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Questões
A isso deve-se adicionar, ainda, que apenas aquele que faz uso dos objetos, por
exemplo de instrumentos musicais, é quem realmente pode, pela sua prática,
oferecer ao que o fabrica, as verdadeiras instruções e roteiros para a sua
construção. Assim vemos que mesmo quem fabrica os objetos, é alguém que
desconhece, de certo modo, a natureza daquilo que faz, estando, por isso,
totalmente subordinado a quem o utiliza. Se assim se dá com o fabricante, que
diríamos do pintor, que apenas o representa e de nada adianta saber como é
utilizado o objeto ou como é construído. Mais afastado ainda, portanto, este se
encontra da verdade.
Da mesma forma, o poeta também está afastado da verdade, pois a sua imitação
está mais voltada para aquilo que deve agradar a multidão, do que para o
princípio racional da alma. E representa mais o múltiplo e aquilo que é menor em
nós, do que o nosso lado superior e racional. Importante citar uma passagem
que demonstra de que forma a poesia faz isso e que, adiante, pode servir para
contrapor a visão aristotélica:
Em Aristóteles, o belo não é uma forma ideal além do mundo sensível, no qual
as coisas consideradas belas participam e tiram disso a sua beleza, mas consiste
justamente na figura e na ordem das partes em um todo qualquer, como no
trecho abaixo.
Platão tece críticas em relação aos trabalhos dos poetas, dentre eles Homero e
Hesíodo, no diálogo A República. Logo no inicio do Livro X, Platão refere-se à
poesia Homérica. Ele afirma: “Nosso Estado possui muitas características que
me certificam que estávamos totalmente certos em fundá-lo e organizá-lo como
fizemos. Quando afirmo isso, refiro-me particularmente a poesia” (PLATÃO,
2012, p. 397).
Gláucon pergunta por que a poesia. Como resposta, Platão diz que, por se tratar
de imitação, a poesia deveria ser “completamente abolida”. Segundo este, a
poesia desperta sentimentos e não contribui para o desenvolvimento da
razão; logo, uma cidade ideal jamais poderia ser formada por poetas.
“Um certo amor e respeito que tenho por Homero desde criança me deixa
hesitante quanto a falar. Ele parece ter sido o primeiro mestre e guia de todos
esses belos trágicos” (PLATÃO, 2012, p. 397). No entanto, Platão afirma que a
poesia desenvolve a pior parte da alma do homem, levando-o a se
distanciar da razão e das ideias perfeitas, bem como da justiça e do belo.
Na seqüência, sobre a poesia Platão conclui: “Atingimos um consenso sobre os
imitadores” (PLATÃO, 2012, p. 401). Aqui Platão classifica o poeta como um
enganador, profanador de mentiras e ilusões.
Dessa forma, o autor coloca a poesia num plano inferior à filosofia. “Dizem que
se um bom poeta produz boa poesia, é forçoso que conheça as coisas sobre as
quais escreve, caso contrário seria cabalmente incapaz de produzi-la” (PLATÃO,
2012 p. 402).
Percebe-se que Platão não aceita que o indivíduo seja formado pelos
poetas, pois a poesia destrói o racional do homem e, conseqüentemente,
destrói a melhor espécie de cidadãos, já que não possuem conhecimento
do que fazem e não conhecem a essência daquilo que imitam. Eles se
preocupam somente com a aparência, prejudicando a alma dos ouvintes e,
por isso, deveriam ser expulsos da cidade.
Platão ao fazer essa repreensão severa com a poesia homérica tinha como
objetivo idealizar um sistema educacional perfeito e para que isso se efetivasse
a poesia trágica deveria ser totalmente eliminada.
De acordo com Haverlock (1996), na obra Prefácio a Platão livro X da República,
identifica-se que Platão trata da questão da poesia fazendo uma comparação
entre o poeta e o pintor. Para Platão, o artista produz uma versão da experiência
a qual esta afastada da realidade. Com base nessa tese, os maiores poetas
gregos, “de Homero a Eurípedes, devem ser excluídos do sistema educacional
da Grécia” (HAVERLOCK, 1996, p. 20).
