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JOSÉ PEREIRA LAMELAS

SISTEMA UNIFORME
DE
CONTABILIDADE ANALÍTICA DE
GESTÃO HOTELEIRA:
UM ESTUDO DE CASO

Lisboa 2002

1
ÍNDICE
(provisório)

Pág.
Apresentação

Prefácio

Introdução..........................................................................................................................9

PRIMEIRA PARTE

CAPÍTULO 1 – CONTEXTO, TEMA E PROBLEMÁTICA DA GESTÃO


HOTELEIRA
1.1.A importância da actividade turística-hoteleira.........................................................11
1.2.Justificação do tema que vamos estudar....................................................................12
1.3.O problema................................................................................................................13
1.4.Questões a pesquisar..................................................................................................14
1.5.Pertinência do problema............................................................................................15
1.6.Análise do contexto...................................................................................................16
1.6.1.Importância e evolução da hotelaria.......................................................................17
1.6.2.Evolução e tendências do turismo mundial............................................................17
1.6.3.Síntese de alguns indicadores gerais do turismo em Portugal................................19
1.6.4.Caracterização do sector hoteleiro emPortugal......................................................21
1.6.5.O ensino da contabilidade e a contabilidade analíticas de gestão hoteleira...........26
1.6.6.A investigação na contabilidade de gestão.............................................................28

CAPÍTULO II- ENQUADRAMENTO TEÓRICO DO TEMA

1.Introdução.....................................................................................................................32
2.A contabilidade e os seus aspectos...............................................................................32
2.1.Tipos de contabilidade...............................................................................................32
2.1.1.Contabilidade geral e financeira ou externa...........................................................32
2.1.2.Contabilidade analítica de gestão ou interna..........................................................33
2.1.3.Contabilidade fiscal................................................................................................34
2.1.4.Contabilidade do controle orçamental...................................................................34
2.1.5.Contabilidade ambiental.........................................................................................35
2.1.6.Contabilidade dos recursos humanos.....................................................................36
2.2.Evolução e tendências da contabilidade em geral.....................................................38
2.2.1.Evolução da contabilidade em Portugal.................................................................39
2.2.2.Contabilidade e fiscalidade.....................................................................................40
2.2.3.Normalização e criatividade...................................................................................42
2.2.4.A internacionalização da contabilidade..................................................................44
2.2.5.Novas questões que se colocam à contabilidade....................................................47
2.3.A contabilidade analítica de gestão...........................................................................50
2.3.1.Alguns desafios actuais da contabilidade analítica de gestão.................................52
2.3.1.1.O sistema tradicional do tratamento dos custos indirectos..................................52
2.3.1.2.O sistema de preços de transferência interna......................................................54
2.3.1.3.CBA-a nova óptica e o novo sistema de tratamento contabilístico dos custos
indirectos.........................................................................................................................56

2
3.A Contabilidade de Gestão Hoteleira...........................................................................64
3.1.Modelos e bjectivos de contabilidade de gestão hoteleira.........................................64
3.2.O sistema suíço (PCHRS).......................................................................... ...............65
3.2.1.Breve caracterização do sistema suíço...................................................................66
3.2.2.Breve análise crítica complementar........................................................................72
3.3.O sistema uniforme americano (USALI)...................................................................75
3.3.1.A teoria do sistema uniforme USALI......................................................................75
3.3.1.1.Princípios e conceitos do sistema uniforme USALI.............................................73
3.3.1.2.Formatação básica dos centros de resultados......................................................77
3.3.1.2.1.Centro de resultados de “Quartos”...................................................................77
3.3.1.2.2. Centro de resultados de “Alimentação e Bebidas”..........................................78
3.3.1.2.3. Centro de resultados de “Secundários”...........................................................80
3.3.1.2.4. Centro de “Rendas e Outras Receitas”............................................................81
3.3.1.3.Formatação básica dos centros de custos auxiliares (“suport centers”).............81
3.3.1.4.Formatação básica dos “Incontroláveis” (custos/receitas não operacionais)......82
3.3.1.5.Mapa resumo de exploração do sistema uniformeUSALI...................................83
3.3.2.O sistema uniforme USALI e o CBA.....................................................................84
3.4.O POC e a contabilidade de gestão hoteleira............................................................88
3.4.1.Compatibilidade entre o POC e a contabilidade analítica do sistema uniforme
USALI..............................................................................................................................90
3.4.2.Alternativa entre a opção “monista” e “dualista”...................................................91
3.5.O anteprojecto de POC para a hotelaria portuguesa..................................................93
3.5.1.Estrutura dos centros de informação de gestão (departamentos)...........................94
3.5.2.Mapa resumo de exploração do anteprojecto da DGT...........................................97
3.5.3.Comentários críticos ao anteprojecto da DGT.......................................................98
4.Síntese da Abordagem Teórica...................................................................................100

SEGUNDA PARTE

CAPÍTULO I - METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO

1.Caracterização da empresa alvo da investigação........................................................102


2.Modelo de análise e desenho da pesquisa..................................................................103
2.1.Premissa geral da investigação................................................................................103
2.2.A opção pelo método de pesquisa “estudo de caso”, sua selecção e justificação...104
3.Metodologia e Recolha de Dados da Pesquisa Empírica...........................................115
3.1.Introdução................................................................................................................115
3.2.Metodologia e plano da pesquisa.............................................................................115
3.3.Análise directa dos documentos..............................................................................117
3.4.Observação directa e participante............................................................................123
3.5.Entrevistas...............................................................................................................124

CAPÍTULO II- APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

1.Introdução...................................................................................................................126
2.Análise dos Resultados...............................................................................................127
2.1.Análise dos resultados da observação directa dos documentos...............................127
2.2.Análise dos resultados das entrevistas.....................................................................133
2.3.Grelha síntese dos resultados importantes da pesquisa...........................................136

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CAPÍTULO III- CONCLUSÕES FINAIS E CAMINHOS A PERCORRER

1.Conclusões Finais.......................................................................................................138
2. Caminhos a Percorrer................................................................................................141

ANEXOS

ANEXONº1
Abordagem ao método de pesquisa de estudo de caso..................................................142
ANEXO Nº2
Aspectos da pesquisa documental segundo Pierre de Saint Georges............................147
ANEXO Nº3
Aspectos das entrevistas semidirectivas segundo Ruquoy............................................148
ANEXO Nº4
Tratamento estatístico da informação relevante das entrevistas....................................150
ANEXO Nº5
Síntese da estrutura do do 1º plano de contas da contabilidade analítica (1988-1994).159
ANEXO Nº6
Síntese da estrutura do “sistema uniforma” com que a empresa se deparou em 1993 e
que adoptou a partir de 1994.........................................................................................162
ANEXO Nº7
Síntese da estrutura do 2º plano de contas da contabilidade analítica adoptado pela
empresa a prtir de 1994.................................................................................................163
ANEXO Nº8
Modelo para um plano de contas da contabilidade analítica de gestão hoteleira, baseado
na 9ª edição do USALI (1996) e tendo presente o caso estudado.................................167

MAPAS

1.Evolução da variação das chegadas e receitas turísticas mundiais...............................18


2.Previsão da evolução do movimento turístico mundial................................................19
3.Percentagens de turistas internacionais relativamente à população potencial..............19
4.Efeito do turismo na balança de transacções correntes, turismo na economia
portuguesa, comparação com outros sectores..................................................................21
6.Número de estabelecimentos hoteleiros recenseados em Portugal..............................24
7.Número de camas e estabelecimentos por categorias e zonas......................................25
8.Dimensão média, em camas, por tipo de estabelecimento...........................................25
9.Evolução e parque hoteleiro da empresa alvo do estudo.............................................85
10.Alguns dados estatísticos da exploração da empresa alvo da pesquisa....................122

QUADROS

1.Ameaças e oportunidades para a actividade hoteleira no início do milénio.................19


2.Vantagens e desvantagens da normalização contabilística...........................................42
3.Quadro comparativo entre o sistema sem CBA e com CBA........................................53
4.Esquema do sistema suíço (PCHRS) “para as grandes empresas”...............................58
5.Esquema do sistema americano (USALI)....................................................................68
6.Esquema resumo da conciliação do sistema uniforme (USALI) com o CBA.............70
7.Novo modelo da demonstração de resultados POC por funções.................................73
8.Vantagens/desvantagens das alternativas monista e dualista para a c. analítica..........76

4
9.Esquema resumo do anteprojecto de POC para a hotelaria portuguesa (da DGT).......80
10.Resumo dos aspectos da pesquisa documental.........................................................100
11.Tipo de entrevistas em função do tipo de investigação............................................102
12.Características das entrevistas semidirectivas..........................................................103
13.Plano da pesquisa......................................................................................................108
14.Resumo da estrutura “sistema uniforme que a empresa encontrou e adoptou.........110
15.Resumo comparativo dos dois planos de contas da empresa com o USALI............111
16.Resumo comparativo do esquema de informação da c.a. da sede e dos directores..113
17.Correlação entre os objectivos USALI e os planos da c.a. da empresa....................121
18.Relação entre tipo de informação de gestão utilizado e o crescimento da empresa.122
19.Síntese das opiniões dos entrevistados face às questões/objectivos iniciais............133
20.Grelha de leitura final dos dados..............................................................................135

SIGLAS

A&B Alimentação e Bebidas


AD Administração
AHP Associação dos Hotéis de Portugal
ANA Aeroportos e Navegação Aérea
BTC Balança de Transacções Correntes
CA Contabilidade Analítica
CBA Custeio Baseado nas Actividades
CC Chefe da Contabilidade
CMVM Comissão do Mercado de Valores Mobiliários
CNC Comissão de Normalização Contabilística
CST Conta Satélite do Turismo
CV Custo de Vendas
DC Directriz Contabilística
CEE Comunidade Económica Europeia
Dep. Departamento
DG Director Geral
DGT Direcção Geral de Turismo
D-L Decreto-Lei
DR Diário da República
EUA Estados Unidos da América
FEEC Fédération Européenne d´Experts Comptables
FSCRH Fédération Suisse des Cafetiers, Restaurateurs et Hôteliers
GB Grã Bretanha
GIESTAGrupo de Investigação Estatística e Análise de Dados
GOP Gross Operating Profit
IAS International Accounting Standard
IASC International Accounting Standard Committee
IFAC International Federation of Accountants
IND Instituto Nacional dos Desportos
INE Instituto Nacional de Estatística
INFT Instituto Nacional de Formação Turística
ISCTE Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa
MO Mão de Obra
NA Não Aplicável
NIC Norma Internacional de Contabilidade

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OMT Organização Mundial de Turismo
ONU Organização das Nações Unidas
PCHRS Plan Comptable pour l`Hôtellerie et Restauration Suisses
PIB Produto Interno Bruto
POC Plano Oficial de Contabilidade
POCAL Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais
POCP Plano Oficial de Contabilidade Pública
PV Pontos de Venda
ROC Revisor Oficial de Contas
SCH Société Suisse de Crédit Hôtelier
SSH Société Suisse des Hôteliers
TOC Técnico Oficial de Contas
UE União Europeia
UEM União Económica e Monetária
USA United States of America
USALI Uniform System of Accounts for the Lodging Industry
US GAAP United States General Accepted Accounting Principles

BIBLIOGRAFIA

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APRESENTAÇÃO

Conheçi o Dr. José Pereira Lamelas em fins da década de 70, num curso de formação de
activos que ministrei na Estalagem Meste Afonso Domingos, na Batalha, onde ele era
sócio gerente e foi meu formando.
Desde logo notei o seu grande interesse e o seu grande entusiasmo pelos assuntos
relacionados com a contabilidade analítica aplicada à actividade hoteleira.
Com efeito, acabada a sua licenciatura em gestão de empresas, ele alí estava como sócio
gerente de uma sociedade que explorava a dita Estalagem Meste Afonso Domingos da
Batalha. Com o seu entusiasmo e com os seus conhecimentos teóricos de recém
licenciado ele implementara uma contabilidade analítica naquela sua pequena unidade
hoteleira e obteve os seus primeiros indicadores de gestão. Mas, precisamente aí, ele
sentiu a necessidade de aferir os seus indicadores de gestão com algum pdarão da
actividade.
Foi assim que nasceu a sua curiosidade e interesse pela pesquiza e estudo de um sistema
de cantabilidade adaptado às características da actividade hoteleira, que lhe permitisse
fazer comparações com as médias padrão dessa actividade

Pucos anos depois, em 1981, ele pediu-me para me pronunciar sobre o seu primeiro
livro, Um Plano de Contabilidade Explicado Para a Hotelaria, de que ele é coautor,
tendo eu feito o seu prefácio. Nele ecrevíamos o seguinte: «há que divulgar
experiências com aceitação, caso do “Uniform System of Accounts for Hotels”,
evitando, como dizem os autores, redescobrir a roda, aproveitando o que está feito» (...)
não deixando, todavia, «de ter presente, como aliás deverá ser, a existência do nosso
Plano Oficial de Contabilidade» (....). Os autores dão «um passo em frente pelo seu
exemplo na necessária consecução de trabalhos de contabilidade em níveis sectoriais
de que tanto se está carecido» (...) «justificando-se assim que apareçam na liça outros
profissionais, pois» (...)« um trabalho intelectual é algo que nunca se pode considerar
acabado, nem mesmo quando seja de valia ou contribuição importante.» (...)«
Reputamos o trabalho extremamente útil para o sector a que especialmente se destina».
«Tem sido dito que Portugal pode ser um país de serviços e entre estes há condições
excelentes, que não vale a pena redizer, para os de turismo e hotelaria» (...) «Eis aqui
uma forte razão para aplaudir a publicação e salientar a oportunidade deste trabalho».

O certo é que, até hoje, não conhecemos mais nenhum livro português publicado sobre
este assunto específico e cremos que o não há.
Por isso, está de parabéns o autor por mais esta iniciativa que vem enriquecer e facilitar
o trabalho não só dos professores e alunos das escolas de turismo e hotelaria como dos
interessados e profissionais da contabilidade em geral e em particular dos que trabalham
para os hotéis e, hospitais, lares, estabelecimentos prosionais, etc.

Além do referido livro, o autor publicou, sobre o assunto, várias dezenas de artigos na
imprensa do sector, ao longo do tempo.

Os conhecimentos e saber desta matéria advêm-lhe não só da formação permanente,


como da experiência de 20 anos de ensino superior, de 19 anos de consultoria, de 12
anos de direcção e administração de empresas hoteleiras, actividades estas que mantém,
graças a uma boa capacidade de organização, gestão do tempo e sinergias. Ora isto faz
confluir, na mesma pessoa, a teoria científica do investigador e académico, o realismo

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pragmático do empresário e a utilização eficaz de tudo isso ao serviço de consultoria de
muitos hoteleiros portugueses.

Na sua defesa de dissertação de mestrado, que teve como tema «Sistema Uniforme de
Contabilidade Analítica de Gestão Hoteleira», fiz parte do júri como arguente
(juntamente com António Borges, Albino Lopes e Mário Murteira). Foi brilhante o seu
trabalho, a sua apresentação e a sua defesa. O juri decidiu atribuir-lhe a nota máxima,
por unanimidade.
Foi dessa dissertação que, após as convenientes adaptações para o público, resultou o
livro que agora se publica e que nos apraz apresentar aos estimados leitores.

No actual panorama bibliográfico do sector em Portugal, consideramos que esta obra


acrescenta e divulga conhecimentos muito úteis, nomeadamente através do estudo e
apresentação de um caso e da larga experiência que o autor obteve ao adaptar o
“Uniform System of Accounts for the Lodging Industry” (USALI) a cetenas de hotéis
portugueses de norte a sul do País.
Com base nessa experiência do terreno, apresenta o autor um modelo de plano de contas
que é suficientemente abrangente para poder inspirar e ser moldado a qualquer unidade
hoteleira, quer seja independente, quer seja integrada num grupo hoteleiro.
Para facilitar e reforçar a uniformização, na esteira do USALI, apresenta o autor não só a
descrição e filosofia deste sistema, como também notas explicativas para as contas e
situações mais específicas, encaminha o leitor para as páginas da 9ª edição do manual
USALI e até apresenta soluções consideradas melhor adaptadas à nossa realidade e ao
desenvolvimento da hotelaria.

.............................................................................................................................................

8
PREFÁCIO

Esta obra, sintetizada a partir de uma tese de Mestrado em Ciências de Gestão que tive o
grato prazer de orientar, segue os passos de um estudo muito bem elaborado da
contabilidade analítica aplicada à gestão hoteleira, em Portugal. Trata-se de uma obra
muito oportuna e muito necessária, num domínio estratégico das economias
desenvolvidas.

O autor não pretende, porém, circunscrever-se ao quadro limitativo do manual


disciplinar. Apresenta-nos de forma sistematizada uma reflexão-acção que visa
encontrar o fio da meada num domínio do saber em que a promoção de soluções
perfeitas e particularizadas, do tipo “Plano Oficial de Contabilidade Hoteleira” (POCH),
coexistem com práticas de terreno perfeitamente laxistas, baseadas no “fazer como
sempre se fez”.

Homem de reflexão e de prática profissional no ramo do ensino e da gestão hoteleira, o


autor proporciona aos leitores uma análise crítica das práticas contabilísticas
normativas, questionando-as através da pesquisa empírica. O estudo da ferramenta de
gestão “Uniform System of Accounts for the Lodging Industry” (USALI) é o ponto de
partida para o questionamento de um projecto de POCH, entretanto abandonado, em que
o autor se envolveu. A frequência do mestrado constituiu a ocasião para retomar o
problema e, através de um estudo de caso, procurar compreender as dificuldades
geradas por um pensamento essencialmente orientado para a produção de normas
contabilísticas de inspiração fiscal.

O contexto da revolução científica e técnica que atravessa a gestão, com a introdução


das Novas Tecnologias da Informação e da Comunicação (NTIC), ajuda a apreender a
necessidade, a urgência e as potencialidades de uma abordagem da contabilidade
emancipada da visão fiscalista e mais centrada na noção de apoio à tomada de decisão,
suportada pela disponibilidade da informação “on line” proporcionada pelos sistemas de
informação de gestão.

Entendo, pessoalmente, que um prefácio se justifica sobretudo, quando é possível


colocar em evidência a contribuição de uma obra para o avanço do saber, num domínio
concreto.

No caso presente, seleccionei seis vectores em que o autor, ao tratar a problemática da


contabilidade de gestão aplicada à hotelaria, interpela a didática e a pedagogia, ou seja,
a “Escola” enquanto instituição produtora do saber.

Antes de mais, como diria Edgar Morin, compete à Escola a missão de estruturar o
pensamento dos alunos, o que nem sempre consegue fazer de maneira adequada. A
estrutura do pensamento subjacente a este trabalho permite conduzir o leitor através de
uma aproximação à noção de projecto, cujo objectivo final se poderia traduzir numa
competência dos directores hoteleiros em tomar decisões fundamentadas numa leitura
de indicadores produzidos (co-produzidos?) em tempo real. Deste ponto de vista, o
pensamento do autor apresenta uma estrutura rigorosa, simples e muito entrosada com
as diversas valências da gestão empresarial, transformando uma matéria habitualmente

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árida numa leitura agradável para qualquer leitor interessado nos problemas da gestão
hoteleira.

Em segundo lugar, um pensamento estruturado abre o espírito dos alunos à necessária


convergência do saber, essencial para o desenvolvimento da reflexão e, sobretudo, da
prática cooperativa entre profissionais. Este aspecto está bem documentado, através dos
casos americano, suíço e português. Para ultrapassar o impasse em que caiu o POCH em
Portugal, o autor promove, neste trabalho, um exercício de interpretação do modelo
USALI, demonstrando como a sua filosofia e objectivos são possíveis de adaptação ao
POC, através da utilização adequada da classe 9.

O esforço de estruturação do pensamento visa, em terceiro lugar, preparar os alunos


para uma correcta utilização da linguagem científica, sem necessidade de tirar partido
do seu tradicional hermetismo, gerador de assimetria de informação e de equívocos
entre sistema cliente e sistema fornecedor. No caso vertente, o autor demonstra como foi
possível, através de uma colaboração entre hoteleiros (clientes) e contabilistas
(fornecedores), à imagem do nascimento do USALI, dotar directores de hotéis de
competências em contabilidade de gestão. A articulação entre os directores e o serviço
de contabilidade gerou, num grupo hoteleiro português, uma cooperação mutuamente
qualificante e constitui uma das bases do seu sucesso empresarial.

Por sua vez, a preocupação com a criação de uma adequada estruturação do pensamento
conduz os alunos na senda da visão crítica e autónoma das disciplinas estudadas e à
produção, como profissionais, de soluções inovadoras. O autor ilustra este ponto de
vista com a proposta de uma solução inovadora, de fácil aplicação, ultrapassando a
necessidade da publicação de um POCH para se conseguir a modernização da gestão
hoteleira, em Portugal.

A Escola é ainda o lugar da aprendizagem do trabalho intelectual metódico e


sistemático, que define problemas, analisa teorias consagradas, explora modelos de
pesquisa, confronta as teorias com os dados e os resultados da realidade pesquisada.
Mas a Escola é igualmente o lugar da pesquisa nas condições da incerteza que permite o
avanço, das aproximações baseadas em metáforas, da comparação entre o conhecido e o
que se procura saber.

Deste ponto de vista, a estrutura do pensamento passa pelo cultivo da abertura ao


inesperado. O autor explora, neste trabalho, outras possibilidades, ou seja, as mais valias
para os profissionais portugueses da comparação com o modelo suíço de contabilidade
de gestão hoteleira e, nomeadamente, da pertinência para o caso de certas modas em
gestão como o “Activity-Based Costing” (ABC) de Cooper e Kaplan. Mas aberto ao
inesperado, conclui que sair da inspiração inicial da adaptação ao POC, classe 9, só
conduziria a multiplicar os equívocos, sem acrescentar valor real à operação. A abertura
ao inesperado proporcionada pelo pensamento crítico guia o autor na procura de
soluções simples que funcionem.

A Escola é, enfim, o lugar, por excelência, do debate. A cultura do debate, porém, está
frequentemente enviesada pela conotação negativa que a vivência política tantas vezes
lhe empresta. O debate é entendido, na prática escolar, no sentido dialógico de
Hobbermas. É criador de realidade, no sentido mais humano do termo. O diálogo cria o
próprio ser humano e, na sua ausência, tudo o que o homem constrói pode ficar em

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causa. Um dos aspectos mais interessantes que o autor coloca em evidência é o facto de
este trabalho cooperativo de produção de indicadores de gestão, capazes de suportar a
tomada de decisão em tempo real, constituir a oportunidade de uma transformação das
práticas de direcção piramidal, permitindo desenvolver uma liderança bicéfala,
suportada na visão partilhada do director hoteleiro e do profissional de contabilidade.
De figura instrumental de apoio à gestão, como é próprio do pensamento burocrático,
este converte-se em co-decisor e a cultura de direcção abre-se à noção de “team
building”. A direcção hoteleira ganha em pró-actividade e a contabilidade deixa de
equivaler unicamente à função de retrovisor.

Estou convicto de que, com a publicação desta obra, a Escola cumpriu a sua missão de
produção de estruturação de um pensamento aberto ao debate. O paradigma subjacente
a esta reflexão não se inspira no positivismo disciplinar, mas, antes, na teoria da
complexidade, orientada para a necessidade de fazer emergir, por sua vez, um trabalho
de gestão mais cooperativo. Começa aqui o trabalho do leitor. Espero, sinceramente, que
no final recomende a sua leitura e entre em debate com o autor. Será esse debate, que o
autor quer incentivar, que poderá ajudar a estabelecer um ensino de excelência da gestão
hoteleira em Portugal. Vale a pena acrescentar que domínios tão cruciais para o futuro
do país, como a gestão dos hotéis, hospitais, estabelecimentos prisionais e outros afins,
teriam muito a ganhar com a abordagem proposta pelo autor.

Albino Lopes

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Introdução

Este livro surge na sequência de um trabalho de investigação que eu realizei em 1999 e


que concluí em 2000, no âmbito do meu curso de mestrado em Ciências de Gestão.

A busca por conhecimentos, saber e acção relacionados com a especificidade da gestão


hoteleira ocupam a grande parte do meu tempo desde 1978 (ano em que, após ter
terminado a licenciatura em gestão, optei por me especializar em gestão de empresas
hoteleiras).

Já em 1981, com a colaboração preciosa de um amigo e experimentado contabilisata do


Lisboa Sheraton Hotel, publiquei um livro intitulado Um Plano de Contabilidade
Explicado Para a Hotelaria. Isso deveu-se, por um lado, à experiência da necessidade
(muito sentida no final do primeiro ano à frente da Estalagem Mestre Afonso
Domingos, na Batalha) de um sistema uniforme de informação de gestão hoteleira e, por
outro, à grande satisfação e entusiasmo que senti quando deparei, pela primeira vez,
com o Uniform System of Accounts for Hotels. Então, achei que essa ferramenta tão útil
deveria ser adaptada ao nosso POC e à nossa hotelaria e que esse trabalho deveria ser
divulgado o mais possível, para ajudar quem sentisse as mesmas necessidades e ainda
não conhecesse este sistema.

O livro Um Plano de Contabilidade Explicado Para a Hotelaria esgotou-se e,


entretanto, tudo evoluiu, designadamente o POC, as soluções informáticas, o meu saber
adquirido pela experiência, pelo que não se justificava uma nova edição, mas antes um
livro novo sobre esta matéria.
A necessidade de um trabalho de investigação para a dissertação de mestrado foi a gota
de água que faltava para fazer transbordar a motivação deste outro livro, que é muito
diferente do primeiro e, por isso, se complementam.

Sendo assim, este livro interessará especialmente aos estudantes dos cursos de empresas
turísticas/hoteleiras, aos profissionais da contabilidade deste género de empresas (desde
hotéis a hospitais e outros estabelecimentos onde se prestem serviços de dormidas,
comidas e bebidas) e, em geral, aos interessados pela contabilidade.

Este livro Sistema de Contabilidade Analítica de Gestão Hoteleira que agora lhe
apresentamos é estruturado em duas partes e vários anexos suplementares, sendo a
primeira parte desdobrada em dois capítulos e a segunda em três.

No capítulo I da primeira parte, fazemos uma abordagem ao contexto geral em que se


incer o tema e a pesquisa a levar a efeito.
O tema é justificado, por um lado, pela relevância que a actividade turística e hoteleira
poderá vir a ter no novo paradigma da economia portuguesa, por outro, pelas
dificuldades e riscos inerentes a esta actividade. O problema é que não vigora, em
Portugal, um modelo de contabilidade analítica de gestão para a hotelaria que seja
uniforme. Contudo, existe uma experiência de sucesso que merece ser estudada e
adaptada. Porquê e como? São as grandes questões a que o estudo vai tentar responder.

No capítulo II deste primeira parte, fazemos o enquadramento teórico da pesquisa.


Começamos por apresentar, resumidamente, os tipos de contabilidade não só os mais

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tradicionais (geral e financeira, analítica de gestão, fiscal, orçamental), como os que
agora estão em emergência (designadamente: ambiental, dos recursos humanos).
Estamos conscientes de que este assunto dos tipos de contabilidade é um ponto comum,
mas, quanto a nós, justifica-se, neste caso, não só porque o tema desta pesquisa se insere
mais especificamente num destes tipos, a contabilidade analítica de gestão que não é
desgarrada de todos os outros tipos (porque a contabilidade é una), mas também porque
há novidades e questões importantes, neste aspecto, ou seja, novas áreas, novas janelas
que se abrem à contabilidade.

Na sequência dos novos desafios que se abrem à contabilidade, num contexto de


tendência geral para a desregulamentação, da necessidade de fazer experiências, de
tactear estas novas áreas 1 abordamos a questão da normalização e criatividade. Além
disso, este ponto também é justificado pelo facto da contabilidade analítica de gestão,
em Portugal, não estar ainda normalizada para a maioria esmagadora dos sectores da
actividade económica, designadamente a hotelaria e, sendo cada vez mais indispensável
à gestão, coloca-se, cada vez mais, a questão da sua normalização oficial ou da
adaptação facultativa de um sistema já provado, com muitos anos de prática e
amplamente divulgado em todo o mundo, como é o inserido no “Uniform System of
Accounts for the Lodging Industry” (USALI).
Na sequência disto, abordamos a questão da tendência para a internacionalização da
contabilidade em geral, não só como consequência da União Económica e Monetária
(UEM) e da globalização da economia, mas também porque constitui um ponto de
reflexão e motivo para a possível adopção de um modelo de contabilidade analítica de
gestão para a hotelaria portuguesa já que, como referimos, tal modelo está
suficientemente testado (desde 1926), amadurecido (vai na 9ª edição, 1996) e divulgado,
sobretudo pelas cadeias hoteleiras internacionais.
Mas a nossa cultura tem sido muito paternalista, seguidista. Não temos grande tradição
de investigação nesta área, pelo que o papel da administração fiscal foi muito
preponderante na normalização contabilística e, no passado, a escassez de técnicos
(salvo honrosas excepções, porventura excessivamente fiscalistas) fez com que o papel
da contabilidade, entre nós, tenha estado demasiadamente dependente da fiscalidade.
Por isso mesmo, não podíamos deixar de abordar não só os principais factos que
marcaram a evolução da contabilidade, em Portugal, como também a questão da
dependência da fiscalidade, dado que o debate à volta desta questão é muito importante
para o papel que a contabilidade tem para a gestão, sobretudo a contabilidade analítica e
para o papel futuro que a administração fiscal deve ter, ou não, na normalização deste
tipo de contabilidade especificamente para a hotelaria.
A abordagem genérica da contabilidade, na perspectiva da sua evolução e tendências,
termina com um apanhado das novas questões e desafios que se colocam à
contabilidade, fazendo ligação e completando as novas perspectivas ou tipos de
contabilidade apresentados anteriormente. Tais questões e desafios centram-se, por um
lado, na quantificação e “patrimonialização” futura daquilo que hoje é meramente
qualitativo, mas que não deixa de ser tão ou mais importante do que os tradicionais
aspectos patrimoniais e, por outro lado, no apuramento dos respectivos custos, proveitos
e resultados que à contabilidade analítica também dizem respeito.
Posto isto e como antecâmara do tema, alinhamos para a contabilidade de gestão onde
apresentamos o sistema tradicional do tratamento dos custos indirectos e o novo sistema
de tratamento dos mesmos (CBA).
1
«Como trabalho? – Tacteio!» Disse um dia Einstein (PETERS T., Em busca do UAU! Um Guia para
Tempos Confusos, Lisboa, Bertrand, 1995).

14
No ponto 3 deste capítulo, mergulhamos, então, no tema da contabilidade de gestão
hoteleira, começando por apresentar os dois sistemas mais conhecidos e seus objectivos.
Em 3.2, fazemos apenas uma apresentação e uma breve análise crítica ao sistema de
contabilidade analítica contido no “Plan Contable pour l`Hôtellerie et la Restauration
Suisses” (PCHRS), por ser um sistema muito limitado e circunscrito, mas sobrevivente
e, por isso, não podíamos deixar de nos referirmos a este modelo.
Em 3.3, afunilamos, então, para o sistema de contabilidade analítica de gestão contido
no “Uniform System of Accounts for the Lodging Industry” (USALI), desenvolvendo a
sua teoria. Destacamos a solução encontrada pelo USALI para compatibilizar as
preocupações da teoria do CBA, com a salvaguarda dos objectivos fundamentais da
uniformização e da simplicidade do sistema.
Em 3.4, analisamos a compatibilidade do sistema de contabilidade analítica contido no
USALI com o nosso POC, bem como as vantagens e desvantagens de se utilizar a opção
monista (analítica integrada no POC) ou dualista (analítica separada, na classe 9).
Terminamos, em 3.5,com a apresentação e análise crítica de uma de duas tentativas que
foram feitas, em Portugal, para adaptação do USALI à contabilidade hoteleira.

Na segunda parte, capítulo I, apresentamos a metodologia que presidiu a esta


investigação.
Começamos por fazer uma brevíssima apresentação (porque algumas as reservas
sigilosas a isso nos limitam) da organização que serviu de base a este estudo de caso.
Posto isto, fazemos a apresentação do método de análise e desenho da pesquisa,
começando por sublinhar a premissa geral da investigação, a que se seguem as razões da
opção pelo método de pesquisa estudo de caso, o desenho da pesquisa, bem como as
técnicas de recolha e de tratamento de dados.
Este capítulo termina com a descrição da metodologia da pesquisa empírica.

No capítulo II desta segunda parte, apresentamos a análise dos resultados da observação


directa dos documentos e das entrevistas. Dado que são técnicas de recolha de
informação bastante diferenciadas entre si, ou seja, de valor bastante diferente, 1
achamos que o fundamental é dito através dos documentos, servindo as entrevistas
como complemento ao factual (documental), pelo que preferimos não seguir a lógica
normal,2 em benefício da clareza.

Finalmente, no capítulo III desta segunda parte, apresentamos as conclusões gerais do


estudo e algumas questões que ficam em aberto.

Apesar das adaptações que fizémos à versão que serviu a tese mestrado, não quisémos,
nesta versão trazida a público, nem alterar a estrutura nem eliminar muito do conteúdo
técnico de um trabalho desta natureza. A intenção foi oferecer também aos
investigadores algo desta minha experiência e pesquiza. Assim, os principais de para
que o trabalho não tivesse uma apresentação tão técnica,

Posto isto, queremos manifestar aqui a nossa homenagem de reconhecimento àsa


seguintes pessoas:

1
A análise de documentos é factual, com características bastante objectivas, as entrevistas com
características bastante subjectivas.
2
Pela lógica normal, a análise é feita em conjunto e não separadamente. Desta feita, realçamos a análise
factual.

15
Ao Prof. Doutor Albino Lopes que sempre esteve disponível para me acompanhar,
sobretudio na vertente científica, desde o início da investigação, até ao momento da
publicação deste trabalho, culminando com o prefácio do mesmo.
Ao Prof. Doutor Rogério Fernandes Ferreira que já havia feito o prefácio do primeiro
livro atrás referido e que agora me honrou não só no seu papel de arguente na defesa da
dissertação de mestrado, como também na apreesentação que faz agora do autor e desta
obra.
Ao Prof. Dr. António Borges que me acompanhou na matéria contabilística,
especialmente na relacionada com a primeira parte deste trabalho.
Ao Prof. Doutor Mário Murteira que presidiu ao juri (composto pelas figuras atrás
mencionadas), da defesa da minha minha dissertação
À Dra. Ana Isabel Araújo que teve a paciência de analisar e corrigir a ortografia e
sintaxe do texto original e das provas finais.

PRIMEIRA PARTE

CAPÍTULO 1

CONTEXTO, TEMA E PROBLEMÁTICA DA GESTÃO HOTELEIRA

1.1-A importância da actividade turístico-hoteleira

O turismo, apesar de ser uma actividade relativamente recente, tem sido aquela que
regista maiores taxas de crescimento nas últimas décadas. Apesar dos acontecimentos
registados nos últimos anos1 a OMT prevê que essa tendência manter-se-á, pelo menos
nas próximas décadas.
Graças à sua massificação, esta actividade está em vias de ultrapassar as indústrias
petrolífera e automóvel, as quais têm estado em primeiro lugar do ranking mundial. As
previsões apontam para que nem a também jovem indústria dos computadores e
software venha a ultrapassar a do turismo.

Com efeito, há pouco mais de 40 anos, viajavam cerca de 60 milhões de turistas (OMT,
1960).2 Mas já em 2000, viajaram cerca de 600 milhões e, daqui a mais 20 anos,
prevêem-se 1 600 milhões de turistas a viajar em todo o mundo 3. Em termos relativos,
este crescimento futuro representa uma taxa de crescimento médio anual de 4% em
quantidade e de 6,7% em valor4.

Na era da globalização, das grandes fusões e da fortíssima concorrência, Portugal tem


condições para competir na área dos serviços, especialmente na actividade turística-
hoteleira.5

1
A vaga de “atentados terroristas” de que se destaca o de 11 de Setembro de 2000, em Nova Iorque, fez
rever em baixa as anteriores previsões da OMT.
2
Turistas são os visitantes que passam pelo menos uma noite num alojamento colectivo ou privado, no
país visitado (Organização Mundial do Turismo). Portanto, é diferente de visitantes que, em 2000,
atingiram os 28.014 milhões.
3
Dados da OMT.
4
A provável expansão da riqueza mundial é estimada em 3% (média anual).
5
«...o turismo português apresenta, no panorama nacional, condições únicas de sustentabilidade
económica. Possuímos, assim, uma posição fundamental e insubstituível no espectro turístico da oferta
mundial, situação que o país não detém em nenhuma outra área produtiva de primeira linha nos mercados

16
No início da década de 80, alguns protagonistas do sector diziam que “o turismo é o
nosso petróleo”. De facto, as condições naturais, climatéricas, geográficas, sócio-
económicas, o elenco de produtos turísticos diferenciados, a segurança, a localização
afastada das zonas de cruzamento de conflitos, mas perto do centro da Europa, o seu
efeito multiplicador e de criação de emprego, a sua fonte de divisas e de equilíbrio da
Balança, vai fazendo com que esta actividade seja encarada, cada vez mais, pelos nossos
governantes e pelo país em geral, como um sector estratégico para o desenvolvimento e
competitividade do nosso país.

1.2-Justificação do tema que vamos estudar

Como vimos, o turismo é uma indústria recente mas de proa.


A atractividade do turismo bem como as oportunidades que proporciona são muito
grandes. O seu efeito multiplicador na economia leva também os governos dos países a
interessarem-se por ela.

Portugal é um país com aptidões naturais especialmente importantes para o grande


sector dos serviços, destacando-se o turismo receptivo. A actividade turística tende a ser
vista como um sector estratégico para a competitividade e desenvolvimento económico
do país, no novo contexto de globalização. Convirá desde já sublinhar que, nos últimos
anos, o turismo já tem um contributo líquido, para o equilíbrio da Balança de
Transacções Correntes, da ordem dos 25%. Em 1995, representava 9,1% do VAB
(estimam-se 10% actualmente) e 8,4% do PIB.

Porém, apesar da atractividade do turismo, em que a hotelaria é um dos principais


suportes, a indústria hoteleira tem características próprias e não fáceis para a sua
rendibilidade. A título de exemplo, referimos, de momento, que a indústria hoteleira é
não só de capital intensivo1, como também de mão de obra intensiva2; a elasticidade da
oferta (produto hoteleiro) é muito rígida, ao passo que a procura é muito volátil
(elástica), sofre de grande sazonalidade, a par de elevados custos fixos, de não se poder
produzir para stock, etc.

Isto leva-nos a concluir que a informação de gestão, na hotelaria, é particular e


crescentemente importante, sobretudo à medida que o turismo se massifica, que a
concorrência aumenta e que a hotelaria começa também a ser vista e comercializada
“como uma mercadoria”3.

internacionais». Cf. ALMEIDA P., Secretário de Estado do Turismo, in: Turismo: Um sector estratégico
para Portugal, número especial da publicação “Informar Portugal” do ICEP Portugal-Investimento,
Comércio e Turismo 2002 (5), pp.6-8.
«...na busca de de uma evolução positiva para a economia portuguesa...é indispensável e urgente assumir
as exigências estratégicas quanto ao futuro do sector (do Turismo)». «...a estratégia do Turismo português
não é, na perspectiva do 1º quartel do século XXI, matéria de mero carácter sectorial, é uma questão de
estratégia económica nacional, inexoravelmente situada num contexto de competição global». Cf. LOPES
E., O Turismo componente relevante da estratégia de desenvolvimento, ibidem, pp.55-58.
1
Por exemplo: dividindo o investimento feito num hotel de cinco estrelas, em Lisboa, pelo seu número de
quartos, resulta um custo médio/quarto da ordem dos 30.000 contos...
2
Além do facto de ser uma actividade prestadora de serviços que se querem personalizados, um dos
indicadores que suportam aquela afirmação é o rácio do total dos custos com o pessoal o qual, dividido
pelo total das receitas, dá um rácio médio que se situa à volta dos 30 a 35% (cf. DGT, «O Turismo em
2001», Lisboa, ed. da DGT, p. 42). Ou seja, absorvem cerca de um terço das receitas totais.

17
Ora, na sua generalidade, a informação de gestão na hotelaria portuguesa afigura-se
insuficiente. Conhecemos muitos hotéis que não têm contabilidade analítica de gestão;
outros têm-na, mas não satisfaz os requisitos de uma boa informação de gestão
hoteleira.

Alguns dados disponíveis e sobretudo a convivência profissional que temos tido, desde
há vinte anos, com muitas dezenas de hotéis portugueses, sobretudo em serviços de
consultadoria, levam-nos a concluir que, em Portugal, predominam os hotéis de pequena
ou média dimensão, os quais estão integrados em empresas com características
familiares, em que é o dono maioritário que gere à sua maneira, não dando a devida
relevância à contabilidade de gestão.

Por sua vez, uma boa parte dos directores gerais dos hotéis ainda são pessoas de baixa
ou média formação académica, que singraram na carreira sobretudo com base na
experiência profissional, desde a base, ou seja, têm falta de algumas das principais
competências exigidas a um gestor dos novos tempos propriamente dito. Muitas das
excepções a este tipo de director geral defrontam-se com a mentalidade tradicional e
desactualizada do chamado topo estratégico, do qual tudo depende. O tipo de cultura
organizacional dos nossos hotéis ainda é muito taylorista, com o poder muito
centralizado (“power organization”, tipo Zeus) ou burocrático (“role organization”,
tipo Apolo) 1. As pessoas fazem aquilo que lhes mandam, não tomam iniciativas, não
pesquisam, não inovam, sobretudo na área da contabilidade. Muitos contabilistas ainda
são meros burocratas que simplesmente cumprem as normas técnico-fiscais que lhes são
impostas.

