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ARTIMANHAS E OPINIÕES DO DOUTOR FAUSTROLL,

PATAFÍSICO

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Título original francês:

Gestes et opinions du docteur Faustroll pataphysicien : Roman néo-


scientifique suivi de Spéculations

Alfred Jarry

Tradução: Guilherme Trucco

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INTRODUÇÃO

Nenhum humor pode ser mais conciso e profundo do que o


humor causado pelo Surrealismo. Algo de assombroso paira entre
as linhas de uma obra surrealista, entre os poros de uma tela. A
justaposição de aspectos opostos é como se fosse um biscoito fino,
que ao mesmo tempo é crocante e macio, de sabor profundo.

Hemingway certa vez escreveu “as palavras perderam o seu


gume”. Escritor em busca da realidade mais crua, Hemingway
acreditava que as palavras, as coisas em geral, acabaram ficando
cegas, insossas, por conta do seu uso em demasia, caindo em um
lugar comum, sem criar tanto impacto. Entretanto, o gume do
surrealismo, por estar escondido, envolto nas entrelinhas da
contraposição, nunca perderá seu traçado. E é por conta dessa
beleza extraordinária dos opostos se encontrando, que a genialidade
de Jarry se mostra concentrada na Patafísica. A beleza de uma
ciência (uma forma de pensar que busca explicar de maneira
concreta a realidade) que não serve para outra coisa, a não ser
explicar soluções imaginárias e exceções.

A primeira ideia para esse texto de Jarry surgiu quando


ainda estudando, como forma de chacota do prolixo professor de
física, era a de fazer um “Tratado sobre a Patafísica” com uma
estrutura de texto se aproximando da escrita científica. Entretanto,
uma segunda ideia se formou, a de transformar a narrativa em uma
jornada indefinida e solta por terras maravilhosas, inspirado nas
obras de Homero e Rabelais. Dessa forma, a estrutura de seu
tratado-romance assume liberdade total para abordar qualquer
assunto. Faustroll simplesmente se move para outros tempos ou
lugares à sua vontade. Jarry denominou esse hibrido literário de
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“romance neo-científico”, ou em outro artigo, um “romance
hipotético”. Essa estratagema estrutural, vinha de encontro com
conceitos científicos que começavam a fascinar Jarry, como
podemos perceber pelo uso do termo Clinâmen (capítulo 34 livro 6)
cunhado por Lucrécio para denominar o comportamento
imprevisível dos átomos. Praticamente vinte e sete anos após a
morte de Jarry, na Conferência de Solvay de 1927, a física Quântica
entraria em total evidência. Físicos de hoje em dia ainda debatem
sobre a física quântica, e o princípio de incerteza de Heisenberg.
Dessa forma, Jarry unia forma e mensagem em uma bela simbiose.

Estava então criada a Patafísica, elevada a Escola por


colegas surrealistas como Eugene Ionesco, Marcel Duchamp entre
outros, e levada a perfeição por Raymond Roussel em Locus Solus,
onde invenções incrivelmente patafísicas nos levam por imaginários
incríveis (embora Roussel, mesmo contemporâneo de Jarry, nunca
o tenha conhecido).

Raymond Roussel, em seu texto “Como escrevi a maioria


dos meus Livros” onde disserta sobre seu método criativo, descreve
sua técnica de escrita a qual consistia em colocar duas palavras de
sons parecidos uma próxima da outra, e depois preencher a história
que havia entre elas.

A Patafísica sendo a ciência das soluções imaginárias, pode


portanto, como uma contraposição em si mesma, criar de diversas
outras contraposições imaginárias, de forma livre e ainda assim
incrivelmente conceitual e engraçada, mantendo a pureza do
traçado surrealista, destacando toda a genialidade de seu inventor.

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RESUMO GERAL

Livro 1

O Doutor Faustroll é despejado por falta de pagamento do


aluguel pelo meirinho Panmuphle, quem inventoria e apreende a
biblioteca pessoal de “vinte e sete livros equivalentes”.

Livro 2

Os elementos da Patafísica são brevemente demonstrados e


ilustrados por um experimento em relatividade e tensão de
superfície.

Livro 3

O Doutor Faustroll escapa da lei em um esquife ou peneira


a qual navega tanto em terra como por mar. Ele é acompanhado
pelo babuíno Bosse-de-Nage, como navegador, e por Panmuphle
domado pela bebida e acorrentado em seu acento, como remador e
narrador até o penúltimo livro. As suas peregrinações os levam por
quatorze terras ou ilhas, as quais a topografia e os habitantes são
descritos de forma a transmitir os comentários de Jarry sobre
quatorze amigos (ou inimigos) no mundo das artes – entre eles,
Aubrey Beardsley, Léon Bloy, Gauguin, Gustave Kahn, Mallarmé,
Henri de Regnier, e Marcel Schwob.

