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1. QUESTÕES INTRODUTÓRIAS SOBRE AS ROUPAS DE AXÉ:


PATRIMÔNIO E IDENTIDADE

[...] o bem cultural, como todo signo, tem um imprescindível suporte físico –
dimensão material que é o suporte da comunicação; uma estrutura
simbólica que lhe dá sentido [...] (BAHIA, IPAC, Pano da Costa, 2009)

Roupa e maneira de trajá-la são assuntos sérios no Candomblé. Se nossa


convenção social não nos permite viver sem trajes, nos terreiros não há festa,
celebração ou até mesmo atividades cotidianas que se realizem sem a presença de
algumas peças específicas do vestuário. Junto com os fios-de-conta, os adereços e
as armas dos orixás, a indumentária pode ser considerada uma vitrine estética da
representação e força cultural e identitária que o Candomblé possui. Além de
funcionarem como uma narrativa para as entidades podem ser consideradas
alicerces na construção de identidades. Dessa forma, mais do que uma forma de
cobrir o corpo, a indumentária tem a capacidade de preservar parte importante da
cultura de um povo. Isso porque tornou-se a “dimensão material”, a representação, a
partir da comunicação visual, de uma determinada cultura religiosa. Como dito por
Nina Rodrigues em sua obra Os africanos no Brasil, “[...] o conhecimento da
significação das vestimentas, sempre foi de grande auxílio as minhas observações.
[...]” (RODRIGUES, 2005, p.51-52)

Os trajes do qual tratamos vão além de meros pedaços de pano; representam a


continuidade de uma identidade; são detalhes conservados de um patrimônio
cultural; podem ser considerados mais que isso; o traje pode ser considerado
patrimônio cultural ou parte dele; fazem parte de um todo, mas possuem na sua
singularidade pontos importantes a serem analisados. Segundo Stuart Hall – que
concebe três concepções de identidade: iluminista, sociológica e pós-moderna – a
identidade torna-se uma “celebração móvel” que é formada transformada a partir de
um processo continuo em constante ligação com as formas pelas como somos
interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. Portanto a identidade cultural é
definida historicamente, e não biologicamente.
2

Trajes vindos das ruas, a partir das negras de ganho1, e das irmandades2 – citando
a famosa Irmandade da Boa Morte da cidade de Cachoeira como exemplo mais vivo
– inseridos na realidade e cotidiano dos terreiros de candomblé mantiveram sua
importância e zelo na forma de vestir.

Por que considerá-las patrimônio cultural ou partícipe do mesmo? Esse


questionamento pode ser respondido em diversos meandros a respeito do conceito
atual de patrimônio cultural. Podemos considerar que os trajes utilizados nos cultos
afro-brasileiros circulam entre duas áreas do patrimônio: material e imaterial.
Material por encontrar-se, propriamente em matéria, na forma de panos e adereços
trabalhados e modificados pela mão humana.

Para falar em materialidade não podemos deixar de enfocar a presença desses


trajes como objetos musealizados, que fazem parte de acervos de instituições
museológicas. O Museu do Traje e do Têxtil (Instituto Feminino), o Museu Afro-
Brasileiro, o Memorial da Baiana de Acarajé e o Museu Imperial, sendo os três
primeiros localizados em Salvador, capital do estado da Bahia e o último na cidade
de Petrópolis, região serrana do Rio de Janeiro, possuem em seus acervos
exemplares de trajes de crioulas, peças do culto afro-brasileiro e trajes de negras
consideradas de ganho. Uma instituição museólogica que não podemos deixar de
citar é o Museu AfroBrasil, localizado no Parque do Ibirapuera na capital do Estado
de São Paulo; em sua tese de doutorado o Professor Marcelo Bernardo Cunha
descreve sucintamente esta instituição da seguinte forma:

[...] Local de novas referências e abordagens [...]. O discurso procura


valorizar a participação de negros em todos os segmentos sociais, fugindo
do lugar comum e recorrente [...] apesar destes lugares também serem
enfocados na exposição. (CUNHA, 2006, p.235).

Outras exposições temporárias acerca do tema já foram exploradas por outras


instituições museológicas, podendo ser citado o exemplo da mostra expográfica
Herança Africana no Universo Baiano – Um ‘filá’ de liberdade, organizada pelo

1
Por negras de ganho, entendem-se as mulheres negras forras ou não que trabalhavam nas ruas das
grandes cidades (destaque para Salvador e Rio de Janeiro) vendendo seus ganhos, que poderiam
ser quitutes, ou até mesmo produtos de primários de consumos (frutas e grãos).
2
As irmandades negras foram instituições de grande importância para as comunidades negras
africanas ou afro-brasileiras, visto que as mesmas representavam, de maneira oficial determinado
grupo social – ainda que apenas religiosamente – dando certo tipo de notoriedade, organização e, de
certa forma auxiliando na preservação da cultura negra.
3

Museu Carlos Costa Pinto, em Salvador, e aberta ao público entre os meses de


agosto e novembro de 2008; no catálogo da exposição consta o texto 3 O traje de
crioula – algumas reflexões onde o universo das roupas utilizadas por essas negras
de partido alto4, e mais tardiamente nos cultos afro-brasileiros, são apresentadas de
forma explicativa e didática, enfocando também a sua riqueza estética. A respeito do
conceito geral de exposições museológicas, façamos as seguintes considerações:

Entendemos exposições como estratégias comunicacionais com lógicas e


sentidos próprios, relacionados com o processo de produção de fatos,
eventos e bens sociais, reconhecidos por sua materialidade, revelando
redes de relações entre acontecimentos, idéias e indivíduos. Há uma
diversidade de formas de abordar e trabalhar referências culturais nos
espaços de exposições e modos específicos de sistematizar os Museus e
suas Exposições, de acordo com suas categorias e imagens relativas ao
tema apresentado. (CUNHA, 2006, p.14)

A partir dos exemplos citados podemos verificar que os trajes funcionam como
possibilidades expositivas, por seu caráter material, quando se trata de expor algo
que remeta a herança/legado africano ou forma de expressão cultural dos afro-
brasileiros. Sobre a questão expositiva da indumentária, o Professor Doutor Marcelo
Bernardo Cunha, em sua tese de doutorado Teatro de Memória, palco de
esquecimentos: Cultura africanas e das diásporas negras nas exposições, defendida
no ano de 2006, expressa a seguinte análise:

Os temas mais explorados nas exposições [...] são: trabalho (basicamente


trabalho escravo), religião (cultos afro-brasileiros e religiosidade popular),
festas e folclores. Sendo que os objetos africanos mais recorrentes são
esculturas e máscaras, cerâmicas, objetos de metal e instrumentos musicais
e de afro-brasileiros são indumentárias, insíguinias de divindades,
instrumentos musicais, objetos de trabalho. (CUNHA, 2006, p. 88)

Mesmo fazendo parte da seqüência de temas mais explorados nas exposições, os


mesmos podem ser considerados como não devidamente explorados, como também
considera no parágrafo seguinte do mesmo texto o Professor Doutor:

A maioria das exposições apresenta culturas afro-brasileiras sem


estabelecer vínculos com a África, sem esclarecimento sobre origens de
traços culturais nacionais, sobre contribuições históricas de africanos para o
Brasil. Não há, também, idéia de culturas afro-brasileiras como permeadas
de transgressões, continuidades, transformações, adaptações e
reinvenções a partir de referências milenares e com fortes tradições e
historicidade. O discurso destas instituições, na maioria das vezes, é
baseado na apresentação isolada de encontros, em cenas „congeladas‟ no

3
Texto escrito pela Professora Doutora Joseania Miranda Freitas, professora do Departamento de
Museologia e do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal da Bahia
(UFBA).
4
Como também eram chamadas as negras de ganho
4

tempo e no espaço como recortes das realidades sem articulação com o


processo histórico, sem que sejam estabelecidos nexos que permitam
melhor compreensão de artefatos e/ou comemorações apresentados.
(CUNHA, 2006, p.88)

Esse fato deve-se a uma face do patrimônio cultural, ainda timidamente explorada
em montagens expográficas de instituições museológicas, e que as indumentárias
dos cultos afro-brasileiros não deixam de possuir: a cultura imaterial. Essa
“categoria” de patrimônio cultural ganhou notoriedade a nível governamental
nacional5 – muito embora já tenha sido elaborada e estabelecida por organizações
internacionais e explicitada em forma de textos por pensadores e pesquisadores
brasileiros – a partir do Decreto n° 3.551, que instituiu o Registro dos Bens de
Natureza Imaterial; esse trabalho de registro vem sendo realizado pelo Instituto do
Patrimônio Histórico Artístico Nacional (IPHAN) por meio da elaboração de
Inventários baseados em um processo de pesquisa, documentação e registro que
são posteriormente divulgados pelo presente órgão.

O conhecimento gerado sobre essas formas de expressão, no processo de


registro, permite identificar de modo bastante preciso as maneiras mais
adequadas de apoio à sua continuidade. [...] O Decreto 3.551/2000
estabeleceu que essas ações serão desenvolvidas no âmbito do Programa
Nacional do Patrimônio Imaterial, que tem como objetivo implementar uma
política pública de identificação, inventário e valorização desse patrimônio.
Os bens selecionados para registro serão, à semelhança dos bens
tombados, inscritos em livros denominados, respectivamente, Livro de
registro dos saberes (para o registro de conhecimentos e modos de fazer);
Livros de celebrações (para festas, os rituais e os folguedos); Livro das
formas de expressão (para a inscrição de manifestações literárias, musicais,
plásticas, cênicas e lúdicas); e Livro dos Lugares (destinado à inscrição de
espaços onde se concentram e reproduzem práticas culturais coletivas). Ao
considerar a dinâmica dessas manifestações e com o objetivo de
acompanhar suas transformações, prevê-se que o registro seja refeito, no
mínimo, a casa dez anos. (ABREU, CHAGAS, 2003, p.53)

Várias fontes e/ou derivados da cultura afro-brasileira já foram inventariados,


documentados e registrados nos Livros de Registro de Bens Culturais de Natureza
Imaterial. Os Terreiros de Candomblé, outrora perseguidos pela força policial na
época do Estado Novo, hoje passam por processos de tombamento, onde é visado à
preservação da área natural e social onde se desenvolvem as práticas religiosas e
dos outros processos culturais contidos dentro daqueles espaços, tidos como
5
A resolução nº 1, de 03 de agosto de 2006 (IPHAN, 2006a), que complementa o Decreto nº 3.551,
de 04 de agosto de 2000, opera claramente com uma definição processual do Patrimônio Cultural
Imaterial, entendendo por bem cultural de natureza imaterial as criações culturais de caráter dinâmico
e processual, fundadas na tradição e manifestadas por indivíduos como expressão de sua identidade
cultural e social; e ainda torna-se tradição no seu sentido etnológico de „dizer através do tempo‟,
significando práticas produtivas, rituais e simbólicas que são constantemente reiteradas,
transformadas e atualizadas, mantendo, para o grupo, um vínculo do presente com o seu passado.
5

sagrado pelos praticantes das religiões candomblé. Iris Verena Santos de Oliveira
em sua dissertação de mestrado Becos, ladeiras e encruzilhadas: andanças do
povo- de-santo pela cidade de Salvador descreve a situação durante o período de
perseguição6, assim como a reversão dessa situação:

