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Táraka Yoga

Lincoln Director: Shree Swami Shankara Saraswati - Brasil

A Psicologia da Índia e suas fontes

1ª Parte: Metafisica da Psicologia Hindu

Precedentemente ao início do estudo da Psicologia Hindu y para melhor


compreensão por parte de um ocidental, é oportuno e positivo ecoar
destacando seu caráter metafísico, estranho para nós, ocidental, já que a
base da psicologia hindu tem um fundamento metafísico, e por conta
disso, convém aclarar os profundos e sobressalientes conceitos desta

metafísica.

‘Jean Riviere’ em “Le yoga tantrique, hindou et tibetain” (existe versão


espanhola), estatua a respeito: “O conceito fundamental do pensamento
(vichara) hindu é a realização absoluta do Ser, como na filosofia
platônica grega. O fenômeno é somente a cobertura, a aparência
(nibha), o forro (kosha) da realidade de Brahman, que está sob todas as
aparências físicas (shtula) e sutis (sukhma) da natureza (vira). Os
fenômenos são a consequência de um despegar aparente do Ser. Nos
referimos a “aparência” por que a realidade sozinha é a do Ser, que é
único, infinito (nispara), absoluto (kevala), idêntico sempre a si mesmo. A
manifestação do Ser que chamamos a criação do cosmos (brahmanda),
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para os hindus se reduz a manifestações sucessivas, projeções, reflexos


que procedem do sutil de alguma coisa mais sutil e assim, até o
Brahman, o Ser imutável que no sofre modificações em si neste
desenvolvimento”;

Para a escola Vedanta, - já nos deteremos a ocupar dele em


profundidade – o Ser é a realidade (svarupa), o indivisível (sadharana).
Para o Vedanta o mundo objetivo não existe, e assim surge para nós
uma aparente contradição, que afirma que o Ser é a presença e o
mundo fenomênico uma mentira. O Vedanta dá a resposta sustentando

sua teoria da ilusão (maya).

Shankara – qual nos referirá especialmente, mais adiante – o grande


filósofo do século VIII d.C. , ao criar sua escola, estabeleceu uma forma
superior (paravara) de conhecimento (vidya), uma sabedoria que por
sua vez, mostra uma forma inferior (adhara) de conhecimento (vidya) da
ignorância (avidya). O valor de avidya é objetivo, nascido das limitações
do espírito (purusha) humano. Este conhecimento limitado se origina na
mediocridade humana que desconhece e oculta a realidade, a verdade
(satya). Como acertadamente afirma Riviere, “avidya é uma ilusão”
(maya) cósmica que mascara o Ser e cujo autor, é Ele mesmo um
mistério (annaya) inefável e maya é a alteração do véu, a cegueira pelo
qual passa o Brahman de categoria de Ser o Absoluto para o
contingente, alteração ilusória, entretanto. E agrega, “mesmo sem afetar
o Ser, é a manifestação de sua energia, sua Shakti com a qual cria e
destrói ao cosmos manifestado”. “É seu poder de criação (kalpa), de
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manifestação, poder da aparência com certo grau de realidade, pois


pertence, entretanto, a Realidade Suprema”. Em conclusão, para fins
práticos, o mundo conhecido, que conhecemos é Real.

Pelo que foi exposto interpretamos que Brahman é a causa da


manifestação (tyat), mas também a causa de sua dissolução (pralaya).
Assim o universo vive alternativamente um grande tempo de expansão
(ayoma), como também de repego.

O Ser, ao manifestar-se, provoca dois aspectos de seu poder: a


substância primordial (prakriti) que é o princípio de toda a atividade,
pertencendo-a toda a espécie de modificação. É uma realidade
universal que trabalha como consequência de suas três qualidades
(gunas) que constitui cada objeto, conservando sempre seu aspecto
psíquico e físico. Portanto, a prakriti, é constituída por três gunas que
são: sattva, a força (dridhta) de crescimento ascendente, a iluminação
espiritual no plano humano; rajas, a força de expansão dinâmica dos
desejos (raga) do prazer (arama), de dor (dukha); tamas, que é a inação,
a preguiça, a imobilidade, isto é, a força descendente. De acordo com o
guna predominante seremos mais afetados pelos seres e as coisas em
relação direta com a mesma. Tanto uma como a outra, os gunas estão
em cada ser humano com força diferente (vischta), executada
diversamente sobre a mente (manas). Estes três gunas sempre estão
presentes na prakriti, manifestando-se de uma e outra forma. Devemos
levar em conta que se funcionam em estado de equilíbrio, não
trabalham, e este estado é a característica da matéria primitiva antes de
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sua evolução. O evoluído compreende a diversidade, a natureza e esse

jogo dos três gunas, inclusive a manifestação material.

Para entender melhor o conceito de prakriti, a metafísica hindu utiliza o


“purusha”, isto é, o primeiro reflexo do Ser em manifestação. A presença
do purusha diante de prakriti provoca a manifestação como
catalizadora. Para esclarecer melhor esses conceitos, podemos dizer
que Prakriti é a matéria, a causa material do cosmos, por meio dos três
gunas e o inativo Purusha é aquele que promove o desenvolvimento do

universo, por meio de uma série de processos.

A filosofia original da Índia é totalitarista, visto que abrange o ser


humano em sua integridade. Nela, a metafísica é uma vívida realidade.
Dessa filosofia veremos o Yoga (unir, untar) que nos referiremos mais
adiante especificamente, por conceituar que no Yoga falaremos de uma
das fontes mais firmes da psicologia hindu e consequentemente, da
metafísica. Pelo exposto, trataremos da metafísica do Yoga para

conseguir uma maior penetração em sua psicologia.

A linguagem do Yoga é o Sânscrito, descobrindo nele um valor


simbólico. De acordo com a lenda hindu foi no princípio uma língua
primitiva e natural denominada “Devavani” (voz divina). Foi à língua dos
grandes Gurus (guru: guia espiritual, mestre). A posteriori foi se
modificando e deu origem a diversos dialetos: os prakritis (de prakrita –
vulgar). Assim se deu em grande parte do original a perda ou
deformação destas palavras. Entre as poucas que ainda se mantém
vemos o “AUM”. Esta lenda é justificada aparentemente pelo espírito
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próprio do Sânscrito. O Sânscrito é uma língua perfeita, sábia, nascida


de uma relação direta com o Védico, uma vez que o Sânscrito Védico
pode ser considerado como o estado mais primitivo da língua. Este
alfabeto fala dos Devas (Deuses). Lembramos que, da mesma forma que
aconteceu com a língua hebreia, o Sânscrito possui um valor vibratório
derivado do próprio som (Shabda) e refletem as verdades, as realidades
espirituais. São, mesmo assim, representações gráficas da força que
permanece adormecida no homem: a kundaliní, uma vez que
voltaremos a falar de todo o alfabeto (devanagari) no interior dos
chakras. Deixamos assim, pois a mesma língua usada pelo Yoga está a
metafísica de sua psicologia.

Muito sobriamente afirma Maryse Choisy em: “Metafísica do Yoga” que


“os hindus foram dialéticos em uma medida não superada pelos
ocidentais. Cada um dos seis darshanas está vinculado a um sistema
lógico. A gramática mesma é uma proeza da inteligência do país, de
Panini. Conforme uma construção total adaptada a esta língua perfeita
que é o Sânscrito. É uma ciência em si e quase uma epistemologia”.

A exegese, por sua parte, agrega Choisy – constitui outra gramática.


Regra o emprego de fórmulas ritualísticas. O Purva-mimansa (a exegese
primeira) é para a doutrina ortodoxa o que a dialética de Platão significa
para a ciência peripatética. O Uttara-mimansa denominado mais tarde
como Vedanta também possui sua lógica. O Shankya contém um
tratado casuístico. Aos outros, também poderíamos afirmar de Kanada –
diz Choisy – sobre seu sistema Vaisheshika. Finalmente, o nome de
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Patanjali, criador dos Yoga Sutras, que enfatiza o primeiro tratado de

Yoga conhecido, como no perfeito comentário da gramática de Panini.

Outro autor, Masson-Oursel, por sua vez em: “Le fait metaphysique”,
revendo ensinamentos sobre a perfeição (vishuddha) Sânscrita,
manifesta que “seus símbolos, suas fórmulas exemplarmente
condensadas, foram modelo da totalidade de um saber”, e agrega que
a dupla teoria da linguagem e da interpretação religiosa, elabora
tecnicamente o pensamento brahmanico, mestre dos símbolos, isto é,
virtuoso para planejamento de educações entre feitos situados em

diferentes planos, saturado logo após as aplicações metafísicas.

Já para Weber em: “Indischa Studian”, ao dedicar-se a lógica indiana


quando fala do Nyaya (de “Ni” – dentro e “I” – ir), que se trata de uma
lógica composta por lições (adhyayas), ditada por Gotama, é o máximo
dos lógicos.

É cativante esclarecer que a lógica ocidental, até a atualidade, se


manteve aferrada a forma, sendo de seu interesse apenas a questão
puramente técnica. Classifica, analisa, observa os modos de
racionalidade, despreocupando-se da origem das premissas.

Os filósofos Sankhya analisaram a fundo as condições necessárias


(upadhis) estabelecendo uma indução. Este espírito sutil indiano nos
demonstra Annambhatta em uma passagem do Tarkasamgraha,
quando expressa: “Ser o acompanhante constante do que deve ser
estabelecido (sadhya-vyapakatva) de uma não existência (atyantabhava)
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absoluta que possui o mesmo sujeito de inerência (samanadhikarana)


do que deve ser estabelecido. Não ser o acompanhante constante do
argumento (sadhanavya-pakatva) de alguma não-existência (não-
impossível) absoluta residente no que possui a natureza de um
argumento.”

Na antiguíssima vida da Índia, nos Bráhmanas y Upanishads existe uma


inesgotável e inacabada controversa entorno do Ser (sat) e do não-Ser
(abhava, asat). Explica Choisy que o colóquio entorno da teologia era
cotidiano. A Ilíada e seus destripares não era outra coisa senão um
relato de papos, se comparado com o Bhagavad Gita. Séculos de
cultura separam a manifesta crueldade de Aquiles das dúvidas e
escrúpulos de Arjuna. Entre Ulisses que procura cuidadosamente obter
um presente dos pretendentes de sua mulher, ao invés de mata-los y
Patanjali que proíbe um yogi aceitar o mais insignificante presente de
seu melhor amigo, se estende um abismo infinito moral. La epopeia
hindu é metafísica. Os reis se comprometem e se entregam a combates
dialéticos. Outorgam um prêmio ao melhor pensador das olimpíadas
intelectuais. Ao famoso Yajnavalkya, vencedor de um torneio filosófico
no qual participaram publicamente todos os pensadores da Índia, o rei
Janaka lhe ofereceu metade de seu reino. E ele mesmo, rei Janaka
quando ocorreu um incêndio de sua capital Mithila, contempla sem
emoção seu palácio consumido pelas chamas, pronunciando essas
palavras, reflexo de um cabal idealismo. “Enquanto Mithila arde, nada
do que realmente é meu pode ser destruído.” Assim relata o Brihasnata
Upanishad.
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Agrega Choisy que o olhar europeu desperta diante da contemplação


do bosque. Os hindus contemplam os desertos (aranya) ou a solidão
(vivikta) de cima dos Himalaias. Muito próxima está essa montanha que
aponta para um céu sem limites, propício para a meditação vertical. Os
dois pensamentos se desenvolveram paralelamente e cresceram no
marco do horizonte nativo. O ocidental se cristalizou entorno do

conceito do finito e o oriental a curta distância do infinito.

