Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
Adriana Regen
São Paulo
2007
ADRIANA REGEN
São Paulo
2007
II
Regen, Adriana
R333a Alta-costura e cinema: o papel da estrela no roteiro
da moda. – São Paulo, 2007.
116 f. : il. color.
CDD 391
III
ADRIANA REGEN
IV
Sumário
Agradecimentos.....................................................................................................VI
Resumo................................................................................................................VIII
Abstract...................................................................................................................IX
Introdução................................................................................................................1
1.2 A Estrela-Deusa................................................................................12
1.4 A Estrela-Mercadoria........................................................................22
Filmografia............................................................................................................110
Agradecimentos
Tenho absoluta convicção de que este projeto não teria se concretizado sem
que acreditou que eu seria capaz de empreender este projeto antes mesmo que
Bayer Regen e Mina Regen, que não mediram esforços ou palavras de confiança
em todo este longo processo. Aos meus queridos irmãos, Artur, pela paciência e
ajuda com o inglês, e Renata, por ter mandado livros aos quais eu não teria acesso
Obrigada à minha amiga Ruth Rebelo, excelente revisora, por ter tido paciência
E ao meu amigo Moacir Samea, pela bonita diagramação que transformou páginas
Agradeço ao meu tio Dr. Aron Diament pelo olho clínico que não deixou
escapar qualquer erro na leitura atenciosa que fez desta pesquisa desde o
primeiro capítulo, além dos elogios que foram muito importantes para que eu
seguisse em frente.
Obrigada à amiga Samia Rios, por ter se disposto a uma última leitura
À minha querida prima, Profª. Dra. Iris Kantor, que durante sua pesquisa
desta jornada, sempre com palavras de incentivo que não me deixavam desanimar,
dúvidas. Agradeço a sorte de tê-la tido como orientadora e retribuo todo o carinho e
por ela criticadas, mas que a porção “fã” desta pesquisadora não pôde eliminar,
que me deu suporte durante a estadia de seis meses de Maria Lucia em Paris, e
que manteve seu apoio e incentivo durante todo o processo desta pesquisa.
Lucia de Castro, Denise Bernuzzi Sant’Anna e Eliane Robert Moraes, pelas excelentes
aulas que tanto acrescentaram à minha pesquisa e pela leitura atenciosa dos textos
produzidos para suas disciplinas, que foram compondo aos poucos este projeto maior,
sem perda de tempo com assuntos que fugissem aos meus interesses.
Não posso esquecer a atenção e dedicação da Juliana e da Tissyana, nossos
Agradeço a CAPES pela bolsa concedida nos últimos seis meses, um alívio
pelo incentivo, apoio, força, dedicação, amor e, principalmente, pela paciência que
teve comigo durante esses dois anos e meio, desculpando os maus humores e as
ausências sem nunca negar uma palavra de carinho. Obrigada, meu amor.
VII
Resumo da Dissertação
Hubert de Givenchy será usada como estudo de caso, exemplificando a relação entre
moda, cinema e os novos estilos de vida a partir da segunda metade do século XX.
VIII
Abstract
studios and the French haute couture, focusing on the post-war period. The objective
is to investigate the star system and the role of costume designers and French
influenced and spread the new lifestyles and social-economics changes of the period.
The present study intends to show the parallel course of both the French
haute couture and the Hollywood movie production system in the 20th Century, from
their peak in the 1920s and 1930s until their decline and overall restructuring in the
1950s and 1960s. In order to overcome the crisis, the fashion and movie industries
the fashion designer Hubert de Givenchy will be used here as a case study,
exemplifying the relationship between fashion, the movie industry and the new
IX
Introdução
Sou uma profissional da área de moda há mais de vinte anos, mas a minha
ligação com o cinema é anterior, talvez herança genética de uma família de assíduos
anos, desde que comecei a estudar história da moda e vê-la através dos filmes de
estilos de vida das populações ao longo do tempo. Tanto a moda quanto o cinema
anos 1900. Pode-se estabelecer um paralelo entre os dois processos, já que ambos
tiveram seu auge nas décadas de 1920 e 1930, uma retração durante a Segunda
Guerra Mundial, que prejudicou mais a alta costura, e um último fôlego nos anos
Além da trajetória paralela, moda e cinema firmaram uma parceria que foi
usavam a roupa da alta costura para enfatizar seu glamour, dentro e fora das
platéias ao mesmo tempo que davam a conhecer os nomes dos criadores. Estes,
BRUZZY, Stella, Undressing cinema – clothing and identity in the movies. London/New York:
Routledge, 1997, p. 3.
Nas primeiras décadas do século XX o público de cinema era formado, em
sua maioria, pela camada mais pobre da população. Era um entretenimento barato
nas cidades. No primeiro capítulo demonstro que, ao longo dos anos, tanto a
moda e beleza, não somente através de suas personagens nos filmes, mas,
vão se modificando a partir dos anos 1930, chegando mais perto do público
O sociólogo Edgar Morin, cujo livro As estrelas de cinema foi uma importante
fonte para esta pesquisa, chama esse período de “crepúsculo do star system”.
Thomas Schatz, autor que relata os meandros e políticas dos grandes estúdios de
esboçar na década de 1950. A udrey foi uma mulher fora dos padrões instituídos
faziam sucesso naquele período. Além disso, ela estabeleceu uma parceria
SCHATZ, Thomas, O gênio do sistema. São Paulo: Companhia das letras, 1988, p. 480.
“Após tantas garçonetes de drive-in tornando-
se estrelas...enfim, a classe. Nesta categoria só
ouve Greta Garbo, a outra Hepburn, e talvez Ingrid
Bergman. É uma rara qualidade, mas meu amigo, você
a reconhece quando encontra.”
proposta por ele, em sintonia com a imagem de mulher moderna que ela
começa a perder seu público. A fragmentação dos estilos de vida na nova sociedade
como grupo social específico, resulta numa abertura de mercado para atender
oferta de produtos para todos os gostos, como explica a socióloga Diana Crane.
Surge o prêt-à-porter, com roupas práticas de boa qualidade, que atendem clientelas
das classes alta e média. A mulher moderna, com sua vida movimentada, não quer
Comentário do diretor William Wyler sobre Audrey Hepburn. In: DUNCAN, Paul; FEENEY, F.X.,
A. Hepburn. Koln: Taschen, 2006, p. 48.
CRANE, Diana. A moda e seu papel social: classe, gênero e identidade nas roupas. São Paulo:
Senac, 2006..
“Os modernos dos anos 1960 têm uma nova
concepção de ‘distinção’, deixando de considerar
o chique sofisticado, valorizando uma elegância
modernizada e sem rigidez” .
de moda, e novos estilistas para supri-las. Londres surge como pólo de tendências,
e para grupos sociais distintos, destina-se aos mais jovens, de várias camadas e
VINCENT-RICARD, Françoise, As espirais da moda. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989, p. 67.
Capítulo 1
Foi inicialmente nos Estados Unidos que esta nova arte se profissionalizou,
Thalberg, que trabalhou na Universal no início dos anos 1920, passando depois
contratados dos estúdios, assim como diretores e roteiristas. Irving Thalberg instituiu
tempo de filmagem, assim como com a quantidade de filme gasto pelo diretor.
libertar dos personagens, passando a ser identificados por seus nomes próprios
cowboy, apareceu pela primeira vez no filme The great train robbery, de 1907,
do estrelato, quando o nome do ator torna-se tão forte que passa a ser o principal
o rosto feminino cada vez mais próximo, cultuando a estrela na pele da heroína
Numa versão leve, a audiência está interessada no filme ou é atraída por uma
BUENO, Maria Lucia, Artes plásticas no século XX: Modernidade e globalização. Campinas:
Editora da Unicamp, 1999, p. 105.
Projeção: “operação pela qual o sujeito expulsa de si e localiza no outro – pessoa ou coisa
– qualidades, sentimentos, desejos e mesmo ‘objetos’ que ele desconhece ou recusa nele”.
Identificação: “processo psicológico pelo qual um sujeito assimila um aspecto, uma propriedade,
um atributo do outro e se transforma, total ou parcialmente, segundo o modelo desse outro”.
LAPLANCHE E PONTALIS, Vocabulário da Psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
10 MORIN, Edgar, As estrelas de cinema. Op cit, p. 20.
11 WALKER, Alexander, The celluloid sacrifice. London: Michael Joseph, 1966.
vida da estrela, não se limitando somente
12 TUDOR, Andrew, Image and influence. London: Allen & Union, 1968, p. 80.
13 MORIN, Edgar, As estrelas de cinema. Op cit, p. 20.
14 Theodor Adorno foi um filósofo da escola de Frankfurt que realizou pesquisas sobre a cultura de
massa nos Estados Unidos nos anos 1930, e cunhou o termo “indústria cultural” nos anos 1940.
