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1 – A legalidade do processo
Em Portugal, uma alteração à Lei Geral Tributária, mais especificamente, através dos nºs 2º e
3º do seu artº 63-A, estabelece que a Autoridade Tributária e Aduaneira deverá publicar (de
acordo com a Portaria 256/2017 de 14 de agosto) “as estatísticas relativas às transferências e
envio de fundos que tenham como destinatário entidade localizada em país, território ou
região com regime de tributação privilegiada mais favorável”; de modo mais sucinto e popular,
offshores.
A propósito de informação estatística, note-se que o INE – Instituto Nacional de Estatística tem
sido afastado, há décadas, da elaboração sobre tudo o que se refere à área fiscal1 como à das
finanças públicas (entre outras áreas), informação essa que tem ficado disseminada de modo
caótico entre a página da referida Autoridade Tributária e Aduaneira, da DGO – Direção-Geral
do Orçamento, do Banco de Portugal, do IGCP, com frequentes alterações de método e de
conteúdo; nos últimos anos, sob o auspícios do Eurostat ou do BCE que, no âmbito da
intervenção da troika, eliminaram muita da falta de transparência nas contas públicas.
Como é evidente, esta situação não é um descuido de ignorantes mas uma política continuada
de obscurecimento e ocultação da realidade da gestão pública, que visa o desconhecimento
das relações mafiosas entre os governos, as oligarquias em que se inserem e os interesses
privados que se insinuam na sombra. Por outro lado, iniciativas individuais não têm
acolhimento na obtenção de dados junto das instâncias estatais – como seria apanágio de um
regime verdadeiramente democrático – embora esses dados sejam disponibilizados, na
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Cremos que as últimas Estatísticas Fiscais publicadas pelo INE foram em 1988; seguiu-se um tempo de
inexistência, ou de divulgação parcial e desconexa, sem qualquer lógica de planeamento da divulgação
de tudo o que se relaciona com a área fiscal e das finanças públicas e da qual o INE ficou de fora.
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prática, a empresas de informática instaladas em órgãos públicos ou às grandes empresas de
consultadoria.
O conceito de registo offshore - embora muitos não se situem geograficamente em ilhas mas
em áreas continentais (onshore) - popularizou-se com aquele nome; e está associado aos
capitais que procuram carga fiscal nula ou reduzida, da ausência de interferências
fiscalizadoras dos Estados e das instâncias judiciais ou policiais, mormente quando esses
capitais são provenientes de tráficos (armas, drogas…) ou de extorsão, provenientes ou
destinados a actividades criminosas.
Por outro lado, os navios com deficientes condições de segurança, com maior risco de
acidente, têm o seu registo impedido nos países mais desenvolvidos, mais zelosos da sua
segurança, condições de trabalho e salariais. Assim, hoje, como há décadas, as principais
bandeiras de registo dos navios são as do Panamá e da Libéria, surgindo mais recentemente,
em terceiro lugar, as Ilhas Marshall que, como se entenderá são países com … enormes
necessidades de transporte e poderosos armadores; porém, em 2017, estes três países têm o
registo de 15.6% da frota mundial e 42.4% da tonelagem (dwt)2.
Se bem que haja offshores que são países, como os Emiratos Árabes Unidos, o Qatar, a Suíça, o
Uruguai… ou o Panamá (que se celebrizou recentemente com os Panama Papers, evidenciando
a relação dos offshores com o crime) outros, são micro-estados, sobretudo nas Caraíbas ou na
Polinésia, tornados como tal por conveniências da anterior potência colonizadora, para os
quais o parqueamento de capitais é importante fonte de receita; finalmente, há ainda
endereços offshore em locais tão remotos ou desconhecidos da maioria das pessoas, como as
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UNCTAD/CNUCED – Review of Maritime Transport - 2017
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ilhas de Jan Mayen, de Niue, de Pitcairn ou de Labuan (esta talvez presente para os leitores de
Emilio Salgari).
Portugal não é um país rico, não tem um painel muito sofisticado de capitalistas e tem relações
comerciais muito concentradas em poucos países. Porém, apresenta, nos elementos que
adiante desenvolveremos uma situação única; “Portugal tem de longe a maior lista de paraísos
fiscais da Europa" disse há perto de um ano, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Voltando aos envios de fundos para “país, território ou região com regime de tributação
privilegiada mais favorável”, pretende-se regulamentar na portaria acima referida, a
informação relativa ao envio de fundos, no sentido da obtenção de informação que enforme
relatório sobre “a evolução do combate à fraude e à evasão fiscais” a entregar pelo governo à
diligente Assembleia da República, no âmbito do artigo 64.º-B da Lei Geral Tributária.
A piedosa intenção revelada em nada irá prejudicar a saída de capitais para offhores, uma vez
que estes se tornaram instrumentos essenciais para as movimentações de capitais, para a sua
menor oneração tributária, para a sua aplicação fora da supervisão dos governos,
eventualmente para negócios escusos e criminosos. Como é bem sabido, apesar de há muitos
anos os governos se referirem negativamente aos offshores, a verdade é que eles perduram,
como se alarga a sua disseminação pelo planeta, tal como aumenta a sua utilização e
envolvimento em fraudes e descapitalizando os estados e as finanças públicas; para além de
contemplarem uma profunda desigualdade na carga fiscal face à que incide sobre os
rendimentos do trabalho – largamente escrutinados pelos governos – e os rendimentos de
capitalistas, médios e grandes.
