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JOSÉ DE ANCHIETA – ESTUDOS

Conceito de performance substitui o de teatro

Sabemos hoje ser anacrônico caracterizar as manifestações cênicas do período


colonial brasileiro como “teatro”.

Durante o período colonial os espetáculos teatrais no Brasil confundem-se frequentemente com


cerimônias religiosas, continuando a praxe dos tempos em que os jesuítas eram os únicos mestres
da arte cênica. As festividades leigas acompanham o calendário litúrgico. As festas do Natal,
Páscoa, Pentecostes, os cortejos carnavalescos e as cavalhadas pouco diferem das procissões,
como estas abrilhantando-se com música de fanfarra, salvas de tiros, fogos de artifício e
mascaradas. ( HESSEL e RAEDERS, O teatro no Brasil. Da colônia à Regeência, p. 11)

Personagens alegóricos
Nas trilhas de Lukács, para Alfredo Bosi, “a alegoria exerce um poder singular de
persuasão, não raro terrível pela simplicidade das suas imagens e pela uniformidade da
leitura coletiva. Daí o seu uso como ferramenta de aculturação, daí a sua presença desde
a primeira hora da nossa vida espiritual, plantada na Contra-Reforma que unia as pontas
do último Medievo e do primeiro Barroco. A força da imagem alegórica não se move na
direção das pessoas, como sujeitos de um processo de conhecimento; move-se de um foco
de poder ao mesmo tempo distante e onipresente, que os espectadores anônimos recebem,
em geral passivos, não como um signo a ser pensado e interpretado, mas como se a
imagem fora a própria origem do seu sentido”. Destacando a alegoria como característica
fundamental do que ele considera como “literatura de Anchieta”, Bosi acaba por reforçar
uma concepção que aliena a artística das festas de seus fins religiosos e, ao mesmo tempo,
subordina a primeira aos segundos. A alegoria, para Bosi, é o pilar de sustentação de um
“instrumento catequético”, não de uma linguagem religiosa específica.

Apesar de discordarmos da posição instrumentalista de Bosi, compartilhamos com


ele a idéia de que a alegoria é a grande marca dos textos do “caderno de Anchieta” e que
ela realmente se apresenta como impessoal e imagética. Todavia, nada disso deve sugerir
que as imagens alegóricas levam a uma atitude passiva do espectador, como se fossem
vozes solitárias impostas a uma interpretação unívoca à leitura coletiva. As imagens
alegóricas dos textos do “caderno de Anchieta” devem ser entendidas como algo a ganhar
corpo na performance de um “público-ator”: personagens e também espectadores que se
reconhecem na dramatização da alegoria. Nas festas, as representações e dramatizações
alegóricas não se distanciam dos participantes, que, a sua maneira, atualizam o mito
original, presentificando-o, realizando a alegoria. Não há passividade: a alegoria não
precede a performance, com ela constitui um evento único que se repete, sempre de forma
diferente, a cada reatualização. A alegoria permite a comunicação religiosa entre os
diversos participantes da festa. De maneira indireta e enigmática, revela inteligivelmente
para todos a “verdade” do testemunho cristão. A alegorização da mensagem é o pilar da
universalidade do Evangelho. No “caderno de Anchieta”, proporciona imagens de
inspiração bíblica mesclada com experiências missionárias, juízos teológicos e morais,
além de valores cristãos privilegiados pela atuação missionária.
Teoria da guerra justa

O Auto da festa de São Lourenço alegoriza a formação do Rio de Janeiro,


formação que se dá, de maneira negativa, como campo de batalha. É possível
acompanhar, na carta XVI de Anchieta, o contexto histórico da guerra entre portugueses
e tupis contra tamoios e franceses, durante a batalha de Guanabara, que dizimou os
tamoios e expulsou os últimos franceses do território brasileiro.

A peça de Anchieta, mais do que uma forma artística de catequização, no sentido


de ensinar os indígenas os fundamentos da religião cristã, constitui-se como um exercício
bélico.

Para São Tomás de Aquino, as guerras, desde que justas, e os exercícios


guerreiros, como os torneios, não são pecados:

deve-se dizer que os exercícios bélicos não são universalmente proibidos. Proibidos são os
exercícios desordenados e perigosos que ocasionam matanças e depredações. Os antigos
praticavam exercícios ordenados à guerra que não tinham nenhum desses perigos. Por isso, eram
chamados de “exercícios de armas” ou “guerras não sangrentas”. ( Suma Teológica, V, p. 519)

Não há, no Auto de Anchieta, nenhum desenvolvimento doutrinário catequético.


