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V Encontro Nacional da Anppas

4 a 7 de outubro de 2010
Florianópolis - SC – Brasil
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Conflitos, Acordos e Direitos de Propriedade Comum


no Estado do Amazonas

Tiago da Silva Jacaúna (UNICAMP)


Sociólogo e Economista, Doutorando em Ciências Sociais
tiagojacauna@hotmail.com

Resumo

O trabalho visa discutir os problemas relacionados ao uso comum dos recursos pesqueiros em
comunidades rurais do estado do Amazonas. Analisam-se os conflitos sociais entre pescadores,
os acordos de pesca formais e informais e os direitos de propriedade comum. Toma-se como
campo de pesquisa comunidades ribeirinhas localizadas na área rural dos municípios de
Manacapuru – AM e na divisa de Novo Airão – AM com Rorainópolis – RR. Essas áreas
apresentam realidades diferentes no que se referem as suas instituições de gestão de recursos
comuns, uma apresenta acordo de pesca legalizado e a outra não. Assim, o estudo focaliza os
problemas relacionados à gestão local do território e suas implicações sociais, políticas e jurídicas.

Palavra chave
Conflitos, acordos de pesca, direitos de propriedade comum
1 Introdução

O presente trabalho trata dos dilemas a respeito do sistema de propriedade comum, da instituição
dos acordos de pesca e dos conflitos sociais enfrentados pelos ribeirinhos moradores das
comunidades Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, Assembleia de Deus, Assembleia de Deus
Tradicional e Santa Isabel pertencentes à localidade Jaiteua de Cima município de Manacapuru-
AM e as comunidades Itaquera, Gaspar, Barreira Branca e São Pedro situadas no Rio Jauaperi e
pertencentes aos municípios de Novo Airão - AM e Rorainópolis - RR.

O foco adotado se dirige para os problemas decorrentes da gestão do território por parte das
populações que dele se utilizam. Muitas teorias, principalmente as apoiadas na “teoria dos jogos”
sugerem a incapacidade dos grupos sociais de se organizarem no intuito de combater a sobre-
exploração da natureza. Reduzem a ação humana em um “simples” jogo racional de interesse
presente no “dilema do prisioneiro”. Assim, a formalização do problema se dá de diferentes
maneiras, mas os pressupostos teóricos básicos são sempre os mesmos e generalizantes: oferta
finita e previsível de unidades de recurso, a homogeneidade dos usuários, a sua tendência
maximização do lucro esperado, e sua falta de interação com o outro ou a capacidade para alterar
as suas instituições (OSTROM, 1990).

Todavia, inúmeros estudos empíricos estão demonstrando uma perspectiva oposta e desafiam os
pressupostos generalizantes da teoria convencional. É de comum acordo que essa teoria não dá
conta de explicar situações onde os indivíduos são capazes de criar e sustentar acordos para
evitar problemas de sobre-exploração. Também não explicam quando a posse do governo pode
se da de forma adequada ou quando a privatização irá melhorar os resultados (OSTROM, 1990).

No entanto, a constatação da capacidade organizacional de alguns grupos sociais não resolve o


problema. É preciso analisar como os acordos são construídos e as ações dos usuários que não
se vêem contemplado pelo acordo.

O estudo apresentado verifica a presença de inúmeros conflitos entre os usuários dos estoques
pesqueiros nos dois municípios estudados. Com realidades diferentes no que se diz respeito a
suas instituições de gestão, os conflitos ora se assemelham ora se diferenciam.

Sendo assim, o objetivo desse artigo é comparar duas realidades diferentes no tocante às
instituições dos acordos de pesca: uma que apresenta acordo de pesca formalizado pelo Estado e
outra que não possui a legalização do Estado, mas mantém acordos de pesca informais.

Assim procurou-se entender como se configuram os conflitos de pesca em cada lugar, quem são
os usuários e quais as reivindicações apresentadas pelos moradores.

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2 Metodologia e fontes de informação

Toma-se como campo de estudo as comunidades Nossa Senhora do Perpétuo Socorro,


Assembleia de Deus, Assembleia de Deus Tradicional e Santa Isabel localizadas na região do
Jaiteua de Cima, lago Grande, município de Manacapuru-AM que possui acordo de pesca informal
(fig. 1) e as comunidades Itaquera, Gaspar, Barreira Branca e São Pedro localizadas no Rio
Jauaperi, no município Novo Airão - AM divisa com Rorainópis - RR que possui acordo de pesca
formal (fig. 2).

Cajazeira
Lago São
Jaitêua Lourenço
de Cima

Manacapuru
Jaitêua
de Baixo

Figura 1 – Localidades com respectivas comunidades pesquisadas, município de Manacapuru – AM.


Fonte: PIATAM (2007).

Figura 2 - Localidades com respectivas comunidades pesquisadas, município de Novo Airão – AM e Rorainópolis – RR
Fonte: Projeto Nova Cartografia Social (2007).

