
O conjunto de todos os números naturais (formais) é definido como a interseção
de todos os conjuntos indutivos e será denotado por ω.

Observação 5.2 Sobre o conjunto ω.

153
5.1. Os Números Naturais

1. Note que ω é definido como um elemento do conjunto recorrente minimal,


pois qualquer conjunto indutivo contém ω. Neste caso,

ω = ∩A = {n : n ∈ A, para qualquer conjunto indutivo A}.

2. A notação dos números naturais por ω é para diferenciar do nosso números


naturais N construído via axiomas de Peano.

3. Qualquer elemento de ω chama-se um número natural. Neste caso, cada


número natural de ω é igual a:

n = {0, 1, 2, . . . , n − 1}.

Além disso, pelo axioma ZF9 , existe um conjunto indutivo A e, por definição,
ω ⊆ A. Assim, pelo axioma ZF4 , ω é um conjunto. Portanto, qualquer
número natural é um conjunto.

Teorema 5.3 n+ = 0, para todo n ∈ ω.

Prova. Como n+ = n ∪ {n}, para todo n ∈ ω, temos que n ∈ n+ , para todo n ∈ ω.


Portanto, n+ = 0, pois 0 é o conjunto vazio.

Teorema 5.4 (Primeiro Princípio de Indução Finita) Seja S um subconjunto de


ω e suponhamos que S tenha as seguintes propriedades:

1. 0 ∈ S. (base de indução)

2. Se n ∈ S, então n+ ∈ S. (P IF )

Então S = ω.

Prova. As condições (1) e (2) implicam que S é um conjunto indutivo. Logo, por
definição, ω ⊆ S. Portanto, S = ω.

É de grande importância lembrar que o Princípio de Indução Finita (PIF) é muito


útil para provar proposições que se referem ao conjunto ω.

Exemplo 5.5 Mostre que se n ∈ ω, então n = 0 ou n = k + , para algum k ∈ ω, ou


seja, qualquer número natural diferente de 0 possui um sucessor.

154
Capítulo 5. Os Números Naturais

Solução. Seja

S = {n ∈ ω : n = 0 ou n = k + , para algum k ∈ ω}.

Então, por definição, 0 ∈ S. Suponhamos que o resultado seja válido para algum n,
isto é, n ∈ S. Então

n+ = n ∪ {n} = k + ∪ {k + } = (k + )+ ,

para algum k ∈ ω. Portanto, n+ ∈ S. Assim, pelo PIF, S = ω. Consequentemente,


qualquer n = 0, n = k + , para algum k ∈ ω.

Lema 5.6 Sejam m, n ∈ ω. Então m ∈ n+ se, e somente se, m = n ou m ∈ n.


Prova. m ∈ n+ = n ∪ {n} se, e somente se, m ∈ n ou m ∈ {n} se, e somente se,
m ∈ n ou m = n. Usamos que m = n se, e somente se, m ∈ {n}.

Seja A um conjunto qualquer. Diremos que A é um conjunto transitivo se X ⊆


A, para todo X ∈ A, isto é,

∀ X [X ∈ A ⇒ X ⊆ A].

Observe que isto é equivalente a: se X ∈ Y ∈ A, então X ∈ A. Neste caso, A é


um conjunto transitivo se, e somente se,

∪A = {x : x ∈ X, para algum X ∈ A} ⊆ A ⇔ A ⊆ P(A).

Exemplo 5.7 3 = {0, 1, 2} é um conjunto transitivo, pois

0 = ∅ ⊆ 3, 1 = {∅} ⊆ 3 e 2 = {∅, {∅}} ⊆ 3.

Enquanto, A = {0, 1, 5} não é um conjunto transitivo, pois

4 ⊆ 5 e 5 ⊆ A, mas 4  A.

Lema 5.8 Qualquer número natural n é um conjunto transitivo. Em particular,


∪n ⊆ n, para todo n ∈ ω.
Prova. Seja
S = {n ∈ ω : n é um conjunto transitivo}.

155
5.1. Os Números Naturais

Então 0 ∈ S, pois se 0 não fosse um conjunto transitivo, então existiria um y ∈ 0


tal que y ⊂ 0, mas isto é impossível, uma vez que 0 = ∅. Suponhamos que n ∈ S.
Então devemos provar que n+ ∈ S. Dado m ∈ n+ , temos, pelo Lema 5.6, que
m ∈ n ou m = n. Se m ∈ n, então m ⊆ n e n ⊆ n+ . Logo, m ⊆ n+ . Se m = n e
n ⊆ n+ , então m ⊆ n+ . Portanto, n+ ∈ S. Assim, pelo PIF, S = ω.

Teorema 5.9 n = ∪n+ , para cada n ∈ ω. Conclua que se m+ = n+ , para todos


m, n ∈ ω, então m = n. Em particular, a função s : ω → ω definida como
s(n) = n+ é injetora e s(ω) = ω.
Prova. Seja S = {n ∈ ω : n = ∪n+ }. Então 0 ∈ S, pois

∪0+ = ∪(0 ∪ {0}) = ∪(∅ ∪ {∅}) = ∪{∅} = ∅ = 0.

Suponhamos que n ∈ S, isto é, n ∈ ω e n = ∪n+ . Então devemos provar que


n+ ∈ S. Note que

∪(n+ )+ = ∪(n+ ∪ {n+ }) = (∪n+ ) ∪ (∪{n+ }) = n ∪ n+ = n ∪ (n ∪ {n}) = n+

Portanto, n+ ∈ S. Assim, pelo PIF, S = ω.

Em 1889 Peano apresenta um método axiomático para os números naturais N.


Provaremos a seguir que o conjunto ω satisfaz os axiomas de Peano, ou seja, o par
(ω,+ ) é um modelo para o sistema de axiomas de Peano. Portanto, em um certo
sentido, ω é semelhante a N.

Teorema 5.10 (Axiomas de Peano) O conjunto ω satisfaz os seguintes axiomas:

P1 - 0 ∈ ω.

P2 - Se n ∈ ω, então n+ ∈ ω.

P3 - n+ = 0, para todo n ∈ ω.

P4 - Se S ⊆ ω é tal que

(a) 0 ∈ S (base de indução).


(b) n ∈ S ⇒ n+ ∈ S. (P IF )

Então S = ω.

156
Capítulo 5. Os Números Naturais

P5 - Se m, n ∈ ω e m+ = n+ , então m = n.

Prova. Fica como um exercício.

Teorema 5.11 (Fórmula de Recorrência) Sejam A um conjunto qualquer, c ∈ A


fixado e g : A → A uma função qualquer. Então existe uma única função f : ω →
A tal que as seguintes condições são satisfeitas:

1. f (0) = c. (base de recorrência)

2. f (n+ ) = g(f (n)), para todo n ∈ ω. (fórmula de recorrência)

Prova. (Existência) Note que f é um subconjunto de ω × A com as seguintes


propriedades:

1. Para qualquer n ∈ ω, existe um x ∈ A tal que (n, x) ∈ f .

2. Se (n, x1 ) ∈ f e (n, x2 ) ∈ f , então x1 = x2 .

3. (0, c) ∈ f .

4. Se (n, x) ∈ f , então (n+ , g(x)) ∈ f , para todo n ∈ ω.

Construiremos um gráfico f com essas propriedades. Seja F o conjunto de todos


os subconjuntos G de ω × A tais que

(0, c) ∈ G e (n, x) ∈ G ⇒ (n+ , g(x)) ∈ G, ∀ n ∈ ω.

Então F = ∅, pois ω × A ∈ F. Seja


f= G.
G∈F

Então é fácil verificar que f ∈ F. Por construção f satisfaz (3) e (4). Assim, resta
provar que f satisfaz (1) e (2).
(1) Pela propriedade (3), (0, c) ∈ f . Assim, 0 ∈ Dom(f ). Suponhamos que
n ∈ Dom(f ). Então existe um x ∈ A tal que (n, x) ∈ f . Logo, pela propriedade
(4), (n+ , g(x)) ∈ f , isto é, n+ ∈ Dom(f ). Portanto, pelo PIF, Dom(f ) = ω.
(2) Seja S o conjunto de todos os n ∈ ω tal que (n, x1 ) ∈ f e (n, x2 ) ∈ f
implicam que x1 = x2 ou, equivalentemente, S é o conjunto de todos os n ∈ ω tal

157
5.1. Os Números Naturais

que existe no máximo um x ∈ A, com (n, x) ∈ f , ou ainda,

S = {n ∈ ω : ∃! x ∈ A, com (n, x) ∈ f }

Devemos provar que S = ω. Note que 0 ∈ S, pois se 0 ∈


/ S, então existe um
(0, d) ∈ f , com c = d, e o conjunto

f  = f − {(0, d)} ⊆ ω × A

é um elemento de F, pois (0, c) ∈ f  e se (n, x) ∈ f  , então (n, x) ∈ f e


(n+ , g(x)) ∈ f . Como n+ = 0 temos que (n+ , g(x)) = (0, d). Assim, (n+ , g(x)) ∈
f  . Logo, f ⊆ f  , o que é uma contradição. Portanto, 0 ∈ S. Suponhamos que
o resultado seja válido para algum n > 0, n ∈ S, isto é, existe um único x ∈ A,
com (n, x) ∈ f e (n+ , g(x)) ∈ f . Então n+ ∈ S, pois se n+ ∈ / S, então existe um
+
(n , y) ∈ f , com y = g(x), e o conjunto

f 0 = f − {(n+ , y)} ⊆ ω × X

é um elemento de F, pois (n+ , y) = (0, c) implica que (0, c) ∈ f 0 e se (m, z) ∈ f 0 ,


então (m, z) ∈ f e (m+ , g(z)) ∈ f . Assim, há dois casos a serem considerados:
1.o Caso. Se m+ = n+ , então (n+ , y) = (m+ , g(z)). Logo, (m+ , g(z)) ∈ f 0 .
2.o Caso. Se m+ = n+ , então pelo Teorema 5.9, m = n. Assim, (n, z) =
(m, z). Logo, x = z, pois n ∈ S. Portanto, (m+ , g(z)) = (n+ , g(x)) ∈ f 0 . Logo,
f ⊆ f 0 , o que é uma contradição. Assim, pelo PIF, S = ω.
(Unicidade) Sejam f1 outra função de ω em A satisfazendo as mesmas condi-
ções de f e
T = {n ∈ ω : f (n) = f1 (n)}.
Então f (0) = c = f1 (0). Assim, 0 ∈ T . Suponhamos que o resultado seja válido
para algum n, isto é, n ∈ T . Então

f (n+ ) = g(f (n)) = g(f1 (n)) = f1 (n+ ).

Assim, n+ ∈ T . Portanto, pelo P IF , T = ω, ou seja, f = f1 .

De posse deste novo conjunto ω vamos lembrar alumas notações e terminolo-


gias. Seja A um conjunto qualquer. Uma sequência sobre A é qualquer função cujo
domínio é um número natural ou ω em A. Uma sequência cujo domínio é algum

158
Capítulo 5. Os Números Naturais

número natural n ∈ ω chama-se sequência finita de comprimento n e denotada por

(xk : k < n) ou (xk : k = 0, . . . , n − 1) ou (x0 , . . . , xn−1 ).

Em particular, () = ∅ é a única sequência de comprimento 0 chamada de sequência


nula e Seq(A) = ∪n∈ω An é o conjunto de todas as sequências finitas. Formalmente,
qualquer função f : n → A chama-se uma lista, pois ela é completamente deter-
minada listando os seus elementos, digamos x0 , . . . , xn−1 . Assim, pelo Exemplo
2.28, σ : An → A × · · · × A definida como σ(f ) = (x0 , . . . , xn−1 ) é bijetora. Uma
sequência cujo domínio é ω chama-se sequência infinita e denotada por

(xn : n ∈ ω) ou (xn : n = 0, , 1, . . .) ou (xn )n∈ω ,

a qual é um elemento de Aω .
Um modo alternativo da Fórmula de Recorrência é: sejam A um conjunto qual-
quer, c ∈ A fixado e g : ω × A → A uma função qualquer. Então existe uma única
sequência f : ω → A tal que as seguintes condições são satisfeitas:

1. f (0) = c. (base de recorrência)

2. f (n+ ) = g(n, f (n)), para todo n ∈ ω. (fórmula de recorrência)

Note que esta Fórmula de Recorrência é um caso especial da Fórmula de Recorrên-


cia de Dedekind, pois sejam F = Seq(A) e g : F → A uma função qualquer. Então
existe uma única função f : ω → A tal que

∀ n ∈ ω [f (n+ ) = g(f |Sn+1 ) = g(fn+1 )],

com fn+1 = (f (0), . . . , f (n)) e f (0) = g(∅) = c.

Corolário 5.12 Sejam g, c e f como na Fórmula de Recorrência. Se g for injetora


ec∈/ Im(g), então f é injetora.

Prova. Devemos provar que se dados m, n ∈ ω, f (m) = f (n), então m = n. Para


provar isso, vamos usar indução sobre m. Se m = 0 e n = 0, nada há para ser
provar. Se n = 0, então existe um k ∈ ω tal que n = k + . Assim,

c = f (0) = f (m) = f (n) = f (k + ) = g(f (k)) ⇒ c ∈ Im(g),

159
5.1. Os Números Naturais

o que é impossível. Portanto, m = 0 = n. Suponhamos que o resultado seja


válido para algum m ∈ ω. Seja f (m+ ) = f (n). Se n = 0, então já vimos que
f (m+ ) = f (0), o que é impossível. Assim, n = 0 e existe um k ∈ ω tal que
n = k + . Logo,

g(f (m)) = f (m+ ) = f (n) = f (k + ) = g(f (k)) ⇒ f (m) = f (k),

pois g é injetora. Portanto, pela hipótese de indução, m = k. Consequentemente,


m+ = k + = n.

Observação 5.13 Sejam A um conjunto qualquer, h : ω × A → A uma função e


ϕ : ω × A → ω × A uma função definida como ϕ(n, a) = (n+ , h(n, a)). Então,
pelo Teorema 5.11, existe uma única função g = (0, f ) : ω → A tal que

1. g(0) = (0, a).

2. g(n+ ) = ϕ(g(n)), para todo n ∈ ω.

Portanto, existe uma única função, f : ω → A tal que

a. f (0) = a.

b. f (n+ ) = h(n, f (n)), para todo n ∈ ω.

Note que a definição de potência de um número real qualquer a ∈ R é usual-


mente definida como:

1. a0 = 1.

2. an+1 = an a, para todo n ∈ ω.

As condições (1) e (2) significam que a0 = 1, a1 = a, a2 = aa etc. Esta definição


intuitiva é formalmente como segue: sejam g : R → R uma função definida como
g(x) = xa e c = 1 uma constante real. Então, pelo Teorema 5.11, existe uma única
função f : ω → R definida como f (n) = an tal que

1. f (0) = 1.

2. f (n+ ) = g(f (n)), para todo n ∈ ω.

Outro exemplo, definindo g : R → R como g(x) = x2 e c = 2. Então, pelo


Teorema 5.11, existe uma única função f : ω → R tal que

160
Capítulo 5. Os Números Naturais

1. f (0) = c = 2.

2. f (n+ ) = g(f (n)), para todo n ∈ ω. Neste caso,


2 n
f (1) = g(f (0)) = g(2) = 22 , f (2) = 22 , . . . , f (n) = 22 , . . .

Exemplo 5.14 Sejam A um conjunto e g : A → B uma função injetora, com B ⊆


A. Mostre que A possui um subconjunto que está em correspondência biunívoca
com ω.

Solução. Como g é injetora temos, pelo Corolário 5.12, que existe uma única função
injetora f : ω → A. Pondo D = f (A), obtemos a função h : ω → D definida como
h(n) = f (n), com as propriedades desejadas.

Exercícios
1. Mostre que A é um conjunto transitivo se, e somente se, B ∈ C e C ∈ A
implica que B ∈ A.

2. Mostre que se A e B são conjuntos transitivos, então A ∪ B e A ∩ B são


conjuntos transitivos.

3. Sejam A e B dois conjuntos. Mostre que se A = B, então A+ = B + .

4. Mostre que n ∈
/ n, para todo n ∈ ω.

5. Dados m, n, p ∈ ω.

(a) Mostre que n = n+ .


(b) Mostre que se m ∈ n, então n ∈
/ m.
(c) Mostre que se m ∈ n e n ∈ p, então m ∈ p.
(d) Se m ∈ n, então m+ ⊆ n.

6. Mostre que se A ∈ n e n ∈ ω, então A ∈ ω. Conclua que ω é um conjunto


transitivo.

7. Mostre que se A+ ∈ ω, então A ∈ ω.

161
5.2. Aritmética dos Números Naturais

8. Mostre que nenhum elemento de ω é um conjunto indutivo.

9. Mostre que nenhum elemento de ω é um subconjunto de qualquer de seus


elementos.

10. Sejam A um conjunto e h : A → A uma função. Vamos definir hn como


h0 = IA e hn+1 = hn ◦ h, para todo n ∈ ω. Mostre que hn é um elemento
unicamente determinado em AA , para todo n ∈ ω.

11. Seja g : Z → Z a função definida como



n + 1, se n < 0
g(n) =
n, se n ≥ 0.

Mostre que existem funções f : Z → Z tais que f (0) = 0 e f (n + 1) =


g(f (n)), para todo n ∈ Z. Por que isto ocorre?

12. Seja A um poset não vazio. Mostre que se A não possui elemento maximal,
então A possui uma sequência estritamente crescente.

5.2 Aritmética dos Números Naturais


Veremos nesta seção uma das mais importantes aplicações da Fórmula de Re-
corrência, que é o seu uso nas definições de adição, multiplicação e potenciação de
números naturais.
Seja m ∈ ω fixado. Então, pelo Teorema 5.11, existe uma única função fm :
ω → ω tal que
1. fm (0) = m.

2. fm (n+ ) = [fm (n)]+ , para todo n ∈ ω.


Note que a função g : ω → ω é definida como g(x) = x+ e c = m.
Dados m, n ∈ ω, definimos a adição sobre ω como sendo

m + n = fm (n).

Assim, como uma relação,

+ = {((m, n), p) : m, n ∈ ω e p = fm (n)}.

162
Capítulo 5. Os Números Naturais

Observe que + : ω × ω → ω é uma operação binária sobre ω e escrevemos m + n


ao invés de +(m, n). Portanto, as condições (1) e (2), podem ser reescritas como:
1. m + 0 = m.

2. m + n+ = (m + n)+ , para todo n ∈ ω.


É muito importante notar que a única razão para usarmos fm é que o Teorema 5.11
aplica-se diretamente a uma função com domínio ω e não ω × ω.

Lema 5.15 1 + n = n+ = n ∪ {n}, em que 1 = 0+ , para todo n ∈ ω. Conclua


que se n = 0, então existe um único k ∈ ω tal que n = k + . Neste caso, escrevemos
n = k + 1 e k = n − 1.
Prova. Seja S = {n ∈ ω : n+ = 1 + n}. Então 0 ∈ S, pois pela condição (1),
0+ = 1 = 1 + 0. Suponhamos que o resultado seja válido para algum n, isto é,
n ∈ S. Então, pela condição (2), 1 + n+ = (1 + n)+ = (n+ )+ . Portanto, n+ ∈ S e
S = ω. A última afirmação segue do Exemplo 5.5.

Lema 5.16 0 + n = n, para todo n ∈ ω, ou seja, 0 é o elemento neutro da adição


sobre ω.
Prova. Seja S = {n ∈ ω : n = 0 + n}. Então 0 ∈ S, pois pela condição (1),
0 = 0 + 0. Suponhamos que o resultado seja válido para algum n, isto é, n ∈ S.
Então, pela condição (2), 0 + n+ = (0 + n)+ = n+ . Portanto, n+ ∈ S e S = ω.

Lema 5.17 k + (m + n) = (k + m) + n, para todos k, m, n ∈ ω, ou seja, a adição


sobre ω é associativa. Neste caso, podemos omitir os parênteses e simplesmente
escrever, k + m + n, sem ambiguidade.
Prova. Para k e m fixados, seja S = {n ∈ ω : k + (m + n) = (k + m) + n}. Então
0 ∈ S, pois pela condição (1), k + (m + 0) = k + m = (k + m) + 0. Suponhamos
que o resultado seja válido para algum n, isto é, n ∈ S. Então, pela condição (2),

k + (m + n+ ) = k + (m + n)+ = (k + (m + n))+
= ((k + m) + n)+ = (k + m) + n+ .

Portanto, n+ ∈ S e S = ω.

Lema 5.18 m + n = n + m, para todos m, n ∈ ω, ou seja, a adição sobre ω é


comutativa.

163
5.2. Aritmética dos Números Naturais

Prova. Para m fixado, seja S = {n ∈ ω : m + n = n + m}. Então 0 ∈ S, pois pela


condição (1), m + 0 = m = m + 0. Suponhamos que o resultado seja válido para
algum n, isto é, n ∈ S. Então, pela condição (2) e os Lemas 5.15 e 5.17,

m + n+ = (m + n)+ = (n + m)+ = 1 + (n + m) = (1 + n) + m = n+ + m.

Portanto, n+ ∈ S e S = ω.

Lema 5.19 Se k + n = m + n, então k = m, para todos k, m, n ∈ ω, ou seja, na


adição sobre ω vale a lei do cancelamento.
Prova. Para k e m fixados, seja S = {n ∈ ω : k + n = m + n ⇒ k = m}.
Então 0 ∈ S, pois pela condição (1), k + 0 = m + 0 ⇒ k = m. Suponhamos que
o resultado seja válido para algum n, isto é, n ∈ S. Então, pela condição (2) e o
Teorema 5.9,

k + n+ = m + n+ ⇒ (k + n)+ = (m + n)+
⇒ k + n = m + n ⇒ k = m.

Portanto, n+ ∈ S e S = ω.

Seja m ∈ ω fixado. Então, pelo Teorema 5.11, existe uma única função fm :
ω → ω tal que

1. fm (0) = 0.

2. fm (n+ ) = m + fm (n), para todo n ∈ ω.

Note que a função g : ω → ω é definida como g(x) = x + m e c = 0.


Dados m, n ∈ ω, definimos a multiplicação sobre ω como sendo

m · n = fm (n).

Observe que · : ω × ω → ω é uma operação binária sobre ω e escrevemos m · n ao


invés de ·(m, n).. Assim, as condições (1) e (2), podem ser reescritas como

1. m · 0 = 0.

2. m · n+ = m + m · n, para todo n ∈ ω.

Com o objetivo de simplificar a notação, às vezes, escrevemos mn ao invés de m·n.

164
Capítulo 5. Os Números Naturais

Lema 5.20 0 · n = 0, para todo n ∈ ω.

Prova. Seja S = {n ∈ ω : 0 · n = 0}. Então 0 ∈ S, pois pela condição (1),


0 · 0 = 0. Suponhamos que o resultado seja válido para algum n, isto é, n ∈ S.
Então, pela condição (2) e o Lema 5.16, 0 · n+ = 0 + 0 · n = 0 · n = 0. Portanto,
n+ ∈ S e S = ω.

Lema 5.21 1 · n = n, para todo n ∈ ω, ou seja, 1 é o elemento neutro da multipli-


cação sobre ω.

Prova. Seja S = {n ∈ ω : 1 · n = n}. Então 0 ∈ S, pois pela condição (1),


1 · 0 = 0. Suponhamos que o resultado seja válido para algum n, isto é, n ∈ S.
Então, pela condição (2), 1 · n+ = 1 · n + 1 = n + 1 = n+ . Portanto, n+ ∈ S e
S = ω.

Lema 5.22 Dados k, m, n ∈ ω.

1. k(m + n) = km + kn.

2. (k + m)n = kn + mn.

Ou seja, a adição e multiplicação sobre ω são distributivas.

Prova. Vamos provar apenas o item (1). Para k e m fixados, seja S = {n ∈ ω :


k(m + n) = km + kn}. Então 0 ∈ S, pois pelo Lema 5.16 e a condição (1),
k(m + 0) = km = km + 0 = km + k · 0. Suponhamos que o resultado seja válido
para algum n, isto é, n ∈ S. Então, pela condição (2) e os Lemas 5.17 e 5.18,

k(m + n+ ) = k(m + n)+ = k + k(m + n) = k + (km + kn)


= (k + km) + kn = (km + k) + kn = km + (k + kn)
= km + kn+ .

Portanto, n+ ∈ S e S = ω.

Lema 5.23 k(mn) = (km)n, para todos k, m, n ∈ ω, ou seja, a multiplicação


sobre ω é associativa.

Prova. Para k e m fixados, seja S = {n ∈ ω : k(mn) = (km)n}. Então 0 ∈ S,


pois pela condição (1), k(m · 0) = 0 = (km)0. Suponhamos que o resultado seja

165
5.2. Aritmética dos Números Naturais

válido para algum n, isto é, n ∈ S. Então, pela condição (2) e o Lema 5.22,

k(mn+ ) = k(m + mn) = km + k(mn) = km + (km)n


= km(1 + n) = (km)n+ .

Portanto, n+ ∈ S e S = ω.

Lema 5.24 mn = nm, para todos m, n ∈ ω, ou seja, a multiplicação sobre ω é


comutativa.

Prova. Para m fixado, seja S = {n ∈ ω : mn = nm}. Então 0 ∈ S, pois pela


condição (1), m · 0 = 0 = 0 · m. Suponhamos que o resultado seja válido para
algum n, isto é, n ∈ S. Então, pela condição (2) e os Lemas 5.21 e 5.22,

mn+ = m + mn = mn + m = nm + 1m = (n + 1)m = n+ m.

Portanto, n+ ∈ S e S = ω.

Lema 5.25 Dados m, n ∈ ω.

1. m ∈ m + n+ .

2. m + n = 0 se, e somente se, m = 0 e n = 0.

Prova. (1) Para m fixado, seja S = {n ∈ ω : m ∈ m + n+ }. Então 0 ∈ S, pois pela


condição (1) e o Lema 5.16, m + 0+ = (m + 0)+ = m+ , de modo que m ∈ m + 0+ .
Suponhamos que o resultado seja válido para algum n, isto é, n ∈ S. Então, pela
condição (2),

m + (n+ )+ = (m + n+ )+ = (m + n+ ) ∪ {m + n+ },

de modo que m ∈ m + (n+ )+ . Portanto, n+ ∈ S e S = ω.


(2) Suponhamos, por absurdo, que m = 0 ou n = 0. Então, pelo Lema 5.15,
existe um k ∈ ω tal que m = k + ou n = k + . Assim, pelo item (1), m ∈ m + k + =
m + n = 0 ou n ∈ n + k + = n + m = 0, o que é uma contradição. A recíproca é
clara.

Vamos introduziremos uma das mais importantes relações sobre o conjunto dos
números naturais ω, a saber, à ordem usual. As notações e terminologias que serão

166
Capítulo 5. Os Números Naturais

usadas a seguir são as mesmas do Capítulo 3. Dados m, n ∈ ω, definimos

m ≤ n ⇔ existe um k ∈ ω tal que n = m + k.

Então ≤ é uma relação de ordem sobre ω. De fato, como m = m + 0, para todo


m ∈ ω temos que m ≤ m. Dados m, n ∈ ω, se m ≤ n e n ≤ m, então existem
k, l ∈ ω tais que n = m + k e m = n + l. Assim, n + 0 = n = n + (k + l) implica,
pelo Lema 5.19, que k + l = 0. Logo, pelo item (2) do Lema 5.25, k = l = 0 e
m = n. Dados m, n, p ∈ ω, se m ≤ n e n ≤ p, então existem k, l ∈ ω tais que
n = m + k e p = n + l. Assim, p = (m + k) + l = m + (k + l). Portanto, m ≤ p.
Note que

m < n ⇔ existe um k ∈ ω − {0} tal que n = m + k.

Observe que k ∈ ω tal que m + k = n é único. Neste caso, k = n − m chama-


se a diferença entre n e m. Como cada número natural é um conjunto o próximo
resultado nos fornece uma formulação de uma relação de ordem sobre ω em termos
de inclusão.

Teorema 5.26 Dados m, n ∈ ω, m ≤ n se, e somente se, m ⊆ n se, e somente se,


m = n ou m ∈ n (m ∈ n+ ). Neste caso, m < n se, e somente se, m ∈ n.
Prova. Suponhamos que m ≤ n, para todos m, n ∈ ω. Então existe um k ∈ ω
tal que n = m + k. Se k = 0, nada há para ser provado. Se k = 0, então, pelo
Lema 5.15, existe um p ∈ ω tal que k = p+ . Assim, pelo item (1) do Lema 5.25,
m ∈ m + p+ = m + k = n, de modo que m ⊆ n.
Reciprocamente, seja

S = {n ∈ ω : ∀ m ∈ ω [m ⊆ n ⇒ m ≤ n]}.

Então 0 ∈ S, pois m ⊆ 0 não é possível, para todo m ∈ ω. Suponhamos que o


resultado seja válido para algum n, isto é, n ∈ S. Então m ⊆ n+ = n ∪ {n} implica
que m = n ou m ∈ n. Se m = n, então, pelo Lema 5.15 m + 1 = n+ , de modo
que m < n+ . Se m ∈ n, então n = m + k, para algum k ∈ ω, com k = 0. Assim,
m + k + = m + k + 1 = n + 1 = n+ , de modo que m < n+ . Portanto, em qualquer
caso, n+ ∈ S e S = ω.

Lema 5.27 Se n ∈ ω, então n ≥ 0, ou seja, 0 é o menor elemento de ω.

167
5.2. Aritmética dos Números Naturais

Prova. Seja S = {n ∈ ω : n ≥ 0}. Então 0 ∈ S, pois 0 = 0. Suponhamos que o


resultado seja válido para algum n, isto é, n = 0 ou 0 ∈ n. Então 0 ∈ n∪{n} = n+ ,
de modo que n+ ≥ 0. Portanto, n+ ∈ S e S = ω.

Lema 5.28 Dados m, n ∈ ω.

1. m < n+ se, e somente se, m ≤ n.

2. m+ ≤ n se, e somente se, m < n.

3. m ≤ n se, e somente se, m+ ≤ n+ .

Prova. Vamos provar apenas o item (2). É claro que se m+ ≤ n, então m < n.
Reciprocamente, para m fixado, seja S = {n ∈ ω : m < n ⇒ m+ ≤ n}. Então
0 ∈ S, pois 0 é o menor elemento de ω. Suponhamos que o resultado seja válido
para algum n, isto é, n ∈ S. Se m < n+ , então m ∈ n+ . Logo, pelo Lema 5.6,
m ∈ n ou m = n. Se m = n, então m+ = n+ e n+ ∈ S. Se m ∈ n, então m < n.
Logo, n+ ∈ S, pois m+ ≤ n < n+ . Portanto, S = ω.

Teorema 5.29 (Princípio da Boa Ordenação) ω é um conjunto bem ordenado.


Prova. Suponhamos, por absurdo, que ω contenha um subconjunto A diferente do
vazio sem menor elemento. Seja

S = {n ∈ ω : n ≤ m, ∀ m ∈ A}.

Então, pelo Lema 5.27, 0 ∈ S. Suponhamos que o resultado seja válido para algum
n, isto é, n ∈ S. Se n = k, para algum k ∈ A, então k seria o menor elemento de
A, o que é impossível. Assim, n < m, para todo m ∈ A. Logo, pelo Lema 5.27,
n+ ≤ m, para todo m ∈ A, ou seja, n+ ∈ S. Portanto, S = ω. Como S ∩ A = ∅,
pois A não contém menor elemento, temos que A = ∅, o que é uma contradição.

Corolário 5.30 Não existe função f : ω → ω tal que f (n+ ) ∈ f (n), para todo
n ∈ ω.
Prova. Se uma tal função existisse, então f (ω) seria um conjunto não vazio sem
menor elemento, o que contradiz a boa ordenação de ω.

Exemplo 5.31 (Princípio Maximal) Mostre que se um subconjunto não vazio B


de ω possui uma cota superior, então ele possui um maior elemento.

168
Capítulo 5. Os Números Naturais

Solução. Sejam

S = {k ∈ ω : k é uma cota superior de B}

e b ∈ ω uma cota superior de B. Então S = ∅, pois b ∈ S Assim, pelo Teorema


5.29, S contém um menor elemento, digamos n ∈ S. Neste caso, é fácil verificar
que n = sup(B) ∈ ω.
Afirmação. n ∈ B.
De fato, suponhamos, por absurdo, que n ∈/ B. Então m < n, para todo m ∈ B.
Logo, n = 0, pois B = ∅, e pelo Lema 5.15, existe um k ∈ ω tal que n = k + .
Assim, pelo item (1) do Lema 5.27, k ≥ m, para todo m ∈ B. Portanto, k ∈ S é
uma cota superior de B, com k < n, o que contradiz a minimalidade de n.

No exemplo a seguir introduzimos um método de resolução conhecido como


prova pelo contraexemplo minimal.

Exemplo 5.32 Sejam a, b ∈ ω, com b > 0. Mostre que existe n ∈ ω tal que nb > a.

Solução. Suponhamos, por absurdo, que nb ≤ a, para todo n ∈ ω. Seja S =


{a − kb : k ∈ ω}. Então S ⊆ ω e S = ∅. Assim, pelo Teorema 5.29, S contém um
menor elemento, digamos c ∈ S. Logo, c ≤ a − nb, para todo n ∈ ω. Portanto,

c − b ≤ (a − mb) − b = a − (m + 1)b, ∀ m ∈ ω,

o que é uma contradição, pois c − b ∈ S, com c − b < c. Este exemplo pode ser
provado usando o Exemplo 5.31.

Teorema 5.33 (Segundo Princípio de Indução Finita) Seja P (n) uma sentença,
para cada n ∈ ω, que goza das seguintes propriedades:

1. P (0) é verdadeira (Base de indução).

2. Se P (k) é verdadeira para cada k, com 0 ≤ k ≤ n, então P (n + 1) é


verdadeira. (P IF )

Então P (n) é verdadeira, para todo n ∈ ω.

Prova. Seja S = {k ∈ ω : P (k) é falsa}. Suponhamos, por absurdo, que S = ∅.


Então, pelo Teorema 5.29, S contém um menor elemento, digamos n ∈ S. Como

169
5.2. Aritmética dos Números Naturais

P (k) é verdadeira para cada k, com 0 ≤ k ≤ n − 1, temos, pela condição P IF ,


que P (n) é verdadeira, ou seja, n ∈
/ S. o que é contradição. Portanto, P (n) é
verdadeira, para todo x ∈ ω.

Exemplo 5.34 Mostre que as seguintes condições são equivalentes:

1. O princípio da boa ordenação;

2. O princípio maximal;

3. O segundo princípio de indução finita.

Solução. (1 ⇒ 2) Já foi provada no Exemplo 5.31. (2 ⇒ 3) Seja P (n) uma


afirmação, para cada n ∈ ω. Suponhamos que P (k) seja verdadeira para cada k,
com k < n, implica que P (n) seja verdadeira. Suponhamos, por absurdo, que
exista m ∈ ω tal que P (m) seja falsa. Consideremos o conjunto

S = {t ∈ ω : P (k) seja verdadeira para todo n tal que 0 ≤ n ≤ t}.

Então m é uma cota superior de S, pois se m ≤ k, então k ∈ / S. Assim, S contém


um maior elemento, digamos s0 ∈ S. Logo, P (k) é verdadeira para todo k, com
0 ≤ k ≤ s0 . Pela condição P IF , temos que P (s0 + 1) é também verdadeira.
Portanto, s0 + 1 ∈ S, o que contradiz o fato de s0 ser o maior elemento de S.
(3 ⇒ 1) Suponhamos que S seja um subconjunto de ω sem menor elemento.
Consideremos a afirmação P (n): s ∈ / S, para todo s ∈ ω tal que 0 ≤ s ≤ n.
Então P (0) é verdadeira, isto é, 0 ∈
/ S. Caso contrário, 0 seria o menor elemento
de S, o que é impossível. Suponhamos que P (k) seja verdadeira para cada k, com
0 ≤ k ≤ n. Então n + 1 ∈ / S, pois se n + 1 ∈ S, então s ∈ / S, para todo s, com
0 ≤ s ≤ n, e n + 1 seria o menor elemento de S, o que é impossível. Portanto,
P (n + 1) é verdadeira. Consequentemente, P (n) é verdadeira, para todo n ∈ ω.
Em particular, n ∈
/ S, para todo n ∈ ω. Logo, S = ∅.

Seja m ∈ ω fixado. Então, pelo Teorema 5.11, existe uma única função fm :
ω → ω tal que

1. fm (0) = 1.

2. fm (n+ ) = fm (n)m, para todo n ∈ ω.

170
Capítulo 5. Os Números Naturais

Note que a função g : ω → ω é definida como g(x) = xm e c = 1.


Dados m, n ∈ ω, definimos a potenciação sobre ω como sendo

mn = fm (n).

Observe que ˆ : ω × ω → ω é uma operação binária sobre ω. Assim, as condições


(1) e (2), podem ser reescritas como
1. m0 = 1.
+
2. mn = mn+1 = mn · m, para todo n ∈ ω.

Lema 5.35 Sejam m, n, p ∈ ω. Então:


1. mn · mp = mn+p .

2. (m · n)p = mp · np .

3. (mn )p = mnp .
Prova. Vamos provar apenas o item (1). Para m e n fixados, seja

S = {p ∈ ω : mn mp = mn+p }.

Então 0 ∈ S. Suponhamos que o resultado seja válido para algum p, isto é, p ∈ S.


Então, pela condição (2),
+
mn+p = mn+p+1 = mn+p m = (mn mp )m
+
= mn (mp m) = mn mp+1 = mn mp .

Portanto, p+ ∈ S e S = ω.

Vamos fazer mais uma aplicação da Fórmula de Recorrência. Observe, pelo


Teorema 2.18, que ω × ω é um conjunto, pois ω é um conjunto. Consideremos a
função g : ω × ω → ω × ω definida como

(0, m + 1), se n = 0
g(m, n) =
(m + 1, n − 1), se n > 0.

Então g é injetora e e é claro que (0, 0) ∈


/ Im(g), pois dados (m, n), (p, q) ∈ ω × ω,
se g(m, n) = g(p, q) = (r, s), então há dois casos a serem considerados:

171
5.2. Aritmética dos Números Naturais

1.o Caso. Se r = 0, então, por definição, n = 0 = q. Assim,

(0, s) = g(m, 0) = (0, m + 1) e (0, s) = g(p, 0) = (0, p + 1).

Logo, s = m + 1 = m+ e s = p + 1 = p+ implicam que m = p.


2.o Caso. Se r > 0, então

(r, s) = g(m, n) = (m + 1, n − 1) e (r, s) = g(p, q) = (p + 1, q − 1)

Assim, r = m + 1 e r = p + 1, s = n − 1 e s = q − 1, ou seja, m = p e n = q.
Portanto, em qualquer caso, (m, n) = (p, q). Consequentemente, pelo Corolário
5.12, existe uma única função injetora f : ω → ω × ω tal que

1. f (0) = (0, 0).

2. f (n+ ) = f (n + 1) = g(f (n)), para todo n ∈ ω.

Vamos provar que f é sobrejetora. De fato, dado (p, q) ∈ ω × ω, usaremos indução


sobre p + q para provar que existe um n ∈ ω tal que f (n) = (p, q). Se p + q = 0,
então p = q = 0 e f (0) = (0, 0). Suponhamos que o resultado seja válido para
todo k, com 0 ≤ k < p + q e p + q = r+ = r + 1. Então há dois casos a serem
considerados:
1.o Caso. Se p = 0, então, pela primeira sentença da definição, obtemos

(p, q) = (0, q) = (0, (q − 1) + 1) = g(q − 1, 0).

Assim, pela hipótese de indução, existe um m ∈ ω tal que f (m) = (q − 1, 0). Logo,

(p, q) = g(q − 1, 0) = g(f (m)) = f (m+ ) = f (m + 1).

2.o Caso.Se p > 0, então, pela segunda sentença da definição, obtemos (p, q) =
g(p − 1, q + 1). Assim, pela hipótese de indução, existe um n ∈ ω tal que f (n) =
(p + q − 1, 0). Logo,

f (n + 1) = g(f (n)) = g(p + q − 1, 0) = (0, p + q)


f (n + 2) = g(f (n + 1)) = g(0, p + q) = (1, p + q − 1)
..
.
f (n + p + 1) = g(f (n + p)) = g(p − 1, q + 1) = (p, q).

172
Capítulo 5. Os Números Naturais

Portanto, em qualquer caso, dado (p, q) ∈ ω × ω, existe um k ∈ ω tal que f (k) =


(p, q), ou seja, f é uma função sobrejetora. Neste caso, f é uma função bijetora e
obtemos uma boa ordenação para ω × ω, a saber,

∀ m, n ∈ ω [m ≤ n ⇔ f (m) ≤ f (n)].

Explicitamente, o método de enumeração diagonal de Cantor,

{(0, 0), (0, 1), (1, 0), (0, 2), (1, 1), (2, 0), (0, 3), . . .}.

Por exemplo, 0 ≤ 1 implica que (0, 0) = f (0) ≤ f (1) = g(f (0)) = (0, 1). É
importante ressaltar que o método geral de provar afirmações P (m, n) é a dupla in-
dução ou ordenação lexicográfica, a saber, primeiro prova que P (0, 0) é verdadeira.
Então prova P (m, n), supondo que P (j, k) é verdadeira, para todos j, k ∈ ω tais
que j < m ou (j = m e k < n).
Observe, pelo Exemplo 4.41, que a função f : Z → ω definida como

2n − 1, n > 0
f (n) =
−2n, n ≤ 0

é bijetora. Portanto, pelo axioma ZF7 , Z é um conjunto. Note que qualquer número
racional r ∈ Q pode ser escrito sob a forma
m
r= , onde m, n ∈ Z, com n = 0.
n
Então a função f : Z × Z∗ → Q definida como f (m, n) = m · n−1 é claramente
sobrejetora. Portanto, pelo axioma ZF7 , Q é um conjunto. No próximo capítulo
provaremos que existe uma correspondência biunívoca entre 2ω e R. Portanto, pelos
axiomas ZF6 e ZF7 , os números reais R é um conjunto. Neste caso, os números
complexos C é um conjunto, pois R × R é um conjunto.
Finalizaremos esta seção apresentando uma segunda prova do celebre teorema
de Cantor-Schröder-Bernstein usando o conjunto dos números naturais ω, cuja exis-
tência é garantida pelo axioma da infinidade ZF9 .

Teorema 5.36 (Teorema de Cantor-Schröder-Bernstein) Sejam A e B conjuntos


quaisquer. Se existem funções injetoras f : A → B e g : B → A, então existe uma
função bijetora de A sobre B.

173
5.2. Aritmética dos Números Naturais

Prova. Para cada n ∈ ω fixado, definimos hn : A → A como hn = (g ◦ f )n ,


Observe que h0 = IA . Como g e f são injetoras temos, indutivamente, que hn
também o é, para todo n ∈ ω. Consideremos o subconjunto X de A definido como

X = {x ∈ A : h−1
n (x) ∈
/ Im(g), para algum n ∈ ω}

Note que se x ∈/ Im(g), então h−1


0 (x) = x ∈ / Im(g), ou seja, x ∈ X. Reciproca-
mente, se x ∈
/ X, então x ∈ Im(g). Neste caso, x ∈
/ X se, e somente se, x ∈ Im(g).
Por outro lado, para cada y ∈ B, se g(y) ∈ X, então y ∈ Im(f ) e f −1 (y) ∈ X,
pois g(y) ∈ X implica que existe um n ∈ ω tal que h−1n (g(y)) ∈/ Im(g). É claro
que n = 0. Neste caso,
−1 −1
h−1 −1
n (g(y)) = [hn−1 (g(y)) ◦ (g ◦ f ) ](g(y)) = hn−1 (f
−1 −1
(g (g(y))))
−1 −1
= hn−1 (f (y)).

Logo, h−1
n−1 (f
−1
/ Im(g). Portanto, f −1 (y) ∈ X. Agora, vamos provar que a
(y)) ∈
função h : A → B definida como

f (x), se x ∈ X
h(x) = −1
g (x), se x ∈
/X

possui as propriedades desejadas. Note que h está bem definida, pois g é injetora e
se x ∈
/ X, então x ∈ Im(g). Dados x, y ∈ A, temos as seguintes possibilidades:

1.a Possibilidade. Se x, y ∈ X e h(x) = h(y), então f (x) = f (y). Logo,


x = y, pois f é injetora.

/ X e h(x) = h(y), então g −1 (x) = g −1 (y). Assim,


2.a Possibilidade. Se x, y ∈
x = y, pois g é injetora.

3.a Possibilidade. Se x ∈ X, y ∈ / X e h(x) = h(y), então f (x) = g −1 (y).


Logo, x = (f −1 ◦ g −1 )(y) = h−1
1 (y). Como x ∈ X temos que existe um n ∈ ω tal
−1 −1
−1
que hn (x) ∈/ Im(g). Assim, hn (h1 (y)) ∈ / Im(g), ou seja, h−1
n+1 (y) ∈
/ Im(g). Isto
implica que y ∈ X, o que é impossível. Portanto, em qualquer possibilidade, h é
injetora. Dado y ∈ B, se g(y) ∈/ X, então h(g(y) = g −1 (g((y)) = y. Se g(y) ∈ X,
então
h(g(y) = f (g((y)) ⇒ f −1 (y) ∈ X.
Logo, h(f −1 (y)) = (f ◦ f −1 )(y) = y. Portanto, h é sobrejetora.

174
Capítulo 5. Os Números Naturais

Exercícios
1. Dados m, n, p ∈ ω.

(a) Mostre que se m = n, então m + p = n + p.


(b) Mostre que se m = n, então mp = np.

2. Dado n ∈ ω.

(a) Mostre que se n < 1, então n = 0.


(b) Mostre que não existe p ∈ ω tal que n < p < p+ .

3. Dados m, n, p ∈ ω.

(a) Mostre que se m < n, então m + p < n + p.


(b) Mostre que se m + n = m + p, então n = p.
(c) Mostre que se m + n = 0, então m = 0 e n = 0.

4. Dados m, n, p ∈ ω.

(a) Mostre que se m < n e p = 0, então mp < np.


(b) Mostre que se mp = np e p = 0, então m = n.
(c) Mostre que se mn = 0, então m = 0 e n = 0.

5. Dado n ∈ ω. Mostre que n = {m ∈ ω : m < n} = Sn .

6. (Lei da Tricotomia) Dados m, n ∈ ω. Mostre que exatamente uma e apenas


uma das condições pode ocorrer:

m < n ou m = n ou m > n.