Residentes em Portugal
2013 2014 2015 2016
Individuais
nº 794 721 759 2.119
1.000 € 140.726 160.309 145.095 258.243
média (1000 €) 177,2 222,3 191,2 121,9
Pessoas coletivas
nº 1465 1692 1859 3148
1.000 € 621.050 828.544 1.112.492 2.132.710
média (1000 €) 423,9 489,7 598,4 677,5
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Quanto aos indivíduos residentes em Portugal observa-se em 2013/15 uma relativa
estabilização quanto ao seu número, bem como do valor global transferido. Em 2016 triplica o
número de saídas e sobe substancialmente o capital transferido, fixando-se a média de cada
ordem de transferência em € 122 milhares, claramente abaixo da verificada nos anos
anteriores. Dito de outro modo, as transferências individuais… “democratizaram-se”.
No que se refere aos ordenantes individuais não residentes em Portugal, o seu número
quadruplica no período considerado, sobretudo devido ao crescimento registado no último
ano. Como o volume dos capitais retidos no exterior cresce aproximadamente na mesma
proporção, a dimensão monetária de cada movimento de capitais varia pouco, situando-se em
2016, próxima dos € 131.2 milhares.
Estes enormes volumes de capitais gerados em Portugal e colocados no exterior, com o brando
cumprimento de deveres fiscais para com o Estado português, são parqueados em “país,
território ou região com regime de tributação privilegiada mais favorável” para se utilizar a
adocicada expressão contida na lei portuguesa. E, pelos números revelados, facilmente se
conclui haver, em contrapartida, uma grande maioria de indivíduos e empresas que não
beneficiam dessa tributação privilegiada, dessas facilidades alargadas de circulação de
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rendimentos e capitais. Trata-se de um expediente disponível ou utilizado por uma ínfima
minoria de pessoas ou empresas.
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ocasionais ou sistemáticas, por exemplo, no contexto das externalizações ou dos lesivos
contratos de parceria público-privada….
O conjunto de capitais transferidos acima quantificados pode ser comparado com algumas
grandezas macroeconómicas (recolhidas no Eurostat e na DGO) para que melhor se avalie a
sua dimensão. São elas, o PIB, a exportação de bens e serviços, os juros da dívida pública e a
formação bruta de capital.
Tomando como base o ano de 2013 a evolução daquelas grandezas e a das transferências para
offshores apresenta o seguinte perfil, revelador da disparidade do que se passou com aquelas
transferências e as outras variáveis macroeconómicas, sobretudo em tempos de anémico
desempenho da economia portuguesa.
No total dos quatro anos foram utilizados 77 destinos offshore para o caso dos residentes
(pessoas ou entidades coletivas) e 70 para os não residentes. A oferta é vasta, a concorrência
forte e o grau de concentração em uns quantos destinos é apreciável. Mas o que mais nos
espanta é o profundo conhecimento de geografia manifestado pelos capitalistas individuais ou
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coletivos que até saberão que existe… um Tuvalu ou um Brunei Darussalam! A procura de
ninho para os capitais, abre caminho à cultura…
No caso dos residentes, a dispersão por vários continentes revela o seu universalismo que
apresenta algumas diferenças, mesmo que o peso dos dez mais relevantes destinos, em
número de transferências e no montante global transferido não seja muito distinto; porém, a
representatividade dos três mais relevantes destinos é muito distinta, em termos de número
de transferências e nos seus valores, revelando assim um valor médio por transferência
relativamente baixo.
O destino com maior volume médio de transferência é Bahamas, com 422 casos em todo o
período; porém, o caso de Samoa é mais interessante porque a sua relevância resulta apenas
de uma transferência, em 2016, de uns € 479 milhares.
Ao contrário do que acontece com os residentes há uma grande concentração dos capitais nos
principais países de destino, claramente superior ao número de transferências. No capítulo do
valor das transferências médias são notórios os grandes montantes observados para o Barhein
e as Bahamas, embora no primeiro caso se tenham realizado apenas 63 transferências em
2013/16, muito menos do que no respeitante às Bahamas para onde se efetuaram 667
transferências no mesmo período.
Transf. Valor
Total 66937 € 5399 M
Transferências de fundo de maneio (Cash
46.0 60.2
Management Transfer) (%)
Pagamento a fornecedores (Supplier Payment) (%) 17.2 14.3
Transações de títulos (?)(Trade) (%) 25.3 13.3
Pagamento da aquisição de títulos (Trade
5.5 5.8
Settlement Payment ) (%)
Outros motivos* (%) 5.9 6.4
* Pagamentos por cartão de crédito, dividendos, pagamento
governamental, seguros, juros, pagamentos internos a uma mesma
empresa, empréstimos, pagamento de salários, títulos, segurança social,
impostos, pagamentos ao tesouro, retenções
Quanto aos não residentes, o grau de concentração é muito mais elevado, sendo o valor
transferido muito superior e, repartido em menos operações.
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Transf. Valor
Total 40269 € 20091 M
Transferências de fundo de maneio (Cash
73.7 93.0
Management Transfer) (%)
Pagamento da aquisição de títulos (Trade
16.7 4.2
Settlement Payment ) (%)
Outros motivos* (%) 9.6 2.8
* Dividendos, pagamentos internos a uma mesma empresa,
empréstimos, pagamento de salários, títulos, segurança social,
pagamento a fornecedores, impostos, transações de títulos, pagamentos
ao tesouro
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