Livro 4

Após demais navegações, discussões, e um grande


banquete, Faustroll discursa sobre a morte e inicia um holocausto
no qual Bosse-de-Nage falece provisoriamente. Sua língua
monossilábica e auto suficiente (“Ha-ha”) é cuidadosamente
analisada.
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Livro 5

Após uma passagem coprológica sobre o “alejado sem


pernas” o qual representa Pierre Loti, Faustroll coloca Henri
Rousseau no comando da “máquina de pintar” para “embelezar” as
telas acadêmicas penduradas no museu de Louxemburg.

Livro 6

Enquanto Faustroll tem uma aventura erótica, a máquina de


pintar sob nome Clinâmen (de Lucrécio) executa treze pinturas,
cada uma descrita em um pequeno poema em prosa.

Livro 7

Faustroll morre afogado após afundar o esquife na tentativa


de evitar uma colisão, e seu corpo, como um pergaminho amarrado
desenrolado pela água, revela o futuro em suas espirais.

Livro 8

O livro final, intitulado Éternidade, conclui o tratado sobre


a Patafísica iniciado no livro dois. Duas cartas telepáticas de
Faustroll para Lord Kelvin sobre os seus experimentos em
medições, matéria, e luz, são seguidas por um discurso patafísico
sobre a superfície de Deus. Em teoremas geométricos precisos Ele é
demonstrado como sendo o “ponto tangêncial entre zero e o
infinito”.

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LIVRO 1

PROCEDIMENTOS

Notificação de acordo com o artigo 819

Neste ano de Mil oitocentos e Noventa e Oito, no oitavo dia


de Fevereiro, nos termos do artigo 819 do Código de Procedimentos
Civis e ao pedido do Sr. e da Sra. Bonhomme (Jacques),
proprietários de uma casa situada em Paris, à rua Richter número
100, o supracitado tendo endereço para serviços à minha residência
e adicionalmente à Prefeitura do Distrito Q.

Eu, o abaixo-assinado, René-Isidore Panmuphle, Meirinho


adjunto da Corte Civil de Primeira Instância do Departamento do
Sena, em sessão em Paris, residindo nesta mesma cidade, à rua
Pavée número 37. Venho por meio desta notificar em nome da LEI
e da JUSTIÇA, o Monsenhor Faustroll, doutor, tenente de vários
locais subordinados à casa supracitada, residindo em Paris, à rua
Richer número 100, e tendo prosseguido a supramencionada casa,
trazendo em seu exterior o número 100, e tendo tocado a
campainha, batido à porta, e chamado o supracitado por repetidas e
sucessivas vezes, tendo nenhuma pessoa aberto a porta para nós, e
os vizinhos da porta ao lado declarado a nós que realmente aquela
era a residência do Senhor Faustroll, mas estes vizinhos também se
recusando a aceitar uma copia desta escritura e, enquanto eu não
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encontrei em tais premissas nem parentes nem servos, ou nenhum
vizinho que aceitasse receber esta presente copia e assinar o
original, outrossim eu procedi imediatamente à prefeitura do distrito
Q, na qual eu entreguei pessoalmente esta copia para o Venerado
Prefeito, que certificou o original, outrossim; no período de no
máximo vinte e quatro horas, o reclamante deverá ser pago em
minhas mãos, em moeda corrente, a quantia total e valida da dívida
de trezentos e setenta e dois mil francos e vinte e sete centavos, que
condizem a onze trimestres de aluguel das premissas supracitadas,
a valer no primeiro dia de Janeiro último, sem prejuízos perante
aqueles que estão em crédito, e devido e para quaisquer outros
direitos, ações, interesses, custos e arrestos, declarando ao
supramencionado a falta da satisfação de sua presente notificação,
dentro do dito período, ele deverá ser obrigado outrossim por
meios legais, e notadamente pela apreensão e represamento de tais
bens e móveis que se encontrem nas instalações alugadas. Portanto
eu deposito esta presente copia do exposto nas instalações
referidas. Custo: Onze francos e trinta centavos, incluindo ½ folha
de papel especial timbrado, a zero francos e sessenta centavos.

PANMUPHLE

Para o Monsenhor Faustroll, Doutor,


e ao Prefeito do distrito Q.

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A RESPEITO DOS HÁBITOS E ATITUDES DO DOUTOR


FAUSTROLL

Doutor Faustroll tinha sessenta e três anos de idade quando


nasceu em Circassia, em 1898 (o século XX tinha [-2] anos de
idade).

