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CO2 de concretos
Strategies for the minimization of CO2 emissions from
concrete
OLIVEIRA, V. C. H. C.; DAMINELI, B. L.; AGOPYAN, V.; JOHN, V. M. Estratégias para a minimização da emissão de CO2 167
de concretos. Ambiente Construído, Porto Alegre,v. 14, n. 4, p. 167-181, out./dez. 2014.
ISSN 1678-8621 Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído.
Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 14, n. 4, p. 167-181, out./dez. 2014.
Introdução
De acordo com o Intergovernmental Panel on soluções mais aceitas atualmente segundo as
Climate Change (2007), há evidências de que técnicas de Análise de Ciclo de Vida (ACV);
atividades humanas são as maiores responsáveis porém, tem sido questionada, e a tendência
pelo aquecimento global nos últimos 50 anos, pois europeia é a de alocar a esses resíduos parte do
a emissão de dióxido de carbono nas ações CO2 e outros impactos ambientais dos processos
antropogênicas é muito alta. A produção de industriais que os originaram (CHEN et al., 2010).
cimento contribui para aproximadamente 5% das
No Brasil, os teores de clínquer permitidos e suas
emissões de CO2 do mundo (SINDICATO...,
substituições estão normalizados (Tabela 1). Os
2010). Pela importância social que o cimento tipos de cimento que admitem maior teor de
possui e pela abundância geográfica de sua substituição são o CP III e o CP IV. Entretanto, é
matéria-prima, é produzido em praticamente todos
importante notar que as faixas de adição são
os países (WORRELL et al., 2001). É o material
bastante amplas. Segundo a norma, um CPII-E
industrializado mais consumido no mundo
pode ter menos clínquer do que um CPIII. A
(AGOPYAN; JOHN, 2011).
existência de faixas de variação do teor de clínquer
Entre os impactos ambientais do concreto, um dos é uma necessidade prática, uma vez que a indústria
mais importantes é certamente a emissão de CO2. cimenteira não controla o volume de oferta,
SegundoLima(2010), 88,6% a 92,2% das emissões tampouco a reatividade de adições ativas (escória e
do concreto originam-se na produção do cimento. cinza volante). Em momentos de grande
O transporte do concreto, mesmo em uma cidade crescimento da demanda de cimento, os teores de
como São Paulo, é responsável por em torno de substituição tendem a ser reduzidos, pois a
4% das emissões do concreto (SOUZA, 2012). produção do cimento aumenta mais rapidamente
que a de aço e energia por queima de carvão
A indústria cimenteira está mobilizada em mitigar
mineral. A disponibilidade de escória de alto-forno
as emissões de CO2 dos materiais cimentícios. A
para a produção brasileira de cimento no ano de
estratégia mais popular para a redução dos
impactos ambientais do concreto é a redução do 2012 atingiu aproximadamente 7,55x106 t
teor de clínquer no cimento.Em consequência, de (INSTITUTO..., 2013). Como a produção de
cimento foi de mais de 59x106 t em
uma forma geral, a estratégia utilizada pelos
2010(SINDICATO..., 2010), pode-se estimar que a
consumidores de cimento envolve a preferência
escória disponível para substituição de clínquer é
dos tipos de cimentos com menor teor de clínquer,
com base na hipótese de que as adições ativas, que de pouco mais de 10% do consumo anual de
são resíduos de outras cadeias produtivas, como as cimento brasileiro, ou próximo de 22% para a
região Sudeste. Também se estima que a oferta de
cinzas volantes, oriundas da queima de carvão
cinza volante não é capaz de suprir toda a demanda
mineral principalmente em termoelétricas, e a
da indústria cimenteira (HUMPHREYS;
escória de alto-forno, gerada na produção do ferro-
MAHASENAN, 2002).
gusa, chegam para a indústria cimenteira com
impacto ambiental nulo. Essa hipótese é uma das
Além da variação permitida de clínquer, as ligante (IL), definido como a massa de ligantes C
emissões da produção de cimento podem variar [kg](adições ativas, clínquer e sulfato de cálcio)
devido a diferenças entre processos produtivos de para produzir 1 m3 de concreto dividido pela
empresas e em uma mesma empresa ao longo do resistência fcj[MPa] do concreto aos 28 dias
tempo (CHEN et al., 2010). A eficiência dos (Equação 1).
