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RELATO DE Experience Report

EXPERIÊNCIA

As tecnologias de education-communication perspective, which is


a field of social intervention that emerged from
the interrelationship between communication and

comunicação education.
Keywords: Communication. Testimony. Techno-

na memória dos idosos logy. The elderly.

Communication technologies Introdução


in the elderly’s memory
Os indicadores de saúde e de quali-
Michel Carvalho da Silva dade de vida dos últimos anos revelam
Doutorando em Ciências Humanas e Sociais pela uma significativa melhoria nas condições
Universidade Federal do ABC (UFABC). Atualmente é de vida das populações tanto de países
jornalista na Câmara Municipal de Cubatão (SP). Atua
como professor colaborador do projeto de extensão desenvolvidos quanto daqueles que ainda
Universidade Aberta à Terceira Idade (Uati), não concluíram o processo de desenvol-
Santos (SP), Brasil.
vimento econômico e social. Isso resultou
michel.carvalho@ufabc.edu.br
na elevação da expectativa de vida, que,
no caso brasileiro, representa um salto de
Resumo: O trabalho recorre a depoimentos dos 33,4 anos em 1910 para os 73,1 em 2010
idosos a fim de compreender as transformações (IBGE, 2010). Com isso, o país apresenta
sociais ocorridas a partir da interação desse grupo um novo perfil demográfico. Hoje, temos
populacional com os meios de comunicação. Por
intermédio da dinâmica “Minha primeira vez”, cerca de 23 milhões de idosos.
cada participante da Uati rememora seu primeiro Essa mudança de paradigma fica mais
contato com o aparelho celular, o computador, a evidente quando pensamos na região me-
TV, o cinema e o rádio. A oficina foi desenvolvi-
da na perspectiva da educomunicação, que se tropolitana da Baixada Santista, que, nos
trata de um campo de intervenção social nascido últimos dez anos, apresentou um aumento
a partir da inter-relação comunicação e educação. de 44,84% de população de idosos (ses-
Palavras-chave: Comunicação. Memória. Tecno- senta anos ou mais), maior que a média do
logia. Idosos.
estado de São Paulo (43,84%) e do Brasil
(41,65%). A região contabiliza hoje em
Abstract: The article calls upon the elderly’s
testimonies in order to understand the social torno de 151 mil pessoas nessa faixa etária
transformations that occurred from the interaction (IBGE, 2010). Em números absolutos,
between this population group and the communi-
cation means. Through the workshop called “My
o total de idosos em Santos passou de
first time”, each UATI (Universidade Aberta da 65.200, em 2000, para 80.353 em 2010, o
Terceira Idade – Open University for the Elderly) que significa que de cada cinco moradores
participant recalls his/her first contact with the
cell phone, the computer, the TV, the cinema and da cidade, um tem mais de sessenta anos
the radio. The workshop was developed from the de idade.

