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Informativo 891-STF
Márcio André Lopes Cavalcante
Processos excluídos deste informativo pelo fato de não terem sido ainda concluídos em virtude de pedidos de vista ou
de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: ADC 42/DF; HC 144717/RS.
ÍNDICE
DIREITO PENAL
CRIME DO ART. 89 DA LEI DE LICITAÇÕES
Elemento subjetivo.
Exige-se descumprimento de formalidades mais violação aos princípios da administração pública.
Decisão amparada em pareceres técnicos e jurídicos.
HABEAS CORPUS
É possível a impetração de habeas corpus coletivo.
DIREITO PENAL
Importante!!!
Elemento subjetivo
Para a configuração da tipicidade subjetiva do crime previsto no art. 89 da Lei 8.666/93, exige-
se o especial fim de agir, consistente na intenção específica de lesar o erário ou obter vantagem
indevida.
Assim, para que ocorra o crime, é necessária uma ofensa ao bem jurídico tutelado, que é o
procedimento licitatório. Sem isso, não há tipicidade material.
OBRIGATORIEDADE DE LICITAÇÃO
Regra: obrigatoriedade de licitação
Como regra, a CF/88 impõe que a Administração Pública somente pode contratar obras, serviços, compras
e alienações se realizar uma licitação prévia para escolher o contratante (art. 37, XXI).
Resumindo:
A regra na Administração Pública é a contratação precedida de licitação. Contudo, a legislação poderá
prever casos excepcionais em que será possível a contratação direta sem licitação.
CONTRATAÇÃO DIRETA
A Lei de Licitações e Contratos prevê três grupos de situações em que a contratação ocorrerá sem licitação
prévia. Trata-se das chamadas licitações dispensadas, dispensáveis e inexigíveis. Vejamos o quadro
comparativo abaixo:
há impossibilidade jurídica de
competição.
Ex.: quando a Administração Ex.: compras de até R$ 8 mil. Ex.: contratação de artista
Pública possui uma dívida com o consagrado pela crítica
particular e, em vez de pagá-la especializada ou pela opinião
em espécie, transfere a ele um pública para fazer o show do
bem público desafetado, como aniversário da cidade.
forma de quitação do débito. A
isso chamamos de dação em
pagamento (art. 17, I, "a").
Procedimento de justificação
Mesmo nas hipóteses em que a legislação permite a contratação direta, é necessário que o administrador
público observe algumas formalidades e instaure um processo administrativo de justificação.
CRIME DO ART. 89
Tipo objetivo
O crime do art. 89 da Lei nº 8.666/93 ocorre se o administrador público...
• dispensar a licitação fora das hipóteses previstas em lei;
• inexigir (deixar de exigir) licitação fora das hipóteses previstas em lei; ou
• deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade (as formalidades estão
previstas especialmente no art. 26 da Lei).
Desse modo, haverá o crime tanto na hipótese em que a licitação é dispensada mesmo sem lei autorizando
ou determinando a dispensa, como na situação em que a lei até autoriza ou determina, mas o
administrador não observa os requisitos formais para tanto.
Tipo subjetivo
Para a configuração da tipicidade subjetiva do crime previsto no art. 89 da Lei 8.666/93, exige-se o especial
fim de agir, consistente na intenção específica de lesar o erário ou obter vantagem indevida. Esse
entendimento é pacífico na jurisprudência do STF e STJ:
Para a caracterização da conduta tipificada no art. 89 da Lei 8.666/1993, é indispensável a demonstração,
já na fase de recebimento da denúncia, do elemento subjetivo consistente na intenção de causar dano ao
erário ou obter vantagem indevida.
STF. 2ª Turma. Inq 3965, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 22/11/2016.
O delito em questão exige, além do dolo genérico (representado pela vontade consciente de dispensar ou
inexigir licitação com descumprimento das formalidades), a presença do especial fim de agir, que consiste
no dolo específico de causar dano ao erário ou de gerar o enriquecimento ilícito dos agentes envolvidos
na empreitada criminosa.