É a partir disso que Platão faz sua crítica à arte. Cada ser particular participa das
ideias (a participação é a relação entre o todo e as partes) sem se confundir com
elas, que são, pois, absolutas. O mundo é uma cópia do real e esse afastamento
do verdadeiro já é uma Dessemelhança, ainda que natural. Entretanto, Platão
julga a arte como imitação, capaz de enganar, uma vez que a realidade sensível
já é uma imitação do inteligível. A arte afasta ainda mais do real, pois imita a
cópia. A imitação da cópia é o que Platão chama de Simulacro, que introduz
uma desmedida maior do que a própria existência do mundo natural. Por isso
Platão rejeita a arte em seu estado ideal, querendo, com isso, substituir a Poesia
pela Filosofia.
De acordo com Havelock (1996), nota-se que, para Platão, o teatro é visto como
“tragédia”, uma vez que representa a arte dramática. O teatro define seu ataque
como “ações forçadas ou voluntárias, e que, em conseqüência de as terem
praticado, pensam ser felizes ou infelizes, afligindo-se ou regozijando-se em
todas essas circunstancias” (HAVELOCK, 1996, p. 24).
Para Platão, a poesia tradicional oferecia pouca orientação moral, além de ser
um perigo, pois a repetição influenciaria as mentes jovens à imitação. A poesia
é classificada em três grupos: “ou ela narra o que está ocorrendo, pela própria
boca do poeta, ou dramatiza o que está ocorrendo deixando que os personagens
em pessoa falem, ou utiliza ambos os modos” (HAVERLOCK, 1996, p. 26).
Na República pode-se notar a critica que Platão faz aos deuses e a mitologia
grega. Os deuses estavam presentes, cada um com sua especificidade e
percurso histórico, tais histórias faziam parte de toda a Grécia. Havia um deus
responsável para cada área da vida humana, esses deuses surgiam à medida
que os gregos buscavam um sentido para a vida num mundo totalmente mutável.
Portanto, para Platão essa influência dos deuses na formação do homem grego
não significava algo saudável para a alma do indivíduo.
Com isso, Platão começa a selecionar as fábulas contadas as crianças, para que
não cresçam acreditando em falsas crenças em suas almas;
Consequentemente, teremos de, antes de mais nada, supervisionar os
contadores de histórias e executar uma censura de suas histórias. Faremos uma
seleção de fábulas, aprovando as boas ou belas e rejeitando as que não são.
Convenceremos, em seguida, as amas e mães a contar as suas crianças às
fábulas que selecionamos, uma vez que elas moldarão as almas de suas
crianças por meio de histórias bem mais do que os corpos dessas manuseando-
os. Muitas das fábulas que lhes contam agora, entretanto, tem de ser rejeitadas
(PLATÃO, 2012. p. 105).
Tais, portanto, observei, são os tipos de histórias ou fábulas que julgo os futuros
guardiões deveriam e não deveriam ouvir a respeito dos deuses desde sua
infância, se pretendemos que honrem aos deuses e aos pais e não tenham a
amizade deles nivelada com outras em baixa estima (PLATÃO, 2012, p. 117).
Solicitaremos a Homero e aos outros poetas para que não representem Aquiles,
o filho de uma deusa... Deitado ora de lado, ora de costas, ora novamente de
bruços, depois se levanta e se põe a perambular distraidamente por um caminho
ou outro da praia do mar infecundo (PLATÃO, 2012. p. 120).
Tais passagens Platão julga que Homero não deveria descrever, pois levaria os
jovens a sofrimentos desnecessários e insignificantes. Então sugere que não se
aprove a poesia de Homero nem o próprio poeta quando se referir aos deuses
nestes termos: “E um riso inextinguível irrompeu entre os deuses bem-
aventurados ao verem Hefaístos coxeando [ao mover-se] pela sala” (PLATÃO,
2012. p. 122).
⁃ Aristóteles
Uma forma de objeção a este argumento é dizer que não parece que a
dor seja uma impureza na emoção de piedade e de medo, pois essas emoções
são dolorosas na sua essência. Tal como Aristóteles concebe a tragédia, os
acontecimentos por ela descritos devem despertar emoções dolorosas.
