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O raciocínio jurídico entre princípios e

regras

Felipe Oliveira de Sousa

Sumário
Introdução. 1. Entre princípios e regras: te-
ses e argumentos acerca de uma distinção. 1.1.
A distinção “forte” entre princípios e regras;
1.1.1. Ronald Dworkin e a distinção entre regras
e princípios. 1.1.2. Robert Alexy e a distinção
entre regras como mandamentos definitivos e
princípios como mandamentos de otimização.
2. Respostas a duas críticas à distinção “forte”.

Introdução
O conceito de norma jurídica e a distin-
ção entre duas de suas espécies (regras e
princípios), ainda que não seja um assunto
recente, ganhou muita força na discussão
contemporânea em teoria do direito, so-
bretudo com as obras de Ronald Dworkin
(2002) e Robert Alexy (1985). Os critérios
que são usados para elaborar a distinção
entre princípios e regras mostram-se muito
diversos, e, às vezes, até inconciliáveis entre
si. Não há um consenso, por exemplo, se
entre princípios e regras (i) há uma relação
de cogeneralidade, caso em que princípios
e regras seriam dois gêneros autônomos
de categorias normativas, ou (ii) há uma
relação de especialidade, caso em que
princípios e regras seriam duas espécies
de uma mesma categoria conceitual desig-
Felipe Oliveira de Sousa é Bacharel em Di- nada, genericamente, com o termo “norma
reito pela UFC. Mestre em Direito pela UFRGS. jurídica”, ou (iii) há uma relação não entre
Bolsista da CAPES. Doutorando em Direito pela dois tipos conceituais claramente definidos,
Universidade de Edimburgo (Reino Unido). mas, sim, uma relação entre dois modos

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distintos de aplicar enunciados normativos A primeira tem como representantes cen-
a casos concretos. Além disso, há diver- trais Dworkin e Alexy2. As duas últimas,
gências consideráveis dentro de cada uma geralmente, surgem na forma de críticas às
dessas hipóteses. Se se toma, por exemplo, a posições sustentadas por esses dois autores.
distinção como sendo de especialidade, res- Essa é a razão pela qual faço, em primei-
ta uma importante questão: que critério(s) ro lugar, uma breve análise da distinção
adotar para definir tal distinção? A doutri- “forte”, tal como proposta por Dworkin e
na aponta para critérios bastante diversos, Alexy, e, em segundo lugar, exponho algu-
como a fundamentalidade, a generalidade mas das críticas que foram colocadas contra
e a estrutura lógica1. Apesar disso, vem-se essa distinção “forte” e em favor de uma
tornando bastante pacífico na doutrina que distinção “fraca”, ou até mesmo em favor
a distinção entre princípios e regras é uma da impossibilidade de delinear qualquer
distinção entre dois tipos normativos, o que distinção entre princípios e regras.
não reduz as controvérsias entre os juristas.
E isso se deve ao fato de que os referidos 1. Entre princípios e regras: argumentos e
critérios podem ou não ser compatíveis teses acerca de uma distinção
entre si, a depender da maneira como sejam
interpretados. 1.1. A distinção “forte” entre
Cabe advertir que podem ser articula- princípios e regras
das diferentes formas coerentes da distin-
A tese “forte” da distinção entre princí-
ção em quaisquer das hipóteses acima, mo-
pios e regras é defendida, sobretudo, por
tivo pelo qual não se deve ir de encontro a
Dworkin e Alexy. É a tese que defende que
isso. O que se deve destacar, para fins deste
há uma diferença de caráter lógico entre
estudo, é que o(s) critério(s) aqui usado(s)
princípios e regras. Essa não é a tese mais
para compor a distinção entre princípios e
difundida na doutrina brasileira, que, em
regras deve(m) ser justificado(s) pela sua
geral, tem-se ocupado em defender uma
utilidade prática, ou seja, pela utilidade
tese que se pode denominar “fraca” da
que teria(m) para a reconstrução de certos
distinção entre princípios e regras, pois
fenômenos observados na prática.
advoga uma distinção de grau, seja de grau
Partindo desse ponto de vista funcio-
de fundamentalidade, de abstração ou de
nal, é possível identificar na doutrina pelo
generalidade3. O objetivo desta seção do
menos duas ou três posições acerca da
texto é expor os argumentos propostos por
distinção princípio/regra, uma que traça
Dworkin em favor da tese “forte” da distin-
uma distinção “forte”, outra que traça uma
distinção “fraca”, e, ainda, outra que rejeita 2
É importante mencionar a contribuição que, na
por completo a possibilidade de distinção. doutrina espanhola, Manuel Atienza e Juan R. Manero
deram para a distinção “forte” entre princípios e re-
1
Como exemplo da variedade de critérios que se gras. Adoto, neste estudo, uma das críticas que esses
adotam na doutrina para definir a distinção princípio/ autores formularam à tese de Alexy dos princípios
regra, vale a pena conferir as catalogações elaboradas como mandamentos de otimização. Para conferir na
por Carrió e por Guastini sobre os diversos usos do íntegra, veja: ATIENZA; MANERO (2004, p. 23-68).
termo “princípio”. É importante inclusive ressaltar
3
O maior representante dessa corrente no Brasil é
que as primeiras distinções apontavam para uma Humberto Bergmann Ávila. Seus argumentos apon-
distinção entre princípios e normas (como a de Josef tam para uma distinção entre princípios e regras feita a
Esser, 1956), e não para uma distinção entre duas partir de vários critérios conjugados. É uma distinção,
espécies de normas. Não me ocupo aqui dessa análise, portanto, complexa. Confira: ÁVILA (2007, p. 30-).
porque vai além dos limites propostos a este texto. Para uma crítica das visões de Ávila, confira: SILVA
É suficiente notar a ampla aceitação doutrinária da (2003). Há um texto meu, ainda não publicado, em que
distinção entre princípios e regras como uma distinção busco avançar noutros pontos de crítica à proposta de
entre duas espécies de normas. Para aprofundamento, Ávila: A proprorcionalidade na argumentação jurídica...
veja: CARRIÓ, (1990); GUASTINI, (2005). (texto inédito).