Uma árvore mostra uma forma precisa na qual joga a eventualidade –


assevera Choisy -. Oculta uma fada, uma ninfa, um Deus. Como tudo,
um Deus muito humano que só se interessa em assuntos de sua árvore
e não se interessa pela salvação do mundo. Toda árvore é única. Mostra
uma fisionomia própria. Um pintor pode utiliza-lo como modelo. Um
poeta pode outorgar-lhe uma alma pessoal. Dai vem o individualismo
ocidental, dai vem as artes plásticas. Observa-se e se estuda tudo o que
pode ser útil para um melhor conhecimento de cada árvore. Dai então
vem à ciência indutiva.

Lembramos que Flaubert aconselhava Maupassant: “Coloque-se diante


de uma árvore e procure descreve-la até que perda toda a semelhança
com outra árvore”. Vemos ai refletido o incondicional individualismo dos
ocidentais, limitando-se a si mesmos na finitude e com muito pouco
interesse por esse infinito (nispara) cimenta o pensamento hindu. Por ele
afirma Protágoras que: “O homem é a medida de todas as coisas”. Esta
é a franca definição do pensamento europeu.
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Em contraposição, o pensamento hindu afirma a eternidade (nitya). Não


o finito, a não-eternidade (anitya). Porque para os hindus o infinito é
uma virtude (vibhuti) absoluta (kevala), é a absoluta continuidade, a
grande virtude que tudo domina. Porque toda a forma (bhutaki), que é
imperfeita, é a que interrompe esta continuidade (nairantarya) do
infinito. Os gregos sustentam que a forma é suficiente, mas não é assim
para os hindus, para quem é apenas um aspecto transitório (anitya).
Porque por detrás da forma está Deus. Tal como expressa o Bhagavad
Gita: “Assim como o ar (vayu) que se move está na totalidade do éter
(akasha), assim todos os seres vivos estão em Mim”.

A sua morte (yama, anta), o homem ocidental entrega sua alma (atman).
O hindu abandona somente seu corpo (deha, sharira) porque a alma e
possuidora de um corpo que pode abandonar. Igualmente para o
homem da Índia, crê na reencarnação (purnabhava), do qual teremos
maior compreensão mais adiante.

Para o hindu em primeiro lugar existe o absoluto, o Brahman (não


confundir com Brahmá, que é o Deus pessoal). O Ser é infinito em si
mesmo. Por isso o mundo (anirvasaniya) atua em função d’Aquele, que
não é nem um e nem outro, ou seja, que é o incondicionado, o
impalpável, o intangível, Deus. Por isso o Vedanta nega o mundo dos
fenômenos. Mas nos lembra de Choisy que o ocidental entende que:
“Pareço o resto, mas é necessário que perdure a realidade do Cosmos.”
O Absoluto do Ser (sat), o pensamento independente (chit), a beatitude
infinita (ananda)”. Desta maneira o Cosmos (brahmanda) desaparece.
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Entretanto, a Índia também tem seus ateus (an-ishvara), por exemplo,


Kapila, o criador de um dos seis sistemas ortodoxos da filosofia hindu,
denominado Sankhya, para qual a alma (atman) e o universo
(brahmanda) são acidentes sem causa. Não menciona Deus. Nisso
discrepa com o Yoga, que é teísta. Kapila exibe a ausência de toda a
causalidade (yadrachavada). A alma é o resultado do corpo. Por isso, os
laukayatikas, os karvakas (não crentes), os nastikas (niilistas) negam a

realidade do que não é percebido pelos sentidos (indriyas).

Em seu Yoga-sutras, Patanjali demonstra a existência de Deus, ou seja,


do Deus Pessoal (Ishwara), se baseando na existência do infinito, vendo
a necessidade da presença de um Ser infinito no universo, pois tudo o
que é humano tem suas limitações. Contrariamente a Kapila, que nega
ao mundo e seu Criador, porque para ele, toda a criação é ação
(karma), que por sua vez supõe-se um desejo (raga) e tudo isso é, em si
mesmo, uma imperfeição.

As temáticas teológicas sempre foram variadas, mas na Índia o


materialismo nunca adquiriu o sentido que foi dado no Ocidente. Um
hindu não concebe que a matéria (prakriti), perecedora, seja mais real
que a ideia (chitta). Não está em discussão para eles, a preeminência do
espírito (purusha) sobre a matéria. Afirma Choisy que na Ásia é um
postulado tão evidente, como para os Ocidentais é a lei da

uniformidade.

O Sankhya, o que mais adiante nos referiremos como uma das


principais fontes da psicologia hindu contém em sua filosofia um
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“idealismo ateu”. Contemporâneo do budismo admite um sujeito


(purusha) e uma substância objetiva (prakriti) que está condicionada
pelo conhecimento e este por sua vez por uma relação com o purusha,
mas exclui Deus como único. Kapila, criador dessa filosofia, investiga os
instrumentos do conhecimento (vidya), isto é, a percepção (avagama,
buddhi) da memória (smriti), do racionamento (vichara). Nada disso
proporciona segundo Kapila, um criador do universo, por isso que Deus
não possui existência. Portanto, o Sankhya não nega Deus, mas
desconhece sua existência. Na Índia, “a dúvida soa ser tão infinita
quanto à fé”.

De outro ponto de vista, não devemos esquecer que o mundo é


mensurável, de acordo com o conceito ocidental, que o conhece por
meio da observação (chitta) externa (pratika). Em contrapartida, para os
hindus o sentido dos objetos (artha) e sumamente profundo que chega
a capta-lo valendo-se de uma concentração (dharana) interior (anta).
Paul Carton, referindo-se a este conceito hinduísta: “Considera que a
ciência materialista comete grosseiras faltas de lógica. O materialismo
científico descarta as ideias gerais. Chegam a ser míopes. Estão
fascinados pelo resultado final. Sem dúvida, se observa através do olho
da fechadura. Por exemplo, é o caso da medicina ocidental: esta ciência
procura curar o sintoma local esquecendo-se da causa real.”

Para o critério hindu todo o estudo fisiológico deriva de uma teoria


filosófica e não podemos deixar de aceitar que esses grandes místicos
são para ele grandes fisiólogos também. Em tudo isso coincide Jung
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quando afirma: “Quando um filósofo constitui um sistema ou quando


um fundador de religiões prediz algo que suscita nele dores corporais,
como exemplo, dores estomacais, oferece o desmentido mais severo
que pode fazê-lo a sua predição, de acordo com sua opinião. Algo
contradiz então as verdades eternas da natureza”.

Da mesma forma como expôs Aurobindo Ghose – o grande filósofo


hindu contemporâneo -, os yogis possuem “uma revelação interior das
verdades filosóficas, étnicas e científicas... Os Deuses védicos, os homens
de seus poderes, tal como observadores quando operam na natureza. A
verdadeira inteligência do sentido dos Vedas apontará então ao
conhecimento das verdades científicas descobertas pela investigação

moderna”.

Para os hindus, a liberação (moksha) se obtém pelas partes mais baixas,


não pelas mais elevadas do Ser (atman). Seu símbolo é a kundalini, a
serpente erguida sobre a cauda com a cabeça levantada. É a eficiência
do homem. Esta energia ascendente é a que converte o yogi em
energia espiritual (oja).

Choisy faz referência a uma interessante característica racial, é quase um


anonimato dos livros Sânscritos, afirmando que a escritura começou a
ser empregado durante o reinado de Vattagamani, no ano 800 a.C. As
crônicas do Ceilão nos dizem que antes dessa época, os monges
estudiosos teriam transmitidos de geração em geração, de acordo com
a tradição, os textos sagrados e seus comentários (attahakatha).
Entretanto, nesse tempo, alguns monges advertidos da debilitação dos
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espíritos, decidiram reunir-se e colocar por escrito a lei, com o fim de

esta perdurasse eternamente.

Complementamos que os hindus dividem a literatura Sânscrita em duas


partes que correspondem a dois períodos diferentes: a “sruti” (ouvido) e
que não seria obra de nenhum autor e a “smriti” (lembrado). A sruti, por
significar revelação divina, finaliza. A smriti, por ser tradição humana,
está fundamentada na autoridade de grandes filósofos, desde os
tempos mais remotos (puratana) até os mais modernos, como Shri
Ramakrishna e Shri Vivekananda por referirem-se constantemente a
ambas, sruti e smriti. Shri Vivekananda em suas “Conferências sobre o
bhakti-yoga” (yoga devocional) diz: “Se procuro ensinar algo novo
prestando minha autoridade e baseando-me nela, ninguém me
escutará, mas se extraio alguma passagem dos Vedas, fantasiando com
o texto até dar um significado mais impossível, suprimindo a
racionalidade e apresentando minhas ideias como extraído do texto
sagrado, então todos os imbecis me seguirão em massa”. A palavra
Vedas significa ciência sagrada, e tanto os yogis como os vedantis,
nyasas, sankhya, tântricos, se inspiraram nela, ou seja, os Vedas. Como
diz Shri Aurobindo, esta ciência sagrada contem virtualmente todas as
demais ciências. São os mais antigos monumentos dos conquistadores
Ários da Índia, já que data de mais de 2.000 a.C., mais ou menos, pois a
data exata não pode determinar. A filosofia de então, não era separada
da religião. A forma poética dos hinos (uktha) védicos é simples e clara,
mas contem profundos pensamentos (vichara, chetas). Mais a frente,
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trataremos sobre os quatro tratados que conformam os Vedas, a saber,

o Rig-veda, o Sama-veda, o Yajur-veda e o Atharva-veda.

Os Upanishads do qual nos referimos, frequentemente são situados por


volta do século VIII A.C., considerando a culminação dos Vedas. Nos
Upanishads falamos sobre um sólido conhecimento filosófico e a
metafísica em sua psicologia enraizada nelas. Sobretudo os principais
Upanishads do Yoga, que são: Chandogya, Brihadaranyaka, Taittiriya,
Katha, Svetasvatara, Maitrayana, Yogatattva, Dhyanabindu e Nadabindu.
Destes, os três últimos são mais firmes e possuidores de maior
sabedoria (vijnana, bheda). Nos Upanishads falamos sobre termos
técnicos que se relacionam entre si, como o Yoga, Brahman, Mimansa,
Atman, Dharma, etc. Nos Upanishads estão: a reflexão (manana), a
intuição (buddhi) e a meditação profunda (niddhidhyasana). Os
Upanishads são visões espirituais expressadas verbalmente e significam
conhecimento interior que chega a estabelecer-se na verdade (satya,
avijanata) última.

Quanto ao Vedanta, que significa o fim dos Vedas, é a direta


continuação dos Upanishads. Poderíamos dizer interpretar que ambos
quase se parecem. Em um princípio significam o final dos Upanishads,
mas logo o Vedanta será último e utilizado na metafísica derivado delas.
Assim aparecem o Uttara-mimansa e o Purva-mimansa que são um

comentário dos Upanishads.

