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1. Tridimensionalismo jurídico.
Cumpre ponderar que os elementos que compõem o Direito se relacionam entre si através
de uma dialética de complementaridade, exigindo uma direção diversa da pesquisa, para
captar o sentido dominante de cada momento da juridicidade.
O Direito é, pois, sempre tridimensional, qualquer que seja seu objeto de indagação, o que
importa na necessidade de um tridimencionalismo ao mesmo tempo específico e dinâmico
– conforme concordaram comigo, a final Recasens Siches e tantos outros.
Dizemos então que a Teoria Tridimensional do Direito tem como pressuposto a conexão
necessária entre fato, valor e norma. Conforme a interpretação tridimensional do Direito, “a norma
não está sozinha, mas convive na dimensão de um relacionamento dialético com fatos e com
valores”.2
*
Doutor em Direito. Professor e pesquisador do Centro Universitário de Volta Redonda - UniFOA.
1
REALE, Miguel. Variações sobre a estrutura do Direito. http://www.miguelreale.com.br/artigos/varestdir.htm.
Acesso em 24, 05, 2010.
2
CAFFÉ ALVES, Alaôr et al. O que é a filosofia do direito? Barueri, SP: Manole, 2004, (Introdução).
2
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Outra observação, ao menos importante, é a de que a norma não é uma proposição derivada
diretamente do fato. Ela é um produto humano que resulta do cotejo: Fato jurídico - Conduta
humana – Valores – Utilidade. Nesse sentido, a norma jurídica resulta de uma valoração humana
que tem como objeto o fato ou a conduta. A norma jurídica tem como finalidade a exigência do
respeito e da obediência social para a realização de valores. Diz-se assim, de um instrumento (ou
veículo) para a realização de valores.
3. Concepções tridimensionalistas.
Conforme vimos, para o tridimensionalismo o Direito não deve ser compreendido como
um conjunto de normas isoladas dos fatos e dos valores. Em verdade, segundo penso, a construção
da norma (ordem normativa) resulta de um processo que se inicia da observação do fato jurídico
tanto voluntário (a conduta humana) como involuntário (simples fato não humano), primeira
etapa, passa por uma qualificação do fato por meio da necessária invocação de valores, segunda
etapa, e termina com a prescrição, terceira etapa.
Todavia, acerca do assunto Miguel Reale4 especifica que há uma teoria tridimensional
jurídica genérica e outras específica, só cabendo à segunda a qualificação de teoria, por não se
limitar ao exame de problemas metodológicos. A afirmação de que o Direito é tridimensional,
continua o nosso autor, surgiu, primeiro, como verificação do que, ao se expor os princípios gerais
do Direito, seguia-se sempre uma divisão didática, no sentido de estudo da matéria dividindo-a
segundo os três pontos de vista do fato, do conceito e do valor. Enquanto predominou o
positivismo jurídico, predominou o estudo do Direito como fato social, tendo sentido
complementar ou secundário a análise de seus aspectos lógico e valorativo.
3
REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 511.
4
REALE, Miguel. Variações sobre a estrutura do Direito. http://www.miguelreale.com.br/artigos/varestdir.htm.
Acesso em 24, 05, 2010.
3
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Tratemos agora da tridimensionalidade genérica. Diz-se de um tridimensionalismo de tipo
enciclopédico, isto é, que abrange todo o saber jurídico.
A teoria tridimensional genérica, afirma Miguel Reale5, foi seguida por vários autores,
como Carlos Cossio, Garcia Maynez e Recasens Siches. Segundo essa diretriz, o Direito pode, em
suma, ser estudado seguindo três pontos de vista distintos, o fato, o valor e a norma. A bem, ver, o
Direito não era considerado sempre e unicamente tridimensional, mas dava lugar a três vertentes
distintas de pesquisa, a saber, a Sociologia Jurídica, que estudaria o Direito como fato social; a
axiologia ou o Direito Natural, isto é, o direito como valor ideal, e a Ciência do Direito como
estudo normativo da experiência jurídica.
Assim, Bobbio caracteriza, em tese, o direito como objeto de três ciências distintas: quanto
a sua formação e evolução, isto é, quanto à eficácia a que correspondem os problemas de
observância, aplicação efetiva e sanção da norma jurídica (sociologia do direito); quanto a sua
estrutura formal, a que corresponde a questão da validez, ou seja, aos problemas de existência da
norma jurídica (jurisprudência ou ciência formal do direito), independentemente do juízo de valor
que sobre ela se possa emitir; e, finalmente, quanto ao seu valor ao qual correspondem os
problemas ideais de justiça ou injustiça da norma jurídica (filosofia do direito). Isto supõe, na
opinião do jusfilósofo brasileiro Miguel Reale, a simples generalização empírica das múltiplas
facetas do direito e não a expressão da dialética de implicação e polaridade recíproca entre aqueles
aspectos, ao eleva-los à categoria de “dimensões” de um mesmo fenômeno.8
5
REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 512. Veja-se, igualmente, REALE,
Miguel. Variações sobre a estrutura do Direito. http://www.miguelreale.com.br/artigos/varestdir.htm. Acesso em 24,
05, 2010.