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http://dx.doi.org/10.1590/0101-6628.074
Dessa maneira, o município santista é Jardim, tendo como responsável o autor
um lócus privilegiado para o desenvolvi- do presente artigo.
mento de atividades de extensão voltadas Situado o contexto em que se de-
para a terceira idade e para a investigação senvolve essa oficina com os estudantes
científica desse estrato social. da Uati, passaremos a refletir sobre três
O projeto de extensão Universidade tópicos conceituais: as potencialidades
Aberta à Terceira Idade (Uati) iniciou suas da terceira idade, a memória do idoso,
atividades em 2006 no campus Baixada e a educomunicação como linguagem e
Santista da Universidade Federal de São estratégia de conversação. Por fim, apre-
Paulo (Unifesp). A iniciativa atende estu- sentaremos o perfil dos participantes da
dantes na unidade central do campus e no Uati em relação ao uso das tecnologias
centro de convivência da Zona Noroeste, de comunicação e analisaremos a relação
na cidade de Santos (SP), e se propõe a dos idosos com esses dispositivos a partir
desenvolver um modelo de universidade de seus depoimentos.
para pessoas acima de sessenta anos, de
ambos os sexos, em consonância com uma
perspectiva crítica de saúde, educação e As potencialidades dos idosos
sociedade.
A proposta político-pedagógica da Uati Ricardo Moragas (2010), referência
considera que os idosos têm plenas condi- nos estudos sobre gerontologia social, nos
ções de continuar aprendendo, produzindo apresenta três conceituações de velhice:
e transmitindo saberes, motivo pelo qual é cronológica, funcional e etapa vital. A
tão importante aproximá-los dos estudan- primeira está relacionada a um aspecto
tes da graduação e do universo acadêmico. objetivo, ou seja, o fato de se atingir 65
As aulas buscam desenvolver temáticas anos. Apesar de considerar a idade um
que despertem o interesse dos estudantes dado importante, o autor critica essa clas-
de modo a envolvê-los e facilitem sua sificação meramente etária por levar em
compreensão do mundo, favorecendo a conta mais o mero transcurso do tempo
criação e o fortalecimento de vínculos e menos a qualidade do tempo decorrido,
intergeracionais (Silva et al., 2015). os acontecimentos vivenciados e as con-
A oficina “A comunicação e a tecnolo- dições ambientais que a rodearam.
gia na vida do idoso”, objeto desse relato O segundo tipo de conceituação está
de experiência, foi desenvolvida nos dias associado ao emprego do termo velho
22 e 29 de maio de 2015 como parte das como sinônimo de incapaz ou limitado,
atividades do projeto de extensão Uati traduzindo a relação tradicional entre
nas unidades Zona Noroeste e Silva velhice e vulnerabilidade. Essa represen-

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tação ajuda a explicar o isolamento social onipresença das tecnologias de comuni-
do idoso, que, por ter suas limitações cação no cotidiano das pessoas.
ressaltadas socialmente, não conseguiria
conviver com naturalidade com crianças,
jovens e adultos. A memória do idoso: recuperando
Por último, temos o conceito denomi- o passado
nado etapa vital, que enxerga o idoso como
um sujeito com muitas qualidades que de- A memória é objeto de investigação de
vem ser exploradas, apesar das limitações diferentes áreas do conhecimento, sendo
que, com o passar do tempo, vão se agra- que o conceito varia de acordo com a natu-
vando, especialmente nos últimos anos de reza do fenômeno e do enfoque da pesquisa.
vida. Moragas destaca que os idosos têm De forma geral, Jacques Le Goff (2003)
características únicas e distintas, como a entende que a memória, como propriedade
serenidade, a experiência, a maturidade, a de conservar determinadas informações,
perspectiva de vida pessoal e social. remete-nos primeiramente a um conjunto
de funções psíquicas, responsáveis pela
Uma pessoa idosa possui várias expe- atualização de impressões passadas ou que
riências, conhecimentos e saberes que o homem representa como passadas.
um jovem pode não ter. Mas este possui Maurice Halbwachs (2006) destaca
a vitalidade de que o velho carece. Se a
que pela memória o passado vem à tona,
sociedade valoriza unicamente o desen-
misturando-se com as percepções ime-
volvimento fisiológico, são evidentes
as limitações dos idosos. Contudo se diatas, deslocando-as, ocupando todo o
ela aprecia a qualidade psíquica social, espaço da consciência. Segundo o autor,
então há muitas oportunidades para eles. para se ter uma memória coletiva é preciso
(Moragas, 2010, p. 37) interligar as diversas memórias dos sujei-
tos que fazem parte do grupo identificado
Por vivermos em uma sociedade que como detentor daquela memória. Por isso,
valoriza o vigor físico, a velocidade e a Halbwachs não encara a memória como
imagem, o idoso não tem suas potenciali- um reviver, mas como um ato de recons-
dades desenvolvidas adequadamente. Por trução, resgatando vivências localizadas
isso, é imperioso dedicar maior atenção no tempo, no espaço e no conjunto de
aos nexos entre produção do conheci- relações sociais.
mento e envelhecimento ativo, a partir da Ecléa Bosi (2007), que tem destacado
recuperação das memórias do passado que trabalho sobre memória social a partir das
auxiliam na compreensão dos fenômenos lembranças de velhos, considera a velhice
sociais contemporâneos, como a quase tanto um destino biológico quanto uma

