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Das árvores...

que a terra do Brasil produz, devo começar


p e l a descrição de u m a das árvores mais notáveis
e apregoadas entre n ó s p o r causa da tinta que
dela se extrai: o Pau-Brasil que deu n o m e a essa
região. Essa árvore, a que os selvagens c h a m a m
de arabutan...
E m verdade só cortam o Pau-Brasil depois
que os franceses e portugueses c o m e ç a r a m a
freqüentar o pais...
... Os nossos tupinambás muito se admiram
dos franceses e outros estrangeiros se darem ao
trabalho de ir buscar o seu arabutan (pau-brasil).
Uma vez um velho perguntou-me: p o r que vindes
vás outros, mairs e peros (franceses e portugueses)
buscar lenha de tão longe para vos aquecer?
Respondi que tínhamos muito mais utilidade p a r a
a madeira, e q u e não queimávamos, c o m o ele
supunha, mas dela extraíamos tinta p a r a tingir,
tal qual o faziam eles com seus cordões de algodão
e suas plumas.
Retrucou o velho imediatamente: e p o r ventura
precisais de muito? - Sim, respondi-lhe, p o i s no
nosso p a í s existem negociantes que p o s s u e m
mais panos, facas, tesouras, espelhos e outras
mercadorias do que podeis imaginar e um só deles
compra todo o pau-brasil com que muitos navios
voltam carregados. - A h . R e t r u c o u o selvagem,
tu me contas maravilhas, acrescentando depois d e
bem compreender o que eu lhe dissera: M a s esse
h o m e m tão rico de que me falas não morre? - Sim
disse eu, morre c o m o os outros.
M a s os selvagens são grandes díscursadores
e costumam ir a qualquer assunto até frito, p o r
isso me perguntou de novo: e quando morrem
para quem f i c a o que deixam? - Para seus filhos,
se os têm, respondi: n a f a l t a destes p a r a os
irmãos ou parentes mais próximos. - N a verdade,
c o n t i n u o u o velho, que, c o m o vereis, n ã o e r a
n e n h u m tolo, agora vejo q u e vós outros mairs
sois grandes loucos, p o i s atravessais o m a r e
sofreis grandes incômodos, c o m o dizeis quando
aqui chegais, e trabalhais tanto p a r a amontoar
riquezas p a r a vossos filhos ou p a r a aqueles que
vos sobrevivem. N ã o será a terra que vos nutrir
suficientes p a r a alimentá-los também? Temos
pais, mães e filhos a quem amamos; mas estamos
certos de que depois de nossa morte a terra que
nos nutriu também os nutrirá, p o r isso descansamos
sem maiores cuidados.

(Lery, Jean de. Viagem a Terra Brasil (In:


Gasrnan, op. Cit, pp.24-7) 1558.
Oh, bendito o que semeia,
Livros... livros à mão cheia!...
e manda o povo pensar.
O livro caindo n´alma
é germe que faz a palma,
é chuva que faz o mar.

Castro Alves

Projeto Pau-Brasil de Leitura em Sala de Aula


aprovado pela Lei Estadual de Incentivo à Cultura,
conforme prot. CTAP7SEC 0401/001/99 - Decretos
nºs 39.494/98, 39.546/98 e 39.684/98

2
A Saga
do
Pau-Brasil

3
A
Prof. Diana Elizabeth,
cúmplice, crítica, personagem.
Maria Vitória, José Francisco (Chico) e Ana Laura,
- 500 anos depois do descobrimento, ainda sentem pelo
Brasil a mesma fé e o fascínio dos descobridores.

4
Welington Almeida Pinto

A Saga
do
Pau-Brasil
História, Monopólio & Devastação

Edições Brasileiras

5
DO MESMO AUTOR

Coleção Infantil Vitória Régia - Livros: A Águia e o Coelho, Clin-Clin, o Beija-Flor Mágico,
Tufi, o Elefante Equilibrista, Seu Coelhino, em Viagem ao Sol, O Gato-do-Mato e
o Preá e A Caçada - Edita/1973
Malta, o Peixinho-Voador no São Chico - Edita/1976
Flicts - adaptação do livro Flicts, de Ziraldo, para o Teatro/1972.
O Pequeno Príncipe - adaptação do livro O Pequeno Príncipe, de Antoine Saint
Exupery para o Teatro/1974
História do Brasil, em Aula Viva - adaptação de temas históricos para o Teatro
aplicados em sala de aula - Edita/1978
A Cela - Obra para Teatro de Arena - Pscodrama - Helbra/1971
Poesia - Antologia Poética - Edita/1980
Dicionário Geográfico e Histórico do Estado de Minas Gerais - Edita/1983
Dicionário Geográfico e Histórico do Estado de São Paulo - Edita/1984
Condomínio e suas Leis - Edições Brasileiras/1993
Licitações e Contratações Administrativas - Edições Brasileiras/1993
A Empregada Doméstica e suas Leis - Edições Brasileiras/1994
Lei do Inquilinato - Edições Brasileiras/1994
Assédio Sexual no Local de Trabalho - Edições Brasileiras/1996
Santos-Dumont - No Coração da Humanidade - Edições Brasileiras/1998

Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional

Pinto, Welington Almeida, 1949


P 659 A Saga do Pau-Brasil
Welington Almeida Pinto - Belo Horizonte: Edições
Brasileiras, 2000.
80 p. : II.
Inclui bibliografia. Contém gravuras e desenhos produzidos desde o
Sec. XV. Suplemento por ficha de leitura : Ensino de 1º Grau
1. Pau-Brasil. Descobrimento, 1500 - Exploração e Viagens
nas Caravelas: História. 2. Índios - Tratamento recebido: Terra
Brasilis. I. Pinto, Welington, A. II. Título. III. Série
CDD : B 869.35
CDU : 869(81) - 3

Índices para catálago sistemático:


1. Brasil : Descobertas e explorações geográficas 869.35
2. Livro de Leitura - História : Ensino de 1º Grau 869.35

Copyright 2000 by Welington A. Pinto


Reservados todos os direitos de publicação a Edições Brasileiras
Sociedade Brasileira de Cultura Ltda
Rua da Bahia, 1148 - conj. 1740 - Belo Horizonte/MG
Telefax.: ( 0 - - 31) 224-6892 - Pedidos pelo Reembolso Postal
Impresso no Brasil - Printed in Brazil

"O livro é um instrumento indispensável no desenvolvimento de uma Nação"- W.A.Pinto


Rebobinando nossa História, vale fazer uma viagem no tempo e passear
pela história do Pau-Brasil, nesta parte do Continente Americano, aqui
contada de forma especial para alunos do ensino fundamental. E a quem
mais possa interessar.
O livro A Saga do Pau-Brasil tem como base o princípio da Pedagogia
de Projetos, capaz de estimular discentes e doscentes a promover pesquisas
interdisciplinares, inclusive de campo, com o objetivo de facilitar o
aprendizado de uma questão histórica em sala de aula.
Combinamos conteúdo de várias disciplinas, como História, Ecologia,
Geografia, Ciências, Matemática, Estudos Sociais e Português, como
suporte para avaliação de alguns trechos e melhor aproveitamento do
conteúdo.
A idéia é apontar um caminho criativo para o estudo de várias matérias
em torno de um assunto único.

O Autor
Mapa do Brasil, reproduzido do atlas dos Reinel. Índios cortando e transportando Pau-Brasil.
- Pau-Brasil? Nunca vi um, Professora.
- E Você, Maria Vitória?
- Só ouvi falar. Sei mais que a Ana Laura!
- E Você, Chico?
- Também já ouvi falar... Vi uma foto numa revista... Jornal... Que é
bonita, posso garantir, Dona Diana.
A Professora:
- Levante a mão quem mais conhece ou já ouviu falar, viu fotografia, da
árvore que é símbolo natural brasileiro.
- Direita ou esquerda? – brinca Maria Vitória.
- Só porque está com o braço na tipóia, aparecida! – caçoa Joana, no
fundo da sala.
Chico, sempre gozador:
- Taí, gostei do aparecida... Só porque quebrou esse braço, fica
levantando, na maior vantagem... Essas meninas, Dona Diana.
Maria Vitória pôs a língua para o colega, a Professora interfere:
- Chega de braço quebrado e de tipóia... Aposto que a Maria Vitória
não quebrou o braço porque quis... Pelo jeito, mais da metade não ouviu
falar e nem viu nossa árvore famosa. Isso mesmo, e nem uma, nem um de
Vocês pode ter culpa nisso. Pau-Brasil quase foi extinto em terras
brasileiras...
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Depois dessa conversa de fim de aula, no Colégio Santos-Dumont, a
Professora Diana combina com a classe dar um passeio até o Jardim
Botânico e conhecer de perto, ao vivo e a cores, um exemplar de Pau-
Brasil. Para os jovens, nada melhor: uma saída do comum das aulas
entusiasma a todos. Motivação melhor? A árvore famosa ia favorecer
uma boa escapada da floresta de pedra da cidade grande.
No dia combinado, lá vão todos contentes, inclusive o motorista do
ônibus, o Tatão, um gorducho de queixo mole e cara arredondada, que
adora passar a manhã longe do trânsito agitado e admirar a Natureza,
principalmente uns passarinhos também raros, uma paixão de seus tempos
de menino no Interior:
- Ô Dona Diana, a senhora é fogo com essas idéias.
Mal o especial estaciona em frente ao portão principal do Jardim
Botânico, os estudantes, um mais assanhado que o outro, se debruçam
nas janelas ou se levantam das poltronas para o corredor para descer o
mais depressa.
- Já posso abrir a porta, Dona Diana? – pergunta o Tatão, cuidadoso.
A Professora, de pé junto à porta do ônibus, balança a cabeça,
concordando:
- Só um minuto. Hei!... Hei!... Sem baderna, Pessoal! Sairemos em
fila, bem comportados.
Os meninos, um a um, descem, falando e rindo. Acham graça em tudo.
Na entrada, orientados pelo Porteiro Juraci da Silva, um moreno
troncudo, cara de índio e voz grossa, os meninos vão para a varanda do
prédio da administração, onde aguardam o Diretor do Parque.
Manhã agradável, céu limpo e muito azul; poucas nuvens passeiam nas
alturas. A vegetação desafiava a cidade, descia pelo Parque em camadas
de glorioso verde. E nas árvores ao redor os passarinhos coloridos
cantavam em galhos, ou cruzavam o ar em vôos rápidos de um lado para
outro.
De repente, a voz rouca de um papagaio invade a varanda:
- Ô Felício! Ô Felício! Currupaco-papaco. Ô Esmaragdo!
Todos olham para cima, procurando o dono da estranha voz. Onde?
Os mais danadinhos ameaçam correr para fora do alpendre, imaginando
que o papagaio só podia estar no telhado. Chico sugere, metido a entender
de papagaio:
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- Podemos pedir uma escada e subir para procurar o bichinho no meio
daquela folhagem no beiral da varanda.
Genial a idéia. Um alvoroço, um empolgamento; querem dar palpite.
Nisso, sem ninguém imaginar, um homem aparece na porta da varanda e
interrompe a algazarra:
- Tchã, tchã, tchã, tchã... Aqui estou eu, Cambada!
Num pulo, os meninos recuam um passo; se embolam. O estranho
homem solta uma sonora gargalhada e pergunta:
- Nunca me viram?
Ninguém responde. Todos embasbacados, olhos arregalados de
espanto e curiosidade.
- Meus Senhores! Minhas Senhoras! Sou o Felício Esmaragdo
Valverde, o Professor Felício, se preferem. Vieram visitar o Jardim ou
aprender mais alguma coisa sobre Botânica, aposto! Fiquem à vontade,
por favor, Professora...
Aliviada pelo susto, sorrindo, aperta a mão do Professor e diz:
- Ambas as coisas. Meu nome é Diana; estes são meus alunos,
conforme telefonei. Vamos cumprimentar o Professor Felício Esma...
- ... ragdo Valverde, Dona Diana, meu nome completo.
- Bom dia, Professor! – gritam em coro, com as mãos na boca,
despistando uma risada pela novidade inesperada da situação.
- Bem vindos ao Jardim das Plantas.
Ana Laura, já descontraída, quer saber:
- Professor, ouvimos um papagaio tagarela por aí. Podemos ver o
bichinho? Se é mesmo papagaio...
- Papagaio, aqui! Não é possível, Professora. Mas pode ser!... No
Brasil, toda reserva florestal, por menor que seja, deve ter papagaio, que
também simboliza esta terra...
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A resposta do Diretor deixa o grupo encafifado. Entreolham-se,
tentando entender a situação.
A Professora intercede:
- Vamos esquecer por enquanto essa história de papagaio. Estamos
aqui para conhecer a árvore que deu nome ao nosso País. E para o
Professor: - Sabemos que o senhor é botânico, ambientalista e especialista
no assunto...
Felício percebe a inquietação geral e tenta acalmar o clima:
- Meu trabalho é uma obrigação e um prazer, aqui entre a Natureza.
Muito bem, Garotada! Será que existe mesmo um papagaio aqui? Eu
bem que desconfiava! Ouvi também voz de papagaio chamar meu nome
por aí, mas ando tão entretido lendo um livro sobre vegetação brasileira
que até nem prestei muito atenção... Bem, se existe um papagaio mesmo
aí fora, vai ter que aparecer. Quem é vivo sempre aparece, diz o ditado.
Aliás, este ambiente não pode ser melhor para um papagaio morar. Vai
ver, fugiu dalgum cativeiro. O Jardim ainda não tem papagaio, a ave-
símbolo do Brasil. Estamos providenciando um casal para povoar este
pedaço... E também outras aves nacionais. Canários e sabiás já temos.
Virão também jandaias e uns periquitos, o nosso pequeno e simpático
tuim. Numa próxima visita, Vocês verão psitacídeos por todos os lados.
Nosso pequeno paraíso vai ficar ainda mais bonito.
Maria Vitória, ainda um tanto confusa, insiste:
- Então pode existir mesmo um papagaio solto aqui?
Sem garantir nem que sim, nem que não, o Professor dá uma boa
risada, que, para os alunos, soa com uma confissão. Felizes, se cutucam,
com rizinhos de satisfação curiosa.
- Muito bem, vamos deixar esse papagaio falador para o final da
história. Até lá, já mostrou a cara, quero dizer, o bico. Qual é mesmo o
nome da árvore que vieram conhecer?
- Pau-Brasil! - gritam na maior euforia.
O Diretor ajeita a calça jeens, sempre escorregando para baixo da
barriga avantajada. Vira o rosto em direção ao fundo do Jardim, arregaça
as mangas da camisa e aponta na direção de uma árvore mais distante,
alta e frondosa:
- Aquela bonita e cheia de espinhos é o nosso Pau-Brasil.
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Os alunos levantam os olhos em direção da árvore, que se distinguia
entre outras.
- Olhem: logo ali, eu vi primeiro – grita a Professora cheia de admiração,
mordendo a ponta da caneta.
O Diretor, muito extrovertido, salta para o pátio. Os meninos, agitados,
nem esperam pela Professora e descem atrás do Professor Felício,
correndo, no rumo de uma estradinha de terra batida, toda riscada pelas
rodas das carrocinhas dos zeladores até o pé da grande árvore.
Ainda na varanda, Dona Diana acompanha a felicidade dos alunos,
também alegre e emocionada, aspirando o cheiro bom de mato. E elogia:
- Isto é um paraíso, Professor! E bem no perímetro urbano!
- Ou o que resta dele, nesta selva de concreto armado!
Os dois adultos descem ao encontro dos colegiais bem mais na frente,
e já com estripulias em volta do tronco majestoso da árvore-símbolo do
Brasil, apalpando com cuidado a casca áspera, apanhando folhas caídas
para jogar uns nos outros, como se lançam confetes em bailes de Carnaval.
Outros abrem os braços e rodopiam feito avião, em torno da planta.
Conheciam um típico exemplar de um Pau-Brasil: frondoso, bem
copado, cheio de folhas miúdas e de casca espinhenta; mais grosso do
que um poste de luz e mais de dez metros de altura.
O Professor pede atenção:
- Meninos e Meninas, hoje é o Dia da Árvore?
- Não! - respondem uns.
- Dia 5 de junho é o do Meio Ambiente. E o da árvore, qual é mesmo?
– insiste.
- 21 de setembro – afirmam, em coro.
A Professora participa:
- Todo dia é dia de árvore, não é, Pessoal?
E depois de uma nova admirada na árvore em frente:
- Que tal agora todos assentados nesses banquinhos em volta do Pau-
Brasil? O Professor vai-nos contar uma história interessante. Eu estou
morrendo de curiosidade...
- Muito bem. Qual de vocês já tinha visto um pé de Pau-Brasil, assim
tão de perto?
Rodrigo levanta um braço:
- Eu só conhecia de fotografia! Assim é muito mais bonito.
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Daniel, que tinha estado calado, levanta também um braço:
- Só conhecia de gravura, de um livro de meu pai. Ao vivo, é a primeira
vez. Legal!
- Eu também!
- Eu também!
- Eu também!
- Pela importância dessa árvore, meus jovens, ela deve ser plantada
nas ruas, praças e jardins das cidades brasileiras.
- É só querer, não é, Professor Felício? – ajuda um no meio do grupo.
- Ainda tem muito Pau-Prasil em nossas matas? - pergunta, outra vez
o Daniel.
Sorridente, o Professor apalpa o tronco da árvore e começa a história
prometida:
- Está praticamente extinto, e isso tem uma explicação. Desde o
descobrimento do Brasil, europeus ambiciosos, doidos para enriquecer,
viram na extração dessa madeira um meio de conseguir, rápido e fácil,
grandes fortunas.
- E ganharam muita grana? – quis logo saber o Beto, faiscando os
olhos.
- Quem já era rico, mais rico ficou. Naquele tempo, cortaram Pau-
Brasil por toda extensão das terras que iam de Cabo Frio, no Rio de
Janeiro, ao Cabo de São Roque, em Pernambuco; um arraso! Coloriam a
Europa de vermelho com a preciosa árvore. O Governo Brasileiro, hoje,
está preocupado em incentivar o replantio de nossa árvore-símbolo. Já é
um bom princípio, não acham?
Todos concordam, os braços levantados. A Professora Diana repete
os gestos dos meninos.

