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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

COORDENAÇÃO DOS PROGRAMAS DE PÓS -GRADUÇÃO EM LETRAS


DOUTORADO EM ESTUDOS LINGÜÍSTICOS
LINHA DE PESQUISA: DISCURSO E INTERAÇÃO
ÁREA: SOCIOLINGÜÍSTICA

ATITUDES LINGÜÍSTICAS DE ALUNOS


DE ESCOLAS PÚBLICAS DE JUIZ DE FORA – MG

Por

Lucia Furtado de Mendonça Cyranka

Tese de Doutorado apresentada à Coordenação de


pós-graduação em Letras da Universidade
Federal Fluminense, como requisito parcial para a
obtenção do grau de Doutor.

Orientadora : Profª Drª Claudia Nívia Roncarati


de Souza

Niterói
2007
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2

EXAME DA TESE

CYRANKA, Lucia Furtado de Mendonça. Atitudes lingüísticas de alunos de escolas


públicas de Juiz de Fora – MG. 2007. 174 f. Tese (Doutorado em Estudos
Lingüísticos)_Instituto de Letras, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2007.

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª CLAUDIA NÍVIA RONCARATI DE SOUZA (UFF, Orientadora)

_______________________________________________________________
Prof. Dr. JOSÉ CARLOS GONÇALVES (UFF)

_______________________________________________________________
Profª Dr.ª LUCIA DE SAN TIAGO DANTAS QUENTAL (UFRJ)

_______________________________________________________________
Prof. Dr. MÁRIO ROBERTO LOBUGLIO ZÁGARI (UFJF)

_______________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª STELLA MARIS BORTONI-RICARDO (UnB)

_______________________________________________________________
Profª Drª MARIA CECÍLIA MOLLICA (Suplente, UFRJ)

_______________________________________________________________
Prof.ª Drª MARIA JUSSARA ABRAÇADO DE ALMEIDA (Suplente, UFF)

Examinada a Tese

Conceito :

Em: 21 de maio de 2007


3

Aos alunos e aos professores das escolas públicas brasileiras.


4

AGRADECIMENTOS

À Profª Drª Claudia Roncarati, minha orientadora, pela paciência, disponibilidade e


competência com que se abriu ao meu desejo de me aprofundar nos estudos de
Sociolingüística, em seus fundamentos e textos seminais.

À Profª Drª Lucia Quental, pela disponibilidade e sabedoria com que me acolheu e me
assessorou, sempre que precisei.

Ao Prof. Dr. Mário Roberto Lobuglio Zágari, meu professor dile to dos anos de graduação,
que, novamente, depois de tantos anos, soube repartir comigo seu saber.

À Prof.ª Dr.ª Stella Maris Bortoni- Ricardo, pelo incentivo e pelo acesso à rica bibliografia,
mais específica e necessária para meu estudo.

À Prof.ª Drª Déa Lucia Campos Pernambuco, diretora da Faculdade de Educação da UFJF,
que me liberou dos entraves funcionais, para dedicar- me a este estudo.

A meus colegas do Departamento de Métodos e Técnicas de Ensino, da Faculdade de


Educação da UFJF, que muito colaboraram para minha dedicação exclusiva ao Curso de
Doutorado.

Ao Prof. Dr. Luiz Cláudio Ribeiro, do Departamento de Estatística da UFJF, que me


auxiliou na análise estatística dos testes, bem como a Flávio da Rocha Azevedo e a
Marilane Trota Barroso, que fizeram o trabalho de digitação e confecção das tabelas e dos
gráficos.

À Polyana Nazareth Matozinhos, aluna do Curso de Comunicação Social da UFJF, que,


com competência, preparou a edição do CD com os depoimentos dos falantes, que
compuseram o teste de atitudes.

Aos falantes, alunos e professores que participaram dos testes.

Aos funcionários da Secretaria de Pós- graduação em Letras da UFF, pelo atendimento


atencioso.

A todos os professores, diretores e coordenadores das várias escolas que visitei, pela
generosidade com que sempre me acolheram.

Ao Peter, meu marido, companheiro querido, que me guiou, pacientemente, por muitas das
estradas das redondezas de Juiz de Fora, em busca do meu campo de pesquisa.

Ao Pedro, meu filho querido, com admiração, pela competência com que me assessorou
nos trabalhos de informática, necessários à edição desta tese.

À Carolina e à Márcia, minhas filhas queridas, pelo incentivo e confiança.


5

The language of the classroom must be seen as a common property of all social
classes and ethnic groups; free from identification with male or female style, neutral
to the opposition of high culture and popular culture; independent of the other
socialization processes of the school system; and restored to the vigor of everyday
life. One step in this direction is to strip away the socially significant symbols that
carry such a heavy social loading.
(LABOV, William. The community as educator, 1987, p. 145)
6

RESUMO

Utilizando a metodologia proposta por Lambert et al. (1960), um teste de atitudes


lingüísticas foi aplicado em alunos de oitava série do Ensino Fundamental de cinco escolas
públicas do Município de Juiz de Fora – MG, visando investigar seu julgamento em
relação a três variedades lingüísticas, detectadas dentro do contínuo rural- urbano. Para
complementar a investigação, servindo de contraponto, incluiu-se, nesse universo, uma
escola particular. O teste de atitudes mostrou uma identificação de todos os alunos com a
variedade rurbana, intermediária entre a rural e a urbana, não havendo diferença, nesse
caso, entre os das escolas públicas e os da particular. Constatou-se, além disso, clara
identificação da variedade urbana/culta com a dimensão de poder, ao passo que as duas
outras foram relacionadas com a dimensão de solidariedade, demonstrando, por um lado, a
atuação do fenômeno do prestígio encoberto e, por outro, o distanciamento em relação à
variedade culta. Os alunos da zona rural avaliaram negativamente a variedade culta, o que
tem conseqüências pedagógicas importantes, já que eles levam suas referências culturais
que devem ser consideradas pela escola, encarregada de ampliar- lhes a competência de uso
da língua materna. Um teste de crenças, como medida direta, foi também aplicado nos
mesmos alunos, em professores das suas escolas e em formandos de Letras do segundo
semestre de 2006, da UFJF, com o intuito de verificar se havia relação entre crenças dos
professores e dos alunos e se essas crenças interferiam no desenvolvimento, no aluno, de
competências de uso da variedade culta. Os resultados evidenciaram alunos em conflito
entre a aprovação de sua variedade lingüística (teste de atitudes) e a declaração de que não
sabem escrever, nem falar bem (teste de crenças): os alunos da oitava série estão inibidos
em relação ao uso de sua própria língua e condicionam o desenvolvimento dessas
competências a crenças equivocadas, como aprender regras de gramática e de ortografia.
Daí sua baixa auto-estima e o preconceito lingüístico às vezes até mesmo contra sua
própria fala, que consideram menos correta do que a escrita. Isso pode constituir indício da
insuficiência do trabalho com a oralidade na escola, instituição com a qual, no entanto,
contam para lhes suprir o que consideram suas deficiências lingüísticas. Um ponto
importante a ser destacado é a crença dos professores de que para escrever direito, deve-se
aprender gramática, 40,9% ainda a julgam verdadeira. Essa postura ainda persistente dos
professores provavelmente influencia atitudes desfavoráveis dos alunos com relação à sua
identificação com a variedade culta, o que poderia ser minimizado com a adoção de uma
pedagogia culturalmente sensível que minimizasse a interação assimétrica, no sentido de
diminuir a distância entre o prestígio conferido à variedade do professor e aquela do aluno.
Em suma, os resultados apontam para a existência de um sistema de crenças, muitas delas
equivocadas, e de seus efeitos na aquisição da variedade culta da língua. No entanto, já há
sinais de que esse quadro está mudando entre os formandos em Letras.

PALAVRAS-CHAVE:. Teste de atitudes lingüísticas; teste de crenças; dimensões de


poder e solidariedade; avaliação de fala e escrita; implicações pedagógicas.
7

ABSTRACT

A linguistic attitudes test (LAMBERT et. al, 1960) was proposed to the students of the
8th . grade of five public schools in Juiz de Fora – MG. It aims at investigating the
students’rating in three Brazilian dialects in the rural-urban continuum. A private
school was also included because it could be a good contrasting parameter in this
investigation. The results of the attitude test showed a strong identification of all
students with the rurban variety, which is in the middle of the continuum. There was no
difference between the ratings of the students of the public schools and the private one.
The students also established a clear connection between the urban/standard variety and
the power dimension, but the solidarity dimension is linked to the rural and the rurban
one. This demonstrated on the one hand, the existence of covert prestige and, one the
other hand, how distant the students are from the urban/standard variety. Rural students
held negative attitudes toward the standard variety and this caused very important
pedagogic consequences, because they carry on to school their cultural references which
ought to be respected in their linguistic development, in the acquisition of this standard
variety during the school activities. One test of beliefs (direct measure), was also used
to verify whether the students’ beliefs are connected with the teacher’s ones, and
whether students’ difficulties in developing their abilities in standard language uses are
connected with the teacher’s beliefs. This test was answered by the teachers of the same
schools and by students of the last grade of the Curso de Letras of UFJF. The result
pointed out that the students are in conflict between the recognition of their linguistic
variety (attitude test) and the statement that they can’t speak well (belief test): students
of the 8th . grade demonstrate insecurity in using their mother tongue and they are
attached to false beliefs, as that they have to study grammar rules and orthography to
overcome these difficulties. This is harmful to their self-esteem and increases the
linguistic prejudices, sometimes not in accordance with their own language uses: they
think that speaking is less correct than writing. It points to the insufficiency of school
activities with the oral language. The students’ expectation, however, is that the school
can help them overcome these difficulties. One important issue to be pointed out is the
teachers’ belief that to speak well ones has to study grammar, 40,9% think that this is
true. This persistent position of the teachers probably influences the increasing negative
attitudes of the students’ identification with the standard language variety. This could be
minimized by the culturally responsive pedagogy to reduce the asymmetric interaction,
to reduce the distance between the teacher’s variety prestige and the students’ variety. In
short, the results point out the existence of a system of beliefs, that many of them are
false beliefs, and that they influence the beliefs and the students’ linguistic attitudes.
This influence increases the students’ difficulties in developing their abilities in the
standard dialect use. But it seems that this situation is changing among the students of
the last grade of the Curso de Letras.

KEY WORDS: Linguistic attitudes test; evaluation; scholar beliefs; power and
solidarity dimensions; school and linguistic competence development.
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RÉSUMÉ

En employent la méthodologie proposée par Lambert et col. (1960), on a fait passer aux
élèves de la Troisième, de cinq écoles publiques de Juiz de Fora – MG, un test
d’attitudes linguistiques. Par cet instrument, on avait le but de réchercher comment ces
élèves jugeaient les trois differentes varietés languistiques dans le continuum rural-
urban. Pour compléter cette investigation une école privée y a été inclue, permettant
ainsi, d’avoir un élément de comparaison au momment de l’évaluation. Les résultats ont
révélé une identification significative de tous les élèves avec la varieté rurbaine, ceci
tant pour les écoles publiques comme pour l’école privée. Il est apparu aussi une forte
identification de la varieté urbaine/soutenue avec la dimension de pouvoir, alors que
l’idenfication des deux autres varietés s’est faite avec la dimension de solidarité, ce que
démontre d’un côté, l’action du prestige sous-jacent et de l’autre, l’éloignement de ces
élèves par rapport à la varieté soutenue. Les élèves qui habitent en zone rural font une
évaluation négative de cette varieté et cela entraîne des cons équences pédagogiques
assez importantes, car leurs références culturelles implicites sont présentes à l’école et
celle-ci doit les prendre en considération et aider ces élèves à développer leurs
compétences dans leur langue maternelle. Ces élèves de la troisième, leurs professeurs,
ainsi qu’un groupe d’étudiants en fin de formation en Lettre à UFJF ont passé un test de
croyance (mesure directe). Le but était de vérifier s’il y avait un rapport entre les
croyances des professeurs et celles des élèves à tel point qu’il puisse déterminer, pour
ces derniers, des difficultés dans le développement des competences de l’usage de la
varieté soutenue. Les résultats ont révélé un conflit, pour les élèves, entre la réussite de
leur varieté languistique (teste d’attitudes) et la déclaration de leur incompétence à bien
écrire et à bien parler (teste de croyances). Les élèves de la Troisième sont inhibés par
rapport à l’usage de leur langue maternelle: ils estiment qu’ils ne parlent ni écrivent
bien, car pour y réussir, il faudrait avoir une bonne maitrise des règles grammaticales et
de l’orthographie. En conséquence de ces fausses croyances, ils ne croyent pas en leur
capacité à bien utiliser la langue et se sous-estiment. Ils ont aussi des préjugés contre
l’oralité, parce qu’ils la considèrent moins correct que la langue écrite. Cela révèle
l’insuffisance du travail de l’école par rapport à la modalité orale de la langue. Mais les
élèves ont confiance dans l’institution scolaire pour les aider à vaincre ces obstacles.
Un point qu’on a considéré assez important c’est la croyance des professeurs suivant
laquelle on doit maitriser la grammaire pour pouvoir bien écrire, 40,9% adhèrent à cette
idée. Il est possible que cette croyance, qui persiste encore, puisse influencer les
attitudes défavorables des élèves par rapport à leurs identification avec la varieté
soutenue. Ceci pourrait être minimisé avec l’adoption d’une pédagogie culturellement
sensible qui puisse diminuer l’intéraction asymétrique et reduire la distance entre le
préstige de la varieté du professeur et celle de l’élève. À la fin, les résultats ont révélé
qu’on construit, à l’école, un système de croyances plein d’équivoques. Il y a, sans
doute, un fort rapport entre les difficultés des élèves dans le développement de leurs
compétences à la varieté soutenue de la langue et ces fausses croyances. Les élèves qui
sont à la fin du Cours de Lettres se montrent plus au fait ces discussions.

MOTS-CLEF: Teste d’atitudes linguistiques; teste de croyances; dimensions de


pouvoir et de solidarité; évaluation de la parole et de l’écrit; implications pédagogiques.
9

LISTA DE QUADROS E MAPAS

Quadro 1 - Perfil dos falantes .........................................................................................71


Figura - Representação de Juiz Fora por regiões, indicando os bairros ....................74
Mapa - Munic ípio de Juiz de Fora com seus distritos .............................................75
Quadro 2 - Escolas selecionadas para a aplicação dos testes .........................................77
Quadro 3 - Sujeitos que responderam ao Questionário I (Teste de crenças) .................94
Quadro 4 - Resumo da ANOVA ..................................................................................102
Quadro 5 - Análise dos dados pessoais dos professores e formandos de Letras
(Questionário I)...........................................................................................113
Quadro 6 - Assertivas associadas a crenças e respectivos p- valores............................114
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S U M Á R I O

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................12
2 PERGUNTAS FUNDADORAS ...............................................................................19
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ............................................................................20
3.1 As atitudes e as crenças ................................................................................20
3.2 O estudo das atitudes lingüísticas ................................................................26
3.2.1 As dimensões de poder e solidariedade nos julgamentos lingüísticos.....32
3.2.2 Tendências apontadas no contexto brasileiro ..........................................35
3.3 A múltipla varieda de do português do Brasil: algumas considerações ..42
3.4 A variedade culta ..........................................................................................52
3.4.1 O papel da escola no ensino da variedade culta.....................................60
4 PESQUISA DE CAMPO ..........................................................................................68
4.1 O problema ...................................................................................................68
4.2 A metodologia ...............................................................................................68
4.3 O teste de atitudes: constituição do corpus ................................................70
4.3.1 A seleção das escolas ..............................................................................72
4.3.2 Os falantes e suas falas ...........................................................................80
4.4 Os testes e sua aplicação ..............................................................................93
5 DESCRIÇÃO E INTERPRETAÇÃO ESTATÍSTICA DOS RESULTADOS .......98
5.1 O tratamento estatístico dos dados............................................................98
5.2 O teste de atitudes subjetivas ....................................................................100
5.2.1 Análise de Variância do Falante I (Mara) - Variedade urbana.............100
5.2.2 Análise de Variância do Falante II (Dª Mercedes) - Variedade rural...105
5.2.3 Análise de Variância do Falante III (Telma) - Variedade rurbana......107
5.2.4 Discussão dos resultados do teste de atitudes .......................................111
5.3.O teste de crenças .........................................................................................113
5.3.1 Assertivas associadas a crenças em relação à escrita ...........................114
5.3.2 Assertivas associadas a crenças em relação à fala ................................118
5.3.3 Assertivas associadas a crenças em relação à fala e à escrita ...............121
5.3.4 Discussão dos resultados do teste de crenças ........................................123
6 CONCLUSÕES ..........................................................................................................125
11

7 REFERÊNCIAS .........................................................................................................132
8 ANEXOS ....................................................................................................................140
A - Convenções para transcrição ..........................................................................140
B - Teste de crenças ..............................................................................................141
C - Dados pessoais dos professores e dos formandos de Letras (Questionário I) 143
D - Teste de atitudes .............................................................................................144
E - Gráficos 1 a 21 (notas e médias dos falantes I, II e III) ................................. 146
F - Tabelas 1 a 25 (associação entre escolaridade e avaliação das assertivas) 154
12

1. INTRODUÇÃO

Esta tese tem como foco central o estudo de atitudes e crenças lingüísticas no
contexto da escola pública da cidade mineira de Juiz Fora. Trata-se de um viés de
trabalho com a língua materna que busca investigar crenças e atitudes que, por hipótese,
teriam implicações no desenvolvimento das habilidades lingüísticas dos alunos.

Escolhi me dedicar a uma área da Lingüística que apresenta conseqüências diretas


no trabalho escolar com a língua materna, de modo que, de alguma forma, pudesse
melhor compreender a distância que ainda existe entre o discurso acadêmico e a sala de
aula. De fato, as novas perspectivas trazidas pelos avanços da Lingüística nas últimas
décadas desencadearam, no interior das escolas e na prática dos professores de
Português, certa inquietação. Acredito que, hoje, uma parcela considerável desses
professores entende a necessidade de mudar as perspectivas de seu trabalho com a
educação em língua materna, mas a transição da teoria para a prática ainda gera
desconfortável sensação de incompetência projetada na resistência da parte de muitos,
resistência essa que, entre outros fatores, pode levar à cristalização de metodologias
estéreis do ponto de vista do desenvolvimento da competência comunicativa dos alunos.

É consabido que ainda há os que se recusam, em nome da “boa tradição”, a


substituir o ensino da metalinguagem com um fim em si mesmo pelas atividades
enriquecedoras dos usos da linguagem que levam os alunos a refletir, por exemplo,
sobre a natureza dela, sobre a variação lingüística e sobre a análise dos gêneros textuais.
Permanecem ainda, na sala de aula, distantes de graves e importantes tarefas: formar
“[...] falantes cultos, isto é, aqueles que sabem escolher a variante adequada, de acordo
com as situações de interação.” (PRETI, 1997, p. 18); levar seus alunos a analisarem a
fala e a reconhecerem nela, juntamente com a escrita, um contínuo que leva, de
diferentes maneiras, a práticas sociais; inaugurar, entre seus alunos, o prazer do texto e
desenvolver, com eles, ações de letramento1 indispensáveis à formação do leitor e do
escritor maduros.

1 Soares (2003, p. 91) assim conceitua letramento: “Ao exercício efetivo e competente da tecnologia da
escrita denomina-se letramento, que implica habilidades várias, tais como: capacidade de ler ou escrever
para atingir diferentes objetivos – para informar ou informar-se, para interagir com os outros, para imergir
no imaginário, no estético, para ampliar conhecimentos, para seduzir ou induzir, para divertir-se, para
13

Há também aqueles que, egressos de nossos cursos de Letras, trazem uma bagagem
rica de informações novas sobre a natureza da linguagem e sobre concepções mais
recentes de educação em língua materna, mas continuam inseguros no momento de
transformar tais propostas em prática docente. Pior que isso, acabam se apropriando de
um discurso de transformação da metodologia tradicional de ensino sem que, de fato, o
tornem efetivo. Resulta daí um artificialismo que, além de estéril, se torna improdutivo
porque não atende nem ao tradicional nem ao moderno.

No meu trabalho com graduandos do curso de Letras, na Faculdade de Educação


da Universidade Federal de Juiz de Fora, tenho me surpreendido com a dificuldade dos
alunos em perceber e estabelecer a correlação entre aspectos variáveis e discursivos e a
prática docente. Nas sessões de seminários e especialmente nas de reflexão sobre as
experiências no estágio em língua portuguesa, fica patente, por exemplo, a existência de
crenças equivocadas sobre a natureza da linguagem, sobre o conceito de erro gramatical,
sobre a concepção de oralidade e letramento e sobre os objetivos das atividades
escolares com a língua materna.

Em geral, nas escolas, se trabalha apenas com a gramática normativa e a descritiva,


sem sequer referência aos processos de construção lingüística, isto é, de observação e
reflexão sobre a língua, o que se faria através da gramática reflexiva e mesmo da
gramática de uso, que “é não-consciente, implícita e liga-se à gramática internalizada do
falante.”2

Esse quadro não constitui novidade e ainda persiste nas faculdades de Letras,
apesar de o início dos estudos de Lingüística no Brasil datarem do final da década de
60. Já no Boletim 4 da ABRALIN, de 1983, Kato alertava para o distanciamento entre
os resultados das pesquisas lingüísticas e a formação dos professores de Português.

orientar-se, para apoio à memória, para catarse [...]; habilidade de interpretar e produzir diferentes tipos
de gêneros de textos; habilidades de orientar-se pelos protocolos de leitura que marcam o texto ou de
lançar mão desses protocolos, ao escrever; atitudes de inserção efetiva no mundo da escrita, tendo
interesse e prazer em ler e escrever, sabendo utilizar a escrita para encontrar ou fornecer informações e
conhecimentos, escrevendo ou lendo de forma diferenciada, segundo as circunstâncias, os objetivos, o
interlocutor.” Na Seção 3.3, apresento a definição de Bortoni-Ricardo (2004), que prefere usar o termo
letramentos.
2
TRAVAGLIA (1997, p. 111). Ver também, nessa mesma obra, p.30-37, os demais conceitos de
gramática.
14

Ela, já então, reivindicava (op. cit., p. 53) o desenvolvimento de “[...] uma literatura
intermediária de ligação entre as pesquisas lingüísticas e os materiais pedagógicos [...]”
que, acompanhada de uma literatura de divulgação, permitisse fazer chegar aos
professores, e mesmo aos especialistas de outras áreas, esses resultados, o que
possibilitaria um trabalho em sala de aula mais rico e eficaz e evitaria sérias distorções
comprometedoras da qualidade do trabalho escolar com a língua materna. Ela
acrescentava, à mesma página:

Esse tipo de discurso que não fomos capazes de desenvolver até hoje é
necessário também para garantir a comunicação interdisciplinar: a pedagogia de
línguas não se alimenta apenas da Lingüística, mas também da Psicologia, da
Literatura, da Teoria da Co municação, da Sociologia, para não falar de
interdisciplinas como a Sociolingüística e a Psicolingüística. Ora, quando
reunimos especialistas nessas áreas, em uma mesa-redonda, em virtude de todos
trabalharem com um objeto e um objetivo comuns (por exemplo, a leitura), o
que observamos freqüentemente é uma discussão mais assemelhada a uma
conversa de surdos. Se especialistas de formação diversa compartilhando um
objeto e um objetivo comuns nem sempre conseguem entender-se, não devemos
estranhar que o professor de línguas venha a utilizar termos e conceitos de
Lingüística sem tê-los assimilado. Por isso, é necessário assegurar que os que
vão se alimentar de teorias para algum objetivo educacional assimilem idéias ou
insights e não apenas “engulam” termos correspondentes a conceitos mal
digeridos.
.

Vinte e um anos depois, Mollica (2004, p. 7), apresentando ao leitor a obra que
organizou, intitulada Formação em Letras e Pesquisa em Linguagem, ainda afirma:

A necessidade de estreitar fronteiras entre a pesquisa e o ensino e entre a


Licenciatura e a prática profissional foi a principal motivação para a organização
deste livro. É comum a queixa dos graduandos em Letras no que se refere à
defasagem entre o que aprendem e o que devem ensinar, entre o que conhecem e
como devem transmitir. Lentamente, a pesquisa em linguagem, desenvolvida nas
pós-graduações, atinge os bancos das graduações, tanto para se fazer conhecer
quanto para esclarecer sua relevância na pedagogia de línguas materna e
estrangeira nos níveis de educação fundamental e médio. A falta de diálogo entre
os distintos graus de ensino tem assim contribuído para a constituição de
distorções na formação de pessoal na área, para uma prática diferenciada do
ponto de vista qualitativo e quantitativo.

Isso, a despeito do muito que tem sido feito nesse sentido, haja vista as freqüentes
divulgações de produtos de pesquisa em congressos da área.

A Lingüística Aplicada, por exemplo, vem se dedicando, desde a década de 90, ao


estudo das crenças de professores e alunos em relação ao ensino/aprendizagem de
línguas. No Brasil, as investigações, nesse campo, estão direcionadas principalmente
15

para o trabalho com línguas estrangeiras (cf. BARCELOS, 2006a; SILVA, 2006;
BASSO, 2006), mas precisam ser incrementadas também em relação à língua
portuguesa.

A questão, portanto, ainda é atual, significando que o esforço que se vem


empreendendo é insuficiente. É preciso mais. Tudo indica que é necessário investir não
apenas na preparação do professor, mas também na sua formação continuada, fazendo
chegar até ele o produto das discussões da academia, sustentadas pelas pesquisas no
campo da linguagem.

Considero que o estudo das atitudes lingüísticas e das crenças, entre outros focos de
pesquisa, me possibilitaria melhor compreender e auscultar a dificuldade de graduandos
e de professores. Essa dificuldade a que me refiro é a que se dá tanto em relação ao
problema, freqüentemente aludido, do reconhecimento da legitimidade da variedade
lingüística, ou dialeto,3 dos alunos, não lhes contrapondo a variedade padrão, ou não
lhes impondo simplesmente, sem reflexão, a norma culta, quanto em relação ao
equívoco de adotarem apenas a modalidade escrita da língua como a única legítima.

A falta de clareza relativamente a essa questão, em parte decorrente de


fundamentação teórica inadequada, costuma levar os professores a subestimarem a
funcionalidade comunicativa da variedade lingüística utlizada pelo aluno e, assim

3
Alguns autores não utilizam o termo dialeto para indicar diferenças sociais ou regionais do português do
Brasil. ZÁGARI (2005, p. 49) utiliza o termo falares: “O que Minas apresenta são falares, isto é,
realizações lingüísticas de agrupamentos humanos que podem ser associados a uma pronúncia
característica, a um ritmo de fala e a uma que outra definida escolha de um item lexical.” BORTONI-
RICARDO (2004, p. 33) prefere o termo variedade, procurando, segundo declara, evitar o caráter
depreciativo que tem sido associado ao termo dialeto. Em sua obra posterior (2005), no entanto, a autora
adota o termo, referindo-se ao português do Brasil e utiliza-o em expressões como: dialeto popular (p. 34,
184, 201, 211), dialeto das classes menos favorecidas, (p. 38), dialetos rurais, dialeto caipira (p. 93), etc.
Outros autores também o têm utilizado como sinônimo de variedades e falares. Assim o faz Mattos e
Silva (2004a, p. 63-68), quando, ao discorrer, sobre a diversidade lingüística brasileira e o ensino de
português, utiliza, reiteradamente, dialetação social, dialetos dos falantes, diversidade de dialetos, dialeto
socialmente privilegiado, até mesmo dialeto da escrita. Pretti (1997, p. 20), explicando a diferença entre
falantes urbanos cultos e comuns, para caracterizar o português do Brasil, também utiliza o termo quando
afirma: “[...] com isso, estamos propondo a relatividade da classificação de dialetos sociais e registros.”
Travaglia (1997, p. 42) procurando diferenciar dialeto e registro, afirma: “Os dialetos são as variedades
que ocorrem em função das pessoas que usam a língua, ou como preferem alguns, para empregar uma
terminologia derivada da teoria da comunicação, dos emissores. Já os registros são as variedades que
ocorrem em função do uso que se faz da língua, como preferem alguns, dependem do recebedor, da
mensagem ou da situação.” No presente trabalho, utilizo também o termo dialeto no sentido de variedade
lingüística e falares.
16

também, a própria capacidade de eles, os graduandos e seus futuros alunos, se


expressarem na língua culta, descrença essa que, contrariamente ao que se espera,
parece recrudescer ao final do curso de Letras. Essa descrença, ao que tudo indica,
repercute no desempenho dos alunos do Ensino Fundamental e Médio, que acabam
introjetando o discurso de que aprender português é muito difícil, ou impossível, e de
que só mesmo os professores e escritores é que sabem falar e escrever corretamente.

Compreender as atitudes lingüísticas, isto é, investigar como os usuários avaliam a


variedade utilizada por eles próprios e por seu interlocutor, tendo em vista os traços
correlacionados com sua posição social, ou ainda com as práticas de oralidade e
letramento, pode abrir caminho para, entre outros, possibilitar a otimização da
aprendizagem escolar e motivar o desenvolvimento de competências lingüísticas, dentro
de uma visão mais ecológica no ensino de língua. Pereira (2006, p. 165), afirma sobre
isso:

Essa consciência de se considerar o contexto de ensino e aprendizagem na


prática de sala de aula implica a adoção de uma perspectiva ecológica para o
ensino de línguas. Conforme van Lier (1997:183) a perspectiva ecológica
“oferece a alternativa de se olhar para os contextos em que o uso e a
aprendizagem de língua ocorrem” .

Essa perspectiva ecológica sustenta também a proposta de Bortoni-Ricardo (2005,


p. 40, p. 52) de estudar o português brasileiro como um continuum de urbanização, para
a “análise dos atributos socioecológicos dos falantes” e/ou da comunidade de fala (p.
93) e suas repercussões no trabalho escolar com a língua materna. A autora explica (op.
cit., p. 151):

A principal influência dos estudos sociolingüísticos para a educação provém da


ênfase veemente na premissa de que todas as variedades que compõem a
ecologia lingüís tica de uma comunidade, sejam elas línguas distintas ou dialetos
de uma ou de mais de uma língua, são funcionalmente comparativos e
essencialmente equivalentes. Nenhum deles é inerentemente inferior e, portanto,
seus falantes não podem ser considerados lingüisticamente ou culturalmente
deficientes. Essa premissa representou uma verdadeira revolução na forma de
encarar as variedades ou línguas minoritárias nas escolas. Muito embora os
preconceitos lingüísticos não tenham desaparecido, a sociolingüística forneceu
munição teórica e tecnológica para combatê-los, bem como para que os sistemas
escolares começassem a se preocupar com a adequação de seus métodos às
peculiaridades lingüísticas e culturais de seus alunos que não provinham das
camadas dominantes da sociedade.
17

O estudo das atitudes e das crenças lingüísticas é uma das tarefas que a
Sociolingüística se propõe, sendo mesmo uma das suas cinco questões fundadoras
(WEINREICH; LABOV; HERZOG, 1968/2006)4, e se refere ao problema da avaliação,
relativo aos julgamentos subjetivos do usuário quanto à sua própria variedade
lingüística e à dos seus interlocutores. Portanto os trabalhos que discutem a rejeição da
escola em relação ao dialeto do aluno e vice-versa devem ser tratados sob a ótica do
problema da avaliação lingüística. Todas as outras questões – a baixa auto-estima do
aluno causada pelo desprestígio conferido à sua variedade dialetal; o conflito sócio-
cultural entre os dialetos; a própria noção de preconceito lingüístico – estão associadas a
esta: o valor social atribuído às variantes, o grau de consciência da variação dialetal e a
crença na superioridade da escrita em relação à fala.

Ao contrário do enfoque de Amaral (1989), que buscou mensurar as atitudes dos


professores em relação aos dialetos de seus alunos, procuro, nesta tese, alargar o âmbito
da pesquisa nesse campo, investigando, além das crenças dos professores, as atitudes e
as crenças dos alunos.5

O foco da minha tese é dual: por um lado, visa auscultar crenças do aluno e do
professor de português do Ensino Fundamental em relação à sua concepção de língua,
linguagem e variação lingüística; por outro, visa examinar as atitudes dos alunos em
relação à variedade lingüística que utilizam e a outras diferentes, inclusive à que escola
parece pretender que ele adote.

Com relação a essa segunda dimensão, interessa-me também investigar até que
ponto as atitudes dos alunos de escola pública com relação à variedade lingüística que
utilizam podem configurar um caso de prestígio encoberto, tal como postula Labov
(1972).6

4
Utilizo a versão 2006, que traz o texto traduzido para o português. A questão da avaliação lingüística
é um dentre os outros problemas: fatores condicionantes, transição, encaixamento e implementação.
5
Na Seção 3.1, apresento uma diferenciação detalhada entre crença e atitude.
6
A noção de prestígio encoberto foi proposta por Labov (1972), para explicar o desejo do falante de
manter sua identidade no interior de seu grupo social. Na Seção 3.4, retomo essa questão.
18

Portanto uma possível contribuição da presente pesquisa seria oferecer um estudo


empiricamente sustentado que ampliasse a compreensão sobre efeitos ou conseqüências
pedagógicas advindos de crenças dos professores sobre o que são a língua e a
linguagem, e de crenças e julgamentos subjetivos dos alunos sobre em que consiste a
variação dialetal.

As questões nucleares do presente estudo, conforme explicito na próxima Seção,


correlacionam-se diretamente a essa contribuição.
19

2. PERGUNTAS FUNDADORAS

[...] ainda creio que a mais importante contribuição que a Lingüística pode trazer
ao professor em sala de aula é reformular sua visão sobre o que são língua e o
aprendizado de uma língua. Isto é mais uma questão de atitude e conceito do
que de análise gramatical, em comparação com outra, ou de uma série de
julgamentos acerca da aceitabilidade de um certo número de formas e expressões
específicas. (HILL, 1974, p. 120-121)

Esta tese visa responder as seguintes perguntas:

1. Há correlação entre as crenças dos professores sobre o que são língua,


linguagem, variação e aprendizagem lingüística e as crenças e as atitudes
dos alunos sobre sua própria variedade dialetal?

Se afirmativo, as crenças dos professores podem ter algum reflexo


nas atitudes desfavoráveis do aluno em relação à própria
capacidade de domínio das variantes padrão?
Nesse sentido, inspiro- me na sugestão de Amaral, que enfatiza (1989, p.
117) a necessidade de se

[...] realizar estudos que abordassem as atitudes lingüísticas de alunos falantes


do dialeto não-padrão para com a sua própria fala bem como para com a fala
padrão dos outros. Assim, poderia verificar até que ponto eles teriam introjetado
a rejeição da própria imagem por falarem uma variedade lingüística
desprestigiada. Tais estudos poderiam pesquisar ainda até que ponto a
depreciação da própria fala interfere na aprendizagem da norma padrão.

2. Levando-se em conta (1) e (2), é possível flagrar, através de teste de


atitudes, um prestígio encoberto (cf. LABOV, 1972) dos alunos de escola
pública em relação à sua própria variedade lingüística?
20

3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Neste capítulo, desenho o quadro metateórico em que se insere o estudo das crenças
e das atitudes, apresentando, inicialmente, a relação entre ambas para, depois, oferecer
uma síntese da literatura disponível sobre atitudes lingüísticas.

3.1 As atitudes e as crenças

Para introduzir uma discussão sobre as atitudes lingüísticas, é preciso lembrar que,
dentre os problemas de base tratados pela Sociolingüística no âmbito da variação e
mudança (WEINREICH, LABOV e HERZOG, 1968/2006, p. 124), trato, conforme já
adiantei, do problema da avaliação, que busca compreender os correlatos subjetivos (ou
latentes) das mudanças lingüísticas em curso.

O estudo das atitudes lingüísticas está relacionado, portanto, ao da avaliação


lingüística, isto é, ao exame dos julgamentos dos falantes em relação à língua ou ao
dialeto utilizado por seu interlocutor, estando subentendidas aí as mudanças
implementadas, ou em implementação na língua, em relação à variedade considerada
padrão. Os componentes dessas atitudes são o que pensam, sentem e como reagem os
falantes expostos aos estímulos lingüísticos que lhes são apresentados7.

