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Cortinas de estacas moldadas

Technical Report · July 2002


DOI: 10.13140/RG.2.1.3862.0648

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1 author:

Jorge de Brito
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INSTITUTO SUPERIOR TÉCNICO

MESTRADO AVANÇADO EM CONSTRUÇÃO E


REABILITAÇÃO

CADEIRA DE CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIOS

CORTINAS DE ESTACAS MOLDADAS

Jorge de Brito

Julho de 2002
ÍNDICE

1. Introdução 1
2. Classificação e processo construtivo das estacas moldadas 3
2.1. Vantagens e desvantagens 3
2.2. Com trado contínuo 5
2.2.1. Vantagens e desvantagens 5
2.2.2. Faseamento construtivo 6
2.2.3. Problemas potenciais 10
2.3. Com tubo moldador recuperável 11
2.3.1. Vantagens e desvantagens 11
2.3.2. Faseamento construtivo 12
2.3.3. Recurso ou não ao tubo moldador 20
2.3.4. Problemas potenciais 20
2.4. Com lamas bentoníticas 21
2.4.1. Vantagens e desvantagens 22
2.4.2. Faseamento construtivo 22
2.4.3. As lamas bentoníticas 24
2.4.4. Problemas potenciais 25
2.5. Selecção do tipo de estacas 27
3. Cortinas de estacas 29
3.1. Vantagens e desvantagens 29
3.2. Cortinas de estacas espaçadas 31
3.3. Cortinas de estacas contíguas 33
3.4. Cortinas de estacas secantes 33
3.5. Selecção do tipo de cortinas de estacas 35
3.6. Soluções mistas 35
3.7. Questões gerais 35
4. Processo construtivo 37
4.1. Aspectos gerais 37
4.2. Análise da envolvente e aspectos burocráticos 38
4.3. Execução dos muros-guia 39
4.4. Rebaixamento do nível freático 41
4.5. Execução da cortina 41
4.6. Execução da viga de coroamento 43
4.7. Execução das ancoragens 45
4.8. Execução dos escoramentos 51
4.9. Execução da superestrutura até ao piso térreo 53
5. Trabalhos preliminares e controlo de execução 55
5.1. Reconhecimento e prospecção geotécnica 55
5.2. Inspecção e controlo da qualidade 56
5.3. Ensaios durante e após a execução 57
5.3.1. Teste de carga 57
5.3.2. Testes de integridade 59
5.3.3. Análise da deformação 60
5.3.4. Ancoragens 60
6. Dimensionamento 62
7. Bibliografia 67
Instituto Superior Técnico Cadeira de Construção de Edifícios
Cortinas de estacas moldadas por Jorge de Brito

CORTINAS DE ESTACAS MOLDADAS

1. INTRODUÇÃO

A solução das cortinas de estacas moldadas no terreno como contenção periférica, quer em
edifícios quer noutros tipos de construção como túneis em zonas urbanas, ou em estabilização
de taludes tem vindo a ganhar popularidade nos tempos mais recentes, sobretudo devido à sua
facilidade e rapidez de execução comparativamente às soluções alternativas.

Esta solução consiste fundamentalmente na execução de uma parede descontínua de estacas


pouco distanciadas entre si (podendo mesmo intersectar-se), sendo o terreno entre elas
estabilizado por um efeito de arco e a sua estabilidade garantida, na fase provisória, por
ancoragens ou pela sua própria rigidez e, por vezes na fase definitiva, também pelas lajes dos
pisos ou pela cobertura do túnel. A sua estabilidade permite que as cortinas de estacas sejam
incorporadas como um elemento resistente na estrutura final.

Ainda que, tal como as cortinas de estacas moldadas, estejam englobadas nas soluções de
contenção flexíveis, as soluções do tipo provisório, como as estacas-prancha metálicas e as
cortinas de painéis pré-fabricados de betão armado ou pré-esforçado, não serão tratadas neste
documento mas sim em outros entretanto elaborados [10] [11].

Este documento pretende servir de apoio aos alunos do Mestrado Avançado em Construção e
Reabilitação do Instituto Superior Técnico na Cadeira de Construção de Edifícios. Foca parte
do capítulo dessa mesma cadeira dedicado às contenções periféricas, neste caso podendo ou
não ser integradas na estrutura de um edifício.

O documento aborda fundamentalmente a descrição das soluções existentes e dos processos


construtivos associados às cortinas de estacas moldadas no terreno, excluindo soluções de
carácter provisório como as cortinas de estacas-pranchas.

A elaboração deste documento não resultou de investigação específica sobre o tema efectuada

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Cortinas de estacas moldadas por Jorge de Brito

pelo seu Autor mas sim de alguma pesquisa bibliográfica e de monografias escritas realizadas
por alunos do Instituto Superior Técnico, tanto no Mestrado em Construção como na
Licenciatura em Engenharia Civil. Assim, muita da informação nele contida poderá também
ser encontrada nos seguintes documentos, que não serão citados ao longo do texto:

 Ana Cristina de Freitas, “Contenções Periféricas - Cortinas de Estacas Moldadas”,


Monografia apresentada no Mestrado em Construção, Instituto Superior Técnico, 1999,
Lisboa;
 Vítor Sousa, “Cortinas de Estacas - Levantamento Fotográfico”, Monografia apresentada
no Mestrado em Construção, Instituto Superior Técnico, 2002, Lisboa;
 Luísa Freitas, Natália Neto e Tiago Almeida, “Cortinas de Estacas”, Monografia
apresentada na Licenciatura em Engenharia Civil, Instituto Superior Técnico, 1998,
Lisboa;
 Hugo Pinto, João Fonseca, Manuel Oliveira e Sofia d’Aguiar, “Cortinas de Estacas
Moldadas”, Monografia apresentada na Licenciatura em Engenharia Civil, Instituto
Superior Técnico, 2000, Lisboa;
 Bernardo Serafim, Gonçalo Marques e Nuno Minas, “Cortinas de Estacas”, Monografia
apresentada na Licenciatura em Engenharia Civil, Instituto Superior Técnico, 2000,
Lisboa;
 Alfredo Silva, João Moreira, Nuno Peres e João Silva, “Cortinas de Estacas”, Monografia
apresentada na Licenciatura em Engenharia Civil, Instituto Superior Técnico, 2001,
Lisboa;
 Jorge Fonseca, Miguel Oliveira, Duarte Abecassis e Pedro Igreja, “Cortinas de Estacas”,
Monografia apresentada na Licenciatura em Engenharia Civil, Instituto Superior Técnico,
2001, Lisboa.

Este documento baseia-se ainda em boa parte num texto didáctico anterior:

 Jorge de Brito, “Cortinas de Estacas Moldadas”, Folhas da cadeira de Tecnologia de


Contenções e Fundações, Mestrado em Construção, Instituto Superior Técnico, 1999,
Lisboa.

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Cortinas de estacas moldadas por Jorge de Brito

2. CLASSIFICAÇÃO E PROCESSO CONSTRUTIVO DAS ESTACAS MOLDADAS

Uma vez que as cortinas de estacas moldadas são, conforme o nome indica, constituídas por
essas mesmas estacas, haverá necessidade de as referir com algum detalhe. No entanto, evitar-
se-á uma descrição excessivamente exaustiva das mesmas e do seu processo construtivo, uma
vez que se elaborou um documento exclusivamente dedicado a esta solução [12], mais numa
perspectiva de sistema de fundações indirectas do que como contenção periférica. Tentar-se-á
no entanto referir os aspectos específicos das estacas quando utilizadas com esta última
função. Refira-se aliás que é bastante corrente o recurso às estacas servindo numa mesma
obra como solução de fundações e de contenção periférica, situação que por vezes viabiliza
em termos económicos a solução de cortina de estacas em relação a outras alternativas.

Estacas moldadas contra o terreno são aquelas em que é o próprio terreno que enforma as
estacas, independentemente de se utilizar ou não tubo moldador. A alternativa são as estacas
cravadas no terreno, pouco adequadas às situações em que se torna importante a redução dos
movimentos e perturbações do terreno.

Em virtude do processo de fabrico, o betão utilizado na execução destas estacas deve ser
fluido (a melhor trabalhabilidade é um sinónimo de melhor betonagem e vibração mais fácil),
de classe superior a C25/30 (com um mínimo de 300 kg de cimento por m3 de betão) e com
um slump da ordem dos 18 a 20. As armaduras deverão ter previsto um recobrimento superior
a 5 cm, de preferência 7.5 cm, recobrimento este conseguido com o auxílio de espaçadores de
argamassa de fabrico artesanal e formas variadas.

2.1. VANTAGENS E DESVANTAGENS

As estacas moldadas apresentam as seguintes vantagens:

 não existe durante a execução risco de levantamento do terreno, cujas condições iniciais
são pouco afectadas;
 podem ser recolhidas amostras dos solos atravessados e atingidos que são comparadas
com os dados do projecto;

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 não há vibrações importantes associadas ao processo de execução, a não ser que se recorra
ao trépano;
 existe uma grande variedade de diâmetros disponíveis;
 podem ser executadas a grandes profundidades e o alargamento da base (ponteira) pode ir
até dois a três diâmetros, se executadas em terrenos coesivos ou de rocha branda;
 o dimensionamento da armadura não depende das condições de manuseamento e
cravação, ao contrário do que se passa com as estacas cravadas;
 podem ser executadas sem ruído sensível e sob condições de pé direito limitado.

Por outro lado, estas estacas apresentam as seguintes desvantagens:

 existe a possibilidade de se dar um estrangulamento em solos moles ou soltos;


 torna-se mais difícil garantir a verticalidade das estacas;
 o controlo de qualidade em termos de dimensões da secção transversal e de recobrimento
das armaduras é muito problemático;
 os métodos de perfuração podem descomprimir os solos arenosos ou com seixos ou
originar lamas nos terrenos argilosos ou em rochas brandas;
 há dificuldades de betonagem debaixo de água, uma das razões da sua qualidade final por
vezes deficiente, e o betão não pode ser inspeccionado após a colocação;
 a entrada e/ou percolação de água pode causar anomalias no betão antes da presa
(arrastamento de finos) ou perturbar o terreno envolvente conduzindo à redução da
capacidade de carga da estaca;
 não se pode efectuar alargamento da base (ponteira) nos terrenos sem coesão.

Na execução de cortinas de estacas, recorre-se geralmente aos seguintes métodos de execução


de estacas: com trado contínuo, com tubo moldador recuperável e com lamas bentoníticas.
Existem outros métodos de execução de estacas moldadas que estão em desuso (todos os que
excluem a extracção do terreno) ou não são apropriados em cortinas deste tipo (com tubo
moldador perdido - inexequível nalguns casos e demasiado caro e sem garantia da
estanqueidade, para o tipo de situações de nível freático em questão, noutros). Finalmente, por
razões evidentes, a hipótese de recorrer a estacas cravadas para este fim não faz muito
sentido.

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2.2. COM TRADO CONTÍNUO

Neste método, prescinde-se do tubo moldador assim como das lamas bentoníticas na
sustentação das paredes do furo para a estaca. A execução do furo é feita por rotação
recorrendo a um trado contínuo, ou seja, um eixo com hélice semelhante a uma broca em que
a hélice se estende a praticamente todo o comprimento da haste (Fig. 2, à direita em segundo
plano), sendo a haste oca para introdução do betão fluido directamente no fundo do furo e a
armadura introduzida apenas após a betonagem.