Quanto aos Sutras, contrariamente aos Upanishads não contem rasgos


de literatura védica, mas ao contrário, seu critério é de juízo científico.
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Estes sutras ou aforismos, sã os que englobam séculos de experiência


psicológica e sem dúvida nenhuma, os Yoga-Sutras de Patanjali, o
grande mestre da psicologia hindu, demonstra severamente. Max Miller
(filósofo e orientalista alemão nascido em 1823), referindo-se a ele
(Patanjali) manifestou que se as obras de Hegel tivessem sido retratadas
em sutras, teriam evitado muitas confusões. Portanto, afirmamos uma
vez mais que a grande diferença ocidental e a oriental se concreta no
feito de que na ocidental, considera-se o pensamento um objeto de
conhecimento, enquanto na oriental significa um instrumento de ação
(karma).

Por este desdobramento – assegurou Choisy – nenhum momento


filosófico do pensamento europeu oferece documentos tão precisos, tão
matizados, como a história do Vedanta e Sankhya, e a oposição do
monismo-pluralismo através de todas suas variantes. Por ele o problema
do Uno se apresenta nos hindus como mais tarde se apresentou para
Parmênides e a Hegel. Em definitivo, o infinito não pode ser além do
Uno, pois se houvesse outro infinito do Uno ficaria inexoravelmente
limitado. Na Índia o Uno é expresso através da palavra Brahman, que
quer dizer o Neutro, não é Brahma masculino e sim o absoluto, o
princípio primeiro que dá nascimento (jati) ao universo (brahmanda).
Brahman é Deus. O inefável.

Etimologicamente a raiz da palavra Brahma, barh ou brih, significa


crescer e como consequência, rogar. Esclarece Müller que como
“crescer” advém “raga”, um problema que provocou apaixonadamente
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muitas discussões entre os “sanscritólogos”. (Convém esclarecer que a


palavra “raga” significa: amor, desejo). Roth, em seu ponto de vista,
considera o termo como uma fórmula mágica que se chega a crescer, a
rogar, pela força de vontade eleva os homens à Deus (Deva-bhu). Para
Daussen, a pregaria é a elevação de nosso “eu” (ahamkara) do qual
temos consciência na meditação (dhyana). Para ele, nós mesmos nos
elevamos por meio da pregação. Já para Jung, são os Deuses (devas)
mesmos os que elevam quando se recita as pregarias e os hinos

sagrados.

Voltando a Choisy em sua intenção de deixar claro estas opiniões


divergentes, diz que para dar uma explicação inteligente da passagem
de “brih” e de suas formas paralelas “vrish”, “vridham” (manifestar-se,
germinar, desenvolver-se e fortalecer-se) em Brahman, carece aos
“sânscritologistas” um conhecimento profundo dos símbolos universais.
Agrega que as gramáticas hindus nos oferecem a chave deste enigma.
Brihat significa antes de tudo, grande. Até aqui, uma etapa normal para
um derivado do crescer. Mas para Panini e Patanjali dão a “brihat”,
“brimhayati” outros dois sentidos. “falante” e “brilhante”. Esta última,
brilhante, esclarece tudo. O link faltante então não podia ser outro
senão, o sol. O “RA” egípcio é um dos exemplos, entre outros, quem
sabe mais típicos de todos eles. Nos simbolismos antigos certos
conceitos (sol, fogo, germinar, crescer, fecundar, amar, falar) estão
ligados ao Princípio Supremo. O logos mesmo resulta um derivado. Se
“brihaspati” é sinônimo de “vachaspati”, o fogo da palavra, e “brih” é
uma forma paralela de vridh (o verbo), tudo é explicável.
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Brahman para o Vedanta clássico posterior, é “Sat”, Chit, Anand. Sat é a


existência pura; Chit a inteligêngia, o pensamento puro e, como diz
Shankara: “Tal como um bloco de sal é sal, salgado por dentro e por
fora, sem nenhum outro sabor... luz substancial por essência”. Ananda é
a bem-aventurança, pura beatitude.

Padre Dandoy, referindo-se a essa trilogia dos atributos de Brahman, diz


que “deve-se evitar identificar a concepção vedântica de Brahman com
nossa concepção cristã de Deus”. Assim, mencionando as diferenças
mais acentuadas: 1) Brahman é de tal maneira, “Aquele que é”, que é o
único Ser. O Ser é concebido pelos vedânticos não como “gênuo”,
menos ainda como “analogum”, mas como único “substratum”, do qual
tudo o que é ou parece ser, mantém a qualidade do Ser. 2) Ainda que
seja luz “intelectual”, causa da visão e do pensamento, Brahman não
tem consciência reflexa, isto é, não se reconhece. O mesmo, visto que
os Advaitins não admitem o que denominamos “reflexionar” o retorno
da consciência a ele mesmo. 3) Acontece que dele mesmo, o Eu não
possui beatitude, com sentido que damos a este termo. Ananda significa
que é o bem, aquele no qual tudo transpõe sua alegria e seu repouso.
Inexato se, entendemos bem, por suas negociações. Sat causa “constitue
universatis”. Chit, luz “percipiendoe veritatis”. Ananda “fons bibondae
felicitatis”.

Antigamente, em seu monismo, se identifica Atman com Brahman. Em


atman está recolhida a antinomia da alma individual (yasti) e a alma
universal (purushottama). O significado primitivo de atman é alento
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(asu), sopro. E´o alento que aparece nas primeiras passagens do Rig-
veda: “Que teu olho ascenda ao céu, teu alento ao vento”.
Posteriormente atman adquiriu outro significado: alma (atman), espírito
(purusha), vida (jiva), alento vital (prana). Logo, os gramáticos fizeram de
atman o pronome pessoal “si” aplicando ao eu, tu, ele, tal como se
demonstra no Atharva-veda: “Eu mesmo, pai, filho, neto, avô, esposa,
mãe todos os que são queridos, apelo a eles”. Entretanto, com o passar
do tempo atman chega a expressar as noções de eu ideal dos
psicólogos modernos e também assim foi empregado pelos yogis. Em
definitivo, Atman é sinônimo do Ser Supremo, isto é, o que Brahman
significa para o Universo.

Essa presença divina que é o atman, como alguns o definem, está


enraizada de alguma maneira no microcosmo (loka-tattva) e é assim a
alma cósmica (hiranyagarbha) do macrocosmo (brahmanda).
Possivelmente foram os filósofos dos Upanishads que no Cosmos
falaram do Absoluto denominando-o Brahman. Também o encontram
em si mesmos e o designam como Atman. Isto é, o incondicionado no
transfundo do universo e o condicionado no fundo de si mesmo.

Em tudo o que foi dito até o momento, notamos um critério metafísico


marcado relacionado com a psicologia hindu, definindo desta maneira
seus conceitos opostos ao relacionamento ocidental. Neste sistema
metafísico tornamos o Vedana, reiterando que o Vedantins nega o
mundo dos fenômenos uma vez que os considera resultante de uma
não ciência (avidya), isto é, a ignorância da natureza humana e que a
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ciência (vidya) a anula, uma vez que a ciência é a captação da essência.


Mas é interessante destacar que existem diferentes graus de
conhecimento: o perfeito (samyadagnam) que é o conhecimento da
verdadeira forma de uma coisa. A constância de uma coisa é uma
realidade (paramartha) e seu conhecimento se lhe considera perfeito.
Enquanto, a avidya, Shankara em seu Bhasya da à definição: “É a falsa
sobreposição (adhyasa), isto é, a ideia de um atributo ou de uma coisa

quando este atributo ou coisa não está ali”.

No Chandogya-upanishad, as palavras que dirige Udalaka Arumaya a


seu filho Svetaketu contém o significado real do Vedanta ao dizê-lo: “Tat
tvam asi” (Tu és isso). O Tat (isso) é o Brahman. O tvam (tu) é o eu
subjetivo. Existe uma identidade do eu e Dele, de causa e efeito, de
sujeito e objeto. “Tat tvam asi” é a síntese de toda uma filosofia.

Diz Choisy que é preciso evitar todo o tipo de confusão referido a


avidya, entre o aspecto epistemológico e psicológico do mundo
fenomênico e tudo o que está relacionado com as características
ontológicas que Shankara denomina como maya (ilusão). Por certo que
este é um dos termos vedânticos que mais interpretações equivocadas
ou entendimentos confusos tiveram os orientalistas europeus. Maya
não foi apresentada como uma doutrina já estabelecida pelos autores
ortodoxos, e sim como uma simples hipótese necessária. Devemos levar
em conta que maya é uma postulação (kalpyata) para justificar a
produção – de outro modo inexplicável – de um mundo irreal (jati),
labirinto de alegrias (harsha) e penas (srama), pelo incondicionado, o
20

Supremo Brahman, eterna beatitude e plenitude para dar razão a um

mundo que é inexplicável e que se demonstra por sua evidência.

A Maya se lhe dá o significado de ilusão, mas literalmente significa


magia, porque somente ela pode criar um mundo inexistente. Maya é
objetiva (artha) contrariamente a avidya que é subjetiva (vivarta). Maya é

mais do que um erro (bhrati), mas a escuridão (rajarasa) é positiva.

O Vedanta não soluciona um grande problema metafísico, isto é, a


relação do relativo (kevala) com o Absoluto (Brahman). Simplesmente o
nega. Swami Siddheswarananda em: “Quelques aspects de la
philosophie vedantique”, explica: “O Vedanta admite que o mundo
possui um valor empírico. Não aceita em sua totalidade a teoria do
mundo subjetivo, do idealismo subjetivo. Para ele, o mundo objetivo
existe, mas o Vedanta tampouco ignora que a experiência yoga
conquiste um estado de consciência no qual o sujeito e o objeto se
desvaneçam de maneira simultânea. O Vedanta possui a particularidade
de não ser nem subjetivo nem objetivo. Não se localiza nem no plano
do realismo nem no idealismo. Observa o valor da experiência
adotando os dois pontos de vistas o do sujeito (paksha) e do objeto
(artha) e procurando falar sobre o substrato comum que vincula o
pensamento com o objeto”. Não obstante, o Vedanta possui sua
experiência mística, isto é, a intuição (buddhi) do Absoluto. O próprio
Shankara, ainda que tão dogmático, quando se referia ao despertar de
si (svanubhava) e a realização do si (svannubhti) expressava que se
sentia “a emoção supra-intelectual, a alegria daquele que viu”.
21

Mesmo que sinteticamente, não podemos deixar de nos referirmos a


buddhi na metafísica da psicologia hindu. O termo é um derivado da
raiz buddh (despertar, perceber) e sendo o desenvolvimento da prakriti,
passa a ser o espírito que clarifica a matéria (vichaya). Cria nos sentidos
(indriyas) a faculdade de perceber (pratyaksha). A buddhi não é objetiva
nem subjetiva, uma vez que necessita involucionar para cumprir com
seu cometido. Para Kapila o “eu” (ahamkara) é indispensável para que
exista a percepção (pratyaksha). Ahamkara também significa egoísmo
(aham). No Raja-yoga encontraremos a técnica psicológica ordenada da
prakriti e a buddhi.

