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As formas do falso: uma análise de Walnice Nogueira Galvão do romance Grande Sertão:

Veredas

Há uma pluralidade de leituras que perpassam grandes romances, e isso não seria

diferente com Grande Sertão: Veredas, escrito por Guimarães Rosa e considerado como um dos

maiores expoentes da literatura brasileira. Uma das mais significativas perspectivas sobre o livro

é a de Walnice Nogueira Galvão, organizada na crítica As formas do falso (1937), que se

estrutura desde a observação das ambiguidades contidas no romance desde o mote de Riobaldo:

“tudo é e não é”. Partindo desse pressuposto, o livro de crítica literária se divide em três grandes

partes: A condição jagunça (p.17 - 50), A forjadura das formas do falso (p. 51-76) e, por fim, O

ponteador de opostos (p. 77-117).

Em A condição jagunça se define, basicamente, o espaço e os tipos que ali habitam;

primeiro o coronelismo e as estruturas sociais de poder, depois o espaço do sertão, a gente pobre

que vive nesse espaço rural, e, por fim, os jagunços dentro desse cenário. Já se procura desde os

primeiros parágrafos a definir e delimitar o que é o jagunço; partindo de quatro excertos

extraídos de Grande Sertão: Veredas, Walnice Galvão demonstra como as figuras formadas após

a leitura dos trechos é múltipla, podendo ser esse sujeito jagunço tanto uma força do mal, um

delinquente aquém dos requisitos de humanidade (p. 18), mas também um sedutor, [...] ver nele

um herói, um revolucionário, um Robin Hood caboclo (p. 18). Ou seja é um sujeito que, por si,

já é ambiguo e ambivalente.

Para corroborar essas sua perspectiva resgata as descrições feitas por Euclides da Cunha

em Os sertões sobre o sertanejo em geral, que ora pendia para a bravura e potência do tipo, ora

para a loucura e desvaire. Enfatiza essa reflexão na frase: O líder de Canudos acabou “indo para

a história como poderia ter ido para o hospício”, demonstrando como a notoriedade e a
obscuridade são lugares intercambiáveis perpassados nessa figura que está se procurando definir.

Demonstra, depois, como mesmo na perspectiva de um discurso cientificista pretensamente

praticado por Euclides da Cunha não se consegue chegar numa descrição única, final durante o

relato, pois apesar de serem aferidos positivamente segundo padrões éticos, são admiráveis, ao

passo que o arraial de Canudos recebe uma avaliação negativa por projeção dos conteúdos

humanos. (p. 19).

Debruçando-se sobre essa ambiguidade e por essas definições duplas dos jagunços,

observa mais de perto a conceitualização de braveza e inutilidade, praticada por Euclides da

Cunha em Os Sertões, apontando como ela deixa nas margens um elemento crucial, o do inútil

utilizável (p. 20), uma vez que esses sujeitos seriam inútil para a produção, e por isso mesmo

utilizável pelo poder. (p. 20). Dessa maneira, a ação dos jagunços seria, antes, um dos elementos

mais comuns da história brasileira, marcada pela organização da violência a nível privado,

sobretudo no espaço rural como mecanismo de garantir tanto as posses materiais, quanto a

instituição do coronelismo, a solidariedade senhorial, o banditismo coletivo , o fanatismo

religioso por meio da vingança familiar, nepotismo, ocupação de cidades, saque, depredação,

assassinato dos adversários políticos, corrupção e afins (p. 22).

Também aponta Walnice Nogueira que essas mesmas ambiguidades aparecem a nível do

sujeito por meio de uma ética difusa, na qual a conduta dos sujeitos é orientada por uma série de

valores e modos de viver, perpassada, por vezes, pela violência como mecanismo de gratitude e

obediência. Por fim, demonstra como o banditismo está inserido no cerne dessa organização

socioeconômica brasileira, marcada pela força bruta e pelo poder concentrado nas mãos dos

donos da terra, que vão subordinar as massas populares, garantindo assim unidades mínimas de
poder no país (p. 24), derivadas desde o período colonial e mantidas até o momento da escritura

de Grande Sertão: Veredas.

Depois de definir essa ambiguidade na forma e ação do jagunço, Walnice procura

delimitar o que é o espaço múltiplo do sertão; esse termo se referiria a uma vasta e indefinida

área do interior do Brasil (p. 25), marcada pela pecuária extensiva (p. 25), na qual as

características naturais seriam menos relevantes para se definir esse espaço a que se chama sertão

do que as características socioeconômicas. Focando na questão do gado, a autora afirma que é a

presença do gado que unifica o sertão (p. 25), estando bastante presente também em Grande

Sertão: Veredas desde a primeira página com o bezerro erroso até a negociação do gado ao final

do livro quando o narrador reencontra Zé Bebelo, ou ainda com a descrição do lugar sertão como

pasto sem fecho (p. 29), marca da gandaia, forma rudimentar e primária de criação do gado.

