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MorroAlto ALUIZIO ELIAS

O VELHO, A ÁRVORE E A VACA


LIVRO I
ALUIZIO ELIAS
O mineiro Aluizio Ferreira
Elias nasceu em 13 de julho
de 1979. É filho da cidade de
Uberaba, no Triângulo Mineiro,
onde constituiu família e trabalha
como professor de História no
ensino universitário. Espírita,
coordena um grupo de estudos
bíblicos em sua cidade natal,
além de integrar o quadro de
pesquisadores e escritores do
Instituto SER. Dedica-se à Arte
(Música e Literatura) de forma
amadora, produzindo poemas,
contos e letras de canções nas
suas horas de folga. Morro
Alto resulta desses momentos
de descanso criativo e é a sua
primeira publicação autoral.
DEGUSTAÇÃO DO LIVRO MORRO ALTO: O VELHO, A ÁRVORE E A VACA - ACESSE WWW.PORTALSER.ORG/MORROALTO

1a Edição - 2.200 unidades


Editora SER - NOV/2016
Av. Caetano Pirri, 930, Anexo 01 - Milionários
Belo Horizonte - MG - 30620-070
editoraser@portalser.org - www.portalser.org
www.lojadoser.com.br - (31) 3243-6601

LIVRO I
Projeto Gráfico e Diagramação: JÚLIO CORRADI
Pintura de capa por JANAÍNA FARIAS

Tratamento de imagem de capa: ADHEMAR RIBEIRO


Revisão: CHRISTIANE CAVALCANTI / ALEXANDRE CAROLI

CD
Direção Executiva: SER
Direção Artística: JÚLIO CORRADI
Direção Musical e Arranjos: LUIS BARCELOS
Composições Musicais:
LUIS BARCELOS (Todas, exceto faixa 11)
ZÉ HENRIQUE MARTINIANO (Faixa 11)
Letras das Músicas: ALUIZIO ELIAS

Elias, Aluizio Ferreira


E42p Morro alto: o velho, a árvore e a vaca. / Aluizio Ferreira Elias. Revisão
Christiane Cavalcanti, Alexandre Caroli. Belo Horizonte: Instituto SER 2016.
128f. il. v. 1.

Acompanha CD
ISBN 978-85-67990-04-0

1. Literatura brasileira. 2. Menino. 3. Velho. 4. Vaca. 5. Conselhos.


I. Instituto SER. III. Título.

CDU: 821.134.3(81)
Iaramar Sampaio – CRB6/1684

LIVRO I
O VELHO, A ÁRVORE E A VACA
ALUIZIO ELIAS

MorroAlto
DEGUSTAÇÃO DO LIVRO MORRO ALTO: O VELHO, A ÁRVORE E A VACA - ACESSE WWW.PORTALSER.ORG/MORROALTO
DEGUSTAÇÃO DO LIVRO MORRO ALTO: O VELHO, A ÁRVORE E A VACA - ACESSE WWW.PORTALSER.ORG/MORROALTO

Sobre a capa: Um dos quadros pintados em nossa reunião mediúnica que mais nos emocionaram, pela delicadeza.
O pintor (desencarnado) o assinou com o nome Modigliani, e assim o tratamos. Obrigado, amigos pintores, pela
dedicação e carinho com este projeto. Foram momentos inesquecíveis de parceria e aprendizado. (N. E.)
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Prefácio

Gladston Lage

Quando recebi o convite de prefaciar a


presente obra, prejulguei que estava recebendo uma
tarefa árdua. A leitura me revelou que, na verdade,
foi uma honra o ofício de que fui incumbido.
As produções literárias não se enquadram
em classificações rígidas, mas alguns aspectos as
singularizam e em essência as agrupam. Há livros
de ficção, aventura, drama, romance, biografia e
mais numerosos segmentos.
Em linhas gerais, é possível afirmar que
algumas obras se destacam pelo que “dizem”, outras
pelos seus “modos de dizer”.
Morro Alto é trabalho de talento porque
concilia estilo, qualidade extraordinária de
linguagem, fidedignidade à variante linguística em
que se alinha, espontaneidade, inspiração fluente
e responsabilidade filosófica na condução das
histórias que conta lindamente.