Durante as primeiras décadas do século XX os adeptos do Candomblé


lutaram pela manutenção de suas crenças, já que suas práticas religiosas
eram consideradas inadequadas diante das tentativas de modernização da
cidade e dos costumes da população. Esses conflitos protagonizados por
mães, pais e filhos-de-santo contaram com a atuação fervorosa da
imprensa baiana e era implementada pela Delegacia de Jogos e Costumes.
(OLIVEIRA, 2007, p.102)

Para compreender a forma como o povo-de-santo era encarado naquele


momento, basta lembrar que as décadas de 1920 e 1930 não estavam tão
distantes no tempo, do auge das teorias raciais, que na Bahia teve como
representante Nina Rodrigues. Se o século XIX é sempre pontuado como o
momento em que grassavam as idéias monogenistas, foi somente no início
do século XX que as políticas públicas, baseadas naqueles princípios,
entraram em vigor, destacadamente, após a Constituição de 1981, que
trazia em seu bojo políticas de incentivo á imigração como obrigação do
Estado. Vale ressaltar também, a decretação do Código Penal em 1980,
que subsidiou a perseguição às culturas religiosas de matriz africana”
(OLIVEIRA, 2007, p.114)

Para driblar tal perseguição, segundo a autora, muitos eram os subterfúgios


encontrados pelos praticantes da religião de matriz africana:

Diversas estratégias foram utilizadas pelo povo-de-santo a fim de manter


suas crenças durante a repressão policial. Atitudes como o registro de
casas de candomblé na condição de sociedades espíritas, a aliança com
intelectuais e políticos influentes ou ainda a mudança das roças para
regiões de difícil acesso eram comuns no período [...] (OLIVEIRA, 2007,
p.115)

Esse período de tensão começa a ser contornado a partir da década de 1930:

Foram significativas essas modificações na forma de tratar as religiões afro-


brasileiras. Parece-me que nas primeiras décadas do século XX, a
repressão aos candomblés não carecia de muitas explicações, essa prática
em si era considerada desprezível [...] Já nos meados de 1930, eram
necessários fatos extraordinários que chocassem a população para
legitimar o combate aos terreiros. [...] Por volta de 1930 iniciou-se uma fase
de diferenciação entre as casas, que foi acompanhado de uma forma mais

6
Em relação à perseguição policial e a forma de lida com a mesma, Júlia Braga em seu texto Na
Gamela do Feitiço faz a seguinte observação:
[...] fica evidente a complexidade que envolvia as relações/tensões entre o povo de santo, jornalistas,
policiais e estudiosos, o que impossibilita qualquer informação enfática, apontando aliados e inimigos,
ao tempo em que também relativiza o papel dos adeptos do candomblé que não podem ser tratados
como vítimas ou réus. Foram pessoas que defenderam seus interesses religiosos e se posicionaram
em meio à teia de acordos e conflitos que lhes foi apresentada. [...] (BRAGA, 1995, p.123)
6

comedida de ser referir a essas práticas religiosas. [...] A partir de 1950 os


guias turísticos apresentavam culturas afro-brasileiras como elementos
folclóricos. [...] (OLIVEIRA, 2007, p.118-119)

Nesse contexto, nessa nova forma de abordagem que se vê em plena evolução,


onde os rituais de Candomblé passam a ser citados não só em guias turísticos mas
passam a compor narrativas literárias como as de Jorge Amado, as religiões afro-
brasileiras passam a ser aceitas, toleradas, a fazer parte do universo de
“baianidade”; mais tardiamente, surgem os processos de tombamento dos terreiros
de Candomblé7. Logicamente, nesse contexto também estão inclusos os trajes e
outros adereços utilizados na nos rituais a atividades cotidianas dos terreiros.

Seu modo de fazer, embora ainda não oficialmente registrado pelo IPHAN, pode,
sim, ser considerado um bem cultural. Por isso não podemos deixar de destacar as
Casas de Alaká, que funcionam como escolas de costura de roupas do Candomblé

7
Como exemplo temos o Edital de Notificação expedido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN) no Diário Oficial da União de 10 de janeiro 2011:
NOTIFICAÇÃO A RESPEITO DO TOMBAMENTO DO TERREIRO JEJE ZOGBODO MALE BOGUM
SEJA UNDE, NO MUNICÍPIO DE CACHOEIRA, ESTADO DA BAHIA - Na forma e para os fins do
disposto nos arts. 6° ao 10 do Decreto-Lei n.º 25, de 30 de novembro de 1937 c/c o art. 15, parágrafo
único, da Portaria n.º 11, de 11 de setembro de 1986, o INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E
ARTÍSTICO NACIONAL - IPHAN, dirige-se a todos os interessados para lhes NOTIFICAR que está
promovendo por meio do Processo n.º 01502.000147/2009-58, o tombamento do Terreiro Jeje
Zogbodo Male Bogum Seja Unde, no Município de Cachoeira, Estado da Bahia, em razão do seu
elevado valor histórico e etnográfico, a ser inscrito nos Livros do Tombo Histórico e Arqueológico,
Etnográfico e Paisagístico, compreendendo o acervo histórico, etnográfico e paisagístico,
correspondente ao conjunto de bens imóveis - o sitio natural e os elementos edificados ou de
espécies arbóreas referenciais do ritos JEJE, conforme identificados e descritos a seguir: A. Gleba de
terreno descrita no processo. B. Componentes referenciais: Edificados: B1. Casa de Hospedagem I;
B2. Casa de Hospedagem II; B3. Oiá (Altar); B4. Peji (cerimonial) de cima; B5. Peji de baixo, com
salão, "ronco" e cozinha sagrada; B6. Casa dos Antepassados; B7. Fonte de Oxum; B8. Poço; B9.
Ponte; e B10. Instalações Sanitárias. Árvores Sagradas: Nana, Tiriri, Ogum Eroquê, Avequité, Zogbo,
Bessém, Ogum, Ajuzum, Lokó, Badé, Aqué e Parara.Riacho Caquende – ODÉ e as margens ou
lados Aziri e Avinagé. Cumpre ressaltar que o bem em comento passa a gozar de proteção por meio
do IPHAN, para os efeitos previstos notadamente nos art. 17 e 18 do Decreto-Lei n.º 25, de 30 de
novembro de 1937. No prazo de 15 (quinze) dias, a contar da publicação desta notificação, assiste a
eventual proprietário do Terreiro Jeje Zogbodo Male Bogum Seja Unde, no Município de Cachoeira,
Estado da Bahia, a faculdade de anuir ou impugnar a iniciativa, após o que se prosseguirá na forma
do disposto nos arts. 6º ao 10 do Decreto-lei n.º 25/1937, combinado com o art. 1º, da Lei n.º 6.292,
de 15 de dezembro de 1975. Ressalte-se, a necessidade de manifestação da Superintendência
Estadual do IPHAN, situada na Casa Berquó - Rua Visconde de Itaparica - 08, centro, Barroquinha,
CEP: 40.020-080, Telefone: (71) 3321-0133, para os processos de licenciamento envolvendo tanto os
bens tombados como aquele(s) situado(s) em sua área de entorno. AMPARO LEGAL: Art. 216, inciso
V, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988; Decreto-lei n.º 25, de
30 de novembro de 1937; Portaria n.º 11, de 11 de setembro de 1986; Lei n.º 6.292, de 15 de
dezembro de 1975; Lei n.º 8.029, de 12 de abril de 1990; Lei n.º 8.113, de 12 de dezembro de 1990;
Decreto n.º 6.844, de 07 de maio de 2009; Lei n.º 9.784, de 29 de janeiro de 1999.
CORRESPONDÊNCIA PARA: Presidente do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural - SBN,
Quadra 02, Edifício Central Brasília, 6° andar, Brasília, Distrito Federal - CEP: 70.904-040.DALMO
VIEIRA FILHO.Presidente do Instituto Substituto (p. 16-17)
7

dentro dos próprios terreiros, e publicações sobre o Pano-da-Costa como a realizada


pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural do Estado da Bahia, órgão vinculado
a Secretaria Estadual de Cultura, no ano de 2009, podem comprovar a importância
da indumentária como partícipe não só do processo de preservação, como também
na divulgação dessa cultura afro-religiosa, anteriormente discriminada.

Mas por que estudar as roupas utilizadas nos rituais e no cotidiano dos terreiros de
candomblé? Seria esta uma questão de tamanha relevância para que se faça um
estudo específico sobre este determinado tema? Ao iniciar a presente pesquisa,
ainda na graduação do curso de Museologia da Universidade Federal da Bahia –
mais especificamente em uma das disciplinas do processo de conclusão da
formação acadêmica Curso Normativo da Formação Étnica da Arte Baiana – o olhar
para este tema, foi despertado, a partir dos estudos iniciais sobre as roupas das
crioulas e negras de ganho, se anteviu, a partir de leituras, entrevistas e pesquisas
in loco vários pontos de observância de cunho sociológico e até mesmo artístico nas
roupas de santo e de ração (de uso diário dentro dos terreiros).

A questão sociológica envolve, além de questões identitárias, o próprio conceito de


cultura e de patrimônio cultural, entendendo esses processos como produto,
constantemente transformado pelo homem ou grupo social do qual o mesmo faz
parte:

[...] Mais do que um sinal diacrítico a diferenciar nações , grupos étnicos e


outras coletividades, a categoria patrimônio, em suas variadas
representações, parece confundir-se com as diversas formas de
autoconsciência cultural. [...] (ABREU, CHAGAS, 2003, p.29)

Entendendo que os trajes de crioula passaram das realidades das negras de partido-
alto e das irmandades para os barracões e festas dos terreiros; podemos entender
que o trajar completo que hoje vemos nas celebrações nada mais é do que uma
construção tecida, literalmente, por negras8 que assimilaram alguns aspectos da
cultura européia e mourisca, e unindo-os aos seus próprios, deram origem ao que
chamamos hoje de roupa de crioula, traje de beca e consequentemente roupa de
santo. Ao tratar das vestimentas, as obras mais específicas sobre o tema, abordam,

8
A especificação de gênero deve-se ao fato do maior número de elementos contemplativos do trajar
feminino á análise, não desconsiderando a presença de elementos estéticos e identitários presentes
nos trajes masculinos. O presente escrito não analisa tal questão, mas a mesma pode ser
aprofundada posteriormente.
8

de uma maneira geral, a influência portuguesa e árabe-islâmica, a produção das


saias e batas com seus mais diversos tipos de bordados e o turbante ou ojá,
respectivamente. Dessa forma, a roupa em estudo nada mais é do que uma das
muitas conseqüências do que os antropólogos e africanistas chamam de
crioulização, como descreve Luis Nicolau Parés em seu artigo O processo de
crioulização do recôncavo baiano (1750-1800), no qual o mesmo conota crioulização
como sendo:

[...] a idéia de hibridação e síntese cultural, quando não assimilação às


práticas e valores dominantes já estabelecidos. Ela se expressava pela
adoção de novas formas de pensar e atuar, novas formas de falar e
significar, novas instituições e novas identidades coletivas mais genéricas e
abrangentes. (PARÉS, 2005, p. 93)

Nas mais diversas sociedades, o ato de trajar uma vestimenta vai além da mera
proteção do corpo ou deslumbre estético. Podem tornar-se símbolos de identidade,
podendo um estudioso refletir, a partir deles, sobre valores sociológicos e culturais.
As roupas utilizadas hoje nas cerimônias do candomblé representam mais do que
um eixo identitário de uma cultura afro-brasileira, refletida na religiosidade;
simbolizam a ascensão social conquistada pelas negras crioulas (de ganho ou
partido alto) não só através da religião, mas também do trabalho nas ruas.