7. Dados m, n, p ∈ ω.

(a) Mostre que se m + p < n + p, então m < n.


(b) Mostre que se mp < np e p = 0, então m < n.

175
5.2. Aritmética dos Números Naturais

8. (Algoritmo da Divisão) Mostre que para quaisquer a, b ∈ ω, com b > 0,


existem únicos q, r ∈ ω tais que

a = qb + r, com 0 ≤ r < b.

9. Um número natural chama-se par se ele for da forma 2k, para algum k ∈ ω,
e chama-se ímpar se ele for da forma 2m + 1, para algum m ∈ ω. Mostre que
qualquer número natural é par ou ímpar, mas não ambos.

10. Mostre que a função f : ω × ω → ω definida como

1
f (m, n) = [1 + 2 + · · · + (m + n)] + m = (m + n)(m + n + 1) + m.
2
é bijetora.

176
CAPÍTULO 6

NÚMEROS CARDINAIS

A definição de Dedekind, de conjunto infinito, é usada na discussão de propri-


edades de conjuntos infinitos e de conjuntos finitos. É demonstrado, dentre outras
coisas, que conjuntos enumeráveis são os menores, em tamanho, dentre os conjun-
tos infinitos. Além disso, apresentaremos propriedades e exemplos de conjuntos
enumeráveis e de conjuntos não enumeráveis. Portanto, toda a matemática clássica
trabalha apenas com duas “medidas” de conjuntos infinitos, a saber, os conjuntos
equipotentes a ω e os conjuntos equipotentes a 2ω . A potência 2ω é frequentemente
chamada de potência do contínuo.
Seja A um conjunto não vazio qualquer. Já vimos, no Teorema 2.31, que existe
uma correspondência biunívoca entre os conjuntos 2A e P(A). Neste capítulo ca-
racterizaremos todos os conjuntos com esta propriedade. Além disso, provaremos
o seguinte teorema de Cantor:

Não existe função bijetora entre os conjuntos A e P(A).

A grande importância deste teorema é o seguinte resultado: se fizermos

A1 = ω, A2 = P(A1 ), A3 = P(A2 ), . . . , An = P(An−1 ), . . .

então obtemos uma família (sequência) estritamente crescente de conjuntos infinitos

A1 < A2 < A3 < · · · < An < · · ·

177
6.1. Conjuntos Equipotentes

6.1 Conjuntos Equipotentes


Sejam A e B conjuntos quaisquer. Diremos que A e B são equipotentes ou
possuem a mesma potência se existir uma função bijetora f : A → B e denotaremos
por A ≈ B. Note que ser equipotente é uma relação de equivalência.

Exemplo 6.1 Os conjuntos [0, 1] e [a, b], com a = b, são equipotentes. Em particu-
lar, os conjuntos I = ]0, 1[ e J = ] − 1, 1[ são equipotentes.
Solução. Vamos provar que a função f : [0, 1] → [a, b] definida como

f (x) = a + (b − a)x

é bijetora. É claro que f é injetora. Dado y ∈ [a, b],

y−a
a≤y ≤b⇒0≤y−a≤b−a⇒0≤ ≤ 1,
b−a

pois b − a = 0. Assim, dado y ∈ [a, b], existe um x = (b − a)−1 (y − a) ∈ [0, 1]


tal que y = f (x). Portanto, f é sobrejetora. Para prova a última afirmação basta
observar que a função f : J → ]a, b[ definida como

a+b b−a
f (x) = + x
2 2
é bijetora.

Exemplo 6.2 Os conjuntos I = ]0, 1[ e [0, 1] são equipotentes.


Solução. Note que

[0, 1] = {0, (n + 1)−1 : n ∈ ω}∪A


˙ e I = {(n + 2)−1 : n ∈ ω}∪A,
˙

com A = [0, 1] − {0, (n + 1)−1 : n ∈ ω} = I − {(n + 2)−1 : n ∈ ω}. Para cada


n ∈ N = ω − {0}, definimos a função f : [0, 1] → I como
⎧ −1
⎨ 2 , se x = 0
f (x) = (n + 2) , se x = n−1
−1

x, caso contrário.

Então é fácil verificar que f é bijetora.

178
Capítulo 6. Números Cardinais

Observação 6.3 Já vimos, no Exemplo 3.18, que os conjuntos ] − 1, 1[ e R são


equipotentes. Portanto, o conjunto de todos os números reais e todos os intervalos
não degenerados são equipotentes, por exemplo, a função f : ]0, +∞[ → ]0, 1[
definida como  
x −1 x
f (x) = f (x) =
1+x 1−x
é bijetora, pois
 
−1
lim f (x) = 0 e lim f (x) = 1 lim f (x) = 0 e lim− f (x) = +∞ .
x→0+ x→+∞ x→0+ x→1

Exemplo 6.4 Os conjuntos B1 (O) = {(x, y) ∈ R2 : x2 + y 2 < 1} e

Br (A) = {(x, y) ∈ R2 : (x − a)2 + (y − b)2 < r2 }

são equipotentes, em que r > 0 e O = (0, 0), A = (a, b) ∈ R2 .


Solução. Vamos provar que a função f : B1 (O) → Br (A) definida como

f (x, y) = (a, b) + r(x, y) = (a + rx, b + ry)

é bijetora. Dados (x, y), (s, t) ∈ B1 (O), se f (x, y) = f (s, t), então

(a + rx, b + ry) = (a + rs, b + rt)


⇒ a + rx = a + rs e b + ry = b + rt
⇒ x = s e y = t ⇒ (x, y) = (s, t).

Logo, f é injetora. Dado (u, v) ∈ Br (A), existe


 
u−a v−b
(x, y) = , ∈ B1 (O)
r r

tal que (u, v) = f (x, y). Portanto, f é sobrejetora.

Exemplo 6.5 Os conjuntos ω, Z e ω × ω são equipotentes.


Solução. Vamos provar que a função f : ω → Z definida como
 n
2
, se n é par
f (n) = 1
− n2 − 2
, se n é ímpar

179
6.1. Conjuntos Equipotentes

é bijetora. Dados m, n ∈ ω, se f (m) = f (n), então m e n são ambos pares ou


ambos ímpares. Se m = 2k e n = 2l, então k = l e m = n. Se m = 2k + 1 e
n = 2l + 1, então k + 1 = l + 1 e m = n. Assim, f é injetora. Dado k ∈ Z. Então
k ≥ 0 ou k < 0. Se k ≥ 0, então existe um n = 2k ∈ ω tal que f (n) = k. Se
k < 0, então existe um n = 2|k| + 1 ∈ ω tal que f (n) = k. Logo, f é sobrejetora.
A função g : ω × ω → ω definida como g(m, n) = 2m (2n + 1) − 1 é bijetora, pois
a função h : ω → ω × ω definida como

(0, n), se x = (2n + 1) − 1
h(x) =
(m, n), se x = 2m (2n + 1) − 1

é a inversa de g.

Exemplo 6.6 (Princípio de Dirichlet) m, n ∈ ω são equipotentes se, e somente se,


m = n. Em particular, se f : n → n é uma função injetora, então f é sobrejetora.

Solução. Para m fixado, seja S = {n ∈ ω : m ≈ n ⇒ m = n}. Então 0 ∈ S,


pois se m ≈ 0, então existe uma função bijetora f : m → 0. Como 0 = ∅ temos
que m = ∅ = 0. Suponhamos que o resultado seja válido para algum n, isto é,
n ∈ S. Sejam f : m → n+ uma função bijetora e k = f (m − 1). Então a função
g : n+ → n+ definida como

⎨ n, se x = k
g(x) = k, se x = n

x, se x ∈
/ {k, n}

é bijetora, pois se k = n, então g = In+ . Se k = n, então g 2 = g ◦ g = In+ . Note


que h = g ◦ f : m → n+ é uma a função bijetora tal que h(m − 1) = n, isto é, h
aplica m − 1 sobre n. Assim, por hipótese, m − 1 = n. Logo,

m = {0, 1, . . . , m − 1} = {0, 1, . . . , n} = n+ ,

ou seja, n+ ∈ S. Portanto, S = ω.

Sejam A e B conjuntos quaisquer. Diremos que A é de uma potência menor


do que B ou A é dominado por B se existir uma função injetora f : A → B e
denotaremos por A  B. Diremos que A é de uma potência estritamente menor do
que B se existir uma função injetora f : A → B e não existir g : A → B sobrejetora

180
Capítulo 6. Números Cardinais

e denotaremos por A ≺ B. Neste caso, A é equipotente a um subconjunto de B.

Teorema 6.7 (Teorema de Cantor) Seja A um conjunto. Então A ≺ P(A).

Prova. Note que a função j : A → P(A) definida como j(x) = {x} injetora.
Portanto, A  P(A). Suponhamos, por absurdo, que exista uma função f : A →
P(A) sobrejetora. Então f (x) ⊆ A, para cada x ∈ A. Assim, x ∈ f (x) ou
x∈/ f (x). Consideremos o conjunto S = {x ∈ A : x ∈ / f (x)}. Então S ∈ P(A).
Logo, por hipótese, existe um y ∈ A tal que f (y) = S. Como S ⊆ A temos que
y ∈ S ou y ∈ / S. Se y ∈ S, então y ∈ / f (y) = S, o que é uma contradição. Se
y∈/ S, então y ∈ f (y) = S, o que é uma contradição. Portanto,

S = {x ∈ A : x ∈  f (x), ∀ x ∈ A,
/ f (x)} =

e A ≺ P(A). Uma outra prova. Suponhamos, por absurdo, que exista uma função
f : A → P(A) sobrejetora. Sabemos, pelo Teorema 2.31, que existe uma função
bijetora ϕ : P(A) → 2A . Portanto, a função ϕ ◦ f : A → 2A seria sobrejetora, o
que contradiz o Exemplo 4.18.

Observação 6.8 O Teorema de Cantor pode ser visualizado geometricamente do


seguinte modo. Sejam A = [0, 1] e f : A → P(A) definida como

f (x) = {(x, y) : y ∈ A} ⊆ {x} × A, ∀ x ∈ A.

Então T = {(x, y) : y ∈ f (x)} ⊆ A × A. Pondo D = {(x, y) : y = x} ⊆ A × A,


obtemos

S = {x ∈ A : x ∈
/ f (x)} = p1 (D − T ) = f (x), ∀ x ∈ A,

em que p1 : A × A → A é a projeção sobre o eixo dos x.

Corolário 6.9 Seja A um conjunto qualquer.

1. Se B é um subconjunto de A, então B ≺ P(A).

2. Se P(A) é um subconjunto de D, então A ≺ D.

Prova. Fica como um exercício.

181
6.1. Conjuntos Equipotentes

Estamos pronto para apresentar a definição de conjunto infinito devida a Dede-


kind. Seja A um conjunto qualquer. Diremos que A é um conjunto infinito se ele
for equipotente com um subconjunto próprio ou, equivalentemente, se existir uma
função f : A → A injetora tal que f (A) = A. Caso contrário, diremos que A é um
conjunto finito.

Exemplo 6.10 O conjunto de todos os números naturais ω é infinito, pois a função


f : ω → ω definida como f (n) = 2n (f (n) = 2n + 1) é claramente injetora.
Consequentemente, o conjunto de todos os números reais R é infinito, pois a função
g : R → R definida como

2x, se x ∈ ω
g(x) =
x, se x ∈ R − ω

é claramente injetora, com g(R) = R.

Teorema 6.11 Sejam A e B conjuntos quaisquer. Então:

1. Se B é um conjunto infinito e B ⊆ A, então A é um conjunto infinito.

2. Se A é um conjunto finito e B ⊆ A, então B é um conjunto finito.

Prova. Vamos provar apenas o item (1). Como B é um conjunto infinito temos que
existe uma função injetora f : B → B tal que f (B) = B. Seja a função g : A → A
definida como 
f (x), se x ∈ B
g(x) =
x, se x ∈/ B.
Então g é claramente injetora e g(A) = A, pois A = B ∪(A
˙ − B). Portanto, A é um
conjunto infinito.

Exemplo 6.12 Sejam A, B conjuntos quaisquer e f : A → B uma função bijetora.


Mostre que se A é infinito, então B também o é.

Solução. Como A é um conjunto infinito temos que existe uma função injetora
g : A → A tal que g(A) = A. Então a função h : B → B definida como

h(y) = (f ◦ g ◦ f −1 )(y),

182
Capítulo 6. Números Cardinais

para todo y ∈ B, é claramente injetora. Note que

h(B) = (f ◦ g ◦ f −1 )(B) = f (g(f −1 (B)) = f (g(A)) = B,

pois g(A) = A. Portanto, B é um conjunto infinito.

Teorema 6.13 Sejam A um conjunto infinito qualquer e a0 ∈ A fixado. Então


A − {a0 } é um conjunto infinito. Conclua que se B é um subconjunto não vazio
finito de A, então A − B é um conjunto infinito.

Prova. Como A é um conjunto infinito temos que existe uma função injetora f :
A → A tal que f (A) = A. Assim, há dois casos a serem considerados:
1.o Caso. Se a0 ∈ f (A), então existe um único a1 ∈ A tal que f (a1 ) = a0 .
Neste caso, a função g : A − {a0 } → A − {a0 } definida como

f (x), se x = a1
g(x) =
b, se x = a1 ∈ A − {a0 },

onde b é um elemento qualquer de A − f (A) fixado, tem as propriedades desejadas,


por exemplo,

g(A − {a0 }) = f (A − {a0 , a1 }) ∪ {b} =


 A − {a0 }.

2.o Caso. Se a0 ∈
/ f (A), então a função g : A−{a0 } → A−{a0 } definida como
g(x) = f (x) tem as propriedades desejadas. Portanto, em qualquer caso, A − {a0 }
é um conjunto infinito.

Exemplo 6.14 Mostre que o conjunto

In = Sn+1 = {m ∈ ω : m < n + 1} = {0, 1, . . . , n}

é finito, para todo n ∈ ω.

Solução. Vamos usar indução sobre n. Se n = 0, nada há para ser provado. Su-
ponhamos que o resultado seja válido para algum n. Consideremos o conjunto
In+1 = In ∪ {n + 1}. Então In+1 é um conjunto finito. Caso contrário, pelo Te-
orema 6.13, In+1 − {n + 1} = In seria um conjunto infinito, o que contradiz a
hipótese de indução. Portanto, In é um conjunto finito, para todo n ∈ ω.

183
6.1. Conjuntos Equipotentes

Note para cada x ∈ R+ que, pelo Princípio de Arquimedes, sempre podemos


escolher um menor k ∈ ω tal que k · 1 > x. Pondo a0 = k − 1, de modo que

a0 ≤ x < a0 + 1 e a0 = x = max{m ∈ ω : m ≤ x}

é a função maior inteiro. Assim, x = a0 + q, com 0 ≤ q < 1, a0 a parte inteira de


x e q a parte fracionária de x. Seja d ∈ ω fixado, com d ≥ 2. Então 0 ≤ dq < d.
Pondo a1 = dq, obtemos

dq = a1 + r1 , com 0 ≤ r1 < 1.

Logo,
a1 a1 + 1 a1 r 1 a1 r1
≤q< ⇔q= + ⇒ x = a0 + + .
d d d d d d
Repetindo este processo com dr1 , teremos dr1 = a2 + r2 , com 0 ≤ r2 < 1, e
a1 a 2 r 2
x = a0 + + 2 + 2.
d d d
Prosseguindo com este processo, possivelmente indefinidamente, obtemos
a1 a2 an
x = a0 + + 2 + ··· + n + ···
d d d
a representação na base d de x. Pode ser provado que existe um n0 ∈ ω tal que
an = 0 ou an+1 = an , para todo n ∈ ω, com n > n0 se, e somente se, x ∈ Q.
Portanto, qualquer representação infinita (sequência) representa um número real
positivo e vice versa. A notação usual é: x = a0 , a1 a2 a3 · · · . Sejam f = (am )m∈ω
e g = (bn )n∈ω sequências. Diremos que f e g representa o mesmo número real se,
e somente se, existir um n0 ∈ ω tal que
1. an0 = b+
n0 .

2. ak = bk , para todo 0 ≤ k < n0 .

3. ak = 0 e bk = d − 1, para todo k > n0 .


Por exemplo, para d = 2, consideremos x = 0, 0111 · · · . Então isto representa a
soma da série infinita
 
1 1 1 1 1 1 1
x = 2 + 3 + 4 + ··· = 2 1 + + 2 + ··· = .
2 2 2 2 2 2 2

184
Capítulo 6. Números Cardinais

Portanto, x = 0, 0111 · · · = 0, 1000 · · · . Por outro lado, se x = 8−1 · 7 ∈ R, então


a0 = 0 e q = x. Assim,

14 3
2q = = 1 + = a1 + r1 , com 0 ≤ r1 < 1.
8 4
Logo,
1
2r1 = 1 + = a2 + r2 , com 0 ≤ r2 < 1.
2
Donde, 2r2 = 1 + 0 = a3 + r3 , com r3 = 0. Portanto, rk = 0, para todo k ≥ 3 e
x = 0, 111000 · · · = 0, 110111 · · · .

Lema 6.15 Sejam I = [0, 1[ e d ∈ ω, com d ≥ 2. Então para cada x ∈ I existe


uma única sequência (ak )k∈ω em R tal que:

1. 0 ≤ ak < d, para cada k ∈ ω  .

2. Não existe um n0 ∈ ω tal que ak = d − 1, para todo k ∈ ω, com k > n0 .

3. a1 d−1 + · · · + ak d−k ≤ x < a1 d−1 + · · · + (ak + 1)d−k , para cada k ∈ ω  .

Prova. Já vimos a existência. Para a unicidade, se x = 0, a1 a2 · · · = 0, b1 b2 · · · ,


então, pondo a = d − 1, teremos
 
∞
an  a
∞ ∞
bn ∞
a
0≤ < =1 0≤ < = 1. ,
n=1
dn n=1
dn n=1
dn n=1
dn

pois ak = a, para algum k ∈ ω. Suponhamos, por absurdo, que exista um menor


elemento n0 ∈ ω tal que an0 = bn0 , digamos bn0 < an0 . Então

∞
an ∞
bn 1 ∞
an ∞
bn
0= n
− n
= n0 (an0 − bn0 ) + n
− n
> 0,
n=n
d n=n
d d n=n +1
d n=n +1
d
0 0 0 0

o que é uma contradição, pois

1 ∞
an ∞
bn 1 1
n
(an0 − bn0 ) + n
− n
> n0 + 0 − n0 = 0,
d 0
n=n +1
d n=n +1
d d d
0 0

Portanto, an = bn , para todo n ∈ ω.

185
6.1. Conjuntos Equipotentes

Exemplo 6.16 Os conjuntos 2ω e R são equipotentes.

Solução. Pela Observação 6.3, basta provar que os conjuntos 2ω e I = ]0, 1[ são
equipotentes. Pelo Lema 6.15, cada x ∈ I pode ser escrito de modo único sob a
forma
a1 a2 a3
x= + 2 + 3 + · · · = 0, a1 a2 a3 . . .
2 2 2
onde ak ∈ {0, 1}. Assim, para cada x ∈ I fixado, temos uma função (sequência)
χx : ω → {0, 1} definida como

 0
ak , se k =
χx (k) =
0, se k = 0.

Logo, a função f : I → 2ω definida como f (x) = χx é claramente bijetora.


Portanto, os conjuntos 2ω e R são equipotentes.

Exemplo 6.17 Os conjuntos R × R e R são equipotentes.

Solução. Seja I = ]0, 1[. Então basta provar que a função f : I × I → I definida
como
f (0, x1 x2 x3 . . . , 0, y1 y2 y3 . . .) = (0, x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . .)
é bijetora.

Finalizaremos esta seção com o seguinte comentário: Seja A um conjunto qual-


quer. Então, pelo Teorema 2.31, os conjuntos P(A) e 2A são equipotentes. Portanto,
A ≺ 2A . Agora, se fizermos

A1 = ω, A2 = P(A1 ), A3 = P(A2 ), . . .

então obtemos uma família estritamente crescente de conjuntos infinitos

A1 ≺ A2 ≺ A3 ≺ · · ·

Consideremos B1 = ∪i∈ω Ai+1 . Então P(Ai+1 ) ⊆ B1 , pois Ai+1 ⊆ B1 , para todo


i ∈ ω. Assim, pelo item (2) do Corolário 6.9,

Ai+1 ≺ B1 , ∀ i ∈ ω.

186
Capítulo 6. Números Cardinais

Se fizermos
B2 = P(B1 ), B3 = P(B2 ), B4 = P(B3 ), . . . ,
então obtemos uma sequência estritamente crescente de conjuntos infinitos

A 1 ≺ A 2 ≺ A3 ≺ · · · ≺ B 1 ≺ B 2 ≺ B 3 ≺ · · · .

Portanto, de modo intuitivo, existem mais “medidas” de conjuntos infinitos que


diferentes “medidas” de conjuntos finitos. No entanto, toda a matemática clássica,
trabalha apenas com duas “medidas” de conjuntos infinitos, a saber, os conjuntos
equipotentes a ω e os conjuntos equipotentes a 2ω .

Exercícios
1. Mostre que equipotência é uma relação de equivalência.

2. Mostre que os conjuntos 2ω e C são equipotentes.

3. Sejam A e B conjuntos, com A não vazio. Mostre que A  B se, e somente


se, existir uma função g : B → A sobrejetora.

4. Sejam A, B e C conjuntos. Mostre que se A ∩ C = ∅ e B ∩ C = ∅, en-


tão A ∪ C ≈ B ∪ C. Mostre, com um exemplo, que esta afirmação não é
necessariamente verdade para um conjunto qualquer C.

5. Sejam A, B, C e D conjuntos. Mostre que se A ≈ C e B ≈ D, então


A × B ≈ C × D.

6. Sejam A e B conjuntos. Mostre que se A ≈ B, então P(A) ≈ P(B).

7. Sejam A e B conjuntos. Mostre que se (A − B) ≈ (B − A), então A ≈ B.

8. Seja Br (P ) = {(x, y) ∈ R2 : (x − a)2 + (y − b)2 ≤ r2 } o disco de centro P =


(a, b) ∈ R2 e raio r > 0. Mostre que quaisquer dois discos são equipotentes.

9. Sejam A um conjunto infinito e E ⊆ A enumerável. Mostre que se X é um


conjunto contável, então A e A ∪ X são equipotentes.

10. Sejam {Bi }i∈I e {Ci }i∈I famílias de conjuntos não vazios disjuntas aos pares.
Mostre que se Bi ≈ Ci , para todo i ∈ I, então ∪i∈I Bi ≈ ∪i∈I Ci .

187
6.2. Números Cardinais

11. Sejam {Bi }i∈I e {Ci }i∈I famílias de conjuntos não vazios. Mostre que se

Bi ≈ Ci , para todo i ∈ I, então i∈I Bi ≈ i∈I Ci .

12. Sejam A um conjunto e Pf (A) = {B ⊆ A : B é um conjunto finito}.

(a) Mostre que Pf (A) é o menor subconjunto de P(A) tal que (i) ∅ ∈
Pf (A) e (ii) Se X ∈ Pf (A) e x ∈ A, então X ∪ {x} ∈ Pf (A).
(b) Mostre que se X, Y ∈ Pf (A), então X ∪ Y ∈ Pf (A).
(c) Mostre que se A é finito, então P(A) é finito.

6.2 Números Cardinais


Já vimos que a relação entre conjuntos A ≈ B é uma relação de equivalência.
Assim, esta definição nos permite comparar “medidas” de conjuntos, mas não ex-
plica o que significa a medida. De fato, a “essência” da medida é mais filosófica do
que matemática, ou seja, intuitivamente, a medida de um conjunto A é a proprie-
dade que é comum a todos os conjuntos que são equipotentes a ele. Formalmente,
temos o seguinte axioma.

ZF10 - Axioma dos números cardinais. Existe uma família C de conjuntos,


chamada números cardinais, com as seguintes propriedades:

1. Se A é um conjunto qualquer, então existe um número cardinal α ∈ C tal que


α ≈ A.

2. Se A é um conjunto e α, β ∈ C, então α ≈ A e β ≈ A implicam que α = β.

Notações. α = |A| ou α = card(A) ou α = #(A).

Observação 6.18 Infelizmente, a família dos números cardinais C não é um con-


junto. De fato, suponhamos, por absurdo, que C seja um conjunto. Então K =
∪α∈C α é um conjunto. Assim, P(K) é um conjunto. Logo, pelo item (1) do axioma
ZF10 , existe um número cardinal β tal que β ≈ P(K), o que é uma contradição,
pois β ⊆ K e K ≺ P(K). Portanto, C é uma classe própria.

Exemplo 6.19 Sejam A e B conjuntos. Mostre que se A ≈ B, então |A| = |B|.

188
Capítulo 6. Números Cardinais

Solução. Pelo item (1) do axioma ZF10 , existem números cardinais α e β tais que
α ≈ A e β ≈ B. Como A ≈ B temos que α ≈ β. Assim, pelo item (2) do axioma
ZF10 , α = β. Portanto, |A| = |B|.

Seja U a classe universal. Dados A, B ∈ U , definimos A ∼ B se, e somente se,


A ≈ B. Então ∼ é uma relação de equivalência sobre U . Assim, o classe quociente
Q = {A : A ∈ U } está em correspondência biunívoca com a família dos números
cardinais C. Portanto, Q é uma classe própria.
Definimos os cardinais finitos como

0 = |∅|
1 = |{0}|
2 = |{0, 1}|
..
.

Além disso, denotaremos os cardinais transfinitos como

ℵ0 = |ω|
ℵ1 = |P(ω)|
ℵ2 = |P(P(ω))|
..
.

Finalmente, denotaremos c = |R|. Neste caso, pelo Exemplo 6.16,

c = |R| = |2ω | = |P(ω)| = ℵ1 = 2ℵ0 .

O símbolo ℵ0 foi denominado por Cantor de alef zero..


Sejam α, β números cardinais e A, B conjuntos tais que α = |A| e β = |B|.
Diremos que α é menor do que ou igual a β, em símbolos, α  β, se A  B, ou
seja, se existir uma função injetora h : A → B. Note que esta relação está bem
definida. De fato, sejam C e D conjuntos tais que α = |C| e β = |D|. Então
A ≈ C e B ≈ D. Assim, existem funções bijetoras f : A → C e g : B → D.
Logo, k = g ◦ h ◦ f −1 : C → D é uma função injetora. É fácil verificar que  é
uma pré-ordem sobre a classe dos números cardinais.
Notação. α ≺ β significa que α  β e α = β.

Lema 6.20 Seja f : A → B uma função sobrejetora. Então |B|  |A|.

189
6.2. Números Cardinais

Prova. Pelo Exemplo 4.17, existe uma função g : B → A tal que f ◦ g = IB e g é


injetora. Portanto, |B|  |A|.

Lema 6.21 Se |A|  |B|, então |A − {a}|  |B − {b}|, para todo a ∈ A e b ∈ B.

Prova. Seja f : A → B uma função injetora. Então a função g : A−{a} → B−{b}


definida como 
f (x), se x = a e b = f (a)
g(x) =
f (a), se x = a e b = f (a).
é claramente injetora e Dom(g) = A − {a}.

Lema 6.22 Sejam A um conjunto e B um subconjunto de A. Se existir uma função


injetora f : A → B, então |A| = |B|. Note que f (A) ⊆ B ⊆ A.

Prova. (Fox1 ) Se A = B, nada há para ser provado. Suponhamos que B = A.


Então A − B = ∅. Consideremos o conjunto C = ∪n∈ω f n (A − B), em que
A − B = f 0 (A − B) e f n+1 = f ◦ f n , para todo n ∈ ω, confira a Figura 6.1.
Note que A − B ⊆ C e f (C) ⊆ C. Além disso, para cada m, n ∈ ω, com m = n,
digamos m < n, obtemos f m (A − B) ∩ f n (A − B) = ∅, caso contrário, existiria
um z ∈ f m (A − B) ∩ f n (A − B), ou seja, existem x, y ∈ A − B tais que z = f m (x)
e z = f n (y). Assim,

f n (y) = f m (x) ⇒ f n−1 (y) = f m−1 (x) ⇒ · · · ⇒ f n−m (y) = x,

pois f é injetora. Logo, x ∈ Im(f n−m ) ⊆ B, o que é impossível, uma vez que
B ∩ (A − B) = ∅. Vamos definir a função g : A → B como

f (x), se x ∈ C
g(x) =
x, se x ∈
/ C.

1
Ralph H. Fox, 1913-1973, matemático americano.

190
Capítulo 6. Números Cardinais

Então g é injetora. Como (A − X) ∪ Y = (A ∪ Y ) − (X − Y ) temos que

g(A) = (A − C) ∪ f (C)
= (A − ∪n∈ω f n (A − B)) ∪ f (∪n∈ω f n (A − B))
= (A − ∪n∈ω f n (A − B)) ∪ (∪n∈ω f n+1 (A − B))
= (A ∪ (∪n∈ω f n+1 (A − B)))−
(∪n∈ω f n (A − B) − (∪n∈ω f n+1 (A − B)))
= A − (A − B) = B.

Assim, g é sobrejetora. Portanto, g é bijetora e |A| = |B|.

Figura 6.1: Esboço da prova do Lema.

Estamos prontos para apresentar uma terceira prova via números cardinais do
celebre teorema de Cantor-Schröder-Bernstein.

Corolário 6.23 (Teorema de Cantor-Schröder-Bernstein) Sejam A e B conjun-


tos. Se |A|  |B| e |B|  |A|, então |A| = |B|.
Prova. Sejam X um subconjunto de A e Y um subconjunto de B tais que A ≈ Y
e B ≈ X. Então existem funções bijetoras f1 : A → Y e g1 : B → X. Assim,
f = g1 ◦ f1 : A → X é uma função injetora. Logo, pelo Lema 6.22, existe uma
função bijetora h : A → X. Portanto, a função g = g1−1 ◦ h : A → B é bijetora e
|A| = |B|.

Observação 6.24 Já vimos que  era uma pré-ordem sobre C. Portanto, pelo Co-
rolário 6.23,  é uma ordem sobre C.

191
6.2. Números Cardinais

Teorema 6.25 Qualquer família de números cardinais possui um menor elemento.

Prova. Sejam C qualquer família de números cardinais e α ∈ C. Se α é o menor


elemento de C, acabou. Caso contrário, seja B = {β ∈ C : β ≺ α}. Como α é um
conjunto temos, pelo Princípio da Boa Ordenação, que α é bem ordenado. Assim,
para cada β ∈ B fixado, seja ϕ(β) o menor elemento x ∈ α tal que β ≈ Sx . Logo,
T = {ϕ(β) : β ∈ B} possui um menor elemento, digamos ϕ(γ) ∈ T .
Afirmação. γ é o menor elemento de B.
De fato, se β ∈ B, então ϕ(γ) ≤ ϕ(β). Logo, Sϕ(γ) ⊆ Sϕ(β) e j : Sϕ(γ) → Sϕ(β) é
a função inclusão. Assim, pelo diagrama

γ ≈ Sϕ(γ) → Sϕ(β) ≈ β,

existe uma função injetora de γ em β. Portanto, γ ≤ β.

Corolário 6.26 (Lei da Tricotomia) A família de todos os números cardinais é


bem ordenada. Consequentemente, para quaisquer números cardinais α e β uma e
apenas uma das condições ocorre:

α ≺ β ou α = β ou α  β.

Prova. Fica como um Exercício ou o Exemplo 4.30.

Exemplo 6.27 Mostre que os conjuntos ]0, 1[ e [0, 1] são equipotentes.

Solução. A função j : ]0, 1[ → [0, 1] definida como j(x) = x é claramente inje-


tora. Por outro lado, a função f : [0, 1] → ]0, 1[ definida como f (x) = 2−1 (x + 1)
é claramente injetora. Portanto, pelo Corolário 6.23, os conjuntos ]0, 1[ e [0, 1] são
equipotentes.

Exemplo 6.28 Os conjuntos ω e ω × ω são equipotentes.

Solução. A função j : ω → ω × ω definida como j(x) = (x, 0) é claramente


injetora. Por outro lado, a função f : ω×ω → ω definida como f (k, l) = (k+l)2 +k
é injetora, pois dados (k, l), (m, n) ∈ ω × ω, se f (k, l) = f (m, n), então

(k + l)2 + k = (m + n)2 + m.

192
Capítulo 6. Números Cardinais

Assim, pela Lei da Tricotomia, k + l > m + n ou k + l = m + n ou k + l < m + n.


Se k + l > m + n, então k + l ≥ m + n + 1 e

m − k = (k + l)2 − (m + n)2 ≥ (m + n + 1)2 − (m + n)2


= 2m + 2n + 1 > m − k,

o que é impossível. O caso k + l < m + n trata-se de modo inteiramente análogo.


Logo, k + l = m + n. Neste caso, k = m e l = n. Portanto, (k, l) = (m, n) e
f é injetora. Consequentemente, pelo Corolário 6.23, os conjuntos ω e ω × ω são
equipotentes.

Exemplo 6.29 Os conjuntos ω e Q são equipotentes. Conclua que todos os con-


juntos enumeráveis são equipotentes.
Solução. A função j : ω → Q definida como j(x) = x é claramente injetora. Por
outro lado, como qualquer número racional x ∈ Q pode ser escrito de modo único
sob a forma x = n−1 · m, onde m, n ∈ Z, com n > 0 e mdc(m, n) = 1, temos que
a função f : Q → ω definida como
⎧ 2
⎨ (m + n) + n, se x > 0 
2n 3m , se m ≥ 0
f (x) = 0, se x = 0 ou f (x) =
⎩ 2n 5|m| , se m < 0
−f (−x), se x < 0

é injetora (prove isto!). Portanto, pelo Corolário 6.23, os conjuntos ω e Q são


equipotentes.

Exemplo 6.30 Os conjuntos I = [0, 1[ e P(ω) são equipotentes.


Solução. A função f : P(ω) → I definida como f (A) = 0, a0 a1 a2 · · · , em que

1, se k ∈ A
ak = χA (k) =
0, se k ∈
/A

é injetora, pois se f (A) = f (B) = 0, a0 a1 a2 · · · , então k ∈ A se, e somente se,


ak = 1 se, e somente se, k ∈ B. Portanto, A = B. Por outro lado, pelo Lema 6.15,
cada x ∈ I pode ser escrito de modo único sob a forma x = 0, a0 a1 a2 . . ., onde
ak ∈ {0, 1}. Então a função g : I → P(ω) definida como g(x) = {ak 2k : k ∈ ω}
é injetora, pois dado k ∈ ω, ak 2k ∈ g(x) = g(y) implica que ak 2k = bm 2m , para
algum m ∈ ω, de modo que k = m e ak = bk . Portanto, x = y.

193
6.2. Números Cardinais

Exemplo 6.31 Sejam V um espaço vetorial sobre um corpo K e X, Y duas bases


de V . Mostre que |X| = |Y |.
Solução. Sejam X = {ui }i∈I e Y = {vj }j∈J duas bases de V . Então cada ele-
mento u de X pode ser escrito de modo único sob a forma

u = c1 v j1 + · · · + c n v j n ,

onde n ∈ N, c1 , . . . , cn ∈ K − {0} e vj1 , . . . , vjn ∈ Y . Seja Yu = {vj1 , . . . , vjn }.


Então cada elemento u de X está associado a um subconjunto finito Yu de Y .
Afirmação. Y = ∪u∈X Yu .
De fato, se v ∈ Y , então [Y − {v}] = V , pois Y é um conjunto minimal de
geradores de V . Assim, existe um w ∈ V tal que w ∈ / [Y − {v}]. Logo,

w = d1 ui1 + · · · + dm uim ,

onde m ∈ N, d1 , . . . , dm ∈ K − {0} e ui1 , . . . , uim ∈ X. Como w ∈/ [Y − {v}]


temos que existe um i0 , 1 ≤ i0 ≤ m, tal que u0 = ui0 ∈ / [Y − {v}]. Portanto,
v ∈ Yu0 . Consequentemente, Y ⊆ ∪u∈X Yu . Note que a função f : X → Y
definida como f (u) = Yu é sobrejetora. Então, pelo Lema 6.20, |Y |  |X|. Por
um argumento simétrico, prova-se que |X|  |Y |. Portanto, pelo Corolário 6.23,
|X| = |Y |.

Finalizaremos esta seção com mais alguns resultados e comentários. Pelo Exem-
plo 4.40, qualquer conjunto finito é equipotente a um número natural. Isto motiva
a seguinte definição. Seja α ∈ C. Diremos que α é um cardinal finito se existir
um n ∈ ω tal que α ≈ n. Caso contrário, diremos que α é um cardinal transfinito.
Note que ℵ0 é o menor cardinal transfinito, pois se α é um cardinal transfinito, então
existe um único conjunto infinito A tal que α = |A|. Assim, pelo Exemplo 4.15, A
contém um subconjunto enumerável. Portanto, α  ℵ0 .

Hipótese do Contínuo. Não existe nenhum número cardinal α tal que

ℵ0 ≺ α ≺ ℵ1 = 2ℵ0 .

Já vimos, segundo Cohen, que a hipótese do contínuo, não pode ser provada a partir
dos axiomas da Teoria dos Conjuntos. Portanto, o status da hipótese do contínuo, na
Teoria dos Conjuntos, é análogo ao do axioma das paralelas de Euclides (o quinto

194
Capítulo 6. Números Cardinais

postulado) na Geometria. Neste caso, podemos postulá-los ou negá-los, em qual-


quer caso obtendo um teoria matemática consistente.

Exercícios
1. Mostre que os conjuntos [0, 1[ e [0, +∞[ possuem a mesma cardinalidade.

2. Sejam A e B conjuntos. Mostre que se |A| = |B|, então |P(A)| = |P(B)|.

3. Mostre que |ω ω | = 2ℵ0 .

4. Mostre que α < 2α , para qualquer cardinal α, ou seja, para qualquer cardinal
existe um cardinal maior.

5. Sejam A um conjunto e f : A → A uma função. Mostre que |f (A)|  |A|.

6. Sejam A e B conjuntos quaisquer. Mostre que se |A|  |B| e A = ∅, então


existe uma função sobrejetora g : B → A.

7. Sejam A, B conjuntos quaisquer. Mostre que se existem funções f : A → B


e g : B → A sobrejetoras, então |A| = |B|.

8. Sejam A, B e C conjuntos quaisquer. Mostre que se A ⊆ B ⊆ C e A


equipotente a C, então B equipotente a C.

9. Mostre que |ω × · · · × ω| = |ω n | = |ω|.

10. Mostre que se A = {a1 , a2 , . . .} e B = {b1 , b2 , . . .}, então



A×B = Sk , Sk = {(ai , bj ) : i + j = k + 1},
k∈ω−{0}

é uma união disjunta de conjuntos finitos.

11. Seja A = ∪i ω Ai , onde cada Ai é contável. Mostre que |A| = ℵ0 .

12. Seja C(R, R) o conjunto das funções contínuas. Mostre que |C(R, R)| = |R|.

13. Seja U a classe universal. Mostre que existe um conjunto B ∈ U tal que
|B|  |X|, para todo X ∈ U .

195
6.3. Aritmética dos Números Cardinais

14. Use o Teorema de Cantor para provar que o “conjunto de todos os conjuntos”
não existe.

6.3 Aritmética dos Números Cardinais


Nesta seção provaremos que os números cardinais possuem “quase” todas as
propriedades algébricas dos números naturais.

Teorema 6.32 Sejam A, B, C e D conjuntos, com A ∩ B = ∅ e C ∩ D = ∅. Se


A ≈ C e B ≈ D, então A ∪ B ≈ C ∪ D.

Prova. Suponhamos que A ≈ C e B ≈ D. Então existem funções bijetoras


f : A → C e g : B → D. Assim, pelo Corolário 2.22, f : A → C ∪ D,
g : B → C ∪ D são funções. Como f |(A∩B) = g|(A∩B) temos, pelo Teorema 2.35,
que existe uma única função h : A ∪ B → C ∪ D tal que h|A = f e h|B = g. Por
outro lado, pelo Corolário 2.22, f −1 : C → A ∪ B, g −1 : D → A ∪ B são funções
tais que f −1 |(C∩D) = g −1 |(C∩D) . Logo, pelo Teorema 2.35, existe uma única função
k : C ∪ D → A ∪ B tal que k|C = f −1 e k|D = g −1 . Agora, dado x ∈ A ∪ B,
obtemos x ∈ A ou x ∈ B. Se x ∈ A, então

(k ◦ h)(x) = k(h(x)) = k(f (x)) = f −1 (f (x)) = x.

Se x ∈ B, então

(k ◦ h)(x) = k(h(x)) = k(g(x)) = g −1 (g(x)) = x.

Assim, em qualquer caso, k ◦ h = IA∪B . De modo inteiramente análogo, prova-se


que h ◦ k = IC∪D . Portanto, h é bijetora e A ∪ B ≈ C ∪ D.

Sejam α, β números cardinais e A, B conjuntos disjuntos tais que α = |A| e


β = |B|. Definimos a adição sobre os números cardinais como sendo

α + β = |A ∪ B|.

Note que + : C × C → C é oma operação binária sobre C e escrevemos α + β ao


invés de +(α, β). Além disso, pelo Teorema 6.32, esta operação está bem definida.

196
Capítulo 6. Números Cardinais

Observação 6.33 Se A e B são conjuntos quaisquer, então A equipotente A × {0}


e B equipotente B × {1}, com (A × {0}) ∩ (B × {1}) = ∅, mesmo que A e B não
sejam disjuntos. Portanto,

α + β = |(A × {0}) ∪ (B × {1})|

em que α = |A| e β = |B|. Assim, a definição da adição de números cardinais


pode ser substituída por esta. Em particular, se A = {a, b, c} e B = {1, 2, 3, 4, 5},
então
3 + 5 = |A ∪ B| = |{a, b, c, 1, 2, 3, 4, 5}| = 8
Neste caso, a adição dos números cardinais coincide com a adição usual dos nú-
meros naturais.

Teorema 6.34 Sejam α, β, γ e δ números cardinais. Então:

1. α + (β + γ) = (α + β) + γ.

2. 0 + α = α.

3. α + β = β + α.

4. α  α + β.

5. Se α  β e γ  δ, então α + γ  β + δ.

Prova. Vamos provar apenas os itens (1) e (5): (1) Basta observar que

A ∪ (B ∪ C) = (A ∪ B) ∪ C,

para todos os conjuntos A, B e C.


(5) Sejam A, B, C e D conjuntos tais que α = |A|, β = |B|, γ = |C| e δ = |D|.
Então existem funções injetoras f : A → B e g : C → D. Podemos supor, sem
perda de generalidade, que A ∩ C = ∅ = B ∩ D. Então, pelo Teorema 2.35, existe
uma única função h : A ∪ C → B ∪ D tal que h|A = f e h|C = g. É fácil verificar
que h é injetora. Portanto,

α + γ = |A ∪ C|  |B ∪ D| = β + δ,

que é o resultado desejado.

197
6.3. Aritmética dos Números Cardinais

Observação 6.35 Sejam α, β e γ números cardinais. Então α + β = α + γ não


implica que β = γ, pois ℵ0 + ℵ0 = ℵ0 = ℵ0 + 1, mas ℵ0 = 1, confira o exemplo
a seguir. Portanto, a lei do cancelamento vale no conjunto dos números naturais,
mas não nos números cardinais.

Exemplo 6.36 Sejam ωp = {2k : k ∈ ω} e ωi = {2m + 1 : m ∈ ω}. Então, pelo


Exemplo 6.10, |ωp | = |ω| = |ωi |. Em particular,

ℵ0 + ℵ0 = |ωp ∪ ωi | = |ω| = ℵ0 .

Não obstante, n + n > n, para todo n ∈ ω, com n = 0,

Proposição 6.37 Sejam α e β números cardinais. Então α  β se, e somente se,


existe um número cardinal γ tal que β = α + γ.

Prova. Sejam A, B e C conjuntos tais que α|A|, β = |B| e γ = |C|. Suponhamos


que α  β e que A ∩ B = ∅. Então existe uma função injetora f : A → B. Como
A ≈ f (A) temos que α = |A| = |f (A)|. Se C = B − f (A), então

β = |B| = |f (A)∪(B
˙ − f (A))| = α + γ.

Reciprocamente, suponhamos que β = α + γ e que A ∩ C = ∅. Então existe uma


função f : A ∪ C → B bijetora tal que g = f |A : A → B é injetora. Portanto,
α  β.

Teorema 6.38 Sejam A, B, C e D conjuntos quaisquer. Se A ≈ C e B ≈ D, então


A × B ≈ C × D.

Prova. Suponhamos que A ≈ C e B ≈ D. Então existem funções bijetoras


f : A → C e g : B → D. Assim, a função h : A × B → C × D definida como

h(x, y) = (f (x), g(y))

é claramente bijetora. Portanto, A × B ≈ C × D.

Sejam α, β números cardinais e A, B conjuntos tais que α = |A| e β = |B|.


Definimos a multiplicação sobre os números cardinais como sendo

α · β = |A × B|.

198
Capítulo 6. Números Cardinais

Note que · : C × C → C é oma operação binária sobre C e escrevemos α · β ao invés


de ·(α, β). Além disso, pelo Teorema 6.38, esta operação está bem definida.

Observação 6.39 Se A = {a, b, c} e B = {1, 2, 3}, então

3 · 3 = |A × B| = |{(a, 1), (a, 2), (a, 3), . . . , (c, 1), (c, 2), (c, 3)}| = 9.

Neste caso, a multiplicação dos números cardinais coincide com a multiplicação


usual dos números naturais.

Teorema 6.40 Sejam α, β, γ e δ números cardinais. Então:

1. α(βγ) = (αβ)γ.

2. 1 · α = α.

3. αβ = βα.

4. (α + β)γ = αγ + βγ.

5. α  αβ, se α  0.

6. Se α  β e γ  δ, então αγ  βδ.

7. α + α = 2 · α. Mais geralmente, nα = α + · · · + α, n parcelas, para todo


n ∈ ω.

8. α + α  α · α, se α  1.

Prova. Vamos provar apenas os itens (1), (4) e (7): (1) A função

f : A × (B × C) → (A × B) × C

definida como f (x, (y, z)) = ((x, y), z) é claramente bijetora.


(4) Basta observar, pelo Teorema 2.7, que

A × (B ∪ C) = (A × B) ∪ (A × C),

para todos os conjuntos A, B e C.

199
6.3. Aritmética dos Números Cardinais

(7) Se α = |A|, então 2 · α = |{1, 2} × A|. Por outro lado, como

{1, 2} × A = ({1} ∪ {2}) × A = ({1} × A)∪({2}


˙ × A)

temos que |{1, 2} × A| = α + α. Portanto, α + α = 2 · α.