Atualmente, essa posição não é mais defendida.
Por último, a catarse pode ser vista como uma espécie de clarificação
ou educação das emoções. Para esse sentido, é possível apontar que o ideal de
pessoa virtuosa, em Aristóteles, englobava a habilidade de sentir as emoções
certas em relação aos objetos adequados, em níveis adequados e em momentos
convenientes. Portanto, a catarse se referiria a uma espécie de educação dos
sentimentos. Nesse aspecto, o herói trágico seria, de fato, uma figura
merecedora da piedade dos expectadores. Por outro lado, a tragédia
representaria acontecimentos genuinamente aterrorizantes. Assim, essa arte
nos educaria a sentir as emoções certas pelos objetos adequados, como se
fosse através de um treinamento. Esse ponto de vista serve como uma resposta
à Platão e sua ideia de censura às artes. E, no mesmo sentido, o prazer advindo
da contemplação da tragédia poderia ser explicado, pois ao educarmos nossas
emoções, o prazer daí advindo seria derivado de uma contemplação que produz
os sentimentos adequados aos seus objetos.
Em Platão, vimos que há uma distinção sobre a poesia ser algo bom ou
não. Aristóteles, ao contrário, se pergunta sobre quando o poema é um bom
poema. Essas não são exatamente as mesmas questões. Por exemplo, nós
poderíamos concordar sobre quais são os métodos de tortura mais eficientes,
enquanto, ao mesmo tempo, poderíamos discordar sobre a tortura em si ser uma
coisa boa.
Aristóteles, por outro lado, diz que a boa poesia deve representar, de
forma plausível, o que o poeta pretende representar. Como corolário dessa
afirmação, temos que não é necessariamente uma falha o fato de um poema não
representar as coisas como elas, de fato, são, ou que ele represente ações
imorais. Para Aristóteles, por exemplo, é apropriado que a poesia represente as
coisas como elas um dia foram (há o exemplo da representação dos costumes
militares tal qual foram um dia), ou como elas devem ser (o exemplo da obra de
Sófocles), ou dado que não exista uma melhor forma de provocar as emoções
adequadas ao gênero artístico em questão. Todas essas são maneiras
aceitáveis de representação artística, apesar de não representar as coisas como
elas de fato são. Feitas essas ressalvas, Aristóteles diz que os poetas não
poderiam representar as coisas como elas não são. Por ser uma restrição muito
frouxa, parece que não há, realmente, problema em representar as coisas como
elas não são, ou coisas imorais, mas apenas em representar as coisas de forma
implausível.
Um outro filósofo fornece uma visão sobre esse aspecto prazeroso. Para
ele, por sabermos que se trata de uma obra de ficção, o nosso medo e a nossa
dor são superados. E, também, no caso da tragédia, nós gostamos de nos
identificar com os personagens superiores, como os heróis trágicos.
Uma das outras visões sobre essa dualidade do prazer e da dor está em
afirmar que nós sentimos prazer por sentir a emoção dolorosa da piedade, pelo
prazer que se deriva de nos identificarmos como sujeitos compassivos, que são
capazes de se identificar com os outros. Uma das objeções a essa visão é que
não parece ser esse o motivo de sentirmos prazer por meio dessas emoções.
Outra objeção é que essa alegação pode explicar o prazer de emoções como a
piedade, mas não explica emoções como o medo, pois parece não haver um
prazer associado ao fato de nos descobrirmos capazes de sentir medo em certas
situações. De todo modo, essas duas objeções parecem indicar algo subjacente,
que é o fato de o prazer derivado das emoções ser apenas auto-congratulatório
e não parece ser uma representação adequada da piedade o fato de considerá-
la auto-congratulatória.
Uma dessas razões gerais (um tanto aristotélica) é que a tragédia nos
permite adentrar de uma forma muito mais plena na mente das pessoas que
sofrem. Uma das razões para ser assim é que, por ser uma representação, ela
nos permite um certo distanciamento, que dá origem a uma apreciação e
compreensão maiores através da obra de arte, do que se fosse algo
efetivamente acontecendo conosco.
