Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
O RESPEITO À DIFERENÇA: contribuições da Teoria das Representações Sociais para as políticas de saúde
voltadas a populações indígenas
Resumo: Valendo-se de uma pesquisa bibliográfica e documental, este artigo tem por objetivo discutir as principais
contribuições que a Teoria das Representações Sociais pode trazer para o estudo de um campo particular da
proteção social no Brasil: a Política Nacional de Saúde Indígena. Procura demonstrar que as representações
sociais que os diferentes atores sociais ali envolvidos — indígenas e profissionais de saúde — constroem acerca
de diversos aspectos dessa questão, relativos a si mesmos e aos “outros”, num contexto marcado por relações
interétnicas, podem gerar diferentes impactos sobre a concretização da Política Nacional de Atenção à Saúde dos
Povos Indígenas (PNASPI), bem como sugerir alguns caminhos alternativos para tal política.
Palavras-chave: saúde indígena, proteção social, representações sociais, relações interétnicas.
THE RESPECT FOR DIVERSITY: contributions of the Theory of Social Representations to health policies towards the
indigenous populations
Abstract: Based on a bibliogra-phical and documentary research, this work intends to discuss the main contributions
that the Theory of Social Representations may bring to a specific field of social protection in Brazil: the Indigenous
Healthcare National Policy. It tries to demonstrate that the social representations created by the social actors
involved — indigenous people and health professionals —, regarding the various aspects of this issue, concerning
themselves and “others”, in a scenary marked by inter-ethnic relationships, may generate different impacts on the
Indigenous Peoples Healthcare National Policy (PNASPI), as well as they may suggest alternative ways for this
policy to follow.
Key words: indigenous health, social protection, social representations, inter-ethnic relationships.
Cabem, a seguir, algumas breves considerações destinada a formulações submetidas às leis gerais
sobre a Teoria das Representações Sociais e sobre da Psicologia. Ainda de acordo com Durkheim (1999),
a pertinência de seu uso em contextos interétnicos. conquanto a sociedade seja constituída da soma dos
indivíduos, dessa junção resulta algo maior, que se
3 A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E traduz no conceito de consciência coletiva, uma
SUA APLICAÇÃO EM CONTEXTOS “categoria ontológica” que resulta em um “todo maior
INTERÉTNICOS do que as partes”.
Segundo o autor, a consciência coletiva exerce
A Teoria das Representações Sociais, cuja coerção sobre as consciências individuais: não é
formulação original coube a Serge Moscovici, vem nestas que se deve buscar a explicação daquela.
passando por um “amplo florescimento”, que As manifestações concretas da consciência coletiva
são as representações coletivas, que
vem ocorrendo em vários aspectos:
constantes inovações teóricas e [...] são o produto de uma imensa
metodológicas, imensa quantidade cooperação, que se estende não
de pesquisas empíricas realizadas apenas no espaço, mas no tempo;
em diversas partes do mundo, para fazê-las, uma multidão de
presença marcante nas mais espíritos diversos associaram,
diferentes disciplinas que buscam misturaram, combinaram suas
conhecer a realidade social, forte idéias e sentimentos; longas séries
tendência à interdisciplinaridade. de gerações acumularam aqui sua
(LEITE, 2002, p. 126) experiência e saber. (DURKHEIM,
1978, p. 216)
Fomentar a interdisciplinaridade: eis uma das
características de tal teoria que melhor expressam Conforme Sá (1995, p. 21), as representações
a pertinência de sua aplicação a contextos coletivas caracterizam-se basicamente pela
interétnicos — qualidade tão mais relevante num autonomia, pela exterioridade e pela coercitividade
período histórico em que o conhecimento mostra-se em relação ao pensamento e ao comportamento do
cada vez mais especializado e, assim, menos apto indivíduo.