2.2.1. Vantagens e desvantagens

Este processo é, para solos adequados, o mais económico e de mais fácil e rápida execução
(pode-se atingir rendimentos de 16 a 20 m/h, mas apenas se se verificar uma boa coordenação
entre as várias fases do processo), para além de que não dá origem a vibrações e os níveis de
ruído são baixos. Daí que seja o método preferido pelas empresas da especialidade. No
entanto, suscita algumas questões técnicas relacionadas com a qualidade e o controlo de
qualidade, nomeadamente:

 a qualidade de execução da estaca está muito dependente do operador e necessita de uma


monitorização adequada de circulação de cimento (o volume total de betão gasto deve ser
superior ao volume teórico, para garantir que a estaca não está cortada, apesar de
apresentar alargamentos localizados do seu diâmetro), pressão e momento torsor (única
indicação da resistência do solo mas, por ser uma medição total, não permitindo a
determinação da profundidade de furação), bem como da velocidade de introdução do
trado (uma velocidade excessiva pode levar à obturação da cabeça do trado e uma
velocidade insuficiente pode provocar uma descompressão dos solos vizinhos por haver
um excesso de solo removido; por outro lado, a velocidade de perfuração deve ser inferior
à rotação da hélice para descomprimir o solo no fundo do furo e permitir a introdução do
trado);

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 em solos arenosos e abaixo do nível freático, há uma redução da resistência na vizinhança


da estaca devido à perfuração; como tal, a relação carga / deformação nestas estacas é
inferior à das estacas cravadas;
 os detritos que vão caindo para o interior do furo contaminam o betão;
 estas estacas têm de ser betonadas até ao nível inicial;
 a altura máxima do trado está limitada a entre 17 a 22 m (Fig. 2, à esquerda) pela lança do
equipamento de furação; a necessidade de colocar as armaduras apenas após a betonagem
leva na prática este limite para os 12 m;
 não se consegue precisar o diâmetro e as características da estaca;
 não se garante o posicionamento exacto das armaduras nem o recobrimento destas;
 em zonas sísmicas, os esforços de corte introduzidos na fronteira entre as camadas mais e
as menos rígidos são significativos, o que desaconselha o uso deste método construtivo.

Estas duas últimas questões são ainda mais prementes para este do que para os restantes
métodos de execução de estacas moldadas, já de si algo imprecisos. Daí que este processo
apenas deva ser usado para estacas com diâmetro até 600 mm e em contenções com pouco
risco (não muito altas e com solos algo coerentes).

2.2.2. Faseamento construtivo

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Fig. 1 - Processo de execução de estacas com trado contínuo: 1) perfuração com trado
contínuo até à profundidade desejada; 2) extracção do trado contínuo em simultâneo com
bombagem de betão através do veio oco do trado; 3) introdução da armadura no betão
Descrevem-se de seguida as fases de execução de estacas com trado contínuo (Fig. 1):

 selecção de equipamento de furação com a cabeça de rotação adequada às características


do terreno (Fig. 2, à direita) e de um trado contínuo com um comprimento adequado
(diâmetro e profundidade) ao furo a executar;

Fig. 2 - À esquerda, máquina para execução de estacas com trado contínuo e , à direita; trado
contínuo (em segundo plano) e cabeça para furação de rocha (em primeiro plano)

 furação com o trado até à profundidade prevista ao mesmo tempo que parte do solo vai
sendo expulsa pelo trado (Fig. 3, à esquerda); a haste oca, com cerca de 10 cm de
diâmetro, está obturada inferiormente para evitar a entrada de terra; a penetração no bed-
rock será limitada à resistência mecânica das ferramentas;
 mantendo o trado no interior do furo, será feita a betonagem com injecção de betão
através do veio oco do trado (abrindo por pressão o obturador) e com recurso a uma
bomba de betão (Fig. 3, à direita); a dimensão máxima da brita será de 10 a 15 mm;
simultaneamente com a injecção de betão fluido (slump 180 a 200 mm), será retirado o

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trado a uma velocidade correspondente ao caudal bombeado, mas garantindo sempre que
a coluna de betonagem está mergulhada no betão já colocado; depois da estaca ter sido
betonada até acima, é de toda a conveniência compactar os últimos 3 metros de estaca
usando um vibrador (Fig. 4), já que nesta zona o betão não tem força suficiente para se
auto-compactar (o restante betão é compactado pelo peso do betão colocado
superiormente);

Fig. 3 - À esquerda, furação com trado contínuo e, à direita, betonagem da estaca

Fig. 4 - Vibração do troço superficial da estaca

 com o betão injectado até à boca, será removido o cone de terra que se vai acumulando
junto ao furo e será colocada a armadura com auxílio do prato e tubo acoplado a vibrador
eléctrico (Fig. 3, à esquerda), em alguns casos tirando partido do seu peso mas
necessitando por vezes de ser empurrada para baixo com o auxílio de auxiliares de

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operação (Fig. 5, à direita); a armadura é suspensa pelo guincho da máquina, verticalizada


e posteriormente introduzida no furo; todas estas operações exigem uma razoável rigidez
da armadura, garantida através de contraventamentos no seu interior (Fig. 6, à esquerda);
qualquer que seja o processo utilizado, a penetração de armaduras com mais de 8 m de
comprimento é difícil;
 a parte inferior das armaduras sofrerá uma redução de diâmetro de modo a facilitar a sua
penetração no betão (Fig. 6, à direita); o comprimento máximo das armaduras, sem
recurso a tecnologias especiais de cravação, está limitado a 12 metros; quando a estaca
tem um comprimento superior, chega a prescindir-se de armadura no troço inferior, uma
prática pouco recomendável na execução de estacas e inaceitável em cortinas;

Fig. 5 - À esquerda, armadura já com prato e tubo rígido montados e, à direita, dificuldades na
fase final da introdução da armadura no betão

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Fig. 6 - Pormenores da armadura das estacas: contraventamentos interiores (à esquerda) e


aperto da ponta inferior com cintagem (à direita)
 a cabeça da estaca deverá ser saneada, ou seja, demolida, para eliminar o betão mais
contaminado com solo; a fim de evitar a operação de saneamento, sempre morosa, numa
grande extensão da estaca, retira-se por vezes o betão ainda fluido à superfície do furo.

Em alguns casos pode ser usada uma mistura de areia e cimento em substituição do betão.
Alguns construtores recorrem a esta modificação, uma vez que a ausência de brita torna o
processo de bombagem mais simples. Quando se opta por esta solução, deve ter-se em conta
que a água da mistura migra para o solo circundante. Caso se esteja em presença de um solo
arenoso, este fenómeno resulta num abaixamento do nível da mistura no topo da estaca. Para
minimizar este efeito, deve ser colocada mistura adicional de forma a manter o mesmo nível
de material na estaca.

2.2.3. Problemas potenciais

São os seguintes os problemas potenciais principais que podem ocorrer durante a execução de
estacas moldadas com trado contínuo:

 colunas de estacas cortadas - grande parte dos problemas com este tipo de estacas está
associada a uma extracção incorrecta do trado durante a betonagem; nesta fase, torna-se
importante uma assistência adequada que assegura uma velocidade de extracção do trado
igual ao ritmo de escoamento do betão;
 redução da capacidade da estaca - a perfuração provoca uma descompressão do solo

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cujo excesso deve ser evitado ao máximo; a potência de ponta do trado tem também uma
determinada influência na descompressão do solo, isto é, os trados com pontas de maior
potência têm melhores resultados em solos com uma descompressão limitada; devido à
descompressão, a força de atrito máximo é normalmente de 60 a 75% da força transmitida
para as estacas cravadas;
 obstruções - o trado pode perfurar pedras de grandes dimensões, desde que sejam pedras
com menos de um terço do diâmetro da estaca e que não se apresentem muito juntas; para
pedras de maiores dimensões, a única solução é mudar a posição inicial da estaca;
 dificuldades na introdução da armadura - o betão tende a endurecer, sobretudo na parte
inferior da estaca, sobretudo porque a água da amassadura exsuda para o terreno
circundante quando este é permeável; curiosamente, este processo, por ocorrer
preferencialmente na periferia da estaca, favorece a centralização da armadura.

2.3. COM TUBO MOLDADOR RECUPERÁVEL

Neste método, recorre-se a um tubo moldador cilíndrico e metálico, cuja função é conter as
paredes do furo enquanto o interior deste não é preenchido com betão. À medida que a
betonagem vai decorrendo, o tubo moldador é puxado para cima e recuperado, naquela que é
a fase mais crítica do processo.

2.3.1. Vantagens e desvantagens

Sendo um método mais moroso e oneroso do que o anterior é, no entanto, por comparação
com o mesmo, mais aconselhável em contenções com estacas com grandes diâmetros e em
solos menos coerentes. Apresenta ainda as seguintes vantagens:

 custos baixos de instalação do equipamento;


 o equipamento pode funcionar em espaços limitados e de difícil acesso;
 as estacas têm boa capacidade de carga;
 podem ser executadas estacas com grandes dimensões e com comprimentos da ordem dos
50 m, dependendo da constituição dos solos;
 se se utilizar o martelo-pilão, as estacas têm bolbos (como as estacas Franki);

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 em alternativa à base dilatada, pode ser criada uma ficha no bed-rock, (procedimento mais
fácil e rápido e, por isso mesmo, preferido hoje em dia em relação aos bolbos).

Este método tem, no entanto, as seguintes desvantagens:

 custo elevado por metro de estaca;


 baixas taxas de produção;
 este método não é adequado para solos sem coesão e situados abaixo do nível freático;
 a variedade de dimensões das estacas está muito limitada aos tubos moldadores
disponíveis;
 os níveis de ruído e vibração, apesar de não serem elevados, podem apresentar problemas.

2.3.2. Faseamento construtivo

Descrevem-se de seguida as fases de execução de estacas com tubo moldador recuperável


(Fig. 7):

Fig. 7 - Processo de execução de estacas com tubo moldador recuperável: A) cravação do


tubo moldador formado por troços acoplados; B) remoção do solo no interior do tubo (com
trado ou balde); C) formação da base alargada com auxílio do martelo-pilão (opcional); D)

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colocação da armadura e betonagem de baixo para cima; E) remoção do tubo moldador; F)


estaca executada

 perfuração prévia de 2 a 4 m com uma largura igual à do diâmetro exterior do tubo


moldador; introdução do 1º troço deste (de coroa denteada na ponta), por pressão e
rodando-o nos dois sentidos para vencer o atrito lateral (Fig. 8);
 furação com trado curto ou balde suspenso na vara telescópica devendo estar o mastro da
máquina devidamente verticalizado (Fig. 9, à esquerda); esta verticalidade é obtida à custa
de diversos mecanismos hidráulicos existentes; o diâmetro nominal da estaca deve ser
aumentado em cerca de 100 mm quando se utiliza tubo moldador;

solo 1
solo 2

a) b) c) d) e) f)

Fig. 8 - Etapas da escavação: a) e b) escavação inicial e introdução do 1º troço de tubo


moldador; c) e d) penetração do tubo moldador por pressão e rotação, escavação e remoção
do terreno; e) e f) conclusão da escavação, recorrendo ao trado e à limpadeira

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Fig. 9 - À esquerda, bate-estacas (“Kelly”) com um trado acoplado (do lado esquerdo, vê-se
ainda uma trémie) e, à direita, introdução do tubo moldador no terreno

Fig. 10 - Introdução do tubo moldador com o auxílio de uma mesa de bamboleamento

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Fig. 11 - À esquerda, troços do tubo moldador e, à direita, trado ainda com terra aderente

 o avanço da furação é precedido da introdução de um tubo metálico de revestimento (Fig.