⁃ Kant
A crítica do juízo é dividida em duas grandes partes. Uma parte é sobre estética
(crítica do juízo estético) e a outra sobre filosofia da ciência (crítica do juízo
teleológico). Não comentaremos sobre a segunda parte, apenas a primeira.
Sobre a primeira parte, muitos assuntos são abordados, e aqui apenas
trataremos das seções de 1 a 40. Temas como a boa arte (fine art) e o gênio não
serão abordados, apesar de fazer parte dessa primeira seção da obra, por
motivos de tempo.
Kant é um autor muito difícil de ser lido. É importante notar os motivos por trás
dessa dificuldade.
Em muitas partes de sua obra, Kant aplica termos indistintos a coisas de
significados meramente semelhantes, sem atentar para as distinções
necessárias entre os objetos. O que mais se destaca, é que, muitas vezes,
sequer parece que o próprio autor está ciente dessas distinções. Então, é
importante lembrar dessa “tendência” kantiana ao fazer suas leituras.
Essa tendência deve ser ligada ainda a uma outra. A das considerações
arquitetônicas de sua obra filosófica. Ou seja, Kant tenta criar sistemas muito
elegantes, ordenados em grupos de 3 e 4 itens, de forma a melhor expor suas
visões. Muitas vezes, na tentativa de dar esse aspecto arquitetônico a sua obra,
ele distorce palavras ou as combina de formas um tanto curiosas.
Dito isso, é importante destacar que Kant tem uma terminologia própria muito
vasta. Sobre a estética em específico, devemos ressaltar que esta está
encaixada no restante do seu sistema filosófico, compondo apenas uma parte
deste último e em harmonia com todo o resto. Não é incompreensível a sua
estética sem o restante da sua filosofia, mas é de grande valia compreender suas
outras visões filosóficas para melhor compreender sua estética.
Outro termo importante a ser clarificado é o termo “a priori”. Kant, por exemplo,
acredita que vários conceitos e intuições são a priori. O conhecimento a priori é
aquele que não é justificado pelos sentidos. Portanto, há o conhecimento
empírico (justificado pelos sentidos), como o conhecimento de que está
chovendo lá fora, que é justificado pela nossa percepção de ver a chuva caindo;
e há o conhecimento a priori, que não é justificado pela experiência sensível. Por
exemplo, o conhecimento matemático e certos princípios da física (como todo
evento tem uma causa). Há duas formas de se identificar o que é conhecimento
a priori, que é através da universalidade e da necessidade. Universalidade quer
dizer quando sabemos que algo é sempre de tal modo, sem exceções e não se
pode saber aquilo através da experiência. Outra marca do conhecimento a priori
é a necessidade, que é quando sabemos que algo é de tal forma
necessariamente. Não podemos saber isso através da experiência. Pela
experiência apenas sabemos que algo é de tal modo, não que deve ser de tal
modo.
Quando se fala em juízos estéticos, não se pretende falar apenas das coisas que
são belas, como naturalmente se deduz. Na verdade, para Kant, há pelos menos
3 tipos de juízos estéticos. O juízo de gosto (que dizem respeito à beleza); o juízo
do sublime; e o juízo do aprazível. O que torna todos esses juízos em juízos
estéticos é que eles possuem fundamentos subjetivos. São baseados em algo
relacionado ao sujeito (julgador), ao invés do objeto. Em cada um desses casos
os juízos se baseiam em sensações, ao invés de propriedades dos objetos.
Juízos de gosto são juízos estéticos. O que significa dizer que são juízos
baseados no prazer. Como vimos em Hume, a beleza não é uma propriedade
do objeto belo. Hume ofereceu algumas argumentações em favor desse
posicionamento e Kant simplesmente assume esse posicionamento sem outras
explicações. Portanto, a beleza depende de uma sensação que o objeto nos
causa. E é por esse motivo que os juízos de gosto são juízos estéticos. Isso os
distingue dos juízos lógicos e teóricos.