Referindo-se a metafísica da relação, expressa a Katha-upanishad: “O


infinito não pode ser obtido mediante objetos que são finitos”. O qual
significa que são transitórios (anitya) as formas (bhutaki) do universo
(brahmanda) e, como consequência, não pode ser conhecida à
realidade (satya), senão por meio da instabilidade (kshipta) de suas
relações. Por meio das formas limitadas não pode ser conhecido o
infinito. Como muito bem afirma Choisy, quando o universo adota uma
forma, necessariamente deve ser superada. O sentido dos objetos não
poderia residir nos objetos mesmos, uma vez que está naquele que o
supera e esta é a relação, estar em nossa representação desses objetos
e em nosso sentir por eles.

Os Upanishads exaltam o entusiasmo diante da realidade. Como por


exemplo, especifica o Isha-upanishad: “O menor movimento da vida
(jiva) seria impossível se o céu (dyu) não estivesse pleno de alegria
22

infinita”. Portanto, cada coisa é na medida da alegria que produz.


Agrega mais: “A inteligência retorna desenganada e ignorante. Também
as palavras (vechas). Mas aquele que realiza a alegria de Brahman, nada
teme”. Em tal caso, Deus é alegria. Segue: “Quando empreenderes um
trabalho faça-o como se fosse viver por cem séculos. Mas que o
trabalho do homem não esteja consagrado e ele”. Sendo assim,
despojando-se do eu, do si mesmo, poderemos superar nossa própria
vida. Há um renunciamento implícito na sabedoria de viver. Quando o
yogi conquista o controle de suas paixões (chanda), suas impurezas
(tamas), faz com que sua serenidade (sama, sattva) o conduza em
direção a esse Ser infinito que é Brahman, porque o homem está feito à
imagem de Brahman.

Para esclarecer dentro do possível, nosso conhecimento do verdadeiro


conteúdo da psicologia indiana, seja oportuno lembrar a proveitosa
definição, do que poderia chamar a psicologia da ascensão, como
descreveu Gastón Bachalard: “É impossível desconhecer o olho vertical
se nos propomos a expressar os valores morais... A queda é uma
realidade psíquica de todas as horas... As imagens do ar estão na via de
imagens da desmaterialização... O sonho imaginativo devolve aos
homens o seu terreno aéreo, com felicidade”. Como consequência, a
imaginação do homem conserva, aparentemente, a nostalgia da altura.
Também Jung interpreta a evolução espiritual por meio de uma imagem
vertical, dizendo: “Enquanto a Idade Média, a antiguidade, inclusive a
humanidade inteira desde os tempos balbucios, viveram a convicção de
uma alma substancial, e então, na segunda metade do século XIX, nasce
23

uma ‘psicologia’ sem alma. Sob a influência do materialismo científico,


tudo o que não era visto ou apreendido, soava como duvidoso, e
inclusive, suspeitoso como metafísica e, portanto, comprometedor.
Somente era ‘científico’ o manifestadamente material, o que se podia
deduzir de causas acessíveis aos sentidos. Essa modificação foi se
afastando mediante uma lenta gestão muito anterior ao materialismo.
Durante a época gótica, direcionada impulsivamente ao céu, mesmo
que descansando em uma base geográfica e uma concepção de mundo
estreitamente circunscrita, a ascensão vertical do espírito europeu cai
arrastada pela catástrofe da reforma e travada pela expansão horizontal
da consciência moderna. Se perdeu altura, mas ganhou em amplitude
geográfica e intelectual”.

A criação (kalpa) é um tema apaixonante, não apenas na psicologia


hindu, mas na psicologia universal. À vontade (buddhi, kratu) criador é o
princípio ativo da vida. Detalhado no Chandogya-upanishad: “O homem
se faz por sua vontade. Tal como se mostra hoje o dia da vontade do
homem, assim será mais tarde. Sua vontade o modela”. Por sua vez o
Brihadaranyaka-upanishad ressalta: “O homem está formado por desejo
(kama). Assim como é o seu desejo, assim é o seu pensamento (vichara),
tal como seu pensamento, assim é a sua ação (karma) e tal como sua
ação, assim é suas aquisições”.

Alguns yogis veem a criação como algo diferente (vividha) a um


movimento de pensamento. Brahman outorga vibrações (spanda)
rítmicas que podem ser percebidas (avagama) como sons (nada)
24

musicais pelos sábios (rishis) videntes. Portanto, é Deus que conduz essa
imensa orquestra que é o mundo (anirvasaniya). No Laya-yoga há uma
concentração mental sobre o som interno (anta) do homem e no
Mantra-yoga está à percepção (japa) cadenciosa de fórmulas místicas
(yukta). As ideias e os sons são um só não apenas na tradição indiana,
mas nas tradições egípcias, hebraicas e alexandrinas. Vale destacar que

para outros yogis o mundo é uma sinfonia de cores (varna).

Também é injurioso ressaltar que o hindu destaca a intenção (chanda)


antes do ato (upachara). Se por exemplo, observarmos ahimsa (não
violência de Gandhi) que é uma das restrições de yama, veremos que
para Patanjali no Raja-yoga e Narada no Bhakti-sutras, significa “não-
matar”. Posteriormente que para os yogis significará “não causar dano”.
Vivekananda disse: “não causar em pensamento”. Como consequência,
ahimsa, significa ausência (abhava) de inveja (macharya). Para Freud, há
um reconhecimento de que esta teoria hindu se assemelha a
experiência psicanalista, pois considera que todo o ciúme se traduz em
um desejo inconsciente (nirvikapla, jada) de matar.

Referindo-nos a ética (niti) hindu, nos perguntamos: ela existe? Patanjali


nos responde: “É preciso cultivar a amizade (mitri) por meio da
felicidade (ananda) dos outros, a compaixão (karuna) para sua dor
(dukha), a alegria (harsha) para seus méritos, a indiferença (urasina) para
com seus defeitos (dosha)... Ela proporciona paz a Chitta”. Como
consequência, a moralidade (em pali, sila) não se busca, mas se recebe
como uma ajuda. Por acaso, esta ética hindu é puramente humanista?
25

Pode nos desconcertar? O conceito da verdadeira moral (niti) está incito


em cada um de nós, ou seja, é, e não está de nenhuma forma. Por que
a moral não é um fim, simplesmente se é ou não. Aceitamos que
existem diferentes critérios referentes ao significado da moralidade. Mas
aquele que é feliz (ananda) e não invejoso (irchalu) pela felicidade dos
outros, está sobre eles, porque se elevaram de suas impurezas (tamas)
interiores. Na moral das ações, estas devem ser boas e, referindo-se a
ele, disse o yogi: “Toda a ação mental, sensível ou física, que tende a
limitar sua evolução, a quem quer que seja, é um mal, pois conduz a
uma regressão. Toda ação que tende a aportar uma limitação (upadhi) e
a fazer progredir o Ser na direção da Divindade, é boa”. Consciente
(buddhi) ou inconscientemente (nirvikalpa) na moral está o amor
direcionado a Deus, por isso que a ideia moral parte da Teologia. Só
mencionaremos que na moralidade jogam os três mundos: o corpo

(deha), a mente (manas) e o espírito (purusha).

Na concentração (dhárana) e, sobretudo na meditação (dhyana) serão


os passos que logo nos detalharemos, mostrando de forma muito
concisa a demonstração da metafísica na psicologia hindu. Yogananda
em “Meditações Metafísicas” explica que: “A meditação é aquela ciência
cujo objetivo é a realização de Deus. É a mais prática de todas as
ciências do mundo... O propósito essencial da meditação é tomar
consciência de Deus e da eterna identidade de alma com Ele. No estado
de realização divina o devoto recebe múltiplas bênçãos: a paz, o amor,
o gozo, o poder e a sabedoria de Deus”.
26

Pontuamos que a concentração (dharana) consiste em fixar a atenção


(ekagrata) em um só ponto ou em um pensamento. Na meditação
(dhyana) há uma superação da concentração, uma vez que o sujeito
(paksha) se introduz no objeto (artha) e o analisa por dentro.
Yogananda escolhe uma forma de meditação totalmente metafísica, na
qual tem como único objetivo o conhecimento (vidya) de Deus. Ao
brindar a percepção direta de Deus, Yogananda diz que a meditação

eleva a prática da religião por cima das diferenças de dogmas.

Em “Meditações Metafísicas” encontramos três tipos de meditação:


orações direcionadas ao Senhor, afirmações sobre Deus e inspiração
espiritual direcionada a nossa própria consciência. Delas, selecionamos

os temas de meditação que conceituamos ser para o homem atual.

Referindo-se a devoção (Bhakti), as aspirações espirituais, Yogananda


reitera esta oração: “Ensinemos a abrir a única porta, a da meditação,
que conduz a Tua divina presença. Guia-Me ao meu coração (hrid),
minha vontade e minha atividade em direção ao objeto devido, ao real
e verdadeiro. Ensina-me a contemplar Teu rosto no espelho de meu

silêncio interno”.

Outra forma de meditação busca a expansão do silêncio (mouna,


turiya): “O silêncio se expande como uma esfera crescente em todas as
direções e em todas as partes. Meu silêncio se difunde como as ondas
sonoras do rádio, para cima, para baixo, à direita, à esquerda, para
dentro, para fora e em todos os lados. Meu silêncio é como o éter, a
27

tudo penetra e leva a todos os cantos da terra, dos átomos e das

estrelas ao Sua infinita mansão”.

O tema meditação que subsegue é o tratamento do infinito (anatman)


no finito (parishina): “Descendi de meu trono onipresente de amor no
regato do espaço e no centro de luzes cintilantes para buscar um grato
asilo no coração do homem e ali permaneci ao longo do tempo, longe
do meu lar paterno. Deixa com que o amor derrame sua alegria em
todos os corações dos seres humanos de todas as raças. Permita que
meu amor repouse no coração das flores, dos animais e no pó de luzes

das estrelas”.

Em outra meditação, Yogananda se preocupa pela necessidade da


transmissão do amor (raga): “Quisera meu amor se estenda a todos os
corações. Sou o servidor sempre disposto a servir todas as almas
necessitadas, com meus conselhos, com meus recursos e com minha
humilde sabedoria adquirida no santuário do silêncio... Encontrando a

Ti, encontrarei todas as coisas”.

Nos fala logo de seus serviços e como presta-los: Não quero


monumentos que se alcem sobre as mentes com a fama. Quero
permanecer oculto dentro das grutas do amor divino nas almas e
silenciosamente servi-los com minhas invisíveis (adrishta) pensamentos
de ajuda e entusiasmo. Quisera desmaterializar meu corpo e sem forma
e nem nome ser o silencioso mensageiro divino que visita os obscuros
cantos de todas as almas e ascender nelas as lâmpadas de paz forjadas
nas oficinas do silêncio”.
28

Também o êxito é um tema importante para a meditação: “Usarei as


forças do meu pensamento para obter êxito em qualquer assunto de
interesse que acometa. Eu mesmo me ajudarei para fazer o uso devido
de todos os poderes que Deus me der. Deus me ajudará se eu me
ajudar a mim mesmo e lhe peço que me ajude a levar a bom termo

meus empreendimentos”.

Vamos comprovando que em cada meditação metafísica há uma


aproximação a Deus e que por meio Dele podemos purificar nosso
interior. Assim se busca também por meio da meditação, evitar a cobiça,
pois se entende que Deus é o poder que está por detrás de toda a
riqueza e os grandes valores. Mesmo assim, vemos a amizade (maitri)
como um tema valioso de meditação quando possível palpar o
sentimento que se brinda de um amigo oculto.