PREFÁCIO - MORRO ALTO 5


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Uma das modalidades literárias pos-


síveis, e é o caso do livro que ora apresentamos, é
a de arcabouço interiorano. De algum modo é da
mesma fonte de “Sagarana” do grandessíssimo
Guimarães Rosa. Deixemos claro que não estamos
alçando Morro Alto à categoria de clássico. Aliás,
isso nem importa. Importa é que o livro é de profunda
identidade literária: agradabilíssimo, instigante,
leve, denso, poderoso.
O ato da leitura tem em si as mágicas da
mente com as magias do pensamento: é túnel do
tempo, é espelho mágico do espírito... Assim, por
exemplo, nos abstraímos da sociedade tecnológica
em que vivemos, do cosmopolitismo que povoamos,
do artificialismo que alimentamos, e imergimos nas
roças, nos grotões, nos lamaçais, nos pântanos, nos
capinzais, nos terrenos, nas cisternas dos contos. E
ali as criaturas são as criações das criações. Tem
bicho que morde à Eça e que canta à Júlio Diniz.
Tem planta que espeta, que espinica, que rocia,
que cura, que nutre, que ornamenta... Tem conto
que alegra, que quebranta, que punge, que esmaga,
que angustia... mas sem constranger nem ofender,
quanto menos desmoralizar. É tudo em prol da
elevação. Tudo água pura que verte das bonanças
virtuosas da alma. A bicharada se arrasta, voa,
salta, pula, corre... O clima se transmuta: escalda,
molha, aquece, enregela...
Preciso abrir parágrafo para destacar
um movimento forte e poderoso da partitura
em questão: a linguagem. A terminologia, a
prodigalidade, a variação, a riqueza bem colocada.

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Tem prumo e tem equilíbrio. Não é pedante, não é
repetitiva, não é enciclopédica, não é exibicionista...
Coerente e naturalmente evita estrangeirismos. É
harmoniosa e por isso tem a alma do interior gostoso
e acolhedor. É opulenta (no sentido dos Parâmetros
Curriculares Nacionais que classificam como um
tipo de poliglota quem conseguir se comunicar em
várias modalidades da própria língua) e não perde
em momento algum a singeleza.
Podemos ousar e dizer que “bem-
aventurados os simples, os mansos, os humildes e
os pacificadores”. As bem-aventuranças estão vivas
nas delícias desta composição. E é muito legítimo que
evoquemos o Evangelho para condecorar o trabalho,
porque alcançou a proeza de ajuntar material de
primeira qualidade, organizá-lo magnificamente e
não escorrega no sentido moral que abraça: alegra
e acalenta, distrai e instrui, entretém e eleva quem
tem o privilégio e o bom gosto de o ler.
Meus humildes parabéns ao amigo-
escritor (escrevente?) Aluizio e aos colaboradores da
publicação; meus agradecimentos pela oportunidade
de deixar aqui nesta grande seara um grão de
mostarda que pretende estimular leitores aos quais
desde já saúdo, abraço e felicito.

PREFÁCIO - MORRO ALTO 7


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Aos encantados...

Humberto de Campos

Honório de Abreu

e João Rosa

Aos amigos de travessia...


Lucas Mardegam
(Nosso benfeitor; grão-padrinho do projeto)

Luis Barcelos
(Irmão e parceiro; coautoria em sentido transversal)

E a valorosa Equipe do SER

Dedico esta obra ao meu amigo


Júlio Corradi

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LIVRO I

“O velho, a árvore e a vaca”

cap.1 Os mutuns .................................................. 13


cap.2 Figueira mata-pau....................... 27
cap.3 Carro de tolda .................................... 41
cap.4 Murundu de tatupeba ........... 53
cap.5 O monjolo ................................................. 63
cap.6 Mãe Figena............................................ 73
cap.7 O Sábado ................................................ 89
Ouça as canções indicadas ao final de cada capítulo

10 Aluizio Elias
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Prefácio .........................................................................5
Gladston Lage
Oração ...........................................................................105
Aíla Pinheiro
Um pouco dessa história...........................108
Júlio Corradi
História de amor ..............................................111
Luis Barcelos

Músicas:
Mansidão ...........................................................................112
Para o mutum, para o menino........................113
Um Choro para São João ....................................114
Arvorar ...............................................................................115
Esperar... esperar ......................................................116
Murundu de tatupeba..............................................117
Canção do Monjolo ...................................................118
Canto de Mãe Figena .............................................119
Bênção ................................................................................121
Vida Além............................................................................122
Morro Alto ........................................................................123

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CAPÍTULO 1

Os mutuns
Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o
homem... (Mateus 19:6)

Possuída pelo espírito da posse exclusivista, a


alma acolhe facilmente o desespero e o ciúme, o
despeito e a intemperança...