Por outro lado, a actividade hoteleira dispõe de um sistema uniforme de contabilidade


analítica de gestão consistente e idóneo contido no “Uniform System of Accounts for the
Lodging Industry” (cuja 1ª edição é de 1926 e 9ª, de 1996) seguido por muitas cadeias
hoteleiras internacionais e não só, e que já é considerado como o plano uniforme
internacional para o sector, só que ainda é pouco conhecido entre muitos hoteleiros e
profissionais da contabilidade, em Portugal.

Desde a sua concepção (1925) que este sistema de contabilidade hoteleira foi pioneiro
em separar os custos directos dos indirectos, rompendo com o tradicional princípio da
absorção (imputação dos custos indirectos aos serviços ou bens produzidos).

Nas últimas edições, sobretudo na 9ª (1996), este sistema deu mais um passo na
tentativa de conciliar os objectivos essenciais da uniformização e simplicidade com a

3
«A indústria hoteleira - tal como todo o sector de serviços- tornou-se um negócio de mercadorias...». Cf.
in PETERS T., «Em busca do Uau! Um Guia para Tempos Confusos», Lisboa, Bertrand editora, 1995,
pp.138-139.
1
Segundo um modelo de diagnóstico de cultura organizacional utilizado por Roger Harrison, Ph.D. e
Herb Stokes (Pfeiffer, 1992), há quatro tipos de cultura organizacional: autocrática (power Orientation),
burocrática (role orientation), realizante (achivement orientation) e cooperante (Support orientation).
A organização orientada para o poder baseia-se na desigualdade do acesso aos recursos, cujo controle
(poder) permite frustrar ou satisfazer as necessidades dos outros e o seu comportamento, pelo que a
liderança está numa pessoa e na sua vontade de premiar ou castigar. A orientada para a burocracia, baseia-
se nas regras e procedimentos que regem as relações entre as pessoas que cumprem funções em troca de
uma remuneração. Charles Handy, dissertando sobre a mesma matéria, serviu-se da mitologia grega e dos
hábitos, costumes e perfil psicológico de alguns deles (Zeus, Apolo, Atena, Posidon e Diónisos) para
caracterizar idênticos tipos de cultura organizacional.

18
recente ênfase dos teóricos em acabar com a destrinça dos custos indirectos, através do
critério do custeio baseado nas actividades (CBA).

Na fase de evolução em que se encontra a contabilidade analítica de gestão na hotelaria,


em Portugal, parece-nos ser de primeira prioridade, nesta matéria, a adaptação desse
sistema de contabilidade analítica contido no “Uniform System of Accounts for the
Lodging Industry”, em conciliação com o nosso Plano Oficial de Contabilidade (POC),
que é obrigatório para a hotelaria e para a generalidades das empresas.

1.3-O Problema

Em Portugal, tal como noutros países, designadamente nos EUA, não existe um plano
sectorial obrigatório para as empresas hoteleiras. Apenas é obrigatório o Plano Oficial de
Contabilidade (POC), ou seja, contabilidade geral e financeira, plano esse que tem uma
classe 9 completamente em branco, prevista para nela se desenvolver a contabilidade
analítica de gestão, ligada à geral, mas independente 1.

Como ficou dito atrás, há indícios de que muitos dos hotéis portugueses ainda
funcionam só com a contabilidade geral, obedecendo apenas a esse POC, talvez porque
ainda não estejam sensibilizados para as vantagens da contabilidade analítica de gestão.

Outros, os que têm consciência da importância da informação de gestão que é fornecida


pela contabilidade analítica, mas que desconhecem o modelo contido no “Uniform
System of Accounts for the Lodging Industry” (USALI), elaboram ou adoptam uma
contabilidade analítica de gestão mais ou menos ad hoc.
Estas soluções ad hoc pecam, sobretudo, pelo facto de não usufruírem das várias
vantagens do sistema uniforme contido no USALI e amplamente utilizado na hotelaria
internacional.

Tais vantagens, de acordo com os propósitos explícitos e implícitos do sistema (e que


são desperdiçadas num sistema ad hoc), são:
 A utilização de uma estrutura de mapas estandardizados e de classificação de contas
de um modo simples e uniforme;
 O aproveitamento da longa experiência e melhoria constante desse sistema, desde
1926;
 A flexibilidade e grande simplicidade de adaptação e de funcionamento,
independentemente da dimensão do hotel;
 O aproveitamento de uma solução que permite, facilmente, satisfazer os requisitos
de uma adequada informação de gestão2;
 A possibilidade de fazer comparações dos seus dados individuais com os dados
standard do sector;
 A possibilidade de fazer análise de performance dos centros de responsabilidade;
 A possibilidade de dispenderem menos custos e energias com a adaptação, do que
com a invenção do que já foi inventado há muito tempo.

1
Também pode ser desenvolvida integradamente nas classes 7 e 6, como veremos oportunamente.
2
Os principais requisitos de uma boa informação de gestão são: credibilidade (fiável ou fidedigna),
compreensibilidade (clareza, objectividade, facilidade de compreensão); relevância (pertinente para o
diagnóstico e para a tomada de decisões); atempada (oportuna, no momento certo); comparabilidade
(com os standards).

19
Muitas dessas soluções ad hoc, além de não usufruírem de uma estrutura de informação
adequada, sofrem, ainda, de um atraso temporal crónico, por várias razões, sendo uma
delas a complexidade do sistema utilizado e o pouco interesse que a informação por ele
fornecida suscita nos gestores1.

Entretanto, temos vindo a assistir, sobretudo nos últimos anos, ao aparecimento de


alguns planos contabilísticos sectoriais, tendo por referência o Plano Oficial de
Contabilidade feito e obrigatório para a área empresarial stricto sensu, desde 1977.2
Contudo, precisamente nessa área económica empresarial stricto sensu, pouco se tem
feito em matéria de contabilidade sectorial e muito menos em matéria de contabilidade
analítica de gestão. Mesmo nos planos sectoriais já formalizados e em vigor, a
Contabilidade Analítica de Gestão não tem sido propriamente formalizada como
obrigatória nestes planos. 3

E na hotelaria, o que se tem passado?

1
Oficialmente, a própria contabilidade oficial (POC) pode andar com três meses de atraso. Conhecemos
vários hotéis e até pequenos grupos de hotéis que têm a contabilidade atrasada muitos mais meses. Alguns
deles estão preocupados com isso e estão a tomar medidas para ultrapassar esta situação.
2
A primeira edição do Plano Oficial de Contabilidade (POC) data de 1977 (Decreto-Lei nº 47/77, de
07/02) e teve a principal revisão em 1989 (Decreto-lei nº 410/89 de 21/11) para se adequar à 4ª Directiva
da CEE (nº 78/660/CEE). Com aquele decreto de 1977, foi criada a Comissão de Normalização
Contabilística, para fazer revisões ao POC e para preparar planos sectoriais.
Depois deste documento histórico que foi o POC, surgiu o plano sectorial para a actividade bancária,
consubstanciado no Plano de Contas para o Sistema Bancário, divulgado nas instruções técnicas
anexas à circular, Série A, nº 235, de 92/04/22.
Depois, surgiu o Plano de Contas para as Empresas Seguradoras, aprovado pela Norma nº 7/94-R do
Instituto de Seguros de Portugal (ISP) e publicado no Diário da República, 3ª Série, nº 127 (2º
Suplemento) de 94/06/01, em consequência dos poderes reconhecidos ao ISP pelo D-L nº 102/94, de
20/04, para esse efeito.
Com o Diário da República (DR) 2ª Série nº 4 (Supl.) de 96/01/05, é aprovado o Plano de Contas dos
Fundos de Investimentos Mobiliários (anteriormente aprovado pelo Regulamento nº 95/14 da CMVM).
O DR, 2ª Série, nº 17, de 97/01/21, aprova o Plano de Contas dos Fundos de Investimento Imobiliário
(anteriormente aprovado pelo Regulamento nº 96/16 da CMVM).
O D-L nº 232/97, de 03/09, aprova o novo Plano Oficial de Contabilidade Pública (POCP) que é
«obrigatoriamente aplicável a todos os serviços e organismos da administração central, regional e local
que não tenham natureza, forma e designação de empresa pública, bem como à segurança social» (...)
bem como « às organizações de direito privado sem fins lucrativos que disponham de receitas
maioritariamente provenientes do Orçamento do Estado»
O D-L nº 74/98, de 27/03, aprova o Plano Oficial de Contabilidade para as Federações Desportivas,
Associações e Agrupamentos de Clubes (POCFAAC).
O D-L nº 54-A/99, de 22/02, aprova o Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais
(POCAL) que não é mais do que a adaptação das regras do POCP à administração local (a que ficam
sujeitos «os municípios, as freguesias, as associações de municípios e de freguesias de direito público e
ainda as áreas metropolitanas e todas as entidades que, por lei, estão sujeitas ao rime de contabilidade das
autarquias locais»
3
«Sendo igualmente desejável nas entidades de carácter público o desenvolvimento de subsistemas
contabilísticos de contabilidade analítica, deixa-se livre, à semelhança do POC, a classe 9 para esse efeito,
reservando-se para uma fase posterior a eventual produção de normas sobre esta área» (D-L nº 232/97, de
03/09, que aprova o POCP).
Dado que a fixação das tarifas e preços dos bens e serviços públicos deve ter uma base objectiva, o
POCAL fixa um conjunto de procedimentos contabilísticos obrigatórios para o apuramento de custos por
funções, para esse efeito, mas suficientemente genérico, para que as várias entidades possam proceder às
adaptações que se lhe impuserem, decorrentes das suas especificidades.
Por sua vez, no artigo 3º do D-L nº 74/98 de 27/03, que institui o POCFAAC, pode ler-se: «as contas da
classe 9, “Contabilidade Analítica”, do presente Plano, são de utilização facultativas, podendo as
entidades adoptar outras contas e designações que considerarem mais adequadas à sua gestão».

20
Sendo o turismo uma indústria em fortíssimo crescimento e tão relevante para a
economia nacional e sendo a hotelaria um dos seus principais suportes, mas um negócio
de elevado risco que, ainda por cima, entrou em tempos muito turbulentos, imprevistos
e de concorrência feroz, parece-nos lógico levantar e estudar o problema da necessidade
de uma contabilidade analítica de gestão que satisfaça os requisitos de uma boa
informação de gestão.

Se devemos optar por um plano específico sectorial oficial, obrigatório, ou se devemos


considerar que se trata apenas de um problema interno do sector, que se resolve sem
formalismo e facilmente, com a utilização da classe 9 e a flexibilidade do POC, são
algumas das questões que se colocam.

Será curioso notar que, já na década de 80, mais precisamente em 1981 e 1987, foram
feitos dois trabalhos que abordavam esta problemática, dos quais destacamos um
anteprojecto de Plano Oficial de Contabilidade para a Indústria Hoteleira e Similares
elaborado pela Direcção Geral de Turismo, com a participação das associações do sector
e que foi entregue ao Ministério das Finanças, nessa altura, mas sem qualquer efeito, até
hoje1.

1.4-Questões a pesquisar

As questões que vamos estudar prendem-se, em primeiro lugar, com a pertinência do


modelo de contabilidade analítica de gestão hoteleira contido no Uniform System of
Accounts for the Lodging Industry (USALI). Em segundo lugar, com a sua adaptação
também à realidade portuguesa. 2 Será preferível elaborar e lutar por um Plano Oficial de
Contabilidade específico para a Hotelaria (POCH) portuguesa, na senda do USALI, ou
simplesmente e mais rapidamente, utilizar a disponibilidade da classe 9 do POC e nela
fazermos a adaptação da parte analítica do USALI, conciliando-a com o POC?

Considerando o escasso progresso que, em nosso entender, se tem verificado na


contabilidade sectorial das empresas stricto sensu e os esforços inconsequentes
1
Em 1981, foi publicado o primeiro trabalho sobre esta problemática LAMELAS, J.P. e TEIXEIRA J C.,
Um Plano de Contabilidade Explicado para a Hotelaria, Lisboa, Clássica Editora, 1981, cujo objectivo
principal era «contribuir para que a hotelaria disponha de um plano que sirva os interesses e necessidades
da gestão hoteleira e não apenas as obrigações fiscais» e «a conciliação entre o experimentado e provado
Uniform System of Accounts for Hotels e o Plano Oficial de Contabilidade» ou «pelo menos, para quem o
não quiser adoptar imediata e livremente, uma base de trabalho e discussão vinda a público, para todos
aqueles que se interessam por estas matérias». No prefácio, Rogério Fernandes Ferreira escreve que a
Comissão de Normalização Contabilista «terá por certo já neste útil trabalho uma primeira matéria para
oportunamente se debruçar» e, acrescenta, «reputamos o trabalho extremamente útil para o sector».
Na introdução ao referido anteprojecto da DGT, este organismo diz que se fez «intérprete das
necessidades sentidas pelo sector» e que «o principal objectivo que presidiu à criação deste anteprojecto
foi a implantação de um sistema contabilístico usado na hotelaria americana e já muito divulgado na
hotelaria europeia, designado por “UNIFORM SYSTEM OF ACCOUNTS FOR HOTELS”», devido à
grande expansão deste sistema e à informação estatística que dele se obtém e que podemos comparar.
2
O modelo do “Uniform System of Accounts for the Lodgimg Industry” (que é a designação que, a partir
da edição de 1996, substitui a anterior Uniform System of Accounts for Hotels) será
convenientemente estudado mais adiante. De momento, convirá apenas referir que este modelo, que teve
a 1ª edição em 1926 e a 9ª em 1996, é normalmente designado por sistema americano, (por ser de
origem americana) e ainda mais conhecido simplesmente por sistema uniforme (não só devido às suas
palavras iniciais, como por estar muito divulgado pela hotelaria mundial e se ter sobreposto a qualquer
outra alternativa do género).

21
registados no sector da hotelaria em particular, privilegiaremos, na pesquisa que vamos
empreender, a hipótese de simplesmente e mais rapidamente se utilizar a
disponibilidade da classe 9 do POC e nela fazermos a adaptação da parte analítica do
USALI, conciliando-a com o POC.

Os objectivos específicos deste trabalho são, pois, os seguintes:


1- “Como” e “porquê” o modelo contido no Uniform System of Accounts for Hotels (hoje,
USALI) se tornou um sistema uniforme, com sucesso, reconhecido e utilizado na
hotelaria mundial?
2- “Como” e “porquê” pode este modelo tornar-se uma boa solução para a contabilidade
analítica de gestão de um hotel ou grupo de hotéis?
3- “Como” e “porquê” pode este modelo facilmente funcionar paralelamente à
contabilidade geral e financeira, através da classe 9 do nosso Plano Oficial de
Contabilidade (POC) e, portanto, em complemento e conciliação com o referido
modelo?

1.5-Pertinência do problema

A contabilidade tem uma importância assumida nas ciências sociais. A contabilidade


geral e financeira é indispensável e obrigatória no relacionamento de interesses entre a
empresa e o seu meio envolvente. A contabilidade analítica de gestão, sendo interna, não
é obrigatória, mas revela-se um instrumento de gestão indispensável à sobrevivência,
consistência e progresso das empresas, num mundo muito instável e altamente
competitivo, onde as medições do que é gerido, a rapidez das decisões fundamentadas e
a criatividade são factores críticos de sucesso.

Como ficou dito anteriormente, há indícios, confirmados pela nossa vivência


profissional no sector, de que ainda há muitas empresas hoteleiras portuguesas a serem
geridas apenas (ou quase só) com base na experiência, intuição e alguma informação
empírica. Torna-se necessário, portanto, um sistema de contabilidade analítica de gestão
que satisfaça as características e requisitos de uma adequada informação de gestão.

Também é verdade que, actualmente, vão aparecendo sinais de tendências e apetência


para alguma mudança nesta área, o que, por isso, também torna esta questão oportuna e
pertinente.

Entre os referidos sinais, destacamos:


 O número significativo de cursos superiores de formação em gestão hoteleira e
de aperfeiçoamento técnico, onde o modelo de contabilidade analítica de gestão
contido no “Uniform System of Accounts for the Lodging Industry” é estudado,
ainda que pela rama;

 A emergência de uma nova geração de directores gerais com formação superior


média (como resultado dos cursos de gestão de empresas turístico-hoteleiras do
ensino politécnico e superior), mas sem capacidade técnica contabilística
suficiente, para levare a cabo a resolução deste problema1;

1
Como não pode deixar de ser, estes cursos destinam-se sobretudo a formar gestores e não contabilistas,
pelo que a sua formação contabilística é na óptica do utilizador e não na do executante da contabilidade.

22
 A preocupação emergente para a reciclagem ou formação permanente dos
directores1;

 A tendência para os hotéis independentes se integrarem em grupos ou se


associarem, facilitando a osmose e necessidade deste know how2;

 A pressão sentida de se fundamentar a gestão em números que dêem informação


credível, atempada, compreensível, relevante, comparável com os standards
medidores do desempenho;

 O avanço tecnológico configurado pela informatização dos hotéis.3

Por sua vez, as características do negócio hoteleiro e a importância que o turismo e a


hotelaria têm na economia mundial e em Portugal tornam a contabilidade de informação
de gestão das empresas hoteleiras um tema específico e também relevante.

No que respeita à investigação relacionada com este tema,4 parece-nos pertinente referir,
aqui, o seguinte: apesar da literatura sobre contabilidade, a nível mundial, já remontar à
centenas de anos,5 os primórdios da investigação contabilística remontam aos princípios
do século XX.6 Contudo, é sobretudo a partir da década de 60, especialmente nos EUA,
que esta investigação se desenvolve, tendo como motores o desenvolvimento dos
computadores e o aparecimento, em 1963, da publicação “Journal of Accounting
Research” que, segundo Ryan et al. (1992), se tornou num líder mundial
na investigação empírica contabilística7.

Almeida8 diz que «Portugal é um dos países menos desenvolvidos no domínio da


investigação das ciências empresariais, portanto, também, no domínio da
contabilidade». (...) «É de esperar que o aparecimento dos recentes mestrados em
ciências empresariais, contabilidade e auditoria venham a criar um impulso e efeito
multiplicador de mudança e valor acrescentado nesta matéria».

De facto, pelo menos no tema que escolhemos e ao qual temos dedicado muito da nossa
vida profissional, não tem sido dada a importância e a atenção necessárias à vertente da

1
Numa recente entrevista publicada pelo jornal “Publituris” (nº 766 de 2000/01/15), o Secretário de
Estado de Turismo destaca que a formação profissional será um dos três vectores estratégicos, nos
próximos anos, para o turismo português (a par do instrumento financeiro QCA III e da promoção).
2
Esta tendência dos hotéis se agruparem assume várias formas (franchising, contratos de gestão, cedência
de exploração, etc). É particularmente importante, ou mesmo condição de sobrevivência, para os novos
aventureiros que entram nesta actividade sem a conhecerem por dentro e para os hoteleiros
tradicionalistas, sem preparação para as exigências da gestão dos novos tempos. Para os gestores
preparados e experientes nesta actividade, tem apenas como vantagem algumas economias de escala e
sinergias. Ao invés, tem a desvantagem do custo dos royalties ou fees que nem sempre compensam,
segundo testemunhos dos que já passaram por esta situação.
3
Muitos desses programas já supõem a utilização do sistema uniforme (modelo USALI).
4
Cf. mais à frente,“A Investigação na Contabilidade de Gestão”.
5
O primeiro tratado escrito sobre esta matéria é de Pacioli (1494).
6
Na sequência da crise dos anos 20, nos Estados Unidos da América.
7
Em Portugal, também foram pioneiros, nestes tempos, os Professores Gonçalves da Silva e Rogério
Fernandes Ferreira.
8
ALMEIDA M., in Revista “Eurocontas”, Ag. Set 1998, (41).

23
contabilidade analítica de gestão, designadamente no que respeita à actividade hoteleira,
pesem embora alguns esforços pioneiros de algumas entidades9.

Nos anos 80, foram feitas as primeiras duas tentativas de adaptação do sistema de
contabilidade analítica de gestão hoteleira contido no “Uniform System of Accounts for
Hotels” e sua conjugação com o POC. Ambas tiveram a colaboração do autor desta
dissertação, o que constitui, também, uma boa razão para a pertinência deste trabalho.

Em suma, a presente dissertação pretende constituir mais um contributo, mesmo que


modesto, para o acréscimo de valor, designadamente para o sector da hotelaria, o qual
constitui uma actividade chave de um sector também chave da economia nacional e mundial
que é o turismo.

1.6-Análise do contexto

Os pontos que se seguem destinam-se não só a descrever o contexto em que o estudo se


vai desenvolver, mas também a desenvolver e aprofundar a síntese apresentada nos
pontos anteriores, designadamente a justificação da escolha do tema, o problema e a
pertinência dos mesmos.

1.6.1-Importância e evolução da hotelaria

A razão de ser essencial de um hotel é alojar as pessoas que estão longe de suas casas e
fornecer-lhes as suas necessidades básicas. Sem hotelaria não poderia haver turismo.
Por isso, a sua importância é idêntica à importância do turismo, designadamente no que
respeita a:
 Satisfazer as necessidades primárias dos visitantes que trazem divisas e,
consequentemente, promovem o comércio e indústrias locais;
 Contribuir, de modo muito significativo, para o equilíbrio da balança de
pagamentos;
 Impulsionar o desenvolvimento de infra-estruturas públicas;
 Gerar emprego e contribuir para o aumento da qualidade de vida e bem estar das
populações.

Apesar das primeiras unidades hoteleiras terem surgido no século XVIII, é durante o
século XIX que a hotelaria se começa a desenvolver e a diversificar (à medida que o

9
Nos anos 60, ALMEIDA A.C. editou aquela que julgamos ser a 1ª obra sobre este assunto. Trata-se de
um rudimentar sistema de escrituração monográfica, baseado em livros de registo e mapas analíticos e
centralizados.
Nos fins dos anos 70, MONTEIRO M.N. (1969) apresentou um trabalho sem grande avanço em termos
de filosofia do sistema, mas com alternativas de plano de contas (monista ou dualista) tendo já uma
preocupação em distinguir os custos directos dos indirectos, mas continuando a propor a absorção (rateio)
destes pelos centros de receitas.
Por sua vez, NETO C. publicou também um trabalho cujo cap. III tem a designação de “Planos de Contas
Uniformizados” e onde se critica a contabilização separada dos custos indirectos, preconizando-se,
também, a sua absorção pelos centros de receita, pretendendo, assim, uma uniformização (?) para poder
fazer comparações com a concorrência...
Todos estes trabalhos foram editados antes do aparecimento da 1ª edição do POC (1997), mas muitas
dezenas de anos após a 1ª edição do “Uniform System of Accounts for Hotels” (1926) que,
progressivamente, tem vindo a ser adoptado como o sistema uniforme de contabilidade para a hotelaria
mundial. Contudo, nenhum destes autores lhe faz a mínima referência.

24
desenvolvimento dos transportes permite o fomento das viagens). Mas é sobretudo a
partir de meados do século XX, no pós guerra, que ela entra numa fase sem precedentes.

Com efeito, nos países mais desenvolvidos, a começar pelos EUA, o sucessivo e
diversificado aumento dos transportes, seu conforto, redes viárias, férias pagas, aumento
do nível de vida, necessidades de lazer, fizeram com que viajar, conhecer novas
culturas, relaxar, se tornassem cada vez mais um hábito e uma necessidade. Isto fez
surgir uma nova actividade económica, o turismo, de que a hotelaria é um dos principais
vectores de desenvolvimento.

1.6.2-Evolução e tendências do turismo mundial:

Segundo fontes oficiais, designadamente a OMT1, em 1950, viajaram cerca de 25


milhões de turistas em todo o mundo; em 1960, esse número subiu para cerca de 60
milhões; em 1990, esse mesmo número subiu para os 445 milhões; finalmente, em 2000,
esse número atingiu os 696.7 milhões, tendo ultrapassado em 5% as previsões da OMT
para esta data.

Além disso, o turismo “mundializou-se”; é hoje uma realidade em todas as regiões


doglobo. Em 1950, os 15 primeiros destinos turísticos captavam 97% do total de turistas
mundiais; em 2000, os 15 primeiros destinos já só representavam 60% desse total,
devido à grande incorporação de novos destinos2.

Segundo a mesma fonte, em 2020, o mundo será caracterizado pela presença da


tecnologia em todos os aspectos da vida; graças aos serviços automatizados, cada um de
nós poderá ser mais independente e ter acesso, directamente de casa, a todo o tipo de
informações, designadamente as relacionadas com turismo. O número de chegadas dos
turistas internacionais atingirá 1.561 milhões, que gastarão (receitas turísticas) mais de
2.000 milhões de euros. Ora estes números correspondem a taxas médias de crescimento
anuais de 4.1% e 6.7%, respectivamente em quantidades e valores, o que («parecendo ser
conservador em comparação com os resultados do passado»3) é uma progressão de
crescimento muito superior à provável expansão da riqueza mundial que se estima, no
máximo, em 3% ano.

Estas soberbas estimativas não impedem que possamos continuar a pensar no enorme
potencial do turismo, para lá do ano 2020, já que, por enquanto, a parte da população
mundial que compõe o turismo internacional é de apenas 3.5%. Mesmo que expurguemos
as pessoas impossibilitadas de fazer turismo, por motivos de idade, de saúde, ou de

1
OMT (Organização Mundial do Turismo), «Tourisme Horizon 2020», Nouvelles Prévisions, Résumé
executif, 1999, pp.3-4.
DGT (Direcção Geral do Turismo), O turismo em 2001, Lisboa, ed. Direcção Geral do Turismo, 2002, p.
12.
FRANGIALLI F. (Secretário Geral da OMT), in: As grandes tendências internacionais do Turismo,
número especial da publicação “Informar Portugal” do ICEP Portugal-Investimento, Comércio e Turismo
2002 (5), pp.63-66.
2
Ásia Oriental e Pacífico (cuja quota de mercado, no contexto mundial, passará dos 12.3%, registados em
1990, para os 24.5% previstos para o ano 2020) e Europa Central e de Leste (cuja quota equivalente
passará de 9.5%, para os 14.5%). (Ibidem).
3
Ibidem.

25
recursos financeiros, essa percentagem sobe “realmente” para apenas cerca de 7%, como
se depreende do quadro seguinte obtido da OMT.

Turistas internacionais como percentagem da população potencial a viajar:

MUNDIAL 7%
Europa 14%
Ásia de Leste e Pacífico 10%
Américas 8%
Médio Oriente 6%
África 5%
Ásia do Sul 1%
Fonte: OMT

É de realçar a modéstia destas percentagens e, por conseguinte, o potencial futuro desta


actividade.

A Europa continuará a ser o principal destino deste fluxo turístico, com um ritmo de
crescimento médio anual da ordem dos 3.1% (inferior à média mundial, mas, mesmo
assim, com uma quota de mercado de 47 a 55%). Por outro lado, continuará a ser a
principal região geradora de turistas para o mundo, com cerca de 50%. A Ásia de Leste
e Pacífico, com um crescimento médio de 6.5%, suplantará a América, cujo crescimento
é de 3.1%.

As viagens de longo curso são as que terão maior aumento (24% do total das viagens,
devido à evolução dos transportes aéreos e sua diminuição de preços) e o turismo interno
conhecerá o mais forte crescimento, por influência, sobretudo, dos países em
desenvolvimento da Ásia, da América Latina e da África.

Em suma, «a indústria ainda só está nos seus começos». O turismo será a maior indústria
do mundo (maior do que a indústria do petróleo e da petroquímica, maior do que a
indústria automóvel, maior do que a indústria de computadores e software). Por volta do
ano 2005, esta actividade ocupará cerca de 300 milhões de postos de trabalho.

Algumas oportunidades e ameaças, para a actividade hoteleira, na sequência do


desenvolvimento turístico no início do novo milénio:

Oportunidades e tendências Ameaças


 Abertura de novos mercados, (especialmente na  População activa dos principais países
Europa de Leste e extremo Leste da Ásia). emissores com cada vez menos tempo para
 Aparecimento de novos segmentos de mercado viajar, ou seja, numa situação de “ricos em
(incentivos, profissionais, ecológicos, dinheiro - pobres em tempo livre”.
“exóticos”, étnico-religiosos e culturais).  Aumento da concorrência do mercado e
 Oferta de uma gama diversificada de produtos presença agressiva de novas entidades que
nos segmentos de turismo de lazer e de conduzirão à necessidade de consolidar marcas
negócios, que irá desde o sol e praia às visitas a para facilitar níveis de qualidade e fidelizar
familiares e amigos, do descanso, do turismo clientela.
urbano, rural e de saúde, até aos de carácter  Aumento das possibilidades e facilidade do
cultural, de natureza, desporto, cruzeiros, consumidor fazer consultas / comparações.
parques temáricos, incentivos, confrências e  Aumento das exigências por parte dos turistas

26
reuniões e de todas as combinações possíveis que reclamarão cada vez mais e melhor
entre estes. qualidade, mas manterão uma clara
 Tendência crescente do potencial de pessoas a sensibilidade aos preços.
viajar, não só a nível internacional, como da  Consolidação dos processos de alianças, fusões
bacia mediterrânea. e aquisições. Polarização entre grandes
 Viagens turísticas mais longas e mais empresas de alcance global e a sobrevivência
frequentes. de pequenas e médias empresas, as quais
 Aumento do fraccionamento das férias. sobreviverão com serviços personalizados e de
 Diminuição da necessidade do papel dos qualidade cada vez mais profissionalizados e,
intermediários (agências de viagens). possivelmente, pela formação de cadeias ou
 Aumento das possibilidades de reserva directa. uniões temporárias.
O recurso crescente à internet permitirá o “faça
por si próprio”, procurando soluções mais
flexíveis para as suas férias e pacotes turísticos
modulares.
 Aumento do tempo de lazer nas sociedades
prósperas.
 Desenvolvimento e modernização contínua das
comunicações.
 Crescimento do nível de vida e da esperança
média de vida das populações.
 Aumento da importância das administrações
nacionais do turismo, para agrupar os interesses
do sector, para os apresentar aos mais altos
níveis e pôr em prática soluções adequadas.
 Aprofundamento da coerência entre os diversos
departamentosda da Adminisração Pública (da
local à central) e cooperação com o sector
privado.
Mapa coligido pelo autor de várias fontes técnicas, designadamente da OMT.

Como vemos, as oportunidades são bastante superiores às ameaças.

1.6.3. – Síntese de alguns indicadores gerais do turismo em Portugal

Até esta data, ainda é pobre e algo descoordenada a nossa informação estatística na área do
turismo/hotelaria, mas a panorâmica afigura-se prometedora no horizonte. As previsões de
que o turismo será a principal actividade económica mundial, levou a Organização
Mundial de Turismo (OMT) a criar a Conta Satélite de Turismo (CST) que é algo «entre a
estatística e a contabilidade nacional, que utiliza os mesmos valores da economia nacional,
mas que integra dados específicos da área do turismo»1.

Dada a importância crescente e estratégica que esta actividade também tem para Portugal,
esta CST também vai ser adoptada no nosso país2.
« Com esta metodologia, haverá informação sobre o impacto do turismo no PIB, na
balança de pagamentos, no desenvolvimento regional, na criação de emprego, nas acções
fiscais do governo e sobre a caracterização de padrões de consumo dos turistas, dados
essenciais para dar credibilidade e reconhecimento económico e político ao turismo, para

1
FRANGIALLI F. (Secretário Geral da OMT), citado pela revista “Viajar”, 15/10/1999 (40).
2
A nova entidade designada por Observatório Nacional do Turismo foi criada por resolução do Conselho
de Ministros de Junho de 2000 e apresentada publicamente na BTL de 2001. Vai actuar nas áreas de
estudos, investigação, reflecção e discução, convergência e coerência de toda a informação estatística, no
sentido de apoiar a formulação da política do turismo e de tornar acessível esta informação a todos os
interessados.

27
as tomadas de decisões de todos aqueles que trabalham no sector, para o governo e para a
própria OMT»1.

Entretanto, a importância que o turismo já tem para Portugal pode ver-se pelos dados que
apresentamos de seguida.

Efeito do Turismo na Balança de Transacções Correntes:

1998 1997 1996 Variação %


98/97 97/96
Receitas turísticas 873,0 749,9 657,6 16,4 14,0
Despesas turísticas 455,4 379,3 362,8 20,1 4,5
Saldo 417,6 370,6 294,8 12,7 25,6

1 Saldo da Balança de Transacções Correntes -1.442,0 -976,6 -848,4


2 Saldo da Balança Turística 417,6 370,6 294,8
3 Saldo da BTC sem Turismo (1)-(2) -1.859,6 -1.347,2 -1.143,2
4 Taxa de cobertura (2)/(3) 22,5% 27,5% 25,8%
Fonte: Banco de Portugal

Como se vê por este quadro, o contributo do turismo para o equilíbrio da nossa Balança
de Transacções Correntes (BTC) é da ordem dos 25%. Caiu ligeiramente em 1998,
porque as respectivas despesas cresceram mais do que as receitas2.

Segundo um estudo recente, mas referente a 1995 (”por desactualização dos dados
estatísticos nacionais”) sobre o impacto do turismo na economia portuguesa, o turismo,
em Portugal, representava, já naquele ano, 9,1% do Valor Acrescentado Bruto (VAB) e
8,4% do Produto Interno Bruto (PIB)3

Impacto do turismo na economia portuguesa, comparação com outros sectores

VALOR ACRESCENTADO BRUTO NACIONAL - 1995


Nº DE SECTOR VALOR (milhões de % DO
ORDEM escudos) TOTAL
1 Comércio por Grosso e Retalho 2063 14,2
Turismo (VAB Directa e Indirectamente 1322 9,1
gerado pelo Turismo)
2 Serviços de Administração Pública 1059 7,3
3 Construção 973 6,7
4 Serviços Educação 871 6,0
Turismo (VAB Directamente gerado pelo 859 5,9
Turismo)
5 Bancos e Instituições Financeiras 476 5,1
6 Têxteis 610 4,2
7 Electricidade, Gás e Água 591 4,0

1
Ibidem revista “Viajar”. Merece aqui destaque o trabalho desenvolvido, também nesta área, pela
Associação de Turismo de Lisboa que, em 1998, criou o seu Observatório de Turismo, o qual foi
reconhecido, por decisão do Ministério da Economia, como Observatório Regional de Turismo de
Lisboae Vale do Tejo, a partir de Abril de 2001. Assim, nesta data, abrangia perto de 25% da capacidade
de alojamento turístico licenciado em Portugal.
2
O ano de 1998 foi um ano extraordinário para o turismo e hotelaria portugueses, devido sobretudo à
realização da “Expo” em Lisboa. «Em 1998 o turismo no nosso país cresceu o equivalente ao que
normalmente progrediria em três anos consecutivos», disse uma fonte da DGT (citada pela revista
“Viajar”, nº42, 2ª série de Novembro/99). Por isso, havia fortes receios de que o ano de 1999, sobretudo,
fosse de quebra significativa. Contudo, quer o ano de 1999 quer o de 2000 e até o de 2001 foram anos de
crescimento sustentado, apesar dos acontecimentos históricos do 11 de Setembro.
3
Estudo encomendado pela Federação do Turismo Português à Universidade do Algarve.

28
8 Turismo (VAB só ramos Turísticos) 575 4,0
9 Aluguer casa de Habitação 568 3,9
Fonte: Com base no estudo ESGHT/Universidade do Algarve

1.6.4-Caracterização do sector hoteleiro em Portugal

1.6.4.1-Características da actividade

a) Variedade e rapidez dos serviços, baixo valor por transacção

É difícil encontrar uma actividade tão importante em que, no mesmo estabelecimento,


haja tanta variedade de serviços que, em simultâneo ou em muito pouco tempo, possam
ser todos ou quase todos solicitados por um grande número de utentes e em que o valor
de cada transacção ( a crédito ou a dinheiro) seja tão pequeno.

Toda a vasta gama de serviços tem de ser prestada com atenção e simpatia e com a
rapidez necessária, de modo a que a conta do cliente esteja sempre actualizada e nada
seja consumido sem que seja registado, sob risco do cliente não ter a informação
correcta ou de sair sem pagar o que consumiu.

b) Bens e serviços atractivos e de primeira necessidade

Os bens e serviços da hotelaria são de primeira necessidade, agradáveis e muito úteis a


toda a gente (dormir, comer, beber, etc.). Eles estão mais ou menos ao alcance das
pessoas que circulam pelo hotel. É o caso dos víveres e bebidas que existem em vários
pontos do hotel (além do armazém central) e que são manejados por várias pessoas,
desde a compra ao consumo pelo cliente. O caso tmbém de muitos materiais diversos
de decoração que estão dispersos por todo o hotel e que são muito atractivos e úteis para
muitas pessoas, algumas das quais os levam consigo, quanto mais não seja por uma
questão de mera recordação ou coleccionismo. Enfim, o nível de atractividade (e,
portanto, a probabilidade de desvio) é muito grande.

c) Baixa formação média dos empregados

Segundo um estudo do INFTUR (1999)1, feito com base nos formandos das escolas de
hotelaria, conclui-se o seguinte:

61% dos formandos têm o 9º ano de escolaridade e 31,7%, o 12º ano. Os formandos
possuem tantas ou mais habilitações académicas que os pais. As habilitações
profissionais da mãe são, maioritariamente, inferiores às dos pais e existem poucos pais
que exerçam actividades hoteleiras (18% para as mães e 11% para os pais).
A maioria das mães são “Domésticas” (29,9%), seguindo-se “Outra” (profissão)
(26,4%) e “Operárias” (19.1%), o que perfaz 75,4%. Por sua vez, a maioria dos pais

1
Inquérito realizado em Outubro de 1998, pelo INFT (actual INFTUR), respondido por 520 formandos
iniciados do 1º ano dos seus cursos de formação (Cozinha/Pastelaria, Restaurante/Bar, Recepção e
Pastelaria, Técnicas e Gestão de Restauração e de Hotelaria, entre outros) e cujo tratamento e análise
estatística foi feito pelo Grupo de Investigação Estatística e Análise de Dados (GIESTA) do ISCTE e
publicado na Revista “Correio do Turismo”, nº 6, de Abril/Maio/Junho/99, do Instituto Nacional de
Formação Turístico (INFT).

29
tem “Outra” (profissão) (36,1%), seguindo-se “Operários” (27,8%), o que perfaz
63,9%. O rendimento mensal do agregado familiar da maioria dos alunos situa-se no 2º
escalão (58.900$00 a 108.900$00).

Estes breves traços da caracterização sociológica dos futuros profissionais mais


habilitados da hotelaria, aliado ao facto de que uma grande parte dos profissionais no
activo nem sequer ter passado por estes cursos, são indicadores desta característica.

d).Capital intensivo e mão de obra intensiva

É uma actividade que exige níveis muito elevados de investimento e com um retorno e
rendibilidade lentos1.

Por outro lado, é uma actividade com baixos níveis de produtividade, porque, para a
prestação de serviços de qualidade, também tem de ter muitos empregados. Isto também
significa que um crescimento da actividade se traduz na criação de emprego directo e
indirecto (um dos vários efeitos multiplicadores desta actividade para a comunidade).

e) Elevada sazonalidade e elevados custos fixos

É uma das características mais críticas do negócio hoteleiro. A par da sazonalidade e de


muita incerteza no que respeita ao nível da actividade, há a necessidade de manter
sempre determinado nível de custos fixos, não só inerente ao investimento (juros,
amortizações, rendas, etc.) como à operação, (pessoal, energia, marketing, manutenção,
etc.).

A sazonalidade pode ser diária (dos almoços para os jantares), semanal (dos dias úteis
de trabalho para os fins de semana), mensal (a parte final do mês e o resto do mês) ou
anual, que é a mais conhecida, por ser a mais significativa e duradoura e, portanto, a
mais complexa.

Se é verdade que alguma sazonalidade é cíclica e, portanto, previsível, podendo ser


planeada (com redução, até certo ponto, dos custos fixos), a verdade é que há sempre
uma grande parte de incerteza e de risco entre reduzir estes ao indispensável (com
predominância da preocupação económica) ou assegurar mais a qualidade do serviço
(privilegiando mais a óptica comercial). Seja como for, este é um dos dilemas mais
difíceis de ultrapassar na hotelaria. Neste negócio, as inércias de comportamento dos
consumidores continuam a ser muito fortes.

f) Perecibilidade

A perecibilidade do “produto” deste negócio é extremamente elevada. Com efeito, a


receita (rotação do capital) de um quarto não vendido (“stock”) nunca mais será
recuperada (“lixo”). Por sua vez, as matérias primas deste negócio, sobretudo os
víveres, também são fisicamente perecíveis, muito susceptíveis de perda de qualidade e
de causar problemas e prejuízos

1
A média de investimento por quarto (total investido a dividir pelo número de quartos) de um hotel de
cinco estrelas, em Lisboa, ronda os 125.000 a 150.000 euros, a preços actuais. O retorno médio do capital
pode atingir os 10 anos ou mais (considera-se uma média normal de 8).

30
g) Impossibilidade de produção para stock

A exigir ainda mais da gestão desta actividade, temos a impossibilidade de produzir para
stock, como seria aconselhável numa boa gestão e como é possível acontecer noutros
negócios (por exemplo de gelados), em que se produz para existências durante a época
baixa, para serem vendidos depois, durante a época alta. Isto seria uma importantíssima
atenuante para a forte sazonalidade, os custos fixos e outras fragilidades desta
actividade. Porém, normalmente, isso não é possível na hotelaria.

h) Elasticidade dualista

A grande rigidez da oferta (produto hotel), em contraste com a fluidez da procura


(fluxos turísticos), tornam esta actividade muito sensível e dependente da conjuntura,
das modas, do poder dos grandes operadores, cada vez mais concentrados, e de outros
factores exógenos.