fornos varia consideravelmente. Adicionalmente,
IL= C.fcj-1 Eq. 1
observa-se com frequência alteração dos tipos de
combustíveis utilizados (LIMA, 2010). Na média Os resultados estão apresentados na Figura 1.O
brasileira, os combustíveis são 40% do volume de filler calcário, presente em muitos cimentos, não é
CO2 liberado na produção do cimento (JOHN, computado como ligante (DAMINELI et al.,
2011;CEMENT..., 2009; SINDICATO..., 2010). 2010a). Os dados mostram uma significativa
Cada combustível tem uma intensidade de CO 2 dispersão na intensidade de ligantes. Por exemplo,
associada. As variações nos combustíveis para uma resistência média (de dosagem, fcj) de 20
utilizados podem ser importantes. MPa, o IL variou entre 10,5 e 22 kg.m-3.MPa-
1
. Isso significa que o teor de ligante variou entre
É também evidente que o impacto ambiental de
210 e 400kg/m³ de concreto. Como o cimento é
concretos e de outros produtos cimentícios cerca de 90% da pegada de CO2 do concreto, a
depende do impacto do cimento utilizado e do teor pegada deste varia na mesma proporção. Os
de cimento empregado. Existem significativas
resultados referem-se a concretos com diferentes
variações no teor de cimento para concretos com
comportamentos reológicos.
resistências à compressão e trabalhabilidade
similares, dependendo das condições de dosagem, Adicionalmente, a variabilidade do processo de
variabilidade do processo, e dos materiais produção do concreto aumenta a resistência de
empregados, inclusive a reatividade do cimento, as dosagem (fcj) em comparação coma resistência
propriedades físicas e mecânicas dos agregados e característica (fck) (JOHN, 2011), que se deve à
tipos e teor de aditivo empregado. A fração reativa necessidade de se projetar o concreto de resistência
presente no cimento também varia, pois o teor de média,o que garante que, mesmo com a
filler é variável, e a reatividade dos fillers, apesar variabilidade do processo produtivo, a resistência
de ser objeto de diversos estudos, é muito menor de projeto será sempre alcançada na prática. Isso
do que a do clínquer (LOTHENBACH et al., influencia o teor de cimento necessário à produção
2008; MENÉNDEZ; BONAVETTI; IRASSAR, de um concreto com determinado desempenho. A
2003).É possível mensurar o efeito desses fatores Equação 2 mostra a relação entre resistência de
analisando o estudo apresentado por Damineli et projeto e resistência média de dosagem, e dp é o
al. (2010a). Os autores analisaram concretos de 28 desvio padrão do processo de produção.
países utilizando um indicador, a intensidade de fcj = fck + 1.65 dp Eq. 2
Figura 1 - Variação da intensidade de ligantes para concretos plásticos de 28 países mais Brasil
30
Brasil
25
Internacional
20
ILrc (kg·m-3·MPa-1)
15
10
1.000 kg/m³
5
500 kg/m³
250 kg/m³
0
0 20 40 60 80 100 120 140
Tabela 2 - Emissão de CO2 (kgCO2/t) de empresas cimenteiras que participam do Cement Sustainability
Initiative, do WBCSD, e declaram publicamente suas emissões – dados de 2010 estimados para
diferentes tipos de cimento
Mínima Declarada (média) Máxima
Empresa 1 174,93 656 799,68
Empresa 2 187,68 597 857,98
Empresa 3 176,33 517 806,08
Para avaliar qual a influência do controle de nos cimentos e do consumo de cimento nos
qualidade adotado sobre o consumo de cimento, concretos. Assim, o resultado desse cruzamento de
foram selecionadas três resistências à compressão dados permite a geração de um cenário para
para fck (20, 30 e 40 MPa). Para cada uma delas, visualização e comparação rápida entre o potencial
foi calculada a resistência de dosagem fcj para de mitigação de CO2 para concretos de uma
desviospadrão de 3, 5 e 7 MPa. Considerando um resistência fixada, variando-se a seleção do
consumo de água médio fixo de 185 l/m3, a cimento e a variação do consumo de cimento com
variação da resistência mecânica é realizada a relação à eficiência do uso dos ligantes.