Os juízos teóricos são possíveis mediante a conexão de percepções com
conceitos; os juízos estéticos, mediante a de percepções com sensações. Essa
identidade, estabelecida por Kant, entre a relação das percepções com os
conceitos e das percepções com as sensações é um tanto problemática, pois
em um nível intuitivo, não nos parece que sejam relações do mesmo tipo.
Para melhor entender esse ponto, Kant vai contrastar prazer na beleza, com
prazer no bom e prazer no agradável. Para julgar que algo é bom (útil), deve-se
saber se o objeto em questão é de fato o que ele deve ser. Por exemplo, se a
faca é de fato um objeto que corta. Para julgar algo como bom (útil), devemos
aplicar o conceito do que o objeto deve ser. Se ele é o que deve ser, então ele é
bom. Portanto, se você tem prazer no fato desse objeto ser útil para o que ele se
propõe, seu prazer deriva do conceito que você aplicou ao objeto. Isso é o que,
mais propriamente, se trata quando dizemos que o prazer é baseado em
conceitos. E, também, é exatamente o que o prazer derivado do belo não é.
Lembrando o caso do botânico, não há problema que você saiba qual a função
da flor para a planta, mas que o seu prazer em sua beleza não se deriva de saber
isso.
O prazer provindo do belo é singular. Isso quer dizer que o prazer que obtemos
a partir da apreciação estética de alguma coisa depende exclusivamente da
representação daquele objeto e não de qualquer generalização a partir daquele
objeto. Por exemplo, é possível dizer: “esta tulipa é bela”. Essa é uma afirmação
que constitui um juízo estético. Já a que diz “todas as tulipas são belas”, não
pode ser um juízo estético, pois é uma generalização.
Portanto, é muito importante ressaltar aqui, que um juízo estético não pode ser
qualquer juízo em que se atribui beleza a algo, pois isso pode ser feito,
inadvertidamente, a partir da generalização de um objeto, a qual, por sua vez,
não é a representação imediata de uma tulipa - muito menos na de todas as
tulipas (!). Além do mais, dizer que todas as tulipas são belas é julgar a beleza a
partir dos juízos de gosto anteriores; e o fato de se basear em juízos estéticos
não faz desse juízo (generalizante), um juízo estético. Na verdade, esse juízo do
exemplo é um juízo teórico.
Importante, também, ressaltar que Kant não está dizendo que não é possível
fazer esses juízos generalizantes, mas apenas que eles não são juízos estéticos,
mas juízos lógicos.
Segundo ponto para melhor aclarar esses juízos (e aqui acreditamos que Kant
está se dirigindo a alegações de Hume). Os juízos estéticos (of taste) não podem
ser demonstrados (proved). Hume sugere que é possível demonstrar que
alguém não tem um bom gosto a partir de princípios gerais. Por exemplo, Hume
diz que é possível demonstrar que um objeto que uma pessoa não acha bonito,
é porque a pessoa não tem um bom gosto, pois existem princípios gerais que
demonstram que o objeto é belo.
Kant se opõe totalmente a esse procedimento de Hume. Portanto, como seria
oferecer um argumento de que algo é belo? Como deveríamos proceder para
justificar um juízo estético? Deve-se tomar a seguinte forma:
1.a premissa: tudo com alguma forma x é belo.
2.a premissa: Este objeto tem a forma x.
Conclusão: Este objeto é belo.
Para Kant, esse procedimento não é possível. E a contemporaneidade talvez
deva um pouco dessa mesma postura à Kant. No entanto, muitos autores
tentaram fazer esse julgamento dessa forma, seja através de conceitos como o
do padrão áureo. Kant, no entanto, discorda disso. De novo, pela mesma razão
já expressa anteriormente, de que afirmar isso seria dizer que os juízos estéticos
são baseados em conceitos. Mas se os juízos estéticos são apenas baseados
no prazer, e não nos conceitos, então não é possível apontar leis gerais que as
coisas belas representem.
Kant também diz que os juízos estéticos não podem ser justificados pelos juízos
estéticos de outras pessoas. Todos os experts dizerem que algo é belo não dá
qualquer suporte para a afirmação de que algo é bonito (mais uma provável
afirmação contra Hume).
