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Rev Bras Crescimento

Elementos protetores doDesenvolvimento


leite materno Hum. 2010; 20(2): 351-360 REVISÃO
Rev Bras Crescimento Desenvolvimento Hum. 2010; 20(2): 351-360
REVIEW

ELEMENTOS PROTETORES DO LEITE MATERNO NA


PREVENÇÃO DE DOENÇAS GASTRINTESTINAIS E
RESPIRATÓRIAS

PROTECTIVE ELEMENTS OF BREAST MILK IN THE


PREVENTION OF GASTROINTESTINAL AND RESPIRATORY
DISEASES
Adriana Passanha ¹
Ana Maria Cervato-Mancuso ²
Maria Elisabeth Machado Pinto e Silva ²

Passanha, A; Cervato-Mancuso, AM.; Silva MEMP. Elementos protetores do leite materno


na prevenção de doenças gastrintestinais e respiratórias. Rev. Bras. Cresc. e Desenv.
Hum. 2010; 20(2): 351-360.

Resumo
Objetivos: identificar os elementos protetores do leite materno que atuam na prevenção de
doenças gastrintestinais e respiratórias. Fonte dos dados: a busca foi realizada nas bases
de dados Bireme, Lilacs, Medline e Scielo, utilizando os descritores leite materno, doenças
gastrintestinais e doenças respiratórias, com limites de idiomas (português, inglês e
espanhol) e de período (1996 a 2009). Foram selecionados 46 textos por atenderem aos
objetivos deste trabalho. Síntese dos dados: a IgA é imunoglobulina com maior capacidade
protetora contra ambos os tipos de doenças, por sobreviver às mucosas intestinal e
respiratória. O leite materno também possui outras imunoglobulinas, anticorpos,
oligossacarídeos, lipídeos, peptídeos bioativos, entre outros constituintes exclusivos com
mecanismos específicos que, além da proteção contra essas doenças, estimulam o
desenvolvimento do sistema imune do lactente. Assim, nenhum outro leite possui essas
propriedades e podem até ser a causa destas doenças. Campanhas e ações em Saúde Pública
que incentivam o aleitamento materno devem ser continuamente desenvolvidas e
estimuladas, considerando todos os benefícios que o mesmo proporciona.

Palavras-chave: leite humano; gastroenteropatias; doenças respiratórias; aleitamento


materno.

1 Nutricionista, aprimoranda na área de Nutrição em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública – USP.
2 Professoras Doutoras do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública – USP.
Faculdade de Saúde Pública – USP - Departamento de Nutrição.
Av. Dr. Arnaldo, 715. Cerqueira César. São Paulo – SP. Cep: 01246-904
Autor responsável: Adriana Passanha. E-mail: adriana.passanha@gmail.com
Endereço para correspondência: Av. Dr. Arnaldo, 715. Cerqueira César. São Paulo – SP. CEP: 01246-904.
Conflito de interesse: nada a declarar.

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Abstract
Objective: to identify the protective elements of breast milk that work in the prevention of
gastrointestinal and respiratory diseases. Sources: the search was performed on Bireme,
Lilacs, Medline and Scielo databases, using keywords breast milk, gastrointestinal disease
and respiratory disease, with limits of languages (English, Portuguese and Spanish) and
period (1996 to 2009). 46 papers were selected for achieving the objectives of this work.
Summary of the findings: the IgA is the immunoglobulin with more protective capability
against both types of disease, to survive the intestinal and respiratory mucosa. Breast milk
also contains other immunoglobulins, antibodies, oligosaccharides, lipids, bioactive peptides,
among other components with unique mechanisms that besides the protection against these
diseases, stimulate the development of infants’ immune systems. No other milk has these
properties, and may even be the cause of these diseases. Campaigns and actions in Public
Health to encourage breastfeeding should be continuously developed and encouraged
considering all the benefits it provides.

Key words: milk, human; gastrointestinal diseases; respiratory tract diseases; breast feeding.

