Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
-•
-TV,C
><?W
f • -
"^r^
Ie ne fay rien
sans
Gayeté
(Montaigne, Des livres)
Ex Libris
José Mindlin
t
i
(DiBmü
DE
CORRECTAS E EMENDADAS
DE
TOMO PRIMEIRO.
E á gente religiosa
Mandae-lhes velas bispaes,
A cera de renda grossa,
Os pavios de casaes,
E logo não porSo grosa.
GrlL VICEITE.
.Que o medrar
Se estivera em trabalhar,
Ou . valera o merecer,
Eu tivera que comer,
E que dar e que deixar. (*)
I.
PRIVILEGIO.
Eu EIRei faço saber aos que e ste alvara virem, que
Paula Vicente, moça da Câmara da muito minha amada e" pre-
zada tia, me disse que ella queria fazer emprimir hum livro e
cancioneiro de todas as obras de Gil Vicente seu pay, assi as
que até ora andarão empremidas pelo meudo, como outras
que o ainda narri foram. Pedindo-me que ouvesse por bem,
que por tempo de dez annos nam podessem emprimir nem
vender o dito cancioneiro, senam ella, e as pessoas a que ella
pera isso de'sse licença: e que as ditas obras meudas do dito
seu pay que ate ora andarão empremidas se nam podessem
mais emprimir, nem vender pelo meudo. E visto seu reque-
rimento, e por alguns justos respeitos que me a isto movem,
ey por bem, e me praz que fazendo ella emprimir o dito "can-
cioneiro de todas as obras do dito seu pay — Empressor algum,
nem outra algüa pessoa possa em meus Reynos e Senhorios
emprimir, nem vender o dito cancioneiro, nem trazelo de íóra
do Reyno a vender sem consentimento e licença da dita Paula
Vicente, e isto por tempo de dez annos somente, que começa-
ram da feitura deste alvará. Emprimindo, ou vendendo algüa
pessoa o dito cancioneiro nos ditos meus Reynos e Senhorios,
ou,trazenáo-o de fora delles a vender como dito he dentro
no dito tempo de dez annos sem licença da dita Paula Vi-
cente, perderá todos os volumes que delles lhe forem achados,
e paoarão cincuenta cruzados, ametade pera a minha Camera,
e a outra ametade pera quem os acusar. E assi me praz que
daqui em diante polo dito tempo de dez annos se nam possão
xxxvi APPENDIX.
II.
PRÓLOGO
dirigido ao mui alto e poderoso Rei nosso Senhor D.
Sebastiam o primeiro do nome por Luís Vicente.
He tão gloriosa cousa, altíssimo Rei e Senhor nosso, a
fama daquelles que a tem e a tiverão, que a toda pessoa
geralmente faz desejo de a acrecentar, e resuscitar suas obras:
e assi o fazem muitos, huns com contarem em pratica suas
cousas, outros com escreverem suas obras, outros trabalharem
que venhão á noticia de todos com as imprimirem, como foi
aquelle que apurou, e alimpou e fez que fossem vistas e acha-
das as cousas de Homero, porque, se elle nam fora, perderam-se,
e outros que tomarão a seu cargo o trabalho de serem pre-
goeiros daquelles que escreverão, e fizerão obras dinas de.
serem apregoadas, sem outra obrigação mais que somente a
curiosidade que tinhão de quererem que se não perdesse a
APPENDIX. xxxvn
III.
Desta illustre Princeza diz um seu biographo: "Se dió
á Ia lengua latina, en que hizo tales progresos, que á poço
tiempo, socorrida de su docilidad y talento, Ia escribia y ha-
blaba como si fuera materna; Io mismo le sucedió cou Ia griega."
(Pacheco, Vid. de Ia Inf. D. Maria.)
E Macedo, nas Flores de Espaíía: "En Ia poesia fue
insigne: escribió en Latin y tenia perpetuamente academia de
mugeres doctas."
IV.
Que muitas obras de Gil Vicente se perderão, se vè do
Prólogo dirigido por seu filho Luiz a D. Sebastião; onde diz:
" A este livro ajuntei as mais obras que faltavão, de que pude
ter noticia." A respeito das obras rneudas mais claramente o
XXXVIII APPENDIX.
V.
Assim a celebra o Padre Reis , nos seus Enthusiasmos
poéticos, No. 66, comparando-a com a mulher de Lucanoí;
Paula parentem
Oegidium sociat nunc celso in vértice MontU,
Quem juvisse feruni, sicut olim Pola maritum
Scríbentem juvit Lucanum.
VI.
A seguinte scena de Encina e visivelmente o modelo de
outra de Gil Vicente, no seu primeiro auto pastoril a pag. i4
do vol.
JlJAS RODRIOACHO.
Asino, qne dígoles pares.
Hora jnguemos! A N T . Jugueiuos. MIGUEIEIO.
MlGUELEJO. Al diabro tales jngares.
Y <i çjué jnego, companones? RODRIOACHO.
RoDP.rGACHO. Hora ganéte bnen caclio.
Jngnemos pares y nones. D o u muchacho,
JüAN. poernito sabes de juegos:
Aliotas, que bien liaremos. no te aprovechan reniegos;
AMTON. cata qne soy hombre macho,
Comenzeinos. JuAN.
JüAN. Nunca acabaremos h o y :
Qné les dices? A N T . Júri á fios, debemos jnego mudar.
Nones digo. J D A . Dá cá dos. RODRIGACHO.
ÁKTON. T ;í qué podreinos jugar ?
Cata, qne no trainpilleinos! ANTON.
RoDRIGACHO. Miafé, á v i v o te Io doy.
Qné les dices, Mignelejo? MlGUELEJO.
Yo no soy
MrouEiEJo.
Pares les digo. R O D . Perdiste! en jugar jnego tan rnin;
JUAN.
mas jugnemo» ai trentin
Al diabro te dó por triste! qne mny desgraciado estoy.
Ta pones ei sobrecejo? Ei. ANGEI,.
Pastores, no hayais temor!
RoDRIGACHO.
qne os anuncio gran placer:
Guando viejo,
sabed qne quiso nacer
inuy m i n gesto lias de tener:
esta noche ei Salvador
por três castafías perder
Redentor
reniegas de san conejo.
en ia cindad de David.
MlSUELEJ.O. T o d o s , todos le servid,
Qné les dices, Rodrigaclio í que es Cristo nnestro Senor &c.
APPENDIX. XXX1X
V i 11 a n c i c o.
Gran gasajo siento yo, gran memória quedará,
Jinihó! hnihá!
Yo tainbien soncas que lia, pnes aqnel que nos crio &x.
lmiliá! Vau virgen de qninca anos
pues aqnel que nos crio morenica de tal gala,
por salvamos nació ya: que tan chapada zagala
Hniliá, hnüiá! n'o se halla en mil rebanos:
qne aquesta noche nació. nunca tal cosa se vió,
huihó!
Esta noche ai médio delia
ni jamas fue ni será,
cuando todo estab.1 en calma,
hnihá!
por nos alninbrar ei alma
pues aqnel qne nos crio &c.
nos nació Ia clara estrella:
Váinonos de dos en dos,
clara estrella de Jaca,
aballemos á Belen,
huihó!
porque percancemos bien
alegrar todos qne ha,
quien es ei liijo de Dios:
hnihá!
gran salnd nos envio,
pnes aqnel qne nos crio &c.
huihó!
En Belen nnestro lngax aqnel, que en Belen está,
inuy gran calor relninbrea, hnihá!
yo te juro qne aquesta aldea pnes aqnel qne nos crio ácc.
por ei mundo ha de sonar: Ya rebnlle Ia inanana,
porque tal fruto nos dió agnijeinos que és de dia,
huihó! pregnntemos por Maria
gran honra se le dará una hijá de Santa Ana,
hniháj qne ella ella Io parió,
pues aqnel que nos crio ke. hnihó!
Una virgen concibiera Vamos, vamos andallá,
sin siniiente de vaion, hnihá!
y virgen sin corrupcion pnes aqnel que nos crio,
ai Iiijo de Dios paríera, por salvamos nació ya:
y despues v/rgen quedo, hnihá! huihó!
huihó < . qne aquesta noche nació.
VIL
Eis-aqui alguns extractos dos antigos Mysterios francezes
tpie aqui se transcrevem para habilitar o leitor a fazer o seu
juizo sobre as observações que fizemos no texto; o seguinte
e' de um antigo Mysterio manuscripto, que Bouterweck nos
fornece na sua historia da Poesia e Eloqüência Franceza. Lu-
cifer falia aos espiritos infernaes:
XL APPENDIX.
Discurso de Lucifer:
" H a r o , Haro, approche toy grant Dyable,
"Approche toy Notaire mal fiable,
"Fier Belial, Procureur des Enfèrs;
" S i tu ne fais ung fanlx traict desnoyable,
"Nons perdons tout le genre hnmain salnable,
" E t demenrons senls enchaynez en fers.
VIII.
Eisaqui o logar a que se refere o texto:
" E as danças acabadas, se começou huma muito boa e
"muito bem feita comedia, de muitas figuras, muito bem ata-
v i a d a s e muy naturaes, feita e reprezentada ao cazamento e
"partida, da Senhora Jnfante; couza muito bem ordenada, e
"com ella acabada se acabou o seram."
(G. de Resende, Hida da Infante D. Beatriz
para Saboia.)
APPENDIX. XLI
IX.
A seguinte passagem fará conceber uma grandiosa idea
do maquinismo dos nossos antigos. Foi em i48i que se
fizerão estas memoráveis festas.
" E á terça feira logo seguinte, houve na salla da madeira
^"cxcellentes e mui ricos momos, antre os quaes EIRei, pera
"desafiar a justa que havia de manteer, veeo primeiro momo,
"etoyfencionado cavalleiro do cirne com muita riqueza, graça e
"gentileza, porque entrou pelas portas da salla com hüa grande
"frota de grandes naoos, mettidas em pannos pintados de
"bravas e naturaes ondas do mar, com grande estrondo. d'ar-
"telharias que jogavam, e trombetas e atabales e ministrees
"que tangiam, com desvairadas gritas e alvoroços d'apitos, de
"fingidos Mestres, Pillotos e Mareantes vestidos de brecados
" e sedas, e verdadeiros e ricos trajos Alemães."
(Inéditos da Hist. Portug., Chron. de D. JoãoII,
por Ruy de Pina, pag. 126.)
DAS OBRAS DE DEVAÇAO.
>#-
OBRAS DE GIL VICENTE.
LIVRO I.
DAS OBRAS DE DEVAÇÁO,
VAQUEIRO.
Y un ciento de quesadas;
Y han traído
Quesos, miei, Io que han podido.
Quiérolos ir á Uamar:
Mas segun yo vi Ias senas,
Hanles de inesar Ias grenas
Los rascones ai entrar.
GIL.
HRAS.
LUCAS.
SILVESTRE.
GREGORIO.
MATHEUS.
ALTO PASTORIL CASTELHANO
endereçado ás matinas do Natal.
GIL.
Aqui está fuerte majada;.
Quiero repastar aqui
Mi ganado; veislo allí
Soncas naquella abrigada.
Yo aqui estoy abrigado
Del tempero de fortuna.
Anublada está Ia luna,
Mal pecado,
Lloverá soncas priado.
Quiero aqui poner mi halo-,
Que cumpre estar anaceando,
Y andarme aqui holgando,
Canticando rato á rato.
Hucia en Dios, vendrá ei verano
Con sus flores y rosetas;
Cantaré mil chanzonetas
Muy ufano,
Si allá Uego vivo y sano.
8 LIVRO I;
L ü C A S . (de longe.)
Hao! carillos! GIL. Á quien hablas?
Luc. Á vosoíros digo yo,
Si alguno de vos ine víó
Perdidas unas dos cabras?
GIL. Yo no. BRA. Ni yo. Luc. Á Dios pliega!
GIL. Como Ias perdiste? dí.
Luc. Perdiéronse por ahi
Por Ia vega,
Ó algun me Ias soniega.
Nel hato de Brás Picado
Andava Marta bailando;
Yo estúvela oteando,
Boquiabierto Irasportado,
Y ai son batlendo ei pie
Estuve dos horas valientes:
El ganado entanamientes,
Á Ia fe,
No sé para donde fue.
GIL.
Y aun por eso que yo sospecho
Me aparto de saliijones;
Que vanas conversaciones
No traen níngun provecho.
Sieinpre pienso en cosas buenas:
Yo me hablo, yo me digo;
Tengo paz sieinpre comigo,
Sin Ias penas,
Que dan Ias cosas agenas.
LUCAS.
No me quiero estar traâ Iras;
Ya perdido es Io perdido.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 11
Tomaremos gasajado,
Que Gil Terron está aqui
En abrigado,
Alegre y bien asombrado.
Vem os pastores, e diz.
SILVESTRE.
Ora terrible placer
Teneis vosotros acá.
HRA. Si, tenemos, soncas ha:
Pues qué habemos de hacer?
Quien ai cordojo se dió,
Mas cordojo se le pega.
SIL. Bailemos una borrega.
BHA. Mi fe no,
Que tú bailas mas que yo.
GIL.
Júri á nos que estás chapado!
Qué es esto, Silvestre hermano?
SIL. NO ves que viene ei verano,
Y soy recien desposado?
GIL. Jesus autem intrinsienes!
Quien te trajo ai matrimuno?
SIL. Mi tio Velasco Nuno.
GIL. Chapados parientes tienes.
Quien es Ia esposa que hubiste?
SIL. Teresuela mi damada.
BHA. Dios! que es moza bien chapada,
Y aun es de buen natío,
Mas honrada dei lugar.
GIL. Neso no hay que dudar;
Porque ei herrero es su tio,
Y ei jurado es ahijado
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 13
Do á rabia Ia jugada:
Ora viste que porrada!
Luc. Tú, amigo,
Ya no consientes castigo.
BRÁS.
Juguemos á adivinar.
Luc. Que ine plaz. BRA. DÍ, compafíero....
Mas comience Gil primero.
GIL. Que me plaz de comenzar.
Coinenzad de adivinar. Luc. Qué?
GIL. Sabello has tú muy mal:
Qual es aquelle animal,
Que corre y corre, y no se ve?
BRA. E S ei pecado mortal.
MATHEUS.
Mas ei viento, mal pecado,
Creo yo que será ese.
Luc. Que no es buen juego este;
Demos este por pasado.
GIL. Bien será via acostar,
Que ya me debroca ei sueno.
Santiguaos dei demueno.
SIL. Yo no me sé santiguar.
GIL. Decid todos como yo:
En ei mes dei padre,
En ei mes dei hijo —
El otro mes se me olvido.
(Dormem e o ANJO os chama cantando.)
u
Ha pastor!
"Que es nacido ei Redentor."
GIL.
Zagales, levantar de ahí,
16 LIVRO I.
Cançoneta.
"Norabuena quedes, Menga,
"Á Ia fe que Dios mantenga.
"Zagala santa bendita,
"Graciosa y morenita,
"Nuestro ganado visita,
"Que ningun mal no le venga.
"Norabuena quedes, Menga,
"A Ia fe que Dios mantenga."
GIL.
Qué decis de Ia doncella?
No es harto prelucida?
SÍL. Nunca otra fue nacida,
Que fuese muger y estrella,
Sino ella.
GIL. Pues sabes quien es aquella?
DAS OBRAS DE DEVAÇAO. 19
Es Ia zagala hermosa,
Que Salomon dice esposa,
Cuando canticava delia.
Con su voz muy deseosa
En su canticar decia:
"Levántate, amiga mia,
Columba mea formosa,
Amiga mia olorosa;
Tu voz suene en mis oidos,
Que es muy dulce á mis sentidos,
Y tu cara inuy graciosa.
Como ei lilio, plantada,
Florecido entre espinos,
Como los olores finos
Muy suave eres bailada.
Tú eres huerta cerrada,
En quien Dios venir desea:
Tota pulchra amica mea,
Flor de virgindad sagrada."
SILVESTRE.
Á Dios plegue con ei ruin!
Mudando vas Ia pelleja:
Sabes de achaque de ygreja!
GIL. Ahora Io deprendí.
SIL. Con eso hablas latin,
Tan á punto que es placer.
Mas Io preciára saber
Que me daren un florin.
BRÁS.
Dí por vida de tu tio,
Tú sabes de profecias?
GIL. Sé que dijo Malaquias
2*
20 LIVRO I.
Es mortal y inmortal,
Mobible y inmobible,
En cuanto Dios, invisible;
Es en todo ai Padre igual,
Menor en cuanto humanai:
Y esto no es bnposible.
Hecha ei sol su rayo en Mayo,
Como mil veces verés;
El mismo rayo sol es,
Y ei sol tambien es rayo:
Entrambos visten un sayo
De un envés,
Y una cosa misma se es.
Ansí este descendió,
Quedando sieinpre en ei Padre:
Aunquè vino á tomar madre,
Del padre no se aparto.
HHA. Gil Terron lletrudo está:
Muy bondo te encaramillas!
GIL. Dios hace estas maravilhas.
BRA. YO IO veo, soncas ha.
Quien te viere no dirá,
Que naciste en serrania.
Luc. Cantemos con alegria,
Que en eso despues se hablará.
(Vão-se cantando.)
FIGURAS.
GREGORIO i
> Pastores.
VALERIO )
HUM EHMITÃO.
HUM CAVALLEIRO.
GREGORIO.
Asmo, asmo. soncas ha,
Que ine da
Ua fortuna trasquilon.
He dejado mi zurron
Y eslabon,
Y no sé que hago acá.
Dios plegue, quien me dirá
Adó está
Este nino que es nacido?
Que ando bobo perdido,
Sin sentido,
Trece dias per habrá, *
Que no sé que haga ya.
No sé parte ni recado
Del ganado,
Y los perros son perdidos;
Mis corderos dan gemidos
Muy sentidos
Por entrar en ei poblado.
Todo mi hato he dejado
Desmedrado,
por buscar este ninito.
Dicenme que es tan bonito,
Que me aflito
24 LIVRO I.
O andais
Á desuso como yo?
El nino que nos crio
Do nació?
Qué es Ia nueva que me dais?
Por Dios que me Io digais;
No hagais
Que me inuera de cordojos.
ERM. Pastor, no tomes enojos,
Que tus ojos
Verán quien todos buscais.
GRE. He medo que ine burlais.
Traeis á ende hreviario,
Ó calendário,
Ó sois frayle? Como quiera,
Si alino aqui hubiera
Bien quisiera,
Si sabeis bien de vicario,
Que digais un trintanario
Al rosário,
26 LIVRO I.
Fuera ver
El resplandor glorioso,
Aquel verbo gracioso,
Tan Uoroso,
Acabando de nacer!
VAL. Buldas deveis de traer
Á vender,
Que os estais chocarreando.
ERM. Harto es eso de desmando,
Pues veis que estoy baldando.
Contemplando
Lo que nos es inenester,
Si suyos queremos ser.
VALERIO.
Decidnos, padre bendito,
Hallais scrito
Si es pecado estornudar?
Mas os quiero preguntar
Y notar;
Esperad ansí un poquito:
Digo que escondo ei cabrito,
Por hacer berrar Ia cabra;
Y remojo Ia palabra
Á cada habla:
Es gran pecado infinito,
Ó es médio pecadito?
GREGOHIO.
Si ei hoinbre, de birra pura,
Por ventura
Adrede despierna un grillo,
Por no vello ni oillo;
Encubrillo
28 LIVRO I.
O se debe perdonar,
Pues se no puede escusar?
ERMITÃO.
Este inundo peligroso
Sin reposo
Nos trae á todos burlados,
Ciegos, mal aconcejados,
Desviados
De aquel reino glorioso.
Quien puede ser mas dichoso
Ni gozoso,
Que tener puesto ei querer,
El amor y su poder,
Sin torcer,
Neste nino inuy gracioso,
Puerto de nuestro reposo?
Quien se viere sojuzgado
Y apretado
De mundano pensamiento,
Contemple su naciinienlo:
Cuan contento
IiO verá desnudo echado,
De los frios traspasado,
Y adorado
De los brutos aniinales!
Luego olvidará los inales
Desiguales,
Que le presenta ei pecado.
GRE. Pecado es ser namorado?
VALERIO.
Crio Dios por Ia ventura
Hermosura
30 LIVRO I.
Es villanía.
Senor, de donde sois vos?
CAV. De Arábia. ERM. Bendígaos Dios!
GRE. Arábio sos?
CAV. Si, y perdi Ia companía
De una gran cabâlleria,
Que venía
A tino Iras una estrella,
Y ellos van en pos delia
Sin perdella;
Y alcanzarlos queria,
Fortuna me Io desvia.
ERMITÃO.
Y adonde van, si sabeis?
CAV. Van três Reis
Adorar con sentimíenlo
Y muy grande acatamienlu
El nacüniento
Del senor de todas greis.
En nuestra tierra sabreis,
Si quereis,
Que desde Balan se velaba
La serial que se esperaba,
Que mosíraba
El naciiniento que veis
Del senor de nuestras leis.
GREGORIO.
Decid, senor, qué estrella era?
ERM. Quien Ia viera!
CAV. ES muy reluciente estrella,
Y un nino en médio delia,
Muy mas que ella
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 33
Caballero relator,
Yo pecador,
Vilano, necio, bestial,
No pense que érades tal,
Y hablé mal,
De que tengo gran dolor.
CAV. YO te perdono, pastor,
Que ei Senor
Por cualquier culpa mortal
No pide ai ai pecador.
Apparecem os três Reis Magos cantando o seguinte
Vilancete.
"Cuando Ia Virgen bendita
"Lo parió,
"Todo ei mundo lo sentió.
"Los coros angelicales
"Todos cantan nueva gloria;
"Los três Reis Ia vitoria
"De Ias almas humanales.
"En Ias tierras principales
"Se sono,
"Cuando nuestro Dios nació."
3*
ALTO DA SIBILLA CASSAIXD
SALOMÃO.
Casandra, Dios te mantenga;
Y yo venga
Tambien mucho norabuena!
Pues te veo tan serena,
Nuestra estrena
Ya por mi no se detenga:
Y pues ya que estoy acá,
Bien será
Que diga á qué soy venido;
Y tanto estoy de ti vencido,
Que creo que se hará.
CASSANDRA.
No te entiendo. SAL. Anda, ven!
Que por tu bien
Te envian á llamar tus tias;
Y luego de aqui três dias
Alegrias
Ternas tú y yo tambien.
CAS. Que ine quieren?
SAL. Que me veas
Y me creas
Para hecho de casar.
CAS. Lo que de ahí puedo pensar,
Que ellas ó tú devaneas.
SAL. Somos parientes, ó que?
Bien se ve
Que soy yo para valer
Tal, que juro á mi poder
Que de no ser,
Ni esta paja me dé.
Yo soy bien aparentado
38 LIVRO I.
Y abastado,
Valiente zagal polido;
Y aun estoy médio corrido
De haber acá llegado.
Anda, si quieres venir!
CAS. Sin mentir,
Tú estás ruera de ti:
Lo que te dije hasta aqui,
Será ansí,
Aunque sepa de inorir.
SAL. No me ves? CAS. Bien te veo.
SAL. No te creo:
Pues no queres? CAS. No te quiero.
SAL. Casamiento te requiero.
CAS. Ya primero
Dije lo que es mi deseo.
SALOMÃO.
Que me dices? CAS. YO te digo
Que comigo
No hables en casamiento;
Que no quiero ni consiento,
Ni con otro ni contigo.
SAL. Quieres tú estar á cuenta?
CAS. Y nesa afrenta
Tengo contigo de estar?
No me quiero cautivar,
Pues nací horra y isienta.
SALOMÃO.
Tu tia misina me habló,
Y prometió
Muy chapado casamiento.
CAS. Otro es mi pensamiento.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 39
SALOMÃO.
Qué te hizo ei casamiento?
Es tonnento,
Que se da por algun hurto?
CAS. Y aun por eso le surto,
Porque es curto
Su triste contentamiento.
Muchos dellos es notório
Purgatório
Sin concierto ni templanza;
Y si algun bueno se alcanza,
No es médio placentorio.
Veo qnejar Ias vecinas
De malinas
Condiciones de maridos:
Unos de ensoberbecidos
Y aborridos,
Otros de médio gallinas,
Otros Uenos de mil celos
Y receios,
Sieinpre aguzando cuchillos,
Sospechosos, amarillos,
Y malditos de los cielos:
Otros á garzonear
Por ei lugar,
Pavonando trás garcetas,
Sin dejar Mancas ni prietas
Ni reprietas;
Y Ia muger? sospirar,
Despues en casa renir
Y grunir
De Ia triste allí cautiva.
DAS OBRAS DE DEVAÇAO. 41
SALOMÃO.
Loco consejo lias tomado.
Estoy espantado!
Do se halló tal desvarío?
CAS. Mi fe, nel corazon mio;
Y lo fio,
Que no vó camino errado.
No quiero dar mi limpeza
Y mi pureza
Y mi libertad exenta,
Ni mi anima contenta,
Por sesenta
Mil millones de riqueza.
PERESICA.
Si tu madre eso hiciera!..
CAS. Bien, qué fuera?
PER. Nunca tú fueras nacida.
CAS. Yo quiero ser escogida
En otra vida,
De mas perfeta manera.
ERU. Escucha, sobrina mia:
Todavia
No puedes sino casar;
Y este debes tomar
•Sin porfiar,
Que es inuy bueno en demasia.
CASSANDRA.
Como ansí? ERU. E S generoso
Y virtuoso,
Cuerdo y bien asombrado:
Tiene tierras y ganado,
Y es loado
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 45
Hien será
Que no le digamos mas.
Pues tú te arrepentirás,
Y querrás,
Cuando ei diablo no querrá.
ERU. Muy mas ayna quizá
Se hará,
Si Ia servieses de amores.
SAL. Qué moza para favores!
No veis que respuesta da?
PERESICA.
Si tus tios allegasen,
Y le hablasen,
Que son hoinbres entendidos...
CIM. Pardiez son, y bien validos
Y sentidos!
Bien sé yo que lo acabasen.
SAL. Quiérolos ir á Ilamar
Al lugar:
Veremos esto en que para;
Aunque ella se declara
Por tan cara,
Que ha de ser dura de armar.
Traz Salomão Esaias e Moyses e Abrahão
tando todos quatro de folia a cantiga seguinte.
'•'•Que saiíosa está Ia nina!
"Ay Dios quien le hablaria!"
Volta.
"En Ia sierra anda Ia nina
"Su ganado á repastar;
"Hennosa como Ias flores,
"Sanosa como Ia mar.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 47
Mar y sierra
De nada lo edificó.
Era vácua y vacía,
Y no habia
Cosa por quien fuese amado.
Ei spírito no criado
Sobre Ias águas lucía.
Fiat luxl luego fue hecha
Muy prehecha,
Sol y Luna y Ias estrellas,
Criadas claras y bellas
Todas ellas
Por regia justa y derecha.
Al Sol dióle compafiera
Por parcera,
De una luz de ambos guarnidos,
Dominados y medidos
Cada uno en su carrera.
Hagamos mas, dijo ei Senor
Criador,
Hombre a nuestrasemejanza,
Angélico en Ia esperanza
Y en lianza,
Y de lo terrestre — senor.
Luego le dió compafiera
En tal manera
De una gracia ambos liados,
Dos en una carne amados,
Como si ambos uno fuera.
El mismo que los crio,
Los caso,
Y troto ei casamiento;
DAS OBRAS DE DEVAÇÂO. 49
Y por su ordcnainiento
Es sacramento,
Que ai inundo estableció.
Y pues fue casamentero
El primero,
Y es lei determinada;
Como estás tú entirrada,
Diciendo que es captivero?
CASSANDRA.
Que cuando Dios los hacía
Y componía,
En esos tales no hablo:
Mas en aquellos que ei diablo
En su retablo
Hace y ordena cadaldia.
Por codicia los ayunta,
Y no pergunta
Por otra virtud alguna;
Y despues que Ia fortuna
Los enfuna,
Toda gloria le es defunta.
Si yo me casase agora,
Dendê á una hora
No querria ser nacida.
No tengo mas de una vida;
Y, sometida,
Diz, Casandra, tirte afuera.
Marido? ni aun sonado,
Ni pintado.
No cureis de porfiar,
Porque para bien casar
No es tiempo concertado.
50 LIVRO I.
ABRAHÃO.
Y si cobras buen marido,
Comedido,
Y nunca apasionado?
CAS. Nunca? estais inuy errado,
Padre honrado,
Porque eso nunca se vido.
Como puede sin pasion
Y alteracion
Conservarse ei casamiento?
Múdase ei contentamiento,
En un momento,
En contraria division.
Solo Dios es perfeccion:
Si en razon
La verdad quereis que hable;
Que ei hombre todo es mudable
Y variable,
Por humanai complision.
Pero yo quiero decir
Y descubrir
Porque virgen quiero estar:
Sé que Dios ha de encarnar,
Sin dudar:
Y una virgen ha de parir.
ERUTEA.
ESO bien ine Io sé yo,
Y cierta só
Que en un presepe ha de estar;
Y Ia madre ha de quedar
Tan virgen como nació.
Tambien sé que de pastores
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 51
Labradores
Será visto y de Ia gente;
Y le traerán presente
Del Oriente
Grandes Reis y sabedores.
CIMERIA.
Yo, dias ha, que hei sofiado
Y barrunlado,
Que via una virgen dar
r
A su bijo de mamar,
Y que era Dios humanado;
Y aun despues ine parecia
Que Ia via
Entre mas de mil doncellas;
Con su corona de estrellas
Mucho bellas,
Como ei sol resplandecia.
Nunca tan glorificada
Y acatada
Doncella se pudo asmar,
Como esta virgen vi estar;
Ni su par
No fue ni será criada.
De sol estaba guarnida,
Percebida,
Contra Lucifer armada,
Con virgen arnés guardada,
Ataviada
De inalla de santa vida.
Con leda cara y guerrera,
Placentera,
El resplandor piedoso,
52 LIVRO I.
A casar;
Por mi alma y por mi vida,
Que quien Ia viera sabida
Y tan leida,
Que se pudiera enganar.
Casandra, segun que mucstra
Esa respuesta
Tan fuera de conclusion,
Tu loca, yo Sáloinon,
Daine razon,
Qué vida fuera Ia nueslra?
CAS. Aun en mi seso esto:
Que soy yo.
ESA. Cállate, loca perdida,
54 LIVRO I.
Si hubiésemos de declarar
Y platicar
Cuanto delia está escrito,
56 LIVRO I.
Y Ia verdad
Despreciada y no valida,
Cuando vieren que Ia vida
Es abatida,
Del que sigue Ia bondad;
Cuando vieren que justicia
Está en malícia,
Y Ia fe fria, enechada,
Y Ia Iglesia sagrada
Captrvada
De Ia tirana codicia;
Cuando vieren irabajar
Por levantar
Palácios demasiados,
Y los pequenos menguãdos
Desolados;
No puede mucho tardar.
Y cuando vieren perdida
Y consumida
La vergüenza y Ia razon,
Y reinar Ia presuncion;
Nesta sazon
Perderá ei inundo Ia vida.
Y cuando mas segurado
Y olvidado
De Ia fin él mismo sea,
En aquel tiempo se crea,
Que ha de ser todo abrasado.
Abrem-se as cortinas onde está todo o apparato do
Nascimento, e cantão quatro Anjos.
"Ro ro ro
-Nueslro Dios y Redentor,
58 LIVRO I.
Un solo Dios,
Nacido por nos salvar.
Vão cantando em chacota, e chegando ao presépio diz
PERESICA.
Erutea, ves allí
Lo que vi,
La cerrada flor parida.
ABR. Oh vida de nuestra vida,
Guarecida
Y remediada por ti!
A ti adoro, Redentor,
Mi senor,
Dios y hombre verdadero,
Santo y divino cordero,
Postrimero
Sacrifício inayor!
MOYSES.
Oh pastorcico nacido,
Muy sabido,
De tu ganado cuidadoso,
Contra los lobos sanoso,
Y piedoso
Al rebano enflaquecido!
Por Ia tierna carne humana,
Nuestra hennana,
Que en ese brizo sospira,
Que nos libres de tu ira,
Y las animas nos sana!
SALOMÃO.
Qué oracion, Dios, te harán,
Qué dirán!
Oh gran Rei desde ninito
60 MVRO I.
CIMERIA.
Espejo de generaciones
Y naciones,
De Dios hija, madre y esposa,
Alta Reina gloriosa,
Especiosa,
Cumbre de las perfecciones!
Oh estrada en campos llanos
De humanos
Sospiros á ti comentes,
Oidora de las gentes,
Encomiéndome en tus manos!
PERESICA.
Oh clima de nuestro polo!
Un bien olo,
Planeta de nuestra gloria,
Influencia de vitoria:
Por memória
Nuestro sino laureolo.
ERU. Ave, stella matutina,
Bella y dina!
Ave, rosa, blanca flor!
Tú pariste ei Redentor,
Y tu color,
Del parto quedo mas fina.
Acabada assi sua adoração cantarão a seguinte cantiga, feita e ensoada
pelo atitor.
TODOS.
"Muy graciosa es Ia doncella:
"Como es bella y hennosa!
"Digas tú, ei marinero,
"Que en las naves vivias,
62 LIVRO I.
Vilancete.
"Á Ia guerra,
" Caballeros esforzados;
"Pues los ángeles sagrados
r
FÉ.
BRAZ.
BENITO.
SYLVESTRE.
Sabrásme tú rellatar
Que declinan estas lumbreras?
Son candeias ó bugeras?
IRA. NO lo sé pronunciar.
Son^palos daquel natío,
m Sonçjis nacen no sé donde.
IEN...NÍ jota n,04,se te esconde;
Pelletras mas que tu tio.
JRA. Oh que cosa tan garrida
Es aquello que allí está!
ÍEN. Y aquello qué sara?
JRA. Nunca tal vi en mi vida.
Juro á diez, mas bobo esto
Que ei triste que anda en aprifo.
No te quellotras, Benito?
SEN. Mas que tú bobeo yo:
No hago sino pensar,
Maginando nesta fiesta.
ÍRA. Es aquello ciesto ó ciesta,
O artesã de amasar ? *
BENITO.
Que es aquella sevandija
Amarilla incrucijada?
IRA. Será serpiente encantada,
O es negocio de igrija?
O sabes lo que será?
Donde deslindan los pleitos.
JEN. Ternas inuy grandes respetos,
Si Dios Ia vida te da.
Hideputa, como aciertas!
Y pareces bobillon.
* Pola caldeira da água benta.
5
Vol. I.
66 HVKO 1.
Tornémonos á salir,
Y revelleinos ahotas.
BENITO,
Tú, Brás, harás Ia entrada.
BRA. Mas entremos par á par,
Porque nos cumple animar
Al dar de Ia revellada.
Comenceinos á Ia una.
BEN. Tente, tente sobre ti.
BRA. Si tú te piegas á mi,
Diablo, bestia ovejuna!
lia inesura bien está:
Las manos tambien pongamos.
BEN. Porque no nos asentainos?
BRA. El diablo acertará.
BEN. Tú no ves como está ella?
BRA. Ora ponte tú, veremos.
BEN. Cuinple que nos debloqueinos,
Y tengamos ojo en ella.
BRAZ.
Está hablando entre dientes.
Haces burla dei verano!
BEN. Ya se ine hincha una mano:
Y tú, carülo, qué sientes?
BRA. Las rodüias entumidas,
Las piernas ine estan temblando.
BEN. Ella que está inaginando?
BRA. Tiene las mientes perdidas.
BENITO.
Levantémonos de aqui:
Nosotros bobos estamos.
Vamos á ver nuestros amos.
5*
68 LIVRO I.
FÉ.
Fé he amar a Deos, so poi? elle,.
Quanto se pode amar,
Por ser elle singular,
Não por interesse delle:
E se mais quereis saber,
Crer na Madre Igreja sanctar
E cantar o que ela canta,
E querer o que ella quer.
BENITO.
El que pergunta no yerra:
Qué es aquella encrucijada,
Que allí está tan replicada,
Que seineja roble en sierra?
FÉ. Aquella he a arvore da vida.
BRA. NO desiludais como ha nombre?
Y qué hace alli aquel hombre
Puesto y Ia color perdida?
FÉ.
AqueHa he a cruz preciosa,
Para sempre esclarecida,
Para os perigos desta vida,
E nao da salvação nossa.
O homem se chama Jesu,
Messias, Rei, Salvador,
Deos e homem, Redemptor;
(Não sei se o entendes t u )
Deos he seu nome maior.
BRAZ.
Mi amo ha nombre tambien
Pero Alonso, y Pero Matos,
Y Perazo lo llainan liados.
70 LIVRO I.
Oh noute favorecida
De memorável coroa,
Vista de Deos em pessoa,
Começando humana vida!
Dos anjos toda cercada,.
Dos elementos servidaT
Do Padre e Filho escolhida,.
Do Sprito Sancto espiradal
BRAZ.
Que no os entiendo, no,
Ni sé que cosas baldais.,
Si mas no lo aclarais.
Como estava me esto.
Si es noche de navidá,.
Esa es otra sevandija;
Mas no veo en nuestra igrija
Esto ansí como aqui eslá.
FÉ.
Haveis de crer firmemente
Tudo quanto vos disser
Os que salvos quereis ser
Naquesta vida presente:
Crede o sancto nascimento,
Ser Deos da Virgem nascido,
Verbo de Deos concebido
Para novo testamento.
E que a Virgem gloriosa
Ficou lal como nasceo;
E sem dor appareceo
A nossa flor preciosa,
Deos em toda perfeição,
Homem para padecer,
72 LIVRO I.
E tirar a Lucifer
Toda sua jurdição.
BRAZ.
Qué anos ha que acaeció?
FÉ. Mil e quinhentos e dez.
BRA. Y ahora nace otra vez ?
De mil anos se acordo!
Quizá si hoinbre allá se bailara
FÉ. Tanto monta se agora
Contemplares aquella hora
Como se agora passara.
Pastor, faze tu assi:
Começa de ünaginar
Que ves a Virgem estar
Como se estivesse ahi:
E esta Virgem mui ornada,
De pobreza guarnecida,
De raios esclarecida,
De joelhos humilhada:
E que ves diante delia
Huin menino então nascido,
Filho de Deos concebido
Naquella sancta donzella.
Ve o menino chorar,
E a Senhora affligida,
Sem ter cousa nesta vida,
Nem pannos para o pensar:
Na mangedoura mettido
Em pobre palha chorando,
E os anjos embalando
O menino entanguecido.
BRA. Con eso se me acordo
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 73
Tamafiito
Veremos como se inuestra
Recien nacido de ahora,
Poço ha;
Veremos Ia reina nuestra,
Nuestra gran superiora,
Cual está.
Vamos ver pulcra y decora
Como está, clara y lumbrosa,
Descansada;
Vamos ver nuestra senora,
lia mas bella y graciosa,
D esposada.
Vamos ver Ia clara silla
Eternalmente guardada
En alto grado;
Vamos ver Ia sin mancilla,
Vamos ver Ia preservada
De pecado:
Emperatriz soberana,
De todo cuento dei viso
Angelical,
Reina dei cielo á Ia liana,
Senora dei paraíso
Terrenal:
La gran princesa sin falta
Deste valle lacrimoso,
Donde mora
lia gran Duquesa muy alta
De Ia paz y dei reposo,
Desde ahora.
Vamos ver con que doncellas,
80 LIVRO I.
Namorados, requebrados:
Renovar los corazones!
Agora reina Cupido,
Desque vido
La nueva sangre venida:
Agora da nueva vida
Al namorado perdido.
"Limones cogia Ia virgo
"Para dar ai su amigo.
"Quiérome ir allá,
''Para ver ai ruisenor
"Como cantaba."
Como me extiendo á placer!
O hideputa zagal,
Qué tiempo tan natural
Para no adolecer!
Cuantas mas veces me miro
Y me reiniro,
Véome tan quülotrado,
Tan lúcio y bien asoinbrado,
Que nunca lacer me tiro.
"Para dar ai su amigo
"En un sombrero de sirgo.
"Quiérome ir allá,
"Por mirar ai ruisenor
"Como cantaba."
Las abejas cobneneras
Ya me zunen los oidos,
Paciendo por los floridos
Las flores mas placenteras.
Cuán granado vieneíel trigo!
Nuestro amigo,
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 85
Ni Apoio se verá,
Ni los Bacos adorados
De Romanos:
Ni ei Hímeneo será
Padrino de los casados
Persianos:
Ni las ninfas aguaceras
Traerán águas por raegos
De las gentes:
Ni las hadas hechiceras
Mostrarán fingidos fuegos
De serpientes.
Y Nayades y Dianas,
Las Driades cazadoras,
Y Netuno,
Y las três diesas troyanas,
Dejarán de ser senoras
De consuno:
Y Ia Rhamnusia doncella
Decida de su castillo
Con ultrage,
Y todas estas con ella
Daran ai nino chiquillo
El menage.
