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prática educativa
1. Introdução
O fato de termos nas aulas trabalhadores que estudam não é apenas o melhor
ponto para entender porque a escola popular fracassa. Esta condição de
trabalhador deverá ser o ponto de partida para encontrar a escola possível e
necessária, sem cair em acomodações e hibridismos” (1986, p. 49-50).
As relações entre o mundo do trabalho e a educação do trabalhador, entre a
escola e o processo produtivo, todavia, como reconhece o próprio Arroyo (1989, p. 22),
não têm sido suficientemente consideradas no âmbito da reflexão pedagógica.
Percorrendo a história da configuração das estruturas de pensamento e das estruturas
sociais em que se situa o educativo, Arroyo conclui que não tem havido espaço para a
educação do trabalhador e que os vínculos entre os processos produtivos e a realidade
do trabalho têm sido freqüentemente ignorados, tanto no âmbito da prática educativa
como na reflexão teórica (1989, p. 22). Carvalho (1994), ao analisar o ensino noturno,
queixa-se também da ausência desta reflexão, uma vez, segundo a autora, o cerne dos
problemas relacionados à escolarização do aluno que freqüenta a escola noturna está na
relação escola-trabalho. De acordo com a autora, há ainda muito o que estudar a respeito
das relações entre escola e processo produtivo.
Torna-se, portanto, difícil pensar uma proposta educativa para a EJA que
efetivamente se articule aos interesses dos alunos jovens e adultos trabalhadores, das
classes populares, sem que se tenha, como adverte Frigotto, “como ponto de partida e de
chegada o conhecimento da realidade gestada no mundo do trabalho, da cultura, das
múltiplas formas com que estes trabalhadores produzem sua existência” (1989, p. 2O).
Nesta perspectiva, entender o mundo do trabalho e suas relações com a educação do
cidadão trabalhador é tão importante quanto o conhecimento do mundo da psique e de
suas relações com o processo de ensino-aprendizagem. A consideração da realidade do
trabalho constitui elemento primordial para a compreensão das relações do aluno jovem
e adulto com o processo de escolarização, desde seu histórico de exclusão dos bancos
escolares na infância ou adolescência, até motivos que o trazem de volta às salas de
aula, os limites e dificuldades enfrentados, assim como as razões que, em boa parte dos
casos, levam a um novo abandono.
Na grande maioria dos casos, foi o ingresso precoce no mundo do trabalho, para
auxiliar os pais na complementação da renda familiar, que levou esses jovens e adultos
a deixarem a escola quando crianças ou adolescentes. Por outro lado, da mesma forma
que, para muitos deles, o trabalho é apontado como causa do abandono da escola,
igualmente é invocado como justificativa para o retorno às salas de aula. Ainda que seja
possível encontrar, entre alunos que freqüentam turmas de EJA, variadas justificativas
para o regresso à escola (em muitos casos, relacionadas à própria reconstrução da auto-
estima, da dignidade pessoal), é bastante recorrente a alusão a esperança de alcançar
uma ocupação mais qualificada, ter melhoria salarial ou, simplesmente, conseguir o
primeiro emprego.
Se o trabalho responde pela motivação que traz de volta à escola muitos jovens e
adultos, o mesmo mundo do trabalho também é a fonte das dificuldades e obstáculos
que comprometem a permanência dos mesmos nas salas de aula (BRASIL, 2006).
Imersos que estão no mundo do trabalho e condicionados pela forma em que este se
realiza, os alunos trabalhadores, como afirma Hara, “pouco tempo dispõem para a sua
formação e quando dispõem o cansaço é um limitante significativo” (1992, p. 9).
Embora nas salas de EJA seja significativa a presença de desempregados e
trabalhadores informais ou temporários, para a grande maioria a escola representa um
terceiro expediente depois de uma longa jornada de trabalho que se torna ainda mais
cansativa face aos deslocamentos que são obrigados a fazer em razão das distâncias
entre a casa, o trabalho e a escola. Situação que se agrava no caso das mulheres que, em
muitas situações, além do trabalho e da escola, têm ainda que assumir afazeres
domésticos. Enfim, é no confronto entre o mundo do trabalho e o mundo da escola que
se vivenciam as dificuldades e obstáculos que, nas palavras de Haddad, acabam por
fazer do trabalhador “um impossibilitado de freqüentar a escola” (1986, p. 183).