partir da variação do teor de cimento. Este foi
calculado utilizando-se uma curva de Abrams Resultados
experimental de um cimento CPV-40 (fcj =
12,073a/c-1,725R² = 0,9965). Influência da variação do teor de
clínquer para cimento
Combinação das variáveis
Os resultados da Figura 2 mostram que o tipo de
Cruzando os dados da variação do teor de clínquer cimento é um fator importante, mas não absoluto,
nos diferentes tipos de cimentos nacionais com a na definição das emissões de CO2. Um cimento
variação do consumo de cimento observada em CPIV, ou até mesmo um CPII-E, pode apresentar
literatura e na central de concreto estudada, é um teor menor de clínquer do que o cimento CPIII.
possível calcular as emissões de CO2 mínimas e Como a norma permite grandes faixas de teores de
máximas de concretos para cada faixa de clínquer, a melhor decisão somente pode ser
resistência e para cada tipo de cimento utilizado. tomada sabendo-se qual o teor de clínquer real
Para os cálculos aqui adotados, foi considerado o utilizado no cimento.
teor de emissões de CO2 por tonelada de clínquer
médio nacional (895,6 kg CO2/tonelada de Embora seja possível realizar estimativas
clínquer), calculado a partir do teor médio de laboratoriais do teor de clínquer, isso só será feito
clínquer e a emissão de CO2 do cimento. A adoção de forma prática quando for introduzida no
desse valor médio deveu-se ao fato de que a mercado a declaração ambiental de produto, na
variação das emissões do clínquer para as qual a empresa declara os impactos ambientais de
empresas pesquisadas é pequena, principalmente seus produtos.
quando comparada às variações do teor de clínquer
Figura 2- Emissão média brasileira de CO2 por teor de clínquer permitido por tipo de cimento e faixa de
emissão média das três empresas estudadas (em cinza)
900
800
700
Emissões de CO2 (kgCO2/t)
600
500
400
300
200 CPI CPV
CPII V CPII-Z
100 I CPII-E
CPII-F
0
0 20 40 60 80 100
Teor de clínquer (%)
A Figura 2 mostra a porcentagem de teor de construção. Talvez faça mais sentido selecionar a
clínquer no eixo horizontal e as emissões de CO2 empresa fornecedora de cimento por critérios
no eixo vertical. Para cada cimento a faixa de como sua matriz energética e eficiência energética
clínquer permitida em norma corresponde a uma do que pelo teor de clínquer médio de seus
faixa de emissões de CO2, com base no cálculo a cimentos, e ainda menos pelo tipo do cimento.
partir da média brasileira. A legenda em cores
abaixo mostra com mais clareza as diferentes Influência da variação do consumo de
faixas de teor de clínquer de cada cimento. Com cimento em concretos de mesmo fck
isso, observa-se a sobreposição de teor de clínquer
em diferentes cimentos. Os cimentos CPIII, CPIV A Figura 3 apresenta a faixa de variação e a
e CPII-E, por exemplo, podem ter o mesmo teor de mediana do ILrc (quantidade de ligante necessária
clínquer, o que corresponde à mesma emissão de para produzir uma unidade de resistência (MPa)
CO2. O mesmo acontece para determinada faixa aos 28 dias de idade) dos dados de literatura, de
dos cimentos CPIV, CPII-E e CPII-Z, e ainda acordo com variação do tipo de cimento utilizado
CPII-Z, CPII-E e CPII-F. A faixa cinza representa na mistura e a classe de resistência à compressão.
a variação das três empresas (valores da Tabela 2). Os dados utilizados para análise são nacionais, do
estudo de Damineli et al. (2010a). A discussão a
Há uma variação de 7% nas emissões entre as
seguir se concentra no valor mediano (que mostra
empresas estudadas para um mesmo teor de
a tendência geral) e o mínimo da faixa de variação,
clínquer. Espera-se que essa faixa deva ampliar
que demonstra o potencial do produto. O valor
significativamente se forem consideradas outras
máximo provavelmente revela apenas limitações
empresas do mercado brasileiro.