6
REALE, Miguel. Variações sobre a estrutura do Direito. http://www.miguelreale.com.br/artigos/varestdir.htm.
Acesso em 24, 05, 2010.
7
BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurídica. Trad. Fernando Pavan Baptista e Ariani Bueno Sudatti. Apresentação
Alaôr Caffé Alves. Bauru, SP: EDIPRO, 2001, p. 13.
8
BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurídica. Trad. Fernando Pavan Baptista e Ariani Bueno Sudatti. Apresentação
Alaôr Caffé Alves. Bauru, SP: EDIPRO, 2001, p. 13.
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Professor de Filosofia do Direito e de Filosofia Política em várias Universidades:
Universidade de Siena, Universidade de Pádua, Universidade de Turim. Sua dedicação e amor pelo
Direito, pela Filosofia, pela Política e pela História permitira a produção e publicação de obras,
hoje consideradas fontes importantes para a pesquisa e a análise do Direito com base numa visão
integral.
Todavia, como resultado da leitura da suas obras, pode-se indicar uma contribuição
metodológica importante para o Direito contemporâneo, centrada na análise de procedimentos
lógicos e argumentativos, recursos importantes para a interpretação e a aplicação do Direito.
Suas obras ficaram cada vez mais conhecidas em todo o mundo deixando uma valiosa
caracterização das diferenças entre o jusnaturalismo e o positivismo jurídico e entre a ética e a
política.
Talvez, “por procurar combinar os três pontos de vista unilaterais e, mais precisamente, os
resultados decorrentes de estudos levados a cabo separadamente” 9, Norberto Bobbio foi
qualificado de tridimensionalista genérico do Direito.
9
REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 514.
10
REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 514.
5
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decomponível; pelo reconhecimento, em suma, de que é logicamente inadmissível qualquer
pesquisa sobre o Direito que não implique a consideração concomitante daqueles três fatores. A
tridimensionalidade específica do Direito resulta de uma apreciação inicial da correlação existente
entre fato, valor e norma no interior de um processo de integração, de modo a abranger, em
unidade viva, os problemas do fundamento, da vigência e da eficácia do Direito, com
conseqüências relevantes no que se refere aos problemas básicos das fontes do direito, dos
modelos jurídicos e da hermenêutica jurídica.11
Miguel Reale (1910 - 2006) foi um intelectual de excelência: professor, filósofo, jurista,
poeta e idealizador de um modelo tridimensional (específico e dialético) que serviria para indicar a
conexão inevitável entre três dos fatores determinante do trabalho do jurista, a saber, o fato, o
valor e a norma. Surgiu assim, em 1968, uma Teoria Tridimensional por meio da qual se
caracterizou um estruturalismo jurídico, abordando os aspectos elementares e basilares do Direito.
Contudo, o caráter normativo do direito, que outrora motivou outras tantas teorias e
concepções, a saber, o “Direito como conjunto de normas”, “Teoria do Ordenamento Jurídico”,
“Teoria da Norma Jurídica”, estaria fatalmente conectado, também, a seu aspecto fático e
valorativo (axiológico).
Assim, o nosso autor supera o pensamento reducionista e analítico vigorante no século XIX
que procurava indicar a unidade, a validade e a coerência normativa como únicos problemas dos
juristas, ficando esquecidos outros tantos problemas sociais e históricos, que assentados no
contexto da realidade jurídica, também preocupam o jurista.
11
REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 513, 515.
12
REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 194.
6
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Outro esclarecimento ainda se torna necessário: o formalismo lógico-normativo, em
extremo, imputa falho o sociologismo, por ignorar o fundamento pelo qual a realidade deve ser
ordenada normativamente. Já o sociologismo declara o defeito de um formalismo lógico-
normativo que apresenta um Direito morto.
Em síntese: o tridimensionalismo veio para cessar essa disputa. Ora, apresentado as três
dimensões sobre as quais pensamos também se assentam a cientificidade jurídica (para uma quarta
dimensão ou dimensão científica) e o caráter discursivo (para uma quinta dimensão: dimensão
discursiva) do Direito.
