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Proto-Fausto e A Tragédia de Margarida

Uma dança-teatro a partir de Dr. Fausto, uma tragédia de Goethe.

Personagens
Fausto
Mefistófeles
Margarida
Senhor
Wagner e Valentim
A Feiticeira

Cenas
Prólogo
Monólogo do Fausto
Wagner e Fausto
Mefisto e Fausto
A Feiticeira
Monólogo da Margarida
Fausto e Margarida, e Mefisto
Monólogo do Valentim
O quarto de Margarida e As Muralhas da Cidade
O Cárcere

I - Prólogo

SENHOR
Que futuro terá nossa empreitada
Nestas terras tupiniquins?

MEFISTO
Desejo temos de agradar ao público
Pois eles vivem e nos fazem viver

SENHOR
O cenário está pronto, todos em seu lugar
esperam ansiosos uma grande festa gozar.
Mas como iremos a todos surpreendê-los?

MEFISTO
Quero que a nossa casa corra aos rebanhos a gentalha
E dispute um lugar ao bilheteiro como em tempos de fome
se briga pelo pão com o padeiro
tal milagre em gente tão diversa
opera-o hoje, ó poeta
SENHOR
o pensamento pode ser incompreendido pelo seu tempo
e ficar escondido assim num longo esquecimento
talvez, só depois de muitos anos,
ressurja, verdadeiro.
O que só brilha, dura um instante
O verdadeiro belo, dura a eternidade

MEFISTO
Mas se eu quiser falar ao futuro
Quem divertirá nossos contemporâneos?
Eles querem se divertir e tem o direito
O momento presente deve ter o seu valor
Todos voltam pra casa satisfeitos

SENHOR
Mal cabidos teus desígnios
Não são dignos de verdadeiro artista

MEFISTO
Sonhas tu com a poesia das alturas
Pode a ralé de um teatro compreendê-la?
Eles nos buscam distraídos como a qualquer entretenimento
Este está pensando em jogar depois da peça
Aquele quer uma noite delirante nos braços de uma moça
Não dê pérolas aos porcos
Coloca coisas infinitas na tua obra, e mais e mais ainda
Busca confundi-los, tão somente, já ficam bem contentes
SENHOR
Só no fundo d’alma que te liga ao imenso Universo
Por que meios comove do público o peito?
Como dominas os elementos?
Como se lhe infunde vida senão pela poesia?
Quem ilumina a cabeça velha e estressada
Com os raios do sol nascente?
Quem canta as dadivas da primavera?
Quem nos torna imortais, nos une aos Deuses?

MEFISTO
São eternos teus dizeres
Mas é de mim que se desperta a fúria das paixões
Trate teus assuntos poéticos
Como histórias de amor
todos aqui, sentados, esperando
Esperam, esperam
Com uma luz pequena, boa aparência e variadas cenas
pouco a pouco envolvem-se em nossos laços
todos veem aquilo que no peito escondem

SENHOR
Já trocamos palavras demais
Também desejo ver ações

MEFISTO
Pouco proveito se tira em falar de inspirações
Se te entendes por poeta, que a poesia te obedeça
Não se cumpre amanha o que hoje não for feito
E nem um dia a perder se deve

SENHOR
Um homem resoluto
Tem o impossível no horizonte
Prossegue na empreita, sem fugir
Tal é a sua força

MEFISTO
Sabes que cada qual nos nossos palcos
Experimenta o que bem quer

SENHOR
Sirvam-se do sol e da lua
Espalhem as estrelas no céu

MEFISTO
Fogo e água não faltem
Nem rochedos, bosques, pássaros

SENHOR
Da coxia ate o palco
A criação inteira se desdobre
SENHOR
E caminhemos juntos
Desde o céu, pela terra, ao fundo inferno

SENHOR
Faça-se a luz
(As luzes se acendem)

MEFISTO
Tu, que sempre me recebes com agrados, me tens aqui em tua celeste abóboda
Perdoa se não sei usar frases altissonantes
Não sei nada do sol nem das esferas
Falar a mim tu quiseras por minha ênfase ao riso
Somos velhos amigos
E do riso não és um desafeto
Pois bem Senhor, me perguntas como vão no mundo as cousas?
O homem viveria melhor se não lhes tivesse dado
Da luz celeste, apenas um raio.
Eles o chamam de razão, só lhes serve para tornar
Os mais brutais dentre os brutais
Se eles pelo menos sossegados ficassem
Mas não há lixo em que o nariz não metam.