na qualidade dos materiais (agregados e aditivos
A análise cuidadosa da Figura 2 também utilizados, por exemplo) ou baixa eficiência do
demonstra que estimar o ganho ambiental de um processo de dosagem.
concreto baseando-se apenas na seleção do tipo de
Observa-se que o ILrc mediano e mínimo
cimento pode levar a erro. A limitação da oferta de
diminuem de acordo com o aumento da resistência.
escória e cinza volante pode causar aumento no
Isso é esperado, conforme analisado em Damineli
teor de clínquer em cimentos CPIII e CPIV,
et al. (2010a), já que os elevados teores de cimento
reconhecidos no mercado como tendo menor
nesses concretos acarretam altos teores de pasta, o
impacto ambiental. Uma alternativa para as
que permite que sejam misturados com baixas
empresas seria reduzir significativamente o teor de
relações a/c. Assim, a seleção de resistências de
adições no CPII-E e CPII-Z para valores muito
projeto maiores é uma estratégia que pode ser
baixos, liberando escória e cinza volante para os
adotada pelo usuário para aumentar a eficiência do
cimentos CPIII e CPIV. Esse cenário é aplicável
uso dos ligantes. Observa-se ainda tendência do
em casos nos quais não há indicação técnica de um
ILrc mínimo e mediano menores (maior eficiência)
cimento específico, que limite o tipo de cimento
de misturas feitas com CPV para todas as classes
que poderá ser utilizado.
de resistência. Quanto maior a classe de
Considerando que a oferta de escória nacional não resistência, maior a diferença entre o CPV e os
é regida pela demanda da indústria do cimento, e demais tipos de cimento. Porém, os dados de CPIII
sim pela produção do ferro-gusa, variações na atingiram valores de ILrc relativamente próximos
demanda de cimento são atendidas com variações aos do CPV. Entretanto, deve ser levado em conta
no teor de clínquer. Como exemplo, supõe-se que que o CPV possui maior pegada de CO2, como
ocorra forte aumento na demanda de um cimento será discutido no item Combinação das variáveis:
CPIII. Considerando que uma empresa já utilize teor de clínquer no cimento e eficiência de
toda a oferta de escória disponível, ela terá de dosagem do concreto.
optar por aumentar o teor de clínquer do cimento
A dispersão dos resultados dentro de cada barra do
CPIII ou diminuir o teor de escória em algum
gráfico deve-se, entre outros aspectos, à variação
outro cimento, para satisfazer o mercado.
nas técnicas de dosagem e materiais utilizados.
Assim, em cenários em que a indústria já utilize Para um mesmo tipo de cimento e uma mesma
todas as adições ativas residuais disponíveis, o tipo classe de resistência à compressão, os valores de
do cimento selecionado não será relevante para a ILrc – e, portanto, o consumo total de ligantes,
mitigação efetiva de CO2. Em outras palavras, a responsável diretamente pelo aumento ou
seleção do cimento pelo teor de clínquer não irá diminuição das emissões de CO2 – variaram
modificar o cenário das emissões brasileiras.Ao se consideravelmente. Para a faixa de resistência de
diminuir a emissão de um prédio, pode haver a 20 MPa e uso de CPV, por exemplo, houve
ilusão de diminuição da pegada de CO2 global. No variação de até 86% nos valores de ILrc, o que
entanto, essa redução será compensada em outra demonstra que a qualidade dos materiais agregados
Figura 3 - Desempenho do ILrc de acordo com a variação da classe de resistência e tipo de cimento
utilizado nas misturas A linha em preto dentro de cada barra de variabilidade é o valor mediano
encontrado em cada conjunto de dados
17
ILrc (kg.m-3.MPa-1)
