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DIREITO AMBIENTAL

2016
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Resumo elaborado conforme o edital do XVII Concurso Público para Provimento de Cargo de Juiz Federal
Substituto do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, tendo sido adaptado com informações do edital
adotado pelo Tribunal Regional da 3ª Região.

Colaboradores: Fernanda Veloso, Hamilton Araújo, Kenia Rezende, Marcel Bueno, Patricia Vieira, Rodrigo
Lanzer, Stephanie Uille.

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Sumário

Ponto 1 - Conceito. Objeto. Princípios fundamentais. Ações judiciais de proteção ao meio ambiente. ... 10
Desdobramentos do conceito jurídico de meio ambiente ....................................................................................... 10
1.1 Estado “Socioambiental” de Direito ..................................................................................................................... 12
1.2 Objeto ............................................................................................................................................................................ 12
1.4 Princípios fundamentais do Direito Ambiental.................................................................................................. 14
1.4.1 Princípio do Meio Ambiente como Direito Humano Fundamental ................................................................. 14
1.4.2 Princípio da Prevenção .................................................................................................................................................. 15
1.4.3 Princípio da precaução (vorsorgeprinzip) ................................................................................................................ 15
1.4.4 Princípio do Poluidor-Pagador ou da Responsabilização .................................................................................... 16
1.4.5 Princípio do Usuário-Pagador...................................................................................................................................... 18
1.4.6 Princípio do Protetor-Recebedor ............................................................................................................................... 18
1.4.7 Princípio do Desenvolvimento Sustentável ou Ecodesenvolvimento ............................................................. 18
1.4.8 Princípio do Ambiente Ecologicamente Equilibrado ............................................................................................ 19
1.4.9 Princípio da Obrigatoriedade de Atuação (princípio da natureza pública da proteção ambiental) ...... 19
1.4.10 Princípio da Participação Comunitária (Princípio Democrático/Cooperação) ................................. 19
1.4.11 Princípio da Publicidade ou da Informação ................................................................................................ 20
1.4.12 Princípio da Educação Ambiental .................................................................................................................. 20
1.4.13 Princípio da Função Socioambiental da Propriedade .............................................................................. 20
1.4.14 Princípio do Equilíbrio (ou proporcionalidade) ......................................................................................... 20
1.4.15 Princípio do Acesso equitativo aos Recursos Naturais............................................................................ 22
1.4.16 Princípio do Limite ou Princípio do Controle do Poluidor pelo Poder Público ................................ 22
1.4.17 ‘Princípio da Ubiquidade (Princípio da Variável Ambiental no processo decisório das políticas
públicas) (Princípio da Transversalidade) ........................................................................................................................... 22
1.4.18 Princípio do Direito à Sadia Qualidade de Vida ......................................................................................... 23
1.4.19 Princípio da Reparação Integral ..................................................................................................................... 23
1.4.20 Princípio da Solidariedade Intergeracional ................................................................................................. 24
1.4.21 Princípio da Proibição do Retrocesso Ecológico (Canotilho) ou “non clicquet” ambiental .......... 24
1.2.1 É inadmissível o recuo da salvaguarda ambiental para níveis de proteção inferiores aos já
consagrados, exceto se as circunstâncias de fato sejam significativamente alteradas. ....................................... 24
1.4.22 Princípio do Progresso Ecológico (Canotilho) ............................................................................................ 24
1.4.23 Princípio da Correção na Fonte (Canotilho) ............................................................................................... 24
1.4.24 Princípio da Responsabilidade Social (ou Princípio do Equador) ......................................................... 25
1.4.25 Princípio do Mínimo Existencial Ecológico (STJ)........................................................................................ 25
1.4.26 Princípio da Cooperação entre os povos ..................................................................................................... 25
1.4.27 Princípio da Moralidade Ambiental (TRF 1)................................................................................................ 25
1.5Ações judiciais de proteção ao meio ambiente. ................................................................................ 25
Ponto 2 - O Direito Ambiental como Direito Econômico. A natureza econômica das normas de Direito
Ambiental. ........................................................................................................................................... 30
2.1 O Direito Ambiental como direito econômico....................................................................................................... 31
2.2 Princípios ambientais com viés econômico ............................................................................................................ 31
2.3 Economia verde .............................................................................................................................................................. 32
Ponto 3 - Normas constitucionais relativas à proteção ambiental. ......................................................... 35
3.1 Histórico do D. Ambiental nas Constituições brasileiras ................................................................................ 35
3.1.1 Constituições anteriores ............................................................................................................................................... 35
3.1.2 Constituição de 1988 ..................................................................................................................................................... 36
3.1.2.1 Introdução.................................................................................................................................................... 36
3.1.2.2 Art. 225 CF.................................................................................................................................................... 37
3.1.2.3 Caput – norma matriz................................................................................................................................... 37
4
3.1.2.4 Parágrafo 1º - Deveres específicos do Poder Público na tutela do meio ambiente .................. 38
3.1.2.5 Determinações específicas para áreas e situações que merecem proteção constitucional ... 40
Ponto 4 – Repartição de competências em matéria ambiental .............................................................. 42
4.1. Introdução ....................................................................................................................................................................... 42
4.2. Critérios para definição de competências ............................................................................................................. 43
4.2.1. Critérios utilizados pelo STF ........................................................................................................................................ 43
4.3. Competência Legislativa ............................................................................................................................................. 44
4.3.1. União 46
4.3.2. Estados e DF ..................................................................................................................................................................... 47
4.3.3. Municípios ........................................................................................................................................................................ 48
4.4. Competência Material ................................................................................................................................................. 49
4.4.1. Competência da União ................................................................................................................................................. 51
4.3.2. Competência dos Estados e DF .................................................................................................................................. 52
4.3.3. Competência dos Municípios ..................................................................................................................................... 52
4.4. A LEI COMPLEMENTAR 140/2001 – Regulamentação da Repartição de Competências Administrativas
em Matéria Ambiental ......................................................................................................................................................... 52
4.4.1.1 Instrumentos de Cooperação .................................................................................................................... 53
4.4.1.2 Ações de Cooperação ................................................................................................................................... 54
4.4.3. Competência dos Estados e do DF ............................................................................................................................ 57
4.4.4. Competência dos Municípios e do DF ...................................................................................................................... 57
Ponto 5 - Zoneamento Ambiental. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. ........... 60
5.1. Zoneamento Ambiental .............................................................................................................................................. 60
5.2. Unidades de Conservação. ......................................................................................................................................... 61
5.2.1 Gestão do Sistema Nacional de Unidades de Conservação................................................................................ 62
5.2.1.1 Unidades em Espécie.................................................................................................................................... 62
5.2.3 Criação, Implantação e Gestão das Unidades de Conservação ......................................................................... 67
Ponto 6 - Poder de polícia e Direito Ambiental. Licenciamento ambiental. Infrações ambientais.
Biossegurança. ..................................................................................................................................... 75
6.1 Poder de Polícia e Direito Ambiental.................................................................................................................... 75
6.1.1 Poder de Polícia Ambiental X Competência para Licenciamento..................................................................... 76
6.2 Licenciamento Ambiental ........................................................................................................................................ 77
6.2.1 Critérios para fixação da Competência Ambiental ....................................................................................... 82
6.3 A Responsabilidade Administrativa Ambiental ................................................................................................. 87
6.3.1 Caracterização da Infração Administrativa Ambiental ................................................................................ 87
6.3.2 Responsabilidade administrativa de natureza objetiva ou subjetiva?.................................................... 88
6.3.3 Sanções Administrativas Em Espécie ................................................................................................................ 92
6.3.3.1 Advertência – art. 72, I, e §2º, Lei e art. 2º, I, e §2º, Decreto ................................................................ 92
6.3.3.2 Multa Simples – art. 72, II, e §§ 3º e 4º, Lei e art. 8º e ss do Decreto 6.514/08 .............................. 93
6.3.3.3 Multa Diária – art. 72, III, e §5º, Lei e art. 10 do Decreto 6.514/08 ..................................................... 93
6.3.3.4 Apreensão de animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos,
equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração ............................................................. 93
6.3.3.5 Destruição ou Inutilização do Produto.......................................................................................................... 93
6.3.3.6 Suspensão de venda e fabricação do produto - art. 72, VI, e §7º, Lei e art. 3º, VI, Decreto
6.514/08 94
6.3.3.7 Embargo Ou Interdição De Obra Ou Atividade - art. 72, VII, e §7º, Lei e art. 3º, VII, Decreto
6.514/08 94
6.3.3.8 Demolição de obra - art. 72, VIII, e §7º, Lei e art. 3º, VIII, Decreto 6.514/08 ................................... 94
6.3.3.9 Suspensão Parcial Ou Total Das Atividades - Art. 72, IX, E §7º, Lei E Art. 3º, IX, Decreto 6.514/97
95
6.3.3.10 Restritivas De Direitos - Art. 72, XI, E §8º, Lei e Art. 3º, X, Decreto 6.514/08 ................................ 95
6.4 Biossegurança .............................................................................................................................................................. 95

5
6.4.1 Órgãos e Entidades de Biossegurança no Brasil ............................................................................................ 95
6.4.1.1 Conselho Nacional De Biossegurança – CNBS............................................................................................. 95
6.4.1.1 Comissão Técnica Nacional De Biossegurança – Ctnbio. ......................................................................... 96
6.4.1.1 Comissão Interna De Biossegurança – Cibio. .............................................................................................. 97
6.4.1.1 Órgãos e Entidades de Registro e Fiscalização. .......................................................................................... 97
Ponto 7 - Responsabilidade ambiental. Conceito de dano. A reparação do dano ambiental. Dano moral
coletivo. ............................................................................................................................................... 97
7.1 Responsabilidade ambiental ................................................................................................................................... 97
7.1.1. Dano ambiental .............................................................................................................................................................. 98
7.1.2. Reparação do dano ..................................................................................................................................................... 101
7.2.1.1 Cumulação de deveres: ......................................................................................................................... 102
7.1.2.1.1 Embasamento normativo................................................................................................................................ 103
7.1.2.1.2 Teoria adotada: Teoria do risco Integral .................................................................................................... 103
7.1.2.1.3 Obrigação Propter Rem e dispensabilidade do nexo de causalidade ................................................ 105
7.1.2.1.4 Responsabilidade ambiental da Pessoa Jurídica de Direito Público .................................................. 105
7.1.2.1.5 Vedação da Intervenção de Terceiros Devedores Solidários (Denunciação à Lide ou
Chamamento Ao Processo). ................................................................................................................................................. 106
7.1.2.1.6 Os profissionais do licenciamento ou do EIA/RIMA ................................................................................ 106
7.1.2.1.7 Desconsideração Da Personalidade Jurídica. Teoria Menor................................................................. 106
7.1.2.1.8 Inversão do Ônus da Prova:............................................................................................................................ 106
7.1.2.1.9 Provimento não Requerido na Inicial .......................................................................................................... 107
7.1.2.1.10 Fungibilidade: ................................................................................................................................................... 107
7.3 Dano moral ambiental ................................................................................................................................................ 107
7.3.1. Punitive Damage (STJ)................................................................................................................................................ 108
Ponto 8 - Sistema nacional do meio ambiente. Política Nacional do Meio Ambiente ........................... 109
8.1 Sistema Nacional do Meio Ambiente ................................................................................................................ 109
8.1.1 Estrutura do SISNAMA................................................................................................................................................ 109
8.1.2 SISNAMA e a gestão do meio ambiente ............................................................................................................... 110
8.2 Política nacional do meio ambiente ................................................................................................................... 111
8.2.1 Dos princípios e objetivos.......................................................................................................................................... 111
8.2.2 Dos conceitos ................................................................................................................................................................ 112
8.2.3 Dos instrumentos da PNMA (art. 9°) ...................................................................................................................... 113
8.2.3.1. Servidão Ambiental (art. 9-A)............................................................................................................... 114
8.2.3.2 Incentivos Governamentais (art. 12) ................................................................................................... 115
8.2.4 Taxa de controle e fiscalização ambiental ............................................................................................................ 116
Ponto 9 - Estudo de impacto ambiental. Conceito. Competências. Natureza jurídica. Requisitos. ......... 116
9.1 Conceito e Natureza Jurídica ................................................................................................................................ 116
9.2 Requisitos ................................................................................................................................................................... 117
9.3 Competências ........................................................................................................................................................... 120
9.4 Questões complementares sobre o tema ........................................................................................................ 120
Ponto 10 - Biodiversidade. Principais instrumentos de proteção internacional. Acesso. Política nacional.
Proteção jurídica do conhecimento tradicional associado ................................................................... 121
10.1 Biodiversidade........................................................................................................................................................ 121
10.1.1 Conceitos ........................................................................................................................................................... 121
10.1.2 Convenções de âmbito global e aplicação geral .................................................................................... 122
10.1.2.1 Convenção sobre comércio Internacional das Espécies da Flora e da Fauna Selvagens em
Perigo de Extinção (CITES) ...................................................................................................................................... 122
10.1.2.2 Convenção sobre a Diversidade Biológica (UNCBD) .................................................................. 122
10.1.3 Acesso e Proteção Jurídica ao Conhecimento Tradicional .................................................................. 123
10.1.4 Caráter erga omnes das normas que tratam de biodiversidade....................................................... 123
10.1.5 Aspectos gerais da Convenção sobre a Diversidade Biológica .......................................................... 123
6
10.1.6 Biopirataria ........................................................................................................................................................ 124
10.1.6.1 Proteção jurídica do conhecimento tradicional associado ...................................................... 124
10.1.6.2 Proteção do conhecimento tradicional associado ..................................................................... 125
Ponto 11 - Proteção às florestas.......................................................................................................... 127
11.1 Novo Código Florestal – Notas Gerais............................................................................................................. 127
11.2 Áreas (Florestais) de Preservação Permanente (APP)................................................................................ 128
11.2.1 Florestas de preservação permanente pelo efeito do Código Florestal ......................................... 128
11.2.2 Floresta de preservação permanente por ato do Poder público ...................................................... 130
11.2.3 Regime de Proteção das Áreas de Preservação Permanente (arts. 7 e 8) ..................................... 130
11.2.4 APPs e Regras para áreas consolidadas .................................................................................................... 131
11.2.5 Exercício do direito de propriedade em área florestal ........................................................................ 132
11.2.5.1 Indenizabilidade da proteção florestal .......................................................................................... 134
11.3 Gestão das florestas públicas - Lei 11.284/2006 ......................................................................................... 136
11.3.1 Princípios da gestão de florestas públicas ............................................................................................... 136
11.3.2 Da gestão direta ............................................................................................................................................... 136
11.3.3 Da destinação às comunidades locais ....................................................................................................... 137
11.3.4 Concessão florestal ......................................................................................................................................... 137
11.3.4.1 Objeto da concessão ........................................................................................................................... 138
11.3.4.2 Licenciamento ambiental ................................................................................................................... 138
11.3.5 Conceitos relevantes (art. 3o ) ..................................................................................................................... 139
11.3.6 Recursos financeiros oriundos dos preços da concessão florestal ................................................... 139
Ponto 12 - Áreas de preservação permanente e Unidades de conservação. ......................................... 140
Ponto 13. Modificação dos genes pelo homem e meio ambiente. ....................................................... 140
13.1 Atividades e pesquisas com OGM ........................................................................................................................ 143
13.2 Células-Tronco Embrionárias................................................................................................................................. 143
13.3 Proibições da LB (art. 6º): ....................................................................................................................................... 144
13.4 Responsabilidade Civil e Administrativa ............................................................................................................ 144
13.5 Órgãos e entidades de biossegurança no Brasil .............................................................................................. 145
13.6 Sistema de Informação em Biossegurança (SIB) ............................................................................................. 147
13.7 Licenciamento ............................................................................................................................................................ 148
13.8 Tipos penais previstos na lei .................................................................................................................................. 148
13.9 Plantio de OGM em terras indígenas e Unidades de Conservação............................................................ 148
Ponto 14 - Proteção química das culturas e meio ambiente (abarcado pelo ponto 15). ....................... 149
Ponto 15 - Produtos tóxicos. Controle. Transporte. ............................................................................. 149
15.1 Introdução ............................................................................................................................................................... 149
15.2 Competência........................................................................................................................................................... 149
15.2.1 Competência da União .................................................................................................................................. 149
15.2.2 Competência dos Estados e DF ................................................................................................................... 149
15.2.3 Competência dos Municípios....................................................................................................................... 150
15.3 Competência acerca das ações penais ........................................................................................................... 150
15.4 Conceito de Agrotóxico ....................................................................................................................................... 152
15.4.1 Regime Jurídico........................................................................................................................................................... 152
15.4.2 Registro de agrotóxicos ................................................................................................................................. 152
15.4.3. Embalagens de agrotóxicos ................................................................................................................................... 154
15.4.4 Propaganda e venda ....................................................................................................................................... 155
15.4.5 Da receita agronômica ................................................................................................................................... 155
15.5 Responsabilidade civil, administrativa e criminal ........................................................................................ 155
15.6 Transporte de agrotóxicos .................................................................................................................................. 156
15.7 Convenções Internacionais ................................................................................................................................ 156
15.8 Convenção de Basiléia ......................................................................................................................................... 157
15.9 Convenção de Estocolmo.................................................................................................................................... 157
7
15.10 Convenção de Roterdã ...................................................................................................................................... 157
15.11 Outros produtos tóxicos ................................................................................................................................... 158
15.12 Resíduos Sólidos .................................................................................................................................................. 160
Ponto 16 – Recursos hídricos .............................................................................................................. 165
16.1 Regime Jurídico das Águas na CF/88 ............................................................................................................... 165
16.2 O Regime jurídico dos recursos hídricos ........................................................................................................ 166
16.3 Conceitos básicos do Código de Águas ........................................................................................................... 167
1.1 Desapropriação de recursos hídricos ............................................................................................. 169
16.4 Política Nacional de Recursos Hídricos – Lei n9.433/1997 ......................................................................... 169
16.5 Política Nacional de Segurança de Barragens ............................................................................................... 188
Ponto 17 – Mineração ........................................................................................................................ 190
17.1 Introdução ............................................................................................................................................................... 190
17.2 Previsão constitucional........................................................................................................................................ 191
17.3 Mineração em terras indígenas (art. 231) ..................................................................................................... 192
17.4 Mineração e Meio ambiente ............................................................................................................................. 192
17.5 Código de Mineração (DL 227/67) ................................................................................................................... 193
17.5.1 Conceitos básicos ............................................................................................................................................ 193
17.5.2 O Código de Minas e a proteção ao Meio ambiente ............................................................................ 193
17.6 Competências ......................................................................................................................................................... 193
17.7 Regimes de Aproveitamento ............................................................................................................................. 194
17.7.1 Permissão de lavra .......................................................................................................................................... 194
17.7.2 Autorização de pesquisa ............................................................................................................................... 195
17.7.3 Concessão de lavra ......................................................................................................................................... 196
17.7.4 Regime de licenciamento .............................................................................................................................. 196
17.8 Deveres relacionados à exploração minerária ............................................................................................. 196
17.9 Servidão administrativa....................................................................................................................................... 197
17.10 Estudos de Impacto Ambiental e Atividades de Mineração .................................................................. 197
17.11 Atividades com repercussões ambientais ................................................................................................... 199
Ponto 18 - Efetivação da proteção normativa ao meio ambiente: Poder Judiciário, Ministério Público e
Administração Pública. ....................................................................................................................... 199
18.1 Poder Judiciário ..................................................................................................................................................... 199
18.1.2 Termo de Ajustamento de Conduta – TAC .............................................................................................. 201
Ponto 19 - Política energética e meio ambiente .................................................................................. 201
19.1 Breve introdução ................................................................................................................................................... 201
19.2 Política Energética no Brasil ............................................................................................................................... 202
19.3 Petróleo e Gás Natural ........................................................................................................................................ 202
19.4 Biocombustíveis..................................................................................................................................................... 204
19.5 Política Nacional de Conservação e Uso Racional de Energia.................................................................. 205
19.6 Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica ........................................................ 206
19.7 Energia Nuclear ...................................................................................................................................................... 206
19.8 Usinas hidrelétricas .............................................................................................................................................. 207
Ponto 20 – Os indígenas e as suas terras. ............................................................................................ 208
20.1. Fundamentos constitucionais dos direitos indígenas ................................................................................... 209
20.3. Direitos sobre as terras indígenas ...................................................................................................................... 210
20.3.1 Terras tradicionalmente ocupadas pelos índios ............................................................................................... 211
20.3.2 Posse permanente ..................................................................................................................................................... 213
20.3.3 Usufruto exclusivo ..................................................................................................................................................... 213
20.3.4 Mineração em terras indígenas ............................................................................................................................. 213
20.3.5 Demarcação das terras indígenas ......................................................................................................................... 213
20.4. Defesa dos direitos e interesses dos índios ..................................................................................................... 217
20.5. Conhecimento tradicional associado dos índios ao patrimônio genético .............................................. 217
8
20.6. Caso da Usina Belo Monte .................................................................................................................................... 217

9
Ponto 1 - Conceito. Objeto. Princípios fundamentais. Ações judiciais de proteção ao meio ambiente.

Denominação: “Direito ambiental” é mais amplo do que a expressão “direito ecológico” ou “direito da
natureza” por não limitar seu campo de estudo a elementos naturais. ‘Meio Ambiente”: Parte da doutrina
brasileira afirma ser redundante a expressão Meio Ambiente, pois meio significa lugar onde se vive, ao
passo que Ambiente é aquilo que cerca ou envolve os seres ou as coisas. Contudo, o uso consagrou esta
expressão.

Natureza Jurídica: Ramo do Direito Público, por sua relação de proximidade com o Direito Administrativo e
seu forte embasamento constitucional. É uma espécie de direito coletivo no sentido amplo: direito difuso.
A CF afirma ser o meio ambiente bem de uso comum do povo no sentido de direito difuso diferindo,
portanto, do conceito de bem de uso comum do povo previsto no Código Civil.

Conceito Doutrinário: É o ramo do direito que estuda, analisa e regulamenta as questões e os problemas
ambientais e sua relação com o ser humano, voltando-se à proteção do meio ambiente e à melhoria das
condições de vida no planeta.

Conceito Legal: Artigo 3º, I, da Lei nº. 6.938/81 (Politica Nacional de Meio Ambiente – PNMC): “o conjunto
de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege
a vida em todas as suas formas”. (restringe-se ao meio ambiente natural). A Resolução CONMA 306/2002
amplia o conceito da PNMC (“... interações de ordem física, química, biológica, social, cultural e
urbanística...) e não extrapola o seu caráter infralegal, pois apenas explicita algo que é trazido pela própria
CF.

Ressalte-se que a CF não traz conceito de MA.

Desdobramentos do conceito jurídico de meio ambiente

A maior parte da doutrina e da jurisprudência (STF ADI 3540 – 4 primeiros desdobramentos) divide o
conceito de meio ambiente em:

a) meio ambiente natural (ou físico): conjunto de recursos naturais bióticos e abióticos. O meio ambiente
natural é tutelado pelo caput do art. 225 da Constituição Federal e imediatamente, v. g., pelo § 1º, I, III e
VII, desse mesmo artigo.

b) meio ambiente artificial: construído ou alterado pelo ser humano, composto pelos edifícios urbanos
(espaços públicos fechados) e pelos equipamentos comunitários (espaços públicos abertos). O meio
ambiente artificial recebe tratamento constitucional especialmente no capítulo referente à Política Urbana.
A mais importante norma vinculada ao Meio Ambiente Artificial é o Estatuto da Cidade (Lei n.
10.257/2001). Atualmente, também, tem grande relevância o Estatuto da Metrópole.

c) meio ambiente cultural: patrimônio histórico, artístico, paisagístico, ecológico, científico e turístico,
constituído tanto por bens imateriais e materiais. Tutelado especialmente na Seção destinada da Cultura,
em especial no art. 216, da CF; Resolução 306/02 do CONAMA inclui o elemento cultural do meio
ambiente, ampliando a definição legal da LPNMA.

d) meio ambiente do trabalho: conjunto de fatores que se relacionam às condições do trabalho,


compreendendo as relações entre o trabalhador e o meio físico e psicológico em que presta serviços. Não

10
se restringe às relações de caráter empregatício, pois fundamentado na promoção da salubridade e
incolumidade de todo trabalhador, independentemente da atividade, do lugar ou da pessoa que exerça;

e) patrimônio genético: é admitido apenas por parte da doutrina. Trata-se de novo elemento do meio
ambiente, consistente nas informações de origem genética oriundas dos seres vivos de todas as espécies.
Compreende o conhecimento obtido sobre a biodiversidade.

Características: a) O Direito Ambiental é multidisciplinar. Seus conceitos, normas e doutrina


necessariamente recorrem às ciências que estudam o meio ambiente (Biologia, à Geografia, à Agronomia,
Engenharia Florestal, Biotecnologia, Ecologia etc.) Exemplo: Lei de Biossegurança (apresenta inúmeros
conceitos extraídos da biologia). b) Os direitos relativos ao meio ambiente são de terceira geração.

Meio Ambiente como Microbem ou MacroBem: Enquanto microbem os recursos naturais são
considerados individualmente, a exemplo de certa espécie animal ou vegetal, e valorizados de acordo com
a sua utilidade ou valoração econômica. Enquanto Macrobem o meio ambiente não pode ser reduzido a
nenhum de seus elementos, pois existe uma relação de integração e interdependência entre cada um
deles, de maneira que se trata de um bem caracteristicamente indivisível, portanto, mesmo que não tenha
valor econômico ou função social, qualquer recurso natural deve ser protegido.

Concepção Objetiva e Subjetiva de Direito Ambiental: A dimensão objetiva se traduz em parâmetros para
a atuação do Poder Público e do Particular na defesa do Meio Ambiente, assim as responsabilidades a
cargo do Poder Público para garantia da salvaguarda do equilíbrio ecológico, os vetores exegéticos atentos
à preservação ambiental e a atenção ao princípio econômico de preservação ambiental são manifestações
de tal dimensão. Por outro lado, a dimensão subjetiva do meio ambiente é pontuada pela consagração de
prerrogativas de exercício individualizado em prol do equilíbrio ecológico tais como: a legitimidade ativa
conferida a “qualquer cidadão” para a propositura de ação popular que objetive anular ato lesivo ao meio
ambiente, as audiências e as consultas públicas.

1. Conferência de Estocolmo de 1972: frisou-se o Desenvolvimento sustentável e princípio da prevenção;


Um dos seus resultados foi a criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA.
Trata-se de uma agência da ONU responsável por promover a conservação do meio ambiente e o uso
eficiente de recursos no contexto do desenvolvimento sustentável.

2. Comissão Brundtland de 1987 – frisou-se o Desenvolvimento sustentável;

3. Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92) – Introduzido o princípio da


precaução. Não tem natureza jurídica de Tratado. Explicitou princípios como da responsabilidade objetiva,
poluidor-pagador e do desenvolvimento sustentável.

4. Protocolo de Kyoto: firmado em 1997, teve o objetivo precípuo de promover o controle climático da
terra por intermédio da diminuição da emissão de gases de efeito estufa (GEEs). Em 2015, na 21a
Conferencia das Partes (COP21), foi celebrado o Acordo de Paris, no qual os países apresentaram suas
metas de redução de emissão de GEEs, denominadas Pretendidas Contribuições Nacionalmente
Determinadas (Intended Nationally Determined Contributions - iNDC). O Brasil comprometeu-se a reduzir
suas emissões em 37% abaixo dos níveis verificados em 2005, até 2025, com uma contribuição indicativa
(não vinculante) de alcançar 43% abaixo dos níveis de 2005, em 2030. O estabelecimento das metas foi de
extrema relevância, pois era o ponto mais controvertido do Protocolo de Kyoto.

11
5. Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável: realizada em Johannesburgo, em 2002, serviu para
reforçar e acelerar as metas e compromissos firmados nos encontros anteriores.

6. Rio + 20: Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, teve por objetivo “a
renovação do compromisso político com o desenvolvimento sustentável, por meio da avaliação do
progresso e das lacunas na implementação das decisões adotadas pelas principais cúpulas sobre o assunto
e do tratamento de temas novos e emergentes.”

1.1 Estado “Socioambiental” de Direito

Segundo INGO SARLET, HERMAN BENJAMIN e FENSTERSEIFER, atualmente é possível falar em um Estado
Socioambiental de Direito. Percebe-se uma expressiva valorização do meio-ambiente em termos jurídico-
constitucionais, incorporando-se uma consciência ecológica que objetiva assegurar a efetividade dos
programas constitucionais e legislativos de proteção ao meio ambiente. O bem-estar ambiental passa a
constituir uma dimensão da própria dignidade da pessoa humana. A qualidade e segurança ambientais
passam a figurar como elemento integrante do próprio conteúdo normativo do princípio da dignidade da
pessoa humana.

1.2 Objeto

O objeto do Direito Ambiental é a harmonização da natureza, garantida pela manutenção dos ecossistemas
e da sadia qualidade de vida para que o homem possa se desenvolver plenamente. Restaurar, conservar e
preservar são metas a serem alcançadas através deste ramo do Direito, com a participação popular.

Para o autor Marcelo Abelha, o art. 225, caput, da CF dispõe sobre o objeto do direito ambiental: o
equilíbrio ecológico, alcançado através da proteção dos elementos bióticos e abióticos e de todas as formas
de interação entre eles.

Direito ao Meio Ambiente x Direito do Ambiente:

O direito ao meio ambiente reconhece o direito ambiental como um direito fundamental do homem de 3a
dimensão (visão antropocêntrica);

O direito do ambiente rompe com a visão antropocêntrica do direito. Decorre do reconhecimento do valor
ecológico independente do homem. Meio ambiente como sujeito de direito, e não como objeto de direito
(fenômeno da ecologização do direito). Alinhada ao biocentrismo e ao ecocentrismo .

1.3 Evolução histórica do Direito Ambiental

A evolução histórica do DA é dividida em três momentos: fase individualista, fase fragmentária e fase
holística.

1.Fase individualista ou de exploração desregrada (propriedade individual)

Inicia-se com o descobrimento do Brasil e termina na década de 50.

Características: inexistência da preocupação com as questões ambientais; as poucas normas sobre o


assunte tinham feição privatística, já que o MA não era considerado um bem autônomo.

2.Fase fragmentária (utilidade econômica)

12
A partir da década de 50 e mais enfaticamente na década de 60,;

Características: surgimento de legislação voltada ao controle das atividades exploratórias dos recursos
naturais, v.g., água, fauna e flora; o MA ainda não era considerado bem autônomo. Somente recursos
naturais com valor econômico recebiam proteção jurídica.

3.Fase holística (valor em si mesmo)

A partir da lei 6.938/81.

Características: É marcada pela compreensão do MA como um todo integrado; a defesa do MA começou a


ser considerada uma finalidade em si mesma; A autonomia científica do Direito Ambiental foi reconhecida.
O marco legislativo mais importante foi a CF/88, que dedicou um capítulo inteiro ao MA.

4. Antropocentrismo e Biocentrismo

No antropocentrismo o ser humano é apontado como titular e destinatário de todos os recursos naturais
existentes, devendo a proteção do MA ocorrer apenas na medida necessária para que os interesses
humanos sejam resguardados.

Fala-se, ainda, em Antropocentrismo utilitarista, quando se considera a natureza como principal fonte de
recurso para atender as necessidades do ser humano; ou, ainda, em antropocentrismo protecionista,
quando a natureza é tomada como um bem coletivo essencial que deve ser preservado como garantia de
sobrevivência e bem-estar do homem, impondo-se equilíbrio entre as atividades humanas e os processos
ecológicos.

Já no biocentrismo, cada recurso natural possui um valor instrínseco e deve ser protegido em razão de sua
função ecológica, pois os seres vivos e os elementos que propiciam a vida fazem parte de um sistema
integrado e interdepentente, sendo o ser humano apenas uma parte dessa complexa teia.

A CF/88, ao estabelecer no caput do art. 225 o direito de todos ao MA ecologicamente equilibrado, adotou
o paradigma antropocêntrico, já que nessa passagem constitucional, o equilibrio ambiental serve aos seres
humanos.

Já o inciso VII, do par. 1, do art. 225, que determina que o Poder Público proteja a fauna e a flora, vedadas,
na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de
espécies ou submetam os animais à crueldade, foi inspirado primordialmente nas linhas ecocêntricas e
principalmente biocêntricas.

Morato Leite afirma que a CF adota o antropocentrismo protecionista, ou para alguns doutrinadores, o
antropocentrismo alargado, não se restringindo o ambiente a mera concepção econômica ou de
subalternalidade direta a interesses humanos.

Meio Ambiente – Preservação x Conservação

Preservação - manter o meio ambiente intocado, sem ações do homem. É não interferir na biota (conjunto
de seres vivos que vive num determinado sistema). A preservação deve ser exceção diante do princípio do
desenvolvimento, por isso é melhor a utilização da expressão conservação.

Conservação - integração do meio ambiente com as atividades desenvolvidas pelo homem.

13
Titularidade do Meio Ambiente (art. 225 da CF)

Teoria Minimalista: a expressão “todos” do dispositivo se refere a todos que estão sujeitos ao regime
constitucional - visão antropocêntrica.

Teoria Maximalista: a expressão “todos” do dispositivo se refere a todos que integram o meio ambiente,
não apenas os homens, mas também a fauna e a flora.

No ordenamento brasileiro não é possível defender os animais como sujeitos de direito, mas o art. 225, §
1º, VII, que dispõe acerca da proteção da fauna e da flora e proíbe que se submetam os animais à
crueldade, representa uma aproximação dessa concepção.

Direito Fundamental ao Meio Ambiente

A divisão histórica dos direitos humanos em dimensões ou gerações (primeira, segunda e terceira, havendo
respeitável doutrina que amplia este rol – ver resumo de direito constitucional) correlaciona os direitos de
primeira dimensão às liberdades individuais (direitos civis e políticos) e ao caráter absenteísta estatal. A
segunda dimensão (direitos sociais, econômicos e culturais) surge após a revolução industrial e passa a
tutelar os direitos à igualdade social, surgindo o Estado social e prestacional. A terceira dimensão é
caracterizada pelos surgimento dos direitos coletivos, transindividuais, caracterizados pelos valores de
solidariedade, dentre os quais destacamos o direito ao Meio Ambiente.

Norberto Bobbio (1992, p. 43), ao se referir ao problema dos direitos humanos de terceira geração, afirmou
que o mais importante deles é o reivindicado pelos movimentos ecológicos: o direito de viver num
ambiente não poluído. No mesmo sentido, Manoel Gonçalves Ferreira Filho: “De todos os direitos de
terceira geração, sem dúvida o mais elaborado é o direito ao meio ambiente”.

Neste sentido, o Artigo 5º da Constituição Federal, que cuida dos direitos e garantias fundamentais, faz
menção expressa ao meio ambiente, a teor do inciso LXXIII, arrolando-o como um dos objetos da ação
popular. Logo, se é uma garantia fundamental do cidadão a existência de uma ação constitucional com a
finalidade de defesa do meio ambiente, conclui-se que o desfrute das condições saudáveis do meio
ambiente é, efetivamente, um direito fundamental do ser humano.

Ademais, conforme já o proclamou o Supremo Tribunal Federal, trata-se de um direito típico de terceira
geração que assiste, de modo subjetivamente indeterminado, a todo gênero humano ((RTJ 158/205-206).

1.4 Princípios fundamentais do Direito Ambiental

1.4.1 Princípio do Meio Ambiente como Direito Humano


Fundamental

Apesar de não estar contido no rol do artigo 5º da CF, o meio ambiente é considerado um direito
fundamental, sendo uma extensão do direito à vida e necessário à pessoa humana. Está previsto
expressamente no artigo 225 da Constituição Federal.

A subsunção da questão ambiental à busca da qualidade de vida se apresenta como elemento de


encontro do direito ambiental com a dignidade da pessoa humana, fato que se apresenta como
fundamento para ligar o meio ambiente a: a) um dos fundamentos da república federativa do Brasil
(dignidade da pessoa humana); b) um dos princípios que rege relação internacional (prevalência dos
Direitos Humanos).
14
O direito fundamental ao meio ambiente equilibrado já havia sido reconhecido pela Conferência das
Nações Unidas sobre o Ambiente Humano de 1972 (Princípio 1). Mais tarde, foi reafirmado na Rio 92
(Princípio 1) e, em 1997, pela Carta da Terra (Princípio 4).

O STJ, por se tratar de um direito fundamental, inerente à vida, a qualidade do meio ambiente é
essencial devendo ser resguardado pelo manto da imprescritibilidade. Ademais, tal princípio está ligado
ao do mínimo existencial ecológico, que apregoa condições mínimas de preservação dos recursos
naturais para a sobrevivência de todas as espécies.

1.4.2 Princípio da Prevenção

Procura-se evitar o risco de uma atividade sabidamente danosa e efeitos nocivos ao meio ambiente.
Aplica-se aos impactos ambientais já conhecidos. Finalidade: evitar que o dano possa chegar a produzir-
se. Deve-se tomar as medidas necessárias para evitar o dano ambiental porque as consequências de se
iniciar determinado ato, prosseguir com ele ou suprimi-lo são conhecidas.

Previsão: Declaração de Estocolmo (1972 – princípios 6 e 21) e Declaração do Rio (ECO – 92 – princípio 2).
A Política Nacional do Meio Ambiente fala em manutenção e proteção (Lei 6.938/81). CR/88: art. 225, §1º,
IV - obrigatoriedade de EIA em obras ou atividades potencialmente causadoras de significativa
degradação ao meio ambiental).

Principal instrumento de prevenção: EIA/RIMA.

1.4.3 Princípio da precaução (vorsorgeprinzip)

Incide quando não se tem certeza científica acerca dos danos que podem ser causados. Aplica-se o
primado da prudência e o benefício da dúvida em favor do ambiente. A falta de plena certeza científica
não deve ser usada como razão para postergar medidas para evitar ou minimizar essa ameaça. In dubio
pro natura. Deve ser aplicado, contudo, apenas em face da ausência científica do impacto de RISCOS
GRAVES E IRREVERSÍVEIS. Inversão do ônus é seu corolário: implica a necessidade de demonstração de que
a atividade não traz riscos ao meio ambiente.

Marco inicial - Lei da Alemanha de 1976. Primeira previsão internacional: Conferência do Mar do Norte de
1987. Foi proposto formalmente na Declaração do Rio (ECO – 92 – princípio 15) e na Convenção Quadro
das Nações Unidas sobre as mudanças do clima – 1992 (uma de suas emendas é o protocolo de Kyoto de
1997). Presente na Convenção sobre Diversidade Biológica – 1992. Amparo constitucional (art. 225, caput,
de forma implícita). Primeira lei que tratou no Brasil foi a da Biossegurança (art. 11.105/05 – art. 1º).

Destaca Paulo Afonso Leme Machado 3 características:

1 - incerteza do dano em face do atual estado da técnica;

2 - possibilidade de efeitos graves e irreversíveis ao ambiente;

3 - dirige-se com primazia às autoridades públicas.

A adoção das medidas públicas, por sua vez, deve ser regida pela temporariedade (enquanto durar a
incerteza) e pela proporcionalidade.

15
A prevenção atua no sentido de inibir o risco de dano em potencial (atividade sabidamente perigosas),
enquanto a precaução atua para inibir o risco de perigo potencial (ou seja, o dano em abstrato).

Mesmo diante dos princípios da precaução e da prevenção, que para alguns suplantariam os princípios de
garantias dos cidadãos, há de se considerar, diante do caso concreto, a possibilidade de aplicação do
princípio da insignificância.

Três correntes diferenciam o conteúdo, extensão e acepção desse princípio:

1) radical: não tolera qualquer risco;

2) minimalista: exige a presença de riscos sérios e irreversíveis;

3) intermediária: o risco deve ser baseado na ciência e deve ser crível, mas não exclui a moratória e adota a
teoria dinâmica da distribuição do ônus da prova.

Jurisprudência: “No atual estágio do conhecimento científico, que indica ser incerta a existência de efeitos
nocivos da exposição ocupacional e da população em geral a campos elétricos, magnéticos e
eletromagnéticos gerados por sistemas de energia elétrica, não existem impedimentos, por ora, a que
sejam adotados os parâmetros propostos pela OMS, conforme estabelece a Lei nº11.934/09”. (RE 627189).

“...O princípio da precaução pressupõe a inversão do ônus probatório, competindo a quem supostamente
promoveu o dano ambiental comprovar que não o causou ou que a substância lançada ao meio ambiente
não lhe é potencialmente lesiva. Nesse sentido e coerente com esse posicionamento, é direito subjetivo do
suposto infrator a realização de perícia para comprovar a ineficácia poluente de sua conduta, não sendo
suficiente para torna-la prescindível informações obtidas de sítio da internet...”(REsp 1.060.753-SP).

1.4.4 Princípio do Poluidor-Pagador ou da Responsabilização

Previsão normativa: Art. 225, § 3º da CF; art. 3º, IV; art. 4º, VII; e art. 14, § 1º, da Lei 6.938/81.

Previsto também na Declaração do Rio 92 (princípio 16)

Conceito: Aquele que polui terá que arcar com os custos da reparação de dano causado.

Caráter Preventivo - devem-se buscar todas as medidas para evitar o dano.

Caráter Repressivo - se, ainda que tenham sido adotadas todas as medidas, o dano vier a ocorrer, aquele
que foi o responsável tem o dever de repará-lo. Esses custos não podem ser repassados para a sociedade.

Internalização das Externalidades Negativas - O ônus ambiental em decorrência da atividade deve ser
considerado como integrante dos custos da produção, não podendo ser transferido para a sociedade.

Responsabilidade civil por dano ambiental

a) Extracontratual - Decorre da Lei, sem que haja um vínculo jurídico contratual anterior;

b) Objetiva - Independe da análise de culpa do agente ou licitude da atividade;

c) Propter rem - O adquirente responderá ainda que não tiver provocado o dano. Qualquer Cláusula de Não
Indenizar só terá validade entre as partes;

16
d) Solidária - Entre todos que de alguma forma deram origem ao dano (litisconsórcio facultativo).
Majoritariamente entende-se que é possível a responsabilidade solidária do ente público quando, devendo
agir para evitar o dano ambiental, mantém-se inerte ou atua de forma deficiente. Entretanto, apesar de
solidária, a execução contra o ente público é subsidiária, de modo a se exigir execução primeiro do
poluidor direto, não devendo, em regra, a sociedade ser duplamente onerada pela degradação ambiental;;

A responsabilidade solidária e de execução subsidiária significa que o Estado


integra o título executivo sob a condição de, como devedor-reserva, só ser
convocado a quitar a dívida se o degradador original, direto ou material (=
devedor principal) não o fizer, seja por total ou parcial exaurimento patrimonial
ou insolvência, seja por impossibilidade ou incapacidade, inclusive técnica, de
cumprimento da prestação judicialmente imposta, assegurado, sempre, o direito
de regresso (art. 934 do Código Civil), com a desconsideração da personalidade
jurídica (art. 50 do Código Civil). (REsp 1071741/SP)

e) Inversão do ônus da prova - Jurisprudência majoritária admite nos moldes do CDC (verossimilhança ou
hipossuficiência). No caso de ACP ambiental, o STJ vem entendendo que em observância ao P. da Precaução
e ao caráter público e coletivo do bem jurídico tutelado, o ônus da prova é do empreendedor;

f) Imprescritível - a responsabilização civil por dano ambiental é imprescritível. Fundamento: a titularidade


do direito ambiental é difusa, pertence às gerações atuais e futuras. Não seria possível aceitar a
penalização decorrente da prescrição àquela geração que sequer existe. (REsp 1120117/AC)

Esse princípio não tolera a poluição, pois a finalidade primordial é evitá-la. Não se trata de uma
autorização para poluir, desde que se indenize. A poluição continua vedada; se acontecer, contudo, deve
dar-se a recomposição in natura e a indenização dos danos insuscetíveis de recomposição.

Jurisprudência: “MP estadual, recorrido, ajuizou, na origem, ação civil pública em desfavor da empresa
agrícola, recorrente, sob a alegação de que essa seria responsável por dano ambiental por uso de
agrotóxico ilegal, o que teria causado grande mortandade de pássaros. A recorrente, em contestação, entre
outras alegações, sustentou a descaracterização do mencionado dano, arguindo que pouco mais de
trezentas aves teriam morrido, sem que tenha havido efetivo comprometimento do meio ambiente. A
sentença julgou procedente a ação, condenando a recorrente a pagar a importância de R$ 150 mil em
indenização a ser revertida para o meio ambiente local, em recomposição do dano ambiental causado com
a morte de 1.300 pássaros da fauna silvestre, o que se manteve em grau de apelação. Nesta instância
especial, ao apreciar a controvérsia, consignou o Min. Relator que a existência de um dano ambiental não
só encerra a necessidade de reconstituição do meio ambiente no que for possível, com a necessária
punição do poluidor (princípio do poluidor-pagador), mas também traz em seu bojo a necessidade de
evitar que o fato venha a repetir-se, o que justifica medidas coercitivas e punições que terão, inclusive,
natureza educativa. Observou não haver como fracionar o meio ambiente e, dessa forma, deve ser
responsabilizado o agente pela morte dos pássaros em decorrência de sua ação poluidora. Quanto ao valor
estabelecido na condenação, entendeu que o pleito da recorrente para que se tome como base de cálculo
o valor unitário de cada pássaro não pode prosperar, já que a mensuração do dano ecológico não se exaure
na simples recomposição numérica dos animais mortos, devendo-se também considerar os nefastos efeitos
decorrentes do desequilíbrio ecológico em face da ação praticada pela recorrente. Diante desses
fundamentos, entre outros, a Turma negou provimento ao recurso. Precedentes citados: REsp 1.120.117-

17
AC, DJe 19/11/2009, e REsp 1.114.893-MG. REsp 1.164.630-MG, Rel. Min. Castro Meira, julgado em
18/11/2010.

1.4.5 Princípio do Usuário-Pagador

Evolução do princípio do poluidor-pagador. O uso gratuito de recursos naturais às vezes pode representar
enriquecimento ilícito por parte do usuário, pois a comunidade que não usa ou usa em menor escala fica
onerada. Não deve ser encarado como punição, pois poderá ser implementado mesmo sem haver
comportamento ilícito (art. 4, VII, da Lei 6.938/81).

O usuário de recursos naturais (escassos) deve pagar por sua utilização. A ideia é de definição do valor
econômico ao bem natural com intuito de racionalizar o seu uso e evitar seu desperdício (o fato gerador é
a mera utilização dos recursos, independentemente de dano ou ilicitude). Leme faz uma correlação entre
o princípio do usuário pagador e a compensação ambiental: "a compensação ambiental é uma das formas
de implementação do usuário pagador, antecipando possíveis cobranças por danos ambientais". Inclusive
o STF no julgamento da ADI 3378-DF definiu que a compensação ambiental densifica o princípio do
usuário-pagador.

O usuário é aquele que não causa poluição. Paga por um direito outorgado pelo poder público. Ex:
cobrança pelo uso de água, art. 19 e 20 da Lei nº 9.433/97. Pagar é garantir o art. 225 CF, em benefício das
futuras gerações.

1.4.6 Princípio do Protetor-Recebedor

Tem previsão expressa no art. 6º, II, da Lei nº 12.305/10 (Política Nacional de Resíduos Sólidos). Está
também previsto no Código Florestal (art. 1-A).

O agente público ou privado que protege um bem natural em benefício da comunidade deve receber uma
compensação financeira como incentivo pelo serviço de proteção ambiental prestado.

Pode ser considerado o avesso do conhecido princípio do usuário-pagador. Exemplos:

a) art. 10, §1º, II, da Lei nº 9.393/96, que excluiu da área tributável de ITR alguns espaços ambientalmente
protegidos; b) Lei nº 12.512/11 (Programa de Apoio à Conservação Ambiental), voltado a famílias de baixa
renda que desenvolvam atividades de conservação em determinadas áreas.

1.4.7 Princípio do Desenvolvimento Sustentável ou


Ecodesenvolvimento

A ideia de desenvolvimento socioeconômico em harmonia com a preservação ambiental emergiu da


Conferência de Estocolmo, de 1972. No início da década de 1980, a ONU retomou o debate das questões
ambientais. O documento final desses estudos chamou-se Nosso Futuro Comum ou Relatório Brundtland.
Apresentado em 1987, propõe o desenvolvimento sustentável, que é “aquele que atende às necessidades
do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas necessidades”.

CR/88: art. 170, VI, e 225. Pilares do desenvolvimento sustentável: crescimento econômico, preservação
ambiental e equidade social. Caráter social: forma de realização da justiça por meio da distribuição da
riqueza.

18
As necessidades humanas são ilimitadas, mas os recursos ambientais não o são, sendo necessário buscar o
equilíbrio, pela sustentabilidade, e decorre de uma ponderação casuística entre o direito fundamental ao
desenvolvimento econômico e o direito fundamental à preservação ambiental.

1.4.8 Princípio do Ambiente Ecologicamente Equilibrado

Reconhecido no art. 225 da CR e em Estocolmo (1972). Está intimamente ligado ao direito fundamental à
vida e à proteção da dignidade humana. Foi o principal princípio utilizado como fundamentação pelo STF
para declarar a constitucionalidade na ADPF 101 das normas em vigor no país que proíbem a importação
de pneus usados e remodelados.

1.4.9 Princípio da Obrigatoriedade de Atuação (princípio da


natureza pública da proteção ambiental)

É dever irrenunciável do Poder Público promover a proteção do meio ambiente. Destaca-se a necessidade
de intervenção do poder público (caráter vinculado do poder de polícia ambiental), mas, ao mesmo tempo,
aborda a questão do aumento da função fiscalizatória/regulatória, via agências reguladoras.

Por ser direito indisponível, a proteção ambiental não pode ser objeto de transação (a única forma
admitida é a negociação de prazo, inclusive por meio de TAC). Esse princípio decorre da declaração de
Estocolmo (1972). Encontra-se na CF (art. 225 – dever de defender e preservar o meio ambiente) e na
declaração do Rio 92.

Encontra previsão expressa, ainda, no artigo 2º, inciso I, da Lei 6.938/81, destacando-se a obrigação do
Poder Público de:

a) Preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e promover o manejo de espécies e


ecossistemas;

b) Preservar a diversidade e integridade genética do país;

c) definir espaços especialmente protegidos;

d) exigir estudo de impacto ambiental.

A intervenção do Estado pode ocorrer ainda de forma indireta, como agente normativo e regulador (Art.
174, CF), mediante: a) fiscalização: de atividades econômicas potencialmente degradadoras; rigorosas
multas ambientais; b) incentivo: incentivos fiscais para empresas ambientalmente responsáveis (princípio
do protetor recebedor); c) planejamento: necessidade de integrar o planejamento ambiental ao
planejamento das questões públicas.

Lei Complementar 140/2011: nos casos de iminência ou ocorrência de degradação da qualidade


ambiental, o ente federativo que tiver conhecimento do fato deverá determinar medidas para evitá-la,
fazer cessá-la ou mitigá-la, comunicando imediatamente ao órgão competente para as providências
cabíveis.

1.4.10 Princípio da Participação Comunitária (Princípio


Democrático/Cooperação)

19
Inserido no caput do art. 225 da CF. Princípio nº 10 da Declaração do Rio de 1992. É dever de toda a
sociedade atuar na defesa do meio ambiente.

A participação consubstancia-se:

a) no dever jurídico de proteger e preservar o meio ambiente;

b) no direito de opinar sobre as políticas públicas; e

c) na utilização dos mecanismos de controle políticos (plebiscito, referendo, iniciativa popular), judiciais
(ação popular, ação civil pública) e administrativos (informação, petição, EIA).

Destaca-se aqui a atuação das ONGs e assento dos cidadãos nos conselhos ambientais e da consulta
pública para criação de algumas unidades de conservação, além da participação como amicus curiae, em
processos de controle abstrato de constitucionalidade.

1.4.11 Princípio da Publicidade ou da Informação

Toda informação sobre o meio ambiente é pública. Visa assegurar a eficácia do princípio da participação. É
necessária a devida publicidade das questões ambientais, sob pena de impossibilidade de atuação do
princípio democrático. O art. 5º, XXXIII da Constituição Federal e a Lei 12.527/11, garantem o acesso à
informação de forma ampla, incluindo aquela que diz respeito ao meio ambiente. Está expressamente
previsto no Princípio 10 da Declaração do Rio/92. Segundo Leme as matérias que envolvam
comprovadamente segredo industrial ou do Estado estão excluídas do aludido princípio.

1.4.12 Princípio da Educação Ambiental

Embora não seja obrigação exclusiva do poder público, encontra-se constitucionalmente previsto no art.
225, § 1º, VI, CF. Para assegurar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, incumbe ao Poder
Público promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a
preservação.

A Lei 9.795/99 trata da educação ambiental. O art. 1 dispõe que se entende por educação ambiental os
processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos,
habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum
do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. O art. 10 assinala que a educação
ambiental será desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e permanente em todos os
níveis e modalidades do ensino formal, e que não deve ser implantada como disciplina específica no
currículo de ensino.

1.4.13 Princípio da Função Socioambiental da Propriedade

Art. 186 da CF: a função social da propriedade é atendida quando há aproveitamento racional e adequado;
utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; observação das
disposições que regulam as relações de trabalho; exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e
trabalhadores. É o princípio que justifica serem as obrigações ambientais propter rem.

1.4.14 Princípio do Equilíbrio (ou proporcionalidade)

20
Consiste na ponderação de valores quando da prática de algum evento que possa repercutir na esfera
ambiental. Necessidade de se analisar quais os prejuízos e impactos, e ao contrário, quais os benefícios e
ganhos. Nessa ponderação, deve-se levar em conta todas as condições ambientais, no sentido legal do
termo, como as influências e integrações de ordem química e biológica, que permitem abrigar e reger a
vida em todas as formas. Esse equilíbrio está atrelado ao desenvolvimento econômico e seus impactos
ambientais, guardando estreita relação com o desenvolvimento sustentável.

O STF julgou inconstitucional lei municipal que proíbe, sob qualquer forma, o
emprego de fogo para fins de limpeza e preparo do solo no referido município,
inclusive para o preparo do plantio e para a colheita de cana-de-açúcar e de
outras culturas.
Entendeu-se que seria necessário ponderar, de um lado, a proteção do meio
ambiente obtida com a proibição imediata da queima da cana e, de outro, a
preservação dos empregos dos trabalhadores que atuem neste setor. No caso, o
STF entendeu que deveria prevalecer a garantia dos empregos dos trabalhadores
canavieiros, que merecem proteção diante do chamado progresso tecnológico e
da respectiva mecanização, ambos trazidos pela pretensão de proibição imediata
da colheita da cana mediante uso de fogo.
Questionou-se ser mais razoável: a proibição imediata da queima da cana ou a
sua eliminação gradual. Afigura-se muito mais harmônico com a disciplina
constitucional a eliminação planejada e gradual da queima da cana, sobretudo,
porque a utilização de máquinas também geraria impacto negativo ao meio
ambiente, como a emissão de gás metano decorrente da decomposição da cana, o
que contribuiria para o efeito estufa, além do surgimento de ervas daninhas e o
consequente uso de pesticidas e fungicidas
Além disso, as normas federais que tratam sobre o assunto apontam para a
necessidade de se traçar um planejamento com o intuito de se extinguir
gradativamente o uso do fogo como método despalhador e facilitador para o
corte da cana. Nesse sentido: Lei 12.651/2012 (art. 40) e Decreto 2.661/98. (RE-
586224).

“O particular que, por mais de vinte anos, manteve adequadamente, sem indício
de maus-tratos, duas aves silvestres em ambiente doméstico, pode permanecer
na posse dos animais” (STJ Resp 1.425.943-RN).

“COSTUME - MANIFESTAÇÃO CULTURAL - ESTÍMULO - RAZOABILIDADE -


PRESERVAÇÃO DA FAUNA E DA FLORA - ANIMAIS - CRUELDADE. A obrigação de o
Estado garantir a todos o pleno exercício de direitos culturais, incentivando a
valorização e a difusão das manifestações, não prescinde da observância da
norma do inciso VII do artigo 225 da Constituição Federal, no que veda prática
que acabe por submeter os animais à crueldade. Procedimento discrepante da
norma constitucional denominado "farra do boi". (STF, RExt 153531, Segunda
Turma, Rel. p/ ac. Min. Marco Aurélio, DJ de 13/03/1998)”

"Por entender caracterizada ofensa ao art. 225, § 1º, VII, da CF, que veda práticas
que submetam os animais a crueldade, o Plenário julgou procedente pedido
formulado em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República para
declarar a inconstitucionalidade da Lei fluminense 2.895/98. A norma impugnada
autoriza a criação e a realização de exposições e competições entre aves das raças
combatentes (fauna não silvestre). Rejeitaram-se as preliminares de inépcia da
petição inicial e de necessidade de se refutar, artigo por artigo, o diploma
21
legislativo invocado. Aduziu-se que o requerente questionara a validade
constitucional da integridade da norma adversada, citara o parâmetro por ela
alegadamente transgredido, estabelecera a situação de antagonismo entre a lei e
a Constituição, bem como expusera as razões que fundamentariam sua
pretensão. Ademais, destacou-se que a impugnação dirigir-se-ia a todo o
complexo normativo com que disciplinadas as "rinhas de galo" naquela unidade
federativa, qualificando-as como competições. Assim, despicienda a indicação de
cada um dos seus vários artigos. No mérito, enfatizou-se que o constituinte
objetivara assegurar a efetividade do direito fundamental à preservação da
integridade do meio ambiente, que traduziria conceito amplo e abrangente das
noções de meio ambiente natural, cultural, artificial (espaço urbano) e laboral.
Salientou-se, de um lado, a íntima conexão entre o dever ético-jurídico de
preservação da fauna e o de não-incidência em práticas de crueldade e, de outro,
a subsistência do gênero humano em um meio ambiente ecologicamente
equilibrado (direito de terceira geração). Assinalou-se que a proteção conferida
aos animais pela parte final do art. 225, § 1º, VII, da CF teria, na Lei 9.605/98 (art.
32), o seu preceito incriminador, o qual pune, a título de crime ambiental, a
inflição de maus-tratos contra animais. Frisou-se que tanto os animais silvestres,
quanto os domésticos ou domesticados - aqui incluídos os galos utilizados em
rinhas - estariam ao abrigo constitucional. Por fim, rejeitou-se o argumento de
que a "briga de galos" qualificar-se-ia como atividade desportiva, prática cultural
ou expressão folclórica, em tentativa de fraude à aplicação da regra constitucional
de proteção à fauna. Os Ministros Marco Aurélio e Dias Toffoli assentaram apenas
a inconstitucionalidade formal da norma. Precedentes citados: RE 153531/SC (DJU
de 13.3.98); ADI 2514/SC (DJU de 3.8.2005); ADI 3776/RN (DJe de 29.6.2007). ADI
1856/RJ, rel. Min. Celso de Mello, 26.5.2011. (ADI-1856)"

1.4.15 Princípio do Acesso equitativo aos Recursos Naturais

A utilização saudável do meio ambiente deve ser partilhada de forma equânime por toda a humanidade.

1.4.16 Princípio do Limite ou Princípio do Controle do Poluidor pelo


Poder Público

Previsão constitucional: art. 225, § 1º, inciso V. A Administração Pública tem a obrigação de fixar padrões
máximos de emissões de poluentes, ruídos, enfim, de tudo aquilo que possa implicar prejuízos para os
recursos ambientais e à saúde humana.

1.4.17 ‘Princípio da Ubiquidade (Princípio da Variável Ambiental no


processo decisório das políticas públicas) (Princípio da
Transversalidade)

Ubiquidade é a qualidade do que está em toda a parte. O meio ambiente é condição prévia para a
existência e o exercício dos direitos humanos. Os bens naturais, tendo caráter de onipresença, colocam-se
em posição soberana a qualquer limitação espacial ou geográfica. O meio ambiente deve ser considerado
em toda decisão política (ex. leis orçamentárias, PAC). Visão holística: protege-se o todo para proteger a
parte. Princípio 17 da RIO/92: “A avaliação do impacto ambiental, como instrumento nacional, será
efetuada para as atividades planejadas que possam vir a ter um impacto adverso significativo sobre o meio
ambiente e estejam sujeitas à decisão de uma autoridade nacional competente”

22
1.4.18 Princípio do Direito à Sadia Qualidade de Vida

Enquanto as primeiras constituições escritas colocavam o direito à vida entre os direitos individuais, a partir
do séc. XX foi inserido o "direito à qualidade de vida", não sendo suficiente viver ou apenas conservar a
vida (caput do art. 225 da CF).

1.4.19 Princípio da Reparação Integral

Invocado pelo STJ em seus julgados e melhor tratado no tópico sobre reparação dos danos ambientais.
Deve conduzir o meio ambiente e a sociedade a uma situação, na medida do possível, equivalente à
anterior ao dano. Incluem-se os efeitos ecológicos e ambientais da agressão, as perdas de qualidade
ambiental, os danos ambientais futuros e danos morais coletivos. Positivado na legislação civil (art. 944,
CC).

“Na hipótese de ação civil pública proposta em razão de dano ambiental, é possível
que a sentença condenatória imponha ao responsável, cumulativamente, as
obrigações de recompor o meio ambiente degradado e de pagar quantia em
dinheiro a título de compensação por dano moral coletivo. Isso porque vigora em
nosso sistema jurídico o princípio da reparação integral do dano ambiental, que, ao
determinar a responsabilização do agente por todos os efeitos decorrentes da
conduta lesiva, permite a cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de
indenizar.” (REsp 1.328.753-MG)

Determinada empresa de mineração deixou vazar resíduos de lama tóxica (bauxita), material que atingiu
quilômetros de extensão e se espalhou por cidades dos Estados do RJ e de MG.
O STJ ao julgar a responsabilidade civil decorrente desses danos ambientais, fixou as seguintes teses em
sede de recurso repetitivo:
a) A responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do
risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o
risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa
responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para
afastar sua obrigação de indenizar;
b) Em decorrência do acidente, a empresa deve recompor os danos materiais e
morais;
c) Na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o
arbitramento seja feito caso a caso e com moderação proporcionalmente ao grau
de culpa, ao nível socioeconômico do autor, e, ainda, ao porte da empresa,
orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com
razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da
vida e às peculiaridades de cada caso, de modo que, de um lado, não haja
enriquecimento sem causa de quem recebe a indenização e, de outro, haja efetiva
compensação pelos danos morais experimentados por aquele que fora lesado.
(REsp 1.374.284-MG).

“O particular que deposita resíduos tóxicos em seu terreno, expondo-os a céu


aberto, em local onde, apesar da existência de cerca e de placas de sinalização
informando a presença de material orgânico, o acesso de outros particulares seja
fácil, consentido e costumeiro, responde objetivamente pelos danos sofridos por
pessoa que, por conduta não dolosa, tenha sofrido, ao entrar na propriedade,
graves queimaduras decorrentes de contato com os resíduos.
23
STJ. 3ª Turma. REsp 1.373.788-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em
6/5/2014 (Info 544)”.

Por outro lado, há julgado do STJ a afastar o punitive damage (teoria do valor do desestímulo) em matéria
ambiental:

A responsabilidade por dano ambiental é OBJETIVA, informada pela teoria do RISCO


INTEGRAL. Não são admitidas excludentes de responsabilidade, tais como o caso
fortuito, a força maior, fato de terceiro ou culpa exclusiva da vítima.
Se uma empresa causou dano ambiental e, em decorrência de tal fato, fez com que
determinada pessoa ficasse privada de pescar durante um tempo, isso configura
dano moral.
O valor a ser arbitrado como dano moral não deverá incluir um caráter punitivo. É
inadequado pretender conferir à reparação civil dos danos ambientais caráter
punitivo imediato, pois a punição é função que incumbe ao direito penal e
administrativo. Assim, não há que se falar em danos punitivos (punitive damages)
no caso de danos ambientais. (REsp 1.354.536-SE)

1.4.20 Princípio da Solidariedade Intergeracional

Previsto no Princípio 3 da RIO/92 e artigo 225 da CF.

O constituinte criou um sujeito de direito indeterminado: gerações futuras.

A solidariedade ambiental é sincrônica (presentes gerações) e diacrônica (futuras gerações).

1.4.21 Princípio da Proibição do Retrocesso Ecológico (Canotilho) ou


“non clicquet” ambiental

É inadmissível o recuo da salvaguarda ambiental para níveis de proteção inferiores aos já consagrados,
exceto se as circunstâncias de fato sejam significativamente alteradas.

Embora não possua previsão expressa constitucional, trata-se de princípio implícito, extraído da própria
noção de Estado Democrático de Direito: dignidade da pessoa humana, máxima eficácia e efetividade dos
direitos fundamentais, princípio da segurança jurídica.

STJ - a salvaguarda do meio ambiente tem caráter irretroativo: não pode admitir o
recuo para níveis de proteção inferiores aos anteriormente consagrados, a menos
que as circunstâncias de fato sejam significativamente alteradas. Busca estabelecer
um piso mínimo de proteção ambiental, para além do qual devem rumar as futuras
medidas normativas de tutela, impondo limites a impulsos revisionistas da
legislação.

1.4.22 Princípio do Progresso Ecológico (Canotilho)

Necessidade de avançar e aprimorar a legislação ambiental. “Cláusula de Progressividade” do Pacto


Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (art. 2º, 1). Finalidade de garantir a disponibilidade
permanente e salubridade social.

1.4.23 Princípio da Correção na Fonte (Canotilho)

24
A poluição deve ser corrigida no local em que foi produzida. Ao poluidor cabe corrigir o dano, no local em
que foi produzido, especialmente para que seja evitado o “turismo” da poluição, ou seja, a migração das
consequências em dada área para outra até então intacta.

1.4.24 Princípio da Responsabilidade Social (ou Princípio do Equador)

São critérios mínimos para a concessão de crédito, que asseguram que os projetos financiados sejam
desenvolvidos de forma socialmente e ambientalmente responsável.

1.4.25 Princípio do Mínimo Existencial Ecológico (STJ)

Por trás da garantia constitucional do mínimo existencial, subjaz a idéia de que a dignidade da pessoa
humana está intrinsecamente relacionada à qualidade ambiental. Ao conferir dimensão ecológica ao
núcleo normativo, assenta a premissa de que não existe patamar mínimo de bem-estar sem respeito ao
direito fundamental do meio ambiente sadio.

1.4.26 Princípio da Cooperação entre os povos

Tendo em vista que o meio ambiente não conhece fronteiras política, sendo a terra um grande
ecossistema, a única forma de preservá-la é a cooperação entre as nações, mormente por meio de
tratados internacionais, para se ter uma tutela global ambiental. O artigo 77 da Lei 9605/98 fala da
cooperação internacional em matéria de crimes ambientais.
Nesse sentido ganha relevo o tema dos Refugiados Ambientais ou Climáticos: Pessoas que em razão de
danos ambientais tem que sair do local em que estão, e, o do Dumping Ambiental: Países que respeitam as
normas ambientais têm condições inferiores de competitividade o que beneficia as empresas e países que
degradam o ambiente.
1.4.27 Princípio da Moralidade Ambiental (TRF 1)

Está ligado à ideia de que a incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses
empresariais nem ficar dependente de motivações de índole econômica, ainda mais se se tiver presente
que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre
outros princípios gerais, àquele que privilegia a "defesa do meio ambiente". (AC 9681920114013900 –
TRF1).

1.4.28 Princípio da cooperação e os refugiados ambientais

Trata-se de um princípio ainda não reconhecido internacionalmente. Há uma proposta na ONU, realizada
pelo Prof. Michel Prieur, para celebração de uma convenção internacional, com força de lei, visando
salvaguardar os direitos humanos das pessoas forçadas a abandonar seus locais de habitat devido a uma
catástrofe (natural ou industrial), sendo obrigadas a procurar acolhida em outro país, ou mesmo dentro de
seus países, de uma região para outra. Essa categoria de pessoas deslocadas em virtude de questões
ambientais tem sido denominada de refugiados ambientais.

1.5 Ações judiciais de proteção ao meio ambiente.

1.5.1 Introdução

Paulo Affonso Leme Machado lista, como principais formas de tutela jurisdicional do meio ambiente: a) a
ação popular; b) a participação do Ministério Público (inquérito civil, recomendações e compromisso de
ajustamento de conduta); c) e a ação civil pública.

25
Neste ponto será analisado somente as peculiaridades dações judiciais de proteção ao meio ambiente,
quais sejam: a ação popular ambiental e ação civil pública ambiental.

1.5.2 Ação Popular em Matéria Ambiental (Peculiaridades)

Introdução: Parcela da doutrina vem defendendo a existência de dois institutos complementares, mas
distintos, na norma constitucional que regula a ação popular. Ação popular propriamente dita, voltada
para a defesa do patrimônio público e regulada pela Lei nº 4.717/65, e a ação popular ambiental, destinada
à defesa do patrimônio histórico, cultural e do meio ambiente.
Diferenças e particularidades podem ser apontadas, de acordo com a doutrina: a)prevalência das regras da
LACP e do CDC em relação às próprias regras da LAP em ações populares em matéria ambiental, por
exemplo, desnecessidade de ajuizamento da ação contra todos os responsáveis, já que a responsabilidade
ambiental é solidária no direito ambiental; ou, ainda, desnecessidade de citar, em todas as demandas
populares ambientais, os órgãos do Poder Público; b) competência para o julgamento do juízo do local
onde ocorreu o dano ou ilícito, observada a hipótese de competência do art. 2º da LACP; c) aplicabilidade
da regra da oitiva prévia da pessoa jurídica de direito público; d) imprescritibilidade, não valendo a regra
do art. 21 da LAP; e) o recurso, em regra, terá apenas o efeito devolutivo, não se aplicando o artigo 19 da
LAP que prevê o duplo efeito; f) poderá tutelar obrigações de fazer e não-fazer de forma autônoma, não se
restringindo aos pedidos constitutivos e condenatório.

Interpretação: A Lei 4.717/1965 deve ser interpretada de forma a possibilitar a mais ampla proteção aos
bens e direitos associados ao patrimônio público, em suas várias dimensões (cofres públicos, meio
ambiente, moralidade administrativa, patrimônio artístico, estético, histórico e turístico) (REsp
453.136/PR)

Legitimidade: É parte legítima para intentar a ação popular o cidadão, assim entendido o brasileiro em
pleno gozo dos direitos políticos, ou seja, alistado na Justiça Eleitoral, devendo a cópia do título de eleitor
instruir a petição inicial. Preso Provisório e maior de 16 anos podem propor ação popular. Pessoa Jurídica
não. Registre-se a existência de uma corrente doutrinária que prega a legitimidade ativa do estrangeiro
residente no Brasil para o ajuizamento da ação popular, por meio de uma definição maximalista da
cidadania ambiental. Ademais, o português com residência permanente no Brasil com reciprocidade pode
se alistar e, portanto, propor ação popular. Já o MP apenas atuará no polo ativo nos casos de sucessão
processual. Em se tratando de ação popular executória todos os cidadãos, sejam ou não autores,
assistentes ou litisconsortes originários na ação popular, além do MP e da própria pessoa jurídica ou
entidade, nos termos dos artigos 16 e 17 da LAP possuem legitimidade.
O eleitor não precisa ter domicílio eleitoral no local da propositura da ação para ter legitimidade. O menor
(16 anos) não precisa estar representado.
A natureza da legitimação na AP é controversa. Na jurisprudência e na doutrina prepondera a tese da
legitimação ordinária, diversamente das demais ações coletivas. O STF já se manifestou assim, enquanto o
STJ se pronunciou no sentido da substituição processual.
Legitimidade passiva será das pessoas jurídicas de direito público que praticaram o ato lesivo ao
patrimônio público, à moralidade administrativa e ao meio ambiente, bem como dos entes receptores de
verba pública, juntamente com as pessoas jurídicas de direito privado que participaram da formação do
ato impugnado ou que dele sejam beneficiários.

Lesividade e Ação Popular Ambiental: Ainda que o ato tenha sido lícito será possível a utilização da ação
popular. No caso da ação popular ambiental também basta o dano ao meio ambiente, porque a
responsabilidade para proteção do meio ambiente independe de culpa ou de ilicitude, basta haver nexo de
causalidade entre a conduta comissiva ou omissiva e a lesão ao ecossistema.

26
Objeto: Objetiva a ação popular a anulação de ato lesivo ao patrimônio público, ao meio ambiente ou à
moralidade administrativa, tendo natureza predominantemente desconstitutiva, pois visa a anular o ato
(ação popular repressiva).
Outrossim, a lesividade e a ilegalidade do ato rechaçado podem ser geradas pela omissão do Poder
Público, sendo possível ter a ação popular como instrumento de controle das omissões administrativas,
conforme já decidiu o STJ:

“A ação popular é o instrumento jurídico que deve ser utilizado para


impugnar atos administrativos omissivos ou comissivos que possam causar
danos ao meio ambiente. 5. Pode ser proposta ação popular ante a omissão
do Estado em promover condições de melhoria na coleta do esgoto da
Penitenciária Presidente Bernardes, de modo a que cesse o despejo de
elementos poluentes no Córrego Guarucaia (obrigação de não fazer), a fim de
evitar danos ao meio ambiente. (REsp 889766/SP)”

A ação popular também pode resultar na condenação ao pagamento de valores, nos termos do art. 11 da
LAP.
Também se admite ação popular preventiva, mais interessante à tutela ambiental, impedindo-se o Poder
Público de editar ato ilegal e potencialmente lesivo aos recursos ambientais.
Logo, nota-se que na ação popular a cominação principal não é condenatória - como na ação civil pública,
pois o objeto da ação popular é mais restrito -, mas, sim a anulação do referido ato ilegal e lesivo.
Contudo, entende-se plenamente possível a reparação dos danos em sede de ação popular, desde que seja
a forma de reconstituir o bem jurídico lesado pelo ato ilegal praticado pelo Poder Público e pelos eventuais
particulares que concorrem à sua prática.
Obs.: a jurisprudência não é pacífica quanto a possibilidade de pedido de obrigação de fazer/não fazer na
ação popular ambiental. Há uma decisão do TRF1 que afirma que “o objeto da ação popular é a anulação
de ato lesivo ao patrimônio público, e somente em casos excepcionais, como bem lembrou a ilustre
magistrada, pode abranger obrigações de fazer”. (REO 0075053-50.2013.4.01.3400 / DF). Em outra
oportunidade, o TRF1 também decidiu que: “o pedido da presente ação popular não visa a anular ato
lesivo ao meio ambiente, mas sim a obter do Estado o cumprimento de obrigação de fazer e de não fazer,
objetivo para o qual é adequada a ação civil pública (Lei 7.347/85, art. 3º), e não a ação popular, voltada
para a invalidação de atos estatais ou de particulares, lesivos ao patrimônio público, ao meio ambiente e
ao patrimônio histórico e cultural (Lei 4.717/65, art. 1º; Carta Magna, art. 5º, LXXIII). (AC 0002112-
05.2000.4.01.4000 / PI)

Prescrição da Ação Popular: Segundo previsão legal, a ação popular prescreve em 5 ANOS. Porém, A AÇÃO
POPULAR AMBIENTAL não está sujeita a esse prazo.
Quando a ação popular é intentada em face de omissão lesiva, não se aplica o prazo prescricional.
Em relação aos casos de lesão ao meio ambiente, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está
pacificada no sentido de que as demandas que envolvem a reparação ao meio ambiente são
imprescritíveis.

1.5.3 Ação Civil Pública em Matéria Ambiental (Peculiaridades)

Legitimidade Ativa: O art. 5º, da Lei 7.347/85, confere legitimidade para propor a ação civil pública
(principal e cautelar) ao Ministério Público, à Defensoria Pública, à União, Estados, Municípios, autarquia,
empresa pública, fundação, sociedade de economia mista, e associação que esteja constituída há pelo
menos um ano, e inclua a proteção ao meio ambiente entre suas finalidades institucionais.
Para Celso Fiorillo, essa legitimidade não se enquadra na dicotomia ordinária/extraordinária, tratando-se
de legitimação autônoma para a condução do processo. Também é concorrente e disjuntiva, podendo cada
um dos co-legitimados promover sozinho a ação coletiva, sem que haja autorização ou anuência dos
27
demais; eventual litisconsórcio entre eles é facultativo. Ainda, quanto aos direitos individuais homogêneos,
há legitimação extraordinária dos entes acima arrolados.
A legitimidade ativa do Ministério Público tem previsão constitucional (art. 129, III), abrangendo ações para
defesa de direitos difusos (meio ambiente), coletivos e individuais homogêneos, quando tratados de forma
coletiva. Não pode, porém, o MP, ajuizar ação individual em nome do lesado pelo dano ambiental para
pleitear a prevenção ou a reparação de dano individual não homogêneo, por lhe faltar legitimidade. Ainda,
é possível o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, dos Estados e do Distrito
Federal (art. 5º, § 5º, Lei 7.347/85). Para Celso Fiorillo, não se trata de litisconsórcio, mas de
representação, tendo em vista que a instituição Ministério Público é una e indivisível.
As associações civis que tenham como finalidade estatutária a defesa do meio ambiente podem agir em
juízo, sendo possível a dispensa da pré-constituição há pelo menos um ano, desde que exista manifesto
interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a
ser protegido (art. 5º, § 4º, Lei 7.347/85).
Admite-se o litisconsórcio facultativo unitário (art. 5º, § 2º, Lei 7.347/85), podendo os legitimados se
habilitarem como litisconsortes de qualquer uma das partes, o que deve ocorrer quando do ingresso da
ação, ou por meio da assistência litisconsorcial, tendo em vista que não se admite o litisconsórcio
facultativo unitário superveniente.
O particular, pessoa natural, não tem legitimidade para ajuizar a ação civil pública em defesa do meio
ambiente, mas a tem para deduzir em juízo pretensão indenizatória para a reparação de dano pessoal,
com base na responsabilidade objetiva do poluidor (art. 14, § 1º, Lei 6.938/81).

Legitimidade passiva: Quanto à legitimidade passiva, pode ser demandada em ação civil pública qualquer
pessoa, natural jurídica, pública ou privada, desde que esteja inserida no conceito de poluidor previsto no
art. 3º, IV, da Lei 6.938/81.
Intervenção de terceiros: Em regra, o sistema de jurisdição coletiva não admite a intervenção de terceiros,
tendo em vista que o regime da reparação do dano ambiental é o da responsabilidade objetiva.
A intervenção de terceiros – como a denunciação da lide – não será admitida se dificultar a efetivação da
proteção do meio ambiente (REsp 232187).
Mesmo havendo vários agentes poluidores (responsabilidade solidária), a jurisprudência do STJ é firme
quanto a não ser obrigatória a formação de litisconsórcio, visto que a responsabilidade de reparação
integral do dano ambiental é solidária.

Competência Jurisdicional: O art 2º da Lei 7.347/85 preceitua que “as ações previstas nesta Lei serão
propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e
julgar a causa”. Nas ações preventivas, fixa-se competência pelo local onde deva ocorrer o dano. A fixação
da competência nesses termos tem por objetivo facilitar a colheita de provas e possibilitar o contato direto
do juiz com a degradação ambiental e as provas desta, privilegiando o princípio da imediatidade. Por se
tratar de competência funcional, é absoluta, acarretando a nulidade dos atos decisórios (art. 113, § 2º,
CPC) e enseja a propositura de ação rescisória em até dois anos após seu trânsito em julgado (art. 485, II,
CPC), caso não seja observada.
Quando o dano ambiental for regional ou nacional, prevalecerá a regra do inciso II, do artigo 93, da Lei
8.078/1990, que confere competência ao foro da Capital do Estado ou no Distrito Federal, para os danos
de âmbito nacional ou regional. De acordo com o STJ, a referida competência do foro da capital do estado
para conhecer de ação civil pública que busca a reparação de dano ambiental nacional ou regional, ostenta
natureza absoluta. (Resp. 1.101.057-MT),
Esse sistema de competência (local do fato) funda-se no princípio da efetividade da tutela dos interesses
metaindividuais, tendo em vista que, além das dificuldades naturais do ajuizamento da respectiva ação
ambiental, outra regra de competência prejudicaria o exercício jurisdicional do magistrado.
Mesmo que o local em que ocorreu o dano não seja sede de vara federal, a este juízo compete processar e
julgar a ação civil pública (e não à Justiça Estadual), quando for matéria de sua competência, por não se

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enquadrar o art. 2º na delegação constitucional de competência prevista no art. 109, § 3º. Nesse sentido,
foi cancelada em 24.11.2000 a Súmula 183, do STJ, que previa a competência da Justiça Estadual.
Havendo interesse na causa da União, suas autarquias, fundações e empresas públicas, ou havendo
discussão sobre tratados internacionais ou direitos indígenas, a competência é da Justiça Federal.
Exs. de competência da Justiça Federal:
a) REsp 1057878 – vazamento de óleo, se afetar porto organizado (equiparado a bem público federal), bem
como pelo fato do licenciamento ambiental ter sido promovido pelo IBAMA.
b) STJ, CC 80905 – quando o dano ocorrer em Área de Proteção Ambiental – APA instituída pela União.
No STJ prevalece que, sendo a ACP ambiental proposta pelo MPF, a competência será da JF.

Litispendência, Conexão e Continência: Não há litispendência entre ação coletiva e ação individual (art.
104, CDC), pois não possuem as mesmas partes no pólo ativo; entre uma ação coletiva sobre direito difuso
e outra voltada à proteção de direito coletivo, pois o objeto desta é mais limitado do que o daquela;
também não se dá entre ação para a defesa de direito individual homogêneo e outra que verse acerca de
direito difuso, podendo haver coincidência, no máximo, entre as causas de pedir. Porém, pode haver
litispendência entre uma ação civil pública, que tenha por objeto a desconstituição de um ato lesivo ao
meio ambiente, e uma ação popular com o mesmo fim. Para Celso Fiorillo, a diferença entre os legitimados
não exclui a identidade das partes ativas, pois exercem direito cuja titularidade pertence à coletividade.
Por esse motivo, o resultado da lide, nos dois casos, é estendido a todos os titulares do direito ao meio
ambiente.
Súmula 489 do STJ (também aplicável em matéria ambiental): Reconhecida a continência, devem ser
reunidas na Justiça Federal as ações civis públicas propostas nesta e na Justiça estadual.

Pedido na ACP Ambiental: STJ passou a admitir, com fundamento no princípio da reparação integral, a
cumulação de pedidos de obrigação de fazer / não fazer / condenação pecuniária, não obstante a
literalidade do art. 3º, Lei 7347/1985, indicar o contrário (REsp 1114893).
Considerando que a tutela ambiental é fungível, o juiz pode, sem incidir em decisão extra ou ultra petita,
fazer as determinações necessárias à recuperação do meio ambiente, ainda que não tenha sido instado a
tanto (REsp 967375). Tal fato tem levado parte da doutrina a afirmar que o pedido, na ACP ambiental, é
aberto.

Prescrição: O pleito de recuperação do meio ambiente degradado é imprescritível, visto que o direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado é fundamental, não sendo permitido a uma geração subtrair
das subsequente referido direito (REsp 1120117).

Termo de Ajustamento de Conduta – TAC: É possível, nos termos do art. 5º, §6º, Lei 7347/85, que os
órgãos legitimados firmem TAC objetivando tratar de temas ambientais. Tal termo não poderá
transacionar sobre a matéria ambiental, mas tão somente sobre a forma de cumprimento das obrigações
ambientais.

Inversão do ônus da prova: O STJ tem admitido a inversão do ônus da prova em casos de empresas ou
empreendedores acusados de dano ambiental, tendo como base o princípio da precaução.

Jurisprudência: “O MPF possui legitimidade para propor, na Justiça Federal, ação civil pública que vise à
proteção de zona de amortecimento de parque nacional, ainda que a referida área não seja de domínio da
União. Com efeito, tratando-se de proteção ao meio ambiente, não há competência exclusiva de um ente
da Federação para promover medidas protetivas. Impõe-se amplo aparato de fiscalização a ser exercido
pelos quatro entes federados, independentemente do local onde a ameaça ou o dano estejam ocorrendo e
da competência para o licenciamento. Deve-se considerar que o domínio da área em que o dano ou o risco
de dano se manifesta é apenas um dos critérios definidores da legitimidade para agir do MPF. Ademais,
convém ressaltar que o poder-dever de fiscalização dos outros entes deve ser exercido quando
29
determinada atividade esteja, sem o devido acompanhamento do órgão local, causando danos ao meio
ambiente. (AgRg no REsp 1.373.302-CE)”

O STJ decidiu, em sede de sistemática de recursos repetitivos (REsp 1253844/SC, Tema 510), que, embora
não seja possível se exigir do Ministério Público o adiantamento de honorários periciais em ações civis
públicas, a referida isenção não pode obrigar que o perito exerça seu ofício gratuitamente, tampouco
transferir ao réu o encargo de financiar ações contra ele movidas. Dessa forma, considerou aplicável, por
analogia, a Súmula n. 232 da Corte Superior ("A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à
exigência do depósito prévio dos honorários do perito"), a determinar que a Fazenda Pública ao qual se
acha vinculado o Parquet arque com tais despesas.

1.5.4 Ação de usucapião de imóvel rural

Em recente julgado, o STJ decidiu pela obrigatoriedade de registro da reserva legal do imóvel rural junto ao
Cadastro Ambiental Rural (CAR), a fim de que a sentença declaratória de usucapião de imóvel rural seja
registrada no RGI. Segue o julgado:

DIREITO AMBIENTAL E CIVIL. REQUISITO PARA REGISTRO DA SENTENÇA DECLARATÓRIA DE USUCAPIÃO.


