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Roger Scruton, sobre Harry Potter

Um futuro historiador olhando para o passado, no tempo em que


vivemos, certamente identificará JK Rowling como uma figura de grande
importância. De um jeito que há poucos precedentes, desde Peter Pan e Wind
in the Willows, ela capturou a imaginação coletiva do povo britânico e encheu
nossas cabeças com personagens e atitudes que serviram como uma
referência compartilhada, não apenas aos nossos sonhos, mas também às
nossas esperanças e intenções.

Através da sua presença nas redes sociais, ela decidiu mudar a cabeça
da nação em direção a um leve socialismo, que pessoas como ela podem
suportar. E ela se esforça em reduzir o complexo mundo da política a uma
batalha entre o bem e o mau, como a que acontece continuamente, em
Hogwarts.

Há aqueles, entre meus “colegas literários”, que dispensaram os livros


Harry Potter, os considerando literatura inculta: baseados em personagens
irreais em enredos fantásticos que não vão a lugar algum. Eu não concordo
com eles. JK Rowling tem o sucesso que apenas um escritor que tocou em
sentimentos reais e universais poderia ter. Ela foi genial em inventar
personagens que entram na simpatia de leitores comuns e em situações em
que emoções comuns são, de repente e alarmantemente, colocadas ao teste.
Seus enredos são extravagantes, mas há poucos, se algum, desconexos e
tudo flui perfeitamente entre descrição e diálogo, e vice-versa.

Ela também tem a genialidade de Dickens quando o assunto é os


nomes: Dumbledore, Voldemort, Malfoy, Hagrid, Hogwarts. Esses e muitos
outros são propriedade registrada, como Magwitch, Peggotty e Oliver Twist. De
modo geral, eu creditaria JK Rowling por criar uma contribuição real para a
literatura, embora a literatura infantil.

A literatura para crianças é uma de dois tipos. De um lado, há histórias


destinadas especificamente para o estado de espírito da criança e que brincam
com essas emoções primordiais, que são tão antigas que vêm dos terrores dos
nômades. Desse tipo é que são os contos coletados e embelezados pelos
Irmãos Grimm. Do outro lado, há a literatura que é direcionada não à criança,
mas à ideia da criança; literatura que enquadra a mente infantil, a emoldura e
também a usa para transmitir verdades sobre a realidade adulta. Dentre as
obras desse segundo tipo, estão algumas das obras-primas da nossa literatura,
incluindo Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll e As Aventuras de
Huckleberry Finn, de Mark Twain. A literatura infantil desse segundo tipo é
sobre o mundo como ele realmente é, mas escrito de modo a colocar a
inocência e honestidade da criança no centro da narrativa.

A literatura infantil do primeiro tipo não é sobre o mundo como ele


realmente é, mas sobre o mundo como as crianças o veem, quando privadas
da sabedoria e experiência adultas. É um mundo mágico, organizado por
forças ocultas e feitiços. Também é um mundo simplificado, em que o bem e o
mau são revelados em termos concretos e dividem a realidade entre eles. É um
mundo sem responsabilidades, já que essa está sempre nas mãos de outros. E
a criança que adentra esse mundo precisa ter apenas um tipo de
conhecimento, que é conhecer os feitiços que invocarão as forças do bem para
protegê-la e espantar as forças do mau. Um mundo a esses moldes é o mundo
descrito e ricamente equipado pela JK Rowling, e sua narrativa resulta em
orações de todos aqueles que já tentaram inventar uma boa história. Mas
levanta perguntas importantes sobre a nossa cultura.

Embora os livros Harry Potter sejam livros infantis, eles foram além das
“histórias para dormir” e invadiram o mundo do trabalho adulto. Os nomes dos
seus personagens estão nas bocas de todos. A internet cria “nomes de Harry
Potter” para cães, gatos e pôneis. A própria JK Rowling o convida a batizar o
seu político favorito, ou mais odiado, dos recursos da sua léxica. Sra May [atual
primeira-ministra do Reino Unido] sendo, obviamente, uma Dursley, mesmo
que Corbyn [líder da oposição, Partido Trabalhista] ainda não tenha alcançado
o status de Dumbledore.

O aspecto mais interessante das histórias de Potter, falando


antropologicamente, é que elas dependem de uma atmosfera bem “às antigas”
e inglesa, embora evite quaisquer referências para nossas tradicionais crenças
religiosas. Hogwarts é uma escola pública inglesa, com claustros e uniformes,
com jogos, que lembram as antigas virtudes esportivas, e hierarquias, com
jantares formais e discursos ritualísticos. É uma grande capela gótica, mas sem
hinos nem orações. Mas como se mantêm essa atmosfera?