8), que é ligado à cabeça de rotação da máquina e introduzido por efeito simultâneo de
pull-down, vibração e rotação, sincronizadamente com a furação (Fig. 9, à direita); para
estacas de grande diâmetro, como as que se utiliza em cortinas, poderá recorrer-se a uma
mesa de bamboleamento (Fig. 10); esta operação poderá ter de ser interrompida para o
acoplamento (com cavilhas mecânicas, parafusos ou um cabo de aço) de troços de tubo
moldador (Fig. 11, à esquerda), em virtude da profundidade da estaca ser superior à altura
da lança do equipamento de furação;
 durante a furação, a terra é retirada da seguinte forma: em solos com alguma coerência, o
próprio trado curto é subido de quando em quando, com a terra aderente ao mesmo (Fig.
11, à direita), e é-lhe imprimido um forte movimento de rotação que liberta a terra; em
solos muito desagregados, o trado não consegue trazer a terra e é necessário recorrer ao
balde;
 ao se atingir a cota de furação prevista, a limpeza do furo é feita com balde do tipo
apropriado às formações atravessadas (também designado por limpadeira); para estacas de
diâmetro superior a 600 mm, é possível a descida de um homem que, com um guincho e

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um balde, faz a limpeza manual; por razões de segurança, esta prática caiu em desuso e é
mesmo proibida em vários países; o fundo pode ser comprimido através de um prato fixo
na extremidade da haste do bate-estacas; no fim destas operações e se possível, o fundo do
furo é inspeccionado por um supervisor;
 se se pretender criar um bolbo na base da estaca, é então descarregada para o furo uma
pequena quantidade de betão com um slump muito baixo para ajudar a retirar o tubo
moldador; o tubo é puxado para cima na extensão correspondente à base ao mesmo tempo
que o betão é expelido do tubo através de pancadas do pilão, conseguindo-se assim a base
dilatada;
 introduz-se então a armadura (Fig. 12, à esquerda) com os espaçadores, garantindo-se o
recobrimento inferior das mesmas suspendendo-as, através de varões transversais
apoiados no topo do tubo moldador, cerca de 0.50 m acima da ponta da estaca, e betona-se
o furo (Fig. 13) com coluna de betonagem (ou trémie, um tubo semi-rígido, constituído
por troços cilíndricos acoplados, com um funil no seu topo), cuja extremidade inferior
deve ser levada até ao fundo, numa primeira fase, e deve ficar sempre mergulhada - 2 a 5
m - no betão já colocado a partir daí (Fig. 14); quando se prevê um longo tempo de
betonagem, há que providenciar um aditivo retardador de presa (o primeiro betão
introduzido na estaca - em regime de betão submerso - deve subir do fundo ao coroamento
da estaca, mantendo a trabalhabilidade);
 à medida que a betonagem vai decorrendo e com o auxílio de macacos hidráulicos
complementados com vibração, o tubo moldador deve ser puxado para cima de forma
gradual quando no fundo da estaca existir uma altura de betão de cerca de 2 a 3 m;
também esta operação poderá ter de ser interrompida para desacoplar troços do tubo
moldador (processo facilitado pelo recurso a massa consistente - Fig. 15) ou da trémie,
por limitações de altura da lança do equipamento de furação (Fig. 16); no entanto, se essa
limitação não existir, pode colocar-se a hipótese de o tubo moldador só ser retirado com o
seu comprimento final e no fim da betonagem (Figs. 14 e 17); em ambos os casos, o
recurso a uma mesa de bamboleamento em estacas de grande diâmetro é útil;

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Fig. 12 - À esquerda, armaduras prontas a ser colocadas e, à direita, trépano para perfurar
rocha

Fig. 13 - À esquerda, betoneira e equipamento de bombagem e, à direita, betonagem de estaca

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solo 1
solo 2

a) b) c) d)

Fig. 14 - Betonagem da estaca: a) introdução das armaduras; b) e c) betonagem com a trémie;


d) estaca betonada

Fig. 15 - Remoção de um troço de tubo moldador

 tal como no método anterior, os 3 m superiores da estaca devem ser compactados com um
vibrador e a cabeça da estaca deverá ser saneada (Fig. 17); o comprimento de estaca a
sanear deverá ser no mínimo de 40 cm, aumentando com o diâmetro da estaca; o processo
inicia-se com a escavação em volta da estaca até à cota pretendida; procede-se depois com
um martelo pneumático ao destacamento do betão a sanear (Fig. 18, à esquerda); remove-
se depois o betão destacado com o auxílio de uma grua (Fig. 18, à direita); este
procedimento só se aplica em estacas de grande diâmetro e dá origem a uma superfície
muito rugosa; à semelhança do que se passa com as estacas de pequeno diâmetro, há então
necessidade de remover com ferramentas de menor potência e até à mão os restos de betão

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(Fig. 19, à esquerda); esta remoção miúda encarece e torna muito lento o processo, para
além de danificar muito mais as armaduras (Fig. 19, à direita).

solo 1
solo 2

a) b) c) d)

Fig. 16 - Betonagem e remoção do tubo moldador: a) introdução das armaduras; b) início da


betonagem recorrendo a uma trémie; c) continuação da betonagem com remoção de troços da
trémie e do tubo moldador; d) estaca betonada

solo 1
solo 2

a) b) c)
Fig. 17 - Remoção do tubo moldador e saneamento da estaca: a) remoção do tubo moldador
de uma só vez; b) assentamento e presa do betão; c) saneamento da cabeça da estaca

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Fig. 18 - À esquerda, destacamento do betão e, à direita, remoção do betão destacado

Fig. 19 - À esquerda, regularização e remoção manual de restos de betão e, à direita, aspecto


das estacas depois de saneadas

Em alternativa à solução da base alargada, pode-se adaptar este método a um encaixe em


rocha. Para perfurar a rocha, é utilizado um trépano (Fig. 12, à direita). Na remoção dos
detritos, bem como na limpeza do suporte, são utilizadas as ferramentas tradicionais. Também
para se remover obstáculos durante a furação se pode recorrer ao trépano.

Por vezes, em solos que têm águas superficiais agressivas, é adequada a colocação de um
revestimento permanente. O revestimento é colocado em posição apenas depois de a base
dilatada ter sido executada. O anel entre o revestimento e o tubo moldador é preenchido com
argamassa. O revestimento pode, por vezes, ser fixado à armadura funcionando os dois como
um só.

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2.3.3. Recurso ou não ao tubo moldador

Vale a pena referir que, em solos auto-sustentáveis e em que não aflui água ao furo, é possível
executar as estacas pelo processo agora descrito mas sem ter de recorrer ao tubo moldador,
com ganhos importantes de economia e rapidez. A questão da ocorrência de afluxo de água no
furo, extremamente comum, é aliás um dos factores mais importantes na decisão sobre a
forma de actuar em obra.

A água aparece pela parede do furo e a decisão sobre como fazer a betonagem da estaca
depende da quantidade de água que chega ao fundo do furo. Se for uma quantidade pequena,
então uma bomba retirá-la-á do poço durante a operação de limpeza. Quando acabar a fase de
limpeza, começa a betonagem da estaca até ao betão chegar a uma cota superior de onde é
oriunda a água. Seguidamente, é colocada a armadura no furo mergulhando-a no betão.
Betona-se então o restante da estaca. Se, durante o tempo em que se tira a bomba e se começa
a betonagem, aparece alguma água no furo, esta não vai alterar o betão da estaca, uma vez que
a betonagem é feita pelo centro e por isso concentra-se muito betão no centro e a água vai
para os bordos. Alguma da água que chega ao poço vai misturar-se com o betão durante a
betonagem, podendo isto ser compensado usando uma quantidade adicional de cimento. Se a
quantidade de água que chega ao poço é grande, é necessário betonar a estaca debaixo de
água. Para isso, é necessário usar um tubo moldador, tal como descrito acima, o que impedirá
o colapso da estaca. Outra alternativa é o uso de estacas moldadas em que se utilizam as
lamas bentoníticas, tal como será descrito mais adiante.

2.3.4. Problemas potenciais

Um dos principais problemas potenciais associados a este método dá pelo nome de boiling.
Este fenómeno ocorre sobretudo devido à existência de um diferencial de pressões entre o
nível da água no exterior e no interior do tubo. Como tal, apenas ocorre na presença de nível
freático. Pode ter também como causa o efeito de sucção provocado pelas ferramentas de
escavação. Se for esse o caso, existe o risco de assentamento do solo em torno da estaca. Este
efeito pode ainda impedir a limpeza da estaca antes da betonagem. Para solos arenosos abaixo

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do nível freático, é importante a existência no local de uma camada de solo coesivo


imediatamente acima do nível de fundação, que funcionará como “selagem” do tubo. Assim a
estaca pode ser limpa e a sua base formada.

Mais dois problemas potenciais podem pôr em causa a qualidade e/ou a segurança associada
às estacas executadas com molde recuperável. O primeiro é o estrangulamento da secção da
estaca por adesão do betão às paredes do tubo quando este é retirado (Fig. 20, à esquerda). O
respectivo espaço é ocupado pelo betão (se ainda tiver alguma fluidez) e por terreno. O
segundo problema é a destruição local da secção da estaca por acção de água corrente que
arrasta os finos do betão (Fig. 20, à direita), mesmo algumas horas após a retirada do tubo
moldador.

Fig. 20 - Problemas potenciais associados à recuperação do tubo moldador: estrangulamento


da secção da estaca (à esquerda) e destruição local da secção da mesma (à direita)

2.4. COM LAMAS BENTONÍTICAS

Neste método, utilizado em solos sem capacidade de auto-sustentação em paramentos


verticais, prescinde-se do tubo moldador, substituindo-se a acção de contenção deste nas
paredes do furo pela presença de lamas bentoníticas, posteriormente reaproveitadas para a
execução de outras estacas.

2.4.1. Vantagens e desvantagens

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Tratando-se de um método com custos fixos e variáveis significativos (particularmente


gravosos em obras de pequena escala), é preterido em relação aos anteriormente descritos
excepto nas situações em que eles não são aplicáveis: estruturas em solos com coesão muito
baixa ou com nível freático elevado (ou com estratos saturados), sobretudo se existir
percolação de água subterrânea. O método apresenta ainda algumas outras vantagens:

 solução económica para o domínio de aplicação acima referido;


 ruído reduzido;
 não há vibração associada;
 existe uma boa gama de diâmetros possíveis;
 permite estacas com grandes comprimentos.

Por outro lado, o método apresenta algumas desvantagens:

 a bentonite é uma matéria-prima muito cara, o que encarece sobremaneira o método;


 é necessário um grande estaleiro para proceder à preparação e reciclagem das lamas
bentoníticas;
 só podem ser construídas estacas na vertical;
 problemas ambientais devido à perda das lamas; podem ser parcialmente resolvidos
recorrendo a lamas biodegradáveis.

2.4.2. Faseamento construtivo

Descrevem-se de seguida as fases de execução de estacas com lamas bentoníticas (Fig. 21):

 montagem e instalação da central de fabrico, distribuição, recuperação e reciclagem (por


centrifugação e sedimentação) das lamas bentoníticas (Fig. 22, à esquerda);
 furação com trado suspenso na vara telescópica devendo estar o mastro da máquina
devidamente verticalizado; esta verticalidade é obtida à custa de diversos mecanismos
hidráulicos existentes; pode-se recorrer eventualmente ao trépano para atravessamento de
blocos ou obtenção de ficha;

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 a parte superior da escavação deve ser delimitada e protegida por tubos-guia, cofragens
metálicas cilíndricas recuperáveis (Fig. 23, à direita), numa profundidade pelo menos
igual a dois diâmetros da estaca, para impedir a penetração das lamas no terreno
superficial, guiar o equipamento e possibilitar a suspensão das armaduras;
 a terra é removida tal como referido no método anterior, sendo que, em virtude do tipo de
solo associado ao presente método, o balde será geralmente a ferramenta utilizada;
esporadicamente, poderá recorrer-se ao trado com pontas de metal endurecido ou ao
trépano;
 à medida que a furação e a remoção da terra do interior do furo vão prosseguindo, este vai
sendo preenchido com as lamas bentoníticas, para estabilização das paredes; o nível
superior dessas lamas deve ser mantido aproximadamente constante durante todo o
processo, ligeiramente abaixo do topo dos tubos-guia;
 ao atingir-se o final do furo, o balde (Fig. 22, à direita) efectuará a limpeza do fundo do
furo de detritos de terreno; também pode ser utilizado um sistema de aspiração;

Fig. 21 - Processo de execução de estacas com lamas bentoníticas: 1) posicionamento e


verticalização da torre da máquina; 2) furação com trado; 3) limpeza do fundo do furo com
balde; 4) furo estabilizado com lamas bentoníticas; 5) introdução da armadura; 6) betonagem
do furo por via submersa, com extracção simultânea das lamas

 introdução da armadura (se a estaca tiver mais de 12 m de comprimento, haverá


necessidade de suspender os primeiros 12 m de armadura para realizar o empalme - Fig.
23, à esquerda) e betonagem do furo, com o auxílio de uma trémie e de baixo para cima,
com extracção simultânea por bombagem das lamas bentoníticas (recicladas para

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reutilização nas estacas seguintes), menos densas que o betão mas mais do que a água; a
betonagem de qualquer estaca deve ser feita continuamente e num intervalo de tempo tal
que, no seu termo, o betão permaneça trabalhável; por outro lado, o bocal da trémie deve
estar sempre abaixo do nível superior do betão cerca de 2 a 4 m;
 a betonagem estará completa quando o nível do betão no furo estiver cerca de 0.5 a 1.0 m
acima da cota do topo da estaca; o volume de betão acima desta cota será retirado quando
a armadura da estaca estiver exposta, garantindo assim que o betão que esteve em
contacto com a lama bentonítica e os detritos de terreno durante a betonagem não afectará
a capacidade resistente da estaca;
 ainda com mais razão de ser do que métodos anteriores, a cabeça da estaca, por apresentar
um betão contaminado, deverá ser saneada.