10
as atrizes e atores escolhidos por estes profissionais eram tipos ideais da nova
na cena seguinte ela já aparece com um belo vestido de festa. A pessoa comum
se vê na atriz que chegou lá, porque pensa que também poderia chegar, mas ao
prontamente desmentida.15
Edgar Morin descreve o processo de fabricação de uma estrela a partir de
jovem vai para Hollywood, tem sua imagem transformada pelas mãos de vários
a andar, cantar, dançar e falar sem sotaque. Faz testes de gravação e consegue
um papel secundário. É posta sob contrato, o que significa que o estúdio passa
cartas dos fãs for significativo, o escritório de publicidade começa a fabricar notícias
a seu respeito, até mesmo um romance com um ator famoso, publicadas nas
como atriz principal de uma grande produção e, a partir da reação do público, pode
tornar-se uma estrela. Os publicitários dos estúdios trabalham para perpetuar seu
sucedida, uma vez que era impossível exercer um controle total sobre o gosto
15 ADORNO, Theodor W. Indústria cultural e sociedade. São Paulo: Paz e Terra, 2002, p. 45.
16 MORIN, Edgar. As estrelas de cinema. Op cit, p. 44.
17 DYER, Richard. Stars. London, BFI Publishing, 1986, p. 13.
11
elemento vital da economia de Hollywood, uma garantia de lucro, mesmo que o
O especialista em cinema Richard Dyer, em seu livro Stars, cita uma frase
famosa de um dos principais produtores da época áurea de Hollywood, Samuel
Goldwin: “Deus faz as estrelas. Cabe aos produtores encontrá-las”. Atores podem
tornar-se estrelas por seu talento, mas este não é um requisito fundamental,
1.2 A Estrela-Deusa
A estrela confere glamour ao
inatingível da estrela.
pelo cinema, assim como a falsa construção da personalidade da atriz. Para ele,
podre de seu valor mercantil”.21 Ele não está criticando o fato de o filme ser uma
reprodução, pois reconhece que o cinema é uma arte que depende do número de
20 MASSEY, Anne, Hollywood beyond the screen. Oxford-New York: Berg, 2000.
21 BENJAMIM, Walter, “A obra de arte na época da sua reprodutibilidade técnica”, In: LIMA, Luiz
Costa (org.), Teoria da cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2000, p. 221.
22 BARTHES, Roland, “O rosto de Garbo”, In: Mitologias. São Paulo: Difel, 1982, p. 47.
13
Diversos autores, como Edgar Morin,
fãs no mundo todo. Nos primeiros anos do cinema os atores traziam suas próprias
a Paramount, e este, por sua vez, foi o primeiro diretor a dar importância ao
figurino. Ele disse a Howard Greer, que substituiu Claire West em 1924: “quero
roupas que façam as pessoas ficarem ofegantes quando a vêem. Não quero que
qualquer um possa comprá-las numa loja”.26 Howard Greer contratou Edith Head
como sua assistente em 1925. Futura ganhadora de muitos Oscars, a partir dos
23 COSTA, Antonio, Compreender o cinema. Rio de Janeiro: Editora Globo, 1987, p. 67.
24 CHIERICHETTI, David, Edith Head – the life and times of celebrated costume designer. New
York: Harper Collins, 2003, p. 13.
25 Intolerância, D.W.Griffith, EUA, 1916.
26 CHIERICHETTI, David. Edith Head – the life and times of celebrated costume designer. Op cit, p.14
27 MASSEY, Anne. Hollywood beyond the screen. Op cit, p. 29.
15
Mudanças na moda poderiam arruinar
muito baixos. Juntamente com o rádio, que também viu suas vendas aumentarem,
com a adesão da nova classe média às salas de exibição. O cinema falado, iniciado
em 1927 com o The jazz singer30, assim como os primeiros filmes coloridos a partir
28 BRUZZY, Stella, Undressing cinema – clothing and identity in the movies. Op cit, p. 4.
29 MASSEY, Anne. Op cit, p. 77.
30 O cantor de jazz, Alan Crosland, EUA, 1927.
16
de 1932 ajudaram a atrair um público cada
com a platéia. O espectador passa a viver a vida intensa e amorosa dos seus ídolos,
sua liberdade de movimento, suas paixões e seu lazer. O estilo de vida da estrela
31 BUENO, Maria Lucia, Artes plásticas no século XX: Modernidade e globalização. Op cit, p. 82.
32 HAYE, Amy. Chanel: The couturiere at work. Londres: The Victoria & Albert Museum, 1995.
33 MORIN, Edgar, As estrelas de cinema. Op cit, p. 71.
17
“A estrela tornou-se efetivamente familiar (no
duplo sentido do termo). Antes de 1930 ignorava
o casamento burguês e só se ligava a estrelas da
mesma categoria. Posteriormente, pôde, sem se
rebaixar, desposar atores secundários, industriais,
médicos. Já não habita o castelo semifeudal ou o
templo pseudogrego, mas o apartamento ou a vila, ou
mesmo o rancho. Exibe com toda simplicidade uma
vida de interior burguês: põe um avental desbotado,
acende o fogão, prepara ovos com presunto. Antes
de 1930, a estrela não podia engravidar, depois de
1930 pode ser mãe, e mãe exemplar”.34
primeiras décadas eram basicamente épicos (Ben Hur36, The birth of a nation37),
comédias (com Charlie Chaplin, o “gordo” Roscoe Arbuckle, Harold Lloyd e Buster
classes trabalhadoras. Com o intuito de atrair um público cada vez mais amplo e de
filmes, caso de Awful truth43, de 1937, com Irene Dunne e Cary Grant, onde eles
appeal, e ao mesmo tempo pode ser uma boa amiga. Em A Star is born45, Janet
interior que vai para Hollywood tentar ser atriz. Determinada, casa-se por amor
com um ator famoso e decadente. Em nome do amor, hesita entre a carreira que
nos enredos dos filmes, que tentam espelhar o estilo de vida do público, ou ao
o good-bad-boy (o bom-mau-menino, em
decência e dão bons exemplos ao público. O Código Hayes foi instituído em 1933
provinciana do país.53
mesmo sexo, mostrando que a relação do espectador com a estrela não ocorre
possui seus deuses, astros e estrelas, e seus diabos, os vilões. Oferece aventuras
para vidas sem aventura e consolo para tudo o que falta no cotidiano do público. A
temas agressivos ou aventureiros, que não podem ser realizados de fato, projetam-
O herói na tela não está sujeito à lei dos homens. Pode matar sem que seja preso
ou fazer justiça com as próprias mãos, como no western, por exemplo. É capaz
de liberar seus instintos mais violentos, seus medos e angústias sem reprimi-
los, ao contrário dos mortais na vida real. Consegue conquistar a mocinha mais
estão felizes com a sua vida de risco e aventura, ou atingem todos os seus
objetivos no happy end, que une o sonho pessoal com o encontro de um grande
1.4 A Estrela-Mercadoria
As transformações quantitativas na vida urbana que ocorreram nas
Quando a luta pela sobrevivência se atenua, abre-se espaço para novos valores
o que facilitou a identificação do público com a nova arte. Por meio desta
58 SIMMEL, Georg. “La mode”, In: La Tragédie de la culture, Paris: Editions Rivales, 1988. p. 89.
59 MORIN, Edgar, Cultura de massas no século XX. Op cit, p. 35-43.
23
Esta capacidade de transformar os enredos em fórmulas padronizadas e
culta e erudita, que chegaram na década de 1930 aos EUA fugindo do nazismo,
em roteiros que “imitam” a vida, mas são carregados de lições de moral, onde quem
é bom acaba bem e quem é mau tem a morte ou o castigo que merece.60
Para a psicanalista Maria Rita Kehl, a produção cinematográfica norte-
o exemplo do western para enfatizar que este herói solitário está sempre de
passagem, vindo não se sabe de onde, e indo embora no final, a cavalo, o que
também uns dos outros, experimentam a ilusão de espionar um mundo que não é o seu.
