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As interações de um fármaco com o seu sítio de ação no sistema biológico ocorrem durante a chamada fase
farmacodinâmica e são determinadas por forças intermoleculares: interações hidrofóbicas, polares, eletrostáticas
e estéricas. Considerando os possíveis modos de interação entre o fármaco e a biofase, podemos classificá-los
de maneira genérica em dois grandes grupos; estruturalmente inespecíficos e estruturalmente específicos.
O
s fármacos ditos estrutu-
ralmente inespecíficos são enxofre produz o tiopental (4), cuja ligação localizado na macromolécula,
aqueles que dependem única lipossolubilidade é maior e tem ação o sítio receptor. A complementaridade
anestésica inespecífica (Figura 2) necessária para a interação da micro- 33
e exclusivamente de suas proprie-
dades físico-químicas, (coeficiente de (Foye et al., 1995, Gringauz, 1997). molécula com a biomacromolécula
partição, pKa) para promoverem o efei- receptora pode ser ilustrada simpli-
Fármacos estruturalmente específicos ficadamente pelo modelo chave-
to biológico. Os anestésicos gerais são
um exemplo clássico de substâncias Os fármacos estruturalmente espe- fechadura (Figura 3). Neste modelo
que pertencem a esta classe de fár- cíficos exercem seu efeito biológico podemos comparar a biomacromo-
macos, uma vez que seu mecanismo pela interação seletiva com uma deter- lécula com a fechadura, o sítio recep-
de ação envolve a depressão inespe- minada biomacromo- tor com o “buraco da
cífica de biomembranas lipo-protéicas, lécula alvo, que apre- fechadura” e as dife-
Os anestésicos gerais são
elevando o limiar de excitabilidade senta na maior parte rentes chaves com
um exemplo clássico de
celular ou a interação inespecífica com dos casos proprieda- ligantes do sítio re-
fármacos estruturalmente
sítios hidrofóbicos de proteínas do sis- des de enzima, proteína ceptor, isto é, regiões
inespecíficos, uma vez que
tema nervoso central, provocando per- sinalizadora (receptor), da micromolécula
seu mecanismo de ação
da da consciência. Neste caso especí- canal iônico ou ácido que vão interagir
envolve a depressão
fico, em que a complexação do fárma- nucléico. O reconhe- diretamente com a
inespecífica de biomem- macromolécula.
co com macromoléculas da biofase cimento do fármaco
branas lipo-protéicas Neste caso espe-
dá-se predominantemente através de (micromolécula) pela
interações de Van der Walls, a potência biomacromolécula de- cífico “abrir a porta”
do fármaco está diretamente relacio- pende do arranjo espacial dos grupa- ou “não abrir a porta” representariam
nada com a sua lipossolubilidade, mentos funcionais e das propriedades as respostas biológicas desta inte-
como está exemplificado comparati-
vamente na Figura 1, mostrando que
o halotano é mais potente que isofu-
rano (Foye e Williams, 1995).
Em alguns casos, a alteração das
propriedades físico-químicas decorren-
tes de modificações estruturais de um
fármaco pode alterar seu mecanismo
de interação com a biofase. Um
clássico exemplo encontra-se na
classe dos anticonvulsivantes. O pen-
tobarbital (3) é estruturalmente especí- Figura 1: Correlação entre as propriedades fisico-químicas e a atividade biológica dos
fico e tem ação sobre o receptor GABA fármacos estruturalmente inespecíficos (1) e (2).
Figura 7: Reconhecimento molecular da PGH2 (10) pelo resíduo Fe-Heme do sítio ativo da
tromboxana Sintase, via interação iôn-dipolo.
Figura 12: Ligações de hidrogênio e a manutenção da estrutura dupla fita do DNA. membros e a formação de uma ligação
covalente, responsável pela inibição
enzimática irreversível ou inativação do inflamatogênicas e pró-algésicas, devi- irreversível da enzima (Figura 16).