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ção, e dar conta dos avanços e das correções são completamente discricionária, pois tem o
que foram conferidos a tais argumentos na dever de tomar tal decisão a partir da aplicação
teoria de Alexy. Como se verá, tanto na obra rigorosa dos princípios jurídicos.
de Dworkin, como na de Alexy, a distinção Dworkin identifica dois critérios para
entre princípios e regras surge como uma distinguir os princípios das regras 6. O
tentativa de explicar a estrutura das normas primeiro deles é o de que as regras se dife-
de direito fundamental. renciam dos princípios a partir de um ponto
de vista lógico, em razão do tipo de solução
1.1.1. Ronald Dworkin e a distinção que oferecem. As regras operam de maneira
entre regras e princípios tudo-ou-nada (“all-or-nothing-fashion”), ou, o
Dworkin elaborou sua distinção como que é dizer o mesmo, as regras operam na
uma das bases teóricas para fazer um “ata- dimensão da validade. Se ocorre o suposto
que geral ao positivismo” (general attack on de fato7 comandado, proibido ou permitido
positivism), sobretudo à versão proposta por por uma regra, então ou (i) a regra é válida,
seu antecessor em Oxford, Herbert Hart. De e então as suas consequências jurídicas são
acordo com Dworkin, o positivismo fornece obrigatórias, ou (ii) a regra não é válida, e
um modelo de sistema jurídico constituído então ela não deve ser aplicada, isto é, e então
exclusivamente por regras, o que o torna as suas consequências jurídicas não contam
insuficiente para dar conta da solução dos em nada para a decisão. Em outras pala-
casos difíceis (hard cases), quando se usam vras, ou a regra é aplicada em sua inteireza
standards que operam e funcionam de manei- (por completo), ou ela deve ser por completo não
ra distinta das regras. Dworkin parte de aplicada (deve ser não aplicada em absoluto).
um problema concreto para refutar a teoria Os princípios, por sua vez, não possuem
positivista propugnada por Hart, que é o de a estrutura disjuntiva das regras, pois não
que o conceito positivista de aplicação do estabelecem claramente os supostos de
Direito seria criticável a partir da seguinte fato cuja ocorrência torna obrigatória a sua
situação: um juiz, quando não há uma regra aplicação, nem que consequências jurídicas
aplicável ao caso concreto, ou quando a devem surgir a partir de sua aplicação, ou
regra aplicável é indeterminada, deve tomar seja, os princípios não determinam por
uma decisão discricionária, ou seja, deve criar completo uma decisão, pois apenas servem
uma solução nova para o caso concreto4. de razões que contribuem a favor de uma
A tese que Dworkin propõe para refutar decisão ou outra.
essa situação é que um sistema jurídico é
constituído não somente por regras, como
6
Dworkin também identifica outros standards
além dos princípios e das regras e faz uma distinção
defende o positivismo de Hart5, mas tam- entre princípios e políticas (policies), por exemplo. Não
bém por princípios. Dessa forma, um juiz, é relevante traçar essa distinção aqui. Apenas cabe
quando se depara com a situação de não notar que uso o termo princípio em sentido amplo para
haver regra aplicável ao caso concreto ou designar tanto os princípios em sentido estrito, como
as políticas (policies). Veja: DWORKIN (2002, p. 22-).
de a regra aplicável estar indeterminada 7
Emprego a expressão “suposto de fato” como um
(casos difíceis), não deve tomar uma deci- termo genérico para indicar aquilo que uma regra co-
manda, proíbe ou permite. Numa visão mais rigorosa,
4
Dworkin (2002, p. 14-80) desenvolveu essas esse suposto de fato pode referir-se tanto a um “estado
ideias sobretudo em dois textos publicados em seu de coisas”, como à “performação de uma ação”, ou
Taking Rights Seriously. Em seqüência, são eles o The seja, uma regra pode comandar, proibir ou permitir
Model of Rules I e o The Model of Rules II, ambos de a criação, a modificação e a extinção de um certo estado
leitura obrigatória para quem se interesse em apro- de coisas, ou pode comandar, proibir ou permitir a
fundar no tema. performação de uma certa ação (ou omissão). Essa
5
Confira, para um contraponto com as teses de- distinção ainda poderia ser mais aprofundada, o que
fendidas por Dworkin, a resposta elaborada por Hart não é necessário aqui. Para uma visão detalhada do
no posfácio de seu The Concept of Law (1986, p. 299-). assunto, confira: WRIGHT (1963, p. 129-).

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O segundo critério, que segue até mes- listar todas as exceções que possam existir a
mo da distinção de caráter lógico acima uma regra8, essa objeção não procede. Ade-
disposta, é o de que os princípios possuem mais, o que importa notar é que a tese de
uma dimensão que as regras não possuem: que o conflito de regras possui uma estru-
a dimensão do peso (dimension of weight) tura completamente distinta da colisão de
(DWORKIN, 2002, P. 25-26). Esse critério princípios fornece um critério justificante
é definido pela importância ou pelo peso para manter a distinção.
relativo que um princípio tem em relação
a outro princípio quando os dois colidem 1.1.2. Robert Alexy e a distinção entre regras
em um caso concreto. Com efeito, quando como mandamentos definitivos e princípios
dois princípios colidem em um caso concre- como mandamentos de otimização
to, a decisão é tomada em virtude de um Alexy elabora com mais rigor a distin-
princípio (P1) ter, diante das circunstâncias ção proposta por Dworkin, e, com isso,
concretas, uma importância ou um peso confere-lhe uma maior precisão conceitual.
relativo maior do que o do outro princípio Parte de dois pressupostos básicos muito
colidente (P2), fato esse que não impede semelhantes aos de Dworkin: (i) o de que
que em uma decisão posterior, mudadas a distinção entre princípios e regras é uma
as circunstâncias concretas, essa situação distinção entre duas espécies do gênero
de prevalência se inverta, e o princípio P1 “norma” 9,10 e (ii) o de que a distinção
que, na primeira situação, tinha um peso tem um caráter qualitativo, e não de grau.
relativo maior, agora tenha um peso rela- A contribuição decisiva de Alexy foi ter
tivo menor do que P2. desenvolvido a tese dos princípios como
Essa situação fica ainda mais evidente, mandamentos11 de otimização.
de acordo com Dworkin (2002, p. 27-),
quando comparada com o conflito de 8
Se não é possível listar todas as exceções possíveis
a uma regra, é pelo menos possível saber que supos-
regras. É que, quando, por exemplo, uma tos de fato não valem como exceção (por exclusão).
regra comanda algo que uma outra regra Isso, por si só, já seria suficiente para comprovar o
proíbe sem que se tenha previsto nenhuma argumento de que não é necessário listar todas as
exceção em nenhuma delas, o conflito só exceções possíveis a uma regra para provar que uma
regra é aplicada de maneira tudo-ou-nada. Conforme
pode ser resolvido mediante declaração de o próprio Dworkin (2002, p. 25): “The rule might
invalidade de uma das regras, ou seja, por have exceptions, but if it does then it is inaccurate
meio da declaração de que uma das regras and incomplete to state the rule so simply, without
não mais pertence ao ordenamento jurídi- enumerating the exceptions. In theory, at least, the ex-
ceptions could all be listed, and the more of them that
co. No caso da colisão de princípios, essa are, the more complete is the statement of the rule”.
declaração de invalidade não ocorre, pois 9
Alexy desenvolve sua teoria dos princípios a partir
ambos os princípios colidentes permane- de um modelo conceitual semântico de norma. Ele parte
cem válidos, e, portanto, continuam ambos de uma distinção básica entre enunciado normativo e
norma propriamente dita. Uma norma, para Alexy, é o sig-
pertencendo ao ordenamento jurídico. O nificado de um enunciado normativo. Toda norma pode
que acontece é que, no caso concreto, um ser expressa por um enunciado normativo, através do uso
princípio cede em detrimento do outro. de expressões deônticas como “proibido”, “permitido”,
É preciso atentar que, quanto à maneira “comandado”. Para uma crítica ao conceito semântico
de norma de Alexy, veja: LA TORRE, (2007, p. 53-67).
tudo-ou-nada de aplicar as regras, há uma 10
Alexy (2002, p. 48) é taxativo ao afirmar que uma
objeção de que não se pode prever todas norma ou é uma regra ou é um princípio.
as exceções possíveis a determinada regra, 11
O termo “mandamento” é adotado aqui de
ou seja, é possível que seja formulada uma forma genérica para incluir os operadores deônticos
“comandar” (ou “é obrigatório que”, ‘O’), “proibir”
nova exceção a uma regra que até então era (ou “é proibido que”, ‘F’) e “permitir” (ou “é permitido
desconhecida. Dworkin rebate afirmando que”, ‘P’). É interessante notar a interdefinibilidade
que, se pelo menos teoricamente é possível desses três operadores, ou seja, cada um deles pode ser