• Dolo genérico: vontade de dispensar ou inexigir licitação com descumprimento das formalidades;
• Especial fim de agir (“dolo específico”): intenção de causar dano ao erário ou de gerar o enriquecimento
ilícito dos agentes envolvidos na empreitada criminosa.
PRISÃO PREVENTIVA
Prisão domiciliar para gestantes, puérperas, mães de crianças e mães de pessoas com deficiência
Importante!!!
O STF reconheceu a existência de inúmeras mulheres grávidas e mães de crianças que estavam
cumprindo prisão preventiva em situação degradante, privadas de cuidados médicos pré-
natais e pós-parto. Além disso, não havia berçários e creches para seus filhos.
Também se reconheceu a existência, no Poder Judiciário, de uma “cultura do
encarceramento”, que significa a imposição exagerada e irrazoável de prisões provisórias a
mulheres pobres e vulneráveis, em decorrência de excessos na interpretação e aplicação da
lei penal e processual penal, mesmo diante da existência de outras soluções, de caráter
humanitário, abrigadas no ordenamento jurídico vigente.
A Corte admitiu que o Estado brasileiro não tem condições de garantir cuidados mínimos
relativos à maternidade, até mesmo às mulheres que não estão em situação prisional.
Diversos documentos internacionais preveem que devem ser adotadas alternativas penais ao
encarceramento, principalmente para as hipóteses em que ainda não haja decisão
condenatória transitada em julgado. É o caso, por exemplo, das Regras de Bangkok.
Os cuidados com a mulher presa não se direcionam apenas a ela, mas igualmente aos seus
filhos, os quais sofrem injustamente as consequências da prisão, em flagrante contrariedade
ao art. 227 da Constituição, cujo teor determina que se dê prioridade absoluta à concretização
dos direitos das crianças e adolescentes.
Diante da existência desse quadro, deve-se dar estrito cumprimento do Estatuto da Primeira
Infância (Lei 13.257/2016), em especial da nova redação por ele conferida ao art. 318, IV e V,
do CPP, que prevê:
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:
IV - gestante;
V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;
Os critérios para a substituição de que tratam esses incisos devem ser os seguintes:
REGRA. Em regra, deve ser concedida prisão domiciliar para todas as mulheres presas que
sejam
- gestantes
- puérperas (que deram à luz há pouco tempo)
- mães de crianças (isto é, mães de menores até 12 anos incompletos) ou
- mães de pessoas com deficiência.
EXCEÇÕES:
Não deve ser autorizada a prisão domiciliar se:
1) a mulher tiver praticado crime mediante violência ou grave ameaça;
2) a mulher tiver praticado crime contra seus descendentes (filhos e/ou netos);
3) em outras situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas
pelos juízes que denegarem o benefício.
Obs1: o raciocínio acima explicado vale também para adolescentes que tenham praticado atos
infracionais.
Obs2: a regra e as exceções acima explicadas também valem para a reincidente. O simples fato
de que a mulher ser reincidente não faz com que ela perca o direito à prisão domiciliar.
STF. 2ª Turma. HC 143641/SP. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/2/2018 (Info 891).
PRISÃO DOMICILIAR
Prisão domiciliar do CPP x Prisão domiciliar da LEP
O tema “prisão domiciliar” é tratado tanto no CPP como na LEP, tratando-se, contudo, de institutos
diferentes, conforme se passa a demonstrar:
IV — gestante; IV — gestante.
As hipóteses em que a prisão domiciliar é permitida estão elencadas no art. 318 do CPP. A Lei nº
13.257/2016 promoveu importantíssimas alterações neste rol. Veja:
Inciso IV - prisão domiciliar para GESTANTE independente do tempo de gestação e de sua situação de saúde
CPP
ANTES DA LEI 13.257/2016 ATUALMENTE
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva
pela domiciliar quando o agente for: pela domiciliar quando o agente for:
(...) (...)
IV - gestante a partir do 7º (sétimo) mês de gravidez ou IV - gestante;
sendo esta de alto risco.