Williams (1973a, p. 113), procurando conceituar atitude lingüística, assim se


expressa:8
Já ficou constatado pelos pesquisadores (e.g. Labov, 1966, Shuy 1969, Williams
1970) que as atitudes lingüísticas são o outro lado da moeda do dialeto social.
Isso significa que, se temos traços lingüísticos que estão correlacionados com a

7
Com relação à reação dos falantes a esses estímulos, Labov (1972b) distingue três tipos. São eles: os
indicadores, que ficam abaixo do nível da consciência e dizem respeito a mudanças lingüísticas no início
da sua implementação; os marcadores, que implicam diferença social e estão correlacionados a grupos
sociais e a estilos de fala, emergindo quando a mudança lingüística já está bem adiantada; os estereótipos,
que têm correlação com o padrão estilístico, gênero e diferenciação sócio-econômica, mas não com a
idade, constituindo uma avaliação consciente com relação à fala de um dado grupo.
8
Como norma, ofereço uma tradução das citações em tela, pela qual assumo a responsabilidade.
21

estratificação social dos falantes, então parece plausível – e as pesquisas têm


confirmado isso – que esses traços podem servir de pistas para a avaliação do
ouvinte quanto ao status social dos falantes.9

Para ampliar a compreensão sobre as atitudes lingüísticas, é importante também


incorporar um estudo das crenças, tema em relação ao qual já existe um grande interesse
das pesquisas em Sociologia, Filosofia, Educação, Antropologia, Psicologia e em
Lingüística Aplicada ao ensino de língua. Barcelos (2006b, p. 15) assim sumariza o que
tem sido feito no Brasil:

Os estudos a respeito de crenças sobre ensino e aprendizagem de línguas têm


crescido bastante nos últimos anos no Brasil e no exterior. No Brasil, um número
razoável de teses e dissertações vem sendo defendido nos diversos programas de
pós-graduação no país [...] Além disso, um grande número de artigos [...] e
capítulos de livros [...], bem como a publicação de um livro a respeito de crenças
sobre aquisição de segunda língua (Kalaja & Barcelos, 2003) sugerem a
importância desse conceito para a Lingüística Aplicada. Nunca se publicou tanto
a respeito de crenças no Brasil e no exterior desde 1995.

Tais estudos têm considerado as crenças dentro da área da cognição, que se


constitui na interação social, moldada por processos culturais e sociopolíticos. A esse
respeito, afirma a mesma autora (op. cit., p. 17): “[...] a concepção atual de cognição
incorpora muitos outros componentes da vida mental humana, tais como capacidade
simbólica, o eu, a vontade, crenças e desejo.”

É consensual, nessas pesquisas, o reconhecimento da dificuldade de se chegar a


uma conceituação categórica sobre crenças, devido ao fato de esse estudo já ter
resultado em uma grande variedade de terminologias, além de tratar de um constructo
de grande complexidade. Por exemplo, se por um lado, as crenças, como afirma Pajares
(1992), tendem a ser estáveis, difíceis de serem alteradas, por se formarem cedo, por
outro lado, estando ligadas ao contexto, podem ser modificadas ou substituídas por
outras a partir da reflexão.

9
The point has already been made by a number of researchers (e.g. Labov 1966, Shuy 1969, Williams
1970) that linguistics attitudes are the other side of the social dialect coin. That is to say, if we have
language features that are known to be correlated with the social stratification of speakers, then it seems
plausible – and research has borne out – that such features may serve as cues in the listener’s estimate of a
speaker’s social status.
22

Barcelos (op. cit., p. 18) assim conceitua crenças :

Entendo crenças, de maneira semelhante a Dewey, como uma forma de


pensamento, como construções de realidade, maneiras de ver e perceber o
mundo e seus fenômenos, co-construídas em nossas experiências e resultantes de
um processo interativo de interpretação e (re)significação. Como tal, crenças são
sociais (mas também individuais), dinâmicas, contextuais e paradoxais.

Por sua vez, Santos (1996, p. 8), em seu trabalho sobre atitudes e crenças escolares
relativas ao ensino de português na escola, esclarece, preliminarmente:

Crença seria uma convicção íntima, uma opinião que se adota com fé e certeza.
[...] Já atitude seria uma disposição, propósito ou manifestação de intento ou
propósito. Tomando atitude como manifestação, expressão de opinião ou
sentimento, chega-se à conclusão de que nossas reações frente a determinadas
pessoas, a determinadas situações, a determinadas coisas seriam atitudes que
manifestariam nossas convicções íntimas, ou seja, as nossas crenças em relação a
essas pessoas, situações ou coisas.

Como se vê, enquanto os teóricos da Lingüística Aplicada, em geral, falam em


crenças e ações, os sociolingüistas, utilizam os termos crenças e atitudes.

Barcelos (2006b, p. 25) apresenta as três formas sugeridas por Richardson (1996)
para se entender ou perceber as rela ções entre crenças e ações:

i) Relação de causa-efeito: Embora não se trate de uma relação


simples, ela existe, de fato, visto que há uma relação recíproca de
influência de crenças e ações.
ii) Relação interativa: Trata-se do efeito da reflexão do professor e do
aluno sobre o processo de ensino/aprendizagem. A percepção do
beneficio de certas práticas pode determinar a mudança ou o
surgimento de novas crenças. “Não é uma relação de causa e
efeito. É uma relação em que a compreensão dos limites
contextuais ajuda na compreensão das crenças.” (Barcelos, op.cit.,
p. 26)
iii) Relação hermenêutica: Aqui se considera a complexidade das
relações entre o discurso e a prática, investigando não apenas os
desencontros entre crenças e ações, mas também a influência dos
fatores contextuais na percepção/mudança das crenças.
iv)

Como se vê, essas três formas não são excludentes, mas cada uma delas amplia a
visão que se deve ter das relações entre crenças e ações. É importante, por exemplo, que
se consiga compreender mais facilmente a influência dos fatores contextuais na
23

contradição, por parte dos professores, entre o que acreditam e fazem, ou seja, o hiato
entre teoria e prática. Nesse sentido, os pesquisadores avaliam que o desencontro entre
os interesses dos professores e os da organização escolar como um todo constitui um
dos fatores contextuais - exigência dos pais, diretores, escola e sociedade; arranjo da
sala de aula; políticas públicas escolares; colegas; testes; disponibilidade de recursos;
condições difíceis de trabalho; salas cheias; alunos desmotivados; programa fixo;
resistência dos alunos a novas maneiras de aprender; carga horária excessiva de
trabalho, etc - que moldam a realidade das salas de aula e que inibem a habilidade dos
professores em adotar práticas que refletem suas crenças (cf. BARCELOS, op. cit.,
p.30).

Já na perspectiva dos estudos sociolingüísticos, há que se ressaltar que, dentre os


problemas de base tratados pela Sociolingüística está o da relação entre crença e atitude.
Dittmar (1976, p. 181) observa que a mensuração das atitudes lingüísticas baseia-se em
dois quadros teóricos diferentes: os mentalistas e os behavioristas. Enquanto os
primeiros propõem que as atitudes sejam analisadas a partir de três componentes
(afetivo, cognitivo e conativo), os behavioristas preferem considerá- las a partir apenas
da dimensão afetiva (avaliativa). No entanto, para Rokeach (1968 apud DITTMAR,
1976, p. 181), as atitudes são primariamente constituídas por crenças. Para Fishbein
(1965), enquanto as atitudes dizem respeito ao aspecto afetivo do sujeito em relação a
determinado objeto, as crenças revelam a dimensão cognitiva e ativa desse mesmo
sujeito em relação ao objeto.10

Para esclarecer melhor a questão da relação entre crenças e atitudes, Santos


(1996, p. 14) apresenta o seguinte exemplo: diante da mesma manifestação de crença
“O Português é muito difícil”, alunos e professores podem ter atitudes opostas.
Enquanto os primeiros rejeitam o objeto, (isto é, a aprendizagem da disciplina
Português) por causa dos obstáculos à aprendizagem em que ele implica, os professores
podem ter uma atitude positiva em relação a ele, justamente por se sentirem valorizados,
já que são capazes de dominar o conhecimento de um objeto tão complexo. Por outro

10 Para esse autor, a crença sobre um objeto pode ser descrita segundo sua relação com outro objeto ou
conceito, de tal modo que uma afirmação que relacione o objeto da crença a qualquer outro objeto
constitui uma expressão de crença.
24

lado, os alunos podem ter outros tipos de crenças sobre Português, que podem levá- los a
ter uma atitude positiva sobre esse objeto.

Daí a necessidade de não se restringir a uma única manifestação de crenças.


É aconselhável se fazer o levantamento de um conjunto de crenças dos sujeitos,
chegando-se mesmo a um sistema de crenças sobre o objeto investigado, enfoque que
adoto no presente estudo, ao tentar associar uma série de crenças relativas ao mesmo
objeto.

Isso porque o componente ativo das crenças se refere, conforme Santos (op. cit, p.
11) “[...] a intenções de comportamento, ou seja, crenças sobre o que deve ser feito em
relação ao objeto.” Se é possível fazer o levantamento de um conjunto das crenças dos
professores e dos alunos sobre questões relativas à língua, à linguagem, à variação e à
aprendizagem lingüística, então se poderá obter um sistema de crenças que pode
explicar melhor as atitudes dos professores em relação à variedade lingüística de seus
alunos e, por conseguinte, a atitude desses alunos em relação ao seu próprio
desempenho lingüístico.

Como se vê, os componentes ativo e cognitivo, excluídos pelos behavioristas da


consideração das atitudes, surgem, portanto, no tratamento das crenças, que apresentam
também um aspecto avaliativo.

Encerrando a distinção entre crenças e atitudes tanto no âmbito da Lingüística


Aplicada quanto no da Sociolingüística, resta ressaltar um aspecto cuja explanação é
relevante para os fins do meu estudo: a sutil diferenciação entre crença em e crença
sobre. Para tanto, novamente recorro a Santos (op. cit, p. 10-11) que esclarece:

A crença ou a descrença de um indivíduo na existência de um dado objeto dá,


normalmente, pouca ou nenhuma informação a respeito da posição em que ele
coloca o objeto dentro da dimensão avaliativa. Em outras palavras, tal crença
não é sintoma apreciável da atitude, segundo Osgood define, e só fracamente
poderia ser relacionada a ela. Muito ao contrário, a crença que se elicita de um
indivíduo sobre o objeto pode revelar, imediatamente, a posição em que esse
indivíduo coloca o objeto dentro da dimensão avaliativa: a atitude em relação ao
objeto. [...] Compreendendo o problema, para dar conta da situação, Fishbein e
Raven estabeleceram uma distinção entre crença em e crença sobre um objeto,
levando em conta essa “crença na existência de uma relação” entre um objeto e
algum outro objeto, qualidade, etc. Mas deve ser entendido que as várias crenças
nas relações entre um objeto e outros objetos ou qualidades – que eles chamam
25

crenças sobre – não escapam à definição de crença proposta por eles. Da mesma
forma que na crença em um objeto (dizendo exclusivo respeito à existência do
objeto), na crença sobre o objeto (relacionada à natureza do objeto, à sua
maneira de existir) o que está em jogo é também a dimensão de probabilidade de
um conceito. Na crença sobre, o que o sujeito assume não é a “probabilidade” ou
“improbabilidade” da existência do objeto, mas a “probabilidade” ou
“improbabilidade” de seu relacionamento com outros objetos.

Nesse sentido, cumpre esclarecer que minha pesquisa está direcionada para o
estudo de crenças sobre, isto é, a posição em que os professores e os alunos colocam os
objetos (língua, linguagem, variação e aprendizagem lingüística) dentro da dimensão
avaliativa, posição essa que, em última instânc ia, leva à atitude deles em relação a esses
objetos.

Da estreita relação entre crenças e atitudes, confirma-se que, como já ficou dito
acima, uma mudança num desses setores pode acarretar também mudanças no outro.
Santos (op. cit., p. 15) afirma ainda: “V árias pesquisas produziram evidências de que a
atitude de um indivíduo pode ser mudada, se forem mudadas suas crenças sobre o
objeto.”

Tal assertiva é extremamente importante para as questões fundadoras do presente


estudo. Retomo-as:

§ Há correlação entre crenças dos professores sobre o que são língua, linguagem,
variação e aprendizagem lingüística e crenças e atitudes dos alunos sobre sua
própria variedade dialetal?
§ Se afirmativo, as crenças dos professores podem ter algum reflexo nas atitudes
desfavoráveis do aluno em relação à própria capacidade de domínio das variantes
padrão?
§ Levando-se em conta (1) e (2), é possível flagrar, através de teste de atitudes, um
prestígio encoberto (cf. LABOV, 1972) dos alunos de escola pública em relação à
sua própria variedade lingüística?
26

Se tais perguntas sobre crenças e atitudes puderem ser respondidas, então, haverá
uma possibilidade de se resolver o problema aí subjacente.

Passo, a seguir, a resenhar a literatura relativa aos estudos das atitudes


lingüísticas.

3.2 O estudo das atitudes lingüísticas

As primeiras investigações sobre atitudes lingüísticas remontam à década de 60,


quando Lambert et al. (1960) investigaram a avaliação de jovens canadenses falantes de
francês e de inglês, em relação à sua própria língua. O experimento, que passou a ser
conhecido como matched guise, ou comparação de modalidades, como foi traduzido em
português por Bortoni- Ricardo (1977), consistiu em solicitar a falantes bilíngües desses
idiomas que gravassem um mesmo texto lido ora numa língua ora noutra. Jovens
estudantes foram convidados a ouvir as gravações, supondo que se tratassem de leitores
diferentes e, a seguir, a apresentar, sobre esses falantes, julgamentos, numa escala de
“muito pouco” a “muito”, em relação a altura, beleza, inteligência, confiabilidade,
ambição, habilidade para o trabalho, etc., num total de quatorze itens.

O resultado evidenciou que os juízes falantes de inglês quanto os de francês


avaliaram melhor os falantes de língua inglesa, não se dando conta de que se tratava do
mesmo leitor do texto. Isso levou à conclusão de que as amostras de fala provocaram
nos ouvintes atitudes que eles associaram ao idioma do leitor que ouviram e avaliaram
e, nesse caso, o inglês canadense teve avaliação mais positiva.

O importante dessa experiência foi a revelação da existência de estereótipos de


grupos dominantes que são adotados pelos grupos dominados na construção de sua
própria auto- imagem. Quanto a isso, Williams et al. (1976, p.1) já comentaram:

Nossa fala, oferecendo rica variedade de correlações étnicas e sociais, cada uma
delas tendo atitudes correlatas em nosso comportamento e no de nossos ouvintes,
constitui um meio através do qual percebemos nossas características sociais e
27

étnicas, sendo, portanto, uma parte do processo social de conservação (ou


mudança). 11

Dentre as investigações no campo das atitudes lingüísticas, grande destaque teve a


que foi empreendida por Labov (1976) entre os falantes de inglês da Ilha Martha’s
Vineyard, na costa de Massachusets. Investigando a diferença de tratamento fonético
dado pelos vineyardenses à pronúncia do ditongo [ay] em palavras como white, wine e
do ditongo [aw], em palavras como house, out, Labov percebeu que a diferenciação
lingüística se dava entre membros da população que lutavam por se manter na Ilha e
outros que desejavam imigrar para o continente. Os primeiros adotavam uma pronúncia
típica do lugar, centralizando o [a] daqueles ditongos, ao passo que os que não tinham
apego à Ilha adotavam uma pronúncia que é encontrada no continente, revelando o
quanto a variável social incide nos comportamentos lingüísticos e, portanto, nas atitudes
dos falantes em relação à língua.

Outra pesquisa de Labov (1966) reveladora de atitudes em relação ao uso de


variantes que marcam diferentes valores sociais foi a que empreendeu nas lojas de Nova
York em relação ao tratamento dado ao [r] em posição pós- vocálica pelos vendedores.
A pesquisa concluiu que, quanto mais elevado o padrão sócio-econômico dos
freqüentadores das lojas, mais destacada era a realização de [r] na pronúncia dos
empregados.

A técnica do matched guise, medida indireta, postulada por Lambert et al. (1960),
tendo sido muito aplicada, foi sofrendo modificações, ora quanto ao tipo de produção de
estímulos (entrevistas, ao invés de leitura de textos, por exemplo) ora quanto à escala de
avaliação. Em relação a esta última, a mais conhecida tem sido a do diferencial
semântico, que consiste na construção de uma série de escalas bipolares de sete pontos,
com adjetivos de valores opostos colocados em ambas as extremidades de cada escala.
Desse modo, uma pessoa pode classificar uma amostra de fala numa escala como a que
se segue:

11
That our speech, by offering a rich variety of social and ethnic correlates, each of which has attitude
correlates in our own and our listeners’ behaviors, is one means by which we remind ourselves of social
and ethnic boundaries, and is thus a part of the process of social maintenance (or change).
28

Rápido __:__:__:__:__:__:__: lento

Construindo-se um conjunto de escalas desse tipo, obtém-se uma classificação


múltipla de atitudes em relação a um estímulo. Como as respostas são marcadas por
números nos traços da escala, pode-se chegar a um cálculo descritivo-demonstrativo das
reações subjetivas dos falantes às amostras de fala e, conseqüentemente, aos dialetos
dos sujeitos avaliados.

Essa metodologia tem também a vantagem de fazer emergir certas dimensões das
escalas avaliativas. Nos experimentos de Williams (1973b, p. 116-117), as dimensões
observadas em reações de professores à fala de alunos brancos, negros e americanos-
mexicanos foram confiança/entusiasmo (confidence/eagerness) e etnia /não padrão
(ethnicity/nonstandardness).

A literatura registra pesquisas de atitudes lingüísticas focalizando as relações entre


língua e variáveis sociais. Uma delas (PUTNAM; O’HERN, 1955) buscou, ao mesmo
tempo, descrever diferenças dialetais e avaliar a importância dessas diferenças no
julgamento do status social de falantes negros de classe social baixa de Washington, a
partir de sua fala, que foi analisada quanto a certos desvios fonêmicos e sintáticos em
relação ao inglês padrão.

Para essa pesquisa, a construção das amostras foi feita, solicitando-se a três
indivíduos desse meio social e a nove outros de classe mais alta que lessem uma fábula
e a recontassem em seguida com suas próprias palavras para serem gravadas. Tais
gravações foram submetidas à apreciação de juízes aos quais se solicitou que avaliassem
o status social dos falantes. A correlação entre os julgamentos e o status social foi
bastante alta, evidenciando a importância das marcas dialetais na identificação da classe
social.

Na década de setenta, Shuy e Williams (1973), partindo da constatação de que os


julgamentos subjetivos sobre os dialetos não constituem uma simples diferenciação
unidimensional da estratificação social, mas uma variedade múltipla de associações
conotativas, examinaram os julgamentos de americanos de Detroit em relação a como
falantes britânicos, brancos sulistas, negros e usuários da variedade padrão do inglês
usavam, na própria Detroit, essa língua.
29

Esses sociolingüistas pretendiam investigar se a estratificação social existe não


apenas em alguns aspectos dos dialetos, mas se ela pode ser encontrada também nas
atitudes subjetivas das pessoas em relação aos falantes desses dialetos, isto é, a
estratificação não seria apenas objetiva, mas também subjetiva. Por outras palavras, a
reação de uma pessoa a um dialeto pode não ser apenas o reflexo de suas atitudes sobre
o estrato social desse dialeto, mas pode incluir também um conjunto de atitudes
relacionadas às qualidades aparentes das pessoas que o falam.

Para isso, utilizaram dados de estudo anterior (SHUY; BARATZ; WOLFRAM,


1969) que registrara julgamentos de estudantes do nível fundamental e secundário, bem
como adultos de Detroit. Os 620 indivíduos da amostra que responderam ao teste
tinham as seguintes características:
(1) raça branca (364), negra (256);
(2) status sócio-econômico variando entre médio-alto, com formação
universitária: dentistas, engenheiros, etc (167); nível de instrução secundária
e técnica - pequenos negociantes autônomos ou empresários (173);
trabalhadores com escolaridade de nível secundário - motoristas de ônibus,
marceneiros, telefonistas, etc (140); trabalhadores com menos escolaridade -
lavadores de pratos, vigias noturnos, pedreiros (140);
(3) idade entre 10 e 12 anos (286), 16-18 anos (170), mais de 21 anos (164);
(4) sexo masculino (305), feminino Para se obterem respostas que revelassem
julgamentos de dimensão afetiva, foram construídas doze escalas de
diferencial semântico, visando mensurar certos domínios de dimensões
avaliativas, tais como valor (bom-ruim, positivo-negativo, esperto-tolo,
valoroso-indigno, polido-áspero, etc), complexidade (fácil-difícil, simples-
complexo etc), potência (forte-fraco, inteligente-estúpido, cuidadoso-
displicente, etc), dinamicidade (rápido-lento, etc). (315).

Do ponto de vista de valor, o dialeto britânico (BBC - padrão), o de Detroit e o


classificado como padrão foram os mais bem avaliados, sendo o falar sulista, o pior.
Quanto a complexidade, o falar britânico foi avaliado como o mais complexo e o dialeto
padrão muito mais do que os outros três. O dialeto de Detroit, o britânico e o padrão
30

foram bem avaliados na dimensão de potência, ficando o falar sulista em último lugar.
Finalmente, do ponto de vista da dinamicidade, o falar britânico foi considerado o mais
ativo dentre os cinco e o sulista, o menos ativo.

A pesquisa revelou também o inglês britânico como o mais bem avaliado,


dependendo do status social dos juízes. Quanto mais alto o status social do indivíduo,
mais positivamente ele julga o falar britânico. Foi também constatada a diferença entre
os grupos de idade, nesse caso, principalmente em relação ao dialeto padrão, que é visto
mais positivamente pelos adultos do que pelos jovens.

Ficou ainda comprovada a interação entre a etnia dos respondentes e os dialetos


avaliados, principalmente em relação às variedades branco sulista, negra e padrão,
ficando os de Detroit e o britânico sem grande diferença entre si. O dialeto negro foi o
que mais revelou interação com a etnicidade, sendo ele naturalmente mais bem avaliado
pelos respondentes negros. Em contrapartida, os juízes brancos julgaram a variedade
padrão e a dos brancos sulistas como melhores.

Houve também interação entre a etnia dos respondentes e o tipo de dialeto quanto à
dimensão potência: os juízes brancos apreciaram melhor a fala dos brancos sulistas do
que os negros.

Em resumo, essa pesquisa demonstrou que os indivíduos constroem atitudes


estereotipadas sobre os dialetos, com determinado componente psicológico, como acima
demonstrado. Tais atitudes constituem o outro lado da moeda dos dialetos sociais, isto
é, podemos classificar consistentemente tanto os dialetos sociais, quanto as atitudes
subjetivas das pessoas em relação a esses dialetos.

Interessante também a investigação de Wölck (1973) acerca das atitudes em relação


ao espanhol e ao quechua no Peru bilíngüe. Em sua pesquisa, esse sociolingüista
procurou controlar as variáveis independentes, como classe social, competência
lingüística (falantes bilingües), estilo de linguagem utilizado nos estímulos (informal,
não muito coloquial) e tópico discursivo, para a montagem das amostras de fala (decidiu
pelo tema tourada, tema comum entre falantes e juízes). As amostras foram gravadas
por indivíduos bilingües e avaliadas por estudantes do final do Ensino Fundamental, do
31

Ensino Médio e universitários, além de pequenos grupos de professores, homens em sua


maioria.

A técnica utilizada foi a do matched guise, tendo-se construído escalas de


diferencial semântico, a partir de acurada pesquisa sociolingüística de modo a evitar a
utilização de termos que induzissem a critério classificatório (ex.: cognitivo /afetivo) ou
que levassem a distorções na sua interpretação: como exemplo, o vocábulo cholo, na
escala cholo ___:___:___:___:___:___:___ decente. Nesse exemplo, o vocábulo cholo
remete ao habitante rude das montanhas, de traços fortes e grosseiros, que não é mais
indígena, mas ainda não se integrou totalmente na cultura do mestiço, falante do
espanhol. Isso lhe dá certa conotação negativa; por outro lado, ele constitui importante
referência antropológica e cultural do peruano nativo, o que lhe garante também uma
interpretação positiva.

Feitos os testes, os falantes do espanhol foram mais bem avaliados em relação a


itens ligados a aspectos institucionais (classe alta/classe baixa, letrado/não- letrado,
rural/urbano, etc.). Por outro lado, aos falantes do quechua foram atribuídos valores
mais altos dentro de uma escala afetiva (feio/bonito, fraco/forte, gentil/ pouco amável,
etc.), revelando, segundo conclusão dos pesquisadores, forte lealdade nativa ao
quechua, a despeito do estigma social que lhe foi atribuído.

Taylor (1973) empreendeu, nos Estados Unidos (Federal City College and Center
for Applied Linguistics), pesquisa de atitudes lingüísticas dentro do âmbito da
sociolingüística educacional. O pesquisador partiu da hipótese de que muitos dos
problemas que os professores enfrentavam em sala de aula deviam ser influenciados por
suas atitudes em relação às diferenças relativas a língua e cultura. Nesse caso, foi
levantada a hipótese de que as interações lingüísticas dos professores com alunos
negros, ou de outro grupo minoritário, poderiam ser mais bem compreendidas
comparando-se as ações desses professores com as atitudes expressas em relação à
variedade não-padrão e, especialmente, em relação ao Black English.

Os resultados de Taylor mostraram que o grupo de professores com atitudes mais


positivas em relação ao dialeto não-padrão foram os que tinham entre três a quatro anos
de magistério, nesse caso revelando-se abertos para novas metodologias. Os professores
32

mais novos pareciam ainda inseguros quanto a experimentar avanços metodológicos


nesse sentido.

Também Williams e Naremore (1974) empreenderam pesquisa sobre atitudes


dentro da área da educação. Partindo da mesma tese de seu experimento anterior,
segundo a qual as pessoas têm, em graus variáveis, atitudes estereotipadas sobre os
dialetos sociais e seus falantes, e que essas atitudes determinam como as pessoas
distinguem as pistas na fala dos outros, procurou investigar uma forma de determinar e
medir as atitudes de professores nas suas avaliações da fala de seus alunos. Utilizando a
mesma metodologia de aplicação do diferencial semântico, puderam ampliar sua tese,
no sentido de que as pessoas tendem a utilizar atitudes estereotipadas como ponto de
apoio para sua avaliação para o que quer que lhe seja apresentado como amostra de fala
de outrem.

3.2.1 As dimensões de poder e solidariedade nos julgamentos lingüísticos

Os testes de atitudes, como se pôde notar, fazem emergir dimensões nas escalas
avaliativas, ligadas, de certa forma, à subjetividade dos ouvintes em relação às
qualidades aparentes dos dialetos ou dos ind ivíduos. Através desses julgamentos, somos
capazes de surpreender significados importantes para a identificação dos grupos de
falantes de determinadas variedades, tais como os ligados a questões de etnia ou de
prestígio social. Vimos acima, por exemplo, na pesquisa empreendia por Wölck, no
Peru, como aos falantes do quechua foram atribuídos valores mais altos dentro da
dimensão do afeto, revelando lealdade nativa; quanto aos do espanhol, os valores
emergentes foram os ligados à dimensão de status social e intelectual.

Conforme observa Amaral (1979, p. 25-26), em geral, os estudos de atitudes


lingüísticas revelam que o falante, utilizando uma língua ou variedade lingüística de
prestígio, é percebido favoravelmente pelos ouvintes em relação a inteligência,
competência, ambição, segurança, sucesso educacional e ocupacional. Daí é derivada a
consideração de que a variedade padrão é associada à dimensão de poder, “status” e
controle social. Em outras palavras, é a variedade que cumpre funções sociais
privilegiadas pelo poder.
33

Chambers (1995) lembra que, nos testes atitudinais, os sujeitos tendem a


discriminar entre as variedades standard e não-standard, a partir de duas dimensões:

Uma dimensão denominada ‘orientação para o prestígio’ (RYAN, 1979, p. 151)


inclui qualidades que têm a ver com inteligência, educação, ambição, riqueza,
sucesso e conquista, e os sujeitos atribuem as avaliações mais altas para essas
qualidades aos falantes da variedade padrão. A outra dimensão, ‘orientação para
a solidariedade’, inclui qualidades, tais como gentileza, amabilidade, amizade,
bondade e confiança, e os sujeitos atribuem as avaliações mais altas para essas
qualidades aos falantes regionais ou de outras variedades não-padrão.12

Nas pesquisas de Shuy e Williams (1973), como descrevi, a dimensão de status


social está ligada ao inglês britânico, mas o dialeto negro se mostrou o mais ligado à
etnia. A dimensão potência se mostrou também significativa em relação à fala dos
brancos.

As dimensões de poder e solidariedade foram elicitadas no trabalho de Brown e


Gilman (1960), que investigaram o tratamento pronominal em italiano, alemão e
francês. Em relação ao francês, é ilustrativa a evolução do significado do tratamento de
vous e tu, desde a época medieval até à modernidade. O primeiro, ao longo dos séculos,
serviu para expressar a dimensão de poder quando usado nas relações não recíprocas,
desde a esfera estatal até o microcosmo das relações familiares, mas passou também a
ser utilizado no tratamento mútuo entre a burguesia e a nobreza, para significar
elegância. Durante muitos séculos, o tratamento vous permaneceu significando poder
nas relações sociais assimétricas. Quanto ao tratamento tu, inicialmente utilizado no
tratamento mútuo das classes mais baixas, passou, modernamente, a expressar
intimidade ou solidariedade, o que tem prevalecido nas sociedades modernas mais
abertas à ideologia igualitária.13

12 One dimension, called ‘status-stressing’ (RYAN, 1979, p. 151) includes qualities having to do with
intelligence, education, ambition, wealth, success and achievement, and subjects typically assign highest
evaluations for these qualities to standard speakers. The other dimension, ‘solidarity-stressing’, includes
qualities such as kindness, likability, friendness, goodness, and trust, and subjects assign highest
evaluations for these qualities to regional or other non-standard speakers.
13
Sobre a análise detalhada desse tema, ver o artigo de RONCARATI a respeito das formas de
endereçamento (cf. VÔTRE, Sebastião Josué e RONCARATI, Claudia (Org.). Anthony Julius Naro e a
lingüística no Brasil: uma homenagem acadêmica, por sua contribuição relevante ao estudo do português .
Rio de Janeiro: 7 Letras/FAPERJ (No prelo).
34

Essas mesmas dimensões foram retomadas por Ryan (op. cit.) que, em seu estudo
sobre as causas da persistência das variedades lingüísticas de baixo prestígio, distingue
esses dois importantes significados da interação social afetando o uso da linguagem:
status e solidariedade, sendo a primeira delas expressa por prestígio, poder e controle,
ligados à situação sócio-econômica dos grupos dos falantes representados; a outra
dimensão, a de solidariedade, é julgada como própria do falante com o qual o “juiz” se
identifica, de fácil interação, aberto, íntimo. A autora conclui (op. cit., p. 150): "Assim,
pode-se esperar índices de maior solidariedade para uma variedade não-padrão, da parte
de membros de um grupo associado com essa variedade lingüística”14

Resumindo esse ponto de vista, a autora (p. 150-151) cita Fishman (1970):

[...] uma variedade de fala (a padrão) é usualmente associada a status, alta


cultura e aspiração à mobilidade social, enquanto a segunda variedade (a não-
padrão) é tipicamente conectada com solidariedade, camaradagem e intimidade
num grupo de baixo status15 .

A predeterminação das dimensões a serem elicitadas quando da construção dos


testes de atitudes é questão controversa, mas Ryan (op. cit, p. 154) considera que ela
seja necessária a fim de se explorar sistematicamente a multidimensionalidade das
atitudes lingüísticas, embora julgue necessário estudo prévio para se estabelecer que
escalas de julgamento representam melhor as dimensões previstas. De qualquer modo, a
autora reconhece (op. cit., p. 150) a relevância das dimensões de poder e solidariedade,
duas importantes dimensões das interações sociais que afetam o uso da linguagem:
“Três de nossos estudos de reação avaliativa identificaram poder e solidariedade como
duas importantes dimensões da interação social que afetam o uso lingüístico”. 16

Passo, agora, a resenhar algumas das pesquisas brasileiras sobre atitudes


lingüísticas.

14
Thus, one might expect higher solidarity ratings for a nonstandard style from members of a group
associated with that language variety.
15
[...] one speech variety (the standard) is usually associated with status, high culture, and aspiration
towards social mobility while the second variety (the non-standard) is typically connected with solidarity,
comradeship, and intimacy within a low status group.
16 Three of our evaluative reaction studies have attempted to distinguish between status and solidarity as
two important dimensions of social interaction affecting language use.
35

3.2.2 Tendências apontadas no contexto brasileiro

No cenário da literatura brasileira, as pesquisas com atitudes lingüísticas têm se


aprofundado justamente no setor educacional, podendo ser catalogadas como resultados
que apontam para o importante papel da escola na construção de atitudes em relação aos
dialetos não-padrão. Nesse sentido, Roncarati (1979) chama a atenção para a
responsabilidade da escola na formação da consciência lingüística dos alunos e focaliza
a importância dos testes de avaliação para se formar, nos professores, essa consciência.
Depois de apresentar depoimento de uma professora, eivado de equívocos sobre a
questão dos usos das variedades lingüísticas, ela comenta (p. 246):

Esse sugestivo depoimento ilustra muito bem atitudes de separativismo


lingüístico (que opõem a língua padrão a outras variedades) instigadas pela
pressão normativa que alija a fala de grupos social e etnicamente marginalizados.
Muitos outros professores manifestaram que, embora admitindo a existência da
heterogeneidade lingüística (ainda não muito bem compreendida), as escolas, na
prática, ainda não sabem direito como trabalhar com as variedades regionais e
sociais dos alunos, porque as escolas não sabem direito como lidar com as
reações de lealdade lingüística e de resistência diante da pressão pelo
aprendizado do padrão dito culto.

Não obstante esse quadro esteja ainda longe de ter melhorado significativamente,
pode-se dizer que trabalhos orientados para essa área da Sociolingüística têm sido
realizados com resultados promissores.

Entre eles, cito novamente o trabalho precursor de Santos (1976). O autor explica
(p. 5) que procurou investigar se a postulação de Labov, segundo a qual “[...] a
percepção da significação social de fatos lingüísticos surge como um terceiro estágio
dentro de um processo geral de aprendizado lingüístico aos quatorze ou quinze anos” se
aplicaria a estudantes de um bairro da zona norte carioca.

Santos selecionou 115 informantes entre 12 e 18 anos, de ambos os sexos, alunos


do segundo segmento do Ensino Fundamental de uma escola pública da cidade do Rio
de Janeiro, além de 18 adultos, pais desses alunos.

Foram escolhidas seis variantes fonéticas consideradas problemáticas, apresentadas


em contextos diferentes, para permitirem a análise da variação social e estilística, a
36

partir da quais se realizaram, por método indireto, testes de avaliação subjetiva e de


percepção dessas variantes.

Foram as seguintes as variantes examinadas: presença ou não de consoante final


em vocábulos oxítonos [fal’a]; palatalização ou não da lateral antes de vogais anteriores
[kui’é]; nasalização ou não, em sílaba átona final, de vocábulos, como em [nuve];
desenvolvimento de vogal anterior nos grupos consonantais em que o segundo elemento
é oclusivo [pineu]; presença ou ausência de elemento nasal em sílabas simples iniciais
de vocábulos [ignorãti].

Santos concluiu que os alunos provenientes das classes pobres passam a


estigmatizar a variação lingüística de seus pais, em contraposição aos da classe alta. Ele
afirma (op. cit., p. 9):

[...] a escola funcionou como fator de integração entre os educandos quanto às


atitudes em relação às variantes julgadas (e dentro dos contextos em que foram
julgadas), sem haver um apagamento da estratificação social entre eles. É
possível que, com o aumento da idade e da instrução, os adolescentes do estrato
social de mais prestígio venham a se aproximar das atitudes dos pais. Mas é certo
que os jovens do ES-1[estrato pobre] não se aproximarão dos padrões de atitudes
dos seus responsáveis.

Nesse caso, a escola não cumpriu seu papel de conscientizar os alunos sobre o
significado social das variedades lingüísticas. O autor retomou essa pesquisa em 1996,
como se verá à frente.

Bortoni- Ricardo (1981), realizando estudos na área de reações subjetivas e atitudes,


estuda o efeito da concordância verbal não-padrão sobre falantes de dois grupos sociais
distintos: estudantes universitários da UnB e alunos do curso supletivo, noturno, do
segundo ciclo do Ensino Fundamental, também de Brasília. Utilizando amostras de
gravações feitas pelo mesmo falante para serem avaliadas diretamente pelos ouvintes-
juízes, a autora testou o efeito que sentenças contendo regras variáveis de concordância
verbal produziam sobre esses sujeitos e comprovou a falta de conscientização dos
falantes de baixa escolaridade sobre a concordância verbal não-padrão. Desse modo,
identificou dois grupos sociolingüísticos em Brasília em função de suas reações
subjetivas à concordância verbal não-padrão.
37

A análise confirmou que os estudantes do curso superior estigmatizam o uso não-


padrão da concordância verbal, ao passo que os de nível de escolaridade mais baixa não
rejeitam essas formas. A autora acredita que, nessa faixa da população, não há ainda a
influência do prestígio da língua padrão, que caracteriza um estágio avançado no curso
de desenvolvimento de um traço lingüístico. Isso vem sendo confirmado em pesquisas
posteriores.

Temos também a tese de Amaral (1989), orientada por Quental (UFRJ). Aplicando
a técnica de escuta de falas gravadas, a pesquisadora investigou as atitudes de
professores de Português em relação à variedade não-padrão de alunos de escolas
públicas de Brasília, com antecedentes regionais e sociais distintos. Nesse sentido, ela
abriu caminho para a presente pesquisa, que pretende se aprofundar justamente nesse
campo em que entram em cena a escola pública e as variedades lingüísticas
estigmatizadas.