Observação 6.41 Sejam α, β e γ números cardinais. Então αβ = αγ não implica


que β = γ, pois pelo Exemplo 6.5

ℵ0 · ℵ0 = |ω × ω| = |ω| = ℵ0 = ℵ0 · 1, mas ℵ0 = 1,

Portanto, a lei do cancelamento vale no conjunto dos números naturais, mas não
nos números cardinais.

Exemplo 6.42 Mostre que ℵ0 · c = c.

Solução. É fácil verificar que a função f : Z×]0, 1[ → R definida como f (n, x) =


x + n é bijetora. Por exemplo, dados (m, x), (n, y) ∈ Z × [0, 1[, se f (m, x) =
f (n, y), então 0 ≤ m − n < 1. Como m − n ∈ Z temos que m = n e x = y. Logo,
(m, x) = (n, y) e f é injetora. Portanto, ℵ0 · c = c.

Teorema 6.43 Sejam A, B, C e D conjuntos quaisquer. Se A ≈ C e B ≈ D, então


B A ≈ DC .

Prova. Já vimos que Y X representa o conjunto das funções com domínio X e


contradomínio Y . Suponhamos que A ≈ C e B ≈ D. Então existem funções
bijetoras f : A → C e g : B → D. Seja F : B A → DC a função definida como
F (k) = h, onde h ∈ DC é a função tal que

h(f (z)) = g(k(z), ∀ z ∈ A,

ou seja, h = g ◦ k ◦ f −1 , confira o diagrama 6.2. Então F é claramente bijetora. Por


exemplo, dados k1 , k2 ∈ B A , se k1 = k2 , então k1 (z) = k2 (z), para algum z ∈ A.
Assim,
F (k1 )(f (z)) = g(k1 (z)) = g(k2 (z)) = F (k2 )(f (z)),
ou seja, F é injetora. Portanto, B A ≈ DC .
Sejam α, β números cardinais e A, B conjuntos tais que α = |A| e β = |B|.

200
Capítulo 6. Números Cardinais

Figura 6.2: Diagrama de flechas.

Definimos a potenciação sobre os números cardinais como sendo

β α = |B A |.

Note que ˆ : C × C → C é oma operação binária sobre C. Além disso, pelo Teorema
6.43, esta operação está bem definida. Convencionaremos 0α = 0 e β 0 = 1.

Teorema 6.44 Sejam α, β, γ e δ números cardinais. Então:

1. αβ αγ = αβ+γ .

2. (αβ )γ = αβγ .

3. (αβ)γ = αγ β γ .

4. α  αβ , se β  0.

5. β  αβ , se α  1.

6. Se α  β e γ  δ, então αγ  β δ .

7. α · α = α2 . Mais geralmente, αn = α · · · · · α, n fatores, para todo n ∈ ω.

Prova. Vamos provar apenas os itens (1), (2) e (6): (1) Sejam A, B e C conjuntos
tais que α = |A|, β = |B| e γ = |C|, com B ∩ C = ∅. Note que se f : B → A
e g : C → A são funções quaisquer, então, pelo o diagrama 6.3, é fácil verificar
que existe uma única função h tal que f = f1 ◦ h e g = g1 ◦ h. Então a função
F : AB∪C → AB × AC definida como F (h) = (f1 ◦ h, g1 ◦ h) tem as propriedades
desejadas. Portanto, AB∪C ≈ AB × AC e αβ αγ = αβ+γ .
(2) Sejam f : B × C → A uma função qualquer e y ∈ C fixado. Então
fy : B → A definida como fy (x) = f (x, y) é claramente uma função. Neste caso,

201
6.3. Aritmética dos Números Cardinais

F : C → AB definida como F (y) = fy é uma função (note que

[F (y)](x) = fy (x) = f (x, y), ∀ x ∈ B e y ∈ C).


 C
A função G : AB×C → AB definida como G(f ) = F tem as propriedades
desejadas. Por exemplo, dados f, g ∈ AB×C , se G(f ) = G(g), então

f (x, y) = fy (x) = [F (y)](x) = gy (x) = g(x, y), ∀ (x, y) ∈ B × C.


 C
Logo, f = g, ou seja, G é injetora. Portanto, AB×C ≈ AB e (αβ )γ = αβγ .
(6) Se α  β e γ  δ, então, pela Proposição 6.37, existem números cardinais
β1 e δ1 tais que β = α + β1 e δ = γ + δ1 .
Afirmação. αγ  (α + β1 )γ .
De fato, sejam A, B e C conjuntos tais que α = |A|, β1 = |B1 | e γ = |C|.
Então, pelo Corolário 2.22, qualquer função f : C → A é também uma função
f : C → A ∪ B1 . Assim, F : AC → (A ∪ B1 )C definida como F (f ) = f , para todo
f ∈ AC , é uma função injetora. Portanto, αγ  (α + β1 )γ e αγ  β γ . Como

αγ = αγ · 1  β γ β δ1 = β γ+δ1

temos que αγ  β δ .

Figura 6.3: Diagrama de flechas.

Exercícios
1. Sejam A, B conjuntos e α, β números cardinais tais que α = |A, β = |B|.
Mostre que α + β = |A ∪ B| + |A ∩ B|.

2. Sejam A, B conjuntos. Mostre que se |A| = |B| = c, então |A ∪ B| = c, em


que c = |R|.

202
Capítulo 6. Números Cardinais

3. Sejam α e β números cardinais. Mostre que:

(a) 0 + α = α.
(b) α + β = β + α.
(c) α  α + β.
(d) Se α + 1 = β + 1, então α = β.
(e) Se α + n = β + n, para todo n ∈ ω, então α = β.

4. Sejam α, β, γ e δ números cardinais. Mostre que:

(a) 1 · α = α.
(b) 0 · α = α.
(c) αβ = βα.
(d) α  αβ, se α  0.
(e) Se α  β e γ  δ, então αγ  βδ.
(f) nα = α + · · · + α, n parcelas, para todo n ∈ ω.
(g) α + α  α · α, se α  1.

5. Sejam α, β e γ números cardinais. Mostre que:

(a) (αβ)γ = αγ β γ .
(b) α  αβ , se β  0.
(c) β  αβ , se α  1.
(d) αn = α · · · · · α, n fatores, para todo n ∈ ω.

6. Mostre que n + c = c, para todo n ∈ ω, em que c = |R|.

7. Mostre que c · c = c, em que c = |R|.

8. Mostre que ℵ0 + c = c, em que c = |R|. Conclua que |R − Q| = c.

9. Sejam α e β números cardinais. Mostre que:

(a) se α · β = 0, então α = 0 ou β = 0.
(b) se α · β = 1, então α = 1 e β = 1.

203
6.3. Aritmética dos Números Cardinais

10. Seja A um conjunto infinito qualquer. Mostre que |ω| ≤ |A|.

11. Sejam F = {x0 , x1 , . . . , xn } um conjunto finito e A = F ∪ω.


˙ Mostre que
|A| = |ω|.

12. Sejam A um conjunto infinito, F = {x0 , x1 , . . . , xn } um conjunto finito e


B = F ∪A.
˙ Mostre que |A| = |B|. Conclua que ℵ0 + |A| = max{ℵ0 , |A|}.

13. Sejam A um conjunto infinito e E um conjunto contável infinito. Mostre que


|A × E| = |A|. Em particular, mostre que se F é um conjunto finito, então
|A × F | = |A|. Conclua que ℵ0 · |A| = max{ℵ0 , |A|}.

14. Sejam A um conjunto infinito e B um conjunto não vazio tal que |B| ≤ |A|.
Mostre que |A ∪ B| = |A|.

15. Seja A um conjunto infinito. Mostre que |A × A| = |A|.

16. Seja A um conjunto infinito. Mostre que |An | = |A|, para todo n ∈ ω, com
n = 0.

17. Sejam A1 , . . . , An conjuntos não vazios tais que |Ai | ≤ |An |, para cada i =
1, . . . , n. Mostre que
|A1 × · · · × An | = |An |.

18. Sejam A um conjunto infinito e

Pf (A) = {B : B ⊆ A e B é um conjunto finito}.

Mostre que |Pf (A)| = |A|.

204
CAPÍTULO 7

NÚMEROS ORDINAIS

Quando introduzimos os números naturais no Capítulo 5, fomos motivados pela


necessidade de formalizar o processo de “contagem.” O conjunto dos números
naturais foi definido como o menor conjunto sucessor

ω = {0, 1, 2, . . . , n, . . .},

em que
0 = ∅
1 = ∅ ∪ {∅} = {0}
2 = {∅} ∪ {{∅}} = {0, 1}
3 = {∅, {∅}} ∪ {{∅, {∅}}} = {0, 1, 2}
..
.
n + 1 = n ∪ {n}
..
.
e
n + 1 = {0, 1, 2, . . . , n − 1, n} = {k ∈ ω : k < n + 1}
é o sucessor de n, isto é, n+ = Sn+1 é o segmento inicial determinado por n + 1, de
modo que as relações < e ∈ coincide em ω, ou seja,

m < n ⇔ m ∈ n, ∀ m, n ∈ ω.

205
Consequentemente, ω é um conjunto transitivo e bem ordenado por ∈. Além disso,

0 ∈ 1 ∈ 2 ∈ 3 ∈ ··· e 0 ⊆ 1 ⊆ 2 ⊆ 3 ⊆ ···

A propriedade n+ = Sn+1 é crucial sobre a qual o processo de contagem é ba-


seado. Neste caso, os números naturais possuem pelo menos dois usos: para contar
a posição de um elemento em uma ordenação finita, primeiro, segundo, terceiro etc.
e para contar o número (cardinal) de elementos de um conjunto finito, 1, 2, 3 etc.
Note que a distinção destas regras não são usualmente notadas. Não obstante, a
situação muda completamente quando lidamos com conjuntos infinitos. Por exem-
plo, pela Fórmula de Recorrência, dada no Teorema 5.11, existe uma única função
f com domínio ω tal que

1. f (0) = ω.

2. f (n+ ) = [f (n)]+ , para todo n ∈ ω.

Neste caso, podemos a partir de ω construir os conjuntos

ω + 1 = ω ∪ {ω}
ω + 2 = (ω + 1) ∪ {ω + 1}
..
.
ω + ω = ω ∪ {ω + n : n ∈ ω} = {0, 1, 2, . . . , ω, ω + 1, ω + 2, . . .}
..
.

Consequentemente, pelo axioma ZF7 ,

Im(f ) = {[f (n)]+ : n ∈ ω}

é um conjunto. Observe que as relações < e ∈, similarmente a ω, coincide para os


“números ordinais” definidos desta maneira (m < n em ω + = ω + 1 se, e somente
se, m < n em ω e m < ω). Mas o que dizer do elemento ω + ω? Sua posição na
família é ambígua.
Neste capítulo, com o objetivo de justificar essa indagação e outras questões,
vamos generalizar a definição de números naturais introduzindo os números ordi-
nais.
Como foi o caso com os números naturais, os números ordinais são definidos de
tal modo que cada é bem ordenado pela relação ∈. Além disso, a família de todos

206
Capítulo 7. Números Ordinais

os números ordinais (a qual como veremos não é um conjunto) é bem ordenada


pela relação ∈, e contém os números naturais como um segmento inicial. Mais
significativamente, os números ordinais são representantes para todos os conjuntos
bem ordenados. Portanto, números ordinais podem ser vistos como um “tipo de
ordem” de conjuntos bem ordenados.

7.1 Números Ordinais


Com o objetivo de não acrescentarmos novos axiomas a nossa lista de axiomas
para a Teoria dos Conjuntos, apresentaremos, nesta seção, uma construção dos nú-
meros ordinais introduzida em 1923, por von Neumann. Para isto, a ideia básica é
definir ordinais, de modo que

α < β ⇔ α ∈ β e α = {β : β < α} = Sα .

Sejam A e B conjuntos bem ordenados. Diremos que A e B são semelhantes ou


possuem o mesmo tipo de ordem se existir um isomorfismo de ordem f : A → B e
denotaremos por A ∼= B. Note que ser semelhante é uma relação de equivalência.

Além disso, se A = B, então |A| = |B|.

Exemplo 7.1 Mostre que o conjunto dos números naturais ω e o conjunto

A = {1 − (n + 1)−1 : n ∈ ω},

com a ordem induzida por R, são semelhantes.

Solução. Seja f : ω → A a função definida como f (n) = 1 − (n + 1)−1 . Então f


é claramente bijetora. Dados m, n ∈ ω,

m ≤ n ⇔ mn + m ≤ mn + n ⇔ (m + 1)−1 m ≤ (n + 1)−1 n ⇔ f (m) ≤ f (n).

Logo, f é um isomorfismo. Seja ∅ =  T ⊆ A. Então S = f −1 (T ) = ∅, pois f é


sobrejetora. Assim, S contém um menor elemento, digamos s0 ∈ S.
Afirmação. t0 = f (s0 ) é o menor elemento de T .
De fato, dado t ∈ T , existe um único s ∈ S tal que t = f (s). Como s0 ≤ s
temos que t0 = f (s0 ) ≤ f (s) = t. Portanto, A é um conjunto bem ordenado e ω é
semelhante a A.

207
7.1. Números Ordinais

Seja A um conjunto qualquer. Diremos que uma relação ∈A ou simplesmente ∈


sobre A é uma ∈-ordem se os seguintes axiomas são satisfeitos:

1. x ∈A y se, e somente se, x ∈ y ou x = y, para todos x, y ∈ A.

2. x ∈
/ A x, para todo x ∈ A. (irreflexiva)

Se A é bem ordenado pela ∈-ordem sobre A, diremos que A é ∈-bem ordenado.

Notações e terminologias:

• x ≤ y significa que x ∈A y, isto é, x ∈ y ou x = y.

• x < y significa que x ≤ y e x = y, isto é, x ∈ y.

Observe que qualquer subconjunto de um conjunto ∈-bem ordenado é ∈-bem orde-


nado.
Seja α um conjunto qualquer. Diremos que α é um ordinal se os seguintes
axiomas são satisfeitos:

1. α é um conjunto transitivo, x ⊆ α, para todo x ∈ α.

2. α é ∈-bem ordenado.

Note, pelo Lema 5.8, que cada elemento n de ω é um conjunto transitivo e, pelo
Teorema 5.29, cada elemento n de ω é ∈-bem ordenado, pois n é um subconjunto
de ω. Portanto, cada elemento n de ω é um ordinal “finito”. Em particular, ω é um
ordinal “transfinito.”

Exemplo 7.2 Mostre que se α é um ordinal, então α+ = α ∪ {α} é um ordinal e α


é seu maior elemento. Em particular, os conjuntos ω + , (ω + )+ , . . . são ordinais.

Solução. Pelo item (4) da Observação 3.51 α+ é ∈-bem ordenado e α é o maior


elemento de α+ . Se x ∈ α+ , então x ∈ α ou x = α. Assim, x ⊆ α ou x = α.
Logo, x ⊆ α+ . Portanto, α+ é transitivo. Consequentemente, α+ é um ordinal e
α + = Sα .

Lema 7.3 Seja α um ordinal:

1. ∅ = 0 é um ordinal.

208
Capítulo 7. Números Ordinais

2. Se ξ ∈ α, então o segmento inicial Sξ = {x ∈ α : x < ξ} = ξ.

3. Se α = 0, então 0 é o menor elemento de α.

4. Se ξ ∈ α, então ξ é um ordinal, isto é, pelo item (2), α contém todos os


ordinais menores. Em símbolos,

α = {x : x ∈ α} = {x : x é um ordinal e x ∈ α} = Sα .

Prova. (1) Segue da definição. (2) Seja x ∈ ξ. Então x ∈ α, pois α é transitivo.


Assim, x < ξ e x ∈ Sξ . Por outro lado, se x ∈ Sξ , então x < ξ. Logo, x ∈ ξ.
Portanto, Sξ = {x ∈ α : x < ξ} = ξ.
(3) Se m é o menor elemento de α, então, pelo item (1), m = Sm = ∅. Portanto,
0 é o menor elemento de α.
(4) Se ξ ∈ α, então, pelo item (2), ξ = Sξ . Assim, ξ é ∈-bem ordenado, pois
Sξ ⊆ α. Resta provar que se y ∈ ξ, então y ⊆ ξ. Como α é transitivo, y ∈ ξ e
ξ ∈ α temos que y ∈ α. De modo análogo, se x ∈ y e y ∈ α, então x ∈ α. Assim,
x, y, ξ ∈ α e x ∈ y ∈ ξ implicam que x ∈ ξ, pois α é uma ∈-cadeia. Portanto,
y ⊆ ξ. Consequentemente, ξ é transitivo.

Teorema 7.4 (Princípio de Indução Transfinita) Sejam α um ordinal e S um sub-


conjunto de α com as seguintes propriedades:

1. 0 ∈ S (base de indução).

2. Se β ∈ α e β = Sβ ⊆ S, então β ∈ S (P IT ).

Então S = α.

Prova. Suponhamos, por absurdo, que S = α. Então T = α − S = ∅. Assim, por


hipótese, T contém um menor elemento, digamos t0 ∈ T . Logo, β ∈ t0 = St0 , para
todo β ∈ S, isto implica que β ∈
/ T , ou seja, St0 ⊆ S. Logo, pela propriedade (2),
t0 ∈ S. Portanto, t0 ∈ S ∩ T = ∅, o que é uma contradição. Consequentemente,
S = α.

Teorema 7.5 Sejam α e β ordinais. Se α ∼


= β, então α = β.
Prova. Como α ∼= β temos que existe um isomorfismo f : α → β. Consideremos
o conjunto A = {x ∈ α : f (x) = x}.

209
7.1. Números Ordinais

Afirmação. α = A.
De fato, suponhamos, por absurdo, que S = α − A = ∅. Então S contém um menor
elemento, digamos m ∈ S. Assim, f (m) = m e f (x) = x, para todo x ∈ m. Logo,
se x ∈ m, então f (x) ∈ f (m) implica que x ∈ f (m). Portanto, m ⊆ f (m). Por
outro lado, se x ∈ f (m), então x ∈ β, pois β é transitivo e f (m) ∈ β. Assim,
existe um y ∈ α tal que x = f (y). Logo, f (y) ∈ f (m), pois x ∈ f (m). Neste caso,
y ∈ m, pois f é um isomorfismo. Portanto, f (y) = y e x ∈ m, ou seja, f (m) ⊆ m.
Consequentemente, f (m) = m, o que é uma contradição. Observe que α = A
implica que
β = {f (x) : x ∈ α} = {x : x ∈ α} = α.
Portanto, α = β.

Lema 7.6 Sejam α um ordinal e S um segmento inicial de α. Então S = α ou


existe um β ∈ α tal que S = {x ∈ α : x < β} = β.
Prova. Note, para cada x ∈ α, que x ∈ S ou y < x, para todo y ∈ S. Suponhamos
que S = α. Então o conjunto que T = α − S contém um menor elemento, digamos
β ∈ T.
Afirmação. S = Sβ = β.
De fato, se x ∈ Sβ , então x < β. Assim, x ∈
/ T , isto é, x ∈ S. Portanto, Sβ ⊆ S.
Por outro lado, dado x ∈ S, devemos provar que x < β. Se β ≤ x, então β ∈ S.
Logo, β ∈ S ∩ T = ∅, o que é impossível. Portanto, x < β e S ⊆ Sβ , ou seja,
S = Sβ .

Corolário 7.7 (Lei da Tricotomia) Sejam α e β ordinais. Então uma e apenas


uma das condições ocorre:

α < β ou α = β ou α > β.

Prova. Por hipótese, α e β são ∈-bem ordenados. Então, pelo Teorema 3.74. uma e
apenas uma das seguintes condições ocorre: (a) α é isomorfo a um segmento inicial
de β. (b) α ∼
= β. (c) β é isomorfo a um segmento inicial de α. Se α é isomorfo
a um segmento inicial de β, então, pelo item (2) do Lema 7.3 e pelo Lema 7.6,
α∼= Sγ = γ, para algum γ ∈ β. Assim, pelo Teorema 7.5, α = γ ∈ β. Portanto,
α < β. De modo análogo, prova-se os outros casos. Resta provar que ocorre apenas
uma das condições. Se α < β e α = β, então α ∈ α, o que é impossível. De modo
análogo, prova-se os outros casos.

210
Capítulo 7. Números Ordinais

Teorema 7.8 Seja O a família de todos os ordinais. Então O é ∈-bem ordenado.


Conclua que para cada α ∈ O, com α = 0, existe um β ∈ α tal que α ∩ β = 0.

Prova. Dados α, β, γ ∈ O. É claro que α ≤ α, pois α = α. Se α ≤ β e β ≤ α,


então α ∈ β ou α = β e β ∈ α ou β = α. Se α = β, acabou. Se α = β, então
α ∈ β e β ∈ α. Assim, α ⊆ β e β ⊆ α, ou seja, α = β, o que é impossível.
Se α ≤ β e β ≤ γ, então α ≤ γ, pois γ é transitivo. Portanto, O é ∈-ordenado.
Consequentemente, α ∈ / α, para todo α ∈ O. Sejam S uma subfamília não vazia
de O e α ∈ S. Se α é o menor elemento de S acabou. Caso contrário, existe um
β ∈ S tal que β < α. Assim, β ∈ α e T = S ∩ α é um subconjunto não vazio de α.
Logo, T contém um menor elemento, digamos m ∈ T .
Afirmação. m é o menor elemento de S.
De fato, suponhamos, por absurdo, que m não seja o menor elemento de S. Então,
pelo Corolário 7.7, existe ξ ∈ S tal que ξ < m. Como ξ ∈ m e m ∈ α temos
que ξ ∈ α, pois α é transitivo. Logo, ξ ∈ T , com ξ < m, o que contradiz a
minimalidade de m. Portanto, O é uma família ∈-bem ordenado.

Observação 7.9 (Paradoxo de Burali-Forti) 1 Infelizmente, a família de todos os


ordinais O não é um conjunto. De fato, suponhamos, por absurdo, que O seja um
conjunto. Então, pelo Teorema 7.8 e o item (3) do Lema 7.3, O é um ordinal. Assim,
O ∈ O, o que é uma contradição. Portanto, O é uma classe própria.

Exemplo 7.10 Sejam α e β ordinais. Mostre que α ≤ β se, e somente se, α ⊆ β.

Solução. Suponhamos que α ≤ β. Se α = β, então nada há para ser provado. Se


α < β, então α ∈ β. Logo, α ⊆ β, pois β é transitivo.
Reciprocamente, suponhamos, por absurdo, que α ∈ / β e α = β. Então β ∈ α,
pois O é uma ∈-cadeia. Assim, β ⊂ α, pois α = β, o que é uma contradição.
Portanto, α ≤ β.

Lema 7.11 Seja C um conjunto não vazio de ordinais em O. Então ∪C é um


ordinal, C ⊂ ∪C, ou seja, existe um α ∈ O tal que C ∩ α ⊆ α. Neste caso,

∪C = sup(C) = sup{α : α ∈ C} = sup{β ∈ O : α ≤ β, ∀ α ∈ C}.

Conclua que qualquer conjunto de ordinais é limitado.


1
Cesare Burali-Forti, 1861-1931, matemático italiano.

211
7.1. Números Ordinais

Prova. Dado α ∈ λ = ∪C. Então α ∈ β, para algum β ∈ C. Assim, pelo item (4)
do Lema 7.3, α é um ordinal. Logo, λ é um subconjunto de ordinais de O. Portanto,
λ é ∈-bem ordenado. Dado α ∈ λ, devemos provar que α ⊆ λ. Como α ∈ λ temos
que α ∈ β, para algum β ∈ C. Se x ∈ α, então x ∈ β, pois β é transitivo. Assim,
x ∈ λ. Portanto, λ é um conjunto transitivo. Consequentemente, λ é um ordinal.
Dado α ∈ C, obtemos α ⊆ λ. Logo, pelo Exemplo 7.10, α ≤ λ, ou seja, λ é
uma cota superior de C. Por outro lado, seja β qualquer cota superior de C. Então
α ≤ β, para todo α ∈ C. Se x ∈ λ, então x ∈ γ, para algum γ ∈ C. Assim, pelo
Exemplo 7.10, x ∈ γ ⊆ β, ou seja, x ∈ β. Logo, λ ⊆ β. Portanto, λ é a menor das
cotas superiores de C.

Observe, pelo Exemplo 5.5, que se n ∈ ω, então n = 0 ou n = k + , para algum


k ∈ ω. Enquanto, n+ < ω, para todo n ∈ ω. Isto motiva a seguinte definição.
Seja λ ∈ O. Diremos que λ é um número isolado ou um sucessor ordinal se
λ = α+ , para algum α ∈ O. Neste caso, diremos que α é o predecessor imediato
de λ. Diremos λ é um número limite ou um limite ordinal se λ = β + , para todo
β ∈ O ou, equivalentemente, λ = 0 e β < λ, então β < β + < λ, para todo β ∈ O,
e denotamos por λ = limα∈λ α.

Lema 7.12 Existe pelo menos um número limite.


Prova. Pelo axioma ZF9 existe um conjunto sucessor S. Seja

λ = ∪{α : α ∈ O e α ∈ S}.

Então, pelo Lema 7.11, λ é um ordinal e α ≤ λ, para todo α ∈ S, pois α ⊆ λ.


Como 0 ∈ S temos que 1 = S0 ∈ S, de modo que 1 ≤ λ. Se λ = β + , para
algum ordinal β, então β ∈ λ. Assim, β ∈ α ∈ S, para algum ordinal α. Logo,
β + = λ ≥ α > β, ou seja, λ = α. Sendo α+ ∈ S teremos α = λ ≥ α+ , o que é
uma contradição. Portanto, λ é um número limite.

Note que ω é o menor número limite diferente de zero e que ω é infinito, pois ω
com a ∈-ordenação não possui elemento maximal e ω = ∪n∈ω {n} = limn∈ω n.

Proposição 7.13 Seja λ um número ordinal. Então λ é um número limite se, e


somente se, ∪λ = ∪α∈λ {α} = limα∈λ α.
Prova. Suponhamos que λ seja um número limite. Então, dado α ∈ ∪λ, existe um
β ∈ λ tal que α ∈ β. Como λ é um ordinal temos que α ∈ λ. Assim, ∪λ ⊆ λ. Por

212
Capítulo 7. Números Ordinais

outro lado, se α ∈ λ, então α+ ∈ λ. Como α ∈ {α} ⊆ α+ temos que α ∈ α+ , de


modo que α ∈ ∪λ. Logo, λ ⊆ ∪λ.
Reciprocamente, suponhamos, por absurdo, que λ = β + , para algum ordinal β.
Então α ∈ ∪β + se, e somente se, α ∈ γ ∈ β + se, e somente se, α ∈ γ ∈ β ou
α ∈ γ = β se, e somente se, α ∈ β. Em símbolos,

∪β + = ∪[β ∪ {β}] = [∪β] ∪ [∪{β}] = [∪β] ∪ β = β.

A última igualdade ocorre, pois β é transitivo. Assim, λ = β, o que é uma contra-


dição. Portanto, λ é um número limite.

Note que o segmento inicial λ = {α ∈ O : α < λ} pode ser visto como


um conjunto de ordinais. Assim, se λ é um número isolado, digamos λ = α+ ,
para algum α ∈ O, então λ possui um maior elemento α. Se λ é um número
limite, então λ não possui maior elemento e λ = sup{α : α < λ}. Uma maneira
alternativa: para cada α ∈ O, o conjunto Aα = {β ∈ O : α < β < λ} é não
vazio. Então obtemos uma família {Aα : α ∈ O} não vazia. Assim, existe uma
função escolha r : O → ∪α∈O Aα tal que r(α) ∈ Aα , para cada α ∈ O. É claro que
r(α) = α+ , para cada α ∈ O. Dado α0 ∈ O, vamos definir, recursivamente, uma
função f : ω → O como f (0) = α0 e αn+1 = f (n+ ) = r(f (n)), para todo n ∈ ω.
Portanto, αn ∈ αn+1 , para todo n ∈ ω, é uma sequência crescente não limitada,
chamada de sequência fundamental, tal que

λ = sup{αn : n ∈ ω} = αn .
n∈ω

Teorema 7.14 (Teorema da Contagem) Seja A um conjunto bem ordenado. En-


tão existe um único α ∈ O tal que A ∼
= α = Sα .
Prova. Como A é bem ordenado temos, pelo Teorema 3.74, que uma e apenas uma
das seguintes condições ocorre: (a) A é isomorfo a um segmento inicial de O. (b)
A ∼= O. (c) O é isomorfo a um segmento inicial de A. Assim, pela Observação
7.9, as condições (b) e (c) não podem ocorrer. Logo, A é isomorfo a um segmento
inicial de O. Portanto, pelo item (2) do Lema 7.3 e pelo Lema 7.6, A ∼
= Sα = α,
para algum α ∈ O.

Sejam A um conjunto bem ordenado e α ∈ O tal que α ∼


= A. Diremos que α é

213
7.1. Números Ordinais

o número ordinal de A ou que A representa α. É importante observar que números


ordinais são conjuntos bem ordenados de uma forma especial (um representante de
classe).
Notações. α = A ou α = (A) ou α = ord(A).

Lema 7.15 Sejam A e B conjuntos bem ordenados. Então A ∼


= B se, e somente
se, (A) = (B).

Prova. Pelo Teorema 7.14, existem α, β ∈ O tais que α ∼


=Aeβ ∼ = B. Como A ∼
=

B temos que α = β. Assim, pelo Teorema 7.5, α = β. Portanto, (A) = (B).

Seja U a classe universal. Dados A, B ∈ U , definimos A ∼ B se, e somente se,



A = B. Então ∼ é uma relação de equivalência sobre U . Logo, a classe quociente
Q = {A : A ∈ U } está em correspondência biunívoca com a família dos números
ordinais O. Portanto, Q é uma classe própria.
Pelo Exemplo 4.40, qualquer conjunto finito é semelhante a um número natural.
Isto motiva a seguinte definição.
Seja α ∈ O. Diremos que α é um ordinal finito se existir um n ∈ ω tal que

α = n. Caso contrário, diremos que α é um ordinal transfinito. Note que ω é o
menor ordinal transfinito, pois se α é um ordinal transfinito, então existe um único
conjunto bem ordenado infinito A tal que α = (A). Assim, pelo Exemplo 4.15, A
contém um subconjunto enumerável. Portanto, α ≥ ω.

Teorema 7.16 Os números naturais são exatamente os números ordinais finitos, ou


seja, ω é o conjunto de todos os ordinais finitos.

Prova. Já vimos que qualquer número natural é um ordinal e, pelo Exemplo 4.40,
um ordinal finito. Por outro lado, seja α ∈ O tal que α = ω. Então, pelo Corolário
7.7, α ≥ ω. Assim, ω ⊆ α, pois α é transitivo. Portanto, pelo item (1) do Teorema
6.11, α é um conjunto infinito.

Observe que o Teorema 7.16 garante que a classe dos ordinais O é uma extensão
do conjunto dos números naturais ω e que os ordinais finitos são:

0, 1, 2, . . . ,

214
Capítulo 7. Números Ordinais

depois destes vem ω e, então

ω + 1 = {0, 1, 2, . . . , ω}
ω + 2 = {0, 1, 2, . . . , ω, ω + 1}
..
.
ω + ω = ω ∪ {ω + n : n ∈ ω}
..
.

Note, pelo Princípio da Boa Ordenação, que qualquer conjunto A pode ser bem
ordenado. Assim, pelo Teorema 7.14, existe um único α ∈ O tal que A ∼
= α. Logo,
a classe
C = {α ∈ O : A ≈ α}
é não vazia. Portanto, pelo Teorema 7.8, C contém um menor elemento, o qual
chama-se ordinal inicial equipotente a A. É fácil verificar que a classe de todos os
ordinais iniciais satisfaz as condições (1) e (2) do axioma ZF10 . Assim, um número
cardinal significa um ordinal inicial. Consequentemente, a classe dos números car-
dinais C é classe dos ordinais iniciais. Portanto, produzimos conjuntos que serve
como números cardinais tão bem como números ordinais, ou seja, para qualquer
conjunto A, obtemos |A| = κ, em que κ é o menor ordinal em O tal que existe uma
função bijetora f : A → κ ou, equivalentemente, não existe uma função bijetora
f : A → α, para todo α ∈ C, com α < κ
Observe que qualquer número natural é um ordinal inicial, pois para cada con-
junto finito A existe, pelo Exemplo 4.40, um n ∈ ω tal que A ≈ n. Portanto, os
números naturais coincide com os ordinais finitos bem como os cardinais finitos.
Note que ω é um ordinal inicial, pois não existe menor ordinal α tal que α ≈ ω.
Portanto, ω possui três significados. No entanto, ω + 1 não é um ordinal inicial, pois
a função f : ω → ω + 1 definida como

ω, se x = 0
f (x) =
x − 1, se x ≥ 1

é bijetora, ou seja, |ω| = |ω + 1|. Então ω + 1 não é o menor ordinal em sua classe.

Teorema 7.17 Qualquer ordinal inicial transfinito é um número limite.


Prova. Suponhamos, por absurdo, que exista um ordinal inicial transfinito κ que
não seja um número limite. Então κ = α+ , para algum α ∈ O. A função f : κ → α

215
7.1. Números Ordinais

definida como ⎧
⎨ 0, se x = α
f (x) = x + 1, se x < ω

x se ω ≤ x < α
é bijetora, ou seja, |α| = |κ|. Portanto, κ não é o menor ordinal em sua classe, o
que é uma contradição.

Finalizaremos esta seção com mais alguns resultados. Sejam α, β ∈ O e A, B


conjuntos bem ordenados tais que α = (A) e β = (A). Definimos

A  B ⇔ α ∈ β,

ou seja, se existir uma imersão crescente f : A → B ou f : α → β. Neste caso, A


é dominado por B e A é semelhante a um segmento inicial de B, isto é,

A∼
= Sb = {y ∈ B : y < b}.

Note que esta relação está bem definida. De fato, sejam C e D conjuntos bem
ordenados tais que α = (C) e β = (D). Então A ≈ C e B ≈ D. Assim,
existem funções bijetoras f : A → C e g : B → D. Logo, se existir uma função
injetora e crescente h : A → B, então k = g ◦ h ◦ f −1 : C → D é uma função
injetora e crescente.

Lema 7.18 Sejam B um conjunto bem ordenado e f : A → B uma função injetora.


Dados a, b ∈ A, definimos a  b se, e somente se, f (a) ≤ f (b). Então  bem
ordena A.

Prova. Vamos provar apenas que  bem ordena A. Seja S um subconjunto não
vazio de A. Então T = f (S) é um subconjunto não vazio de B, pois f é injetora.
Como B é bem ordenado temos que T contém um menor elemento, digamos t0 ∈ T .
Assim, existe um único elemento s0 ∈ S tal que t0 = f (s0 ).
Afirmação. s0 é o menor elemento de S.
De fato, dado s ∈ S, obtemos f (s) ∈ T . Então f (s0 ) ≤ f (s). Logo, s0 ≤ s.
Portanto, A é bem ordenado.

216
Capítulo 7. Números Ordinais

Exercícios
1. Mostre que semelhança é uma relação de equivalência.

2. Seja A um conjunto finto. Mostre que se ≤ e  são ordenações totais sobre


A, então (A, ≤) é isomorfo a (A, ).

3. Mostre que se um conjunto A é bem ordenado por R e R−1 , então ele é finito.

4. Sejam α, β ∈ O. Mostre que se α+ = β + , então α = β.

5. Seja α ∈ O. Mostre que não existe ordinal β tal que α < β < α+ , ou seja,
α+ é o menor ordinal maior do que (sucessor imediato) α.

6. Seja C um conjunto não vazio de ordinais em O. Mostre que existe pelo


menos um β ∈ O tal que C ⊂ β (C ⊆ ∪C).

7. Sejam C um conjunto não vazio de ordinais em O e λ = ∪C. Mostre que se


λ∈/ C, então λ é um número limite. Por exemplo, C = ω e λ = ∪C = ω.

8. Mostre que cada elemento em O é um número isolado ou um número limite


e não ambos.

9. Mostre que um ordinal α é um número natural se, e somente se, qualquer


subconjunto não vazio de α possui um maior elemento.

10. Seja C um conjunto não vazio de ordinais em O. Mostre que ∩C = inf(C) é


um ordinal. Conclua que ∩C é o menor elemento de C.

11. Sejam α ∈ O tal que α ≥ ω e

C = {μ ∈ O : μ ≤ α e μ um número limite}.

Mostre que λ = sup(C) é um número limite.

12. Mostre que C = {A : A é um conjunto bem ordenado contável} é uma


classe própria. Conclua que não existe o conjunto de todos os ordinais contá-
veis.

217
7.2. Aritmética dos Números Ordinais

13. Mostre que não existe uma função f : ω → O tal que f (n+ ) ≤ f (n), para
todo n ∈ ω. Conclua que se uma tal função existisse ela seria estacionária
isto é, existe um n0 ∈ ω tal que f (n) = f (n0 ), para todo n ∈ ω, com n ≥ n0 .

14. (Princípio de Indução Transfinita) Seja P (α) uma afirmação que é verda-
deira ou falsa, para cada α ∈ O. Suponhamos que as seguintes propriedades
sejam satisfeitas:

(a) P (0) é verdadeira.


(b) Se P (α) é verdadeira, então P (α+ ) é verdadeira.
(c) Para cada número limite λ = 0, se P (α) é verdadeira, para cada α ∈ Sλ ,
então P (λ) é verdadeira.

Então P (β) é verdadeira, para todo β ∈ O.

15. Mostre que cada elemento n em ω é um número cardinal e que ω é um número


cardinal. Conclua que qualquer outro cardinal é um número limite.

16. Seja κ ∈ O. Mostre que as seguintes condições são equivalentes:

(a) Existe uma função bijetora f : κ → α, para algum α ∈ O, com α < κ;


(b) κ ∈
/ C;
(c) Existe uma função injetora f : κ → α, para algum α ∈ O, com α < κ.

7.2 Aritmética dos Números Ordinais


Nesta seção provaremos que os números ordinais possuem “quase” todas as
propriedades algébricas dos números naturais. Para isto, vamos usar uma analogia
com os números cardinais, ao invés da Fórmula de Recorrência usada na artimética
dos números naturais.
Sejm A e B são conjuntos bem ordenados disjuntos. Então A∪B é um conjunto
bem ordenado com a seguinte ordenação. Dados x, y ∈ A ∪ B, definimos

⎨ x, y ∈ A e x ≤A y ou
xy⇔ x, y ∈ B e x ≤B y ou

x ∈ A e y ∈ B.

218
Capítulo 7. Números Ordinais

Note que na ordenação , os elementos em A ou em B são ordenados como antes


e qualquer elemento de A é menor do que qualquer elemento de B. Formalmente,

 |A×A = ≤A ,  |B×B = ≤B e x  y, ∀ x ∈ A e y ∈ B,

ou ainda,
=≤A ∪ ≤B ∪(A × B).
Vamos provar que (A∪B, ) é bem ordenado. Por exemplo, dados x, y, z ∈ A∪B,
x  x, pois x ∈ A ou x ∈ B, mas (x, x) ∈
/ A × B. Se x  y e y  z, então [x ≤A y
ou x ≤B y ou (x ∈ A e y ∈ B)] e [y ≤A z ou y ≤B z ou (y ∈ A e z ∈ B)]. Assim,
[x ≤A y e y ≤A z] ou [x ≤B y e y ≤B z], pois as outras possibilidades não podem
ocorrer. Portanto, x  z e  é uma ordenação para A ∪ B. Seja S um subconjunto
não vazio de A ∪ B. Então S1 = S ∩ A = ∅ ou S ⊆ B, por exemplo, S1 contém
um menor elemento, digamos a0 ∈ S1 . Portanto, é fácil verificar que a0 é o menor
elemento de S. Consequentemente,  é uma boa ordenação para A ∪ B.
Sejam A e B são conjuntos bem ordenados disjuntos. A soma ordinal de A e
B, em símbolos,
A⊕B
é o par ordenado (A ∪ B, ). Observe que se A e B são conjuntos bem ordenados
quaisquer. Então A é semelhante a A × {0} e B é semelhante a B × {1}, com

(A × {0}) ∩ (B × {1}) = ∅,

mesmo que A e B não sejam disjuntos. Portanto, a soma ordinal de A e B pode ser
substituída pelo o par ordenado ((A × {0}) ∪ (B × {1}), ), onde
⎧ ⎧
⎨ (x, 0)  (y, 0) ou ⎨ x, y ∈ A e x ≤A y ou
(x, 1)  (y, 1) ou ⇔ x, y ∈ B e x ≤B y ou
⎩ ⎩
(x, 0)  (y, 1) x ∈ A e y ∈ B.

Sejam α, β ∈ O e A, B conjuntos bem ordenados disjuntos tais que α = (A)


e β = (B). Definimos a adição sobre os números ordinais como sendo

α+β = (A ⊕ B).

Note, pelo Teorema 6.32, que essa operação está bem definida.

219
7.2. Aritmética dos Números Ordinais

Teorema 7.19 Sejam α, β e γ números ordinais. Então:

1. 0 + α = α + 0 = α.

2. α + (β + γ) = (α + β) + γ.

3. Se β > 0, então α < α + β.

4. β ≤ α + β.

5. α < β se, e somente se, existir um único ordinal τ > 0 tal que α + τ = β.

6. Se α < β, então γ + α < γ + β.

7. Se γ + α = γ + β, então α = β.

Prova. Sejam A, B e C conjuntos bem ordenados disjuntos tais que α = (A),


β = (B) e γ = (C). (1) Como ∅ ∪ A = A = A ∪ ∅ temos que as somas ordinais
∅ ⊕ A e A ⊕ ∅ representam o conjunto A. Portanto, 0 + α = α + 0 = α.
(2) Note que A ⊕ (B ⊕ C) ∼
= (A ⊕ B) ⊕ C, pois as somas ordinais A ⊕ (B ⊕ C)
e (A ⊕ B) ⊕ C representam o conjunto A ∪ B ∪ C, com a ordenação dada acima.
Por exemplo, qualquer elemento de C é maior do que qualquer elemento de B e
qualquer elemento de B é maior do que qualquer elemento de A. Portanto,

α + (β + γ) = (α + β) + γ.

(3) Seja b0 o menor elemento de B. Então é fácil verificar que A é igual ao


segemento inicial Sb0 de A ⊕ B. Assim, existe uma imersão estritamente crescente
f : A → A ⊕ B. Portanto, α < α + β.
(4) Como B ⊆ A ⊕ B temos, pelo Teorema 3.74, que B é semelhante a A ⊕ B
ou a um segmento inicial de A ⊕ B. Portanto, β ≤ α + β.
(5) (Existência) Como α < β temos que A ∼ = Sb , para algum b ∈ B. Pondo
D = B − Sb e τ = (D), obtemos τ > 0, pois D = ∅ e é bem ordenado. Como
α = (C) e B = Sb ⊕ D temos que α + τ = β.
(Unicidade) Seja υ > 0 outro ordinal tal que α + υ = β. Suponhamos, por
absurdo, que τ < υ. Então existe um ordinal δ > 0 tal que τ + δ = υ. Logo, pelo
itens (2) e (3),

β = α + υ = α + (τ + δ) = (α + τ ) + δ = β + δ > β,

220
Capítulo 7. Números Ordinais

o que é uma contradição. Portanto, τ = υ.


Reciprocamente, seja D um conjunto bem ordenado tal que τ = (D). Então
B = A ⊕ D. Assim, pelo item (3), β = α + τ > α. Portanto, α < β.
(6) Suponhamos que α < β. Então, pelo item (5), existe um τ > 0 tal que
α + τ = β. Assim, pelo itens (3) e (4),

γ + β = γ + (α + τ ) = (γ + α) + τ > γ + α.

Portanto, γ + α < γ + β.

Observação 7.20 Se 2 = {0, 1}, então ω ∼= 2 ⊕ ω, pois a função f : ω → 2 ⊕ ω


definida como 
(x, 0), se x ∈ {0, 1}
f (x) =
(x − 2, 1), se x ≥ 2
é uma semelhança. No entanto, ω⊕2 não é semelhante a ω, pois ω⊕2 possui último
elemento 1, mas ω não. Logo, 2 + ω = ω + 2. Portanto, a comutatividade vale no
conjunto dos números naturais, mas não nos números ordinais. Além disso, 0 < 2,
mas 0 + ω = ω = 2 + ω. Note, em geral, que m + ω = sup{m + n : n ∈ ω} = ω
ou m + ω = m + ∪n∈ω {n} = ∪n∈ω {m + n} = ω, pois se m ∈ ω, então m + n ∈ ω.
Neste caso, m + ω = ω + m.

Sejam I um conjunto bem ordenado e {Ai }i∈I uma família de conjuntos bem
ordenados disjuntos aos pares. Neste caso, diremos que {Ai }i∈I é uma família bem
ordenada. Seja F = ∪i∈I Ai . Dados x, y ∈ F , existem únicos i, j ∈ I tais que
x ∈ Ai e y ∈ Aj , definimos

[x  y, se i < j] e [x ≤Ai y, se i = j].

Então  bem ordena F . Note que



(x, i) ≤ (y, i), x, y ∈ Ai ou
xy⇔
(x, i) ≤ (y, j), se i < j.

Seja S um subconjunto não vazio de F . Então J = {j ∈ I : S ∩ Aj = ∅} é não


vazio ou S ⊆ Aj + . Assim, J contém um menor elemento, digamos j0 ∈ J. Logo,
S ∩ Aj0 = ∅. Como Aj0 é bem ordenado temos que S ∩ Aj0 contém um menor
elemento, digamos a0 ∈ S ∩ Aj0 . É fácil verificar que a0 é o menor elemento de S.

221
7.2. Aritmética dos Números Ordinais

Portanto,  é uma boa ordenação para F . Neste caso, a soma ordinal de qualquer
família bem ordenada {Ai }i∈I , em símbolos, ⊕i∈I Ai , é o par ordenado (∪i∈I Ai , ).
Sejam {αi }i∈I uma família bem ordenada em O e {Ai }i∈I uma família bem
ordenada tal que αi = (Ai ), para todo i ∈ I . Definimos a adição da família bem
ordenada {αi }i∈I como sendo
 
αi = ( Ai ).
i∈I i∈I

Em particular, se I = N e cada αn = 0 é finito, então n∈N αn = ω.
Sejam A e B conjuntos bem ordenados quaisquer. Dados (a, b), (c, d) ∈ A × B,
definimos
(a, b)  (c, d) ⇔ b <B d ou b = d e a ≤A c.
Então  bem ordena A × B. De fato, seja S um subconjunto não vazio de A × B.
Então S = {(a, b) : a ∈ A e b ∈ B}. Assim,

S2 = {b ∈ B : (a, b) ∈ S, para algum a ∈ A} =


 ∅ e S2 ⊆ B.