La nueva infante Safos
Subió ai monte Parnaso,
Con aliiío
De traer en tierra Dios
De los Alpes en lo raso,
Hecho nino:
La cual infante gloriosa
En Ia Castália fuente
90 LIVRO I.
Se banó;
Porque siendo generosa,
Humildosa por ei monte
Se subió.
La muy escura vision
De Ia caverna Saturna,
Con Ias vidas
De los hijos de Monjergon,
Y de Ia diesa noturna,
Son sumidos.
Los venenos ponzonosos,
Que de Medusa salieron
Goteando,
Sus actos tanto danosos,
Cuando tal mistério vieron,
Van cesando.
lia Hechene venenosa,
Y aquella Estyx laguna
Infernenta,
Desde ahora temerosa
Está su boca importuna,
De contenta.
Creo que oyó los bramidos
De los bregos ancianos
De alegria,
Porque hoy son abatidos
lios infernales tiranos
Neste dia.
Todos van hoy adorar
Al criador poderoso,
Que es nacido;
Las aves con su cantar,
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 91
Y ei ganado selvinoso
Con bramido.
Los salvaginos bestiales
Con olicorne pandero
Dan loores;
Y los brutos aniinales
Adoran aquel cordero,
Y los pastores.
Pues qué haceis, Tiempos hennanos,
Descuidados dei amor
Del que nació?
Levantad todos Ias manos,
Vamos ver aquel Senor,
Que nos crio.
INV; NO decís, si puedo yo?
No veis que estoy renegado
Del tempero?
VER. Cuantés yo sudando esto.
EST. Fiebres me tienen cansado,
Pero no os diré de no,
Que ver lo quiero.
INVERNO.
O Júpiter, si en tu ventura
Topásemos allá fuego,
Luego holgaria.
JUP. El criador y criatura
Es ei inundo y es ei huego,
Y él Io envia.
EST. Aquesta dolencia mia
Le tengo de encomendar
De corazon.
VER. Yo cantaré de alegria.
92 LIVRO L
Y Ia Canina,
lia inayor y menor dellas,
Con ininensa devocion
Se te inclina.
Y ei tu cielo etereo,
Círculos y Zodíaco,
Y Arcturo sino
Reconocen tu aseo;
No segun ei cuerpo flaco,
Mas divino.
El monte de Ipobnorea,
Y inontaõas de Carmelo,
Y Gelboé,
Y Ia inontana Rifea
Alegres con mucho zelo
Las hallé.
El monte de Selmeron,
Y inontanas de Efrain,
Y de Galaad,
Y las selvas de Frion,
Maridan adorar por iní
Tu deidad.
Y ei noble rio Ganges,
Con oro, piedras, ineíales,
Y arboledas,
Alegre, claro y cortês,
Te ofrecen, con sus iguales,
Cosas ledas.
Eufrates, Tigre, Guijon,
Con cosas muy olorosas
Se te ofrecen
Sin ninguna division.
94 LIVRO I.
Golondrinas, abubillas,
Palomas y tortolillas,
Picapuercos y garcenas,
Zorzales y aveduenas,
Codornices y grideíías,
Milanos y tantaranas,
Muchos gayos y pardenas.
Y tambien los gusanitos,
Hormigas rubias j prielas,
Mariposas y veletas,
Cientopiés y buercitos,
Caracoles y garlitos,
Moscas, ratos y ratones,
Muchas pulgas á inontones,
Y piojos infinitos:
Agriones y rabazas,
Apiopoleo, painpillo,
Mabnequieres amarillo,
Almeirones y margazas,
Florecitas por Ias zarzas,
Madresilva y rosillas,
Jazmines y maravillas,
Rábanos, coles y alfazas:
Puerros, ajos y cebollas,
Mastuerzo,* habas, hervejas,
Gravanizos, granos, lentejas,
Verdolagas y vampollas,
Mil yerbas, fructas y folias,
Untesgina y catasol;
Y ansí hoinbre de prol
Te doy gracias y grollas.
96 LIVRO I.
ESTÍO.
Senor, yo con mi dolencia,
Mis fiebres y mi flaqueza,
Me humillo á tu alteza,
Y adoro tu clemência
De Ia triste vida mia
Dolentía:
Pues te place con ella,
Quiero callar ini querella,
Sufriendo de dia en dia.
Entra D avia, em figura de pastor, e diz.
DAVID.
Pues los ángeles sagrados,
Y los Tiempos y Elementos,
Tocan hoy caramUlos,
Dejen todos los ganados
Los pastores inuy contentos,
Silbemos, demos gritillos.
Yo tambien quiero tocar
Y cantar
Con mi salterio alegrias,
En tono de profecias,
Mientras me vaga lugar;
Y luego os adoraré.
"Levavi óculos meos
"En los montes onde espero
"Aquella ayuda que quiero
"Con ahincados deseos.
" Y Ia ayuda que demando
"Repastando
"En cima daquesta sierra
" Qui fecít caúum y tierra,
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 97
PRÓLOGO.
HUM FRADE.
A VIRGEM.
PRUDÊNCIA.
POBREZA.
HUMILDADE.
FÉ.
O ANJO GABRIEL.
S. J O S E P H .
ANDRÉ.
P A Y O VAZ.
PESSIVAL.
MOFINA MENDES.
B R A Z CARRASCO.
BARBA TRISTE.
TIBALDINHO.
ANJOS.
7*
ALTO DA MOFINA MENDES.
E Venite adoremus
Vestido com capa alhea.
Trará Te Deum laudamus
D'escarlata hüa libre:
Jam lucis orto sidere
Cantará o benedicamus,
Pola gran festa que he.
Quem terra, pontus, cethera
Virá muito assocegado
N'hum sendeiro mal pensado,
E hum gibão de tafetá,
E hüa gorra d'orelhado.
Et electa ut sol,
Balsamo mui oloroso,
Pulchra ut liltum gracioso,
Das flores mais linda flor,
Dos campos o mais fermoso:
Chama-llie plantatio rosa,
Nova oliva speciosa,
Mansa columba Noe,
Estrella a mais luminosa.
PRUDÊNCIA.
Et acies ordinata,
Fennosa filha d' elrei
De Jacob, et tabernacula
ISpeculum sine macula,
Ornata civitas Dei.
FÉ. Mais diz ainda Salomão:
Hortus conclusus, fios hortorum,-
Medecina peccatorum,
Direita vara de Arão,
Alva sobre quantas forão,
Sancta sobre quantas são.
E seus cabellos polidos
São formosos em seu grado
Como manadas de gado,
E mais que os campos floridos,
Em que anda apascentado.
Pnu. He tão zeloso o Senhor,
Que quererá seu estado
Dar ao mundo per favor,
Por hüa Eva peccador,
Hüa virgem sem peccado.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 107
VIRGEM.
Oh! se eu fosse tão ditosa
'Que com estes olhos visse
Senhora tão preciosa,
Thesouro da vida nossa,
E por escrava a servisse!
Que onde tanto bem se encerra,
Vendo-a ca entre nós,
Nella se verão os ceos,
E as virtudes da terra,
E as moradas de Deos.
Neste passo entra o anjo Gabriel, dizendo:
GABRIEL.
Oh! Deos te salve, Maria,
Cheia de graça graciosa,
Dos peccadores abrigo!
Gosa-te com alegria,
Humana e divina rosa,
Porque o Senhor he cointigo.
VIR. Prudência, que dizeis vós?
Que eu muito turbada sam;
Porque tal saudaçam
Não se costuma antre nós.
PRUDÊNCIA.
Pois que he auto do Senhor,
Senhora, não esteis turbada;
Tornae em vossa color,
Que, segundo o embaixador,
Tal se espera a embaixada.
GAB. O Virgem, se ouvir me queres,
Mais te quero inda dizer.
Benta es tu em mereceres
108 LIVRO I.
PAYO VAZ.
Agora posso eu dizer,
E jurar e apostar,
Qu'es Mofina Mendes toda,
PES. E s'ella baila na voda,
Qu'está ainda por sonhar,
E os patos por nascer,
E o azeite por vender,
E o noivo por achar,
E a Mofina a bailar;
Que menos podia ser?
Vai-se Mofina Mendes, cantando.
MOFINA MENDES.
"Por mais que a dita m'engeite,
"Pastores, não me deis guerra:
"Que todo o humano deleite,
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 117
P s a I m o.
VIRGEM.
O devotas almas felis,
Para sempre sem cessar
Laudate Dominum de coelis,
Laudate eum iii excelsis,
Quanto se pede louvar.
PRUDÊNCIA.
Louvae, anjos do Senhor,
Ao Senhor das altezas,
E todalas profundezas,
Louvae vosso criador
Com todas suas grandezas.
HUMILDADE.
Laudate eum, Sol et Luna,
Laudate eum, stellce et lumen,
Et lauda, Hierusalem,
Ao Senhor que te enfuna
Neste portal de Bethlem.
VIRGEM.
Louvae o Senhor dos ceos,
Louvae-o, água das águas,
Que sobre o ceo sois firmadas;
E louvae o Senhor Deos,
Relâmpagos e trovoadas.
PRUDÊNCIA.
Laudate Dominum de terra,
Dracones et omnes abyssi,
E todas diversidades
De nevoas e serra,
Ventos, nuvens et eclipsi,
E louvae-o, tempestades.
120 LIVRO I.
HUMILDADE.
Bestial et universa
Pecora, volucres, serpentes,
Louvae-o, todalas gentes,
E toda a cousa diversa,
Que no inundo sois presentes.
Vem a Fé com a vela sem lume, e diz
JOSEPH.
Não vos anojeis, Senhora,
Pois estais ein terra alheia,
Ser o parto sem candeia,
Porque as gentes d'agora
São de mui perversa veia.
Todos dormem a prazer,
Sem lhes vir pela memória
Que por força hão de morrer;
E não querem accender
A sancta vela da glória.
HüMttiDADE.
Devíão ter piedade
Da Senhora peregrina,
Romeira da christandade,
Que está nesta escuridade,
Sendo Princeza divina,
Pera exemplo dos senhores,
Pera lição dos tyrannos,
Pera espelho dos mundanos,
Pera lei aos peccadores,
E memória dos enganos,
FÉ.
Não fica por lh'o pregar,
Não fica por lh'o dizer,
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 121
E o lume a perfeição.
Jos. Senhora, não monta mais
Semear milho nos rios,
Que querermos por sinaes
Metier cousas divinaes
Nas cabeças dos bugios.
Mandae-lhe accender candeias,.
Que chamem ouro e fazenda,
E vereis bailar baleias;
Porque irão tirar das veias
O lume com que se accenda.
E á gente religiosa
Manda-lhes velas bispaes;
A cera, de renda grossa;
Os pavios, de casaes;
E logo não porão grosa.
PRUDÊNCIA.
Senhora, a meu parecer,
Para esta escuridade
Candeia não ha mister;
Que o Senhor qu'ha de nascer
He a mesma claridade;
Lumen ad revelationem genttum
He profetizado a nós,
E agora se ha de cumprir:
Pois para que he ir e vir,
Huscar lume para vós,
Pois lume haveis de parir?
Nem deveis de estar afflita,
Para lhe guisar manjar;
Porque he fartura infinita,
He chamado Panis vita,
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 123
PRÓLOGO.
VASCO AFFONSO.
CATHERINA.
JOANNE.
FERNANDO.
MAÜANELIiA.
AFFONSO.
INEZ.
MARGARIDA.
CLÉRIGOS.
JOANNE.
He essa a tua saia nova?
Mostra ca a A^er que lan tem.
CAT. Joanne! JOA. Catalina! CAT. Ora bem,
O demo t'a ti faz a cova.
JOA. Toinae lá! esta vos he ella!
CAT. Tal foste com Madanella,
E sempre chufou de ti:
Pois qu'esperas tu de mi,
Que sam mais valente qu'ella?
JOANNE.
O Dexemo que t'eu digo,
Que porque isso he ja sabido,
Ando eu assi franzido,
E o demo anda comego.
Renego ora d'enha mãe,
Porque as lagrimas me sãe
O dia que te não vejo;
E tu tens-ine tal entejo,
Que os esp'ritos se me cãe.
CATHERINA.
Choros mãos chorem por ti:
Quem te manda a ti chorar?
JOA. TU in'has de fazer botar
Mui cedo per esse chão per hi.
Não sejas ora entirrada,
Catalina minha dama;
Que cedo hei d'ir á feira,
E eu farei de maneira
Que tu sejas bem toucada.
Não m'arrarão alfenetes,
E lambem enxaravia.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 135
AFFONSO.
Ella oinagein in'affegura:
Oh Senhora Virgem pura!
CAT. Quem vos trouge a esta serra?
FER. Ponde os giolhos em terra.
AFF. Ponhamo-la nesta verdura.
E posta a imagem, diz
JOANNE.
Pois não sabemos rezar,
Façainos-lhe hüa chacota,
Porque toda a alma devota
O que tem, isso ha de dar.
FER. Façamos, que bem será.
CAT. Joanne, tir'-te tu lá.
Dá-me tu a mão, Fernando.
FER. Nisso estava or'eu cuidando.
Madanella, vem tu ca.
MADANELLA.
Com Affonso quero eu.
AFF. Inez mana, eu condigo,
146 LIVRO I.
"Muito pequenina,
"Vi hüa desposada
" E Virgem parida.
"Em Bethlem, cidade
"Muito pequenina,
"Vi hüa desposada
" E virgem parida.
"Quem he a desposada?
"A Virgem sagrada.
"Quem he a que paria?
"A Virgem Maria.
"Hüa pobre casa
"Toda reluzia,
"Os anjos cantavão,
"O mundo dizia:
"Quem he a desposada?
"A Virgem sagrada.
"Quem he a que paria?
"A Virgem Maria."
MERCÚRIO. DOROTHEA.
TEMPO. MONECA.
SERAPHIM, GILBERTO.
DIABO. NABOR.
ROMA. MATHEUS.
AMANCIO VAZ. JUSTINA.
DENIZ LOURENÇO. VICENTE.
BRANCA ANNES. LEONARDA.
MARTA DIAS. MERENCIANA.
TESAURA. THEOÜORA.
JULIANA. GIRALDA.
E mais achareis
Somma de contas, todas de contar
Quão poucos e poucas haveis de lograr
As feiras mundanas; e mais contareis
As contas sem conto qu'estão per contar.
E porque as virtudes, Senhor Deos, que digo,
Se forão perdendo de dias em dias,
Com a vontade que deste ó Messias
Memória o teu anjo que ande comigo,
Senhor, porque temo
Ser esta feira de inaos compradores,
Porque agora os mais sabedores
Fazem as compras na feira do Demo,
E os mesmos diabos são seus corretores.
Entra hum Seraphim enviado por Deos a petição do
Tempo, e diz:
SERAPHIM.
A feira, a feira, igrejas, mosteiros,
Pastores das almas, Papas adormidos;
Comprae aqui pannos, mudae os vestidos,
Buscae as çamarras dos outros primeiros
Os antecessores.
Feirae o carão que trazeis dourado;
r
O presidentes do crucificado,
Lembrae-vos da vida dos sanctos pastores
Do tempo passado.
r
Ha de levar ao mercado
O que lhe comprão melhor;
Porque a ruim comprador
Levar-lhe ruim borcado.
E mais as boas pessoas
São todas pobres a eito;
E eu por este respeito
Nunca tracto ein cousas boas,
Porque não trazem proveito.
Toda a glória de viver
Das gentes he ter dinheiro,
E quem muito quizer ter
Cumpre-lhe de ser primeiro
O mais ruim que puder.
E pois são desta maneira
Os contractos dos mortaes,
Não me lanceis vós da feira
Onde eu hei de vender mais
Que todos á derradeira.
SER. Venderás muito perigo,
Que tens nas trevas escuras.
DIA. EU vendo perfumaduras,
Que, pondo-as no embigo,
Se salvão as criaturas.
As vezes vendo virotes,
E trago d'Anda!uzia
Naipes com que os sacerdotes
Arreneguem cada dia,
E joguem té os pellotes.
SER. Não venderás tu aqui isso,
Que esta feira he dos ceos:
Vae lá vender ao abisso
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 161
DIABO..
Preposito Frei Sueiro,
Diz lá o exemplo velho,
Dá-me tu a mim dinheiro,
E dá ao demo o conselho.
Depois de ida Roma, entrão dous lavradores, hum per
nome Amando Vaz, e outro Deniz Lourenço, e diz
AMANCIO VAZ.
Compadre, vas tu á feira?
DEN. A feira, compadre. AMA. Assi;
Ora vamos eu e ti
O longo desta ribeira.
DEN. Bofá, vamos. AMA. Folgo bem
De te vir aqui achar.
DEN. Vas tu lá buscar alguém,
Ou esperas de comprar?
AMANCIO VAZ.
Isso te quero contar,
E iremos patorneando,
E er lambem aguardando
Polas moças do logar.
Compadre, enha mulher
He muito destemperada,
E agora, se Deos quizer,
Faço conta de a vender,
E da-la-hei por quasi nada.
Qu'eu quando casei com ella
Dizião-ine, — hétega he;
E eu cuidei pola abofé
Que mais cedo morresse ella,
E ella anda inda em pé.
E porque era hétega assim
168 LIVRO I.
Parece demoninhada,
Ante San Bartholomeu.
)EN. Ja siquer terá esp'iito:
Mas renega da mulher
Que ó tempo do mister
Não he cabra nem cabrito.
AMANCIO VAZ.
A minha tinir eu em guarda
Para bein de minha prol,
Cuidando que era ourinol,
E tornou-se-me bombarda.
Folga tu que ess'outra tenhas,
Porque a minha he tal perigo,
Que por nada que lhe digo
Logo ine salla nas grenhas.
Então tanto punho sêcco
Me chiinpa nestes focinhos;
Eu chamo pelos vezinhos,
E ella nego dar-*ne em xeco.
DEN. ISSO he de coraçuda;
Não cures de a vender,
Que s'alguein le mal fizer,
Ja siquer tens quem te acuda.
Mas a minha he tão cortez,
Que se viesse ora á mão
Que in'espancasse hum rascão,
Não diria, — mal fazes:
Mas antes s'assentaria
A olhar como eu bradava.
Todavia a mulher brava
He, compadre, a qu'eu queria.
170 LIVRO I.
AMANCIO VAZ.
Pardeos! tanto me faras,
Que feire a minha comtego.
DEN. Se queres feirar comego,
Vejamos que me darás.
AMA. Mas antes in'has de tornar,
Pois te dou mulher tão forte,
Que te castigue de sorte
Que não ouses de fallar,
Nem no mato nem na corte.
Outro bem teras com ella:
Quando vieres da arada,
Conterás sardinha assada,
Porqu'ella jenta a panella.
Então geme, pardeos, si,
Diz que lhe doe a moleira.
DEN. Eu faria por maneira
Que esperasse ella por mi.
AMANCIO VAZ.
Que hVhavias de fazer?
DEN. Amancio Vaz, eu o sei bem.
AMA. Deniz Lourenço, ei-las ca vem.
Vamo-nos nós esconder,
Vejamos que vem catar,
Qu'ellas ambas vem a feira.
Mette-te nessa silveira,
Qu'eu daqui hei d'espreitar.
Vem Branca Armes a brava, e Marta Dias
mansa, e vem dizendo a brava:
HRANCA A N N E S .
Pois casei má hora, e nella,
E com tal marido, prima,
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 171
Compradores a comprar
Sainica ovos e gallinhas.
DOR. Não lhe hei de vender as minhas,
Que as trago pera dar.
Vem dous compradores, hum per nome Vicente, e ou\
Malheus, e diz Matheus a Jus tina.
MATHEUS.
Vós rosa do amareflo,
Mana, tendes hi queijadas?
Jus. Tenho vosso avô marmelo^
Conhecei-lo ?
MAT.Aqui estão einborilhadas.
Jus. Estade ma ora quedo,
Pela vossa negra vida.
MAT.Menina, não hajais medo:
Vós sois mais engrandecida
Que Branca de Figueiredo.
Se trazeis ovos, meus olhos,
Não m'os vendais a ninguém.
Jus. Andar ein burra e ter bem:
Ouvide ora o rasca-piolhos
(Azeite no inicho!) ein que vem!
Vic. Minha vida Leonarda
Traz caça para vender?
LEO. Vossa vida' negra e parda
Não lhe abastará comer
Da vacca com da mostarda?
VICENTE.
E a mesa de meu senhor
Irá sem ave de penna?
LEO. Quem? e vós sois comprador?
Pois nem grande nem pequena
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 179
MATHEUS.
Vós Tesaura, minha estrella,
Não virieis ca ein vão.
TES. Pois si, vossa estrella vos er'ella:
Como aquillo he de rascão!
MvT.Mas como isso he de donzella!
Porém va ja como vai,
E casemo-nos, senhora.
TES. Pois casae co'el!e, casae.
Casar ma ora, meu pae,
Casar ma ora.
MATHEUS.
Porém trazeis algum pato?
TES. E quanto dareis por elle?
Hui! e elle revolve o fato:
Olho mao se metta nelle.
MAT. Não trazeis vós o qifeu cato.
Vic. Merenciana deve ter
Neste cesto algum cabrito.
MER. Não m'haveis de revolver,
Senão pardeos que dê grito
Tamanho, qu'haveis de ver.
VICENTE.
Eu hei de veí que trazeis.
MER.Se vós no cesto bolis...
Vic. Senhora, que me fareis?
MER. Hum aqui-delrei, ouvis?
Não sejais vós descortez.
Vic. Não quero senão amores,
Pois vosso, senhora, sô.
MER. Amores de vosso avô,
182 LIVRO I.
ALMA.
ANJO CUSTODIO.
IGREJA.
S. AGOSTINHO.
S. AMBROSIO.
S. JERONIMO.
S. THOMAZ.
Dous DIABOS.
ARGUMENTO.
Assi como foi cousa muito necessária haver nos caminhos
estalagens, pera repouso e refeição dos cansados caminhan-
tes, assi foi cousa conveniente que nesta caminhante vida
houvesse hüa estalajadeira, pera refeição e desanco das
almas que vão caminhantes pera a eternal morada de Deos.
Esta estalajadeira das almas he a Madre Sancta Igreja;
a mesa he o altar, os manjares as insígnias da paixão.
E desta perfiguração tracta a obra seguinte.
Está posta hüa mesa com hüa cadeira. Vem a Madre
Sancta Igreja com seus quatro doctores, San Thomaz, San
Jeronimo, Sancto Ambrosio, Sancto Agostinho; e diz
AGOSTINHO.
Necessário foi, amigos,
Que nesta triste carreira
Desta vida,
Pera mui p'rigosos p'rigos
Dos iinigos,
Houvesse algüa maneira
De guarida.
Porque a humana transitória
Natureza vai cansada
Em várias calmas;
Nesta carreira da glória
186 LIVRO L
Meritoria,
Foi necessário pousada
Pera as almas.
Pousada com mantimentos,
Mesa posta em clara luz,
Sempre esperando
Com dobrados mantimentos
Dos tormentos
Que o Filho de Deos na cruz.
Comprou, penando.
Sua morte foi avença,
Dando, por dar-nos paraizo,
A sua vida
Apressada, sem detença;
Por sentença
Julgada a paga em proviso,
E recebida.
A sua mortal empresa
Foi, sancta estalajadeira
Igreja Madre
Consolar á sua despesa
Nesta mesa
Qualquer alma caminheira,
Com o Padre
E o anjo custodio aio.
Alma que lh'he encoinmendada,
Se enfraquece
E lhe vai tomando raio
De desmaio;
Se chegando a esta pousada,
Se guarece.
Vem o Anjo Custodio com a Alma, e diz:
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 187
ANJO.
Alma humana formada
De nenhüa eousa, feita
Mui preciosa,
De corrupção separada,
E esmaltada
Naquella frágoa perfeita
Gloriosa;
Planta neste valle posta
Pera dar celestes flores
Olorosas,
E pera serdes tresposta
Em a alta costa
Onde se crião primores
Mais que rosas;
Planta sois e caminheira,
Que ainda que estais, vos is
Donde viestes.
Vossa pátria verdadeira
He ser herdeira
Da glória que conseguis:
Andae prestes.
Alma bem-aventurada,
Dos anjos tanto querida,
Não durmais;
Hum ponto não esteis parada,
Que a jornada
Muito em breve he fenecida,
Se attentais.
ALM. Anjo que sois minha guarda,
Olhae por minha fraqueza
Terreal:
188 LIVRO I.
O precioso defensor
Meu favor!
Vossa espada lumiosa
Me defenda.
Tende sempre mão em mim,
Porque hei medo de empeçar,
E de cahir.
ANJ. Pera isso sam, e a isso vim;
Mas emfiin
Cumpre-vos de me ajudar
A resistir.
Não vos occupem vaidades,
Riquezas, nem seus dabates.
Olhae por vós;
Que pompas, honras, herdades
E vaidades,
São embates e combates
Pera vós.
Vosso livre alvedrio,
Isento, forro, poderoso,
Vos he dado
Polo divinal poderio
E senhorio,
Que possais fazer glorioso
Vosso estado.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 189
Não caiais:
Siga vossa fermosura
As gloriosas.
Adianta-se o Anjo, e vem o Diabo e diz:
DIABO.
Tão depressa, ó delicada,
Alva pomba, pera onde is?
Quem vos engana,
E vos leva tão cansada
Por estrada,
Que somente não sentis
Se sois humana?
Não cureis de vos matar,
Que ainda estais ein idade
De crescer.
Tempo ha hi pera folgar,
E caminhar:
Vivei á vossa vontade,
E havei prazer.
Gozae, gozae dos bens da terra,
Procurae por senhorios
E haveres.
Quem da vida vos desterra
A triste serra?
Quem vos falia em desvarios
Por prazeres?
Esta vida he descanso
Doce e manso,
Não cureis d'outro paraizo:
Quem vos põe em vosso siso
Outro remanso?
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 191
ALMA.
Não me detenhais aqui,
Deixae-me ir, que ein ai me fundo.
DIA. Oh descansae neste inundo,
Que todos fazem assi.
Não são em balde os haveres,
Não são em balde os deleites,
E fortunas;
Não são de balde os prazeres
E comeres:
Tudo são puros affeítes
Das criaturas.
Pera os homens se criarão.
Dae folga á vossa passagem
D'hoje a mais:
Descansae, pois descansarão
Os que passarão
Por esta mesma roínagem
Que levais.
O que a vontade quizer,
Quanto o corpo desejar,
Tudo se faça.
Zombae de quem vos quizer
Reprender,
Querendo-vos marteirar
Tão de graça.
Tornára-ine, se a vós fora.
Is tão triste, atribulada,
Que he tonnenta.
Senhora, vós sois senhora
Imperodora,
Não deveis a ninguém nada;
192 LIVRO I.
Sede isenta.
ANJ. Oh! andae; quem vos detém?
Como vindes pera a glória
Devagar!
Oh meu Deos! oh summo bem!
Ja ninguém
Não se preza da victoria
Em se salvar.
Ja cansais, alma preciosa?
Tão asinha desmaiais?
Sede esforçada!
Oh como virieis írigosa
E desejosa,
Se visseis quanto ganhais
Nesta jornada!
Caminhemos, caminhemos;
Esforçae ora, ahna sancta
Esclarecida!
Adianta-se o Anjo, e torna Satanaz:
DIABO.
Que vaidades e que extremos
Tão supremos!
Pera que he essa pressa tanta?
Tende vida.
Is mui desautorisada,
Descalça, pobre, perdida
De remate:
Não levais de vosso nada,
Amargurada.
Assi passais esta vida
Em disparate.
Vesti ora este brial,
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 193
13
Vol. I.
194 LIVRO L
Por mercante,
O cossairo Satanaz,
Porque queres.
Oh! caminhae com Cuidado,
Que a Virgem gloriosa
Vos espera.
Deixais vosso prineipado
Desherdado^
Engeitais a glória vossa
E pátria vera!
Deixae esses chapins ora,
E esses rabos tão sobejos,
Que is carregada:
Não vos tome a morte agora
Tão senhora;
Nem sejais com taes desejos
Sepultada.
ALMA.
Andae, dae-me ca essa mão;
Andae vós, que eu irei,
Quanto puder.
Adianta-se o Anjo, e torna o Diabo.
DIABO.
Todas cousas com razão
Tem sazão.
Senhora, eu vos direi
Meu parecer.
Ha hi tempo de folgar,
E idade de crescer;
E outra idade
De mandar e triumphar,
E apanhar
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 195
E acquirir prosperidade
A que puder.
Ainda he cedo pera a ihOrte;
Tempo ha de arrepender,
E ir ao ceo.
Ponde-vos á fór da corte,
Desta sorte
Viva vosso parecer,
Que tal nasceo.
O ouro pera que he,
E as pedras preciosas,
E brocados?
E as sedas pera que?
Tende por fé,
Que p'ra as almas mais ditosas
Forâo dados.
Vedes aqui huin collar
D'ouro mui bein esmaltado,
E dez anneis.
Agora estais vós p'ra casar
E namorar:
Neste espelho vos vereis,
E sabereis
Que não vos hei de enganar.
E poreis estes pendentes,
Em cada orelha seu:
Isso si;
Que as pessoas diligentes
São prudentes.
Agora vos digo eu
Que vou contente daqui.
13
196 LIVRO I.
ALMA.
Oh como estou preciosa,
Tão dina pera servir,
E sancta pera adorar!
ANJ. Oh alma despiedosa
Perfiosa!
Quem vos devesse fugir,
Mais que guardar!
Pondes terra sobre terra;
Qu'esses ouros terra são.
O Senhor,
Porque permittes tal guerra,
Que desterra
Ao reino da confusão
O teu lavor?
Não ieis mais despejada,
E mais livre da primeira
Pera andar?
Agora estais carregada
E embaraçada
Com cousas que, á derradeira,
Hão-de ficar.
Tudo isso se descarrega
Ao porto da sepultura.
Alma sancta, quem vos cega,
Vos carrega
Dessa van desaventura?
ALMA.
Isto não me pesa nada,
Mas a fraca natureza
Me embaraça.
Ja não posso dar passada
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 197
De cansada:
Tanta he minha fraqueza,.
E tão sem graça!
Senhor, ide-vos embora,
Que remédio em mim não sento;
Ja 'stou tal
ANJ. Sequer dae dous passos ora
Até onde mora
A que tem o mantimento
Celestial.
Ireis alli ropousar,
Comereis alguns bocados
Confortosos;
Porque a hóspeda he sem par
Em agasalhar
Os que vem atribulados
E chorosos.
ALM. He longe? ANJ. Aqui mui perto.
Esforçae, não desmaieis;
E andemos,
Qu'alli ha todo concerto
Mui certo:
Quantas cousas querereis
Tudo tendes.
A hóspeda tem graça tanta,
Far-vos-ha tantos favores —
ALM. Quem he ella?
ANJ. He a Madre Igreja Sancta,
E os seus sanctos Doutores
Hi com ella.
Ireis d'hi mui despejada,
Cheia do Spirito Sancto,
198 LIVRO I.
E mui fermosa.
0 Alma, sede esforçada!
Outra passada;
Que não tendes de andar tento
A ser esposa.
DIABO.
Esperae, onde vos is?
Essa pressa tão sobeja
He ja pequice.
Como! vós, que presumisT
Consentis
Continuardes a igreja,
Sem velhice?
Dae-vos, dae-vos a prazer,
Que muitas horas ha nos annos
Que lá vem.
Na hora que a morte vier,
Como se quer,
Se perdoão quantos damnos
A alma tem.
Olhae por vossa fazendas
Tendes hüas escripturas
De huns casaes,
De que perdeis grande renda.
He contenda,
Que leixárão ás escuras
Vossos pães;
He demanda mui ligeira,
Litígios que são vencidos
Ein hum riso.
Citae as partes terça-feira,
De maneira
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 199
Mui accesa.
2° D. E quem t'a levou forçada?
1° D. 0 da espada.
2° D. Ja m'elle fez outra tal
Bulra como essa.
Tinha outra alma ja vencida,
Em ponto de se enforcar
De desesperada,
A nós toda offerecida,
E eu prestes pera a levar
Arrastada;
E elle fê-la chorar tanto,
Que as lagrimas corrião
Pola terra.
Blasfemei entonces tento,
Qu,e meus gritos, reünníão
Pola serra.
Mas faço conta que perdi,
Outro dia ganharei,
E ganharemos.
1° D. Não digo eu, irmão, assi:
Mas a esta tornarei,
E veremos.
Torna-la-hei a affagar,
Depois que ella sair fora
Da Igreja
E começar de caminhar;
Hei de apalpar
Se vencerão ainda agora
Esta peleja.
Entra a Alma, com o Anjo.
204 LIVRO I.
ALMA.
Vós não me desempareis,
Senhor meu anjo custodio.
O increos
Imigos, que me quereis,
Que ja sou fora do ódio
De meu Deos?
Leixae-me ja, tentadores,
Neste convite prezado
Do Senhor,
Guisado aos peccadores
Com as dores
De Cbristo crucificado,
Rederaptor.
Estas cousas estando a Alma assentada d mesa, e o
Anjo junto com ella em pé, vem os Doutores com quatro
bacios de cozinha cubertos, cantando, Vexilla reçis pro-
deuntj e, postos na mesa, diz Sancto Agostinho:
AGOSTINHO.
Vós, senhora convidada,
Nesta cea soberana
Celestial,
Haveis mister ser apartada
E transportada
De toda a cousa mundana
Terreal.
Cerrae os olhos corporaes,
Deitae ferros aos damnados
Appetitos,
Caminheiros infernaes;
Pois buscais
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 205
Oh Imperador celeste,
Deos alto mui poderoso
Essencial,
Que polo homem que fizeste,
Offereceste
O teu estado glorioso
A ser mortal!
E tua filha, madre, esposa,
Horta nobre, frol dos ceos,
Virgem Maria,
Mansa pomba gloriosa;
Oh quão chorosa
Quando o seu Deos padecia!
Oh lagrimas preciosas,
De virginal coração
Estilladâs!
Correntes das dores vossas
Cos olhos da perfeição
Derramadas!
Quem hüa so podéra haver,
Vira claramente nella
Aquella dor,
Aquella pena e padecer,
Com que choraveis, donzella,
Vosso amor.
E quando vós amortecida,
Se lagrimas vos faltavão,
Não faltava
A vosso filho e vossa vida
Chorar as que lhe ficavão
De quando orava.
Porque muito mais sentia
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 207
A avogada,
A força da nossa vida!
AMBROSIO.
Isto chorou Hieremias
Sobre o monte de Sion
Ha ja dias;
Porque sentio que o Messias
Era nossa redempção.
E chorava a sem ventura,
Triste de Jerusalém
Homecida,
Matando, contra natura,
Seu Deos nascido em Belém
Nesta vida.
JERONLMO.
Quem vira o sancto cordeiro
Antre os lobos humildoso,
Escarnecido,
Julgado pera o marteiro
Do madeiro,
Seu rosto alvo e fermoso Í
Mui cuspido!
AGOSTINHO, (benze « mesa)
A benção do Padre eternal,
E do Filho, que por nós
Soffreo tal dor,
E do Spirito Sancto, igual
Deos immortal,
Convidada, benza a vós
Por seu amor.
IGREJA.
Ora sus, venha água ás mãos.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 209
IGREJA.
Venha a primeira iguaria.
JER. Esta iguaria primeira
Foi, Senhora,
Guisada sem alegria
Em triste dia,
A crueldade cozinheira
E matadora.
Gosta-la-heis com salsa e sal
De choros de muita dor;
Porque os costados
Do Messias divinal
Sancto, sem mal,
Forão polo vosso amor
Açoutados.
Esta iguaria em que aqui se falia, são os Açoules; e em
este passo os tirão dos bacios, e os presentão .á Alma,
e todos de joelhos adorão, cantando, Ave fia gel htm; e
despois diz
JERONIMO.
Esf outro manjar segundo
He iguaria,
Que haveis de mastigar,
Em contemplar
A dor que o Senhor do mundo
Padecia,
Pera vos remediar,
Foi hum torinento improviso,
Que aos miolos lhe chegou:
E consentio,
Por remediar o siso,
Que a vosso siso faltou;
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 211
•?€*""
F I G L R A S.
ANJO — Arrais do Ceo. FRADE.
DIABO — Arrais do In- BRIZIDA VAZ Alco-
ferno. viteira.
COMPANHEIRO do Di- JUDEU.
abo. CORREGEDOR.
FIDALGO. PROCURADOR.
ONZENEIRO. ENFORCADO.
PARVO. QUATRO CAVALLEIROS
SAPATEIRO.
DIABO.
Á barca, á barca, hou lá,
Que temos gentil maré.
Ora venho a caro a ré:
Feito, feito, bem está.
Vae alli muitieramá,
E atesa aquelle palanco,
E despeja aquelle banco,
Pera a gente que virá.
Á barca, á barca, hul
Asinha, que se quer ir.
Oh que tempo de partir!
Louvores a Berzebu.
Ora sus, que fazes tu?
Despeja todo esse leito.
COM. Em bonora, logo he feito.
DIA. Abaixa arama esse eu.
Faze aquella poja lesta,
E alija aquella driça.
COM. O caça, ó ciça.
DIA. Oh que caravella esta!
Põe bandeiras, que he festa;
Verga alta, âncora a pique.
Ó precioso Dom Anrique!
Ca vindes vós? que cousa he esta?
216 LIVRO I.
FHIALGO.
Esta barca onde vai ora,
Qu'assim está apercebida?
DIA. Vai pera a Ilha perdida,
E ha de partir logo essora.
FID. Pera lá vai a senhora?
DIA. Senhor, a vosso serviço.
FID. Parece-me isso cortiço.
DIA. Porque vedes lá de fora.
FIDALGO.
Porém a que terra passais?
DIA. Pera o Inferno, senhor.
Fm. Terra he bein sem sabor.
DIA. Que! e também ca zombais?
FID. E passageiros achais
Pera tal habitação?
DIA. Vejo-vos eu em feição
Pera ir ao nosso cais.
FIDALGO.
Parece-te a ti assi.
DIA. Em que esperais ter guarida?
FID. Que deixo na outra vida
Quem reze sempre por mi.
DIA. Quem reze sempre por ti?
Hi hi hi hi hi hi hi.
E tu viveste a teu prazer,
Cuidando ca guarecer,
Porque rézão lá por ti?
Embarca, ou embarcae,
Qu'haveis d'ir á derradeira.
Mandae metter a cadeira,
Qu'assi passou vosso pae.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 217
FIDALGO.
Ao Inferno todavia!
Inferno ha hi pera mi?
Oh triste! que eih quanto vivi,
Nunca cri que o hi havia;
Tive que era fantasia;
Folgava ser adorado,
Confiei em meu estado,
E não vi que me perdia.
Venha essa prancha, e veremos
Esta barca de tristura.
DIA. Embarque vossa doçura,
Que ca nos entenderemos.
Tomareis hum par de remos,
Veremos como reinais;
E chegando ao nosso cais,
Nós vos desembarcaremos.
FDDALGO.
Mas esperae-me aqui;
Tornarei á outra vida
Ver minha dama querida,
Que se quer matar por mi.
DIA. Que se quer matar por ti?
FID. Isto bem certo o sei eu.
r
Samica de caganeira.
DIA. De que? PAR. De caga merdeira.
Ma rabugein que te dê!
DIA. Entra, e põe aqui o pé.
PAR. HOU lá, não tombe o zambuco.
DIA. Entra, tolaço eunuco,
Que se nos vai a maré.
PARVO.
Aguardae, aguardae, hou lá,
E onde havemos nós d'ir ter?
DIA. AO porto de Lucifer.
PAR. Como? DIA. O Inferno. Entra ca.
PAR. O Inferno ieramá.
Hio hio, barca do corhudo,
Beiçudo, beiçudo,
Bachador d'alverca, huhá!
Sapateiro de Landosa,
Antrecosto de carrapato,
Sapato, sapato,
Filho da grande aleivosa;
Tua mulher he tinhosa,
E ha de parir hum sapo,
Chentado no guardanapo,
Neto da cagarrinhosa.
Furta cebolas, hio, hio,
Excominungado nas igrejas,
Burrela cornudo sejas.
Toma o pão que te cahio,
A mulher que te fugio
Pera a Ilha da Madeira.
Ratinho da Giesteira,
O demo que te pario.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 225
DIABO.
E não vos punhão lá grosa,
Nesse convento sagrado?
FRA. Assi fui bem açoutado.
DIA. Que cousa tão preciosa!
Entrae, Padre reverendo.
FRA. Pera onde levais gente?
DIA. Pera aquelle fogo ardente,
Que não temeste vivendo.
FRADE.
Juro a Deos que não f entendo:
E este hábito me não val?
DIA. Gentil padre mundanal,
A Berzebu vos commendo.
FRA. Corpo de Deos consagrado!
Pola fé de Jesu Christo,
Qu'eu não posso entender isto:
Eu hei de ser condemnado?
Hum padre tão namorado,
E tanto dado á virtude!
Assi Deos me dê saúde,
Que estou maravilhado.
DIA. Não façamos mais detença;
Embarcae, e partiremos;
Tomareis hum par de reinos.