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É importante notar que Alexy, apesar são que as regras não possuem (a dimensão
de reconhecer a diversidade de critérios de peso), Alexy concorda integralmente
que se pode usar para traçar a distinção, com Dworkin, porém avança e desenvolve
concentra seus esforços em aprofundar os a ideia dos princípios como mandamentos
critérios utilizados por Dworkin. No que de otimização. Os princípios, de acordo
concerne ao primeiro critério, o de que as com Alexy, são “normas que demandam
regras são aplicadas de maneira tudo-ou- que algo seja realizado na maior medida
-nada (“all-or-nothing fashion”), Alexy (1988) possível dentro das possibilidades fáticas
critica a postura de Dworkin em defender e jurídicas”13. Isso conduz à tese de que os
que é teoricamente possível listar todas as princípios podem ser satisfeitos (concre-
exceções a uma regra, pelo simples fato de tizados) em vários graus, e que esse grau
que elaborar tal lista é epistemologicamente de satisfação depende não só do que é
impossível, já que é impossível a qualquer possível faticamente, mas também do que é
ser humano prever todas as situações possível juridicamente14. As regras, por sua
fáticas que seriam qualificadas, caso ocor- vez, são normas que ou são satisfeitas ou
ressem, como exceções a certa regra. Em não são satisfeitas. Se uma regra é válida,
outras palavras, Alexy defende que a tese então o mandamento é fazer exatamente o
de Dworkin de que as regras são aplicadas que ela prescreve, nem mais, nem menos15.
de maneira tudo-ou-nada pressupõe a Enquanto os princípios possuem um grau
possibilidade de conhecimento de todas as de satisfação variável, as regras possuem um
exceções a todas as regras. Essa constatação grau de satisfação fixo na dimensão do que
implica uma outra: se não é possível conhe- é fática e juridicamente possível.
cer todas as exceções possíveis a uma certa É importante notar que a ideia de prin-
regra, então também não seria possível nem cípios terem grau de satisfação variável e
formular completamente a regra enquanto de regras terem grau de satisfação fixo, do
tal, nem muito menos deduzir com algum ponto de vista teórico, não implica afirmar
grau aceitável de certeza as consequências nem que princípios nunca podem ser reali-
jurídicas que decorreriam da aplicação des- zados completamente, nem que regras nunca
sa regra a um caso concreto12. Alexy ainda podem ser realizadas apenas parcialmente16.
argumenta que, se fosse possível conhecer
todas as exceções possíveis às regras, então
13
“... principles are norms which require that some-
thing be realized to the greatest extent possible given the
também seria possível conhecer todas as legal and factual possibilities” (ALEXY (2002, p. 47).
exceções possíveis aos princípios, fato que 14
“Principles are optimization requirements, char-
conduziria a distinção entre princípios e acterized by the fact that they can be satisfied to varying
regras a uma mera distinção de grau, e não degrees, and that the appropriate degree of satisfaction
depends not only on what is factually possible but also on
de estrutura lógica, como o próprio Dworkin what is legally possible. The scope of the legally possible is
sugere. determined by opposing principles and rules” (ALEXY,
No que concerne ao segundo critério, o 2002, p. 47-48).
15
“By contrast, rules are norms which are always either
de que os princípios possuem uma dimen- fulfilled or not. If a rule validly applies, then the requirement
is to do exactly what it says, neither more nor less”. Veja:
definido a partir da realização de algumas operações ALEXY (2002, p. 48).
lógicas simples com os demais. Por exemplo, o opera- 16
Esse ponto é de especial destaque, porque boa
dor deôntico de “permitir” pode ser definido como a parte das objeções que a teoria dos princípios de
conjunção das negações dos operadores “comandar” e Alexy recebeu gira em torno de saber se uma regra
“proibir”, ou seja, quando algo “é permitido” significa sempre é satisfeita completamente, e de saber se um
que esse algo é “não comandado” ou “não proibido” princípio sempre é satisfeito apenas parcialmente. As
(P(a) à ~ O(a) v ~ F(a)). Não é preciso aprofundar o críticas ficarão mais claras no decorrer do texto. O
tema aqui. próprio Alexy (2004, p. 48, nota de rodapé 24) parece
12
Para uma crítica da posição de Dworkin pelo reconhecer, em uma nota de rodapé na versão inglesa
próprio Alexy, confira: ALEXY (1995, p. 177-212). da TDF, que isso não ocorre.

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Isso quer dizer que, de um lado, princípios a depender do tipo de relação de preferên-
podem, sim, ser realizados completamente cia que se estabeleça. Partindo disso, uma
e que, de outro, regras podem, sim, ser regra R, em determinadas circunstâncias,
realizadas apenas parcialmente. Tal posição é poderia ter a sua satisfação restringida por
explicada, ao menos em parte, pelo caráter um princípio P, e vice-versa. É suficiente,
de mandamentos de otimização dos princí- por enquanto, anotar essas observações.
pios da seguinte maneira: (a) primeiro, se No próximo item, mostro como a teoria de
cada princípio for tomado em consideração Alexy é compatível com essas ideias.
isoladamente, ou seja, se for tomado sem A distinção qualitativa entre normas
estar em relação com outros princípios17, que são princípios e normas que são regras,
ou se a realização de um princípio, no caso além de ter como critério a maneira como
concreto, não estiver sendo restringida devem ser aplicadas essas normas aos casos
por nenhum outro princípio18, não é um concretos, também tem como critério uma
absurdo, do ponto de vista teórico, aceitar perspectiva conexa, a saber: o modo como
a conversão do conceito de princípio como se solucionam as colisões e os conflitos que
mandamento de otimização dentro do que é são implicados a partir das noções dos prin-
fática e juridicamente possível para um con- cípios como mandamentos de otimização e
ceito de princípio como mandamento de das regras como mandamentos definitivos.
maximização dentro daquilo que é apenas A colisão de princípios e o conflito de
faticamente possível. Um princípio, nessa si- regras convergem no sentido de que ambos
tuação, poderia ser realizado completamente, apontam para duas normas que demandam
caso as circunstâncias fáticas fossem ideais, condutas ou estados de coisas incompatí-
ou seja, caso fosse possível concretizar um veis entre si, ou seja, apontam para duas
estado de coisas ideal; e (b) segundo, nada normas que demandam, na ocorrência
impede, na teoria de Alexy, como se verá das hipóteses previstas em sua estrutura,
adiante, que um princípio P restrinja a sa- consequências jurídicas mutuamente in-
tisfação de uma regra R, ou que uma regra compatíveis. Um conflito entre duas regras
R restrinja a realização de um princípio P, somente pode ser resolvido ou declarando
pelo menos uma das regras como inválida
17
Essa ideia é criticável porque, pelo menos do (expurgando-a, assim, do ordenamento
ponto de vista prático, um princípio está quase sempre jurídico), ou inserindo uma cláusula de
em relação com outros princípios, ou seja, o grau de
satisfação de certo princípio quase sempre depende
exceção em uma delas. Caso não seja pos-
do grau de não importância em satisfazer outros prin- sível inserir uma cláusula de exceção em
cípios. Assim, a realização de certo princípio parece uma das regras, e haja um problema em
quase sempre ser limitada pela realização de outros decidir qual das regras deve ser declarada
princípios, no caso concreto. Isso torna a possibilidade
dos princípios como mandamentos de maximização inválida, pode-se fazer uso de critérios
pouco relevante do ponto de vista prático, mas não como lex posterior derogat legi priori, ou lex
impossível no plano teórico. specialis derogat legi generali, ou lex superior
18
Essa última situação pode ser lida, na teoria de
Alexy, como uma situação ideal dentro das possibilida-
derogat legi inferiori para resolver o conflito.
des jurídicas. Caso a realização de um princípio P1 não Esse modo típico de solucionar os conflitos
seja restringida por nenhum outro princípio P2, P1 não de regras guarda uma relação direta com
encontra limites jurídicos para a sua realização, fato que a estrutura das regras como mandamentos
faz com que a realização de P1 só seja restringida na
dimensão fática. A situação mais ideal é quando P1 não definitivos. Isso porque as regras são aplica-
encontra nem limites jurídicos (i.e. nenhum princípio das mediante subsunção, ou seja, se a regra
restringe a sua realização), nem limites fáticos para a é válida e os supostos de fato que nela se
sua realização. Nessa situação mais ideal, o conceito de
subsumem ocorrem, então a consequência
princípio enquanto mandamento de otimização se con-
verte em um conceito completo de princípio enquanto jurídica que tal regra demanda é válida, ou
mandamento de maximização. seja, deve ser aplicada. Se a regra não é válida,