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As informações utilizadas para a confecção desse trabalho originam-se de pesquisas de campo
com entrevistas e análise de documentos, realizadas na dissertação de mestrado elabora por
Jacaúna (2009) intitulada “A ressignificação dos comuns” comparando-se com os resultados
publicados pelo projeto coletivo “Nova cartografia social dos povos e comunidades tradicionais do
Brasil” (2007).

As pesquisas de campo das duas fontes de informação foram realizadas mais ou menos nos
mesmos anos, entre 2005 e 2007. Na pesquisa realizada por Jacaúna (2009) foi utilizada a prática
da etnografia na coleta de dados, utilizando as técnicas de entrevistas semi-estruturadas,
questionários com perguntas abertas e fechadas e conversas informais.

A pesquisa realizada pelo projeto “Nova Cartografia Social” coletou os dados a partir de oficinas
que contou com a participação dos moradores das comunidades de Gaspar, Itaquera, Barreira
Branca e São Pedro.

3 Resultados

3.1 A instituição dos acordos de pesca

Grande parte da literatura contemporânea que trabalha com a relação entre instituições e uso de
recursos naturais se apóia na noção de instituições cunhada por North (1990) (FOLKE et al.,
2007). “Institutions are the rules of the game in a society or, more formally, are the humanl devised
constraints that shape human interaction. In consequence they structure incentives in human
exchange, whether political, social, or economic” (NORTH, 1990, p. 3)

Nessa perspectiva as instituições são vistas como estruturas poderosas que influenciam as ações
individuais. Granovetter (2007) etiqueta essa visão como “supersocializada” A concepção
supersocializa assenta na ideia de que as pessoas são sensíveis e influenciadas pelas opiniões
dos outros, assim, são obedientes aos sistemas consensualmente desenvolvidos de normas e
valores, transmitindo pela socialização na qual a obediência torna-se natural.

Proponents of these approaches, from neofunctionalists and systems


theorists to many historical- comparative analysts, all too often fall back
upon the assumption that it is durable, coherent entities that constitute the
legitimate starting points of all sociological inquiry. Such entities possess
emergent properties not reducible to the discrete elements of which they

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consist. Not individual persons, but groups, nations, cultures, and other
reified substances do all of the acting in social life and account for its
dynamism (EMIRBAYE, 1997: 285)

Essa concepção tornou-se proeminente em 1961 com a tentativa de Talcott Parsons a superar o
problema da ordem problematizado por Hobbes, propondo a superação e ruptura com a
perspectiva atomizada e subsocializada do homem da tradição utilitarista da qual Hobbes fazia
parte.

Tentando fugir dessa “gaiola de ferro” teórica, prefiro entender as instituições a partir de uma
perspectiva relacional, vendo as instituições não como uma estrutura que define a forma das
relações humana e nem como uma “coisa” que nasce a partir de escolhas individuais (teoria das
escolhas racionais), mas como um conjunto de relações sociais que possui padrões de transação
que define o conteúdo dessas relações.

O desafio que se coloca a sociologia relacional é explicar os fenômenos sociais sem eleger
nenhuma relação causal, total ou parcial de estruturas sociais para a ação. A sociologia relacional
rejeita as concepções voluntaristas e deterministas como modo realista de percepção. Assim,
nenhum ator específico pode mudar toda a estrutura social conforme sua vontade, assim como
nenhuma estrutura social pode determinar as ações de qualquer indivíduo, isto é, não existe a
possibilidade de qualquer relação empírica entre estruturas e atores sociais

Nesse ínterim, os acordos de pesca podem ser entendidos como arranjos participativos locais que
grupos sociais de pescadores tencionam regulamentar os recursos ictiofaunísticos adjacentes às
suas moradias. Os primeiros acordos de pesca datam de meados da década de 1970, nesse
período, quando havia apenas uma comunidade nas margens do lago, os acordos eram
realizados pelas lideranças da própria comunidade. No caso de se encontrarem muitas
comunidades nas margens de um lago ou de um sistema de lagos, então os presidentes das
comunidades e mais algumas lideranças locais participavam do processo de elaboração e
negociação do acordo intercomunitário (AZEVEDO e APEL, 2004).

Na localidade Jaiteua de Cima, o acordo de pesca existente envolve o conjunto das quatro
comunidades pertencentes à localidade (Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, Assembleia de
Deus, Assembleia de Deus Tradicional e Santa Izabel), sendo iniciados pelos presidentes ou
líderes de cada comunidade que convocaram os demais moradores, sobretudo, os pescadores,
para discutirem sobre o problema do escasseamento do pescado em “seus” ambientes aquáticos.

A elaboração desses acordos surgiu da necessidade de proteger os ambientes de pesca


adjacentes às suas moradias. Esses ambientes vinham sendo alvo de um grande esforço de
pesca praticado, principalmente, pelos pescadores comerciais citadinos. Dessa forma, o acordo

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de pesca nasceu através de uma iniciativa local de regulamentação da pesca face à ausência ou
ineficiência do Estado na regulamentação e fiscalização dessa atividade.