As questões hierárquicas e simbólicas, que tiveram uma discussão de caráter inicial


no texto anterior da graduação, também permeiam esse campo sociológico. Em uma
religião em que a ancianidade sempre foi símbolo de autoridade, as vestes não
fogem à regra: somente as pessoas com alto grau hierárquico, presumidamente os
mais antigos, podem usar todos os elementos do figurino, além dos paramentos
mais sofisticados; a vestimenta dos iniciados, em contrapartida, chamadas de
roupas de “ração”, são simples, não possuindo nenhuma espécie de ornatos como
babados e rendados. Também, os pontos de tecido costurados vão de acordo com a
regra de cada casa de candomblé, revelando um misto de sensibilidade e
compreensão da lógica do terreiro.

Acreditamos também na questão estética inerente a essas vestes na confecção de


uma roupa para determinado orixá, ou uma bata em rechelieu9 para uma autoridade
da casa de candomblé. Uma roupa para orixá Oxum será na maioria das vezes
9
Tipo de bordado intermediário – entre o bordado tradicionalmente conhecido e a renda – que surgiu
no século XV na Europa, que se distingui por sua técnica realizada com pontos cortados aplicados
sobre o tecido aberto.
9

recheada de motivos ligados ao dourado, com bastante babados, rendados e


elementos decorativos em amarelo. Além das temáticas de cores – que renderia
uma pesquisa a parte – há também questões referentes aos aspectos de
suntuosidade que estas roupas representam e apresentam aos espectadores.

E, tratando-se dos espectadores, não podemos deixar de destacar a questão da


comunicação visual presente nessas roupas. Manuel Querino, em sua obra
Costumes Africano no Brasil em uma passagem que trata sobre os trajes, afirma que
as mulheres praticantes do candomblé (tidas por ele como feiticistas10) identificam-
se, “tornam-se entre si conhecidas” pelo traje. A comunicação visual extra “muros do
candomblé” também pode ser vista, ainda hoje nas ruas de Salvador, quando junto a
outros elementos representantes da religião identificamos os adeptos ao culto, pelas
roupas e contas utilizadas. A comunicação visual dentro de uma celebração também
pode ser observada; diferenciamos uma mãe-de-santo ou pai-de-santo, de uma
ekéde11 ou de uma filha ou filho de santo, não só pela posição em que estão
dispostos dentro do local da festa, mas também pelo traje e forma de amarrar e
vestir os mesmos.

O porquê de uma análise bibliográfica e não um trabalho de campo, de cunho


antropológico. Por tratar-se de um tema muito amplo, ainda pouco explorado por
completo. É mister que, dentro do universo das religiões afro-brasileiras, existem
uma série de outros núcleos; há diferenças entre nações (jejê, ketu, angola por
exemplo) e por consequência diferenças nas formas de ritos e celebrações,
nomenclaturas e por que não vestimentas. José do Prado Valladares, já na década
de 50, falava na existência de diferenciações grupais, na maneira de uso do torço
nos terreiros de Candomblé da Bahia. O mesmo salientava que:

Filhas-de-santo antigas falam que havia um modelo de torço para cada uma
das diferentes „nações‟: torço à moda gêge, à moda ketto, ijexá, angola,
congo etc. Também falam numa correlação entre o tipo de torço e a posição
da pessoa dentro do culto, ou de correlação entre o torço e a divindade,
„orixá‟ a que se está consagrado. Tal correlação abrangeria tanto o formato
do pano como seu colorido e modo de amarrá-lo. Pelo visto assunto
suficiente para uma pesquisa especial [...] (VALLADARES, 1952, p.7)

10
Termo usual da época também utilizado por Nina Rodrigues em seus escritos.
11
Espécie de zeladora dentro do culto, que não passa pelo processo de transe.
10

Essa pesquisa especial demanda, além de tempo, um mergulho em casas de


candomblé específicas, ou em uma determinada casa apenas para uma análise
focal. Porém, em um escrito introdutório como este deve, contudo, necessariamente,
limitar-se a um levantamento seletivo fontes escritas. Fontes estas que são
consideradas primordiais nos estudos da antropologia do negro no Brasil, em
questões referentes a comportamento, identidade cultural e social e, logicamente,
religiosidade. Serão utilizados aqui, por exemplo, livros como As religiões africanas
no Brasil, de Roger Bastide; O animismo fetichista dos Negros Baianos, de Nina
Rodrigues; e o já citado Costumes africanos no Brasil, de Manuel Querino, que
conta na sua segunda edição com prefácio de Arthur Ramos – outro grande
estudioso das questões referentes à raça negra no Brasil; serão utilizados também
artigos mais contemporâneos e recentes como o Candomblé e o tempo: concepções
de tempo, saber e autoridade da África para as religiões afro-brasileiras, escrito por
Reginaldo Prandi, assim como o texto escrito por Vagner Gonçalves da Silva, Arte
Religiosa Afro-Brasileira: as múltiplas estéticas da devoção brasileira. Também
serão considerados os textos escritos sobre elementos que compõem a
indumentária afro-religiosa.

Para analisar o tema foram criadas categorias e subcategorias nas quais se


adequam os trechos encontrados nas pesquisas bibliográficas. Apontamentos de
Definição Tipológica, onde estão inclusas as diferenciações de nações (como José
do Prado Valladares fez na citação acima) e as categorias e utilizações das
indumentárias, no qual podemos incluir as questões de hierarquia; outra categoria
seria a roupa inserida no ritual, que corresponde à descrição por esses estudiosos
das celebrações ritualísticas realizadas, inserindo a roupa nesse determinado
contexto; A confecção da indumentária caracteriza outro ponto de destaque nessa
análise, pois também foi ponto de observação dos autores; Formas e padrões que
se referem a elementos como cor e textura estão constantes nos estudos da grande
maioria dos autores, quase sempre na forma de exemplos que em algumas
situações se assemelham; a indumentária está também agregada a outras formas
de representação, no qual se destacam os emblemas e ícones, além das jóias e
elementos corporais; As formas de representação da indumentária seja em
exposições museológicas ou nas pinturas dos viajantes que por aqui passaram
durante os séculos XIX e XX (dando destaque as gravuras de Debret), constituem
11

um importante acervo a ser estudado acerca do corrente tema. Embora não fazendo
parte da análise, não podemos deixar de mencionar o acervo fotográfico e postal do
Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e do Museu Tempostal, ambos localizados
na cidade do Salvador; foram fontes de pesquisa de vários artigos e dissertações
publicadas a respeito dos modos de vida e costumes dos negros baianos, da qual
podemos destacar o trabalho de Sofia Olszewski Filha, em sua dissertação A
fotografia e o negro na cidade de Salvador (1840-1914), e do próprio Manuel
Querino.

É válido ressaltar que análises iconográficas e imaginéticas não serão contempladas


aqui, pois, embora já tenha sido feito anteriormente na graduação, acreditamos que
essa análise está parcialmente contida nos trechos dos autores selecionados que
serão aqui analisados, principalmente no tratar da roupa inserida no ritual e de seus
padrões estéticos.

Dessa forma, a análise bibliográfica de questões hierárquicas e simbólicas das


roupas “de axé” 12 proposta no título do trabalho, não se restringirá somente as estas
questões. Trata-se de um campo amplo que ao longo da pesquisa suscitou outros
vieses e aprofundando-o mais poderá, com toda certeza abrir novos caminhos para
outros estudos e escritos; ainda há muito que se falar sobre o candomblé; e ainda há
muito que se dizer sobre as roupas de santo.

12
Como são denominados os objetos, utensílios e até indivíduos ligados ao candomblé.
12

2. TRABALHOS BIBLIOGRÁFICOS EXISTENTES

Nota-se, a partir da análise das fotografias, desenhos, dos relatos dos viajantes que
aqui habitaram o Brasil durante o período imperial, assim como os estudos feitos
durante o final do século XIX sobre os “modos” dos africanos, que as roupas eram
utilizadas tanto na esfera sacra como no cotidiano, com distinções estéticas e
hierárquicas. Nessa perspectiva, podemos sugerir que os trajes foram incorporados
do cotidiano para as celebrações religiosas, por uma preferência cultural dos
adeptos que deram origem aos cultos de matriz africana, sendo que hoje
encontramos exemplos dessa forma identitária na realidade dos terreiros de
candomblé e nas celebrações públicas das mesmas. Partindo dessa perspectiva,
temos os trabalhos dos viajantes do Brasil Império como primeira referência de
trabalhos não só bibliográficos como também documentais, visto que as descrições
escritas do ambiente social que circundava as cidades brasileiras durante o período
em questão são seguidas de aquarelas e gravuras contendo imagens das cenas ou
de outras que por ventura chamaram à atenção o observador. Após esse referente
período, temos algumas observações acerca dos trajes nos textos que serão
analisados nos tópicos seguintes, que remetem aos africanistas e antropólogos
precursores nos estudos sobre o negro e seu legado cultural.

Textos específicos sobre peças que compõem o vestuário sacro afro-brasileiro


vieram à tona na década de 1950, escrito pela pesquisado H. A. Torres, como sua
dissertação de mestrado e por José do Prado Valladares em um pequeno livreto; as
peças escolhidas para a análise foram o Pano-da-Costa e o Torço (ou Ojá)
respectivamente. Segundo H. A. Torres, o caráter mais importante desse símbolo
vai além da sua origem sentimental, e permeia o fator simbólico: o pano da costa
utilizado em cerimônias do candomblé e a suas diferentes formas de posicionamento
denotam significados diferenciados. Ainda afirma ser válido ressaltar que se trata de
uma peça que possui um alto grau de importância, por seu valor identitário e por sua
atual funcionalidade. Assim, o resume H. A. Torres:

O pano da costa é mais do que um elemento decorativo no traje da baiana:


é um símbolo. Varia na sua padronagem, conforma-se a certos preceitos
convencionais de disposição, nos atos de culto, indica pelo colorido o santo
a que é consagrada cada crioula. Além disso, ele traduz um sentimento de
fidelidade para com o passado; prende as suas portadoras à terra de
13

origem. Elo que a capacidade artística da crioula modificou a ponto de


torná-lo irreconhecível pelas suas irmãs da Costa constituiu entretanto, no
campo afetivo da crioula, uma amarra emocional com a pátria distante. [...]
Na silhueta da crioula, os diferentes modos de trazer o pano refletem-se
no conjunto de linha do traje e mui particularmente na modalidade tão
expressiva que caracteriza a indumentária baiana. (TORRES, 1950, p. 75).

Já segundo José do Prado Valladares, em sua obra O torço da Baiana, “(...) o torço,
ou turbante é, pois, uma das partes essenciais do traje da baiana. Baiana sem torço
[...] é baiana incompleta a que faltou um dos arremates.” (VALLADARES, 1952, p.5).
Entenda-se baiana, nesse sentido, também, como uma negra de ganho.

Alguns outros escritos foram publicados sobre a indumentária, referindo-se


previamente às baianas, quituteiras sucessoras das negras de ganho. Podemos
considerar que, após as publicações acima referenciadas, as publicações do
antropólogo e museólogo Raul Lody estão entre as mais expressivas da temática.
Foi autor de uma lista bastante extensa de publicações sobre a cultura material afro-
brasileira, e, fugindo do eixo Salvador e Rio de Janeiro, desenvolveu estudos de
caso também em outras cidades nordestinas como Recife (capital de Pernambuco) e
na capital maranhense (São Luis).