Desse modo, agora basta que a investigada ou ré esteja grávida para ter direito à prisão domiciliar. Não
mais se exige tempo mínimo de gravidez nem que haja risco à saúde da mulher ou do feto.
Inciso V - prisão domiciliar para MULHER que tenha filho menor de 12 anos
A Lei nº 13.257/2016 acrescentou o inciso V ao art. 318 com a seguinte redação:
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:
(...)
V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;
Inciso VI - prisão domiciliar para HOMEM que seja o único responsável pelos cuidados do filho menor de
12 anos
A Lei nº 13.257/2016 acrescentou o inciso VI ao art. 318 com a seguinte redação:
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:
(...)
VI - homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade
incompletos.
Esta hipótese também não existia e foi incluída pela Lei nº 13.257/2016.
Se uma mulher grávida estivesse em prisão preventiva, o juiz, obrigatoriamente, deveria conceder a ela
prisão domiciliar com base no art. 318, IV, do CPP? As hipóteses de prisão domiciliar previstas nos incisos
IV e V do art. 318 do CPP eram consideradas obrigatórias ou facultativas?
A maioria da doutrina e os julgados do STJ afirmavam que não.
O entendimento que prevalecia era o de que a substituição da prisão cautelar pela domiciliar não era
automática e o juiz deveria analisar, em cada caso concreto, se a prisão domiciliar seria suficiente.
Nesse sentido:
STJ. 5ª Turma. HC 381.655/AC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 09/05/2017.
STJ. 6ª Turma. RHC 81.300/SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 06/04/2017.
Mas o pedido formulado neste habeas corpus coletivo poderia ser obtido, por exemplo, com uma ADPF...
É verdade. O pedido formulado no presente habeas corpus coletivo até poderia, em tese, ser conseguido
com uma decisão em ADPF.
No entanto, o rol de legitimados da ADPF é mais restrito.
Assim, a existência de outras ferramentas disponíveis para suscitar a defesa coletiva de direitos não deve
obstar o conhecimento desta ação.
Como o acesso à justiça, sobretudo de mulheres presas e pobres, é muito difícil em virtude de sua notória
deficiência, o Poder Judiciário não pode negar que os vários segmentos da sociedade civil façam a sua
defesa com os mecanismos que dispõem.
Além disso, era fundamental uma decisão de âmbito nacional do STF para garantir maior isonomia às
partes envolvidas, para permitir que lesões a direitos potenciais ou atuais sejam sanadas com mais
celeridade e para descongestionar o acervo de processos em trâmite no país.
Essas razões, somadas ao reconhecimento do estado de coisas inconstitucional do sistema prisional, bem
assim à existência de decisões dissonantes sobre o alcance da redação do art. 318, IV e V, do CPP, impõem
o reconhecimento da competência do STF para o julgamento do writ, sobretudo tendo em conta a
relevância constitucional da matéria.
MÉRITO DA IMPETRAÇÃO
Grave deficiência estrutural no sistema carcerário
Como é do conhecimento de todos, o sistema prisional brasileiro vive uma grande crise. São observados
inúmeros problemas, como a superlotação e a falta de condições mínimas de saúde e de higiene.
O STF, inclusive, já reconheceu que o sistema penitenciário brasileiro vive um "Estado de Coisas
Inconstitucional", com uma violação generalizada de direitos fundamentais dos presos. As penas privativas
de liberdade aplicadas nos presídios acabam sendo penas cruéis e desumanas.
A ausência de medidas legislativas, administrativas e orçamentárias eficazes representa uma verdadeira
"falha estrutural" que gera ofensa aos direitos dos presos, além da perpetuação e do agravamento da
situação. Nesse sentido: STF. Plenário. ADPF 347 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 9/9/2015
(Info 798).
Diante disso, as mulheres grávidas e as mulheres mães de crianças que se encontram presas estão sujeitas
a situações degradantes na prisão, em especial privadas de cuidados médicos pré-natal e pós-parto. Além
disso, os seus filhos menores estão em situação de abandono em virtude da falta de berçários e creches.
