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HISTORIA DAS MULHERES Joan Scott* A blatéis que se pode esceve dot estes sobre és mulheres permnee também a0 movimereo nko ‘ome melinguge, ei ar, 2 como um ‘momento conservador, quanta como ure stent subversivo a0 hé ums interpret reoreamente nea da isis dos esuudos sobre as mulheres, A his tet al umn papel usnae . Jeeques Dei, 1984 A histéria das mulheres apareceu como um campo definivel principalmente nas duas ulcimas décadas. Apesar das enormes diferencas nos recursos para ela slocados, em sua representario € em seu lugar no curriculo, na posigic a ela concedida pelas universidades e pelas associagbes disciplinares, parece nao haver mais divida de que a historia das mulheres é uma pritica estabe- lecida em muitas partes do mundo. Bmbora a situagio dos Estados Unidos sefa tinica pelo fato de a historia des mulheres ter atingido * Profissora de Citcias Socinés no Ina de Extudas Avangados, er Princentan, 1. "Women in the Bechive: A seminar with Jacques Derida" ranserco do casino com Derrida promovido pelo Centro Pembroke pera o Ensina e a Pesquisa, em, Subjece/Objeces Pimavera de 1984, p17. 4 PETER BURKE, uma presenga visivel ¢ influente na academia, hd evidéncia clara - em artigos e livros, na auto:dentificacto dos historiadores que se pode encontrar em conferéncias internacionais, e nas redes infor. mais que transmitem as noticias do mundo intelectual - da participacio internacional no movimento da histéria das mulheres. Ustilizo © termo “movimento, deliberadamente, para distin- guir-o fendmeno atual dos esforgos anteriormente dissemninados por alguns individuos para escrever no passado sobre as mulheres, para sugerir algo da quatidade dinémica envolvida nos interctim: bios no nivel nacional e nos interdisciplinares pelos historiadores das mulheres, e aincla, para evocar as associagéies com a politica. Aconexdio enteea historia das mulheres ea politica é0 mesmo tempo dbvia e complexa, Em uma das narrativas convencionais das origens deste campo, a politica feminista é 0 ponto de partida. Esses relatos situamn a origern do campo.na década de 60, quando as ativistas feministas reivindicavam urna historia que estabelecesse heroinas, prova da atuagio das mulheres, e também explicagdes sobre a opressio e inspiragio para a aco. Foi dito queas feministas académicas responderam ao chamado de “sua” hist6ria e dirigiram sua erudiglo para uma atividade politica mais ampla; no inicio, houve uma conexio disera entre politica ¢ intelectualidade, Mais tarde ~ em algum momento entre a metade e o final da década de 70 - continua o releto, a historia das mulheres afastouse da politica, Amplioa seu campo de questionamentos, documentando todos os aspectos da vide das mulheres no passado, e dessa forma adquiriu uma energia propria. Oacimulo de monografias e artigos, © surgimento de controvérsias internas e 0 avango de diélogos Interpretativos, ¢ ainda, a emergéncia de autoridades inceleccuais reconhecidas foram os indicadores familiares de um novo campo de estudo, legitimado em parte, a0 que parecia, por sua grande discancia da luta politica, Finalmente (assira prossegue a tajetiria), © desvio par o género! na década de 80 foi em rompimento definitive com a politica e propiciou a este campo conseguir o seu 2. Genero agul como divisdo natural dos sexos, (N.T) AESCRITA DA HISTORIA 6 eGprio espaco, pois genero é um termo aparentemente neutro, desprovido de propésite idealégico imediato, A emergéncia da hhistéria das mulheres como um campo de estudo envolve, nesta interpregio, uma evolucio do feminismo para as mulheres ¢ dat para © género; ou seja, da politica para a histéria especializada e loi para a andlise. Certamente, esta narrativa tem variagdes significativas, depen- ulendo de quem a relata. Em algumas vers6es, a evolugdo € encarada positivamente como um resgate da histéria, tanto de principios politicos de interesses estreitos, quanto de um enfoque demasiado exclusive sobre as mulheres ou de suposicées filosoficamente ingénuas. Em outras, a interpremefo é negativa, a “retirada” para a academia (para nio falar do desvio para o género e para.a tearia) sendo encarada como um sinal de despolitizacdo. “O que ocorre com 0 feminismo quando o movimento das mulheres esta morto?” perguntou recentemente Elaine Showalter. “Torna-se estudos so- bre as mulheres - apenas outra disciplina académniea.”} Entretanto, apesar das diferentes valencias colocadas no relato, a trajetdria em si é compartithada por muitas feministas ¢ seus criticos, como se fosse, incontesmvelmente, o mode como as coisas aconteceram. Gostarta de argumentar que a narrativa necessita de alguma teflexio critica, nfo apenas por no ser tio simples, mas também. porque representa mal a historia da histria das mulheres ¢ seu relacionamento, tanto com a politica, quanto com a disciplina da historia. A histéria deste campo nio tequer somente uma narrativa linear, mas um relato mais complexo, que leve em conta, ao mesmo tempo, a posiggo varidvel das mulheres na histéria, o movimento ferninista e adisciplina da historia, Embora a historia das mulheres esteja certamente associada a emergéncin do feminismo, este nao desapareceu, seja como uma presenca na academia ou na sociedade. ‘etm geral, ainda que os termos de sua organizagio ede sun existéncia tenkam mudado. Muitos daqueles que usam o termo genero, na 3. Chada em Karen. Winkler, "Women’s Sexics Afer Two Deendes: Debates over Plies. New Directions for Reseateh", The Chronicle of Higher Educaron, 28 de setembro de 1988, p. AS 6 PETER BURKE, verdade se denqminam historiadores feministas, Isso ndo ¢ somen- te uma submissio politica, mas também uma perspectiva tesrica ‘que os leva a encarar © sexo como um modo melhor de conceituar a politica. Muitos dequeles que escrevem a historia das mutheres consideram-se envolvidos em um esforco almmente politico, para desafar a