Efectivamente, a procura turística é muito sensível à envolvente externa (difícil de


controlar), à publicidade, à forte concorrência, etc. Por outro lado, a oferta (o produto
hotel) não pode ser deslocada, para acompanhar a variação da procura, nem tão pouco
se pode modificar na sua estrutura, decoração ou simples recheio, com facilidade ou
frequentemente, devido aos altos investimentos que isso implica.

i) Dependência crescente dos grandes operadores

As consequências da globalização também se reflectem nesta actividade por esta via. Os


operadores turísticos e agentes de viagens trabalham com margens reduzidas e grandes
volumes de facturação. Por isso, pelo que, para se defenderem dos vários riscos, agora
acrescidos com o progresso das novas tecnologias postas ao dispor dos consumidores,
agrupam-se, dominam o mercado e pressionam os preços da hotelaria. Esta é, também,
uma das razões por que os hotéis tendem a agrupar-se de várias formas.

j) Actividade em franca expansão e com grandes potencialidades futuras

Apesar das fragilidades apresentadas anteriormente, o negócio da hotelaria é muito


atractivo. Corre a montante e a jusante da actividade turística que, como vimos em
pontos anteriores, é uma actividade com expressão relativamente recente e, apesar disso,
espera-se que se torne no maior negócio do mundo, sobretudo quando tiver maior
expressão noutras zonas do globo. «O sector é e será vulnerável às crises. Mas não está,
nem estará, à mercê delas. A sua resistência e provado poder de recuperação é
invulgar»1.

l) Actividade com boa margem

A actividade hoteleira também é atractiva porque, se gerida por quem possui o know
how e em sityuações normais, proporciona boas performances. Como veremos mais
adiante, a margem de contribuição do negócio das dormidas para o resultado global
ronda, em média, os 70 a 80%. A margem de contribuição do negócio de alimentação e

1
FRANGIALLI F. (Secretário Geral da OMT), in As grandes tendências internacionais do Turismo,
número especial da publicação “Informar Portugal” do ICEP Portugal-Investimento, Comércio e Turismo
2002 (5), pp.63-66.

31
bebidas ronda, em média, os 30%. O Gross Operating Profit (GOP) ronda, em média,
os 30 a 40%1. Assim, aqueles que estão bem por dentro desta actividade não hesitam em
classificar os investimentos bem direccionados no sector como uma “aposta ganha” e
recomendam-no quer para o lançamento de novos negócios, quer para a expansão e
diversificação das áreas de negócio de empresas de outros sectores económicos, desde
que a gestão seja entregue a quem sabe da operação e da gestão dos recursos2.

Posto isto, parece que podemos concluir que a hotelaria tem, no mundo da actividade
económica, uma posição competitiva forte. Porém, como negócio que tem
características de alto risco, devido às suas fragilidades intrínsecas, exige não só
competências e capacidades por parte dos seus gestores, como também uma informação
de gestão apropriada, constituindo uma das principais fontes dessa informação a sua
(apropriada) contabilidade analítica de gestão.

1.6.4.2- Evolução da procura turística

Evolução do número de turistas entrados em Portugal nas últimas décadas:

Ano Número turistas Taxa de crescimento Taxa de crescimento


(em milhões) (na década) (acumulado)
1970 1 586
1980 2 708 71% 71%
1990 8 020 196% 406%
2000 12.100 51% 663%
Fonte: DGT. Mapa coligido pelo autor

Como se depreende destes números, mesmo na década mais recente, o ritmo ainda é de
crescimento, a caminho da consolidação e da maturidade.

Eventos e factos relevantes como a Expo 98, o Euro 2004, a parceria de Portugal como
membro inter pares da União Europeia, etc. são factores úteis para o nosso turismo e
para a nossa hotelaria e que projectam o país a nível mundial.

Por sua vez, o nosso mercado turístico interno também está nessa fase de crescimento
acentuado. Em 2001, mais de 5.4 milhões de portugueses maiores de 15 anos gozaram
férias, o que representa 70% da população nessas condições. Em 1996, essa
percentagem era apenas de 37%3.
1
Este resultado é obtido subtraindo às receitas operacionais os custos operacionais. Não se consideram
custos operacionais os que não dependem da capacidade de gestão do gestor ou director geral, como por
exemplo: amortizações, encargos financeiros, rendas, impostos de capital, seguros (excepto de pessoal).
2
Alguns grupos económicos e financeiros de destaque elegeram a actividade turística e hotelaria para a
diversificação das suas áreas de negócio. Caso do Grupo Sonae que, desde 1994, fez «uma aposta
estratégica no sector» (imobiliária turística, hotelaria, animação e viagens); caso do Grupo Amorim, que
desde 1987, associado ao Grupo Accor, tem crescido como mais nenhum outro, ao ponto de ter planeado
possuir 66 unidades (6.400 camas) em 2005 (entre Portugal, Moçambique e Cuba), isto para além de
também deter o casino da Figueira e um terço dos casinos do Estoril e Póvoa; o caso do Grupo RAR que,
desde 2000, também entrou no sector com a “criação” da agência de viagens Geotur; o caso do GES
( mais conhecido pelo BES) que, em 1998, assumiu a opção estratégica de enveredar pela actividade
turística e que, decorridos cinco anos, possuía 11 unidades hoteleiras (cerca de 2.300 camas), dois
complexos termais (Monfortinho e Vimeiro), um grande operador turístico (Top Atlântico) e campos de
golfe. Para além destes, há outros, como o Grupo Teixeira Duarte, com unidades também já em
Moçambique.
3
Direcção Geral do Turismo (DGT), O Turismo 2001, Lisboa, Ed. Direcção Geral do Turismo, 2002, p.
76.

32
As férias dos portugueses gozadas fora da sua residência habitual também têm estado a
crescer em grande ritmo. Tendo por base o referido segmento (total da população do
Continente com mais de 15 anos), em 2001, esse número foi da ordem dos 3,9 milhões,
o que representa 51% desse universo (ao nível das médias europeias), contra apenas
25% em 1996 (era o mais baixo nível da união europeia). 1

1.6.4.3- Evolução da oferta hoteleira

Para além das estatísticas do turismo (de natureza mais “macro” do que “micro”)
produzidas pela Direcção Geral do Turismo (DGT) e pelo Instituto Nacional de
Estatística (INE), pouco mais há, por enquanto, de informação relevante e idóneo sobre
as empresas hoteleiras e os hotéis portugueses .2

No que respeita ao investimento hoteleiro, em Portugal, representado pela capacidade


em camas, na “hotelaria clássica”3, a evolução tem sido significativa.

Ano Investimento Taxa de crescimento Taxa de crescimento


(em camas) (na década) (acumulado)
1970 73.236
1980 99.886 36% 36%
1990 139.713 40% 91%
2000 1773284 27% 142%
Fonte: INE citado pela DGT. Mapa coligido pelo autor

Apesar destas taxas de crescimento interessantes, elas são inferiores ao crescimento da


procura, parecendo revelar um investimento ponderado e cuidado.5

Passando a uma informação mais detalhada, mas que se julga de interesse, segundo o
INE, o número de estabelecimentos da hotelaria clássica (ou tradicional) recenseados,
em 2000/07/31, por tipo de estabelecimentos, era o seguinte:

Número de estabelecimentos e de camas da hotelaria clássica recenseada em 00/07/31


Tipo Hotéis Hotéis Motéis Pousadas Estalagens Pensões TOTAL
Estabelec. Apartamen
Nº estabel. 483 118 19 46 78 862 1.606
Nº camas 98.434 29.764 1.583 2.323 4.503 40.721 177.328

1
Ibidem.
2
O Banco de Portugal tem uma central de balanços para as empresas hoteleiras, mas ainda não é representativa, “por
falta de colaboração das empresas” (sic) no envio dos dados.
Também merece menção, por ser uma esperança nesta matéria, a criação da nova entidade designada por
Observatório Nacional do Turismo, que foi criada por resolução do Conselho de Ministros de Junho de
2000 e que vai actuar nas áreas de estudos, investigação, reflecção e discução, convergência e coerência
de toda a informação estatística, no sentido de apoiar a formulação da política do turismo e de tornar
acessívem esta informação a todos os interessados.
3
“Hotelaria clássica” (ou tradicional) inclui: hotéis, hotéis-apartamentos, pousadas, estalagens, pensões e
motéis. Portanto, não inclui: parques de campismo, aldeamentos turísticos, apartamentos turísticos,
pousadas da juventude, unidades de alojamento de turismo no espaço rural.
4
Estas camas correspondem a 1.606 estabelecimentos hoteleiros clássicos. (Cf. dados do INE, citados
pela DGT, in O Turismo 2001, Lisboa, Ed. Direcção Geral do Turismo, 2002, p. 18-19).
5
Muitos empresários queixam-se das demoras e burocracias dos processos que atrasam os investimentos
e alguns até alegam este facto como uma das motivações para se internacionalizarem, ou seja, irem
investir no estrangeiro (como: Brasil, Moçambique) em vez de o fazerem em Portugal.

33
Média
cams/estab 204 252 83 51 58 47 110
Fonte: INE1

Se considerarmos que a maioria esmagadora dos quartos dispõe de cama dupla,


concluímos que, em Portugal, a dimensão das unidades hoteleiras é relativamente baixa,
na hotelaria clássica (cerca de 55 quartos).

Número de estabelecimentos e de camas da hotelaria não clássica recenseada em 00/07/31


Tipo Aldeamen. Aparetam. Turismo Parques de Colón Féri. TOTAL
Estabelec. Turísticos Turísticos Rural Campismo e Pous Juv.
Nº estabel. 33 147 668 203 60 1.111
Nº camas 12.983 32.647 6.293 251.961 9.988 313.872
Média
cams/estab 393 222 9 1.241 166 283
Fonte: INE2

Com excepção das unidades de turismo (que se caracterizam, entre outros aspectos, pela
reduzida dimensão), a dimensão média desta hotelaria não clássica é bastante superior à
dita clássica. Mesmo assim, termos de considerar que são também de pequena dimensão
média (equivalente a cerca de 140 quartos).

Dos dois mapas anteriores resulta um total geral de 2.717 unidades recenseadas, em
00/07/31, a que correspondem 491.200 camas, o que dá uma média de 181 camas, ou
seja, o equivalente a cerca de 90 quartos.

Em suma, em comparação com outros destinos concorrentes, como a vizinha Espanha,


por exemplo, o nosso parque hoteleiro é pequeno (mais pequeno do que algumas zonas
turísticas de Espanha). Porém, está tendo um crescimento sustentado e, em geral, a
apresentação é de boa qualidade.
A “Expo 98” e o“Euro 2004” são dois acontecimentos marcantes também no
investimento hoteleiro em Portugal. Aquele, sobretudo na zona de Lisboa, este também
noutras cidades do país participantes directas do evento.

1.6.4.4-O ensino da contabilidade e a contabilidade analítica de gestão


hoteleira

a) O ensino da contabilidade

À primeira vista, a abordagem deste assunto poderá parecer descabida no contexto, mas
vejamos porque não.

Actualmente, em Portugal, a contabilidade analítica de gestão é totalmente facultativa,


não tem regras nem qualquer esquema obrigatórios. Assim, muitas empresas
simplesmente não dispõem da informação que a contabilidade analítica de gestão pode
disponibilizar.

1
Citado pela DGT, in: O Turismo 2001, Lisboa, Ed. Direcção Geral do Turismo, 2002, p. 19. As médias
foram calculadas pelo autor, dividindo simplesmente o número das camas pelo número dos
estabelecimentos.
2
Citado pela DGT, in: ibidem, pp. 19-29. As médias foram calculadas polo autor, dividindo simplesmente
o número das camas pelo número dos estabelecimentos.

34
Nos casos em que é implementada, quem decide a filosofia, o tipo e a estrutura
departamental desta contabilidade interna é, regra geral, o responsável pela
contabilidade, porque a maioria dos directores, administradores e gerentes dos hotéis
não têm os conhecimentos suficientes nesta matéria.

De um modo geral nem uns nem outros sabem o tipo de informação que lhes convém
ter. Quando avançam para a implementação dessa contabilidade analítica, inventam, não
investigam devidamente, porque não tiveram formação nesse sentido.

A criatividade é positiva se com sentido de progresso, de soluções para insuficiências


existentes ou de melhoria das informações que competem à contabilidade. Repudiam-se,
porém, soluções que, científica e tecnicamente, não se mostram adequadas aos
objectivos de uma correcta informação e apreciação da gestão.1

Em nosso entender, os grandes responsáveis por qualquer uma destas situações são os
contabilistas. Contudo, os culpados não são eles, mas a escola que os formou nesta
matéria ou, mais propriamente dito, os seus professores. «Perde-se tempo em muitas
universidades e escolas superiores a ensinar os alunos a fazer balancetes, quando, hoje
em dia, carrega-se numa tecla do computador e há uma impressora que deita cá para
fora balancetes. Perder tempo com isso é um autêntico disparate. Esse tipo de ensino é
virado para o fazer e não para o como fazer e porque é que se faz desta e não de outra
maneira. (...) ensina-se muito a fazer, mas pouco a saber como e porque é que se faz.
Este é um panorama geral, onde cabem algumas excepções» 2. Referindo-se às
excepções (novo espírito do ensino), Rocha (1999), diz: «o ensino do fazer as coisas
está a ser reduzido ao mínimo, enquanto que o porquê está a ser ampliado (...) não
interessa ensinar POC`s. O que interessa é saber-se porque se faz de uma determinada
maneira e não de outra, seja onde for».

Neste momento, no quadro da globalização e internacionalização, para o contabilista, só


saber fazer não chega, não terá capacidade de sobrevivência. Tem de ter também uma
forte componente teórica que o habilite a saber aprender (investigação e formação
contínua), a saber apresentar a informação mais adequada ao empresário. Já não basta
ser-se um bom técnico de contabilidade3.

Portanto, o futuro do contabilista é ser menos um mecânico da contabilidade (até


porque os aspectos patrimoniais e fiscais estão praticamente resolvidos pelo
computador) e mais um conselheiro da gestão, pelo que a sua formação também tem
de ser mais diversificada e mais teórica, sob risco de ficar rapidamente ultrapassado.Por
isso, «Paradoxalmente, o contabilista do futuro saberá menos contabilidade»4

Também a administração pública teve a sua quota-parte de culpa nesta mentalidade e


nas dificuldades e limitações que ela levantou aos profissionais da contabilidade.

A contabilidade, em Portugal, está imbuída de excesso de normas. Há um exagero na


normalização. Está-se muito preocupado com o pormenor. Ora a norma em excesso é a
grande inimiga da evolução científica. O ser humano descansa na norma. Isso é

1
Cf. FERREIRA R.F., in: Revista “Eurocontas”, 1999 (Junho).
2
ROCHA A., in: ibidem.
3
Cf. CAIADO P., IN: Revista “Eurocontas”, 1998 (Março).
4
ALMEIDA M. in: ibidem, 1998 (Agosto/Setembro).

35
cómodo, mas transforma muitos contabilistas em autómatos, que nem sequer discutem
se a norma está correcta ou incorrecta, limitando-se à sua aplicação. São necessárias
normas, mas não em excesso nem demasiado taxativas, porque, assim, não deixam
grande margem para a liberdade criativa1.

Esta situação provoca uma ligação excessiva e até perversa da contabilidade à


fiscalidade. Pensa-se sempre ir procurar saber o que é que a fiscalidade diz. Muitas
pessoas da contabilidade ainda insistem em não dar um passo sem primeiro saber o que
está a acontecer na fiscalidade.
Ora isto é uma inversão de sentido, já que a contabilidade deve ser, acima de tudo, um
intrumento da gestão.

Finalmente, são também os empresários responsáveis por esta situação. Há pessoas que
estão só interessadas em fazer a contabilidade na óptica da fiscalidade, porque não se
servem dela para fundamentar as suas decisões e actos. Nesses casos, a contabilidade
está orientada meramente para cumprimento das normas fiscais. Estas situações devem-
se não só às já referidas falhas de formação e de competência de muitos profissionais,
mas também à mentalidade de certos empresários2

Uma parte importante das empresas portuguesas (sobretudo as pequenas e médias)


preocupa-se, quase em exclusivo, com a “escrituração”, numa perspectiva
eminentemente tributária.

b) A contabilidade analítica de gestão hoteleira

Não é conhecido nenhum estudo científico sobre a situação da contabilidade analítica de


gestão na hotelaria portuguesa.

A nossa convivência, desde o início dos anos 80, com muitos hotéis portugueses, bem
como a análise dos trabalhos de pesquisa feitos pelos nossos alunos nos cursos de
Gestão de Empresas Turístico-Hoteleiras, indicia-nos que já há alguns hotéis
portugueses a usar uma contabilidade analítica. Porém, nestes, se retirarmos os hotéis
que estão ligados de qualquer forma às cadeias multinacionais, a solução adoptada para
a contabilidade analítica de gestão é muito variada e satisfaz pouco os requisitos de uma
informação de gestão útil3.

1
Cf. ROCHA A, in: ibidem, 1999 (Março).
2
Cf. CAIADO P., in: ibidem, 1998 (Março).
3
Há uns tantos atributos ou requisitos ou características que são indispensáveis para que uma informação
contabilística seja útil e que se aplicam muito especialmentre à contabilidade analítica de gestão.
Seleccionamos os seguintes: Credibilidade: significa isenta de erros, apropriada, sem juízos de valor.
Compreensibilidade: significa que tem de ser entendível pelos destinatários e utilizadores da mesma.
Tempestividade: significa o mais em cima da hora possível ou atempada, oportuna, dentro de um período
que permita introduzir medidas correctivas logo que necessário, para evitar custos significantes
desnecessários. Comparabilidade: significa que a divulgação e quantificação da informação deve ser
registada de modo consistente, em cada período da empresa. Esta característica supõe, também, a adopção
de uma normalização, a fim de se poderem fazer comparações entre empresas. Relevância: significa que
a informação deve ser pertinente para a tomada de decisões. Tem de ser de tal ordem que possa
influenciar as decisões dos seus utentes, ou ajudá-los a avaliar os acontecimentos passados, presentes e
futuros, ou a confirmar, ou a corrigir as suas avaliações. Portanto, a informação é de relevância material
se a sua omissão ou erro forem susceptíveis de influenciar as decisões de quem a utiliza.

36
De um modo geral, os hotéis ligados de qualquer forma às cadeias hoteleiras
internacionais, a funcionar em Portugal, usam um modelo de contabilidade analítica de
gestão igual ou muito semelhante ao Uniform System of Accounts for the Lodging
Industry (USALI,) vulgarmente designado, simplesmente, por sistema uniforme. Este
facto tem produzido o efeito benchmarking para outros hotéis que, directa ou
indirectamente, tomam contacto com aquele sistema.

Também é sintomático o facto de, desde meados da década de 80, ser feita uma
publicação estatística anual, com dados sobre a exploração da “Indústria Hoteleira em
Portugal” (esta era a última designação desta publicação), cujo inquérito de base é
estruturado no referido sistema uniforme (USALI) e nunca ter constado nessa publicação
a fixa técnica. Supõe-se que a razão está, precisamente, no facto de tal estudo não
conseguir colher uma amostra minimamente representativa e coerente. O mesmo se
passa, aliás, com outras publicações do género feitas por outras empresas internacionais,
que publicam o mesmo tipo de informação sobre a hotelaria portuguesa e que também
não informam nada sobre a amostra1.

1.6.5.-A investigação na contabilidade de gestão

Antes da segunda grande guerra, a contabilidade de gestão focalizava-se no custeio do


produto (i. e., identificação do custo unitário) e no controle dos componentes desse
custo: matérias primas e subsidiárias, mão de obra directa e gastos gerais, ou seja, na
identificação de todos os custos que entram na composição de cada unidade produzida
(output). Isso conduziu a vários métodos de identificação e distribuição dos custos e a
uma ênfase no custeio por absorção 2.

Após a segunda grande guerra, a contabilidade de gestão evoluiu para satisfazer as


necessidades dos gestores, pelo que a ênfase foi posta na informação contabilística
destinada à tomada de decisão dos interessados. Deste modo, a contabilidade de gestão
tornou-se um instrumento de planeamento e controle. Isto constituiu a ruptura com a
contabilidade de custos (com a sua ênfase na obtenção de uma medida exacta dos
custos) e a viragem para uma contabilidade de gestão (com a sua ênfase no
reconhecimento do custo relevante para cada tomada de decisão específica).

A ruptura foi de tal ordem que, por exemplo, na Grã Bretanha, em 1965, o Institute of
Cost and Work Accountants mudou o nome do seu jornal de Cost Accounting para
Management Accounting, e o seu próprio nome para Institute of Cost and Management
Accountants em, 1972 e, nos EUA, em 1958, a National Association of Cost
Accountants mudou o nome para National Association of Accountants. (Ryan et al.,
1992).

Nem sempre houve uma sobreposição entre os teóricos que escreveram livros sobre esta
matéria (nas décadas de 50 e 60) e os práticos. Aqueles apresentavam a contabilidade de
1
Relativamente a uma dessas publicações, nós próprios tivemos oportunidade de analisar, nos escritórios
da respectiva empresa, em Londres, o tamanho da amostra referente a Portugal, que era constituída por
cerca de uma dúzia de hotéis. Isto leva-nos a pensar que o objectivo destes trabalhos é, sobretudo,
promover a marca das empresas de consultoria e auditoria que os produzem. Apesar disso, estas
publicações têm o efeito muito positivo de divulgarem o sistema uniforme de contabilidade hoteleira.
2
O sistema de custeio por absorção dos custos indirectos será abordado, no estudo da contabilidade de
gestão, a propósito do sistema tradicional do tratamento dos custos indirectos e do novo sistema de
tratamento contabilístico dos mesmos.

37
gestão como um conjunto de técnicas (análise volume/custo/benefício, modelos de
estimativa, etc., surgem nesta altura). Estes destacavam o serviço potencial que ela
podia prestar e viam o seu papel em termos muito gerais, tal como preparar informação
financeira para as necessidades das reuniões de gestão.

Muitos dos livros tinham sido escritos com base em pesquisas muito normativas, feitas
nos anos 50 e 60, por influência acentuada dos princípios económicos neoclássicos, que
tinham como fundamental a ideia de “custo diferente para diferentes propósitos”, ou
seja, que custos relevantes deviam ser identificados para o contexto da decisão
específica em cada momento (de acordo com o objectivo da maximização do lucro).
Assim, partia-se do princípio de que não era apropriado um único conceito de custo para
todos os propósitos (o que contrastava com o anterior conceito de custo “verdadeiro” da
contabilidade de custos) e, portanto, a informação contabilística deveria ser determinada
pelas necessidades de cada decisor isolado, independentemente dos outros decisores da
organização. Uma vez analisada e tomada a decisão, seria determinada uma informação
contabilística adequada. A contabilidade de gestão era então apresentada como um
conjunto de métodos e técnicas a utilizar na prática. Mas é claro que a maximização do
lucro pode não ser um bom critério para as práticas da tomada de decisão; o somatório
das decisões individuais pode não ser a melhor decisão para o conjunto do grupo; há
muita falta de informação, há incertezas e há custos que escapam aos modelos de
previsão e controle de gestão, mesmo aos mais sofisticados. Por isso, surgiram os
adversários deste modo de pensar.

Nos fins da década de 70 e princípios da 80, o “gap” entre a teoria e a prática da


contabilidade de gestão foi reconhecido entre os pesquisadores desta matéria. Tais
pesquisadores começaram a reconhecer que muitas das técnicas apresentadas nos livros
eram realmente inúteis ou irrelevantes na prática. Este reconhecimento teve um duplo
efeito na pesquisa da contabilidade de gestão: primeiro, um aumento do interesse pelos
estudos que explorassem a natureza da prática da contabilidade de gestão; segundo,
mudanças na metodologia de pesquisa, que se mantiveram até hoje, passando-se a
observar, analisar e explicar as práticas da contabilidade de gestão (pesquisa descritiva,
a montante, para explorar a natureza da prática, e trabalho analítico, a jusante, para gerar
teorias que explicassem essa prática). (Ryan et al., 1992).

Os pesquisadores começaram por utilizar questionários e entrevistas, para obterem uma


imagem da prática da contabilidade de gestão, reforçando, depois, tal pesquisa com
visitas a algumas empresas, para discussão e aprofundamento das técnicas mais
específicas aí usadas. A importância do trabalho de campo e do estudo de casos também
foi reconhecido por Kaplan e seus colegas (1984), nos Estados Unidos.

Apesar de tudo, conclui-se que a contabilidade não fornece soluções 100% correctas
para os problemas de decisão dos gestores e, além disso, é necessário utilizar tais
soluções com cautela e em conjugação com outras informações menos objectivas que
podem estar disponíveis dentro ou fora da organização. A informação é encarada como
qualquer mercadoria: tem valor o que os seus possuidores conseguem tirar dela. (Ryan
et al., 1992).

É importante reconhecer que a pesquisa sobre contabilidade de gestão continua a


preocupar-se com a natureza prática da mesma. No entretanto, os vários estudos
descritivos já feitos começam a dar uma imagem da prática da contabilidade de gestão.

38
Porém, com estas pesquisas, apenas estamos no limiar da primeira fase. Há muito ainda
por fazer. Para os pesquisadores académicos, a descrição é normalmente insuficiente; a
explicação é também necessária, i.é., as razões que justificam o uso de uma
contabilidade de gestão com características particulares. (Ryan et al. 1992).

Em conclusão, a investigação contabilística iniciou-se e tem-se verificado, sobretudo


nos países anglo-saxónicos, designadamente nos Estados Unidos da América. Entre nós,
houve um ou outro que foi pioneiro de mérito e digno de realce, como é o caso de
Gonçalves da Silva e de Rogério F. Ferreira. É de esperar que o aparecimento dos
recentes mestrados e doutoramentos (década de noventa) em ciências empresariais,
contabilidade e auditoria venham a criar um impulso e efeito multiplicador de mudança
e valor acrescentado nesta matéria. Isto significa que a contabilidade, em termos de
investigação, também está a evoluir, em Portugal.1

CAPÍTULO II– ENQUADRAMENTO TEÓRICO DO TEMA

1-Introdução

Temos consciência da larguíssima bibliografia e de grandes autores nacionais e


estrangeiros em matéria de contabilidade geral e analítica e, portanto, da modéstia de
algum contributo deste nosso trabalho. Mas um longo convívio com a actividade
hoteleira, designadamente na área da contabilidade, permitiu-nos alargar e aprofundar o
campo da contabilidade específica hoteleira, o que, aliado ao facto da escassez de
bibliografia em Português sobre este tema, talvez façam com que seja provável que a
nossa abordagem acrescente algo de útil na pesquisa contabilística hoteleira entre nós.

Antes de entrarmos no enquadramento teórico da contabilidade específica hoteleira,


vamos começar por abordar o enquadramento teórico da contabilidade em geral, que,
não trazendo novidades aos especialistas, vem a propósito recordar e sistematizar,
especialmente para quem ainda está na fase de estudo destas matérias.

2-A Contabilidade e os seus aspectos

A contabilidade faz parte do “núcleo duro” das disciplinas de gestão, tanto da micro
como da macroeconomia. A sua missão básica e genérica começa por ser quantificar e
classificar os factos externos e internos que ocorrem nas unidades económicas para,
depois, proporcionar informação de controle e de tomadas de decisões.

Abordarmos também nós, neste trabalho, os aspectos ou tipos de contabilidade, poderá


parecer fastidioso. Contudo, o tema deste trabalho situa-se precisamente num dos tipos
de contabilidade geralmente referidos (aliás, constitui um dos mais distintos), que é a
contabilidade analítica de gestão, pelo que optámos por fazer uma caracterização
sintética, não só dos tipos mais tradicionais, como dos que traduzem uma emergência de
novas perspectivas que procuram novas soluções para que a contabilidade continue a
satisfazer a sua missão acima referida.
1
Alguém disse que inovar não é só inventar e descobrir; é também estar aberto, receptivo e adaptar aquilo
que outros descobriram e inventaram. Se isto não é propriamente inovar é, pelo menos, divulgar a
inovação, com mais ou menos adaptação e algum acréscimo. É pelo menos ajudar a inovar.

39
2.1-Tipos de contabilidade

A contabilidade é una. Os diferente rótulos que se colocam à contabilidade reflectem a


aplicação da unidade contabilística a aspectos específicos das empresas. Quantificar e
classificar os factos que ocorrem na empresa é a parte técnica e imprescindível da
missão da contabilidade.

Há dois tipos de factos numa empresa : os externos (que se relacionam com o meio
exterior) e os internos (os que se relacionam com o meio interno, combinação dos
factores produtivos com vista à produção de bens e serviços). Daqui resulta a mais clara
destrinça que se pode fazer na contabilidade, ou seja, a contabilidade geral e financeira e
contabilidade analítica de gestão. Tudo o resto são várias perspectivas e novos âmbitos
da contabilidade, conforme os utilizadores da mesma e de acordo com a importância dos
novos valores, as novas exigências da globalização da economia e o consequente
aumento da sua turbulência e novas exigências para resolver os problemas que daí
resultam. As linhas divisórias não são estanques e, por isso, não é fácil desagregá-las
completamente. Normalment, muitas delas coexistem. Apesar disso, é possível
caracterizá-las.

2.1.1-Contabilidade geral e financeira ou externa

Designa-se assim, porque estuda as linhas gerais e comuns a todas as unidades


económicas e nos dá a situação económica geral e a financeira em particular. Também
se designa por externa, porque regista as operações ocorridas entre a empresa e o
exterior, bem como as alterações quantitativas (unidades monetárias) e algumas
qualitativas (transformação de um activo físico em direito de crédito) do património,
dando a conhecer a sua composição, valor e resultados. Os seus principais interessados
são entidades externas, designadamente: accionistas, bancos, administração fiscal,
fornecedores, outros stakeholders1 e público em geral interessado.
É ou tende a ser obrigatória e mais ou menos estandardizada, isto é, a sua estrutura e
movimentos são muito idênticos nos vários ramos da actividade económica, a nível
local, regional ou mesmo mundial. Por isso, não exige tantos conhecimentos específicos
do negócio, por parte dos profissionais.

A informação que dá é não só genérica, designadamente pela demonstração de


resultados, como de natureza eminentemente financeira, para analisar o património, a
situação e estrutura financeira, a distribuição dos resultados, a base objectiva para o
cálculo dos impostos, etc.

1
Stakeholders é um neologismo que foi criado propositadamente semelhante a stockholders (accionistas).
Genericamente, o termo é traduzível por “clientelas”, ou seja, as entidades com as quais as organizações
se relacionam, com interesses que nem sempre são convergentes; todas as entidades que podem afectar ou
ser afectadas pela organização; é um universo vasto, com fronteiras mal definidas, mas o termo refere-se
a um conjunto de entidades que estão mais relacionadas e mais próximas das organizações. Há os
primários, do tipo: investidores, fornecedores, distribuidores, clientes, trabalhadores, gestores, e os
secundários, do tipo: órgãos de comunicação, associações, sindicatos e outros grupos de pressão. (Cf. An
Academy of Management Publication: “The Executive”, Volume V, Number 2, Maio/91: “Strategies for
Assessing and Managing Organizational Stakeholders”).

40
Resume-se em duas demonstrações: o balanço (que nos dá a situação financeira da
empresa num determinado momento) e a demonstração de resultados (que nos permite
fazer a análise do desempenho da empresa num determinado período).

2.1.2-Contabilidade analítica de gestão ou interna

É a contabilidade imprescindível a uma gestão mais controlada e fundamentada. Sem


ela, a informação contabilística fica muito incompleta. Preocupa-se com a gestão da
actividade, no sentido de optimizar os recursos disponíveis para aumentar valor em cada
exercício. Permite um controle mais directo e pormenorizado da actividade da empresa.
Concentra a sua atenção predominantemente nas operações e movimentos internos (por
isso também a designam por contabilidade interna).

Geralmente não é obrigatória e é específica para cada sector de actividade, podendo ser
estandardizada apenas a este nível (sectorial). Por isso, requer conhecimentos das
características e necessidades de informação e controle do negócio por parte dos
profissionais.

A informação que nos dá é de receitas, custos e resultados, por cada centro de


informação de gestão (departamentos) ou por centros de responsabilidade pré
estabelecidos, de acordo com a especificidade do negócio, o tipo e detalhe de
informação de gestão pretendida.

Participa activamente em todos os problemas da gestão, fornecendo informações e


sugestões que auxiliam a tomada de decisões para optimizar a gestão no dia a dia do
negócio e, assim, contribuir para o aumento do valor patrimonial da empresa.

Está mais virada para o futuro, trabalhando em paralelo com o orçamento (controle
orçamental).

A ideia convencional e simplista da contabilidade de gestão é a de que é um ramo da


contabilidade cuja finalidade é satisfazer as necessidades dos gestores, mas esta é uma
ideia muito genérica, já que toda a contabilidade dá, de algum modo, informações da
actividade do negócio aos gestores.

Apesar disso, o termo contabilidade de gestão é relativamente recente. Foi usado pela
primeira vez na Grã Bretanha, em 1950 na sequência da visita da equipa do Conselho
Anglo-Americano sobre Produtividade e Contabilidade de Gestão dos Estados Unidos.
(Kotas, 1977).

Não obstante não haver uma definição precisa, existe um considerável grau de consenso
na literatura académica, dado que a sua natureza e funções são bem entendidas,
actualmente.
A ideia comum que se obtém do estudo da arte é a de que a contabilidade de gestão é
um conjunto coerente de técnicas que podem ser usadas para preparar informação para
os gestores, a fim de os assistir na tomada de decisões.

Na introdução ao seu relatório intitulado Contabilidade de Gestão, a Equipa de


Contabilidade de Gestão do Conselho Anglo-Americano sobre Produtividade diz o
seguinte:

41
“A contabilidade de gestão é a apresentação da informação contabilística de
maneira a assistir a gestão na criação da política e no empreendimento da
operação do dia a dia” (citado por Kotas, 1977).

Por sua vez, o Glossário de Técnicas de Gestão distribuído por H.M. Treasury define
Contabilidade de Gestão como:
“A aplicação de conhecimentos contabilísticos, com o fim de produzir e
interpretar a informação contabilística e estatística destinada a assistir a gestão,
na sua função de empreender a máxima eficácia e na formulação e coordenação
de futuros planos e, subsequentemente, na mensuração da sua execução”. (citado
por Kotas, 1977).

São apenas duas citações, de entre muitas outras que poderiam ser feitas. A expressão
“assistir a gestão” é comum a todas. De facto, a função de assistir a gestão é o que
distingue a contabilidade de gestão. Porém, há quem tenha uma visão mais lata da
contabilidade de gestão. Cox (1982), por exemplo, fazendo eco do ponto de vista oficial
do Institute of Cost and Management Accountants, argumenta que a contabilidade de
gestão não se deve restringir ao reporte interno.

Em suma, a contabilidade de gestão é uma mistura de contabilidade de controle e de


decisões. O controle das operações do negócio e a tomada de decisões são duas das
tarefas mais difíceis da gestão e é aí que a contabilidade tem um bom papel a
desempenhar. Para o conseguir, os técnicos que a preparam, para além dos
conhecimentos contabilísticos, têm de ter uma mentalidade de gestão e conhecimentos
do sector económico em que se insere a actividade da empresa, do tipo de informação
mais adequado, dos métodos e técnicas usados, etc.

Além da contabilidade geral/financeira e da contabilidade analítica de gestão, desde há


muitos anos que se fala noutras facetas da contabilidade, de que destacamos a
contabilidade fiscal e contabilidade orçamental.

2.1.3-Contabilidade fiscal

Há quem ache abusivo realçar a contabilidade fiscal como um tipo de contabilidade. De


facto, parece-me que não é propriamente um tipo de contabilidade, mas antes uma parte
da contabilidade financeira conjugada com as atenções e preocupações que a matéria de
economia fiscal exige1.
Os autores que se referem a este tipo de contabilidade vêem nela, essencialmente, tudo o
que está relacionado com os vários impostos e taxas2.

1
Empresas há que executam a contabilidade apenas por que são obrigadas a cumprir com o POC e, então,
referem-se a esta como a “contabilidade fiscal”, porque o fisco o obriga e porque só serve para o fisco...
2
Cf. SCHMIDGALL R.S., Hospitality Industry Managerial Accounting, Michigan, Educational Institute
of the American Hotel & Motel Association, 1986, p. 17. Além da contabilidade financeira e de gestão,
este autor descreve também a contabilidade de custos e a contabilidade dos impostos (muito
semelhantemente ao que fica expresso neste texto).
Cf. KOTAS R., Management Accounting for Hotels and Restaurants, London, Surrey University Press,
1977, p.20. Este autor descreve os seguintes tipos de contabilidade: histórica, de custos, financeira, de
decisões, de controle, de gestão, de receitas,

42
A montante (a priori), preocupa-se com a planificação e modus faciendi no sentido de
minimizar este custo, normalmente o menos desejado, se não mesmo “odiado”, sem
deixar de cumprir com os preceitos legais.

A jusante (a posteriori), preocupa-se não só com o cumprimento da lei, mas também


com a preparação dos dados e informação necessária para o preenchimento dos
formulários exigidos.

2.1.4-Contabilidade do controle orçamental

A base e razão de ser desta faceta da contabilidade é o orçamento, que é feito


essencialmente com base na contabilidade analítica de gestão. Trabalhando em conjunto
com a contabilidade histórica (o que efectivamente se fez, designadamente proveitos e
custos reais), dá origem ao controle ou contabilidade do controle orçamental, que
consiste em comparar o que foi previsto ou o desejável com o que se está realizando e
achar as diferenças, cujas causas (das grandes diferenças) serão analisadas, para se
tomarem medidas correctivas adequadas.

Para além destes aspecto e preocupações, outros há, hoje em dia, que nos preocupam.
Há um conjunto de aspectos (externalidades, poluição, greves, conflitos de recursos
humanos...) que, por escaparem completamente à tradicional relevação digráfica,
limitam cada vez mais o valor informativo da contabilidade actual. Há pois necessidade
de alargar o seu âmbito a aspectos relacionados com os intangíveis (factores estratégicos
não financeiros).

Na era da informação em que vivemos, é indispensável termos dados 1 e conhecimentos 2


que nos permitam um sistema de medição (informação) da gestão, equilibrado e
integrado. Ou seja, é necessário ter dados e conhecimentos que reúnam não só
indicadores de informação financeira (do tangível) como também não financeira (do
intangível). Ou seja, é necessário termos um sistema que meça os processos críticos da
gestão do curto e do médio/longo prazos.

“A linguagem do negócio” já não é só a informação contabilística tradicional. As


medições não podem ser apenas de carácter financeiro, têm de ser também de carácter
não financeiro. As de carácter financeiro referem-se a activos tangíveis e medem
objectivos e resultados de curto prazo. As de carácter não financeiro referem-se a
activos intelectuais e intangíveis e medem objectivos e resultados de longo prazo. Ora
hoje em dia, os activos intangíveis e competências de uma organização são mais
importantes para o sucesso futuro da empresa, do que os activos físicos e tangíveis
tradicionais (Kaplan,1996).

Daí a razão de se falar, hoje, em contabilidade ambiental, contabilidade dos recursos


humanos e outras. Por agora, abordemos apenas estas duas prespectivas.

2.1.5-Contabilidade ambiental

As acções poluentes provocam sucessivas e acentuadas mudanças com efeitos na


economia, nos indivíduos e na sociedade, que interessa relevar.
1
Factos obtidos pela observação.
2
Dados recolhidos, tratados e armazenados.

43
Actualmente, já é pacífico que os gestores não podem alhear-se das questões
ambientais. Em muitos países, já é crescente a preocupação e consequente legislação a
impor às empresas e seus gestores obrigações e responsabilidades sobre questões do
género: obrigações de utilização de equipamentos ecológicos, processamento de
reciclagens, reaproveitamento de resíduos. Paralelamente, impõem-se multas ou coimas
aos prevaricadores. Disto resultam limitações e custos adicionais para as empresas, que
os procuram integrar nos seus preços de venda.

A contabilidade ambiental é, assim, o reflexo desta crescente sensibilização dos


consumidores e dos governantes aos problemas da ecologia e também à crescente
consciencialização do papel social da empresa.

Podemos definir esta faceta da contabilidade como um sistema destinado a dar


informações sobre a diminuição dos recursos naturais ocasionados pelas actividades
empresariais e sobre as medidas tomadas para evitar essa diminuição (Bernard
Christophe citado, por João E.P.Tinoco, em Ecologia, Meio Ambiente e Contabilidade,
Revista Brasileira de Contabilidade, Nov. 1994, p. 28).

Face à consciência crescente da nova responsabilidade que as empresas têm ao nível da


conservação do meio ambiente, estas têm de assumir os seus ónus, disponibilizando os
recursos necessários para o efeito. Neste sentido, surge a necessidade do aparecimento
de dispositivos contabilísticos em que assumem carácter operacional os custos do
ambiente, processados em contas de exploração e resultados, com repartição de custos
(amortizações) por vários exercícios (dado tratar-se de custos plurianuais), bem como a
consideração de custos estimados (provisões razoáveis) relativos a despesas de eventual
comprovação futura, por danos causados ao ambiente. Tais provisões ainda não estão
previstas ao nível da contabilidade e da fiscalidade, mas é de esperar que venham a ter
um carácter imperativo num futuro próximo, à medida que forem ultrapassadas as
dificuldades na determinação dos passivos decorrentes dos danos causados.