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então a sua consequência jurídica também regra de precedência condicionada que
não o é, ou seja, não deve ser aplicada. se pode formular mediante a seguinte lei:
Por sua vez, uma colisão de princípios é (LC) As circunstâncias sob as quais
solucionada de modo inteiramente distinto um princípio tem precedência sobre outro
do conflito de regras. De acordo com Alexy, constituem as condições de uma regra que
uma colisão de princípios é solucionada tem as mesmas consequências jurídicas do
mediante ponderação. Quando dois princí- princípio precedente20.
pios colidem em um caso concreto, não é Como se vê, Alexy evoluiu a distinção já
possível solucionar essa colisão declarando proposta por Dworkin e a elaborou em ter-
um dos princípios como inválido (e, portan- mos mais precisos. A distinção entre prin-
to, eliminando-o do ordenamento jurídico), cípios e regras, seja na obra de Dworkin,
ou inserindo uma cláusula de exceção em seja na de Alexy, é uma distinção de caráter
um deles. O que acontece é que, em face “forte”, pois pressupõe uma diferença de
de determinadas circunstâncias concretas, estrutura entre princípios e regras, seja
um princípio tem um grau de importância em nível de estrutura conceitual, seja em
maior em ser satisfeito do que o outro, nível de estrutura nos procedimentos que
fato esse que não impede, como já notou se deve performar para aplicá-los aos casos
Dworkin, que, mudadas as circunstâncias concretos. No próximo item, não procuro
concretas, a situação se inverta. O que há, desenvolver exaustivamente todas as ver-
precisamente, é uma relação de precedência sões dos argumentos que defendem uma
condicionada entre um princípio Pi e um distinção “fraca” ou que rejeitam qualquer
princípio Pj que pode ser assim represen- possibilidade de distinção entre princípios
tada: (PiP Pj)C ou (PjP Pi)C (ALEXY, 2002, e regras, mas, sim, fazer uma exposição de
p. 50-54). Essa simbologia deve sempre duas das principais críticas que sustentam
ser lida da seguinte forma: Pi prevalece tais posições, e que, no geral, surgem como
sobre Pj diante das condições C19. É ainda tentativas de refutar a distinção “forte” tal
possível conceber uma relação de precedência como proposta por Dworkin e, principal-
incondicionada entre um princípio Pi e um mente, por Alexy.
princípio Pj que se representa assim: (PiP
Pj) ou (PjP Pi). Aqui, não há uma colisão 2. Respostas a duas críticas à
concreta entre os dois princípios, mas distinção “forte”
apenas uma relação de precedência prima
facie, razão pela qual, na teoria de Alexy, é Ocupo-me, aqui, em elucidar apenas
possível se referir a princípios como sendo duas das inúmeras críticas que são feitas à
deveres prima facie. Quando um princípio distinção “forte” entre princípios e regras.
Pi prevalece prima facie sobre um outro São elas: (i) a primeira, que é mais incisiva,
princípio Pj, isso se traduz na ideia de que, é que, ao contrário do que Dworkin e Alexy
em face das circunstâncias concretas, o ônus defendem, algumas regras são aplicadas
argumentativo para justificar a realização aos casos concretos mediante ponderação,
de Pj em detrimento de Pi é maior do que o e não de uma maneira tudo-ou-nada. Pode-
ônus argumentativo para justificar a relação 20
No original: “The circumstances under which
inversa, ou seja, para justificar a realização one principle takes precedence over another consti-
de Pi em detrimento de Pj. Cabe ainda notar tute the conditions of a rule which has the same legal
que a colisão de princípios, conforme Ale- consequences as the principle taking precedence”
xy, é solucionada, em concreto, por uma (ALEXY, 2002, p. 54). Essa lei será aqui denominada
Lei da Colisão (LC). É apenas importante observar
que a solução de uma colisão de princípios é feita por
19
Ou, obviamente, no caso de (PjP Pi)C, lê-se: Pj uma regra que pode ser compreendida assim: (PiP Pj)
prevalece sobre Pi diante das condições C. C ou (PjP Pi)C.