Para que a sentença declaratória de usucapião de imóvel rural sem matrícula seja registrada no Cartório
de Registro de Imóveis, é necessário o prévio registro da reserva legal no Cadastro Ambiental Rural
(CAR). De fato, o art. 16, § 8º, da Lei 4.771/1965 (Código Florestal revogado) previa que a área de reserva
legal deveria ser averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel no registro de imóveis
competente, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão a qualquer título, de
desmembramento ou de retificação da área. No mesmo sentido, há previsão no art. 167 da Lei 6.015/1973
(Lei dos Registros Públicos). Assim, por uma construção jurisprudencial, respaldada em precedentes do STJ,
firmou-se o entendimento de que a averbação da reserva legal seria condição para o registro de qualquer
ato de transmissão, desmembramento ou retificação de área de imóvel rural (REsp 831.212-MG, Terceira
Turma, DJe 22/9/2009; RMS 18.301-MG, Segunda Turma, DJ 3/10/2005). Nessa linha de raciocínio, seria o
caso de impor a averbação da reserva legal como condição para o registro da sentença de usucapião.
Contudo, a Lei 12.651/2012 (novo Código Florestal) deu tratamento diverso à matéria da reserva legal
ambiental. O novo Código instituiu o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que passou a concentrar as
informações ambientais dos imóveis rurais, sendo dispensada a averbação da reserva legal no Registro de
Imóveis (art. 18, § 4º). Assim, ante esse novo cenário normativo, como condição para o registro da
sentença de usucapião no Cartório de Registro de Imóveis, é necessário o prévio registro da reserva legal no
CAR. A nova lei não pretendeu reduzir a eficácia da norma ambiental, pretendeu tão somente alterar o
órgão responsável pelo "registro" da reserva legal, que antes era o Cartório de Registro de Imóveis, e agora
passou a ser o órgão ambiental responsável pelo CAR. A propósito, verifica-se que a parte final do art. 16, §
8º, do Código revogado foi praticamente reproduzida no art. 18, caput, in fine, do novo Código Florestal,
tendo havido apenas a supressão da hipótese de "retificação da área". A supressão da hipótese de
"retificação de área" teve um propósito específico, de permitir, excepcionalmente, a mudança de
localização da reserva legal. Desse modo, a omissão acerca da hipótese de "retificação de área" não
atenuou a eficácia da norma em relação às outras hipóteses previstas na lei anterior e repetidas na lei
nova. (REsp 1.356.207-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 28/4/2015, DJe 7/5/2015).

Ponto 2 - O Direito Ambiental como Direito Econômico. A natureza econômica das normas de Direito
Ambiental.

30
2.1 O Direito Ambiental como direito econômico

A oposição entre economia e proteção ambiental deixa de existir plenamente, quando a política
econômica adotada traz de volta o relacionamento da economia com a natureza de uma forma integrativa.

A ligação umbilical entre os dois ramos do direito pode ser visualizada quando a Constituição “Econômica”
impõe como princípio a preservação ambiental, e a Constituição “Verde” possibilita a exploração
econômica mesmo em detrimento do meio ambiente desde que ex vi legis. Compreende, assim, que o
meio ambiente é um valor preponderante (mas, não intolerante) que deve estar interligado ao
desenvolvimento.

O próprio art. 225, §4º, CF é exemplo disso, pois declara alguns ecossistemas (mata atlântica, mangues,
etc.) como patrimônio nacional, não para torná-los estaticamente conservados, pelo contrário, sua
utilização econômica, inclusive quanto à utilização dos recursos naturais, é admissível, na forma da lei,
dentro das condições que assegurem a preservação do meio ambiente.

Outras intervenções do direito ambiental nas ações econômicas podem ser, assim, sintetizadas: a)
necessidade de planejamento ambiental, através do estudo prévio de impacto ambiental para evitar
atividades potencialmente destruidoras (art. 225, § 1º, IV); b) a sanção imposta pelo princípio ambiental do
Poluidor-Pagador, o qual impõe a responsabilidade àqueles que causam danos ambientais de arcarem com
o custos de recuperação do ato lesivo (art. 225, § 3º); c) a necessidade do Plano Diretor como instrumento
legal que possibilita o limite ao direito de propriedade mediante o zoneamento urbano, controlando assim,
as atividades potencialmente degradantes (lei 6938/81, art. 2º, V); d) função social necessária ao direito de
propriedade, retirando sua característica de direito soberano, em prol da transindividualidade (art. 170, II e
III).

Ademais, a busca por uma melhor qualidade de vida, em atenção ao princípio da dignidade da pessoa
humana, é objetivo central dos dois ramos jurídicos.

2.2 Princípios ambientais com viés econômico

Embora todos os princípios ambientais levem a uma correlação às ciências econômicas, alguns princípios
se destacam.

O princípio do desenvolvimento econômico é a síntese do entrelaçamento entre o Direito Ambiental e o


Direito Econômico.

O DESENVOLVIMENTO é SUSTENTÁVEL quando satisfaz as necessidades presentes sem comprometer a


habilidade das futuras gerações em satisfazer as suas próprias necessidades.

Já o princípio da UBIQUIDADE OU TRANSVERSALIDADE nos mostra que o meio ambiente deve ser
considerado em toda decisão política, sobretudo, as econômicas.

O princípio da FUNÇÃO SÓCIO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE tem como consequência básica fazer com
que a propriedade seja efetivamente exercida para beneficiar a coletividade e o meio ambiente (aspecto
positivo), não bastando apenas que não seja exercida em prejuízo de terceiros ou da qualidade ambiental
(aspecto negativo).

Ademais, o surgimento DO PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR foi inspirado na teoria econômica segundo


a qual os custos sociais externos decorrentes da produção industrial (custos resultantes da poluição)
devem ser internalizados, isto é, incluídos nos custos de produção dos agentes econômicos poluidores.

31
Por fim, o PRINCÍPIO DO PROTETOR RECEBEDOR objetiva premiar através de incentivos fiscais, financeiros
ou creditícios, quem desenvolve e adota práticas sustentáveis na sua atividade econômica.

2.3 Economia verde

A Economia Verde foi um dos principais temas da Rio+20 (Conferência das Nações Unidas sobre o
Desenvolvimento Sustentável), realizada na cidade do Rio de Janeiro em junho de 2012.

Definição: Economia verde é um conjunto de processos produtivos (industriais, comerciais, agrícolas e de


serviços) que ao ser aplicado em um determinado local (país, cidade, empresa, comunidade, etc.), possa
gerar nele um desenvolvimento sustentável nos aspectos ambiental e social.

Objetivo: O principal objetivo da Economia Verde é possibilitar o desenvolvimento econômico


compatibilizando-o com igualdade social, erradicação da pobreza e melhoria do bem-estar dos seres
humanos, reduzindo os impactos ambientais negativos e a escassez ecológica.

Importância e benefícios: A aplicação da Economia Verde em países desenvolvidos e em desenvolvimento


aumentaria a geração de empregos e o progresso econômico. Ao mesmo tempo, combateria as causas do
aquecimento global (emissões de CO2), do consumo irracional de água potável e dos fatores que geram a
deterioração dos ecossistemas.

Principais características da Economia Verde: - Pouco uso de combustíveis fósseis (gasolina, carvão, diesel,
etc.) e aumento do uso de fontes limpas e renováveis de energia; - Eficiência na utilização de recursos
naturais; - Práticas e processos que visam à inclusão social e erradicação da pobreza; - Investimento e
valorização da agricultura verde; - Tratamento adequado do lixo com sistemas eficientes de reciclagem; -
Qualidade e eficiência nos sistemas de mobilidade urbana.

2.4.Dumping ambiental

Ocorre dumping ambiental quando os preços baixos dos bens resultam do fato das empresa produtoras
estarem instaladas (ou terem-se instalado) em países cuja legislação não exige o cumprimento de normas
de defesa do ambiente, nem seguem os habituais padrões de qualidade do ambiente existentes nos países
desenvolvidos, pelo que tais empresas economizam custos ao não efetuarem investimentos no domínio
ambiental a que estariam obrigadas se estivessem instaladas em países desenvolvidos.

2.5. Instrumentos de implementação de políticas públicas ambientalmente sustentáveis

O papel do Estado na economia é de agente normativo e regulador, exercendo função de fiscalização,


incentivo e planejamento.

Os meios utilizados pelo Estado para intervir indiretamente na economia são fundamentais para a
implementação de políticas públicas ambientalmente corretas, quais sejam:.

A) Fiscalização: Não sendo coagidas pelo Poder Público a substituir seus métodos produtivos poluentes por
métodos mais limpos, as empresas que não respeitam a legislação ambiental acabam se beneficiando
economicamente. Ao continuarem exercendo suas atividades com métodos tecnológicos ultrapassados,
elas obtém menor custo de produção. Com um menor custo, as empresas poluentes disponibilizam
produtos mais baratos, expandindo seus negócios, em detrimento daquelas cuja produção industrial
tornou-se ambientalmente correta.

32
B) Multas Ambientais: O princípio do poluidor pagador tem como um de seus objetivos evitar a
concretização do dano, auxiliando na prevenção e na precaução. Desta forma, as multa ambientais passam
a ter uma finalidade dissuasiva, tendo em vista que a obrigação de pagar pelo dano causado atua, como
incentivo negativo face a todos aqueles que pretendem praticar uma conduta lesiva ao meio ambiente.

C) Instrumentos Econômicos: Através da adoção de instrumentos econômicos, como complementação do


direito regulamentar, busca-se a internalização dos custos ecológicos, facilitando a integração da dimensão
ambiental na política econômica. Ex: Na Suiça, os camponeses estabelecidos nos arredores dos Alpes
recebem isenções tributárias para manterem preservado o cartão postal do país. Nas proximidades de
Nova York, as propriedades rurais que contribuem para a preservação das nascentes e olhos d’água
também são recompensadas economicamente. No Brasil, somente poderão ser beneficiadas com
financiamentos públicos aquelas empresas que possuírem licenciamento ambiental (art. 12 da LPNMA).

C.1) Tributação Ambiental: Ocorre tributação ambiental quando são instituídos tributos com a finalidade
de viabilizar a preservação ambiental ou coibir condutas lesivas ao Meio Ambiente. São os denominados
“tributos verdes”.

C.1.1) IMPOSTO DE RENDA. No Brasil, a tributação ambiental foi instituída por via do artigo 1º da lei nº
5.106/66 ao determinar que as importâncias empregadas em florestamento e reflorestamento podem ser
abatidas ou descontadas nas declarações de rendimento das pessoas físicas e jurídicas, residentes ou
domiciliados no Brasil. (OBS: O Decreto 1.503/76, atualmente, não permite que o benefício possa ser
concedido às pessoas jurídicas) .

C.1.2) ICMS ECOLÓGICO: A CF, no artigo 158, estabelece que 25% do ICMS deve ser destinado aos
Municípios, cabendo ao legislador estadual legislar sobre o destino de ¼ deste montante. Alguns Estados
impõem como condição para o repasse desses valores a adoção de algumas condutas por parte do
município que induzam a uma maior conservação ambiental. O mecanismo teve origem a partir da
reivindicação de municípios com unidades de conservação em seus territórios, áreas onde o livre
desenvolvimento de atividades produtivas é vedado. Como forma de compensação econômica, aqueles
municípios receberiam parcela do ICMS arrecadado pelo estado membro. Ex: MG (Lei Estadual
13.803/2000;

C.1.3) IPTU: O citado imposto poderá ser progressivo em razão do valor do imóvel e ter alíquotas
diferentes de acordo com a localização e o uso. É possível, portanto, se falar no IPTU VERDE a contemplar o
critério de redução e separação de resíduos favorecendo a eficiência na separação de materiais recicláveis
e orgânicos. Apesar de o diagnóstico apontar poucas experiências municipais, do ponto de vista social, este
é um instrumento com alto potencial de inserção da população no processo de gestão, contribuindo para a
separação dos materiais recicláveis e, eventualmente, para a redução do volume de resíduo gerado.

C.1.4) ITR: O Art. 10, II, §1º da Lei 9.393/96, estabelece hipótese de isenção tributária ao considerar, para
fins de apuração do ITR, como área tributável, a área total do imóvel, subtraídas as áreas de preservação
permanente e de reserva legal; as áreas de interesse ecológico para a proteção dos ecossistemas; as áreas
comprovadamente imprestáveis para qualquer exploração agrícola, pecuária, granjeira, aquícola ou
florestal, declaradas de interesse ecológico mediante ato do órgão competente, federal ou estadual; as
áreas sob regime de servidão ambiental; e aquelas áreas cobertas por florestas nativas, primárias ou
secundárias em estágio médio ou avançado de regeneração.

Evolução da Jurisprudência sobre a necessidade de averbação da reserva legal para obter a isenção de
ITR:

33
- O posicionamento da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça era no sentido de ser considerado
ilegítimo o condicionamento do reconhecimento do referido benefício à prévia averbação dessa área no
Registro de Imóveis, pois a isenção não poderia ser conjurada por força de interpretação ou integração
analógica, máxime quando a lei tributária especial reafirmou o benefício através da Lei n.º 11.428/2006,
reiterando a exclusão da área de Reserva Legal de incidência da exação (art. 10, II, "a" e IV, "b").

-Já a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça entendia que enquanto o bônus individual resultante
da imposição da Reserva Legal ao contribuinte é a isenção no ITR, ao mesmo tempo, a averbação da
reserva funciona como garantia do meio ambiente.

- Posteriormente, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça em consonância com o entendimento


da 2ª turma, nos Embargos de Divergência no Resp nº. 1.027.051, deu primazia à interpretação sistemática
e sinalizou pela imprescindibilidade da averbação da Reserva Legal para que a isenção seja concedida aos
proprietários ou possuidores.

Ementa: TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ITR .


ISENÇÃO. ART. 10 , § 1º , II , a , DA LEI 9.393 /96. AVERBAÇÃO DA ÁREA DA
RESERVA LEGAL NO REGISTRO DE IMÓVEIS. NECESSIDADE. ART. 16 , § 8º , DA LEI
4.771 /65. 1. A Primeira Seção firmou o entendimento de que a isenção do ITR
relativa à área de Reserva Legal está condicionada à prévia averbação desse espaço
no registro do imóvel. Precedentes: EREsp 1.310.871/PR, Rel. Ministro Ari
Pargendler, DJe 04/11/2013; EREsp 1.027.051/SC, Rel. Ministro Benedito
Gonçalves, DJe 21/10/2013. 2. Agravo regimental não provido.

- Ocorre, contudo, que a obrigatoriedade desta averbação, que encontrava previsão na lei 4.771/65, foi
superada com a promulgação da lei 12.651/12. Assim, antecipando as possíveis demandas nesse sentido, a
Corte já acenou que, atualmente, para a concessão da isenção o requisito será a prévia inscrição da
propriedade no CAR.

C.1.5) IPI e II. Embora tais impostos não tenham finalidade ambiental, suas alíquotas são fixadas por um
critério seletivo, aumentando ou diminuindo conforme a matéria-prima empregada. Ex: aquisição de
automóveis biocombustível ou de eletrodomésticos com baixo gasto de energia.

C.1.6) TAXA. A Taxa Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA) é um tributo de natureza parafiscal instituído
e cobrado pelo IBAMA no exercício do seu poder de polícia para controlar e fiscalizar as atividades
potencialmente causadoras de impactos ambientais.

C.1.7) CIDE COMBUSTÍVEIS: A lei 10.336/01 deu caráter de tributo ambiental à CIDE-COMBUSTÍVEIS ao
instituir que o produto de sua arrecadação será destinado ao financiamento de projetos ambientais
relacionados com a indústria do petróleo e do gás.

C.1.8) ISENÇÃO DE PIS/PASEP E DA COFINS: De acordo com a Lei n. 11.828/08, no caso de doações em
espécie recebidas por instituições financeiras públicas controladas pela União e destinadas a ações de
prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento, inclusive programas de remuneração por
serviços ambientais, e de promoção da conservação e do uso sustentável dos biomas brasileiros, há
isenção da incidência da Contribuição para o PIS/Pasep e da Contribuição para o Financiamento da
Seguridade Social - COFINS. Tais doações também poderão ser destinadas ao desenvolvimento de ações de
prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento e de promoção da conservação e do uso
sustentável de outros biomas brasileiros e em outros países tropicais.

34
C.2) Logística Reversa: Conceituada legalmente como o instrumento de desenvolvimento econômico e
social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a
restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros
ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada.

São obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, os fabricantes, importadores,


distribuidores e comerciantes de: agrotóxicos, seus resíduos e embalagens; produtos cuja embalagem,
após o uso, constitua resíduo perigoso; pilhas e baterias; pneus; óleos lubrificantes, seus resíduos e
embalagens; lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; produtos
eletroeletrônicos e seus componentes. Tal sistema poderá ser estendido aos produtos comercializados em
embalagens plástica, metálica ou de vidro, e aos demais produtos e embalagens.

Cabe aos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes dos referidos tomar todas as medidas
necessárias para assegurar a implementação e operacionalização do sistema de logística reversa sob seu
encargo, podendo, entre outras medidas: I - implantar procedimentos de compra de produtos ou
embalagens usados; II - disponibilizar postos de entrega de resíduos reutilizáveis e recicláveis; III - atuar
em parceria com cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e
recicláveis, nos casos do §1º do artigo 33 da lei 12.305/10.

C.3) Depósito-Retorno (deposit-refund), mecanismo no qual o retorno de certas embalagens, vasilhames


ou produtos é remunerado. O consumidor irá pagar uma quantia suplementar, em função do tipo de
embalagem, e receberá a mesma quantia ao retornar a embalagem para o centro de coleta destes
materiais.

C.4) Incentivos Governamentais: O artigo 12 da LPNMA condiciona a concessão de incentivos e de


financiamentos públicos à comprovação do licenciamento ambiental. No mesmo sentido, foram
elaborados os “princípios do equador”, documento internacional que define critérios socioambientais
mínimos para a concessão de crédito.

C.5) Pagamento por Serviços Ambientais: O objetivo é implementar um fundo para utilização em
operações financeiras relacionadas ao pagamento por serviços ambientais aos proprietários rurais
conservacionistas que participem de projetos na condição de provedores de serviços ambientais, como
reflorestamento, conservação de áreas verdes e de vegetação de nascentes. Os recursos econômicos para
o pagamento dos proprietários conservacionistas podem ser originar dos Fundos de Recursos Hídricos,
mantidos, dentre outras fontes pelo instrumento de cobrança pelo uso da água.

Ponto 3 - Normas constitucionais relativas à proteção ambiental.

3.1 Histórico do D. Ambiental nas Constituições brasileiras


3.1.1 Constituições anteriores

As constituições que precederam a de 1988 não se preocuparam com a proteção do ambiente de forma
específica e global. Nelas, nem mesmo uma vez foi pregada a expressão meio ambiente, dando a revelar
total inadvertência ou até despreocupação com o próprio espaço em que vivemos.

Constituição do Império, de 1824: apenas cuidou da proibição de indústrias contrárias à saúde do


cidadão.

Primeira constituição republicana 1891: atribuía competência à União para legislar sobre as suas minas e
terras.
35
Constituição de 1934: dispensou proteção às belezas naturais, ao patrimônio histórico, artístico e cultural;
conferiu à União competência em matéria de riquezas do subsolo, mineração, águas, florestas, caça, pesca
e sua exploração.

Constituição de 1937: também se preocupou com a proteção dos monumentos históricos, artísticos e
naturais, bem como das paisagens e locais especialmente dotados pela natureza; inclui entre as matérias
de competência da União, legislar sobre minas, águas, florestas, caça, pesca, e sua exploração; cuidou ainda
da competência legislativa sobre subsolo e tratou da proteção das plantas e rebanhos contra moléstias e
agentes nocivos.

Constituição de 1946: além de manter a defesa do patrimônio histórico, cultural e paisagístico, conservou
como competência da União legislar sobre normas gerais da defesa da saúde, das riquezas do subsolo, das
águas, florestas, caça e pesca.

Constituição de 1967: insistiu na necessidade de proteção do patrimônio histórico, cultural e paisagístico;


disse ser atribuição da União legislar sobre normas gerais de defesa da saúde, sobre jazidas, florestas, caça,
pesca e água.

Constituição de 1969: emenda outorgada pela Junta Militar à Constituição de 1967, cuidou também da
defesa do patrimônio histórico, cultural e paisagístico. No tocante à divisão de competência, manteve as
disposições da Constituição emendada. Art. 172-“a lei regulará, mediante prévio levantamento ecológico, o
aproveitamento agrícola de terras sujeitas a intempéries e calamidades”; “o mau uso da terra impedirá o
proprietário de receber incentivos e auxílio do governo”. Introdução do vocábulo “ecológico” em textos
legais.

3.1.2 Constituição de 1988


3.1.2.1 Introdução

A Constituição de 1988 pode ser denominada “verde” em razão do grande destaque à proteção ambiental.
A dimensão conferida ao tema não se resume aos dispositivos concentrados, especialmente, no Capítulo
VI, do Título VIII, dirigido à ordem social; alcança, da mesma forma, inúmeros outros regramentos insertos
ao longo do texto nos mais diversos Títulos e Capítulos, decorrentes do conteúdo multidisciplinar da
matéria, a exemplo das disposições constantes nos Princípios Gerais da Atividade Econômica (arts. 170 a
181), na Política Urbana (arts. 182 a 183) e na Política Agrícola e Fundiária e à Reforma Agrária (arts. 184 a
191).

Vale ressaltar, no que concerne à ordem econômica, que após a EC 42/2003, se tornou expressa a sua
sujeição à defesa do meio ambiente (inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto
ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação). Neste sentido, já
decidiu o STF que a ordem econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios
destinados a tornar efetiva a proteção do meio ambiente, impondo ao proprietário de determinado
bem, inclusive, a necessidade de exercer comportamentos positivos, para que sua propriedade
concretamente conforme-se à preservação do meio ambiente.

Outrossim, a política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal deve observar
as diretrizes gerais de proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do
patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico (Estatuto da Cidade, art. 2, inciso XII), a
exemplo da função social da propriedade rural, a qual só se considera cumprida quando atender, dentre

36
outros, o requisito da utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio
ambiente (CR, art. 186, II).

3.1.2.2 Art. 225 CF

O art. 225 Define o meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito de todos e lhe dá a natureza
de bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
O reconhecimento material do direito fundamental ao ambiente justifica-se, também, na medida em que
tal direito é extensão do direito à vida, sob os aspectos da saúde e da existência digna com qualidade de
vida, ostentando o status de cláusula pétrea, consoante entendimento do STF.
O art. 225, par. 4º, declara patrimônio nacional a Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do
Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira, e sua utilização econômica, inclusive, quanto ao uso
dos recursos naturais é admissível, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do
meio ambiente.

Art. 225, seus parágrafos e incisos: compreende, segundo José Afonso da Silva, três conjuntos de normas.

O primeiro aparece no caput, onde se inscreve a norma matriz, reveladora do direito de todos ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado; o segundo encontra-se no §1º, com seus incisos, que versa sobre
os instrumentos de garantia e efetividade do direito anunciado no caput do artigo; o terceiro compreende
um conjunto de determinações particulares, em relação a objetos e setores, referidos nos §§ 2º a 6º, que,
por tratarem de áreas e situações de elevado conteúdo ecológico, merecem desde logo proteção
constitucional.

3.1.2.3 Caput – norma matriz

A norma matriz cria um direito constitucional fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
e, sendo assim, é indisponível.

Indisponibilidade acentuada - o interesse não é só da presente geração, mas das futuras também. Os
titulares do bem jurídico “meio ambiente” não são apenas os cidadãos do país – as presentes gerações,
mas também gerações futuras.

Bem de uso comum do povo - Em segundo lugar, o meio ambiente é considerado bem de uso comum do
povo, o que o qualifica como patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em
vista o uso coletivo.

Essencial à sadia qualidade de vida - Além de ser bem de uso comum do povo, é reputado bem essencial à
sadia qualidade de vida.

Esta norma cria para o Poder Público um dever constitucional, geral e positivo, representado por
verdadeiras obrigações de fazer, isto é: defender e preservar o meio ambiente. Esta ação é vinculada,
saindo da esfera da conveniência e oportunidade, para ingressar num campo de imposição.

O cidadão deixa de ser mero titular (passivo) do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e
passa também a ter a titularidade de um dever de defesa e preservação.

37
3.1.2.4 Parágrafo 1º - Deveres específicos do Poder Público na tutela do meio ambiente

Inciso I:

(1) Preservar e restaurar dos processos ecológicos essenciais - Cuida-se de garantir, através de ações
conjugadas de todas as esferas e modalidades do Poder Público, a preservação do que se encontra em boas
condições originais, e de recuperar o que foi degradado.

Processos ecológicos essenciais: garantem o funcionamento dos ecossistemas e contribuem para a


salubridade e higidez do meio ambiente.

(2) Promover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas - Significa lidar com as espécies, conservá-
las, e, se possível, recuperá-las. Cuida do equilíbrio das relações entre a comunidade biótica e seu habitat.
Em caso de dúvida, o gestor deve pautar-se pela solução mais segura sob o ponto de vista ecológico, uma
vez que o patrimônio da coletividade deve ser assegurado.

Inciso II:
(1) Preservar a biodiversidade e (2) fiscalizar as entidades de pesquisa e manipulação de material
genético.

Biodiversidade: variedade de seres que compõe a vida na Terra, a variabilidade de organismos vivos de
todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos, aquáticos e os
complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo, ainda a diversidade dentro de espécies, entre
espécies e ecossistemas.

Preservar a biodiversidade é reconhecer, inventariar e manter o leque dessas diferenças de organismos


vivos.

Foi no Fórum sobre Biodiversidade, realizado em Washington, em 1986, que a questão foi posta como
uma grande preocupação de nosso tempo, alertando para o desaparecimento acelerado das espécies, e
colocando o assunto na agenda internacional.

Inciso III:

Definir os espaços territoriais protegidos - figura no rol dos Instrumentos da Política Nacional do Meio
Ambiente, por força de determinação da L. 7.804, de 18.07.1989, que deu nova redação ao art. 9º, VI, da L.
6.938/81. Estes espaços são um dos instrumentos jurídicos para implementação do direito constitucional
ao ambiente hígido e equilibrado, em particular, no que se refere à estrutura e funções do ecossistema.

Existem quatro categorias fundamentais de espaços territoriais especialmente protegidos:

a) As áreas de proteção especial;

b) As áreas de preservação permanente;

c) As reservas legais; e

d) As unidades de conservação.

Inciso IV:

38
Exigir, na forma da lei, a realização de Estudo Prévio de Impacto Ambiental para a realização de obras e
atividades potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente – o EIA destina-se à
prevenção de danos. Inspirado em modelo americano; introduzido em nosso ordenamento pela lei
6.938/81, que dispõe sobre as diretrizes básicas para zoneamento industrial nas áreas criticas de poluição.

Objetivo - evitar que um projeto (obra ou atividade), justificável sob o ponto de vista econômico, revele-se
posteriormente nefasto ou catastrófico para o meio ambiente.

Necessidade de que seja elaborado no momento certo: antes do início da execução, ou mesmo antes de
atos preparatórios do projeto.

Publicidade: possibilita a participação popular nas discussões e aferições do conteúdo dos estudos.

Inciso V:

Controlar a produção, a comercialização e a utilização de técnicas, métodos e substâncias que impliquem


em risco para a vida, para a qualidade de vida e para o meio ambiente. Permite-se aqui, a interferência do
Poder Público nas atividades econômicas de domínio privado para impedir a prática danosa à saúde da
população ao meio ambiente.

Através do exercício do poder de policia, o Poder público deve fiscalizar e orientar a sociedade quanto aos
limites na utilização do meio ambiente.

Implicitamente são privilegiadas tecnologias limpas.

Inciso VI:

Promover a Educação Ambiental – é um dos grandes instrumentos para esclarecer e envolver a


comunidade no processo de responsabilidade com o meio ambiente. Tem por objetivo desenvolver a
percepção da necessidade de se preservar o meio ambiente.

Assim, a educação ambiental é fundamental à efetiva participação dos cidadãos no controle dos atos
estatais, bem como nos atos da iniciativa privada. Sem educação ambiental é impossível exigir da sociedade
efetiva participação na preservação dos recursos naturais.

O art. 2º, X da lei 6938/81 estabelece como princípio da politica nacional do meio ambiente “a educação
ambiental em todos os níveis de ensino, que tem por objetivo a capacitação para a participação ativa na
defesa do meio ambiente.”.

A Lei complementar 140 prevê a competência concorrente dos entes políticos para promover e orientar a
educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio
ambiente.

A lei 9795 instituiu a Politica nacional de Educação ambiental. A educação ambiental é reconhecida como
um “conjunto de processos por meio dos quais o individuo e a coletividade constroem valores sociais,
conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente...”
(art. 1º).

Inciso VII:
39
Proteger a Fauna e a Flora, vedadas práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a
extinção de espécies e submetam os animais a crueldade - Estão protegidos todos os animais
indistintamente (todo ser vivo tem valor, função e importância ecológica, seja como espécie ou como
indivíduo).

É estreita a ligação entre fauna e flora, expressada nas relações ecossistêmicas. Florestas, matas ciliares,
cerrados, manguezal, e quaisquer formas de vegetação estão sob a proteção constitucional.

3.1.2.5 Determinações específicas para áreas e situações que merecem proteção constitucional

Parágrafo 2º - Meio ambiente e mineração - Mineração possui interface direta com o meio ambiente: não
há como extrair um mineral sem danos.

Após consagrado interesse público existente sobre o aproveitamento dos minerais, impôs ao minerador a
responsabilidade de recuperar o meio ambiente degradado, segundo soluções técnicas exigidas pelo
órgão público. Anteriormente, a Lei 6.938/81, art. 2º, VIII já se referia à recuperação de áreas degradadas
como um dos princípios programáticos informadores da Política Nacional do Meio Ambiente.

Parágrafo 3º - A responsabilidade cumulativa das condutas e atividades lesivas - Ao poluidor, nos termos
da Constituição, aplicam-se medidas de caráter reparatório e punitivo.

A danosidade ambiental, potencial ou efetiva, pode gerar uma tríplice reação do ordenamento jurídico
(sanções administrativas, penais e civis).

Em âmbito civil, a responsabilidade ambiental é objetiva. O dever de reparar exsurge do nexo causal entre a
lesão e uma determinada atividade. A responsabilidade civil, segundo a teoria do risco integral, não
admite as hipóteses de excludentes do nexo de causalidade (força maior, caso fortuito, e fato de terceiro).

A responsabilidade civil do transportador de carga perigosa é objetiva, na


modalidade “risco integral”, em que não se admite qualquer causa excludente de
responsabilidade. (...) O STJ entendeu que a culpa de terceiro não elide a
responsabilidade de transportador de carga perigosa. Incide no caso a teoria do
risco integral, vindo daí o caráter objetivo da responsabilidade. O dano ambiental é,
por expressa previsão legal, de responsabilidade objetiva (art. 225, § 3º, da CF e
do art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81), impondo-se, pois, ao poluidor, indenizar, para,
posteriormente, ir cobrar de terceiro que porventura sustente ter
responsabilidade pelo fato. (STJ - Informativo 490).

Em âmbito penal, a responsabilidade é subjetiva.

Na esfera administrativa o tema é polêmico. Todavia, o Superior Tribunal de Justiça tem majoritariamente
(decisões nas duas turmas) repelido a tese da adoção da responsabilidade objetiva na imposição de
responsabilização administrativa ambiental, em razão: : i) da teoria da culpabilidade ao direito
sancionador; ii) do princípio da intranscendência das penas; e iii) da utilização de vocábulo
“transgressores” no caput do art. 14 da Lei de 8.938 (referência a responsabilidade administrativa), e não
tão somente “poluidor”, referida no §1º do art. 14, relativa a responsabilidade civil. (REsp 1251697/PR)

Essa orientação foi reafirmada em 2015 pela 1ª Turma do STJ em julgado com participação do
Desembargador Olindo Menezes (AgRg no AREsp 62.584/RJ).

40
Entretanto, nesse mesmo ano (três meses antes da decisão citada acima), a própria 1ª Turma, sem o
Desembargador Olindo, decidiu pela responsabilidade objetiva para aplicação de multa (REsp 1318051/RJ).

Não obstante, a posição hoje mais segura é no sentido da responsabilidade administrativa subjetiva,
devendo-se mencionar a posição do examinador Olindo e os precedentes do próprio STJ, bem como a
existência de julgados do própria 1ª Turma em sentido contrário.

Parágrafo 4º - Proteção especial às microrregiões

Cinco regiões entre os grandes biomas brasileiros recebem tratamento particular em decorrência das
características de seus ecossistemas: Floresta Amazônica, Mata Atlântica, Serra do Mar, Pantanal Mato-
grossense e Zona Costeira.

Tão grande foi a preocupação do legislador constitucional com a manutenção desses vastos territórios, que
os considerou patrimônio nacional, estabelecendo, em consonância com a devida proteção aos direitos de
terceira geração, uma limitação ao seu uso, que só se dará na forma da lei e dentro de condições que
assegurem a preservação do meio ambiente.

A expressão patrimônio nacional não tem o sentido de propriedade federal ou do Estado, mas de riqueza
que herdamos com a obrigação de preservar e transmitir às gerações futuras, sem perda de seu adequado
aproveitamento econômico. Qualificado como bem de uso comum do povo, não integra o patrimônio
disponível do Estado, que atua como simples administrador de um patrimônio que pertence à coletividade.

Parágrafo 5º - Indisponibilidade de terras devolutas e de áreas indispensáveis à preservação ambiental -


As terras devolutas ou arrecadadas pelo Estado por ações discriminatórias, desde que necessárias à
proteção de ecossistemas naturais, são consideradas indisponíveis.

No atual quadro constitucional, as terras devolutas foram mantidas como bens públicos. Pertencem à
União as indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias
federais de comunicação e à preservação ambiental definidas em lei. As demais pertencem aos Estados.

A indisponibilidade independe da ação discriminatória; não pressupõe a arrecadação, com julgamento


final da ação de discriminação. É determinada em razão da origem de seu domínio e da finalidade a que
se destina. Terras devolutas que concorrem para a proteção de determinado ecossistema são indisponíveis,
por força de mandamento constitucional, mesmo que ainda não incorporadas ao patrimônio público da
União, em virtude de ação discriminatória. A União, como detentora do domínio, só pode dispor dessas
terras na estrita conformidade da intentio legis, ou seja, com o cuidado de preservar os ecossistemas que
abrangem ou dos quais elas façam parte.

Parágrafo 6º - O controle das usinas nucleares - As usinas que operam com reator nuclear deverão ter sua
localização definida em lei federal. Somente após a edição de norma que regulamente a localização de
usina nuclear o empreendimento poderá ser efetivamente instalado. Só a lei, no sentido estrito (lei
federal), poderá dispor sobre a matéria, pois a Constituição também elegeu o controle político, efetuado
pelo Congresso Nacional, como forma de gestão das atividades nucleares.

41
Ponto 4 – Repartição de competências em matéria ambiental

Competência: para José Afonso da Silva, competência são as modalidades de poder de que se revestem os
órgãos ou entidades paraestatais para o desempenho de suas funções, ou a atribuição facultada a um
órgão, entidade ou agente do Poder Público para tomar decisões. Dessa forma, a autonomia federativa está
fundamentada na existência de órgãos governamentais próprios e na posse de competência exclusivas que
a Constituição Federal reconhece à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.

4.1. Introdução

A repartição de competências é um dos temas mais controvertidos de Direito Ambiental, pelas seguintes
razões:

a) as competências administrativas e legislativas em matéria ambiental foram delimitadas, pela primeira


vez, em sede constitucional;

b) em matéria ambiental, o texto constitucional estabeleceu rol de competências comuns, no caso de


atuação administrativa, e de competências concorrentes, no âmbito da atuação legislativa. Entretanto,
não conseguiu fixar com segurança os limites de atuação de cada ente, gerando superposição de
competências;

c) a utilização de conceitos jurídicos indeterminados como “interesse local”, “normas gerais”, pelo
legislador constituinte, assim como pela doutrina e jurisprudência (“predominância de interesses”, v.g.)
sem definição precisa de seu conteúdo;

d) a natureza difusa dos bens tutelados pelo direito ambiental;

e) a regulamentação tardia, através de lei complementar, das competências administrativas em matéria


ambiental (LC 140/2011 – que já é objeto de ação direta de inconstitucionalidade).

A repartição constitucional de competências é ínsita ao próprio Estado Federado, tendo a Constituição da


República adotado um sistema complexo que busca realizar o equilíbrio federativo em busca de uma maior
simetria possível. Apesar de certa divergência, entende-se que a CF/88 adotou um sistema de federalismo
de cooperação (em oposição ao dual), devendo haver uma relação de cooperação entre os entes (art. 23,
p.único CF/88). A Lei Complementar nº 140/2011 veio atender ao mandamento do referido dispositivo
constitucional.

A Constituição brasileira busca realizar o equilíbrio federativo, por meio de uma repartição de
competências que se fundamenta na técnica da enumeração dos poderes da União (arts. 21 e 22), com
poderes remanescentes para os Estados (art. 25, § 1º) e poderes definidos indicativamente para os
Municípios (art. 30). Também existem áreas comuns de atuação paralela e setores concorrentes entre
União e Estados, em que se outorga à primeira a competência para edição de normas gerais e aos últimos
as normas específicas.

42
4.2. Critérios para definição de competências

A doutrina ambiental (ROMEU THOMÉ e LEONARDO DE MEDEIROS GARCIA) lembra que há uma
bipartição da competência em: competência legislativa e competência material. A competência legislativa
se expressa no poder outorgado a cada ente federado para elaboração das leis e dos atos normativos. A
competência material cuida da atuação concreta do ente, através do exercício de poder de polícia.

a) exclusiva (art. 21) União


I – Material b) comum, cumulativa ou paralela (art.
União, Estados e DF
23)

a) privativa (art. 22) União


b) concorrente (art. 24) União, Estados e DF

b.1) concorrente suplementar (art. 24, Estados e DF


II – Legislativa §2º)
b.2) concorrente supletiva (art. 24, §3º) Estados e DF

c) exclusiva (art. 25, §§1º e 2º) Estados

d) remanescente (art. 25, §1º) Estados

Ademais, a doutrina identifica que a CF/88 adota, em matéria de repartição de competências entre os
entes políticos, tanto a técnica de repartição horizontal (separar radicalmente a competência entre os
entes federativos), como a vertical (divisão de uma mesma matéria em níveis diferentes da Federação).

4.2.1. Critérios utilizados pelo STF

Antes de adentrar na divisão de competências legislativas e materiais propriamente dita, importante a


fixação, sem ignorar a existência da Lei Complementar 140/2011, de alguns critérios definidos pelo STF
para fixação de competências.

a) Predominância de interesses  Na repartição de competências (não só ambiental), o critério norteador


será o da predominância de interesses, de modo que à União caberão matérias de predominante
interesse nacional (geral); aos Estados predominante interesse regional; e aos Municípios predominante
interesse local. Não há hierarquia entre entes políticos, mas sim de interesses.

b) Colaboração entre as pessoas políticas  Dentro de uma ideia de federalismo de cooperação.

c) Privilegiar a norma que atenda de forma mais efetiva ao interesse comum  imposição constitucional
da tutela do meio-ambiente (sendo o verdadeiro escopo constitucional).

d) Interesses da União são mais abrangentes e devem, ordinariamente ter precedência.

43
e) Teoria dos poderes implícitos  Quando a Constituição outorga a determinado ente uma competência
explícita, considera-se que implicitamente ela outorgou para este ente a competência para os meios
necessários à persecução de tal fim.

f) Princípio da Subsidiariedade  Utilizando outras palavras, PAULO AFONSO LEME MACHADO entende
que tal princípio reforça a competência dos entes menores, uma vez que a competência somente deve ser
transferida para um ente maior caso um ente menor não tenha capacidade de exercê-la bem.

4.3. Competência Legislativa

A regra é que todos os entes políticos têm competência para legislar concorrentemente sobre o meio
ambiente, cabendo à União editar normas gerais, a serem especificadas pelos Estados, Distrito Federal e
Municípios, de acordo com a amplitude do interesse, se regional ou local (art.24 da CF/88).

Em razão da inexistência de hierarquia entre as entidades que compõem a federação, o conflito entre leis
ambientais de diferentes esferas, caso não seja hipótese de aplicabilidade do princípio da especialidade,
será solucionado pela delimitação pontual do que é considerado como norma geral sobre o meio
ambiente e o que é disposição que verse sobre peculiaridades regionais ou locais.

De acordo com o STF, "o espaço de possibilidade de regramento pela legislação estadual, em casos de
competência concorrente abre-se: (1) toda vez que não haja legislação federal, quando então, mesmo
sobre princípios gerais, poderá a legislação estadual dispor [competência legislativa supletiva]; e (2)
quando, existente legislação federal que fixe os princípios gerais, caiba complementação ou suplementação
para o preenchimento de lacunas, para aquilo que não corresponda à generalidade; ou ainda, para a
definição de peculiaridades regionais [competência legislativa suplementar]". Ainda segundo o Pretório
Excelso, o meio ambiente do trabalho está fora da competência legislativa concorrente (competência
exclusiva da União).

A priori, não há que se falar em conflito quando normas estaduais, distritais ou municipais são mais
restritivas de que as normas federais, ou seja, instituam regras mais protetivas ao meio ambiente, desde
que a lei federal sobre normas gerais o permita (por exemplo, a Resolução CONAMA 02/1990, que
instituiu o Programa Nacional de Educação e Controle da Poluição Sonora - SILÊNCIO, prevê expressamente
em seu art. 3º que "sempre que necessário, os limites máximos de emissão poderão ter valores mais rígidos
fixados a nível estadual e municipal").

Cabe ressaltar que boa parte da doutrina, por outro lado, entende que no caso de conflito entre normas
ambientais deve prevalecer sempre a norma mais protetiva ao meio ambiente, ou seja, a prevalência das
normas mais restritivas. Tal tese é fundamentada nos princípios da precaução e do in dúbio pro natura,
bem nos arts. 24, §1º e 4º c/c art.225 da CF/88. Entretanto, observamos que tal teoria não tem
encontrado respaldo na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que, por diversas vezes, declarou a
inconstitucionalidade de normas estaduais e municipais mais protetivas em face a usurpação/ou
contrariedade com a lei federal, senão vejamos:

a) Inconstitucionalidade de Lei Estadual que Restringe o Uso Organismos Geneticamente Modificados.

Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada contra a lei estadual paranaense de


no 14.162, de 27 de outubro de 2003, que estabelece vedação ao cultivo, a
manipulação, a importação, a industrialização e a comercialização de organismos
geneticamente modificados. 2. Alegada violação aos seguintes dispositivos
44
constitucionais: art. 1o; art. 22, incisos I, VII, X e XI; art. 24, I e VI; art. 25 e art. 170,
caput, inciso IV e parágrafo único. 3. Ofensa à competência privativa da União e das
normas constitucionais relativas às matérias de competência legislativa concorrente.
4. Ação Julgada Procedente (ADI 3035)

b) Inconstitucionalidade de Lei Estadual que Restringe a Comercialização de Produtos com Agrotóxicos.

É formalmente inconstitucional a lei estadual que cria restrições à comercialização,


à estocagem e ao trânsito de produtos agrícolas importados no Estado, ainda que
tenha por objetivo a proteção da saúde dos consumidores diante do possível uso
indevido de agrotóxicos por outros países. A matéria é predominantemente de
comércio exterior e interestadual, sendo, portanto, de competência privativa da
União (CF, art. 22, inciso VIII). 2. É firme a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal no sentido da inconstitucionalidade das leis estaduais que constituam
entraves ao ingresso de produtos nos Estados da Federação ou a sua saída deles,
provenham esses do exterior ou não. 3. Ação direta julgada procedente. (ADI 3813)

c) Inconstitucionalidade de Lei Estadual que Veda a Comercialização de Amianto.

A Lei nº 9.055/95 dispôs extensamente sobre todos os aspectos que dizem respeito
à produção e aproveitamento industrial, transporte e comercialização do amianto
crisotila. A legislação impugnada foge e muito do que corresponde à legislação
suplementar, da qual se espera que preencha vazios ou lacunas deixado pela
legislação federal (ADI n. 2.396)

COMPETÊNCIA NORMATIVA – TRANSPORTE – AMIANTO. Surge relevante pedido


voltado a afastar do cenário jurídico-normativo diploma estadual a obstaculizar o
transporte de certa mercadoria na região geográfica respectiva – do estado. (....)
trecho do voto: Ante o quadro, defiro a medida acauteladora, em parte, para
determinar a suspensão da eficácia das interdições ao transporte praticado pelas
empresas associadas à arguente, quando fundamentadas em descumprimento da
norma proibitiva contida no artigo 1º da Lei nº 12.684/2007, do Estado de São
Paulo, reconhecendo-lhes o direito de efetuar o transporte interestadual e
internacional de cargas, inclusive as de amianto da variedade crisotila, observadas
as disposições legais e regulamentares editadas pela União. (ADPF 234 MC)

d) Inconstitucionalidade de lei municipal que proíbe queimada em canaviais


Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE ESTADUAL. LIMITES DA COMPETÊNCIA MUNICIPAL. LEI
MUNICIPAL QUE PROÍBE A QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR E O USO DO
FOGO EM ATIVIDADES AGRÍCOLAS. LEI MUNICIPAL Nº 1.952, DE 20 DE DEZEMBRO
DE 1995, DO MUNICÍPIO DE PAULÍNIA. RECONHECIDA REPERCUSSÃO GERAL.
ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 23, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, Nº 14,
192, § 1º E 193, XX E XXI, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO E ARTIGOS
23, VI E VII, 24, VI E 30, I E II DA CRFB. 1. O Município é competente para legislar
sobre meio ambiente com União e Estado, no limite de seu interesse local e desde
que tal regramento seja e harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais
entes federados (art. 24, VI c/c 30, I e II da CRFB). 2. O Judiciário está inserido na
sociedade e, por este motivo, deve estar atento também aos seus anseios, no

45
sentido de ter em mente o objetivo de saciar as necessidades, visto que também
é um serviço público. 3. In casu, porquanto inegável conteúdo multidisciplinar da
matéria de fundo, envolvendo questões sociais, econômicas e políticas, não é
permitido a esta Corte se furtar de sua análise para o estabelecimento do alcance
de sua decisão. São elas: (i) a relevante diminuição – progressiva e planejada – da
utilização da queima de cana-de-açúcar; (ii) a impossibilidade do manejo de
máquinas diante da existência de áreas cultiváveis acidentadas; (iii) cultivo de
cana em minifúndios; (iv) trabalhadores com baixa escolaridade; (v) e a poluição
existente independentemente da opção escolhida. 4. Em que pese a inevitável
mecanização total no cultivo da cana, é preciso reduzir ao máximo o seu aspecto
negativo. Assim, diante dos valores sopesados, editou-se uma lei estadual que
cuida da forma que entende ser devida a execução da necessidade de sua
respectiva população. Tal diploma reflete, sem dúvida alguma, uma forma de
compatibilização desejável pela sociedade, que, acrescida ao poder concedido
diretamente pela Constituição, consolida de sobremaneira seu posicionamento no
mundo jurídico estadual como um standard a ser observado e respeitado pelas
demais unidades da federação adstritas ao Estado de São Paulo. 5. Sob a
perspectiva estritamente jurídica, é interessante observar o ensinamento do
eminente doutrinador Hely Lopes Meireles, segundo o qual “se caracteriza pela
predominância e não pela exclusividade do interesse para o município, em relação
ao do Estado e da União. Isso porque não há assunto municipal que não seja
reflexamente de interesse estadual e nacional. A diferença é apenas de grau, e não
de substância." (Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores,
1996. p. 121.) 6. Função precípua do município, que é atender diretamente o
cidadão. Destarte, não é permitida uma interpretação pelo Supremo Tribunal
Federal, na qual não se reconheça o interesse do município em fazer com que sua
população goze de um meio ambiente equilibrado. 7. Entretanto, impossível
identificar interesse local que fundamente a permanência da vigência da lei
municipal, pois ambos os diplomas legislativos têm o fito de resolver a mesma
necessidade social, que é a manutenção de um meio ambiente equilibrado no que
tange especificamente a queima da cana-de-açúcar. 8. Distinção entre a proibição
contida na norma questionada e a eliminação progressiva disciplina na legislação
estadual, que gera efeitos totalmente diversos e, caso se opte pela sua
constitucionalidade, acarretará esvaziamento do comando normativo de quem é
competente para regular o assunto, levando ao completo descumprimento do
dever deste Supremo Tribunal Federal de guardar a imperatividade da
Constituição. 9. Recurso extraordinário conhecido e provido para declarar a
inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do
Município de Paulínia”. (RE 586224 / SP)

4.3.1. União

A União possui competências legislativas privativa (art.21 da CF) e concorrente (art.24 da CF) para legislar
sobre o meio ambiente. No caso de competência legislativa privativa da União, a matéria, em princípio,
deve ser tratada com exclusividade, com base no critério da predominância de interesses – o próprio
legislador constituinte já elencou matérias que considerou de interesse predominantemente nacional. Nos
termos do art. 22 da CF/88:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: IV – águas, energia,


informática, telecomunicações e radiodifusão; XII – jazidas, minas, outros recursos
46
minerais e metalurgia; XIV – populações indígenas; XVIII – sistema estatístico,
sistema cartográfico e de geologia nacional; XXVI – atividades nucleares de
qualquer natureza. Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados
a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo.

Ressalta-se ainda que o fato de a competência legislativa ser privativa da União não significa que, em
princípio, somente a ela caiba a fiscalização. Estados e Municípios podem e devem zelar pela proteção do
meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas (competência material comum).

Entretanto, conforme o parágrafo único do art.22 da CF, existe a possibilidade de delegação específica
para Estados legislarem sobre questões pontuais. Neste ponto, convém ressaltar que a delegação deve
ocorrer por meio de lei complementar e de forma específica, uma vez que a delegação genérica por parte
da União significaria negar o caráter privativo de sua competência constitucional, fato, por óbvio, não
admitido pelo ordenamento. Ademais, ALEXANDRE DE MORAES aponta como requisito implícito para a
delegação do parágrafo único do art.22 da CF – impossibilidade de delegação a uns Estados em detrimento
de outros, em virtude da proibição do estabelecimento de preferências.

Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre


questões específicas das matérias relacionadas neste artigo.

Compete, ainda, à União, no âmbito das ATRIBUIÇÕES CONCORRENTES, estabelecer normas gerais sobre
as matérias discriminadas no art. 24 da CF/88:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar


concorrentemente sobre: I – direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico
e urbanístico; VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do
solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; VII
– proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; VIII –
responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de
valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

Um exemplo de norma geral da União em matéria ambiental é o Código Florestal, que dispõe, entre
outras coisas, sobre a proteção da vegetação nativa. Nada impede que os Estados instituam também seus
Códigos Florestais, desde que não disponham de forma contrária ao Código Nacional.

Observe-se, contudo, que “normal geral” não é o mesmo que norma genérica. Segundo a melhor doutrina,
geral é o interesse abarcado pela norma e não a regulamentação em si, podendo a lei geral tratar uma
questão de forma pormenorizada. Por exemplo: APP com largura mínima de 30m para faixas marginais ao
longo das bordas de cursos d’água com menos de 10m de largura (art. 4º, I, “a”, do Código Florestal). É
norma geral, apesar de detalhista. Assim, a antítese da normal geral é a norma particular, que adentra a
peculiaridade de determinado Estado ou Município, sendo, dessa forma, inconstitucional.

4.3.2. Estados e DF

Os Estados e o Distrito Federal legislam concorrentemente sobre as matérias consignadas no já transcrito


art. 24 da CF. Tais entes federados não possuem competência enumerada, sendo identificada por exclusão
– quando não for privativa na União e dos Municípios – ou por se tratar de competência concorrente –
quando possuir competência em conjunto com a União.

47
As normas gerais da União limitam-se a estabelecer preceitos gerais. Não podem, em tese, especificar
situações que, por sua natureza, são campo reservado aos Estados-membros, perpassando o escopo de
coordenação e uniformização.

É concorrente, por exemplo, a competência para legislar sobre florestas. O Código Florestal passou a ser
considerado norma geral depois da vigência da CF/88. Seus dispositivos, a partir de então, foram elevados
à condição de princípios gerais obrigatórios, podendo os Estados legislar sobre florestas até onde não
exista confronto com as regras genéricas.

No âmbito da competência concorrente, os Estados e o DF atuarão também para complementar as normas


gerais expedidas pela União. Trata-se do exercício da competência concorrente suplementar ou
complementar, insculpida no art. 24,§2º, da CF. Como exemplo do exercício desta competência
suplementar, a Política Nacional de Meio Ambiente (norma federal) prevê a competência dos Estados para
complementar o seu conteúdo normativo (art. 6o, §1o ).

Além disso, a atuação concorrente dos Estados e DF poderá ocorrer de forma supletiva, é dizer, exercer
competência plena para edição de normas gerais e específicas sobre os assuntos previstos no art. 24 da
CF, diante da inércia da União, conforme autoriza o §3º deste artigo. No caso de superveniência de lei
federal, será suspensa a eficácia da lei estadual ou distrital no ponto que for contrária à lei federal.

Aos Estados também é reservada a competência legislativa remanescente (art. 25, §1º da CF). Com isso,
os Estados podem legislar sobre matérias que não estejam implícita ou explicitamente vedadas. A
atribuição da competência remanescente aos Estados evita lacunas no sistema constitucional de repartição
de competências.

4.3.3. Municípios

A doutrina majoritária entende que os Municípios também possuem competência legislativa


concorrente em matéria ambiental, extraindo-a do art.30, incisos I e II da CF.

A base constitucional para a elaboração da lei municipal encontra-se no art. 30, I e II, da Carta Magna.
Embora o inciso I não seja específico para o meio ambiente, a matéria encontra-se nele incluída, conforme
se observa na expressão “assuntos de interesse local”. Igualmente, pode-se verificar, a partir do inciso II, a
possibilidade de o Município suplementar, no que couber, a legislação federal e estadual (v.STF, RE
673.681/SP, Rel. Ministro Celso de Mello (16.12.2014).

Art. 30. Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesse local; II -
suplementar a legislação federal e a estadual no que couber; IX - promover a
proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação
fiscalizadora federal e estadual.

Tal competência está disciplinada no § 2º do art. 6º da Lei nº 6.938/81, que subordina a legislação
municipal sobre o meio ambiente aos preceitos contidos nas leis estaduais existentes.

Art. 6º. § 1º Os Estados, na esfera de suas competências e nas áreas de sua


jurisdição, elaborarão normas supletivas e complementares e padrões relacionados
com o meio ambiente, observados os que forem estabelecidos pelo CONAMA. (...) §
48
2º Os Municípios, observadas as normas e os padrões federais e estaduais, também
poderão elaborar as normas mencionadas no parágrafo anterior.

Inconstitucionalidade de Lei Municipal, que proibia o uso do fogo, prejudicando toda uma classe de
trabalhadores canavieiros, em face da Lei Estadual que previa a diminuição gradual da queima da cana
de açúcar:

O município é competente para legislar sobre o meio ambiente, com a União e o


Estado-membro, no limite do seu interesse local e desde que esse regramento
seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (CF,
art. 24, VI, c/c o art. 30, I e II). (…) O Plenário asseverou que, na espécie, não seria
permitida uma interpretação na qual não se reconhecesse o interesse municipal em
fazer com que sua população gozasse de um meio ambiente equilibrado. (...)
Quando, não obstante existentes os interesses nacional e estadual, não houver
legislação editada por tais entes, os Municípios podem livremente atuar no campo
do interesse local (competência legislativa supletiva). No entanto, quando
existirem leis estaduais e federais, há a “questão de identificação da
preponderância desses interesses notadamente comuns”. Portanto, seria forçoso
admitir que todo o sistema do meio ambiente, no tocante à situação dos autos,
proporia determinada solução estrita, qual seja, planejar a diminuição gradual da
queima da cana, enquanto que o diploma normativo atacado disciplinaria de
maneira completamente diversa, na contramão da intenção que se extrairia do
plano nacional. Seria, pois, cristalino que o tratamento dispensado pela legislação
municipal iria de encontro ao sistema estruturado de maneira harmônica entre as
esferas federal e estadual. Outrossim, não se poderia enquadrar a matéria como
de interesse local, específico de um único município. O interesse seria abrangente,
a atrair, portanto, para a disciplina do tema, a competência do Estado-membro, a
apanhar outros municípios” (RE-586224).

Nota: No caso, o STF entendeu que deveria prevalecer a garantia dos empregos dos trabalhadores
canavieiros, que merecem proteção diante do chamado progresso tecnológico e da respectiva
mecanização, ambos trazidos pela pretensão de proibição imediata da colheita da cana mediante uso de
fogo. Entendeu-se que a proibição da queima da cana não pode ser imediata, abrupta, mas sim gradual,
progressiva, sob pena de gerar um desemprego em massa no setor.

4.4. Competência Material

Competência material é a competência administrativa propriamente dita, que atribui a uma esfera de
poder o direito de fiscalizar e impor sanções em caso de descumprimento da lei, intrinsecamente
correlacionada com o poder de polícia estatal.

Em regra, o policiamento de determinada atividade é da atribuição da pessoa de Direito Público interno


dotada da competência legislativa. Contudo, observa TERENCE DORNELLES, que “a Constituição atribuiu,
pela primeira vez, separadamente, competências administrativas, as quais eram, até então,
automaticamente incluídas nas competências legislativas correspondentes. (...) Depois da entrada em vigor
do art. 23, qualquer ente público tem competência para aplicar a legislação ambiental, ainda que a
norma não tenha sido de autoria do ente que a aplica. O art. 23, VI e VII, dispõe que os três níveis da
federação têm competência para tomar medidas em prol da defesa do meio ambiente, da flora e fauna,

49
contra poluição etc., ficando agora ao critério das prefeituras executar também normas federais ou
estaduais, quando necessário”.

O art. 23 da CF/88 estabeleceu a competência material comum da União, Estados e Municípios na seara
ambiental, nos seguintes termos:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios: III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico,
artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios
arqueológicos; IV – impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras
de arte e de outros bens de valor histórico, artístico e cultural; VI – proteger o meio
ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII – preservar as
florestas, a fauna e a flora; IX – promover programas de construção de moradias e a
melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico; XI – registrar,
acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de
recursos hídricos e minerais em seus territórios. Parágrafo único. Lei complementar
fixará normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em
âmbito nacional.

No que tange a competência comum, não importa o ente político que tenha o domínio do bem ou que
legislou sobre o assunto, todos os entes devem atuar na proteção ao meio ambiente, de forma ampla.
Vejamos:

Art. 17. Compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização,


conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infração
ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à
legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou
autorizada.
§ 1o Qualquer pessoa legalmente identificada, ao constatar infração ambiental
decorrente de empreendimento ou atividade utilizadores de recursos ambientais,
efetiva ou potencialmente poluidores, pode dirigir representação ao órgão a que se
refere o caput, para efeito do exercício de seu poder de polícia.
§ 2o Nos casos de iminência ou ocorrência de degradação da qualidade ambiental,
o ente federativo que tiver conhecimento do fato deverá determinar medidas para
evitá-la, fazer cessá-la ou mitigá-la, comunicando imediatamente ao órgão
competente para as providências cabíveis.
§ 3o O disposto no caput deste artigo não impede o exercício pelos entes
federativos da atribuição comum de fiscalização da conformidade de
empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente poluidores ou
utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em vigor,
prevalecendo o auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a
atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o caput.
Conforme já dito, alguns autores entendem que o art.23 da CF é a tentativa de dar concretude a um
federalismo cooperativo. Por outro lado, outros autores encaram como um mero dispositivo programático,
refletindo intenções ideológicas com reduzido grau de eficácia.

50
PAULO AFFONSO LEME MACHADO defende a aplicação do princípio da subsidiariedade, salientando que
nada deverá ser exercido por um poder de nível superior, se puder ser cumprido pelo inferior. Ou seja, o
Município prefere ao Estado e à União. No entanto, tal princípio não afasta a possibilidade de atuação
supletiva ou concorrente da entidade federal. Nesse sentido, os precedentes do TRF1:

Em se tratando de exploração de atividade potencialmente poluidora do meio


ambiente, a competência do ente municipal e/ou estadual, para o licenciamento
ambiental, não exclui a competência supletiva do IBAMA, que se impõe, em casos
assim, em face da tutela cautelar constitucionalmente prevista no art. 225, § 1º, V
e respectivo § 3º, da Constituição Federal, na linha autoaplicável de imposição ao
poder público (incluído o Poder Judiciário) e à coletividade o dever de defender e
preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado, como bem de uso
comum do povo e essencial à qualidade de vida, para as presentes e gerações
futuras (CF, art. 225, caput), tudo em harmonia com o princípio da precaução, já
consagrado em nosso ordenamento jurídico (AMS 0012338-54.2008.4.01.3300)

4.4.1. Competência da União

A União possui competências exclusivas e comuns no que tange à matéria ambiental. Nos termos do art.21
da CF/88:

Art. 21. Compete à União: IX – elaborar e executar planos nacionais e regionais de


ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social; XII – explorar,
diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão: b) os serviços e
instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água,
em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos; XV –
organizar e manter os serviços oficiais de estatística, geografia, geologia e
cartografia de âmbito nacional; XIX – instituir sistema nacional de gerenciamento
de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso; XX –
instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento
básico e transportes urbanos; XXII – executar os serviços de polícia marítima,
aeroportuária e de fronteiras; XXIII – explorar os serviços e instalações nucleares de
qualquer natureza e exercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o
enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios
nucleares e seus derivados, atendidos os seguintes princípios e condições: a) toda
atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos e
mediante aprovação do Congresso Nacional; b) sob regime de concessão ou
permissão, é autorizada a utilização de radioisótopos para a pesquisa e usos
medicinais, agrícolas, industriais e atividades análogas; c) a responsabilidade civil
por danos nucleares independe da existência de culpa. XXV – estabelecer as áreas e
as condições para o exercício da atividade de garimpagem, em forma associativa.

Os recursos minerais são de propriedade da União, e não do proprietário do solo, cabendo, portanto, ao
Poder Público Federal autorizar sua exploração. Da mesma forma, a pesquisa e a lavra das jazidas de
petróleo dependem de autorização do ente federal (art.176 e 177) – razão pela qual não é devida

51
indenização no caso de existir jazida mineral em bem imóvel a ser desapropriado, salvo se autorizada a
pesquisa, lavra ou exploração.

Acerca das atividades nucleares, pela importância e gravidade da matéria, considerando os riscos
decorrentes de uma administração deficitária e a responsabilidade do Brasil, não apenas ante seus
cidadãos, mas também perante a comunidade internacional, a União exerce o monopólio da sua
exploração.

4.3.2. Competência dos Estados e DF

Deixando aos Estados a matéria remanescente, a CF tornou de menor interesse a competência material
privativa de tais unidades da Federação. Nos termos do art. 25, § 2º, da CF/88:

Art. 25. § 1º. São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam
vedadas por esta Constituição. (...) § 2º. Cabe aos Estados explorar diretamente, ou
mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a
edição de medida provisória para a sua regulamentação.

Cumpre observar, porém, que os Estados têm competência material para agir administrativamente,
mesmo nos casos em que a legislação tenha sido editada pela União ou por Municípios.

4.3.3. Competência dos Municípios

A competência administrativa dos Municípios em matéria ambiental apresenta-se de forma reduzida ou de


forma difusa (“interesse local”). Exemplo: fiscalização de um bem tombado de interesse histórico exclusivo
do Município.

4.4. A LEI COMPLEMENTAR 140/2001 – Regulamentação da Repartição de Competências


Administrativas em Matéria Ambiental

Antes da edição da referida lei complementar, os entes administrativos disputavam a prioridade no


exercício de certas atribuições, bem como rejeitavam outras, gerando grave insegurança jurídica.

A LC 140, consagrando o federalismo cooperativo, em atendimento ao disposto no parágrafo único do art.


23 da CF/88, veio fixar normas, para ações administrativas decorrentes do exercício da competência
comum de todos os entes da federação, relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção
do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da
fauna e da flora (são alguns dos incisos do art. 23 que tratam de matéria ambiental).

Por oportuno, já cabe ressaltar que segundo a Orientação Jurídica Normativa (OJN) nº 33/2012, da
Procuradoria Federal do IBAMA, a Lei Complementar 140/2011 acolheu, em regra, a LOCALIZAÇÃO como
critério para definição do órgão competente. Com isso, se os impactos ambientais de um
empreendimento ultrapassarem os limites estaduais, mas o empreendimento estiver localizado
integralmente em um único Estado, seu licenciamento ambiental será de competência do órgão estadual e
não do IBAMA, como acontecia anteriormente – a LC tenta “desfederalizar o licenciamento ambiental. Ao
lado do critério geográfico, em relação à União, temos ainda o critério da atividade (para a atividade militar
e com energia nuclear) e uma via aberta, que é a definição por ato do Poder Executivo Federal segundo
proposta do Conselho Tripartite.

52
4.4.1. ESTRUTURA DA LC 140/2011

A Lei Complementar está dividida em quatro capítulos:

DISPOSIÇÕES GERAIS

a) Fundamentos da LC 140 (art. 1º): - proteger o meio ambiente; - proteger paisagens naturais notáveis; -
combater a poluição; - preservar fauna e flora.

b) Objetivos da LC 140 (art. 3º):

- promover gestão descentralizada, democrática e eficiente;

- desenvolvimento sustentável, com ênfase na dignidade da pessoa humana, erradicação da pobreza e


redução das desigualdades sociais e regionais;

- harmonizar políticas e ações, evitando sobreposição de ações e conflitos de atribuições;

- uniformizar política ambiental no país, respeitando peculiaridades regionais e locais.

c) Conceitos trazidos pela LC 140 (art. 2º):

LICENCIAMENTO AMBIENTAL: o procedimento administrativo destinado a licenciar atividades ou


empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes,
sob qualquer forma, de causar degradação ambiental;

ATUAÇÃO SUPLETIVA: ação do ente da Federação que se substitui ao ente federativo originariamente
detentor das atribuições, nas hipóteses definidas nesta Lei Complementar;

ATUAÇÃO SUBSIDIÁRIA: ação do ente da Federação que visa a auxiliar no desempenho das atribuições
decorrentes das competências comuns, quando solicitado pelo ente federativo originariamente detentor
das atribuições definidas nesta Lei Complementar.

4.4.1.1 Instrumentos de Cooperação

Os entes federativos podem valer-se, entre outros, dos seguintes instrumentos de cooperação
institucional:

I - Consórcios Públicos, nos termos da legislação em vigor;

II - Convênios, acordos de cooperação técnica e outros instrumentos similares com órgãos e entidades do
Poder Público, respeitado o art. 241 da Constituição Federal;

• convênios podem ser firmados por tempo indeterminado, sendo exceção, portanto, à regra
máxima de 60 meses estabelecida pela Lei 8.666/93;

III - Comissão Tripartite Nacional, Comissões Tripartites Estaduais e Comissão Bipartite do Distrito Federal;

• a Comissão Tripartite Nacional e as Estaduais são formadas, paritariamente, por representantes das
três esferas de poder; a do DF é Bipartite, já que este ente não se divide em Municípios

IV - fundos públicos e privados e outros instrumentos econômicos;

53
• Fundo Nacional do Meio Ambiente (objeto de arguição no último concurso)

O Fundo Nacional do Meio Ambiente criado há 25 anos, é o mais antigo fundo ambiental da América Latina.
O FNMA é uma unidade do Ministério do Meio Ambiente (MMA), criado pela lei nº 7.797/ 1989, com a
missão de contribuir, como agente financiador, por meio da participação social, para a implementação da
Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA.

Seu objetivo é desenvolver projetos que visem ao uso racional e sustentável dos recursos naturais,
incluindo a manutenção, a melhoria ou a recuperação da qualidade ambiental, no sentido de elevar a
qualidade de vida do povo brasileiro.

Constituirão recursos do Fundo Nacional de Meio Ambiente: I - dotações orçamentárias da União; II -


recursos resultantes de doações, contribuições em dinheiro, valores, bens móveis e imóveis, que venha a
receber de pessoas físicas e jurídicas; III - rendimentos de qualquer natureza, que venha a auferir como
remuneração decorrente de aplicações do seu patrimônio; IV - outros, destinados por lei.

Serão consideradas prioritárias as aplicações de recursos financeiros aos projetos das seguintes áreas:
Unidade de Conservação, Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico, Educação Ambiental, Manejo e
Extensão Florestal, Desenvolvimento Institucional, Controle Ambiental e Aproveitamento Econômico
Racional e Sustentável da Flora e Fauna Nativa.

Será dada prioridade aos projetos que tenham sua área de atuação na Amazônia Legal ou no Pantanal
Mato-Grossense.

V - delegação de atribuições de um ente federativo a outro, respeitados os requisitos previstos nesta Lei
Complementar;

VI - delegação da execução de ações administrativas de um ente federativo a outro, respeitados os


requisitos previstos nesta Lei Complementar.

Obs.: só poderá haver delegação se o ente delegatário dispor de órgão ambiental capacitado e conselho de
meio ambiente. Considera-se capacitado o órgão que possui técnicos em quantidade compatível com a
demanda.

4.4.1.2 Ações de Cooperação

Nesse capítulo são descritas as diversas ações administrativas (competências) pertencentes aos diversos
entes da Federação, tratando o art. 7º das atribuições da União, o 8º das do Estado e o 9º das dos
Municípios.

4.4.2. Competência da União

Em regra, as competências da União estão relacionadas a efetivação da Política Nacional do Meio


Ambiente em nível nacional, compreendendo planejamento, diretrizes, articulação entre os demais entes,
conscientização pública, entre outras.

Para o licenciamento federal, há um critério geral, que é o da localização geográfica do empreendimento


ou atividade (e não mais do impacto ambiental), e dois critérios suplementares: o da atividade (militar ou
nuclear/radioativa) e o do ente instituidor da unidade de conservação – instituída pela União, o

54
licenciamento é de competência desse ente (o art. 12 da LC nomeia expressamente esse critério, dizendo
não se aplicar às APAs).

Com isso, são ações administrativas da União:

I - formular, executar e fazer cumprir, em âmbito nacional, a Política Nacional do


Meio Ambiente;
II - exercer a gestão dos recursos ambientais no âmbito de suas atribuições;
III - promover ações relacionadas à Política Nacional do Meio Ambiente nos âmbitos
nacional e internacional;
IV - promover a integração de programas e ações de órgãos e entidades da
administração pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
relacionados à proteção e à gestão ambiental;
V - articular a cooperação técnica, científica e financeira, em apoio à Política
Nacional do Meio Ambiente;
VI - promover o desenvolvimento de estudos e pesquisas direcionados à proteção
e à gestão ambiental, divulgando os resultados obtidos;
VII - promover a articulação da Política Nacional do Meio Ambiente com as de
Recursos Hídricos, Desenvolvimento Regional, Ordenamento Territorial e outras;
VIII - organizar e manter, com a colaboração dos órgãos e entidades da
administração pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, o Sistema
Nacional de Informação sobre Meio Ambiente (Sinima);
IX - elaborar o zoneamento ambiental de âmbito nacional e regional;
X - definir espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos;
XI - promover e orientar a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a proteção do meio ambiente;
XII - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e
substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio
ambiente, na forma da lei;
XIII - exercer o controle e fiscalizar as atividades e empreendimentos cuja atribuição
para licenciar ou autorizar, ambientalmente, for cometida à União;
XIV - promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades: a)
localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; b)
localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma continental ou na
zona econômica exclusiva; c) localizados ou desenvolvidos em terras indígenas; d)
localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pela União,
exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs); e) localizados ou desenvolvidos
em 2 (dois) ou mais Estados; f) de caráter militar, excetuando-se do licenciamento
ambiental, nos termos de ato do Poder Executivo, aqueles previstos no preparo e
55
emprego das Forças Armadas, conforme disposto na Lei Complementar no 97, de 9
de junho de 1999; g) destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar,
transportar, armazenar e dispor material radioativo, em qualquer estágio, ou que
utilizem energia nuclear em qualquer de suas formas e aplicações, mediante
parecer da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen); ou h) que atendam
tipologia estabelecida por ato do Poder Executivo, a partir de proposição da
Comissão Tripartite Nacional, assegurada a participação de um membro do
Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), e considerados os critérios de
porte, potencial poluidor e natureza da atividade ou empreendimento;
XV - aprovar o manejo e a supressão de vegetação, de florestas e formações
sucessoras em:
a) florestas públicas federais, terras devolutas federais ou unidades de conservação
instituídas pela União, exceto em APAs; e
b) atividades ou empreendimentos licenciados ou autorizados, ambientalmente,
pela União;
XVI - elaborar a relação de espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção e
de espécies sobre-explotadas no território nacional, mediante laudos e estudos
técnico-científicos, fomentando as atividades que conservem essas espécies in situ;
XVII - controlar a introdução no País de espécies exóticas potencialmente invasoras
que possam ameaçar os ecossistemas, habitats e espécies nativas;
XVIII - aprovar a liberação de exemplares de espécie exótica da fauna e da flora
em ecossistemas naturais frágeis ou protegidos;
XIX - controlar a exportação de componentes da biodiversidade brasileira na
forma de espécimes silvestres da flora, micro-organismos e da fauna, partes ou
produtos deles derivados;
XX - controlar a apanha de espécimes da fauna silvestre, ovos e larvas;
XXI - proteger a fauna migratória e as espécies inseridas na relação prevista no
inciso XVI;
XXII - exercer o controle ambiental da pesca em âmbito nacional ou regional;
XXIII - gerir o patrimônio genético e o acesso ao conhecimento tradicional
associado, respeitadas as atribuições setoriais;
XXIV - exercer o controle ambiental sobre o transporte marítimo de produtos
perigosos; e
XXV - exercer o controle ambiental sobre o transporte interestadual, fluvial ou
terrestre, de produtos perigosos.
Parágrafo único. O licenciamento dos empreendimentos cuja localização
compreenda concomitantemente áreas das faixas terrestre e marítima da zona
costeira será de atribuição da União exclusivamente nos casos previstos em
tipologia estabelecida por ato do Poder Executivo, a partir de proposição da
Comissão Tripartite Nacional, assegurada a participação de um membro do
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Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e considerados os critérios de porte,
potencial poluidor e natureza da atividade ou empreendimento.
Além disso, a União é responsável pela aprovação do manejo e da supressão de vegetação, de floresta e de
formações sucessoras em: florestas públicas federais, terras devolutas federais, unidades de conservação
instituídas pela União, exceto APA’s e atividades e empreendimentos licenciados ou autorizados
ambientalmente pela União.

4.4.3. Competência dos Estados e do DF

Basicamente, a competência é a mesma da União, só que em âmbito estadual, incluindo-se a formulação,


execução e imposição da Política Estadual do Meio Ambiente.

Para o licenciamento estadual há dois critérios: o residual, que deve ser orientado pela regra geral da lei,
qual seja, o da localização geográfica do empreendimento ou atividade, e o do ente instituidor da unidade
de conservação – se instituída pelo Estado, é desse ente o licenciamento na área (que não se aplica às
APAs).

Sobre o licenciamento ambiental, compete ao Estado: a) promover o licenciamento ambiental de


atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores
ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, ressalvado o disposto nos arts. 7º e 9º;
b) promover o licenciamento ambiental de atividades ou empreendimentos localizados ou desenvolvidos
em unidades de conservação instituídas pelo Estado, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs).

Na prática, a competência dos Estados, seguindo a lógica constitucional, é residual, cabendo a ele o que
não for de competência da União ou dos Municípios.

Também se insere na competência dos Estados, aprovar o manejo e a supressão de vegetação, de floresta
e de formações sucessoras em: florestas públicas estaduais ou Unidades de Conservação do Estado, exceto
APA’s; imóveis rurais excetuados os casos conferidos à União; atividades ou empreendimentos licenciados
ou autorizados, ambientalmente, pelos Estados.

4.4.4. Competência dos Municípios e do DF

Basicamente, a competência é a mesma da União e dos Estados, só que em âmbito municipal, incluindo-se
a formulação, execução e imposição da Política Municipal do Meio Ambiente.

Para o licenciamento municipal há dois critérios: permanece o do impacto ambiental local e o do ente
instituidor das unidades de conservação (que não se aplica às APAs);

Sobre o licenciamento ambiental, compete ao Município:

(...) promover o licenciamento ambiental das atividades ou empreendimentos: a)


que causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito local, conforme
tipologia definida pelos respectivos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente,
considerados os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade; ou b)
localizados em unidades de conservação instituídas pelo Município, exceto em
Áreas de Proteção Ambiental (APAs).

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Além disso, cabe aos Municípios autorizar o manejo e da supressão de vegetação, de floresta e de
formações sucessoras em: florestas públicas municipais e Unidades de Conservação instituídas pelo
Município, salvo APA’S; empreendimentos licenciados ou autorizados, ambientalmente, pelo Município.

Por óbvio, o legislador complementar tentou contemplar as diversas realidades municipais. TALDEN
FARIAS, entretanto, alerta que, na prática, a grande parte da competência municipal para ações ambientais
foram “jogadas” para os Governos Estaduais, que poderão centralizar ou descentralizar um maior número
de atribuições, a depender da vontade política do grupo no poder, podendo gerar insegurança jurídica.

Ao submeter a competência dos Municípios à definição de tipologia dos Conselhos Estaduais do


Meio Ambiente, a Lei Complementar revalou em inconstitucionalidade, entendendo parte da doutrina que
não é possível que um órgão executivo estadual possa delimitar as competências executivas municipais
(PAULO BESSA ANTUNES).

Com isso, sustentam que a referida Lei Complementar desrespeitou o pacto federativo, ao colocar em
cheque a autonomia administrativa dos municípios, no que tange ao meio ambiente.

Obs.: A lei complementar somente se aplica à processos de licenciamento e autorização ambiental que
foram iniciados a partir de sua vigência (08 de dezembro de 2011). Foi alterada a redação do art. 10 da Lei
6.938/81, excluindo-se a previsão da atuação supletiva do IBAMA.

Obs.2: Referida Lei modifica também o entendimento que vinha sendo adotado acerca da imposição de
multas.

Pelo art. 70, §§1º e 3º, da Lei 9.605/98, todos os entes federados seriam competentes para lavrar autos de
infração em matéria ambiental.

Para evitar a duplicidade de punição pelo mesmo fato (já que todos eram considerados competentes para
lavrar o auto) e eventual conflito de atribuições entre os entes, existiam alguns dispositivos que
estabeleciam regras definidoras de competência, entre os quais o art. 14, I e § 2º da Lei 6.938/81 e art. 76
da Lei 9.605/98. Este último artigo reza que o pagamento da multa imposta pelos Estados, Municípios ou
DF substitui a multa federal. Agora não é mais assim: prevalece, em caso de dupla lavratura de auto de
infração, a multa do órgão ambiental competente para o licenciamento.

Apenas o competente tem a atribuição de lavrar o auto, mas todos podem fiscalizar. Entretanto, havendo
perigo iminente ou atual ao meio ambiente os demais entes federados estão autorizados a agir
cautelarmente e/ou existindo omissão e inércia do ente originalmente atribuído da competência para
licenciar, fica o ente diverso autorizado a agir com base no poder de polícia, fiscalizando o particular e
tomando medidas cabíveis (a lei não estabelece que medidas seriam essas).

Contudo, existe uma questão que tem intrigado quem se debruça sobre a LC 140. O caput do art. 17 diz
que só o ente competente pode lavrar auto de infração (para aplicação de multa, por exemplo). Porém, o
§3° do mesmo artigo afirma que todos os entes podem fiscalizar e, em caso de dupla multa, prevalecerá o
auto de infração lavrado pelo órgão que detenha a atribuição de licenciar. Quer dizer, ao disciplinar que
todos podem fiscalizar e que prevalecerá o auto do ente competente, está admitindo a possibilidade de
dupla lavratura de auto.

Obs. 3: A Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (ASIBAMA)
ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4757) contra a

58
Lei Complementar 140/2011. De acordo com a ASIBAMA, o Meio Ambiente ficou menos protegido com o
estabelecimento de competências ambientais privativas para estados, DF e municípios, uma vez que a
maioria deles não está preparada para tais ações, e a União estaria impedida de agir, pois teria perdido
essas atribuições com a promulgação da lei. A associação afirma que a aprovação da LC 140/2011
desrespeitou os artigos 65 e 255 da Constituição Federal. Na ação, a ASIBAMA pede liminar para suspender
os efeitos da lei e, no mérito, pede que a norma seja declarada inconstitucional. Alternativamente, pede a
suspensão, até o julgamento definitivo da ação, dos seguintes dispositivos: artigo 4º, incisos V e VI; artigo
7°, inciso XIV, alínea "h" e parágrafo único; artigo 8°, incisos XIII e XIV; artigo 9°, incisos XIII e XIV; artigo
14, parágrafos 3° e 4°; artigo 15; artigo 17, caput e parágrafos 2° e 3°, incisos XIII e XIV; além dos artigos 20
e 21 da Lei Complementar 140/2011. A liminar ainda não foi apreciada.

59
Ponto 5 - Zoneamento Ambiental. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza.

5.1. Zoneamento Ambiental

O zoneamento ambiental, também chamado de Zoneamento Econômico-Ecológico (ZEE), é um


dos instrumentos para a efetivação da Política Nacional do Meio Ambiente, nos termos previstos no art.
9º, II, da Lei 6.938/81. É regulamentado pelo Decreto n. 4.297/2002. Trata-se de uma modalidade de
intervenção estatal sobre o território (tipo de limitação administrativa), a fim de reparti-lo em zonas
consoante o melhor interesse na preservação ambiental e no uso sustentável dos recursos naturais.

O ZEE deverá observar os princípios da função socioambiental da propriedade, da prevenção, da


precaução, do poluidor-pagador, do usuário-pagador, da participação informada, do acesso equitativo e da
integração, conforme expressa previsão regulamentar (art. 5º do Decreto n. 4.297/2002).

Cumpre ressaltar que, nos termos do art. 13, § 2o., da Lei 12.651/12 (Novo Código Florestal), “os
Estados que não possuem seus Zoneamentos Ecológico-Econômicos (ZEEs) segundo a metodologia
unificada, estabelecida em norma federal, terão o prazo de 5 (cinco) anos, a partir da data da publicação
desta Lei, para a sua elaboração e aprovação”.

A definição formal de zoneamento ambiental encontra-se prevista no art. 2º, do Decreto


4.297/02: é o instrumento de organização do território a ser obrigatoriamente seguido na implantação de
planos, obras e atividades públicas e privadas, estabelece medidas e padrões de proteção ambiental
destinados a assegurar a qualidade ambiental, dos recursos hídricos e do solo e a conservação da
biodiversidade, garantindo o desenvolvimento sustentável e a melhoria das condições de vida da
população.

A finalidade de elaboração do ZEE é assegurar a plena manutenção do capital e serviços


ambientais dos ecossistemas por meio da organização, de forma vinculada das decisões de agentes
públicos e privados quanto a planos, programas, projetos e atividades que utilizem recursos naturais (art.
3º, caput, Dec. 4.297).

Quanto ao conteúdo, o ZEE dividirá o território em zonas, conforme as necessidades de proteção,


conservação e recuperação dos recursos naturais e desenvolvimento sustentável. Isso será orientado pelos
princípios da utilidade e simplicidade (art. 11, Dec).

Vale destacar que, se o zoneamento vedar a instalação de determinada atividade, por ser de
caráter vinculante, fica vedada a concessão de licença ambiental.

A competência para a realização do zoneamento será da União, em caso de zoneamento nacional


ou regional, quando tiver por objeto biomas brasileiros ou territórios abrangidos por planos e projetos
prioritários estabelecidos pelo Governo Federal (artigo 21, IX, da CRFB c/c o art. 6º do Decreto 4.297/02). A
competência da União para elaborar o zoneamento ambiental de âmbito nacional e regional também
consta da LC 140/2011, na forma do seu artigo 7º, IX.

Já os Estados terão a incumbência de elaborar o zoneamento ambiental de âmbito estadual, em


conformidade com os zoneamentos de âmbito nacional e regional.

Apesar de inexistir previsão específica para os municípios, a CRFB, art. 30, VIII, afirma competir
a eles o adequado ordenamento territorial. Para a doutrina, essa previsão contém a competência para o
zoneamento.

Questão complexa é saber se a aprovação do zoneamento ambiental será feita por lei ou
mediante decreto. Muito embora inexista previsão constitucional ou legal para a instituição do ZEE por lei

60
em sentido estrito, consta do Decreto n. 4.297/2002 a exigência de processo legislativo de iniciativa do
poder executivo para a alteração do zoneamento (art. 19, §1º). Desta forma, no entendimento de
Frederico Amado, é possível concluir que a exigência de lei em sentido estrito para a aprovação do ZEE
pressupõe, ainda que implicitamente, a sua aprovação por lei, de acordo com o princípio da simetria.
Calha lembrar que, no âmbito dos municípios, o zoneamento ambiental é um dos instrumentos para a
execução da Política Urbana (artigo 4.º, III, “c”, da Lei 10.257/2001), devendo ser considerado na
elaboração do Plano Diretor.

Salienta-se que a alteração só pode ser feita após 10 anos da conclusão ou última alteração, a
menos que seja para aumentar a proteção ou decorrente aprimoramento científico e depende de
consulta pública e aprovação da comissão (art. 19 do Decreto n. 4.297/2002).

Entre os diplomas legais editados pela União com finalidade de estabelecimento de zoneamento
ambiental, podemos destacar a Lei n. 6.803 (zoneamento industrial), Lei n º 4504 (Estatuto da Terra, que
estabelece zoneamento agrícola), Lei nº 7661 (Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro) e o Decreto n.
6961 (zoneamento agroecológico da cana-de-açúcar).

5.2. Unidades de Conservação.

A lei 9.985/2000 institui o SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza.