SENHOR
Não tens outra ladainha a contar-me? Tu só reclamas
Nunca há de ter na Terra algo que possas contentar-te?
MEFISTO
Senhor, nunca
Em seus dias de dor, os homens matam-se entre si
até a mim comovem, causam-me tal pena
que não precisam mais do diabo para atormentá-los
estou praticamente desempregado

SENHOR
Conheces Fausto?

MEFISTO
O Doutor? Doutor Fausto?

SENHOR
É meu servo

MEFISTO
É singular a maneira que este tem de vos servir
Há uma agitação secreta que o impele a imensidade
Inveja dos céus as mais altas estrelas e da terra o gozo sumo das delícias
Seu peito inquieto não se acalma
E é quase consciente de sua loucura

SENHOR
Se ainda me serve envolvido no erro
Em breve o guiarei a claridade
Como a árvore frutífera que recém verdeja
Antevê os frutos de anos futuros
Que vão amadurecer na posteridade

MEFISTO
Pois eu aposto que ele ainda se perde
Se me derdes licença de tentá-lo
Suavemente pelo meu caminho
SENHOR
Enquanto viver vida terra
Não estais proibido de experimentá-lo
O homem está sujeito a errar enquanto luta

MEFISTO
Pois te agradeço, não quero cadáveres
Gosto de barrigas gordas e coradas faces

SENHOR
Eu te entrego este espírito
E, se vencê-lo podes
Sirvas de guia em tua senda tortuosa
Mas não se surpreenda que
Lidando em treva escura
O homem honesto sente o bom caminho

MEFISTO
Desta aposta nada receio
Nem preciso de muito tempo
Se eu vencer, permitas que cante em voz alta o triunfo?
Tal como a famosa serpente, minha tia

II – O Monólogo de Fausto
(no seu quarto de trabalho, sozinho)

FAUSTO
O estudo fiz , com máxima insistência.
Pobre simplório, aqui estou
E sábio como dantes sou!

Não julgo algo saber direito,


Que leve aos homens uma luz que seja
Edificante ou benfazeja.
Nem de ouro e bens sou possuidor,
Ou de terreal fama e esplendor;
Um cão assim não viveria!
Por isso entrego-me à magia,
magia naturalis, magia cerimonium,
A ver se o espiritual império
pode entreabrir-me algum mistério,
Que eu já não deva, oco e sonoro,
Ensinar a outrem o que ignoro;
Para que apreenda o que a este mundo
Liga em seu amâgo profundo,
Os germes veja e as vivas bases,
E não remexa mais em frases.

Ah! se eu pudesse, em flóreao prado,


Vaguear em fulgor prateado,
Flutuar com gênios sobre fontes,
Tecer na semiluz dos montes,
Livre de todo saber falho,
Sarar, em banho de orvalho!

Céus! prende-me ainda este antro vil?


Maldito, abafador covil,
Isto é teu mundo! chama-se a isto um mundo!

E inda não vês por que, em teu seio,


O coração se te comprime?
Por que um inexplicado anseio
Da vida a flama em ti reprime?
Em vez da viva natureza,
Em que criu Deus os mortais,
De crânios cerca-te a impureza,
De ossadas de homens e animais.
Não! para o campo e a luz fujamos!

Quando te orienta a natureza,


Nova pujança no Eu te brota,
Como um espírito a outro reza.
Explicam-te os sinais sagrados

Sobre mim voais, gênios alados;


Pois respondei-me, se me ouvis!
Me expõem da natureza a oculta tessitura?
Vejo ante a alma jazer nosso ativo universo

Contempla o signo!
Como fluem e refluem celestes energias,
A se estenderem mutuamente as áureas pias!
Com surtos prenhes de balsâmeo alento
A terra imbuem, fluindo do firmamento,
Vibrando pelo Todo com harmonioso acento!

Ah, que visão! mas sóvisão ainda!


Como abranger-te, ó natureza infinda?
Vós, fontes, de que mana a vida em jorro,
Das quais o céu, a terra, pende,
Às quais o peito exausto pende -
Correi, nutris, enquanto à mingua eu morro?
Quão outro, em mim, é deste signo o efeito!
Tu Gênio térreo, me és vizinho;
Alçam-se as forças em meu peito,
A abrasear-me um novo vinho,
A opor-me ao mundo já me alento,
A sustentar da terra o júbilo, o tormento,
A arcar com o furacão e o vento,
E no naufrágio a ir-me, sem lamento.