A partir de entrevistas com alunos de escolas do Gama, cidade satélite da Capital e


do Plano Piloto, a autora chegou a quatro amostras de fala, duas da variedade padrão e
duas da variedade não-padrão, “[...] considerando-se como tais, respectivamente, a fala
de classe média do Plano Piloto e a fala de classe baixa da cidade-satélite do Gama”
(op. cit., p. 49). Tais amostras representavam também variedades regionais, do Sudeste
e do Nordeste: os quatro falantes eram naturais de Brasília, dois com antecedentes
maranhenses e dois com antecedentes mineiros, que ficaram assim distribuídos: falante
do Plano Piloto, com antecedentes maranhenses, falante da cidade satélite do Gama,
com antecedentes maranhenses, falante do Gama com antecedentes mineiros, falante do
Plano Piloto, com antecedentes mineiros.

Obtidas as amostras dentro dos critérios técnicos exigidos pela Psicologia Social e
pela pesquisa sociolingüística, 116 professores foram convidados a avaliá- las a partir de
uma escala de diferencial semântico, procurando-se evidenciar as suas reações
subjetivas, consideradas variáveis dependentes, que foram analisadas em função das
variáveis independentes: dialeto ouvido no estímulo, local de atuação do professor
(Plano Piloto/cidade satélite), disciplina lecionada (Português/outras disciplinas) e
região de origem (professores de origem nortista e/ou nordestina e professores de outras
regiões).
38

Os resultados mostraram que os professores preferem o dialeto da classe média,


apreciando mais o falar mineiro. O que surpreendeu na pesquisa foi que os professores
de Português, apesar de não terem depreciado a variedade não-padrão dos falantes das
amostras gravadas, mostram sensível preferência pelo dialeto da classe baixa, quando
hipercorrigido, o que demonstra que, no fundo, suas atitudes continuam sendo
orientadas pela valorização da variedade padrão.

A pesquisadora, ao início da tese, indaga até que ponto a reação dos professores ao
dialeto não-padrão dos alunos provenientes das camadas mais carentes da população
não estaria colaborando para reforçar o conflito cultural, especialmente o lingüístico,
entre os atores do processo educativo. Essa pergunta, a meu ver, precisa ser ainda
respondida.

Testes de atitudes em relação à língua portuguesa foram aplicados em informantes


fluminenses (RONCARATI, 1993) e demonstraram que esses informantes reconhecem
a importância da língua como traço de identidade cultural. Acusam a escola de dificultar
a aprendizagem da língua devido a seu afastamento da linguagem popular e regional. A
atitude lingüística disso conseqüente é a de lealdade e de resistência à pressão
normativa, reforçando o mito da inexistência de dificuldades na comunicação
interdialetal, crença que, como se sabe, retarda o processo de tomada de consciência e
de empenho para a resolução desse problema.

No IX Encontro Nacional da ANPOL, realizado em Caxambu, em 1994, Roncarati


coordenou, no Grupo de Estudos de Sociolingüística, uma mesa redonda sobre testes de
atitudes lingüísticas aplicados em diferentes regiões do país (João Pessoa, Da Hora,
1995; Brasília, Bortoni-Ricardo, Gomes e Malvar, 1994; Fortaleza, Roncarati, 1996).
Foram relatados trabalhos sobre atitudes lingüísticas apresentados nessas diferentes
localidades.

Nessa mesa redonda, Da Hora (1995) buscou identificar as atitudes de falantes


residentes na cidade de João Pessoa (PB) em relação a sua própria fala e à de outros. O
autor concluiu que os falantes têm consciência lingüística mais acentuada em nível
supra-segmental. Quando submetidos à medida indireta, no entanto, a percepção é mais
39

nítida no plano segmental, sendo, nesse caso, o aspecto gramatical mais significativo do
que o fonético-fonológico.

Nesse mesmo encontro, Bortoni-Ricardo, Gomes e Malvar (1994) destacaram a


sensibilidade de falantes nativos de português diante da escala de saliência, princípio
que, conforme demonstrado por Naro e Lemle (1977), constitui um grupo de fatores
condicionantes de regras variáveis. O experimento testou a percepção de falantes à
ausência de [-r] final em nomes e verbos, a neutralização de caso de objeto direto
anafórico e a concordância nominal no SN. Relativamente aos três casos, as
pesquisadoras constataram a importância da variável escolaridade na percepção das
diferenças dialetais e confirmaram que o princípio da saliência fônica está ligado à
função de prestígio da língua padrão.

Por fim, Roncarati apresentou seus resultados de testes de atitudes lingüísticas


aplicados em falantes cearenses, sobre aspectos relativos à consciência, percepção e
avaliação do português falado. Essa pesquisa foi publicada em 1996. O estudo avaliou o
julgamento de falantes relativamente à variação da negação, evidenciando uma atitude
negativa dos falantes em relação a V+NEG (Sei não).

Outra pesquisa ali por ela também apresentada relatou o resultado de investigação
realizada entre alunos da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Ceará,
visando determinar a avaliação social do fenômeno do enfraquecimento das fricativas
[ž], [v] [z], como em hente, há fui, gostaha, mehmo, a chamada heização. Os “juízes”
interpretaram esse uso como displicência e sinal de necessidade de maior monitoração
lingüística, quando de seu emprego.

Em síntese sobre esse encontro, Roncarati (1994) assim se expressa:

Os trabalhos [...] oferecem quadro potencialmente rico para diagnosticar relações


entre língua e poder, pressão normativa e variação lingüística, lealdade e
intolerância lingüística. Esse quadro diagnóstico da dialetação brasileira permite
(re)dimensionar, ainda que em termos relativamente projetivos, a rentabilidade
de políticas de intervenção educacional em face dos múltiplos componentes
socioculturais que interagem, de forma aberta ou encoberta, no problema da
avaliação da situação lingüística brasileira.
40

Temos também o trabalho de Ferreira [s.d], orientada por Oliveira e Silva (UFRJ),
que analisou a sensibilidade de cariocas em relação a sua fala e concluiu que eles são
inseguros quanto à qualidade da variedade lingüística que utilizam, a ponto de
embalarem o desejo de que venham a ser capazes, juntamente com seus descendentes,
de falar melhor a sua língua. Consideram o ensino escolar deficiente em relação a sua
tarefa de levar o aluno a se expressar na variedade padrão.

Continuando sua investigação já anteriormente referida e datada de 1976, Santos,


em seu livro publicado em 1996, procura mostrar o resultado da influência da escola no
desenvolvimento de crenças e atitudes, no aluno, de modo a torná- lo capaz de perceber
o valor social de certas variantes.

Partindo da conclusão de Labov (1974) de que só num terceiro estágio, no início da


adolescência, o indivíduo começa a ser capaz de perceber o valor social das variantes
lingüísticas, ele pretendeu testar a capacidade de percepção de alunos nessa faixa etária
de seis variantes apontadas por professores, em entrevistas, como sendo problemáticas
para a aquisição do português padrão.

Foram as seguintes as variantes: [R] - relativamente à presença ou não dessa


consoante em final de vocábulos, principalmente substantivos (Guiomar, pintor, colar);
[?] - palatalização ou não da lateral antes de vogais anteriores em vocábulos (colher,
palheta, velhinho); [?] - presença ou não de traço nasal em sílaba átona final de
vocábulos (homem, vagem); variante [o] - embrião vocálico (epentético) que se
desenvolve em vocábulos (apto, pneu advogado); variante [i] - nasalização de [i], por
analogia com os vocábulos derivados com o prefixo in- (ignorante); variante [ay] -
presença ou não desse ditongo antes de consoante álveo-palatal em sílabas tônicas ou
átonas de vocábulos (baixa,caixa, enfaixamos).

O autor aplicou testes de percepção em alunos de diferentes idades (entre 12 e 18


anos), de diferentes níveis de escolarização (desde a 2ª série do antigo curso primário a
alunos recém ingressos no curso superior) e de diferentes níveis sócio-econômicos
(alunos bolsistas provenientes de famílias incapazes de pagar os estudos dos filhos,
alunos provenientes de famílias com alguma capacidade de pagar esses estudos, alunos
41

filhos de famílias com posses limitadas, mas capazes de prover os estudos dos filhos,
alunos com famílias de posses amplas).

As variantes foram testadas em diferentes contextos: leitura de um texto no estilo


casual, leitura de um texto em estilo policiado com palavras formando par mínimo em
relação às variantes em estudo e leitura de lista de palavras.

Os testes revelaram haver uma pressão da escola em relação à percepção de


algumas dessas variantes, sendo que o efeito principal se realiza nos alunos que mais
tempo nela permanecem. Santos comenta (op. cit., p. 102):

De qualquer forma, com relação a todas essas cinco variantes, olhando-se apenas
os alunos a caminho do final de curso superior, pode-se concluir que a escola
conseguiu garantir a percepção, por parte deles, das variantes em que ela está
interessada, sinal de que tais alunos estão atentos às crenças e atitudes escolares e
têm, assim o mínimo de condições para eventualmente até mesmo realizar os
valores de prestígio escolar.

Quanto àqueles que não alcançam o curso superior, e que são a maioria, saem da
escola sem chegar a perceber a diferença entre a realização de certas variantes que a
escola prestigia e os outros valores que elas possam apresentar noutros contextos menos
formais. Considerando esse contraste, o autor aponta a lamentável manutenção dos
estereótipos que estigmatizam o uso dessas variantes. Ele acrescenta (p. 109):

Entre esses alunos de cursos superiores estão os estudantes de Letras, futuros


professores de português, de Comunicação e Expressão, sem condições de levar
o aluno a realizar, por treinamento, os valores que a escola prescreve, mas
perfeitamente aptos a transmitir ao aluno as informações sobre as crenças e
atitudes escolares tradicionais. E tudo se repetirá.

Ele conclui que a escola, ao invés de levar os alunos à consciência e ao uso dos
valores que prescreve, convence-os de que falam errado e não conseguem dominar a
língua que falam.

Em 2004, Barbosa defendeu, no Brasil, sua dissertação de Mestrado em


Lingüística, orientada por Quental (UFRJ), a partir de investigação sobre a interpretação
de falantes de português e espanhol, em área da tríplice fronteira Brasil-Colômbia-Peru,
42

sobre esse contato bilingüe, isto é, sobre como os falantes percebem as línguas em
questão. Concluiu (p. 140) que “[...] há indícios de diferenças de crenças e valores entre
brasileiros e colombianos, a partir do que disseram sobre suas línguas.” Os testes de
atitudes lingüísticas aplicados nos falantes revelaram ainda que, apesar do contato
estreito entre as duas culturas, permanecem claras e bem vivenciadas as fronteiras
política e lingüística, não havendo indício de formação de uma terceira língua, nem
alterações sócio-culturais ou de identidade.

Após deter- me no foco central de meu trabalho, apresentando uma síntese dos
estudos sobre crenças e atitudes lingüísticas na literatura, aponto a seguir, criticamente,
alguns aspectos dos dialetos populares no Brasil e do papel da escola no ensino da
variedade culta da língua, para traçar um quadro mais claro do cenário da minha
pesquisa. De fato, os alunos com os quais empreendi minha investigação são falantes
desses dialetos, em geral, rejeitados pela escola, em favor da única variedade ali
considerada legítima, a culta. É preciso, portanto, tentar compreender a origem de tais
variedades rejeitadas.

Esclareço que essas reflexões oferecem subsídio importante para a compreensão do


contexto histórico-social em que se constituíram essas variedades.

3.3 A múltipla variedade do português do Brasil: algumas considerações

Nesta Seção, parti das pesquisas de Mattos e Silva (2004b), de Lucchesi (2003) e de
Bortoni- Ricardo (2004 e 2005), referências atuais para a reconstituição das nossas raízes
lingüísticas.

Mattos e Silva (op. cit.) considera que, para se recuperar a história do português
brasileiro, teremos de reconstruir uma história social lingüística do Brasil, tarefa que
ainda constitui um desafio para presentes e futuras pesquisas. Ela acrescenta (op. cit., p.
13):

Ainda está por ser elaborada uma reconstituição que conjugue fatores sócio-
históricos, demográficos, lingüísticos do passado e do presente que, reunidos,
43

poderão explicar e espelhar os processos sócio-históricos e lingüísticos que


interagiram na constituição do português que falamos.

Uma das fontes importantes para uma breve retrospectiva da constituição do


português brasileiro são os estudos que vêm sendo realizados pelo PROHPOR –
Programa para a História da Língua Portuguesa - que a autora (op. cit., p. 45) assim
apresenta:

Os objetivos gerais deste Programa, coletivamente construído, são reunir novos


dados e velhos dados reinterpretados com a finalidade de fazer uma história
renovada da língua portuguesa e têm como arco de tempo a ser investigado das
origens da língua portuguesa até o século XVI e daí infletir para o português
trazido ou transplantado para o Brasil e aqui formado, nos contextos próprios
deste novo espaço sócio-histórico que se tornou românico, parte da chamada
România Nova.

Como ponto de partida, a autora salienta a presença, no início do processo de


colonização, de falantes de mais de cerca de 1.500 línguas indígenas em todo o território
nacional (MATTOS E SILVA, op. cit., p. 14), chegando mesmo a se constituir uma
língua geral, de base tupi, através da qual se intercomunicavam, brancos, negros e
índios. Foi essa a situação de risco que levou, em 1757, à conhecida intervenção de
Marquês de Pombal, expulsando do Brasil os jesuítas e tornando o português a língua
oficial do país, com uso obrigatório em documentos oficiais e estimulando seu ensino
nas escolas.

Já no início do século XVI, se iniciara o tráfico de negros, o que determinaria, mais


tarde, no Brasil, um contingente populacional e lingüístico intensamente diversificado,
de tal modo que estudos posteriores se referem aos “falares negros”.

Por que “falares” negros? Isso porque, ao contrário do que normalmente se


considera, os africanos aqui chegados não falavam todos a mesma língua. A autora
esclarece esse fato, informando-nos que a chegada dos negros no Brasil passava, desde
os portos, por uma seleção negativa, para se evitar o adensamento de etnias e falares na
mesma localidade, situação que permaneceu até o século XIX quando a chegada desses
“imigrantes” se tornou extensiva. E conclui (op. cit., p.18): “Algum consenso existe
também quando se afirma que impossível seria ter sido mais praticada uma língua
africana no Brasil do que outra [...]”.
44

Conforme nos informa a mesma autora, considerava-se suficiente que o escravo


negro aprendesse apenas rudimentos da língua portuguesa, para compreender as ordens
dos seus senhores. Somente os escravos domésticos se tornavam bilíngües e seus
descendentes é que se tornarão verdadeiramente falantes do português, sendo cada vez
menos hábeis na língua de seus pais. A freqüência à escola, apesar disso, lhes foi negada
até a segunda metade do século XIX.

Foi no século XVIII que se deu a emergência do português brasileiro, frente ao


descenso dos africanos, dos indígenas e dos portugueses, e ao crescimento da população
de brasileiros mulatos e brancos, segundo nos aponta essa pesquisadora (op. cit., p. 21):

A miscigenação e a presença não-maciça de portugueses certamente são


indicadores favoráveis à formação de uma “língua geral brasileira”, que não seria
africana, pelas razões afloradas anteriormente [a autora se refere à seleção
negativa da entrada dos negros no Brasil], mas sim continuadora do português, já
que o terceiro actante nesse drama, os índios, os que não morreram, ou já
estavam integrados ou acoitados nos confins protegidos.

Mais à frente, a chegada da corte portuguesa ao Brasil implementou um ainda que


fraco desenvolvimento cultural e possibilitou o surgimento da norma lingüística, que
passou a ser policiada pelos meios oficiais e pela escola. Referindo-se a esse conjunto
de fatores determinantes da caracterização do português do Brasil, incrementado pela
influência do processo de imigração em diferentes regiões brasileiras, assim ela se
expressa (op. cit., p. 22): “É certamente no entrecruzar-se de variantes localizadas
menos ou mais interferidas por marcas indígenas e/ou africanas, de variantes mais
gerais menos ou mais africanizadas ou menos ou mais aportuguesadas que se definem e
emergem os traços característicos do português brasileiro, língua nacional.”

No entanto, como se pode depreender desse quadro, a política adotada no Brasil


desfavoreceu a grande população desvalida economicamente, que permaneceu num dos
extremos da linha divisória que a separava, como ainda hoje acontece, da elite letrada.
A autora (op. cit., p. 99) comenta:

Essa questão explica a polarização sociolingüística – feliz designação de Dante


Lucchesi – que caracteriza o português brasileiro nos tempos que correm. Os
avanços dos estudos sociolingüísticos no Brasil, a partir dos anos 1960,
demonstram uma realidade sincrônica que reflete a história do nosso passado e
que permanece, mudados, contudo, os senhores. Essa polarização indica que no
45

português brasileiro convivem normas vernáculas ou o português popular


brasileiro e normas cultas ou o português culto brasileiro dos que atingem nível
de escolaridade mais alto, para além da norma padrão, lusitanizante, ainda
veiculada pelas gramáticas normativas, sendo impossível deixar de afirmar que a
interação social no Brasil, sociedade não-segmentada em estamentos estanques,
permite o trânsito entre falantes do português popular e do português culto, num
entrecruzar-se de possibilidades que justifica a afirmativa da heterogeneidade
social do português brasileiro.

Um outro aspecto importante a se considerar na constituição da heterogeneidade


desse português brasileiro no início da colonização é a presença da dicotomia
rural/urbano, tratado por Bortoni-Ricardo (2004 e 2005). Nas grandes cidades do
litoral, se falava o português lusitano, constantemente realimentado pelo intercâmbio
intenso, em todos os níveis, com a metrópole, ainda que, pouco a pouco, fosse dele se
distanciando. No interior, no entanto, o português esteve em contanto direto com as
línguas indígenas e com os falares dos negros africanos.

Segundo Bortoni-Ricardo (2005, p. 33), para se comunicarem entre si, operavam


eles certa acomodação lingüística, originando uma língua de emergência, o chamado
pidgin, processo que durou todo o período de chegada de novas levas de escravos que,
como se viu acima, traziam diferentes línguas. A autora chama a atenção para o fato de
que muitas das oposições fundamentais que caracterizam o sistema da língua portuguesa
se constituíram já nesse pidgin temporário:

Repare-se que, nos vernáculos rurais, muitas dessas oposições, como a de


número, a de gênero e a de pessoa, para citar algumas, que no sistema da língua
portuguesa são implementadas de maneira redundante, passaram a ser realizadas
com recursos analíticos, em decorrência do reducionismo flexional. Assim, a
oposição número-pessoa, nas formas verbais, que se consubstancia
redundantemente por meio dos pronomes pessoais e das flexões, dispensou estas
e manteve apenas aquelas. Na oposição de número, nos sintagmas nominais, a
marca de plural desapareceu dos determinados, mas se conservou no prime iro
determinante. O sistema modo-temporal se simplificou, mas a dicotomia
presente-passado foi mantida.

Mattos e Silva (2004b, p. 22) corrobora a interpretação de essa tendência do


português brasileiro ter sido herdada das línguas africanas, em que não existem sílabas
travadas, o que determinou a queda do [s] final nos sintagmas nominais pluralizados.
Mais à frente, na mesma obra (p. 26), ela afirma, referindo-se às áreas rurais e urbanas
sem escolarização em que aparecem formas sem concordância: “Seriam exemplos de
46

áreas preteritamente ‘crioulizadas’ e que a escolarização reintroduziria a regra de


concordância no português brasileiro, ‘descrioulizando-o’.”

Também Lucchesi (2003) pesquisou essa questão dentro da chamada


Crioulística17. O português popular do Brasil não teria passado por uma fase de língua
crioula, mas sofrido o chamado processo de transmissão lingüística irregular, no qual o
prestígio da chamada língua alvo suplantou o processo de mudança gramatical. De
qualquer modo, relativamente a essa questão da tendência à perda da concordância no
português brasileiro, ele afirma (p. 281) :

Não obstante a diversidade de estruturas do PB que podem ser relacionadas ao


contato entre línguas, há um aspecto básico do processo de transmissão
lingüística irregular que é crucial para o entendimento do desenvolvimento
histórico do português do Brasil. O ponto de partida de todo processo de
transmissão lingüística irregular desencadeado pelo contato entre línguas é a
perda de morfologia flexional na aquisição inicial da língua alvo por parte dos
falantes das outras línguas. Essa característica está na base da formação de todas
as línguas pidgins e crioulas, e muitas das propriedades dessas línguas decorrem
de mudanças desencadeadas por esse ‘fato inaugural’.

A questão da concordância nominal permanece sendo uma das questões instigantes


nos estudos sociolingüísticos brasileiros. Segundo constatou a pesquisa de Bortoni-
Ricardo (1981) já referida aqui, a estigmatização desse traço, no português brasileiro, é
forte e parece, pois, estar em estágio evolutivo, atuando numa direção diametralmente
oposta à evolução da tendência à redução flexional, que também segue seu próprio
curso evolutivo. Nessa evolução, o papel da escola tem sido decisivo, reintroduzindo a
regra de concordância.

Continuando a reflexão sobre a permanência, nos centros urbanos, das variedades


lingüísticas desprestigiadas, é também ilustrativo rever outro aspecto da variedade
lingüística: trata-se do conceito de contínuo, que passo a examinar.

A configuração do fator determinante da variação dialetal não se dá de forma


abrupta. Constitui a diferenciação entre falares um contínuo que vai desde aqueles que
permaneceram isolados geograficamente nas zonas rurais, com poucos contatos

17
“Tradicionalmente, a Crioulística tem-se ocupado de processos históricos de contato massivo entre
línguas, dos quais resultam entidades lingüísticas qualitativamente distintas das línguas envolvidas em
sua formação. Tais entidades lingüísticas constituem as línguas pidgins e crioulas típicas e, em nuitos
casos, são faladas por comunidades de fala muito restritas ” (LUCHESI, 2003, p. 272).
47

significativos com estruturas lingüísticas inovadoras, até a variedade padrão urbana que,
como Ferguson (1974) apontou, é marcada, entre outros fatores, pela herança literária,
pelo controle da escola, das instituições oficiais, pelos meios de comunicação de massa.

Para se entender a variação do português brasileiro, evitando-se o risco de se


determinarem fronteiras rígidas entre as variedades lingüísticas, Bortoni-Ricardo (2004,
p. 51) propõe três contínuos: contínuo de urbanização, de oralidade- letramento e de
monitoração estilística. Outra vantagem dessa nomenclatura é nos manter afastados do
forte viés do preconceito, inerente às tradicionais denominações padrão, não-padrão,
etc. A autora percebe a ecologia do português brasileiro como um contínuo de
urbanização.

Ela ilustra esse contínuo da seguinte forma:


Contínuo de urbanização
----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------?
variedades rurais área rurbana variedades urbanas
isoladas padronizadas
(BORTONI-RICARDO, op. cit., p.
52)

Esse contínuo se destina especialmente à análise dos atributos socioecológicos dos


falantes. Chico Bento, personagem das histórias em quadrinho de Maurício de Sousa,
seria um representante do falante do pólo rural dentro desse contínuo. São comuns,
nesse dialeto, os chamados traços descontínuos, como as construções nóis qué, nóis
percisa, etc., muito estigmatizadas.

Esses traços vão se tornando menos comuns nos falantes que se aproximam do pólo
urbano, a chamada zona rurbana, assim caracterizada por essa autora (op. cit, p. 52):

No espaço entre eles fica uma zona rurbana. Os grupos rurbanos são formados
pelos migrantes de origem rural que preservam muito de seus antecedentes
culturais, principalmente no seu repertório lingüístico, e as comunidades
interioranas residentes em distritos ou núcleos semi -rurais, que estão submetidas
à influência urbana, seja pela mídia seja pela absorção da tecnologia
agropecuária.
48

Nesses falantes se reconhecem os chamados traços graduais, que se caracterizam


por terem uma distribuição descontínua nas áreas urbanas. Poderíamos neles reconhecer
mesmo uma gradação, isto é, a presença desde construções muito estigmatizadas até
outras consideradas padrão. Como exemplo destes últimos, o objeto direto lexical (Vi
ele passar ali), a oração adjetiva cortadora (O livro ø que eu gostei), a ausência do /r/ na
pronúncia do infinitivo (Pra falaø a verdade...), etc, que estão presentes, ou não, na
variedade lingüística dos falantes mais próximos do pólo urbano, a depender do
contexto de produção de sua fala, o que determinaria o outro contínuo, o da
monitoração.

Bortoni- Ricardo (2004, p. 62) propõe a figura abaixo para ilustrar esse contínuo:

--------------------------------------------------------------------------------------------------?
- monitoração + monitoração

Mas, se por um lado, a migração campo-cidade determina o desaparecimento dos falares


regionais, o processo de adensamento das redes na periferia dos centros urbanos tem,
como conseqüência, “[...] um recrudescimento da estratificação vertical na língua
urbana. Assim, vão-se acentuando as distinções entre as múltiplas variedades, não
obstante o esforço padronizador das escolas e dos meios de comunicação.” (BORTONI-
RICARDO, 2005, p. 34). Isso vai constituindo o processo de diglossia.

Quanto a esse fenômeno da diglossia, na trajetória de desenvolvimento dos estudos


de Sociolingüística, o texto que ficou como referência principal é o de Ferguson,
publicado na revista Word, 1959, e divulgado no Brasil por Fonseca (1974). Estudando
esse fenômeno de diglossia, Ferguson (1974, p. 99) o considera “[...] um tipo particular
de padronização onde duas variantes de uma língua coexistem numa mesma
comunidade, cada uma desempenhando um papel definido.”

Ainda que esse conceito tenha sofrido críticas, ele acabou se tornando funcional
para explicar situações de heterogeneidade lingüística, como a do português do Brasil,
que se caracteriza pela co-existência da variedade culta, às vezes confundida com a
49

variedade padrão, ao lado da popular dos centros urbanos e rurais, às quais cabem
funções distintas.

Acrescente-se ainda o fato de que grande parte da população, não tendo acesso à
norma culta, faz recrudescer a separação entre a variedade popular e a culta. Por isso,
Bortoni- Ricardo (2005, p. 184) conclui: “Temos, pois, uma situação de diglossia sem
bidialetalismo extensivo.”

Os fatores externos da variação lingüística ligados ao receptor ou às condições de


produção discursiva dão origem à chamada variação estilística, também denominada de
registro, ou variante diafásica18. Ela está ligada à necessidade de adequação do falante
ao contexto imediato da construção textual, à finalidade de seu ato verbal, ao grau de
formalidade exigido pela circunstância, ou mesmo ao grau de sua familiaridade com o
conteúdo da mensagem a ser construída. Daí a gradiência entre o estilo formal e o
informal. Todo falante deve desenvolver certos recursos lingüísticos, de tal modo que
possa deles lançar mão para a finalidade que tem em vista no processo discursivo. Essa
competência, no entanto, como se sabe, é vedada a grande número de falantes que,
como resultado, sofrem o efeito disso, sendo- lhes negado o acesso a bens sociais.

Bortoni- Ricardo (2005, p.131) ainda chama a atenção para a responsabilidade da


escola na tarefa de levar os alunos a adquirirem tal competência de monitorar seu estilo,
sendo esse o único momento em que as ações de planejamento lingüístico têm efeito
realmente. Em relação ao vernáculo, a ação da escola é pouco ou nada significativa:

Labov e Harris (1986) têm razão quando afirmam que a escola não interfere no
sistema básico da língua, considerando que o sistema básico é o vernáculo.
Porém não se pode inferir de suas palavras que seja inócua a influência da escola
na formação do repertório lingüístico do falante, uma vez que a escola atua na
aquisição dos estilos sobrepostos ao vernáculo. A tarefa da escola está
justamente em facilitar a incorporação ao repertório lingüístico dos alunos de
recursos comunicativos que lhes permitam empregar com segurança os estilos
monitorados da língua, que exigem mais atenção e maior grau de planejamento.

Essas atividades escolares levam o aluno a compreender mais claramente o


português falado no Brasil. De fato, há que se tomar consciência dos ajustes feitos por

18
Travaglia (1997, p. 42) esclarece que: “[...] os registros são as variedades que ocorrem em função do
uso que se faz da língua, ou como preferem alguns, dependem do recebedor, da mensagem ou da
situação.”
50

qualquer falante, dependendo do enquadre em que se insere a interação lingüística. Se


se tratar de um interlocutor com certa ascendência, seja por razão de autoridade,
conhecimento ou outra forma de poder; se a situação exigir comportamento
cerimonioso; se o tema enfocado na interação não for de pleno domínio do falante,
então ele deve tomar consciência da necessidade de operar sobre seu repertório
lingüístico, certas mudanças, ou adaptações, que não são necessárias numa conversação
espontânea.

Vejamos o que sobre isso conclui Labov (1987, p. 141) ao estudar a influência da
escola e da grande comunidade na educação lingüística de seus membros. Referindo-se
ao Ebonics (na época, Black English Vernacular - BEV), ele afirma:

Apenas quando os membros da comunidade negra interagem com os falantes


brancos em intercâmbios face a face que afetam as oportunidades de suas vidas é
que eles começam a adquirir traços de outros dialetos. A regra de concordância
do sujeito-verbo é adquirida inconscientemente através da cultura dominante e
aparece na fala vernacular. 19

E mais à frente: (op. cit., p. 143):


Parece que há uma aprendizagem lingüística ativa mais tardiamente, que pode
assumir um caráter quase tão sistemático quanto o da língua materna. A grande
comunidade atua como educadora sob condições muito particulares: quando os
falantes do dialeto de status mais desprestigiado lidam e negociam com falantes
do dialeto dominante, eles adquirem inconscientemente os mesmos tipos de
regras lingüísticas em cujo ensino a escola fracassou.20

Como se vê, trata-se de uma competênc ia que a escola deve trabalhar. Cumprirá ela
esse seu papel?

Quanto à sua tarefa de desenvolver no aluno a percepção de status de valor de


determinada forma lingüística, ampliando sua competência dentro desse contínuo, o
estudo de Santos (1996, p. 111) revela a inexistência de treinamento, de modo que
apenas os alunos que ingressam no curso superior passam a dispor dessa competência.

19
It is only when members of the black community engage white speakers in face-to-face dealings that
affect their life chances that they begin to acquire features of the other dialects. The rule of subject-verb
agreement is acquired unconsciously from the dominant culture and appears in vernacular speech.
20
It appears that there is active language learning in later life, which can assume a systematic character,
almost as systematic as first-language learning. The wider community acts as educator under very
particular conditions: when speakers of lower-status dialect deal with and negotiate with speakers of the
dominant dialect, they acquire unconsciously the very kinds of linguistic rules that the school failed to
teach.
51

Santos enfatiza que a grande maioria da classe estudantil brasileira não atinge o terceiro
grau, e deixa a escola sem conseguir sequer perceber auditivamente grande número de
variantes. Ele vai mais além afirmando:

A escola sequer erradica do aluno o valor que ela estigmatiza. O aluno, tomando
conhecimento do status escolar do valor que usa, pode ficar definitivamente
seguro de que fala ‘errado’. Mas se ele não percebe auditivamente a diferença
entre os valores, se ele não incorporou uma resposta avaliativa implícita à
presença dos valores, ele não assumiu a atitude escolar em relação à variante, por
maior que seja a sua disposição para aderir à ideologia escolar.

Está, pois, aqui ilustrada a importância da operacionalização do contínuo de


monitoração estilística de que nos fala Bortoni- Ricardo.

O caráter contínuo da variação lingüística pode ainda ser verificado em relação ao


terceiro contínuo, o da oralidade-letramento.21 Bortoni- Ricardo (2004, p. 62) sugere,
para ele, a ilustração abaixo:

-------------------------------------------------------------------------------------------------------?
eventos de eventos de
oralidade letramento

Esse contínuo, também como os outros dois (o de urbanização e o de monitoração


estilística), tem fronteiras fluidas, havendo, inclusive possibilidade de sobreposições,
quando um falante alterna, em seu discurso, enunciados que apontam para o coloquial,
com outros que constroem um discurso tenso e mais monitorado, que caracteriza o
mundo letrado.

Na sala de aula, o professor, freqüentemente, transita por esse contínuo. Quando


conversa com seus alunos, quando interrompe explanações para fazer alguma
advertência, freqüentemente o faz utilizando seu vernáculo, caracterizado por traços
21
Bortoni-Ricardo (2004, p. 24) assim conceitua letramento: “O termo letramento é geralmente
empregado para indicar um acervo cultural preservado por meio da escrita. Podemos usar o termo
letramentos, no plural, ou nos referir a culturas de letramento para preservar a idéia de que não existe só
uma cultura de letramento. Nas comunidades sociais convivem culturas de letramento associadas a
diferentes atividades sociais, científicas, religiosas, profissionais etc. Também existem manifestações
culturais letradas associadas à cultura popular, como a literatura de cordel, por exemplo.’’
52

graduais que marcam as diferenças em relação à variedade padrão e que ele mesmo não
percebe. A regra é, pois, ‘invisível’ para ele.

A noção de contínuo, portanto, pode se constituir em fator importante para a


compreensão da diversidade do português brasileiro.

Trabalhar essas questões na escola abre amplo caminho para o desenvolvimento de


habilidades e competências no uso da língua materna, fator que pode determinar a boa
ou a má auto-estima do aluno, como pretendo demonstrar no estudo de julgamentos
lingüísticos que vou fazer.

3.4 A variedade culta

O caráter de heterogeneidade inerente a todas as línguas responde, em qualquer


comunidade lingüística, pela existência de diferentes falares e registros. Como
conseqüência da organização das sociedades em grupos de diversificadas condições
sócio-econômicas, essas variedades lingüísticas entre os membros da sociedade acabam
se revestindo de certo caráter valorativo, que reflete a hierarquia desses grupos sociais.

Isso significa que determinados falares são mais desvalorizados do que outros,
segundo seus falantes pertençam a uma classe econômico-social mais ou menos
privilegiada. Daí a reflexão de Gnerre (1994, p. 6), segundo a qual “[...] uma variedade
lingüística ‘vale’ o que ‘valem’ na sociedade os seus falantes, isto é, vale como reflexo
do poder e da autoridade que eles têm nas relações econômicas e sociais.” Essa
variedade própria dos falantes das classes dominantes é alçada à posição de modelo de
todas as outras, a chamada variedade padrão.

A Sociolingüística desmitifica a crença comumente difundida de que a língua


padrão é melhor, superior às demais. Sobre isso afirma Alkmim (2003, p. 40) :

A variedade padrão de uma comunidade – também chamada norma culta, ou


língua culta – não é, como o senso comum faz crer, a língua por excelência, a
língua original, posta em circulação, da qual os falantes se apropriam como
podem ou são capazes. O que chamamos de variedade padrão é o resultado de
uma atitude social ante a língua, que se traduz, de um lado, pela seleção de um
dos modos de falar entre os vários existentes na comunidade e, de outro, pelo
estabelecimento de um conjunto de normas que definem o modo ‘correto’ de
53

falar. Tradicionalmente, o melhor modo de falar e as regras do bom uso


correspondem aos hábitos lingüísticos dos grupos socialmente dominantes. Em
nossas sociedades de tradição ocidental, a variedade padrão, historicamente,
coincide com a variedade falada pelas classes sociais altas, de determinadas
regiões geográficas. Ou melhor, coincide com a variedade lingüística falada pela
nobreza, pela burguesia, pelo habitante de núcleos urbanos, que são centros do
poder econômico e do sistema cultural predominante.

Faraco (2002, p. 38), aprofundando-se no exame da diferenciação entre padrão/não


padrão, apresenta importante distinção entre norma culta e norma padrão. Para isso,
parte do “[...] conceito técnico de que os grupos sociais se distinguem pelas formas de
língua que lhes são de uso comum. Esse uso comum caracteriza o que se chama de
norma lingüística de determinado grupo”. Pode-se identificar, nesse caso, a norma rural,
aquela dos falantes das periferias dos centros urbanos, a dos grupos letrados, enfim,
cada uma delas correspondendo aos valores socioculturais específicos da comunidade
que a utiliza. Tais normas agregam à expressão lingüística esse tipo de valor inerente à
sua comunidade. O autor esclarece ainda (op. cit., p. 39):

Não há, obviamente, um total encapsulamento e insulamento dos grupos sociais,


nem de seus membros. Assim, é inevitável o contato entre essas muitas normas
no intercâmbio social, o que redunda em múltiplas interinfluências (as normas
são, portanto, hibridizadas) e também eventualmente em mudanças lingüísticas
em diferentes direções.