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A VIAGEM DE CABRAL

O Professor Felício prossegue:


- Atrás de novas terras para conseguir riquezas, como as que extraíam
no Oriente, os portugueses não perderam tempo, ainda mais depois das
descobertas de Cristóvão Colombo, para a Espanha. Assim, cheio de
planos, o Almirante Pedro Álvares Cabral partiu de Lisboa com uma frota
de treze navios, com destino à Índia, onde as riquezas eram conhecidas e
trazidas para a Europa com muitos lucros; viajaria mar afora pelo caminho
descoberto por Vasco da Gama.
Contam alguns historiadores que uma calmaria, isto é: uma falta de
ventos para soprar nas velas dos navios, obrigou a frota de Cabral a
afastar-se da costa africana. Desviou-se tanto que, quarenta e quatro dias
depois, com bons ventos, acaba por cruzar o desconhecido e temido
Oceano Atlântico e descobre, em vinte e dois de abril de 1500, o nosso
País, com a sua floresta rica em Caesalpinia echinata, o Pau-Brasil - as
viagens marítimas eram muito perigosas e demoradas, como estão
percebendo.
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Rugendas - Ponte sobre o cipó - prancha 54

O Professor pára e pergunta:


- Muito bem, Turma, e qual mesmo o nome da elevação de terra que
Cabral e seus tripulantes avistaram primeiro?
- O Monte Pascoal – Conceição acerta.
- Ótimo! – e tirando um livrinho do bolso de trás das calças – aqui está
cópia da carta de Pero Vaz de Caminha, o escrivão da frota de Cabral.
Marquei o trecho em que descreve esse primeiro grande momento do
descobrimento. Quem quer ler para mim?
Antes que alguém responda, Ana Laura levanta um braço:
- Manda o Chico, ele vive esnobando que tem voz de locutor de rádio.
O garoto cai na risada:
- Você é quem deve ler... É a mais tagarela da turma.
- Eu não!... Mas se é para o bem geral de todos...
- Muito bem, Laura. É um trechinho de nada – mostra o Professor.
- Mas só vale em sotaque português!... sugere um.
- Isso eu não sei imitar. Ah!... Vamos lá: ... quarta-feira seguinte,
pela manhã, topamos aves a que chamam furabuchos. Neste dia, a
horas de véspera, houvemos vista de terra. Primeiramente dum
grande monte, mui alto e redondo: e doutras serras mais baixas ao
sul dele: e de terra chã, com grandes arvoredos: ao monte alto o
Capitão pôs o nome: o Monte Pascoal, e à terra, a Terra de Vera
Cruz.
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- Parabéns! E por que Cabral deu esse nome ao monte?
- Por ser época da Páscoa – apressa em dizer, Vitor.
- Professor, essa história de calmaria parece papo furado... – Maria
Vitória, a do braço direito numa tipóia, insiste no assunto dos ventos
parados.
O Diretor coça a testa, em sinal de pausa para raciocinar:
- Com o avanço dos estudos da História do Brasil, essa lenda das
calmarias já está explicada. A frota de Cabral viajou mesmo com intenção
definida para tomar posse de umas terras que Portugal sabia existir, embora
superficialmente, por alto, por assim dizer. Pelo Tratado de Tordesilhas,
assinado em julho de 1494, entre os reis de Portugal e Espanha, todas as
terras descobertas nos limites de 370 léguas, além da Ilha de Santão, no
Arquipélago de Cabo Verde, pertenceriam a Portugal.
- Já li, Professor: os ventos fortes é que afastaram a frota de Cabral da
rota – completa Matilde.
- A Carta de Pero Vaz de Caminha, aquela para Cabral enviar ao Rei,
conta a descoberta com pormenores; desmente essa tese, mesmo com o
desaparecimento da nau comandada por Vasco de Ataíde; como também
a das calmarias. Caminha informou que durante a viagem não ter havido
tempo forte nem contrário.
- Tanto segredo! Por quê?
- O silêncio pode ser de ouro – filosofa o Professor. Talvez o rei D.
Manuel I não tinha absoluta certeza de encontrar terras dentro dos limites
fixados no Tratado de Tordesilhas. Um fracasso desprestigiaria a memória
de D. João II, que tinha assinado o documento, certo de assegurar parte
de terras do outro lado do Mundo a Portugal, como fez Cristóvão Colombo
para a Espanha. Pode ter sido essa a razão do sigilo. Caso Cabral não
descobrisse nada, ninguém ia saber; o destino declarado publicamente da
viagem era a distante Índia, onde ia constituir relações comerciais com
Calicute e, principalmente, consolidar a presença portuguesa no continente.
E quem duvidaria?
- Rei esperto! Não tinha pensado nisso – comenta Jaqueline.
- O segredo é a alma do negócio – cita a conhecida frase o Chico,
sempre com um palpite.
Risos gerais.
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- O assunto é polêmico. Em 1843, o historiador Francisco Adolfo
Varnhagem, após consultar a Carta de Mestre João Faras, nos arquivos
da Torre do Tombo, em Portugal, passa a defender a intencionalidade da
descoberta do Brasil.
- Professor Felício – levanta a mão Sonia – não é esse Var...nhagem
quem descobriu a tumba com os restos mortais de Cabral?
- Sim senhora. Isso se deu em 1839, lá em Santarém, também Portugal.
Aí ele botou a boca no mundo acusando Portugal de descaso com o
túmulo.
- Epa! – protesta um.
- Professor, existem mais provas de que a Corte Portuguesa sabia de
terras por aqui? – pergunta Lucinha.
- Sim. E bem consistentes. Se Cabral não renovou o estoque de água
em Cabo Verde, é porque ele tinha segurança que faria escalas em terras
ocidentais. Caso contrário, a tripulação morreria de sede antes de chegar
à Índia. Tem outra versão que é uma verdadeira bomba, a do historiador
português Joaquim Barradas de Carvalho. Ele garante que, em 1498,
Duarte Pacheco Pereira esteve no Brasil, numa viagem secreta, a serviço
da coroa portuguesa. Em 1505, ele publicou um tratado sobre navegação
e geografia da costa africana, com o nome Esmeraldo de Situ Orbis
(Sobre os Lugares do Mundo), onde registra pormenores sobre terras na
parte ocidental do Atlântico, como a de uma grande terra firme, com
muitas ilhas oceânicas e coberta de muito fino brasil. Duarte foi um
dos negociadores portugueses no Tratado de Tordesilhas e comandou
uma das caravelas de Cabral.
- Que legal, sô! – surpreende Juquinha.
O Professor vai completando a narrativa:
- Outra prova importante. Em fevereiro de 1500, exatamente no dia
dois, pouco antes da chegada de Cabral nas praias brasileiras, o espanhol
Vicente Yañez Pinzon, navegando com uma flotilha de quatro caravelas,
desembarca na Ponta do Mucuripe, atual Estado do Ceará. Dali é que
avança para o noroeste, indo descobrir a foz do Rio Amazonas.
Impressionado com a vastidão de seu leito, chama o local de Santa Maria
del Mar Dulce.
18
Na volta para o mar, Pinzon, ainda próximo da costa do Pará, cruzou
com a expedição de Diogo de Leppe, outro espanhol que navegou pelo
Brasil antes de Cabral. O principal testemunho dessa viagem pioneira é a
chamada Carta de Juan de La Cosa, cartógrafo e navegador, escrita ainda
em 1500.
Os visitantes imaginam a cena, e o Professor Felício conclui:
- O certo, meus Caros: a Terra dos Papagaios, a Terra do Pau de
Tingir, a Terra dos Tupis e dos Tapuias, chamada por estes de Pindorama,
foi mesmo descoberta por Pedro Álvares Cabral, que encontrou
ancoradouro firme, mais com alívio e satisfação, do que com surpresa.
Acho que nada vai tirar o pioneirismo de Cabral. Para muitos historiadores,
o ano de 1500, como descobrimento do Brasil, se reveste de um caráter
mais simbólico e oficial do que real. Não importa!...
Ao pronunciar Terra dos Papagaios os estudantes remexem nos
banquinhos. O Professor percebe a inquietação, e tranqüiliza os ouvintes:
- Não me esqueci da história do papagaio desconhecido. Vocês não
perdem por esperar mais um pouquinho!
Risos confiantes. Ângela tira uma dúvida:
- Verdade que o nome do Rio Amazonas foi uma homenagem a uma
tribo de mulheres guerreiras, que vivia na região?
- Conta a História que o navegador espanhol Francisco Orellana foi
quem viajou pela primeira vez pelo enorme rio. No diário de bordo, ele
relata ter encontrado índias guerreiras montadas a cavalo, como na lenda
das amazonas. Pelo sim, pelo não, o fato determinou a escolha do nome
para o maior rio do Planeta.
O Professor Felício volta a falar de Cabral:
- Ele era inteligente, ambicioso, profundo conhecedor de Geografia,
Ciências e da arte de navegação. Tinha muito prestígio em Portugal, tanto
que na sua despedida, uma multidão tomou conta do cais; e pelo Rio
Tejo, dezenas de barcos, apinhados de gente, festejaram em torno de
seus navios até a frota desaparecer no horizonte.
Tiago se ajeita numa pedra em que estava sentado, e pergunta:
- Aposto que Cabral também queria buscar Pau-Brasil?
- Não. A portentosa armada de Cabral, em cujas velas dos navios
realçava o enorme símbolo da cruz da Ordem de Cristo, veio sondar a
região. Confirmar terras, claro. Depois, voltaria à Índia para assumir de
vez o domínio português naquele território; prender ao Reino Lusitano os
samorins e rajás indianos pelos laços do comércio e da aliança,
principalmente Glafer, o Samorim de Calicute.
19
- Pelo bem ou pela força, não é, Professor? – caçoa Ana Laura.
Chico levanta o braço para esclarecer uma dúvida:
- Uai! Então Pindorama foi o primeiro nome do Brasil?
- De certa forma, sim.
- Que significa Pindorama?
- Em Tupi, quer dizer Terra das Palmeiras.

Nau Portuguesa do tempo do descobrimento do Brasil. Aquarela de Roque


Gameiro
20
O PRIMEIRO CONTATO

Entusiasmado com a motivação nos meninos, o Professor continua:


