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CONSTITUCIONAIS
Resumo
O presente trabalho tem como objetivo abordar os requisitos para a constituição de uma
família e, por conseguinte suas evoluções históricas. Não obstante, é dever do Poder Público
acompanhar as transformações ocorridas na sociedade, pois o objetivo do Direito é abarcar
as mudanças ocorridas na sociedade e regulamentá-las. Para tanto, a visualização da família é
conceituada de forma cada vez mais abrangente. Para o desenvolvimento do tema proposto
realizou-se pesquisas bibliográficas, mormente jurisprudenciais e doutrinárias, de modo a
propiciar a discussão a respeito da temática visando a defesa das uniões homoafetivas.
Desta forma, analisou-se o conceito histórico para a formação da família e a evolução desse
conceito a partir de Princípios Constitucionais que visam garantir a possibilidade
das uniões homoafetivas de modo a inseri-las no mundo jurídico. Pois, essas uniões não
fazem parte somente da atual realidade social, mas também já são responsáveis por
incipientes Jurisprudências em alguns Tribunais. Nesse sentido, o direito como um conjunto
de regras dinâmicas, é coerente ressaltar a importância de regulamentar as novas formas de
vínculos familiares.
INTRODUÇÃO
O direito é um fato ou fenômeno social, isto é, o direito não existe senão na sociedade e
não pode ser concebido fora dela. Portando, ao analisar a teoria tridimensional do direito,
proposta por Miguel Reale (2007, p. 5): conclui-se que o fenômeno jurídico compõe-se,
sempre e necessariamente, de um fato, correspondente a realização de uma conduta, que
originará um valor (concretização da ideia de justiça) e será enquadrado em uma norma
(“ordenação bilateral-atributiva de fatos segundo valores”). Ou seja, devido à mudanças
ocorridas nas relações afetivas, o direito viu-se obrigado a mudar para acompanhar as
mudanças.
Nesse sentido, colaciono a teoria do ilustríssimo doutrinador Miguel Reale, senão
vejamos:
Por conseguinte, o direito de família estuda, em síntese, as relações das pessoas unidas
pelo matrimônio, bem como daqueles que convivem em uniões sem casamento (...)
4
(VENOSA; 2009, p. 1). Contudo, para chegar na definição exposta acima, a família sofreu
profundas mudanças em sua estrutura, função, natureza, composição e, consequentemente de
concepção.
Ressalta-se, portanto, que entre os vários organismos sociais e jurídicos, o conceito, a
compreensão e a extensão do vínculo familiar são o que mais se alteram no curso dos tempos.
Ou seja, o conceito de família nem sempre foi abrangente e receptivo às novas modalidades
de relacionamento fora do casamento como exposto acima por Silvio de Salvo Venosa.
Porém, conforme ensina Miguel Reale (2007, p. 4-5): o direito sempre acompanhou valores
culturais e, principalmente, influências religiosas de uma determinada época. Portanto,
antigamente, família era organizada, segundo o direito romano, sob o princípio da autoridade.
Ou seja, o pater famílias1 exercia sobre os filhos o direito de vida e de morte. Deste modo,
podia vendê-los, impor-lhe castigos e penas corporais e até mesmo tirar-lhe a vida. A mulher
era totalmente subordinada à autoridade marital e podia ser repudiada por ato unilateral do
marido. A autoridade do pater familias era exercida sobre todos seus descendentes não
emancipados, sobre a sua esposa e as mulheres casadas com manus2 com os seus
descendentes (GONÇALVES; 2008; p. 15).
Isto é, em Roma, assim como em muitas civilizações antigas, a instituição familiar
fundava-se no poder paterno ou no poder marital. E, embora pudesse existir o afeto entre os
membros de uma família, a rigor, esse não era o critério que constituía o fundamento essencial
para a formação do vínculo familiar.
Nesse sentido, a família, representada, sempre, pelo pater familias, era
simultaneamente uma unidade econômica, religiosa, política e jurisdicional. Posto que, o
ascendente comum, vivo e mais velho era ao mesmo tempo chefe político, sacerdote e juiz,
cabia a ele comandar, oficiar o culto dos deuses doméstico e distribuir justiça. Portanto, o
1
O termo é Latim e significa, literalmente, "pai da família". A forma é irregular e arcaica em Latim, preservando a antiga
terminação do genitivo em -as. O termo pater se refere a um território ou jurisdição governado por um patriarca. Disponível
em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Pater_familias. Acessado em: 15/03/2010.