15
13
11
5
CP IIF CP IIE CP III CP V CP IIF CP IIE CP III CP IV CP V CP IIF CP IIE CP III CP V
Tipo de cimento
Figura 4 - Desempenho do ILrc de acordo com a variação da classe de resistência, o tipo de cimento e a
fonte de dados (LIT - literatura ou CONCR - central de concreto). A linha horizontal apresenta o
consumo mínimo estabelecido pela norma
20
19 20 MPa 30 MPa 40 MPa
18
17
ILrc (kg.m-3.MPa-1)
16
15
14
13
12
11
10
9
8
7
6
5
LIT
LIT
CONCR
LIT
CONCR
LIT
CONCR
CONCR
LIT
CONCR
LIT
CONCR
1,1
1,08
cimento
1,06
1,04
1,02
0,98
2 3 4 5 6 7 8
Desvio padrão
O menor desvio descrito na norma técnica NBR Combinação das variáveis: teor de
12655é 4 Mpa (ABNT, 1996). Porém, na presente clínquer no cimento e eficiência de
análise, o desviopadrão de 3 MPa foi adotado
porque nas centrais de concreto o processo é dosagem do concreto
bastante controlado, o que permite o uso de um As Figuras 6 a 7 apresentam a variação das
menor desvio padrão, desde que seja superior a 2 emissões de CO2 por metro cúbico de concreto em
MPa. Considerando-se um aumento deste desvio função da seleção do cimento e da eficiência da
para 5 e para 7 MPa, observa-se na Figura 5 o dosagem no que diz respeito ao uso dos ligantes.
aumento do consumo de cimento necessário para Cada figura apresenta os resultados para
que as misturas com maior desviopadrão (portanto, determinada resistência à compressão. Os dados
menor controle tecnológico) atinjam a resistência utilizados para análise são resultado de diferentes
requerida. Quanto menor a resistência do concreto, combinações dos dados de centrais de concreto de
maior a influência do desviopadrão no consumo de Damineliet al. (2010b), considerando os teores de
cimento, já que, proporcionalmente, a diferença clínquer permitidos nas normas brasileiras.
entre a resistência média (fcj) e a característica
(fck) se torna gradativamente maior. Dessa forma, Observa-se que, por causa da grande variabilidade
considerando-se o pior caso (resistência de 20 MPa da eficiência do uso dos ligantes – expressa pela
e desviopadrão de 7 MPa), o aumento do consumo variação do consumo de cimento para obtenção de
de cimento chega a, no máximo, 13% com relação concretos de mesma resistência –, o uso de
ao mesmo concreto com desviopadrão baixo (3 cimentos com menor teor de substituição de
MPa). O aumento do consumo de cimento diminui clínquer pode gerar concretos com emissões de
gradativamente à medida que se aumenta a CO2 menores do que cimentos que teoricamente
resistência característica de projeto e se diminui o seriam mais “ecológicos”, por permitirem maior
desviopadrão. Em um cenário mediano, com teor de substituição. Isso demonstra que a simples
resistência de 30 MPa e desvio de 5 MPa, esse seleção do cimento, apesar de ser uma estratégia
aumento do consumo de cimento não passa de 4%. reconhecida até mesmo por certificações
Vale lembrar que o desvio padrão de uma central ambientais, pode não significar um ganho real em
não é constante. termos de emissões caso o cimento não seja bem
utilizado. Dessa forma, sugere-se que todas as
Embora os números devam variar em função da certificações e estratégias de redução de emissões
curva de Abrams e de diferentes conjuntos de através da seleção de cimentos devam ser
materiais, esta variável tem menor importância do acompanhadas de parâmetros mínimos de
que a eficiência do conjunto materiais e dosagem, eficiência do uso desses cimentos para que o ganho
discutida anteriormente. Essas conclusões seja real.
precisam ser confirmadas com uma análise mais
abrangente.