Espírito implorado,
Revela a face!

(surge uma chama avermelhada, o Gênio aparece dentro da labareda)

GÊNIO DA TERRA
Quem me invocou?

FAUSTO
Atroz visão!

GÊNIO DA TERRA
Chamaste-me com força austera
Hauriste ardente a minha esfera,
E agora...

FAUSTO
Ah! não te aturo!

GÊNIO DA TERRA
Olhar-me, imploras, anelante,
Ouvir-me a voz, ver-me o fulgor;
Cedo a essa invocação possante,
Eis-me! - Que mísero pavor
Te invade, ó super-homem?
Tu que em lances de ventura
Ousou erguer-se à nossa altura?
Fausto, onde estás, tu, cuja voz me ecoou?
Tu, cuja força ingente me invocou?

FAUSTO
Fugir-te, eu, flâmeo vulto?
Sou eu, sou Fausto, o teu igual!

GÊNIO DA TERRA
No ardor da ação, no afã da vida,
Fluo, ondulo, urdo, ligo,
cá e lá, a tramar,
Berço e jazigo,
Perene mar,
Urdidura alternante,
Vida flamante,
Do Tempo assim movo o tear milenário,
E da divindade urdo o vivo vestuário.

FAUSTO
Tu, que o infinito mundo rondas,
Gênio da Ação, sinto-me um só contigo!

GÊNIO DA TERRA
És um, com o gênio que em ti sondas;
Mas não comigo!

FAUSTO
Mas não contigo?
Então, com quem?

(Wagner bate à porta)

III – Wagner e Fausto


(Fausto esta agoniado, no gabinete de estudos)

Wagner
Como pode viver, neste recinto, alguém
Que o mundo só percebe através da vidraça.
E em dia feriado esta sempre a distancia,
Licoes de morais a dar com tamanha arrogância?

Fausto
Não o conseguirá quem o não sente,
A quem não fluir do peito sem requintes,
Para, com gosto onipotente,
Conquistar todos os ouvintes.
Juntai, fervei aqui e ali,
Guisados com o manjar vizinho,
E das escassas cinzas espeli
O vosso flamejar mesquinho.
Crianças, vos admirarao,
Se assim for vosso paladar;
Mas, nunca falareis a um outro coração,
Se o próprio vos não inspirar.
Partitura corporal + Wagner toca violão (far horizons)
(com possíveis experimentações com canto e leitura de obras românticas)
Wagner
Ah! Deus! Como a arte é longa
E tao breve é a vida!
E de estudar na lida
Doem-me o peito e a cabeça. O meu sofrer prolonga!
Bem duros os caminhos que nos dao subida
Para as fecundas fostes do saber eterno,
Sem jamais atingir a meta apetecida!

Fausto
É o pergaminho o manancial sagrado
Que, para sempre, a sede vos acalma?
Alivio não tereis lucrado,
Não vês jorrando da própria alma.

Wagner
Perdao! Não pode haver mais doce agrado,
Que penetrar do mundo o espirito passado
É de um sábio conceito apreciar presente,
Vendo-o sempre avançar, no tempo, vivo e ardente.

Fausto
Oh, sim! Até o ceu estrelado!
São, meu amigo, os tempos do passado
Livro lacrado, de mistério infindo.
O que chamais de espirito de outrora
É o espirito que em vossas testas mora,
No qual o outrora esta refletindo.
Por hoje basta, amigo, por favor,
Que da noite altas horas são.

Wagner
Por mim continuaria aqui a conversar,
Com o mestre há sempre muito a aprender e estudar.
Amanha já da pascoa, aproveitando a vinda,
Permites que formule outras questões ainda?
Com muito esforço estou me dedicando a estudo,
Muito já sei, porem, almejo saber tudo