Nesta sequência, será de esperar também o aparecimento da figura do auditor ecológico,


bem como do balanço ecológico, à semelhança do balanço social que já é uma realidade
em alguns países.

Em suma, contabilidade ambiental é a que se relaciona com os custos e processos


ambientais provenientes das obrigações e responsabilidades das empresas e gestores
sobre: certas limitações de actuação, utilização de equipamentos ecológicos,
processamentos de reciclagens, reaproveitamento de resíduos, respectivas coimas,
processos de integração destes encargos nos preços de venda, processamento destas
obrigações e contas de exploração e de resultados, com chaves de repartição de custos
(amortizações) por futuros exercícios e a consideração de custos estimados (provisões)
relativamente a gastos de comprovação futura.

2.1.6-Contabilidade dos recursos humanos

Atribui-se esta designação à contabilidade que se relaciona com o processamento do


valor e desvalor qualitativo das pessoas que fazem as coisas acontecer na empresa,
designadamente: capitalização do factor humano e patrimonialização (contabilização no
activo) de despesas com efeitos futuros no seu desenvolvimento, ou seja, com efeitos

44
visíveis nas operações e proveitos dos exercícios seguintes; valia dos processos, do
clima de trabalho, da cultura organizacional, da experiência e competência dos seus
dirigentes, quadros e pessoal da linha da frente, bem como outras potencialidades em
que assenta, decisivamente, a marcha futura da empresa e a sua evolução patrimonial.

O caso das sociedades desportivas criadas pelos clubes de futebol é já um exemplo


concreto de aplicabilidade emergente desta nova faceta da contabilidade que já não é tão
teórica como poderá parecer à primeira vista.

2.2-Evolução e tendências da contabilidade em geral

A literatura sobre um qualquer conhecimento representa, historicamente, um estádio


evolutivo importante. A contabilidade teve a sua primeira expressão literária importante,
no ocidente1, em 1494, quando o frade franciscano Luca Pacioli publicou «por
compaixão pelos ignorantes», como ele próprio diz, uma monumental enciclopédia
matemática intitulada «Summa Arithmeticae, Proportionis et Proportionalitatis», na
qual inclui um capítulo intitulado: «Tractatus de Computis et Scripturis»2.

Porém, muitos anos antes de Cristo, povos negociantes como Fenícios, Gregos,
Romanos e outros faziam os seus registos, mais ou menos artesanais, das suas
transacções. As partidas dobradas são apenas um marco histórico de uma longa
evolução (resultante do gradual aumento do número de contas utilizadas pelos
comerciantes medievos), ou seja, aparecem muitos milénios após a técnica contábil ter
passado por critérios técnicos que não passavam de simples registos.

Depois da Renascença e durante muitos séculos, a missão da contabilidade era


sobretudo um meio de prova e uma servidora do Estado. As contas do património
começaram por ser os elementos essenciais da contabilidade, a partir do momento em
que se tornou obrigatória a publicação do balanço anual.

Mas a história e evolução da contabilidade está muito associada ao desenvolvimento das


empresas comerciais. Daí as partidas dobradas se generalizarem só a partir do século
XIX, quando o capitalismo iniciou a sua marcha triunfante.

Com o progredir do século XX, a contabilidade foi-se tornando um modo de explicação,


um instrumento de gestão. As contas de exploração foram tomando uma importância
crescente, ao ponto da sua eficácia estar, hoje, principalmente, na contabilidade analítica
de gestão3.

1
SÁ A.L., «Uma Hipótese sobre o Aprendizado de Paciolo Sobre as Partidas Dobradas», in: Anexo ao nº
205 do Vol. LII da Revista de Contabilidade e Comércio, 1995. O autor diz que «tudo faz crer que a nossa
literatura (da contabilidade) desperta-se com maior intensidade, apenas a partir do século XIII D.C....» e
que esta primeira literatura «tem fortes bases no Oriente,...mas a que, no Ocidente, se tornaria mais
famosa seria a do frei Luca Pacioli». Ou seja, «Que antes de Pacioli houve literatura contábil, não há
dúvida, mas que sua obra seria a mais famosa, também não se discute».
2
Os primeiros Compêdios de contabilidade impressos em Portugal e Espanha datam de 1565 (simples
tradução de um mau trabalho de autor alemão) e de 1758 (medíocre adaptação duma obra de Delaporte.
Estranho, para um país de navegadores comerciantes... Do «Tractatus» existem também, «ao que consta,
duas traduções em Português, ambas relativamente recentes». «Infelizmente, nenhuma delas chegou a
imprimir-se». (SILVA F. V. G., «Luca Pacioli o homem e a obra» in: Revista de Contabilidade e
Comércio, 1995 (Anexo), Vol. LII (205).

45
Sobre se a contabilidade, hoje em dia, é uma técnica ou uma ciência, as opiniões
dividem-se e não queremos desenvolver este ponto aqui, até porque depende do
conceito de ciência, a qual tem muitas perspectivas.

No início do século XIX, a Academia Francesa aceitava que a contabilidade cumpria


todos os requisitos para ser considerada ciência1.

Ferreira (1999) diz que a contabilidade se apresenta como uma privilegiada técnica de
observação económica que utiliza uma linguagem, perfilha princípios, usa critérios,
segue procedimentos, de acordo com a instrumentalidade que lhe é inerente e os fins
que lhe são exigidos2.

Almeida (1998) diz que a contabilidade, mais do que uma técnica e arte, é uma ciência e
um instrumento fundamental de desenvolvimento e de valor acrescentado, nas
sociedades modernas3.

Por sua vez, Rocha (1999)4 afirma que todos aqueles que pensaram a contabilidade
como técnica e como arte estragaram-na, não permitindo que ela evoluísse, em Portugal.
A contabilidade é uma ciência. Se assim não fosse, não poderia evoluir, porque as
ciências é que investigam e se desenvolvem.

Talves seja mais correcto considerarmos a contabilidade como um misto de ciência,


técnica e até uma certa arte 5, mas com uma preponderância cada vez maior para ser
tratada cientificamente. Ela insere-se no contexto das ciências sociais, que são bem mais
complexas do que a matemática, a física ou a química, uma vez que envolve
conhecimentos duma multiplicidade de matérias de índole económica, jurídica, fiscal,
estatística, informática, ciências do comportamento, etc., razão porque assentou todo o
seu suporte técnico, teórico e científico em postulados, princípios, pressupostos, regras,
convenções e doutrinas. Esta realidade e tendência crescente obriga a que as várias
entidades, designadamente empresas e o próprio estado, tenham de recorrer, muitas
vezes, a peritos nesta matéria.

Mas, hoje em dia, considera-se que esta questão é sobretudo académica e algo estéril 6.
Estamos no primado da gestão. Na prática, o importante é ela ser um instrumento de
informação de gestão credível, compreensível, comparável, relevante, atempado,

3
A grande crise dos anos 30 constituiu um estímulo muito importante para o desenvolvimento da
contabilidade na óptica da exploração, designadamente com a necessidade do cálculo dos custos unitários.
As novas necessidades, os novos métodos de gestão do pós segunda guerra mundial e as grandes
concentrações de empresas deram um novo impulso à contabilidade analítica de gestão.
1
Cf. GUIMARÃES R.A. et al., «Evolução e situação Actual da Produção de Artigos sobre
Contabilidade em Portugal (1987-1997)», in: Revista de Contabilidade e Comércio, 2000, vol. LVII,
(225), p. 77.
2
FERREIRA R.F., in: “Eurocontas”, 1999 (Junho).
3
ALMEIDA M., in: “Eurocontas”, 1998, (Agosto/Setembro).
4
ROCHA A, in: “Eurocontas”, 1999, (Março).
5
Alguns autores, como KUHN («A revolução copernicana», Lisboa, 1990, Ed. 70), consideram que é
determinante a imaginação do cientista... Por seu turno, FEYERABEND («Adeus à razão», Lisboa, 1991,
Ed. 70) considera que os verdadeiros progressos do conhecimento científico surgiram, ao longo da
história da ciência, quando os cientistas colocaram de lado os métodos vigentes no tempo.
6
Hoje, o conhecimento dito científico não é considerado o único saber válido. Deve partir-se de uma rede
de relações na qual cada saber tem o seu papel na procura de estabelecimento e respeito do ser. (Cf.
GUIMARÃES, Raul A et al., in obra citada, p.79).

46
imprescindível neste novo mundo das empresas transnacionais, das mega fusões e, ao
mesmo tempo, da pulverização das mesmas em unidades de negócios autónomas1.

2.2.1-Evolução da contabilidade em Portugal

Durante dezenas de anos, a contabilidade identificou-se, sobretudo para a maioria


esmagadora das pequenas e médias empresas, com objectivos vincadamente fiscais.

Em Portugal, a contabilidade tem vindo a evoluir lentamente, à medida do


desenvolvimento económico do país e retratando essa relação estreita entre a
contabilidade e a fiscalidade.2

Assim, na opinião de Alves (1998), podem reconhecer-se, nos últimos 30/35 anos, três
grandes fases: a primeira tem como marco, na década de 1960, a publicação do Código
da Contribuição Industrial (“fisco-contabilidade”); a segunda tem como marco a
publicação do POC/77 (“contabi-fiscalidade”); a terceira (“contabilidade-fiscalidade”) é
a que se nos depara nesta fase de mudança em que vivemos. Existem um “pensamento”
e uma “cultura” contabilística associados a cada uma destas fases, que coexistem ainda
hoje, distinguindo-se com nitidez os seus normalizadores, defensores, professores,
mestres e pensadores, sendo os de maior protagonismo, talvez, os das primeira e
segunda fases.

Ferreira3 (1999) considera que a evolução destas últimas décadas foi significativa, em
particular num aspecto que apelida de democratização da cultura contabilística.

Com efeito, até à reforma fiscal da década de 60, eram poucas as pessoas que se
dedicavam à contabilidade e, dessas poucas, a grande maioria tinha uma preocupação de
carácter prático, em regra, despojado de conhecimentos de natureza teórica e,
geralmente, pouco aprofundados.

Com a reforma fiscal da década de 60 e o Código da Contribuição Industrial, dá-se o


primeiro grande salto qualitativo. Os técnicos de contas passaram a ser considerados
responsáveis pelas declarações sobre os lucros tributáveis, pelo que tiveram que
ponderar procedimentos, sua justeza, confrontando-os com ditames legais. Profissionais
e empresas passaram a sentir necessidade de dar resposta à legislação fiscal, pelo que
passou a haver maior preocupação com formação e debate alargado à fiscalidade e
gestão financeira.

Na década de 70, operou-se um outro passo significativo, que foi o dos estudos relativos
à normalização contabilística. No início da década (1973), surgiu o Anteprojecto de
Plano Geral de Contabilidade. Em 1975, a 1ª fase do trabalho Normalização
Contabilística. Em 1977, o 1º Plano Oficial de Contabilidade (POC) e, em 1989, o 2º
POC, que é a adaptação do 1º às normas da 4ª directiva da CEE.

1
«Ser ou não ser uma ciência conta muito menos do que a enorme e indiscutível importância que a
contabilidade tem vindo a desempenhar na evolução do mercado económico-social como processo
insubstituível destinado a recolher, ordenar e medir as consequências de toda a actividade humana
(especulativa ou não) expressa em números representativos de unidades de valor». (AMORIM, J.L.
Citado por GUIMARÃES, R. A. et al., in obra citada, p.78).
2
ALVES, L., in: “Eurocontas”, 1998, (julho).
3
FERREIRA, R. F., in: “Eurocontas”, 1999, (Junho).

47
As duas últimas décadas (80/90) foram ainda mais intensas em acontecimentos que
influenciaram esta evolução, designadamente: a legislação sobre a fiscalização das
sociedades, a criação da profissão dos ROC, o Código das Sociedades Comerciais, o
Código do Mercado de Valores Mobiliários, o estatuto dos TOC, as novas reformas de
fiscalidade, o ingresso na UEM, as Directivas Comunitárias, as Directrizes
Contabilísticas da CNC, os efeitos da globalização, entre outras.
Em suma, como diz Ferreira (1999), no nosso país, «os cultores da contabilidade
ponderaram prioridades. Inicialmente, centraram-se em problemas mais imediatistas,
buscando a melhor relevação sistemática e digráfica (...) a certa altura, passou a dar-se
mais relevo às funções previsionais e de controle, procurando-se um acompanhamento
crítico e evolutivo da gestão e pedagógico.(...) Entretanto, hoje, estamos solidários com
tentativas de quantificação de fenómenos gestivos de natureza humana e sociológica,
com novas perspectivas de estudo (ou quantificação do hoje inquantificável ou
construção de uma nova filosofia da contabilidade, onde as apreciações não se façam
apenas através de expressões quantitativas)»1.

2.2.2-Contabilidade e fiscalidade

A contabilidade, no seu todo,2 tem vários destinatários: gestores, sócios, accionistas


fisco, banca, trabalhadores, entidades e estatísticas oficiais, stakeholders em geral.
Todos têm de ser simultaneamente servidos, directa ou indirectamente, com informação
eficaz, sob risco da empresa não ser bem gerida e de não ser credível. Sendo assim, a
contabilidade não pode estar limitada pelas regras e fundamentos fiscais.

Segundo Machado (1998), apesar de uma certa evolução que se tem verificado por parte
da administração pública, nos últimos anos, ainda há muitas pessoas que acham que, em
Portugal, o fisco tem uma grande interferência na contabilidade, de tal modo que se é
levado a preparar a contabilidade para aquele efeito, sacrificando, muitas vezes, a
perspectiva contabilística e de gestão à perspectiva fiscal, o que constitui uma limitação
muito grande. Muitas empresas fazem uma contabilidade fundamentalmente virada para
o preenchimento das demonstrações fiscais, sobrepondo-as às questões contabilísticas,
quando a contabilidade deve ser fundamentalmente utilitária, ou seja, de prestação
de informações o mais rigorosas possíveis, para poderem ser úteis aos seus utentes.
Noutros países mais evoluídos, acontece que o fisco tem as suas próprias regras, mas
não as impõe à contabilidade. Ou seja, seguem-se as regras fiscais, para o
preenchimento das demonstrações fiscais e as regras contabilísticas para as
demonstrações financeiras3.
Também Rocha (1999),4 é da opinião que, em Portugal, há uma ligação excessiva «e até
perversa» da contabilidade à fiscalidade. Pensa-se sempre ir procurar saber o que é que
a fiscalidade diz. As pessoas da contabilidade insistem em não dar um passo sem
primeiro saber o que está a acontecer na fiscalidade... «É uma inversão de sentido, já
que deveria acontecer precisamente o contrário». Contudo, acrescenta este técnico, «a
culpa não é da administração fiscal, que já compreendeu que as regras de jogo podem
ser diferentes e é por isso que existe o quadro 17 5 na declaração modelo 22, onde,
1
FERREIRA R.F., in “Eurocontas”, 1999, (Junho).
2
Como já vimos, ao falarmos sobre os tipos de contabilidade, a contabilidade é una, mas tem várias
funções ou facetas, conforme a utilidade informativa que dela se pretende.
3
MACHADO B., in “Eurocontas”, nº35, Fevereiro/98.
4
ROCHA A., in “Eurocontas, 1999, (Março).
5
A partir do exercício fiscal de 1999, passou a ter a numeração 07.

48
partindo-se da contabilidade e em conformidade com as regras fiscais, se obtém o lucro
tributável».
Por sua vez, Caiado (1998),1 reforça esta última ideia ao afirmar que a contabilidade
baseada no POC não está demasiado condicionada à fiscalidade ou não tem de ficar
manietada pelas exigências fiscais. «Quando é possível conciliar as duas exigências,
tudo bem. Quando não é, a contabilidade tem a sua óptica, que está no POC, e a
fiscalidade tem a sua, permitindo o quadro 17 2 (do modelo 22), fazer a transposição de
uma para a outra, sem prejuízo para qualquer delas».

Neste momento, a nossa experiência também nos diz que esta questão se traduz mais na
seguinte realidade: há pessoas que estão só interessadas em fazer a contabilidade na
óptica da fiscalidade, porque não se servem dela para fundamentarem as suas decisões e
acções subsequentes. Nesses casos, a contabilidade está orientada meramente para
cumprimento das normas fiscais. Estas situações devem-se não só à mentalidade de
certos empresários, como também a falhas de formação e de competência de muitos
profissionais. Uma parte importante das empresas portuguesas (sobretudo as pequenas e
médias) ainda se preocupa, quase em exclusivo, com a “escrituração”, numa perspectiva
eminentemente tributária.

É verdade que a tributação do rendimento (óptica fiscal), foi, em Portugal como noutros
países, uma alavanca para o desenvolvimento da contabilidade. Contudo, nos últimos
anos, tem-se registado uma mudança crescente de pensar e de atitude, quer por parte do
da administração pública, quer por parte dos novos líderes da classe dos profissionais da
contabilidade.

Para isso, terão contribuído principalmente três factores: (a) o mercado de capitais, (b) a
internacionalização da economia e (c) um consequente sentido de mudança da
mentalidade dos nossos governantes e de uma nova classe de estudiosos e profissionais
que passaram, muitos deles, por empresas multinacionais anglo-saxónicas, onde a
mentalidade é mais pragmática.

Com efeito, a instalação de empresas multinacionais , em Portugal, e a participação de


capitais estrangeiros em empresas portuguesas levaram a que estas, de um modo geral,
utilizassem duas contabilidades: uma para cumprir os requisitos “domésticos” e outra
para satisfazer as necessidades do grupo. Ora, estas empresas têm mentalidades e
atitudes diferentes das nossas tradicionais e foram e são factores de mudança,
designadamente na hotelaria, com a divulgação do sistema uniforme (USALI)3.

Por sua vez, as empresas que são obrigadas a revisão legal de contas, muito
especialmente as cotadas na bolsa, também tiveram de adoptar uma moldura
contabilística qualitativamente superior à que é exigida à generalidade das outras.

1
CAIADO, P., in “Eurocontas”, nº 36, Março/98.
2
Ibidem.
3
Constatámos que várias empresas e profissionais tomaram conhecimento do modelo de contabilidade
analítica de gestão contido no “Uniform System of Accounts for the Lodging Industry” (USALI) quando,
por qualquer motivo, contactam com hotéis portugueses geridos por empresas sobretudo anglo-saxónicas,
as quais utilizam naturalmente o POC e a contabilidade específica para a sua gestão, designadamente o
USALI. A cadeia hoteleira Sheraton terá sido a primeira estrangeira a instalar-se em Portugal. Nós
próprios, em 1978/79, quando estagiámos no seu hotel Sheraton, em Lisboa, tivemos oportunidade de
verificar exactamente a mesma cumplicidade entre POC e a contabilidade interna (modelo USALI) que
tinha de estar na sede internacional na semana seguinte à do fecho do mês.

49
2.2.3-Normalização e criatividade

Entende-se por normalização (ou uniformização) contabilística todo um conjunto de


terminologia, esquemas e regras de contabilização uniformemente adoptados por várias
empresas de um sector ou de um país ou de uma zona económica. Daqui resultam
planos de contabilidade sectoriais, regionais ou nacionais.

A internacionalização da economia (e agora também a sua globalização), e com ela


também a da contabilidade, bem como as muitas peculiaridades encontradas na prática
recomendam que não se estabeleçam normalizações muito rígidas e muito menos se
imponham esquemas demasiado analíticos, convindo, como diz Ferreira (1970), que se
comece por indicar normas e regras puramente orientadoras, de modo a conciliar
soluções de puro logicismo teórico, com as necessidades do simples pragmatismo
operacional e utilitário.
Rocha (1999),1 é da opinião que, para alguns, a contabilidade, em Portugal, ainda está
imbuída de excesso de normas (de actuação, de registo, de demasiado pormenor). Há
um exagero na normalização. Entra-se muito no pormenor. Assim, não há liberdade
criativa. Ora a norma em excesso é a grande inimiga da evolução científica. O ser
humano descansa na norma. Isso é cómodo, mas transforma muitos especialistas da área
da contabilidade em autómatos, que nem sequer discutem se a norma está correcta ou
incorrecta, aplicando-a simplesmente.

Em nossa opinião, esta situação e atitude estão a mudar paulatinamente. Hoje, o Estado
já não é tão interventor e proteccionista como dantes e o maior índice de formação
proporciona maior autonomia, capacidade crítica e discernimento às pessoas.

Contudo, a nossa cultura assentou muito no paternalismo e autoritarismo (discricionário


e temeroso, que dita as regras), na distância hierárquica (sempre aliada ao
obscurantismo e à repressão) e no consequente desrespeito pelas regras (quando se
pode) e, por isso, na necessidade de criar mais regras, na aversão ao risco e consequente
falta de iniciativa, no colectivismo e consequente falta de espírito associativista; enfim,
numa educação estruturante baseada na obediência, em detrimento de uma formação
informante, orientada para o pensar e para o agir2. «São necessárias normas, mas não em
excesso nem demasiado taxativas, porque, assim, não deixam grande margem para a
liberdade criativa»3.

Por outro lado, por limites do seu âmbito e do seu objecto, nos tempos actuais, a
contabilidade reduz bastante a sua própria importância e o valor acrescentado que pode
1
ROCHA, A in “Eurocontas”, nº99, Março/99.
2
Cf. MARQUES R., «Gestão de Recursos Humanos: Que Tipos Esperar em Portugal», in Organizações
e Trabalho (Revista da Associação Portuguesa de Profissionais em Sociologia Industrial, das
Organizações e do Trabalho), 1996/97, (16/17) Dez/Jun, pp. 99-117, e HOFSTEDE G., Culturas e
Organizações, Compreender a nossa Programação Mental, Lisboa, ed. Sílabo, 1997.
Em 1925, a Associação de Hotéis de Nova Iorque tomou a iniciativa de formar uma equipa de peritos em
gestão hoteleira e em contabilidade, para elaborarem o “Uniform System of Accounts for Hotels”, o qual
foi, em breve, adoptado por todas as associações hoteleiras dos EUA e do Canadá. Em Portugal, tem sido,
durante demasiados anos, o Estado a tomar iniciativas deste género. Em 1981, apresentámos à Associação
de Hotéis de Portugal um projecto de adaptação daquele sistema uniforme ao POC e à nossa realidade.
Não despertou especial interesse. Em 1987, foi a Direcção Geral de Turismo que apresentou às várias
associações do sector um documento idêntico cujas características e resultados analisaremos mais adiante.
3
Cf. ROCHA A., in: “Eurocontas”, 1999, (Março).

50
dar. Temos de ter hoje consciência de que tudo o que está no balanço é contigente e que
as contingências vão ser cada vez mais acentuadas. Aquilo que hoje é válido nas contas
de uma empresa pode não o ser daqui a cinco ou seis meses, devido à complexidade da
envolvente, que é cada vez mais instável, pelo que os balanços têm cada vez mais
contas de incerteza. A tendência é para a desregulamentação, a que está inerente uma
certa criatividade (engenharia financeira, fiscal, contabilística), pelo que o juízo do
contabilista e do auditor sobreleva os aspectos meramente técnicos, o que levanta novas
exigências de formação, de ética e deontologia profissional1

Em suma, podemos resumir esta questão com o seguinte parecer de Rogério F. Ferreira:
«a criatividade é positiva se com sentido de progresso, de soluções para insuficiências
existentes ou de melhoria das informações que competem à contabilidade. Repudiam-se
soluções que, científica e tecnicamente, não se mostram adequadas aos objectivos de
uma correcta informação e apreciação da gestão, ou seja, que mostrem propósitos de
confundir ou enganar. (...) Os cientistas terão de estar atentos às preocupações dos
profissionais, às aplicações da ciência. Há que fazer trabalho profícuo, acautelando
utilizações impróprias. Os técnicos, os que decidem no concreto, não podem ignorar
nem a racionalidade nem a lei. Os profissionais, por vezes, interferem representando os
interesses da empresa ou associação, acautelando interesses corporativos. Mas há que
dar atenção, também, a regras deontológicas. Há que privilegiar ética e ciência».

Posto isto, vejamos, pelo seguinte mapa, um resumo das vantagens e desvantagens da
uniformização contabilística.

Resumo dos objectivos (vantagens) e de alguns riscos (desvantagens) da


normalização contabilística:
Objectivos (vantagens) Riscos (desvantagens)
 Proporcionar aos técnicos de contabilidade,  Entrave ao processo destas matérias;
orientações, esquemas, regras e procedimentos mais  Opção por modelos que não satisfazem as
consensuais, evitando perdas de tempo, de energias e necessidades;
de esforços em “descobertas já descobertas”;  Imposições rígidas e minuciosas;
 Uniformizar terminologia e esquemas estruturais;  Soluções afastadas da realidade;
 Constituir um instrumento para melhor comunicação  Dificuldade na obtenção dos resultados líquidos dos
e gestão; centros de resultados e de tudo o que isso envolve;
 Recolher dados relativamente homogeneizados;
 Dispor de dados sectoriais e nacionais em
quantidade e qualidade;
 Proceder a estudos de sector ou da economia;
 Melhorar o conhecimento de cada sector e da
situação económica em geral;
 Tornar consistente a informação dos agregados
económicos;
 Mostrar a posição relativa de cada empresa;
 Incentivar as empresas em situação menos favorável
a proceder a revisões e alterações para melhorar
posição e produtividade;
 Propiciar uma base de procedimentos mais
ortodoxos e certeiros para efeitos de tributação mais
justa;
 Propiciar instrumentos de previsão e análise mais
correctos para os gestores e entidades oficiais;
 Facilitar o controle da Administração Fiscal;
Quadro coligido pelo autor

1
Cf. ALMEIDA M., in: “Eurocontas”, 1998, (Agosto/Setembro).

51
Como se pode ver neste quadro resumo que apresentamos, as vantagens são muito
superiores às desvantagens. Pensamos que as vantagens de uma normalização sensata,
competente, flexível se sobrepõem a alguns inconvenientes. A nossa experiência na
consultoria e gestão das empresas hoteleiras convence-nos de que, para a gestão, é do
máximo interesse que um sistema de contabilidade permita salvaguardar a
uniformização. Alguns dos seus poucos mas importantes inconvenientes práticos
podem, entretanto, ser ultrapassados no interior de cada empresa e em paralelo com o
sistema uniforme. Ou seja, a contabilidade de hoje, designadamente a analítica de
gestão, também não se pode limitar à única preocupação da uniformização. Dentro de
um sistema uniforme que seja eficaz e eficiente para a gestão, terá de haver variantes
internas que permitam gerir as actividades da empresa geradoras dos serviços, uma vez
que são estas que consomem os recursos (custos), ou seja, conciliar as vantagens da
fácil uniformização com uma solução, o mais pragmática possível, de obtenção de
margens de contribuição (líquida) por cada bem ou serviço.

Como diz Ferreira (1999), o mais importante, hoje, não será substituir teorias e
convenções contabilísticas tradicionais por outras. A questão fundamental centra-se na
necessidade que existe, actualmente, de obter uma informação cada vez mais
multifacetada, para fins diversos. Propugnam-se compilações de dados diversificados,
encarando diferentes perspectivas. A profunda alteração das condições económicas e
sociais e da própria ciência social e económica obriga a que, na apreciação da gestão, se
utilize uma contabilidade que, adoptando procedimentos diversificados e novas técnicas
de análise, aprecie, em termos necessariamente multiformes, a realidade. Ou seja, pode
coexistir um modelo, cujos princípios teóricos e estrutura base sejam razoavelmente
consensuais e rígidos, para salvaguardar esse objectivo tão almejado e útil que é a
uniformização com seus benefícios e, ao mesmo tempo, coexistirem modelos internos
de informação de gestão, para os propósitos, necessidades e possibilidades de cada um1.

Em suma, a melhor solução talvez seja, então, a forma de encarar ou a necessidade de


encarar, em simultâneo, variadas alternativas de apreciação reputadas úteis, mas eleger
uma filosofia e estrutura básica e essencial que se revele suficientemente consensual. As
novas tecnologias favorecem essas informações multifacetadas, úteis e com menores
custo.

2.2.4-A internacionalização da contabilidade

A situação de existirem diferentes modelos de contabilidade, em função de cada país, irá


mudar, proximamente, a nível europeu e, com o tempo, a nível de outros países,
caminhando-se para uma homogeneização, pelas seguintes razões: (a) efeitos da UEM e
da sua afirmação (não é provável que para o euro existam expressões contabilísticas não
comparáveis, ou seja, não uniformes quer para as contas consolidadas quer para as
singulares dos países membros); (b) efeitos da crescente internacionalização da
economia e, eminentemente, das bolsas de valores que geram uma enorme difusão da
informação financeira e determinam que as empresas tenham de produzir contas para
um número indeterminado e diferenciado de utentes em vários países e em vários
continentes. A aceitação, pelas principais bolsas de valores europeias, de demonstrações
financeiras preparadas em conformidade com as International Accounting Standard
1
Mais adiante veremos que o “Uniform System of Accounts for the Lodging Industry”(USALI), tal como a
sua filosofia e estrutura de origem e as soluções de compatibilização que aponta para o sistema de custeio
CBA, é um bom exemplo deste compromisso.

52
(IAS) 1 é já uma realidade. As IAS constituem, cada vez mais, a fonte de inspiração dos
Standard Setting Bodies 2 de grande número de países. Mesmo as comissões de
normalização contabilística dos países fora do modelo anglo-saxónico têm vindo a
aceitar, progressivamente, as normas internacionais do International Accounting
Standard Commitee (IASC).3 Ou seja, os países têm, cada vez mais, reduzida margem de
manobra para normalizar à sua imagem e à sua escala. A contabilidade tornou-se uma
disciplina de contexto mundial.

Na introdução ao nosso POC (versão de 1989), está escrito o seguinte: “estão a ser
desenvolvidos, no âmbito das organizações europeias dos profissionais de contabilidade
e em ligação com as estruturas da CEE, vários trabalhos com vista a conseguir a
harmonização contabilística mundial, objectivo máximo da International Federation of
Accountants (IFAC).4 Para a sua consecução, estão a fazer-se esforços no sentido de
eliminar as divergências, não muito significativas, entre as normas contabilísticas
contidas na 4ª Directiva e as normas internacionais de contabilidade emitidas pela
International Accounting Standards Committee (IASC), órgão dependente da IFAC” (...)
“Nesta matéria e com a internacionalização dos mercados de bens, de serviços e de
capitais, o nosso país não pode deixar de acompanhar os desenvolvimentos e progressos
que se verificam ao mais alto nível, desligando-se de esferas de influências mais
restritas, sob pena de se pôr em causa não só o funcionamento desses mercados, sempre
dependentes da qualidade da informação financeira, como os profissionais de
contabilidade, que se vêm esforçando por acompanhar a evolução registada”.(Decreto-
Lei nº 410/89, de 21 de Novembro).

Segundo Machado (1998),5 em Portugal, a Comissão de Normalização Contabilística


(CNC) não pode prescindir de seguir o que se faz internacionalmente ao nível da
contabilidade. Após ter adaptado a 4ª Directiva da CEE a Portugal, a nossa CNC, 6 para
suprir deficiências, emite directrizes contabilísticas de aproximação às que a IASC
elabora e aprova, não se limitando a um papel de mera tradução, mas de adaptação à
realidade portuguesa. “É evidente, diz, que temos de acompanhar as normas
internacionais, através da IASC e que são adaptadas , em Portugal, pela CNC».

Caiado (1998),7 testemunha o mesmo, quando diz: «A contabilidade, em Portugal, tem


vindo a enveredar pelo diapasão internacional. O POC não limitou essa perspectiva e,
actualmente, não se verificam grandes problemas de adaptação às regras internacionais
(...) isto resulta da preocupação que a CNC tem de seguir as orientações das normas
internacionais da IASC».

Lérias (1998),8 não vê a actuação da CNC desta forma facilitadora, mas sim
complicativa, afirmando: «as directrizes contabilísticas portuguesas têm procurado
complementar ou reorientar as regras estabelecidas (...) têm sido dados passos
significativos, mas parece caminhar-se para uma encruzilhada significativamente em

1
Normas Internacionais de Contabilidade.
2
Comissões de Normalização Contabilísticas.
3
Comité Internacional de Normalização Contabilística.
4
Federação Internacional de Contabilidade que integra o Comité Internacional de Normalização
Contabilística, o qual elabora as Normas Internacionais de Contabilidade.
5
MACHAD B, in: “Eurocontas”, 1998, (Fevereiro).
6
Comissão de Normalização Contabilística.
7
CAIADO P., in: “Eurocontas”, 1998, (Março).
8
LÉRIAS G., in: “Eurocontas”, 1998, (Abril).

53
contradição com o POC e insuficientemente em sintonia com a normalização
internacional. Talvez porque as normas fundamentais da nossa contabilidade,
influenciadas pela óptica jurídico-fiscal, tenham ainda por trás uma carga institucional e
formal, acaba-se por tentar a evolução através da normalização around do POC,
gerando, aqui ou ali, pontos de incoerência. A situação só pode ser sustentada
transitoriamente, pelo que é necessário que se apresse o passo no sentido de um
ordenamento coerente da nossa contabilidade para o século XXI, aproveitando os
resultados dos desenvolvimentos que se estão a verificar a nível internacional (...) A
IASC, num esforço orientado pelas necessidades das empresas em contexto de
mundialização das actividades e dos mercados em que se financiam, está a proceder a
alterações profundas às suas normas e a estender a normalização a novos domínios.
Deste esforço estão a resultar princípios contabilísticos de muito ampla aceitação que
esmagarão, progressivamente, as regras contabilísticas regionais e locais. Estando estas
normas contabilísticas a tornar-se nos padrões universalmente reconhecidos, até que
ponto se justificam normas específicas para Portugal?»

Há um conjunto de problemas contabilísticos novos que têm de ser resolvidos de uma


forma harmonizada, de forma a permitir que as organizações possam produzir grupos de
demonstrações financeiras que sejam entendidas por utentes situados em qualquer um
desses países. É por isso que alguns autores falam na necessidade de uma nova ordem
contabilística internacional, de onde emergem dois grupos de instituições: nas públicas,
destacam-se a ONU1 e a UE2; nas privadas, a IASC e a IFAC, 3 a nível mundial, e as
organizações contabilísticas continentais como a Federation Europeénne d´Experts
Comptables (FEEC) 4, a nível europeu .

Contudo, é previsível que não venha a haver uniformidade nesta homogeneização e,


provavelmente, o modelo dual standard virá a ganhar terreno. Alves (1998),5 é da
opinião que «vamos assistir à emergência de três grandes grupos de empresas,
provavelmente com três grupos de exigências financeiras diferentes: (a) um constituído
pelo global e euro players, empresas cotadas em bolsa e grandes empresas e algumas
médias empresas (que adoptarão as big IAS); (b) outro constituído pelas médias e
algumas pequenas empresas (que adoptarão as little IAS em que se tornarão
progressivamente as normas nacionais); (c) o grupo das pequenas e das micro empresas
(que adoptarão regras nacionais menos exigentes)».

De facto, embora haja toda a vantagem e necessidade de se adoptar um esquema básico


comum que convém ser respeitado para qualquer tipo de contabilidade, 6 há de facto
empresas que, pela sua complexidade ou pela sua estratégia, são mais exigentes do que
outras, em termos de necessidades informativas7. Não se pode meter tudo no mesmo
saco. As maiores exigências justificam-se e impõem-se, sobretudo, às empresas que têm
responsabilidades sociais.

1
Organização das Nações Unidas.
2
União Europeia.
3
Associação Internacional de Contabilidade e Federação Internacional de Contabilidade.
4
Federação Europeia dos Técnicos de Contabilidade.
5
ALVES L., in: “Eurocontas”, 1998, (julho).
6
Como veremos mais adiante, para a contabilidade analítica de gestão hoteleira, já há um modelo que se
impôs, naturalmente, na hotelaria internacional.
7
Há empresas mais complexas e importantes que até conseguem negociar, por vezes, em alguns países,
normas de contabilidade fiscalidade e auditoria (ALMEIDA M., “Eurocontas”,1998, Ago-Set).

54
E que modelos irão ser utilizados?

A contabilidade está mais avançada nos países de cultura anglo-saxónica e, em


particular, nos Estados Unidos.1
Assim, uma das vias para a normalização internacional seria a adopção directa das
United States General Accounting Accepted Principles (US GAAP)2, tal como aconteceu
nalguns casos em empresas europeias e japonesas.
Outra via seria a assimilação gradual das mesmas US GAAP, mas por via das IAS,
(solução que também aconteceu nalguns casos e que tem a vantagem de ter envolvido
grande número de países na sua elaboração, o que as tornou “politicamente aceitáveis”
para a generalidade dos países, e foi gradual (25 anos) e faseada).

Quanto às empresas, é evidente que política e economicamente existe maior


predisposição para a aceitação das normas internacionais de contabilidade, em lugar das
United States General Accounting Accepted Principles (US GAAP)3.

2.2.5-Novas questões que se colocam hoje à contabilidade

A única certeza dos tempos de hoje é a mudança. A mudança é o refrão obrigatório dos
tempos actuais. Nada está gravado em pedra. As estratégias raramente se desenrolam
como imaginamos. Atravessamos tempos muito efervescentes. Não há respostas seguras
para muitas perguntas de hoje. Podemos ajudar-nos com algumas perguntas e alguns
palpites, mas não há respostas certas. Nas organizações de hoje, o principal activo que
tem valor crescente é o da imaginação humana e da consequente inovação. O futuro
cria-se transformando as regras. É necessário desaprender muito do passado, para ser
capaz de encontrar o futuro4.

Será que esta efervescência também toca à contabilidade? A contabilidade futura


ocupar-se-á já de matérias qualitativas e passará a quantificar o que hoje é meramente

1
Como vimos anteriormente, foi primeiramente nos EUA e depois em Inglaterra, que se deram os
primeiros e grandes passos da investigação contabilística. No que respeita à hotelaria, a 1ª edição do que
designamos hoje por sistema uniforme nasceu nos EUA em 1925, com a designação de “A Uniform
System of Accounts for Hotels”. Vai hoje na 9ª edição (1996).
2
Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites dos Estados Unidos.
3
Cf. ALVES L., in: “Eurocontas”, 1998, (julho).
4
Ideias captadas de Peters T., «Em Busca do UAU», Lisboa, Bertrand, 1995.

55
qualitativo? Esta é a grande questão que se coloca cada vez mais à contabilidade como
instrumento, por excelência, medidor dos recursos e da gestão eficaz e eficiente dos
mesmos.

Nas últimas décadas, em que a competição aumentou extraordinariamente, é


particularmente notório, mas sem explicação económico-financeira, o facto de haver
organizações que perduram com sucesso e outras não, apesar de disporem de idênticas
características como: mercado, dimensão, tecnologia, estrutura, processos,
investimentos tangíveis e até, aparentemente, idênticos recursos humanos (quantidade,
média etária, habilitações académicas, etc.). A explicação reporta-nos para a dimensão
dos investimentos intangíveis, como: capital humano, liderança, estilo de gestão, cultura
da equipa, reputação, know how, investigação e desenvolvimento, marcas, patentes,
segredos comerciais. O valor deste manancial de riqueza não vem nos balanços, é um
dos activos mais valiosos das organizações, porque é inimitável e pode ser duradouro.
Por isso, os balanços não traduzem o valor das empresas. 1 Entramos numa era em que o
conhecimento é determinante para ter sucesso2. A vantagem estratégica baseada
eminentemente nas tecnologias, nos processos, no investimento e mesmo nos produtos
diferenciados é copiável, a curto prazo, deixando assim de ter a eficácia competitiva
inicial, mais tarde ou mais cedo. Logo, é importante, mas não basta, porque é facilmente
ultrapassável pelos imitadores. O que não é copiável, e dá vantagem competitiva
consistente à empresa, são os seus recursos intangíveis, o capital intelectual (produto da
conversão do conhecimento- nova matéria prima- em algo de valor) cuja fonte é o
capital humano a funcionar na empresa e que interage com o capital organizacional
(conjunto de bens, designadamente os imateriais, de capacidades, de saber colectivo
acumulado, de processos e de relacionamentos entre clientes internos e externos da
organização).

Assim, as pessoas, aquilo que fazem e como o fazem (comportamento) tornaram-se no


activo mais precioso das organizações, bem como aquilo que produzem, e a forma como
o fazem3. «Os activos intangíveis e competências de uma organização são mais
importantes, hoje em dia, para o sucesso futuro da empresa, do que os activos físicos,
tangíveis tradicionais»4.

1
Por exemplo, a General Motors, símbolo da era industrial e que possui activos tangíveis avultados, tinha,
a certa altura, uma capitalização de mercado da ordem dos 40 mil milhões de dólares. A Microsoft,
símbolo da era da informação e que possui relativamente poucos bens tangíveis, tem um valor de
capitalização de mercado da ordem dos 70 mil milhões de dólares. (Barchan, 1998, citado por Catarina A
Martins, in Revista de Contabilidade e Comércio, nº 229, vol LVIII, de Outubro 2001, pág. 75).
2
Sendo o conhecimento a matéria prima do capital intelectual, convirá ter presente a distinção entre
dados, informação e conhecimento. Os dados são simples medidas de algumas variáveis; a informação
são os dados organizados e estruturados; o conhecimento é o processamento da informação no nosso
cérebro (permitindo tirar ilações, fazer associações causa-efeito, tomar decisões). Por sua vez, o
conhecimento pode ser explícito ou tácito. O conhecimento explícito é o que é articulado e está à
disposição de cada um para ser ou não utilizado (aulas, livros, relatórios, mapas, etc); o conhecimento
tácito é desarticulado, subjectivo, não é visível a não ser pelos actos, é adquirido sobretudo pela
experiência (a intuição, as perspectivas, os sentimentos, os valores formados pela experiência); é o mais
importante; é a partir dele que se constroem os quadros de referência, a grelha de conduta do
comportamento e de avaliação/interpretação, para ajuizarmos as nossas percepções. Assim, esta grelha
formada pelo conhecimento tácito também limita o desempenho de cada um e, portanto, os resultados.
3
Na hotelaria, isto é cada vez mais assim, devido à crescente escassez de trabalhadores, à disputa e perda
fácil dos empregados competentes e capazes, à dificuldade do gestor em conseguir praticar políticas
eficientes que seleccionem e cativem esse património valioso (a selecção é estratégia, diz. Peters T.).
4
KAPLAN R. S. et al, Balanced Scorecard, Harvard Business School Press, Boston, Massachusetts,
1996.