Livro: Pensamento e Vida


Capítulo 24 - “Humildade”
Emmanuel / Chico Xavier

Morro Alto - O velho, a árvore e a vaca 13


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E Era uma figueira brava do sertão. A

Gameleira de meu avô.

Erguendo-se rente a um mourão de

angelim, espraiava o corpo para o adiante e o

acima. Sobre o tronco grosso sustentava um cocar

de folhas fazedor de sombra [galhada atrevida que

não se acanhava ante a mancheia do vazio]. E,

ainda, a raiz: que era a copa ao avesso – espaçosa e

mandante, dona do entorno.

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Plantar currais debaixo de gameleiras era

coisa comum nas fazendas do de-lá-para-cá. Também

ali, na fazenda Morro Alto. É que o quenta-sol vinha

vindo de perto da metade de um dia até o fim da

tarde. A claridade agigantada, num braseiro que

se punha a judiar da criação. Por isso, dar algum

conforto ao gado – a fresca – era anelo de santos

homens.

“– Uê, uê... vaqueirada!”

Meu avô aprendera a regra com o avô dele

e agora a repetia para mim: “– Sombra assim, mô fío

– como a da Gameleira – Deus só fez melhor no Céu.”

Eu passei minha infância assuntando

sobre aquela árvore. Queria entender o sentido de

sua arvoreza. Nela folgava ocupado. Meu avô até

fizera uma escadinha maria-mole, com corda de

bacalhau, para a subida.

Acho que ele gostava de me ver alcançando

a culminância da árvore. Dizia que era importante

mirar as coisas desde os cimos. Que era assim que

16 Aluizio Elias
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o olhar se alargava, nele cabendo sempre o mais de

tudo: a montanha, o vale, a serra...

Empoleirado na forquilha de um galho

largo, eu ficava espiando a cisma ruminante da

vaquinha Imperatriz. Ela só... lá embaixo, no

pátio do curral. Bicho pensativo, tal e qual o meu

avô: o Antônio Nogueira. Sim, eu gostava de vê-

los pausados, dando trégua ao corpo. Cada qual

a seu modo; o velho e a vaca. E eles pensavam...

pensavam... Pisando o instante, atravessando

o momento, mas sem pressa alguma, porque se

sabiam filhos da eternidade.

Essa vaquinha era a sentinela dócil que

guardava o miolo da sombra. Com um olhar bovino,

falava-me do seu apreço pela Gameleira. Sempre

ela, a Imperatriz, sob o gentil sombreiro de sua ami-

ga árvore. Desde a sua bezerrice havia recorrido ao

pouso alegre daquela amizade. Crescera junto à boa

companheira. Hoje, gado concluído, já podia trans-

formar gratidão em leite e aconchego em mansidão.

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Meu avô sabia daquela irmandade entre

a planta e o animal; aprovava. Disso parecia par-

ticipar, apreciando tudo [a sombra da Gameleira

estirada sobre o sossego agradecido de Imperatriz].

Ele gracejava: “– Faz muito tempo, Nosso

Senhor encardiu as mão com a terra da Morro Alto.

Aqui compareceu só pra plantar nossa Gameleira.”

Dizia ser verdade juramentada que Je-

sus, por bênção caprichosa, enterrara no chão da fa-

zenda a rama verde daquela figueira: uma mudinha

de sua bondade.

Da altivez de meu galho largo, eu esprei-

tava o vô. O velho Antônio Nogueira golava o café

à porta do casarão e partia em marcha. Buscava a

cerca do curral e, antes de atravessar a cancelinha,

estacava solene ao pé da árvore, calçando os pés

no entranhado da raiz. Ajustado debaixo de tanta

grandeza, tirava o chapéu e erguia o olhar para con-

templar toda ela: a Gameleira. Depois me achava

no galho mais largo, armava um riso que preferia

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não vir, para só então se benzer com o sinal da Trin-

dade.