para lidar com questões abrangentes, complexas e Apesar da influência considerável dessa categoria
multifacetadas, que, exatamente por isso, devem ser durkheimiana no pensamento de Moscovici,
abordadas à luz de uma perspectiva totalizante. identificar em tal influência uma transposição
Em parte, o uso da Teoria das Representações mecânica é um grave erro. A substituição feita por
Sociais em diferentes campos do saber tem raízes Moscovici, da expressão “representações coletivas”
na própria diversidade de correntes teóricas que por “representações sociais” não se deve a uma
influenciaram o pensamento de Moscovici. De acordo questão estilística, mas a uma necessidade de
com Mora (2002), três aportes teóricos tiveram marcar posição contrária ao conteúdo do conceito
impacto considerável sobre o pensamento daquele em sua versão original (SÁ, 1995; OLIVEIRA, 2004).
autor: a Etnopsicologia de Wundt, o interacionismo Aliás, como afirmam Guareschi e Jovchelovitch
simbólico de Mead e o conceito de representações (1995, p. 19),
coletivas formulado por Durkheim.
Cabe abordar aqui, com algum grau de atenção, [...] Moscovici pensou com Durkheim
a ambivalente influência durkheimiana sobre o e contra ele, dando-se conta de que
na sociologia durkheimiana havia o
pensamento de Moscovici. De certa forma, isso perigo implícito de esquecer que a
auxilia-nos a esclarecer melhor para o leitor a própria força do que é coletivo [...] encontra
contribuição que a teoria, em questão, traz para o sua mobilidade na dinâmica do
presente trabalho. social, que é consensual, é reificado,
O núcleo dos vínculos entre a teoria formulada mas abre-se permanentemente para
os esforços dos sujeitos sociais, que
por Moscovici e o pensamento de Durkheim reside o desafiam e se necessário o
no conceito de representações coletivas, uma peça- modificam.
chave no “quebra-cabeça” da Sociologia
durkheimiana. Durkheim (1999) considera um erro Isso porque, para Moscovici, as representações
buscar nos indivíduos a explicação dos fenômenos não têm uma existência própria, desvinculada das
sociais — busca essa baseada em dois estruturas sociais e cognitivas em que se inserem e
pressupostos: 1) a sociedade existe apenas na dos sujeitos que aí se encontram. Variam segundo
medida em que dos indivíduos emanam idéias e as especificidades do ser social dos grupos que as
necessidades que determinam a formação social e constroem. Considerar que as representações são
2) nas sociedades, há apenas consciências sociovariáveis significa reconhecer que a sociedade,
individuais. Se tais pressupostos fossem corretos em seu conjunto, não possui uma moral única ou,
— argumenta o autor —, a Sociologia não teria mesmo, formas homogêneas de pensar, agir e sentir.
contribuições teóricas relevantes a dar, pois estaria Por isso, é comum que se constituam
representações diversas de um mesmo objeto, em Para Leite (2002, p. 134), “[...] o fato de os conteúdos
função de diferenças existentes entre vários das representações sociais trazerem em si atributos
segmentos da sociedade e, em alguns casos, para do sujeito é de suma importância. Demonstra, com
responder às demandas dos grupos por toda nitidez, que elas não são meros reflexos
diferenciação. Isso parece-nos tanto mais relevante passivos do exterior na mente desse sujeito.”
quando estamos em presença de relações Isso ocorre porque, quando os sujeitos
interétnicas: não é difícil entender por que os grupos constroem representações de aspectos da realidade
sociais aí em contato elaboram, em referência aos em que vivem, fazem-no a partir de seu ser social,
mesmos objetos, representações diferentes entre dos paradigmas prévios que trazem consigo: a
si.10 posição que ocupam na sociedade, seus valores
É fato que, na formulação original da teoria culturais e ideológicos, suas histórias de vida, seus
fundada por Moscovici, as representações sociais conhecimentos anteriores sobre diferentes facetas
são os saberes próprios do senso comum das da vida em sociedade, seus afetos em relação aos
sociedades contemporâneas, as quais são diversos elementos da realidade etc. Na verdade,
fortemente marcadas pela fluidez; pela acentuada as representações sociais respondem à
presença dos meios de comunicação de massa; pela necessidade que temos de transformar o estranho
apropriação e reelaboração, no âmbito do senso (aquilo que é novo para nós) em familiar (SÁ, 1995;
comum, de objetos formulados primeiramente no MOSCOVICI, 1978; LEITE, 2002) — transformação
mundo acadêmico; pela ampla diversidade de que se faz mediante uma atividade cognitiva que
ambientes sociais (MOSCOVICI, apud SÁ, 1995, p. integra aquilo que será representado a uma rede de
22; Leite, 2002, p. 127). Mas, como bem o significados preexistentes (LEITE, 2002).
