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Conselho Editorial
Cleonara Maria Schwartz, Eneida Maria Souza Mendonça, Giancarlo Guizzardi,
Gilvan Ventura da Silva, Glícia Vieira dos Santos, José Armínio Ferreira, Maria Hele-
na Costa Amorim, Sandra Soares Della Fonte, Wilberth Claython Ferreira Salgueiro.
Inclui bibliografia.
ISBN: 978-85-7772-141-2
Vitória • 2013
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO......................................................................................................07
CAPÍTULO l
A AMÉRICA LATINA NA LITERATURA
O jogo da amarelinha, de Julio Cortázar,
o fim-começo da aventura literária................................................. 17
Barroco, Surrealismo e miscigenação na
América Latina: água de um mesmo rio ................................ 55
CAPÍTULO II
O BRASIL NOS SERTÕES DA LITERATURA
Graciliano Ramos: um diálogo antimoderno
com a modernidade .......................................................................................... 81
A hora da estrela, de Clarice Lispector
– Macabéa, Dom Quixote da fome............................................... 93
João Gilberto Noll e o céu aberto do
niilismo contemporâneo............................................................................ 119
O corpo barroco de Grande Sertão:
veredas, de João Guimarães Rosa,
a traição a-Deus......................................................................................................125
CAPÍTULO III
A LITERATURA NO MUNDO E O MUNDO
NA LITERATURA
Mimesis, alteridade e pobreza.......................................................... 143
O que é a literatura? Literatura,
experimentação e engajamento
– a carta do amor louco ............................................................................ 167
APRESENTAÇÃO
Referências bibliográficas
Bibliografia do autor
RAMOS, Graciliano. Angústia. São Paulo: Record, 1984.
RAMOS, Graciliano. Caetés. Rio de Janeiro: Record, 1983.
RAMOS, Graciliano. Infância. Rio de Janeiro: Record, 1984.
RAMOS, Graciliano. Linha torta. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
RAMOS, Graciliano. Memórias do Cárcere. São Paulo: Record,
1992. v. 1 e 11.
RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 1985.
Quanto ao futuro
Ou
Lamento de um blue
Ou
DEDICATÓRIA DO AUTOR.
(Na verdade Clarice Lispector)
Questão de mimesis
Antes de começar a falar de mimesis, tendo em vista os textos
de Compagnon, O demônio da Teoria1, e de Luiz Costa Lima,
Dispersa Demanda2, primeiramente vamos à palavra mimesis. Em
termos gerais, é sinônimo de representação, trata da relação do
texto com o mundo, do modo como esse ou aquele texto (seja
literário ou não) representam aspectos do mundo, entendendo
o mundo como aquilo a que estamos acostumados a chamar de
realidade.
Nesse sentido, mimesis, referência, representação, significado,
conteúdo, tema, autor, leitor, intenção (do autor, por exemplo,
ao escrever um texto de criação), história, contexto, operário,
patrão, colonizador, colonizado, mulher, negro, fome, injustiça,
justiça, sonho, desejo, loucura, paixão, libidos corporais,
poder, dominado, dominante, ideologia, heterossexualidade,
homossexualidade, enfim, tudo que tenha a ver com o mundo
– mesmo que o mundo do texto – pode ser considerado como,
digamos, questões relacionadas à mimesis.
Embora pretenda, como se vê, inscrever este ensaio no
campo das obviedades, do senso comum, ressalte-se que não
conceberei, aqui, mimesis como imitação da realidade, sua
reprodução, como se de um lado tivesse o mundo e de outro as
suas representações miméticas. Minha intenção é a de enfocar
Mimesis platônica
Acho que Platão, na República4, antecipa o que, ainda hoje,
constitui a ferida aberta que perpassa, o tempo todo, essa
relação entre mundo e instituições, o mundo e os textos
literários.
Na República, Platão se preocupa antes de tudo em pensar como
deveria ser a sua cidade ideal, como deveria, enfim, ser organizada,
politicamente, uma cidade, para que funcionasse bem, para que
Mimesis em Compagnon
Chegamos finalmente em Compagnon, em seu O demônio
da teoria. Observem que o texto começa com o tópico “O
Mundo”5, o que se justifica na medida em que ele propõe falar
sobre mimesis e, portanto, sobre a relação da literatura com a
realidade.