Ele e a vaquinha muito me ensinaram

sobre o silêncio daquela árvore. Empoleirado nela,

eu aprendi a falar calado – só para o meu coração

– sobre as descobertas que fazia. De modo que, na-

queles dias, à vista do vô e dos outros, eu tagarelava

feito araguari no telhado [com sonoridade acriança-

da] sobre tolices todas. Mas, entre os galhos da Ga-

meleira, em segredo, já era capaz de sentir e pensar

as coisas como sinto e penso hoje.

O senhor não se assuste não, nem duvide.

Por agora detenho os poderes que apurei lá atrás.

Logo vai aprender o que digo, revirando adentro a

noção de criança. Porque, veja só: gente é bicho sa-

bedor de si, mesmo quando ignora o derredor de sua

existência.

Aprumando o tino entre o mistério da

Gameleira, a gratidão de Imperatriz e a fé do vô

Antônio, é que eu formei minha substância de

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gente. Feliz e sabedor das muitas artes. Reinando

sobre minha sorte. Aquela era toda a escola de que

eu carecia: o velho, a árvore e a vaca.

Ah! Mas, nesse vaguear da alma

perambulante, eu laço a lembrança e prossigo.

Já era junho frio e eu partira para o festão

de Santo Antônio, um que acontecia todo ano na

casa de parentes nossos. Fiquei com essa parentada

mais de mês. Meu avô voltara antes para a Morro

Alto, confiando-me à prima Isaltina. Lá no arraial

da Antinha, cabeceira do Tamanduá.

Quando voltei para a fazenda nossa,

subindo na Gameleira para matar saudade, descobri

no galho largo – o de minha predileção – um ninho

exagerado. Desci da árvore em dois tempos. Só no

chão é que me dei conta de que o ninho intruso era

do pertencimento de uma galinhona preta. Ave

esquisita, com uma crista de penas arrepiadas no

cocuruto. Cheia de chiliqueiras. Bandeava a cabeça

para um lado e para o outro. Nervosa. Ciscava entre

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as raízes da Gameleira e parecia esbravejar contra

a minha presença.

Veio um susto. Então, busquei a firmeza

de meu avô: “– Vô véio! Vô véio! Me acuda! Eu vi o

capiroto! É o demo! Com bico e pluma!” Ele riu-se ao

regalo quando apontei para aquela feiura. Deu-me

entendimento sobre a questão, dizendo se tratar de

um mutum-de-penacho.

A fêmea vigiava de perto a cria sua, que

eram dois garnisés mutunzentos. Mais além, estava

o macho graúdo. Todos ali, na Gameleira do curral.

Alojados, ciscando sob o galho largo onde eu tinha

meu quinhão de árvore.

Anoitecia e eu não me conformava com

o ido. Quando atinei já estavam lá, empoleirados;

justo como eu fazia. Isso doía no osso da alma.

“– Arre, trem!”

Se eu visitava a árvore há mais tempo,

dela merecia posse em perpétuo. Sentia que ela

havia me dado uma parte sua para deleite.

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Agi em cólera. Peguei o bambu de cutucar

abacates e derrubei o ninho. Nem olhei para trás.

Não queria ver a bagunça do feito. Segui meu rumo,

ocultando o resolvido de minha raiva.

Mas vô Antônio via meu desarranjo. Depois

de ouvir meu queixume, receitou chá de boldo amargo,

dizendo a sério: “– É quiçaça brava a ciumeira sua.

Capina essa roça, fío! Vai rezar que passa.” Aquilo me

deu pavor. Rezar não queria... não podia. Era pensar

nisso e me vinha uma queimura lá das tripas, um

fogaréu que ardia desde a barriga até a goela.

E se eu rezasse? Deus vinha ter comigo?

Podia. Era o certo. E ele reprovaria meu proceder.

Eu desconfiava que o mutum-de-penacho tinha

rezado antes de mim. Por direito, ele pedira a Deus

um galho largo para morar com a família. Sei que

assim. Então, eu me desentenderia em reza com

Deus. Judiação comigo colocar o ninho dos mutuns

no galho largo. Por que Ele não dera aos bichos um

galho sem dono?

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E assim foi. Toleimas. Aquele pensa-

mento meu já era, sem que eu soubesse, a oração

desensaiada de um menino. A reza que eu não

queria, fizera. Deus escutara o que eu dissera no

meu temor de dizer. E Ele veio com autoridade.