autoridade dominante na profissao e na universidede e para mudar o modo como a histéria é esctita, E grande paste da atual historia das mulheres, mesmo quando opera com conceitos de género, esti voltada para as preocupagbes contemporineas da politica feminista (entre eles, nos Estados Unidos atualmente, o bem-estar, o cuidado dos filhos ¢ o direito a0 aborto). Na verdade, ‘ha uma razio importante para se argumentar que os desenvolvi ments na historia das mulheres esto forcemente relacionados “a forca crescente ea legitimidade do ferninismo como um movimen- to politico”, como também para insistir que esté aumentando a distancia entre o trabalho académico € 0 politico. Mas tomarse a historia das mulheres simplesmente como um reflexo do eresci- mento da politica feminista externa a academia, também ¢ falho. ‘Mais do que postular uma simples correlagao, precisamos pensat sobre este campo como um estudo dindmico na politica da produgdo de conhecimento. A palavra politica ¢ usada atualmente em varios sentidos. Primeiro, em sua definigio mais pica, ela pode significar a atividade dirigida para/ou em governos ou outras autoridades poderosas, atividade essa que envolve um apelo a identidade coletiva, a mobilizagio de recursos, & avallacio estrattgica ¢ manobra titica. Segundo, a palavra politica é também utilizada para se referie as relacées de poder mals gorais e as estratégias visadas para mantélas ou contestilas,* Terceiro, a palavra politica ¢ 4. Nancy Fasere Linda Nicholson, "Social Caticism Wichour Philosophy", manuscrio Inge, 1987, p. 29. 5. "Politics in the profound sense, asthe ensemble: social structure, in chair aily eo conttet the wor Thurman relations tn chee eal, Roland Barches, Mythologies, Paris, 1987, p. 250, Ver tambim Michel Fouesuly, The Hisry of Seualin, v1, An Inteduction, Nova York, 1980, p. 92102. AESCRITA DA HISTORIA © aplicada ainda mais amplamente a priticas que reprodusem ou desafiam o que € ds vezes rotslado de “ideologia”, aqueles sistemas de conviesfo e pritica que estabelecem as identidades individuais ecoletivas que formam as relagdes entre individuos e coletlvidades ¢ seu mundo, ¢ que so encaradas como naturais, notmativas ou auto-evidences § Essas definigdes correspondem a diferentes tipos de acio e diferentes esferas de atividade, mas a minha utilizacio da palavea “polisica” para caracterizartudo isso sugere que os limites de defnigéo e espaco sto indistintos, ¢ que, inevitavelmente, qualquer utilizagdo tem miltiplas ressondncias. A narrativa da histéria das mulheres que eu desejo fazer depends dessas miltiplas ressonincias; é sempre uma natrativa politica. “Profissionalismo” versus “politica” © feminismo tem sido, nas ditimas décadas, um movimento internacional, mas possui caractertsticas particulares, regionals ¢ nacionais, Parece-me util focalizar os detalhes do caso que melhor ‘eu conheso ~ o dos Estados Unidos - para fazer algumas observa: ‘goes gersis. Nos Estados Unidos, o: feminismo ressurgiu nos anos 60, estimulado em parte pelo movimento dos Direitos Civis ¢ pelas politicas do governo destinadas a estabelecer o potencial ferninino, para ir ao encontro da expansio econdmica através da sociedade, incluindo as profissdes e a academia, Moldou seu apelo e sua autojustificativa nos termos da rerérica prevalecente de igualdade. No proceso, o feminismno assumiu ¢ criou uma identidade coletiva de mulheres, individuos do sexo ferninino com um interesse compartilhado no fim da subordinacio, da invisibilidade e da 16, Gayatst Chalsavory Spvak, “The Foites of interpremsion”, em W4-T. Mitel, ‘The Poles of Inerprecaion, Chicngo, 1983, p. 347-66; Mary Poowey, Usewen Deelopmenes: The eateaieat Workaf Genderin ad Vitran Enalend, Chicag, 1988. ‘Vertambém ideologia’ no glossirio de Louis Altussere Benne Babar, Reading Capita ad. de Ben Brewer, Londres, 1979, p. 314. 68 PETER BURKE impoténcia, criando igualdade e ganhando um controle sobre seus corps ¢ sobre suas vidas. Em 1961, por ordem de Esther Peterson, dirigente da Divisio de Mutheres do Departamento de Trabalho, o presidente Kennedy estabeleceu uma Comissio sobre a Condigio da Muther. Seu telatério em 1963 documentou o fato de que eram negados as mulheres americanas iguais diteitos ¢ oportunidades, e recoren- dou criagio de cinqUenta comissdes estaduais. Em 1964, quando 2 Comissio para Oportunidades Iguais de Emprego (Equal Em- ployment Opporuinity Commission - EEOC) foi estabelecida pelo Ato dos Direitos Civis, a discriminacio sexual foi incluida em sua jurisdicdo (acrescentada por um legislador hostil para desacreditar © séximo direlto do Ato). Em 1966, delegados do terceiro encontro da Conferéncia Nacional das Comissées Estaduais sobre a Condi- <0 da Mulher votaram uma resolucdo que pressionava a EEOC para fazer valer a proibiggo contra a discriminagao sexual to seriamente quanto ela o fez contra a discriminacko racial. As mulheres que apresentaram a emenda derrotada encontraram-se entio pam decidir sua proxima aco ¢ formaram a Organizagao ‘Nacional das Mulheres.? Mais ou menos na mesma época, as jovens do grupo Estudantes por uma Sociedade Demoeratica e do Movimento dos Direitos Civis comegaram a articular seus agravos, exigindo reconhecimento de seu pupel de mulheres como partick pantes ativos (e iguais) nos movirnentos politicos para a mudanga social,# No reino da politica tradicional, as mulheres tornaram-se ‘um goupo identificavel (pela primeira vez desde o movimento sufragista na virada do século). Durante os anos 60, também as faculdades, as escolas de graduacio e as fundacdes comesaram a estimular as mulheres a ‘obterem PhDs, oferecendo bolsas de estudo e um consideravel apoio financeito. “E claro”, comentow um autor, “que as mulheres “L.Jo Freeman, “Women en the Move: Roots of Reval’, em Alice S. Rossi e Ann Calderwood (ed), Academic Women on the Mov, Nova York, 1973, p. 1-37. Ver também os ensslos de Alice Ross e Kay Klouburger no sestno volume. 