FRA. Não ficou isso n'avença.
DIABO.
Pois dada está ja a sentença.
FRA. Pardeos, essa seria ella!
Não vai em tal caravella
Minha senhora Florença.
Como! por ser namorado,
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 229
Aviae-vos, e partir;
Que vossa vida he sonhar,
E a morte he despertar
Pera nunca mais dormir,
Nem acordar.
Este rio he mui escuro,
Não tendes vao nem maneira:
Entrae em barco seguro^
Havei conselho maduro,
Não entreis em ina bateira;
Que na viagem primeira,
Quantos vistes embarcados
Todos forão alagados:
No mais fundo da ribeira
São penados.
Pois não se pôde escusar
A passada deste rio,
Nem a morte s' estorvar,
Qu'he outro braço de mar
Sem remédio nem desvio.
E o batei dos damnados,
Porque nasceo hoje Christo,
Está, c'os reinos quebrados,
r
Em sêcco. O descuidados»
Cuidae nisto.
Agora que a madre pia,
Frol de toda a perfeição,
Está com tanta alegria;
Pedi a sua Senhoria
Gloriosa embarcação,
Que sua he a barcagein.
Pedi-lhe como avogada,
DAS OBBAS DE DEVAÇÃO. 249
Segura de damnação,
Teras angústia e paixão,
E tonnento em gran maneira.
Isto até que o Senhor queira
Que te passemos o rio:
Será tua dor lastimeira,
Como ardendo em gran brazio
De fogueira.
MARTA GIL.
Oh esperança, esperança,
A mais certa pena minha
Com toda esta segurança!
Tu es a mesma tardança
Em figura de mézinha.
Oh quem tal arrepender,
Tal maneira de penar,
Lá soubesse no viver!
Oh quem tornasse a nascer,
Por não peccar!
Vem hum Pastor, e diz, olhando pera a barca do imigo:
PASTOR..
Isto he cancêllo, ou picota,
Ou senefica algorrem?
Não lhe marra ella aqui gota
De ser isto terremota
Pera enforcar alguém.
DIA. Queres embarcar, pastor?
PAS. Praz. DIA. Entra neste batei.
PAS. Irra! pulha he isso, salvanor.
S'eu não fora pulhador,
J'ella passava o burel.
Digo, senhor pesadello,
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 261
DIABO.
Dize, rústico perdido,
Fizeste tu por saber
O Pater noster comprido?
PAS. E pera que era elle sabido?
DIA. Porque o havias de dizer.
PAS. A quem? DIA. A quem te creou.
PAS. Al tem elle que comer.
DIA. Não fizeste o que mandou.
PAS. Callae-vos, Senhor Jão Grou;
Ja sei quem m'ha de levar,
Sei quem sou.
Esta noite he dos pastores,
E tu, Decho, estás ein sêcco;
E salvão-se os peccadores
Criados de lavradores,
E tu estás coma peco.
DLV. Digo-te, pastor amigo,
Que foste gran peccador.
PAS. Senhor tartarugo, digo
Que inentis como bestigo,
Salvanor.
Falia em tua merencória,
E não falles em passar,
E conta lá outra história;
Porque em festa de tal glória,
Não has ninguém de levar.
Ronca, quês tu pôr comego
Algorrem pera beber,
Que vens de casta de pego,
E neto d'algum morcego?
Pardicas não pôde ai ser.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 263
DIABO.
Não estou "em meu poder,
Pera me vingar de ti.
PAS. Não podes nada fazer
Na noite que quiz nascer
Christo filho de Davi.
DIA. Quem te poz no coração
Fallares cousa tão boa?
Que tu não tens descrição.
PAS. E quem te deu a ti lição
De ser tão ruim pessoa?
ANJO.
Pastor, tu queres passar?
PAS. Este he melhor artezão.
ANJ. Folgarei de te levar,
Se te ajuda o bein obrai-,
Que as obras reinos são.
PAS. Enha mãe in'o bradará,
Que fica no sahiinento,
E o responso do inamento;
E tudo Sa Gil fará
Com bom tento.
ANJO.
Morreste tu bom christão?
PAS. Que sei eu que vós dizeis?
ANJ. Dize ora o krieleison,
Kirieleison, Christeleison.
PAS. O Pater noster quereis?
Ja eu soube hum quinhão delle.
No santo faceto andei ja,
E nunca ine dei por elle;
264 LIVRO I.
DIABO.
Não na foste tu sperar,
Pera a damnares, villão,
E começou de bradar
Que a querias forçar?
PAS. O fideputa cabrão!
Quizera eu e ella não,
Porque a trédora fugio:
E s'isto assi foi, ladrão,
Que peccado se seguio,
Pois não houve concrusão?
Juro ao corpo verdadeiro
Que tu te podes gabar
Que casado nem solteiro,
Não anda tão vil barqueiro
Sôbolas águas do mar.
Soma, Anjo, eu nfenfestei:
Abrenuncio Satanaz!
ANJ. Faze o que f eu direi,
E depois embarcarás,
E eu mesmo te passarei.
Purga ao longo do rio
Em gran fogo, merecendo.
PAS. E quando parte o navio?
Senhor, se eu não tenho frio,
Pera que hei d'estar ardendo?
Vem hüa Pastora menina, e temendo a visão do ini-
migo que lhe appareceo na morte, diz:
MOÇA.
Jesu! Jesu! que he ora isto ?
Ave Maria! Ave Maria!
Qu'he do meu cão qifeu trazia?
266 LIVRO I.
MOÇA.
r
E ella matar-vos-ha:
Então ireis a morrer.
DIABO.
Ré. MEN. Aquelle, s'eu chamar
O nosso Joanne! DIA. Bé.
MEN. Não queres senão berrar?
DIA. Onde has d'ir, ou pera que?
MEN. Fica minha mãe chorando,
So porque in'eu vim de lá.
ANJ. Mas fica desvariando,
Que tu es do nosso bando,
E pera sempre será.
Fez-te Deos secretamente
A mais profunda mercê
Em idade de innocente:
Eu não sei se sabe a gente
A causa porqu'isto he.
Cantando, mettem os Anjos o Menino no balei, e entra
hum Taful, e diz o Diabo:
DIABO.
O meu sócio, ó meu amigo,
Meu bem e meu cabedal!
Vós, irmão, ireis comigo,
Que não temeste o perigo
Da viagem infernal.
TAF. Eis aqui flux d'hum metal.
DIA. Pois sabe que eu te ganhei.
TAF. Mostra se tens jogo tal.
DIA. TU perdes o enxoval.
TAF. Não he isto flux com rei.
DIABO.
Baralha o jogo e partamos.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 271
Vol. I, 18
F I G L R A S.
Á pesar de mi linage,
Los grandes de alto estado
Como tarda n en ini passage!
MORTE.
Tienen mas guaridas csos,
Que lagartos de arenal.
DIA. De carne son y de huesos;
Vengan, vengan, que son nuesos,
Nuestro derecho real.
MOR. Ya lo hiciera,
Su deuda paga me fuera;
Mas ei tieinpo le da Dios,
Y preces le dan espera:
Pero deuda es verdadera,
Y los porné ante vos.
Voyme allá de soticapa
Á ini estrada seguida,
Verás como no me escapa
Desde ei Conde hasta ei Papa.
DIA. Haced prestes Ia partida
En buenora.
COM. Pues ei conde que vendrá ora,
Irá echado, ó de qué suerte?
ANJ. O Virgen nuestra Senora,
Sed vos su socorredora
En Ia hora de Ia inuerte.
Vem a Morte, e traz o Conde, e diz:
MORTE.
Senor Conde prosperado,
Sobre todos mas ufano,
Ya pasastes por ini vado.
CON. O Muerte! cuan trabajado
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 277
L i ç ã o .
O parce mihi, Dios mio,
Quia níhil son mis dias:
Porque ensalza tu poderio
Al hombre, y das senorío,
Y luego dei te desvias?
Con favor
Visitas eum ai alvor,
Y súpito Io pruevas luego:
Porquê consientes, Senor,
Que tu obra, y tu hechor,
Sea deshecha nel fuego?
Ayudadme, remadores,
De Ias altas hierarquias,
Favoreced mis temores,
Pues sabeis cuantos dolores
Por mi sufrió ei Mesías.
Sabed cierto
Como fue preso en ei huerto,
Y escupida su hermosura,
Y dendê allí fue, inedio inuerto,
Llevado muy sin concierlo
Al juiçio, sin ventura.
DIABO.
Ahora se os acordo?
El asno muerto cevada.
De vos bien seguro esto:
Pensareis que no sé yo
La vuesa vida pasada?
CON. YO te requiero.
DIA. Vos, Senor Conde agorero,
Fuisteis á Dios perezoso,
280 LIVRO I.
Pasinareis:
Si mirais, dahi vereis
Adó sereis morador
Naquellos fuegos que veis;
Y llorando, cantareis
"Nunca fue pena mayor."
L i ç ã o .
REI.
Teedet anima mea
Vitai meai muy dolorida,
Pues Ia gloria que desea
.Me quita que no Ia vea
La muy pecadora vida
Que pasé.
Loquar in amaritudine
Palabras muy dolorosas;
De mi alma hablaré
A mi Dios, y le diré,
Con lagrimas piadosas:
Noli me condemnare,
Judica mihi, porque
No me dejas quien me ampare:
Si ai infierno bajare,
Tuyo so, cuyo seré?
Ay de mi!
Cur me judices ansí?
Pues de nada me heciste,
Mándame pasar daqui:
Ampárame, fili Davi,
Que dei cielo descendiste.
Responso.
O mi Dios, ne recorderis
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 285
Bis. Yo confio
En Jesu Redentor mio,
Que por mi se desnudo,
Puestas sus llagas ai frio;
Se clavo naquel navio
De Ia cruz donde espiró.
Vem a Morte e traz hum Arcebispo, e diz a
MORTE.
Senor Arzobispo amigo.
Que os parece de ini?
Bien peleaste comnigo.
Anc. No puede nadie contigo,
E yo nunca te temi.
O muerte amara!
I*a vida nos cuesta cara,
El nacer no es provecho.
MOR. Voy hacer otra eeara.
ARC O facciones de mi cara!
O ini cuerpo tierra hecho!
Qué aprovecha en ei vivir
Trabajar por descansar?
Qué se monta en presumir?
De qué sirve en ei morir
Candeia para cegar?
Ni placer
En ei mundo por vencer
Estado de alta suerte,
Pues presto deja de ser?
Nos morimos por lo haber,
Y es todo de Ia muerte.
DIABO.
LO que da, es lo seguro.
294 LIVRO I.
A Ia tierra de consuelo.
ANJ. Es fuerte cosa
Entrar en barca gloriosa.
ARC Reina que ai cielo subiste,
Sobre los coros lustrosa,
Del que te crio esposa,
Y tú virgen lo pariste;
Pues que súpita dolor
Por San Juan recibiste,
Con nuevas dei Redentor,
Y, mudado lo color,
Muerta en tierra descendiste;
Oh despierta,
Pues es dei cielo puerta!
Levántate, cerrada huerta;
Con tu hijo nos concierta,
Madre de consolacion;
Mira nuestra redencion,
Que Satan Ia desconcierta.
Vem a Morte com hum Cardeal, e diz a
MORTE.
Vos, Cardenal, perdonad,
Que no pude mas ama.
CAR. O guia de escuridad,
Robadora de Ia edad,
Ligera ave de rapina!
Qué ínudanza
Hizo mi triste esperanza!
Fortuna, que me ayudaba,
Peso en mortal balanza
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 297
La firmeza y confianza
Que ei falso mundo me daba.
DIABO.
Domine Cardinalis,
Entre vuestra Preeminencia,
Ireis ver vuessos iguales
A las penas infernales,
Haciendo su penitencia:
Pues moristeis
Llorando porque no fuisteis
Siquiera dos dias papa,
Y á Dios no agradecisteis,
Viendo cuan bajo os visteis,
Y en despues os dió tal capa.
Y no quiero declarar
Cosas mas para decir:
Determinad de embarcar,
Y luego sin dilatar,
Que no teneis que argüir.
Sois perdido:
Oyes aquel gran ruido
Nel lago de los leones?
Despertai! bien ei oido:
Vos sereis allí comido
De canes y de dragones.
L i ç ã o .
CARDEAL.
Todo hoinbre que es nacido
De inuger, tien breve vida;
Que cuasi fios es salido,
Y luego presto abatido,
Y su alma perseguida.
298 LIVRO I.
Y no pensamos,
Cuando Ia vida gozamos,
Como delia nos partimos;
Y como sombra pasamos,
Y en dolores acabamos,
Porque en dolores nacimos.
Responso.
Peccantem me quotidie,
Et non me paynitentem Ctriste!)
Sancte Deus, adjuva me;
Pues fue christiana mi fe,
Succurre dolores, Christe,
O Dios eterno,
Senor, quia in inferno
Nulla est redemptio,
O poderio sempiterno,
Remedia mi mal moderno,
Que no sé por donde vo.
(Vai-se o Cardeal ao batei dos Anjos, e diz o)
DIABO.
Váiste, Senor Cardenal?
Vuelta, vuelta á los Francezes.
CAR. Déjame, plaga infernal.
DIA. VOS visteis por vueso mal
Los anos, dias y meses.
CAR. Marineros,
Remadores verdaderos,
Llagas, reinos, caravela,
Embarcad los pasageros,
Que vos sois nuestros remeros,
Y Ia piedad Ia vela.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 299
ANJO.
Socoréos, Cardinal,
A Ia madre dei Senor.
CAR. 0 Reina celestial,
Abogada general
Delante dei Redentor;
Por ei dia,
Senora Virgen Maria,
En que Io viste llevar
Tal que no se conocia,
Y vuesa vida inoria,
Nos queirais resucitar.
Vem a Morte e traz hum Papa, e diz a
MORTE.
Vos, Padre sancto, pensasteis
Ser iminortal? Tal os vísteis,
Nunca me considerasteis,
Tanto en vos os enlevasteis,
Que nunca me conocisteis.
PAP. Ya venciste,
Mi poder me destrüiste
Con dolor descompasado.
O Eva! porque pariste
Esta Muerte amara y triste
Al pié dei arbol vedado?
Estais viva, y has parido
A todos tus hijos muertos;
Y mataste á tu marido,
Poniendo á Dios en olvido
En ei huerto de los huertos.
Véisuie aqui
Muy triste, porque naci,
300 LIVRO I.
Venid embarcar.
Veis aquellos azotar
Con vergas de hierro ardiendo,
Y despues atanazar?
Pues allí hábeis de andar
Para siempre padeciendo.
L i ç ã o .
PAPA.
Quare de vulvu me eduxisti
Mi cuerpo y alma, Senor?
En tu silla me subisíe,
En tu lugar ine pusiste,
Y me heciste tu pastor:
Mejor fuera
Que dei vientre no saliera,
Y antes no hubiera sido,
Ni ojo de hombre me viera,
Y como fuego á Ia cera
Me hubieras consumido.
Responso.
Heu mihi! heu mihi! Senor,
Quia peccavi nimis in vita:
Quid fadam, miser pecador?
Ubi fugiam, malhechor?
O piedad infinita,
Para ti.
Amercéate de mi,
Que para siempre no llore:
Mándame pasar daqui,
Que nel infierno no ha hi
Quien te loe ni te adore.
302 LIVRO I.
DIABO.
Que me penan esos puntos,
Despues que pasa ei vivir!
Mirad, Senores difuntos,
Todos cuantos estais juntos
Para ei infierno hábeis de ir.
ANJ. O Pastor,
Porque fuiste guiador
De toda Ia Christandad,
Habemos de ti dolor:
Plega a Jesu Salvador
Que te envie piedad.
PAPA.
O gloriosa Maria,
Por las lágrimas sin cuento
Que lloraste en aquel dia
Que tu hijo padecia,
Que nos libres de tormento,
Sin tardar;
Por aquel dolor sin par,
Cuando en tus brazos lo viste,
No le pudiendo hablar,
Y lo viste sepultar,
Y sin él, dél te partiste.
ANJO.
Vuestras preces y clamores,
Amigos, no son oidas:
Pésanos tales senores
Iren á aquellos ardores
r
DUQUE.
0 Cordero delicado,
Pues por nos estás herido,
Muerto y tan atormentado;
Cóino te vas alongado
De nuestro bien prometido?
ARC Fili Davi,
Como te partes daqui?
Al infierno nos envias?
La piedad que es en ti,
Cóino Ia niegas ansí?
Porque nos dejas, Mesías?
CONDE.
O Cordero divinal,
Médico do nuestro dano,
Viva fuente perenal,
Nuesa carne natural;
No permitas tanto dano.
Bis. O flor divina,
In adjuvandum me festina,
Y no te vayas sin nos;
Tu clemência á nos inclina,
Sácanos de foz malina,
Benigno hijo de Dios.
Não fazendo os Anjos menção destas preces, começarão
a botar o batei ás varas, e as Almas fizerão em roda hüa
musica a modo de pranto, com grandes admirações de dor;
e veio Christo da resurreição, e repartio por elles os remos
das chagas, e os levou comsigo.
F I G L R A S.
PRÓLOGO.
ANJO.
Vol. I. 20
ALTO DA HISTORIA DE DEOS.
SATANAZ.
Pois que remédio? que este mal he muito!
Luc Deos lhe mandou mandado mui forte,
Sob pena de dores, trabalhos e morte,
Que não lhe tocassem em hum certo fruito,
Fruito da sciencia;
Porque perderão sua innocencia,
Angélica em parte, subtil e immortal,
E a posição do paraizo terreal:
Isto em peccando, á primeira audiência
Sentença final.
Vae tu, Satanaz, por embaixador,
Eu te dou meu comprido poder;
E vae-te a Eva, porque he mulher,
E dize que coma, não haja temor:
E, como avisado,
Lhe falia cortez e mui repousado,
Mostrando-te alegre com todo seu bem,
E seu muito amigo maior que ninguém:
Minte-lhe largo, e dá-lhe o cuidado
Que agora não tem.
Vem tomar graça, pois has de pregar
Á mais avisada senhora do mundo:
Eu te outorgo meu poder facundo.
Não hajas dó delia, faze-a finar,
Destrue-la asinha;
Nem por formosa, nem por ser rainha,
Não olhes por nada, aperta com ella:
Que como a venceres, sem ti, mesma ella
Fará ao marido cobrir-se de tinha,
E muito mais qu'ella.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 309
SATANAZ.
Em que figura lhe fallarei bem?
Luc Faze-te cobra, por dissimular,
Porque pareças do mesmo pomar,
Que sabes das fructas as graças que tem;
Porque has de dizer:
Senhora fermosa, deveis de saber
Que aquella fructa que vos foi vedada
Oh! quanta sciencia em si tem cerrada.
SAT. Ja vos entendo, não falleis mais nada;
Leixae-me fazer.
Partido o tentador Satanaz, Belial anojado de inveja
porque Lucifer o não mandou a elle, diz:
BELIAL.
Crede hüa cousa, Senhor Lucifer,
Que não ha hi pena que seja igual
Aquella que sente o grande official,
Quando ninguém lhe dá que fazer.
Eu sou dos primeiros -
E o vosso leal entre os cavalleiros,
E mais sou Meirinho desta vossa corte.
Vós não fazeis guerra em que eu faça sorte,
E sendo meirinho sem prisioneiros
Me pesa de morte.
E foste mandar Satanaz agora
Com todo poder de vosso vigor,
Accrescentado por embaixador,
Ao novo Senhor e nova Senhora,
Porém a mim não.
Se lá me mandáras, me houvera por cão,
Se não os fizera per força peccar:
' Logo per força os fizera tragar
310 LIVRO I.
A justiça porém
Quando executa, não cuida ninguein,
Que he com mil partes o que merecia.
Adão he deitado de sua alegria,
Porque por seu mal não pôde c'o bem
Que Deos lhe queria.
E porém comtudo piedoso tornado,
Manda-te, Mundo, agasalhar Adão
E todos aquelles que procederão
De sua semente, de qualquer estado,
E lhes dês folgança,
E todalas cousas em muita abastança:
Os peixes, que vão per carreiras do mar;
Aves, que andão as vias do ar;
Ovelhas e bois, e toda abondança
Os leixa lograr.
Porque, ainda que são peccadores,
Não tem outro padre senão o Senhor,
Que não quer a morte ao peccador,
Mas antes que viva e lhe dê louvores.
E a ti porém
Manda-te, Tempo, que temperes bem
Este relógio, que te dou, das vidas;
E como as horas forem cumpridas
De que fez mercê á vida d'alguem,
Serão despedidas.
Assi que tu, Mundo, os gasalharás,
E Satanaz os aconselhará,
O Tempo e relógio os despedirá,
A morte será o que tu verás.
Eis aqui vem
O padre Adão, e Eva também;
314 LIVRO I.
"Também as verduras;
^Adorae, desertos
: " E serras floridas,
"O Deos dos secretos,
"O Senhor das vidas:
"Ribeiras crescidas,
"Louvae nas alturas
"Deos das creaturas.
"Louvae, arvoredos
"De fructo presado,
"Digão os penedos,
"Deos seja louvado,
" E louve meu gado
"Nestas verduras
"O Deos das alturas."
SATANAZ.
Oh como cantas tão doce, pastor!
Quanta doçura que nasceu comíigo!
Conselho-te, irmão, senhor e amigo,
Que te estimes muito: pois es tal cantor,
Bem he que te prezes.
Tu es mais formoso que teu pae mil vezes:
E se eu a ti fosse leixaria o gado,
Que andas nos matos mui mal empregado,
Mancebo disposto: e não te desprezes
De ser namorado.
ABEL.
Queria ora mais fartar o meu gado,
Sem fazer nojo nem perda a ninguém.
SAT. Queres que engorde o teu gado bem?
Sempre apascenta em pasto vedado.
ABE. Quem te mette a ti
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 319
Nem ha hi maneira.
MOR. Não sabeis vós que sou vossa herdeira,
E a vossa filha a primeira gerada?
ADÃ. O triste Morte, como es apertada!
Como es espantosa, em tanta maneira
Desaventurada!
Entrando na casa de sua prisão, e achando Abel, seu
filho, preso naquella infernal estância, fizerão todos hum
pranto, cantando a três vozes; e acabando diz o
MUNDO.
Eis Job vem fatiando ha grande pedaço,
Triste com causa de ter gran tristeza.
TEM. Oh quantos haveres e quanta riqueza
Perde aquelle homem em tão pouco .espaço!
MUN. Infinitos gados
E muitos haveres lhe tenho ja dados,
E tudo lhe foi atravez brevemente;
Porque Satanaz o achou excellente,
Todos seus bens lhe tem assolados;
E Job paciente.
JOB.
Se os bens do mundo nos dá a ventura,
Também em ventura está quem os tem.
O bem que he mudavel não pôde ser bem,
Mas mal, pois he causa de tanta tristura;
E se Deos os dá,
Como eu creio mui bem que será,
E a fortuna tem tanto poder,
Que os tira logo cada vez que quer,
O segredo disto, oh! quem m'o dirá,
Pera o eu saber?
2 l
Vol. i.
322 LIVRO I.
SATANAZ.
Fallemos huin pouco, Job, a de parte
Sobre esse segredo, verás que te digo.
Eu quero-te bem e sou teu amigo,
Sem usar Comtigo cautela nem arte.
Tu saberas,
E não me descubras nem hoje nem eras,
Deos he aquelle que te tracta assi;
Quer-te gran mal e diz mal de ti:
Não cures delle, e logo tomaras
A como te vi.
Tu dás com teus males louvores a Deos,
E elle pesa-lhe por tu nomea-lo:
Renega, renega de ser seu vassalo,
E logo verás tecer outros veos.
JOB. Se o eu leíxar,
Qual he o senhor que in'ha d'emparar?
Qual he o Deos que me pôde valer?
Nos bens desta vida não está o perder,
Que assi como assi ca hão de ficar,
Pois hei de morrer.
Eú creio, Mundo, que o meu rédeinpíor
Vive, e no dia mais derradeiro
Eu o verei Redemptor verdadeiro,
Meu Deos, meu Senhor e meu Salvador.
Eu o verei, eu,
Não outrem por mim, nem com olho seu,
Mas o meu olho, assim como está;
Porque minha carne se levantará,
E ein carne mea verei o Deos meu,
Que me salvará.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 323
SATANAZ.
Prosigue tu embora tua mania,
Que Deos bem de chapa te assenta elle a mão:
Derribou-te agora as casas no chão,
E matou-te os filhos morte supitania.
JOB. Verdade he isso?
SAT. Assim me veja eu rei do Paraizo.
JOB. Bento e louvado seja o Deos dos ceos!
SAT. Se o tu renegasses, temer-t'hia Deos,
E correr-se-hia muito de te fazer isso.
JOB. La, lá aos increos!
SATANAZ.
Assi! ora espera, farei que renegues,
Quero fazer o que Deos me manda.
(Toca Satanaz a Job, e fica çuberto de lepra.)
JOB. Oh chagado de mi, que esta he outra demanda!
Oh Deos meu! e porque me persegues?
Contra mim perfias,
Sabendo que nada são os meus dias!
Minha ahna s'enoja ja de minha vida,
E como a setta he minha partida.
Senhor, meu Senhor! porque te desvias
De tua guarida?
Responde-me, quantas maldades te fiz?
Ou quantas treições obrei contra ti?
Porque assim escondes a face de mi,
Como meu contrário, sendo meu juiz ?
Contra a folha prove,
Que ligeiramente o vento revolve,
Mostras as forças que tu tens comtigo?
Porque te fizeste contrairo comigo?
21*
324 LIVRO I.
A RESURREIÇÃO
ENTRE OS JUDEUS
RABI SAMUEL.
Fallemos, saltemos no arrendamento.
LEV. Rabi Samuel, mais releva isto.
Quiçais era sancto este Jesu Christo,
Que elle o mostrou em seu finamento:
O sol escurou, e a terra tremeo.
SAM. EU te direi a verdade inteira.
348 LIVRO I.
Vol. I. 23
F I G L R A S.
E os prantos de Isaias.
Estas são as alegrias
Que meu gado anda a buscar.
SILVESTRA.
Não menos quebro os sentidos
Com meus veados diversos.
HEB. Isso são gados perdidos.
Os meus forão escolhidos,
E fizerão-se perversos.
Os Patriarchas primeiros
Erão gados celestiaes,
Ovelhas, sanctos carneiros,
E os profetas cordeiros,
E os d'agora lobos taes.
Pois tem em mim hüa pastora,
Que nunca foi outra tal.
SIL. Nego eu essa por agora.
HEB. Oh, se tu quizesses ora
Fazer-te minha igual!
SIL. Mas melhor he terdes grandeza.
HEB. Cal'-te, que não dizes nada;
Qu'eu sam per Deos espirada,
E tu pela natureza.
SILVESTRA.
Parece esta que ca vem,
Lei da Graça, sancta e benta.
HEB. Ella assi o representa,
Segundo a graça que tem;
Mas de ti valho eu setenta.
Vem a Lei da Graça, per nome Veredina, e diz
cantando:
358 LIVRO I.
VEREDINA.
"Serranas, não hajais guerra,
"Que eu sam a flor desta serra."
Oh que malhada, e que gado,
E que tempo, e que pastora!
Por sempre seja louvado
Huin so Deos que no ceo mora:
Elle m'enviou agora
Das alturas ca na terra,
"Pera ser flor desta serra.
"Serranas, não hajais guerra."
Ovelhas e cordeirinhos
He o meu gado maior;
Muito humildes e mansinhos,
E pascem pólos caminhos
E montes do Redemptor:
Elle he o summo pastor;
"E vós escusae a guerra,
"Qu'eu sam a flor desta serra.
Outra mais alta pastora
Anda na serra preciosa,
Imperatriz gloriosa,
Principal minha Senhora.
Esta dos anjos se adora
Sancta Rainha na terra;
" E me fez flor desta serra.
"Serranas, não hajais guerra."
Eu repasto suas cordeiras
Virgens e martyrisadas,
Que leixão frescas ribeiras,
E as mundanas ladeiras,
Por serem sacrificadas.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 359
E se te elle hi achar,
Teras inunda carreira.
BELZEBU.
Irmão, quereis ir comigo?
SAT. Vae tu, eramá pera ti,
Qu'eu não posso ir condigo,
E bem m' abasta o perigo
Em que domingo me vi.
Elle ha de vir pera aqui
De rondão
Pera Tiro e Sidão:
Quero ver que faz per hi
Este famoso leão.
BELZEBU.
Eu vou ora atormentar
A filha da Cananea;
E quem a de mim livrar
Fará d'hum rato balea,
E fará secar o mar.
SAT. Vae tu, qu'eu hei d'espreitar
Alguns dias
Se será este o Messias,
Ou o Deos que ha de encarnar,
Como escreveo Isaias.
Porque Abrahão, na verdade,
Nem Elias, nem Moisem,
Não forão da sanctidade,
Nem poderio que este tem,
Nem com grande quantidade.
BEL. Fallas á tua vontade
Eramá;
364 LIVRO I.
A tua sabedoria,
Que nos dê o que não temos.
CHRISTO.
A justiça e boa petição
Traz bom despacho coinsigo;
Mas bento he o varão
Que reza com coração,
E com alma e com sentido:
Que o rezar não he ouvido,
Nem he nada,
Sem alma estar inflamada,
E o spirito transcendido
Na divindade sagrada.
Nem cuideis que arrecadais,
Por rezar muita oração,
Se no coração estais
Fora de contemplação.
Tende prompto o coração
Em seu louvor;
E com lagrimas de amor,
Direis esta oração
A grandeza do Senhor:
Pater noster, qui es in ca>lis, sancti-
ficetur nomen tuum: adveniat regnum
tuum; fiat voluntas tua, sicut in cedo
et in terra.
Com almas limpas e puras,
Direis isto ao Senhor,
Firmando-o por creador,
E padre das creaturas,
366 LIVRO I.
O maldito Belzebu,
Quem te deu a ti poder
Que atormentasses tu
Nenhum homem nem mulher,
Sem ter direito nenhum?
BELZEBU.
Senhores Sanctos bemditos.
Hi ha planetas visíveis,
Ha hi outras invisíveis,
Que pertencem aos spirftos,
E causão cousas terríveis.
Qualquer que nascer sujeito
A maldita conjunção,
Sem nenhüa appellação,
Nem estylo de direito,
Pertence á nossa prisão,
Assün como quem nascer
24'
372 LIVRO I.
Na conjunção desastrada
Em que peccou Lucifer.
E quem nasceo na hora tal
E planeta em que peccárão
Os Judeus, quando adorarão
O bezerro de metal,
Pera nossos se gerarão.
Também quem nascer no fito
Da conjunção em que cuido,
Que aftbgou o mar ruivo
Os cavalleiros do Egypto,
São nossas almas e tudo.
Também he da nossa alçada
Toda a pessoa nascida
Na conjunção celebrada
Que Sodoma foi queimada,
E Goinorra sovertida.
E he perdido também
Todo o que nascido for
Na conjunção do item,
Em que com bravo furor
EIRei Nabucodenusor
Destruio Jerusalém.
E esta moça de Canão,
E filha desta Senhora,
Foi nascer na conjunção
Que reinava a nossa hora.
E pois vós rogais por ella
A vosso Mestre, qu'eu temo,
Eu vou chamar outro demo,
E entraremos juntos nella,
E veremos este extremo.
DAS OBRAS DE DEVAÇÃO. 373
O mestre da vaidade,
Tu não sabes que es cativo,
E escravo da Trindade?
Quem te deu ter potestade
Sobre nenhum corpo vivo?
BELZEBU.
Não dizem que o Esprito Sancto
Fallava dentro em Davi,
E dos profetas assi?
Porque não farei outro tanto
Nos que tenho pera mi?
E Deos Padre não assombrava
A Moisem com terremoto,
Cada vez que lhe fallava?
Canfeu vi que assombrava
Com temores seus devotos.
S. PEDRO.
Tu queres ser igualado
Com Deos, summa das grandezas?
Como es desavergonhado,
Triste, maldito, austinado,
374 LIVRO I.
BELZEBU,
Venho saber que isto he.
SAT. Como vens assi turvado?
BEL. Chegou-nos lá hum recado
De Jesu de Nazaré,
Mui terrível e apertado.
SAT. Que recado? BEL.< Eu t'o direi,
Que nenhüa cousa fique.
Não era mais seu repique,
Senão íte maledicti patris mei.
SATANAZ.
Mais que me faz pasmar
Como chegou isso lá;
Que Christo não foi de ca,
Nem se bolio d'hum logar.
BEL. Não sei com'isso será;
Que éramos mil escolhidos
Procedidos das nações
Daquelles coros subidos,
Thronos e Dominações.
A moça com grandes gritos
Ajuntou toda a cidade;
E veio hüa claridade,
Que nos cortou os espritos.
SAT. De fogo, ou que calidade?
BEL. Era assi hum resplandor
Cercado de nuvens pretas;
Os raios erão de seitas,
E o fogo de temor.
No meio logo olhei,
Onde mil espantos vi:
Então sahia dalli
378 LIVRO I.
H*~
F I G U R A S .
H U M PORRE.
S. MARTINHO.
PAGENS.
FIM no LIVRO 1.
ERRATAS.
Pag. lin. CITO emenda
14 12 madruga madrugada
30 21 yo te digo ya te dijo
48 nll. trotrt trato
70 10 jüeaceva Alcaçova
101 4 Beocio Boecio
125 14 ANDRÉ ANJO
131 11 targer tanger
15ü ult. guamidas guarnecidas
191 31 Imperodora Jmperadova
222 27 falia: ONZENEIKO
238 IS J o g a taes Jogntais
348 1!) onde v o s . . . onde r a s ?
I N D E X .
Pag.
ADVERTÊNCIA. ,
Visitação i
Auto pastoril Castelhano y
Auto dos Reis Magos 23
Auto da Sibila Cassandra 36
Auto da Fe' 64
Auto dos quatro Tempos nn
Auto da Mofina Mendes ioo
Auto Pastoril Portuguez. 127
Auto da Feira i5l
:«.V'J»'
Wvr.
*vllj*
W;**
,<rs£ , ãtwe
-<*.-. ".
BRASILIANA DIGITAL
1. Você apenas deve utilizar esta obra para fins não comerciais.
Os livros, textos e imagens que publicamos na Brasiliana Digital são
todos de domínio público, no entanto, é proibido o uso comercial
das nossas imagens.
~i&X ^
»'V
>' % ? T ^ '
le ne fay rien
sans
Gáyete
(Montaigne, Des livres)
Ex Libris
José Mindlin
(DLBJBH
DE
#11 15 ^W"
&
CORRECTAS E EMENDADAS
DE
TOMO SEGUNDO.
müMBtíri&cEcí)
NA OFFICINA TYP0GRAPI1ICA DE T.ANGHOFF.
1834.
LIV/RÍJ' m.
DAS COMEDIAS.
F I G U R A S DA I a SCENA.
PROLOGO.
H U M L I C E S C E A ü O.
RUBENA.
BENITA — Criada
Hua PARTEIRA.
Hüa FEITICEIRA.
LEGIÁO
PLUTÁO
Díanos.
DRAGUINHO
CAROTO
SCEUTA P R I M E I R A .
RUBENA.
Ay de mí, de mí robada,
Y no de otros robadores!
Ay de mí desventurada!
Ay! que no puedo cuitada
Decir ay á mis dolores!
Ay! que no oso quejar!
Ay! que no oso decir!
Ay! que no oso querellar;
Ni me puedo ya vingar
Del consentir!
Oh triste de mí Rubena!
A quien me descubriré?
A quien contaré mi pena?
Como porné en mano agena
Mi vida, mi honra y mi fe?
Oh mocedad desdichada,
De falso amor engañada,
Engañada sin sentido!
Qué haré desamparada?
Qué haré triste preñada
Sin marido?
Escuro parto escogí
En peligroso secreto:
Qué será triste de mí!
O Dios! porqué me salí
DAS COMEDIAS.
De mí camino discreto!
Quien tuviera, ó quien hallara
Una preciosa vara,
Que tuviera tal condón,
Que improviso me llevara
A alguno que me sacara
El corazón?
O tristes nubes escuras,
Que tan recías camináis,
Sacadme destas tristuras,
Y llevadme á las honduras
De la mar, adonde vais,
üuélanvos mis tristes hadas,
Y llevadme apresuradas
Aquel valle de tristura,
Donde están las mal hadadas,
Donde están las sin ventura
Sepultadas.
Oh cuanto benditas son
Muchas doncellas que vi,
Que para su proprio varón
Guardaron su perfección,
Y no la triste de mí!
Benditas y bien libradas
Desposadas y casadas,
Corona de sus parientes!
Ay! que me ciercan puntadas!
Mis angustias son llegadas,
Y accidentes.
Yo misma quiero el morir.
Porqué me apertaís, dolores?
Que mas duele arrcpentir
8 LIVRO II.
BENITA.
Señora, con quien habláis?
Vos veis alguna visión;
No sé de que os quejáis.
RUB. Del mal de ini corazón.
BEN. Las quejadas
Tenéis tan descarílladas,
Y la barriga rellena,
Las espaldas empandadas;
No sois vos esta aosadas:
Con quien trocastes, Rubena?
RUBENA.
Con nadie; no sé que dices.
BEN. Tenéis los ojos sumidos,
Y delgadas las narices.
RUB. TÚ no ves que son lombrices?
BEN. NO entiendo estos partidos.
Ansí será,
Y eso mismo os causará
Tener ojeras y paño.
RUB. Ay! qué gran dolor me da!
BEN. Será de la frialdad
Que cogiste ora ha un año.
RUBENA.
Ay! dolores de pesar!
BEN. Bien entiendo á mi señora,
Y ella quiéreme cegar.
RUB. Qué? BEN. Digo que no se pensar
Que remedio os busque ahora.
RUB. Oh Benita!
BEN. Estávades tan bonita
Nueve meses habrá,
10 LIVRO II.
BENITA.
Que quiera Dios que aproveche
Esa cura que hacéis:
Veo yo correr la leche.
RUB. Qué veis? BEN. No veo adó me eche,
Y son las horas que veis.
PAR. Ide-vos, minha donzella,
Trazede-me encenso e macella,
E a névoda. BEN. Demo he.
PAR. E tres oncas de canella.
BEN. Ansí vivas tú y ella,
Como yo acá porné el pie. Oaí-se)
PARTEIRA.
Mostrade ca, filha amiga,
Verei em que pontos stais.
Muí alta está a criancinha;
Nao pariréis tao asinha:
Asinha vos vos agastais.
RUB. Oh cuitada dolorida,
En que extremo está mi vida!
PAR. Mordei neste macapao;
Esforcae, rosa florida.
En venida e vos parida:
Kyrieleison, Christeleison.
Dizei tres vezes passinho:
O verbo caro foto he:
Dou-vos a San Sadorninho.
Saia ca o cordeirinho,
O cóneguinho da Sé.
E como a dor aperlar,
Puxar pera campear.
Va-se o tempo á inaresia,
DAS COMEDIAS. 15
RUBENA.
Señora, pues consentí
Contra mí tan mala suerte,
Voyme del todo daqui.
Sí perguntaren por mí,
Decid que fui con la muerte:
Y á mi padre señor
Diréis, con algún color,
Que no haya de mí cura,
Y que me voy de temor;
Y me duele su dolor
Mas que mi desaventura.
Leva rao os Diabos a Rubena, e diz o Licenceado que
fez o argumento.
LICENCEADO.
Llevaron nel aire ansí á Rubena
Aquellos espritus á una montaña:
Parió una hija, mas linda de España,
Según trataremos en estotra cena.
Como se vído ya fuera de pena,
Echó sus vestidos en una ribera,
Ciñió su camisa las carnes de fuera,
Hermosa en cabello como una sirena.
Fue la cuitada de tierna edad
Subiendo la sierra, de entonces parida,
Por do la guiaba su mísera vida,
Sin otra compaña sino soledad.
Y por escusarnios la prolijidad,
Dejemos la madre, que es cosa profunda,
Y tratarse ha nesta cena segunda
Daqucsta MI hija de extrema bondad.
FIGURAS DA %\ SCENA.
FEITICEIRA.
DRAGUÍNHO.
CAROTO.
LEGIÁO.
PLUTÁO.
AMA DE CISMENA.
LEDERA ,
Fadas.
MINEA \
CISMENA.
JOANNE.
PEDRINHO
Pastorinhos.
AFFONSINHO
SCENA S E G U N D A .
E tu vae a Montaxique
A casa do dedos da murteira.
FEI. Nisso estáis? ma cagananeira
Que vos pique.
Vao, e fica a Feiticeira cantando á Menina.
"Ru ni, menina, ru, ru,
"Mourao as vellias e fiques tu
"C'o a tranca no cu."
Vem os Espiritas com o berco, e com a Ama, e diz
DRAGUÍNHO.
Que vos parece, noss'ama?
Este berco tomos furtar
Ao Paco do Lumear,
Que foi dado a hüa dama
De freí... quero-ine calar.