O olhar escopofílico, que implica no prazer de observar e ser observado, dirigido pelo
das suas fantasias. Ao mesmo tempo, seu olhar em relação ao protagonista masculino
do filme é narcisista, de identificação, já que é através desse herói que o espectador vai
realizar suas fantasias de dominar a mulher, o espaço, a história e a vida. Nos enredos
seus enredos o mito da construção da América. Além disso, desejou ter uma
roupas, vida e conforto.65 Erwin Panofsky, outro crítico da indústria cultural, sintetiza
essa idéia ao afirmar que “os filmes é que moldam, mais do que qualquer outra
mesmo a aparência física de um público que abrange mais de sessenta por cento
63 MULVEY, Laura, “Prazer visual e cinema narrativo”. In: XAVIER, Ismail (Org.), A experiência
cinematográfica. São Paulo: Graal, 2003. p. 437.
64 KEHL, Maria Rita. Op cit, p.107.
65 MASSEY, Anne. Op cit, p. 35.
66 PANOFSKY, Erwin, “Estilo e meio no filme”, 1947. In: LIMA, Luiz Costa (Org.), Teoria da cultura
de massa. Op cit, p. 346.
67 GREEMBERG, Clement, “Avant-garde et kitsch”. In: LES CAHIERS du Musée National d’Art
Moderne, nº 19-20, junho, 1987.
25
Hollywood e seus filmes constituíram
que Adrian desenhou para Joan Crawford em Letty Linton70, e o estilo New Look
usado por Elizabeth Taylor em A place in the sun71, desenhado por Edith Head.72
68 BREWARD, Christopher, Fashion. Oxford/New York: Oxford University Press, 2003, p. 132.
69 WILSON, Elizabeth, Enfeitada de sonhos. Lisboa: Edições 70, 1989, p. 171.
70 Redimida, Leo McCarey, EUA, 1931.
71 Um lugar ao sol, George Stevens, EUA, 1951.
72 BRUZZY, Stella. Undressing cinema – Clothing and identity in the movies. Op cit, p. 4..
26
Tal estratégia fez crescer a carreira de diretores de filmes femininos, das próprias
individual. Ele observa que o consumo de luxo pode ser uma busca por distinção,
Apesar de ter mantido uma boa audiência durante a Segunda Guerra Mundial,
indústria cultural. Otto Friedrich, que dissecou a Hollywood dos anos 1940 em seu
em casa e passaram a fazer parte da vida do público. Edgar Morin refere-se a elas
como “estrelas-mercadoria”, pois têm suas vidas fabricadas pelo star system para
serem consumidas pelo público. “A estrela é uma mercadoria total: não existe um
76 FRIEDRICH, Otto, A cidade das redes: Hollywood nos anos 40. São Paulo: Companhia das
Letras, 1988, p. 340.
77 MORIN, Edgar, As estrelas de cinema. Op cit, p. 80.
28
público, o star system se encarregava
de “fabricar” outra.
Em Poeira de estrelas79,
as propagandas, as músicas e a
Cartaz do filme
Niagara com crítica. Essa rede de comunicação de
Marilyn Monroe.
massa aproximava a estrela do seu
difusão mundial do ideal democrático americano. Por seu caráter universal, o cinema
americano acabou impondo sua estética e seus valores para todo o planeta.
consumidores. Eles são divididos conforme idade, gênero, educação, renda, além
dos hábitos, interesses e gostos. Mulheres jovens, por exemplo, tendem a ser mais
seria a mais apta a conferir valor e eleger os itens de bom gosto, sendo seguida
uma profusão de gostos numa mesma classe social, além de grande mobilidade
A socióloga Diana Crane, em seu livro A moda e seu papel social, cita
bens culturais, tais como música, cinema e moda, é um indicador mais eficiente
80 BOURDIEU, Pierre, “A Metamorfose dos gostos”. In: Questões de sociologia. Rio de Janeiro:
Marco Zero, 1983, p.131.
30
muitas subdivisões dentro de uma mesma classe social, além de um certo grau
produtos são usados para expressar um autoconceito, são signos do “eu” que o
produto até tê-lo à sua disposição para ser consumido. O desejo de ter é despertado,
entre outras coisas, pela necessidade de pertencer ao grupo e firmar uma identidade
social. O que move a indústria de produtos de massa até hoje, inclusive culturais,
é um movimento dialético criado por essa mesma indústria, visando seu próprio
de sua difusão maciça, que estes se tornem imprescindíveis para a felicidade dos
81 CRANE, Diana. A moda e seu papel social: classe, gênero e identidade nas roupas. Op cit, p. 35.
82 MIRANDA, Ana Paula Celso de, “Mitos femininos do cinema: uma tipologia de consumidoras de
moda”. In: Fashion Theory nº 1, Edição brasileira, março, 2002.
83 BREWARD, Christopher. Op cit, p. 117.
31
manteve uma audiência elevada e internacional. Nos anos que se seguiram, porém,
a situação política nos Estados Unidos deflagrou uma perseguição intensa aos
o mundo após a guerra e nos Estados Unidos este período ter sido de grande
oferecidos pela indústria cultural. Para Otto Friedrich, a caça aos comunistas pode
ser considerada, juntamente com a televisão, como um dos fatores que contribuíram
84 FRIEDRICH, Otto, A cidade das redes: Hollywood nos anos 40. Op cit, p. 340.
85 FRIEDRICH, Otto. Op cit, p. 347.
32
system em particular. O esgotamento das fórmulas dos enredos e do próprio
cuja estrela é o próprio autor, um cinema de idéias e com uma estética nova. A
Nouvelle Vague francesa foi o seu maior exemplo, mas também em Hollywood
Audrey Hepburn,
Hollywood, Cecil Beaton, responsável pelo seu figurino em My fair lady90. Numa
matéria para a revista Vogue, em 1954, o mesmo comenta: “magra de doer, de peitos
Audrey Hepburn parece uma escolha esquisita para o ‘novo ideal feminino’ da
revista Vogue”.91
De fato, alta, muito magra e quase sem busto, a imagem da atriz é a antítese
e Jane Russell, entre outras.92 O diretor de cinema Billy Wilder decretou: “Essa
menina pode tornar peitos uma coisa do passado”. O jornalista e biógrafo de estrelas
Barry Paris revela um termo usado para descrevê-la no começo de sua carreira,
89 Comentário de Cecil Beaton. In: HOWELL, Georgina, In Vogue. New York: Schocken Books,
1975, p. 216.
90 Minha adorável dama, George Cukor. EUA, 1964.
91 BEATON, CECIL, “Audrey Hepburn”. Vogue, 01 Nov 1954, New York, p.129.
92 SMITH, Kate Elizabeth, The influence of Audrey Hepburn e Hubert de Givenchy on American
fashion 1952-1965. Dissertação de Mestrado em Artes, Michigan: State University, 2001.
34
“unmarilynmonroeish”,93 cuja tradução seria
93 PARIS, Barry, Audrey Hepburn. New York: GP.Putnam’s Sons, 1996.
94 KEOGH, Pamela Clark, Audrey Style. Op cit, p. 80.
95 “Princess apparent”. New York: Time, Set 1953, p. 60.
96 A Princesa e o plebeu, William Wyler. EUA, 1953.
97 Audrey Hepburn foi indicada ao Oscar de melhor atriz mais quatro vezes: Sabrina (1954), The
nun’s story (1959), Breakfast at Tiffany’s (1961) e Wait until dark (1967).
98 KEOGH, Pamela Clark. Op cit, p. 78.
35
estruturais complexas, pequenos hábitos do cotidiano incorporam e refletem os
vida, ainda que restritos aos padrões instituídos pela indústria de Hollywood. Para
função da apropriação do termo pela publicidade. É fato que os mais ricos têm mais
refere a todas as decisões e ações dos indivíduos para o curso da vida, mesmo que
99 GIDDENS, Anthony, Modernidade e identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2002, p.79.
100 GIDDENS, Anthony, Modernidade e identidade. Op cit, p. 82.
101 GIDDENS, Anthony. Op cit, p.13.
36
nos meios de comunicação, mas também
dos papéis descartáveis e das novas fibras têxteis sintéticas.106 Menos tempo para
clamavam pela ajuda das cidadãs nos esforços de luta e vitória. No pós-guerra a
104 TAYLOR, Dabrina Anne, Fair lady, huckleberry friend: Feminity and freedom in the image of
Audrey Hepburn, 1953-1967. Tese de doutorado em filosofia. Universidade de Maryland, 1997, p.7.
105 PASSERINI, Luisa, “Mulheres, consumo e cultura de massa”. In: DUBY, George; PERROT,
Michelle, História das mulheres 5 - O Século XX. Porto: Edições Afrontamento, 1991, p. 387.
106 LEFAUCHER, Nadine, “Maternidade, Família, Estado”. In: DUBY, George; PERROT, Michelle,
História das mulheres 5 - O Século XX. Op cit, p. 492.