8. Sama Evans, Reronal Poles, Nova York, 1979. ‘AESCRITA DA HISTORIA 6 constitue uma importante forga latente para as faculdades e as universidades carentes de bons professores € pesquisadores.”? Embora autores tho diversos quanto diretores de faculdades‘e académicos feministas reconhecessem que tinha havido “precon- ceitos contra as mulheres nas -profissdes intelectualizadas", eles tendiam a concordar que os obsticulos cairiam por terra, se as mulheres buscassem uma formacdo de nivel superior.'? E interes- sante (8 luz das discussdes tedricas subseqilentes) que a atuacdo das mulheres foi aqui presummida; como opgdo espontinea, atores racionais, as mulheres eram chamedas para se inserirem em. profissdes que previamente as havia excluido ou subutilizada. Noespaca.aberto pelo recrutamento de mulheres, o feminismo. logo apareceu para reivindicar mais recursos para as maulheres e para denunciar a persisténcia da desigualdade. As feministas na + academia declaravam que os preconceitos contra as mulheres nio haviam desaparecido, ainda que elas tivessem credenciais académi- cas ot profissionais, ¢ se organizaram para exigir uma totalidade de direitos, aos quais suas qualificaghes presumivelmente Ihes davam direinp. Nas associagdes das disciplinas académicas, as mulheres formavam faccoes para pressionar suas exigéncias. (Bssas incluiam maior representagio nas associagbes € nas reunides de intelectuis, atencdo as diferencas salariais entre homens ¢ mulhe- res ¢ um fim a discriminagio nos contatos, nos titulas e nas promogées.) A nova identidade coletiva das mulheres na academia anunciava uma experigncia compartithada de discriminacio basea- da na diferenciagéo sexual e também admitia que as historiadoras, como ur grupo, tinham necessidades ¢ interesses particulares que nao poderiam ser subordinadas categoria geral dos historiadores. Sugerindo que as historiadoras eram diferentes dos historiadores, 9, Cagéo de Barnaby Keeney, Retora da Brown Universi, Pembroke Alumnce 27, 14,9. Iyouubrode 1962. . 10, Keane, (id. p89; Jessie Beratd, Amdenic Women, Clewland, 1966; Lucie ‘Addison Pollard, Wormer on Calle end Univers Faculties: A Hiorcal Srey and a: Sly of thelr present Acadenz Siu, Nowe York, 1917. Ver especialwenie a £296. 0 PETER BURKE € que seu sexo influenciava suas oportunidades profissionals, as feminisas disputavam os termos universals e unititios que em geral designavam os profissionais ¢ lancavam a acusagio de que eles haviam “politizado” previamente organizagdes nio-politicas. Em 1969, o recém-formado Comité de Coordenaciio de Mus theres na Profissio Hist6rica apresentou, no encontra profissional da Associagio Historica Americana (AHA), resolug&es dirigidas a melhorar a condi¢3o das mulheres, o que ocorreu dentro de uma. acmosfera tensa e altamente carregada. Normalmente destinads a discussées de leis secundirias ¢ politica organizacional - o papel (nfo a politica) da associagao - esses encontros eram em geral um modelo de boa camaradagem ¢ decoro. As discordancias, quando: ‘ocorriam, poderiam ser atributdas 4s diferencas de opiniao pessoal, preferéncia ou mesmo de persuasio politica, & prioridade insticu- cional ou regional, mas nenhuma delas era fundamental, nenhuma delas a plataforma de um “interesse" identificavel, em desacordo com o tedo, Por seu tom, sua prontidao para a luta e sua exigéncia em representar uma entidade coletive a quem sistematicamente foram negados os seus dircitos, as mulheres romperam as normas de conduta ¢ desafiaram as implicagies de “trabalho, como sem- pre”. Naverdade, acuisaram que o trabalho, como sempre, era em si uma forma de politica, pois ignorava ¢ assim perpenuava a sisterndtica exclustio (em termos de g&nero € raga) de profissionais qualificados. O ataque ao poder entrincheirado teve pelo menos dois resultados: obteve concessées da AHA sob a forma de um comité ad hoc para averiguar as questes levantadas (um comité que publicou um relatério em 1970 reconhevendo a condigéo inferior das mulheres e recomendando varias medidas pu vas, incluindo a criaglo de um comité permanente sobre as maulheres) ¢ resultou na critics da conduta des mulheres como. nic-profissional. A oposicio entre "profissionalismo” e “politica” nio é uma oposigéo natural, mas parte da autodefinigao da profissao como uma pritica especializada, basenda na posse compartlhada de extensivo conhecimento adquirido através da educacio. Ha dois ABSCRITA DA HISTORIA a aspectos distintos, mas em geral insepardvels, da definiclo de uma profissio. Um deles envolve a nanureza do conhecimento produzi- do, neste caso do que se considera como historia. O outro envolve as fungies de barreira que estabelecem e reforcam os padroes mantidos pelos membros da profissio, neste caso os historiadores. Para os historiadores profissidnais do século vinie, a historia ¢ 0 conhecimentn do passado obtido por meio de investigacao desin- teressada ¢ imparcial (o interess€ ¢ a parcialidade sao a antitese do profissionalismo)¢ universalmente disponivel para quem quer que tenka dominado os procedimentos cientificos requeridos."! © ‘acesso repousa entio neste dominio, cuja possessio se supde evidente aqueles que j4 so profissionais ¢ que por si s6 podem julgar. O dominio nao pode ser uma questio de estratégia ou de poder, mas apenas de educagio e treinamento. A qualidade de membro na profissio histérica confete responsabilidade aos indi- vviduos que se tornam os guardides daquele conhecimento que & 0 seu campo de ago especial. A guarda e o dominio so portanto a base para a autonomia e pata o poder de determinar 0 que conta como conhecimento € quem © passui. Ealém disso, ¢ claro, as profissies € as onganizacSes profissio- nals sto estruturadas bierarquicamente: 0s estilos ¢ padrées domi nantes operam para incluir alguns ¢ excluir outros da qualidade de membros. © “dorninio” ea “exceléncia” podem ambos explici tar julgamentos de capacidade ¢ desculpas inplicitas para tendén- cias viciosas; na verdade, os julgamentos de capacidade esto com feeqUéncia entrelagados com avaliacdes de uma identidade social do individua que sio irrelevantes & compettncia profissional.'