No acordo estabelecido entre os pescadores, o paraná do Anamã (ambiente protegido pelo


acordo) funciona como lago de manutenção das comunidades do Jaiteua de Cima, isto é, só é
permitida a pesca de subsistência nesse ambiente aquático durante o período da seca, sendo
este zoneamento o principal instrumento do acordo de pesca da localidade. Em face disto, as
regras do acordo orientam a atividade pesqueira, impedindo a pesca comercial no paraná do
Anamã no período de seca, sendo permitido somente a pesca de subsistência. Nesse sentido,
não é permitido aos moradores locais nem aos “de fora”, o exercício da pesca comercial.

Nesse ínterim, os pescadores de subsistência da localidade Jaiteua de Cima provocaram uma


ação social normativamente regulada, pois buscaram entendimento sobre problemas no mundo
social e, assim, criaram o acordo de pesca. Todavia a regulação proposta pelos pescadores não
foi imediatamente aceitas por todos, criando ruídos para o entendimento.

Quando a ação visa alcançar um entendimento, num sentido de um processo cooperativo, mas,
ao mesmo tempo, não se limita a apenas isso, pois deve permitir o estabelecimento de relações
com o mundo, temos a ação comunicativa. “Alcançar entendimento significa que os participantes
na comunicação chegam a um acordo a respeito da validade de uma asserção: o acordo é o
reconhecimento intersubjetivo da pretensão de validade que o falante ergue” (ARAGÃO, 1992, p.
54).

Contudo, como foi mencionado, o cumprimento das regras do acordo não é seguido por todos, há
resistência de parcela dos próprios moradores locais. Os pescadores que não aceitam as regras
são aqueles que têm na pesca a sua principal fonte de renda, isto é, os pescadores comerciais
locais, por isso, não aceitam as limitações impostas. Assim, a ação comunicativa manifesta no
acordo de pesca não obteve sucesso pleno, pois, como foi visto, quando a ação comunicativa
alcança o entendimento, ela acarreta a ausência da coerção na medida em que é aceita por
todos.

Outro obstáculo encontrado para a efetivação do acordo é o não cumprimento das regras por
parte dos pescadores “de fora”, pois estes se apresentam em maior número e se apoiam no fato
de os moradores locais não disporem de legitimidade jurídica para impedir o acesso dos
pescadores aos ambientes aquáticos da região. Por isso, os moradores reclamam da ausência de
apoio do Estado na legitimação do acordo, visto que foram feitas diversas tentativas no sentido de
obter a presença do governo na localidade, mas nada aconteceu.

Segundo Castro e McGrath (2001, p. 117), esses obstáculos na efetivação dos acordos de pesca
se dão em virtude de geralmente não haver critérios que estabeleçam a representação necessária
de todos os usuários dos recursos pesqueiros na elaboração dos acordos de pesca: “[...] essa
falta de critérios de representação tem sido frequente motivo de conflitos na implementação dos

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acordos, já que os pescadores “de fora” e outros que não participam do processo não se
consideram responsáveis pelo cumprimento do acordo”

Nas comunidades pertencentes ao município de Novo Airão – AM e Rorainópolis - RR (Itaquera,


Gaspar, Barreira Branca e São Pedro) os acordos de pesca são legitimados pelo Estado através
da Instrução Normativa Nº 43, de 18 de outubro de 2005 (BOX I) e a Nº 99 de 26 de abril de 2006
(BOX II).

BOX I

GABINETE DA MINISTRA – MMA


INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 43, DE 18 DE OUTUBRO DE 2005.

ANEXO I
Período de defeso da piracema por terceiros da Bacia Hidrográfica da Região Amazônica
(...)

1. Bacia Amazônica
c) Estado do Amazonas 15/11 a 15/03

ANEXO II
Descrição das proibições e permissões específicas

1. BACIA AMAZÔNICA
c) Rios do Estado do Amazonas: Fica proibida a captura, o transporte, a comercialização, o
armazenamento e beneficiamento das espécies: tambaqui (Colossoma macropomum),
pirapitinga (Piaractus brachypomus), mapará (Hypophthalmus edentatus), curimatã
(Prochilodus nigricans), sardinha (Triportheus sp.), pacu (Mylossoma SP.) e aruanã
(Osteoglossum bicirrhosum).

A constatação do ato doloso de acobertamento de espécie proibida por transportador,


comerciante, armazenador ou beneficiador, implicará na perda total do lote, independente
da espécie.

Fica proibida a pesca num raio de 1500 m (mil e quinhentos metros), nas confluências dos
sistemas dos rios e corpos de água explicitamente mencionados (...) Bacia do rio Negro:
todo corpo de água desses afluentes, bem como as suas confluências: rio Jauaperi (abaixo
do Rio Macucuaú).

g) Rios do estado de Roraima: Fica proibida a pesca em todos os rios do estado. Permitida
somente a pesca de subsistência.