- Na quinta-feira, dia 23, assim que amanheceu, a esquadra cabralina
avança um pouco mais, ancorando-se em frente à desembocadura de um
pequeno rio, o Caí, ao sul do Monte Pascoal, aproximadamente meia
légua (3 km) da costa.
Dos navios, a tripulação curiosa, avista um grupo de homens que andava
pela praia. Nicolau Coelho, marujo que participou da viagem de Vasco
da Gama à Índia, foi o primeiro a desembarcar para tentar um contato
com os nativos.
21
- E o coitado foi sozinho? – se preocupa Ana Laura.
- Não, nem pensar... Levou o companheiro Gaspar da Gama, o judeu
da Índia, conhecedor de vários dialetos hindus da costa de Malabar, um
padre, um grumete da Guiné e um escravo da Angola.
E depois de um suspiro:
- Tudo era desconhecido até então. Ana Laura, venha ler o trecho em
que a carta de Caminha registra este encontro histórico.
A menina, vaidosa:
- Sim, Professor. Parece que virei a narradora oficial do Jardim
Botânico! Muito bem, me dá o livro.
- Não vale gaguejar – faz chacota a Maria Vitória.
- Eu não sou gaga. Muito bem, vamos lá: de acordo com Caminha
eram poucos índios, cerca de 18 ou 20, pardos, todos nus, trazendo
nas mãos arcos e suas setas, aguardavam na praia os estrangeiros
com aquelas roupas mais espalhafatosas, jamais vistas por eles.
Nicolau, por gestos, fez sinal para que pousassem os arcos. E eles
consentiram. Dóceis, receptivos, tornaram fácil o primeiro encontro
com o branco. Nicolau, para iniciar as relações diplomáticas com os
índios, ofereceu-lhes o seu barrete vermelho, uma carapuça de linho
e um chapéu preto. Em troca, os índios retribuíram com uns cocares
de penas compridas, pintadas de vermelho, e colares de continhas
brancas; o Padre dava-lhes a bênção, fazendo no ar o sinal-da-cruz, o
que os índios, naturalmente, nada entendiam.
O Professor dá um tapinha de leve no ombro da estudante,
agradecendo. E continua:
- Quando Nicolau regressou ao navio, todo satisfeito, Cabral esperava
aflito no convés: - Vamos, Nicolau, (o Professor Felício acentua o sotaque
português), diga logo o que viu, o que conversou com a gente dessa terra!
O marujo, o rosto avermelhado pelo sol forte da praia, o dólmã, um
tipo de casaco militar, desabotoado no peito, responde ainda meio surpreso:
- Pura sorte!... Mal sabe o Capitão o que nossos olhos viram?
- Não me faça suspense, ó Nicolau. Sem trocadilhos, conte logo.
Nicolau, piscando muito, exclama:
22
- Todos nus, Capitão! Peladinhos! Peladinhos! Tanto homens como
mulheres. Gente parda, de bons narizes e bons corpos. Ih!... Nusinhos,
como Adão e Eva no Paraíso! Pobrezitos, de uma ignorância espantosa!
Nunca dos nuncas meus olhos viram coisa igual. Mas, são muito agradáveis.
- Que nada vestem, isso lá eu sei, pá!... Afinal para que servem minhas
lunetas! Diga que conversa teve com eles, homem de Deus? Não me
minta pela gorja! – Cabral, impaciente, alisava com a mão direita a barba
densa, arrebitando um pouco o dedo mindinho, onde exibia uma safira
indiana, presa num grosso anel, reluzente ao sol.
Os olhos do Marinheiro Nicolau brilhavam como a safira do dedo do
Capitão-Mor. E procura explicar melhor o encontro com os nativos:
- Ora, pois, pois, Almirante. Ih! Ih! Tentar, eu tentei falar no Português
mais compreensível que pude. E nada. Não entendiam bulhufas. Também
nada compreendemos do que eles falaram... Uma língua muito estranha!
Entendemo-nos por meio de gestos. Capitão, isso garanto: aqueles lá não
são negros, nem mouros, nem hindus.
- Arra! Isso eu também percebi, ora, Nicolau – bufa Cabral.
Cabral começa então a passear de um lado para o outro no convés do
navio, absorto em pensamentos. Depois, torce o nariz e pergunta:
- Nicolau, diga-me mais: deu para saber se professam alguma religião;
se temem ao nosso Deus?
Mais uma vez, com um sorriso amarelado, Nicolau Coelho se esquiva:
- Não, Capitão. Isso lá não me foi possível perguntar. Me perdoe...
Nem lembrei.
Cabral andava cada vez mais ansioso pelo convés, com passadas tão
rijas que tremem o soalho da embarcação. Pára e grita por um marinheiro,
pede um jarro de água fresquinha, trazida da terra pelos companheiros de
Nicolau, e bebe quase tudo num gole só. O calor tropical batia intenso; os
portugueses não estavam acostumados com um clima assim.
- Jesus! De que adianta lembrar, Você só fala Português, Nicolau!
Não ia entender nada mesmo! Os nativos terão pelo menos alma?
O marinheiro, num sorriso servil:
23
- Isso lá não foi possível observar, meu Capitão. Ih!... Se aqueles têm
alma como nós, não mostraram. O padre pode responder com segurança.
Assim que aterrarmos todos, vamos esmiuçar a vida dessa gente.
Saberemos tintim-por-tintim o que se passa com eles. São pacíficos e
curiosos, isso eu garanto, e facilitarão tudo, com certeza.
Após refletir, Cabral faz um sim com a cabeça e aplica várias batidinhas
nas costas de Nicolau, aliás, confuso com tanta pergunta. Cabral,
compreensivo:
- Pileca!... Está bem! Está bem, Companheiro! Todos ficam liberados
para desembarcar, tão logo decida o dia e a hora. Um porém: não podemos
esquecer que estamos aqui nesse fim do mundo para trabalhar; nada de
excessos. Dos índios, primeiramente, cuidarão os religiosos. Encontre o
Escrivão Pero Vaz de Caminha e relate tudo o que viu.
Terminada a conversa com o Marinheiro Nicolau, o Capitão-Mor, os
olhos pregados no Continente, recosta-se num dos mastros do convés;
emocionado pelo espetáculo de cores e de luz de um pôr-do-sol
inteiramente novo.
O Professor continua:
- Vem a noite, Cabral ainda permanece na proa do navio, calado,
namorando no infinito uma estrelinha solitária, que brilhava e tremia, muito
viva, destacando-se no firmamento. E certamente pensando em Isabel de
Castro!...
- Isabel de Castro! Quem era? - surpreende-se Isabela.
- A sua namorada. Muito ansiosa, esperava por ele em Portugal.
- Eles se casaram?
- Em 1503. Tiveram vários filhos e viveram felizes para sempre.
- Legal!
- Só mais tarde Cabral deixa o convés; dá algumas ordens à tripulação
e entra na cabine para repousar. Junto à imagem de Nossa Senhora da
Boa Esperança, reza uma oração: Ó bondosa Protetora dos filhos de
nossa terra, nunca desprezes as preces, daquele que em Ti, sempre
espera.
Apaga o candeeiro e logo adormece; feliz da vida, encantado.
24
Maria Vitória quebra o silêncio dos ouvintes e tira uma dúvida:
- Índios! Por que chamaram nossos selvagens de índios? Para mim,
índio deveria ser gente da Índia.
- Você tem inteira razão, minha querida! Esse foi o nome que Cristóvão
Colombo deu aos nativos, ao descobrir o Continente Americano, em 1492.
Colombo morreu acreditando que tivesse chegado em terras indianas;
por isso, chamava de índios as criaturas que encontrou nas Antilhas.

Imagem de Nossa Senhora da Boa Esperança, que acompanhou


Pedro Álvares Cabral na viagem em que descobriu o Brasil.
Atualmente pode ser vista na Igreja da Sagrada Família,
em Belmonte, Portugal, cidade onde nasceu o navegante.
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26

Gravura do século XV. Coletânea portuguesa.


ÍNDIOS VISITAM CABRAL

O Professor faz uma pequena pausa e continua:


- Naquela noite caiu uma forte tempestade na região, tão forte que,
por pouco não causou grandes prejuízos à frota de Cabral. Como a sexta-
feira amanheceu cheia de sol, o Conselho de Pilotos, sugeriu ao Capitão
levantar as âncoras e fazer velas, em busca de algum lugar mais abrigado.
As embarcações pequenas foram na frente, rumo ao norte, à procura de
um ancoradouro mais seguro. Após bordejarem umas dez léguas, já à
tardinha, atingem a foz do rio Mutari e descobrem um recife com um
excelente porto, ampla entrada, com capacidade para abrigar mais de
duzentas caravelas.
Cabral, fundeado com sua nau Capitânia mais ao sul do recife, manda
o piloto Afonso Lopes, homem vivo e destro, sondar o porto. Ele toma
uma almadia e desce até a praia. Mais tarde, à noitinha, volta trazendo
dois indígenas, que foram muito bem recebidos por Cabral e pela tripulação.
Entusiasmados com tudo que viam, os nativos logo ficaram à vontade sem
se importar com a curiosidade dos portugueses.
27
Caminha, surpreso, pega a pena e assim descreve os gentios: ... a
feição deles é serem pardos - maneira de avermelhados - de bons
rostos e bem feitos; andam sem nenhuma cobertura; trazem o beiço
de baixo furado e, metido por ele, cenhos brancos de ossos, agudos
na ponta como furador. Os cabelos são corredios, e tosquiados de
boa grandura.
- Almadia! Quê isso, Professor? – pergunta curioso Igor.
- Almadia é uma embarcação muito comprida e estreita. Vem do árabe:
al-ma’adiã. Muito bem, continuando: - Cabral pede para mostrar aos
nativos um papagaio, eles reconhecem. Depois, uma ovelha, eles nem
ligam. Uma galinha, eles ficam assustados e com medo. Depois, Cabral
manda servir aos índios, peixe cozido, biscoitos, arrufadas, mel e uma
taça de vinho. Rejeitam tudo. Um deles aponta o dedo para o colar de
ouro de Cabral e, depois para a praia, querendo dizer que ali havia ouro...
Caminha mata a charada:
- Isso nós assim pensamos, por assim o desejamos.
O Professor deixa de imitar os portugueses e arregala bem os olhos,
dizendo:
- Aí que a tripulação ficou mais interessada nos jovens guerreiros!
O olhar do Chico chega a brilhar:
- Os índios mostraram o caminho da mina?
- Os navegantes bem que tentaram tirar deles mais informações sobre
metais preciosos. Deram a eles camisas novas, carapuças, dois rosários
de contas brancas e alguns guizos. Mas de nada valeu o esforço.
Na manhã seguinte, sábado, Nicolau Coelho e Bartolomeu Dias
desembarcam com os dois índios. Ficaram tão contentes e amigos dos
portugueses que facilitaram o entrosamento deles com sua tribo.

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Desenho de J. Wasth Rodrigues

Desenho de J. Wasth Rodrigues

A EMOÇÃO DO DESEMBARQUE DE CABRAL

- Conforme determinado, meus jovens, dia 26 de abril, domingo da


Páscoa, Frei Henrique Soares, de Coimbra, o principal dos padres a
bordo, celebra a primeira missa num altar armado nas areias de um país
ainda para eles sem nome. Na segunda-feira, grumetes cuidam de abastecer
os navios de água fresca e lenha, enquanto outros iniciam a preparação de
uma pesada cruz de madeira. No dia 29, Sancho de Tovar, o imediato de
Cabral, comanda a procura de alimentos. No dia 30 os marinheiros
continuam levando água, lenha e alimentos para as embarcações, ajudados
pelos nativos, que se fizeram amigos dos portugueses.
Na sexta-feira, dia 1º de maio, Cabral manda erguer a cruz, adornada
com o brasão do rei de Portugal, como sinal de posse e domínio. Ao pé
dela, Frei Henrique e seus freis, num altar rústico construído na véspera,
celebram a segunda missa na nova terra.
O Capitão-Mor permanece o tempo todo ao lado do altar, todo
garboso, vestido de gala: um fardamento azul, com debruns dourados,
espetado de medalhas, capacete com penachos azul claro e amarelo,
espadachim na cintura, botas longas de couro cru e com um colar de ouro
muito grande no pescoço.

29
Depois da cerimônia, cercado pelos seus Capitães, Cabral, emocionado
com os acontecimentos, passeia pelas praias do ilhéu da Coroa Vermelha,
saudando todo mundo, isto é, os marujos que festejavam a posse e os
nativos, curiosos, reunidos na beira do mar, já bastante familiarizados com
os portugueses.
Pedro Álvares Cabral fica impressionado com a densa floresta logo na
sua frente: árvores colossais, tão grandes de alcançar as nuvens. E muito
mais alegre ao ver a imensa quantidade de Pau-Brasil, destacando-se na
mata, ao longo da orla marítima.
- Os Tupiniquins receberam tão bem assim os portugueses? – Matilde
quer saber, quase junto com outros meninos.
- Com festa. Mais ou menos assim: os mais jovens cercam Cabral por
todos os lados, deslumbrados com sua vistosa vestimenta. Mães índias,
cheias de curiosidade, vão e vêm com seus filhos escanchados na cintura;
riem de tudo, com pureza. Os mais velhos, ainda desconfiados com a
novidade, permanecem meio afastados, observando a chegada dos
estrangeiros. E os meninos, estes mais alegres com a movimentação e, já
bem entrosados com os brancos, promovem macaquices na areia da praia,
tentando chamar a atenção dos adultos.
- E Cabral foi mesmo legal com os índios? – pergunta Rafael.
- Adorou o bom entrosamento entre os gentios e a sua tripulação.
Pedrálvares cumpria as recomendações de D. Munuel I: fazer amizade
com os povos, estabelecer com eles relações de comércio e, se for o
caso, covertê-los à fé cristã.

30
Querendo agradar, procura logo um jeito de retribuir a recepção e
pede ao ex-Bobo da Corte, o Marinheiro José Esperto, também conhecido
pela alcunha de Zé Bom de Pé, para fazer uma apresentação, isto é, dar
um show, e divertir ainda mais aquela gente. Aí, o moço, que de bobo não
tinha nada, esperto até no nome, abre uma roda no meio das pessoas e
começa a palhaçada: levanta-se sobre as pernas arqueadas e se lança em
uma série de figuras acrobáticas, cada uma mais engraçada do que a outra,
numa flexibilidade física e cênica fenomenal. Salta de frente, salta de costas,
gira no ar. Com as mãos no chão, corre de pernas para cima. Dá cambotas.
Saltos mortais. Faz careta. Apronta. Depois de tanta estripulia, o
Marinheiro, ainda consegue fôlego para pegar uma gaita de foles, tocar
músicas alegres e dançar; inspirado na ginga da capoeira africana, introduzia
até elementos de angola na coreografia. Um espetáculo e tanto, onde só
faltou mesmo o berimbau.
A Professora ressalta:
- Esse João Esperto devia, lógico, como um bom Bobo-da-Corte,
parecer muito engraçado mesmo. Tão ágil e espirituoso que rapidamente
conquistou a atenção e admiração dos silvícolas e até dos marinheiros,
acostumados com suas macaqueações.
- Os índios, também caíram na farra? – mostra-se curioso, o Mateus.
- Aposto que sim! - adianta a menina Rita de Cássia, com ar de
sabichona.
- E como!... Os índios assistiam tudo, hipnotizados. Observavam o
espetáculo com um encantamento que crescia à medida que o Zé Bom de
Pé encadeava cambalhota após cambalhota. Cada um mais contagiado
do que o outro, dançava a seu modo ou arremedava gestos dos brancos.
E imitando Cabral, Felício Esmaragdo segue com a narrativa:
- Santos Anjos!... Nessa colônia dinheiro dá em árvores, ou melhor,
no sulco bendito, colorido e afortunado dos seus troncos. Sua Majestade,
D. Manuel I, precisa ser muito bem informado de tanta riqueza, ora, pois-
pois!
Os meninos começam a rir com a remedação lingüística do sotaque
português, representado pelo Professor, já um artista para os ouvintes,
agora bem mais descontraídos:
31
- O Jovem Cabral, Alcaide-Mor de Azurara e Senhor de Belmonte,
assim também chamado, vibra com tudo. Logo despacha importante
ordem a Caminha, escrivão que entrou para nossa História por causa de
uma carta: - Escrivão Pero Vaz de Caminha, cesse tudo que está aí a
descrever dessa festa e prepare uma descrição especial, em carta ao nosso
rei; diz que tudo anda certo no achamento das novas terras e que, nessa
região santificada pela fantástica natureza, existe em abundância a planta
que dará muita riqueza ao Reino de Portugal. É o Pau-Brasil, Pero Vaz, é
a madeira de afortunadas qualidades. Estamos feitos!
Cabral convoca alguns ajudantes, e impõe:
- Tragam os machados mais afiados e derrubem quantas boas árvores
de Pau-Brasil puderem. Quero todas viçosas e sadias, dignas de um
monarca português. Enviarei tudo, já, já, a Lisboa! A Europa mais uma
vez cairá aos pés dos domínios lusitanos, ora pois!
Risos gerais.
Felício Esmaragdo Valverde aprecia a própria versatilidade e dá outra
de artista, arremedando de novo o Almirante Português, no sotaque e nos
gestos. Com a mão direita, assim, na altura do peito, posudo, importante,
fala mais grosso e ordena:
- Capitão Gaspar de Lemos, tão logo o Escrivão Caminha termine a
Carta ao rei, prepare sua nau e faça velas ao mar; retorne a Portugal com
boa quantidade de troncos de Pau-Brasil; D. Manuel vai adorar receber
nossa encomenda. Que os ventos lhe sejam constantes!
O Professor faz uma pausa e continua:
- Aí, meus jovens, ruídos estranhos dentro da floresta chamam a atenção
de Cabral e de seus comandados; barulhos muito esquisitos. Admirados,
reparam ao longo daquele imenso tapete verde. Cabral leva o dedo
indicador aos lábios e pára para observar melhor e escutar uns guaribas,
uns macacos, trançando de galho em galho, no alto das árvores, no maior
alvoroço. Terra mais estranha! Pensou, com toda certeza.
32
Neusa ergue a mão:
- Pelo entusiasmo de Cabral, o Pau-Brasil só existia aqui!...
- Que nada! Documentos registram que uma espécie semelhante, a
Casealpinia sappan, nativa da Sumatra, já era industrializada na Ásia há
muito tempo, desde o século XI. O produto chegava a preço de ouro ao
mercado europeu, vindo principalmente do Egito e da Turquia, através
dos comerciantes venezianos e genoveses, habitantes de cidades hoje da
Itália, que eram os melhores navegadores do mar Mediterrâneo. Cabral
tanto conhecia a famosa e procurada Madeira de Tingir (Caesalpinia
echinata, este o seu nome científico de uma das espécies encontradas no
Brasil), que mal põe as botas na areia da praia já vai de olho nas árvores
de Pau-Brasil, logo na sua frente. Imaginem Vocês como ficaram os olhos
cobiçosos do Capitão-Mor com o achado...
Marco Antônio aproveita a deixa e brinca:
- Cabral não quis mandar também umas belas moças índias para
Portugal?
- Menino esperto! Cabral não achou prudente enviar índios entre as
amostras da nova terra. Mandou apenas arcos, flechas, enfeites, papagaios
de várias cores e muitas toras da madeira vermelha, o cobiçado pau-de-
tinta. Quanto mais nativo ficasse para ajudar na derrubada da preciosidade,
melhor, maior o lucro, deve ter concluído fácil o Capitão.
César, até então calado, indaga:
- Quantos dias Cabral ficou no Brasil?
- Dez dias, meu Caro. Tempo suficiente para tomar posse do território
achado, descoberto, como queira; recolher amostras da nova terra, mandar
rezar duas missas, como de costume e impressionar os índios, já caindo
de amores pelas gentilezas dos chegantes.
- Pelo menos por enquanto!... - critica Ana Laura, cada vez mais ativa.
- Os índios levam a pior, desde aquele dia... – interfere a Professora. -
Os europeus chegaram como os legítimos donos da terra, sem respeitar
os direitos dos povos que viviam aqui há séculos.
- A Professora tem razão. Mas... Só para encerrar esse capítulo: no
sábado, pela manhã, a frota de Cabral parte para as Índias. E a nau de
Gonçalo, abarrotada de Pau-Brasil, volta para Portugal.
33
- Professor, – pergunta Tijuca balançando o braço – a frota de Cabral
tinha mesmo os melhores navios daquele tempo?
- O que havia de mais moderno, ou melhor, a síntese da mais alta
tecnologia existente na época. As caravelas eram consideradas as
embarcações mais sofisticadas disponíveis no mercado; o ônibus espacial
da era dos descobrimentos.