Ao ser humano se torna uma tarefa muito difícil vencer o orgulho


(dambha) com humildade (vinaya). O homem carrega um profundo
conflito interior e geralmente não tenta desembaraçar-se dele e, se
tenta liberar-se (mukti) se transforma sumamente penoso de conseguir.
Mas a humildade é a maior força que os humanos possuem para abrir o

caminho à liberação.

Também o temor (kampa) é uma carga constante ao homem e torna de


difícil liberação. Por meio da meditação, se busca o alijamento do temor
à morte, a tristeza, a solidão e inclusive a ação, ao fazer, ao gozo e as
dificuldades que se apresentam no diário ir e vir. Entretanto, é possível
que o homem tema mais os medos do que a própria violência. Mas é
29

preciso conseguir afugentar a ira (krodha) se pretendemos conquistar a


tão ansiada paz (shanti). Por meio da meditação é possível apagar a ira
desenhada no rosto humano. O homem que consegue viver uma paz
interior é quem pode apaziguar o enojo dos outros.

Cada um de nós requererá várias formas de meditação e deveremos


reitera-las constantemente para desimaginar de nossos defeitos (dosha)
e como supera-los. A conquista da alegria (harsha), da esperança (asha)
e dos valores (driti) é também possível, porque o estado de bendição

que nos dá a meditação faz com que isso seja possível.

O ser humano demanda afanosamente a liberdade (mukti) ignorando


que a sabedoria (vijnana) e o entendimento (antakarana) nos oferece o
caminho (patha) direcionado a ela. A meditação dá ao homem o calor
de sua própria alma e nela se ascende a luz, porque a consciência já
não permanece mais atada ao corpo e a mente, pois foram dominadas.

Para alcançar a paz (shanti) existe uma forma de meditação que o hindu
pratica com veemência. É quando o pensamento se torna silencioso e
dissipa toda a inquietude. Esta inquietude que a todos atormenta (tapta)
desaparece na fonte da meditação.

Yogananda em suas “Meditações Metafísicas” nos diz como trazer de


volta a vida a sua origem: “Eu era um prisioneiro que carregava uma
pesada carga de ossos e carne, mas rompi com essa cadeia por meio
do poder do relaxamento. Já sou livre. Agora tratarei de penetrar ao

meu interior”. O relaxamento (shavasana) é uma prática de yoga.


30

O eu (ahamkara), como eternidade (achyuta) é um assunto diretamente


da meditação. O homem pode perceber do seu interior, a si mesmo,
criando um centro (kendra) cósmico (samasti) ao redor no qual gira a
eternidade.

Agregaremos uma última meditação metafísica, na qual nos ajuda a nos


conectar em um mesmo tom com os sons cósmicos que emanam da
matéria (prakriti) e das forças da vibração (spanda). Observa Yogananda
que nessa meditação se pode escutar o som cósmico no lado sensitivo
direito da cabeça (shira) e sentir como se expande pela cabeça inteira. É
esse som que corre pela espinha dorsal nessa meditação abrindo o
coração e fazendo-o bater intensamente. Assim o som cósmico então,
penetrou nos raios cósmicos conscientes. É um prazer que somente é
possível compreender vivenciando-o.

Por meio das meditações metafísicas de Yogananda, aportamos um


maior entendimento da metafísica da psicologia hindu, permitindo-nos
entender (cheta) ainda mais as características peculiares. Mesmo que
nesse caso, o objetivo dessa forma de meditação seja ir de encontro a
Deus, sua metafísica mostra realidades que possibilitam a purificação
(nirajana) de nosso corpo (deha), espírito (purusha) e mente (manas).
Não obstante, comprovaremos continuando com nossas ilustrações que
a metafísica do yoga aportará novos elementos para clarificar nosso

saber e entender.

É de vital importância o poder da autossugestão no aspecto metafísico


da psicologia indiana. Para compreender seu alcance, esclarecemos que
31

a prática de yoga é autossugestão em si mesma. Racionalmente Choisy


esclarece que este termo, isto é, a autossugestão substituiu no século XX
a “virtude dormita” de Moliere. A psico-fisiologia moderna – acrescenta
– recorreu a ela para diminuir sua ignorância. Aptidão para o
mimetismo. Aptidão para receber um impulso. Choisy faz estas
interessantes, perguntas: É possível explicar como e por que age? É
possível reproduzir cem vezes sobre cem fenômenos a autossugestão?
Voluntariamente e em pessoas sãs? Pois todos os fenômenos que a
medicina moderna não pode explicar, senão apenas observados em
casos patológicos.

Assigna Choisy ao yoga da sabedoria (Jnana-yoga) a faculdade de


interpretar racionalmente, por meio de uma hipótese, a autossugestão e
diz: “Somente o Jnana-yoga a interpreta de um modo racional mediante
hipótese dos graus de consciência na vida secular. O problema se
esclarece então: como alteram as dúvidas da inteligência voluntária do
destelo de inteligência das ‘pequenas vidas’ e como cura a fé”.

Por sua vez, Charles Baudouin, em seu estudo “Suggestion et


autosuggestion”, afirma que a autossugestão é uma atividade mental
que não está vinculada ao instinto (riti) nem a vontade (kratu), nem ao
hábito (ahimsa). A autossugestão está para a vontade, como a
complexidade está para a afetividade (anuraga) ou a intuição (buddhi)

para a inteligência.

Quanto ao mecanismo da sugestão, devemos delimitar claramente dois


processos: 1) as relações por intermediação das imagens da inteligência
32

com os centros de consciência, 2) a regeneração das células por um


princípio mais material, isto é, a energia vital (prana) que buscamos no
ar (vayu), na água (jala), nos alimentos (anna). Quando se alcança este
estado, recém saberemos por que é preciso controlar o próprio
pensamento antes de realizar ações no mundo exterior. De nada serve
exercitar o corpo como um violino, diz Choisy, se ignoramos a arte de

fechar à porta as sugestões desmoralizadoras ou perigosas.

Quanto os diferentes estados de consciência (prajña, sajñana), somente


terão referências deles, mas sem examina-los adequadamente. Ainda
assim temos os estados superiores de consciência, base de uma
posterior evolução espiritual. O Raja-yoga, isto é, o yoga do controle
mental, estabelece uma escala psíquica e os yogis distinguem nove
graus de consciência. Somente o sexto grau é consciência (buddhi) e
nos referimos à inteligência (medha) voluntária. Quanto às cinco
primeiras são subconsciências (vasana samskara) e as três últimas são
supraconsciências (turiya, tandra).

Com respeito aos estados de consciência inferiores, não são em si


mesmas consideradas negativas ou más, mas controladas pela
consciência superior. Mencionaremos então os oito estados de
consciência inferiores e estes são: 1) consciência mineral, 2) consciência
vegetal, 3) consciência animal, 4) instinto, 5) hábito, 6) intelecto, 7) razão
supra-consciente ou consciente e 8) intuição. Choisy em: “Metafísica do
Yoga”, os explica detalhadamente.
33

Nós, vamos nos deter nos três últimos destes estados de consciência; a
intuição (buddhi) na qual reconhecemos a supra-consciente (turiya) que
passa a dominar a consciência. Referindo-nos a isso, diz Vivekananda:
“Não há um homem entre um milhão que esteja inspirado no estado
atual do mundo”. Como esta atividade da intuição é inconsciente
(nirvikalpa) não é conveniente afirmar ou determinar se o que produz é
supra-consciente ou subconsciente (samskara), pois podemos incorrer
em um engano (damha), como exemplo, o instinto (riti) pode confundir-
se com a intuição, tal como afirma Freud e Bergson. Por outra parte
Vivekananda trata de esclarecer o critério da intuição e explica que “em
certos dias cada um de nós se sente inspirado e exibe reinvindicações
sobre-humanas. Como distinguir a inspiração (prana) do engano? Em
primeiro lugar, a inspiração não deve contradizer a razão (budhhi). O
ancião (vriddha) não contradiz a criança (bala). É sua continuação. O
que se poderia afirmar sobre a inspiração é a continuação da razão”.
Bergson coincide com esta definição ao considerar que a intuição é “a
continuação de nossa vida interior”.

Para Vivekananda também “uma inspiração pura transita o caminho da


razão”. Além do mais, a inspiração deve ser para o bem de todos e não
para o castigo ou benefício pessoal. Quando estas condições são
cumpridas se justifica plenamente a crença no poder da inspiração. Na
atualidade a religião não deixa de ser um jogo. Com a inspiração se

abandona esta atitude e se pratica uma religião cabal. v


34

Na antiga e sagrada literatura da Índia, se fala sobre a intuição positiva,


que é quase como afirmar ou tratar-se de uma vivência metafísica.
Assinalou Marsson-Oursel que: “A poesia soa como uma obsessão por
realizações mais imediatas, um plano anterior à especificação de uma
arte maior, inclusive na distinção entre o sujeito que sou e os objetos
que me proporciono. Sem pretender sempre ter o acesso ao Absoluto,
mas ao menos para reconhecer-se em cada coisa, a poesia reitera o “tat
twam asi” diante de todo o espetáculo da vida. Por isso toda a paisagem
é um estado de alma: este poderia expressar-se pela definição mesma
do verdadeiro “adaquatio rai et intellectus” a menos que a alma se volte
ao objeto pela própria alma inteira com intuição, coração e sentido”.

A arte é uma expressão superior do interior (anta) do ser humano. O


artista cria para manifestar-se, para realizar-se, para brindar-se, dar-se
ao exterior (pratika). Nos tratados hindus da poesia (alamkara) se
estabelece a diferença entre “a arte pela arte mesma” ou a arte para os
demais. Eugenio D’Ors ao referir-se ao retrato, dá uma teoria
congruente sobre a arte. Detalha D’Ors que “o verdadeiro retrato é a
pintura do símbolo que todo o homem representa ao gênio, ou seja,
segundo a terminologia socrática ao denominar, familiar, ou segundo a
teologia católica, o anjo. Por que um verdadeiro, um grande retrato
para seguir parecendo ao seu modelo ao cabo de dois anos? Acontece
que por ele, foi revelado o supra-consciente – lei celestial -, a
personalidade, o anjo não tem vida consciente do modelo, nem
subconsciente. O retratista vê o que será seu modelo depois. Trabalha
de acordo com o sentido da vida, segundo o sentido da purificação. Vê
35

além ao homem ou mulher, tal como modelaria a eternidade (achyuta),


eliminando todo o provisório, o contingente temporal, sempre como
um esboço da aparência da hora ou do momento. Descobre o definitivo
da edição não variável”;

Não devemos esquecer para os yogis a arte na qual tanto manifesta a


intuição é a abertura de um chakra, ou seja, a porta de comunicação
entre o mundo aparente e o sobrenatural. Tanto para os hindus como
para os tibetanos, o artista é um vidente (kavi) e há um encanto mágico

em sua criatividade.

A consciência (prajña) cósmica é o plano mental mais elevado. São


poucos os que conseguem chegar a ela e, para os yogis, somente se
alcança com a união (ekata) mística com Deus. De acordo com
Bachalard este aspecto fundamental do Raja-yoga pode denominar-se
como a psicologia da verticalidade, sendo esta, a antecessora de todas
as psicologias do inconsciente (nirvikalpa) e nenhuma delas chegou a

supera-la.

