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Anais do II Colóquio Nacional Representações de Gênero e de Sexualidades – de 12 a 14 de julho de 2006

NOS BRAÇOS DE EROS: EROTISMO, SEXUALIDADE


E SENSUALIDADE
EM UNS BRAÇOS, DE MACHADO DE ASSIS

Marcelo Medeiros da Silva – UFCG

INTRODUÇÃO

Quão manso e amoroso


despertas em meu seio,
onde secretamente só tu moras;
e em teu saboroso,
de bem e de glória pleno,
quão delicadamente me enamoras!
Juan de la Cruz

Embora seja uma das temáticas bastante divulgadas na


atualidade, a sexualidade, durante séculos, foi vista como algo que
precisava ser combatido por meio do autocontrole, já que, sendo
uma pulsação básica em homens e mulheres, possuía um único
fim: a reprodução. Esquecia-se, assim, que ela, além da
reprodução, tinha – e continua tendo – como função contribuir
para que as pessoas pudessem ter uma vida sexual saudável e sem
conflito. Esse outro olhar contribuiu para que a sexualidade
deixasse de ser pensada como algo inato à natureza humana e
passasse a ser vista como algo construído sócio-historicamente,
tornando-se um assunto em voga, seja como objeto de estudos
científicos, seja como objeto de representação em discursos
literários (SILVA e DINIZ, 2004).
Como representação literária, a sexualidade visa não só
propiciar a excitação sexual como também representar uma das
mais antigas formas da experiência humana – o desejo sexual –,
uma vez que este é um fato natural que, conforme assinala
Bataille (1987), foi convertido em atividade erótica. Entretanto,
como adverte este autor, “a atividade sexual dos homens não é

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necessariamente erótica. Ela o é sempre que não for rudimentar,


que não for simplesmente animal” (1987: 28).
Para se desvencilhar da animalidade inicial e transformá-la
em atividade erótica, o homem teve de trabalhar, compreender
que morria; teve de passar da sexualidade livre à sexualidade
envergonhada, donde nasceu o erotismo, e esquecer que a
imposição de limites é um meio para a multiplicação dos desejos
lascivos mais obscuros, os quais, na maioria das vezes, devem,
para que a suposta ordem social seja mantida, estar sob a sombra
de interditos que, no entanto, não impediram que, em todas as
épocas da história da humanidade, existisse um interesse pelas
práticas e representações sexuais.
Entretanto, esse interesse não foi suficiente para
enobrecer o tema e “a representação erótica foi e ainda costuma
ser marotadamente colocada em nível das coisas não sérias (ou
demasiadamente sérias), rebaixada ao nível das manifestações
imorais, irrelevantes, apolíticas, menores, desagregadores,
perigosas, ou incentivadas até uma saturação restritiva”
(DURIGAN, 1985: 11). Em todas essas épocas, portanto, o
erotismo era algo de que não se falava ou de que se falava
somente em espaços restritos, o que o obrigou a refugiar-se no
domínio do implícito, do não-dito, das entrelinhas, do sussurro.
Estes, depois, passaram a ser tomados como suas características
absolutas, mas não impediram a manifestação dos ímpetos
sexuais, já que, de há muito, a humanidade se interessa por
saberes sobre o sexo, os quais foram registrados pelas mais
diversas formas de arte – sobretudo pela literatura.
No caso específico da literatura, o texto literário, há muito
tempo, é uma fonte inesgotável de ensinamento e encantamento
e, sendo erótico, ele passa a ser “um tecido, um espetáculo, uma
textura de relações significativas que no seu conjunto configura e
entrelaça papéis e características com a finalidade de mostrar uma
representação cultural, particular, singular da sexualidade”
(DURIGAN, 1985: 38). Esta, ao ser representada literariamente,
apresenta características singulares que dependem da época, dos
valores, dos grupos sociais, das particularidades do escritor, das

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características da cultura em que ela, a sexualidade, encontra-se


engendrada. Todavia, cabe ressaltarmos que não é apenas através
dos canais da sexualidade explícita que Eros se faz ouvir:

Aliás, o segredo de seu poder parece residir exatamente nessa


maleabilidade: o erotismo deriva de impulsos sexuais, mas é
capaz de ultrapassá-los e de se revelar mesmo em casos de
extrema sublimação dos impulsos sexuais.
[...] Afinal, como deus que varia e multiplica as espécies vivas,
Eros deve ser também múltiplo, vário em seu constante
movimento. Fugidio e subterrâneo, ele permanecerá
invulnerável aos controles e leis sociais: onde houver vida
humana, haverá sempre a ameaça da desordem erótica, a
promessa de resgate da totalidade perdida, o silêncio hipnótico
do deus (BRANCO, 1987: 14).

Sendo assim, os impulsos de Eros abrangem, ainda de


acordo com Branco (1987), as visões alucinadas dos místicos, o
canto dos poetas, as imagens abstratas de um pintor, o diálogo
uterino entre mãe e filho, os mitos sobre a criação e fim do
mundo, o que pode nos levar a ver o erotismo como um tema
que apresenta algumas variações, as quais vão do mero olhar, da
mais delicada sensualidade, do erotismo espiritual e mesmo
religioso, do relacionamento sexual específico e o sexo
propriamente dito, isto é, genital. Diante disso, é que, neste
trabalho, abordaremos apenas uma dessas variações: o erotismo
fino e sutil que a palavra sensualidade encobre. Esta, cumpre
esclarecermos, uma vez que, para não morrer, toma várias
formas, será, por causa disso, tomada no sentido comum: libido
sentiendi. Para tanto, mostraremos como ela, enquanto
representação do prazer/desejo, flui no conto Uns braços, ao qual
faremos referência utilizando-nos da sigla (UB) seguida do
número da página, de Machado de Assis, cuja obra é considerada
o epicentro da Literatura Brasileira e continua, como um veio
inesgotável, a despertar o interesse de pesquisadores.