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categoria social. Ela defende que os idosos esquecida no tempo e a idealização dessa
têm a função social de lembrar, sendo que realidade, transformada e recriada cons-
a memória deles pertence à coletividade. tantemente. Essa tentativa de resgatar
A autora também entende que a evidência lembranças e reminiscências ajuda a evi-
oral, transformando os “objetos” de estudo tar que a imaginação dos idosos se torne
em “sujeitos”, contribui para uma história improdutiva, além de contribuir com o
mais verdadeira. processo de autoavaliação, que se constitui
Para Guita Debert (2004), o velho é de- como um verdadeiro mergulho interior:
positário de uma experiência e de um saber “Comprovou-se que levar o idoso a olhar
único e exclusivo dado pelo tempo vivido. seu percurso de vida desde o passado,
Para a antropóloga, a memória é um bem trilhando o presente até chegar ao futuro,
valioso que, assim como a história, deve poderá ajudá-lo a perceber melhor o que
ser transmitida à juventude. Por conta já conquistou e o que o motiva na vida”
disso, cada idoso, sendo portador dessa (Novaes, 2007, p. 106).
memória, deve ter sua respeitabilidade A memória tanto favorece o conheci-
recuperada e garantida pelos mais jovens. mento do passado na organização ordena-
As memórias dos idosos servem de da do tempo, localizando os eventos numa
marcas referenciais para a compreensão do sucessão cronológica, quanto contribui
processo histórico-cultural. Os relatos de para a identidade pessoal e social dos
experiências e vivências que marcam mo- mais velhos. Ao acionar suas lembranças,
mentos decisivos da população idosa regis- o idoso acaba reunindo fragmentos que
tram sonhos, medos, frustrações, escolhas serão conservados na memória, associando
e valores que entrelaçam três dimensões: começos e fins no tempo e no espaço.
o real, o simbólico e o imaginário. A memória social possui caráter dia-
É comum observar idosos que não lógico e, por isso, não representa somente
recordam de passagens cotidianas, mas o passado. Ela está ligada ao presente ao
lembram com exatidão de situações ocor- relacionar valores, preceitos e crenças. Se-
ridas há muitos anos. Isso acontece porque gundo Novaes, a memória, por sua natureza
a memória se desloca com mais facilidade dinâmica, é um processo conflitual e está
para evocações passadas devido ao seu inserida num movimento de constantes mu-
significado especial, ficando o registro do danças, sendo uma construção do presente,
dia a dia dificultado pelo desgaste cogni- através do resgate do passado, que se insere
tivo, comum da idade, e, sobretudo, pelo no campo das possibilidades do futuro.
pouco valor que lhe é atribuído. Jorge L. Bondia (2002) nos fala que
O exercício da memória aciona dois a aceleração em que o sujeito moderno
movimentos: a busca de uma realidade vive impede a experiência e, consequente-

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mente, a memória. Para ele, tudo se passa O olhar educomunicativo
demasiadamente depressa, numa vivência
pontual e fragmentada. O resgaste das lembranças dos idosos
em relação aos meios de comunicação foi
A velocidade com que nos são dados desenvolvido na perspectiva educomuni-
os acontecimentos e a obsessão pela cativa a fim de criar um espaço de troca de
novidade, pelo novo, que caracteriza o
saberes em que os estudantes da Uati/BS
mundo moderno, impedem a conexão sig-
se sentissem protagonistas do processo,
nificativa entre acontecimentos. Impedem
também a memória, já que cada aconte- num contraponto à tradição verticalizada
cimento é imediatamente substituído por e canônica dos ambientes de ensino.
outro que igualmente nos excita por um A centralidade da comunicação na vida
momento, mas sem deixar qualquer ves- das pessoas vem transformando vários
tígio. (Bondia, 2002, p. 23)
setores da sociedade, particularmente o
da educação. Educar já não é mais ex-
Assim, ao reter determinados fatos por clusividade de pais e professores. Com o
um longo tempo e recuperá-los no momen- avanço da midiatização (Hjarvard, 2012),
to da troca de experiências, os idosos se a informação circula rapidamente e o co-
contrapõem a esse processo de aceleração nhecimento é construído de forma pulveri-
temporal, exercitando sua capacidade de zada. Ser mediador nessa nova conjuntura
leitura do mundo. comunicacional é uma das características
Entender as formas como se dão as do educomunicador.
apropriações, os usos e as negativas com Na década de 1980, o filósofo Mário
relação aos meios de comunicação nos Kaplun, baseado na pedagogia de Paulo
leva a relacionar os processos entre o pas- Freire, cria o neologismo educomunicação
sado e o presente, bem como os sentidos para se referir a um novo campo de inter-
elaborados pelos mais envelhecidos. No venção social. As discussões sobre essa
entanto, Marialva Barbosa considera que emergente área do conhecimento foram
é “no processo de vida, na distinção que ampliadas pelo Núcleo de Comunicação
se faz em relação ao que já foi vivido, que e Educação da Universidade de São Paulo
se constrói o tempo histórico, tempo dos (NCE-USP) no final da década de 1990.
sujeitos e das ações do homem no mundo” De acordo com Citelli e Costa (2011),
(2015, p. 156). Dessa forma, o passado só a educomunicação não indica apenas a
pode ser recuperado parcialmente a partir existência de uma nova área que trabalha
de rastros e vestígios, ou seja, o passado na interface comunicação e educação, mas
tal como se deu não pode ser recuperado, também sinaliza para uma circunstância
e sim presumido como poderia ter sido. histórica, segundo a qual os mecanismos