demonstrou Arruda (2002a, p. 41 e 44), “O estudo Por outro lado, a Teoria das Representações
das representações [sociais] [...] mostrou aplicar- Sociais possibilita entender “o pensamento social
se para além das sociedades complexas [...]”, pois em sua dinâmica e diversidade” (ARRUDA, 2002b).
os “mecanismos de elaboração e organização” desse Para dar conta dessa diversidade, são apontados
tipo de saber “não caracterizam somente o dois tipos de universos de pensamento coexistentes
pensamento das sociedades ditas complexas, nas sociedades contemporâneas: os universos
atuais.” consensuais e os universos reificados (SÁ, 1995,
Mora (2002), por sua vez, levanta pontos p. 28). Segundo Arruda (2002b), os primeiros
importantes para compreender as representações constituem-se nas conversas informais, nas quais
sociais especialmente em contextos interculturais. as opiniões, palpites e impressões são
Afirma que elas atendem a demandas como: manifestadas pelos curiosos e “amadores”, com
compreender acontecimentos complexos e cumplicidade e igualdade, como se todos tivessem
dolorosos; justificar ações cometidas contra outros a mesma competência. Já os universos reificados
grupos; reafirmar diferenças quando elas parecem fazem-se presentes no campo da ciência, no mundo
ter sido esquecidas. acadêmico. Aqui, o diálogo desenvolve-se segundo
Afirmamos, há pouco, que a teoria fundada por uma hierarquia marcada pela primazia do expert em
Moscovici volta sua atenção para o senso comum, determinada área do conhecimento. Ainda de acordo
um tipo de conhecimento usualmente desqualificado com Arruda (2002b), as representações sociais
ou, pelo menos, pouco valorizado por certos constroem-se mais amiúde nos universos
segmentos da academia. Estudar essa modalidade consensuais, embora os dois universos não sejam
de saber permite compreender formas alternativas estanques e separados, sobretudo se
de conhecimento, contrárias àquela/diversa daquela considerarmos as sociedades contemporâneas, nas
que o pensamento ocidental desenvolveu na esteira quais, como já afirmamos, é comum que objetos
do racionalismo cartesiano, profundamente marcada originalmente próprios do saber científico passem a
por dicotomias como: sujeito/objeto, indivíduo/ ser representados — e remodelados — no âmbito
sociedade, natureza/cultura etc. Ademais, o uso da do senso comum.