(Wagner sai de foco e vai ler livros enquanto só fausto divaga em um monologo
Fausto e Wagner saem para passear pela cidade)
Fausto
As torrentes e os rios degelam de repente
Primavera em fulgor ressurge sem tardança!
No campo aflora em tudo alegria e esperança,
Enquanto o velho inverno, extenue e decadente
Às ásperas montanhas se recolhe e lança
Co’ estertores finais, nos ares regelados,
Granizo em profusão que toda a terra envolve.
Cobrem-se verdejantes e distantes prados
Com branca e pura neve e o sol logo a dissolve;
Tudo renasce e vibra em força e fantasia,
Natureza rebenta em cores e poesia,
E como nesse campo existem poucas flores
Enfeita-se com vestes humanas multicores.
(Se dirigindo a Wagner)
Vira-te, olha abaixo, procura
Ver a cidade desta altura,
De seu portal, pelo obscuro,
Porque eles mesmos estão redivivos,
De áreas sem luz, de quartos abafados,
Do suor do trabalho e oficio exaustivos,
Da opressão dos frontões, telhados,
Do aperto das vielas, triste e frio,
De igrejas úmidas, de obscuridade,
Vieram todos à claridade.
Da aldeia já ouço o canto e o riso,
Do povo é isto o paraíso,
De cada um soa alegre o apelo:
Aqui sou gente, aqui posso sê-lo

(A conversa para até a atenção de fausto ser chamada pelo cão)

Fausto
Vês o cão negro a errar pelo restolho e seara?

Wagner
Há tempos já o vi. Não o julguei.

Fausto
Olha-o com atenção! Que animal te parece?

Wagner
Julgo ser um cão negro a terra a farejar,
Que o rastro de seu dono investiga ladrando.

Fausto
Vês como em largas espirais nos roda
E nos galopa perto e mais perto ainda à vista?
E, caso não me iluda, brilha-
-Lhe um borbulhão de fogo sobre a trilha.

Wagner
Não vejo nada além de que um cão; esse jogo
De movimentos faz a visão imprecisa.
Este é um cão meio louco, andando por aí,
Se paras um momento, ele logo faz festa;
Se falas, quer morde, pelo jeito não presta;
Se alguma coisa perdes, apanha-a num instante,
Se jogas n’água um pau, vai busca-lo radiante.

Fausto
Pois tem razão; vejo-o de todo isento
De espirito e é tudo adestramento.

Wagner
Cachorro como esse, assim tao educado,
Mesmo até por um sábio há de ser estimado.

IV – O Primeiro Contato de Mefistófeles e Fausto

Fausto
Escrito está: (era no início o verbo)
Começo apenas e já me exarcerbo!
Como hei de ao verbo dar tão alto apreço
De outra interpretação careço
Se o espírito me deixa esclarecido, escrito está
No início era o sentido!
Pesa a linha inicial com calma plena
Não se apressure a tua pena
É o sentido então que tudo opera e cria
Deverá opor, no início era a energia
Mas já enquanto assim o retifico, diz me algo que tão pouco nisso fico
Do espiríto me vale a direção
E escrevo em paz, era no início a ação

Mefisto
Por que tanto barulho?
Em que posso servir a Mestre tão eminente

Fausto
Do cão era esse o cerne então?

Mefisto
Eu te saúdo com grado, oh meu sábio senhor!
Já me fizeste suar bastante até aqui vir

Fausto
Que nome tens?

Mefisto
Sou parte da energia que sempre o mal pretende e que o bem sempre cria

Fausto
Com tal enigma, o que se alega?

Mefisto
Eu sou aquele gênio que nega e que destrói
E o faço com ração, a obra da criação
Caminha com vagar para a destruição.
Muito melhor seria que nada fosse criado
Por isso tudo aquilo a que chamas pecado,
Ou também destruição ou simplesmente o Mal
Constitui meu elemento eleito e natural

Fausto
Já te percebo o ofício, ilustre herói
Nada de grande o teu furor destrói
Começas pois, no que é pequeno

Mefisto
Devemos na verdadem e com mais reflexão,
Sobre isso conversar noutro encontro amistoso
Posso agora sair? Devo então retirar-me?

Fausto
Perguntas o porque não vejo
Agora que te conheci vem visitar-me ao teu desejo
A porta a vez, heis a janela, tens ao dispor, a chaminé

Mefisto
Há uma lei do diabo e dos fantasmas certa:
Devem entrar e sair só pelo mesmo vão.
Livre são para entrar, no sair estão sujeitos

Fausto
O inferno até tem leis? Mas bravos!
Podemos pois, firmar convosco algum contrato,
Sem medo de anular-se o pacto?