Fig. 22 - Estação de tratamento das lamas bentoníticas (à esquerda) e equipamento utilizado


para a execução deste tipo de estacas (à direita), com o balde em primeiro plano

2.4.3. As lamas bentoníticas

As lamas bentoníticas são uma mistura, feita numa misturadora, de água com bentonite (cerca
de 5%), uma argila com propriedades tixotrópicas, ou seja, caracterizando-se por ter um

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comportamento muito viscoso quando em repouso e relativamente fluido quando em


movimento. Daí, e da sua densidade intermédia entre a da água e a do betão, resulta que as
lamas são capazes de suportar a escavação, não se escoam para o terreno, mantêm os detritos
em suspensão, são facilmente removíveis pelo betão e simplificam o processo de reciclagem.
O processo de fabrico e reciclagem das lamas bentoníticas está ilustrado na Fig. 24. Durante a
escavação, as lamas são contaminadas com terreno e areias, que têm de ser retirados durante a
reciclagem através de centrifugação e sedimentação.

Fig. 23 - À esquerda, suspensão da armadura através de uma trave metálica para empalme da
primeira e, à direita, pormenor do trado e dos tubos guia no topo da escavação

A estabilização do terreno escavado é conseguida pela formação de uma película


praticamente estanque (cake), que se forma quando a suspensão de bentonite é posta em
contacto com o solo, e também pela transmissão ao solo da pressão hidrostática da suspensão.
Esta película tem que ser contínua para evitar fugas para o interior do terreno, bem como a
queda do terreno para o interior da escavação.

2.4.4. Problemas potenciais

São os seguintes os problemas potenciais principais que podem ocorrer durante a execução de
estacas moldadas com recurso a lamas bentoníticas:

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Fig. 24 - Processo de fabrico e reciclagem das lamas bentoníticas

 colapso da escavação da estaca - existe o risco de colapso da parede da escavação, mas


este hipótese pode ser reduzida tomando um procedimento correcto na escavação e
assegurando que as lamas bentoníticas têm as características técnicas esperadas; pode
ocorrer um pequeno e localizado colapso, mas isso não será perigoso para a estaca; um
colapso maior pode ser sério para a estaca, e o conselho é encher a escavação de terra o
mais rapidamente possível após o colapso; a causa do mesmo deve ser determinada antes
de fazer uma nova escavação;
 espera entre a furação e a betonagem - idealmente, a estaca deve ser betonada no
mesmo dia que a escavação é completa; se houver espera entre a betonagem e a
escavação, a película de bentonite tende a aumentar de espessura e está provado que este
facto diminui a capacidade de mobilizar atrito lateral na estaca; se o atraso já for muito
grande, então a escavação da estaca tem de ser reiniciada;
 betonagem com a trémie - esta operação apela a grande experiência por parte do operador
da “Kelly”, para criar uma estaca em condições; o maior problema consiste no
entupimento da trémie, sendo conveniente que esta seja removida e limpa; se apenas uma
pequena parte do betão foi betonado para a estaca, o melhor a fazer é tirar a armadura e
retirar o betão fresco; se já foi colocada uma grande quantidade de betão quando ocorre o
entupimento da trémie, esta deve ser retirada e limpa, deve ser colocada uma braçadeira

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fechada na ponta no pé da trémie, e ser deixada penetrar no betão fresco pelo menos 2
metros (nesta operação, como em tudo o que envolve o uso de trémies, é necessário que o
tubo seja totalmente impermeável), após o que a trémie é cheia de betão até que, por
gravidade, se rompa o fecho da manga, prosseguindo-se então com a betonagem da forma
normal;
 betão fluido - para o betão escorrer na trémie, é necessário que este tenha um slump da
ordem dos 20 cm; a obtenção deste slump sem ter excesso de água é muito difícil, se não
mesmo impossível com agregados e adjuvantes correntes; em estacas profundas, o
excesso de água no betão exsuda deste e tende a encaminhar-se para a superfície; o canal
que se forma é normalmente encontrado no centro da estaca onde a trémie tende a formar
uma zona de excesso de argamassa; o betão nesta zona mostra muitas vezes sinais de
excesso de água e pode ter alguma deficiência de cimento; este é um problema que não
pode ser completamente eliminado em estacas profundas betonadas usando uma trémie;
ainda que possa ser minimizado; adoptando técnicas convenientes, a percentagem de área
da estaca afectada pode ser mantida baixa, para que a sua capacidade de carga não seja
muito afectada; antes de se começar a construir, deve fazer-se também um estudo dos
agregados a utilizar para se conseguir a posologia ideal; finalmente, em obra a posologia
deve ser rigidamente seguida e não se deve juntar mais água à amassadura.

2.5. SELECÇÃO DO TIPO DE ESTACAS

Descritos os diversos tipos de estacas mais correntemente utilizados na execução de cortinas


de estacas, é fácil perceber que, em cada circunstância, a selecção do tipo de estaca tem duas
vertentes: a técnica e a económica. Assim, definido o domínio no qual é aplicável cada tipo de
estaca, optar-se-á geralmente pela solução mais económica de entre as possíveis.

As soluções descritas podem ser ordenadas da seguinte forma por ordem crescente de custos:
com trado contínuo, com trado curto sem tubo moldador, com trado curto com tubo moldador
recuperável e com lamas bentoníticas, sendo estas duas últimas claramente as mais onerosas.
Como, por outro lado, a gama de aplicações geralmente decresce com o custo, a opção é pela
solução mais barata no seu domínio de aplicação, após o que se passa para a menos onerosa
das soluções restantes no domínio de aplicação desta não comum ao da primeira solução, e

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assim sucessivamente.

Desta forma, nos solos coerentes e sem a presença de água (ou com uma presença residual /
acidental desta), opta-se pelas estacas executadas com trado contínuo. As estacas executadas
com trado curto e sem tubo moldador têm um domínio de aplicação pouco maior, aceitando
solos um pouco menos coerentes e uma presença de água mais acentuada. São por isso
preteridas em relação às primeiras, a não ser nas situações em que, em virtude do menor
controlo de qualidade associado à execução com trado contínuo, o caderno de encargos não
permite essa solução. Nos solos com alguma coesão mesmo que pequena (o que exclui por
exemplo os solos incoerentes ou os lodosos) e mesmo com presença do nível freático elevado
desde que não exista percolação de água, a solução das estacas com tubo moldador
recuperável é a preferida. Se existirem dúvidas sobre a garantia das condições atrás referidas
ou em solos sem qualquer capacidade de auto-sustentação, opta-se pelas estacas executadas
com o auxílio de lamas bentoníticas, sendo preciso garantir espaço de estaleiro para a estação
de tratamento das mesmas.

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3. CORTINAS DE ESTACAS

As cortinas de estacas têm como campos de aplicação principais as construções enterradas


situadas perto de estruturas de médio a grande porte (Fig. 25, à esquerda) não excessivamente
susceptíveis a deformações e os túneis em zonas urbanas (Fig. 26, à direita). No entanto,
podem também ser utilizadas como muros de suporte de taludes verticais (Fig. 26, à esquerda)
ou em estruturas especiais (Fig. 25, à direita, e Fig. 35, à esquerda).

Fig. 25 - Aplicação de cortinas de estacas: junto a edifícios (à esquerda) e poço técnico de


acesso e ventilação do Metropolitano (à direita)

3.1. VANTAGENS E DESVANTAGENS

Em relação a outras soluções de paredes de contenção, as cortinas de estacas apresentam as


seguintes vantagens [8]:

 baixo custo (se as estacas forem executadas com trado contínuo ou com trado curto mas
sem tubo moldador, aumentando significativamente se se recorrer a tubo moldador
recuperável ou a lamas bentoníticas; por outro lado, esta afirmação é mais válida para

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cortinas de estacas espaçadas ou contíguas do que secantes) e rapidez de construção para


estruturas de suporte de terras, temporárias ou permanentes, desde que as condições de
perfuração sejam propícias;

Fig. 26 - Outras aplicações de cortinas de estacas: muros de suporte junto a uma linha-férrea
(à esquerda) ou em túneis (à direita)

 todo o processo de instalação do equipamento e de execução é relativamente limpo


(excepto se se recorrer a lamas bentoníticas) e pouco ruidoso; a execução das estacas
origina apenas vibrações não significativas (sobretudo quando se recorre ao trépano);
 para profundidades de escavação pequenas, consegue-se distâncias muito pequenas entre a
cortina e eventuais estruturas existentes;
 a solução é válida numa gama de solos muito alargada: solos incoerentes com poucas
excepções; solos coerentes excepto se muito duros em profundidade significativa; solos
intermédios em geral; rochas pouco resistentes e gesso (embora possam ocorrer
problemas);
 podem ser utilizadas em conjunto com outras soluções de contenção periférica (por
exemplo, troços de parede moldada entre estacas espaçadas);
 em relação a outras soluções de paredes de contenção (por exemplo, paredes tipo
Munique), as cortinas de estacas necessitam em geral de menos níveis de ancoragens.

As cortinas de estacas apresentam também as seguintes limitações / desvantagens relativas


[8]:

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 a solução não é aplicável em determinados (poucos) tipos de terreno: argilas moles ou


solos fracos de carácter orgânico; rochas duras;
 a não garantia da impermeabilidade da solução (excepto para as cortinas de estacas
secantes, se bem executadas);
 apresentam limitações em termos de altura, devido à profundidade até à qual as estacas
podem ser executadas (12 m em termos práticos para as estacas executadas com trado
contínuo) - ver parágrafo seguinte - mas que também têm a ver com a dificuldade em
manter a verticalidade e com a dificuldade em perfurar solos muito rijos na base da
cortina;
 baixa eficiência das secções circulares em termos de flexão, a que se junta o facto de ser
necessário prever um elevado recobrimento das armaduras, pela dificuldade em garantir o
seu valor na fase construtiva;
 obrigam geralmente a trabalhos adicionais (execução de parede de alvenaria interior) para
se obter um paramento interior esteticamente aceitável;
 as estacas com grande diâmetro geralmente utilizadas vão roubar espaço útil ao interior da
contenção e obrigam a um espaço maior entre a cortina e as eventuais estruturas
adjacentes existentes.

A máxima profundidade a que as cortinas de estacas podem ser construídas é, na prática,


cerca de 18 a 20 metros, se bem que, em certas circunstâncias e particularmente quando
existem amplos espaçamentos entre estacas, esse comprimento possa ser maior. Em teoria, as
estacas secantes podem ser perfuradas até profundidades da ordem dos 30 metros, se as
estacas iniciais contiverem perfis metálicos. No entanto, as dificuldades de construção de uma
estaca aumentam quando o seu comprimento vai para além dos 20 metros, sendo estas
dificuldades especialmente sentidas em solos onde as estacas atravessam o nível freático
(exactamente as circunstâncias em que as estacas secantes se tornam geralmente as soluções
mais adequadas).

Em relação ao espaçamento entre estacas, existem basicamente os seguintes tipos de cortinas


(Fig. 27): de estacas espaçadas (foto da capa e Fig. 25, à direita), contíguas (Fig. 25, à
esquerda) e secantes (Fig. 38, à esquerda).

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3.2. CORTINAS DE ESTACAS ESPAÇADAS

As cortinas de estacas espaçadas (Fig. 27, em cima) consistem em estacas com um


espaçamento livre entre si até cerca de 1.5 m, sendo o solo entre as mesmas estabilizado na
fase construtiva com betão projectado contendo no seu interior uma rede de aço
electrossoldada, formando abóbadas de betão armado executadas à medida que se prossegue
com a escavação do interior da contenção. Como é evidente, esta solução não garante a
impermeabilidade dessa mesma contenção e é menos resistente aos impulsos por metro linear.

Abóbadas de
Estacas moldadas betão armado
ancoradas
A

Fig. 27 - De cima para baixo, cortinas de estacas espaçadas (ver também Fig. 35, à esquerda),
contíguas (ou tangentes) e secantes

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Em relação às outras soluções de cortinas de estacas, as de estacas espaçadas apresentam as


seguintes vantagens:

 são mais económicas por metro de largura de cortina;


 oferecem uma boa flexibilidade, em termos de tipos de estacas e respectivos diâmetros;
 as estacas de grande diâmetro oferecem um aumento de rigidez para certas aplicações;
 são facilmente incorporadas em trabalhos permanentes;
 podem ser projectadas para suportar cargas verticais;

e desvantagens (para além das referidas anteriormente):

 obrigam quase sempre à colocação de ancoragens, por serem menos resistentes por metro
de largura da cortina;
 só são aplicáveis em solos relativamente estáveis (auto-portantes durante a fase
construtiva através de um efeito de arco).