Teoria das Representações Sociais possibilita Julgamos pertinente acrescentar que, em casos
entender a própria medicina ocidental como objeto específicos, podem-se formar, no interior dos
de representação, embora isso seja dificultado por universos reificados, universos consensuais, que
uma tendência à naturalização e à produção do seu darão origem a representações sociais balizadas
discurso como uma verdade tida, amiúde, como na visão de mundo construída, em parte, nos
inquestionável. próprios espaços científicos. É o caso das
Quanto ao par indivíduo/sociedade, Moscovici representações sociais próprias de alguns
refuta a primazia da sociedade sobre o indivíduo no profissionais da saúde, nas quais a incidência de
processo de construção do conhecimento, atribuindo certas patologias que acometem os índios é
ao segundo um papel ativo. A explicação, nesse associada ao modo de vida destes, tido como
caso, não se vai apoiar num ou noutro polo, mas na propagador de doenças. O mesmo ocorreu entre os
tensão entre ambos, pois uma representação social médicos higienistas que problematizaram a favela
expressa características tanto do objeto a que ela pouco depois da Proclamação da República,
se refere como, também, do sujeito que representa. originando uma leitura que, balizada na
(BERTOLANI, 2005). Isso mostra que, nas com a alteridade. Essa relação funda-se numa visão
representações Guaranis, a medicina ocidental é etnocêntrica — determinada a priori pela cultura na
eficaz no combate aos sintomas, permanecendo as qual o observador se insere — que busca definir os
causas, a serem curadas pelos meios fornecidos modos de pensar, agir e sentir do outro a partir do
pela própria cultura do índio. São frequentes, em suas que Sarti (2005, p. 36) denomina “pressuposto da
reclamações, relatos de ocasiões em que, ao levarem falta”. Nessa linha, os sistemas políticos das
os filhos ao médico, este não consegue identificar o sociedades indígenas foram definidos a partir da
problema e, já de volta para casa, as crianças, à ausência do Estado; as sociedades indígenas,
noite, continuam se queixando por causa dos entendidas como sem história, pela falta de escrita;
espíritos do mal — e, então, “só quem cura é o os sistemas econômicos dos índios, tidos como
xamã”. inexistentes, pela falta de excedente; e os saberes
Por sua vez, as representações do sistema de indígenas, caracterizados pela suposta ausência de
saúde e da cultura indígenas construídas pelos pensamento lógico.
profissionais de saúde também estruturam-se Mesmo após Lévi-Strauss (2002) ter demonstrado
segundo contextos históricos de curto e longo que o pensamento indígena é dirigido por uma lógica
alcance, e podem derivar tanto dos universos tão complexa quanto a que serve de orientação para
consensuais (campo dos “curiosos”, dos “amadores”) a ciência ocidental moderna — e depois de o
quanto dos universos reificados (campo dos evolucionismo ter perdido, há muito, a condição de
especialistas). Tomando como exemplo o caso dos paradigma hegemônico na Antropologia —, ainda
Guaranis, no Espírito Santo, cremos não ser persiste o entendimento dos sistemas de cura
precipitado inferir que as representações sociais do indígenas como resquícios de um pensamento
sistema de saúde e da cultura indígenas presentes mágico e anterior ao desenvolvimento da
entre tais profissionais podem ser ancoradas, quer racionalidade científica. É assim que ganha destaque
em estereótipos disseminados durante mais de o já mencionado “pressuposto da falta”, o realce da
quinhentos anos de contato, quer em concepções negatividade: destaca-se aquilo que os índios não
ideológicas mais recentes, como aquela que pensam, não sentem e não fazem, e perde-se a
estabelece sumariamente que os índios perderam a possibilidade de entender as nuanças que definem
sua cultura — ou seja, já não seriam mais índios — a sua positividade concreta,14 ou seja, os modos
, o que é propagado sem qualquer ingenuidade pela pelos quais os índios efetivamente pensam, sentem
Empresa Aracruz Celulose, em função de seu e fazem.
interesse nas terras indígenas (BERTOLANI, 2008). Na base desse modo de pensar os índios,
No campo das políticas de saúde indígena, é marcado por “imagens em negativo”, fazem-se
consenso entre os autores que a falta de preparo presentes características do sujeito que os
dos profissionais para atuar em contextos que representa: enfatizar a falta expressa um modo de
envolvem relações interculturais constitui um dos olhar “o outro” que tem como ponto de partida
principais entraves para que se efetive um características do próprio “eu”/”nós”. Temos, aqui, o
atendimento específico à saúde do índio.11 O processo que, na Teoria das Representações Sociais,
despreparo dos profissionais para lidar com a é chamado focalização: por meio dele, “[...] cada
alteridade12 apresenta reflexos imediatos em sua indivíduo ou grupo dá maior ou menor atenção a tal
relação com os índios e pode ser observado, entre ou qual aspecto de um objeto segundo sua distância,
os Guaranis, mediante comentários sobre atitudes seu envolvimento com ele”; recorta-o, dando “relevo
discriminatórias, só igualadas em situações de aos pontos que estão em conformidade com suas
etnocídio.13 preocupações.” (ARRUDA, 1995, p. 249).