? ‘Como separar esses julgamentos, e realmente se cles podem ser afinal separados, so questées nao apenas de estratégia, mas de 11, Peter Novick, That Noble Dream: The “Objectivity Quewtion" and the American serial Profesion, Nove York, 1988, 12, Sobre a questo do acesio, vee Mary G. Diet, “Convent is All: Femintem and ‘Theorles of Culzenship fill K. Convay,"Pollcs, Pedagogy, and Gender" ¢ Joan W. Scot, “Hlseory and Difference”, rodos em Daedalus, ouiono de 1987, p. 124, 13752, 93418, respeedvamente : n PETER BURKE. epistemologia."A oposigio entre “politica” e “profissionalismo” conseguiu pouco a pouco obscurecer a questio epistemolégica. Na AHA, as mulheres, as negros, os judeus, as catélicos e os “naocavalheiros” foram sistematicomente subrepresentados durante anos. Esta situagio era perfodicamente observada e protestada, alguns historiadores combinaram esforcos para remediar a discri- minagio, mas os termos e o estilo de protesto eram diferentes daqueles utilizades apés 1969. Nos primeiros tempos, seja se recusando a comparecer a uma convendo marcada em um hotel segregacionista, seja insistindo para que as mulheres fossem inclut das nos encontros profissionais, os historiadores que participavam do protesto alegavam que a discriminacéo baseada em raga, reli: gido, etnia ou sexo prejudicava o reconhecimento de historiadores qualificados. Aceitando 0 conceito do que a profissio deveria ser, argumentayam que a politica nfo tinhg espago ali; sua agio, declaravam, estava direcionada & realizacio dos verdadeiros ideals profissionais. Em contraste, a implicago dos protestos de 1969 Posteriores era que as profissdes eram organizagses politicas (nos ratikiplos significados da palavra “politica”, apesar do decore de seus membros, ¢ apenas a acio coletiva poderia modificar as relacies de poder prevalecentes. Durante os anos 70, 2s mulheres da AHA (e de outras associagGes profissionais) uniram suas lutas locais por teconhecimento e representacio &s campatthas nacionais das mu- heres, especialmente aquela para a Emenda dos Direitos Iguais & Constituicao (Equal Rights Amendment — ERA), ¢ insistiram em. que as associagSes profissionais como um todo tomassem uma posigdo nessas questies nacionais. Rejeitavam a sugestio de que a ERA fosse irrelevante para as questes da AHA, atgumentando que ciéncia nio era neutralidade, mas cumplicidade com discrimina- ‘go, No interior das organizagdes, nogées sagradas como “excelén- cia intelectual” e “qualidade da mente” foram investidas por mamas capas de tratamento discriminatério, que deveriam ser substituldas 13, Howard K. Beale, “The Profesional Historian: His Theory and His Pratee” Pacific Historla! Review, 2, p. 235, agosto de 1953, AESCRITA DA HISTORIA B por medidas quantitativas de aco afirmativa. Os padrées profis- sionais de imparcialidade e desinteresse estavam sendo derrubados por interesses particulares, ou assim parecia aqueles que manti- nham a visio normativa. No entanto, outra maneira de ver o problema ¢ tratar o desafio das mulheres como uma questio de redefiniclo profissto- nal, pois a presenca de mulheres orgonizadas contestava a nocéo de que a profissio da histéria fosse um corpo unitdrio. Insistinde ‘em que havia uma identidade de historiadoras em desacordo com aquela dos homens (e sugerindo também que a raca separava os historiadores brancos dos negros), as feministas questionavatn se algum dia poderia haver avaliscdes imparciais do saber, sugerin- do que elas nfo erarn mais que a atitude hegemdnica de um ponto de vista interessado. Elas nao puseram de lado os padrées profis- sionais; na verdade, continuaram a defender a necessidade da educacio e de julgamentos de qualidade (instiruindo, entre outras coisas, concursos para trabalhos de valor sobre a historia das mulheres). Embora certamente se possa citar evidéncia de tenden- ciasidade entre os historiadores das mulheres, isso nao caracteri- zava © campo como um todo, nem era (ou é) algo peculiar as feministas. E mesmo 0 tendencioso no defendia a distorgio deliberada dos fatos ou a supressio da informagio em prot da “causa".'* A maior parte dos historiadores das mulheres nfo 1. ot questo surgi de vias mancicasdicenee, mais recentements em eonexio como exo da Sears, No decor den proceso de discriminagia de sax movido contr 3 eadcia de lojas Seas Roebuck and Company, das hiswradors das mulheres, Rosalind Rosenberg e Alco Kesler Hari, tetemunkaram een lados ‘posts. O cao provocou uma enorme cnetovérsia ene cs hiswiadores a espeita das ienplieages plas da histxa das mulheres e des compromeimentos pitcar das hisosiedoms feinisot. Howse seus; dea fd aabos 0 dos, ma scusoqdes mais ecenes (eben mais conadenas) de Sanford Levinson e Thomas ‘sll em defsa de Rocenberg insist em que Kessler Hari ditorce delibere para desafiar a viabilidade da categoria das “mulheres” e introdu- airam a “diferenca” como um problema a ser analisado. O foco na diferenca tornou explicita parte da ambigdidade que sempre esteve implicita na histéria das mulheres, apontando para os sigaificados inerentenente relacionados das categorias de género. Trouxe & luz questbes sobre os elos entre o poder e o conhecimento e demons- ‘rou as interconexdes entre a'teoria e a politica, O objetivo dos historiadores das muthetes, mesmo quando estabeleceran a identidade separada das mulheres, era integrar as mulheres & historia. Eo impulso para a integracdo prosseguiu com verbas do governo e fundagdes privadas nos anos 70 e inicio dos 80. (Essas agéncias estavarn ndo apenas interessadas na histéria, mas também na luz que os estudos histéricos poderiam lancar sobre a politica contemporinea a