INTRODUÇÃO aleitamento materno em todo o país9. Apenas


35% dos lactentes menores de quatro meses
O aleitamento materno representa uma são amamentados exclusivamente e o desma-
das experiências nutricionais mais precoces do me precoce ainda está associado a altos índi-
recém-nascido1. Nenhum outro alimento ou lei- ces de mortalidade infantil por desnutrição e
te industrializado modificado é capaz de ofe- diarreia8.
recer ao bebê todos os ingredientes do leite Estimativas recentes quanto a diversas
materno. Este alimento apresenta composição formas de ação e suas consequências para a
específica que se ajusta às necessidades nutri- saúde da criança mostraram que a promoção
cionais do lactente, e é compatível com suas do aleitamento materno exclusivo é a interven-
limitações metabólicas e fisiológicas2,3. Ade- ção isolada em saúde pública com o maior po-
mais, não representa ônus para o orçamento tencial para a diminuição da mortalidade na
familiar4,5. infância10, já que o aleitamento materno exclu-
Embora a frequência e a duração do alei- sivo contribui para reduzir a morbimortalidade
tamento venha evoluindo favoravelmente duran- infantil11. De acordo com Betrán et al.12, 13,9%
te os últimos 30 anos6, e apesar do consenso de todas as causas de mortalidade infantil na
acerca das inúmeras vantagens do aleitamento América Latina podem ser prevenidas através
materno e da mobilização mundial nas últimas do aleitamento exclusivo em lactentes de 0 a 3
décadas para recuperação da cultura da amamen- meses e em aleitamento parcial no primeiro ano
tação, o desmame precoce ainda é uma prática de vida.
comum em todo o mundo7,8. No Brasil, a maioria das mulheres inicia
Os índices da frequência e duração do o aleitamento materno; entretanto, mais da
aleitamento materno vêm contrariando a efi- metade das crianças já não se encontra em
cácia dos esforços de inúmeros programas ofi- amamentação exclusiva no primeiro mês de
ciais e não governamentais, de incentivo ao vida, o que contraria a recomendação da OMS13

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de que o aleitamento exclusivo deve durar até fecções no ser humano é representada pelas su-
os seis meses de idade5. perfícies mucosas, principalmente dos tratos
O período entre o nascimento e os dois gastrintestinal e respiratório. Através da alimen-
anos de idade é muito crítico para a promoção do tação e da respiração o organismo entra em con-
crescimento, da saúde e desenvolvimento ótimos. tato com microorganismos patogênicos, assim
O aleitamento materno é uma ferramenta privile- como substâncias potencialmente alergênicas ou
giada para assegurar às crianças os melhores re- nocivas23. A amamentação exclusiva salva mi-
sultados possíveis e transitar com êxito esse pe- lhões de crianças a cada ano por prevenir doen-
ríodo tão vulnerável da vida, de maneira a ças infecciosas agudas e crônicas, principalmen-
contribuir com um melhor desempenho nas eta- te respiratórias e intestinais7.
pas seguintes14, auxiliando, também, na preven- Considerando todos os efeitos benéficos
ção de doenças na infância e na idade adulta15. da amamentação e a proteção exclusiva que esta
A amamentação oferece inúmeros bene- oferece contra diversas doenças, o objetivo
fícios para a saúde da criança, sendo a melhor deste estudo é identificar os elementos prote-
maneira capaz de promover seu desenvolvi- tores presentes no leite materno que atuam na
mento integral, pois o leite materno fornece os prevenção de doenças gastrintestinais e doen-
nutrientes necessários para a criança iniciar ças respiratórias.
uma vida saudável16. O leite humano supre as
necessidades do lactente até o sexto mês de
vida17,18, e durante o primeiro ano da criança é METODO
um dos meios mais eficientes de atender seus
aspectos nutricionais e imunológicos19. Trata-se de uma revisão sobre o tema,
Além da composição adequada de nu- onde as informações foram obtidas por meio
trientes, o leite materno possui outros compo- de rastreamento literário sistemático, empre-
nentes que atuam na defesa do organismo do gando-se a técnica booleana utilizando a pala-
lactente, como imunoglobulinas, fatores anti- vra and e os seguintes descritores: leite mater-
inflamatórios e imunoestimuladores. Seus me- no and doenças gastrintestinais; e leite materno
canismos incluem atividade específica contra and doenças respiratórias. Para tanto, utiliza-
agentes infecciosos, crescimento celular da ram-se fontes de pesquisa como publicações
mucosa intestinal aumentando a resistência às específicas e os provedores de pesquisa
infecções, entre outros2,3. Há relatos de apro- Bireme, Lilacs, Medline e Scielo. Como crité-
ximadamente 250 elementos de proteção no lei- rios de busca foram utilizados limites de idio-
te humano, além de fatores de crescimento do mas (português, espanhol e inglês), e de perío-
trato gastrintestinal19. do (1996 a 2009).
A lactação diminui a incidência e/ou a Com estes limites de pesquisa, foram
gravidade de diarreia, botulismo, enterocolite rastreados 302 materiais. Destes, foram sele-
necrotizante, alergias, doenças infecciosas e cionados 46 por atenderem aos objetivos do
respiratórias, entre outras doenças3,5,11,12,20,21, presente trabalho.
incluindo as auto-imunes20, como também es-
timula o desenvolvimento adequado do siste-
ma imunológico do bebê18. ELEMENTOS DE PROTEÇÃO DO LEI-
Outros tipos de leite aumentam os riscos TE MATERNO
de desenvolvimento de doenças e alergias17, e
podem ocasionar lesões no intestino imaturo do Recém-nascidos e lactentes, sobretudo
lactente22. A porta de entrada da maioria das in- nos primeiros seis meses de vida, são mais