FEI. Dízei-m'o á puridade.
DRA. Queréis saber? he hum frade,
Huin freí Vasco de Palmella;
Huin que tinha Madanella
Colchoeíra na Trindade.
FEI. Muito me dá na vontade
Que conheco quein he ella.
DRA. Rógo-vos, senhora amiga,
Por aquella dor sagrada
Quando fostes acoutada,
Que nao nos deis mais fadiga.
FEITICEIRA.
Ora ¡-vos ieraniá,
E a ama venha embora.
Ora cntrae, minha senhora,
E.sperac huin pouco lá;
Ora vinde pera ca
DAS COMEDIAS. %?
AMA, (canta)
"Llevantéme un día."
FEITICEIRA.
O de mais quero eu ver
Que o cantar; perdei cuidado:
Que lhe dades a comer?
AMA. Papínhas de pao relado.
FEI. E depois que aponía a amella?
AMA. Sopasinhas da panella,
E leite fresco coado.
FEI. Diabos, por meu amor,
Filhos meus e meus senhores,
Ide á deosa maior,
Dizei que por seu louvor
Me mande as fadas maiores.
As suas duas fermosas
Com melodía serena,
Que me fadem a Cismena
Sobre todas as ditosas.
Emtanto quero eu benzer
Os caminhos e carreiras
Que vilo daqui pera Oeiras,
Que de lá deveis de ser.
Padre santo San Gíao
Que vcm e vai com os que váo,
San Braz e San Sadorninho,
San Pedro, Paio, Marlinho,
Sancto Ilario e San Joáo.
Entres natos mulleres
Nao sorrexe outro maior
Joáo Baptisla corretor.
Mal me queres, bcm me qucres.
DAS COMEDIAS. S>9
Pera a vender
Por Moura, e ferro no pé.
Aqui a haveinos de fadar,
E de benzer,
Que ella o possa entender,
E se salve na boscagem
D' Arrouchella:
E lhe dará de comer
Hüa bestial salvagem,
De dó della.
FEITICEIRA.
Tudo isso sao carambolas.
Ama, levade-a asinha.
Ora i-vos, minha rain ha,
E inandar-m'heis das cebólas.
Idas todas estas figuras, diz o Licenceado que fez o
argumento :
LICENCEADO.
Hagamos ahora mención y querena,
En esta segunda cena en que estamos,
De como enviaban los villanos amos
Guardar el ganado la niña Cismena,
Y de cinco años muy linda y serena
Su ganadico por sí careaba;
Y con pastorcicos villanos andaba,
Asegun que luego mostrar se os ordena.
Oh pezar de mi comigo!
Di, rogo-te, Císmeninha,
Yiste-m a ininha burrinha?
32 LIVRO II.
PEDRINHO.
Eu comi papas aquesta.
AFF. E ininha máe deu-me hum bolo.
JOA. Qués-ine tu dar delle, tolo?
Cis. Outro levo eu ca na cesta.
PEO. J a parió a nossa bésta.
JOA. E nos temos tanto inel,
Que trouxe a nossa Isabel!
AFF. Mentes, Joanne. JOA. Por esta.
CISMENA.
E a íníin hao-ine de comprar
Hüa coifinha lavrada.
PEO. Temos tanta marmelada,
Que minha mae m'ha de dar!
JOA. E meu pae ha d'ir pescar,
Tomará hum peixe tainanho,
Assi como o nosso tanho,
E nao vo-lo hei de dar.
PEDRINHO.
Olha, Joanne. JOA. Hain?
PED. Dar-in'has tu hum tamaníno?
AFF. NOS temos outro menino,
Que minha mae parió á manham.
Cis. E eu nao tenho no carril
Dous alfinetes que achei?
JOA. Tambem eu er acharei
Algum dia algum ceilil.
PEDRINHO.
E a miin dáo-me sardínha inteira.
A F F . Oh! PED. Pola Virgem Maria.
JOA. Nao t'acouláráo outro dia
Por jurar dessa inaneira?
\ oí. II
34 LIVRO II.
CISMENA.
CLITA — sua Criada.
Hüa BEATA.
BRISIDA
SEQUEIRA
ANDRESA
FELICIA \ Lavrandeiras.
SERRANA
ORIBELLA
AUREIJA
FELICIO.
DARÍO LEDO.
CRASTO LIBERAL.
AFFONSO — sen Criado.
PRINCIPE - IrniSo de Felicio.
SCEWA TERCEIRA.
Ó extrema formusura,
Garca bella,
Temo que subáis n'altura,
Onde vos tornéis estrella,
Por estardes mais segura.
Nao por tomar claridade,
Antes vos a podéis dar;
Mas por poder enviar
Coriseos e tempestade
Sobre quem vos inais amar.
Pera que he, senhora, usar
Vosso poder,
Que vos deveis d'espantar
Nao leixardes esquecer
Tantos modos de matar.
CUTA.
Que fazeis ca todo o dia?
Vos nao tendes que fazer?
Ella a calar, e elle a dizer:
Pera que he tanta porfía?
Ide buscar de comer.
Cuidáis que a haveis de haver
Logo assi?
Nao m'o quer agora ver
Nem ouvir, e elle allí:
Cuida elle que o háo misíer.
FELICIO.
Porque nao falláis, senhora.
Seja sequer contra mi?
Pois sem ventura nasci,
Nao ín'hei d'espantar agora
Do que sempre padecí.
DAS COMEDIAS. 51
Em calcas e em jubáo:
E alvoradas de cravo,
E canella vein á máo,
Servíndo-a como escravo,
Cantando a D''amores jago,
Quando as torgo d"1 amores dormo,
E todas reluziráo.
Miiihas lagrimas ausentes,
Meus suspiros sem ventura,
O inhibas dores ardentes,
Agora que estáis presentes,
Alegrae vossa tristura.
Saudades porque caíais,
Angustias, que nao dizeis,
Gemidos, que nao falláis
Os tormentos que ine dais,
Os males que ine fazeis?
FELICIO.
Nao entra mais isso nella
Que prégacáo em Judeu:
Despois que inoro coin ella,
Nem d'albarda nem de sella
Nao me quer haver por sen.
AUR. Darío Ledo, digo eu
Que tanjáis hüa cantiga.
DAR. Nao sei que cantiga diga
Hum liomem de amor sandeu.
(Tempera a viola.)
FELICIO.
Em tudo ha hi temperanca
Por mais que se desteinpera;
Mas meu mal nao se tempera,
DAS COMEDIAS. 53
CISMENA.
Cant'á agora sera bom
Que diga de meu direito.
Que saude ou que proveíto
He o que Cismena tein,
Que a seguís tanto a peito?
De veréis d'ha ver respeíto
Que sois casado e ja velho.
CHA. Com esse ar, com esse geito,
Minha vida e meu espelho,
Me tendes todo desfeíto.
CISMENA.
Muito tarde vos chegáráo
Táo engañados engaños.
CRA. Porque despresais meus annos,
Que a servir-vos me arribáráo
Sem receio de meus dañinos?
Cis. Oh enleios soberanos!
CRA. O Senhora,
Morte e vida dos humanos!
Cis. Se vos visseis ca de fóra
Mudarieis esses pannos.
CRASTO.
Senhora, em concrusáo,
Eu tenho inuita fazenda,
Sem filhos, e grande venda,
E liberal condicáo,
Sein haver quem ine reprenda.
Cis. Senhor, nao estou ein tenda,
Nem ine vendo.
CRA. Vossa Mercó' nao entenda
DAS COMEDIAS. 55
Eco. Anjo.
FEL. Anjo que tu, alma, adoras:
Anjo que ine tira a Aida,
Hora he de seres ida
Do triste corpo ein que moras.
Eco. Horas.
Em este espacio cahido Felicio de todo morto, diz o en-
cuberto Principe:
PRINCIPE.
Quiero ver si desmayó
Felicio, ó como esto va.
Hou Felicio! esforzá!
Pulso no le siento yo.
No cale, mas muerto está.
Oh cuitado!
Como estás desfigurado
Siendo galán tan real,
Muy discreto namorado;
Y de leal
Moriste desamparado.
Oh muerte mal empleada!
Pues tu fe era tan buena,
No debiera ser pensada.
Ni la Señora Cismena
Deja de ser la culpada:
Que el matar
No es cosa de loar,
Cuando sin razón se hace;
Que á Dios place
Que amemos en tal lugar.
Ya que es hecho tal lavor,
Tal IaA'or, y sin porque.
64 LIVRO II.
LAVRANDEIRAS.
Senhora, nao mais costura;
Festejemos tal ventura,
Ventura bem empregada,
O VIUVO.
HUM FRADE.
PAULA ,
( Filhas do Vmvo.
MELICIA )
COMPADRE do Viuvo.
D. ROSVEL — Principe disfarcado.
ü. GILBERTO — Seu irmao.
HUM CLÉRIGO.
Quebrántame el corazón.
Oh qué humilde condición,
A la razón
Cuan callada, cuan sufrida,
Toda plantada y ingerida
En descricíon!
Alegre con mi alegría;
Con mi tristeza lloraba;
Pronta á cuanto yo decía;
Quería lo que yo quería;
Amaba lo que yo amaba:
Toda su casa mandaba,
Y castigaba,
Sin de nadie ser oida,
Ni de persona nacida
Profazaba.
Amiga de mis amigos,
Amparo de mis parientes;
Muy humilde á mis castigos,
Cruel á mis enemigos;
Placentera á sus servientes;
Tal que con fieras serpientes
Impacientes
Hiciera vida paciente:
No fue muger mas prudente
En las prudentes.
Enemiga de celosas,
De las castas compañera,
Contraria á las maliciosas,
Callada con porliosas,
Para virtud la primera:
Muy honesta y placentera,
DAS COMEDIAS. 71
De manera
Que nunca se desmedía;
Sublimada en cortesía
Verdadera.
Envidia, ni parlería
Jamas la sentí ni oí;
Y sí mal de alguien oía,
Desculpaba y respondía
Como si fuera de sí.
Pues que tanto bien perdí,
Porqué nací?
O muger, flor de las castas,
Donde estás, que tú te gaslas
Y á mí?
En el punto que partiste,
No debiera quedar yo;
Porque la vida que es triste
Mas muere quien la resiste,
Que el muerto que la dejó.
Aquel Dios que la llevó
Pido yo
Muerte luego por victoria;
Pues la vida de mi gloria
Ya pasó.
Vem hum Frade a consolar o f'iuvo, c diz:
FRADE.
La gloria y consolación
Daquel que es padre eterual
Sea en vuestro corazón,
Porque tenéis gran razón
De llorardes vuestro nial.
Viu. O ini padre espritual,
T¿ LIVRO II.
Cuan mortal
Hallareis á vuestro amigo!
Por amparo y por abrigo
Lloro tal.
Tal que nacer no debiera;
Pues sabes como perdí
Mu«rer tanto á mí manera.
FRA. Quien perdió tal compañera
Que llore, digo que sí.
Viu. Oh cuan amiga de mí!
FRA. Bien lo vi.
Viu. Oh mí vida trabajada!
Ay de ini ahna penada,
Y ay de ti!
FRADE.
Tomad un consejo, hermano,
Deste amigo singular:
Pensad como lo humano,
Unos tarde, otros temprano,
Nacimos para acabar:
Y todo nuestro tardar,
A buen juzgar,
Por mas trabajo se cuenta;
Pues no se escusa tormenta
Neste mar.
Quitad el luto de vos,
Y eses paños negregosos;
Que cierto sabemos nos
Negar los hechos de Dios
Todos los que están lutosos.
Que se muestran soberbiosos
De quejosos,
DAS COMEDÍAS ?3
Fuertemente!
Sacudióme un torniscón,
Y sacóme un rifanazo
De la greña:
Corralóme en un rincón,
Y dióme con un palazo
De la leña.
Viuvo.
Algo le harías tú.
Ros. Nada, nada, jurí á san:
Venía yo haciendo
Tu ru ru ru ru,
Viene el liideputa can,
Que lo yo encomiendo.
Viu. Quieres conmigo vivir?
Ros. Si me dais buena soldada,
Trabajar:
Yo bien tiengo de servir
En ganado y en sembrada
Y en caArar.
Ir por leña y al molino,
Traer mato para el horno
Y aun cocer;
Vindimiar y coger lino,
Hacer vino y poner torno,
Si os menester.
No, cuanto es de servicial,
No Arenga el diablo acá
Que mas haga.
Yo os daré un corral,
Que el ganado no habrá
Miedo de plaga.
DAS COMEDIAS. 85
MELICIA.
Oh como es tan placentero!
Ros. Juan de las Brozas Juan
Me soy yo.
Viu. Y el ganado? Ros. Esperad, diré primero:
Anduve tras un gavillan,
Y allá quedó.
Ora, nuestramo, hablad vos.
Viu. Queda todo en el corral?
Ros. Quien? El ganado
Bueno está, bendito Dios;
No se me perdió ni tal,
Él sea loado.
Viuvo.
Dalde luego de cenar.
Ros. Que no tengo gana yo
De comida;
Mi placer es trabajar
Y hacer doquier que esto
Es mi vida.
Viu. Cena, cena: dalde el pan
Y migas á gran hartura,
Con del ajo:
Y comerás, hijo Juan,
Que el comer es la holgura
Del trabajo.
Voyme á cas del sacristán
Á pagalle las campanas
Que tañió:
Quédate, hijo Juan.
Ros. Ambas á dos sois hermanas?
MEL. Creo yo.
88 LIVRO II.
A mi querer.
Pido á vuestra gran beldad,
Que no os turbéis, señoras,
Por aquesto:
Que en guardar vuesa beldad
Yo seré á todas horas
Mucho presto.
No quiero sino miraros,
No quiero sino serviros
Desta suerte;
Y si os ofendo en amaros,
Bien lo pagan los suspiros
De mi muerte.
Don Rosvel soy, generoso,
DAS COMEDIAS. 89
Ni por sueño;
Que otro soy des que os AÍ,
Y por vos es mi placer
Tener dueño.
PAULA.
La merced que nos haréis,
Que somos huérfanas señor,
Y sin madre,
Que os vais y nos dejéis:
No matéis al pecador
De mi padre.
Abatís en vueso estado,
Siendo noble en señoría
Por derecho,
Y queréis ser deshonrado
Por tan pequeña contía,
Sin provecho.
ROSVEL.
No me deja ir amor
Ni las mis andas tamañas,
Que departo;
Que es tan vivo ini dolor
Que me abrasa las entrañas,
Si me parto.
No pude de otra manera,
Para veros y serviros,
Sino ansí:
Hice yo que no debiera,
Porque muchos mas suspiros
Tengo aqui.
PAULA.
Ora eso que aprovecha,
DAS COMEDIAS. 91
Consentimos:
Estamos en dos extremos,
Porque á él también erramos,
Si decimos :
Son dos extremos sin medio.
MEL. El medio es si nos dejase.
PAU. TU no A'es
Que eso no lleva remedio ?
Si consigo lo acabase,
Cierto es.
MELICIA.
Pues nos que lo publiquemos
r
A mi padre ó á alguien
Es niñería.
PAU. Ningún favor no le demos.
MEL. Y quien por nos sirve tan bien
Qué diría?
PAU. Y pues quien le pagará
La grande soldada suya
Norabuena ?
MEL. Hermana, él se enfadará:
Culpa no es mia ni tuya
De su pena.
Vem D. Rosvel, cantando, carregado.
ROSA T EL.
"Mal herido me ha la niña,
"No me hacen justicia."
Ha, nuestramo! PAU. Fuera es ido.
Ros. Consuelo de mi alegría,
Como estáis?
Mi gloria, mi bien cumplido?
Que la muerte y vida mia
94 LIVRO II.
Vos la dais.
PAU. Señor, porqué os matáis,
Y nos dais vida cuidosa
Sin porque?
Porque en Arano trabajáis?
Ros. O esmeralda preciosa!
Bien lo sé.
Pero este mi sudor
Amata las Aivas llamas
Que amor quiso,
Y el afán de mi labor
Por vos, muy hermosas damas,
Es paraíso.
Y el ganado que apaciento
Como á ángeles del cielo
Lo adoro
Por A^ueslro merecimiento,
A que no pido consuelo,
Sino lloro.
Otra gloria no me siento
Sino desesperar della,
Y desespero:
De mis trabajos contento,
A nadie tengo querella;
Y sé que muero,
Y sé muy cierto que no
Con servicio os enamore
Ya en mis días:
Porque no soy diño yo,
Ni sé como os adore,
I'dolas mías.
DAS COMEDIAS. 95
PAULA.
Por cual de nos lo habéis vos1
Ros. Dos amores se ayuntaron
Contra mí;
IiOs males de dos en dos
Mi cuerpo y alma cercaron,
Cuando os AÍ.
De dos en dos los dolores,
Dos saetas en mí siento,
Y me hierieron:
Ay, que juntos dos amores
En un solo pensamiento
No se vieron!
Sufrir doble padecer,
Padecer doble pasión,
Cual me veis,
No sé como puede ser;
Que mi fuerza y corazón
Vos la leñéis.
La una de Aros bastara
Para que mí poder fuera
Consumido,
Y la vida y alma gastara.
No que mi querer pudiera
Ser perdido.
Vem o Viuvo, e diz
ROSVEL.
Nuestramo, Avenís cansado?
Viu. Mas antes mucho contento
Del casal;
Porque dejo concertado
Para Paula un casamiento
96 LIVRO II
Muy real:
Y aun Melicia esla semana
Le espero de dar marido
De hazaña —
Lloras? Ros. Lloro una hermana,
Que poco ha se ha morido
Supitaña.
Quiero llevar el ganado
Á unos valles sombríos
Y tristoños,
Donde se harte el cuitado
De oir los gritos míos
Muy medoños.
Viu. Limpia el establo primero,
Y lleva el eslércol luego
Al linar.
Ros. Que me place, eso quiero.
Acábame ya, triste muerte,
De matar!
Viuvo.
Qué hablas? Ros. Qué he de hablar?
Digo que voy soñoliento
Y carcomido.
Viu. YO me voy ora á rezar,
Que Dios haga á tu contento
Aquel marido. (vai-se)
PAU. Oh como va lastimado
El triste de Don Rosvel!
MEL. ES de doler.
PAU. De veras es namorado.
MEL. Luego pareció en él
Su querer.
DAS COMEDIAS. 97
PAULA.
Pues no es de los fingidos,
Dame tú la fe, hermana,
Yo doy la mía,
Que no tomemos maridos,
Hasta que él de su gana
Haya alegría.
No hagamos sinrazón
A quien de amores nos trata
En tanta fe.
Perseguillo hasta la mala
Será mala condición
Y sin porque.
Yem D. Rosvel e diz:
A todos das sepultura,
Muerte; díme que es de ti,
Que te amo,
Y por mi gran desventura,
Tú te haces sorda á mí,
Que te llamo.
Pues mi ánima se enoja
Con las tristes ancias mias,
Tan penada;
Rasgada sea la hoja
Adó están escritos mis dias.
Y quemada!
Oh, por Dios, lindas señoras,
En este transo penado,
Tan mortal,
Xd os mostréis consentidoras,
Ni vea yo desdichado
Tanto mal.
V o l . U.
98 LIVRO II.
Su porquero.
Hermano, yo te requiero,
Por la mucha virtud dolías.
Que nos casemos con ellas,
Yo primero.
Amparemos y honremos
Huérfanas tan preciosas,
Que en las cosas virtuosas
Son extremos.
Villas y tierras tenemos;
Hagamos esta hazaña,
Que quede ejemplo en España,.
Y no tardemos.
Toma esta por muger,
Y á mí darás la vida
Y ternas muger nacida
A tu placer.
Quien casa por solo haber,
Casamiento es temporal.
GIL. Como á hermano especial
Lo quiero hacer.
Tomou D. Rosvel a Paula pola mao, e D. Gilberto a
Melicia. E neste passo veio o pae dellas, e cuidando que
era d'outra maneira, se queixa dizendo:
Viuvo.
Señores, qué cosa es esta
Que hacéis en mi posada
Dolorida y quebrantada,
Descompuesta ?
Qué cosa tan deshonesta
Para señores reales!
102 LIVRO II.
CLÉRIGO.
Este santo sacramento,
Magníficos desposados,
Es precioso ayuntamiento;
Dios mismo fue el instrumento
De los primeros casados,
Por su boca son sagrados:
Serán dos in carne una,
Benditos del sol y luna,
En un amor consei'vados.
El Señor sea con vos:
Las manos aqui pomeis,
Y decid: Nombre de Dios,
Don Rosvel, recibo á vos
Et cetera, ya lo sabéis
Y aquel dicho de Noé;
Le dijo Dios: Multiplicad,
Enchid la tierra y holgad
Con salud, que Dios os dé.
F I G U K A S.
LAVRADOR. MELIDONIO.
CELIPONCIO. COLIMENA.
GALAMENO. BELICRASTA.
LIBERATA. SIL VENDA.
HERIDEA. SOSSIDERIA.
ERMITÁO. PERIGERIA.
MONDERIGON. PEREGRINO.
ARGUMENTO.
PEREGRINO.
Pois que o honor do mundo presente
Se dá coin rezao á antiguidade,
Infinita honra Ion» esta cidade,
Segundo se escreve copiosamente.
E a honra maior
He que o altissiino Imperador,
Vossas Magestades, a Sacra Iinperatriz,
A alta Duqueza Dona Beatriz,
Se sois sacros fructos, daqui foi a flor.
E tambem a Rainha que he d'Inglaterra,
E a verdadeira Rainha de Franca,
A quem Déos, Déos nosso dé tanta bonanca
Como dá Maio ás flores da serra:
O lucido Infante,
Rei Duque d'Austria, Heitor militante,
E o sacrosancto nosso Cardeal,
Os nobres Infantes, bem de Portugal,
Daqui procedestes, e ¡s adianto.
Assi que os principes da Chrislandade,
Que agora reináo, daqui florccéráo:
Aqui jaz o Rei de que procedéráo:
E que o fez rei senáo esta cidade?
DAS COMEDIAS. 107
De afrenta,
La vida del labrador,
Que no tiene de que dar
Tanta cuenta.
Casé con una pastora,
Que andaba en esta montaña
Otra tal,
Hija de grande señora
Y del señor de Bretaña,
Mi igual,
Y con la misma intención
Que yo, dejó su estado
Y su tierra,
Y acertó por conjunción
Casarnos entre el ganado
Desta sierra.
Ella cada año paría
De dos en dos las crianzas
Tan hermosas,
Que en ellas se parecía
Y parece que son plantas
Generosas.
Vino Dios ya sin razón,
Estando resando ella
En mi corral,
Consentió que un dragón
Me hiciese viudo della,
Por mi mal.
No bastó: mas va en siete años
Que no cogo pan ni nada
En mis herdades
Con los inviernos tamaños,
DAS COMEDIAS. 113
Ya no os el que solía,
Mas mudó otro semblante
Para nos.
LIB. Si tú, Celiponcio hermano,
Lo que dijo el ermitaño
Has por seso,
Y mi padre nos da mano,
Luego antes de mas daño
Se haga eso.
Y cumple de caminar,
Sí vieres que de razón
Se ha de hacer;
Porque el buen remediar,
Como pasa su sazón,
No puede ser.
Descarguemos de cuidado
Mi padre, que lanío Hora
Nuestro daño;
Porque, un mal remediado,
Los otros teman su hora
Por el año.
Chegño a tomar a bengao do pae, o qual diz:
LAVRADOR.
O mi hija liiberata,
Discreta, mansa, muy buena,
Despedios;
La mía bendición beata
Os echo con triste pona.
Hijos míos,
Llevareis esta ballesta,
Y esta chuza llevad
Y eslabón.
a'
116 LIVRO II.
Celeponcio y Liberata
Idos son.
En antes que morir os vea.
Partios con mi sacrata
Bendición.
Galameno, hé aqui tu hermana,
Y esta cana de pescar
Y pedernal:
Hijos, quien no anda, no gana.
Yo quedo para llorar
Aun mas mal.
Razoamento do Lavrador com o Ermitao, depois de par-
tidos os filhos, ficando sos.
LAVRAÜOR.
Ora me di tu ventura,
Padre bienaventurado
En el cielo,
Consejo de mi tristura,
Maestro de mi cuidado,
Y mi consuelo.
ERM. YO soy el Rei Ceridon
De Corduba y Andalusía;
Y un selvage,
A que llaman Mondrigon
Cautivó una hija mia,
Por mi ultrage.
Y cautivó un su hermano,
Á que llaman Melidonio,
Y cuatro damas
Me robó el cruel tirano
Por el poder del demonio
Y' de sus llamas,
118 LIVRO II.
LmERATA.
Es ido: pues por mi fe
Que no sé por qué interese
Deseaba que se fuese,
Y pésame porque se fue,
Como si bien le quisiese.
Y pluguiese al alma mía
Que yo pudiese librarme;
Que esto que hace pesarme
Porque se fue, algún dia
Quizá podrá amargarme.
Mas qué digo?
Por ventura es enemigo,
Que quiere hacerme herege:
Mas no rege,
Que el amor sentó conmigo.
Qué haré?
Si volvíere, mostrarle he
Manso corazón, ó bravo?
Mas él náceseme esclavo,
Para qué me ablandaré?
Todavía
Seguiré la tema mia;.
No me quiero condenar,
Ni pensar
En este hombre hora ni dia.
Bien mirado
Es tan dulce y bien hablado —
Que lo sea norabuena;
Que esta lena
Después da luengo cuidado.
Vcm Celiponcio da caga, e diz.
DAS COMEDIAS. 125
CELIPONCIO.
Ya la caza viene asada.
LIB. Seáis mucho bien venido.
CEL. Hermana, como te ha ido?
LIB. Bien, que ya estoy descansada.
CEL. Dios loado!
Vengo bien aventurado.
LIB. Cómo, Celiponcio? qué?
CEL. Una serpiente hallé,
Y un león muy denodado,
Y dainbos quedan allí.
Guárdanme en esta espesura,
Que animal ni criatura
No osa á llegar á mí.
Ellos veníanme á matar,.
Yo fui los halagar,
Echando la ballesta á mal,
Y tomáronme amor tal,
Que no ine pueden dejar.
LIB. Qué son? qué son?
CEL. Una sierpe y un león.
Dígote, hermana querida,
Que aman tanto ini vida,
Y dambos en tanto extremo,
Que todo el mundo no temo.
Bendita nuestra venida!
LIB. Parece cosa divina.
CEL. Toma, hermana, esta bocina.
Porque la conocen bien;
Y si te enojare alguien,
Toca, y verás cuan aína
Destruen Jerusalen.
126 LIVRO II.
LIBERATA.
Fuerte cosa es esa, hermano!
CEL. Anda, ven acá conmigo,
Y verás lo que te digo
Si te lo pongo en la mano.
LIB. Bien creo que será ansí;
Pero bien me estoy aqui:
Canso mucho por la sierra.
CEL. Si alguno te hiciere guerra,
La bocina queda ahí.
Monderigon nao ousando quebrantar a postura que Li-
berata lhe poz que nao tornasse ahí mais, mandou-lhe hum
recado por Melidonio, irmao da princesa Colitnena; e
porque elle vinha muito desfigurado cnberto de cabello, e
com hüa braga de ferro, diz Liberata, espantada delle:
LIBERATA.
Quien sois? Oh Abálame, Dios!
MEL. Soy captivo sin razón
Del cruel Monderigon,
Que es tan perdido por Aros,
Que pasa de perdición.
Y tiene mi hermana presa,
Colimena la princesa,
Cuatro damas sus hermanas que prendió.
Señora, á ATOS me enAió,
Que os dícese esta empresa.
LIBERATA.
Dejemos eso agora,
Que en después me hablareis.
Mas decidme, ansí gocéis,
Como trata esa señora?
MEL. Tan mal que os espantareis,
DAS COMEDIAS. 127
PEREGRINO.
Sus, vos, Sossideria, onde repousa
O canto d'antiguidade Romana.
Sos. Eu edifiqueí a villa da Arrifana,
E de mi procedem todos os de Sousa;
Os Sousas que o sao digo eu poréin,
Porém os de Sousa que bein Sousas sao,
Sao homens de paz, poe tudo em rezáo,
Bos caAralleiros ñas partes d'alem.
E sao Aerdadeiros e dissimulados,
Amigos do Rei e bos servidores:
Muito a miude comecáo amores;
Poréin nunca acabáo de ser na morados:
E as muflieres Sousas de nacáo
Sao boas, sao graves, fennosas, inui bellas;
E tanto ATOS monta adorardes nellas,
Como nao lerdes nellas devacáo.
PEREGRINO.
«^•«—
F I G U R A S .
PROLOGO.
HDM P H I L o S o P H O.
HUM PARVO.
Y dormiremos á la una.
Pin. Menguada estaba la luna
Cuando nacimos los dos,
Y contraria la fortuna.
Después dormiré, amigo:
Entanto tú dormirás,
Y no soñarás conmigo;
Mas yo soñaré contigo,
Por cuanta pena ine das.
Porque cualquiera pasión,
Asegun A7eo y entiendo,
Que se siente con razón,
Ni velando ni dormiendo
Se consuela el corazón.
PAR. Pues aborrís la dormida,
No os A7ais por hi andando,
Ni me llevéis arrastrando,
Nuestramo, por vuestra vida,
Por Aros irdes escapando.
Deita-se o Parvo a dormir, c diz o
PHILOSOPHO.
Veis que hago penitencia
Desta suerte, sin pecar;
Y es tanta mi paciencia,
Siendo tal la penitencia,
Que no me quiero ausentar.
Porque la obediencia, amigo,
Las Airludes son sus puentes:
En tu hablar no te exentes,
Porque le vas del abrigo
Al peligro que no sientes.
Aun que el daño sea profano,
142 LIVRO II.
DOUTOR.
Quien pensara norabuena
Que una rapaza de un año
Hiciera tan grande engaño
Á un doctor hecho en Sena?
Será mas sano
Callar hecho tan profano,
Y olvidar esta guerra,
Y irme á juzgar la tierra,
Que ya el Rei Telebano
Ahora llega á la sierra.
Aqui se representa o que passou el Rei Telebano na
serra Minea com Grata Celia, sua filha.
TELEBANO.
Grata Celia, hija mia,
Esta es la sierra Minea,
La cual vuestra casa sea
De lágrimas sin alegría.
GRA. Porqué, Señor?
TEL. Porque yo. por mi dolor,
Os he traído engañada
De mi casa desterrada.
GRA. Porqué, triste pecador!
Que yo no os hice nada.
TELEBANO.
Mándalo Apolo Dios,
Y me metió neste afán;
Y como hizo Abrahan,
Hago sacrificio de vos.
GRA. Oh triste yo!
Ya sé quien esto ordenó:
Cupido hizo estes daños.
DAS COMEDIAS 16o
CUPIDO.
Pues sois remedio del daño
Que consume mis placeres,
Bendito seáis engaño,
Que con tu poder estraño
Todo acabas cuanto quieres:
E n ti inora
Todo el descanso de ahora;
Tú lo das, por ti se da.
Mi vida te la dará,
Pues me la diste, señora.
Perfección de las mugeres,
Vos me quitastes la vida,
Y la tenéis consumida
Y mis bienes y placeres:
Y Aiendoos puesta
E n esta braA7a floresta
Y entre estas espesuras,
Dejé el cíelo á escuras
Por ver la claridad Aruesa.
No por sanar mi pasión,
Ni menguar en mis enojos,
Porque vuesos rayos son
Dolores al corazón
Y lágrimas á los ojos.
GRA. Podéis hablar,
Que yo tengo de escuchar,
Pues, triste, por mi dolor,
Telebano, mi señor,
Me dejó neste lugar,
Así como me hallaste»,
Presa en estos fierros tristes.
DAS COMEDIAS. 167
Ou ín'engano?
CUP. Allégate acá, hermano.
PAS. Ora m'enganaAra tanto,
Que cuideí qu'ereis vos santo,
E vos falláis castelhano.
Pois que estáis aqui fazendo?
CUP. Qués te lo haga saber?
Tu no lo has de entender,
Que yo mismo no lo entiendo
Por ahora.
PAS. E ATOS estáis preso, ina ora?
CUP. Pastor, esto no es prisión,
Que es cadena de condón,
Que me dio una señora
De mucha veneración.
El que en ella se prendiere
Será libre de tristeza,
Y mil bienes y riqueza
Terna quien nella estuviere,
Por mi fé.
Y pues tu ventura fue
Que tú alcansases vella,
Yo te hago mercé della
Y Dios te hará mercé:
Gózate mucho en tenella.
Quítamela con tu mano.
PAS. Esta veío do Peni:
Ora Déos me Iroux'aqui.
CUP. Dala acá; ponía en ti:
Buena prol te haga, hermano.
P.vs. Oh coitado!
CUP. Qué has? P.vs. Estou namorado.
17a LIVRO II.
VENTURA.
0 Grata Celia Princesa,
De las princesas mayor,
Qué os hizo el Dios de Amor,
Que tenéis su vida presa?
GRA. Mas holgara
Que Ventura perguntara,
Pues que ya me conocía,
Quien me robó el alegría
Y las flores de mi cara.
VENTURA.
Perdonad, que perdí el norte.
GRA. O Ventura consagrada,
Que siendo de mi adorada,
Vos .me disteis por mi suerte
Ventura desventurada!
Tal ha de ser,
Por ser buena la muger,
Virtuosa sin mudanza.
Dios de amor ha de querer
Tomar tan cruda vinganza?
PRINCIPE.
De quien os quejáis, os pido,
Princesa de hermosura?
GRA. Quejóme de la Ventura
Y de Apolo y de Cupido.
VEN. NO es cordura
Quejaros de la Ventura:
Con Apolo es la demanda:
Que naquello que Dios manda
No erró nada la Ventura.
DAS COMEDIAS. 179
PRINCIPE.
Si vos nada aprovecháis,
Para qué os llevo por guia?
VEN. Yo os guio por la via
Que Dios quiere que vayáis.
Pongo figura:
Dice cualquier criatura,
(Esto bien lo sabéis vos)
Quizo Dios y la Ventura:
Primero se nombra Dios,
Porque es cosa mas segura.
Yo os guio por acá,
Por muy venturosa via,
Por dar nueA'a alegría
r
DAS TRAGICOMEDIAS.
FIGURAS.
ü. DUARDOS.
O IMPERADOR PALMEIRIM.
PRIMALION, seu filho.
FLERIDA.
AMANDRIA i .
\ Damas de Flerida.
ARTADA )
CAMILOTE.
MAIMONDA.
D. ROBUSTO.
OLIMBA, Infanta.
JULIÁO, Horteláo.
CONSTANZA ROIZ, sua mulher.
FRANCISCO i
J seus filhos.
JOÁO )
PATRÁO DE GALERA.
De tal son,
Que por ira ni ainicicia
No deje Vuesa Magestad
La razón.
Porque si con muestra de rey
Vendiéredes después, Señor,
Falso paño,
Vos os quedareis sin ley,
Y será emperador el engaño.
Gridonia, Señor, está
Agraviada en extremo,
Y de manera,
Que de pesar morirá.
Y pues, Señor, esto temo,
Dios no quiera
IMPERADOR.
Esforzado aventurero,
Muestra el razonamiento
Que habéis hecho,
Que sois mas que caballero.
D.Du.No soy mas que cuanto siento
Esto despecho.
Primalion le mató
Á Perequin que ella amaba
Como á Dios;
Ansí que á ella heríó,
Y aunque con uno lidiaba,
Mató dos.
PRIMALION.
Vos venís á demandado?
D.üu.Por ventura sois, Señor,
Primalion ?
DAS TRAGICOMEDIAS. 185
MAIMONDA.
Todo loor es fastío
En la perfección segura
Y manifiesta;
Bien basta que en ser vos mío
Se prueva mi hermosura
Bien compuesta.
CAM. Bien decís. MAL Mas así es.
CAM. Esperad, señora mia.
MAL Qué señora?
CAM. Diana hermosa es,
Pero quiere cada dia
Su loor.
Y las Reinas soberanas
Muestran señas y terrores
A deshora,
Cuando las lenguas humanas
No publican sus loores
Cada hora.
Pues bien manifiesta y clara
Es la hermosura de ellas
Y la valer.
Pues á vos no se compara
Ni ellas ni las estrellas,
A mi ver.
MAIMONUA.
Así es ello por mi vida.
CAM. Pues dejaos loar, señora.
MAL Para qué?
CAM. Porque es cosa sabida
Que quien alaba colora
Su gran fe.
188 LIVUO III.
No es esto lisonjaros,
Como muchos han mentido
A sus amores.
MAL ASÍ me lo dice el espejo
De esa propia manera
De esos prados.
CAM. Señora es mi consejo
De tomar la delantera
A esforzados.
Á Constantinopla vamos.
Señora, al Emperador
Palmeirin;
Allí quiero ir; veamos
Lo que vuestro resplandor
Obra en mí.
Yo porné esta grinalda
Sobre vuestra hermosura
Que es sobre ella:
Veremos, o mi esmeralda,
Quien dirá que ama figura
Tanto bella.
MAIMONDA.
No os mucho que venzáis
Teniendo tanta razón.
CAM. A eso os vó,
Que solo el aire que dais
Mata de pura afición
Al que os vio.
MAL Vamos adonde queréis:
Celos no los escusais,
Que aquel que ama
Recela como sabeís,
DAS TRAGICOMEDIAS 189
No nació.
Xo le hacéis, damas, á esta
lia de vida ceremonia
A vuesa guisa?
AMA. Señoras, qué cosa es esta ?
ART. Esta debe ser Gridonia,
O Melisa.
FLERIDA.
Parece á la reina Oído,
Y Camilote á Eneas.
ART. SÍ, aosadas.
FLE. Espantado es mi sentido!
Quien hizo cosas tan feas
Namoradas ?
IMP. Son los milagros de amores,
Maravillas de Cupido.
Oh gran Dios!
Que á los rústicos pasture*
Das tu amor encendido
Como á nos!
Y á Camilote hace
Adorar en esa muerte,
Por mostrar
Que hace cuanto le place,
Y que nada no le es fuerte
De acabar.
Tales fuerzas no tuvieron
Otros dioses poderosos:
Que hace ser
*
A los que nunca se vieron
Enamorados deseosos,
Sin se ver.
192 LIVRO 111.
A un pardal.
D.Ro.Mucho os desmandáis vos.
CAM. Quereilo vos demandar?
D.Ro.Sobs caballero?
Si lo sois, juro á Dios
Que os haga yo tornar
Majadero.
Y en Flerida habíais vos?
Nadie es diño de vella,
Ni osamos,
Porque nos defiende Dios
Que no pensemos en ella,
Que pecamos;
Y manda, no sé porqué,
Que por do vaya ó eslé,
La tierra sea sagrada,
Y sea luego adorada
La pisada de su pie.
O herege entre varones!
Puede ser mayor locura,
Vol. I I . 13
194 LIVRO III
A Primalion.
ART. NO vino tal caballero
A la corle, ni se vio
Tal corazón.
AMANDRIA.
Supe, Señora, quien era?
FLE. Nunca se ine quizo dar
A conocer;
Mas, asegun su manera,
Gran señor, á mi pensar.
Debia ser.
ART. Cuan fuertemente lidiaba!
AMA. Oh como se combatía
Apresurado!
FLE. Qué ricas armas armaba,
Y cuan mañoso lo hacía
Y cuan osado!
CONSTANCA.
Dios bendiga Vuesa Altesa,
Y os dé mucha salud,
Y logréis la jiiA'entud.
Sin fatiga ni tristeza.
Estas rosas
Son de las mas olorosas.
FLE. Serán de casta de Ungría:
Mas decidme, no es dia
Hov de hacer afán?
«04 LIVRO 111.
No es día de holgar,
Sino donde ha hi placer.
Un hijo nos vino ayer,
Que nos quitó gran pesar.
FLE. Bendígaos Dios!
Otro hijo tenéis vos?
CON. Veinte años hace este mes.
FLE. Pues que vuestro hijo es,
Decidle que venga á nos.
CON. Viene roto; hasta mañana
No osará aparecer.
FLE. El hombre queremos ver,
Que los paños son de lana.
CONSTANCA.
Julián, mi hijo, mi diamau,
Llámaos la princesa
Flerida. D. DUA. Mas diesa,
Que todos alabarán.
Cual corazón osa ahora,
En tan disforme visage
Y vil figura,
Ir delante una Señora
Tan altísima en linage
Y hermosura!
Y vos mis ojos indinos.
Cuales hados os mandaron,
Siendo humanos.
Ir á ver los mas divinos,
DAS TRAGICOMEDIAS. 205
ARTADA.
El bobo muy bien asienta
Sus razones, y dirán
Sin letijo,
Si lo mira quien lo sienta,
Que no hizo Julián
Aquel hijo.
AMA. Venida es la noche escura,
Vayase Vuesa Altesa.
FLE. Aquel lal
Que lamenta su ventura
Y exclama su tristeza,
De que mal?
AMANDHIA.