Elevação da Cruz. Detalhe do quadro do pintor Pedro José Pinto Perez. Museu
Nacional de Belas-Artes - RJ.
34
A FESTA DO PAU-BRASIL

- Dias mais tarde, – continua o Professor Felício - D. Manuel I recebe


com entusiasmo o mensageiro de Cabral. Depois de ler todas as cartas
dirigidas a ele, fica impressionado com a riqueza de detalhes do relato de
Pero Vaz de Caminha. Faz o sinal-da-cruz e beija os dedos cruzados,
agradecido: pareceu que Nosso Senhor milagrosamente quis que se
achasse terra tão generosa em tão preciosa planta de tinta!...
O rei enchia os olhos diante dos toros de Pau-Brasil, e também dos
papagaios tagarelas. Na verdade, não esperava notícias tão agradáveis
da nova colônia. Juntava gente no Palácio para escutar, imaginando todos
mundos e fundos com a minuciosa descrição da terra encantada.
- Babava, isso sim, com as novidades - completa Ana Laura.
- E as outras cartas? - Dinha questiona.
- Também importantes, é claro. Tinha carta até do próprio Cabral e de
outros tripulantes das caravelas para D. Manuel I, como também para as
suas famílias, amigos, namoradas. Entre essas cartas, a do Mestre João,
que descrevia a constelação do Cruzeiro do Sul, muito bonita e jamais
vista por olhos europeus.
35
Mas a Carta de Pero Vaz de Caminha destacou-se das demais, lógico,
pelas minúcias bem relatadas durante a viagem e da descrição da nova
terra, num depoimento de entusiasmo e alegria, de um escrivão
impressionado com a beleza do lugar e com a felicidade dos nativos, sempre
com um perpétuo sorriso em tudo. Foi através dela que a Europa ficou
sabendo que tinha portos seguros, gentio amigável e ares balsâmicos. E,
na sua vastidão, coberta pela esbraseada madeira. Através da Carta de
Caminha, ainda hoje é possível reconstituir com pormenores os dias
inaugurais do Brasil, o nascimento de nossa Pátria.
- Um bom historiador, esse Caminha, heim Professora!?
- Muito bom mesmo, Márcia. Boa observação. Quando voltarmos,
vamos ler mais trechos da Carta. Muito curiosa e importante.
Todos:
- Claro, Dona Diana!!!
Um fala meio escondido:
- Convida o Professor para ir escutar a Carta também...
- E lá em nossa sala de aula...
- Assentadinho bem na frente...
- E bem comportado...
- E sem dar muito palpite feito o Chico aí...
- Só o coitado do Chico?
- Evidente, Meninos! Já está convidado, em nome de toda a turma,
Professor Esma...
- ... ragdo Valverde, Dona Diana. Vou, sim, e com maior prazer. E me
comporto de acordo... Marquem o dia e a hora. Aproveito e levo um
personagem muito importante que ainda vão conhecer e admirar...
Surpresa! Também...
- Professor, essas cartas estão guardadas em algum museu?
- A grande maioria, Vitória, foi queimada num incêndio em Lisboa, em
1580. As que escaparam do fogo, foram engolidas pelo terremoto de
1755. Azar e tanto, né! Restaram apenas a de Caminha, do Mestre João
e a Relação do Piloto Anônimo.
Risos parcelados. O professor continua a história:
- O poder, então, sobe à cabeça do rei D. Manuel I. Tanto que anuncia
aos outros reinos, com muita propaganda, a nova descoberta de Portugal.
Para o rei da Espanha escrevera carta especial, considerando-se senhor
da Guiné e da conquista, da navegação e do comércio da Etiópia,
Arábia, Persia e Índia... Senhor da Terra de Vera Cruz, onde existe a
maior concentração de pau-de-tinta do Mundo.
36
Lisboa transforma-se num atrativo centro de negócios dalém-mar,
tornando-se uma das cidades mais ricas da Europa e o mais ativo mercado
de Pau-Brasil, escravos e especiarias do Mundo. Imediatamente foi
invadida por banqueiros alemães, liderados pela família Fugger,
comerciantes italianos e agentes judeus que especulavam com especiarias
e Pau-Brasil.
D. Manuel I manda instalar no Salão Imperial uma grande exposição e
exibe com destaque as peças de Pau-Brasil e outras amostras da Terra
de Vera Cruz. Tinha papagaio até falando Português misturado com língua
dos índios... Um grande acontecimento em Lisboa, prestigiado pelos
maiores comerciantes e industriais ligados ao mercado têxtil da Europa.
Renata, interessada:
- E aí, Professor, quando apareceu pela primeira vez o nome do Brasil
nos mapas?
- Em 1501, no mapa de Cantino, logo após a viagem de Américo
Vespúcio, que dá o nome de rio Brasil, o que fica próximo de Porto Seguro.
O Professor, após uma pequena pausa:
- Portugal vivia o Século Áureo. Vasco da Gama descobrira o itinerário
das especiarias e Pedro Álvares Cabral o país do Pau-Brasil... Lisboa
tornava-se a Senhora dos Mares.

37
Rugendas - Foz do Rio Cachoeira - Prancha 26

Rugendas - Foz do Rio Cachoeira - Prancha 26

38
O PAÍS DAS MARAVILHAS

E prossegue Felício Esmaragdo Valverde:


- A madeira vermelha, meus jovens, produz uma sensação ambiciosa
de poder na Corte Portuguesa, naqueles anos dos mais surpreendentes
descobrimentos. Assim, foi logo decretada sua exploração comercial. Em
seguida, D. Manuel I convoca Gaspar de Lemos para fazer velas, como
diziam, até a nova colônia, com o objetivo de verificar as verdadeiras
riquezas do lugar; realizar um levantamento minucioso da costa e informar
a quantidade presumida de Pau-Brasil, existente.
Nisso, o Diretor olha para a Professora, dando sinal de que queria
descansar um pouco, e pede:
- Dona Diana, explique aos seus alunos a missão de Gaspar de Lemos,
já que este assunto é também de sua área.
- Com prazer, Professor,... Mas fique sabendo que não tenho nenhum
jeito de representar, como Você faz, imitando sotaque português,
dramatizando como poucos a história. Então, vamos lá, Meninos: Partindo
de Lisboa, em maio de 1501, com três navios, noventa dias depois, a
expedição exploratória de Gaspar de Lemos ancora na costa do atual
Estado do Rio Grande do Norte, onde começa o trabalho de identificar,
um a um, os acidentes geográficos do litoral da então chamada Terra de
Vera Cruz, que, depois, como devem saber Vocês todos, vai receber
novo nome por causa da sua madeira principal.
Valdemar, braço levantado, pede logo mais esclarecimentos:
- Essa história de identificar acidentes geográficos...
- Acidentes geográficos! Ora, Valdemar, Você se lembra muito bem
quando estudamos essa matéria na História do Brasil e também em
Geografia! Tudo bem, não temos obrigação de lembrar tudo. Podem
perguntar à vontade, não é Professor Felício Esma...
- ... ragdo Valverde... Claro que sim, Diana. Bobo quem não pergunta
nada.
Rapidinho Cidinha pega a pergunta no ar e entra no assunto dos
acidentes geográficos:
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- Também vou ajudar, com licença, Dona Diana. Li sobre isso, é muito
interessante. Gaspar de Lemos levou com ele especialistas em várias áreas
da Ciência. Entre eles, o italiano Américo Vespúcio, cosmógrafo super
experiente. Aparecia um morro, um lugar para estacionar um navio, um...
Ancoradouro, uma saída de rio para o mar... Uma... Foz de rio, o acidente
geográfico acabava batizado com o nome do Santo comemorado naquele
dia. Deviam levar também no navio uma folhinha, um calendário, tipo
Folhinha de Mariana... Cada dia tem um santo para comemorar.
- Olha aí, Chico: a Cida ganha de Você e da tipóia da Maria Vitória! –
graceja o colega Douglas.
- Muito bem. Quais foram as nomeações feitas por Gaspar de Lemos?
Chico, enciumado, sai na frente:
- Essa eu sei. Decorei todos. Decorar é comigo mesmo... O primeiro:
Cabo de São Roque; depois o de Santo Agostinho; os rios... Espere aí...
Ah: São Miguel e São Francisco, até cá em baixo, o Porto de São Vicente.
Todos. É duro saber de cor e salteado...
O Professor dá um tapinha no ombro do Chico, e aperta sua mão:
- Menino supimpa, sô! E a Cidinha, a grande sabichona! Vou ter mais
cuidado com esta sua turma, Professora!
Uma voz de menina não identificada:
- Chico Decoreba!
- Cidinha é fogo!
A Professora Diana retoma o fio da meada de sua narrativa:
- Depois da expedição de Gaspar de Lemos, não é Professor Felício... ?
- Esmaragdo Valverde ...
- ... A notícia da fartura de madeira de tinta no Brasil se espalha
rapidamente pela Europa, despertando a cobiça de contrabandistas de
todo Mundo. A Coroa Portuguesa se apressa em determinar o monopólio
real de sua extração - reserva estatal que permaneceu até o Século XIX,
quando os corantes artificiais desbancaram os naturais.
A Professora faz uma pausa e segue:
- Aí... começa a exploração sistemática do Novo Mundo lusitano,
principalmente pelos piratas. Navios saem daqui abarrotados de toras de
Pau-Brasil, de animais exóticos, como sagüis e papagaios, peles de animal,
redes de algodão - era elegante uma dama européia carregar nos braços
um macaquinho tupiniquim, amarrado pelo pescoço, por uma corrente de
ouro.
- Que pesadelo, meu Deus!... Era o homem branco, civilizado, deixando
a marca da maldade em nosso Brasil! - critica Vicentina.

40
O ARRENDAMENTO

O Professor retoma a narração da história:


- D. Manuel I, empenhado em explorar cada vez mais as terras asiáticas,
bem mais lucrativas, vai perdendo o interesse em colonizar de imediato a
nova colônia. Então, o rei teve uma idéia: como a corte não podia se
dedicar de corpo e alma à Terra Brasilis, autorizaria alguém para fazer
isso. Resolve arrendar nosso país.
- Mas um rei decidia tudo sozinho? – pergunta Maria Vitória, sem
levantar o braço com tipóia.
- A palavra de rei naquela época, minha querida, era absoluta. Todos,
aliás, chamados reis absolutistas com poderes extremos, além de serem
considerados os representantes de Deus na Terra - um rei sancionava e
executava as leis que ele próprio fazia. Luis XIV, ao assumir o reino da
França, no final do Século XVII, declarou: - O Estado sou eu!
- Prepotente!... – debocha Jaqueline.
E com sotaque português, o Professor imita D. Manuel I:
- Caros Ministros, tomei, em meu nome e em nome de Deus, a decisão
de arrendar a Terra de Santa Cruz, assim como fez D. Afonso V, que, em
1469, arrendou a Fernão Gomes o comércio da Guiné. Certo deu lá,
certo dará nas terras dos brasis. A razão é muito simples: no momento
investir nas Índias é mais lucrativo aos cofres portugueses, ora, pois, pois.
Risinhos gerais.
- Como ninguém se manifestasse contrário à decisão irrevogável, o rei
ordena: - Que a ata dessa reunião seja lavrada e que o Edital do
Arrendamento esteja redigido imediatamente. Quero-o afixado nas portas
das principais igrejas de Portugal, como também deverá ser enviado para
todos os jornais que circulam em território europeu.
41
O Professor provoca, com um ligeiro raspar de garganta, uma pausa.
Dona Diana observa:
- Podemos dizer que essa foi, então, a primeira experiência em privatizar
um monopólio no Brasil. Vejam que, durante muito tempo o Brasil teve
um dono. Muito bem, Professor Felício, vá em frente que a turma está
gostando. Até os passarinhos escutam lá nos galhos.
Risinhos e cutucadas.
- Boa lembrança, minha cara. Ganhou a concessão um cristão novo,
isto é: um judeu convertido à fé cristã, o comerciante espanhol Fernão de
Noronha, também conhecido por Fernão de Loronha, representante de
empresários alemães de origem judaica, o grupo dos Fugger, que detinha
o monopólio do cobre na Europa. O contrato permitia aos arrendatários
explorar por três anos o Pau-Brasil em novecentas léguas, mais ou menos
cinco mil quilômetros na costa brasileira. Em troca, teriam que estabelecer
feitorias e defender a Colônia contra a cobiça de estrangeiros, além de
pagar um quinto, isto é, vinte por cento, dos lucros à Coroa. Esse
arrendamento foi prorrogado três vezes.
Chico ergue-se, outra vez:
- Professor Felício Valverde...
- Você pulou o Esmaragdo, Chico...
- O que é mesmo arrendamento?
- É o mesmo que alugar, por exemplo, uma fazenda ou um sítio, onde
o inquilino pode usar a propriedade como quiser, explorando tudo para
ganhar dinheiro.
Marcelo aproveita para tirar uma dúvida:
- Professor Valverde... Não, não vou pronunciar seu nome todo... Pode
ficar sossegado... O que era mesmo uma feitoria?
- Um local fortificado para armazenamento de toros de Pau-Brasil, já
prontos para o embarque. Entre várias feitorias implantadas nas costas
brasileiras, uma das mais importantes foi a de Itamaracá, fundada em 1526,
onde hoje é o Estado de Pernambuco.
Maria Vitória protesta, com o braço levantado, o sem tipóia:
- Na verdade, foi a primeira iniciativa para devastar nossas florestas,
para degradar o meio ambiente brasileiro. Céus!... Sabemos que Pedro
Álvares Cabral encontrou aqui uma floresta vasta e rica, toda arranjada,
cada árvore no seu lugar; porque Deus assim queria a nossa Pátria!...
42
- Parabéns, pela observação, minha querida.
- Vender Pau-Brasil dava o mesmo lucro que vender especiarias da
Índia? – pergunta Geni Maria.
- Não. Veja Você: um navio carregado de Pau-Brasil valia sete vezes
menos do que um navio carregado de especiarias da Índia, mesmo assim
capaz de apurar mais de trezentos por cento de lucro.
- Puxa! E quanto o tal Fernão de Noronha pagava pelo aluguel do
Brasil?
- Existem controvérsias... É Marilda mesmo seu nome!?... Já estou
conhecendo o nome de Vocês; ótimo! Historiadores afirmam que havia
parceria, entre os arrendatários e a Coroa Portuguesa, também nos lucros.
Outros garantem que o preço do arrendamento era fixo, isto é, mil Ducados
por ano. Deveria ser um ótimo negócio, pois o contrato com o grupo de
Fernão de Noronha durou até 1513, quando o direito de arrendamento
foi arrematado por Jorge Luís Bixorda ...
- Poxa, que nome mais esquisito!...
- E em 1516, Nuno Manuel ganhou a concorrência.
- O quê!... Ducado! – exclama Jussara, sem levantar nenhum braço.
- Ducado era uma moeda de ouro ou prata, cunhada pela primeira vez
em Veneza, em 1284. Na época, também utilizada em Portugal.
- Seria quanto no dinheiro do Brasil, hoje?
- Cálculo difícil. Tanto tempo passou de lá para cá... O melhor é sugerir
à Professora Diana que combine com Vocês uma pesquisa sobre essa
moeda, o Ducado. Senão nosso bate-papo vai até o escurecer. Como
Fernão de Noronha era um comerciante de bom faro para negócios, deve
ter aumentado em muito a fortuna dos empresários que representava,
explorando o Pau-Brasil.
- Também o trabalho era só mandar índio cortar Pau-Brasil, encher o
navio com as toras e levar para vender, não é? – critica Matilde.
- Havia, sim, outros problemas, mas, na essência, era mais ou menos
assim mesmo. Para essas viagens, admitia-se gente de toda espécie,
principalmente prisioneiros que aceitavam viajar em troca da liberdade.
Eram muito perigosas, aquelas viagens!
Laura procura tirar outra dúvida:
43
- O arquipélago de Fernando de Noronha foi descoberto por Fernão
de Noronha?
- Não. Por Gonçalo Coelho, que trabalhava para ele, em 1503. No
mesmo ano, Gonçalo também fundou uma feitoria na Bahia e outra em
Cabo Frio.
- Foi esse Comandante, para puxar o saco do patrão, que sugeriu
mudar o nome do arquipélago de São João para Fernando de Noronha?
– brinca Robson.
- Não, não foi. Mais tarde, o arquipélago foi dado de presente pela
Corte Portuguesa a Fernão de Noronha. Daí, mudar o nome foi só um
capricho do dono. Mas além de São João, também se chamou Quaresma
e São Lourenço. Darei um pirulito de mel de abelha a quem adivinhar por
que Gonçalo Coelho batizou o arquipélago com o nome de São João?
Rafael arrisca um palpite:
- Aposto que era Dia de São João!
- Muito bem, aprendeu direitinho. Aqui está o pirulito.
- Epa! – acertei na mosca. Quero ver alguém aí me chamar de
decoreba...
- No final, todos vão ganhar desse pirulito. É feito pelo Porteiro Juraci,
de colméias daqui mesmo do Jardim. Vão adorar. Ele entende de coisas
naturais como poucos. Também...
Ôbas gerais.