Podemos considerar que a obra de maior significância escrita por Lody, em relação
à indumentária afro-religiosa seja, o Dicionário de arte sacra e técnicas afro-
brasileiras; assumindo o estudo a Ergologia13, e contendo informações advindas em
sua maioria de pesquisas de campo, o autor propõe uma obra de consulta – que
está aberta, já que não a considera o assunto esgotado. São 1.407 verbetes, com
valores descritivos, analíticos, e correlacionado os temas. O autor assim a define:

Há vocação disseminadora neste Dicionário. Ele é obra de consulta, ele


retém parcela da memória viva e afetiva do patrimônio material afro-
brasileiro. Ele transita nos universos do cotidiano, nos ciclos festivos, nos
rigores religiosos, nas mesas e tabuleiros de comidas, nas identificações e
representações regionais e flui ainda no âmbito nacional, sem, no entanto,
ser total, completo. Sabe-se da construção cotidiana em que os
testemunhos matérias representam o homem criador, o homem usuário,
diferentes contextos, diferentes momentos sociais e históricos. (LODY,
2006, p.17).
O Dicionário de Arte Sacra & Técnicas Afro-brasileiras é um projeto
eminentemente dinâmico e assim se deve comportar com abertura e
sensibilidade á mudança, acréscimos e freqüentes adaptações. (LODY,
2006, p.27)

13
Ramo da etnologia que estuda a cultura material.
14

Raul Lody, ainda na introdução do trabalho, fala de questões de reminiscência,


referindo-se ao material documental-visual deixado por artistas como Debret,
Rugendas e Carlos Julião, além de outros artistas documentais dos modos urbanos
que deram destaque à população negra da época retratada; cita também a tradição
acadêmica e os precursores nos trabalhos científicos sobre o negro no Brasil; na sua
obra podemos encontrar citações das seguintes obras e autores: O negro na
civilização Brasileira, de Arthur Ramos; Casa Grande & Senzala, de Gilberto
Freyre14; A Bahia já foi assim, de Hildegardes Viana; As religiões africanas no Brasil,
de Roger Bastide; Dicionário do Folclore Brasileiro, de Luís Camara Cascudo;
Estudos inéditos de Jean Baptisde Debret, contendo gravuras de Debret e textos de
Afonso Arinos de Melo Franco, dentre outros aqui não citados; cita ainda os acervos
do Museu do Homem do Nordeste (Pernambuco), do Museu da Cidade de Salvador,
do Museu Nacional (no Rio de Janeiro) e do Instituto Geográfico e Histórico da
Bahia. Apesar de todas as citações empreendidas pelo autor, o mesmo faz a
seguinte alerta a respeito do tema abordado: “[...] algumas áreas permanecem
carentes, como a de estudos de matérias-primas, tecnologias, destinação cultural e
situações sociais de uso e de representação.” (LODY, 2006, p.24). Acreditamos que
esse seja, sim, o caso da indumentária afro-religiosa, o qual se tentou aqui iniciar um
estudo preliminar e bibliográfico. A relevância creditada ao tema é fundamentada no
capítulo da obra que Lody dedica as Roupas e Objetos do Corpo:

Originários dos terreiros, dos autos populares, dos cortejos de rua, do


cotidiano nas feiras e mercados, dos ritos de passagem em situações
sociais diversas está cada roupa composta por objetos integrados e que
constroem o indivíduo na plenitude da função e do papel por ele encarnado
e que é expresso na própria roupa. A roupa no Dicionário é revelada
enquanto discurso visual e iconológico integrado ao corpo do homem e seus
entornos físico simbólico. (LODY, 2006, p.30).

Nesse referido capítulo, definindo a palavra Axó – o termo usual na realidade dos
terreiros para roupa ou conjunto de roupas – enfatiza que nos candomblés de
origem Kêtu e Nagô existem cargos para pessoas responsáveis por cuidar das
roupas de uso ritualístico; são elemaxó (para figura masculina) ou iamaxó (para
figura feminina). E complementa dizendo que: “[...] A roupa, sem dúvida, é um dos

14
Ainda nesta obra, Raul Lody, explicitando sobre outros objetos da indumentária afro-brasileira,
afirma que Gilberto Freire em Casa Grande & Senzala relata sobre as usuais roupas de escravos,
reconhecendo através das mesmas os trabalhos e atividades desenvolvidos pelos cativos.
15

mais eficazes meios de representação sociorreligiosa e de comunicação visual dos


terreiros [...]” (LODY, 2003, p.220)

Foram encontrados também textos jornalísticos referentes à indumentária dos


terreiros de candomblé, sua beleza estética e forma de utilização. Adriana Jacob –
repórter, assessora de imprensa e colaboradora da revista eletrônica
Soteropolitanos – escreveu em maio de 2009 o texto intitulado Roupa do povo de
Santo, no qual discute questões como a hierarquia presente no traje, a forma de
produção do mesmo e suas riquezas estéticas; cita autores como José Valladares (e
sua obra O torço da Baiana de 1952) e Raul Lody (citando o livro Jóias de Axé de
2005) ainda contando com depoimentos como do historiador Jaime Sodré. Trata-se
de um texto com informações riquíssimas sobre o tema, porém com problemas
normativos em relação às referências. Já o texto contido na edição de novembro de
2010 da revista semanal Muito – vinculada ao Jornal ATarde – escrito pela repórter
Tatiana Mendonça, fala especificamente sobre o terreiro Pilão de Prata e seu
babalorixá Air José Souza de Jesus; contando com depoimento do antropólogo
Vilson Caetano, o texto, que trata mais especificamente sobre os 50 anos do terreiro
em questão, afirma este tratar-se da “alta costura do candomblé”. São textos que
apesar do caráter jornalístico – texto rápido, abrangente, sem muitas fontes de
pesquisa – pode identificar a importância do tema, e as possibilidades de
aprofundamento.

Abordando o traje sobre a perspectiva identitária/cultural, temos o artigo produzido


em conjunto pelas pesquisadoras Joseania Freitas, Juliana Monteiro e Luzia Gomes
As roupas de crioula no século XIX e o traje de beca na contemporaneidade:
símbolos de identidade e memória publicado na revista de Humanidades Mneme em
2005. Os simbolismo identitário e os valores sócio-culturais das roupas são
analisadas a partir do Traje de Beca da Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte,
na cidade de Cachoeira, localizada no recôncavo baiano. As autoras afirmam que:

[...] O traje de beca marcava a diferença entre as mulheres negras e


brancas na sociedade colonial. Distinguia, também, as negras entre si, pois,
fossem elas escravas, libertas ou alforriadas nem todas possuíam um traje
de beca, no século XIX. [...] (MONTEIRO; FERREIRA; FREITAS, 2005,
p.395)

As irmãs da Boa Morte são denominadas “senhoras que vestem bata”, denotando o
alto grau hierárquico que possuem dentro das casas de candomblé que frequentam,
16

pois apenas pessoas com altos cargos ou iniciadas há muito tempo pode fazer uso
de tal parte do traje; as abiãs e yaôs (pessoas recentemente iniciadas) apenas o
camisu15 ou roupas simples sem adornos lhes é permitido.

Outros textos que não podemos deixar de citar são Bahia Negra na Coleção do
Museu Tempostal, de Jeferson Bacelar e Cláudio Pereira16, e Caderno Wearable-art:
O traje da Baiana, produzido pela Fundação G. B. V. Museu do Traje Wearable-art,
com apoio da Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura de Salvador (BA)
através da Fundação Gregório de Mattos. O primeiro é um estudo sobre a Coleção
de postais do referido museu, criado a partir da doação do acervo particular de
Antonio Marcelino do Nascimento17, priorizando a imagem do negro e de suas
relações de trabalhos; as indumentárias são apresentadas a partir das imagens
cedidas pelo Museu Tempostal, não havendo no texto referências relevantes a
respeito do tema. Em O Traje da Baiana, que conta com introdução elaborada pelo
18
historiador Cid Teixeira, além da descrição da “roupa sura” há uma descrição,
ainda que reduzida do turbante, tronco (no caso batas), da saia, dos calçados, da
roupa interior e dos acessórios; há ainda um pequeno apontamento sobre o traje na
atualidade, falando especificamente sobre as quituteiras de acarajé, cocada e outros
elementos gastronômicos que encontramos facilmente pelas ruas da capital baiana.

Mais recentemente temos a produção dos Cadernos do IPAC produzidos pela


Secretaria de Cultura do Estado da Bahia através do Instituto do Patrimônio Artístico
e Cultural da Bahia – em comemoração aos 40 anos do órgão; segundo o diretor do
IPAC, Frederico A. R. C. Mendonça os mesmos podem ser considerados: “Um
exercício de resgate da memória”. Ao todo foram cinco publicações das quais
podemos destacar: Pano da Costa (Caderno 1); Boa Morte (Caderno 2) e Santa
Bárbara (Caderno 5). O destaque deve-se ao fato de que, em todas, a indumentária

15
Tipo de camisão que vai, normalmente, até o joelho, sem adornos, antecedendo a bata.
16
Jeferson Bacelar é Doutor em Antropologia pela Universidade Federal da Bahia, professor do
Departamento de Antropologia e dos cursos de pós-graduação de Estudos Étnicos e Africanos e de
Antropologia da UFBA e pesquisador do Centro de Estudos Afro-Orientais. Cláudio Pereira é Doutor
em Antropologia pela Universidade de Campinas, Professor do Curso de pós-graduação de Estudos
Étnicos e Africanos da Universidade Federal da Bahia e pesquisador na área de Antropologia da
Religião e Antropologia Visual.
17
Antonio Marcelino do Nascimento foi secretário da Escola de Teatro em Salvador e acumulou
postais de todos os estados brasileiros e de vários lugares do mundo. Doou sua coleção, que contava
com mais de 35 mil postais, em 1995 para o Governo do Estado.
18
[...] O Conjunto era composto por uma saia e blusa, desprovido de ornamentos e adereços, liso e
muito discreto. [...] (FUNDAÇÃO G. B. V., 1997, p.7)
17

se faz partícipe em maior ou menor grau. O pano-da-costa como peça marcante do


vestuário afro-religioso; A irmandade da Boa Morte e seu traje de beca, além dos
outros trajes utilizados durante a festa como o bioco 19, por exemplo. O caderno de
Santa Bárbara traz a beleza dos trajes de baiana vistos na festa e a referência e
reverência contida nas cores vermelha e branca, predominante nos festejos.

Em vista ao apresentado ao longo do capítulo, a frase clichê “muito já foi escrito


sobre, mas ainda há muito a se escrever” é totalmente aceitável quando falamos
sobre indumentária afro-religiosa e as suas questões culturais, identitárias,
simbólicas e por que não estéticas.

19
Lenço branco em formato triangular, preso ao queixo, no qual remetem as mulheres da Irmandade
de Boa Morte às negras Mulçumanas.
18

3. AUTORES E ENFOQUES ANALÍTICOS

Antes de listar os autores e enfoques escolhidos para análise devemos fazer as


seguintes considerações. Primeiramente é necessário explicar e explicitar por que
alguns aspectos gerais acerca do candomblé não serão aqui observados: tipologias
de nações; questões de gêneros; especificidades dos cargos; tradicionalismo de
certas casas de candomblé; temporalidade; ordenação de rituais e brigas de poder.
É necessário tocar também no que tece a ausência de alguns autores na análise
assim como as diferenças conceituais e temporais entre os autores analisados.