3.3. CORTINAS DE ESTACAS CONTÍGUAS

As cortinas de estacas contíguas ou tangentes (Fig. 27, ao centro) são construídas ao longo de
uma linha com pequenos espaços livres entre as estacas, como regra entre 75 e 100 mm (fazer
as estacas tangentes entre si é extremamente difícil), exigindo um bom controlo do
posicionamento das estacas e da verticalidade da furação. Em consequência, esta solução não
pode ser facilmente usada para estruturas para contenção de água. A sua principal utilização é
em solos argilosos onde a afluência de água não constitui problema, se bem que também
tenham sido frequentemente usadas para reter materiais granulares. Claramente, onde a água
não é problema, o espaçamento entre estacas pode ser regulado de modo a que o solo entre
estacas não colapse. Prescinde-se desta forma da necessidade de estabilizar o solo com betão
projectado durante a construção, ainda que na fase de colocação dos elementos de
revestimento interior haja vantagem em o fazer.

3.4. CORTINAS DE ESTACAS SECANTES

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As cortinas de estacas secantes (Fig. 27, em baixo) são construídas de tal modo que há uma
intersecção de cada estaca com as adjacentes. A prática usual consiste na construção numa
fase inicial de estacas alternadas ao longo da linha da parede, deixando um espaço livre entre
estacas de menos de um diâmetro. Estas estacas, também designadas por estacas fêmea,
podendo conter no seu interior um perfil metálico, não têm de ser construídas
necessariamente com a mesma profundidade que as estacas intermédias, também designadas
por estacas macho, que se vão seguir, dependendo do modo em que a parede foi
dimensionada e armada. Por outro lado, o betão das estacas iniciais tem uma posologia tal que
tem uma baixa resistência, a fim de facilitar o seu corte aquando da execução das estacas
intermédias, podendo pura e simplesmente recorrer-se à injecção de uma argamassa
desagregável, do tipo bentonite + cimento (Fig. 28). Pela mesma razão, as estacas iniciais não
têm geralmente armadura convencional. Esta solução só pode ser usada com estacas moldadas
sem tubo moldador ou com trado contínuo.

Estacas executadas mediante injecção Estacas de betão normal moldada in-


de argamassa desagregável, colocada situ em furo aberto de forme a
em torno de um perfil previamente interessar parte do espaço ocupado
introduzido no furo respectivo pelas estacas anteriores; só estas
estacas são ancoradas (se necessário)

Fig. 28 - Esquema do processo construtivo das cortinas de estacas secantes

Estas cortinas podem ser usadas para formar uma parede contínua à prova de água, ou quase;
mas isso depende do controlo constante da tolerância para a posição do projecto e da direcção
da perfuração. Uma falha na intersecção fará com que a parede não seja impermeável. Tanto
nesta solução como na imediatamente anterior, é preciso controlar as tolerâncias horizontais
( 25 mm) e verticais (1:100) na instalação das estacas com muito mais cuidado que na

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solução das estacas espaçadas, para evitar situações como a que é visível na Fig. 38, à
esquerda.

3.5. SELECÇÃO DO TIPO DE CORTINA DE ESTACAS

A escolha do tipo de cortina de estacas a executar depende de vários factores, nomeadamente:

 presença de nível freático (que praticamente impossibilita as estacas espaçadas e as


contíguas);
 coesão dos solos (quanto mais coerente eles forem, mais exequíveis se tornam as estacas
espaçadas);
 necessidade de estanqueidade (tornando praticamente obrigatórias as estacas secantes);
 disponibilidade financeira e prazos de tempo a cumprir (as cortinas de estacas espaçadas
são mais baratas e rápidas de executar);
 n.º de estacas a executar (naturalmente menor para as cortinas de estacas espaçadas).

3.6. SOLUÇÕES MISTAS

Há registos [6] da utilização de cortinas de estacas espaçadas com o espaço intercalar


constituído por troços de parede moldada no solo, de profundidade ligeiramente inferior à das
estacas (Fig. 29 e Fig. 30, à esquerda).

Fig. 29 [6] - Corte horizontal de solução de cortina mista estacas - paredes moldadas

3.7. QUESTÕES GERAIS

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A escolha do tipo de parede de contenção depende muito do facto de ser necessário que esta
seja impermeável ou não, assim como do tipo de terreno (necessariamente estável para as
cortinas de estacas espaçadas) e da posição relativa do nível freático. A utilização de cada tipo
de parede tem bastante influência na sua profundidade e custo (aumenta das estacas espaçadas
para as secantes).

Em virtude dos elevados impulsos a que as cortinas são sujeitas e para limitar os deslocamen-
tos na fase construtiva, as estacas são sempre de médio a grande diâmetro ( 1.00 m).

Não deve também deixar de ser referida a possibilidade que existe de fazer cortinas com
estacas inclinadas (Fig. 30, à direita), sobretudo nas situações em que existem construções
muito próximas e não se pretende perder muito espaço útil na nova construção.

Fig. 30 - À esquerda, corte vertical de solução de cortina mista estacas - paredes moldadas [6]
e, à direita, execução de cortinas de estacas inclinadas [8]

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4. PROCESSO CONSTRUTIVO

4.1. ASPECTOS GERAIS

O processo construtivo de uma cortina de estacas passa (pode passar) pelas seguintes fases:

 análise da envolvente - construções vizinhas, circulação de trânsito e todos os aspectos de


segurança afectos ao local; levantamento de todos os obstáculos (Fig. 31, à esquerda) na
zona afecta à obra;
 montagem do estaleiro (Fig. 31, à direita), com espaço para a disposição e movimentação
dos equipamentos (sistema de produção, bombagem e reciclagem de bentonite, instalações
administrativas, gruas, etc.), incluindo a execução da plataforma de trabalho da máquina,
com adequadas dimensões e condições de resistência para que os trabalhos de execução
da cortina decorram normalmente e sem impedimentos;
 execução dos muros-guia;
 rebaixamento do nível freático (caso exista);
 implantação das estacas no terreno;
 execução das estacas;
 primeira fase de escavação (no intradorso da cortina) até cerca de 0.60 m de profundidade,
contados do nível da plataforma de trabalho; demolição da cabeça das estacas;
 colocação do betão de limpeza para a viga de coroamento;
 execução da viga de coroamento, à cabeça das estacas e ao longo da totalidade do
perímetro a conter;
 realização das ancoragens sobre a viga de coroamento da cortina (este passo pode ser
omitido, ou porque não são executadas ancoragens, ou porque não são feitas ao nível da
viga de coroamento mas apenas a níveis mais abaixo, ou ainda porque as ancoragens são
feitas nas próprias estacas);
 segunda fase de escavação (também no intradorso da cortina) até ao nível da base da viga
intermédia ou até ao nível inferior previsto para a escavação (neste caso, os dois passos
seguintes não existem); aplicação, quando as estacas são contíguas ou espaçadas ou
quando se pretende regularizar a superfície das estacas, de betão projectado,
eventualmente armado com rede electrossoldada;

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 realização da viga intermédia, caso exista, e conveniente ligação desta às estacas da


cortina mediante descasque prévio das mesmas, seguida da execução do segundo nível de
ancoragens a estabelecer sobre esta viga; por vezes esta viga intermédia é feita com perfis
metálicos;
 terceira fase de escavação no intradorso da cortina, até ao nível inferior previsto para a
mesma (a obra da foto da capa encontra-se nesta fase da execução); estes dois últimos
passos poder-se-ão repetir se houver mais níveis de ancoragens, o que não é muito
corrente;
 execução, de baixo para cima, da estrutura a construir, até ao nível do pavimento térreo
(plataforma de trabalho), ligação dos elementos estruturais (lajes dos pisos enterrados) à
cortina de estacas nos termos a indicar pelo projectista da estrutura, seguida da
desactivação das ancoragens (piso a piso).

Fig. 31 - À esquerda, remoção de obstáculos com recurso a estacas-prancha e, à direita,


disposição geral do estaleiro

4.2. ANÁLISE DA ENVOLVENTE E ASPECTOS BUROCRÁTICOS

O início dos trabalhos deve prever a remoção de todos os obstáculos existentes no perímetro
do estaleiro. Para tal, deve ser levantado o cadastro e desactivados todos os serviços (água,
gás, electricidade, esgotos e telefones) que possam interferir com a obra. Segue-se a vedação
do espaço em causa e a introdução de todas as medidas de segurança afectas a pessoas e
máquinas. Devem ser respeitadas todas as indicações regulamentares sobre higiene e
segurança no local do trabalho.

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Cortinas de estacas moldadas por Jorge de Brito

Por parte da empresa adjudicatária, deverá existir um seguro de obra que cubra a
responsabilidade civil (sinistros materiais e acidentes pessoais) que se venha a verificar.

A análise da envolvente passa pela inspecção visual e análise dos projectos das construções
vizinhas. Relembra-se que, em virtude da sua deformabilidade, a execução de uma cortina de
estacas poderá dar origem a assentamentos nas estruturas mais pesadas nas imediações da
mesma, pelo que é preciso verificar se alguma dessas estruturas é muito sensível a esses
mesmos assentamentos. A vistoria deve ser, de preferência, registada fotograficamente ou
filmada, para poder testemunhar a situação inicial e evitar possíveis acções fraudulentas de
pedidos de indemnização indevidos. Deverá também ser elaborado um relatório escrito que
constará do Livro de Obra.

Os moradores da zona envolvente deverão ser avisados do início dos trabalhos. Em termos de
circulação de tráfego, deverá ser colocada a sinalização necessária para a realização da obra.
A ocupação da via pública rege-se pelas exigências regulamentares e municipais existentes
para o efeito (obtenção de licenças, pedido de policiamento, etc.).

4.3. EXECUÇÃO DOS MUROS-GUIA

Após a montagem do estaleiro e independentemente do equipamento que vai ser utilizado


para a execução da cortina, deverão ser executados muros-guia, com 0.80 m de altura mínima
e com uma distância entre si igual à do diâmetro das estacas acrescida de cerca de 5 cm (Fig.
32), destinados a traçar a directiva do trabalho (posicionamento correcto dos topos das
estacas). Têm também funções de suportar as cargas transmitidas pelo equipamento da
escavação e de resistir aos impactos causados pelo mesmo. No caso de utilização de lamas
bentoníticas, os muros-guia criam um canal de condução da suspensão da lama bentonítica
aquando da betonagem.

Os muros-guia deverão estar sempre, no mínimo, 1.50 m acima do nível freático e serão
betonados contra o terreno virgem (Fig. 32); caso tal não seja possível, estudar-se-á para cada
caso a forma adequada do muro.

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Fig. 32 - Exemplo de muros-guia usados na execução tanto de cortinas de estacas como de


paredes moldadas em zonas não confinadas

No caso de serem encontrados obstáculos à escavação por baixo dos muros-guia, estes serão
retirados e substituídos por um aterro argiloso compactado ou betão pobre C12/15. Se forem
encontrados vazios, estes serão preenchidos com a solução anteriormente descrita ou, em
alternativa, prolongar-se-ão os muros-guia até terreno compacto.

A cofragem dos muros-guia (Fig. 33, à esquerda) levanta algumas dificuldades, devido à
forma final que se pretende, nomeadamente nas cortinas de estacas contíguas. As cofragens
metálicas (Fig. 33, à direita) permitem uma produtividade mais elevada mas não se adaptam
aos pontos singulares, como os cantos.

Fig. 33 - Cofragem de muros-guia: em madeira (à esquerda) e metálica (à direita)

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Após a montagem da cofragem, procede-se à montagem da armadura (Fig. 34, à esquerda) e à


betonagem (Fig. 34, à direita).

