“Deus nos deu, para nos melhorarmos, justamente o que necessitamos
e nos é suficiente: a voz da consciência e as tendências instintivas; e nos tira o que poderia prejudicar-nos.” “O homem traz, ao nascer, aquilo que adquiriu. Ele nasce exatamente como se fez. Cada existência é para ele um novo ponto de partida. Pouco lhe importa saber o que foi: se estiver sendo punido, é porque fez o mal, e suas más tendências atuais indicam o que lhe resta corrigir em si mesmo. É sobre isso que ele deve concentrar toda a sua atenção, pois daquilo que foi completamente corrigido já não restam sinais. As boas resoluções que tomou são a voz da consciência, que o adverte do bem e do mal e lhe dá a força de resistir às más tentações.” “(...)A falta de uma lembrança precisa, que poderia ser-lhe penosa e prejudicial às suas relações sociais, permite-lhe haurir novas forças nesses momentos de emancipação da alma, se ele souber aproveitá- los.”
FRANCO, Divaldo P. Em Busca da Verdade. Pelo Espírito Joanna de Ângelis.
Cap. 2 – item: Predomínio da sombra. (Visão psicológica da Parábola do Filho Pródigo)
FRANCO, Divaldo P. Psicologia da Gratidão. Pelo Espírito Joanna de Ângelis.
Cap. 2 – Item: A sombra perturbadora e a gratidão.
Todas as criaturas possuem o seu lado sombra, o lado obscuro da sua
existência, às vezes considerado como o lado negativo do ser. Essa sombra que, quase sempre, responde por muitas aflições que se insculpem no ego, atormentando o Self, é, conforme o Dr. Friedrich Dorsch, resultado de traços psíquicos do homem [e da mulher] em parte reprimidos, em parte não vividos, que, por razões sociais educativas ou outras, foram excluídos da convivência e, por isso, foram reprimidos. A sombra é portadora de valores e requisitos que podem ser utilizados de maneira produtiva ou perturbadora, podendo mesmo expressar-se de três formas, como sejam: a) a de natureza pessoal, cujos significados que foram reprimidos pertencem ao próprio indivíduo; b) a de natureza coletiva, que representa os mesmos significados reprimidos em cada sociedade; c) a de natureza arquetípica, em que há um caráter ancestral de destrutividade do ser humano, que não dispõe de possibilidade de diluição... Jung considerava que se torna necessário adquirir a consciência desses conteúdos reprimidos, porque somente assim será possível alcançar a individuação. Após essa tentativa inicial, deve-se trabalhar pela sua integração no Self, o que equivale a dizer esforçar-se pelo amadurecimento psicológico, não mascarando a responsabilidade pessoal e aceitando-a de forma consciente, compreendendo todas as manifestações sombrias já experiênciadas. Todo indivíduo é possuidor de aspirações que nem sempre consegue concretizar ou vivenciar, recalcando-as com mágoa e não conseguindo diluí-las conscientemente pela superação. Somando a esse conflito não exteriorizado, conduz a herança ancestral da cultura em que se movimenta assim como a presença arquetípica de autodestruição, como fenômeno de fuga da realidade. Tais ocorrências defluem da vivência em cada reencarnação, quando experimentou a carga dos conflitos gerados anteriormente e que ressumam - sombra pessoal e coletiva —, tomando o aspecto arquetípico bem característico dos movimentos primários antes do surgimento da consciência e da personalidade. Com todo esse potencial negativo, a sombra responde pelos desaires que geram sofrimento e amargura, retendo o ser na sua rede invisível e constritora. Nada obstante, ao ser-se conscientizado desses fatores de perturbação, pode-se e deve-se trabalhar interiormente para superá-los por intermédio da redução da sua carga, aplicando-se contribuições edificantes e saudáveis, como o otimismo, a confiança no êxito, a solidariedade, o esforço para manter as perspectivas de realização sem os receios injustificáveis. A sombra pode ser vista como uma névoa ou uma ilusão que o sol da realidade dilui, proporcionando a visão clara do existir, no qual todos se encontram situados. E porque as aspirações humanas saudáveis são crescentes, à medida que vão sendo superadas algumas dificuldades do amadurecimento psicológico, ampliam-se os horizontes do equilíbrio e do despertamento para a individuação. Há, sem dúvida, um grande conflito entre o que se é e o que se deseja ser, no esforço contínuo por alcançar patamares em que a harmonia emocional torne-se uma realidade, proporcionando estímulos para serem conquistados. Nada a estranhar, nessa aparente dualidade, já que existem realmente o lado bom e o lado mau de todas as coisas, o alto e o baixo, o dia e a noite, a vida e a morte, o yin e o yang, produzindo a integração, a unidade... Em toda parte podem ser identificadas