Ela corresponde ao mandamento constitucional de definição de espaços territoriais especialmente
protegidos, no art. 225, §1º, III. Antes do SNUC, já havia previsão de alguns desses espaços, como as áreas
de proteção ambiental e estacoes ecológicas (Lei 6.902/81) e florestas nacionais (antigo CFlo). A primeira
UC, no Brasil, foi o Parque Nacional de Itatiaia, em 1937.

“Espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos”, expressão do art.


225, §1º, III, CRFB. Há celeuma na doutrina quanto ao alcance da expressão. Em sentido amplo, seriam
todas as áreas protegidas, englobando, por exemplo, as APPs. Em sentido estrito, Edis Milará, afirma que
seriam apenas os previstos na lei do SNUC e, em último caso, as chamadas unidades de conservação
atípicas, que se adequam ao conceito do art. 2º, I, sem serem expressamente previstas na lei.

O conceito legal de Unidade de Conservação consta do art. 2º, I, da Lei do SNUC: “espaço
territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais
relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos,
sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção”.

O conceito pode incluir na área de UC o subsolo e o espaço aéreo, sempre que influírem na
estabilidade do ecossistema (art. 24 da Lei 9.985/00). Paulo Bessa entende ser norma de
constitucionalidade duvidosa, uma vez que o subsolo é bem da união, cuja propriedade depende da do
solo.

Quanto ao subsolo, os limites serão definidos no ato de criação, para as UC de proteção integral,
quanto as de uso sustentável, poderá ser ou no ato de criação ou no Plano de Manejo.

A Lei traz definições importantes, que merecem ser conferidas (art. 2º – ex.: conservação,
conservação in situ, preservação, diversidade biológica, proteção integral, uso direto, uso indireto e uso
sustentável, extrativismo, manejo, recuperação, restauração).

As UCs são divididas em 2 grandes grupos:

I) Unidades de Proteção Integral (UPI): têm por objetivo básico a preservação da natureza, sendo
admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos na própria
lei. São elas:

61
a. Estação Ecológica
b. Reserva Biológica
c. Parque Nacional
d. Monumento Natural
e. Refúgio da Vida Silvestre
II) Unidades de Uso Sustentável (UUS): destinam-se à compatibilização entre a conservação da
natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais. Admite o uso direto e indireto, de
consumo e coleta.
a. Área de proteção ambiental
b. Área de relevante interesse ecológico
c. Floresta nacional
d. Reserva extrativista
e. Reserva de fauna
f. Reserva de desenvolvimento sustentável
g. Reserva particular do patrimônio natural
Excepcionalmente, para atender peculiaridades regionais ou locais, a critério do CONAMA,
podem integrar o SNUC, UC estaduais e Municipais, que possuam objetivos de manejo que não possam ser
satisfatoriamente atendidos por nenhuma categoria prevista na Lei do SNUC e cujas características
permitam, em relação a estas, uma clara distinção. Para Vladimir Passos de Freitas as UCs elencadas na Lei
9.985/00 são meramente exemplificativas.

5.2.1 Gestão do Sistema Nacional de Unidades de Conservação.

A gestão do SNUC é disciplinada no art. 6º da lei n.9.985/2000, e compõe-se de

a. CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (CONAMA) – órgão consultivo e deliberativo, com


atribuições para acompanhar a implementação do sistema
b. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE – órgão central, com finalidade de coordenar o sistema
c. INSTITUTO CHICO MENDES (ICMBIO) E IBAMA e, em caráter supletivo, os órgãos estaduais e
municipais – órgãos executores, com finalidade de implementar o SNUC, subsidiar as
propostas de criação e administrar as UC federais, estaduais e municipais, nas suas esferas de
atuação.

5.2.1.1 Unidades em Espécie

→ Unidades de Proteção Integral – 5 Espécies – Art. 8°

I) Estação Ecológica (art. 9°)


Visa à preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas. É de propriedade pública,
devendo as áreas particulares incluídas em seus limites serem desapropriadas.
Permite-se apenas o uso indireto dos atributos naturais, sendo vedado consumo, coleta, dano, ou
destruição dos recursos naturais. A visitação pública é proibida, salvo objetivo educativo. A pesquisa
depende de autorização prévia e condições especificadas pelo órgão responsável pela gestão. A alteração
de ecossistemas é permitida apenas nos casos de medidas que visem :
a restauração de ecossistemas modificados;
manejo de espécies com o fim de preservar a diversidade biológica;
coleta de componentes dos ecossistemas com finalidades científicas;
62
pesquisas científicas, em área de no máximo 3% da extensão total, limitado a 1.500 hectares.
II) Reserva Biológica (art. 10)
A Reserva Biológica visa à preservação integral da biota e demais atributos naturais existentes, sem
interferência humana direta. As modificações ambientais permitidas são apenas:
Medidas de recuperação de seus ecossistemas alterados
Ações de manejo necessárias para recuperar e preservar:
Equilíbrio natural
Diversidade biológica
Processos ecológicos naturais.
É de posse e domínio públicos, devendo as áreas particulares incluídas em seus limites serem
desapropriadas. A visitação pública é proibida, salvo objetivo educativo. A pesquisa depende de
autorização prévia e condições especificadas pelo órgão responsável pela gestão da UC.
III) Parque Nacional (art. 11)
O Parque Nacional tem como objetivo básico a preservação de ecossistemas naturais de grande
relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o
desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a
natureza e de turismo ecológico.
É de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites serão
desapropriadas. É forma de conservação in situ. Nele é absolutamente vedada a exploração econômica
dos recursos naturais.
A visitação pública está sujeita às normas e restrições no Plano de Manejo da unidade, às estabelecidas
pelo órgão responsável, e às previstas em regulamento.
A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade
e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como àquelas previstas em
regulamento.
Se criadas por Estado ou Município, serão denominadas, respectivamente, Parque Estadual e Parque
Natural Municipal.
IV) Monumento Natural (art. 12)
O Monumento Natural tem como objetivo básico preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande
beleza cênica.
Pode ser constituído por áreas particulares, desde que seja possível compatibilizar os objetivos da
unidade com a utilização da terra e dos recursos naturais do local pelos proprietários. Havendo
incompatibilidade entre os objetivos da área e as atividades privadas ou não havendo aquiescência do
proprietário às condições propostas pelo órgão responsável pela administração da unidade para a
coexistência do Monumento Natural com o uso da propriedade, a área deve ser desapropriada, de acordo
com o que dispõe a lei.
A visitação pública está sujeita às condições e restrições estabelecidas no Plano de Manejo da unidade, às
normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração e àquelas previstas em regulamento.
V) Refúgio da Vida Silvestre (art. 13)
O Refúgio de Vida Silvestre tem como objetivo proteger ambientes naturais onde se asseguram condições
para a existência ou reprodução de espécies ou comunidades da flora local e da fauna residente ou
migratória.
Pode ser constituído por áreas particulares, desde que seja possível compatibilizar os objetivos da
unidade com a utilização da terra e dos recursos naturais do local pelos proprietários. Havendo
incompatibilidade entre os objetivos da área e as atividades privadas ou não havendo aquiescência do
proprietário às condições propostas pelo órgão responsável pela administração da unidade para a
coexistência do Refúgio de Vida Silvestre com o uso da propriedade, a área deve ser desapropriada, de
acordo com o que dispõe a lei.
A visitação pública está sujeita às normas e restrições estabelecidas no Plano de Manejo da unidade, às
normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração, e àquelas previstas em regulamento.

63
A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade
e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como àquelas previstas em
regulamento.
QUADRO RESUMO COMPARATIVO:
UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL
Proibida a Pesquisa
Preservar a Áreas visitação científica
natureza e Posse e particulares pública, depende de
ESTAÇÃO ECOLÓGICA Conselho
realizar domínio serão exceto autorização
(ART. 9º) Consultivo.
pesquisas público. desapropriad quando com prévia do
científicas. as. objetivo órgão
educacional. responsável.
Preservar Proibida a
Pesquisa
integralmente Áreas visitação
Posse e depende de
a biota e particulares pública,
RESERVA BIOLÓGICA domínio autorização Conselho
demais serão exceto
(ART. 10) público prévia do Consultivo.
atributos desapropriad quando com
s. órgão
naturais as. objetivo
responsável.
existentes. educacional.
Preservar
Visitação está Pesquisa
Ecossistemas Áreas
Posse e sujeita a depende de
naturais de particulares
PARQUE NACIONAL domínio normas e autorização Conselho
grande serão
(ART. 11) público restrições do prévia do Consultivo.
relevância desapropriad
s. Plano de órgão
ecológica e as.
Manejo. responsável.
beleza cênica.
Pode ser
constituído
por áreas
particulares,
desde que
haja
Visitação está
Preservar compatibilid Pesquisa
sujeita a
sítios naturais ade entre os depende de
MONUMENTO normas e
raros, objetivos da autorização Conselho
NATURAL (ART. 12) xxxxxxx restrições do
singulares ou unidade com prévia do Consultivo.
Plano de
de grande a utilização órgão
Manejo
beleza cênica. pelo responsável
(art. 32, §2º).
proprietário.
Caso
contrário,
haverá
desapropriaç
ão.
Proteger Pode ser Visitação está Pesquisa
ambientes constituído sujeita a depende de
REFÚGIO DA VIDA xxxxxxx Conselho
naturais para a por áreas normas e autorização
SILVESTRE (ART. 13) x Consultivo.
existência ou particulares, restrições do prévia do
reprodução de desde que Plano de órgão
64
espécies ou haja Manejo. responsável.
comunidades compatibilid
de flora local e ade entre os
da fauna objetivos da
residente ou unidade com
migratória. a utilização
pelo
proprietário.
Caso
contrário,
haverá
desapropriaç
ão.

→ Unidades de Uso Sustentável – 7 Espécies – Art. 14

I) Áreas de Proteção Ambiental/APA (art. 15)


Criadas pela Lei n 6.902/81. É uma área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana,
dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a
qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a
diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos
recursos naturais.
É constituída por terras públicas ou privadas. Pode haver normas e restrições para a utilização da
propriedade privada.
A pesquisa científica e visitação pública nas áreas sob domínio público terá condições estabelecidas pelo
órgão gestor da unidade. Nas áreas sob propriedade privada, cabe ao proprietário estabelece-las,
observadas as exigências e restrições legais.
Disporá de um Conselho presidido pelo órgão responsável por sua administração e constituído por
representantes dos órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e da população residente,
conforme regulamento.
II) Áreas de Relevante Interesse Ecológico (art. 16)
Previstas inicialmente no Decreto 89.336/84. É uma área em geral de pequena extensão, com pouca ou
nenhuma ocupação humana, com características naturais extraordinárias ou que abriga exemplares
raros da biota regional. Tem como objetivo manter os ecossistemas naturais de importância regional ou
local e regular o uso admissível dessas áreas, de modo a compatibilizá-lo com os objetivos de conservação
da natureza.
É constituída por terras públicas ou privadas, podendo ser estabelecidas restrições para a utilização em
propriedades privadas. Nesses casos, em princípio, não será devida indenização.
III) Floresta Nacional (art. 17)
É área com cobertura florestal de espécies predominantemente nativas e tem como objetivo básico o
uso múltiplo sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase em métodos para
exploração sustentável de florestas nativas.
É de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser
desapropriadas.
Admite-se a permanência de populações tradicionais que a habitam quando de sua criação, conforme o
regulamento e o Plano de Manejo da unidade. Caso a permanência das populações tradicionais seja
incompatível com a instituição da Floresta Nacional, serão as mesmas indenizadas e reassentadas em área
de características que respeitem seus modos de vida e suas fontes de subsistência.
A visitação pública é permitida, conforme Plano de Manejo. A pesquisa é permitida e incentivada,
sujeitando-se à prévia autorização do órgão responsável pela administração da unidade, às condições e
restrições por este estabelecidas e àquelas previstas em regulamento.
65
Disporá de um Conselho Consultivo, presidido pelo órgão responsável por sua administração e constituído
por representantes de órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e, quando for o caso, das
populações tradicionais residentes.
Criada por Estado ou Município, chamar-se-á Floresta Estadual ou Floresta Municipal.
IV) Reserva Extrativista (art. 18)
É uma área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo
e, complementarmente, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte. Tem
como objetivos básicos proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso
sustentável dos recursos naturais da unidade.
A Reserva Extrativista é de domínio público, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites
devem ser desapropriadas. Será concedido uso às populações extrativistas tradicionais, que será regulado
por contrato. A concessão é direito real de uso a título gratuito, intransferível e condicionado ao
cumprimento dos requisitos. As populações se obrigam a participar da preservação, recuperação, defesa e
manutenção da UC. O uso dos recursos naturais deve obedecer, além das normas do plano de manejo e
contrato:
Proibição de uso de espécies localmente ameaçadas de extinção ou de práticas que danifiquem seus
habitats
Proibição de práticas ou atividades que impeçam a regeneração natural dos ecossistemas
São proibidas a exploração de recursos minerais e a caça amadorística ou profissional. A exploração
comercial de recursos madeireiros só será admitida em bases sustentáveis e em situações especiais e
complementares às demais atividades desenvolvidas na Reserva Extrativista, conforme regulamento e
Plano de Manejo.
A UC será gerida por um Conselho Deliberativo, presidido pelo órgão responsável por sua administração e
constituído por representantes de órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e das populações
tradicionais residentes na área. O Plano de Manejo da unidade será aprovado por este conselho.
A visitação pública é permitida, desde que compatível com os interesses locais e de acordo com o
disposto no Plano de Manejo da área. A pesquisa científica é permitida e incentivada, sujeitando-se à
prévia autorização do órgão responsável pela administração da UC, e sujeitando-se a normas previstas em
regulamento.
V) Reserva de Fauna (art. 19)
É área natural com populações animais de espécies nativas, terrestres ou aquáticas, residentes ou
migratórias, adequadas para estudos técnico-científicos sobre o manejo econômico sustentável de
recursos faunísticos. É proibido o exercício da caça amadorística ou profissional.
É de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser
desapropriadas de acordo com o que dispõe a lei.
A visitação pública pode ser permitida, desde que compatível com o manejo da unidade e de acordo com
as normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração.
A comercialização dos produtos e subprodutos resultantes das pesquisas obedecerá ao disposto nas leis
sobre fauna e regulamentos.
VI) Reserva de Desenvolvimento Sustentável (art. 20)
É uma área natural que abriga populações tradicionais, cuja existência baseia-se em sistemas sustentáveis
de exploração dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições
ecológicas locais e que desempenham um papel fundamental na proteção da natureza e na manutenção
da diversidade biológica.
Tem como objetivo básico preservar a natureza e assegurar as condições e os meios necessários para a
reprodução e a melhoria dos modos e da qualidade de vida e exploração dos recursos naturais das
populações tradicionais, bem como valorizar, conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as técnicas de
manejo do ambiente, desenvolvido por estas populações.
É de domínio público, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas.
A posse e uso da terra pelas populações tradicionais será regulada por contrato. Elas se obrigam a

66
participar da preservação, recuperação, defesa e manutenção da UC. O uso dos recursos naturais deve
obedecer, além das normas do plano de manejo e contrato:
Proibição de uso de espécies localmente ameaçadas de extinção ou de práticas que danifiquem seus
habitats
Proibição de práticas ou atividades que impeçam a regeneração natural dos ecossistemas
A UC será gerida por um Conselho Deliberativo, presidido pelo órgão responsável por sua administração e
constituído por representantes de órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e das populações
tradicionais residentes na área, conforme se dispuser em regulamento e no ato de criação da unidade.
As atividades desenvolvidas obedecerão às seguintes condições:
É permitida e incentivada a visitação pública, desde que compatível com os interesses locais e de acordo
com o disposto no Plano de Manejo da área;
É permitida e incentivada a pesquisa científica voltada à conservação da natureza, à melhor relação das
populações residentes com seu meio e à educação ambiental, sujeitando-se a prévia autorização do órgão
de administração, a condições e restrições, deles, e ao regulamento.
Deve ser sempre considerado o equilíbrio dinâmico entre o tamanho da população e a conservação; e
É admitida a exploração de componentes dos ecossistemas naturais em regime de manejo sustentável e
a substituição da cobertura vegetal por espécies cultiváveis, desde que sujeitas ao zoneamento, às
limitações legais e ao Plano de Manejo da área.
O Plano de Manejo definirá as zonas de proteção integral, de uso sustentável e de amortecimento e
corredores ecológicos, e será aprovado pelo Conselho Deliberativo.
VII) Reserva Particular do Patrimônio Natural (art. 21)
A Reserva Particular do Patrimônio Natural é uma área privada, gravada com perpetuidade, com o
objetivo de conservar a diversidade biológica. Este gravame constará de termo de compromisso assinado
perante o órgão ambiental, que verificará a existência de interesse público, e será averbado à margem da
inscrição no Registro Público de Imóveis.
Só poderá ser permitida, conforme regulamento:
a pesquisa científica;
a visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais.
Os órgãos integrantes do SNUC, sempre que possível e oportuno, prestarão orientação técnica e científica
ao proprietário de Reserva para a elaboração de um Plano de Manejo ou de Proteção e de Gestão da
unidade.
São vantagens: isenção de ITR (art. 104, p.u., Lei 8.171/91), preferência na concessão de recursos do
Fundo Nacional de Meio Ambiente e crédito agrícola, nas instituições de crédito oficiais (Decreto n./
1.922/96, arts. 12 e 13).
Obs.: A servidão ambiental perpétua equivale, para fins creditícios, tributários e de acesso aos recursos
de fundos públicos, à Reserva Particular do Patrimônio Natural. Art. 9º-B, Lei 6.938, redação pelo Novo
CFlo, Lei 12.615/12

5.2.3 Criação, Implantação e Gestão das Unidades de Conservação

→ Normas gerais
Criadas por ato do Poder Público. Para Paulo Bessa Antunes, é por decreto, enquanto Vladimir Passos de
Freitas, apenas por lei, decreto ou resolução. Frederico Amado entende que a criação ocorre por lei ou
decreto.
A depender da modalidade podem ser compostas de área pública ou particular, neste último caso, será
necessária sua desapropriação, por utilidade pública. A Lei do SNUC, art. 45 exclui da indenização as
espécies arbóreas declaradas imunes ao corte, os lucros cessantes, juros compostos e áreas sem prova
inequívoca do domínio anterior.
A criação precedida de estudos técnicos e consulta pública. A consulta pública, concretização do princípio
democrático, visa subsidiar a definição da localização, da dimensão e dos limites mais adequados (art. 5º,

67
Dec. 4.340/02). O STF (MS 24.184/2003) já decidiu que ela não pode ser dispensada, sob pena de
invalidade do ato de criação, apesar de não ser vinculativa. Frise-se que a consulta pública é dispensada
para estações ecológicas e reservas biológicas, uma vez que o interesse público é presumido. A mera
ampliação dos limites territoriais, sem redução em outras áreas, depende dos requisitos da criação. No
MS 25.347/2010, o STF entendeu não haver ilegalidade na criação de mais de um tipo de UC pelo mesmo
procedimento administrativo.
É possível a transformação de UC de uso sustentável em UC de proteção integral, total ou parcialmente,
por meio de instrumento normativo de mesmo grau hierárquico que o da criação, obedecendo os
procedimentos de prévio estudo técnico e consulta pública. A transformação de UC de proteção integral
para UC de uso sustentável, por sua vez, depende de lei.
A desafetação ou redução dos limites de uma UC apenas pode se dar por meio de lei específica (exceção
ao princípio do paralelismo das formas), já que o art. 225, §1º, III, CRFB, afirma que alteração e supressão
somente podem ser feitas por lei.
Durante os estudos técnicos, podem ser instituídas limitações administrativas provisórias ao exercício de
atividades e empreendimentos efetiva ou potencialmente causadores de degradação ambiental, pelo
prazo improrrogável de sete meses. Essas limitações visam a proteção cautelar da área, quando houver
risco de dano grave aos recursos ali existentes, a critério do órgão competente, nelas, não serão permitidas
atividades que importem em exploração a corte raso da floresta e demais vegetações nativas. Ficam
ressalvadas as atividades agropecuárias e outras atividades econômicas em andamento, bem como
obras públicas licenciadas (art. 22-A, Lei 9.985/2000)
A partir da criação da UC, as licenças ambientais anteriormente outorgadas tornam-se imediatamente
inválidas, pela incompatibilidade de regimes jurídicos, conforme o STJ (RESP 1.122.909-SC/2009).
→ Zonas de amortecimento
Zona de amortecimento é o entorno de uma UC, onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e
restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a UC (art. 2º, XVIII, Lei do
SNUC). Todas as UC devem possuir uma zona de amortecimento, salvo as Áreas de proteção ambiental e
as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (art. 25, caput).
Pela inexistência de definição dos limites em lei, eles podem ser definidos no ato de criação da UC ou
posteriormente, devendo ser ouvidos os proprietários e possuidores das áreas.
Cabe ao órgão de administração da UC estabelecer normas específicas regulamentando a ocupação e o uso
dos recursos da zona. Se o regime for incompatível com o uso anterior da propriedade, o Poder Público
deve indenizar o proprietário, ou, em último caso, deve desapropriar
Se um empreendimento afetar a zona de amortecimento, seu licenciamento só poderá ser concedido
mediante autorização do órgão responsável administração da UC, e a UC correspondente deve ser
beneficiada pela compensação. Se a UC não tiver zona de amortecimento, depende de autorização as
atividades num raio de até 3km do limite da UC, salvo as áreas urbanas consolidadas. Regramento válido
até 2015.
A zona de uma UC de proteção integral, uma vez definida formalmente não pode ser transformada em
zona urbana.
→ Corredor ecológico
São porções de ecossistemas naturais ou seminaturais, ligando unidades de conservação, que
possibilitam entre elas o fluxo de fenes e o movimento da biota, facilitando a dispersão de espécies e a
recolonização de áreas degradadas, bem como a manutenção de populações que demandam para a sua
sobrevivência áreas com extensão maior do que aquelas da UC individual (Art. 2º, XIX Lei do SNUC). São
instituídos pelo Ministério do Meio Ambiente (art. 11, Dec. 4.340/02), terão mesmo tratamento de uma
zona de amortecimento, a menos que integrem mosaico.
→ Mosaico de UCs
Conjunto de Unidades de Conservação de categorias diferentes ou não, próximas, justapostas ou
sobrepostas e outras áreas protegidas, públicas ou privadas. Os corredores integram o mosaico. Esse
mosaico exige gestão integrada e participativa, feita por um conselho de mosaico, que considerará os
distintos objetivos de conservação, para compatibilizar a presença da biodiversidade, valorização da

68
sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional. É reconhecido em ato do
Ministério do Meio Ambiente, a pedido de órgãos gestores das UC.
→ Plano de manejo – art. 27
É documento técnico mediante o qual se estabelece seu zoneamento e as normas que devem presidir o
uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à
gestão da UC. É vinculante.
Obs.: zoneamento é a definição de setores ou zonas em uma unidade de conservação com objetivos de
manejo e normas específicos, com o propósito de proporcionar os meios e as condições para que todos os
objetivos da unidade possam ser alcançados de forma harmônica e eficaz.
O plano, que deve ser elaborado em 5 anos da criação da UC, deve abranger a área da UC, sua zona de
amortecimento e os corredores ecológicos, devendo incluir medidas com o fim de promover sua
integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas.
É garantida a ampla participação da população residente na atualização e implementação em Reservas
Extrativistas, Reservas de Desenvolvimento Sustentável, Áreas de Proteção Ambiental e, quando couber,
das Florestas Nacionais e Áreas de Relevante Interesse Ecológico.
Nas Áreas de Proteção Ambiental e nas zonas de amortecimento das demais UC, ele poderá dispor sobre
as atividades de liberação planejada e cultivo de organismos geneticamente modificados, observada as
informações técnicas da CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) sobre:
o registro de ocorrência de ancestrais diretos e parentes silvestres;
as características de reprodução, dispersão e sobrevivência do organismo geneticamente modificado;
o isolamento reprodutivo do organismo geneticamente modificado em relação aos seus ancestrais diretos e
parentes silvestres; e
situações de risco do organismo geneticamente modificado à biodiversidade.”
UC de proteção integral: até que seja elaborado o Plano de Manejo, todas as atividades e obras
desenvolvidas devem se limitar àquelas destinadas a garantir a integridade dos recursos que a unidade
objetiva proteger, assegurando-se às populações tradicionais as condições e os meios necessários para a
satisfação de suas necessidades materiais, sociais e culturais.
→ Atividades Proibidas – arts. 28 e 31
São proibidas:
Quaisquer alterações, atividades ou modalidades de utilização em desacordo com os objetivos da UC, ao
Plano de Manejo e seus regulamentos.
Introdução de espécies não autóctones – não originadas do local em que vivem, salvo:
Área de Proteção Ambiental, Floresta Nacional, Reserva Extrativista e Reserva de Desenvolvimento
Necessário
Animais e plantas necessários à administração e às atividades das demais UC, conforme o plano de manejo
Nos Refúgios da Vida Silvestre e Monumentos Naturais podem ser criados animais domésticos e cultivadas
plantas compatíveis com as finalidades da unidade, conforme o plano de manejo.
→ Espécies não autóctones
São espécies não originárias da unidade de conservação. Em regra, não será permitida a sua introdução
em UC, salvo, na presença de plano de manejo, em:
• APA – Área de Proteção Ambiental
• FLONA – Floresta Nacional
• RESEX – Reserva Extrativista
• RDS – Reserva de Desenvolvimento Sustentável
→ Doações
Os órgãos responsáveis pela administração das UC podem receber doações e recursos nacionais ou
internacionais. A administração desses recursos caberá ao órgão gestor da unidade. Sua utilização deve se
dar exclusivamente na implantação, gestão e manutenção da UC
→ Conselho Consultivo – art. 29
Obrigatório nas Unidades de Conservação de Proteção Integral. É presidido pelo órgão responsável pela
administração da UC e constituído por representantes de órgãos públicos, organizações da sociedade civil,

69
proprietários de terras em UC de Refúgio da Vida Silvestre ou Monumento Natural, quando for o caso, e
das populações tradicionais, enquanto ainda não remanejadas, nas UC que não as permitem.
Têm Conselho Deliberativo:
Reserva Extrativista
Reserva de Desenvolvimento Sustentável
Reserva de Biosfera (tratada a frente)
→ Gestão compartilhada com OSCIP – art. 30
Podem ser geridas por organizações da sociedade civil de interesse público com objetivos afins aos da
unidade, mediante instrumento a ser firmado com o órgão responsável por sua gestão. Frederico Amado
entende que a referida possibilidade é inconstitucional, pois importa em delegação do poder de polícia,
que é atividade estatal indelegável.
→ Taxa de Visitação – art. 35
Pode ser cobrada quando se tratar de unidade de conservação de proteção integral, seus recursos devem
ser aplicados nas áreas. Não foram definidos pressupostos básicos da cobrança.
→ Compensação por significativo impacto ambiental negativo – art. 36
Nos casos de licenciamento ambiental de empreendimento de significativo impacto ambiental, conforme
o órgão ambiental competente, fundamentado em EIA/RIMA, o empreendedor é obrigado a apoiar a
implantação e manutenção da unidade de conservação de proteção integral.
O montante de recursos destinados a essa finalidade, sendo o percentual fixado pelo órgão ambiental
licenciados, conforme o grau de impacto ambiental causado pelo empreendimento. É realização do
princípio do usuário-pagador.
STF ADI 3.378/2008: declarou inconstitucional a expressão que previa que o montante “não pode ser
inferior a 0,5% dos custos totais de implantação do empreendimento”. Entendeu que o valor da
compensação deve ser fixado proporcionalmente o impacto ambiental após estudo que assegurasse
contraditório e ampla defesa, que prescinde de fixação percentual sobre os custos do empreendimento.
Em retrocesso, por ser prejudicial às UC, o Dec. 6.848/2009, que alterou o Dec. 4.340/02 estabeleceu
regras para o cálculo do valor, limitando a 0,5% dos custos totais.
O órgão licenciador definirá as UC beneficiadas, considerando o EIA/RIMA, ouvindo o empreendedor. Pode,
até mesmo, ser criada nova UC. Se o empreendimento afetar UC específica ou sua zona de amortecimento,
o licenciamento dependerá de autorização do órgão responsável por sua administração, devendo a UC ser
beneficiada, mesmo que não seja de proteção integral.
No RESP 896.863/2011, o STJ afirmou que, se o dano ambiental já tiver sido alvo de compensação
ambiental, não deve gerar a responsabilidade civil posterior do empreendedor, sob pena de bis in idem.
Apenas no caso de dano ambiental não previsto no EIA/RIMA é que será possível a posterior
responsabilização.
Destaque-se, por fim, que o Novo Código Florestal proporciona aos proprietários localizados nas zonas de
amortecimento de UC de proteção integral a possibilidade de receber apoio técnico-financeiro
decorrentes da compensação ambiental, com a finalidade de recuperação e manutenção das áreas
prioritárias para a gestão da unidade.
→ Populações tradicionais
Em que pese a lei 9.985/2000 não ter definido o termo, a ideia de populações tradicionais está
essencialmente ligada à preservação de valores, de tradições, de cultura. O decreto 6.040/2007, art. 3º, I,
que aprovou a política nacional de desenvolvimento sustentável dos povos e comunidades tradicionais
define como:
Grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem recursos naturais
como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando
conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição.
São considerados como tal os povos indígenas, quilombolas, seringueiros, pescadores artesanais,
extrativistas, caiçaras, entre outros.
É possível sua manutenção nas:
Áreas de proteção ambiental

70
Áreas de relevante interesse ecológico
Florestas nacionais
Reservas extrativistas
Reservas de desenvolvimento sustentável

Desde que observem o regime jurídico de utilização dos recursos de cada modalidade.
Nas UC que não podem mantê-los, por manifesta incompatibilidade, as populações serão indenizadas ou
compensadas pelas benfeitorias existentes e devidamente realocadas pelo poder público em local e
condições acordados entre as partes, devendo o poder público priorizar o seu reassentamento. Até que
isso ocorra, serão estabelecidas normas e ações específicas destinadas a compatibilizar a sua presença.
→ Competência para o licenciamento ambiental em UC.
Nos termos da LC 140/2011, salvo no que concerne às áreas de proteção ambiental (APA), a competência
observará o critério do ente federativo instituidor do referido espaço com regime especial de proteção.
Logo, as UC da União serão licenciadas pelo IBAMA
→ Outras disposições
A exploração comercial de produtos, subprodutos ou serviços obtidos ou desenvolvidos a partir dos
recursos naturais, biológicos, cênicos ou culturais ou da exploração da imagem de unidade de
conservação, exceto Área de Proteção Ambiental e Reserva Particular do Patrimônio Natural, dependerá
de prévia autorização e sujeitará o explorador a pagamento, conforme disposto em regulamento”.

→Res
ervas
da Biosfera – Art. 41
Inobstante tratadas pela lei do SNUC, não são UC. É um modelo adotado internacionalmente de gestão
integrada, participativa e sustentável de recursos naturais. Têm objetivos básicos de:
preservação da diversidade biológica
desenvolvimento de atividades de pesquisa
monitoramento ambiental
educação ambiental
desenvolvimento sustentável
melhoria na qualidade de vida das populações
É constituída por áreas de domínio público ou privado, podendo conter:
uma ou várias áreas-núcleo, destinadas à proteção integral da natureza;
uma ou várias zonas de amortecimento, onde só são admitidas atividades que não resultem em dano para
as áreas-núcleo; e
uma ou várias zonas de transição, sem limites rígidos, onde o processo de ocupação e o manejo dos
recursos naturais são planejados e conduzidos de modo participativo e em bases sustentáveis.
Elas podem ser integradas por UC já criadas pelo Poder Público, respeitadas as normas legais de cada
categoria.

71
São geridas por Conselho Deliberativo, que será formado por representantes de instituições públicas,
organizações da sociedade civil e população residente.
O objetivo do Programa MAB (O Homem e a Biosfera), estabelecido pela UNESCO em 1974, foi criar uma
rede de Reservas da Biosfera para assegurar a conservação de áreas representativas dos principais
ecossistemas mundiais. A UNESCO já reconheceu as seguintes reservas da biosfera, no Brasil: Mata
Atlântica, Cerrado, Cinturão Verde da Cidade de São Paulo, Pantanal Mato-Grossense, Caatinga, Amazônia
Central e Serra do Espinhaço.

→ Outras Unidades de Conservação (Não Previstas Na Lei n.º 9.985/00)


São UCs não mantidas pelo SNUC, já que delas a Lei n.º 9.985/00 não tratou. Paulo Bessa entende não
terem sido revogadas, em respeito ao ato jurídico perfeito e acabado. De maneira oposta, Frederico
Amado defende a revogação.
Frederico Amado afirma haver regra de transição para que as UC criadas anteriormente a vigência da lei
9985/2000 e não pertençam a nenhuma das categorias listadas sejam reavaliadas em até dois anos para
seu reenquadramento.
→ Reservas Ecológicas
Estão no Art. 18, Lei 6.938/81 (artigo revogado pela lei do SNUC) e reguladas no decreto nº 89.336/1984.
→ Jardins Botânicos
São parques científicos e culturais destinados à pesquisa sobre espécies em extinção; Sítios ecológicos de
relevância cultural. Disciplinado apenas pela Res. CONAMA 11/87.
→ Jardins Zoológicos
Art. 1°, Lei 7.173, de 14.12.83. Qualquer coleção de animais silvestres e mantidos vivos em cativeiro ou
semiliberdade e expostos à visitação pública. Patrimônio público ou privado, de funcionamento
autorizado pelo Poder Público. Obs.: animais silvestres são propriedade estatal
→ Horto Florestal
Natureza científica semelhante e ao jardim botânico, mas deles diferem, pois os hortos são mais voltados
ao aprimoramento e armazenamento de exemplares da flora e neles o aspecto do lazer é menos saliente.
Res. CONAMA n.° 11/87
→ Cavidades naturais
Propriedades da União (art. 20, X, CF/88). Decreto 99.556/90 deu-lhes especial proteção e regulamentação.
É proibido em um raio de 1.000 metros no entorno de cavernas o desenvolvimento de atividades de
terraplanagem, mineração, dragagem e escavação que venham a causar danos ou degradação do meio
ambiente ou perigo para pessoas ou para a biota (Resolução CONAMA n.°10, de 14.12.88).
3. Jurisprudência do TRF 4

DECISÃO: SINDETUR - SINDICATO DAS EMPRESAS DE TURISMO DE FOZ DO IGUAÇU-PR impetrou mandado
de segurança coletivo contra ato do JUIZ FEDERAL DA 2ª VARA FEDERAL E JEF CÍVEL DE FOZ DO IGUAÇU -
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO PARANÁ - RONY FERREIRA – (...) Ação Civil Pública nº
50008723820114047002 que tramita na 2ª Vara Federal e JEF Cível de Foz do Iguaçu - Seção Judiciária do
Estado do Paraná, proposta pelo Instituto Justiça Ambiental contra o ICMBIO - Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade, na qual não figura como parte, desgarrou-se completamente da lei, da
jurisprudência e da doutrina ao impedir a entrada no Parque Nacional de qualquer veículo que não seja da
Concessionária Cataratas S/A. Afirma os maiores prejudicados pela citada decisão são os membros do
impetrante, que são empresas prestadoras de serviço na área de viagem e turismo da cidade de Foz do
Iguaçu, os quais não foram, em momento algum, informados pelo juízo da decisão que os afeta
diretamente. Sustenta que o Plano de Manejo prevê a circulação de veículos particulares nos locais
definidos nos respectivos subprogramas, desde que credenciados conforme critérios estabelecidos pela
Administração do Parque. Argumenta que, por este motivo, a decisão liminar proferida não estaria
acobertada pelo fumus boni iuris e que, tampouco haveria periculum in mora, porquanto prolatada quase
um ano e meio após o ajuizamento da ação civil pública. Argui, por fim, vício da decisão porquanto o
pedido teria sido de impedimento imediato da entrada no Parque Nacional de qualquer veículo que não

72
seja da Concessionária Cataratas S/A ou expressamente autorizados, conforme reza o Plano de Manejo,
sob pena de multa, tendo o magistrado a quo deferido a liminar para que o transporte de turistas no
interior do Parque do Iguaçu fosse feito apenas pela Concessionária, extrapolando o pedido (ultra
petita). É o relatório. Decido. Alegam os impetrantes, ainda, que os itens 7.3.4.4. (Evento 36 dos autos
da ACP, PROCADM22, fls. 8/9) e 7.4.5.2, subitem 33 (Evento 36 dos autos da ACP, PROCADM22, fls.
119/120) do Plano de Manejo prevêem que a circulação de veículos particulares e do Parque será
limitada aos locais definidos nos respectivos subprogramas e Além do transporte coletivo, será
permitida na BR-469, a circulação de veículos de serviço do Parque, de seus funcionários e demais
credenciados, todos devidamente identificados com adesivo colocado no parabrisa e que A administração
do Parque estabelecerá critérios para distribuição do adesivo de identificação dos veículos que poderão
circular nessa via. Há que se salientar que tal situação não foi ignorada pelo juízo a quo, nesse sentido
destaco o seguinte trecho da liminar: Por ser o Parque Nacional do Iguaçu uma unidade de conservação,
o Plano de Manejo é o documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais da
unidade de conservação, estabelece as normas que devem presidir o uso da área e o manejo dos
recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à gestão da unidade (Lei 9985,
de 18 de julho de 2000). E da leitura desse, o que se infere, em princípio, é que o transporte dos turistas
deve ser feito de forma coletiva e, existindo concessionária para esse fim, é de supor-se competir-lhe tal
encargo. Este Juízo é sensível ao respeitável trabalho exercido por todas as Agências de Turismo e por
todos os Taxistas que transportam turistas, e também reconhece sua indiscutível importância para o
desenvolvimento econômico de Foz do Iguaçu. Todavia, o uso público do Parque Nacional do Iguaçu,
sobretudo em face do crescente número de visitantes, não pode desconsiderar as diretrizes traçadas
pela Autoridade Ambiental no Plano de Manejo. A leitura sistêmica do Plano de Manejo revela que a
circulação de veículos particulares credenciados, configura exceção à regra do tópico Atividades e
Normas, integrante do Subprograma de Administração e Manutenção, que trata dos meios que
viabilizam o funcionamento da Unidade, indicando aqui um quadro funcional mais adequado, bem como
traça ações visando à manutenção da infra-estrutura existente, o controle administrativo da UC e suas
normas, indicando ainda um processo de controle para assegurar o bom desempenho administrativo do
Parque, porquanto está previsto no caput do item 33: Estabelecer um sistema de transporte único para
atender as AD localizadas ao longo da BR-469. Não foi outra a interpretação do magistrado. Como se
observa, foi proibida a entrada - em qualquer hora do dia ou da noite - de outros veículos (empresas de
turismo e/ou taxistas) para levar ou buscar hóspedes do Hotel existente no Parque; deferido prazo para
que o Diretor do Parque informasse a quantidade de ônibus em operação e quais os critérios utilizados
para definir a quantidade de ônibus, bem como, estabelecido um prazo, para que a Concessionária, as
agências de turismo e taxistas pudessem se adequar às determinações, tudo no intuito de fazer cumprir o
objetivo do Plano de Manejo, no ponto em que determina o estabelecimento de um sistema de transporte
único para atender as AD localizadas ao longo da BR-469. Tal decisão, em que pese incongruente no que
tange aos prazos que estabelece - o que será analisado a seguir -, não acarreta, no meu entendimento,
prejuízo às empresas de turismo de Foz do Iguaçu que se dedicam ao transporte de turistas dentro do
Parque Nacional ou desemprego em massa no setor do turismo, como argumentam os impetrantes, na
medida em que o transporte entre os hotéis situados na cidade e região e o Parque poderá e seguirá sendo
feito pelos táxis e empresas de turismo, que apenas terão o seu acesso restrito à entrada do Parque. (...)
Além disso, a comodidade dos turistas não pode se sobrepôr ao direito fundamental ao meio ambiente
equilibrado, constitucionalmente assegurado. O Plano de Manejo, revisto em 1999, ou seja, há mais de
10 anos atrás, traz à saciedade informações que corroboram a necessidade de fazer cumprir o objetivo
de se estabelecer um sistema de transporte único (...)Assim, evita-se a possibilidade de acesso a áreas
protegidas do PNI, ruído, poluição, atropelamento de animais e risco de derramamento de cargas tóxicas
e incêndios, provocados por tocos de cigarros e materiais análogos. A possibilidade de atropelamento de
diversas espécies de anfíbios e répteis, sobretudo na rodovia das Cataratas e na estrada do Colono, foi
identificada como um dos problemas que mais atingem a fauna desses animais. Verificou-se, também,
ausência completa de controle, fiscalização e monitoramento de tráfego ao longo de seus 11km, à
exceção da rotina usualmente empregada na portaria de acesso ao PNI. As características de

73
trafegabilidade favorecem a possibilidade de atropelamento de animais silvestres e afugenta as espécies
mais retraídas, constituindo-se em barreira para a sua livre dispersão. (...) Entendo que merecem prestígio
as providências determinadas pelo magistrado, que melhor conhece a realidade do lugar e entende a
importância de se dar efetividade à garantia de promoção do equilíbrio ecológico, uma vez que a
existência da atividade econômica defendida pelos impetrantes depende inteiramente da qualidade
ambiental daquela Unidade de Conservação. (TRF4 5012553-25.2012.404.0000, QUARTA TURMA, Relator
JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 03/08/2012) ( o acórdão é muito extenso.
Condensamos acima os trechos mais relevantes. Segue link para consulta na íntegra:
http://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/citacao.php?doc=TRF402880253)

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DEPUTADO FEDERAL. PREFEITO.


LEGITIMITIDADE PASSIVA. INCENTIVO À INVASÃO DO PARQUE NACIONAL DO IGUAÇÚ.
DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. IMUNIDADE PARLAMENTAR. NÃO INCIDÊNCIA DA REGRA
INSERTA NO AR 53, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DANOS AO MEIO AMBIENTE. DANOS
PATRIMONIAIS AO ERÁRIO. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. MOTIVAÇÃO DA
SENTENÇA. CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. ARTIGO 131, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
RESSARCIMENTO. SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS. PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER
PÚBLICO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE OBSERVADO. PENAS ADEQUADAS. INCIDÊNCIA DO ARTIGO
11, DA LEI Nº 8.429/92. PENA DE MULTA. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. Nos artigos 4º e 5º, do Código
de Ética e Decoro Parlamentar estão elencadas as condutas que afrontam os princípios éticos e as regras
básicas de decoro parlamentar puníveis com censura, verbal ou escrita, suspensão de prerrogativas
regimentais, suspensão temporária do exercício do mandato ou perda do mandato, não estando tipificada
na Resolução nº 25/2001 a conduta descrita pelo Ministério Público Federal na inicial da ação de
improbidade administrativa, qual seja, incentivar a degradação patrimonial e ambiental do Parque
Nacional do Iguaçu mobilizando a população local, instigando-a a descumprir a ordem judicial que
determinou o fechamento da estrada, conduta que vai além das relações formais e funcionais do agente
público para alcançar a intenção pessoal do réu. 2. Preliminar de carência de ação afastada. 3. Os agentes
políticos respondem por atos de improbidade administrativa, conforme precedente deste Tribunal
Regional Federal (AC nº 2007.72.12.000242-6 (D.E 30/112011). 4. Preliminar de ilegitimidade passiva
afastada. 5. É notório o fato de que os réus incentivaram a invasão do Parque Nacional do Iguaçu, bem
como do conjunto probatório produzido em contraditório judicial conclui-se acerca da plena viabilidade
da versão narrada na petição inicial, havendo provas suficientemente hábeis sobre a liderança dos réus
na invasão do Parque Nacional do Iguaçu, área constituída de terras públicas e reconhecida pela UNESCO
como Patrimônio da Humanidade, em descumprimento a ordem judicial que determinou o fechamento da
estrada do colono. 6. A conduta dos réus, considerando a condição de agentes públicos, Prefeitos e
Deputado Federal, ainda que sob a alegação de evitar conflito, contraria o poder que lhes foi conferido
mediante outorga de mandato parlamentar para o Poder Legislativo ou para o Executivo, porquanto não
lhes foi conferida representação para cometerem atos ilícitos. 7. A insurgência contra as provas que
motivaram a sentença condenatória dos réus não prospera, porquanto provas lícitas, admitidas em direito
e, quando não impugnadas no momento oportuno, são suficientemente hábeis a formar o convencimento
do magistrado, que, considerando a lei e os elementos existentes nos autos concluiu acerca dos fatos
descritos na inicial. Esta é a regra do artigo 131, do Código de Processo Civil. 8. As penas de suspensão dos
direitos políticos, proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios estão adequadas à situação concreta reproduzida nos autos, porquanto respeitado o princípio
da proporcionalidade. 9. Considerando que se trata de ilícito cometido por agentes políticos justifica-se a
aplicação adequada de multa civil, porquanto é a multa meio legal para reprimir a conduta ilícita e abusiva
dos réus contra a ordem jurídica, o Estado Democrático de Direito, o meio ambiente e os princípios da boa
administração pública. (TRF4, AC 5005374-20.2011.404.7002, TERCEIRA TURMA, Relator NICOLAU KONKEL
JÚNIOR, juntado aos autos em 07/03/2013)

74
(Foi interposto Resp em face deste acordão, porém foi negado seguimento
https://eproc.trf4.jus.br/eproc2trf4/controlador.php?acao=acessar_documento_publico&doc=413824562
74148321030000000216&evento=41382456274148321030000000109&key=6ee4efdf048b87eb3f76b0ab9
8a8e6e6dbaf9ec50222f5e38c98f92e3f58ebad

Ponto 6 - Poder de polícia e Direito Ambiental. Licenciamento ambiental. Infrações ambientais.


Biossegurança.

6.1 Poder de Polícia e Direito Ambiental.

A proteção ao meio ambiente é dever do Estado e da coletividade (art. 225, CF/88). Uma das formas do
Estado garanti-la é através do exercício do poder de polícia ambiental. O poder de polícia tem previsão no
art. 225, §3º da CF/88, sendo que a omissão do Poder Público no seu exercício pode constituir infração
administrativa (art. 70, § 3º, Lei n.º 9.605/98), ou ato de improbidade (art. 11, II, Lei n.º 8.429/92).

Poder de Polícia, de acordo com José dos Santos Carvalho Filho “é a prerrogativa de direito público que,
calcada na lei, autoriza a Administração Pública a restringir o uso e gozo da liberdade e da propriedade em
favor do interesse da coletividade” (2002, p.61).

Além do conceito doutrinário (a expressão é amplamente acolhida pela doutrina nacional e estrangeira),
temos no Brasil uma definição legal prevista no art. 78 do CTN: “Art. 78. Considera-se poder de polícia
atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula
a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene,
à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas
dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à
propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do
poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com
observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso
ou desvio de poder”.

“O licenciamento ambiental das atividades que utilizam recursos naturais decorre do poder de polícia da
Administração Pública. Os consentimentos estatais, como as licenças, também decorrem do poder de
polícia e representam resposta positiva da administração pública aos pedidos formulados por indivíduos
interessados em exercer determinada atividade que dependa do referido consentimento, como a
utilização de recursos naturais.” (Romeu Thomé, Leis especiais para Concurso. Direito Ambiental, 2016. P.
140).

A Lei n.º 6.938/81 estabeleceu, em seu art. 9º, IX, como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio
Ambiente, “as penalidades disciplinares ou compensatórias ao não cumprimento das medidas necessárias
à preservação ou correção da degradação ambiental”. Recorde-se, outrossim, que nos termos do art. 23,
III, CF/88, a competência para a proteção ao meio ambiente é comum entre a União, Estados, DF e
Municípios. Da mesma forma, conforme art. 24, VI, VII e VIII, c/c art. 30, I, II, VI e IX, todos da CF/88, é
competência concorrente dos entes federados legislar sobre direito ambiental.

Assim, cabe a cada ente federado exercer o seu poder de polícia no âmbito de suas atribuições, assim
como estabelecer regras próprias para esse exercício.
75
Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso,
gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente, sendo que qualquer pessoa, constatando
infração ambiental, poderá dirigir representação às autoridades ambientais, para efeito do exercício do
seu poder de polícia.

A autoridade ambiental que tiver conhecimento de infração ambiental é obrigada a promover a sua
apuração imediata, mediante processo administrativo próprio, sob pena de co-responsabilidade.

Poder de Polícia Ambiental é Comum: Recorde-se que a competência para a proteção ao meio ambiente é
comum entre a União, Estados, DF e Municípios (art. 23, III, CF/88) e que é competência concorrente dos
entes federados legislar sobre direito ambiental (art. 24, VI, VII e VIII, c/c art. 30, I, II, VI e IX, todos da
CF/88). Assim, cabe a cada ente federado exercer o seu poder de polícia no âmbito de suas atribuições,
bem como estabelecer regras próprias para esse exercício.

Autoridades Competentes Para Imposição De Multa: Artigo 72, § 1º, da LCA: São autoridades
competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo os funcionários de
órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, designados para as
atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha.

Paulo Affonso Leme destaca que no Estado moderno não se resume mais à administração direta, sendo os
serviços públicos exercidos também por empresas estatais e entes de cooperação (paraestatatais), assim, o
exercício do poder de polícia ambiental poderá ser atribuído, por lei expressa, não só à Administração
direta como à Administração indireta.

6.1.1 Poder de Polícia Ambiental X Competência para Licenciamento

Há que se diferenciar a competência para fiscalização e para licenciamento. A competência atribuída a


certo ente federado para a concessão da licença ambiental não retira dos demais as prerrogativas
atinentes ao poder de polícia, pois a preservação ambiental é de competência comum. Em regra, a
competência para lavrar o auto e apurar a infração é do órgão competente para licenciar (art. 17, caput).
Contudo, o § 3° do mesmo artigo afirma que isso não impede o exercício da atribuição comum de
fiscalização dos demais entes federados, prevalecendo o auto de infração lavrado pelo órgão que detenha
a atribuição de licenciar.

Pelo art. 70, §§ 1º e 3º, da Lei 9.605/98, todos os entes federados seriam competentes para lavrar autos de
infração em matéria ambiental. A LC 140 estabelece que em caso de dupla lavratura prevalece a multa do
órgão ambiental competente para licenciar (art. 17, §3°).

Sanções: Com a LC 140/11, ampliou-se a interpretação do art. 76 da Lei 9.605/98, prevalecendo para a
mesma infração ambiental todo o auto de infração do ente competente para licenciar, abarcando
quaisquer sanções previstas no art. 72 e não apenas a sanção de multa (o art. 76 só diz que o pagamento
de multa imposta pelos Estados, Municípios, Distrito Federal ou Territórios substitui a multa federal na
mesma hipótese de incidência). Eis as demais infrações:

Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções,


observado o disposto no art. 6º: I - advertência; II - multa simples; III - multa diária;
IV - apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos,
76
petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração; V
- destruição ou inutilização do produto; VI - suspensão de venda e fabricação do
produto; VII - embargo de obra ou atividade; VIII - demolição de obra; IX -
suspensão parcial ou total de atividades; X – (VETADO) XI - restritiva de direitos.

Havia também entendimentos de que o pagamento da multa municipal ou estadual, sendo menor que a
federal, não impedia a cobrança da diferença. Hoje, com a LC 140, mesmo que a multa federal seja maior,
a multa do ente competente prevalecerá mesmo que menor, não cabendo a cobrança de quaisquer
diferenças em relação à multa federal.

6.2 Licenciamento Ambiental

Definição e Natureza Jurídica do licenciamento: é “o procedimento administrativo pelo qual o órgão


ambiental licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades
utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que,
sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental” (Resolução CONAMA 237/97, art. 1º, §1º). De
acordo com art. 9º, IV, da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 6.938/81), o licenciamento
ambiental é um instrumento de caráter preventivo de tutela do meio ambiente. (Fiorillo)

Todo o procedimento de licenciamento ambiental deverá ser elaborado de acordo com os princípios do
devido processo legal, devendo-se garantir: a) um órgão neutro; b) notificação adequada da ação proposta
e de sua classe; c) oportunidade para a apresentação de objeções ao licenciamento; d) o direito de
produzir e apresentar provas; e) o direito de conhecer a prova contrária; f) o direito de contraditar
testemunhas; g) uma decisão baseada somente nos elementos constantes da prova produzida; h) o direito
de se fazer representar; i) o direito à elaboração de autos escritos para o procedimento; j) o direito de
receber do Estado auxílio técnico e financeiro; l) o direito a uma decisão escrita motivada

O licenciamento ambiental é plurifuncional, pois se presta a diversas funções: a) objetiva o controle de


atividades potencialmente poluentes; b) operacionaliza os princípios da precaução, prevenção e
poluidor-pagador; c) impõe medidas mitigadoras e compensatórias para a degradação ambiental; d)
possibilita inserir determinada atividade na programação e planificação do desenvolvimento econômico
nacional, regional ou local; e e) instrumento de direito econômico, pois importa no planejamento e na
tomada de decisões sobre o que preservar e o que degradar.

Destaca-se que o licenciamento ambiental é o procedimento administrativo, enquanto que a licença é o


ato administrativo de outorga, de aprovação do poder público da atividade a ser realizada pelo particular,
concedida ou não ao final do procedimento de licenciamento.

Natureza da licença ambiental: Discute-se a natureza jurídica da licença ambiental, tendo em vista a
clássica diferenciação entre licença (ato vinculado e definitivo) e autorização (ato discricionário e precário).

Parte da doutrina entende que o termo licença estaria sendo empregado sem o rigor técnico-jurídico,
devendo, no caso, ser entendido como autorização (posição de Paulo Affonso Leme Machado, Toshio
Mukai e de Vladimir Passos de Freitas). Arrolam-se os seguintes argumentos:

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(i) O emprego na legislação e na doutrina do termo “licenciamento” ambiental não traduz
necessariamente a utilização da expressão jurídica “licença”, em seu rigor técnico;

(ii) o escopo de prevenção sempre foi entendido como típico da categoria da autorização;

(iii) A Constituição utilizou o termo “autorização” em seu texto, dizendo no art. 170, parágrafo único:
“E assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de
autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei”;

iv) A possibilidade de “renovação” como de “revisão” indicam que a Administração Publica pode
intervir periodicamente para controlar a qualidade ambiental da atividade licenciada, não havendo
na “licença ambiental” o caráter definitivo; afastando-a do conceito de “licença”, tal como
conhecemos no Direito Administrativo; e

v) O conceito de “licenciamento ambiental” tem vida própria, independente do conceito de


“licença”, expressão utilizada no Direito Administrativo.

Por sua vez, Édis Milaré entende que se trata de licença, uma vez que a capacidade decisória da
Administração se resume ao reconhecimento formal de que os requisitos ambientais para o exercício do
direito de propriedade (empreendimento ou atividade) estão preenchidos. Entretanto, traça 3 diferenças
entre a licença ambiental e a administrativa, a saber:

(i) desdobramento da licença ambiental em licença prévia, de instalação e de operação;

(ii) necessidade de avaliação prévia de impactos, podendo-se exigir a formalização de EIA-RIMA para
atividades significativamente degradadoras do meio ambiente; e

(iii) a licença ambiental não assegura ao seu titular a manutenção do status quo vigorante ao tempo
de sua expedição, sujeita que se encontra a prazos de validade, obrigando à renovação com
exigências supervenientes à vista do estado da técnica e da própria alteração das características
ambientais de determinada época e de determinado local

Há quem sustente, por outro lado, que “a licença ambiental não é vinculada ou discricionária por sua
natureza, pois sua caracterização depende da vontade do próprio legislador em cada nível federativo, a
quem cabe a escolha entre a concessão de maiores ou menores espaços para os órgãos administrativos
na tomada de decisão sobre a concessão ou negação da licença” (ANDREAS J. KRELL).

Para Fiorillo, trata-se de um ato com discricionariedade sui generis, havendo vinculação, ou seja, direito
subjetivo do empreendedor nos casos de EIA-RIMA favorável, senão vejamos

Deve-se observar que a existência de um EIA/RIMA favorável condiciona a


autoridade à outorga da licença ambiental, existindo, dessa feita, o direito de o
empreendedor desenvolver sua atividade econômica. Temos nessa hipótese o
único caso de uma licença ambiental vinculada. De fato, se a defesa do meio
ambiente é limitadora da livre iniciativa (art. 170, VI), e inexistem danos àquele,
não haverá razão para que o empreendimento não seja desenvolvido. Por outro
lado, se o EIA/RIMA mostra-se desfavorável, totalmente ou em parte, caberá à
Administração, segundo critérios de conveniência e oportunidade, avaliar a
concessão ou não da licença ambiental, porquanto, como já foi realçado, o

78
desenvolvimento sustentável é princípio norteador da preservação do meio
ambiente e do desenvolvimento da ordem econômica. Essa possibilidade retrata
uma discricionariedade sui generis. Evidentemente, a concessão da licença deverá
ser fundamentada, atacando cada um dos pontos que se mostraram impactantes
ao meio ambiente, sob pena de ferir o preceito contido no art. 37 da Constituição
Federal. Interessante verificar que o EIA/RIMA atua como elemento de restrição da
discricionariedade que ele mesmo criou, porquanto permite à Administração, com
base nos elementos do estudo, a concessão ou não da licença

Destarte, em síntese, vislumbramos quatro posicionamentos: i) natureza de autorização, cujo principal


argumento é ausência de definitividade da licença ambiental, sujeita revalidação e revisão; ii) natureza de
licença, uma vez que, atendidos os requisitos legais, é direito subjetivo (ato vinculado) do empreendedor
obter a licença ambiental, ainda que sua continuidade fique sujeita a revisão ou reavaliação pelo órgão
ambiental; iii) natureza de licença sui generis, uma vez que seria ato vinculado, caso restem atendidos os
requisitos legais, entretanto, não-definitivo ficando condicionada ao estado da técnica e a superveniência
das condições ambientais ou legais; e iv) natureza indefinida, dependendo dos contornos dados pela
legislação correlata (Nota do Resumidor).

Modificações na Licença Ambiental (natureza de autorização). Importante característica da licença


ambiental verifica-se na possibilidade de sua modificação ante a superveniência de riscos ambientais
graves, nos termos do artigo 19 da Resolução 237/97:

Art. 19 – O órgão ambiental competente, mediante decisão motivada, poderá


modificar os condicionantes e as medidas de controle e adequação, suspender ou
cancelar uma licença expedida, quando ocorrer: I - Violação ou inadequação de
quaisquer condicionantes ou normas legais. II - Omissão ou falsa descrição de
informações relevantes que subsidiaram a expedição da licença. III - superveniência
de graves riscos ambientais e de saúde.

Dessa forma, verifica-se que a licença ambiental, diferentemente do que ocorre com a licença modalidade
de ato administrativo estudada no direito administrativo, pode sofrer modificação posterior. Previsões da
Resolução 237:

• Suspensão: é a retirada temporária da licença, quando houver possibilidade de adequação da


atividade. Ocorre nos casos de suspeita de risco ambiental grave, mesmo que superveniente ao
licenciamento, e quando for identificada irregularidade não tão grave no licenciamento.

• Anulação: é retirada definitiva, que ocorre por irregularidade na concessão da licença ambiental,
que desconsiderou os preceitos legais. Omissão ou falsidade de informações relevantes que
servirem para fundamentar a expedição da licença.

• Cassação: irregularidade posterior à concessão da licença ambiental, em razão do descumprimento


das condicionantes ou da legislação ambiental.

• Revogação: superveniência de graves riscos para o meio ambiente e para a saúde pública.

Revogação ou Anulação da Licença Ambiental: A revogação dar-se-á quando sobrevier motivo de


interesse público que desaconselhe a realização da obra licenciada, tal como: a) mudança das
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circunstâncias, seja por haver desaparecido as que motivaram sua outorga ou sobrevirem outras que, se
existissem antes teriam justificado sua denegação; b) adoção de novos critérios de apreciação, em que a
incompatibilidade da atividade licenciada deriva de uma modificação posterior que a Administração
introduziu no ordenamento jurídico urbanístico, quer aprovando novo plano diretor, quer modificando o
existente, quer aprovando nova lei de zoneamento ou modificando a existente, com efeitos negativos
para a manutenção da licença e do direito reconhecido ao particular com sua outorga. (José Afonso da
Silva)

O erro na sua outorga: o erro que supõe a equivocada apreciação de circunstâncias reais não é um erro de
fato – que em todo momento poderia ser sanado pela Administração – mas um erro de classificação, de
valoração, de interpretação, quer dizer, um erro de direito. O erro, no entanto, pode gerar uma
ilegalidade na outorga da licença, caso em que seu desfazimento deverá ser feito por anulação e não por
revogação. E a cassação vincula-se ao problema da legalidade, mas não da legalidade da licença em si,
mas de posterior descumprimento das exigências dela. (José Afonso da Silva)

A suspensão ou cancelamento da licença: a resolução Conama 23797 arrolou os fundamentos da


suspensão ou cancelamento da licença da licença expedida: violação ou inadequação das condicionantes
ou normas legais, omissão ou falsa descrição de informações relevantes e superveniência de graves riscos
para saúde ou para o meio ambiente (art. 19).

Ressaltamos que, no que tange à anulação da licença ambiental, inexiste prazo para a sua fulminação,
quer administrativa, quer judicial, tendo em conta que não se sujeita à preclusão administrativa (Frederico
Amado).

Direito à Indenização no Caso de Cancelamento: Há a discussão sobre se haveria direito à indenização no


caso de revogação/anulação da autorização/licença no prazo de sua validade. Há três posicionamentos
doutrinários:

(i) inexiste direito a indenização, uma vez que ao “empreendedor são imputados todos os riscos de
sua atividade, o que se coaduna com os princípios do Poluidor-pagador e da Precaução. Portanto,
constatada a impertinência de determinada atividade econômica regularmente licenciada, impõe-se
ao Poder Púbico a análise da conveniência e oportunidade da revogação, não se vislumbrando a
possibilidade de indenização por perdas e danos decorrente exclusivamente da revogação realizada
pela Administração, pois o dever de proteção não é só do Poder Público, mas também de toda a
coletividade incluindo o próprio empreendedor” (Maurício de Jesus Nunes da Silva)

(ii) há direito a indenização, haja vista que mesmo suspensa ou cassada a licença, é importante
assinalar, remanesce o direito do administrado de algum modo vinculado ao empreendimento: se
não sob a forma de atividade efetiva, ao menos sob a forma de ressarcimento dos danos (materiais e
morais) que vier a sofrer pela perda dos investimentos que antes foram legítima e legalmente
autorizados (Edis Milaré)

(iii) em regra, não há direito a indenização, “salvo quando a sua causa determinante do
cancelamento puder ser imputada diretamente à Administração Pública ambiental, quando, por
exemplo, equivocar-se ao licenciar uma atividade que sabidamente, naquele momento, não
deveria sê-lo, pois incompatível com o interesse público” (Frederico Amado).

80
De qualquer forma, aqueles que defendem a possibilidade de indenização ao empreendedor, entendem
ser cabível a reparação dos danos emergentes, apenas os diretos e imediatos, mas não dos lucros
cessantes, haja vista o caráter temporário da licença ambiental (Frederico Amado).

Sobre o tema, colacionamos interessante decisão do Superior Tribunal de Justiça, aduzindo que:

Não gera dano moral a conduta do Ibama de, após alguns anos concedendo
autorizações para desmatamento e queimada em determinado terreno com a
finalidade de preparar o solo para atividade agrícola, deixar de fazê-lo ao
constatar que o referido terreno integra área de preservação ambiental (...) Como
se pode depreender, o agricultor é simultaneamente agente agressor do meio
ambiente e titular do direito difuso à preservação ambiental contra suas próprias
técnicas agropastoris. Assim, não se legitima a pretensão indenizatória que busca
responsabilizar o Poder Público por proteger o próprio agricultor – na qualidade de
titular coletivo do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado – contra os
danos provocados pelas suas próprias técnicas de plantio. Além disso, a simples
vedação da utilização de técnica degradadora no preparo do solo não impede que
se dê continuidade à atividade agrícola com o uso sustentável de técnicas
alternativas à queima e ao desmatamento. Ademais, a concessão de autorização
para queimada e desmatamento nos anos anteriores não gera um direito para o
agricultor, pois a negativa configura nítido exercício do poder de autotutela
(Súmula 473 do STF), por meio do qual a Administração Pública busca justamente
recompor a legalidade do ato administrativo. Por fim, ganha substancial relevo o
princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, porque a limitação
imposta pelo Poder Público quanto à forma de exploração da propriedade
constitui medida restritiva a um direito individual que, todavia, reverte
positivamente em favor de um direito de titularidade difusa – o meio ambiente.
(REsp 1.287.068).

Ao meu sentir, a posição mais segura é a intermediária, sustentada por Frederico Amado, devendo, caso
perguntado, o candidato delinear os posicionamentos acima e o citado julgado do STJ, posicionando-se no
sentido de que, em regra, é incabível a indenização pelo cancelamento (revogação ou anulação) da licença
ambiental, ressalvados casos onde o Poder Público seja responsabilizado diretamente pela concessão
indevida da licença (Nota do Resumidor).

Casos de dispensa de licenciamento: (i) a execução, em caráter de urgência, de atividades de segurança


nacional e obras de interesse da defesa civil destinadas à prevenção e mitigação de acidentes em áreas
urbanas; (ii) o manejo sustentável para exploração florestal eventual sem propósito comercial, para
consumo no próprio imóvel, devendo apenas ser declarados previamente ao órgão ambiental a
motivação da exploração e o volume explorado, limitada a exploração anual a 20 metros cúbicos; (iii)
plantio ou do reflorestamento com espécies florestais nativas ou exóticas; e (iv) é a permissão de livre
extração de lenha e demais produtos de florestas PLANTADAS nas áreas não consideradas Áreas de
Preservação Permanente e Reserva Legal, certamente em razão de se tratar de área de uso alternativo do
solo, cuja vegetação foi plantada pelo proprietário ou possuidor.

Atividade não Potencialmente Causadora de Significativo Impacto Ambiental: O órgão ambiental


competente, verificando que a atividade ou empreendimento não é potencialmente causador de
significativa degradação do meio ambiente, definirá os estudos ambientais pertinentes ao respectivo
processo de licenciamento. (parágrafo único do artigo 3º da Resolução do CONAMA 237/97).
81
Espécies de Licença Ambiental: São três as espécies de licenças ambientais estabelecidas pela Resolução
237/97 do CONAMA. Ressalte-se que boa parte da aplicação dessa resolução foi afastada pela Lei
Complementar 140/11. Entretanto, parte dela continua em vigor. Os tipos de licença são:

(i) Licença prévia (LP): concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou


atividade aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e
estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua
implementação;

(ii) Licença de Instalação (LI): autoriza a instalação do empreendimento ou atividade de acordo com
as especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de
controle ambiental e demais condicionantes, da qual constituem motivo determinante;

(iii) Licença de Operação (LO): autoriza a operação da atividade ou empreendimento, após a


verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as medidas de
controle ambiental e condicionantes determinados para a operação.

As licenças ambientais poderão ser expedidas isolada ou sucessivamente, de acordo com a natureza,
características e fase do empreendimento ou atividade.

Procedimento para Obtenção das Licenças. Iter procedimental das licenças: 1 - definição pelo órgão
ambiental, junto com o empreendedor, do que é necessário para o início do procedimento; 2 –
requerimento da LP; 3 – análise pelo órgão; 4 – possibilidade de pedir esclarecimentos, inclusive com
renovação desse pedido; 5 – audiência pública, se for o caso (para procedimentos que exijam a realização
de EIA/RIMA, o órgão ambiental a realizará quando julgar necessário ou quando requerido por 50 ou mais
cidadãos ou pelo MP, nos termos da Re. CONAMA 09/87); 6 – novos esclarecimentos, se necessários após
a audiência; 7 – emissão de parecer técnico conclusivo e, se preciso, parecer jurídico; 8 – deferimento, ou
não, da LP, também com publicidade; 9 – o procedimento deve ser concluído em 6 meses, sem EIA/RIMA,
ou até 12 meses, com EIA/RIMA (art. 14 da Resolução 237/97); 10 – deferimento, ou não, da LI; 11 –
concluídas e aprovadas as obras, deferimento da LO.

6.2.1 Critérios para fixação da Competência Ambiental

Histórico da Legislação Anterior (A Resolução 237/97): A Resolução 237/97 do CONAMA estabelecia um


sistema racional de divisão das atribuições entre as diversas esferas federativas, buscando evitar a
duplicidade de procedimentos. A referida resolução tinha como intuito suprir a lacuna legal, pois a lei
complementar mencionada parágrafo único do art. 23 da CF só veio a ser aprovada em 2011 (LC
140/2011). Parte da doutrina argumentava que a Resolução 237/97 seria inconstitucional na parte em que
procedia à divisão da competência licenciatória entre os entes da federação. Segundo esse entendimento,
tratando-se de matéria prevista como competência comum (art. 23 da CF), caberia a lei complementar
fixar as normas de cooperação entre os entes federativos. Além disso, criou o licenciamento municipal,
extrapolando o poder regulamentar concedido pelo art. 10 da Lei nº. 6.938/81.

LC 140/11 (legislação atual): A LC 140 estabeleceu que o licenciamento será feito por um único ente e
estabeleceu taxativamente as competências de cada ente da federação, tendo referido diploma sido
objeto da ADI 4757, (ainda pendente em 06/09/2016). Ressaltamos que a LC 140 não se aplica aos
procedimentos anteriores a 08/12/11. É bom frisar que mesmo que se conclua pela competência de um
órgão ambiental o licenciamento ambiental, não resta excluído o poder de fiscalização dos demais de
outras esferas, observado o disposto no já analisado artigo 17, da LC 140/2011.

82
Critérios de definição de competência ambiental:

(i) dimensão do impacto ou dano ambiental (ou predominância do interesse): definição do órgão
ambiental licenciador decorrerá da dimensão territorial dos danos ambientais a serem causados. O
interesse local/competência municipal é aquele que não ultrapassa as fronteiras do território de um
Município. Impacto estadual/competência do Estado é aquele que ultrapassa o território de um
Município, mas fica adstrito às fronteiras de um Estado da federação. Impacto regional ou
nacional/competência federal é aquele que ultrapassa o território de um Estado, abarcando uma
região ou mesmo todo o território brasileiro.

(ii) localização geográfica do empreendimento ou atividade: parte da doutrina advoga a tese de que
LC 140/2011 não acolheu o critério da dimensão do impacto ou dano ambiental, mas sim da
localização geográfica do empreendimento como regra geral para fixação da competência federal
para licenciamento ambiental.

(iii) dominialidade do bem público afetável: a competência para a promoção do licenciamento


ambiental será definida de acordo com a titularidade do bem a ser afetado pelo empreendimento
licenciando.

Há julgados do STJ e alguns regionais no sentido de que a dominialidade (titularidade do bem) não é
critério definidor da competência para o licenciamento ambiental, contudo, a dominialidade acaba
sendo adotada para definição da legitimidade ativa da União e do IBAMA em ações fundamentadas
em possíveis ilegalidades no licenciamento ambiental, insuficiência da atuação do órgão estadual de
meio ambiente ou dano a bem de domínio da União (REsp 769753/SC).

(iv) atuação supletiva: quando o órgão ambiental do ente federado de menor extensão territorial
não puder licenciar, o de maior abrangência territorial o fará, de acordo com os critérios do artigo 14,
da LC 140/2011. Em todo caso, será apenas um o órgão responsável pelo licenciamento.

(v) ente instituidor da unidade de conservação: o órgão competente para licenciar é o mesmo que
instituiu a UC, exceto em se tratando de APA (art. 12 LC 140).

(vi) atividade: atividades militares ou nucleares/radioativas devem ser licenciadas pela União

COMPETÊNCIAS PARA LICENCIAMENTO. De acordo com os arts. 7°, 8º e 9º da LC 140, ficou assim definida
a competência para o licenciamento ambiental:

83
Atividades ou empreendimentos:
a) localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe;
b) localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica
exclusiva;
c) localizados ou desenvolvidos em terras indígenas;
d) localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pela União, exceto em Áreas
de Proteção Ambiental (APAs);
e) localizados ou desenvolvidos em 2 (dois) ou mais Estados;
f) de caráter militar, salvo os previstos no preparo e emprego das Forças Armadas
g) os relativos à material radioativo ou energia nuclear; ou
h) que atendam tipologia estabelecida por ato do Poder Executivo, a partir de proposição da Comissão
Tripartite Nacional, assegurada a participação de um membro do Conselho Nacional do Meio Ambiente
Licencia
(Conama), e considerados os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade ou
mento
empreendimento (ou seja, licenciar o que for determinado por ato do Poder Executivo, por proposição
Federal
da Comissão Tripartite Nacional).
(IBAMA)
Obs.: Há um critério geral, que é o da localização geográfica do empreendimento ou atividade (e não
mais do impacto ambiental), e dois critérios suplementares: o da atividade (militar ou
nuclear/radioativa) e o do ente instituidor da unidade de conservação – instituída pela União, é
competência desse ente (salvo APAs). Entretanto, há doutrinador que afirma que o critério da atividade
é, na verdade, ditado pela predominância do interesse (pois é, o tema é muito polêmico!).

Frederico Amado defende que, nos itens “a”, “e” e “g”, o legislador adotou o critério da extensão do
impacto, enquanto, nos itens ”b” e “c”, teria acolhido o critério da dominialidade. O item “d” teria
escolhido o critério do ente instituidor. Saliento que o Des. João Batista Moreira possui artigo a respeito
da competência para licenciamento, onde parece defender a utilização do critério da extensão do
impacto para fins de fixação da competência ambiental, quando houver conflito entre os órgãos
ambientais.
A competência para licenciamento pelo Estado é residual, cabendo-lhe aquilo que não for conferido à
União ou ao Município (art. 8º, XIV), in verbis:
a) (é ação administrativa do Estado) promover o licenciamento ambiental de atividades ou
empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou
Licencia capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, ressalvado o disposto nos arts. 7 o e 9o;
mento Cabe, ainda, ao Estado:
estadual b) promover o licenciamento ambiental de atividades ou empreendimentos localizados ou
desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pelo Estado, exceto em Áreas de Proteção
Ambiental (APAs)
Obs.: Há dois critérios, o residual, e o do ente instituidor da unidade de conservação – se instituída pelo
Estado, é desse ente a competência (salvo APAs).
Atividades ou empreendimentos:

a) que causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito local, conforme tipologia definida pelos
Licencia respectivos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente, considerados os critérios de porte, potencial
mento poluidor e natureza da atividade;
municip b) localizados em unidades de conservação instituídas pelo Município, exceto em Áreas de Proteção
al Ambiental (APAs)

Obs.: Há dois critérios, permanece o do impacto ambiental local e o do ente instituidor das unidades de
conservação (salvo APAs).

84
O licenciamento que compreenda, concomitantemente, área terrestre e marítima da zona costeira só será
atribuição da União se ato do Poder Executivo o definir, a partir de proposição da Comissão Tripartite
(União não quer se ocupar com pequenos empreendimentos, a exemplo de pequenas barracas e aluguéis
de bananas boat).

Em unidades de conservação (exceto APA): A LC 140 diz que quem institui a unidade de conservação deve
licenciar os empreendimentos na área, excetuando-se as APAs. No caso das APAs, o critério é a regra geral
da LC: o da localização geográfica do empreendimento ou atividade. Entretanto, isso não exclui a
competência da União nos casos de sua exclusividade (APA em fronteira com país limítrofe, APA em terra
indígena, mar territorial, zona econômica exclusiva, atividades nucleares em APA...).

Delegação do licenciamento: A LC 140 prevê expressamente a possibilidade de delegação do


licenciamento, mediante convênio, desde que o ente destinatário da delegação disponha de órgão
ambiental capacitado a executar as ações administrativas a serem delegadas e de conselho de meio
ambiente (art. 4°, V e VI e art. 5°). Considera-se capacitado, aquele que possui técnicos próprios ou em
consórcio, devidamente habilitados e em número compatível com a demanda das ações administrativas a
serem delegadas (parágrafo único do art. 5°).

Atuação subsidiária: A ação subsidiária dos entes federativos dar-se-á por meio de apoio técnico,
científico, administrativo ou financeiro, sem prejuízo de outras formas de cooperação (artigo 16), e um
exemplo é a delegação do licenciamento. Acrescente-se que a ação subsidiária deve ser solicitada pelo
ente originariamente detentor da atribuição.

Contrariando a doutrina e a jurisprudência, a nova Lei estabelece que os empreendimentos devem ser
licenciados ou autorizados por um único ente federativo. Os demais entes podem manifestar-se ao órgão
responsável pela licença ou autorização, de maneira não vinculante, respeitados os prazos e
procedimentos do licenciamento (a licença ambiental envolve estudo, avaliação, enquanto a autorização
os dispensa, por ser a atividade considerada simples e de reduzido impacto).

O ente competente para licenciar é quem deve autorizar a supressão de vegetação decorrente dos seus
licenciamentos ambientais.

Prevê, ainda, o art. 13, § 3° da LC 140 que os valores alusivos às taxas de licenciamento ambiental e outros
serviços afins devem guardar relação de proporcionalidade com o custo e a complexidade do serviço
prestado.

Licenciar e Fiscalizar: a competência para licenciamento ou autorização não impede o exercício pelos entes
federativos da atribuição comum de fiscalização da conformidade de empreendimentos e atividades
efetiva ou potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em
vigor, prevalecendo o auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de
licenciamento ou autorização. (AgRg no REsp 1373302/CE)

Prazo para Análise do Pedido de Licença: A Resolução 237/97 prevê o prazo máximo de 6 (seis) meses
para análise dos pedidos de licença, a contar do ato de protocolo do requerimento, ressalvados os casos
em que houver EIA/RIMA e/ou audiência pública, quando o prazo será de até 12 (doze) meses. Essa parte
da Resolução continua aplicável.

85
As exigências de complementação de informações, documentos ou estudos feitas pela autoridade
licenciadora suspendem o prazo de aprovação, que continua a fluir após o seu atendimento integral pelo
empreendedor (art. 14, § 2°).

O decurso dos prazos de licenciamento, sem a emissão da licença ambiental, não implica emissão tácita
nem autoriza a prática de ato que dela dependa ou decorra, mas instaura a competência supletiva,

A renovação de licenças ambientais deve ser requerida com antecedência mínima de 120 (cento e vinte)
dias da expiração, ficando seu prazo automaticamente prorrogado até a manifestação definitiva do órgão
ambiental competente (art. 14, § 4°).

Atuação Supletiva. Pode ocorrer, ainda, a atuação supletiva em função da deficiência na ação do órgão
ambiental estadual ou municipal, nas seguintes hipóteses (art. 15):

I - inexistindo órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente no Estado ou no Distrito


Federal, a União deve desempenhar as ações administrativas estaduais ou distritais até a sua criação;

II - inexistindo órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente no Município, o Estado


deve desempenhar as ações administrativas municipais até a sua criação; e

III - inexistindo órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente no Estado e no Município,
a União deve desempenhar as ações administrativas até a sua criação em um daqueles entes
federativos.

Prazo de validade das licenças. As licenças têm prazo de validade diferenciado de acordo com a sua
espécie. Ao fim do prazo, deve ocorrer a revisão do licenciamento, para evitar a perenização de padrões
ultrapassados tecnologicamente (os prazos são fixados pela Res. 237/97).

Licença Prazo mínimo Prazo Prorrogabilidade


máximo

O estabelecido pelo cronograma de


LP elaboração dos planos, programas e 5 anos Sim, desde que observado o limite máximo
projetos

O estabelecido pelo cronograma de


LI 6 anos Sim, desde que observado o limite máximo
instalação

Não é prorrogada, mas renovada, por prazo


que independe do prazo inicial.

Ocorre prorrogação, contudo, a partir do


requerimento de renovação até a
LO 4 anos 10 anos
manifestação definitiva do órgão ambiental.

O pedido de renovação deve ser


apresentado até 120 dias antes do fim do
prazo.

86
O órgão ambiental poderá estabelecer prazos específicos para empreendimentos ou atividades que
por sua natureza e peculiaridade estejam sujeitos a encerramento ou modificações em prazos
inferiores

Publicação da licença: De modo a viabilizar o controle popular, há previsão para publicação resumida dos
pedidos de licenciamento, em qualquer de suas modalidades, sua renovação e a concessão da licença. Tal
publicação deve ser paga pelo interessado, no jornal oficial do Estado e em periódico de grande circulação,
regional ou local (art. 4° do Decreto 99.274/90 e art. 4° da Lei 10.650/03).

Regras específicas de licença: Além dessas regras referentes ao licenciamento ambiental, classificadas
como gerais, podem ser definidas regras específicas, pelo órgão ambiental competente, para o
licenciamento de atividades dotadas de características peculiares em razão do porte, da natureza, da
localização, da dinâmica de exploração e assim por diante (Resolução 237/97 – art. 12).

São exemplos de atividades que têm disciplina específica para o licenciamento ambiental: obras de grande
porte (Resolução 006/87), obras de saneamento (Resolução 005/88), atividades minerárias (Resolução
009/90 e 010/90), atividades de exploração e produção de petróleo (Resolução 023/94), empreendimentos
em praias de tartarugas marinhas (Resolução 010/96), assentamentos de reforma agrária (Resolução
289/2001).

As decisões do órgão ambiental acerca do licenciamento são passíveis de recurso, conforme previsão no
art. 20 do Decreto 99.274/90.

6.3 A Responsabilidade Administrativa Ambiental

6.3.1 Caracterização da Infração Administrativa Ambiental

De acordo com o caput do artigo 70, da Lei 9.605/1998, “considera-se infração administrativa ambiental
toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do
meio ambiente”.

É importante notar que a ocorrência de dano ambiental não é exigida para a consumação do citado tipo
administrativo, em consonância com o princípio da prevenção, sendo bastante que o agente, por ação ou
omissão, infrinja a legislação administrativa ambiental, existindo infrações de dano e de perigo.

Entende-se que a essência da infração é o comportamento em desobediência a uma norma jurídica de


tutela do ambiente. O dano, isoladamente, não é gerador da responsabilidade administrativa, mas apenas
se for resultado descrito em tipo infracional ou o provocado por uma conduta omissiva ou comissiva
violadora de regra jurídica.

Poderá ser autor dessa infração tanto as pessoas físicas ou jurídicas, mas neste último caso exige-se que o
ato tenha sido praticado por seu representante legal ou contratual, no interesse ou benefício da
entidade moral.

Do Princípio da Legalidade: A aplicação de sanções pelos entes federativos se pauta pelo princípio da
legalidade. Nesse sentido: “É vedado ao IBAMA instituir sanções sem expressa previsão legal. Questão já
87
enfrentada pelo STF, no julgamento da ADI-MC 1823/DF, ocasião em que restou determinada a
impossibilidade de aplicação pelo IBAMA de sanção prevista unicamente em portarias, por violação do
Princípio da Legalidade”. (AgRg no REsp 1164140/MG)

Outrossim, exige-se lei em sentido formal para a tipificação de infrações administrativas. Destarte, “a
aplicação de sanções administrativas, decorrente do exercício do poder de polícia, somente se torna
legítima quando o ato praticado pelo administrado estiver previamente definido por lei como infração
administrativa” (AgRg no REsp 1284558/PB).

Contudo, não viola o princípio da estrita legalidade a instituição de um tipo genérico por lei, a ser
regulamentado via decreto, uma vez que até em Direito Penal Ambiental já se admite a criação de normas
penais em branco heterogêneas, ante o caráter concretista e interdisciplinar do meio ambiente (Frederico
Amado). Nesse sentido STJ e TRF4:

“Não há atipicidade na conduta do agente, porquanto ela se inclui na previsão estabelecida no


artigo 25, §1º do Decreto nº 6.514/08. A descrição de conduta típica, para fins de infração
administrativa, pode vir regulamentada por meio de Decreto, desde que a norma se encontre
dentro dos contornos previstos na Lei n. 9.605/98, não inovando na ordem jurídica” (REsp
1441774/SC)

Consoante precedentes desta Corte, o Decreto n.º 6.514/08 não padece de nenhuma ilegalidade,
na medida em que, ao disciplinar as infrações administrativas ambientais, apenas detalha as
previsões da Lei n.º 9.605/98, facilitando a sua execução pela Administração Pública, sem, com
isso, invadir a esfera legislativa reservada às leis (TRF4, AC 5000861-27.2012.404.7211, TERCEIRA
TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 04/08/2016).

6.3.2 Responsabilidade administrativa de natureza objetiva ou subjetiva?

Basicamente, apontam-se três correntes:

(i) responsabilidade objetiva: a responsabilidade é objetiva e o dever de recuperar o meio ambiente


decorre de simples prova do prejuízo, pois a Lei 9.605/1998 em momento algum faz a distinção excluindo a
responsabilidade de quem não se houve com culpa, sendo, ainda, que há casos em que a mera omissão já
é suficiente para configurar infração (Vladimir Passos de Freitas). Esse é o entendimento também
defendido pelo IBAMA.

(ii) somente a multa simples exige responsabilidade subjetiva, conforme a dicção do art. 72 da Lei de n.
9.605/98. Às demais penalidades, inclusive a multa diária, incidirá a responsabilização objetiva (Paulo
Affonso Leme Machado)

(iii) responsabilidade subjetiva, em razão: a) da teoria da culpabilidade afeta ao direito sancionador; b)


do princípio da intranscendência das penas; e iii) da utilização de vocábulo “transgressores” no caput do
art. 14 da Lei de 8.938 (referência a responsabilidade administrativa), e não tão somente “poluidor”,
referida no §1º do art. 14, relativa a responsabilidade civil.