De fato, no entanto, Kant parece aceitar que o juízo estético de pessoas que, por
exemplo, são exímias apreciadoras de obras de arte oferece alguma base para
o argumento de que o juízo tem algum fundamento. Contudo, mais uma vez, é
imprescindível compreender que esse não seria um juízo estético em si mesmo,
apesar de ser uma afirmação sobre a beleza do objeto.
A próxima conclusão que Kant retira de sua argumentação é que o belo não é
um tipo de perfeição. O motivo para ele dizer isso é que, anteriormente em seu
século, alguns filósofos cristãos, como Cristian Wolf e outros, mantinham que,
quando percebíamos o belo, estávamos de alguma forma percebendo algum tipo
de perfeição. Kant diz que isso não é possível, pois para julgar que algo é perfeito
em algum aspecto, devemos saber que tipo de coisa o objeto é e quais os seus
propósitos/finalidades, para saber se ele cumpre essa finalidade, o que nos faz
ter que aplicar esses conceitos ao objeto.
A última conclusão de Kant nessa seção é que o belo não pode ser definido,
pelos menos caso você esteja utilizando conceitos de propriedades a partir das
quais deva categorizar o objeto de forma que ele seja considerado belo.
E, por fim, Kant diz que é possível se achar evidência empírica para o que os
povos de diferentes épocas consideraram bonitos, mas sem que isso seja um
juízo estético propriamente dito.
Dito tudo isso, Kant procede a uma distinção consistente com o alegado até aqui.
É a distinção entre a belo livre e o belo dependente. Quando se diz, por exemplo,
um belo guerreiro, um belo cavalo, belos seres humanos, o que se diz é que
esses objetos são representados de forma a se adequar as suas funções.
Guerreiros são desenhados de forma assustadora, os cavalos de forma a
demonstrar propriedades de que eles são bons de corrida. Tais objetos
combinam tanto o útil quando o belo. Aqui parece que Kant está fazendo uma
ressalva a sua ideia de que os juízos estéticos devem ser baseados apenas no
prazer.
As pessoas leram isso de muitas maneiras. Uma das maneiras de dizer que essa
não é uma ressalva de seu pensamento é dizer que apesar de o juízo estético
não ser baseado no conceito, o motivo pelo qual o objeto assume determinada
forma é porque tem um conceito por trás. Por exemplo, uma igreja pode ser
construída de muitas maneiras belas, mas a igreja só possui a arquitetura que
possui, porque ela serve uma função específica. Não podemos construir uma
igreja de maneira aleatória, ou como qualquer outra construção bela. Portanto,
o juízo de que uma igreja é bela pode ser considerado um juízo complexo, em
que um de seus componentes é um juízo estético e o outro é um juízo de
utilidade. Essa é uma das formas de defender o ponto de vista de kant sobre os
juízos de gosto.
O belo livre, por sua vez, não pressupõe conceitos.
O outro ponto que Kant faz sobre os juízos estéticos é o de que o prazer obtido
a partir deles é desinteressado. Essa é uma doutrina muito influente.
Na verdade, esse termo ‘desinteressado’, ao invés de querer dizer um tipo de
indiferença, quer dizer algo como imparcialidade. Nesse contexto está dando o
seu próprio significado ao termo.
O interesse é o prazer conectado com a representação da existência de um
objeto e que deriva de um desejo de que o objeto exista.
O ponto parece ser que a gente deseja que o objeto exista, representamos um
tal objeto como existente, e isso nos dá prazer.
Isso não é o que o prazer do belo é.
O que Kant diz para embasar isso é através de um exemplo de um palácio.
Se perguntamos se um palácio é bonito e a pessoa diz que não devia existir
palácios, quando tem tanta gente morrendo de fome, ou que os palácios são
desperdícios de espaço, pois só precisamos de um espaço menos para o nosso
conforto. Kant diz que isso que a pessoa disse pode ser muito admirável, mas
não responde a pergunta sobre se o objeto é belo.
Pois o que se deve considerar não é o prazer (na verdade, desprazer nesse
caso) derivado da existência do palácio, mas se a mera representação da
percepção do palácio te agrada ou não.