38
mercado, mas as coisas já não poderiam voltar atrás. Pesquisas demonstram que
É importante frisar que o trabalho feminino era comum nas classes baixas, ou
nas famílias onde o marido não conseguia suprir sozinho as despesas domésticas.
contraditória em relação a uma atividade externa, a partir dos anos 1950 inicia-se
um novo ciclo histórico com a mulher no trabalho, que vai transformar não somente
tradicional (casal com filhos), foram abalados por novas leis que legalizaram
universidades fez surgir um novo agente social independente, uma camada jovem
que desenvolveu uma cultura própria e um estilo de vida específico. Esse grupo
107 TAYLOR, Dabrina Anne, Fair lady, huckleberry friend: Feminity and freedom in the image of
Audrey Hepburn, 1953-1967. Op cit, p. 36-37.
108 LIPOVETSKY, Gilles, A terceira mulher – Permanência e revolução no feminino. São Paulo:
Companhia das Letras, 2000, p. 204.
109 HOBSBAWN, Eric, Era dos extremos – O breve século XX : 1914-1991. São Paulo: Companhia
das Letras, 1995.
39
passou a entrar em conflito com a geração de seus pais e professores, instituindo
Dabrina Anne Taylor enfatiza que a dualidade do pós-guerra nos Estados Unidos
efeitos de uma abundância sem precedentes, gerada pela cultura e pelo consumo
difusão desta imagem, que serviu como baluarte contra a ansiedade causada
Estados Unidos como o país mais poderoso do mundo. Ainda segundo Taylor,
trabalho e a liberdade.112
110 HOBSBAWN, Eric, Era dos extremos – O breve século XX : 1914-1991. Op cit, p. 318.
111 TAYLOR, Dabrina Anne. Op cit, p. 33.
112 TAYLOR, Dabrina Anne. Op cit, p. 35-40.
40
A publicidade e as revistas femininas do período incentivavam o consumo
representou para esta sociedade patriarcal. Se a idéia inicial era suprir a dona-de-
designar uma ampla produção industrial que tem por objetivo facilitar o exercício
113 LIPOVETSKY, Gilles, A terceira mulher – Permanência e revolução no feminino. Op cit, p. 228.
114 HOBSBAWN, Eric. Op cit, p. 259.
115 SANT’ANNA, Denise Bernuzzi, “Horizontes do corpo”. In: BUENO, Maria Lucia e CASTRO,
Ana Lucia de, Corpo território da cultura. São Paulo: Annablume, 2005, p. 126.
41
A democratização do consumo, da beleza e do lazer incentivada pelos
mais jovens, foram as principais responsáveis pelo extraordinário aumento nas vendas
Maria Lucia Bueno evoca Thomas Crow para explicar que, na nova cultura urbana,
o lazer está ligado ao universo do prazer, que, por sua vez, remete à diversão e à
estrelas de cinema com sorriso branco e cabelos brilhantes vendendo creme dental
e xampu anunciavam novas práticas, difundiam uma nova maneira de lidar com o
vice-versa. Ela exerceu grande influência, não somente estética, mas também de
que sua verdadeira beleza vinha de dentro.123 Uma triste história de vida ajudou a
formar a imagem popular de uma pessoa do bem, já que passou o fim da infância e
início da adolescência na Holanda ocupada pelas tropas nazistas, onde vivia com
a mãe, separada do pai. A magreza extrema foi interpretada como sinal de controle
121 GABLER, Neal, Vida, o filme. São Paulo: Companhia das Letras, 1999, p. 188.
122 GABLER, Neal, Vida, o filme. Op cit, p. 54-59.
123 TAYLOR, Dabrina Anne. Op cit, p. 50.
124 SMITH, Kate Elizabeth, The influence of Audrey Hepburn and Hubert de Givenchy on American
fashion 1952-1965. Op cit, p.18.
43
escola, uma prova concreta de sua coragem e determinação.125 Em Londres, após
o término da guerra, tentou de todas as maneiras ser bailarina, enquanto a mãe
trabalhava para sustentá-las. Quando soube que nunca seria a melhor, resolveu
trabalhar como corista e atriz em pequenos papéis para ajudar a mãe no sustento
masculino, só encontraria um final feliz nos braços do herói, seu lugar na ordem
patinho feio que desabrocha num belo cisne tornou-se também sua assinatura, uma
marca particular que aparece nos enredos da maioria de seus filmes. Não faltam
experiente “Don Juan” em Love in the afternoon132; a florista que aprende as regras de
Um olhar mais atento aponta para outros padrões nos filmes protagonizados por
Casamento de Audrey
par romântico um homem bem mais velho, na
Hepburn e Mel Ferrer
em 1954. O vestido
vida real protagonizado pelo ator Mel Ferrer,
de noiva foi desenhado
por Pierre Balmain.
com quem Audrey se casou em 1954, aos 25
vida de esposa.135 Mel era mais velho e estava no terceiro casamento. E, apesar
atriz aumentava na mesma proporção que o salário,136 que foi maior que o dele
filmes dela foram rodados fora dos Estados Unidos, a relação foi classificada
pela imprensa como um “casamento sobre rodas”. 138 Na vida e na tela, Audrey
marido, mas que é também doce, apaixonada e até consegue ser mãe (seu filho
Sean nasceu em 1960), a atriz resume em sua história o conflito maior do pós-
atriz. Um termo francês originalmente masculino, gamin, teve que ser transformado
a fim de incluí-la na descrição. A palavra remete a um garoto vadio que anda pelas
ruas, o moleque. Esta Audrey gamine é o patinho feio do início dos filmes, que passa
Anita Loos para a Broadway, buscava uma protagonista jovem, alegre, elegante
como uma francesa, leve e espirituosa. Encontrou tudo isso em Audrey Hepburn.139
“Parecia ter uma aura desenhada em seu redor, daquelas que só as crianças
Antes ainda de se transferir para Nova York, foi chamada para um teste do
européia e o filme seria rodado em Roma. Audrey saiu-se bem, mas ao final a câmera
permaneceu ligada sem que ela soubesse, e foi nesse momento de descontração
me impressionou por ser muito alerta, muito inteligente, muito talentosa e muito
ambiciosa”.141 Não falou em beleza ou sensualidade. Era algo além, diferente, a
filme em Hollywood, Roman holiday, lhe rendeu um Oscar de melhor atriz, graças
ao olho apurado do diretor William Wyler, que merece os créditos por ter lançado
característica das primeiras, com exceção de My fair lady, que volta ao tema em
48
1964. Embora suas heroínas fossem muitas vezes mais novas que a própria atriz,
sua interpretação.
veste. Esta “roupa culta” é inerente a uma distinção social nitidamente européia
e traz em si algo mais que elegância, muito longe do que a moda americana
repertórios culturais tão diferentes. Para Maria Lucia Bueno, os europeus sentiam-
se superiores aos americanos nesta questão, em função da legitimidade que o
infância e no contato com a família e com a cultura européia eram visíveis no seu
jeito de ser e se comportar. Segundo Bourdieu, o habitus, ou seja, todo esse capital
elegância era natural e sem exageros, na medida exata para uma mulher moderna,
é acometida por uma crise de nervos. Antes que o sedativo dado pelos
no meio da rua. Gregory Peck faz o papel do jornalista que a encontra, descobre
trabalho tedioso, longe dos contos de fada que idealizam a felicidade da realeza.