A resposta é: pela mágica. E essa mágica é uma criação esplêndida de


Rowling, que ocupa todo lugar que a religião ocuparia, enquanto realocando o
conflito entre o bem e o mau do plano cósmico para o primeiro plano, da ação
humana. O conflito é revelado em formas e rostos, em símbolos e trajes, nos
contornos e nas sombras dessa assustadora instituição.

Assim como o poeta invocado por Shakespeare, Rowling deu a Airy


Nothings uma casa e um nome. Mas a atmosfera criada por ela também nos
lembra porque a religião e a mágica já estiveram na cabeça de loucos. A
religião nos diz que não temos poder no mundo e devemos aprender a aceitar
nossas limitações e reconhecer que nossa salvação depende em Deus, que
nos salvará. Quando rezamos, não comandamos ao mundo que nos obedeça,
muito pelo contrário, nós modestamente reconhecemos nossa falta de poder e
pedimos que Deus intervenha em nosso nome. Orar é reconhecer nossa
fraqueza e, ao mesmo tempo, a determinação em merecer a ajuda de Deus.
Nesse sentido, orações são o exato oposto dos feitiços. Aquele que conjura um
feitiço está assumindo seu poder sob a realidade; ele não precisa de Deus,
porque ele é Deus, ele está assumindo os poderes do Criador e subjugando a
vida e o mundo a sua vontade.

Quando a alquimia foi condenada pela Igreja medieval, era como uma
tentativa blasfêmica de usurpar o poder de Deus. Se posicionando contra a
alquimia, a Igreja contribuiu consideravelmente para o avanço da ciência,
forçou as pessoas a renunciarem seus desejos de controlar o mundo e as
instigou a tentar entendê-lo. Experimentos científicos e a teorização se
transformaram na verdadeira obediência religiosa.

Eu distingui dois tipos de literatura infantil. O tipo que explora os medos


primordiais e esperanças da criança, em que a mágica atua em um papel
controlador, e o tipo que olha com os olhos da criança para o mundo adulto e
real e trás um olhar de inocência para o que se vê nele. Lewis Carroll, que
contribuiu para esse segundo tipo de literatura infantil, com o maior padrão
artístico, foi um matemático, com um cérebro limpo, tranquilo e científico, em
que sua heroína luta contra a mágica e a ilusão, com todos os seus
encantadores e racionais poderes. Ela é a criança que quer se tornar uma
adulta, explorando as sombras da sua própria imaginação e brilhando a luz da
razão, que perseguirão as sombras.

As histórias do Harry Potter são o oposto disso. Elas mostram um


mundo adulto totalmente invadido por medos e desilusões infantis. Mágica e
mistério são a moeda em que todas as transações são feitas. A varinha, a
magia e o saber oculto substituíram todo tipo de disciplina espiritual. Todo
personagem é bom ou mau por natureza. E não há processo de
desenvolvimento, nenhum caminho para renúncia e oração, através do qual o
herói ou heroína pode se preparar para enfrentar as provocações de uma
existência adulta e real. Todos os obstáculos são sonhos, que podem ser
dissipados pelo aceno de uma varinha, e não há algum poder que ele não
possa obter das coisas desse mundo, já que ele conhece seus segredos.

É de se esperar que crianças se sintam desse jeito, porque elas ainda


não foram libertadas das garras daquelas emergências primordiais. Mas
também esperamos que elas cresçam e as superem, entendendo o mundo
totalmente cientes da sua complexidade, entendendo o papel da ciência e a
necessidade de humildade e entendimento. A religião é um dos papeis que nos
distancia da magia primitiva, para encarar o mundo sabendo do fato que nós
não o controlamos.

Crescer significa entender que o mundo não nos dará os bens só porque
os queremos. A visão de mundo adulta é o oposto da postura mental
emoldurada pelo “potterismo”. Mas o potterismo está começando a prevalecer.
O herói da Rowling e suas circunstâncias invadiram tanto a cultura, que as
pessoas estão começando a viver em uma cyber-Hogwarts, acreditando que
tudo está ao seu alcance, já que querer algo já é metade do caminho para
consegui-lo. Talvez o leve socialismo que está crescendo na nova geração de
jovens adultos é parcialmente explicado por isso. Se você sofre de uma
overdose de potterismo – de maneira a ver o mundo real em termos de forças
ocultas e feitiços que as desbloqueiam – você é mais suscetível a pensar que o
que você quer será providenciado apenas por um click numa tela.

Os tweets da JK Rowling para seus 11 milhões de seguidores


encorajaram essa atitude. Eles falam de um mundo fantástico, onde os bens
são adquiridos simplesmente por querê-los. Resta então, pedir a um futuro
primeiro-ministro que balance a varinha mágica.

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