“Cultura do encarceramento”
Na opinião do Min. Ricardo Lewandowski, existe, atualmente, uma “cultura do encarceramento” vigente
no Poder Judiciário, a qual se revela pela imposição exagerada de prisões provisórias a mulheres pobres e
vulneráveis. Isso decorre em virtude de um “proceder mecânico, automatizado, de certos magistrados,
assoberbados pelo excesso de trabalho” e também por conta de uma “interpretação acrítica, matizada
por um ultrapassado viés punitivista da legislação penal e processual penal, cujo resultado leva a situações
que ferem a dignidade humana de gestantes e mães submetidas a uma situação carcerária degradante,
com evidentes prejuízos para as respectivas crianças”.
O Brasil não tem conseguido garantir sequer o bem-estar de gestantes e mães que estão soltas
Vale ressaltar que o Brasil não tem sido capaz de garantir cuidados relativos à maternidade nem mesmo
às mulheres que não estão em situação prisional. Nesse sentido, deve-se relembrar o conhecido “caso
Alyne Pimentel”.
“Em 14 de novembro de 2002, Alyne da Silva Pimentel Teixeira estava no sexto mês de gestação e buscou
assistência na rede pública em Belford Roxo, no estado do Rio de Janeiro. Alyne era negra, tinha 28 anos
de idade, era casada e mãe de uma filha de cinco anos. Com náusea e fortes dores abdominais, buscou
assistência médica, recebeu analgésicos e foi liberada para voltar a sua casa.
Não tendo melhorado, retornou ao hospital, quando então foi constatada a morte do feto. Após horas de
espera, Alyne foi submetida a cirurgia para retirada dos restos da placenta. O quadro se agravou e foi
indicada sua transferência para hospital em outro município, mas sua remoção foi feita com grande atraso.
No segundo hospital, a jovem ainda ficou aguardando por várias horas no corredor, por falta de leito na
emergência, e acabou falecendo em 16 de novembro de 2002, em decorrência de hemorragia digestiva
resultante do parto do feto morto.
O caso foi apresentado à Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as
Mulheres (Cedaw), órgão ligado à ONU, pela mãe de Alyne, Maria de Lourdes da Silva Pimentel.
Em 2011, o Cedaw responsabilizou o Estado brasileiro por não cumprir seu papel de prestar o atendimento
médico adequado desde o início das complicações na gravidez de Alyne. Para o órgão, a assistência à saúde
uterina e ao ciclo reprodutivo é um direito básico da mulher e a falta dessa assistência consiste em
discriminação, por tratar-se de questão exclusiva da saúde e da integridade física feminina.”
(https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2013/11/14/entenda-o-caso-alyne).
Este caso representou a primeira denúncia sobre mortalidade materna acolhida pelo Comitê para a
Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, incumbido de monitorar o cumprimento
pelos Estados-parte da Convenção relativa aos Direitos das Mulheres, adotada pelas Nações Unidas em
1979 tratando-se da única condenação do Estado brasileiro proveniente de um órgão do Sistema Universal
de Direitos Humanos (ALBUQUERQUE, Aline S. de Oliveira; BARROS, Julia Schirmer. Caso Alyne Pimentel:
uma análise à luz da abordagem baseada em direitos humanos. Revista do Instituto Brasileiro de Direitos
Humanos, Fortaleza, n. 12, jul. 2016, p. 11).
Legislação prevê direitos às mulheres presas que não estão sendo assegurados
Tanto a Constituição Federal como a Lei de Execução Penal preveem uma série de direitos às mulheres presas:
Constituição Federal
Art. 5º (...)
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e
a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra
eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;
XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito,
a idade e o sexo do apenado;
XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos
durante o período de amamentação;
Art. 83 (...)
§ 2º Os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário, onde as
condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses
de idade.
Art. 89. Além dos requisitos referidos no art. 88, a penitenciária de mulheres será dotada de seção
para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores
de 7 (sete) anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa.