Roma é um espetáculo alegre e sensual, com jovens e casais pelas ruas, nos
cafés e nas fontes, um dia-a-dia ao qual ela não tem acesso. A jovem anda de
motocicleta, corta o cabelo, troca os sapatos altos por sandálias e vai, aos poucos,
se da precoce incumbência de
a vida adulta passa pelo contato com esse nobre sentimento, que a leva a ter
consciência da verdadeira vocação para a vida familiar. Nos Estados Unidos dos
possuí-la, exibi-la e alimentar-se dela, mas esta não é a razão exclusiva da sua
relação às novas idéias feministas que começaram a circular neste período, onde
tenha tido a chance de fazê-lo ainda. Para ela, viver ao lado de um homem e cuidar
da casa significaria ser livre, enquanto o uso da coroa remete a uma prisão.152
A história polariza a escolha entre a “carreira” de princesa, uma vida pública e
Sabrina, do diretor Billy Wilder153, segundo filme de Audrey Hepburn nos Estados
Unidos e o primeiro em que usa roupas de Givenchy, embora só Edith Head tenha
enredo anterior, neste filme Sabrina está separada do seu amor por diferenças
filha do motorista de uma família muito rica, enviada pelo pai para estudar culinária
saias rodadas com sapatilhas, típicos do “Sweetheart Line”, nome pelo qual se
popularizou o estilo New Look nos Estados Unidos dos anos 1950.155 Sua postura é
andrógena e infantil, com os cabelos presos num rabo de cavalo, sentada no galho
de uma árvore.
rival na história, a noiva do irmão mais novo, parece uma matrona ao seu lado. A
terceira roupa do costureiro francês que ela escolheu é um vestido preto de decote
bateau com lacinhos sobre os ombros. Ideal para esconder seus ossos da clavícula,
muito acentuados, o modelo ficou famoso e conhecido desde então como “decote
Sabrina”. Edith Head afirmou até sua morte que a peça foi feita por ela a partir de um
As outras roupas que Audrey veste em Sabrina são as que enfatizam o seu lado
irmão mais velho, o homem de negócios vivido por Humphrey Bogart. A própria
assim as roupas ajudam a construir essa mulher que inclui as duas maneiras de ser,
a feminina e a ativa, a delicada e a forte. Audrey Hepburn era tudo isso também fora
feio em cisne é o tema desta produção que selou a parceria entre Audrey Hepburn
para a mulher moderna, devido à sua “graça, elegância e personalidade”. Numa época
em que inteligência e cultura em excesso não eram qualidades bem vistas para uma
mulher158, a modelo que pensa despontava como uma raridade. No filme como na
vida, um novo padrão de beleza se insinuava, em que a perfeição estética já não seria
157 Stanley Donen vinha do sucesso de Singing in the Rain (Cantando na Chuva, 1952), que
dirigiu em parceria com Gene Kelly, e voltaria a trabalhar com Audrey em Charade (Charada, 1963)
e Two for the Road (Um caminho para dois, 1967).
158 BASSANEZI, Carla, Mulheres dos anos dourados. Op cit, p. 626.
159 KEOGH, Pamela Clark. Op cit, p.39.
54
No início do filme sua roupa é
uma paixão é Love in the afternoon. Audrey é uma adolescente parisiense, estudante
55
de música e filha de um detetive particular.
Audrey veste
holiday, a adolescente constrói para si uma
Givenchy em Love
in the afternoon.
persona inspirada nas investigações e nos
adultério. A menina incorpora uma mulher que teve casos com vários homens, uma
coquette, a versão feminina daquele que tenta conquistar. Em todas as cenas fora
de casa ela veste Givenchy, ferramenta que lhe dá segurança e reforça a imagem
Os dois ficam juntos no final, partindo num trem sob o olhar preocupado
off entra para explicar que os dois se casam e vivem felizes para sempre nos
Estados Unidos, funcionando como uma confirmação moral do happy end. Mais
Hepburn, considerado indecente por mostrar uma relação com tanta diferença
familiarizada com histórias tão imorais. A imprensa considerou que a heroína agiu
nos filmes protagonizados por Audrey Hepburn, um dos muitos pontos em que arte e
vida se misturam. Quando não aparecem como namorados, estes atores veteranos
situações onde o progenitor é viúvo e cria a filha sozinho, ou então a família não
que Hollywood precisava deles para incrementar o sucesso dos filmes, mas
apesar da baixa média de idade do público, por volta dos vinte anos. Além
românticas. Astros como Cary Grant, Gary Cooper e William Holden, entre muitos
nesta lista: Marilyn Monroe, Audrey Hepburn, Doris Day e June Allyson. Delas,
críticas julgaram inconcebível a passividade do pai frente à situação, fato que pode
Charade, o par romântico é Cary Grant, vinte e seis anos a mais que ela.
de infantilidade, “molecagem” ou
que veste durante todo o filme, somente com o rosto à mostra, a moça é
tão bela que desperta o interesse de um médico vivido por David Finch.
Aqui o par romântico não é um homem muito mais velho e o caso não se
nova mulher que está sendo esboçada entre 1950 e 1960. As qualidades de
obras de arte por hobby e depende da filha para salvá-lo da prisão. Porém, nesse
filme, ela faz par com Peter O’Toole, num dos raros casos em que a diferença
60
2.4 Mulheres Modernas
que denota um estilo de vida fora dos padrões. Este espaço da cidade de Nova York
era ocupado por artistas de vanguarda e intelectuais durante os anos 1940 e 1950,
pensa, esta personagem representa um novo paradigma para a mulher moderna, com
inteligência além da beleza. Para Elizabeth Wilson, esse estilo “margem esquerda”
170 Comentário de Molly Haskell. In: DUNCAN, Paul e FEENEY, F.X., A. Hepburn. Op cit, p. 105
171 BUENO, Maria Lucia. Op cit, p. 218.
172 WILSON, Elizabeth, Enfeitada de sonhos. Op cit, p. 251.
61
intelectuais que a personagem freqüenta no bairro boêmio de Paris.
Para Dabrina Taylor, a moça caminhando pela Rive Gauche em Funny face
poderia remeter a uma espécie de apropriação hollywoodiana do flâneur, ou flâneuse
no feminino, uma pessoa que anda pela cidade observando tudo e produzindo
seu próprio conhecimento sobre a vida. Descrito inicialmente por Baudelaire, este
se pode dizer da personagem que se torna freira somente para poder trabalhar como
enfermeira na África. Ela é inteligente e com uma educação além do normal para as
mulheres da época, mas, por conta de suas idéias avançadas, encontra dificuldade
Essa é mais uma personagem com um forte traço masculino, uma mulher corajosa
e à frente do seu tempo, moderna como as novas mulheres dos anos 1950, mesmo
and peace. Suas falas seriam já repreensíveis numa jovem americana do pós-
XVIII. A garota afirma que adoraria ser um rapaz para poder se divertir indo à
guerra, lutando ou bebendo nos bares, além de dizer que prefere ser bailarina
a se casar. Ela se envolve com dois homens mais velhos ao longo da história,
embora continue divertida e zombeteira. No entanto, seu tipo físico magro e sem
como a própria atriz, embora tenham mantido certas características dos primeiros
“estilo Givenchy” passou a estar presente desde o início das tramas. O próprio
mais jovem e casual, incorporada pela atriz em seu cotidiano e nos filmes.
caras dos Estados Unidos, sonho de consumo da protagonista, texana que vive
a tela como uma imensa vitrine. “As pessoas vão ao cinema como para um
corrida por colares de pérolas falsos, vestidos pretos sem manga e óculos
Neste filme, o sexo está ligado ao dinheiro e todos parecem ter seu preço.
esteve ligada ao sexo, ao contrário de outras estrelas do período. Seu corpo magro e
sem curvas foi sempre coberto por roupas retas, sem decotes, no estilo minimalista
elegante de Givenchy, que se tornou o seu próprio. Práticas e sem excessos, estas
nos ensinou que não há nada mais moderno que a abstinência de excessos”.179
subvertendo o exagero dos trajes femininos, na primeira metade dos anos 1960 ela
filmes. Para Elizabeth Wilson, a rejeição da moda por parte das representantes deste
184 WILSON, Elizabeth, “Fashion and the postmodern body”. In: ASH, Juliet; WILSON, Elizabeth,
Chic thrills: A fashion reader. Los Angeles: University of California Press, 1993.
185 A expressão “consumo conspícuo” foi cunhada por Thorstein Veblen no livro A teoria da classe
ociosa, de 1904, para designar o consumo exagerado da alta burguesia com o intuito de demonstrar
riqueza e demarcar a divisão de classes. VEBLEN, Thorstein, A teoria da classe ociosa. São Paulo:
Livraria Pioneira, 1965.
186 BREWARD, Christopher. Op cit, p. 131.
68
moda como chapéus, óculos escuros e colares, a fim de causar tal impressão, já que
usa somente dois vestidos pretos durante o filme, um longo para noite e um curto para
dos acessórios, dando sempre a impressão de uma roupa nova, ao mesmo tempo em
século XX era possível distinguir ricos e pobres pela maneira de vestir. Diana
Crane aponta que, a partir dos anos 1950 a moda de classe é substituída pela
exibir uma imagem rica e sofisticada, criando para si uma identidade diferente. É
inegável que o fato de Audrey ser realmente uma mulher de elegância européia
fase de sua carreira, ora em função dos olhares arregalados, ora de situações
de Paris when it sizzles, com suas roupas chiques de última moda, usa os truques
da imaginação para levar adiante a história do escritor, rumo ao final feliz que os
coloca lado a lado. Uma moça que vive daquele trabalho dificilmente teria condições
está coerente na pele de uma milionária que veste Givenchy no dia-a-dia, embora
Por fim, em Charade ela é uma americana elegante em Paris que precisa de muitos
primeira roupa de How to steal a million, por exemplo, toda branca com um chapéu
atado embaixo do queixo e grandes óculos escuros brancos com lentes pretas,
189 Comentário de Gregory Pack. In: KEOGH, Pamela Clark. Op cit, p.124.
70
mistura humor e estranheza com uma
Two for the road foi o último filme protagonizado por Audrey Hepburn,
casal mostrada através de várias viagens que fazem pelo sul da França ao
uma minissaia.
elegância, até hoje uma referência para mulheres de várias partes do mundo.