Referindo-se ao conhecimento desta dita técnica, afirmam Laubry e


Brossa: “Assim como a noção de uma função já não se apresenta como
o resultado de uma série de interações laterais, nas quais a vontade
seria indiferente ou impotente, em troca, podemos considerar
submetida a um mecanismo completo que funciona e se cabe dizer, em
um sentido vertical”.
36

A mãe, isto é, o eterno feminino, é fundamental nos povos arianos e se


falamos de eterno feminino instalado, falamos em um trono de
bondade (sadbhava) e poder (vibhava). A época que mais adquiriu a
difusão do culto a Mãe na Índia foi ao período chamado mundo pré-
cristão. A isso se refere Ramakrishna: “Quando penso em Ser Supremo
como inativo, não criando, nem conservando, nem destruindo, os
chamo de Brahman ou Purusha, Deus impessoal. Quando penso Nele
como ativo, criador, conservador e destruidor, o chamo de Shakti ou
Maya ou Prakriti, o Deus pessoal. A distinção entre eles não implica em
diferença nenhuma. É o impessoal e o pessoal no mesmo Ser. Como o
leite e a brancura. A Mãr divina e Brahman são um... Kali não é outra
denominação, senão próprio Brahman. Kali e Shakti, a energia primitiva,

Brahman e seu poder são idênticos”.

Aurobindo coincide com os princípios de Ramakrishna em sua definição


entendendo que a Prakriti é a energia, a alma da natureza, a potência
da vontade atuando no universo. Por outro lado o Mahanirvara-tantra
afirma que a “Shakti é o próprio Brahman”.

Aurobindo interpreta e compreende a mediação de Shakti, ao expressar


que: “A Mãe, como Mahashakti, deste triplo mundo de ignorância se
mantém em um plano intermediário entre a luz suprema e a vida de
verdade, a criação da verdade que deve ser conduzida para baixo e
essa hierarquia ascendente e descendente dos planos de consciência
que se funde na ignorância da matéria e sobre novamente ao infinito do
espírito através do desenvolvimento da vida, da alma e do intelecto”.
37

Mas, para Aurobindo, a Mãe penetra este triplo universo (brahmanda)


inferior (adhara): “Também de um modo pessoal se dignou a descer na
escuridão (rajarasa) com o fim de poder conduzir a luz (dyata), da
mentira (asatya), do erro (dosha), a verdade (satya), mediante uma
morte (yama) que se transforma em uma vida (bhava) divinizada, na dor
(duskha) do mundo (anirvasaniya) seu sofrimento (vyadhi) e seu pesar
obstinados para por um fim por êxtase (turiya), transformador ao
sublime Ananda. Por amor (raga) profundo de seus filhos, consciente
em reverter o manto dessa escuridão condescende a padecer aos
ataques e influências torturantes dos poderes das nebulosas mentiras,
suportando cruzar o portal desse nascimento (jati) que é uma morte,
devorando a angustia (avedana), as penas (srama) e os padecimentos
da criatura, pois parecia que somente assim a criação poderia salvar-se
em direção a luz (dyata), a alegria (ananda) e a verdade (satya), a vida
eterna (achuyta). É este o grande sacrifício de Purusha e mais ainda, o
grande holocausto da Prakriti, o sacrifício da Mãe Divina”.

Aurobindo baseando-se em quatro virtudes (vibhuti) principais:


perfeição (radha), energia (bala), beleza (sundara) e sabedoria (prajña,
bheda), destacam as manifestações principais da Mãe e as divide em
quatro formas mais importantes que são: 1) Maheshwari, ou a Mãe sob
o aspecto da bondade e do conhecimento supremo. Quanto a Ela,
Aurobindo esclarece: “Para Ela, todos seus filhos são partes do Único,
inclusive asura, rakasha, pizaka e todos os revoltados e hostis. Suas
repelências são simplesmente um apaziguamento e seus castigos uma
graça”. Referem-se as três categorias de demônios: asura é um titã, um
38

ser de egoísmo, ignorância e oposto a um Deva, ser de luz. O rakasha


que também é egoísta se diferencia por suas paixões mais violentas.
Nos contos de fadas hindus, o rakasha é um ogro. A casta mais baixa de
demônios é a dos pizakas, e seus apetites são mais vis e obscuros.
Representam toda a perversidade e satanismo. 2) Mahakali ou a Mãe
sob seu aspecto de força suprema. Esta Mãe é a que nada perdoa. Ama
a coragem, a energia e a ação. Conduz todas as guerras santas,
castigam aos culpáveis, os indiferentes. Vence os obstáculos que versa
sobre a obra dos ardentes. 3) Mahalaksmi ou a Mãe sob seu aspecto de
beleza e de supremo amor. É a Mãe da simpatia, é a patroa dos
artisitas. Detalha Aurobindo que a severidade ascética não é agradável,
muito menos a supressão das emoções mais profundas do coração ou a
repressão rígida dos elementos de beleza, da alma e a vida. Pelo amor e
beleza situa os homens sob o jugo do divino. Em suas criações
supremas muda a vida em uma rica obra de arte celeste, continua
Aurobindo, dizendo que toda a existência é um poema de delicia
sagrada. 4) Mahasarawati ou a Mãe sob aspecto da habilidade, técica e
sabedoria suprema para a ação. A ciência, arte e a técnica são âmbitos
desta Mãe divina. Aurobindo a denomina “uma Mãe para nossas
necessidades, uma amiga de nossas dificuldades, uma conselheira e

uma mentora constante e tranquila”.

Detendo-nos a compreender a metafísica da psicologia hindu, é óbvio


que não podemos deixar de fazer alusão à mente (manas) e aos
sentidos (indiryas). Para os hindus o manas inferior (adhara) não é uma
faculdade espiritual. Forma parte de uma dessas faculdades da sensação
39

(bhoga) e da ação (karma), denominadas de Indriyas. O Sankhya situa


manas entre os sentidos (indriyas), porque os considera o primeiro de
uma série, o regulador, a alma coletiva das percepções. Regula as
informações dos sentidos. Logo depois de reunir os dados, imagina
(vasana), recorda (smriti), compreende (avagama). Isto é, são operações
materiais (murta). Não obstante, manas, é parte pertencente a um plano
mais sutil (shuksma) uma vez que funciona por uma sorte de acordo
vibratória com os objetos de seus conhecimentos. Para o yogi,
concentrar-se é “tomar a forma do objeto por conhecer”, ou seja, que o
sujeito (paksha) se introduz no objeto (artha) e toma forma do objeto
examinado.

Podemos considerar especial esta psicologia por suas teorias referentes


ao mecanismo da percepção (avagama). Os elementos materiais
(mahabhutas) compostos desigualmente de cinco essências principais
(tanmatras), excitam os buddhindriyas. Esta modificação (vikara) é
prontamente transmitida a manas que percebe e logo ao Eu (ahamkara)
que age e finalmente a Buddhi que determina. A via inversa conduz de
Buddhi aos sentidos eferentes. Mas durante o recorrido pode acontecer
que os elementos interiores (anta) ou estranhos perturbem a percepção
ou a intuição (buddhi) de acordo com o ser em sua tendência a
materializar ou evolucionar. O homem, acima, entra em contato direto
com o Divino e abaixo, se apoia no mais vasto grau de manifestação,

pois é um ser completo.


40

Os distintos planos vibratórios formaram no homem, envoltórios


(koshas) e os três corpos principais são os seguintes: 1) o corpo causal
(karana-sharira ou parasharira), o corpo divino ou superior; 2) o corpo
sutil (shuksma-sharira) ou a consciência; 3) o corpo grosseiro ou
material (sthula-sharira). Portanto, o corpo causal (karana-sharira) é o
espírito (puusha). O corpo sutil (shuksma-sharira) é a alma (atman). E o

corpo grosseiro (sthula-sharira) é o material.

É oportuno dizer que nos relacionemos com o prana. O prana é o


vínculo vital entre o plano sutil e as vibrações do corpo grosseiro. Toda
a criatura não existe de fato sem à medida que o prana está nela, ou
seja, natural (prakritika) ou artificialmente. Existem ritos tântricos, explica,
Riviere, estabelecidos para iluminar uma vida artificial bastante efêmera,
em um objeto inorgânico ou em morte recente. É uma sorte de
insuflação de prana por meio de um procedimento análogo a carga
elétrica de um acumulador esgotado.

O termo Sânscrito prana, significa “energia absoluta”. É o princípio


universal do dinamismo, da força (dridhata), do movimento (chala). Está
presente na gravitação, magnetismo, eletricidade em movimento dos
planetas em toda expressão (vada) de vida. O prana está em tudo e em
todas as partes, no homem (deha) e no animal, o princípio ativo
(karma). O qual no deve ser confundido com o princípio divino
(sayujya). Apenas acrescentamos que no corpo humano o prana
cósmico revela certas especializações.
41

(Referindo-nos a meditação (dhyana) do Raja-yoga, lembramos que


este tende a buscar a liberação da dor (duskha) nos ensinando a nos
situar conscientemente (buddhi) nosso eu na mais alta vida). O jivatma
cria e transforma (parinama) os corpos sutis e grosseiros. Sob a
influência de parabda-karma, o buddhi se converte em tamasia, rajasia e
satvica. Portanto, o jivatma revive um corpo inanimado a um corpo
ativo ou um corpo satvico, cuja excelência espiritual vai do homem a

deva (a Deus).

Entretanto, é preciso um bom direcionamento de consciência para a


conquista de um alto nível espiritual e é assim como o guru (guia
espiritual), desinteressadamente sábio, indica para cada discípulo
(shishya), o caminho mais conveniente, uma vez que ele conhece as
etapas místicas (yukta), a sequia dos desertos (aranya) sem oásis e a

eterna obscuridade dos sentidos (indiryas).

Não devemos esquecer que o atman possui vários estados de

consciência (chita sajñana) e eles são:

1) Os estados de vigília (jagrat), este estado se produz quando os


objetos são percebidos por manas e buddhi através dos órgãos
(karana) dos sentidos. É a fonte da ação exterior através atividade
dos sentidos.
2) O estado de sono (svapna) que se produz quando os órgãos dos
sentidos se recolhem em si mesmos. Atman é consciente das
imagens mentais surgidas das impressões que permanecem da
experiência jagrática.
42

3) O sono sem sonhos (shushupti) Neste terceiro estado o manas se


retira. É o estado no qual não tem consciência de nada.
4) O conhecimento purificado (turiya). Neste estado o atman
adquire o conhecimento purificado (shuddha-vidya) e significa a
função do real para o yogi. Ali, ascende ao samadhi, então o jiva
se funde com o grande corpo causal ou divino ( maha-karana).
Do segmento de turiya nasce o quinto estado.
5) Sem nome e sem forma transcendente (Shambhava). Neste
estado o yogi tende a converter-se como Shiva. A partir de então,
este que não tem mácula alcança o maior estado de unidade ou
igualdade.