As questões referentes à diferenciação de modelos de culto de acordo com a nação


a qual pertence o candomblé (se tratamos de uma casa ou culto ketu, jejê-nagô,
congo ou angola) não será aqui abordada, por não se tratar de um estudo de caso
específico e sim de uma análise bibliográfica – que foram buscar suas fontes em
casas de culto diferenciadas. Categorização por gêneros também não é o objetivo
desse trabalho, assim como as especificidades de cada cargo existente dentro de
um terreiro de candomblé, muito embora os trajes reflitam e comuniquem essa
realidade; o intuito é apontar essas diferenciações e tentar entender a sua
procedência e não discorrer – de maneira técnica e descritiva tal qual um
antropólogo ou etnólogo – sobre a funcionalidade a partir dos gêneros nem sobre a
ampla quantidade de cargos existentes dentro de cada casa de culto afro-brasileiro.
No que cerca as questões de tradicionalismo de determinada casa de culto ou sobre
brigas de poder, o tema também não será aqui discutido, pois esses fatos
constituem-se casos isolados, especificidades e singularidades que fogem ao
meandro da pesquisa. Sobre a temporalidade, podemos citar Vivaldo Costa Lima,
em sua obra A família de Santo nos candomblés jeje-nagôs da Bahia: um estudo de
relações intra-grupais, onde o autor diz que: “[...] Pequeno ou desprezível que
pareça o tempo de diferença em termos de duração mensurável, esse intervalo no
candomblé possui um sentido que está para além das dimensões convencionais de
tempo.” (LIMA, 1997, p.75). O tempo no candomblé é próprio, possui lógica
particular e, acreditamos, será item de essencial importância no estudo dos trajes –
muito embora não seja aqui abordado com veemência. Por fim, a ordenação dos
rituais, também se caracteriza como não relevante nesse estudo, pois, independente
19

de sua ordem, nos interessa a comunicação visual, simbólica, hierárquica e estética


emitida pelos trajes durante o acontecimento dos mesmos.

O animismo fetichista dos negros baianos em Salvador, escrito por Raymundo Nina
Rodriguez; As religiões africanas no Brasil, de Roger Bastide; Costumes africanos
no Brasil, trabalho do professor Manuel Querino; Notas sobre o culto dos Orixás e
Voduns na Bahia de Todos os Santos, no Brasil, e na Antiga Costa dos Escravos, na
África, escrito por Pierre Verger; A fotografia e o negro na cidade de Salvador (1840-
1914), de Sofia Olszewski Filha; O candomblé e o tempo, artigo escrito por
Reginaldo Prandi; Arte Religiosa Afro-brasileira: as múltiplas estéticas da devoção
brasileira artigo de Vagner Gonçalves da Silva; O Pano da Costa na Representação
dos Viajantes: Séculos XVII ao XIX, texto escrito por Maria da Conceição Barbosa
da Costa e Silva, presente no Caderno I do IPAC; e Teatro de Memória, palco de
esquecimentos: Cultura africanas e das diásporas negras nas exposições, tese de
doutorado defendida pelo professor Marcelo Nascimento Bernardo Cunha. São
estes os textos, obras e artigos selecionados para a análise bibliográfica a que se
propõe o presente escrito. É imprescindível atentar para o fato de que as obras –
principalmente os livros com diversas edições publicadas – não serão aqui
analisadas em sua totalidade, seja ela temática ou de exposição. A seleção baseou-
se na utilização de pesquisadores e textos consagrados pela antropologia do negro
no Brasil (como Nina Rodrigues, Roger Bastide, Manuel Querino e Pierre Verger),
assim como textos deveras contemporâneos em formatos de dissertação, teses e
artigos para revistas científicas – o caso de Sofia Olszewski e Maria da Conceição
Barbosa da Costa e Silva, Marcelo Cunha, Reginaldo Prandi e Vagner Gonçalves,
respectivamente. Dessa forma, teríamos uma “evolução de pensamentos” e um
panorama das diferentes formas de perceber, pensar e tratar o tema afro-religioso,
podendo identificar as quebras de paradigmas e mudanças conceituais a respeito do
tema.

Faz-se necessário citar também os faltantes nesta análise, suscitando, assim novas
possibilidades, e novos trabalhos a serem desenvolvidos. Os pesquisadores
estrangeiros Donald Pierson e Ruth Lands, que muito escreveram sobre os negros e
seus costumes; Edson Carneiro, autor de Ladinos e Crioulos, Antologia do negro no
Brasil e Candomblés da Bahia; Arthur Ramos, discípulo de Nina Rodrigues, e autor
de obras como O negro na Civilização Brasileira e As culturas negras no Novo
20

Mundo; contemporaneamente, podemos citar a figura de Vivaldo Costa Lima; e, por


fim, não deixaremos de lembrar os acervos museológicos (como os já citados Museu
Tempostal, Museu do Traje e do Têxtil e Museu Afro-Brasileiro), além das pranchas
e desenhos de Carybé; artista plástico argentino, radicado na Bahia que – por meio
da arte – exemplificou visualmente, os ritos, os cultos o cotidiano e
conseqüentemente os trajes utilizados no candomblé.

Raymundo Nina Rodriguez, nascido no Maranhão, além de aluno e posteriormente


professor da Faculdade de Medicina da Bahia, localizada na cidade do Salvador, foi
um dos primeiros expoentes no estudo do negro no país; seus estudos de caráter
médicos, anteriormente desprezados por serem considerados preconceituosos, hoje
constituem bases iniciais para pesquisas que envolvam a cultura negra. A sua forma
de abordagem, enfocando a inferioridade física e mental do homem negro, nada
mais é do que um reflexo do paradigma vigente na época que considerava a “raça
20
negra” como culpada para o atraso social, intelectual e político do país. As
considerações que necessitam ser feitas sobre sua obra O animismo fetichista dos
negros baianos, escrito no início do século XX, remetem a essa perspectiva de
análise, baseada na consciência da “raça negra” como inferior considerando os
cultos proferidos pelos mesmos como reflexo do atraso mental que atinge a “raça”.
Sobre os estudos de Nina Rodrigues, discorre Vivaldo Costa Lima:

[...] O possível desvio metodológico, no caso de NINA, se justificaria pelas


dificuldades que esse pioneiro dos estudos afro-brasileiros encontrou em
sua investigação, numa época em que os candomblés só eram abordados
pelos representantes das classes dominantes e da ciência oficial em
termos de repressão ou de censura. Sabe-se quanto custou a NINA
RODRIGUES enfrentar os preconceitos de que ele, mais tarde,
ironicamente, seria acusado – contra a cultura negra em geral e as religiões
dos negros em particular, na Bahia do fim do século XIX. NINA
ROGRIGUES, como já disse anteriormente, observou especialmente uma
grande casa de candomblé jeje-nagô, o Gantois, ao seu tempo
dirigido ainda pela velha MARIA JÚLIA DA CONCEIÇÃO NAZARÉ e
em seguida por sua filha PULCHERIA [...]. (LIMA, 1977, p.49).

Roger Bastide, antropólogo francês, que chegou ao Brasil em 1938, também se


destacou nos estudos sobre a população negra; participou da organização da
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo e antes de

20
Colocamos aqui “raça negra” entre aspas por considerar, com base em estudos antropológicos em
voga, que o uso de tal terminologia encontra-se hoje em total desuso por não ser mais considerada
pertinente no ambiente acadêmico. Não se tratando assim de uma analogia ao mito da democracia
racial que inibe o preconceito existente a considerar todos como uma única raça – humana – e
desconsidera as diferenças étnicas e a necessidade de alteridade entre as mesmas.
21

desenvolver seus próprios estudos, se dedicou à leitura de autores brasileiros como


Nina Rodrigues, Euclides da Cunha e Manuel Querino, buscando entender a
realidade brasileira a partir da compreensão do que fora escrito por autores locais.
Sobre esse fato fala Maria Isaura Pereira de Queiroz:

Esta forma de abordagem, a partir da literatura existente no próprio país


subdesenvolvido que se projeta estudar até então quase não havia sido
adotada por sociólogos e antropólogos estrangeiros e ainda hoje não é
corretamente empregada [...] (QUEIROZ, 1976, p. 47).

Ainda sobre o método de abordagem aplicado por Bastide, discorre a mesma autora:

[...] Quer interrogue as etnias, ou as classes, ou os grupos ou os indivíduos,


procurou sempre Roger Bastide apanhar na Rede da Sociologia as
manifestações dos movimentos históricos e a - históricos que são a
essência das sociedades humanas e que a sociedade brasileira segundo
ele, revela possuir em alto grau. (QUEIROZ, 1976, p.51)

Sobre Manuel Querino há muito a ser falado; não só sobre ele, mas como de toda
sua trajetória e de sua obra, logicamente. Sobre ele falam, respectivamente, na
apresentação, e prefácios de Costumes africanos no Brasil, Thales de Azevedo21:
“[...] Manuel Querino ficou como um dos fundadores da Antropologia brasileira ao
menos no relativo ao que nesta tem relevo os aportes da multiplicidade de africanos
aos quais tanto devem nossos modos de ser [...]”; Raul Lody22: “Enquanto homem
negro, de formação intelectual nos moldes exigidos para a época, segundo padrões
europeus, especialmente franceses, não se afastou do cotidiano afro-soteropolitano
de um mundo marcado e indivisível de matrizes africanas e portuguesas.”; e Arthur
Ramos23: “Sem o rigor metodológico e a erudição cientifica de Nina Rodrigues, foi,
contudo, Manuel Querino um pesquisador honesto, um trabalhador incansável,
impulsionado por aquele interesse insuspeito que provinha das suas próprias
origens africanas.”. Apesar de todos os predicados apresentados acima, Manuel
Querino faleceu em Salvador em 1923, sem o reconhecimento pelos seus trabalhos
intelectuais, só alcançado uma década após sua morte.

Tendo notoriedade também como etnofotográfo, Pierre Verger, por ser autodidata,
sentiu-se a vontade para desenvolver a sua forma própria de trabalho: anotações

21
Apresentação da segunda edição da obra Costumes africanos no Brasil, de Manuel Querino
(1988).
22
Prefácio da segunda edição da obra Costumes africanos no Brasil de Manuel Querino (1988).
23
Prefácio da primeira edição da obra Costumes africanos no Brasil de Manuel Querino (1938).
22

sobre relatos orais, cultura material e rituais; além do estudo sobre as religiões de
matriz africana desenvolveu outros relacionados às conseqüências sociais,
econômicas e políticas do tráfico de escravos para o Brasil. Sobre as fontes de
pesquisa utilizadas pelo autor, fala Vivaldo Costa Lima:

A obra apaixonada e admirável de Pierre VERGER é toda ela, por sua vez,
confessadamente jeje-nagô na abordagem e na interpretação e sua valiosa
documentação fotográfica acentua claramente, no emprenho de
identificação formal, o seu enfoque rigidamente comparativo. (LIMA, 1977,
p.50)

Os outros autores24 que participarão da análise podem ser considerados


contemporâneos – tanto cronológica como tematicamente falando – em relação aos
citados anteriormente. Fazem parte de uma nova safra de cientistas sociais, em sua
maioria professores universitários em plena atividade acadêmica, e encontram-se
constantemente escrevendo textos e apresentando trabalhos em fóruns e
seminários. Devem ser considerados autores de grande relevância, pois seus textos,
ou na releitura critica feita de autores que os antecederam fazem surgir novos
questionamentos, que darão origem as mais diversas idéias e pensamentos que
ainda estão por vir.