Es un modo de hablar
General, que oís decir
A amadores,
Que á todos veréis quejar,
Y ningún veréis morir
Por amores.
Julián sin saber que es,
Quiere ordenar también
De quejarse,
Y muchos tales veres:
Mas querría ver alguien
Que amase.
Si alguno al Dios Apolo
Hiciese adoración
Por su dama,
Y esto estando solo,
Y llorando su pasión,
Este ama.
DAS TRAGICOMEDIAS. 209
No uses de poderosa
Porque diciendo te alabes
Yo vencí!
Ni sepas cuanto hermosa
Eres, que si lo sabes,
Ay de mí!
Oh primor de las mugeres,
Muestra de su excelencia
La mayor;
Oh señora, por "quien eres,
No niegues la tu clemencia
i
A mi dolor.
Por los ojos piadosos
Que te vi neste lugar,
Tan sentidos,
Claríficos y lumbrosos,
Dos soles para cegar
Los nacidos,
Que alumbres mi corazón,
O Flerida, diesa mia,
De tal suerte,
Que mires la devoción
Con que -vengo en romería
Por la muerte.
Tú duermes, yo me desvelo,
Y también está dormida
Mi esperanza:
Yo solo, señora, velo
Sin Dios, sin alma, sin vida,
Y sin: mudanza.
Si el consuelo viene á mí,
Como á. mortal enemigo
U*
212 LIVRO III.
Le requiero:
Consuelo, vete de ahí,
No pierdas tiempo conmigo
Ni te quiero.
Estq^ es ya claro dia,
Darleshé este tesoro,
Porque el mió
Es Flerida, señora mia,
De cuyo Dios* yo adoro
Su poderío.
Vem Juliao e Constanga, e diz Juliao:
JUL. Mala noche habéis llevado
Harto escura sin lunar.
D.Du.Y sin placer.
CON. Vueso almozo está guisado.
D.Du.Trabajar y suspirar
Es mi comer.
Veis aqui lo que saqué
Aquesta noche primera.
JUL. Oh qué cosa!
Pardiez aína diré
Que no es Flerida en su manera
Tan hermosa.
D.Du.Ay, ay! JUL. Venís cansado?
D.üu.Mi corazón lo diría,
Si osase.
CON. Comeréis un huevo asado,
Mi hijo, mi alegría?
r
Eu mi tesoro.
Esta copa ha de haber
Flerida, que es descendida
De un rey Moro.
Esta le A'iene de herencia
De sus agüelos pasados;
Cumple á nos
Dársela por conciencia,
Y los trecientos ducados
Para A7OS.
CONSTANCA.
O mi hijo y mi hermano,
Mi santo descanso mío
Y de mi vida!
Dios os trajo á nuestra mano,
Y fue por él, yo os fio,
La venida.
Su Alteza vendrá ora,
Que ya acabó de jantar
Ha buen rato.
JUL. Oh Dios, quien tuviera ahora
Para os agasajar
Un buen pato.
CONSTAM; v.
Andad acá, hijos míos,
Y porneinos en recado
Lo que hallamos;
Dios sabe ora cuan vacíos
Y sin blanca ni cornado
Nos hallamos.
Vamos, hijo, á la posada,
Y descansareis siquiera
214 LIVRO III.
Ve la noche
Mala que habéis HeA-ada:
"No faltará una estera
En que os- eche.
.Vem Flerida, Artada, Amandria ti borla e diz
FLÉRIOA.
Jesús!- qué cosa es esta?
No hacen hoy labor
Ni ayer?
ART. Terna ochavas la fiesta
De su hijo y su amor
Con placer.
FLE. Amandria, por vida vuestra
Que lo busquéis'y llamaldo.
AMA. Sí, señora.
FLE. Y si os hiciere muestra
De poca gana, dejaldo
Por ahora.
AMANDRIA.
Dice la señora Infanta
Que holgará de (e ver
Trabajar.
D.üu.No será su gana tanta
Cuanto será mi placer
De le agradar.
AMA.Sabéis sembrar toda suerte?
Ü.Ou.Señora, soy singular
Hortelano
Mas esta tierra es tan fuerte,
Que pienso que el trabajar
Será en vano.
Cavaré de corazón,
DAS TRAGICOMEDIAS. 215
Si te habías de partir,
Para, que era tu venida
É irte luego ?
Si Julián se partiese,
Por causa de nuestra vega
Pesarmehia,
Como se mucho perdiera.
ART. Si conmigo se aconseja,
No se iría. (^«o-se.)
Depois* de idas diz Juliao a >D. Duardos.
JULIAO.
Queréis ora que os diga?
Hermano, muy bien fiareis.
Que está noche no cavéis,
Ni os deis tanta fatiga.
Ceñaremos,
Y antes que nos echemos,
Tomaremos colación.
D.Du.Ni yo ni mi corazón
No cumple que reposemos.
Hora es que os acogais.
Voy á cavar mi riqueza;
No que descubra tristeza
Los secretos de mis ais.
Soliloquio segundo de
D. DUARDOS.
Oh floresta de dolores,
Arboles dulces, floridos,
Inmortales,
Secáredes vuesas flores,
Si tuviérades sentidos
• Humanales.
DAS TRAGICOMEDIAS. 219
De alegría.
Quiero lleA'ar mas tesoro
Y contentar á mis amos
Que es de dia.
Vai-se D. Duardos, e vem Flerida descobrindo a Arlada
o amor que tem a D. Duardos sem saber que era aquelle,
e diz:
FLERIDA.
O Arfada mi amiga,
Llave de mi corazón,
Tal ine hallo,
Que no sé como os diga
Ni calle tanta pasión,
Como callo.
Deciros quiero mi vida:
No, que de tal desvarío
Digo nada.
Mas es una alma perdida,
Que habla en el cuerpo mío
Ya finada.
Bien os podéis santiguar
De mí, que soy atentada
Del amor,
Y amor en tal lugar,
Que no oso decir nada
De dolor.
Esconjuradme y saberes
De esta ánima, que os digo,
Ya difunta,
Quien era, y cuya es;
Dirá que del enemigo
Toda junta.
DAS TRAGICOMEDIAS. 221
FLE.. No es razón,
Que está en muda mi halcón,
Y el azor desvelado,
Y mas ¡do el mi amado
Hermano Primalion.
Vem Constanga Roiz, e diz, chorando, a Flerida:
- CONSTANZA.
Ha hi azúcar rosado,
Señora, en vuesa casa?
FLE. Para qué?
CON. Mi hijo está maltratado,
Que el corazón se le abraza.
FLE. NO lo sé.
CON. DOS veces se ha amortecido.
ART. S Í lo apalpa la tierra!.
AMA. Quien guardó ganado en sierra,
En el poblado es -perdido.
CONSTANZA.
Es mi hijo muy sesudo,
Nueso Señor me lo guarde:
Suspira de tarde en tarde,
Pero quéjase á menudo
Que el ánima se le arde.
FLE. Qué será?
CON. Señora, no sé que ha;
Sus lágrimas son iguales
A perlas orientales:
Tan gruesas salen de allá.
Vem D. Duardos com sua enchada, e diz:
D. DUARDOS.
Madre, donde iré cavar?
Que no puedo estar parado,
DAS TRAGICOMEDIAS. 223
Ni socicgo:
No se entienda descansar
En mí, porque descansando
Muero luego.
CON. Mas dejad, hijo, la azada,
Y mirad estas doncellas
Que aqui veis.
Requebrad os con Arlada,
Y hablad con todas-ellas,
Y holgareis.
FLERIDA.
Vamos pasar los calores
•'Debajo del naranjal.
D.üu.Señora, ahí es natural,
•Caerá flor "en las flores.
FLE. De manera
Que siempre tienes ligera-
lia respuesta^ enamorada.
No os digo yo, Arlada,
Que va honda esta ribera?
ART. Señora, yo estoy espantada.
FLERIDA.
Tañed vuestros instrumentos,
Que pensativa me siento,
Y de un solo pensamiento
Nacen muchos pensamientos
Sin ningún contentamiento.
Y o so'specho
En el centro de mi pecho,
Y mi corazón sospecha
Que esta cosa va derecha
Para; yo perder derecho.
224 LIVRO III.
Pues busqué
Medecina provechosa,
Y con el mismo remedio
Me maté.
Que si Flerida es herida
De tal dolor como yo
Tan estraño,
Oh cuitada de mi vida!
Mi corazón qué ganó
En tal daño?
Oh Olimba qué heciste,
Que para remediarme
De mil suertes,
Heciste á Flerida triste,
Y verla triste es matarme
De mil muertes.
La copa me echó en medio
De un placer que me desplace
Y descontenta.
Pues ahora qué remedio;
Que lo que ine satisface
Me atormenta.
Oh preciosa diesa mia,
Yo confieso que pequé,
Señora, á ti,
Y por eso el alegría
Del remedio que busqué
Es contra mí.
Conozco que fue traición;
Perdona, rosa del mundo,
Al que pecó,
Porque fue mi corazón
DAS TRAGICOMEDIAS. 227
Como yo.
Tu diosa porqué no viene
Ver que esto suyo se va
AI infierno,
Onde por lu amor peno?
Y la gloria será
Que es eterno.
Apertando o amor a Princeza Flerida, e nño podcndo
cumprir o degredo que em si mesma poz, manda primeiro
Artada, e vendo a D. Duardos vir, diz antre si:
D. DUARDOS.
Aqui do viene Artada
Del mal lo menos es bueno.
Ya siquiera
Mi ánima atribulada
Dirá el mal de que peno
Y la manera;
Que no puede ser tan cruda;
La doncella es bien criada,
Per nivel
Que no sea mas sesuda,
Mas secreta y mas callada
Que cruel.
ARTADA.
Constanza Roiz qué os delta ?
D.Du.Señora, qué le queréis?
ART. Quiero rosas.
D.Du.Ya las cogeré sin ella:
De mí no las tomareis?
ART. Cuantas cosas
Quereisme hacer entender?
Quien sois, y lo que buscáis
232 LIVRO III.
Por aqui?
D.Du.Y la que os manda eso saber
Porqué no le perguntaís
Qué es de mí?
Y porqué se ausentó
De dar vista al triste ciego
Estrangero,
Que su alteza cegó?
Y ciego caí en tal fuego
En que muero.
No hay mas piedad ni ley
Que matarme en tierras strañas
Sin ventura?
O Flerida! memento mei,
Que se gastan mis entrañas
Con tristura.
ARTADA.
Como señora tan alta
Cabe ei1 vueso corazón?
D.Du.Nel alma está
Toda sin ninguna falta,
Y en el alma la pasión
Que me da:
Porque el triste corazón
Está ocupado con fuego
Y con fe,
Con suspiros, con razón
Con amores, con ser ciego:
Y esto sé.
Pues do cabrá mi alegría?
Oh mis dolores profundos!
Ay de mí!
DAS TRAGICOMEDIAS. 233
Que es peor.
AnT. El diablo os trujo acá,
Que esas palabras no son
De villano;
No sé porque os queda allá,
Quien sois, nese corazón
Inhumano.
Voyme y no sé qué diga.
D.Du.Decid que no sé quien só,
Ni qué digo,
Ni qué haga ni qué siga.
Ni sé si soy hombre yo,
Ni estoy conmigo.
Decible que no tengo nombre,
Que el suyo me lo ha quitado
Y consumido;
Y decid que no soy hombre,
Y, si hombre, desventurado
Y destruido.
Soy quien anda y no se muda,
Soy quien calla y siempre grita
Sin sociego;
Soy quien vive en muerte cruda,
Soy quien arde y no se quita
De su fuego,
Soy quien corre y está en cadena,
Soy quien vuela y no se aleja
Del amor,
Soy quien placer ha por pena,
Soy quien pena y no se aqueja
Del dolor.
Y decílde que, si yo soy rey,
236 LIVRO III.
Terna medio.
ART. NO dice mas, mi señora,
Sino que es hombre perdido
Sin remedio.
Mas, señora, vaya allá
Sola vuesa Señoría,
Y espere
Si le declarará,
O con que nueva osadía
La requiere.
FLE. SÍ yo hallo que de hecho
Me habla claros amores,
Yo me fundo
Que es ansí como sospecho
Ser príncipe de los mayores
Que hay en el mundo.
Entrando Flerida so polo pomar da horta, vai dizendo:
FLERIDA.
Cuan alegres y contentos
Estes árboles están!
, En esto veo
Que no son graves tormentos
Los que sufre Julián
Con deseo;
Que en la cámara adó esto,
Veo llorar las figuras
De los paños
Del dolor que siento yo,
Y aqui crecen las verduras
Con sus daños.
Y mis jardines tejidos
Con seda de oro tirado
238 LIVRO III.
Se amustiaron,
Porque mis tristes gemidos,
Teñidos de mi cuidado
Los tocaron.
É yo veo aqui las flores
Y las aguas perenales,
Y lo al,
Tan agenas de dolores,
Como yo llena de males,
Por ini mal.
D. DUARDOS.
No sé que viene hablando
La mayor díesa del cielo
Entre sí:
Si mal me viene rogando,
Ya los males son consuelo
Para mí;
Si ruega á Dios que ine dé muerte,
Nadie tiene en mí poder,
Sino ella.
Y dichosa fue mi suerte,
Pues muerte no puede haber
Sino della.
FLERIDA.
Julián, vé tú ahora,
Y cógeme una manzana.
D.Du.Lo que yo digo;
Discordia queréis, señora.
Oh ini guerrera Troyana,
Paz conmigo.
La manzana que queréis,
Aunque vos la merecistes,
DAS TRAGICOMEDIAS. 239
Vida mía,
Es discordia que traéis,
Con que ya me despedistes
De alegría.
FLERIDA.
Qué hablas? estás durmiendo?
Sueñas en la Troya ahora?
D.Du.Mas despierto
El sueño de vuestro olvido,
Con que estos dias, señora,
Me habéis muerto.
FLE. Si supiese bien de cierto
Que eso me dices velando,
Matarme hia.
D.Du.Yo no hago desconcierto
En andaros contemplando
Noche y dia.
Diesa mia, no pequé
En adoraros, señora,
La hermosura,
Como contra ley ni fe
Va aquel que os adora
Por ventura.
Adonde estuvo escondida
Vuesa Alteza, pues que sabe
Mi pasión?
Que piedad merecida
En tales señoras cabe
De razón.
FLERIDA.
Piedad tengo de ti,
Que tu mal para sanar
240 LIVRO III.
No ha hi cura.
D.Du.Porqué, señora? FLE. Porque oí
Que no se puede curar
La locura.
D.Du.Pues qué haré, perdido el seso,
Sin tener en tierra agena
Cura en mí?
Pues pesad injusto peso,
Que por A7OS, reina serena,
Lo perdí.
Y perdí el alma mía,
Si de perder yo ventura
Sois servida,
Perdí de ser quien solía
Por la mayor hermosura
De esta Aida.
FLE. Quien solías tú de s e r ?
D.Du.De mozo guardé ganado
Y araba;
Esto sé yo bien hacer:
Después dejé el arado
Y trasquilaba.
Después estuve á soldada,
Y acarreaba harina
De un molino.
FLE. Paréceme á mí, Artada,
Que este caso no camina
Buen camino.
D.Du.Yo lo veo, alma mia,
Que es camino de dolor
Y de pesar.
FLE. Adonde hallaste osadía?
DAS TRAGICOMEDIAS. 241
Si quisieres.
D.Du.Pláceme, con tal cautela,
Por hacer hechos discretos,
Que estemos
Sin sol, luna, ni candela.
Que descubran los secretos
Que hacemos.
Será á horas y en lugar
Que estén solas las estrellas
De presente,
lias árboles sin lunar,
Y Artada allí con ellas,
Sin mas gente.
Allí os descubriré
Quien soy, y seréis servida,
Pues queréis
No creer quien yo soy: por fe
Que por ATOS tomé esta vida
Que me A7eis.
Y si tenéis desconsuelo,
Pensando que para enojaros
Esto quiero,
Juro á los Dioses del cielo
Que solamente en miraros
Tiemblo y muero.
ART. Señor, mudad el pellejo,
Id á vestir vuesos paños
Naturales.
Ella haberá su consejo,
Que estos pasos traen daños
Inmortales.
Vai-se D. Duardos, e vño Artada e Herida fallando, e diz
DAS TRAGICOMEDIAS. 243
ARTADA.
Señora, qué será aqui,
Si este hombre es caballero
Y no al?
Para qué es, triste de mí,
Dar por la vaca el vaquero
Principal ?
De otra parte qué ha de hacer,
Salvo si es Príncipe él
De Normandía?
FLE. Y quien se había de atrever
A mí, si no fuese aquel
O su valía?
ARTADA.
Paréceme mal, señora,
Quereros hablar á escuras.
FLE. Y á mí.
ART. YO duermo luego en la hora
Que anochece, y sus dulzuras
Bien las vi.
FLE. Qué remedio, que yo me fino
Por saber quien es este hombre?
Soy perdida;
Ardo en fuego de confino,
Con amias que no han nombre
Ni medida.
Camilote emquanto se estas cousas passño, sobre o reto de
Maimonda contra Flerida, matón D. Robusto e outros ca-
vaüeiros; sabcndo isto D. Duardos, armou-se e foi-se ao
campo e malou Camilote, e Amandria entra dizendo:
AMANDRIA.
Camilote es muerto ya.
10*
244 LIVRO III.
Al engaño.
Queréis vencer mi pelea,
Y no queréis que me tema
De mi daño?
Queréis que pierda el amor
A mi padre y mi señora
Y al sociego,
Y á mi fama y á mi loor,
Y á mi bondad, que se desdora
En este fuego?
D. DUARDOS.
Xo; debéis considerar
Que el lugar y las estrellas
Y el modo,
Y el amor y el callar
Mis dolores, mis querellas.
Vencen todo.
FLE. E U todo cuanto deseo
En iodo os hallo duro
Hasta aqui:
Todo siento, todo veo,
Y lodo se hace escuro
Para mí.
D. DUARDOS.
Si al menor rincón llegáis
De ini ardiente corazón,
Encenderéis
Candela con que veáis
Que os pido galardón
Que me debéis.
FLE. Que será de mí, Artada,
Pues que amar y resistir
248 LIVRO 111.
Es mi pasión?
ART. Señora, estoy espantada,
Y cantando quiero decir
La conclusión.
"AI Amor y á la Fortuna
"No hay defensión ninguna."
FLERIDA.
Aunque nunca se halló
Al Amor y á la Fortuna
Defensión,
Debiera haber, triste yo!
Para mi siquiera alguna
De razón.
O Ventura diesa mia,
Refugio de los humanos
Soberano,
Tú sola tomo por guia,
Y entregóme á tus manos
Por mi mano.
PATRAO.
Señores, es ya plena mar,
Y son horas naturales
De partir,
Por que puedan bien nadar
Las diez galeras reales
Y salir;
Y las otras medianas,
Y las fustas y galeras
Y las naves,
Están y vienen lozanas,
Espalmadas y ligeras
Como aves.
DAS TRAGICOMEDIAS. 249
GANDALIN.
Yo también allá iré
Á seguir lo que decís;
No quedaré; y el porqué,
Por ver lo que hará Amadis,
Y saber lo que haré.
Quiero deprender la guerra,
Que como estáis platicando,
El nuestro cuerpo se encierra
Sola tierra,
Y la fama anda volando.
AMADIS.
No me convida la gana
De la faina, aunque es harto,
Sino que siervo á Oriana,
Hermosura soberana,
En cuyo nombre me parto
En dos partes y no en una:
La del alma doy á ella,
La del cuerpo á la Fortuna,
Y á la Luna,
Porque la hizo tan bella.
Si el peligro me convida
Que de las guerras rehuya,
Diré: Oh esclarecida,
Cuan segura está la vida
Que se defiende por tuya!
Voy me á la Gran Bretaña
Al muy soberbio Dardan,
Que ni Francia ni Alemana,
Ni caballeros de España,
Ningunos vida le han.
256 LIVRO III.
Él me tiene amenazado,
Solo de locura Arana;
Mas el triste está engañado,
Que, acordarme de Oriana,
Tengo mi juego ganado.
Vayamos, mas no se espere,
Cada uno por su Aia.
GAL. Yo me A7oy á la Turquía.
FLO. Yo adonde Dios quisiere
Y fuere la dicha inia.
Vao-se estas figuras e vem a Corle delliei Lisuarte,
s. a Rainha Brisena, Oriana, Mabilia, Corisanda,
Dinamarca, Hurganda e D. Dorin; e diz EIRei \
LISUARTE.
Don Dorin, tengo enviado
Mis correos á saber
Daqui á cuanto ha de ser
La guerra que en mi reinado
Siete reís ine han de hacer.
D.üo.Señor, nada se os pene.
Lis. El correo Arbindieta
No sé en que se detiene.
D.üo.Ya me parece que viene,
Que yo siento la corneta.
Entra o Correio tocando a corneta, e diz
LISUARTE.
En buenora seas llegado;
Mas tardaste todavía.
COR. Pues, Señor, yo no dormía;
Barruntaron que era espía,
Y estuve medio ahorcado.
Lis. Dime si vienen ó cuando,
DAS TRAGICOMEDIAS. 257
D. DORIN.
Señor, ya bien poderán
Cenar Vuestras Magestades.
Lis. No sé las cuantas serán.
D.Do.Nunca ciertas horas dan
Relojes de las ciudades.
Y es perdido en su poder
Las ruedas y la campana.
Pero á mi parecer
Buen relox es del comer
Cuando lo templa la gana.
Levantase EIRei Lisuarte e toda a sua Corle, e váosc
com música; e vem Amadis e entrando no pomar, onde a
carta de Mabilia lhe disse que viesse, diz:
AMADIS.
Si Orfeo por Proserpúia
Tan dulce gloria sentió
Cuando nel infierno entró,
En esta huerta divina
Cuanto mas sentiré yo?
Mas él fue á buscar la vida,
Yo la muerte sin placer;
El cantando en la venida.
Yo llorando la partida,
Porque sé cual ha de ser.
Que Oriana por mi ventura
Ordenó en su consistorio
Que fuese su hermosura
Casa de mi purgatorio,
Paraíso de mi tristura,
Do paso la vida estrecha,
Donde doy gritos al cíelo.
264 LIVRO III.
18
276 LIVRO III
Y dende su mocedad
Siempre fue mi caballero.
De otra parte bien mirado,
Dice verdad el Enano,
Porque el corazón humano
Cuan improviso es mudado
Y cuan pocas veces sano!
Y quizá no; porque la conA'ersacion,
De luengo tiempo usitada,
No es tan desacordada
Que olvide sin razón
Toda la vida pasada.
Mas ay de mí,
Que creo que será ansí!
El Enano dice verdá,
Porque nunca ausencia vi
Que el amor turase allá.
Ejemplo es verdadero
Que ausencia aparta amor.
Oh traidor caballero!
Caballero traidor!
Quien supiera esto primero!
Y ansí le escriviré
Que hizo como villano,
Y nunca mas lo veré;
Yr sepultaré su fe
Dentro del mar océano,
Y el amor que le tenia
Verdadero y muy sereno,
Y toda el afición mia
Sepultaré neste dia
En el mar inedioterreno.
DAS TRAGICOMEDIAS. 277
Llorallo no os remedio.
ORÍ. Lloro su mal y mi mal,
Mas el suyo es que mas siento;
Esto mata el sufrimiento
Y da vida natural
A la muerte que lamento.
Que la mia sola mia
Yo misma me la pasara;
Mas la suya me es tan cara,
Que eso seso, hermana mia,
Pluguiera á Dios que lo hallara.
MAB. Remedio, señora! ORÍ. Qué tal?
MAB. Muy bueno, señora mia.
Envíele su señoría
Una carta cordeal,
Namorada en demasía.
Y en persona vaya allá
Dinamarca, que es secreta,
Y doncella muy discreta,
Tal que só que sanará
La llaga de esta saeta.
Este consejo os dó
Que se haga luego en verde;
Luego, luego, digo yo,
Porque el tiempo nunca usó
De ayudar á quien lo pierde.
ORIANA.
Vamos eso á concertar;
Mas asegun son mis penas,
Debía irme enterrar
Debajo de las arenas
Que están nel hondón del mar.
288 LIVRO III
El hermano de Amadis.
Dadme aqui, padres, posada,
Á mí é á estas doncellas,
Que si no fuera por ellas,
Ya yo fuera sepultada,
Y no puedo vivir sin ellas.
Tal música Dios les dio,
Y mi tristeza es de suerte,
Que me libran de la muerte
Que mi vida me buscó,
Estando salva en la corte.
Que cuando mis pensamientos
Ahogan mi corazón,
Tocando sus instrumentos,
Y cantando una canción,
Adormecen mis tormentos.
ERMITAO.
Dos casitas y mas no
Hay en esta pobre ermita;
Una en que este padre habita,
lia otra en que yo esto,
Muy estrecha y muy chiquita.
AMA. Padre, dalde vos la mia,
Que yo nel yermo pasaré;
Repose su señoría,
Que su mal ya lo pasé,
Y aun lo paso cadaldía.
CORISANDA.
Padre, qué nombre tenéis?
AMA. Llamóme Beltenebrós.
Con. Pues ansí me salve Dios
Que Amadis os parecéis:
Vol. 11. 19
290 LIVRO III
AMADIS.
Padre, no puedo pensar
Dinamarca, que acá viene,
Que negocios aqui tiene,
Que ha pasado la mar,
Y punto no se detiene.
DIN. Señor, yo \rengo cansada,
Y cansando descansé,
Pues trabajando cobré
El descanso que buscaba,
Que es hallar vuesa Mercé.
Vengóme á confesar
A vos con firme denuedo,
Que me podéis remediar
lias culpas con que no puedo,
Ni se pueden disculpar.
Apartados Amadis e Dinamarca, ella lhe diz:
DINAMARCA.
Qué se hicieron vuesos primores?
Siendo sabio perenal
Y tan diestro en los amores,
Como discreto en lo al,
Y hacer tan flacos labores!
Oh qué mudar tan errado!
Que aunque ella mostró furor,
Bien sabéis, como avisado,
Que el enojo enamorado
Es crecimiento de amor.
Y pues que tanto sentía
Lo que el Enano contó,
Grande muestra os hacía
19'
292 LIVRO III.
E he d'EIRei e da Rainha,
Cuja eu saín inteiramente.
PRÍNCIPE.
Aunque se diga de plaza,
Y en toda parte suena
Que porfía mata caza,
Algunas Areces no es buena.
No porfío mas pedir
Eso que no podéis dar;
Pero no puedo partir
Sin que por vos pueda hallar
Lo que vengo á descubrir.
Por remedio á mis dolores
Dadme Ucencia entera
Que haga una nao de amores
Aqui en vuesa ribera,
Do se hacen las mejores.
Mis ojos serán maestros,
Mis cuidados carpinteros;
Y porque sean mas diestros,
Yo serraré los maderos,
Los descantos serán vuestros.
LISBOA.
Toda de amores, senhor?
PRI. Toda de amores, señora.
Lis. Pois- que ha de ser d'ainor,
Fazei A7ós muito einbora
Sem receto nem temor.
PRI. Ha de ser desta manera,
Para navegar segura:
La voluntad la madera,
302 LIVRO III.
Y la razón plegadura,
Dorada toda de fuera:
lias estopas de recelos
Hincados de diez en diez,
Y los castillos de celos,
Y la tristeza la pez,
Tanta que cubran los cielos:
El mastel de fe segura,
Y la Arela de esperanza,
La gavia de hermosura,
El traquete de membran/.a.
La mesana de dulzura:
La mesas de guarnición
Serán todas de lindeza,
Plegadas con discreción,
Y la jarcia de firmeza
Sacada del corazón:
Cabrestante de porfías,
Todo de trabajos ínios,
La bomba lágrimas mias,
Los guardines de desvíos
Que tú, Fortuna, desvias.
El aguja el desear,
Y los rumos pensamientos,
El áncora será el callar,
Y los suspiros los vientos,
Y carta de marear
El calabre de temores,
Trincado por mil lugares;
El payol lleno de amores,
Y el convés de pesares,
Las bombardas disfavores.
DAS TRAGICOMEDIAS. 303
PAGEM.
Quien quisiere ir á buscar
Ventura, si no la alcanza,
Venga luego á embarcar
Mientra el mar está bonanza
# Y el tiempo da lugar.
PRI. Aqui do viene el Amor,
Dios de la nave y de mí,
Patrón y Capitán mayor.
AMO. Poco estaremos aqui,
Placiendo á nueso Señor.
Suso, nombre de Dios sea,
Comencemos la pasage,
Porque quien pierde marea,
Dicen que pierde viage.
Entra hum Frade dou do, e diz o
PAGEM.
Este fraile que aquí viene
De amores enloqueció;
Maldito el seso se tiene;
En Toledo se curó,
Y ningún remedio liene.
FRADE.
" Que formosa caravela !
"Quem fosse o capitáo della!
"Caravela de Coruche
"Vai por nabos a Pombeiro.
"Quem fosse o capitáo della!
"Huha! Imlia! buha! huha!"
PAG. Ah santo Fray Majadero,
Como cantáis vos tan bajo?
FRA. EU SOU O frade d'Aveiro
Vol. l l . 20
306 LIVRO III.
Debeísle remediar,
Que este padre era doctor,
Y vos fuístelo matar
De amores de Miraflor.
AMO. Pues como serán sentidos
Mis poderes cuantos son,
Sino en los sabios vencidos?
Los mas sabios mas perdidos,
Como os dirá Salomón.
Y Adán, el mas sabido,
El amor de la muger
Lo paró loco perdido,
Pues que por la complacer,
Hizo lo que habéis oido.
FRA. Pera que he fazer gaiola
De padaco de ceíráo?
Entáo anda gaviáo.
Eu tinha entáo escola,
E nao havia ahí tanto cao.
Rapazes e caes e mocos
Háo de matar Frei Martínho,
Ou roer-me-háo o toutico.
Por isso he bom ter dous pescocos
Como tem Frei Aparico.
Quando dáo pao e tramocos,
Ora vínde á prégacáo.
Antes que fosse Lisboa,
Nem houvesse aqui cidade,
Iáo todos á Trindade,
Com tres caes e hüa furoa,
Cacar á sua vontade.
Víeráo estes roazes,
20*
308 LIVRO III
Desnudo, desventurado,
Lastimaste con tu frecha
Por en cima del ganado.
Y pues de amor me herías
Por Serena tanto bella,
Hirieras también á ella
De piedad de andas mías,
Pues tantas sufro por ella.
Cuantas veces puedo vella
Me quejo á Dios del cielo,
De vai é de tí é della.
FIIA. Dá ó demo essa cachopa.
Asscnta-te na portella
E vae correndo tras ella
Com hüa rocada d'estopa.
Entáo cajadadas nella,
E nao lhe assobieis mais.
AMOR.
Mas tiene de que quejar
Este padre gran doctor,
Que es loco solo de amor,
Sin lo poderen salvar
Sus letras al pecador.
PAS. Mas su amor fue venial,
Pues es livre de su mano:
Mas reniego el amor tal
Que hace el seso mas sano,
Porque sienta mas el mal.
Vem hum Negro de Ben i, s diz:
NEGRO.
Quere boso que me bac
Buscar o poco de venturo.
312 LIVRO III
PRINCIPE.
Lo mas de que esto espantado,
Amor, de vuesas hazañas,
Es que al viejo arrugado
Metéis en las sus entrañas
Presunción de enamorado.
VEL. Y fue ese, mal pecado.
PRI. Viejo, vuestro mundo es ido.
VEL. En antes tengo pensado
Que todo el tiempo pasado
De nuevo se me ha venido.
PRINCIPE.
Los que compran el caballo
Luego miran se es viejo;
Si viejo, vía dejado,
Que aunque lo den por un huevo
No quiere nadie comprado.
Ansí el viejo arrugado
En la feria del amor,
Ni de silla ni albardado
No le sale comprador
Y siempre vive engañado.
Dejad la nave de amores
A los fuertes mareantes.
AMO. Venga con mis servidores,
Porque los viejos amantes
Son los ciertos amadores.
FRA. Tomae tres cordas de viola
E atae-as no calcanhar,
Coin sua salsa e cebóla,
Bein ó longo do linliar.
E vos me nomeares.
316 LIVRO III.
AMOR.
Pues que dice la marea,
Lieva áncora, suso avante,
A tesa aquella polea,
Galanes, al cabrestante,
Y venga la escola á rea;
AI governalle vos, Page.
PAG. YO haré cuanto él me mande.
AMO. Desfcríd la vela grande:
Decid todos — buen víage!
Todos a vozes.
Boa víagein!
PRI. Quede, señora Ciudad,
Con mucha gloria e consuelo;
Dios os dé prosperidad,
Y tanta salud del cielo,
Como tenéis de bondad.
Lis. O senhor Déos e sua gloria
A vossa alta senhoría
Dé táo próspera victoria
Como eu para mi quería.
E quando einbora tornar,
Torne-me outra A7ez a ver.
Pni. Si yo ventura topar,
Yo quedo de os la traer,
Aunque vos la podéis dar,
Y está en vueso poder.
Ea, señores, desferir,
Todas las- velas metamos,
Que el viento es á pedir,
Y luego todos digamos
La salve, antes del dormir.
vol. ii. 21
322 LIVRO III.
-^~>c
V I G l R A S.
HUM PEHEGHINO QUATRO SERRANAS.
HUM ROMEIRO. CUPIDO.
VENUS. JUSTINA.
MERCURIO. HUM NEGRO.
JÚPITER. HUM FRADE.
SATURNO HUM PARVO.
SOL. DOUS PAGENS.
PEREGRINO.
Para te hablar verdad
Por fuerza no fue vencido,
Mas el Capitán Cupido
Le pedió la voluntad,
Y dióla sin mas ruido:
Vino del cielo escondido
De su madre Venus Diosa,
Volando mucho depriesa,
Hecho niño esclarecido.
Y fue el Capitán principal,
Que cercó la fortaleza,
El castillo angelical,
Por parte de Portugal,
Y por bien de su nobleza.
Cuando Venus no halló
En el cíelo Dios de amor.
Sus músicas con vertió
En lágrimas y decendió
Del cielo con gran dolor.
Vem a Deosa Venus, Rainha da 3Ittsica, c diz:
VENUS.
No sé á qiijen perguntar
Por el mi hijo Cupido,
Vuestro Dios de amor, pGrdido;
Y no sé en que lugar
Se me ha desparecido.
O ini hijo esclarecido!
Adonde estás?
Que en mis tetas he sentido
Que es cierto que llorarás,
Y no serás socorrido.
328 LIVRO III.
SOL.
VOS sois, Serrana de flores,
El cuarto gozo de amor,
Y os que el vueso servidor
No os sienta otros amores,
Porque es engaño mayor:
No le deis competidor,
Sea vueso amor sencillo,
Porque el otra es desamor.
í S. Sí él supiere sentido,
Yo lo haré ansí, señor.
CUPIDO.
Paréceme que es razón,
Pues Reina tan excelente
Viene "á reinar nuevamente,
Que hagamos refundición
En la Portuguesa gente.
Hagamos mundo nuevo aqui,
Pues nuevos Reís son venidos,
Por el gran Dios escogidos;
Apregonad por ahí
Mis milagros ascondidos.
MERCURIO.
Quien quisiere renovarse,
O hacerse de otra suerte,
Venga aqui que sin la muerte,
Puede muy bien emendarse;
Y no lo hayáis por cosa fuerte.
Cualquier hombre bajuelo
Que quisiere ser mayor,
Y aun el luengo ser menor,
\ u l . II. 2-2
838 LIVRO III.
Dirá a mi sá chorreíro.
Oiae, sioro ferreiro,
Boso meu negro (ornae,
Como mi saba primeiro.
Vem a Justiga em figura de hüa velha corcovada,
torta, muito mal feita, com sua vara quebrada, e diz:
JUSTICA.
Sempre Déos faz cousas boas!
Dizei, que tenhais prazer,
Isto he cousa de crer
Que refundís as pessoas,
E as tornáis a fazer?
SOL. Quien sois, que ansí estáis polida?
Jus. A Justica sou chamada,
Ando muito corcoA7ada,
A vara tenho torcida,
E a balanca quebrada.
E pois de novo nos vem
Rainha de tanto honor,
Irman do Imperador,
Renovae-me muito bein,
Que cada vez vou peor.
CUP. Qué pedís ó qué buscáis?
Jus. Que me mandéis reformar
E de novo endireitar,
Que a Rainha que esperáis
Nao pode muito tardar.
MERCURIO.
Vos venís tan mallratada,
Que tenemos bien que hacer.
CUP. Es por fuerza y ha de ser
La Justicia aderezada,
342 LIVRO III.
Por lo al no so perder.
Jus. Fazei-me estas máos menores,
Que nao possáo apanhar,
E que nao possa escutar
Esses rogos de Senhores,
Que me fazein entortar.
MERCURIO.
Alto pues á refundir.
Jus. O Jesu, a quem m'eu dou!
Apartae-vos, que eis me voti.
JUP. Nos tenemos bien que heñir.
Jus. Sus, que ja na fragoa estou.
Andño os martellos forjando a Justica com a dita música,
e acabado, diz Júpiter a Cupido.
JÚPITER.
Señor, nuestro martillar
No nos aprovecha nada,
Porque la Justicia dañada,
Los que mas la han de emendar
La hacen mas corcovada.
Ansí que en vano gastamos
El carbón y herramienta,
Ninguna cosa emendamos,
Mas cuanto mas martillamos,
Menos crece la emienda.
CUPIDO.
Serranas, sacalde vos
Las escoreas bien sacadas
Con las linazas doradas,
Que con la ayuda de Dios
Ella saldrá sana á osadas.
Tornño os Planetas „ dar onlra calda, c a Serrana
DAS TRAGICOMEDIAS. 343
CLÉRIGO.
Ora fallemos de siso:
Estáis todos de saude?
ZEU. Fideputa, meio ahnude,
Que íens lu de A7er com isso?
Q.E. Minhas potencias relaxo,
E ine abaxo:
Fallae-me d'outra maneira.
DAN. Sois Bispo vos da Landeira,
Ou vígairo no Carlaxo?
ZEBRON.
He Cura do Lumear,
Sochantre da Mealhada,
Acipreste de cañada,
Bebe sem desfolegar.
DAN. He capelláo terranlez,
Boin Ingrez,
Palríarcha ein Ribatejo,
Beberá sobre hum cangrejo
As guelas d'hum Francez.
ZEBRON.
Danor, di-me, he Cardial
D'Arruda ou de Caparica?
DAN. Nenhüa cousa lhe fica
Senáo sempre o vaso tal.
Tem hum grande Arcebispado
Muíío hqnrado,
Junto da pedra da estrema,
Onde püe o diadema
E a mitra o (al prelado.
ZEBRON.
Ladráo, sabes o Seixal
2:3*
356 LIVRO III.
E Aliñada e pereli?
O fideputa alfaqui,
Albardeiro do Tojal!
CLE. Diabos, queréis fazer
O que eu quizer,
Per bem, ou de outra feicao?
r
— «>»>«>»>;
Vul. I I . '-*
F I G U R A S.
APOLLO.
PORTEIRO DO TEMPLO.
MUNDO
VENCIMENTO
Romeiros.
CETRO OMNIPOTENTE
TÉMPO GLORIOSO
FLOR DA GENTILEZA
FAMA
> Romeiras.
GRÁVIDA DE
SAHEÜORIA
HUM VILLÁO.
Y Berzabé se lavaba
Lo presento y lo ausento
En un arrayo corriente;
Y de en medio de una fuente
Yo solo me la miraba.
Ella sentóse á hilar,
Desnuda sobre su baño,
Y David, hecho ermitaño,
Salió con ella á bailar,
También sin palmo de paño.
Vi andar después de aquella,
Raquel guardando ganado,
Tan linda, que su cayado
Era perdido por ella,
Y el zurrón su enamorado.
Una llanta le AÍ yo,
Y cuando la oí tocar,
Presumí de la abrazar,
Y ella llamó por Jacob,
Que era ido á vendimiar.
Vi mas á la Reina Esthoi,
Con su hermosura tanta,
Matar pulgas en su manta,
Que tenia por coser,
Y ella hecha una santa.
La muy lucida Medoa,
Hermana sin división,
Vi perguntar por Jason,
Puesta en una chaminea
En el techo de un mesón.
Vi la Troyana Helena
Con su rosto serafino.
DAS TRAGICOMEDIAS. 373
La Emperatriz soberana,
Que sea muy fresca y llana:
Y que hagas convertidos
Los caminos en cristales.
Y las estradas reales
Sean lirios floridos,
Que le A7engan naíurales.
Y esto luego, señor.
APO. Despachaldo con quien quiera:
Diogo Lopes de Siquera
Me hablará nesa labor;
Y Nabucodenosor,
Que era de su manera;
Sino el Doctor Bras Nieto,
Con el Profeta Abacu:
Entonces yo te proinieto
De hacer lo que pides tú.
MUNDO.
No sé esos si querrán.
APO. El Chanciller mayor sea,
Y consigo Cidaea,
Que tan parecidos son
Como Mandinga á Guinea.