44
SUOR E SANGUE TUPI

Pausa na narrativa.
No galho alto de um Jacarandá, um Canário-da-Terra, o nosso popular
Chapinha, ou Cabecinha-de-Fogo, como é chamado em diferentes regiões
do Brasil, quebra o silêncio momentâneo com o estalar seu canto cheio de
alegria. E quase oculto entre as folhas de uma Cerejeira, ouvia-se, em
dueto com o canário, o lamento de um Sabiá-Laranjeira; enquanto um
beija-flor cruza o espaço aberto e se aproxima de um cacho de banana
em formação para dividir o mel da flor da bananeira com um bando de
pequenas abelhas.
Todos param um instante, distraídos, voltados para cima, ao derredor,
procurando descobrir em que galho cantavam o Chapinha e o Sabiá,
tentando acompanhar a agilidade do Beija-Flor que girava em volta de
mais flores, numa parceria harmoniosa com as abelhas.
- Professor!... – Tiago levanta o dedo.
- Pode perguntar.
- Será que Cabral ouviu aqui o canto de um Chapinha?
45
- Com certeza. Tanto do Cabecinha-de-fogo, como do sabiá, do
pintassilgo, de tantos outros pássaros que encantam pelo canto e pela
plumagem. Escutem o que o Comandante Américo Vespúcio disse da
fauna alada brasileira: ... pássaros de diversas formas, e cores, e tantos
papagaios que era deslumbrante; alguns corados como carmim, outros
verdes e cor de limão e outros negros, e encarnados, e o canto dos
pássaros que estavam nas árvores era coisa tão suave, e de tanta
melodia, que nos acontece muitas vezes estarmos parados pela doçura
deles. E a mata é de tanta beleza e suavidade que pensamos estar no
Paraíso Terrestre.
Em seguinda, o Botânico convida outra vez a Professora para substituí-
lo na palestra. Ela concorda e começa falando da exploração do índio
pelo branco:
- Para o europeu os selvagens tinham parentesco com os monstros
medievais; andavam nus e cultivavam hábitos estranhos, portanto,
considerava-se superior, com direito sobre a terra, à liberdade e a própria
vida do índio. Partindo deste princípio, os exploradores brancos utilizaram
os silvícolas para cortar e carregar o Pau-Brasil para seus navios, em
troca de pequenos objetos que mal valiam um vintém!
Jaqueline pede mais explicação:
- Desculpe! Não entendi direito...
- Como o nosso litoral era habitado por tribos indígenas de boa índole,
pacíficos e dóceis, fazer escambo com essa gente foi moleza. Ainda mais
que as ferramentas européias eram de grande serventia ao índio na luta
que travava com a Natureza pela sua sobrevivência.
- Escambo!...
- Escambo, meu Caro Chico, era a maneira de realizar uma troca de
um produto por outro, entre pessoas interessadas, sem envolvimento de
dinheiro. Os índios davam Pau-Brasil aos europeus; em troca, recebiam
quinquilharias ou ferramentas, coisas de pouco valor monetário.
- Então, o europeu era fera na tapeação dos índios! - debocha
Marildinha.
A expressão do rosto da Professora muda rapidamente. Alisa com as
palmas das mãos a frente da blusa, e censura:
46
- Uma judiação! Os nativos eram ignorantes, limitados às suas aldeias.
Inocentes que nem crianças ficavam até zonzos diante de tantos objetos
desconhecidos. Tudo era novidade: espelho, pente, guizo, colar de
miçangas; ferramentas, como machado e faca, necessários para a própria
obtenção da madeira para o branco; foices, enxadas, cunhas de ferro,
tesouras, panelas, anzóis, tambor, sininho, pedaços de tecido, gorro
vermelho. Por qualquer um desses objetos, um índio era capaz de dispor
tudo que possuía, ou trabalhar duro de sol a sol para o branco, em troca
de um presentinho de nada.
- Poxa, Pessoal, sinto até um frio por dentro...
- Dose acreditar, Maria Vitória Aparecida...
- Maria Vitória Ferreira Pinto, seu Chico Decoreba, e nem levantei o
braço quebrado, desta vez.
- Mas os índios aceitavam tudo numa boa, Professora?
- Para eles, Marisa, uns meninos, era uma festa... A maioria das tribos
trabalhava com satisfação para o europeu invasor. Ainda mais cortando
Pau-Brasil com machado de ferro! Comemoravam o fim da idade da
pedra.
Ana Laura zomba:
- Engabelavam os coitados com coisinhas iguais aos mixurucos presentes
das nossas lojas de 1,99!
- E até menos...
Hunnnnssss gerais.
- Coitados, Dona Diana! Essa exploração deve ter sido a parte mais
amarga da história – conclui Renata, inconformada.
Ana Laura sente um frio por dentro. Pensa no sofrimento dos índios.
Mas fica calada.
Cidinha levanta uma dúvida:
- Professora: se os índios não falavam a língua dos brancos, como
entendiam e obedeciam as ordens dos exploradores?
- O homem civilizado, quando esperto, arruma sempre um jeito para
garantir suas vantagens, levar o seu lucro com o mínimo de gasto e quase
nenhum trabalho pessoal. No princípio, fazendo gestos; depois,
aprendendo a linguagem dos indígenas e também ensinando a eles palavras
de ordem, em sua língua. Não era difícil.
- Como que um nativo escolhia o objeto de seu agrado?
47
- Filipe, os brancos empregavam uma tática infalível: expunham os
produtos na beira da praia. Coisinhas bem vistosas, brilhantes, coloridas!
Atraídos, os nativos ficavam boquiabertos diante de tanta bugiganga. Logo,
um interessado apontava com o dedo, mostrando o que desejava. Pulava
e gritava palavras na sua língua, que os exploradores interpretavam como
eu quero isso ou aquilo. Aí, o espertalhão branco fazia o índio entender:
- Muito bem, esse espelho será seu; primeiro, corte dez pés de
Arabutã, o nome do Pau-Brasil em Tupi-Guarani. E mostrava os dedos
das mãos.
O índio escancarava os dentes de alegria. Pegava um machado, cortava
as árvores, trazia a madeira para a Feitoria e ganhava o espelho. Outro
ficava doido por um gorro vermelho, aí o explorador impunha:
- Ótimo... meu Amigo.
- Mui amigo!... – grita um.
- Traga tantos troncos bem aparadinhos de Ibiratinga, outro nome
que os índios davam ao Pau-Brasil. Sempre com gestos de cortar galhos,
carregar nos ombros. E mostrava os dedos das mãos: tantos e tantos
toros.
Um morubixaba, caído de amores por uma campainha, um mero sininho,
que retinia diferente de todos os sons já ouvido, se tornava uma presa
fácil. O explorador abusava:
- Tudo bem. Será seu e mais esta tira de pano vermelho, mas quero o
navio cheio de Muirapiranga, referindo-se ao Pau-Brasil; e dos melhores,
dos mais grossos. Fazia o gesto já conhecido de aparar a árvore. Entendeu?
Índio nenhum reclamava da sorte. Diante de uma mercadoria que
preenchia seus sonhos, não resistia, corria para mato com um machado
bom de corte, mourejava de sol a sol, trazia a madeira e trocava pelo
objeto desejado, ou melhor, sonhado. Não havia sábado, nem domingo
de folga para um índio, depois do descobrimento; a semana toda derrubava
a floresta para algum explorador europeu.
Ana Laura levanta-se como se impelida por uma mola, corada:
- Que gente malvada esses comerciantes brancos, faziam tudo para
enganar os coitadinhos! Não tinha índio bravo no Brasil?
- Para botar para correr aquela corja de exploradores...
48
- Índios bravos? Ah, sim, havia. Lógico, mais para o interior do
Continente. Como exemplo os Caetés, que habitavam desde a Ilha de
Itamaracá até as margens do Rio São Francisco. Ferozes, rebeldes e
androfágicos, comedores de carne humana; eram inamansáveis. Defendiam
seu território com bravura; aliás, como os verdadeiros donos da terra;
não aceitavam ser capiturados, reagindo às ameaças dos invasores
estrangeiros. Já os Tupiniquins, os Tamoios, os Tabajaras, os Carijós e
outros que viviam no litoral eram de boa índole, aceitando com facilidade
o entrosamento pacífico e danoso com os europeus.
Maria Vitória lembra:
- O Bispo Sardinha foi devorado pelos Caetés. Confere, Professora?
Sim. Em junho de 1556. Numa viagem para Portugal, seu navio Nossa
Senhora da Ajuda naufragou-se nas costas de Alagoas. O Bispo e outros
marinheiros salvaram-se, mas foram aprisionados e devorados pelos índios
Caetés. Tribos tão selvagens que até o Padre José de Anchieta tinha medo
deles: - eram tribos bárbaras e indômitas, aproximam-se mais à
natureza das feras que à dos homens. Mais tarde foram exterminados
pelo Governador Mem de Sá.
E depois de uma pausa:
- O Comandante Antônio Pigafetta, da frota de Fernão de Magalhães,
escreveu sobre a antropofagia de índios no Brasil: ... comem algumas
vezes carne humana, porém somente a de seus inimigos. Mas não é
por gosto ou apetite que a comem. Não os comem nos campos de
batalhas, nem tampouco vivos. Despedaçam o corpo e repartem entre
os vencedores...
- Quantos índios existiam aqui no tempo de Pindorama?
- Boa pergunta, Rita. Antes de Cabral, supostamente mais de cinco
milhões de aborígines viviam aqui dentro das matas e no litoral. Os primeiros
extintos foram os Tupiniquins, pouco tempo depois da chegada de Cabral.
Por volta de 1570, a tribo já era considerada extinta.
Índios morriam pelos maus tratos, massacres e também pelas doenças
transmitidas pelos brancos, como a varíola, desinteria, tifo, lepra, pneumonia
e outras. A mais devastadora dessas epidemias foi a varíola, cujos sintomas,
de acordo com os gentios num relato ao Frei Bernardino Sahagun, em
1555, eram: ... tosse, grãos ardentes, que queimam... Muitos morreram
com a pegajosa, compacta, dura doença de grãos.
49
De lá para cá desaparecerem aproximadamente 1200 línguas nativas
no Brasil e, com elas, seus povos. Hoje, somando todas a Nações
Indígenas, são menos de trezentos mil índios. Cento e sessenta mil na
região amazônica, falando aproximadamente cento e cinqüenta línguas
distintas. Juntos, mal lotariam três estádios de futebol.
- Puxa!
- Dose!
- Fogo!
Ana Laura ergue um braço e pede para recitar o versinho chamado
Erro de Português. O Professor concorda e ela declama:

Quando o português chegou


Debaixo duma bruta chuva
Vestiu o índio.
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha
Despido o português

Risada geral.
- Ana Laura, parabéns, nota dez – festeja a Professora. E virando-
se para a turma: - Cinco pontos para quem acertar o nome do autor do
poema. Não vale a resposta de Ana Laura.
Alguns abanam os braços, gritando:
- Eu... Eu
- Eu...
- Você – aponta a Professora para Filipe.
- Foi o poeta paulista Oswald de Andrade.
Felício levanta-se do seu banquinho e se dirige à Professora, sorrindo:
- Muito bem!... Muito bem!... Professora Diana, ótima sua explicação.
Ana Laura, boa a lembrança do poeta modernista Oswald de Andrade.
Anote aí... Estudar o Movimento Pau-Brasil, liderado por esse escritor
no Brasil. Parabéns para todos.
- Ótimo que gostou, Diretor. Agora, sua vez de continuar.