A respeito disso, Bhaskaramaya, em seu comentário sobre Lalita,


assinala que a doutrina tântrica junta o quarto e o quinto estado aos
três estados clássicos. Mas dizia que nestes estados novos nem shiva,
nem Jiva alcançam a perfeição. A existência eterna, imutável
(avikara) transcendente de turiya e de outros estados é o Absoluto
incondicionado, o Supremo Brahman, sem prakriti e sem atributos (o
nishkala Brahman e o nirguna Brahman). Ou seja, o Brahman sem
prakriti e sem atributos. “Somente o espírito (purusha) pode
conhecer ao espírito”, dizem os Upanishads. Brahman está mais além
do espírito e do verbo (shabdabrahma).

No Kena-upanishad o termo empregado para designar a emissão da


palavra é literalmente “elevação para enfrentar a manas. Brahman é
o que não se pode ser assim elevado ao entendimento pela palavra”.
43

A palavra (vachas) humana “eleva” então a representação de uma


representação, a figura mental de um objeto que não outra coisa
senão uma figuração de uma única realidade: Brahman. Possui, sem
dúvidas, um poder de criação nova, afirma Aurobindo em seu
comentário sobre o Kena-upanishad: “Mas esse poder não se
extingue além da criação de imagens mentais novas, isto é, de
formações complementares baseadas em imagens mentais interiores.
Um poder assim limitado não nos dá ideia da potência criadora

original que os antigos pensadores atribuíam ao Verbo divino”.

Na Índia, como em qualquer outra parte, a origem (mula) do verbo


foi sempre de longa discussão. Já no Maitriyana-upanishad comenta-
se que é “preciso meditar sobre os Brahmanes: a palavra e a não-
palavra. Somente pela palavra é revelada (prakashya) a não-palavra”.

Antes dos os filósofos modernos, Panini e Patanjali, já haviam escritos


volumes sobre a conotação das palavras muito além das letras que a
comporiam. Assim a voz (vak) não é um composto de v.a.k., mas
uma explosão invisível (adrishta). Como consequência, os gramáticos

hindus acabaram sendo todos metafísicos.

Para eles, em sua origem, todas as palavras significam Brahman.


Receberam um sentido especializado de acordo a sua relação com
os logos criadores e foram a causa de sua manifestação. Assim todas
as palavras indicam primitivamente ações. Coincidem com esta

hipótese quase todos os linguistas modernos.


44

Esta doutrina que aparentemente procede da Alexandria é explicada


por Vivekananda do seguinte modo: “Quanto mais durável e sutil é
uma coisa, mais pode ser comprovável. Quanto mais grosseira,
menos persistente. Assim a forma é o estado grosseiro e o nome o
estado sutil de um poder único que se manifesta e que se denomina
pensamento. Mas estes três não são outra coisa senão a própria
unidade ou a trindade, os três graus da existência da mesma coisa:
sutil, mais condensado e muito condensado. Em todas as partes
onde houver um dos três, também estarão os outros. Em todas as
partes onde estiver o nome (shabda), estará a forma (rupa) e o
pensamento (vichara). Consequentemente, se o universo está
construído no mesmo plano que o corpo (deha) também terá as
mesmas divisões de forma, nome e pensamento. O pensamento é a
parte mais sutil (shuksma) do universo (brahmanda), a verdadeira
força motriz. O pensamento, detrás de nosso corpo é chamado alma
e o pensamento detrás do universo é chamado Deus. Depois do
pensamento vem o nome e em u´ltimo lugar a forma que vemos e
sentimos...” “No universo, Brahma ou Hiranyagarbha ou Mahat
cósmico se manifestou primeiramente como nombre e logo como
forma, isto é, como o universo mesmo. Todo esse universo
expressado (abhilapa) e perceptível (avagama) é a forma que por
detrás de mantem a eterna e inexpressível Estofa. O que se manifesta
o Logos, o Verbo. Essa Estofa, material essencial de todas as ideias
ou nomes é o poder pelo qual o Senhor criou o universo. Mas ainda
o Senhor se condiciona como Estofa e depois Ele mesmo se despega
45

sob a forma ainda mais concreta e perceptível do universo”. Como


consequência, o nome, a palavra e o verbo, são os que mediam
sutilmente entre o corpo material (laya) e o pensamento sutil.

Em seu comentário sobre o Darshana de Panini, Madhava demonstra


que o som (shabda) do gramático (shabdanusasana) é o próprio
Brahman e expressa: “A palavra eterna se chama Estofa e é invisível,
a causa real do universo”. Logo cita um testemunho de outros
gramáticos: “Brahman sem começo, nem fim, a essência indestrutível
da linguagem (gir)”. E acrescenta, “se desenvolveu sob a forma das

coisas e de onde estalou a criação do mundo”.

Estofa, explica Vivekananda, “é a matéria do qual são feitas as


palavras. Entretanto, não é um nome definido com uma forma
plenamente desenvolvida. Isto é, que eliminaram todas as
particularidades que distinguem uma palavra da outra, ficando então
a Estofa sozinha, do qual também se denomina Nada-Brahman (o

som de Brahman)”.

O logos hindu em definitivo é o som primordial e este som (shabda)


faz parte de Brahman. É Brahman mesmo. Como verbo projeta o
universo (brahmanda). Também é a manifestação da Chit-shakti. Por
isso diz Aurobindo: “A palavra não é outra coisa senão uma
aplicação particular do princípio do som, uma vibração produzida
pela pressão do alento em seu passo através da garganta e a boca”.
Continua sua definição, “Cria formas de emoção, imagens mentais,
46

impulsos, ação. A teoria e a prática védica do passado acrescentam a

esta ação criadora o emprego dos mantras”.

Referindo-se ao ritmo (swara), a metafísica hindu esclarece que as


doutrinas Jñana-yoga ensinam que tudo é vibração. A vibração
obedece a certo ritmo. O ritmo é o último segredo do universo. O
eclipse dos planetas ao redor do sol, o fluxo e refluxo do oceano, o
pulsar do coração, o crescimento das plantas, tudo é atribuído ao
ritmo. A técnica yoga da respiração (pranayama) cronometrada está
baseada nesta lei. Trata-se de harmonizar por meop do ritmo
neumográfico, o corpo grosseiro (shtula-bhuta) com a vontade sutil
para poder devolver deste modo, o homem ao plano cósmico.

Antes dos físicos ocidentais, os yogis já conheciam o fenômeno da


ressonância e seus efeitos. A ressonância é produzida quando as
frequências são iguais ou pouco diferenciadas. O primeiro sistema,
denominado ressonador, no começo em repouso é ativado pela
ação de um segundo sistema chamado excitador. O ressonador
adquire o ritmo de um movimento periódico de grande amplitude, e
às vezes, adquire uma dimensão considerável e apresenta

inconvenientes.

Os yogis prontamente descobriram que uma nota de violino ou de


uma guitarra repetida longamente com um ritmo particular pode
também engendrar vibrações fatais para uma ponte e inclusive para
uma fortaleza. Sem dúvidas, uma nova explicação para as trombetas
de Jericó.
47

Há duas técnicas derivadas desta teoria e da ressonância, o Laya-


yoga e o Mantra-yoga. O Laya-yoga se volta para a contemplação
do som interior (nada), isto é, ouvir quando os ouvidos estão
tapados. O shabda-brahman existe também no corpo humano. Pode
carecer de letra, som puro (nada ou dhavani) ou com letra (varna),
ou seja, com som articulado. Dhavani produz varna, o aspecto sutil
(Shuksma) da Shakti vital do homem. Assim como se despega no éter
(akasha), assim também é no microcosmo (pindanda) as vibrações de
ares vitais (prana-vayus) e o processo respiratório causam, eles
também, sonoridades graduadas de acordo a uma escala que vai do
mais sutil ao mais perceptível. Shabda nasce no muladhara-chakra, ai
onde a shakti começa a insuflar a vida, porque em definitivo a

kundalini é a fonte do verbo.

O estado extremamente sutil do som, tal como se produz no


muladhara-chakra é o que denomina “para”. A altura do coração
(hrid) se torna menos sutil e adquire o nome de “pashyanti”. Quando
se une a buddhi se manifesta grosseiramente como madhyama. Por
último, em seu aspecto mais grosseiro, sai da boca (vedana) diz o
Rig-veda e é vekari.

Também o Mantra-yoga é um fenômeno de ressonância que ensina


até como matar (himsa) ou ressuscitar (jivita) pela repetição (japa) de
um mantra e procura concordar com o ritmo divino. Diz Patanjali:
“Pela repetição sobrevém à realização da deidade concebida”. O
mantra é uma série de letras, portanto de sons, unidos para produzir
48

um efeito ativo sobre a matéria. É um aspecto do próprio Brahman.


Os Shastras afirmam que “vão ao inferno os que acreditam que o
guru é uma pedra e o mantra, letras do alfabeto. De manhã (ato de
pensar) nasce a compreensão da verdade e o conhecimento de que
Brahman e o brahmanda (universo) são a mesma essência”.

Um mantra até pode carecer de sentido. Assim a linguagem usual, os


mantras sementes (bija-mantras) como, klim, hrim ou como os que
vêm inscritos nos pericarpos dos logos, não significam nada, mas o
yogi sabe que o valor reside nas vibrações próprias (svarupa) de
Deus (deva) que representa. Dhvani, no plano sutil, da o som do que
ouvimos (sravana) a tudo o que diz. Para que um mantra seja eficaz
deve ser acentuado de maneira correta, de acordo com as regras do
ritmo (swara) e do som articulado (varna). Uma falsa entoação pode
produzir o efeito contrário ao articulado. A isso se deve o porquê a
maioria dos mantras perdem o poder mágico na tradução.

Alguns salmos bíblicos podem ser considerados como mantras. A


poesia mesma foi um começo, um encantamento, uma busca de

mantra.

Aurobindo, referindo-se ao mantra: “A teoria do mantra radica em


acreditar que é uma palavra de poder nascida das profundidades
(gaghana) secretas (rahasya) de nosso ser (atman) onde esteve
alimentada por uma consciência mais profunda que a consciência
mental e formada no coração e não no intelecto, mantida no mental
e no objeto de concentração (dharana) da consciência mental
49

desperta (gunatama). Finalmente se projeta silenciosamente fora


deste âmbito, ou melhor, pela voz (lapita), mas sempre com um
propósito de criação. O mantra pode criar em nós não apenas novos
estados subjetivos que modificam nosso ser psíquico, mas produzir
resultados similares em outros espíritos, gestando vibrações cujo
resultado é ações ou participações de novas formas materiais no

plano físico”.

O mantra-yoga procura conquistar a salvação (pramoha) por meio


de elementos sonoros. A repetição de mantras (japa) termina sendo
um estado hipnótico. Em última instância uma consequência menor,
entretanto não é o efeito que se procurou conquistar. Por meio do
mantra, o yogi trata unicamente de sincronizar o ritmo (swara)
individual (vyasti) com o som universal, dentro de um marco de
silêncio (mouna) e de calma (prasama). Mas para ele o sentido literal
de um mantra tem menos interesse que o sentido vibratório. A
música dos yogis está calculada para obter uma ruptura (sambheda)
do psiquismo como uma mudança de frequência.

Devemos reforçar o aspecto simbólico (pratika) do mantra. O sinal se


adere ao som e ao ritmo e logo nasce a sílaba sagrada. O guru é

aquele que transmite a palavra e o discípulo (shishya) o que recebe.

