Felizmente não tenho filhos em idade de prestar vestibular. Se tivesse, ficaria alarmado com o que li no caderno especial que a Folha publicou na sexta-feira passada, sobre os 16 "melhores" colégios de São Paulo. Ponho aspas em "melhores", mas não é que os considere necessariamente ruins; é provável que sejam "bons" colégios em muitos aspectos. O problema está no critério de avaliação. O caderno destacava os "campeões de vestibular". Ou seja, os colégios que contam com maior número de alunos aprovados nos cursos mais difíceis da USP. Escusado dizer que, dos 16 colégios, só três eram públicos e gratuitos. Esse assunto eu deixo para o final do artigo. O fato é que, a cada página que eu ia lendo, crescia a minha impressão de estar diante de um verdadeiro pesadelo educacional. Dou alguns exemplos. Um dos colégios recordistas em aprovação na USP tem como característica "estimular a hiperconcorrência" entre os alunos. As classes são divididas segundo o desempenho dos estudantes. Um deles, vitorioso "treineiro" em vestibulares, diz: "Se eu caio um décimo de ponto, já me olham esquisito". Em outro colégio, os alunos fazem prova quatro vezes por semana. Seu diretor explica o método com meridiana clareza: "Todo mundo diz que só estuda em véspera de prova; pois aqui tem de estudar todo dia". Arrisco-me a perguntar se, com tantas provas, o horário dedicado às aulas não diminui... A observação tem certo espírito sofístico, mas em todo caso me parece verdade que, num ensino tão preocupado com o desempenho em provas objetivas, é natural que vá desaparecendo o espaço dedicado à discussão, ao pensamento independente. E cresce para os alunos a obrigação de regurgitar no papel o que lhes foi enfiado pelos ouvidos na véspera. A monstruosidade do sistema se revela a cada reportagem do caderno. Determinado estabelecimento de ensino tem salas com capacidade para até 600 alunos, com baias individuais, disponíveis até as 22h, para que os alunos se exercitem. Qualquer semelhança com a criação de gado confinado fica por conta da imaginação deste articulista. Mas até que esse colégio tem um mérito; não desliga o aluno que repetiu de ano. Outras instituições de ensino "top" adotam essa política. Imagino que considerem mais importante manter os altos escores de sucesso do colégio do que dedicar atenção individual ao aluno que não se adapta à linha de montagem. Sim, porque os próprios colégios estão entregues a um mecanismo concorrencial destrutivo e perverso. Basta ver seus gastos em publicidade, mostrando quantos jovens prodígios "emplacaram" na Politécnica ou na Medicina. Uma escola, aliás, dá prêmio em dinheiro aos alunos que entrarem no ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica). A seguir essa tendência, logo alguém vai ter a idéia de contratar vestibulandos profissionais, que melhorem as estatísticas de aprovação do colégio X ou Y. Nunca fui bom em matemática, mas é óbvio que, se 10% dos aprovados numa Fonte: Folha de São Paulo, Maio de 2005 Fonte: Folha de São Paulo, Maio de 2005