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vulneráveis a infecções, devido à imaturidade nucleotídeos, plasmócitos e células


do sistema imunológico e à maior epiteliais2,18,27,29-32.
permeabilidade intestinal. Assim, durante um O leite humano possui também
período crítico de relativa incompetência lactoperoxidase, que oxida bactérias com ação
imunológica, o leite humano apresenta atribu- antimicrobiana18,29. Os macrófagos e linfócitos
tos de qualidade frente às suas necessidades são responsáveis pela fagocitose e pela produ-
imunobiológicas, protegendo-os de diversas ção de fatores do complemento27.
doenças2,23,24. Os anticorpos presentes no leite mater-
Tanto a idade cronológica quanto o es- no são dirigidos a inúmeros microorganismos
tado nutricional das mães não influenciam de com os quais a mãe entrou em contato durante
forma significante as concentrações de proteí- toda sua vida, representando um tipo de “re-
nas totais, albuminas, IgG e IgA presentes no pertório” imunológico. A maior parte desses
colostro25. A glândula mamária parece ter me- microorganismos já entrou em contato com as
canismos específicos para regular a concentra- superfícies mucosas do aparelho gastrintestinal
ção de oligoelementos no leite, mesmo em con- ou respiratório maternos20.
dições específicas de variação de dieta Além dos anticorpos, o colostro huma-
materna26. no contém inúmeros fatores bioquímicos e cé-
No entanto, a composição do leite de lulas imunocompetentes, que interagem entre
mãe de prematuro apresenta algumas dife- si e com a mucosa dos tratos digestivo e respi-
renças, pois promove efeitos anti-inflama- ratório do lactente, conferindo não apenas imu-
tórios mais exuberantes do que o leite de nidade passiva, como também estímulo ao de-
mãe de recém-nascido a termo 27. Essa com- senvolvimento e maturação do próprio sistema
posição diferenciada pode prover imune de mucosas do neonato11.
imunoproteção via maturação do intestino Os glicoconjugados e oligossacarídeos
do prematuro 27 , já que pré-termos têm possuem atividade antiaderente para inúmeros
maior risco de desenvolver complicações microorganismos causadores de doenças
no trato gastrintestinal e respiratório 28 . As gastrintestinais e respiratórias23. O leite de vaca
propriedades nutricionais e anti-infeccio- não possui nenhum elemento imunológico que
sas do leite da mãe de pré-termos são ade- seja favorável ao lactente27, e a administração
quadas às necessidades fisiológicas e de alimentos ou suplementos pré-lácteos au-
imunológicas do imaturo tubo digestivo do menta o risco de infecções no lactente4.
recém-nascido, com maior quantidade de
IgA, lisozima e lactoferrina 2.
As propriedades antiinfecciosas do lei- DOENÇAS GASTRINTESTINAIS
te humano são representadas através dos com-
ponentes solúveis e celulares. Os solúveis in- Já no ano de 1989, quando foi publica-
cluem imunoglobulinas, IgA, IgM, IgD, IgE, do o estudo de Brown et al.33, sabia-se que o
IgG, com predominância da IgA, lisozima, uso de chupetas e a administração de chás e
lactoferrina, componentes do sistema do com- outros fluidos não-nutritivos a lactentes, além
plemento (C3, C4), peptídeos bioativos, de favorecerem o desmame precoce, predis-
oligossacarídeos e lipídios (fator põem o aparecimento de diarreia, pelo risco
antiestafilococos e inativação de vírus). Os de contaminação a que ficam expostos.
componentes celulares imunologicamente ati- O prolongamento do aleitamento mater-
vos são constituídos por fagócitos no traz benefício adicional no final do primei-
polimorfonucleares, linfócitos, macrófagos, ro e segundo anos de vida, quando a incidên-