O Superior Tribunal de Justiça tem majoritariamente (decisões nas duas turmas) repelido a tese da adoção
da responsabilidade objetiva na imposição de responsabilização administrativa ambiental, senão
vejamos:

88
“Isto porque aplicação de penalidades administrativas não obedece à lógica da
responsabilidade objetiva da esfera cível (para reparação dos danos causados), mas
deve obedecer à sistemática da teoria da culpabilidade, ou seja, a conduta deve
ser cometida pelo alegado transgressor, com demonstração de seu elemento
subjetivo, e com demonstração do nexo causal entre a conduta e o dano” (REsp
1251697/PR)

A questão, portanto, não se cinge ao plano da responsabilidade civil, mas da


responsabilidade administrativa por dano ambiental. Pelo princípio da
intranscendência das penas (art. 5º, inc. XLV, CR88), aplicável não só ao âmbito
penal, mas também a todo o Direito Sancionador, não é possível ajuizar execução
fiscal em face do recorrente para cobrar multa aplicada em face de condutas
imputáveis a seu pai. Isso porque a aplicação de penalidades administrativas não
obedece à lógica da responsabilidade objetiva da esfera cível (para reparação dos
danos causados), mas deve obedecer à sistemática da teoria da culpabilidade, ou
seja, a conduta deve ser cometida pelo alegado transgressor, com demonstração
de seu elemento subjetivo, e com demonstração do nexo causal entre a conduta e
o dano. (...) Em resumo: a aplicação e a execução das penas limitam-se aos
transgressores; a reparação ambiental, de cunho civil, a seu turno, pode abranger
todos os poluidores, a quem a própria legislação define como "a pessoa física ou
jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por
atividade causadora de degradação ambiental" (art. 3º, inc. V, do mesmo diploma
normativo). Note-se que nem seria necessária toda a construção doutrinária e
jurisprudencial no sentido de que a obrigação civil de reparar o dano ambiental é do
tipo propter rem, porque, na verdade, a própria lei já define como poluidor todo
aquele que seja responsável pela degradação ambiental - e aquele que, adquirindo
a propriedade, não reverte o dano ambiental, ainda que não causado por ele, já
seria um responsável indireto por degradação ambiental (poluidor, pois). Mas fato
é que o uso do vocábulo "transgressores" no caput do art. 14, comparado à
utilização da palavra "poluidor" no § 1º do mesmo dispositivo, deixa a entender
aquilo que já se podia inferir da vigência do princípio da intranscendência das
penas: a responsabilidade civil por dano ambiental é subjetivamente mais
abrangente do que as responsabilidades administrativa e penal, não admitindo
estas últimas que terceiros respondam a título objetivo por ofensa ambientais
praticadas por outrem. (REsp 1251697/PR)

Essa orientação foi reafirmada em 2015 pela 1ª Turma do STJ em julgado com participação do
Desembargador Olindo Menezes, senão vejamos:

A responsabilidade civil ambiental é objetiva; porém, tratando-se de


responsabilidade administrativa ambiental, o terceiro, proprietário da carga, por
não ser o efetivo causador do dano ambiental, responde subjetivamente pela
degradação ambiental causada pelo transportador (AgRg no AREsp 62.584/RJ)

Discorreu o Desembargador Olindo Menezes que:

É de se destacar que a hipótese em julgamento, no que diz respeito à empresa


recorrente, não é propriamente de responsabilidade objetiva por danos causados
ao meio ambiente, que é efetivamente objetiva, quer nos termos do § 1º do art.
14 da Lei 6.938/1981, quer nos termos do parágrafo único do art. 927 do Código
Civil (“Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos

89
casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo
autor do dano implicar, pela sua própria natureza, riscos para os direitos de
outrem.”), senão pela multa de R$ 5.000.000,00 por infração administrativa
ambiental, que lhe aplicou o Município de Guapimirim/RJ, que constitui o objeto
da execução. (...)
Entendeu-se que a questão não se cingia ao plano da responsabilidade civil, senão
da responsabilidade administrativa por dano ambiental, que “não obedece à
lógica da responsabilidade objetiva da esfera civil (para reparação dos danos
causados), mas deve obedecer à sistemática da teoria da culpabilidade, ou seja, a
conduta deve ser cometida pelo alegado transgressor, com demonstração de seu
elemento subjetivo, e com demonstração do nexo causal entre a conduta e o
dano.” Por último, acentuou o acórdão que “o uso do vocábulo “transgressores”
no caput do art. 14, comparado à utilização da palavra “poluidor” no § 1º do
mesmo dispositivo, deixa a entender aquilo que já se podia inferir do princípio da
intranscendência das penas: a responsabilidade civil por dano ambiental é
subjetivamente mais abrangente do que a responsabilidade administrativa e
penal, não admitindo estas últimas que terceiros respondam a título objetivo por
ofensas ambientais praticadas por outrem.”
Essa leitura, em face da compreensão dos julgadores que compõem a 1ª Seção,
afigura-se majoritária, com a observação, assaz relevante, de que as afirmações
que dão pela responsabilidade ambiental objetiva tratam de danos causados ao
meio ambiente, e não em razão da responsabilidade por multas por infrações
administrativas ambientais, que é de ordem subjetiva e, como tal, restrita aos
seus autores. Fora dos danos oriundos da atividade normalmente desenvolvida
que implique, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem, hipótese que
não é a dos autos, que trata de multa por infração administrativa, não se pode
afirmar um caso de responsabilidade civil objetiva sem previsão legal específica,
como estatui o referido parágrafo único do art. 927 do Código Civil.

O posicionamento foi mantido em 2016 pela Segunda Turma, em julgado de relatoria do Ministro Herman
Benjamin:

PROCESSUAL CIVIL. AMBIENTAL. EXPLOSÃO DE NAVIO NA BAÍA DE PARANAGUÁ


(NAVIO "VICUNA"). VAZAMENTO DE METANOL E ÓLEOS COMBUSTÍVEIS.
OCORRÊNCIA DE GRAVES DANOS AMBIENTAIS. AUTUAÇÃO PELO INSTITUTO
AMBIENTAL DO PARANÁ (IAP) DA EMPRESA QUE IMPORTOU O PRODUTO
"METANOL". ART. 535 DO CPC. VIOLAÇÃO. OCORRÊNCIA. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO PELO TRIBUNAL A QUO. QUESTÃO
RELEVANTE PARA A SOLUÇÃO DA LIDE. 1. Tratam os presentes autos de: a) em 2004
a empresa ora recorrente celebrou contrato internacional de importação de certa
quantidade da substância química metanol com a empresa Methanexchile
Limited. O produto foi transportado pelo navio Vicuna até o Porto de Paranaguá, e
o desembarque começou a ser feito no píer da Cattalini Terminais Marítimos Ltda.,
quando ocorreram duas explosões no interior da embarcação, as quais
provocaram incêndio de grandes proporções e resultaram em danos ambientais
ocasionados pelo derrame de óleos e metanol nas águas da Baía de Paranaguá; b)
em razão do acidente, o Instituto recorrido autuou e multa a empresa recorrente
no valor de R$ 12.351.500,00 (doze milhões, trezentos e cinquenta e um mil e
quinhentos reais) por meio do Auto de Infração 55.908; c) o Tribunal de origem
consignou que "a responsabilidade do poluidor por danos ao meio ambiente é
objetiva e decorre do risco gerado pela atividade potencialmente nociva ao bem

90
ambiental. Nesses termos, tal responsabilidade independe de culpa, admitindo-se
como responsável mesmo aquele que aufere indiretamente lucro com o risco
criado" e que "o artigo 25, § 1º, VI, da Lei 9.966/2000 estabelece
expressamente a responsabilidade do 'proprietário da carga' quanto ao
derramamento de efluentes no transporte marítimo", mantendo a Sentença e
desprovendo o recurso de Apelação. 2. A insurgente opôs Embargos de Declaração
com intuito de provocar a manifestação sobre o fato de que os presentes autos não
tratam de responsabilidade ambiental civil, que seria objetiva, mas sim de
responsabilidade ambiental administrativa, que exige a demonstração de culpa
ante sua natureza subjetiva. Entretanto, não houve manifestação expressa
quanto ao pedido da recorrente. 3. Cabe esclarecer que, no Direito brasileiro e de
acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a responsabilidade
civil pelo dano ambiental, qualquer que seja a qualificação jurídica do degradador,
público ou privado, proprietário ou administrador da área degradada, é de natureza
objetiva, solidária e ilimitada, sendo regida pelos princípios do poluidor-pagador,
da reparação in integrum, da prioridade da reparação in natura e do favor debilis.
4. Todavia, os presentes autos tratam de questão diversa, a saber a natureza da
responsabilidade administrativa ambiental, bem como a demonstração de
existência ou não de culpa, já que a controvérsia é referente ao cabimento ou não
de multa administrativa. 5. Sendo assim, o STJ possui jurisprudência no sentido
de que, "tratando-se de responsabilidade administrativa ambiental, o
terceiro, proprietário da carga, por não ser o efetivo causador do dano
ambiental, responde subjetivamente pela degradação ambiental causada pelo
transportador" (AgRg no AREsp 62.584/RJ, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Rel. p/
acórdão Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 7.10.2015). 6. "Isso
porque a aplicação de penalidades administrativas não obedece à lógica da
responsabilidade objetiva da esfera cível (para reparação dos danos causados),
mas deve obedecer à sistemática da teoria da culpabilidade, ou seja, a conduta
deve ser cometida pelo alegado transgressor, com demonstração de seu
elemento subjetivo, e com demonstração do nexo causal entre a conduta e o
dano". (REsp 1.251.697/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda
Turma, DJe 17.4.2012). 7. Caracteriza-se ofensa ao art. 535 do Código de
Processo Civil quando o Tribunal de origem deixa de se pronunciar acerca de
matéria veiculada pela parte e sobre a qual era imprescindível manifestação
expressa. 8. Determinação de retorno dos autos para que se profira nova
decisão nos Embargos de Declaração. 9. Recurso Especial provido.

Com relação ao TRF4, não foi possível encontrar julgados que enfrentem de maneira clara a questão,
parecendo que a linha adotada, contudo, vai no sentido de adoção da responsabilidade objetiva mesmo
para infrações de natureza administrativa, conforme se depreende da ementa abaixo:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA E AÇÃO ORDINÁRIA DE ANULAÇÃO DE AUTO DE INFRAÇÃO. MEIO AMBIENTE.
CORTE DE ÁRVORES. ARTIGO 70 DA LEI Nº 9.605/98. ARTIGO 44 DO DECRETO 6.514/08. - A
responsabilidade pelo dano ambiental é objetiva e a obrigação de reparação dos danos tem
natureza é propter rem. - É imprescritível a pretensão reparatória de danos ao meio ambiente,
matéria pacificada na doutrina e jurisprudência, pois o bem jurídico - meio ambiente - é
indisponível e fundamental. Orientação do STJ. - Consoante precedentes desta Corte, o Decreto n.º

91
6.514/08 não padece de nenhuma ilegalidade, na medida em que, ao disciplinar as infrações
administrativas ambientais, apenas detalha as previsões da Lei n.º 9.605/98, facilitando a sua
execução pela Administração Pública, sem, com isso, invadir a esfera legislativa reservada às leis -
Constatada a impossibilidade de integral reparação natural do dano ambiental, é possível a
cumulação da obrigação de fazer e/ou de não fazer com indenização pecuniária. - Hipótese em que
reconhecida a higidez da autuação e do processo administrativo respectivo, bem assim do valor da
multa cominada, pois condizente com a dimensão das providências determinadas e a importância da
controvérsia posta nos autos. (TRF4, AC 5000861-27.2012.404.7211, TERCEIRA TURMA, Relator
RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 04/08/2016)

6.3.3 Sanções Administrativas Em Espécie

As infrações e sanções administrativas em matéria ambiental são tratadas no Decreto 6.514/08, que
regulamentou a Lei 9.605/98.

O Auto de infração é a forma de aplicação da sanção administrativa e dá início ao processo administrativo

Prescrição da Pretensão Punitiva: o prazo para deflagrar o processo administrativo ambiental é de 5 anos,
a contar do fato, não é do seu conhecimento. O prazo prescricional é interrompido com a lavratura do
auto de infração (art. 21 do Dec. 6.514/08);

Prescrição intercorrente: ocorre se o processo ficar parado por mais de 3 anos, sem impulso por parte da
Administração Pública (art. 21, § 2º);

Dosimetria: A dosimetria das sanções será norteada pelos critérios do artigo 6.º, da Lei 9.605/1998,
consoante a gravidade do fato, os antecedentes do infrator e a sua situação econômica.

O cometimento de mais de uma infração administrativa pelo infrator o sujeita à aplicação cumulativa de
sanções, conforme texto expresso do § 1.º, do artigo 72 da Lei.

Reincidência: O cometimento de nova infração ambiental pelo mesmo infrator, no período de cinco anos,
contados da lavratura de auto de infração anterior devidamente confirmado no julgamento de que trata o
art. 124, implica: (a) aplicação da multa em triplo, no caso de cometimento da mesma infração; ou (b)
aplicação da multa em dobro, no caso de cometimento de infração distinta.

6.3.3.1 Advertência – art. 72, I, e §2º, Lei e art. 2º, I, e §2º,


Decreto

Caberá a advertência pelo cometimento de qualquer infração administrativa, sem prejuízo das demais
sanções cominadas. O artigo 5.º, do Decreto 6.514/2008, prevê a possibilidade de aplicação dessa
penalidade para as infrações de menor lesividade ambiental, quando a multa máxima cominada não
ultrapassa R$ 1.000,00.

Será aplicada, nos termos do art. 72, §2º, Lei n.º 9.605/98, “pela inobservância das disposições desta Lei e
da legislação em vigor, ou de preceitos regulamentares, sem prejuízo das demais sanções previstas neste
artigo”.

92
Configurada infração ambiental grave, é possível a aplicação da pena de multa sem a necessidade de
prévia imposição da pena de advertência (art. 72 da Lei 9.605/1998). (Informativo 581/STJ)

6.3.3.2 Multa Simples – art. 72, II, e §§ 3º e 4º, Lei e art. 8º


e ss do Decreto 6.514/08

Será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo, deixar de sanar as irregularidades no prazo
consignado pela autoridade administrativa, ou opuser embaraço à fiscalização (art. 72, § 3º. Lei 9.605/98).

O §4º permite a conversão da multa simples em serviços de preservação, melhoria e recuperação da


qualidade ambiental. É faculdade da Administração Pública e pode ser requerida pelo infrator. Quando
concedida, suspende a exigibilidade da multa enquanto perdurar a obrigação de fazer.

A prestação de serviços substitutiva não pode ser confundida com a obrigação do infrator de corrigir as
irregularidades apontadas e reparar danos ambientais decorrentes de sua conduta - que são obrigações
autônomas, nos termos do art. 225, §3º, CF.

6.3.3.3 Multa Diária – art. 72, III, e §5º, Lei e art. 10 do


Decreto 6.514/08

Aplicável no caso de infração que se prolonga no tempo, até a sua efetiva cessação ou celebração de
Termo de Compromisso de reparação de dano.

Nem a Lei nem o Decreto definem “infração que se prolonga no tempo”. Para Milaré, não é aquela que se
repete diversas vezes (aí seria reincidência), mas aquela cujos efeitos se protraem no tempo. Geralmente
ocorre em 2 situações: - operação de atividade sem a licença ambiental exigível; - funcionamento de
atividade não provida de meios adequados para evitar a emissão de poluentes.

As demais disposições mencionadas no tópico da multa simples aplicam-se também à multa diária.

6.3.3.4 Apreensão de animais, produtos e subprodutos da


fauna e flora, instrumentos, petrechos,
equipamentos ou veículos de qualquer natureza
utilizados na infração

6.3.3.5 Destruição ou Inutilização do Produto

A apreensão está prevista no art. 72, IV, Lei e art. 3º, IV, Decreto 6.514/08. A destruição ou inutilização do
produto, por sua vez, está prevista no art. 72, V, Lei e art. 3º, V, Decreto 6.514/08. O art. 72, § 6º,
estabelece que ambas obedecerão ao disposto no art. 25.

Art. 25. Verificada a infração, serão apreendidos seus produtos e instrumentos,


lavrando-se os respectivos autos.

§ 1º Os animais serão prioritariamente libertados em seu habitat ou, sendo tal


medida inviável ou não recomendável por questões sanitárias, entregues a jardins
zoológicos, fundações ou entidades assemelhadas, para guarda e cuidados sob a
responsabilidade de técnicos habilitados. (Redação dada pela Lei nº 13.052, de
2014)

93
§ 2º Até que os animais sejam entregues às instituições mencionadas no § 1o deste
artigo, o órgão autuante zelará para que eles sejam mantidos em condições
adequadas de acondicionamento e transporte que garantam o seu bem-estar físico.

§ 3º Tratando-se de produtos perecíveis ou madeiras, serão estes avaliados e


doados a instituições científicas, hospitalares, penais e outras com fins
beneficentes.

§ 4º Os produtos e subprodutos da fauna não perecíveis serão destruídos ou


doados a instituições científicas, culturais ou educacionais.

§ 5º Os instrumentos utilizados na prática da infração serão vendidos, garantida a


sua descaracterização por meio da reciclagem.

6.3.3.6 Suspensão de venda e fabricação do produto - art.


72, VI, e §7º, Lei e art. 3º, VI, Decreto 6.514/08

Tem por objeto a irregularidade do produto, e não de sua fabricação ou produção. É usualmente aplicada
pelas autoridades competentes para o licenciamento de produtos, como alimentos e remédios.

Em sede ambiental é pouco utilizada, limitada a produtos que, apesar de não sujeitos ao licenciamento
ambiental, possam causar danos ao meio ambiente.

6.3.3.7 Embargo Ou Interdição De Obra Ou Atividade - art.


72, VII, e §7º, Lei e art. 3º, VII, Decreto 6.514/08

Impede o prosseguimento da obra ou atividade e é geralmente imposto no caso de edificação sem licença.
Relativamente à atividade, equivale à sanção de suspensão de atividade.

6.3.3.8 Demolição de obra - art. 72, VIII, e §7º, Lei e art. 3º,
VIII, Decreto 6.514/08

É medida extrema, que só deve ser tomada em caso de irregularidade insanável ou de perigo à saúde
pública ou de grave dano ambiental.

Autoexecutoriedade:

(i) Obra já conclusa: O STJ já decidiu que a penalidade administrativa de demolição não é autoexecutória,
ao menos no caso de obra já conclusa, cabendo ao órgão ambiental postular autorização judicial para a
sua execução. (REsp 789.640).

(ii) Casa Habitada: Os atos de polícia são executados pela própria autoridade administrativa,
independentemente de autorização judicial. Se, todavia, o ato de polícia tiver como objeto a demolição de
uma casa habitada, a respectiva execução deve ser autorizada judicialmente e acompanhada por oficiais
de justiça. (REsp 1217234/PB)

(iii) Interesse de Agir: Mesmo que a Lei n. 9.605/98 autorize a demolição de obra como sanção às infrações
administrativas de cunho ambiental, a verdade é que existe forte controvérsia acerca de sua auto-
executoriedade (da demolição de obra). Em verdade, revestida ou não a sanção do referido atributo, a
qualquer das partes (Poder Público e particular) é dado recorrer à tutela jurisdicional, porque assim lhe

94
garante a Constituição da República (art. 5º, inc. XXXV) - notoriamente quando há forte discussão, pelo
menos em nível doutrinário, acerca da possibilidade de a Administração Pública executar manu militari a
medida. (REsp 1246443/PR)

6.3.3.9 Suspensão Parcial Ou Total Das Atividades - Art. 72,


IX, E §7º, Lei E Art. 3º, IX, Decreto 6.514/97

É penalidade extremamente severa. Será aplicada quando o produto, a obra, a atividade ou o


estabelecimento não estiverem obedecendo às determinações legais ou regulamentares (art. 15 do
Decreto).

6.3.3.10 Restritivas De Direitos - Art. 72, XI, E §8º, Lei e Art.


3º, X, Decreto 6.514/08

As sanções restritivas de direito são: I - suspensão de registro, licença ou autorização; II - cancelamento de


registro, licença ou autorização; III - perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais; IV - perda ou
suspensão da participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito; e V -
proibição de contratar com a Administração Pública, pelo período de até três anos”.

São penalidades, no fundo, acessórias à pena principal, eis que não há sentido em aplicá-las dissociadas da
multa ou da suspensão de obra ou atividade.

6.4 Biossegurança

A Biossegurança é uma medida surgida no século XX, e, em sentido lato, consiste no conjunto de atividades
e técnicas utilizadas no controle e na minimização de riscos ao meio ambiente e à saúde humana advindos
da utilização de diferentes tecnologias. Luís Paulo Sirvinskas formula o seguinte conceito de Biossegurança:
“conjunto de normas legais e regulamentares que estabelecem critérios e técnicas para a manipulação
genética, no sentido de evitar danos ao meio ambiente e à saúde humana” (SIRVINSKAS, Luís Paulo.
Manual de Direito Ambiental. São Paulo, Saraiva, 2ed. 2003).

A disciplina básica da Biossegurança no Brasil está contida na Lei n. 11.105/2005, estabelece normas de
segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o
transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização,
o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados – OGM
e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e
biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da
precaução para a proteção do meio ambiente.

6.4.1 Órgãos e Entidades de Biossegurança no Brasil

6.4.1.1 Conselho Nacional De Biossegurança – CNBS

O Conselho Nacional de Biossegurança é órgão de assessoramento superior, vinculado ao Presidente da


República, e tem a missão básica de auxiliar a formulação e a implantação da Política Nacional de
95
Biossegurança (arts. 8º e 9º da Lei 11.105). Convém ponderar que, segundo a doutrina, tal órgão possui
natureza política, e não técnica. Suas decisões não estão adstritas ao juízo formulado pela CTNBio, ainda
que possa utilizar os subsídio técnicos fornecidos por esta Comissão. O juízo, portanto, formulado pelo
CNBS é de conveniência e oportunidade, ainda que tal juízo deva seguir os ditames impostos pelo princípio
da legalidade.

As atribuições do conselho estão previstas no art.8º da Lei 11.105, dentre as quais destacam-se: fixar
princípios e diretrizes para a ação administrativa dos órgãos e entidades federais com competências
sobre a matéria; analisar, a pedido da CTNBio, quanto aos aspectos da conveniência e oportunidade
socioeconômicas e do interesse nacional, os pedidos de liberação para uso comercial de OGM e seus
derivados; avocar e decidir, em última e definitiva instância, com base em manifestação da CTNBio e,
quando julgar necessário, dos órgãos e entidades referidos no art. 16 desta Lei, no âmbito de suas
competências, sobre os processos relativos a atividades que envolvam o uso comercial de OGM e
seus derivados.

Compõem o CNBS (11 membros): Ministro de Estado Chefe da Casa Civil, que o preside; Ministro da
Estado da Ciência e Tecnologia; Ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário; Ministro de Estado da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Ministro de Estado da Justiça; Ministro de Estado da Saúde;
Ministro de Estado do Meio Ambiente; Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior; Ministro de Estado das Relações Exteriores; Ministro de Estado da Defesa; Secretário Especial
de Aquicultura e Pesca da Presidência da República.

6.4.1.1 Comissão Técnica Nacional De Biossegurança –


Ctnbio.

A CTNbio é a base do sistema de biossegurança e dela partem as principais decisões sobre o tema. A
CNTbío não tem personalidade jurídica, não sendo autarquia, fundação, empresa pública ou agência. Ela
integra a pessoa jurídica da União. Trata-se de um órgão eminentemente técnico integrante do Ministério
da Ciência e Tecnologia, sendo uma instância colegiada multidisciplinar de caráter consultivo e
deliberativo, para prestar apoio técnico e de assessoramento ao Governo Federal na formulação,
atualização e implementação da PNB de OGM e seus derivados, bem como no estabelecimento de normas
técnicas de segurança e de pareceres técnicos referentes à autorização para atividades que envolvam
pesquisa e uso comercial de OGM e seus derivados, com base na avaliação de seu risco zoofitossanitário, à
saúde humana e ao meio ambiente.

Quanto aos aspectos de biossegurança do OGM e seus derivados, a decisão técnica da CTNBio vincula
os demais órgãos e entidades da administração, de modo que prevalece sobre aquelas proferidas por
qualquer outro órgão administrativo, à exceção do CNBS. Nesta seara, convém ponderar que é a
CTNbio que detém a prerrogativa de classificar determinada atividade que utilize OGMs como
causadora de “significativo impacto ambiental”, e, assim, estabelecer o cabível EIA/RIMA (REsp 592682
/ RS).
A CTNBio é composta de membros designados pelo Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia e será
constituída por 27 (vinte e sete) cidadãos brasileiros de reconhecida competência técnica, de notória

96
atuação e saber científicos, com grau acadêmico de doutor e com destacada atividade profissional nas
áreas de biossegurança, biotecnologia, biologia, saúde humana e animal ou meio ambiente.

6.4.1.1 Comissão Interna De Biossegurança – Cibio.

Toda instituição que utilizar técnicas e métodos de engenharia genética ou realizar pesquisas com
OGM e seus derivados deverá criar uma Comissão Interna de Biossegurança - CIBio, além de indicar
um técnico principal responsável para cada projeto específico. Os critérios de funcionamento destas
comissões são estabelecidos pena CTNBio e as atribuições destas comissões estão previstas no art.
18 da lei.
6.4.1.1 Órgãos e Entidades de Registro e Fiscalização.

A lei prevê que os órgãos e entidades de registro e fiscalização do Ministério da Saúde, do


Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Ministério do Meio Ambiente, e da
Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República possuem atribuições no
sistema brasileiro de Biossegurança. Suas atribuições possuem caráter meramente registrário e
fiscalizatório, devendo sempre obedecer, as decisões técnicas da CTNBio, as deliberações do CNBS e
os mecanismos estabelecidos na Lei 11.105/05.
Cumpre destacar que, no exercício de atividade fiscalizatória, tais órgãos e entidades podem aplicar
multas, sendo o valor arrecado destinado aos próprios órgãos e entidades. Esta destinação destoa
daquela prevista na Lei 9.605, onde o valor das multas aplicadas em decorrência de infrações
ambientais é destinado ao Fundo Nacional do Meio Ambiente.

6.4.1.2 Responsabilidade Penal

Foram previstos crimes no Cap. VIII, arts. 24 a 29, da Lei 11.105/2005; e, com o acréscimo da tipificação do
art. 5a, § 3a, há sete crimes no total. Todos são crimes dolosos.

Ponto 7 - Responsabilidade ambiental. Conceito de dano. A reparação do dano ambiental. Dano moral
coletivo.

7.1 Responsabilidade ambiental

A Constituição Federal, em seu art. 225, § 2o, determina que: "aquele que explorar recursos minerais fica
obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com a solução técnica exigida pelo órgão
público competente, na forma da lei." O §3o acrescenta: "as condutas e atividades consideradas lesivas ao
meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar o dano”.
A responsabilidade civil em matéria ambiental (independentemente da existência de culpa) é um
mecanismo que garante da reparabilidade dos danos ambientais, bem como de eventuais danos causados
reflexamente a vítimas do evento danoso. Aquele que exerce uma atividade uma atividade potencialmente
poluidora ou que implique risco a alguém, assume a responsabilidade pelos danos oriundos do risco
criado.

97
Um dos pressupostos para a configuração da responsabilidade é a existência do dano, e, por conseguinte,
tem-se a obrigação de ressarcir, que só se concretiza onde há o que reparar. A este respeito, o que se
pretende é aprofundar alguns aspectos atinentes à responsabilidade civil em matéria ambiental, em
especial, o conceito de dano, a sua reparação e a possibilidade de reparação por dano ambiental de
natureza moral.

7.1.1. Dano ambiental

Noções gerais
Nossa Constituição Federal não elaborou um conceito técnico-jurídico de meio ambiente e a lei ordinária
delimitou-se a noções de degradação da qualidade ambiental e de poluição.
A degradação ambiental, expressão mais ampla do que poluição, é definida como qualquer alteração
adversa das características do meio ambiente, decorrente de atividades humanas (alterações antrópicas)
ou naturais (ex.: evolução de ecossistemas).
A poluição é a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que, direta ou indiretamente:
• prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; • criem condições adversas às
atividades sociais e econômicas; • afetem desfavoravelmente a biota; • afetem as condições estéticas ou
sanitárias do meio ambiente; • lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais
estabelecidos (artigo 3.º, III, da Lei 6.938/1981).
Inclusive, na definição de poluição também se enquadra a emissão de sons e ruídos em desacordo com os
padrões ambientais estabelecidos (poluição sonora), conforme já reconhecido pelo STJ (REsp 1.051.306,
de 16.10.2008).
Dessa relação entre degradação ambiental e poluição, Édis Milaré conclui que "dano ambiental é a lesão
aos recursos ambientais, com conseqüente degradação – alteração adversa ou in pejus – do equilíbrio
ecológico e da qualidade de vida".
Conceito
Pode-se definir o dano ambiental como um prejuízo causado ao meio ambiente por uma ação ou omissão
humana, que afeta de modo negativo o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado e, por consequência, atinge, também de modo negativo, todas as pessoas, de maneira direta
ou indireta, inexistindo uma definição legal de dano ambiental no Brasil.
Em sentido amplo, o dano ambiental é aquele que afeta todas as modalidades de meio ambiente (natural,
artificial, cultural e laboral), ao passo que o dano ambiental stricto sensu afeta os elementos bióticos e/ou
abióticos da natureza, sendo denominado puramente ecológico.
São recursos ambientais, nos termos da Lei 6.938/81, art. 3 o, V, a atmosfera, as águas interiores,
superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a
fauna e a flora.
Acrescente-se a esse conjunto de recursos ambientais os elementos artificiais e culturais, uma vez que o
meio ambiente resulta das interações recíprocas do ser humano com a natureza. Em outras palavras, o
dano ecológico pode degradar o meio ambiente (sentido amplo) ou seus elementos naturais (sentido
estrito).
Para José Rubens Morato Leite e Patryck de Araújo Ayala, “dano ambiental significa, em uma primeira
acepção, uma alteração indesejável ao conjunto de elementos chamados meio ambiente, como, por
exemplo, a poluição atmosférica; seria, assim, a lesão ao direito fundamental que todos têm de gozar e
aproveitar do meio ambiente apropriado. Contudo, em sua segunda conceituação, dano ambiental
engloba os efeitos que esta modificação gera na saúde das pessoas e em seus interesses”.
Na primeira acepção, define-se o dano ao patrimônio (imaterial) ambiental como o dano ao macrobem
tutelado, ao passo que a segunda se reporta aos efeitos da lesão à sadia qualidade de vida das pessoas, ou
seja, ao dano extrapatrimonial ambiental.
A classificação dos bens ambientais em macrobem e microbem é encampada pela doutrina majoritária
(Édis Milaré, Antonio Herman Benjamin, Celso Pacheco).

98
Ávila Coimbra dispõe que por macrobem ambiental deve ser entendido o meio ambiente como um todo,
em seu conceito mais profundo e adequado. O meio ambiente em sua máxima complexidade, em sua
máxima extensão. Todas as formas de vida interagindo entre si e com todas suas manifestações e criações.
Logo, a tutela também deverá ocorrer de forma ampla. Por conseguinte, o dano a um macrobem
ambiental ofende o direito fundamental da coletividade ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
possibilitando a tutela por meio de instrumentos coletivos previstos no microssistema (Lei de Ação Civil
Pública, Ação Popular, CDC).
Para o autor, o microbem ambiental é todo e qualquer elemento constituinte e integrante do meio
ambiente. Os microbens, ao interagirem, é que formam o meio ambiente e, consequentemente, o
macrobem ambiental. Por serem individualmente considerados, muitos possuem tratamentos legislativos
próprios, tornando-os verdadeiros bens ambientais individuais. Caso o dano recaia sobre microbem
ambiental, a tutela se dará a título individual (singular), por meio das regras do Código Civil e do CPC.
De tal forma, resta assegurada a proteção e reparação de qualquer dano causado ao meio ambiente
natural, seja no tocante a macrobem ou microbem, tendo como vítimas pessoas indeterminadas ou
determinadas. Não obstante, os danos individuais e coletivos não se classificam em categorias estanques e
são frequentes os casos de tramitação simultânea entre os instrumentos coletivos, bem como entre esses
e os individuais (sobre os aspectos processuais, ver o item de classificação do dano e o ponto 18 deste
resumo).
Note-se que a norma determina que o poluidor responderá pela degradação ambiental, assim considerada
qualquer alteração adversa das características do meio ambiente.
Todavia, é preciso vislumbrar que nem toda atividade humana impactante ao meio ambiente configurará
dano ambiental, mas apenas quando se ultrapassar a capacidade natural de absorção ambiental, o que
deve ser feito casuisticamente e com proporcionalidade, sem se descurar da natureza sinergética dos
danos ambientais.
Logo, para a caracterização do dano ambiental, é necessário que exista um prejuízo anormal ao meio
ambiente, dotado de mínima gravidade, ou seja, algo que afete o equilíbrio do ecossistema, não se
enquadrando como dano ao ambiente qualquer alteração de suas propriedades.
Assim, José Rubens Morato Leite e Patryck de Araújo Ayala afirmam que “da análise empreendida na lei
brasileira, pode-se concluir que o dano ambiental deve ser compreendido como toda lesão intolerável
causada por qualquer ação humana (culposa ou não) ao meio ambiente, diretamente, como macrobem
de interesse da coletividade, em uma concepção totalizante, e indiretamente, a terceiros, tendo em vista
interesses próprios e individualizáveis e que refletem no macrobem”.
Ainda é necessário apontar o caráter multifacetário do dano ambiental, que se apresenta na seara
ecológica, ética, patrimonial e temporal, conforme narra o Ministro Herman Benjamin em passagem do
julgamento do Recurso Especial 1.198.727 de 2012.
Poluidor
Considera-se poluidor “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável,
diretamente ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” (artigo 3.º, IV, da Lei
6.938/1981).
Poluição Lícita e Ilícita:
A poluição poderá ser lícita ou ilícita.
Se uma pessoa desmata parte da vegetação de sua fazenda amparada por regular licenciamento
ambiental, haverá uma poluição lícita, pois realizada dentro dos padrões de tolerância da legislação
ambiental e com base em licença, o que exclui qualquer responsabilidade administrativa ou criminal do
poluidor.
Contudo, atenção: mesmo a poluição licenciada não exclui a responsabilidade civil do poluidor, na
hipótese de geração de danos ambientais, pois esta não é sancionatória, e sim reparatória, senão vejamos:
“A legislação de regência e os princípios jurídicos que devem nortear o raciocínio jurídico do julgador para
a solução da lide encontram-se insculpidos não no códice civilista brasileiro, mas sim no art. 225, § 3º, da
CF e na Lei 6.938/81, art. 14, § 1º, que adotou a teoria do risco integral, impondo ao poluidor ambiental
responsabilidade objetiva integral. Isso implica o dever de reparar independentemente de a poluição

99
causada ter-se dado em decorrência de ato ilícito ou não, não incidindo, nessa situação, nenhuma
excludente de responsabilidade. (AgRg no REsp 1412664/SP)
Classificação

Dano ambiental coletivo, dano ambiental em sentido estrito ou dano ambiental propriamente dito

Causado ao meio ambiente globalmente considerado, em sua concepção difusa, como patrimônio
coletivo, atingindo um número indefinido de pessoas, sempre devendo ser tutelado por Ação Civil Pública,
Ação Popular, mandado de segurança coletivo ou outro meio processual adequado. Quando cobrado, tem
eventual indenização destinada a um Fundo, cujos recursos serão alocados à reconstituição dos bens
lesados.
ii) Dano ambiental individual ou pessoal
É também chamado de dano ricochete ou reflexo, pois, por intermédio do dano ao meio ambiente, atinge
interesses pessoais.
Viola interesses pessoais, legitimando os lesados a uma reparação pelo prejuízo patrimonial ou
extrapatrimonial. Podem ser ajuizadas ações individuais, de maneira independente, não havendo efeito de
coisa julgada entre a ação individual e a coletiva. Nesse caso, o objeto lesado é a face da propriedade
privada ou saúde individual do bem comum meio ambiente. Nessas ações privadas, a responsabilidade do
poluidor também é objetiva.
São casos típicos desse tipo de dano problemas de saúde pessoal por emissão de gases e partículas em
suspensão ou ruídos, a infertilidade do solo de um terreno privado por poluição do lençol freático, doença
e morte de gado por envenenamento da pastagem por resíduos tóxicos etc.
Ressalte-se que os danos ambientais, segundo a divisão acima, não constituem categorias estanques, de
maneira que um mesmo fato pode gerar danos difusos e individuais.
Principais Características
Na seara privada, liga-se o dano ao prejuízo ao patrimônio de alguém. Mesmo nos casos de danos
extrapatrimoniais (morais, em sentido amplo), acaba-se indenizando em pecúnia, ante a sua
irreparabilidade natural.
No Direito Ambiental existem inúmeras especificidades que impedem a adoção integral da linha
privatística.
Enseja, prioritariamente, a reparação ou restauração do meio ambiente - Tecnicamente, o dano
ambiental normalmente é irreparável in natura. Assim, uma vez impossibilitada a reparação (ou
restauração) em espécie, que é prioritária, dever-se-á partir para uma compensação ambiental ou, em
último caso, para a indenização em pecúnia.
Pulverização de vítimas - Contrapõe-se o dano ambiental ao dano comum pelo fato de que, enquanto este
atinge uma pessoa ou um conjunto individualizado de vítimas, aquele atinge, necessariamente, uma
coletividade difusa de vítimas, "mesmo quando alguns aspectos particulares da sua danosidade atingem
individualmente certos sujeitos" (Milaré).
Difícil reparação - Na grande maioria dos casos de dano ambiental, a reparação ao status quo ante é quase
impossível e a mera reparação pecuniária é sempre insuficiente e incapaz de recompor o dano.
Difícil valoração - Nem sempre é possível calcular o dano ambiental, justamente em virtude de sua
irreparabilidade.
Portanto, o dano ambiental é peculiar, exigindo o desenvolvimento de uma teoria geral de
responsabilização específica para atender a suas características.
Deve ser reparado integralmente - Reparação In Integrum - O princípio da reparação in integrum aplica-se
ao dano ambiental. Com isso, a obrigação de recuperar o meio ambiente degradado é compatível com a
indenização pecuniária por eventuais prejuízos, até sua restauração plena. Contudo, se quem degradou
promoveu a restauração imediata e completa do bem lesado ao status quo ante, em regra, não se fala
em indenização.
Poluição Lícita Gera Responsabilidade. A degradação tolerada socialmente, amparada em regular
licenciamento ambiental, dentro dos padrões fixados pela legislação ambiental, não isenta o poluidor de

100
responder civilmente pelos danos ambientais, pois a reparação não tem a natureza jurídica de sanção civil,
já que visa recompor o estado ambiental anterior ou compensá-lo.
Por fim, para o STJ, a licença concedida não confere direito adquirido para poluir, podendo-se,
posteriormente, revogar a licença (REsp 1.287.068-RR).

7.1.2. Reparação do dano

Previsão normativa e formas de reparação do dano


A responsabilidade civil por danos ambientais é um tema alvo de grandes polêmicas e inúmeras
indefinições, sendo certo que possui um regime jurídico próprio, pois sofre o influxo de normas específicas
ambientais, apenas se utilizando as normas dos demais ramos jurídicos supletivamente no que for
compatível, especialmente do Direito Civil e Administrativo.
De acordo com o Princípio 13, da Declaração do Rio, “os Estados deverão desenvolver a legislação
nacional relativa à responsabilidade e à indenização referente às vítimas da contaminação e outros
danos ambientais. Os Estados deverão cooperar de maneira inteligente e mais decidida no preparo de
novas leis internacionais sobre responsabilidade e indenização pelos efeitos adversos dos danos
ambientais causados pelas atividades realizadas dentro de sua jurisdição, ou sob seu controle, em zonas
situadas fora de sua jurisdição”.
Esta espécie de responsabilidade ambiental goza de expressa previsão constitucional, nos termos do art.
225, parágrafo 3º da CRFB, que prevê que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente
sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados, (art. 225, § 3.º, da CF)
O diploma legal básico para o tratamento jurídico do dano ambiental no Brasil é a Lei da Política Nacional
do Meio Ambiente, n.º 6.938/81, cujo art. 14, § 1º, reza que "o poluidor é obrigado, independentemente de
existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por
sua atividade".
Por sua vez, o art. 3º, IV, da referida lei, define poluidor como “a pessoa física ou jurídica, de direito
público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação
ambiental.”
Já o art. 4º, VII, dispõe que a Política Nacional do Meio Ambiente visará “à imposição, ao poluidor e ao
predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados, e ao usuário, da contribuição pela
utilização de recursos ambientais com fins econômicos”.
Há, portanto, basicamente duas formas principais de reparação do dano ambiental: (1) a recuperação
natural ou o retorno ao status quo ante, modalidade ideal; (2) a compensação ambiental; e a indenização
em dinheiro, forma indireta de reparar a lesão.
Consoante Édis Milaré, a reparação ao dano ambiental é a reconstituição do meio ambiente agredido,
cessando-se a atividade lesiva e revertendo-se a degradação ambiental.
A compensação ecológica é aplicada quando não for possível a restauração natural. Existem vários tipos
de compensação ecológica. Quando se trata de responsabilidade civil por danos ambientais, corresponderá
à recuperação de outra área que não aquela onde ocorreram os danos ambientais
Apenas quando essa recuperação/compensação não for viável é que se admite indenização em dinheiro.
O fato é que não existe um critério único para a fixação da reparação. Pode-se optar pela reconstrução do
local degradado, pela compensação (degradação de uma área deve corresponder à recuperação de uma
outra) ou por qualquer outro mecanismo capaz de estabelecer uma reparação adequada.
Princípio da reparação integral do dano
É importante ressaltar um aspecto de maior importância na matéria: o princípio da reparação integral do
dano – que é um princípio geral na teoria da responsabilidade civil, encampado expressamente pelo NCC
no art. 944, caput – tem inteira aplicação na reparação do dano ambiental. Esta, com efeito, deve conduzir
o meio ambiente e a sociedade a uma situação, na medida do possível, equivalente àquela de que seriam
beneficiários se o dano não tivesse sido causado.

101
Destarte, a reparação integral do dano ao meio ambiente deve compreender não apenas o prejuízo
causado ao bem ou recurso ambiental atingido, como também toda a extensão dos danos produzidos em
consequência do fato danoso à qualidade ambiental. Deve incluir, então: a) os efeitos ecológicos e
ambientais da agressão inicial a um bem ambiental corpóreo, que estiverem no mesmo encadeamento
causal (ex: destruição de espécimes, habitats e ecossistemas); b) os denominados danos interinos, ou seja,
as perdas de qualidade ambiental havidas no interregno entre a ocorrência do prejuízo e a efetiva
recomposição do meio degradado; c) os danos ambientais futuros que se apresentarem como certos; d) os
danos irreversíveis à qualidade ambiental e e) os danos morais coletivos resultantes da agressão a
determinado bem ambiental.
Em tema de dano ambiental, portanto, tendo em vista a indisponibilidade do direito protegido – direito ao
meio ambiente como direito humano fundamental – não se admite qualquer limitação à plena
reparabilidade do dano, que não seja decorrente das próprias características do meio ou do bem
ambiental atingido. Como já mencionado, o sistema pátrio de responsabilidade por danos ao meio
ambiente dispõe de regras próprias e específicas, derrogatórias do regime geral de responsabilidade civil,
que se aplicam com exclusividade nessa matéria e não contemplam nenhuma exceção ao princípio da
reparação integral do dano.

7.2.1.1 Cumulação de deveres:

“Ao responsabilizar-se civilmente o infrator ambiental, não se deve confundir prioridade da recuperação in
natura do bem degradado com impossibilidade de cumulação simultânea dos deveres de repristinação
natural (obrigação de fazer), compensação ambiental e indenização em dinheiro (obrigação de dar), e
abstenção de uso e de nova lesão (obrigação de não fazer).
De acordo com a tradição do Direito brasileiro, imputar responsabilidade civil ao agente causador de
degradação ambiental difere de fazê-lo administrativa ou penalmente. Logo, eventual absolvição no
processo criminal ou perante a Administração Pública não influi, como regra, na responsabilização civil,
tirantes as exceções em numerus clausus do sistema legal, como a inequívoca negativa do fato ilícito (não
ocorrência de degradação ambiental, p. ex.) ou da autoria (direta ou indireta), nos termos do art. 935 do
Código Civil.
Nas demandas ambientais, por força dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum,
admite-se a condenação do réu, simultânea e agregadamente, em obrigação de fazer, não fazer e
indenizar. Aí se encontra típica obrigação cumulativa ou conjuntiva.
Assim, na interpretação dos arts. 4º, VII, e 14, § 1º, da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei
6.938/81), e do art. 3º da Lei 7.347/85, a conjunção "ou" opera com valor aditivo, não introduz alternativa
excludente. (…) A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem,
porquanto a indenização, em vez de considerar lesão específica já ecologicamente restaurada ou a ser
restaurada, põe o foco em parcela do dano que, embora causada pelo mesmo comportamento pretérito
do agente, apresenta efeitos deletérios de cunho futuro, irreparável ou intangível.” (RESP 1198727).

Danos decorrentes de atividades nucleares


A Lei 6.453/77, relativa à responsabilidade civil por danos decorrentes de atividades nucleares, que
estabelece limite máximo para a indenização no seu art. 9º, cuida, na realidade, dos danos causados aos
particulares pela poluição resultante de acidentes com materiais radioativos e nucleares, e não do dano
coletivo, causado à qualidade ambiental. Este último escapa à limitação legal, devendo prevalecer, em
relação a ele, a norma do art. 225, § 3º, da CF e a norma do art.14, §1º, da Lei 6.938/81, específicas à
matéria.
Ademais, tem-se entendido que a norma do art.9º dessa Lei 6.453/77, determinadora do teto máximo para
as indenizações em tema de responsabilidade civil nuclear, foi revogada pelas normas do art.14, §1º, da L
6.938/81, aplicável igualmente à reparação dos danos reflexos causados às pessoas físicas e jurídicas por
fatos de poluição, e do art. 21, XXIII, “c”, da CF, relativa à responsabilidade objetiva por danos nucleares,

102
sem menção a limite de qualquer ordem para a reparação dos danos. Este é o entendimento de Paulo
Affonso Leme Machado, Álvaro Luiz Valery Mirra, entre outros.

Natureza objetiva da responsabilidade civil

7.1.2.1.1 Embasamento normativo

A Constituição de 1988 prevê no artigo 225, § 3.º, que “as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente
sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. Nota-se que literalmente a CRFB não
prevê a responsabilidade civil objetiva do poluidor por danos ambientais (salvo danos nucleares, a teor
do artigo 21, XXIII, “d”, da Lei Maior), valendo registrar que muitos doutrinadores entendem presente
implicitamente (Celso Antônio Pacheco Fiorillo).
Em geral, o sistema brasileiro de responsabilidade civil é de cunho subjetivo, tendo por seu fundamento a
culpa do causador de um dano (art. 186, NCC). No entanto, a legislação específica, em algumas áreas,
retirou a necessidade da comprovação da culpa (dolo, negligência, imprudência ou imperícia) do agente de
um ato lesivo.
Com o advento da Lei 6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente) a responsabilidade civil para a
reparação do dano ambiental também passou a ser objetiva: “Sem obstar a aplicação das penalidades
previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou
reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade (art. 14, § 1º)”.
Portanto, perceba-se que o fundamento normativo direto da responsabilidade objetiva ambiental não é
constitucional, mas legal.
Uma das razões da introdução da responsabilidade objetiva nessa área foi também o fato de que a maioria
dos danos ambientais graves era e está sendo causada por grandes corporações econômicas (indústrias,
construtoras) ou pelo próprio Estado (empresas estatais de petróleo, geração de energia elétrica,
prefeituras), o que torna quase impossível a comprovação de culpa concreta desses agentes causadores
de degradação ambiental.

7.1.2.1.2 Teoria adotada: Teoria do risco Integral

É firme a jurisprudência do STJ afirmando que se trata de responsabilidade civil objetiva na sua modalidade
mais forte, ou seja, norteada pela Teoria do Risco Integral, em que não se quebra o vínculo de causalidade
pelo fato de terceiro, caso fortuito ou força maior. É posição majoritária na doutrina também (REsp
1373788/SP).
Acrescentam alguns autores que a responsabilidade objetiva por dano ambiental decorre também da
teoria do risco-proveito ou "risco do usuário": quem obtém lucros com determinada atividade deve arcar
também com os prejuízos causados à natureza, evitando assim, "a privatização dos lucros e socialização
dos prejuízos" (ubi emolumentum, ibi onus).
A teoria do risco-proveito nos parece apontar ao principal motivo da introdução da responsabilidade
objetiva no direito brasileiro. Ela é consequência de um dos princípios básicos da Proteção do Meio
Ambiente em nível internacional, o princípio do poluidor-pagador, consagrado ultimamente nas
Declarações Oficiais da Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (RIO-92 - UNCED1).
Uma consequência importante dessa linha de fundamentação da responsabilidade objetiva pelo dano
ambiental (contrariamente à teoria do risco integral) é a possibilidade de admitir fatores capazes de excluir
ou diminuir a responsabilidade como: o caso fortuito e a força maior, o fato criado pela própria vítima

1 Princípio 16
As autoridades nacionais devem procurar promover a internacionalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo
em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse
público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais.
103
(exclusivo ou concorrente), a intervenção de terceiros e, em determinadas hipóteses, a licitude da
atividade poluidora.
Não são poucos os autores que, em primeiro momento, se declaram adeptos da teoria do risco integral,
que não permite excludentes à responsabilidade, e depois, para fundamentar a sua posição, passam a
recorrer a argumentos muito mais ligados à teoria do risco-proveito.
Os defensores do risco integral no contexto da responsabilidade objetiva do Estado (Art. 37, § 6º, CF)
destacam que ela serve como meio de repartir por todos os membros da coletividade o ônus dos danos
atribuídos ao Estado (Caio M. da Silva Pereira, ob. Cit., p. 270, 274). Ocorre que o mesmo já não vale
indiscriminadamente para todos os casos da ocorrência de um dano ambiental. O sujeito que deve
indenizar, aqui, na maioria dos casos, não é o erário do Estado e, em consequência, a coletividade, mas o
poluidor particular, que muitas vezes até age com uma autorização válida concedida pelo próprio Estado.
Toshio Mukai, por sua vez, defende a adoção da teoria do risco administrativo, ou do risco criado,
admitindo as excludentes, mas este posicionamento é minoritário.
Todavia, podemos constatar que a maior parte da doutrina do Direito Ambiental Brasileiro, hoje, adere à
"linha dura" da teoria do risco-integral, que não permite nenhum tipo de excludente nos casos de danos
ambientais. Também é este o entendimento firme do STJ.
“RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. DANOS DECORRENTES DO ROMPIMENTO DE BARRAGEM. ACIDENTE
AMBIENTAL OCORRIDO, EM JANEIRO DE 2007, NOS MUNICÍPIOS DE MIRAÍ E MURIAÉ, ESTADO DE MINAS
GERAIS. TEORIA DO RISCO INTEGRAL. NEXO DE CAUSALIDADE. 1. Para fins do art. 543-C do Código de
Processo Civil:
a) a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o
nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo
descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de
responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar;
b) em decorrência do acidente, a empresa deve recompor os danos materiais e morais causados e
c) na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito caso a caso e
com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico do autor, e, ainda, ao
porte da empresa, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com
razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades
de cada caso, de modo que, de um lado, não haja enriquecimento sem causa de quem recebe a
indenização e, de outro, haja efetiva compensação pelos danos morais experimentados por aquele que
fora lesado”. (REsp 1374284 / MG, Min. Luis Felipe Salomão, DJe 05/09/2014, tema repetitivo 707)
Nexo de causalidade
O nexo causal é o vínculo que une conduta e resultado lesivo, variando a sua determinação de acordo com
a teoria que se adote. Em se tratando de meio ambiente, tem-se sustentado que o nexo causal existe
mesmo quando se manifesta de modo indireto ou mediato, podendo deduzir-se de presunções,
admitindo-se uma prova de que o risco da atividade teve uma influência causal decisiva na produção do
dano.
Não se exige que o ato tenha sido causa exclusiva do dano, bastando a conexão causal. Seja qual for a
participação de alguém na causação do dano, ele tem o dever de indenizar.
Nexo é prescindível: De maneira inovadora, há precedente do STJ que expressamente admitiu
excepcionalmente a responsabilidade civil ambiental independente de nexo de causalidade: “A
responsabilidade por danos ambientais é objetiva e, como tal, não exige a comprovação de culpa,
bastando a constatação do dano e do nexo de causalidade.
Ainda de acordo com o STJ, “para o fim de apuração do nexo de causalidade no dano ambiental,
equiparam-se quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem não se importa que
façam, quem financia para que façam, e quem se beneficia quando outros fazem”. (REsp 650.728)
Excetuam-se à regra, dispensando a prova do nexo de causalidade, a responsabilidade de adquirente de
imóvel já danificado porque, independentemente de ter sido ele ou o dono anterior o real causador dos
estragos, imputa-se ao novo proprietário a responsabilidade pelos danos. (REsp 1.056.540).

104
7.1.2.1.3 Obrigação Propter Rem e dispensabilidade do nexo de causalidade

O STJ também entende que a obrigação de reparar o dano ambiental é propter rem, sendo o proprietário
obrigado a reparar o dano ambiental em seu prédio rústico, mesmo que não o tenha causado. (RESP
1251697)
Esse regime de responsabilização ambiental do proprietário ou possuidor do bem degradado,
independentemente de ter sido o autor do ato lesivo ao ambiente, foi positivado pela Lei 12.651/2012,
que aprovou o novo Código Florestal brasileiro. De acordo com o seu artigo 2º, § 2º, “as obrigações
previstas nesta Lei têm natureza real e são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de
transferência de domínio ou posse do imóvel rural”.
Responsabilidade por atos lícitos
Como já mencionado em tópico anterior, mesmo a poluição licenciada não exclui a responsabilidade civil
do poluidor, na hipótese de geração de danos ambientais, pois esta não é sancionatória, e sim reparatória.
Ademais, a licença concedida não confere direito adquirido para poluir, podendo-se, posteriormente,
revogar a licença (REsp 1.287.068-RR).
Quem tem o dever de reparar
(1) Os autores da degradação: os empreendedores da atividade lesiva;
(2) Os responsáveis solidários;
A impossibilidade de se estabelecer o valor da indenização que compete a cada um gera afinal uma
indivisibilidade do dano e a solução é uma atenuação nos requisitos de verificação do liame da causalidade
e a instituição de um regime de solidariedade passiva dos vários poluidores. No caso do dano ambiental, a
solidariedade seria decorrência lógica da adoção do sistema de responsabilidade objetiva.
A lei diz que há solidariedade na responsabilidade aquiliana quando há mais de um causador do dano (art.
942, NCC). E, mesmo que se trate de responsabilidade objetiva, ela não deixa de ser aquiliana, apenas sem
o requisito da culpa. O art. 225, §3º, CF, apoia este entendimento.

7.1.2.1.4 Responsabilidade ambiental da Pessoa Jurídica de Direito Público

Poluidor direto ou Indireto. Note-se que mesmo as pessoas jurídicas de direito público poderão ser
consideradas poluidoras, por atos comissivos ou omissivos. Assim, quando explora diretamente atividade
econômica, a exemplo da atividade petrolífera, por meio de empresa estatal, a Administração Pública
poderá se enquadrar como poluidora direta. Outrossim, a concessão de uma licença ambiental irregular
por um órgão ambiental que culmine em degradação ambiental colocará o Poder Público na condição de
poluidor indireto.
No caso de entidade ambiental que se omite na fiscalização de atividades poluidoras, conquanto não seja
entendimento pacificado internamente, prevalece no STJ que a responsabilidade é objetiva (REsp
1.071.741 - 24.03.2009).
Responsabilidade Solidária. “A Turma entendeu haver responsabilidade solidária do Estado quando,
devendo agir para evitar o dano ambiental, mantém-se inerte ou atua de forma deficiente. Assim, sem
prejuízo da responsabilidade solidária, deve o Estado – que não provocou diretamente o dano nem obteve
proveito com sua omissão – buscar o ressarcimento dos valores despendidos do responsável direto,
evitando, com isso, injusta oneração da sociedade. Com esses fundamentos, deu-se provimento ao
recurso”. (REsp 1.071.741-SP)
Execução Subsidiária Do Estado. Contudo, apesar de ser solidária, a atual jurisprudência dominante no STJ
(1.ª e 2.ª Turmas) é no sentido de que a responsabilidade civil do Poder Público é de execução subsidiária,
na hipótese de omissão de cumprimento adequado do seu dever de fiscalizar que foi determinante para a
concretização ou o agravamento do dano causado pelo seu causador direto:
A responsabilidade solidária e de execução subsidiária significa que o Estado integra o título executivo
sob a condição de, como devedor-reserva, só ser convocado a quitar a dívida se o degradador original,
direto ou material (= devedor principal) não o fizer, seja por total ou parcial exaurimento patrimonial ou
insolvência, seja por impossibilidade ou incapacidade, inclusive técnica, de cumprimento da prestação

105
judicialmente imposta, assegurado, sempre, o direito de regresso (art. 934 do Código Civil), com a
desconsideração da personalidade jurídica (art. 50 do Código Civil). (REsp 1071741/SP)

7.1.2.1.5 Vedação da Intervenção de Terceiros Devedores Solidários (Denunciação à Lide ou


Chamamento Ao Processo).

Há uma tendência específica no Direito Ambiental em buscar responsabilizar quem tem mais condições de
arcar com os prejuízos ambientais, com base na doutrina americana do “bolso profundo”, uma vez que
prevalece que todos os poluidores são responsáveis solidariamente pelos danos ambientais.
Com base nas lições de José de Aguiar Dias, obtempera Paulo Affonso Leme Machado: “Num distrito
industrial ou num conglomerado de indústrias pode ser difícil apontarem-se todas as fontes poluidoras que
tenham causado prejuízo. A vítima não está obrigada a processar conjuntamente todos os poluidores,
podendo escolher aquele que lhe convier, chamar à responsabilidade, por exemplo, optando por um
poluidor solvente e não pelo insolvente”.
Inclusive, visando a celeridade processual e a prática viabilidade da reparação, há forte entendimento
vedando a denunciação da lide ou o chamamento ao processo nos processos de reparação por danos
ambientais, sendo necessário o ajuizamento de ação própria contra os codevedores ou responsáveis
subsidiários (AgRg no Ag 1.213.458).

7.1.2.1.6 Os profissionais do licenciamento ou do EIA/RIMA

Embora não possam ser demandados em ação ambiental, podem sê-lo em ações de regresso de Estado ou
do empreendedor que contratou seus serviços, pois têm responsabilidade subjetiva e podem ser
demandados civilmente, provando-se a sua culpa.

7.1.2.1.7 Desconsideração Da Personalidade Jurídica. Teoria Menor

Outro instrumento importante para garantir a reparação dos danos ambientais é a desconsideração da
personalidade jurídica, que na esfera ambiental é informada pela Teoria Menor, pois não se exige o abuso
da personalidade jurídica para a sua concretização. De acordo com o artigo 4.º da Lei 9.605/1998, “poderá
ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de
prejuízos causados à qualidade do meio ambiente”.

7.1.2.1.8 Inversão do Ônus da Prova:

O STJ também admite a inversão do ônus da prova nas ações de reparação dos danos ambientais, com
base no interesse público da reparação e no princípio da Precaução: “No Direito Ambiental brasileiro, a
inversão do ônus da prova é de ordem substantiva e ope legis, direta ou indireta (esta última se manifesta,
p. ex., na derivação inevitável do princípio da precaução), como também de cunho estritamente processual
e ope judicis (assim no caso de hipossuficiência da vítima, verossimilhança da alegação ou outras hipóteses
inseridas nos poderes genéricos do juiz, emanação natural do seu ofício de condutor e administrador do
processo). Como corolário do princípio in dubio pro natura, ‘Justifica-se a inversão do ônus da prova,
transferindo para o empreendedor da atividade potencialmente perigosa o ônus de demonstrar a
segurança do empreendimento, a partir da interpretação do art. 6º, VIII, da Lei 8.078/1990 c/c o art. 21 da
Lei 7.347/1985, conjugado ao Princípio Ambiental da Precaução’ (REsp 972.902/RS, Rel. Min. Eliana
Calmon, Segunda Turma, DJe 14.9.2009), técnica que sujeita aquele que supostamente gerou o dano
ambiental a comprovar ‘que não o causou ou que a substância lançada ao meio ambiente não lhe é
potencialmente lesiva’ (REsp 1.060.753/SP).

106
7.1.2.1.9 Provimento não Requerido na Inicial

Assim, no contexto, encontra plena aplicação o princípio do poluidor pagador, a indicar que, fazendo-se
necessária determinada medida à recuperação do meio ambiente, é lícito ao julgador determiná-la,
mesmo que não tenha sido instado a tanto. (REsp 967.375-RJ)

7.1.2.1.10 Fungibilidade:

A tutela ambiental é de natureza fungível por isso que a área objeto da agressão ao meio ambiente pode
ser de extensão maior do que a referida na inicial e, uma vez assim aferida pelo conjunto probatório, não
importa em julgamento ultra ou extra petita. (REsp 1.107.219-SP)

Imprescritibilidade
Por fim, frise-se que a pretensão reparatória ambiental imaterial é perpétua, porquanto não sujeita a
prazo prescricional, conforme já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 647.493/2007.
Isso porque a higidez do meio ambiente possui a natureza de direito fundamental, supraindividual e
indisponível, além de ser de titularidade da coletividade.
(...)
6. O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro da logicidade hermenêutica, está
protegido pelo manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e
essencial à afirmação dos povos, independentemente de não estar expresso em texto legal.
7. Em matéria de prescrição cumpre distinguir qual o bem jurídico tutelado: se eminentemente privado
seguem-se os prazos normais das ações indenizatórias; se o bem jurídico é indisponível, fundamental,
antecedendo a todos os demais direitos, pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer ,
considera-se imprescritível o direito à reparação.
8. O dano ambiental inclui-se dentre os direitos indisponíveis e como tal está dentre os poucos
acobertados pelo manto da imprescritibilidade a ação que visa reparar o dano ambiental.
9. Quando o pedido é genérico, pode o magistrado determinar, desde já, o montante da reparação,
havendo elementos suficientes nos autos. Precedentes do STJ.
10. Inviável, no presente recurso especial modificar o entendimento adotado pela instância ordinária, no
que tange aos valores arbitrados a título de indenização, por incidência das Súmulas 284/STF e 7/STJ.
11. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido. (STJ, REsp 1120117/AC, Rel. Ministra ELIANA
CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/11/2009, DJe 19/11/2009)

7.3 Dano moral ambiental

Discute-se também a reparabilidade do chamado dano moral ambiental, como dano moral coletivo.
De acordo com a extensão do dano ao ambiente, é possível subdividir o gênero dano ambiental, em duas
espécies: dano patrimonial e dano extrapatrimonial ou moral. Existirá dano patrimonial quando os bens
lesados forem bens materiais, exigindo-se, portanto, a restituição; quando o prejuízo ao indivíduo ou à
coletividade for não-patrimonial (por ter lesado bens imateriais), haverá dano extrapatrimonial ou moral.
O dano moral ambiental, como dano coletivo, consiste, em linhas gerais, na dor ou no sentimento de
frustração da sociedade decorrente da agressão a um determinado bem ambiental, ao qual a coletividade
se sinta especialmente vinculada, seja por laços de afeição, seja por algum vínculo de especial respeito.
O dano moral ou extrapatrimonial, por sua vez, é dividido em dois aspectos. O aspecto subjetivo do dano
(em que o interesse ambiental atingido diz respeito a um interesse individual) ocorre quando a vítima
experimenta algum sofrimento psíquico, de afeição ou físico. Na hipótese de lesão ambiental, configura-se
subjetiva quando, em consequência desta, a pessoa física venha a falecer ou sofrer deformidades
permanentes ou temporárias, acarretando sofrimento de ordem direta e interna. Ocorre o que se chama

107
de dano reflexo, ou efeito ricochete, isto é, uma lesão ao meio ambiente resvala no indivíduo, causando-
lhe problemas de ordem pessoal.
Verifica-se, por outro lado, o dano moral ambiental em seu aspecto objetivo (quando o interesse
ambiental atingido é difuso) quando não há repercussão na esfera interna da vítima de forma exclusiva,
mas diz respeito ao meio social em que vive. Nesse caso, o dano atinge valores imateriais da pessoa difusa
ou da coletividade, como, por exemplo, a degradação do meio ambiente ecologicamente equilibrado ou da
qualidade de vida, como um direito intergeracional, fundamental e global. Não é, nessa perspectiva, o
meio ambiente um meio intermediário entre o dano e o lesado; mas é ele próprio lesado, ocorrendo uma
perda de qualidade de vida das presentes gerações e um comprometimento à qualidade de vida das
futuras gerações (humanas e não humanas). Entra-se aqui em uma visão antropocêntrica alargada, na qual
a preservação ambiental não corresponde apenas a interesses humanos imediatos, mas
preponderantemente, a um valor ínsito do meio ambiente, que, se preservado, culmina na sadia qualidade
de vida de toda a coletividade.
Pode ocorrer o fato de um mesmo dano ambiental afetar concomitantemente a esfera subjetiva e a
esfera objetiva.
A reparação de um dano moral objetivo visa a proteger o ambiente como valor autônomo e como
macrobem pertencente à coletividade, ao contrário do dano moral subjetivo, cuja reparação objetiva
proteger um interesse particular de uma pessoa.
Pode-se constatar que o dano ambiental, além de poder se relacionar intimamente com uma suposta
vítima ou grupo de vítimas determináveis na sociedade (requisito clássico para a configuração do dano
moral); pode também se relacionar com toda a coletividade, uma vez que esta tem a sua qualidade de vida
afetada, mesmo que de maneira não diretamente perceptível. A colaboração ao impedimento de um
desenvolvimento pleno da personalidade advindo com o dano ambiental, afeta toda a coletividade e não
apenas supostas vítimas diretas.
Nota-se, então, a necessidade de tutela ambiental em duas frentes complementares: tutela do meio
ambiente como microbem, relacionando-o a interesses individuais e tutela do meio ambiente como
macrobem, relacionando-o a interesses difusos, em que o titular do direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado não pode ser identificado, uma vez que se confunde com toda a coletividade.
No caso em que se determina o pagamento de indenização por dano moral ao individual atingido
reflexamente, o objetivo é a compensação da dor e do sofrimento causado pela lesão decorrente de
alterações ambientais de índole poluidora.
Já na indenização por dano moral coletivo, o objetivo principal é a compensação da perda de qualidade
de vida da sociedade proveniente da lesão ambiental. A compensação, nesse caso, relaciona-se à
coletividade e a seu sofrimento pela alteração ambiental negativa.
Observe-se que o direito brasileiro admite, expressamente, a reparabilidade do dano moral ambiental, ao
lado do dano causado à qualidade ambiental em si mesma considerada, conforme se verifica do disposto
no art. 1, caput, e inciso I, da Lei 7.347/85, segundo o qual: “Regem-se pelas disposições desta lei, sem
prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: I - ao
meio ambiente;”
Atualmente, o STJ possui jurisprudência consolidada no sentido da admissibilidade do dano moral coletivo
ambiental, veja-se: “O dano ao meio ambiente, por ser bem público, gera repercussão geral, impondo
conscientização coletiva à sua reparação, a fim de resguardar o direito das futuras gerações a um meio
ambiente ecologicamente equilibrado. O dano moral coletivo ambiental atinge direitos de personalidade
do grupo massificado, sendo desnecessária a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa,
a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado” (REsp 1269494/MG).

7.3.1. Punitive Damage (STJ)

O valor a ser arbitrado como dano moral deverá incluir um caráter punitivo? NÃO. É inadequado pretender
conferir à reparação civil dos danos ambientais caráter punitivo imediato, pois a punição é função que
incumbe ao direito penal e administrativo. Assim, não há que se falar em danos punitivos (punitive

108
damages) no caso de danos ambientais, haja vista que a responsabilidade civil por dano ambiental
prescinde da culpa e revestir a compensação de caráter punitivo propiciaria o bis in idem (a punição
imediata é tarefa do direito sancionatório).” (REsp 1.354.536-SE, repetitivo).

Ponto 8 - Sistema nacional do meio ambiente. Política Nacional do Meio Ambiente

8.1 Sistema Nacional do Meio Ambiente

O Sistema Nacional do Meio Ambiente, SISNAMA, é formado pelo conjunto de órgãos e instituições dos
diversos níveis do Poder Público, incumbidos da proteção ambiental e da implementação da Política
Nacional do Meio Ambiente - PNMA.

O antecedente do SISNAMA foi a Secretaria Especial do Meio Ambiente - SEMA, que surgiu logo após a
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano - Estocolmo, 1972. Foi a resposta
brasileira às pressões da comunidade internacional do momento.

8.1.1 Estrutura do SISNAMA

A estrutura político-administrativa está descrita no art. 6º da Lei 6.938/81, tendo a seguinte disposição,
sendo que, por ser um sistema nacional, não detém personalidade jurídica:

Órgão Superior: o Conselho de Governo, com a função de assessorar o Presidente da República na


formulação da política nacional e nas diretrizes governamentais para o meio ambiente e os recursos
ambientais.

Órgão Consultivo e deliberativo: Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, com a finalidade de
assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo, diretrizes de políticas governamentais para o meio
ambiente e os recursos naturais e deliberar, no âmbito de sua competência, sobre normas e padrões
compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida.

Atente-se para sua competência normativa, editando normas complementares à lei - atuação secum
legem. O Conselho é formado por representantes de cinco setores, a saber, órgãos federais, estaduais e
municipais, setor empresarial e sociedade civil.

As competências do CONAMA estão disciplinadas no art. 8o, da Lei 6.938/81, destacando-se sua atribuição
para o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental, notadamente no que toca ao licenciamento
ambiental.

Avulta salientar a competência do CONAMA para revisão, em grau recursal, das penalidades aplicadas pelo
IBAMA foi expressamente revogada pela Lei 11.941/09. A respeito, decidiu o TRF4:

DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO. INSTÂNCIAS


RECURSAIS. ARTIGO 57 DA LEI Nº 9.784/99. DIREITO À AMPLA DEFESA E AO CONTRADITÓRIO. LEI Nº
11.941/09. NATUREZA EMINENTEMENTE PROCESSUAL. APLICAÇÃO IMEDIATA. PRINCÍPIO DO
TEMPUS REGIT ACTUM. PRECEDENTES. Conforme entendimento firmado no egrégio STJ, as
alterações legais que possuem natureza eminentemente processual têm aplicação imediata
(princípio do tempus regit actum); . A Lei nº 11.941/09, que revogou expressamente o dispositivo
insculpido no artigo 8º, inciso III, da Lei º 6.939/81, o qual estipulava a competência recursal do
CONAMA, em última instância administrativa, no que diz respeito às multas e penalidades
aplicadas pelo IBAMA, deve ser aplicada de imediato aos processos pendentes, a partir de sua
vigência; . O artigo 57 da Lei nº 9.784/99 é bastante claro ao estabelecer que haverá, no máximo,
três instâncias recursais na via administrativa, não estabelecendo de maneira imperiosa a
existência de todas elas. (TRF-4 - AC: 50296553220144047100 RS 5029655-32.2014.404.7100,

109
Relator: CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, Data de Julgamento: 19/05/2015, QUARTA TURMA,
Data de Publicação: D.E. 21/05/2015)

Órgão Central: Ministério do Meio Ambiente (antiga Secretaria do Meio Ambiente), a quem incumbe
planejar, coordenar, supervisionar e controlar a Política Nacional e as diretrizes governamentais fixadas
para o meio ambiente.

Órgãos Executores: Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais renováveis - IBAMA e
o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBIO. Ao Ibama compete exercer o
poder de polícia ambiental federal, executar ações da PNMA na esfera federal e ações supletivas. Ao
ICMBio compete a tarefa da conservação ambiental, mediante a gestão das unidades de conservação
federais.

Órgãos Seccionais: são órgãos ou entidades estaduais constituídos na forma da lei e por ela incumbidos de
preservar o meio ambiente, assegurar e melhorar a qualidade ambiental, controlar e fiscalizar ações
potencial ou efetivamente lesivas aos recursos naturais e à qualidade do meio.

Órgãos Locais: são órgãos ou entidades municipais incumbidos legalmente de exercer a gestão ambiental
no respectivo território e no âmbito de sua competência, na forma a lei.

8.1.2 SISNAMA e a gestão do meio ambiente

Deve-se entender que o SISNAMA, como um sistema, a que compete exercer a tutela ambiental por meio
dos seus órgãos executores federais (IBAMA e ICMBIO), estaduais e municipais, em compasso com as
normas legais e as regulamentares expedidas pelo CONAMA, sem embargo da administração ambiental
setorizada, tal como na área de recursos hídricos, a ser realizada por órgãos específicos criados para tal fim
(Sistema Nacional de Recursos Hídricos).

Quadro resumo

Órgão do Composição Finalidade


Sisnama

Órgão Superior Conselho de Assessoras Presidente na formulação na política nacional e


Governo diretrizes governamentais para MA e recursos naturais.
Órgão CONAMA Assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo, diretrizes
consultivo e de políticas governamentais para o meio ambiente e os recursos
deliberativo naturais e deliberar, no âmbito de sua competência, sobre normas
e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente
equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida.
Órgão central MMA Planejar, coordenar, supervisionar e controlar a Política Nacional e
as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente.
Órgãos ICMBio, IBAMA, Executar e fazer executar políticas e diretrizes governamentais
Executores Seccionais e Locais para com MA de acordo com as respectivas competências.

ICMBio (ADI 4029) - Associação Nacional dos Servidores do Ibama (Asibama) ingressou com a ADI 4029,
alegando vício formal na tramitação Medida Provisória 366/2007, que deu origem à Lei 11.516/2007,
instituidora do ICMBio. A associação defendia não ter sido observado o disposto no art. 62, § 9º da CF/88
(§ 9º Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas
emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do
Congresso Nacional.). Ocorre que o Congresso Nacional vinha utilizando a Resolução n.°1, de 2002, para
disciplinar o tema, a qual fixava o prazo de 14 dias para que a comissão mista emitisse parecer sobre a

110
matéria objeto da MP, caso o prazo não fosse observado, o parecer poderia ser dado apenas pelo relator
da comissão, dispensando a análise colegiada (art. 6o, § 2o ). A Asibama sustentou que tal rito não se
coaduna com o previsto no art. 62, § 9º da CF/88, que atribui a comissão mista, e não ao relator, a emissão
do parecer. Por conseguinte, em 07/03/2012, o STF julgou a ADI procedente e modulou os efeitos da
decisão, fixando o prazo de 2 anos para que o Congresso Nacional editasse nova lei para garantir a
continuidade da autarquia. Contudo, no dia seguinte ao julgamento, a AGU suscitou questão de ordem,
afirmando que, se fosse mantida a decisão do STF de reconhecer a inconstitucionalidade dos arts. 5°, caput
e 6°, §§ 1° e 2° da Resolução n.° 1, do Congresso haveria um caos e uma tremenda insegurança jurídica,
considerando que cerca de 500 leis em vigor (resultado de conversão de medidas provisórias) foram
aprovadas segundo este procedimento, dentre elas a do Bolsa Família e a do Minha Casa Minha Vida. O
Plenário do STF acolheu a questão de ordem e declarou que a declaração de inconstitucionalidade dos
arts. 5°, caput e 6°, §§1° e 2° da Resolução n.° 1, do Congresso Nacional somente valerá da data do
julgamento em diante (08032012). Assim, a Lei n.° 11.516/07 foi considerada válida, tendo em vista que
a inconstitucionalidade dos arts. 5°, caput e 6°, §§ 1° e 2° da Resolução n.° 1, do Congresso Nacional
somente produziu efeitos ex nunc. (dizer o direito)

8.2 Política nacional do meio ambiente

Trata-se das diretrizes gerais estabelecidas na lei que têm o objetivo de harmonizar e de integrar as
politicas públicas de meio ambiente dos entes federados, procurando torná-las mais efetiva, por meio de
instrumentos tratados na própria lei, tendo como vetor a promoção do desenvolvimento sustentável.

O pioneirismo da referida Lei deve-se ao fato dela inaugurar um microssistema legal de tutela do meio
ambiente, composto não só de princípios norteadores, mas também de instrumentos eficazes na defesa
do ecossistema. Seu escopo foi o de trazer equilíbrio entre a proteção do meio ambiente e o
desenvolvimento econômico (na esteira do desenvolvimento sustentável).

8.2.1 Dos princípios e objetivos

O art. 2º da Lei 6.938/81 traz uma série de princípios, formatados mais como objetivos ou metas a serem
alcancados por meio da PNMA, saber:

I - ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como


um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo;

II - racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar;

Ill - planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais;

IV - proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativas;

V - controle e zoneamento das atividades potencial ou efetivamente poluidoras;

VI - incentivos ao estudo e à pesquisa de tecnologias orientadas para o uso racional e a proteção dos
recursos ambientais;

VII - acompanhamento do estado da qualidade ambiental;

VIII - recuperação de áreas degradadas; http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1980-


1989/D97632.htm

IX - proteção de áreas ameaçadas de degradação;

111
X - educação ambiental a todos os níveis de ensino, inclusive a educação da comunidade,
objetivando capacitá-la para participação ativa na defesa do meio ambiente.

Cabe dizer que, tais princípios, como concernentes à política de governo, não se confundem aqueles mais
amplos e ditados como vetores do Direito Ambiental como ciência, como o da precaução na seara
ambiental.

Já o art. 4º, por sua vez, elucida os objetivos específicos a serem alcançados pela PNMA, sem se descurar
de seu objetivo gerai elencado no art. 2o da lei, a saber, preservar e melhorar a qualidade ambiental para
as presentes e futuras gerações.

I - à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio


ambiente e do equilíbrio ecológico;

II - à definição de áreas prioritárias de ação governamental relativa à qualidade e ao equilíbrio


ecológico, atendendo aos interesses da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos
Municípios;

III - ao estabelecimento de critérios e padrões de qualidade ambiental e de normas relativas ao uso e


manejo de recursos ambientais;

IV - ao desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para o uso racional de


recursos ambientais;

V - à difusão de tecnologias de manejo do meio ambiente, à divulgação de dados e informações


ambientais e à formação de uma consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade
ambiental e do equilíbrio ecológico;

VI - à preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas à sua utilização racional e
disponibilidade permanente, concorrendo para a manutenção do equilíbrio ecológico propício à vida;

VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos


causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.

Atenção ao art. 4o, VII, da Lei, o qual elucida a necessidade de responsabilzação tanto do poluidor quanto
do usuário dos recursos ambientais para fins lucrativos, para este última na forma de contribuição.

8.2.2 Dos conceitos

Há vários conceitos na lei de Política Ambiental, que se encontram no art. 3º, a saber:

I - meio ambiente: o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica,
que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; Obs.: de acordo com a doutrina, deve ser
interpretado de modo abrangente, englobando I -) meio ambiente natural ou físico; II -) meio ambiente
cultural (art. 215 e 216, da CF/88), integrado pelo patrimônio artístico, paisagístico, histórico, turístico,
arqueológico; III - ) meio ambiente artificial (art. 182 e art. 183 da CF/88), consubstanciado no conjunto de
edificações (espaço público) e equipamentos, espaços públicos (ruas, praças, áreas verdes, etc.); IV - ) meio
ambiente do trabalho (arts. 7º, XXII, XXIII, e 200, VIII, da CF/88), protegendo o homem em seu local de
trabalho, definindo normas de segurança laborativa.

II - degradação da qualidade ambiental: a alteração adversa das características do meio ambiente;

III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a)
prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades

112
sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias
do meio ambiente e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;

IV – poluidor: a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente,
por atividade causadora de degradação ambiental;

V - recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar


territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora

Cabe ressaltar a distinção feita pela lei entre degradação e poluição, nos incisos II e III, do dispositivo, tratando
o diploma a poluição como uma forma qualificada de degradação.

8.2.3 Dos instrumentos da PNMA (art. 9°)

São instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente:

I - o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental;

Frederico Amado preceitua que estados, DF e municípios também poderão fixar padrões de qualidade
ambiental, comumente, mais restritivos. Defende que, a princípio, inexiste qualquer conflito quando as
normas estaduais, distritais e municipais são mais restritivas que as federais, desde que não invadam a
competência privativa de outros entes. Os padrões, nada mais são, do que a definir de níveis de poluição
e da tecnologia a ser utilizada para a sua mitigação, sendo atribuição do CONAMA estabelecer tais
limitações. Romeu Tomé diz que o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental implica definir,
grosso modo, a linha divisória entre impacto ambiental tolerável e dano ambiental.

II - o zoneamento ambiental (Ponto 05);

III - a avaliação de impactos ambientais (Ponto 09);

IV - o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou poten. poluidoras (Ponto


06);

V - os incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou


absorção de tecnologia, voltados para a melhoria da qualidade ambiental;

Tal previsão tem encontrado grande eco, atualmente, por força dos processos de certificação da ISO 9.000
e ISO 14.000. O objetivo deste instrumento é fazer com que o Poder Público estimule a adoção e práticas
ecologicamente corretas por meio de incentivos fiscais ou econômicos. desdobramento do princípio do
protetor-recebedor, efetivado por meio das chamadas sanções premiais. É o caso da isenção de ITR para
imóveis transformados em espaço especialmente protegido.

VI - a criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público


federal, estadual e municipal, tais como áreas de proteção ambiental, de relevante
interesse ecológico e reservas extrativistas (Ponto 5)

VII - o sistema nacional de informações sobre o meio ambiente;

Visa fortalecer o processo de criação, sistematização, análise de informações, estatísticas e indicadores


ambientais (relacionado aos princípios da obrigatoriedade da intervenção estatal, da informação e da
participação democrática). Faz parte da estrutura do IBAMA, no âmbito do CNIA - Centro Nacional de
Informação Ambiental. À União compete organizá-lo e mantê-lo com colaboração dos demais entes (LC
140/2011). Além disso, o novo Código Florestal instituiu o Cadastro Ambiental Rural – CAR, obrigatório
para todos os imóveis rurais, para registros de posse e propriedades rurais.

113
VIII - o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental;

Registro, com caráter obrigatório, de pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam à consultoria técnica
sobre problemas ecológicos e ambientais e à indústria e comércio de equipamentos, aparelhos e
instrumentos destinados ao controle de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras. É administrado
pelo IBAMA, nos termos do artigo 17, I da Lei 6.938/81.

IX - as penalidades disciplinares ou compensatórias ao não cumprimento das


medidas necessárias à preservação ou correção da degradação ambiental (Ponto 6);

X - a instituição do Relatório de Qualidade do Meio Ambiente, a ser divulgado


anualmente pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais
Renováveis - IBAMA;

Este item não tem sido cumprido sistematicamente, mas vale ressaltar a importância do Relatório lançado
pelo IBAMA denominado GEO BRASIL 2002 - Perspectivas do meio ambiente no Brasil.

XI - a garantia da prestação de informações relativas ao Meio Ambiente, obrigando-


se o Poder Público a produzi-las, quando inexistentes;

Apesar do não cumprimento do encargo pelo Poder Público, a Lei 10.650/03 dispõe sobre o a acesso
público aos dados e informações existentes no SISNAMA.

XII - o Cadastro Técnico Federal de atividades potencialmente poluidoras e/ou


utilizadoras dos recursos ambientais.

Também em pleno funcionamento por parte do IBAMA, que o administra, nos termos do artigo 17, II, e
inclusive cobra uma taxa anual para tal fim, nos termos da Lei 10.165/2000.

XIII - instrumentos econômicos, como concessão florestal, servidão ambiental,


seguro ambiental e outros.

Concessão Florestal: nos termos da Lei nº 11.284/2006, art. 3o, VII: “é delegação onerosa, feita pelo poder
concedente, do direito de praticar manejo florestal sustentável para exploração de produtos e serviços
numa unidade de manejo, mediante licitação, à pessoa jurídica, em consórcio ou não, que atenda às
exigências do respectivo edital de licitação e demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e
risco e por prazo determinado”. Sendo contrato administrativo no qual o poder público outorga ao
particular a exploração sustentável das florestas públicas. (art. 7º, da Lei nº 11.284 de 2006). Seguro
Ambiental: tem como objetivo reparar os danos ambientais advindos da execução das atitidades
economicas, haja vista a responsabilidade de meio ambiente ser objetiva, baseada na teoria do risco
integral.

8.2.3.1.Servidão Ambiental (art. 9-A)

O proprietário ou possuidor de imóvel, pessoa natural ou jurídica, pode, por instrumento público ou
particular ou por termo administrativo firmado perante órgão integrante do Sisnama, limitar o uso de toda a
sua propriedade ou de parte dela para preservar, conservar ou recuperar os recursos ambientais existentes,
instituindo servidão ambiental.

A servidão ambiental não se aplica às Áreas de Preservação Permanente e à Reserva Legal mínima exigida.

A restrição ao uso ou à exploração da vegetação da área sob servidão ambiental deve ser, no mínimo, a
mesma estabelecida para a Reserva Legal.

114
Pode ser negociada com outros proprietários ou possuidores para compensar áreas com proteção ambiental
deficitária, ou com proprietário ou entidade pública ou privada que tenha a conservação ambiental como fim
social.

O instrumento de instituição da servidão ambiental e o eventual contrato de alienação, cessão ou


transferência devem ser objeto de averbação na matrícula do imóvel.

É vedada, durante o prazo de vigência da servidão ambiental, a alteração da destinação da área, nos casos de
transmissão do imóvel a qualquer título, de desmembramento ou de retificação dos limites do imóvel.