Veio de dentro de mim, queimando a alma, desde

as tripas, da barriga até a goela. Pronunciando

retidões sobre tudo que era torto.

Depois, o peso daquela oração me

prostrou. Adormeci.

Quando acordei, já era dia novo. Meu

avô esquentara leite e café. Deitei o olhar sobre a

mistura e vi o todo. O leite de Imperatriz e o café

de meu avô viviam em paz, dividindo o mesmo

caneco. O leite e o café não disputavam o espaço:

coabitavam. E era bom o resultado daquele acordo.

Se mesclados, viravam coisa melhor.

Saí para a vida. Quando pisei o terreiro,

senti que Deus pensava alto. Uma nuvem trovejava,

seca. E era em mim. Assobio do vento, entre folhas,

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chamando o meu nome. Ali ecoavam os Santos

Mandamentos da Lei. E Eles me punham rédea. Foi

então que um naco de brisa animou-me o espírito.

No cheiro da manhã estavam o esterco, a

garapa e o mato. O orvalho acendia a essência das

três coisas. Elas dividiam o mesmo ar, ocupando-o

todo. Convivendo, sem antipatias. Só agora eu

entendia aquele cheiro. Acordara para ele. Era o

aroma da harmonia.

Então, constatei isso: para cada árvore, há

um passarinho certo; para cada rio, um dado peixe; e

para cada roça, ou arraial, uma gente sua. Tudo no

lugar e no tempo concebidos por Deus. No quando e

no onde Ele calcula a exatidão de dever ser.

Mas pode acontecer d’Ele achar ocasião

necessária em que se decida pela bagunçação do

ordenamento. E é aí que Ele vem com vontade

sobre nós, desenredando a história, reinventando

os gerais.

24 Aluizio Elias
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A vida de uma criatura enxertada na

freguesia de outra. E era a minha hora, o meu

momento. Era o mutum no meu galho largo.

Manobras altas da Providência. O reinado do

Criador. Pois primeiro Ele meramente quis, depois...

simplesmente foi.

Trajetória nossa é pura governança d’Ele.

Músicas deste capítulo:


Faixa 1 - Mansidão
Faixa 2 - Para cada árvore, rio e arraial
Faixa 3 - Para o mutum, para o menino

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01 - Mansidão
(Luis Barcelos e Aluizio Elias)
GRUPO VERBOS DE VERSOS* e TURMA DO SER** - Coro | Sons da fazenda Morro Alto gravados por Aluizio Elias em Uberaba
ALUIZIO ELIAS - Voz | LUIS BARCELOS - Arranjo / violão / voz | PEDRO AUNE - Contrabaixo Acústico | BEBÊ KRAMER - Acordeon | JAIME ALEM - Viola Caipira

cantam Luis Barcelos e Aluizio Elias

Pensa, o Homem pensa Sim, eu gostava de vê-los


Ruminando a hora pausados, dando trégua
Pesa sobre o Agora ao corpo. Cada qual a seu
Passo e prontidão modo; o velho e a vaca. E
eles pensavam... pensavam...
Pensa o Homem, pensa Pisando o instante, atravessando
Pisando o momento o momento, mas sem pressa
Pasto é livramento alguma porque se sabiam filhos
Posto sobre chão da eternidade.

Reunir, contar a boiada


O aboiar...
Bom Jesus campeia
Toca o gado, guia o boi

Passa o pranto e a várzea


Toma o rumo do curral
Segue confiando
Pois vem vindo um temporal

Pensa e repensa
Capim, vida afora
Prova de outrora
Ser-lhe-á ração

Mas, também, não pensa


Pausa o teu lamento
Pousa o sentimento
Muge em oração

112 Aluizio Elias


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Ficha técnica do CD

PRODUÇÃO EXECUTIVA: SER


DIREÇÃO ARTÍSTICA: JÚLIO CORRADI
DIREÇÃO MUSICAL: LUIS BARCELOS
TÉCNICO DE GRAVAÇÃO, MIXAGEM E MASTERIZAÇÃO: JOÃO FERRAZ

ESTÚDIO PRINCIPAL: LONTRA MUSIC - RJ


GRAVAÇÕES EXTRAS:
ESTÚDIO BEMOL - BH por Ricardo e Dirceu Cheib (Ladston do
Nascimento, Sergio Santos, Celso Adolfo e coro de vozes)
AVATAR PRODUÇÕES - Altay Veloso
ESTÚDIO DANÇAPÉ - por Mário Gil (Renato Braz em “Para o mutum,
para o menino”)

Coro:
VERBOS DE VERSOS: Saulo Silva, Sandra SOM, Emanuele Souza,
Wederson Gonçalves / SER: Aluizio Elias, Lucas Mardegam, Janaíne
Polese, Thiago Franklim, Natália Dantas, Claudia Lopes (Cacau), Janaína
Farias, Júlio Corradi, Luis Barcelos e Luiz Gustavo.