Apesar disso, passados tantos anos da sua edição, nem a Constituição nem a LEP vêm sendo respeitadas
pelas autoridades responsáveis pelo sistema prisional.
Conforme já vimos acima, a CF/88, em seu art. 5º, XLV, prevê o princípio da intranscendência, segundo o
qual “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”. No caso das mulheres presas, a privação de
liberdade e suas nefastas consequências estão sendo estendidas às crianças que levam no ventre e àquelas
que geraram.
São evidentes e óbvios os impactos perniciosos da prisão da mulher, e da posterior separação de seus
filhos, no bem-estar físico e psíquico das crianças.
Qual deve ser o critério para a substituição de que tratam esses incisos? Trata-se de hipótese obrigatória
ou facultativa?
A 2ª Turma do STF fixou os seguintes parâmetros:
REGRA:
Em regra, deve ser concedida prisão domiciliar para todas as mulheres presas que sejam
- gestantes
- puérperas (que deram à luz há pouco tempo)
- mães de crianças (isto é, mães de menores até 12 anos incompletos) ou
- mães de pessoas com deficiência.
EXCEÇÕES:
Não deve ser autorizada a prisão domiciliar se:
1) a mulher tiver praticado crime mediante violência ou grave ameaça;
2) a mulher tiver praticado crime contra seus descendentes (filhos e/ou netos);
3) em outras situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes
que denegarem o benefício.
Obs: o raciocínio acima explicado vale também para adolescentes que tenham praticado atos infracionais.
Ressalta-se que houve superação do entendimento até então dominante da doutrina e no STJ que
explicamos acima (HC 381.655/AC e RHC 81.300/SP).
Audiências de custódia
Os juízes, durante a realização das audiências de custódia, já deverão adotar as diretrizes acima explicadas,
concedendo, em regra, a prisão domiciliar.
Concessão de ofício
Embora a provocação por meio de advogado não seja vedada para o cumprimento desta decisão, ela é
dispensável, pois o que se almeja é, justamente, suprir falhas estruturais de acesso à Justiça da população
presa. Cabe ao Judiciário adotar postura ativa ao dar pleno cumprimento a esta ordem judicial.
Em outras palavras, os juízes e Tribunais deverão, de ofício, conceder a prisão domiciliar às mulheres que
se enquadrem nos incisos IV e V do art. 318 do CPP.
Cabe reclamação caso algum juiz ou Tribunal descumpra essa decisão do STF no HC coletivo?
NÃO. O STF, com o objetivo de se proteger do grande número de reclamações que receberia, afirmou
expressamente que, “nas hipóteses de descumprimento da presente decisão, a ferramenta a ser utilizada
é o recurso, e não a reclamação”.
Essa informação é muito importante, tanto na prática, como nas provas de concurso público.
Resumo:
O STF reconheceu a existência de inúmeras mulheres grávidas e mães de crianças que estavam
cumprindo prisão preventiva em situação degradante, privadas de cuidados médicos pré-natais e pós-
parto. Além disso, não havia berçários e creches para seus filhos.
Também se reconheceu a existência, no Poder Judiciário, de uma “cultura do encarceramento”, que
significa a imposição exagerada e irrazoável de prisões provisórias a mulheres pobres e vulneráveis, em
decorrência de excessos na interpretação e aplicação da lei penal e processual penal, mesmo diante da
existência de outras soluções, de caráter humanitário, abrigadas no ordenamento jurídico vigente.
A Corte admitiu que o Estado brasileiro não tem condições de garantir cuidados mínimos relativos à
maternidade, até mesmo às mulheres que não estão em situação prisional.
Diversos documentos internacionais preveem que devem ser adotadas alternativas penais ao
encarceramento, principalmente para as hipóteses em que ainda não haja decisão condenatória
transitada em julgado. É o caso, por exemplo, das Regras de Bangkok.
Os cuidados com a mulher presa não se direcionam apenas a ela, mas igualmente aos seus filhos, os
quais sofrem injustamente as consequências da prisão, em flagrante contrariedade ao art. 227 da
Constituição, cujo teor determina que se dê prioridade absoluta à concretização dos direitos das
crianças e adolescentes.