respeito das mulheres.) A inte gracdo presumia nfo somente que as mulheres poderiam set acomo- dadas nas historias estabelecidas, mas que sua presenca era requerida para corrigit a histéria, Aqui estavam em aco as implicacses contraditérias da condicao suplementar da historia das mulheres. A histéria das mulheres ~ com suas compilagdes de dadas sobre as mulheres no pasado, com sua insisténcia em que as petiodiza- ges aceites nic funcionavam, quando as mulheres eram levadas 86 PETER BURKE ‘em conta, com sua evidéncia de que as mulheres influenciavern os acontecimentos ¢ tomavam parte na vida pblica, com sua insisténcia de que a vida privada tinha uma dimensio publica, politica - implicava_uma insuficigncia fundamental: 0 sujeito da historia nfo era uma figura universal, os historiadores, que escreviam como se ele o fosse, no podiam mais reivindicar estar contando toda a hisedria. O projeto de integracao tomou essas implicacdes explicita. Tomada com grande entusiasmo e otimismo, a integragio se comprovou dificil de ser atingida, Parecia mais uma resistncia dos historiadores do que uma simples rendéncia ou preconceito, embora isso certemente fizesse parte do problema. Sem diwvida, 08 préprios historiadores das mulheres acharam dificil inscrever as mulheres na historia e a carefa de reescrever a histéria exigia reconceituagdes que eles nao estavam inicialmente preparados ou treinados para realizar, Bra necessatio um modo de pensar sobre a diferenca e como sua construcdo definiria as telagses entre os individuos e os grupos sociais. “Genero” foi o termno usado para teorizar a questio da diferenca sexual. Nos Estados Unidos, o termo éextraido tanto da gramatica, com suas implicagdes sobre as convengdes ou regras (feitas “pelo homem) do uso da lingiistica, quanto dos estudos de sociologia dos papéis sociais designados is mulheres e aos homens. Embora 08 sos socioldgicos de “género” possam incorporar tonicas fuun- cionalistas ou essencialistas, as feministas escolheram enfatizar as ‘conotages sociais de géneto em contraste com as conotagdes fisicas de sexo. Também enfatizaram 0 aspecto relacionado do género: 35. Susan Hardy Aiken eco, "Trying Transformations: Currculorn Incegraton and the Problem of Resistance’ Sign, 12:2, p.255-75,Inverno de 1987. Vertarmbem sabee a mesma questio Margaret L. Anderson, *Changing the Guricuhum in Higher Eduezton’,p, 222-54. 36, Ver Gail Rubin, “The Trae in Women: Notes om the Political Economy of Sex", ‘em Rayna R Reiter (ed), Towards aa Anthropolgy of Wamen, Nova York, 1925. Vet também Joan W. Seon, *Gender: A Usefel Cocegory of Historical Analysis", American Historia Review 91:5, deaembro de 1986; Donna Harsway, "Geschlecy, ‘Gender, Genre: Sesuelpolu eines Worcs", em Viele One uberll!Feminiamas in Bewegung Festchrif fir Frigga Haug) ed, Kornelia Hauser, Beri, 2987, p, 22-41, [AESCRITA DA HISTORIA, 7 snap se pode conceber mulheres, exceto se elas forem definidas em twlagio aos homens, nem homens, exceto quando eles forem sliferenciados das mulheres. Além disso, uma vez que o género foi slefinido como relativo aos contextos social ¢ cultural, foi possive) pensar em termos de diferenses sistemas de género ¢ nas relagdes slaqueles com outras categorias cofno raga, classe ou etnia, assim como em levar em conta a mudanga, A categoria de género, usada primeiro para analisar as diferen. gas entre os sexos, foi estendida a questio das diferencas dentro dh diferenca. A politica de identidade dos anos 80 touxe & tong alegagdes miltiplas que desafiaram o significado unitirio da cate. goria das “mulheres”. Na verdade, o termo “mulheres” dificilmente poderia ser usado sem modificagio: mulheres de cor, mulheres judias, mulheres lésbicas, mulheres trabalhadoras pobres, mies soleeitas, foram apenas algumas das categorias introduzidas. Todag Aesaftavam a hegemonia heterossexual da classe média branca do termo “mulheres”, argumentando que as diferencas fundamentais da experiéncia tornaram impossivel reivindicar uma identidade isolada.2? A fragmentagdo de uma idéia universal de “enutheres” por raga, etnia, classe e sexualicade esteva associada a difetencas 32. Teresade Laue, “Feminist Sadies/Cebscal SaadiesLsaues, Terms, and Contees*, Cherie Moras, "From a Lang Line of Vendidas:Chicanas and Feminism”; Biddy ‘Marcin ¢ Chandra Taopate Mokang, "Feminist Plies: What's Hore Goto Oy with Te", rodon em Terese de Laure (ed, Feminist Stulles/Critcat Sai, ‘Bloomington, 1986p. 119, 173190, 91-212, repectivarente, Vertambém, "Th (Combahee River Cllective, A Black erinistSaement’,em Gloria, Hull Petia Bell Sotee Barhsta Smith (os), But Same of Us ere Brave: Black Women's Saud, [Nova Torque, 1982; Barbara Smith (ed), Home Gis, A Black Women's Anthology, Nova forque, 1983. Ver embém, Bartara Smith, “Toward a Blask Feminut Citic”; Deborah E, McDowell, "New Directions fr Black Feministe Cie, Bonnie Zimmerman, “Whar has Never Been; An Overview of Lesbian Feminist Ciccism’ todos em Elaine Showalter (i), The New Feminist Uterery Citi, Ezayron Women, Literature, Theor, Novalorqus, 1985p. 168224, Nancy Hose, "White Women, Black Women: Invendngan Adequate Pedagogy”, Women’s Suey Neanfeter, 5, p. 214, primavera de 1977; Michele Wallace, “A Black Fersind, Search for Sistethoos", Vilegt Voie, 28 de jul de 1975, p. 7s Teresa de Let, * Displacing Hegemon Discourses: Reletions on Feminis: Theory in dhe 1933 (rscibins 0. 3/4, p. 127A, 1988, * 88 PETER BURKE politcas sérias no interior do movimento das mulheres sobre questdes qtle variavamn desde a Palestina até A pornografia.