Vem o Poderoso Vencímenlo, Romciro do Impera-
dor, e a Virtuosa Fama, Romeira da Imperalriz, r
querendo entrar no templo, lhe diz o
PORTEIRO.
No habéis de entrar acá,
Romero ni la Romera;
Bien podéis resar de fuera,
Que Dios lo recibirá,
Si la fe (raéis entera.
DAS TRAGICOMEDIAS. 381
Oracao.
Señor, yo vení del cielo,
Y bajé acá en la tierra,
Y aqui estaré
Serviendo al Cesar novelo,
Y siempre en paz y en guerra
Serviré. •
Vengo á ver tu santo templo,
Pues debes ser adorado,
A según suena,
Y das á todos ejemplo.
Digo que seas loado
Norabuena.
Y pues eres Dios del oro,
Y crias las esmeraldas
Y zafiras,
Dame, Señor, gran tesoro,
No me vuelvas las elpaldas,
Pues me miras.
Que si tú quieres ser mas
Amado que Dios del cielo,
Y mas querido,
Da dineros y verás:
Da riqueza sin recelo,
Que te pido.
Porque las guerras que espera
De las geníes de Turquía,
En mar y (ierra,
Aunque soy fueríe guerrero,
El dinero es la guia
De la guerra.
APO. El amo me hablará,
DAS TRAGICOMEDIAS 385
Y el Profeía Balaan,
Y entrambos me hablarán,
Y luego á tu voluntad
Ellos te despacharán.
Vem outro Romeiro do Imperador, chamado Tempo
Glorioso, e outra Romeira da Imperatriz, chamada Ho-
nesta Sabedoria, cantando hum dito, cuja letra he a
seguinte:
"Gloriosa gloria mia,
"Vos seáis muy bien venida;
"Pues con vos vive la vida,
"Tiempo es de ini alegría."
PORTEIRO.
No entréis, Romero honrado,
Ni tanpoco la Romera.
TEM. Cuerpo de mí! Porqué no?
POR. Porque es templo sagrado
Y no entra acá quien quiera.
TEM. Pues jura á Dios que entre yo.
POR. Quien diré yo que sois A7OS?
TEM. Glorioso Tiempo só
Del Cesar nueso señor.
POR. Y VOS, Romera de Dios?
Cumple ser yo sabidor
Quien sois, porque entréis los dos.
SABEDORIA.
Honesta Sabidoría
Es ini nombre; y soy doncella
De la Imperatriz, aquella
Por quien el Mundo decía:
O eres ángel, ó estrella.
POR. Entrad; norabuena vais:
2 5
Vul. II.
386 LIVRO III
Cantiga.
"Pardeos, bem andou Castella,
"Pois tem Rainha táo bella.
"Muito bem andou Castella
" E todos os Castelhanos,
"Pois (em Rainha (ao bella,
"Senhora de los Romanos.
"Pardeos, bem andou Castella
"Com toda sua Hespanha,
"Pois tem Rainha (áo bella,
"Imperatriz d'AHeinanha.
"Muito bem andou Castella,
DAS TRAGICOMEDIAS. 393
Navarra e Aragáo,
Pois tein Rainha táo bella,
E Duqueza de Miláo.
Pardeos bem andou Castella
E Sicilia tambem,
Pois tem Rainha táo bella,
Conquista de Jerusalem.
Milito bem andou Castella,
E Navarra nao lhe pesa,
Pois tem Rainha táo bella,
E de Frandes he Duqueza.
Pardeos bein andou Castella,
Ñapóles e sua fronteira,
Pois tem Rainha táo bella,
Franca sua prisioneira."
APOLLO.
Yo no me puedo sufrir:
'ambien Dios ha de bailar,
¡i ángel ha de quedar,
íi arcángel ha de huir,
Vi apóstol se escusar.
Lpartad, que viene Dios,
'ardeos, nunca eu vi tal Déos.
li aqui gaita hubiera,
tailara con una Romera,
• con cualquiera de vos.
Porque esta fiesta, oh qué fiesta!
toé placer, oh aué placer!
Á Emperatriz divina,
De esta águila serafina
Se cantará este cantar.
"Águila, que dio tal vuelo,
"También velará al cielo.
"Águila del bel volar
"Voló la tierra y la mar:
"Pues tan alto fue á posar
"De un vuelo,
"También volará al cielo.
"Águila una Señora
"Muy graciosa voladera,
"Si mas alto bien hubiera
"En el suelo,
"Todo llevara de vuelo.
"Voló el águila real
"Al trono imperial,
"Porque le era natural,
"Solo de un vuelo,
"Subirse al mas alto cielo."
E se fazem oradores,
Em oflérta dando flores
E suas pobres soldadas.
Bispos, frades, e beguinos,
E monjas de Jesu Chrísto,
Alé mocos e meninos
De joelhos pedem isto,
Humilhados e continos.
Que elle muito a seu prazer
A leve a salvamento;
E para isto haver de ser,
Júpiter ha de fazer
Cortes logo em hum momento.
Porque Déos me deu a mi,
Que o fizesse rei do mar,
E dos ventos outro si,
E dos sinos: venha aqui
Pera logo comecar.
Vem Júpiter e diz:
JÚPITER.
Eis-me aqui, alta senhora;
Que quer Vossa Magestade?
PRO. Nobre Rei, venhais einbora.
Cuinpre que facais nessora
Cortes coin solemnidade.
JUP. Sobre que, divina joia?
PRO. Porque \Ta¡ hüa Princeza,
Alta Iffanta Portugueza,
Duqueza pera Saboia.
JÚPITER.
Por muiío seu bem será
E \ida do coracáo.
398 LIVRO III
JÚPITER.
Tudo s'ha de conceríar
Nesías cortes que fazemos:
O ceo e a térra e o mar
E os ventos s'hao d'am ánsar,
Pera ser o que queremos,
Vem o Sol e a Lúa bailando ao som das trombetas
dos Ventos, e com elles Venus, e diz o
SOL.
Oh caso pera espantar!
Que he isto, Júpiter?
A que nos mandáis chamar?
Quer-se o Orbe renovar,
Ou torna-se o inundo a fazer?
JÚPITER.
Enxarrocos os tenores;
•Contrabaxos, bacalhaos.
Coin elles Pero do Porto
Em figura de calió,
Meio congro deste rio,
Cantando inui sem conforto:
"Yo me soy Pero cafío."
JÚPITER.
Agora cumpre atteníar
Como poemos as niños,
Porque he razáo de ordenar
Como a vño acompanhar
O seu Principe e seus irmños.
LÚA. Em que figuras iráo?
VEN. Aves me parece a mi,
Que ein peixes nao he razáo:
Em aves, d'outra feícáo.
JUP. Nao háo d'ír senáo assi:
O Principe nosso Senhor
Irá em quatro rocins
Marinhos, ein hum andor
Do ouro que melhor for
Em toda a térra dos Chins:
E hum sobreceo por cima,
D'esmeraldas e rubis
Lavrado d'obra de lima,
Que nao possáo dar eslima
A lavores (¿lo subtis.
Sua figura será
Hum Alexandrc segundo,
Que sein grifos subirá
Onde bem divisará
406 LIVRO III.
JÚPITER.
Sobre satyros do mar
Irá oulra fresca rosa
Dentro de hum lindo pomar,
Ouvíndo as aves cantar,
Vestida muito custosa.
Cantaráo a esta fermosa
A calhandra c o rouxinol:
"Genlíl dama valerosa,
Y doncella por cuyo amor."
A moca irá n'hum alguidar,
E vestido hum alquicé;
O alguidar por lavar,
E ella por pentear.
Perguntando por Guiñé,
Cantará batendo o pé:
"Sem mais mando nem mais rogo
Aqui me tendes, levae-ine logo."
SOL.
Outra de gran fermosura
Irá em nuvein de bonanca,
Em hum brial sem costura:
A cor sera verde escura,
Porque dá triste esperanca.
E com esperanca perdida
Cantará sjw namorado:
"Al dolor de mi cuidado,
Y en tus manos la mi vida,
Me encomiendo condenado."
Sua aia em corvos marinhos
Irá antre huns almadraques,
E nos marinhos caminhos
412 LIVRO III
£?M-»+~-
F I G U R A S .
SERRA DA ESTRELLA.
HUM PARVO.
GONCALO.
FELIPA.
CATHERINA.
FERNANDO.
MADANELA.
RODRIGO.
H U M ERMITAO.
JORGE.
LOPO.
SERRA DA ESTRELLA.
E os leigos amarellos,
E faz os veldos murzellos.
Enruca os mancebeldóes,
E nao atienta por nada;
Pedem-lde em Coimbra cevada,
E elle dá-lhe mexílhoes
E das solhas em cambada.
GON. Vos, Serra, se haveis d'ir
Com serranas e pastores,
Primeiro se hao d'avir
Hüa manada d'amores,
Que nao querem concrudír.
Eu trago na phantesia
De casar com Madanela,
Mas nao sei se querrá ella;
Perol eu, bofe, quería.
Vem Felipa, pastora da Serra, cantando.
FELIPA.
"A mi seguem dous acores,
"Hum delles morirá d'amores.
"Dous acores qu'eu da via
"Aqui andáo nesta bailia,
"Hum delles morirá d'amores."
Goncalo, viste o meu gado?
Díze se o viste einbora.
GON. Venho eu da corte agora,
E diz que lhe dé recado!
FEL. Pois ja tu ca es casado,
Nega que esperáo por ti.
GON. E sem mi me casáo a mi?
Ora estou bem aviado!
426 LIVRO III.
FELIPA.
Nao ha hi nega casar logo,
E fazer vida com ella,
Se nao for com Madanela.
GON. Tiro-m'eu fóra do jógo.
FEL. Essa he a melhor-do jógo.
GON. Ess'ouíra será Alvarenga?
FEL. Mas Caíherina Meigengra.
GON. Antes me queiine mao fogo.
Nao vem a Meigengra a contó,
Que he descuidada perdida;
Traz a saia descosida,
E nao Ide dará lium ponto.
Oh ((nautas lendes .vi nella,
E pentear nemigalha;
E por dá-me aquella palha,
He maior o riso qu'ella.
Varre e leixa o lixo em casa,
Come e leixa allí o bacio;
Cada dia a espanca o tio,
Nega porque táo devassa
Madanela mata a braza.
Nao cuides de mais arenga,
E dize tu, mana, a Meigengra
Que va amassar mitra inassa.
FELIPA.
Ja teu pac (em dada a niño,
E dada a máo feito he.
GON. Pardeos, dardhe-hei eu de pé,
Como a casca de meláo.
Raivo eu de coracáo
D'amores de Madanela.
DAS TRAGICOMEDIAS. 427
MADANELA.
"Quando aqui chove e neva,
"Que fará na serra.
"Na serra de Coimbra
DAS TRAGICOMEDIAS 433
"Nevava e chovia,
"Que fará na serra?"'
Goncalo, tu a que vens?
GON. Madanela, Madanela!
MAD.Torna-te ma hora e nella
Que táo pouco empacho íeus.
GON. Madanela, Madanela!
MAD. O dechu (Jou eu a amargura :
Qu' assi m'agasla, Jesu!
Ora (ras mi íe vens tu?
GON. Pois a mi se m'affigura
Que nao in'has de comer cru.
Se (u me queres matar
Por t'eu ter boa vontade,
Nao pode ser de Aerdado.
MAD. Goncalo, torna a lavrar,
Que isso íudo he vaidado.
GON. Que rezáo me das íu a mi
Pera nao casar comigo?
Eu hei de íer mudo digo,
E heí-íe de íer a (i
Mais doce que hum pintisirgo.
Nao quero que vas mondar,
Nao quero que andes ó sol:
Pera (i soja o tolgar,
E pera miin fazer prol.
Queres Madanela?
MAU. Goncalo, torna a lavrar,
Porque eu nao hei de casar
Em (oda a serra d'Estrolla.
\em íe presta prefiar.
Catalina he muito boa,
V.il. II.
28
434 LIVRO III.
A sentenca he ja dada,
E a sustancia della,
Que cases com Madanela.
MAD. Fernando, nao me dá nada,
Seja inuiío einbora e nella.
FER. Dias ha que ('o eu digo,
E (u (inhas-me fastio.
CAT. Oh Fernando de meu lio,
Quem me casara comd'go!
GONZALO.
Oh Madanela, ierainá
Se me cahíras em soríe!
CAT. Ante eu morréra ma moríe,
Que Fernando ficar lá
Táo contrairo do meu norte.
E poréin nao ine dá nada,
Ja me íu a mi pareces bem,
Goncalo. GON. E tu a mi,
Catalina; muda-te d'hi
E passea per hi alan,
Vereí que ar das de (i.
FELIPA
Esíou-('eu, Rodrigo, odiando,
DAS TRAGICOMEDIAS». 439
O almoco moxama,
E vinho do seu matiz
•O
Esquecess'ella as ovelhas,
E na celia me abracasse
E mordesse ñas orelhas,
Inda que ine laslimasse.
Irmños, pois deveis saber
Da serra (oda a guarida,
Praza-vos de me dizer
Onde poderei fazer
Esla ininha sánela vida.
GONCALO.
Está allí, padre, hum silvado
(*) Lactina que se acl>a no ex. da l-'1 ed. <lc que nos
servimos, por estar rola a follia neste logar. Apczar de toda
a nossa diligencia nao nos foi possivel reslabelecer o texto
pois nem alcanzamos noticia d'outro ex. da 1» cd. nem aqui
nos pudemos valer da 2<! por ter sido nella sttpprimida
pela Inquisicño toda esta scena do Ermitao.
DAS TRAGICOMEDIAS. 441
A guisa do Sardoal.
LOP. Esse de outro carrascal;
Esperae ora e Arereis.
"Ja nao quer minlia sendora
"Que lhe falle ein apartado:
"Oh que mal táo alongado!
"Minha Senhora ine disse
"Que me quer fallar huin dia,
"Agora por meu peccado
"Disse-me que nao podía:
"Oh que mal táo alongado!
"Minda sendora me disse
"Que me quería fallar,
"Agora por meu péccado
"Nao ine quer ver nem ofliar.
"Olí que mal táo alongado!
'Agora por meu peccado
"Disse-ine que nao podía.
"Ir-me-hei triste polo mundo
DAS TRAGICOMEDIAS. 445
PARTE II.
VERÁQ. | HUM FERREIRO.
!
SERRA DE CINTRA. INFANTE.
HÜA FORNEIRA. ¡
0 A U T O R.
Em Portugal vi eu ja
Em cada casa pandeiro,
E gaita em cada paldeiro;
E de viníe anuos a ca
Nao da hi gaita nem gaileiro.
A cada porta lium terreiro,
Cada aldea dez folias,
Cada casa atabaqueiro;
E agora Jeremías
He nosso tainborileiru.
So om lian-arena havia
Tambor em cada muiíiho,
E no mais triste ratínhu
S'enxergava hüa alegría
Que agora nao (ein cainindu.
Se oldardes ás cantigas
Do prazer acostumado,
Todas tem snm lamentado,
Carregado do fadigas,
lionge do tempo passado.
O d'enláo era cantar
E bailar como ha de sor,
O cantar pera folgar,
O bailar pera prazer:
448 LIVRO III.
Desíierro de golondrinas,
Voz de las- aguas marinas,
Agravio de viejas dueñas,
Dios de los fríos Arapnres,
Y señor de los nublados,
Peligro de los ganados,
Tormento de tos pastores.
Soy portera de los vientos,
Pastor de las íempesíades,
Ayo de las frialdades,
Ira de los dáñenlos;
Maestre sala de la luna,
De los hielos correíor,
Y suy capitán mayor
De la marina fortuna.
Aunque veáis mi figura
Hecha un salvage bruto,
Yo cubro el aire de luto,
Y las sierras de blancura.
Quitu las sumbras graciosas
Debaju de lus castañus,
Y hago á lus ermitaños
Encovar cuinu raposas.
Hago mustios lus perales,
Los busques frescus, inedoños,
Y alegres los madroños,
Y llorosos los rosales.
Hago sunar las campanas
31uy lejos cun mis primores,
Y callar los ruiseñores,
Y los grillos y las ranas.
Hago á buenos y. á ruines
DAS TRAGICOMEDIAS. 451
BRISCO.
"Quien me ahora ca mi sayo
"Cuitado,
"Quien me ahura ca mi sayu "
Bendito seas, Verano,
Y el padre que íe engendró,
Aquel, aquel digo yu
Que Dius hizo por su mano.
Mas Invierno, yo juraría
Pur la crizma del bapíismo
Que Salañe se lo hizo,
Sin saber lo que hacía.
"El mozo y la moza
"Van en ruinaría:
"Tómales la noche
"Naquella mon (i na:
"Cuitado,
"Quien me ahora ca mi sayo."
Oh Verano, qué es de (i,
Amparo de los pastores,
Sácame destos temblores,
Si has mansilla de mí.
Que este Invierno determina,
A según Areo tratarme,
Que solo por acabarme
Ha tomado esto conidia.
"Tómales la noche
"Naquella monlina,
"La moza cantaba,
"El mozo decia:
"Cuitado,
"Quien ine ahora ca mi sayo."
DAS TRAGICOMEDIAS 453
INVERNÓ.
Pues del ganado (e alejas
Y temblas con cuitas (antas,
Dimc, pastor, porqué caídas
Y cantas, de qué (o quejas?
Porque mira, hermano mío,
Quien canta no (¡en tormento.
lint. No íe oigo con el viento,
No íe entiendo con el frió.
INVERNÓ.
Cantas ó lloras, vTaquern?
No tienes orejas, creo.
Bni. Con la niebla no (o veo:
Derreniego del (empero:
Ya no sé lo que me hablo.
Ay que me fino cuitado!
Si no fuera desposado,
Muriera con el diablo.
Mas la mi bezos de mona,
Hija de Giraldo Gil,
Si me muero antes de Abril,
Cuitada de la soplona.
Que á según le cayó en suerte
Condición de mataperros,
Comerá trescientos puerros
Con rabia de la mi muerte.
Digo yo á la voz que suena.
No sé si es aqui, si es allí,
Que el Invierno no es (an ruin
Que no (iene cosa buena.
Isv. Blasfemas de mí, pastor,
Como sí vo fuese el infierno.
454 LIVRO III.
INVKRNO.
Tal gozo veas de ti,
Que quieras bien á muger,
Que no Arca olro placer
Que verte partir de sí,
Y te muestre gran querer.
BRI. Pues no quieres concluir,
Del amor seas llagado
Por dama de tal estado
Que no ge lo oses decir,
Y mueras de enamorado.
INVERNÓ.
Por muger tengas enojos,
Pues aguzas tus sentidos
Contra mi,
Que íenga hermosos ojos
Y cerrados los oídos
Para ti.
Bm. Zagala vayas mirar,
Por quien ían perdido seas,
Que jamas nunca la veas
Ni la puedas olvidar.
INVERNÓ.
Tal moza servirte vea
Que (c dé crudas faíigas;
Y cuando lu mal le digas,
Ninguna cosa (c crea.
Biu. Por muger casada penes,
De amores mucrío perdido,
Y pensando que la íicnes,
Se queje de li al marido,
Y le quiebre las sienes.
458 LIVRO III.
INVERNÓ.
Tengas amiga hermosa,
Que la quieras muy querida,
Y le ame como á su vida,
Y sea dulce y graciosa;
Y que se venga á finar,
Y tú de presente allí,
Y al tiempo del espirar
Ponga los ojos en ti,
Para jamas te mirar.
No hay mas pullas, pastor?
BRI. Cuido que mas me quedaron.
INV. No, que en esta se acabaron
Quince dolures de amur,
Que á muchos maltrataron.
BRI. Ansí viva la fortuna
Como íú sabes de amores;
Que sus casos de dolores
No tienen cuenta ninguna.
BRISCO.
Acá viene Juan Guijarro
Muy perdido á maravilla,
Que gastó con Torobilla,
Con que no compró zamarro.
Hizole muy cruda guerra
Todo el Verano el amor,
Y agora el pecador
Esta frialdad lo atierra.
Entra Juan Guijarro cantando.
DAS TRAGICOMEDIAS. 459
JUAN.
"Por do pasaré la sierra,
"Genlíl serrana morena?"
Gran remedio es para al frió
Al que viste poca lana
Bailar recio de mañana,
AI son de este cantar mió:
Y si mi spirilu no yerra,
A según quedé en faldelas,
Si no diese sapaíeías
Caería muerto en tierra.
"Por do pasaré la sierra,
"Geníil serrana morena?"
"Tu ru ru ru ru lá: quien la pasará?
"Tu ru ru ru ru: no la pases (ú.
"Tu ru ru ru ré: yo la pasaré.
"Di, serrana, por íu fe,
"Si naciste en esla fierra,
"Por do pasaré la sierra,
"Geníil serrana morena?"
Todalas cosas á ratos
Tienen su remedio cierto:
Para pulgas el desierto,
Para ratones los gaíos,
Para la muerte enlerrar,
Para el rico mal VÍAÍT,
Para el amor el dormir,
Y para al frió bailar.
"Ti ri rí ri ri: queda tú aqui.
"Tu ru ru ru ru: qué me quieres tú?
"To ro ro ro ro: que yo sola esto.
"Serrana, no puedo no,
460 LIVRO III.
INVERNÓ.
Pastores, acullá asoma
Una vieja sin sentido,
Que quiere un mozo marido;
Y él dice que la toma,
Y sacóle esto partido:
Que si esta sierra pasar
Así lloviendo y nevando.
Luego la quiere (ornar;
Y ella por se casar
Viene descalza cantando.
Vem a Vel ha cantando.
VELHA.
"Assi andando, amur andando,
"Assi andando m'ora ¡rei."
Mando-vos eu a vos chover
E nevar e saraivar,
Pois pera haver de casar
Nao se pode hi al fazer.
Jesu! que nevé lamanba!
Nunca hei daqui de sair.
Mudos daviño de rir,
DAS TRAGICOMEDIAS. 463
Se soubessem a artimanda
Que em lal íempo me fez vir.
BRISCO.
Adó vais, vieja honrada,
Que no hay aqui camino?
VEL. EU nao vou senáo a íinu
Per esta serra nevada.
He tamanha a frialdade
Que levo ñas ¡lhargadas,
E as gengivas ínchadas,
Que haverieis piedade
Se me visseis as queixadas.
JUAN GUIJARRO.
Vos madre vieja, á qué vais?
VEL. He mui longo de contar;
Poréin por desabafar,
Direi hum pouco e nó mais.
Eu desejo ser casada
Com hum mancebo solteiru,
Filho do Priol d'Aveiro,
E eu sua namorada,
E o moco sapateíro.
Ora fui-lhe eu fallar nisso,
Dix'eu: Fernando amigo,
S'havés de casar comigo,
Agora he o tempo disso,
Que vai abaixando o trigo.
Díxe elle: Brasia Caiada,
Praz-me pois que vos queres,
Com condícáo que passés
Aquella serra nevada
San levar nada nos pés.
464 LIVRO III
INVERNÓ.
El mí triunfo segundo
Son tormentas en la mar,
Que luego quiera tratar,
Las mas fuertes que en el inundu
DAS TRAGICOMEDIAS. 467
•M'
468 LIVRO III
GREGORIO.
E quem he aquí o traquele?
O traque sei eu que he,
Mas o quete nao sei eu
Inda agura onde elle s'do.
AFF. Samicas de u lancol
Que vai naquella picota.
PIL. Ca^ae eramá a escota,
Que A7ai o A7ento c'o sul.
Apilo
Pi pi pi pi pü.
GRE. Tanto monta assubiar
Cuin'aquillo que s'de li.
PIL. Nao sabéis alli cacar?
GUN. E cños tendes vos aqui?
Ves, ves, tu tu tu.
AFF. Gómalo, vae polo furáo.
GON. Va Gregorio. GRE. Mas vae tu,
E eu chamarei o cao
Do piloto: tu íu tu.
Ves, ves: raiva te tome.
E como ha o vosso cao nome, Piloto?
PIL. VOSSO pae torio.
Melhor matáis vos a tome.
Nao vai nesta nao grumete,
Que váida hum so caracol;
Á vela cdamáo lancul,
E picota ao traquete.
MARINHEIRO
Vos sois, Piloto, a picota:
Se nosso caininho he em Leste,
E o vento he Noroeste,
DAS TRAGICOMEDIAS 469
AFFONSU.
Havemos nos de nadar.
MAR.Que dizes, tolo? que dizes?
AFF. Digo que ha veis d'ir pescar
Dos cranguejos c'us narizes,
Que andáo per fundo do mar.
MAR.Jesu! Jesu! Sanííago!
O Virgem Maria da Luz,
Eu íe promeíto hüa cruz,
E hum íribulo e hum bago.
PILOTO.
O Senhora da Batalda,
Ñas tuas sanctas ináos me modo.
Gnu. O Virgem Maria du Loreío!
S'escapulo, eu te prometió
Hüa cárrega de palha
Polu sancío dia de Déos.
MAR. Ei-Io precioso sancío
Frei Pero Goncalv7es bento!
PIL. Empara-nos de tanto vento
C'o teu precioso manto,
Senhor, libra nos a malo.
GRE. Demos á bomba, piloto:
Dae ó demo Frei Goncalo,
E nao Frei Pero minholo.
PILOTO.
He o bemaventurado
Frei Pero Goncalves bento.
GRE. Sancto que anda com tal vento,
Nao he elle senáo peccado,
Polos sánelos evangelhos.
MAR. Vos, piloto, esmorecéis,
DAS TRAGICOMEDIAS. 475
Y vos la serenidad,
Delante tal claridad
Mi fuerza se consumió.
Empero quiero deciros
Lo que se ve y no se entiende:
Que nadie sabe sentiros,
Y para saber serviros
En la tierra no se aprende.
Y porque va enflaqueciendo
Mi fuerza delante vos,
Para decir lo que entiendo,
Señores, dígalo Dios,
Que yo ya A7uy pereciendo.
Y ansí casi en Aida,
Os trayo á empresentar
El brizo para brizar
La Reina recien nacida,
Y estas para cantar.
Vos, Sirenas, cantareis,
Por memoria y enxalzainiento
De su vida y nacimiento,
Este romance que oiréis.
Romance.
Dios del cielu, Rey del mundo,
Por siempre seas luadu,
Que mostraste tu grandeza
En lodo cuanto has criado.
Heciste reinos disididos
Cada unu en su grado,
Distóles muy justos reís,
Cada rey en su reinado.
También diste á Portugal,
DAS TRAGICOMEDIAS. 479
Esperado no me cale,
Vos os podereis quedar,
Y acoger á la mar,
Si la líerra no os vale.
V E R A o.
"Del rosal vengo, mi madre,
"Vengo del rósale."
Afuera, afuera, nublados,
Neblinas y ventisqueros,
Reverdeen los oteros,
Los valles, priscos y prados:
Sea el frío rebentado,
Salgan los frescos vapores,
Píntese el campo de flores
Alégrese lo sembrado.
"A riberas de aquel vado
"Viera eslar rosal granado.
"Vengo del rósale."
Vuélvase la hermosura
A cada cosa en su grado;
A las flures su blancura.
A la (ierra su A7erdura,
Que el bravu tiempo ha robado.
Bendito el triunfo mío,
Que da claridad al cielo,
Y no es menos mi zolu
De lu que es ini señurío.
3 l
A o ) . 11.
482 LIVRO III.
I.NA7EnNO.
Aquel maestro dcrrero
Tiene la muger dornera,
Y quieren (Jo que Dius un quiera)
Que siempre sea Genera.
Tiéuenme amenazado,
Porque los dagu sudar;
DAS TRAGICOMEDIAS 4H5
SERRA.
Hum tildo de hum Rei passadu
Dos gentíos Portuguezes
Tenho eu muito guardado,
Ha mil annos e tres inezes
Per hum mágico encantado.
E este tem hum jardim
Do paraíso terreal,
DAS TRAGICOMEDIAS. 491
CERRO VENTOSO.
Assi que pescastes nícdel:
Mui mal olhado foi isso.
FR.N.Ja fizessein-me ora bispo
Siquer do ilheo de Peniche,
Pois saín frade para isso:
Que sem saber 1er nem rezar
Vi eu ja bispos que pasmo,
E nao sei conjecturar
Como se pode assentar
Mílara em cabeca d'asno.
CERRO VENTOSO.
Que lendes vos, Padre meu,
De renda? FR. N. Tenho lazeíras,
Oitenía mil tenho eu.
CER. Dice; e quem isso tem de seu
Nao pedirá polas eiras.
FR.N.Dizeí-me, Cerro Ventoso,
Nao hei de íer hüa muía?
CER. Se for bem estudioso,
Porque quer hum religioso
Andar sempre xula xula?
FR. NARCISO.
Por isso peco eu bispado,
Que possa ter dez rascóes,
E hum escravo occupado,
Que sempre tenha cuidado
Dos cavados e falcoes.
CER. Esse esíado láo bispal
A dita vos pode dado;
Mas San Jerónimo he tal,
DAS TRAGICOMEDIAS. 5|'
Aparicianes vem
Com sua fildá Giralda,
LaATrador que falla bem:
Nao nos estorve ninguem,
Nem percamos delle nada.
Vem Aparicianes com sua filha, e diz
APA. Eu sohia a ser que cantava
C'os bois e san bois aínda,
Tambein quando caminliava,
Sempre á ida e á vinda,
Nunca de cantar cessava.
Jamáis canseira sentía
Nein por calina nem por lama,
E aínda cantaría,
Mas pobreza e alegría
Nunca dormán m'hüa cama.
Grande bem, se nao m'enllieio,
He lembrar o mal passado
Depois de ser acabado;
Porém eu que estuu no moiu,
Vivo mais desesperado.
Vou nesta triste romageni
Hum dos mais atribulados;
E pera justa romagem
Minha era a pilotagem,
Per maior dos aggravados.
Fii.P.Corpo de mi c'o villáo,
Como falla cerceado!
Onde vas? APA. Por esse cháu.
FR.P.Queréis bailar? APA. Bofa nao.
FR.P.Porque? APA. Vou aggravado.
DAS TRAGICOMEDIAS. 5I<)
F R . PAVO.
Aggravo podo hi haver.
Que aggravo seja em ti?
APV. Perdoae, frei Alfaqui,
Que vos nao sabéis cumer,
Puis falláis issu assi.
Purque ou tenho dous casaos
Dos frades d'apanha porros,
E c'us fortes temporaes,
Sao as novidades tees,
Que nao chegáo pera os foros.
E os padres verdadeíros
Cartuxus de sancta vida.
Apanháo-me os Iravesseims
Com mais ira que os rondoiros.
Sem me rezñu ser uuvida.
Cuidei qu'elles me esperárñu.
Por nño ficar ein carniza.
E o com que ine consolarán.
Fui dizer que nao íomárñu
Espera por sua divisa.
Nao Ides rogo mal, nem nada.
Porque sao sánelas pessoas:
Mas praza á paixáo sagrada
Que ldes dein tanta seixada.
Que ldes quebrem as corúas.
Quero ora perder rancor,
E nao ir com isto au cabo:
Perdoo-Idos polo amor
Do Déos nosso Salvador.
Encoimnendu-os ó diado.
Como vos chamáis? Fu. P- Frei Pao».
520 LIVRO III.
E se cumpre o testamento?
APA. Freí Paco, ja bem esíá;
Escusada he mais linguagein.
Quero ir minha romagem,
Quisto mui bem se fará,
Porque a moca he d'avantagein.
FR. PACO.
Hüas freirás que ca vem,
Sao na tura es de Sicilia;
Dorosia e Domicilia
Sao os seus nomes que tem.
E de mal aconselhadas,
E locadas da ignorancia,
Váo queixosas e aggravadas,
Porque as fazem encerradas,
E viver em observancia.
Vem Domicilia e Dorosia, freirás, c diz
DOMICILIA.
Cerlamenle infindos sao,
Cousa pera nao se crer,
Os queixosos que ca váo,
S'elles iodos tem rezáo;
Mas'isto nao pode ser.
Don. Porque ha hi tantos aggravados,
Mais agora que sohia?
DOM. Porque nos tempos passados
Todos eráo compassados,
E ninguem se desmedía.
Mas a presumpeáo isenta,
Que creceo em demasía,
Criou lanía fantasía,
Que nínguem nao se contenta
DAS TRAGICOMEDIAS. 525
COMEDIAS. l'ug.
TRAGICOMEDIAS.
Dom Duardos i83
Amadis de Gaula a.j3
IVao d'amores 294
Fragoa d'Amor 3a4
Exliortacao da guerra 3.5o
Templo d'Apollo 371
Cortes de Júpiter 3<)6
Serra da Estrella fa «
Triumpho do Invernó 447
Roraagcm de Aggravndos 4í>('
ERRATAS.
l'.'.g. lin. erro emenda
ib 4 detende tostende
4j 4
Ao Déos Apollo claro convertid*
len-se
Ao íleos Apollo claro
Convertida
113 ult. ni linarias alimaña?
117 7 c-aiin caua
120 21. dicese diese
150 1 ttb arrisco abarrisco
155 4 iinpnerta importa
168 17 Escoguiera Escognioradei
219 14 dispíerto dispiert.i
242 11 Las Los
250 22 ora oro
253 20 GlN. GAL.
290 19 hondas ondas
301 22 descantos descansos
372 27 Rermana Hermosa
387 12 Ruy Rey
309 3 Sot Si; L
484 24 INVKRKÍO VKHAO
52S 27 Rascoes Rascóos
, '1« ' V
¿ %A
hf I¿* 1 %
•^í . j
ÜPS TrtB^iV f*
fc»*'
£V i
*& tt* -
1
t
JL^Lm-tm.'» / r
' *£Í
t; \ * J>-- I r *
-j"fc
"V
1
K
* i^-v *' - * • i ñfrn
í
1 f
*->Vr JP
$
>5x.;?*••#; r «¿
" ,
^>i'
•*-*.
BRASILIANA DIGITAL
1. Você apenas deve utilizar esta obra para fins não comerciais.
Os livros, textos e imagens que publicamos na Brasiliana Digital são
todos de domínio público, no entanto, é proibido o uso comercial
das nossas imagens.
«s V*- £*
: :
# ^ ; F: ^H
.ts*^
,
-"-
i f•
1
fcó*
%^.Ç ^
pn?r
« > •
(© 3 B ® àl
DE
CORRECTAS E EMENDADAS
DE
TOMO TERCEIRO.
ORDONHO.
Y pues porquê estás con él?
APA. Diz que m'ha de dar a ei Rei,
E tanto farei farei —
ORD. Déjalo, reniega dél;
Y tal amo has de tener?
APA. Bofá, não sei qual me tome;
Sou ja tão farto de fome,
Coma outros de comer.
ORDONHO.
Poça gente de esta es franca.
Pues ei mio es repeor;
Suénase muy gran senor,
Y no tiene media blanca,
Júrote á Dios que es un cesto,
Un badajo contrahecho,
Galan mucho mal dispuesto,
Sin descanzo y sin provecho.
Habla en roncas, picas, dalles,
En guerras y desbarates;
Y si pelean allí dos gatos,
Ahuirá montes y valles:
Nunca viste tal buharro.
Cuenta de los Anibaies,
Cepiones, Rozasvalles,
Y no matará un jarro.
Apuéstote que un judiu
Con una beca Io mate.
Cuando allende fue ei rebate,
Nunca él entro en navio.
Y cuando está en Ia posada,
Quiere destruir Ia tierra.
DAS FARÇAS. 9
Outra ma.
Pois amor me quer matar
Com dor, tristura e cuidado,
Eu me conto por finado,
E quero-me soterrar.
Fui tomar hüa pendença
Com hüa cruel senhora,
E agora
Acho que foi pestelença.
Chore quem quiser chorar;
Saibão ja que sam finado
Sem finar,
E quero ser soterrado.
Fa Ia mi re ut
(falia)
Não rosmeies tu comigo.
( canta )
AIRES.
Que tenhais, que não tenhais,
Tenho mais tapessaria,
Cavallos na estrebaria,
Que não ha na corte taes:
Vossa camilha dobrada:
Não tendes em que vos occupar,
Senão somente enfiar
Aljofar, ja d'enfadada.
APARIÇO.
Oh Jesu! que mao ladrão!
Quer enganar a coitada.
AIR. Ide ver se está acordada;
Que estas velhas pragas são.
GalloCacaracà — cacaracá.
Am. Meia noite deve ser.
APA. Ja fora rezão comer,
Pois os gallos cántão ja.
AIRES, (canta)
"Cantan los gallos,
"Yo no me duermo,
"Ni tengo sueno."
Como! vossa mãe vem ca?
Ca á rua? pera que?
Não me dá, por minha fé;
Venha que aqui me achará.
VELHA.
Rogo á Virgem Maria,
Quem me faz erguer da cama,
Que ma cama e ina dama,
E ma lama negra e fria,
Ma mazella e ma courella,
Voi. i n .
18 LIVRO IV.
VELHA.
Ma cainça que te coma,
Mao quebranto te quebrante
E mao lobo que t'espante.
Toma duas figas, toma.
Nunca a tu has de levar
Para bargante rascão,
Que não te fertas de pão,
E queres musiquian
AIRES.
"Não me vos querem dare,
"Irme hei á tierras agenas,
"A chorar meu pesare,
"Garrido amor."
VELHA.
Vae-t'ó Demo com sa mãe,
E dormirá a visinhança.
Ó Demo dou eu de ti a criança,
E esse te ca aportou.
APA. Dizei-lhe que va comer,
Qu'hoje não comeu bocado.
VEL. Vae comer, homem coitado,
E dá ó demo o tanger.
E demais, se não tens pão,
Qne ma ora começaste,
Aprendêras a alfaiate
Ou sequer a tecelão.
Am. "Ja vedes minha partida,
"Os meus olhos ja se vão;
"Se se parte minha vida,
"Ca me fica o coração."
Vai-se o Escudeiro, e fica a Velha dizendo á Filha:
DAS FARÇAS. 2i
VELHA.
Isabel, tu fazes isto;
Tudo isto sahe de ti.
Isabel, guaV-te de mi,
Que tu tens a culpa disto.
ISA. Pois si, eu o fui chamar.
VEL. Ai Maria, Maria Rabeja.
ISA. Trama a quem o deseja,
Nem espera desejar.
VELHA.
Que dirá a vizinhança?
Dize, ma mulher sem siso!
ISA. Que tenho eu ca de ver colsso.
VEL. Como tens tão ma criança!
ISA. Algum demo valho eu,
E algum demo mereço,
E algum demo pareço,
Pois que cántão pelo meu.
Vós quereis que me despeje,
Vós quereis que tenha modos,
Que pareça bem a todos
E ninguém não me deseje?
Vós quereis que mate a gente,
De fermosa e avisada;
Quereis que não falle nada,
Nem ninguém em mim attente?
Quereis que cresça e que viva,
E não deseje marido;
Quereis que reine Cupido,
E qu'eu seja sempre esquiva.
Quereis que seja discreta,
E que não saiba d'amores;
22 LIVRO IV
AMA.
MOÇA.
CASTELHANO.
LEMOS.
MARIDO.
"AUTO DA I N D I A."
MOÇA.
Jesu! Jesu! que he ora isso?
He porque se parte a armada?
AMA. Olhade a mal estreada!
Eu heide chorar por isso?
Moç. Por minha alma, que cuidei
E que sempre imaginei
Que choraveis por noss'aino.
AMA. Por qual demo ou por qual gamo
Alli ma ora chorarei?
Como me leixa saudosa!
Toda eu fico amargurada.
Moç. Pois porque estais anojada?
Dizei-m'o por vida vossa.
AMA. Leixa-me ora eramá,
Que dizem que não vai ja.
Moç. Quem diz esse desconcerto?
AMA. Disserão-m'o por mui certo
Que he certo que fica ca.
O Concelos me faz isto.
Moç. S'elles ja estão em Rastello,
Como pôde vir a pello?
Melhor veja eu Jesu Christo.
26 LIVRO IV.
AMA.
Ja lh'eu tenho promettido.
Moç. Muito embora, seja assi.
AMA. Hum Lemos andava aqui
Meu namorado perdido.
Moç. Quem? o rascão do sombreiro?
AMa. MAS antes era escudeiro.
Moç. Seria, mas bem çafado:
Não suspirava o coitado
Senão por algum dinheiro.
AMA.
Não he elle homem dess'arte.
Moc.Pois inda elle não esquece?
Ha muito que não parece.
AMA. Quanfeu não sei delle parte,
Moç. Como elle souber á fé
Que noss'amo aqui não he,
Lemos vos visitará.
LEM. Hou da casa! AMA. Quem he lá?
LEM. Subirei? AMA. Suba quem he.
LEMOS.
Vosso captivo, senhora.
AMA. Jesu! tamanha mesura!
Sou a rainha por ventura?
LEM. Mas sois minha imperadora.
AMA. Que foi do vosso passear,
Com luar e sem luar,
Toda a noite nesta rua?
LEM. Achei-VOS sempre tão crua,
Que vos não pude aturar.