ILrc (kg.m-3.MPa-1)
10,0 15,0 20,0 25,0
450 22,5
Emissões de CO2 (kg CO2/m3 concreto)
400 20,0
350 17,5
ICrc (kg.m-3.MPa-1)
300 15,0
CP V CP II-F
250 12,5
150 7,5
50 2,5
0 0,0
200 250 300 350 400 450 500 550
Consumo de cimento (kg/m3)
12
350
CP II-F
300 CP V 10
ICrc (kg.m-3.MPa-1)
250
8
CP II-E
200
6
150
CP III 4
100
2
50
0 0
200 250 300 350 400 450 500 550
Consumo de cimento (kg/m3)
400 CP II-F 10
350
CP V 8
ICrc (kg.m-3.MPa-1)
300
CP II-E
250 6
200
150 4
CP III
100
2
50
0 0
200 250 300 350 400 450 500 550
Consumo de cimento (kg/m3)
O caso do CP II-E e do CP III é ainda mais proximidade das regiões produtoras de escória,
complicado. Apesar de o CPIII ser considerado possibilita minimizar a emissão de CO2 pelo
sempre o cimento mais ecoeficiente do mercado transporte, o máximo de substituição não
nacional, por apresentar os maiores percentuais de ultrapassa 23%, ou seja, dificilmente o cimento
substituição de clínquer, nota-se que, mesmo sob CPIII terá teor de substituição muito elevado,
uma mesma eficiência de dosagem (mesmo mesmo que seja utilizado somente nas regiões
consumo de cimento), pode haver maior eficiência próximas à produção de escória. A tendência,
ambiental do CPII-E com relação ao CPIII, já que segundo Damineli e John (2012), é a diminuição
o teor máximo de substituição possível daquele do uso de carvão em termoelétricas, o que diminui
cimento é maior do que o teor mínimo de a disponibilidade de escória. Da mesma forma, a
substituição do CPIII. Na prática, este é um estimativa da produção de cinza volante
cenário pouco provável, mas demonstra a (HUMPHREYS; MAHASENAN, 2002) não é
insuficiência da informação que o tipo de cimento suficiente para sustentar o máximo de adição
proporciona. Considerando-se que ambos se possível nos cimentos.
utilizam da mesma adição mineral para ser
O aumento da demanda de cimento dos últimos
produzidos (escória de alto-forno), essa
anos não vem sendo acompanhado de um aumento
constatação é extremamente relevante. De acordo
na produção do ferro-gusa e de escória, o que
com a demanda de produto e a oferta dos resíduos,
resulta na necessidade de aumento da produção de
pode-se facilmente transformar um cimento CPII- clínquer. Diante desse cenário, quanto maior a
E em um CPIII, sem modificação alguma na demanda de cimento, maior será o teor de clínquer
proporção clínquer-escória de alto-forno. Ao
do cimento brasileiro, dado que as adições estão
receber, assim, esse cimento o rótulo de CPIII,
maximizadas. Assim, em termos de impacto
sugere-se maior compromisso com aspectos de
global, não importa muito qual o tipo de cimento
sustentabilidade.
utilizado em um empreendimento em especial:
Apesar de baixo se comparado aos teores caso este opte por um CPIII para ser considerado
permitidos por norma, esse teor é ainda alto perto mais sustentável, estará, em verdade, relegando
da média mundial, que dificilmente ultrapassa os aos empreendimentos vizinhos o rótulo de
10% (DAMINELI; JOHN, 2012). Se somente 10% poluidores, pois não haverá escória suficiente para
do teor de cimento pode ser substituído por escória todos. Em outras palavras, por mais que um
de alto-forno no Brasil, fica claro que a empreendimento se esforce por utilizar cimentos
substituição máxima permitida por norma para o de menor impacto ambiental, a oferta de adições
CPIII, na prática, não ocorre. Se a escória for minerais, muito aquém das porcentagens possíveis
utilizada somente na região Sudeste, que, pela por norma, sempre fará com que a soma final do
impacto nacional seja o mesmo, no caso da determinada obra ou concreteira, haverá aumento
demanda nacional de cimento anual ser estável. Se máximo de 13% no consumo total de cimento.
a demanda de cimento aumentar, o impacto
Quanto às variações do consumo de cimento
aumentará, independentemente do tipo de cimento.
relacionadas ao processo de dosagem do concreto,
Isso faz com que as análises das Figuras 6 a 8
os números levantados, ainda que sobre dados de
sejam muito importantes, pois, aliando-as ao
apenas uma central de concreto, demonstram
conceito de disponibilidade nacional de escória, potencial grandioso para a melhora – ou piora – da
percebe-se que os teores mínimos de emissões de eficiência do uso dos ligantes. Dependendo da
CO2 por metro cúbico de concreto encontrados no
resistência de projeto e do tipo de cimento, as
gráfico são irreais em um contexto global; neste, as
variações no ILrc chegaram a até 86% para uma
emissões reais tendem a algo próximo das médias
mesma fonte, no caso, dados da literatura.