Mefisto
O que te prometer, gozarás sem tardança,
E nada poderei ao fim te arrebatar
Não podemos expor assuntos través,
Falaremos depois, outros motivos tenho,
Por enquanto suplico e com maior empenho,
Que me deixes sair ao menos esta vez

Fausto
Conta-me histórias mais, de leve
Demora-te mais um instante

Mefisto
Deixa sair depressa! Eu voltarei depois
Perguntarás mais tarde o que melhor te agrade

Fausto
Não fui eu que te persegui,
Vieste tu, dar na rede aqui
Segure o diabo quem com ele esbarra
Pela segunda vez, de certo não o agarra.

Mefisto
Se assim te satisfaz, também estou disposto,
A dar-te companhia, aqui permanecendo
Mas com a condição e do tempo ao meu gosto
Com artes que conheço eu te ir entretendo

Fausto
Em todo o traje hei de sentir as penas
Da vida misera o cortejo
Sou velho para brincar apenas,
Jovem sou pra ser sem desejo
Só com pavor desperto de manhã
Quase a gemer de amargo dó
Ao ver o dia que, em fugida vã
Não me cumpre um desejo nem um só
Que até o presságio de algum gozo
Com um fútil critiquisse exclui
Que as criações de meu espírito audacioso
Com farsas mil da vida obstrui
Também a noite com receio, terei de me estender no leito
Também lá, foge-me o repouso, alheio
Sonhos de horror me angustiarão ao peito
A morte almejo a vida me é malquista

Mefisto
No entanto, nunca a morte é um hóspede bem-vindo.
Fausto
Feliz a quem cingir nos ápses da glória
As fontes com os laoréis sangrentos da vitória
A quem depois do baile delirante
Colher nos braços de uma amante
Oh! Tivesse ante a voz do espírito pré-claro
Caído eu, rapto, extinto.

Mefisto
Não brinques mais com os teus pesares
Que a tua vida, qual abutres comem
Na pior companhia em que te achares
Entre homens sentirás ser homem.
Se te apraz a mim unido
Tomar os passos pela vida
Pronto estou sem medida
A ser teu neste instante
Companheiro constante
E se assim for do teu agrado
Sou teu lacaio, teu criado

Fausto
E com que ofício retribuo os teus?

Mefisto
Dispões de longo prazo ainda a teu favor

Fausto
Não, não! O diabo é um egoísta
E não fará só por amor a deus
Aquilo que a algum outro assista
Dize bem clara a condição
Traz servo tal, perigos ao patrão

Mefisto
Desejo aqui ficar como teu bom criado,
Sem descanso nem tréguas atendo a um aceno:
Mas quando nos acharmos, depois, do outro lado
Servir-me-ás também muito humilde e sereno

Fausto
Que importam do outro mundo os embaraços
Emana desta terra o meu contento
E este sol brilha ao meu tormento
Se deles me tornar isento
Aconteça o que der e vier
Algum em baixo e algum em cima
Mefisto
Com as ideias que tem já podes arriscar-te!
Une-te a mim e verás, com toda a minha arte
Nos dias que hão de vir posso logo mostrar-te
O que homem nenhum no mundo pode ver

Fausto
Se estiver com lazer num leito de delícias
Não me importa morrer! Assim fico liberto!
Se podes me enganar com coisas deliciosas
Doçuras a sentir, prazeres! Alegria!
Se podes me encantar com coisas saborosas,
Que seja para mim o meu último dia!
Aposto e tu?

Mefisto
A mim basta o papel, qualquer uma filhinha
Mas escreve com sangue, usa uma gotinha

(Fausto tira um canivete do bolso e corta a própria mão, despejando uma gota de
sangue em um papel)

Fausto
Pois bem, a farsa então se adota!
Já que te deixa contente.

Mefisto
O sangue humano é tinta ardente e especial

Fausto
Não há perigo de eu romper o pacto
Nos turbilhões do sensual fermento
Se aplaque das paixões o ígneo tumulto!
Em véus de mágica se quede oculto
Saciemos-nos no efêmero momento
No giro rápido do evento
Alternem-se prazer e dor

Triunfo e dissabor

Mefisto: Que enfim te satisfaça e te amanse o apetite!


Serve-te com vontade e sem constrangimento!