Mas agora como estais?
AMA. Foi-se á índia meu marido,
DAS F ARCAS. 33
CASTELHANO.
Reniego de Marinilla:
Esto es burla, ó es burleta?
Quereis que me haga trombeta,
Que me oiga toda Ia vi lia?
AMA. Entrae-vos alli, senhor,
Que ouço o corregedor;
Temo tanto esta devassa:
Entrae vós ness' outra casa,
Que sinto grande rumor.
( Chega ú janella )
Fallae vós passo, micer.
CAS. Pesar ora de San Pablo,
Esto es burla ó es diablo?
AMA. Eu posso vos mais fazer?
CAS. Y aun en eso está ahora
La vida de Juan de Zamora?
Son noches de Navidá,
Quiere amanecer ya,
Que no tardará media hora.
AMA.
Meu irmão cuidei que s'ia.
CAS. Ah sefiora, ireivos vos.
Ábrame, cuerpo de Dios!
AMA. Tomareis ca outro dia.
CAS. Asosiega, corazon,
Adormiéntate, leon,
No eches Ia casa en tierra,
Ni hagas tan cruda guerra,
Que mueras como Sanson.
Esta burla es de verdad,
Por los huesos de Medea,
36 LIVRO IV.
"AUTO DA FAMA."
ARGUMENTO.
O argumento desta farça he, que a Fama he hüa tão
gloriosa exccllencia, que muito se deve de desejar: a qual
este reino de Portugal está de posse da maior de todolos
outros reinos. Segue-se que esta Fama Portuguesa he de-
sejada de todalas outras terras, não tamsomente pola gloria
interessai dos commercios, mas principalmente polo infinito
damno que os Mouros, imigos da nossa fé, recebem dos Por-
tugueses na Indica navegação. E porque antigamente a
fama desta nossa província era em preço de pequena estima,
significando isto, será a primeira figura hüa mocinha cha-
mada Portugueza Fama, guardando patas, a qual scra re-
querida por França, por Itália, por Castella, e de todos
se escusará, porque cada hum a quererá levar; e provará
por evidentes razões que este reino a merece mais que outro
nenhum. Polo qual será posta no fim do auto cm carro
friumphal per duas Virtudes, s. Fé e Fortaleza.
FAM. Joanne!
Jov. 0 diabo que tesgane.
FAM. Alevanta-te. JOA. Não me quero erguer.
FAM. Não es farto de jazer?
Oh! ma morte que t'apanhe.
JOANNE.
Filha da comuda açoutada!
FAM. Vae ás patas. JOA. Pate, pate. —
Ma raposa que as mate.
FAM. Dar-t-'hei tamanha punhada!
Tens miolo?
JOA. EU sonhava que era tolo,
Polo ceo de Deos sonhava;
Olhae, então eu chorava;
FAM. Oh Jesu! como es cebolo!
Vem hum Italiano, c diz a
FAMA.
Quem sois vós? ITA. Italiano.
FAM. Ide, ide vosso caminho.
Acorda tu, Joanninho.
Vistes como vem oufano!
Ide embora.
JOA. Hou Franchinote, fora, fora,
Não espanteis as patas, hou!
FAM. A que vindes onde estou?
ITA. Audime, mia senhora.
Dio nutro salvatore
Tu belleza salve y guarde.
Porque guarde aqueste ave,
Con tu aspecto resplendore
Y tan pobleta?
Una jovena perfecla
DAS FARÇAS. 49
E bálhando á mourisca
Dentro gente Portuguez.
Achareis Meca em tristeza,
Ainda mui sem folgança,
Renegando a vizinhança
De tão forte natureza.
Porque farão
Na ilha do Camarão
E no estreito fortalezas,
E as mouriscas riquezas
A o Tejo se virão.
ITALIANO.
Diu, que gran fato!
Como Ia fiel fortuna,
Estelle, sol y Ia luna
Proseguio tanto andato.
Fit partito,
Si plaze ai tu petito,
Pui plaze a mi tu amore,
Que lassis queste labore,
Porque ei cor tengo aflito.
FAMA.
Por amores não se ha faina.
Olhae vós que cousa aquella!
Ide cantar a gamella;
Que a Fama he mais que Dama.
ITA. Si le Veneciani
Aqui fizo tanti dani,
Que satisfará por aquello?
FAM. A ilha de Caramello.
ITA. Par Di, este he grave afani.
Cruda, crudele, con Dio,
54 LIVRO IV.
A pietate me donai,
El agrave que me fai
Non resolve in mio desio;
Y Ia empreza,
Que mio valle tan acesa,
Durará Ia vita mia.
FAM. Para que he essa porfia,
Que esta moça he Portugueza?
ITALIANO.
Qué paciência basta ai core
Del pastore disperato!
Congregar Io y grave fato
Si Ia mente vir o amore
Al foco eterno
Delia flamme dei inferno,
Fará partito col mio:
Tu Io sa, Domine mio,
Que mi mal es sempiterno.
Encontra-se o Italiano com o Francez.
FRANCEZ.
Diu vu garde, bon aini.
ITA. NO vale parole, Micero,
Ni ou pur Ia vita quiero.
FRA. Y que xosa fue essa ansi?
ITA. Arco en foco,
Y plango in hoc loco,
Y ei alma se me va.
FnA. Que diable fue esse allá?
ITA. Modici acerba invoco.
FRANCEZ.
Vus topes Ia Fama açora,
La famosa Portugueza?
DAS FARÇAS. 55
PARVO.
Dono, veio lá meu tio,
Estava minha dona — então ella
Foi-se-lhe o lume pela panella,
Senão acertá-lo acario.
VEL. Oh Senhora,
Como sei que estais agora
Sem saber minha saudade!
Oh senhora matadora,
Meu coração vos adora
De vontade.
PARVO.
Raivou tanto rosmear
Oh pezar ora da vida!
Está a panella cozida,
Minha dona quer jentar:
Não quereis?
VKL. Não hei de comer, que me pês,
Nem quero comer bocado.
PAn. E se vós, dono, morreis?
Então depois não fallareis,*
Senão finado.
Então na terra nego jazer,
Então finar dono estendido.
VKL. Oh quem não fora nascido,
Ou acabasse de viver!
PAR. Assi, pardeos.
Então tanta pulga em vós,
Tanta bichoca nos olhos,
Alli c'os finados sos;
E comer-vos-hão a vós
Os piolhos.
7 4 LIVRO IV
Comer-vos-hão as cigarras,
E os sapos morreré, morreré.
VEL. Deos me faz ja mercê
De me soltar as amarras.
Vae saltando,
Aqui fico esperando:
Traze a viola e veremos.
PAR. Ah corpo de San Fernando!
Estão os outros jentando,
E cantaremos?
VELHO.
Quem fosse do teu teor,
Por não sentir tanta praga
De fogo que não s'apaga
Nem abranda tanta dor!
Hei de morrer.
PAR. Minha dona quer comer;
Vinde eramá, dono, que brada.
Olhae, eu fui-lhe dizer
Dessa rosa e do tanger,
E está raivada.
VELHO.
Vae-te tu, filho Joanne,
E dize que logo vou,
Que não ha tanto que ca 'slou.
PAR. Ireis vós pera Sanhoanne
Polo ceo sagrado,
Que meu dono está danado.
Vio elle o demo no ramo.
Se elle fosse namorado,
Logo eu vou buscar outr'amo.
DAS FARÇAS. 75
Ai triste desatinado,
Ainda tomo a viver;
Cuidei que ja era livrado.
BRA. Qu'esfôrço de namorado
E que prazer!
Havede ma ora aquella.
VEL. Que remédio me dais vós?
BRA. Vivireis, prazendo a Deos,
E casar-vos-heis com ella.
VEL. He vento isso.
BRA. Assi veja o paraíso,
Que não he ora tanto extremo.
Não curedes vós de riso,
Que se faz tão improviso
Como o demo:
E lambem d'outra maneira,
Se in'eu quizer trabalhar.
VEL. Ide-lhe, rogo-vo-lo, fallar,
E fazei com que me queira,
Que pereço;
E dizei-lhe que lhe peço
Se lembre que tal fiquei
Estimado em pouco preço:
E se tanto mal mereço
Não no sei.
E se tenho esta vontade,
Que não se deve enojar,
Mas antes muito folgar
Matar os de qualquer idade.
E se reclama
Que sendo tão linda dama
Por ser velho m'aborrece,
DAS FARÇAS. 85
BRANCA.
Dei ma ora hüa topada;
Trago as sapatas rompidas,
Destas vindas, destas idas,
E emfim não ganho nada.
VKL. Eisaqui
Dez cruzados pera ti.
BRA. (Começo com boa estrea.)
Vem hum Ale ai de com quatro beleguins, « diz:
ALCAIDE.
Dona levantae-vos d'hi.
BRA. E que me quereis vós assi?
ALC. Á cadeia.
VELHO.
Senhores homens de bem,
Escutem vossas senhorias.
ALC Deixae essas cortezias.
BRA. Não hei medo de ninguém: —
Vistes ora?
ALC. Levantae-vos d'hi, senhora;
Dae ó demo esse rezar:
Quem vos fez tão rezadora?
BRA. Leixae-m'ora na ma ora
Aqui acabar.
ALCAIDE.
Vinde da parte d'E!Rei.
BRA. Muita vida seja a sua.
Não me leveis pola rua;
Leixae-me vós qu'eu m'irei.
VEL. SUS, andar.
BRA. Onde me quereis levar?
Ou quem me manda prender?
88 LIVRO IV.
Da vida e da fazenda!
Oh velho, siso enleado,
Quem te metteo, desastrado,
Em tal contenda?
Se os jovenes amores,
Os mais tem fins desastradas,
Que farão as cans lançadas
No conto dos amadores!
Que sentlas,
Triste velho, em fim dos dias,
Se a ti mesmo contempláras,
Souberas que não sabias,
E viras como não vias,
E acertáras.
VELHO.
Quero-m'jr buscar a morte,
Pois que tanto mal busquei.
Quatro filhas que criei,
Eu as puz em pobre sorte.
Vou morrer,
Elias hão de padecer,
Porque não lhes deixo nada
De quanta riqueza e haver
Fui sem rezão dispender
Mal gastada.
«>«!»>»>
F I G U R A S .
FEITICEIRA.
DIABO.
DOUS FRADES.
TRÊS FADAS.
A candeia e o saquinho,
E veredes labaredas.
Se vos tremerem as pelles
D'espantos e de temores,
Hi estão vossos servidores,
Encostade-vos a elles
E cobride-vos d'ainores.
Traz a Feiticeira hum alguidar e hum saco preto, cm
que traz os feitiços, os quaes começa a fazer, dizendo:
Alguidar, alguidar,
Que feito foste ao luar
Debaixo das sette éstrellas,
Com cuspinhos de donzellas
Te mandei eu amassar:
O cuspinhos preciosos
De beiços tão preciosos
Dae ora prazer
A quem vos bem quer,
E dae boas fadas
Nas encruzilhadas.
Este caminho vai pera lá,
Esfoutro atravessa ca;
Vós no meio, alguidar,
Que aqui cruz não ha de estar.
Embora esteis, encruzilhada.
Perequi entrou, pereli sahio.
Bem venhades, dona honrada.
Vai a estrada pola estrada.
Benta lie a gata que pario
Gato negro, negro he o gato.
Bode negro anda no inato,
Negro he o corvo e negro he o pez,
7
Vol. III.
98 LIVRO IV.
DIABO.
Ó dame, jordene
Vu seae Ia bien trovee.
Tu es fause te humeyne,
Sou ye vous esposec.
FKI. Que linguagem he essa tal?
Hui, e elle falia ara via!
Olhade o nabo de Turquia!
Fallade arama Portugal.
DIABO.
Tu has fet bian de mal
Avec un frayre jacopim.
FEL Ma pezar vej'eu de ti:
Dize, ma trama te naça,
Que dizes que não fentendo?
Fazes escarneo de mim?
Ora juro a Deos que he graça.
Ó demo que tfeu encommendo
Cainanho tu hi estás.
DIABO.
Macarde de Limosim,
Tripiere de sancte Ovim.
FKI. Dá ó demo esse latim,
Que não entendo o que he.
DIA. TU nas oy tene vergonhe?
FKI. Que fiz eu?
DIA. De tois lesães en aute sois.
FKI. VÓS me diredes depois
O que isso quer dizer.
DIA. TU aspete de bem Ia mer.
Fw. Hui! pete que pôde ser?
Esta que linguagem he?
7*
100 LIVRO IV.
DIABO.
Tan santy xi noble entraprisu.
FEL Viste-lo demo em que vem?
DIA. E Ia ribalde norrem
E puis je sa venu.
FEI. Pois pera que vieste tu,
Senão pera serviços meus?
DIA. Dime tos xem que tu véus,
Fame d'um vilhom cocu.
FEL Quem vio diabo Alleinão?
Dize, rogo-te, bargante,
Mao quebranto te quebrante,
Não fallas d'outra feição?
Por vida de Genebra Pereira,
Velha, ladra, alcoviteira,
Que chame o nome de Jesu.
DIA. EU, eu! que dile tu?
FEITICEIRA.
Esconjuro-te, malino,
Membro da ira de Deos,
Pola terra e pólos ceos
E por teu malvado sino,
Tu has-me de responder.
DIA. Oh que maldita mulher!
Que me queres, infernal?
FEI. Quero-vos, mano, entender.
Minha rosa, vinde ca,
Meu quebranto, dae-me a fé
Que me não falleis por lá,
E adoro o rabo de boi.
DIA. Té toi, té toi.
Tumerum Ia caboxes.
DAS FARÇAS. 101
FEITICEIRA.
Falia arama Portuguez:
Atéqui estou zombando;
Tu has d'ir onde t'eu mando.
DIA. Irei indaque me pez.
FKI. Vae logo ás ilhas perdidas,
No mar das penas ouvinhas,
Traze três fadas marinhas,
Que sejão mui escolhidas.
Parte logo, ora sus.
DIA. TU as desata, que Ia pendus.
Vai-se o Diabo e a Feiticeira tonta aos feitiços, dizendo:
FEITICEIRA.
Que fazeis, relíquias minhas,
Nesta água clara mettidas?
Havedes mister mexidas
Co lixo das andorinhas.
Vem o messaqeiro, e em logar das fadas que lhe a Fei-
ticeira mandou trazer, traz-lhe dous Frades infernaes,
hum delles tangendo huma gaita, e o outro foi pregador;
mas emquanto vivia foi muito namorado; o qual logo diz:
1<? FRADE.
Qué gran tormento me diste
En traerme aqui mal punto!
Ita vere. DIA. Que ouviste?
1<?F. Aqui nos hacen mas triste,
Que ei infierno todo junto.
DIA. Per quam regula diremos?
1? F. Porque muy cierlo sabemos.
Quia dedit Deus potestatem
A las damas que nos maten
Y nos que las adoremos.
102 LIVRO IV.
2" FADA.
As cousas que fazem a terra parir
Lírios alvos e veas divinas,
Cerquem os quadros de vossas cortinas,
E sempre victoria vos faça dormir.
E a fada primeira
Que fez a Fortuna geral dispenseira,
E fez nossos mares e ceos por medida,
Vos faça gosar o gôso da vida
De nova maneira.
3í FADA.
As novas que temos nas ondas do mar
São que na terra ha pouca verdade;
E pois de verdades ha ma novidade,
Por novidades as haveis de tomar.
Ora he pera ver:
Tome Vossa Alteza qualquer que quizer,
Que todo he verdade as sortes que são,
Tornae desses sete planetas que hi vão
A que vos vier.
Aqui derão as sortes primeiramente a elRei.
Júpiter.
Este planeta escolhido
Escolheo, porque he profundo,
O mais alto bem do mundo..
Sol. (á Rainha)
Muitos bens deu Deos na terra,
Porém se este não viera,
Nunca nos amanhecera.
Cuptdo. (ao Príncipe)
Furão.
Este ha mister açamado,
Porque he tão orgulhoso,
Que passa de querençoso.
Podengo.
Este animal alevanta
A caça, porque a cata;
Porém sempre outrein a mata.
Rato.
Este bonito animal
Não sei que faz o coitado,
Que sempre anda homesiado.
Cagado.
Quem tiver este animal
Não he muito que o leixe,
Pois não he carne nem peixe.
Camaleão.
Tem este fraco animal
Tão estranho alimento,
Que não se farta de vento.
Lobo.
Este morre com razão,
Porque tal contrairo tem,
Que emprega a morte bem.
Ouriço cacHeiro.
Este animal enganado
Cuida que anda escondido,
E elle he mais conhecido
Rebuçado.
Porco montez.
Este animal se recolhe
Vol. o i .
114 LIVRO IV.
8*
116 LIVRO IV.
Rafeiro.
Este he falso e fagueiro,
Sorrateiro;
Quando virdes este cão,
Levae sempre hum pao na mão.
Doninha.
Este não he bem furão'
Nem gineta nem esquio:
He hum bichinho vadio.
Sortes das Damas per aves.
Falcão.
Esta ave tem crueldade
Sem piedade;
E quem na quizer tomar
Tem muito que suspirar.
Garça.
Esta ave he temerosa
E fermosa,
E não se toma por manha
Nem cahe senão por tacanha.
Melroa.
Esta ave he namorada
Declarada
E faz seu ninho de praça,
E tudo com muita graça.
Rousinol.
Esta ave tem seus amores
Co'as flores
Dous mezes, nó mais, no anuo;
Porém ama sem engano.
Águia.
Esta vence o sol co'a vista,
118 LIVRO IV
Ctrne.
Esta ave segue hum extremo.
Que cauta contra a razão,
Quando mata o coração.
Pega.
Esta ave nunca socega,
He galante e muito oufana;
Mas a hora que não engana
Não he pega.
Adam.
Esta se tem por real;
He tão brava e tão esquiva,
Que não quer ver cousa viva.
Alvela.
Esta avesinha fermosa
Faz que aguarda,
Mas. pardeos, mui bem se guarda.
Francelho.
Esta ave sempre peneira
E nunca deita farinha:
Tal sois vós, senhora minha.
Andorinha.
Esta ave bem assombrada
He confiada:
Seus amores vão e vem,
Nenhüa certeza tem.
Calhandra.
Esta nunca tem tristeza;
Sobe-se no ar cada hora,
E canta porque outrem chora.
Oja.
Esta ave segue hum temor;
120 LIVRO IV
PERO.
Eu cuido que não 'stou bem.
MÃE. Como vos chamais, amigo?
PKR. EU Pero Marques ine digo,
Como meu pae que Deos tem.
Falleceo (perdoe-lhe Deos,
Que fora bem escusado)
E ficamos dous hereos,
Porém meu he o morgado.
MÃE. De morgado he vosso estado?
Isso viria dos ceos.
PERO.
Mais gado tenho eu ja quanto,
E o maior de todo o gado,
Digo maior algum tanto.
9*
132 LIVRO IV.
Escarnefuchão de vós.
Creio que lá fica a pea:
Pardeos! bô ia eu á aldea. —
Senhora, ca fica o fato.
INE. Olhae se o levou o gato.
PER. Inda não tendes candea?
Ponho per cajo que alguém
Vem como eu vim agora,
E vós a escuras a tal hora:
Pârece-vos que será bem?
Ficae-vos ora com Deos:
Cerrae a porta sobre vós
Com vossa candeiasinha;
E siquaes sereis vós minha,
Entonces veremos nós. (Vai-se.)
INEZ.
Pessoa conheço eu
Que levara outro caminho.
Casae lá c'hum villãosinho,
Mais covarde que hum judeu!
Se fora outro homem agora,
E me topara a tal hora,
Estando comigo ás escuras,
Dissera-me mil doçuras,
Ainda que mais não fora.
MÃE.
Pero Marques foi-se ja?
INE. E pera que era elle aqui?
MÃE. E não fagrada elle a ti?
INE. Va-se muitieramá;
Que sempre disse e direi,
Mãe, eu me não casarei
DAS FARÇAS. 135
VID AL.
Esperae, aguardae ora.
Soubemos d'hum escudeiro
De feição d'atafoneiro,
Que virá logo essora,
Que falia, e como ora falia
Qu'estrugirá esta sala,
E tange, e como ora tange
E alcança quanto abrange,
E se preza bem de gala.
Vem o Escudeiro com seu Moço, c diz:
ESCUDEIRO.
Se esta senhora he tal
Como os Judeos nos gabarão,
Certo os anjos a pintarão,
E não pétíe ser hi al.
Diz que os olhos com que via
Forão de Sancta Luzia,
E cabellos de Madanella.
Se fosse moça tão bella,
Como donzella seria?
Moça de villa será ella
Com sinalzinho postiço,
E sarnosa no toutiço,
Como burra de Castella.
E assi como chegar,
Cumpre-me bem d'attentar
Se he garrida, se he honesta,
Porque o melhor da festa
He achar siso e calar.
MÃE.
Se este Escudeiro ha de vir,
DAS FARÇAS. 139
E he homem de descrição,
Has-te de pôr em feição
De fallar pouco e não rir.
E mais, Inez, não muito olhar,
E muito chão o menear,
Porque te julguem por muda;
Porque a moça sisuda
He hüa perla para amar.
ESCUDEIRO.
Olha ca, Fernando, eu vou
Ver a com qu'hei de casar:
Avisa-te, que has de estar
Sem barrete onde eu estou.
Moç. Como a Rei! Corpo de mi,
Mui bem vai isso assi.
Esc. E se cuspir pela ventura,
Põe-lhe o pe e faz mesura.
Moço.
Ainda eu isso não vi.
Esc. E se ine vires mentir,
Gabando-me de privado,
Está tu dissimulado,
Ou sae-te pera fora a rir.
Isto tfaviso daqui,
Faze-o por amor de mi.
Moç. Porém, senhor, digo eu
Que mao calçado he o meu
Pera estas vistas assi.
ESCUDEIRO.
Que farei, que o sapateiro
Não tem solas, nem tem pelle?
Moç. Sapatos me daria elle,
140 LIVRO IV.
E sabe de gavião:
Tomae-o por meu amor.
Podeis topar hum rabugento,
Desmazelado, baboso,
Descancarado, brigoso,
Medroso, carapatento.
Este escudeiro, aosadas,
Onde se derem pancadas,
Elle as ha de levar
Boas, se não apanhar:
Nelle tendes boas fadas.
MÃE.
Quero rir com toda a mágoa
Destes teus casamenteiros.
Nunca vi Judeos ferreiros
Aturar também a fragoa.
Não te he, melhor, mal por mal,
Inez, hum bom official,
Que te ganhe nessa praça,
Que he hum escravo de graça,
E mais casas com teu igual?
LATÃO.
Senhora, perdei cuidado:
O que ha de ser, hade ser;
E ninguém pôde tolher
O que está determinado.
VID. Assi diz Rabizarão.
MÃE. Inez, guar'-te de rascão:
Escudeiro queres tu?
INE. Jesu nome de Jesu!
Quão fora sois de feição!
Ja minha mãe adivinha.
DAS FARÇAS. 145
Moço.
Senhora, o que elle mandou
Não posso menos fazer.
INE. Pois que te dá de comer,
Faze o que fencommendou.
Moç. Vós fartae-vos de lavrar,
Eu me vou desenfadar
Com essas moças lá fora:
Vós perdoae-me, senhora,
Porque vos hei de fechar. (vai-se.)
Fica fechada Inez Pereira, e lavrando canta.
INEZ.
"Quem bem tem e mal escolhe,
"Por mal que lhe venha não se anoje."
Renego da descrição,
Commendo ó demo o aviso,
Que sempre cuidei que nisso
Stava a boa condição:
Cuidei que fossem cavalheiros
Fidalgos e escudeiros,
Não cheios, de desvarios,
E em suas casas macios,
E na guerra lastimeiros.
Vede que cavallarias,
Vede ja que Mouros mata
Quem sua mulher maltrata,
Sem lhe dar de paz hum dia.
Sempre eu ouvi dizer
Que o homem que isto fizer
Nunca mata drago em valle,
Nem Mouro que chamem Alie;
E assi deve de ser.
DAS FARÇAS. 151
LEONOR.
Como estais, Inez Pereira?
INE. Muito triste, Lianor Vaz.
LEO. Que fareis ao que Deos faz?
INE. Casei por minha canceira.
LEO. Se ficaste prenhe, basta.
INE. Bem quizera eu delle casta,
Mas não quiz minha ventura.
LEO. Filha, não tomeis tristura,
Que a morte a todos gasta.
O que havedes de fazer,
Casade vós, filha minha.
INE. Jesu! Jesu! tão asinha?
Isso havieis de dizer?
Quem perdeo hum tal marido,
Tão discreto e tão sabido,
E tão amigo de minha vida?
LEO. Dae isso por esquecido,
E buscae outra guarida.
Pero Marques tem que herdou
Fazenda de mil cruzados;
Mas vós quereis avisados.
INE. Não; ja esse tempo passou:
Sobre quantos mestres são
Exp'riencia dá lição.
LEO. Pois tendes esse saber,
Querei ora a quem vos quer,
Dae ó demo a opinião.
Vai-se Leonor Vaz por Pero Marques.
INEZ.
Andar: Pero Marques seja;
Quero tomar por esposo
154 LIVRO IV.
Eu determino lá d'ir
Á ermida, Deos querendo.
ERM. Y cuando? INE. I-VOS, meu santo,
Que eu irei hum dia destes
Muito cedo e muito prestes.
ERM. Senora, yo me voy en tanto.
INEZ.
Em tudo he bô a eoncrusão.
Marido, aquelle ermitão
He hum anginho de Deos.
PER. Corregê vós esses veos,
E ponde-vos em feição.
INE. Sabeis vós o que eu queria?
PKR. Que quereis, minha mulher?
INE. Que houvesseis por prazer
De irmos lá em romaria.
PERO.
Seja logo sem deter:
INE. Ora este caminho he comprido,
Contae huma historia, marido.
PER. Bofá que me praz, mulher.
INE. Passemos primeiro o rio.
Descalsae-vos. PKR. Assi ha de ser?
INE. E pois como?
E levar-me-heis no liombro,
Não me corte a madre o frio.
(Põe-se án costa* do marido.)
, ^ , s .^^f*!
F I G U R A S .
PERO MARQUES.
PORTEIRO.
FERREIRO.
VASCO AFFONSO.
ANNA DIAS.
SAPATEIRO.
ESCUDEIRO.
MOÇO DO ESCUDEIRO.
PREGUIÇOSO.
BAILADOR.
AMADOR.
BRIGOSO.
Esteis muitieramá:
Tornae lá, senhor Juiz,
Pera vós este vos diz.
PERO.
Pera mi! ahi serei:
Pardeos, próprio he com'este
Hum banco que lá deixei:
Agora estou coma EIRei,
E praza a'Deos que me preste.
Ora sus, agasalhar,
Tirae d'hi essas cancellas;
Aquellas hi não hão d'estar:
Ou fora, á rua com ellas.
FERREIRO.
Estae vós ahi, Juiz,
E nós em pe como bons filhos.
PER. Senhor Porteiro, esses peguilhos
Deitae-os no chafariz.
POR. Levarei, ora estae quedo:
Perdida he a decoada
Na cabeça d'asno pegada.
Não sois vós pera câmara, Pedro.
Leva o Porteiro as cadeiras e topa com Anna Dias, fMJj
vem á audiência, e diz:
PORTEIRO.
Venhais embora, Anna Dias.
Em demanda andais ca?
ANN. Sempre o diabo me dá
Com que tenha negros dias.
POR. He feito crime ou que he?
ANN. Não sei s'he crime ou se que:
Minha filha he violada,
DAS FARÇAS. 16«
E houvcrão-ura forçada:
Vou-me ao Juiz. POR. Esse he;
Mas tanto vai como nada.
ANNA DIAS.
Qucrello-ine, senhor Juiz,
Do filho de Pero Amado
Que o achei emburilhado
Com a minha Beatriz.
PER. E onde? ANN. No seu cerrado.
PER. E que ia ella lá catar?
ANN. Forão ambos a inundar,
E o trigo era crcçudo
E foi-se a ella. PKR. Coma sesudo,
Pois que tinha bô logár.
ANNA DIAS.
Olhae vós como elle gosta!
Juiz, fazei-me direito.
PKR. Digo que pois ja he feito,
Venha elle com sua reposta,
Ou lhe faça bom proveito,
E venha a moça citada.
ANN. E a cachopa he prenhada.
PKR. Assi se faz. ANN. Não ha hi mais?
Esse he o remédio que dais?
Ora estou bem aviada.
Mãe, mãe, eu não sei que diga.
PKR. Pae, pae, venha a rapariga,
E veremos que ella diz:
E como diz a cantiga,
Traga as testemunhas ca,
Sete ou oito abastarão.
168 LIVRO IV.
Y mercader en Medina,
Casado con Dona Dina,
Nieta de Jacob Zarion,
Maestro mor de Adefina.
Agora que soy guayado
Y negro cristianejo,
Ándome á calzado viejo,
Desnudo, desfarrapado,
El mas triste dei Concejo,
Y por mas postomeria
Una hija que teniá
Tal como cera colada,
Húbomela alcohetada.
Voyme al Juez todavia.
Honrado senor Juez.
PER. Eilo. SAP. Seais bien logrado.
Yo me sòy Alonso Lopez,
(Que se vea negra pez
La que me tienè enlodado!)
Ana Dias que ahi está
Usa de alcohetaría;
Enlodó una hija mia,
Moza ya de buena edad,
Tal como Ia luz dei dia.
ANNA DIAS.
Olho mao se metta em ti,
Cascarrea de judeu!
E em tal mulher como eu
Fallas tu? dize, alfaqui,
Alcoviteira sam eu?
SAP. Senor Juez. PER. Eilo. SAP. Buen placer.
Mandad á esa muger
DAS FARÇAS. 171
Y á mi hija engano.
PER. Se lhe ella fora rogar
Pera mondar hum linhar,
A moça embargara o caminho;
Mas bom he de encaminhar
O gato pera o toucinho.
SAPATEIRO.
Si no fuera esta malvada,
Marina no errara ansí.
ANN. Agora me lembra a mi
Onde Marina morava:-
Antre os odreiros alli
Me parece que vos vi
Cos odres dependurado.
SAP. Senor Juez. PER. Eilo. SAP. Buen mandado.
Yo tambien veisme aqui
Con los odres pendurado.
El negro Alonso Lopez
Mal viva si otra vez
Venga a pediros derecho.
No ine fuera mas provecho
Dar al diablo el Juez?
Que esta merece, quemada.
PKR. Julgo que se esta dona honrada
Sabe isso tão bem fa/.er,
Se o deixar esquecer,
Seja por isso açoutada.
Assi se cerra a cancella.
Calar, ieramá, calar,
E não vir-vos exemplar.
Não no sabia senão ella,
E elle vem-no apregoar.
m LIVRO IV.
ANNA DIAS.
Que vos dixe eu então?
Esc. Esperae, qu'eu o direi.
Dixestes-me: Trabalharei
Por hum cruzado p'ra pão.
— Senhora, eu vo-lo haverei. —
Vou e vendo hüa viola
E hum gibão de fustão
E botas de cordovão,
Que tinhão inda boa sola
Que durarião hum verão;
E vendi hüa gualteira,
E fiz da pousada feira.
Soma emfim de rezões,
Ajuntei quatro tostões,
E metti-lh'os na mãosinha,
Dizendo-lhe* Senhora minha,
Lembrein-vos minhas paixões.
Foi-se a boa d'adela,
E ao primeiro recado
Disse: Dae-me outro cruzado,
Que prazendo a Madanela
Logo sereis aviado,
Deos querendo, muito prestes,
Porque aquelle que me destes
Em cuz-cuz o comeo ella.
E se vós quereis vencê-la,
Andem os dinheiros bastos,
E não receeis os gastos
Em tal moça como aquella.
ANNA DIAS.
Não vos dizia eu mal nisso,
DAS FARÇAS. 177
12*
LIVRO IV
180
E do meu tempo servido
E d'outras cousas que calo.,
Esta noite, eu lazerando
Sobre hüa arca e as pernas fora,
Elíe acorda-me á hüa hora:
— Oh! se soubesses, Fernando,
Que trova que fiz agora! —
Faz-me accender candieiro,
E que lhe tenha o tinteiro,
E o seu galgo uivando*
E eu em pé, renegando
Porque ao somno primeiro
Está meu senhor trovando.
ESCUDEIRO.
Não sabes, dize, parviço,
Que sou eu o mesmo Paço?
Moç. Bem sei eu segundo jaço
Que cousa he paço e palhiço.
Nem vós não tendes chumaço,
Nem de ventura atolais
Em colchões e cabeçaes.
Também vós fazeis pendença?
Eu não sei como a doença
Não vai onde vós estais.
Peço contra elle, Juiz,
Que o serviço que lhe fiz
Que in'o pague por inteiro.
PEn. Veremos nós o que elle diz.
Que dizeis vós, cavalleiro?
Esc. Não ha hi por hu correr,
Emqué m'esfoIem a pelle.
PEn. Mando que sirvais a elle,
DAS FARÇAS. 181
O mi senura SanfAnna,
Qué sino, qué suerte, qué hado!
Qué ventura tan dichuza.
Tú senura graciuza.
Ternaz tierras y ganados,
Cuatro hijos mucho honrados,
Mucho oro y mucha coza.
CASSANDRA.
O mi ave fénix linda,
Mi sibila, mi senura,
Dame acá Ia mano ahura.
Hermozura de Esmerinda
Tú tienez muchos cuidados,
Y algunos desviados
De tu provecho, alma mia.
Tienez alta fantasia,
Y los mundos son inundados.
Un travesero que tienez,
De dentro dél hallaráz
Un espejo en que veráz
Muy claro todos tus bienez.
Luc. Dad acá, garza real,
Gridonia natural,
Diré Ia buena ventura.
Viva tu gran hermozura,
Que esta mano ez divinal.
Unaz personaz te ayudau
Á una coza que quierez;
Estas son dambas mugerez,
Y otraz doz le desayudan.
Date un poquito á vagar,
Que aun está por comenzar
800 LIVRO IV.
Lo bueno de tu ventura.
Confia en tu hermuzura,
Que ella te ha de descanzar.
GlRALDA.
Dad acá, Mayo florido,
Eza mano inelibea.
Por bien, senura, te sea
Buen marido, buen marido.
Na Landera cazaráz,
Nunca te arrepentiráz,
Y iráz morar á Pombal,
Y dentro en tu naranjal
Un gran tesoro hallaráz.
El que ha de ser tu marido
Anda ahora trasquilado,
Mucho honrado, inucho honrodo,
En muy buen sino nacido.
Naciste en buena ventura.
MAR.Huerta de Ia hermozura,
Cirne de Ia mar salada,
Dioz te tenga bien guardada
Y muy segura.'
CASSANDRA.
Senuraz, con benedicion
Os quedad, puez no dais nada.
IiUC No vi gente tan honrada
Dar tan poço galardon.
Tornárão-se a ordenar em sua dança, e com ella se forão.
FIGURAS.
FIDALGO.
PAGEM.
CAPELLÃO.
OURIVES.
PERO VAZ
( Almocreves.
VASCO AFFFONSO )
OUTRO FIDALGO
E a peso de dinheiro
r
O mula desemparada.
Vi vir ao longo do rio
Hüa batalha ordenada,
Não de gente, mas de mus,
Com muita raiva pisada.
A carne está em Bretanha,
E as couves em Biscaia.
Sam capellão d'hum fidalgo
Que não tem renda nem nada;
Quer ter muitos apparatos,
E a casa anda esfaimada;
Toma ratinhos por pagens,
Anda ja a cousa damnada.
Quero-lhe pedir licença,
Pague-me minha soldada
Chega o Capellão a casa do Fidalgo e faltando com elle,
diz:
CAPELLÃO.
Senhor, ja será rezão.
FID. Avante, padre, fallae.
CAP. Digo que ein três annos vai
Que sam vosso capellão.
FID. He grande verdade: avante.
CAP. EU fora ja do Iffante,
E pudera ser que d'ElRei.
FID. Á bofé, padre, não sei.
CAP. Si, senhor, qu'eu sou d'estante,
Aindaque ca m'empreguei.
Ora pois veja, senhor,
Que he o que in'ha de dar,
Porque alem do altar
204 LIVRO IV.
Servia de comprador.
FID. Não vo-lo hei de negar:
Fazei-me hüa petição
De tudo quanto requereis.
CAP. Senhor, não me prolongueis,
Qu'isso não traz concrusão,
Nem vejo que a quereis.
Porque me fiz polo vosso
Clericus et negociatores.
FID. Assi vos dei eu favores,
E disso pouco qu'eu posso
Vos fiz mais que outros senhores:
Ora hum clérigo que mais quer
De renda nem d'outro 'bem,
Que dar-lhe homem de comer,
Que he cada dia hum vintém,
E mais muito a seu prazer?
Ora a honra que se monta —
He capellão de fuão!
CAP. E do vestir não fazeis conta ?
E esse comer com paixão,
E dormir com tanta afiFronta,
Que a coroa jaz no chão,
Sem cabeçal, e á hüa hora
E missa sempre de caça?
E por vos cair em graça
Servia-vos também de fora,
Té comprar sibas na praça.
E outros cárregosinhos
Deshonestos pera mi.
Isto, senhor, he assi.
E azemel nesses caminhos,
DAS FARÇAS. 205
PERO VAZ.
"A serra he alta, fria e névosa,
"Vi venir serrana gentil, graciosa;"
Arre, mulo namorado,
Que cústaste no mercado
Sete mil e novecentos
E hum traque pera o siseiro.
Apre, ruço, acrecentado
A moradia de quinhentos,
Paga per Nuno Ribeiro.
Dix, pera a paga e pera ti.
Arre, arre, arre embora,
Que ja as tardes são d'amigo.
Apre, besta do ruim.
Uxtix! o atafal vai por fora
E a cilha no embigo.
São diabos pera os ratos
Estes vinhos da Candosa.
"A serra he alta fria e nevosa,
"Vi venir serrana, gentil, graciosa."
Apre ca ieramá,
Que te vas todo torcendo,
Como jogador de bola.
Uxtix, uxte xulo ca,
Que t'eu dou irás gemendo
E resoprando sob a cola.
Ao corpo de mi Tareja,
Descobris-vos vós na cama.
Parece? Dix, pera vossa ama:
Não criarás tu hi vareja.
"Vi venir serrana, gentil, graciosa,
"Cheguei-me pcrVIla com gran cortezia."
DAS FARÇAS. 215
Mando-vos eu suspirar i
Pola padeira d'Av'eiro,
Que haveis de chegar á venda,
E então alli desalbardar,
E albardar o vendeiro,
Se não tiver que vos venda
Vinho a seis, cabra a três,
Pão de calo, filhos de manteiga,
Moça formosa, lençoes de veludo,
Casa juncada, noite longa,
Chuva coin pedra, telhado novo,
A candea morta, gaita á porta.
Apre, zambro, empeçarás'.
Olha tu não te ponha eu
Óculos na rabadilha,
E verás per onde vás,
Demo que t'eu dou por seu,
E andarás lá de cilha.
"Cheguei-me a ella de gran curtezia,
"Disse-lhe: Senhora, quereis companhia?"
Vem Vasco Affonso, outro almocreve, e topão-se ambos
no caminho, e diz
PERO V A Z .
Hou, Vasco Affonso, onde vas?
VAS. Uxtix, por esse chão.
PER. Não traes chocalhos nem nada?
VAS. Furtáráo-m'os lá detraz
Hum fideputa ladrão
Na venda da repeidada.
PKR. Hi bebemos nós á vinda.
VAS. Cujo he o fato, Pero Vaz?
PKR. D'hum fidalgo. Dou ó diabo
a i6 LIVRO IV.
E o Juiz da Samora:
De fidalgo he manter fé.
VAS. Bem sabes tu, Pero Vaz,
Que fidalgo ha ja agora,
Que não sabe se o he. —
Como vai a ta mulher
E todo teu gasalhado?
PER. O gasalhado hi ficou.
VAS. E a mulher? PKR. Fugio. VAS. Não pôde ser!
Como estarás magoado,
Ierainá! PKR. Bofá não estou. —
Uxtix, sempre has d'andar
Debaixo dos sovereiros? — (par* o mnio.)
E a mi que me dá disso?
VAS. Por força t'ha de pezar
Se rirem de ti os vendeiros.
PER. Não tenho de ver co'isso.
Vae, Vasco Affonso, ao teu mu,
Que se quer deitar no chão.
VAS. Peza-te, mas desingulas.
PKR. Não peza; bem sabes tu
Que as mulheres não são
Todo o Verão senão pulgas.
Isto he quanto á saudade
Que eu delia posso ter;
E quanto ao rir das gentes,
Ella faz sua vontade;
Foi-se per hi a perder,
E eu não perdi os dentes.
Ainda aqui estou inteiro,
Vasco Affonso, como d'antes,
Filho de Affonso Vaz,
218 LIVRO IV.
«~c-
FIGURAS.
HUM CLÉRIGO.