Vivekananda expressa sua teoria em torno do nome sagrado,


dizendo: “Aqueles que vocês tenham estudado como o cristianismo
primitivo e outras religiões do mundo, puderam observar que
sempre esteve oculto ao nome. Se considera um nome particular
50

como muito sagrado. Encontramos na Bíblia que somente o nome


de Deus é considerado como o mais sagrado, como a coisa mais
santa. Era o mais santo dos nomes e se pensava que este Verbo era
Deus. Isso é exato. O que é este universo senão forma e nome?
Podemos pensar sem palavras? Palavra e pensamento são
inseparáveis. São o rosto interior e o rosto exterior de uma mesma
onda. Por esta razão, os nomes foram exaltados e adorados no
mundo inteiro. Consciente ou inconscientemente o homem

descobriu a glória do nome”.

A fonte textual dos mantras está nos Vedas, Puranas e Tantras. Estes
são essencialmente os tratados dos mantras (Mantras-shastras). Os
hindus falam sobre seus livros sagrados: os Tantras, compostos de
mantras, são o Paramatman; os Vedas, são o Jivatman compostos de
darshanas (sistemas de filosofias) que representam os sentidos; os
Puranas, são o corpo e as memórias (smriti), e ainda os membros
(angas, ainga). O Mahanishvana é a Shakti da consciência.

O corpo grosseiro da kundalini (shthula) que se mostra nas diferentes


manifestações de devatas, é a devata permanente em todos os
mantras. Não obstante, o yogi prefere procurar por sua forma sutil.
Quando o Mantra-shakti é despertado por exercícios espirituais
(sadhanas), surge a devata principal. Desde o momento em que se
adquire o perfeito poder dos mantras (mantrasiddhi), a devata surge
com claridade.
51

Repetir um mantra continuamente é fazer japa. Mas, qual é o melhor


método para fazer japa? Para Vivekananda e Aurobindo é o japa
mental, isto é, a repetição silenciosa do mantra acompanhada de
meditação (dhyana) sobre seu sentido. Mas devemos levar em conta
que o mantra mental é mais difícil de levar a cabo; para isso os
mestres hindus aconselham aos iniciados em japa, o japa ritmado.
Contudo, o método oral oferece por sua vez dois inconvenientes: o
automatismo e a fatiga (klanta). Nestes casos, se aconselha
interromper o japa, porque se persistisse, esclarece Vivekananda,
poderia se produzir alucinações (maya) e inclusive um certo tipo de
loucura. Eles demonstram que o hindu não procura a hipnose
(bashikarana), mas o contrário trata de evita-la. Por esse motivo
Vivekananda desconfia da alegria produzida pelo japa, uma vez que
poderia ser uma forma de hipnose e de alucinação. Detalha mais
ainda a respeito: “Às vezes, quando se pratica japa se experimenta
alegria. Em seguida, essa mesma alegria nos impediria de continuar.
Essa alegria afeta aos exercícios espirituais. Se chama rasaswadana
(paladar da doçura). É necessário superá-la”.

É curioso lembrar-se da importância que possui o japa de Patanjali


no Raja-yoga e se refere a ela Vivekananda entendendo que: “a
teoria dos samskaras, de acordo com o conjunto de todas as
impressões recebidas continuam vivendo no espírito. Sobrevivem e
passam a um estado latente ficando ali instalado. Quando
provocadas de maneira apropriada, aparecem novamente. A
vibração molecular não cessa jamais. Quando destruído nosso
52

universo, desaparece todas as vibrações massivas fundindo-se no sol,


a lua, a estrelas e a terra, mas as vibrações continuarão nos átomos.
Cada átomo cumprirá com as funções de um astro. Por exemplo,
ainda que as vibrações de chita tenham cessado, suas vibrações
moleculares continuarão e quando receba o estímulo requerido
voltará a aparecer. Bem, agora estamos então na condição de
compreender o que significa japa. É o maior estimulante que se pode

proporcionar ou tocar aos samskaras espirituais”.

Acertadamente afirma Choisy que a utilidade do japa foge, sem


dúvidas, a muitos leitores intelectuais, mas todos os gurus
reconhecem sua eficácia. Grandes místicos hindus conseguiram por
meio do japa, chegar ao último e mais alto escalão espiritual. Swami
Randa, por exemplo, utilizou exclusivamente japa para a conquista
de sua riqueza espiritual. Seu “Diário de uma peregrinação” é o mais
fascinante testemunho disso. Também é útil lembrar que Patanjali
insiste nesse uso, uma vez que o swadhyaya, estudo no qual se
refere a significação da repetição do mantra, integra o niyama, um
dos meios mediatos indispensável a liberação final. Por sua vez,
Ramakrishna afirma que “Deus e seu santo Nome são idênticos.
Quando se chega a acreditar em seu Santo Nome, nem o exercício e
nem a piedade são necessários. Todas as dúvidas se dissipam. Tudo
advém puro. Deus mesmo se realiza pelo poder de seu Santo

Nome”.
53

Recapitulamos então que o homem possui meios que possibilitam


adequar o ritmo pessoal ao ritmo divino. São dois meios pelos quais
se consegue transmitir o pensamento, muito além de si mesmo.
Estamos nos referindo ao som e ao alento. E como muito bem
definiu Choisy, os ritmos não são outra coisa senão a matemática

vital do universo.

Metafisica no Ocidente

Ainda que sucintamente vamos dar uma referência ao significado da


metafísica no Ocidente. A origem do termo “metafísica” se deu na
classificação das obras de Aristóteles, realizadas no século I por
Andrômaca de Rodas. Como os livros que tratavam da filosofia
primeira foram colocados na edição das obras de Estagirita, detrás
dos livros da Física, se denominou aos primeiros, “metafísica”, isto é,
“os que estão por detrás da física”. Posteriormente teve um
significado mais profundo, pois pretendia penetrar naquilo que está
mais além do ser físico, enquanto tal, porque segundo Aristóteles:
“Há uma ciência que estuda o ser, tanto que o ser e o que lhe
pertence é próprio. Esta ciência não se confunde com nenhuma das
chamadas ciências particulares, pois nenhuma delas considera em
geral, o ser, enquanto ser, mas como unicamente uma parte dele
mesmo”. Em troca esta ciência investiga “os primeiros princípios e as
causas mais elevadas”. Por isso pode ser chamada “filosofia primeira”,
a diferenciar-se de toda a “filosofia segunda”.
54

A filosofia, afirma Aristóteles, tem tantas partes como substâncias


existentes. Assim, a substância que trata a substância natural é a
física, uma filosofia segunda. Acima dessas partes existe uma ciência
na qual se estuda o que é, enquanto e não em nenhuma espécie de
forma particular deste ser. Desde que Aristóteles determinou o
objeto da “filosofia primeira”, usando a terminologia “metafísica”
(metaphysica) como equivalente a “filosofia primeira” surgiram
diversos problemas. Um deles foi quanto ao próprio objeto da
“metafísica”. O próprio Aristóteles fala de vacilação, que determinaria
posteriormente discussões sobre o assunto. De sua parte, o que se
denomina “filosofia primeira”, ou seja, a metafísica ao ocupar-se do
ser como ser, de suas determinações e princípios, etc... se interessa
por algo que é muito superior e até supremo, na ordem de “o que é”
e também na ordem de seu conhecimento. Mas este ser “superior ou
supremo” pode ser interpretado de dois modos: como estudo formal
ou formalidades, e neste caso a metafísica se denominara “ontologia”
ou como resultado da substância separada e imóvel – Deus –
considerando-a Aristóteles neste caso “filosofia teológica”, isto é,

teologia.

O termo, metafísica, parecia indicar que o objeto desta ciência era


“algo” que se fala mais além do “ser físico” e a metaphysica neste
caso uma transphysica. Se o que está mais além do ser físico pode
ser estimado como um ser inteligível, então a metafísica significará o
estudo do ser inteligível.
55

H. Reiner diz que o vocábulo, metafísica, interpretado, não no


sentido literal, mas relativo ao conteúdo, teve prontamente dois
sentidos: um, “mais natural”, de um pós physica e, outro,
“sobrenatural”, de uma transphysica. O primeiro sentido adverte –
entre outros – no D. Gundisalvo, possivelmente com base em
Avicena. Em seu tratado “De divisões philosophie”, afirma que a
metafísica é pós-física. No que concerne o segundo sentido, existe
uma discrepância quanto ao significado que dão diversos autores. Os
dois sentidos pareceram unir-se com Pedro Fonseca, que afirma que
a metafísica estuda conjuntamente a pós-naturalia e a super-
naturalia.

Não obstante o observado, podemos considerar que o termo


“metafísica” conservou sempre o sentido de uma investigação formal
e, como consequência, relacionada com a lógica (ainda que não
identificada com ela) com assuntos, tais como: o ser, a substância, a
essência, os modos, a existência,, etc., os quais tem sido vistos como
“objetos” da metafísica. O estudo de ditos temas foi apreciado
indispensavelmente para estabelecer a base de uma “filosofia
segunda”, mas também teve por fundamental a teologia, sobretudo
para a “teologia racional”. Por essa descoberta foi que começou a ser
utilizada a expressão “metafísica geral”.

Os escolásticos medievais se ocuparam frequentemente enquanto


objeto da metafísica e como conteúdo da teologia estava
determinado, primeiramente, pela revelação e se interessaram
56

também nas relações entre a metafísica e a teologia. As opiniões


com respeito a eles foram diversas e divergentes. Em geral, os
investigadores estiveram de acordo que a metafísica é uma ciência
primeira e uma filosofia primeira: “A metafísica é, antes de tudo, de
ente”, mas provêm as divergências. Santo Tomás estimou que a
metafísica é uma “filosofia prima” que possui objetos de estudo das
causas primeiras, mas a causa realmente primeira, é Deus. A
metafísica trata do ser, o qual é “conversível” com a verdade. Mas a
fonte de toda a verdade é Deus. Neste sentido, Deus é o objeto da
metafísica. Por outro lado, a metafísica é ciência do ser como ser e
da substância. Em um aspecto, a metafísica tem um conteúdo, mas
por esse conteúdo teológico, não é dado como a metafísica mesma
e sim pela revelação, já que a metafísica é o estudo do primeiro,
dependente do entendimento, entretanto, continua subordinada a

teologia, mas encara a problemática de tal subordinação.

Para Duns Escoto, a metafísica é primária e formalmente ciência do


ente, enquanto, ciência primeira do primeiro cognoscível. Tanto para
ele, como para Avicena, a metafísica, é prévia a teologia, não porque
o objeto desta última se faz subordinada ao objeto da primeira, mas
porque sendo a metafísica a ciência do ser, o conhecimento deste
último é o fundamento do conhecimento do ser infinito.

Para Occam a metafísica não é nem ciência de Deus nem ciência do


ser, uma vez que pode ser entendida que possui por objeto o ser
57

como primeiro objeto com primado de atribuição e por objeto Deus

como objeto primeiro com primado da perfeição.

Suarez foi aquele que resumiu quase todos os pensamentos dos


escolásticos com referência à metafísica. Assim afirmou que uma
primeira crença sustenta que o objeto total da metafísica é o ente
considerado na maior abstração possível quando encerra, não só a
soma dos entes reais, substanciais e acidentais, como
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