Saiba mais sobre este projeto do SER


em www.portalser.org/morroalto
ou use o QRCODE acima.

Morro Alto - O velho, a árvore e a vaca 123


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Vem aí...

MorroAlto ALUIZIO ELIAS

O CEGO, A SANTA E O RIO


LIVRO II

A senhora não me conhece, nunca me

viu. Falo com proximidade, porém. Assim como

alguém da família, porque a considero muito [com

reverência maior e nobre conceito].

Aguardei esse dia e venci as estradas do

tempo para poder tê-la à frente. Como querendo

contar-lhe o que sei e ouvir o que desconheço.

...

Acesse: www.portalser.org/morroalto

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Belo Horizonte - MG
(31) 3243-6601
LUIS BARCELOS
O gaúcho Luis Barcelos nas-
ceu na cidade de Rio Grande em
2 de abril de 1987. Multi-instru-
mentista, arranjador e composi-
tor, “Luisinho” escolheu o Rio de
Janeiro, onde desembarcou com
toda a família em 2005, para vi-
ver e trabalhar. Espírita, integra a

MorroAlto ALUIZIO ELIAS

O VELHO, A ÁRVORE E A VACA


equipe de colaboradores do Ins-
tituto SER. Coube a ele a direção
musical e os arranjos do CD, além
da composição de dez entre as
onze canções para o livro 1 da
trilogia Morro Alto, que marcou
também o início de sua parceria
com Aluizio Elias (um de seus
LIVRO I parceiros mais constantes e que
o considera “coautor de Morro
Alto em sentido transversal”).
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O VELHO, A ÁRVORE E A VACA


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m menino e suas percepções; criança descobrindo a Vida. Sabedoria


morando nas coisas mais simples. Os conselhos do avô zeloso; a
mansidão da vaquinha leiteira e a vitalidade da velha árvore. A menina-moça
vestidinha de Esperança e a mãe preta ofertando o colo quente. Uma história de
amor: fé, gratidão e amizade.
Morro Alto é para olhos de ver e ouvidos de ouvir. Obra a ser lida e ouvida;
contada e cantada [escrito e canções formam uma peça única].
Um Livro: com letra, som e sentimento. Esforço que contou com a generosidade
e o talento de amigos que se sensibilizaram com a proposta.
Prod. ExEcutiva: SEr - dir. MuSical E arranjoS: LUIS BARCELOS, intérPrEtES: ALICE PASSOS, ALTAY VELOSO,
ÁUREA MARTINS, CELSO ADOLFO, GRAZIE WIRTTI, ILESSI, LADSTON DO NASCIMENTO, PAULO CESAR
PINHEIRO, PEDRO MIRANDA, RENATO BRAZ, SERGIO SANTOS. MúSicoS: RAFAEL MALLMITH (Violão 7 cordas),
GLAUBER SEIXAS (violão), MARCUS THADEU (percussão), MAGNO JÚLIO (Percussão), PEDRO AUNE (Baixo
Acústico), ALBERTO CONTINENTINO (Baixo Elétrico), BEBÊ KRAMER (Acordeon), ADRIANO SOUZA (Piano),
JAIME ALEM (viola caipira), LEONARDO PEREIRA (cavaquinho), RUI ALVIN (Clarinete), EDUARDO NEVES
(Fauta e Flauta em Sol), AQUILES MORAES (Trompete), EVERSON MORAES (Trombone), THIAGO OSÓRIO
(Tuba), MARIA CLARA VALLE (Violoncello), THAIS SOARES (Violino). Coro: VERBOS DE VERSOS e SER.

PROD. POR INSTITUTO SER, CNPJ 97.525.813/0001-37 ISBN 978-85-67990-04-0


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