Como observado anteriormente neste capítulo, as obras não serão analisadas em


sua totalidade. Em O animismo fetichista dos negros baianos, de Nina Rodrigues
será analisado o capítulo II, Liturgia fetichista dos áfrico-baianos. O capítulo
Apresentação do candomblé foi o escolhido da obra de Roger Bastide As religiões
africanas no Brasil; Já na obra Costumes africanos no Brasil, de Manuel Querino, foi
selecionado o primeiro capítulo, A raça africana e seus costumes na Bahia; sobre a
obra de Pierre Verger, Notas sobre o culto dos Orixás e Voduns na Bahia de Todos
os Santos, no Brasil, e na Antiga Costa dos Escravos, na África o capitulo
selecionado trata sobre Iniciações e estados de transe; a dissertação de Sofia
Olszewski Filha A fotografia do negro na cidade de Salvador foram utilizadas as
partes finais do texto, principalmente o capítulo cinco A imagem do negro na cidade

24
Sofia Olszewski é pesquisadora e atualmente participa de bancas examinadoras de diversas
dissertações de mestrado, principalmente no campo da história da arte; Reginaldo Prandi é professor
titular da Universidade de São Paulo (USP) e docente permanente do programa de pós-graduação
em Sociologia da mesma Universidade; Vagner Gonçalves Silva é professor do Departamento de
Antropologia da USP, realizou seu pós-doutorado na Havard University; Marcelo Bernardo Cunha é
professor titular do Departamento de Museologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e
coordenador do Museu Afro-Brasileiro, também vinculado a UFBA.
23

de Salvador; já a tese do professor Marcelo Bernardo Cunha, Teatro de Memória,


palco de esquecimentos: Cultura africanas e das diásporas negras nas exposições
teve o capítulo sobre Estratégias expositivas das imagens analisado; os artigos
serão analisados em sua totalidade.

A importância dada por esses autores, mesmo que em um único parágrafo, ao tema
é de extrema importância, pois cada texto parte de uma perspectiva. Dessa forma, é
importante ressaltar que este escrito não comportará comparativo entre os textos; os
mesmos contam com informações variadas e enfoques bastante diferenciados
sejam por questões temporais ou ideológicas.
24

4. ROUPAS DE AXÉ: ANÁLISE BIBLIOGRÁFICA25

A roupa pode ser considerada uma das expressões mais requintadas, dentro da
lógica dos terreiros, pois o Candomblé é uma religião que trabalha com o elemento
simbólico e estético como determinante. Dessa forma, através da leitura dos estudos
desenvolvidos dentro dessa lógica cultural singular, que é o universo religioso afro-
brasileiro, foi possível elencar uma série de informações sobre os trajes; informações
estas contidas não em textos específicos, como já observados, mas em textos que
abordam, de uma maneira geral, e sobre vários viéses a cultura negra e afro-
religiosa.

Em nível do modo definidor de tipologia, a roupa e o seu modo de vesti-la podem


funcionar com um diferenciador entre as nações; assim como os nomes dos orixás,
as contas e a maneira de reger e executar os cultos, o traje também vária entre
ketos, angola, ijexá e congo. Esse fato é relatado por Roger Bastide quando o
mesmo se refere à existência de tais diferenciações grupais:

[...] Os candomblés pertencem a „nações‟ diversas e perpetuam, portanto,


tradições diferentes [...]. É possível distinguir essas „nações‟ umas das
outras pela maneira de tocar o tambor (seja com a mão, seja com varetas),
pela música, pelo idioma dos cânticos, pelas vestes litúrgicas, algumas
vezes pelos nomes das divindades, e enfim por certos traços do ritual. [...]
(BASTIDE, 1958, p.29). [Grifo nosso]

Os trajes não são, de forma alguma, utilizados aleatoriamente; assim como tudo
dentro do Candomblé, há uma lógica pertinente, uma explicação mítica, uma regra a
ser seguida em relação à utilização das vestes. São as categorias e modo de
utilização das indumentárias, válidos para todos os praticantes do culto. Nina
Rodrigues, descrevendo uma situação em seu texto, faz a seguinte observação:

[...] Por ocasião de candomblés, como sempre o tenho visto, a parede do


fundo fica ocupada por um grande leito de vinhático de casal, sobre o qual
existe grande quantidade de vestes. As outras três paredes ficam cobertas
de adornos e vestimentas dos santos, de cores e formas variadíssimas,
desde a seda e o veludo custoso, mais ou menos usado, até a chita barata.
Faixas bordadas de búzios, voltas colossais de contas e miçangas, enfeites
diversos se encontram por ali, presos e suspensos à menor saliência das
paredes, às guarnições do leito, a pregos fincados nos umbrais da porta e

25
Alguns trechos que remetem à indumentária foram grifados, a fim de dar destacar as passagens
relacionadas ao tema.
25

um pouco por toda a parte. São os paramentos sacerdotais, é o guarda-


roupa dos santos. [...] (RODRIGUES, 2005, p.46). [Grifo nosso]

A utilização de tal expressão, “guarda-roupa dos santos”, faz-nos confirmar a


importância das vestes. A variação de roupas em razão do orixá, também é
observada:

[...] As vestes variam também de santo a santo. [...] Este vestuário é tão
constante que facilmente se distinguem por ele os iniciados de cada
confraria. O conhecimento da significação das vestimentas de santo me
foi de grande auxílio nas minhas observações.[...] (RODRIGUES, 2005,
p. 51-52). [Grifo nosso]

[...] Conhecido o santo e designado o pai ou mãe do terreiro que o tem de


fazer, o iniciado prepara seu enxoval, ou antes o guarda-roupa do santo
e reserva as suas economias para a grande festa da iniciação.[...]
(RODRIGUES, 2005, p.53). [Grifo nosso]

Atenção também à observação de Nina Rodrigues alertando sobre a ajuda obtida


através do conhecimento das vestimentas “de santo”. Manuel Querino, por
conseguinte, vem tratar sobre as obrigações e exigências existentes no universo dos
trajes sacros afro-brasileiros:

As filhas-de-santo são obrigadas a dois trajos característicos: um é exigido


nos dias festivos da seita, e por isso é conservado em poder da mãe-de-
santo; o outro é destinado aos dias de preceito, à sexta-feira de cada
semana, embora seja usado em outros dias. [...] e não é permitido tratar
de qualquer negócio tendente ao orago sem as vestes da seita, pois
cada encantado tem seu emblema característico. (QUERINO, 1988, p.36).
[Grifo nosso]

A questão categórica e de utilização dos trajes é citada ainda quando Pierre Verger
refere-se a um mito relacionado às divindades africanas:
[...] Obatala é o rei dos Orisa. Está velho, cansando e convoca seus súditos
a fim de saber qual é o mais inteligente e mais digno de substituí-lo. Envia-
os mundo afora. Será seu sucessor aquele que receber mais honrarias.
Partem todos juntos, usando seus mais belos trajes, porém Ose é pobre e
seu único haver é um saco velho. [...] Ao regressar, eles se apresentam
diante de Obatala. Os Orisa narram um de cada vez suas viagens, as
grandes recepções e os banquetes suntuosos de que participaram. [...] „E o
que vocês me trazem como prova de tudo isso? ‟ pergunta Obatala.
Somente Ose, ao abrir o saco e retirar dele a cabeça, os pés e os ossos dos
animais, pode demonstrar a exatidão de suas palavras. Obatala faz Ose
sentar-se no trono, tira seus trajes e entrega-os a Ose. (VERGER, 2000.
p.98). [Grifo nosso]

Além de ceder seu trono, Óbatala – a divindade africana em questão – entrega seus
trajes, mostrando que os mesmo também estão relacionados ao poder. Já Vagner
Gonçalves da Silva fala de uma conotação sagrada presente nas roupas:
26

Na composição da indumentária litúrgica do orixá podemos observar duas


categorias de objetos artístico-religiosos. A primeira refere-se à vestimenta
propriamente dita do orixá que cobre o corpo do iniciado no momento do
transe. A segunda engloba as insígnias e adereços que o orixá carrega na
cabeça, pescoço, peito, ombros, pulsos, mãos e pernas. Esses objetos
revestem-se de uma aura do sagrado que devem, inclusive, ser
diferenciados daqueles que os adeptos usam no cotidiano. Assim, se
um orixá incorpora seu filho, as pessoas ao redor devem imediatamente
retirar do corpo deste os braceletes, colares, brincos etc. antes de vesti-lo
com as peças próprias do vestuário do seu orixá. (SILVA, 2008, p.100).
[Grifo nosso]

O traje está simbólica, hierárquica e esteticamente ligado aos rituais; entendendo


rituais dentro do universo afro-religioso como todas as cerimônias correntes, desde a
iniciação, festa de “dar o nome do santo”, saída de iaôs ou festas dos orixás da
casa. Essas são algumas, dentro da gama de celebrações correntes durante todo
ano dentro de um terreiro de candomblé. É no relato desses rituais, que
encontramos o maior número de citações a respeito da indumentária feitos pelos
estudiosos. Nina Rodrigues refere-se às celebrações festivas que correm em
paralelo aos festejos sacros da seguinte forma:

[...] Grande parte do dia passam as regras em sambas e danças destituídas


de caráter religioso. [...]. As raparigas com vestimentas de cores vistosas,
trazendo os clássicos turbantes e panos da Costa, pulseiras colossais e
grandes voltas de outro em torno do pescoço, dançam com quartinhas
douradas na cabeça, simulando a romaria à fonte sagrada. (RODRIGUES,
2005, p.55)

Roger Bastide assim descreve, passo a passo, os procedimentos após uma


possessão durante festejos:

Produzida à crise de possessão, as equedes, encarregadas de velar pelos


filhos e filhas-de-santo, retiram-lhe o casaco se trata de um homem, ou, em
se tratando de mulher, o xale que a poderia estrangular no caso de
convulsões, e, antes de mais nada, os sapatos. O gesto é altamente
simbólico: trata-se de um despojar o indivíduo de sua personalidade
brasileira para que retorne à condição africana. [...] (BASTIDE, 1958, p.36-
37). [Grifo nosso]

Assim também o faz Manuel Querino:


Em meio do festejo, o santo chegará à cabeça da promotora da função e de
outras pessoas. Os vestuários obedecem à doutrina do santo celebrado. As
roupas um pouco folgadas são entrelaçadas de toalhas estreitas com
granjas bordadas, nas extremidades, de sorte que não se percebam as
formas plásticas das mulheres. (QUERINO, 1988, p.49)

Bastide e Querino descrevem duas ações que se completam: o despir das roupas
usuais do individuo em transe e o vestir da roupa-de-santo; a comunicação presente
27

em tais atos entende que o indivíduo, por hora, encontra-se incorporado, atuante e
vestido por outra figura: a do orixá. Manuel Querino ainda atenta para questões
corpóreas, salientando que as roupas não devem marcar anatomicamente o tipo
físico do indivíduo. Esclarece-se, portanto, que a questão de gênero é relevante, e
suscitaria um estudo direcionado, quando tratamos de vestes; uma mulher, por
exemplo, que incorpora um orixá masculino se vestirá de acordo com as roupas e
portará as insígnias do mesmo; o mesmo vale para um homem que possui um orixá
feminino; quem está ali naquele momento é à força da natureza e não indivíduo;
nesse momento, esta força, o orixá, dita as regras.