2
No Casamento Romano existiam duas possibilidades para a mulher: ou continuava se submetendo aos poderes da
autoridade paterna (casamento sem manus), ou ela entrava na família marital e devia a partir deste momento
obediência ao seu marido (casamento com manus). Disponível em :
HTTP://www.buscalegis.ufsc.br/revista/index.php/buscalegis/article/viewFile/9544/9110. Acessado em 12/06/2010.
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patrimônio familiar, assim como outras atividades exercidas pela família, era administrado
pelo pater familias. Os membros da família antiga eram unidos por vínculo mais poderoso
que o nascimento: a religião doméstica e o culto dos antepassados. (VENOSA; 2008. p. 4)
Esse culto era dirigido pelo pater familias, sendo que, a mulher ao se casar,
abandonava o culto do lar de seu pai e passava a cultivar os deuses antepassados do marido, a
quem passava a fazer oferendas. Ressalta, ainda, que ao contrair núpcias, a mulher, não
poderia ser continuadora do culto dos deuses de seu pai.
Portanto, sob pena de não mais serem cultivados os antepassados, sempre era
necessário que um descendente homem continuasse o culto familiar. Desta forma, o celibato
era considerado uma desgraça, pois por decisão de não ter filhos, o celibatário colocava em
risco a continuidade do culto.
Contudo, não bastava gerar um filho, isto é, este deveria ser fruto de um casamento
religioso. Ou seja, o filho bastardo ou natural não poderia ser continuador da religião
doméstica, pois as uniões livres não possuíam o status de casamento e, embora, fosse lhes
atribuído certo vínculo jurídico, o cristianismo havia condenado as uniões livres e
instituiu o casamento como sacramento. (VENOSA; 2009. p. 4)
Por conseguinte, a instituição do casamento era visto como um dogma da religião
doméstica, pois conforme ressaltado acima, as uniões livres não possuíam o status de
casamento. Por isso, o cristianismo instituiu o casamento como sacramento, pondo em relevo a
comunhão espiritual entre os nubentes, cercando-a de solenidades perante a autoridade
religiosa. O casamento era obrigatório e não tinha, por fim, o prazer, pois o seu objeto
principal não estava na união de dois seres mutuamente simpatizantes um com o outro e com o
objetivo de associarem-se para a felicidade e para canseiras da vida. O eleito do casamento, à
face da religião e das leis, estaria na união de dois seres humanos no mesmo culto doméstico,
fazendo deles nascer um terceiro, apto para continuador desse culto (VENOSA apud
TEIXEIRA, 2009. p. 5).
Durante a Idade Média as relações de família regiam-se exclusivamente pelo direito
canônico, sendo o casamento religioso o único modo de constituir uma família. Embora as
normas romanas continuassem a exercer bastante influência no tocante ao pátrio poder e as
6
3
ASSIS, Reinaldo Mendes de. União entre homosexuais:aspectos gerais e patrimoniais . Jus Navigandi, Teresina, ano
6, n. 52, nov. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2432>. Acesso em:02 junho 2010.
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Podemos dizer que a família brasileira, como hoje é conceituada, sofreu forte
influência da família romana, da família canônica e da família germânica.
Nota-se, portanto, que a família apresenta-se como uma instituição que nasce e
desenvolve-se com casamento entre homem e mulher, portanto, merecedora de ampla proteção
do Estado, o qual confere à família o status de célula mater4 de sua organização social.
Posto isto, percebe-se, ainda, que a família constitui a base de toda a estrutura da
sociedade, pois nela se assentam não só colunas econômicas, como se esteiam as raízes
morais da organização social. Por conseguinte, o Estado, para preservação de sua própria
sobrevivência, tem interesse primário em proteger a família, por meio de leis que lhe
assegurem o desenvolvimento estável e a intangibilidade de seus elementos institucionais.
Daí a interferência, por vezes até exagerada, do Estado nas relações familiares.
Contudo, o Estado deve preservar os direitos básicos de autonomia da família e intervir
somente de modo protetor, nunca invasivo da vida privada. Cabendo ao Estado tutelar e
proteger a família, intervindo de forma direta apenas quando essencial para sua própria
estrutura.
4
A família é a pedra fundamental do ser humano e, a galinha dos ovos de ouro do estado, por conseguinte é dever do Estado
resguardar a família e protegê-la.