50
VIAGENS PELO MAR DO MEDO

- A madeira vermelha ficou mesmo muito famosa! O negócio era tão


atraente e tentador que para muitos valia a pena atravessar o Atlântico,
em sua busca, apesar das dificuldades, dos incômodos nas caravelas
desconfortáveis, dos riscos da longa e demorada travessia e outros
problemas inesperados.
- Essa madeira despertava muito interesse mesmo!...
- Prefiro o termo ganância, Menina...
- Joanna, com dois enes, Professor...
- Não vou esquecer... Pau-Brasil, como sabemos, meus Caros, minhas
Caras, é uma madeira de tronco duro, compacto; contém uma substância
corante de tom vermelho muito vivo e brilhante, a brasileína, empregada
para tingir tecido de linho, seda e algodão com um tom carmesim ou
purpúreo. Um vidrinho dessa tinta custava um bom dinheiro. Naquela
época, o vermelho era o príncipe das cores. Rei que se prezava tinha seu
manto vermelho. Cardeais e nobres, também. Tanto interesse encarecia o
produto, porque a oferta era sempre menor do que a procura.
51
A Professora Diana observa:
- O sexo feminino, Gente, também teve participação no excesso de
consumo da tinta preciosa. A partir do Século XVI, a mulher européia,
principalmente a inglesa e a francesa, passou a se interessar pelos requintes
da moda, atraída pelo suntuoso tom carmesim ou purpureo: a cor da
nobreza. Isso deu um grande impulso na indústria têxtil, exigindo cada vez
mais dessa tinta extraída da árvore, aos milhões em nossas terras. Confere,
Professor Felício?
- Sim. Não só para tinta servia o Pau-Brasil. Os móveis da Universidade
de Coimbra e de vários outros prédios públicos na Europa foram
fabricados com essa rica madeira do Brasil.
- Brincadeira!...
Iago, até então quietinho no seu canto, levanta a mão e pergunta, como
se faz em sala de aula:
- Uma viagem da Europa para o Brasil durava quantos dias?
- Xiii!... Dias e dias. A calmaria atrasava muito uma viagem. Dois, três
meses ou mais, enfrentando o mau tempo, a fome e a sede. Há notícias de
navio que levou até cento e oitenta dias para cruzar o Atlântico. Boa parte
da tripulação morria antes de chegar ao destino, em conseqüência da má
alimentação, da falta de remédios e de conforto. Os marinheiros dormiam
ao relento, no assoalho ou em redes espalhadas ao ar livre pelo convés,
com ou sem chuva. Deixar Lisboa rumo ao Brasil ou a Índia era mesmo
uma loteria. Precisava de muita sorte para chegar bem ao destino.
- De que o pessoal do navio se alimentava? – procura saber Maria
Vitória ainda sem levantar o braço com tipóia, mas de olho no Chico, com
receio de outra gozação.
- Peixe, carne salgada, de porco e de boi; bolachas secas. A
conservação era de péssima qualidade. Depois de certo tempo, a situação
tornava-se insuportável, os alimentos iam ficando raros, apodrecidos e
mofados.
Uma menina faz careta:
- Coitados! Ora, se estavam no mar por que não pescavam?
- Isso os marinheiros faziam sempre que possível. Mas durante uma
tempestade quem é que consegue fisgar um peixe? Quando não tinham
nada mais para se alimentar, comiam ratos caçados no porão do navio ou
gaivotas que voavam em redor das embarcações. E quando nem isso
mais existia, cozinhavam tudo que era de couro na embarcação, como
couro retirado dos mastros, sola dos sapatos, das bolsas ou de qualquer
outro objeto de pele de animal.
52
Cara de nojo, Geni Maria observa:
- Se a comida, argh, era tão ruim, a água então devia ser uma nojeira!
- Acertou, menina. Antes da partida de um navio, a tripulação enchia
pipas e barris de água potável suficiente para a viagem programada. Depois
de duas semanas, o líquido ia-se tornando esverdinhado, viscoso, cheio
de bichinhos e infestado de bactérias, cada dia mais impróprio para o
consumo.
Novas caras de nojo e penalizadas.
- Já existia o pernilongo da dengue?
Risos.
- A água servida nos navios tinha mesmo um gosto horrível, insuportável.
Mas era a única fonte disponível para matar a sede.
- Santa Maria! Ainda aparecia gente para se aventurar numa viagem
dessa! – suspira Luísa, chocada.
- E as doenças?
- Muitas. De arrepiar os cabelos. Doenças provocadas pela má
alimentação, pela falta de higiene, pela dieta carente de sais minerais e
vitaminas encontrados nas frutas e nas verduras; fundamentais à saúde do
ser humano. Morria gente todo dia, atacada por febres malígnas ou pelo
medonho mal-de-luana. Outra doença freqüente entre os navegantes era
o escorbuto, pela falta de vitamina C, uma doença terrível que atacava as
gengivas dos marinheiros, fazendo cair os dentes. Morriam à míngua, no
maior sofrimento.
Para viajar naqueles navios o aventureiro tinha que ter muita coragem,
saúde de ferro, gostar exageradamente de dinheiro e nenhum amor à vida.
Coisa de louco! Mesmo assim, o Oceano Atlântico vivia cheio de
navegantes ambiciosos, que não tinham medo de tempestades em alto-
mar, de monstros marinhos, nem da fome, nem da sede e muito menos da
morte. Eram meses ao relento dentro de uma embarcação, sem cama
nem banheiro, pouca comida, enfrentando terríveis tempestades e
naufrágios. Mas, para muitos era preferível a passar o resto da vida
trancafiado numa masmorra de prisão em seu país de origem.
Filipe arregala os olhos:
- Monstros Marinhos! Monstros no mar? Vi na televisão...
53
- Lógico que não. Antigamente, meus Jovens, o mar assombrava,
porque era desconhecido. A comunicação entre os povos era muito difícil;
faltavam bons livros de informação para difundir o conhecimento entre os
povos. Assim, o homem via como verdadeiro uma escabrosa mentira,
uma lenda sem nenhum fundamento.
O Oceano Atlântico era conhecido por Mar Tenebroso ou Mar da
Escuridão. Pensavam que a Terra era plana e que, depois do Cabo Não,
que fica nas costas do Marrocos, as águas se despencavam num precipício
sem fim; indo cair no inferno. Imaginavam ser o Mar habitado por gigantes
imensos, por almas penadas, por homens sem cabeça, por monstros de
um olho só ou de quatro olhos pregados nos ombros, por belas sereias,
capazes de enlouquecer os marinheiros com seus cantos sedutores. Tudo
invencionice, fantasia pura.
Risos amarelos.
- E divertimento, não tinha? - Vitor, ainda meio assustado com o
sofrimento dos navegantes daquela época.
- Quase nada. Um ou outro tripulante, com sangue de artista, é que
improvisava uma apresentação de teatro ou de música. Mas, para
preencher mesmo as horas de ócio no convés, o jogo de cartas era
imbatível.
- Professor, dá licença? – levanta o braço a Renata.
- Pode perguntar.
- Por que deram o nome de Não ao Cabo Não?
- Ali era o limite da navegação costeira da África Setentrional. Só em
1418, os navegantes João Gonçalves Zaco e Tristão Vaz Teixeira,
orientados pela Escola de Sagres, do Infante D. Henrique, conseguiram
navegar além do Cabo Não, descobrindo a Ilha do Porto Santo. O limite
passou a ser o Cabo Bojador.
- Que legal! – admira Rogério.
- Havia até um ditado: quem navegar para além do Cabo Não, ou
voltará ou não.
- E o Cabo Bojador foi ultrapassado por Gil Eanes, não foi?
- Parabéns, sabichão. Isso é história para outro dia.
54
Jaqueline espanta-se:
- Meu Deus! Tanto martírio para ganhar dinheiro!
- Ainda hoje muita gente enfrenta horrores para garantir a sobrevivência.
Depois, Vocês poderão pesquisar sobre profissões no Mundo; ainda
existem trabalhos que lembram o sofrimento dos navegantes de mais de
quinhentos anos atrás.
Vitor dá sua opinião:
- Eu acho, Gente, que o pior trabalho é nas minas de extração de ouro
ou de carvão. Já vi num filme...
Pausa.
A manhã continua cheia de luz e sombra no Jardim Botânico, onde os
meninos estão ouvindo histórias da História do Brasil. Um galo cocorica
longamente; outros galos respondem. Existem soltos na área, dezenas de
galos e galinhas, todos com uma missão muito importante: são agentes
controladores de pragas, bem treinados em comer insetos nocivos às
plantas; além de produzir ovos, é claro.

Tubarões e peixes voadores dos oceanos tropicais (grav. do Século XVI)

55
Interior de uma caravela portuguesa - a parte da ré
Expedição guarda-costas combatendo
(gravura de Roque Gameiro) de Pau-Brasil
o contrabando

56
OS PRIMEIROS BRASILEIROS

Ao ver a cara de pesar dos estudantes sobre o sofrimento dos


navegadores dos tempos de navio à vela, o Professor Felício resolve
antecipar a distribuição dos doces, dos pirulitos de mel prometidos. Chama
o Porteiro Juraci e pede que lhe traga um tabuleiro furado com os pirulitos.
Todos saboreiam a doçura.
- Pode pedir bis? – Laura mostra-se gulosa.
O Professor dá uma risada:
- Pode pedir mais pirulito, sim, Laura, e quem mais quiser. E tudo por
conta da casa! Depois o Jura, como o chamamos na intimidade, arranja
mais. O Juraci Silva é responsável pelo portão do Jardim e de outras
surpresas agradáveis a simpáticos visitantes, como Vocês... Repito, meus
Jovens: para enfrentar o desconhecido e perigoso Atlântico o sujeito
precisava ser um destemido, desprendido de tudo, movido apenas pela
ambição de enriquecer a qualquer custo. Ah, ia-me esquecendo... Sabem
como eram conhecidos esses aventureiros, comerciantes da madeira de
tinta? Brasileiros. Isso mesmo: brasileiros... Ficaram conhecidos assim na
Europa.
Chico dá um salto. E grita:
- Matei a charada, Turma. Vem daí o nome de nosso País!
- Evidente, seu decoreba...
- Em parte sim, meu Caro. Em todo canto da Europa, depois do
descobrimento de Pedro Álvares Cabral, referiam-se ao nosso território
como a terra do Pau-Brasil, ou a terra que fornecia brasis às tinturarias. O
comerciante da madeira era conhecido por brasileiro. Isso mesmo,
brasileiro. Até que, em 1503, D. Manuel I oficializa o nome de Brasil para
sua colônia do outro lado do Mundo - do Orbe Terrestre, como diziam.
- E Vocês, o que acham do nome Brasil? – interrompe a Professora.
- Lindo! Imponente! Sonoro! - responde primeiro Maria Vitória com
orgulho na voz.
57
Dona Diana dá sua opinião:
- Nome bonito de uma árvore produtiva, rica e que representa a
fertilidade de um solo abençoado.
Outros concordam.
O Botânico Felício Esmaragdo Valverde explica:
- Quem não gostou foi a Igreja. Religiosos protestaram, acharam um
absurdo trocar o nome sagrado de Santa Cruz por Brasil.
- Ainda existem dúvidas da influência do Pau-Brasil no nome do Brasil,
Professor?
- A madeira rubra contribuiu, sim. Mas a origem etimológica da palavra
brasil é um tanto quanto misteriosa. Existem mais de vinte interpretações
sobre a sua origem; a palavra é antiga. Querem ter uma idéia? De 1351
até 1731 o nome Hy Brazil poderia ser visto em mapas e globos usados
pelos pesquisadores, denominando uma ilha mítica em meio às névoas do
Mar Tenebroso, quer dizer, do Oceano Atlântico.
- Hy Brazil! Ilha mítica! O que é isso? – Douglas se espanta.
- Segundo a lenda, Hy Brazil era uma ilha movediça, que sumia
misteriosamente no horizonte sempre que os navegadores se aproximavam
dela. Etimologicamente falando, brasil vem do celta bress, com origem
do inglês to bless, e significa abençoar. Por outro lado, pode-se afirmar
que brasil vem do francês brésil, que, por sua vez, tem sua origem do
toscano verzino, a denominação da madeira de tinta na Itália.
A Professora faz uma observação:
- Ainda bem. Se não fosse o elevado valor comercial do Pau-Brasil,
não teria nosso País escapado da vexação de ter como nome Terra dos
Papagaios, denominação que recebeu, por breve tempo, em mapas e
documentos imediatamente posteriores ao descobrimento.