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cia de diarreia alcança seu valor máximo17. A Os carboidratos presentes no leite hu-
presença de leite no lúmen intestinal estimula mano são os oligossacarídeos e a lactose. Os
o desenvolvimento de sua mucosa17,28 e a ativi- oligossacarídeos, na presença de peptídeos,
dade da enzima lactase34. De acordo com a re- formam um fator bífido (carboidrato com ni-
visão de Toma & Rea10, bebês amamentados trogênio dialisável). No meio rico em lactose,
exclusivamente apresentaram menor produzirá ácido láctico e succínico, o que di-
morbidade por diarreia em comparação com minui o pH intestinal, tornando o local desfa-
aqueles que receberam aleitamento materno vorável ao crescimento de bactérias
junto com alimentos complementares aos três/ patogênicas, fungos e parasitas. Sendo assim,
quatro meses. a lactose também exerce fator protetor ao de-
Desde as primeiras horas de vida diver- senvolvimento de afecções gastrintestinais,
sas linhagens de Escherichia coli colonizam o promovendo essa colonização benéfica2,38.
intestino humano, passando a fazer parte da sua Esses oligossacarídeos nitrogenados
flora normal. No entanto, algumas destas po- possibilitam a instalação da flora bífida que
dem causar doença intestinal grave23. No re- impede, por ação seletiva, que novas bactérias
cém-nascido, a imaturidade do epitélio intesti- recém-chegadas à luz do intestino e os poten-
nal, a baixa acidez gástrica e a menor atividade ciais agentes patogênicos da diarreia, como a
de enzimas digestivas não constituem uma bar- E. coli, dentre outras enterobactérias, coloni-
reira muito eficiente contra a entrada de micro- zem o trato intestinal18,29,31.
organismos35. A mucina é uma proteína presente no
A partir da década de 1970, com a des- colostro ligada aos glóbulos de gordura. Sua
coberta do fator bifidus, torna-se cada vez mais principal função é inibir a adesão bacteriana
conhecido o mecanismo pelo qual ocorre a pro- ao epitélio intestinal39.
teção da mucosa intestinal contra os agentes Algumas gorduras poliinsaturadas, como
patogênicos. Vários tipos de oligossacarídeos os ácidos araquidônico e linoleico, têm impor-
e glicoconjugados presentes no leite materno tância na síntese de prostaglandinas envolvi-
(conhecidos como agentes prebióticos) estimu- das em funções biológicas que atuam sobre a
lam a colonização do intestino por digestão e sobre a maturação de células intes-
microorganismos benéficos. Esses agentes atu- tinais, propiciando a queda da prevalência de
am na primeira etapa essencial da patogênese, alergia intestinal e contribuindo para a defesa
ao impedir que um microorganismo se fixe na do lactente2,40. Os lipídeos presentes no leite
parede celular36. humano são hidrolisados em ácidos graxos e
Crianças amamentadas exclusivamente monoglicerídeos que têm atividade sobre al-
apresentam uma flora intestinal benéfica, com guns tipos de vírus, de bactérias e de
maior quantidade de bifidobactérias e menos protozoários39.
Clostridium dificile e Escherichia coli, de acor- Nucleotídeos, glutamina e lactoferrina
do com Penders et al.37. Segundo o estudo des- presentes no leite materno influenciam o de-
ses autores, que examinaram as fezes de 1.032 senvolvimento gastrintestinal e as defesas do
bebês holandeses de até um mês de idade, den- organismo3,21,35,41. A glutamina age como prin-
tre os principais fatores determinantes da cipal combustível para o crescimento do
microflora intestinal no início da vida está a ali- epitélio intestinal em períodos de estresse28.
mentação infantil. Já em 1905, havia registros Uma das funções da lactoferrina é quelar
de diferenças na composição da microflora in- íons ferro, que são essenciais para a multipli-
testinal de crianças amamentadas em compara- cação de microorganismos patogênicos, dimi-
ção a crianças desmamadas. nuindo assim sua biodisponibilidade no