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A nova Carta Magna trata o casamento como uma das formas para o estabelecimento de
uma família, porém não a única. Ou seja, o artigo 226 da Constituição de 1988 diz apenas que
a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. Isto é, o vínculo familiar não se
restringe a existência do casamento, portanto, família do novo milênio continua a ser o
elemento essencial de formação da sociedade constituindo a base do Estado, por isso
merecedora de proteção especial do Estado.
Nesse diapasão, Silvio Rodrigues afirma que a Constituição vigente não só deu maior
amplitude ao conceito de família, abrangendo a família havida fora do casamento, com
origem na união estável entre o homem e a mulher, bem como, aquela composta por um dos
progenitores e sua descendência, ou seja, a família monoparental.
A família, segundo os conceitos atuais e sob o prisma constitucional, é uma família
plural, ou seja, o casamento deixa de ser a única forma de constituição do vínculo familiar,
dando lugar a outras formas para a constituição da família.
Segundo Maria Berenice Dias:
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Com todas essas mudanças, a família passa ser o local de realização do afeto, e a
procriação deixa de ser uma função básica. Isto é, a procriação continua importante, porém
essa função não representa mais uma obrigação.
Nesse patamar, é preciso lembrar que o casamento era o único lugar onde se poderiam
manter relações sexuais de forma legitimada. No tema da procriação, contribuíram para a
desmistificação da importância funcional, em primeiro lugar, a possibilidade de domínio do
corpo da mulher com a descoberta da pílula anticoncepcional e, de forma também
significativa, os novos meios de reprodução assistida. (TEIXEIRA; RIBEIRO, 2008, p. 56)
propósito de proteger apenas a família constituída pelo casamento, ignorando, então, uma
situação de fato, digna de qualquer amparo. Nesse sentido, transfiro:
O Código Civil, que data de 1916, além de se omitir em regular as uniões extra-
matrimoniais, restou por puni-las, o que, no entanto, não logrou impedir o
surgimento de relação sem vínculo legal. Na tentativa de deferir alguns afeitos
patrimoniais, mas sem ver no concubinato um relacionamento familiar análogo ao
casamento. De primeiro se concedia a mulher indenização por serviços domésticos,
talvez em compensação dos serviços de cama e mesa prestados por ela. No máximo
chegou ao reconhecimento de uma sociedade de fato, tão só para evitar que o acervo
adquirido durante sua vigência não ficasse nas mãos de apenas um dos sócios,
normalmente da mulher. A dificuldade em aceitar que essas uniões configuram uma
entidade familiar, persistiu até depois de haver a Constituição Federal (DIAS, 2001,
p. 93).
Contudo, a Constituição de 1988, em seu artigo 226, 3º, objetivando suprir a omissão do
legislador de 1916 diz que: “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união
estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua
conversão em casamento”.
Uma vez que os homossexuais mantenham relações de afeto, duradouras, públicas com
o intuito de formar uma família, eles podem ter seu relacionamento equiparado à união
estável? Nota-se, atualmente, através de julgados, numa análise da Teoria Tridimensional do
Direito, que:
Hoje a nossa sociedade considera valor Social relevante a situação jurídica daqueles
que optam por uma preferência sexual diversa, daquela que a nossa sociedade
considera certa. Consideramos que a busca da felicidade é preceito fundamental
destinada a toda humanidade. Aliás, o bem-estar é um direito natural, ou seja,
verifica-se aí a transnacionalização de seus preceitos, que servem de impulso para o
desenvolvimento da Ciência do Direito, bem como do Movimento Positivista.
(CARMO, 2003, p. 20)
pelo Código Civil de 2002, no artigo 1.723, é possível traçar um paralelo entre união estável
heterossexual e a união homossexual, destacando inúmeras semelhanças.
Para tanto, é importante, reconhecer as características essenciais para a configuração das
uniões estáveis proposta no artigo 1.723 do Código Civil de 2002: “É reconhecida como
entidade familiar a união entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública,
contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.”