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-se elaborar uma versão de (i) da seguinte diferenças, sobretudo para os fins deste es-
forma: não é possível formular uma distin- tudo, são essenciais para defender a posição
ção entre princípios e regras como sendo de que os princípios como mandamentos de
duas espécies de normas, pois o que há são otimização oferecem uma saída teoricamente
normas em sentido amplo, e a distinção válida para dar conta da ponderação como
que pode ser formulada apenas se baseia um procedimento racional. Dessa forma,
no fato de que essas normas em sentido procuro agora refutá-las completamente,
amplo podem ser usadas de diferentes manei- tomando por base uma (re)leitura da teoria
ras no momento da aplicação21. Por sua vez, a de Alexy.
objeção (ii) diz respeito mais diretamente à Quanto a (i), regras nunca são aplicadas
tese de Alexy para os princípios e enuncia diretamente via ponderação, mas o podem
que, se princípios são mandamentos de oti- ser indiretamente. Existe um fato óbvio de
mização, ou os princípios otimizam, ou não que, em um conflito de regras no caso
otimizam, ou seja, a objeção enuncia que concreto, podem ser tomadas várias razões
princípios, mesmo qualificados como nor- (inclusive princípios) para justificar a inser-
mas de otimização, possuem uma estrutura ção de certa cláusula de exceção, ou para
semelhante à das regras no momento de justificar a escolha de determinada regra
aplicação (uma maneira tudo-ou-nada)22. em detrimento de outra (i.e. para justificar
Essas duas críticas, se confirmadas, a invalidade de uma das regras). De outra
levam a sérias dificuldades para manter parte, uma regra, em certo sentido, poderia
a distinção entre princípios e regras, pelo ter a sua satisfação tolhida por um princí-
menos enquanto uma distinção possível pio, e, assim, uma regra poderia ser afasta-
entre duas espécies de normas (a dis- da em um caso concreto, mesmo quando ela
tinção “forte”). Elas apontam para uma devesse ser aplicada24. O contrário também
tendência ou de tomar critérios distintivos pode acontecer, ou seja, um princípio, em
mais flexíveis e fluidos, como aqueles que certo sentido, pode ter seu grau de satisfação
advogam uma mera diferença de grau de restringido pela importância da satisfa-
abstração, ou de cunho interpretativo (uma ção de certa regra. Essas constatações em
distinção, portanto, “fraca”)23, ou de rejeitar nada alteram o modo como os conflitos
por completo qualquer possibilidade de de regras e as colisões entre princípios
distinção, pois tanto princípios como regras são solucionados. Com efeito, ambos os
pertenceriam indistintamente à categoria procedimentos permanecem sendo estru-
dos fenômenos deônticos (normativos), e turalmente distintos. Assim, regras sempre
não à categoria dos fenômenos axiológicos ou são cumpridas, ou não são cumpridas,
(AARNIO, 1990, p. 185). O caminho que e não podem ser aplicadas diretamente via
percorro aqui é o inverso dessas tendências. ponderação. O que pode ocorrer é que as
Sustento que, apesar de ambos se qualifi- regras, em certas circunstâncias, sejam apli-
carem deonticamente, há, sim, diferenças cadas indiretamente mediante ponderação,
relevantes entre os fenômenos deônticos porque podem ter a sua satisfação tolhida
consubstanciados em normas que são prin- pelo grau de importância em satisfazer
cípios e em normas que são regras. E essas algum princípio. Na teoria de Alexy, essas
21
Essa crítica é um dos elementos centrais usados 24
Uma outra possiblidade aqui seria a seguinte: o
por Humberto Ávila (2007, p. 40-64) como ponto de grau de satisfação da regra pode ser limitado por um
partida para elaborar a sua teoria dos princípios. princípio, e, assim, a regra poderia ser aplicada apenas
22
Uma formulação da objeção (ii) pode ser encon- parcialmente em um caso concreto. A questão é que
trada, por exemplo, em Aarnio (1990). admitir a possibilidade de aplicar uma regra apenas em
23
Para uma crítica da distinção “forte” entre parte seria incorrer em uma contradição com o próprio
princípios e regras confira, por exemplo: COMAN- conceito de regra enquanto mandamento definitivo,
DUCCI (1998). já que uma regra ou é aplicada, ou não é aplicada.

102 Revista de Informação Legislativa


possibilidades podem ser elaboradas com a sua satisfação tolhida por Pi, já que é
mais rigor, a saber25: possível uma colisão entre Pi e PjR. Por
(a) Uma regra R pode promover ou limi- sua vez, é também possível, na teoria de
tar a satisfação de um certo princípio Pi. No Alexy, imaginar que, em vez de se recorrer
caso em que R é uma regra limitadora do a uma regra de validade, possa-se recorrer
princípio Pi, há duas maneiras de aplicá-la a um princípio de validade (Pv), que, em
nos casos concretos: vez de comandar, como Rv, que R precede
(a.1) R pode ser aplicada estritamente, incondicionalmente Pi, comande que, em
e essa sua aplicação estrita pode ser justi- certas circunstâncias, Pi preceda (tenha pre-
ficada por uma regra de validade (Rv) que ferência sobre) Pj e tolha a satisfação de R.
enuncia que R precede incondicionalmente Essa relação, tal qual disposta, seria assim
o princípio Pi, ou, mais claramente, que R representada: Pv((PiP PjR)C). A função de Pv
tem precedência sobre Pi independente- seria nula se Pv apenas suscitasse a relação
mente do grau de importância em satisfazer entre Pi e PjR (tal como expresso acima). Pv,
Pi, ou do grau de não importância de R26. no entanto, deve ser tomado como um prin-
Aqui, precisamente, deve-se ler Rv como cípio formal (RAZ, 1999, p. 40-) e, assim,
uma regra que oferece uma razão excludente serve de razão (justificativa) para a validade
(RAZ, 1998, p. 40-) para que se tome como de regras em geral, o que criaria um ônus
relevante a restrição de Pi em face do dever argumentativo para justificar a precedência
de aplicação estrita de R. Essa situação de Pi em relação a PjR, ou seja, a importância
corresponde à situação-limite de que se se de satisfazer Pi teria de pesar mais do que
trata de uma regra válida, então ela deve ser o grau de não satisfação de PjR, em confor-
sempre aplicada mediante subsunção, inde- midade com o que é comandado em Pv. Em
pendentemente do fato de a sua aplicação outros termos, PjR, em virtude de Pv, teria
restringir ou não um certo princípio Pi. Isso uma precedência prima facie com relação a
pode ser representado mais sucintamente Pi28. Nessa segunda opção, portanto, seria
da seguinte forma: Rv(RPPi); possível, dadas certas circunstâncias, que
(a.2) R não pode ser aplicada estrita- uma regra R, ainda que válida (com justifi-
mente, pois R, que tem como razão (ou cativa em Pj), pudesse ser não aplicada em
justificativa)27 um princípio Pj, pode ter virtude da restrição que a realização de Pj,
a partir da aplicação de R, realiza em um
25
Essa leitura mais rigorosa Alexy (2002, p. 48) outro princípio Pi que, por sua vez, fosse
dispôs em uma nota de rodapé na versão inglesa da
TDF. Nesse ponto, procuro reconstruir certos pontos
considerado, no caso concreto, como tendo
que, a meu ver, tornar-se-iam mais claros se fossem um grau de importância maior do que Pj em
articulados do modo como procuro articular aqui. ser realizado. Ressalte-se que, para Alexy,
26
Essa posição é sustentada por quem se posiciona tanto Pi quanto Pj são, necessariamente,
em favor da tese de que um sistema jurídico é constitu-
ído exclusivamente por regras. Outro ponto aqui é que
princípios substantivos, enquanto Pv é sem-
“grau de não importância de R” deve ser lido, a rigor, pre um princípio formal;
para preservar a coerência interna na teoria de Alexy,
como o “grau de não importância” da realização do princípio formal, nada acrescentaria à relação de pre-
princípio que serve de razão (ou justificativa) da regra cedência, já que toda e qualquer regra deriva de um
R, e não como o grau de importância da regra propria- grupo mais ou menos definido de princípios ditos
mente dita. É que, no caso da aplicação estrita de R, formais. Como exemplo de princípios formais, pode-se
é irrelevante a questão do grau de importância de R citar os princípios que se referem a procedimentos,
(ou do princípio que serve de justificativa para R) na como o princípio democrático. Como exemplo de
realização de outros princípios, pois R, em sendo uma princípios substantivos, pode-se citar os princípios que
regra válida, enfatize-se, sempre deveria ser aplicada por são “de conteúdo”, como o princípio da privacidade,
subsunção em toda e qualquer situação concreta. da preservação da intimidade etc.
27
Para Alexy, Pj, necessariamente, tem de ser um 28
Para a relação de precedência prima facie (e, por-
princípio substantivo para que possa servir de razão tanto, incondicionada): Pv(PjR)PPi. Para a relação de pre-
(ou justificativa) para a regra R, pois, caso fosse um cedência condicionada: [Pv(PjR)PPi]C ou [Pi PPv(PjR)]C.