Logo, existe um b0 ∈ S2 tal que b0 ≤ b, para todo b ∈ S2 . Pondo

S1 = {a ∈ A : (a, b0 ) ∈ S} =
 ∅ e S1 ⊆ A,

temos que existe um a0 ∈ S1 tal que a0 ≤ a, para todo a ∈ S1 . É fácil verificar que
(a0 , b0 ) é o menor elemento de S. Portanto, (A × B, ) é bem ordenado. Observe
que A × B = ∪b∈B (A × {b}). Assim, pondo Ab = A × {b}, teremos uma família
bem ordenada {Ab }b∈B . Portanto,

A × B = ⊕b∈B Ab ,

em que A × B é ordenado com ordem antilexicográfica dada acima. Isto motiva a


seguinte definição.
Sejam A e B são conjuntos bem ordenados. O produto ordinal de A e B, em
símbolos,
A"B
é o par ordenado (A × B, ), onde  é a ordem antilexicográfica sobre A × B. De
modo inteiramente análogo, B " A é o par ordenado (A × B, ), onde  é a ordem

222
Capítulo 7. Números Ordinais

lexicográfica sobre A × B.
Sejam α, β ∈ O e A, B conjuntos bem ordenados tais que α = (A) e β =
(B). Definimos a multiplicação sobre os números ordinais como sendo

α·β = (A " B).

Note, pelo Teorema 6.38, que essa operação está bem definida.

Teorema 7.21 Sejam α, β e γ números ordinais. Então:

1. 0 · α = α · 0 = α.

2. 1 · α = α · 1 = α.

3. α(βγ) = (αβ)γ.

4. α(β + γ) = αβ + αγ.

5. Se γ > 0 e α < β, então γα < γβ.

6. Se γ > 0 e γα = γβ, então α = β.

Prova. Vamos provar apenas os itens (3), (4), (5) e (6): Sejam A, B e C conjuntos
bem ordenados tais que α = (A), β = (B) e γ = (C). (3) A função f :
A × (B × C) → (A × B) × C definida como f (x, (y, z)) = ((x, y), z) é claramente
bijetora. Assim, resta provar que

(a, (b, c))  (x, (y, z)) ⇔ ((a, b), c)  ((x, y), z),

para todos a, x ∈ A, b, y ∈ B e c, z ∈ C. Como ((a, b), c)  ((x, y), z) se, e


somente se, c < z ou c = z e b < y ou c = z, b = y e a < x temos que os produtos
ordinais (A " B) " C e A " (B " C) representam o conjunto A × B × C, com a
ordenação dada acima. Portanto, α(βγ) = (αβ)γ.
(4) Como A×(B ∪C) = (A×B)∪(A×C) temos que os ordinais A"(B ⊕C)
e (A " B) ⊕ (A " C) representam o conjunto A × (B ∪ C), com as ordenações
dadas acima. Portanto, α(β + γ) = αβ + αγ.
(5) Como α < β temos, pelo item (5) do Teorema 7.19, que existe um único
ordinal τ > 0 tal que α + τ = β. Assim, pelos itens (3) e (4) do Teorema 7.19,

γβ = γ(α + τ ) = γα + γτ > γα.

223
7.2. Aritmética dos Números Ordinais

Portanto, γα < γβ.


(6) Se α = β, digamos α < β, então, pelo item (5), γα < γβ, o que é impossí-
vel. Portanto, α = β.

Observação 7.22 Se 2 = {0, 1}, então ω ∼= 2 " ω, pois a função f : 2 " ω → ω


definida como f (r, q) = q2 + r é uma semelhança. Note que

2 " ω = {(0, 0), (1, 0), (0, 1), (1, 1), (0, 2), (1, 2), . . .}.

Note, em geral, que m · ω = sup{m · n : n ∈ ω} = ω ou m · ∪n∈ω {n} =


∪n∈ω {m · n} = ω, para todo m ∈ ω − {0}. Por outro lado,

ω " 2 = ∪n∈{0,1} (ω × {n}) = ω × {0} ∪ ω × {1}


= {(0, 0), (1, 0), (2, 0), . . . ; (0, 1), (1, 1), (2, 1), . . .} ∼
= ω ⊕ ω,

(ordenação lexicográfica) de modo que ω  ω"2, pois ω é semelhante ao segmento


inicial
S(0,1) = {(0, 0), (1, 0), (2, 0), . . .}
de ω " 2. Assim, 2 · ω = ω · 2 = ω + ω. Portanto, a comutatividade vale no conjunto
dos números naturais, mas não nos números ordinais. Como (1 + 1)ω = 2 · ω e

1 · ω + 1 · ω = ω + ω = ω(1 + 1) = ω · 2

temos que (1 + 1)ω = 1 · ω + 1 · ω. Logo, a distributividade não vale à direita. Além


disso, 1 < 2, mas 1 · ω = ω = 2 · ω.

Teorema 7.23 Sejam α, β e γ números ordinais. Então:

1. Se γ < βα, então existem ordinais δ e τ tais que

γ = βδ + τ, com δ < α e τ < β.

2. (Algoritmo da Divisão) Se β > 0, então existem únicos ordinais π e ρ tais


que
α = βπ + ρ, com 0 ≤ ρ < β.
Em particular, diremos que β “divide” α se ρ = 0.

224
Capítulo 7. Números Ordinais

Prova. Sejam A, B e C conjuntos bem ordenados tais que α = (A), β = (B) e


γ = (C). (1) Como γ < βα temos que C ∼ = S(b,a) , para algum (b, a) ∈ B × A.

Pondo D = Sb × {a}, é claro que D = Sb .
Afirmação. S(b,a) = (B " Sa ) ⊕ D.
De fato, dados x ∈ B e y ∈ A, obtemos

(x, y) ∈ S(b,a) ⇔ (x, y) < (b, a) ⇔ y < a (y ∈ Sa ) ou [y = a e x < b]


⇔ (x, y) ∈ B × Sa ou (x, y) ∈ D ⇔ (x, y) ∈ (B × Sa ) ∪ D.

Portanto, S(b,a) = (B × Sa ) ∪ D. É fácil verificar que (B " Sa ) ⊕ D e S(b,a) possuem


a mesma ordenação. Fazendo δ = (Sa ) e τ = (D) = (Sa ), obtemos

γ = βδ + τ, com δ < α e τ < β,

pois γ = (C) = (S(b,a) ).


(2) (Existência) Como β ≥ 1 temos que βα ≥ α. Se α = βα, então nada há
para ser provado. Se α < βα, então, pelo item (1), existem ordinais δ < α e τ < β
tais que γ = βδ + τ .
(Unicidade) Suponhamos que γ = βδ1 + τ1 . Se δ < δ1 , então δ + η = δ1 , para
algum ordinal η > 0. Assim,

βδ + τ = βδ1 + τ1 = β(δ + η) + τ1 = βδ + βη + τ1 .

Logo, τ = βη + τ1 > βη ≥ β, o que é impossível. Por um argumento simétrico,


não pode ocorrer δ1 < δ. Portanto, δ = δ1 . Consequentemente, pelo item (8) do
Teorema 7.19, τ = τ1 .

Note, pelo item (2) doTeorema 7.23, que existem únicos ordinais π1 e ρ1 tais
que
α = βπ1 + ρ1 , com 0 ≤ ρ1 < β.
Se ρ1 = 0, então α = βπ1 . Se, ao contrário, ρ1 > 0, então existem únicos ordinais
π2 e ρ2 tais que
β = ρ1 π2 + ρ2 , com 0 ≤ ρ2 < ρ1 ,
e assim por diante até que algum dos restos seja igual a zero, digamos ρn+1 = 0,
pois a sequência
β > ρ1 > ρ2 > · · · > ρn > 0

225
7.2. Aritmética dos Números Ordinais

não pode ser infinita pela boa ordenação de β. Portanto, obtemos as seguintes rela-
ções:
a = βπ1 + ρ1 , com 0 < ρ1 < β
β = ρ1 π2 + ρ2 , com 0 < ρ2 < ρ1
..
.
ρn−2 = ρn−1 πn + ρn , com 0 < ρn < ρn−1
ρn−1 = ρn πn+1 .
Com o objetivo de completude finalizaremos esta seção com alguns comentários
sobre exponenciação de números ordinais. Sejam A e B conjuntos bem ordenados
e A(B) o conjunto de todas as funções f : B → A definidas como f (b) = min(A),
para todos exceto um número finito b ∈ B. Mais precisamente, se a0 = min(A) e
Sf = {x ∈ B : f (x) = a0 }, então A(B) = {f ∈ AB : |Sf | < ∞}. Então A(B) é um
conjunto bem ordenado com a seguinte ordenação . Dados f, g ∈ A(B) , definimos

f ≺ g ⇔ f = g e f (b) <A g(b),

onde b ∈ B é o maior elemento tal que f (b) = g(b), ou seja, f (x) = g(x), para todo
x ∈ B, com x > b. Note que  está bem definida, pois {b ∈ B : f (b) = g(b)} é um
conjunto finito. Além disso,  é a ordem lexicográfica. Portanto, (A(B) , ) é bem
ordenado. Sejam α, β ∈ O e A, B conjuntos bem ordenados tais que α = (A) e
β = (B). Definimos a exponenciação sobre os números ordinais como sendo

αβ = (A(B) ).

Exemplo 7.24 Mostre que nω = ω. Mas, ω n = ω, para todo n ∈ ω, com n = 0.


Solução. Sejam A = {1, . . . , n} e B = N. Então A(B) é o conjunto de todas as
sequências com valores em A tais que f (b) = 1, para todos exceto um número finito
b ∈ B. Logo,

A(B) = {(1, 1, 1, . . .), . . . , (n, 1, 1, . . .), (1, 2, 1, . . .), . . . , (n, 2, 1, . . .), . . .}


= {f1 , . . . , fn , fn+1 , . . . , f2n , . . .}.

Portanto, nω = ω. Como B (A) = B × · · · × B temos que ω n = ω · · · ω = ω.

226
Capítulo 7. Números Ordinais

Exercícios
1. Seja α ∈ O. Mostre que 1 + α = α se, e somente se, α é transfinito (α ≥ ω).
Neste caso, n + α = α e (1 + α)n = αn + 1, para todo n ∈ ω.

2. Sejam C = {α : α ∈ O} não vazio e D = {β ∈ O : α ≤ β, ∀ α ∈ C}.


Mostre que α+ ≤ β + , para todo α ∈ C e β ∈ D. Conclua que ∪C = ∪D.

3. Seja ρ ∈ O − {0}. Diremos que ρ é irredutível se não existirem α, β ∈ O tais


que 0 < α, β < ρ e ρ = α + β.

(a) Mostre que ρ é irredutível se, e somente se, α + ρ = ρ, para todo α ∈ O,


com α < ρ. Conclua que se ρ > 1, então ρ é transfinito.
(b) Mostre que se ρ > 1, α ∈ O − {0} e αρ é irredutível, entâo ρ é irredu-
tível.
(c) Mostre que ρ é irredutível e α ∈ O satisfaz 0 < α < ρ, então existe
β ∈ O irredutível tal que ρ = αβ.
(d) Mostre que se α ∈ O − {0}, então o conjunto

C = {ρ ∈ O : ρ é irredutível e ρ ≤ α}

possui um maior elemento.

4. Sejam α, β ∈ O. Mostre que α+ = α + 1. Conclua que α + β + = (α + β)+


e α · β + = α · β + α.

5. Sejam α, β ∈ O − {0}.

(a) Mostre que se α + β = ω, então α é finito e β = ω. Conclua que se


α ≤ β, então a equação τ + α = β possui infinitas soluções.
(b) Mostre que se β = 1 e α · β = ω, então α é finito e β = ω.

6. Seja λ ∈ O um limite ordinal. Mostre que existe um único α ∈ O tal que


λ = ωα.

7. Seja λ ∈ O um sucessor ordinal. Mostre que existem únicos α ∈ O e n ∈ ω,


com n = 0, tais que λ = ωα + n.

227
7.2. Aritmética dos Números Ordinais

8. Sejam α, β, λ ∈ O, com λ = 0 um sucessor ordinal.

(a) Mostre que se α < β, então αλ < βλ.


(b) Mostre que se αλ = βλ, então α = β.
(c) Mostre que γ + λ > γλ, para todo γ ∈ O, com γ = 0.

9. Sejam α, λ ∈ O, com λ um limite ordinal. Mostre que λ + α = α se, e


somente se, α ≥ λω

10. Seja λ ∈ O, com λ = 0.

(a) Mostre que ω = nω, para todo n ∈ ω.


(b) Mostre que λ é um limite ordinal se, e somente se, λ = nλ, para todo
n ∈ ω.

11. Sejam α, λ ∈ O, com λ = 0.

(a) Mostre que λ é um limite ordinal se, e somente se, α + λ é um limite


ordinal, ou seja, α + limβ∈λ β = limβ∈λ (α + β).
(b) Mostre que α = 0 e λ é um limite ordinal se, e somente se, αλ é um
limite ordinal, ou seja, α · limβ∈λ β = limβ∈λ (αβ).

228
CAPÍTULO 8

CONSTRUÇÃO DOS NÚMEROS REAIS

A construção formal do sistema de números reais é atribuída a Cantor e Dede-


kind, ambos publicaram seus resultados independentemente em 1872. Para manter
o espírito do texto seguiremos a construção de Dedekind, pois sua construção do
sistema dos números reais usa apenas os axiomas básicos do sistema dos núme-
ros inteiros e os princípios da Teoria dos Conjuntos, de tal modo que ele possua a
mesma completividade como a reta real. Além disso, apresentaremos as provas de
quase todos os resultados usados implicitamente no texto.

8.1 Os Números Inteiros


Depois de termos dado um desenvolvimento axiomático do conjunto dos nú-
meros naturais ω, agora estendemos esse conjunto para o conjunto Z dos números
inteiros. A necessidade de se fazer isto deve-se ao fato de que o conjunto dos nú-
meros naturais ω originalmente, ele tinha a capacidade de representar “todas” as
quantidades e, posteriormente, com o advento das operações elementares, em par-
ticular a adição e a multiplicação, foi possível somar e multiplicar dois números
quaisquer de ω, obtendo-se um número de ω, o que em linguagem moderna signi-
fica dizer que ω é fechado em relação à soma e à multiplicação. Com a subtração
surgiu um problema, que era o da impossibilidade de se subtrair um número do ou-
tro quando o primeiro era menor do que o segundo, ou seja, a equação m + x = n
não necessariamente possui solução em ω.

229
8.1. Os Números Inteiros

Para k, m, n, p ∈ ω, definimos a relação

(k, m) ∼ (n, p) ⇔ k + p = m + n.

Então ∼ é uma relação de equivalência sobre ω × ω. Como exemplo provaremos a


transitividade, dados (k, m), (n, p), (q, r) ∈ ω × ω, (k, m) ∼ (n, p) e (n, p) ∼ (q, r)
implicam que k + p = m + n e n + r = p + q. Assim,

k + r + p = k + p + r = m + n + r = m + p + q = m + q + p.

Logo, pela Lei do Cancelamento em ω, k + r = m + q. Portanto, (k, m) ∼ (q, r).


Vamos definir os números inteiros como as classes de equivalências (k, m) de-
terminada por (k, m):

(k, m) = {(n, p) ∈ ω × ω : k + p = m + n}.

Por exemplo, como veremos a classe de equivalência (0, 1) será identificada com o
número inteiro −1. Portanto, de um ponto de vista intuitivo, podemos ver a classe
(k, m) como um número inteiro sob a forma k − n, ou seja, os inteiros são “retas”
com inclinações iguais a 1 em ω × ω.
Note que o inteiro (k, m) é um conjunto. Assim, devemos descrever as opera-
ções binárias de adição, de multiplicação e de ordem, de modo que o novo conjunto
dos némeros inteiros contenha o conjunto dos némeros naturais ω.
Dados k, m, n, p ∈ ω, vamos definir a adição e a multiplicação de números
inteiros como:

1. (k, m) + (n, p) = (k + n, m + p).

2. (k, m) · (n, p) = (kn + mp, kp + mn).

Observe, intuitivamente, que estas operações binárias fazem sentidos:

(k − m) + (n − p) = (k + n) − (m + p) e (k − m)(n − p) = (kn + mp) − (kp + mn).

É importante ressaltar que os símbolos + e · estão sendo usados para representar as


operações binárias tanto nos inteiros quanto em ω, caso isto cause alguma dúvida,
use ⊕ e ". Vamos provar apenas que a operação binária (2) está bem definida.
Suponhamos que (k, m) = (q, r) e (n, p) = (s, t). Então k + r = m + q e n + t =

230
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

p + s. Assim,

kn + mp + qt + rs + nr = (k + r)n + mp + qt + rs
= (m + q)n + mp + qt + rs
= q(n + t) + mn + mp + rs
= q(p + s) + mn + mp + rs
= qs + (q + m)p + mn + rs
= qs + (k + r)p + mn + rs
= kp + mn + qs + (p + s)r
= kp + mn + qs + (n + t)r
= kp + mn + qs + rt + nr.

Portanto, (kn + mp, kp + mn) = (qs + rt, qt + rs).

Teorema 8.1 Sejam k, m, n, p, q, r ∈ ω.

1. (k + n, m + n) = (k, m).

2. (k, m) + [(n, p) + (q, r)] = [(k, m) + (n, p)] + (q, r).

3. (k, m) · [(n, p) · (q, r)] = [(k, m) · (n, p)] · (q, r).

4. (k, m) + (n, p) = (n, p) + (k, m).

5. (k, m) · (n, p) = (n, p) · (k, m).

6. (k, m) · [(n, p) + (q, r)] = (k, m) · (n, p) + (k, m) · (q, r).

7. Existe um único (0, 0) tal que (k, m) + (0, 0) = (k, m) e existe um único
(1, 0) tal que (k, m) · (1, 0) = (k, m).

8. Existe um único (m, k) tal que (k, m) + (m, k) = (0, 0), o inverso de (k, m)
é denotado por (m, k) = −(k, m).

9. Se (k, m) + (n, p) = (k, m) + (q, r), então (n, p) = (q, r).

10. A equação (k, m) + (x, y) = (n, p) possui apenas a solução (n, p) − (k, m).

11. (k, m) · (n, p) = (0, 0) implica que (k, m) = (0, 0) ou (n, p) = (0, 0).

12. Se (k, m) · (n, p) = (k, m) · (q, r) e (k, m) = (0, 0), então (n, p) = (q, r).

231
8.1. Os Números Inteiros

Prova. Vamos provar apenas o item (11). Pelo item (1), (k, m) · (n, p) = (0, 0)
implica que kn + mp = kp + mn. Suponhamos que (n, p) = (0, 0). Então, pelo
item (1), n = p, digamos n < p. Assim, pelo Teorema 5.26, existe um t ∈ ω, com
t = 0, tal que p = n + t. Logo,

kn + mp = kp + mn ⇒ kn + m(n + t) = k(n + t) + mn
⇒ kn + mn + mt = kn + kt + mn
⇒ kt = mt.

Como t = 0 temos que k = m. Portanto, (k, m) = (0, 0).

Vamos denotar por Z o conjunto dos números inteiros. Note que (Z, +) é um
grupo abeliano e (Z, +, ·) é um anel comutativo com unidade e sem divisores de
zeros, o qual chama-se domínio de integridade. O próximo resultado é muito útil
para simplificar as provas.

Lema 8.2 Seja (k, m) ∈ Z.

1. Se k > m, então existe um único p ∈ ω  tal que (k, m) = (p, 0).

2. Se k < m, então existe um único p ∈ ω  tal que (k, m) = (0, p).

Conclua que qualquer inteiro pode ser representado de modo único como (0, 0) ou
(p, 0) ou (0, p), para algum p ∈ ω, com p = 0.

Prova. Vamos provar apenas o item (1). Se k > m, então, pelo Teorema 5.26,
existe um p ∈ ω, com p = 0, tal que k = m + p. Assim, k + 0 = m + p implica
que (k, m) = (p, 0). Seja q ∈ ω tal que (k, m) = (q, 0). Logo, (p, 0) = (q, 0), de
modo que p = p + 0 = 0 + q = q.

Dados (k, m), (n, p) ∈ Z. Vamos denotar por

(n, p) − (k, m) = (n + m, p + k)

a diferença ou a subtração entre (n, p) e (k, m). Observe, pelo item (10) do Teo-
rema 8.1, que esta operação está bem definida.
Dados (k, m), (n, p) ∈ Z, definimos

(k, m) ≺ (n, p) ⇔ k + p < m + n.

232
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

Esta operação está bem definida. Suponhamos que (k, m) = (q, r) e (n, p) = (s, t).
Então k + r = m + q e n + t = p + s. Assim, em ω,

k+p<m+n ⇔ k + p + (r + t) < m + n + (r + t)
⇔ k + r + (p + t) < n + t + (m + r)
⇔ m + q + (p + t) < p + s + (m + r)
⇔ q + t + (m + p) < r + s + (m + p)
⇔ q + t < r + s.

A notação (k, m)  (n, p) significa que (k, m) ≺ (n, p) ou (k, m) = (n, p).

Teorema 8.3 (Lei da Tricotomia) Dados (k, m), (n, p) ∈ Z, exatamente uma e
apenas uma das condições pode ocorrer:

(k, m) ≺ (n, p) ou (k, m) = (n, p) ou (k, m)  (n, p).

Prova. Basta observar, em ω, que exatamente uma e apenas uma das condições
pode ocorrer: k + p < m + n ou k + p = m + n ou k + p > m + n.

Dados (k, m) ∈ Z. Diremos que (k, m) é um inteiro positivo se (k, m)  (0, 0)


e é um inteiro negativo se (k, m)  (0, 0).

Teorema 8.4 Seja f : ω → Z uma função definida como f (n) = (n, 0). Então f é
injetora e
1. f (0) = (0, 0) e f (1) = (1, 0).

2. f (k + m) = f (k) + f (m), para todos k, m ∈ ω.

3. f (km) = f (k)f (m), para todos k, m ∈ ω.

4. k ≤ m se, e somente se, f (k)  f (m), para todos k, m ∈ ω. Conclua que Z


é infinito.
Prova. Fica como um exercício.

O Teorema 8.4 nos permite identificar ω com Im(f ) = {(n, 0) : n ∈ ω}, ou seja,
identificar cada n ∈ ω com sua imagem f (n) = (n, 0) ∈ Z. Assim, denotaremos,
com um abuso de notação, n = (n, 0) e −n = (0, n). Além disso,

(m, n) = (m, 0) + (0, n) = m + (−n) = m − n.

233
8.1. Os Números Inteiros

O conjunto P = {a ∈ Z : a > 0} chama-se cone positivo de Z. Neste caso,


Z+ = P ∪ {0} = {a ∈ Z : a ≥ 0} é o conjunto dos números inteiros positivos.
Conclua que Z+ é um modelo para o sistema de axiomas de Peano. Portanto, Z+
é um conjunto bem ordenado. Pondo −P = {−a ∈ Z : a ∈ P}, obtemos Z =
−P ∪ {0} ∪ P uma união disjunta e

Z = {. . . , −3, −2, −1, 0, 1, 2, 3, . . .}.

Observe que o subconjunto P de Z possui as seguintes propriedades:

1. a + b, ab ∈ P, para todos a, b ∈ P.

2. Se a ∈ Z, então exatamente uma e apenas uma das condições pode ocorrer:


−a ∈ P ou a = 0 ou a ∈ P.

Por exemplo, se a = (a, 0) > 0 e b = (b, 0) > 0, então ab = (ab, 0) > (0, 0), pois
ab = ab + 0 > 0 + 0 = 0 em ω. Portanto, ab ∈ P, para todos a, b ∈ P.
Sejam a, b ∈ Z. Diremos que b é maior do que a, em símbolos b > a, se, e
somente se, b − a ∈ P. Note que a < b se, e somente se b > a. A notação a ≤ b,
significa que a = b ou a < b. Neste caso, o par (Z, ≤) é um poset. Pelo exposto
acima, podemos concluir a nossa motivação: dados a, b ∈ ω, a equação a + x = b,
possui uma única solução x = b − a em Z.
É pertinente identificar graficamente os números inteiros. Para isto, conside-
remos a função diferença d : ω × ω → Z definida como d(m, m + p) = −p e
d(n + p, n) = p. Então os pares P = (m, n) ∈ ω × ω sâo pontos de coordenadas
inteiras no primeiro quadrante de R2 = {(x, y) : x, y ∈ R}, enquanto d projeta
todos os pontos da reta x − y = p sobre p ∈ Z (faça um esboço). O conjunto

ker(d) = {(m, n) ∈ ω × ω : d(m, n) = 0}

chama-se pares diagonais. Portanto, d(P + D) = d(P ), para todo P ∈ ω × ω


e D ∈ ker(d). Note que d é sobrejetora, pois d(p, 0) = p e d(0, p) = −p, para
todo p ∈ Z. Assim, d possui uma inversa à direita s : Z → ω × ω definida
como s(m) = (m, 0) e s(−n) = (0, n), para todo m ∈ Z+ e n ∈ P. Neste caso,
d ◦ s = IZ . Mas, (s ◦ d)(n + p, n) = (p, 0) e (s ◦ d)(m, m + p) = (0, p), de modo
que d não é injetora. Logo, para cada P ∈ ω × ω, existe um D ∈ ker(d) tal que

234
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

(s ◦ d)(P ) + D = P . Além disso, dados a, b ∈ Z,

a ⊕ b = d(s(a) + s(b)) = a + b e a " b = d(s(a)s(b)) = ab

são as operações induzidas por d sobre Z, as quais são as mesma de ω. Neste caso,
se (s ◦ d)(P ) + D = P e (s ◦ d)(Q) + E = Q, então

d(P + Q) = d(P ) ⊕ d(Q) e d(P · Q) = d(P ) " d(Q).

Por exemplo,

d(P ) ⊕ d(Q) = d((s ◦ d)(P ) + (s ◦ d)(Q))


= d((s ◦ d)(P ) + D + (s ◦ d)(Q))
= d((s ◦ d)(P ) + D + (s ◦ d)(Q) + E)
= d(P + Q).

Teorema 8.5 Sejam a, b, c, d ∈ Z. Então:

1. Se a < b e b < c, então a < c.

2. Se a = 0, então a2 ∈ P.

3. Se a < b, então a + c < b + c.

4. Se a < b e c < d, então a + c < b + d.

5. Se 0 < c, então a < b se, e somente se, ac < bc.

6. Se c < 0, então a < b se e somente se, ac > bc.

Prova. Vamos provar apenas os itens (2) e (5): (2) Se a = 0, então −a ∈ P ou


a ∈ P. Assim, a2 = (−a)2 ∈ P, pois

(−a)2 = (−a) · (−a) = (0, a) · (0, a) = (a2 , 0) = a · a = a2 .

(5) Se a < b e c > 0, então b − a ∈ P e c ∈ P. Assim, bc − ac = (b − a)c ∈ P.


Portanto, ac < bc.

235
8.1. Os Números Inteiros

Exercícios
1. Mostre que R = {(a, b) ∈ Z × Z : b − a ≥ 0} é um relação de ordem total
sobre Z.

2. Sejam a, b ∈ Z. Então:

(a) Mostre que −1 · a = −a e −a < a se a ≥ 0.


(b) Mostre que −(a + b) = (−a) + (−b).
(c) Mostre que −(−a) = a e (−a)b = −ab = a(−b).
(d) Mostre que se b ∈ P, então a < a + b.

3. Sejam a, b, c ∈ Z. Então:

(a) Mostre que a < b se, e somente se, a + c < b + c.


(b) Mostre que a > b se, e somente se, c − a < c − b.
(c) Mostre que ab > 0 se, e somente se, a > 0 e b > 0 ou a < 0 e b < 0.
(d) Mostre que ab < 0 se, e somente se, a < 0 e b > 0 ou a > 0 e b < 0.
(e) Mostre que a < b se, e somente se, a3 < b3 .

4. Mostre que a ordenação natural de Z não é densa e Z não é limitado.

5. Sejam a ∈ Z fixado e S ⊆ Z, com as seguintes propriedades a ∈ S e x ∈ S


implica que x + 1 ∈ S. Mostre que {x ∈ Z : a ≤ x} ⊆ S.

6. Mostre que qualquer subconjunto não vazio de Z que é limitado inferiormente


possui um menor elemento.

7. Mostre que qualquer subconjunto não vazio de Z que é limitado superior-


mente possui um maior elemento.

8. (Algoritmo da Divisão) Sejam a, b ∈ Z, com b > 0. Mostre que existem


únicos q, r ∈ Z tais que a = qb + r, com 0 ≤ r < b. Em particular, se r = o,
diremos b divide a, em símbolos, b|a.

9. Sejam a, b, d ∈ Z. Se d ≥ 0 satisfaz os seguintes axiomas:

(a) d divide a e d divide b.

236
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

(b) Se c divide a e c divide b, então c divide d.

Diremos que d é o maior divisor comum de a e b, e denotaremos por d =


mdc(a, b). Mostre que se b > 0 e a = qb + r, então mdc(a, b) = mdc(b, r).
Conclua que d sempre existe e existem x, y ∈ Z tais que d = xa + yb (Algo-
ritmo Euclidiano).

10. (Lema de Euclides) Sejam a, b, c ∈ Z. Se c divide ab e mdc(a, c) = 1, então


c divide b.

8.2 Os Números Racionais


No conjunto Z não temos problemas com a subtração, isto é, podemos subtrair
um elemento qualquer de outro sem qualquer restrição, mas surge a impossibilidade
de medir quantidades tais como comprimento etc ou efetuar a divisão de certos nú-
meros inteiros ou, equivalentemente, a equação ax = b, com b = 0, não necessa-
riamente possui solução em Z. Para contornarmos esse problema agiremos como
no caso dos números inteiros Z, o qual estendeu todas as operações dos números
naturais ω.
Para a, b ∈ Z e c, d ∈ Z = Z − {0}, definimos

(a, b) ∼ (c, d) ⇔ ad = bc.

Então ∼ é uma relação de equivalência sobre Z × Z . Como exemplo provaremos a


transitividade, dados (a, b), (c, d), (e, f ) ∈ Z × Z , (a, b) ∼ (c, d) e (c, d) ∼ (e, f )
implicam que ad = bc e cf = de. Assim,

af d = adf = bcf = bde = bed.

Logo, pela Lei do Cancelamento em Z, af = be. Portanto, (a, b) ∼ (e, f ).


Vamos definir os números racionais como as classes de equivalências (a, b) de-
terminada por (a, b):

(a, b) = {(c, d) ∈ Z × Z : ad = bc}.

Por exemplo, como veremos a classe de equivalência (0, 1) será identificada com o
número racional 0. Portanto, de um ponto de vista intuitivo, podemos ver a classe

237
8.2. Os Números Racionais

(a, b) como um número racional sob à forma de “fração ordinária” b−1 · a, ou seja,
os racionais são “retas” não horizontais em Z × Z.
Note que o racional (a, b) é um conjunto. Assim, devemos descrever as opera-
ções binárias de adição, de multiplicação, de divisão e de ordem, de modo que o
novo conjunto dos números racionais contenha o conjunto dos números inteiros Z.
Dados a, b, c, d ∈ Z, vamos definir a adição e a multiplicação de números raci-
onais como:

1. (a, b) + (c, d) = (ad + bc, bd).

2. (a, b) · (c, d) = (ac, bd).

Observe, intuitivamente, que estas operações binárias fazem sentidos:

a c ad + bc a c ac
+ = e · = .
b d bd b d bd

É importante ressaltar que os símbolos + e · estão sendo usados para representar as


operações binárias tanto nos racionais quanto em Z, caso isto cause alguma dúvida,
use ⊕ e ". Vamos provar apenas que a operação binária (1) está bem definida.
Suponhamos que (a, b) = (e, f ) e (c, d) = (g, h). Então af = be e ch = dg.
Assim,

(ad + bc)f h = adf h + bcf h = bedh + bf dg = (eh + f g)bd.

Portanto, (ad + bc, bd) = (eh + f g, f g).

Teorema 8.6 Sejam a, c, f ∈ Z e b, d, f ∈ Z .

1. (ad, bd) = (a, b).

2. (a, b) + [(c, d) + (e, f )] = [(a, b) + (c, d)] + (e, f ).

3. (a, b) · [(c, d) · (e, f )] = [(a, b) · (c, d)] · (e, f ).

4. (a, b) + (c, d) = (c, d) + (a, b).

5. (a, b) · (c, d) = (c, d) · (a, b).

6. (a, b) · [(c, d) + (e, f )] = (a, b) · (c, d) + (a, b) · (e, f ).

238
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

7. Existe um único (0, 1) tal que (a, b) + (0, 1) = (a, b) e existe um único (1, 1)
tal que (a, b) · (1, 1) = (a, b).

8. Existe um único (−a, b) tal que (a, b) + (−a, b) = (0, 1), o inverso aditivo de
(a, b) é denotado por (−a, b) = −(a, b).

9. Existe um único (b, a) = (0, 1) tal que (a, b) · (b, a) = (1, 1), o inverso multi-
plicativo de (a, b) é denotado por (b, a) = ((a, b))−1 .

10. Se (a, b) + (c, d) = (a, b) + (e, f ),então (c, d) = (e, f ).

11. A equação (a, b) + (x, y) = (c, d) possui apenas a solução (c, d) + (−a, b).

12. (a, b) · (c, d) = (0, 1) implica que (a, b) = (0, 1) ou (c, d) = (0, 1).

13. Se (a, b) · (c, d) = (a, b) · (e, f ) e (a, b) = (0, 1), então (c, d) = (e, f ).

14. A equação (a, b)·(x, y) = (c, d), com (a, b) = (0, 1), possui apenas a solução
(b, a) · (c, d).

Prova. Vamos provar apenas o item (14). É claro que (x, y) = (b, a) · (c, d) é uma
solução. Por outro lado, se (e, f ) é outra solução, então (a, b) · (e, f ) = (c, d) e

(e, f ) = (1, 1) · (e, f ) = (b, a) · ((a, b) · (e, f )) = (b, a) · (c, d).

Portanto, a equação possui apenas a solução (b, a) · (c, d).

Vamos denotar por Q o conjunto dos números racionais. Note que (Q, +) e
(Q, ·) são grupos abelianos, enquanto, (Q, +, ·) é um corpo. O próximo resultado é
muito útil para simplificar as provas.

Lema 8.7 Qualquer (p, q) ∈ Q pode ser escrito de modo único sob a forma (a, b),
com b > 0 e mdc(a, b) = 1.

Prova. Como (p, q) = (−p, −q), podemos supor que q > 0. Assim, pelo Exercício
(7) da Seção 8.1, d = mdc(p, q) existe. Logo, existem a, b ∈ Z, com b > 0, tais
que q = ad e q = bd. Portanto, (p, q) = (ad, bd) = (a, b), com mdc(a, b) = 1, pois

d = xp + yq = (xa + yb)d ⇒ xa + yb = 1.

239
8.2. Os Números Racionais

Se (p, q) = (c, d), com mdc(c, d) = 1, então ad = bc. Assim, pelo Lema de
Euclides, b divide d e d divide b, pois mdc(a, b) = 1 = mdc(c, d). de modo que
b = d. Logo, a = c. Portanto, (a, b) = (c, d).

Dados (a, b), (c, d) ∈ Z. Vamos denotar por

(a, b) ÷ (c, d) = (a, b) · (d, c) = (ac, bd)

a divisão entre (a, b) e (c, d). Observe, pelo item (14) do Teorema 8.6, que esta
operação está bem definida. É importante observar que

(c, d) − (a, b) = (bc − ad, bd)

representa a diferença ou a subtração entre (c, d) e (a, b) a qual, pelo item (11) do
Teorema 8.6, está bem definida.
Dados (a, b), (c, d) ∈ Q, com b > 0 e d > 0, definimos

(a, b) ≺ (c, d) ⇔ ad < bc.

Esta operação está bem definida. Suponhamos que (a, b) = (e, f ) e (c, d) = (g, h),
com f > 0 e h > 0. Então af = be e ch = dg. Como bd > 0 e f h > 0 temos que

ad < bc ⇔ ad(f h) < bc(f h) ⇔ af (dh) < ch(bf )


⇔ be(dh) < dg(bf ) ⇔ eh(bd) < f g(bd)
⇔ f g < eh.

A notação (k, m)  (n, p) significa que (k, m) ≺ (n, p) ou (k, m) = (n, p).

Teorema 8.8 (Lei da Tricotomia) Dados (a, b), (c, d) ∈ Q, exatamente uma e ape-
nas uma das condições pode ocorrer:

(a, b) ≺ (c, d) ou (a, b) = (c, d) ou (a, b)  (c, d).

Prova. Basta observar, em Z, que exatamente uma e apenas uma das condições
pode ocorrer: ad < bc ou ad = bc ou ad > bc.

Dados (a, b) ∈ Q. Diremos que (a, b) é um racional positivo se (a, b)  (0, b) =


(0, 1) e é um racional negativo se (a, b)  (0, b) = (0, 1).

240
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

Teorema 8.9 Seja f : Z → Q uma função definida como f (a) = (a, 1). Então f é
injetora e

1. f (0) = (0, 1) e f (1) = (1, 1).

2. f (a + b) = f (a) + f (b), para todos a, b ∈ Z.

3. f (ab) = f (a)f (b), para todos a, b ∈ Z.

4. a ≤ b se, e somente se, f (a)  f (b), para todos a, b ∈ Z. Conclua que Q é


infinito.

Prova. Fica como um exercício.

O Teorema 8.9 nos permite identificar Z com Im(f ) = {(a, 1) : a ∈ Z}, ou seja,
identificar cada a ∈ Z com sua imagem f (a) = (a, 1) ∈ Q. Assim, denotaremos,
com um abuso de notação, a = (a, 1) e a−1 = (1, a). Além disso,
a
(a, b) = (a, 1) ÷ (1, b) = b−1 a = = a/b
b
é o quociente entre a e b. O conjunto P1 = {b−1 a ∈ Q : ab > 0} chama-se cone
positivo de Q. Neste caso, Q+ = P1 ∪ {0} = {b−1 a ∈ Q : ab ∈ Z+ } é o conjunto
dos números racionais positivos. Pondo −P1 = {−r ∈ Q : r ∈ P1 }, obtemos
Q = −P1 ∪ {0} ∪ P1 uma união disjunta e

Q = {a/b : a, b ∈ Z, com b = 0}.

Observe que o subconjunto P1 de Q possui as seguintes propriedades:

1. b−1 a ∈ P1 se, e somente se, ab ∈ P.

2. r + s, rs ∈ P1 , para todos s, s ∈ P1 .

3. Se r ∈ Q, então exatamente uma e apenas uma das condições pode ocorrer:


−r ∈ P1 ou r = 0 ou r ∈ P1 .

Por exemplo, se b−1 a ∈ Q, então b−1 a = (b−1 )2 ab. Assim, b−1 a ∈ P1 se, e somente
se, ab ∈ P.
Sejam r, s ∈ Q. Diremos que s é maior do que r, em símbolos s > r, se, e
somente se, s − r ∈ P1 . Note que r < s se, e somente se s > r. A notação

241
8.2. Os Números Racionais

r ≤ s, significa que r = s ou r < s. Pelo exposto acima, podemos concluir a


nossa motivação: dados a, b ∈ Q, com a = 0, a equação ax = b, possui uma única
solução x = a−1 b em Q.

Teorema 8.10 Sejam r, s, t ∈ Q. Então:


1. Se r < s e s < t, então r < t.

2. Se r < s, então r + t < s + t.

3. Se 0 < t, então r < s se, e somente se, rt < st.

4. Se 0 > t, então r < s se, e somente se, rt > st.

5. Se r > 0 e s < 0, então rs < 0 e r−1 > 0;

6. Se 0 < r, então r < s se, e somente se, s−1 < r−1 .


Prova. Vamos provar apenas o item (6). Como r−1 − s−1 = (rs)−1 (s − r) temos
que 0 < r < s se, e somente se, s−1 < r−1 .

Seja | | : Q → Q a função definida como



x, se x ≥ 0
|x| =
−x, se x < 0.

A imagem |x| chama-se valor absoluto de x ou, equivalentemente, |x| = max{x, −x}
a qual, pela Lei da Tricotomia, está bem definida.

Teorema 8.11 Sejam a, x, y ∈ Q. Então:


1. Se a ≥ 0, então |x| ≤ a se, e somente se, −a ≤ x ≤ a.

2. |xy| = |x||y|.

3. |x + y| ≤ |x| + |y|. (Desigualdade Triangular)

4. ||x| − |y|| ≤ |x − y|.


Prova. Fica como um exercício.

Geometricamente |x| representa a distância entre 0 e x. Mais geralmente, dados


a, x ∈ Q, a distância entre a e x é definida como

d(a, x) = |x − a|.

242
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

Exercícios
1. Mostre que R = {(a, b) ∈ Q × Q : b − a ≥ 0} é um relação de ordem total
sobre Q.

2. Sejam r, s ∈ Q. Então:

(a) Mostre que −1 · r = −r e se r > 0, então −r < r.


(b) Mostre que −(r + s) = (−r) + (−s).
(c) Mostre que −(−r) = r e (−r)s = −rs = r(−s).
(d) Mostre que se r > 0, então r < r + s.

3. Sejam r, s ∈ Q. Mostre que existem k, m, n ∈ Z, com n > 0, tais que


r = n−1 k e s = n−1 m.

4. Mostre que a ordenação natural de Q é densa e Q não é limitado.

5. Mostre que a ordenação natural de Q satisfaz o Princípio de Arquimedes.

6. Seja r ∈ Q. Mostre que existe um único n ∈ Z tal que n ≤ r < n + 1.

7. Mostre que existe subconjunto não vazio de Q que é limitado inferiormente


(superiormente) sem menor (maior) elemento.

8. Mostre que a relação de ordem < sobre Q pode ser caracterizada como:

a/b < c/d ⇔ abd2 < b2 cd.

8.3 Os Números Reais


No conjunto Q não temos problemas com a divisão, mas surge a impossibilidade
em relação a ordem: Q possui buracos, ou a equação x2 = a não necessariamente
possui solução em Q. Para contornarmos esse problema agiremos como no caso
dos números racionais Q, o qual estendeu todas as operações dos números inteiros
Z.
Já vimos, nos Exemplos 3.9 e 3.40, que o conjunto

E = {x ∈ Q : x < 0 ou x2 < 2}

243
8.3. Os Números Reais

satisfaz as seguintes propriedades:

1. E = ∅ e E ⊂ Q.

2. Se a ∈ E e x ≤ a, então x ∈ E.

3. Não existe maior elemento em E.

Isto motiva a seguinte definição.


Seja E um subconjunto de Q. Diremos que E é um corte de Dedekind à es-
querda em Q se os seguintes axiomas são satisfeitos:

1. E = ∅ e E ⊂ Q.

2. Se a ∈ E e x ≤ a, então x ∈ E (Fechamento à esquerda).

3. Não existe maior elemento em E, ou seja, se a ∈ E, então a < p, para algum


p ∈ E.

O item (2) significa se a ∈ E  , então x < a, para todo x ∈ E. Note, pelo item (3),
que se sup(E) existir, então sup(E) ∈ E. Um corte de Dedekind em Q é um par
ordenado (E, D) de subconjuntos não vazios de Q com as seguintes propriedades:

1. E ∩ D = ∅ e E ∪ D = Q.

2. Se a ∈ E e x ≤ a, então x ∈ E.

3. Se a ∈ D e a ≤ x, então x ∈ D.

4. Não existe maior elemento em E e nem menor elemento em D

Observe que D = E  = Q − E e E é um segmento inicial próprio de Q sem maior


elemento. Portanto, um corte é unicamente determinado pelo par (E, D).
Vamos definir os números reais como os cortes de Dedekind à esquerda em Q e
por R o conjunto dos números reais. Neste caso, se r ∈ Q, então

r = Sr = {x ∈ Q : x < r}

representa o número real determinada por r. É importante ressaltar que um número


real é um corte à esquerda e não uma classe de equivalência de cortes. Vale lembrar
que r = Q − r.

244
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

Exemplo 8.12 (Existência de Cortes) Dado r ∈ Q.

1. Mostre que r = {x ∈ Q : x < r} é um corte à esquerda e limitado superior-


mente, o qual chama-se um “racional.” Conclua que r ∈
/ r e r é um racional

se, e somente se, r possui o menor elemento r.

2. Mostre que E = {x ∈ Q : x ≤ 3−1 } não é um número real.

Solução. (1) Note que ∅ = r ⊂ Q, pois r − 1 ∈ r e 1 + r ∈ / r. Se a ∈ r e x ≤ a,


então a < r e x ≤ a implica que x < r e x ∈ r. Como r ⊂ Q temos que existe
um M ∈ r , de modo que M seja uma cota superior de r. É claro que r é limitado
superiormente por M . Dado a ∈ r, existe um s = 2−1 (a + r) ∈ r tal que a < s < r.
Assim, r não possui maior elemento. Portanto, r é um corte à esquerda.
(2) Basta observar que 3−1 é o maior elemento de E.

Observe que o real r é um conjunto. Assim, devemos descrever as operações


binárias de adição, de multiplicação e de ordem, de modo que o novo conjunto dos
némeros reais R contenha o conjunto dos némeros racionais Q.
Dados r, s ∈ R, definimos a ordem natural (ordenação por inclusão) como:

r ≤ s ⇔ r ⊆ s.

A notação r < s significa que r ≤ s e r = s.

Teorema 8.13 Sejam r, s, t ∈ R.

1. Se p ∈ r e q ∈
/ r, então p < q e se x ∈
/ r e x < y, então y ∈
/ r.

2. Se r ∈ Q, r = {x ∈ Q : x < r} e r < s, então r ∈ s.

3. Se r < s e s < t, então r < s.

Prova. (2) Suponhamos que r < s. Então existe um x ∈ s, com x ∈ / r. Assim,


x ≥ r. Se x = r, acabou. Se x > r, então r ∈ s. Portanto, em qualquer caso, r ∈ s.
(3) Suponhamos que r < s e s < t. Então existe um x ∈ s, com x ∈ / r, e existe
um y ∈ t, com y ∈/ s. Assim, x ∈ s e y ∈
/ s implicam que x < y. Logo, x ∈ t, pois
y ∈ t. Como x ∈/ r temos que r<s.