Verger relata um caso africano, descrevendo um culto de Abomé: “[...] Ele faz três
aparições sucessivas diante do público usando diferentes trajes [...]” (VERGER,
2000, p.110). Em nota de rodapé, o autor especifica o simbolismo presente nos
trajes das três aparições realizadas pelo iniciado no culto. Há também a descrição
de ritos internos feitas por Roger Bastide:

[...] Uma vez conhecido o nome do orixá, tem lugar então a entrada no
santuário. Vai então a candidata, nas trevas em geral luminosas das noites
tropicais, tomar banho na fonte sagrada; põe de lado as velhas vestes antes
de entrar na água, envergando novas roupas à saída. Assim fica
simbolizada, pelo banho lustral e pela mudança de trajes, a passagem da
vida profana à vida mística. [...] (BASTIDE, 1958, p. 48)

Também Manuel Querino faz a descrição de uma cerimônia de Bori26:

Por processos diversos pode-se levar a efeito esta cerimônia com o


emprego de obi e água fria captada no mesmo dia. Na ocasião aprazada,
estende-se no chão uma esteira, que é forrada de roupas brancas. A
pessoa que vai dar comida a cabeça, depois de uma ablução geral, veste-
se de branco trazendo nos ombros uma toalha ou lençol. (QUERINO, 1988,
p.43)

Roger Bastide descreve ainda uma cerimônia funerária; o funeral de uma pessoa
que venha a falecer e possua um alto cargo dentro de um terreiro é cercada de ritos
e procedimentos singulares; as roupas utilizadas por esse membro também são alvo
de algumas ações, como bem descreve o autor:

[...] Mas o morto deixou outros objetos ainda, que não estão em sua casa,
mas se encontram no próprio recinto do candomblé; não podem servir a

26
Bori significa em ioruba, dar comida à cabeça e corresponde a um dos ritos iniciais do Candomblé
de origem iorubana.
28

nenhuma outra pessoa, pois foram ligados unicamente àquele que acabou
de morrer; constituem de certo modo seus „pertences‟, são elementos
constitutivos de sua personalidade. Far-se-á, pois um despacho com esses
elementos litúrgicos; depois é perguntado aos orixás ou a Ifá, com o auxílio
dos búzios, o lugar onde as vestes, as insígnias etc. devem ser
abandonadas, mar, água doce, floresta..., os filhos do terreiro dirigem-se ao
lugar designado para jogá-las ali e, em seguida, regressarão sem olhar para
trás nenhuma vez. [...] (BASTIDE, 1958, p.66)

Vagner Gonçalves da Silva e Reginaldo Prandi falam ainda de duas nomenclaturas


utilizadas no ambiente dos terreiros que relacionam ritos e trajes:

Preparar o toque inclui cuidar das roupas, algumas costuradas


especialmente para aquele dia, que devem ser lavadas, engomadas e
passadas a ferro (é sempre uma enormidade de roupas para engomar e
passar!), por em ordem os adereços, que devem ser limpos e polidos;
preparar as comidas que serão servidas a todos os presentes e providenciar
as bebidas; decorar o barracão, colhendo-se para isso folhas apropriadas
etc. etc. (PRANDI, 2001, p.45). [Grifo nosso]

‘Vestir o santo’ é como no candomblé se diz quando uma pessoa se inicia


e pode receber em seu corpo a manifestação da energia imaterial do orixá
e, nessa condição de transe, vestir-se com a roupa e insígnias que
caracterizam a identidade mítica do seu orixá. Estas vestimentas e
insígnias, por meio das quais os orixás se manifestam para dançar e estar
entre seus filhos, constituem a face mais conhecida do candomblé. A
imagem dos orixás, tal como estes se apresentam nas festas públicas que
ocorrem no barracão dos terreiros, tem sido muito divulgada por meio do
trabalho de artistas famosos como o do fotógrafo e etnólogo Pierre Verger e
do pintor Carybé. (SILVA, 2008, p.100). [Grifo nosso]

No primeiro caso, Prandi fala em “preparar o toque” e inclui o cuidado com os trajes
nesse processo; Já Vagner Gonçalves coloca a expressão “vestir o santo”, que
corresponde ao indivíduo preparado para entrar em estado de transe e possessão
do orixá. Temos dessa forma: uma expressão que exige a execução de tarefas que
envolvem a roupa e seus cuidados; e outra que relaciona o ato de trajar/vestir a
outro ato de extrema importância e ocorrência dentro dos terreiros: a possessão.
Vagner Gonçalves da Silva ainda destaca que as roupas e outros adereços como “a
face mais conhecida do candomblé”; é por onde a comunicação visual ocorre.
Destaca também os trabalhos de Pierre Verger e Carybé no registro visual dos
trajes.

A produção de tais vestes também é ponto abordado em tais pesquisas. Como


ressalta Vagner Gonçalves:

Atualmente a arte de produzir essa vestimenta que envolve a tecelagem e o


bordado, aplicação de rendas e outros acabamentos e um conjunto de
técnicas manuais de amarração de torços e execução de laços têm sido
29

preservados nos terreiros como legado de um importante conhecimento


artístico-religioso. (SILVA, 2008, p.101)

É o trabalho desempenhado pelo espaço Cultural Vovó Conceição, no terreiro da


Casa Branca e da Casa de Alaká, no terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, ambos em
Salvador. São eles hoje responsáveis pela perpetuação desse modelo de confecção
e também referência no que trata o comércio dessas peças a outras casas de culto.
Ainda sobre a produção de tais peças, fala o mesmo autor:

As roupas dos orixás tradicionalmente são confeccionadas coletivamente


pelos próprios membros dos terreiros, o que não impede que talentos
individuais possam se destacar tornando inúmeros adeptos conhecidos
pelas roupas e adereços que confeccionam [...] (SILVA, 2008, p. 101-102)

[...] Foi, aliás, no âmbito do terreiro que se formaram e ficaram conhecidos


primeiramente os vários artistas que exerceram e exercem o ofício de
costurar vestimentas, bordar adês, modelar insígnias, pintar jarros, forjar
ferro etc. [...] (SILVA, 2008, p.108)

Porém, muito antes da discrição acima, já escrevia Roger Bastide sobre o processo
de confecção dos trajes:

Os dias se sucedem: com o fim de evitar qualquer encontro desagradável,


vai a iaô, acompanhada da „mãe-pequena‟, tomar seu banho na fonte
sagrada enquanto a noite ainda não se dissipou completamente. Totalmente
despida, é friccionada com „sabão-da-costa‟. Depois regressa ao santuário,
onde aprende os segredos do candomblé. Todavia, o termo segredo não é
muito exato, pois não se trata de modo nenhum de lhe transmitir
ensinamentos esotéricos. Ensinam-lhe simplesmente o que seu estado
futuro de „filha-de-santo‟ exige que saiba. Trabalha também com a
confecção das vestes litúrgicas que envergará no momento da cerimônia de
saída, ou dos trajes que usará, mais tarde, durante grandes festas públicas,
e que ficam guardados no terreiro. [...] (BASTIDE, 1958, p.51)

Atualmente, é importante ressaltar que, mesmo havendo uma produção de roupas


dentro de uma determinada casa, os praticantes encontram variados pontos de
venda de objetos relacionados ao culto, dentre os quais se incluem as roupas.

Sobre as formas e padrões temos dois fatores determinantes: cor e textura, sendo a
cor o fator de maior observância por parte dos estudiosos. A cor está sempre
relacionado à força da natureza, ao orixá. O branco, relacionado ao orixá Oxalá, está
sempre presente nos ritos iniciais e também nos funerais. É a cor predominante no
candomblé. Está ligada a criação, a limpeza, ao fim (ou recomeço)

[...] A iaô ou as iaôs que acabam de ser feitas efetuam nessa noite três
aparições sucessivas, que condensam ou resumem simbolicamente o
conjunto cerimonial de iniciação. Na primeira aparição, elas vêm com
roupas comuns, lembrança do passado que acaba de ser abolido. Na
30

segunda, vestem-se de branco, recordando o momento em que novamente


foram criadas que, [...], se efetuou sob o signo de Oxalá. Na última,
finalmente, cada qual tem o traje litúrgico de seu próprio orixá, e constitui a
afirmação de que daí por diante, no interior da cabeça, está assentado
esse santo. [...]. (BASTIDE, 1958, p.56)

Mais especificamente sobre questões de cor e textura, fala Vagner Gonçalves da


Silva:

Na confecção da vestimenta dos orixás esta técnica se expressa em toda


sua amplitude, pois é preciso observar as cores a eles associadas (amarelo
para Oxum, vermelho e branco para Xangô, azul para Ogum, branco para
Oxalá), a textura e o material adequados (palha para Obaluaiê, tecido
rústico para Ogum, brilhante para os orixás femininos); as formas e
padrões que expressam as características das divindades como, por
exemplo, a da parte superior e inferior da vestimenta (saia mais curta para
os orixás masculinos e em forma de tiras para Xangô), entre inúmeros
outros itens. (SILVA, 2008, p.101)

Complementando a imagem transmitida pelas roupas temos as insígnias:


ferramentas de orixás, braceletes e outros adornos, mostrando que a indumentária
está fielmente agregada a outras representações:

As ferramentas ou insígnias mais do que compor as roupas dos orixás


tornaram-se espécie de símbolos metonímicos de sua identidade. São
uma espécie de emblema ou ícones exemplares por meio dos quais os
orixás são imediatamente identificados e associados aos seus domínios
básicos [...] (SILVA, 2008, p. 103)

No que tange às representações feitas de negras crioulas e das vestes dos cultos
afro-religiosos, temos nesses três expoentes analisados aqui (atentando para
existência de tantos outros) uma breve noção de comunicação e sentido visual
transmitido pelas indumentárias. Primeiramente, temos as gravuras de Jean Baptiste
Debret, pintor que viveu na França durante a segunda metade do século XVIII, e
recebeu o convite para vir ao Brasil – junto a outros artistas – desembarcando aqui
no início do século XIX (janeiro de 1816). Trouxe para terras brasileiras a arte
neoclássica, mas não deixou de notar a presença marcante dos negros que
circulavam pelas cidades, passando a representá-los por meio de litografia sobre
papel. Retratando a mulher e o homem negro, retratou conseguintemente suas
vestes, como aponta Maria da Conceição Barbosa Costa e Silva:

Os desenhos de Debret deram forma às variadas atividades


desempenhadas pela escrava, pela liberta e pela mestiça. As imagens
suscitam seu lado expansivo, seus momentos relaxantes. A
expressividade contida no rosto das dezenas de negros e negras que
pintou, transmite uma comunicação com o olhar do observador. É uma
variedade de faces, de trajes, de postura, de lugares. O artista primou no
enfocar a figuração, porém soube explorar muito bem o lado
31

cenográfico. [...] Um olhar investigador percebe a importância dada por


esse pintor ao documentar o vestuário e os tecidos usados. Vários foram
os modos de trajar que são encontrados nas aquarelas. Panos e matizes
são particularizados. [...] (SILVA, 2009,p.38)

Dessa forma, esses viajantes, em busca do exótico e pitoresco, deixaram aqui o


registro de suas experiências, antes do advento da fotografia. E sobre esse novo
advento e a forma de representação do negro fala Sofia Olszewski:

Quase todas as fotografias de mulheres negras encontradas, usavam trajes


típicos. O gênero ama-de-leite, com criança branca, foi fartamente
registrado em todo o Brasil. Estas mulheres que faziam parte integrante
da grande família patriarcal brasileira no século XIX. [...] O grande número,
porém, de fotografias foram de qualidade turística e documental. Com
poses artificialmente construídas, todas elas vestiam as saias rodadas
coloridas, batas decotadas e turbantes.” (OLSZEWSKI FILHA, 1989, p.72)

Apesar da crítica da autora sobre esse tipo de foto, considerando-as construções


deveras artificiais, podemos fazer as seguintes observações: se pousavam,
utilizavam suas melhores vestes e jóias; vestes, muito provavelmente, utilizadas em
festejos religiosos católicos e não-católicos; assim podemos entender e deduzir que
as roupas suntuosas utilizadas nas fotografias transitaram nessa época entre a zona
de prestigio social e religioso, e com passar do tempo, com as mudanças ocorridas
no meio social, passaram a circular no meandro sacro e ritualístico negro e afro-
descendente.