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BOX II

INSTRUÇÃO NORMATIVA MMA/IBAMA Nº 99 de 26 de abril de 2006

Considerando a necessidade de dar ordenamento legal ao manejo dos ambientes aquáticos


do Rio Jauaperi, municípios de Noco Airão e Roiranópolis, tendo em vista as constantes
gressões aos estoques pesqueiros;

Considerando as deliberações dos ribeirinhos e representantes das Associações de


Artesãos do Rio Jauperi 0 AARJ, Associação de Artesãos de Novo Airão – AANA (...)
(...) Resolve:

Art. 2º. A Área de abrangência do acordo fica situada do Medoini (Rio Negro) à placa da
Reserva Waimiri- Atroari.

I – Na área situada do Paraná do Maçueira à placa da Reserva, fica proibida, por dois anos
a pesca comercial (gelo), esportiva e de peixes ornamentais, sendo somente permitida a
pesca de subsistência;

Art. 4º. Durante a vigência do Acordo será realizado o monitoramento e avaliação dos
recursos pesqueiros da área em questão...

A organização das comunidades do Rio Jauaperi ocorre não apenas entorno do acordo de pesca,
os moradores debatem diversos assuntos relacionados a vida das comunidades, incluindo a
pesca, na Associação dos Artesãos do Rio Jauaperi – AARJ.

“A associação dos artesãos do Rio Jauaperi foi fundada em 25 de fevereiro


de 2004. Foi uma forma de reivindicar nossos direitos. Nós fazíamos
muitos pedidos e não vinha uma boa escola para nossas famílias, não
vinha nada. A AARJ foi uma maneira de exigir tudo a que temos direito:
terra, educação, saúde” (Francisco Parede de Lima, 2007, p. 3).

Os moradores gerenciam diversas áreas e destinam uma forma de uso para cada uma como:
áreas de produção agrícola (sítios, roças), recursos para a fabricação de artesanato e extrativismo
(cipós, castanhal, frutas do mato, palmeiras, seringueira, restos de madeira e resinas), áreas de
uso comunitário (cipó ambé, arumazal, buritizal, áreas de pesca de uso comunitário e espécies
florestais de interesse comunitário) etc.

“A cartografia é mais uma forma de mostrar nosso trabalho, de ver que não estamos predando a
natureza. Através do mapa a gente pode mostrar nossos recursos, que estamos zelando para
nosso sustento e de nossos filhos” (Rozan Dias da Silva, 2007, p. 3).

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3.2 Direitos de Propriedade Comum

Direito de propriedade é um título que dá autoridade executiva a seu possuidor de empreender


ações particulares em um domínio específico (COMMONS, 2006). Mas antes de discutirmos
direitos de propriedade comum, temos que diferenciar “livre acesso” de “propriedade comum”.

Livre acesso pode ser definido quando ninguém tem o direito legal de impedir alguém de usar um
determinado recurso (HESS e OSTROM, 2003). Alguns regimes de livre acesso são definidos
pelo fracasso do direito de propriedade, isto é, pela falta regras efetivas ou pela falta de
“interesse” no recurso, seja o estado ou qualquer outra entidade. Outro regime de livre acesso é
aquele que surge através de políticas públicas que garante o acesso de todos os cidadãos ao uso
dos recursos; “the concept of jus publicum applies to their formal status, but effectively these
resources are open-access (HESS e OSTROM, 2003, p. 122). Além desses, existe o regime de
livre acesso que resulta da dificuldade de excluir os não proprietários pelas entidades que
atribuem os direitos formais de propriedade.

Regimes de propriedade comum são aqueles pautados no controle social do acesso e da retirada
de recursos locais tais como água, floresta, áreas de pasto e de pesca. Regimes como esse tem
se desenvolvido ao um longo período de tempo e em várias partes do mundo, todavia, raramente
ganham status de códigos legais (BERKES e FOLKE, 1998). Hess e Ostrtom (2003, p. 123) fazem
uma analogia com as corporações privadas para caracterizar o regime de propriedade comum:

A modern, private corporation is, after all, a common-property regime that has
widespread use throughout the global economy—with both efficient and inefficient
consequences. Common-property regimes are essentially share contracts.

Dessa forma, os regimes de propriedade comum são contratos sociais negociados entre os
indivíduos para controlar o uso dos recursos comuns. Por conseqüência, os benefícios gerados
para o sistema dos recursos naturais e para os próprios usuários são muito maiores do que o
regime de livre acesso.