Teorema 8.14 (Lei da Tricotomia) Dados r, s ∈ R, exatamente uma e apenas


uma das condições pode ocorrer: r < s ou r = s ou r > s.

245
8.3. Os Números Reais

Prova. Suponhamos que r = s, digamos existe um a ∈ r, mas a ∈ / s. Então a ∈ s ,


de modo que x < a, para todo x ∈ s. Assim, x ∈ r. Portanto, s ⊂ r e r > s.

Concluímos do item (2) do Teorema 8.13 e da Lei da Tricotomia, que o par


(R, ≤) é um poset totalmente ordenado. O conjunto P = {r ∈ R : r > 0} chama-se
cone positivo. Diremos que r é negativo se r < 0. Note que 0 < r se, e somente se,
r > 0.
Dados r, s ∈ R, vamos definir a adição como:

r + s = {p + q : p ∈ r e q ∈ s}.

Observe, intuitivamente, que esta operação binária faz sentido, pois ela coincide
sobre Q. Vamos provar que a operação está bem definida, ou seja, é um corte. De
fato, como r = ∅ e s = ∅ temos que existem p ∈ r e q ∈ s tais que p + q − 1 < p + q
implica que p + q − 1 ∈ r + s e r + s = ∅. Note que r + s ⊂ Q, pois a ∈ r e
b ∈ s implicam que x < a, para todo x ∈ r, e y < b, para todo y ∈ s. Assim,
x+y < a+bea+b ∈ / r + s. Dado r ∈ r + s e x ≤ r, obtemos r = p + q,
onde p ∈ r e q ∈ s. Como x ≤ r temos que x − q ≤ p implica que x − q ∈ r e
x = (x − q) + q ∈ r + s. Se s ∈ r + s, então existem p ∈ r e q ∈ s tais que s = p + q.
Como p ∈ r temos que p < t, para algum t ∈ r, de modo que p + q < t + q. Assim,
s < t + q, para algum t + q ∈ r + s. Portanto, r + s não possui maior elemento.

Teorema 8.15 Sejam p, q, r ∈ R. Então:

1. p + (q + r) = (p + q) + r.

2. p + q = q + p.

3. Existe um único 0 ∈ R tal que p + 0 = p.

4. Existe um único x ∈ R tal que p + x = 0, o inverso aditivo de p é denotado


por x = −p.

5. Se q < r, então p + q < p + r. ( Compatibilidade)

Prova. Vamos provar apenas os itens (3), (4) e (5): (3) Se x ∈ p + 0, então existem
p ∈ r e q ∈ 0 tais que x = p + q. Como q < 0 temos que x = p + q < p + 0 = p.
Assim, x ∈ p. Por outro lado, se x ∈ p, então x < y, para algum y ∈ p. Logo,

246
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

x − y ∈ 0. Portanto, x = y + (x − y) ∈ p + 0. Consequentemente, p + 0 = p. Seja


s ∈ R outro tal que p + s = p. Então s = s + 0 = 0 + s = 0.
(4) Seja x = {q ∈ Q : a + q < 0, ∀ a ∈ p}. É importante notar que
x = {−q ∈ Q : q ∈ p, com q = min(p)} (q = min(p) significa −q ∈ x). Então
x ∈ R e p + x = 0. De fato, se a ∈ p , então y < a, para todo y ∈ p, de modo
que −a < −y, para todo y ∈ p. Assim, −a + y < 0 implica que −a ∈ x e x = ∅.
Como y + (−y) = 0, para todo y ∈ p, temos que −y ∈ / x e x ⊂ Q. Dado r ∈ x
e a ≤ r, obtemos a + y ≤ r + y < 0, onde y ∈ p, de modo que a ∈ x (−r ∈ / x
e −r ≤ −a, de modo que −a é um cota superior de p, mas −a = min(p)). Se
s ∈ x, então s + y < 0, para todo y ∈ p. Suponhamos, por absurdo, que exista um
b ∈ p tal que s + b + r ≥ 0, para todo r ∈ Q+ , de modo que b + r ∈ / p, para todo
r ∈ Q+ . Por outro lado, b ∈ p implica que b < c, para algum c ∈ p. Assim, pondo
r = c − b ∈ Q+ , obtemos b + r = c ∈ p, o que é uma contradição. Logo, existe um
r ∈ Q+ tal que s + y + r < 0, para todo y ∈ p. Portanto, s + r ∈ x e s < s + r, ou
seja, x não possui maior elemento. É claro que p + x ⊆ 0. Se a ∈ 0, então a < 0.
Assim, (a − y) + y = a < 0, para todo y ∈ p. Logo, a ∈ x. Portanto, 0 ⊆ p + x.
(5) É fácil verificar que p + q ≤ p + r. Se p + q = p + r, então

q = −p + (p + q) = −p + (p + r) = r.

Portanto, p + q < p + r.

O Teorema 8.15 garante que o terno (R, +, ≤) é um grupo comutativo total-


mente ordenado.

Lema 8.16 Sejam p, q, r ∈ R. Então:

1. Se p + q = p + r, então q = r.

2. A equação p + x = q possui apenas a solução q + (−p). Como usual a


notação q − p = q + (−p) significa a diferença entre q e p.

3. −(−p) = p.

4. p > 0 se, e somente se, −p < 0. Em particular, −0 = 0.

5. −(p + q) = −p − q.

247
8.3. Os Números Reais

6. R = R+ + (−R+ ), com −R+ = {−x : x ∈ R+ }, ou seja, cada real pode ser


escrito como a diferença de dois reais positivos.
Prova. Vamos provar apenas os itens (3), (4), (5) e (6): (3) Como −p + p = 0
temos, pelo item (4) do Teorema 8.15, que p = −(−p).
(4) Observe que p > 0 significa que 0 ∈ p e a > 0, para algum a ∈ p.
Suponhamos, por absurdo, que −p ≥ 0. Então existe um q ∈ −p tal que q > −a.
Assim, a + q > 0 implica que p + (−p) > 0, o que é uma contradição.
Reciprocamente, se −p < 0, então existe um a < 0 tal que q < a, para todo
q ∈ −p. Assim, −a < −q, para todo q ∈ −p, de modo que q + (−a) < 0 implica
que −a ∈ p. Como −a > 0 temos que 0 ∈ p. Portanto, p > 0.
(5) Como

p + q + (−p − q) = (p − p) + (q − q) = 0 + 0 = 0

temos, pelo item (4) do Teorema 8.15, que −p − q = −(p + q).


(6) É claro que R+ + (−R+ ) ⊆ R. Por outro lado, dado p ∈ R, existe um
q = max{0, p} ∈ R+ tal que

p = q − (q − p).

Portanto, R ⊆ R+ + (−R+ ).

Dados r, s ∈ R, com r > 0 e s > 0, vamos definir a multiplicação como:

r · s = {pq : p ∈ r, p > 0, e q ∈ s, q > 0}.

Observe, intuitivamente, que esta operação binária faz sentido, pois ela coincide
sobre Q. Vamos provar que a operação está bem definida, ou seja, é um corte. De
fato, como r = ∅ e s = ∅ temos que existem 0 < p ∈ r e 0 < q ∈ s tais que
pq − 1 < pq implica que pq − 1 ∈ r · s e r · s = ∅. Note que r · s ⊂ Q, pois a ∈ r
e b ∈ s implicam que x < a, para todo 0 < x ∈ r, e y < b, para todo 0 < y ∈ s.
Assim, xy < ab e ab ∈ / r · s. Dado r ∈ r · s e x ≤ r, obtemos r = pq, onde
0 < p ∈ r e 0 < q ∈ s. Como x ≤ r temos que q −1 x ≤ p implica que q −1 x ∈ r
e x = (q −1 x)q ∈ r · s. Se s ∈ r · s, então existem 0 < p ∈ r e 0 < q ∈ s tais que
s = pq. Como p ∈ r temos que p < t, para algum 0 < t ∈ r, de modo que pq < tq.
Assim, s < tq, para algum 0 < tq ∈ r · s. Portanto, r · s não possui maior elemento
e é claro que r · s > 0. Vamos denotar r · s como a justaposição rs.

248
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

Teorema 8.17 Sejam p, q, r ∈ R, com p > 0, q > 0 e r > 0. Então:

1. p(qr) = (pq)r.

2. pq = qp.

3. p(q + r) = pq + pr.

4. Existe um único 1 ∈ R, com 1 = 0, tal que p · 1 = p.

5. Existe um único x ∈ R, com x > 0, tal que p · x = 1, o inverso multiplicativo


de p é denotado por x = p−1 .

6. Se q < r, então pq < pr. ( Compatibilidade)

Prova. Vamos provar apenas os itens (3), (4) e (5): (3) Se x ∈ p(q + r), então
existem 0 < a ∈ p e 0 < b ∈ q + r tais que x = ab. Como b ∈ q + r temos que
existem 0 < c ∈ q e 0 < d ∈ r tais que b = c + d. Assim, 0 < ac, 0 < ad e
x = a(c + d) = ac + ad ∈ pq + pr. Por outro lado, se x ∈ pq + pr, então existem
0 < y ∈ pq e 0 < z ∈ pr tais que x = y + z. Como y ∈ pq e z ∈ pr temos que
existem a, b ∈ p, c ∈ q e d ∈ r tais que y = ac e z = bd. Assim,

x = ac + bd = a(c + (a−1 b)d) = b((b−1 a)c + d) ∈ p(q + r),

pois 0 < a−1 b ≤ 1 ou 0 < b−1 a ≤ 1 implica que (a−1 b)d ≤ d ou (b−1 a)c ≤ c, de
modo que (a−1 b)d ∈ r ou (b−1 a)c ∈ q.
(4) Note que 0 ∈ 1, mas 0 ∈
/ 0. Se x ∈ p·1, então existem 0 < a ∈ p e 0 < b ∈ 1
tais que x = ab. Como b ∈ 1 temos que 0 < b < 1. Assim, x = ab < a, de modo
que x ∈ p. Por outro lado, se x ∈ p, então existe um 0 < a ∈ p tal que x < a.
Assim, x < 2−1 (a + x) < a implica que (2a)−1 (a + x) < 1 e (2a)−1 (a + x) ∈ 1.
Como x < a(2a)−1 (a + x) temos que x ∈ p · 1.
(5) Seja x = {r ∈ Q : ∃ a, b ∈ Q, com a > 0, 0 < b ∈ p, ab < 1 e r < a}.
É importante notar que x = {q −1 ∈ Q : 0 < q ∈ p , com q = min(p )}. Então
x ∈ R e p · x = 1. De fato, p > 0 implica que existe um 0 < b ∈ p. Como
0 · s = 0 < 1, para todo s ∈ Q, temos que 0 ∈ x e x = ∅. Note que x ⊂ Q, pois
existe um 0 < b ∈ p, de modo que b−1 · b = 1 e b−1 ∈ / x. Dado r ∈ x e t ≤ r,
existem a, b ∈ Q tais que 0 < b ∈ p, ab < 1 e r < a. Assim, b < a−1 < r−1 ≤ t−1 ,
de modo que tb < 1 e t ∈ x. Se t ∈ x, então t < a. Logo, t < 2−1 (a + t) < a

249
8.3. Os Números Reais

implica que 2−1 (a + t) ∈ x. Dados s ∈ x, b ∈ p e a ∈ Q, com a > 0 e ab < 1,


obtemos s < a. Assim, bs < ab < 1 e

p · x = {r ∈ Q : r < bs < ab < 1, ∃ a, b, s > 0} = {r ∈ Q : r < 1} = 1,

que é o resultado desejado.

Para definirmos a multiplicação sem qualquer restrição sobre R vamos imitar


a multiplicação sobre Z. Dados u, v ∈ R, existem, pelo item (6) do Lema 8.16,
p, q, r, s ∈ R+ tais que u = q − p e v = s − r:

u · v = pr + qs − ps − qr.

Pode ser provado que esta operação depende somente de u e v e não da particular
diferença. Uma definição alternativa e mais comum é:


⎪ 0, se p = 0 ou q = 0


(−p)(−q), se p < 0 ou q < 0
p·q=

⎪ −((−p)q), se p < 0 ou q > 0

⎩ −(p(−q)), se p > 0 ou q < 0.

Esta operação está bem definida, pois o lado direito é, em qualquer caso, um corte.
Todas as propriedades do Teorema 8.17 podem ser provadas usando o Lema 8.16.
Em particular, a identidade p = −(−p). Por exemplo. para provar o item (3). (a)
Se p < 0 e q + r > 0, então q > 0 ou r > 0. Assim, q > 0 e r > 0 implica que

pr = −[(−p)r] = −[(−p)((q + r) + (−q))] = −[(−p)(q + r) + (−p)(−q)].

Logo, pela definição e os itens (3) e (5) do Lema 8.16,

pr = −(−p)(q + r) − (−p)(−q) = p(q + r) − pq.

Portanto, p(q+r) = pq+pr. Se q > 0 e r ≤ 0, continue! (b) Se p > 0 e q+r < 0,


então

p(q + r) = −[p(−(q + r))] = −[p(−q − r)] = −[−pq − pr] = pq + pr.

Os casos (c) p > 0 e q + r > 0; (d) p < 0 e q + r < 0; (e) p = 0, são análogos.

250
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

É muito importante observar que uma desvantagem da construção de Dedekind


de R é a multiplicação. O conjunto (R, +, ·, ≤) é um corpo ordenado.

Teorema 8.18 (Teorema da Completividade) Qualquer subconjunto não vazio e


limitado superiormente de R possui um supremo.

Prova. Seja S um conjunto de R não vazio e limitado superiormente. Então existe


um c ∈ R tal que r ≤ c, para todo r ∈ S. Assim, s = ∪r∈S r ∈ R. Com efeito,
∅ = s ⊂ Q, pois S = ∅ e existe um x ∈ c tal que x ∈/ r. Se a ∈ s e x ≤ a, então
a ∈ r, para algum r ∈ S, e x ≤ a. Logo, a < r e x ≤ a implica que x < r e x ∈ r,
de modo que x ∈ s. Se a ∈ s, então a ∈ r, para algum r ∈ S, de modo que a < b,
para algum b ∈ r. Portanto, a < b, para algum b ∈ s e s não possui maior elemento.
É claro que s é um cota superior de S. Se r < c, para todo r ∈ S, então s ≤ c.
Consequentemente, s = sup(C).

Teorema 8.19 Seja f : Q → R uma função definida como f (r) = r. Então f é


injetora e

1. f (0) = 0 e f (1) = 1.

2. f (p + q) = f (p) + f (q), para todos p, q ∈ Q.

3. f (pq) = f (p)f (q), para todos p, q ∈ Q.

4. p ≤ q se, e somente se, f (p)  f (q), para todos p, q ∈ Q.

Prova. Vamos provar apenas o item (2). Se x ∈ f (p) + f (q), então existem r ∈ p
e s ∈ q tais que x = r + s, de modo que x = r + s < p + q. Assim, x ∈ f (p + q).
Por outro lado, se x ∈ f (p + q), então x < p + q. Observe que

x−q+p x−p+q
x= + .
2 2
Como 2−1 (x − q + p) < 2−1 (p + p) = p e 2−1 (x − p + q) < 2−1 (q + q) = q temos
que 2−1 (x − q + p) ∈ f (p) e 2−1 (x − p + q) ∈ f (q). Portanto, x ∈ f (p) + f (q).

O Teorema 8.19 nos permite identificar Q com Im(f ) = {p : p ∈ Q}, ou seja,


identificar cada p ∈ Q com sua imagem f (p) = p ∈ R. Assim, denotaremos, com
um abuso de notação, p = p e x = x, para todo x ∈ R.

251
8.3. Os Números Reais

Lema 8.20 Sejam p, q ∈ R. Então:


1. Se p < q, então existe um corte racional r tal que p < r < q, ou seja, Q é um
subconjunto denso em R.

2. r ∈ p se, e somente se, r < p.


Prova. (1) Se p < q, então existe um x ∈ Q tal que x ∈ q, mas x ∈ / p. Como
r = x + 1 > x temos que r ∈ q. Portanto, p < r < q.
(2) Se r ∈ p, então r ∈
/ r. Assim, r < p. Por outro lado, se r < p, então existe
um x ∈ Q tal que x ∈ p, mas x ∈/ r. Portanto, x ≥ r e r ∈ p.

Teorema 8.21 (Teorema de Dedekind) Sejam E e D subconjuntos de R tais que


1. E = ∅ e D = ∅.

2. E ∩ D = ∅ e E ∪ D = R.

3. p ∈ E e q ∈ D implicam que p < q.


Então existe um único m ∈ R tal que

4. x ∈ R e x < m implica que x ∈ E.

5. y ∈ R e m < y implica que y ∈ D.


Note que o número real m é tal que m ∈ E ou m ∈ D, mas não em ambos.
Prova. (Existência) Para algum r ∈ E fixado, seja m = {x ∈ Q : x ∈ r}. Então m
é um corte. De fato, m = ∅, pois E = ∅. Se p ∈ D e q ∈/ p, então q ∈
/ r, para todo
r ∈ E (r<p). Assim, m ⊂ Q. Se p ∈ m e x ≤ p, então p ∈ r e x ≤ p implicam que
x ∈ m. Dado s ∈ m, obtemos s ∈ r. Logo, existe um p ∈ r tal que s < p. Portanto,
p ∈ m e m não possui maior elemento. É claro que p ≤ m, para todo p ∈ E.
(Unicidade) Seja n outro número real que satisfaz a condição. Se m < n, então,
pelo item (1) do Lema 8.20, existe um r tal que m < r < n, de modo que r ∈ D e
r ∈ E, o que é impossível. Portanto, m = n.

Exemplo 8.22 Seja E = {x ∈ Q : x ≤ 0 ou x2 < 2}. Mostre que x ∈ Q .


Solução. Seja D = {x ∈ Q : x > 0 e x2 > 2}. Então já vimos, no Exemplo
3.40, que o par (E, D) satisfaz as condições do Teorema de Dedekind. Assim,

m = 2 existe. Neste caso, m2 = m · m = 2. Portanto, temos a existência números
irracionais, ou seja, R não possui lacunas.

252
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

Exercícios
1. Sejam r, s ∈ R. Mostre que r + s = {x ∈ Q : x < p + q, p ∈ r e q ∈ s}.

2. Sejam r ∈ R e t ∈ Q, com t > 0. Mostre que existem p, q ∈ Q tais que


p ∈ r, q ∈  min(r) e q − p = t.
/ r, q =

3. Seja r ∈ R. Mostre que s = {x ∈ Q : −x < p, para algum p ∈ r } ∈ R.

4. Sejam r, s ∈ R, com s > 0 e s > 0. Mostre que r · s = {x ∈ Q : x <


pq, onde 0 < p ∈ r e 0 < q ∈ s}.

5. Sejam r, s ∈ R. Mostre que rs = 0 se, e somente se r = 0 ou s = 0.

6. Sejam r, s ∈ R. Mostre que (−r)s = −rs = r(−s).

7. Sejam r, s ∈ R, com r = 0. Mostre que a equação r · r = s possui apenas a


solução r−1 s.

8. Mostre que qualquer subconjunto não vazio e limitado inferiormente de R


possui um ínfimo.

9. Mostre que os Teoremas da Completividade e de Dedekind são equivalentes.

8.4 Representação de Números Reais


Um número real pode ser representado de várias maneiras. A mais popular, é a
representação por expansão decimal, ou seja, expressando um número real como
uma série geométrica com base 10. Uma modificação dessa representação está
expressando um número real como uma série geométrica com base d ≥ 2, para
qualquer número natural d ≥ 2 e chama-se representação d-ádica.
Vamos lembar que uma série geométrica de razão 0 < |r| < 1 é definida como

1  ∞
= rn = 1 + r + r2 + · · ·
1 − r n=0

253
8.4. Representação de Números Reais

Observe que se r = d−1 e ak ∈ {0, 1, . . . , d − 1}, então a série geométrica



ak rk = a0 + a1 r + a2 r2 + · · ·
k=0

converge, pelo Teste da Comparação, para um número real, pois ak rk ≤ (d − 1)rk ,


para todo k ∈ ω. O principal problema desta seção é obter a recíproca.

Teorema 8.23 (Princípio de Arquimedes) Sejam a, b ∈ R, com a > 0. Então


existe um n ∈ Z tal que na > b.
Prova. Confira Exemplo 3.39.

Teorema 8.24 Seja x ∈ R. Então existe um único n ∈ Z tal que

n ≤ x < n + 1 e x − 1 < n ≤ x.

Neste caso, obtemos a união disjunta ou partição R = ∪n∈Z [n, n + 1[.


Prova. (Existência) Seja S = {m ∈ ω : m > |x|}. Então, pela Princípio de
Arquimedes, S = ∅. Assim, pelo P BO, S contém um menor elemento, digamos
k ∈ S. Como k − 1 ∈ / S temos que k − 1 ≤ |x| < k. Se x ≥ 0, então, pondo
n = k − 1, obtemos n ≤ x < n + 1. Se x < 0, então, quando x ∈ Z, ponha
n = −k + 1 ou quando x ∈ / Z, ponha n = −k, obtemos n − 1 < x ≤ n ou
n < x ≤ n + 1.
(Unicidade) Suponhamos que exista outro m ∈ Z tal que m ≤ x < m + 1.
Se n < m, então n < m ≤ x < n + 1, o que impossível. De modo inteiramente
análogo, trata o caso m < n. Portanto, m = n.

O inteiro n do Teorema 8.24 chama-se parte inteira de x e denotaremos por


n = x. A função f : R → Z definida como f (x) = x chama-se função maior
inteiro sobre R. Note que x = max{n ∈ Z : n ≤ x}, ou seja, para cada n ∈ Z
fixado, x ∈ ]n − 1, n[ implica que x = n − 1 e

0 ≤ x − x < 1 ou x = x + q, com 0 ≤ q < 1,

em que q chama-se a parte fracionária de x.


Para cada x ∈ R+ , pelo Princípio de Arquimedes, x = a0 + q, onde a0 ∈ ω e
0 ≤ q < 1. Portanto, basta encontrar a representação de q.

254
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

Construímos uma sequência de dígitos ak ∈ {0, 1, . . . , d−1} como segue: sendo


da0 ≤ dx ≤ da0 + (d − 1) e 0 ≤ dq < d, pondo a1 = dq, temos que

dq = a1 + r1 , com 0 ≤ r1 < 1.

Logo,
a1 a1 + 1 a1 r 1
≤q< ⇔q= + .
d d d d
Repetindo este processo com dr1 , teremos dr1 = a2 + r2 , com 0 ≤ r2 < 1, e

a1 a2 a 1 a2 + 1 a1 a2 r2
+ 2 ≤q< + 2
⇔q= + 2 + 2.
d d d d d d d
Prosseguindo com este processo, obtemos

a1 a2 ak a 1 a2 ak + 1
+ 2 + ··· + k ≤ q < + 2 + ··· + .
d d d d d dk
Geometricamente, o processo significa: qualquer número real não inteiro x sobre
a reta está entre dois inteiros consecutivos a0 e a0 + 1. Em seguida dividimos o
intervalo de extremos a0 e a0 + 1 em d partes iguais. Se x não for um dos pontos da
subdivisão, então x deve está entre dois pontos consecutivos da subdivisão, ou seja,

a1 a1 + 1
a0 + < x < a0 + ,
d d
e assim sucessivamente.

Observe que se an = 0, para algum n, então ap = 0, para todo p ≥ n. Assim, o


processo termina e
a1 a2 ak
x = a0 + + 2 + ··· + k
d d d
é finita. Caso contráro, o processo continua indefinidamente e



ak a1 a 2 an
x= = a0 + + 2 + ··· + n + ···
k=0
dk d d d

é uma série geométrica. Estas expressões chamam-se a representação na base d de


x e denotadas por:

x = a0 , a1 a2 · · · ak ou x = a0 , a1 a2 · · · ak · · ·

255
8.4. Representação de Números Reais

É muito importante observar que o conjunto


a1 a2 ak
E = {sk ∈ Q : k ∈ ω} , com sk = a0 + + 2 + ··· + k,
d d d
é não vazio e limitado superiormente. Portanto, x = sup(E) existe. Conse-
quentemente, cada representação na base d determina um número real. Seja q =
0, aaa · · · , com a = d − 1. Então
 
a a a a 1 1 a d
q = + 2 + 3 + ··· = 1 + + 2 + ··· = · = 1,
d d d d d d d d−1

o que é impossível. Portanto, não existe um n0 ∈ ω tal que ak = d − 1, para todo


k ∈ ω, com k > n0 . Em resumo:

Teorema 8.25 Sejam I = [0, 1[ e d ∈ ω, com d ≥ 2. Então para ada x ∈ I existe


uma única sequência (ak )k∈ω em R tal que:

1. 0 ≤ ak < d, para cada k ∈ ω  .

2. Não existe um n0 ∈ ω tal que ak = d − 1, para todo k ∈ ω, com k > n0 .

3. a1 d−1 + · · · + ak d−k ≤ x < a1 d−1 + · · · + (ak + 1)d−k , para cada k ∈ ω  .

Prova. Confira Lema 6.15.

Observe que cada x ∈ R pode ser representado de modo único na base d como



ak
x = ±a0 + ,
k=1
dk

onde o número real negativo possui representação obtida da correspondente repre-


sentação do número real positivo de modo usual.
Note que se a sequência (ak )k∈ω continua indefinidamente, então temos duas
possibilidades. A sequência (ak )k∈ω não possui repetições ou existem k, p ∈ ω,
com p > 0, tais que am+p = am , para todo m ∈ ω, com m > k. Neste caso,
diremos que a representação é eventualmente periódica ou simplesmente periódica,
p é o período e escrevemos

x = a0 , a1 · · · ak ak+1 · · · ak+p ak+1 · · · ak+p · · · = a0 , a1 · · · ak ak+1 · · · ak+p ,

256
Capítulo 8. Construção dos Números Reais

em que y indica a parte que repete-se indefinidamente. Observe que podemos es-
colher k, p ∈ ω mínimos. A representação é simples se p = 1 e é composta se
p > 1.

Teorema 8.26 Seja x ∈ R, com x > 0. Então a representação de x é finita ou


periódica se, e somente se, x ∈ Q.

Prova. Se x = a0 , a1 · · · ak 0 = a0 + a1 d−1 + · · · + ak d−k ∈ Q. Por outro lado, se


x = a0 , a1 · · · ak ak+1 · · · ak+p , então pondo y = a0 , a1 · · · ak e z = 0, ak+1 · · · ak+p ,
obtemos y, z ∈ Q e

z dp
ak+1 · · · ak+p = , a k+1 · · · a k+p ⇒ a k+1 · · · a k+p = z.
dp dp − 1

Portanto, x = y + (dp − 1)−1 dp z ∈ Q.


Reciprocamente, se x ∈ Q, digamos x = b−1 a, com a > 0 e b > 0, então, pelo
Algoritmo da Divisão, x = a0 + q, onde a0 ∈ ω e 0 ≤ q = b−1 r0 < 1. Assim,

dq = a1 + b−1 r1 , com 0 ≤ b−1 r1 < 1.

Em geral, para cada k ∈ ω  , obtemos

db−1 rk−1 = ak + b−1 rk , com 0 ≤ b−1 rk < 1.

Mas isto é exatamente o Algoritmo Euclidiano:

drk−1 = ak b + rk , com 0 ≤ rk < b, k = 1, 2, . . .

Observe que ak ∈ {0, 1, . . . , d − 1}, pois 0 ≤ rk−1 < b implica que

0 ≤ drk−1 < db ⇒ 0 ≤ ak b + rk < db ⇒ 0 ≤ ak b < db − rk ≤ (d − 1)b,

de modo que 0 ≤ ak ≤ d − 1. Se rk = 0, para algum k, então rn = 0, para todo


n ≥ k, e
a1 ak
x = a0 + + · · · + k = a0 , a1 · · · ak 0.
d d
Caso contrário, a sequência (rk )k∈ω deve conter repetições, pois rk ∈ {0, . . . , b−1}.
Seja rn o primeiro resto que repete-se. Então existe um k ∈ ω, com n > k, tal que
rn = rk+1 . Como o quociente e o resto da divisão drn e drk+1 por b são os mesmos

257
8.4. Representação de Números Reais

temos que an+1 = ak+2 , an+2 = ak+3 , . . . Portanto,

x == a0 , a1 · · · ak ak+1 · · · an .

Sendo n > k, existe um único p ∈ ω, com p > 0, tal que n = k + p. Neste caso, p
é o período e p ≤ |b|.

Corolário 8.27 Seja x ∈ R, com x > 0. Então a representação de x não possui


repetições se, e somente se, x é irracional.
Prova. Fica como um exercício.

É importante notar que


a ak+p   ak+1 ak+p 
k+1
ak+1 · · · ak+p = k+1 + · · · + k+p + k+p+1 + · · · + k+2p + · · ·
d d d d
ou seja,
 
ak+1 ak+p 1 1
ak+1 · · · ak+p = k+1 + · · · + k+p 1 + p + 2p + · · · .
d d d d

Por exemplo, se d = 10 e x = 7−1 , então a0 = 0 e q = x. Assim,

10 · 1 = 1 · 7 + 3, com a1 = 1 e r1 =3
10 · 3 = 4 · 7 + 2, com a2 = 4 e r2 =2
10 · 2 = 2 · 7 + 6, com a3 = 2 e r3 =6
10 · 6 = 8 · 7 + 4, com a4 = 8 e r4 =4
10 · 4 = 5 · 7 + 5, com a5 = 5 e r5 =5
10 · 5 = 7 · 7 + 1, com a6 = 7 e r6 =1
10 · 1 = 1 · 7 + 3, com a7 = 1 = a1 e r7 = 3 = r 1
..
.

Portanto,
1
= 0, 142857142857 · · · = 0, 142857.
7

258
BIBLIOGRAFIA

[1] Bourbaki, N. - Theory of Sets, Addison-Wesley, 1968.

[2] Da Costa, N. C. A. - Introdução aos Fundamentos da Matemática, Editora


Hucitec, 1977.

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[4] Halmos, P. R. - Naive Set Theory, Princeton, N. J., Van Nostrand, 1960.

[5] Hamilton, A. G. - Numbers, Sets and Axioms the Apparatus of Mathematics,


Cambridge University Press, 1982.

[6] Hrbacek, K. and Jech, T. - Introduction to Set Theory, 3rd ed., Marcel Dek-
ker, 1999.

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York, 1951.

[8] Lipschutz, S. - Teoria dos Conjuntos, Coleção Schaum, McGraw-Hill, 1978.

[9] Mac Lane, S. and Birkhoff, G. Algebra, 3th ed., Macmillan Company, New
York, 1968.

[10] Pinter, C. C. - Set Theory, Addison-Wesley, 1971.

[11] Silva, A. de A. e - Notas de Aula, Departamento de Matemática, Campus I,


UFPB.

259
B IBLIOGRAFIA

[12] Suppes, P. - Axiomatic Set Theory, Dover Publications, Inc, New York, 1972.

[13] Tarski, A. Introduction to Logic and to the Methodology of the Deductive


Sciences, 4th ed., Oxford University Press, 1994.

[14] Wilder, R. L. - Introduction to the Foundation of Mathematics, John Wiley


& Sons, 1965.

260
RESPOSTAS E SUGESTÕES

Capítulo 1
É importante observar que os exercícios deste Capítulo constam de dois objetos:
Um conjunto de “pontos” P , um conjunto de “retas” R formado de subconjuntos
de P e uma ou mais “operações” sobre P .

Seção 1.2
1. (a) Suponhamos que exista outro vetor 0 ∈ V tal que u + 0 = u, para todo
u ∈ V . Então, pelo axioma V3 , obtemos 0 = 0 + 0 = 0 . (e) Pelo axioma V3 ,
u + 0 = u, para todo u ∈ V . Em particular, 0 + 0 = 0. Logo, pelos axiomas V6
e V9 , obtemos a0 = a(0 + 0) = a0 + a0. Portanto, pelo item (a), a0 = 0. (g) Se
a = 0, nada há para ser provado. Se a = 0, então, pelos axiomas V7 , V10 , F10 e pelo
item (e), obtemos

u = 1u = (a−1 a)u = a−1 (au) = a−1 0 = 0.

Se u = 0, então necessariamente a = 0. Caso contrário, o raciocínio acima implica


que u = 0, o que é impossível. 2. É fácil verificar que C munido com as operações

+ : C × C −→ C · : R × C −→ C
e
(z, w) −→ z + w (a, z) −→ a · z

satisfaz o sistema de axiomas V, pois R é um subcorpo de C e essas operações já


existem de modo natural em C. 3. (c) É claro que x0 = a−1 · b é uma solução da

261
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

equação a · x = b, pois pelos axiomas G2 , G4 e G3 , obtemos

a · x0 = a · (a−1 · b) = (a · a−1 ) · b = e · b = b.

Se x1 é outra solução da equação a · x = b, então, pelos axiomas G3 , G4 e G2 ,


obtemos

x1 = e · x1 = (a−1 · a) · x1 = a−1 · (a · x1 ) = a−1 · b = x0 .

A unicidade segue de modo inteiramente análogo. 4. Dados A, B ∈ GL2 (R).


Então, pelo Teorema de Binet-Cauchy, obtemos

det(AB) = det(A) det(B) = 0.

Logo, AB ∈ GL2 (R), isto é, o produto usual de matrizes satisfaz o axioma G1 .


É claro que essa operação satisfaz o axioma G2 e a matriz identidade I2 satisfaz o
axioma G3 . Se A ∈ M2 (R) é tal que det(A) = 0, então, depois de alguns cálculos,
obtemos
   
−1 1 a22 −a12 a11 a12
A = , em que A = .
det(A) −a21 a11 a21 a22

Como det(A−1 ) = det(A)−1 = 0 temos que

A−1 ∈ GL2 (R) e AA−1 = A−1 A = I2 ,

ou seja, GL2 (R) satisfaz o axioma G4 .

Seção 1.3
1. Seja F13 o axioma: “K possui no máximo dois elementos.” Então F13 = ¬F9
e (F − F9 ) + F13 é um sistema de axiomas satisfatório. De fato, o conjunto K =
Z2 = {0, 1}, com as operações binárias definidas via tabelas:

⊕ 0 1 " 0 1
0 0 1 e 0 0 0
1 1 1 1 0 1

é uma interpretação para (F −F9 )+F13 . Portanto, (F −F9 )+F13 é satisfatório e F9

262
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

é independente em F. Note que para provar que Z2 satisfaz a maioria dos axiomas
de F = (K, ⊕, "), basta verificar que a função f : Z → Z2 definida como

0, se n par
f (n) =
1, se n ímpar

é sobrejetora e satisfaz as propriedades

f (m + n) = f (m) ⊕ f (n) e f (m · n) = f (m) " f (n).

Por exemplo, m + n é par se m, n são ambos pares ou ímpares. Caso contrário,


m + n é ímpar. Assim, f (m + n) = 0 = 0 ⊕ 0 = 1 ⊕ 1 = f (m) ⊕ f (n) ou
f (m + n) = 1 = 0 ⊕ 1 = 1 ⊕ 0 = f (m) ⊕ f (n). O corpo Z2 nos fornece
um modelo analítico e finito para o sistema de axiomas E = (P, R), em que P =
{A, B, C, D} = {(0, 0), (1, 0), (0, 1), (1, 1)} = {(x, y) : x, y ∈ Z2 } e

R = {ax + by = c : a, b, c ∈ Z2 , com a = 0 ou b = 0}.

Note que as retas são: AB : y = 0, AC : x = 0, AD : x + y = 0, BC : x + y = 1,


BD : x = 1 e CD : y = 1. 2. (a) Use o mesmo argumento do Exemplo 1.28 para
provar que o axioma V5 não é independente. (b) Seja V11 o axioma: “existe u ∈ V
tal que 1 · u = u.” Então V11 = ¬V10 e (V − V10 ) + V11 é um sistema de axiomas
satisfatório. De fato, o conjunto V = R2 munido com as operações de adição e
multiplicação por escalar

u + v = (x1 + y1 , x2 + y2 ) e a · u = (ax1 , 0),

para todos u = (x1 , x2 ), v = (y1 , y2 ) ∈ V e a ∈ R, é uma interpretação para


(V − V10 ) + V11 . Portanto, (V − V10 ) + V11 é satisfatório e V10 é independente em
V = (V, +, ·). 3. (a) É fácil verificar que R∗ munido com a operação binária ·:

· : R∗ × R∗ −→ R∗ + : Q × Q −→ Q
e
(a, b) −→ a · b (a, b) −→ a + b

satisfaz o sistema de axiomas G = (G, ·). (b) Novamente, é fácil verificar que Q
munido com a operação binária + satisfaz o sistema de axiomas G = (G, +). (c)
O sistema de axiomas G é consistente, pois o item (a) e/ou (b) serve como uma

263
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

interpretação para G. (d) Não, os modelos M (R∗ ) e M (Q) não são isomorfos.
(e) Vamos provar apenas que os axiomas G2 e G4 são independentes. Seja G5 o
axioma: “existem a, b, c ∈ G tais que a · (b · c) = (a · b) · c.” Então G5 = ¬G2 e
(G − G2 ) + G5 é um sistema de axiomas satisfatório, pois o conjunto

G = {±1, ±i, ±j, ±k, ±l, ±il, ±jl, ±kl}

com a operação · sobre G definida via tabela

· 1 i j k l il jl kl
1 1 i j k l il jl kl
i i −1 k −j il −l −kl jl
j j −k −1 i jl kl −l il
k k j −i −1 kl −jl il −l
l l −il −jl −kl −1 i j k
il il l −kl jl −i −1 −k j
jl jl kl l −il −j k −1 −i
kl kl −jl il l −k −j i −1

é uma interpretação para (G − G2 ) + G5 . Por exemplo, se a = l, b = il e c = jl,


então

a(bc) = l(−k) = kl e (ab)c = i(jl) = −kl ⇒ a(bc) = (ab)c.

Portanto, (G − G2 ) + G5 é satisfatório e G2 é independente em G = (G, ·). Seja


G6 o axioma: “para algum a ∈ G, a = e, não existe um a−1 ∈ G tal que a · a−1 =
a−1 ·a = e.” Então G6 = ¬G4 e (G −G4 )+G6 é um sistema de axiomas satisfatório,
pois o conjunto dos números inteiros Z∗ , com a operação usual de multiplicação, é
uma interpretação para (G − G4 ) + G6 . Portanto, (G − G4 ) + G6 é satisfatório e
G4 é independente em G = (G, ·). 4. (c) Vamos provar apenas que o axioma A7 é
independente. Seja A9 o axioma: “existem a, b, c ∈ A tais que a · (b · c) = (a · b) · c.
Então A9 = ¬A7 e (A − A7 ) + A9 é um sistema de axiomas satisfatório, pois o
conjunto S = {A ∈ M2 (R) : At = A}, com a soma usual e a multiplicação · sobre
S definida como
1
A · B = (AB + BA)
2
é uma interpretação para (A−A7 )+A9 . Portanto, (A−A7 )+A9 é satisfatório e A7 é

264
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

independente em A = (A, +, ·). (f ) Não é completo, pois se A9 é o axioma: “a·b =


b · a, para todos a, b ∈ A”, então A + A9 e A + (¬A9 ) são satisfatórios, um vez que,
o primeiro admite a interpretação do item (a) e o segundo admite a interpretação do
item (b). 5. (e) Vamos provar apenas que o axioma R1 é independente. Seja R4 o
axioma: “existe um x ∈ X tal que x não está relacionado com x, isto é, rxx = 0”.
R4 = ¬R1 e (R − R1 ) + R4 é um sistema de axiomas satisfatório, pois o conjunto
X = {1, 2, 3}, com a relação binária
⎛ ⎞
1 1 1
R = (rij ) = ⎝ 1 1 1 ⎠ ,
1 1 0

é uma interpretação para (R − R1 ) + R4 . Portanto, (R − R1 ) + R4 é satisfatório


e R1 é independente em R = (X, R). 6. (e) Vamos provar apenas que o axioma
P2 é independente. Seja P4 o axioma: “existem x, y ∈ X tais que xPy e yPx, mas
x = y.” Então P4 = ¬P2 e (P − P2 ) + P4 é um sistema de axiomas satisfatório,
pois o conjunto X = Z, com a relação binária xP y se, e somente se, x divide y,
é uma interpretação para (P − P2 ) + P4 . Neste caso, x divide −x e −x divide
x, mas x = −x. Portanto, (P − P2 ) + P4 é satisfatório e P2 é independente em
P = (X, P ). 7. Vamos provar apenas o item (a). Se x ≺ y e y ≺ x, então,
pelo axioma S3 , obtemos x ≺ x, o que impossível. 8. (a) Seja I o conjunto dos
intervalos abertos de R. É claro que ∅, R ∈ T . Seja

J= Iλ
λ∈Λ

uma união qualquer de intervalos abertos de I. Então devemos provar que J é um


intervalo aberto, ou seja, dado x ∈ J, existe  > 0 tal que

x ∈ (x − , x + ) ⊆ J.

Dado x ∈ J, existe λ ∈ Λ tal que x ∈ Iλ . Como Iλ é um intervalo aberto temos que


existe  > 0 tal que
x ∈ (x − , x + ) ⊆ Iλ .
Portanto,
x ∈ (x − , x + ) ⊆ Iλ ⊆ J

265
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

e J ∈ T . Finalmente, dados intervalos abertos I1 e I2 de I. Então devemos provar


que I1 ∩ I2 é um intervalo aberto. Dado x ∈ I1 ∩ I2 , obtemos x ∈ I1 e x ∈ I2 .
Assim, existem 1 > 0 e 2 > 0 tais que

x ∈ (x − 1 , x + 1 ) ⊆ I1 e x ∈ (x − 2 , x + 2 ) ⊆ I2 .

Pondo  = min{1 , 2 }, obtemos

x ∈ (x − , x + ) ⊆ I1 ∩ I2 .

Portanto, I1 ∩ I2 ∈ T , ou seja, I é um modelo para T . (b) Verificação direta de


união e interseção de conjuntos. (c) Sim, pois o item (a) e/ou (b) é um modelo. (d)
Não, os modelos M (I) e M (B) não são isomorfos.

Capítulo 2
Seção 2.2
1. Pelo item (a), obtemos A ∪ B ⊆ X. Por outro lado, pondo Y = A ∪ B, temos,
pelo item (2) do Teorema 2.3, que A ⊆ Y e B ⊆ Y . Assim, pelo item (b), teremos
X ⊆ Y = A ∪ B. Portanto, X = A ∪ B. 2. Sejam A, B subconjuntos de U e X
um subconjunto de U com as seguintes propriedades: (a) X ⊆ A e X ⊆ B. (b) Se
Y ⊆ A e Y ⊆ B, então Y ⊆ X, para todo Y ⊆ U . Mostre que X = A ∩ B. Agora,
faça a prova. 3. Vamos provar apenas o item (a).

∀ x [x ∈ A ∪ C ⇒ x ∈ A ou x ∈ C
⇒ x ∈ B ou x ∈ D ⇒ x ∈ B ∪ D].

Portanto, (A ∪ C) ⊆ (B ∪ D). 4. Vamos provar apenas o item (j).

∀ x [x ∈ A ∩ (B − C) ⇔ x ∈ A e x ∈ (B − C)
⇔ x∈A e x∈B e x∈ /C
⇔ x∈A∩B e x∈ / A∩C
⇔ x ∈ (A ∩ B) − (C ∩ A)].
Portanto, A ∩ (B − C) = (A ∩ B) − (C ∩ A). 5. Vamos provar apenas o item (a).

∀ x [x ∈ A ∪ B ⇔ x ∈ A ou x ∈ B
⇔ x ∈ A ou x ∈ (B − A)
⇔ x ∈ A ∪ (B − A)].

266
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Portanto, A ∪ B = A ∪ (B − A). Note que

∀ x [x ∈ A ∩ (B − A) ⇒ x ∈ A e x ∈ B − A
⇒ x∈A e x∈ / A],

o que é impossível. Portanto, A ∩ (B − A) = ∅. 6. Vamos provar apenas os itens


(f ) e (g): (f ) Pelos itens ((6), (7) e (8) do Teorema 2.3, obtemos

(A + B) = [(A ∩ B  ) ∪ (A ∩ B)]


= (A ∩ B  ) ∩ (A ∩ B)
= (A ∪ B) ∩ (A ∪ B  )
= (A ∩ B) ∪ (A ∩ B  ).

(g) Novamente, pelos itens (7) e (8) do Teorema 2.3 e o item (f ), teremos

A + (B + C) = (A ∩ (B + C) ) ∪ (A ∩ (B + C))


= (A ∩ [(B ∩ C) ∪ (B  ∩ C  )])
∪(A ∩ [(B ∩ C  ) ∪ (B  ∩ C)])
= (A ∩ B ∩ C) ∪ (A ∩ B  ∩ C  )
∪(A ∩ B ∩ C  ) ∪ (A ∩ B  ∩ C).

Como esta expressão é simétrica em relação A, B e C temos, pelo item (d), que

A + (B + C) = C + (A + B) = (A + B) + C.

Uma solução gráfica do item (g), confira Figura 8.1. Note que A = {1, 2, 4, 5},

Figura 8.1: Solução Gráfica do item (g).

B = {2, 3, 5, 6} e C = {4, 5, 6, 7}. Assim, A + B = {1, 3, 4, 6} e B + C =


{2, 3, 4, 7}. Portanto, A + (B + C) = {1, 3, 5, 7} = (A + B) + C. 7. É claro, pelo
axioma ZF2 , que R é um conjunto e que R ∈ / A, pois R ∈ R ou R ∈ / R. 8. (a)

267
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Como a afirmação x ∈ ∅ é sempre falsa temos que a condição

∀ A ∀ x [x ∈ ∅ ⇒ x ∈ A],

é sempre verdadeira. Portanto, ∅ ⊆ A, para todo conjunto A. (b) Se B ⊆ A,


para todo conjunto A, então, em particular, B ⊆ ∅. Portanto, pela unicidade de ∅,
obtemos B = ∅.

Seção 2.3

1. Basta observar a relação entre elemento e conjunto. 2. Vamos provar apenas o


item (e).

∀ (x, y) [(x, y) ∈ (B × A) ∩ (C × A )
⇒ (x, y) ∈ B × A e (x, y) ∈ C × A
⇒ y∈A e y∈ / A],

o que é impossível. Portanto, (B × A) ∩ (C × A ) = ∅. 3. Vamos provar apenas o


item (b).

∀ (x, y) [(x, y) ∈ H ◦ G ⇒ ∃ z tal que (x, z) ∈ G e (z, y) ∈ H


⇒ (x, z) ∈ A × B e (z, y) ∈ B × C
⇒ x∈A e y∈C
⇒ (x, y) ∈ A × C].