}® As diferencas cada vez mais visiveis ¢ veementes entre as mulheres questionavam a possibilidade de uma politica unificada e sugeriatn que os interesses das mulheres nao eram autoevidentes, mas uma questio de disputa e de discussio. De fato, todas as exigéncias de reconhecimento das experiéneias e das hist6rias de diversos tipos de mulheres representam a légica da suplementaglo, desta vez em relacio’ categoria universal das taulheres, o bastanve para qualquer histéria_geral das mulheres € para a cormpeténcia de qualquer hristorlador das mulheres cobrir todo 0 campo. A questio das diferencas dencro da diferenca trouxe a tona um debate sobre 6 modo ¢ a conveniéncia de se articular o género como uma categoria de andlise. Uma dessas articulagses servese do trabalho nas cigncias sociais sobre os sistemas ou estruturas do agénero; presume uma oposicko fixe entre os homens ¢ as mulheres, ¢ identidades (ou papéis) separadas para 0 sexos, que operam. consistentemente em todas as esferas da vida social. Também presume uma correlacio divera entre as categotias sociais masculina @ feminina eas identidades de sujeto dos homens e das mulheres, e atribui sua variagio a outras caractersticas sociais estabelecidas, come classe ou raca. Amplia o foco da histéria das mulheres, cuidando dos relacionamentos macho/femea e de questées sobre como o género & percebido, que processos sfo esses que estabele- cem as instituigbes geradas, e das diferencas que a rac, a classe, a etia € a sexualidade produziram nas experiéncias histéricas das 38. Algoma ds rupaua oconreram em sega deroe da Emenda dos Diets Cis {aqua Rights Amendoenc - Eta) & Constiuego Arevcan uma campanha que roeona uma frente uns entre visos grupor de fminiss, Evdentament, a ‘ampana em «da ERA wowee como erm profndas os derenas ene feminists ¢ 0s andmininas e ps em divida qualquer iia de woldaredede feriina insrecte. Alpumas dss dibrengue foram anibulae 8 “conscinca fit”, ror nio interment, Sobteacampanh da ERA, vet Mary Frances Berry, Why ERA Fealet, Bloomington, 1986; Jane Mansbridge, Why We Lo the ERA, Chicago, 1986 Donsld'G. MatheuseJane horton de Har, Bes and the Polite of Cultured Confit Nah Ceolna, Nova York, 1989. ‘ABSCRITA DA HISTORIA, e mulheres. A abordagem da ciéncia social a0 género pluralizou a categoria das “mulheres” e produziu um conjunto brilhante de historias ¢ de identidades coletivas; mas também esbarrou em um conjunto aparentemente intracivel de problemas que se seguiramn a0 reconhecimento das diferencas entre as mulheres. Se hé tantas diferencas de classe, raga, emia e sexualidade, 0 que constitui campo comum em que as feministas podem organizar uma ago coletiva coerente? Qual € o clo conceitusl para a historia das raulheres ou para os cursos de estudos das mulheres, entre o que parece ser uma proliferacSo infinita’de diferentes histérias (de mulheres)? (Os dois problemas estio ligndos: seri que hé uma identidacle comum para as mulheres e seri que ha uma histéria elas que possamos escrever!) ‘Algumas feministas tentaram abordar essas questies, analisan- doo género com as abordagens literérias ¢ filoséficas que, por mais diversas que sejam, esto conjuntamente agrupadds sob a rubrica do pésescroturalismo. Aqui a énfase se afasta da documentacao da oposicio bindria macho versus fémea, para questionar como ela é estabelecida, da suposigio de uma identidade preexistente das “mulheres” pera investigar © processo de sua construcio, do estabelecimento de um significado inerente para as categoriagcomo “homens” ¢ “mulheres”, para analisar como seu significado ¢ assegurado, Essa andlise assume a significagio como seu objeto, ‘examinando as praticas e 0s contextos dentro dos quais os signifi- cados da diferenca sexual sio produzidos. Freqdentemente usa a teoria psicanalitica (particularmente as leituras lacanianas de Freud), para discutir a complexidade e a instabilidade de quaisquer identificagdes de sujeito. A masculinidade ¢ a feminilidade sio encaradas como posicies de sujeito, nfo necessariemente restritas a machos ou femneas biolégicos.” Mais importante foram as maneiras como as feministas se apropriaram do pés-estruturalismo para pensar sobre a diferenga. 39. VerJodith Buler, Gender Trouble: Feminism and the Subversion of Iden, Nova York, 1989. 50 PETER BURKE. A diferenca esti no amago das teorias lingQisticas de significagao. Diese que todos os significados sao produsidos diferencialmente, através de contrastes e de oposicies, e hierarquicamente, através da designacao de primazia a um termo e de subordinacio a outro. A interconexio do relacionamento assimético ¢ importante de ser considerada, porque sugere que a mudanga € mais"que uma ‘questio de ajustamento dos recussos sociais para um grupo subor- dinado, mais que uma questo de justica distibutiva, Se adefinicdo do Homem permanece na subordinagio da Mulher, eneio uma modificagio na condiggo da Mulher requer (e provocs) urna modificscio em nossa compreensio do Homem (um simples pluralismo curmulativo no funciona). A amenga radical colocada pela historia das mulheres situa-se exatamente neste tipo de desafio 4 historia estabelecids; as mullheres nao podem ser adicionadas sem uma remodelagio fundaraental dos termos, padres ¢ suposi- $6es daquilo que passou para a histéria objetiva, neutra e universal no passado, porque essa visto da historia incluia em sua propria definigio de si mesma a exclusdo das mulheres. Aqueles que se dediéam ao ensino do pésestruturalisrmo afirmam que o poder deve ser compreendido em termos dos processos discursivos que produzem diferenca. Como ¢ produsido, legitimado e disseminado o conhecimento da diferenga? Como as identidades si construidas e em que termos? As historiadoras ferainistas encontram respostas para essas quest6es em particular, exemplos contextuais, mas elas no produzem simplesmente nat- rativas separadas. O campo comum, politica ¢ academicamente, & um campo de preferéncia das ferministas, onde elas produzem anilises da diferenca e organizam resisténcia contra a exclusdo, dominagio ou marginalidade, que sio os efeitos dos sistemas de diferenciagao. Diferentemente da abordagem da ciéncia social, que aceita tacitamentea identidade ea experigneta das mulheres, a abordagem pésestruturalista