Dentro dos regimes de propriedade existem diferentes formas de direitos que definem a relação
de um indivíduo com outros indivíduos e deles com os recursos. Schlager e Ostrom (1992)
apresentam as cinco principais formas mais relevantes para estudo dos common-property
systems:

1. Acesso:o direito de entrar numa área definida fisicamente sem subtrair recursos (por exemplo,
caminhada, desfrutar da natureza);

2. Extração: o direito à obtenção de recursos das unidades ou produtos de um sistema de


recursos (por exemplo, a captura de peixes, desviarem a água);

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3. Gestão: o direito de regular os padrões de uso interno e transformar o recurso, fazendo
melhorias;

4. Exclusão: o direito de determinar quem terá direito de acesso e extração, e como esses direitos
podem ser transferidos; e

5. Alienação: o direito de venda ou locação e direitos de exclusividade.

A partir dessa definição, Hess e Ostrom (2003) apresentam como essas cinco formas de direitos
de propriedade são exercidas. As autoras argumentam que muitos estudiosos dos common-
property systems tem preferido enfatizar como os cinco direitos de propriedade são exercidos em
cada local e quais as conseqüências disso. Assim, do ponto de vista dos usuários temos:

a) “Authorized entrants”: incluem usuários em busca de recreação, como usuários de parques,


possuem o direito de entrar e desfrutar da natureza, mas não podem colher produtos na floresta;

b) “Authorized users”: aqueles que tem tanto direito de entrar quanto de extrair unidades de
recursos;

c) “Claimants”: possui o direito de acesso e extração mais o direito de participar das escolhas
coletivas a respeito da gestão dos recursos como definir limites de retirada de recursos.

d) “Proprietors”: possui os mesmo direitos dos claimants com a adição de poder determinar quem
terá direito de acesso e extração, todavia não possui direito de exclusividade. De acordo com
Hess e Ostrom (2003, p. 126),

Most of the property systems that are called “common-property” regimes involve
participants who are proprietors and have four of the above rights, but do not
possess the right to sell their management and exclusion rights even though they
most frequently have the right to bequeath it to members of their family and to earn
income from the resource.

e) “Full owners”: possui, além dos outros direitos mencionados, o direito de alienação, isto é, pode
transferir a quem quiser os bens que lhe possui, desde que essa transferência não represente
ameaça aos atributos físicos dos recursos ou aos outros proprietários.

As autoras chamam a atenção ao fato de que os direitos “full owners” podem ser incluídos nos
common-pool resource. Todavia, o direito de propriedade não é absoluto, até mesmo a
propriedade privada tem a responsabilidade de não gerar ameaça a terceiros. Dessa forma, todas
as formas de direitos acima mencionados, podem ser usados tanto por indivíduos isolados quanto
por comunidades.

As áreas aqui analisadas apresentam realidades opostas no que se refere aos direitos de
propriedade comum. As comunidades localidades em Jaiteua de Cima, Manacapuru – AM, não
possuem acordo de pesca legitimado pelo Estado. Analisando pela ótica dos direitos de
propriedade, esses comunitários só possuem três direitos dos cinco mencionados: acesso,

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extração e gestão. Nesse sentido, os usuários podem ser divididos entre os “claimants”
(moradores das comunidades, em geral pescadores de subsistência) e os “authorized users”
(pescadores comerciais locais e citadinos que possuem o direito de extração). Assim, é fácil
imaginar conflitos envolvendo os “claimants” e os “authorized users” (abordarei na próxima
secção).

As comunidades do Rio Jauaperi – AM/RR como possui acordo de pesca legitimado pelo Estado
possui quatro dos cinco direitos mencionados: acesso, extração, gestão e exclusão. O direito de
exclusão, ou melhor, o direito de poder determinar quem tem direito, em termos legais, só é
conseguido, nesse caso, através da legitimação do acordo estabelecido verbalmente. É
importante mencionar que é uma exclusão é limitada, isto é, os “proprietors” podem determinar
quem pode acessar, quando e quanto pode retirar, mas não podem excluir integralmente nenhum
usuário, entretanto, possuem mais autonomia e poder do que os “claimants”. O poder de exclusão
total, dessa forma, só pode ocorrer com o direito de exclusividade ou o direito de alienação, isto é,
pertence aos “full owners”.

Contudo à questão da legitimação do acordo de pesca através do ordenamento jurídico se torna


fundamental, pois, como afirma Habermas, “[o] direito torna-se fundamental na medida em que,
nas condições da sociedade pós-tradicional, apenas ele permite a expressão simultânea de um
acordo racionalmente motivado com a ameaça de sanções externas” (SOUZA, 2000, p. 84).

O direito se coloca, em situação de modernidade, como elo entre o mundo-da-vida e a esfera


política e econômica da sociedade. Ele permite a integração social através de possíveis sanções à
quebra de acordos pré-estabelecidos.

Nas condições das sociedades modernas cabe ao direito, precisamente, exonerar


os atores da sobrecarga da integração social. Essa exoneração se dá na medida
em que a validade social do direito depende da facticidade artificial da ameaça de
sanções pelo Estado.

Não obstante esse vínculo entre facticidade e validade do direito coercitivo só consegue garantir
sua força integradora apenas na medida em que os destinatários da norma se vejam, ao mesmo
tempo, como os autores da mesma. Por isso, a participação de todos os usuários do recurso no
processo de construção do acordo é condição sine qua non para seu sucesso.