Fig. 34 - Montagem da armadura (à esquerda) e fase pós-betonagem dos muros-guia (à


direita)

4.4. REBAIXAMENTO DO NÍVEL FREÁTICO

Para que se consigam boas condições de trabalho e não se verifiquem fenómenos de


levantamento hidráulico do fundo da escavação (heaving), há que proceder ao rebaixamento
do nível freático durante a fase de construção da cortina. O rebaixamento pode ser feito, entre
outras [2], das seguintes maneiras, a estudar caso a caso:

 extracção da água, por bombagem, com o auxílio de uma mangueira (Fig. 35, à esquerda)
à medida que a obra avança;
 estabelecendo uma rede de poços de alívio (câmaras de visita provisórias, tipo
saneamento) dispostos na parte exterior da cortina, munidos, no fundo, de uma bomba que
garanta o rebaixamento desejado e a consequente regularização do nível freático a cotas
mais inferiores;
 técnicas menos correntes, como a electro-osmose ou o congelamento da água freática.

4.5. EXECUÇÃO DA CORTINA

As estacas da cortina são normalmente executadas à rotação, sendo as soluções mais correntes
as descritas no Capítulo 2 deste documento. Conforme referido no Capítulo 3, as estacas

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podem ser secantes, contíguas ou espaçadas, dependendo do tipo de terreno e da existência ou


não de nível freático ao longo da contenção.

Nas soluções de estacas secantes e contíguas, pouco mais há a acrescentar em termos da


execução da cortina propriamente dita. Para regularizar a superfície que fica à vista das
estacas após a escavação no intradorso da cortina, pode-se recorrer a uma camada pouco
espessa de betão projectado (Fig. 35, à direita), que, no caso das estacas contíguas, servirá
também para evitar que se desagregue o terreno entre as estacas, susceptível de entupir as
caleiras ao nível dos pisos enterrados entre a cortina e as paredes de revestimento interiores
(geralmente executadas em face do aspecto esteticamente deficiente das cortinas de estacas).
Outro aspecto importante é a drenagem das águas na fase definitiva, sendo a solução a
adoptar geralmente diferente consoante a cortina se integre na estrutura de um edifício ou
funcione como muro de suporte exterior (Fig. 35, à direita).

Fig. 35 - À esquerda, rebaixamento do nível freático em estação elevatória de esgotos,


efectuada por bombagem através de mangueira e, à direita, muro de suporte exterior feito com
uma cortina de estacas já concluída (com betão projectado), vendo-se uma fiada de drenos sub-
horizontais

Já nas cortinas de estacas espaçadas, é necessário, na fase definitiva, estabilizar o terreno


entre estacas, sobretudo se tratar de solos menos estáveis como argilas moles ou solos pouco
densos, o que é feito através de uma espécie de abóbadas (foto da capa), com cerca de 50 a

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150 mm de espessura total, executadas através de uma primeira camada de betão projectada
contra o terreno, à superfície da qual é colocada uma malha electrossoldada, após o que se
segue uma segunda camada de betão projectado (Fig. 37, à esquerda).

Para garantir a amarração destas armaduras, pode-se proceder das seguintes maneiras: prever,
incorporadas nas próprias estacas, armaduras de espera para posterior empalme da malha
electrossoldada; fazer com que esta passe no intradorso das estacas e, portanto, com
continuidade de cada abóbada para as adjacentes (solução normalmente preferida, por ser
mais prática, não obstante origine um maior consumo de malha e betão projectado).

4.6. EXECUÇÃO DA VIGA DE COROAMENTO

Após a execução da cortina, há que proceder ao saneamento da cabeça das estacas (Fig. 36, à
esquerda) com a finalidade de retirar o betão contaminado e de obter comprimento de
amarração suficiente da armadura longitudinal destas na viga de coroamento. A finalidade da
viga de coroamento é a de proceder à distribuição de esforços equitativamente ao longo das
estacas e pode também servir de apoio à implantação das ancoragens (Fig. 26, à esquerda).

Fig. 35a - Viga de coroamento de cortina de estacas já executada

A viga de coroamento tem normalmente grandes dimensões (Fig. 35a), apresentando,


contrariamente a uma viga normal, maior percentagem de armadura nas faces laterais do que
nas faces superior e inferior, dado serem os impulsos horizontais os condicionantes numa

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contenção periférica executada com este método.

Nas zonas da viga em contacto directo com o terreno (ou com uma eventual estrutura
confinante) e entre a viga e as estacas, tendo em consideração que, como é habitual, esta viga
fará parte da estrutura definitiva, há que garantir 5 a 10 cm de espessura de betão de limpeza
(Fig. 36, à direita) de classe C12/15, colocado após o saneamento da cabeça das estacas e
antes da execução da viga de coroamento. A adequada aderência entre o betão de limpeza e o
da estrutura confinante é conseguida picando o betão existente até obter uma superfície
rugosa, aplicando um produto selante à base de resina epoxi e colocando então o betão de
limpeza (se necessário, utilizando cofragem). Pela mesma razão, o betão de limpeza sob a
viga de coroamento deve ter um acabamento áspero.

Fig. 36 - À esquerda, saneamento da cabeça das estacas com macacos pneumáticos de


pequena dimensão e, à direita, betão de limpeza da viga de coroamento, vendo-se ainda parte
da armadura já montada e colocada no local

O recobrimento das armaduras (Fig. 36, à direita) deve ser sempre assegurado, bem como o
comprimento de amarração da armadura das estacas na viga. Caso nada conste no projecto, o
recobrimento deve ser da ordem dos 5 cm e o comprimento de amarração da armadura das
estacas na viga deve ser o maior possível e nunca inferior a 50 Ø. Quando se pretender ligar
elementos da superstrutura à cortina de estacas, é preciso também deixar armaduras de espera
com o comprimento de amarração necessário (Fig. 37, à direita).

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Fig. 37 - À esquerda, projecção de betão contra malhasol (neste caso, numa pregagem) e, à
direita, armaduras de espera acima da viga de coroamento para execução de muro tradicional

Quando existir uma fiada de ancoragens implantada na viga de coroamento, há que prever os
negativos para as mesmas antes da betonagem da viga (Fig. 40, à direita).

Após a execução da viga de coroamento e das suas eventuais ancoragens, inicia-se uma fase
alternada de escavação na parte anterior das estacas (poder-se-á ter de recorrer a equipamento
auxiliar para a escavação e limpeza da terra adjacente às estacas - Fig. 37a, à esquerda) e
introdução do sistema de suporte intermédio (fiada de ancoragens ou escoramentos).

4.7. EXECUÇÃO DAS ANCORAGENS

Para qualquer das soluções de cortinas, as estacas poderão ou não (Fig. 38, à esquerda, em
que se recorreu apenas a escoramentos com perfis metálicos) ser ancoradas, dependendo essa
opção do dimensionamento da cortina, do nível de deslocamentos permitido no topo, do tipo
de terreno, da altura livre da cortina e da rigidez das próprias estacas. As ancoragens poderão
estar ligadas directamente às estacas (Fig. 37a, à direita), para o que é preciso prever em obra
o negativo integrado nas armaduras das mesmas e garantir uma grande precisão na execução
das estacas a fim de posicionar correctamente a ancoragem. Em alternativa, geralmente
preferível, as ancoragens poderão ser colocadas entre as estacas, sendo as respectivas cargas
transferidas para estas últimas através de uma viga metálica (Fig. 38, à direita) e/ou de betão
armado (foto da capa). Embora esta última opção seja um pouco mais dispendiosa (obriga à
criação da viga transmissora de cargas), é mais prática e acaba por ser preferível em obra. O

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posicionamento das ancoragens na vertical tanto pode ocorrer na viga de coroamento como a
qualquer nível intermédio (foto da capa e Fig. 38, à direita).

Fig. 37a - À esquerda, limpeza da terra junto às estacas na fase de escavação e, à direita,
cortina de estacas em que as ancoragens são aplicadas directamente nas estacas

Fig. 38 - À esquerda, cortina de estacas secantes (com problemas de verticalidade) não


ancorada (mas escorada) em estação elevatória de esgotos e, à direita, cortina ancorada entre
estacas com vigas metálica e de betão armado para transmissão das cargas

Uma ancoragem é um sistema constituído por um tirante pré-esforçado, introduzido num furo
de sondagem, normalmente da ordem dos 8 a 14 cm, aberto num maciço e constituído por
uma armadura de aço de alta resistência (Fig. 40, à esquerda), geralmente pré-esforçada
(ancoragem activa). No extremo inferior do furo existe a zona de ancoragem, também
designada de zona de amarração ou bolbo de selagem (Fig. 39, à esquerda), e no outro
extremo (cabeça - Fig. 39, à direita) é absorvida a tracção exercida na armadura (corpo da
ancoragem ou zona livre) [7]. Os furos das ancoragens podem transmitir aos maciços forças

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que são da ordem de 50 a 70 tf em solos coesivos, 80 a 100 tf em solos não coesivos e


algumas centenas de toneladas em formações rochosas.

CORTE A-A

Abóbadas

Estacas
Ancoragens

Fig. 39 - À esquerda, corte vertical esquemático de uma cortina de estacas espaçadas (ver
também Fig. 16, em cima) com dois níveis de ancoragens e, à direita, cabeça de ancoragem
com 7 cabos de pré-esforço

Fig. 40 - À esquerda, cabos de pré-esforço de ancoragens definitivas, vendo-se os espaçadores


(a branco) e, à direita, negativo para o tubo manchete em viga de coroamento (tubo de PVC)

As ancoragens designam-se por provisórias ou definitivas consoante o tempo em que se


mantêm com função resistente. Segundo a norma alemã DIN 4125, o carácter provisório é
atribuído às ancoragens com período de utilização com função resistente inferior a 2 a 3 anos.

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As ancoragens são normalmente injectadas com calda à base de cimento, podendo essa
injecção ser efectuada com ou sem pressão. A injecção à pressão pode ser realizada em uma
ou mais fases variando, neste caso, a pressão da injecção. A aplicação de injecções faseadas é
normalmente utilizada em solos pouco resistentes. Em maciços rochosos, em vez da calda de
cimento, é usual utilizar-se resina (tempo de endurecimento muito curto, facilmente
controlável e facilidade de aplicação), podendo ainda recorrer-se a ancoragens mecânicas.

O posicionamento das ancoragens é feito com recurso a negativos deixados nas estruturas de
suporte (viga de coroamento, viga intermédia ou as próprias estacas), normalmente
constituídos por tubos metálicos ou de PVC (Fig. 40, à direita).

A sequência de execução das ancoragens (em cortinas de estacas ou noutras soluções de


contenção periférica) é a seguinte (Fig. 41, na qual a introdução da armadura deveria preceder
a operação 4):

Fig. 41 - Processo de execução de ancoragens (seguir legenda)

 perfuração à roto-percussão com trado de varas e bit (Fig. 42, à esquerda), garantindo a
inclinação do furo com o plano horizontal definida em projecto (normalmente entre 20 e
35º); as paredes do furo deverão ficar rugosas, e é essencial que os detritos da furação
sejam removidos eficientemente usando um de três meios: ar, água (o método mais usado,

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garante uma boa ligação da calda ao terreno, excepto se este amolecer quando húmido) ou
lama argilosa (suspensão de água / bentonite);
 extracção das varas e bit e sondagem do furo para controlo do seu estado de limpeza;
 introdução do tubo manchete (Fig. 42, à direita), para execução do bolbo de selagem, e do
tubo liso (de diâmetro igual ao do furo e não penetrando na zona de selagem), este último
só quando as paredes do furo não são auto-sustentáveis (nesta hipótese, ainda existe a
possibilidade de ir preenchendo o furo com calda logo na furação, o que permite dispensar
o tubo liso exterior);

Fig. 42 - À esquerda, perfuração à roto-percussão com trado de varas e bit e, à direita, tubo
manchete no interior do qual é colocada a armadura da ancoragem (as válvulas a preto, de
metro a metro em cerca de 6 m na extremidade inferior do tubo, permitirão a passagem da
calda para formação do bolbo de selagem)

 introdução da armadura de pré-esforço (Fig. 40, à esquerda), no interior do tubo liso e fora
do tubo manchete (Fig. 43, à esquerda), munida de separadores / centralizadores ao longo
do seu comprimento (de 2 em 2 m na zona de amarração e de 4 em 4 m na zona livre);
para permitir a penetração da calda, os cabos devem estar afastados entre si pelo menos 5
mm (Fig. 43, à direita);
 selagem do furo com calda, de modo contínuo e sem interrupções; se se tratar de
ancoragens provisórias, destinadas apenas a suster o terreno durante a execução da obra
de contenção, a selagem abrange apenas a extremidade dos cabos (zona de amarração);
para as ancoragens definitivas, a selagem tem que abranger todo o comprimento do furo
(fazendo a calda afluir à boca deste), mais para proteger a armadura contra a corrosão do

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que para incrementar a capacidade de carga da ancoragem; esta selagem é feita


geralmente através de um terceiro tubo cuja extremidade fica no fundo do furo (Fig. 43, à
esquerda);
 operação de injecção faseada (por troços de 1.5 m) da calda para formação do bolbo de
selagem; a primeira reinjecção ocorre cerca de 24 horas depois da primeira injecção, cuja
função é a impermeabilização prévia do furo; após cada injecção, feita através do obtura-
dor (Fig. 44, à esquerda), é feito um ensaio de absorção de água; a pressão de injecção não
deve ser excessiva para não provocar danos no terreno e nas estruturas vizinhas;

Fig. 43 - À esquerda, armadura de pré-esforço, tubo manchete e tubo para selagem do furo e,
à direita, pormenor da armadura de pré-esforço e do espaçamento entre cordões

 aplicação do pré-esforço através de um macaco hidráulico aproximadamente 3 a 7 dias


após a injecção da calda (Fig. 44, à direita); este tempo deverá ser adaptado em função de,
na calda, terem ou não sido introduzidos aceleradores de presa; regista-se o
comportamento tensão-deformação do cabo e compara-se com o comportamento das
ancoragens de ensaio ou com critérios preestabelecidos.