A norma culta, nesse caso, corresponde aos usos lingüísticos do grupo social
situado no extremo do contínuo do letramento e que se caracteriza pelo convívio com
práticas sociais de uso formal da fala e da escrita. Lembremos aqui, o que aduz Bortoni-
Ricardo (cf. nota 21), sobre a cultura do letramento, que inclui aquelas associadas à
cultura popular. É preciso, portanto, afastar dessa denominação norma culta quaisquer
pré-julgamentos sobre os falantes que não têm acesso a ela, o que acontece não por
serem ignorantes ou incultos, o que iria contra o conceito antropológico de cultura.
Trata-se, como se viu, simplesmente de uma aproximação maior de práticas sociais do
mundo letrado, o que não impede haver constante intercâmbio entre ela e as outras
normas sociais.

Quanto à norma padrão, Faraco assim a apresenta (op. cit. p. 40):


54

A cultura escrita, associada ao poder social, desencadeou também, ao longo da


história, um processo fortemente unificador (que vai alcançar basicamente as
atividades verbais escritas), que visou e visa uma relativa estabilização
lingüística, buscando neutralizar a variação e controlar a mudança. Ao resultado
desse processo, a esta norma estabilizada, costumamos dar o nome de norma-
padrão ou língua-padrão.

A língua padrão, tendo-se tornado a variedade precípua das instituições oficiais que
são, em última análise, fruto da cultura letrada, passou a ser, por essa via, instrumento
de transmissão e perpetuação das intenções do Estado. Daí seu caráter abstrato,
mantendo-se acima de todas as outras variedades sociais e se tornando “uma referência
supra-regional e transtemporal.” (FARACO, 2002 p. 42).

É interessante trazer para essa discussão o que apresentam Garvin e Mathiot (1974,
p. 123) sobre uma das propriedades da língua padrão, a intelectualização. Ela consiste
na propriedade de responder à necessidade de se construir proposições de alto nível de
rigor e precisão, resultando numa expressão mais definida e acurada, até mesmo mais
abstrata. Eles afirmam:

Isto é resumido por Havránek numa escala de intelectualização em três etapas,


levando desde a simples inteligibilidade via explicitação até a precisão, às quais
correspondem, respectivamente, um dialeto de conversação, um técnico
rotineiro, e um científico funcional. Enquanto a fala folk se limita aos dialetos de
conversação e a algumas fases do técnico rotineiro, todos os três dialetos
funcionais são representados, pelo menos em termos ideais, na língua padrão.

Não resta dúvida, portanto, que à variedade padrão se agregam propriedades


específicas que remetem à idéia de valor, o que não deixa de ser perigoso, se tais valores
a ela atribuídos não correspondem a fatos lingüísticos reais, principalmente quando se
trata não dessa variedade prestigiada, mas de outras estigmatizadas. Nesse sentido,
Labov (1987, p. 133) chama a atenção para o risco de se criarem estereótipos, isto é,
variantes que se tornam alvo de comentários na comunidade em geral. Como exemplo
disso no português do Brasil, temos a fala dos nordestinos frente à do Centro-Sul e o
linguajar do caipira mineiro ou do paulista. A questão da denominação caipira será
retomada mais à frente, na apresentação do corpus da pesquisa de campo.
55

Como mostra Labov (op. cit.), tais estereótipos são freqüentemente utilizados pela
mídia e pelos autores nos livros didáticos sem conhecimento suficiente dos fatos do
sistema lingüístico.22 Isso resulta em dificuldade dos professores em identificar os
dialetos que encontram em sua sala de aula. Referindo-se ao Ebonics (na época, BEV),
ele comenta (op. cit, p. 134): “Um crítico do ‘Black English’[...] perguntou a doze
pessoas o que era o ‘Black English’e jamais conseguiu a mesma resposta duas
vezes.”23

Faraco chama ainda a atenção para o fato de que, embora a norma culta seja a que
mais se aproxima da variedade padrão, pois é dos extratos sociais que a utilizam que
saem os seus codificadores, as forças que naturalmente atuam na variação e mudança
lingüística acabam cavando entre ela e o padrão um enorme distanciamento, “[...]
ficando esse padrão cada vez mais artificial e anacrônico, se não houver mecanismos
socioculturais para realizar os necessários ajustes.” (op. cit., p. 42).

O prestígio da variedade padrão, leia-se da escrita, a faz exercer certo poder


unificador das outras variedades sem, no entanto, conseguir frear o caráter naturalmente
heterogêneo característico de qualquer língua, nem mesmo chegando a impedir que
recaiam sobre ela mesma as influências das outras normas sociais.

Garvin e Mathiot (1974, p. 121-122), reconhecem a função unificadora da língua


padrão, mas requerem para ela, ao mesmo tempo, a propriedade de estabilidade flexível
como ideal: “[...] uma língua padrão, a fim de funcionar eficientemente, deve ser
estabilizada por uma codificação apropriada; deve ser ao mesmo tempo bastante flexível
na sua codificação para permitir modificação concomitante com a mudança cultural.”

Nesse sentido, as pesquisas do Projeto NURC também têm trazido, sobre essa
questão e sobre o estudo da norma culta no Brasil, importantes informações. Esse
Projeto, segundo nos apresenta Castilho (2002), tem como objetivo pesquisar as normas
cultas de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Porto Alegre e Salvador, na modalidade da

22
A respeito do papel da mídia na difusão do preconceito lingüístico, veja Scherre (2005, p. 37-71), em
que a autora analisa detidamente essa questão.
23
One critic of “Black English” said [...] that he had asked a dozen participants to tell him what “Black
English” was and he never got the same answer twice.
56

fala, e investigar os registros coloquial e o da norma refletida dentro desse mesmo


espaço social.

Um dos resultados mais interessantes do Projeto NURC-SP está descrito por Preti
(1997, p.17) em que o autor apresenta o que ele mesmo classifica, como resultados
inesperados e até contraditórios. Tendo em vista que o Projeto seleciona, para sua
pesquisa, o chamado falante culto (de nível universitário), foi realmente surpreendente
constatar a existência de um dialeto social que é comum tanto a ele quanto aos falantes
que têm menor grau de escolaridade. Segundo palavras do autor, trata-se de

[...] um falante de um dialeto social dividido entre as influências de uma


linguagem mais tensa, marcada pela preocupação com as regras de gramática
tradicional, e uma linguagem popular, espontânea, distensa. Portanto, essa
hipotética linguagem urbana comum comportaria oposições como a presença de
uma sintaxe dentro das regras tradicionais da gramática ao lado de discordâncias,
regências verbais de tendência uniformizadora, colocações dos componentes da
frase justificadas pelos elementos prosódicos, como no caso dos pronomes
pessoais; abrangeria a precisão de um vocabulário técnico, ao lado da abertura de
significado de vocábulos gírios; utilizaria vocábulos raros, de significação
precisa, específica, concomitantemente com vocábulos populares de uso
constante e de significado aberto.

Buscando a explicação para o surgimento desse novo perfil do falante culto, Preti
encontra-a no processo contemporâneo de democratização política, que alcança também
a democratização do ensino, levando as camadas populares a terem acesso à escola.
Tudo isso associado ao desenvolvimento e à expansão da mídia, com seu importante
papel na uniformização da língua, fixando o que ele denominou de linguagem urbana
comum e descreveu como sendo uma variedade em que estão presentes tanto as regras
da gramática tradicional quanto a espontaneidade da linguagem popular. Preti rediscute
o conceito de discurso urbano oral culto, com base em evidências empíricas da pesquisa
do NURC-SP. Ele acrescenta (p. 19-20):

Índice inequívoco dessas transformações culturais, a presença da linguagem oral


comum, até em contextos de ensino, demonstra uma nova atitude lingüística, em
que está implícita a rejeição do caráter normativo inflexível da tradição
gramatical e a aceitação do caráter normal do uso vigente.
Um dos índices mais expressivos desse processo democratizador da cultura e de
sua representação na linguagem espontânea ocorre, em nível de léxico, com o
uso crescente das formas gírias, nas mais variadas situações de interação, com os
mais variados tipos de falantes (inclusive os cultos). Não estaríamos exagerando,
se disséssemo s que esse vocabulário se expandiu consideravelmente, na época
contemporânea, surgindo inclusive em situações de interação formal e
57

constituindo, hoje, uma marca representativa do léxico popular na linguagem


urbana comum.

Percebe-se aqui uma convergência dessa constatação com o que já afirmara Labov
(1987, p.132) a propósito dos mecanismos da variação lingüística, em que atribui esse
papel menos à escola do que à comunidade:

Poder-se-ia pensar que o padrão é resultante do ensino escolar ou da imitação


consciente dos locutores de rádio. Isso pode ser verdade para alguns aspectos da
variação, mas há várias razões para se acreditar que a principal rota de
transmissão está na grande comunidade.24

Nessa afirmação de Labov, pode-se entrever o fenômeno do prestígio encoberto (V.


nota 6 desta Tese), postulado por ele mesmo em 1972. Trata-se de um status particular
atribuído pelos falantes de um determinado grupo social à sua própria variedade
lingüística, ou vernáculo básico (cf. BORTONI-RICARDO, 2005, p. 49).

Segundo Chambers (1995, p. 221-222), esse prestígio configura um caso de contra-


pressão a favor do vernáculo ao qual se atribuem valores positivos.

Trugdill (1974, p. 96), ao tratar de problemas referentes às atitudes dos falantes


com relação às variantes lingüísticas, também invoca a noção de prestígio encoberto
como um dos fatores que poderiam explicar a discrepância entre as avaliações
subjetivas e o uso real - as pessoas julgam seu próprio uso segundo normas advindas de
seu vernáculo:

A esse respeito, Paiva (2003, p. 40) enfatiza:

As variantes lingüísticas estigmatizadas pela comunidade de fala possuem,


muitas vezes, uma função de garantir a identidade do indivíduo com um
determinado grupo social, um sistema de valores definido. Isso é, são formas
partilhadas no interior de um grupo e assinaladoras de sua individualidade com
relação a outros grupos sociais. Se um indivíduo deseja integrar o grupo, deve
partilhar, além das suas atitudes e valores, a linguagem característica desse
grupo. Nesse caso, determinadas formas de linguagem se investem de um status
particular, embora sejam desprovidas de prestígio na comunidade lingüística em
geral.

24
One might think that the pattern is the result of school teaching or the conscious imitation of radio
announcers. This may be true for some part of the variation, but there are several reasons to believe that
the main transmission route is in the wider community.
58

O fenômeno do prestígio encoberto parece estar associado à dimensão de


solidariedade, sinalizadora de identificação e lealdade lingüística (cf. GARVIN e
MATHIOT, 1974, p. 126).

Esse fenômeno que aumenta o prestígio da variedade popular leva à necessidade de


se indagar sobre critérios de diferenciação entre o falante do vernáculo e o falante
urbano culto. Preti (1997, p. 18) propõe que o segundo pode ser identificado por sua
competência em transitar de uma variedade coloquial, espontânea, a uma tensa, formal.
Essa habilidade do falante está ligada ao contexto e, portanto, à sua necessidade de
comunicação, sendo esse o único critério válido para se identificar o falante culto real, e
não, seu conhecimento das regras de gramática. Cabe, entretanto, reconhecer que, em
princípio, a habilidade de adaptar o registro ao contexto é comum a todos os falantes.

Também Barros (1997, p. 32), outra pesquisadora do NURC-SP, ao referir-se às


elocuções formais nessas pesquisas, assim caracteriza o falante culto: “É a capacidade
de variação e não o ‘purismo’ de um único uso que separará de um lado os falantes
cultos, de outro os que ‘não sabem falar’, não são maleáveis, não se adaptam às
necessidades dos diferentes momentos e situações.”

Preti (op. cit., p. 26) resume assim as conclusões a que chegou sobre a questão do
falante culto:

Em síntese, o que o corpus do Projeto NURC/SP tem-nos mostrado (e isso já na


década de 70) é que os falantes cultos, por influência das transformações sociais
contemporâneas a que aludimos antes (fundamentalmente, o processo de
democratização da cultura urbana), o uso lingüístico comum (principalmente, a
ação da norma empregada pela mídia), além de problemas tipicamente
interacionais, utilizam praticamente o mesmo discurso dos falantes urbanos
comuns, de escolaridade média, até em gravações conscientes e, portanto, de
menor espontaneidade.

Apesar dessa surpreendente transformação do comportamento do falante culto,


ainda paira sobre a comunidade de fala a pressão da imagem da norma culta explícita,
imagem esta construída dentro de um processo sócio-histórico e que é preciso respeitar
em determinadas condições, tanto na língua falada quanto na escrita.
59

Sobre essa questão, ainda Barros (op. cit., p.35) se aprofunda, analisando o material
coletado pelo NURC-SP. A pesquisadora mostra como se constrói o papel social do
falante culto, cuja característica ela retoma: “[...] falante de prestígio, que conhece as
regras da conversação e da língua, que emprega adequadamente suas possibilidades de
variação, que tem a função de referendar os ‘bons usos’ da linguagem.”

Vimos acima que Faraco (2002, p. 42) adverte sobre o risco de se exacerbar o
distanciamento entre a variedade padrão e a culta e sugere a criação de mecanismos
sócio-culturais para realizar os ajustes necessários.

Os resultados do Projeto NURC-SP já apontam com clareza esse distanciamento.


Pergunta-se: a quem caberia a viabilização de tais mecanismos de ajuste?

O grande agravante de tudo isso, a meu ver, é que o acesso não só à norma padrão,
mas também à norma culta tem sido vedado à maior parte dos brasileiros, não pela falta
de escola, instituição prioritariamente encarregada de divulgar esse “saber”, mas pelo
desconhecimento de toda essa realidade por grande parte dos que são encarregados da
sua transmissão de forma organizada e sistemática.

Fosse isso adequadamente trabalhado na escola, estariam garantidas o que Garvin e


Mathiot (1974, p. 121) denominam as funções de uma língua padrão: promover a
unidade lingüística, garantir a sua existência dentro do quadro de outras línguas, agregar
prestígio como língua de cultura e constituir um quadro de referência para o uso da fala
em geral. Tais funções determinam as atitudes culturais em relação a ela: a lealdade
lingüística, o orgulho e a consciência da norma.

O correlato disso seria evitar que os julgamentos valorativos sobre as línguas


acabem sendo, na verdade, julgamentos sobre seus falantes, o que leva à intolerância
lingüística, ao preconceito, um dos comportamentos mais nefastos contra as classes
desprivilegiadas, já que sua condenação está sequer prevista na Constituição brasileira.

No entanto o direito de o cidadão ser reconhecido como membro de uma


comunidade lingüística e de conviver e de se associar a outras comunidades, mantendo e
desenvolvendo sua própria cultura, mas, ao mesmo tempo, fazendo-se partícipe do
legado da cultura brasileira, está expresso na “Definição da Política Lingüística do
60

Brasil”, proposta pela Associação Brasileira de Lingüística (cf. SCLIAR-CABRAL,


1999, p. 7-17).

Gnerre (1994, p. 25) entrevê aí uma questão ideológica:

Talvez exista uma contradição de base entre ideologia democrática e a ideologia


que é implícita na existência de uma norma lingüística. Segundo os princípios
democráticos nenhuma discriminação dos indivíduos tem razão de ser, com base
em critérios de raça, religião, credo político. A única brecha deixa da aberta para
a discriminação é aquela que se baseia nos critérios da linguagem e da educação.

Sem o acesso à língua culta, enfim, estão vedados os caminhos que possibilitam o
acesso ao poder. É também Gnerre (op. cit., p. 22) que afirma: “A começar do nível
mais elementar de relações com o poder, a linguagem constitui o arame farpado mais
poderoso para bloquear o acesso ao poder.”

3. 4. 1 O papel da escola no ensino da variedade culta25

Do que acima ficou exposto e a partir do pressuposto adotado pela Sociolingüística


de que todas as línguas são heterogêneas e que, portanto, todas as variedades são
igualmente suficientes para o falante se expressar dentro de seu contexto sócio-cultural,
igualmente legítimas como meio de interação entre os membros da mesma comunidade,
a existência de uma variedade considerada melhor – a culta – demonstra que, de fato,
como entreviu Gnerre, por trás da questão lingüística, existe outra de caráter ideológico.
Numa sociedade em que o acesso aos bens culturais exige o domínio de uma só
variedade lingüística, a da classe dominante, a língua deixa de ser apenas instrumento
de interação e ação sobre a realidade para ser também um instrumento de exclusão
social.

Ora, para preparar os indivíduos para a vida em sociedade, elegeu-se a escola como
instituição oficial. Cabe a ela, no que se refere ao trabalho com a língua materna,
desenvolver no aluno habilidades e competências para utilizar adequadamente esse
patrimônio comum de sua comunidade. O que se esperaria é que a escola, adotando uma

25 Pelos motivos apresentados na discussão que acabo de apresentar, a partir desta Seção, opto por
utilizar, preferencialmente, as expressões norma culta, língua culta, variedade culta, ou mesmo variedade
urbana, isto é, a que corresponde aos usos lingüísticos do grupo social situado no extremo do contínuo de
letramento, ao invés de língua padrão ou variedade padrão, isto é a norma estabilizada.
61

orientação de base científica, fizesse o trabalho de desenvolver, em seus alunos,


competências mais refinadas, sem se preocupar em substituir a variedade lingüística que
já tivessem adquirido, qual seja a de seu grupo social.

Se se tratasse de alunos advindos de classes sociais favorecidas nas quais o uso da


norma culta é comum e com a qual, portanto, estão mais familiarizados, caberia à escola
apenas desenvolver essa competência, ampliando-a no domínio da leitura, da utilização
dos gêneros textuais que circulam na sociedade, numa palavra, tornando-os indivíduos
letrados.

Esse trabalho é, claro, estaria associado às práticas de oralidade, tratando-se essa


questão, como se viu atrás, dentro da perspectiva de um contínuo, sem cair no que
Marcuschi (2000, p. 27) denominou a armadilha que ameaça os que estudam a relação
oralidade/escrita. Introduzindo, em sua obra, um dos itens que trata dessa questão, ele
anuncia:

Será feita uma tentativa de evitar cair na armadilha preparada para todos os que
tentam entrar na análise das relações entre oralidade e escrita. Segundo Street
(1995), é difícil não sucumbir a algum dos mitos presentes nessa armadilha,
mesmo quando se postula, como nós, a teoria de que a relação se funda num
continuum e não numa dicotomia polarizada.

Se, ao contrário, essa variedade fosse a das classes desfavorecidas sócio-


economicamente, seria necessário, obviamente, que a essa competência fosse
acrescentada a do domínio da norma culta para que o acesso aos bens culturais e sociais
não lhes fosse vedado. Juntamente com isso, o mesmo trabalho de promover- lhes o
letramento, propiciar-lhes as práticas de escrita e oralidade, tornando esses alunos
familiarizados com os gêneros textuais necessários a seu intercâmbio social.

Veja-se o que sobre isso orienta Mattos e Silva (2004a, p. 114-115):

Se o professor tiver uma formação sociolingüística adequada, o que acontecerá


com uma minoria, terá de trabalhar com a variação da sintaxe nas suas aulas e
saber, na maioria das vezes de maneira ni tuitiva e tentativa, já que não há
materiais prontos para isso, definir o que será o uso lingüístico socialmente
aceitável para que seus alunos não fracassem no curso de sua futura vida
profissional em nossa sociedade.
Assim, entre as variantes sintáticas em convívio nas falas brasileiras, o professor
terá de distinguir, pelo menos, as estruturalmente mais salientes e socialmente
mais estigmatizadas, para, sem desprestigiar as segundas, selecionar ambas, a
62

fim de treinar o uso formal falado e os usos escritos de seus alunos. Aí está a
grande contribuição que a sociolingüística sobre o português brasileiro poderá
dar para uma efetiva virada no ensino da língua portuguesa no Brasil.
Seria este talvez, um dever patriótico: o conhecimento e o reconhecimento, na
escola, da realidade do português brasileiro.

Já assinalamos como Labov (1987) aponta a dificuldade da escola em desenvolver


nos alunos competências de uso da escrita e da leitura e como chama a atenção, em
contrapartida, para o sucesso do “trabalho” assistemático que acontece fora da escola,
na comunidade em geral, no ensino de outras competências lingüísticas. Aqui ele atribui
papel importante não apenas à família, mas em grande parte, à patota (peer groups).

Apoiando-se em suas pesquisas sobre o Ebonics (na época, BEV), ele (1987)
conclui sobre a dificuldade de se ensinar padrões fonéticos a alunos falantes de outras
variedades lingüísticas e aconselha que os professores se limitem àqueles que sejam
gerais para a população como um todo. Reconhece (op. cit, p. 139) a força da patota e
sua resistência em aceitar o padrão lingüístico da escola:

A evidência aponta para o fato de que o adolescente da “patota”, nas cidades do


interior, institucionaliza resistência às normas, à ideologia e às práticas do
sistema escolar. Essa resistência parece ser o resultado de um conflito político e
cultural entre os falantes do vernáculo e as autoridades escolares (Labov, 1982).
O comportamento lingüístico dos membros da “patota” é um reflexo e um
símbolo desse conflito. 26

Se no caso examinado por Labov, as raízes das diferenças ideológicas estão na


questão racial, no Brasil, tudo indica ser ela de ordem econômico-social historicamente
constituída. Bortoni-Ricardo (2005, p. 131) esclarece:

No Brasil, a variação está ligada à estratificação social e à dicotomia rural-


urbano. Pode-se dizer que o principal fator de variação lingüística no Brasil é a
secular má distribuição de bens materiais e o conseqüente acesso restrito da
população pobre aos bens da cultura dominante. Diferentemente de outros
países, como os Estados Unidos, por exemplo, a variação lingüística não é um
índice sociossimbólico de etnicidade, exceto nas comunidades bilingües, sejam
as de colonização européia ou asiática, sejam as das nações indígenas.

26
The evidence points to the fact that the adolescent peer group in the inner cities institutionalizes
resistance to the norms, the ideology, and the practices of the school system.This resistance appears to be
the result of a political and cultural conflict between the vernacular speakers and the school authorities
(Labov, 1982). The linguistic behavior of peer group members is a reflection and a symbol of this
conflict.
63

De qualquer modo, os dialetos dos negros americanos e dos alunos brasileiros das
classes sociais baixas são estigmatizados. O único caminho acertado para superar essas
diferenças, enfatiza Labov, é a exposição das crianças, o mais cedo possível, às outras
variedades lingüísticas.

Acrescentamos, portanto, a importância das práticas de oralidade na escola. Se a


comunidade lingüística como um todo é capaz de ensinar, de forma inconsciente,
padrões lingüísticos, não há razão para que o mesmo não possa ser feito pela escola.
Aqui Labov (1987, p. 144) clama pela necessidade de certa “engenharia” social que
permita que essa aprendizagem aconteça. “Temos que fazer na sala de aula o que a
comunidade faz, mas de forma concentrada e coerente”.27 Uma importante estratégia é
reduzir a distância entre o significado social simbólico e o sistema lingüístico.

O professor estaria, nesse caso, praticando o modelo da diferença verbal


(CAMACHO, 2003, p. 71), que vê nos dialetos sociais estigmatizados um sistema
lingüístico simplesmente diferente, mas estruturalmente capaz de oferecer os mesmos
recursos expressivos utilizados na norma culta. Não estaria, nesse caso, substituindo
competências, isto é, não estaria reprimindo o uso da variedade trazida pelo aluno de
seu ambiente familiar, legitimamente utilizado, por ele respeitado, do qual
freqüentemente se orgulha.

Ao contrário, estaria se preocupando em levá- lo a conhecer não apenas a norma


culta, mas também outros registros que, como foi lembrado acima, permitem- lhe
adequar seu texto ao contexto imediato da produção lingüística, à finalidade de seu ato
verbal, selecionando recursos de expressão formal ou familiar.

Desse modo, a escola estaria realizando sua importante tarefa, do ponto de vista
político-social, de promover as camadas marginalizadas, abrindo- lhes o acesso aos bens
simbólicos que a língua veicula. Soares (1989, p. 60-65) adverte sobre a importância de
a escola compreender essa questão dentro do quadro da economia das trocas simbólicas
explicitado por Bourdieu (cf. ORTIZ, 1983), já que a língua, sendo um desses bens, é
tratada, na sociedade capitalista, a partir de seu valor de mercado. Os alunos das classes
populares, não dispondo do capital lingüístico escolarmente rentável, isto é, a variedade

27
We must do in the classroom what the community does, but in a concentrated and coherent way.
64

legitimada pelos fa lantes das classes econômicas privilegiadas, estariam fadados ao


fracasso escolar; “[...] por outro lado, acrescenta ela (op. cit., p. 62), é, em grande parte,
a posse dele que explica as maiores possibilidades de sucesso, na escola, dos alunos
pertencentes às classes dominantes.”

Bortoni- Ricardo (1985, p. 92), discutindo esse tema da avaliação positiva das
variedades prestigiadas, em oposição às não-prestigiadas, chama a atenção para o fato
de que é inegável o estímulo que se estabelece numa interação assimétrica no sentido
de o inferior se aproximar da avaliação positiva de seu interlocutor. No entanto essa
convergência pode representar, para o falante, a perda da percepção da sua integridade
pessoal ou identidade de grupo, sendo isso deletério para sua auto-estima. Há
necessidade, portanto, de uma pedagogia culturalmente sensível para que esse trabalho
seja realizado sem prejuízo para os valores culturais do aluno. Esta é, aliás, uma questão
freqüentemente reiterada pela autora, que advoga, a favor dele, a adoção, na escola,
dessa pedagogia – culturally responsive pedagogy - conceito proposto por Erickson
(1987) e que ela explica (2005, p. 128):

É objetivo da pedagogia culturalmente sensível criar em sala de aula ambientes


de aprendizagem onde se desenvolvam padrões de participação social, modos de
falar e rotinas comunicativas presentes na cultura dos alunos. Tal ajustamento
nos processos interacionais é facilitador da transmissão do conhecimento, na
medida em que se ativam nos educandos processos cognitivos associados aos
processos sociais que lhes são familiares.

Apresentando vinheta em que demonstra como um professor alterna, em seu


discurso, uma variedade formal e outra distensa com a qual o aluno está familiarizado,
Bortoni- Ricardo ainda acrescenta (op. cit., p. 144): “Observa-se, ademais, nessa sala de
aula, respeito às características culturais e lingüísticas dos educandos, o que lhes garante
a manutenção da auto-estima e viabiliza sua integração na cultura escolar que lhes é
razoavelmente estranha.” (Grifo meu).

Esse aspecto é também focalizado por Bourdieu (1930-2002, p. 310), quando, na


sua análise sobre o mercado dos bens simbólicos veiculados pela escola, sendo um deles
o capital cultural, trata das sanções do mercado escolar que se exercem com todas as
aparências de legitimidade e suas conseqüências sobre os alunos. Ele explica:
65

Desta maneira, as disposições negativas no tocante à escola que levam a maioria


das crianças das classes e frações de classe mais desfavorecidas culturalmente à
auto-eliminação, como por exemplo, a depreciação de si mesmas, a
desvalorização da escola e de suas sanções ou a resignação ao fracasso e à
exclusão, devem ser compreendidas em termos de uma antecipação fundada na
estimativa inconsciente das probabilidades objetivas de êxito viáveis para o
conjunto da categoria social, sanções que a escola reserva objetivamente às
classes ou frações de classe desprovidas de capital cultural. (Grifo meu).

Mollica (2000, p. 35), apoiando-se nos princípios da Sociolingüística variacionista,


demonstra como a escola pode trabalhar eficientemente a heterogeneidade da língua,
desconstruindo preconceitos a partir do que ela denomina uma “metodologia
pedagógica” para transformar em recursos didáticos itens em processo de variação e/ou
mudança, já apontados pelos especialistas da área.

Fixando o critério fala/escrita, ela pesquisou, em ambiente escolar, se a orientação


clara e direcionada no ensino/aprendizagem da escrita reduz a ocorrência de certas
variantes, algumas mais outras, menos estigmatizadas. Os resultados demonstraram que
uma orientação explícita acerca da influência da relação fala/escrita é importante para o
processo de correção na escrita. Ela propõe, portanto (p. 81), que: “ (a) uma
metodologia de ensino da escrita deve levar em conta os trabalhos sociolingüísticos
voltados para a fala; (b) assumindo (a) como verdade, uma metodologia eficaz para o
ensino da escrita de certas regras deve prever orientações dirigidas explicitamente.”

Advoga ainda a necessidade de se construir material didático específico para o


esclarecimento dos alunos sobre a variação lingüística, o que implica, evidentemente,
em preparação sociolingüística adequada dos professores nos cursos de formação.

Bortoni- Ricardo (1992) propõe que as escolas, cuja clientela é constituída de


alunos falantes de variedades estigmatizadas, empreendam uma educação bidialetal.
Segundo sua experiência tem demonstrado, isso é possível, se a educação é
comprometida com uma pedagogia culturalmente sensível, sendo indispensável, para
isso, que os professores freqüentem cursos especiais de educação sociolingüística.

Refletindo sobre as dificuldades de implementação da educação bidialetal, uma


proposta, a autora aponta (p. 58):
66

São questões cruciais na implementação de um currículo bidialetal a definição da


natureza dos traços dialetais - graduais ou descontínuos – e o preconceito que a
sociedade brasileira desenvolveu, ao longo de sua história, quanto ao “português
errado”. Para a grande maioria dos brasileiros, as noções de dialeto (ou
variedade) ou de variação dialetal não têm qualquer realidade psicológica. O que
existe, como um valor cultural bem arraigado, é a noção de erro gramatical.

Essas e outras dificuldades chegariam mesmo a impedir um programa de educação


bidialetal. Labov já constatou ser impossível se assentar essa proposta na preservação
dos falares estigmatizados paralelamente à assimilação da variedade prestigiada.
Bortoni- Ricardo (op. cit., p. 58) transcreve a afirmação desse autor (1972):

Ainda que se possa atingir um certo insaite, trabalhando-se com informantes


bilíngües, é duvidoso que o mesmo possa ser dito de informantes “bidialetais”,
se é que, de fato, tais falantes existem. Nunca encontramos falantes que
houvessem ganhado um bom controle da língua padrão e ainda assim tenham
preservado bom controle do vernáculo não-padrão.

Portanto, a viabilidade da educação bidialetal se assenta no respeito às


características culturais e lingüísticas do educando, partindo a escola do conhecimento
lingüístico e da competência comunicativa que ele apresenta em sala de aula.

Leia-se a reflexão de Labov (1987, p. 145):

A língua da sala de aula deve ser uma propriedade comum de todas as classes
sociais e grupos étnicos; livre da identificação com estilo masculino e feminino;
neutro em relação à oposição entre alta cultura e cultura popular; independente
de outros processos de socialização do sistema escolar; e restaurar o vigor da
vida cotidiana. Um passo nessa direção é rejeitar os símbolos socialmente
significativos que carregam esse peso social. 28

28
The language of the classroom must be seen as a common property of all social classes and ethnic
groups; freee from identification with male or female style, neutral to the opposition of high culture and
popular culture; independent of the other socialization processes of the school system; and restored to the
vigor of everyday life. One step in this direction is to strip away the socially significant symbols that carry
such a heavy social loading.
67

Quanto àqueles alunos que já chegam à escola familiarizados com a variedade


culta, sofrem menos, porque cometem naturalmente menos “erros”. Mas ficam, em
grande medida, presos na memorização estéril de regras e classificações.

É preciso que essa questão continue sendo alvo de estudo. Nesse sentido, creio que
procurar torná- la explícita através do estudo das reações subjetivas dos alunos a
diferentes variedades de sua língua materna, em ambiente escolar pode ser mais uma
contribuição da pesquisa sociolingüística para se compreender o problema, tendo em
vista a necessidade de se resolvê- lo.

Acreditando nisso, foi que empreendi uma pesquisa de campo em escolas públicas
do Município de Juiz de Fora e que passo a relatar.
68

4. PESQUISA DE CAMPO

4.1 O problema

No Brasil, atualmente, como se sabe, as escolas públicas são freqüentadas


principalmente por alunos provenientes de famílias de baixa renda, que têm dificuldade
de acesso aos bens culturais, permanecendo, por isso mesmo, quase sempre impedidas
de promover mudanças substantivas em sua realidade sócio-econômico-cultural. A
escola pública, por sua vez, historicamente constituída a partir de valores da classe
média, não se preparou suficientemente para atender também àquele público que, só a
partir da década de sessenta, passou a freqüentá- la massivamente.

Do ponto de vista lingüístico, portanto, uma das decorrências com que se depara a
escola pública é o descompasso entre a variedade trazida pelos alunos e a variedade
culta, que a escola pretender ensinar, podendo isso ser apontado como uma das causas
do fracasso e da evasão escolar.

Essa questão – a contra-pressão do prestígio encoberto atribuído pelos alunos da


escola pública à sua variedade lingüística - está associada a uma das minhas perguntas
fundadoras. Nesse sentido, como esses alunos avaliam a variedade lingüística com a
qual estão familiarizados, mediante a mais prestigiada, que a escola lhes apresenta como
sendo a melhor?

4.2 A metodologia

Para essa investigação, utilizei testes de medida indireta e direta. Como medida
indireta, um teste de atitudes; como medida direta, um questionário de questões
fechadas.

Na construção dos testes de atitudes, selecionei amostras de três variedades


lingüísticas, a urbana, a rurbana e a rural. Essas variedades dialetais já foram aqui
discutidas quando, na Seção 3.3, me referi ao contínuo rural-urbano. Nesse sentido,
69

considerei a variedade urbana, a do pólo direito extremo desse contínuo, como sendo
um falar culto; a rural, a do pólo extremo esquerdo, com características do que se
considera fora da norma culta; a rurbana, intermediária entre ambas. Essas
características serão demonstradas, através da análise fonética dos traços característicos
dessas três variedades, quando for apresentado o corpus da pesquisa.

Para esse trabalho, apresentei gravações de falas a alunos de algumas escolas, a fim
de elicitar suas reações subjetivas a essas variedades. A vantagem dessa medida indireta
é surpreender as reações inconscientes dos sujeitos, o mais possível, sem interferência
de sua monitoração lingüística, relativamente às convenções e aos padrões
institucionalizados.

Paralelamente, foram apresentadas a esses mesmos alunos, a professores e a


formandos de Letras, questões diretas que os levaram a explicitar, por exemplo, suas
crenças em relação ao trabalho escolar com a língua materna, à concepção de certo e
errado em linguagem, às relações entre as modalidades falada e escrita, ao preconceito
lingüístico, etc., fazendo evidenciar, se fosse o caso, aqueles padrões institucionalizados
em relação ao ensino-aprendizagem de línguas, o que constituiu material importante
para subsidiar o estudo das reações subjetivas dos alunos.

Os testes com os professores, em consonância com as perguntas fundadoras (Seção


2), funcionariam como forma de se controlar os resultados das investigações com os
alunos, isto é, quanto mais as crenças dos professores fossem desfavoráveis à variedade
lingüística dos alunos, mais desfavoráveis seriam as atitudes desses últimos em relação
à proposta da escola, mais descrentes estariam eles de sua própria capacidade de se
expressar com competência, segundo os padrões escolares esperados.

Relativamente a essa correlação entre crenças e atitudes, leia-se o que afirma Basso
(2006, p. 24): “[...] a aprendizagem dos alunos é melhorada quando eles percebem as
expectativas e as intenções dos professores, e quando os professores percebem
acuradamente as expectativas e as intenções de seus alunos.” E mais à frente (p. 25):
“De maneira geral, os dados revelam muitas convergências, o que confirma a posição de
Barcelos quanto à influência das crenças dos professores nas crenças de seus alunos.”
70

A inclusão de formandos do Curso de Letras, por sua vez, serviu como parâmetro
para avaliar os resultados das reflexões, em Sociolingüística, que vêm ocorrendo nos
cursos de formação de professores de português.

Para a interpretação dos resultados, foi utilizada a Análise de Variância, conforme


será demonstrado no Capítulo 5.

4.3 O teste de atitudes: constituição do corpus

O corpus foi constituído de excertos de três entrevistas gravadas e que me foram


concedidas voluntariamente por moradores de um bairro e de um distrito de Juiz de
Fora, além de uma colega de trabalho da Faculdade de Educação da Universidade
Federal de Juiz de Fora. As três entrevistadas estão relacionadas no quadro abaixo, com
dados pertinentes para a caracterização da pesquisa.

Falante I Falante II Falante III

Nome 29 Mara Dª Mercedes Telma

Idade 56 anos 76 anos 41 anos

Grau/instr. Mestrado Analfabeta 4ªsérie do Ens. Fund.

Residência Juiz de Fora (MG) Juiz de Fora (MG) Juiz de Fora (MG)

Local entrevista Fac.Educ.UFJF Residência Fac. Educação UFJF

Varied.lingüística Urbana Rural Rurbana

QUADRO 1 - Perfil dos falantes.

Todas as entrevistas foram realizadas no mês de outubro de 2006.

As únicas variáveis controladas foram assunto e sexo. Para a primeira variável,


(assunto ou tópico) elegi o tema: Mudanças ocorridas, ao longo do tempo, na cidade ou

29 Para fins de preservação da identidade dos falantes, os nomes aqui informados são fictícios.
71

bairro da pessoa entrevistada. Na edição em CD dos fragmentos para a realização dos


testes, tomei o cuidado de selecionar os trechos em que os falantes não elicitassem
pistas diretas sobre sua situação sócio-econômico-cultural, dados que, como se verá no
teste proposto, poderiam interferir no julgamento dos alunos, tendo em vista os
adjetivos selecionados para a escala semântica.