Logo de saída Compagnon menciona Aristóteles, Poética. Nesse
livro, Aristóteles já pensa a mimesis para além da imitação
da realidade, inscrevendo-a como instância de recriação do
mundo6. De qualquer forma, o que se destaca em Aristóteles,
ou pelo menos o que a modernidade tem destacado em
Aristóteles é o fato de ele ter abandonado um pouco o mundo,
ou as questões do mundo, para se prender nas questões das
tipologias textuais, discorrendo sobre o gênero épico, o lírico e
o dramático.
Notas
1
Dialogo com O Demônio da Teoria, especialmente tendo em
vista o seu capítulo sobre mimesis, com sua exposição descritiva
de tendências e correntes críticas a respeito do assunto. Cf.
COMPANON, Antoine. O demônio da teoria: literatura e senso
comum. Trad. Cleonice Paes Barreto Mourão e Consuelo Fortes
Santiago. 2. ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003. p. 96-115.
2
Interesso-me pela leitura que Luiz Costa Lima faz sobre o
conceito de mimesis em Demanda Dispersa. Cf. LIMA, Luiz Costa.
Demanda Dispersa: ensaios sobre literatura e teoria. Rio de
Janeiro: Francisco Alves, 1981. p. 216-234.
3
O sociólogo português Boaventura de Souza Santos
trabalha com três tipos de racionalidade, a saber, a cognitivo-
instrumental, a estético-expressiva e a moral-prática, ligada
ao senso comum. Cf. SANTOS, Boaventura de Souza. Crítica da
Preâmbulo
O termo literatura, para designar um campo discursivo, surge
no início século XVIII, concorrendo com a expressão belas
letras e superando-a de vez a partir do século XIX, designando,
genericamente, as letras artísticas em contraste com as letras
filosóficas e as letras científicas.
Bem mais que pontuar essa substituição de termos, de belas
letras para literatura, faz-se necessário refletir sobre os motivos
histórico-culturais que levaram o segundo termo, literatura, a
impor-se sobre o primeiro, as belas letras.
O argumento deste artigo é simples: o termo literatura substituiu
o de belas letras porque, por razões diversas, se tornou
historicamente mais apropriado para designar um conjunto de
textos, cada vez mais comuns a partir do século XVIII, que não
apenas não se encaixavam mais nas floreadas fronteiras das
belas letras, mas antes de tudo porque eram textos marcados
por uma alta voltagem experimental, estranha e iconoclástica,
seja em relação às formas fixas herdadas da tradição, seja em
relação ao tratamento dado ao tema, nos termos também da
tradição clássica, sobretudo a aristotélica.
* Ensaio publicado originalmente em: FERREIRA FILHO, Júlio F. e SOUZA, Santinho Ferreira de (orgs.). Jornadas
de Leitura Monteiro Lobato e Rubem Braga. Versão 1.0. Vitória, 2007. 1 CD-ROM. Configuração mínima: PC 486
DX2 66 Mhz, 1 Mb de espaço livre no disco rígido, 8 Mb de memória RAM, monitor SVGA color, drive CD-ROM, kit
multimídia, Windows 95, 98, ME, NT, 2000 ou XP
Considerações finais
Se comecei este ensaio dizendo que a divisão social do trabalho
impôs a consequente divisão das práticas e dos saberes – texto
literário em contraposição ao discurso científico e filosófico –, o
encontro pessoal da literatura, de alta voltagem experimental,
com ela mesma (ou a experimentação pela experimentação,
gueteada em rituais vanguardeiros, protagonizados por
agitadores culturais), bem mais que uma tragédia, tornou-se
a própria farsa, tanto mais farsesca e permitida quanto mais
orgulhosa de si, de ter se transformado em experimentação de
papel, para poucos, fora do quartel.
Certamente dessa situação resultou a extrema dificuldade,
especialmente entre surrealistas e existencialistas, na primeira
metade do século passado, de fazer convergir experimentação
e engajamento, outro nome para o encontro pessoal.
Igualmente é somente nesse contexto que faz sentido que
tenha virado lugar comum (e não apenas na academia) o