A servidão ambiental poderá ser onerosa ou gratuita, temporária (prazo mínimo de 15 anos) ou perpétua.

É dever do proprietário do imóvel serviente, entre outras obrigações, manter a área sob servidão
ambiental e defender a posse da área serviente, por todos os meios em direito admitidos.

É dever do detentor da servidão ambiental, entre outras obrigações, defender judicialmente a servidão
ambiental.

O Código Florestal instituiu a Cota de Reserva Ambiental – CRA, título nominativo representativo de área
com vegetação nativa, existente ou em processo de recuperação, sob regime de servidão ambiental que
ultrapasse os limites mínimos exigidos em lei. Podem ser negociadas com proprietários cujas terras
apresentem percentual de vegetação nativa inferior ao mínimo legalmente exigido. Busca-se atribuir valor
à vegetação nativa preservada, com previsão de mecanismos de remuneração daqueles que contribuem
para proteção ambiental.

8.2.3.2 Incentivos Governamentais (art. 12)

Instrumento econômico para induzir comportamentos ambientalmente recomendados. Condiciona a


concessão de incentivos e financiamentos públicos à comprovação de licenciamento ambiental e ao
cumprimento das normas vigentes. Segue os “Princípios do Equador”.

Atento a isso, o Novo Código Florestal (art. 78-A) prevê que “após cinco anos da data da publicação desta lei,
as instituições financeiras só concederão créditos agrícola, em qualquer de suas modalidades, para
proprietários de imóveis rurais que estejam inscritos no CAR(...).”

Destaca-se ainda que o Código Florestal dispõe de capítulo sobre apoio e incentivo à preservação do meio
ambiente (art. 41 e seguintes) elencando como linhas de ação, dentre outras medidas de incentivo:

I - pagamento ou incentivo a serviços ambientais como retribuição, monetária ou não, às atividades de


conservação e melhoria dos ecossistemas e que gerem serviços ambientais;

II - compensação pelas medidas de conservação ambiental necessárias para o cumprimento dos objetivos
desta Lei mediante obtenção de crédito e seguro agrícolas em melhores condições, linhas de financiamento
para iniciativas de preservação voluntária, dedução de APP e reserva legal para cálculo do ITR, isenção de
impostos para principais insumos e instrumentos destinados a recuperar e manter APP, reserva legal e uso
restrito além de destinação de recursos arrecadados com cobrança pelo uso da água para manutenção de
áreas protegidas na respectiva bacia hidrográfica; e

III - incentivos para comercialização, inovação e aceleração das ações de recuperação, conservação e uso
sustentável das florestas e demais formas de vegetação nativa, tais como a) participação preferencial nos
programas de apoio à comercialização da produção agrícola; b) destinação de recursos para a pesquisa
científica e tecnológica e a extensão rural relacionadas à melhoria da qualidade ambiental.

115
8.2.4 Taxa de controle e fiscalização ambiental

A Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA tem como fato gerador o exercício regular do poder de
polícia conferido ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA
para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais e
teve sua constitucionalidade reconhecida pelo STF (RE 416.601, 30/09/2005).

O STF, no que diz respeito à natureza jurídica da Taxa de Controle e Fiscalização


Ambiental – TCFA, por ocasião do julgamento do RE 416.601/DF, decidiu que a
hipótese de incidência da taxa em destaque decorre da fiscalização de atividades
poluidoras e utilizadoras de recursos ambientais, ou seja, remunera o exercício do
poder de polícia do Estado exercido pelo IBAMA. A forma simplificada de
tributação (SIMPLES) engloba o recolhimento exclusivo de tributos e
contribuições expressamente elencados na Lei 9.317/96 e LC 123/2006. Não se
revela possível abranger no sistema de arrecadação diferenciado, por ausência de
previsão legal, a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental –TCFA ... (REsp
1242940)

Rememore-se a possibilidade de instituição de taxas estaduais e municipais com o mesmo objetivo. De


acordo com o art. 17-P da Lei 6.938/81, parte do montante efetivamente pago pelo empreendedor ao
Estado ou ao Município constitui crédito para compensação com o valor devido a título de TCFA
(federal). É possível a realização de parceria entre a União, os Estados, o DF e os Municípios, através de
convênios, para a realização das atividades de fiscalização ambiental (art. 17-Q).

Ponto 9 - Estudo de impacto ambiental. Conceito. Competências. Natureza jurídica. Requisitos.

A Avaliação de Impacto Ambiental – AIA (gênero do qual são espécies os mais diversos estudos ambientais)
é mecanismo de realização do desenvolvimento sustentável, pois permite identificar previamente o grau
de impacto ao meio ambiente provocado pela implantação de uma certa atividade socioeconômica,
visando a adoção das providências adequadas.

O princípio do desenvolvimento sustentável ou ecodesenvolvimento (implícito no caput do art. 225, c/c,


170, VI, ambos CF) é o modelo que se procura coadunar os aspectos ambientais, econômicos e sociais,
buscando um ponto de equilíbrio entre a utilização dos recursos naturais, o crescimento econômico e a
equidade social. Além do caráter eminentemente constitucional, o princípio do “ecodesenvolvimento”
encontra suporte legitimador no Relatório Brundtland, de 1987, feito pela Comissão Mundial de Meio
Ambiente e Desenvolvimento da ONU. Assim, a atividade econômica não pode ser exercida em
desarmonia com a proteção ambiental, haja vista a necessidade de compatibilização do art. 170 com o art.
225, ambos da CF/88.

9.1 Conceito e Natureza Jurídica

Inicialmente, não se deve confundir o EIA com a Avaliação de Impacto Ambiental (art. 9, III da Lei 6938/81).
A AIA é um instrumento de política ambiental formado por um conjunto de procedimentos capaz de
assegurar, desde o início do processo, que se faça um exame sistemático dos impactos ambientais da ação
proposta (projeto, programa, plano ou política) e de suas alternativas, e que o resultado sejam
apresentados de forma adequada ao público e aos responsáveis pela tomada de decisão. Permite que se
exija do empreendedor a adoção das medidas necessárias. A AIA pode ser implementada tanto para
projetos que envolvam execução física de obras e processo de transformação, como para políticas e planos
que contemplem diretrizes programáticas, limitadas ao campo das ideias, neste caso denominada
Avaliação Ambiental Estratégica.

116
O EIA/RIMA é uma das espécies de estudos contemplados pela AIA. São vários os impactos ambientais
possíveis e há diferentes espécies de estudos menos complexos previstas para atividades de baixo
impacto, como plano e projeto de controle ambiental, plano de recuperação de área degradada, plano de
manejo, etc.

O EIA, assim é uma modalidade de avaliação de impacto ambiental e deve ser realizado para subsidiar o
procedimento de licenciamento ambiental de atividades consideradas efetiva ou potencialmente
causadoras de significativa degradação ambiental. Cuida-se de relevante instrumento da PNMA que tem
previsão expressa na Constituição Federal no inciso IV do § 1º do art. 225: “exigir, na forma da lei, para
instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”.

Trata-se de pré-procedimento administrativo, vinculado ao licenciamento ambiental (Capelli). O estudo


de Impacto ambiental tem natureza de instituto constitucional. A natureza previa do EIA, “é balizado a luz
do principio da Precaução e da Prevenção, pois, deverá ser realizada antes do inicio da atividade poluidora,
assim como seu caráter público, a fim de permitir o pleno acesso da comunidade sobre o seu conteúdo,
visando conferir real eficácia aos instrumentos de participação popular”. AMADO. Federico, 2015, pág.
183.

Nos termos do art. 3 da Resolução 237/97 do CONAMA: “A licença ambiental para empreendimentos e
atividades consideradas efetiva ou potencialmente causadoras de significativa degradação do meio
dependerá de prévio estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre o meio
ambiente (EIA/RIMA), ao qual dar-se-á publicidade, garantida a realização de audiências públicas, quando
couber, de acordo com a regulamentação. Parágrafo único. O órgão ambiental competente, verificando
que a atividade ou empreendimento não é potencialmente causador de significativa degradação do meio
ambiente, definirá os estudos ambientais pertinentes ao respectivo processo de licenciamento.” A
Resolução CONAMA n. 01/86 (art. 2o) em seu artigo segundo traz um rol exemplificativo de atividades que
seriam potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental.

Não se deve também confundir o EIA (Estudo de Impacto Ambiental) com o RIMA (Relatório de Impacto
Ambiental). Este último é documento que veicula as conclusões do EIA de forma mais clara e acessível aos
interessados. “A ideia é traduzir as informações do EIA (que normalmente é complexo, redigido em
linguagem técnica) através da utilização de linguagem simples, quadros, mapas, gráficos, com intuito de
demonstrar as vantagens e desvantagens do projeto, bem como, todas as consequências ambientais de
sua implementação”. (Romeu Tomé, 2016, p. 140). Viabiliza-se assim através do RIMA o princípio da
participação comunitária.

Em regra, o EIA deverá proceder à concessão da Licença Prévia, pois este ato administrativo aprova o
projeto e declara a sua viabilidade ambiental, tendo o estudo ambiental como pressuposto lógico. Assim,
cabe ao EPIA qualificar e, quanto possível, quantificar antecipadamente o impacto ambiental, de modo a
dar suporte a um adequado planejamento de obras ou atividades. Assim, podemos dizer, em síntese, que
o EPIA é “um estudo das prováveis modificações nas diversas características socioeconômicas e biofísicas
do meio ambiente que podem resultar de um projeto proposto”.

9.2 Requisitos

O EPIA está sujeito a três condicionantes (T-C-M):

Transparência administrativa – o EPIA é divulgado publicamente, respeitado o sigilo industrial;

Consulta aos interessados – possibilidade de efetiva participação e fiscalização da atividade administrativa


por parte da comunidade, que pode exprimir suas dúvidas e preocupações;
117
Motivação da decisão ambiental – quando a Administração opta por uma das alternativas apontadas pelo
EPIA que não seja ambientalmente a melhor, ou quando deixa de determinar sua elaboração por
inexistência de “significativa degradação”, deve fundamentar sua decisão, inclusive para possibilitar seu
questionamento futuro perante o Judiciário.

As conclusões do EPIA não vinculam o órgão administrativo ambiental (parte da doutrina advoga que a
EPIA positivo vincula a concessão de licença pelo administrador) O objetivo do estudo é orientar a decisão
da Administração, informando sobre as consequências ambientais de um determinado empreendimento.
Não obstante, o estudo é um limite da discricionariedade administrativa, pois a administração deve expor
as razões que a levaram a optar por solução diversa.

Os casos em que pode haver significativa degradação do meio ambiente estão previstos,
exemplificativamente, na Res. CONAMA 01/86. Podemos citar: estradas de rodagem com duas ou mais
faixas de rolamento, ferrovias, portos, etc.

Tem prevalecido na doutrina que as hipóteses de atividades listadas na Resolução 001/86 ensejam
presunção absoluta de serem potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental.
Entretanto, Milaré advoga que, segundo a Resolução CONAMA 237/97, a presunção é apenas relativa. De
fato, dispõe o art. 3º da resolução, p. único, que o “órgão ambiental competente, verificando que a
atividade ou empreendimento não é potencialmente causador de significativa degradação do meio
ambiente, definirá os estudos ambientais pertinentes ao respectivo processo de licenciamento”. Há normas
específicas que presumem a necessidade de EIA-RIMA (p. Ex. Lei 11.284/06, art. 18).

No que se refere aos OGM – Organismos Geneticamente Modificados, a matéria encontra-se atualmente
tratada na Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005), em seu artigo 16. Somente se exige EPIA nos casos em
que a CTNBio deliberar que o OGM é potencialmente causador de significativa degradação do meio
ambiente.

O EPIA e o RIMA são feitos antes da concessão da Licença Prévia, como uma condição à expedição desta, a
partir de um Termo de Referência fornecido pelo órgão ambiental, norteado, no mínimo, pelas seguintes
diretrizes (art. 5º, da Resolução nº 01/86 do CONAMA):

a) contemplar todas as alternativas tecnológicas e de localização do empreendimento, confrontando-as


com a hipótese de sua não execução (HIPÓTESE ou OPÇÃO ZERO, que só deve ser adotada quando o
projeto causar grandes impactos ambientais, sem possibilidade de mitigação aceitável, e quando os
resultados econômico-sociais sejam desprezíveis”);

b) identificar e avaliar sistematicamente os impactos ambientais gerados nas fases de implantação,


operação e desativação do empreendimento;

c) definir os limites da área geográfica a ser direta ou indiretamente afetada pelos impactos,
denominada área de influência do empreendimento, considerando, em todos os casos, a microrregião
sociogeográfica e a bacia hidrográfica na qual se localiza;

d) considerar os planos e programas governamentais e não-governamentais, propostos e em


implantação, operação e desativação do empreendimento.

Além dessas, pode o órgão ambiental fixar outras diretrizes fundamentais que entenda pertinentes, em
razão das peculiaridades do projeto e características ambientais da área.

Ao lado das diretrizes e atividades mínimas, exige-se, também, um conteúdo mínimo:

I – diagnóstico ambiental da área de influência do projeto: consiste no inventário do meio ambiente


anterior a ação proposta, descrevendo as inter-relações entre os componentes bióticos, abióticos e
antrópicos do sistema a ser afetado pelo empreendimento.
118
II – análise dos impactos ambientais: identificação, valoração e interpretação dos prováveis impactos
ambientais.

III – definição das medidas mitigadoras: explicitação das medidas que visam a evitar o impacto ambiental,
inclusive quanto aos aspectos referentes ao seu modo e tempo de aplicação.

IV – programa de acompanhamento e monitoramento dos impactos ambientais.

O EPIA, como procedimento complexo, deve ser elaborado por uma equipe multidisciplinar de
especialistas, cuja habilitação se dá com a inscrição no Cadastro Técnico Federal de Atividades, sob a
administração do IBAMA (Resolução CONAMA 001/86).

Cabe ao empreendedor providenciar a realização do EPIA. O Estudo deve apresentar a alternativa mais
favorável do ponto de vista ambiental ou, até mesmo, se for o caso, a recomendação de não realização do
projeto. Os custos são arcados pelo proponente do projeto (art. 8º da Resolução 01/86), consagrando o
princípio do poluidor-pagador.

Entendia-se que a equipe autora do EPIA deveria ser desvinculada do projeto em exame, a fim de
favorecer sua independência. Atualmente não mais se faz tal restrição, pois se entende que sempre vai
haver dependência na medida em que o estudo é custeado pelo empreendedor. Assim, entende-se que a
neutralidade dos estudos de impacto ambiental será garantida não por uma eventual independência da
equipe autora em face do proponente, mas pela existência de uma contra-equipe técnica governamental
que examinará o EPIA, do ponto de vista do interesse público.

O empreendedor e os profissionais que subscreverem os estudos serão responsáveis pelas informações


apresentadas, sujeitando-se às sanções administrativas, civis e penais (Res. CONAMA 237/97).

Na esfera administrativa, o empreendedor estará sujeito às sanções do art. 72 da Lei 9.605, enquanto os
técnicos respondem perante os Conselhos Profissionais e perante o IBAMA.

No campo da responsabilidade civil, que é objetiva, o empreendedor (quem se beneficia da atividade),


responde pelos prejuízos causados, ressalvado o seu direito de regresso contra o causador do dano,
inclusive contra o profissional que responsável pelo erro.

Criminalmente, respondem tanto a pessoa jurídica quanto as pessoas físicas.

As conclusões do EPIA serão refletidas no RIMA, cuja linguagem deve ser acessível, ilustrada por mapas,
gráficos e outros métodos que deixem claras as possíveis consequências ambientais do projeto,
comparando-se as vantagens e desvantagens de cada alternativa.

Sobre a publicidade, a Lei 10.650/2003 estabeleceu que o registro de apresentação do EPIA, bem como o
ato de aprovação ou rejeição, serão publicados em diário oficial e ficarão disponíveis nos respectivos
órgãos, em local de fácil acesso ao público.

Ainda nesse contexto, segundo a Res. CONAMA 009/87, deve ser convocada audiência pública, sob pena
de invalidade da licença, sempre que: o órgão de meio ambiente julgar necessário; for solicitada por
entidade civil; for solicitada pelo MP; for pedida por 50 ou mais cidadãos.

A audiência pública deve acontecer na área de influência da obra, tendo prioridade o município ou a área
onde os impactos forem mais significativos, sendo, em alguns casos, necessária a realização de mais de
uma audiência.

A qualidade do EPIA pode ser controlada pela comunidade (controle comunitário), por meio das
audiências públicas e por denúncias e pressões sociais. Pode também ser controlada pelo órgão ambiental
(controle administrativo), através da fixação de diretrizes e termos de referência específicos, bem como

119
pelo exame de mérito da viabilidade do projeto. Pode, ainda, ser controlado pelo Poder Judiciário
(controle judicial), exercido no julgamento das ACP e AP, conforme a proporcionalidade e razoabilidade.

Inexistente ou insuficiente o EPIA não pode a obra ou atividade ser licenciada e se, por acaso, já tiver
havido o licenciamento, este será inválido (Sílvia Cappelli).

O órgão ambiental detém discricionariedade sui generis: ainda que o EPIA/RIMA seja favorável ao
empreendimento, pode negar a licença, desde que motive sua decisão.

Por fim, em havendo interesses diversos envolvidos, deve haver necessária participação dos órgãos
responsáveis, como é o caso da FUNAI, IPHAN, INCRA, etc, situação comum dentre os casos levados à
apreciação do TRF4. Menciona-se a respeito o seguinte precedente:

EMENTA: DIREITO AMBIENTAL. LICENÇA PRÉVIA. POSSIBILIDADE DE IMPACTO DO


EMPREENDIMENTO SOBRE TERRA INDÍGENA. PARTICIPAÇÃO DA FUNAI NO PROCESSO DE
LICENCIAMENTO AMBIENTAL. Se há a possibilidade de o empreendimento a ser licenciado provocar
impacto ambiental sobre terras indígenas e respectivas comunidades, impõe-se a participação da
FUNAI desde o início do processo de licenciamento, para se decidir sobre sua viabilidade, para
determinarem-se os estudos necessários e para se estabelecerem eventuais condicionantes ao
empreendimento, a serem inseridos na respectiva licença prévia. (TRF4, AG 5009059-
84.2014.404.0000, QUARTA TURMA, Relator CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos
autos em 03/07/2014).

9.3 Competências

A coordenação do processo de exigência do EPIA foi entregue aos órgãos estaduais competentes, exceção
feita aos casos de expressa competência federal, da alçada do IBAMA, ou de exclusivo interesse local, de
responsabilidade dos órgãos municipais (Resolução do Conama nº 237/97, art. 4, 10).

Deve-se observar o empreendimento em âmbito nacional ou regional, estadual, quando os impactos


ambientais ultrapassarem os limites territoriais de um ou mais municípios e, por fim, quando essa
competência for delegada pela União por instrumento legal ou convênio.

Entretanto, desconfiado da eficiência das estruturas ambientais, o legislador deu ao CONAMA


competência para “determinar, quando julgar necessário, a realização de estudos das alternativas e das
possíveis consequências ambientais do projetos públicos ou privados (...)”. (Lei 6.938/81, art. 8º, II).

Para uma visão mais ampla sobre a distribuição das competências dos órgãos responsáveis pelo
licenciamento ambiental, remete-se ao ponto 6 do Edital.

9.4 Questões complementares sobre o tema

Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV): previsto no Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/00). Semelhante ao
EPIA/RIMA, mas não se confundem. Mais usado em empreendimentos típicos do contexto urbano, sem
grandes impactos no ambiente natural. O EIV não substitui o EPIA, quando exigido. Mas o EPIA, mais
abrangente, pode tornar o EIV dispensável.

EIA a posteriori – Res. 06/1987 CONAMA prevê EIA para obras de grande porte que tenham sido instaladas
ou estejam em operação antes da Resolução 01/1986. Além disso, o art. 8º, II, da Lei 6.938/1981 refere
que o CONAMA poderá determinar a realização de EIA/RIMA sempre que julgar necessário, inclusive
depois do início de obra ou atividade. Tema este controverso, porquanto trata da concorrência entre
direito adquirido e defesa ambiental, sendo que, em regra, esta última prevalece.

120
É inconstitucional norma que submeta a apreciação do licenciamento, ou de seu relatório, a órgão fora
do Poder Executivo, por ofensa à repartição de Poderes (ADI1501, DJ 01.03.2005).

Ponto 10 - Biodiversidade. Principais instrumentos de proteção internacional. Acesso. Política nacional.


Proteção jurídica do conhecimento tradicional associado

10.1 Biodiversidade

10.1.1 Conceitos

Em apertada síntese, biodiversidade pode ser conceituada como a variedade e a quantidade de espécies
de uma comunidade ou ecossistema.

A proteção à biodiversidade decorre da CF/88, art. 225, § 1º, II, que determina que o Poder Público e a
coletividade devem preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as
entidades dedicadas à pesquisa e manipulação do material genético.

Segundo a Convenção da Biodiversidade, ratificada pelo Brasil, biodiversidade significa: “a variabilidade de


organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres,
marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte;
compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas”.

Ante a sua importância para o ser humano pode ser considerada como um conjunto de riquezas, sendo um
patrimônio natural de uma nação.

As normas de proteção à biodiversidade têm duas funções básicas: prevenir a ocorrência de danos à
biodiversidade; buscar a reparação quando ocorrido um dano.

O meio ambiente tem quatro aspectos: meio ambiente natural, artificial, cultural e do trabalho. A proteção
à biodiversidade tutela o meio ambiente natural.

Cumpre lembrar que há incidências de vários princípios do direito ambiental na proteção da


biodiversidade, tais como: princípio do desenvolvimento sustentável; do poluidor-pagador; e o da
participação.

Principais instrumentos de proteção internacional – direito internacional público

As normas de proteção à biodiversidade são bastante desenvolvidas no Direito Internacional. A questão


sobre a preservação da biodiversidade em âmbito global surgiu pela primeira vez na Convenção de
Estocolmo, que, em seus princípios, destacou a importância de preservar a fauna e a flora para as
presentes e futuras gerações através de um cuidadoso planejamento.

Segundo Phillipe Sands, três categorias de convenções tratam da biodiversidade:

1. A primeira abrange os tratados aplicáveis a todas as espécies e habitat do planeta.

2. A segunda categoria inclui tratados aplicáveis a todas as espécies e habitats de uma determinada
região. Alguns exemplos desses tratados: - Convenção Africana sobre a Natureza, de 1968: objetiva
assegurar a conservação, utilização dos recursos naturais, incluindo a fauna e a flora; - Protocolo Kingston
SPA, de 1990: adotado a partir da Convenção de Cartagena (1983), na América do Norte e América Central,
com o objetivo de proteger e utilizar maneira sustentável às áreas de espécies ameaçadas de extinção.

3. A terceira categoria inclui tratados que podem ser aplicados em nível global e regional, mas que seu
objetivo é conservar uma determinada espécie ou habitat. São exemplos os instrumentos para a
121
conservação e proteção de: - Convenção relativa a Zonas Úmidas (Wetlands) de Importância Internacional,
Particularmente como Habitat das Aves Aquáticas (Convenção de Ramsar), de 1971: objetiva conservar,
aumentar e melhorar as zonas úmidas; - Acordo Internacional sobre Madeiras Tropicais, de 1994: visa o
desenvolvimento de técnicas de reflorestamento de madeiras tropicais, como também de manejo de
atividades florestais; - Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar (CNCDM ou UNCLOS – United
Nations Convention on the Law of the Sea), de 1982: principal instrumento internacional a estabelecer
direitos e obrigações dos Estados e outros membros da Comunidade Internacional, visando a conservação
e o uso sustentável dos recursos marinhos, como a sua biodiversidade.

10.1.2 Convenções de âmbito global e aplicação geral

Apenas duas convenções se enquadram nessa categoria: a Convenção sobre Comércio Internacional das
Espécies da Flora e da Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (CCIEFFSPE ou CITES, Convention on
International Trade in Endangered Species), de 1973, e a Convenção das Nações Unidas sobre a
Diversidade Biológica (CNUDB ou UNCBD, United Nations Convention on Biological Diversity), de 1992. As
duas convenções são as mais importantes para o desenvolvimento do Direito Internacional Ambiental no
que concerne a biodiversidade. É através da conferência das partes de ambos os instrumentos que são
discutidas novas questões acerca da preservação, servindo de escopo para o surgimento de novos
regulamentos, como o Protocolo de Cartagena de Biossegurança de 2000.

10.1.2.1 Convenção sobre comércio Internacional das Espécies da Flora e da Fauna Selvagens em
Perigo de Extinção (CITES)

Essa convenção abrange todas as espécies da fauna e da flora do planeta e adota medidas protecionistas
da Biodiversidade no sentido de proibir e regular o comércio internacional de espécies ameaçadas de
extinção, tendo em vista que essas espécies são insubstituíveis e devem ser protegidas para o benefício da
presente e das futuras gerações.

A fim de facilitar a regulamentação do comércio de espécies protegidas, a CITES as dividiu em três anexos.
O anexo I inclui as espécies ameaçadas de extinção e que são ou possam ser afetadas pelo comércio. O
anexo II abrange as espécies que embora não estejam ameaçadas de extinção, poderão atingir esse status
devido à sua exploração comercial. O Anexo III inclui todas as espécies que umas das Partes “declare
sujeitas, nos limites de sua competência, à regulamentação para impedir ou restringir sua exploração e que
necessitem da cooperação das outras partes para o controle do comércio”.

A Convenção não prevê penalidade por descumprimento, mas as próprias partes preferem não constar
da lista de inadimplência, pois pode comprometer as relações econômicas com outras Partes. A própria
Conferência das Partes aconselha a cessação de comércio caso um país esteja atrasando
injustificadamente a implementação da Convenção.

10.1.2.2 Convenção sobre a Diversidade Biológica (UNCBD)

Pode ser aplicada a todas as espécies de animais e plantas encontradas no mundo e a sua atuação é de
nível global. O art. 1º da Convenção estabelece os seguintes objetivos: “A conservação da diversidade
biológica, a utilização sustentável dos seus componentes, a repartição justa e equitativa dos benefícios
derivados da utilização dos recursos genéticos e a transferência adequada de tecnologias pertinentes,
levando em conta todos os direitos sobre tais recursos e tecnologias, mediante financiamento
adequado”.

O preâmbulo da Convenção define ainda que a preservação da biodiversidade representa um “interesse


comum da humanidade” e que os Estados têm direitos soberanos sobre os seus recursos naturais, mas
também têm a responsabilidade de conservar a biodiversidade de seus países e usar esses recursos de
maneira sustentável. A UNCBD prevê ainda a troca de informações e até mesmo ajuda financeira e
tecnológica principalmente no que diz respeito aos recursos genéticos para a conservação da
122
biodiversidade. A finalidade é promover a colaboração entre os países desenvolvidos com os em
desenvolvimento.

A UNCBD serviu de base para o Protocolo de Cartagena, um importante instrumento de proteção da


biodiversidade, pois disciplina o movimento transfronteiriço, a produção, uso e a comercialização de
organismos geneticamente modificados. Esse protocolo foi assinado na Convenção sobre Diversidade
Biológica (CDB), em Cartagena, Colômbia. Foi aprovado em 29/1/2000 e está em vigor desde
setembro/2003.

10.1.3 Acesso e Proteção Jurídica ao Conhecimento Tradicional

Com o desiderato de regulamentação da Constituição e da Convenção da Biodiversidade, foi editada a


Medida Provisória 2.186-16/2001, que regula o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao
conhecimento tradicional associado, a repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de
tecnologia para sua conservação e utilização.

A MP 2.186-16/2001 foi revogada pela recente Lei 13.123/15, a qual dispõe sobre a regulamentação
interna sobre a proteção à biodiversidade, em atenção à Convenção sobre Diversidade Biológica, e
dispõe sobre o acesso ao conhecimento tradicional associado. Como esta matéria é recente, em caso de
cobrança, o candidato deve se ater aos conceitos constantes no art. 1o, da Lei.

A proteção se encontrada tratada nos arts. 8o e seguintes da Lei 13.123/15.

10.1.4 Caráter erga omnes das normas que tratam de biodiversidade

Argumenta-se que as obrigações oriundas de normas sobre a biodiversidade são erga omnes, pois a
preservação desta é interesse comum da Comunidade Internacional. A biodiversidade representa recursos
genéticos insubstituíveis para prosperidade do planeta, fontes alimentícias, matéria farmacêutica e
contribui para o equilíbrio na biosfera. Além disso, é interesse da Comunidade Internacional que os
recursos naturais sejam conservados para o benefício da presente e das futuras gerações.

A Convenção sobre a Diversidade Biológica, em seu preâmbulo, afirmou que a preservação da


biodiversidade é uma preocupação comum da humanidade. Como foi observado por Kofi Annan em seu
relatório, a biodiversidade “permeia todo o espectro da atividade humana” e “está diretamente ligada ao
bem-estar do nosso planeta e ao progresso da humanidade em longo prazo.”
A UNCBD não aceita reservas e prevê que suas disposições devem prevalecer sobre tratados cujos
dispositivos possam causar danos desnecessários à biodiversidade.

O Direito Internacional do Meio Ambiente apresenta mais de 400 tratados multilaterais que preveem,
entre outras, normas sobre a conservação da biodiversidade. Portanto, o caráter erga omnes de normas
sobre a proteção e preservação da biodiversidade é passível de comprovação, dada a grande aceitação dos
documentos sobre o assunto entre os Estados.

10.1.5 Aspectos gerais da Convenção sobre a Diversidade Biológica

A Convenção da Diversidade Biológica (CDB ou UNCBD) propõe regras para assegurar a conservação da
biodiversidade, o seu uso sustentável e a justa repartição dos benefícios provenientes do uso econômico
dos recursos genéticos, respeitada a soberania de cada nação sobre o patrimônio existente em seu
território.

Já foi assinada por 175 países (em 1992 durante a Eco-92), dos quais 168 a ratificaram, incluindo o Brasil
(Decreto Nº 2.519 de 16 de março de 1998).

123
A implementação dos princípios da CDB entre os países mega-biodiversos e os detentores de tecnologia
não avança, pois alguns (como os EUA) não a ratificaram. Portanto, não são obrigados a respeitar (e não
respeitam) os princípios da Convenção.

10.1.6 Biopirataria

Biopirataria é a exploração, manipulação, exportação e/ou comercialização de recursos biológicos


contrariando as normas da CDB (Convenção sobre Diversidade Biológica, 1992). Em outras palavras, é a
apropriação indevida de recursos da fauna e da flora, levando à monopolização dos conhecimentos no que
se refere ao uso desses recursos.

As informações de um grupo de indivíduos acumuladas por anos, portanto, são bens coletivos, não
simplesmente mercadorias que podem ser comercializadas como qualquer objeto de mercado. Nos
últimos anos, graças ao avanço da biotecnologia e a facilidade de se registrar patentes e marcas em âmbito
internacional, as possibilidades da exploração da biodiversidade se multiplicaram.

Convém ressaltar que o termo biopirataria não se refere somente ao contrabando de diversas espécies
naturais da flora e da fauna, mas principalmente, à apropriação e monopolização dos conhecimentos das
populações tradicionais no âmbito do uso dos recursos naturais. Estas populações estão perdendo o
controle sobre tais recursos.

A biopirataria prejudica a Amazônia. Causa risco de extinção a inúmeras espécies da fauna e da flora, com
sua retirada do habitat natural.

O termo "biopirataria" foi lançado em 1993 pela ONG RAFI (hoje ETC-Group) para alertar sobre o fato do
conhecimento tradicional e dos recursos biológicos estarem sendo apanhados e patenteados por empresas
multinacionais e instituições cientificas.

Cabe ressaltar que, com a novel Lei 13.123/05, a biopirataria e outros atentados contra à biodiversidade
são sancionados administrativamente com penas de multa, advertência e apreensão (art. 27), contudo
ainda não há tipificação penal, entre nós, do crime de biopirataria.

10.1.6.1 Proteção jurídica do conhecimento tradicional associado

Conceito de conhecimento tradicional associado segundo a Lei 13.123/15: conhecimento tradicional


associado é a informação ou prática da população indígena, comunidade tradicional ou agricultor
tradicional sobre as propriedades ou usos diretos ou indiretos associada ao patrimônio genético.

- Acesso ao conhecimento tradicional associado: Pesquisa ou desenvolvimento realizado sobre


conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético, ainda que obtido de fontes secundárias tais
como feiras, publicações, inventários, filmes, artigos científicos, cadastrados e outras formas de
sistematização e registro de conhecimentos tradicionais associados.

O conhecimento tradicional associado é patrimônio comum do grupo social e tem caráter difuso, de
maneira que toda a comunidade envolvida deve receber os benefícios de sua exploração.

Importância do conhecimento tradicional associado

É de fácil constatação que as práticas, processos, atividades e inovações das populações indígenas e locais
exercem significativa contribuição para a preservação da biodiversidade, tendo em vista o intenso manejo
e interação mantidos com ela.

Os conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade também são importantes por servirem como
indicadores de material apropriado à pesquisa, encurtando sua procura pelos pesquisadores.

124
A Convenção sobre Diversidade Biológica reconhece que os conhecimentos, inovações e práticas das
comunidades indígenas e locais com estilo de vida tradicionais são relevantes à conservação e à utilização
sustentável da diversidade biológica e deverão ser respeitados e preservados (art. 8 “j”).

O Princípio 22 da Declaração do Rio (ECO-92) dita que: “As populações indígenas e suas comunidades, bem
como outras comunidades locais, têm papel fundamental na gestão do meio ambiente e no
desenvolvimento, em virtude de seus conhecimentos e práticas tradicionais. Os Estados devem reconhecer
e apoiar de forma apropriada a identidade, cultura e interesses dessas populações e comunidades, bem
como habilitá-las a participar efetivamente da promoção do desenvolvimento sustentável”.

10.1.6.2 Proteção do conhecimento tradicional associado

O artigo 8 “j” da Convenção estatui que cada parte contratante deve, na medida do possível: “em
conformidade com sua legislação nacional, respeitar, preservar e manter o conhecimento, inovações e
práticas das comunidades locais e populações indígenas com estilo de vida tradicionais relevantes à
conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica e incentivar sua mais ampla aplicação com
a aprovação e a participação dos detentores desse conhecimento, inovações e práticas; e encorajar a
repartição equitativa dos benefícios oriundos da utilização desse conhecimento, inovações e práticas”

O dispositivo transcrito traz a lume dois princípios básicos enunciados pela CDB, quais sejam: o
consentimento prévio fundamentado (significa que as comunidades detentoras de conhecimentos
tradicionais deverão ser previamente consultadas sobre o acesso e utilização), e a justa e equitativa
repartição de benefícios (garante às populações indígenas e locais o direito de receber os benefícios
derivados do acesso e uso de seus conhecimentos).

O consentimento prévio fundamentado possui como ideia o entendimento de que todas as partes devem
estar cientes dos fatores envolvidos no acesso, isto quer dizer que os povos detentores devem ser
esclarecidos sobre os riscos e benefícios do acesso, bem como de seu intento, entre outros aspectos, e os
interessados na utilização dos conhecimentos devem tomar conhecimento das práticas culturais dos povos
detentores, a saber, sua forma de organização política, seus representantes, suas tradições.
O consentimento prévio informado deve ser comprovado mediante assinatura de termo, registro
audiovisual, parecer do órgão oficial competente ou adesão na forma de protocolo comunitário.
A dificuldade porventura existente em relação ao mecanismo ora tratado seria a identificação do titular da
competência para dar o consentimento prévio informado, uma vez que as formas de representação variam
de uma comunidade para outra e em razão de muitas comunidades possuírem o mesmo conhecimento.
Uma saída para o impasse é estudar de forma detalhada a organização política da comunidade para
descobrir a quem cabe falar em nome da coletividade e verificar se todos os indivíduos foram informados
sobre o pretendido acesso aos conhecimentos, uma vez que qualquer negociação levada a efeito só pode
se regrar pelas normas internas da comunidade. No caso do conhecimento ser do domínio de várias
comunidades, o ideal seria que todas as comunidades fossem identificadas para que houvesse legítimo
consentimento para o acesso e justa repartição de benefícios. Levanta-se a hipótese de constituição de
uma agência nacional que intermediaria a negociação identificando e abordando o maior número possível
de comunidades detentoras daquele conhecimento. O Estado pode participar deste processo, assegurando
que o consentimento de povos indígenas e comunidades locais seja livre e consciente.
Acerca da justa e equitativa repartição de benefícios, trata-se da possibilidade das comunidades
detentoras do conhecimento tradicional associado de participar dos resultados da pesquisa, que poderá
derivar em perspectiva de uso comercial. Porém, mesmo que não se realize a comercialização do produto
ou processo desenvolvido, as comunidades que concederam seus conhecimentos, ainda assim, farão jus à
participação de benefício, os quais não são necessariamente econômicos, podendo consistir em
informação útil à comunidade sobre o resultado da pesquisa, por exemplo.

125
A proteção, tal como determinada pela Convenção, encontra-se tratada nos arts. 8o, 9o e 10, da Lei
13.123/15, destacando-se, no tratamento legal, a necessidade da participação das comunidades na
tomada das decisões e, mormente, a divisão dos resultados obtidos.

Há duas propostas para a forma de proteção: o sistema dos direitos de propriedade industrial (na
hipótese, estariam os conhecimentos tradicionais inseridos no sistema de patentes); e o regime sui
generis, proposta que ganha corpo e reflete a intenção de resguardar os conhecimentos ancestrais acima
de qualquer outro interesse envolvido.

A CDB não deixou claro qual o modelo de proteção a ser utilizado, se o da propriedade industrial ou o do
regime sui generis. Contudo, com base no art. 10, da Lei 13.123/15, percebe-se que, no Brasil, o sistema
seria diferenciado, não se confundindo com a propriedade industrial, porquanto se destaca, na
normativa, mais o caráter protetivo do conhecimento associado, do que a exploração econômica dele.

Ressalta-se a tendência contraditória na Lei de conjugar dois institutos distintos, quais sejam: os direitos
coletivos das comunidades indígenas e locais sobre seus conhecimentos e a possibilidade de utilização dos
direitos de propriedade intelectual. O art. 10º, §1o, da Lei 13.123/15, estatui que o conhecimento
tradicional associado, ainda que pertencente a um indivíduo, poderá ser de titularidade da comunidade,
reconhecendo, nestes termos, a titularidade coletiva da comunidade indígena ou local sobre seus
conhecimentos. A contrario sensu, o §4º do art. 17 prevê a possibilidade de patentear produtos ou
processos resultantes da aplicação comercial ou industrial de conhecimentos tradicionais, permitindo,
assim, a apropriação individual dos ditos conhecimentos tradicionais, sem a repartição dos benefícios.

A doutrina tem posicionamento que reconhece o domínio público do conhecimento tradicional associado2:

A outra orientação – à qual nos filiamos – pretende criar um regime legal sui generis,
ou seja, totalmente distinto do sistema patentário, tanto do ponto de vista
conceitual quanto valorativo. Tal orientação parte da constatação de que todo o
sistema patentário vigente, de proteção a direitos de propriedade intelectual,
protege os chamados “conhecimentos novos”, individualmente produzidos, e não os
conhecimentos tradicionais, gerados coletiva e informalmente, e transmitidos
oralmente de uma geração para outra. Estes são considerados, dentro do sistema
vigente, como pertencentes ao domínio público, e sem qualquer proteção
patentária.

O candidato não deve deixar de ler o art. 17, da Lei 13.123/15, que trata da forma de repartição de
benefícios da exploração do conhecimento tradicional associado, porquanto denota, como dito alhures, o
caráter coletivo da detenção do conhecimento, mas que, ao seu turno, permite o licenciamento exclusivo
do produto resultante por conta do proprietário intelectual:

Art. 17. Os benefícios resultantes da exploração econômica de produto acabado ou


de material reprodutivo oriundo de acesso ao patrimônio genético de espécies
encontradas em condições in situ ou ao conhecimento tradicional associado, ainda
que produzido fora do País, serão repartidos, de forma justa e equitativa, sendo
que no caso do produto acabado o componente do patrimônio genético ou do
conhecimento tradicional associado deve ser um dos elementos principais de
agregação de valor, em conformidade ao que estabelece esta Lei.

§ 1o Estará sujeito à repartição de benefícios exclusivamente o fabricante do


produto acabado ou o produtor do material reprodutivo, independentemente de
quem tenha realizado o acesso anteriormente.

2
SANTILLI, Juliana Ferraz da Rocha. Biodiversidade e conhecimentos tradicionais associados. Rev. Fund. Esc. Super. Minist.
Público Dist. Fed. Territ., Brasília, Ano 10, Volume 20, pp. 50-74, jul./dez. 2002. p. 56.
126
§ 2o Os fabricantes de produtos intermediários e desenvolvedores de processos
oriundos de acesso ao patrimônio genético ou ao conhecimento tradicional
associado ao longo da cadeia produtiva estarão isentos da obrigação de repartição
de benefícios.

§ 3o Quando um único produto acabado ou material reprodutivo for o resultado de


acessos distintos, estes não serão considerados cumulativamente para o cálculo
da repartição de benefícios.

§ 4o As operações de licenciamento, transferência ou permissão de utilização de


qualquer forma de direito de propriedade intelectual sobre produto acabado,
processo ou material reprodutivo oriundo do acesso ao patrimônio genético ou ao
conhecimento tradicional associado por terceiros são caracterizadas como
exploração econômica isenta da obrigação de repartição de benefícios.

§ 5o Ficam isentos da obrigação de repartição de benefícios, nos termos do


regulamento: I - as microempresas, as empresas de pequeno porte, os
microempreendedores individuais, conforme disposto na Lei Complementar
no 123, de 14 de dezembro de 2006; e II - os agricultores tradicionais e suas
cooperativas, com receita bruta anual igual ou inferior ao limite máximo
estabelecido no inciso II do art. 3º da Lei Complementar nº 123, de 14 de
dezembro de 2006.

§ 6o No caso de acesso ao conhecimento tradicional associado pelas pessoas


previstas no § 5o, os detentores desse conhecimento serão beneficiados nos
termos do art. 33.

§ 7o Caso o produto acabado ou o material reprodutivo não tenha sido produzido


no Brasil, o importador, subsidiária, controlada, coligada, vinculada ou
representante comercial do produtor estrangeiro em território nacional ou em
território de países com os quais o Brasil mantiver acordo com este fim responde
solidariamente com o fabricante do produto acabado ou do material reprodutivo
pela repartição de benefícios.

§ 8o Na ausência de acesso a informações essenciais à determinação da base de


cálculo de repartição de benefícios em tempo adequado, nos casos a que se refere
o § 7o, a União arbitrará o valor da base de cálculo de acordo com a melhor
informação disponível, considerando o percentual previsto nesta Lei ou em
acordo setorial, garantido o contraditório.

Ponto 11 - Proteção às florestas.

11.1 Novo Código Florestal – Notas Gerais

A L. 12.651/12, inicialmente denominada “Novo Código Florestal”, teve sua ementa alterada, suprimida a
menção a Código. A nova lei não se denomina Código: o texto não é um conjunto sistematizado de normas
relativas às florestas. A legislação a respeito se encontra muito dispersa e a abrangência da Lei 12.651 não
é grande.

Abrangência do NCF: o antigo (primeiro Código Florestal, de 1934) tratava de todas as florestas brasileiras,
com ênfase na produção de madeira. Tratava dos monumentos naturais, florestas protetoras, florestas de
rendimentos (produção de madeira), florestas remanescentes (as demais). O de 1965 manteve
basicamente os institutos do anterior, mas sua abrangência diminuiu com o tempo (criação da Lei das

127
Unidades de Conservação, Lei da Mata Atlântica, Lei de diversidade biológica, Lei de Gestão das Florestas
Públicas etc. – leis especiais que tiraram do âmbito do Código de 65 sua regulamentação). Assim, o novo
“Cód. Florestal” ficou reservado, praticamente, apenas para áreas particulares. Porém, mantendo a
tradição, nos referimos à Lei 12.651 como NCF/NCFlo (Novo Código Florestal).

O principal ponto negativo foi a instituição das chamadas “áreas consolidadas”, espaços degradados por
desobediência à legislação anterior cujos infratores foram anistiados. Houve, assim, o reconhecimento de
fatos consumados sem medidas de recuperação do que foi desmatado no passado, premiando quem
descumpriu a lei. Já os defensores da anistia asseveram que as áreas consolidadas foram criadas para
compatibilizar a proteção do meio ambiente com as atividades já realizadas, por motivo de segurança
jurídica. A ampla anistia foi abrandada por alguns vetos e pela MP 571.

O art. 1º-A estabeleceu que o fundamento central no Novo Código é a proteção e uso sustentável das
florestas e o desenvolvimento sustentável é o objetivo a ser alcançado (art. 1º-A, parágrafo único).

Foram poucas as mudanças com o Novo Código em termos gerais e estruturais, já que a lei aprovada
permitiu somente ajustes pontuais para adequação da situação de fato à situação de direito pretendida
pela legislação ambiental.

A proteção do meio ambiente natural continua sendo obrigação do proprietário mediante a manutenção
de espaços protegidos de propriedade privada, divididos entre Área de Preservação Permanente (APP) e
Reserva Legal (RL).

Uma novidade está na implementação e na fiscalização desses espaços, agora sujeito ao Cadastro
Ambiental Rural (CAR).

O Código Florestal protege: florestas, demais formas de vegetação e as terras propriamente ditas.

Art. 2o As florestas existentes no território nacional e as demais formas de


vegetação nativa, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de
interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de
propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei
estabelecem.

Exprimir que as florestas e demais formas de vegetação “são bens de interesse comum a todos” significa
que, embora o domínio da floresta seja público ou privado, o interesse deve ser compreendido como a
faculdade legal e constitucionalmente assegurada a qualquer indivíduo de exigir, administrativa ou
judicialmente, do titular do domínio que ele preserve a sua boa condição ecológica.

11.2 Áreas (Florestais) de Preservação Permanente (APP)

Área de Preservação Permanente - APP: “área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a
função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a
biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das
populações humanas” (Art. 3º, II).

Enfim, basicamente, a APP tem a função de preservar a água, o solo, a paisagem, a fauna e a flora.

A APP é caracterizada pela intocabilidade dos recursos naturais da área, salvo casos de utilidade pública
ou interesse social ou outros definidos nesta lei.

11.2.1 Florestas de preservação permanente pelo efeito do Código Florestal

Os Estados poderão estabelecer, em sua legislação própria, outros critérios para que se definam locais nos
quais a flora será considerada de preservação permanente, já que o Código Florestal é tido como lei geral
(nacional).
128
O disposto no artigo 19, parágrafo 1º da Lei Estadual nº 10.561/91 não conflita com
o preceito contido no artigo 21, parágrafo único do Código Florestal. Trata-se
aquela de lei especial, compatível com o tratamento genérico da norma federal.
(REsp 246531/MG)

Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:

I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros,
desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de: [...]

A preocupação do art. 4º, I, “a”, “b”, “c”, “d” e “e” do Código Florestal situa-se na preservação da
vegetação que protege os cursos d’água, diante de sua relevância. “A remoção da cobertura vegetal reduz
o intervalo de tempo observado entre a queda da chuva e os efeitos nos cursos d’água (deflúvio de base),
diminui a capacidade de retenção de água nas bacias hidrográficas e aumenta o pico de cheias”. Ademais,
a cobertura vegetal limita a possibilidade de erosão do solo, minimizando a poluição dos cursos de água
por sedimentos”.

Note-se que a Lei n. 12.727/12 fez sensível alteração para estabelecer que apenas as faixas marginais de
curso d’água natural perene [que possui água corrente durante todo o ano] e intermitente/temporário
[aquele que, naturalmente, não apresenta escoamento superficial em alguns períodos do ano; seca em
período de escassez de chuva] são APPs, excluindo os rios efêmeros [que têm escoamento superficial
apenas durante ou imediatamente após períodos de precipitação].

A linha inicial de demarcação da largura das APPs foi alterada, reduzindo a dimensão das APPs: mede-se,
agora, não a partir do nível mais alto do corpo de água (nível alcançado com a cheia sazonal), mas sim da
“da borda da calha do leito regular”.

II - as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de: a) 100 (cem) metros,
em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal
será de 50 (cinquenta) metros; b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas;

III - as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento
de cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento;

IV - as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação
topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros;

V - as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na
linha de maior declive;

VI - as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;

VII - os manguezais, em toda a sua extensão;

VIII - as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100
(cem) metros em projeções horizontais;

IX - no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação
média maior que 25°.

X - as áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros.

XI - em veredas, a faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de 50 (cinquenta) metros, a
partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado.

129
§ 1º Não será exigida Área de Preservação Permanente no entorno de reservatórios artificiais de água que
não decorram de barramento ou represamento de cursos d’água naturais.

§ 4o Nas acumulações naturais ou artificiais de água com superfície inferior a 1 (um) hectare, fica
dispensada a reserva da faixa de proteção prevista nos incisos II e III do caput, vedada nova supressão de
áreas de vegetação nativa, salvo autorização do órgão ambiental competente do Sistema Nacional do Meio
Ambiente - Sisnama. (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).

A proteção das florestas e demais formas de vegetação que se encontrem no topo dos morros, montes,
montanhas e serras tem a finalidade de preservar a integridade dos acidentes geográficos, evitando, ainda,
enchentes e inundações nos térreos mais baixos (a vegetação constitui barreira natural).

Também, o simples efeito da vigência do Código Florestal fez com que as restingas, fixadoras de dunas ou
estabilizadoras de mangue, fossem consideradas como de preservação permanente.

As florestas de preservação permanente por efeito da lei só podem ser suprimidas por outra lei, diante
do princípio da similitude das formas.

11.2.2 Floresta de preservação permanente por ato do Poder público

A instituição dessas áreas de preservação permanente, através de ato administrativo (Decreto, via de
regra), possui conteúdo declaratório. Preenchidos os requisitos do art. 6º, a Administração deverá editar o
decreto declaratório da área de preservação permanente. É declaratório, pois “as áreas que ora estão
sendo tratadas já são consideradas protegidas desde a edição do Código Florestal”.

Art. 6º Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando declaradas de


interesse social por ato do Chefe do Poder Executivo, as áreas cobertas com
florestas ou outras formas de vegetação destinadas a uma ou mais das seguintes
finalidades:

I - conter a erosão do solo e mitigar riscos de enchentes e deslizamentos de terra e


de rocha;

II - proteger as restingas ou veredas;

III - proteger várzeas;

IV - abrigar exemplares da fauna ou da flora ameaçados de extinção;

V - proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico, cultural ou histórico;

VI - formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;

VII - assegurar condições de bem-estar público;

VIII - auxiliar a defesa do território nacional, a critério das autoridades militares.

IX - proteger áreas úmidas, especialmente as de importância internacional.

11.2.3 Regime de Proteção das Áreas de Preservação Permanente (arts. 7 e 8)

A vegetação situada em Área de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área,
possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado.

Tendo ocorrido supressão de vegetação situada em Área de Preservação Permanente, o proprietário da


área, possuidor ou ocupante a qualquer título é obrigado a promover a recomposição da vegetação,
ressalvados os usos autorizados pelo código (obrigação propter rem).

130
A obrigação prevista tem natureza real (propter rem) e é transmitida ao sucessor no caso de transferência
de domínio ou posse do imóvel rural.

Essa supressão só pode ser autorizada mediante prévio procedimento administrativo no qual fique
comprovada a utilidade pública ou interesse social e a inexistência de alternativa técnica e locacional
para o empreendimento.

A autorização é da competência do órgão ambiental estadual, com anuência prévia, quando cabível, do
órgão federal ou municipal competente (arts. 10; 11-A, III; 26, Novo Cód. Florestal).

No caso de supressão não autorizada de vegetação realizada após 22 de julho de 2008, é vedada a
concessão de novas autorizações de supressão de vegetação enquanto não cumpridas as obrigações de
recomposição.

A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente somente ocorrerá


nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental.

Houve grande alargamento das hipóteses de utilidade pública e interesse social, que permitem a
intervenção na APP e a supressão de sua vegetação.

É dispensada a autorização do órgão ambiental competente para a execução, em caráter de urgência, de


atividades de segurança nacional e obras de interesse da defesa civil destinadas à prevenção e mitigação
de acidentes em áreas urbanas.

É permitido o acesso de pessoas e animais às Áreas de Preservação Permanente para obtenção de água e
para realização de atividades de baixo impacto ambiental.

SUPRESSAO DE VEGETAÇÃO EM AREA DE SUPRESSAO DA PRÓPRIA ÁREA DE PRESERVAÇÃO


PRESERVACAO PERMANENTE PERMANENTE
A supressão de vegetação em APP pode ser A supressão de uma APP só pode ser autorizada
autorizada mediante ato administrativo. mediante lei, de acordo com o inciso III do § 1º do
art. 225 da CF.

11.2.4 APPs e Regras para áreas consolidadas

A consolidação da utilização antrópica das Áreas de Preservação Permanente foi aspecto principal da
Medida Provisória 571/12 e dos vetos da Presidente da República ao projeto de lei aprovado no Congresso
Nacional.

Art. 61-A. Nas Áreas de Preservação Permanente, é autorizada, exclusivamente, a


continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural
em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008.

Foram estabelecidas diversas condicionantes e limitações para a continuidade do uso dessas áreas. O art.
61-A traz disciplina detalhada da recomposição das áreas consolidadas, com tratamento isonômico (mais
brando para pequenos proprietários e mais severo para os grandes proprietários), especificado para cada
tipo de APP. Em matéria de APP, ficou bem clara a inexistência de direito adquirido a poluir, devendo a
propriedade se adequar à conformação legal de sua função social ambiental.

No ponto, aliás, merece destaque importante julgado do STJ relativo à aplicação intertemporal do novo
CFlo, especialmente no que diz com as regras menos protetoras do meio ambiente:

Indefiro o pedido de aplicação imediata da Lei 12.651/12, notadamente o disposto


no art. 15 do citado regramento...‘o novo Código Florestal não pode retroagir para
131
atingir o ato jurídico perfeito, direitos ambientais adquiridos e a coisa julgada,
tampouco para reduzir de tal modo e sem as necessárias compensações ambientais
o patamar de proteção de ecossistemas frágeis ou espécies ameaçadas de extinção,
a ponto de transgredir o limite constitucional intocável e intransponível da
'incumbência' do Estado de garantir a preservação e restauração dos processos
ecológicos essenciais (art. 225, § 1º, I). (AgRg no AREsp 327687)

No que se refere às áreas consolidadas, é importante ressaltar que a Lei 12.651/12 não estabeleceu
anistia universal e indiscriminada para todos que tivessem praticado desmatamento, supressão de
vegetação ou degradação de Mata Atlântica antes de sua vigência.

É dizer, este dispositivo não tem normatividade autônoma, está dentro de um capítulo que trata
"das áreas consolidadas em áreas de reserva legal", ou seja, não atinge qualquer degradação ambiental ou
supressão de vegetação que tenha ocorrida em área de proteção ambiental, mas apenas dentro de
reserva legal.

Trata de anistia muito específica e restrita a um caso concreto, a fim de evitar que esses proprietários
sejam obrigados à recuperação de uma extensão de área que antes não era considerada reserva legal, mas
que passou a ser considerada no novo Código Florestal. (neste sentido, dispõe o precedente do TRF4, da 4ª
Turma: AC 50015662920104047006).

11.2.5 Exercício do direito de propriedade em área florestal

Pelo Código Florestal, a propriedade florestal é regida pelas limitações gerais existentes, tais como normas
de vizinhança e o desempenho da função social da propriedade, delineada na Constituição e regulada pelo
Código Florestal.

A propriedade florestal possui 3 limitações principais: áreas de preservação permanente, reservas legais
e corte somente com autorização do poder público.

Verifica-se, portanto, que o direito de propriedade não é caracterizado somente pela liberdade de ação do
proprietário, contraposta a um dever geral ("erga omnes") de todos respeitarem o domínio, mas também
pelos deveres e obrigações a cargo do titular do direito de propriedade. Dessa forma, é a função social
princípio que se manifesta na estrutura do direito de propriedade, sendo que as interferências causadas
no próprio domínio por esse princípio são diversas dos seus limites externos, pois são "limitações" que
surgem com o próprio direito, sendo-lhes intrínsecas. (AC 00005315320094047007, 3ª Turma do TRF4).

Reserva legal florestal (RLF)

Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do art. 12 do Código,
com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural,
auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da
biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa.

Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a
título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de
Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação
à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei:

I - localizado na Amazônia Legal: a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em


área de florestas; b) 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de
cerrado; c) 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;

132
II - localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento).

Ficou definitivamente superada a concepção inicial do Código Florestal de 1965, de que a Reserva Legal era
um limite para o desmatamento. Agora trata-se claramente de um ônus inerente ao exercício da
propriedade, cuja responsabilidade é propter rem, acompanha a coisa, independentemente do vínculo
pessoal. Em caso de fracionamento do imóvel rural, a qualquer título, inclusive para assentamentos pelo
Programa de Reforma Agrária, será considerada a área do imóvel antes do fracionamento.

Uma novidade relevante é a possibilidade do cômputo da APP na reserva legal. Esse benefício, que poderá
ser muito útil à regularização de imóveis rurais, está, no entanto, limitado às hipóteses em que:

a) o cômputo não implique a conversão de novas áreas para o uso alternativo do solo;

b) a área a ser computada esteja conservada ou em processo de recuperação; e

c) o proprietário ou possuidor tenha requerido inclusão do imóvel no Cadastro Ambiental Rural (CAR).

Reserva Legal acima do mínimo legal - Área excedente poderá ser utilizada para fins de constituição de
servidão ambiental, Cota de Reserva Ambiental ou outros instrumentos congêneres. Poderá ser instituído
Reserva Legal em regime de condomínio ou coletiva entre propriedades rurais, respeitado o percentual
previsto no art. 12 em relação a cada imóvel.

Regime de Proteção da Reserva Legal

A Reserva Legal deve ser conservada com cobertura de vegetação nativa pelo proprietário do imóvel rural,
possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado.

Admite-se, no entanto, a exploração econômica da Reserva Legal mediante manejo sustentável,


previamente aprovado pelo órgão competente do Sisnama.

Para fins de manejo de Reserva Legal na pequena propriedade ou posse rural familiar, os órgãos
integrantes do Sisnama deverão estabelecer procedimentos simplificados de elaboração, análise e
aprovação de tais planos de manejo.

É obrigatória a suspensão imediata das atividades em área de Reserva Legal desmatada irregularmente
após 22 de julho de 2008.

Sem prejuízo das sanções administrativas, cíveis e penais cabíveis, deverá ser iniciado processo de
recomposição da Reserva Legal em até 2 (dois) anos contados a partir da data da publicação desta Lei,
devendo tal processo ser concluído nos prazos estabelecidos pelo Programa de Regularização Ambiental –
PRA.

A área de Reserva Legal deverá ser registrada no órgão ambiental competente por meio de inscrição no
CAR de que trata o art. 29, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a
qualquer título, ou de desmembramento, com as exceções previstas nesta Lei.

Na posse, a área de Reserva Legal é assegurada por termo de compromisso. A transferência da posse
implica a sub-rogação das obrigações assumidas no termo de compromisso.

O registro da Reserva Legal no CAR desobriga a averbação no Cartório de Registro de Imóveis.

O manejo florestal sustentável da vegetação da Reserva Legal com propósito comercial depende de
autorização do órgão competente.

O manejo sustentável para exploração florestal eventual sem propósito comercial, para consumo no
próprio imóvel, independe de autorização dos órgãos competentes, devendo apenas ser declarados

133
previamente ao órgão ambiental a motivação da exploração e o volume explorado, limitada a exploração
anual a 20 (vinte) metros cúbicos.

Controvérsia acerca da possibilidade de se condicionar o registro da sentença de


usucapião de imóvel sem matrícula à averbação da reserva legal ambiental. "É
possível extrair do art. 16, §8º, do Código Florestal que a averbação da reserva
florestal é condição para a prática de qualquer ato que implique transmissão,
desmembramento ou retificação de área de imóvel sujeito à disciplina da Lei
4.771/65". Extensão desse entendimento para a hipótese de aquisição originária
por usucapião, aplicando-se o princípio hermenêutico "in dubio pro natura".
Substituição da averbação no Cartório de Registro de Imóveis pelo registro no
Cadastro Ambiental Rural - CAR, por força do novo Código Florestal. Adaptação do
entendimento desta Corte Superior à nova realidade normativa, mantida a eficácia
da norma protetiva ambiental. Necessidade de prévio registro da reserva legal no
CAR, como condição para o registro da sentença de usucapião no Cartório de
Registro de Imóveis. (REsp 1356207)

Áreas Consolidadas

O proprietário ou possuidor de imóvel rural que detinha, em 22 de julho de 2008, área de Reserva Legal
em extensão inferior ao estabelecido no art. 12, poderá regularizar sua situação, independentemente da
adesão ao PRA, adotando as seguintes alternativas, isolada ou conjuntamente: I - recompor a Reserva
Legal; II - permitir a regeneração natural da vegetação na área de Reserva Legal; e III - compensar a
Reserva Legal.

11.2.5.1 Indenizabilidade da proteção florestal

A proteção florestal, seja por RFL ou por APP, não implica desapropriação, nem deve ser indenizada,
exceto se restringir o domínio ou causar alguma espécie de prejuízo.

Sendo imposições de natureza genérica, as limitações administrativas não rendem


ensejo à indenização, salvo comprovado prejuízo. Se alguma perda sofreu o
proprietário de terras situadas em área de preservação permanente, tal prejuízo
remonta à edição da Lei 4.771/65, marco inicial do prazo de prescrição. Extingue-se
em cinco anos o direito de propor ação que vise a indenização por restrições
decorrentes de atos do Poder Público. (REsp 1233257)

A jurisprudência do STJ sedimentou o entendimento de que não há indenização pela só limitação


administrativa. Se a limitação vai ao ponto de privar o seu proprietário do uso pleno, indeniza-se na
mesma proporção do prejuízo causado. 3. Área de preservação permanente que impede o uso da
propriedade, mas onde não é possível haver exploração econômica do manancial vegetal. Indenização
limitada à terra nua, não se estendendo à cobertura vegetal. (REsp 167070/SP)

A desapropriação indireta somente se dá com o efetivo desapossamento do imóvel em favor do ente


expropriante, tal não ocorrendo com a simples limitação decorrente da criação de área de preservação
permanente, situação em que o proprietário mantém o domínio da gleba, mas com restrições impostas
por norma de direito ambiental. 2. Essa situação, por caracterizar-se como limitação administrativa,
autoriza seja o proprietário indenizado, limitada a sua pretensão, no entanto, ao prazo prescricional
quinquenal de que trata o art. 10 do Decreto-Lei 3.365/1941, disposição de regência específica da matéria.
(AgRg nos EDcl no REsp 1417632/MG)
Cumpre frisar ainda que o TRF4 possui entendimento na linha de que o exercício de eventual pretensão neste sentido tem como
marco inicial do prazo a data do fato que teria ensejado à redução do proveito econômico, o que não se confunde com a data da
cominação da multa administrativa. (nesta linha: AC 00004596620094047007, da 3ª Turma).

134
A desapropriação indireta pressupõe três situações, quais sejam: (I) apossamento do bem pelo Estado sem
prévia observância do devido processo legal; (II) afetação do bem, ou seja, destiná-lo à utilização
pública; e (III) irreversibilidade da situação fática a tornar ineficaz a tutela judicial específica. A edição do
Decreto Federal n. 750/93, que os embargantes reputam ter encerrado desapropriação indireta em sua
propriedade, deveras, tão somente vedou o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou em
estados avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica, sendo certo que eles mantiveram a posse do
imóvel. Logo, o que se tem é mera limitação administrativa. As vedações contidas no Decreto Federal n.
750/93 não são capazes de esvaziar o conteúdo econômico da área ao ponto de ser decretada a sua perda
econômica. Recurso de embargos de divergência conhecido e não provido. (STJ. EREsp 922.786/SC, Rel.
Min. Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 15/9/2009).

Por outro lado, o STJ já decidiu em inúmeras oportunidades que a indenização referente à desapropriação
de propriedades detentoras de APP's não deve abranger a área de preservação permanente por esta não
ser passível de exploração econômica, senão vejamos: Nas demandas expropriatórias, é incabível a
indenização da cobertura vegetal componente de área de preservação permanente. (REsp 1090607/SC)

Com relação à cobertura vegetal (RFL), quando o imóvel for desapropriado, o STJ diz que é necessária a
demonstração de exploração econômica (lícita) para o recebimento de indenização:

É possível a indenização em separado da cobertura vegetal somente se: a)


demonstrada a exploração econômica anteriormente aos atos de expropriação; b)
comprovada a viabilidade de exploração da mata nativa, tanto sob o aspecto da
licitude, à luz das normas ambientais pertinentes, quanto do ponto de vista
econômico, sopesados os custos de exploração em confronto com as estimativas
de ganho (REsp 1395597/MT).

A área de reserva legal de que trata o § 2° do art. 16 do Código Florestal é


restrição imposta à área suscetível de exploração, de modo que não se inclui na
área de preservação permanente. Não se permite o corte raso da cobertura
florística nela existente. Assim, essa área pode ser indenizável, embora em valor
inferior ao da área de utilização irrestrita, desde que exista plano de manejo
devidamente confirmado pela autoridade competente. (REsp 867085/PR)

O STF segue orientação diametralmente oposta, pugnando pela indenizabilidade das áreas de APP e da
cobertura vegetal nos processos de desapropriação: O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento
de que as áreas referentes à cobertura vegetal e à preservação permanente devem ser indenizadas, não
obstante a incidência de restrição ao direito de propriedade que possa incidir sobre todo o imóvel que
venha a ser incluído em área de proteção ambiental. (AI 653062)

Uma situação interessante no que diz respeito às desapropriações indiretas é referente à legitimidade
passiva ad causam da União quando estas são manejadas tendo por causa de pedir atos decorrentes da
implantação do Parque Nacional, isto é, quando os atos constitutivos da hipótese de desapropriação
indireta decorrem da constituição de UC por meio de Decreto da Chefia do Poder Executivo Federal.

Nestas hipóteses, a União é indubitavelmente parte legítima, uma vez que a unidade de conservação da
natureza foi por ela instituída mediante decreto da Chefia do Poder Executivo Federal e tendo em vista
que a própria Lei nº 9.985/2000 (SNUC), enquadra os Parques Nacionais na categoria de Unidade
de Proteção Integral, com posse e domínio públicos, afirmando a necessidade de que as áreas privadas,
abrangidas nos limites dos Parques, sejam desapropriadas. (nesta linha consta o precedente contido da
Apelação/Remessa Necessária 50082167220134047205, da 3ª Turma do TRF4).

135
“Dumping ambiental”: A Câmara de Comércio Exterior - CAMEX é autorizada a adotar medidas de
restrição às importações de bens de origem agropecuária ou florestal produzidos em países que não
observem normas e padrões de proteção do meio ambiente compatíveis com as estabelecidas pela
legislação brasileira”.

11.3 Gestão das florestas públicas - Lei 11.284/2006

A Lei 11.284/2006 estabelece no plano jurídico um sistema de gestão de florestas destinado a criar
produtos e serviços em proveito do desenvolvimento sustentável, concebendo a floresta como um
instrumento de exploração econômica eficiente e de largo alcance, compreendendo: I - a criação de
florestas nacionais, estaduais e municipais (...) e sua gestão direta; II - a destinação de florestas públicas às
comunidades locais, nos termos do art. 6º desta Lei; III - a concessão florestal, incluindo florestas naturais
ou plantadas e as unidades de manejo das áreas protegidas referidas no inciso I do caput deste artigo.

A lei 11.284/2006 é tida como norma geral, de modo que as leis estaduais e municipais deverão se adequar
às suas normas de contornos gerais, bem como, pela competência suplementar, poderão elaborar normas
supletivas e complementares e estabelecer padrões relacionados à gestão florestal.

11.3.1 Princípios da gestão de florestas públicas

Constituem princípios da gestão de florestas públicas:

I - a proteção dos ecossistemas, do solo, da água, da biodiversidade e valores culturais associados, bem
como do patrimônio público;

II - o estabelecimento de atividades que promovam o uso eficiente e racional das florestas e que
contribuam para o cumprimento das metas do desenvolvimento sustentável local, regional e de todo o
País;

III - o respeito ao direito da população, em especial das comunidades locais, de acesso às florestas
públicas e aos benefícios decorrentes de seu uso e conservação;

IV - a promoção do processamento local e o incentivo ao incremento da agregação de valor aos produtos


e serviços da floresta, bem como à diversificação industrial, ao desenvolvimento tecnológico, à utilização
e à capacitação de empreendedores locais e da mão-de-obra regional;

V - o acesso livre de qualquer indivíduo às informações referentes à gestão de florestas públicas, nos
termos da Lei no 10.650, de 16 de abril de 2003;

VI - a promoção e difusão da pesquisa florestal, faunística e edáfica, relacionada à conservação, à


recuperação e ao uso sustentável das florestas;

VII - o fomento ao conhecimento e a promoção da conscientização da população sobre a importância da


conservação, da recuperação e do manejo sustentável dos recursos florestais;

VIII - a garantia de condições estáveis e seguras que estimulem investimentos de longo prazo no manejo,
na conservação e na recuperação das florestas.

11.3.2 Da gestão direta

O Poder Público poderá exercer diretamente a gestão de florestas nacionais, estaduais e municipais,
sendo-lhe facultado, para execução de atividades subsidiárias, firmar convênios, termos de parceria,
contratos ou instrumentos similares com terceiros, observados os procedimentos licitatórios e demais
exigências legais pertinentes.

136
A duração dos contratos e instrumentos similares a que se refere o caput deste artigo fica limitada a 120
(cento e vinte) meses.

Nas licitações para as contratações, além do preço, poderá ser considerado o critério da melhor técnica
previsto no inciso II do caput do art. 26 desta Lei.

11.3.3 Da destinação às comunidades locais

As comunidades locais são “populações tradicionais e outros grupos humanos, organizados por gerações
sucessivas, com estilo de vida relevante à conservação e à utilização sustentável da diversidade
biológica” e, antes da realização das concessões florestais, as florestas públicas ocupadas ou utilizadas
por comunidades locais serão identificadas para a destinação, pelos órgãos competentes.

A destinação pode ser feita nas seguintes formas: I - criação de reservas extrativistas e reservas de
desenvolvimento sustentável; II - concessão de uso, por meio de projetos de assentamento florestal, de
desenvolvimento sustentável, agroextrativistas ou outros similares; III - outras formas previstas em lei.

O Poder Público poderá, com base em condicionantes socioambientais definidas em regulamento,


regularizar posses de comunidades locais sobre as áreas por elas tradicionalmente ocupadas ou utilizadas,
que sejam imprescindíveis à conservação dos recursos ambientais essenciais para sua reprodução física e
cultural, por meio de concessão de direito real de uso ou outra forma admitida em lei, dispensada
licitação.

Estas destinações serão feitas de forma não onerosa para o beneficiário e efetuada em ato administrativo
próprio (art. 6º, § 1º).

A previsão dos instrumentos de destinação acima mencionados não impede que as comunidades locais
participem das licitações destinadas à concessão florestal, por meio de associações comunitárias,
cooperativas ou outras pessoas jurídicas admitidas.

11.3.4 Concessão florestal

É “a delegação onerosa, feita pelo poder concedente, do direito de praticar manejo florestal sustentável
para exploração de produtos e serviços numa unidade de manejo, mediante licitação, à pessoa jurídica,
em consórcio ou não, que atenda às exigências do respectivo edital de licitação e demonstre capacidade
para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado”.

A concessão florestal é uma espécie de contrato administrativo por meio do qual o Poder Público, por
meio de licitação, concede ao particular o direito de explorar os recursos florestais (produtos e serviços) de
forma racional e sustentável, de acordo com o Plano de Manejo Florestal Sustentável – PMFS aprovado
pelo governo.

Já a unidade de manejo é o “perímetro definido a partir de critérios técnicos, socioculturais, econômicos


e ambientais, localizado em florestas públicas, objeto de um Plano de Manejo Florestal Sustentável -
PMFS, podendo conter áreas degradadas para fins de recuperação por meio de plantios florestais” (art.
3º, VII e VIII).

A concessão florestal será autorizada em ato do poder concedente e formalizada mediante contrato, que
deverá observar os termos desta Lei, das normas pertinentes e do edital de licitação (art. 7º). O poder
concedente publicará, previamente ao edital de licitação, ato justificando a conveniência da concessão
florestal, caracterizando seu objeto e a unidade de manejo (art. 12). Também, as licitações para concessão
florestal serão realizadas na modalidade concorrência e outorgadas a título oneroso, sendo vedada a
declaração de inexigibilidade prevista na Lei 8666/93.

137
A publicação do edital de licitação de cada lote de concessão florestal deverá ser precedida de audiência
pública, por região, realizada pelo órgão gestor, nos termos do regulamento, sem prejuízo de outras
formas de consulta pública.

São elegíveis para fins de concessão as unidades de manejo previstas no Plano Anual de Outorga
Florestal – PAOF, que é proposto pelo órgão gestor e definido pelo poder concedente, contendo a
descrição de todas as florestas públicas a serem submetidas a processos de concessão no ano em que
vigorar (art. 10), o qual será submetido ao órgão consultivo da respectiva esfera de governo. Se for federal,
ainda requer a manifestação da SPU/MPOG e se situado em faixa de fronteira, deverá ouvir o Conselho de
Defesa Nacional.

11.3.4.1 Objeto da concessão

A concessão florestal terá como objeto a exploração de produtos e serviços florestais, contratualmente
especificados, em unidade de manejo de floresta pública, com perímetro georreferenciado, registrada no
respectivo cadastro de florestas públicas e incluída no lote de concessão florestal.

É vedada a outorga de qualquer dos seguintes direitos no âmbito da concessão florestal (art. 16, §1º):

I - titularidade imobiliária ou preferência em sua aquisição;

II - acesso ao patrimônio genético para fins de pesquisa e desenvolvimento, bioprospecção ou constituição


de coleções;

III - uso dos recursos hídricos acima do especificado como insignificante, nos termos da Lei no 9.433, de 8
de janeiro de 1997;

IV - exploração dos recursos minerais;

V - exploração de recursos pesqueiros ou da fauna silvestre;

VI - comercialização de créditos decorrentes da emissão evitada de carbono em florestas naturais.

11.3.4.2 Licenciamento ambiental

Prevê-se, ainda, licenciamento ambiental, compreendendo a licença prévia e a licença de operação, não se
exigindo a licença de instalação.

A licença prévia para uso sustentável da unidade de manejo será requerida pelo órgão gestor, mediante a
apresentação de relatório ambiental preliminar ao órgão do SISNAMA.

O início das atividades florestais na unidade de manejo somente poderá ser efetivado com a aprovação
do respectivo PMFS pelo órgão do SISNAMA e com a obtenção da licença de operação pelo
concessionário.

Há descrição de procedimento licitatório específico, utilizando-se da Lei 8666/93 supletivamente, inclusive


no que tange ao contrato administrativo, nos arts. 19 a 35.

O prazo dos contratos de concessão florestal será estabelecido de acordo com o ciclo de colheita ou
exploração, considerando o produto ou grupo de produtos com ciclo mais longo incluído no objeto da
concessão, podendo ser fixado prazo equivalente a, no mínimo, um ciclo e, no máximo, 40 (quarenta)
anos. Mas se for contrato de concessão exclusivo para exploração de serviços florestais será de, no
mínimo, 5 (cinco) e, no máximo, 20 (vinte) anos.

Prazos do contrato de concessão florestal

138
Exploração de produtos florestais Apenas serviços florestais

Mínimo: 01 ciclo Máximo: 40 anos Mínimo: 05 anos Máximo: 20 anos

11.3.5 Conceitos relevantes (art. 3o )

I - florestas públicas: florestas, naturais ou plantadas, localizadas nos diversos biomas brasileiros, em bens
sob o domínio da União, dos Estados, dos Municípios, do Distrito Federal ou das entidades da
administração indireta;

II - recursos florestais: elementos ou características de determinada floresta, potencial ou efetivamente


geradores de produtos ou serviços florestais;

III - produtos florestais: produtos madeireiros e não madeireiros gerados pelo manejo florestal sustentável;

IV - serviços florestais: turismo e outras ações ou benefícios decorrentes do manejo e conservação da


floresta, não caracterizados como produtos florestais;

V - ciclo: período decorrido entre 2 (dois) momentos de colheita de produtos florestais numa mesma área;

VI - manejo florestal sustentável: administração da floresta para a obtenção de benefícios econômicos,


sociais e ambientais, respeitando-se os mecanismos de sustentação do ecossistema objeto do manejo e
considerando-se, cumulativa ou alternativamente, a utilização de múltiplas espécies madeireiras, de
múltiplos produtos e subprodutos não madeireiros, bem como a utilização de outros bens e serviços de
natureza florestal;

VII - concessão florestal: delegação onerosa, feita pelo poder concedente, do direito de praticar manejo
florestal sustentável para exploração de produtos e serviços numa unidade de manejo, mediante licitação,
à pessoa jurídica, em consórcio ou não, que atenda às exigências do respectivo edital de licitação e
demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado;

VIII - unidade de manejo: perímetro definido a partir de critérios técnicos, socioculturais, econômicos e
ambientais, localizado em florestas públicas, objeto de um Plano de Manejo Florestal Sustentável - PMFS,
podendo conter áreas degradadas para fins de recuperação por meio de plantios florestais;

XI - auditoria florestal: ato de avaliação independente e qualificada de atividades florestais e obrigações


econômicas, sociais e ambientais assumidas de acordo com o PMFS e o contrato de concessão florestal,
executada por entidade reconhecida pelo órgão gestor, mediante procedimento administrativo específico;

11.3.6 Recursos financeiros oriundos dos preços da concessão florestal

Os recursos financeiros oriundos dos preços da concessão florestal, via de regra, serão destinados aos
Estados, aos Municípios e ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal no sentido de propiciar
recursos econômicos em face do uso da floresta como bem ambiental.

A Lei 11.284/06 e o Decreto (regulamentador) Federal nº 6.063/2007, preveem o pagamento de duas


formas de preço pela outorga:

139
1. O preço sobre os custos de realização do edital de licitação da concessão florestal federal de cada
unidade de manejo, que deve ser pago ao concessionário, excluído do custo do edital aqueles relacionados
às ações realizadas pelo poder público e que, por sua natureza, geram benefícios permanentes ao
patrimônio público (art. 37, Decreto 6063/2007).

2. O preço da concessão florestal: calculado em função da quantidade de produto ou serviço auferido do


objeto da concessão ou do faturamento líquido ou bruto.

Resultado da exploração, excluído o valor mínimo do art. 36, §3º; (art. 39, II)

Estados = 30% Municípios = 30% FNDF = 40%

Resultado da exploração, excluído o valor mínimo do art. 36, §3º, no caso de concessão florestal de
unidades localizadas em florestas nacionais criadas pela União; (art. 39, §1º, II)

Estado = 20% Município = 20% FDF = 20% ICM-Bio = 40%

O art. 36, §3º da Lei 11284/06, prevê que “será fixado, nos termos de regulamento, valor mínimo a ser
exigido anualmente do concessionário, independentemente da produção ou dos valores por ele auferidos
com a exploração do objeto da concessão”, valor este que integrará os pagamentos anuais devidos pelo
concessionário. A distribuição se dá pela seguinte forma:

IBAMA= 30%; para utilização restrita em atividades de


controle e fiscalização ambiental de atividades
Órgão gestor da floresta = 70%
florestais, de unidades de conservação e do
desmatamento.

Se oriundos dos preços da concessão florestal de unidades localizadas em florestas nacionais criadas
pela União: o valor integral vai para o órgão gestor (art. 39, §1º, I).

Ponto 12 - Áreas de preservação permanente e Unidades de conservação.

Áreas de Preservação Permanente – Ponto 11

Unidades de Conservação – Ponto 5

Ponto 13. Modificação dos genes pelo homem e meio ambiente.

1)Natureza jurídica do Patrimônio Genético: O patrimônio genético é bem ambiental de uso comum do
povo brasileiro.

2)Princípios

2.1) Princípios que fundamentam a proteção do patrimônio genético extraídos da Constituição Federal,
da Declaração Universal do Genoma Humano e dos Direitos do Homem e da Declaração Ibero-Americana
sobre Ética e Genética:

a) Princípio da integridade do ser humano: visa direcionar as manipulações em genes de seres


humanos, no sentido de não interferir na composição do material genético da espécie humana,
com o intuito de "melhorar" determinadas características fenotípicas, utilizando-se de genes de
outra espécies. Proíbe-se a eugenia (estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar
ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja física ou mentalmente. Embasou
140
cientificamente o holocausto), e, também, não se permite a criação de uma espécie inferior, criada
simplesmente para gerar órgãos para doação.
b) Princípio da diversidade: visa garantir a variedade da espécie humana.
c) Princípio da identidade: o ser humano não pode ser reduzido às suas informações genéticas;
d) Princípio da não discriminação: a pessoa não pode ser discriminada por possuir um gene
defeituoso;
e) Princípio da não disponibilidade econômica: o patrimônio genético humano não deve ser aferido
economicamente em seu estado natural, para a obtenção de ganho financeiro.
f) Princípio do consentimento informado: a pessoa tem o direito de saber a qual terapia será
submetida. É obrigatória a manifestação da vontade, livre e espontânea da pessoa envolvida, e
caso não esteja em condições de consentir, deverá ser representada por uma pessoa legalmente
reconhecida, ou de acordo com a lei, para a satisfação da vontade da pessoa.
g) Princípio da confidencialidade: o material genético não pode ser divulgado, a não ser que haja
autorização expressa.
h) Princípio da informação: o detentor do material genético a ser manipulado deve receber todas as
informações necessárias para compreender os resultados com clareza e conscientizar-se das
conseqüências que poderão advir da referida manipulação.

2.2) Princípios sobre a realização das pesquisas:

a) Princípio da precaução: antes da realização de qualquer pesquisa, tratamento ou diagnóstico no


patrimônio genético humano deve ser realizada uma prévia avaliação dos potenciais riscos e
benefícios a serem incorridos, além de atender às exigências legais vigentes no território nacional.
b) Princípio da prudência: todas as entidades que estiverem ligadas à pesquisa deverão agir com
prudência, para garantir a preservação da dignidade da pessoa humana.
c) Princípio da vulnerabilidade: diz respeito ao estado da pessoa envolvida, que por quaisquer razões
ou motivos, tenham a sua capacidade de autodeterminação reduzida, principalmente para
consentir a realização da pesquisa, bem como a falta de conhecimento técnico suficiente para a
realização do experimento.
a) Princípio da necessidade: todo experimento científico a ser realizado no material genético humano
deve comprovar a real necessidade dessa ocorrência para o avanço do conhecimento humano.
d) Princípio da qualidade da pesquisa: assegura que as atividades exercidas no material genético
terão especificidade e sensibilidade adequadas e serão realizadas em laboratórios capacitados com
acompanhamento de uma equipe de cientistas e de uma comissão ética.
e) Princípio da dignidade da pessoa humana: visa impedir que os indivíduos sejam reduzidos a suas
características genéticas nas pesquisas científicas. A singularidade e a diversidade do genoma
humano devem ser respeitadas em sua totalidade.
f) Princípio da responsabilidade: as entidades de pesquisa tanto as que agirão sobre o genoma, como
os comitês de revisão ética e científica - assumirão todos os riscos decorrentes de suas atividades
sobre o patrimônio genético humano, independentemente de qualquer circunstância, em face dos
danos que poderão ocasionar para toda a espécie humana.

3) Legislação sobre biossegurança:

Lei nº 6.938/81: Estabeleceu a Política e o Sistema Nacional de Meio Ambiente. Com base nesta lei o
CONAMA deliberou as Resoluções 237/97 e nº 305/02.

Resolução Conama nº 237/97: Regulamenta os aspectos de licenciamento ambiental e, no anexo I,


informa as atividades ou empreendimentos sujeitos ao licenciamento, tais como: introdução de espécies
exóticas e/ou geneticamente modificadas; e - uso da diversidade biológica pela biotecnologia.

141
Resolução Conama nº 305/02: Trata do licenciamento ambiental de atividades e empreendimentos que
façam uso de OGMs e derivados. (Deve, atualmente, ser aplicada naquilo que não contrariar a LB);

Lei n°8.078 e Decreto nº4.680: Para o CDC um dos direitos básicos do consumidor é o de obter informação
adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta, inclusive, a respeito
de suas características e composição, bem como sobre os riscos que apresentem. Já a rotulagem de
alimentos destinados à alimentação humana e animal que contenham ou sejam produzidos a partir de
OGMs foi regulamentada pelo Decreto nº 4.680, de 24 de abril de 2003.

Instrução Normativa Interministerial nº1: Definiu os procedimentos complementares para aplicação do


Decreto nº4.680/03.

Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança: O Protocolo é o primeiro acordo internacional para o


controle transfronteiriço de organismos geneticamente modificados (OGMs), com regras de transporte,
estocagem, manipulação e uso seguro de organismos vivos modificados - OVMs resultantes da
biotecnologia moderna e que podem ter efeitos adversos para conservação e utilização sustentável da
diversidade biológica e oferecer riscos à saúde humana. O Protocolo expressamente prevê o Princípio da
Precaução.

Lei nº11.105 ou nova Lei de Biossegurança e Decreto nº5.591/05: A Lei de Biossegurança estabelece
normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos
geneticamente modificados - OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança - CNBS,
reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio e dispõe sobre a Política Nacional de
Biossegurança - PNB.

4)Conceitos

Bioética: é a ciência que tem como objetivo indicar os limites e as finalidades da intervenção do homem
sobre a vida, identificar os valores de referência racionalmente proponíveis, denunciar os riscos das
possíveis aplicações.