FRANCISCO, seu filho.
GONÇALO. - Villão.
ALMEIDA
> Moços do Paço.
DUARTE
HUM NEGRO.
HUMA VELHA.
CEZILIA PEDREANES.
15'
O CLÉRIGO DA BEIRA.
CLKRIGO.
Creio que a vara ha dandar.
S'is«o vai dessa maneira.
FRA. EU não sou vossa oliveira
Que a haveis de varejar.
CLE. Renego destas respostas:
Vae muito asinha. FRA. EU creio
Que cuidais que sou correio
Que vai e vem polas postas.
CLÉRIGO.
Cre tu se me a mim não fora
Que ta mãe logo s'assanha,
Ja t'eu dera hüa tamanha,
Que tu foras logo essora.
Requeiro-te que vas embora,
Ante que se assanhe o abbade.
FRA. Ainda eu não tenho vontade,
Lá he ella algures fora.
CLE. Vae, Francisco. FRA. Si, irás.
Ide vós: não tendes pés?
CLE. Filho de clérigo es,
Nunca bô feito farás.
FRANCISCO.
Peores são os de Frei Mendo,
E os do Beneficiado,
Que vão tomar o bocado
Que seu pae está comendo.
CLK. Vae, que ja está no cortiço,
Senão tomá-la e trazê-la.
FRA. Ja ma ora vou por ella,
Mas hei de furtar chouriço.
Vai o moço pela furoa c fica o Clérigo antre si dizendo:
g30 LIVRO IV.
CLÉRIGO.
Medraria este rapaz
Na corte.mais que ninguém,
Porque lá não fazem bem
Senão a quem menos faz.
Outras manhas tem assaz,
Cada hüa muito boa:
Nunca diz bem de pessoa,
Nem verdade nunca a traz.
Mexerica que por nada
Revolverá San Francisco;
Que pera a Corte he hum visco,
Que caça toda a manada.
Vem o filho com a furoa, e diz:
FRA. Ja minha mãe tem tascada
A regueifa do bautismo:
Andae vós ca, pae, ao bismo,
Que ella não lh'escapa nada.
CLÉRIGO.
Rezemos matinas logo,
Antes que entremos á caça;
Que como homem s'embaraça
Nella, não he senão fogo.
FRA. Matinas de ca da Beira,
Ou como quereis rezar?
CLE. Si, pera que he mudar
Cada dia hüa maneira?
Porque os capellães d'ElRei,
Que ca na Beira tem renda,
Se rézão lá d'outra lei,
Tem outra lei de fazenda.
Mas Deos dê muita prebenda
DAS FARÇAS. 231
GONÇALO.
Bofá vejo eu Portuguezes
Da corte muito alterados,
Mais própinquos dos arados
Que parentes dos Menezes.
DUA. Oh fideputa avisado!
E o villão he castiço:
O rapaz rapa chouriço,
Rapaz mouro emgrageijadn.
GONÇALO.
Vós sombreiro acutilado,
Cuidareis que sois alguém?
Pois vos eu conheço bem,
Fallae vós mais conchavado.
DUA. Rapaz, es tão namorado!
Ora falia sem sabor,
Rapaz, que mudas a côr.
GON. Ora estais bem aviado.
ALMEIDA.
Vendes a lebre, villão?
GON. Si, fidalgo. ALM. Mostra ca:
Quanto a dás? que custará?
GON. Samicas meio tostão.
ALM. E no cesto, que tens lá?
GON. Trago aqui estes capões,
E bons marmelos valentes,
Se delles fordes contentes;
E er também trago limões
Pera aguçardes os dentes.
Enquanto Gonçalo se abaixa a descobrir o cesto pera
mostrar tudo o que traz, foge Almeida e leva a lebre, e
Gonçalo achando-a menos, diz:
240 LIVRO IV.
GONÇALO.
E a lebre que foi delia?
DUA. Que sei eu? GON. Hu-lo parceiro?
DUA. Não te deu elle o dinheiro?
GON. Pardeos de graça vai ella:
Lá a leva elle o escudeiro.
DUA. Vae, vae correndo asinha,
Que inda agora vai per hi.
GON. Olhae-me vós perequi,
Porque ella não era minha,
E he mal perdê-la assi.
DUARTE.
Oh que gostoso villão,
E que boa festa temos!
Almeida e eu partiremos
Como irmão com irmão.
GON. HOU mulher do amarello,
Viste ca, se vem á mão,
Hum fidalgo terrastão
Com hüa lebre no capello?
Hou vós do sacco de palha,
Viste-ine ça minha lebre?
Oh! dou-me a Deos que me leve,
Não hei de achar nem migalha.
Dize, senhor sapateiro,
A minha lebre vai ca?
Pera que he buscá-la ja!
Dou ó demo o escudeiro.
Leve-a por amor de Deos,
Pola alma de meus finados,
Porque lhe somos obrigados,
Eu e todos meus ereos.
DAS FARÇAS. 241
Se topares lá em fundo
Hum negro, põe-te a recado,
Porque he hum perro malvado,
0 maior ladrão do inundo.
Não olhes no que fallar,
Qu'he muito falso o cabrão.
Olha per teu chapeirão,
Porque elle ha-te de atentar
Se tens tu olho ou não.
Indo Gonçalo seu caminho, apartando-se do Clérigo, topa
hum Negro grande ladrão, e entra cantando buscando hum
mulato: e diz Gonçalo, depois de cantar o Negro:
GONÇALO.
Dizc, negro, es da corte?
NBG. Qu'esso? GON. S'es da corte?
NEG. Ja a mi forro, nain sa cativo.
Boso conhece Maracote?
Corregidor Tibão he.
Elle comprai mi primeiro;
Quando ja paga a rinheiro,
Daita a mi fero na pé.
He masa tredora aquelle,
Arama que te ero Maracote.
GON. Mais tredor era o rascote
Que m'a mim furtou a lebre.
NEG. Qu'hc quesso que te furtai?
GON. Hüa lebre de meu pae,
De meu cunhado huns capões,
E marmelos e limões;
Abonda tudo lá vai.
NEGRO.
Jesu, Jesu, üeoso consabrado!
244 LIVRO IV
Mi cansai e á deradera
A mior fica sua mão.
Vejamos bolsa que tem:
Hum pente para que bo?
Três ceitil sa qui so:
Ratinho nunca bitem.
O riabo ladarão!
Corpo re reos consabrado!
Essa villão murgurado
Sa masa prove que cão.
Quando bolsa mi acha.se
Fernão d'Álvaro, esse si;
Nunca pente sa alli.
Ah reos! quem te furtasse
Bolsa, Nu na Ribeiro!
Home bai busca rinheiro:
A toro ere rise:
Ja rinheiro feito he.
Arama que tu ero gaiteiro!
Fernão d'Alvaro m'acontenla;
Elle nunca risse nam.
Logo chama ca crivam,
— Crivaninhae esormenta;
Toma rinheiro, vas embora.
Boso,ihome de bem, que buscae?
— Mi da cureiro agarba sae.
— Boso que buscae corte agora?
— Buscae a Rei jain João,
Paga minha casarainento.
— Dá ca, moso, trac esoruiento;
Crivaninhae boso, crivão:
Home, tornae hum dos quatro sete
248 LIVRO IV.
Vejamos se adivinhais.
CKZ. DOUS mancebos fenganárâo,
E os limões que te levarão
Venderão por seis reaes.
E hüa moça corcovada
Está agora depennando
O capão de tua cunhada,
E o outro se está assando,
E a lebre pendurada.
Ainda por mais signal
Cubrírão-na c'hum sombreiro
Em casa d'hum alfaiate.
GON. Que besteiro he este tal!
Este he o Déxemo inteiro
Em trajos de carafate.
Mais hei hoje de saber,
Pois m'eu acho aqui á mão.
Assi Deos te dê prazer
Que tu me queiras dizer
S'hei de casar cedo ou não?
CKZ. Casarás polo natal
Com mulher sem tua perda;
Seu corpo como cristal,
E achar-lhe-has hum signal
No meio da coxa esquerda.
E tem na teta direita
Hum luar com três cabcllos:
Pola cinta muito estreita,
De hüa nádega contreita.
E zauibra dos cotovelos.
GON. Não hei de casar dessartc,
Nem Deos não ha de querer.
252 LIVRO IV.
gSS3&-*—-
17
F I G U R A S .
INTRODUCÇAO.
LEDIÇA. CORTE <<
MÃE SAULINHO.
de Lediça.
PAE JACOB.
F A R Ç A .
LICENCEADO (no argumento).
LISIBEA. I FEBRUA.
LUSITÂNIA. I JUNO.
PORTUGAL. DINATO.
MAIO. BERZEBU.
VENUS. TODO O MUNDO.
VERECINTA. í NINGUÉM.
"AUTO DA LUSITÂNIA."
LEDIÇA.
Muito tenho por fazer
E não tenho feito nada:
Está a logea por varrer,
Os meninos por erguer
E enha mãe ensobradada.
Meu pae vai-se a passear
Com outros judeos andando,
E a costura está folgando,
Dous annos por acabar
O capuz de Dom Fernando.
Meu pae não era de arte
Senão pera cavalheiro,
Ou fidalgo, ou rendeiro,
E o christão pera alfaiate
Sem agulha e sem dinheiro.
Entra hum Cortezão, e diz:
Con. Vosso pae he ca, senhora?
LED. Que lhe quereis vós dizer?
COR. Pergunto a vossa mercê.
LKD. Per hi sábio elle fora
A arrecadar não sei que.
262 LIVRO IV
E Catclão namorado
He meu primo e meu cunhado,
E rendeiro na Sertãe.
MÃE.
Que! não vens, filha Lediça?
Nunca acabas de a limpar?
LED. Como sois agastadiça!
Cuidareis que de preguiça
Não faço senão folgar,
Ou samica estou dormindo?
MÃE. Ora faze, filha minha.
LED. EU estava-me ja indo,
E Menoba está saindo
No meio da camarinha.
CORTEZÃO.
Antre essas cousas louçans
Peço que me consoleis.
LKD. Pinhoado comereis,
Ou caçoila de maçans:
Vede vós o que quereis.
COR. Peço esperança coitado
E favor favorecido.
LKD. Isso he coisa d'adubado.
Con. Oh que mal ser namorado
Onde não he entendido!
Eu vou-me: vosso pae vem.
LKD. Mãe, vinde que vem meu pae.
MÃE. Que figeste? guai, guai, guai!
Ou fallaste com alguém,
Ou não sei como isto vai.
LED. Com quem havia de fallar?
Olhae que coisas aquellas!
DAS FARÇAS. 267
E da Sibyla informado
Dos segredos que sabia
Do antigo tempo passado.
Em especial
O antigo Portugal,
Lusitânia que cousa era,
E o seu original:
E por cousa mui severa
Vo-lo quer representar.
E pera claro cimento
E a obra não ser escura,
Direi em prosa o argumento;
Porque a cousa que he segura,
Procede do fundamento.
E como sempre isto guardasse
Este mui leal autor,
Até que Deos enviasse
O Príncipe nosso senhor,
Não quiz qu'outrem o gozasse.
LISIBEA.
Canseira de minha vida,
Põe esses olhos no chão,
Vela-te de ser perdida,
E não olhes tão garrida
Quantos vem c quantos vão.
Lus. Oh que forte condição!
Como sois destemperada
E ciosa sem razão!
Lis. Eu não teria paixão
Se te visse assocegada;
278 LIVRO IV.
Oh Senhora,
E tu Senhor Deos Neptuno,
E Venus, que a todos presta,
Valei-m'ora.
E acabae c'o Sol meu pae,
Que me mande hum messageiro,
Que me veja,
E saiba como me vai;
E pois he pae verdadeiro,
Me proveja.
Entra Maio, messageiro do Sol, cantando.
MAIO.
"Este he Maio, o Maio he este,
"Este he o Maio e florece,
"Este he Maio das rosas,
"Este he Maio das fermosas,
"Este he Maio e florece,
"Este he Maio das flores,
"Este he Maio dos amores,
"Este he Maio e florece."
Mui muito in'espanto eu
De inundo tão albardeiro,
Que por eu ser prazenteiro,
Me tem todos por sandeu,
E, por sisudo, Janeiro.
Pois hei de tomar prazer,
E não hei de ser com'este;
Que o prazer crece o viver:
E quem isto não fizer
Não terá vida que preste.
"Este he Maio, o Maio he este,
"Este he Maio e florece."
284 LIVRO IV.
MAIO.
Senhora, não he rezão
Encobrir esta alegria.
Saiba vossa senhoria
Que acabou sua oração
Quanto vossa alma queria;
E por vosso bem ditoso,
E merecer mui facundo,
Vem Mercúrio precioso
Deos dos coinmercios do Mundo,
Eleito por vosso esposo.
Vem co'elle as soberanas
üiesas de Grécia e Egypto,
Venus vem com as Troyianas,
Verecinta co'as Romanas,
Cantando com ledo esp'rito.
Vem estas Deosas em dança ao som desta
Cantiga.
"Luz amores de Ia nina,
"Que tan linduz ujuz ha,
"Que tan linduz ujuz ha,
"Ay Diuz quien luz habrá,
"Ay Diuz quien luz servirá."
VENUS.
Dejemuz ora el cantar
Y antez de estaz ricaz bodaz
Que venimuz celebrar,
Pongámunuz hi luego todas
Cada una en su altar.
Verecinta, Fébrua y Vesta,
Romanaz maz singularez,
Antez de empezar Ia fiesta,
286 LIVRO IV.
BBRZEBU.
Beato seja o varão
Que adora cães e gatos,
E as muelas dos patos,
E os miolos do cão,
E o gallo de Pilatos.
DIN. Beato seja e acceito
O que doce língua tem
E a maldade no peito,
E louva sempre o malfeito,
E diz mal de todo o bem.
BERZEBU.
Bento seja o verdadeiro
Avarento per natura,.
Que poz a alma no dinheiro,
E o dinheiro em ventura,
E a ventura em palheiro.
DIN. Bentos sejão os primeiros
Que tomão por devação
Aborrecer-lhe o sermão,
E andão traz feiticeiros
De todo seu coração.
BERZEBU.
Bentos aquelles e aquellas
Que so três ave-marias
Os enfadão nas capellas,
E folgão de ouvir novellas
Que durem noites c dias.
DIN. Adiante va a mulher
Que não crê senão patranhas,
E reza sempre ás aranhas,
288 LIVRO IV.
Y de su gracia vellida!
A qué manos es venida
La flor de Ia gentileza!
VKN. Y nunca ha de ser prenada,
Ni mandada Ia triste?
MER. Que quer ella de mais nada,
Senão ser de mi amada
O mais que tu nunca viste?
PALLAS.
Todo eso tu sueno suena:
Arre acá burra de Logrono.
Para jaula es Ia ciguena.
Ansi que no harás duena,
Ni serás tanpoco dueno.
VEN. Ay de ti lirio florido,
Ay de ti sarza florida,
Cuando tu fresco sentido
Se hallare con marido
Y le hallare inarida.
MERCÚRIO.
Oh renego de Turquia!
Eu lhe dou meu coração
Com tanta gloria e alegria,
Que as aves lhe cantarão
Continuada melodia.
VEN. Las aves á Ia desposada
Sabes que se monta ahi?
Cantarle han por alvorada
"La bella mal maridada
Mal gozo viste de ti."
JUNO.
Mi esmeralda oriental.
DAS FARÇAS. 295
PORTUGAL.
Segundo se me afigura,
E este caso se moveo
E minha alma não segura,
Eu perdi a mor ventura
Que homem nunca perdeo.
Quem tem tempo e espera tempo,
Tem maré e espera maré,
Tem vento e espera vento,
Não teve conhecimento
Da fortuna que cousa he.
Que erro pera doer
Grande pena em demasia,
Quando homem ve perder
O bem que pudera haver
E o leixou de dia ein dia!
Não sei como me enlheou
Esta safíra da Pérsia,
Que me disse, — emquanto eu vou
Chorar a mãe que me criou,
I-vos á Serra Solercia.
Eu errei em a leixar,
E mereço este castigo;
Porque o verdadeiro amigo,
Se ve o amigo chorar,
Sempre o ha dachar comsigo
E sentir as suas dores
Na sua angustia maior.
O Lusitânia, os teus primores
Me causarão taes amores,
Que me esqueceo este amor.
O Senhora, onde vos is?
DAS FARÇAS. 297
CLÉRIGO.
Aqui do viene veremos. —
Estaba sola? Moç. So estava.
CLE. Qué hacia? Moç. Ensavoava.
CLE. Y de Io ai qué tenemos?
Moç. Quando me vio espirrava.
CLE. Porquê? Moç. Porque he boa mulher.
DAS FARÇAS. 305
De mi triste perdicion,
Moço venga Ia candeia.
Moço.
Pera a missa? CLE. No: cuitado!
Nel infierno diré misa.
Moç. Pezar de Branca Denisa!
CLE. Ay, ay, ay desamparado!
Trae Ia candeia á prisa.
Entra Brasia Dias, e diz:
BRA. Que he isto, compadre amigo?
CLE. E S ia muerte por mas cierto.
BRA. Dormirieis descuberto,
E arrefeceo o embigo.
Moç. Olhae aquelle concerto!
BRASIA DIAS.
Não he senão frialdade;
Ponde-Ihe hüa telha quente.
CLE. Ay! que es mortal accidente.
BRA. Hui, compadre, esforçade:
Nunca outrein foi doente?
Tornae ora hum suadouro
De bosta de porco velho,
E com unto de coelho
Esfregae o pousadeiro,
E crede-me de conselho.
E se de quebranto for,
Tomade o incenso bello,
E o çumo do marinelo,
E as favas de Guiné,
E untae o cotovelo.
S i ; e se for priorisa,
DAS FARÇAS. 307
Tomade da guiabelha,
Pisada co'o fel d'ovelha.
Moç. Mas pondc-Ihe Branca Denisa.
BRA. Zombais de quem no aconselha? —
E se for de cadarrão,
Comei caramujos quentes,
Como saturem ferventes,
E mexilhões vos coserão,
Porque são aqui parentes.
E se for caleca passa,
Que nasce das bandarrinlias,
Tornae do çumo das vinhas,
E acolá a sopa na braza,
Então ferver as mézinhas.
Não posso mais aqui estar,
Que ando destemperada.
Como eu for estancada,
Virei ca mais devagar.
Moç. Boa mestra he aquella honrada.
CLK. Ay, ay, ay triste de mi!
Porquê Ia muerte no viene?
Suéltela quien Ia detiene;
Venga y lléveme de aqui,
Que el vivir no me conviene.
O muerte, pues que es hermosa,
Porquê te pintau terrible?
Y pues eres convenible,
Porquê te Uainan furiosa?
Mas ante muy apacible.
Oh! bendito Dios amen,
Porque me hizo inortaí;
Que si nacera inmortal,
20"
308 LIVRO IV.
No me puedo arrepentir,
Porque es tan dulce el dolor,
Que no me amarga ei morir.
Padre, no soy quien solia,
Ya os confieso mi pena;
No tengo contricion buena,
Ni tengo el anima mia,
Que este mal Ia hizo agena.
Qué haré? PAU. Qué hábeis de haeer?
La parte hizoos engano?
CLE. NO, padre, mas desengano,
Que uo quier oir ni ver
La desculpa de mi dano.
PADRE.
Ha mucho que os enamoro?
CLK. DOS afios. PAU. Santa Maria!
Eso es penar un dia.
Oh! triste inesquino yo,
Cuan luenga pena es Ia mia!
Decid vuestra culpa á Dios,
Que muy aína os matais.
Ante omnia os congojais:
Decid que no estais en vos,
Pues tan sin.tiempo os quejais.
Dos anos, y aun diez y médio,
Dos dias son en amores,
Para merecer favores.
Y él que pide remédio
Es muy flaco en sus dolores.
No leistes de Jacó
Cuanto servió por Raquel?
Aquel fue amante fiel,
2l
Voi. m.
322 LIVRO IV.
PARAPHRASE DO PSALMO L.
S E R M Ã O
feito á christianissima Rainha D. Leonor, e pregado em Abran-
tes ao muito nobre Rei D. Manuel, primeiro do nome, tia
noite do nacimento do Illustrissimo Iffante D Luís. Era do
Senhor de i5o6. E porque alguns forão em contrário
parecer que se não pregasse sermão d'homem leigo, começou
primeiro di/.endo, antes de entrar no sermão:
Tercera serial.
Otra sefial tercera le siento;
Que pierde Ia vista, los ojos quebrados,
No ve los peligros de tantos pecados,
No ve el camino de tanto tormento,
No ve Ia ceguera de su pensamiento,
Ni ve los barrancos nesta triste estrada;
Ni ve adó va ni á que posada,
Ni siente lo cierto de su perdimiento.
No ve lo que toma ni lo que le dan;
No ve lo que deja, ni ve Io que lleva;
No ve quien lo alumbra, ni ve quien Io ciega;
Ni ve lo que pide ni que le daran:
No ve quien lo Ilama, ni á que afan;
No ve Io que topa, ni de que se guarda;
No ve lo que viene, ni ve lo que tarda;
No ve lo que es piedra, ni lo que es pau..
R O M A N C E
ao mesmo a s s u m p t o.
Pranto fazem em Lisboa,
Dia de Santa Luzia,
Por EIRei Dom Manuel,
Que se finou nesse dia.
Chorão Duques, Mestres, Condes,
Cada hum quem mais podia;
Os fidalgos e donzellas
Muito tristes em porfia;
Os Iffantcs davão gritos,
A Iffanta se carpia;
Seus cabellos, fios d'ouro,
Arrincava e destruía;
Seus olhos maravilhoso.*
Fontes d'agua parecia.
Bem merecem ser escriptas
As lástimas que dizia.
"Paço tão desamparado
"Derribado merecia,
"Pois a sua fortaleza
"Se tornou em terra fria.
"O minha senhora madre
"Rainha Dona Maria,
"Quem a vós levou primeiro
DAS OBRAS VARIAS. 349
A mundanal senhoria.
Disse que os vãos thesouros
A morte não pertencia.
Desque ficou enterrado
Cada hum se despedia,
Dizendo estes versos tristes
w
A gloriosa Maria.
Oração dos Grandes de Portugal a X. Senhora, ilepois
de enterrado D. Manuel.
O Duque de Bragança.
Senhora Virgem gloriosa,
Que leixaste sepultado
O verbo deificado
Vestido da carne vossa,
Do inundo desamparado;
Este vosso encommendado
Rei, que tanto vos queria,
Que lhe dês tanta algria,
Como nos leixa cuidado
Neste dia.
O Mestre de Santiago.
Senhora dos três Reis Magos,
E de todolos Senhores,
Coroa d'Imperadores,
Que tragaste tantos tragos
Tristes pólos peccadores;
Polas vossas sanctas dores,
Que este Rei que era nosso
Haja de vós os favores,
Como hum dos servidores
Que foi vosso.
352 LIVRO V.
O Marquez de Torres.
Senhora, que o Rei dos Ceos
Viste na cruz espirar,
Espirar e lamentar,
Dizendo: "Oh Deos, meu Deos!
Foste-me desamparar!"
Vós queirais lá emparar
Este Rei que aqui leixamos
Em tão escuro logar,
E a nós alunliar,
Que vos vejamos.
O Conde de Marialva.
\ Senhora, Senhora nossa,
Senhora nossa avogada,
Sereis deste Rei lembrada,
Por aquella sancta hora
Que fostes encoinmendada.
Ca vos fica soterrada
Sua Alteza e consumida:
DAS OBRAS VARIAS. 353
O Bispo d'Evora.
O Conde de Tentugaí.
O Conde da Feira.
O Conde de Penella.
O Conde d'Alcoutim.
O Conde Portalegre.
O Virgem que a Deos paristes
Junto com Jerusalém,
No sancto logar de Belém;
Consolae os choros tristes
Que Lisboa agora tem.
Aqui leixamos seu bem,
Tornado nem bem nem mal:
O Rainha imperial,
Amerceae-vos de quem
Deveis mais que a ninguém
Em Portugal.
R o M A N c E.
r e c l a m a ç ã o d e D. J o ã o III.
Desanove de Dezembro,
Perto era do Natal,
Na cidade de Lisboa
Mui nobre e sempre leal,
Foi levantado por Rei
Dos reinos de Portugal
O Príncipe Dom João,
Príncipe angelical.
Sahio n'hüa faca branca,
Parecia de cristal,
Guarnecida de maneira
Que não se vio sua igual.
Opa leva roçagante,
Tudo fio d'ouro tal,
Forrada de ricas martas,
Bem parecia real;
23"
356 LIVRO V.
O Mestre de Santiago,
De quem sempre mercê vejo,
Diria d'amor sobejo:
Eisaqui minha alma trago,
Com que servir-vos desejo:
De todo o meu ine despejo.
E fique-me o coração
Onde está tanta affeição;
Que sempre em vós me revejo,
Com rezão.
O Marquez de Villa Real
Diria lagrimejando:
Ó neto d'E!Rei Fernando,
Todo de sangue Real,
Pera bem vos seja o mando.
E diria aconselhando:
Governae polo antigo,
Que este pasto está em p'rigo,
As ovelhas suspirando
Sem abrigo.
O Bispo d'Evora creo
Que ouvindo esta rezão,
Diria: Pera redempção
Foi homo misms a Deo,
Cujo nome era João.
Bejo-vos, Senhor, a mão,
E ferrae sobre o velho,
Não cureis daquelle espelho
Que cegou a Reboão,
De meu conselho.
O Conde de Marialva sei
Que diria assocegado:
360 LIVRO V.
Conde de Villanova.
PRANTO DE M A R I A PARDA,
por que vio as ruas de Lisboa com tão poucos ra un
tavernas e o vinho tão caro, e ella não podia viver sem
Eu so quero prantear
Este mal que a muitos toca;
Que estou ja como minhoca
Que puzerão a seccar.
Triste desaventurada,
Que tão alta está a canada
Pera mi como as estreitas:
Oh coitadas das guelas!
Oh guelas da coitada!
Triste desdentada escura,
Quem me trouxe a taes mazelas!
Oh gengivas e arnellas,
DAS OBRAS VARIAS. 365
O Rua da Ferraria,
Onde as portas erão ínayas.
Como estás cheia de guaias,
Com tanta louça vazia!
Ja m'a mim acconteceo
Na manhan que Deos naceo,
A hora do nacimento,
Beber alli hum de cento,
Que nunca mais pareceo.
Rua de Cata-que-farás,
Que farei e que farás!
Quando vos vi taes, chorei,
E tornei-me por detrás.
Que foi do vosso bom vinho,
E tanto ramo de pinho,
Laranja, papel e cana,
Onde bebemos Joanna
E eu cento e hum cinquinho.
O tavernas da Ribeira,
Não vos verá a vós ninguém
Mosquitos, o verão que vem,
Porque sereis areeira.
Triste, que será de mi!
Que ma ora vos eu vi!
Que ma ora me vós vistes!
Que ma ora me paristes,
Mãe da filha do ruim!
Quem vio nunca toda Alfama
Com quatro ramos cagados,
Os tornos todos quebrados!
DAS OBRAS VARIAS. 367
O Senhora Biscainha,
Fiae-me canada e meia,
Ou ine dae hüa candeia,
Que se vai esta alma minha.
Acudi-ine dolorida,
Que trago a madre cabida,
E çarra-se-me o gorgomilo:
Emquanto posso engoli-lo,
Soccorei-me minha vida. ,
Biscainha.
Não dou eu vinho fiado,
Ide vós embora, amiga.
Quereis ora que vos diga?
Não tendes isso aviado.
Dizem lá que não he tempo
De pousar o eu ao vento.
Sangrade-vos, Maria Parda;
Agora tem vez a Guarda
E a raia no avento.
DAS OBRAS VARIAS. 369
João Cavalleiro.
Amiga, dicen por villa
Un ejeinplo de Pelayo,
Que una cosa piensa el bayo
Y otra quien Jo ensilla.
Pagad, si quereis beber;
Porque débeis de saber
Que quien su yegua mal pea,
Aunque nunca mas Ia vea,
Él se Ia quiso perder.
Branca Leda.
Olhado, mulher de bem,
Dizem qu'em tempo de figos
Não ha hi nenhuns amigos,
Nem os busque então ninguém.
E diz o exemplo dioso,
Que bem passa de guloso
0 que come o que não tem.
Muita água ha em Boratem
E no poço do tinhoso.
Vai-se a João do Lumiar.
João do Lumiar.
Exemplo de mulher honrada,
Que nos ninhos d'ora a hum anno
Não ha pássaros oganno.
I-vos, que sois aviada.
Emquanto isto assi dura,
Matae com água a seccura,
Ou ide a outrem enganar,
Que eu não in'hei de fiar
De mula com matadura.
DAS OBRAS VARIAS. 371
Vai-se d Falula.
Amor meu, mana Falula,
Minha gloria e meu deleite,
Emprestae-me do azeite,
Que se me sécca a inatula.
Até que haja dinheiro,
Fiae, que pouco requeiro,
Duas canadas bem puras,
Por não'ficar ás escuras,
Que se m'arde o candieiro.
Fa lula.
Diz Nabucodonosor
No sideraque e miseraque,
Aquelle que dá gran traque
Atravesse-o no salvanor.
E diz mais, quem muito pede,
Mana minha, muito fede.
Sete mil custou a pipa;
Se quereis fartar a tripa,
Pagae, que a vinte se mede.
Maria Parda.
Raivou tanto sideraque
E tanta zarzagaiiia,
Vou-me a morrer de sequia
Em cima d'hum ahnadraque.
E ante de meu finamento,
Ordeno meu testamento
Desta maneira seguinte,
Na triste era de vinte
E dous desde o nacimento.
DAS OBRAS VARIAS 373
Testamento.
A minha alma encommendo
A Noé e a outreui não,
E meu corpo enterrarão
Onde estão sempre bebendo.
Leixo por minha herdeira
E também testamenteira,
Lianor Mendes d'Arruda,
Que vendeo como sesuda,.
Por beber, at'á peneira.
Item mais mando levar
Por tochas cepas de vinha,
E hüa borracha minha
Com que me hajão d'encensar,
Porque «teve malvasia.
Encensein-me assi vazia,
Pois também eu assi vou;
E a sede que me inalou,
Venha pola cleresia.
Levar-me-hão em hum andor
De dia, ás horas certas
Que estão as portas abertas
Das tavemas per hu for.
E irei, pois mais não pude,
N'hum quarto por ataude,
Que não tivesse água pé
O sovenite a Noé
Cantem sempre a monde.
Diante irão mui sem pejo
Trinta e seis odres vazios,
Que despejei nestes frios,
Sem nunca matar desejo.
374 LIVRO V.
A AFFONSO L O P E S Ç A P A I O .
AO MESMO,
estando em Santarém muito doente de câmaras.
Senhor, eu ia-vos ver,
Pera vos ver e ouvir,
E eu ouvi-vos gemer,
Hum gemer e espremer
Como arremedar parir.
Erão câmaras sem telhas,
Pera vós agastadiças;
Vós cagado atfás orelhas,
As vossas calças vermelhas
Tinhei-las por corrediças.
Vosso eu com surdos brados
Apupava a seus vizinhos,
Que estavão dependurados;
Hum delles, por seus peccados,
Cerceárão-lhe os focinhos.
Diz que tinheis tal desmaio
Na tripa do cagalar,
Que vos disse o inez de Maio,
Melhor vos fora, Çapaio, >M>
Que cagáreis em Thoinar.
DAS ORRAS VARIAS. 381
Outras,
Pois vosso negro bespeiro
Se vasa no inez de Maio,
Affonso Lopes çapaio.
Que quem tem vida guaiada
Coma vós da vossa sorte,
Por vós he cousa provada
Que quem tem vida cagada,
Cagada ha de ser a morte.
Quando vierdes á corte,
E o eu vos der desmaio,
Dae-o ó demo, çapaio.
Tomareis destes vasculhos,
Que pintão polas paredes,
Huns á vela, outros ja vedes,
E tapae esses angulhos.
Assi que o pousadeiro,
Que vos poz em tal desmaio,
Se o quereis vedar, çapaio.
V
Ao CONDE DO VIMIOSO, ,
a quem EIRei remetteo o autor sobre hum despacho seu.
Foi isto em tempo de peste, e o primeiro rebate delia deu
por sua casa; e andava então na corte hum Gonçalo d'Avola,
Castelhano, muito fallador, e medrava muito.
Isto digo
Polo que passo comigo
Polo tempo que se passa:
Vejo minha morte em casa
E minha casa em perigo.
Certo he, nobre-.senhor,
Que quiz Deos ou. a Fortuna,
Que quem serve com amor,
Quanto maior servidor,
Tanto menos importuna.
Daqui vem
Que quem não pede não tem,
E quem espera padece,
E quem não parece esquece,
Porque não lembra a ninguém.
Muito debaixo da sola
Trouxera quanto desejo,
S'eu aprendera na escola
Onde Gonçalo d'Ayola
Aprendeo tanto despejo.
Que o sesudo
Deste tempo falia tudo,
Quer va torto quer direito:
E tornando a meu respeito,
Pera mi sempre fui mudo.
Agora trago antre os dedos
Hüa farça mui fermosa;
Chamo-a: A Caça dos segredos,
De que fícareis mui ledos
E minha dita ouciosa.
Que o medrar,
Se estivera ein trabalhar,
DAS OBRAS VARIAS. 383
Ou valera o merecer,
Eu tivera que comer,
E que dar e que deixar.
Porém por cima de tudo,
O meu despacho queria,
Porque minha fajitesia
Occupa o mais do estudo
Todo ein vossa senhoria;
E o cuidado,
Quando anda assi occupado,
Cuida muito e não faz nada;
A vontade acho dobrada,
Mas o espirito cansado.
CARTA
que Gil Vicente mandou de Santarém a EIRei D. João 111.,
estando S. A. em Pajmella, sobre o tremor de terra, que
foi a a 6 de Janeiro de i 5 3 i .
Senhor!
V I M.
TABOA GLOSSARIA
mostrando a significação de algumas palavras antiquadas
que se encontrão nesta obra, e que se não achão
no Diccionario de Moraes (Lisboa 1833), e no da
Academia Hespanhola (Paris 1830).
A.
B.
*Badeones (melones) badeas.
*Bayones eneas ó espadanas.
Barzoneiro vadio.
Basto (a). em abondancia.
Bebarro. beberrão.
*Borrega. espécie de danza.
*Brego. brega, pendência.
^Bugera bugia.
C.
Cainçada . barulho causado pelo latir
de muitos cães.
Çáfara arisca, esquiva.
Cajuso por acaso.
Calabreada embuste, enredo.
Caufeu quanto a mim.
Capelladas manteadellas.
Carapetento embusteiro, inclinado a men-
tir.
Carafate calafate.
-Celuras zelos.
Chapeirão vestido cumprido de campa-
nezes, espécie de capote ?
TABOA CLOSSARIA. 395
D.
Dainado querido, amante.
* Desclucio. desahucio.
Defengules dissimules.
*Dcsfar rapado. desarrapado.
* Desferir. largar las velas.
Desingulas dissiinulas.
*Despipitar (los sentidos) apurar.
Dexemo. demo.
Doairo inclinação, fadario?
Di diz (imperai.)
Doma semana.
#Dominguejo. doininguero.
E.
Embelecar-se enganar-se.
Einperol porém, todavia.
Einpipinar i Iludir.
Empresentado de presente, em offcrta
Emquc ainda que.
Enfarar-se enfadar-se.
396 TABOA GLOSSARIA.
F.
Faes fazes.
Farnesia frenezi.
Ferrar lançar ferros.
Fersura forçura.
Fim Çfemenino~)
Finto findo.
Finita. busca, pretende.
Folão (cavallo). fogoso.
Fór (á) á moda.
-For (á) á fuer, segun estilo ó cost
umbre.
TABOA GLOSSARIA. 397
G.
*Galajo (círculo) zodíaco.
Geitar lançar.
* Genelosía genealogía.
*Generacio generacion.
Gentar jantar.
Gerecido. gerado.
#Gestadura gesto, semblante.
Gingrar mofar, escarnecer.
*Gingreta. burla, mofa.
Gorgomileiras gorgoinilos.
Gravisca • grave, esquiva.
#Grolla gloria.
Guaroupaz. gurupés.
Guarra alarido de dor.
H.
*Hace haz.
Hétego ethico.
Hervilhar Qv. ervilhar)
Huja uga, peixe.
I.
Ierainá ma ora.
Increos. infiéis, incrédulos.
*Ingrillando aguzando.
*Inoto ignoto.
*Inorar ignorar.
398 TABOA GLOSSARIA.
*Jacer yacer.
* Jantar. comida.
Jeitar ( r . geitar}
L.
*Lacer laceria.
Lavrandeira costureira,
Lavrar costurar.
*Lena blandura.
«Letgo letigio.
#LIetrudo letrado.
*Llugo luego.
Luxar-se çujar-se.
M.
Marchante mercador.
*Mágines. imagines.
*Manguispanado con mangas escasas ó rotas
Mal avesinho (31, 2<? v.) com ma visinhança?
Marmelula remela?
Mártel martyr.
Marrar (260, 2<? v.) faltar?
*Medono. lúgubre, terrible.
Mela metade por meio.
Minte. mente.
Motrete (de pão) pedaço.
Mu (tomar o) desconfiar.
Muitieramá. muito na ma ora.
N.
Nego >
senão.
Nega S
TABOA GLOSSARIA. 399
0.
Offegoso que tem offego.
Oja uma ave.
Ouvo ouço.
p.
Pação
cortezão, homem da corte.
Paceiro
Panadeira (161, v. 2) padeira, do Hesp. panadera,
ou mulher que peneira?
Papear (93, v. 3) cochichar, ou fallar baixo,
percebendo-se apenas o
movimento dos beiços?
Partuno. importuno.
Patornear conversar, dar á língua.
#PegulIal. pegujal.
*Pelletrar penetrar.
Perein. porém.
Perol porém, todavia.
Perneta. planeta.
Pertem pertence.
Pinceos (fallar per) por figuras?
* Placentorio placentero.
Pratel (2 v.. .) pratos (instrumento)? pan-
deiro?
400 TABOA GLOSSARIA.
Q-
*Quellotrotarse enquillotrarse.
Quês queres.
R.
Ralear remoer, raivar.
Rebentinha. raiva.
Rebuchudo rechonchudo, roliço.
*Regello água helada.
Regno reino.
#Rellea. ralea.
Rêlina retine.
«Revellada )
reverencia.
#Revellencia j
*Riedro hácia trás.
# Rifanazo punado.
Rosmear . resmungar.
S.
S. scilicet, a saber.
Sam \
Som f sou.
São í
Sejo )
Sages. prudente.
Salvanor com o devido respeito
Sainão (signo). salomão.
Senhos diversos, vários.
Ses es.
* Sezon. cuartana.
Sia é
Sigro século.
TABOA GLOSSARIA. 401
T.
Tá. até.
Ta. pron. tua; interj. tem mão.
Tamanino. bocadinho.
* Término Qadj.~) extremo.
Tenchar chantar.
*Tónica son harmônico.
* Toste presto.
Trepas folhos de vestido.
*Tristono. lúgubre, sombrio.
V.
Veairo loucura.?
«Via ea.
*Vido vió.
Vonda basta.
Vol. III. 26
ERRATAS.
Pag. liu. *flTO imundu
12 3 AYKKS Ariano
— 6 0 Ordonho Ó Ordonho
15 22 Tamae Tornae
26 28 da foz de foz
29 13 graza gracia
38 7 Pera Perra
46 7 missa missa
05 1 Tornados Formados
103 28 gaiteiro nin gaiteiro
108 22 deinogneira, de mogneira
132 14" ter mão ler na mão
189 20 Trenzentas Trezentas
199 17 mandados •lindados
200 16 honrodo honrado
202 nll. apaliada apanhada
250 12 siindia sandia
308 11 consnerte conorte
331 5 Humildados Humilhados
I N D E X .
FARÇAS. P.g
OBRAS VARIAS.
Paraphrasé do psalmo L. 327
Sermão pregado em Abrantes, no nascimento do Infante
D. Luis 334
Trovas á morte d'E!Rci D. Manuel 346
Romance ao mesmo assumpto 348
Romance á acclamacão de D. João III. 355
Pranto de Maria Parda 364
Trovas a Felipe .Guilhem 37;
Trovas a AflTonso Lopes Çapaio 379
404 INDEX.
Ao mesmo ^
Ao Conde do Vimioso . 38 1
A EIRei D. João III. 383
Carta a EIRei D. João III. 385
Epístola dedicatória ao mesmo 38g
Sepultura de Gil Vicente 3gi
Taboa glossaria 3g3
w» »• ;<?&'
» ;
f^k>..
U'rá% *2
*»»-..
»££»-
BRASILIANA DIGITAL
1. Você apenas deve utilizar esta obra para fins não comerciais.
Os livros, textos e imagens que publicamos na Brasiliana Digital são
todos de domínio público, no entanto, é proibido o uso comercial
das nossas imagens.