Dessa maneira, a pecuária é o substrato material do sertão ao mesmo tempo que uma

presença cultural e cotidiana, seja pelas relações travadas entre os sujeitos ao redor da atividade

econômica do gado, seja pelo boi como objetos do cotidiano feitos de chifre e couro que

adornam e compõem as moradias e vestes dos sujeitos que ali vivem.

Passando a definir os sujeitos que vivem no sertão, a autora os define como nem

senhores, nem escravos; sujeitos excluídos do processo produtivo principal, que para sobreviver

recorre a atividades marginalizadas e esporádicas. Ao mesmo tempo que são marginais,

representam a maior parte da população brasileira, sempre preocupando as autoridades pelo seu

crescimento ao longo da história. No meio rural, aponta-se que esses sujeitos excluídos vão se

tornar agregados e moradores de fazendeiros, coabitando duas categorias contraditória: por um

lado são homens livres, mas despossuídos também de tudo são dependentes absolutos dos
senhores de terra e latifundiários, garantindo sua sobrevivência na peculiaridade do latifúndio (p.

37).

Fruto dessa relação entre o homem-livre que se torna um agregado, surge o favor,

categoria crucial na vida pública e econômica brasileira, amarrando esse sujeito a um

compromisso pessoal com os grandes proprietários de terra, seja atuando como vaqueiro,

parceiro, meeiro, camarada, vaqueiro e afins. Seu lugar de existência é bastante precário, uma

vez que pode ser facilmente descartado e por não ser parte crucial da cadeia produtiva; além

disso vale ressaltar que o laço que mantém com os coronéis e donos de terra fazem com que não

tenham grande força organizativa ou institucional, restando apenas a força bruta e o próprio

corpo para sanar os problemas e desavenças que venha a ter. A autora demonstra como essa

realidade está contida na frase Em jagunço com jagunço, o poder seco da pessoa é o que vale (p.

39) proferida por Riobaldo em Grande Sertão: Veredas.

Por fim, para concluir a primeira parte do livro, Walnice retorna à figura do jagunço

como inútil utilizado, aprofundando as imagens ambíguas formadas por ele: livre e dependente,

despossuído e servo de quem tem, livre, mas de destino determinado por outro, sem causas

pessoais, por isso defendendo causas alheias e avulso e móvel, pronto a ser usado como sujeitos

disponíveis (p. 41-42). Define que dentro desse cenário mesmo o crime que pode vir a ser

cometido pelo jagunço nada mais é do que uma obrigação a quem se serve, a quem essa plebe

rural deve sua proteção e existência.

Essa realidade teria sido derivada das peculiaridades de povoamento do espaço brasileiro,

que resultou em pequenos núcleos de poder, em que os objetivos defensivo e ofensivos sempre

se mesclaram. Esse fenômeno teria gerado o que se definiu no livro como “clã rural” (p. 43),

uma unidade fazenda perpassada pelas alianças, relações de poder, parentescos, e busca por
proteção, ou domínio da terra. Dentro desse “clã rural” quem manda é o senhor de terras - O

senhor é quem opta, o jagunço executa (p. 47) -, em uma estrutura vertical de poder; a

horizontalidade aparece apenas entre os senhores aliados, visto que mesmo entre os braços-

armados dos mais variados clãs que se juntam cada um deles responde unicamente ao seu chefe,

não estabelecendo relações entre si.

Walnice aponta que é justo esse elemento uns do que Riobaldo não compreende; há

vários chefes, vários que mandam: Hermógenes, João Goanhá, Ricardão, Sô Candelário, etc.

Dessa forma a autora define que: Cada fazendeiro com seus chefiados, em guerra privada: a

unidade econômica mínima é também a unidade mínima do poder político do Brasil rural (p.

44), ou seja cada uma dessas células disputa também internamente sobre o poder, pois representa

certo número de votos, bem como a potencialidade de intimidar o eleitorado.

Concluindo a primeira parte do livro, mais ambiguidades sobre a figura do jagunço são

apontadas; a jagunçagem é tanto passível de ser utilizada para o trabalho como para a destruição,

para manter ou ameaçar a ordem, para impor ou transgredir a lei, para vingar ou realizar ofensas.

O traço que mais sobressai tudo isso, contudo, é que apesar de executar o jagunço, por estar

inserido dentro de um contexto socioeconômico específico não escolhe o que fazer, apesar de

fazer.