Fausto: Não penso em alegrias, já te disse


Entrego-me ao delírio, ao mais cruciante gozo
Ao fértil dissabor como ao ódio amoroso
Meu peito da ânsia do saber curado
A dor nenhuma fugirá do mundo
E o que a toda a humanidade é doado
Quero gozar no próprio eu a fundo
Com a alma lhe colher o vil e o mais perfeito
Juntar-lhe a dor e o bem estar no peito
E desta arte ao seu ser, ampliar meu próprio ser
E com ela, ao final, também eu perecer

Mefisto: Falas pouco e certo!


Quais louros ornarão a tua fronte brilhante:
A coragem do leão
Do cervo a ligeireza
Sangue ítalo, um vulcão
Do nórdico a firmeza

Fausto: Que é que eu sou se é me vedado, pois, granjear da humanidade o diadema


Do eu todo a aspiração suprema?

Mefisto: Não és mais, meu senhor, do que és: Um mortal!


Perucas podes ter, com louros aos milhões
Alçar-te com teus pés nos mais altos tacões
Serás sempre o que és: Um pobre ser mortal!

Fausto: Mas que quero! Como faremos, pois?

Mefisto: Vamos embora ora essa! Esse antro de martírio, ao acaso te interessa?

V – A Feiticeira

VI – O Monólogo da Margarida
(A noite, um quartinho muito bem arrumado)

MARGARIDA
Um rei de tule, em era já passada,
E que foi tão fiel, quanto forte,
Da amada recebeu, após a morte,
Uma taça de ouro cinzelada.

Dessa taça jamais se separava,


Nos banquetes, da taça se servia,
No entanto, sempre que a via,
Uma lágrima incôndita derramava.
Ao chegar esse rei ao fim da vida,
Legou todos os bens, toda riqueza,
Que tinha, mas negou-se, com firmeza,
A afastar-se da taça tão querida.

Mandou então, seus nobres convidar,


Seus duques, seus marqueses, seus barões,
Para um grande banquete nos salões,
Do castelo que tinha junto ao mar.

Depois o velho rei, perante o agouro,


Para o terraço do castelo avança,
Sem hesitar um só momento, e lança,
Nas ondas do oceano a taça de ouro.

Abra-se as águas do oceano e abraça,


E nas ondas do mar desaparece.
O velho rei, tremendo, empalidece,
Nunca mais levará aos lábios, a taça.

VII – Fausto e Margarida, e Mefisto.


(Um jardim, Margarida, de braço dado com Fausto, Mefistófeles caminhando de um lado para o
outro)

FAUSTO
Um teu olhar, uma só palavra, me dizem mais do que toda a sabedoria do mundo.
(Beija-lhe a mão)

MARGARIDA
Como podeis beijar-me a mão? Ela é tão maltratada, tão áspera! Tenho de fazer
todo o trabalho de casa. Ah, minha mãe é tão exigente!

FAUSTO
Ó minha querida! O que tanto se enfeita com o nome de espírito não passa, muitas
vezes, de tolice e vaidade.

MARGARIDA
A nossa casa é muito pequena, mas é preciso cuidar de tudo. Uma casinha com
quintal na entrada da cidade e um pouco de dinheiro de herança, é o que o pai nos
deixou. Não temos criada, tem-se que cozinhar, varrer a casa, costurar e fazer
crochê. Levo uma vida tranquila, meu irmão é soldado e minha irmãzinha morreu.
FAUSTO
Devia ser uma anja, se era parecida contigo.

MARGARIDA
Eu a criei, ela gostava muito de mim. Nasceu depois da morte de meu pai; ficamos,
então, com medo de perder nossa mãe, tanto foi o seu sofrimento. Levo muito
tempo para ela se refazer, de maneira que não pôde alimentar a filhinha, e eu tive de
cuidar dela, dando-lhe de beber leite e água; era como minha filha. Nos meus
braços, no meu seio, apegou-se a mim, e assim foi crescendo.

FAUSTO
Deves ter gozado então uma felicidade bem pura.

MEFISTÓFELES
Diz o provérbio: “Uma casa própria e uma boa mulher são tão preciosas quanto
ouro e as pérolas”.

(Inicia-se uma dança com In der Palastra)

MEFISTÓFELES
Com as mulheres não se deve brincar nunca.

FAUSTO
Querida...

MARGARIDA
Deixa-me (colhe uma margarida e arranca as pétalas uma após a outra)

FAUSTO
O que queres fazer? Um buquê?

MARGARIDA
Não, é uma brincadeira.

