que fazer? Contrato de compra e venda de imóvel, ad mensuram!
No caso de compra e venda de um bem imóvel, poderão as
partes estipular o preço por medida de extensão, situação em que a medida passa a ser condição essencial ao contrato efetivado, presente à venda ad mensuram. Nessa hipótese, a área do imóvel não é simplesmente enunciativa ao contrário do que ocorre na venda ad corpus, onde um imóvel é vendido como corpo certo e determinado, independente das medidas especificadas no instrumento, que são apenas enunciativas. Como exemplo de venda ad mensuram, pode ser citado o caso de compra e venda de um imóvel por metro quadrado (m²). No caso de venda por extensão, admite-se, em regra, uma variação de área de até 1/20 (um vigésimo), ou seja, 5% (cinco por cento), existindo uma presunção relativa ou iuris tantum de que tal variação é tolerável pelo comprador. Mas este pode provar o contrário, requerendo a aplicação das regras relacionadas com esse vício redibitório especial, nos termos do art. 500do CC. Art. 500. Se, na venda de um imóvel, se estipular o preço por medida de extensão, ou se determinar a respectiva área, e esta não corresponder, em qualquer dos casos, às dimensões dadas, o comprador terá o direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço.
§ 1o Presume-se que a referência às dimensões foi
simplesmente enunciativa, quando a diferença encontrada não exceder de um vigésimo da área total enunciada, ressalvado ao comprador o direito de provar que, em tais circunstâncias, não teria realizado o negócio. § 2o Se em vez de falta houver excesso, e o vendedor provar que tinha motivos para ignorar a medida exata da área vendida, caberá ao comprador, à sua escolha, completar o valor correspondente ao preço ou devolver o excesso.
§ 3o Não haverá complemento de área, nem devolução de
excesso, se o imóvel for vendido como coisa certa e discriminada, tendo sido apenas enunciativa a referência às suas dimensões, ainda que não conste, de modo expresso, ter sido a venda ad corpus.
Art. 501. Decai do direito de propor as ações previstas no artigo
antecedente o vendedor ou o comprador que não o fizer no prazo de um ano, a contar do registro do título.
Parágrafo único. Se houver atraso na imissão de posse no
imóvel, atribuível ao alienante, a partir dela fluirá o prazo de decadência.
Desse modo, se a área não corresponder ao que for pactuado e
o imóvel não tiver sido vendido como coisa certa e discriminada (ainda que não conste de modo expresso que a venda foi ad corpus – art. 500, § 3.º, do CC), havendo uma variação superior ao tolerável, estará presente o vício, podendo o comprador prejudicado exigir: 1.º) A complementação da área, por meio da ação ex empto. 2.º) O abatimento proporcional no preço, por meio da ação quanti minoris. 3.º) A resolução do contrato, com a devolução do que foi pago (ação redibitória). Havendo má-fé por parte do alienante, este induz culpa, podendo o comprador requerer as perdas e danos que o caso concreto indicar.
Por razões óbvias, para a complementação da área, é
necessário que o vendedor seja proprietário do imóvel vizinho. Havendo inviabilidade física, tal pedido não cabe. Questionamento importante é saber se se trata de opções do comprador, ou se a ordem acima descrita deve ser seguida. Apesar de o primeiro entendimento ser muito plausível, deve- se aplicar o princípio da conservação contratual, que mantém relação com a função social (Enunciado n. 22 do CJF/STJ). Desse modo, a resolução do contrato deve ser encarada como a ultima ratio, o último caminho a ser percorrido. Mas se, em vez de faltar área, houver excesso, quem estará em uma situação de prejuízo é o vendedor. Este ingressará com ação específica, devendo provar que tinha motivos justos para ignorar a medida exata da área. O fundamento dessa ação é o enriquecimento sem causa por parte do comprador. Assim sendo, na ação proposta pelo vendedor, o comprador tem duas opções:
1.º) completar o valor correspondente ao preço ou 2.º)
devolver o excesso. No que toca à devolução do excesso, obviamente surgirão despesas que deverão ser arcadas por alguém (exemplo: destruição e construção de cercas e muros). Para a divisão dessas despesas, deve ser aplicado o princípio da boa-fé. Se houver indícios de que o vendedor sabia do vício, deverá ele arcar com tais despesas de forma integral. Havendo má-fé do comprador, este é quem deverá arcar com tais valores. Caso contrário, as despesas deverão ser divididas entre as partes, sendo vedada a caracterização da onerosidade excessiva.
O prazo decadencial para o ingresso de todas as
ações referenciadas é de um ano, contado do registro do título (art. 501 do CC). De acordo com o parágrafo único desse dispositivo, tal prazo não correrá enquanto o interessado não for imitido na posse do bem. Trata-se de um caso excepcionalíssimo de impedimento ou suspensão da decadência, em sintonia com o art. 207 do CC. O prazo decadencial para o ingresso de todas as ações referenciadas é de um ano, contado do registro do título (art. 501 do CC) Por fim, se a venda for realizada ad corpus, ou seja, sendo o imóvel vendido como coisa certa e discriminada, não caberão os pedidos aqui descritos, eventualmente formulados pelo suposto comprador ou vendedor prejudicados. Exemplo típico é o caso de compra e venda de um rancho, interessando mais ao comprador que seja banhado por águas de um rio, onde pretende pescar nos finais de semana, do que a extensão exata do imóvel. Para terminar o estudo da venda ad mensuram é importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça entendeu pela incidência do CDC ao contrato em questão, aplicando o conceito de cláusula abusiva no caso de previsão contratual reiteradamente incluída por uma construtora do Distrito Federal em seus contratos, que enunciava a possibilidade de variação da área em até 5%, conforme o art. 500 do CC. Entendeu-se que a repetição constante da cláusula representaria abuso de poder econômico, violando o equilíbrio dos pactos, a boa-fé objetiva e a função social do contrato (STJ, REsp 436.853/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3.ª Turma, j. 04.05.2006, DJ 27.11.2006, p. 273). Venda Ad Mensuram é importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça entendeu pela incidência do CDC ao contrato em questão, aplicando o conceito de cláusula abusiva no caso de previsão contratual reiteradamente incluída por uma construtora do Distrito Federal em seus contratos, que enunciava a possibilidade de variação da área em até 5%
O julgado é um exemplo típico de incidência da teoria do
diálogo das fontes a uma venda de consumo. A sua conclusão é perfeita, punindo um conhecido construtor de Brasília, que tinha o costume de inserir cláusulas nesse sentido em seus contratos de compra e venda de imóvel. Fez-se justiça, portanto.
Raphael FariaPRO Especialista em Direito Civil e Processo Civil.
Sócio fundador do escritório Raphael Faria Advocacia, localizado em Curitiba. Escritório
totalmente capacitado para atender demandas unitárias, bem como de massa. Pós- graduado pelo Centro Universitário Curitiba- UNICURITIBA- Direito Civil e Processo Civil (2013-2015).