São veiculados em suas mensagens apenas os ensinamentos destinados à formação de
uma subjetividade social cristã, aquela capaz de assujeitar os indígenas a partir dos
princípios da pastoral cristã. Tais princípios estavam ligados, naquele momento histórico,
à preservação do território brasileiro controlado pelos jesuítas, mais especificamente ao
Rio de Janeiro de São Sebastião. A peça teatral de Anchieta é uma espécie de exercício
bélico porque promove uma prática ( ver conceito católico de prática) a partir das batalhas
ocorridas anteriormente , preparando os habitantes locais para defenderem as possessões
jesuíticas e portuguesas em futuras guerras justas. O Temor e o Amor a deus, “fogos
internos” invocados como integrantes da subjetividade missionária do mártir que dá nome
ao auto, são apresentados como modelo disciplinar de conduta. Assim, a peça não ensina,
mas disciplina, a partir de paradigmas militares, tão caros à Ordem dos Jesuítas, soldados
de Cristo.

Para Tomás de Aquino, a guerra justa requere as seguintes condições:

1ª. A Autoridade do príncipe, sob cuja ordem deve-se fazer a guerra. (...) Assim como defendem
licitamente pela espada contra os perturbadores internos quando punem os malfeitores, segundo
esta palavra do Apóstolo: “Não é em vão que carrega a espada; é ministro de Deus para fazer
justiça e castigar aquele que faz o mal”; assim também compete-lhes defender o bem público pela
espada da guerra contra os inimigos”. (...) 2ª. Uma causa justa: requer-se que o inimigo seja
atacado em razão de alguma culpa. (...) Costumamos definir como guerras justas aquelas que
punem as injustiças, por exemplo, castigar um povo ou uma cidade que foi negligente na punição
de um mal cometidos pelos seus, ou restituir o que foi tirado por violência. 3ª. Uma reta intenção
naqueles que fazem a guerra: que se pretenda promover o bem ou evitar o mal. (...) Entre os
verdadeiros adoradores de Deus até mesmo as guerras são pacíficas, pois não são feitas por cobiça
ou crueldade, mas numa preocupação de paz, para reprimir os maus e socorrer os bons. (...)
Aquele que pela autoridade do príncipe ou do juiz (...) empunha uma espada, não toma da espada
por si mesmo, mas empunha a espada que um outro lhe confiou. Não incorre, pois, em pena. (
Idem, p. 517-518)
No Auto de Anchieta esta justificativa das batalhas passadas, visando apaziguar
os traumas do genocídio dos tamoios, e a preparação para a possível guerra futura, realiza-
se por meio da coação e atemorização do sujeito, o terceiro ato apresenta o juízo final,
alcançando imperadores romanos há muito mortos mas ainda não condenados, e por meio
de uma prática generalizada do sacrifício. Os protagonistas da peça, São Lourenço e São
Sebastião, são mártires do sacrifício.

Ao estudar os primórdios da religiosidade colonial, Luís Palacin lembra que, entre


as principais práticas do catolicismo popular, destacava-se em primeiro lugar o gosto pela
penitência, praticada não só no âmbito privado mas ainda em locais públicos, “imodéstia
estimulada pelos religiosos não como exibicionismo personalista, e sim para servir de
emulação aos silvícolas e às almas mais frígidas” ( História da vida privada no Brasil I,
p. 172). Na Carta anual da Companhia de Jesus de 1552, dava-se conta que “duas ou três
vezes na semana os alunos do Colégio da Bahia se disciplinam, cingem-se os rins com
cilícios aspérrimos, muitos dedicam em suas casas ou em nosso templo duas horas inteiras
à oração e andam com tal modéstia nos olhos e em todo rosto, que mais que meninos,
parecem religiosos”. (idem). Tanto entre os índios como entre os portugueses e os padres,
as disciplinas constituíam-se como uma verdadeira paixão. Nas procissões, no alto dos
púlpitos, nos claustros e salas capitulares, ou dentro de suas próprias casas, miudamente
os religiosos e leigos entregavam-se à autoflagelação: “até mulheres e curumins nas
aldeias entregavam-se com frequência à autoflagelação”. (idem)

No plano da dramaturgia e da encenação, o exercício bélico se constitui, para além


dos conteúdos narrados no Auto, perseguição e condenação dos chefes tamoios e dos
imperadores que perseguiram os cristãos, no plano da forma, por meio de dois
procedimentos fundamentais. O primeiro pode ser decifrado por meio da relação entre
rubricas e diálogos ou narrações proferidas pelos personagens alegóricos: há sempre uma
relação disciplinar entre a ação e o discurso, a ação ocorre sempre destacada do discurso,
determinando-o, fazendo as palavras obedecerem a prática, organizada com fins bélicos
e não didáticos. O segundo procedimento está relacionado à movimentação processional,
recurso presente nos autos medievais e apropriado por Anchieta, mas aqui reconfigurado:
o caminho percorrido por público e pelos personagens é aquele do enterro e entronização
de São Lourenço na Igreja. As cenas sucedem-se do lado de fora do templo,
provavelmente em espaços ao ar livre, no aldeamento de São Lourenço, situado no Rio
de Janeiro (Niterói), para terminarem dentro do templo. Tal percurso, alegoriza o enterro
dos mortos na batalha e prepara e disciplina, com o recurso prático da obediência do
espectador, que segue, domesticado, o traçado determinado pela procissão, os primeiros
habitantes cariocas para a defesa do seu território.

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