Biodireito: positiva as regras éticas, garantindo não só o direito a vida, mas também uma melhor qualidade
de vida, do paciente e da relação, garantindo a integridade física do paciente e a integridade do patrimônio
genético.

Biossegurança: conjunto de normas legais e regulamentares que estabelecem critérios e técnicas para a
manipulação genética, no sentido de evitar danos ao meio ambiente e à saúde humana(Luís Paulo
Sirvinskas).

5) Lei da Biossegurança

A lei da biossegurança não está adstrita ao patrimônio genético humano, mas compreende também a
informação de origem genética contida em amostras de todo ou de parte de espécime vegetal, fúngico,
microbiano ou animal.

A norma trata expressamente do princípio da precaução.

5.1) Competência para legislar sobre patrimônio genético: Na ADI 3035 o STF declarou inconstitucional Lei
do Paraná que invadia a competência da União. Naquela ação o STF afirmou que a Lei paranaense invadia a
competência privativa da União no que se referia à importação, comercialização e portos e violava a
competência concorrente quanto à matéria ambiental, produção e consumo, vez que existente norma
federal sobre o tema.
142
“Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada contra a lei estadual paranaense de
no 14.162, de 27 de outubro de 2003, que estabelece vedação ao cultivo, a
manipulação, a importação, a industrialização e a comercialização de organismos
geneticamente modificados. Alegada violação aos seguintes dispositivos
constitucionais: art. 1o; art. 22, incisos I, VII, X e XI; art. 24, I e VI; art. 25 e art. 170,
caput, inciso IV e parágrafo único. Ofensa à competência privativa da União e das
normas constitucionais relativas às matérias de competência legislativa
concorrente. (ADI 3035)”.

Ocorrência de substituição - e não suplementação - das regras que cuidam das


exigências, procedimentos e penalidades relativos à rotulagem informativa de
produtos transgênicos por norma estadual que dispôs sobre o tema de maneira
igualmente abrangente. Extrapolação, pelo legislador estadual, da autorização
constitucional voltada para o preenchimento de lacunas acaso verificadas na
legislação federal. (STF. ADI 3645)

A regulamentação das atividades envolvendo OGMs através de lei federal, que


define as regras de caráter geral, homenageia o princípio da predominância do
interesse, na medida em que o controle e a fiscalização dessas atividades não se
limita ao interesse regional deste ou daquele Estado-membro, mas possui
indiscutível alcance nacional. (STJ. REsp 592.682/RS)

OBS: Notícia extraída do site do STF, em 25/08/2016, informou que o ministro Gilmar Mendes, deu
provimento ao Recurso Ordinário em Mandado de Segurança (RMS) 26277, para determinar à União que
permita o acesso do Estado do Paraná aos documentos firmados com os produtores rurais daquela
unidade da federação, no que diz respeito à utilização de organismos geneticamente modificados
(transgênicos) sem origem certificada, relativos à safra de 2004, sobretudo, diante do direito fundamental
de acesso à informação.

13.1 Atividades e pesquisas com OGM

As atividades e projetos que envolvam OGM e seus derivados ficam restritos ao âmbito de entidades de
direito público ou privado, sendo vedada às pessoas físicas as atividades e projetos com OGM, de forma
autônoma e independente, ainda que mantenham vínculo com pessoas jurídicas.
A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio é o órgão competente para conceder aos
interessados autorização para a realização dessas atividades.
Quem financia ou patrocina tais atividades deve exigir a apresentação de Certificado de Qualidade em
Biossegurança, emitido pela CTNBio, sob pena de se tornarem co-responsáveis pelos eventuais efeitos
decorrentes do descumprimento da Lei ou de sua regulamentação.

13.2 Células-Tronco Embrionárias

O Art. 5º da LB permite, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias


obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo
procedimento, desde que sejam embriões inviáveis; ou sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou
mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de
completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento, desde que haja, em qualquer caso
o consentimento dos genitores, sendo vedada a comercialização do material biológico (descumprimento
da regra implica no crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997).

143
O referido dispositivo teve sua constitucionalidade questionada através da ADI (3510), que, ao final foi
julgada improcedente.

Asseverou-se na decisão que as pessoas físicas ou naturais seriam apenas as que sobrevivem ao parto,
dotadas do atributo a que o art. 2º do Código Civil denomina personalidade civil, assentando que a
Constituição Federal, quando se refere à "dignidade da pessoa humana" (art. 1º, III), aos "direitos da
pessoa humana" (art. 34, VII, b), ao "livre exercício dos direitos... individuais" (art. 85, III) e aos "direitos
e garantias individuais" (art. 60, § 4º, IV), estaria falando de direitos e garantias do indivíduo-pessoa.
Assim, numa primeira síntese, a Carta Magna não faria de todo e qualquer estágio da vida humana um
autonomizado bem jurídico, mas da vida, que já é própria de uma concreta pessoa, porque nativiva, e
que a inviolabilidade de que trata seu art. 5º diria respeito exclusivamente a um indivíduo já
personalizado. Enfatizou-se, ainda, que a lei em questão se referiria, por sua vez, a embriões derivados
de uma fertilização artificial, obtida fora da relação sexual, e que o emprego das células-tronco
embrionárias para os fins a que ela se destina não implicaria aborto. Considerou, também, que, se à lei
ordinária seria permitido fazer coincidir a morte encefálica com a cessação da vida de uma certa pessoa
humana, a justificar a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo ainda fisicamente pulsante para fins
de transplante, pesquisa e tratamento (Lei 9.434/97), e se o embrião humano de que trata o art. 5º da
Lei da Biossegurança é um ente absolutamente incapaz de qualquer resquício de vida encefálica, a
afirmação de incompatibilidade do último diploma legal com a Constituição haveria de ser afastada.
(STF, ADI 3510).

13.3 Proibições da LB (art. 6º):

I – implementação de projeto relativo a OGM sem a manutenção de registro de seu acompanhamento


individual;

II – engenharia genética em organismo vivo ou o manejo in vitro de ADN/ARN natural ou recombinante,


realizado em desacordo com as normas previstas nesta Lei;

III – engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano e embrião humano;

IV – clonagem humana;

V – destruição ou descarte no meio ambiente de OGM e seus derivados em desacordo com as normas
estabelecidas pela CTNBio, pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização,

VI – liberação no meio ambiente de OGM ou seus derivados, no âmbito de atividades de pesquisa, sem a
decisão técnica favorável da CTNBio e, nos casos de liberação comercial, sem o parecer técnico favorável
da CTNBio, ou sem o licenciamento do órgão ou entidade ambiental responsável, quando a CTNBio
considerar a atividade como potencialmente causadora de degradação ambiental, ou sem a aprovação do
Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, quando o processo tenha sido por ele avocado, na forma
desta Lei e de sua regulamentação;

VII – a utilização, a comercialização, o registro, o patenteamento e o licenciamento de tecnologias


genéticas de restrição do uso.

13.4 Responsabilidade Civil e Administrativa

A responsabilidade civil por descumprimento da LB é objetiva e solidária, artigo 20 LB.


Já a Responsabilidade Administrativa e suas respectivas sanções estão previstas no artigo 21 da LB.
144
Os alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou
sejam produzidos a partir de OGM ou derivados deverão conter informação nesse sentido em seus
rótulos, conforme regulamento (art. 40).
As regras de rotulagem de alimentos e ingredientes com OGM estão a cargo do Decreto 4.680/02 que
estabelece no seu art. 2° que "Na comercialização de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao
consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente
modificados, com presença acima do limite de impor certo produto, o consumidor deverá ser informado
da natureza transgênica desse produto. 6. O art. 2°, caput, do Decreto 4.680/23 é ilegal em face do art.
40 da Lei 11.105/05 que regulamenta os incisos II, IV e V, do art. 225, § 1°, Da CF/88 e estabelece normas
e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados e seus
derivados. 7. O art. 40 da Lei 11.105/05 estabelece a rotulagem compulsória de produtos transgênicos e
seus derivados e ao art 3°, VI, conceitue OGM como aquele cujo material genético ADNAR tenha sido
modificado por técnica de engenharia genética e o inciso, VI, defini organismos derivados de 0CM como
o produto que não possua capacidade autônoma de replicação ou que não contenha forma viável de
OCM. 8. Produtos alimentares em porcentual de transgênia abaixo de 1% (um por cento), não sendo
rotulados como OGM's, induzem o consumidor em erro, pois é omitida informação quanto à origem
propriedade e características, impossibilitando aos consumidores a escolha de alimentos provenientes
de modificação genética e outros sem essa peculiaridade. (AC 0000471-35.2007.4.01.4000 / PI)
Obs.: notícia extraída no site do STF, de 24 de maio de 2016, informou que o ministro Edson Fachin, julgou
improcedente reclamação ajuizada pela União contra acórdão da 5ª turma do TRF da 1ª região, que
garantiu a indicação no rótulo de alimentos que utilizam ingredientes geneticamente modificados,
independentemente da quantidade presente. A decisão do TRF acolheu pedido do Idec para que fossem
rotulados quaisquer teores de transgênicos e afastou a aplicação do decreto 4.680/03, que flexibiliza a
exigência de rotulagem apenas para produtos que contêm mais de 1% de ingredientes geneticamente
modificados. O Tribunal considerou que o direito à informação previsto no CDC se sobrepõe ao decreto.
Em sua decisão, o ministro Fachin pontuou que o afastamento da incidência do ato normativo se deu com
base na sua incompatibilidade com a legislação infraconstitucional (CDC), de tal forma que a não aplicação
da norma não teve como fundamento, explícito ou implícito, a incompatibilidade em relação à
Constituição.

13.5 Órgãos e entidades de biossegurança no Brasil

Conselho Nacional de Biossegurança – Cnbs


O CNBS é órgão de assessoramento superior, vinculado ao Presidente da República, e tem a missão de
auxiliar a formulação e a implantação da Política Nacional de Biossegurança. Segundo a doutrina, tal órgão
possui natureza política, e não técnica. Suas decisões não estão adstritas ao juízo formulado pela CTNBio,
ainda que possa utilizar os subsídios técnicos fornecidos por esta Comissão. O juízo, portanto, formulado
pelo CNBS é de conveniência e oportunidade, ainda que deva observar o princípio da legalidade.
Os membros do CNBS estão elencados no art. 9 LB. Já as atribuições do órgão são as seguintes:
I – fixar princípios e diretrizes para a ação administrativa dos órgãos e entidades federais com
competências sobre a matéria;
II – analisar, a pedido da CTNBio, quanto aos aspectos da conveniência e oportunidade socioeconômicas e
do interesse nacional, os pedidos de liberação para uso comercial de OGM e seus derivados;
III – avocar e decidir, em última e definitiva instância, com base em manifestação da CTNBio e, quando
julgar necessário, dos órgãos e entidades referidos no art. 16 desta Lei, no âmbito de suas competências,
sobre os processos relativos a atividades que envolvam o uso comercial de OGM e seus derivados;
Sempre que o CNBS deliberar favoravelmente à realização da atividade analisada, encaminhará sua
manifestação aos órgãos e entidades de registro e fiscalização referidos no art. 16 desta Lei.
Sempre que o CNBS deliberar contrariamente à atividade analisada, encaminhará sua manifestação à
CTNBio para informação ao requerente.

145
O Conselho reunir-se-á sempre que convocado pelo Ministro Chefe da Casa Civil, ou mediante provocação
da maioria absoluta de seus membros. A reunião do CNBS poderá ser instalada com a presença de 6 (seis)
de seus membros e as decisões serão tomadas com votos favoráveis da maioria absoluta.
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNbio
Trata-se de um órgão eminentemente técnico. Integra o Ministério da Ciência e Tecnologia, sendo uma
instância colegiada multidisciplinar de caráter consultivo e deliberativo, para prestar apoio técnico e de
assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação da PNB de OGM e
seus derivados, bem como no estabelecimento de normas técnicas de segurança e de pareceres técnicos
referentes à autorização para atividades que envolvam pesquisa e uso comercial de OGM e seus
derivados, com base na avaliação de seu risco zoofitossanitário, à saúde humana e ao meio ambiente.
As decisões da CTNbio referentes à Biossegurança prevalecem sobre àquelas proferidas por qualquer outro
órgão administrativo, à exceção do CNBS. Nesta seara, convém ponderar que é a CTNbio que detém a
prerrogativa de classificar determinada atividade que utilize OGMs como causadora de “significativo
impacto ambiental”, e, assim, estabelecer o cabível EIA/RIMA.
STJ - Os estudos de impacto ambiental, conquanto previstos na CF/88, são exigidos, na forma da lei, nos
casos de significativa degradação ambiental. No sistema normativo infraconstitucional, o EIA e o RIMA não
constituem documentos obrigatórios para realização de experimentos com OGMs e derivados, salvo
quando, sob o ponto de vista técnico do órgão federal responsável (CTNBio), forem necessários.”
Constituída por 27 (vinte e sete) cidadãos brasileiros de reconhecida competência técnica, de notória
atuação e saber científicos, com grau acadêmico de doutor e com destacada atividade profissional nas
áreas de biossegurança, biotecnologia, biologia, saúde humana e animal ou meio ambiente.
Cada membro efetivo terá um suplente. Terão mandato de 2 (dois) anos, renovável por até mais 2 (dois)
períodos consecutivos. Devem pautar a sua atuação pela observância estrita dos conceitos ético-
profissionais, sendo vedado participar do julgamento de questões com as quais tenham algum
envolvimento de ordem profissional ou pessoal, sob pena de perda de mandato, na forma do regulamento.
As decisões da CTNBio serão tomadas com votos favoráveis da maioria absoluta de seus membros.
Competências: I – estabelecer normas para as pesquisas com OGM e derivados de OGM; II – estabelecer
normas relativamente às atividades e aos projetos relacionados a OGM e seus derivados; III – estabelecer,
no âmbito de suas competências, critérios de avaliação e monitoramento de risco de OGM e seus
derivados; IV – proceder à análise da avaliação de risco, caso a caso, relativamente a atividades e projetos
que envolvam OGM e seus derivados; V – estabelecer os mecanismos de funcionamento das Comissões
Internas de Biossegurança – CIBio, no âmbito de cada instituição que se dedique ao ensino, à pesquisa
científica, ao desenvolvimento tecnológico e à produção industrial que envolvam OGM ou seus derivados;
VI – estabelecer requisitos relativos à biossegurança para autorização de funcionamento de laboratório,
instituição ou empresa que desenvolverá atividades relacionadas a OGM e seus derivados; VII – relacionar-
se com instituições voltadas para a biossegurança de OGM e seus derivados, em âmbito nacional e
internacional; VIII – autorizar, cadastrar e acompanhar as atividades de pesquisa com OGM ou derivado
de OGM, nos termos da legislação em vigor; IX – autorizar a importação de OGM e seus derivados para
atividade de pesquisa; X – prestar apoio técnico consultivo e de assessoramento ao CNBS na formulação da
PNB de OGM e seus derivados; XI – emitir Certificado de Qualidade em Biossegurança – CQB para o
desenvolvimento de atividades com OGM e seus derivados em laboratório, instituição ou empresa e
enviar cópia do processo aos órgãos de registro e fiscalização referidos no art. 16 desta Lei; XII – emitir
decisão técnica, caso a caso, sobre a biossegurança de OGM e seus derivados no âmbito das atividades
de pesquisa e de uso comercial de OGM e seus derivados, inclusive a classificação quanto ao grau de risco
e nível de biossegurança exigido, bem como medidas de segurança exigidas e restrições ao uso; XIII –
definir o nível de biossegurança a ser aplicado ao OGM e seus usos, e os respectivos procedimentos e
medidas de segurança quanto ao seu uso, conforme as normas estabelecidas na regulamentação desta Lei,
bem como quanto aos seus derivados; XIV – classificar os OGM segundo a classe de risco, observados os
critérios estabelecidos no regulamento desta Lei; XV – acompanhar o desenvolvimento e o progresso
técnico-científico na biossegurança de OGM e seus derivados; XVI – emitir resoluções, de natureza
normativa, sobre as matérias de sua competência; XVII – apoiar tecnicamente os órgãos competentes no

146
processo de prevenção e investigação de acidentes e de enfermidades, verificados no curso dos projetos e
das atividades com técnicas de ADN/ARN recombinante; e XVIII – apoiar tecnicamente os órgãos e
entidades de registro e fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, no exercício de suas atividades
relacionadas a OGM e seus derivados;
Democratização das reuniões da CTNBio: A restrição de acesso de pessoas às reuniões plenárias e das
subcomissões setoriais do CTNBio viola o princípio da publicidade. (AMS 0012201-97.2007.4.01.3400 /
DF)
Comissão Interna de Biossegurança - CIBIO
Toda instituição que utilizar técnicas e métodos de engenharia genética ou realizar pesquisas com OGM e
seus derivados deverá criar uma Comissão Interna de Biossegurança - CIBio, além de indicar um técnico
principal responsável para cada projeto específico.
Os critérios de funcionamento destas comissões são estabelecidos pela CTNBio.
As atribuições destas comissões estão previstas no art. 18: I – manter informados os trabalhadores e
demais membros da coletividade, quando suscetíveis de serem afetados pela atividade, sobre as
questões relacionadas com a saúde e a segurança, bem como sobre os procedimentos em caso de
acidentes; II – estabelecer programas preventivos e de inspeção para garantir o funcionamento das
instalações sob sua responsabilidade, dentro dos padrões e normas de biossegurança, definidos pela
CTNBio na regulamentação desta Lei; III – encaminhar à CTNBio os documentos cuja relação será
estabelecida na regulamentação desta Lei, para efeito de análise, registro ou autorização do órgão
competente, quando couber; IV – manter registro do acompanhamento individual de cada atividade ou
projeto em desenvolvimento que envolvam OGM ou seus derivados; V – notificar à CTNBio, aos órgãos e
entidades de registro e fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, e às entidades de trabalhadores o
resultado de avaliações de risco a que estão submetidas as pessoas expostas, bem como qualquer
acidente ou incidente que possa provocar a disseminação de agente biológico; e VI – investigar a
ocorrência de acidentes e as enfermidades possivelmente relacionados a OGM e seus derivados e
notificar suas conclusões e providências à CTNBio.
Órgãos e entidades de registro e fiscalização
A lei prevê que os órgãos e entidades de registro e fiscalização do Ministério da Saúde, do Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Ministério do Meio Ambiente, e da Secretaria Especial de
Aquicultura e Pesca da Presidência da República possuem atribuições no sistema brasileiro de
Biossegurança. Suas atribuições possuem caráter meramente registrário e fiscalizatório, devendo sempre
obedecer, as decisões técnicas da CTNBio, as deliberações do CNBS e os mecanismos estabelecidos na
Lei 11.105/05.
As atribuições destes órgãos e entidades consistem em: I – fiscalizar as atividades de pesquisa de OGM e
seus derivados; II – registrar e fiscalizar a liberação comercial de OGM e seus derivados; III – emitir
autorização para a importação de OGM e seus derivados para uso comercial; IV – manter atualizado no SIB
o cadastro das instituições e responsáveis técnicos que realizam atividades e projetos relacionados a OGM
e seus derivados; V – tornar públicos, inclusive no SIB, os registros e autorizações concedidas; VI – aplicar
as penalidades de que trata esta Lei; VII – subsidiar a CTNBio na definição de quesitos de avaliação de
biossegurança de OGM e seus derivados.
Cumpre destacar que, no exercício de atividade fiscalizatória, tais órgãos e entidades podem aplicar
multas, sendo o valor arrecadado destinado aos próprios órgãos e entidades. Esta destinação destoa
daquela prevista na Lei 9.605/95, onde o valor das multas aplicadas em decorrência de infrações
ambientais é destinado ao Fundo Nacional do Meio Ambiente.

13.6 Sistema de Informação em Biossegurança (SIB)

A LB cria o SIB destinado à gestão das informações decorrentes das atividades de análise, autorização,
registro, monitoramento e acompanhamento das atividades que envolvam OGM e seus derivados. As
normas relativas à biossegurança devem ser divulgadas no SIB, concomitantemente com as respectivas
entradas em vigor.

147
13.7 Licenciamento

A Competência para deliberar sobre a necessidade do licenciamento ambiental será da CTNBIO, inclusive
da exigência ou não do EIA-RIMA. Entende-se que esse licenciamento será sempre de competência do
IBAMA, pois se trata de atividade que poderá gerar danos ambientais regionais ou nacionais, muito
embora a Resolução CONAMA 305/02 apenas preveja expressamente a atribuição da autarquia federal nos
casos de licenciamento para liberação comercial de OGM. A emissão dos registros, das autorizações e do
licenciamento ambiental referidos na LB deverá ocorrer no prazo máximo de 120 (cento e vinte) dias.

13.8 Tipos penais previstos na lei

Os crimes previstos na LB podem ser assim resumidos: Utilizar embrião humano em desacordo com o que
dispõe o art. 5º desta Lei (art. 24); Praticar engenharia genética em célula germinal humana, zigoto
humano ou embrião humano (art. 25); Realizar clonagem humana (art. 26); Liberar ou descartar OGM no
meio ambiente, em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de
registro e fiscalização (art. 27 – Crime de Competência Federal, pois a liberação de OGM pode acarretar
consequências a direitos difusos, como a saúde pública, não se restringindo ao âmbito dos Estado – STJ
CC nº 41.301). Há causas de aumento variadas para tais crimes, quando resultar dano à propriedade
alheia; dano ao meio ambiente; se resultar lesão corporal de natureza grave em outrem; se resultar a
morte de outrem. Por fim, há, ainda, o crime de utilizar, comercializar, registrar, patentear e licenciar
tecnologias genéticas de restrição do uso. Neste último caso, não há causas de aumento previstas na lei.

13.9 Plantio de OGM em terras indígenas e Unidades de Conservação

O art. 1º da Lei nº11.460/07 veda a pesquisa e o cultivo de organismos geneticamente modificados nas
terras indígenas e áreas de unidades de conservação, exceto nas Áreas de Proteção Ambiental.
Nas APAs e nas Zonas de Amortecimento das demais UC será o Plano de Manejo que disporá sobre as
atividades de liberação planejada e cultivo de OGM, observadas as informações contidas na decisão
técnica da CTNBio sobre: a) o registro de ocorrência de ancestrais diretos e parentes silvestres; b) as
características de reprodução, dispersão e sobrevivência do organismo geneticamente modificado; c) o
isolamento reprodutivo do organismo geneticamente modificado em relação aos seus ancestrais diretos e
parentes silvestres; e d) situações de risco do organismo geneticamente modificado à biodiversidade.
Por fim, caso a UC não tenha fixado, ainda, sua Zona de Amortecimento, caberá ao Poder Executivo
estabelecer os limites para o plantio de OGM nas áreas que circundam as unidades de conservação, até
que seja fixada sua zona de amortecimento e aprovado o seu respectivo Plano de Manejo. Tais limites
estão hoje no Decreto 5.950/06 (500 metros para plantio de soja geneticamente modificada; 800 metros
para o caso de plantio de algodão geneticamente modificado e 5000 metros para o caso de algodão
geneticamente modificado, quando existir registro de ocorrência de ancestral direto ou parente silvestre.
Há, contudo, decisões entendendo pela inconstitucionalidade da aludida norma, por violar o artigo 225 da
CF, especialmente os princípios da precaução e prevenção (TRF 4 AG 2830 RS 2009.04.00.002830-0) e
outras determinando sua aplicação (TRF-4 - AG 30510 RS 2006.04.00.030510-0).

148
Ponto 14 - Proteção química das culturas e meio ambiente (abarcado pelo ponto 15).

Ponto 15 - Produtos tóxicos. Controle. Transporte.

15.1 Introdução

Os efeitos sobre a saúde humana do uso dos agrotóxicos são bem conhecidos. Em casos extremos,
chegam a provocar anomalias genéticas, tumores e câncer. O Brasil é o quarto maior consumidor de
agrotóxicos no mundo e responde por 50% de todo o consumo de agrotóxico na América Latina.
Os agrotóxicos são pesticidas. Podem ser divididos em inseticidas, herbicidas e fungicidas. A
comercialização desses produtos somente pode ser feita através de receituário próprio, prescrito por
profissionais legalmente habilitados, salvo casos excepcionais previstos na regulamentação da lei.
A Constituição prevê a obrigatoriedade do Poder Público controlar os agrotóxicos, tendo sido mais
abrangente ao não mencionar expressamente o termo “agrotóxico”, mas sim “substâncias que comportem
risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente” (art. 225, § 1º, V, da CF).

15.2 Competência

É competência material de todos os entes federativos controlar a produção, a comercialização e


o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o
meio ambiente, na forma da lei, consoante previsto na Lei Complementar 140/2011.
No que atine ao seu aspecto legislativo, a regulação dos agrotóxicos insere-se na competência
concorrente do art. 24 da CF (competência para legislar sobre produção e consumo). A União editou a
legislação geral, a lei de agrotóxicos (Lei 7.802/89), regulamentada pelo Decreto 4.074/2002.

15.2.1 Competência da União

O art. 9º da Lei 7.802/89 dispões sobre as providências que estão a cargo da União:
Art. 9º No exercício de sua competência, a União adotará as seguintes providências:
I - legislar sobre a produção, registro, comércio interestadual, exportação,
importação, transporte, classificação e controle tecnológico e toxicológico;
II - controlar e fiscalizar os estabelecimentos de produção, importação e exportação;
III - analisar os produtos agrotóxicos, seus componentes e afins, nacionais e
importados;
IV - controlar e fiscalizar a produção, a exportação e a importação.

15.2.2 Competência dos Estados e DF

Na sequência, o art. 10 da Lei 7.802/89 prevê a competência dos Estados e do DF.


Art. 10. Compete aos Estados e ao Distrito Federal, nos termos dos arts. 23 e 24 da
Constituição Federal, legislar sobre o uso, a produção, o consumo, o comércio e o
armazenamento dos agrotóxicos, seus componentes e afins, bem como fiscalizar o
uso, o consumo, o comércio, o armazenamento e o transporte interno.
STF - Sob a égide da CF/1967, se afirmara a competência exclusiva da União para legislar sobre
normas gerais de produção, comércio e consumo de mercadorias que contivessem substâncias nocivas (…).
149
A CF/1988 mudou o modelo de repartição de competências legislativas no Brasil e que, em consequência,
o Estado-membro seria competente para condicionar a prévio cadastramento o uso de agrotóxicos e
biocidas em seu território. (Rcl 5847/2014).

15.2.3 Competência dos Municípios

Quanto aos Municípios, o art. 11 da Lei 7.802/89, assim dispôs:


Art. 11. Cabe ao Município legislar supletivamente sobre o uso e o armazenamento
dos agrotóxicos, seus componentes e afins
A fiscalização cabe ao Poder Público, que verificará: a devolução e destinação adequada de
embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, de produtos apreendidos pela ação
fiscalizadora e daqueles impróprios para utilização ou em desuso; e o armazenamento, transporte,
reciclagem, reutilização e inutilização de embalagens vazias.

15.3 Competência acerca das ações penais

No que diz respeito às ações penais que versam sobre agrotóxicos, a depender da conduta
praticada, poderá haver incidência típica no crime do art. 15 da Lei 7.802/89 ou do art. 56 da Lei 9.605/98
(nesse caso, quando se tratar de produto de importação ou exportação clandestina), cuja adequada
definição jurídica do caso concreto determinará se os fatos serão de competência da Justiça Estadual ou
Federal.
“Aquele que produzir, comercializar,
transportar, aplicar, prestar serviço, der
destinação a resíduos e embalagens
vazias de agrotóxicos, seus componentes
e afins, em descumprimento às
Art. 15 da Lei 7.802/89
exigências estabelecidas na legislação
pertinente estará sujeito à pena de
reclusão, de dois a quatro anos, além de
multa. (Redação dada pela Lei nº 9.974,
de 2000)
Produzir, processar, embalar, importar,
exportar, comercializar, fornecer,
transportar, armazenar, guardar, ter em
depósito ou usar produto ou substância
Art. 56 da Lei 9.605/98 tóxica, perigosa ou nociva à saúde
humana ou ao meio ambiente, em
desacordo com as exigências
estabelecidas em leis ou nos seus
regulamentos:
A importação de agrotóxicos de ingresso proibido no Brasil configura o crime ambiental previsto
no art. 56 da Lei 9.605/98, competindo à Justiça Federal processar e julgar o feito, segundo orienta a
jurisprudência do TRF4.
EMENTA: CORREIÇÃO PARCIAL. IMPORTAÇÃO DE AGROTÓXICOS. ART. 56 DA LEI
9605. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA DESCRITA NA DENÚNCIA NA FASE DA
ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. REMESSA AO MPF PARA PROPOSTA DE SUSPENSÃO
150
CONDICIONAL DO PROCESSO. INVERSÃO TUMULTUÁRIA DO PROCESSO. NÃO
OCORRÊNCIA. 1. (...). 2. Em face ao princípio da especialidade, aplicam-se as penas
previstas no artigo 56 da Lei n. 9.605/1998 à conduta de importar agrotóxicos,
conforme firme e consolidada orientação desta Corte. Precedentes. (TRF4
5015261-09.2016.404.0000, SÉTIMA TURMA, Relator ADEL AMERICO DIAS DE
OLIVEIRA, juntado aos autos em 18/05/2016)Por outro lado, ficou decido pelo STJ
que a circunstância de o agrotóxico ser proveniente do exterior não atrai, por si só,
a competência da Justiça Federal, caso inexistente qualquer investigação acerca da
existência contrabando do produto.
“PENAL E PROCESSO PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. 1. JUSTIÇA FEDERAL X
JUSTIÇA ESTADUAL. CRIME DE TRANSPORTE DE AGROTÓXICOS DE ORIGEM
ESTRANGEIRA. ART. 56 DA LEI N. 9.605/1998 OU ART. 15 DA LEI N. 7.802/1989.
AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE COMPROVEM A IMPORTAÇÃO. CONDUTA
PRATICADA NO BRASIL. CONCLUSÃO ALCANÇADA APÓS A INSTRUÇÃO
PROCESSUAL. 2. AUSÊNCIA DE CONTROVÉRSIA ACERCA DA PROCEDÊNCIA
ESTRANGEIRA DO AGROTÓXICO. FATO QUE NÃO ATRAI, POR SI SÓ, A
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. 3. AUSÊNCIA DE PROCESSO POR SUPOSTO
CONTRABANDO. IMPOSSIBILIDADE DE ATRAÇÃO EM RAZÃO DE INVESTIGAÇÃO
INEXISTENTE. 4. CONFLITO CONHECIDO PARA RECONHECER A COMPETÊNCIA DO
JUÍZO DE DIREITO DA VARA CRIMINAL DE MATELÂNDIA/PR, O SUSCITANTE. 1. No
caso, a fixação da competência não deve ser firmada de forma apriorística,
porquanto já efetivamente realizada a instrução processual, com base na qual se
considerou não subsistirem indícios da internacionalidade do crime praticado.
2. Não é possível, com base apenas na origem estrangeira dos agrotóxicos - o que
não se discute -, firmar a competência da Justiça Federal. O art. 109, inciso V, da
Constituição Federal dispõe que o crime deve constar em tratado ou convenção
internacional e que deve ter se iniciado em outro país. Contudo, a conduta
atribuída ao denunciado, de transportar agrotóxicos, iniciou-se já dentro do
Brasil, segundo apurado, não se inserindo, portanto, na disposição constitucional.
3. Admitir-se, de forma peremptória, que todo crime que tenha relação com
produtos contrabandeados seja da competência da Justiça Federal,
independentemente da apuração do crime federal e sem que efetivamente se
verifique a vulneração imediata, e não meramente reflexa, de bens, serviços e
interesses da União, desvirtuaria a competência fixada constitucionalmente.
Portanto, não havendo informações acerca da investigação do delito de
contrabando cometido por terceiro que entregou os agrotóxicos ao denunciado,
não há se falar em atração da competência da Justiça Federal.
4. Conheço do conflito para reconhecer a competência do Juízo de Direito da Vara
Criminal de Matelândia/PR, o suscitante.
(CC 114.148/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA SEÇÃO, julgado
em 09/04/2014, DJe 22/04/2014)
Questiona-se se o transportador que sabe da origem ilícita do produto tóxico, que foi importado
por terceiro de forma clandestina, comete o crime do art. 56 da Lei 9605/98 (modalidade especial de
contrabando - justiça federal) ou o do art. 15 da Lei 7802/89 (transporte ilegal de produto agrotóxico de
origem estrangeira - em tese da justiça estadual)? A resposta é: Depende do liame subjetivo do agente e
da adesão à conduta do importador antes da consumação (coautoria sucessiva). Veja:
A conduta consistente em transportar, no território nacional, em desacordo com as exigências
estabelecidas na legislação pertinente, agrotóxicos importados por terceiro de forma clandestina não se
adequa ao tipo de importação ilegal de substância tóxica (art. 56 da Lei 9.605/1998) caso o agente não

151
tenha ajustado ou posteriormente aderido à importação ilegal antes da entrada do produto no país, ainda
que o autor saiba da procedência estrangeira e ilegal do produto, subsumindo-se ao tipo de transporte
ilegal de agrotóxicos (art. 15 da Lei 7.802/1989).
Essa é a posição do STJ, a qual é seguida pelo TRF4, conforme demonstram os seguintes
julgados:
“Não havendo elementos no sentido de que o agente, tendo recebido os produtos
dentro do Brasil, sabendo da procedência estrangeira, tenha previamente
ajustado ou posteriormente aderido à importação ilegal antes da consumação do
crime, que, sendo formal instantâneo, ocorre com a simples entrada do produto
no país, não se pode falar em participação na importação de substância tóxica
(art. 56 da Lei 9.605/1998), mas tão somente em delito autônomo de transporte
de agrotóxico (art. 15 da Lei 7.802/1989)”. (REsp 1.449.266-PR)
EMENTA: PENAL E PROCESSO PENAL. ARTIGO 15 DA LEI 7.802/89. LEI Nº 9.099/95,
ART. 56. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE PARTICIPAÇÃO DO RÉU NA IMPORTAÇÃO.
AUSÊNCIA DE LESÃO DIRETA E IMEDIATA A BENS, SERVIÇOS OU INTERESSE DA
UNIÃO OU CRIME ANTERIOR DE COMPETÊNCIA FEDERAL. COMPETÊNCIA
DECLINADA. (...) Consoante entendimento firmado por esta Corte, o simples
conhecimento da origem estrangeira de agrotóxicos não é suficiente para a
fixação da competência federal. Caso em que, a despeito da origem
comprovadamente estrangeira dos agrotóxicos apreendidos, inexistem indícios que
apontem para a participação do réu na suposta importação irregular. (...) (TRF4,
ACR 5007497-70.2011.404.7105, SÉTIMA TURMA, Relator ROBERTO FERNANDES
JÚNIOR, juntado aos autos em 27/05/2015)

15.4 Conceito de Agrotóxico

A Lei n. 7.802/89, que regula a matéria, tratou de definir agrotóxicos, no seu art. 2º, I, a e b, como
“os produtos e os agentes de processos físicos, químicos ou biológicos, destinados ao uso nos setores de
produção, no armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens, na proteção de
florestas, nativas ou implantadas, e de outros ecossistemas e também de ambientes urbanos, hídricos e
industriais, cuja finalidade seja alterar a composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação
danosa de seres vivos considerados nocivos”, bem como as “substâncias e produtos empregados como
desfolhantes, dessecantes, estimuladores e inibidores de crescimento”.
Também importa saber o conceito de componentes que seriam: os princípios ativos, os produtos
técnicos, suas matérias-primas, os ingredientes inertes e aditivos usados na fabricação de agrotóxicos e
afins.

15.4.1 Regime Jurídico

O tratamento jurídico dos agrotóxicos (registro, produção, comercialização, importação e


exportação e utilização) deve levar em conta os princípios gerais do Direito Ambiental, especialmente os
princípios da prevenção e da precaução.

15.4.2 Registro de agrotóxicos

A Lei 7.802/89 exige o registro em órgão federal.


Art. 3º Os agrotóxicos, seus componentes e afins, de acordo com definição do art.
2º desta Lei, só poderão ser produzidos, exportados, importados, comercializados e
utilizados, se previamente registrados em órgão federal, de acordo com as
152
diretrizes e exigências dos órgãos federais responsáveis pelos setores da saúde, do
meio ambiente e da agricultura.
O decreto regulamentador (Dec 4.074/2002), dispõe ser o registro ato privativo de órgão federal
(art. 1º, XLII). Mas destaca Paulo Afonso Leme Machado que não havendo previsão constitucional de ser
essa uma competência privativa, nada obsta que os estados estabeleçam seus próprios registros e
cadastros de agrotóxicos. A propósito, no Supremo Tribunal Federal há entendimento no sentido de
admitir que os Estados, no âmbito de suas competências constitucionais para legislar e zelar pela
integridade da saúde e do meio ambiente, podem exigir o registro de produtos agrotóxicos em órgãos
estatais, que proverão o cadastramento desses produtos (ADI 384/PR).
O artigo 5.º, do Decreto 4.074/2002, declarou competente o Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento para conceder o registro, inclusive o RET (Registro Especial Temporário), de agrotóxicos,
produtos técnicos, pré-misturas e afins para uso nos setores de produção, armazenamento e
beneficiamento de produtos agrícolas, nas florestas plantadas e nas pastagens, atendidas as diretrizes e
exigências dos Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente.
O registro se reveste de características de licenciamento de atividade, que encontra fundamento
legal no art. 10 da Lei n. 6.938/81
No procedimento de registro, estabelecido pelo decreto regulamentar, há duas fases, a primeira
é a de avaliação técnico-científica, e a segunda é a da concessão ou indeferimento do registro.
No registro o ônus da prova é do registrante, que deve comprovar que o seu produto é adequado
e não-perigoso.
A decisão administrativa é vinculada aos critérios legais e regulamentares, não se revestindo de
discricionariedade.
Quando organizações internacionais responsáveis pela saúde, alimentação ou meio ambiente, das
quais o Brasil seja membro integrante ou signatário de acordos e convênios, alertarem para riscos ou
desaconselharem o uso de agrotóxicos, seus componentes e afins, caberá à autoridade competente tomar
imediatas providências, sob pena de responsabilidade (§ 4º do art. 3º da Lei 7.802/89).
O registro para novo produto agrotóxico, seus componentes e afins, somente será concedido se a
sua ação tóxica sobre o ser humano e o meio ambiente for comprovadamente igual ou menor do que a
daqueles já registrados, para o mesmo fim, segundo os parâmetros fixados nesta lei (§ 5º do art. 3º da Lei
7.802/89).
Em razão do grau de perigo ambiental e em observação ao Princípio da Precaução, foi proibido o
registro de agrotóxicos, componentes e afins (§ 6º do art. 3º da Lei 7.802/89):
a. Para os quais o Brasil não disponha de métodos para desativação de seus componentes, de modo a
impedir que os seus resíduos remanescentes provoquem riscos ao meio ambiente e saúde pública;
b. Para os quais não haja antídoto ou tratamento eficaz no Brasil;
c. Que revelem características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas, de acordo com os resultados
atualizados de experiências da comunidade científica;
d. Que provoquem distúrbios hormonais, danos ao aparelho reprodutor, de acordo com os
procedimentos e experiências atualizadas da comunidade científica;
e. Que se revelem mais perigosos para o homem do que os testes de laboratório, com animais, tenham
podido demonstrar, segundo critérios técnicos e científicos atualizados;
f. Cujas características causem dano ao meio ambiente.
Acrescente-se a essa lista a proibição quanto a fabricação, a importação, a exportação, a

153
manutenção em estoque, a comercialização e o uso de diclorodifeniltricloretano (DDT), nos termos da Lei
11.936/2009. O DDT é um agrotóxico altamente persistente no meio ambiente e na cadeia alimentar, além
de possuir características carcinogênicas e de alteração endócrina.
Há também um controle estatal sobre as pessoas físicas e jurídicas que prestem serviços na
aplicação de agrotóxicos, seus componentes e afins, ou que os produzam, importem, exportem ou
comercializem. Todos deverão promover registros nos órgãos competentes, do Estado ou do Município,
atendidas as diretrizes e exigências dos órgãos federais responsáveis que atuam nas áreas da saúde, do
meio ambiente e da agricultura.
Em decorrência do Princípio da Participação Comunitária ou Cidadã, possuem legitimidade para
requerer o cancelamento ou a impugnação, em nome próprio, do registro de agrotóxicos e afins,
arguindo prejuízos ao meio ambiente, saúde humana e dos animais:
- As entidades de classe, representativas de profissões ligadas ao setor;
- Partidos políticos com representação no Congresso Nacional;
- Entidades legalmente constituídas para a defesa dos interesses difusos do consumidor, do meio
ambiente e dos recursos naturais.
O decreto regulamentar admite o registro de agrotóxicos, seus componentes e afins, para uso
em emergências, nesse caso sendo concedido por prazo determinado, observadas diretrizes e exigências
dos órgãos responsáveis (art. 18). Também por prazo determinado é o registro para fins de pesquisa e
experimentação (art. 24). Nesse uso os produtos agrícolas não podem ser utilizados para alimentação
humana ou animal.

15.4.3. Embalagens de agrotóxicos

A Lei 7.802/1989, visando à proteção ambiental e da saúde pública, instituiu regras para a
fabricação das embalagens de agrotóxicos e afins, estabelencendo as seguintes exigências (art. 6º):
I - devem ser projetadas e fabricadas de forma a impedir qualquer vazamento,
evaporação, perda ou alteração de seu conteúdo e de modo a facilitar as operações de
lavagem, classificação, reutilização e reciclagem;
II - os materiais de que forem feitas devem ser insuscetíveis de ser atacados pelo
conteúdo ou de formar com ele combinações nocivas ou perigosas;
III - devem ser suficientemente resistentes em todas as suas partes, de forma a não
sofrer enfraquecimento e a responder adequadamente às exigências de sua normal
conservação;
IV - devem ser providas de um lacre que seja irremediavelmente destruído ao ser
aberto pela primeira vez.
Além disso, apenas as empresas produtoras ou estabelecimentos credenciados podem promover
o fracionamento e a reembalagem de agrotóxicos e afins com o objetivo de comercialização.
O art. 6.º, §§ 2.º, 3.º, 4.º e 5.º, da Lei 7.802/1989, criou deveres ambientais para os usuários,
fabricantes e importadores de agrotóxicos e afins.
Com efeito, os usuários de agrotóxicos, seus componentes e afins deverão efetuar a devolução
das embalagens vazias dos produtos aos estabelecimentos comerciais em que foram adquiridos, de
acordo com as instruções previstas nas respectivas bulas, no prazo de até um ano, contado da data de
compra, ou prazo superior, se autorizado pelo órgão registrante, podendo a devolução ser intermediada
por postos ou centros de recolhimento, desde que autorizados e fiscalizados pelo órgão competente.
No caso de produto importado, assumirá a responsabilidade a pessoa física ou jurídica
responsável pela importação.
154
Em decorrência do Princípio do Poluidor-pagador, as empresas produtoras e comercializadoras
de agrotóxicos, seus componentes e afins, são responsáveis pela destinação das embalagens vazias dos
produtos por elas fabricados e comercializados, após a devolução pelos usuários, e pela dos produtos
apreendidos pela ação fiscalizatória e dos impróprios para utilização ou em desuso, com vistas à sua
reutilização, reciclagem ou inutilização, obedecidas as normas e instruções dos órgãos registrantes e
sanitário-ambientais competentes, sendo o tema regulamentado pela Resolução CONAMA 334/2003.
Em decorrência do Princípio da Informação, é condição para a venda ou exposição de agrotóxicos
a exibição de rótulos próprios visíveis em condições normais e bulas redigidos em português, que
obrigatoriamente deverão conter indicações para a identificação do produto, instruções para a sua
utilização, informações referentes aos perigos potenciais e recomendação para que o usuário leia o
rótulo antes de utilizá-lo.
O descumprimento das regras sobre o rótulo e a embalagem pode ser arguido através da
impugnação do registro, como pode ser detectado de ofício pelo próprio servidor público.

15.4.4 Propaganda e venda

Consoante determina o artigo 8.º, da Lei 7.802/1989, a propaganda comercial de agrotóxicos,


componentes e afins, em qualquer meio de comunicação, conterá, obrigatoriamente, clara advertência
sobre os riscos do produto à saúde dos homens, animais e ao meio ambiente. Além disso, 1) estimulará os
compradores e usuários a lerem o rótulo e folheto; e 2) não conterá nenhuma representação visual de
práticas potencialmente perigosas, tais como a manipulação ou aplicação sem equipamento protetor, o
uso em proximidade de alimentos ou em presença de crianças.
Adverte-se, ainda, que a propaganda não poderá induzir em erro o consumidor, perpetrando
comparações falsas ou inserindo afirmações como “não tóxico” ou “seguro”, não devendo ainda aduzir que
há recomendação governamental para a sua utilização.

15.4.5 Da receita agronômica

Receita agronômica é a prescrição e orientação técnica para utilização de agrotóxico ou afim,


por profissional legalmente habilitado. A aquisição de agrotóxicos, tal como exige o artigo 13 da Lei
7.802/1989, somente pode ser feita mediante a apresentação de rereceituário próprio (em duas vias)
prescrito por profissionais legalmente habilitados, salvo casos excepcionais que forem previstos no
Regulamento, que prevê apenas a possibilidade de dispensa do receituário para agrotóxicos de baixa
periculosidade, devendo constar no rótulo ou bula.
A Corte Especial do STJ, em 2003, deixou assentado a competência de profissionais, de nível
médio (técnicos com habilitação), para emitir tais receituários de agrotóxicos:
“A Lei nº 5.254, de 1968, prevê, entre as atividades próprias do técnico agrícola de nível médio, a
de dar assistência na compra, venda e utilização de produtos especializados da agricultura (art. 2º, II), nos
quais se consideraram incluídos os produtos agrotóxicos. Assim, tais técnicos possuem habilitação legal
para expedir o receituário exigido pelo art. 13 da Lei nº 7.802, de 1989.” (EREsp 265636/SC)

15.5 Responsabilidade civil, administrativa e criminal

As responsabilidades administrativa, civil e penal pelos danos causados à saúde das pessoas e ao
meio ambiente, quando a produção, comercialização, utilização, transporte e destinação de embalagens
vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, não cumprirem o disposto na legislação pertinente,
cabem:

155
a) ao profissional, quando comprovada receita errada, displicente ou indevida;
b) ao usuário ou prestador de serviço, quando proceder em desacordo com o receituário ou as
recomendações do fabricante e órgãos registrantes e sanitários ambientais;
c) ao comerciante, quando efetuar venda sem respectivo receituário ou em desacordo com a
receita ou recomendações do fabricante e órgãos registrantes e sanitários ambientais;
d) ao registrante que, por dolo ou culpa, omitir informações ou fornecer informações incorretas;
e) ao produtor, quando produzir mercadorias em desacordo com as especificações constantes
do registro do produto, do rótulo, da bula, folheto e da propaganda ou não der destinação as embalagens
vazias em conformidade com a legislação pertinente;
f) Ao empregador, quando não fornecer e não fizer manutenção dos equipamentos adequados
proteção da saúde dos trabalhadores ou dos equipamentos na produção, distribuição e aplicação dos
produtos.
A pena pelo não cumprimento do previsto na legislação sujeita o infrator a pena de reclusão de 2
a 4 anos, além de multa (art. 15).
Sem prejuízo das responsabilidades civil e penal cabíveis, a infração de disposições da lei
acarretará isolada ou cumulativamente as seguintes sanções (administrativas): Advertência; Multa,
dobrando em caso de reincidência; Condenação do produto; Inutilização do produto; Suspensão de
autorização, registro ou licença; Cancelamento de autorização, registro ou licença; Interdição temporária
ou definitiva do estabelecimento; Destruição de vegetais, partes de vegetais e alimentos, com resíduos
acima do permitido ou nos quais tenha havido aplicação de agrotóxicos não autorizados, a critério do
órgão competente (art. 17).

15.6 Transporte de agrotóxicos

O transporte de agrotóxico tem regulamentação específica (Decreto 96.044/88 que trata de do


transporte de produtos perigosos).
Transportar agrotóxicos juntamente com animais ou com alimentos é crime, da mesma forma:
sem os documentos exigidos pela norma regulamentar; sem contratar previamente o seguro contra
acidentes; sem estar a carga adequadame nte acondicionada. Pertinente destacar a desnecessidade de
que ocorra qualquer dano a pessoas e ao meio ambiente para que o crime reste configurado.

15.7 Convenções Internacionais


Conferência das Nações Unidas Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92)
Um relevante passo para a estipulação de metas relativas à regulamentação internacional das
substâncias químicas, perante o meio ambiente, se deu a partir da Rio 92, quando se propôs reafirmar os
mecanismos de proteção ambiental internacional, constantes na Declaração de Estocolmo. Entretanto,
cuidam-se de normas de soft law (Agenda 21), as quais seriam implementadas alguns anos após na
Convenção de Roterdã na Holanda, que finalmente dispôs, como se verá a seguir, sobre o combate contra
a poluição do meio-ambiente por meio da regulamentação das substâncias químicas.
Uma das áreas de programa, e que se considerou essencial, foi a “Harmonização da classificação
e da rotulagem dos produtos químicos”. Dentro desses propósitos da Convenção, ficaram estipuladas
duas formas de se atingir um melhor controle no uso dos produtos tóxicos: a) uma rotulagem apropriada
dos produtos químicos; b) e a difusão de folhas de dados sobre segurança e outros materiais escritos
semelhantes que se baseiem na avaliação dos riscos para a saúde humana e o meio ambiente.
Assim, segundo a Convenção, “(...) a classificação dos produtos químicos pode se fazer com
propósitos diferentes e é um instrumento particularmente importante para o estabelecimento de sistemas
156
de rotulagem. É necessário desenvolver, com base nos trabalhos em desenvolvimento, sistemas
harmônicos de classificação dos riscos e rotulagem.”

15.8 Convenção de Basiléia

Convenção de Basiléia sobre o controle de movimentos fronteiriços de resíduos perigosos e seu


depósito, aprovada pelo Decreto Legislativo n. 34/92, tem por objetivo reduzir a circulação internacional
de resíduos perigosos, tendo em vista que as partes consideram “que a maneira mais eficaz de proteger a
saúde humana e o MA dos perigos que esses resíduos representam é a redução ao mínimo da sua geração
em termos de quantidade e/ou potencial de seus riscos”.
Essa convenção foi estabelecida como um meio de acabar com a covarde destinação dos resíduos
perigosos dos países industrializados, principalmente os pertencentes a OCDE - Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (EUA, Canadá, Europa Ocidental, Japão), aos países em
desenvolvimento como a África e o Haiti, ou mesmo para a Antártida e países da Europa Oriental,
causando inúmeros danos ambientais em sua maioria irreversíveis.
Em 1995 e em 1997, foram aprovadas duas emendas a Convenção proibindo definitivamente a
exportação de qualquer resíduo para fins de destinação (1995) ou reciclagem (1997) pelos países da OCDE,
Comunidade Européia e Liechestein (Anexo VII). Segundo a Ong BAN, que atua para impedir o comércio
internacional de resíduos perigosos, 63 países já ratificaram as emendas à Convenção.

15.9 Convenção de Estocolmo

Promulgada pelo Decreto n. 5.472/05, a Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos


Persistentes, objetiva que as partes adotem medidas para reduzir ou eliminar as liberações decorrentes de
produção e uso intencionais dos poluentes orgânicos persistentes (POPs) que, em essência, são os
chamados organoclorados.
Os Poluentes Orgânicos Persistentes - POPs são substâncias químicas que têm sido utilizadas
como agrotóxicos, para fins industriais ou liberados de modo não intencional em atividades
antropogênicas, e que possuem características de alta persistência (não são facilmente degradadas), são
capazes de serem transportadas por longas distâncias pelo ar, água e solo, e de se acumularem em tecidos
gordurosos dos organismos vivos, sendo toxicologicamente preocupantes para a saúde humana e o meio
ambiente.
Numa posição preventiva, o tratado determina que os governos promovam as melhores
tecnologias e práticas no seu campo tecnológico e previnam o desenvolvimento de novos POPs. Indo mais
além, define como seu objetivo final a eliminação total dos POPs. A Convenção apresenta opções
inovadoras e objetivas de ações para a gestão adequada dessas substâncias.
Hoje estão listadas na Convenção de Estocolmo 23 substâncias POPs. Inicialmente, foram listados
12 POPs na Convenção, número ampliado em 2009, após decisão da 4ª Conferência das Partes de incluir
mais 9 substâncias, e depois, em 2011, com a inclusão do Endossulfam. Na COP 6, em maio de 2013, foi
adicionado o Hexabromociclododecano

15.10 Convenção de Roterdã

A Convenção de Roterdã sobre o Procedimento de Consentimento Prévio Informado para o


Comércio Internacional de Certas Substâncias Químicas e Agrotóxicos Perigosos, conhecida
simplesmente como “Convenção PIC”, foi aprovada pelo Decreto Legislativo n. 197/2004 e promulgada
através do Decreto n. 5.360/2005, sendo que se insere no contexto de combate contra a poluição do meio
ambiente por meio da regulamentação das substâncias químicas.

157
A Convenção PIC, juntamente com a Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos
Persistentes (POP) e com a Convenção de Basiléia sobre Movimento Transfronteiriço de Resíduos
Tóxicos, constitui o tripé das normas que regulam o campo de produção, comércio e transporte
internacional de certas substâncias químicas.
A Convenção prevê a possibilidade de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão por Estados e
organizações regionais de integração econômica, sem o direito de impor reservas ao seu texto, mediante
depósito do instrumento respectivo no Secretariado geral da Organização das Nações Unidas.
Exclui-se da abrangência da convenção os entorpecentes e as substâncias psicotrópicas; os
materiais radiativos; os resíduos; as armas químicas; os produtos farmacêuticos, incluídos os
medicamentos humanos e veterinários; as substâncias químicas utilizadas como complementos
alimentares; os alimentos; os produtos químicos importados em quantidades mínimas para fins de
pesquisa ou para uso pessoal.
O Anexo III traz uma listagem das substâncias químicas sujeitas ao procedimento de
consentimento prévio informado, e, portanto, submetidos ao regime jurídico da Convenção. As Partes da
Convenção deverão adotar leis ou medidas administrativas apropriadas para assegurar uma tomada de
decisão em tempo hábil, que poderá consistir em uma decisão final consentindo ou não a importação.
No caso de exportação de uma substância química proibida ou estritamente regulamentada a
partir de seu território, o país exportador deverá dirigir uma notificação de exportação ao país
importador, antes da primeira exportação, contendo diversas informações acerca do produto exportado.
Ademais, o produto químico exportado deverá obedecer a padrões de rotulagem que assegurem a difusão
das informações relativas aos riscos para a saúde das pessoas ou para o meio ambiente, considerando-se
as normas internacionais aplicáveis à matéria, independentemente das exigências do país importador.
Os Estados Partes solucionarão suas controvérsias por meio da negociação ou de qualquer outro
modo de solução pacífica, ou então por um modo jurisdicional de solução de controvérsias, mediante
obrigação recíproca de submeter a controvérsia à arbitragem ou ao mecanismo institucional da Corte
Internacional de Justiça. As organizações internacionais Partes poderão resolver suas controvérsias por
qualquer meio pacífico ou pela arbitragem.
O princípio básico da Convenção PIC consiste em que a exportação de uma substância química
proibida ou severamente restringida, incluída em seu Anexo III, apenas possa ter lugar com o
consentimento prévio informado da Parte importadora. É estabelecido um procedimento para a obtenção
e divulgação das decisões dos países importadores no sentido de consentir a importação de determinado
produto químico e para assegurar o respeito destas decisões pelos países exportadores.
O outro pilar da Convenção diz respeito ao intercâmbio de informações entre as Partes sobre
substâncias químicas potencialmente perigosas que possam ser objeto do comércio internacional. Nesse
sentido, a Parte exportadora de um produto químico proibido ou severamente restringido para uso no seu
território será obrigada a informar a Parte importadora de que essa exportação terá lugar, antes do
primeiro envio.

Possível indagação: Qual o tripé normativo do transporte de substâncias químicas? 1.


Convenção de Roterdã; 2. Convenção de Estocolmo; e 3. Convenção da Basiléia.

15.11 Outros produtos tóxicos

AMIANTO – a legislação brasileira, sem desconhecer os riscos causados pelo amianto em


suspensão atmosférica, compreendendo a grande importância econômica da utilização do amianto, optou
por permitir a sua utilização controlada no território brasileiro. A opção do legislador nacional está
plenamente amparada pelos princípios que regem o direito ambiental e, da mesma forma, segue a
tendência internacional sobre a matéria.
158
Riscos – é nocivo apenas para o pulmão e causa a asbestose, o câncer de pulmão e o
mesotelioma.
Discussão importante:
STF, ADI 3937 QO-MC/SP – Indeferida a liminar em ADI, sob o fundamento de que a lei estadual,
que restringe o uso de amianto, era aparentemente constitucional sob o ponto de vista formal
(competência sobre proteção à saúde).
Atenção: essa ADI trata apenas do uso de Amianto, porquanto as leis estaduais sobre esse
produto retiram seu fundamento de validade da Convenção OIT nº 162, devidamente internalizada pelo
Decreto nº 126/91, que adverte sobre alternativas viáveis ao produto.
Prevaleceu naquela assentada o voto do Min. Joaquim Barbosa. Para ele, a Convenção da OIT é
uma norma supralegal, com força normativa maior que a norma federal: "Não faria sentido que a União
assumisse compromissos internacionais que não tivessem eficácia para os estados membros. Não
acredito que a União possa ter duas caras: uma comprometida com outros Estados e organizações
internacionais e outra descompromissada para as legislações com os estados-membros".
Acontece que na ADPF 234-MC, o Tribunal enfrentou questão semelhante. Contudo, a discussão
nessa ADPF era sob uma ótica do “transporte” de mercadoria tóxica (Amianto) e não sobre o “uso” (como
se deu na ADI 3937).
Concluiu a Corte que lei estadual não pode proibir o “transporte” do produto tóxico, sob pena de
violar a competência privativa da União sobre comércio interestadual e internacional. Vejamos a notícia:
Observou caber à União legislar, privativamente, sobre transporte — inclusive de
cargas perigosas — e sobre comércio interestadual e internacional. Assinalou,
ademais, inexistir lei complementar que delegue aos Estados-membros a
disciplina do tema. Afirmou que, se cada Estado-membro impusesse restrições ao
comércio, ora vedando o acesso aos próprios mercados, ora impedindo a
exportação por meio das regiões de fronteiras internacionais, seria o fim da
Federação. Salientou, nesse sentido, que incumbiria à União explorar os portos
organizados, bem como regular o transporte rodoviário de cargas. Concluiu que a
liberdade de locomoção, na espécie, seria qualificada, ou seja, instrumento para a
comercialização de certo produto, inserido nas atividades licitamente exercidas por
determinada pessoa jurídica (liberdade de iniciativa), e realizada por meio de
serviços públicos (portos e rodovias federais). O relator consignou, por fim, que a lei
adversada proibiria o “uso” e não o “transporte” da referida mercadoria. Explicou
que quem usa o faria em termos finais, seria titular de uma das faculdades
inerentes ao domínio. Aquele que transporta, por sua vez, prestaria um serviço,
mas não deteria, necessariamente, a titularidade da coisa para si. Desse modo, se
proibido o uso do amianto no Estado de São Paulo, não o seria o transporte quando
o material estivesse destinado a outros Estados da Federação ou ao exterior, no
que não configuraria “uso” na acepção técnica da palavra. (ADPF-234)
No caso em apreço: diante da constitucionalidade da lei estadual de São Paulo que proibia o uso
do Amianto, os fiscais de trânsito estavam vedando que os veículos de transporte do produto circulassem
pela rodovia que liga os Estados e passa necessariamente por SP. Sendo assim, foi ajuizada a referida
ADPF, resultando na conclusão acima.
Em recente decisão do STF (2015), concluiu-se novamente pela inconstitucional formal de lei
estadual (agora do Rio Grande do Sul) que restringiu o trânsito de outros produtos tóxicos. Veja:
Restrições ao comércio de produtos agrícolas importados no Estado. Competência privativa da
União para legislar sobre comércio exterior e interestadual (CF, art. 22, inciso VIII). 1. É formalmente

159
inconstitucional a lei estadual que cria restrições à comercialização, à estocagem e ao trânsito de
produtos agrícolas importados no Estado, ainda que tenha por objetivo a proteção da saúde dos
consumidores diante do possível uso indevido de agrotóxicos por outros países. A matéria é
predominantemente de comércio exterior e interestadual, sendo, portanto, de competência privativa da
União (CF, art. 22, inciso VIII). 2. É firme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido da
inconstitucionalidade das leis estaduais que constituam entraves ao ingresso de produtos nos Estados da
Federação ou a sua saída deles, provenham esses do exterior ou não. (ADI 3813)
Assim, conclui-se que o STF diferencia “uso” (competência concorrente – matéria de saúde
pública) de “transporte” (competência privativa da União – matéria de transporte interestadual e comércio
exterior) de produtos tóxicos, sobretudo, do Amianto.
ASCAREL – é utilizado em larga escala na refrigeração de sistemas elétricos
Portaria Interministerial n. 19/81 – proibiu a instalação de qualquer equipamento que utilize o
Ascarel ou qualquer elemento congênere. Resolução Conama n. 06/88
MERCÚRIO – provoca o envenenamento. Art. 2o do Decreto n. 97.507/89 – vedou o uso do
mercúrio no garimpo não licenciado. Resolução CONAMA n. 357/05 – trata do limite legal de
concentração de mercúrio na água.
BENZENO – Portaria Interministerial n. 03/82 proibiu a fabricação de produtos que contenham
benzeno. Admite-se, contudo, a presença de 1% como agente contaminante.
CLORO – é certamente um dos produtos químicos mais importantes e que, em tal condição, é
responsável por importantes impactos ambientais e sobre a saúde humana (é muito usado no tratamento
da água). A Lei n. 9.976/00 regulamentou a produção de cloro no Brasil.
PILHAS E BATERIAS – a disposição final delas é um dos mais graves problemas gerados pelos
resíduos sólidos. A matéria vem tratada na Resolução n. 401/08 do CONAMA. Trata da informação e
educação ambiental preconizando que “nos materiais publicitários e nas embalagens de pilhas e baterias,
fabricadas no País ou importadas, deverão constar de forma clara, visível e em língua portuguesa, a
simbologia indicativa da destinação adequada, as advertências sobre os riscos à saúde humana e ao meio
ambiente, bem como a necessidade de, após seu uso, serem encaminhadas aos revendedores ou à rede
de assistência técnica autorizada, conforme Anexo I.”

15.12 Resíduos Sólidos

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) integra a Política Nacional do Meio
Ambiente.
A Lei nº 12.305/10, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) é bastante atual e
contém instrumentos importantes para permitir o avanço necessário ao País no enfrentamento dos
principais problemas ambientais, sociais e econômicos decorrentes do manejo inadequado dos resíduos
sólidos. Dispõe sobre a prevenção e a redução na geração de resíduos, tendo como proposta a prática de
hábitos de consumo sustentável e um conjunto de instrumentos para propiciar o aumento da reciclagem
e da reutilização dos resíduos sólidos (aquilo que tem valor econômico e pode ser reciclado ou
reaproveitado) e a destinação ambientalmente adequada dos rejeitos (aquilo que não pode ser reciclado
ou reutilizado).
Considera-se resíduo sólido o material, substância, objeto ou bem descartado
resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se
propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido,
bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem

160
inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam
para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia
disponível.
A lei de resíduos sólidos traz, em seu art. 3º, conceitos importantes para melhor compreensão
da matéria, sendo relevante a leitura atenta desse dispositivo. A fim de otimizar os estudos a que se
propõe o presente resumo, colaciono a seguir os conceitos que, ao meu ver, podem ser objeto de
questionamento em prova.
acordo setorial: ato de natureza contratual firmado entre o poder público e
fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes, tendo em vista a
implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto;
área órfã contaminada: área contaminada cujos responsáveis pela disposição não
sejam identificáveis ou individualizáveis;
destinação final ambientalmente adequada: destinação de resíduos que inclui a
reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento
energético ou outras destinações admitidas pelos órgãos competentes do Sisnama, do
SNVS e do Suasa, entre elas a disposição final, observando normas operacionais
específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a
minimizar os impactos ambientais adversos;
disposição final ambientalmente adequada: distribuição ordenada de rejeitos em
aterros, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos
à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos;
geradores de resíduos sólidos: pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou
privado, que geram resíduos sólidos por meio de suas atividades, nelas incluído o
consumo;
gerenciamento de resíduos sólidos: conjunto de ações exercidas, direta ou
indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação
final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final
ambientalmente adequada dos rejeitos, de acordo com plano municipal de gestão
integrada de resíduos sólidos ou com plano de gerenciamento de resíduos sólidos,
exigidos na forma desta Lei;
logística reversa: instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado
por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a
restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu
ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente
adequada;
reciclagem: processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve a alteração
de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à transformação
em insumos ou novos produtos, observadas as condições e os padrões estabelecidos
pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa;
rejeitos: resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de
tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente
viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente
adequada;
responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos: conjunto de
atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores
e comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza
urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos
e rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à
qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos, nos termos desta Lei;

161
reutilização: processo de aproveitamento dos resíduos sólidos sem sua transformação
biológica, física ou físico-química, observadas as condições e os padrões estabelecidos
pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa;
serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos: conjunto de
atividades previstas no art. 7º da Lei nº 11.445, de 2007.
Para a execução da Política Nacional de Resíduos Sólidos, foram invocados os seguintes princípios
ambientais gerais: prevenção, precaução, poluidor-pagador, PROTETOR-RECEBEDOR (previsão
inovadora), desenvolvimento sustentável, razoabilidade e proporcionalidade.
Atenção para exclusão expressa da aplicação da Lei 12.305/2010 aos rejeitos radioativos, por já
sofrerem regulação especial pela Lei 10.308/2001.
Dentre as inovações da Lei nº 12.305/10, destacam-se:
• A proibição dos lixões (observada a regra de transição);
• A atribuição de responsabilidade às indústrias pela destinação dos resíduos sólidos que produzem,
verdadeiro corolário do Princípio do Poluidor-pagador;
• A inclusão social das organizações de catadores;
• A logística reversa, que determina que fabricantes, importadores, distribuidores e vendedores realizem o
recolhimento de embalagens usadas;
• A responsabilidade compartilhada, que envolve a sociedade, as empresas, os governos municipais,
distrital, estaduais e federal na gestão dos resíduos sólidos;
• A previsão dos planos de resíduos sólidos;
• A responsabilidade das pessoas de acondicionar de forma adequada o lixo para o seu recolhimento,
devendo fazer a separação onde houver a coleta seletiva.
Na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos, deve ser observada a seguinte ordem de
prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição
final ambientalmente adequada dos rejeitos.
OBJETIVOS:
É possível afirmar que o objetivo geral da Política Nacional de Resíduos Sólidos é a proteção da
saúde pública e da qualidade ambiental.
Foram listados os seguintes objetivos específicos no artigo 7.º da Lei 12.305/2010:
• Não geração, redução, reutilização, reciclagem3 e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição
final ambientalmente adequada dos rejeitos;
• Estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços;4
• Adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de minimizar impactos
ambientais;
• Redução do volume e da periculosidade dos resíduos perigosos;
• Incentivo à indústria da reciclagem, tendo em vista fomentar o uso de matérias-primas e insumos
derivados de materiais recicláveis e reciclados;
• Gestão integrada de resíduos sólidos;5
• Articulação entre as diferentes esferas do poder público, e destas com o setor empresarial, com vistas à
cooperação técnica e financeira para a gestão integrada de resíduos sólidos;
• Capacitação técnica continuada na área de resíduos sólidos;
• Regularidade, continuidade, funcionalidade e universalização da prestação dos serviços públicos de
limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, com adoção de mecanismos gerenciais e econômicos que
assegurem a recuperação dos custos dos serviços prestados, como forma de garantir sua sustentabilidade
operacional e financeira, observada a Lei 11.445, de 2007;
• Prioridade, nas aquisições e contratações governamentais, para: produtos reciclados e recicláveis; bens,
serviços e obras que considerem critérios compatíveis com padrões de consumo social e ambientalmente
sustentáveis;
162
• Integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a
responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos;
• Estímulo à implementação da avaliação do ciclo de vida do produto;
• Incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados para a melhoria
dos processos produtivos e ao reaproveitamento dos resíduos sólidos, incluídos a recuperação e o
aproveitamento energético;

• Estímulo à rotulagem ambiental e ao consumo sustentável.

INSTRUMENTOS PARA A CONSECUÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS.


Os principais instrumentos são os planos de resíduos sólidos, que deverão se publicizados e
sofrer controle social em sua formulação, implementação e operacionalização.
São previstos os seguintes planos:
I – o Plano Nacional de Resíduos Sólidos;
II – os planos estaduais de resíduos sólidos;
III – os planos microrregionais de resíduos sólidos e os planos de resíduos sólidos de
regiões metropolitanas ou aglomerações urbanas;
IV – os planos intermunicipais de resíduos sólidos;
V – os planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos;
VI – os planos de gerenciamento de resíduos sólidos.

O Plano Nacional de Resíduos Sólidos será elaborado pela União, sob a coordenação
do Ministério do Meio Ambiente, mediante processo de mobilização e participação
social, incluindo a realização de audiências e consultas públicas, com vigência por
prazo indeterminado e horizonte de 20 anos, a ser atualizado a cada quatro anos.

Os planos estaduais de resíduos sólidos serão elaborados para vigência por prazo
indeterminado, abrangendo todo o território dos estados, com horizonte de atuação
de 20 anos e revisões a cada quatro anos. A aprovação dos planos estaduais é
condição para que os estados tenham acesso aos recursos da União, ou por ela
controlados, destinados a empreendimentos e serviços relacionados à gestão de
resíduos sólidos, ou para serem beneficiados por incentivos ou financiamentos de
entidades federais de crédito ou fomento para tal finalidade. Ainda poderão os estados
aprovar planos microrregionais de resíduos sólidos, bem como planos específicos
direcionados às regiões metropolitanas ou às aglomerações urbanas, com a
participação obrigatória dos municípios envolvidos.

Deverão os municípios aprovar os seus planos municipais de gestão integrada de


resíduos sólidos, que também funcionarão como condição para que os municípios
tenham acesso a recursos da União, ou por ela controlados, destinados a
empreendimentos e serviços relacionados à limpeza urbana e ao manejo de resíduos
sólidos, ou para serem beneficiados por incentivos ou financiamentos de entidades
federais de crédito ou fomento para tal finalidade.
Para os municípios com menos de 20.000 habitantes, foi permitida a elaboração de
plano simplificado, exceto se:
- os entes políticos locais integrarem áreas de especial interesse turístico,
- estiverem inseridos na área de influência de empreendimentos ou atividades com
significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional;
- ou o território abranja, total ou parcialmente, unidades de conservação.
Vale ressaltar que a inexistência do plano municipal de gestão integrada de resíduos

163
sólidos não obsta a elaboração, a implementação ou a operacionalização do plano de
gerenciamento de resíduos sólidos.

RESPONSABILIDADE DOS GERADORES E DO PODER PÚBLICO


Caberá à Administração Pública prestadora dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo
de resíduos sólidos a responsabilidade pela organização e prestação direta ou indireta desses serviços.
Já as pessoas físicas e jurídicas geradoras de resíduos sólidos, listadas no artigo 20, da Lei
12.305/2010, deverão implementar e operacionalizar integralmente o seu plano de gerenciamento de
resíduos sólidos, cuja responsabilidade civil por danos que vierem a ser provocados pelo gerenciamento
inadequado dos respectivos resíduos ou rejeitos persistirá, mesmo que tenha sido contratado terceiro para
a prestação dos serviços de coleta, armazenamento, transporte, transbordo, tratamento ou destinação
final de resíduos sólidos, ou de disposição final de rejeitos. Caberá ao Poder Público atuar subsidiariamente
para minimizar ou cessar o dano, assegurado o regresso contra os responsáveis para a recomposição do
erário.
O gerador de resíduos sólidos domiciliar terá cessada a sua responsabilidade pelos resíduos com a
disponibilização adequada para a coleta ou pela devolução.
Foi instituída a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, que engloba os
fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, os consumidores e os titulares dos serviços
públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, a ser implementada de forma individualizada
e encadeada, que independe da existência de culpa.
Sob a égide do poluidor-pagador, confere obrigações a toda a cadeia produtiva e de consumo, no
sentido de obrigar aos fabricante e fornecedores a assumir as externalidades negativas que
acompanham todo o processo de produção, devendo agir para diminuir ou buscar a neutralização dos
danos que, porventura, possam prejudicar o equilíbrio ambiental. Já sob a ótica do usuário-pagador,
repassa parte da responsabilidade das externalidades negativas ao próprio usuário, refletindo um outro
lado da aplicação do princípio, visto que, na mesma ótica, implica num certo retorno para a coletividade
que não teve acesso com a utilização, ainda que indireta do recurso ambiental.
INSTRUMENTOS ECONÔMICOS
Foi prevista genericamente a instituição de medidas indutoras para a implementação da Política
Nacional de Resíduos Sólidos, a exemplo dos incentivos fiscais, financeiros ou creditícios, desde que
respeitadas as disposições da Lei de Responsabilidade Fiscal.
A lei estabeleceu que os consórcios públicos com o objetivo de viabilizar a descentralização e a
prestação de serviços públicos que envolvam resíduos sólidos terão prioridade na obtenção dos incentivos
instituídos pela União.
PROIBIÇÕES
São proibidas as seguintes formas de destinação ou disposição final de resíduos
sólidos ou rejeitos:
I - lançamento em praias, no mar ou em quaisquer corpos hídricos;
II - lançamento in natura a céu aberto, excetuados os resíduos de mineração;
III - queima a céu aberto ou em recipientes, instalações e equipamentos não
licenciados para essa finalidade;
IV - outras formas vedadas pelo poder público.

É proibida a importação de resíduos sólidos perigosos e rejeitos, bem como de resíduos sólidos

164
cujas características causem dano ao meio ambiente, à saúde pública e animal e à sanidade vegetal, ainda
que para tratamento, reforma, reúso, reutilização ou recuperação.

Ponto 16 – Recursos hídricos

16.1 Regime Jurídico das Águas na CF/88

Domínio da União: art. 20, III e VIII, CF


Relevante a transcrição dos dispositivos, porque cai a redação literal:
III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um
Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham,
bem como os terrenos marginais e as praias fluviais;
(...)
VIII - os potenciais de energia hidráulica;

Os critérios utilizados pelo constituinte para definir quais águas integram o domínio da União foram:

a) Extensão das águas:


a. Banhar mais de um Estado
b. Advir ou se destinar a outro país

b) Segurança Nacional: servir de limite com outros países.

Domínio dos Estados: art. 26, I a III, CR/88.


I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na
forma da lei, as decorrentes de obras da União;
II - as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio, excluídas aquelas sob domínio
da União, Municípios ou terceiros;
III - as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União;

Atenção: assertiva recorrente em concursos consiste em atribuir à União a titularidade das águas
subterrâneas. Pela simples leitura dos dispositivos acima, percebe-se que a afirmativa é falsa.
Domínio dos Municípios: não há dispositivo constitucional que atribua aos Municípios
titularidade sobre quaisquer espécies de águas.
No que tange à titularidade dos recursos hídricos, cabe frisar que a ANA – Agência Nacional da Águas – traz
critérios para, no caso concreto, poder classificar o curso d’água como pertencente à União ou aos Estados
– Res. 399/04.
Segundo os critérios apresentados pela ANA, os trechos de rios que compõem cursos principais das bacias
hidrográficas que transpassam ou compõem limites estaduais são de domínio federal.
165
Outrossim, de acordo com o art. 11 do Código das Águas, as margens de rios navegáveis são bens de
domínio público relativo ao ente titular do rio. Assim já decidiu o STJ, Resp 679076/MS.
Tal entendimento afeta diretamente o valor da indenização por desapropriação de imóveis localizados
próximos às margens desses rios. Isso porque, se as margens já são bens públicos, não poderão integrar o
total da indenização.
Esse também é o entendimento do STF, corroborado pela Súmula 479:

As margens dos rios navegáveis são de domínio público, insuscetíveis de expropriação e, por isso
mesmo, excluídas de indenização.

Sobre a repartição das competências em matéria hídrica: no que tange à competência legislativa, cabe
privativamente à União legislar sobre a exploração econômica dos recursos naturais com potencial
energético, dentro do qual se inclui as águas – Art. 22, inciso IV da CF.
Por outro lado, está no rol da competência legislativa concorrente a atividade legislativa sobre proteção
dos recursos naturais – art. 24, VI.
Em relação à competência material, a divisão do tema ocorre da mesma maneira.
Quando se tratar de exploração econômica dos recursos naturais com potencial energético, dentro os
quais se encontram as águas – cabe somente à União – art. 21 XVI e XIX.
Ao passo que, relativamente à proteção ambiental dos recursos naturais, como a água, nesse caso todos
os entes federados podem exercer o poder de polícia, pois está dentro da competência material comum –
art. 23, XI.

16.2 O Regime jurídico dos recursos hídricos

As águas podem estar submetidas a regimes jurídicos de D. Privado ou de D. Público; podem ser de
propriedade pública ou privada e, qualquer que seja o regime jurídico ao qual estejam submetidas, são
merecedoras de tutela jurídica especial.
Não é recente a preocupação do D. Brasileiro com as águas. A proteção às águas já era tratada na
legislação colonial, sobretudo as Ordenações Filipinas, decretadas em 11.01.1603.
Atualmente, o principal instrumento é o Código de Águas (Dec. 24.643/34). Outras normas:

a) CC;
b) L. 4.466/64;
c) L. 5.357/67;
d) L. 6.050/74;
e) L. 6.662/79;
f) L. 6.938/81;
g) Resoluções CONAMA 20/86 e 05/88;
h) CP.

166
O importante da legislação brasileira de recursos hídricos é que, mesmo antes da L. 6.938/81, o Código de
Águas e as demais normas jurídicas voltadas para a proteção dos recursos hídricos já estavam
fundamentados em concepção jurídica que contemplava, simultaneamente, a proteção da saúde humana,
com a proteção da qualidade ambiental das águas e com a proteção e manutenção do valor que as
mesmas ostentam para o desenvolvimento econômico e social.

16.3 Conceitos básicos do Código de Águas

Primeiramente, vale salientar que a diferença fundamental entre o CC brasileiro e o Código de Águas está
no fato de que o Código de Águas enfoca as águas como recursos dotados de valor econômico para a
coletividade. É a partir de uma ótica intervencionista que devem ser compreendidos os institutos jurídicos
estabelecidos pelo Código de Águas.

O Código de Águas divide as águas em 3 categorias básicas:

1. Públicas

1.1 De uso comum

a) os mares territoriais, nos mesmos incluídos os golfos, bahias, enseadas e portos;

b) as correntes, canais, lagos e lagoas navegáveis ou flutuáveis;

c) as correntes de que se façam estas águas;

d) as fontes e reservatórios públicos;

e) as nascentes quando forem de tal modo consideráveis que, por si só, constituam o "caput fluminis";

f) os braços de quaisquer correntes públicas, desde que os mesmos influam na navegabilidade ou


flutuabilidade;

g) as situadas em zonas periodicamente assoladas pela seca, nos termos e de acordo com a legislação
especial sobre a matéria.

1.2 Dominicais: são aquelas situadas em terrenos que ostentem a condição de domínio público
dominical, quando não forem do domínio público de uso comum, ou não forem comuns.

2. Comuns: são as correntes não navegáveis ou flutuáveis

3. Particulares: as nascentes e todas as águas situadas em terrenos que também o sejam, quando as
mesmas não estiverem classificadas entre as águas comuns de todos, as águas públicas ou as águas
comuns.

Em relação a seus proprietários, águas públicas podem se classificar em:

167
1. Federais. Quando:
a) sejam marítimas;
b) estejam situadas em territórios federais;
c) sirvam de limites da República com as nações vizinhas ou se estendam a território estrangeiro;
d) quando situadas na zona de 100km contígua aos limites da República;
e) quando sirvam de limites entre dois ou mais Estados;
f) quando percorrerem parte do território de dois ou mais Estados.

2. Estaduais. Quando:
a) sirvam de limites a dois ou mais municípios e
b) quando percorram parte dos territórios de dois ou mais municípios.

3. Municipais. Quando exclusivamente situadas em seu território, respeitadas as restrições que possam
legalmente ser impostas.

Art. 9º Álveo é a superfície que as águas cobrem sem transbordar para o solo natural e ordinariamente
enxuto. (em sentido comum é o leito do rio)

Art. 89. Consideram-se "nascentes" para os efeitos deste Código, as águas que surgem naturalmente ou
por indústria humana, e correm dentro de um só prédio particular, e ainda que o transponham, quando
elas não tenham sido abandonadas pelo proprietário do mesmo.

Art. 102. Consideram-se águas pluviais, as que procedem imediatamente das chuvas.

Rio: curso de água que é apto para navegação ou flutuação, bastando que essa aptidão exista em algum
trecho nos termos do art. 6o do DL 2.281/40. Se assim não for, a corrente deverá denominar-se córrego,
ribeirão, riacho, arroio, etc.

Bacia hidrográfica: área cujo escoamento das águas superficiais contribui para um único exutório. Área de
drenagem de um curso d’água ou lago. Área total drenada por um rio e seus afluentes. Conjunto de terras
drenadas por um rio principal e seus afluentes. São grandes superfícies limitadas por divisores de águas e
drenadas por um rio e seus tributários.

Lago: extensão de água cercada de terras.

Lagoa: lago pouco extenso. No Brasil é corrente chamar lagoa a qualquer lago.

168
Corrente: águas que correm, que não se acham estagnadas; corrediço, corredio. O curso das águas de um
rio, de um ribeiro, de um regato; correnteza.

Desapropriação de recursos hídricos

Está prevista nos arts. 32 e 33 do Código de Águas:

Art. 32. As águas públicas de uso comum ou patrimoniais, dos Estados ou dos Municípios, bem como as
águas comuns e as particulares, e respectivos álveos e margens, podem ser desapropriadas por
necessidade ou por utilidade pública:

a) todas elas pela União;

b) as dos Municípios e as particulares, pelos Estados;

c) as particulares, pelos Municípios.

Art. 33. A desapropriação só se poderá dar na hipótese de algum serviço público classificado pela legislação
vigente ou por este Código.

São aplicáveis as hipóteses do art. 2o, § 2o e 5o, do DL 3.565/41, e as disposições da L 4.132/62


(especialmente art. 2o, VI e VII)

Obrigação de conservação da qualidade das águas: arts. 109 a 118 do Código de Águas.

Regime de prescrição. Vem tratado no art. 79 do Código de Águas:

Art. 79. É imprescritível o direito de uso sobre as águas das correntes, o qual só poderá ser alienado por
título ou instrumento público, permitida não sendo, entretanto, a alienação em benefício de prédios não
marginais, nem com prejuízo de outros prédios, aos quais pelos artigos anteriores é atribuída a preferência
no uso das mesmas águas.

Parágrafo único. Respeitam-se os direitos adquiridos até a data da promulgação deste código, por
título legítimo ou prescrição que recaia sobre oposição não seguida, ou sobre a construção de obras no
prédio superior, de que se possa inferir abandono do primitivo direito.

16.4 Política Nacional de Recursos Hídricos – Lei n9.433/1997

A Lei n. 9.433/1997 institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, sendo que os objetivos desta estão em
consonância com a Política Nacional do Meio Ambiente, razão pela qual os órgãos responsáveis para tanto
devem atuar de forma integrada.
169
Seus principais objetivos são:
a) Assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água em padrões de
qualidade adequados aos respectivos usos (princípio da solidariedade ou do desenvolvimento sustentável);

b) A utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte aquaviário, com vistas
ao desenvolvimento sustentável (princípio do planejamento racional);

c) A prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do


uso inadequado dos recursos naturais. Nesse contexto vale transcrição o seguinte julgado do STJ:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MATA ATLÂNTICA.
RESERVATÓRIO BILLINGS. LOTEAMENTO CLANDESTINO. ASSOREAMENTO DA REPRESA. REPARAÇÃO
AMBIENTAL. 1. A destruição ambiental verificada nos limites do Reservatório Billings – que serve de água
grande parte da cidade de São Paulo –, provocando assoreamentos, somados à destruição da Mata
Atlântica, impõe a condenação dos responsáveis, ainda que, para tanto, haja necessidade de se remover
famílias instaladas no local de forma clandestina, em decorrência de loteamento irregular implementado
na região.

2. Não se trata tão-somente de restauração de matas em prejuízo de famílias carentes de recursos


financeiros, que, provavelmente deixaram-se enganar pelos idealizadores de loteamentos irregulares na
ânsia de obterem moradias mais dignas, mas de preservação de reservatório de abastecimento urbano,
que beneficia um número muito maior de pessoas do que as residentes na área de preservação. No
conflito entre o interesse público e o particular há de prevalecer aquele em detrimento deste quando
impossível a conciliação de ambos. (...) (REsp 403190/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA,
SEGUNDA TURMA, julgado em 27/06/2006, DJ 14/08/2006, p. 259)

Fundamentos
A PNRH baseia-se nos seguintes fundamentos:
I) Água é um bem de domínio público (princípio da dominialidade pública: não há se falar em águas
particulares):

ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. INDENIZAÇÃO. OBRA REALIZADA POR TERCEIRA PESSOA ÁREA


DESAPROPRIADA. BENFEITORIA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. PROPRIEDADE. SOLO E SUBSOLO. DISTINÇÃO.
ÁGUAS SUBTERRÂNEAS. TITULARIDADE. EVOLUÇÃO LEGISLATIVA. BEM PÚBLICO DE USO COMUM DE
TITULARIDADE DOS ESTADOS-MEMBROS. CÓDIGO DE ÁGUAS. LEI N.º 9.433/97. CONSTITUIÇÃO FEDERAL,
ARTS. 176, 176 E 26, I.