O processo de execução das ancoragens e os próprios materiais e equipamento utilizados


podem sofrer algumas alterações, consoante as condições do terreno, o nível freático e o

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próprio empreiteiro. Essas nuances são descritas num documento específico sobre ancoragens
[13].

Fig. 44 - À esquerda, obturador para injecção faseada do bolbo de selagem e, à direita,


aplicação do pré-esforço numa ancoragem através de macaco hidráulico

4.8. EXECUÇÃO DOS ESCORAMENTOS

Em alternativa ou em complemento das ancoragens, podem ser executados escoramentos para


sustentação das cortinas de estacas numa fase provisória, enquanto a construção do resto da
superstrutura, que irá diminuir os esforços na cortina, não ocorre.

O sistema de escoramento pode ser utilizado para o suporte de vários tipos de paredes. Para
trincheiras e escavações de largura limitada, é utilizado um sistema de escoras colocadas
horizontalmente (Fig. 45, em cima à esquerda). Quando a distância é grande demais para a
solução anteriormente adoptada, a colocação das escoras passa a ser inclinada (Fig. 45, em
cima à direita). Se a escavação além de muito larga, também é profunda, pode usar-se a
escavação em socalcos, deixando banquetas adequadas para o suporte da fundação vizinha e
dando-se início à construção das fundações na parte central (Fig. 45, em baixo). À medida

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que a construção da estrutura definitiva avança, vai-se instalando um sistema de escoramento


horizontal. Em solos muito pobres, pode vir a ser necessário recorrer à execução de estacas
para o sistema de fundações das escoras. As escoras utilizadas podem ser de metal (Fig. 38, à
esquerda), betão ou de madeira, dependendo das cargas actuantes.

Fig. 45 - Várias soluções de escoramentos

Em relação às ancoragens, o recurso a escoramentos apresenta as seguintes vantagens:

 não é necessária a intromissão nas propriedades vizinhas;


 o sistema não requer um operador especializado para a sua execução;
 o procedimento para pequenas escavações é bastante simples e rápido;
 é substancialmente mais barato.

No entanto, tem desvantagens importantes:

 restringe substancialmente o acesso e a construção no local de trabalho;

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 em escavações mais profundas, são necessários procedimentos especiais, tais como o pré-
esforço das escoras.

É a seguinte a sequência de colocação dos escoramentos. Até ao primeiro nível de suporte ser
atingido, a escavação é feita com escoramento horizontal. O espaçamento vertical e horizontal
das escoras é função das forças de suporte necessárias e do tipo de parede em questão. Caso
seja necessário, é colocada na parede uma viga (longarina) horizontal que faz a ligação da
escora à parede (Fig. 38, à esquerda).

As escoras podem ser pré-esforçadas, especialmente em situações em que é necessária a


restrição de movimentos de solos em terrenos adjacentes. O pré-esforço é normalmente
realizado com uma carga com um valor de cerca de 50% da carga de funcionamento.

Normalmente, a instalação de escoras inclinadas é feita através de um faseamento da


escavação, de forma a deixar uma berma que suporta a parede. De seguida, é instalado o
sistema de fundação para a escora e, se necessário, é colocada uma longarina para a ligação à
parede. Para avançar a escavação, a berma é rebaixada e os seguintes níveis de escoras são
colocados. Para o controlo das deformações, deve ter-se especial atenção ao processo
construtivo e a pormenores de projecto relacionados com a rigidez dos tirantes e com a sua
ligação à parede.

4.9. EXECUÇÃO DA SUPERESTRUTURA ATÉ AO PISO TÉRREO

Após a execução das ancoragens, o terreno é escavado até à profundidade pretendida para
execução do piso térreo (Fig. 46, à esquerda) e fundações da superestrutura e esta começa a
ser construída de baixo para cima, devendo ser executadas as devidas amarrações entre a
cortina de estacas e a superestrutura (de forma idêntica ao que acontece com as paredes
moldadas). A escavação só deve fazer-se 28 dias após a betonagem das estacas, para garantir
que o betão apresente a resistência mecânica adequada.

Caso não tenham sido deixadas armaduras de espera para a superstrutura (Fig. 46, à direita),
terão que ser feitos roços na própria cortina de estacas e/ou na viga de coroamento destinados

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a amarrar a armadura das lajes dos pisos. Neste processo, deve ser usado um produto selante,
à base de resinas epoxi, e um betão não retráctil para garantir a adequada aderência do betão
novo ao betão velho e assegurar um perfeito funcionamento da ligação.

Fig. 46 - À esquerda, piso térreo já executado e, à direita, armadura de espera de ligação entre
a cortina de estacas e a superstrutura a ser desdobrada

Após a conclusão da superestrutura enterrada, as ancoragens deverão ser desactivadas, no


caso de serem de carácter provisório. As ancoragens são puxadas até se poderem retirar as
cunhas e assim libertar os cabos das cabeças. O pré-esforço deixa imediatamente de se
exercer e as cabeças das ancoragens podem ser reutilizadas.

Todo este processo ocorre apenas nas cortinas de estacas integradas numa superestrutura
(edifício com caves ou túnel) e não é extensível a cortinas que funcionem independentemente,
como muros de suporte de terras, por exemplo.

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5. TRABALHOS PRELIMINARES E CONTROLO DE EXECUÇÃO

Aquando da necessidade de execução de uma contenção periférica, é importante analisar os


seguintes factores [6]:

 características do terreno (peso específico, coesão, ângulo de atrito interno, posição do


nível freático, etc.);
 solicitações da estrutura (contenção provisória ou definitiva);
 espaço disponível para o estaleiro;
 análise da envolvente - construções vizinhas e circulações de trânsito a considerar;
 economia;
 tempo.

5.1. RECONHECIMENTO E PROSPECÇÃO GEOTÉCNICA

Antes do início de qualquer trabalho de fundações / contenção periférica, deve ser efectuado o
reconhecimento do terreno (estudo geológico) que permita identificar em termos geotécnicos
as formações encontradas, principalmente no que se refere a características de resistência e
deformabilidade. Devem ser tomados em consideração os elementos geográficos e geológicos
já existentes sobre o local.

Os trabalhos de prospecção e a interpretação do estudo geotécnico devem ser efectuados por


um especialista e devem constar de relatório escrito de acordo com as especificações LNEC
E219 “Prospecção geotécnica de terrenos - Vocabulário” e E220 “Prospecção geotécnica de
terrenos - Vocabulário”.

Os ensaios mais frequentes são executados para determinação da coesão, ângulo de atrito
interno e módulo de deformabilidade do terreno. Os mais utilizados são:

 sondagens de furação - ensaios de penetração (S.P.T.);


 ensaios de corte - pás rotativas ou colheita de amostras para ensaios laboratoriais;

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 sondagens de penetração - penetrómetros dinâmicos ou estáticos tipo holandês.

Os ensaios de sondagem deverão indicar a altura do nível freático. Devem ainda ser
analisadas as condições de circulação da água subterrânea, a natureza e localização das
formações aquíferas, níveis piezométricos e influência de marés de forma a poder ser
determinado o seu caudal.

Pretendendo-se executar elementos de betão enterrados, é prudente que a água existente no


solo seja analisada quimicamente para ser detectada a presença de agentes químicos
responsáveis pela deterioração do betão. Os ensaios devem ser realizados sobre amostras
colhidas no campo. Na prática, por vezes esta análise química é descurada cabendo aos
Projectistas, ao Dono da Obra e à Fiscalização a implementação da sua execução. Este ensaio
deverá ser executado num laboratório credenciado e o seu resultado deverá constar no
processo da empreitada (Livro de Obra).

5.2. INSPECÇÃO E CONTROLO DE QUALIDADE

Durante a execução da cortina de estacas, são anotados em fichas próprias dados como os
seguintes:

 dados gerais da obra como o tipo de obra, o cliente e o endereço;


 descrição dos tipos de equipamento utilizados;
 identificação da estaca executada;
 comprimento real escavado abaixo da cota do terreno;
 diâmetro real do furo feito pelo trado;
 horário de início e fim de escavação;
 horário de início e fim da betonagem;
 pressão de injecção da argamassa;
 consumo de materiais por estaca e comparação com o consumo real em relação ao teórico;
 controlo do posicionamento de armadura durante a betonagem;
 qualidade dos materiais empregues;

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 anomalias na execução;
 desvios do eixo em relação ao projectado.

5.3. ENSAIOS DURANTE E APÓS A EXECUÇÃO

Não obstante a muita alargada experiência já adquirida na execução de estacas e de cortinas


de estacas, são muitas as contingências a que aquela pode estar sujeita, o que motiva a
implementação de ensaios durante e após a construção, sendo de realçar que a estrutura final
da cortina só é acessível para inspecção visual de um dos lados. Destes, os mais importantes
são os de carga e os de integridade. A estes haverá que acrescentar os relacionados com a
análise da deformação das cortinas e a eficácia das ancoragens. Mais corriqueiros mas
igualmente importantes, podem referir-se os relacionados com o controlo dos materiais (betão
- Fig. 46a, calda de injecção, lamas bentoníticas, etc.) e da execução (verticalidade, relação
entre o volume real de escavação e o teórico, relação entre o volume real de betão bombeado
e o teórico, etc.).

Fig. 46a - À esquerda, ensaio de abaixamento do betão fresco pelo cone de Abrams e, à
direita, provetes cúbicos para posterior ensaio em laboratório do betão endurecido

5.3.1. Teste de carga

Os principais objectivos na execução de um teste de carga são:

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 estabelecer a relação carga / deformação da estaca;


 determinar, se possível, a capacidade última da estaca;
 estudar a interacção estaca-solo;
 verificar a integridade estrutural da estaca;
 verificar se a relação carga / deformação da estaca corresponde ao especificado no
contrato;
 verificar os parâmetros da estaca.

A forma mais comum de teste de carga é o teste de compressão estática (Fig. 47, à esquerda),
para o qual é aplicado gradualmente uma carga na cabeça da estaca enquanto a deformação
vai sendo medida. O teste de carga estática pode também ser executado em tensão e ainda
lateralmente (Fig. 47, à direita). As estacas podem também ser testadas utilizando testes de
carga dinâmicos ou semi-dinâmicos.

Fig. 47 - Teste de carga à compressão [9] (à esquerda) e por pressão lateral (à direita)

O teste de carga estática pode ser executado em estacas de trabalho (que não podem ser
danificadas no ensaio) ou em estacas de ensaio, executadas exclusivamente para este efeito,
que podem ser levadas à rotura (Fig. 47a). O teste consiste num carregamento gradual das
estacas (com incrementos de carga), seguido de um descarregamento também gradual. A
carga é aplicada no centro da cabeça da estaca, recorrendo a macacos hidráulicos (Fig. 47).

No entanto, como estes ensaios são de execução demorada e de elevado custo, acaba por se
realizar um número muito reduzido dos mesmos em relação à quantidade de estacas
executadas. Daqui resultam problemas de representatividade bem patentes no Quadro 1.