Primeiro: para configurar a união estável é necessário que os conviventes possuam uma
vida social pautada na convivência pública e, coincidentemente, os homossexuais não
pretendem esconder o que sentem por seus parceiros, buscado, então, o reconhecimento das
relações homoafetivas como geradoras de direitos. Para ilustrar o requisito citado acima, ora se
transcreve:
Segundo: no quesito estabilidade, o atual Código Civil coloca como pressuposto para a
constituição de uma união estável a convivência contínua e duradoura entre seus
companheiros. Nesse sentido, podemos observar a existência de diversos casos de pessoas, do
mesmo sexo, que vivem juntas. Conforme demonstrado abaixo:
Por último, e como os meios devem justificar os fins, os pontos destacados acima
devem caracterizar o intuito de constituição de uma família. Portanto, é importante ressaltar
que nenhuma espécie de vínculo que tenha por base o afeto pode deixar de conferir o status de
família, pois a Constituição Federal consagra em norma pétrea, o respeito à dignidade
humana. (DIAS; 2008, p. 53)
Apesar de, atualmente, existir um número expressivo de decisões que reconheçam
direitos previdenciários ao parceiro sobrevivente, além do pioneirismo do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul por formar ao longo de quase uma década, uma sólida jurisprudência
que aos poucos está sendo seguida por outros Estados, reconhecendo não só a união estável,
mas também a competência das varas de família para seu julgamento. Ainda hoje, conforme
afirma o Ministro Marco Aurélio Mello, “aos olhos do judiciário as relações homoafetivas
não são consideradas como geradoras de direito.” (MELLO; 2007, p. 22)
No entanto, apesar do grande número de decisões judiciais favoráveis, o que ainda tem
sido argumentado para impedir a equiparação da união homossexual à união estável é a
ausência do pressuposto da diversidade de sexos:
Além desse projeto de lei, o PEC5 n. 139/1995, de autoria da mesma deputada, que
objetivava alterar a CF/88 para incorporar aos objetivos da República Federativa do Brasil a
liberdade de orientação sexual, foi arquivado em 1999 pela Mesa da Câmara dos Deputados.
Embora a interdição Constitucional alega ser parcialmente procedente, uma vez que da
análise gramatical do § 3º. do artigo 226 da Constituição Federal, do artigo 1º da Lei nº.
9.278/96 e do artigo 1.723 do Código Civil resulta tal conclusão, tem-se por outro lado, que o
referido dispositivo não pode ser encarado de forma isolada, seja dentro do próprio artigo,
seja dentro do texto constitucional como um todo. (SÉGUIN; 2009, p. 92)
E justamente adotando uma visão integrada do § 3º. do artigo 226 com as demais
disposições da Constituição, é que se verifica a possibilidade de equiparação da união estável
com a união homossexual. Primeiro, por força de seu caput, que estabelece “especial proteção
do Estado” à família. Segundo, pelos direitos fundamentais assegurados pela Carta e os
objetivos e fundamentos da República.
Ainda, na trilha da interpretação do § 3º. do artigo 226 dentro do contexto
constitucional em sua totalidade, como já anunciado, não há como escapar da leitura do
Direito de Família à luz dos princípios Constitucionais.
A expressão diálogo das fontes foi criada por Erik Jayme justamente para se
contrapor à expressão antes usada, ou seja, de “conflitos de leis no tempo”. (MARQUES;
MIRAGE, BAIJAMIM, 2008, p. 88).
“Diálogo” porque, diferentemente do que ocorria nos conflitos de leis no tempo,
ocorre aplicação conjunta de duas normas ao mesmo tempo e ao mesmo caso, seja
5
Projeto de Emenda Constitucional
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Deve-se entender que o Direito de Família, necessariamente, merece ser analisado sob o
prisma da Constituição Federal, o que traz uma nova dimensão de tratamento dessa
disciplina. Assim sendo, é imperioso analisar os institutos de Direito Privado, tendo como
fonte de origem a Constituição Federal de 1988, o que leva ao caminho sem volta do Direito
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Civil Constitucional. Ou seja, na atualidade, não é correto fazer referência ao Código Civil
sem analisar a Constituição, pois a constituição, ao outorgar proteção à família, independente
da celebração do casamento, criou um novo conceito de entidade familiar, albergando
vínculos outros.
Para tanto, é importante conhecer a necessidade da constitucionalização do Direito de
Família, pois grande parte do Direito Civil foi englobado pela norma Ápice. Para tanto, os
antigos princípios do Direito de Família foram aniquilados, surgindo outros, e, dentro dessa
proposta de constitucionalização, remodelando esse ramo jurídico. Muitos desses princípios
são cláusulas gerais, janelas abertas deixadas pelo legislador para nosso preenchimento, para
complementação pelo aplicador do Direito.