58
A CORTE PORTUGUESA ABRE OS OLHOS

- Vejam bem: os corsários contrabandistas, também conhecidos por


brasileiros, não só influenciaram o nome de nosso País, como também
contribuíram para abrir os olhos da Coroa Portuguesa, na conquista
definitiva do Brasil.
Luísa não se contém:
- Quais foram os maiores contrabandistas?
- Os franceses. Campeões absolutos do tráfico de Pau-Brasil, sem a
menor sombra de dúvida. Dizem que, com a ajuda dos Tupinambás,
levaram daqui mais Pau-Brasil do que os portugueses, para atender a
demanda crescente de corantes na industria têxtil francesa.
Em 1503 o navio L´Espoir de Honfleur, tripulado por bretões e
normandos, abriu o caminho do contrabando francês de Pau-Brasil na
costa brasileira. A partir daí as visitas tornaram-se constantes, e, com o
apoio da Corte Francesa. O rei Francisco I (1515-1547), até mandou ao
rei de Portugal o seguinte recado: eu não conheço o testamento em que
meu avô Adão legara herança americana apenas aos primos de
Portugal e Espanha.
Respondendo a ousadia, a Corte Portuguesa intensificou o combate
aos contrabandistas. Entre os vários navios de bandeira francesa
apreendidos e incendiados, destaca-se o La Pélérine, preso pelos lusitanos
no torna-viagem, carregado de centenas de toras de Pau-Brasil, 300
macacos, 600 papagaios, 3.000 peles de onças, 300 quintais, isto é, 1762
quilos de algodão e outros produtos.
59
- Os franceses eram amigos dos índios? – quer saber Alice.
- Poucos exploradores podiam se igualar aos franceses no conhecimento
e no trato com os índios, o que contribuía para facilitar o escambo. A
maioria dos exploradores considerava os nativos uma raça inferior e
bárbara; tratava-os como escravos, como já vimos.
- Que horror?! – quase grita Maria Vitória, ressabiada.
- Olha aí apareceu a aparecida!
- Olha aqui, Chico Decoreba, o gesso no meu braço...
Risos e olhares para o lado do Chico.
- Ordem na assembléia, Meninos!... – pede a Professora.
Pausa com risos despistados. O Professor conclui:
- A pirataria, meus Jovens, nas costas brasileiras crescia dia a dia. E o
Governo Português, pouco ou quase nada fazia para combater o tráfico
de Pau-Brasil.
Vitor empina a mão direita e protesta:
- Por que aqueles portugueses não usaram canhões para estourar os
navios invasores!...
- Ora, Vitor, é claro. Canhões Portugal tinha aos montes, só que estavam
ocupados em garantir as conquistas na Ásia. Vez ou outra Portugal mandava
uma expedição para vigiar as costas brasileiras e botar os piratas a correr,
digo: para nadar, com estouros de seus pesados canhões.
Até 1531, a expedição de guarda-costa mais importante foi a de Martim
Afonso de Souza, comandante de uma frota de cinco navios e quatrocentos
homens armados até os dentes. Mal desembarca no Porto de Piaçagüera,
na altura de Pernambuco, aprisiona dois navios franceses lotados de Pau-
Brasil.
- Então Martim Afonso foi um herói na defesa do Pau-Brasil? –
entusiasma Tijuca.
- Sim, meu Jovem. A fibra, a coragem, a decisão de Martim Afonso
fez com que, durante muito tempo, navio pirata para ancorar aqui tinha
que dar sorte ou ser muito esperto. A frota do Capitão Martim subia e
descia a costa brasileira com a ordem de atirar em navios de bandeira
estrangeira, que estavam levando a madeira brasileira.
- Atirava e depois perguntava, Professor? – brinca o Vertinho.
- A partir daí, o Pau-Brasil se torna um monopólio da Coroa Portuguesa,
ficando encarregada exclusivamente de sua exploração e comercialização.
- Até quando exploraram o Pau-Brasil, no Brasil? – pergunta Marise.
60
- Acredite se quiser: até acabar. Derrubaram o Pau-Brasil a torto e a
direito. Em pouco mais de trezentos anos o estoque natural em nossas
matas quase zerou. A ação destruidora dos europeus foi tão violenta que
a Natureza foi incapaz de se recompor. Uma devastação! Alguns pés
ainda são preservados em pequenos projetos florestais, em Jardins
Botânicos, em praças e em ruas de algumas cidades brasileiras. Ou ainda
outra, camuflada no meio de mata fechada, que escapou dos predadores
ou rebrotou.
- Pau-Brasil rebrota? – pergunta Róbson.
- Ainda bem. Mas sua muda se faz com semente. Uma curiosidade: na
Estação Ecológica Pau-Brasil, lá na Bahia, ainda restam algumas espécimes
dessa madeira do tempo de Cabral, possivelmente árvores rebrotadas.
Uma delas é chamada pelos pesquisadores de Pau-Brasil Rei, tem dois
metros e sessenta centímetros de circunferência e 40 metros de altura.
Dona Diana aproveita e cita:
- A descoberta da anilina, no princípio do XVIII, contribuiu para
diminuir o interesse pelo Pau-Brasil. Estou certa, Professor Valverde...
- Felício Esmaragdo... Minha cara Diana...
- Desculpe-me, Professor. Prometo me lembrar do Esma... ra... gdo
direitinho.
- Sim. O produto químico, extraído do carvão-de-pedra, então,
substituiu a tinta vegetal, por um custo menor e com qualidade
extraordinária. Tanto que, em setembro de 1826, Dom Pedro I, mandou
cinqüenta quintais, isto é, três toneladas de toras de Pau-Brasil para serem
leiloadas em Londres e liquidar parte dos juros da dívida brasileira. Um
fiasco. A venda não deu para cobrir o custo de transporte, a madeira de
tinta estava com a cotação em baixa no mercado europeu, em conseqüência
do crescimento da indústria de anilinas.
- A dívida foi paga? – pergunta Adauto com um sorriso torcido.
- Acredito que sim, mas não com o resultado do leilão de Pau-Brasil
na Bolsa de Mercadorias de Londres.
Isabel levanta a mão e com ar de mistério:
- A cidade onde moro tem ruas plantadas com Pau-Brasil.
- Uê!... Você não mora aqui?
- Ora, Filipe, eu não disse que não moro aqui. É aqui mesmo que tem
ruas arborizadas com Pau-Brasil.
61
- E onde ficam essas ruas?
- Em vários bairros. Na rua onde mora minha Vó Filhinha mesmo tem.
Na rua da Tia Ila. Da Tia Guiomar, da Tia Ida. Na pracinha onde mora o
Tio Oliveiro. Na cidade onde mora o Tio Zezé.
- Eu também sei onde tem pé dessa árvore – ri toda orgulhosa, Ana
Laura.
- Se Você sabe, então conte.
- No clube que freqüento tem dezenas de árvores de várias qualidades,
quero dizer, espécies, não é assim mesmo Professor Felício? E, no meio
delas, alguns pés de Pau-Brasil.
- Parabéns para seu Clube! - festeja Cidinha.
O Diretor dá uma risada, feliz, e também aplaude:
- Gosto do bate-boca de vocês. É uma ação cívica plantar nossa querida
árvore em praças, jardins públicos; ruas, clubes recreativos e
principalmente, nas margens das estradas, o que daria sombra, proteção
e madeira para ser utilizada em construções públicas. Desde o princípio
do século XX a idéia era difundida pelo biólogo pernambucano, Professor
Roldão Campos, que queria ver em cada cidade brasileira pés de Pau-
Brasil preservados.
- Professor, como hoje é utilizado o Pau-Brasil?
- A sua utilidade é muito variada, excelente madeira para construção
civil e naval. Na marcenaria fina também; serve até para fazer arco de
violino.
- Instrumento musical!... - admira Ana Lúcia.
- Sim. Beetohven, Mozart e outras feras da música clássica eram fãs
de carteirinha de arco feito de Pau-Brasil para tocar violino. O som sai
mais cristalino, vai mais longe. Curiosidade: na cidade de Guaraná, no
Estado do Espírito Santo, tem uma velha fábrica de arco de Pau-Brasil
para instrumento de corda.
- Legal!... – todos.
- Os escultores também gostam de fazer suas peças com Pau-Brasil.
A madeira bem lixadinha adquire uma textura muito fina e delicada... Como
bumbum de neném!
Todos riram. O professor continua entusiasmado:
62
- Na medicina popular, os índios usavam o pau-de-tinta para curar
diversos males. E Maurício de Nassau foi o primeiro homem público a
recolher amostras de Pau-Brasil para estudos científicos na Europa. No
Brasil, o cientista pernambucano, José Lamarotti tem uma longa pesquisa
sobre o poder medicinal dessa planta. São infinitas as propriedades de
nossa árvore.
Dona Diana, sorridente:
- Muito bem, Professor Felício. Adoramos sua história. Só para
completar: tem gente preocupada em repovoar nossas matas com Pau-
Brasil. Entre tantos, a professora Ana Cristina, filha do Professor Roldão,
que dirige a Fundação Nacional do Pau-Brasil. Na Bahia, a Embrapa
estuda o DNA das árvores existentes na Estação Pau-Brasil. Ainda tem
gente trabalhando para devolver ao seu habitat natural uma espécie vegetal
que jamais poderia ser extinta!
- Professora Diana, quero parabenizá-la por trazer seus alunos para
conhecer a Natureza in-loco.
- In ... lo... O quê!... – estranha Ana Laura.
- In-loco - repete a Professora. - Isso quer dizer: estudar, observar
uma árvore no local onde está plantada. Entende?
O Professor Felício sugere:
- Cheguem todos para cá, vamos abrir uma roda em torno deste Pau-
Brasil. De mãos dadas, recitaremos um poema em sua homenagem, como
se hoje fosse o seu dia. Repitam comigo, legal?
- Siiiimmm! - todos num grito.
Meninos e meninas abrigam-se debaixo da majestosa árvore, pisando
o chão coberto de folhas secas.
63
O Diretor, já de pé, endireita o colete, ajeita a calça jeens e tira do
bolso uma folha de papel. Contempla por um minuto a copa do Pau-
Brasil. Depois, coloca-se no meio dos estudantes, faz pose e com a voz
cheia, também de um artista de teatro, gestos pausados, lê:

Ao Viandante
Tu que passas e ergues para mim o teu braço,
Antes que me faças mal, olha-me bem.
Eu sou o calor de teu lar nas noites frias de inverno,
Eu sou a sombra amiga que tu encontras,
quando caminhas sob o sol de agosto.
E os meus frutos são a frescura apetitosa,
Que te sacia a sede nos caminhos.
Eu sou a trave amiga de tua casa, a tábua da tua mesa,
a cama em que descansas e o lenho de teu barco.
Eu sou o cabo de sua enxada, a porta de tua morada,
A madeira de teu berço e do teu próprio caixão.
Eu sou o pão da bondade, a flor da beleza.
Tu que passas, olha-me bem e não me faças mal.

Sem risinhos atravessados, nem deboche, os meninos acompanharam


direitinho os versos lidos.
- Esse Doutor Felício é cobra criada... – brinca Chico.
A Professora sensibilizada:
- Que lindo, Professor! O Senhor também é um excelente intérprete.
De quem é o poema?
Felício, que ruborizara, agradece com discreta cerimônia:
- Bondade sua. O Autor é desconhecido – e com os dedos reverentes
dobra a folha de papel. - Certa vez, visitando o Castelo de São Jorge, em
Lisboa, vi uma prancha de madeira gravada com esse poema. Amei os
versos, fotografei a tábua e hoje passo para Vocês. Tenho cópias xerocadas
no escritório, que sempre distribuo aos visitantes.
- Poxa!
- Eu quero uma!
- Eu também!
- Eu também!
- Vou xerocar um tantão e espalhar com a galera do meu bairro! –
insiste Ana Laura, gracejando.
- A tabuleta com os versos era de Pau-Brasil? – provoca Chico.
64
- Infelizmente não. Era de Cedro.
- Legal, assim mesmo! – aplaude Alessandra com um sorriso.
- Jóia!
- O Professor é um barato mesmo! – aclama Rose, radiante.
Felício Esmaragdo Valverde sorri amável. Curva o tronco num gesto
de agradecimento, aquele gesto de artista no palco, emocionado com os
aplausos de uma grande platéia. Dona Diana aproveita a oportunidade:
- Que ótimo que nos recebe com tanto carinho, tornando nosso passeio
uma fonte de aprendizado e divertimento. Aprendemos História e Ecologia
e...como declamar um poema!
- Disponha. Entendo cada vez mais porque seus alunos são tão
interessados, conscientes e amigos.
Risos gerais.
- O Jardim Botânico, Diana, minhas Meninas, meus Meninos, está
aberto a qualquer interessado em ter um contato direto com a Natureza.
Tenho a certeza de que os visitantes saem daqui mais puros de alma, bem
mais interessados em defender a Ecologia e muito mais responsáveis.
Súbito, a mesma voz de um papagaio invisível interrompe as fala e os
risos:
- Ô Felício! Ô Professor! Ô Esmaragdo! Currupaco!
Os estudantes olham uns para os outros, ainda mais admirados e
curiosos. Procuram o misterioso papagaio por todos os lados.
- É o mesmo, Professor, o mesmo papagaio!
- Pelo menos, a voz é igual ...
Nisso, uma flecha de índio, da verdadeira, corta o ar, assobiando,
numa velocidade tremenda e se finca no chão, próximo ao pé do Diretor.
Susto geral.
- Vamos cascar fora, Pessoal! – gritam uns.
- Essa não!!!
- Aqui tem índio de verdade!
- Eu, heim, Rosa!?
- Quero minha mãe!...
E um outro mais retumbante:
- Salve-se quem puder!
Debandada geral.
65
Uns correm; outros se escondem em moitas próximas; outros sobem
em árvores; as meninas se agarram nos braços da Professora, também
espantada e sem saber o que fazer.
O Diretor do Jardim Botânico nem se abala. Ria-se com o
apavoramento dos visitantes, enquanto a flecha enfeitada de penas
coloridas, enterrada no chão, ainda tremia pelo impacto.
A Professora, implicada, num inquieto reparo de curiosidade:
- Essa flechada quase acerta o Senhor! Que brincadeira é essa?
Sem dizer uma palavra, Felício Esmaragdo Valverde mantém o sorriso
zombeteiro diante da apreensão do grupo visitante; alisa a barbicha, e em
tom macio, carinhoso, amigo:
- Dona Diana, meus Jovens, calma! Tudo uma brincadeira fora do
script, com sabor de alegria. A flecha é verdadeira, sim, feita de osso de
canela-de-ema, envernizada com veneno de cobra e escorpião. O
guerreiro, também. Mas não se trata de ataque do Índio Peri. Na haste da
flecha tem um papel amarrado. Traz uma mensagem, aposto. Leia para
nós, Dona Diana.
A Professora ainda ressabiada, retira, mãos trêmulas, o pedacinho de
papel.
Silêncio.
Ela lê o bilhete com atenção, tranquilizada exclama:
- Escute, Gente: aqui está escrito: Educação Ambiental - o caminho
mais curto e eficiente para modificar a relação do homem com a
Natureza. Parabéns, Professora Diana Pena! Parabéns Meninas!
Parabéns, Meninos! Voltem sempre.
Sorrisos curiosos. Todos olham para o Professor, admirados.
A Professora, agora tranqüila:
- Uê! Como esse índio guerreiro sabia meu nome?
- Muito simples. É uma homenagem do Jardim Botânico aos
professores que trazem alunos para um contato direto com a Natureza. O
seu nome e de sua escola já estão registrados em nossos arquivos. Agora,
cada estudante, ao sair, vai assinar o livro de visitas. E olhando para todos:
- No futuro, quando Vocês passarem aqui, muitos vindos de muito longe,
e rever nossos registros, as assinaturas de Vocês lembrarão com doçura
este dia.
- Hummmm, que chique! – brinca a Professora.
- Ôba! – gritam os estudantes, sentindo-se importantes.
66
- Estou maluco para ficar adulto, casar e trazer meus filhos para conhecer
o Jardim e ver minha assinatura – apressa Pascoal.
- Vamos assinar o tal livro, já!!! – conclama Henri.
Chico se apressa:
- Onde está, Professor, já destampei minha esferográfica!
- Quem chegar por último é...
Ana aproveita e cobra, resumindo o consenso geral:
- Espera aí, Gente, e o papagaio?
- Verão já. O Diretor adianta uns dez passos e grita, com voz no jeito
de índio falar:
- Índio Misterioso, poder descer da árvore.
Rapidamente, surge um homem vestido de índio, isto é: descalço, de
tanga recoberta com penas coloridas, colares de osso no pescoço, nos
braços e nas pernas; a cara pintada de vermelho. Mesmo disfarçado assim,
não foi difícil reconhecer, travestido de selvagem, o Porteiro Juraci Silva.
Muito sorridente, caminhando de mansinho até o grupo de pessoas.
Os meninos batem palmas.
- Olhem: é o Juraci, Gente, o dos pirulitos...
- ... Aquele do portão do Jardim!
- Aqui só tem artista...
- E Pau-Brasil!
Em sotaque tribal, Juraci Silva agradece, numa brincadeira:
- Índio ficar grato, ficar muito emocionado.
Ana Laura insiste e também brinca:
- Bom dia, Índio Juraci. Uê!... Achei que o papagaio que ouvimos
vinha empoleirado no seu ombro!
Gritos em coro:
- O papagaio! Queremos ver o papagaio!
Juraci promete:
- Índio mostrar o papagaio, sim. Aqui e agora.
Dá um salto para trás, tira preso no elástico que segurava a tanga,
bem camuflado, um gravador pequeno, levanta no ar e justifica, rindo:
- Este ser papagaio eletrônico, índio fazer ele falar direitinho, que nem
de verdade.
Num gesto delicado, liga o aparelho e a gravação repete:
- Currupaco-papaco! ! Ô Felício! Ô Felício! Ô Esmaragdo!
67
A meninada decepciona-se.
Cada um com o sorriso mais amarelo:
- Ah!... Ohhhh ....
Os adultos desatam uma risada com o desapontamento momentâneo
dos colegiais. O Diretor bate palmas, chamando a atenção dos estudantes,
e esclarece:
- Calma, meus Jovens! Não quero ver ninguém triste aqui. O nosso
Juraci é um índio de verdade, da tribo dos Maxacalis, nosso funcionário
há muito tempo. Sempre que pode, encena essa demonstração. Aqui até
as aves são artistas alegres!... Mas temos outra surpresa...
Maria Vitória, em nome dos colegas:
- Professor, deixa de fazer hora e mostra logo o papagaio. Queremos
era ver um papagaio de verdade.
Silêncio.
O Professor chama, em voz alta, por um dos zeladores. Logo aparece
um homem de aspecto humilde, olhos redondos e negros, muito brilhantes.
Agitando no ar uma das mãos; com a outra, toca uma música num
instrumento desconhecido, um velho Realejo, onde também se equilibra,
serelepe, uma maritaca anã.
Mais surpresas.
Nenhum dos meninos conhecia um instrumento assim; nem de ouvir
falar, nem de gravura. Ficam satisfeitos e, com jovialidade, recebem o
velho, a quem o Professor chama Godofredo, e sua maritaca adestrada.
O Professor abana a cabeça:
- Não é um papagaio dos grandes. Não fala, mas desperta muita
emoção. Antigamente o Realejo, este instrumento popular, como vêm, é
espécie de órgão mecânico portátil; tem um fole e teclado, que são
acionados por um cilindro dentado movido por esta manivela; servia, e
ainda serve, de meio para consultar a sorte de um curioso; principalmente
no amor.
- Ôba!!!
- Quero saber o nome de meu namorado! – brinca Maria Vitória.
- Calma, Gente. Deixe o Professor Felício...
- Esmaragdo Valverde...
- Terminar a explicação... - interfere a Professora.
- Poxa que passeio este de hoje!
- Vejam só: o Godofredo faz um sinal com a mão, a maritaca desce até
a cestinha presa ao lado do realejo e pega com o bico um papelzinho, tem
um tantão deles, cada com uma mensagem escrita.
68
O Professor, com cara de mistério, puxa Maria Vitória pelo braço:
- Vamos ver o que a Maritaca Ana, xará de sua irmã, tira para Você?
Usam muito essa brincadeira para conhecer recados de namorados...
Vamos ver...
- Anã, ou Ana?... – quer saber Ana Laura.
- Ana é apelido aproveitado de anã... tudo brincadeira...
Ao ver o sinal do Godofredo, a maritaca puxa um bilhetinho do cesto,
dobrado em quatro.
Maria Vitória lê, em voz alta:
- Escutem: Na natureza nada é inútil. Tudo tem a sua razão de ser.
Tudo precisa ser respeitado.
- Quebrou a cara a Aparecida...
- Bem feito! Com esse braço na tipóia nenhum namorado quer Você
nem morto...
- Mas a mensagem é bonita, Chico!
Ana Laura quer uma mensagem. A maritaca faz seu trabalho, e a menina
lê: Viver de bem com a Natureza só depende de Você. Ame a Natureza.
Seja feliz.
Chico também ganha um bilhetinho: Defender a Natureza é um ato
de cidadania. Um compromisso de amor.
Ôbas gerais.
Foi preciso fazer uma fila indiana, senão embolavam todos de uma
vez em redor do Godofredo. Todos foram agraciados com uma mensagem.
Logo, o Professor recomenda ao encarregado:
- Seu Godô, agora guarde o realejo com o mesmo cuidado e carinho
que o senhor lhe dedica há anos; solte a maritaca na sua árvore predileta.
E aguarde meu sinal para acompanhar a Professora e seus estudantes em
um passeio pelo Jardim Botânico. Mostre a eles tudo que quiserem, certo?
- Sim senhor! – também simpático o Zelador.
O Diretor despede-se de Dona Diana; enaltece-lhe a profissão:
- Educar é um sacerdócio. Exige de nós muita dedicação, amor e,
principalmente, acreditar no ser humano, como fonte de crescimento. Só
a educação pode fazer com que uma Nação mude a sua cara.
Os olhos negros e miúdos da Professora Diana umedecem. Num gesto
rápido, tira os óculos escuros de sua bolsa e coloca no rosto.
O Professor Felício suspira, sai apressado, limpando a testa, o pescoço,
molhados pela emoção. E ainda acrescenta:
- Só falta mais uma coisa... Para encerrar o passeio de Vocês...
- ???
- Vamos almoçar que ninguém é de ferro.
69
Chico aproveita para caçoar:
- Quero ver a Maria Vitória pegar no garfo com a mão esquerda...
- Vivaaaaaa o Professor Felício E s – m a – r a – g d o Valverde!
O canário estala. O sabiá canta noutro galho e distante. As abelhas no
afã de cumprir ordens de sua rainha, zumbem, pesadas de mel no corpo e
pólen nas patinhas e o beija-flor, agora de companheira, descansa num
ramo de árvore, observando tudo ao redor.
Primavera no Brasil é assim. E muito mais.