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Fig. 47a - Célula de pré-carga (à esquerda ) e estrutura de reacção para prova de carga até 600
toneladas (à direita )

N.º de estacas defeituosas N.º de estacas ensaiadas Probabilidade de pelo menos uma
estaca defeituosa seja ensaiada
2 2 0.04
2 5 0.10
2 10 0.18
2 20 0.33
2 2 0.18
10 5 0.41
10 10 0.65
Quadro 1 [14] - Relação entre o n.º de estacas ensaiadas (dimensão da amostra) num universo
de 100 e a probabilidade de que pelo menos uma das ensaiadas seja defeituosa

5.3.2. Testes de integridade

Conforme o nome indica, o teste de integridade tem como principal função confirmar se não
existem descontinuidades ao longo do comprimento da estaca, correspondentes a vazios ou a
espaços preenchidos com terreno. O teste torna-se indispensável sobretudo nas estacas
executadas com tubo moldador recuperável ou com lamas bentoníticas.

O teste de integridade pode ser executado com tecnologia sónica ou nuclear (menos
utilizada). Os métodos sónicos envolvem um conjunto de informação sobre reflexões de uma
onda sónica gerada por batidas leves da cabeça da estaca, ou por acumulação de informação
num colector de ondas sónicas que, por sua vez, são geradas por um emissor. Tanto o emissor
como o colector são colocados na estaca separadamente. No método nuclear, recorre-se a um

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isótopo nuclear e o que se mede é a densidade do betão através da quantidade de radiação


reflectida.

Estes ensaios acabam por funcionar como um substituto dos ensaios de carga na maioria das
obras, sendo que nas mais importantes são também efectuados nas estacas carregadas e a
respectiva calibração é utilizada para ensaiar as restantes.

5.3.3. Análise da deformação

A deformação das cortinas após a escavação é extremamente relevante nos potenciais


estragos que pode provocar em estruturas vizinhas. Daí que se recorra a diversos instrumentos
e ensaios para a quantificar.

Destes, ressaltam os inclinómetros (Fig. 48, à esquerda), que permitem medir ângulos que o
paramento faz com a vertical, os teodolitos, para apoio topográfico, e os extensómetros
magnéticos, para medir os movimentos verticais do terreno a várias profundidades abaixo da
superfície. Também relacionados com a deformação da cortina, estão as medições do pré-
esforço (e respectivas perdas) nas ancoragens, feitas através de células de carga (Fig. 48, à
direita).

Fig. 48 - À esquerda, inclinómetro e, à direita, célula de carga

5.3.4. Ancoragens

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Para além do controlo de características geométricas, são efectuados ensaios de recepção para
efeito de controlo de qualidade. Os ensaios de recepção de ancoragem consistem na aplicação
de um esforço de tracção e na medição do deslocamento da extremidade livre. Nas
ancoragens que são instrumentadas aonde são instaladas células de carga, são efectuados
ensaios de recepção detalhados. Nas restantes, são efectuados ensaios de recepção
simplificados.

Nos primeiros, devem ser elborados os seguintes diagramas: tracções - deslocamentos totais;
tracções - deslocamentos elásticos e permanentes; evolução dos deslocamentos no tempo e
nos patamares de carga; relação entre o coeficiente de fluência e força de tracção. Nos
segundos, fazem-se os mesmos diagramas que no ensaio de recepção detalhada mas as
leituras são efectuadas num espaço de tempo mais curto.

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6. DIMENSIONAMENTO

Qualquer projecto de contenção periférica deve permitir uma previsão aproximada do


comportamento das obras, nomeadamente dos deslocamentos induzidos pela escavação no
maciço envolvente. O projecto deve ser concebido com vista a minimizar estes
deslocamentos, principalmente na vizinhança de outras estruturas. Deverá também assegurar
a estabilidade do fundo da escavação (rotura de fundo e levantamento hidráulico) bem como a
estabilidade global da estrutura de suporte do maciço de terras (Fig. 49) [6].

Fig. 49 [3] - Principais tipos de rotura em cortinas de estacas

O diâmetro das estacas está relacionado com a sua profundidade, isto é, quanto mais
profundas, maior o diâmetro exigido. Para fundações profundas, utiliza-se a seguinte regra
empírica: L = 10 m  Ø = 400 mm e L = 20 m  Ø = 800 mm. Para contenções periféricas,
é aconselhável incrementar estes diâmetros, de forma a assegurar um eficiente
comportamento da cortina como uma parede contínua que tem que resistir a impulsos

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horizontais significativos. Daí que a regra vigente seja a utilização de estacas de diâmetro
igual ou superior a 1.0 m na execução deste tipo de cortinas.

Em termos de resistência às cargas gravíticas provenientes da superestrutura, as cortinas


funcionam como estacas isoladas, se forem suficientemente espaçadas, e como estacas
agrupadas, se forem contíguas ou secantes. Em termos práticos, a sua capacidade de carga é
estimada multiplicando a área da secção transversal por uma tensão que varia geralmente
entre os 3.5 e os 6.0 MPa (embora este último valor só deva ser adoptado com muitas
precauções), em função do tipo de terreno, podendo atingir os 8.0 MPa, se as estacas forem
apoiadas em rocha. A capacidade de carga para cargas verticais depende também da limpeza
do fundo do furo durante a execução e do recurso ou não ao bolbo na ponta. Em última
análise, só o teste de carga permite tirar conclusões fundamentadas sobre este parâmetro.

Nas cortinas actua o impulso activo proveniente das terras a conter. Há portanto que encastrar
as estacas em terreno firme numa altura suficiente (“ficha”) para haver um impulso passivo
que compense os impulsos activos, na sua totalidade (em cujo caso a cortina é auto-portante)
ou em parte (em que é necessário recorrer a ancoragens ou escoramentos, na fase provisória,
ou a ancoragens ou à própria superestrutura, na fase definitiva). Na prática, esta altura varia
entre 2 e 6 vezes o diâmetro da estaca, respectivamente para solos argilosos e areias, sendo no
entanto a gama entre 4 e 5 diâmetros a mais usual para penetração mínima na camada
resistente, excepto em rocha em que se torna muito mais difícil a penetração [5]. Como valor
mínimo, adopta-se os 2 m.

A solução aconselhada, se não se recorrer a modelos contínuos, para o cálculo de soluções de


contenções ancoradas passa pela determinação dos esforços de dimensionamento adoptando
um modelo unidimensional (na direcção vertical) assente em apoios de comportamento
elasto-plástico. No que se refere aos deslocamentos transversais e rotações, consideram-se
duas situações, admitindo que uma estaca é uma viga em fundação elástica:

 solo homogéneo (argilas sobreconsolidadas) - o módulo de elasticidade e o coeficiente de


reacção são considerados constantes em profundidade (E, K s = constante);
 solos sem coesão ou argilas normalmente consolidadas - o módulo de elasticidade e o

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coeficiente de reacção aumentam com a profundidade (E varia linearmente em


profundidade e K s = n h z).

A estaca é considerada fixa na base. Os programas de elementos finitos simulam as estacas


com as suas próprias características (A e , I e , E e ), sendo o terreno simulado por molas
colocadas ao longo do comprimento das estacas e com rigidezes obtidas por K z = K s a, sendo
K s o módulo de reacção do terreno à profundidade da mola e a o comprimento de influência
da mola (Fig. 50, à esquerda). A análise dinâmica deve ter em atenção a hipótese de
liquefacção de estratos de areia que, no modelo, deve ser simulada com ausência de molas no
nível correspondente. Em alternativa ao método dos elementos finitos elásticos, pode também
ser utilizado o modelo da viga de corte em que o terreno é ligado às estacas por bielas rígidas
(Fig. 50, à direita).

Fig. 50 [4] - Modelação das cortinas de estacas na fase definitiva: com elementos finitos
elásticos (à esquerda) e com viga de corte (à direita)

Um aspecto muito importante no dimensionamento destas cortinas é o facto de este ser muito
dependente da fase construtiva, a qual deve ser simulada fase a fase, tendo em conta o facto
de tanto as acções exteriores (impulso não equilibrado das terras) como as deformações
impostas (níveis e intensidade do pré-esforço introduzido nas ancoragens) evoluírem ao longo
do tempo.

Refira-se ainda que os métodos acima preconizados constituem simplificações da realidade, já

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que não têm em conta de forma explícita a interacção solo-estrutura. De facto, as cortinas de
estacas podem ser classificadas como estruturas de contenção flexíveis, ou seja, estruturas nas
quais as deformações sofridas em serviço para absorver os impulsos assumem valores tais que
condicionam a distribuição e grandeza desses mesmos impulsos.

O modelo em causa terá de ter em conta o processo construtivo adoptado, a fim de


contabilizar os esforços e deslocamentos instalados na estrutura durante o processo de
construção. As fases de escavação serão simuladas por incrementos sucessivos de carga de
acordo com o faseamento previsto. Os incrementos de carga correspondentes a uma fase de
construção são determinados a partir dos diagramas de impulso mínimo (impulso activo). Isto
origina a necessidade de estimar os diagramas de momentos flectores nas cortinas, as
deformações nos maciços e o valor máximo dos esforços nas ancoragens. A resolução do
sistema é feita pelo processo incremental pois o sistema global não é linear [6].

Na fase definitiva (superestrutura construída), considera-se de forma conservativa o impulso


em repouso como solução de partida. As ancoragens são desactivadas e as lajes dos pisos
enterrados passam a funcionar como apoios.

Qualquer que seja o método de cálculo escolhido, a observação do comportamento real das
obras é da maior importância de forma a aferir os modelos de cálculo e os parâmetros
utilizados [6].

Do ponto de vista prático, as constatações / regras a ter em conta no dimensionamento são [6]:

 os esforços nas ancoragens aumentam durante a escavação e decrescem quando algum


nível inferior é pré-esforçado;
 o valor máximo do esforço em cada nível de ancoragens é atingido na fase de escavação
seguinte à sua instalação;
 a adopção de pré-esforço mais elevado nos níveis de ancoragens situados mais perto do
topo da parede origina menores deslocamentos;
 na fase definitiva, as ancoragens não são contabilizadas no dimensionamento das
contenções por não serem definitivas (são desactivadas após a construção das lajes dos

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pisos enterrados).

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7. BIBLIOGRAFIA

Nota: as referências bibliográficas indicadas de seguida não incluem as referidas no capítulo


de introdução a este documento, assim como um número não especificado de catálogos
comerciais.

[1] Coelho, Silvério, “Tecnologia de Fundações”, Edições E.P.G.E., Lisboa, 1996.


[2] Brito, Jorge de, “Drenagem de Escavações”, IST, Lisboa, 1999.
[3] Brito, José Mateus de, “Concepção e Projecto de Infraestruturas Rodoviárias. Módulo
VIII - Obras de Suporte de Terras”, IST, Lisboa, 1992.
[4] Branco, Fernando; Correia, António, “Modelação de Fundações na Análise Estrutural”,
Relatório CMEST DT 02/90, IST, Lisboa, 1990.
[5] Castro, Guy de, “Acerca do Projecto de Fundações em Estacas de Betão Armado”,
Memória n.º 743, LNEC, Lisboa, 1989.
[6] Carreto, A. Pires, “Problemática das Caves”, 1º Simpósio Nacional de Materiais e
Tecnologias na Construção de Edifícios - SIMATEC, Lisboa, 1985.
[7] Pinelo, António, “Regulamento sobre Ancoragens e Cortinas Ancoradas”, Capítulo I,
Seminário S 217, 3ª edição, LNEC, Lisboa, 1997.
[8] Puller, Malcolm, “Deep Excavations. A Practical Manual”, Thomas Telford, London,
1996.
[9] Correia, António, et al., “Mecânica dos Solos e Fundações II. Elementos Teóricos”,
IST, Lisboa, 1996.
[10] Paulo, Pedro; Brito, Jorge de, “Cortinas de Estacas-Prancha”, IST, Lisboa, 2001.
[11] Brito, Jorge de, “Paredes Moldadas”, IST, Lisboa, 2001.
[12] Brito, Jorge de, “Estacas Moldadas no Terreno”, IST, Lisboa, 1999.
[13] Brito, Jorge de, “Ancoragens”, IST, Lisboa, 2001.
[14] Fleming, W. G. K., et al., “Piling Engineering”, John Wiley & Sons, Inc, London, 1992.

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