Os problemas ligados à qualificação dos Pode-se mesmo dizer que, para compreender
profissionais têm influência direta sobre a organização relações como aquelas que estamos tratando, cabe
dos serviços de saúde. Sua formação, balizada em o conceito de alteridade radical, usado por Jodelet
procedimentos de intervenção — que, em muitos (2002)15 para tratar de relações perpassadas por
casos, implicam mudança de comportamento —, práticas como diversas formas de violência, desprezo,
dificulta o diálogo entre a medicina ocidental e o intolerância, humilhação e exclusão, e que
sistema de saúde indígena, bem como a expressam uma hierarquização em termos de valor
compreensão, pelos profissionais, da importância da físico e simbólico.
participação dos índios na atenção à saúde. O É imperativo que os profissionais que atuam no
desconhecimento das concepções indígenas de campo da proteção social aqui abordado,
saúde e doença que interferem no modelo de compreendam que, para os indígenas, a saúde não
assistência já preconizado inviabiliza a adaptação é um domínio separado das outras esferas sociais:
desse modelo e prejudica a organização dos serviços não é possível compreendê-la como algo exterior à
de saúde (ATHIAS; MACHADO, 2001). economia, à política, à cosmologia e às questões
Atitudes discriminatórias, ao lado do relacionadas ao ambiente. Entre os índios, a saúde,
desconhecimento das representações indígenas de como qualquer outro campo da vida social, deve ser
saúde e doença, são balizadas numa forma compreendida como um fato social total (MAUSS,
específica que a sociedade ocidental tem de lidar 1974), como um fenômeno que engloba aspectos
A relevância das representações sociais no _____. Teoria das Representações Sociais e Teoria
campo da proteção social aqui abordado, baliza-se de Gênero. Cadernos de Pesquisa, Rio de Janeiro,
nos seguintes eixos: 1o) as representações sociais Universidade Federal do Rio de Janeiro, n. 117, p.
são uma “preparação para a ação” e, portanto, afetam 127-147, nov. 2002b.
o modelo de prestação de serviços de saúde às
populações indígenas; 2o) considerando que o ATHIAS, Renato; MACHADO, Marina. A saúde
contexto em que são construídas tais representações indígena no processo de implantação dos Distritos
é marcado por relações interétnicas, estas podem Sanitários: temas críticos e propostas para um
refletir a demanda dos índios de reafirmar as diálogo interdisciplinar. Cadernos de Saúde
fronteiras que demarcam os limites do contato com Pública, Rio de Janeiro, Escola Nacional de Saúde
a sociedade envolvente; 3o) os modos pelos quais Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, v.
os índios representam a medicina ocidental, refletem 17, n. 2, p. 425-431, mar/abr. 2001.
um processo de familiarização que busca
estabelecer a conexão entre as práticas da BERTOLANI, Marlon Neves. Ambiente, saúde e
biomedicina e o sistema cultural do próprio grupo; desenvolvimento entre os Guarani no Espírito
4o) o elevado grau em que os profissionais de saúde Santo. 2005. Monografia (Graduação em Ciências
desconhecem as representações indígenas, em Sociais). Centro de Ciências Humanas e Naturais.
conjunto com suas próprias representações da Universidade Federal do Espírito Santo.
cultura e da saúde indígenas e com o modo pelo
qual entendem que os índios representam a saúde ______. Representações sociais da saúde e
— tudo isso pode produzir ou fomentar tensões políticas de saúde voltadas a populações
prejudiciais à eficácia dos serviços prestados. indígenas: uma análise da relação entre o sistema
Considerando-se que, “ao falarmos em políticas de saúde Guarani e a biomedicina. 2008. Dissertação
sociais, tratamos de ações fundamentadas em (Mestrado em Política Social) — Centro de Ciências
escolhas baseadas nos valores assumidos, de forma Jurídicas e Econômicas. Universidade Federal do
explícita ou implícita, por quem trabalha nessa área, Espírito Santo.
seja na formulação de tais políticas, seja em sua
execução” (LEITE, 2008, p. 80-81) —, entendemos BRASIL. Decreto no 5.051, de 19 de abril de 2004.