Quanto à variável sexo, dentre as várias gravações feitas nos testes-piloto para o
experimento, as três consideradas melhores, dentro dos padrões técnicos, foram as
realizadas com mulheres (Mara, Dª Mercedes e Telma).

As gravações foram feitas em aparelho digital MP3, que oferece excelente


qualidade de som. A seguir, foram levadas ao Laboratório de Rádio da Faculdade de
Comunicação da UFJF, onde se operaram os cortes das falas, para obtenção de excertos
de 1 minuto cada, utilizando-se o programa Sound Forge, que edita material de áudio
em computador. O corpus perfaz, portanto, o total de cerca de 3 minutos. Nesse mesmo
Laboratório, foi feita a gravação desse material em CD, para ser apresentado aos alunos
na realização dos testes. Apesar de se tratar de entrevistas, durante o minuto selecionado
para o corte, o turno era ocupado apenas pelo falante cuja fala interessava avaliar.

A escolha da ordem de apresentação das falas foi aleatória, tendo sido feito, para
isso, o sorteio delas, ficando a seguinte seqüência: Mara (variedade urbana), Dª
Mercedes (variedade rural) e Telma (variedade rurbana). Na seção 4.3.2, apresentarei os
traços lingüísticos tipificadores desses três falantes.

Para a seleção dos adjetivos, decidi trabalhar com as dimensões de poder e


solidariedade, a partir do que ficou explicitado na Seção 3.2.1. Isso porque me
interessou investigar, justamente, a relação que os alunos estabelecem com a variedade
que a escola lhes apresenta como a melhor e que está inserida na primeira dimensão
(poder, prestígio) e aquela que utilizam nas suas relações cotidianas, entre familiares e
amigos (solidariedade). Essa predeterminação das dimensões a serem avaliadas é
recomendação de Ryan (1979, p.154), quando afirma: “Acreditamos que o uso
predeterminado das dimensões é necessário para se explorar sistematicamente a
multidimensionalidade das atitudes lingüísticas.”30

30
It is our belief that the use of predetermined dimensions is necessary in order to explore systematically
72

Para representar a dimensão de poder, os adjetivos escolhidos foram competente,


inteligente e rico; para a de solidariedade, honesto, simpático e boa pessoa.

Na determinação da ordem de apresentação desses adjetivos, utilizei também o


critério aleatório, resultando na seguinte seqüência: inteligente, honesto, competente,
simpático, rico, boa pessoa. Mais à frente (em 4.4), será detalhado o trabalho com esse
material.

4.3.1 A seleção das escolas

Para a condução dos testes de atitudes, selecionei cinco escolas, quatro de ensino
público e uma particular.

Ainda que esta pesquisa tenha implicações indiretas com a questão de nível sócio
econômico, decidi não trabalhar com esse constructo, já que o estudo dessa variável
implicaria em uma outra pesquisa específica. Isso significa que também não explorei a
questão de renda, porque este é um dado que a cidade de Juiz de Fora não possui de
modo atualizado e confiável, segundo informações obtidas junto à direção do Centro de
Pesquisas Sociais da UFJF.31

Além disso, estudos anteriores em Sociolingüística já demonstraram a


complexidade dessa questão. Trudgill (1974, p. 37) afirma não serem as classes sociais
entidades claramente definidas, mas agregados de pessoas com características
econômicas semelhantes, que podem, inclusive, se deslocar para cima ou para baixo na
hierarquia social, o que dificulta a pesquisa, na identificação dos traços lingüísticos
desses grupos.

Também a esse respeito afirma Chambers (1995, p. 37), que a noção de classe
social é vaga:

the multimensionality of language atitudes.


31
O atual diretor desse Centro de Pesquisas é o Prof. Carlos Alberto Hargreaves Botti, a quem agradeço a
orientação nesse sentido.
73

Nas complicadas sociedades industriais, as divisões em classe média e classe


trabalhadora é por demais abrangente para ser significativa, exceto para as
discussões mais gerais. Usualmente, necessitamos fazer mais distinções,
redividindo os dois grupos maiores em subgrupos de posição mais alta, média e
baixa. Aqui essas divisões aumentam a indistinção. Isso porque muitos
indivíduos podem ser incluídos tanto na classe média quanto nas categorias mais
baixas, ou tanto na classe média quanto na mais alta. 32

A classe social, esse autor adverte, pode ser vista como um contínuo e, nesse caso,
ela seria mais bem caracterizada a partir de membros prototípicos, isto é, daqueles que
estão no meio da categoria, não se devendo considerar seus representantes de situações
limítrofes. Ele considera (op. cit., p. 39) menos arriscado selecionar os sujeitos a partir
do critério de vizinhança, tal como o fizeram ele mesmo, em pesquisa apresentada nessa
mesma obra, e Milroy e Milroy (1978) em sua pesquisa de Belfast. O sociolingüista, ele
aconselha (op. cit., p. 38), deve confiar na sua intuição ao apontar a classe social dos
indivíduos de sua amostra, para evitar digressões relativas a esse problema.

No caso particular de minha pesquisa, preferi, então, escolher as escolas a partir de


sua localização geográfica dentro do perímetro do Município de Juiz de Fora. Por esse
critério, escolhi uma escola localizada no centro da cidade, duas em bairros
considerados centrais, isto é, bairros próximos ao centro da cidade, uma na periferia da
cidade e uma outra localizada na zona rural.33 Assim agindo, pude fazer recortes que
resultaram em quadros sociais mais ou menos homogêneos, sem cair na dificuldade
acima aludida.

As ilustrações que se seguem mostram:

(a) a localização da zona central e dos bairros situados no perímetro urbano do


Município de Juiz de Fora, onde se encontram quatro das escolas da amostra;

(b) o mapa de Juiz de Fora, com seus distritos, fora do perímetro urbano do
Município, destacando o de Rosário de Minas, lócus da única escola da amostra
pertencente à zona rural.

32
In complicated industrial societies, divisions into middle class and working class are too gross to be
very meaningful except for the most general discussions. Usualy we need to make further distinctions,
partioning these two major groups into upper, middle and lower subg-groups. Here the distinctions grow
cloudy. For many individuals, it is possible to argue for their inclusion in either the middle or lower
categories, or the middle and upper.
33
É preciso esclarecer que o centro da cidade de Juiz de Fora é considerado, pelos seus moradores, zona
nobre do ponto de vista do comércio e do mundo dos negócios.
74

Figura – Representação de Juiz de Fora, por regiões, indicando os bairros. Em destaque, os locais das
escolas selecionadas para os t estes.
75

Mapa - Município de Juiz de Fora com seus distritos. Em letra vermelha, o de


Rosário de Minas
76

As variáveis controladas para compor o universo da pesquisa foram:

§ grau de instrução (8ª série do Ensino Fundamental);


§ faixa etária (entre 14 e 17 anos);
§ média de número de alunos testados por escola: 30;
§ localização da escola (centro da cidade, bairro central, periferia, zona
rural).

Para responder aos testes, foram selecionados, aleatoriamente, 30 alunos de 8ª série


do Ensino Fundamental de cada uma das quatro escolas. Na Escola Municipal “Profª
Helena Antipoff”, a quinta da amostra no quadro abaixo, havia apenas 15 alunos nessa
série, de modo que, à exceção dessa escola, 30 alunos de cada grupo responderam aos
testes, perfazendo um total de 135 sujeitos avaliados, conforme demonstro a seguir:

Escolas Localização Nº de
alunos
testados
Colégio “Cristo Redentor” Centro da cidade 30
(Escola particular)
Colégio de Aplicação “João XXIII” Bairro Santa Helena 30
(Escola pública federal) (bairro central)

Escola “Estadual “Fernando Lobo” (Escola Bairro São Mateus 30


pública estadual) (bairro central)
Escola Municipal “Quilombo dos Bairro Sagrado Coração de Jesus 30
Palmares” (Escola pública municipal) (periferia, limítrofe com zona
rural)
Escola Municipal “Profª Helena Antipoff” Distrito de Rosário de Minas 15
(Escola pública municipal) (zona rural)
Total 135

Quadro 2 – Escolas selecionadas para a aplicação dos testes


77

Ainda que minha pesquisa seja especialmente voltada para as escolas públicas,
decidi, por sugestão da Profª Drª Lucia Quental, estendê- la também a uma escola
particular, o Colégio “Cristo Redentor”, localizado no centro da cidade, para possibilitar
a comparação de dois universos distintos. Haveria muita diferença entre o que avaliam
os alunos de diferentes níveis sociais em relação à variedade lingüística que utilizam e
aquela que a escola lhes apresenta como a melhor? Como os alunos falantes de uma
variedade mais próxima da culta a julgam? Haveria diferença entre as atitudes dos
alunos das classes sócio-econômicas mais dicotomizadas em relação à sua variedade
lingüística, em função das crenças que a escola inculca em todos eles?

A seguir, apresento, mais detalhadamente, o perfil de cada escola incluída na


testagem.

Colégio “Cristo Redentor” – Escola particular tradicional de Juiz de Fora, mais


conhecida como “Academia de Comércio”, nome com o qual foi fundada em 1894,
passando, em 1951, a se chamar Colégio “Cristo Redentor”. Desde 1901, é de
propriedade da Congregação do Verbo Divino. Localiza-se no centro da cidade. Seus
2.200 alunos dispõem de salas amplas, bem iluminadas e arejadas e podem contar com
muitas atividades extraclasse: várias modalidades de esporte (capoeira, futsal, esportes
acrobáticos, vôlei, natação, basquete), atividades artísticas variadas (coral, balé, Cia. de
atores, Cia. de dança, teatro), além de um museu de etnologia indígena, um de história
natural e uma biblioteca muito bem equipada. 34 A Escola abriga também um Centro de
Ensino Superior. Goza de grande prestígio junto à comunidade juizforana, mas é
accessível quase que apenas a alunos oriundos de famílias com alto poder aquisitivo,
com exceção dos filhos de professores e funcionários, que têm ali o ensino gratuito.

Dentre os 64 professores de 5ª a 8ª série do Ensino Fundamental e das séries do


Ensino Médio, 16 têm Mestrado e 42 completaram o curso de Especialização; dentre
eles, 09 são professores de Português: 02 mestres e 07 especialistas.

Colégio de Aplicação “João XXIII” – Foi fundado em 1965, para ser uma escola de
experimentação, demonstração e aplicação, para atender aos licenciandos da

34
Informações obtidas no site www.academia.com.br/, em 29/11/2006.
78

Universidade Federal de Juiz de Fora, em termos de pesquisa e realização de estágios


supervisionados. Está instalado em um amplo e confortável edifício, com laboratórios,
biblioteca, quadra de esportes. Conta atualmente com 1100 alunos matriculados em 24
turmas de Ensino Fundamental e 09 de Ensino Médio, além de 08 turmas do Curso de
Educação de Jovens e Adultos e 01 turma de Especia lização em Prática Interdisciplinar.
Seus professores têm a Revista Instrumento (ISSN-15166368) para divulgação de suas
pesquisas. 35

São profissionais bem qualificados. Dentre os 63 professores, há 35 mestres, 05


doutores, 21 especialistas e 02 com apenas o curso de graduação. Entre os professores
de Português, todos têm completo o curso de Mestrado, 01 o de Doutorado, além de
outros completando o seu doutoramento. Essa escola goza de muito prestígio na cidade
por manter ensino gratuito e de qualidade.

Embora seja uma escola de ensino gratuito (os alunos aí são admitidos por meio de
sorteio público, nas séries iniciais do Ensino Fundamental), por sua localização num
bairro próximo ao centro da cidade, o Bairro Santa Helena, acabou se tornando pouco
ou nada acessível à camada pobre da sociedade, que reside em bairros distantes e que,
por isso, teria que arcar com despesas de quatro conduções diárias. O resultado é que a
maior parte do corpo discente dessa escola é constituída de alunos que residem no
mesmo bairro - que é considerado de padrão residencial muito bom - ou que vêm de
outros pontos da cidade, trazidos pelos pais, em condução própria. Esta última
informação me foi passada por professores dessa escola.

Escola Estadual “Fernando Lobo” – Trata-se de uma escola pública tradicional,


localizada no bairro de São Mateus, próximo do centro da cidade. É bairro residencial
considerado bom, com um comércio bem desenvolvido, mas que fica na fronteira com
outros bairros mais pobres.

Foi fundada em 1917 e conta hoje com aproximadamente 1550 alunos de Ensino
Fundamental e Médio, segundo informação obtida junto à secretaria da Escola. Está
instalada numa construção de dimensões amplas, com salas de aula bem iluminadas e

35
Informações obtidas junto à secretaria da escola e no site http://www.joaoxxiii.ufjf.br/, em 29/11/2006.
79

arejadas, uma biblioteca, um laboratório de informática e quadra de esportes aberta,


para vôlei, basquete e futsal.

Dentre seus 62 professores, apenas 01 tem Mestrado, mas noutra área, que não a de
linguagem; 61 são especialistas. Dos seus 14 professores de Português, nenhum tem
Mestrado e 13 comp letaram um Curso de Especialização.

Apesar do esforço da administração e de seu corpo docente, as famílias residentes


nesse bairro, em geral, preferem, para seus filhos, as escolas particulares. Desse modo,
seu corpo discente é constituído principalmente de alunos que residem nos bairros
vizinhos, de nível sócio-econômico baixo. Essa informação me foi passada pela
coordenação da Escola.

Escola Municipal “Quilombo dos Palmares” – Essa escola está situada num bairro da
periferia da cidade, bem próximo à zona rural, o Bairro Sagrado Coração de Jesus, ou
Sagrado, como é mais conhecido. Oferece todas as séries do Ensino Fundamental e, em
regime de suplência, o Ensino Médio. O corpo discente – 700 alunos – é, em sua
totalidade, constituído de alunos que residem ali mesmo no bairro, onde se pode ver
principalmente casas simples, ou pobres. Alguns são filhos de empregados de
propriedades rurais vizinhas, segundo informações da direção da Escola.

Está abrigada num prédio simples, mas dispõe de uma biblioteca, um laboratório de
informática e uma quadra poliesportiva.

Quanto à formação de seu corpo docente, 04 professores são mestres, mas apenas
01 na área de linguagem; 02 têm curso de Especialização em Literatura.

Escola Municipal “Profª Helena Antipoff” – É considerada, pela Secretaria de


Educação da Prefeitura Municipal de Juiz de Fora, uma escola rural. Está situada num
dos distritos de Juiz de Fora, o de Rosário de Minas, a 72 km da cidade (Ver Mapa 2).
Esse Distrito, durante aproximadamente dois séculos, viveu intensamente sob a
economia rural, tendo conhecido o trabalho escravo, de que se tem notícia não apenas
pelos relatos de moradores, como também por documentos históricos. 36

36
Exemplares do Jornal O Pharol e informações contidas no Álbum do Município de Juiz de Fora, de
Albino
80

A arquitetura desse pequeno povoado, que exibe grandes e velhos casarões de pau a
pique, já mal conservados e desvalorizados, demonstra que ele passou por um declínio,
que se pode bem visualizar no casario empobrecido, na fraca presença das conquistas
modernas dos centros urbanos, tais como telefone residencial fixo e celular. Como
comércio, dois ou três estabelecimentos simples. Apenas em 1980, conforme relato de
moradores, conheceu a energia elétrica. Segundo minha investigação, só uma família
possui um computador em casa. O único outro pertence à escola.

Seu acesso à sede do Municíp io apenas bem recentemente foi facilitado pela
construção de estrada, ainda que os primeiros oito quilômetros permaneçam sendo de
terra. Isso fez com que ele permanecesse um núcleo isolado durante muitos anos, o que,
de certa forma, continua sendo até hoje.

A Escola “Profª Helena Antipoff” é a única do lugar e oferece todas as séries do


Ensino Fundamental a 236 alunos, que são residentes no Distrito, segundo informações
obtidas junto à Direção. Está abrigada numa construção bastante simples, com salas de
aula pequenas, sem biblioteca, sem pátio ou qualquer outro recurso pouco mais
sofisticado.

De seu corpo docente, apenas 01 professor é pós-graduado (Mestrado em Ciências).


Na área de linguagem, apenas a Coordenadora da Escola tem curso de Especialização.

4.3.2 Os falantes e suas falas

Na escolha dos falantes para a construção dos testes de atitudes, procurei


caracterizar três variedades dentro do contínuo rural- urbano segundo Bortoni-Ricardo
(2004, p. 51). Para isso, selecionei, três falantes:

• um representante da variedade urbana, culta, localizável, portanto, no extremo


direito desse contínuo (Mara);
• um que seria representante do pólo extremo esquerdo, falante da variedade rural
(Dª Mercedes);

Esteves, existentes nos arquivos da Biblioteca Municipal “Murilo Mendes”, em Juiz de Fora, constituem
esses documentos.
81

• e um intermediário entre esses dois pólos, falante da variedade rurbana (Telma).

Na caracterização tanto da variedade urbana, quanto da rural e da rurbana, utilizei,


dentre outros autores, as descrições propostas por Zágari (1988, 2005) e Bortoni-
Ricardo (1985). No segundo capítulo dessa obra, The caipira dialect, a autora, depois de
apresentar os aspectos fonéticos do português padrão do Brasil, faz também o
levantamento dos aspectos fonéticos do dialeto caipira. Ela, preliminarmente (op. cit., p.
21), adverte:

Em sentido restrito, Caipira se refere à população rural do interior de São Paulo.


De acordo com Cândido (1964, p. 8), Caipira se refere ao “universo da cultura
rústica de São Paulo” e identifica o modo de ser, nunca o tipo racial. Atualmente,
o termo, que tem etimologia tupi: curupira, não é restrito à área da influência
paulista histórica, mas se refere à população rural e tradicional brasileira em
geral. Como um adjetivo, a palavra é utilizada para descrever o modo de ser
isolado e atrasado dos habitantes rurais, em oposição ao modo de vida urbano37 .

É, portanto, a partir dessa segunda interpretação que utilizo a denominação caipira,


quando apresento os traços fonéticos dos falantes selecionados para os testes de
atitudes.

Esclareço que não procedi a um levantamento estatístico dos traços, mas procurei
simplesmente caracterizá- los.

A seguir, apresento a transcrição das três falas, seguidas da descrição fonética dos
que considerei característicos de cada uma.38

37
In a narrow sense Caipira denotes the rural population of the hinterland of São Paulo. According to
Cândido (1964:8), Caipira refers to the ‘universe of the rustic culture of São Paulo’ and identifies a way
of life, never a racial type. At present the term, which has a Tupi etymology: curupira, is not restricted to
the area of Paulista historical influence, but refers to the rural and traditional population of Brazil in
general. As an adjective, the word is used to describe the isolated and backward way of life of the rural
dwellers as opposed to the urban way of life.
38 A es colha da convenção aqui utilizada para as transcrições foi sugeria pela Profª Drª Lucia Quental e é
baseada em uma adaptação daquelas de Tannen (1993) e Shiffrin (1987). (Ver ANEXO A).
82

Falante I – Mara (Variedade urbana)

Sob alguns aspectus, ela melhorô. Porém, é:::, u qui eu sintu


mais falta é da, da relação qui havia:, (2.0) das pessoas nus
bairrus. (1.5) Us bairrus eram-, é: centrus comunitárius. havia:
aquela coisa di pidir a xícara di açúcar imprestada pru vizinhu,
né?. Di: durmi um na casa du otru, di formá turminha,d i jogá
bola, a criançada si reunir, us adolescentis fazerem festinhas. I
u centru, u centru é qui era u anônimu. Qui as pessoas si
dirigiam au centru, para u comérciu, para u-, a-, uma-, u futing
na na Halfeld, né, a paquerinha, mas nãu havia uma relação das
pessoas qui moravam nu centru. U centru representava um pocu essa
impessoalidadi. Qui achu qui agora ela vai si istendendu, vai
tomandu us bairrus mais próximus du centru.

Trata-se de falante com 56 anos de idade. É professora de português da UFJF, com


Mestrado em Lingüística em andamento. Sempre residiu em Juiz de Fora (MG), cidade
onde nasceu.

Sua fala apresenta alguns traços graduais, comuns no português do Brasil, ao lado
de outros característicos da variedade culta. Aqui se pode observar o que já referi na
Seção 3.4, relativamente aos resultados do Projeto NURC/SP, apresentados por Preti
(1997). Trata-se, justamente, da existência de um processo de interação entre uma fala
tensa, “[...] marcada pela preocupação com regras de gramática tradicional, e uma
linguagem popular, espontânea, distensa.” (p.17). O autor acrescenta ainda (p. 20):

Esse painel cultural e suas conseqüências lingüísticas favorecem decididamente


a linguagem popular, aumentam-lhe o prestígio. Pode-se afirmar que muitas de
suas formas expressivas, embora em desacordo com a tradição gramatical, se
incorporam definitivamente à linguagem oral urbana comum, incluindo-se
também na fala das pessoas cultas e nas suas expectativas com referência aos
interlocutores, durante uma interação. Assim por exemplo, não seria mais
possível a um falante culto, em qualquer tipo de situação interacional, evitar
sempre o uso do pronome proclítico, em início de frase, como determina a
gramática tradicional.

Vejamos alguns traços característicos desse falante culto:


83

(i) as‘pec[tus]; [u] [ki] eu‘sin[tu]; ‘bai[hus]; [dži] açúcar [ im pres’tada].

Alçamento das vogais átonas [o] e [e], pós-tônicas e pré-tônicas, e em monossílabos


átonos. Esse traço não é percebido pelos falantes e ouvintes do português. Leite e
Callou (2004, p. 41) assim explicam essa variação:

A opção por uma vogal baixa aberta, [e] ou [ ], ou alta fechada, [i] ou [u],
obedece a condicionamentos estruturais e sociais, sutilezas que passam
desapercebidas aos falantes e ouvintes. O primeiro condicionamento é a presença
de uma vogal alta ou baixa na sílaba acentuada, como em c[u]ruja e p[i]rigo, em
vez de coruja e perigo, P[e]lé e b[ ]lota, em vez de Pelé e bolota.

(ii) pe[dži{ø}] a xícara; dor[’mi{ø}] um na casa do outro

Cancelamento de [R] em posição final, nas formas verbais de infinitivo. Esse traço
comum a todas as variedades do português brasileiro está ligado às nossas raízes
históricas. As línguas faladas pelos negros trazidos da África (nagô, bantu, umbundo,
quimbundo, etc), apesar de diferentes entre si, tinham um caráter comum: não possuíam
o [R] final. Provavelmente, ao aprenderem português, os escravos negros não só não
usavam o infinitivo com [R] final, como também transmitiram essa característica a seus
descendentes e às pessoas com as quais conviviam. Dada a sabida influência de seu
contato com a população de língua portuguesa, pode-se compreender por que esse traço
fonético se generalizou, tornando-se mesmo um dos que diferenciam o português
brasileiro do português europeu. 39

39
Informações obtidas na Conferência proferida pelo Prof. Dr. Mário Roberto Lobuglio Zágari,
na XVIII Semana de Estudos Clássicos, em outubro de 2006, na Faculdade de Letras da UFJF.
84

(iii) melho[’ro]; [‘otru]; [‘po]co

A não articulação de [w] no ditongo [ow], desfazendo os ditongos decrescentes.


Segundo Paiva (1998, p. 233), esta constitui a norma no português falado, em razão da
existência de uma mudança totalmente implementada no sistema. A autora enfatiza:

Reforça o caráter padronizado da pronúncia [o] para [ow] a baixa percepção do


falante em relação à articulação deste ditongo. Solicitado a emitir julgamentos
sobre o status de variantes como [va’sowra], [va’sora], o falante de português
não percebe a diferença entre as duas, atribuindo a ambas o mesmo valor (cf.
SANTOS, 1996).

Por isso a oposição entre as duas formas [me?o’row] – [me?o’ro] não é percebida
no julgamento dos falantes dessa língua.

(iv) [us] 'bai[hus] [‘erãw] cen[trus] comuni’ta[riws];

[us] adole’scen[tšis] fa’ze[r??] fes’ti[ñas].

A presença, em todos os sintagmas nominais e verbais, dos morfemas marcadores


de plural caracteriza essa fala como sendo exemplo de variedade culta. “O fenômeno
sob estudo é abordado pela tradição gramatical brasileira como sendo de natureza
obrigatória, com base explícita ou implícita, na escrita ou na fala de pessoas cultas, num
registro formal ou coloquial tenso. [...] Conseqüentemente, o uso lingüístico sem a
obediência às regras de concordância gramatical é estigmatizado” (SCHERRE, 1998, p.
88).

(v) porém; relação que havia; centros comunitários; as pessoas se


dirigiam ao centro, para o comércio.

Marca da variedade culta é também a presença de itens lexicais de uso menos


freqüente, ou até mesmo ausentes, nas variedades menos prestigiadas.
85

Como se vê, esse falante está dentro do que o projeto NURC-SP reconhece como
falante culto. Reproduzimos aqui, mais uma vez, a identificação, feita por Preti (1997,
p. 26), do falante culto com o falante urbano:

Em síntese, o que o corpus do Projeto NURC/SP tem-nos mostrado (e isso já na


década de 70) é que os falantes cultos, por influência das transformações sociais
contemporâneas a que aludimos antes (fundamentalmente, o processo de
democratização da cultura urbana), o uso lingüístico comum (principalmente, a
ação da norma empregada pela mídia), além de problemas tipicamente
interacionais, utilizam praticamente o mesmo discurso dos falantes urbanos
comuns, de escolaridade média, até em gravações conscientes e, portanto, de
menor espontaneidade.

A partir de agora, portanto, me referirei ao Falante I, Mara, como sendo um falante


urbano/culto.
Falante II – Dª Maria (Variedade rural)

Quandu eu mudei práqui, intãu Rusáriu di Mina era muitu bãu.


Purque tem iscola, us meus fiu istudô aqui na iscola. Nunca
deu pobrema, graças a deus. I: Rusáriu di Mina abalô um mucado
purque: u pessuau mudaru muitu, né? Mudaru muitu daqui. Aqui
tem- treis, tem-, achu que treis quatru venda, intãu uns
venderu muitu bau, muitu amigu. Intãu a genti aqui vevi
assim, vevi nu sussegu, né? graças a deus. Purque eu vivu
muitu dentru da minha casa. Intãu Rusariu di Mina abaxô um
mucadu du tempu qui a genti intrô aqui. Purque aquelis mais
véiu foi morrenu. Aquelis amigu mais véiu foi morrenu. intãu
foi intranu us novu. intãu us novu qui entra aí, a genti dá
cum eis tudu. Mais num é quandu eu entrei aqui. Rusáriu di
Mina num é quandu eu entrei aqui. Mais graças a Deus, a genti
lá vai vivenu, na paiz di Deus, cum todu mundu. Mais Rusariu
di Mina pricisa di mais um cadim di:, di força. né

Falante de 76 anoss. Reside há mais de 50 anos em Juiz de Fora (MG), no Distrito


de Rosário de Minas, considerado zona rural. Nunca freqüe ntou escola e é analfabeta,
segundo declaração sua.
Sua variedade lingüística, como se pode constatar, tem características marcantes do
falar rural. Vejamos:
86

(i) Rosário de Mina[ø]

A queda das consoantes finais [l], [r] e [s] pós-vocálicas no final do vocábulo é uma
tendência geral da variedade não-padrão do português do Brasil. Porém a queda da
sibilante final não- morfêmica, como no caso acima, sendo menos comum, se torna um
traço descontínuo, distintivo do falar caipira e das variedades rurbanas. Bortoni-
Ricardo (1985, p. 54) oferece outros exemplos: [’onibus] - [’onibu] ;[’simplis] -
[‘simpli].

(ii) meus [‘fiyu]; aqueles mais [‘veyyw]

Nas formas assinaladas, está reiterada a vocalização da palatal lateral [ ? ], marca


da variedade rural e que, segundo Bortoni-Ricardo (op. cit,. p. 60), sofre o grau
máximo de estigmatização, um dos estereótipos do falar caipira brasileiro. A autora
lembra a reflexão de Labov (1972, p. 180) a respeito das variantes que se tornam
estereótipos das falas estigmatizadas e identifica nessa um desses casos.

Nesses falares, a perda dessa palatal se dá pelo mesmo motivo por que se perde a
nasal [ñ], como em [‘bañu] - [bã?]; [‘ga ñu] - [gã?]. Esses dois fonemas são “débeis”
na língua portuguesa: nos substantivos, nos adjetivos e nos verbos. Só ocorrem em
posição intervocálica, sendo, portanto, menos distribuídos do que as outras consoantes.
40
Daí não serem percebidos por determinados falantes.

(iii) meus [‘fiyu{ø}] estu[’do]; o pessoal muda[ru]

Nos exemplos, há três formas não canônicas de concordância: no sintagma


nominal, o morfema de plural apenas no determinante; as duas outras, nos sintagmas
verbais: a ausência de concordância do verbo com seu sujeito, ainda que adjacente a ele,
e a forma plural concordando com o sujeito coletivo. Trata-se de traços descontínuos,
porque presentes de forma sistemática no mesmo falante, o que é próprio do falar
caipira, altamente estigmatizados.

40
Informações obtidas em conversa informal com o Prof. Dr. Mário Roberto L. Zágari.
87

O distanciamento da norma culta se radicaliza pelo processo de desnasalização na


desinência da terceira pessoa do plural, no sufixo modo-temporal, (muda [ru]), sendo
também essa marca acentuada da variedade, bastante estigmatizada. (BORTONI-
RICARDO, op.cit., p. 52).

(iv) pobrema

Na história da língua portuguesa, o fonema [l], como segundo elemento do grupo


consonantal, passou a [r] obligatione > obrigação; eclesia > igreja; blandu > brando;
fluxu > frouxo; clavu > cravo. Essa é, portanto, uma herança do português
(COUTINHO, 1969, p. 111-123).

Mollica e Paiva (1993, p. 139) consideram esse fenômeno de rotacismo como um


processo que possui raízes profundas na língua e cuja continuidade “[...] fornece
razoável sustentação para a hipótese de que a permuta de [l] por [r] tenha configurado,
em todos os estágios, um espaço variacional.”

Quando o vocábulo, como no caso acima, possui mais de um [r] há forte tendência
de ocorrer a queda de um deles por dissimilação, como em prora > ‘proa; [marmora’ria]
- [marmoa’ria]; [proprie’tariw] - [propie’tariw] ; [‘propriw] - [‘propiw] (COUTINHO,
op. cit., p. 123-124).

Em seu estudo sobre os aspectos da fonética do dialeto caipira brasileiro em


oposição à do português padrão do Brasil, Bortoni- Ricardo (op. cit., p. 58), ao tratar do
processo de alteração das líquidas, como no caso acima [pro’blema] - [po’brema],
chama a atenção para o fato de que, embora seja esse um traço descontínuo bastante
estigmatizado, ele pode ocorrer também no repertório de um falante da variedade
padrão afetado por problemas de articulação. No caso desse falante, no entanto,
aparecem outros traços característicos do falar rural, segundo o que sugere a autora,
conforme estamos observando.
88

(v) a gente [vevi]

Segundo analisa Bortoni-Ricardo (1985, p. 62-63), ainda que o lócus da variação


das vogais, no falar rural, seja a sílaba pré-tônica, mudanças na vogal tônica “[...] parece
serem restritas a formas verbais e provavelmente resultam de diferenças no sistema de
regras morfofonêmicas do verbo na fala caipira, se comparadas às da língua padrão.”41
Outros exemplos da autora: [a’sistši] - [a’sestši] ; [abi’tua] - [ abi’toa].

(vi) aqueles mais [veyyw {ø}] foi morre[nu]

Aqui estão presentes três traços não-padrão: a vocalização da palatal lateral [? ]; a


ausência de concordância nos sintagmas nominal e verbal; a assimilação de [d], na
seqüência [nd], comum nas formas de gerúndio. Quanto a esse último, sabe-se que é
comum em português. No Appendix Probi, documento do latim vulgar, lê-se: grundio
non grunnio. Daí: verecundia > vergonha. Essa é, portanto, uma tendência antiga do
português, que se mantém até hoje e constitui traço gradual presente também nas
variedades urbanas.

Mattos e Mollica (1992, p. 55), ao examinarem o fenômeno da assimilação [nd] em


[no], constataram que ele é mais freqüente entre os gerúndios, acentuando-se mais entre
os gerúndios fáticos (como em tá entendeno?).

(vii) os [nôvu]

As línguas neo- latinas, perderam o traço quantidade (breves e longas) das vogais
latinas. O espanhol, transformou essa oposição em vogal : ditongo. O que era breve,
ditongou-se: portos > puertos ; mortos > muertos.

41 Changes in stressed vowels seem to be restricted to verb forms and probably result from differences in
the system morphophonemic rules of Caipira as compared to those of the standard language.
89

O português substituiu esse traço por [± altura]. Zágari (1988, p. 75), assim explica
essa última, que é uma das tendências da fonologização da altura, no começo da
expansão roma na:

[...] a. com base no ESQUEMA 1, manutenção do par mínimo, no eixo do


tempo, convertida a oposição até então existente, em oposição[± altura e/ou
abertura]. Apenas, o que era um alofone, a pronúncia /e/ ou /? / adquire um valor
novo e imprescindível. O que era uma variação de gosto, de estilo ou de
sociedade ou mesmo regional, passa a ser uma marca distintiva. A oposição [±
quantidade] se reescreve, então, como [± altura].

Assim, sendo a vogal breve latina, abaixa; sendo longa, alteia. Ocorre que, havendo
um segmento [+alto] na sílaba subseqüente, a tendência, ontem e hoje, é o alçamento. É
o fenômeno da metafonia: novu > novo; ossu > osso. A presença de um segmento
[+alto] na sílaba subseqüente à tônica provocou o alteamento.

No plural, consagrou-se, no português culto, a forma sem metafonia: novos


[‘nóvus], ossos [‘óssus]. A forma plural com metafonia, ossus [‘ôssus], característica da
variedade rural, é muito estigmatizada. 42

(viii) a gente dá com [‘eys] [ tudu]

Neste exemplo, a lateral alveolar [l] em posição intervocálica desapareceu,


ocorrência também característica do falar caipira, mas que, segundo Bortoni-Ricardo
(op. cit., p 61), é restrita à forma plural de poucos morfemas muito utilizados, os
pronomes pessoais e determinantes. Outros exemplos da autora: [ku’elis] - [kw’eys] ;
[a’kelas]- [a’keas].

Observe-se também a falta de concordância do pronome indefinido com a forma


pronominal eles.

42
Informação obtida em conversa informal com o Prof. Dr. Mário Roberto Lobuglio Zagari.
90

(ix) um [mucadu]

A expressão sempre foi bom bocado, quer dizer, bom pedaço. O problema é de
natureza fonética, como [tã’b??] - [ta’m??]; [bõw bukadu] - [bõw mukadu]. A
proximidade da nasal bilabial contamina a bilabial não-nasal, o que Martinet (1956, p.
56) denomina o princípio da economia. Deve-se também levar em conta que a língua
43
portuguesa tem grande força nasalizante.

(x) mais um [kadži]

Temos em [kadži], dois fenômenos relativos ao vocábulo [bokadiñu]: a aférese da


sílaba inicial [bo] e a redução do sufixo diminutivo -inho.

Este último é típico do falar mineiro (cf. Esboço de um Atlas Lingüístico de Minas
Gerais, carta 37), excluída a grande Belo Horizonte que, cidade nova, atraiu falantes de
diversos lugares, processando-se aí o natural nivelamento dos diferentes traços
lingüísticos. 44 Nas outras regiões mineiras, no entanto, encontramos três variações:
[kafeziñu] - [kafeziw] - [kafezi] 45 , a segunda delas típica do Norte do Estado. Trata-se
de traço gradual, comum também nos falantes urbanos.

43
Idem.
44
Informação obtida em conversa informal com o Prof. Dr. Mário Roberto Lobuglio Zágari.
45
RIBEIRO et alii, (1977).
91

Falante III – Telma (Variedade rurbana)

Juiz di Fora merolhô, melhorô bastanti. Purque antis num tinha


ônibus, movimentu di ônibus nus bairru, hoji aumentô. Tem
bastanti movimentu di ônibus né. Cê passa, cê fica isperanu,
rapidim cê, consegui:, entrá nu ônibus i i prá cidade né. Ah
agora festividades né. Parqui, nu Parqui Halfeld hoji tem-,
hoji tem brinquedu pras criança, antigamenti num si via né. É:
parqui né, diversões né. É: artesanatu, a genti vê-, passá vê
i comprá as coisa boa né. Assim é: muitas coisas assim,
atividadis né, qui a genti procura assim. Antigamenti
procurava i num achava. Hoji procura acha né. Nu Parque
Halfeld tem mais, agora eu achu a natureza lá também. Us
jardins né. Teim muitas floris. né? Hoji u calçadãu fica muitu
mais movimentadu nus finais di semana, coisas qui a genti num
si via era u pessual passá u final di semana nu Parqui Halfeld
cum mesinhas né, barzinhus né, batenu papu né. Tinha pocu
movimentu. Milhorô muita coisa boa. Até hoji existem muita
coisa boa. Daquelis tempu pra cá, hoji milhorô bastanti,im
Juiz di Fora. Hospital também cresceu bastanti, né. Teim
bastantes hospitais né. Quantus hospitais, né, construíram né,
hoji im dia né. Depois da Santa Casa, teim a co-,depois da
Cotrel né.