Há uma conclusão muito grande agora que é o que coloca o grande problema
que é a principal função da crítica resolver.
Quando julgamos algo como belo estamos comprometidos com a alegação de
que o mesmo objeto deve ser agradável a todos.
Isso, Kant diz, dá aos juízos de gosto a qualidade de universalidade, que é a
marca dos juízos a priori.
Não está muito claro se isto está implícito no que foi dito anteriormente ou é o
conteúdo do que ele disse.
A primeira premissa que Kant embasa essa alegação é a partir do fato de que,
se nós contemplamos uma obra esteticamente aprazível e o nosso prazer é
desinteressado (como deve ser), nós, implicitamente, sabemos que não há nada
nessa obra que nos faz ser prazerosa por uma característica dependente de nós
mesmos, como o nosso desejo por algo, que os outros podem não partilhar.
O segundo ponto, é que se estamos cientes que não há nada que faça que a
obra seja prazerosamente apenas a nós mesmos, então devemos inferir que o
nosso prazer deriva de algo que é de nós, mas que partilhamos com todos os
outros.
A terceira premissa é que se estamos cientes que a fonte do prazer é algo em
nós que partilhamos com todos os outros, então devemos acreditar que todos os
outros devem concordar com o nosso juízo estético.
É assim que Kant deriva a universalidade do desinteresse.
⁃ Aula 2 do Kant
Hoje veremos a solução para o problema do juízo de gosto visto na última aula
na Analítica do Belo. A estratégia é que na Analítica algumas características que
o juízo de gosto possui são identificadas e, supostamente, na Dedução uma
explicação da possibilidade de se ter essas características problemáticas é dada.
Como dito, é apenas supostamente dada porque o material que embasa esse
argumento está espalhado por toda a Crítica, nas duas seções intituladas
Analítica e Dedução.
Um ponto que não foi comentado na aula passada é que Kant acredita que essa
característica de universalidade permite que falemos da beleza como se ela
fosse uma propriedade dos objetos, mesmo que não o seja. A palavra
‘belo’/‘bonito’ é um adjetivo que, pelo menos, normalmente, é usada para atribuir
propriedades objetos e, de várias maneiras, nós falamos da beleza como se
fosse propriedade dos objetos. Kant acredita que a razão para isso é essa
peculiaridade dos juízos estéticos de que os outros devem concordar com ele. E
isso faz com que, ao imputar essa universalidade aos outros, nós como que
estamos atribuindo propriedades do belo ao objeto, pois quando fazemos
julgamentos baseados em conceitos, nós também esperamos que os outros
concordem. Então, por exemplo, se olhamos para um objeto e o julgamos como
tendo uma forma quadrada, nós também acreditamos que os outros concordarão
com essa alegação. Portanto, os juízos lógicos ou conceituais também têm essa
característica de atribuição de universalidade.
É essa analogia que nos permite falar da beleza como se ela fosse uma
propriedade dos objetos. Por fim, é por causa dessa similaridade que nos é
apropriado falar da beleza assim.
É importante notar, de forma complementar, que Kant usa isso para defender
um tipo de formalismo sobre a beleza. Kant diz que se depreende do dito
anteriormente que as cores e os matizes não podem ser belos, eles podem
apenas ser agradáveis. A razão para isso é porque não podemos ter certeza que
todos veem as mesmas cores que vemos. Interessante que Kant também
defende, ao mesmo tempo, que a pureza das cores pode ser considerada bela,
porque ela é uma característica formal, homogênea (undiferentiated), passível
de ser atribuída universalidade. Já a experiência com as cores, não.
Até aqui, vimos que não podemos estar justificados em crer que uma coisa é
bela por causa do prazer que ela nos causa, pois essa é uma característica
intrinsecamente subjetiva, mas também não podemos nos justificar através de
uma prova, pois isso não seria um juízo de gosto - que não é baseado em
conceitos; e também não é baseado em uma evidência empírica de que o objeto
é belo para os outros (esse também seria um juízo baseado em gosto).