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de produção, circulação e recepção do do os estereótipos de improdutividade,
conhecimento e da informação se fazem solidão e adoecimento.
considerando o papel de centralidade da
comunicação. Para os autores, a educo-
municação busca compreender a educação A experiência da oficina: apontamentos
formal, informal e não formal no interior
sobre os relatos
do ecossistema comunicativo, entendido
como o entorno educacional difuso e
A oficina “A comunicação e a tec-
descentralizado no qual estamos imersos.
nologia na vida do idoso” foi iniciada
A educomunicação, como uma rede com a exibição de um trecho do desenho
de relações inclusivas, abertas e criati-
animado Jetsons (Hanna-Barbera, 1962),
vas, atende a uma demanda da sociedade
que retrata a “era espacial”, mostrando
contemporânea, suprindo a lacuna entre o
como seria a humanidade em 2062: car-
saber formal e o midiático. Dessa maneira,
ros voadores, cidades suspensas, trabalho
uma oficina educomunicativa requer uma
automatizado, aparelhos eletrônicos que
metodologia voltada para a dialogicidade e
executam todas as tarefas cotidianas e
a convivência, não sendo possível realizá-
androides como empregados domésticos.
-la sumariamente de cima para baixo, de
O objetivo desse momento foi despertar a
forma dirigida e preocupada apenas com
resultados práticos. reflexão dos idosos sobre como se imagi-
nava o futuro naquela época. Vale destacar
Mais do que uma estratégia pedagó-
que muitos participantes da oficina afirma-
gica, a educomunicação é uma interface
de sociabilidade que tem o objetivo de ram que chegaram a pensar, quando eram
melhorar o coeficiente expressivo e co- crianças, que o mundo seria como aquele
municativo dos sujeitos envolvidos num retratado no desenho animado, ou seja,
processo educativo, rompendo com a bem mais automatizado e tecnológico do
cultura do silêncio, tão presente nesse que realmente é hoje.
grupo populacional. Depois desse panorama inicial, aplica-
Os idosos, quando estimulados a mos um questionário para verificar o uso
compartilhar suas experiências de vida, das tecnologias de comunicação pelos 76
têm a possibilidade de produzir novos idosos que participaram da oficina nas duas
conhecimentos, reforçar vínculos e desen- unidades da Uati. Como alguns deles apre-
volver maior autoestima. Dessa maneira, sentavam dificuldades de leitura e escrita,
o diálogo estabelecido entre os idosos, de o responsável pela oficina auxiliou-os no
forma livre e espontânea, pode ajudar a momento de preencher o questionário,
construir um ambiente favorável para um tomando cuidado para não direcionar as
envelhecimento realmente ativo, superan- respostas. Vejamos os resultados:

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1. Sexo

Masculino: 5 (7%) Feminino: 71 (93%)