Portanto, H ◦ G ⊆ A × C. 3. Vamos provar apenas o item (a).

∀ (x, y) [(x, y) ∈ G|B ⇔ (x, y) ∈ G e x ∈ B


⇔ (x, y) ∈ G e (x, y) ∈ B × Im(G)
⇔ (x, y) ∈ G ∩ (B × Im(G))].

Portanto, G|B = G ∩ (B × Im(G)). 5. Note que

∀ (x, y) [(x, y) ∈ G−1 ⇒ (y, x) ∈ G


⇒ (y, x) ∈ Im(G) × Dom(G)].

Assim, G−1 ⊆ Im(G) × Dom(G). Portanto, pelo axioma ZF4 , G−1 é um conjunto.
6. Observe que A − B = A ∩ B  ⊆ A. Portanto, pelo axioma ZF4 , A − B é um

268
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

conjunto. 7. Vamos provar apenas o item (a).

∀ x [x ∈ ∪i∈I Ai ⇒ ∃ i ∈ I tal que x ∈ Ai ⇒ x ∈ B]

pois Ai ⊆ B, para todo i ∈ I. Portanto, ∪i∈I Ai ⊆ B. 8. Pelo itens (a) e (b) do


Exercício (7), obtemos X ⊆ ∩i∈I Ai . Por outro lado, pondo Y = ∩i∈I Ai , temos,
pelo item (3) do Teorema 2.3, que Y ⊆ Ai , para todo i ∈ I. Assim, pelo item (b),
obtemos Y ⊆ X. Portanto, X = ∩i∈I Ai . 9. Confira o Exercício (1) da Seção 2.2.
10. Vamos provar apenas o item (b).

∀ x [x ∈ (∩i∈I Ai ) ⇔ x ∈
/ ∩i∈I Ai ⇔ ∃ i ∈ I tal que x ∈
/ Ai
 
⇔ ∃ i ∈ I tal que x ∈ Ai ⇔ x ∈ ∪i∈I Ai ].

11. Vamos provar apenas o item (d).



∀ (x, y) [(x, y) ∈ (∪i∈I Ai ) × (∪j∈J Bj ) ⇔ x ∈ Ai e y ∈ Bj
i∈I j∈J
⇔ ∃ i0 ∈ I tal que x ∈ Ai0 e ∃ j0 ∈ J tal que y ∈ Bj0
⇔ ∃ (i0 , j0 ) ∈ I × J tal que (x, y) ∈ Ai0 × Bj0
⇔ (x, y) ∈ ∪(i,j)∈I×J (Ai × Bj )].

12. Vamos provar apenas o item (a).

∀ X [X ∈ ∪i∈I P(Ai ) ⇒ ∃ i ∈ I tal que X ∈ P(Ai )


⇒ ∃ i ∈ I tal que X ⊆ Ai ⇒ X ⊆ ∪i∈I Ai
⇒ X ∈ P(∪i∈I Ai )].

Note que se A1 = {1} e A2 = {a, b}, então P(A1 ) ∪ P(A2 ) ⊂ P(A1 ∪ A2 ). 13.
Vamos provar apenas o item (c).

∀ X [X ∈ P(A) ∩ P(B) ⇒ X ∈ P(A) e X ∈ P(B)


⇒ X ⊆ A e X ⊆ B ⇒ X ⊆ A ∩ B = ∅],

o que é impossível. Portanto, P(A) ∩ P(B) = {∅}. Reciprocamente,

∀ x [x ∈ A ∩ B ⇒ x ∈ A e x ∈ B ⇒ {x} ⊆ A e {x} ⊆ B
⇒ {x} ∈ P(A) ∩ P(B) = {∅}],

o que é impossível. Portanto, A ∩ B = ∅. 14. Note que P(P(∅)) = P({∅}) =

269
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

{∅, {∅}} e P(P(P(∅))) = {∅, {∅}, {{∅}}, {∅, {∅}}}.

Seção 2.4
1. Vamos provar apenas o item (d). Como ∩i∈I Ci ⊆ Ci , para todo i ∈ I, temos
que f (∩i∈I Ci ) ⊆ f (Ci ), para todo i ∈ I. Portanto, f (∩i∈I Ci ) ⊆ ∩i∈I f (Ci ).
Como f é injetora temos que f = i ◦ g, em que i : f (A) → B é a função inclusão e
g : A → f (A) é uma função bijetora. Seja h a inversa de g. Então f (X) = h−1 (X),
para todo X ⊆ A. Portanto, pelo item (b), obtemos

f (∩i∈I Ci ) = h−1 (∩i∈I Ci ) = ∩i∈I h−1 (Ci ) = ∩i∈I f (Ci ).



2. Confira o item (a) do Exercício (5) da Seção 2.2. 3. Note que se f ∈ i∈I Bi ,
então f : I → ∪i∈I Bi é uma função tal que f (i) ∈ Bi , para todo i ∈ I. Como

Bi ⊆ Ai temos que f (i) ∈ Ai , para todo i ∈ I. Portanto, f ∈ i∈I Ai , ou seja,

B ⊆ A . 4. Como p ( i∈I Ai ) ⊆ A , para todo j ∈ I, temos que
i∈I i
−1
i∈I i j
j −1
i∈I Ai ⊆ pj (Aj ), para todo j ∈ I, ou seja, i∈I Ai ⊆ ∩i∈I pi (Ai ). Por outro
lado, dado f ∈ ∩i∈I p−1 i (Ai ), obtemos

f ∈ p−1 i (A i ) = {g ∈ Bi : pi (g) ∈ Ai }, ∀ i ∈ I.
i∈I

Assim, pi (f ) ∈ Ai , para todo i ∈ I. Portanto, f = (pi (f ))i∈I ∈ i∈I Ai . Conse-

quentemente, ∩i∈I p−1i (Ai ) ⊆ i∈I Ai . 5. Para qualquer x ∈ A, existe um i ∈ I e
j ∈ J tal que x ∈ Ai e x ∈ Bj . Assim, existe um (i, j) ∈ I × J tal que x ∈ Ai ∩ Bj ,
ou seja, x ∈ ∪(i,j)∈I×J (Ai ∩ Bj ). Portanto, A ⊆ ∪(i,j)∈I×J (Ai ∩ Bj ). 6. Como
Ai = ∅, para todo i ∈ I, e Bj = ∅, para todo j ∈ J, temos que Ai × Bj = ∅, para
todo (i, j) ∈ I × J. Pelo item (d) do Exercício (11) da Seção 2.3, obtemos

A × B = (∪i∈I Ai ) × (∪j∈J Bj ) = ∪(i,j)∈I×J (Ai × Bj ).

Finalmente, se (x, y) ∈ (Ai × Bj ) ∩ (Ak × Bl ), então (x, y) ∈ (Ai × Bj ) (x, y) ∈


(Ak × Bl ). Logo, x ∈ Ai ∩ Ak e y ∈ Bj ∩ Bl , ou seja, Ai × Bj = Ak ∩ Bl . Portanto,
a família {Ai × Bj }(i,j)∈I×J é uma partição de A × B. 7. Como Bj = ∅, para todo
j ∈ J, e f é sobrejetora temos que

f −1 (Bj ) = {x ∈ A : f (x) ∈ Bj } =
 ∅, ∀ j ∈ J.

Sendo f −1 (Bj ) ⊆ A, para todo j ∈ J, obtemos ∪j∈J f −1 (Bj ) ⊆ A. Por outro lado,

270
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

para qualquer x ∈ A, temos, pelo item (b) do Exercício (1), que

f (x) ∈ f (A) = B = ∪j∈J Bj ⇒ x ∈ f −1 (∪j∈J Bj ) = ∪j∈J f −1 (Bj ).

ou seja, A ⊆ ∪j∈J f −1 (Bj ). Se x ∈ f −1 (Bj ) ∩ f −1 (Bk ), então f (x) ∈ Bj e


f (x) ∈ Bk . Logo, Bj = Bk , isto é, f −1 (Bj ) = f −1 (Bk ). Portanto, {f −1 (Bj )}j∈J
é uma partição de A. 8. Veja a prova do Exercício (7). 9. Sejam A um conjunto
qualquer, P (x) uma afirmação especificada pelo axioma ZF2 e C = {x : P (x)}.
Então a função I : C → C definida como I(x) = x é tal que a fórmula

F (x, y) := P (x) ∧ x = y

é verdadeira. Assim, pelo axioma ZF7 ,

D = {y : ∃ x ∈ A ∧ F (x, y)}

é um conjunto tal que D = {x ∈ A : P (x)} do axioma ZF2 . 10. Sejam A e B


conjuntos. Então, pelo axioma ZF5 , A ∪ B é um conjunto. É fácil verificar que a
função f : A ∪ B → {A, B} definida como


⎪ A, se x ∈ A − B e A ⊂ B


B, se x ∈/ A − B e A ⊂ B
f (x) =

⎪ B, se x ∈ B − A e A ⊂ B

⎩ A, se x ∈ / B−A e A⊂B

é sobrejetora. Portanto, pelo axioma ZF7 , {A, B} é um conjunto. 11. Para qual-
quer a ∈ A fixado, a função fa : B → Ba definida como fa (y) = (a, y), em
que
Ba = {(a, y) : y ∈ B} = {a} × B,
é claramente bijetora. Assim, pelo axioma ZF7 , Ba é um conjunto, para todo a ∈ A.
Como A × B = ∪a∈A Ba temos, pelo axioma ZF5 , que A × B é um conjunto. O
conjunto Ba chama-se faixa vertical. 12. Sejam A e B conjuntos. Então, pelo
Exercício (11), A × B é um conjunto. Assim, pelo axioma ZF6 , P(A × B) é um
conjunto. Como B A é uma subclasse de P(A×B) temos, pelo axioma ZF4 , que B A
é um conjunto. 13. Vamos provar apenas o item (a). Para qualquer f ∈ AC ∪ B C ,
obtemos f ∈ AC ou f ∈ B C , ou seja, f é uma função de C em A ou f é uma função

271
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

de C em B. Como A ⊆ A ∪ B e B ⊆ A ∪ B temos, pelo Corolário 2.22, que f é


uma função de C em A ∪ B. Logo, f ∈ (A ∪ B)C . Portanto, AC ∪ B C ⊆ (A ∪ B)C .
14. É fácil verificar que R é uma relação de equivalência sobre A e que

f −1 (b) = {x ∈ A : b = f (x)} =
 ∅, ∀ b ∈ B,

pois B = Im(f ). Assim, se b ∈ Im(f ), então existe um x ∈ A tal que b = f (x).


Logo,

f −1 (b) = f −1 (f (x)) = {y ∈ A : f (x) = f (y)} = {y ∈ A : xRy} = x.

Portanto, as classes de equivalências são as imagens inversas de f . Neste caso,


{f −1 (b)}b∈B é uma partição de A e o subconjunto f −1 (b) chama-se fibra sobre
o elemento b ∈ Im(f ). 15. Note que dados x, y ∈ A, xRy se, e somente se,
f (x) = f (y) se, e somente se, y = (f −1 ◦ f )(x). Assim,

∀ (x, y) [(x, y) ∈ R ⇔ xRy ⇔ y = (f −1 ◦ f )(x) ⇔ (x, y) ∈ (f −1 ◦ f )],

ou seja, R = f −1 ◦ f . Suponhamos que f ◦ f = f , então

∀ y [ y ∈ x ⇒ f (x) = f (y) ⇒ f (x) = (f ◦ f )(y) = f (f (y))


⇒ x = (f −1 ◦ f )(f (y)) ⇒ f (y) ∈ x].

Reciprocamente, dado x ∈ A, obtemos

x ∈ x ⇒ f (x) ∈ x = (f −1 ◦ f )(x) ⇒ (f ◦ f )(x) = f (x).

Portanto, f ◦ f = f . 16. Dados f, g, h ∈ A. É claro que f ∼ f e se f ∼ g, então


g ∼ f . Agora, se f ∼ g e g ∼ h, então os conjuntos

S1 = {n ∈ N : f (n) = g(n)} e S2 = {n ∈ N : g(n) = h(n)}

são finitos. Neste caso, se f (n) = h(n), então f (n) = g(n) ou f (n) = g(n) e
g(n) = h(n). Logo,

S = {n ∈ N : f (n) = h(n)} ⊆ S1 ∪ S2

é um conjunto finito. Assim, f ∼ h. Portanto, ∼ é uma relação de equivalência

272
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

sobre A. 17. Pondo R = ∩i∈I Ri . Para quaisquer x, y, z ∈ A, obtemos xRi x, para


todo i ∈ I. Assim, xRx. Se (x, y) ∈ R, então xRi y, para todo i ∈ I. Como yRi x,
para todo i ∈ I, temos que (y, x) ∈ R, ou seja, se xRy, então yRx. Finalmente,
se (x, y) ∈ R e (y, z) ∈ R, então xRi y e yRi z, para todo i ∈ I. Logo, xRi z,
para todo i ∈ I. Portanto, xRz, isto é, R é uma relação de equivalência sobre A.
18. Para quaisquer X, Y, Z ∈ P(B). É claro que XRX e se XRY , então Y RX.
Finalmente, se XRY e Y RZ, então A ∩ X = A ∩ Y = A ∩ Z. Portanto, XRZ,
isto é, R é uma relação de equivalência sobre P(B). 19. Vamos provar apenas o
item (b). Note que

∀ x [χB∪C (x) = 1 ⇔ x ∈ B ∪ C = (B ∩ C) ∪ [B ∪ C − (B ∩ C)]


⇔ x ∈ B ∩ C ou x ∈ B ∪ C − (B ∩ C)].

Por outro lado,

∀ x [(χB + χC − χB∩C )(x) = 1 ⇔ x ∈ B ∩ C ou x ∈ B ∪ C − (B ∩ C)].

Portanto, pelo item (a), χB∪C = χB +χC −χB ·χC . 20. Vamos provar apenas o item
(a). Se x ∈ ∪i∈I Ai , então existe um i ∈ I tal que x ∈ Ai . Como f (J) = I temos
que existe um j ∈ J tal que i = f (j). Assim, x ∈ Af (j) . Logo, x ∈ ∪j∈J Af (j) .
Por outro lado, se x ∈ ∪j∈J Af (j) , então existe um j ∈ J tal que x ∈ Af (j) . Como
f (j) ∈ I temos que x ∈ ∪i∈I Ai . Portanto, ∪j∈J Af (j) = ∪i∈I Ai . 21. Suponhamos
que f : A → B seja injetora. Então, pelo Corolário 2.22, f : A → C é uma função
bijetora, em que C = Im(f ) ⊆ B. Assim, f −1 : C → A é uma função. Seja a ∈ A
fixado e B = C ∪(B˙ − C). Então a função g : B → A definida como

f −1 (y), se y ∈ C
g(y) =
a, se y ∈ B − C

tem as propriedades desejadas, pois para qualquer x ∈ A, obtemos

(g ◦ f )(x) = g(f (x)) = f −1 (f (x)) = x = IA (x).

22. Pelo Exercício (21) basta, para cada k ∈ N, considerar a função gk : N → N


definida como gk (n) = n − 1 se n > 1 e gk (n) = k se n = 1. Se existissem inversa
à direita, então f seria sobrejetora, o que é impossível. 23. Suponhamos que f :
A → B seja sobrejetora, então f −1 (y) = ∅, para todo y ∈ B = Im(f ). Assim, pelo

273
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Exercício (14), {f −1 (y)}y∈B é uma partição de A. Assim, para qualquer y ∈ B,


podemos escolher um x = x(y) ∈ f −1 (y) ⊆ A. Então a função g : B → A definida
como g(y) = x tem as propriedades desejadas, pois para qualquer y ∈ B, obtemos

(f ◦ g)(y) = f (g(y)) = f (x) = y = IB (y).

24. Pelo Exercício (23) temos que {f −1 (n)}n∈N = {2n − 1, 2n}n∈N é uma partição
de N. Assim, para cada k ∈ N, basta considerar a função gk : N → N definida
como gk (n) = 2n − 1 se 1 ≤ n < k e gk (n) = 2n se n ≥ k. Se existissem inversa
à esquerda, então f seria injetora, o que é impossível. 25. Vamos provar apenas o
item (c). Dados x, y ∈ R, se f (x) = f (y), então
x y
√ = .
1 + x2 1 + y2

Como os denominadores destas frações são positivos temos as seguintes possibili-


dades: x = y = 0 ou x > 0 e y > 0 ou x < 0 e y < 0. A primeira possibilidade é
clara. Se x > 0 e y > 0, então
! √ "
x2 x2 x y y2
= √ = √ = = .
1 + x2 1 + x2 1 + x2 1 + y2 1 + y2

Logo, elevando ao quadrado ambos os membros, obtemos



x2 = y 2 ⇒ x = |x| = x2 = y 2 = |y| = y.

A possibilidade x < 0 e y < 0 é tratada de modo inteiramente análogo. Portanto,


x = y, ou seja, f é injetora. Para provar que f é sobrejetora, dado y ∈ I, devemos
resolver a equação y = f (x) para obter x como função de y. Para isso, devemos
considerar as seguintes possibilidades: y = 0 ou y > 0 ou y < 0. Se y = 0, então
existe x = 0 ∈ R tal que 0 = f (0). Se y > 0, então x > 0 e
!
x x2 2 x2 y
y=√ = ⇒ y = ⇒x= ,
1 + x2 1 + x2 1 + x2 1 − y2

ou seja, se y > 0, então existe x = √ y ∈ R tal que y = f (x). A possibilidade


1−y 2

274
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

y < 0 é tratada de modo inteiramente análogo. Portanto, f é bijetora. Note que

lim f (x) = −1 e lim f (x) = 1.


x→−∞ x→+∞

Finalmente, é fácil verificar que a função g : I → R definida como


x
g(x) = √
1 − x2

é a inversa de f . 26. Basta considerar f = IB . 27. Suponhamos, por absurdo,


que g = h. Então existe um x0 ∈ A tal que g(x0 ) = h(x0 ). Consideremos a função
f : B → {g(x0 ), h(x0 )} definida como

g(x0 ), se y = h(x0 )
f (y) =
h(x0 ), se y ∈ B − {h(x0 )}.

Então

(f ◦ g)(x0 ) = h(x0 ) e (f ◦ h)(x0 ) = g(x0 ) ⇒ (f ◦ g)(x0 ) = (f ◦ h)(x0 ),

o que é uma contradição. 28. (a ⇒ b) Dado x ∈ B, existe um a ∈ A tal que


x = f (a). Logo,

g(x) = g(f (a)) = (g ◦ f )(x) = (h ◦ f )(x) = h(f (a)) = h(x).

Portanto, g = h. (b ⇒ c) Suponhamos, por absurdo, que exista um X ⊆ A tal que


B − f (X) ⊂ f (A − X), isto é, existe um y0 ∈ B − f (X) tal que y0 ∈
/ f (A − X).
Então y0 = f (x), para todo x ∈ A. Para qualquer b ∈ B fixado, com b = y0 ,
consideremos h = IB e a função g : B → B definida como g(y) = y se y = y0 e
g(y0 ) = b. Então

f (x) = (g ◦ f )(x) e f (x) = (h ◦ f )(x), ∀ x ∈ A,

isto é, g ◦ f = h ◦ f . Logo, g = h, o que é uma contradição. (c ⇒ a) Pondo


X = A, obtemos B − f (A) ⊆ f (A − A) = f (∅) = ∅. Assim, f (A) = B, ou seja,
f é sobrejetora. 29. (a ⇒ b) Dado x ∈ C, f (g(x)) = (f ◦ g)(x) = (f ◦ h)(x) =
f (h(x)) implica que g(x) = h(x). Portanto, g = h. (b ⇒ c) Suponhamos, por
absurdo, que exista X ⊆ A tal que f (A − X) ⊂ B − f (X), isto é, existe um

275
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

y0 ∈ f (A − X) tal que y0 ∈/ B − f (X). Então existe um a ∈ A − X e x0 ∈ X tal


que f (a) = y0 = f (x0 ). Consideremos a função h : A → A definida como

⎨ x, se x ∈ A − {a, x0 }
h(x) = x , se x = a
⎩ 0
a, se x = x0

e seja g = IA . Então

f (x) = (f ◦ g)(x) e f (x) = (f ◦ h)(x), ∀ x ∈ A,

isto é, f ◦ g = f ◦ h. Logo, g = h, o que é uma contradição. (c ⇒ a) Suponhamos,


por absurdo, que f não seja injetora. Então, pelo Exemplo 2.24, existe um X ⊆ A
tal que f (A) − f (X) ⊂ f (A − X). Como f (A) ⊆ B temos que f (A) − f (X) ⊆
B −f (X) (prove isto!). Portanto, f (A−X) ⊂  B −f (X), o que é uma contradição.
30. Vamos provar apenas o item (a). Note que

∀ (x, y) [(x, y) ∈ (g ◦ f ) |X ⇔ (x, y) ∈ g ◦ f e x ∈ X


⇔ ∃ z tal que (x, z) ∈ f e (z, y) ∈ g e x ∈ X
⇔ ∃ z tal que ((x, z) ∈ f e x ∈ X) e (z, y) ∈ g
⇔ (x, y) ∈ g ◦ (f |X )].

Portanto, (g ◦ f ) |X = g ◦ (f |X ). 31. Suponhamos que exista uma função h : B →


C tal que f = h ◦ g. Então

g(x) = g(y) ⇒ f (x) = h(g(x) = h(g(y)) = f (y), ∀ x, y ∈ A.

Reciprocamente, seja c ∈ C fixado. Então a função h : B → C definida como


h(y) = f (x) se y = g(x) e h(y) = c se y = g(x) tem as propriedades desejadas,
pois para qualquer x ∈ A, obtemos f (x) = h(y) = h(g(x)) = (h ◦ g)(x). Seja
h1 : B → C outra função com a mesma propriedade de h. Então, pelo Exercício
(26), h = h1 . 32. Suponhamos que exista uma função h : C → B tal que f = g◦h.
Então

∀ y [y ∈ Im(f ) ⇒ ∃ x ∈ C tal que y = f (x)


⇒ ∃ x ∈ C tal que y = (g ◦ h)(x) ⇒ (x, y) ∈ g ◦ h
⇒ ∃ z ∈ C tal que (x, z) ∈ h e (z, y) ∈ g ⇒ y ∈ Im(g)].

276
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Reciprocamente, a função h : C → B definida como h(x) = g −1 (f (x)) tem as


propriedades desejadas, pois para qualquer x ∈ C, obtemos

f (x) = IA (f (x)) = (g ◦ g −1 )(f (x)) = g(g −1 ◦ f )(x) = (g ◦ h)(x).

Seja h1 : C → B outra função com a mesma propriedade de h. Então

h1 = IB ◦ h1 = (g −1 ◦ g) ◦ h1 = g −1 ◦ (g ◦ h1 )
= g −1 ◦ f = g −1 ◦ (g ◦ h) = (g −1 ◦ g) ◦ h = IB ◦ h = h.

33. Primeiro note que f (0) = f (0 + 0) = f (0) + f (0) implica que f (0) = 0 e
0 = f (0) = f (1 + (−1)) = f (1) + f (−1) implica que f (−1) = −f (1). Segundo
f (1) = f (1·1) = f (1)·f (1) implica que f (1)·(f (1)−1) = 0, ou seja, f (1) = 0 ou
f (1) = 1. Se f (1) = 0, então f (x) = f (x · 1) = f (x) · f (1) = 0, para todo x ∈ Z,
isto é, f = 0. Se f (1) = 1, então, pela Lei da Tricotomia, dado x ∈ Z, x < 0 ou
x = 0 ou x > 0. Assim, x > 0 implica que f (x) = f (1 + · · · + 1) = xf (1) = x e
x < 0 implica que −x > 0 e f (x) = f (−1 · (−x)) = x. Portanto, f (x) = x, para
todo x ∈ Z, isto é, f = IZ . 34. Pelo Exercício (33), obtemos f = 0 ou f (x) = x,
para todo x ∈ Z. Dado y ∈ Z, com y = 0, obtemos

1 = f (1) = f (y · y −1 ) = f (y) · f (y −1 ) = y · f (y −1 ).

Assim, f (y −1 ) = y −1 . Finalmente, dado r = x · y −1 ∈ Q, com y = 0, teremos


f (r) = f (x · y −1 ) = f (x) · f (y −1 ) = x · y −1 = r. Portanto, f = IQ . 35. Note que
se n ∈ N e f n (A−f (A))∩f n+1 (A−f (A)) = ∅, então existe um z ∈ f n (A−f (A))
e z ∈ f n+1 (A − f (A)), ou seja, existem x, y ∈ A − f (A) tais que z = f n (x) e
z = f n+1 (y). Como f é injetora temos, pelo Exercício (29), que

f n+1 (y) = f n (x) ⇒ f n (y) = f n−1 (x) ⇒ · · · ⇒ f (y) = x.

Logo, x ∈ f (A), o que é impossível. Portanto,

f (A − f (A)), f 2 (A − f (A)), f 3 (A − f (A)) . . .

são mutualmente disjuntos. 36. Se f (A) = A, então, pelo Exercício (35), A seria
um conjunto infinito.

277
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Capítulo 3
Seção 3.1
1. (a) Se xEy e yEz, então xRy e yRz. Assim, xRz. Se x = z, então xRy e yRx
implica que x = y, o que é impossível, pois xEy. Portanto, x < z. (b) Se xEy
e x = y, então xEx, o que é impossível. Se xEy e yEx, então, pelo o item (a),
xEx, o que é impossível. Portanto, no máximo uma das condições ocorre: xEy
ou x = y ou yEx. A recíproca é clara. 2. Dados X, Y, Z ⊆ A. É claro que
(X, f ) ≤ (X, f ). Se (X, f ) ≤ (Y, g) e (Y, g) ≤ (X, f ), então X = Y e f = g.
Logo, (X, f ) = (Y, g). Se (X, f ) ≤ (Y, g) e (Y, g) ≤ (Z, h), então X ⊆ Y e
f (x) = g(x), para todo x ∈ X, e Y ⊆ Z e g(y) = h(y), para todo y ∈ Y . Em
particular, X ⊆ Z e f (x) = h(x), para todo x ∈ X. Assim, (X, f ) ≤ (Z, h).
Portanto, ≤ é uma ordem sobre C. 3. Dados (a, b), (c, d), (e, f ) ∈ A × B, obtemos
(a, b)  (a, b), pois a = a e b ≤ b. Se (a, b)  (c, d) e (c, d)  (a, b), então
a < c ou a = c e b ≤ d e c < a c = a e d ≤ b. Note que a possibilidade a < c
e c < a não pode ocorrer. Assim, a = c, b ≤ d e d ≤ b, isto é, (a, b) = (c, d).
Se (a, b)  (c, d) e (c, d)  (e, f ), então a < c ou a = c e b ≤ d e c < e ou
c = e e d ≤ f . Observe que se a < c e c < e, então a < e e (a, b)  (e, f ). Se
a = c = e, b ≤ d e d ≤ f , então a = e, b ≤ f e (a, b)  (e, f ). Portanto,  é uma
ordem sobre A × B. 4. Dados (a, b), (c, d), (e, f ) ∈ A, obtemos (a, b)  (a, b),
pois a = a e b ≤ b. Se (a, b)  (c, d) e (c, d)  (a, b), então a = c e b ≤ d e a = c
e d ≤ b. Assim, a = c, b ≤ d e d ≤ b, isto é, (a, b) = (c, d). Se (a, b)  (c, d) e
(c, d)  (e, f ), então a = c e b ≤ d e c = e e d ≤ f . Logo, a = c = e, b ≤ d
e d ≤ f , ou seja, (a, b)  (e, f ). Portanto,  é uma ordem sobre A. 5. Dados
(a, b), (c, d), (e, f ) ∈ N × N, obtemos (a, b)  (a, b), pois f (a, b) = f (a, b). Se
(a, b)  (c, d) e (c, d)  (a, b), então f (a, b) ≤ f (c, d) e f (c, d) ≤ f (a, b). Assim,
f (a, b) = f (c, d) implica que (a, b) = (c, d), pois f é injetora. Se (a, b)  (c, d) e
(c, d)  (e, f ), então f (a, b) ≤ f (c, d) e f (c, d) ≤ f (e, f ). Logo, f (a, b) ≤ f (e, f )
implica que (a, b)  (e, f ). Portanto,  é uma ordem sobre N × N. 6. Pondo
R = ∩i∈I Ri . Para quaisquer x, y, z ∈ A, obtemos xRi x, para todo i ∈ I. Assim,
xRx. Se (x, y) ∈ R e (y, x) ∈ R, então xRi y e yRi x, para todo i ∈ I. Logo,
x = y. Se (x, y) ∈ R e (y, z) ∈ R, então xRi y e yRi z, para todo i ∈ I. Portanto,
xRi z, para todo i ∈ I. Consequentemente, xRz, isto é, R é uma ordem sobre A.
7. Dados f, g, h ∈ F, obtemos f  f , pois f (x) ≤ f (x), para todo x ∈ A. Se
f  g e g  f , então f (x) ≤ g(x) e g(x) ≤ f (x) , para todo x ∈ A. Assim,
f (x) = g(x), para todo x ∈ A, ou seja, f = g. Se f  g e g  h, então

278
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

f (x) ≤ g(x) e g(x) ≤ h(x), para todo x ∈ A. Logo, f (x) ≤ h(x), para todo
x ∈ A, ou seja, f  h. Portanto,  é uma ordem sobre F que não é total, pois se
b, c ∈ B não são comparáveis, então as funções constantes f (x) = b e g(x) = c,
para todo x ∈ A, não são comparáveis. 8. Confira o exercício (7). 9. Dados
(a, b), (c, d), (e, f ) ∈ A × B, obtemos (a, b)  (a, b), pois b = b e a ≤ a. Se
(a, b)  (c, d) e (c, d)  (a, b), então b < d ou b = d e a ≤ c e d < b ou
d = b e c ≤ a. Note que a possibilidade b < d e d < b não pode ocorrer. Assim,
b = d, a ≤ c e c ≤ a, isto é, (a, b) = (c, d). Se (a, b)  (c, d) e (c, d)  (e, f ),
então b < d ou b = d e a ≤ c e d < f ou d = f e c ≤ e. Note que se b < d
e d < f , então b < f e (a, b)  (e, f ). Se b = d = f, a ≤ c e c ≤ e, então
b = f , a ≤ e e (a, b)  (e, f ). Portanto,  é uma ordem sobre A × B. 10.
Dados (a, b), (c, d) ∈ C × D, teremos a, c ∈ C e b, d ∈ D. Assim, por hipótese,
[a < c ou a = c ou c < a] e [b < d ou b = d ou d < b]. Logo, se a < c, então
(a, b)  (c, d). Se a = c, então b < d e (a, b)  (c, d) ou b = d e (a, b) = (c, d) ou
d < b e (c, d)  (a, b). De modo inteiramente análogo faz o caso c < a. Portanto,
(a, b)  (c, d) ou (a, b) = (c, d) ou (c, d)  (a, b), ou seja, C × D é uma cadeia de
A × B. 11. Como E ∩ D = ∅ e E ∪ D = B temos que

(A × E) ∩ (A × D) = A × (E ∩ D) = A × ∅ = ∅

e
(A × E) ∪ (A × D) = A × (E ∪ D) = A × B.
Se (a, b) ∈ A × E e (x, y)  (a, b), então y < b ou y = b e x ≤ a. Se y < b,
então y ∈ E, pois b ∈ E. Se y = b, então y ∈ E. Portanto, em qualquer caso,
(x, y) ∈ A × E. Se (c, d) ∈ A × D e (c, d)  (z, w), então y < b ou y = b e x ≤ a.
Se y < b, então y ∈ E, pois b ∈ E. Se y = b, então y ∈ E. Portanto, em qualquer
caso, (x, y) ∈ A × E. 12. Confira as definições. 13. Observe que para qualquer
r ∈ Q, multiplicando o numerador e o denominador de r por −1, se necessário,
podemos escrever r sob a forma r = a · b−1 , onde a, b ∈ Z, com b > 0. Dados
r = a · b−1 , s = c · d−1 ∈ Q, onde b, d ∈ N. Então, pela Lei da Tricotomia em Z,
ad < bc ou ad = bc ou ad > bc. Assim, r  s ou r = s ou s  r. Portanto, Q é
totalmente ordenado. Uma outra prova, dado r = a · b−1 ∈ Q, com a = 0 e b ∈ N.
Se a > 0, então r  0. Se −a > 0, então −r  0. Note que r  0 e −r  0 não
pode ocorrer. Caso contrário, r = a · b−1 e −r = c · d−1 , com a > 0, b > 0, c > 0 e
d > 0, implica que −ad = bc, o que é impossível, pois ad > 0 e bc > 0. Portanto,

279
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Q é totalmente ordenado. 14. Confira o exercício (8). 15. Dados a, b, c ∈ A,


existem únicos i, j, k ∈ I tais que a ∈ Ai , b ∈ Aj e c ∈ Ak . É claro que a  a. Se
a  b e b  a, então i = j e a = b. Se a  b e b  c, então temos as seguintes
possibilidades i < j e j = k ou i = j e j < k ou i < j e j < k ou i = j e j = k.
Assim, em qualquer possibilidade a  c. Como I é totalmente ordenado temos que
i < j ou i = j ou i > j. Se i < j ou i > j, então a  b ou a  b. Se i = j, então
a, b ∈ Ai e a < b ou a = b ou a > b. Portanto,  é uma ordem total sobre A.

Seção 3.2
1. Dados x, y ∈ A, se x < y e x = y, então f (x) < f (y), pois f (x) = f (y) e f é
crescente. 2. Note que as funções I, f, g : N → Z definidas como

1, se n = 1
I(n) = n, f (n) = n − 10 e g(n) =
n + 2, se n ≥ 2

são imersões crescente. 3. A função f : Z+ → A definida como

1
f (n) = 1 −
n+1

tem as propriedades desejadas. 3. (a) Dados (a, b), (c, d) ∈ A × B, se (a, b) 


(c, d), então a < c ou a = c e b ≤ d. Assim, p1 (a, b) = a ≤ c = p1 (c, d). Portanto,
p1 é uma função crescente. (b) Dados (a, b), (c, d) ∈ A×B, se (a, b)  (c, d), então
b < d ou b = d e a ≤ c. Assim, p2 (a, b) = b ≤ d = p2 (c, d). Portanto, p2 é uma
função crescente. 5. Dados x, y ∈ f (C), existem a, b ∈ C tais que x = f (a) e
y = f (b). Como C é uma cadeia temos que a ≤ b ou a ≥ b. Assim, x ≤ y ou x ≥ y,
pois f é crescente. Portanto, f (C) é uma cadeia em B. 6. Dados a, b ∈ f −1 (C)
e x ∈ A, com a ≤ x ≤ b. Como f é crescente temos que f (a) ≤ f (x) ≤ f (b).
Por outro lado, sendo a, b ∈ f −1 (C), obtemos f (a), f (b) ∈ C e, por hipótese,
f (x) ∈ C. Assim, x ∈ f −1 (C). Portanto, f −1 (C) é um subconjunto convexo
de A. Reciprocamente, primeiro note, para qualquer a ∈ A, que a ∈ f −1 (Cf (a) ),
com Cf (a) = {y ∈ B : y ≤ f (a)} um subconjunto convexo de B. Assim, por
hipótese, f −1 (Cf (a) ) é um subconjunto convexo de A. Dados x, y ∈ A, se x ≤ y,
então x ∈ f −1 (Cf (y) ). Portanto, f (x) ≤ f (y). Consequentemente, f é uma função
crescente. 7. Já vimos que x = f −1 (b), para todo b ∈ B. Agora, use o Exercício
(6). 8. Como E ∩ D = ∅ e E ∪ D = B temos que f −1 (E) ∩ f −1 (D) = ∅
e f −1 (E) ∪ f −1 (D) = f −1 (f (A)) = A, pois f é sobrejetora. Se a ∈ f −1 (E)

280
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

e x ≤ a, então f (a) ∈ E e f (x) ≤ f (a), pois f é crescente. Assim, f (x) ∈


E, ou seja, x ∈ f −1 (E). Se b ∈ f −1 (D) e b ≤ y, então f (b) ∈ D e f (b) ≤
f (y), pois f é crescente. Assim, f (y) ∈ D, ou seja, y ∈ f −1 (D). Portanto,
(f −1 (E), f −1 (D)) é um corte de A. 9. Vamos provar apenas o item (c). Para isto
basta provar f ([a, b]) = [f (a), f (b)]. Dado y ∈ f ([a, b]), existe um x ∈ [a, b] tal que
y = f (x). Como a ≤ x ≤ b e f é um isomorfismo temos que f (a) ≤ f (x) ≤ f (b),
ou seja, y ∈ [f (a), f (b)] e f ([a, b]) ⊆ [f (a), f (b)]. Para verificar a outra inclusão
use f −1 . 10. Confira o Exercício (9). 11. Consideremos a função f : A → F
definida como f (a) = Ia . Então f é o isomorfismo desejado, por exemplo, dados
a, b ∈ A, se f (a) = f (b), então Ia = Ib . Assim, a = b, pois se a = b, digamos
a < b, então Ia ⊂ Ib = Ia , o que é impossível. Portanto, f é injetora. 12. Vamos
provar apenas o item (a). Note que Da = A − Ea , para todo a ∈ A. É claro
que Ea ∩ Da = ∅ e Ea ∪ Da = A. Se b ∈ Ea e x ≤ b, então x ≤ b e b ≤ a.
Assim, x ≤ a e x ∈ Ea . Se c ∈ Da e c ≤ y, então a < c e c ≤ y. Logo,
a < y e y ∈ Da . Portanto, (Ea , Da ) é um corte de A, para todo a ∈ A. 13.
Dados x, y ∈ B, existem únicos a, b ∈ A tais que x = f (a) e y = f (b). Como A
é um conjunto totalmente ordenado temos que a < b ou a = b ou a ≥ b. Assim,
x = f (a) < f (b) = y ou x = f (a) = f (b) = y ou x = f (a) > f (b) = y,
pois f é um isomorfismo. Portanto, B é um conjunto totalmente ordenado. 14.
É fácil verificar que a é o único elemento tal que f −1 (Ib ) = Ia . Vamos definir
g : B → A como g(b) = a. Dados b, c ∈ B, se b ≤ c, então Ib ⊆ Ic . Assim,
f −1 (Ib ) = Ia ⊆ Id = f −1 (Ic ), ou seja, g(b) = a ≤ d = g(c). Portanto, g preserva
ordem. Como g(b) ∈ Ig(b) = Ia = f −1 (Ib ) temos que (f ◦ g)(b) ≤ b, para todo
b ∈ B, isto é, f ◦ g ≤ IB . Por outro lado, a ∈ f −1 (If (a) ) = Ig(f (a)) , de modo que
a ≤ (g ◦ f )(a), para todo b ∈ B, ou seja, IA ≤ g ◦ f . A unicidade de g é clara.
Reciprocamente, como f (a) ≤ b temos que x ≤ g(f (a)) ≤ g(b) e x ≤ g(b) implica
que f (x) ≤ f (g(b)) ≤ b. Assim, f (a) ≤ b se, e somente se, a ≤ g(b). Portanto,
f −1 (Ib ) = Ig(b) .

Seção 3.3
1. Vamos provar apenas os itens (a) e (c): (a) Note que a < b ⇒ 2a = a + a <
a + b ⇒ a < 2−1 (a + b). Por outro lado, a < b ⇒ a + b < b + b = 2b ⇒
2−1 (a + b) < b. Portanto, a < 2−1 (a + b) < b. (c) Suponhamos, por absurdo,
que a > 0. Então existe um 0 = a −  > 0 tal que 0 < 0 < a, o que é uma
contradição. Portanto, a = 0. 2. Basta provar que inf(B) = mdc(a1 , a2 , . . . , an )
e sup(B) = mmc(a1 , a2 , . . . , an ). 3. (b) Note que A não possui maior elemento,

281
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

mas menor elemento 1. (c) Observe que A possui elementos maximais 18 e 24 e


elemento minimal 1. 4. Vamos provar apenas o item (a). Neste tipo de problema
um candidato natural para cota superior é: M = ∪A. Como

M = ∪A = ∪n∈N {2n, 2n + 4} = {2k : k ∈ N}

é um elemento de F temos que M é uma cota superior de A, pois para qualquer


X ∈ A temos que X ⊆ M . Note que M = sup(A). 5. Vamos provar apenas o
item (c). Sejam c = sup(C) e d = sup(D). Então x ≤ d, para todo x ∈ D. Em
particular, y ≤ d, para todo y ∈ C, pois C ⊆ D. Portanto, d é uma cota superior de
C e c ≤ d, por definição. Afirmação dual: se C, D são subconjuntos de A, C ⊆ D
e cada C e D possui ínfimo em A, então inf(C) ≤ inf(D). 6. Dado M ∈ f −1 (b) e
x ∈ A, se M ≤ x, então f (M ) ≤ f (x), pois f é crescente. Como b = f (M ) e b é
um elemento maximal de B temos que b = f (x). Portanto, M = x, pois se M < x,
então b = f (M ) < f (x) = b, o que é impossível. Neste caso, cada elemento de
f −1 (b) é um elemento maximal de A. 7. Dado y ∈ f (A), existe um x ∈ A tal que
y = f (x). Como a é o maior elemento de A temos que z ≤ a, para todo z ∈ A.
Assim, f (z) ≤ f (a), para todo z ∈ A. Em particular, y = f (x) ≤ f (a). Portanto,
f (a) é o maior elemento de f (A). 8. Confira o Exercício (7). 9. Vamos provar
apenas o item (c). Suponhamos que x ∈ A seja uma cota superior de C. Então
a ≤ x, para todo a ∈ C. Dado c ∈ f (C), existe um único b ∈ C tal que c = f (b).
Como b ≤ x temos que c = f (b) ≤ f (x). Portanto, f (x) ∈ B é uma cota superior
de f (C). Para provar a recíproca use f −1 . 10. Pelo Exemplo 3.32, ∅ possui um
supremo e um ínfimo, os quais são necessariamente o menor elemento e o maior
elemento de A, respectivamente. 11. Dado x ∈ [a, b] ∩ [c, d], obtemos a ≤ x ≤ b
e c ≤ x ≤ d se, e somente se, a, c ≤ x e x ≤ b, d. Assim, por definição,

sup{a, c} ≤ x e x ≤ inf{b, d} ⇔ sup{a, c} ≤ x ≤ inf{b, d}.

Logo, x ∈ [sup{a, c}, inf{b, d}] e reciprocamente. Portanto,

[a, b] ∩ [c, d] = [sup{a, c}, inf{b, d}].

12. Dados c, d ∈ [a, b], obtemos M = sup{c, d} ∈ A. Como c, d ≤ b temos que


M ≤ b, pois M é a menor das cotas superiores de {c, d}. Assim, M ∈ [a, b]. De
modo inteiramente análogo, prova que m = inf{c, d} ∈ [a, b]. Portanto, [a, b] é

282
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

um sub-reticulado de A. 13. Seja A um conjunto finito qualquer. Escolhendo um


elemento x1 de A. Se x1 é um elemento maximal de A, acabou. Caso contrário,
escolhendo um elemento x2 de A, com x1 ≤ x2 . Continuando assim, obtemos uma
cadeia de elementos de A,

x1 ≤ x 2 ≤ · · · ≤ x n ≤ · · ·

Como A possui um número finito de elementos temos que essa cadeia para, digamos
em xk . Portanto, a = xk é um elemento maximal de A. 14. Seja m ∈ A um
elemento minimal de A. Dado x ∈ A, obtemos x ≤ m ou m ≤ x, pois A é
totalmente ordenado. Assim, m = x ou m ≤ x, para todo x ∈ A. Portanto, m é um
menor elemento de A. 15. Falso. confira o Exemplo 3.24 ou considere o conjunto
A = N ∪ {∞}, com a ordenação usual de N e 1 < ∞ (faça o Diagrama de Hasse).
Então M = ∞ é o único elemento maximal de A, mas não é o maior elemento
de A. 16. (a) É claro que W ⊆ W , para todo W ∈ F. Dados U, W ∈ F, se
U ⊆ W e W ⊆ U , então U = W . Dados U, W, Z ∈ F, se U ⊆ W e W ⊆ Z,
então é claro que U ⊆ Z. Portanto, ⊆ é uma relação de ordem sobre F. (b) É
claro que {0} ⊆ W , para todo W ∈ F. Assim, {0} é o menor elemento de F.
Mais fácil ainda é que W ⊆ V , para todo W ∈ F. Portanto, V é o maior elemento
de F. (c) Confira o Exemplo 3.41. (d) Segue do item (c). 17. Basta observar
que a ∧ b = min{a, b} e a ∨ b = max a, b. 18. Confira o Teorema 2.3. 19. É
verificar que a ∧ b = mmc(a, b) e a ∨ b = mdc(a, b) e que Z+ é distributivo. Para
cada d ∈ Z+ , Id = {dk : k ∈ Z+ } é um ideal de Z+ . De fato, dados a, b ∈ Id ,
existem k, m ∈ Z+ tais que a = dk e b = dm, de modo que d divide a ∨ b. Assim,
a ∨ b ∈ Id . Para cada m ∈ Z+ , se m  a, então m = an, para algum n ∈ Z+ .
Logo, m = (dk)r = d(kn), ou seja, m ∈ Id . Seja p ∈ Z+ um número primo. Então
P = Ip é um ideal primo de Z+ . Com efeito, dados a, b ∈∈ Z+ , se a ∧ b ∈ P ,
então a ∧ b = pk, para algum k ∈ Z+ . Agora, use que ab = mdc(a, b) mmc(a, b).
Reciprocamente, se P = Id é um ideal primo, então d é um número primo (prove
isto!). 20. Seja (A, ) um reticulado distributivo qualquer. Para cada a ∈ A fixado,
vamos admitir Pa o conjunto de todos os ideais primos P de A tal que a ∈ / P exista
(isto pode ser provado usando o Lema de Zorn!). Então a família F = {Pa : a ∈ A}
ordenada pela inclusão é um reticulado de conjuntos. Assim, a funcção f : A → F
definida como f (a) = Pa é oum isomorfismo.