O segundo aspecto que queremos destacar aqui se refere ao fato de que os jovens
e adultos trabalhadores que freqüentam as salas de aula da EJA– enquanto sujeitos
histórica e socialmente construídos – estão situados no mundo, em relação com ele
(FREIRE, 1987, p. 43). Protagonistas de histórias reais das quais trazem o acúmulo de
experiências vividas, “os alunos jovens e adultos configuram tipos humanos diversos.
São homens e mulheres que chegam à escola com crenças e valores já constituídos”
(BRASIL, 2006, p. 4). De sua inserção no mundo adulto do trabalho, de que decorrem
obrigações e responsabilidades sociais e familiares, resultam “valores éticos e morais
formados a partir da experiência, do ambiente e da realidade cultural em que estão
inseridos” (ibidem, p. 4). São, portanto, sujeitos que produzem e carregam consigo
idéias acerca de si mesmo e do mundo com o qual se relacionam. Nesta relação com o
mundo, os jovens e adultos trabalhadores constroem um quadro de referências próprio;
são dotados de “valores, crenças e representações sociais” (OTERO, 1991, p. 207) a
partir das quais interpretam o mundo à sua volta, dão sentido aos seus pensamentos,
sentimentos e ações e atribuem significados às coisas e à sua própria vida. É dentro
deste contexto que se constrói a sua identidade e que se movem seus interesses e
motivações, expectativas e frustrações com relação à escola.
Como já assinalamos aqui, o aluno jovem e adulto que freqüenta as salas de aula
da EJA, em razão de históricos de exclusão e insucessos em experiências escolares
anteriores, retorna à escola, em muitos casos, carregando consigo a desconfiança na sua
própria capacidade de aprendizagem. Nesta circunstância, a atuação do professor
assume um papel crucial, podendo constituir-se em fator determinante para a
permanência ou não deste aluno em sala de aula. O fato de trazerem para as salas de
aula uma cultura própria, nascida de suas experiências de vida, impõe a necessidade de
que o espaço escolar e a postura dos professores estejam abertos às especificidades
próprias de sua condição. Assim, a prática educativa realizada com este aluno não pode
se limitar à repetição de modelos mecânicos de ensino da leitura e da escrita que
desconsiderem os contextos culturais e o mundo de significados em que o mesmo está
situado. Nos referenciais trazidos por este aluno à escola estão fortemente presentes as
marcas do seu cotidiano, do mundo do trabalho e da vida familiar, assim como as
expectativas, necessidades, angústias e inquietações oriundas deste mesmo universo.
Como assinala Piconez, “São motivados por material que é prático, aplicável ao seu
trabalho ou situação de vida e centrado em problemas; trazem consigo o desejo de
crescer e aprender” (2003, p. 3). Esperam da escola, por isso mesmo, respostas que
correspondam às suas demandas e que lhes auxiliem a buscar e construir sentido em
suas relações com o mundo.
5. Conclusões
Para além da formação inicial, tal reflexão deve ocupar lugar ainda nos
processos de formação continuada e em serviço dos profissionais da educação, os quais
devem ser assumidos pelos sistemas de ensino como política com caráter institucional,
de forma regular e permanente, de modo a atender as demandas que o trabalho
pedagógico com a EJA apresenta a esses profissionais. Demandas que se traduzem,
entre outros aspectos, na necessidade de considerar a pluralidade e diversidade que
caracterizam o contexto social dos alunos e alunas que freqüentam as salas de aula da
EJA (BANNEL, 2001); na necessidade de valorizar conhecimentos e formas de
expressões oriundos desse contexto e que são trazidos por esses alunos para a sala de
aula (BERNARDINO, 2008); e, ainda, na necessidade de, a partir do diálogo, tomar
esses conhecimentos como ponto de partida para a sua própria ampliação, na
perspectiva da garantia do “acesso aos saberes, conhecimentos, significados e a cultura
acumulados pela sociedade” (ARROYO, 2006, p. 35). É pela consideração dessas
necessidades que, para além da dimensão legal e formal, se assegurará, para os jovens e
adultos que freqüentam as salas de aula da EJA, a efetivação de fato do direito à
educação.
Referências
CARVALHO, Célia Pezzolo de. Ensino noturno: realidade e ilusão. São Paulo: Cortez,
1994.
HARA, Regina. Alfabetização de adultos: ainda um desafio. São Paulo: CEDI, 1992.
PINTO, Álvaro Vieira. Sete lições sobre educação de adultos. São Paulo: Cortez,
2005.