Assim, o direito abre canais para que os imperativos provenientes de interações comunicativas
alcancem os sistemas econômicos e jurídicos com a pretensão de seu direcionamento legítimo.
Para Habermas, o direito é o meio pelo qual o poder comunicativo pode transformar-se em poder
administrativo. Em outras palavras,

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A ambiguidade constitutiva do direito é o motivo que permite que ele se
transforme, nas modernas sociedades complexas, do meio por excelência que
permite a tradução da linguagem cotidiana, que impera no mundo da vida, em
linguagem compreensível aos subsistemas altamente diferenciados da economia
e da política e vice-versa (SOUZA, 2000, p. 86).

Jacaúna (2009) observa que os direitos de propriedade comum enfrentam muitas dificuldades na
localidade Jaiteua de Cima, o que requer um maior diálogo entre os grupos sociais envolvidos e
uma presença mais eficaz do Estado de Direito no amparo e legitimidade às ações do acordo de
pesca.

Desde 1997, a formulação dos Acordos de Pesca se integrou aos objetivos de gestão participativa
do Governo Federal, formulado pelo IBAMA no documento intitulado “Administração Participativa:
um desafio à Gestão Ambiental”. Este documento prega um novo conceito de gestão dos recursos
pesqueiros, determinando critérios para orientar as discussões dos acordos de pesca e tornando-
os passíveis de legalização, através de portarias de pesca complementares à legislação pesqueira
vigente, a qual foi publicada como Instrução Normativa n° 29 em 31.12.2002. Posteriormente o
IBAMA, por meio de uma reunião de trabalho do Projeto Manejo dos Recursos Naturais da Várzea
do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (PróVárzea/Ibama),
publicou o Instrumento Normativo n° 19/2002, que normatiza os procedimentos dos Agentes
Ambientais Voluntários às ações de fiscalização, contemplando, assim, a participação dos atores
locais no processo de controle e monitoramento do cumprimento das portarias, o qual foi
considerado indispensável para garantir o sucesso do movimento. Entrementes, até o presente
momento, nenhuma portaria foi regulamentada pelo IBAMA na localidade Jaiteua de Cima,
embora o órgão já tenha sido procurado diversas vezes pelos moradores (JACAÚNA, 2009).

3.3 Conflitos sociais

Simmel (1983) lança a ideia de que o conflito não contém apenas elementos de desagregação,
ele também age positivamente na medida em que produz uma “sociação” entre os indivíduos, isto
é, uma cooperação com forças unificadoras. Para o autor, o conflito tem como característica
resolver dualismos divergentes, busca, assim, construir algum tipo de unidade, possuindo
elementos de negatividade e positividade.

Caso implique na rejeição ou no fim da sociação, a indiferença é puramente


negativa; em contraste com esta negatividade pura, o conflito contém algo de
positivo. Todavia, seus aspectos de positivos e negativos estão interligados;
podem ser separados conceitualmente, mas não empiricamente (SIMMEL, 1983,
p. 123).

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A partir desses pressupostos, o conflito ganha relevância sociológica. Simmel argumenta que não
existe unidade social onde correntes convergentes e divergentes não estejam entrelaçadas.
Assim, um grupo social puramente harmônico ou centrípeto, é empiricamente irreal. Nas palavras
de Simmel (1983, p. 124),

Assim como o universo precisa de “amor e ódio”, isto é, de forças de atração e de


forças de repulsão, para que tenha uma forma qualquer, assim também a
sociedade, para alcançar uma determinada configuração, precisa de quantidades
proporcionais de harmonia e desarmonia, de associação e competição, de
tendências favoráveis e desfavoráveis

Nesse sentido, o sociólogo aborda o conflito como importante na constituição da sociedade. Sem
essa dimensão da interação é impossível conceber a sociedade tal como a conhecemos.

[...] a oposição nos dá satisfação íntima, distração, alívio, assim como, sob
condições psicológicas diferentes, nos dá humildade e paciência. Nossa oposição
nos faz sentir que não somos completamente vítimas das circunstâncias. Permite-
nos colocar nossa força à prova conscientemente e só dessa maneira dá
vitalidade e reciprocidade às condições das quais, sem esse corretivo, nos
afastaríamos a todo custo (SIMMEL, 1983, p. 127).

Assim como elemento da sociação, o conflito produz unidade, essa é a parte positiva do conflito.
Os elementos desagregadores são articulados de tal forma que permitem a união entre o grupo de
interesse.

O conflito pode não só elevar a concentração de uma unidade já existente,


eliminando radicalmente todos os elementos que possam obscurecer a clareza de
seus limites com o inimigo, como também pode aproximar pessoas e grupos, que
de outra maneira não teriam qualquer relação entre si (SIMMEL, 1983, p. 157).