Entrando na segunda parte do livro A forjadura das formas do falso a autora passa a

deslindar os limites entre a matéria imaginária e a matéria real em Grande Sertão: Veredas;

principiando pelas questões do imaginário da cavalaria no romance aponta como esses não são

utilizados apenas para dar um tom mitológico ao cangaço, mas antes entender essa presença

como uma célula ideológica do livro (p. 52). Para chegar nessa conclusão, a autora analisa os

dois níveis em que a cavalaria aparece no romance roseano; o primeiro plano é o da tradição
letrada, em que o mote medieval ressurge como tradição da escritura, o segundo plano, mais

curioso e profundo, analisa a questão identificando os paralelos entre o sistema de dominação

vigente no sertão com o feudalismo degradado (p. 53) tais como indicados desde Euclides da

Cunha, ao chamar essa relação de “cavalaria rústica”, conceitualização feita inclusive pelas

roupas que o vaqueiro usa, semelhantes ao cavaleiro medieval.

Walnice indica ainda que para Pedro Calmon a medievalização se dá pela nobilização da

classe dominante sertaneja, desde os processos de passagem do capitalismo predatório para o

capitalismo produtivo, que gera processos de degradação no sertão brasileiro, passando da idade

heróica para a era mesquinha (p. 54).Essa roupa do vaqueiro também aparece como marca das

ambiguidades carregadas pelos jagunços. Walnice indica ainda que é quase impossível achar um

relato sobre o sertão em que não se tenha esse viés mitológico medieval, baseado nos heróis

cavaleirescos.

Partindo para a análise linguística de Grande Sertão: Veredas, a autora indica como a

forma de narrar usada por Guimarães Rosa tira a verossimilhança das outras formas as quais

estamos mais habituados, afinal o romance trata, nada mais nada menos, do que um relato de um

velho jagunço anotado por um entrevistador, tal qual hoje acontece em quase todos os livros,

jornais e revistas. Além disso ressalta que a pontuação usada - um travessão no começo um

ponto final ao término do monólogo- marca uma estrutura narrativa monológica, que nunca é

interrompida, tampouco começada. Walnice indica que o outro desse diálogo é apenas sugerido

por um pressuposto, dado pelas frases interrogativas, e exclamativas, as interjeições, os

expletivos, as frases truncadas e entrecortadas (p. 70). Indica, contudo, que essa é uma fala

escrita, não a oralidade, realmente; é um discurso fictício, criada a partir de modelos orais

mediante a forma escrita. E essa seria, para Walnice, a grande diferença entre o romance roseano
e um relato outro de qualquer jagunço; há uma dimensão literária e criativa, por suposto,

inventada que não existe na mera entrevista e depoimento. Isso justifica também o narrador de

Grande Sertão: Veredas ser um letrado, afinal isso seria necessário para a verossimilhança da

história, que acaba por transcender as dimensões da situação do narrador-personagem.

Além disso, a linguagem é dupla: por um lado é semelhante ao falar do sertanejo e pode

ser reconhecido pelo vocabulário e cadência utilizada na escrita, por outro lado essa mesma

linguagem também é uma marca letrada, do próprio autor Guimarães Rosa, os arcaísmos do

português, seu estilo pessoal. Essa ambiguidade e duplicidade perpassa todo o romance roseano,

estando condensado na figura do narrador-personagem, que garante também que Grande Sertão:

Veredas ultrapasse as fronteiras do folclórico, ingressando em uma nova dimensão estética-

literária, desde uma totalidade do romance por um fluxo de fala. Conclui essa segunda parte do

livro teórico afirmando que a verdade é que Guimarães Rosa tem portanto, um pé na linguagem

do sertão e o outro pé na linguagem do mundo (p. 74).

Entrando na terceira e última parte de As formas do falso, intitulada O ponteador de

opostos, Walnice vai analisar as fases de Riobaldo: letrado, jagunço e pactário. Começa

definindo Riobaldo como um narrador-personagem, que observa a própria vida, a sombra tanto

da jagunçagem, quanto do letramento em que no momento narrativo vive. Aponta como não

possuí grandes lembranças da infância, sendo sua memória mais antiga o encontro com

Reinaldo, aos 14 anos, bem como a mudança para a fazenda de Selorico Mendes após a morte da

mãe.

Desde esse padrinho se define a duplicidade do destino do personagem; como afilhado

aprende as ordens instrumentais, a ordem escolar, mas, ao mesmo tempo, da jagunçagem, afinal

o padrinho o quer ensinar a ler para que consiga compreender a relação que possui com o famoso
chefe dos jagunços. Dessa maneira, o menino ingressa no universo da escolarização para

adentrar, conflituosamente, como demonstra Walnice Nogueira, também na jagunçagem,

realizando um intercâmbio do seu lugar social: de agregado à menino de classe alta escolarizado.