56
Com efeito, há várias perspectivas estratégicas (que não as de carácter económico-
financeiro) que escapam à relevação digráfica, ou seja, à contabilidade, o que limita a
contabilidade stricto sensu, pelo que há necessidade de alargar os medidores de
informação de gestão a aspectos relacionados com os intangíveis (factores estratégicos
não financeiros).

Segundo Kaplan (1996), na era da forte concorrência, da mudança alucinante e da


informação em que vivemos, é indispensável definir os vectores críticos (critical
drivers) e dispormos de vectores de resultados (performance drivers) que nos permitam
um sistema de medição da gestão equilibrado e integrado. Ou seja, é necessário ter
dados e conhecimentos que reúnam não só indicadores financeiros como também não
financeiros. O mesmo é dizer que é necessário ter um sistema que meça os processos
críticos da gestão, porque a linguagem da gestão de uma actividade já não é só a
informação contabilística tradicional. As medições não podem ser apenas de carácter
financeiro, têm de ser também de carácter não financeiro. As de carácter financeiro
referem-se a activos tangíveis e medem objectivos e resultados de curto prazo. As de
carácter não financeiro referem-se a activos intelectuais e intangíveis e medem
objectivos e resultados de longo prazo.

Como diz Ferreira (1999), o histórico controle digráfico e pecuniário, base das
exigências das partidas dobradas, impôs a necessidade de dar expressão pecuniária,
financeira, a todas as aplicações dos recursos. Com a expressão financeira ou pecuniária
dada às diversas categorias de elementos patrimoniais, conseguiu-se o objectivo útil de
harmonização.

Porém, desde há algum tempo, está-se revelando insuficiente essa pura visão
quantitativa convencional. A informação contabilística tradicional, puramente
quantitativa, tornou-se notoriamente insuficiente. Carece-se, cada vez mais, de relevar e
de medir valores que antes se apreciavam sob perspectivas puramente qualitativas.
Assim, ocorrem novos visionamentos de realidades já actuais, como a contabilidade
ambiental, a “patrimonialização” dos recursos humanos, o processamento contabilístico
de bens livres que se tornam escassos. Valores que antes eram tidos como extra-
patrimoniais passam agora a configurar-se no património das empresas. Tudo isto exige
apuramentos e registos contabilísticos de custos, proveitos, resultados e patrimónios que
antes não se punha sequer a questão de serem quantificados ou objecto de
contabilização1.

Uma vez que a contabilidade, como expressão da empresa, adquiriu uma importante
dimensão social, mais cedo ou mais tarde, estes valores do capital imaterial irão passar a
ser relatados pela contabilidade, através de métodos digráficos e matriciais, de anexos às
contas ou de relatórios não quantitativos.

Em suma, a contabilidade tem de passar a relevar também os aspectos sociais e


sobretudo os aspectos imateriais, que são cada vez mais importantes, porque os aspectos
patrimoniais tradicionais têm cada vez menos expressão e peso, sobrelevando-se os
aspectos de investigação e desenvolvimento, de qualidade, de valorização das marcas,
dos recursos humanos, das competências, da cultura organizacional, etc.2

1
Cf. FERREIRA, R. F., in: “Eurocontas”, 1999, (Abril).

57
Sendo assim, a questão fundamental centra-se na necessidade que existe, actualmente,
de obter uma informação cada vez mais multifacetada, encarando diferentes
perspectivas. A profunda alteração das condições económicas e sociais e da própria
ciência social e económica obriga a que, na apreciação da gestão, se utilize uma
contabilidade que, adoptando procedimentos diversificados e novas técnicas de análise,
aprecie, em termos necessariamente multiformes, a realidade. «Muitos temas de
contabilidade estão carecidos de melhor atenção, mas sentimos existirem anseios de
progresso e prenúncios sérios nesse caminho. Aparecem estudiosos a privilegiar áreas já
em estudo e outros a desenvolver novas áreas»1.

Perante esta situação e o facto de não haver ainda um modelo objectivo e uniforme para
valorizar os intangíveis, têm sido experimentados alguns métodos, concretizados em
modelos, que são tentativas de avaliação e apresentação. 2 Também no âmbito da
uniformização contabilística, já estão a ser dados alguns passos importantes,
designadamente pelo IASC (NIC 38- Activos Intangíveis e o tratamento do Goodwill
definido na NIC 22- Combinação de Empresas) 3.

Certamente que as novas soluções que se vão propondo, para estes problemas, também
suscitam diversas ordens de dificuldade. Há que ter um espírito aberto e inovador,
investigar “tacteando”,4 ou adaptando, mas importa alcançar maior abrangência e, ao
mesmo tempo, objectividade e operacionalidade nos apuramentos e na apresentação da
informação aos diversos stakeholders.

Em suma, certamente que o futuro da contabilidade será de maior desenvolvimento e de


maior complexidade. A contabilidade vai-se complexificando, assumindo necessidades
operacionais de variada magnitude e utilizando vias interdisciplinares (estatística,
matemática, direito, fiscalidade, economia, sociologia). Seja como for, a informação
contabilística modernizada e considerada num sentido mais lato do que o tradicional
continua a constituir a disciplina privilegiada e essencial na boa aplicação da ciência às
práticas de gestão. A contabilidade continua a ser o instrumento que melhor pode avaliar
o delicado sistema de relações não só intra-empresa, como inter-empresas, instituições,
clientes, fornecedores, colaboradores, outros stakeholders e a comunidade em geral.
2
Em Maio de 1995, a Skania (empresa sueca de serviços financeiros e de seguros) teve uma ideia
revolucionária. Juntou um relatório sobre o capital intelectual da empresa, intitulado Vizualizing
Intellectual Capital, que se destinava a revelar o «valor escondido» que constitui todo o investimento
realizado pela empresa em: desenvolvimento dos recursos humanos, melhoramento do relacionamento
com clientes, optimização de processos horizontais, inovação, inclusivamente a falhada. Em Outubro de
1994, a revista Fortune publicou um artigo sobre este marco importante no reconhecimento desta
temática como válida por parte dos gestores de empresas. (Cf. MARTINS C. A., «O Valor dos Activos
Intangíveis e o Capital Intelectual», in: Revista de Contabilidade e Comércio, 2001, vol. LVIII, Outubro
2001, (229), pp. 63-90 e MAGALHÃES R., «Tecnologia e Conhecumento Organizacional», in: Revista
Portuguesa de Gestão, 2001, III série, ano 16, (4), pp. 26-27).
1
FERREIRA R.F., in “Eurocontas”, 1999, (Junho).
2
MARTINS C.A., «O Valor dos Activos Intangíveis e o Capital Intelectual» in: Revista de Contabilidade
e Comércio, 2001, vol. LVIII, (229), Outubro, pp.63-90, apresenta-nos dois considerados mais
pertinentes. O primeiro é O Monitor de Activos Intangíveis da CELEMI (empresa que vende software e
serviços de consultoria e cujo modelo se baseia em três áreas, que são consideradas os factores
determinantes de um sucesso continuado: “os nossos clientes”, “o nosso pessoal” e “a nossa
organização”). O segundo é O Modelo NAVIGATOR da empresa sueca SKANDIA (empresa de serviços
financeiros e de seguros que se se baseou em seis elementos: Missão, Quantificação, Liderança,
Tecnologia, Capitalização e Previsão).
3
Ibidem: pp. 73.
4
«Como trabalho? Tacteio!» (Einstein)

58
«Apenas estamos no limiar da primeira fase. Há muito ainda por fazer» (Ryan et al.
1992).

2.3-A contabilidade analítica de gestão

A contabilidade analítica é uma “exigência” para uma optimização da gestão, em


qualquer empresa ou organização1.

O empresário que não fundamenta as suas decisões na contabilidade não está em


condições de competir, vai ter dificuldade em reagir. Se os empresários não derem o
salto no sentido de fundamentarem as suas decisões em informação contabilística
adequada, não vão acompanhar o combóio da internacionalização da economia. As suas
empresas vão ter problemas, porque não basta ser-se um empresário que sabe tudo e que
tudo faz. Isso está ultrapassado. Ele tem de se apoiar em informação contabilística
adequada2.

É verdade que a contabilidade analítica de gestão fornece elementos à gestão que


também estão contidos na contabilidade geral e financeira (por natureza), contudo a
perspectiva e estrutura da informação é completamente diferente (por centros de
informação de gestão, por centros de responsabilidades ou por actividades).

Por enquanto, à generalidade das empresas, a nossa administração fiscal só exige uma
demonstração de resultados, por natureza. Por outro lado, mas apenas para as empresas
a partir de determinada dimensão, também uma outra rudimentar, por funções.
A Norma Internacional de Contabilidade (NIC) nº 3 parece não estabelecer preferência
entre os métodos de classificação dos custos por natureza ou por funções, uma vez que
se limita a considerar que a classificação por natureza é simples de aplicar nas pequenas
empresas e que a classificação por funções fornece geralmente melhor informação aos
utilizadores, pese embora o problema da afectação de certos custos.

Em Portugal, está, desde há muito, consagrada a elaboração e divulgação da


demonstração dos resultados segundo a classificação por natureza. A demonstração dos
resultados por funções está prevista a título facultativo, desde o POC de 1977, não
tendo, no entanto, a preparação e a divulgação habituais.

Contudo, em 1997, a Directriz Contabilística (DC) nº 20 (Demonstrações de resultados


por funções, Diário da República, 2ª série, nº 179, de 5/8/97) veio estabelecer que as
entidades abrangidas pelo POC que ultrapassem dois dos três limites referidos no artigo
262º do Código das Sociedades Comerciais 3 devem elaborar, além da demonstração dos
resultados por natureza, também uma nova demonstração dos resultados por funções.

«Assim, tais empresas ficaram com a obrigatoriedade de elaborar duas demonstrações


dos resultados que assentam em conceitos diferentes de classificação de proveitos e
custos. Ou seja, uma vez que a nossa escrituração contabilística é orientada pelas regras

1
2
Cf. CAIADO, Pires, in: “Eurocontas”-1998.
3
Os referidos três limites têm sido actualizados. Nesta altura (decreto regulamentar 343/98, de 6/11), são
os seguintes: 1.500.000 euros de activo, 3.000.000 euros de vendas líquidas e outros proveitos e uma
média de 50 trabalhadores.

59
do POC (influenciadas pela óptica jurídico-fiscal) não é possível extrair directamente
dela os dados para a nova peça contabilística. Além disso, tem termos com conteúdo
diferente».1

Apesar de tudo, este novo modelo de demonstração de resultados é o início da


apresentação de um conteúdo informativo muito relevante para ajudar os interessados
exteriores à gestão2 a avaliar e a perspectivar o desempenho das empresas. Além disso,
aproxima-nos mais da normalização internacional.

Um bom sistema de contabilidade de gestão é o adequado para processar dados


rapidamente, com rigor e com custos razoáveis e optimizar o serviço ao cliente (os
utilizadores da informação contabilística). Para isso, tem de ser bem estruturado, desde
os simples impressos e formulários, aos mapas e relatórios de informação de gestão,
sem esquecer que é sempre possível melhorar3. Administrativamente, o sistema deve
produzir informação que seja útil para o planeamento e seu o controle e para o apio na
tomada de decisões.

Os objectivos da contabilidade analítica de gestão ou interna estão muito relacionados


com a mentalidade e tipo de liderança, a missão, a estratégia e os objectivos da empresa
ou organização.

Muitas empresas organizam ou adaptam um sistema de contabilidade analítica de


gestão, utilizando três vias que as ajudarão a alcançar a sua missão e objectivos
previamente traçados. Essas três vias são:
 Delegar nos colaboradores o poder de tomar decisões sobre os recursos
postos à sua disposição. Para isso, servem-se do processo orçamental, o qual
tem por base a estrutura e as principais rubricas do plano da contabilidade
analítica de gestão;
 Uma vez que este tipo de contabilidade tem por missão dar uma informação
salutar que apoie as tomadas de decisão da actividade, esta contabilidade tem
de originar vários mapas resumo da informação, que são regularmente
distribuídos4. Uns como fazendo parte da informação de gestão corrente,
outros especialmente concebidos e elaborados para determinadas decisões
pontuais;
 Finalmente, um sistema de contabilidade analítica de gestão é usado para
avaliar e recompensar o desempenho das decisões tomadas por todos e cada
um dos responsáveis e grupos de trabalho5.

1
Cf. LÉRIAS G., in: “Eurocontas”, 1998.
2
Mencionamos especificamente os exteriores à gestão, no pressuposto de que os responsáveis pela gestão
têm contabilidade analítica onde dispõem de muito mais informação do que essa, só que é privada ou
interna.
3
Vem a propósito anotar, desde já, que o sistema uniforme de contabilidade hoteleira USALI (Uniform
System of Accounts for the Lodging Industry), nascido em 1926, tem sido periodicamente revisto e
melhorado e vai na sua 9ª edição (1996). Mais do que um plano de contas, é um manual com o conjunto
de mapas de informação analítica do negócio hoteleiro, por centros de informação de gestão, e com as
respectivas notas explicativas e princípios, para uma maior uniformização.
4
Uns diariamente, outros semanalmente, outros mensalmente, outros esporádica e pontualmente.
5
Tal é conseguido através do controle orçamental de cada departamento. Em algumas empresas, já existe
a política de distribuição de resultados, através de prémios de produtividade, anuais ou semestrais,
referenciados a objectivos orçamentais alcançados ou ultrapassados.

60
Assim, os objectivos da contabilidade analítica de gestão começam por ser a missão e os
objectivos mais gerais da empresa, os quais criam a necessidade de informação mais
detalhada e estruturada de determinada maneira, para o controle e a tomada de decisões.

Apesar de um hotel ser uma unidade de negócio única, ele é composto por diferentes
centros de resultados e vários centros auxiliares (que agrupam os custos indirectos)1. Por
isso, a gestão de um hotel exige mais informação do que a dada, normalmente, por uma
contabilidade geral e financeira (como o nosso POC), ou seja, mais do que um simples
balanço e demonstração de resultados genérica. Os gestores hoteleiros necessitam de
demonstrações de resultados por centros de informação de gestão, a fim de ponderarem
os proveitos e os custos, o desempenho de cada área de responsabilidade e o seu próprio
desempenho (da operação em geral), para poderem analisar os pontos fortes e fracos, as
possíveis causas e soluções correctivas.

2.3.1-Alguns desafios actuais da contabilidade analítica de gestão

Apesar de podermos considerar a contabilidade como uma ciência com regras e técnicas
relativamente estáveis, ela também tem muito de criatividade e, como vimos
anteriormente, mais do que nunca, ela tem de acompanhar estas mudanças e as novas
necessidades das empresas e da sociedade de hoje. Só assim ela cumprirá o seu nobre
papel de ser um instrumento insubstituível da gestão.

Um dos aspectos mais relevantes e problemáticos da contabilidade analítica de gestão é


a maneira de encararmos e tratarmos os custos e, de entre estes, muito especialmente, os
designados por custos indirectos. Ou seja, o problema da “afectação dos custos”.

2.3.1.1-Sistema tradicional do tratamento dos custos indirectos

São considerados indirectos os custos comuns aos vários centros de resultados (ou de
receitas), ou seja, aqueles custos que dizem respeito a mais do que um desses centros de
informação de gestão e que não podem dispor de uma base ou critério objectivo (e
portanto, uniforme) para a sua correcta afectação aos referidos centros.

A “contabilidade dos custos líquidos” começou por ser uma preocupação das grandes
empresas industriais (sobretudo nas indústrias mecânicas e siderúrgicas da Europa e
EUA), já no século XIX. Contudo, foi nos finais da década de 1920 que emergiu o
método de cálculo correlativo designado por «método das secções homogéneas», ou
seja, «repartição dos encargos indirectos reais (custo histórico) entre secções (que, em
geral, são centros de responsabilidade funcionais) cuja prestação pode ser considerada
como sendo homogénea (daí o nome do método) e é “consumida” pelos produtos ou
serviços comercializados»2. Este método generalizou-se amplamente e servia para
satisfazer o grande objectivo que era o de servir de base à fixação dos preços (pricing).

1
Isto tendo por base a filosofia e estrutura do Uniform System of Accounts for the Lodging Industry
(USALI), como veremos mais adiante.
2
LEBAS M., «Método ABC: Contabilidade por Actividades, ou Activity Based Costing, ou Contabilidade
à Base de Causas», in: 10 Instrumentos Chave da Gestão, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1999, 1ª
edição, p.234.

61
É assim que os sistemas tradicionais de contabilidade se baseiam no princípio de que os
produtos ou serviços consomem recursos ou custos. Por isso, nesta filosofia, todos os
custos, directos e indirectos, são absorvidos pelos produtos ou serviços. Nesta
perspectiva, se para os primeiros (directos) não existem dúvidas, para os segundos
(indirectos) há necessidade de engendrar um conjunto de critérios, mais ou menos
subjectivos, mais ou menos complicados e grosseiros de afectação.

Assim, orientando sistematicamente o custo para os produtos e serviços produzidos,


esses sistemas tradicionais têm como consequência o seguinte:

 Privilegiam sobretudo o “reporting” das consequências (dos factos passados)


das decisões dos gestores;
 Provocam a distorção desse “reporting”, porque alguns dos custos atribuídos
não aderem à sua verdadeira causa, ou seja, ao factor que esteve na base do
consumo do recurso e, consequentemente, do respectivo custo;
 Porque utilizando o princípio da “absorção” (imputação dos custos indirectos
aos produtos e serviços produzidos) leva a que se “descarreguem” nesses
produtos e serviços produzidos todos aqueles custos indirectos ou gerais, dado
que, pensa-se, “se existem, alguém tem de os suportar”;
 Provocam discussões desgastantes e improdutivas, geram a irresponsabilidade e
desmotivação nos gestores que acabam numa atitude passiva.

Enfim, esvaziam uma grande parte do papel e interesse da contabilidade analítica como
instrumento de gestão, designadamente no que diz respeito à análise de desempenho.

A década de 1950 trouxe dos EUA (com as «Missões de Produtividade») uma nova
visão da contabilidade, já com a preocupação de servir de ajuda à tomada de decisão
(contabilidade em custos-padrão, contabilidade orçamental, direct costing, etc.).
A década de 1980, diz Lebas (1999), abre uma nova era na contabilidade de gestão,
como consequência de quatro fenómenos independentes:

 A introdução do comando numérico e da informática na produção;


 O desenvolvimento das actividades de serviços na economia e no próprio
interior das empresas;
 A tomada de consciência de que custo líquido e preço não estão ligados e que,
portanto, a gestão dos custos, por um lado, e a gestão do valor apreendido pelo
cliente, por outro, são os determinantes da rentabilidade da empresa;
 O desenvolvimento das abordagens “Qualidade Total” e “Em Tempo Útil” (just
in time), que promove a análise das causas, tanto na busca de prevenção dos
incidentes (avarias, defeitos)1 como da criação da qualidade.

Apesar disso, Azevedo Rodrigues (1992), diz que, de um modo geral, os sistemas de
informação da contabilidade analítica de gestão não têm evoluído muito (pelo menos
entre nós). As metodologias, regras, princípios e procedimentos mantêm-se
praticamente intactos, desde há algumas décadas. «O que se ensinava nas décadas de
60/70, continua a ensinar-se e a praticar-se na década de 90». Muitos profissionais da
contabilidade e do ensino da mesma ainda repetem os esquemas tradicionais com um

1
A causa de um efeito pode muito bem não se situar no mesmo sítio em que este é detectado devido à
transfuncionalidade. A ideia de transfuncionalidade e de rede de processos foi reforçada com o conceito
de “cadeia de valor” introduzido por Porter, em 1982. Foi esta evolução que conduziu ao CBA.

62
automatismo e um à vontade preocupantes. É preocupante não apenas devido às suas
apatia e cegueira face ao contexto bastante diferente, mas também pelas consequências
que podem resultar para o mundo empresarial, não só para a cultura organizacional,
como também quando utilizados como suporte à definição das suas políticas e
estratégias.

Em suma, esta maneira bastante inadequada de tratar os custos indirectos, ainda


perdura. Para além de ser complicada, grosseira, laxista e desmotivante, pode ter
repercussões bastante nefastas nas decisões e nos resultados das empresas utilizadoras,
uma vez que o seu peso, relativamente ao total de custos, é bastante significativo.

Então, torna-se bastante claro que, a insistência no cálculo dos custos líquidos dos
produtos ou dos serviços, para além de complicada, grosseira, irrealista, encobre a falta
de controle da causa da existência destes custos. Em vez deste método que permite
apenas constatar acções passadas, é mais interessante compreender os custos induzidos
pelo funcionamento da empresa, ou seja, os que decorrem da maneira de fazer, do que
as pessoas fazem realmente na organização. Assim, chegamos àquilo que os autores
americanos designam por Activity based Accounting, de onde deriva o Activity Based
Management.

2.3.1.2-Os sistemas de preços de transferência interna

O processo de “preços de transferência” são uma tentativa de resposta para o problema


da afectação dos custos. É um dos processos mais experimentados, mas, nem por isso
menos complexo, de valorizar os fluxos de trabalho entre sectores, no interior de uma
mesma organização. É este “mercado interno” e as transacções de bens e serviços entre
os seus segmentos que lhe conferem razão de ser.

O papel fundamental dos preços de transferência interna, nos sistemas de controle,


reside no seu contributo para motivar os gestores dos centros de responsabilidade e
avaliar o desempenho quer do centro prestador (fornecedor), quer do centro utilizador
(cliente), quer ainda dos seus responsáveis.

Há diversas abordagens teóricas deste tema (preços de transferência) que permitem


entender as suas determinantes. Cada uma dessas teorias acrescenta conhecimentos
sobre o papel, a natureza e a evolução dos sistemas de preços de trensferência.
Também há diversos métodos para a determinação desses preços de transferência, de
acordo com os objectivos a que se propõe.
Não é nossa intenção desenvolver, aqui, nem as teorias nem os métodos referidos.
Outros já o fizeram, pelo que não constitui novidade1. Tão somente pretendemos fazer
um breve apontamento sobre este tema e, assim, chamar a atenção para o mesmo, dado
permanecer em aberto e estar intimamente ligado à contabilidade analítica de gestão.

Segundo Coelho (2000)2, o estudo mais antigo que se conhece sobre os preços de
transferência data de 1956 e deve-se à National Association of Accountants (NAA),

1
Cf. COELHO M.H.M., «Os Preços de Transferência», Revista de Contabilidade e Comércio, 2000, vol.
LVII, (225) Julho; ECCLES, R., «The Transfer Pricing Problem: A Theory for Practice», Lexington,
MASS, 1985; SPICER, B. H., «Towards an Organizational Theory of the Transfer Pricing Process»,
Accounting, Organizations and Society 1988, 13 (3), p. 303-321.
2
Ibidem.

63
sediada nos Estados Unidos da América. Trata-se de diversos artigos teóricos que
preconizam que se junte uma margem ao custo de produção, pelo que as divisões são
encaradas como centros de resultados.

Na década de 60, verificou-se uma grande tendência para a descentralização e para a


estruturação das organizações em centros de resultados. Consequentemente, ao nível
interno (em empresas da América do Norte e da Europa), desenvolveu-se a política dos
preços de transferência.

Na década de 70, dá-se a emergência progressiva da expansão das multinacionais norte-


americanas que se servem deste sistema não só para melhor controlar e analisar o
desempenho dos respnsáveis das filiais como também para minimizarem os impostos
globais nas transferências internacionais. Este facto, aliado ao desenvolvimento da
contabilidade analítica como instrumento de gestão (abordagem económica da
informação) e da estratégia, faz com que se tenha assistido ao início de uma proliferação
da literatura sobre este tema.

Mas foi nos anos 80 e 90 que o estudo dos preços de transferência conheceu um
desenvolvimento muito significativo, não só ao nível académico, como empírico,
sobretudo graças à evolução rápida das novas tecnologias da gestão da produção1. A
evolução das novas tecnologias também tem contribuído para a nova era da
contabilidade de gestão a que tem desembocado, mais recentemente, em novos temas,
de que destacamos o sistema de Custeio Baseado nas Actividades (CBA).

Emmanuel e Mehafdi (1994) dizem que, na prática, foram as empresas norte-


americanas as pioneiras neste tema, mas que continuam a ser escassas as evidências
empíricas disponíveis2. No que diz respeito à Hotelaria, podemos testemunhar que,
nesta data, a referida escassez é por demais evidente, mas há indícios de que uma
contabilidade analítica de gestão hoteleira ainda não é prática corrente nem
generalizada.

2.3.1.3-CBA - a nova óptica e o novo sistema de tratamento


contabilístico dos custos indirectos

O sistema tradicional anteriormente descrito, tinha como motivação principal o cálculo


e fixação do preço (“pricing”).

No contexto actual em que os negócios se inserem, à contabilidade analítica como


instrumento de gestão interessa, sobretudo, avaliar as margens de contribuição de cada
negócio (bem ou serviço da gama da empresa) para o resultado global.
Como refere Rodrigues (1992), a questão do “pricing”, hoje, tem de ser vista de uma
maneira completamente diferente. Antes, o preço de venda era fixado em função do
preço de custo, acrescido da margem. Hoje, é o mercado (a procura e a concorrência) o

1
Cf. EMMANUEL C. e MEHAFDI M., «Transfer Pricing», Academic Press, 1994.
2
«A escassez de informação sobre a prática das empresas na década actual implica que não haja
possibilidade de saber qual o impacto das tecnologias de produção (avançadas) na concepção e
implantação de sistemas de preços de transferência e o seu futuro, em contexto CBA...». (EMMANUEL
C. e MEHAFDI M., «Transfer Pricing», Academic Press, 1994, citado por COELHO, M.H.M., «Os
Preços de Transferência», Revista de Contabilidade e Comércio, 2000, vol. LVII, (225) Julho.

64
principal factor no processo de fixação dos preços3. Isto obriga a que as empresas
tenham de ser mais competitivas, pelo que há que optar por modelos que levem o gestor
a actuar sobre a utilização e racionalização dos recursos, ou seja, apostar na criação de
valor “na própria cadeia de valor”, uma vez que o mercado tende, cada vez mais, a
rejeitar o pagamento das ineficiências do prestador .

Para isso, nasceu, nos finais da década de 80, nos Estados Unidos da América, um novo
modelo, designado por Activity Based Costing (ABC), cuja tradução que propomos é de
Custeio Baseado nas Actividades (CBA)2. É um conceito relativamente recente que
assenta no seguinte princípio:

“as actividades consomem recursos (custos) e os produtos (e serviços) consomem


actividades”.

A partir deste raciocínio, uma vez que os custos resultam da utilização dos recursos,
então, primeiramente, devem atribuir-se os custos às actividades e, só depois, estas aos
produtos ou serviços. É que se os custos são afectados directamente aos produtos ou
serviços (sistema tradicional de “absorção”), o sistema de informação não alerta o
gestor para as causas dos custos (que são as actividades desenvolvidas), mas para as
suas consequências, uma vez que o custo do produto ou serviço resulta da forma como
os gestores gerem os seus recursos.

Daqui resulta uma nova cadeia de valor do preço de custo dos bens e serviços:

Recursos Custos Actividade Bens e


Serviços

Contudo, segundo Lebas (1999), o aspecto inovador de CBA (e, para alguns,
revolucionário) não está tanto num novo método de fazer contabilidade analítica de
gestão (e de conhecer melhor os custos líquidos), mas está, sobretudo, em duas novas
ópticas importantes que se desenvolveram sob o nome de ABM-Activity Based
Management (Gestão Baseada nas Actividades). Essas novas ópticas são:
 O processo de análise dos custos parte do cliente e não da observação dos
custos, isto é, da construção e não da constatação dos custos;

3
A decisão do “pricing” tem de considerar, entre outros factores, a inter-relação dos seguintes princípios
determinantes do preço: a procura, na sua dimensão; a concorrência, na sua força e agressividade; o
posicionamento do produto no mercado.
2
LEBAS M., in: «Método ABC: Contabilidade por Actividades, ou Activity Based Costing, ou
Contabilidade à Base de Causas», in: «10 Instrumentos Chave da Gestão», Lisboa, Publicações Dom
Quixote, 1999, 1ª edição, p.234, prefere a desgná-la por «Contabilidade ABC» ou «Contabilidade à base
de causas». Nas pp.236-127, justifica dizendo que a tradução da palavra “activity” (do termo
ABC-“Activity Based Costing”) pela palavra “actividade” não foi feliz, porque esta tem uma variedade de
sentidos, sobretudo no domínio da economia e da empresa. Assim, na medida em que, neste contexto,
uma “actividade” é uma maneira de fazer algo, um conjunto encadeado de tarefas, para atingir um
resultado (atributo realizado de bem ou serviço que satisfaça o cliente) e, portanto, é vista como sendo a
causa da existência dos custos, prefere traduzir a designação de “Activity Based Costing” por
«Contabilidade à Base de Causas». Além disso, acrescenta este autor, desta maneira, não se liga o método
ABC assim compreendido, à noção de cálculo de custo líquido que estava implícito nos primeiros
trabalhos americanos sobre a “Activity Based Costing”, dado que a palavra “costing” remete aqui para
«cálculo do custo líquido» que, como já vimos, é uma outra visão.

65
 Uma visão da empresa como rede de processos que põe todos os colaboradores a
trabalhar interdependentemente (fornecedor-cliente).

A abordagem do CBA parte dos clientes e do papel das empresas na satisfação das
necessidades que eles exprimem. Ao contrário da visão tradicional, aqui, os custos já
não são considerados como uma «fatalidade» que é necessário ligar a um bem ou
serviço, cuja venda vai gerar uma receita que cobrirá os custos e deixará uma margem
de lucro. Como diz Lebas (1999), os custos são considerados como resultado tanto de
decisões estratégicas relativas à oferta aos clientes, como de decisões relativas às
actividades e aos processos a pôr em prática para concretizar esta oferta. O desempenho
e a rentabilidade são o resultado das acções; os custos são apenas o reflexo destas
últimas. Portanto, os custos começam por ser geridos, a priori, na fase de definição e
concepção do produto (caracterização, atributos) e, em seguida, pela escolha de
processos apropriados para os produzir. Segundo este autor, 60 a 75% dos custos que
um produto ou serviço consumirá ao longo da sua vida estão já fixados no final do
período de concepção e de industrialização, enquanto que, nessa data, apenas uma dada
percentagem dos custos totais do ciclo de vida do produto ou serviço foi efectivamente
realizada. Logo, a gestão do desempenho da empresa não se faz através do
conhecimento do custo líquido (que chega muito tarde), mas através da preparação e da
avaliação das decisões relativamente aos atributos oferecidos, dado que estes
condicionam os processos que deverão ser utilizados para os criar. Isto faz com que esta
óptica seja «uma verdadeira revolução cultural», revolução essa que se estende à da
representação organizativa, em rede de processos ou de actividades transfuncionais (em
vez de centros de responsabilidade hierárquicos desgarrados). Ou seja, é através da
cooperação dos actores entre si que o valor é criado, de modo eficiente, para o cliente
(com o consumo de menores recursos possível). Além do responsável vertical, há os
responsáveis horizontais (de processos) que garantirão que cada um coopere
eficazmente para a melhor realização possível da finalidade da actividade. O que é novo
no CBA, diz Lebas (1999), é podermos reconhecer as actividades como locais de
pilotagem1, utilizando indicadores muitas vezes não financeiros. Ele permite separar as
actividades (que geralmente se passam num centro de responsabilidade) dos processos
que constituem os seus agrupamentos transversais2 .

A lógica do CBA põe em evidência o facto de que a causa da existência de um custo não
se encontra, muitas vezes, onde o custo é captado (caso de muitas reparações).

As perguntas do método tradicional das “secções homogéneas” (centrado no cálculo do


custo líquido) eram: «O quê?» e «Onde?». O método CBA tem subjacente outras
interrogações mais pertinentes, que se colocam antes que os dados possam ser
acumulados: «Porquê?» e «Para quê?». Mais pertinentes porque são relativas à
causalidade do consumo (porquê realizar estas actividades? Sendo justificadas,
poderiam ser realizadas de um modo mis eficaz e eficiente?) e à finalidade deste
consumo (são realmente necessárias?)3. Estas perguntas são a porta de entrada naquilo

1
No sentido de que aquilo que as pessoas fazem e como o fazem é que é preciso gerir.
2
Geralmente, um centro de responsabilidade participa em várias actividades, pelo que não é mais
homogéneo ou mono-actividade. Assim se compreende porque deixa de ter sentido, nesta filosofia do
CBA, falar-se em “contabilidade por secções homogéneas”.
3
Tentar compreender o porquê das coisas é o elemento fundamental. Nada do que as pessoas fazem
realmente numa empresa tem uma resposta simples à pergunta «porquê?» (cf. Lebas, in obra citada, p.
271).

66
que se designa por “engenharia organizativa” 1 e levar o gestor a interrogar-se sobre as
suas opções essencialmente estratégicas, já que responder a estas questões implica
definir o que se quer que a empresa seja ou faça, colocando-se, depois, a questão do
funcionamento eficaz e eficiente dos processos e das actividades. Em seguida, compete
a cada empresa (e sector) escolher os indicadores mais apropriados (indicadores não
financeiros de desempenho e indicadores financeiros) para avaliar o funcionamento dos
processos que alimentam os painéis de bordo e que permitem tomar as medidas
correctivas, no sentido da melhor satisfação do cliente.
Isto significa que o conhecimento do custo líquido de um bem ou serviço é, aqui,
secundário, enquanto o controle dos custos, a priori, se torna primordial.
Deste modo, chegamos a uma «cadeia de causalidade» que Lebas (1999) resume do
seguinte modo:

 Os clientes causam os produtos;


 Os produtos são cabazes de atributos;
 Os atributos são criados por processos;
 Um processo é composto por actividades;
 Uma actividade é uma sequência ordenada de tarefas;
 A tarefa é que é a consumidora dos recursos, ou seja, dos custos.

Nesta óptica, qualquer custo é visto, primeiramente, como consequência de uma acção e
são apontadas como principais causas possíveis do aparecimento dos custos as
seguintes:

 O volume comercializado ou produzido (na óptica tradicional era visto como a


única causa);
 A complexidade dos produtos ou dos processos;
 Os desperdícios de recursos;
 As relações com os fornecedores;
 O processo de criação dos bens ou serviços;
1
A “engenharia organizativa” é, pelo menos, tão importante como a condução, diz Lebas (1999). Trata-se
de um método de construção da empresa e da sua estratégia. Na engenharia organizativa distinguem-se
quatro etapas que funcionam em círculo. São elas: 1-Compreender inicialmente o projecto e modelizá-lo
progressivamente, com a sua vivência. 2- Formular a estratégia (que é a etapa mais importante e que
consiste em classificar os processos e as actividades em quatro categorias: as actividades essenciais que
condicionam a sobrevivência, as actividades principais que acrescentam valor do ponto de vista do
cliente, as actividades secundárias que não implicam perda de vantagens concorrenciais, as actividades
que não acrescentam valor do ponto de vista do cliente). 3-Avaliar a estratégia, dispondo de meios que
permitam saber se se tem bom desempenho nos processos e actividades que se decidiu manter. 4-
Identificar e tomar as acções apropriadas para melhorar o desempenho. (cf. Lebas, in obra citada, pp. 256-
262).
A fase da avaliação estratégica é das mais importantes para a gestão. Nela, o gestor mune-se dos meios
para avaliar se a sua empresa gere os seus processos de maneira eficaz (em referência aos objectivos e à
empresa referência (benchmark). Interroga-se sobre o nível dos serviços prestados aos clientes, sobre as
cuasas da existência dos custos (indutores de custos), sobre a possibilidade de agir sobre essas causas,
sobre a análise de tendências, sobre a comparação com os melhores, sobre a reinvenção de processos
(reengenharia de processos para satisfazer o cliente).
Uma vez construído um produto e serviços com um bom desempenho, isto é, bem adaptados ao cliente, é
então altura de se fazer a análise dos custos. Note-se que esta análise não está centralizada no custo
líquido dos bens e serviços (sistema tradicional), mas sim na tomada de decisão de gestão. O custo é
sempre o reflexo das decisões tomadas. Qualquer acção sobre os custos passa por um trabalho sobre os
processos e as actividades. Neste contexto, a contabilidade dos custos líquidos vem «por acréscimo»,
porque, como diz Lebas (1999), não é aí que se encontram os verdadeiros ganhos ligados ao método
CBA.

67
 A manutenção de um produto no catálogo dos produtos;
 As escolhas estratégicas relativamente ao nível de valor que a empresa decide
incorporar no produto;
 A escolha dos canais de distribuição ou do número destes;
 A escolha da localização das intalações;
 A escolha da forma de organização da empresa;

A partir do momento em que se reconhece a variedade das causas possíveis da


existência do custo, deixa de haver custos indirectos, ou seja, todos os custos são
directos, relativamente à sua causa. Como diz Lebas (1999), a distinção
directo/indirecto é apenas uma maneira disfarçada de se dizer: há custos cuja causa
conheço (os directos, causados pelo volume de um produto produzido e comercializado)
e outros, cuja causa desconheço (os indirectos ou comuns, a que está implícita uma não
responsabilidade, que é o grande ponto fraco desta modalidade de agrupamento de
custos).

Poderá parecer bizarro, mas uma das grandes vantagens do CBA está na ênfase que dá
às actividades indirectas. Ele procura optimizar o sistema de custeio, orientando a
atenção dos gestores para as verdadeiras causas ou factores geradores de custos, que são
as actividades.1 A performance da empresa dependerá exactamente da forma ou eficácia
como essas actividades forem desempenhadas. Daí o dizer-se que o CBA orienta os
gestores a «criar valor na própria cadeia de valor da empresa».

Em suma, o grande objectivo do sistema CBA é demonstrar e evidenciar como estão a


ser geridas as actividades de apoio ou auxiliares e em que medida os produtos ou
serviços consomem ou utilizam esses recursos.

Considerado isoladamente, este é um objectivo muito interessante. Mas quais as suas


implicações práticas?

Para a aplicação deste sistema de custeio, é necessário o seguinte:

1º- Definir e destrinçar as várias actividades da empresa;


2º- Definir e destrinçar os vários recursos associados a cada actividade;
3º- Identificar as respectivas unidades de medida e apurar os respectivos custos
unitários;
4º- Apurar os produtos ou serviços que utilizam essas actividades e determinar
os respectivos níveis de utilização, a fim de obter os custos relevantes desses
produtos ou serviços.

Portanto, o CBA considera que os “objectos de custo” são as actividades desenvolvidas


no “back office”2, as quais devem ser identificadas e medidas, para serem imputadas em
função da sua utilização.
Deste modo, dizem os teóricos do CBA, é possível imputar os custos indirectos aos
produtos ou serviços em função dos recursos consumidos, numa base mais fidedigna e,
assim, avaliar o custo das actividades, ou apurar os custos mais realisticamente.
1
Entendidas, como vimos anteriormente, como maneira de realizar algo. Portanto, um encadeamento ou
conjunto de tarefas executadas (e que combinam e consomem recursos materiais, financeiros e humanos),
para atingir resultados ou realizações. Essas tarefas (actividades) são ordenadas em «processos» mais
agregados.
2
Centros auxiliares ou de apoio

68
Assim, o sistema de custeio CBA permite obter informação sobre a maneira como os
gestores estão utilizando e gerindo as actividades e, por arrastamento, os recursos, pelo
que, dizem, é mais adequado como instrumento de apoio à decisão e controle interno.
Por isso, intimamente relacionado com este conceito está uma nova maneira de encarar
a organização que se designa por Gestão Baseada nas Actividades (GBA) e que não
pretendemos aqui aprofundar.

Pelo exposto neste resumo teórico, facilmente se chega conclusão que, de acordo com a
teoria do CBA, o conceito e divisão dos custos em directos e indirectos perde muito o
seu sentido, uma vez que todos os custos são atribuídos a determinadas actividades da
empresa.

Segundo Rodrigues (1992), também perde significado a distinção entre custos fixos e
variáveis, porque, numa lógica de actividades, os custos existem porque as actividades
são realizadas, ou seja, porque se tomam decisões para a utilização de certos níveis de
recursos.

Para além do parecer crítico que apresentaremos no final deste ponto, não resistimos,
desde já, a fazer um comentário. Podemos considerar pacífica a ultrapassagem da
destrinça entre custos directos e indirectos, restando, por um lado, o problema da
dificuldade da sua operacionalidade, sobretudo para as pequenas e médias empresas,
pelas razões que veremos mais adiante e, por outro lado, o problema da sua
compatibilização com o objectivo muito importante e desejado que é a uniformização,
de que resultam os indicadores standard para uma actividade ou sector e a consequente
possibilidade de se fazerem comparações.