Falante de 41 anos. É filha de pais procedentes da zo na rural do Município de Mar


de Espanha (MG). Sua mãe é analfabeta. Sempre viveu em Juiz de Fora (MG), em
bairros caracterizados por serem de classe econômica pobre. Atualmente, mora no
Bairro de Santa Efigênia, que tem também essa característica. Conseguiu completar
apenas o primeiro segmento do Ensino Fundamental, pelo Supletivo. Tem, no entanto,
contato diário com falantes da variedade culta, pois trabalha nos Serviços Gerais da
Faculdade de Educação da UFJF. Pode ser considerada, como se vê, falante rurbana,
segundo propõe Bortoni- Ricardo (2004, p. 52). Como se pode notar, ocupa posição
mais à direita do contínuo rural-urbano.

Vejamos alguns traços característicos de sua fala:

(i) [nus] ‘bai[hu{ø}]; pras crian[sa{ø}];


as coi[za{ø}] [bowa{ø}]

Dentre as várias ocorrências de concordância verbal e nominal, aparecem, nesta


fala, três em que a concordância não se dá. A queda do morfema marcador de plural é
92

considerada um traço gradual, tendência geral da variedade não-padrão do português do


Brasil. Sobre esse fenômeno afirma Bortoni-Ricardo (1985, p. 54):

A perda da consoante sibilante, que é usualmente a marca de plural, reflete uma


tendência geral no português moderno do Brasil em privilegiar a forma singular
em prejuízo de sua correspondente forma plural. Os marcadores redundantes de
plural nas expressões nominais tendem ao apagamento com a preservação do
46
morfema de plural apenas no primeiro determinante .

Em Scherre (2005, p. 51), encontra-se uma síntese de seus estudos sobre a


tendência em se preservar o determinante no plural, à esquerda do núcleo, como em
umas casinha e umas coisinha bonitinha.

No trecho examinado, no entanto, houve apenas essas três ocorrências de não


concordância nominal, o que a situa mais próximo do falar culto.

(ii) cê fica esper[ãnu]

Nota-se aqui a assimilação de [d], na seqüência [nd], comum nas formas de

gerúndio, traço gradual, comum nas variedades urbanas não-padrão, já comentado

anteriormente.

(iii) [sê] passa; rapi[dži]

Duas reduções também freqüentes na fala coloquial das variedades urbanas. A

segunda delas, rapi[dži] , com a redução da última sílaba do sufixo -inho, como vimos

atrás, é típica do falar mineiro. Trata-se de traços graduais, não estigmatizados.

46
Deletion of sibilant consonant, which is usually the plural marker, reflects a general trend in modern
Brazilian Portuguese to privilege the singular form at the expense of its plural counterpart. Redundant
markers of plurality in the noun phrase tend to be deleted and the plural morpheme preserved in the first
determiner only.
93

(iv) Coisas que a gente não se via; existem muita coisa boa.

Aqui dois exemplos de hipercorreção 47 , indício do contato com falantes da


variedade culta.

(v) Tem bastantes hospitais

Chama a atenção a preocupação desse falante em fazer a concordância do adjetivo


bastantes que, por ser confundido com a forma adverbial bastante, freqüentemente
aparece sem o morfema de plural, nesse contexto. Esse procedimento, como vimos nos
comentários de Barros (1997, p. 35), apresentados na Seção 3.4, caracteriza a
construção do falante culto, que demonstra preocupação com o bom uso da língua.

Chambers (1995, p. 57) apresenta esta preocupação do falante como um indício de


mobilidade social em processo, quando ele se preocupa em usar menos variantes não-
padrão do que as pessoas de sua classe social, e até mesmo do que os falantes da classe
à qual pretende ascender. 48

4.4 Os testes e sua aplicação

Como foi comentado anteriormente, na seção 4.2, foram construídos dois tipos de
teste:

• o Questionário I (de medida direta) e


• o Questionário II (de medida indireta).

47
Bortoni-Ricardo (2004, p. 28) chama "[...] hipercorreção ou ultracorreção, o fenômeno que decorre de
uma hipótese errada que o falante realiza num esforço para ajustar-se à norma -padrão. Ao ajustar-se à
norma, acaba por cometer um erro.’’
48
The upwardly mobile speakers not only use fewer non-standard variants than the people in the class in
which they originated but also use fewer than the people in the class which they are emulating.
94

O primeiro, o Questionário I, constitui uma avaliação de crenças sobre a língua e


seu ensino na escola (ANEXO B). Constou de questões fechadas, para serem
respondidas com falso/verdadeiro, com exceção da última questão que, aberta, foi
proposta por sugestão da Prof.ª Drª Lucia Quental, para ser respondida facultativamente,
visando elicitar alguma informação secundária que pudesse esclarecer questões de
interesse geral de pesquisa sociolingüística. Esse mesmo questionário foi respondido
também pelos professores das escolas onde foram aplicados os testes e por alunos
formandos do 2º semestre de 2006, do curso de Letras da Universidade Federal de Juiz
de Fora, alguns deles já com experiência de magistério, como bolsistas (ANEXO C). O
quadro abaixo apresenta o universo testado:

Alunos 135

Professores 22

Formandos de Letras da UFJF 33

Total 190

Quadro 3 - Sujeitos que responderam ao


Questionário I (Teste de crenças)

O Questionário II (ANEXO D) constitui o teste de atitudes propriamente dito.


Apresentou, para cada falante, uma relação de seis atributivos: três marcadores da
dimensão de poder (inteligente, competente, rico) e três da dimensão de solidariedade
(honesto, simpático, boa pessoa). Ao lado de cada um desses atributos, encontravam-se
alinhados horizontalmente sete traços nos quais, os alunos deveriam dar uma nota
(apenas uma para cada um deles), variando de 7 a 1, sendo que, quanto mais próxima do
adjetivo, mais alta seria a nota. Esclareço que não julguei necessário incluir, no extremo
direito da linha, o par opositivo de cada adjetivo alocado no extremo esquerdo.
Abaixo, reproduzo um exemplo da formatação do teste. A reprodução completa
está disponível no ANEXO D.
95

FALANTE ( I, II, III)

Inteligente _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Honesto _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Competente _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Simpático _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Rico _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Boa pessoa _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Para a viabilização da pesquisa, apresentei- me, em primeiro lugar, à direção e/ou


coordenação de cada escola, expondo claramente meu objetivo. Obtida a permissão, fui
apresentada ao professor da sala cujo horário me seria disponibilizado para a aplicação
dos testes. Sempre que possível, me foi cedida uma aula assistida por um professor de
Português que, em momento algum, interferiu na condução dos trabalhos. No Colégio
“Cristo Redentor”, não sendo isso possível, ocupei a aula de um professor de
Matemática, que assistiu aos procedimentos. Apenas na Escola Estadual “Fernando
Lobo” não houve a presença de um professor. Nela, os testes foram realizados na
Biblioteca, só com a minha participação e a dos alunos.

Busquei, em cada escola, seguindo sugestão da Prof.ª Drª Lucia Quental, evitar que
os 30 alunos fossem da mesma sala, procurando juntar dois grupos de quinze, para
conseguir, em cada um deles, respostas fruto de experiência escolar mais variada. Isso
só não foi possível no Colégio “Cristo Redentor”, devido a restrições feitas pela
Coordenação.

As sessões foram conduzidas da seguinte forma: depois de ser apresentada aos


alunos pelo professor de sala, tomando a palavra, informei-os sobre a realização da
96

pesquisa e do seu objetivo - estudar questões relativas à linguagem. Sem exceção,


obtive deles a intenção de colaborar.

Expliquei- lhes que, na pesquisa, interessava a opinião de cada um e que ali não
estava em jogo nenhum julgamento de certo ou errado, de modo que seria muito
importante que não trocassem opinião entre si sobre as respostas.

Comecei, então, apresentando- lhes o Questionário II (teste de atitudes), antes de


aplicar o Questionário I (teste de crenças). A razão por que inverti a ordem de aplicação
dos testes foi propiciar certo envolvimento dos alunos na reflexão sobre a linguagem, de
modo a facilitar- lhes a tarefa exigida para a avaliação sobre crenças, que viria a seguir.
É importante enfatizar que essa minha opção não enviesou os resultados. Ao contrário,
propiciou, entre os alunos, um clima de tranqüilidade, sem pressões relativas aos
resultados de sua avaliação, segundo critérios de certo e errado, porque, com a escuta
das gravações seguida da solicitação da sua opinião, eles puderam entender que
estavam, sem dúvida, colaborando numa pesquisa de linguagem, a partir de
competência que realmente tinham. Isso os deixou confiantes para responderem o teste
de crenças (Questionário I).

Depois que os alunos leram o enunciado do Questionário II (teste de atitudes),


quando necessário, reiterei explicações e tirei dúvidas. Alguns estavam inseguros sobre
o significado do adjetivo competente e foram esclarecidos nesse sentido. Não houve
outra dificuldade. Expliquei também, de antemão, que o tema das falas era único:
Mudanças ocorridas, ao longo do tempo, na cidade ou bairro da pessoa entrevistada.
Considerei que essa informação evitaria ansiedade e os tranqüilizaria na tarefa de
escutar as gravações.

Combinamos que cada gravação seria ouvida duas vezes, antes que procedessem à
avaliação. Depois de ouvirem cada falante, teriam alguns minutos para atribuírem as
notas; só, então, passariam a ouvir o próximo falante, dariam as notas, e assim
sucessivamente.

Terminado o teste de atitudes, os alunos foram convidados a ler e responder o


Questionário I, o teste de crenças, marcando V (verdadeiro) ou F (falso) à frente de cada
um dos enunciados, todos eles expressos em frases afirmativas, para evitar
97

ambigüidade. Como se tratava de questões fechadas, não foi necessária nenhuma


explicação complementar em qualquer das escolas.

Terminada essa segunda parte, antes de devolverem os testes, solicitei que


preenchessem o cabeçalho que pedia duas informações pessoais, sexo e idade.

O tempo total para a realização de ambos os questionários foi de aproximadamente


50 minutos, correspondente a 1 hora-aula, em todas as escolas. Talvez por isso, os
alunos não tivessem se mostrado cansados.

Na Escola Municipal “Profª Helena Antipoff”, por ter havido alteração de horário
para atender a questões administrativas, os alunos foram chamados para a refeição na
Cantina, no momento em que ainda respondiam os testes, mas eles solicitaram à
Coordenadora mais tempo, para não interromper nosso trabalho, iniciativa que julguei
altamente positiva. Essa atitude demonstrou, além disso, o grande envolvimento deles e
seu prazer em participar da pesquisa.

Registro também aqui outra interessante questão. Na Escola Municipal “Quilombo


dos Palmares”, os alunos quiseram, ao final, ouvir novamente o Falante II (Dª
Mercedes, de variedade rural). Percebi o prazer com que escutavam essa fala, talvez
porque lhes dissesse respeito muito de perto, já que a escola está localizada na fronteira
com a zona rural. Nenhum problema foi registrado durante a condução dos trabalhos em
nenhuma das escolas. Os alunos se revelaram prestativos e colaboraram com prazer, na
tarefa a eles solicitada.
98

5. DESCRIÇÃO E INTERPRETAÇÃO ESTATÍSTICA DOS DADOS

Neste capítulo, apresento a descrição e a interpretação estatística dos dados obtidos


no teste de atitudes subjetivas e no de crenças, realizados para elicitar, no primeiro caso,
as atitudes dos alunos em relação às variedades de língua que fazem parte de sua
vivência, inclusive na escola; no segundo, as crenças relativas à língua e ao trabalho
escolar com a língua.

5.1 O tratamento estatístico dos dados

Os dados obtidos nos testes foram submetidos ao programa SPSS (Statistics


Package for Social Sciences) e processados no Laboratório de Estudos Estatísticos na
Saúde, do Instituto de Ciências Exatas da Universidade Federal de Juiz de Fora.

Para a avaliação dos resultados do primeiro teste, o de atitudes, foi aplicada a


Análise de Variância (ANOVA), que é uma ferramenta para comparação de vários
grupos de interesse, no presente caso, as cinco escolas selecionadas, para investigar se
havia diferenças significativas entre as médias desses grupos.

Para a Análise de Variância, são confrontadas duas hipóteses: a hipótese básica, sob
a qual o teste é construído, que é denominada hipótese inicial, e é representada por H0.
Como alternativa a ela, tem-se a hipótese alternativa, H1. Temos, então:

§ hipótese inicial (H0): todas as médias são iguais;


§ hipótese alternativa (H1): pelo menos uma das médias é diferente.

A idéia básica do teste de significância é buscar, na amostra, elementos que


possam ou não refutar a hipótese inicial. Se esses elementos são encontrados, então
admite-se que a hipótese alternativa seja verdadeira, com a probabilidade alpha de se
estar errado nessa decisão (alpha é denominada o nível de significância do teste). Caso
contrário, isto é, caso não sejam encontrados elementos para se refutar H0, pode-se
dizer que não podemos rejeitá- la.
99

Para a avaliação do teste, verifica-se o p-valor que, em estatística e especificamente


no campo dos testes de hipóteses, é a probabilidade de que a amostra tenha sido tirada
de uma população testada, assumindo-se que a hipótese inicial seja verdadeira, ou seja,
a probabilidade de as médias serem iguais. Desse modo, p-valor é a significância
observada.

Num teste realizado a um nível de confiança de 0,95 (95%), deve-se observar o


valor de p, se maior ou menor que 0,05 (5%). Quando o p-valor é < 0,05 (5%), podemos
rejeitar a hipótese inicial. Conseqüentemente, a média de um grupo será
significativamente diferente das médias dos outros. Do mesmo modo, se p-valor é >
0,05 (5%), não podemos rejeitar a hipótese inicial, admitindo-se que as diferenças sejam
devidas ao acaso.

Se a hipótese inicial for rejeitada, ou seja, se pelo menos uma das médias testadas
for diferente, aplica-se o teste Post Hoc de Tukey, para verificar quais as médias são
estatisticamente diferentes.

Para a análise da segunda avaliação feita – o teste de crenças -, em que foram


listadas 25 assertivas, para que alunos de 8ª série, formandos do Curso de Letras e
professores as julgassem falsas ou verdadeiras, utilizou-se o teste qui-quadrado, que é
adequado para variáveis qualitativas, com duas ou mais categorias e mede o grau de
discrepância entre um conjunto de freqüências observadas e um conjunto de freqüências
esperadas. É também utilizado para avaliar a associação entre duas variáveis
qualitativas.

O teste qui-quadrado também avalia duas hipóteses:

§ hipótese inicial (H0): não existe associação entre as variáveis qualitativas;


§ hipótese alternativa (H1): existe associação entre as variáveis qualitativas.

Nesse teste, a forma de se avaliar a rejeição ou a não-rejeição da hipótese inicial,


também é observando-se se o p-valor é maior ou menor que o nível de significância
escolhido 0,05 (5%).
100

A seguir, apresento a análise estatística e a discussão dos resultados do teste de


atitudes para, depois, fazer o mesmo com o teste de crenças.

5.2 O teste de atitudes subjetivas

No presente estudo, interessava comparar as atitudes subjetivas dos alunos de


escolas públicas de diferentes níveis sócio-culturais em relação a três variedades
lingüísticas diferentes, a urbana, a rurbana e a rural, para verificar como esses alunos
percebem a variedade lingüística que a escola apresenta como modelo ideal em face das
que lhes são familiares. Trabalhei também com a hipótese de haver diferença
significativa no julgamento dos alunos de uma escola particular, o Colégio Cristo
Redentor”, tal como destaquei na Seção 4.3.

5.2.1 Análise de Variância do Falante I (Mara - Variedade urbana)

Utilizando-se a Análise de Variância, foram comparadas as médias das avaliações


relativas aos seis adjetivos (inteligente, honesto, competente, simpático, rico e boa
pessoa), segundo o julgamento dos alunos das cinco escolas selecionadas em relação à
fala do sujeito Mara (variedade urbana). Algumas dentre essas médias se mostraram
estatisticamente significativas, confirmando a hipótese alternativa (H1).

Observemos o gráfico abaixo 49 que apresenta a comparação entre as médias de


todos os adjetivos, atribuídas pelos alunos das cinco escolas em relação a esse Falante:

49
No ANEXO E, encontram-se 21 gráficos relativos às notas atribuídas a cada um dos adjetivos para os
três falantes e suas médias. Durante a análise desta Seção, no entanto, apresentarei apenas os três gráficos
(7, 14 e 21) com as médias dos falantes (Mara, Dª Mercedes e Telma, respecivamente). Essa é a razão da
descontinuidade que se observará na numeração deles. Ao me referir às notas, optei por apresentá-las
diretamente no texto e remeter aos gráficos que as apresentam no ANEXO E.
101

7
6 5,6 5,3 5,5
5,1 4,8
5
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo Quilombo dos Helena
João XXIII Palmares Antipoff

Gráfico 7 – Média do Falante I : Mara (Var. urbana), extraída a partir


dos gráficos 1 a 6, por meio da Análise de Variância (ANOVA)

Como se vê, as médias são diferentes entre si, de modo que a hipótese inicial (H0)
foi rejeitada. Realizou-se, então, o teste Post Hoc de Tukey, para verificar quais escolas
apresentaram, estatisticamente, maiores diferenças nas médias entre si. Os resultados
evidenciaram que o Colégio de Aplicação “João XXIII”, com exceção dos adjetivos
honesto: 5,6 (Gráfico 2) e rico: 4,8 (Gráfico 5) , atribuiu a esse Falante as maiores notas
- para inteligente e boa pessoa: 6,0 (Gráficos 1 e 6); competente: 5,6 (Gráfico 3); para
simpático: 5,8 (Gráfico 4). Por outro lado, a Escola Municipal “Helena Antipoff”, com
exceção dos adjetivos honesto: 5,5 (Gráfico 2) e simpático: 5,2 (Gráfico 4), lhe atribuiu
as notas mais baixas para inteligente 4,8 (Gráfico 1); para competente 4,4 (Gráfico 3);
para rico 3,7 (Gráfico 5) e para boa pessoa 5,4 (Gráfico 6). Esses gráficos estão
disponíveis no ANEXO E.

Nota-se que, enquanto, no Colégio de Aplicação “João XXIII”, tanto as maiores


notas quanto as menores estão distribuídas entre os adjetivos das duas dimensões, poder
(inteligente, competente) e solidariedade (simpático, boa pessoa), na Escola Profª
“Helena Antipoff”, as menores notas foram dadas exatamente a adjetivos da dimensão
de poder.
102

Esse julgamento dos alunos da escola rural em relação à variedade urbana, culta,
acrescido da identificação maior em relação aos adjetivos da dimensão de solidariedade,
parece apontar para um distanciamento (rejeição?) deles em relação à variedade
lingüística através da qual se consolida, na sociedade, a voz do poder. Essa pode ser
também uma evidência de seu distanciamento do mundo letrado, pelo menos daquele
que se expressa através da variedade urbana da língua, isto é, a que cumpre funções
sociais privilegiadas pelo poder (cf. nota 19, nesta Tese, a respeito do conceito de
culturas de letramento).

É também ilustrativo verificar o p-valor, isto é, a probabilidade de essas diferenças


referentes às médias das notas atribuídas ao Falante I (cf. Gráfico 7) serem, ou não,
devidas ao acaso. Para isso, observemos o quadro abaixo, que contém o resumo da
ANOVA, com os p-valores:

p-valor
Adjetivos (ANOVA) Colégios com diferenças maiores
Falante I (Mara - Variedade urbana)

Inteligente 0,006 João XXIII e Helena Antipoff


Honesto 0,430 -
Competen 0,011 João XXIII e Helena Antipoff
Simpático 0,145 -
Rico 0,022 Helena Antipoff e Quilombo dos Palmares
Boa Pes 0,527 -
Média do
Falante 0,004 João XXIII versus Cristo Redentor e Helena Antipoff
Falante II (D. Mercedes - Variedade rural)
Inteligente 0,028 Cristo Redentor e Helena Antipoff
Honesto 0,114 -
Competen 0,012 Cristo Redentor e Fernando Lobo
Simpático 0,003 Cristo Redentor versus F. Lobo e Quil. dos Palmares
Rico 0,142 -
Boa pes 0,117 -
Média do Cristo Redentor versus Fernando Lobo,
Falante 0,002 Quilombo dos Palmares e Helena Antipoff
Falante III (Telma - Variedade rurbana)
Inteligente 0,595 -
Honesto 0,190 -
Competen 0,294 -
Simpático 0,197 -
Rico 0,755 -
Boa Pes 0,315 -
Média do
Falante 0,333 -
Quadro 4 – Resumo da Análise de Variância (ANOVA), para avaliar diferença na média dos
adjetivos referentes aos falantes, com base nas notas atribuídas pelos alunos dos diferentes colégios.
103

Como se observa nesse Quadro 4, em relação ao Falante I, o estudo comparativo


dessas médias entre todas as escolas mostrou um p- valor < 0,05 (5%) para os adjetivos
da dimensão de poder: inteligente (0,6%), competente (1,1%) e rico (2,2%). O p-valor >
0,05 (5%) foi observado com os adjetivos da dimensão de solidariedade: honesto
(43,0%), simpático (14,5%) e boa pessoa (52,7%).

Conforme ficou dito atrás, p- valor < 0,05 (5%) significa que as diferenças são
devidas a fator determinante, e não ao acaso. Portanto a polarização entre poder e
solidariedade constitui uma evidência do que ficou dito atrás, isto é, de estar atuando, no
imaginário desses alunos, a forte associação entre a variedade padrão e a dimensão de
poder, dimensão esta ligada a questões sócio-econômicas (cf. RYAN, 1979) e através da
qual se consolida, na sociedade, exatamente a voz do poder.

Esse Quadro 4 aponta outros resultados importantes, ainda em relação a esse


Falante 1:

a) No que diz respeito à diferenciação de julgamento ocorrida entre as duas


escolas, o Colégio de Aplicação “João XXIII” e a Escola Municipal “Profª Helena
Antipoff”, em relação aos adjetivos da dimensão de poder, dimensão que a variedade
culta da língua representa, merece também lembrar que esta última é uma escola situada
em um núcleo rural isolado, mergulhada numa cultura, de certa forma, distanciada das
práticas de letramento que são valorizadas nos grandes centros urbanos, ao passo que a
outra, cujos alunos se sentiram mais atraídos pela variedade culta da língua, faz parte da
comunidade acadêmica da UFJF e é procurada pelas famílias de uma fatia da sociedade
inteiramente familiarizada com o mundo letrado urbano e, conseqüentemente, com a
variedade culta da língua.

b) Outro aspecto dessa diferença de julgamento ressalta ainda quando se


observa que, na média do Falante I, (cf. Quadro 4- Resumo da ANOVA) esse Colégio
de Aplicação se opôs tanto à Escola Municipal “Profª Helena Antipoff” quanto ao
Colégio “Cristo Redentor”, esta última, uma escola particular, freqüentada por alunos de
situação economicamente privilegiada. Observando novamente o Gráfico 7,
104

verificamos que essas duas escolas atribuíram ao Falante I as menores médias (5,1 e
4,8), enquanto o Colégio de Aplicação “João XXIII”, lhe atribuiu a maior, dentre todas
as escolas (5,6). Isso sugere haver, por parte do Colégio de Aplicação “João XXIII”,
algum tratamento pedagógico determinante dessa diferença, no que se refere à questão
da variedade culta que, como se pôde constatar, caracteriza esse Falante. Vale lembrar
que se trata de escola cujo corpo docente é altamente qualificado (cf. Seção 4.3.1):
professores ligados à UFJF; todos os de Português são pós-graduados, com Mestrado
completo, um deles já tendo se doutorado e outros já próximos de se doutorar; ali se
desenvolvem pesquisas na área de linguagem, publicadas em revista indexada, como
comentado atrás, quando da apresentação das escolas selecionadas para esta pesquisa.

c) O Quadro 4 aponta também a diferença de julgamento em relação ao


adjetivo rico (cf. Gráfico 5, ANEXO E), mas, surpreendentemente, entre as duas
escolas do mesmo grupo sócio-econômico, a Escola Municipal “Quilombo dos
Palmares” e a Escola Municipal “Helena Antipoff”. Isso pode sugerir, a meu ver, que
haja, na população escolar da primeira escola, expectativa de ascensão social mais forte
do que na segunda, que está situada na zona rural, mais afastada, portanto, das atrações
de consumo, característica da zona urbana.

De qualquer modo, fica patenteada a forte associação entre a dimensão de poder e a


variedade urbana (culta), no julgamento dos alunos das cinco escolas testadas.

5.2.2 Análise de Variância do Falante II (Dª Mercedes – Variedade rural)

Utilizando-se a Análise de Variância, foram comparadas as médias das avaliações


dos seis adjetivos, segundo o julgamento dos alunos das cinco escolas selecionadas em
relação à fala de Dª Mercedes.

Vejamos abaixo, no Gráfico 14, a comparação entre as médias dos adjetivos


atribuídas pelos alunos das cinco escolas em relação a esse Falante.
105

5 4,5 4,7 4,6


4,1
4 3,7

0
Colégio Cristo Colégio de E.E. E.M. E.M. Profª
Redentor Aplicação Fernando Quilombo dos Helena
João XXIII Lobo Palmares Antipoff

Gráfico 14 - Média do Falante II : Dª Mercedes (Var. rural), extraída a partir


dos gráficos 8 a 13, por meio da Análise de Variância (ANOVA)

Na análise que se segue, utilizaremos tanto o Quadro 4 – resumo da ANOVA,


apresentado atrás, quanto os Gráficos 8 a 13, que mostram as notas e as médias
atribuídas a esse Falante (ANEXO E).

O gráfico acima atesta que a escola que avaliou pior o Falante II (média 3,7) foi o
Colégio “Cristo Redentor”, escola particular, freqüentada por alunos de condições
econômicas privilegiadas.

Como algumas dentre essas médias, expostas no Gráfico 14, foram estatisticamente
significativas, utilizou-se o teste Post Hoc de Tukey, para verificar quais escolas
apresentaram maiores diferenças nas médias entre si. A fim de conhecer esse resultado,
voltemos ao Quadro 4 – resumo da ANOVA e observemos os p-valores, relativos às
notas atribuídas a esse Falante II e os seus significados:
106

a) Esse Quadro -4 evidenciou que, de acordo com o Teste Post Hoc de Tuckey,
a Escola “Cristo Redentor” apresentou um comportamento distinto, opondo-se à Escola
Estadual “Fernando Lobo” e às duas escolas municipais, “Quilombo dos Palmares” e “
Prof.ª Helena Antipoff”, mas não se opôs ao Colégio de Aplicação “João XXIII”.

b) Comparando-se o julgamento das escolas em relação a esse Falante (ver


também Gráficos 8 a 13, no ANEXO E), verificou-se que as melhores notas lhe foram
atribuídas pelas duas escolas ligadas à zona rural, a Escola Municipal “Profª Helena
Antipoff”, mergulhada nesse ambiente, e a Escola Municipal “Quilombo dos Palmares”,
localizada em fronteira com a zona rural:

• Na dimensão de poder – inteligente: 3,9 (Gráfico 8); competente: 4,8 (Gráfico


10); rico: 2,6 (Gráfico 12); na dimensão de solidariedade – honesto:6,1
(Gráfico 9); simpático:5,5 (Gráfico 11); boa pessoa: 6,1 (Gráfico 13).
• Em competente: (4,8) e rico (2,6), houve uma convergência também com a
Escola Estadual “Fernando Lobo”, como mostram os Gráficos 10 e 12 do
ANEXO E.

c) Em contrapartida, a escola que atribuiu as piores notas a esse Falante II foi,


de maneira geral, o Colégio “Cristo Redentor” (cf. Gráficos 8 a 13 do ANEXO E):

• Na dimensão de poder – inteligente: 2,6 (Gráfico 8); competente: 3,6 (Gráfico


10); rico: 2,1 (Gráfico 12), tendo havido, neste último, uma convergência com
o Colégio de Aplicação “João XXIII”: 1,7; na dimensão de solidariedade –
honesto: 5,0 (Gráfico 9); simpático: 3,8 (Gráfico 11); boa pessoa: 5,1
(Gráfico 13).

Como podemos observar, novamente, a dimensão de solidariedade recebeu as


melhores notas.

d) O estudo comparativo das médias das notas atribuídas a esse Falante


mostrou p-valor significativo < 0,05 (5%) (cf. Quadro 4 – resumo da ANOVA), nos
adjetivos: inteligente (2,8%), competente (1,2%), simpático (0,3%). As diferenças entre
107

as escolas não foram significativas em relação aos adjetivos honesto (11,4%) e rico
(14,2%) e boa pessoa (11,7%).

e) O Gráfico 14, acima, demonstra também que o Falante II foi mais bem
avaliado pelos alunos das escolas de meio social mais pobre (Escola Municipal “Profª
Helena Antipoff” (média 4,6) e Escola Municipal “Quilombo dos Palmares” (média
4,7); ao contrário, foram os alunos de classe social privilegiada que, no outro extremo, o
avaliaram pior: Colégio “Cristo Redentor” (média 3,7) e Colégio de Aplicação “João
XXIII” (média 4,1).

Esse, a meu ver, é mais um forte indício do distanciamento dos alunos das escolas
públicas da realidade do mundo letrado, em que se utiliza, em geral, a variedade culta,
pelo menos, nos centro urbanos e, por isso mesmo, é mais acessível às classes sociais
privilegiadas. Portanto essa parece ser uma reação subjetiva ao contexto que lhes diz
pouco sobre seus ideais e sua cultura. Em contrapartida, fica evidenciada a forte
identificação desses alunos com a variedade lingüística de seu meio social e familiar.

5.2.3 Análise de Variância do Falante III (Telma – Variedade rurbana)

Podemos iniciar a análise dos resultados dos julgamentos subjetivos dos alunos que
avaliaram o Falante III , observando o gráfico abaixo, que apresenta sua média nas
cinco escolas.

6
5 4,5 4,7 4,7 4,5
4,3
4

3
2

1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 21 - Média do Falante III: Telma (Var. rurbana), extraída a partir


dos gráficos 15 a 20, por meio da Análise de Variância (ANOVA)
108

Como podemos constatar, as médias das notas atribuídas a esse Falante revelam
apenas leve discrepância entre os alunos das cinco diferentes escolas. Não se pode dizer,
estatisticamente, em relação a ele, qual escola, ou quais escolas o avaliaram pior ou
melhor.

Podemos ver isso, com mais detalhe, nos Gráficos 15-20 (ANEXO E), que mostram
significativa convergência, tanto nos adjetivos da dimensão de poder, quanto nos de
solidariedade, entre todas as escolas. Essa convergência se dá ora entre as duas escolas
ditas rurais, ora entre uma delas e a Escola Estadual “Fernando Lobo”, ora entre esta
última e o Colégio de Aplicação “João XXIII”, ora entre ela e o Colégio “Cristo
Redentor”.

Se voltarmos novamente ao Quadro 4 – resumo da ANOVA, veremos que, para


esse falante rurbano, as médias das notas atribuídas pelos alunos tiveram todas p-valor
>5%: inteligente (59,5%), honesto (19,0%), competente (29,4%), simpático (19,7%),
rico (75,5%), boa pessoa (31,5%), significando, com isso, não haver fator determinante
das diferenças. Esse resultado merece uma reflexão mais aprofundada, como detalho a
seguir.

Vimos, no início deste capítulo, que, para a Análise de Variância, deve-se partir da
hipótese inicial (H0), isto é, a hipótese de que a diferença das médias entre os grupos,
no presente caso, entre as escolas, seja produto do acaso, se temos p-valor > 0,05 (5%).
Se o p-valor é pequeno, < 0,05 (5%), deve-se rejeitar essa hipótese, isto é, haverá
fatores determinantes dessas diferenças. No presente estudo, esses fatores estariam
fortemente ligados aos fatores sócio-econômico-culturais: as escolas foram selecionadas
a partir de diferenças relativas a esses fatores, sugeridos pela sua localização geográfica.

No caso do Falante III, como o p-valor não é pequeno, sempre > 0,05 (5%),
conforme demonstra o Quadro 4 – resumo da ANOVA, não podemos rejeitar essa
hipótese (H0), isto é, as evidências não são fortes o bastante, para garantirmos que haja
fator determinante das diferenças nas médias dos falantes, segundo o julgamento dos
alunos das escolas avaliadas.
109

Tal fato sugere, portanto, haver uma semelhança na avaliação dos alunos das cinco
escolas em relação a esse Falante III. Lembremos que se trata de variedade rurbana, cuja
análise de fala, anteriormente empreendida (Seção 4.3.2), a situa bem à direita do
contínuo rural- urbano. Repito que esses dados estão claramente demonstrados no
Quadro 4 - resumo da ANOVA, no qual se pode ler a ausência de diferenças
significativas entre as escolas, em relação ao Falante III, de variedade rurbana, a Telma.

Para melhor compreender essa ausência de diferenças significativas entre as


escolas, em relação ao Falante III, é necessário estabelecer um confronto com os
resultados dos das escolas com relação aos Falantes I e II. O mesmo Quadro 4 mostra
claramente as escolas cujas médias dos adjetivos referentes aos falantes apresentam
diferenças mais significativas entre si. Como vimos, tratando-se da variedade urbana
(Falante I, Mara), as duas escolas que apresentaram entre si maior diferença de
julgamento foram o Colégio de Aplicação “João XXIII” (escola pública situada em
bairro central da cidade, freqüentada principalmente por alunos de classe econômica
privilegiada) e a Escola Municipal “Profª Helena Antipoff” (escola de zona rural, onde
residem alunos pobres), em relação a dois adjetivos da dimensão de poder - inteligente e
competente.

Vimos também que, quando os alunos avaliaram a amostra do Falante II (Dª


Mercedes), de variedade rural, novamente a Escola Municipal “Profª Helena Antipoff”
ficou em oposição a uma escola situada no centro da cidade, zona nobre, o Colégio
“Cristo Redentor”.

Um dos resultados interessantes revelados pelo Teste Post Hoc de Tuckey é que, se
considerarmos que as duas escolas municipais, (“Quilombo dos Palmares” e “Profª
Helena Antipoff”), no presente estudo, são representativas de regiões geográficas
distantes do centro comercial nobre, facilmente observaremos que, nas diferenças das
médias atribuídas aos três falantes pelas cinco escolas, a que menos contraste apresenta
é justamente a que foi escolhida para representar o nível intermediário entre os dois
extremos: de um lado, os colégios “Cristo Redentor” e “João XXIII”; de outro lado, as
escolas “Profª Helena Antipoff” e “Quilombo dos Palmares”. Trata-se da Escola
Estadual “Fernando Lobo”. Presumivelmente, seus alunos estão mais familiarizados
com uma variedade lingüística intermediária entre a norma culta e a rural, já que
110

provêm de famílias que residem em bairro próximo ao centro da cidade e/ou em outros
vizinhos, pouco mais afastados e de condições econômico-sociais mais difíceis. (cf.
Seção 4.3.1).

Isso sugere que a avaliação dos alunos dessa escola fica num nível intermediário
em relação às outras, o que pode significar certo distanciamento em relação à norma
culta por um lado, prestígio encoberto; por outro, pode significar, nesses alunos, a
percepção do valor/função dessa variedade como um quadro de referência, conforme
apontam Garvin e Mathiot (1974, p. 121).

Por fim, nesse confronto, há ainda um outro aspecto a ser considerado: a atitude dos
alunos do Colégio “Cristo Redentor”, instituição particular de ensino, que foi colocada
no universo das escolas avaliadoras para, possivelmente, indicar diferença no tratamento
dado pelos alunos às três diferentes variedades lingüísticas escolhidas para este estudo
(cf. Seção 4.3.1).

O que se observou, no entanto, foi que, no cômputo geral, essa diferença não se
evidenciou. Ao contrário, houve até mesmo a identificação total com todos os outros
alunos, no caso da avaliação do Falante de variedade rurbana, a Telma, o que pode
significar que, também para esses alunos, a variedade culta está mais distante (cf.
Quadro 4 – Resumo da ANOVA).

Isso sugere também que, na determinação dessas atitudes subjetivas, possa estar
incluído o fator faixa etária: lembramos que se trata de alunos de 8ª série, entre 14 e 17
anos de idade.