Nos casos aqui analisados, o conflito também produz forças unificadoras, aproximando grupos e
tencionando outros. Com relação aos conflitos relacionados ao uso comum dos recursos
pesqueiros, o motivo principal das divergências é a quebra do acordo de uso estabelecido – com
exceção dos conflitos envolvendo fazendeiros. Nas comunidades com acordo de pesca informal
os conflitos se deram na seguinte direção: pescadores de subsistência x pescadores comerciais
citadinos; pescadores de subsistência x pescadores comerciais locais; pescadores de
subsistência e locais x fazendeiro.

O conflito entre pescadores de subsistência x pescadores comerciais citadinos acontecem no


período da vazante e seca, período em que os peixes ficam mais vulneráveis à captura por
estarem concentrados em lagos, igarapés e pequenos corpos d’água de baixa profundidade.

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Alguns lugares, como o lago Grande e, principalmente, o paraná do Anamã são bastante
frequentados pelos pescadores comerciais citadinos. Porém o ápice desses conflitos se dá no
período mais crítico da seca (setembro e outubro) onde todos os ambientes aquáticos próximos às
residências dos moradores secam, restando quase que exclusivamente apenas um lugar para as
pescarias o paraná do Anamã (JACAÚNA, 2009).

Essa situação contribuiu para que nessa época do ano os pescadores de subsistência criassem
acordos de pesca. Assim, proíbem a entrada de pescadores de “fora” para pescarem
comercialmente no paraná do Anamã, gerando conflitos entre eles.

A insatisfação por parte dos pescadores de subsistência aumenta ao perceberem que os


pescadores citadinos, em sua grande maioria, são filiados à Colônia de Pescadores de
Manacapuru. Na concepção de um morador, os pescadores associados da colônia de pescadores
de Manacapuru deveriam praticar a pesca agindo em conformidade com os regulamentos
estabelecidos pela colônia, uma vez que tais atribuições prevêem direitos, deveres e sanções aos
pescadores profissionais associados, mas que, na sua visão, não estão sendo cumpridos. Assim
nas palavras do morador,

[...] tem gente que é sócio da Colônia [de pescadores], mas aí a Colônia é o
seguinte: se você tem os direitos de pescar da Colônia quando chega o tempo,
eles recebem um dinheiro da Colônia, mas é para eles não pescar, aqueles meses
eles recebem aquele dinheiro para não pescar. O que adianta você ser sócio da
colônia e naqueles tempos você querer ir ainda pescar. Aí eu digo não, se você
ganha o dinheiro e você recebe pago pela colônia, então guarde os seus preparos.
Se você é sócio é pra pescar no tempo de pesca [...] (José, 41, pescador de
subsistência, 11 ago 2006).

Os conflitos gerados entre os pescadores de subsistência x pescadores comerciais locais é a


quebra do acordo de pesca que existe na localidade, os pescadores comerciais locais insistem em
pescar durante o período da seca no paraná do Anamã, confrontando com as determinações dos
pescadores de subsistência. O argumento dos pescadores comerciais locais é que o paraná do
Anamã, mesmo durante a seca, continua transitável ou navegável, ou seja, ele não fica preso
como um “poço” ou um lago, dessa forma, não se pode proibir a pesca, “ele é livre”. A única
maneira de se preservar o paraná do Anamã, segundo um pescador comercial local, seria através
de um órgão federal, nas palavras dele: “pro acordo só se for um órgão federal mesmo, que fique
uma planta, um flutuante [...], ou que bote uma placa lá numa volta que tem, o nome da volta se
dá boca do laguinho, [...] aí é preciso se botar uma placa assim” (Lucas, 37, pescador comercial
local, 12 out. 2006).

A intolerância dos pescadores comerciais ao acordo acarreta conflitos mais violentos do que com
os pescadores citadinos. Um pescador comercial local narra o fato de ter sido amarrado e quase
sido levado à delegacia, além de terem destruído seus apetrechos de pesca. De acordo com
alguns moradores, muitas vezes ocorreu violência física entre as partes.

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O conflito entre pescadores (de toda ordem) x fazendeiros vem se desenvolvendo em decorrência
do processo de pecuarização da várzea que se processa na Amazônia já há certo tempo. Assim,
“se tem mais gado na várzea, certamente vai haver destruição dos habitats dos peixes, que é o
lugar de reprodução e da criação de diversas espécies pesqueiras” (O’DWYER, 2005, p. 222).

Na localidade Jaiteua de Cima, os problemas relacionados à criação de animais de grande porte,


sobretudo em relação à criação de gado bubalino, demonstram que as práticas de desmatamento
para pastagem dos búfalos e a circulação desses animais nos ambientes aquáticos têm
provocado mudanças de comportamento, a migração e a redução de algumas espécies de peixes,
sendo estas muito apreciadas para o consumo e para a comercialização pelos pescadores de
subsistência e comerciais das comunidades

Dessa forma, a criação de búfalos tem causado transtornos aos moradores, os animais pisoteiam
o chão provocando a compactação do solo, nadam em lagos e igarapés afugentando os peixes e
incomodando os pescadores, circulam nos roçados destruindo as plantações de mandioca e feijão
e atacam outros animais de grande e pequeno porte, como o gado bovino e os porcos.