De acordo com a Teoria Tridimensional do Direito o campo dos estudos jurídicos está
interligado à organização jurídica (ordem e instituições jurídica), à evolução legislativa e expressão
teórico-doutrinária. Dessa forma, os estudos jurídicos poderão versar sobre a parte teórico-
sistemática do direito: sistemas jurídicos, institutos, normas (sobre uma questão protegida e
resolvida por regras jurídicas), sobre a crítica teórica e doutrinária, ou ainda, sobre determinados
fenômenos que estão vinculados ao direito.
Para Miguel Reale é impossível lidar com a experiência jurídica sem lidar simultaneamente
com os fatos sociais, com os valores e com as normas. Assim, fatos, valores e normas são partes
integrantes da experiência jurídica. A interdependência existente entre eles permite pensar o
Direito, seja pelo ângulo interno, seja pelo ângulo externo. Em outras palavras, permite lidar com o
Direito como um sistema independente, estudando as normas e sua inserção no ordenamento
(ângulo interno), sem descurar que é um sistema dependente dos fatos sociais e dos valores
(ângulo externo). O tridimensionalismo, como uma Filosofia do Direito, baseada na experiência
jurídica, contribui para dar um status epistemológico aos procedimentos intelectuais de que se vale
o jurista para comprovar, aplicar e conciliar normas de Direito Positivo2.
O Direito, assim, deveria ser estudado com base numa unidade, constituída pela conexão
existente entre as normas, os fatos e os valores. Diz-se de uma orientação que exige do jurista
teórico e prático uma compreensão integral do fenômeno jurídico, evitando-se, desta forma, o
parcelamento, isto é, a fragmentação do Direito. A verdade é que a fragmentação do Direito reduz
sua metodologia a um mero capítulo da Lógica, da Sociologia, da Psicologia ou da Filosofia
Moral.
Resta-nos ainda tratar dos critérios para a crítica jurídica fornecidos pelo
tridimensionalismo jurídico. Eis que o tridimensionalismo, como vimos, coloca em evidencia a
conexão, talvez dialética entre norma, fato e valor. Nesta dialeticidade, o valor se torna o elo
mediador e principal que comunica o fato à norma.
Imaginemos, pois a seguinte situação: (a) eis um comportamento (conduta) “X”; (b) “X”,
de fato, é um comportamento antijurídico e socialmente perigoso: um comportamento socialmente
perigoso deve ser proibido. Logo, (c) é proibido “X”. Observe-se que tais são juízos, a saber, juízo
de fato (a), juízo de valor (b) e juízo prescritivo (c) justificam a prática do Direito, isto é, os
processos de criação (processo legislativo), de interpretativo (a hermenêutica jurídica), e de
aplicação da norma jurídica. Ora, tais juízos e processos são objetos e a razão da atividade
científica e discursiva do Direito.
Quanto a este aspecto a realidade jurídica não necessariamente se define pelos pressupostos
propostos pelo jusnaturalismo clássico, medieval e moderno. Tampouco o positivismo jurídico
seria capaz de abordar integralmente a realidade jurídica por privilegiar a razão de utilidade e não
necessariamente a justiça. Os realistas tornariam o fato jurídico em um elemento primário do
Direito centrando seu esforço na Sociologia Jurídica (Sociologismo Jurídico).
Neste ponto julgamos conveniente destacar que o estruturalismo jurídico proposto pelo
tridimensionalismo tanto genérico com específico é de total utilidade prática, porém orienta
parcialmente o trabalho metodológico. Trata-se de uma teoria que facilita a compreensão da
comunicação da dimensão fática, valorativa e normativa, e que nos alerta acerca da dialeticidade
dos problemas fenomenológico, axiológico e lógico, possibilitando, assim uma análise integral e
não fragmentada do Direito.
Segundo o ponto de vista anterior, a crítica jurídica há de estar fundada na relação dialética
entre esses elementos ou dimensões do Direito. Aqui a metodologia nos autoriza a indagar as
razoes da existência das normas e seus diversos problemas: validade, coerência, completude,
eficácia, justiça etc. Abre-se, desta forma um leque maior de possibilidades para o estudo de outras
importantes dimensões, a saber, científica e discursiva do Direito que, direta ou indiretamente
incidem na atividade prática do jurista.
Deve-se ver o tridimensionalismo como uma teoria que coopera para o estudo dos
problemas histórico-culturais do Direito. Talvez a falha do tridimensionalismo esteja na concepção
do Direito como um “fato histórico-cultural”, ou melhor, como um fenômeno histórico-cultural
assentado numa realidade (dialética) limitada á relação das três dimensões aqui estudadas. Trata-
se, pois, de uma concepção estruturalista do Direito hodiernamente superada pela concepção
funcionalista do Direito a ser explicada em próximo tema (Tema 10 Para uma Compreensão
Moderna do Direito).
Questões:
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1- Signifique o tridimensionalismo jurídico.