Diante da existência desse quadro, deve-se dar estrito cumprimento do Estatuto da Primeira Infância
(Lei 13.257/2016), em especial da nova redação por ele conferida ao art. 318, IV e V, do CPP, que prevê:
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:
IV - gestante;
V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;
Os critérios para a substituição de que tratam esses incisos devem ser os seguintes:
REGRA. Em regra, deve ser concedida prisão domiciliar para todas as mulheres presas que sejam
- gestantes
- puérperas (que deu à luz há pouco tempo)
- mães de crianças (isto é, mães de menores até 12 anos incompletos) ou
- mães de pessoas com deficiência.
EXCEÇÕES:
Não deve ser autorizada a prisão domiciliar se:
1) a mulher tiver praticado crime mediante violência ou grave ameaça;
2) a mulher tiver praticado crime contra seus descendentes (filhos e/ou netos);
3) em outras situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos
juízes que denegarem o benefício.
Obs1: o raciocínio acima explicado vale também para adolescentes que tenham praticado atos
infracionais.
Obs2: a regra e as exceções acima explicadas também valem para a reincidente. O simples fato de que
a mulher ser reincidente não faz com que ela perca o direito à prisão domiciliar.
STF. 2ª Turma. HC 143641/SP. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/2/2018 (Info 891).
CUSTOS VULNERABILIS
Como vimos acima, a DPU estava patrocinando, como impetrante, um habeas corpus coletivo no STF
pedindo que a Corte reconhecesse, de forma ampla e geral, que as presas grávidas ou com filhos menores
de 12 anos possuem direito à prisão preventiva.
Várias Defensorias Públicas estaduais pediram para intervir no caso na condição de custos vulnerabilis.
No âmbito cível, especificamente no caso das ações possessórias, o art. 554, § 1º do CPC é exemplo de
intervenção custos vulnerabilis:
Art. 554. (...)
§ 1º No caso de ação possessória em que figure no polo passivo grande número de pessoas, serão
feitas a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e a citação por edital dos
demais, determinando-se, ainda, a intimação do Ministério Público e, se envolver pessoas em
situação de hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública.
Vale ressaltar que as duas previsões acima são exemplificativas, admitindo-se a intervenção defensoral
como custos vulnerabilis em outras hipóteses. A Defensoria Pública defende, inclusive, que essa
intervenção pode ocorrer mesmo em casos nos quais não há vulnerabilidade econômica, mas sim
vulnerabilidade social, técnica, informacional, jurídica. É o caso, por exemplo, dos consumidores, das
crianças e adolescentes, dos idosos, dos indígenas etc. Veja o que diz o ECA:
Art. 141. É garantido o acesso de toda criança ou adolescente à Defensoria Pública, ao Ministério
Público e ao Poder Judiciário, por qualquer de seus órgãos.
Assim, nos casos de outras espécies de vulnerabilidades, não importa se estamos tratando de pessoas
economicamente necessitadas. As outras formas de vulnerabilidades já justificariam a intervenção do
órgão na causa.
Em sentido semelhante, apontando outros aspectos: ROCHA, Jorge Bheron. A Defensoria como custös
vulnerabilis e a advocacia privada. Disponível em https://www.conjur.com.br/2017-mai-23/tribuna-
defensoria-defensoria-custos-vulnerabilis-advocacia-privada
No HC 143641/SP (HC coletivo em favor das mulheres presas), várias Defensorias Públicas ingressaram
com pedidos para intervir como custos vulnerabilis. Subsidiariamente, pediram a intervenção como
amicus curiae. O que o STF decidiu?
O Ministro Relator Ricardo Lewandowski, monocraticamente, admitiu a intervenção das Defensorias
Públicas na qualidade de amicus curiae.