Nas comunidades com acordo de pesca formal os conflitos se deram na seguinte direção:
pescadores de subsistência e agentes ambientais voluntários x pescadores citadinos; pescadores
de subsistência e agentes ambientais voluntários x tartarugueiros.

Antes de analisar as relações de conflito, é importante ressaltar o surgimento de um novo ator no


cenário da gestão dos territórios da pesca, os agentes ambientais voluntários. Surgem com a
legalização dos acordos de pesca; são pessoas das próprias comunidades treinadas pelo IBAMA
e estão na linha de frente do processo de fiscalização das regras acordadas.

A relação entre pescadores de subsistência e agentes ambientais voluntários x pescadores


citadinos ocorre em virtude do desrespeito dos pescadores citadinos (representados pelos barcos
geleiros) aos limites legais imposto pelos acordos de pesca. Na fala dos próprios moradores são
bem perceptíveis os problemas:

Nós temos conflito aqui começando pela água. Temos conflito de barco geleiro,
que vem aqui no Jauaperi pescar, que é ilegal. Nós temos Acordo de Pesca
dizendo que é proibido. (...) eu moro no Gaspar e lá agente preserva. Nós temos
praia, agente tenta preservar, mas quando chega o tempo da seca agente não
consegue fazer com que saia o bicho de casco ou reproduz o peixe. Se o quelônio
desova, a gente não consegue guardar porque tem gente de fora que vem e tira.
O que a gente consegue é pouco. Na subida da água nós temos peixe em
piracema que chocam que é pouco. Temos o pacu que é muito perseguido pelo
gelador, eles vêm, lançam rede, pescam tudo e levam (Alexandre Santana de
Souza, 2007, p. 5-6).
(...) a perseguição dos geleiros é grande (Alenilza de Nazaré Brazão, 2007, p. 8).
Nós temos lagos aqui, como o lago da Nariquinha, que sempre tinha muito peixe e
agora não tem porque o gelador ataca demais (Valdemar da Silva Brazão, 2007,
p. 8).

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Já temos pouco peixes nos nossos rios e o pouco que está reproduzindo vem o
barco peixeiro que é grande, pega os peixes da gente, que seria pra nós e nossos
filhos (Damião da Silva Nazaré, 2007, p. 8).
Quero falar da questão das invasões dos barcos geleiros. Eu venho dizendo que
ultimamente a gente não conseguiu ter o controle que agente desde o início
pretendia. A gente tentou lá falando com os peixeiros, com os barcos geleiros,
mas não foi possível, eles não obedecem o acordo de pesca e a gente vem
lutando para preservar os peixes. (...) Ultimamente a gente vê que a malhadeira é
uma das coisas que vem deixando o peixe muito escasso (Francisco Parede de
Lima, 2007, p. 8).

A outra relação de conflito, entre pescadores de subsistência e agentes ambientais voluntários x


tartarugueiros, também ocorre em virtude da “invasão” de pescadores “de fora”. Os tartarugueiros
são interessados na comercialização somente dos ovos produzidos pelos quelônios ou nos
próprios quelônios. Vejamos os relatos dos moradores:

Os tartarugieiros também invadem nosso rio o tempo todo. Ninguém nem vê, mas
sempre eles passam aí. Os agentes [ambientais] são os mais ameaçados pelos
tartarugueiros. Os tartarugueiros odeiam eles, fazendo ameaças de pegar eles e
matar (Silvia P. de Lima, 2007,p. 8)
As vezes a gente guarda uma cova de ovos, com dois, três. Mas é preciso estar
mudando para sair algum bichinho, pois tem vez que a gente chega a mudar, que
nem ontem, e quando chega hoje não tem mais nada, eles [os tartarugueiros] já
tiraram tudo (Valdemar da Silva Brazão, 2007, p. 8).

4 Conclusão

A análise dos resultados demonstra que a formalização das instituições de acordo resolve, em
parte, os conflitos internos com relação à pesca. Os pescadores locais tendem a respeitar o
acordo imposto pelos estabelecidos. Todavia, os pescadores citadinos e os tartarugueiros (tipo
encontrado somente no rio Jauaperi) não obedecem nem mesmo as placas proibitivas do IBAMA.

A formalização dos acordos cria novos agentes dentro do sistema de propriedade comum, os
“agentes ambientais voluntários”. Esses sujeitos estão na linha de frente dos conflitos com
pescadores. Nas comunidades localizadas no rio Jauaperi, foi relatado que nove agentes
ambientais estão sendo ameaçados de morte por tentarem impedir a ação de pescadores.

Nesse sentido, a legalização dos acordos de pesca não é o bastante para resolver o problema dos
conflitos e da sobre-exploração dos estoques pesqueiros. Porém, é fundamental para garantir o
direito dos ribeirinhos de controlarem seu território.

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