Já não consideramos pacífica a opinião de que perde significado a distinção entre custos
fixos e variáveis, porque há determinados custos (ditos irreversíveis) que, depois de
serem assumidos, têm de ser suportados, quer por motivos éticos e humanos, quer por
motivos legais e de mercado, mesmo que o nível da respectiva actividade tenha
diminuído ou mesmo cessado (a título de exemplo, basta pensar na actual lei geral do
trabalho que vigora em Portugal...1 ou nas amortizações).

Portanto, é possível transformar todos os custos em directos, designadamente os fixos,


mas, infelizmente, os custos fixos continuam uma realidade que, no caso da hotelaria, é
uma realidade bem penosa, devido às suas características, designadamente ao contraste
com a sazonalidade.

Voltando à análise do CBA, vejamos o que diz A. Rodrigues (1992): «o princípio da


contribuição deve sobrepor-se ao da absorção, por forma a podermos identificar em que
medida os actos e decisões de gestão contribuem ou não para os objectivos da
organização. Sendo assim, o CBA apresenta-se como um instrumento de apoio à
estratégia, o que raramente era conseguido nos modelos tradicionais. Tal é verdade
porque a definição estratégica leva à definição de planos de acção, por forma a se
atingirem os objectivos estratégicos ora delineados. Esses planos de acção não são mais
do que a identificação das actividades (combinação de recursos materiais, humanos,
financeiros, etc.) necessárias para a realização desses objectivos».
1
Que não tem a flexibilidade que tem nos Estados Unidos da América, onde, por isso mesmo, não
constitui, como entre nós, um custo fixo (pelo menos durante o período em que vigora o contrato).

69
Assim, o sistema do CBA garante a ligação entre o controle e a estratégia da empresa.
Como?
 Denunciando as actividades que são estrategicamente relevantes e as que
representam apenas desperdício de recursos;
 Identificando as actividades com valor acrescentado 1 e as actividades sem valor
acrescentado, que devem ser reduzidas ao mínimo ou eliminadas;
 Possibilitando a identificação das actividades principais (core activities) 2 e das
actividades auxiliares (support activities)3.

Enquanto os sistemas tradicionais de tratamento e apuramento dos custos se preocupam


apenas com a sua medida financeira, isto é, relatórios e mapas resumo da exploração
expressos em termos monetários, o sistema CBA, para além disso, preconiza que as
actividades sejam medidas também pelos factores tempo e qualidade. Isto é importante,
porque reduzir certos custos pode significar perdas na qualidade, tendo de, por
consequência, contrariar a estratégia. A curto prazo, isso pode beneficiar a performance
financeira, mas, a médio/longo prazo, prejudicar a competitividade e,
consequentemente, a performance económica e financeira.

Por outro lado, enquanto os modelos tradicionais privilegiam o apuramento de custos


numa lógica funcional (por secções, departamentos, etc., trabalho feito em gabinete por
“especialistas”), o CBA tem uma perspectiva interfuncional, ou seja, a implementação
deste sistema tem de ser realizado por equipas multifuncionais, o que leva a uma maior
aproximação àquilo que o gestor e a organização fazem, facilita melhor a identificação
das eficiências ou ineficiências, questiona a organização taylorista, privilegiando as
ligações operacionais em vez da hierarquia funcional.

Resumindo, há duas razões para a escolha do sistema CBA:

a) Uma vez que as actividades são responsáveis pela utilização dos recursos, é
necessário quantificar o custo dessas actividades;
b) Facilita a fixação e realização dos objectivos bem como a melhoria da
competitividade e, consequentemente, da performance da empresa, porque
orienta a atenção dos gestores para a gestão das actividades. Como?

 Eliminando desperdícios (actividades sem valor acrescentado);


 Melhorando o desempenho das actividades de valor acrescentado;
 Melhorando a avaliação dos produtos ou serviços e identificando o ciclo
de vida;
 Melhorando a qualidade continuamente;
 Apoiando a tomada de decisões, ao identificar as causas dos consumos de
recursos (geradores de custos) e não as suas consequências (custo dos
produtos ou serviços);
 Melhorando a eficiência dos métodos de gestão, ao simplificar as
actividades.

Quadro comparativo entre o sistema sem CBA e o sistema com CBA:


1
As que contribuem, efectivamente, para “a criação de valor da empresa”.
2
As que contribuem directamente para a missão da empresa.
3
As que apoiam a realização das actividades principais.

70
Características Sistema sem CBA Sistema com CBA

Distribuição dos custos indirectos Usa o critério de absorção, com bases Não usa o critério de absorção, mas
grosseiras e discutíveis, provocadoras de contribuição. Identifica as
de distorções por falta de relação de actividades usadas na produção de
proporcionalidade bens ou serviços e atribui os seus
custos a quem efectivamente os
provoca, pelo que a dualidade
“directos - indirectos” perde muito do
seu significado.

Proporcionalidade dos custos Os produtos ou serviços de maior Os produtos ou serviços são onerados
indirectos volume são os onerados com maiores pela quantificação do consumo dos
custos recursos associados às respectivas
actividades.

Ciclo de vida do bem ou serviço Não tem em conta o ciclo de vida dos As preocupações do ciclo de vida
bens ou serviços sobrepõem-se às do exercício
económico.

Os custos são os recursos consumidos Identifica as consequências e não as Faz a quantificação do consumo dos
pelas actividades causas dos custos. recursos pelas actividades, pelo que
Não dá informações que retratem, informa dos elementos sobre os quais
com realismo, o impacto no consumo é possível actuar para melhoria do
de recursos das decisões ou desempenho.
alternativas escolhidas. Permite identificar as causas e não as
consequências dos custos, pelo que é
mais útil ao gestor e para a melhoria
da rentabilidade da empresa.

Expressão da informação Preocupa-se apenas com a expressão Para além dos aspectos monetários,
financeira (monetária) preocupa-se também com os factores
tempo e qualidade da prestação do
serviço.

Princípio base do apuramento dos Os produtos e serviços consomem As actividades consomem recursos e
custos recursos (custos) os produtos e serviços consomem
Os custos totais (directos e actividades.
indirectos) deverão ser absorvidos A atribuição do custo ao produto é
pelos produtos ou serviços feita de acordo com o nível de
actividade utilizado.

Gestão das actividades Não permite obter informação sobre Identifica as actividades e os seus
as actividades (elementos) geridas, geradores de custos, pelo que apoia
pelo que não ajuda os gestores a melhor as decisões e o controle
racionalizar os custos e a tomar as interno.
melhores decisões.

Interdependência entre as actividades Não retratam a interdependência Identifica e permite compreender os


(interfuncionalidade) entre as actividades correlacionadas. inputs e os outputs das actividades, o
O apuramento de custos é feito numa que proporciona uma visão mais
óptica funcional e burocrática. global e integrada do processo
empresarial

Mapa resumo elaborado pelo autor

Este quadro resumo visa tornar perceptível o enorme interesse do questionamento, por
parte do sistema CBA, do sistema de contabilidade analítica de gestão tradicional (total

71
costing) e esse questionamento é pertinente, como facilmente se depreende deste quadro
resumo. O problema é que a passagem da teoria à prática, nomeadamente para as
pequenas e médias unidades, não se está revelando conclusivo. Quantas empresas o
estão utilizando, mesmo considerando só as que estão já sensíveis à importância da
contabilidade analítica de gestão? Quais as que que terão condições de levar a cabo este
sistema, satisfazendo, de uma maneira económica, os requisitos de uma gestão útil,
anteriormente referidos (atempada, credível, comparável, compreensível, relevante,
económica)? Como começámos por dizer no início deste ponto, esta teoria é
relativamente recente. Está ainda a ser objecto de estudo e investigação. Por isso e pela
sua dificuldade prática, ainda está pouco implementada, designadamente na hotelaria
portuguesa, que é um sector que conhecemos suficientemente bem, para o podermos
afirmar.

Tanto quanto sabemos, esta é uma teoria que partiu dos teóricos e é muito interessante 1.
Contudo, pelo que nos é dado a conhecer pela história da investigação da contabilidade
de gestão, até princípios da década de 80, havia um fosso entre a teoria e a prática, o que
levou os teóricos a explorarem mais a natureza da prática da contabilidade de gestão e a
uma mudança na metodologia de pesquisa, que passou a observar , analisar e a explicar
as práticas da contabilidade de gestão, para gerar teorias que explicassem essas práticas.
Será que os teóricos desta matéria estão a partir da prática ou estão a criar mais um
fosso? Parece-nos uma questão relevante e que exige muito mais desenvolvimento e
pesquisa. Desta feita, não é esse o nosso objectivo.

Posto isto, não nos queremos alongar mais, por agora. 2 Teoricamente é um sistema
muito atractivo, diríamos mesmo ideal, para a gestão, mas “o óptimo é inimigo do
bom”, diz o ditado. Pelo isso, além dos aspectos críticos que já apresentámos no
decorrer deste ponto, achamos que, na prática, tem alguns inconvenientes e, sobretudo,
porque nos parece de viabilidade prática bastante difícil, designadamente nos hotéis
portugueses que são, predominantemente, de pequena e média dimensão. Para além
disso, exige muita organização, muito envolvimento, uma cultura organizacional
bastante avançada, a começar pelos gestores e administradores e dificulta ou põe mesmo
em causa o objectivo primordial da uniformização, com todos as consequências
importantes que daí advêm.

Na opinião de A. Rodrigues (1992), o CBA tem vindo a ser reconhecido de grande


interesse quer pelos académicos, quer pelos organismos profissionais, quer pelos
próprios gestores. Contudo, ele próprio também diz: «alguns autores recomendam
prudência na implementação deste novo sistema; outros recomendam passos
progressivos (...) o interesse e envolvimento dos gestores continua a ser o factor chave
desta implementação...».

Por sua vez, Lebas (1999) diz que a própria linguagem CBA «ainda não está
estabilizada e encontramos uma variedade de termos aos quais é necessário prestar

1
Outras interessantes houve que foram aventadas pelos teóricos, mas que pouco mais foram de que
teorias académicas (análise volume custo benefício, modelos de estimativa, etc).
2
Voltaremos a este assunto ao apresentarmos a teoria do sistema uniforme de contabilidade analítica de
gestão para a hotelaria contido no “Uniform System of Accounts for the Lodging Industry”, o qual, na sua
última edição (9ª, de 1996), apresenta uma solução de compromisso, mas contingente, para esta questão.

72
atenção, porque o seu sentido varia com o contexto». Nouto passo, refere que muitas
grandes empresas ocidentais aplicaram este método, mas difunde-se lentamente nas
PME, «porque o esforço de investigação exigido pelo desenvolvimento da
representação da empresa por actividades ou processos é geralmente encarado como
sendo demasiado pesado...». Têm sido utilizados vários métodos de instalação. Uns
têm-se revelado eficazes, outros não. Qualquer um deles exige uma equipa
multidisciplinar. «O maior interesse do método e, sem dúvida, o seu aspecto mais difícil
reside na identificação e na análise das actividades...». A instalação do método CBA não
se faz isoladamente. A abordagem CBA «representa uma verdadeira revolução cultural».
A introdução deste método «modifica completamente as relações dos actores, as
definições das missões e das responsabilidades, as percepções de rentabilidade, etc. Será
necessário acompanhar estas mudanças através de uma revisão dos processos de medida
de desempenho e de recompensa/sanção. Será necessário fazer mudar as mentalidades e
mudar mentalidades é a coisa mais difícil e mais morosa. Finalmente, será necessário
adaptar os sistemas de informação e de contabilidade a estas representações».

Em conclusão, para que o CBA seja viabilizado, é necessário um determinado clima e


cultura organizacional, um envolvimento total da Direcção (como elemento motor na
realização do projecto), um envolvimento total de todo o pessoal (após iniciado no
método e na clareza dos seus objectivos) e a atribuição de um papel preciso de
instalação a uma equipa que deve ser pluridisciplinar.

Importará questionar como o experimentado e pragmático USALI (sistema americano)


encara ou não a pertinência do CBA e se lhe dá uma resposta, sob o ponto de vista
prático. Assunto que retomaremos e aprofundaremos mais adiante, num ponto
específico, ao estudarmos o USALI e a sua evolução.

3-A Contabilidade de Gestão Hoteleira

3.1-Modelos e objectivos de contabilidade de gestão hoteleira

Há dois modelos conhecidos de Contabilidade Analítica de Gestão Hoteleira: o Uniform


System of Accounts for the Lodging Industry (USALI), normalmente designado por
sistema americano ou, mais genericamente, por sistema uniforme1 e o Plan Contable
pour l´Hôtellerie et la Restauration Suisses (PCHRS), normalmente designado por
sistema suíço2.

De acordo com os objectivos gerais que presidiram à elaboração destes dois sistemas,
parece haver uma convergência em relação à maior parte desses objectivos e que são:

 Uniformização: Permitir a introdução de um sistema uniforme de contabilidade


em todos os estabelecimentos de hotelaria e restauração, bem como facilitar uma
contabilização correcta para todos. (prefácio do PCHRS). Estabelecer mapas
estandardizados e classificação de contas que sirvam de guia a cada um na
1
EDUCATIONAL INSTITUTE of the AMERICAN HOTEL & MOTEL aSSOCIATION, 1996, ninth
revised edition, Michigan, USA.
2
GASTROSUISSE, Société Suisse des Hôteliers, Société Suisse de Crédit Hôtelier, Edition
GASTROSUISSE, Edition de la Société Suisse des Hôteliers, Suisse, 1991/1997.

73
preparação e apresentação dos mapas de informação standard (introdução do
USALI).

 Obtenção de indicadores standard sectoriais: Fornecer indicações e exemplos


de meios suplementares de gestão, graças aos números obtidos da contabilidade
(PCHRS)

 Possibilidade de se fazerem comparações: Facilitar a procura de dados úteis e


necessários para a gestão e o controle do andamento da empresa hoteleira
(PCHRS). Permitir aos que utilizam os mapas de informação standard fazer
comparações da sua unidade hoteleira com outras congéneres (USALI).

 Facilidade de utilização: Permitir uma adaptação rápida às necessidades e


especialidades de cada caso (USALI). Ter em consideração as necessidades
diferentes de informação, quer dos pequenos, quer dos grandes hotéis (PCHRS).

 Possibilidade de análise de desempenho: O sistema americano desde sempre


preconizou um outro objectivo que caracterizou de muito importante e que
deveria ser respeitado pelo seu modelo de sistema uniforme de contabilidade: a
responsabilização ou, por outras palavras, a possibilidade de imputar
responsabilidades, através da análise de desempenho, quer do director geral,
quer dos directores ou chefes departamentais. A evolução mais recente desta
preocupação e objectivo a atingir designa-se por contabilidade por actividades
ou por centros de responsabilidade, de que a 9ª edição do USALI (1996) também
faz eco. Este último objectivo (que não é mencionado no sistema suíço) foi
determinante na configuração do sistema americano e marca a grande diferença
entre estes dois modelos de contabilidade.

Em resumo, podemos concluir que são objectivos comuns de uma Contabilidade


Analítica de Gestão Hoteleira: a uniformização, a obtenção de indicadores standard, a
possibilidade de se fazerem comparações, o ser fácil de utilizar e flexível e o permitir
fazer análise de desempenho ou de performance (responsabilização).

3.2-O Sistema suíço

Num trabalho subordinado ao tema Sistema Uniforme de Contabilidade Analítica de


Gestão Hoteleira, não podemos deixar de abordar a parte analítica de gestão contida no
Plan Contable pour l´Hôtellerie et la Restauration Suisses (PCHRS), normalmente
designado por sistema suíço. Contudo, será apenas uma abordagem com uma breve
apresentação e alguns comentários críticos, uma vez que não é este o modelo que, para
efeitos práticos, nos cativa e, geralmente, tanto quanto nos é possível constatar, também
não é este o sistema preferido pelas empresas hoteleiras (pelo menos fora do país da sua
origem, a Suíça). Como veremos, enquanto sistema uniforme de contabilidade hoteleira,
interssar-nos-á mais o Uniform System of Accounts for the Lodging Industry (USALI).
Aliás, o próprio sistema suíço dá um estatuto de maioridade ao USALI, ao reconhecer a
maior divulgação e adopção generalizada a esse sistema americano, de tal modo que dá
indícios de tentar aproveitar a sua boleia, como veremos mais adiante.

74
3.2.1-Breve caracterização do sistema suíço

O actual Plano de Contabilidade para a Hotelaria e Restauração Suíça (PCHRS) foi


editado em 1997 (no ano a seguir à 9ª edição do USALI, ou seja, setenta anos após a 1ª
edição deste). Esta versão é-nos apresentada como sendo a 1ª edição.

Efectivamente trata-se de uma revisão completa de dois sistemas diferentes de planos de


contabilidade anteriormente existentes, sendo um da responsabilidade da Fédération
Suisse des Cafetiers, Restaurateurs et Hôteliers (FSCRH) e outro da Société Suisse des
Hôteliers (SSH). Deste último, havia pelo menos três edições anteriores, sendo a última
de 19731.

O manual do PCHRS2 divide-se em quatro partes: 1-Prefácio, 2-Plano de contas


detalhado, 3-Conteúdo das contas, 4-Chave de contabilização (para facilitar a
uniformização na contabilização).

Pela leitura do prefácio, concluímos que estas duas associações, juntamente com a
Société Suisse de Credit Hôtelier (SCH) juntaram os seus esforços no sentido de
encontrarem uma pretensa solução uniforme para todos os hotéis e restaurantes, de
modo a «possibilitar que cada um execute a sua escrita e monte a sua contabilidade
segundo os mesmos critérios» (extraído do prefácio do PCHRS-1997).
As razões apresentadas por estes três organismos para esta conjugação de esforços e
para a solução do sistema apresentado como 1ª edição do Plano de Contabilidade para a
Hotelaria e Restauração Suíça (PCHRS) são as seguintes:
 A introdução da informática na hotelaria e restauração.
 As mudanças introduzidas nas estruturas da exploração.
 «A utilização, cada vez mais generalizada, do plano de contas americano
(Uniform System of Accounts for the Lodging Indutry)».
 As necessidades acrescidas postas à contabilidade enquanto instrumento de
gestão.

Com esta nova edição, os editores (Société Suisse des Hôteliers-SSH) “esperam” que
hoteleiros e similares possam dispor dum instrumento útil de gestão e de informação e
que este novo plano constitua “uma base melhor” para compararem entre eles os
resultados da exploração.

De um modo mais específico, expressam os seguintes objectivos com este novo plano:

 Permitir a introdução de um sistema uniforme de contabilidade em todos os


estabelecimentos de hotelaria e restauração.
1
No prefácio da 3ª edição editada em 1973 (pela Société Suisse des Hôteliers e pela Société Suisse de
Crédit Hôtelier e distribuída por aquela primeira entidade, em Berna), podemos ler o seguinte: «a segunda
edição do plano de contabilidade normalizado da hotelaria suíça apareceu em 1957. A edição em língua
francesa data de 1959». E mais adiante diz que «o plano de contabilidade actual, isto é, a segunda edição
em língua alemã e a 1ª em língua francesa, não necessitava de revisões fundamentais, uma vez que, na
prática, se tem revelado totalmente satisfatório».
Daqui se conclui que o chamado sistema de contabilidade suíço começou por ter as duas primeiras
edições só em alemão, sendo a 2ª edição de 1957 (desconhecemos a data da 1ª edição). A primeira
edição em francês é de 1959.
2
GASTROSUISSE et al. Plan Contable pour l’Hôtellerie et la Restauration Suisse, Société Suisse des
Hõteliers, 1997, première edition.

75
 Permitir uma contabilização correcta, mesmo por parte dos não especialistas.
 Facilitar a procura de dados (données) úteis e necessários para a gestão e controle do
andamento da empresa.
 Ter em consideração as necessidades diferentes de informação, quer das pequenas,
quer das grandes empresas.
 Fornecer indicações e exemplos de meios suplementares de gestão, graças aos
números obtidos da contabilidade.

Todos estes objectivos são louváveis e também se encontram no sistema americano,


mas, como veremos, parecem-nos ser mais difíceis de alcançar por este sistema do que
pelo sistema americano. Além disso, falta aqui um dos principais objectivos dum
sistema de contabilidade analítica de informação de gestão que é a análise de
desempenho ou de performance dos responsáveis departamentais (imputação de
responsabilidades). No sistema americano, este é um dos principais objectivos e foi
determinante na sua concepção e arquitectura, desde 1925, até hoje.

Tal como os planos de contas anteriores, também este tem uma versão para as pequenas
explorações (com desdobramentos obrigatórios de contas apenas até ao 2º grau), outra
versão para as médias explorações (com desdobramento daquela versão até ao 3º grau) e
outra para as grandes explorações (com desdobramento daquela versão até ao 4º grau). 1
O desdobramento do plano base inicial para satisfazer a eventual necessidade de
informação sentida pelas médias e grandes empresas iniciou-se com 3ª edição, em 1973.
Contudo, desde logo ficou explícito que «as contas previstas no plano de contabilidade
para as pequenas empresas representam o mínimo admissível», o que é indicado para as
pequenas empresas «serve de base à organização da contabilidade das médias e grandes
empresas»2.

Apresentamos, seguidamente, um quadro (adaptado por nós) que resume e traduz, muito
fielmente, o esquema que resume o plano para as pequenas explorações e que nos é
apresentado na parte introdutória do manual do plano de contas (páginas 1.7 e 1.8 3) e
que mantém, sem grandes alterações, a estrutura base tradicional e obrigatória 4 do que
designamos por sistema de contabilidade suíço para a hotelaria.

“ Esquema de Ventilação da Conta de Resultados”5


Classe Grupo Designação Conteúdo
conta6 conta
3 Receitas da Exploração Mercadorias (por sectores e departamentos) e serviços
4 40 Custos directos de Mercadorias Sectores e mercadorias de revenda
1
Note-se que o primeiro dígito designa a classe, pelo que não faz parte do grau (nível de informação) da
conta.
2
SSH e SCH, «Plan comptable de l’hôtellerie suisse», distribuído pela Sossiété Suisse des Hôteliers,
Berne, 1973.
3
GASTROSUISSE et al. Plan Comtable pour l’Hôtellerie et la Restauration Suisse, Société Suisse des
Hôteliers, 1997, première edition.
4
É o mínimo obrigatório para qualquer empresa do sector. Contudo, para as grandes empresas, é
apresentado um esquema mais desenvolvido, como é apresentado a seguir.
5
“Schéma de ventilation du compt de résultat”.
6
As classes 1 e 2 estão reservadas par as contas do Balanço (património): 1 para as do Activo, 2 para as
do Passivo (e Capital Próprio).

76
45 Custos directos de Prestação de Alojamento e outras prestações de serviços
Serviços
Resultado Bruto I
5 Custos com pessoal Ordenados, respectivos encargos sociais e seguros, etc.
Resultado Bruto II
6 60 Outros custos da exploração Seguros, energia, lavagem/limpeza, mat. escritório,
publicidade/promoção, animação, custos
administrativos, com veículos, etc.
Resultado de Exploração I
69 Custos da direcção Direcção, proprietário, órgãos sociais, impostos directos
Resultado de Exploração II
7 70 Custos de manutenção Imóveis, móveis, instalações, máquinas e aparelhos,
veículos, etc.
71 Substituição de instalações Móveis, máquinas e aparelhos, etc.
Gross Operating Profit GOP
72 Impostos s/ imobilizado Impostos e seguros relativos ao imobilizado
73 Alugueres/Leasing Leasing, proveitos e custos de alugueres
75 Alojamento do pessoal Proveitos e custos com alojamento do pessoal
Resultado antes de juros e amortizações
78 Juros Proveitos e encargos financeiros
Cash-flow resultante da exploração
79 Amortizações e provisões Amortizações, ajustamento/correcções de valores e
provisões
Lucro ou prejuízo da exploração
8 80-86 Explorações complementares
(imóvel do pessoal e outros,
centro balnear ou médico,
instalações desportivas e de
fitness, agricultura, artesanato) Proveitos e custos
9 Ganhos e perdas extraordinários
Lucro ou prejuízo da empresa
0 Contas de encerramento
Fonte: “Plan Comptable pour l´Hôtellerie et la Restauration Suisse”, tradução e adaptação do autor

Dissecando este modelo de “ventilação de conta de resultados”, temos o seguinte


esqueleto informativo:

Receitas da explorão (classe 3)


- Custos directos da exploração (classe 4)
= Resultado bruto I
- Custos com pessoal (classe 5)
= Resultado bruto II
- Outro custos da exploração (classe 6)
= Resultado da exploração I
- Custos com a direcção (classe 6)
= Resultado da exploração II
- Custos de manutenção/reparação e de reposição de equipamentos
(classe 7)
= (Gross Operating Profit -GOP)
- Impostos sobre o imóvel, locação/leasing e alojamento do pessoal
(classe 7)
= Resultado antes de juros e amortizações
- Juros (classe 7)
= “Cash-flow” – Resultado da exploração

77
- Amortizações e provisões (classe 7)
= Lucro ou prejuízo da exploração
- Explorações complementares (classe 8)
- Ganhos e perdas extraordinárias (classe 9)
=Lucro ou prejuízo da empresa

Como se vê, este esquema, que é o resumo das contas do Plano (o mínimo obrigatório
para todas as empresas e aconselhado para as pequenas explorações) e que nos é
apresentado na introdução, é mais uma demonstração de resultados geral e por natureza,
do que uma análise por centros de informação de gestão ou mesmo por funções (com
algumas ressalvas para as vendas, custos de matérias e alguns custos especificados
como directos). Provavelmente, terá sido a falta de clareza deste modelo que levou os
seus autores a socorrerem-se da utilização da numeração I e II para designar os
resultados (brutos e de exploração) em vez de designações classificativas.

O primeiro grande ponto fraco do PCHRS está no facto de ser um sistema monista 1. Isto
faz com que a estrutura da sua informação fique dependente ou mesmo escrava das
contas por natureza. Deste modo, o balancete que é directamente produzido por este
plano de contas não nos fornece uma informação de receitas, custos e resultados por
centros de informação de gestão pretendidos e uniformes. Para isso terá de se elaborar
um segundo balancete (integrado ou não no softwere da contabilidade) para repescagem
e reordenamento da informação por centros de informação pretendidos uniformemente.2
O desdobramento mínimo das contas, discrimina:

 As receitas de exploração por natureza (classe 3-Produits d’exploitation) que


subdividide por aquilo que designa por “secteurs”3 (30-Produits marchandises
par secteurs: vins, bières, spiritueux, eaux minerales, cuisine, cafés/thés, etc. ) e
por ”services”4 (35-Produits prestations services: hébergement, autres
prestations hôtelièrs, automates/appareils, téléphone, etc.).
 Custos directos da exploração (classe 4-Charges directes d’exploitation) que
subdividide por custos das matérias (40-Charges marchandises) e por mais
alguns custos directos do que designa por «prestações de serviços» (45-Charges
directes prestations de service) que subdivide apenas em: “alojamento”
(hébergement), “outras prestações hoteleiras” (autres prestations hôtelières),
“máquinas e aparelhos automáticos” (automates/appareils), “telefones dos
clientes” (téléphones des clients), “outras prestações de serviços” (autres
prestations de service) e “desporto/fitness” (sport/fitness).

1
Integrado na contabilidade geral, a qual é estruturada, à cabeça, por naturezas de custo em vez de por
centros de informação ou de responsabilidade pretendidos. Mais à frente, aprofundaremos as
desvantagens duma contabilidade analítica de gestão integrada na contabilidade geral, isto é, estruturada
por naturezas.
2
Nas “Notas gerais” da 3ª edição (1973) podemos ler o seguinte, a propósito: «com efeito, as contas de
exploração por centros de produção serão feitas extra-contabilidade, por via estatística. A contabilidade
geral fornecerá as informações necessárias, através de notas apropriadas... ou de subcontas auxiliares».
3
Considera como secteurs (sub-contas da 30-“Receitas das mercadorias por sectores”): cave, vins, bières,
spiritueux, eaux miérales, cuisine, cafés/thés, articles de commerce, ventes complémentaires.
Considera como départements (sub-conta da 31-“Receitas das mercadorias por departamentos” que só é
aplicável, no desdobramento, para as médias e grandes explorações): restaurant, salles, bar, dancing,
jardin, traiteur, take away, service en chambres.
4
Considera prestations services (sub-contas da 35-“Receitas das prestações de serviços”): hébergement,
autres prestations hôtelières, automates/appareils, téléphone, autres prestations de service, sport/fitness.

78
Porém, o mesmo já não acontece com muitos outros custos directos importantíssimos na
hotelaria, tais como:

 Custos de pessoal (classe 5-Charge de personnel), que (nesta versão apontada


para as pequenas empresas e, efectivamente, a única obrigatórias para todas as
empresas)1 não são tratados como custos directos, uma vez que são apresentados
genericamente, desdobrados em: “Salários brutos” (conta 500, que engoba
também o alojamento, a alimentação e bebidas do pessoal), “Encargos patronais
e seguros do pessoal” (conta 510) e “Outros custos do pessoal” (conta 520).
Apenas os salários dos artistas, da direcção e das explorações anexas não estão
aqui incluídos.
 Outros custos de exploração (conta 60) que são simplesmente desdobrados em
sub-contas por natureza, apesar de muitos serem directos. Temos assim:
“Seguros de bens/taxas”(conta 600), “energia” (conta 601), “lavandaria e
limpeza” (conta 602), “material de exploração e de escritório” (conta 603),
“publicidade e promoção de vendas” (conta 604), “divertimento de clientes”
(conta 605), “custos com viaturas” (conta 606), “custos administrativos” (conta
607), “outros custos de exploração” (conta 608).

Posto isto, se analisarmos o conteúdo dos desdobramentos das contas 45-“Custos


directos de prestação de serviços” (criadas para as médias e grandes explorações), bem
como dos desdobramentos da contas 60-“Outros custos da exploração”, verificamos que
há, de facto, muitos custos que têm condições para serem considerados directos, mas
que se encontram previstos nas contas 60, em vez de estarem previstos nas contas 45.

Em suma, predomina a informação por natureza, por vezes desdobrada à exaustão, em


vez da informação por centros de informação de gestão. A estrutura dos centros de
informação de gestão (por tipo de bebida, por tipo de comidas, por outros tipos de
serviços detalhados) não é a mais conveniente para dispormos de informação de gestão
eficaz. A divisão entre custos directos e indirectos não é suficientemente clara e, para
determinados custos muito importantes, como os de pessoal (e não só), até nem é
considerada importante.

Portanto, um plano e um resumo deste género não servem a missão da contabilidade


analítica como instrumento de gestão.

«Para as grandes empresas», na página 1.92 (ainda na parte introdutória), o manual


apresenta-nos este outro esquema, mais desenvolvido, e com o seguinte título bem
sintomático:

«Contabilidade analítica dos centros de resultados


inspirada no “Uniform System of Accounts”»

Departamentos de Receitas da Custos directos Resultado Custos directos Resultado bruto


exploração exploração da exploração bruto I do Pessoal departamental
1
Em sub-contas da conta 50-“Salários, excepto artesãos, direcção, explorações anexas”.
2
Ibidem.

79
(centro resultados) (mercadorias, etc) (centro resultado)
Grupo contas 30-351 40-452 50-523
Alojamento
(Rooms) x x xx x xx
Restauração
(F+B) x x xx x xx
Complementa
res (Other) x x xx x xx
Total x x xx x xx
-Custos Indirectos do pessoal (grupo de contas 50-524)............................... x
= Resultado Bruto II.............................................................................. xx
-Outros custos da exploração (grupo de contas 605)................................... x
= Resultado da exploração I................................................................. xx
-Custos da direcção da empresa (grupo de contas 696)............................... x
= Resultado da exploração II................................................................ xx
-Custos relativos ao financiamento e imobilizações (grupo contas 70-797):
(Manutenção e reposição das instalações da exploração) (Contas 70-71) x
xx
=== Resultado antes dos custos fixos / GOP........................................... x
(Impostos s/ imóveis, rendas/leasing, alojamento do pessoal) (72,73,75) xx
= Resultado antes de juros e amortizações.................................... x
(Juros (grupo de contas 78).................................................................... xx
= Resultado antes de amortizações / Cash-fow de exploração......
x
(Amortizações e provisões) (grupo de contas 79)....................................
xx
= Lucro ou prejuisoa exploração..........................................................
x
- Imóveis e explorações complementares (grupo de contas 80-868).............
- Ganhos e perdas extraordinários (grupo de contas 909)................................. x
= Lucro ou prejuízo da empresa........................................................... xx

Fonte: “Plan Comptable pour l´Hôtellerie et la Restauration Suisse”, tradução do autor

Como o próprio título indica, é uma tentativa de aproximação ou mesmo encaixe com
«o plano de contas americano (Uniform System of Accounts) cada vez mais divulgado»
(sic).
Este mapa-resumo apresenta-se bastante mais atractivo para quem espera ter informação
contabilística de gestão e, à primeira vista, até se pode confundir com o equivalente do
USALI (que apresenteremos mais adiante). Porém, é apenas uma percepção, porque
continua a ser bastante diferente. Ainda fica muito aquém, sobretudo no conteúdo destes
agregados e centros de custo. Relativamente ao USALI, a pouca vantagem que lhe
reconhecemos é o evidenciar o cash-flow (no sentido de meios libertos), que é uma
informação muito importante e que, por isso, convém acompanhar todos os meses10.

1
Mais desenvolvido do que no anterior “Esquema de ventilação da conta de resultados”.
2
Igual ao desenvolvimento do anterior “Esquema de ventilação da conta de resultados”.
3
Mais desenvolvido do que no anterior “Esquema de ventilação da conta de resultados”.
4
Mais desenvolvido do que no anterior “Esquema de ventilação da conta de resultados”.
5
Igual ao desenvolvimento do anterior “Esquema de ventilação da conta de resultados”.
6
Igual ao desenvolvimento do anterior “Esquema de ventilação da conta de resultados”.
7
Igual ao desenvolvimento do anterior “Esquema de ventilação da conta de resultados”.
8
Igual ao desenvolvimento do anterior “Esquema de ventilação da conta de resultados”.
9
Igual ao desenvolvimento do anterior “Esquema de ventilação da conta de resultados”.

80
Passemos a uma análise crítica mais específica, enbora não pretenda ser exaustiva.

3.2.2-Breve análise crítica complementar

O plano de contas divide-se em nove classes, correspondentes aos seguintes


aglomerados de contas: 1-Activo; 2-Passivo; 3-Receitas da exploração; 4-Custos
directos; 5-Custos com pessoal; 6-Outros custos de exploração; 7-Custos financeiros e
de imobilizado; 8-Custosdo imóvel do pessoal; 9-Proveitos e custos extraordinários.

Tal como nas versões dos planos que antecederam este, todas as contas do plano são
apresentadas em três subdivisões: a mais pequena, com três dígitos, (aconselhada às
pequenas empresas) é a que é verdaderamente obrigatória; a intermédia com quatro
dígitos (aconselhada às médias empresas); e a mais desdobrada, com cinco dígitos
(aconselhada para as grandes empresas).

As contas analíticas estão integradas nas gerais (sistema monista ou integrado). Ou seja,
as contas desenvolvem-se por natureza (de uma maneira, por vezes, demasiado
exaustiva) e, no fim de cada natureza, reagrupadas por “departamentos”. Portanto, no
plano (e no balancete), nunca temos resultados apurados automaticamente, já que
predomina a sequência lógica das receitas e custos por natureza e não por centro de
custos.

Assim, o apuramento dos resultados departamentais só pode ser feito com recorrência a
um repescar e reordenar das contas por centros ou grupos de informação de gestão, o
que obriga a um trabalho complementar imprescindível ou não temos informação de
gestão compreensível.

Além dos comentários já feitos no ponto anterior, parece-nos importante realçar o


seguinte:

 Esta edição do “Plan Comptable pour l´Hôtellerie et la Restauration Suisse” é,


dizem os editores (SSH1-1997), «a revisão completa dos dois sistemas diferentes de
10
Uma das significativas alterações introduzidas já na 8ª edição do USALI foi a inclusão da
Demonstração de Resultados dos Cash Flows. Só que os conceitos de cash flow são completamente
diferentes. Assim:
No contexto do PCHRS, o conceito de cash flow é o de meios libertos, calculados do seguinte modo:
Resultado antes de amortizações, de provisões, de ganhos e perdas extraordinárias, de imóveis, de contas
de exploração complementares ou anexas.
No contexto do USALI, o conceito de cash flow é o de demonstração dos fluxos de caixa, ou seja, resumo
das variações do disponível e das aplicações de tesouraria (no mesmo período da demonstração de
resultados) originadas pelas actividades operacionais, de investimento e de financiamento.
Note-se que a expressão cash flow surgiu nos Estados Unidos da América em 1863 mas, só em 1971, este
instrumento de análise financeira passou a ser obrigatório.
Têm-lhe sido atribuídos vários significados e é utilizado em diferentes e díspares acepções, ao ponto de
W. Paton ironizar com a doença que designa por «cash flowitite»....
O significado mais correcto é o que decorre do significado da própria expressão, ou seja, fluxos de caixa
(tesouraria) durante um determinado período de tempo. Portanto compreende os recebimentos (cash
inflows) e os pagamentos (cash outflows), ao longo de um período bem demarcado.
A identificação de cash flow operacional com meios libertos brutos de exploração ou do cash flow
(global) com meios libertos líquidos totais ou ainda com os meios libertos totais retidos
(autofinanciamento) carece de rigor etimológico (cf. MENEZES H. C., Princípios de Gestão Financeira,
Lisboa, Editorial Presença, 1996, 6ª edição, pp. 106-107).
1
Société Suisse des Hôteliers (SSH).

81
plano de contas, da FSCRH1 e da SSH» e, acrescentam, “esperam” que constitua
“uma base melhor” para compararem entre eles os resultados da exploração.

A impressão que nos deixa a comparação entre os planos anteriores e o actual é que
não há grande evolução quer na sua concepção teórica quer na sua estrutura. A
novidade que ressalta está na tentativa de encaixar as contas de exploração do plano
de contas (com a contabilidade analítica integrada) na estrutura do mapa resumo da
exploração modelo americano. Mas isso resulta, e só em parte, com os centros de
receitas. Com os centros auxiliares ou de apoio, que aglutinam os custos indirectos,
tal tentativa de encaixe não é minimamente conseguida, porque a concepção e
estrutura base do modelo são muito diferentes.

 Ao referir-se expressamente, em vários pontos, ao sistema americano com a


designação de “Uniform System of Accounts”, sem mais, e ao reconhecer,
expressamente, «a utilização, cada vez mais generalizada, do plano de contas
americano (Uniform System of Accounts for the Lodging Industry)», o sistema
suíço parece render homenagem, claramente, ao USALI e reconhece-lhe
superioridade2.

Em suma, esta edição conjunta tenta encaixar-se no sistema americano e tirar


partido dele, ao mesmo tempo que não abdica da sua filosofia, da sua estrutura e da
sua identidade. Daí resulta que não perde de facto a sua identidade, mas também não
consegue atingir as virtudes e vantagens do sistema americano. Portanto, como
sistema alternativo, continua a não ter as vantagens competitivas do sistema
americano e os seus objectivos, além de incompletos, continuarão provavelmente a
não ser alcançados como pretendido.

3.3-O sistema uniforme americano

1
Fédération Suisse des Cafetiers, Restaurateurs et Hôteliers (FSCRH)
2
Do manual de um seminário sobre “A Contabilidade Analítica de Exploração na Hoteleira”, ministrado
entre 5 e 9 de Maio de 1980, que nós frequentámos e que foi ministrado pelo professor de contabilidade
da famosa escola hoteleira de Lausanne (“catedral” do sistema suíço), retirámos os seguintes ctários,
referentes ao sistema americano: «...Ele materializa uma concepção de utilização da contabilidade como
instrumento precioso para a gestão». Referindo-se à sua implementação, diz que «a sua implementação
não levanta dificuldades». «Pode funcionar manualmente ou com ajuda mecanografica ou informática».
No parágrafo em que refere, especificamente, as suas vantagens, diz que «ele se baseia na noção de custos
directos e, portanto, não utiliza “chaves de repartição”, como fazem outros sitemas analíticos, para
distribuir os custos entre os diferentes departamentos». «Permite fazer comparações inter-empresas». «É
o único sistema que permite uma uniformização e uma homogeneidade entre todas as actividades
hoteleiras, de restauração e para-hoteleiras». «É fácil de pôr a funcionar». «O pessoal pode assimilá-lo
facilmente». «Os mapas de gestão são de fácil leitura». «Adapta-se perfeitamente às legislações
nacionais».
Apesar deste testemunho idóneo e imparcial, o referido professor reservou apenas um, dos cinco dias que
durou o seminário, para o USALI. Faz-nos lembrar a célebre frase «le coeur a des raisons que la raison
ne conaît pas»...

82
Em 1925, a Associação dos Hotéis de Nova Iorque resolveu fazer um plano de contas
para a hotelaria. Para isso, formou uma equipa de peritos em contabilidade e hotelaria.
Esta equipa foi presidida por duas grandes figuras da hotelaria: E. M. Statler (por parte
das empresas hoteleiras) e William Forster (por parte dos especialistas em contabilidade
hoteleira)1.

A primeira edição foi publicada em 1926, com a designação de “A Uniform System of


Accounts for Hotels & Restaurants”. Passados dois anos, em 1958, a Associação
Nacional de Restaurantes aprovou e publicou o “Uniform System of Accounts for
Restaurants”, de que é proprietária2. Na sequência disto, aquela primeira publicação
passou a preocupar-se exclusivamente com a hotelaria e a ter a designação de “A
Uniform System of Accounts for Hotels”.