– ou máximos – para cada classe de cimento. Incluindo nessa variação os dados da central de
Dessa forma, confirma-se a importância da correta concreto, que apresentaram eficiência de dosagem
dosagem dos concretos tendo em vista o aumento
significativamente melhor, esse número ultrapassa
da eficiência do uso dos ligantes, já que, avaliando
os 100%, o que significa dizer que, para as
as emissões dos concretos nas proximidades
tecnologias usuais de dosagem, há concretos que
superiores dos quadrantes confeccionados para
utilizam mais do que o dobro de teor de ligantes do
cada cimento, a variação do consumo de cimento que outros de mesma resistência e tipo de cimento
passa a ter relevância muito superior a todas as para ser produzidos – a eficiência de dosagem é
outras variáveis neste artigo estudadas.
menos da metade.Ainda deve ser considerado o
efeito da dosagem na durabilidade. A influência do
Conclusões teor de cimento na durabilidade não é abordada
neste artigo e deve ser levada em consideração.
A determinação dos critérios de dosagem, embora
regidos, prioritariamente por fatores técnicos e Dessa forma, demonstra-se o grande potencial da
econômicos, também pode ser pensada sob o ponto melhoria dos processos de dosagem na mitigação
de vista ambiental, desde que os fatores prioritários das emissões de CO2 da cadeia do concreto. Esse
sejam respeitados. potencial é significativamente maior do que o
potencial de reduções trazido pelas outras duas
Devido à limitação da disponibilidade de adições
estratégias aqui estudadas.
para abastecimento do mercado de cimento
brasileiro, tanto por fatores geográficos que Também se conclui, em termos gerais, que não é
inviabilizem seu transporte quanto pela limitação apropriado fundamentar as decisões acerca das
de que sua produção não seja regida pela demanda emissões do concreto baseando-se apenas na
de cimento, variações na demanda de cimento resistência e no tipo de cimento utilizado, pois as
implicam variações na demanda de clínquer, que é variações são significativas. Através de uma
o grande responsável pelos altos índices de Análise de Ciclo de Vida, por exemplo, é possível
emissões de CO2 do material. Se a demanda chegar à emissão específica de um concreto. Para
aumenta, a produção de clínquer aumenta, e o teor os cimentos, especialmente o cimento CPIII, faixas
de adições no clínquer diminui, dentro das menores de teor de clínquer – ou melhor, o teor
extensas faixas permitidas pelas normas técnicas. específico de clínquer do cimento – podem trazer
O aumento do teor de adições em um tipo de grandes benefícios para auxiliar a escolha pelo
cimento também pode ser realizado às custas da cimento com menores emissões.
redução do teor de adições em outro tipo (por
exemplo, o CPIIE e o CPIII utilizam exatamente a Referências
mesma adição, a escória de alto-forno, apenas com
variação na faixa total de substituição possível). AGOPYAN, V.; JOHN, V. M. O Desafio da
Assim, devido à extensão dessas faixas, um CPIII Sustentabilidade na Construção Civil. São
pode conter teores de escória muito próximos de Paulo: Edgard Blücher, 2011.
um CPIIE, por exemplo. Isso, aliado ao fato de que ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS
o teor de escória é fixo, faz com que a seleção de TÉCNICAS. NBR 5735: cimento Portland de alto-
um CPIII em detrimento de um CPIIE não seja forno. Rio de Janeiro, 1991a.
uma ação tão importante do ponto de vista
ambiental global; seu benefício em termos de ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS
certificação ambiental é superestimado. TÉCNICAS. NBR 5733: cimento Portland de alta
resistência inicial.Rio de Janeiro, 1991b.
Também foi visto que, com relação ao controle de
qualidade do processo produtivo do concreto,
sendo desconhecido o desvio padrão específico de
Vahan Agopyan
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