selativiza a identidade e a priva de suas bases ei uma “experiéncia” essencializads, ambos elementos ctuciais, na matot parte das definigées padronizadas de politica, para a mobi- A.SORITA DA HISTORIA om Inzagdo dos movirnentos politicos. Problematizando os conceitos de entidade ¢ experiéncia, as feministas que utilizam a anilise pés-estruturalista apresentatam interpretagoes dindmicas do géne- ro queenfatizam a (uta, a coneradi¢do ideolégica eas complexidades «las relacbes de poder em mutacio. De muitas maneiras seu trabalho insiste em maior variabilidade histérica ¢ especificidade contextual para os termos do-préprio gtnero, do que o faz o trabalho daqueles que se baseiam em conceituagdes cientificas sociais. Mas o trabalho influenciaco pelo pos-estruturalismo esbar. ra em alguns dos mesmos problemas encontrados por aqueles que preferem as abordagens cientificas sociais. Como declarou Denise Riley, se a categoria das “mulheres”, ¢ assim a idencidade e 3 experitnela das mulheres, sito instaveis, porque séo historicamente variiveis, quais sto os campos para a mobilizacio politica? Como escrever uma historia coerente das mulheres, sem uma idéia determinada e compartilhada do que sto as mulheres? Riley responde, corretamente a meu ver, que € possivel pensarse ¢ organizarse a politica com categorias instéveis, 0 que na verdade sempre tem sido feito, mas exatamente como faztlo é algo que necesita de discussio, Tronicamente, entretanto, mais que o reconhecimento da similaridade dos dilemas confrontados pelas historiadoras do sexo feminino nos anos 80, os dilemas causados por nossa necessidade de pensar a politica em novos termos, Gesenvolveuse um debate polarizado sobre a utilidade do pés. estruturalismo pata o feminismo, que ¢ engastado em um contexto entre 2 “teoria” ea “politica”. As feministas hostis ao pés-estruturalismo generalizaram sua critica como uma dentncia da “teoria” eo rotularam como abstrato, elitista e machista. Em contraposicgo, insistiram em que sua posigio é concteta, pritica e feminista, ¢ por isso politicammente corteta. Tudo 0 que for tebrico a respeito do femninismo ¢ redeno- minado de “politica” nesta oposicaa, porque (de acordo cgm um relato recente) suas introjecdes vem “direto da prépria reflexio de nés mesmas, ou seja, da experiéncia das mulheres, das contra: ‘ebes que sentimos entre as diferentes maneiras em que fomos 2 PETER BURKE representadas até para nés mesinas, das injustigas que temas ha tanto tempo suportado em nossas situagées"*” Colocando 0 problema em termos de uma oposicéo bindria intrativel, esta formulacdo afasta a possibilidade de considerara utilidade de varias abordagens teéticas & histéria ferninista e politica feminista, assim, como a possibilidade de conceber a teoria e a politica como intrincadamente ligadas. Creio que a oposigao entre “teotia”e “politica” é uma oposicio falsa, que busca slenciar os debates que devernos realizar sobre que teorla é mais util para o feminismo, para tornar apenas uma teoria aceitivel como “politica”. (Na linguagem daqueles que utilizam esta dicotomia, “politica” realmente significa uma boa teoria; e“teoria” significa uma ma politica} A “boa” woria encara as “mulheres” ‘e sua “experigncia”” como os fatos auto-cvidentes que slo a origem da idencidade e da agto coletivas. Com efeico, (em uma mudanea, que € 0 inverso da reagio da historia & histéria das mulheres) aqueles que usam essa oposicio estabelecem a “politica” como a posigio normativa, para alguns, senda 0 teste ético da validade do feminismno ¢ da historia das mulheres. E os historiadores das mulheres que rejeitam a “teoria” em nome da “politica”, estio curiosamente aliados aqueles historiadores tradicionais que consi detam o pés-estruturalismo (e consideravam a histéria das mulhe- Tes) uma antitese aos principios de sua disciplina.*? Em ambos os 40. Jodich Newson, "Historyas Usual! Femninismand the New Histariciem”, Cultural Crigue,9, p93, 1988, 41. A oposigc entre “to: “pati sugere arable uma opesig ent idealisina ‘e materalismo que desviewa ar quests flovsficat analmante em voss, Sobre a invalidate da opesicio ieallsmo/manerallsmo, ver Joan Scot, "A Reply to Crit satin, Intemational Labor ard Working Clos History 32, p. 3945, ourono de 1987, A oposigio “worla® versus "poltica” ambém se rere indiretsmente & quostio ds anusqlo hurnana, muito enfaizada auslnente pelos hlsworiadoces. A tworia pos ‘evrurraista nde nega que as pessoas azusm ou que rém algun contecle sobre seas agSes; anes critica a totia individual liberal que presuime que os Individuos «80 rorimente auiducmes, acionas e autogeraies. A questo no &a anaes per re, ‘mas os limes da tora liberal da auuagio, 42. oni ¢ nostuel. Os hisoriadores dax mulheres que sceturam ss idan de lunivesaidade da discplina (srescencande a categoria universal das “mulheres” 8 if existe dos "nomens*) do dominfo (presumindo que os historadores podem A BSCRITA DA HISTORIA, % casos, esses historiadores estio defendendo o conceito da “expe: tiéncia’,, recusando-se a problematizé-lo; opondo “teoria” € “polt- tica”, removem a “experiéncia” da sondagem da critica e a prove ‘gem, como o campo de origem e sem problemas da politica e da explicacio histérica. Todavia, concelto da experiéncia temse tornado problemati- co para os historiadores e necessita ser criticamente discutido. N&o somenteo pos-estruturalismo questionou se a experiéncia tem uma posiclo exerna & convencdo lingiiistica (ou construgdo cultural), ‘mas o trabalho dos historiadores das raulheres tambérn pluralizou € complicou os caminhos que os historiadores usaram convencio- nalmente para a experiéncia. Além disso, e mais importante para minha argumentagio aqui, o mundo diferense do movimento politico feminista nos anos 80 tornou impossivel uma dnica definigao da experiencia das mulheres. Como tem sempre ocorrt do, as questées colocadas para a teoria so questées sobre politica: hi uma experiéncia das mulheres que tanscenda os limites de classe © raga? Como as diferencas de raga ou emia afetam a “experiéneia das mulheres" e as definigées das necessidades interesses fernininos em torno dos quais podemos nos organizar ou sobre os quais podemos escrever? Como podemos determinar © que aquela “experiéncia” € ou foi no pasado? Sem algum caminho para pensar teoricamente sobre a experiéncia, os histo- riadores nfo podem responder a esas questées; sem algum caminho para pensar teoricamente sobre o relacionamento da historia das mulheres com 2 histéria, os efeitos potencialments eriticos ¢ desestabilizantes do feminismo serdo muito facilmente perdidos e renunciaremos & oportunidade de transformar radical aleancar um conhecimentedesinersssdo 0: completo do puss), nfo obsane cxnciam sua posito camo "poltien’ ~ temo qut india seu elaonarento subvers com 2 discipline Ciclo que este # mts um excmglo de loca do suplemenio: os hiscadones das audhete (ra qual fos posite episamoloyea) ‘so sto nem intettsiens dango nem nteirmence fora da profs da hist 43. Ver John Toes, "Inlleel History Aer the Linguase Tar: The Auornony of Meaning and the Inecbity of Experience", Amescan Historical Review, 92, 1879907, ounubro de 1957. * PETER AURKE tmente o canhecimento que constitui a historia e a politica que praticamos. © posestruturalismo ndo deixa de ter seus dilemmas para as historiadoras feministas. Creio que aquelas que insistem em que ‘© pos-estruturalismo no pode lidar com a realidade ou que seu foco nos textos exclui as estruttiras sociais, nfo compieendeu 0 ponto principal da teoria. Mas creio que ele no proporciona respostas prontas para os historiadores, para alguns dos proble- mas que levanta: como invocara “experiéncia” sem implicitamen- te sanclonear conceitos essencializados, identidades a-histéricas; como descrever a atuagio humana, enquanto reconhece suas determinacdes linglsticas e culturais; como incorporar a fantasia € 0 inconsciente em estudos de comportamento social; como reconhecer diferencas e elaborar processos de diferenciagio do foco da andlise politica, sem terminar com relatos miltiptos e desconectados ou com categorias protegidas como classe ou “o coptimido”; como reconhecer a parcialidade da histéris de vida de alguém (na verdade de todas as histérias de vida) ¢ ainda contila com autoridade e conviecéo? Estes sfo problemas nio resalvides, pondose de lado a “teoria” ou declarande-s uma antitese i “politica”; antes de tudo, requerem uma discussio continuada ¢ simultinea (discussio que ¢ 20 mesmo tempo tedrica e politica), pois no fim eles sio os problemas de todos aqueles que escrevem a histéria das mulheres, seja qual for a sua abordagem. So problemas comuns, porque seguem a logica da suplemen- tagio que caracterita a historia das mulheres e que lhe proporcic nou sua forge critica. A medida que as historiadoras feministas resolveram produzir um novo conhecimento, elas necessariamente questionaram a adequacio, no apenas da substancia da histéria existente, mas também de suas bases conceituais e premissas episterolégicas. Nisso encontraram aliados entre 0s historladores € outros estudiosos de humanidades e nas ciéncias sociais que esto discutindo entre si questies de causalidade e explicacio, atuacio e determinacdo. Mas as femministas, em sua maior parte, AESCRITA DA HISTORIA, 95 iio tém sido consideradas parosiras plenas nesses debates.44 Mesmo nesses discursos criticos, sua posigfo permanece suplementar: a6 mesmo tempo um exemplo particular de um fendmeno geral e um. comentirio radical da (in)suficigneia de seus termos e priticas. A posigdo suplementar é uma indeterminagdo recorrente ¢ uma deses- tabilizagio porencial. Requer atengfo constante aos relacionamentos de poder, uma certa vigilancia diante das tentativas de implementar uma ou outra de suas posigdes contraditétias. Os historiadores das mulheres constantemente se deparam protestando contra as tentati- vas de rélegilos a posigdes que so meramente estranhas; também resistem aos argumentos que poem de lado o que eles faze como sendo tio diferente que no pode ser qualificado de historia. Suas vidas profissionais ¢ seu trabalho, sio, por isso, necessariamente politicos. No final, no hi jeito de se evitar a politica — as relacdes de poder, os sistemas de conviceio e pritica - do conhecimento ¢ dos processos que o prodweny, por essa razio, a historia das mulheres é um campo inevitavelmente politico. Neste ensaio, utilizel:me das operagées da logiea do suplemento para que me facilitassern a compreensio ¢ a andlise da natureza inerentemente politiea do campo da historia das mulheres; final- mente, eu diria que ¢ tal “teoria” que pode nos iluminar a politica de nossa pratica!5 44. Um exernplo dese despreo pels consibusbes feminists para os debnes hii iifcos pode ser encontrado no frum espacial sobre histria © teria enti emt ‘Amen Hiserial Rese, 94, fanko de 1989. Nevhum dos stigos reconhce 0 Impacto ques hina feminisea (oa whistria seoemerkena, ou a hist ay" © lesbica) tem do sobre as questes epstemaldgics cnftontadas pels dscptina. Ver David Harlan, “Ieellewal Hiscory and the Return of Literate", David Hollinger, “The Rearm of the Prodigal: The Peritence of Historical Knowing” e Alan Megll, “Recouncng he Past ‘Descripcion’, Explanation, and Narrative in Hiseortography", 581-609, 61021, ¢ 627.53, cespecvarem, 445. Gost de sree «Clif Germ: porter cofoado slgumas ds quetes gue levarara A chtongn dese ens, © ambér por sus escbecedores coments saber ume imi esi raleaa, Dod Sauls nastaulsSode mains ponmascucats «Elbe Wend epresceinu ined genes riers, También epee of come sites econalhos de Judth Bute, Lau Zagnen, Saran Handing, Rah Lee Many lovise Robern. As es de Hida Rowe, Tania Unum Kevin Wideibeg prevecuram denafos difes que methorram e refraram o argument grt por as,

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