Por fim, falemos do modo de representação diferenciado; onde o objeto – no caso a


roupa – sai do seu meio de uso e significações para ocupar lugar nas montagens
expográficas das instituições museais. Para isso, utilizamos um pequeno trecho do
estudo desenvolvido pelo Professor Doutor Marcelo Bernardo Cunha:

[...] o discurso sobre as populações africanas e afro-brasileiras situa-se


sempre no pretérito, a cena e o fato são apresentados sem perspectiva
de continuidade, como se seus nexos tivessem sido deslaçados e
rompidos na continuidade histórica de tais povos e culturas. O afro-
brasileiro e o africano continuam sendo apresentados como pertencentes
a comunidades do passado, essencialmente a - históricos na concepção de
modernidade. Análises na perspectiva das dinâmicas histórico-culturais de
luta e resistência frente às seculares agressões ocidentais estão ausentes
dos discursos expográficos sobre África e sociedades da diáspora negra.
Em contrapartida, há questões que se dispõem de forma interessante na
sua exposição, como a busca pela fuga aos estereótipos, que são
comuns e recorrentes em narrativas deste tipo, como por exemplo, a
ênfase normalmente atribuída às indumentárias utilizadas pelos
iniciados durante as cerimônias de candomblé. [...] (CUNHA, 2006,
p.100). [Grifo nosso].
32

Nesse trecho, a ênfase dada às indumentárias utilizadas nas cerimônias afro-


religiosas nas exposições é criticada pelo autor; mas tirar essas peças da exposição
seria a questão? Ou seria necessário mudar o enfoque? Ou melhor, o adequado
seria não enfocar, e sim estabelecer meios e métodos de abordagem para que as
peças, nesse caso as vestes, comuniquem o seu vasto significado para o público
visitante dos espaços museais? A esse questionamento, temos alguns avanços,
algumas novas tentativas de abordagem:

[...] nos últimos anos, é possível observar a configuração de novos cenários


museológicos no tratamento e exposição de referenciais culturais africanos
e afro-brasileiros, entre eles a reestruturação do Museu Afro-Brasileiro da
Universidade Federal da Bahia, o surgimento do Museu AfroBrasil, em São
Paulo, o projeto de reestruturação do Museu da Abolição em Recife e o
projeto de criação do Museu Nacional de Cultura Afro-Brasileira, em
andamento em Salvador. Estas iniciativas podem ser encaradas como
desdobramentos dos debates iniciados já há alguns anos, pelas ações do
Movimento Negro e políticas afirmativas. (CUNHA, 2006, p.244).

Decerto não podemos esperar que os museus atualizem, permanentemente


os conteúdos de suas exposições, pois esta é tarefa impossível, seja qual
for o tema da exposição, pois as metodologias e práticas relacionas aos
museus requerem tempo e recursos que são próprios e específicos ao fazer
museológico, propiciando níveis próprios de fruição e maturação dos
conteúdos enfocados. No entanto, tal reconhecimento e necessidade não
pode eximir museus da responsabilidade de buscarem a atualização de
seus discursos, que devem estar em sintonia com o potencial das pesquisas
sobre os temas socialmente desenvolvidos e que estão relacionados às
instituições. Talvez seja o reconhecimento de tal compromisso e
necessidade de atualização que esteja levando a maioria das instituições
analisadas ao redimensionamento das suas metas e exposições. (CUNHA,
2006, p. 249).

A partir do trecho e ao longo de todo o texto podemos observar que houveram


mudanças contundentes no modo de tratar o culto afro-religiosos, suas significâncias
e significados, assim como na abordagem museográfica das instituições que
possuem tal acervo. Mudanças essas que possuem como uma das bases visual e
comunicativa os trajes.
33

5. CONSIDERAÇÕES E DESDOBRAMENTOS

As roupas que compõem as vestes litúrgicas dos orixás e mesmo aquelas


que os adeptos usam como parte da indumentária do terreiro constituem por
isso algumas das imagens mais populares da religião. [...] (SILVA, 2008, p.
101)

Seguindo os ritos do candomblé, a criança, ao nascer, tendo pais praticantes da


religião, deve ser apresentada à comunidade do terreiro. Para isso, dias após o seu
nascimento, a criança é envolvida em um pano-da-costa, especialmente preparado
para ocasião: lavado com folhas especiais, perfumado e devidamente incensado.
Envolta neste tecido, o recém-nascido recebe bênçãos especiais e os orixás que
cuidarão de sua proteção são saudados com cânticos e toques. Em uma cerimônia
funerária, como a descrita anteriormente por Roger Bastide, as roupas e outros
objetos pessoais do indivíduo falecido são “despachadas” em cerimônia e local
específicos. As roupas perpassam por todas as instâncias de um terreiro de
Candomblé; estão presentes no dia-a-dia dos praticantes e das atividades por eles
desenvolvidas. Como especificado por Vagner Gonçalves da Silva, as roupas estão
entre as imagens mais popularmente conhecidas quando se fala em culto afro-
religioso. Constam nos estudos de africanistas e antropólogos de trajetória e
trabalhos amplamente conhecidos. Foram representadas por viajantes do século
XVIII e XIX por artistas como Debret, por uma gama de fotógrafos viajantes que por
aqui passaram, e no século XX e XXI representada por Carybé em seus muitos
desenhos. É, hoje, também acervo museólgico. E com de todos esses predicados,
ainda continua a vestir e embelezar as filhas e filhos-de-santo; a ser utilizada nas
cerimônias e atividades cotidianas; a ser preparada, passada e engomada para as
festas. Enfim, como patrimônio cultural de caráter material e imaterial está em
constante movimento, continua sendo utilizado, passando, assim por modificações.

Tratamos aqui de algumas questões inerentes aos trajes do candomblé, por


entendermos que os mesmos são meios de comunicação, símbolos identitários,
reflexos de modificações sociais e do processo de crioulização da população negra,
objetos de estudo, fonte de inspiração para trabalhos artísticos, face ativa do
patrimônio cultural. A opção por não apresentar de forma figurativa – através de
imagens e trabalhos artísticos – o tema trabalhado foi intencional. Tal metodologia
poderá, sim, ser utilizada em escritos posteriores.
34

Trabalhamos aqui com autores de diferentes épocas. O pioneiro Nina Rodrigues


escreveu seu texto no início do século XX (1900); a obra de Manuel Querino com
prefácio de Arthur Ramos foi publicada em 1938; Pierre Verger publicou a primeira
edição de sua obra em 1957; já Bastide teve sua obra publicada em 1958; Sofia
Olszewski publica sua dissertação mais tardiamente já em 1989; Os artigos de
Reginaldo Prandi e Vagner Gonçalves Silva, assim como a Tese de Doutorado do
Professor Marcelo Bernardo Cunha são de 2001, 2008 e 2006, respectivamente;
sendo a obra mais recente a de Maria da Conceição Barbosa Costa e Silva escrita
para a série de Cadernos do IPAC, publicado em 2009. Trata-se, portando, de uma
miscelânea de textos que demonstram um pouco sobre o traje e o trajar no mundo
afro-religioso.

Voltamos, por fim, a reiterar o dito durante todo o desenrolar do texto: as


possibilidades de desdobramento do tema. As possibilidades de estudar outras
obras dos autores selecionados, ou focar em apenas em um autor especificamente;
em direcionar-se para os autores não citados; nos enfoques iconográficos; nas
fontes visuais: fotografias, pinturas e gravuras; um estudo de campo em um terreiro
específico. Aqui, como ocorre com grande parte das temáticas acadêmicas, não se
encerra um estudo; é sim um ponto de partida. Ainda há, sim, muito que dizer sobre
as roupas do povo-de-santo.
35

REFERÊNCIAS ANALISADAS

BASTIDE, Roger. As religiões Africanas no Brasil Contribuição a uma sociologia das


interpenetrações de civilizações. In: Apresentação do candomblé. 3ª ed. Livraria
Pioneira Editora. São Paulo. 1989.
CUNHA, Marcelo N. B. Teatro de memória, palco de esquecimentos: culturas
africanas e das diásporas negras nas exposições. 2006. 285f. Tese (Doutorado
em História) - Pontifica Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.
OLSZEWSKI FILHA, Sofia. A fotografia e o negro na cidade do Salvador.
Salvador: EGBA: Fundação Cultural do Estado da Bahia, 1989.
PRANDI, Reginaldo. O candomblé e o tempo: concepções de tempo, saber e
autoridade da África para as religiões afro-brasileiras. RBCS, V. 16, n 47, outubro/
2001.

QUERINO, Manuel. Costumes africanos no Brasil. In: A raça africana e seus


costumes na Bahia. 2 ed. Recife: FUNDAJ. Ed. Massangana, FUNARTE, 1988.
254p.

RODRIGUES, Raimundo Nina. O animismo fetichista dos negros bahianos. In:


Liturgia fetichista dos áfrico-baianos. Salvador, Reis & Comp., 1900. Reedição:
São Paulo, Civilização Brasileira, 1935.
SILVA, Maria Conceição Barbosa da Costa e Silva. Pano da Costa. In: O pano da
costa na representação dos viajantes: séculos XVII ao XIX. Salvador: IPAC.
Fundação Pedro Calmon, 2009.
SILVA, Vagner Gonçalves. Arte Religiosa Afro-Brasileira: as múltiplas estéticas
da devoção brasileira. Debates do NER, Porto Alegre. Ano 9. Número 13.
Janeiro/Junho 2008. p. 97-113.
VERGER, Pierre. Notas sobre o culto aos orixás e voduns. In: Iniciações e estados
de transe. Tradução de Carlos Eugênio Marcondes de Moura, do original de 1957.
São Paulo, Edusp, 1999.
36

OUTRAS REFERÊNCIAS

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contemporâneos. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. 320p.
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Tempostal. Salvador: P555 edições. 2006. 84p.
BASTIDE, Roger. O candomblé da Bahia: rito nagô. 3ª ed. São Paulo, Nacional,
1978.
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BAHIA, Governo do Estado. Secretaria de Cultura. IPAC. Festa da Boa Morte.
Salvador: IPAC. Fundação Pedro Calmon, 2009. 122p.
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