Este sistema foi, logo de seguida, adoptado pela Associação de Hotéis Americanos
(primeiro, dos Estados Unidos da América e, depois, também do Canadá). Foi o
primeiro trabalho do género organizado com sucesso, na hotelaria, no sentido de criar
um sistema uniforme e prático de contabilidade hoteleira3.

Este sistema foi-se divulgando, progressivamente, por todo o mundo, ao ponto de ser
designado, no sector, simplesmente como “o sistema uniforme”4. A nona e mais
recente edição deste sistema foi publicada em 1996, com a nova designação de
“Uniform Sistem of Accounts for the Lodging Industry (USALI).

3.3.1-A teoria do sistema uniforme americano

Ao contrário do sistema suíço, não se trata propriamente de um plano de contas


codificado, mas de um manual que cria, criteriosamente, centros de informação de
gestão, apresenta mapas de exploração normalizados com as respectivas designações de
contas para cada um desses centros de informação de gestão e para cada designação de
conta apresenta notas explicativas sobre o seu conteúdo.
Tal como o sistema suíço, ele abrange e começa por dedicar as primeiras 30 páginas (de
um total de 300) às informações das peças especificamente financeiras, como sejam o
balanço, a demonstração de resultados, a demonstração dos fluxos de caixa e as
respectivas notas explicativas.
Porém, desta feita, interessa-nos tratar especificamente a parte analítica de gestão
hoteleira que constitui a parte essencial, particularmente desenvolvida nas restantes 300
1
Este último tornou-se também muito conhecido pela empresa internacional que fundou com a
designação “Pannell Kerr Forster” e que desenvolve uma grande parte dos seu estudos, auditoria e
consultoria no turismo e hotelaria.
2
Os objectivos, o formato e o próprio estilo do manual deste plano específico para a restauração são em
tudo semelhantes aos do USALI. Nos textos introdutórios do manual da 4ª edição (1968) a Associação
apela aos restaurantes para que usem o dito Plano, a fim de que todos possam falar a mesma linguagem,
usem os mesmos mapas demonstrativos de resultados, possam dispor de dados fidedignos para que daí
possam resultar futuros estudos sectoriais e, assim, cada um possa fazer comparações com as médias do
sector. Posteriormente a esta publicação, houve novas edições revistas nos anos: 1930, 1942, 1958, 1968
(a última que é do nosso conhecimento).
3
Na sequência deste primeiro trabalho e revisões subsequentes, formou-se a Associação Internacional de
Contabilistas Hoteleiros.
4
Entre nós, há quem não goste do termo “uniforme” e prefira o termo “normalizado”. Respeitamos a
opinião, mas não vemos relevância para o caso, nesta discussão, uma vez que o referido “sistema
uniforme” faz um apelo expresso à flexibilização e adaptação a cada caso. Bastará que sejam seguidos os
processos, a filosofia e os princípios que permitam atingir os objectivos a que se propôs.

83
páginas deste manual do sistema uniforme de contabilidade da indústria hoteleira
(USALI-Uniform System of Accounts for the Lodging Industry).

Uma das características marcantes do USALI é a sua clareza teórica, de conceitos, de


concepção, de estrutura, de coerência com os objectivos. Por exemplo, os critérios para
a criação e estruturação dos dados de cada centro de informação de gestão foram: o
organigrama hoteleiro, os vários tipos de negócio da hotelaria e de cada hotel e o
agrupamento de custos homogéneos e com peso significativo na hotelaria e em cada
hotel.

A sua clareza, simplicidade e flexibilidade faz com que a sua implementação e os seus
objectivos possam ser concretizados por qualquer unidade hoteleira, independentemente
da sua dimensão e em qualquer parte do mundo. Para isso contribuiu muito, também, a
liberdade de adaptação ao sistema contabilístico de cada caso.

Muitos são os testemunhos desta constatação quer de empresas nacionais quer de


empresas multinacionais, para além das americanas. Marcel Bourseau (1974),
presidente da Fe
Fédération National de l’Industrie Hôtellière Française, testemunha que grandes cadeias
hoteleiras francesas utilizam este sistema, porque ele possibilita obter, num prazo
rápido, as informações de gestão adaptadas às necessidades, com baixos custos,
inferiores mesmo a qualquer outro sistema e capaz de responder, com adaptação fácil, às
exigências da legislação de qualquer país onde seja utilizado 1.

3.3.1.1-Princípios e conceitos do sistema uniforme americano

Antes de mais, convém esclarecer alguns conceitos e princípios inerentes à teoria do


USALI. É o que passamos a fazer.

A) Estrutura base dos centros de informação de gestão ou departamentos

A clareza da estrutura dos centros de informação de gestão é particularmente importante


para a elaboração da estrutura e codificação de um plano de contas de contabilidade
analítica de gestão sectorial, ou seja, de um dado ramo da actividade económica.

Apesar da simplicidade clareza e maioridade do USALI, verifica-se ainda alguma


fluidez em alguns termos que ora são designados e apresentados de uma maneira ou de
outra. A ituação piora quando passamos para os vários autores que escrevem sobre este
assunto, quer dos EU, quer de outras nacionalidades. Assim sendo, nós adaptamos os
termos da maneira que nos parece mais significativa, no âmbito do USALI, mas com o
cuidado de colocarmos entre parêntesis os termos mais representativos constantes no
original do USALI.

Centro de informação de gestão é um agregado homogéneo constituído por proveitos


e custos (caso dos centros de receitas/resultados) ou só por custos (caso dos centros de
custos auxiliares e dos incontroláveis), com expressão na exploração de uma unidade
hoteleira.

1
BOURSEAU M., La Gestion Hôtelière: Exploitation, Commercialisation, Administration, Paris,
Editions Flammarion, 1974

84
Cote (1997) define define este conceito como uma área de responsabilidade para a qual
deve ser recolhida e reportada uma informação de custos separada. Alguns destes
centros de informação são considerados departamentos, quando a gestão de topo
designa uma pessoa como gestor responsável das operações dessa área. Na linguagem
corrente e prática, usam-se indiferentemente os termos “departamento” ou “centro de
informação de gestão”, independentemente da dimensão e importância de cada um.
Organizam-se em dois grandes grupos: centros de receitas/resultados (operated
departements) e centros de custos indirectos que, por sua vez, podem ser controláveis
(undistributed operating expenses) e incontroláveis (que, no manual, também aparecem
designados por fixid costs)1.

Centros de receitas2/resultados (operated departments): são os que geram receitas


provenientes das vendas de produtos e/ou serviços a clientes. Subdividem-se em
principais (Quartos, Alimentação e Bebidas) e secundários (Lavandaria de Hóspedes,
Telecomunicações, Centro de Saúde, etc.). O número destes centros de receitas varia
conforme o tamanho e variedade de serviços de cada hotel.

Alguns dos centros de receitas podem não justificar-se como departamentos


propriamente ditos (autónomos) em certos hotéis (pequenos e médios), mas todos eles
são centros de informação de gestão.

Centros de custos indirectos controláveis ou auxiliares (undistributed operating


expenses): são os departamentos que têm um contacto mínimo ou nulo com os clientes e
não produzem receitas. Eles fornecem serviços aos centros de receitas (e, por isso,
também se podem designar por auxiliares ou de apoio) os quais, por sua vez, fornecem
serviços aos hóspedes.

Alguns dos que estão previstos na 9ª edição do USALI (e que serão apresentados mais à
frente) podem, em muitos hotéis, não ter dimensão suficiente que justifique um centro
de informação de gestão separado e, nesse caso, pese embora a sua existência física, são
integrados nos respectivos departamentos congéneres (pode ser o caso, por exemplo,
dos transportes, dos recursos humanos, da segurança, que, nesse caso, seriam rubricas
integradas no departamente de Serviços Gerais e Administrativos).

Centros de custos indirectos incontroláveis ou de capital (fixid costs): aglutinam


num ou mais grupos os custos de capital, tais como: rendas/alugueres, seguros e
impostos do imobilizado, encargos financeiros, amortizações, etc. Também se
enquadram neste departamento as receitas congéneres, ou seja de capital, tais como:
juros de aplicações financeiras, ganhos extraordiários, etc.

1
A designação de custos controláveis e incontroláveis é da nossa responsabilidade, mas traduz bem, em
nossa opinião, o espírito da teoria contida no USALI, uma vez que, na óptica do gestor, os custos antes do
GOP-Gross Operating Profit são (juntamente com as receitas), sobretudo, dependentes da capacidade do
gestor, ao passo que os custos que não afectam o GOP (que são registados depois deste resultado) são,
sobretudo, da responsabilidade da administração ou do empreendedor. Por isso, e só assim, é que o GOP
mede a performance da gestão, o mesmo é dizer, a capacidade e desempenho do gestor.
Mas se investigarmos outras fontes congéneres do USALI, como seja o “Uniform System of Accounts for
Restaurants” (4ª ed. 1968, p. 19), verificamos que ao total dos custos antes do GOP chama de
«controllable expenses».
2
Uma vez que as características da actividade hoteleira não permitem produzir para stock, os proveitos
são coincidentes com a receita e, por isso, usamos o termo receita que ocorre no acto da prestação do
serviço ou venda.

85
Para efeitos de estruturação do plano de contas da contabilidade analítica sistema
uniforme (USALI), temos de ter em consideração, para além daqueles três grandes
grupos de centros de informação de gestão (que constam também no mapa resumo da
exploração), mais um outro grupo especial de centros de informação de gestão que se
designa por centro de custos transferidos, tais como: lavandaria do hotel, refeitório do
pessoal, outros benefícios e encargos do pessoal, etc. Trata-se de centros de informação
de gestão que aglutinam custos comuns a muitos daqueles departamentos referidos
anteriormente, mas que, apesar disso, não são custos indirectos mas directos e, portanto,
controláveis. Para iss, têm de ter um critério objectivo (e, portanto, uniforme e
universal) de imputação pelos departamentos para os quais prestam serviços internos.
Estes centros de informação de gestão são tratados, na contabilidade analítica de gestão,
autonomamente, mas, depois, ficam diluídos pelos departamentos a que se referem.
Assim, aparecem como contas transferidas nos balancetes e extractos daqueles
departamentos, mas não são visíveis no mapa resumo da exploração.

B) O agrupamento dos custos

De entre as várias maneiras de agrupar os custos1, o sistema uniforme (USALI) adoptou


o de custos directos e indirectos, também designado, tradicionalmente, por “direct
costing”2.

Os custos são agrupados, genericamente, em directos e indirectos.

Os directos são os que são específicos, no todo ou em parte, de um centro de


informação de gestão. Ou seja, são custos que ocorrem para benefício de um
departamento específico. Portanto, só se debitam a um determinado departamento os
custos que podem ser identificados, objectivamente, no todo ou em parte, com um
determinado departamento. No todo quer dizer a cem por cento; em parte quer dizer que
pode haver alguns custos que embora sejam comuns a mais do que um departamento,
não obstante têm uma base de rateio objectiva (e, portanto, necessáriamente uniforme
em qualquer unidade e em qualquer parte do mundo) que lhes permite serem
considerados e tratados como directos. Estes reduzem-se, infelizmente, a muitos pucos
casos (lavandaria interna, o refeitório do pessoal e poucos mais 3). Estes custos estão no
âmbito do controle e da responsabilidade directa do chefe ou director ou gestor
departamental e, por inerência, do director geral. Os custos directos são todos
controláveis, porque dependem da capacidade de gestão e decisão dos respectivos
gestores .

Os indirectos são os que são comuns a mais do que um centro de receitas/resultados.


Ocorrem para o benefício de todo o conjunto do hotel, pelo que não podem ser
identificados com nenhum centro de receitas exclusivamente. Eles não podem ser
controlados por nenhum chefe ou director de centro de receitas isoladamente, mas são
sempre da responsabilidade directa do director geral que os gere e responde por eles.
1
As mais utilizadas são: fixos-variáveis-mistos, directos-indirectos, controláveis-incontroláveis, reais-
orçamentados, reversíveis-irreversíveis.
2
Por oposição ao tradicional “total costing” que imputa todos os custos aos departamentos de receitas.
3
Nestes casos, o referido critério objectivo e portanto uniforme ou universal, é a percentagem de quilos
de roupa lavada para cada departamento (para o caso dos custos da lavandaria interna) e a percentagem de
refeições servidas para cada departamento (para o caso dos custos do refeitório do pessoal). Para o caso
dos benefícios do pesoal, é a percentagem da carga salarial de cada departamento, uma vez que esses
banefícios estão correlacionados com os ordenados.

86
Alguns dos custos indirectos não dependem da capacidade de decisão do gestor, mas
dos donos do capital e, por isso, dizem-se custos de capital ou incontroláveis. São os
que não afectam o GOP e, por isso, aparecem depois deste resultado. Não afectam o
resultado da exploração hoteleira. São custos eminentemente fixos (seguros, juros,
contribuição autárquica, rendas, amortizações.
Como já foi referido, estes são da responsabilidade não do gestor operacional, mas sim
da administração. Eles ocorrem independentemente do hotel estar aberto ou fechado. Ou
seja, são independentes do nível de actividade. É por isso, também, que podemos
designá-los por incontroláveis, na óptica do director geral. Alguns destes custos fixos
não têm uma existência física propriamente dita, com o é o caso das amortizações. O
objectivo deste agrupamento de custos é separá-los dos anteriores (directos e indirectos,
controláveis por parte do gestor operacional). Por isso, para efeito de informação de
gestão, este grupo de custos é tratado separadamente e apresentado em mapa próprio.
Nenhum departamento operacional é responsável por estes custos, mas sim o topo
estratégico1.

Todos os outros custos indirectos são inerentes à operação hoteleira e, por isso, se
designam por operacionais ou controláveis,2 tal qual os custos directos.

Por sua vez e atendendo à importância dos custos na hotelaria e em cada centro de
informação de gestão, os mapas de exploração do USALI e, portanto, o plano de contas
que lhes serve de base, agrega aqueles custos em cinco sub-grupos de importância:

 Custo das vendas;


 Custos com pessoal;
 Outros custos;
 Custos incontroláveis ou de capital;
 Impostos sobre o resultado

No plano de contas que serve de base aos mapas resumo de exploração, estes sub-
grupos têm um código que integra ou totaliza uma série de contas por natureza, a que
corresponde um código. São as contas de movimento propriamente ditas.

O “custo das vendas” é constituído por todos os bens ou serviços comprados e


vendidos (com ou sem transformação) aos clientes do hotel. Há alguns centros de
receitas, como por exemplo “Quartos”, que não têm custo e vendas.
Os “custos com pessoal” são constituídos pelos ordenados e todos os restantes custos
correlativos. Podem existir em quase todos os centros de informação de gestão, com
excepção do de “Água e Energia” (Utilities).
Os “outros custos” compreendem todos os restantes custos específicos de cada centro
de informação de gestão/departamento.
Os “custos incontroláveis ou de capital” são os custos inerentes a todo o género de
capital (fixo, como: amortizações, contribuição autárquica, seguros do imobilizado,
leasing, ou. Numerário, como: encargos financeiros).

1
Também podem ser designados por “Despesas e Receitas de Capital”, devido à sua natureza extra
operação hoteleira.
2
Como já referimos anteriormente, o “Uniform System of Accounts for Restaurants” (4ª ed. 1968, p. 19)
também designa o total dos custos antes do GOP por «controllable expenses».

87
Os “impostos sobre lucros” é um caso especial de custos, muito diferente dos
anteriores. Nem é um custo fixo nem um custo indirecto e muito menos directo. Ele
aparece com rubrica separada, no final do mapa resumo geral da exploração.

O detalhe de cada grupo destes custos, ou seja, as contas de custos a aparecer no plano
de contas, depende também muito do tamanho do hotel, da quantidade de centros de
informação de gestão e do nível de detalhe que se pretende para essa informação de
gestão, do tipo de operação e do sistema de contabilidade.

Para podermos escolher informação útil para o preenchimento dos mapas dos centros de
informação de gestão e respectivos relatórios de análise, torna-se necessário estabelecer
contas separadas por centro, de acordo com as várias naturezas de receitas e custos. Por
exemplo, uma conta única para registar os custos com pessoal não é suficiente para
satisfazer as necessidades de informação de gestão de cada departamento. Serão
necessárias contas discriminadas, para registar os respectivos custos.

Como também já referimos, alguns custos são primeiramente contabilizados num centro
de apoio e só depois transferidos para os centros para os quais prestam serviços, com
base num critério objectivo e, portanto, uniforme. É o caso, por exemplo, da Lavandaria
do Hotel (em função da percentagem do peso de roupa lavada para cada centro) e do
Refeitório Pessoal (em função da percentagem do número de refeições servidas a cada
centro).

Apesar de se preocupar com a uniformização, o sistema americano refere,


insistentemente, que cada hotel deve adaptar o modelo para satisfazer as suas próprias
necessidades particulares.

Tais adaptações podem ser feitas, quer ao nível da formatação dos extractos dos centros
de informação de gestão estandardizados, quer ao nível das contas, eliminando ou
acrescentando, conforme o que for mais apropriado. O sistema uniforme foi desenhado
de forma a permitir óptima flexibilidade, com a condição de se manter fiel aos
princípios de contabilidade geralmente aceites e com a teoria e estrutura básica do
sistema uniforme.

3.3.1.2-Formatação básica dos centros de resultados (ou de receitas)

Estes centros de informação de gestão têm vendas e custos (directos) e, por isso, se
chamam centros de resultados. É neles que se geram as vendas na hoteleira. Os centros
que compram e vendem, com ou sem transformação bens ou serviços, têm um conjunto
de contas cujo total se designa por “custo de vendas”. É o caso dos víveres, bebidas, nos
centros de Alimentação e de Bebidas, é o caso dos períodos telefónicos, no centro de
telefones.

Além destes custos, outros (como os de pessoal e outros) são deduzidos às respectivas
vendas, obtendo-se a margem de contribuição bruta do centro de receitas (positiva ou
negativa).

A título de exemplo, temos o seguinte resumo:

-Vendas líquidas (de descontos, abatimentos, IVA)

88
- Custo das vendas
- Custos com pessoal
- Outros custos directos
= Margem de contribuição bruta (positiva ou negativa)

3.3.1.2.1-Centro de receitas/resultados de “Quartos”

Este centro de resultados compreende as vendas de quartos ou alojamento, ou seja, de


dormidas. Não tem custo de vendas porque não vende matérias primas (víveres e
bebidas). Mesmo que um hotel disponha de mini bares (ou frigo bares) nos quartos, esse
negócio não é considerado em quartos, mas sim em alimentação (víveres) e em bebidas
(as bebidas).

Assim, os custos directos deste departamento agrupam-se apenas em dois sub-grupos:


os “custos com pessoal” e os “outros custos” directos. Da diferença entre as vendas de
dormidas e os custos directos, assim agrupados, resulta a margem bruta de contribuição
de quartos (positiva ou negativa).

3.3.1.2.2-Centro de receitas/resultados de “Alimentação e Bebidas”

Normalmente, sobretudo nas pequenas e médias unidades hoteleiras, onde a


plurifuncionalidade é mesmo muito importante, os custos de “pessoal” e “outros custos”
são de difícil desagregação do negócio específico de “alimentação” e do negócio
específico de “bebidas”.

Sendo assim, apenas as vendas de alimentação e as vendas de bebidas, bem como os


respectivos custos de vendas (víveres e de bebidas) são separados. Isto quer nos
respectivos consolidados de alimentação e de bebidas, quer em cada um dos pontos de
venda (restaurante, bar, etc.). Deste modo, é possível a obtenção de rácios custo de
vendas de alimentação e de bebidas, mas não os rácios discriminados de “pessoal” e de
“outros” custos directos. Estes (“pessoal” e “outros”) são tratados em conjunto, no
negócio de alimentação e de bebidas. Daqui resulta um remanescente também conjunto
que é a margem bruta de contribuição conjunta de alimentação e de bebidas (positiva ou
negativa).

Para hotéis grandes, onde também aqueles custos podem ser correcta e facilmente
discriminados, quer o negócio de alimentação, quer o de bebidas poderão ser tratados
totalmente separados.

Além das vendas separadas de alimentação e de bebidas, poderão ser gerados “outros
proveitos” neste departamento (designadamente, taxa de serviço de alimentação e
bebidas em quartos) que são tratados separadamente das vendas de alimentação e de
bebidas, para não afectarem a preciosa informação transmitida pelo rácio custo das
vendas de alimentação e de bebidas.

Quer as vendas, quer os custos são tratados, ao longo do mês, pela função controle de
proveitos e custos que, após auditar aquelas e apurar e tratar estes, transmite-os à
contabilidade. Normalmente, estes documentos de síntese têm a designação de “diário
de vendas” e de “reconciliação de custos”. Naturalmente, ambos fornecem a informação

89
discriminada por pontos de venda e, no caso dos custos, também o consolidado de
alimentação e de bebidas. A possibilidade do uso de bons pogramas de informática torna
toda esta preparação muito simples.

Resumidamente, as reconciliações de custos têm a seguinte estrutura básica:

Reconciliação geral ou consolidada de Alimentação.

Inventário inicial
+ Compras

= Custo dos víveres disponíveis (débitos)

- Inventário final (créditos)

= Total de víveres consumidos (custo bruto)

+ Bebidas para a confecção de alimentos


- Víveres para bebidas (mistura e aperitivos)
- Quebras
- Cedências de armazém (ao preço de custo)
- Consumos grátis de alimentação:
. Administração e direcção
. Promoção
. Animação
. Pessoal
...............

= Custo líquido das vendas de Alimentação

Reconciliação geral ou consolidada de Bebidas:

Inventário inicial
+ Compras

= Custo das bebidas disponíveis (débitos)

- Inventário final (créditos)

= Total das bebidas consumidas (custo bruto)

+ Víveres para bebidas (mistura e aperitivos)


- Bebidas para a confecção de alimentos
- Quebras
- Cedências de armazém (ao preço de custo)
- Consumos grátis de bebidas
. Administração e direcção
. Promoção
. Animação
. Pessoal

90
................

= Custo líquido das vendas de Bebidas

Reconciliação do ponto de venda:

Inventário inicial
+ Requisições
+ Transferências

= Custo dos víveres (ou bebidas) disponíveis (débitos)

- Inventário final (créditos)

= Total de víveres (ou bebidas) consumidos (custo bruto)

- Transferências
- Quebras
- Consumos grátis de alimentação (ou de bebidas):
. Administração e direcção
. Promoção
. Animação
. Pessoal
................

= Custo líquido das vendas de Alimentação (ou de Bebidas)

Note-se que, neste modelo, parte-se do princípio de que os víveres para bebidas (mistura
e aperitivos), bem como as bebidas para a confecção de alimentos são requisitados
sempre ao armazém, com requisição específica. O mesmo se aplica às cedências que se
subentende saírem única e exclusivamente do armazém. Sendo assim, os víveres para
bebidas (mistura e aperitivos) são para acrescentar na reconciliação dos bares que os
usaram e as bebidas para a produção são para acrescentar nas reconciliações dos pontos
de venda onde houver produção de alimentos (cozinhas) com utilização dessas bebidas.

Os restantes custos directos do departamento conjunto de alimentação e de bebidas são


agrupados por: “pessoal” e “outros” custos directos, à semelhança do que ficou dito para
o centro de receitas de quartos.

3.3.1.2.3-Centros de receitas/resultados de “Secundários”

Este grupo de centros de receitas é designado por “centros secundários” (“minor


departments”) porque, normalmente, de per si e mesmo em conjunto, têm um
contributo pouco significativo, relativamente aos departamentos operacionais principais,
para o total das vendas do hotel.

Com efeito, a principal razão de ser destes pequenos negócios não é propriamente o
negócio em si, mas a importância que eles poderão ter na valorização dos negócios
principais e, portanto, na motivação que podem ajudar a transmitir ao cliente, para ele

91
escolher o hotel que deles dispõe e para nele permanecer mais tempo. O próprio
investimento é visto mais como infra-estrutura de apoio e valorização da unidade, do
que como fonte de receita.

São muitas e variadas as hipóteses destes secundários. Com excepção dos telefones e da
lavandaria, eles variam muito de hotel para hotel. Mas vejamos alguns exemplos:
telefones, lavandaria, lojas, garagem, golfe, centro de saúde, ténis, etc. Dada a variedade
de situações e a natureza e dimensão de cada um destes pequenos negócios, cada caso é
um caso, pelo que não vamos entrar, aqui, em detalhes.

Além das vendas, todos têm alguns custos directos que são agrupados por: “custo das
vendas”, (no caso dos telefones, lavandaria de hóspedes e outros onde haja custos de
serviços ou bens vendidos), “custos com pessoal” (no caso de algum destes centros ter
pessoal específico) e, de um modo geral, “outros custos” directos. Do remanescente
entre as vendas de cada um e os respectivos custos, resulta a “margem de contribuição
bruta” (positiva ou negativa).
No caso de alguns destes pequenos serem mesmo insignificantes, podem juntar-se num
único centro de receitas, com um total de vendas e respectivos custos subagrupados
como ficou descrito nos departamentos anteriores.

3.3.1.2.4-Centro de “Rendas e Outros Proveitos”

Este é uma espécie de centro de receitas vassoura que varre, ou seja, aglutina todos os
restantes proveitos operacionais que não têm custos directos e que, portanto, não têm
cabimento nos centros de resultados anteriormente expostos. Entre outros, podemos
referir os seguintes: descontos de pronto pagamento, rendas de lojas, comissões,
serviços debitados mas não consumidos, etc.

3.3.1.3-Formatação básica dos centros de custos auxiliares (“suport


centers”)

Estes centros de apoio não têm receitas. São constituídos apenas por custos indirectos
(relativamente aos centros de receitas) mas controláveis. Ou seja, pelos restantes custos
operacionais,(para além dos custos directos dos centros de receitas), mas comuns aos
centros de receitas, portanto não distribuíveis, devido à falta de critérios objectivos de
rateio, a fim de salvaguardar a uniformização.

São organizados por grupos homogéneos, mais ou menos discriminados, de acordo com
a dimensão da unidade e a importância ou peso que tiverem em cada unidade hoteleira.
A 9ª edição do USALI (Uniform System of Accouts for the Lodging Industry) prevê os
seguintes:

 Serviços Gerais e Administrativos


 Recursos Humanos
 Sistemas de Informação
 Segurança

92
 Marketing (e comissões de franchise)
 Transportes
 Manutenção e Reparação
 Água e Energia (utility costs)

Os mais vulgarmente utilizados e tradicionais no USALI são:

3.3.1.3.1-Centro de custos auxiliar de “ Gerais e Administrativos”

Geralmente (pequenas e médias unidades), este departamento engloba os custos


relacionados com as funções de carácter administrativo e geral que não tenham centro
próprio, designadamente: direcção geral, contabilidade, compras, recursos humanos,
informática, segurança, transportes. Quem quiser e justificando-se, pode desdobrar
alguns destes custos por departamentos autónomos, como ficou dito, designadamente:
sistema informático, recursos humanos, transportes.

A subdivisão dos custos é sempre resumida em dois grupos: custos com “pessoal”
(quando aplicável) e “outros” custos.

3.3.1.3.2- Cento custos auxiliar de “Marketing”

Agrupa os custos associados com: publicidade, relações públicas, pesquisas comerciais,


comissões de franchising, animação1.
Havendo custos com pessoal, deve criar-se um grupo específico de custos , separado
dos “outro custos”.

3.3.1.3.3- Cento custos auxiliar de “Manutenção e Reparação”:

Agrupa todos os custos com as limpezas gerais, a manutenção de jardins, do edifício e


do equipamento de todo o hotel (excepto certos serviços especializados contratados a
terceiros, tais como central telefónica e informática, que se inserem nos respectivos
departamentos)2.

Também aqui, o grupo de custos com “pessoal” deve ficar separado e realçado dos
“outros custos” que, por sua vez, devem ser discriminados por natureza e
departamentos.

3.3.1.3.4- Cento custos auxiliar de “Água e Energia” (utilities):

Agrupa todos estes custos consumidos por todo o hotel. É o único departamento que
nunca tem custos de pessoal nem de materiais, para além daqueles que lhe dão o título.

1
Na edição anterior do USALI (a 8ª, de 1988), a animação tinha um departamento próprio, quando o seu
montante o justificasse. Nesta última edição (9ª), tal não está previsto.
2
Na edição anterior (8ª, 1988) os custos directos de manutenção eram contabilizados nos respectivos
departamentos, perdendo-se, assim, a informação de conjunto. Nesta 9ª edição, voltou a centralizar-se
toda a manutenção num único departamento auxiliar, como sempre se fez, desde a 1ª edição. Recomenda-
se, contudo, que este departamento tenha os custos o mais possível desdobrados por centros de
informação de gestão, podendo-se, assim, obter dupla vantagem informativa.

93
Por este motivo, este centro de custos é diferente dos anteriores, ou seja, não é
propriamente um “auxiliar” ou “centro de apoio” à letra.

3.3.1.4-Formatação básica dos “Incontroláveis” ou dos custos e receitas


de capital (“fixed costs”)

Trata-se de um grupo de custos cuja natureza, comportamento e dependência pouco tem


a ver com a gestão da operação hoteleira.

Com efeito, a responsabilidade destes custos não é do gestor da operação hoteleira, mas
dos proprietários (sócios ou accionistas) ou da administração da empresa. Por isso
mesmo, também podemos designá-los por custos “incontroláveis”, na óptica do gestor
operacional. Estes custos, normalmente, acontecem independentemente do nível de
actividade do hotel. Mesmo que ele esteja fechado, eles mantêm-se. Por isso, o “sistema
uniforme” americano designa-os por “custos fixos”1. Além disso, beneficiam o hotel no
seu conjunto, pelo que são indirectos. Portanto são indirectos incontroláveis.

Os principais custos deste grupo são:

 Rendas(inclusive o management fee)


 Contribuição autárquica
 Seguros (excepto os de pessoal)
 Encargos financeiros
 Amortizações

3.3.1.5-Mapa resumo da contabilidade analítica de gestão (sistema


uniforme americano - USALI):

Margem de
Centros de receitas Vendas líquidas Custo das vendas Custos c/ Pessoal Outros custos dir. contribuição
(ou de resultados) bruta
Quartos x x x xx
Alimentação x x X x xx
Bebidas x x x x xx
Telecomunicações x x x x xx
Lavandaria de hóspedes X x x X xx
Garagem X X X X xx
Centro de saúde X X x X xx
Ténis X X x X xx
Golfe X X X X xx
Piscina X X X X xx

1
Temos dificuldade em adoptar este termo para designar este grupo de custos, porque há outros custos no
nossa hotelaria que também são custos fixos, embora sejam controláveis (operacionais), como é o caso
dos custos com o pessoal.

94
Outros cent secundários X X X X xx
Rendas e outras receitas X xx
Total dos centros de
receitas
xx xx xx xx xx
Centros auxiliares
Gerais e administrativos X X x
Recursos humanos X X x
Sistemas de informação X X x
Segurança X X x
Marketing X X x
Comissões de franchise X x
Transportes X X x
Manutenção e reparação X X x
Água e energia X x
Total custos indirectos
operacionais
xx xx xx
Totais
xx xx xx xx xx
Resultado Operacional (GOP)
xx
Comissões de gestão / rendas
x
Contribuição autárquica
x
Seguros
x
Resultado antes de juros amortizações e de IRC
x
Juros
x
Resultado antes de amortizações e de IRC
x
Amortizações
x
Ganhos e perdas extraordinárias
x
Resultado antes de IRC
x
IRC
x
Resultado líquido
x
Fonte: USALI, 9ª edição, 1996, tradução do autor

3.3.2-O sistema uniforme americano (USALI) e o CBA

Já apresentámos, anteriormente, os objectivos deste sistema de contabilidade. Interessa,


contudo, aprofundar o objectivo da análise de desempenho (responsabilização) sem
deixar perder o fundamental da uniformização.

Este objectivo específico consiste na possibilidade de imputar responsabilidades


(premiar ou penalizar) através da análise de desempenho, quer do director geral, quer
dos directores ou chefes departamentais. A evolução desta preocupação e objectivo a
atingir designa-se por contabilidade baseada nas actividades de que a 9ª edição deste
sistema uniforme continua a revelar eco, embora este processo levante alguns problemas
de incompatibilidade com os objectivos da uniformização, dos rácios standard
subsequentes e da possibilidade de se fazerem comparações, que são objectivos
importantíssimos conseguidos pelo USALI e que o guindaram ao nível de sistema
uniforme de contabilidade hoteleira mundial.

95
Como já referimos anteriormente, este último objectivo (possibilidade de medir
performance), que não é mencionado no sistema suíço, foi determinante na
configuração do sistema americano (designadamente na separação entre custos directos
e indirectos) e marca a grande diferença entre estes dois modelos de contabilidade.

O objectivo da informação de gestão configurada dentro deste ponto de vista é dar


informação de gestão útil na avaliação da eficiência dos gestores e directores
departamentais (Cote, 1997). Ou seja, os gestores devem ser julgados, com base nas
receitas e custos que estão sob o seu controle directo. É uma das razões importantes por
que só se devem debitar a cada departamento apenas os custos directos controláveis
respectivos. Ir mais além, só é possível em segunda versão dos extractos
departamentais, com objectivos específicos e pontuais, do género:

 Ter uma ideia mais ou menos aproximada do total de custos desses mesmos
departamentos;
 Ter uma ideia mais ou menos aproximada dos resultados líquidos de cada centro
de resultados e respectiva rendibilidade;
 Ajudar a tomar uma decisão do género: comprar determinados bens ou serviços
a fornecedores externos, como alternativa aos internos, se tal for praticável
(outsoursing);
 Aumentar a sensibilidade e preocupação dos gestores dos centros de resultados
(departamentos operacionais) pelos custos gerais (indirectos ou comuns). Ou
seja, incentivar mais os directores dos departamentos operacionais a poupar
também nos custos gerais;
 Ter uma ideia mais ou menos aproximada dos custos unitários dos serviços
vendidos.

Naturalmente que, para este processo, não há procedimentos de fácil e rápida


implementação que possam ser totalmente uniformes. Cada hotel tem de encontrar os
métodos que, para si, achar mais correctos e segui-los consistentemente. Daí o
inconveniente para a uniformização, para a consequente obtenção de dados standard e
para a possibilidade de se fazerem comparaçõs. Em suma, para a satisfação dos
objectivos do sistema uniforme. Por isso mesmo, o manual do USALI alerta para que
esta informação seja vista e usada como mero complemento do sistema uniforme,
quando for considerada necessária para a gestão.

No exposto sobre o sistema de custeio baseado nas actividades (CBA), Azevedo


Rodrigues (1992) diz que a metodologia de implementação deste sistema obriga a um
questionamento que ajude a identificar as razões da sua adopção. Assim:

1. Quais são os problemas da empresa? O que se espera ou pretende obter da adopção


deste novo sistema de custeio? Que utilidade?
2. Está a empresa preparada para a sua utilização? Tem recursos para isso? Foi
ponderado o possível impacte sobre a estrutura e o processo de gestão? Existe boa
aceitação do pessoal? Os gestores vão utilizá-lo como verdadeiro instrumento de
gestão?

96
Posto isto, se as respostas aos quesitos anteriores forem por forma a acreditarmos no
sucesso do modelo, então há que:

 Definir as actividades da empresa (dentro dos seus processos de negócio).


 Identificar as actividades com e sem valor acrescentado, bem como as principais
e de suporte.
 Determinar o ciclo de actividade, bem como a sua unidade de medida.
 Identificar os geradores de custos (desenvolver análises de causa e efeito, por
forma a determinar os factores que verdadeiramente consomem recursos).
 Acumular os custos em actividades, por forma a conhecer o seu valor unitário,
para análises e decisões posteriores, nomeadamente, avaliação da cadeia de
valor, redução das perdas (custo de actividades sem valor acrescentado),
prospecções e simulações com base nas actividades de valor acrescentado.

Neste aspecto, os processos sugeridos na 9ª edição do manual do “Uniform System of


Accounts for the Lodging Industry (USALI) não são tão perfeitos, mas são mais
pragmáticos, porque mais simples. Ele começa por sugerir dois princípios gerais que
devem presidir à atribuição dos custos indirectos (undistributed expenses) nos centros
de resultados e que são:

1. Os que podem ser mais claramente atribuíveis a cada centro de resultados, como é o
caso, por exemplo, das rendas e de uma boa parte dos custos de manutenção e
reparação1
2. Os que podem ser atribuíveis em função dos recursos consumidos por cada
actividade e, por sua vez, por cada centro de receitas (sistema de custeio CBA
anteriormente apresentado).

Como vimos anteriormente, o sistema de custeio CBA é extremamente interessante


na teoria, mas não é fácil de implementar e generalizar como se pretende e muito
menos de o realizar uniformemente. Contudo, isto não impede que cada um possa,
privadamente e como complemento à informação standard obtida de acordo com o
sistema uniforme USALI (que utiliza o direct costing), distribuir os custos indirectos
pelos centros de receitas (critério total costing) e, assim, obter uma outra informação
complementar que permita ter uma ideia dos totais de custos de cada serviço,
respectivas margens líquidas de contribuição, etc. Os computadores facilitam esse
rateio. O problema é a dificuldade no rigor dos critérios.

Seja como for (recomenda o manual do USALI), nesse caso, os gestores devem estar
de acordo em atribuir a cada centro de receitas apenas aqueles custos que a boa
gestão crê que poderiam ser abolidos se o respectivo centro fosse encerrado ou
descontinuado.

Por outro lado, este processo requer:

 Um sistema de contabilidade apropriado.


 Uma adequada informação estatística (o mais realista possível) que sirva de base
ao processo de atribuição dos custos aos departamentos.

1
A partir desta 9º edição, os custos de manutenção e reparação estão, novamente, todos centralizados no
centro de custos de “Manutenção e Reparação”.

97
Sendo assim, segundo o manual do USALI, o mapa resumo de exploração do sistema
uniforme poderá apresentar a seguinte configuração complementar, para uso interno.

Quartos Alimentação Telefones Outros


e Bebidas
Vendas Líquidas
Custos directos
Margem bruta reportada
Menos:
Custos indirectos atribuíveis1
Margem bruta atribuível2
Menos:
Custos indirectos rateados3
Resultado Departamental
Ajustado
Mapa extraído do “Uniform System of Accounts for the Lodging Industry”, 9th edition e traduzido pelo autor

Deste modo, conciliam-se, simplesmente, as margens de contribuição brutas,


uniformemente obtidas, dos centros de receita (“Margem Bruta Reportada”),4 com as
margens de contribuição líquidas dos mesmos (“Resultado Departamental Ajustado”),
mais ou menos rigorosas e que muito dificilmente podem ser uniformes e comparáveis,
mas que podem ser úteis, não só pontualmente, para uso e tomada de certas decisões em
cada hotel, como para satisfazer outros objectivos almejados pelo CBA.

Porque alguns centros de custo auxiliares (agrupamento de custos indirectos mais ou


menos homogéneos) fornecem recursos a outros departamentos auxiliares bem como a
departamentos de receitas (ou de resultados), o rateio destes custos requer alguns
processos sistemáticos.

Na prática, o USALI sugere que se usem os seguintes métodos:

1-O método directo: em que os custos indirectos são debitados, directamente, aos
departamentos de receitas, com base numa certa lógica, do género: contributo para o
total das vendas, custos com o pessoal por departamento ou os metros quadrados de
cada área.

2-O método por etapas. Neste caso, os custos “não distribuídos” dum departamento
auxiliar tanto podem ser rateados por um outro departamento auxiliar, como também
por um departamento de receitas. Com este procedimento, é seleccionado um
departamento para um primeiro rateio e os custos são divididos segundo bases lógicas.
Os restantes departamentos são rateados de forma semelhante.

1
«Traceable Undistributed Expenses». Cf. Manual do USALI, 1996, 9ª edição, p. 184.
2
«Traceable Departmental Income». Ibidem.
3
«Allocated Undistributed Expenses»Ibidem.
4
Que são obtidas pela utilização do sistema uniforme (que utiliza o critério da separação dos custos
directos e indirectos, de acordo com o descrito pelo “Uniform System of Accounts for the Lodging
Industry”)

98
3-O método da fórmula: Segundo este método, o rateio de cada centro auxiliar é feito,
em simultâneo, para todos os outros departamentos servidos por esse departamento,
quer sejam ou não centros de receitas.

De acordo com este método, os centros de custos auxiliares (gerais) são classificados
como: (a) os que servem não só centros de receitas, mas também centros de custos e (b)
aqueles que servem exclusivamente, mas vários, centros de receitas. Os departamentos
designados na primeira alínea são rateados em primeiro lugar. 1

De acordo com o USALI, embora qualquer dos métodos apresentados possa fornecer
informação útil, se seguidos consistentemente, o método da fórmula ainda é o que
produz resultados que reflectem mais aproximadamente as actividades
interdepartamentais.

Seja qual for o método seguido, o manual da 9ª edição do USALI apresenta como
necessárias as seguintes etapas:

1- Compilar os dados, incluindo os serviços comuns aos departamentos, bem como


outras informações necessárias à determinação da base de rateio.
2- Reclassificar, se necessário, ou seja, alguns rateios podem ser feitos rotineiramente,
todos os meses. Contudo, esses rateios podem necessitar de revisão, a fim de se
obter uma distribuição mais rigorosa dos custos.
3- Distribuir as rendas, seguros e impostos por todos os departamentos, utilizando o
método directo.
4- Ratear os restantes custos indirectos, incluindo a parte dos custos fixos, usando um
dos métodos estipulados.