Brasília a. 48 n. 192 out./dez. 2011 103


Essa construção, partindo da noção re- Cabe notar ainda que, nesse ponto,
lacional de precedência, permite ver que a foram inseridas noções que permanecem
teoria de Alexy oferece uma possibilidade pouco claras na teoria dos princípios de
de compatibilizar, não sem dificuldades Alexy. A primeira noção inserida é a que
teóricas, a ideia de que um princípio pode está consubstanciada nos conceitos de
ser restringido por uma regra, e de que “regra de validade” e de “princípio de
uma regra também pode ser restringida validade”30. A “regra de validade”, pelo
por um princípio, razão pela qual regras que parece, seria, tal como qualquer regra,
podem ser aplicadas via ponderação, mas ape- um mandamento definitivo, e, como tal, de-
nas indiretamente, por meio da inserção de um veria sempre ser aplicada via subsunção, i.e.
princípio formal de validade (Pv) na relação de sem levar em conta a possibilidade de haver
precedência. Essa ponderação indireta para razões (princípios) a serem sopesadas. O
aplicar regras aos casos concretos se refere, ponto de destaque aqui é que a chamada
na verdade, a uma colisão de princípios, em “regra de validade” seria um mandamento
que um deles necessariamente é um prin- definitivo de um tipo especial, a saber: um
cípio substantivo que serve de justificativa mandamento de que se deve aplicar estri-
“de conteúdo” (Pj) para a regra R e o outro tamente uma certa regra R, sem que se leve
é um princípio substantivo (Pi) que tem a sua em conta o grau de restrição que a aplicação
realização limitada ou limita a realização de R teria na realização de quaisquer princí-
de Pj 29. Nessa estrutura, é possível ver que pios, e até mesmo as possíveis consequências
razões sempre vão ter um grande peso no que a aplicação de R teria na inserção de um
momento da aplicação, seja de princípios, estado de coisas altamente restritivo daquilo
seja de regras aos casos concretos. Isso que é comandado idealmente em um ou
apenas traduz a tese genérica de que a mais de um princípio.
aplicação do Direito nunca é realizada A segunda noção é a que está con-
irrefletidamente, ou seja, sem levar em substanciada no conceito de “princípio de
consideração razões contra e em favor da validade”, e dessa noção ainda segue uma
aplicação de uma regra ou de um princípio outra noção derivada que resta pouco ex-
a um determinado caso concreto. plorada, a distinção entre princípios formais
e substantivos. O “princípio de validade”,
29
Dizer que tanto Pi quanto Pj devam ser princí-
pelo que parece, seria, tal como qualquer
pios substantivos, enquanto o princípio de validade
que trata do modo de solução da colisão entre Pi e Pj princípio, um mandamento de otimização
deve ser, necessariamente, um princípio formal, é uma (i.e. um dever prima facie), e, como tal, de-
maneira de afastar a dificuldade teórica de admitir veria ser sempre aplicado via ponderação,
como possível a colisão entre um princípio formal e um
princípio substantivo. Como resolver, por exemplo, a 30
Destaque-se, nesse ponto, o caráter normativo
colisão entre o princípio democrático com o princípio especial que Alexy parece atribuir à “regra de valida-
de preservação do meio ambiente? Não parece que de” e ao “princípio de validade” como meta-normas,
seja uma colisão possível, ainda que ambos possam i.e. como normas formais que, enquanto tais, não são
ser qualificados, na teoria de Alexy, como princípios, objeto de aplicação, pois dizem respeito ao modo de
i.e., ainda que ambos possam ser qualificados, sem como aplicar regras e/ou princípios substantivos aos
maiores dificuldades, como mandamentos de otimi- casos concretos. Alexy, nesse ponto, apenas se refere
zação. Uma discussão similar pode ser referida à pro- à categoria de “princípio formal”, e não também à
porcionalidade, na medida em que as (sub-)regras da categoria de “regra formal”. Como quer que seja, a
adequação, da necessidade e da proporcionalidade em distinção entre norma “formal” e “substantiva” não
sentido estrito, ainda que sejam aplicadas mediante parece ser uma distinção própria das normas que são
subsunção, não possuem pelo menos uma caracterís- princípios, pois, se assim fosse, seria difícil explicar o
tica que, geralmente, as regras como mandamentos caráter especial, p.ex., das (sub-)regras da proporcio-
definitivos possuem, a saber: a possibilidade de entrar nalidade enquanto “regras de validade”. Assim sendo,
em conflito com outras regras do sistema jurídico, e aqui se admite como possível tanto a distinção entre
a consequente necessidade de analisar os modos de princípios formais e substantivos, quanto a distinção
solução possíveis para esse conflito. entre regras formais e regras substantivas.

104 Revista de Informação Legislativa


ou seja, levando em conta as outras razões aplicação de uma regra válida em um caso
(princípios) que pesam em sentido contrá- concreto, mesmo quando se considere que
rio à sua realização, e, assim, levando em a sua aplicação restrinja um ou mais de um
conta razões que devem ser sopesadas em princípio substantivo. Esse ponto, como se
um caso concreto. Isso, porém, não é de todo verá no parágrafo seguinte, não deixa de ser
coerente. O ponto aqui é que o “princípio de problemático. Pelo que parece, utilizando
validade”, em sendo necessariamente um agora uma terminologia similar, pode-se
princípio formal, não é, ele próprio, objeto afirmar que uma regra é válida sempre que
de ponderação, pois é um metaprincípio que ela é constitucional, e que uma regra é in-
comanda que os princípios substantivos em válida (= inconstitucional) sempre quando
rota de colisão sejam ponderados da melhor (i) ela é formalmente inconstitucional, e/ou
forma possível, tendo em conta as circunstân- quando (ii) ela é materialmente inconstitu-
cias fáticas e jurídicas31. Da posição de que cional32. Questionar a (in-)constitucionali-
todo “princípio de validade” tem sempre dade formal de uma regra exige um ônus
de ser um “princípio formal” segue que argumentativo menor do que questionar
essa seria a única possibilidade de atribuir a (in-)constitucionalidade material dessa
alguma importância à aplicação das regras regra. E questionar a (in-)constitucionali-
na argumentação jurídica. Apesar de não dade material de uma regra quando essa
tê-lo feito expressamente, parece que nesse regra é formalmente válida exige um ônus
ponto Alexy está ciente de que, caso se ad- argumentativo ainda maior. Creio que essa
mitisse que também os por ele chamados seja a saída possível para a teoria de Alexy.
“princípios substantivos” pudessem ser Como quer que seja, essas observações
qualificados como “princípios de valida- ainda precisam ser aprofundadas. É que,
de”, pouca ou nenhuma função restaria às em linhas gerais, admitir que é possível
regras na argumentação jurídica, já que em resolver um choque entre uma regra e um
toda e qualquer situação concreta poder- princípio, à primeira vista, ou implicaria (a)
-se-ia questionar a aplicação de certa regra sustentar que tal solução se daria no plano
não pelo fato de ela ser necessariamente da validade, e então o princípio não poderia
inválida, mas pelo fato de a sua aplicação ser qualificado como um dever prima facie, já
(e a aplicação do princípio que lhe serve que poderia ser expurgado do ordenamen-
de justificativa) eventualmente restringir to jurídico como inválido (tal como uma
um ou mais de um princípio substantivo. regra), solução essa incompatível com o
A saída que Alexy propõe, então, é que conceito de princípio como mandamento de
somente princípios formais, tomados como otimização; ou implicaria (b) sustentar que
princípios de validade, poderiam sustentar tal solução se daria no plano do sopesamen-
adequadamente a exigência de que há um to, e então a regra poderia não ser aplicada
ônus argumentativo maior para afastar a ao caso concreto mesmo que fosse válida,
e, assim, mesmo que devesse ser aplicada,
31
Um princípio formal, portanto, embora não seja solução essa incompatível com o conceito
objeto de sopesamento, funciona como um comando
de regra como mandamento definitivo.
para sopesar da melhor forma possível, e, assim, funciona
como um mandamento de otimização. Na resposta à Nenhuma dessas soluções, pois, poderia ser
segunda crítica enunciada, acredito que esse ponto lida como uma solução possível a partir da
poderá ser mais bem colocado. Registro, ainda, que
um sistema jurídico compreendido não mais apenas 32
Aqui não considero a possibilidade do que se
como um sistema de regras, mas, sim, como um sistema chama de “inconstitucionalidade reflexa”, i.e. a catego-
de regras e princípios, teria de conter princípios formais ria de invalidade que define uma regra como inválida
e princípios substantivos, já que não seria possível por ela não estar em conformidade com os requisitos
aplicar princípios substantivos aos casos concretos formais e/ou materiais que uma certa lei válida (i.e.
sem princípios formais que comandassem como essa formal e materialmente constitucional) impõe para
aplicação deve proceder. que ela seja uma regra válida.