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microambiente intestinal, processo que é fa- compensatório. Sendo assim, anticorpos IgM
vorecido pela presença de bicarbonato no leite podem ter um importante papel na defesa das
humano39,42. A lactoferrina é encontrada intacta superfícies mucosas do lactente23.
tanto nas fezes quanto na urina de crianças No decorrer da lactação, mesmo com o
amamentadas, podendo assim exercer um pa- declínio da secreção de IgA no leite materno, a
pel protetor sistêmico23. atividade biológica de inibição da adesão
A lisozima é uma enzima com ação bacteriana permanece inalterada. Esse dado é
bactericida, interagindo sinergicamente com compatível com o fato de que as crianças per-
lactoferrina e IgA 39,42. A proteção contra manecem protegidas contra gastrenterites du-
gastrenterites se traduz numa menor incidên- rante todo o período de aleitamento. Diarreias
cia de diarreias, pela presença de anticorpos são mais frequentes após o desmame, indepen-
IgA presentes no leite materno, reativos com dente da idade em que ocorram. Por sua vez,
patógenos ou toxinas20. esses dados reforçam a importância do leite ma-
A IgA é a principal imunoglobulina do terno para recém-nascidos prematuros e peque-
colostro23,28,43. Ela está presente no intestino de nos para a idade gestacional23.
bebês alimentados com leite humano, impedin- A caseína do leite humano é também um
do a invasão e a aderência de vírus e bactérias de seus vários constituintes que ajudam a pro-
na mucosa intestinal, e neutralizando toxinas teger a criança de infecções gastrintestinais,
e fatores de virulência28. impedindo a aderência de bactérias às células
A principal ação da IgA é se ligar a da mucosa intestinal2.
microorganismos e macromoléculas, inibindo Anticorpos secretores reativos com os
a interação entre bactérias e células epiteliais, fatores de virulência de algumas bactérias são
impedindo sua aderência às superfícies capazes de inibir a adesão bacteriana à mucosa
mucosas, prevenindo o contato de patógenos intestinal e com isso impedir a colonização do
com o epitélio44. Dessa forma, a IgA protege a hospedeiro, impedindo a sequência de eventos
mucosa contra diarréias, pois forma um reves- que culminaria em infecção e diarreia. Esse é
timento protetor nas superfícies mucosas do um importante mecanismo de proteção confe-
lactente23. rido pelo leite materno, que deve ocorrer em
Os anticorpos IgA do colostro resistem casos de diversas infecções iniciadas pela ade-
ao trato gastrintestinal do recém-nascido e po- são de microorganismos às superfícies
dem ser encontrados intactos nas fezes, pre- mucosas45.
servando a mesma reatividade contra antígenos
que apresentavam quando no colostro da mãe,
conservando sua atividade anti-infecciosa ao DOENÇAS RESPIRATÓRIAS
longo de todo o trato gastrintestinal do recém-
nascido23,39,42,45. Sua estrutura peculiar promo- A amamentação exclusiva protege as
ve a essa classe de anticorpos maior resistên- crianças pequenas de evoluírem para quadros
cia à ação de enzimas proteolíticas, abundantes mais graves de infecção respiratória 10,46 .
nas secreções mucosas44. Quando predominante por pelo menos seis
As outras imunoglobulinas são encon- meses e até um ano de idade também pode
tradas no colostro e no leite humano em con- reduzir a prevalência de infecções respirató-
centrações bem mais baixas que a IgA. Dentre rias na infância47,48. O leite materno é capaz
elas, destaca-se a IgM como a segunda mais de reduzir a exposição e a absorção intesti-
abundante. Quando não há IgA suficiente no nal de alergênicos responsáveis por doenças
leite materno a IgM atua como mecanismo respiratórias 49,50.