283
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Seção 3.4

1. Suponhamos, por absurdo, que 2 seja um número racional, digamos existem
√ √ √
a, b ∈ N tal que 2 = b−1 · a. Seja S = {n 2 : n ∈ N e n 2 ∈ N}. Então
S = ∅, pois b ∈ S. Assim, existe um s0 ∈ S tal que s0 ≤ s, para todo s ∈ S. Pondo
√ √
s0 = k 2 e 2 > 1, obtemos
√ √ √ √ √
s0 ( 2 − 1) = s0 2 − k 2 = (s0 − k) 2 > 0 ⇒ (s0 − k) 2 ∈ S,
√ √
o que é uma contradição. De fato, s0 2 = 2k e 2 < 2 2 implicam que 2 −
√ √ √
2 < 2, de modo que (s0 − k) 2 < s0 . 2. Considerando os números reais
1 1
2− 2 a < 2− 2 b temos, pelo Exemplo 3.57, que existe um r ∈ Q tal que

a b √
√ < r < √ ⇔ a < r 2 < b.
2 2

Portanto, existe um número irracional x = r 2 tal que a < x < b. 3. Vamos
provar apenas o item (c). Dado b ∈ R temos, pela Princípio Arquimedes, que existe
um m ∈ Z tal que ma > b. Assim, o conjunto S = {k ∈ N : (k + 1)a > b}
é não vazio. Logo, S contém um menor elemento, digamos n ∈ S. Portanto,
na ≤ b < (n + 1)a se, e somente se b ∈ [na, (n + 1)a[, pois n − 1 ∈
/ S, ou seja,

R ⊆ ∪˙ n∈Z [na, (n + 1)a[.

A outra inclusão é clara. 4. Note que 1 e 2 não possuem predecessores imediatos


em A, pois existe um c ∈ A tal que 1 < c < 2. Além disso,

S1 = ∅, S5 = {1, 3}, S2 = {1, 3, 5, . . .} e S8 = {1, 3, 5, . . . ; 2, 4, 6}.

5. Vamos provar apenas o item (a). Suponhamos que a ≤ b. Como A é um CBO


temos que a+ ≤ b+ ou a+ > b+ . Se a+ > b+ , então a+ > b ≥ a, o que é impossível.
Portanto, a+ ≤ b+ . Usando um argumento simétrico prova-se a recíproca. 6. (a)
Dado x ∈ R, obtemos 2−1 · x < x, ou seja, x não é menor elemento de R. Por
outro lado, para cada y ∈ R, com y < x, teremos y < 2−1 · (x + y) < x, isto
é, x não possui um predecessor imediado. Portanto, x é um elemento limite de R.
Portanto, concluímos que R não possui sucessor imediato. (b) Suponhamos que q
seja um elemento limite de A. Então para qualquer a ∈ Sq , existe um b ∈ A tal
que a < b < q. Portanto, a+ < q, pois q ≤ a+ é impossível. Reciprocamente, é

284
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

claro que q não é menor elemento de A. Por outro lado, para cada a ∈ Sq , existe um
a+ ∈ A tal que a < a+ < q, ou seja, q não possui predecessor imediato. Portanto,
q é um elemento limite de A. (c) Suponhamos que q seja um elemento limite de A
e que p = sup(Sq ). Então p ≤ q, pois x < q, para todo x ∈ Sq . Se p < q, então,
pelo item (b), p < p+ < q, o que é impossível. Portanto, p = q. Reciprocamente, é
claro que q não é o menor elemento de A. Por outro lado, para cada a ∈ Sq , existe,
pelo item (b), um a+ ∈ A tal que a < a+ < q, ou seja, q não possui predecessor
imediato. Portanto, q é um elemento limite de A. 7. Note que A é um CBO, pois
se S é qualquer subconjunto não vazio de A, então

S1 = {m ∈ Z+ : m + (n + 1)−1 · n ∈ S, para algum n ∈ Z+ } =


 ∅,

pois S = ∅. Logo, S1 contém um menor elemento, digamos m0 ∈ S1 . Como

S2 = {n ∈ Z+ : m0 + (n + 1)−1 · n ∈ S} =
 ∅

temos que S2 contém um menor elemento, digamos n0 ∈ S2 . Portanto, m0 +


(n0 + 1)−1 · n0 é o menor elemento de S. Os pontos limites de A são todos os
elementos m, enquanto os sucessores imediatos de A são todos os elementos da
forma m + (n + 1)−1 · n, onde m, n ∈ Z+ , com n > 0. 8. Suponhamos que
A = S. Então T = A − S = ∅. Logo, T contém um menor elemento, digamos
m ∈ T . Vamos provar que S = Sm . É claro que Sm ⊆ S, pois x < m e x ∈ / T
implicam que x ∈ S. Por outro lado, se x ∈ S, então x < m, ou seja, x ∈ Sm .
9. Seja S qualquer subconjunto não vazio de B. Então f −1 (S) é um subconjunto
não vazio de A, pois f é sobrejetora. Logo, f −1 (S) contém um menor elemento,
digamos m ∈ f −1 (S). É fácil verificar que m0 = f (m) ∈ S é o menor elemento
de S. Portanto, B é um CBO. 10. Como A e B são conjuntos enumeráveis temos
que existem bijeções f : Ni → A e g : Np → B, em que

Ni = {1, 3, 7, . . .} e Np = {2, 4, 6, . . .}.

Assim, pelo Corolário 2.22, f : Ni → A ∪ B e g : Np → A ∪ B são funções.


Como f |(Ni ∩Np ) = g|(Ni ∩Np ) temos, pelo Teorema 2.35, que existe uma única função
bijetora h : N → A ∪ B tal que h|Ni = f e h|Np = g. Explicitamente,
  
f n+1 , se n é um úmero ímpar
h(n) =  n 2
g 2 , se n é um número par.

285
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Portanto, pelo Exercício (9), A∪B é um CBO. 11. Seja F = {Sa }a∈A uma família
de segmentos iniciais de A. Consideremos a função f : A → F definida como
f (a) = Sa . Então f é o isomorfismo desejado, por exemplo, dados a, b ∈ A, se
a = b, digamos a < b, então a ∈ Sb . Como a ∈ / Sa temos que Sa = Sb , ou seja, f é
injetora. 12. Confira o Exercício (11). 13. Dados x, y ∈ A, se f (x) = f (y), então
x = y, pois se x = y, então x < y ou x > y. Logo, f (x) < f (y) ou f (x) > f (y),
pois f é estritamente crescente, o que é impossível. Portanto, f é injetora. A
recíproca é clara. 14. Suponhamos que (E, D) seja um corte de A. Dado x ∈ E
e y ∈ D, obtemos x < y ou x > y, pois {E, D} é uma partição de A. Se y < x,
então x ∈ E ∩ D = ∅, o que é impossível. Portanto, x ≤ y. Reciprocamente, como
{E, D} é uma partição de A temos que E ∩ D = ∅ e E ∪ D = A. Agora, se a ∈ E
e x ≤ a, então x ∈ E, pois a ∈ / D. Finalmente, se b ∈ D e b ≤ y, então y ∈ D, pois
b∈ / E. Portanto, (E, D) é um corte de A. 15. Suponhamos que B seja uma seção
de A. Então é claro que B ∩ (A − B) = ∅ e A = B ∪ (A − B). Se a ∈ B e x ≤ a,
então x ∈ B, pois B é uma seção de A. Se b ∈ A − B e b ≤ y, então y ∈ A − B,
pois se y ∈/ A − B, então y ∈ B. Assim, b ∈ B ∩ (A − B) = ∅, o que é impossível.
Portanto, (B, A − B) é um corte de A. A recíproca é clara. 16. Dado a ∈ f −1 (C)
e x ∈ A, com x ≤ a. Como f é crescente temos que f (x) ≤ f (a). Por outro
lado, sendo a ∈ f −1 (C), obtemos f (a) ∈ C e, por hipótese, f (x) ∈ C. Assim,
x ∈ f −1 (C). Portanto, f −1 (C) é uma seção de A. Reciprocamente, primeiro note,
para qualquer a ∈ A, que a ∈ f −1 (Cf (a) ), com Cf (a) = {y ∈ B : y ≤ f (a)} uma
seção de B. Assim, por hipótese, f −1 (Cf (a) ) é uma seção de A. Dados x, y ∈ A, se
x ≤ y, então x ∈ f −1 (Cf (y) ). Portanto, f (x) ≤ f (y). Consequentemente, f é uma
função crescente. 17. Suponhamos que B possua um menor elemento, digamos
m ∈ B. Então m ≤ x, para todo x ∈ B. Em particular, m ≤ b. Dado y ∈ Sb ∩ B,
obtemos y < b e m ≤ y. Assim, m < b, ou seja, m ∈ Sb ∩ B. Portanto, m é o
menor elemento de Sb ∩ B. Reciprocamente, suponhamos que Sb ∩ B possua um
menor elemento, digamos n ∈ Sb ∩ B. Dado y ∈ B, obtemos b ≤ y ou b > y, pois
A é totalmente ordenado. Se b ≤ y, então n < y. Se b > y, então y ∈ Sb ∩ B.
Logo, n ≤ y, para todo x ∈ B. Portanto, B possui um menor elemento. 18.
Confira o Exercício (17). 19. Suponhamos, por absurdo, que exista uma família
S = {xn : n ∈ Z+ }, com xn > xn+1 , para todo n ∈ Z+ . Então S = ∅ e não
possui menor elemento, o que é uma contradição. Reciprocamente, se A não é um
CBO, então existe um subconjunto não vazio S de A sem menor elemento. Pondo
x0 ∈ S, obtemos um x1 ∈ S tal que x1 < x0 , pois S não possui menor elemento.

286
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Como x1 não é um menor elemento temos que existe um x2 ∈ S tal que x1 < x2 .
Prosseguindo assim, obtemos elementos x0 , x1 , x2 . . . em S tais que

x 0 > x 1 > · · · > xn > · · ·

Portanto, existe uma família T = {xn : n ∈ Z+ }, com xn > xn+1 , para todo
n ∈ Z+ . Note que {(n + 1)−1 : n ∈ Z+ } é uma cadeia infinita descendente
de [0, 1]. Portanto, [0, 1] não é um CBO. 20. Confira o Lema 3.63. 21. Seja
f : A → A um isomorfismo qualquer. Então x ≤ f (x), para todo x ∈ A, pois
A é um CBO. Por outro lado, como f −1 : A → A é um isomorfismo temos que
x ≤ f −1 (x), para todo x ∈ A. Neste caso, f (x) ≤ f (f −1 (x)) = x, para todo
x ∈ A. Portanto, x ≤ f (x) ≤ x implica que f (x) = x, ou seja, f = IA . 22. Como
g ◦ f : A → A é um isomorfismo temos, pelo Exercício (21), que g ◦ f = IA . De
modo inteiramente análogo, f ◦ g = IB . Portanto, g = f −1 . 23. Seja g : A → B
outro isomorfismo. Então g −1 : B → A é um isomorfismo. Assim, pelo Exercício
(22), g = f . 24. Sejam C ⊆ A e D ⊆ B tais que A  D e B  C. Então,
pelo Corolário 3.75, C  A ou C  Sa , para algum a ∈ A, e D  B ou D  Sb ,
para algum b ∈ B. Se C  Sa , para algum a ∈ A, então B  Sa , para algum
a ∈ A. Asim, pelo Lema 3.67, A não é isomorfo a D, o que é impossível. Logo,
C  A. De modo inteiramente análogo, prova-se que a possibilidade D  Sb não
pode ocorrer. Assim, D  B. Portanto, A  D  B. 25. Confira o Exercício
(24). 26. Note que g injetora e c ∈ A − Im(g) implicam que A não pode ser finito.
Assim, basta provar que c, g(c), g(g(c)) . . . são mutualmente distintos.

Capítulo 4
Seção 4.1
1. Seja S um subconjunto não vazio de A × B. Então

S1 = {a ∈ A : (a, b) ∈ S, para algum b ∈ B} =


 ∅ e S1 ⊆ A.

Assim, existe um a1 ∈ S1 tal que a1 ≤ a, para todo a ∈ S1 . Por outro lado,

S2 = {b ∈ B : (a1 , b) ∈ S} =
 ∅ e S2 ⊆ B,

Portanto, existe um b1 ∈ S2 tal que b1 ≤ b, para todo b ∈ S2 . Agora, mostre que


(a1 , b1 ) é o menor elemento de S. 2. Sejam j ∈ I fixado e xj ∈ Aj . Então {Bi }i∈I ,
em que Bj = {xj } e Bi = Ai , para todo i ∈ I, com i = j, é uma família não vazia

287
R ESPOSTAS E S UGESTÕES


de conjuntos não vazios. Assim, pelo axioma da escolha, Q = i∈I Bi = ∅ e
Q ⊆ P . Portanto, para cada g ∈ Q, temos que pj (g) = xj . Consequentemente, pj é
sobrejetora, para todo j ∈ I. 3. Vamos prova apenas o item (a). Dado f ∈ A × A,
obtemos
ϕ∗ (f )(j) = (f ◦ ϕ)(j) = f (ϕ(j)) ∈ A.
Portanto,

(f (1), f (2)) → (f (ϕ(1)), f (ϕ(2)), f (ϕ(3))) = (f (2), f (2), f (1)),

ou seja, (x1 , x2 ) → (x2 , x2 , x1 ). 4. Já vimos, no Exemplo 4.10, que a família


F = {Ab : b ∈ B}, com Ab = f −1 (b) = ∅, é uma partição de A. Assim, existe um
conjunto escolha C para A. Então é fácil verificar que a função g = f |C : C → B
é bijetora. 5. Como g : A → Im(g) ⊆ C é uma função sobrejetora temos que
Xc = g −1 (c) é um subconjunto não vazio de A, para todo c ∈ Im(g). Em particular,
para todo c ∈ Im(f ). Por outro lado, seja r : P(A)∗ → A uma função escolha para
A, isto é, r(X) ∈ X, para todo X ∈ P(A)∗ . Então a função h : B → A definida
como
h(b) = r(Xf (b) ) ∈ Xf (b) , ∀ b ∈ B,
tem as propriedades desejadas, pois dado b ∈ B, obtemos (g ◦ h)(b) = g(h(b)) =
f (b). Portanto, existe uma função h : B → A tal que g ◦ h = f . 6. Seja r :
P(B)∗ → B uma função escolha para B, isto é, r(Y ) ∈ Y , para todo Y ∈ P(B)∗ .
Então a função f : A → B definida como f (x) = r(F (x)) ∈ F (x), para todo
x ∈ A, tem as propriedades desejadas. Reciprocamente, como Im(f ) ⊆ Im(F )
temos, pelo Exercício (4), que existe uma função r : P(B)∗ → B tal que F ◦r = f .
Portanto, r é uma função escolha para B, pois r(X) ∈ X, para todo X ∈ P(B)∗ .
7. Para um x ∈ A fixado, consideremos

Ax = {x} × {y ∈ B : (x, y) ∈ G}.

Então F = {Ax }x∈A é uma família de conjuntos não vazios disjuntos aos pares.
Assim, existe um conjunto escolha C para F tal que C ∩ Ax = {(x, y)}. Logo,
existe uma função f : A → B definida como y = f (x), onde (x, y) ∈ C ∩ A, para
todo x ∈ A, é tal que f ⊆ G. Reciprocamente, seja F uma família de conjuntos

288
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

não vazios disjuntos aos pares. Então, pondo



A = F, B = X e G = {(X, x) : X ∈ X , x ∈ X},
X∈A

obtemos uma função f : A → B, tal que f (X) = x ∈ X, para todo X ∈ A e


f ⊆ G. Portanto, o conjunto C = Im(f ) possui as propriedades desejadas, pois
dado X ∈ F, teremos (X, x) ∈ G. Logo, se f (X) = x ∈ C, então f (X) ∈ C ∩ X.
Por outro lado, se y ∈ C ∩ X, então existe Y ∈ A tal que y = f (Y ), ou seja,
(Y, y) ∈ G e y ∈ Y . Assim, y ∈ X ∩ Y , de modo que X = Y . Portanto,

y = f (Y ) = f (X) e C ∩ X = {f (X)}.

Mais geralmente, sejam G qualquer relação sobre A × B e C = Im(G) ⊆ B.


Então existe uma função escolha r : P(C)∗ → C tal que r(D) ∈ D, para todo
D ∈ P(C)∗ . Pondo Gx = {y ∈ B : (x, y) ∈ G}, a função f : Dom(G) → B
definida com f (x) = r(Gx ) tem as propriedades desejadas, pois f (x) ∈ Gx implica
que f ⊆ G. Reciprocamente, sejam F é uma função, com Dom(F ) = A, tal que
F (x) = ∅, para todo x ∈ A, e B = ∪x∈A F (x). Então

G = {(x, y) : x ∈ A e y ∈ F (x)}

é uma relação sobre A × B. Assim, existe uma função f : A → B tal que f ⊆ G


e Dom(f ) = Dom(G) = A. É claro que f (x) ∈ F (x), para todo x ∈ A. Portanto,
o axioma da escolha está satisfeito. 8. Seja Rx = {y ∈ A : (x, y) ∈ R}, para
cada x ∈ A. Então Rx = ∅ e F = {Rx }x∈A é uma família não vazia de conjuntos
não vazios. Assim, existe uma função escolha r : A → ∪x∈A Rx tal que r(x) ∈
Rx , para todo x ∈ A. Dado x1 ∈ A, vamos definir, recursivamente, uma função
f : N → A como f (1) = x1 e f (n + 1) = r(f (n)), para todo n ∈ N. Portanto,
(f (n), f (n + 1)) ∈ R, para todo n ∈ N. Note que essa afirmação não implica o
axioma da escolha.

Seção 4.2
1. Vamos provar apenas o item (a). Dado (x, y) ∈ A, com x = y, então, pelo
Exemplo 3.57, existe um r ∈ Q tal que x ≤ r ≤ y. Logo, D ∪ {(x, y)} não é uma
cadeia de A, pois os elementos (r, r) e (x, y) não são comparáveis. Portanto, D é
uma cadeia maximal de A. 2. Note que o conjunto D = {(x, x) ∈ R2 : x ∈ R} é

289
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

uma cadeia maximal de R2 que contém C. 3. Sejam A um poset não vazio qualquer
e
F = {C ⊆ A : C é uma cadeia de A}.
Então F =  ∅, pois {x} ∈ F, para todo x ∈ A. Dados C1 , C2 ∈ F, definimos
C1 ≤ C2 se, e somente se, C1 ⊆ C2 . Assim, F é um poset. Sejam C uma cadeia
qualquer de F e M = ∪C∈C C. Então vamos provar que M ∈ F e M = sup(C).
De fato, dados x, y ∈ M , existem C1 , C2 ∈ C tais que x ∈ C1 e y ∈ C2 . Como C é
uma cadeia temos que C1 ⊆ C2 ou C2 ⊆ C1 , digamos C1 ⊆ C2 . Logo, x, y ∈ C2
e x ≤ y ou y ≤ x, pois C2 é uma cadeia. Portanto, M é uma cadeia. É fácil
verificar que M = sup(C). Assim, pelo Lema de Zorn, F contém pelo menos um
elemento maximal, C ∈ F. Portanto, C é uma cadeia maximal de A. 4. Seja
Sa = {x ∈ A : a ≤ x}. Então Sa , com a ordem induzida por A, é um conjunto
indutivamente ordenado. Assim, pelo Lema de Zorn, Sa possui pelo menos um
elemento maximal, digamos b ∈ Sa . Vamos provar que b é o elemento maximal de
A. De fato, seja m ∈ A tal que b ≤ m. Então a ≤ m, pois a ≤ b. Logo, m ∈ Sa .
Portanto, m ≤ b, isto é, m = b. Neste caso, A possui pelo menos um elemento
maximal b tal que b ≥ a. 5. Seja

F = {C ⊆ A : C é uma cadeia de A e B ⊆ C}.

Então F = ∅, pois B ∈ F. Agora, confira o Exercício (3). 6. Consideremos a


família

F = {(B, C) : B ⊆ A e C uma cobertura contável de B},

ou seja, (B, C) ∈ F significa que B = ∪i∈I Bi , em que C = {Bi }i∈I é uma família
de conjuntos contáveis infinitos disjuntos aos pares de A. Então, pelo Exemplo
4.15, F = ∅, pois (E, {E}) ∈ F, com E um subconjunto contável infinito de A.
Dados (B1 , C1 ), (B2 , C2 ) ∈ F, definimos (B1 , C1 )  (B2 , C2 ) se, e somente se,
B1 ⊆ B2 e C1 ⊆ C2 . Assim, F é um poset. Sejam C uma cadeia qualquer de F,
digamos C = {(Bi , Ci )}i∈I , para algum conjunto de índice I, e M = (D, U ), com
D = ∪i∈I Bi e U = ∪i∈I Ci . Então vamos provar que M ∈ F e M = sup(C).
De fato, se D1 , D2 ∈ U , com D1 = D2 , então existem i, j ∈ I tais que D1 ∈ Ci
e D2 ∈ Cj . Como C é uma cadeia temos que Ci ⊆ Cj ou Cj ⊆ Ci , digamos
Ci ⊆ Cj . Logo, D1 , D2 ∈ Cj e D1 ∩ D2 = ∅. Por outro lado, se x ∈ D, então
existe i ∈ I tal que x ∈ Bi . Assim, existe um C ∈ Ci tal que x ∈ C, ou seja,

290
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

U é uma cobertura disjunta de D. Sendo Ci subconjuntos contáveis infinitos de


A temos que U é uma cobertura disjunta de D formada por conjuntos contáveis
infinitos. Portanto, M ∈ F. É fácil verificar que M = sup(C). Logo, pelo Lema
de Zorn, F contém pelo menos um elemento maximal, digamos (D, U ) ∈ F. Se
A − D fosse um conjunto infinito, então, pelo Exemplo 4.15, A − D conteria um
subconjunto contável infinito E de A. Assim, (D ∪ E, U ∪ {E}) ∈ F, o que
contradiz a maximalidade de (D, U ). Neste caso, D0 = A − D é um conjunto
finito. Como A é um conjunto infinito temos, pelo Exemplo 4.15, que A contém
pelo menos um subconjunto contável infinito. Logo, D contém pelo menos um tal
elemento E e F = E ∪D˙ 0 é um subconjunto contável infinito de A. Portanto,

A = D∪D
˙ 0 = [(D − E)∪E]
˙ ∪D˙ 0 = (D − E)∪F
˙

é uma união disjunta de conjuntos que são cada contável infinito. 7. (a) Sejam C
uma cadeia qualquer de A e M = ∪C∈C C. Então vamos provar que M ∈ A e que
M é uma cota superior de C. De fato, seja B um subconjunto finito qualquer de M .
Então existe um C ∈ C tal que M ⊆ C, pois existem C1 , . . . , Cn ∈ C tais que

C ⊆ C1 ∪ · · · ∪ Cn .

Logo, pelo Exemplo 4.19, existe um Cj , com 1 ≤ j ≤ n, tal que Ci ≤ Cj , para todo
i = 1, . . . n. Portanto, C ⊆ Cj , ou seja, M ∈ A e claramente M é uma cota superior
de C. (b) Consequência direta do Lema de Zorn. 8. Seja A um conjunto não vazio
indutivamente ordenado. Então existe uma função escolha r : P(A)∗ → A para
A. Vamos construir, indutivamente, uma sequência crescente f : Z+ → A como
f (0) = a0 e
f (n) = r ({a0 , . . . , an−1 })
a cota superior do conjunto {a0 , . . . , an−1 }. Assim, f está bem definida e é cres-
cente. Então obtemos a cadeia {an }n∈Z+ , a qual possui uma cota superior. Portanto,
A possui um elemento maximal, pois qualquer cadeia possui uma cota superior.
9. Já vimos que se f : A → A é uma função, então x ∼ y se, e somente se,
f (x) = f (y), para todos x, y ∈ A, define uma relação de equivalência sobre A
tal que Ax = f −1 (x) é a classe de equivalência determinada por x. Neste caso,
{Ax : x ∈ A} é uma a família não vazia de conjuntos não vazios. Assim, existe
uma função escolha g : A → ∪x∈A Ax = A definida como g(x) ∈ Ax = f −1 (x),

291
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

para todo x ∈ A. Portanto,

(f ◦ g ◦ f )(x) = (f ◦ g)(f (x)) = f (x), ∀ x ∈ A.

Consequentemente, f ◦ g ◦ f = f . 10. Note que G =  ∅, pois {eG } ∈ G. Dados


H, K ∈ G, definimos H ≤ K se, e somente se, H ⊆ K. Assim, G é um poset. Seja
C = {Hi : i ∈ I} uma cadeia qualquer de G. Então M = ∪i∈I Hi é um subgrupo
de G. De fato, é claro que M = ∅, pois e ∈ Hi , para todo i ∈ I. Dados a, b ∈ M ,
existem i, j ∈ I tais que a ∈ Hi e b ∈ Hj . Como C é uma cadeia temos que
Hi ⊆ Hj ou Hj ⊆ Hi , digamos Hi ⊆ Hj . Logo, a, b ∈ Hj e ab−1 ∈ Hj , pois Hi é
um subgrupo de G. Portanto, ab−1 ∈ M e M é um subgrupo de G. É claro que M é
uma cota superior de C. Vamos provar que M ∈ G. Com efeito, como Hi ⊆ S, para
todo i ∈ I, temos que M ⊆ S. Finalmente, pelo Lema de Zorn, M é um elemento
maximal de G. Portanto, M é um subgrupo maximal de G. 11. Sejam G um grupo
não abeliano qualquer e F a família de todos os subgrupos abelianos de G. Então
F =  ∅, pois {e} ∈ F. Dados H, K ∈ F, definimos H ≤ K se, e somente se,
H ⊆ K. Assim, F é um poset. Seja C = {Hi : i ∈ I} uma cadeia qualquer de F.
Então M = ∪i∈I Hi é um subgrupo de G. De fato, é claro que M = ∅, pois e ∈ Hi ,
para todo i ∈ I. Dados a, b ∈ M , existem i, j ∈ I tais que a ∈ Hi e b ∈ Hj .
Como C é uma cadeia temos que Hi ⊆ Hj ou Hj ⊆ Hi , digamos Hi ⊆ Hj . Logo,
a, b ∈ Hj e ab−1 ∈ Hj , pois Hi é um subgrupo de G. Portanto, ab−1 ∈ M e M
é um subgrupo de G. É claro que M é uma cota superior de C. Vamos provar que
M ∈ F. Com efeito, dados a, b ∈ M , existem i, j ∈ I tais que a ∈ Hi e b ∈ Hj .
Como C é uma cadeia temos que Hi ⊆ Hj ou Hj ⊆ Hi , digamos Hi ⊆ Hj . Logo,
a, b ∈ Hj e ab = ba, pois Hi é um subgrupo abeliano de G. Finalmente, pelo Lema
de Zorn, M é um elemento maximal de F. Portanto, M é um subgrupo maximal
abeliano de A. 12. Seja F a família de todos os ideais J em A, onde I ⊆ J e
J = A. Então F = ∅, pois I ∈ F. Dados J, K ∈ F, definimos J ≤ K se, e
somente se, J ⊆ K. Assim„ F é um poset. Seja C = {Ji : i ∈ Λ} uma cadeia

qualquer de F. Então M = Ji é um ideal em A. De fato, é claro que M = ∅,
i∈Λ
pois 0 ∈ Ji , para todo i ∈ Λ. Dados a, b ∈ M , existem i, j ∈ Λ tais que a ∈ Ji e
b ∈ Jj . Como C é uma cadeia temos que Ji ⊆ Jj ou Jj ⊆ Ji , digamos Ji ⊆ Jj .
Logo, a, b ∈ Jj e a − b, ab ∈ Jj , pois Ji é um ideal em A. Portanto, a − b, ab ∈ M
e M é um ideal em A. É claro que M é uma cota superior de C. Vamos provar que
M ∈ F. Com efeito, se M = A, então 1 ∈ M . Logo, existe um i ∈ Λ tal que

292
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

1 ∈ Ji . Assim, Ji = A, o que é impossível. Finalmente, pelo Lema de Zorn, M


é um elemento maximal de F. Portanto, M é um ideal maximal em A contendo I.
13. (a) Seja

F = {γ : γ é um conjunto de vetores LI de V e α ⊆ γ ⊆ β}.

Então F = ∅, pois α ∈ F. Dados γ, δ ∈ F, definimos γ ≤ δ se, e somente se,


γ ⊆ δ. Assim, F é um poset. Sejam C qualquer cadeia de F e L = ∪γ∈C γ. Vamos
provar que L ∈ F. De fato, sejam u1 , . . . , un vetores distintos de L e x1 , . . . , xn
escalares de K tais que
x1 u1 + · · · + xn un = 0.
Como ui ∈ L temos que existe um γi ∈ C tal que ui ∈ γi . Pelo Exemplo 4.19,
existe um γj , com 1 ≤ j ≤ n, tal que γi ≤ γj , para todo i = 1, . . . n. Logo,
u1 , . . . , vn ∈ γj . Portanto, xi = · · · = xn = 0. É claro que L é uma cota superior
de C. Pelo Lema de Zorn, F contém um elemento maximal, digamos δ. Portanto,
pelo Lema 4.31, V = [δ] e δ é uma base de V . (b) Basta tomar β = V no item
(a). (c) Basta tomar α = ∅ no item (a). 14. Sejam {ui }i∈In uma base de Rn visto
como espaço vetorial sobre R e {xj }j∈J uma base de Hamel de R. Então é fácil
verificar que {xj ui }(i,j)∈In ×J é uma base de Hamel de Rn . A função T : Rn → R
definida como
k  m 
k 
m
T( rij xj ui ) = rij xj
i=1 j=1 i=1 j=1

tem as propriedades desejadas. Por exemplo, como T (xj ui ) = xj temos que ela
leva base em base. Assim, T é bijetora. 15. Se x ∧ a = 0, então

x = x ∧ 1 = x ∧ (a ∨ a ) = (x ∧ a) ∨ (x ∧ a ) = 0 ∨ (x ∧ a ) = x ∧ a .

Portanto, x ≤ a . Reciprocamente, se x ≤ a , então x ∧ a ≤ a ∧ a = 0, de modo


que x ∧ a = 0. 16. Seja Z, com a ordem usual, a ∧ b = min a, b e a ∨ b = max a, b,
é um reticulado. É fácil verificar que qualquer ideal de Z é um ideal primo. Em
particular, o ideal principal P = {x ∈ Z : x ≤ 0} é um ideal primo. Enquanto, se
M é um ideal maximal de Z e M = Z, então existe um m ∈ Z tal que m ∈ / M.
Assim, x ∈ M implica que x < m ou x > m. Se M ⊂ ] − ∞, m[, então é fácil

293
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

verificar que o conjunto

J = {x ∈ Z : x ≤ m + 1}

é ideal de Z, com M ⊂ J, o que é impossível. Por outro lado, A = {a, b, c, d, e}


ordenada pelo diagrama de Hasse, confira Figura 3.2 (a), é um reticulado. É fácil
verificar que M = {a, c} é um ideal maximal, mas não é um ideal primo. 17.
Aplique o Lema de Zorn a família

F = {I ⊆ A : I é um ideal de A, com I ∩ S = ∅}.

Então F = ∅, pois I = {0} ∈ F. 18. Aplique o Lema de Zorn a família

F = {I ⊆ A : I é um ideal próprio de A}.

Então F = ∅, pois I = {0} ∈ F.

Seção 4.3
1. Basta provar que a função f : N × I → R+ definida como f (n, x) = n + x − 1
tem as propriedades desejadas. Note que qualquer elemento de I × N possui um
sucessor imediato, enquanto R+ não. 2. Sejam A um poset não vazio qualquer e

F = {B ⊆ A : B é bem ordenado}.

Então F = ∅, pois {a} ∈ F, para todo a ∈ A. Dados C1 , C2 ∈ F, definimos


C1 ≤ C2 se, e somente se, C1 ⊆ C2 . Assim, F é um poset. Sejam C uma cadeia
qualquer de F e M = ∪C∈C C. Então prove que M ∈ F e use o Lema de Zorn.
3. Confira o Execício (2). 4. Suponha,os que R não bem ordena A. Então A
conté um subonjunto não vazio S com a seguinte propriedade: para cada x ∈ S,
existe um y ∈ S tal que yRx. Assim, podemos escolher, indutivamente, elementos
x1 , . . . , xn , . . . ∈ S tais que xn+1 Rxn , para todo n ∈ N. Portanto, existe uma
sequência infinita {xn : n ∈ N} de elementos de A tal que xn+1 Rxn , para todo
n ∈ N. 5. Seja ≤ uma boa ordenação para A. Então, dados X, Y ∈ P(A),
definimos X  Y se, e somente se, o menor elemento de X + Y pertence a X, em
que
X + Y = (X − Y ) ∪ (Y − X) = (X ∪ Y ) − (X ∩ Y ).
6. (i) Se existisse um filtro F  sobre A tal que F ⊂ F  , então existe um X ∈ F  −F.

294
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Assim, a ∈ / X. Por outro lado, {a} ∈ F  implica que ∅ = X ∩ {a} ∈ F  ,


o que é impossível. (ii) (a) Sejam X, Y ∈ F. Então, pela Lei de De Morgan,
A − (X ∩ Y ) = (X ∩ Y ) = (A − X) ∪ (A − Y ) é finito. Assim, X ∩ Y ∈ F. (b)
Se X ∈ F e X ⊆ Y , então A − Y ⊆ A − X. Assim, A − Y é finito, pois A − X
é finito. Logo, Y ∈ F. (c) Como A − ∅ = A temos que ∅ ∈ / F. Portanto, F é um
filtro não principal sobre A, pois se B ∈ F, então existe um subconjunto cofinito
próprio X de B tal que X ∈ F. (iii) A família

A = {F : F é um filtro próprio sobre A}

é não vazia. Dados F1 , F2 ∈ A, F1 ≤ F2 se, e somente se, F1 ⊆ F2 . Assim, A


é um poset. Sejam C uma cadeia qualquer de A e M = ∪F ∈C F. Então prove que
M ∈ A e use o Lema de Zorn. 7. Direto das definições.

Capítulo 5
Seção 5.1
1. Suponhamos que A seja um conjunto transitivo. Então C ⊆ A, para todo C ∈ A.
Como B ∈ C e C ⊆ A temos que B ∈ A. Reciprocamente, dado X ∈ A, se
a ∈ X, então a ∈ A. Logo, X ⊆ A. Portanto, A é um conjunto transitivo. 2.
Sejam X ∈ Y e Y ∈ A ∪ B. Então [X ∈ Y e Y ∈ A] ou [X ∈ Y e Y ∈ B].
Assim, por hipótese, X ∈ A ou X ∈ B. Logo, X ∈ A ∪ B. Portanto, pelo
Exercício (1), A ∪ B é um conjunto transitivo. 3. Como A = B temos que A+ =
A ∪ {A} = B ∪ {B} = B + . 4. Seja S = {n ∈ ω : n ∈ / n}. Então 0 ∈ S, pois
0∈ / 0 = ∅. Suponhamos que o resultado seja válido para algum n, isto é, n ∈ S.
Então n+ ∈ / n+ , pois se n+ ∈ n+ , então n+ ∈ n ou n+ = n implica que n ∈ n, o
que é impossível. Portanto, n+ ∈ S. Assim, pelo P IF , S = ω. 5. (a) Se n = n+ ,
então n ∈ n, o que, pelo Exercício (4), é impossível. Portanto, n = n+ , para todo
n ∈ ω. (b) Se m ∈ n, então m ∈ n+ = n. Logo, n ∈ / m. (c) Pelo Lema 5.8, p
é um conjunto transitivo. Assim, pelo Exercício (1), m ∈ p. (d) Se m ∈ n, então
m ⊆ n, pois n é um conjunto transitivo. Portanto, m+ = m ∪ {m} ⊆ n. 6. Seja
S = {n ∈ ω : A ∈ n ⇒ A ∈ ω}. Então 0 ∈ S, pois A ∈ ∅ ∈ ω implica que A ∈ ω,
desde que A ∈ ∅ é impossível. Suponhamos que o resultado seja válido para algum
n, isto é, n ∈ S. Então A ∈ n+ = n ∪ {n}. Assim, A ∈ n ou A = n implica
que A ∈ ω. Portanto, n+ ∈ S. Logo, pelo P IF , S = ω. Consequentemente, ω
é um conjunto transitivo. 7. Como A ∈ A+ e A+ ∈ ω temos, pelo Exercício (6),
que A ∈ ω. 8. Suponhamos, por absurdo, que n ∈ ω seja um conjunto indutivo.

295
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Então, por definição, ω ⊆ n. Portanto, n = ω, o que é impossível. 9. Seja n ∈ ω.


Então n = {0, 1, . . . , n − 1}. Assim, se m ∈ n e n ⊆ m, então m ∈ m, o que
é impossível. 10. Sejam IA ∈ AA e g : AA → AA uma função definida como
g(h)(x) = h(x). Então, pelo Teorema 5.11, existe uma única função f : ω → AA
definida como f (n) = hn tal que f (0) = IA e f (n+ ) = g(f (n)), para todo n ∈ ω.
Portanto, hn é um elemento unicamente determinado em AA , para todo n ∈ ω, com
as propriedades desejadas. 11. As funções f : Z → Z definidas como

f (n) + 1, se f (n) < 0
f (n + 1) =
f (n), se f (n) ≥ 0

são tais que f (0) = 0 e f (n + 1) = g(f (n)), para todo n ∈ Z. Em particular, para
cada a ∈ Z fixado, com a ≤ 1, consideremos

n + a, se n < a
fa (n) =
0, se n ≥ a

Isto ocorre pois Z não é um conjunto bem ordenado com a ordem usual. 12. Pri-
meiro lembramos que uma sequência estritamente crescente sobre A é uma função
f : ω → A tal que

∀ m, n ∈ ω [m < n ⇒ f (m) < f (n)].

Vamos denotar f (n) = xn e usar indução sobre n. Como A = ∅ temos que ele
contém um elemento, digamos x0 ∈ A. Suponhamos que o resultado seja válido
para algum n, ou seja,
x 0 < x 1 < x2 < · · · < x n .
Consideremos o conjunto An = {x ∈ A : x > xn }. Então An = ∅, pois caso
contrário xn seria o elemento maximal de A, o que é uma contradição. Assim, An
contém um elemento, digamos xn+1 ∈ An , e

x0 < x1 < x2 < · · · < xn < xn+1 .

Portanto, indutivamente, obtemos uma sequência crescente

S0 = {x0 }, S1 = {x0 , x1 }, . . . , Sn = {x0 , x1 , . . . , xn+1 }, . . .

296
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Pondo f = ∪n∈ω Sn = {xn }n∈ω temos a sequência sobre A estritamente crescente:

x 0 < x1 < x2 < · · · < x n < · · ·

Seção 5.2
1. Vamos provar apenas o item (a). Para m e n fixados, seja S = {p ∈ ω : m =
n ⇒ m + p = n + p}. Então 0 ∈ S. Suponhamos que o resultado seja válido para
algum p, isto é, p ∈ S. Então

m + p+ = m + (p + 1) = (m + p) + 1 = (n + p) + 1 = n + (p + 1) = n + p+ .

Portanto, p+ ∈ S e S = ω. 2. Confira o Lema 5.28. 3. Confira o Lema 5.19. 4.


Vamos provar apenas o item ()a. Paras m e n fixados, consideremos a afirmação
P (p): m < n implica que mp < np, para todo p ∈ ω − {0}. Então P (1) é
verdadeira, pois m · 1 = m < n = n · 1. Suponhamos que a afirmação P (p) seja
verdadeira. Então, pelo item (a) do Exercício (3),

mp+ = m(p + 1) < mp + n, np + n = n(p + 1) = np+ .

Logo, P (p+ ) é verdadeira. Portanto, P (p) é verdadeira, para todo p ∈ ω. Note que
podemos usar este resultado para provar que o conjunto S = {n ∈ ω : 0 < n < 1} é
vazio. De fato, se S = ∅, então, pelo Teorema 5.29, S contém um menor elemento,
digamos n0 ∈ S. Assim, 0 < n0 < 1 implica que 0 < n20 < n0 < 1. Logo, n20 ∈ S,
o que contradiz a minimalidade de n0 . Portanto, S = ∅. 5. Seja m ∈ n. Então
m ∈ ω, pois ω é transitivo. Logo, m < n e m ∈ Sn , ou seja, n ⊆ Sn . Por outro
lado, se m ∈ Sn , então m < n. Assim, m ∈ n, ou seja, Sn ⊆ n. Portanto, n = Sn .
6. Para m fixado, seja S o conjunto dos elementos n em ω tais que pelo menos uma
das condições
m < n ou m = n ou m > n
seja verdadeira. Então 0 ∈ S, pois 0 é o menor elemento de ω. Suponhamos que
o resultado seja válido para algum n, isto é, n ∈ S. Então m ≤ n ou m > n.
Se m ≤ n, então m < n+ . Se m > n, então, pelo item (2) do Lema 5.28,
n+ ≤ m. Assim, em qualquer caso, n+ ∈ S. Portanto, S = ω. Vamos provar
que ocorre exatamente uma das três condições. Se m < n e m = n, então m ∈ n
e m = n. Logo, n ∈ n, o que é impossível. De modo análogo, prova-se as outras
possibilidades. 7. Vamos provar apenas o item (b). Suponhamos, por absurdo, que

297
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

m ≥ n. Então m = n ou m > n. Se m = n, então, pelo item (b) do Exercício


(1), pm = pn, para todo p ∈ ω, com p = 0, o que é impossível. Se m > n, então,
pelo item (a) do Exercício (4), pm > pn, para todo p ∈ ω, com p = 0, o que é
impossível. Portanto, m < n. 8. Consideremos o conjunto S = {t ∈ ω : tb ≤ a}.
Então S ⊆ ω e S = ∅, pois 0 ∈ S. Note que a é uma cota superior de S, pois
t ≤ tb, para todo t ∈ S. Assim, pelo Exemplo 5.31, S contém um maior elemento,
digamos q ∈ S. Logo, qb ≤ a < (q + 1)b. Pondo r = a − qb, obtemos

0 ≤ r = a − qb < (q + 1)b − qb = b.

Para provar que q e r são únicos. Sejam q  , r ∈ ω outro par. Suponhamos, por
absurdo, que r = r , digamos r < r . Como

a = qb + r e a = q  b + r

temos que 0 < r − r = (q − q  )b. Observe que q ≥ q  , pois b > 0. Se q > q  , então
b ≤ (q − q  )b. Logo,

b ≤ (q − q  )b = r − r < b − r ≤ b,

o que é impossível. Assim, q = q  implica que r − r = 0, o que é uma contradição.


Portanto, r = r e q = q  . Uma outra prova seria aplicando o P BO ao conjunto

S = {t ∈ ω : t + xb = a, para algum x ∈ ω}.

Então S ⊆ ω e S = ∅, pois a ∈ S quando x = 0. 9. Consequência direta do


Exercício (8). 10. Note que dado q ∈ ω, sempre podemos escolher p ∈ ω tal que

p(p + 1) (p + 1)(p + 2)
≤q< .
2 2
Neste caso,

p(p + 1) (p + 1)(p + 2)
m=q− ∈ω e n= − (q + 1) ∈ ω.
2 2
Assim, dado q ∈ N, existe um (m, n) ∈ ω × ω tal que f (m, n) = q, pois m + n = p
e m + n + 1 = p + 1. Logo, f é sobrejetora. Para provar que f é injetora. Dados
(k, l), (m, n) ∈ ω × ω, se (k, l) = (m, n), então há três casos a serem considerados:

298
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Se k+l = m+n e k < m, então f (k, l) < f (m, n). Se k+l < m+n (k+l > m+n
inteiramente análogo), então existe um único r ∈ ω, r > 0, tal que m+n = k+l+r.
Observe, pelo primeiro caso, que

f (k, l) ≤ f (k + l, 0) e f (0, m + n) ≤ f (m, n).

Assim, basta provar que f (k + l, 0) < f (0, m + n). De fato,

f (0, m + n) = 21 (m + n)(m + n + 1)
= 12 (k + l + r)(k + l + r + 1)
= 12 [(k + l)2 + (k + l)(2r + 1) + r(r + 1)]
> 12 [(k + l)2 + 3(k + l)]
= (k + l) + 12 (k + l)(k + l + 1)
= f (k + l, 0).

Portanto, em qualquer caso, f ((k, l)) = f ((m, n)), isto é, f é injetora.

Capítulo 6
Seção 6.1
1. Como a função identidade IA : A → A é bijetora temos que A ≈ A. Se A ≈ B,
então existe uma função bijetora f : A → B. Assim, f −1 : B → A é bijetora
e B ≈ A. Se A ≈ B e B ≈ C, então existem funções bijetoras f : A → B e
g : B → C. Logo, g ◦ f : A → C é bijetora. Portanto, A ≈ C. 2. Confira o
Exemplo 6.17. 3. Como A não vazio temos que existe um x0 ∈ A. Se A  B,
então existe uma função injetora f : A → B. Assim, a função g : B → A definida
como  −1
f (y), se y ∈ f (A)
g(y) =
x0 , se y ∈ B − f (A)
é sobrejetora. Reciprocamente, suponhamos que exista uma função g : B → A
sobrejetora. Além disso, pelo Princípio da Boa Ordenação, podemos supor que B
seja bem ordenado. Então a função f : A → B definida como f (x) = min{y ∈
B : g(y) = x} é injetora. Portanto, A  B. 4. Como A ≈ B temos que existe
uma função bijetora f : A → B. Então a função g : A ∪ C → B ∪ C definida como

f (x), se x ∈ A
g(x) =
x, se x ∈ C

299
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

é bijetora (prove isto!). Portanto, A ∪ C ≈ B ∪ C. Tome A = {1, 2} e B = C =


{2, 3}. Então é claro que A ∪ C = {1, 2, 3} e B ∪ C = {2, 3} não são equipotentes.
5. Confira o Teorema 6.32. 6. Como A ≈ B temos que existe uma função bijetora
f : A → B. Assim, pelo Teorema 2.23, a função F : P(A) → P(B) definida como
F (X) = f (X) é bijetora. Portanto, P(A) ≈ P(B). 7. Seja f : (A−B) → (B−A)
uma função bijetora. Como A = (A ∩ B)∪(A ˙ − B) e B = (A ∩ B)∪(B ˙ − A) temos
que a função g : A → B definida como

f (x), se x ∈ A − B
g(x) =
x, se x ∈ A ∩ B

é bijetora (prove isto!). Portanto, A ≈ B. 8. Pelo Exemplo 6.4, existem funções


bijetoras f : B1 (O) → Br (P ) e g : B1 (O) → Bs (Q), respectivamente. Então
é fácil verificar que a h = g ◦ f −1 : Br (P ) → Bs (Q) é bijetora. Portanto, os
conjuntos Br (P ) e Bs (Q) são equipotentes. 9. Como E ∪ X é enumerável temos
que E ∪ X ≈ E. Assim, pondo C = A − E, obtemos

A ∪ X = C ∪ E ∪ X ≈ C ∪ E = A.