FAUSTO
Me ensina?

MARGARIDA
Vais rir de mim. (ri)

FAUSTO
O que murmuras?

MARGARIDA (baixinho)
Bem-me-quer. Malmequer....

FAUSTO
Meiga anja do céu. (segura-lhe as mãos)

MARGARIDA
Estou tremendo.

(Fausto leva Margarida até o seu ninho e fecha a cortina de tule)

FAUSTO
Ah, menina sem coração, fugindo de mim! És minha! (Abraça-a e beija-a)

MARGARIDA (retribuindo o beijo)


Ó melhor dos homens, eu te amo de todo o coração.

MEFISTÓFELES
Já é hora de sair.

(Desvencilham e sai)

MARGARIDA
Sinto-me envergonhada diante dele e digo “sim” a tudo que ele fala.

IX – O Monólogo de Valentim
(Valentim morre e amaldiçoa Margarida)

Valentim
Muitas vezes sentei-me em rodas a beber,
Cada qual a exaltar-se, a gritar a valer,
Os rapazes pediam o nome da mais pura,
A flor da mocidade, um amos de candura,
Molhavam o elogio com copos todos cheios.
Na mesa punha as armas toda aquela malta.
Escutava com calma e sem quaisquer receios
Os gritos e protestos feitos em voz alta.
A mao por sobre a barba passava lentamente
O copo a transbordar, bradava de repente:
--que escolha cada qual como pensar!
Existe uma mulher em toda a redondeza
Que à cara margarida iguale na pureza
E chegue ao calcanhar da minha bela irmã?
E com alegria louçã
Alguns logo gritavam: ele tem toda razão!
É margarida a flor de toda a geração.

E hoje! Há que puxar e arrancar os cabelos,


Como louco subir agarrado à parede!
Agora, com ironia, torcidas de nariz,
Qualquer um vagabundo o que deseja diz!
Como mau pagador, devo sentar com sede
E suar ao ouvir no ar insultos, crede.
Poderia espancar a tantos invejosos,
Não posso, todavia, chamar-lhes mentirosos!

(Mefistófeles e Fausto entram em cena, brigam com Valentim e o acertam um golpe


mortal, fogem. Entra Margarida, ouve seu irmão)

Valentim
Morro! Fui atacado
E logo rechaçado.
Oh mulher, por que tanto choro e tormento?
Vinde perto de mim e escutai meu lamento!
Minha margaridinha! És jovem e sem prudência,
Não tens experiência:
A vida reges mal, minha querida irmã,
E agora te asseguro em livre confidencia:
Viraste puta;
Vai, trata então de sê-lo!
O que aconteceu é fato consumado.
E o que for ocorrer jamais será evitado;
Cameçaste com um, escondida, com medo,
Logo mais muitos outros virao com ansiedade,
E depois que uma dúzia houver se saciado,
És de toda a cidade.

Quando nasce a vergonha,


Surge aos olhos do mundo escondida; a peçonha
Faz lançar sobre ela o manto gris da noite,
Cobrindo-lhe a cabeça e a feição medonha!
Gostaríamos até de eliminá-la a açoite.
Ela porem se expande,
E logo faz-se grande,
Expõe-se à luz do sol inteiramente nua,
Nem por isso é mais bela ou fica menos crua.
Quanto mais asqueroso e feio é o seu semblante,
Mais e mais luz do sol procura extravagante.

O tempo já está perto,


Em que todos honrados e dignos cidadãos
De ti, oh prostituta, se afastarão, por certo,
Qual fosses cadáver em putrefação.
Quando dentro mirarem dos teus olhos de ouro
Não verão nunca mais o teu maior tesouro!
Nem poderás dobrar
O teu corpo na igreja ante um sagrado altar!
Nem podes deleitar-te,
Quando fores a dança,
Com belo véu de renda, o colo a adornar-te.
Ficarás escondida em cantos isolados,
Entre pobres mendigos, tristes aleijados.
Poderás ser no céu um dia perdoada,
Mas na terra serás uma eterna execrada.

Oh mulher infamante e alcoviteira vil!


Espero recolher, dos pecados, do Eterno,
Completa, imediata e justa redenção.

Digo e repito: deixa as lágrimas de lado!


Quando saíste da honra e abraçaste o pecado
Deste em meu coração um golpe bem certeiro.
Busco através da morte o sono verdadeiro
E sigo para deus como um bravo e um soldado.