À essa idade, a qual ele manteve durante toda a sua vida,


Doutor Faustroll era um homem de altura mediana, ou, para ser
absolutamente preciso, de (8x1010 +109 + 4x108 + 5 x 106)
diâmetros atômicos; com uma pele de amarelo ouro, sua face era
perfeitamente barbeada, com exceção de um bigode verde-mar,
como os tinha o Rei Saleh; seus cabelos eram alternadamente loiro-
platina e preto puro, uma ambiguidade ruiva que mudava de acordo
com a posição do sol; seus olhos, duas capsulas de tinta de escrever
comum salpicados com espermatozoides de ouro, como aguardente
Danzig.

Ele não tinha barba, a não ser pelo seu bigode, pelo uso
sagaz de micróbios de calvície, que permeavam sua pele desde suas
virilhas até as sobrancelhas e que se alimentavam de seus folículos
capilares, garantindo que Faustroll não precisasse se preocupar que
sua careca reluzente ou suas sobrancelhas fossem cair, já que estes
micróbios atacavam apenas cabelos frescos recém nascidos. Da sua
virilha para baixo, até os pés, em contraste, ele era envelopado de
pelo preto, pelo qual ele era um homem a um certo ponto
impróprio.

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Naquela manhã ele tomou o seu sponge-bath diário com
seu papel-de-parede de dois tons pintado por Maurice Denis, com o
desenho de dois trens subindo em espirais; há muito tempo atrás ele
tinha desistido da água em favor de papel-de-parede – oportuno,
elegante, e de acordo com seus caprichos.

Portanto para não deixar o populacho em geral


constrangido, ele desenhou e criou uma camisa feita de fibra de
quartzo; calças largas de um veludo preto enfadonho que
afunilavam rentes nos tornozelos; pequeninas botas cinzas, com
camadas iguais de poeira cuidadosamente preservadas, com grande
dificuldade, por muitos meses, quebradas apenas por formigueiros
secos de formiga-leão; um colete amarelo-ouro, de cor exatamente
igual à sua pele, com a mesma quantidade de botões de um pulôver,
e dois rubis como botões para os bolsos de peito, bem altos, e um
sobretudo forrado com pelo de raposa azul.

Em seu dedo indicador direito, ele usava múltiplos anéis de


esmeralda e topázio que se empilhavam até a altura da unha – a
única das dez que ele não roía – o limite dos anéis era mantido por
uma chaveta especialmente desenhada, feita de molibdênio,
aparafusada no osso da falange ungueal, atravessando a unha.

Por meio de um laço, ele amarrava em seu pescoço a fita


cerimonial da Grande Giroleta, uma Ordem inventada por ele
mesmo e patenteada pra evitar qualquer vulgarização.

Ele se enforcava com esta fita em uma forca especialmente


construída, procrastinando por alguns minutos para poder escolher
entre as duas maquiagens de asfixia, chamadas branco-enforcado, e
homem-azul-enforcado.

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E, depois de cortar o lenço para sair da forca, ele colocava
um chapéu colonial solar.

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MANDADO JUDICIAL

Neste ano de Mil oitocentos e


noventa e oito, no décimo dia de Fevereiro, às
oito horas da manhã, nos termos do artigo
819 do Código de Procedimentos Civis e ao
pedido do Sr. e da Sra. Bonhomme (Jacques), o marido comprou
em seu próprio nome e apoiado pela autorização de sua esposa,
proprietários de uma casa situada em Paris, à rua Richter número
100, o supracitado tendo endereço para serviços à minha residência
e adicionalmente à Prefeitura do Distrito Q.

EU, O ABAIXOASSINADO, RENÉ-ISIDORE


PANMUPHLE, MEIRINHO ADJUNTO AO TRIBUNAL CIVIL
DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DO DEPARTAMENTO DO SENA,
EM SESSÃO EM PARIS, E RESIDINDO NESTA MESMA
CIDADE, RUA PAVÉE, NÚMERO 37, venho por meio desta,
notificar em nome da Lei e da Justiça, o Monsenhor Faustroll,
doutor, tenente de vários locais subordinados à casa supracitada,
residindo em Paris, à rua Richer número 100, e tendo prosseguido a
supramencionada casa, trazendo em seu exterior o número 100, e
tendo tocado a campainha, batido à porta, e chamado o supracitado
por repetidas e sucessivas vezes, sem ter resposta, nós recorremos
ao escritório do Sr. Solarcable, comissário de polícia, este último
nos concedendo sua assistência em nosso empreendimento; o de
pagar a mim como Meirinho e portador da dita notificação, a
quantia de trezentos e setenta e dois mil francos e vinte e sete
centavos que condizem a onze trimestres de aluguel das premissas
supracitadas, sem o prejuízo de outras reivindicações, tendo o
nomeado se recusado a pagar estas reivindicações.