Brasília a. 48 n. 192 out./dez. 2011 105


teoria de Alexy. Para dar conta desse ponto, seria possível desenvolver um argumento
como se viu acima, Alexy procura articular ulterior de que, se uma regra não consti-
uma solução alternativa, na medida em tucional é sempre resultado de um prévio
que defende que, quando há um choque sopesamento de princípios constitucionais
entre uma regra e um princípio, o que há, realizado pelo legislador, então uma tal re-
na verdade, é uma colisão entre o princí- gra é resultado de uma restrição imposta pelo
pio substantivo que serve de justificativa próprio legislador no exercício regular da sua
(razão) para a referida regra e um outro função legislativa. Disso segue que, se uma
princípio substantivo posto em questão. regra não constitucional pode ser sempre
Essa solução, porém, não é menos entendida como uma restrição legislativa
controvertida, pois abre espaço à objeção a direitos fundamentais (e, assim, como
de que se confere uma ampla esfera de resultado de um sopesamento prévio feito
liberdade para que qualquer aplicador do pelo legislador), então há sempre uma forte
Direito possa deixar de aplicar uma regra razão para que um juiz a aplique em um
válida quando quer que ele identifique uma caso concreto mediante subsunção, i.e. sem
colisão do princípio que serve de justificati- ter de recorrer sempre a um posterior sope-
va a essa regra com algum outro princípio samento das razões que contam em sentido
do ordenamento jurídico considerado contrário à sua aplicação. O problema é que
como mais importante, i.e. em termos mais dizer que é uma forte razão não significa
simples, o aplicador estaria sempre livre, em dizer que é uma razão definitiva, pois, como
toda e qualquer situação concreta, para se há de convir, é sempre possível que seja
afastar a aplicação de uma regra válida em em algum ponto duvidoso se a função
virtude de ela restringir um princípio que legislativa foi exercida de modo regular,
ele, aplicador, julgue como mais importante i.e. se a função legislativa foi exercida de
do que o princípio que serve de razão para modo constitucional ou inconstitucional35.
a referida regra (ALEXY, 2002)33.
e a função legislativa, se é uma diferença qualitativa
Uma possível saída para esse impasse
ou apenas uma diferença de grau. Veja, p.ex., o modo
– que, ressalte-se, implica uma total insegu- como Kelsen (2003, p. 387-) sustenta uma diferença de
rança jurídica – seria recorrer ao argumento grau entre as duas funções.
de que toda regra sempre é um posterior resul-
35
Há uma distinção relevante entre o caso simples
em que compete a um juiz verificar a (in-)constitucio-
tado de um sopesamento entre princípios, o qual nalidade da regra enquanto tal e um caso mais proble-
é realizado ou por algum juiz (é dizer, por meio mático, em que compete a um juiz avaliar se deve ou não
do exercício da função jurisdicional), ou pelo aplicar uma certa regra não por ser inconstitucional,
legislador (é dizer, por meio do exercício da fun- mas por sua aplicação gerar, no caso concreto, um
estado de coisas inconstitucional. O primeiro caso é
ção legislativa)34. A partir desse argumento, simples apenas em um sentido restrito de que o juiz
tem apenas duas opções: ou decide pela constitucio-
33
Outro ponto que poderia ser levantado é que a nalidade da regra, e então a aplica por subsunção, ou
própria escolha de qual princípio, dentro do conjunto decide por sua inconstitucionalidade, e então não a
de princípios constitucionais, é aquele que serve de aplica no caso concreto. A questão de como o juiz decide
justificativa (razão) para determinada regra não é uma sobre a (in-)constitucionalidade ainda permanece, sobre-
questão de simples resposta. É possível justificar uma tudo nos casos de (in-)constitucionalidade material,
mesma regra a partir de diferentes sopesamentos. uma situação complexa. No segundo caso, trata-se de
Disso segue que mais de um princípio constitucional um caso tão difícil quanto o caso de um juiz que está
pode ser tomado como sendo a justificativa (razão) na posição de verificar uma (in-)constitucionalidade
de certa regra, e a questão de qual foi o sopesamento material da regra, porque dele se exige, em ambas as
permanece, em grande medida, no espaço de decisão situações, a realização de um sopesamento, que, per
de um órgão jurisdicional. Essa questão é central, mas definitionem, é algo complexo. O juiz, nesse caso, avalia
aqui me reservo ao limite de enunciá-la para não fugir as consequências de formular uma argumentação con-
dos objetivos deste trabalho. tra legem para preservar a constitucionalidade de um
34
Aqui não se entra no mérito da discussão de estado de coisas, e tal avaliação, ressalte-se, é também
quão clara é a diferença entre a função jurisdicional uma avaliação que é feita mediante sopesamento de