Como Kant chega até isso? Um dos passos parece ser que nós apenas podemos
ter essa crença justificada de que todos podem ter prazer no objeto, caso
pudermos acreditar que o nosso próprio prazer deriva de um estado mental
(condição mental, atividade mental), que podemos conhecer a priori que todos
podem também estar quando perceberem o que a gente percebe. Essa é uma
alegação sobre a fonte do nosso prazer. Esse é um dos passos.
Esse passo relembra alguns apontamentos que fizemos sobre o desinteresse na
última palestra, a respeito de a fonte de nosso prazer não poder ser exclusiva de
nós.
Kant possui uma teoria sobre quais são esses estados mentais mencionados
acima, que é apresentada na Crítica da Razão Pura. De forma a aplicarmos um
conceito ao que percebemos, há duas faculdades que são imprescindíveis.
Primeiro, a imaginação (conceito similar ao que entendemos), que é a faculdade
de representar uma intuição de algo que não nos está presente. Adiante, é
preciso ressaltar que Kant também dá um papel central para a faculdade da
imaginação para a nossa percepção sensível. Em particular, de modo que
apliquemos conceitos ao que percebemos por meio dos sentidos, a imaginação
deve combinar ou sintetizar intuições. Portanto, o fato de a imaginação combinar
representações perceptivas distintas é um dos fatores que nos permite aplicar
conceitos ao que percebemos.
Paul Guyer crê ter encontrado uma passagem onde Kant dá um exemplo desse
processo (seção 53 da Crítica do Juízo). Nessa passagem, Kant está falando
sobre música e a experiência da melodia e da harmonia.
O pensamento básico aqui parece ser, da mesma forma que a harmonia agrupa
as notas para produzir os sons, a nossa imaginação agrupa certos elementos
que produzem o nosso prazer pela beleza, mas sem um conceito que represente
o que esses elementos possuem em comum. O fato de que há um conceito
unificador por trás da experiência com o belo, é o que Kant tenta demonstrar
aqui com a matemática. Esses tons agrupados, de fato, estão em certas relações
uns com os outros e que podem ser descritas, mas o ponto é que não
representamos esses tons com um conceito que os unifique, enquanto ouvimos
a música e a fruímos - e mesmo que entendamos a teoria musical por trás do
que está sendo tocado, não é daí que vem nosso prazer.
Isso parece ser o que o jogo livro da imaginação e do entendimento se trata. É
um jogo, portanto, porque as faculdades utilizadas não estão sendo utilizadas
em função de adquirir conhecimento, mas como um jogo apenas. É um jogo livre
porque a imaginação está combinando diversas representações, mas não está
sendo guiada pelos conceitos. É harmonioso porque, conforme Guyers, a
imaginação satisfaz a requisição usual do entendimento por algumas
combinações de representações, mesmo que o entendimento não aplique um
conceito. E isso é um estado de mente que todo mundo pode estar, quando se
depara com um certo objeto. E é pelo jogo livro que nos justificamos a priori de
que todos podem ter o prazer ao contemplar o mesmo objeto.
Inúmeros pontos podem ressaltar dessa teoria de Kant. Não está muito claro
quando Kant está apenas tentando explicar quando algo é possível, já
assumindo que é possível premeditadamente, ou se ele tentar explicar, inclusive,
a possibilidade de algo. Portanto, não sabemos aqui se Kant já acredita na
possibilidade do juízo estético universal ou se ele está demonstrando a sua
possibilidade através de sua teoria.
Kant, ainda, sabe que é possível que nós não saibamos quando estamos
justificados em crer que o nosso prazer se deriva do jogo livre da imaginação e
do entendimento ou de algum interesse. Da mesma forma, na filosofia moral
kantiana, há a afirmação de que não temos como saber indubitavelmente que
estamos agindo por juízo moral ou simplesmente pelas nossas inclinações. No
entanto, ainda não podendo ter certeza, podemos tentar justificar o nosso prazer,
pela análise de se ele provém de algum interesse ou não. Portanto, a falta de
certeza não nos deixa numa condição de completa ignorância sobre a natureza
do nosso prazer.