70
INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES

Pau-Brasil - Caesalpinia echinata Lam - família Leguminosae-


Caesalpinoideae leguminosa - a mesma do Pau d´óleo, da Cássia, do
Feijão, do Jacarandá, da Sucupira, da Sibipiruna, do Pau ferro, da Braúna,
do Barbatimão.

Nomes populares: pau-brasil, ibirapitanga, orabutã, brasileto,


ibirapiranga, ibirapitã, muirapiranga, pau-rosado, pau-de-pernambuco.

Características morfológicas - planta espinhenta de 8-12 m de altura


(a literatura cita exemplares de até 30 m que existiram no passado), com
tronco de 40-70 cm de diâmetro. Folhas compostas bipinadas de 10-15
cm de comprimento com 5-6 pares por pina, de 1-2 cm de comprimento.

Ocorrência: Ceará ao Rio de Janeiro na floresta pluvial Atlântica, sendo


particularmente freqüente no sul da Bahia.

Madeira: muito pesada, dura, compacta, muito resistente, de textura


fina, incorruptível, com alburno pouco espesso e diferenciado do cerne.

Informações ecológicas: planta semidecídua, heliófita ou esciófita,


característica da floresta pluvial Atlântica. Ocorre preferencialmente em
terrenos secos e inexiste na cordilheira marítima. É planta típica do interior
da floresta primária, sendo rara nas formações secundárias.

Árvores derrubadas: 70 milhões de pés, mais de 3 mil toneladas por


ano, durante três séculos.
71
DADOS HISTÓRICOS

Nomes do Brasil: Pindorama (não oficial – indígena: país das palmeiras),


Ilha de Vera Cruz (1500), Terra Nova (1501), Terra dos Papagaios
(1501), Terra de Vera Cruz (1503), Terra de Santa Cruz ( 1503), Terra
de Santa Cruz do Brasil (1505), Terra do Brasil (1505) e Brasil, a partir
de 1527.

Tupiniquins – índios da família Tupi-Guarani. No século XVI, cerca de


85 mil habitavam duas regiões do litoral brasileiro: nos costões do sul da
Bahia, norte do Espírito Santo e numa faixa entre Santos e Bertioga, na
costa paulista.

Acidentes Geográficos ( principais registros ): O primeiro foi o Monte


Pascoal, em 22 de abril de 1.500. Em 16 de agosto de 1501, o Cabo de
São Roque. Depois, no mesmo ano, o de Santo Agostinho, em 28 de
agosto. Mais adiante os rios São Miguel, em 29 de setembro e São
Francisco, em 4 de outubro; a Baía de Todos os Santos, em 1º de
novembro; o Cabo de São Tomé, em 21 de dezembro; o Rio de Janeiro,
em 1º de janeiro de 1502; a baia de Angra dos Reis, em 6 de janeiro; a
ilha de São Sebastião, em 20 de janeiro e o Porto de São Vicente, em 22
de janeiro.

Rio Caí - pequeno rio, conforme registra Caminha, é contestado pelo


historiador Max Justo Guedes, capitão-de-mar-e-guerra, do Serviço de
Documentação da Marinha, defende a tese de que o rio citado pelo
escrivão português é o atual rio do Frade, a 15 quilômetros ao norte do
Caí, no município de Troncoso.
72
CONQUISTANDO A LINGUAGEM
Compreensão do Texto

Atividades - Respostas em folha anexa:

01) - Você conhece outro livro sobre a História do Pau-Brasil?


02) - Você já viu uma árvore da Pau-Brasil? Onde?
03) - Você já viu um móvel ou uma peça de arte fabricada com Pau-
Brasil?
04) - Replantar o Pau-Brasil no Brasil seria bom para o nosso País?
05) - Onde Você acha que o Pau-Brasil deve ser plantado?
06) - Se Você tivesse um quintal, um jardim ou uma área rural plantaria
um pé de Pau-Brasil?
07) - Você acha que se os franceses tivessem colonizado o Brasil, o
Pau-Brasil teria sido melhor preservado?
08) - E os holandeses?
09) - E os Índios, que já moravam aqui?
10) - Divida o texto em quatro trechos em que o autor narra situações
diferentes. Escolha um e reescreva, acrescentando mais diálogo entre os
personagens.
11) - O autor insere no texto vários adágios populares. Você conhece
todos? Explique, em outras palavras, o que significa cada um dentro do
contexto.
12) - Transcreva do texto todas as palavras que Você não conhece.
13) - Pesquise e monte um painel sobre o Mar Tenebroso.
73
14) - Faça uma pesquisa sobre as moedas no Mundo e monte um
painel.
15) - Pesquise sobre profissões no Mundo.
16) - Descubra mais sobre o Movimento Pau-Brasil, de Oswald de
Andrade.
17) - Interprete o poema: Ao Viandante.
18) - Crie uma historinha ou uma estrofe falando do Pau-Brasil
19) - A história fala sobre o Realejo, descubra alguém que o conheça
e peça para contar uma história envolvendo o instrumento.
20) - Invente duas ou mais frases defendendo a Natureza.

Para o Professor

Reflexão
Falar com apuro a Língua Vernácula é prestar culto a uma herança
sagrada que recebemos do passado através dos lábios de nossas mães
(Coelho Neto).

Motivação

Converse com os alunos sobre recontar uma história, lembrando a


eles que o processo tem como objetivo básico atualizar a linguagem,
explorando de maneira substanciosa, novos termos e situações relacionadas
com a realidade deles. Cite algumas frases ou palavras que foram extraídos
da linguagem coloquial ou da científica, mostrando a diferença.
Trabalhe e elabore um Vocabulário do livro com os alunos.
Peça as crianças para contar, com suas palavras, o trecho que acharam
mais engraçado.

Educação Ambiental

Mostre a importância e a dinâmica de um ecossistema, onde diversos


tipos de vida dividem a mesma área.
Peça aos alunos para colar uma foto ou um desenho do pé de Pau-
Brasil, no caderno de exercícios.
74
DATAS COMEMORATIVAS

Abril, 7 – Dia Mundial da Saúde; 15 – Dia da Conservação do Solo;


19 – Dia do Índio. Maio, 10 – Dia do Campo. Junho, 5 – Dia da Ecologia
– Dia Mundial do Meio Ambiente. Julho, 28 – Dia do Agricultor. Agosto,
5 – Dia Nacional da Saúde; 11 – Dia do Estudante. Setembro, 5 – Dia da
Amazônia; 21 – Dia da Árvore. Outubro, 4 – Dia da Natureza; 5 – Dia
da Ave; 15 – Dia Mundial da Alimentação; 15 – Dia do Professor.
Novembro, 8 – Dia Mundial do Urbanismo. Dezembro, 2 – Dia Pan-
Americano da Saúde; 07 - dia do Pau-Brasil; 10 – Dia da Declaração
dos Direitos Humanos; 25 – Natal.

LEGISLAÇÃO

Foi determinado que toda escola elabore um Plano de Educação


Ambiental, de acordo com a Constituição Federal de 1988, Art. 225 –
“Todos têm direito ao meio embiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se
ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações.
... § 1º - Inciso VI – promover a educação ambiental em todos os
níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio
ambiente.
75
BIBLIOGRAFIA

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BARROSO, Gustavo, História do Brasil, Rio de Janeiro, Brasil-América,
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Nacional, 1957.
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VARGANHAGEM, Francisco Adolfo, História Geral do Brasil, São
Paulo, Ed. Melhoramentos, 1975
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Welington Almeida Pinto
O Autor e sua obra
Nascido em São Roque de Minas, cidade
berço da nascente do Rio São Francisco, em 18
de março de 1949. Filho de José Francisco
Pinto e Maria do Livramento Pinto. Residiu
com a família em Campos Altos e depois, em
Passos, onde conclui seus estudos para dar inicio
à vida profissional na área de contabilidade. A
intimidade com a literatura manifesta-se desde
a escola primária, quando apresenta suas
primeiras composições poéticas.
Em 1971, transfere-se para Belo
Horizonte, empregando-se no departamento
de contabilidade de uma empresa imobiliária,
sem abandonar o gosto pela leitura dos grandes
clássicos da literatura universal. Entusiasmado
com o movimento cultural da Capital,
freqüenta as reuniões da Academia Mineira de
Letras, da Academia Municipalista de Letras e
do Instituto Histórico e Geográfico de Minas
Gerais. Ingressa no jornalismo, passando pela
redação dos jornais O Diário, A Última Hora e
Estado de Minas. De 1972 a 1976 estuda artes
no Centro de Pesquisas Plásticas da ACM.
Especializa-se em publicidade e funda a sua
própria agência.
Durante anos dedica-se a conhecer países da Europa, da América do Sul e da América do
Norte, procurando em cada cidade visitada manter contato com artistas e entidades produtoras
de arte.
Publica o seu primeiro livro aos 23, A Cela, que também foi adaptado para o teatro de
arena. Entre 1972 e 1973, escreve vários contos infantis para o suplemento infantil Gurilândia,
do Estado de Minas, como também para o Zero Hora Infantil, de Porto Alegre e para a
Gazetinha, do Gazeta do Paraná, de Curitiba. Eleito em novembro de l986 para o Instituto
Histórico e Geográfico de Minas Gerais. Membro efetivo da UBE – União Brasileira dos
Escritores/SP e ABRALE - Associação Brasileira de Autores de Livros Educativos.
Livros Publicados
Coleção Infantil Vitória Régia/Edita, 1997:
A Águia e o Coelho
Clin-Clin, o Beija-Flor Mágico e Tufi, o Elefante Equilibrista
Seu Coelhino, em Viagem ao Sol
O Gato-do-Mato e o Preá e A Caçada
Literatura Adulta: A Cela- Helbra/1969
Poesia - Antologia Poética - Edita/1980
Toponímia: Dicionário Geográfico e Histórico do Estado de Minas Gerais
Dicionário Geográfico e Histórico do Estado de São Paulo
Coleção Legislação Brasileira/Edições brasileiras/1993:
Condomínio e suas Leis
Licitações e Contratações Administrativas
A Empregada Doméstica e suas Leis
Lei do Inquilinato
Assédio Sexual no Local de Trabalho
Coleção Infanto/Juvenil/Edições Brasileiras/1998:
Malta, o Peixinho-Voador no São Chico
Santos-Dumont, no Coração da Humanidade
A Saga do Pau-Brasil
Dramaturgia: A Cela – peça adulta, adaptação do livro “A Cela”
Flicts - adaptação do livro “Flicts”, de Ziraldo.
Pequeno Príncipe - adaptação do livro “O Pequeno Príncipe”, de
Antoine Saint Exupery
História do Brasil, em Aula Viva - adaptação de temas históricos para
teatro, aplicado em sala de aula - Edita/1978

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Lendo contos em família. Ilustração de Gustavo Doré (Paris, 1867).

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Dos Índios...
neste dia os vimos mais de perto e mais
à nossa vontade, por andarmos todos
quase misturados. Ali, alguns andavam
daquelas tinturas quartejados; outros de
metades; outros de tanta feição, como em
panos de armar, e todos com beiços furados,
e muitos com ossos neles, e outros sem
ossos. Traziam alguns deles uns ouriços
verdes, de árvores, que, na cor, queriam
parecer de castanheiros, embora mais e
mais pequenos. E eram aqueles cheios
duns grãos vermelhos pequenos, que,
esmagados entre os dedos, faziam tintura
muito vermelha, de que eles andavam
tintos. E quanto mais se molharam, tanto
mais vermelhos ficavam.

Pero Vaz de Caminha


Carta a El-Rei Dom Manuel
Fundindo História e Literatura, este livro registra
a extração abusiva do Pau-Brasil em nossas
florestas, a escravidão e o extermínio de inúmeras
nações indígenas pelos europeus.
O autor expõe os fatos sem abusar da citação
de individualidades, descreve e explica episódios
que despertam o interesse e avivam a curiosidade
do jovem leitor, tornando acessível, proveitosa e
vibrante a leitura e a compreensão da História do
Brasil.
A narrativa está em sintonia com a sensibilidade
da juventude brasileira. Resgata em assuntos
históricos a ação da fala e, reescreve, de forma
espontânea, importante período do Brasil colonial.

Leia também
Santos-Dumont,No Coração da Humanidade
de Welington Almeida Pinto

Obra completa sobre o gênio brasileiro, favorecida por


uma linguagem moderna, de fácil compreensão e rica em
conteúdo. Bem ilustrada, reproduz fotos e ilustrações
editadas pelas revistas La Nature, L'lllustration, Le Figaro
e outros veículos de imprensa que cobriam as experiências
de Santos-Dumont, em Paris, de 1898 a 1909.

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