Alta-costura e cinema:
Trajetórias paralelas
e colaborações
em enaltecer suas criações através da imagem das estrelas, que eram admiradas e
capítulo anterior, foi um grande impulso na carreira do costureiro, já que era jovem e
Sua trajetória na moda começou aos dezessete anos, quando largou a faculdade
de direito e foi para Paris trabalhar na casa do costureiro Jacques Fath. Após uma
passagem de um ano pelo atelier do clássico Robert Piguet, trabalhou seis meses
com Lucien Lellong, uma grande oficina com mil e quinhentos funcionários, por onde
já haviam passado Christian Dior e Pierre Balmain,195 que não resistiu aos efeitos
suas atividades neste período, como Molineaux e Robert Piguet em 1950 e Marcel
194 Maison significa casa em francês, e é como são chamadas as lojas que vendem alta-costura.
A palavra atelier também é usada aqui com o mesmo significado.
195 MOHRT, Françoise. Op cit, p. 44.
73
Rochas em 1952,196 em função da crise que se abateu sobre o dispendioso sistema
de produção de roupas dos ateliers.
a verdadeira elegância e teve permissão para criar. Amiga dos surrealistas, seus
bolsas, cintos e lenços para compor o guarda-roupa, que eram vendidos na butique
o desejo das mulheres por roupas simples e mais fáceis de usar que a tradicional
alta-costura, e fez desse conceito a sua fórmula e a base do seu trabalho.198 Suas
sair para montar sua própria casa de alta-costura. O tempo áureo dela já havia
a um tio, proprietário da rede Printemps, para abrirem juntos uma casa de alta
costura. O tio desistiu na última hora, mas um cunhado, Louis Fountaine, dono da
Prisunic, aceitou investir no projeto. Assim, em janeiro de 1952, aos vinte e quatro
anos de idade, Hubert de Givenchy instalou sua maison numa mansão neogótica
com Givenchy, mas também com Dior, Balmain, Cardin, Courrège e Ungaro,
196 PALLAIS GALLIERA, Givenchy, 40 years of creation. Catálogo da exposição no Pallais Galliera,
Paris-Musées, 1991.
197 MOHRT, Françoise. Op cit, p. 66.
198 PALLAIS GALLIERA, Givenchy, 40 years of creation. Op cit, p. 115.
199 MOHRT, Françoise. Op cit, p. 69.
74
entre outros. Pierre Bourdieu analisa este movimento como a base que
seus membros. Para pertencer ao sindicato, era necessária uma estrutura de salas
desfiles diários mostrando a coleção202, quesitos que o jovem não tinha condições
atividade principal era a confecção de roupas sob medida. As casas mais importantes,
além de dançarinas e artistas de teatro e cinema. Para citar somente dois exemplos,
200 O sociólogo Pierre Bourdieu cunhou o termo “campo” para definir uma área de interesses
específicos com um conjunto de leis de funcionamento invariantes, respeitadas por todos os agentes
que têm o mesmo habitus, a mesma maneira de se comportar. A base do campo é um mercado
de bens restritos aos seus agentes, que lutam entre si pela autonomia, sendo que os que estão
estabelecidos há mais tempo são os dominantes e os novos que chegam, os dominados. O motor
do campo são as disputas entre dominantes e dominados que lutam para se estabelecer, porém
sem transgredir as regras do jogo. BOURDIEU, Pierre, “Algumas propriedades dos campos”. In:
Questões de sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983.
201 BOURDIEU, Pierre, “O costureiro e sua grife”. In: A produção da crença: Contribuição para uma
economia dos bens simbólicos. São Paulo: Zouk, 2004, p. 139.
202 GOMES, Susana Helena de Avelar, Moda – entre arte e consumo. Tese de doutorado em
Comunicação e Semiótica, PUC-S, São Paulo, 2005, p. 44.
75
em 1935 Jean Patou tinha mil e duzentos funcionários e Chanel, quatro mil.203
A maioria dos criadores de moda das primeiras décadas do século XX
envolvimento com a arte foi usado como estratégia para atrair uma clientela de elite
pai, marquês. O interesse pela moda começou na infância, influenciado pelo avô,
comerciante têxtil que foi diretor da famosa tapeçaria Gobelins. Com ele aprendeu
que cada tecido tem sua própria vida. Era um amador da arte e desenvolveu uma
confecção em série nos anos que o seguiram. Porém, novos modelos de casas de
não era mais o administrador ou o dono do dinheiro. Christian Dior foi o primeiro
exemplo do novo modo de gestão ao abrir sua casa, em 1946, em parceria com um
et Mancini.210
209 MENDES, Valerie; HAYE, Anne, A moda no século XX. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 169.
210 PALLAIS GALLIERA. Op cit, p. 103.
211 PALLAIS GALLIERA. Op cit, p. 116.
212 MENDES, Valerie; HAYE, Anne, A moda no século XX. Op cit, p. 129.
77
dado pelas principais revistas de moda dos Estados Unidos. Recebido friamente
roupas já existentes em New Look, acrescentando tecido à roda das saias.214 Ela
podiam ser usadas com calças justas ou com saias para o dia. As mesmas peças,
em versão noturna, com tecidos nobres e saias longas, poderiam ser compradas
praticamente sem provas. A coleção era jovem, fresca, fácil de usar, feminina e cheia
número suficiente para dar conta de tanta demanda. Graças ao sucesso entre
técnica aperfeiçoada pelo mestre, que a cortava junto ao corpo, sem uma costura
que ligasse as duas partes. Com ele, aprendeu a respeitar o tecido, construir a
Audrey sugeriu ao diretor Billy Wilder que as roupas da protagonista, após a estadia
Balenciaga, mas o mestre estava muito ocupado e indicou o jovem amigo.223 A atriz,
primeira vez quando filmava em Monte Carlo, mas na ocasião não tinha dinheiro
para comprá-las. Ela confessou, porém, que investiu num casaco dele com o salário
por Miss Hepburn, de Hollywood, e levou um susto ao deparar-se com aquela jovem
teria tempo de produzir nada especialmente para o filme. Combinaram que ela
escolheria três trajes de coleções passadas, e ele deixou-a à vontade para fazê-lo.
ossos da clavícula.225
Quem não gostou da situação foi
Audrey não gostou do fato de Givenchy não ter sido mencionado. Mesmo assim,
predileto, fotos essas publicadas em revistas como Vogue e Life. Eles se associaram
Givenchy, desde 1957 Audrey esteve presente na lista das mulheres mais bem vestidas
do mundo pelo New York Couture Group231, consagrando o sucesso do costureiro entre
o corpo de cada cliente numa elegância atemporal. Apaixonado por tecidos desde
roupas do amigo.
fevereiro 1910 e foi produzido em Londres com o título Fifty years of Paris
poucos foram progredindo para pequenas histórias que giravam em torno das
casas de alta costura, mas suas roupas eram, na maioria das vezes, desenhadas
pelos próprios figurinistas dos estúdios, alguns formados por costureiros, como
de 1928 a 1942, quando saiu para montar sua própria casa de alta-costura. Ele
maiores estrelas do período, como Joan Crawford e Norma Shearer, com seu estilo
de linhas retas, ombros quadrados e muita lantejoula, além dos contrastes de preto
e branco.241 Ele fez o famoso vestido que Joan Crawford usou em Letty Linton, uma
Somente a loja Macy’s, de Nova York, diz ter vendido 500.000 cópias da peça.242
se amigas. Edith também cobria as faltas de Banton sempre que este bebia
demais, o que começou a ser cada vez mais freqüente, principalmente no final
formação se deu dentro do estúdio, já que aprendeu tudo com seus antigos chefes,
Howard Greer e Travis Banton. Ela mal sabia desenhar quando foi contratada, mas
de fazer programas de rádio e televisão onde dava dicas sobre roupas e respondia
dúvidas das espectadoras. Edith foi nomeada para o Oscar de figurino trinta e
muitos chegaram a trabalhar com Edith Head, como Mitchell Leisen, Orry-Kelly,
Robert Kalloch, Walter Plunkett, Cecil Beaton, Jean Louis e Irene, entre outros.