(Valentim morre)

X - O Quarto de Margarida e As Muralhas da Cidade


(a igreja, missa, órgão e cântico)

I
MARGARIDA
Ai de mim! Ai de mim! Pudesse escapar dos pensamentos que me torturam!

MARGARIDA
Se eu estivesse longe daqui! Tenho a impressão de que esse órgão me sufoca, esses
cantos despedaçam-me o coração! Estas colunas me comprimem, essa abóbada me
esmaga! Ar.

(Margarida, sozinha, no seu ninho, em um nicho do muro, a imagem da Mater


Dolorosa; vasos de flores diante dela. Margarida, traz um vaso de flores novas)

II
Foge-me o sossego. Ah, não encontro jamais, jamais, a paz do meu coração
enfermo. Em toda parte onde não o vejo, vejo um túmulo. O mundo inteiro se
cobre de luto. Foge-me o sossego. Ah, não encontro jamais, jamais, a paz do meu
coração enfermo. Fiquei todo o dia à janela, ou em frente da casa, para vê-lo de
longe, ou para correr ao seu encontro. O encanto de sua palavra, o aperto da sua
mão e seu beijo. Foge-me o sossego. Ah, não encontro jamais, jamais, a paz do meu
coração enfermo.

III
Baixa, ó Senhora das dores, um olhar de piedade sobre minha dor. Quem sentirá,
quem sofrerá o mal que dilacera o meu seio? Em qualquer lugar aonde vou, é uma
dor amarga, bem amarga, que levo comigo. Mal me vejo só choro, choro, choro e o
meu coração se dilacera dentro de mim. Estas flores vicejavam diante da janela do
meu quarto, todos os dias eu as regava com o meu pranto, hoje as colhi para trazer-
te. Socorre-me! Salva-me da vergonha e da morte! Baixa, ó Senhora das dores, um
olhar de piedade sobre a minha dor.

XI – O Cárcere
MARGARIDA
És um homem? Compadecerás de meu sofrimento.

FAUSTO

MARGARIDA
Carrasco! Quem te deu esse poder sobre mim? Já vens me buscar à meia noite!
Amanhã, ao amanhecer, não será bem cedo? (levanta-se) Eu sou tão jovem, tão jovem
e já tenho que morrer! Sou tão bela, também, e foi isso que causou a minha
perdição. A minha coroa foi arrancada, as flores dispersas. Não me agarres
brutalmente! Não sejas insensível às minhas lágrimas; nunca te vi em minha vida.

FAUSTO
Poderei resistir a este doloroso espetáculo?

MARGARIDA
Estou inteiramente ao seu dispor, mas deixa-me amamentar meu filho. Durante
toda a noite, eu o apertei de encontro ao coração e dizem que fui eu que o matei.
Eu jamais recuperarei a alegria.

FAUSTO
Teu amante está a teus pés, procurando romper estes grilhões tão dolorosos.

MARGARIDA
Ajoelhamo-nos para invocar os santos! Vê sob aqueles degraus, na soleira da porta...
é lá que se agita o inferno.
FAUSTO

MARGARIDA
Matei minha mãe e meu irmão! Afoguei meu filho! Vou te descrever os túmulos que
terás o cuidado de levantar a partir de amanhã. O melhor lugar tem de ser para
minha mãe; que meu irmão fique vem perto dela; eu, um pouco ao lado, com o
pequeno perto de mim. Lá fora, é o túmulo, é a morte que me espreita!

FAUSTO

MARGARIDA
Depressa! Depressa! Salva teu pobre filho! Vai, segue ao longo do regato, na
estrada, ao fundo da floresta, à esquerda, onde está a barragem, na lagoa. Agarra-o
bem depressa! Ele está boiando na superfície da água, ainda se batendo, salva-o,
salva-o.

FAUSTO

MARGARIDA
Mal tínhamos passado além da montanha. Minha mãe está lá, sentada na pedra.
Minha mãe está lá, sentada na pedra, sacudindo a cabeça, sem me fazer qualquer
sinal, sem piscar os olhos. Nós tornaremos a nos ver, mas não na dança. O sino me
chama, a vara da justiça está quebrada. Já tomba sobre o pescoço de todos a lâmina
lançada contra o meu. Eis o mundo inteiro mudo como um túmulo!

Fim

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