A propósito, reproduzimos aqui, com as adaptações consideradas apropriadas, a título de


curiosidade e de exemplo, um quadro com algumas bases típicas de rateio dos custos
indirectos “incontroláveis”2 e dos custos indirectos controláveis e que pode ser
encontrado na edição anterior do USALI (a 8ª, de 1986, p.137):

Bases típicas de rateio dos custos indirectos incontroláveis


Custos rateados Bases de rateio
Rendas 1-Percentagem do mix das vendas
2-Metros quadrados por área ocupada (renda fixa)
Contribuição predial 1-Metros quadrados por área ocupada
Seguro do imobilizado (edifício e recheio) 1-Metros quadrados por área ocupada
2-Metros quadrados mais investimento em
mobiliário e equipamento fixo
Juros 1-Igual ao anterior
Amortização - edifício 1-Metros quadrados por área ocupada
Amortização – mobiliário e equipamento 1-De acordo com discriminação do activo
2-Metros quadrados por área ocupada
Amortização - leasings 1-De acordo com o departamento que utiliza o
equipamento “alugado”

Bases típicas de rateio para os custos indirectos controláveis (Depart. Auxiliares):


Telefone 1-Número de extensões
1
É evidente que todo este processo é facilitado com recurso à informática.
2
“Incontroláveis”, no sentido já referido anteriormente, ou seja, que estão fora da alçada da competência
do gestor da operação hoteleira. Por isso, também podem ser designados por custos não operacionais ou
de capital. Na referida edição do USALI, têm a designação de “custos fixos”.

99
Benefícios e encargos referentes a pessoal 1-Registo do processamento dos ordenados
2- Número de empregados
3-Ordenados e salários
Gerais e administrativos 1-Custos acumulados
2-Número de empregados
Informática 1-Custos acumulados
2-Número de empregados
Marketing 1-Rácio da composição (“mix”) das vendas
Animação 1-Rácio da composição (“mix”) das vendas
Energia 1-Métros cúbicos por área ocupada
Manutenção e reparação 1-Folhas de obra
2-Número de empregados
3-Metros quadrados
Recursos humanos 1-Número de empregados
Transportes 1-Número de empregados
Mapa extraído do “Uniform System of Accounts for Hotels”, 8th edition, traduzido e adaptado pelo autor

Naturalmente que muitas destas bases ou critérios são discutíveis. Mas, de um modo
geral estas ou outras semelhantes serão sempre discutíveis. Por isso, não passam de uma
informação de segunda dimensão que pode ser útil para estudos pontuais de apoio a
determinadas decisões.

3.4-O POC e a contabilidade analítica de gestão hoteleira

Até à aprovação da 1ª versão do POC, em 1977, só existia normalização contabilística,


em Portugal, para as actividades bancária e seguradora. Como resultado da entrada de
do nosso país na CEE, em 1986, e as exigências da 4ª Directiva, entrou em vigor um
novo POC, em 1989, pelo qual nos regemos ainda hoje, no essencial.1
O POC abrange, no que lhe é essencial, a generalidade dos sectores, com excepção dos
que têm um POC específico.2 Contudo, nas pormenorizações é possível e natural que se
formulem diferenciações, desvios ou particularizações.
A. Borges et al. (1997) diz que «O POC mostra-se suficientemente flexível, quer no
sentido de possibilitar desdobramentos, quer devido ao facto de a sua aplicação se
restringir em função das situações concretas de cada empresa, em que parte das contas e
das notas do anexo poderá ser dispensada». Além disso, para as pequenas empresas,

1
Foi aprovado pelo Decreto-Lei nº 410/89, de 21de Novembro. Outras alterações houve posteriormente,
como o Decreto nº 238/91, de 2/7 (para normalização da consolidação de contas), mas não tão
importantes.
2
Alguns têm sido criados, tais como: para a actividade bancária e outras entidades do sector financeiro
(fundos de investimento mobiliário e imobiliário), para a actividade seguradora e, mais recentemente,
para as federações desportivas, associações e agrupamentos de clubes, para as autarquias locais, para as
organizações de solidariedade social, sem fins lucrativos, etc.
Não estão abrangidos obrigatoriamente pelo POC aqueles que, exercendo a título individual qualquer
actividade comercial, industrial ou agrícola, não realizem, na média dos últimos três anos, um volume de
negócios superior a € 150.000 (30.000 contos).

100
exige modelos de balanço e de demonstrações de resultados mais simples e anexos
menos pormenorizados.

É verdade que o POC foi elaborado a pensar sobretudo nas empresas comerciais e
industriais (R.F.Ferreira), pelo que empresas de prestação de serviços terão de fazer
algumas adaptações. No caso da hotelaria, por surpreendente que pareça, tais adaptações
são mesmo muito ligeiras, pelo que podemos dizer que o nosso POC, para a actividade
hoteleira, parece não levantar problemas significativos de compatibilidade com a
contabilidade analítica de gestão inclusa no USALI. Mas convém realçar que o decreto-
lei que instituiu o POC não exclui a admissão ou criação de planos sectoriais.1

Aquilo que do POC mais se aproxima da informação da contabilidade analítica de


gestão é a Demonstração de Resultados.

O POC preconiza duas demonstrações de resultados:


a) uma por natureza, obrigatória para todas as empresas (embora com um modelo
mais simples, para as pequenas empresas e outra, mais desenvolvida, para as
restantes);
b) outra por funções, obrigatória apenas para as entidades abrangidas pelo POC
que ultrapassem dois dos três limites anteriormente referidos2.
A demonstração de resultados por natureza é um resumo das contas de exploração
contidas nas classes 6 e 7 do POC (por natureza de proveitos e de custos). Portanto, não
satisfaz os objectivos da análise da performance, pelo que tem um interesse muito
limitado para a análise da gestão interna3.

A demonstração de resultados por funções proporciona-nos os resultados, discriminando


os seus componentes positivos e negativos por origem ou afectação e, em particular, de
acordo com as funções empresariais (produção, comercial, administrativa, financeira,
etc)4.

Em 97/05/09, a Comissão de Normalização Contabilística, através da sua Directriz nº


20, consagrou um novo modelo para a demonstração dos resultados por funções que
constava do POC. O objectivo foi uma maior aproximação a conceitos e normas
internacionais.

Novo modelo de demonstração dos resultados por funções


Venda e prestações de serviços X
Custo das vendas e prestações de serviços -X
Resultados brutos +/-X
1
Compete aos Ministros das Finanças e da Tutela, ouvida a Comissão de Normalização Contabilística, a
aprovação dos planos sectoriais e das normas regulamentares necessárias à aplicação. Como ficou
descrito anteriormente, nos últimos anos, têm vindo a lume e entraram em funcionamento vários planos
específicos, embora com pouca expressão, ainda, no campo das empresas propriamente ditas.
2
1.500.000 euros de activo, 3.000.000 euros de vendas líquidas e outros proveitos e uma média de 50
trabalhadores.
3
A Borges et al. (1997, p. 799) diz: «prevendo a 4ª Directiva quatro modelos de demonstrações de
resultados, foi, escolhido, como obrigatório, aquele que apresenta, em disposição horizontal, os custos e
proveitos classificados por natureza».
4
«O termo demonstração dos resultados por funções não nos parece o mais adequado, na medida em que
estando mais orientado para o interior da empresa, a sua estrutura deveria ser o mais próximo possível das
necessidades e interesses de informação de gestão». (BORGES A. et al., in: Elementos de Contabilidade
Geral, Lisboa, Rei dos Livros, 1997, 15ª ed., p. 803).

101
Outros proveitos e ganhos operacionais X
Custos de distribuição -X
Custos administrativos -X
Outros custos e perdas operacionais -X
Resultados operacionais +/-X
Custo líquido de financiamento -X
Ganhos (perdas) em filiais e associadas +/-X
Ganhos (perdas) em outros investimentos +/-X
Resultados correntes +/-X
Impostos sobre os resultados correntes -X
Resultados correntes após impostos +/-X
Resultados extraordinários +/-X
Impostos sobre os resultados extraordinários -X
Resultados líquidos +/-X
Resultados por acção +/-X
Fonte: Directriz Contabilística nº 20, transcrita de Borges A. et al. “Elementos de Contabilidade Geral” (1997, p. 805)

Isto coloca-nos já na direcção das preocupações da contabilidade analítica de gestão 1.


Contudo, a sua estrutura ainda está muito longe do objectivo final que traduza as
necessidades e interesses da informação de gestão. Normalmente, não tem interesse,
para a gestão das empresas, uma segmentação da informação por áreas funcionais tão
genéricas. As necessidades de análise, de diagnóstico e do apoio informativo às tomadas
de decisão podem exigir outro tipo de estrutura informativa: tipo de negócios, centros de
responsabilidade, actividades, segmentos de mercado, etc. «Daí ser possível e
aconselhável (diz Borges et al. na obra já citada) a elaboração de demonstrações de
resultados de acordo com a segmentação escolhida, como forma de analisar cada uma
das parcelas da empresa ou da sua actividade».

Vimos, anteriormente, o que a teoria e modelo do “Uniform System of Accounts for the
Lodging Industry” nos propõem como mais conveniente para a actividade hoteleira, a
qual ultrapassa, superiormente, esta generalidade, reduzindo-a a mero formalismo, nos
casos em que for obrigatória.

3.4.1-Compatibilidade entre o POC e a contabilidade analítica do


sistema uniforme americano

A prática da utilização de uma contabilidade analítica de gestão de acordo com o


sistema uniforme americano em complemento e paralelamente ao nosso POC tem-se
revelado pacífica e compatível. Já em 1981, poucos anos após termos optado pela
especialização em gestão hoteleira, publicámos uma singela obra debutante que
pretendia exactamente sugerir essa possibilidade2.

O essencial da actividade hoteleira, no seu conjunto, é uma prestação de serviços de


alojamento, restauração e outros, durante mais ou menos tempo, pelo que as suas vendas
típicas se contabilizam nas contas 72 do POC.
1
«Ao carácter universalista das demonstrações de resultados por natureza, contrapõe-se o carácter
particularista das demonstrações de resultados por funções» (ibidem BORGES et al, p. 803).
2
“Um plano de Contabilidade para a Hotelaria” (1981). Nesta adaptação, optámos por integrar a Analítica
nas classes 6 e 7 (“sistema” monista). A prática veio a ensinar-nos que é preferível utilizar a Analítica na
classe 9, separada da Geral (“sistema” dualista).

102
Podemos dizer que a novidade mais significativa está na contrapartida da contabilização
da prestação desses serviços que, na hotelaria, não coincide, normalmente, com o fecho
da factura.

Assim, a contrapartida da prestação dos serviços, para quem utilizar uma contabilidade
analítica de gestão a reflectir a realidade mensal da exploração, não pode ser nem contas
correntes (como é normal nas vendas a crédito) nem contas de caixa ou bancos (como é
normal nas vendas a pronto pagamento). Isto porquê?

Normalmente, porque os clientes dum hotel são hóspedes que consomem os vários
serviços espalhados pelo hotel e durante vários dias. Os registos desses vários serviços
são centralizados numa factura única, na recepção. Em todos os fins de mês, há muitas
facturas com débitos acumulados, mas não fechadas, que transitam para o mês seguinte,
porque dizem respeito precisamente a clientes que continuam hospedados. Perante esta
singularidade e para compatibilizarmos os interesses duma correcta informação analítica
de gestão, a solução poderá ser utilizarmos uma subconta da 21 que esteja livre no POC,
como é o caso, por exemplo, da 214, que podemos designar por “clientes hospedados”.
Sendo assim, esta conta é debitada, por contrapartida duma 72 “prestações de serviços”.
Quando o cliente sai e a factura é fechada, então debita-se “banco” ou “caixa” (se foi
paga) ou a “conta corrente” (se foi dado crédito) por contrapartida daquela conta
intermédia de “clientes hospedados”. Assim, o saldo desta última deverá coincidir com
o somatório do valor das facturas dos hóspedes que transitam para o mês seguinte.

Esquematicamente e como exemplo singelo de uma factura de 10.000 euros, com uma
suposta taxa de IVA de 12%, temos:

Prestação de serviços IVA liquidado Clientes hospedados Banco

8.800 (1) 1.200 (1) 10.000 (1) 10.000 (2) (2) 10.000
(vendas registadas e (IVA das respec- (soma facturas (soma facturas (soma facturas
facturadas líq. de IVA) tivas vendas) clientes no hotel) clientes saídos) pagas )

Para além desta singularidade, para o normal negócio da hotelaria restam poucas mais
adaptações do que designações do género: em vez de matérias primas são víveres e
bebidas; em vez de facturas em conferência são guias de remessa aguardando facturas,
etc.

A questão de se utilizar o sistema monista (Analítica integrada na Geral) ou dualista


(Analítica na classe 9, independente da Geral) não se põe tanto ao nível técnico, mas
sim em termos práticos.

3.4.2-Alternativa entre opção “monista” ou “dualista”

O nosso POC pressupõe, por princípio, a separação da contabilidade geral e da


contabilidade analítica de exploração. Este “sistema” designa-se por dualista ou duplo
contabilístico, por permitir manter a autonomia das duas contabilidades, de que resulta
uma grande flexibilidade da Analítica, conforme o sector de actividade e o maior ou
menor detalhe de informação desejado pelos gestores.

103
Contudo, permite também a possibilidade de integrar a contabilidade analítica de
exploração na contabilidade geral, desdobrando-se as contas obrigatórias das classes 6 e
7, à vontade de cada um.

Assim, na prática, podemos observar empresas hoteleiras portuguesas a respeitarem as


obrigações do POC e a trabalharem com a contabilidade analítica de gestão
(designadamente com o modelo USALI), optando por uma das seguintes alternativas:

a) Sistema dualista ou duplo contabilístico, que mantém a separação das duas


contabilidades, embora classificadas e processadas em simultâneo, mas com
estrutura e códigos que podem ser bem distintos.

Utilizando o modelo do sistema uniforme USALI, a estrutura básica dos centros de


responsabilidade e de informação de gestão, bem como o critério de tratamento ou de
agrupamento dos custos, têm de ser razoavelmente rígidos, para salvaguardar as
vantagens da uniformização ou normalização. Contudo, o desdobramento desses custos
(contas) e respectiva codificação podem ser muito flexíveis ou até mesmo totalmente
livres, desde que respeitem uma lógica adequada à estrutura e filosofia do USALI. Seja
como for, a utilização desta alternativa é exequível com as contas obrigatórias do POC,
sem problemas em toda a sua extensão (nem mais nem menos), ou seja,
compatibilizando as obrigações comuns do POC com as especificidades da actividade
hoteleira e a liberdade e necessidades de informação de cada gestor.

b) Sistema monista que integra a contabilidade analítica de gestão na contabilidade


geral, criando subcontas das contas por natureza e obrigatórias das classes 6 e 7 do
POC.

Esta alternativa tem vários inconvenientes, designadamente: dependência da lógica e


das contas por natureza (muito genéricas) do POC; necessidade de criar uma cascata de
subcontas nas contas obrigatórias do POC; códigos de contas com muitos dígitos,
dificultando memorização e aumentando a probabilidade de erros na digitação; plano de
contas (sobretudo a classe 6) muito longo e de difícil leitura e consulta; balancetes
muito longos com informação de gestão não estruturada por centros de informação de
gestão, mas por natureza de custos; informação dos centros de informação de gestão
espalhada ao longo do plano; necessidade de produzir um segundo balancete que
reagrupe essas naturezas espalhadas ao longa do plano, por centros de informação de
gestão, para se poder apurar os resultados e os indicadores de gestão e fazer as
comparação com os standards, ou seja, fazer a análise de desempenho.

É verdade que os recursos informáticos que hoje temos à disposição atenuam muitos
dos inconvenientes da alternativa monista e até resolvem alguns, mas só alguns e é
preciso que o software da aplicação de contabilidade esteja preparado para conseguir
isso de uma maneira eficaz e eficiente, o que nem sempre acontece. Assim, a nossa
vivência de muitos casos e o testemunho de vários gestores dizem-nos que a melhor
opção é a alternativa dualista.

Podemos resumir, no seguinte quadro, algumas das vantagens e desvantagens das


alternativas dualista e monista:

104
Vantagens e desvantagens das alternativas dualista e monista para a C.A.

Alternativas Vantagens Desvantagens


Duplo contabilístico  Maior flexibilidade e independência  Obriga a ter dois planos
do POC  Maior número de lançamentos
 Não obriga a muitas mais contas no contabilísticos
POC, para além das obrigatórias  Menor automatismo na integração
 Total independência e liberdade de
codificação e de informação
detalhada para cada centro de
informação de gestão e de cada caso
 Balancetes mais reduzidos e com
informação analítica directa por cada
centro de informação de gestão
 Informação directa das várias
margens departamentais e gerais
 Toda a informação de proveito,
custos e resultados gerais e por
centros de informação de gestão
pode ser lida com clareza,
simplicidade, mesmo por pessoas
menos familiarizadas com a
contabilidade
Integrado  Menor número de lançamentos  Menor flexibilidade e maior
contabilísticos dependência do POC
 Integração automática  Obriga a muito mais contas e
subcontas no POC, para além das
obrigatórias
 Dependência da lógica e das contas
por natureza do POC, em vez da
lógica departamental
 Códigos de contas com muitos
dígitos no POC
 Alongamento do plano de contas e
balancetes
 Impossibilidade de se obter
informação de gestão departamental
directamente do balancete
contabilístico
 Necessidade de se obter um segundo
balancete que aglutine as contas por
centros de informação de gestão
 Maior consumo de recursos (custos)
Quadro coligido pelo autor

Como se pode ver mais facilmente, por este quadro resumo comparativo, as vantagens
do sistema duplo contabilístico são bastante maiores do que as do sistema monista .

3.5-O anteprojecto do POC para a hotelaria portuguesa

Em Fevereiro de 1987, a Direcção Geral de Turismo (DGT) apresentou às associações


hoteleiras um documento que designou por anteprojecto do “Plano Oficial de
Contabilidade para a Indústria Hoteleira e Similar” e pediu-lhes o parecer. Este
projecto teve início em 19811 e o grupo de trabalho que o elaborou era presidido pela
DGT, mas constituído por técnicos em contabilidade e em direcção de hotéis que eram
1
Por coincidência o ano em que foi publicado um livro, já atrás referido, intitulado «Um Plano de
Contabilidade para a Hotelaria» que demonstrava a possibilidade de utilizar a contabilidade analítica de
gestão contida no sistema uniforme americano, com o nosso Plano Oficial de Contabilidade (POC) sem
que isso levantasse dificuldades e com o respeito que ele exige.

105
representantes nomeados pelas associações hoteleiras, sendo o autor um desses
representantes.

Após aceso debate sobre um documento base apresentado pela DGT a este grupo de
trabalho (muito seguidor do sistema suíço, na parte da contabilidade analítica),
concluiu-se ser mais vantajoso enveredar pelo modelo analítico americano. O processo
foi moroso e acabou por ser finalizado apenas pelos técnicos da DGT1.

Na introdução do trabalho final, pode ler-se o seguinte:

«Fazendo-se intérprete das necessidades sentidas pelo sector, preparou a DGT um


anteprojecto do Plano de Contabilidade para a Indústria Hoteleira (...). Desejaria a DGT
que este anteprojecto constituísse uma consistente base de trabalho para a aprovação de
um POC sectorial (...). O principal objectivo que presidiu à criação deste anteprojecto
foi a implantação de um sistema contabilístico usado na hotelaria americana e já muito
divulgado na hotelaria europeia, designado por “Uniform System of Accounts for
Hotels”.(...) A causa da grande expansão desse sistema contabilístico é exactamente o
motivo que leva a DGT a propor a sua adopção em Portugal: A existência de diversos
dados estatísticos (a nível nacional e internacional) de extraordinária importância para o
sector e que, em Portugal, são também publicados há já alguns anos, com o apoio da
DGT (...). Desejando, por consequência, tirar o maior partido da existência desses
elementos estatísticos sectoriais, tentou a DGT, com este trabalho, combinar o “Plano
Oficial de Contabilidade para as Empresas” com o “Uniform System”(...)».

Dado que era objectivo deste plano de contas servir também para os similares da
hotelaria, são apresentadas alternativas mais simplificadas em várias partes do plano,
mas está sempre subjacente o espírito de grande flexibilidade, porventura exagerada,
dado que, por vezes, se corre o risco de se perder o essencial da informação uniforme e,
portanto, a possibilidade se poderem fazer comparações.

Não é nosso propósito, neste trabalho, estudar o todo da contabilidade hoteleira, mas
apenas a parte analítica de gestão. Tão pouco queremos alongar muito a apresentação
deste anteprojecto, pelo que nos cingiremos à estrutura nuclear que presidiu aos centros
de informação de gestão (departamentos) e ao mapa resumo de exploração que se pode
obter, com base nos extractos departamentais, os quais sintetizam a teoria e a estrutura
que presidiram à elaboração da parte analítica do plano.

3.5.1-Estrutura dos centros de informação de gestão (departamentos)

Nas últimas décadas, as revisões do sistema uniforme americano foram editadas mais ou
menos de dez em dez anos. São alterações fruto da evolução da actividade hoteleira e
daquilo que a prática vai aconselhando, por vezes com avanços e recuos. Na data em
que foi finalizado este anteprojecto (início de 1987), tinha acabado de entrar em vigor a

1
À frente deste projecto da DGT, esteve sempre a Dra. Elisabete Louro que foi quem acabou por o
finalizar sozinha.

106
8ª edição do “A Uniform System of Accounts for Hotels” (1986) que introduziu algumas
importantes alterações e inovações à edição anterior.

Com excepção da exclusão do negócio de casino da exploração hoteleira (no caso deste
negócio estar integrado dentro de um hotel), o anteprojecto respeita praticamente todas
as restantes alterações e inovações.
Como vimos noutro ponto deste trabalho, em 1996 entrou em vigor a 9ª edição do
sistema uniforme americano com a nova e mais sugestiva designação “Uniform System
of Accounts for the Lodging Industry”. Por sua vez, o nosso POC também foi alterado
em 1989.

De acordo com as informações que nos foi possível obter, o anteprojecto de “Plano de
Contabilidade para a Indústria Hoteleira” foi entregue pelos dinamizadores do projecto
da DGT ao Ministério das Finanças em 1997. Entretanto, os referidos dinamizadores da
DGT mudaram, as associações do sector não agarraram o processo e, tanto quanto se
sabe, por lá ficou sem mais evolução e notícias.

Isto significa que a abordagem crítica que vamos fazer sobre este ponto é no contexto da
8ª edição do sistema uniforme e da edição do POC antes das alterações de 1989.

Não se pense, porém que estes factos desvirtuam significativamente este anteprojecto, já
que o essencial da teoria e da estrutura de informação de gestão se mantêm.

Estrutura dos centros de informação de gestão do anteprojecto DGT1

1-Departamentos Operacionais

11 Aposentos

12 Alimentação e Bebidas
121 Alimentação
1211 Restaurante
1212 Bar
1213 ..................
122 Bebidas
1221 Restaurante
1222 Bar
1223 ..................

13 Animação
131 Golfe
132 Piscina
133 Ténis

1
Recorde-se que o USALI foi da iniciativa e concretização da Associação de Hotéis de Nova Iorque, logo
abraçada pela hotelaria de todos os EUA e Canadá. Em contraste, o autor do presente trabalho apresentou
à Direcção da Associação de Hotéis de Portugal (AHP), em 1981, um projecto designado por «Um Plano
de Contabilidade Explicado para a Hotelaria», com a intenção de estimular uma iniciativa semelhante,
mas tal não conseguiu mais do que um louvor, da parte da direcçãso da AHP, e um “recomenda-se” aos
associados, através de uma circular.

107
134 Cinema
135 Casino
136 .................

14 Departamentos Complementares
141 Telefones
142 Lavandaria de Hóspedes
143 Lojas
1431 Tabacaria
1432 .....................
144 Garagem
145 .....................

15 Rendas e Outras Receitas

2-Departamentos Auxiliares

21 Vendas e Promoção
22 Música e Animação
23 Água, Energia e Combustíveis
24 Manutenção e Reparação
25 Serviços Administrativos
26 ......................................
27 ......................................
28 Outros Departamentos Auxiliares

3 -Exploração Global

31 Rendas e Alugueres
32 Seguros
33 Impostos
34 Encargos financeiros
35 Amortizações
36 Receitas Financeiras

4-Departamentos Secundários

41 De Produção
411 Cozinha
412 Pastelaria
413 ...............
46 Lavandaria do Hotel
47 Refeitório do pessoal
48 ....................................

108
É com base nesta estrutura que o plano de contas da contabilidade analítica se
desenvolve, apresentando duas opções: a alternativa monista e a alternativa dualista.

A nossa vivência profissional diz-nos que é preferível a alternativa dualista, ou seja,


trabalhar a contabilidade analítica na classe 9. Assim, ficamos independentes das contas
por natureza do POC, podemos desenvolver mais informação detalhada sem complicar
o plano e, mais importante ainda, temos o próprio balancete com a informação
estruturada, desde logo, por centros de informação de gestão, com uma leitura analítica
departamental directa, tornando-se mais fácil a obtenção dos extractos e resumos da
informação de gestão quer departamentais quer gerais.

3.5.2-Mapa resumo da exploração do anteprojecto da DGT

Lavand Outros Rendas TOTAIS


Designações Quartos A&B Telefone Clientes Animaç. departa e Outras
mentos Receitas Valor %

Departamentos Operacionais:
Vendas líquidas:
Alimentação X 1 X
Bebidas X 1 X
Restantes departamentos X X X X X X X
Total das Vendas Líquidas X 1 X 1 X 1 X 1 X 1 X 1 X 1 X 1oo
Custo das vendas:
Alimentação X % X %
Bebidas X % X %
Outros departamentos X % X % X % X % X %
Total custo das vendas X % X %
Margem bruta das vendas X % X % X % X % X % X %
Custos com pessoal X % X % X % X % X % X % X %
Outros custos directos X % X % X % X % X % X % X %
Margem bruta departamental X % X % X % X % X % X % X % X %
Departamentos Auxiliares:

Promoção e vendas........................................................................................................................................................ X %
Música e animação........................................................................................................................................................ X %
Água, Energia e Combustíveis...................................................................................................................................... X %
Manutenção e reparação................................................................................................................................................ X %
Serviços administrativos............................................................................................................................................... X %
Total dos Custos Auxiliares............................................................................................................................................. X %
Resultado Bruto Operacional (GOP)........................................................................................................................... X %

Custos e Receitas Globais.............................................................................................................................................. X %


Resultado Corrente........................................................................................................................................................... X %
Resultados extraordinários............................................................................................................................................... X %
Resultado exercícios anteriores........................................................................................................................................ X %
Resultado Antes de Impostos........................................................................................................................................... X %
Provisão para impostos..................................................................................................................................................... X %
Resultado Líquido............................................................................................................................................................ X %

Resumo adaptado pelo autor

Em anexo, apresentamos não só fotocópia do mapa original equivalente que consta no


anteprojecto e que tem a designação de “Demonstração de Resultados por Funções
(Hotelaria)”, como outros documentos relacionados com este anteprojecto.

Em nosso entender, esta síntese que aqui apresentamos não só traduz melhor a teoria
do sistema uniforme americano imanente neste anteprojecto de POC para a
Hotelaria, como resume melhor e mais claramente, os extractos departamentais

109
apresentados em anexo ao referido documento. Esta nossa opinião baseia-se,
resumidamente, no seguinte:

 Sugere-se a introdução dos rácios departamentais e não apenas os consolidados que


já lá constam, para dispormos desses importantes indicadores da performance de
cada departamento e os podermos comparar com os standards;
 Dispensa-se o cálculo da margem bruta departamental intermédia entre os Custos
com Pessoal” e os “Outros Custos Directos”, porque não se revela de interesse, na
prática, e muito menos num mapa de síntese informativa;
 Elimina-se a rubrica “Custos Operacionais não Incorporados” (subentende-se não
incorporados nos departamentos operacionais), que, de acordo com o USALI, se
identificam tão só com os custos indirectos que se subagrupam na designação de
“Auxiliares” (suport centers) e que, neste mapa em análise, aparecem a seguir, com
a designação de “Custos dos Departamentos Auxiliares”1;
 Elimina-se a rubrica “Resultado Operacional dos Departamentos”, (que no mapa em
análise, aparece a seguir à tal rubrica “Custos Operacionais não Incorporados”),
porque este resultado é o proveniente das vendas totais, menos os custos directos
totais e, como tal, já consta no mapa antes da tal rubrica “Custos Operacionais não
Incorporados”;
 Recomenda-se a discriminação da rubrica “Custos dos Departamentos Auxiliares”,
de acordo com os principais aglomerados dos custos indirectos
operacionais/controláveis que constam no USALI e no próprio anteprojecto:
“Promoção/Vendas”, “Música/Animação”, “Água/Energia/Combustíveis”,
“Manutenção/Reparação” e “Serviços Administrativos”. Isto porque o total destes
“Auxiliares” representam, normalmente, mais de 20% das vendas totais e
necessitam, no mínimo, desta informação mais detalhada;
 Introduz-se a rubrica “Resultado Bruto de Exploração (GOP 2)”, por ser o indicador
por excelência da performance e eficiência operacional;
 Aglutinam-se os “Proveitos não Imputados aos Departamentos” (cuja rubrica consta
no mapa em análise) com os vários “Custos Indirectos Não
Operacionais/Incontroláveis” (também designados por “Custos de Capital”) e cuja
rubrica não descortinamos no mapa em análise. Isto porque não os consideramos
relevantes numa perspectiva de análise/resumo de exploração e o seu montante
variar muito de caso para caso e, portanto, serem de difícil estandardização e, por
isso, não serem muito comparáveis.

Algumas das razões deste nosso parecer também fazem parte dos “comentários de
carácter geral”, contidos numa carta que a Associação de Hotéis de Portugal (AHP)

1
Com uma nota em rodapé que diz (e muito bem) que se “trata dos custos não imputados aos
departamentos da exploração”.
2
Gross Operating Profit, que foi a designação que o Uniform System of Accounts for Hotels (agora
USALI) utilizou durante muitas décadas (creio que até à 7ª edição) e que deixou de utilizar para não se
confundir com Gross Margin (Vendas-Custo das Vendas), passando a utilizar a designação Incom Before
Fixed Charges, designação que também tem tido alguma evolução, sendo a da 9ª e última edição de
Income After Unidistributed Operating Expenses. A realidade, porém, é que, na prática, tanto os
profissionais no terreno como a literatura da arte e as publicações estatísticas continuam a entender-se
com a sigla GOP para identificarem este resultado e indicador tão importante, para medir a performance e
eficiência do gestor operacional.

110
enviou à DGT, em 87/04/23,1 pronunciando-se sobre o referido anteprojecto, a pedido
da própria DGT 2.

3.5.3-Comentários críticos ao anteprojecto da DGT:

De um modo geral, as associações consultadas pela DGT manifestaram o seu acordo e


apoio a este anteprojecto, ressalvando apenas alguns pormenores. Dos comentários da
Associação dos Hotéis de Portugal (a única que tinha e tem expressão nacional)
enviados por carta à DGT, retiramos o seguinte extracto:

«Felicitamos a DGT por esta iniciativa que, desde a primeira hora, a AHP apoiou
criteriosamente. Estamos certos de que a futura (e esperamos que breve) entrada em
vigor deste documento, após os melhoramentos que sugerimos, será um marco na
organização e gestão das empresas hoteleiras, enquadrando-a no Sistema Uniforme
Internacional. Contem com todo o apoio da AHP para a promoção do Sistema
proposto».(AHP-1987).

Os principais melhoramentos que a AHP sugeria, e que corroboramos, são os seguintes:

a) Substituir a designação “Departamentos de Exploração Global” por “Custos e


Receitas de Capital” ou por “Custos Incontroláveis”. Isto para não se confundirem com
os custos operacionais indirectos (subagrupados nos departamentos auxiliares), mas que
são controláveis por parte do director geral do hotel, ao passo que estes que estão em
causa têm a natureza de capital e, como tal, são incontroláveis por parte do director
geral (embora sejam também indirectos).
b) Substituir a designação de “Departamentos Secundários” por “Departamentos
Transferidos”. Isto porque, por um lado, o termo “secundário” é o inverso de
“principal”, que normalmente é atribuído aos departamentos de “Quartos” e
“Alimentação e Bebidas”, por serem a essência do negócio hoteleiro; por outro lado, o
termo “transferidos” diz claramente tudo o que acontece com os departamentos em
causa, ou seja, são transferidos para os departamentos para os quais eles prestam
serviços, com base num critério objectivo (percentagem do peso de roupa lavada, no
caso da lavandaria do hotel e com base na percentagem de refeições servidas ao pessoal
dos diversos departamentos, no caso dos custos do refeitório do pessoal).
c) Discorda-se que, nos “Departamentos Auxiliares”, seja considerado um departamento
com a designação “Outros Departamentos Auxiliares”. O tratamento e agrupamento dos
vários custos indirectos é uma matéria muito sensível na contabilidade de informação e
controle de gestão, visto que tem evoluído e continua a evoluir ao longo do tempo. As
várias edições do sistema uniforme americano têm demonstrado muita preocupação
nesta evolução, mas também em preservar as características e os objectivos
fundamentais que são: a uniformização, a simplicidade pragmática e a análise de
desempenho. Por isso, embora o sistema uniforme vá abrindo novos centros
(departamentos) dentro dos “auxiliares”, para serem utilizados conforme os casos o
justifiquem (como por exemplo, “Informática”, “Transportes”, Recursos Humanos”,
etc.), não podemos, nesta área, criar uma solução tipo saco.

1
Alguns destes comentários constam em carta da AHP, refª. 149/10.3, de 87/04/23 e foram preparados
pelo próprio autor desta tese que, nessa data, fazia parte dos órgãos directivos dessa associação e a quem
a direcção da mesma incumbiu de elaborar parecer técnico sobre a redacção final do anteprojecto, que,
tanto quanto sabemos, já só foi da responsabilidade da DGT.
2
Ofício da DGT 0004240, ref. 87/DGT/SG, de 87/02/23

111
d) Compreende-se a grande simplificação de algumas alternativas apresentadas,
sobretudo no departamento de “Alimentação e Bebidas”. Contudo, o sistema uniforme
de contabilidade analítica de gestão é muito simples de aplicar, quer pela grande, quer
pela pequena unidade, pelo que, para as unidades hoteleiras, deverá ser obrigatória a
estrutura básica e essencial do sistema uniforme. Assim, a discriminação das vendas e
respectivos custos de vendas (ou seja, víveres e bebidas) entre “Alimentação”,
“Bebidas” e “Outras Receitas de A&B” deve ser obrigatória. É a partir desta
discriminação que se obtêm alguns dos indicadores de controle de gestão mais
importantes na actividade hoteleira.
e) Também em relação à estrutura dos mapas resumo da exploração são apresentadas
várias críticas, mas partindo-se do princípio de que tal resumo apresentado não passa de
uma mera sugestão exemplificativa, não nos alongamos mais nesta matéria1.

4-Síntese da abordagem teórica


O progresso tecnológico tem conduzido a uma preponderância do sector de serviços. O
turismo, apesar de ser uma actividade relativamente recente, está prestes a ser a primeira
actividade económica mundial. O aumento da competitividade empresarial, a
globalização da economia, a defesa dos interesses comuns e de cada um têm levado a
um maior interesse e realce do papel da informação contabilística e da sua suficiente
uniformização.

O Uniform System of Accounts for the Lodging Industry contém um esquema específico
de contabilidade analítica sectorial que data de 1926. Ele constituiu a primeira tentativa,
com sucesso, de levar a cabo um sistema uniforme de contabilidade, por centros de
responsabilidade, para a actividade hoteleira e foi uma das primeiras tentativas do
género em qualquer ramo da actividade económica.2

O Plan Contable pour l`Hôtellerie et Restauration Suisses é um modelo de plano de


contabilidade sectorial específico que, sintomaticamente, tem dado indícios claros de
procurar aproximar-se do modelo USALI.

Seja como for, ambos os casos constituem modelos de uma opção que é um plano de
contabilidade sectorial específico para a hotelaria e que poderia ser, também, uma das
hipóteses para a hotelaria portuguesa.

Acontece que, em Portugal, sobretudo nos últimos anos, temos assistido ao


aparecimento de alguns planos oficiais de contabilidade sectorial, embora não
propriamente na área das empresas stricto sensu. Assim, parece que deveríamos ou
poderíamos seguir aqueles exemplos e avançarmos para um plano específico sectorial
para a hotelaria portuguesa.

1
Ver o arranjo no ponto 3.5.2
2
«This represented the first successful organized effort to establish a uniform responsibility accounting
system for the Lodging Industry and one of the first such efforts in any industry» (Hotel Association of
New York City, Inc., “A Uniform System of Accounts for Hotels”, New York, H.A.N.Y.C., 1996, eighth
revised edition, p. vi.

112
Porém, já em 1987, por iniciativa da DGT e com a colaboração de associações do
sector, foi concluído e apresentado ao Ministério das Finanças um anteprojecto de
«Plano Oficial de Contabilidade para a Indústria Hoteleira e Similar», com o objectivo
de constituir «uma consistente base de trabalho para a aprovação de um POC sectorial»,
baseado no “Uniform System of Accounts for Hotels”1, devido às várias vantagens que
lhe são reconhecidas e à sua grande divulgação pela hotelaria internacional2.

Também já em 1981, foi publicado um livro (previamente apresentado à Associação de


Hotéis de Portugal, mas que declinou o projecto) onde, pela primeira vez, em Portugal,
se fazia a conciliação do sistema analítico contido no USALI com o nosso POC e onde,
no prefácio, uma das maiores autoridades nestas matérias e que foi membro da CNC 3,
reputava este trabalho «extremamente útil para o sector» e dizia que «a CNC criada pelo
Decreto-Lei nº 47/77 de 07 de Fevereiro, que aprovou o POC, tem, entre as suas
atribuições específicas, a de orientar a elaboração de planos sectoriais e de pronunciar-
se sobre eles terá por certo, já neste útil trabalho, uma primeira matéria para
oportunamente se debruçar».4

Apesar disso e passados todos estes anos, nada transparece que tenha evoluído nem que
se tenha concretizado neste sentido, para a actividade hoteleira. Também não se sente
qualquer pressão das forças do sector,5 pelo que esta aparente tendência de enveredar
por planos específicos sectoriais, na hotelaria, parece não despertar grande interesse
nem por parte dos empresários, nem por parte da CNC e, portanto, parece não impor-se,
pelo menos para já.

Embora o POC, nascido em 1977, apenas contemple a contabilidade na vertente


generalista e financeira, que não é suficiente como informação e instrumento de gestão,
ele reserva uma classe completamente livre (a nove) para nela poder ser desenvolvida a
contabilidade analítica de gestão, em ligação com a parte geral.

O sistema de custeio baseado nas actividades (CBA) é uma teoria muito interessante,
recentemente divulgada, mas de difícil aplicabilidade plena e rigorosa, principalmente
para as pequenas e médias unidades, que são predominantes na hotelaria portuguesa.
Além disso, e também por isso, a sua aplicabilidade plena é de difícil compatibilidade
com a uniformização (objectivo primordial, também, de uma contabilidade analítica de
gestão sectorial). O essencial deste sistema6, tanto quanto é compatível com esse
objectivo primordial da uniformização, já é tido em consideração pelo sistema uniforme
americano (USALI) desde 1926, data da sua primeira edição. Para os restantes custos
indirectos dificilmente imputáveis com base em critérios objectivos e, portanto
uniformes, este sistema uniforme (USALI) aconselha alguns métodos mais pragmáticos,
mas menos rigorosos e, portanto, como subproduto apenas da informação do sistema
1
8ª edição, 1988.
2
Ver introdução ao referido anteprojecto.
3
Professor Doutor Rogério Fernandes Ferreira.
4
LAMELAS J. P. et al. Um Plano de Contabilidade Explicado para a Hotelaria, Lisboa, Clássica, 1981,
pp.10-11.
5
Curiosamente, no prefácio do “Plano Oficial de Contabilidade para as Federações Desportivas,
Associações e Agrupamentos de Clubes”, Lisboa, Vislis, 1998, p.8, escreve o vice-presidente do IND,
Miguel, A M M: «na Comissão de Normalização Contabilística (CNC) encontrámos imediato apoio e
compreensão do problema, tendo-nos sido indicado o melhor caminho para a obra que realizámos e que
ora se publica. Em cerca de três meses, refizemos todo o trabalho que havíamos inicialmente
apresentado»...
6
Não absorção (imputação) dos custos indirectos pelos bens e serviços (departamentos de receitas).

113
uniforme, para uso exclusivo de cada unidade, quando tal informação se torne
necessária para auxílio suplementar de certas análises pontuais e tomadas de decisão.

O estudo feito, parece indicar-nos que o sistema uniforme de contabilidade analítica de


gestão contido no USALI é o que mais nos convém, para já. Para lá da literatura
específica que foi referida e de alguns artigos esporádicos, não é do nosso conhecimento
outra, entre nós, que nos diga qual será a opção mais viável para a hotelaria portuguesa.

Em suma, do ponto de vista pragmático, por agora e para a hotelaria portuguesa, parece-
nos que a melhor maneira, a solução mais rápida, imediata para os hotéis portugueses
que desejarem resolver o problema da implementação de uma contabilidade analítica
que satisfaça os requisitos de uma boa informação de gestão, será a adaptação do
modelo de contabilidade analítica contido no USALI, usando o espaço disponível na
classe 9 do POC, em conciliação com a obrigatória parte geral e financeira do mesmo
POC, que nos parece suficientemente flexível para que tal seja possível.

Este nosso parecer (de que com o POC e com o USALI, desenvolvido na classe 9, nós
resolvemos o problema) foi validado com o estudo de um caso significativo e relevante,
como veremos na segunda parte.

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