2. Idade

60-65 anos: 15 65-70 anos: 12 70-75 anos: 21 75-80 anos: 21 Mais de 80 anos: 7
(19,74%) (15,79%) (27,63%) (27,63%) (9,21%)

3. Assinale o meio de comunicação que você mais utiliza?

TV: 46 Rádio: 7 Jornal/Revista: 7 Internet: 15 Outras Mídias: 1


(60,53%) (9,21%) (9,21%) (19,74%) (1,31%)

4. Você tem aparelho celular?

Sim: 64 (84,21%) Não: 12 (15,79%)

5. Você tem computador?

Sim: 53 (69,74%) Não: 23 (30,26%)

6. A internet mudou a sua vida de alguma maneira?

Sim: 54 (71,05%) Não: 22 (28,95%)

7. Você tem dificuldades em mexer no caixa eletrônico?

Sim: 31 (40,79%) Não: 45 (59,21%)

8. Você acessa o facebook?

Sim: 34 (44,74%) Não: 42 (55,26%)

9. Você tem e-mail?

Sim: 32 (42,10%) Não: 44 (57,90%)

10. Em relação às novas tecnologias, como você se sente? (Apenas um)

Preocupado: 13 (17,10%) Curioso: 49 (64,47%) Indiferente: 14 (18,42%)

Os números nos revelam alguns dados A maioria dos idosos tem computador
importantes para caracterizar o grau de (69,74%) e celular (84,21%), no entanto,
apropriação do grupo estudado acerca paradoxalmente, apenas 44,74% do grupo
das tecnologias de comunicação. Se a TV acessa a rede social facebook e só 42,10%
ainda é a mídia mais utilizada por esses possuem e-mail.
idosos, com 60,53%, chama a atenção o Os idosos, em sua maior parte (71,05%),
fato de a internet conquistar a preferência mostraram que a internet mudou a vida
de 19,74%, superando o rádio, o jornal e deles de alguma forma. Eles também
outras mídias. revelaram que, em relação às novas

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t­ ecnologias, se sentem curiosos (64,47%). passa também por sua experiência com as
Na realidade, como dito anteriormente, tecnologias de comunicação.
a tecnologia vem alterando a dinâmica Dessa forma, para entendermos como
social dessas pessoas há muito tempo, a os meios de comunicação desempenham
tal ponto que 59,21% dos participantes da papel importante no universo do idoso,
oficina afirmaram não ter dificuldades para é fundamental investigar as mediações
mexer nos caixas eletrônicos. sociais que o circundam, como a família,
Voltando à oficina, depois do preen- a igreja, o bairro, o centro de convivência,
chimento dos questionários, comentamos enfim, o entorno comunicativo, como
acerca da importância das tecnologias de nos acentua Jesús Martín-Barbero (2009,
comunicação na vida das pessoas. A turma, p. 261): “Assim, o eixo do debate deve
então, foi dividida em cinco grupos para se deslocar dos meios para as mediações,
participar da dinâmica “Minha primeira isto é, para as articulações entre práticas
vez”, em que cada participante descreveu de comunicação e movimentos sociais,
como foi seu primeiro contato com o para as diferentes temporalidades e para
aparelho celular, o computador, a TV, o ci- a pluralidade de matrizes culturais”.
nema e o rádio. Os participantes da oficina Cada um dos idosos trouxe uma his-
discutiram como eles encararam os dispo- tória singular, com seus caminhos per-
sitivos tecnológicos: de forma natural ou corridos de acordo com sua experiência.
com espanto? Os novos aparatos foram Por meio dos relatos, o participante da
vistos como aliados ou inimigos? Depois Uati resgata sua relação com as dife-
desse momento de partilha, cada grupo rentes tecnologias de comunicação ao
escolheu um representante para apresentar longo dos anos. A memória de um su-
aos demais a síntese da discussão coletiva. jeito pertencente a determinado núcleo
Ao realizar um esforço para recordar familiar evoca a experiência única ante
como foi seu primeiro contato com o ce- um evento comunicacional, como, por
lular, o computador, o rádio, o cinema, a exemplo, a transmissão de um jogo de
TV, o idoso resgata determinado período Copa do Mundo ou o último capítulo de
histórico, caracterizado por específicas uma radionovela.
práticas sociais de ser e estar no mundo. O exercício de recordar envolve o pro-
Além disso, não há como dissociar essa cesso de assimilação dos acontecimentos,
apropriação midiática da estrutura fami- que exige atribuir sentido aos eventos,
liar, da temporalidade social e da com- registrando situações e personagens que
petência cultural. A partir desse processo mais interessam. No caso de lembranças
de imbricação, podemos afirmar que a oriundas dos meios de comunicação, é
experiência coletiva de sociedade do idoso interessante observar que as memórias