que o uso da Teoria das Representações Sociais Promulga a Convenção no 169 da Organização
não apenas afigura-se como importante facilitador Internacional do Trabalho – OIT sobre Povos
das relações que envolvem profissionais de saúde e Indígenas e Tribais. Disponível em: http://
indígenas. Aquele uso é, também, de grande ccr6:pgr.mpf.gov.br. Acesso em: 20 de jan. de 2007.
relevância para a permanente avaliação dos serviços
de saúde prestados às populações indígenas, bem CICCARONE, Celeste. Drama e sensibilidade:
como para fornecer indicadores que poderão ser
migração, xamanismo e mulheres Guarani-mbya.
utilizados na (re)formulação e no aprimoramento de
2001. Tese (Doutorado em Antropologia) — Pontifícia
projetos destinados a responder às demandas
Universidade Católica de São Paulo.
daquelas populações, engajadas na luta pelo direito
à cidadania e pelo respeito à diferença.
COELHO, Elizabeth Maria Beserra. Saúde
Por fim, cabe lembrar que as representações
indigenista no Brasil: mobilização e participação
sociais orientam ações e, são marcadas pela
indígena. Brasil. [s.d.]. Disponível em: http://
dinâmica, o que faz com que seu estudo possa
www.alasru.org/cdalasru2006/
contribuir, de modo considerável, para a construção
25%20GT%20Elizabeth%20Coelho.pdf. Acesso em:
de relações balizadas no reconhecimento da
20 de jan. 2007.
diferença e na compreensão mútua.
VALLADARES, Lícia. A gênese da favela carioca: a 7 A expressão “controle social” consta da Constituição
produção anterior às Ciências Sociais. Revista Federal de 1988 e diz respeito à participação
Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 15, organizada da sociedade civil na fiscalização das
ações do Estado no campo das políticas sociais.
n. 44, p. 5-34, set. 2000. Refere-se, também, à participação da sociedade civil
na formulação e na implementação dessas políticas
VÉRAS, Maura Pardini Bicudo. Por uma (RAICHELIS, 1998), o que, em princípio, contribui
Sociologia da alteridade: estranhos e estrangeiros para o aprofundamento da cidadania.
em São Paulo. In: BERNARDO, Teresinha; TÓTORA,
8 A PNASPI estabelece: “A formação e a capacitação
Silvana (Orgs.). Ciências Sociais na atualidade: de indígenas como agentes de saúde é uma
percursos e desafios. São Paulo: Cortez, 2004. p. estratégia que visa favorecer a apropriação, pelos
153-172. povos indígenas, de conhecimentos e recursos
técnicos da medicina ocidental, não de modo a
substituir, mas de somar ao acervo de terapias e
NOTAS outras práticas culturais próprias, tradicionais ou
não.” (FUNASA, 2002, p. 15)
1 Trabalhamos aqui com o conceito de representação 9 Alguns autores que avaliam a Política Nacional de
social tal como se faz presente na teoria cuja Saúde Indígena a partir da variável “cultura” (CRUZ,
formulação original coube a Moscovici (1978). É 2003; COELHO, 2006) têm apontado a existência
adequada para nossos propósitos a caracterização de uma contradição presente na política indigenista
de representação social apresentada por Jodelet brasileira, qual seja: reconhecer as especificidades
(2001, p. 22): “[...] é uma forma de conhecimento, culturais dos índios no bojo da elaboração de uma
socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos
prático, e que contribui para a construção de uma Indígenas, mas, ao mesmo tempo, balizá-la a partir
realidade comum a um conjunto social. Igualmente dos mesmos princípios estabelecidos pela Política
designada como saber do senso comum ou ainda Nacional de Saúde. Isso comprova que houve uma
saber ingênuo, natural, esta forma conhecimento é sobreposição de modelos, realizada sem que as
diferenciada, entre outras, do conhecimento questões relativas às especificidades étnico-
científico.” culturais dos povos indígenas fossem pensadas de
antemão.