Prevê o art. 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988 que o nosso Estado,
Democrático de Direito, tem como fundamento a dignidade da pessoa humana.
PRINCÍPIO DA ISONOMIA
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Deve-se mencionar, também, o Código Civil de 1916 que trata a família no molde
patriarcal, fundada no casamento, no patrimônio, hierarquizada e heterossexual, demarcando as
funções do homem e da mulher e determinando as formas de conduta para cada um. Nesse
período, toda a administração familiar ou patrimonial, estava a cargo exclusivo do homem, a
mulher por sua vez estava inteiramente à margem da direção familiar, cabendo-lhe, apenas, o
papel de esposa e mãe.
Até 1962, a capacidade da mulher casada, por força do artigo 6º do Código Civil
Brasileiro, era considerada relativa, ou seja, considerava-se normal a chefia exclusiva do lar
obrigação do marido, conforme Lourival Serejo:
No entanto, logo de início, a atual Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso I, faz
menção ao princípio da isonomia, determinando que homens e mulheres são iguais em
direitos e obrigações. Essa mudança provocou inúmeras consequências jurídicas e deu nova
postura às relações entre os cônjuges, pois o Código vigente aboliu a hierarquia entre os
cônjuges, passando a conceituar-se o matrimônio como a união permanente entre a mulher e o
homem, de acordo com a lei, a fim de se assistirem mutuamente.
Isto é, isonomia jurídica, regulamentação instituída no artigo 226, §5 da norma Ápice
vigente, acaba com o poder marital e com o sistema que enquadra a mulher, restringindo-a à
tarefas domésticas e à procriação. Com isso, as decisões devem ser tomadas em comum acordo
entre os cônjuges ou companheiros.
Um dos fatores determinantes para esta isonomia aconteceu quando a mulher saiu para o
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mercado de trabalho, assumindo uma carreira, uma casa, filhos, enfim, uma família. Ao
conquistar a independência financeira e, muitas vezes, sustentar a família, ela conquistou a
isonomia jurídica conjugal. Ou seja, com o aumento do poder aquisitivo que, numa sociedade
capitalista como a nossa, lhe deu condições de igualdade.
Nesse sentido, o princípio da isonomia, tratado pela Constituição, trouxe reflexos para o
Código Civil, isto é, com base nesse princípio, eliminou-se uma série de artigos que refletia
uma época de patriarcalismo.
Assim, pela ótica constitucional, discute-se sobre a permanência do artigo 223 do
Código Civil, que confere a chefia da sociedade conjugal ao marido.
PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE
pouco contribuem para clarear a relação entre pais e filhos, pois a imputação da
paternidade biológica não substitui a convivência, a construção permanente dos
laços afetivos. O biodireito depara-se com as consequências da dação anônima de
sêmen humano ou de material genético feminino. Nenhuma legislação até agora
editada, nenhuma conclusão da bioética não é mais determinante, imposto-se
profundas transformações na legislação infraconstitucional e no afazer dos
aplicadores do direito, ainda fascinados com as maravilhas das descobertas
científica. Em suma, a identidade genérica não se confunde com a identidade da
filiação, tecida na complexidade das relações afetivas, que o ser humano constrói
entre a liberdade e o desejo.6
Nesse sentido, ainda que a sociedade não aceite essa nova realidade, não é coerente que
a Justiça decida de modo a desconsiderar o afeto existente entre duas pessoas usando como
justificativa, para tanto, a falta de diversidade de sexo.
Prevê o artigo 1.513 do Código Civil em vigor, que é defeso a qualquer pessoa de
direito público ou direito privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família. Trata-
se da consagração do princípio da liberdade ou da não-intervenção na ótica do Direito de
Família.
6
LOBO, Paulo Luiz Netto. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Disponível em:
http://www.ibdfam.com.br/public/artigos.aspx?codigo=109 Acessado em: 05/01/2010
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Por certo que o princípio em questão mantém relação direta com o princípio da
autonomia privada, que também deve existir no âmbito do Direito de Família. A autonomia
privada não existe apenas em sede contratual ou obrigacional, mas também em sede familiar.
Quando escolhemos, na escalada do afeto, com quem ficar, com quem namorar, com quem ter
uma união estável ou com quem casar, estamos falando em autonomia privada, obviamente.