1. Benfeitorias são as obras ou despesas realizadas no bem, para o fim de conservá-lo, melhorá-lo ou
embelezá-lo, engendradas, necessariamente, pelo proprietário ou legítimo possuidor, não se
caracterizando como tal a interferência alheia.

2. A propriedade do solo não se confunde com a do subsolo (art. 526, do Código Civil de 1916), motivo pelo
qual o fato de serem encontradas jazidas ou recursos hídricos em propriedade particular não torna o
proprietário titular do domínio de referidos recursos (arts. 176, da Constituição Federal).

3. Somente os bens públicos dominiais são passíveis de alienação e, portanto, de desapropriação.

170
4. A água é bem público de uso comum (art. 1º da Lei n.º 9.433/97), motivo pelo qual é insuscetível de
apropriação pelo particular.

5. O particular tem, apenas, o direito à exploração das águas subterrâneas mediante autorização do Poder
Público cobrada a devida contraprestação (arts. 12, II e 20, da Lei n.º 9.433/97).

6. Ausente a autorização para exploração a que o alude o art.12, da Lei n.º 9.443/97, atentando-se para o
princípio da justa indenização, revela-se ausente o direito à indenização pelo desapossamento de aqüífero.

7. A ratio deste entendimento deve-se ao fato de a indenização por desapropriação estar condicionada à
inutilidade ou aos prejuízos causados ao bem expropriado, por isso que, em não tendo o proprietário o
direito de exploração de lavra ou dos recursos hídricos, afasta-se o direito à indenização respectiva.

8. Recurso especial provido para afastar da condenação imposta ao INCRA o quantum indenizatório fixado
a título de benfeitoria.

(REsp 518744/RN, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/02/2004, DJ 25/02/2004, p.
108)

II) A água é um recurso natural limitado (princípio da finitude), dotado de valor econômico, o que
concretiza o princípio do usuário-pagador.

A ideia de dar à água a definição de valor econômico tem o intuito de racionalizar o seu uso e evitar o
desperdício, uma vez que se trata de recurso ambiental finito e vulnerável. Portanto, a apropriação desse
recurso por parte de um ou de vários indivíduos, públicos ou privados, deve proporcionar à coletividade o
direito a uma compensação financeira pela utilização de recursos naturais, bens de uso comum.

III) Em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a
dessedentação de animais

Nas situações excepcionais de escassez, poderá haver suspensão total ou parcial da outorga de direito de
uso de recursos hídricos. Vale ressaltar que a declaração de escassez demanda ato da Administração.

IV) A gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas.

Não só o consumo direto, como também a irrigação, a navegabilidade, as atividades industriais devem ser
o destino dos recursos hídricos.

V) A bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos


Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

VI) A gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder
Público, dos usuários e das comunidades.

Diretrizes
As diretrizes da PNRH estão elencadas no art. 3º da Lei 9433/97:
171
Art. 3º Constituem diretrizes gerais de ação para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos:

I - a gestão sistemática dos recursos hídricos, sem dissociação dos aspectos de quantidade e qualidade;

II - a adequação da gestão de recursos hídricos às diversidades físicas, bióticas, demográficas, econômicas,


sociais e culturais das diversas regiões do País;

III - a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental;

IV - a articulação do planejamento de recursos hídricos com o dos setores usuários e com os planejamentos
regional, estadual e nacional;

V - a articulação da gestão de recursos hídricos com a do uso do solo;

VI - a integração da gestão das bacias hidrográficas com a dos sistemas estuarinos e zonas costeiras.

Instrumentos

Para que sejam alcançados os objetivos estabelecidos em seu art. 2º, a Lei n. 9.433/1997 prevê, no seu art.
5º, os instrumentos da PNRH:

Art. 5º São instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos:

I - os Planos de Recursos Hídricos;

II - o enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes da água;

III - a outorga dos direitos de uso de recursos hídricos;

IV - a cobrança pelo uso de recursos hídricos;

V - a compensação a municípios;

VI - o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos.

a) Planos de recursos hídricos


Constituem planos diretores que visam a fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional de
Recursos Hídricos e o gerenciamento dos recursos hídricos. De acordo com o art. 8º da Lei n. 9.433/1997,
serão elaborados: o Plano Nacional, Plano Estadual e o Plano por Bacia Hidrográfica.
No âmbito federal, o Plano Nacional de Recursos Hídricos é formado por 4 volumes, nos termos da
Resolução 58/2006 expedida pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos:
1. Panorama e o estado dos recursos hídricos no Brasil

172
2. Águas para o futuro: Cenários para 2020 – define três cenários prováveis sobre os recursos hídricos
no Brasil para 2020.

3. Diretrizes: orientações gerais para as tomadas de decisão no âmbito do Plano

4. Programas Nacionais e metas: apresenta programas, subprogramas e metas do PNRH, com marcos
operacionais e indicadores de monitoramento e avaliação dos resultados alcançados e sua implementação.

No âmbito nacional, é do Conselho Nacional de Recursos Hídricos a competência para aprovar e


acompanhar a execução do Plano Nacional de RH (art.35, Lei 9.433/97). No âmbito Estadual, por sua vez, a
competência para aprovação dos planos correspondentes é dos Comitês de Bacia (art.38, III, Lei 9.433/97).

b) Enquadramento dos corpos de água em classes


O enquadramento é feito segundo os usos preponderantes da água, tendo como objetivo exatamente
assegurar às águas qualidade compatível com os usos mais exigentes a que forem destinadas, além de
diminuir os custos de combate à poluição das águas, mediante ações preventivas permanentes.
Segundo preceitua o art. 9º da Lei 9.433/97, o enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os
usos preponderantes da água, visa a:

“I- assegurar às águas qualidade compatível com os usos mais exigentes a que forem destinadas;
II- diminuir os custos de combate à poluição das águas mediante ações preventivas permanentes.”

As classes de corpos de água estão na Resolução CONAMA 357/05, quais sejam: Doces, com salinidade até
0,5%; Salobras, com salinidade entre 0,5% a 30%; e Salinas, com salinidade acima de 30%, sendo todas
subdividas em 13 classes de destinação. A Resolução CONAMA 396/08, por sua vez, dispõe sobre as águas
subterrâneas (bens dos Estados/DF), classificando-as de acordo com padrões de qualidade.
Por fim, registre-se que a classificação das águas federais, de competência da União, é feita pelo Conselho
Nacional de Recursos Hídricos, ao passo que a classificação das águas estaduais incumbe aos órgãos
estaduais respectivos.

c) Outorga de direitos de uso recursos hídricos

A utilização dos recursos naturais, bens de uso comum do povo e essenciais à sadia qualidade de vida,
depende de prévio consentimento do Poder Público. O meio ambiente é qualificado como patrimônio
público a ser necessariamente assegurado e protegido tendo em vista o seu uso coletivo e, portanto,
inexiste direito subjetivo à sua livre utilização.
O consentimento estatal é deferido por meio de outorga de direitos de uso de recursos hídricos, com a
finalidade de exercer o controle do uso da água sob os critérios quantitativo e qualitativo e do exercício
dos direitos de acesso à água3. Frise-se que a outorga não implica a alienação parcial das águas, que são
inalienáveis, mas o simples direito de uso, por prazo determinado nos termos e condições expressos no
respectivo ato.

Natureza jurídica: outorga é uma AUTORIZAÇÃO (Instrução normativa n. 4; art. 4º, IV, Lei 9.984/00).

3
Coleção Sinopses para Concursos. Direito Ambiental. Editora Juspodivm, 2ª Edição, 2014, p.163.
173
Obs.: trata-se de uma autorização, mas com peculiaridade próprias do direito ambiental, e não como as
características típicas do direito administrativo. Somente poderá ser revogada quando devidamente
motivada.
Nessa linha, para Paulo Afonso de Leme Machado, o Poder Público não poderá deixar de conceder a
outorga se o indivíduo cumprir todos os requisitos. Não seria mera discricionariedade do Poder Público. A
autorização não garante a perpetuidade da autorização, mas nem por isso ela seria precária. Existem
prazos, e estes devem ser respeitados.
Prazo: até 35 anos, podendo ser renovado (art. 16, Lei 9.433/97), com o prazo começando a fluir da
publicação do ato administrativo de concessão, respeitando-se os prazos de até dois anos, para início da
implantação do empreendimento objeto da outorga e de até seis anos para a sua conclusão (art. 5º, lei
9984/2000).4
Finalidade: outorga serve para definir as condições pelas quais os usuários dos recursos hídricos poderão
captá-los ou nele lançar efluentes dentro de critérios técnicos que assegurem a sustentabilidade do
recurso.
Competência para conceder: a outorga deve ser solicitada para a entidade de direito público que detenha
a titularidade do corpo hídrico, ou quem lhe faça às vezes.
Aquele que detiver a gestão do recurso é quem deve dar a autorização para a utilização do recurso.
• Recursos hídricos que estão sob a gestão da União: ANA.
• Recursos hídricos que estão sob a gestão do Estado: dependerá da estrutura de cada Estado (no
Estado de São Paulo – DAEE).

Obrigatoriedade: outorga nem sempre será necessária.

Usos que estão sujeitos à outorga (art. 12, caput, Lei 9.433/97):
a) captação de água
b) extração de água de aquífero subterrâneo
c) lançamento de esgoto e resíduos em corpo de água tratados ou não, com o fim de sua diluição,
transporte ou disposição final: o que se cobra é o uso do recurso. Portanto, mesmo aquele que lança o
efluente dentro dos padrões de tratamento deverá pagar.
d) aproveitamento dos potenciais hidrelétricos
e) outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de
água.

Hipóteses de uso isento de outorga ou de não exigibilidade de outorga (art. 12, § 1º, Lei 9.433/97):

a) satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural;


b) derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes;
c) acumulações de volumes de água consideradas insignificantes.

4
Coleção Sinopses para Concursos. Direito Ambiental. Editora Juspodivm, 2ª Edição, 2014, p.164/165.
174
Segundo Edis Milaré será o plano que deverá estabelecer quais os casos em que não deverá haver a
outorga.
Especificamente sobre a outorga para fins de geração de energia elétrica: estará subordinada ao Plano
Nacional de Recursos Hídricos.

Outorga preventiva: é preciso ressaltar que essa outorga não está prevista na Lei da Política Nacional de
Recursos Hídricos (Lei n. 9.433/1997), mas sim na Lei n. 9.984/2000, que criou a ANA – Agência Nacional
de Águas e no art. 10, §1º, da Resolução CONAMA 237/1997

Relaciona-se com o questionamento prático de qual ato deve ocorrer primeiro, se a outorga ou o
licenciamento ambiental: outorga deverá preceder à realização do licenciamento.
No corpo do licenciamento ambiental, a existência da outorga é um pressuposto, quando o
empreendimento estiver relacionado com a utilização de recurso hídrico (art. 10, Resolução CONAMA
237/97 – “a outorga para o uso da água emitida pelos órgãos competentes).
Algumas atividades que utilizam recursos hídricos, além da outorga para a utilização da água, também
estão sujeitas ao licenciamento ambiental, como obras de saneamento, abertura de canais para
navegação, transposição de bacias etc.

Nesse caso, o art. 10, §1º da Resolução CONAMA 237/97 esclarece que, anteriormente ao procedimento
de licenciamento, o interessado deve obter a outorga para o uso da água. Essa é a outorga preventiva.
Ela não confere o direito de uso de recursos hídricos. Apenas faz uma reserva da utilização, uma
declaração de disponibilidade da água para o uso pretendido, de forma que o interessado fique seguro
para realizar o planejamento necessário com vistas à realização o empreendimento. A efetiva utilização da
água somente pode acontecer a partir do licenciamento da atividade.
A fixação de prazo da outorga preventiva deve levar em conta a complexidade do planejamento do
empreendimento, limitando-se ao máximo de 3 anos.

Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica: nos rios de domínio da União, a exploração dos
potenciais de energia hidráulica demanda quantidade significativa de recursos hídricos, motivo pelo qual,
antes da licitação da concessão do empreendimento pela ANEEL, ou antes da autorização do uso do
potencial hidráulico, a ANA deve emitir uma Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica – DRDH.
Posteriormente esse documento é convertido em outorga – arts. 7º e 26 da lei 9984/00; art. 23 do Decreto
nº 3692/00 e do art. 9º da Resolução CNRH nº 37 de 2004.
Para as águas de titularidade dos Estados, cabe ao órgão estadual.
Atenção: de acordo com art. 7º da Lei n. 9.984/2000, cabe à própria ANEEL promover, junto à ANA ou ao
órgão estadual, a emissão DRDH, e não ao empreendedor.
Após a ANEEL conceder ou autorizar o empreendimento, a DRDH será transformada automaticamente
pelo outorgante em outorga de direito de uso de recursos hídricos em favor do empreendedor.
Por fim, o artigo 15 da Lei 9.433/97 elenca as hipóteses de suspensão, parcial ou total, da outorga
concedida, senão vejamos:

“Art. 15. A outorga de direito de uso de recursos hídricos poderá ser suspensa parcial ou totalmente, em
definitivo ou por prazo determinado, nas seguintes circunstâncias:

175
I - não cumprimento pelo outorgado dos termos da outorga;
II - ausência de uso por três anos consecutivos;
III - necessidade premente de água para atender a situações de calamidade, inclusive as decorrentes de
condições climáticas adversas;
IV - necessidade de se prevenir ou reverter grave degradação ambiental;
V - necessidade de se atender a usos prioritários, de interesse coletivo, para os quais não se disponha de
fontes alternativas;
VI - necessidade de serem mantidas as características de navegabilidade do corpo de água.”

d) Cobrança do uso de recursos hídricos


Código de Águas (1.934) já previa a possibilidade da cobrança.

Lei da Política Nacional do Meio Ambiente – previsão do Princípio do Usuário-Pagador (art. 4º, VII, segunda
parte, Lei da Política Nacional).
A cobrança pelo uso da água vem do fato de ser considerada recurso natural limitado e dotado de valor
econômico.
Assim, como corolário do princípio do usuário-pagador, positivado no inciso VII, do art. 4º da Lei 6938/81 –
Política Nacional do Meio Ambiente – faz-se necessário impor ao usuário uma contribuição pela utilização
de recurso ambiental com fim econômico.

Os objetivos de se cobrar pelo uso da água são:


1. Reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu valor

2. Incentivar a racionalização do seu uso;

3. Obter recursos financeiros para o financiamento de programas e intervenções contempladas nos


planos de recursos hídricos.

4. Estimular o investimento em despoluição, reuso, proteção e conservação, bem com utilização de


tecnologias limpas e poupadores dos recursos hídricos;

5. Induzir e estimular a conservação, o manejo integrado, a proteção e a recuperação dos recursos


hídricos, com ênfase para as áreas inundáveis e de recarga de aqüíferos, mananciais e matas ciliares, por
meio de compensações e incentivos dos usuários.

Existe relação entre a cobrança e a outorga, na medida em que aquela somente é possível após o poder
público realizar o procedimento de outorga para a utilização do recurso, art. 20 da Lei n. 9.433/1997.
Os critérios para fixação de valores encontram-se no art. 21 da Lei n. 9.433/1997.
O valor arrecadado pela utilização dos recursos hídricos tem natureza jurídica de preço público ou tarifa.
Como não configura tributo, pode ser aplicado de maneira direcionada, na bacia hidrográfica em que foi
gerado.

176
Além de ter o objetivo primeiro de fomentar a racionalização da utilização da água, os recursos
arrecadados pela cobrança financiam programas previstos pelos próprios planos de recursos hídricos.
Dentro do tema da cobrança pelo o uso da água, insta fazer uma digressão acerca do pagamento por
serviços ambientais.

Desde a CF/88, o direito ambiental foi alçado ao âmbito constitucional, de maneira que a preservação do
meio ambiente e o desenvolvimento sustentável passaram a ser desideratos protegidos
constitucionalmente. Assim se legitimam diversas intervenções e instrumentos de que dispõe o Poder
Público, previstos em âmbito infraconstitucional e infralegal com vistas à proteção do meio ambiente.
Dentre esses diversos instrumentos, tem-se destacado atualmente os mecanismos econômicos de
proteção ambiental.
Tais mecanismos partem do pressuposto de que os bens ambientais devem possuir valor econômico, de
maneira que, tanto sua utilização deve ser objeto de pagamento, quanto a sua preservação deve ser
recompensada economicamente. Isso significa dizer que práticas ambientalmente sustentáveis são
implementadas à medida que os seus responsáveis são compensados financeiramente.

Nessa toada, alguns estados brasileiros como MG, SP e RJ vêm implementando um interessante
instrumento econômico, principalmente para os recursos hídricos, que é o pagamento por serviços
ambientais. Resumidamente consiste num pagamento pelo Poder Público para aqueles que prestam
serviços de proteção ambiental, como preservar uma floresta ou manter a qualidade dos recursos hídricos
de suas propriedades.
Os recursos para esses pagamentos são provenientes dos Fundos de Recursos Hídricos, que são
abastecidos pela cobrança pelo uso da água.
Trata-se de concretização do princípio do protetor-recebedor.

Cobrança no caso da suspensão da outorga: tem-se entendido que no caso da suspensão da outorga a
cobrança pode ser cessada.

Cobrança e o caso do art. 50, III e IV, Lei 9.433/97:

• EMBARGO PROVISÓRIO DA OBRA (art. 50, III, Lei 9.433/97) – como não há suspensão da
outorga, a doutrina tem entendido que a cobrança deve persistir.

• EMBARGO DEFINITIVO DA OBRA (art. 50, IV, Lei 9.433/97)– como há suspensão da outorga, a
doutrina tem entendido que a cobrança não deve persistir.

e) Sistema de informação sobre os Recursos hídricos


Instituto semelhante ao SISNIMA.

Tem por objetivo ser um sistema de coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de informações
sobre recursos hídricos e fatores intervenientes em sua gestão.

177
Basta a leitura dos arts. 25 a 27 da Lei n. 9.433/1997.

O SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS


Compreende o conjunto de órgãos públicos responsáveis por planejar, normatizar, regular e implementar
a Política Nacional de Recursos Hídricos. O objetivo geral do SNGRH é fazer com que os órgãos ambientais
das diferentes esferas atuem de forma integrada e harmônica, buscando maior efetividade na busca de
resultados.
São objetivos específicos do Sistema (art. 32, Lei 9.433/1997):
a) coordenar a gestão integrada das águas

b) arbitrar administrativamente os conflitos relacionados com os recursos hídricos;

c) implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos

d) planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação dos recursos hídricos;

e) promover a cobrança pelo uso de recursos hídricos

O sistema é integrado pelos seguintes órgãos (art.33, Lei 9.433/97):

• Conselho Nacional de Recursos Hídricos


• Agência Nacional de Águas
• Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal
• Comitês de Bacia Hidrográfica
• os órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do Distrito Federal e municipais
cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos
• Agências de Águas

O Conselho Nacional de Recursos Hídricos: é órgão político formado por representantes dos Ministérios
com atuação no gerenciamento ou uso de recursos hídricos, representantes dos Conselhos Estaduais de
Recursos Hídricos, representantes dos usuários de recursos hídricos e representantes das organizações
civis de recursos hídricos.
Possui atribuições que giram em torno do planejamento, diretrizes e legislação acerca da Política Nacional
de Recursos Hídricos.

Arts. 34 a 36 da Lei n. 9.433/1997.

Agência Nacional de Águas (ANA): a Lei n. 9984/2000 criou essa autarquia federal, sob regime especial,
com autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade
de implementar, em sua esfera de atribuições, a Política Nacional de Recursos Hídricos.

No âmbito federal, é a entidade responsável pela outorga de uso de recursos hídricos. Obs: pode delegar
algumas atividades de sua competência para as agências de águas ou comitês de bacias hidrográficas.
178
a) Autonomia administrativa e financeira: art. 1º.
b) Poder normativo técnico ou discricionariedade técnica no que tange ao uso de recursos hídricos:
art. 4º, inciso II, da Lei n. 9.984/2000;
c) Poder de polícia, fiscalização e controle sobre o uso de recursos hídricos: art. 4º, incisos I, IV, V, XII,
da Lei n. 9984/2000.
d) Mandato por prazo determinado de seus dirigentes, com a peculiaridade de que podem ser
exonerados imotivadamente nos primeiros 4 meses: art. 9º.

Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal: tem atuação complementar ao
Conselho Nacional no âmbito das Unidades da Federação.
Comitê de Bacia Hidrográfica: funciona como se fosse o parlamento da correspondente bacia, onde serão
tomadas as principais decisões políticas sobre a utilização das águas. Deve o comitê selecionar uma
entidade sem fins lucrativos para atuar como braço executivo, na forma de agência de bacia ou de agência
de água.

Suas atribuições estão previstas no art. 38 da Lei Nacional de Recursos Hídricos, destacando-se: a) arbitrar,
em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados aos recursos hídricos; b) estabelecer os
mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados; c) promover
o debate da questões relacionadas a recursos hídricos e articular a atuação das entidades integrantes; d)
aprovar e acompanhar o plano de recursos hídricos da respectiva bacia; e sugerir providências visando o
cumprimento das metas; e) propor aos Conselhos nacional e estaduais as captações e lançamentos de
baixa expressão para fins de isenção de outorga de direitos de uso; e f) promover critérios e rateios de
custos de obras de interesse coletivo. Obs: das decisões do Comitê caberá recurso para o Conselho
Nacional ou Estadual, conforme o caso.

Agências de Água: as Agências de água são órgãos com personalidade jurídica criados para exercer a
função de secretaria executiva do respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica. Como
secretaria executiva, sua existência depende da prévia instituição do respectivo comitê da Bacia
Hidrográfica.

Arts. 41 a 44 da Lei.

Organizações Civis de Recursos Hídricos: são pessoas jurídicas sem fins lucrativos que tem como finalidade
a proteção dos recursos hídricos. Podem receber delegação do Conselho Nacional ou do Conselho
Estadual, por prazo determinado, as funções inerentes as Agências de Água, enquanto não forem criadas.

INFRAÇÕES ADMINISTRATIVAS
As infrações à utilização de recursos hídricos estão previstas no art. 49 e as sanções no art. 50.

JURISPRUDÊNCIA
Alguns entendimentos do STF e do STJ sobre o assunto:

179
a) se o crime ambiental atingir bem da União (no caso, o Rio Alagoas, que corta mais de um Estado), a
competência é da Justiça Federal. - RE 45470/AL

b) a água é bem público de uso comum – art. 1º da Lei 9433/97, motivo pelo qual é insuscetível de
apropriação pelo particular. O particular tem, apenas, o direito à exploração das águas subterrâneas
mediante autorização do Poder Público cobrada a devida contraprestação – art. 12, II e art. 20 da lei
9433/97. Ausente a autorização para exploração a que alude o art. 12 da lei 9433/97, atentando-se para o
princípio da justa indenização, revela-se ausente o direito à indenização pelo desapossamento de aquífero.
Não havendo o direito de exploração dos recursos hídricos, afasta-se o direito à indenização respectiva. -
Resp 518744/RN

c) a água fornecida à população, após ser tratada pelas empresas concessionárias, permissionárias ou
autorizada, não caracteriza mercadoria, razão pela qual é insuscetível de cobrança de ICMS. Além disso,
a concessão de exploração da água não importa sua alienação, visto ser bem de uso comum do povo –
AgRg no Resp 1056579/RJ

d) o faturamento do serviço de fornecimento de água com base na tarifa progressiva, de acordo com as
categorias de usuários e as faixas de consumo, é legítimo e atende ao interesse público, porquanto
estimula o uso racional dos recursos hídricos – Resp 861661/RJ

STJ:
PROCESSUAL CIVIL - ADMINISTRATIVO - MANDADO DE SEGURANÇA - CAPTAÇÃO DE RECURSOS HÍDRICOS -
OUTORGA - NÃO COMPROVAÇÃO - FALTA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA - ATRIBUIÇÃO DO PODER
EXECUTIVO - DILAÇÃO PROBATÓRIA - DESCABIMENTO. 1. A Lei 9.433/97, que institui a Política Nacional de
Recursos Hídricos, estipula que a exploração de recursos hídricos está sujeita a outorga pelo Poder Público
(art. 12), de modo que somente se legitima a questionar judicialmente, em mandado de segurança, ato da
autoridade pública que visa impedir a captação de água, quem é detentor de outorga do Poder Público
para a referida exploração. 2. A inexistência de comprovação, no ato da impetração, da referida outorga
impede o exame de eventual direito líquido e certo do impetrante à captação de recursos hídricos, uma
vez que o mandado de segurança pressupõe a juntada aos autos de prova pré-constituída do direito
alegado, não podendo haver dilação probatória, nessa via. 3. A concessão da outorga não pode ser
conferida pelo Poder Judiciário, em sede de mandado de segurança, pois, nos termos do art. 14 da citada
Lei, a competência de tal ato é atribuída exclusivamente a autoridade do Poder Executivo Federal, Estadual
ou Distrital. Ademais, os requisitos para essa concessão não podem ser aferidos nesta seara processual,
que sequer admite dilação probatória. 4. Recurso especial improvido.
(ROMS 200501594346, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, 20/06/2007)

12/02/2012 - 08h00
ESPECIAL
Proteção a recursos hídricos é tema recorrente em julgados do STJ
Essencial para a vida no planeta, a água é um recurso limitado, e por isso vem merecendo atenção e
proteção especial do poder público, principalmente por meio da Agência Nacional de Águas (ANA). Em
muitos casos, porém, a necessidade de sua preservação transborda os limites da ação administrativa,

180
exigindo a intervenção do Poder Judiciário – quando não é a própria administração quem põe em risco
esse recurso natural.
O Tribunal da Cidadania tem examinado o assunto sob diversos ângulos, procurando coibir o descaso com
os recursos hídricos e o desrespeito à legislação que trata desse bem público tão precioso.
No ano passado, por exemplo, a Segunda Turma manteve decisão (REsp 1.249.683) que condenou o
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o município de
Caucaia (CE) a remover pessoas que se instalaram em área de preservação permanente na margem
esquerda do rio Ceará. A decisão determinou que o município fizesse o reassentamento das famílias em
local disponível da cidade e a demolição das edificações irregulares. No recurso especial, o Ibama
pretendia sua exclusão do processo, o que foi negado pelo STJ.
Na ocasião, o relator do caso, ministro Mauro Campbell, afirmou que o Tribunal de Justiça do Ceará nada
mais fez que confirmar sentença que havia condenado o município a remover as pessoas instaladas
irregularmente e reassentá-las em outros locais, além de obrigar o Ibama a impedir novas invasões e fazer
cessar o agravamento da degradação ambiental local. “Até mesmo em razão do dever de fiscalização
ambiental dessa autarquia”, observou.

Poço artesiano
Em decisão publicada quatro meses antes, a Segunda Turma discutiu (REsp 994.120) os limites da
competência fiscalizatória municipal relacionada à perfuração de poço artesiano e sua exploração por
particular. A questão teve início quando o município de Erechim (RS) autuou um condomínio e lacrou o
poço artesiano. O condomínio recorreu ao Judiciário, e o tribunal estadual entendeu que a competência do
município para fiscalizar referia-se, exclusivamente, à proteção da saúde pública. No recurso ao STJ, o
Ministério Público estadual afirmou ser legal o ato da prefeitura.
A Segunda Turma concordou que o município tem competência para fiscalizar a exploração de recursos
hídricos, podendo, portanto, coibir a perfuração e exploração de poços artesianos, no exercício legítimo
de seu poder de polícia urbanístico, ambiental, sanitário e de consumo. “A Lei da Política Nacional de
Recursos Hídricos significou notável avanço na proteção das águas no Brasil e deve ser interpretada
segundo seus objetivos e princípios”, considerou o ministro Herman Benjamin ao votar.
Ele lembrou os principais objetivos da legislação, observando que todos têm repercussão no caso
analisado: a preservação da disponibilidade quantitativa e qualitativa de água, para a presente e as
futuras gerações; a sustentabilidade dos usos da água, admitidos somente os de cunho racional; e a
proteção das pessoas e do meio ambiente contra os eventos hidrológicos críticos, que ganha maior
dimensão em época de mudanças climáticas.
“Além disso, a Lei 9.433/97 apoia-se em uma série de princípios fundamentais, cabendo citar, entre os
que incidem diretamente neste litígio, o princípio da dominialidade pública (a água, dispõe a lei
expressamente, é bem de domínio público), o princípio da finitude (a água é recurso natural limitado) e o
princípio da gestão descentralizada e democrática”, acrescentou. (importante!)

Autorizações nulas
Em 1998, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública contra o município de Joinville (SC),
Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina (Fatma) e Ibama, buscando a decretação de nulidade das
autorizações deferidas pelos órgãos ambientais para supressão de vegetação de Mata Atlântica e
licenciamento para construção de anfiteatro e ginásio de esportes.
Requereu, então, a condenação dos três à recuperação da área de 3,5 ha, com recomposição da vegetação
e desassoreamento do curso d’água. Houve a condenação em primeira instância, mas o Tribunal Regional
Federal da 4ª Região entendeu que, dada a largura do córrego (70 cm), a vedação ao desmatamento
181
imposta pelo Código Florestal não se aplicava ao caso, devido às circunstâncias de reduzida ou nenhuma
repercussão ambiental.
Ao julgar o caso, a Segunda Turma observou que a legislação somente admite o desmatamento de Área
de Preservação Permanente quando o empreendedor comprovar que a obra, empreendimento ou
atividade é de utilidade pública ou interesse social e, com base nessa excepcionalidade, conseguir a
necessária e regular autorização, o que não ocorreu.
Segundo o relator, ministro Herman Benjamin, o magistrado não pode afastar a exigência legal de
respeito à manutenção de mata ciliar, sob o argumento de que se está diante de simples “veio d’água”.
“Raciocínio que, levado às últimas consequências, acabaria por inviabilizar também a tutela das
nascentes (olhos d’água)”, observou. “Mais do que nos grandes rios, é exatamente nesses pequenos
cursos d’água que as matas ciliares cumprem o papel fundamental de estabilização térmica, tão
importante à vida aquática, decorrente da interceptação e absorção da radiação solar”, acrescentou.
Especialista em direito ambiental, o ministro lembrou que o rio caudaloso não existe sem suas nascentes e
multifacetários afluentes, mesmo os menores e mais tênues, cuja estreiteza não reduz sua essencialidade
na manutenção da integridade do sistema como um todo. “Por tudo isso, há que ser refutada a
possibilidade de supressão da mata ciliar baseada na largura do curso d’água”, afirmou.
Ao dar provimento ao recurso do MPF, ele observou, ainda, que “nulidade de pleno direito, nos termos da
legislação ambiental, não admite flexibilização, como pretendeu o acórdão recorrido, sob pena de tornar
absolutamente inócuo o mandamento constitucional em defesa da Mata Atlântica como patrimônio de
todos os brasileiros”.
“Assim, é de se reconhecer nulas as autorizações conferidas ao arrepio da lei e, portanto, inviável qualquer
pretensão do município em prosseguir o desmatamento da gleba”, afirmou Herman Benjamin, para
concluir: “Pelo contrário, urge impor aos agentes da infração (município, Ibama e Fatma) a recomposição
do prejuízo ambiental, tal qual pleiteado na ação civil pública.”

Direitos em conflito
Em outra decisão (REsp 403.190), foi mantida condenação de proprietário de imóvel e do município de São
Bernardo do Campo (SP) a remover famílias de local próximo ao Reservatório Billings, que fornece água a
grande parte da cidade de São Paulo. A construção de loteamento irregular provocou assoreamentos,
somados à destruição da Mata Atlântica.
Ao manter a condenação, o ministro João Otávio de Noronha afirmou não se tratar apenas de restauração
de matas em prejuízo de famílias carentes de recursos financeiros, que, provavelmente, deixaram-se
enganar pelos idealizadores de loteamentos irregulares na ânsia de obterem moradias mais dignas. “Mas
de preservação de reservatório de abastecimento urbano, que beneficia um número muito maior de
pessoas do que as residentes na área de preservação”, considerou o ministro. “No conflito entre o
interesse público e o particular, há de prevalecer aquele em detrimento deste quando impossível a
conciliação de ambos”, concluiu.

Vazamento tóxico
E o que dizer dos vazamentos de elementos tóxicos nas águas? Em caso julgado pela Primeira Turma (REsp
570.194), foi mantida condenação das empresas Genesis Navigation Ltd., Chemoil International Ltd.,
Liverpool & London P & I Association Limited, Smit Tak B.V., Fertilizantes Serrana S/A, Trevo S/A, Manah
S/A e Petrobras, além da União Federal, Ibama, Superintendência do Porto de Rio Grande e Estado do Rio
Grande do Sul.
O pedido do Ministério Público na ação civil pública ocorreu após vazamento de substância tóxica do navio
MT Bahamas no Porto de Rio Grande e na Lagoa dos Patos, localizados no Rio Grande do Sul. O
182
requerimento, na ocasião, era de realização de perícia complementar e de monitoramento espaço-
temporal contínuo do processo de biacumulação de metais na área afetada pelo
bombeamento/vazamento da mistura ácida contida no navio Bahamas.
Provado o vazamento do ácido sulfúrico no Estuário da Lagoa dos Patos, pelo navio Bahamas, a
condenação foi mantida, para que o pagamento do monitoramento fosse feito pelos réus. “É manifesto
que o direito ambiental é regido por princípios autônomos, especialmente previstos na Constituição
Federal (artigo 225 e parágrafos) e legislação específica, entre os quais a responsabilidade objetiva do
causador do dano ao meio ambiente”, lembrou na ocasião a ministra Denise Arruda (hoje aposentada).
A insistência da Petrobras em não querer ser responsabilizada ou não pagar custas adiantadas foi,
inclusive, punida com a multa de 1%. “Todas as questões apresentadas foram analisadas e decididas, ainda
que contrariamente à pretensão da embargante”, considerou Denise Arruda. “A embargante insiste – de
maneira censurável e contrária à boa-fé processual – em tese já superada nesta Corte Superior. Evidencia-
se, pois, o intuito procrastinatório dos embargos, impondo-se a aplicação da multa prevista no artigo 538,
parágrafo único, do Código de Processo Civil”, concluiu a relatora.
Responsabilidade penal
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. DESNECESSIDADE DE DUPLA IMPUTAÇÃO EM CRIMES
AMBIENTAIS.
É possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da
responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome. .... Precedentes citados: RHC
53.208-SP, Sexta Turma, DJe 1º/6/2015; HC 248.073-MT, Quinta Turma, DJe 10/4/2014; e RHC 40.317-SP,
Quinta Turma, DJe 29/10/2013. RMS 39.173-BA, Rel. Min. Reynaldo Soars da Fonseca, julgado em
6/8/2015, DJe 13/8/2015.

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO


ESPECIAL. POÇO ARTESIANO. CAPTAÇÃO DE ÁGUA SUBTERRÂNEA. ARTS. 45 DA LEI N. 11.445/07 E 20 DA
LEI N. 9.433/97. INEXISTÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 211/STJ, 282/STF E 356/STF.
VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. IMÓVEL CONSIDERADO
RURAL. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. (...) 3. O aresto afirmou categoricamente que, "no
caso em tela, verifica-se a utilização do recurso hídrico de fonte derivada de um poço artesiano, cuja vazão
não se enquadra na moldura normativa que exige a outorga onerosa deste bem" (e-STJ, fl. 286). E mais
adiante (e-STJ, fl. 288) ressaltou que: "[...] o Condomínio provou a condição de potabilidade da água
conforme laudo de fls. 41/44, bem como a declaração de uso de recursos hídricos expedido pela Agência
Nacional de Águas - ANA (fls. 45/47), informando, inclusive, a vazão média do manancial que se subsume a
norma do § 10 do artigo 12 da Lei n. 9.433/97 e da norma de reprodução estadual contido no artigo 22, §
10, da Lei 3.239/99". 4. De outra parte, em nenhum momento o Estado invocou o fato de o condomínio
situar-se em área urbana, tendo o Tribunal, ao contrário, tratado o imóvel como rural. 5. Rever tais
conclusões, no sentido de que o condomínio configura pequeno núcleo populacional rural, implicaria
reexaminar fatos e provas, o que é defeso na via eleita, pela Súmula 7/STJ. 6. Agravo regimental a que se
nega provimento. (AgRg no AgRg no REsp 1317668/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA,
julgado em 17/03/2015, DJe 24/03/2015)

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANOS AO MEIO AMBIENTE. USINA
HIDRELÉTRICA DE CHAVANTES. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. LEI
7.990/89. COMPENSAÇÃO FINANCEIRA PELA UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS. DANOS AMBIENTAIS
EVENTUAIS NÃO ABRANGIDOS POR ESSE DIPLOMA NORMATIVO. PRECEDENTE STF. EXIGÊNCIA DE ESTUDO
PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL (EIA/RIMA). OBRA IMPLEMENTADA ANTERIORMENTE À SUA
183
REGULAMENTAÇÃO. PROVIDÊNCIA INEXEQUÍVEL. PREJUÍZOS FÍSICOS E ECONÔMICOS A SEREM APURADOS
MEDIANTE PERÍCIA TÉCNICA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O Tribunal de origem apreciou
adequadamente todos os pontos necessários ao desate da lide, não havendo nenhuma obscuridade que
justifique a sua anulação por este Superior Tribunal. 2. A melhor exegese a ser dispensada ao art. 1º da Lei
7.990/89 é a de que a compensação financeira deve se dar somente pela utilização dos recursos hídricos,
não se incluindo eventuais danos ambientais causados por essa utilização. 3. Sobre o tema, decidiu o
Plenário do STF: "Compensação ambiental que se revela como instrumento adequado à defesa e
preservação do meio ambiente para as presentes e futuras gerações, não havendo outro meio eficaz para
atingir essa finalidade constitucional" (ADI 3.378-DF, Rel. Min. AYRES BRITTO, DJe 20/06/2008). 4. A
natureza do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado - fundamental e difusa - não confere ao
empreendedor direito adquirido de, por meio do desenvolvimento de sua atividade, agredir a natureza,
ocasionando prejuízos de diversas ordens à presente e futura gerações. 5. Atrita com o senso lógico,
contudo, pretender a realização de prévio Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) num empreendimento
que está em atividade desde 1971, isto é, há 43 anos. 6. Entretanto, impõe-se a realização, em cabível
substituição, de perícia técnica no intuito de aquilatar os impactos físicos e econômicos decorrentes das
atividades desenvolvidas pela Usina Hidrelétrica de Chavantes, especialmente no Município autor da
demanda (Santana do Itararé/PR). 7. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1172553/PR, Rel.
Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 04/06/2014)
TRF1:
ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. PORTARIA Nº 283/97 DO DEPARTAMENTO NACIONAL DE ÁGUAS E
ENERGIA ELÉTRICA - DNAEE. OUTORGA DE CONCESSÃO PARA CAPTAÇÃO DE ÁGUA NO RESERVATÓRIO
BILLINGS PARA ABASTECIMENTO PÚBLICO PELO SERVIÇO MUNICIPAL DE ÁGUA E SANEAMENTO DE SANTO
ANDRÉ - SEMASA. USINA HIDRELÉTRICA DE HENRY BORDEN. POTENCIAL HIDRELÉTRICO. COMPETÊNCIA DA
UNIÃO. MONOPÓLIO LEGAL DO ESTADO-MEMBRO INEXISTENTE. SERVIÇO PÚBLICO DE INTERESSE LOCAL.
CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. SERVIÇOS MUNICIPAIS AUTÔNOMOS DE ÁGUA E ESGOTO.
ART. 293. AUTONOMIA MUNICIPAL. CONSTITUIÇÃO FEDERAL E LEI ESTADUAL Nº 119/73. INTERESSE
PÚBLICO. COMPETÊNCIA DO ÓRGÃO ESTADUAL PARA ATUAR COMO PODER CONCEDENTE. ILEGITIMIDADE
PASSIVA AD CAUSAM DA ANEEL. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. 2. O art. 21, XIX, da Carta Política
dispõe que compete à União "instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir
critérios de outorga de direitos de seu uso". 3. Não há no ordenamento jurídico qualquer norma que
estabeleça o regime de monopólio na prestação de serviço público de tão relevante importância para a
sociedade. Ao contrário, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 30, V, atribui aos municípios
competência para "organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços
públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial". 4. Se não há
vedação à prestação do serviço pelos entes municipais, se não há monopólio atribuído ao Estado-membro,
e considerando o interesse local do fornecimento de água, não se afigura ilegal a participação dos
municípios neste processo. 8. A prestação de serviço de fornecimento de água aos munícipes pela
prefeitura atende ao interesse público, pela essencialidade que lhe é peculiar. (AC 0036229-
81.1997.4.01.3400/DF, Rel. Desembargadora Federal Selene Maria De Almeida, Quinta Turma,e-DJF1 p.334
de 20/08/2010)

AMBIENTAL. LICENCIAMENTO PRÉVIO E INSTALAÇÃO DE USINA TERMOELÉTRICA. SECRETARIA ESTADUAL


DE MEIO AMBIENTE. COMPETÊNCIA DO IBAMA PARA O ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL (EIA).
RELATÓRIO DE IMPACTO AMBIENTAL (RIMA). PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO
IMPROVIDO. 2. Caracterizado o significativo potencial de impacto ambiental que o empreendimento
representa, com incidência direta e indireta, sobre áreas do mar territorial e de mangue, em face da
política nacional de recursos hídricos e política de preservação dos manguezais. 3. A legislação atinente à
espécie fixou a área sob influência direta dos impactos ambientais do empreendimento como elemento
definidor da competência para o licenciamento ambiental. Correta a decisão impugnada ao prestigiar a
competência do IBAMA, uma vez que compete à autarquia o licenciamento previsto em caso de dano de
184
âmbito nacional e regional. A zona costeira do país não conhece divisões políticas. 4. Incidência do
princípio da precaução, princípio de Direito Internacional que deve reger as decisões administrativas e
judiciais em questões que envolvam o meio ambiente. Se há suspeitas de que determinada autorização
para exploração de área considerável de recursos vegetais está eivada de vício, o princípio da precaução
recomenda que em defesa da sociedade não seja admitida a exploração da área em questão, pois pode ser
causado ao meio ambiente prejuízo de caráter irreversível. 5. Em sede de matéria ambiental, não há lugar
para intervenções tardias, sob pena de se permitir que a degradação ambiental chegue a um ponto no qual
não há mais volta. 6. Agravo de instrumento improvido. (AG 2008.01.00.025509-1/MA, Rel.
Desembargadora Federal Selene Maria De Almeida, Quinta Turma,e-DJF1 p.976 de 21/11/2008)

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REMESSA EX OFFICIO.


CONSTRUÇÃO DE USINA HIDRELÉTRICA EM RIO DE DOMÍNIO DA UNIÃO E QUE ATRAVESSA ÁREAS DE
TERRAS INDÍGENAS. ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL E RELATÓRIO DE IMPACTO AMBIENTAL.
LICENCIAMENTO AMBIENTAL: COMPETÊNCIA DO IBAMA. APROVEITAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS EM
TERRAS INDÍGENAS: NECESSIDADE DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DO CONGRESSO NACIONAL. 1. O
aproveitamento de recursos hídricos em terras indígenas somente pode ser efetivado por meio de prévia
autorização do Congresso Nacional, na forma prevista no artigo 231, § 3º, da Constituição Federal. Essa
autorização deve anteceder, inclusive, aos estudos de impacto ambiental, sob pena de dispêndios
indevidos de recursos públicos. 2. Também, é imprescindível a intervenção do IBAMA nos licenciamentos e
estudos prévios relativos a empreendimentos e atividades com significativo impacto ambiental, de âmbito
nacional ou regional, que afetarem terras indígenas ou bem de domínio da União (artigo 10, caput, e § 4º,
da Lei nº 6.938/81, c/c artigo 4º, I, da Resolução nº 237/97, do CONAMA). 3. Remessa oficial desprovida.
Sentença mantida. (REO 1999.01.00.109279-2/RR, Rel. Desembargador Federal Souza Prudente, Conv. Juiz
Federal Moacir Ferreira Ramos (conv.), Sexta Turma,DJ p.9 de 29/01/2007)

DIREITO AMBIENTAL. HIDROVIA PARAGUAI-PARANÁ. PORTO DE MORRINHOS, NA REGIÃO DE


CÁCERES/MT. PRETENSÃO DE CONSTRUÇÃO PARA INCREMENTO DA NAVEGAÇÃO CINCO VEZES A
CAPACIDADE ATUAL. LICENCIAMENTO REQUERIDO À FEMA/MT E EIA/RIMA ISOLADO. LIMIAR DO
PANTANAL MATOGROSSENSE ("PATRIMÔNIO NACIONAL" E "PATRIMÔNIO NATURAL DA HUMANIDADE").
ADAPTAÇÃO DA HIDROVIA PROPRIAMENTE DITA. CONSEQÜÊNCIA INEVITÁVEL. IMPACTO AMBIENTAL DE
CARÁTER REGIONAL. COMPETÊNCIA DO IBAMA PARA O LICENCIAMENTO. APRECIAÇÃO CONJUNTA DO
PEDIDO DE LICENCIAMENTO DAS DIVERSAS OBRAS. NECESSIDADE. PRINCÍPIOS DA PREVENÇÃO E
PRECAUÇÃO. CONSULTA ÀS POPULAÇÕES ATINGIDAS. EXIGÊNCIA IMPLÍCITA. 5. O projeto de construção do
Porto de Morrinhos, em face de sua localização e da finalidade de incrementar cinco vezes a capacidade de
navegação no Rio Paraguai, poderá causar graves consequências ambientais ao Pantanal Matogrossense, a
cujo respeito dispõe a Constituição que constitui "patrimônio nacional" e que "sua utilização far-se-á, na
forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao
uso dos recursos naturais" (art. 225, § 4º). 6. A inexistência de um projeto global, formalmente
estabelecido, de reconstrução da hidrovia Paraguai-Paraná não significa que o EIA/RIMA para efeito de
licenciamento do projeto do Porto de Morrinhos possa ser feito isoladamente. Ao contrário, depende de
estudo de impacto ambiental, senão unitário, concomitante de todas as inevitáveis adaptações no trecho
da hidrovia que corta o Pantanal Matogrossense, precedido de autorização do Congresso Nacional
relativamente ao(s) segmento(s) em que há reserva(s) indígena(s). 7. A fragmentação da realidade, em
casos da espécie, serve aos interesses econômicos, em detrimento dos interesses ambientais. Cumpre a
finalidade de vencer furtiva e gradativamente as resistências, utilizando-se, inclusive, de arma psicológica.
Uma etapa abre caminho e força a outra, sob o argumento de desperdício de recursos, até a conquista
final do objetivo. Construído isoladamente o Porto de Morrinhos, o Pantanal Matogrossense ficará
literalmente "sitiado". Em tal situação a autoridade administrativa, na tomada de decisão, e o Poder
Judiciário, no papel de controle, não podem circunscrever o exame ao fragmento fático, isolado do
conjunto sistêmico, nem às regras legais, isoladas da Constituição. 8. Competência administrativa do
185
IBAMA para apreciar o pedido de licenciamento ambiental do Porto de Morrinhos, em face do caráter
regional dos impactos ambientais, só podendo fazê-lo juntamente com a apreciação de pedido(s) de
licenciamento das consequentes obras de adaptação da hidrovia ao fluxo de embarcações e cargas que o
novo porto provocará no trecho que atravessa o Pantanal Matogrossense, dependente tal licenciamento,
ainda, de prévia autorização do Congresso Nacional para a intervenção em áreas indígenas. 9. Os princípios
da prevenção e da precaução conduzem à conclusão que o referido porto só poderá ter sua construção
liberada caso se verifique, mediante aprofundada pesquisa, que inexistem riscos de significativa
degradação ambiental ao Pantanal Matogrossense ou sejam encontradas alternativas técnicas para
preveni-los. Preserva-se, ao mesmo tempo, o princípio da proporcionalidade ("versão balanceada" dos
princípios da prevenção e da precaução): não se admite que o porto seja licenciado isoladamente, mas não
se vai ao ponto de exigir licenciamento unitário e global de todo o trecho brasileiro da Hidrovia Paraguai-
Paraná, nas suas mais de duzentas obras. 10. Na exigência de que no processo de licenciamento do Porto
de Morrinhos seja levada em conta a repercussão física e social da obra na região pantaneira está implícita
a necessidade de consulta às populações atingidas, por meio de audiências públicas. 11. Em face da
natureza da causa e da sucumbência recíproca, deixa de haver condenação em honorários de advogado.
12. Parcial provimento à remessa oficial e às apelações. (AC 200036000106495, DESEMBARGADOR
FEDERAL JOÃO BATISTA MOREIRA, TRF1 - QUINTA TURMA, 05/10/2007)

CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. JULGAMENTO DO MÉRITO PELO TRIBUNAL
(CPC, ART. 515, § 3º, REDAÇÃO DA LEI Nº 10.352/2001). HIDROVIA PARAGUAI-PARANÁ. AUTORIZAÇÃO DO
CONGRESSO NACIONAL QUE SE FAZ INDISPENSÁVEL DIANTE DA CONCRETUDE DAS INTERVENÇÕES
EFETIVADAS A TÍTULO DE "ESTUDOS" (CF, ART. 231, § 3º). APELAÇÃO PROVIDA. 2. "O aproveitamento dos
recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras
indígenas só podem ser efetivadas com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades
afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei." (Constituição
Federal, art. 231, § 3º). 3. Interpretação teleológica da norma leva à conclusão de que não importa se a
ação do Estado se dá sob o título de "estudo" ou de efetivo "aproveitamento dos recursos hídricos".
Intervenções concretas ao bem estar das comunidades indígenas, ainda que sob o nome de "estudos" só
podem ser efetivadas se precedidas da necessária autorização do Congresso Nacional. 4. A intervenção do
Congresso Nacional no processo de implementação da hidrovia, por afetar diretamente interesses
indígenas, não pode ser postergada para momento imediatamente anterior à execução das obras que se
realizarão a fim de implantá-la. (AC 1999.01.00.068811-3/MT, Rel. Desembargadora Federal Selene Maria
De Almeida, Quinta Turma,DJ p.39 de 29/07/2005)

ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. COMPENSAÇÃO FINANCEIRA PELO USO DE RECURSOS HÍDRICOS.


PREVISÃO DEFINIDA NAS LEIS NºS 8.001/90, 9.433/97, 9.648/98 e 9.984/2000. ISENÇÃO PARA AS
PEQUENAS CENTRAIS HIDRELÉTRICAS (PCHs). ART. 4º, § 1º, LEI 7.990/89. APELAÇÃO PROVIDA. 1.
Cumprindo o inciso XIX da Constituição Federal a Lei 9.433/97 criou o Sistema Nacional de Gerenciamento
de Recursos Hídricos e definiu critérios de outorga de direitos de seu uso, e as Leis nºs 8.001/90, 9.433/97,
9.648/98 e 9.984/2000, ao disciplinarem a compensação financeira pela exploração desses recursos, o
fizeram com base no § 1º do art. 20 da Constituição Federal. 2. Não há embasamento legal para fixar a
conclusão da ANA no sentido de que "a isenção prevista no art. 4º, I, da Lei nº 7.990, de 1989, não se
estende à cobrança pelo uso dos recursos hídricos da União, prevista na Lei nº 9.433, de 1997". Isso
porque, além do § 1º do art. 20 da CF, bem como das Leis nºs 8.001/90, 9.433/97, 9.648/98 e 9.984/2000,
expressamente estabelecerem a compensação financeira devida aos entes federados e a "órgãos da
administração direta da União", ou seja, sem que se possa dizer que "as compensações financeiras devidas
pela utilização de recursos hídricos na produção de energia elétrica visam compensar os entes federados
pelos danos causados pelo represamento das águas com a construção de hidrelétricas", a conclusão de
que se a isenção definida no inciso I do art. 4º da Lei 9.433/97, por se tratar de "uma exceção à regra a
todos imposta, a mesma deve ser interpretada restritivamente", sob pena do intérprete usurpar a
186
competência legislativa e criar uma nova exceção sem previsão legal, seria reconhecer que,
inconcebivelmente, o § 1º do art. 20 da Constituição Federal, muito embora a sua importância,
principalmente, econômica, até o momento não teria sido regulamentado. 3. Apelação provida para
suspender, em relação à autora, a cobrança de compensação pelo uso dos recursos hídricos da Bacia do
Rio Paraíba do Sul, nas Pequenas Hidrelétricas de Marmelos, Joasal e Paciência, de sua propriedade,
referentes aos exercícios 2003 e 2004, cancelando-se os respectivos lançamentos de débitos. (AC 0015288-
30.2004.4.01.3800 / MG, Rel. JUIZ FEDERAL OSMANE ANTONIO DOS SANTOS, 2ª TURMA SUPLEMENTAR, e-
DJF1 p.439 de 24/07/2013)

TRF4:
INDENIZAÇÃO. SUPRESSÃO DAS SETE QUEDAS PELA CONSTRUÇÃO DA USINA ITAIPU BINACIONAL.
COMPENSAÇÃO FINANCEIRA PELA UTILIZAÇÃO DE RECURSOS HÍDRICOS PARA FINS DE GERAÇÃO DE
ENERGIA ELÉTRICA. CRITÉRIOS QUE NÃO FORAM REGULAMENTADOS. IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO
PELO PODER JUDICIÁRIO. MÉRITO ADMINISTRATIVO. PREJUÍZOS ECONÔMICOS. BEM DA UNIÃO. AUSÊNCIA
DE RESPONSABILIDADE. INDENIZAÇÃO DESCABIDA. 1. Embora o Decreto n. 01/91 tenha deixado de
regulamentar matéria, que por determinação legal (art. 5º da Lei n. 7.990/89), deveria ter sido
regulamentada, não há como o Judiciário suprir a omissão para escolher os demais critérios para
compensação financeira mediante a valoração do que possa ser considerado interesse público regional ou
local. Essa escolha, envolve, portanto, a discricionariedade da Administração. (APELREEX
199970040101767, MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA, TRF4 - TERCEIRA TURMA, 01/07/2009)

TRF5:
ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE CONCESSÃO DE USO DE ÁREA. UTILIZAÇÃO DAS ÁGUAS PÚBLICAS. NÃO
INCLUSÃO NO OBJETO DO CONTRATO. INADMISSIBILIDADE. NECESSIDADE DE OUTORGA ESPECÍFICA
ORIUNDA DO PODER PÚBLICO. ATO ILÍCITO. NÃO CONFIGURAÇÃO. INDENIZAÇÃO. DESCABIMENTO. 2. Em
primeiro lugar, imperioso observar que o contrato de concessão citado não abrange em seu objeto a
utilização das águas públicas existentes na mencionada faixa de terra. 3. Em segundo lugar, ainda que
fosse o desejo das partes contratantes, a utilização dos recursos hídricos decorrentes das águas públicas,
segundo a legislação vigente, depende de outorga específica oriunda da Administração Pública, o que
inexistiu no caso. 4. Diante das leis que regulam a utilização das águas públicas, sobretudo da formalidade
imposta para tais autorizações - que devem ser específicas -, inadmissível se mostra a tese de que a
autorização, no caso em apreço, havia sido tácita e decorrente do contrato de concessão de área. 5.
Recurso improvido.
(AC 200382000038142, Desembargador Federal Cesar Carvalho, TRF5 - Terceira Turma, 19/03/2010)

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ÁGUA MINERAL. EMPRESA EXPLORADORA E


COMERCIALIZADORA. REGISTRO NO CREA. EXIGÊNCIA PERTINENTE. LEI 5.194/1966. 2. Ademais, além da
água ser um bem social indispensável à sobrevivência da população - razão pela qual sua qualidade há de
ser rigorosamente preservada, sob pena, de assim não ocorrendo por em risco toda a sociedade que dela
consumir inadequadamente - não se pode olvidar que um dos objetivos da Política Nacional de Recursos
Hídricos é "assegurar à atual e as futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de
qualidade adequados aos respectivos usos (AMS 200381000092602, Desembargador Federal Petrucio
Ferreira, TRF5 - Segunda Turma, 28/01/2005).

187
16.5 Política Nacional de Segurança de Barragens

Por meio da Lei 12.334/2010, a União aprovou a Política Nacional de Segurança de Barragens – PNSB –
destinadas à acumulação de água para quaisquer usos, à disposição final ou temporária de rejeitos e à
acumulação de resíduos industriais, bem como criou o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança
de Barragens. De efeito, considera-se barragem qualquer estrutura em um curso permanente ou
temporário de água para fins de contenção ou acumulação de substâncias líquidas ou de misturas de
líquidos e sólidos, compreendendo o barramento e as estruturas associadas. A PNSB tem como objetivos:
I – garantir a observância de padrões de segurança de barragens de maneira a reduzir a possibilidade de
acidente e suas consequências; II – regulamentar as ações de segurança a serem adotadas nas fases de
planejamento, projeto, construção, primeiro enchimento e primeiro vertimento, operação, desativação e
de usos futuros de barragens em todo o território nacional; III – promover o monitoramento e o
acompanhamento das ações de segurança empregadas pelos responsáveis por barragens; IV – criar
condições para que se amplie o universo de controle de barragens pelo poder público, com base na
fiscalização, orientação e correção das ações de segurança; V – coligir informações que subsidiem o
gerenciamento da segurança de barragens pelos governos; VI – estabelecer conformidades de natureza
técnica que permitam a avaliação da adequação aos parâmetros estabelecidos pelo poder público; VII –
fomentar a cultura de segurança de barragens e gestão de riscos.
As barragens deverão ser classificadas pelo Poder Público por categoria de risco, por dano potencial
associado, e pelo seu volume, com base em critérios gerais estabelecidos pelo Conselho Nacional de
Recursos Hídricos. Para a implementação da PNSB, serão manejados os seguintes instrumentos:
I – o sistema de classificação de barragens por categoria de risco e por dano potencial associado; II – o
Plano de Segurança de Barragem; III – o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens
(SNISB); IV – o Sistema Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente (Sinima); V – o Cadastro Técnico
Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental; VI – o Cadastro Técnico Federal de Atividades
Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais; VII – o Relatório de Segurança de
Barragens.
De resto, também foi instituído o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens, para
registro informatizado das condições de segurança de barragens em todo o território nacional,
compreendendo um sistema de coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de suas informações,
devendo contemplar barragens em construção, em operação e desativadas.
Caso Samarco

Em 05 novembro de 2015, ocorreu o pior acidente da mineração brasileira no município de Mariana, em


Minas Gerais. A tragédia ocorreu após o rompimento de uma barragem (Fundão) da mineradora Samarco,
que é controlada pela Vale e pela BHP Billiton.

O rompimento da barragem provocou uma enxurrada de lama que devastou o distrito de Bento
Rodrigues, deixando um rastro de destruição à medida que avança pelo Rio Doce.

Foram suscitados conflitos de competência perante o STJ. No Conflito de Competência (CC) nº1.44.922,
foi firmada a competência da Justiça Federal para analisar as ações civis públicas que tenham por objeto
questões decorrentes do rompimento da barragem de Fundão, conforme acórdão abaixo. O CC nº
145.695, que tinha por objeto fixar a competência para apreciação dos processos criminais relacionados
à tragédia ambiental, foi julgado prejudicado, ante a superveniente perda do objeto, uma vez que
Ministério Público de Minas Gerais apresentou pedido de arquivamento indireto do inquérito penal,
reconhecendo a competência da Justiça Federal - eventualmente até mesmo de Júri Federal – para
apreciação do feito.

CC nº1.44.922

188
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÕES CIVIS PÚBLICAS AFORADAS NO
JUÍZO ESTADUAL E NA JUSTIÇA FEDERAL DE GOVERNADOR VALADARES/MG. ROMPIMENTO DA
BARRAGEM DE FUNDÃO EM MARIANA/MG. FORNECIMENTO DE ÁGUA POTÁVEL. DANOS
SOCIOAMBIENTAIS. RIO DOCE. BEM PÚBLICO PERTENCENTE À UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
FEDERAL. FORO COMPETENTE. SITUAÇÃO DE MULTICONFLITUOSIDADE. IMPACTOS REGIONAIS E
NACIONAL. CONEXÃO ENTRE AS AÇÕES CIVIS PÚBLICAS OBJETO DO CONFLITO E OUTRAS QUE
TRAMITAM NA 12ª VARA FEDERAL DE BELO HORIZONTE/MG. PREVENÇÃO. APLICAÇÃO DA REGRA
ESTABELECIDA NA LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
(...)
7. A Justiça Federal é, pois, competente para conhecer e julgar demandas relacionadas aos impactos
ambientais ocorridos e aos que ainda venham a ocorrer sobre o ecossistema do Rio Doce, sua foz e sobre
a área costeira.
8. Reconhecida a competência da Justiça Federal para o processamento das ações civis públicas referidas
no presente conflito, cabe definir o foro competente para o seu julgamento. FORO
COMPETENTE (BELO HORIZONTE).
9. A problemática trazida nos autos deve ser analisada à luz do microssistema do processo coletivo,
notadamente no que diz respeito à tutela de interesses difusos e metaindividuais, decorrentes todos eles
de um único evento, qual seja, o desastre ambiental consistente no rompimento da barragem de Fundão,
no dia 5 de novembro de 2015, ocorrido na unidade industrial de Germano, entre os distritos de
Mariana e Ouro Preto (cerca de 100 km de Belo Horizonte). (...)
11. A questão que se coloca como premente na hipótese, decorrente da tutela dos interesses difusos,
caracterizados pela indeterminação dos sujeitos e indivisibilidade do objeto, é como se dará a fixação do
foro competente quando o dano vai além de uma circunscrição judiciária. Outra resposta não há, senão
pela prevenção. (...)
13. Existente ação civil pública com escopo mais amplo (danos ambientais strito sensu e danos
pessoais e patrimoniais), já em curso na 12ª Vara Federal de Belo Horizonte-MG, na qual o Ministério
Público Federal se habilitou, inclusive, como litisconsorte ativo (Processo n. 60017-58.2015.4.01.3800).
Além dessa, tramitam na 12ª Vara Federal de Belo Horizonte-MG a Ação Popular n. 0060441-
03.2015.04.01.3800 e a Ação Civil Pública n. 0069758-61.2015.4.01.3400, sendo partes nesta última a
União Federal e outros em face da Samarco Mineração S.A. e outros. (...)
15. Mostra-se caracterizada a relação de pertinência entre as ações civis públicas manejadas em
Governador Valadares/MG, com vistas ao abastecimento de água potável à população local, com essa
outra ação civil (n. 0069758-61.2014.4.01.3400) que tramita na 12ª Vara Federal de Belo Horizonte, cujo
objeto é mais abrangente, englobando as primeiras, pois busca a garantia de fornecimento de água
potável à população de todos os Municípios que tiveram o abastecimento interrompido em função da
poluição do Rio Doce com a lama advinda do rompimento da barragem de Fundão. (...)

17. Dessas circunstâncias, observa-se que a 12ª Vara Federal da Secção Judiciária de Minas Gerais
possui melhores condições de dirimir as controvérsias aqui postas, decorrentes do acidente ambiental
de Mariana, pois além de ser a Capital de um dos Estados mais atingidos pela tragédia, já tem sob sua
análise processos outros, visando não só a reparação ambiental stricto sensu, mas também a
distribuição de água à população dos Municípios atingidos, entre outras providências, o que lhe propiciará,
diante de uma visão macroscópica dos danos ocasionados pelo desastre ambiental do rompimento da
barragem de Fundão e do conjunto de imposições judiciais já direcionadas à empresa Samarco, tomar
medidas dotadas de mais efetividade, que não corram o risco de ser neutralizadas por outras decisões
judiciais provenientes de juízos distintos, além de contemplar o maior número de
atingidos. (...)
EXCEÇÕES À REGRA GERAL.
18. Há que se ressalvar, no entanto, as situações que envolvam aspectos estritamente humanos e
econômicos da tragédia (tais como o ressarcimento patrimonial e moral de vítimas e familiares, combate a
abuso de preços etc) ou mesmo abastecimento de água potável que exija soluções peculiares ou locais,

189
as quais poderão ser objeto de ações individuais ou coletivas, intentadas cada qual no foro de residência
dos autores ou do dano. Nesses casos, devem ser levadas em conta as circunstâncias particulares e
individualizadas, decorrentes do acidente ambiental, sempre com base na garantia de acesso facilitado
ao Poder Judiciário e da tutela mais ampla e irrestrita possível. Em tais situações, o foro de Belo
Horizonte não deverá prevalecer, pois significaria óbice à facilitação do acesso à justiça, marco fundante do
microssistema da ação civil pública.
19. Saliento que em outras ocasiões esta Corte de Justiça, valendo-se do microssistema do processo
coletivo, aplicou a regra específica de prevenção estabelecida na Lei de Ação Civil Pública para definir o
foro em que deveriam ser julgadas as ações coletivas. Precedentes.
20. Conflito de competência a que se julga procedente para ratificar a liminar proferida pela Ministra
Laurita Vaz, no exercício da Presidência, e determinar a competência definitiva do Juízo da 12ª Vara
Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais, em Belo Horizonte, para apreciar e julgar a causa,
determinando a remessa da Ação Cautelar n. 0395595-67.2015.8.13.0105 e da Ação Civil Pública n.
0426085-72.2015, ambas em tramitação no Juízo de Direito da 7ª Vara Cível da Comarca de Governador
Valadares/MG, e da Ação Civil Pública n. 9362-43.2015.4.01.3813, em curso no Juízo da 2ª Vara Federal
da Subseção Judiciária de Governador Valadares/MG, ficando a critério do Juízo da 12ª Vara Federal da
Seção Judiciária de Minas Gerais a convalidação dos atos até então praticados. (STJ, Primeira Seção, CC
144922 / MG, Ministra DIVA MALERBI (DESEMBARGADORA CONVOCADA TRF 3ª REGIÃO), DJe
09/08/2016)

BIBLIOGRAFIA
Antunes, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 12a ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010.
Romeu, Maria Thomé. Manual de Direito Ambiental. Editora: JUSPODIVM, 2011.

Ponto 17 – Mineração

17.1 Introdução

Há critica na doutrina aos incentivos explícitos concedidos à garimpagem pelo legislador constituinte
considerando que, hoje tal atividade constitui um dos mais graves problemas nacionais, seja pelos
aspectos ambientais, seja pelos aspectos sociais. Em contraposição diz que, o art. 225, § 2o, da CF, serve de
verdadeiro marco a indicar um caminho que, deve ser percorrido pela sociedade e pelas autoridades, com
o objetivo de estabelecer um ordenamento razoável para o grave problema.

É importante observar que, o Estado brasileiro chamou a si a responsabilidade de organizar a garimpagem


que, como se sabe, é uma prática de alto impacto ambiental. E mais, além de organizar a atividade
garimpeira, o Estado brasileiro atribuiu prioridade à autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos
recursos, jazidas, de minerais garimpáveis nas áreas em que, os garimpeiros estejam atuando, e mesmo
em áreas que, posteriormente, venham a ser demarcadas.

190
17.2 Previsão constitucional

Dispositivos constitucionais: art. 20, IX; 21, XXV e 22, XII.

Art. 20. São bens da União: IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo;

Art. 21. Compete à União: XXV - estabelecer as áreas e as condições para o


exercício da atividade de garimpagem, em forma associativa.

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XII - jazidas, minas, outros
recursos minerais e metalurgia;

Também tem relação: art. 174, § 3o e 4o; art. 176; art. 231, § 3°.

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado


exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento,
sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

§ 3º - O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas,


levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social
dos garimpeiros.

§ 4º - As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade na


autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais
garimpáveis, nas áreas onde estejam atuando, e naquelas fixadas de acordo com o
art. 21, XXV, na forma da lei.

Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de


energia hidráulica constituem propriedade distinta de da do solo, para efeito de
exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário
a propriedade do produto da lavra.

§ 1º A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a


que se refere o "caput" deste artigo somente poderão ser efetuados mediante
autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou
empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração
no País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas
atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas.

§ 2º - É assegurada participação ao proprietário do solo nos resultados da lavra, na


forma e no valor que dispuser a lei.

§ 3º - A autorização de pesquisa será sempre por prazo determinado, e as


autorizações e concessões previstas neste artigo não poderão ser cedidas ou
transferidas, total ou parcialmente, sem prévia anuência do poder concedente.

§ 4º - Não dependerá de autorização ou concessão o aproveitamento do potencial


de energia renovável de capacidade reduzida.

191
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas,
crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente
ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus
bens. § 3º - O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais
energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só
podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as
comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da
lavra, na forma da lei.

É importante observar que o Estado brasileiro chamou a si a responsabilidade de organizar a garimpagem,


que é uma prática de alto impacto ambiental.

Além de organizar a atividade garimpeira, o Estado brasileiro atribuiu prioridade à autorização ou


concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpáveis, nas áreas em que os
garimpeiros estejam atuando, e mesmo em áreas que, posteriormente, venham a ser demarcadas.

17.3 Mineração em terras indígenas (art. 231)

Importante notar que a mineração em terras indígenas não está proibida no Brasil. O que a CF determinou
foi, apenas e tão-somente, que (1) o Congresso Nacional autorizasse a atividade e que (2) a comunidade
indígena afetada fosse ouvida, (3) assegurando-se à mesma a percepção de royalties. Até hoje o CN não
aprovou a lei a que se refere o citado dispositivo.

Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas,
crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente
ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus
bens.

§ 3º - O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos,


a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser
efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades
afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma
da lei.

Algumas atividades realizadas fora de áreas indígenas podem eventualmente, gerar consequências em
terras indígenas. O Serviço do Meio Ambiente das Terras Indígenas (SEMATI), vinculado à Coordenadoria
de Patrimônio Indígena da FUNAI, é o órgão responsável pela aprovação de projetos. Obrigação de
recuperação ambiental da área degradada.

17.4 Mineração e Meio ambiente

As únicas restrições são aquelas com imediato assento constitucional. Tais restrições são:

a) ser praticada em áreas definidas como intocáveis;

192
b) ser realizada em áreas indígenas sem autorização do CN e sem que as comunidades indígenas
sejam consultadas.

Excetuando-se essas 02 vedações, a atividade mineraria será permitida, desde que

(1) precedida de EIA (art. 225, §1o, inc. IV) e que

(2) sejam atendidas as condições do § 2o do art. 225.

17.5 Código de Mineração (DL 227/67)


17.5.1 Conceitos básicos

É o principal instrumento normativo sobre o assunto. Conceitos básicos:

a) Jazida: ocorrência anormal de minerais constituindo um depósito natural que existe concentrado em
certos pontos da superfície do globo terrestre.

b) Mina: depósito mineral (jazida) em exploração pelo homem.

c) Lavra: lugar onde se realiza a exploração de mina, geralmente de ouro ou diamante.

d) Garimpo: mina de diamantes ou carbonados; lugar onde se encontram tais minas; lugar onde existem
explorações diamantinas e auríferas; mineração ou exploração clandestina de diamante e de ouro;
povoação fundada e habitada pelos garimpeiros.
Continuando no Código de Mineração, o Decreto-Lei N° 227/67 em seu artigo 70, considera a garimpagem
como:

“O trabalho individual de quem utiliza instrumentos rudimentares, aparelhos


manuais ou máquinas simples e portáteis, na extração de pedras preciosas,
semipreciosas e minerais metálicos ou não metálicos, valiosos, em depósitos de
eluvião ou aluvião, nos álveos de cursos d'água ou nas margens reservadas, bem
como nos depósitos secundários ou chapadas (grupiaras), vertentes e altos de
morros, depósitos esses genericamente denominados garimpos".

e) Pesquisa mineral: Entende-se por pesquisa mineral a execução dos trabalhos necessários à definição da
jazida, sua avaliação e a determinação da exequibilidade do seu aproveitamento econômico.

17.5.2 O Código de Minas e a proteção ao Meio ambiente

Há dispositivos tímidos, a exemplo do art. 47. Tais disposições não foram revogadas com o advento da
novel legislação de proteção ambiental mas, pelo contrário, devem ser interpretadas de acordo com o
sistema instituído pela política nacional do MA.

17.6 Competências

A União tem competência privativa para legislar sobre “jazidas, minas, outros recursos minerais e
metalurgia” (art. 22, XII, CF/88). Os principais diplomas são o DL 227/67, a L. 7.805/89 e o Dec. 62.934/68.
Há leis especiais para minérios sob monopólio da União e águas minerais em fase de lavra, por exemplo.

O DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral) é a autarquia responsável pela outorga dos títulos
minerários e pela fiscalização da exploração em vista da legislação ambiental da União, dos Estados e
Municípios. O controle do Poder Público Federal, por meio do DNPM, dá-se por meio de três

193
procedimentos: Autorização de Pesquisa, Concessão de Lavra e Permissão de Lavra Garimpeira (já
abordados).

17.7 Regimes de Aproveitamento

Os recursos minerais poderão ser aproveitados mediante (I) autorização de pesquisa, (II) concessão de
lavra, (III) permissão de lavra garimpeira, (IV) licenciamento e (V) regime de monopolização, nos termos
do artigo 2.º do CM.

Art. 2º. Os regimes de aproveitamento das substâncias minerais, para efeito deste
Código, são: (Redação dada pela Lei nº 9.314, de 1996)

I - regime de concessão, quando depender de portaria de concessão do


Ministro de Estado de Minas e Energia; (Redação dada pela Lei nº 9.314, de
1996)

II - regime de autorização, quando depender de expedição de alvará de


autorização do Diretor-Geral do Departamento Nacional de Produção Mineral -
DNPM; (Redação dada pela Lei nº 9.314, de 1996)

III - regime de licenciamento, quando depender de licença expedida em


obediência a regulamentos administrativos locais e de registro da licença no
Departamento Nacional de Produção Mineral - DNPM; (Redação dada pela Lei
nº 9.314, de 1996)

IV - regime de permissão de lavra garimpeira, quando depender de portaria de


permissão do Diretor-Geral do Departamento Nacional de Produção Mineral -
DNPM; (Redação dada pela Lei nº 9.314, de 1996)

V - regime de monopolização, quando, em virtude de lei especial, depender de


execução direta ou indireta do Governo Federal. (Incluído pela Lei nº 9.314, de
1996)

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica aos órgãos da


administração direta e autárquica da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, sendo-lhes permitida a extração de substâncias minerais de emprego
imediato na construção civil, definidas em Portaria do Ministério de Minas e
Energia, para uso exclusivo em obras públicas por eles executadas diretamente,
respeitados os direitos minerários em vigor nas áreas onde devam ser executadas
as obras e vedada a comercialização. (Redação dada pela Lei nº 9.827, de 1999)

Obs. As autorizações e concessões somente podem ser transferidas mediante anuência do Poder Público
(art. 176, § 3°, CF/88).

17.7.1 Permissão de lavra

O regime de permissão da lavra garimpeira também é regulado pela Lei 7.805/1989, a ser outorgada pelo
DNPM, pelo prazo de até cinco anos (renovável), sendo o título pessoal e não podendo a área extrapolar
a 50 ha, salvo se outorgada a cooperativa.

194
Considera-se o regime de permissão de lavra garimpeira como o aproveitamento imediato de jazimento
mineral que, por sua natureza, dimensão, localização e utilização econômica, possa ser lavrado,
independentemente de prévios trabalhos de pesquisa, segundo critérios fixados pelo Departamento
Nacional de Produção Mineral.

A Permissão de Lavra Garimpeira estabelece deveres ambientais para o seu titular (art. 9°, da Lei nº
7.805/1989). A outorga de permissão depende de prévio licenciamento concedido pelo órgão ambiental
competente (art. 3°, da Lei nº 7.805/1989). O licenciamento pode se dar nos três níveis da federação, sem
qualquer hierarquia entre eles. Bastará o indeferimento de uma licença ambiental para que o DNPM não
possa outorgar a permissão da lavra garimpeira.

Garimpagem (lato sensu) abarca a faiscação e a cata, depende de permissão do governo federal, sendo
modalidades rudimentares de mineração, de índole individual e por conta própria.
Nos regramentos do art. 10 da Lei nº 7.805/1989 garimpagem em sentido amplo é “a atividade de
aproveitamento de substâncias minerais garimpáveis, executadas no interior de áreas estabelecidas para
este fim exercida por brasileiro, cooperativa de garimpeiro, autorizada a funcionar como empresa de
mineração, sob o regime de permissão de lavra de garimpeira”. A permissão também depende de
aquiescência do dono da propriedade.

Excepcionalmente, o artigo 7.º dessa Lei possibilita a outorga de permissão garimpeira em área de
manifesto de mina ou de concessão de lavra, a critério do DNPM, se for possível a compatibilização de
ambos os regimes.

17.7.2 Autorização de pesquisa

A autorização de pesquisa depende de prévia outorga do DNPM, autarquia federal vinculada ao Ministério
de Minas e Energia, consistindo na execução dos trabalhos necessários à definição da jazida, sua
avaliação e a determinação da exequibilidade do seu aproveitamento econômico.

O terceiro que explorou clandestinamente área objeto de outorga para pesquisa


de viabilidade de lavra de minérios deve indenizar o particular que possuía o
direito de pesquisa e de lavra. Ainda que o Estado seja o proprietário exclusivo das
reservas minerais existentes no solo e subsolo, ao concessionário particular é
garantida a propriedade do produto de sua exploração, fazendo emergir da nossa
ordem constitucional o princípio do livre acesso aos recursos minerais. Nesse
cenário, o Código de Mineração trouxe o importante instituto da prioridade, ou
seja: cumpridas as determinações legais, o minerador faz jus à obtenção de um
título minerário, obedecida a prioridade prevista no art. 11, a, do Decreto-
Lei227/1967. Desse modo, para fins de fixação do direito de prioridade, o referido
dispositivo estabelece que se tomará em consideração a data do requerimento
relativo à pesquisa ou à exploração de área considerada livre. Concedido o alvará
de pesquisa e verificada a viabilidade da exploração em conclusão dos trabalhos de
pesquisa, o autorizatário terá o prazo decadencial ânuo para requerer a concessão
da lavra ou negociar seu direito com terceiros. Daí se extrai que, uma vez
autorizada a pesquisa para fins de mineração, nasce para o autorizatário o direito
subjetivo e exclusivo à futura exploração da mina, como decorrência do direito de
prioridade, durante o prazo decadencial de um ano, contado da aprovação do
relatório final da pesquisa. Portanto, fixado legalmente o direito subjetivo à futura
concessão da lavra como decorrência da autorização de pesquisa, a exploração
indevida, exercida clandestina e ilicitamente por terceiro, que não detinha nenhum
título minerário, resulta em prejuízo injusto ao legítimo autorizatário. Dano esse
195
que, portanto, deve ser-lhe integralmente ressarcido na esteira do art. 927 do CC
(REsp 1.471.571-RO)

17.7.3 Concessão de lavra

Já a concessão de lavra depende de ato do Ministério de Minas e Energia (portaria), compreendendo o


conjunto de operações coordenadas objetivando o aproveitamento industrial da jazida, desde a extração
das substâncias minerais úteis que contiver, até o beneficiamento das mesmas.

A outorga da lavra exige que (1) a jazida esteja pesquisada, (2) com relatório aprovado pelo DNPM, bem
como que (3) a área de lavra ser adequada à condução técnico-econômica dos trabalhos de extração e
beneficiamento, respeitados os limites da área de pesquisa.

A concessão de lavras depende de prévio licenciamento do órgão ambiental competente.

Não haverá lavra se esta for considerada prejudicial ao bem público ou comprometer interesses que
superem a utilidade da exploração industrial, a juízo do Governo. Será considerada ambiciosa a lavra
conduzida sem observância do plano preestabelecido, ou efetuada, de modo a impossibilitar o ulterior
aproveitamento econômico da jazida.

As obrigações ambientais do concessionário estão previstas no art. 47, incisos X a XII, do DL 227/1967 e do
art. 16 da Lei nº 7.805/1989 que, pondera ao prévio licenciamento ambiental.

17.7.4 Regime de licenciamento

Os recursos minerais também poderão ser aproveitados pelo regime de licenciamento, regulado pela Lei
6.567/1978, que se limita a substâncias minerais em áreas restritas, sendo facultado exclusivamente ao
proprietário do solo ou a quem dele tiver expressa autorização, dispensando a pesquisa mineral.

Poderão ser objeto de licenciamento o aproveitamento de areias, cascalhos e saibros para utilização
imediata na construção civil, no preparo de agregados e argamassas, desde que não sejam submetidos a
processo industrial de beneficiamento, nem se destinem como matéria-prima à indústria de
transformação; rochas e outras substâncias minerais, quando aparelhadas para paralelepípedos, guias,
sarjetas, moirões e afins; argilas usadas no fabrico de cerâmica vermelha e rochas, quando britadas para
uso imediato na construção civil e os calcários empregados como corretivo de solo na agricultura.

17.8 Deveres relacionados à exploração minerária

Deveres do titular da concessão (art. 47 do Código de Mineração): dentre outros, “II - Lavrar a jazida de
acordo com o plano de lavra aprovado pelo D.N.P.M., e cuja segunda via, devidamente autenticada, deverá
ser mantida no local da mina; III - Extrair somente as substâncias minerais indicadas no Decreto de
Concessão; (...) V - Executar os trabalhos de mineração com observância das normas regulamentares; (...)
VII - Não dificultar ou impossibilitar, por lavra ambiciosa, o aproveitamento ulterior da jazida; VIII -
Responder pelos danos e prejuízos a terceiros, que resultarem, direta ou indiretamente, da lavra; IX -
Promover a segurança e a salubridade das habitações existentes no local; X - Evitar o extravio das águas e
drenar as que possam ocasionar danos e prejuízos aos vizinhos; XI - Evitar poluição do ar, ou da água, que
possa resultar dos trabalhos de mineração; XII - Proteger e conservar as Fontes, bem como utilizar as
águas segundo os preceitos técnicos quando se tratar de lavra de jazida da Classe VIII; XIII - Tomar as
providências indicadas pela Fiscalização dos órgãos Federais; (...)”.

196
Deveres do DNPM (art. 3º da Lei nº 8.876/94): “V – fomentar a produção mineral e estimular o uso
racional e eficiente dos recursos minerais”; “VI – fiscalizar a pesquisa, a lavra, o beneficiamento e a
comercialização dos bens minerais, podendo realizar vistorias, autuar infratores e impor as sanções
cabíveis, na conformidade do disposto na legislação minerária”; “VII – baixar normas, em caráter
complementar, e exercer fiscalização sobre o controle ambiental, a higiene e a segurança das atividades de
mineração, atuando em articulação com os demais órgãos responsáveis pelo meio ambiente e pela
higiene, segurança e saúde ocupacional dos trabalhadores”.

17.9 Servidão administrativa

O artigo 59 do CM instituiu uma servidão administrativa incidente sobre o solo e o subsolo nas
propriedades onde se situam a pesquisa ou lavra, bem como nas vizinhas.

Art. 59. Ficam sujeitas a servidões de solo e subsolo, para os fins de pesquisa ou
lavra, não só a propriedade onde se localiza a jazida, como as
limítrofes. (Renumerado do Art. 60 para Art. 59 pelo Decreto-lei nº 318, de
1967)

Parágrafo único. Instituem-se Servidões para:

a) construção de oficinas, instalações, obras acessórias e moradias;

b) abertura de vias de transporte e linhas de comunicações;

c) captação e adução de água necessária aos serviços de mineração e ao


pessoal;

d) transmissão de energia elétrica;

e) escoamento das águas da mina e do engenho de beneficiamento;

f) abertura de passagem de pessoal e material, de conduto de ventilação e de


energia elétrica;

g) utilização das aguadas sem prejuízo das atividades pre-existentes; e,

h) bota-fora do material desmontado e dos refugos do engenho.

17.10 Estudos de Impacto Ambiental e Atividades de Mineração

A mineração, assim como as demais atividades utilizadoras de recursos ambientais, está submetida à
necessidade de licenciamento, para que possa ser exercido o licitamente, este deve ser em conformidade
com a lei brasileira (art. 10 da Lei nº 6.938/81). Há, entretanto, direito especial quanto ao regime jurídico
do licenciamento das atividades minerarias – Lei nº 7.805/89:

Art. 17. A realização de trabalhos de pesquisa e lavra em áreas de conservação


dependerá de prévia autorização do órgão ambiental que as administre.
197
O licenciamento é obrigatório tanto para a permissão de lavra garimpeira (art. 3º da Lei nº 7.805/89)
quanto para a concessão de lavra (art. 16 da Lei nº 7.805/89), concedido pelos órgãos ambientais
competentes na estrutura do SISNAMA.

O licenciamento ambiental da atividade mineraria é, prioritariamente, realizado pelos órgãos estaduais


integrantes do SISNAMA. Entretanto, nem sempre as atividades minerárias são potencialmente causadoras
de significativa degradação do MA (Resolução CONAMA n. 10/90).

Obs. Exploração mineral em áreas de conservação: depende de prévia autorização do órgão ambiental que
a administre (art. 17, Lei nº 7.805/89).
EIA: sempre necessário (Resolução 01/86, art. 2º, IX; e Resolução nº 09/90, ambas do CONAMA).

Previsões legais:

A Lei nº 7.805/89, no art. 3º exige prévio licenciamento ambiental para a outorga de premissa de lavra
garimpeira.

A Resolução do CONAMA nº 01/1986 em seu art. 2º, IX, disciplina que o EIA-RIMA, elenca a atividade de
extração de minérios como causadora de significativa degradação ambiental, sendo obrigatória a prévia
realização do referido estudo ambiental.