em tonalidades de cinza, mesmo que não combinassem a olho nu. Além disso, as
Artists and models251, filme lançado pela Paramount em 1937 sob a direção
de Lanvin, Maggie Rouff, Paquin, Jean Patou, Schiaparelli, Lucien Lellong e Worth.252
A própria Paramount produziu uma refilmagem com o mesmo título em 1955, desta
vez com figurinos de Edith Head.253 Lançado no mesmo ano de 1937 e do mesmo
estúdio, I’d give my life254 trazia a atriz Frances Drake vestindo Schiaparelli, Lucille,
Elsa Schiaparelli trabalhou para muitos filmes ingleses nos anos 1930, mas
também vestiu atrizes americanas como Mae West em Every day’s a holiday256 e
com o cinema britânico durante quarenta e cinco anos. Em 1941 apareceu no filme
no primeiro capítulo, esteve sob contrato com a MGM por um breve período no
início da década de 1930, mas a relação com as estrelas do estúdio foi conflituosa,
de marketing e patrocínio.261 A Maison Dior vestiu muitas atrizes dentro e fora das
entre outras.
firmando seu estilo através da jovem atriz que representava a nova mulher, prática,
o começo, mas a relação de Givenchy com Audrey Hepburn pode ser considerada
Jackie, modelo de
total afinidade entre roupa e personalidade,
Givenchy, tinha as
mesmas medidas
justamente por manter o mesmo estilo
de Audrey Hepburn.
dentro e fora das telas. Nesse sentido
pois seu visual não foi fabricado pelo star system. Trouxe seu próprio estilo para
não teve nenhuma relação com os figurinos do filme, mas mesmo assim levou
fama, já que a Vogue fez um editorial de moda com chapéus feitos por Givenchy
enquanto Jean Claude e Colette eram responsáveis por ternos e casacos e Francine
butiques de luxo em várias cidades dos Estados Unidos e Europa, mas também
Stores vendia alta-costura francesa nas décadas de 1920 e 1930, assim como
luvas, chapéus e perfumes, além de realizar desfiles com “modelos vivas”, uma
277 Comentário de Audrey Hepburn sobre Givenchy. In: PALLAIS GALLIERA. Op. cit, p. 85.
278 Comentário de Givenchy sobre Audrey Hepburn. In: MOHRT, Françoise. Op cit, p. 84.
279 PALLAIS GALLIERA. Op cit, p. 73.
280 BONADIO, Maria Claudia, Moda e sociabilidade: Mulheres e consumo na São Paulo dos anos
1920. São Paulo: Editora Senac, 2007, p. 103/113.
92
A importação de vestidos da alta-costura implicava na compra da tela,
material. Era possível ainda adquirir uma peça pronta diretamente de Paris, a
ser ajustada posteriormente, modalidade mais cara de importação. 281 Até o final
dos anos 1950 as vendas eram constantes e as maisons chegavam a fazer três
de alta-costura a desaparecer.
O licenciamento de produtos e a
Modelo veste
coleção Inverno profusão de acessórios e perfumes
67-68 de Givenchy.
foram estratégias usadas pelos
281 GOMES, Susana Helena de Avelar, Moda – entre arte e consumo. Op cit, p. 63.
282 PALLAIS GALLIERA. Op cit, p. 102.
93
costureiros para diversificar seus ganhos, além da introdução de roupas
entre 150 e 200 horas para ser confeccionado, na década de 1970 esta
média caiu para 45 a 90 horas. Givenchy enxugou sua estrutura para quatro
do mundo da moda.
moda
283 O termo prêt-à-porter pode ser traduzido como “pronto-a-vestir”, e consiste em roupas de
alta qualidade e de marcas ligadas ao segmento de luxo, mas que são compradas prontas em
butiques.
284 PALLAIS GALLIERA. Op cit, p. 73.
285 BOURDIEU, Pierre, O costureiro e sua grife. Op cit, p. 115.
94
A crescente presença e relevância dos jovens como parcela significativa
visavam atingir esse novo segmento da sociedade. Estas butiques tinham uma
observa Bourdieu, “se pode ser tradicional e, ao mesmo tempo, moderna, em suma,
O prêt-à-porter passa a dar o tom nos anos 1960, criado por grandes
confecções e normalmente contando com uma equipe de estilistas que captam
para criar uma marca competitiva, com anúncios e catálogos sofisticados, nos
de menor poder aquisitivo e formado por diferentes grupos de jovens, cada qual
com seus modismos, tornou-se a grande fonte de inspiração para a moda das
Esta nova estética juvenil é retratada com criatividade e bom humor pelos estilistas
Quant e sua minissaia, Jean Muir, Hardy Amies, ou ainda as butiques Biba e Bazaar, que
Paris estava em plena atividade e também tinha seus “modernos”, com destaque para
294 DELIBERO, Linda Benn. “A garota do ano: uma história pessoal e crítica de Twiggy”. In:
BENSTOCK, Shari; FERRISS, Suzanne. Por dentro da moda. Op cit, p. 54.
295 East of Eden, (Vidas amargas), Elia Kazan, EUA, 1954 e Rebel without a cause, (Juventude
transviada), Nicholas Ray, EUA, 1955.
296 The wild one, (O selvagem), László Benedek, EUA, 1953.
297 FOGG, Marnie, Boutique: a 60’s cultural phenomenon. London: Mitchell Beazley, 2003.
98
“O discurso de Courrèges transcende amplamente
a moda: ele não fala mais de moda, mas da mulher
moderna, que deve ser livre, descontraída, esportiva,
à vontade. Na realidade, acho que uma revolução
específica, algo que inicia um novo período num
determinado campo, é a sincronização de uma
necessidade interna com algo que se passa fora, no
universo que o engloba. O que faz Courrèges? Ele não
fala de moda; fala de um estilo de vida.”298
e 1960 culminou numa revolução estética, que nada mais foi que o reflexo da
sobreviver.
298 BOURDIEU, Pierre, “Alta costura e alta cultura”. In: Questões de sociologia. Op cit, p.157.
99
quanto a indústria da moda buscam atender a uma clientela variada, diversificando
grandes empresas, aquelas que realmente geram lucro, são as que pertencem a
Henessy), criado em 1987 e que controla as grifes Emilio Pucci, Christian Dior,
Givenchy, Kenzo e Louis Vuitton. A Gucci pertence sessenta por cento ao grupo
No mundo atual a estrela não perdeu seu papel, mas passou a dividi-lo com
nomes como Linda Evangelista, Naomi Campbell e Claudia Schiffer, que teve uma
303 “Über”, palavra em alemão para designar algo muito grande, maior que “super”.
101
“Privilegiando a criação da imagem, da aparência e da moda na produção da
da indústria da moda”.304
Os grandes nomes da moda de luxo continuaram a colaborar com o cinema
e a vestir seus atores e atrizes. Giorgio Armani, por exemplo, vestiu Richard Gere
diretor Martin Scorcese e veste o ator George Clooney, nos filmes e fora deles. Os
Festival de Cannes, na França, provocam a cada ano uma verdadeira disputa entre
os estilistas para vestirem as estrelas, que são fotografadas pela imprensa de todo
copiadas, mesmo que não façam parte das tendências da estação. A maioria das
marcas de moda empresta, ou até oferece gratuitamente suas roupas para que as
estrelas usem, dentro e fora das telas. Associar seu nome a estrelas ou celebridades
Givenchy com a naturalidade que seu habitus legitima. A mulher que teve uma
internalizada que parece inato, embora, como nos assegura Bourdieu, estas
para realçar um padrão de elegância que fazia parte do hábitus social da atriz
304 KELLNER, Douglas, “Madonna, moda e identidade”. In: BENSTOCK, Shari; FERRISS, Suzanne.
Por dentro da moda. Op cit, p. 190.
305 Um gigolô americano, Paul Schrader, EUA, 1980.
102
como uma segunda pele, sem esforço. Aquelas roupas, para ela, nunca foram
vir dos avanços tecnológicos. A palavra de ordem é “customização”, que poderia ser
definida como “à maneira do cliente”. Roupas podem ser compradas pela Internet
digital permite que qualquer pessoa faça um filme e coloque-o na Internet para ser
assistido do outro lado do planeta. Até o telefone celular pode ser considerado uma
mídia, já que possui câmera e tela. Todos podem ser autores e criadores.
103
Bibliografia
ADORNO, Theodor W, Indústria cultural e sociedade. São Paulo: Paz e Terra,
2002.