Portanto, A e A ∪ X são equipotentes. 10. Como Bi ≈ Ci temos que existe


uma função bijetora fi : Bi → Ci , para cada i ∈ I. Assim, pelo Teorema 2.35,
existe uma única função bijetora f : ∪i∈I Bi → ∪i∈I Ci tal que f |Bi = fi , para
todo i ∈ I. Portanto, ∪i∈I Bi ≈ ∪i∈I Ci . 11. Para cada i ∈ I, existe uma função

bijetora fi : Bi → Ci . Então a função F : i∈I Bi → i∈I Ci definida como
F ({xi }i∈I ) = {fi (xi )}i∈I é bijetora (prove isto!). 12. Vamos provar apenas os
itens (a) e (c): (a)É claro que ∅ ∈ Pf (A). Se X ∈ Pf (A) e x ∈ A, então
X ∪ {x} ∈ Pf (A), caso contrário, pelo Teorema 6.13, (X ∪ {x}) − {x} = X seria
um conjunto infinito, o que é impossível. Seja Q qualquer subconjunto de P(A)
satisfazendo as condições (i) e (ii). Então, por (ii), X ∈ Q, para todo X ∈ Pf (A),
pois
X = ∅ ∪ X = (∅ ∪ {x0 }) ∪ · · · ∪ (∅ ∪ {xn }),
para algum n ∈ ω. (c) Vamos usar indução sobre o número de elementos de A. Se
A = ∅, então P(A) = {∅} é finito. Suponhamos que P(A) seja finito quando A
possuir n elementos e que B = {b0 , b1 , . . . , bn }. Então, pondo

A = {b0 , b1 , . . . , bn−1 } e C = {X ⊆ B : bn ∈ X},

300
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

é fácil verificar que a função f : C → P(A) definida como f (X) = X − {bn } é


bijetora. Assim, P(A) e C são finitos. Portanto, pelo item (b), P(B) = P(A) ∪ C
é finito.

Seção 6.2
1. Basta observar que a função f : [0, +∞[ → [0, 1[ definida como
x
f (x) = √
1− x

injetora. 2. Confira o Exercício (5) da Seção 6.1. 3. Basta observar que 2ω ⊆


ω ω ⊆ P(ω × ω). 4. Seja A um conjunto tal que α = |A|. Então, pelo Teorema de
Cantor, A ≺ P(A). Portanto, α < 2α , pois P(A) ≈ 2A . 5. Note que Ab = f −1 (b)
é um subconjunto não vazio de A, para todo b ∈ f (A), e Ab ∩ Ac = ∅ quando b = c.

Assim, pelo axioma da escolha, existe um g ∈ b∈f (A) Ab . Logo, g : f (A) → A é
injetora, pois dados b, c ∈ f (A), se b = c, então g(b) ∈ Ab e g(c) ∈ Ac implicam
que g(b) = g(c). Portanto, |f (A)|  |A|. 6. Confira o Exercíco (3) da Seção 6.1.
7. Como f : A → B e g : B → A são funções sobrejetoras temos, pelo Lema 6.20,
que |B|  |A| e |A|  |B|. Portanto„ pelo Corolário 6.23, |A| = |B|. 8. A função
j : A → B definida como j(x) = x é claramente injetora. Por outro lado, como A é
equipotente a C temos que existe uma função f : A → C bijetora. Assim, a função
g = f −1 |B : B → A é injetora. Portanto, pelo Corolário 6.23, A é equipotente a B.
Consequentemente, B é equipotente a C. 9. A função j : ω → ω ×· · ·×ω definida
como j(x) = (x, 0, . . . , 0) é claramente injetora. Por outro lado, sejam 2, 3, . . . , pn
os primeiros n números primos. Então a função f : ω × · · · × ω → ω definida
como f (r1 , r2 , . . . , rn ) = 2r1 3r1 · · · prnn é injetora, pelo Teorema Fundamental da
Aritmética. Portanto, pelo Corolário 6.23, |ω × · · · × ω| = |ω n | = |ω|. 10. É claro
que
A×B = Sk , Sk = {(ai , bj ) : i + j = k + 1}.
k∈ω−{0}

Se (x, y) ∈ Sm ∩ Sn , então (x, y) = (ai , bj ) = (ar , bs ), com i + j = m + 1 e


r + s = n + 1. Como x = ai = ar e y = bj = bs temos que m = n, ou seja,
Sm = Sn . 11. Pelo Exercício (6), existe uma função sobrejetora fi : ω → Ai , para
cada i ∈ ω. Sabemos que cada n ∈ ω − {0} pode ser escrito de modo único sob a
forma n = 2i 3j m, com mdc(m, 2) = 1 = mdc(m, 3). Assim, a função f : ω → A
definida como f (0) = f0 (0) e f (n) = fi (j) é sobrejetora, pois dado x ∈ A, existe
um i ∈ ω tal que x ∈ Ai . Logo, existe um j ∈ ω tal que x = fi (j). Portanto,

301
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

existe um n = 2i 3j ∈ ω tal que x = f (n). 12. Para cada a ∈ R fixado, a função


fa : R → R definida como fa (x) = a é claramente um elemento de C(R, R). Então
a função f : R → C(R, R) definida como f (a) = fa está bem definida e é injetora.
Portanto, |R ≤ |C(R, R)|. Por outro lado, a função ϕ : C(R, R) → 2Q definida
como ϕ(f ) = f |Q está bem definida e é injetora. De fato, dados f, g ∈ C(R, R), se
ϕ(f ) = ϕ(g), então f |Q = g|Q , ou seja, f (r) = g(r), para todo r ∈ Q. Dado x ∈ R,
existe, pelo Exemplo 3.57, uma sequência {rn }n∈N em Q tal que limn→∞ rn = x.
Assim,
f (x) = lim f (rn ) = lim g(rn ) = g(x),
n→∞ n→∞

ou seja, f = g e ϕ é injetora. Portanto, |C(R, R)| ≤ |2Q | = |R|. Consequentemente,


|C(R, R)| = |R|. 13. Sejam U a classe universal, C = ∪U e B = P(C). Então,
pelo Teorema de Cantor, |C| ≺ |B|. Como |X|  |C|, pois se X ∈ U , então
X ⊆ C, temos, por transitividade, que |B|  |X|, para todo X ∈ U . 14. Seja C
o conjunto de todos os conjuntos. Então, pelo Exercício (13), existe um conjunto
B ∈ C tal que |B|  |X|, para todo X ∈ C. Como P(B) ∈ C temos que
|P(B)| ≺ |B|, o que contradiz o Teorema de Cantor.

Seção 6.3
1. Como A ∪ B = A∪(B
˙ − A) e B = (A ∩ B)∪(B
˙ − A) temos que

|A ∪ B| = |A| + |B − A| e |B| = |A ∩ B| + |B − A|.

Assim, |A ∪ B| + |A ∩ B| = |A| + |B − A| + |A ∩ B| = |A| + |B|. Portanto,


α + β = |A ∪ B| + |A ∩ B|. 2. Sejam f : A → [0, 1[ e g : A ∪ B → [1, 2[ funções
bijetoras. Se A ∩ B = ∅, então a função h : A → [0, 2[ definida com

f (x), se x ∈ A
h(x) =
g(x), se x ∈ B

é claramente bijetora (prove isto!). Portanto, |A ∪ B| = c. Se A ∩ B = ∅, então a


função h : A ∪ B → [0, 2[ definida com

f (x), se x ∈ A
h(x) =
g(x), se x ∈ B − A

é claramente injetora (prove isto!). Assim, |A ∪ B| ≤ c. Como A ⊆ A ∪ B temos


que c = |A| ≤ |A ∪ B|. Portanto, pelo Corolário 6.23, |A ∪ B| = c. 3. Vamos

302
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

provar apenas os itens (c) e (d): (c) Sejam A e B conjuntos tais que α = |A| e
β = |B|. Como a função f : A × B → B × A definida como f (x, y) = (y, x)
é claramente bijetora temos que α + β = β + α. (d) Seja A um conjunto tal que
α + 1 = |A| = β + 1. Então existem subconjuntos B e C de A tais que α = |B|,
β = |C| e A − B, A − C possuem um elemento cada. Sejam A − B = {x} e
A − C = {y}. Então

A − (B ∩ C) = A ∩ (B ∩ C) = A ∩ (B  ∪ C  )
= (A − B) ∪ (A − C) = {x, y}.

Assim, existem duas possibilidades: se x = y, então B = B ∩ C = C, de modo


que α = β. Se x = y, então

B = (B ∩ C) ∪ (B − C) = (B ∩ C) ∪ {y} e C = (B ∩ C) ∪ {x},

de modo que

α = |B| = |(B ∩ C) ∪ {y}| = |(B ∩ C) ∪ {x}| = |C| = β.

4. Vamos provar apenas os itens (d) e (f ): (d) Como α  β e γ  δ temos, pela


Proposição 6.37, que existem números cardinais β1 e δ1 tais que β = α + β1 e
δ = γ + δ1 . Logo,

βδ = (α + β1 )(γ + δ1 ) = α(γ + δ1 ) + β1 (γ + δ1 )
= αγ + (αδ1 + β1 γ + β1 δ1 ).

Portanto, pela Proposição 6.37, βδ  αγ. (f ) Como 2  α temos, pelo item (d),
que 2 · α  α · α. Portanto, α + α  α · α, pois α + α = 2 · α. 5. Vamos provar
apenas os itens (a) e (d): (a) Sejam A, B e C conjuntos tais que α = |A|, β = |B|
e γ = |C|, com B ∩ C = ∅. Seja F : AC × B C → (A × B)C definida como
F (f, g) = h, com h(z) = (f (z), g(z)), para todo z ∈ C. Note que F está bem
definida. Dados (f, g), (f1 , g1 ) ∈ AC × B C , se h = F (f, g) = F (f1 , g1 ) = h1 ,
então
(f (z), g(z)) = h(z) = h1 (z) = (f1 (z), g1 (z)), ∀ z ∈ C.
Assim, f (z) = f1 (z) e g(z) = g1 (z), para todo z ∈ C. Logo, f = f1 e g =
g1 . Portanto, (f, g) = (f1 , g1 ) e F é injetora. Dado h ∈ (A × B)C , digamos
h(z) = (xz , yz ) ∈ A × B, para todo z ∈ C. Então existem funções f : C → A

303
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

e g : C → B definidas como f (z) = xz e g(z) = xy tais que F (f, g) = h, ou


seja, F é sobrejetora. Portanto, AC × B C ≈ (A × B)C e (αβ)γ = αγ β γ . (d)
Vamos provar o caso n = 2, o caso geral, segue por indução sobre n. Seja A
um conjunto tal que α = |A|. Então a função F : 2A → A × A definida como
F (f ) = (f (1), f (2)) é bijetora (prove isto!). Portanto, A × A ≈ 2A e α · α = α2 .
6. Sejam A = {0, 1, . . . , n − 1} e I = ]n − 1, n[. Então A ∪ I ⊆ R, de modo que
|A ∪ I| ≤ |R|. Por outro lado, I ⊆ A ∪ I implica que |R| ≤ |A ∪ I|. Portanto, pelo
Corolário 6.23, n + c = c, para todo n ∈ ω. 7. Como ℵ0 = ℵ0 + ℵ0 temos, pelo
Exemplo 6.16, que

c = 2ℵ0 = 2ℵ0 +ℵ0 = 2ℵ0 · 2ℵ0 = c · c.

8. Seja A = ω∪ ]0, 1[. Então |A| = ℵ0 + c, pois ω e ]0, 1[ são conjuntos disjuntos.
Por outro lado, como R ≈ ]0, 1[ ⊆ A e A ≈ A ⊆ R temos, pelo Corolário 6.23,
que A ≈ R. Portanto, ℵ0 + c = c. 9. Vamos provar apenas o item (a). Sejam A e
B conjuntos tais que α = |A| e β = |B|. Então |A × B| = α · β = 0 = |∅|, ou seja,
A × B ≈ ∅. Logo, A ≈ ∅ ou B ≈ ∅. Portanto, α = 0 ou β = 0. 10. Já vimos,
pelo Exemplo 4.15, que existe uma função injetora f : ω → A. Portanto, |ω ≤ |A|.
11. É fácil verificar que a função f : A → ω definida como

i, se x = xi ∈ F
f (x) =
x + n + 1, se x ∈ ω

é bijetora (prove isto!). Portanto, |A| = |ω|. 12. Pelo Exercício (9) existe um
subconjunto enumerável E de A tal que |E| = |ω|. Assim, A = E ∪(A˙ − E). Logo,
B = F ∪E˙ ∪(A
˙ − E). Pelo Exercício (10), existe uma função bijetora g : F ∪E
˙ →
E. A função f : B → A definida como

g(x), se x ∈ F ∪E
˙
f (x) =
x, se x ∈ A − E

é bijetora (prove isto!). Portanto, |A| = |B|. 13. Como A é um conjunto infinito
temos, pelo Exercício (6) da Seção 4.2, que A = ∪i∈I Ei é uma união disjunta de
conjuntos enumeráveis. Assim, A × E = ∪i∈I (Ei × E). Sendo Ei × E um conjunto
enumerável temos que existe uma bijeção fi : Ei × E → Ei , para cada i ∈ I.
Logo, pelo Teorema 2.35, existe uma única função bijetora f : A × E → A tal que
f |(Ei ×E) = fi , para todo i ∈ I, pois (Ei × E) ∩ (Ej × E) = ∅, quando i = j.

304
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Portanto, |A × E| = |A|. Como F é um conjunto finito temos que existe uma


imersão de F em um conjunto enumerável E. Logo, |A × F | ≤ |A × E| = |A|. Por
outro lado, sendo a função j : A → A × F definida como j(x) = (x, y) injetora,
onde y ∈ F é fixado, obtemos |A| ≤ |A × F |. Portanto, pelo Corolário 6.23,
|A × F | = |A|. 14. Note que A ∪ B = A∪C, ˙ com C = B − A ⊆ B. Assim,
|C| ≤ |A|, pois |B| ≤ |A|. Como A × {1, 2} = (A × {1})∪(A
˙ × {2}) e |C| ≤ |A|
temos uma imersão de A∪C ˙ em A × {1, 2}. Logo, pelo Exercício (13),

|A∪C|
˙ ≤ |A × {1, 2}| = |A|.

Por outro lado, sendo |A| ≤ |A∪C|


˙ temos, pelo Corolário 6.23, que |A ∪ B| = |A|.
15. Consideremos a família

F = {(B, f ) : B ⊆ A e f : B → B × B é uma função bijetora}.

Então, pelo Exemplo 4.15, F = ∅, pois (E, f ) ∈ F, com E um subconjunto


contável infinito de A. Dados (B1 , f1 ), (B2 , f2 ) ∈ F, definimos (B1 , f1 )  (B2 , f2 )
se, e somente se, B1 ⊆ B2 e f2 |B1 = f1 . Assim, F é um poset. Sejam C uma cadeia
qualquer de F, digamos C = {(Bi , fi )}i∈I , para algum conjunto de índice I e
M = ∪i∈I Bi . Definimos uma função bijetora (g = ∪i∈I fi ) g : M → M × M .
Dado x ∈ M , existe um i ∈ I tal que x ∈ Bi . Logo, a função g : M → M × M
definida como g(x) = fi (x) possui as propriedades desejadas. De fato, se existe
um j ∈ I tal que x ∈ Bj , então Bi ⊆ Bj ou Bj ⊆ Bi , pois C é uma cadeia,
digamos Bi ⊆ Bj . Logo, x ∈ Bj e fj (x) = fi (x), ou seja, g está bem definida.
Dados x, y ∈ M , se g(x) = g(y), então fi (x) = fi (y) e x = y, pois fi é injetora.
Assim, g é injetora. Dado (x, y) ∈ M × M , existem i, j ∈ I tais que x ∈ Bi e
y ∈ Bj . Como C é uma cadeia temos que Bi ⊆ Bj ou Bj ⊆ Bi , digamos Bi ⊆ Bj .
Logo, x, y ∈ Bj e fj (b) = (x, y), para algum b ∈ Bj , pois fj é sobrejetora. Assim,
por definição, g(b) = (x, y) e g é sobrejetora. Portanto, (M, g) ∈ F e (M, g) =
sup(C). Pelo Lema de Zorn, F contém pelo menos um elemento maximal, digamos
(M, g) ∈ F. Seja C = A − M . Se |C| ≤ |M |, então, pelo Exercício (14),
|M | ≤ |A| = |M ∪ C| = |M |. Assim, pelo Corolário 6.23, |M × M | = |M | = |A|
e |A × A| = |A|. Se |M | ≤ |C|, então existe um subconjunto C1 de C tal que
|M | = |C1 |. Como

(M ∪ C1 ) × (M ∪ C1 ) = (M × M ) ∪ (C1 × M ) ∪ (M × C1 ) ∪ (C1 × C1 )

305
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

temos que (M ∪ C1 ) × (M ∪ C1 ) = (M × M )∪D,


˙ em que D = (C1 × M ) ∪ (M ×
C1 ) ∪ (C1 × C1 ) e, pelo Exercício (14),

|C1 × M | = |M × C1 | = |C1 × C1 | = |M |.

Logo, |D| = |M |. Neste caso, existe uma bijeção f : C1 → D. Definimos uma


função
h : M ∪ C1 → (M ∪ C1 ) × (M ∪ C1 )
como 
g(x), se x ∈ M
h(x) =
f (x), se x ∈ C1 .
Então claramente h é bijetora. Assim, (M ∪ C1 , h) ∈ F, o que contradiz a ma-
ximalidade de (M, g), ou seja, o caso |M | ≤ |C| não pode ocorrer. Portanto,
|A × A| = |A|. 16. Use o Exercício (15) e indução sobre n ∈ ω, com n = 0.
17. Como |Ai | ≤ |An | temos que existe uma função injetora fi : Ai → An , para
cada i = 1, . . . , n. Logo, a função f : A1 ×· · ·×An → An ×· · ·×An definida como
f (x1 , . . . , xn−1 , xn ) = (f1 (x1 ), . . . , fn−1 (xn−1 ), xn ) é claramente injetora. Assim,
pelo Exercício (16),

|An | ≤ |A1 × · · · × An | ≤ |An × · · · × An | = |An |.

Portanto, pelo Corolário 6.23, |A1 × · · · × An | = |An |. 18. Para cada n ∈ ω, com
n = 0, consideremos o conjunto

Pn (A) = {B : B ⊆ A tal que |B| = n}.

Então Pf (A) = ∪∞ n=1 Pn (A) é uma união disjunta. Como |Pn (A)| ≤ |A| temos que
existe uma função injetora fn : Pn (A) → A, para cada n ∈ ω. Assim, pelo Teorema
2.35, existe uma única função injetora g : Pf (A) → A tal que g|Pn (A) = fn , para
todo n ∈ ω. Logo, |Pf (A)| ≤ |A|. Por outro lado, dado F ∈ Pn (A), digamos F =
{x1 , . . . , xn }. Então é fácil verificar que a função f : Pn (A) → An definida como
f (F ) = (x1 , . . . , xn ) é injetora. Assim, pelo Exercício (15), Pn (A)| ≤ |An | = |A|.
Como |P1 (A)| = |A| temos que |A| ≤ |Pf (A)|. Portanto, pelo Corolário 6.23,
Pf (A)| = |A|.

306
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Capítulo 7
Seção 7.1
1. Como a função identidade IA : A → A é um isomorfismo temos que A ∼ = A.

Se A = B, então existe um isomorfismo f : A → B. Assim, f −1
: B → A
∼ ∼ ∼
é um isomorfismo e B = A. Se A = B e B = C, então existem isomorfismos
f : A → B e g : B → C. Logo, g ◦ f : A → C é um isomorfismo. Portanto,
A ∼= C. 2. Se (A, ≤) = {x1 }, . . . , xn e (A, ) = {y1 }, . . . , yn , então a função
f : (A, ≤) → (A, ) definida como yi = f (xi ) é um isomorfismo. 3. Pelo
Teorema 3.74, (A, R) ∼ = (A, R−1 ). Assim, A possui menor e maior elemento.
Portanto, A é finito. 4. Basta notar que α = ∪α+ = ∪β + = β. 5. O conjunto
S = {β ∈ O : α < β} é não vazio, pois α+ ∈ S, de modo que S contém um menor
elemento, digamos β0 ∈ S. Assim, β0 ≤ α+ . Se β0 < α+ , então β0 = α, o que é
impossível. Portanto, α+ é o menor ordinal maior do que α. 6. Pondo α = C ∩ O,
temos, pelo axioma ZF4 , que α é um conjunto. Como α é um ordinal temos que
β = ∪α é um ordinal. Portanto, se γ > β, então γ ∈ / α, de modo que α ⊆ β + . 7.
Seja α ∈ λ. Então α < λ. Assim, α ∈ / S(C) e existe um β ∈ C tal que α < β.
Como λ = sup(C) temos que γ ≤ λ, para todo γ ∈ C. Logo, β = λ, pois λ ∈ / C.
+
Portanto, α < β < λ (α < α < λ) e λ é um ordinal limite. 8. Para cada α ∈ O,
λ = ∪α ∈ O e λ ≤ α. Então λ < α ou λ = α. Se λ < α, então, pelo Exercício
(3), α = λ+ , pois x ≤ λ, para todo x ∈ α. Se α = 0 e λ = α, então α é um número
limite. 9. Se α é um número natural, então ele é um sucessor ordinal. Assim, α
possui um maior elemento e qualquer subconjunto não vazio de α possui um maior
elemento. A recíproca é clara. 10. Dado α ∈ ∩C, então α ∈ β, para todo β ∈ C.
Se x ∈ α, então x ∈ β, pois β é transitivo. Logo, x ∈ ∩C e ∩C é transitivo. É
claro que ∩C ∈-bem ordenado. Portanto, ∩C é um ordinal. Note que ∩C ⊆ C.
Se ∩C = C, então C = {α} e α é o menor elemento. Se ∩C < C, então é fácil
verificar que ∩C = inf(C). 11. Como C ⊆ α+ temos que C é um conjunto de
ordinais e não vazio, pois ω ∈ C. Se λ ∈ C, nada há para ser provado. Se λ ∈ / C,
então, pelo Exercício (5), λ é um número limite. 12. Suponhamos, por absurdo,
que C seja um conjunto. Então

B = {{X} : X é um conjunto}

seria um conjunto, o que é uma contradição (Paradoxo de Russell). Portanto, C


é uma classe própria. 13. Suponhamos, por absurdo, que exista uma tal função.

307
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

Então o conjunto T = Im(f ) = {f (n) : n ∈ ω} é não vazio. Assim, T contém um


menor elemento, digamos α0 ∈ T . Em particular, α0 ≤ f (n), para todo n ∈ ω. Por
outro lado, como α0 ∈ T temos que α0 = f (n0 ) ∈ T , para algum n0 ∈ ω. Assim,
f (n0 ) ≥ f (n), para todo n ∈ ω, com n ≥ n0 . Portanto, f (n+ 0 ) = f (n0 ). Neste
caso, T = {f (0), f (1), . . . , f (n0 )}. 14. Para cada α ∈ O, seja P (α) a afirmação
P IT : para cada β ∈ Sα , P (β) verdadeira implica que P (α) é verdadeira. Se α = 0,
então, por (a), P (α) é verdadeira. Se α é um sucessor ordinal, digamos α = β + ,
então, β < α e P (β) é verdadeira. Assim, por (b), P (β + ) = P (α) é verdadeira.
Se α = 0 é um número limite, então, por (c), P (α) é verdadeira. Portanto, pelo
Teorema 7.4, P (β) é verdadeira, para todo β ∈ O. 15. Seja A um conjunto finito.
Então A ≈ n, pois cada n ∈ ω é um ordinal inicial (confira Princípio de Dirichlet).
Portanto, |A| = n. 16. (a ⇒ b) Para cada conjunto A existe uma função bijetora
g : A → κ. Então h = f ◦ g : X → α, para algum α ∈ O, com α < κ. Portanto,
κ∈ / C. (b ⇒ c) basta tomar A = κ. (c ⇒ a) Como f (κ) é bem ordenado temos,
pelo Teorema 7.14, que existe um isomorfismo g : β → f (κ), para algum β ∈ O.
Assim, g −1 ◦ f : κ → β é bijetora. Resta provar que β ≤ α.

Seção 7.2
1. Se α < ω, então α = 1 + α = α+ , que é impossível. Portanto, α ≥ ω e α
é transfinito. Reciprocamente, seja A um conjunto bem ordenado infinito tal que
α = (A). Então, tomando m ∈ / A e B = {m} ∪ A ordenado, de modo que
m = min(B), temos que a função f : B → A definida como f (m) = min(A)
e f (x) = x, para todo x ∈ A, é claramente bijetora. Portanto, 1 + α = α. 2.
Como β + > β temos que β + > α, α+ . Assim, pelo Exercício (3) da Seção 7.1,
β + é o menor ordinal maior do que α ∈ C. Portanto, β + ≥ α+ . 3. (a) Para todo
α ∈ O, com α < ρ, existe, pelo item (5) do Teorema 7.19, um único τ ∈ O − {0}
tal que ρ = α + τ . Como τ ≤ α + τ = ρ temos que τ = ρ, pois ρ é irredutível.
Portanto, α + ρ = ρ, para todo α ∈ O, com α < ρ. Reciprocamente, se existissem
α, β ∈ O tais que 0 < α, β < ρ e ρ = α + β, então, pelo item (6) do Teorema 7.19,
ρ = α + β < α + ρ implica que ρ = α + ρ. Portanto, ρ é irredutível. (b) Como
α < αρ temos, pelo item (a), que αρ = α + αρ = α(1 + ρ). Assim, pelo item (6)
do Teorema 7.19, ρ = 1 + ρ, com 1 < ρ. Portanto, ρ é irredutível. (c) Pelo item (2)
do Teorema 7.23, existem únicos π, τ ∈ O tais que ρ = απ + τ , com 0 ≤ τ < α.
Se τ > 0, então ρ < απ + ρ, o que contradiz o item (a). Assim, ρ = απ. Se π
não fosse é irredutível, então π = β + π, para algum β ∈ O, com β < π. Logo,
απ = α(β + π) = αβ + απ, ou seja, ρ = αβ + ρ, com αβ < ρ, o que contradiz a

308
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

irredutibilidade de ρ. (d) Seja

D = {β ∈ O : α = β + ρ, para algum ordinal irredutível ρ}.

Então D = ∅ e, pelo Lema 7.11, λ = sup(D) é um ordinal. Assim, β ≤ λ, para


todo β ∈ D. Logo, α = λ + ρ0 , para algum ordinal irredutível ρ0 . Portanto, ρ0
é o maior elemento de C. 4. Já vimos, pelo Exercício (3) da Seção 7.1, que α+
é o menor ordinal maior do que α. Assim, pelo item (5) do Teorema 7.19, existe
um único τ ∈ O − {0} tal que α+ = α + τ . Logo, pela minimalidade de α+ ,
τ = 1. Portanto, α+ = α + 1. Uma outra prova: seja A conjunto bem ordenado tal
que α = (A). Então A ⊕ {∞} representa o conjunto bem ordenado A ∪ {∞},
onde ∞ ∈ / A é o maior elemento. Mas, isto é a mesma ∈-ordenação do conjunto
α = α ∪ {α}. Portanto, α + 1 = α+ . 5. Sejam A e B conjuntos bem ordenados
+

tais que α = (A) e β = (B). (a) Como A ⊕ B é um conjunto bem ordenado


temos que A ⊕ B ∼ = ω e A é semelhante ao segmento inicial Sb0 de A ⊕ B, com
b0 o menor elemento de B. Assim, A ⊂ A ⊕ B implica que A ∼ = m, para algum
m ∈ ω, e B = ω. Portanto, α é finito e β = ω. (b) Como A " B é um conjunto bem
ordenado temos que A " B ∼ = ω. Assim, p2 : A " B → B é uma função crescente e
A × {b} ⊂ A " B implica que A ∼ = m, para algum m ∈ ω, e B = ω. Portanto, α é
finito e β = ω. 6. Pelo item (2) do Teorema 7.23, existem únicos α, γ ∈ O tal que
λ = ωα + γ, com 0 ≤ γ < ω. Como γ < ω temos que γ é finito. Assim, γ = 0.
Caso contrário, γ = n+ , para algum n ∈ ω, implica que λ = ωα + n+ não seria um
limite ordinal. Portanto, λ = ωα. 7. Como, no Exercício (6), λ = ωα + β, com
β finito. Se β = 0, então λ seria um limite ordinal, o que é impossível. Portanto,
β = n, para algum n ∈ ω, com n = 0. 8. (a) Como λ é um sucessor ordinal
temos que λ = γ + , para algum γ ∈ O. Assim, pelo Exercício (4) e pelo item (6)
do Teorema 7.19,

βλ = βγ + = βγ + β > βγ + α ≥ αγ + α = αγ + = αλ.

Portanto, αλ < βλ. 9. Basta observar que se α ≥ λ, então, pelo item (2) do
Teorema 7.23, existem únicos π, ρ ∈ O tais que α = λπ + ρ, com ρ < λ. Assim,

= λπ + ρ, se π ≥ ω
λ + α = λ + λπ + ρ = λ(1 + π) + ρ
> λπ + ρ, se π < ω.

10. (a) Dado n ∈ ω, pelo item (2) do Teorema 7.23, existem únicos α, γ ∈ O

309
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

tal que ω = nα + γ, com 0 ≤ γ < n. Como ω é um limite ordinal temos que


γ = 0 e α = ω. (b) Se λ é um limite ordinal, então, pelo Exercício (6), λ = ωα.
Assim, pelo item (a), nλ = n(ωα) = ωα = λ. Reciprocamente, se λ não fosse
um limite ordinal, então, pelo item (b) do Exercício (8), n = 1. 11. (a) Observe
que β0 = 0 e βn+1 = α + βn é uma sequância fundamental, então ela define limite
ordinal. Pondo γ = limβ∈λ (α + β), obtemos α + λ ≥ γ, pois α + β < α + λ,
para todo β ∈ O. Por outro lado, como γ > α temos, pelo item (5) do Teorema
7.19, que existe um único τ ∈ O tal que α + τ = γ. Assim, α + τ > α + β,
para todo β ∈ O, de modo que τ > β, para todo β ∈ O. Logo, λ ≤ τ . Portanto,
α + λ ≤ γ. Consequentemente, α + λ = limβ∈λ (α + β). (b) Observe que β0 > 0 e
βn+1 = α · βn é uma sequância fundamental, então ela define limite ordinal. Pondo
γ = limβ∈λ (αβ), obtemos αλ ≥ γ, pois αβ < αλ, para todo β ∈ O. Por outro
lado, pelo item (2) do Teorema 7.23, existem únicos π, ρ ∈ O tais que γ = απ + ρ,
com ρ < α. Assim,

αβ < γ = απ + ρ < απ + α < α(π + 1),

de modo que, β < π + 1, para todo β ∈ O. Logo, λ ≤ π + 1. Portanto, λ ≤ π, pois


λ = π + e αλ ≤ απ ≤ γ. Consequentemente, αλ = limβ∈λ (αβ).

Capítulo 8
Seção 8.1
1. Direto da definição. 2. (c) Note que a = (a, 0), b = (b, 0), −a = (0, a) e
−b = (0, b) implicam que

(−a)b = (0, a) · (b, 0) = (0, ab) = −ab = (a, 0) · (0, b) = a(−b).

3. (e) Basta observar que b3 − a3 = (a − b)(a2 + ab + b2 ). 4. Dado k ∈ Z, basta


provar que não existe inteiro entre k e k + 1. 5. Seja

T = {y ∈ Z+ : y + a = x, para algum x ∈ S}.

Então T = ∅, pois 0 ∈ T . Dado y ∈ T , existe um x ∈ S tal que y + a = x. Como


x + 1 ∈ S temos que y + 1 + a = x + 1 implica que y + 1 ∈ T . Portanto, pelo P IF ,
T = Z+ . Assim, se x ∈ {x ∈ Z : a ≤ x}, então existe um y ∈ Z+ tal que y+a = x.
Logo, y ∈ T , de modo que x ∈ S. Portanto, {x ∈ Z : a ≤ x} ⊆ S. 6. Seja S um

310
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

subconjunto não vazio de Z que é limitado inferiormente. Então existe um a ∈ Z tal


que a ≤ x, para todo x ∈ S. Assim, o conjunto T = {y − a : y ∈ S} ⊂ Z+ é não
vazio. Logo, pelo P BO, T possui um menor elemento, digamos t0 ∈ T . Portanto,
existe um s0 ∈ S tal que t0 = s0 − a, de modo que s0 é o menor elemento de S. 7.
Aplique o Exercício (6) ao conjunto T = {−x : x ∈ S}. 8. Seja

S = {x ∈ Z+ : x = a − qb, para algum q ∈ Z}.

Então S = ∅, pois se a ≥ 0, então a = a − 0 · b ∈ S e se a < 0, então (−a)(b − 1) =


a − ab implica que (−a)(b − 1) ∈ S. Assim, pelo P BO, S possui um menor
elemento, digamos r ∈ S, com r ≥ 0. Logo, a = qb + r, para algum q ∈ Z.
Se r ≥ b, então existe um c ∈ Z+ tal que r = b + c, de modo que c < r e
c = r − b = a − (q + 1)b ∈ S, o que contradiz a minimalidade de r. Portanto,
a = qb + r, com 0 ≤ r < b. Seja (q1 , r1 ) outra solução. Então qb + r = q1 b + r1 .
Se r = r1 , digamos r1 < r, então existe um c ∈ Z+ tal que r = r1 + c, de modo
que 0 < c < r e c = r−1 = (q1 − q)b, de modo que 0 < (q1 − q)b < b, o que é
impossível. Portanto, r = r1 e q = q1 . 9. Note que mdc(a, b) = mdc(−a, b) =
mdc(a, −b) = mdc(−a, −b) e mdc(a, 0) = |a|. Assim, podemos supor, sem perda
de generalidade, que a > 0. Pondo d = mdc(a, b) e d1 = mdc(b, r). Se d =
mdc(a, b), então existem x, y ∈ Z tais que a = xd e b = yd. Como a = qb + r
temos que r = (x − q)d, de modo que d divide r. Assim, d divide d1 (d ≤ d1 ). Por
outro lado, se d1 = mdc(b, r), então existem z, w ∈ Z tais que b = zd1 e r = wd1 .
Como a = (q + w)d1 temos que d1 divide a, de modo que d1 divide d (d1 ≤ d).
Portanto, d = d1 . 10. Use que b = b · 1 = b(ax + cy).

Seção 8.2
1. e 2. Similar aos da Seção 8.1. 3. Já sabemos que r = b−1 a e s = d−1 c, com
b > 0 e d > 0. Assim, existem k = ad, m = bc, n = bd ∈ Z, com n > 0, tais
que r = n−1 k e s = n−1 m. 4. Dados r, s ∈ Q, existe um t = 2−1 (t + s) ∈ Q
tal que r < t e t < s. Portanto, a ordenação natural de Q é densa. Além disso,
r − 1 < r < r + 1 implica que Q é não limitado. 5. Dados r, s ∈ Q, com
0 < r < s. Assim, pelo Exercício (3), existem a, b, c ∈ ω  tais que r = c−1 a e
s = c−1 b. Logo,
r · cb = c−1 a · cb = ab > b ≥ c−1 b = s.
Portanto, existe um n = bc ∈ Z tal que nr > s. 6. Seja r = b−1 a ∈ Q, com
b > 0. Se a ≥ 0, então a ≤ ab e r = b−1 a ≤ b−1 (ab) ≤ a ∈ Z. Assim,

311
R ESPOSTAS E S UGESTÕES

S = {x ∈ Z : x ≤ a} é não vazio e limitado superiormente por a. Se a < 0, então


a ≥ ab e r = b−1 a ≥ b−1 (ab) ≥ a ∈ Z. Logo, T = {x ∈ Z : a ≤ x} é não vazio
e limitado superiormente por 0. Portanto, em qualquer caso, existe, pelo Exercício
(7) da Seção 8.1, um maior elemento n ∈ Z. Consequentemente, n ≤ r < n + 1.
Prove a unicidade! 7. S = {x ∈ Q : 0 < x}. 8. Direto dos resultados.

Seção 8.3
1. É claro que r + s ⊆ {x ∈ Q : x < p + q, p ∈ r e q ∈ s}. Por outro lado, se
x < p + q, onde p ∈ r e q ∈ s, então x − p < q, de modo que x − p ∈ s. Assim,
x = p + (x − p) ∈ r + s. Portanto, r + s ⊆ {x ∈ Q : x < p + q, p ∈ r e q ∈ s}.
2. Existem a ∈ r e b ∈ r tais que a < b ou b − a > 0. Assim, pelo Princípio de
Arquimedes, existe um n ∈ ω tal que b − a < nt, de modo que b + n(−t) < a e
b + n(−t) ∈ r. Logo, S = {m ∈ ω : b + (−m)t ∈ r} = ∅ e, pelo P BO, existe um
menor n0 ∈ S tal que b+n0 (−t) ∈ r e b+(n0 −1)(−t) ∈ r . Pondo p = b+n0 (−t)
e q = b + (n0 − 1)(−t), obtemos q − p = t, com q = min(r). 3. Já vimos que
existe um b ∈ r tal que b − 1 ∈ r , de modo que −(−(b − 1)) < b e −(b − 1) ∈ s,
ou seja, s = ∅. Dado a ∈ r, obtemos −(−a) ∈ / r . Assim, existe um b ∈ r tal que
−(−a) > b. Logo, −a ∈ / s e s ⊂ Q. Se p ∈ s e p ≤ x, então existe um b ∈ r tal
que −p < b e −x ≤ −p < b implica que x ∈ s. Dado b ∈ s, existe um c ∈ r tal
que −b < c ou −c < b. Como −c < 2−1 (b − c) < b temos que −2−1 (b − c) < c
e 2−1 (b − c) ∈ s. Portanto, s não possui menor elemento. 4. Confira o Exercício
(1). 5. Se r = 0, então s = r−1 (rs) = r−1 0 = 0. 6. rs + (−r)s = (r + (−r))s =
0s = 0 implica que (−r)s = −rs. 7. Confira o caso racional. 8. Seja S um
subconjunto não vazio e limitado inferiormente de R. Então T = {−x : x ∈ S}
é um subconjunto não vazio e limitado superiormente de R. Assim, sup(T ) existe.
Prove que inf(S) = − sup(T ). 9. Seja S um subconjunto não vazio e limitado
superiormente de R. Então E = {x ∈ R : x < r, para algum r ∈ S} e D = R−E
satisfazem as condições do Teorema de Dedekind. Portanto, sup(S) = min(D)
existe, pois max(E) não existe.

312
ÍNDICE REMISSIVO

Álgebra Booliano, 137 Base de Hamel, 135


Bolyai, 4
Alef zero, 189 Boole, 34
Algoritmo
da divisão, 176, 236 Cadeia, 71
Euclidiano, 237 crescente, 109
Antinomia, 28 decrescente, 105
Aristóteles, 3 Cantor, 27
Axioma(s), 2 Cardinal
condicionais, 17 finito, 194
da construção de conjuntos, 33 transfinito, 194
da escolha, 118 Classe(s), 30
da extensão, 31 de equivalência, 96
da fundação, 151 própria, 30
da individualidade, 31 universal, 35
da infinidade, 153 Cobertura, 64
da substituição, 62 Cohen, 117
das potências, 47 Cone positivo, 234
de Euclides, 6 Conjunto(s)
de Peano, 156 bem ordenado, 101
de peneiração, 45 complementar, 35
de união, 46 completo, 90
do par (não ordenado), 39 das potências, 47
dos números cardinais, 188 de índices, 43
independente, 19 diferença, 35

313
Í NDICE R EMISSIVO

disjuntos, 35 triangular, 242


dos números inteiros, 232 Diagrama
dos números inteiros positivos, 234 comuta, 54
dos números naturais, 153 de Hasse, 74
dos números racionais, 239 de linha, 74
dos números racionais positivos, 241 Venn, 36
dos números reais, 244 Diferença, 167
equipotentes, 178 Distância, 242
escolha, 123
estritamente indutivamente ordenado, Elemento, 31
129 limite, 115
finito, 182 maximal, 84
iguais, 31 minimal, 84
indutivamente ordenado, 129 Equação
indutivo, 153 de Cauachy, 136
infinito, 182 Está contido, 32
interseção, 34 Euclides, 3
isomorfos, 81 Euler, 54
parcialmente ordenado, 71 Extensão, 32
semelhantes, 207
sucessor, 153 Fórmula
totalmente ordenado, 72 de recorrência, 157
união, 34 de recorrência de Dedekind, 111
unitário, 40 Faixa
universal, 35 vertical, 271
vazio, 35 Família
Contraexemplo minimal, 169 bem ordenada, 221
Corolário, 3 compatível, 63
Corte, 74 de caráter finito, 144
de Dedekind, 244 de conjuntos (indexadas), 43
Cota totalmente ordenada, 77
inferior, 86 Fibra, 272
superior, 86 Filtro, 95, 149
Cox, 190 principal, 149
Fraenkel, 27
Desigualdade Função, 52

314
Í NDICE R EMISSIVO

maior inteiro, 184, 254 fechado, 73


aditiva, 136 Isomorfismo, 78
avaliação, 58 dual, 89
característica, 60
crescente, 78 Kuratowski, 40
decrescente, 78
Lei
escolha, 118, 122
da tricotomia, 72, 175
estritamente crescente, 78
de De Morgan, 36
iguais, 54
do cancelamento, 164
residual de, 84
modular, 93
valor, 54
Lema, 3
Gödel, 27 de Euclides, 237
Gauss, 4 de Zorn, 133
Gráfico, 41 Lobachevsky, 4
diagonal, 42
Método
domínio, 42
da diagonal de Cantor, 127
identidade, 42
Maior elemento, 85
imagem, 42
Menor elemento, 86
restrição, 50
modelo(s), 16
Hilbert, 5 axiomático, 6
Hipótese
Núcleo, 65
do contínuo, 194
Número(s)
Ideal, 95, 149 ímpar, 176
maximal, 137 cardinais, 188
primo, 101 menor do que ou igual, 189
principal, 95 cardinal, 215
Imersão inteiro negativo, 233
crescente, 82 inteiro positivo, 233
diagonal, 58 inteiros, 230
Infimo, 88 irracionais, 252
Intervalo isolado, 212
aberto, 73 limite, 212
não limitado à direita, 73 naturais, 154
não limitado à esquerda, 73 Ordinal, 214

315
Í NDICE R EMISSIVO

par, 176 fracionária, 254


racionais, 237 inteira, 254
racional negativo, 240 Partição, 63
racional positivo, 240 Pasch, 5
reais, 244 Peano, 152
Ponto
Operação fixo, 91
de adição, 11, 13, 23, 162, 196, 219, isolado, 119
222 limite, 119
de diferença, 232 Poset, 71
de divisão, 240
coroa, 75
de exponenciação, 226
Postulado, 2
de multiplicação, 11, 23, 164, 198,
Euclides, 3
223
Lobachevsky-Gauss-Bolyai, 4
de multiplicação por escalar, 13
Riemann, 5
de potenciação, 171, 201
Potência
de produto, 15
do contínuo, 177
de subtração, 232
menor do que, 180
Ordem
n-ésima, 113
dual, 89
Predecessor
isomorfos, 81
imediato, 102, 212
Ordenação
Princípio
pela inclusão, 72
da boa ordenação, 147, 168
Ordinal, 208
da contradição, 17
finito, 214
da dualidade, 90
inicial, 215
irredutível, 227 das escolhas dependentes, 128
limite, 212 de Arquimedes, 69, 91
transfinito, 214 de Dirichlet, 180
de indução finita
p-sequência, 130 primeira forma, 154
Par ordenado, 40 segunda forma, 169
Paradoxo, 28 de indução transfinita
lógico, 28 primeira forma, 110, 209
semântico, 29 segunda forma, 111, 218
Parte do terceiro excluído, 18

316
Í NDICE R EMISSIVO

maximal, 168 distributivo, 92


maximal de Hausdorff, 132 Retração, 66
Proclus, 3 Riemann, 5
Produto Russell, 28
cartesiano, 41, 56
ordinal, 222 Seção, 66, 105
Propriedade Segmento
universal, 58 final, 73
inicial, 73
Regra Sentença, 30
de Sarrus, 8 Sequência, 44
Relação, 70 estacionária, 218
binária, 24 fundamental, 213
de equivalência, 24 Sigma
de ordem antilexicográfica, 77 proposição, 18
de ordem cartesiana, 77 Sistema(s)
de ordem densa, 70 categórico, 22
de ordem induzida, 71 completo, 21
de ordem inversa, 77 consistente, 16
de ordem irreflexiva, 76 de axiomas, 6
de ordem lexicográfica, 76 inconsistente, 16
de ordem parcial, 25, 70 independente, 21
de ordem simples, 26 isomorfos, 21
de ordem total, 70 minimal de representantes, 124
de pré-ordem, 70 satisfatório, 17
epsilon-ordem, 208 Skolem, 27
Representação Soma
d-ádica, 253 ordinal, 219, 222
composta, 257 Sub-reticulado, 96
periódica, 256 Subconjunto, 32
simples, 257 cofinito, 149
Reta(s) convexo, 83
paralelas, 4 denso, 104
Reticulado, 92 limitado, 87
completo, 96 limitado inferiormente, 87
de conjuntos, 101 limitado superiormente, 87

317
Í NDICE R EMISSIVO

não limitado, 87
próprio, 32
Sucessor, 152
imediato, 102
ordinal, 212
Supremo, 87

Teorema, 2
da comparbilidade, 108
da Completividade, 251
da contagem, 213
de Bourbaki, 130
de Cantor, 181
de Cantor-Schröder-Bernstein, 97, 173,
191
de Dedekind, 252
de Pitágoras, 3
do Ponto Fixo de Knaster, 91
do Ponto Fixo de Tarski, 97
Topologia, 26

Valor
absoluto, 242
von Neumann, 27

Zermelo, 27

318
Nasceu em Coremas, alto sertão paraibano, em 26 de
janeiro de 1954. Veio para João Pessoa em 1974, onde
permanece até hoje. Ingressou em 1977 na Univer-
sidade Federal da Paraíba (UFPB), onde concluiu o
bacharelado em matemática. Obteve o grau de mes-
tre em matemática (1989) na Universidade Federal
do Ceará (UFC) e de doutor em engenharia elétrica
(1996) na Universidade Estadual de Campinas (UNI-
CAMP). É professor titular aposentado da Universi-
dade Federal da Paraíba.

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