Também, depois, ingressa no cangaço por ser letrado; Riobaldo foge da casa de seu pai e

começa a trabalhar como professor na fazenda de Zé Bebelo, recebendo o título de professor (p.

79). De professor, Riobaldo depois se torna secretário, chegando depois no meio de sua fuga a

conhecer e reencontrar Reinaldo, a questionar a ordem e ação de Zé Bebelo, a oscilar seu

pensamento e sentimento com relação a traição e dessa mesma forma nasce sua consciência

como líder.

Outro acontecimento que Walnice aponta como decisivo na história de Riobaldo é o

primeiro encontro que tem com um bando de jagunços, na fazenda do padrinho, pois nesse

momento ele sente o impulso da vida de jagunçagem ao se deparar com esses seres mitológicos.

Como a tarefa de Riobaldo é reconstruir seu passado em texto, esses elementos passam a figurar

de forma decantada, não mais na fúria da ação do que viveu, aponta a autora, destacando que isso

também gera diferenças entre a vida-representação da vida. Isso também justificaria as tentativas

de Riobaldo de se desculpar sobre a falta de reflexão feita durante o desenrolar da sua vida, seu

gesto de apontar o texto como espaço privilegiado, da verdade, clareza, coerência, da própria

razão. O seu interlocutor presente e ouvinte, nesse ponto, se torna fiel como o papel (p. 89).

Seria nessa tensão que se afirmaria Riobaldo como o ser letrado.

Riobaldo como jagunço, próxima perspectiva apontada por Walnice, é já apresentada

como tendo sido um contragosto (p. 93) gerada por dois acontecimentos: o encontro com

Reinaldo e o contato com o bando de jagunços. Dessa maneira, a autora aponta que Riobaldo é
apenas meio-jagunço, marcado pelas dúvidas e angústias que não estão presentes nos outros,

sendo também uma presa da angústia.

Aponta ainda que o laço travado entre Reinaldo-Diadorim é um laço de duplo conteúdo: é

um laço de amor ao mesmo tempo que de morte: amor mútuo e mútuo contrato de matar os

inimigos. (p. 100). Quando se situa como narrador, Riobaldo compreende que desta relação gera-

se a morte de Diadorim, pelo voto de fidelidade feito contra Hermógenes. É com Riobaldo que

também aflora outra contradição: seu desejo por alguém do sexo masculino, apesar da virilidade

masculina que tinha certeza possuir, outra ambiguidade que passa a viver nesse desenrolar de sua

vida.

Por fim, a última parte do livro vai estudar o Riobaldo pactário, questão levantada nos

meios do romance de Grande Sertão: Veredas ao se contar o caso de Maria Mutema, um dos

contos que trabalha a questão dos contrários que se mostram de forma adversa para Walnice

Galvão. Ao analisá-lo e remontá-lo, a autora percebe sua relação com o delírio e vontades

pactárias de Riobaldo, trecho do romance marcado pela dúvida e insegurança, raiva e medo, da

própria luta do bem e mal. A crítica literária aponta como essa questão do pacto é a linha

organizativa da narrativa: foi feito o pacto ou não? O narrador vendeu sua alma ou não? Assim

como Maria Mutema o que se percebe é que o narrador expurga essa sua dúvida e angústia pela

fala, por contar, por organizar o acontecido; aloca o diabo no próprio homem, na própria

natureza.

Para Walnice, isso indica que as essência da vida é o movimento e mudança, de um

processo dinâmico, sem pressa, elementos presentes no falar de Riobaldo, bem como em seus

gestos: querer subjugar o mundo e fazê-lo curvar-se às suas ordens pode redundar em danação.

Assim agiu Riobaldo, vendendo sua alma e perdendo Diadorim (p. 130). Fora todas as
ambiguidades e mudanças por que passa durante sua vida, é o pacto que é indicado como

reviravolta: consegue caminhar em linha reta para o objetivo (p. 132), consegue se apegar a

vingança de Hermógenes e se torna chefe de jagunços. Esse destino reto é construído também

com base na dolorosa ação do pacto; Riobaldo se torna o jagunço que precisa ser e cumpre a

ação necessária, mas ao mesmo tempo seu grande amor, Reinaldo, morre, dando ensejo as

dúvidas que o perseguem por toda a narrativa.

GALVÃO, Walnice Nogueira. As formas do falso. São Paulo: Perspectiva, 1937.

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