No despacho, o Ministro não enfrentou a temática acerca do custos vulnerabilis, tendo simplesmente
admitido a intervenção de todos os postulantes como amici curiae (plural de amicus curiae). Veja:
“Defiro o ingresso, como amici curiae, do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), o Instituto
Terra Trabalho e Cidadania (ITTC) e a Pastoral Carcerária Nacional, bem como de todas as Defensorias
Estaduais que vierem a requerer sua admissão nos autos. Anote-se.”
HABEAS CORPUS
É possível a impetração de habeas corpus coletivo
Importante!!!
O STF admitiu a possibilidade de habeas corpus coletivo.
O habeas corpus se presta a salvaguardar a liberdade. Assim, se o bem jurídico ofendido é o
direito de ir e vir, quer pessoal, quer de um grupo determinado de pessoas, o instrumento
processual para resgatá-lo é o habeas corpus, individual ou coletivo.
A ideia de admitir a existência de habeas corpus coletivo está de acordo com a tradição jurídica
nacional de conferir a maior amplitude possível ao remédio heroico (doutrina brasileira do
habeas corpus).
Apesar de não haver uma previsão expressa no ordenamento jurídico, existem dois
dispositivos legais que, indiretamente, revelam a possibilidade de habeas corpus coletivo.
Trata-se do art. 654, § 2º e do art. 580, ambos do CPP.
O art. 654, § 2º estabelece que compete aos juízes e tribunais expedir ordem de habeas corpus
de ofício. O art. 580 do CPP, por sua vez, permite que a ordem concedida em determinado
habeas corpus seja estendida para todos que se encontram na mesma situação.
Assim, conclui-se que os juízes ou Tribunais podem estender para todos que se encontrem na
mesma situação a ordem de habeas corpus concedida individualmente em favor de uma
pessoa.
Existem mais de 100 milhões de processos no Poder Judiciário, a cargo de pouco mais de 16
mil juízes, exigindo do STF que prestigie remédios processuais de natureza coletiva com o
objetivo de emprestar a máxima eficácia ao mandamento constitucional da razoável duração
do processo e ao princípio universal da efetividade da prestação jurisdicional.
Diante da inexistência de regramento legal, o STF entendeu que se deve aplicar, por analogia,
o art. 12 da Lei nº 13.300/2016, que trata sobre os legitimados para propor mandado de
injunção coletivo.
Assim, possuem legitimidade para impetrar habeas corpus coletivo:
1) o Ministério Público;
2) o partido político com representação no Congresso Nacional;
3) a organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em
funcionamento há pelo menos 1 (um) ano;
4) a Defensoria Pública.
STF. 2ª Turma. HC 143641/SP. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/2/2018 (Info 891).
EXERCÍCIOS
Julgue os itens a seguir:
1) O tipo penal previsto no art. 89 da Lei de Licitações criminaliza o mero fato de o administrador público
ter descumprido formalidades. ( )
2) Para a caracterização da conduta tipificada no art. 89 da Lei 8.666/1993, é indispensável a demonstração,
já na fase de recebimento da denúncia, do elemento subjetivo consistente na intenção de causar dano
ao erário ou obter vantagem indevida. ( )
3) O STF não admite a impetração de habeas corpus coletivo. ( )
4) Explique em que consiste a chamada “cultura do encarceramento”.
5) Diante da inexistência de regramento legal, o STF entendeu que os legitimados do habeas corpus coletivo
devem ser os mesmos da ação direta de inconstitucionalidade. ( )
6) O STF decidiu que possuem direito à substituição da prisão preventiva pela domiciliar, sem prejuízo da
aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no art. 319 do CPP, todas as mulheres presas,
gestantes, puérperas, ou mães de crianças e deficientes sob sua guarda, excetuados os casos de crimes
praticados por elas mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes ou, ainda, em
situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que
denegarem o benefício. ( )
7) Explique em que consiste o custos vulnerabilis.
Gabarito
1. E 2. C 3. E 4. - 5. E 6. C 7. -
OUTRAS INFORMAÇÕES
CLIPPING DA R E P E R C U S S Ã O G E R A L
DJe 19 a 23 de fevereiro de 2018