106 Revista de Informação Legislativa


Em outras palavras, disso segue que seria regra sobre um princípio, seja de um princí-
sempre possível questionar a correção do pio sobre uma regra. As observações acima
sopesamento realizado pelo legislador, e colocadas não invalidam, nem alteram, a
tal questionamento, ressalte-se, somente é meu ver, os pontos centrais elaborados por
possível mediante a demonstração de que Alexy em sua teoria dos princípios, pois
há um outro sopesamento de princípios que apenas oferecem uma boa oportunidade
é considerado, pelo próprio órgão julgador, de complementar a discussão e, assim, de
como mais correto do que o sopesamento fornecer um suporte teórico mais completo
feito pelo legislador. Sendo assim, torna-se e sólido para a distinção princípio/regra.
uma afirmação plausível a de que nunca se É que, de todas as formas, o problema de
poderia negar que sempre há um amplo como solucionar o choque entre uma regra
espaço, no exercício da função jurisdicional, e um princípio é um problema para toda
para questionar as decisões legislativas e qualquer teoria dos princípios, e tem de
restritivas de direitos fundamentais36. A ser composto dentro de um quadro que
saída aqui seria reafirmar a tese de que seja, tanto quanto possível, coerente com
entre as duas funções não haveria uma o que se manifesta na prática. A crítica de
distinção qualitativa (ou de natureza), mas foco à teoria dos princípios de Alexy não
apenas uma distinção de grau. É que ambas, é capaz de colocar em xeque a ideia básica
em certo sentido, são funções criadoras de de que somente princípios são objetos de
Direito, pois ambas são funções que, por sopesamento e de que somente regras são
um lado, aplicam Direito, e, por outro lado, aplicadas via subsunção, pois é possível
criam Direito37. encontrar saídas teoricamente válidas (ain-
Como quer que seja, o que importa notar da que difíceis) dentro do próprio contexto
é esse grande peso das razões enquanto teórico fornecido por Alexy38. Com isso
justificativas da relação de precedência seja dito, creio que os pontos levantados refu-
de um princípio sobre outro, seja de uma tam convenientemente a objeção apontada
em (i).
princípios potencialmente restringíveis. Sobre o tema Quanto à objeção (ii), ou seja, quanto à
da argumentação contra legem, veja, por todos: BUS-
objeção de que princípios, como manda-
TAMANTE (2005).
36
Há apenas duas possibilidades de reduzir objeti- mentos de otimização, possuem uma estru-
vamente esse espaço de discricionariedade da função tura similar à das regras, pois ou otimizam,
jurisdicional comum: ou reduzir o espaço do controle ou não otimizam, é importante introduzir
de constitucionalidade ao da (in-)constitucionalidade
uma distinção entre comandos para otimizar
formal, ou eliminar qualquer possibilidade de a função
jurisdicional comum exercer controle de constitucio- e comandos para serem otimizados 39. Isso
nalidade. Caso não se opte por nenhuma das duas,
deve-se necessariamente restar na exigência de funda- 38
Essas saídas teoricamente válidas, ainda que
mentação explícita e detalhada das decisões judiciais. difíceis são saídas que não só conduzem ao ponto
Aqui não procuro avaliar se tais possibilidades são nevrálgico da teoria proposta por Alexy, mas também
também boas possibilidades, ou se são melhores do a um ponto não menos essencial que se revela cons-
que a possibilidade de garantir esse amplo espaço tantemente na prática judicial de qualquer Estado: o
discricionário de decisão. Apenas registro que são elas ponto de que se não se admite como possível uma
as únicas hipóteses logicamente possíveis para afastar função jurisdicional que apenas aplique regras aos
a discricionariedade da função jurisdicional comum casos concretos (posição formalista), será sempre uma
no controle de constitucionalidade e para preservar questão difícil a questão de saber qual é o limite que a
a posição tradicional da delimitação rígida entre função jurisdicional teria para argumentar mediante
uma função que é puramente legislativa (= criadora princípios, e, assim, a questão de se teria a função
de Direito) e outra que é puramente jurisdicional (= jurisdicional o poder de solapar restrições legislativas
aplicadora do Direito criado), ambas exercidas por ór- a direitos fundamentais mediante a formulação de
gãos distintos dentro de uma mesma estrutura estatal. regras novas (i.e. de restrições novas).
37
O locus clássico de defesa dessa tese é, 39
Essa distinção foi admitida por Alexy para
obviamente, a Teoria Pura de Kelsen (2005, p. 193-). responder à crítica elaborada em (ii). Uma versão

Brasília a. 48 n. 192 out./dez. 2011 107


porque constatar no conceito de princípios como seu objeto de comando os próprios
como mandamentos de otimização o con- comandos para serem otimizados, ou seja, dos
ceito de comandos para otimizar não implica princípios que demandam que os comandos
necessariamente a falha interna da tese de para serem otimizados sejam realizados na
que princípios são normas que demandam maior medida possível. Os comandos para
que algo seja realizado na maior medida otimizar, portanto, são satisfeitos não pela
dentro do que é fática e juridicamente exigência de serem eles próprios otimiza-
possível. Poder-se-ia argumentar que os dos, mas, sim, pela exigência de otimização
princípios, em sendo comandos para oti- dos comandos por eles comandados41.
mizar, tornam obrigatório o resultado ótimo, Essa distinção permite ver claramente
e, então, tornam aceitável o argumento de que é possível admitir, dependendo da
que somente esse resultado ótimo seria de- necessidade, duas classes de princípios que
vido. É precisamente por isso que se torna não diferem em sua estrutura lógica, mas,
plausível, à primeira vista, o argumento de sim, no tipo de conteúdo que é comandado. En-
que princípios, no final das contas, acabam quanto, nos comandos para serem otimiza-
por ter uma estrutura idêntica à das regras. dos, o conteúdo é um estado de coisas ideal,
Existe, no entanto, uma diferença sutil, que deve ser realizado concretamente em
mas muito relevante, entre comandos para sua máxima medida possível, nos coman-
otimizar e comandos para serem otimizados40. dos para otimizar o conteúdo é o próprio
Com efeito, os comandos para serem oti- comando cujo conteúdo é um estado ideal
mizados são os princípios quando tomados de coisas a ser perseguido. A objeção (ii),
como objetos de sopesamento. Só se otimiza de que os princípios teriam uma estrutura
um princípio quando esse princípio colide idêntica à das regras, não procede, pois
com outro princípio, ou seja, só faz sentido princípios nunca ou são otimizados ou não
falar em comandos para serem otimizados em são otimizados, já que é admissível, no plano
uma situação concreta de colisão em que teórico, a otimização de dever ser otimizado, ou
um princípio limita a realização de outro. E melhor, é admissível o dever de otimizar a
é precisamente essa limitação que justifica realização (no plano concreto) de um conteúdo
a necessidade da otimização. Dessa forma, ideal que deve ser otimizado (no plano ideal).
os comandos para serem otimizados repre-
sentam princípios enquanto deveres ideais,
isto é, enquanto comandos para atingir Referências
estados de coisas ideais, e que devem ser
concretizados na maior medida possível AARNIO, Aulis. Taking Rules Seriously. In: LAW and
(quando convertidos em deveres reais). De the States in modern times: Proceedings of the 14th
IVR World Congress in Edinburgh, August, 1989.
outra parte, os comandos para otimizar não se
Stuttgart: F. Steiner, 1990. p. 180-192. (Archives for
situam no nível dos princípios como objetos Philosophy of Law and Social Philosophy = Archiv
de sopesamento (enquanto princípios na für Rechts- und Sozialphilosophie, n. 42).
iminência de serem otimizados), mas, sim,
num metanível dos princípios que têm
41
Alexy (2000, p. 294) escreve que “...as
optimization commands they are not to be optimized
but to be fulfilled by optimization”. Essa distinção
completa do argumento de Alexy pode ser encontrada é, como já se pode notar, muito relevante para este
em: ALEXY (2000, p. 294-304). trabalho, pois a proporcionalidade se situa nesse
40
Essa é uma distinção correlata à distinção metanível, já que não inclui, como se verá, em sua
já comentada acima entre princípios formais e estrutura normas “de conteúdo”, mas sim normas
substantivos. Em geral, os princípios formais se “de procedimento”. Nesse sentido, as regras que
aproximam dos agora chamados “comandos para compõem a estratégia da proporcionalidade podem
otimizar”, enquanto os princípios substantivos se ter como razão (ou justificativa) algum princípio que
aproximam dos chamados “comandos para serem tenha como característica central ser um comando para
otimizados”. otimizar comandos.

108 Revista de Informação Legislativa


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