as manifestações sombrias do ser humano, mas também o lado numinoso em toda a sua grandiosidade, rutilante nos heróis do saber e do ser, do conquistar e do realizar, na ciência, na tecnologia, nas artes, na religião, no pensamento, na solidariedade, enquanto também vige o instinto de destruição pela agressividade, pelos vícios, pela ignorância, pela prepotência... A civilização hodierna, rica de conquistas de vária ordem, ainda não logrou tornar feliz a criatura humana que, embora favorecendo alguns dos membros a viverem em grande conforto e desfrutando de comodidades, de belezas ao alcance da mão, em sua grande parte ainda permanece insatisfeita, infeliz, invariavelmente derrapando nos abismos da drogadição, do alcoolismo, da busca desenfreada pelo prazer, pela ilusão. Naturalmente que aí encontramos a predominância da sombra coletiva e arquetípica não trabalhada pelo conhecimento do ser em si mesmo e das suas imensas possibilidades, sempre conduzido pelo comércio para o gozo e o não pensar em profundidade, vivendo na superficialidade dos fenômenos humanos. Tem faltado a coragem social para romper com essa cortina que impossibilita a clara visão da realidade psicológica da existência, de tal forma que as suas aspirações não vão além dos limites sensoriais. Embora o esforço da Psicologia Social e de outras escolas, de algumas valiosas doutrinas religiosas e filosóficas, o ser humano atém-se mais ao que tateia e alcança do que anela emocionalmente, agarrando as sensações materiais sem fruir as emoções libertadoras. Infelizmente, a educação vigente trabalha mais em favor da preservação do medo ao lado sombra do indivíduo, que se propõe a ignorá-la, a fim de desfrutar os bens que se encontram ao alcance, e mesmo quando defrontado por pensamentos ou ocorrências infelizes, logo deseja esquecê-los, não os enfrentar, como se fosse possível ocultá-los num depósito especial que os asfixiaria. Realmente, quando reprimidos esses sentimentos e sucessos, na primeira oportunidade ei-los que ressumam com a carga aflitiva de que se constituem e nublam os céus róseos dos iludidos. A existência humana é um permanente desafio que o Self tem pela frente e todo o seu esforço é procurar a integração da sombra no seu eixo. Cabe a todos os indivíduos o dever de diluir a treva que se lhe encontra ínsita, com naturalidade igual à que defronta a luz, considerar a dor e a frustração como fenômenos normais que podem corresponder ao bem-estar e à sabedoria, logo sejam convertidos pela racionalização e pelo trabalho psicológico. Todos aqueles que são portadores da sombra — e todos o são —, em vez de a compreenderem na condição de processo de crescimento, experimentam uma certa forma de vergonha, de constrangimento, e procuram disfarçá-la. Tal comportamento dá lugar a uma sociedade hipócrita, artificial, incapaz de procedimentos maduros e significativos que a todos beneficiem. O ser mais hábil no disfarce é sempre o mais homenageado e querido, produzindo-lhe maior soma de sombra e de conflito, porque se vê obrigado a continuar a parecer aquilo que, realmente, não é. Torna-se necessária a coragem para o auto enfrentamento, saindo da obscuridade na direção da claridade existencial. A herança arquetípica já nos fala, na linguagem do Gênesis, que Deus fez primeiro a luz, deixando significar a Sua presença em plena escuridão, momentaneamente obstaculizada pela sombra. Em cada passo, a cada conquista diluidora do lado treva, vai-se conseguindo superar o medo do enfrentamento, o que exige a consciência da sombra que deve ser aceita sem reservas nem ressentimentos, oferecendo a cada lutador o seu poder de transformação e a sua tenacidade em alcançar a felicidade, a plenitude. Assim vista, por conseguinte, a sombra transforma-se em árvore dadivosa, porque o medo (desgosto) do que se é torna-se superado pelo amor do que se deseja ser. A batalha travada com a sombra, portanto, é contínua e se faz presente em todos os instantes da existência. Quando se ama, se respeita e se atende aos compromissos, a sombra perde, mas quando se reage, mantendo-se ressentimento, ódio, ciúme, sentimentos de amargura e de cólera assim como outros do mesmo gênero, a sombra triunfa... O amor que edifica é vitória sobre a sombra, enquanto o tormento afetivo que trai é glória da sombra. Quando se é reconhecido à vida, se agradece e se trabalha pelo progresso, a sombra é vencida, no entanto, quando se é desagradecido e soberbo, triunfa a sombra. Desse modo, a sombra densa das paixões inferiores é o maior obstáculo psicológico à vivência da proposta da gratidão, responsável pela integração das duas partes do ser na sua realização unívoca.