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Portanto, eu estou apreendendo em penhora e colocando sob a
autoridade da Lei e da Justiça os seguintes objetos:

A RESPEITO DOS LIVROS EQUIVALENTES DO DOUTOR


FAUSTROLL

Nas premissas detalhadas acima, com a entrada sendo efetuada


pelo Sr. Lourdeau, chaveiro de Paris, nº. 205, rua Nicolas Flamel,
com a exceção de uma cama feita de malha de cobre polido, com
doze metros de largura e sem roupa de cama, de uma cadeira de
marfim e de uma mesa de ônix e ouro; apropriação feita de vinte e
sete volumes sortidos, alguns em brochura e outros encadernados,
com os seguintes títulos:

1. BAUDELAIRE, um volume de E.A. POE traduções.


2. BERGERAC, Trabalhos, volume II, contendo a Historia
dos Estados e Impérios do Sol, e a História dos Pássaros.
3. O Evangelho de acordo com SAINT LUKE, em Grego.
4. BLOY, O Mendigo Ingrato.
5. COLERIDGE, A Balada do Velho Marinheiro
6. DARIEN, O Ladrão
7. DESBORDES-VALMORE, O Juramento dos Homens
Pequenos
8. ELSKAMP, Iluminuras
9. Um volume incomum das Peças de FLORIAN
10. Um volume incomum das Mil e Uma Noites, na tradução
GALLAND.

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11. GRABBE, Piadas, Sátira, Ironia e seu significado profundo,
comédia em 3 atos.
12. KAHN, O Conto do Ouro e do Silêncio.
13. LAUTRÉAMONT, Cantos de Maldoror
14. MAETERLINK, Aglavaine e Sélysette.
15. MALLARMÉ, Verso e Prosa.
16. MENDÉS, Gog.
17. A Odisséia, Edição de Teubner.
18. PÉLADAN, Babilônia.
19. RABELAIS.
20. JEAN DE CHILRA, A Hora Sexual.
21. HENRI DE RÉGNIER, A Cana de Jasper
22. RIMBAUD, Iluminações.
23. SCHWOB, A cruzada das Crianças
24. Ubu Rei.
25. VERLAINE, Sabedoria.
26. VERHAEREN, As Paisagens Alucinadas
27. VERNE, Viagem ao Centro da Terra

Adicionalmente, três quadros pendurados na parede, um pôster


de TOULOUSE-LAUTREC, Jane Avril; um de BONNARD, com
uma propaganda da Revue Blanche; um retrato do Doutor Faustroll,
por AUBREY BEARDSLEY; e uma fotografia antiga, que nos
pareceu ser um Saint Cado sem valor, impresso pela Oberthür
gráfica de Rennes.

Era impossível de entrar na adega, devido à inundação da


mesma. Estava aparentemente submersa, a uma altura de dois
metros, com uma mistura de vinho e destilados, entretanto nenhum
barril ou garrafa podia ser avistado.

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Eu instalei como guardião outrossim, na ausência do sujeito de
arresto, Sr. Delmor de Pionsec, uma das testemunhas nomeadas
abaixo. A venda deverá acontecer em qualquer dia que será
posteriormente decidido, ao meio dia, no Place de l´Opera.

Para todos os fatos supracitados, eu montei o presente relatório,


compilação que me tomou das oito da manhã até as quinze para as
três da tarde, e do qual eu deixei uma cópia para o sujeito de
arresto, nas mãos de vossa excelência o supramencionado
comissário de polícia, e com um guardião, e sem prejuízo para
nenhuma ação posterior, o assunto acima e na presença de e
assistido pelos Srs. Delmor de Pionsec e Troccon, advogados,
residentes em Paris, rua Pavée, número 37, as testemunhas
requeridas que assinaram em conjunto comigo o original e a copia.
Custo de trinta e dois francos, e quarenta centavos. Para as cópias
foram usadas duas folhas de papel oficial custando 1 franco e vinte
centavos. Assinado: Lourdeau, chaveiro. Assinado: Solarcable,
comissário de polícia. Assinado: Delmor de Pionsec. Assinado:
Panmuphle, meirinho. Registrado em Paris, ao décimo primeiro dia
de Fevereiro de 1898. Recebidos cinco francos. Assinado: Liconet.
Certificado de cópia verdadeira. (Ilegível.)

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