Essa constatação vem ao encontro das conclusões de Labov (1987 p. 145) já


tratadas anteriormente aqui. Em suas pesquisas sobre o Ebonics (na época, BEV), pôde
ele se deparar com a dificuldade de se ensinar padrões fonéticos a alunos falantes de
outros dialetos, sugerindo que os professores se limitassem àqueles gerais para a
população como um todo. Reproduzimos, novamente, suas palavras, ao referir-se à
“patota”:

A evidência aponta para o fato de que o adolescente da “patota”, nas cidades do


interior, institucionaliza resistência às normas, à ideologia e às práticas do
sistema escolar. Essa resistência parece ser o resultado de um conflito político e
111

cultural entre os falantes do vernáculo e as autoridades escolares. O


comportamento lingüístico dos membros da “patota” é um reflexo e um símbolo
desse conflito.

A identificação com o falante rurbano por parte de todo o universo dos alunos
testados constitui uma evidência que a escola precisa reconhecer. É preciso que se
promovam mudanças, nesse sentido, no trabalho escolar com a língua materna.

5.2.4 Discussão dos resultados do teste de atitudes.

A análise dos achados dos testes de atitudes sugere haver, no quadro geral, uma
forte identificação dos alunos com a variedade lingüística que, oficialmente, está fora da
escola, o que configura um caso de prestígio encoberto. Isso, apesar do esforço dos
professores e da instituição escolar em desconhecer essa realidade.

Além disso, alguns aspectos merecem ser ressaltados. O primeiro deles é a


identificação que os alunos operam entre a variedade culta e a dimensão de poder, o que
fica mais explícito em relação aos alunos da zona rural, que chegam a avaliá- la
negativamente, como se viu. Isso tem conseqüências pedagógicas importantes e deve,
por isso mesmo, ser alvo de reflexão dos agentes escolares.

O segundo aspecto, não menos importante, é a confirmação de que o aluno leva


para a escola suas referências culturais que precisam, por isso mesmo, ser respeitadas e
valorizadas. Isso ficou claramente ilustrado na avaliação do Falante II (Dª Mercedes),
feita pelos alunos das duas escolas municipais, a de periferia e a de zona rural. A escola
não pode, portanto, simplesmente sobrepor a essa cultura uma outra, seja ela qual for,
sem comprometer seu trabalho educativo.

O último aspecto se refere à diferença de julgamento em relação às duas dimensões


expressas pelos adjetivos, a de poder (inteligente, competente, rico) e a de solidariedade
(honesto, simpático, boa pessoa). Nas cinco escolas, os adjetivos que se referem à
dimensão de solidariedade receberam, em geral, as médias mais altas, havendo um
112

distanciamento grande entre as notas atribuídas a esses adjetivos e os da dimensão de


poder.

Isso corrobora a conclusão apresentada por Ryan (1979, p. 155) segundo a qual há,
entre os falantes, clara distinção entre “[...] status e prestígio, o valor de uma variedade
orientada para a ascensão social, e a solidariedade, o valor de uma variedade orientada
para a identificação com um grupo.”50 No caso do julgamento das falas pelos alunos-
juízes, não podemos esquecer que todos pertencem à mesma faixa etária e ao mesmo
nível de escolaridade, havendo entre eles, portanto, forte tendência a se identificarem
com uma variedade lingüística mais próxima da que utilizam na sua vida cotidiana, nos
momentos de descontração e camaradagem.

5.3 O teste de crenças

Como ficou dito atrás, esse teste de questões fechadas, falso/verdadeiro, foi
aplicado no mesmo universo do teste de atitudes. Responderam a ele, além dos mesmos
alunos da 8ª série, 22 professores de Português dessas escolas e 33 alunos formandos do
Curso de Letras do 2ª semestre de 2006, da UFJF. O objetivo foi subsidiar, com ele, o
estudo das atitudes lingüísticas. Através de respostas diretas, foi possível elicitar alguns
referenciais teóricos que permeiam o trabalho escolar com a língua materna.

Para melhor delinear o universo dos professores e alunos de Letras que


responderam a esse teste, foi- lhes solicitado que, em folha própria, fornecessem
informações adicionais sobre sexo, local de trabalho, curso de habilitação profissional,
tempo de formando (no caso dos professores), tempo de exercício de magistério (há
alunos de Letras que já lecionam, ainda que em caráter de aprendizagem), opinião sobre
sua formação em Sociolingüística e características sociais de seus alunos (cf. ANEXO
C).

O quadro abaixo informa o resultado dessa parte da pesquisa:

50
[...] status or prestige, the value of a speech variety for social advancement, and solidarity, the value of
a variety for identification with a group.
113

Professores (22) Formandos de Letras (33)


Sexo masculino 1/22 = 4,5% 7/33 = 21,2%
Sexo feminino 21/22 = 95,4% 26/33 = 78,7%
Curso/Letras completo 22/22 = 100,0% -
Curso/Letras incompleto 33/33 = 100,0%
Mestrado/Doutorado 10/22 = 45,4% -
Especialização na área de Linguagem 8/22 = 36,3% -
Recém-formado 0 -
1 a 5 anos de formado 3/22 = 13,6% -
Mais de 5 anos de formado 19/22 = 86,3% -
Professor de alunos de classe média 9/22 = 40,9% -
Professor de alunos de classe sócio-econômica baixa 5/22 = 22,7% -
Professor de alunos de classe média e baixa 8/22 = 36,3% -
Excelente formação sociolingüística 3/22 = 13,6% 6/33 = 18,1%
Boa formação sociolingüística 9/22 = 40,9% 16/33 = 48,4%
Estudo em Sociolingüística razoável a fraco 4/22 = 18,1% 8/33 = 24,2%

Sem qualquer estudo em Sociolingüística 5/22 = 22,7% 2/33 = 6,0%


Não declarado 1/22 = 4,5% 1/33 = 3,0%
Tempo de magistério Entre 2 a 10 anos 5/22 = 22,72% (10/33 = 30,3%)
Entre 10 e 20 anos 4/22 = 18,1% A experiência declarada pelos
Entre 20 e 36 anos 13/22 = 59,0% formandos neste item, refere -
se à atuação no magistério, na
qualidade de bolsistas, durante
o Curso de Letras (monitoria,
treinamento, iniciação ao
magistério, etc.)

Quadro 5 – Resultados da análise dos dados relativos às características de professores e


formandos de Letras que responderam ao Questionário I (Teste de crenças).

Este quadro demonstra que, no universo analisado:

a) o sexo preponderante é o feminino (professor: 95,4%; formandos, 78,7%);


b) poucos professores têm especialização na área de linguagem (36,3%);
c) a maior parte dos professores têm mais de cinco anos de formados (86,3%);
d) os professores lecionam tanto para alunos de classe média (40,9%) quanto para
114

alunos de classe média e baixa (36,3%);


d) a formação sociolingüística dos professores é considerada, por eles mesmos, como
boa (40,9%), ou aquém do razoável (18,1%); os formandos avaliam melhor sua
formação nessa área (48,4%);
e) o tempo de magistério dos professores é maior entre 20 e 36 anos (59,0%);
f) entre os formandos, a atuação fica restrita à atividade de monitoria e treinamento
(30%).

Os desdobramentos desse perfil serão retomados na conclusão.

Foram apresentadas as vinte e cinco assertivas constantes no quadro abaixo, que


relaciona também o p-valor referente ao teste qui-quadrado, para avaliar as diferenças
relativas à escolaridade:
Assertivas p-valor

A língua ESCRITA é mais correta que a FALADA. 0,000


Eu FALO bem. 0,001
Eu ESCREVO bem. 0,005
Para saber ESCREVER bem, basta conhecer as regras de ortografia. 0,000
Os adultos FALAM melhor que os jovens. 0,000
Para ESCREVER bem, é preciso ler muito. 0,012
Para ESCREVER bem devo melhorar meu jeito de FALAR. 0,000
O bom professor de Português FALA sempre de acordo com as regras de gramática. 0,000
A linguagem dos livros é sempre melhor e mais bonita do que meu modo de FALAR. 0,000
Para aprender a ESCREVER, o aluno deve aprender a FALAR como seu professor de 0,008
Português.
A escola deve corrigir a FALA dos alunos. 0,018
As pessoas analfabetas FALAM errado. 0,000
Para se ESCREVER direito, deve-se aprender gramática. 0,000
A língua ESCRITA é mais importante do que a FALADA. 0,005
Saber FALAR bem é tão importante quanto saber ESCREVER bem. 0,001
Eu gosto de FALAR do mesmo jeito da minha família e dos meus amigos. 0,005
O meu jeito de FALAR é igual ao das pessoas com quem convivo no lugar onde
moro, por isso eu tenho orgulho do meu jeito de falar. 0,466
A língua ESCRITA é mais complicada do que a língua FALADA. 0,000
Só a escola ensina a ESCREVER bem. 0,009
Em qualquer situação da vida, posso FALAR do mesmo jeito. 0,030
Quem já aprendeu a LER já pode ESCREVER qualquer tipo de texto. 0,002
Só há um modo de FALAR corretamente: aprender o que a escola ensina. 0,000
Eu devo ESCREVER do mesmo jeito que falo. 0,042
O jeito de FALAR em Minas é bonito. 0,144
Há outras falas mais bonitas que a de Minas. Exemplo a de ___________. 0,000

Quadro 6 – Assertivas associadas a crenças e respectivos p-valores referentes ao teste qui-


quadrado, para avaliar diferenças em função da escolaridade (Ensino
Fundamental, alunos de Letras e professores de Português)
115

Como se pode notar, houve o cuidado de se evitar declarações negativas para


afastar ambigüidades que costumam acontecer em presença de duas negações.

Os dados desse teste foram também processados no Laboratório de Estudos de


Estatística da Saúde, do Instituto de Ciências Exatas da UFJF, tendo sido analisados
através do teste qui-quadrado, para comparar as proporções relativas ao conteúdo das
respostas e verificar a relação entre estas e a escolaridade dos sujeitos avaliados. Os
resultados completos desse teste, com o p- valor e as porcentagens estão disponíveis no
ANEXO F (Tabelas 1 a 25).

Também no teste qui-quadrado, com se viu acima (Seção 5.1), há um p-valor que,
quando < 0,05 (5%), sugere haver interferência de fatores determinantes das respostas.
No presente caso, justamente a diferença de escolaridade: alunos de 8ª série do Ensino
Fundamental, formandos do Curso de Letras e professores de Português. Sendo o p-
valor >0,05 (5%), essa hipótese deve ser rejeitada, isto é, os fatores determinantes da
escolha da resposta não devem ser atribuídos à diferença de escolaridade.

O Quadro 6 revela que, das 25 assertivas, relativamente a apenas duas delas, as que
estão em destaque, não houve associação entre a resposta e o nível de escolaridade.
Foram as seguintes:

§ O meu jeito de falar é igual ao das pessoas com quem convivo no lugar onde moro,
por isso, eu tenho orgulho do meu jeito de falar.
§ O jeito de falar em Minas é bonito.

Para essas duas questões, como mostra o Quadro 6, acima, o p-valor foi >0,05
(5%), respectivamente, 46,6% e 14,4%. Em ambas, os sujeitos se dividiram em torno de
50%, como se pode observar nas Tabelas 17 e 24 do ANEXO F.

As demais expressões de crenças apresentadas, como se pode observar, envolvem


três diferentes categorias de relação:
116

i) do sujeito com a escrita;


ii) do sujeito com a fala;
iii) entre fala e escrita.

Essas categorias serão detalhadas nas próximas seções.

5.3.1 Assertivas associadas a crenças em relação à escrita

Foram cinco as declarações desse tipo:

(i/a) Eu escrevo bem. (Tabela 3)


(i/b) Para escrever bem, basta conhecer as regras de ortografia. (Tabela 4)
(i/c) Para escrever bem, é preciso ler muito. (Tabela 6)
(i/d) Para escrever direito, deve-se aprender gramática. (Tabela 13)
(i/e) Só a escola ensina a escrever bem. (Tabela 19)
(i/f) Quem já aprendeu a ler já pode escrever qualquer tipo de texto. (Tabela 21)

Como se pode observar, as assertivas (i/b), (i/d), (i/e) e (i/f) contêm afirmações
equivocadas sobre a aquisição da competência de escrita, equívoco, aliás, que
provavelmente está na base das dificuldades e até mesmo do bloqueio de muitos alunos,
no desenvolvimento de habilidades que os levem ao domínio dessa competência. Os
resultados, expostos nas tabelas, no entanto, demonstram que elas ainda são verdadeiras,
para esses alunos da 8ª série, na seguinte proporção: 43,2% para a assertiva (i/b) –
Tabela 4: Para escrever bem, basta conhecer as regras de ortografia; 75,6% para a
assertiva (i/d) – Tabela 13: Para escrever direito, deve-se aprender gramática; 27,5%
para a assertiva (i/e) – Tabela 19: Só a escola ensina a escrever bem; e 19,8% para a
assertiva (i/f) – Tabela 21: Quem já aprendeu a ler, já pode escrever qualquer tipo de
texto.

Quanto aos formandos de Letras e aos professores, em relação à assertiva (i/b) –


Tabela 4: Para escrever bem, basta conhecer as regras de ortografia, esse equívoco
parece estar sendo corrigido: 100% dos formandos de Letras a consideram
117

categoricamente falsa, felizmente, embora ainda haja um resíduo de professores (4,5%)


que a considerem verdadeira.

Em relação à assertiva (i/f) – Tabela 21: Quem já aprendeu a ler já pode escrever
qualquer tipo de texto, os formandos de Letras e os professores categoricamente a
consideram falsa (100%).

O prestígio maior, no entanto, parece ser ainda o da teoria gramatical - assertiva


(i/d) - Tabela 13: Para escrever direito, deve-se aprender gramática. Ela é ainda
essencial para se aprender a escrever bem, segundo a opinião de 75,6% dos alunos da 8ª
série, 29,0% dos formandos de Letras e 40,9% dos professores de português. A meu ver,
o que se torna preocupante, nesses resultados, é o fato, lamentavelmente generalizado,
de que ainda há professores que não privilegiam a gramática de uso ou a gramática
reflexiva, insistindo numa tradição calcada em regras e classificações.

A grande porcentagem de rejeição do valor de verdade da assertiva (i/e) – Tabela


19: Só a escola ensina a escrever bem - constitui um reconhecimento das outras
instâncias de letramento, embora o índice de concordância por parte dos alunos do
Ensino Fundamental seja ainda preocupante (27,5%).

A assertiva (i/c) – Tabela 6: Para escrever bem é preciso ler muito – foi proposta
para verificar o grau de adesão a essa crença, que faz parte da cultura letrada. Ela é
verdadeira para 85%,1 dos alunos, 62,5% dos formandos de Letras e 86,4% dos
professores. Embora ela seja verdadeira, é indispensável também o trabalho específico
com os gêneros discursivos e a prática de construção textual, para se construir a
competência de escrever bem.

Como conseqüência de tudo isso, há que se destacar, ainda, que as respostas à


assertiva (i/a) - Tabela 3: Eu escrevo bem demonstram que os alunos de 8ª série, em
grande parte (33,3%), ainda consideram que não têm essa capacidade. Podemos
observar também, nessa mesma tabela, que, até no final do Curso de Letras, 24,2% dos
formandos não podem afirmar que dominam essa competência. Os professores, esses
sim, todos estão seguros disso.
118

5.3.2 Assertivas associadas a crenças em relação à fala

As assertivas propostas para o exame dessas relações foram as seguintes:


(ii/a) Eu falo bem. (Tabela 2)
(ii/b) Os adultos falam melhor que os jovens. (Tabela 5)
(ii/c) O bom professor de Português fala sempre de acordo com as regras de gramática.
(Tabela 8)
(ii/d) A escola deve corrigir a fala dos alunos. (Tabela 11)
(ii/e) As pessoas analfabetas falam errado. (Tabela 12)
(ii/f) Eu gosto de falar do mesmo jeito da minha família e dos meus amigos. (Tabela
16)
(ii/g) Em qualquer situação da vida, posso falar do mesmo jeito. (Tabela 20)
(ii/h) Só há um modo de falar corretamente: aprender o que a escola ensina. (Tabela 22)
(ii/i) Há outras falas mais bonitas que a de Minas. (Tabela 25)

Dentre essas nove assertivas, quatro delas, (ii/c) – Tabela 8: O bom professor de
Português fala sempre de acordo com as regras de gramática; (ii/d) – Tabela 11: A
escola deve corrigir a fala dos alunos; (ii/e) – Tabela 12: As pessoas analfabetas falam
errado; (ii/h) - Tabela 22: Só há um modo de falar corretamente: aprender o que a escola
ensina afirmam a influência da escola na construção, nos alunos, de crenças negativas
em relação a sua competência de uso da língua, mesmo na sua fala espontânea.51

Se, por um lado, no entanto, é preocupante a porcentagem alta de alunos da 8ª série


(71,1%) que, ao final do Ensino Fundamental, acreditam que o bom professor de
Português fala sempre de acordo com as regras de gramática52 - assertiva (ii/c) – Tabela
8, mito que uma boa porcentagem dos próprios professores de Português (23,8%) ainda
afirma ser realidade; por outro lado, tudo indica que, nos cursos de Letras, pelo menos
no universo que serve de parâmetro para o presente estudo, as reflexões sobre certo e
errado em linguagem já estejam dando bons resultados: apenas 3,% dos formandos
participam dessa crença. O mesmo se pode dizer em relação à afirmativa (ii/e) – Tabela
12: As pessoas analfabetas falam errado, que 60,5% dos alunos da 8ª série e 13,6% dos
51
Relativamente à assertiva (e), é claro que outras instâncias da sociedade, como a mídia, também podem
contribuir para alimentar esse preconceito. Mas, no caso, estamos tratando somente da pressão escolar.
52
Estou considerando aqui o conceito de gramática vigente no ambiente escolar, isto é, o que está
associado ao conceito de língua padrão, conforme foi discutido na Seção 3.4 e em relação à qual o Projeto
NURC-SP, como se viu, apontou indícios para sua desmitificação.
119

professores consideram verdadeira, mas a totalidade dos formandos de Letras a


consideraram falsa.

Observe-se, no entanto, os resultados da assertiva (ii/d) – Tabela 11: A escola deve


corrigir a fala dos alunos. Ela é verdadeira para 62,8% dos alunos, 40,6% dos
formandos de Letras e 38,1% dos professores. Esse é um indício forte de que a
descrença dos alunos na competência de uso de sua própria língua é construída no dia-a-
dia, dentro da escola.

A assertiva (ii/h) – Tabela 22: Só há um modo de falar corretamente: aprender o


que a escola ensina, é verdadeira para 34,2% dos alunos, mas, felizmente, o é para
apenas 3,0% dos formandos de Letras e 4,5% dos professores.

A assertiva (ii/b) – Tabela 5: Os adultos falam melhor que os jovens, considerada


ainda verdadeira por 38,3% dos alunos da 8ª série, parece, a meu ver, ser reflexo de sua
auto-estima baixa, construída ao longo de seus oito anos de vida escolar, crença
reiterada no confronto com os resultados da assertiva (ii/a) – Tabela 2: Eu falo bem:
40,8% desses alunos ainda julgam que não falam bem.

A assertiva (ii/f) – Tabela 16: Eu gosto de falar do mesmo jeito da minha família e
dos meus amigos, quando considerada falsa, sugere uma insatisfação, por parte dos
sujeitos, em relação à variedade lingüística de seu meio. 53,7% dos alunos do Ensino
Fundamental manifestando esse sentimento nos reportam às conclusões de Santos
(1976), apresentadas na Seção 3.2.2 deste trabalho. Ao final de sua pesquisa em que
utiliza testes de atitudes aplicados em alunos de escola pública da cidade do Rio de
Janeiro, o autor conclui que os alunos provenientes das classes pobres, a partir do
segundo segmento do Ensino Fundamental, passam a estigmatizar a variação lingüística
de seus pais. Nesse caso, a escola não terá cumprido seu papel de conscientizar os
alunos sobre o significado social das variedades lingüísticas. Retomamos suas palavras
(op. cit. p. 9):

[...] a escola funcionou como fator de integração entre os educandos quanto às


atitudes em relação às variantes julgadas (e dentro dos contextos em que foram
julgadas), sem haver um apagamento da estratificação social entre eles. É
possível que, com o aumento da idade e da instrução, os adolescentes do estrato
social de mais prestígio venham a se aproximar das atitudes dos pais. Mas é certo
120

que os jovens do ES-1[estrato pobre] não se aproximarão dos padrões de atitudes


dos seus responsáveis.

O interessante é que, entre os professores, o índice de rejeição (54,5%) é também


alto, bastante equivalente ao dos alunos (53,7%). Entre os formandos de Letras, 21,9%
rejeitam o jeito de falar de seus pares.

A mesma reflexão cabe em relação à assertiva (ii/i) – Tabela 25: Há outras falas
mais bonitas que a de Minas. É significativa a porcentagem dos alunos da 8ª série que a
consideram verdadeira: 69,2%.

Poderíamos indagar se essas duas manifestações de crença se coadunam com as


conclusões relativas ao teste de atitudes, quando todos os alunos avaliados
identificaram-se com a variedade que se poderia considerar intermediária entre a
variedade culta e a rural, o que poderia significar que estão satisfeitos com sua
variedade lingüística. Neste teste de crenças, como se vê, o resultado relativo a essas
assertivas em tela parece apontar para a direção contrária.

Não estaria essa contradição ligada à natureza diferente dos dois métodos adotados?
O teste de atitudes é indireto, surpreende as atitudes subjetivas, portanto, ligadas ao
inconsciente dos sujeitos. No entanto, questões diretas, ligadas ao nível consciente,
como as de falso/verdadeiro, tendem a elicitar crenças e preconceitos, possivelmente,
inculcados pelas instituições sociais encarregadas da formação desses jovens. Aí pode
estar a explicação. Em conseqüência disso, a responsabilidade dos agentes escolares que
colaboram diretamente na construção do sistema de crenças que pode determinar as
atitudes lingüísticas. Santos (1996, p. 15) constatou: “Várias pesquisas produziram
evidências de que a atitude de um indivíduo pode ser mudada, se forem mudadas suas
crenças sobre o objeto.”

As respostas relativas à assertiva (ii/g) – Tabela 20: Em qualquer situação da vida,


posso falar do mesmo jeito, tranqüilizam: apenas 11,8% dos alunos de 8ª série parecem
ainda insensíveis à necessidade de adequar sua fala às situações de uso. Os formandos
de Letras e os professores, categoricamente, a consideraram falsa.
121

5.3.3 Assertivas associadas a crenças em relação à fala e à escrita.

As assertivas propostas nesta categoria foram:

(iii/a) A língua escrita é mais correta que a falada. (Tabela 1)


(iii/b) Para escrever direito, devo melhorar meu jeito de falar. (Tabela 7)
(iii/c) A linguagem dos livros é sempre melhor e mais bonita do que meu modo de
falar. (Tabela 9)
(iii/d) Para aprender a escrever, o aluno deve aprender a falar como seu professor de
Português. (Tabela 10)
(iii/e) A língua escrita é mais importante que a falada. (Tabela 14)
(iii/f) Saber falar bem é tão importante quanto saber escrever bem. (Tabela 15)
(iii/g) A língua escrita é mais complicada que a falada. (Tabela 18)
(iii/h) Eu devo escrever do mesmo jeito que falo. (Tabela 23)

Dentre essas assertivas, as cinco primeiras, ainda que eivadas de preconceito


lingüístico, tiveram, principalmente entre os alunos de 8ª série, alto índice de
concordância: (iii/a) – Tabela 1: A língua escrita é mais correta que a falada - 75,2%;
(iii/b) – Tabela 7: Para escrever direito, devo melhorar meu jeito de falar - 66,1%; (iii/c)
–Tabela 9: A linguagem dos livros é sempre melhor e mais bonita do que meu modo de
falar - 58,3; (iii/d) – Tabela 10: Para aprender a escrever, o aluno deve aprender a falar
como seu professor de Português - 25,4%; (iii/e) – Tabela 14: A língua escrita é mais
importante que a falada - 29,4%. Com relação a essa última assertiva, esse índice mais
baixo de concordância sugere que já se vai caminhando no sentido de serem
valorizadas, na escola, as práticas de oralidade.

Entre os professores, embora menor, o índice é ainda, lamentavelmente, alto: 42,9%


para a assertiva (iii/b) – Tabela 7: Para escrever direito, devo melhorar meu jeito de
falar. Entre os formandos de Letras, ele é bem menor ainda, o que é apreciável: 12,1%.
122

A assertiva (iii/f) – Tabela 15: Saber falar bem é tão importante quanto escrever
bem - foi considerada verdadeira por 87,3% dos alunos, 62,5% dos formandos de Letras
e 95,2% dos professores.

A assertiva (iii/g) – Tabela 18: A língua escrita é mais complicada que a falada foi
considerada falsa por 25,0% dos alunos, 60,6% dos formandos de Letras e 45,5% dos
professores.

Finalmente, assertiva (iii/h) – Tabela 23: Eu devo escrever do mesmo jeito que falo
– só foi considerada verdadeira por 10,8% dos alunos. Todos os demais (89,2%) e l00%
de formandos de Letras e dos professores a consideraram errada, o que, felizmente, não
é de se surpreender. Afinal, essa – a aquisição da escrita - constitui a grande arena em
que se debatem todos os agentes da escola. Se há forte preconceito contra a oralidade na
escola, natural é que a escrita goze lugar privilegiado. Felizmente, pelo menos, em
teoria, está clara a diferença entre as duas modalidades. Resta trabalhá- las eficaz e
adequadamente.

A assertiva da Tabela 25: Há outras falas mais bonitas que a de Minas Gerais abriu
a possibilidade de os respondentes se expressarem sobre eventual preferência por outros
falares diferentes do de Minas Gerais. O objetivo da questão fo i o de sondar a existência
ou não dessa crença, o que poderia ser também um indício de como eles se sentem
diante da variedade lingüística de sua própria região. Apenas 01 professor e 01
formando de Letras declararam preferência, ambos pelo falar sulista (Rio Grande do Sul
e sulista, respectivamente). Alguns dentre os demais respondentes declararam ser
preconceito lingüístico a preferência por esse ou aquele falar regional.

O levantamento complementar com relação às falas preferidas (Exemplo de ___)


revelo u que dos 135 alunos que responderam ao teste, apenas 77 expressaram sua
opinião nesse sentido. 61,0% dentre eles declarou gostar mais do falar carioca; 15,5%
mostrou preferência pelo fa1ar do Sul (12 explicitamente nomearam o gaúcho, 02 o
falar de Santa Catarina, 01 o falar do Paraná e 01 chamou-o genericamente de falar
sulista); 4,2% prefere o falar paulista e 9,0% o do Nordeste (05 explicitamente
nomearam o falar baiano, 01 o falar de Recife e 02 genericamente, o falar nordestino).
123

A preferência tão grande pelo falar carioca (61,0%) pode estar ligada à influência
econômica e cultural da cidade do Rio de Janeiro, sobre Juiz de Fora, ambas separadas
por apenas 192km, ligadas por excelente estrada de rodagem, a BR-040. De fato, a
sociedade juizforana parece estar muito mais ligada ao modo de vida carioca do que ao
da capital do Estado, Belo Horizonte. Essa influência é histórica, se considerarmos, por
exemplo, que a primeira rodovia macadamizada da América Latina foi construída para
ligar Juiz de Fora a Petrópolis (RJ), sendo inaugurada em 1861, por D. Pedro II. Na
época da expansão das comunicações radiofônicas, na década de 30, e mesmo da
televisiva, na década de 50, eram as emissoras cariocas praticamente as únicas
conhecidas e acessadas pela população de Juiz de Fora. De qualquer modo, permanece
sendo deveras significativa a influência carioca sobre os juizforanos dessa cidade.

5.3.4 Discussão dos resultados do teste de crenças

Os resultados apresentados, como se vê, revelam que os alunos da 8ª série das


escolas avaliadas estão inibidos relativamente à competência de uso de sua própria
língua: em geral, não consideram que falam nem que escrevem bem. E mais,
condicionam o desenvolvimento dessa competência a falsos instrumentos, como
aprender regras de gramática ou de ortografia. Como conseqüência, apresentam baixa
auto-estima, além de alimentarem, já nesse nível, o preconceito lingüístico, algumas
vezes contra seu próprio modo de falar. Estão seguros de que a escola os pode ajudar e
esperam isso.

Entre os professores, embora, em geral, não participem de muitas das crenças


equivocadas de seus alunos, alguns ainda se mostram presos a outras crenças que não
têm fundamento, como a de que é preciso “corrigir” a fala do aluno, de que os
analfabetos falam errado, de que sem saber gramática não se aprende a escrever. Nesse
caso, os professores demonstram-se desfavoráveis à variedade lingüística de seus alunos
e acabam colaborando para que eles descreiam da sua própria capacidade de se
expressar com competência, segundo os padrões escolares esperados.

O que se deve perguntar, no entanto, a meu ver, é por que a escola ainda não
conseguiu desfazer tantos equívocos. As atividades escolares de reflexão sobre a língua
124

e a linguagem, fundamentadas em princípios científicos, são o caminho seguro para a


desconstrução de falsas crenças e do preconceito lingüístico, para se desenvolver
competências de uso da variedade culta da própria língua.

Essa questão é pertinente com o que foi discutido na Seção 3.1. Vimos que
Richardson (1996), examinando as relações entre crenças e ações/atitudes, aponta a
necessidade da reflexão do professor e do aluno sobre o processo ensino/aprendizagem,
para as mudanças ou surgimento de novas crenças. Nesse caso, creio, o professor pode
desempenhar um papel importante no apoio ao aluno no sentido de levá- lo a
desenvolver uma boa auto-estima, acreditando na possibilidade de se tornar um usuário
competente de sua língua, capaz de transitar tanto pelas situações de maior formalidade
quanto por aquelas de total descontração.

Levantando um sistema de crenças dos professores e dos alunos, pôde-se construir


um quadro ilustrativo do que vai se desenhando nas escolas e, por conseguinte, no
universo conceitual dos alunos sobre ensino/aprendizagem/competência de uso de sua
própria língua.

Quanto aos formandos de Letras, tudo indica, vão avançando na construção de


crenças mais compatíveis com o avanço dos estudos de linguagem.
125

6. CONCLUSÕES

Minha pesquisa possibilitou evidenciar, de maneira pontual, a origem de algumas


das inconsistências do trabalho escolar com a língua portuguesa. Sem dúvida, sabe-se
que, nesse sentido, há outras questões já amplamente apontadas e discutidas na literatura
que se vem construindo sobre o tema. No presente caso, a Sociolingüística propondo a
avaliação como um dos seus problemas de base, funcionou como uma lente que
aproximou o investigador de seu objeto de análise, isto é, o estudo das atitudes e crenças
lingüísticas no contexto da escola pública da cidade mineira de Juiz de Fora.

Para o teste de atitudes, o universo da pesquisa consistiu de 105 alunos de 4 escolas


públicas e 30 de 01 escola particular, todos cursando a 8ª série, na faixa etária de 14-17
anos. As escolas selecionadas diferenciaram-se por localização geográfica dentro do
Município: 01 escola particular, o Colégio “Cristo Redentor”, situada na área central da
cidade, zona comercial nobre; 02 escolas públicas em bairros centrais - a primeira delas,
o Colégio de Aplicação “João XXIII”, situada em bairro de bom padrão residencial e a
outra, a Escola Estadual “Fernando Lobo”, igualmente de bom padrão, mas circundada
por bairros de baixo nível sócio-econômico; 01 escola em bairro de periferia próximo à
zona rural, a “Quilombo dos Palmares” e, por fim, 01 escola na zona rural do
Município, a “Profª. Helena Antipoff”.

Os sujeitos dos testes julgaram falas caracterizadas no contínuo de urbanização:


variedades rurais isoladas (Dª Mercedes) > variedade rurbana (Telma) > variedades
urbanas padronizadas (Mara), proposto por Bortoni-Ricardo (2004).

Em síntese, os aspectos relevantes desse teste foram:

(i) a identificação de todos os alunos do universo testado com a variedade rurbana, que
está fora da prática escolar oficial, isto é, uma variedade intermediária entre a
urbana/culta, mais prestigiada, e a rural, estigmatizada;
126

(ii) no universo das escolas públicas, uma identificação, quanto ao julgamento da


variedade culta da língua, entre escolas localizadas em pólos opostos (Escola Municipal
“Profª Helena Antipoff” e Escola Municipal “Quilombo dos Palmares” versus Colégio
de Aplicação “João XXIII”);

(iii) a ausência de diferenciação entre a avaliação dos alunos das escolas públicas e
aqueles da particular, Colégio “Cristo Redentor”;

(iv) a constatação de que o preconceito lingüístico pode se dar a partir tanto dos falantes
do dialeto mais prestigiado quanto dos que convivem com a variedade mais
estigmatizada. Os alunos da zona rural, Escola “Profª Helena Antipoff”, atribuíram
índices menores à variedade culta do que à rural, evidenciando o fenômeno do prestígio
encoberto. Nesse caso, a avaliação atitudinal da escola que convive com os dois
extremos e que apresentou menor contraste nas diferenças das médias atribuídas aos três
falantes – a “Fernando Lobo” – aponta que esses alunos estão mais familiarizados com a
variedade lingüística rurbana, portanto, menos sujeitos à contra-pressão do prestígio
encoberto. Tal resultado sugere uma implicação pedagógica: a escola deve levar em
consideração essa identificação com a variedade intermediária entre a urbana
padronizada e a rural, na função de ampliar a competência dos alunos em diferentes
registros;

(v) a atribuição dos julgamentos das falas revelou que os adjetivos da dimensão da
solidariedade (honesto, simpático e boa pessoa) foram os que exibiram maiores índices,
sugerindo que, na faixa etária de 14-17 anos de alunos de escola pública e particular do
Município de Juiz de Fora, a identificação se dá mais com o comportamento lingüístico
de seu grupo do que com o poder, que a variedade culta simboliza, fato este apontado
por Labov (1987, p. 139);

(vi) os julgamentos que os alunos do Colégio de Aplicação “João XXIII” conferiram ao


falante da variedade urbana padronizada (Mara) evidenciaram nítida oposição em
relação àqueles das demais escolas, sobretudo os das escolas “Profª Helena Antipoff” e
“Cristo Redentor”. Note-se que esta última é a instituição particular, situada em zona
comercial nobre da cidade e se supõe que seus alunos convivam mais estreitamente com
essa variedade. Ainda assim, não se identificam tanto com ela. Tudo indica, portanto,
127

haver um tratamento pedagógico diferente naquela primeira escola, cujos professores


são os mais qualificados da amostra. De qualquer modo, segundo a análise dos dados
relativos às características dos professores que compuseram o universo da pesquisa, é
muito pequeno o número dos que têm estudos continuados, ainda que a maior parte
tenha mais de 20 anos de magistério. Sua formação sociolingüística, considerada por
alguns deles aquém do razoável, pode ser também um fator determinante desses
resultados.

Para o teste de crenças, o universo consistiu dos mesmos alunos de 8ª série, com o
acréscimo de 22 professores de Português daquelas escolas anteriores e 33 formandos
do Curso de Letras do segundo semestre de 2006 da UFJF.

Os achados relevantes desse teste, que consistiu em 25 assertivas sobre as relações


com a fala, a escrita e entre ambas, demonstraram:

(i) por parte dos alunos, um preconceito significativo contra a própria fala: 40,8% ainda
julgam que não falam bem; uma desvalorização da fala da família e dos amigos
(53,7%); a crença de que o bom professor de Português fala sempre corretamente
(71,1%). Por parte dos formandos, apenas 3% compartilham desta última crença, muito
embora 72,7% consideram que falam bem. Por parte dos professores, é categórica a
crença de que falam bem; mas ainda 38,1% acham que devem corrigir a fala dos alunos,
embora não julguem (90,9%) que só a escola ensine a falar corretamente;

(ii) por parte dos alunos, uma crença de que não escrevem bem (33,3%) e que, para
adquirirem tal competência, basta conhecer regras de ortografia (43,2%) e de gramática
(75,6%); não obstante somente 27,5% avaliam que apenas a escola ensina a escrever
bem. Quanto aos formandos, 75,8% afirmam que escrevem bem e categoricamente
discordam da crença de que o conhecimento de regras ortográficas leva a uma boa
escrita; 71,0% não acreditam que aprender gramática implica em escrever bem.
Categoricamente os professores julgam escrever bem; a crença de que aprender
ortografia para se escrever bem é falsa para 95,5%, mas ainda 40,9% consideram
verdadeiro que é preciso aprender gramática para escrever bem;

(iii) por parte dos alunos, uma crença de que a escrita é mais correta do que a fala
(75,2%), mais importante (29,4%) e mais complicada (75%) do que a fala. Por parte dos
128

formandos e dos professores há uma coincidência: 90,9% consideram falsa a crença de


que a escrita é mais correta; os formandos (87,9%) julgam não ser necessário melhorar
o jeito de falar para escrever direito e os professores, 57,1%. As crenças dos alunos de
que não falam bem e de que sua fala deve ser corrigida constituem um indício da
insuficiência do trabalho com a oralidade na escola, o que redunda em baixa auto-estima
e em descrença na própria competência lingüística.