Retornando ao art. 1.513, do Código Civil em vigor, ressalta-se que o real sentido do
texto legal é que o Estado ou mesmo um ente privado, não pode intervir coativamente nas
relações de família. Entretanto, o Estado poderá incentivar o controle da natalidade e o
planejamento familiar por meio de políticas públicas. Vale lembrar, também, que a
Constituição Federal de 1988 incentiva a paternidade responsável e o próprio planejamento
familiar, devendo o Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício
desses direitos, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais e privadas
(art. 227, § 7º da CF/88). Além disso, o Estado deve assegurar a assistência à família na
pessoa de cada um dos que a integra, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito
de suas relações (art. 227, § 8º da CF/88).
JULGADOS
Segundo Maria Berenice Dias (2008, p. 6), apesar da falta de legislação específica, as
uniões homoafetivas, assim como as uniões heterossexuais estáveis, percorrem o caminho em
busca da legalidade. No entanto, não é justo que nesse percurso não se reconheça que a
convivência entre duas pessoas deva ser baseada no afeto e, portanto, submeter às uniões
homossexuais a “invisibilidade perante a legislação”. Portanto, não é coerente que a
imparcialidade do Poder Judiciário seja empregada para abstê-lo de questões que precisam ser
resolvidas, pois a diversidade necessita ser respeitada e não mais se concebe conviver com a
exclusão e o preconceito.
A justiça não é cega nem surda, também não pode ser muda! Precisa, portanto, ter os
olhos abertos para ver a realidade social, os ouvidos atentos para ouvir o clamor do que por
ela esperam, e coragem para dizer o direito em consonância com a justiça (DIAS, 2008, p.53).
25
Nesse sentido, afirma o ministro Marco Aurélio Mello (2007, p. 23) que: o Poder
Judiciário gaúcho sobressai pela modernidade, uma vez que foi o primeiro a julgar ações
concernentes a vínculos homoafetivos na Vara de Família e não na Vara Civil. Por
conseguinte explica que:
O relator José Ataídes Siqueira Trindade justifica seu voto de forma magnífica, isto é:
26
CONSIDERAÇÕES FINAIS
7
Advocacia-Geral da União
8
CRUZ. Maria Luiza Povoa. AGU reconhece união homoafetiva para fins previdenciários, Disponível em: <
http://marialuizapovoa.com.br/marialuizapovoa/principal.asp>. Acesso em 12/06/2010
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não sejam mais reconhecidas como sociedades de fato, o que gera apenas direitos obrigacionais
e patrimoniais, mas sim como entidades familiares plenas.
Mostrou-se o instituto da união estável e, detectou-se com mais clareza o porquê da
possibilidade de enquadrar as uniões homossexuais, analogicamente, ao caso previsto no
parágrafo 3º do artigo 226 da Constituição Federal. As uniões entre pessoas do mesmo sexo
atendem a todos os requisitos previstos em lei, sendo a negativa de reconhecimento dessa
realidade pelo Judiciário uma verdadeira afronta aos princípios constitucionais, base primordial
de todo o ordenamento jurídico.
Aos poucos, porém, importantes avanços conquistados pelos homossexuais para terem
seus direitos reconhecidos, às vezes parecem não ter surtido grandes efeitos, pois ainda temos
sentenças e acórdãos baseados em convicções pessoais, religiosas e culturais.
Enquanto não se entender o Direito como ciência humana, e o Direito de Família como o
ramo mais sensível dessa ciência, não se consegue compreender toda a magnitude e
complexidade da natureza humana, expressa tanto na riqueza das relações afetivas constituídas
pelas pessoas ao longo de suas vidas, quanto em outros aspectos do convívio social.
A orientação sexual do indivíduo não deve ser aspecto predominante de
julgamento moral por parte de ninguém, muito menos por parte do Judiciário. Não se pode
discutir a existência do afeto e do amor nas uniões homossexuais, assim como também não
se pode negar que tais vínculos geram entidades familiares.
Entender as relações homossexuais como núcleo familiar digno da proteção do direito de
família, por analogia, é humanizar o exercício do poder que o Estado exerce sobre o cidadão,
assim como significa, também, auxiliar uma camada da população já tão discriminada e
marginalizada nas demais esferas do convívio social.
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. Porto Alegre: Livraria do
31
Advogado, 2005.
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2007.
REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 27. ed. São Paulo: Saraiva,
2002.
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. 28. ed. São Paulo: Saraiva,
2007.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 9. ed. São Paulo:
Atlas, 2009.