sítio receptor (Foye et al., 1995, Grin- do à inibição da enzima prostaglandina
gauz, 1997, Taylor e Kennewell, 1981, endoperóxido sintase (PGHS). Esta
A estereoquímica e o reconhecimento
Wolff, 1995). interação fármaco-receptor é de natu- molecular: Ligante / sítio receptor
38 Esta interação, envolvendo a forma- reza irreversível em função da forma- Apesar do modelo chave-fechadu-
ção de uma ligação sigma entre dois ção de uma ligação covalente resultan- ra ser útil na compreensão dos eventos
átomos que contribuem cada qual com te do ataque nucleofílico da hidroxila envolvidos no reconhecimento molecu-
um elétron, ocorrem com fármacos que do aminoácido serina530 ao grupamen- lar ligante-receptor, este modelo é uma
apresentam grupamentos com acen- to eletrofílico acetila presente em (14) representação grosseira da realidade,
tuado caráter eletrofílico e bionucleó- (Figura 15). uma vez que a interação entre a bio-
filos orgânicos. A aspirina (14) e a Um outro exemplo diz respeito ao macromolécula e a micromolécula
benzilpenicilina (15) (Foye et al., 1995, mecanismo de ação da benzilpenici- apresenta natureza tridimensional dinâ-
Gringauz, 1997) são dois exemplos de lina (15) e outras penicilinas sintéticas, mica. Desta forma, a dimensão mo-
fármacos que atuam como inibidores que atuam inibindo a D,D-carboxipep- lecular do ligante, as distâncias intera-
enzimáticos irreversíveis, cujo reconhe- tidase, enzima responsável pela forma- tômicas e o arranjo espacial entre os
cimento molecular envolve a formação ção de ligações peptídicas cruzadas grupamentos farmacofóricos cons-
de ligações covalentes. na peptideoglicana da parede celular tituem aspectos fundamentais na com-
O ácido acetil-salicílico (14) apre- bacteriana, através de processos de preensão de diferenças na interação
senta propriedades antiinflamatórias e transpeptidação (Figura 16). O reco- fármaco-receptor. A Figura 17 ilustra a
analgésicas decorrentes do bloqueio nhecimento molecular do fármaco (15) natureza 3D do complexo bio-macro-
da biossíntese de prostaglandinas pelo sítio catalítico da enzima é função molécula-micromolécula, com des-
de sua similaridade estru- taque para o arranjo espacial dos ami-
tural com a subunidade ter- noácidos que constituem o sítio ativo
minal D-Ala-D-Ala da pepti- (figura adaptada da obtida em
deoglicana. Entretanto, a li- pdb.life.nthu.edu.tw/)
gação peptídica inclusa no
anel β-lactâmico de (15) ca- Configuração absoluta e atividade
racteriza-se como um centro biológica
altamente eletrofílico, como Um dos primeiros relatos da litera-
ilustra o mapa de densidade tura que indicava a relevância da este-
eletrônica descrito na Figura reoquímica, mais particularmente da
16. Desta forma, o ataque configuração absoluta na atividade
nucleofílico da hidroxila do biológica, foi feito por Piutti (1886), des-
resíduo serina da tríade ca- crevendo o isolamento e as diferentes
talítica da enzima ao centro propriedades gustativas dos enantiô-
Figura 13: Principais grupos doadores e aceptores de eletrofílico de (15) promove meros do aminoácido asparagina (16)
ligações de hidrogênio. a abertura do anel de quatro (Figura 18). Essas diferenças de
Figura 22: Reconhecimento molecular dos grupamentos farmacofóricos dos estereoisômeros trans e cis-dietilestilbestrol (21).
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(IUPAC, 1996) (Figura 23). O reconhe- completa caracterização das proprie- TAYLOR, J.B. e KENNEWELL, P.D. In-
cimento seletivo dos ligantes de origem dades físico-quimico-estruturais da troductory medicinal chemistry. Nova
natural muscarina (23) e nicotina (24) micromolécula que codificam uma Iorque: John Wiley & Sons, 1981.
por estes subtipos de receptores, mensagem, que será lida após atingir TESTA, B. Acta Pharm. Nord., v. 2, p.
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permitiu evidenciar que a conformação um endereço específico: a biomacro- IUPAC, Comissão de nomenclatura em
antiperiplanar de (22) é responsável molécula receptora. Acentuaram-se química orgânica, Seção E: estereo-
pela interação com os receptores também as propriedades estereoquí- química (recomendações 1996). Pure
muscarínicos, enquanto a conforma- micas das moléculas e dos fragmentos Appl. Chem., v. 68, p. 2193-2222, 1996.
ção sinclinal de (22) é responsável pela moleculares e sua importância sobre WAINER, I. Drug stereochemistry - ana-
interação com o subtipo nicotínico a formação de interações entre os lytical methods and pharmacology. Nova
(Foye e Williams, 1995, Casy e Dewar, ligantes e o sítio receptor. Iorque: Marcel Dekker, 1993.
WERMUTH, C.G. The pratice of medici-
1993).
Agradecimentos nal chemistry. London: Academic Press,
Considerações finais 1996.
O autor agradece ao Prof. Carlos
WERMUTH, C.G.; GANELLIN, C.R.;
Os aspectos abordados nesta Rangel Rodrigues (LASSBio - Faculda- LINDBERG, P. e MITSCHER, L.A. Pure
comunicação destacam a interdisci- de de Farmácia - UFRJ) pelo auxílio na Appl. Chem., v. 70, p. 1129, 1998.
plinaridade característica da química confecção da Figura 17. WOLFF, M.E. Burger´s medicinal
medicinal e tornam evidentes que a chemistry and drug discovery. Nova
Carlos Alberto Manssour Fraga (cmfraga@pharma. Iorque: John Wiey & Sons, , 1995.
compreensão das razões moleculares ufrj.br), farmacêutico formado pela Faculdade de Far-