Com base nesses resultados, concluo que as hipóteses aventadas nas perguntas
fundadoras, que aqui retomo, foram confirmadas:

1. Há correlação entre as crenças dos professores sobre o que são língua,


linguagem variação e aprendizagem lingüística e as crenças e as atitudes dos
alunos sobre sua própria variedade dialetal?

2. Se afirmativo, as crenças dos professores podem ter algum reflexo nas atitudes
desfavoráveis do aluno em relação à própria capacidade de domínio das variantes
padrão?

Uma evidência significativa a favor de (1) e (2) é a de que 75,6% dos alunos do
Ensino Fundamental avaliam que o conhecimento gramatical é indispensável para o
domínio da escrita padrão. O ponto importante a ser aí destacado é que a crença dos
professores quanto a esse quesito apresenta um resultado ainda preocupante: 59,1%
consideram falsa essa crença, mas 40,9% ainda a julgam verdadeira. Essa postura ainda
persistente dos professores provavelmente influencia as atitudes desfavoráveis dos
alunos com relação à sua identificação com a variedade culta, o que poderia ser
minimizado com a adoção de uma pedagogia culturalmente sensível que minimizasse a
interação assimétrica no sentido de diminuir a distância entre o prestígio conferido à
variedade do professor e aquela do aluno. No entanto, já há sinais de que esse quadro
está mudando: só 29% dos formandos em Letras participam dessa crença.

Os resultados da pesquisa também mostraram alunos em conflito entre a aprovação


de sua variedade lingüística (teste de atitudes) e a declaração de que não sabem
escrever, nem falar bem (teste de crenças). Percebe-se, portanto, que, subliminarmente,
um sistema de crenças vai sendo construído na direção oposta do que a escola pretende.
As manifestações de crenças dos professores revelam o quanto de participação ainda
129

têm nesse conflito, já que alguns deles ainda parecem estar influenciados por um
sistema de crenças eivado de equívocos, quanto à língua, à linguagem, à variação e à
aprendizagem lingüística.

As evidências comprovam, portanto, uma relação entre as crenças dos professores e


as crenças e atitudes lingüísticas dos alunos influenciando no processo de aquisição da
variedade culta da língua, fator indispensável - como assim pontua a definição da
política lingüística proposta pela ABRALIN (cf. SCLIAR-CABRAL, 1999) - à
construção da cidadania, para que possam se integrar na comunidade lingüística de que
fazem parte e cuja variedade prestigiam. Isso remete à necessidade de se fundamentar a
prática do trabalho escolar com a língua materna em sólidas bases de estudos
sociolingüísticos.

3. Levando-se em conta (1) e (2), é possível flagrar, através de testes de atitudes,


um prestígio encoberto dos alunos de escola pública em relação à sua própria
variedade lingüística?

Os resultados demonstram que principalmente naqueles alunos que convivem com


a fala rural, mais desprestigiada no contínuo, atua o fenômeno do prestígio encoberto,
tanto que foram justamente eles que atribuíram as menores notas ao falante da variedade
urbana padronizada, a Mara. No entanto, os achados atestam que a totalidade dos alunos
da escola pública e particular se identificam mais com a variedade rurbana (Telma), o
que sugere que esse fenômeno também está aí presente. Pedagogicamente, há a
implicação de que à escola não compete substituir o vernáculo do aluno, mas incorporar
a ele outros estilos, conforme aponta Bortoni- Ricardo (2005, p. 131):

Labov e Harris (1986) têm razão quando afirmam que a escola não interfere no
sistema básico da língua, considerando que o sistema básico é o vernáculo.
Porém não se pode inferir de suas palavras que seja inócua a influência da escola
na formação do repertório lingüístico do falante, uma vez que a escola atua na
aquisição dos estilos sobrepostos ao vernáculo. A tarefa da escola está
justamente em facilitar a incorporação ao repertório lingüístico dos alunos de
recursos comunicativos que lhes permitam empregar com segurança os estilos
monitorados da língua, que exigem mais atenção e maior grau de planejamento.

Creio que esta pesquisa, tendo focalizado o aluno, suas atitudes subjetivas e
crenças, conseguiu evidenciar, empiricamente, o que é uma suposição bastante comum:
130

a escola falha, quando insiste em desconhecer o que é próprio do aluno, sua cultura, sua
vivência, sua linguagem. A simples imposição de uma variedade lingüística, com a
justificativa de que é a mais prestigiada não é suficiente para fazê-lo aderir a ela. Nesse
caso, não há diferença, pelo menos no estágio atual da crise de ensino no Brasil, entre
alunos de qualquer procedência.

Ora, essa evidência aponta claramente para a necessidade de a escola reconhecer a


legitimidade da variedade vernacular, a ponto de trabalhar com ela em sala de aula,
mostrando-se não propriamente compassiva, mas detentora do conhecimento de que ela
vale para seus fins, tanto qua nto a variedade prestigiada vale para outros diferentes fins.
Enquanto a escola insistir em negar o caráter sócio-histórico- funcional dessa variedade,
ela permanecerá na perplexidade, ao se defrontar com resultados cada vez mais pobres
do ponto de vista do desenvolvimento, nos alunos, da competência de uso da língua
culta53. Isso porque, ao invés de aproximar, ela os distancia da crença de que são
capazes de adquirir a competência de uso dessa variedade, ainda que mais prestigiada e
diferente da que utilizam.

Lembramos aqui o que afirmam Leite e Callou (2004, p. 16): “Cumpriria, a


uma educação realmente democrática e igualitária, reconhecer a diversidade e com ela
trabalhar, no sentido de possibilitar a todos os usuários da língua o acesso às normas
prestigiadas e às mesmas oportunidades.” A posição ocupada pelos alunos da Escola
Estadual “Fernando Lobo” pode servir para demonstração de quanto é benéfica, como
ponto de partida, a convivência com todas as variedades. À escola competiria levar os
alunos à reflexão sobre a realidade e a legitimidade da heterogeneidade lingüística.

Futuras investigações devem continuar nesse sentido, chamando a atenção para a


necessidade de se levar em conta o componente avaliativo dentro das relações entre

53
O jornal Folha São Paulo, de 08 de fevereiro de 2007, mostra, em sua primeira página, um quadro de
perplexidade: “[...] os mais baixos índices de rendimento entre os alunos do ensino médio e da 8ª série do
ensino fundamental desde a primeira aplicação das provas, em 1995.” Por sua vez, o jornal Tribuna de
Minas, de Juiz de Fora, em sua edição de 07 de fevereiro de 2007, também em sua primeira página,
anuncia: “Uma nova face do fracasso escolar na rede pública de Juiz de Fora vem à tona. Desta vez, os
dados remetem ao resultado do concurso realizado pelo Colégio Técnico Universitário (CTU) para
candidatos à primeira série do ensino médio. Dos 1.622 estudantes da oitava série do ensino fundamental
que participaram da seleção, 76% deles provenientes de escolas municipais e estaduais, somente 147
alcançaram a pontuação mínima nas provas. No total, 90,94% não conseguiram acertar nem a metade das
provas de português, matemática, história, geografia, biologia, química e física. A coordenação do exame
revela que o mau resultado se repete ao longo dos anos. ”
131

falantes, notadamente nas relações escolares, já que ali pode ser o lugar, por excelência,
da construção de crenças relativas ao trabalho escolar com a língua materna. Apesar do
muito que a Sociolingüística tem operado no sentido de descontruir preconceitos na área
da lingua gem, creio que muito deve ser feito ainda no sentido de fazer chegar à escola e
às relações professor/aluno esses resultados expressivos.

Uma sugestão para futuras investigações seria ampliar a aplicação desse teste de
atitudes em alunos de escolas particulares, já que, no presente estudo, a participação
deles serviu apenas como referencial de contraponto para o universo dos alunos das
escolas públicas. Como sabemos que as diferenças sócio-econômicas existem também
entre alunos daquelas escolas e entre escolas, uma investigação, nesse universo, poderia
confirmar as evidências aqui encontradas ou apontar outras ainda desconhecidas.
132

7. REFERÊNCIAS

ALKMIM, Tânia. Sociolingüística. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C. (Org.).


Introdução à lingüística; domínios e fronteiras. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2003. p. 21-
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dialeto não-padrão. 1989. 153 f. Dissertação (Mestrado em Lingüística)_UNB, Brasília,
1989.

BARBOSA, Gabriela de Campos. Atitudes lingüísticas e identidade na fronteira


Brasil-Colômbia. 2004. Dissertação (Mestrado em Lingüística)_Faculdade de
Letras/UFRJ, Rio de Janeiro, 2004.

BARCELOS, ANA Maria Ferreira; ABRAHÃO, Maria Helena Vieira. Crenças e


ensino de língua: foco no professor, no aluno e na formação de professores. Campinas:
Pontes, 2006a.
______. Cognição de professores e alunos: tendências recentes na pesquisa de crenças
sobre ensino e aprendizagem de línguas. In: ______; ABRAHÃO, M. H. V. (Org.).
Crenças e ensino de língua: foco no professor, no aluno e na formação de professores.
Campinas: Pontes, 2006b. p. 15-42.

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140

8. ANEXOS

ANEXO A - Convenções para transcrição de fala*

[. (ponto) + Maiúscula ] - Entonação descendente, pensamento (parcialmente) acabado.

[ , ] - Entonação descendente-ascendente; ascendente; fragmento de um pensamento (=


vem mais aí).

[?] – Entonação ascendente; perguntas bipolares.

[Pala:vra] - Alongamento do som que antecede os pois pontos.

[Pa-la- vra] - Pronúncia escandida, destacando as sílabas.

[=] - Continuação de um enunciado de um mesmo ou de outro falante, completando o


turno do primeiro, sem mudança de ritmo.

Sublinhado - Ênfase; ênfase contrastiva.

MAIÚSCULA - Ênfase maior.

Palavra-- - Interrupção abrupta; auto- interrupção.

^ palavra - onset, ou ataque alto de voz relativamente à norma do falante.

[...] - Pausa não marcada.

[pausa] - Pausa marcada.

[0.4] - Pausa medida em segundos e décimos de segundos.

(xxx) - Trecho impossível de se transcrever.

(palavra) - Incerteza na transcrição da palavra.

[INFORMAÇÃO NÃO-VERBAL OU SOBRE O CONTEXTO.

[Sobreposição de vozes.

[ = ] engatamento - Não há pausa entre uma fala e outra; idêntico ao uso para
enunciado de um mesmo falante sem mudança de ritmo.

-- > à esquerda do texto - Indica um ponto que será comentado no corpo do trabalho.

* Convenções sugeridas pela Prof.ª Drª Lucia Quental, baseadas nas de Tannen (1993) e Shiffrin
(1987), das quais extraí algumas, conforme pertinente.
141

ANEXO B - Teste de crenças

QUESTIONÁRIO I

DADOS PESSOAIS
Sexo: Masculino Feminino Idade ______anos
_________________________________________________________________
Você encontra, abaixo, algumas afirmações sobre a língua portuguesa.
Diga se cada uma delas é verdadeira (V) ou falsa (F)

V F

1. A língua ESCRITA é mais correta do que a FALADA.


2. Eu FALO bem.

3. Eu ESCREVO bem.

4. Para saber ESCREVER bem, basta conhecer as regras de ortografia.

5. Os adultos FALAM melhor que os jovens.

6. Para ESCREVER bem, é preciso ler muito.

7. Para ESCREVER direito, deve-se melhorar o jeito de FALAR.


8.O bom professor de Português FALA sempre de acordo com as regras de
gramática.
9. A linguagem dos livros é sempre melhor e mais bonita do que o meu modo de
FALAR.
10. Para aprender a ESCREVER, o aluno deve aprender a FALAR como seu
professor de Português.
142

11. A escola deve corrigir a FALA dos alunos.

12. As pessoas analfabetas FALAM errado.

13. Para ESCREVER direito deve-se aprender gramática.

14. A língua ESCRITA é mais importante do que a FALADA.


15. Saber FALAR bem é tão importante quanto saber ESCREVER bem.

17. O meu jeito de falar é igual ao das pessoas com quem convivo no lugar
onde moro, por isso eu tenho orgulho do meu jeito de FALAR.
18. A língua ESCRITA é mais complicada que a língua FALADA.

19. Só a escola ensina a ESCREVER bem.


V

20. Em qualquer situação da vida, posso FALAR do mesmo jeito.

21. Quem já aprendeu a ler, já pode ESCREVER qualquer tipo de texto.

24. O jeito de FALAR em Minas Gerais é bonito.

25. Há outras FALAS mais bonitas que a de Minas Gerais, exemplo, a de


__________
143

ANEXO C

Dados pessoais dos professores e dos formandos de Letras (Questionário I)

DADOS PESSOAIS (Apenas para fins estatísticos)

1. Sexo : ( ) Feminino ( ) Masculino


2. Local de trabalho:
( ) Escola Pública
( ) Escola particular
3. Curso de habilitação profissional:
( ) Curso de Letras completo
( ) Curso de Letras incompleto
( ) Pós-graduação (Mestrado, Doutorado)
( ) Pós-graduação (Especialização na área de linguagem)
4. Tempo de formado
( ) recém- formado
( ) entre 1 e 5 anos
( ) mais de 5 anos
5. Há quanto tempo leciona : ____ anos
6. Na sua formação, o estudo de Sociolingüística pode ser considerado:
( ) excelente ( ) bom
( ) razoável ( ) fraco
( ) não fiz estudos de Sociolingüística
7. Características sociais dos alunos na escola onde você trabalha:
( ) predominantemente de classe média
( ) predominantemente de classe sócio-econômica baixa
( ) um misto de classe sócio-econômica média e baixa
144

ANEXO D - Teste de atitudes

QUESTIONÁRIO II

Quando ouvimos a voz de uma pessoa, sem vê-la, formamos impressões sobre ela. É o
que provavelmente acontecerá com você quando ouvir os trechos gravados que lhe
serão apresentados agora. São seis gravações, cada uma delas trazendo a voz de pessoas
diferentes. Depois de ouvir cada um desses pequenos trechos, indique a impressão que
lhe causou, a partir das questões abaixo.
A sua resposta deve ser dada da seguinte maneira: atribua uma nota variando de 7 a 1,
em relação às qualidades expressas pelos adjetivos que estão relacionados. Você tem
seis adjetivos, cada um deles seguido de sete traços. Cada traço corresponde a uma nota.
Quanto mais próxima do adjetivo, maior será a nota. Assim, se você atribuir a um dos
falantes a nota mais alta (7), em relação ao adjetivo inteligente, você deve colocá- la no
traço próximo a esse adjetivo; se você atribuir a nota imediatamente inferior (6), deve
colocá- la no segundo traço, e assim sucessivamente, até a menor (1), que deverá ser
colocada, se for o caso, no último traço. Isso em relação a cada um dos adjetivos.
Você vai ouvir uma gravação de cada vez. Depois de cada uma delas, vamos lhe dar um
tempo para você colocar as notas nos traços. Só então ouvirá a gravação seguinte para
atribuir as notas, e assim sucessivamente.

FALANTE I (II, III)

Inteligente _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Honesto _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Competente _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Simpático _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Rico _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Boa pessoa _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____


145

FALANTE II

Inteligente _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Honesto _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Competente _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Simpático _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Rico _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Boa pessoa _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

FALANTE III

Inteligente _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Honesto _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Competente _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Simpático _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Rico _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____

Boa pessoa _____: _____: ____: ____: ____: ____: ____


146

ANEXO E - Gráficos 1 a 21 (Notas e médias dos falantes I, II e III)

Falante I – Mara (Variedade urbana)

7
5,2 6,0 5,7 5,7
6
4,8
5
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 1: Inteligente – Falante I (Mara – Variedade urbana)

7
5,6 5,7 5,9
6 5,5
5,2
5
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 2: Honesto – Falante I (Mara -Variedade urbana)

7
5,6 5,4
6
4,9 4,9
5 4,4
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 3: Competente – Falante I (Mara – Variedade urbana)


147

7
5,8 5,7
6 5,1 5,3 5,2
5
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. E.M. E.M. Profª
Redentor Aplicação Fernando Quilombo dos Helena
João XXIII Lobo Palmares Antipoff

Gráfico 4: Simpático – Falante I (Mara – Variedade urbana)

7
6 5,1
4,5 4,8
5 4,2
3,7
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 5: Rico – Falante I (Mara – Variedade urbana)

7
5,7 6,0 5,7
6 5,5 5,4
5
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 6: Boa pessoa – Falante I (Mara – Variedade urbana)


148

Média do Falante I

7
5,6 5,3 5,5
6 5,1 4,8
5
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo Quilombo dos Helena
João XXIII Palmares Antipoff

Gráfico 7 – Média do falante I (Mara – Variedade urbana)

Falante I I – Dª Mercedes (Variedade rural)

7
6
5
3,9
3,7
4 3,1
2,6 2,8
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 8: Inteligente – Falante II (Dª Mercedes - (Variedade rural)

7
5,8 6,1
6 5,4 5,5
5,0
5
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 9: Honesto – Falante II (Dª Mercedes - Variedade rural)


149

7
6
4,8 4,5 4,8
5
4,0
4 3,6

3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 10: Competente – Falante II (Dª Mercedes –Var. rural)

7
6 5,3 5,5
4,8 4,9
5
3,8
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico ll: Simpático – Falante II (Dª Mercedes (Var. rural)

7
6
5
4
3 2,6 2,4 2,6
2,1
1,7
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 12: Rico – Falante II (Dª Mercedes (Var. rural)


150

7
6,1
6 5,7 5,8
5,1 5,3
5

0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo Quilombo dos Helena
João XXIII Palmares Antipoff

Gráfico 13: Boa pessoa – Falante II (Dª Mercedes – Var. rural)

7
6
5 4,5 4,7 4,6
4,1
4 3,7

3
2
1
0
Colégio Colégio de E.E. E.M. E.M. Profª
Cristo Aplicação Fernando Quilombo Helena
Redentor João XXIII Lobo dos Antipoff
Palmares

Gráfico 14 – Média do Falante II – Dª Mercedes (Var. rural)


151

Falante I I I – Telma (Variedade rurbana)

6
4,7
5 4,2 4,2 4,4
4,0
4

0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 15: Inteligente - Falante III (Telma –Var. rurbana)

Honesto - Falante III

7
6 5,4 5,5
4,9 5,1
4,7
5
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo Quilombo dos Helena
João XXIII Palmares Antipoff

Gráfico 16: Honesto – Falante III (Telma – Var. rurbana )

7
6
5 4,4 4,5 4,7
4,0 3,9
4
3
2

1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação João Lobo dos Palmares Helena Antipoff
XXIII

Gráfico 17 – Competente – Falante III (Telma – Var. rurbana)


152

7
6
5,0 5,1
5 4,4 4,6
4,4
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 18: Simpático – Falante III (Telma – Var. rurbana )

4 3,5 3,4 3,5 3,3


3,0
3

0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 19: Rico – Falante III (Telma – Var. rurbana)

5,6 5,7 5,7


6
5,2 5,1
5

0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. Quilombo E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo dos Palmares Helena
João XXIII Antipoff

Gráfico 20 – Boa pessoa – Falante III (Var. rurbana)


153

7
6
4,5 4,7 4,7 4,5
5 4,3
4
3
2
1
0
Colégio Cristo Colégio de E.E. Fernando E.M. E.M. Profª
Redentor Aplicação Lobo Quilombo dos Helena
João XXIII Palmares Antipoff

Gráfico 21 – Média do Falante III – (Telma – Var. rurbana


154

ANEXO F – Tabelas 1 a 25 (Associação entre escolaridade e avaliação das assertivas)

Tabela 1- Crosstabs

Escolaridade * A língua escrita é mais correta que a falada.


Crosstab

A língua escrita é mais


correta que a falada.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 30 91 121
% within Escolaridade 24,8% 75,2% 100,0%
Aluno de Letras Count 30 3 33
% within Escolaridade 90,9% 9,1% 100,0%
Professor(a) Count 20 2 22
% within Escolaridade 90,9% 9,1% 100,0%
Total Count 80 96 176
% within Escolaridade 45,5% 54,5% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 66,667a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 73,488 2 ,000
Linear-by-Linear Association 56,266 1 ,000
N of Valid Cases 176
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 10,00.
155

Tabela 2

Escolaridade * Eu falo bem


Crosstab

Eu falo bem
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 49 71 120
% within Escolaridade 40,8% 59,2% 100,0%
Aluno de Letras Count 9 24 33
% within Escolaridade 27,3% 72,7% 100,0%
Professor(a) Count 22 22
% within Escolaridade 100,0% 100,0%
Total Count 58 117 175
% within Escolaridade 33,1% 66,9% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 14,622a 2 ,001
Continuity Correction
Likelihood Ratio 21,343 2 ,000
Linear-by-Linear Association 14,056 1 ,000
N of Valid Cases 175
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 7,29.
156

Tabela 3

Escolaridade * Eu escrevo bem


Crosstab

Eu escrevo bem
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 40 80 120
% within Escolaridade 33,3% 66,7% 100,0%
Aluno de Letras Count 8 25 33
% within Escolaridade 24,2% 75,8% 100,0%
Professor(a) Count 22 22
% within Escolaridade 100,0% 100,0%
Total Count 48 127 175
% within Escolaridade 27,4% 72,6% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 10,585a 2 ,005
Continuity Correction
Likelihood Ratio 16,298 2 ,000
Linear-by-Linear Association 9,869 1 ,002
N of Valid Cases 175
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 6,03.
157

Tabela 4

Escolaridade * Para saber escrever bem basta conhecer as regras


de ortografia.
Crosstab

Para saber escrever bem


basta conhecer as regras de
ortografia.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 67 51 118
% within Escolaridade 56,8% 43,2% 100,0%
Aluno de Letras Count 33 33
% within Escolaridade 100,0% 100,0%
Professor(a) Count 21 1 22
% within Escolaridade 95,5% 4,5% 100,0%
Total Count 121 52 173
% within Escolaridade 69,9% 30,1% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 30,718a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 41,986 2 ,000
Linear-by-Linear Association 24,379 1 ,000
N of Valid Cases 173
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 6,61.
158

Tabela 5

Escolaridade * Os adultos falam melhor que os jovens.


Crosstab

Os adultos falam melhor


que os jovens.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 74 46 120
% within Escolaridade 61,7% 38,3% 100,0%
Aluno de Letras Count 30 3 33
% within Escolaridade 90,9% 9,1% 100,0%
Professor(a) Count 20 1 21
% within Escolaridade 95,2% 4,8% 100,0%
Total Count 124 50 174
% within Escolaridade 71,3% 28,7% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 17,511a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 20,811 2 ,000
Linear-by-Linear Association 15,709 1 ,000
N of Valid Cases 174
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 6,03.
159

Tabela 6

Escolaridade * Para escrever bem é preciso ler muito.


Crosstab

Para escrever bem é


preciso ler muito.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 18 103 121
% within Escolaridade 14,9% 85,1% 100,0%
Aluno de Letras Count 12 20 32
% within Escolaridade 37,5% 62,5% 100,0%
Professor(a) Count 3 19 22
% within Escolaridade 13,6% 86,4% 100,0%
Total Count 33 142 175
% within Escolaridade 18,9% 81,1% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 8,914a 2 ,012
Continuity Correction
Likelihood Ratio 7,811 2 ,020
Linear-by-Linear Association 1,005 1 ,316
N of Valid Cases 175
a. 1 cells (16,7%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 4,15.
160

Tabela 7

Escolaridade * Para escrever direito devo melhorar o jeito de


falar.
Crosstab

Para escrever direito deve


melhorar o jeito de falar.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 40 78 118
% within Escolaridade 33,9% 66,1% 100,0%
Aluno de Letras Count 29 4 33
% within Escolaridade 87,9% 12,1% 100,0%
Professor(a) Count 12 9 21
% within Escolaridade 57,1% 42,9% 100,0%
Total Count 81 91 172
% within Escolaridade 47,1% 52,9% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 31,129a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 33,678 2 ,000
Linear-by-Linear Association 14,797 1 ,000
N of Valid Cases 172
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 9,89.
161

Tabela 8

Escolaridade * O bom professor de português fala sempre de


acordo com as regras da gramática.
Crosstab

O bem professor de
português fala sempre de
acordo com as regras da
gramática.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 35 86 121
% within Escolaridade 28,9% 71,1% 100,0%
Aluno de Letras Count 32 1 33
% within Escolaridade 97,0% 3,0% 100,0%
Professor(a) Count 16 5 21
% within Escolaridade 76,2% 23,8% 100,0%
Total Count 83 92 175
% within Escolaridade 47,4% 52,6% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 56,064a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 64,564 2 ,000
Linear-by-Linear Association 37,979 1 ,000
N of Valid Cases 175
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 9,96.
162

Tabela 9

Escolaridade * A linguagem dos livros é sempre melhor e mais


bonita do que meu modo de falar.
Crosstab

A linguagem dos livros é


sempre melhor e mais
bonita do que meu modo
de falar.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 50 70 120
% within Escolaridade 41,7% 58,3% 100,0%
Aluno de Letras Count 29 4 33
% within Escolaridade 87,9% 12,1% 100,0%
Professor(a) Count 18 4 22
% within Escolaridade 81,8% 18,2% 100,0%
Total Count 97 78 175
% within Escolaridade 55,4% 44,6% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 29,466a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 32,290 2 ,000
Linear-by-Linear Association 23,014 1 ,000
N of Valid Cases 175
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 9,81.
163

Tabela 10

Escolaridade * Para aprender a escrever, o aluno deve aprender a


falar como o seu professor de português.
Crosstab

Para apredender a escrever,


o aluno deve aprender a
falar como o seu professor
de português.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 88 30 118
% within Escolaridade 74,6% 25,4% 100,0%
Aluno de Letras Count 32 1 33
% within Escolaridade 97,0% 3,0% 100,0%
Professor(a) Count 19 2 21
% within Escolaridade 90,5% 9,5% 100,0%
Total Count 139 33 172
% within Escolaridade 80,8% 19,2% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 9,781a 2 ,008
Continuity Correction
Likelihood Ratio 12,215 2 ,002
Linear-by-Linear Association 6,706 1 ,010
N of Valid Cases 172
a. 1 cells (16,7%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 4,03.
164

Tabela 11

Escolaridade * A escola deve corrigir a fala dos alunos.


Crosstab

A escola deve corrigir a fala


dos alunos.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 45 76 121
% within Escolaridade 37,2% 62,8% 100,0%
Aluno de Letras Count 19 13 32
% within Escolaridade 59,4% 40,6% 100,0%
Professor(a) Count 13 8 21
% within Escolaridade 61,9% 38,1% 100,0%
Total Count 77 97 174
% within Escolaridade 44,3% 55,7% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 8,065a 2 ,018
Continuity Correction
Likelihood Ratio 8,061 2 ,018
Linear-by-Linear Association 7,158 1 ,007
N of Valid Cases 174
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 9,29.
165

Tabela 12

Escolaridade * As pessoas analfabetas falam errado.


Crosstab

As pessoas analfabetas
falam errado.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 47 72 119
% within Escolaridade 39,5% 60,5% 100,0%
Aluno de Letras Count 33 33
% within Escolaridade 100,0% 100,0%
Professor(a) Count 19 3 22
% within Escolaridade 86,4% 13,6% 100,0%
Total Count 99 75 174
% within Escolaridade 56,9% 43,1% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 47,481a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 60,691 2 ,000
Linear-by-Linear Association 34,479 1 ,000
N of Valid Cases 174
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 9,48.
166

Tabela 13

Escolaridade * Para escrever direito deve-se aprender gramática.


Crosstab

Para escrever direito


deve-se aprender
gramática.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 29 90 119
% within Escolaridade 24,4% 75,6% 100,0%
Aluno de Letras Count 22 9 31
% within Escolaridade 71,0% 29,0% 100,0%
Professor(a) Count 13 9 22
% within Escolaridade 59,1% 40,9% 100,0%
Total Count 64 108 172
% within Escolaridade 37,2% 62,8% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 28,026a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 27,780 2 ,000
Linear-by-Linear Association 19,908 1 ,000
N of Valid Cases 172
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 8,19.
167

Tabela 14

Escolaridade * A língua escrita é mais importante que a falada.


Crosstab

A língua escrita é mais


importante que a falada.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 84 35 119
% within Escolaridade 70,6% 29,4% 100,0%
Aluno de Letras Count 30 3 33
% within Escolaridade 90,9% 9,1% 100,0%
Professor(a) Count 20 1 21
% within Escolaridade 95,2% 4,8% 100,0%
Total Count 134 39 173
% within Escolaridade 77,5% 22,5% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 10,438a 2 ,005
Continuity Correction
Likelihood Ratio 12,334 2 ,002
Linear-by-Linear Association 9,556 1 ,002
N of Valid Cases 173
a. 1 cells (16,7%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 4,73.
168

Tabela 15

Escolaridade * Saber falar bem é tão importante quanto saber


escrever bem.
Crosstab

Saber falar bem é tão


importante quanto saber
escrever bem.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 15 103 118
% within Escolaridade 12,7% 87,3% 100,0%
Aluno de Letras Count 12 20 32
% within Escolaridade 37,5% 62,5% 100,0%
Professor(a) Count 1 20 21
% within Escolaridade 4,8% 95,2% 100,0%
Total Count 28 143 171
% within Escolaridade 16,4% 83,6% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 13,654a 2 ,001
Continuity Correction
Likelihood Ratio 12,205 2 ,002
Linear-by-Linear Association ,307 1 ,580
N of Valid Cases 171
a. 1 cells (16,7%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 3,44.
169

Tabela 16

Escolaridade * Eu gosto de falar do mesmo jeito da minha família


e dos meus amigos.
Crosstab

Eu gosto de falar do
mesmo jeito da minha
família e dos meus amigos.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 65 56 121
% within Escolaridade 53,7% 46,3% 100,0%
Aluno de Letras Count 7 25 32
% within Escolaridade 21,9% 78,1% 100,0%
Professor(a) Count 12 10 22
% within Escolaridade 54,5% 45,5% 100,0%
Total Count 84 91 175
% within Escolaridade 48,0% 52,0% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 10,713a 2 ,005
Continuity Correction
Likelihood Ratio 11,313 2 ,003
Linear-by-Linear Association 1,375 1 ,241
N of Valid Cases 175
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 10,56.
170

Tabela 17

Escolaridade * O meu jeito de falar é igual ao das pessoas com


quem convivo no lugar onde moro, por isso eu tenho orgulho do
meu jeito de falar.
Crosstab

O meu jeito de falar é igual


ao das pessoas com quem
convivo no lugar onde
moro, por isso eu tenho
orgulho do meu jeito de
falar.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 54 67 121
% within Escolaridade 44,6% 55,4% 100,0%
Aluno de Letras Count 11 21 32
% within Escolaridade 34,4% 65,6% 100,0%
Professor(a) Count 11 11 22
% within Escolaridade 50,0% 50,0% 100,0%
Total Count 76 99 175
% within Escolaridade 43,4% 56,6% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 1,525a 2 ,466
Continuity Correction
Likelihood Ratio 1,546 2 ,462
Linear-by-Linear Association ,000 1 ,999
N of Valid Cases 175
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 9,55.
171

Tabela 18

Escolaridade * A língua escrita é mais complicada do que a


língua falada.
Crosstab

A língua escrita é mais


complicada do que a língua
falada.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 30 90 120
% within Escolaridade 25,0% 75,0% 100,0%
Aluno de Letras Count 20 13 33
% within Escolaridade 60,6% 39,4% 100,0%
Professor(a) Count 10 12 22
% within Escolaridade 45,5% 54,5% 100,0%
Total Count 60 115 175
% within Escolaridade 34,3% 65,7% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 15,957a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 15,491 2 ,000
Linear-by-Linear Association 9,369 1 ,002
N of Valid Cases 175
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 7,54.
172

Tabela 19

Escolaridade * Só a escola ensina a escrever bem.


Crosstab

Só a escola ensina a
escrever bem.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 87 33 120
% within Escolaridade 72,5% 27,5% 100,0%
Aluno de Letras Count 31 2 33
% within Escolaridade 93,9% 6,1% 100,0%
Professor(a) Count 20 2 22
% within Escolaridade 90,9% 9,1% 100,0%
Total Count 138 37 175
% within Escolaridade 78,9% 21,1% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 9,328a 2 ,009
Continuity Correction
Likelihood Ratio 10,891 2 ,004
Linear-by-Linear Association 7,234 1 ,007
N of Valid Cases 175
a. 1 cells (16,7%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 4,65.
173

Tabela 20

Escolaridade * Em qualquer situação da vida posso falar do


mesmo jeito.
Crosstab

Em qualquer situação da
vida posso falar do mesmo
jeito.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 105 14 119
% within Escolaridade 88,2% 11,8% 100,0%
Aluno de Letras Count 33 33
% within Escolaridade 100,0% 100,0%
Professor(a) Count 22 22
% within Escolaridade 100,0% 100,0%
Total Count 160 14 174
% within Escolaridade 92,0% 8,0% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 7,037a 2 ,030
Continuity Correction
Likelihood Ratio 11,196 2 ,004
Linear-by-Linear Association 5,934 1 ,015
N of Valid Cases 174
a. 2 cells (33,3%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 1,77.
174

Tabela 21

Escolaridade * Quem já aprendeu a ler, já pode escrever qualquer


tipo de texto.
Crosstab

Quem já aprendeu a ler, já


pode escrever qualquer
tipo de texto.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 97 24 121
% within Escolaridade 80,2% 19,8% 100,0%
Aluno de Letras Count 33 33
% within Escolaridade 100,0% 100,0%
Professor(a) Count 22 22
% within Escolaridade 100,0% 100,0%
Total Count 152 24 176
% within Escolaridade 86,4% 13,6% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 12,632a 2 ,002
Continuity Correction
Likelihood Ratio 19,663 2 ,000
Linear-by-Linear Association 10,661 1 ,001
N of Valid Cases 176
a. 2 cells (33,3%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 3,00.
175

Tabela 22

Escolaridade * Só há um modo de falar corretamente: aprender o


que a escola ensina.
Crosstab

Só há um modo de falar
corretamente: aprender o
que a escola ensina.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 79 41 120
% within Escolaridade 65,8% 34,2% 100,0%
Aluno de Letras Count 32 1 33
% within Escolaridade 97,0% 3,0% 100,0%
Professor(a) Count 21 1 22
% within Escolaridade 95,5% 4,5% 100,0%
Total Count 132 43 175
% within Escolaridade 75,4% 24,6% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 18,983a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 23,941 2 ,000
Linear-by-Linear Association 15,607 1 ,000
N of Valid Cases 175
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 5,41.
176

Tabela 23

Escolaridade * Eu devo escrever do mesmo jeito que falo.


Crosstab

Eu devo escrever do
mesmo jeito que falo.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 107 13 120
% within Escolaridade 89,2% 10,8% 100,0%
Aluno de Letras Count 33 33
% within Escolaridade 100,0% 100,0%
Professor(a) Count 21 21
% within Escolaridade 100,0% 100,0%
Total Count 161 13 174
% within Escolaridade 92,5% 7,5% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 6,322a 2 ,042
Continuity Correction
Likelihood Ratio 10,126 2 ,006
Linear-by-Linear Association 5,333 1 ,021
N of Valid Cases 174
a. 2 cells (33,3%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 1,57.
177

Tabela 24

Escolaridade * O jeito de falar em Minas é bonito.


Crosstab

O jeito de falar em minas é


bonito.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 37 81 118
% within Escolaridade 31,4% 68,6% 100,0%
Aluno de Letras Count 16 16 32
% within Escolaridade 50,0% 50,0% 100,0%
Professor(a) Count 7 14 21
% within Escolaridade 33,3% 66,7% 100,0%
Total Count 60 111 171
% within Escolaridade 35,1% 64,9% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 3,874a 2 ,144
Continuity Correction
Likelihood Ratio 3,744 2 ,154
Linear-by-Linear Association ,846 1 ,358
N of Valid Cases 171
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 7,37.
178

Tabela 25

Escolaridade * Há outras falas mais bonitas que a de Minas.


Exemplo a de ____________.
Crosstab

Há outras falas mais


bonitas que a de Minas.
falso verdadeiro Total
Escolaridade Ensino básico Count 36 81 117
% within Escolaridade 30,8% 69,2% 100,0%
Aluno de Letras Count 24 1 25
% within Escolaridade 96,0% 4,0% 100,0%
Professor(a) Count 16 1 17
% within Escolaridade 94,1% 5,9% 100,0%
Total Count 76 83 159
% within Escolaridade 47,8% 52,2% 100,0%

Chi-Square Tests

Asymp. Sig.
Value df (2-sided)
Pearson Chi-Square 51,495a 2 ,000
Continuity Correction
Likelihood Ratio 59,674 2 ,000
Linear-by-Linear Association 43,281 1 ,000
N of Valid Cases 159
a. 0 cells (,0%) have expected count less than 5. The minimum
expected count is 8,13.
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