ASH, Juliet e WILSON, Elizabeth, Chic thrills: A fashion reader. Los Angeles:
University of California Press, 1993.
BASSANEZI, Carla, “Mulheres dos anos dourados”. In: PRIORE, Mary Del (Org.);
BASSANEZI, Carla (coord. de textos), História das mulheres no Brasil. São Paulo:
Contexto, 1997.
BRUZZI, Stella, Undressing cinema – clothing and identity in the movies. London:
Routledge, 1997.
CASTRO, Ana Lucia de, “Culto ao corpo: Identidade e estilos de vida”. In:
BUENO, Maria Lucia; CASTRO, Ana Lucia de, Corpo território da cultura. São
Paulo: Annablume, 2005.
CRANE, Diana, A moda e seu papel social: classe, gênero e identidade nas roupas.
São Paulo: Senac, 2006.
DELIBERO, Linda Benn, “A garota do ano: uma história pessoal e crítica de Twiggy”.
In: BENSTOCK, Shari; FERRISS, Suzanne, Por dentro da moda. Rio de Janeiro:
Rocco, 2002.
DUBY, George; PERROT, Michelle, História das Mulheres 5 - O Século XX. Porto:
Edições Afrontamento, 1991.
DURAND, José Carlos, Moda, luxo e economia. São Paulo: Babel Cultural, 1988.
FRIEDRICH, Otto, A cidade das redes: Hollywood nos anos 40. São Paulo:
Companhia das Letras, 1988.
GABLER, Neal, Vida, o filme. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
HAYE, Amy, Fashion source book – a visual reference to the twentieth century
fashion, New Jersey: The Wellfleet Press, 1988.
__________, Chanel: The couturiere at work, Londres: The Victoria & Albert
Museum, 1995.
105
__________; MENDES, Valerie, A Moda no Século XX. São Paulo: Martins Fontes,
2003.
JARVIE, I. C., Movies and Society. New York: Basic Books, 1970.
KAEL, Pauline, 1001 noites no cinema. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
KAWAMURA, Yunika, The japanese revolution in Paris fashion. New York: Berg,
2004.
KEOGH, Pamela Clarke, Audrey Style. New York: Harper Collin Publishers, 1999.
KEHL, Maria Rita, “Cinema e imaginário”. In: XAVIER, Ismail, (Org.), O cinema no
século. Rio de Janeiro: Imago, 1996.
LAVER, James, A roupa e a moda – uma história concisa. São Paulo: Companhia
das Letras, 1989.
LEESE, Elizabeth, Costume design in the movies. New York: Dover Publications,
1991.
LIMA, Luiz Costa., Teoria da cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
106
LODGE, Jack; TAYLOR, Russel; TURNER, Adrian; JARVIS, Douglas; KERMODE,
Mark; CASTELL, David, 1930 – 1990 - Hollywood – 60 great years. London: Prion,
1992
MASSEY, Anne, Hollywood beyond the screen. Oxford/New York: Berg, 2000.
MELLO E SOUZA, Gilda, O espírito das roupas – A moda no século XIX. São Paulo:
Companhia das Letras, 1987.
MULVEY, Laura, “Prazer visual e cinema narrativo”. In: XAVIER, Ismail (Org.), A
experiência cinematográfica. São Paulo: Graal, 2003.
PANOFSKY, Erwin, “Estilo e meio no filme”. In: LIMA, Luiz Costa (Org.), Teoria da
cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
PRIORE, Mary Del (Org.); BASSANEZI, Carla (Coord. de textos), História das
mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997.
107
SCHATZ, Thomas. O gênio do sistema. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
SIMMEL, Georg, “La Mode”. In: La Tragédie de la cultura. Paris: Editions Rivales,
1988.
TUDOR, Andrew, Image and influence. London: Allen & Union, 1968.
VEBLEN, Thorstein, A teoria da classe ociosa. São Paulo: Livraria Pioneira, 1965.
Periódicos
BEATON, CECIL, “Audrey Hepburn”. Vogue, 01 Nov. 1954.\
VANCE, Young, “For Man Only”. Hollywood Screen Parade, Jul. 1958
MIRANDA, Ana Paula Celso de, “Mitos femininos do cinema: uma tipologia de
consumidoras de moda”. In: Fashion Theory nº 1, edição brasileira, Mar. 2002.
108
Teses e dissertações
SMITH, Dina M., Taking off at 1954: Poor white mobility and fifties culture. Dissertação
de Mestrado em Filosofia. Florida State University, 2000.
SMITH, Kate Elizabeth, The influence of Audrey Hepburn and Hubert de Givenchy
on American fashion 1952-1965. Dissertação de Mestrado em Artes. Michigan
State University, 2001.
TAYLOR, Dabrina Anne, Fair lady, huckleberry friend: Feminity and freedom in the
image of Audrey Hepburn, 1953-1967. Tese de Doutorado em Filosofia. Maryland
State University, 1997.
GOMES, Susana Helena de Avelar, Moda – entre arte e consumo. Tese de Doutorado
em Comunicação e Semiótica. São Paulo: PUC-S, 2005.
NACIF, Maria Cristina Volpi. Obra consumada: uma abordagem estética da moda
feminina no Rio de Janeiro entre 1932 e 1947. Dissertação de Mestrado em História
da Arte. Rio de Janeiro: Escola de Belas Artes/UFRJ, 1993.
Arquivos Digitais
CLINTON, Paul, Legendary director Billy Wilder dead at 95. CNN, 20/01/2006.
Disponível em: http://en.wikipedia.org/wiki/Billy_Wilder
109
Filmografia
Roman holiday (A princesa e o plebeu), William Wyler. EUA, 1953.
Sabrina (idem), Billy Wilder. EUA, 1954
War and peace (Guerra e paz), King Vidor. EUA, 1956.
Funny face (Cinderela em Paris), Stanley Donen. EUA, 1957.
Love in the afternoon (Amor à tarde), Billy Wilder. EUA, 1957.
The nun’s story (Uma cruz a beira do abismo), Fred Zinnemann, EUA, 1959.
Bonequinha de luxo (Breakfast in Tiffany’s), Blake Edwards. EUA, 1961.
The children’s hour (Infâmia), William Wyler, EUA, 1961.
Charade (Charada), Stanley Donen, EUA, 1963.
Paris when it sizzles (Quando Paris alucina), Richard Quine, EUA, 1964.
My fair lady (Minha bela dama), George Cukor, EUA, 1964.
How to steal a million (Como roubar um milhão de dólares), William Wyler, EUA,
1966.
Wait until dark (Um clarão nas trevas), Terence Young, EUA, 1967.
Two for the road (Um caminho para dois), Stanley Donen, EUA, 1967.
110
Índice das Ilustrações
Capítulo 1
pág. 6 – Cartaz de espetáculo cinematográfico de 1896. Fonte: Gran
história ilustrada del cine
pág. 10 – Atriz Florence Lawrence. Fonte: Gran história ilustrada del cine
pág. 12 – Marlene Dietrich vestida por Travis Banton. Fonte: Décadas de moda
pág. 19 – Gary Cooper e Jean Arthur em 1936. Fonte: 500 Grandes filmes
pág. 26 – Joan Crawford em Letty Linton. Fonte: Costume design in the movies
pág. 26 – Elizabeth Taylor em A place in the sun. Fonte: The life and
times of Hollywood’s celebrated costume designer Edith Head
Capítulo 2
pág. 34 – Audrey Hepburn. Fonte: A. Hepburn
111
pág. 50 – Audrey Hepburn e Gregory Pack em Roman Holiday. Fonte: A. Hepburn
pág. 56 – Audrey Hepburn em Love in the afternoon. Fonte: Givenchy, 40 years of reation
Capítulo 3
pág. 73 – Audrey Hepburn para coleção verão 63 de Givenchy. Fonte:
Givenchy, 40 years of creation
pág. 81 – Audrey Hepburn e Edith Head. Fonte: The life and times of
Hollywood’s celebrated costume designer Edith Head
112
pág. 83 – Mme. Patrick Guiness veste Givenhy. Fonte: Givenchy, 40 years of creation
pág. 85 – Fotograma de filme de moda, 1910. Fonte: Costume design in the movies
pág. 86 – Vestido de Howard Greer, 1925. Fonte: Costume design in the movies
pág. 87 – Marlene Dietrich vestida por Travis Banton. Fonte: Costume design in
the movies
pág. 90 – Vivien Leigh veste Pierre Balmain. Fonte: Costume design in the movies
pág. 97 – Fachada da butique Yves Saint Laurent Rive Gauche. Décadas de moda
113