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Os efeitos protetores da amamentação O CD14 solúvel está presente em altas


contra infecções do ouvido e pulmão têm-se concentrações no leite materno e tem importan-
tornado mais evidentes nos últimos anos. Nes- te papel na indução da resposta de linfócitos T
se particular, cumpre importante papel a IgA auxiliares a bactérias, podendo também prote-
secretora, um anticorpo resultante da resposta ger contra o desenvolvimento de alergias55. O
da mãe à exposição prévia a agentes infeccio- alto nível de proteína eosinofílica catiônica tam-
sos. Ela tem como característica sobreviver nas bém proporciona essa proteção.56 Os linfócitos
membranas da mucosa respiratória e ser resis- protegem o lactente contra doenças respiratóri-
tente à digestão proteolítica. Além de impedir as, principalmente contra a asma57-59.
que agentes patogênicos se fixem nas células
da criança amamentada, ela limita os efeitos O aleitamento materno também diminui
danosos do processo inflamatório32,49,51. a involução da glândula do timo durante a in-
As concentrações de citocinas têm um fância60, o que consequentemente estimula os
papel fundamental na imunogenicidade do leite efeitos das células T, protegendo o lactente de
materno. As citocinas IL-4, IL-5 e IL-13, mais doenças respiratórias48.
envolvidas com a produção de IgE e indução de
resposta de eosinófilos, podem proteger o lactente Assim, o leite materno é o único alimen-
contra doenças respiratórias52. O fator de cresci- to capaz de proteger o lactente de diversas do-
mento transformador beta, uma das citocinas pre- enças nos primeiros meses de vida, pois é rico
dominantes no leite humano, aumenta a capaci- em compostos nutricionais e imunológicos que
dade do lactente de produzir IgA53. conferem essa proteção. Outros tipos de leites,
Os oligossacarídeos bloqueiam pneumo- fórmulas ou alimentos, além de não conter es-
cocos pelas células receptoras da faringe28. Di- tes componentes protetores, podem causar do-
versos tipos de anticorpos protegem contra ví- enças no recém-nascido.
rus causadores de bronquite. Os lípideos e
algumas macroglobulinas possuem ação Campanhas e ações em Saúde Pública
antiviral, protegendo o lactente contra o vírus que incentivam o aleitamento materno devem
influenza. Essas macroglobulinas também pro- ser continuamente desenvolvidas e estimula-
tegem o recém-nascido de agentes causadores das, tendo em vista todos os efeitos benéficos
de infecção respiratória alta aguda54. que o mesmo proporciona.

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