A Resolução do CONAMA nº 09/1990 aduz que, a pesquisa mineral “demanda prévio Licenciamento
Ambiental quando demandar guia de utilização”, além disso, o empreendedor deve requerer a licença de
operação e apresentar plano de pesquisa mineral, com avaliação do impacto ambiental e as medidas
mitigatórias a serem adotadas. A Resolução do CONAMA n. 9/90 cometeu ilegalidade ao exigir
licenciamento ambiental para as atividades de pesquisa mineral, pois, nos termos da legislação vigente
(art. 16 a 18 da L. 7.805/89 e Dec. 98.812/90), a pesquisa mineral só depende do licenciamento
exclusivamente minerário.

A Resolução CONAMA nº 10/1990 regula a exploração de minérios classe II (minerais empregadas na


construção civil, argilas em cerâmicas velhas, calcário na agricultura), que prevê a possibilidade de
dispensa o EIA-RIMA, devendo apresentar somente o RCA – Relatório de Controle Ambiental.

Na hipótese de lavra, salvo a garimpagem, deverá submeter seu pedido de licenciamento ambiental ao
órgão estadual de meio ambiente ou ao IBAMA (quando tiver que prestar todas as informações técnicas
respectivas ao empreendimento, nos meandros da legislação ambiental).

A Licença Prévia é requerida ao órgão ministerial competente, ocasião em que o empreendedor deverá
apresentar os “Estudos de Impacto Ambiental”, com os respectivos “Relatórios de Impacto Ambiental”
(Resolução do CONAMA nº 1/1986, art, 2, IX).

A Licença de Instalação é requerida ao órgão ambiental competente, ocasião em que, o empreendedor


deverá apresentar o “Plano de Controle Ambiental - PCA”, que contém os projetos executivos de
minimização dos impactos ambientais (avaliados no LP).

A concessão da Portaria de Lavra fica condicionada à apresentação ao Departamento Nacional de Proteção


Ambiental, por parte do empreendedor, da Licença de Instalação, sendo que após a obtenção da Portaria
de Lavra e a implantação dos projetos constantes no PCA, aprovados quando da concessão de Licença de

198
Instalação, o empreendedor deverá requerer a Licença de Operação, apresentando a documentação
necessária.

17.11 Atividades com repercussões ambientais

O legislador embora tenha exigido que, as atividades minerarias se façam com respeito à legislação de
proteção ao MA e mediante critérios bastante rígidos de segurança, admitiu que, durante a fase de
extração, são inevitáveis os resultados negativos sobre o MA.

O titular de autorização de pesquisa, de permissão de lavra garimpeira, de concessão de lavra, de


licenciamento ou de manifesto de mina responde pelos danos causados ao meio ambiente.

A recuperação dos danos ambientais causados pela mineração é, precipuamente, uma atividade de
compensação, pois raramente é possível o retorno, ao status quo ante, de um local que tenha sido
submetido a atividades de mineração.

É proibida a atividade de exploração e prospecção de minérios em parques nacionais, estaduais e


municipais, reservas biológicas (art. 5°, p. ún., L. 4.771/65); estações ecológicas (L. 6.902/1981); áreas
tombadas (art. 17, DL 25/1937); áreas de preservação permanente - APPs (arts. 2° e 3° da L. 4.771/65);
áreas de reserva legal - ARLs (art. 16, L. 4.771/1965).

Nas áreas de proteção ambiental - APAs, a exploração somente é admitida se for demonstrada pelo
requerente sua compatibilidade com as regras estabelecidas para aquela área específica, além das normas
gerais previstas no art. 9° da L. 6.902/1981. Nesse sentido, a Res. 10/88 CONAMA, art. 6°.

A realização de trabalhos de pesquisa e lavra em áreas de conservação dependerá de prévia autorização


do órgão ambiental que as administre.

A exploração mineral deve ser acompanhada de plano de recuperação da área degradada (art. 225, § 2°,
CF/88), que deve ser apresentado por ocasião do EIA/RIMA (art. 6°, III, Res. 1/86 CONAMA). Aquele que
deixa de recuperar a área pesquisada incorre no crime (art. 55, Parágrafo único, da Lei nº. 9.605/1998).

A poluição da água e do ar sujeita o infrator às penas de advertência, multa e caducidade da autorização


de pesquisa mineral ou da concessão da lavra (art. 63, DL 227/67).

O art. 21, Parágrafo único, da Lei nº. 7.805/1989 permite a apreensão da produção mineral e dos bens
utilizados na exploração realizada de forma sem a necessária permissão, concessão ou licença.

Ponto 18 - Efetivação da proteção normativa ao meio ambiente: Poder Judiciário, Ministério Público e
Administração Pública.

18.1 Poder Judiciário

Cabe à Justiça Comum (Federal e Estadual) a competência para processo e julgamento de questões
ambientais. Excepcionalmente, caberá à Justiça do Trabalho o julgamento de causas fundadas em questões
atinentes ao meio ambiente do trabalho (STF, RE 213.015).

199
O juiz, na tutela dos interesses difusos, assume o papel de guardião da atividade programada, seja
garantindo a efetivação das medidas administrativas, seja garantindo a legalidade do procedimento
administrativo, e de estímulo ao seu cumprimento pelas partes.

São fundamentais as medidas judiciais preventivas de proteção ao meio ambiente, já que é quase
impossível ao retorno ao status quo ante.

Assim, o sistema constitucional de proteção ao meio ambiente ocorre, principalmente, por meio das
tutelas inibitórias previstas nos arts. 461, do CPC, e 84, do CDC, possibilitando a antecipação da ocorrência
do dano.

Também é destacada a ação mandamental preventiva do art. 102, do CDC, tratando-se de ação de rito
ordinário movida contra o Poder Público, do que pode resultar um provimento judicial de natureza
mandamental, inclusive antecipatório de tutela (art. 84, § 3º, CDC), tendo como objeto obrigação de fazer,
a ser cumprida sob pena de multa

Apesar do acesso ao Judiciário se dar por diversas vias, Paulo Affonso Leme Machado lista, como principais
formas de tutela jurisdicional do meio ambiente: a) a ação popular; b) a participação do Ministério Público
(inquérito civil, recomendações e compromisso de ajustamento de conduta); c) e a ação civil pública.

18.1.1 Microssistema de tutela coletiva

Com a formação jurídica dos direitos difusos, a jurisdição civil apresenta-se em dois sistemas de tutela
processual: a) um destinado às lides individuais, cujo principal instrumento é o Código de Processo Civil; b)
e outro voltado para a tutela coletiva, baseado fundamentalmente nas Leis 7.347/85 e 8.078/90 (CDC).

Considerando que o meio ambiente é um bem difuso, sua defesa recebe tratamento nas normas
procedimentais previstas na jurisdição coletiva (Título III do CDC, Lei da Ação Civil Pública, Lei da Ação
Popular e Mandado de Segurança Coletivo), com a aplicação subsidiária do CPC.

A promulgação do Código de Processo Civil de 2015 não traz mudanças significativas ao microssistema
coletivo, pois o CPC15 deixou de contemplar o processo coletivo: só contém normas esparsas a respeito,
com algumas referências à tutela coletiva. Hugo Nigro Mazzilli destaca que o CPC15: “remeteu
expressamente ao sistema da Lei da Ação Civil Pública e do Código de Defesa do Consumidor, como no art.
139, X; quis que os casos repetitivos fossem julgados por meio do incidente de resolução de demandas
repetitivas (art. 976 e s.); alargou a atuação do Ministério Público nos litígios coletivos que envolvessem a
posse de terra rural ou urbana (art. 178, III), o que não é de todo uma novidade, pois o CPC de 1973, em
seu art. 83, III, já previa a participação do Ministério Público em conflitos coletivos possessórios; previu a
suspensão dos processos individuais nos casos em que a repercussão geral tivesse sido reconhecida (art.
1.037, II); previu também a aplicação da tese jurídica fixada no IRDR a processos individuais e coletivos
(art. 985)”.

O autor sustenta que “não é verdade que o Código de Processo Civil de 2015 seja voltado para o coletivo.
Ele contemplou, sim, incidentes que tornariam as teses dos tribunais vinculantes para os juízes inferiores
ou resolveriam lides repetitivas, mas omitiu totalmente a disciplina do processo coletivo”.

200
18.1.2 Termo de Ajustamento de Conduta – TAC

É possível, nos termos do art. 5º, §6º, Lei 7347/85, que os órgãos legitimados firmem TAC objetivando
tratar de temas ambientais. Tal termo não poderá transacionar sobre a matéria ambiental, mas tão
somente sobre a forma de cumprimento das obrigações ambientais.

O STJ decidou que a assinatura de TAC ambiental não é capaz de afastar a tipicdade penal, pois a extensão
nesta seara não é alcançada pela esfera administrativa ou civil - independência de instâncias. O
cumprimento do TAC servirá, no máximo, para atenuar a sanção penal imposta (Informativo STJ 467 e REsp
1.294.980)

Ponto 19 - Política energética e meio ambiente

19.1 Breve introdução

As fontes de energia são elementos ou corpos que contêm ou transformam a energia, a exemplo do sol e
das usinas hidroelétricas, pois estas conseguem converter a energia cinética em elétrica com a força das
águas que impulsionam as turbinas. Podem ser classificadas em renováveis ou não renováveis.

A discussão sobre as políticas energéticas a serem adotadas pelas nações está na ordem do dia nos
debates mundiais. É certo que a energia gerada pela queima de combustíveis fósseis vem gerando o
célere aquecimento do Planeta Terra, havendo o comprometimento de muitas nações na redução da
emissão dos gases que causam efeito estufa, a exemplo da celebração do Protocolo de Quioto.
Da mesma forma, o crescimento das economias exige uma maior utilização de energia pelas indústrias
e pelo comércio, sendo diretamente proporcional, forçando as nações a cada vez mais investirem em
novas fontes energéticas para não estagnar o avanço econômico.
No Brasil, viveu-se uma crise energética principalmente nos anos 2001 e 2002, conhecida como
"apagão", pois houve um grande risco de não existir energia suficiente para mover a economia, tendo
em vista a ausência de chuvas que prejudicou as atividades nas usinas hidroelétricas, atestando a
fragilidade da política energética do país.
Não faltou somente chuva neste período, mas também um planejamento e investimentos no setor, vez
que a ocorrência de períodos contínuos de seca é algo que deve ser previsto pelo Poder Público. Na
época, houve um racionamento de energia que foi decisivo para prevenir o pior, além de ter
colaborada na educação energético-ambiental da população.
Por outro lado, existem também inúmeros problemas ambientais a serem equacionados pelo
crescimento do setor energético. As fontes de energia fóssil geram o aumento do efeito estufa e da
temperatura na Terra. A fonte hidrelétrica exige o alagamento de extensas áreas com significativo
impacto ambiental, a exemplo da construção da usina de Belo Monte, no Estado do Pará.
Já a energia nuclear é deveras perigosa, pois os acidentes que podem ocorrer são altamente lesivos ao
ambiente e à saúde da população, a exemplo da tragédia ocorrida em Fukushima, no Japão, em 2011.
As fontes "limpas" de energia, especialmente a solar e a eólica, contam com o inconveniente de ainda
não serem viáveis economicamente, sendo pouco utilizadas pelas nações e gerando pouca energia.
Em 2007, a Comissão Europeia propôs um pacote integrado relativo à energia e às alterações climáticas
para reduzir a emissão de gases com efeito estufa. O pacote energético visava a estabelecer uma nova
Política Energética para a Europa, com o objetivo de combater as alterações climáticas e dinamizar a
segurança energética e a competitividade.
O Conselho Europeu aceitou a maior parte das propostas apresentadas e aprovou ações para
desenvolver uma política europeia integrada em matéria de clima e energia.

201
Pode-se concluir que os países europeus estão se preparando para enfrentar ou prevenir uma potencial
crise energética, bem como adotar fontes menos impactante ao ambiente.
No Brasil, o tema é regulado principalmente pela Lei n. 9.478/97, que dispõe sobre a política energética
nacional, as atividades relativas ao monopólio do petróleo, institui o Conselho Nacional de Política
Energética e a Agência Nacional do Petróleo.
19.2 Política Energética no Brasil

A abertura do setor petrolífero nacional, promovida pela Emenda Constitucional n. 9, de 9 de novembro de


1995, exigiu a determinação de princípios que norteassem o novo plano estratégico de desenvolvimento.
Isto se deu pela edição da Lei n. 9.478/97, conhecida como Lei do Petróleo, que além de prever a criação
de um órgão regulador para o setor – a Agência Nacional do Petróleo (ANP) – trata das condições de
contratação com os novos atores da indústria petrolífera e dos princípios que o Poder Público deve
observar no delineamento das políticas públicas relacionadas ao setor energético.

A Lei do Petróleo trata principalmente do setor energético que lhe dá o nome, mas a este não se limita. Ao
cuidar dos princípios e objetivos da Política Energética Nacional, aborda a generalidade das fontes de
energia disponíveis.

É preciso destacar que os princípios fundantes e os objetivos da Política Energética foram reproduzidos,
em boa parte, a partir dos princípios constitucionais norteadores da República Federativa e da Ordem
Econômica.

A Lei criou o Conselho Nacional de Política Energética, órgão vinculado à Presidência da República e
presidido pelo Ministro de Estado de Minas e Energia, com a atribuição de propor ao Presidente da
República políticas nacionais e medidas específicas destinadas a promover o aproveitamento racional dos
recursos energéticos do País, em conformidade com os objetivos da Política Energética.

As demais atribuições do CNPE estão no art. 2° e incisos da Lei n. 9.478/97. A estrutura e o funcional do
CNPE são regulados pelo Decreto n. 3.520/2000.

19.3 Petróleo e Gás Natural

São propriedades da União os depósitos de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos
existentes no território nacional, nele compreendidos a parte terrestre, o mar territorial, a plataforma
continental e a zona econômica exclusiva.

Por sua vez, são monopólio da União as atividades de pesquisa e lavra das jazidas de petróleo e gás
natural e outro hidrocarbonetos fluidos; a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro, a importação e
exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades ora previstas e o transporte
marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País,
bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer
origem.

No entanto, desde a promulgação da Emenda Constitucional n. 9, de 1995, essas atividades podem ser
exercidas, mediante concessão, autorização ou contratação sob o regime de partilha de produção, por
empresas constituídas sob as leis brasileiras, com sede e administração no país. A EC, portanto, promoveu
uma flexibilização do monopólio.

Para promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da


indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis foi criada a Agência Nacional do Petróleo, que
conta com previsão constitucional (art. 177, § 2º, III, da CF/88).

202
As demais atribuições na ANP estão no art. 8° da Lei n. 9.478/97. Dentre estas, destaca-se a seguinte:
articular-se com órgãos reguladores estaduais e ambientais, objetivando compatibilizar e uniformizar as
normas aplicáveis à indústria e aos mercados de gás natural.

Destaca-se, em termos de meio ambiente, esta última competência administrativa da ANP, pois a sua
atuação deve ser harmônica e em regime de parceria com os órgãos ambientais das três esferas de
governo, pois não raro as atividades petrolíferas e de gás natural podem gerar acidentes catastróficos
de significativa degradação aos ecossistemas.
Quando, no exercício de suas atribuições, a ANP tomar conhecimento de fato que possa configurar
indício de infração da ordem econômica, deverá comunicá-lo imediatamente ao Conselho
Administrativo de Defesa Econômica – CADE e à Secretaria de Direito Econômico do Ministério da
Justiça, para que estes adotem as providências cabíveis, no âmbito da legislação pertinente.
Nos termos do art. 21 da citada lei, todos os direitos de exploração e produção de petróleo, de gás natural
e de outros hidrocarbonetos fluidos em território nacional, nele compreendidos a parte terrestre, o mar
territorial, a plataforma continental e a zona econômica exclusiva, pertencem à União, cabendo sua
administração à ANP, ressalvadas as competências de outros órgãos e entidades expressamente
estabelecidas em lei

Já a Petróleo Brasileiro S.A - PETROBRÁS - é uma sociedade de economia mista, vinculada ao Ministério de
Minas e Energia, que tem como objeto a pesquisa, a lavra, a refinação, o processamento, o comércio e o
transporte de petróleo proveniente de poço, de xisto ou de outras rochas, de seus derivados, de gás
natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, bem como quaisquer outras atividades correlatas ou afins,
conforme definidas em lei.

Desde a flexibilização do monopólio do petróleo levada a efeito pela EC n. 9/1995, a pesquisa, a lavra, a
refinação, o processamento, o comércio e o transporte de petróleo proveniente de poço, de xisto ou de
outras rochas, de seus derivados, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, bem como quaisquer
outras atividades correlatas ou afins serão desenvolvidas pela PETROBRÁS em caráter de livre competição
com outras empresas, em função das condições de mercado, que inclusive poderá atuar fora do território
nacional.

A PETROBRÁS poderá constituir empresas subsidiárias para o desenvolvimento de suas atividades,


podendo transferir para seus ativos os títulos e valores recebidos por qualquer subsidiária, em
decorrência do Programa Nacional de Desestatização, mediante apropriada redução de sua
participação no capital social da subsidiária.
Por sua vez, as atividades de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e de gás serão
exercidas mediante contrato de concessão, precedidos de licitação, conforme regras estabelecidas na
Lei n. 9.478/98, ou sob o regime de partilha de produção 5 nas áreas do pré-sal 6 e nas áreas
estratégicas, conforme legislação específica (Leis n. 12.304/2010 e 12.351/2010).
Os contratos de concessão deverão prever duas fases: a de exploração e a de produção. Na primeira,
inserem-se as atividades de avaliação de eventual descoberta de petróleo ou gás natural, para
determinação de sua comercialidade. Na segunda, estão incluídas atividades de desenvolvimento.
A concessão implica, para o concessionário, a obrigação de explorar, por sua conta e risco e, em caso
de êxito, produzir petróleo ou gás natural em determinado bloco, conferindo-lhe a propriedade desses

5
Partilha de produção: regime de exploração e produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos
fluidos no qual o contratado exerce, por sua conta e risco, as atividades de exploração, avaliação, desenvolvimento e produção e,
em caso de descoberta comercial, adquire o direito à apropriação do custo em óleo, do volume da produção correspondente
aos royalties devidos, bem como de parcela do excedente em óleo, na proporção, condições e prazos estabelecidos em contrato.
6
Área do pré-sal: região do subsolo formada por um prisma vertical de profundidade indeterminada, com superfície
poligonal definida pelas coordenadas geográficas de seus vértices estabelecidas no Anexo desta Lei, bem como outras regiões
que venham a ser delimitadas em ato do Poder Executivo, de acordo com a evolução do conhecimento geológico.
203
bens, após extraídos, com os encargos relativos ao pagamento dos tributos incidentes e das
participações legais ou contratuais correspondentes.
Ademais, o contrato para exploração, desenvolvimento e produção de petróleo ou gás natural não se
estende a nenhum outro recurso natural, ficando o concessionário obrigado a informar a sua
descoberta, prontamente e em caráter exclusivo, à ANP.
Existem regras licitatórias especiais para a concessão em comento, no que concerne aos critérios de
julgamento das propostas. Da mesma forma, obrigatoriamente, a Lei n. 9.478/1997 prevê disposições
especiais que deverão constar do edital e do contrato a ser celebrado. Interessante notar que, em caso
de empate, a licitação será decidida em favor da PETROBRÁS, quando esta concorrer não consorciada
com outras empresas.
A participação governamental na concessão consistirá em bônus de assinatura, royalties, participação
especial e pagamento pela ocupação ou retenção de área, sendo as duas últimas de previsão contratual
obrigatória.
Constará também do contrato de concessão de bloco localizado em terra cláusula que determine o
pagamento aos proprietários da terra de participação equivalente, em moeda corrente, a um
percentual variável entre cinco décimos por cento e um por cento da produção de petróleo ou gás
natural, a critério da ANP.
As concessões serão extintas pelo vencimento do prazo contratual, por acordo entre as partes, pelos
motivos de rescisão previstos em contrato, ao término da fase de exploração, sem que tenha sido feita
qualquer descoberta comercial, conforme definido no contrato, no decorrer da fase de exploração, se o
concessionário exercer a opção de desistência e de devolução das áreas em que, a seu critério, não se
justifiquem investimentos em desenvolvimento.
Insta destacar que, em qualquer caso de extinção da concessão, o concessionário fará, por sua conta
exclusiva, a remoção dos equipamentos e bens que não sejam objeto de reversão, ficando obrigado a
reparar ou indenizar os danos decorrentes de suas atividades e praticar os atos de recuperação
ambiental determinados pelos órgãos competentes.
Na forma do art. 3° da Lei n. 12.351/2010, a exploração e a produção de petróleo, de gás natural e de
outros hidrocarbonetos fluidos na área do pré-sal e em áreas estratégicas serão contratadas pela União
sob o regime de partilha de produção.
Demais disso, a PETROBRÁS será a operadora de todos os blocos contratados sob o regime de partilha
de produção, sendo-lhe assegurado, a este título, participação mínima no consórcio, não cabendo à
União assumir os riscos das atividades de exploração, avaliação, desenvolvimento e produção
decorrentes dos contratos de partilha de produção.
No caso específico das áreas localizados no pré-sal eventualmente contratadas sob o regime de
concessão, a parcela dos royalties que cabe à administração direta da União será destinada
integralmente ao fundo de natureza contábil e financeira, criado por lei específica, com a finalidade de
constituir fonte de recursos para o desenvolvimento social e regional, na forma de programas e
projetos nas áreas de combate à pobreza e de desenvolvimento da educação, da cultura, do esporte,
da saúde pública, da ciência e tecnologia, do meio ambiente e de mitigação e adaptação às mudanças
climáticas, vedada sua destinação para outras despesas.

19.4 Biocombustíveis

O biocombustível é o combustível biológico que não tem origem fóssil, normalmente oriundo da cana-
de-açúcar, do milho, da mamona, da beterraba, dentre outros produtos agrícolas.
Legalmente, é definido como a substância derivada de biomassa renovável, tal como biodiesel, etanol e
outras substâncias estabelecidas em regulamento da ANP, que pode ser empregada diretamente ou
204
mediante alterações em motores a combustão interna ou para outro tipo de geração de energia,
podendo substituir parcial ou totalmente combustíveis de origem fóssil (Lei n. 12.490/2011).
A vantagem do biocombustível é ser uma alternativa ao petróleo, tendo um processo de produção
menos impactante ao meio ambiente, bem como uma menor emissão de CO2, reduzindo o efeito
estufa.
Mas existem sérias desvantagens, inclusive ambientais. É possível que o objetivo de lucrar com os
biocombustíveis incentive o desmatamento de florestas nativas, com o propósito de plantar cana-de-
açúcar e outros gêneros agrícolas, além de ocupar áreas antes destinadas ao plantio de produtos de
subsistência, além de elevar o consumo de água.
De acordo com a Lei n. 12.490/2011, qualquer empresa ou consórcio de empresas constituídas sob as
leis brasileiras com sede e administração no País poderá obter autorização da ANP para exercer as
atividades econômicas da indústria de biocombustíveis.
Não são sujeitas à regulação e à autorização pela ANP a produção agrícola, a fabricação de produtos
agropecuários e alimentícios e a geração de energia elétrica, quando vinculadas ao estabelecimento no
qual se construirá, modificará ou ampliará a unidade de produção de biocombustível.
19.5 Política Nacional de Conservação e Uso Racional de Energia

Especialmente em razão do risco do "apagão" a partir do ano 2001, a União aprovou a Política Nacional
de Conservação e Uso Racional de Energia por meio da Lei n. 10.295/2001, que visa à alocação eficiente
de recursos energéticos e a preservação do meio ambiente.
Ora, cada vez mais é preciso utilizar a energia de modo mais eficiente e racional, prevenindo-se o seu
desperdício e adotando-se a produção de equipamentos com baixo consumo de energia com o manejo
de novas tecnologias.
Segundo a referida lei, cabe ao Poder Executivo estabelecer níveis máximos de consumo específico de
energia, ou mínimos de eficiência energética, de máquinas e aparelhos consumidores de energia
fabricados ou comercializados no País, com base em indicadores técnicos pertinentes.
Os fabricantes e os importadores de máquinas e aparelhos consumidores de energia são obrigados a
adotar as medidas necessárias para que sejam obedecidos os níveis máximos de consumo de energia e
mínimos de eficiência energética, constantes da regulamentação específica estabelecida para cada tipo
de máquina e aparelho.
As máquinas e aparelhos consumidores de energia encontrados no mercado sem as especificações
legais, quando da vigência da regulamentação específica, deverão ser recolhidos, no prazo máximo de
30 (trinta) dias, pelos respectivos fabricantes e importadores.
Findo este prazo, os fabricantes e importadores estarão sujeitos às multas por unidade, a serem
estabelecidas em regulamento, de até 100% (cem por cento) do preço de venda por eles praticados.
Previamente ao estabelecimento dos indicadores de consumo específico de energia, ou de eficiência
energética, de que trata a aludida lei, deverão ser ouvidas em audiência pública, com divulgação
antecipada das propostas, entidades representativas de fabricantes e importadores de máquinas e
aparelhos consumidores de energia, projetistas e construtores de edificações, consumidores,
instituições de ensino e pesquisa e demais entidades interessadas.
Eis uma aplicação do Princípio da Participação Comunitária.
Vide Decreto n. 4.059/2001, que regulamenta a Lei n. 10.295/2001 e institui o Comitê Gestor de
Indicadores e Níveis de Eficiência Energética - CGIEE.

205
19.6 Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica

Em meio à crise energética, a União criou o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia
Elétrica (PROINFA), por meio da Lei n. 10.438/2002, que ainda dispôs sobre a expansão da oferta de
energia elétrica emergencial e a recomposição tarifária extraordinária.
O PROINFA tem como objetivo aumentar a participação da energia elétrica produzida por
empreendimentos de Produtores Independentes Autônomos, concebidos com base em fontes eólica,
pequenas centrais hidrelétricas e biomassa, no Sistema Elétrico Interligado Nacional, sendo
implementado em duas etapas (para aprofundamento do tema, vide art. 3° da Lei n. 10.438/2002).
O Produtor Independente é Autônomo quando sua sociedade, não sendo ela própria concessionária de
qualquer espécie, não é controlada ou coligada de concessionária de serviço público ou de uso do bem
público de geração, transmissão ou distribuição de energia elétrica, nem de seus controladores ou de
outra sociedade controlada ou coligada com o controlador comum.
O intuito é promover a diversificação da Matriz Energética Brasileira, buscando alternativas para
aumentar a segurança no abastecimento de energia elétrica, além de permitir a valorização das
características e potencialidades regionais e locais.
O grande benefício ambiental trazido pelo PROINFA foi o desenvolvimento da matriz energética eólica
nacional, considerada como energia limpa.
19.7 Energia Nuclear

São diversas as atividades nucleares que podem ser desenvolvidas pelas nações como, por exemplo, a
produção de armamento, geração de energia nuclear, pesquisas e usos médicos. A Política Nacional de
Energia Nuclear foi instituída pela Lei n. 4.118 de 1962.

No Brasil, é da competência exclusiva na União explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer


natureza e exercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a
industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados (art. 21, XXIII, CF).

Registre-se, ainda, que toda atividade nuclear em território nacional somente é admitida para fins
pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional. Neste sentido, dispõe o art. 48, XIV, da CF, ser da
competência exclusiva do CN aprovar iniciativas do Poder Executivo referentes a atividade nuclear.

Conforme inovação inaugurada pela EC n. 49/2006, sob regime de permissão, são autorizadas a
comercialização e a utilização de radioisótopos para a pesquisa e usos médicos, agrícolas e industriais.

Da mesma forma, sob regime de permissão, são autorizadas a produção, comercialização e utilização de
radioisótopos de meia-vida igual ou inferior a duas horas. Esses isótopos radioativos podem ser utilizados
especialmente para detectar doenças do coração e do pulmão.

Por tudo isso, conclui-se que constitui monopólio da União a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e
reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, com ressalva
das exceções descritas acima, não podendo haver delegação desta atividade para empresas privadas.
Trata-se de uma exceção à livre-iniciativa ao trabalho que fundamenta a Ordem Econômica no Brasil,
especialmente em razão de imperativos de segurança nacional.

O monopólio da União é exercido pela Comissão Nacional de Energia Nuclear - CNEN, autarquia federal
criada em 1956 (na época, como órgão) e vinculada ao Ministério de Ciência e Tecnologia.

O art. 21, XXIII, da CF, ainda prevê que a responsabilidade civil por danos nucleares independe da
existência de culpa (teoria do risco integral), tema regulamentado pela Lei n. 6.453/1977. Considera-se
dano nuclear o dano pessoal ou material produzido como resultado direto ou indireto das propriedades

206
radioativas, da sua combinação com as propriedades tóxicas ou com outras características dos materiais
nucleares, que se encontrem em instalação nuclear, ou dela procedentes ou a ela enviados.

A competência legislativa é exclusiva da União (art. 22, XXVI, CF/88) e o art. 225, §6°, da CF prescreve que
as usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que
não poderão ser instaladas. Logo, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão editar atos
normativos acerca das atividades nucleares, tema reservado ao ente federal (v. ADI 329/SC).

O destino final dos rejeitos radioativos produzidos no território nacional é regulado pela Lei n. 10.308/2001.
Considera-se rejeito radioativo qualquer material resultante de atividades humanas, que contenha
radionuclídeos em quantidades superiores aos limites de isenção, estabelecidos pela CNEN, para o qual a
reutilização é imprópria e não prevista.

Não se sabe ao certo o que fazer com os rejeitos radioativos. Este, certamente, juntamente com os riscos
de acidentes, é o principal problema da energia nuclear. Inexiste tecnologia para retirar imediatamente a
sua carga nociva ao ambiente e à saúde humana, devendo-se esperar a ação do tempo para a sua
descontaminação, razão pela qual os rejeitos devem ser depositados em algum lugar considerado seguro.
Para aprofundamento do tema "rejeitos radioativos" (incabível neste resumo), estudar a Lei n.
10.308/2001.

No Brasil, o maior acidente com rejeitos radioativos ocorreu no Estado de Goiás, em 13 de setembro de
1987. A União foi responsabilizada solidariamente pelo acidente, por decisão do STJ.

19.8 Usinas hidrelétricas

Matriz energética é o conjunto de todos os tipos de energia que um país produz e consome. A matriz
energética brasileira é uma das mais limpas do planeta, porque parte significativa da energia consumida
aqui provém de fontes renováveis (recursos hídricos, biomassa, etanol). De acordo com Resenha
Energética divulgada pelo Ministério de Minas e Energia em 2015 (ano base 2014), 39% da energia
consumida no Brasil foi produzida a partir de fontes renováveis, enquanto nos países integrantes da OCDE
o percentual foi de 10%. Considerando todos os países do mundo, o percentual foi de 14%,

A principal fonte de energia renovável no Brasil é o aproveitamento do potencial hidráulico. Ainda de


acordo com a Resenha Energética divulgada pelo MME em 2015, tal predominância foi menos acentuada
em 2014 (65,2%), se comparada ao ano anterior, em que correspondeu a 70,6% da energia renovável
consumida no país.

Apesar dos benefícios decorrentes da utilização da energia renovável, o seu aproveitamento resulta em
diversas modificações no meio ambiente, provocando impactos sérios e, muitas vezes, irreversíveis, tais
como: inundação de terras agricultáveis, cidades, sítios arqueológicos; desordenação da vida aquática no
curso d'água onde é construída a barragem; alteração climática; mortandade de animais; redução da
biodiversidade; danos paisagísticos; erosão; assoreamento. Isso sem considerar os danos à população
residente nas áreas afetadas, como as comunidades ribeirinhas que, não raro, são realocadas e privadas
do seu meio habitual de sustento.

A CF/88 determina que o Poder Público exija, na forma da lei, Estudo de Impacto Ambiental (EIA) para
instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental (art. 225,
§ 1º, IV).

Tal exigência está diretamente relacionada a dois princípios centrais do Direito Ambiental: o da precaução
e o da prevenção. Enquanto este último tem aplicação diante de riscos certos e de perigo concreto de
danos, o primeiro se relaciona com riscos incertos e perigo abstrato e potencial. O certo é que, em ambas
as situações, a realização do estudo de impacto ambiental é indispensável. No primeiro caso, para verificar

207
a viabilidade do empreendimento, a partir do estado de técnica atual, e, no segundo, para dimensionar o
impacto ambiental.

No caso das centrais hidrelétricas, é sabido que a atividade causará significativos impactos ambientais: “O
EIA/RIMA não servirá tanto para demonstrar a inexistência dos danos, mas, sobretudo, seu alcance, formas
de mitigação e compensação. O que não se pode admitir é a elaboração de EIA sem consideração da
hipótese de não-realização da obra, como vem ocorrendo”.

Já em relação ao princípio da precaução, tem-se dito que “o princípio tem aplicação irrestrita. Qualquer
atividade que tenha potencialidade para afetar a quantidade ou a qualidade da água dos mananciais deve
ser analisada com profundidade, buscando-se sempre evitar o agravamento da crise da água. Isso não quer
dizer que toda e qualquer dimensão de dano seja impeditiva da atividade potencialmente poluidora. O que
se exige é a realização do estudo de impacto ambiental, do desenvolvimento do estado da técnica, da
busca de alternativas não ou menos poluentes. A partir de todos esses recursos, a deliberação deve ser
tomada com suporte no princípio do desenvolvimento sustentável, mas somente após amplo
conhecimento da situação e dos riscos, dos prós e dos contras. A solução tem de ser consciente e
responsável; se foi acertada, por vezes só o futuro evidenciará.”

O princípio do desenvolvimento sustentável tem o papel de conciliar desenvolvimento econômico,


preservação ambiental e redução das desigualdades sociais. O princípio surgiu porque o modelo de
crescimento econômico e demográfico implementado durante o curso do século XX começou a oferecer
sinais claros de que estamos ultrapassando os limites de suportabilidade natural do planeta. Estes limites
podem ser sentidos no plano global de várias maneiras e com sérios reflexos sociais e econômicos: a) o
contínuo desaparecimento de espécies da fauna e da flora; b) a perda de solos férteis pela erosão e pela
desertificação; c) o aquecimento da atmosfera e as mudanças climáticas; d) a diminuição da camada de
ozônio; e) a chuva ácida; f) o acúmulo crescente de lixo e resíduos industriais; g)o colapso na quantidade e
na qualidade da água.

No âmbito da Política Nacional do Meio Ambiente, o licenciamento ambiental é o principal instrumento


para prevenção de danos ambientais decorrentes das atividades das usinas hidrelétricas. O procedimento
é regulamentado pela Lei 6.938/81, Resolução 237/97 do CONAMA e pela LC 140/2011, que estabelecem
regras gerais. Após o apagão de 2001, sobreveio a Resolução 279/2001 do CONAMA, que instituiu um
procedimento simplificado para o licenciamento ambiental, com prazo máximo de 60 dias, para
empreendimento com impacto ambiental de pequeno porte, necessários ao incremento de oferta de
energia elétrica no país. Priorizou-se a produção de energia para garantir o abastecimento nacional em
detrimento da proteção ambiental.

Já foi objeto de pergunta de concurso : como reduzir ao máximo os possíveis danos ambientais. A resposta
registrada pelo anotador foi “gestão eficiente do processo”. Isto é, a pessoa física ou jurídica responsável
pelo aproveitamento do potencial hidráulico deve implementar um Sistema de Gestão Ambiental (SGA),
que corresponde a um conjunto inter-relacionado de políticas, práticas e procedimentos organizacionais,
técnicos e administrativos com o objetivo de obter melhor desempenho ambiental, bem como, controle
e redução dos seus impactos ambientais, a partir da observância das normas internas e internacionais de
proteção ao meio ambiente.

Ponto 20 – Os indígenas e as suas terras.

Atenção! Este ponto não consta no edital do XVI concurso do TRF 4, mas optamos por atualizá-lo e
mantê - lo.

208
20.1. Fundamentos constitucionais dos direitos indígenas

A proteção aos direitos indígenas ganhou capítulo próprio na CF/88. Trata-se do Capítulo VIII, que engloba
os artigos 231 e 232, os quais reconhecem o direito originário dos índios (declaratório, e não constitutivo)
sobre as terras que tradicionalmente ocupam, ou seja, as ocupadas em caráter permanente, as utilizadas
para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários ao
seu bem estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural.
A CF assegura às comunidades indígenas a posse permanente sobre tais terras, bens da União, tendo este
estado de fato contornos constitucionais, não se aplicando o regime jurídico tradicional do Código Civil,
acerca da posse, apenas utilizados supletivamente, no que for compatível com o direito publicístico
constitucional.
O art. 231 da Lei Maior reconhece aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições,
e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las,
proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
A CF ainda prevê a competência privativa da União para legislar sobre populações indígenas (art. 22, XIV) e
a necessidade de autorização do Congresso Nacional para mineração em terras indígenas (art. 49, XVI).

20.2. Organização social dos índios: comunidade, etnia e nação


Segundo lição de José Afonso da Silva, o sentimento de pertinência (ou pertenciamento) a uma
comunidade indígena é que identifica o índio. A dizer, é índio quem se sente índio. Essa auto-identificação,
que se funda no sentimento de pertinência a uma comunidade indígena, e a manutenção dessa identidade
étnica, fundada na continuidade histórica do passado pré-colombiano que reproduz a mesma cultura,
constituem o critério fundamental para a identificação do índio brasileiro.
O substantivo “índios” é usado pela Constituição Federal de 1988 por um
modo invariavelmente plural, para exprimir a diferenciação dos aborígenes
por numerosas etnias. Propósito constitucional de retratar uma diversidade
indígena tanto interétnica quanto intra-étnica. Índios em processo de
aculturação permanecem índios para o fim de proteção constitucional.
Proteção constitucional que não se limita aos silvícolas, estes, sim, índios
ainda em primitivo estádio de habitantes da selva. (...) (STF, Pleno, Pet 3388,
Rel. Min. Carlos Britto, DJe de 24/09/2009)

Obs.: Índios x Quilombolas – as comunidades quilombolas são grupos étnicos predominantemente


constituídos pela população negra rural ou urbana, que se autodefinem a partir das relações com a terra, o
parentesco, o território, a ancestralidade, as tradições e práticas culturais próprias. Estima-se que existam
mais de 3 mil comunidades quilombolas no País.
Há um conceito legal de comunidade tradicional, que tem como elemento de diferenciação cultura e social
em relação à sociedade envolvente ou, como diria a Constituição, formas próprias de criar, fazer e viver
(art.216, II), o autorreconhecimento dessa condição, a transmissão dessa cultura de geração em geração
pela via da tradição e o vínculo da comunidade com um território – local geográfico intimamente vinculado
à comunidade e sua cultura sem o qual ela terá grandes dificuldades de se perpetuar.
Índios e quilombolas são as únicas comunidades tradicionais referidas na Constituição, mas existem outras
como os grupos faxinais ou as quebradoras de coco babaçu. A simples ausência de previsão constitucional
expressa, não impede que estas sejam reconhecidas como comunidades tradicionais.

209
Art. 68. Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam
ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o
Estado emitir-lhes os títulos respectivos.

Obs.2: Ementa de Acórdão – Dra. Maria Isabel Klein (membro da Banca TRF4) – dano moral coletivo a
quilombola.
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5043925-95.2013.4.04.7100/RS
RELATORA : Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN APELANTE : ESTADO DO
RIO GRANDE DO SUL APELADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL EMENTA
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO.
POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. USO EXCESSIVO E
IMOTIVADO DE FORÇA POLICIAL. COMUNIDADE REMANESCENTE DO
QUILOMBO FAMÍLIA SILVA. DANOS MORAIS COLETIVOS. CARACTERIZADOS.
INDENIZAÇÃO.
(...)
A jurisprudência dos tribunais pátrios consolidou entendimento segundo o
qual a possibilidade de indenização por dano moral, prevista no art. 5º, inciso
V, da Constituição Federal, não se restringe a hipóteses de violação à esfera
individual, sendo plenamente viável a caracterização da lesão
extrapatrimonial coletiva, quando a avaliação direcionar-se-á a valores e
interesses fundamentais de um grupo, ou seja, à defesa do patrimônio
imaterial de determinada coletividade. Precedentes do STJ e deste Tribunal.
- In casu, estão caracterizados a conduta estatal (violência promovida pelos
policiais contra membros da 'Família Silva'), dano antijurídico (lesão à honra e
à dignidade da comunidade, posto estar latente o preconceito social e de
raça) e o nexo de causalidade entre ambos (efetivamente a abordagem
policial gerou toda essa situação de consequências jurídicas nefastas ao
patrimônio imaterial), requisitos que configuram o dever do Estado do Rio
Grande do Sul de, exemplarmente, reparar o dano coletivo sofrido por
Quilombo historicamente esquecido das mais básicas políticas estatais (como
saneamento e assistência social) e que tardiamente obteve o
reconhecimento formal das áreas de sua propriedade. - Deverá o valor da
indenização ser utilizado com acompanhamento e fiscalização do Ministério
Público Federal e prestação de contas ao juízo federal, tudo em prol
preferencialmente da Comunidade Quilombola. Porto Alegre, 27 de janeiro
de 2016.

20.3. Direitos sobre as terras indígenas

A questão das terras se transformara no ponto central dos direitos constitucionais dos índios, pois, para
eles, ela tem um valor de sobrevivência física e cultural. Não se ampararão os seus direitos se não se lhes
assegurar a posse permanente, a riqueza das terras por eles tradicionalmente ocupadas. Conforme já dito,
sem a proteção de uma local geográfico intimamente ligado à cultura e a tradição, dificilmente a
comunidade consegue se perpetuar.
Portanto, a disputa dessas terras e de sua riqueza constitui o núcleo da questão indígena hoje no Brasil.
Declara-se, em primeiro lugar, que essas terras são bens da União (artigo 20, XI). A outorga constitucional
dessas terras ao domínio da União visa precisamente preservá-las e manter o vínculo que se acha
210
embutido na norma, cria-se aí uma propriedade vinculada ou propriedade reservada como fim de garantir
os direitos dos índios sobre ela. Por isso são terras inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas,
imprescritíveis. Essas terras destinam-se à posse permanente dos índios, cabendo-lhes o usufruto
exclusivo das riquezas do solo dos rios e dos lagos nela existentes.
Disto também origina a irremovibilidade dos índios de suas terras, o que só é permitido com o referendo
do Congresso Nacional, e apenas em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população,
ou no interesse da soberania do País, garantido, em qualquer hipótese o retorno imediato logo que cesse o
risco (art. 231, §5°, da CF).
São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos os atos que tenham por objeto a ocupação, o
domínio e a posse das terras indígenas (art. 231, §5°, da CF).

20.3.1 Terras tradicionalmente ocupadas pelos índios

A base do conceito acha-se no art.231, §1º, fundado em quatro condições, todas necessárias e nenhuma
suficiente sozinha, a saber: 1. Serem habitadas em caráter permanente; 2. Serem por eles utilizadas para
suas atividades produtivas; 3. Serem imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a
seu bem-estar; 4. Serem necessárias a sua reprodução física e cultural.
Costuma-se afirmar que os índios tem direito congênito às terras tradicionalmente ocupadas, revelando o
indigenato o fundamento da sua posse constitucional especial, sendo mais que um direito adquirido, pois
já nasceu com os índios como um direito natural, reconhecido pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Ao analisar o instituto do indigenato, José Afonso da Silva diz que “(…) o indigenato não se confunde com a
ocupação, com a mera posse. O indigenato é a fonte primária e congênita da posse territorial; é um direito
congênito, enquanto a ocupação é um título adquirido”.
Segundo o Professor José Ribas Vieira, indigenato é “um instituto tradicional do direito luso-brasileiro que
remonta ao Alvará de 1º de abril de 1680 e define o direito dos índios às suas terras como congênito,
legítimo por si, podendo ser exercido de forma imediata, independentemente de posterior legitimação e
registro, ao contrário do que ocorre com a posse por ocupação (que é título adquirido).
A primeira constituição brasileira a tratar de forma expressa sobre o instituto do indigenato foi a
Constituição de 1934, que dispunha: “Art. 129. Será respeitada a posse de terras de silvícolas que nelas se
achem permanentemente localizados, sendo-lhes no entanto, vedado aliená-las”.
As Constituições subsequentes também trataram sobre o tema:
E, conforme o art. 231, § 1º, CF/88: “São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles
habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à
preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física
e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”.

Teoria do fato indígena x Teoria do indigenato no STF7:


Essa diferenciação ganhou relevância depois do voto-vista do ministro Menezes Direito (STF) no
julgamento sobre a demarcação da reserva indígena denominada Raposa Serra do Sol (PET 3388).
Nesse julgamento, aplicou-se a teoria do fato indígena em substituição à teoria do indigenato, no tocante à
verificação da posse indígena e a delimitação do seu marco temporal.
Enquanto na teoria do indigenato defende-se que a posse é imemorial, ou seja, os índios são donos da
terra por tanto tempo, que não é possível dizer qual a data inicial; na teoria do fato indígena, aplicada

7 Fonte: http://blog.ebeji.com.br/o-que-se-entende-por-indigenato/
211
pelo ministro, diz-se que o direito dos indígenas começou com a Constituição de 1988 (Dos Índios –
Capítulo VIII).
Importante ressaltar que as duas teorias visam definir, na prática, quais são, segundo a Constituição, as
terras indígenas, ou seja, as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, sendo que um dos requisitos
constitucionais para o reconhecimento destas é o fato de serem por eles habitadas em caráter
permanente (art. 231 § 1°).
Segundo o ministro Menezes Direito, esse caráter permanente não pode ser considerado como imemorial
ou remoto, excessivamente ligado ao passado longínquo das tribos indígenas e do próprio território,
conforme determina a teoria do indigenato. A teoria do fato indígena, em sua opinião, exige requisitos
mais plausíveis para a constatação da posse, sendo suficiente para isso averiguar a presença constante e
permanente dos índios nas terras em questão, com base na data da promulgação do Texto Maior.
Resumindo: O STF (Pet. 3388/RR) adotou a Teoria do Fato Indígena para definir a partir de qual momento
se consideraria como “terras indígenas” a área a ser demarcada. Com isso, a data fixada para esse limite
temporal foi 05 de outubro de 1988, quando a Constituição da República foi promulgada. Afastou-se a
Teoria do Indigenato, segundo a q qual a posse indígena é imemorial, ou seja, sem data inicial aferível.
Entretanto, a doutrina, bem como os TRF’s e o MP adotam a Teoria do Indigenato em detrimento da
Teoria do Fato Indígena: Vejamos alguns julgados:
TRF da 1ª Região:

A Constituição Federal de 1988, assim como as que a antecederam, preocupou-se em


proteger os direitos e interesses das populações indígenas, acolhendo o instituto do
indigenato ao reconhecer os direitos originários dos índios sobre as terras que
tradicionalmente habitam (art. 231) (AC 2006.36.00.014647-0/MT, publicação 08/03/2013).

TRF da 5ª Região:

O direito dos silvícolas à posse permanente das terras mencionadas no art. 231, parágrafo
1º, da Constituição, funda-se no indigenato, a revelar fonte primária e congênita da posse
territorial. Daí que, tais terras se destinam à posse permanente dos índios, constituindo
garantia para o futuro da cultura indígena, sendo inalienáveis e imprescritíveis (AC
505872/CE, julgamento 21/08/2012).

Obs.: Exceção à Teoria do Fato Indígena no STF (ARE 803462/MS – 04/08/2014 – Rel. Min. Teori Zavascki)
Como regra, se os índios não estavam na posse da área em 05/10/1988, ela não será
considerada indígena. Existe, contudo, uma exceção a essa regra. Trata-se do chamado
renitente esbulho. Assim, se, na época da promulgação da CF/1988, os índios não ocupavam
a terra porque dela haviam sido expulsos em virtude de conflito possessório, considera-se
que eles foram vítimas de esbulho e, assim, essa área será considerada terra indígena para
os fins do art.231. O renitente esbulho se caracteriza pelo efetivo conflito possessório,
iniciado no passado e persistente até o marco demarcatório temporal da data da
promulgação da Constituição, materializado por circunstancias de fato ou por controvérsia
possessória judicializada. Vale ressaltar que, para que se caracterize o renitente esbulho, é
necessário, que no momento da promulgação da CF/88, os índios ainda estivessem
disputando a posse da terra ou tivesse sido dela expulsos há pouco tempo. Se eles foram

212
expulsos muitos anos antes de entrar em vigor a CF/88, não se configura o chamado
“renitente esbulho”.

20.3.2 Posse permanente

Isso significa uma garantia para o futuro, no sentido de que estas terras são inalienáveis e indisponíveis e
são destinadas para sempre ao seu habitat.
O reconhecimento do direito dos índios ou comunidades indígenas à posse permanente das terras por eles
ocupadas, nos termos do art. 231, §2º, independe de sua demarcação, e cabe ser assegurado pelo órgão
federal competente, atendendo à situação atual e ao consenso histórico.

20.3.3 Usufruto exclusivo

Completa o conjunto de direitos dos índios, outorgado no art. 231 da CF, o reconhecimento de seu direito
ao usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios, e dos lagos existentes nas terras que tradicionalmente
ocupam. Esse usufruto é intransferível e é pleno, compreende o uso e a fruição, quer se trate de minerais,
de vegetais ou de animais.

20.3.4 Mineração em terras indígenas

O art. 231, §3º, dispõe que o aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a
pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivadas com autorização do
Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos
resultados da lavra, na forma da lei.
Nem mesmo se admite a atividade garimpeira, em cooperativa ou não, mencionada no art.174, §§ 3º e 4º,
salvo, evidentemente, a atividade garimpeira dos próprios índios.

20.3.5 Demarcação das terras indígenas

Compete à União demarcar as terras indígenas (art. 231, CF). Mas não é da demarcação que decorre
qualquer dos direitos indígenas. Estes direitos preexistem antes mesmo da demarcação.
O processo administrativo de demarcação das terras indígenas é regulado pelo Decreto 1.775/1996,
validado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do MS 24.045, de 28/04/2005:
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS. RESPEITO AO
CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. SEGURANÇA INDEFERIDA. Imprescindibilidade de
citação da FUNAI como litisconsorte passiva necessária e ausência de direito líquido e certo,
por tratar a questão de matéria fática. Preliminares rejeitadas. Ao estabelecer um
procedimento diferenciado para a contestação de processos demarcatórios que se iniciaram
antes de sua vigência, o Decreto 1.775/1996 não fere o direito ao contraditório e à ampla
defesa. Proporcionalidade das normas impugnadas. Precedentes. Segurança indeferida. (MS
24045, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 28/04/2005, DJ 05-
08-2005 PP-00006 EMENT VOL-02199-01 PP-00197 LEXSTF v. 27, n. 322, 2005, p. 145-154)

213
Com propriedade, restou assentado pelo TRF da 3ª Região que a "orientação jurisprudencial é no sentido
da necessidade de produção de estudo histórico-antropológico para quaisquer questões acerca da posse
de imóvel que estaria localizado em região tradicionalmente ocupada por indígenas" (AI
2001.33.00.029599-3).
Processo Administrativo de Demarcação: O primeiro passo é identificar e delimitar a área a ser
demarcada, sendo fundamentado em trabalho desenvolvido por antropólogos. Há previsão de designação
de grupos complementares, composto por servidores da FUNAI, preferencialmente. Se solicitados, os
órgãos públicos devem prestar informações sobre a área demarcada num prazo máximo de 30 dias.
Uma vez apresentado o relatório delimitando a área a ser demarcada, caberá ao Presidente da FUNAI
aprová-lo e publicá-lo no Diário Oficial da União, em um prazo de 15 dias. Os Estados e Municípios
interessados em questionar a área demarcada poderão fazê-lo em um prazo de até 90 dias da publicação
do resumo no D.O. As referidas objeções deverão ser instruídas com todas as provas pertinentes, como
títulos dominais, laudos periciais, pareceres, declarações de testemunha, fotografias, mapas (...) podendo,
ainda, pleitear indenização e demonstrar os vícios dos relatórios.
Assim, as terras indígenas serão administrativamente demarcadas por iniciativa e orientação da FUNAI,
com fundamento em estudo antropológico de identificação, com a participação da comunidade indígena
interessada.
Em seguida, caberá a participação do Ministro da Justiça no processo de demarcação, a quem competirá
declarar, mediante portaria, os limites da terra indígena, determinando a sua demarcação, ou então
desaprovar a identificação e fazer retornar os autos ao órgão federal de assistência ao índio.
A decisão é ato vinculado, de modo que o Ministro da Justiça não pode avaliar a conveniência e
oportunidade da demarcação. Caso a área demarcada tiver a presença de ocupantes não índios, o INCRA,
órgão fundiário federal, deverá dar prioridade ao reassentamento.
O ato final será do Presidente da República, que, via decreto, irá homologar a demarcação da terra
indígena, a sofrer registro imobiliário e na Secretaria de Patrimônio da União.
De acordo com o STF, "a demarcação administrativa, homologada pelo Presidente da República, é ato
estatal que se reveste de presunção juris tantum de legitimidade e de veracidade" (RE 183.188), além de se
revestir de natureza declaratória e força autoexecutória (Pet. 3.388, de 19/03/2009).

Obs,: Terras indígenas marcadas anteriormente à CF/88 e possibilidade de remarcação.


STF:
Segundo já decidiu o STF, é vedada a remarcação de terras indígenas demarcadas em período anterior à
CF/1988, tendo em conta o princípio da segurança jurídica.
A União poderá até ampliar a terra indígena, mas isso não deverá ser feito por meio de demarcação (art.
231 da CF/88), salvo se ficar demonstrado que, no processo originário de demarcação, houve algum vício
de ilegalidade e, ainda assim, desde que respeitado o prazo decadencial de 5 anos (art. 54 da Lei nº
9.754/99).
No caso concreto, essa remarcação não seria possível porque, ainda que tivesse havido alguma ilegalidade,
como afirma o Ministério da Justiça, já teria se passado o prazo decadencial para rever esse ato.
STF. 2ª Turma. RMS 29542/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 30/9/2014 (Info 761).

STJ:
O STJ decidiu que a alegação de que a demarcação da terra indígena não observou os parâmetros
estabelecidos pela CF/1988 não justifica a remarcação ampliativa de áreas originariamente demarcadas
em período anterior à sua promulgação.

214
Desde o julgamento da Pet 3.388-RR (Caso Raposa Serra do Sol), a jurisprudência passou a entender que é
vedada a ampliação de terra indígena já demarcada, salvo em caso de vício de ilegalidade do ato de
demarcação e, ainda assim, desde que respeitado o prazo decadencial.
É inegável que a CF/88 mudou o enfoque atribuído à questão indígena e trouxe novas regras mais
favoráveis a tais povos, permitindo a demarcação das terras com critérios mais elásticos, a partir da
evolução de uma perspectiva integracionista para a de preservação cultural do grupamento étnico. Isso,
contudo, não é motivo suficiente para se promover a revisão administrativa das demarcações de terras
indígenas já realizadas, especialmente nos casos em que se passou o prazo decadencial.
STJ. 1ª Seção. MS 21.572-AL, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 10/6/2015 (Info 564).
3.6 Terra Indígena Raposa Serra do Sol
Em 25/09/2013 foi publicado o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Pet
3.388, que trata da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Trata-se de Ação Popular ajuizada
por Augusto Affonso Botelho Neto em impugnação à Portaria n. 534/2005, do Ministério da Justiça,
homologada pelo Presidente da República em 15/04/2005, que estabeleceu a demarcação da terra
indígena denominada “Raposa Serra do Sol”.
O ato questionado revogou a Portaria n. 820/98, contra a qual foram ajuizadas inúmeras ações, todas
encaminhadas ao Supremo Tribunal Federal por força da decisão proferida na RCL 2.388, as quais foram
posteriormente extintas sem julgamento de mérito, em decorrência da revogação da referida Portaria.
O emblemático caso “Raposa Serra do Sol” é de grande relevância não apenas porque envolveu a posse e a
propriedade de vasta extensão territorial - açambarcando uma considerável fatia do território de uma
unidade federativa (Estado de Roraima) – mas também porque definiu importantes aspectos ligados à
tutela constitucional dos povos indígenas
Neste resumo, serão transcritas as condicionantes fixadas pela Corte Maior. No mais, recomenda-se a
leitura do acórdão:

1 – O usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas
pode ser relativizado sempre que houver como dispõe o artigo 231 (parágrafo 6º, da
Constituição Federal) o relevante interesse público da União na forma de Lei
Complementar;
2 - O usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e
potenciais energéticos, que dependerá sempre da autorização do Congresso
Nacional;
3 - O usufruto dos índios não abrange a pesquisa e a lavra das riquezas minerais, que
dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional, assegurando aos índios
participação nos resultados da lavra, na forma da lei.
4 – O usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, devendo se for o
caso, ser obtida a permissão da lavra garimpeira;
5 - O usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da Política de Defesa Nacional. A
instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a
expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho
estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico a critério dos órgãos
competentes (o Ministério da Defesa, o Conselho de Defesa Nacional) serão implementados
independentemente de consulta a comunidades indígenas envolvidas e à Funai;

215
6 – A atuação das Forças Armadas da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas
atribuições, fica garantida e se dará independentemente de consulta a comunidades
indígenas envolvidas e à Funai;
7 – O usufruto dos índios não impede a instalação pela União Federal de equipamentos
públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além de construções
necessárias à prestação de serviços públicos pela União,
especialmente os de saúde e de educação;
8 – O usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica sob a
responsabilidade imediata do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade;
9 - O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela
administração da área de unidade de conservação, também afetada pela terra indígena,
com a participação das comunidades indígenas da área, que deverão ser ouvidas, levando
em conta os usos, as tradições e costumes dos indígenas, podendo, para tanto, contar com
a consultoria da Funai;
10 - O trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à
unidade de conservação nos horários e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes;
11 – Deve ser admitido o ingresso, o trânsito, a permanência de não-índios no restante da
área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela Funai;
12 – O ingresso, trânsito e a permanência de não-índios não pode ser objeto de cobrança de
quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas;
13 – A cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou
ser exigida em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de
transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a
serviço do público tenham sido excluídos expressamente da homologação ou não;
14 - As terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou
negócio jurídico, que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela
comunidade indígena;
15 – É vedada, nas terras indígenas, qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou
comunidades indígenas a prática da caça, pesca ou coleta de frutas, assim como de
atividade agropecuária extrativa;
16 - As terras sob ocupação e posse dos grupos e comunidades indígenas, o usufruto
exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o
disposto no artigo 49, XVI, e 231, parágrafo 3º, da Constituição da República, bem como a
renda indígena, gozam de plena imunidade tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer
impostos taxas ou contribuições sobre uns e outros;
17 – É vedada a ampliação da terra indígena já demarcada;
18 – Os direitos dos índios relacionados as suas terras são imprescritíveis e estas são
inalienáveis e indisponíveis.
19 – É assegurada a efetiva participação dos entes federativos em todas as etapas do
processo de demarcação.

Por oportuno, registre-se que as "chamadas condições ou condicionantes foram consideradas


pressupostos para o reconhecimento da validade da demarcação efetuada. Não apenas por decorrerem,

216
em essência, da própria Constituição, mas também pela necessidade de se explicitarem as diretrizes
básicas para o exercício do usufruto indígena, de modo a solucionar de forma efetiva as graves
controvérsias existentes na região. Nesse sentido, as condições integram o objeto do que foi decidido e
fazem coisa julgada material. Isso significa que a sua incidência na Reserva da Raposa Serra do Sol não
poderá ser objeto de questionamento em eventuais novos processos" "Pet 3388 ED, Relator(a): Min.
Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 23/10/2013, Acórdão Eletrônico DJe-023 divulg 03-02-2014
public 04-02-2014).

20.4. Defesa dos direitos e interesses dos índios

Os direitos e interesses dos índios têm natureza de direito coletivo, direito comunitário. A CF reconhece
legitimação para defendê-los em juízo aos próprios índios, às suas comunidades e organizações, intervindo
o Ministério Público em todos os atos do processo.

20.5. Conhecimento tradicional associado dos índios ao patrimônio genético

A Medida Provisória 2.186-16/2001 (Lei nº13.123/2015) assegura às comunidades indígenas o direito ao


seu conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético, inclusive com garantia de participação
nos benefícios decorrentes da exploração comercial.
Com efeito, o legislador reconheceu expressamente o direito desses povos de decidir sobre o uso de seus
conhecimentos tradicionais associados ao patrimônio genético, inclusive declarando-o patrimônio cultural
brasileiro, não podendo ser obstados a preservação, a utilização e o desenvolvimento de conhecimento
tradicional de comunidade indígena ou comunidade local.
Como consectário dessa titularidade, foram conferidos direitos às comunidades indígenas, como o de ter
indicada a origem do acesso ao conhecimento tradicional em todas as publicações, utilizações, explorações
e divulgações, assim como o de impedir terceiros não autorizados de: a) utilizar, realizar testes, pesquisas
ou exploração, relacionados ao conhecimento tradicional associado; b) divulgar, transmitir ou retransmitir
dados ou informações que integram ou constituem conhecimento tradicional associado.

20.6. Caso da Usina Belo Monte

Notícia STF, Sexta-feira, 24 de agosto de 2012


AGU questiona acórdão sobre a Usina de Belo Monte
A Advocacia-Geral da União (AGU) ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) uma Reclamação (RCL
14404), com pedido de antecipação de tutela, contra decisão da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da
1ª Região (TRF-1). O acórdão questionado impediu que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (Ibama) praticasse qualquer ato de licenciamento da Usina Hidrelétrica de
Belo Monte, no Estado do Pará, além de tornar insubsistentes os atos já praticados, determinando a
imediata paralisação de atividades necessárias à implementação do empreendimento.
A autoridade de decisão do Supremo no julgamento da Suspensão de Liminar 125, conforme a AGU,
estaria sendo desrespeitada. Nessa decisão, a Presidência da Corte manteve o Decreto Legislativo
788/2005 e autorizou ao lbama que procedesse "à oitiva das comunidades indígenas interessadas", além
de manter a determinação para realização do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do laudo antropológico,
a fim de permitir os atos necessários à viabilização do empreendimento.
217
Conforme a AGU, a decisão do TRF-1 declarou a invalidade do Decreto Legislativo 788/2005 por violação à
Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), e à Constituição Federal, bem como
decidiu impedir que o Ibama praticasse qualquer ato de licenciamento da Usina Hidrelétrica de Belo
Monte. “Assim, tal acórdão do TRF-1 descumpre o que ficou estabelecido na decisão proferida no âmbito
do Supremo Tribunal Federal, cujos efeitos valerão até o trânsito em julgado do processo principal,
conforme determina o § 9°, art. 4° da Lei n° 8.437/92”, ressalta a AGU.

Histórico
O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública com o objetivo de paralisar as atividades
administrativas relacionadas ao processo de licenciamento da UHE Belo Monte, sob o fundamento da
suposta nulidade do Decreto Legislativo 788/2005, tendo em vista a existência, em tese, de vícios formais e
materiais. Porém, o juiz federal da Vara Única de Altamira (PA) julgou improcedente o pedido.
O MPF interpôs recurso de apelação, mas a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região negou seu
provimento, “entendendo não existirem vícios que maculem a legalidade e a constitucionalidade do
Decreto Legislativo 788/2005, que autoriza o aproveitamento hidroelétrico de Belo Monte”. Após isso, o
MPF apresentou outro recurso (embargos de declaração) e, na análise deste, o TRF-1 declarou a invalidade
do Decreto Legislativo 788/2005, por violação à Convenção 169 da OIT e à Constituição Federal. Decidiu,
ainda, impedir que o Ibama praticasse qualquer ato de licenciamento da UHE Belo Monte, bem como
tornar insubsistentes os já praticados e conferiu imediata eficácia à sua decisão, ordenando a paralisação
do empreendimento.

Pedido
Segundo a AGU, o cumprimento do ato reclamado “está prestes a inviabilizar o empreendimento, do qual,
presentemente, depende o planejamento da política energética do país”. “São incalculáveis as
consequências dessa proibição de realização de qualquer ato de licenciamento da Usina Hidrelétrica de
Belo Monte por parte do IBAMA no cronograma governamental de planejamento estratégico do setor
elétrico do país”, afirma.
Além disso, assevera que além de desrespeitar decisão do Supremo, a decisão do TRF-1 “invade
completamente a esfera de discricionariedade administrativa e repercutirá na formulação e
implementação da política energética nacional”. Assim, pede, liminarmente, a suspensão da eficácia do
acórdão da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) a fim de evitar dano irreparável ao
patrimônio público e, no mérito, solicita a anulação da decisão questionada por desrespeitar a autoridade
da decisão proferida pelo STF no julgamento da Suspensão de Liminar 125.

Notícia STF, Segunda-feira, 27 de agosto de 2012


Belo Monte: ministro Ayres Britto defere liminar requerida pela AGU
O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ayres Britto, deferiu hoje (27) pedido de liminar
formulado pela Advocacia-Geral da União (AGU) e suspendeu decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª
Região (TRF-1) que, ao julgar embargos de declaração, determinou a paralisação das atividades na Usina
Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, e impediu que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama) praticasse qualquer ato de licenciamento da usina. O ministro considerou
“evidente a plausibilidade jurídica do pedido” da AGU na Reclamação (RCL 14404), na qual foi requerida a
liminar.
Na Reclamação, a AGU, em nome da União e do Ibama, sustenta que a última decisão do TRF desrespeitou
a autoridade do STF no julgamento da Suspensão de Liminar (SL) 125. Nela, a então presidente do STF,
ministra Ellen Gracie (aposentada), autorizou o Ibama a ouvir as comunidades indígenas interessadas, além
218
de manter a determinação para realização de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do laudo antropológico,
a fim de permitir os atos necessários à viabilização do empreendimento. Esta decisão, assinalou o ministro
Ayres Britto, “vigora até o trânsito em julgado da decisão de mérito na ação principal”.
Ele explicou que, na SL 125, o que estava em discussão era a interpretação do parágrafo 3º do artigo 231
da Constituição Federal: se a audiência das “comunidades afetadas” deveria preceder a autorização do
Congresso Nacional para o aproveitamento de recursos hídricos em terras indígenas ou se, ao contrário, a
autorização do parlamento é etapa anterior ao processo de licenciamento da obra. Embora no exame da
SL 125 não se tenha entrado no mérito da causa, a ministra Ellen Gracie, “em homenagem à ordem e
economia públicas, autorizou a atuação do Ibama e dos demais órgãos responsáveis pela continuidade do
processo de licenciamento ambiental da obra, não obstante continuar existindo a pendência judicial”.
No julgamento de embargos de declaração, porém, o TRF decidiu em sentido contrário, proibindo o Ibama
de praticar os atos administrativos referentes ao licenciamento e invalidando os já praticados. Ao
determinar a intimação do presidente do Ibama “para fins de imediato cumprimento”, o acórdão do TRF
“violou, neste juízo provisório, a autoridade da decisão deste Supremo Tribunal Federal na SL 125”,
concluiu.
A liminar deferida suspende os efeitos do acórdão do TRF da 1ª Região nos Embargos de Declaração na
Apelação Cível nº 2006.39.03.000711-8, sem prejuízo de uma "mais detida análise quando do julgamento
de mérito”.

RESUMO DA ACP 2006.39.03.000711-8


- 24/03/2006: MPF ingressa com ação em Altamira/PA
- 28/03/2006: Juiz Substituto concede liminar (suspende licenciamento)
- 15/05/2006: Juiz Titular revoga a liminar (determina continuidade do licenciamento);
- 23/05/2006: MPF interpõe 2006.01.00.017736-8/PA e obtém decisão favorável (Des. proíbe o
andamento, paralisando o processo de consulta – posterior ao Decreto – das comunidades afetadas)
- 29/03/2007: AGU ingressa com Suspensão de Liminar 125/06 e Min. Ellen Gracie determina o andamento
do projeto, com oitiva das comunidades afetadas (decisão acima)
- 27/03/2007: Sentença IMPROCEDENTE na ACP
- 21/11/2011: Apelação improvida na ACP
- 27/01/2012: MPF ingressa com Embargos de Declaração
- 13/08/2012 (publicação em 27/08/2012): Reforma da Apelação, com parcial provimento, determinando a
suspensão do projeto (decisão acima)
- 23/08/2012: AGU ingressa com Reclamação 14.404 (notícia STF acima), com base na decisão obtida na SL
125/06.
- 27/08/2012: STF concede liminar na Reclamação 14.404 (notícia acima) atendendo pedido da AGU.

Outros detalhes
A Usina Hidrelétrica de Belo Monte é uma central hidrelétrica que está sendo construída no Rio Xingu. Será
feita uma barragem principal no rio, localizada a 40 km abaixo da cidade de Altamira, formando o
Reservatório do Xingu. A partir deste reservatório, parte da água será desviada por um canal de derivação
de 20 km de comprimento para um Reservatório Intermediário, localizado a aproximadamente 50 km de
Altamira na região cercada pela Grande Volta do Xingu.

219
Este reservatório será criado fechando os escoadouros da região por 27 diques menores. A área total dos
reservatórios será de 516 km²3, dividida entre os municípios de Vitória do Xingu (248 km²), Brasil Novo (0,5
km²) e Altamira (267 km²). A área a ser alagada é apenas parte desse total, pois este inclui a calha atual do
Rio Xingu. Custo estimado em 26 bilhões pela concessionária4. Potência: 11.233 MW; (efetivamente 4.500
MW) cerca de 10% do consumo nacional. Em potência instalada, a terceira maior hidrelétrica do mundo,
atrás apenas da chinesa "Três Gargantas" e da brasileira e paraguaia "Itaipu".
Impacto Ambiental e Socioeconômico:
Comunidades Indígenas e Locais: Remanejamento de mais de 20 mil famílias de moradores da periferia de
Altamira e da área rural de Vitória do Xingu, e de impacto em cerca de 350 famílias ribeirinhas que vivem
em reservas extrativistas6. Índios: Todas as 24 etnias que ocupam 30 Terras Indígenas na Bacia do Xingu,
12 no Mato Grosso e 18 no Pará, seriam direta ou indiretamente afetadas à medida que o Xingu e sua
fauna e flora, além do seu entorno, fossem alterados pela usina.
Na região de influência direta de Belo Monte, três Terras Indígenas seriam diretamente impactadas: a TI
Paquiçamba, dos índios Juruna, e a área dos Arara da Volta Grande, que se situam no trecho de 100 km do
rio que teria sua vazão drasticamente reduzida. Já a área indígena Juruna do KM 17 fica às margens da
rodovia PA 415, e seria fortemente impactada pelo aumento do tráfego na estrada e pela presença de um
canteiro de obras.
Inundação de Igarapés: Inundação constante, hoje sazonal, dos igarapés Altamira e Ambé, que cortam a
cidade de Altamira, e parte da área rural de Vitória do Xingu.

Redução da vazão da água a jusante do barramento do rio na Volta Grande do Xingu e interrupção do
transporte fluvial até o Rio Bacajá, único acesso para comunidades ribeirinhas e indígenas. Alteração do
regime do rio sobre os meios biótico e socioeconômico, com redução do fluxo da água; afetando a flora e
fauna locais e introduzindo diversos impactos socioeconômicos. Atualmente, este é o único meio de
transporte para comunidades ribeirinhas e indígenas chegarem até Altamira, onde encontram médicos,
dentistas e fazem seus negócios.

7. Julgados do TRF da 1ª Região


Por fim, colacionam-se alguns julgados recentes do TRF da 1ª Região acerca do tema "os índios e suas
terras":
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESERVA INDÍGENA APYTEREWA. TERRAS DECLARADAS DE OCUPAÇÃO IMEMORIAL
PELOS ÍNDIOS PARAKANÃ. PORTARIA 2.581/2004, QUE SUBSTITUIU A PORTARIA 1.192/2001, NULA POR
VÍCIO FORMAL. DEMARCAÇÃO HOMOLOGADA. ÁREA INVADIDA POR NÃO-ÍNDIOS. RESISTÊNCIA À ORDEM
DE DESOCUPAÇÃO. CF, ART. 231, CAPUT, §§ 1º, 2º E 6º. LEVANTAMENTO FUNDIÁRIO. NÃO ULTIMAÇÃO
QUE NÃO INFLUIU NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DE DEMARCAÇÃO. RESOLUÇÃO 220/2011/FUNAI.
ATOS ADMINISTRATIVOS FUNDADOS NA ILEGAL PORTARIA 1.912/2001/MJ. LIMINAR CONCEDIDA NA
RECLAMAÇÃO 12.516/PA, PROPOSTA PERANTE O STJ. ANÁLISE DAS OCUPAÇÕES DE BOA-FÉ PARA
PAGAMENTO DE BENFEITORIAS INDENIZÁVEIS. OBSERVÂNCIA DO LIMITE TEMPORAL REPRESENTADO PELA
PORTARIA 2.581/2004/MJ. OBRIGATORIEDADE. 1. Pretendem o Ministério Público Federal e a FUNAI, por
meio de ação civil pública, a desocupação da Terra Indígena Apyterewa, cuja área de pouco mais de
773.000 hectares, situada nos Municípios de Altamira e São Félix do Xingu - PA, há muito foi invadida por
não-índios, os quais tentaram impedir a autarquia de concluir a respectiva demarcação, tendo criado,
desde então, toda sorte de embaraços ao pleno usufruto da área pelos índios Parakanã. 2. A Portaria
1.192/2001/MJ, que inicialmente declarara a área de ocupação imemorial indígena, foi anulada pelo
Superior Tribunal de Justiça no Mandado de Segurança 8241/DF (Rel. Ministro Humberto Gomes de
Barros, DJ 14/12/2002, p. 183), pois resultante de procedimento maculado por vício formal. Seguiu-se,
então, com a devida observância de todas as formalidades impostas pelo Decreto nº 1.775/96, novo
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processo de demarcação, tendo este culminado com a edição da Portaria nº 2.581/2004/MJ, que
finalmente declarou a área de posse permanente dos Parakanã, autorizando a FUNAI a realizar a
delimitação para posterior homologação pelo Presidente da República. 3. Iniciados os trabalhos, a equipe
encarregada de realizar a demarcação física das terras viu-se obrigada a suspendê-los devido à forte
oposição de terceiros não-índios que ali se estabeleceram, tentando impedir o cumprimento do quanto
determinado administrativamente no tocante à fixação das estremas. 4. A Constituição Federal em seu
artigo 231, caput, §§ 1º e 2º, assegura aos índios a posse permanente e o usufruto exclusivo das riquezas
naturais das terras que tradicionalmente ocupam, assim consideradas aquelas por eles habitadas em
caráter permanente, as utilizadas para sua atividade produtiva e as imprescindíveis à preservação dos
recursos naturais necessários ao seu bem-estar, observado os aspectos físico e cultural. 5. A garantia da
posse das terras imemorialmente ocupadas pelos índios é assegurada desde a Constituição de 1934,
valendo salientar que a ordem constitucional vigente estabelece que são nulos, não produzindo efeitos
jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras indígenas (CF, art.
231, § 6º). Daí ter o ato de demarcação administrativa índole meramente declaratória. Noutras palavras,
os direitos dos índios sobre as terras que tradicionalmente ocupam são, conforme entendimento
jurisprudencial sedimentado, constitucionalmente reconhecidos e não simplesmente outorgados, "com o
que o ato de demarcação se orna de natureza declaratória, e não propriamente constitutiva. Ato
declaratório de uma situação jurídica ativa preexistente. Essa a razão de a Carta Magna havê-los chamado
de "originários", a traduzir um direito mais antigo do que qualquer outro, de maneira a preponderar sobre
pretensos direitos adquiridos, mesmo os materializados em escrituras públicas ou títulos de legitimação de
posse em favor de não-índios. Atos, estes, que a própria Constituição declarou como "nulos e extintos" (§
6º do art. 231 da CF)" (STF, Pet 3388/RR, Rel. Min. Carlos Brito, DJe 25/092009; RTJ 212, pp. 49). 6.
Publicado, em 2007, o decreto homologatório da demarcação, os réus, firmes no propósito de resistir à
ordem de desocupação, argumentam com a ausência de finalização do levantamento fundiário referido no
art. 2º do Decreto nº 1.775/1996, mas trata-se de matéria a ser discutida em ação própria. Efetivamente,
tramitou perante o Juízo da Subseção Judiciária de Marabá/PA a ação declaratória nº 2005.39.01.001733-
3/PA, que objetivava a anulação do ato demarcatório da área indígena Apyterewa, mas a sentença ali
exarada, já transitada em julgado, rejeitou o pedido inicial, afastando qualquer dúvida quanto à legalidade
da delimitação do imóvel, sobre cujo processo administrativo a alegada não-finalização de levantamento
fundiário não tem influência, a par de envolver interesses meramente pecuniários de eventuais ocupantes,
circunstância que não se presta a infirmar um direito originário com assento constitucional. 7. A não
ultimação do cadastro de ocupantes irregulares, para efeito de avaliação de benfeitorias indenizáveis, não
pode ser imputada à FUNAI, cuja equipe sempre se deparou, como amplamente demonstrado nos autos,
com as mais variadas e constantes formas de oposição à realização da própria delimitação física da
reserva. 8. O reconhecimento da imemorialidade da ocupação da Terra Indígena Apyterewa e respectiva
demarcação não impediram que se desse continuidade aos estudos fundiários. Tanto é assim que a FUNAI
editou a Resolução nº 220, de 29/08/2011. O ato desafiou a Reclamação 12.516/PA, proposta perante o
Superior Tribunal de Justiça, onde se obteve decisão liminar, uma vez que os atos da Comissão
Permanente de Análise de Benfeitorias da FUNAI vinham sendo embasados na Portaria 1.192/2001. 9. A
liminar concedida na Reclamação 12.516/PA não impede a apreciação da controvérsia, desde que
respeitado o limite temporal representado pela aludida Portaria 2.581/2004. Ou seja, considera-se como
marco referencial, para efeito de levantamento das ocupações de boa-fé pelos não-índios e pagamento de
benfeitorias indenizáveis, a Portaria 2.581/2004. 10. Apelação parcialmente provida, apenas para
estabelecer que, para efeito de análise das ocupações de boa-fé pelos não-índios e pagamento de
indenizações, serão consideradas indenizáveis as benfeitorias implantadas até a publicação da Portaria
2.581/2004 (AC 0000339-52.2005.4.01.3901 / PA, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE
ALMEIDA, QUINTA TURMA, e-DJF1 p.146 de 07/04/2014)

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POSSESSÓRIA. INTERDITO PROIBITÓRIO. TERRAS


TRADICIONALMENTE OCUPADAS PELOS ÍNDIOS. CF, ART. 231, § 1º. LEI 6.001/73. POSSE INDÍGENA.

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NECESSIDADE DE LAUDO ANTROPOLÓGICO. SENTENÇA ANULADA. APELAÇOES PROVIDAS. 1. Em exame
apelações interpostas pelo Ministério Público Federal e pela União em face de sentença que julgou
procedente ação de interdito proibitório incidente sobre imóvel rural situado no Distrito de Olivença,
Município de Ilhéus/BA. 2. As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios são aquelas por eles habitadas
em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos
recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural,
segundo seus usos, costumes e tradições (CF, art. 231, §1º). 3. A posse indígena, por suas peculiaridades,
não pode ser analisada à luz dos conceitos civilistas de posse e propriedade. 4. Está em curso
procedimento administrativo de demarcação da "Terra Indígena Tipinambá de Olivença" cujo resumo do
relatório foi publicado no Diário Oficial da União de 20/04/2009. Incide a espécie na vedação prevista no §
2º do artigo 19 do "Estatuto do Índio" (Lei nº 6.001/73) que proíbe a concessão de interdito proibitório. 5.
Além disso, ainda que não haja notícia nos autos de que o processo administrativo de demarcação já
chegou ao fim, não foi elaborado laudo antropológico ao longo da instrução processual, necessário para
aferir se o imóvel rural encontra-se localizado na área indígena da aludida reserva. Se tal hipótese for
confirmada, essa circunstância basta para desfigurar o pretendido direito à reintegração de posse. 6. "O
Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade do procedimento administrativo de
demarcação de terras indígenas, previsto no Decreto 1.775/96 (...). Saber se os índios ocupavam a área na
data de promulgação da CF/88, ou se nela já não habitavam por força de esbulho injusto e violento de não
índio (marco temporal), se estiveram sempre na intenção de reocupá-las, se têm relação anímica com
aquela específica porção do território (marco tradicionalista), dentre outras questões de fato, dependem
de indispensável dilação probatória (...). A demarcação de terras indígenas processada e conduzida
exclusivamente na instância administrativa, sem necessidade de apreciação judicial, é prática reiterada na
Administração Pública Federal, sobretudo após a promulgação da CF/88." (STJ, MS 15.822/DF, Rel.
Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/12/2012, DJe 01/02/2013) 7. Deve ser anulada
a sentença e determinado o retorno dos autos à Vara Federal de origem para realização de prova pericial.
8. Apelações da União e do Ministério Público Federal providas. (AC 0000932-04.2006.4.01.3301 / BA, Rel.
DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL MÁRCIO BARBOSA
MAIA (CONV.), QUINTA TURMA, e-DJF1 p.91 de 27/02/2014).

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO DE APELAÇÃO. SUSPENSÃO DO ATO IMPUGNADO NA


IMPETRAÇÃO, MEDIANTE ANTECIPAÇÃO CAUTELAR DA TUTELA RECURSAL. 1. Antecipação da tutela
recursal concedida para fins de suspensão dos efeitos da Portaria 824, de 23 de agosto de 2007, expedida
pelo Presidente da Fundação Nacional do Índio, constituindo Grupo Técnico com intuito de realizar
estudos de natureza antropológica e ambiental necessários à revisão dos limites da Terra Indígena Wawi,
localizada no Município de Querência, no Estado do Mato Grosso. 2. Presença dos requisitos que
autorizam a adoção da providência, assim a relevância do pleito, com conformação de prova inequívoca
quanto á verossimilhança da alegação em que se sustenta o direito defendido, diante do entendimento, a
partir do decidido pela Suprema Corte em relação à Terra Indígena "Raposa Serra do Sol", indicativo da
impossibilidade de demarcação com objetivo de ampliação de reservas indígenas já demarcadas, e
possibilidade de ocorrência de dano grave e de difícil reparação. 3. Agravo regimental não provido (AGRAC
0036677-05.2007.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MOREIRA ALVES, SEXTA
TURMA, e-DJF1 p.849 de 24/01/2014)

8. Julgados do TRF da 4ª Região

Decisão Monocrática
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO
Processo: 5028231-41.2016.404.0000 UF:
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Data da Decisão: 06/07/2016 Orgão Julgador: QUARTA TURMA
Fonte D.E. 06/07/2016
Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que, em ação de reintegração ajuizada
por Geneci Aparecida Siqueiri Fanhani e outros, em virtude de ocupação indígena de imóvel de sua
propriedade, localizada no Município de Terra Roxa/PR, indeferiu o pedido de suspensão do feito até a
finalização do procedimento demarcatório e o julgamento da Ação Civil Pública n.º 5001076-
03.2012.404.7017, formulado pelo Ministério Público Federal.
A ação civil pública n.º 5001076-03-2012.404.7017 foi proposta pelo MPF contra a Funai e a União,
objetivando compelir os réus a identificar e demarcar as terras indígenas de aldeias Guarani nas cidades de
Guaíra e Terra Roxa, no Paraná. Nela foi deferida, em parte, a antecipação de tutela, para determinar à
Funai que inicie o procedimento demarcatório. A decisão interlocutória foi parcialmente confirmada por
esta Turma, em julgado de relatoria do Desembargador Cândido Alfredo Silva Leal Junior, assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. FUNAI. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MPF. DEMARCAÇÃO DAS TERRAS INDÍGENAS.
FIXAÇÃO DE PRAZO. MULTA DIÁRIA. REDUÇÃO.
1. Não cabe ao Judiciário fixar prazos para a administração exercer as atribuições que lhe são próprias, a
não ser em casos excepcionais, em que a mora do poder público é flagrante, e nos quais a inércia da
administração inviabiliza o exercício de direitos pelos cidadãos
2. Redução da multa diária pelo descumprimento, para R$ 200 (duzentos reais) ao dia, conforme os
princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. POSSE INDIGENATA. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA.


NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA. HONORÁRIOS PERICIAIS. ÔNUS. 1. Em se tratando de demanda
cujo pedido é o reconhecimento da nulidade de demarcação de terras indígenas, a fim de obter
indenização pela desapropriação indireta de imóvel, é imperativa a realização de perícia antropológica,
para averiguação do cumprimento dos requisitos no procedimento demarcatório. 2. A Constituição Federal
(art. 231, § 6º) dispõe que o reconhecimento da posse indigenata afasta a possibilidade de indenização da
terra nua por desapropriação indireta, sendo juridicamente irrelevante e ineficaz título de propriedade em
nome de particular e cabendo apenas indenização quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-
fé. 3. É necessária também a realização de perícia avaliatória, pois - considerando-se os parágrafos
anteriores - em não sendo reconhecida qualquer nulidade na demarcação das terras indígenas e,
consequentemente, restando afastada a possibilidade de indenização pela terra nua, somente caberá o
pleito de indenização das benfeitorias realizadas pela ocupação de boa-fé. Por tais motivos e porque,
embora semelhantes, são distintos os imóveis, não é cabível a produção de prova emprestada em relação
à avaliação. 4. A desapropriação indireta é regida pelo procedimento comum, de modo que é da agravante
- como autora da ação originária - o ônus do adiantamento dos honorários periciais, quando determinada a
produção da prova de ofício pelo juiz, de acordo com o disposto no art. 33 do CPC. 5. Mantida a decisão
agravada. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5024516-93.2013.404.0000, 4ª TURMA, Des. Federal
VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 28/02/2014)
Por tais razões, inexistindo omissão, contradição, obscuridade ou erro material no julgado, impõe-se a
rejeição dos embargos de declaração.

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