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não foram centradas apenas no disposi- ções dedicam muito tempo ao uso desses
tivo tecnológico em si, mas também nos dispositivos. Alguns afirmaram ter difi-
contextos sociais em que ocorriam as culdades em conversar com filhos e netos
apropriações. por causa da atenção voltada quase que
Pelos relatos, verificamos também que, exclusivamente ao universo das redes
muitas vezes, a interpretação do grupo sociais (facebook, whatsapp, twitter, entre
acerca de um acontecimento do passado outras), que impossiblitam o diálogo face
supera o viés testemunhal do indivíduo, a face entre os familiares.
que, mesmo fazendo parte da sua história, Observamos ainda que muitos idosos
privilegia a representação elaborada pelo manifestaram um sentimento de saudo-
grupo sobre o fato. sismo, que remetia a um tempo em que as
Além da curiosidade, é natural que o pessoas se reuniam para escutar o rádio ou
surgimento de novas tecnologias possa assistir à TV, o que atualmente é raro por
gerar uma sensação de preocupação ou conta de nosso cotidiano cada vez mais
desconforto, que está associada, muitas acelerado e individualista. Fica claro, do
vezes, ao receio de ser excluído por não ponto de vista dos mais velhos, que quanto
saber utilizar tais dispositivos. Esse temor maior o desenvolvimento tecnológico,
foi relatado por alguns participantes da ofi- mais as pessoas se distanciam da vida
cina, que citaram como exemplo quando em grupo.
a máquina de datilografia foi substituída
pelos computadores nos escritórios e o
micro-ondas começou a fazer parte dos Algumas considerações
lares brasileiros.
Outra questão significativa levantada A presença da tecnologia tornou-se
pelos participantes da oficina é a importân- imperativa na sociedade desde o começo
cia de os idosos começarem a lidar com as da humanidade. Inovações, invenções de
tecnologias, a fim de se tornarem indepen- instrumentos e máquinas sempre acom-
dentes em suas atividades do cotidiano, ga- panharam os seres humanos, desde a era
rantindo com isso autoconfiança e também pré-histórica, passando pelas primeiras ci-
melhor qualidade de vida. Alguns deles vilizações, a Idade Média, a modernidade,
relataram que utilizar o caixa eletrônico até chegar aos dias atuais. Assim, desde o
era uma atividade complexa no começo, princípio, o imaginário, a representação de
mas que depois se tornou uma tarefa fácil, si, dos outros e do mundo são elaborados a
que não exige o auxílio de ninguém. partir de um aparato tecnológico.
Em relação às mídias digitais, boa Vale ressaltar que a tecnologia em
parte deles reclamou que as novas gera- si mesma não tem nenhum problema. A

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questão está no futuro do homem diante pensar na urgência dos estudos acerca da
do mundo maquínico; está no modo de apropriação social da tecnologia. Novos
sermos humanos e de nos relacionarmos. dispositivos não devem resultar em novos
O controle remoto, por exemplo, mudou processos de exclusão, principalmente em
o hábito de assistir à TV, tornando a troca relação aos mais velhos, que ainda não se
de canais uma atividade mais cômoda, mas adequaram às inovações incorporadas na
também contribuiu para que nos tornásse- vida cotidiana.
mos mais sedentários a partir do momento
que não precisávamos mais levantar do
sofá para executar essa tarefa.
Recebido em: 3/2/2016
No que se refere aos meios de comu-

nicação, algumas dessas tecnologias sur-
Aprovado em: 18/2/2016
giram na vida dos idosos de hoje quando
eles já eram adultos ou até mesmo velhos,
influenciando a relação estabelecida com
esses dispositivos. À medida que aumenta Referências bibliográficas
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