O OLHAR SEDUZIDO POR UNS BRAÇOS

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Publicado em Várias histórias (1986), o conto Uns Braços se


desenvolve em torno da narração de um episódio – a
perturbadora revelação do amor na adolescência – da vida de
Inácio, jovem que se encantara pelos braços de D. Severina,
esposa do solicitador Borges, em cuja casa Inácio fora morar
porque seu pai, barbeiro na Cidade Nova, o queria pôr “de
agente, escrevente, ou quer que era, [...] com a esperança de vê-lo
no foro, porque lhe parecia que os procuradores de causa
ganhavam muito” (UB: 306). Noutras palavras, vivendo de favor
em um quarto nos fundos da casa do solicitador Borges, já que na
época em que o conto se passa, isto é, 1870, o favor de um
grande era o meio de acesso à vida social e a seus bens e, como
tal, “pratica a dependência da pessoa, a exceção à regra, a cultura
interessada, remuneração e serviços pessoais” (SCHWARZ, 2000:
17), Inácio – “cabeça inculta, mas bela, olhos de rapaz que sonha,
que advinha, que indaga, que quer saber e não acaba de saber
nada” (UB: 306) – é um jovem adolescente – “tinha quinze anos
feitos e bem-feitos” – que, diante do primeiro apelo da carne e do
sexo, se sente espantado, mas, ao mesmo tempo, agarrado e
acorrentado pelos braços de D. Severina, pois “nunca ele pôs os
olhos nos braços [dela] que se não esquecesse de si e de tudo”
(UB: 306).
Neste caso, a eroticidade/sensualidade é aguçada a partir
de estímulos sensoriais perceptíveis pelo olhar de Inácio. Este,
uma vez tendo mirado para os braços de D. Severina, foi
capturado por eles e, a partir daí, o seu sentimento erótico por ela
foi ativado, despertado, o que culmina na irrupção de um amor
que é cultivado em silêncio, mas que é a expressão da sexualidade
nascente de Inácio e da sexualidade já florescente de D. Severina.
Ou seja, se Inácio começa a ser iniciado no terreno nebuloso e
movediço de Eros, D. Severina se transformará, parafraseando
Meyer (1986), em fêmea, em um animal astuto e lascivo que está
em plena posse da técnica de seduzir, pois se encontra no
momento de sua maturação e, sendo assim, “atrai como para um

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desaguadouro o filete inquieto e sem profundidade da


sensualidade nascente” (FILHO, 1997: 163-164).
Uns Braços pode, portanto, ser visto como uma bonita
representação de como, em meio a uma sociedade marcada por
interditos, como era a sociedade no século XIX, pode se
configurar a sedução, esta que é, de acordo com Kehl (2003), um
jogo arriscado e fascinante cuja única possibilidade de empate se
chama amor. Este, por sua vez, no conto em estudo, é visto
como desejo não carnal, um desejo imerso nas águas do encanto
do corpo embora a presença sensual de D. Severina e a atração
que Inácio sente por ela sejam o fio tênue que não permite que o
amor dele se mantenha apenas como um simples estado de alma.
De qualquer forma, trata-se de um amor entre corpos separados,
um amor em silêncio que, talvez por isso mesmo, se apresenta,
principalmente para Inácio, como “um sentimento confuso, vago,
inquieto, que lhe doía e fazia bem, alguma coisa que deve sentir a
planta, quando abotoa a primeira flor. Tinha vontade de ir
embora e de ficar” (UB: 307).
Tal confusão, talvez, advenha do fato de Inácio estar
passando por uma fase crucial na vida de todo indivíduo – a
juventude –, já que ele contava apenas com quinze anos, idade
com que se inicia a passagem para essa fase que marca o início da
inserção definitiva do indivíduo na vida em sociedade e que,
como tal, é um momento de incertezas – “tinha vontade de ir
embora e de ficar” –, de procura, de aprendizado profissional,
militar ou erótico. Neste caso, a perturbação de Inácio vem,
sobretudo, do fato de ele estar experienciando esse aprendizado
erótico e de ter que esconder, reprimir tal aprendizado oriundo da
presença sensual dos braços de D. Severina. No entanto, isto não
impede que ele alimente um amor apaixonado em nome do qual
“agüentava toda a trabalheira de fora, toda a melancolia da
solidão e do silêncio, toda grosseria do patrão, pela única paga de
ver, três vezes por dia, o famoso par de braços” (UB: 308).
Inácio é tomado por um amor apaixonado que tem uma
qualidade de encantamento e que o coloca à parte das rotinas na
vida cotidiana, pois o envolvimento emocional com D. Severina é

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tão invasivo, tão forte que o leva a ignorar as suas obrigações e,


dessa forma, ele confunde “os papéis todos, erra a casa, vai a um
escrivão em vez de ir a outro, troca os advogados: é o diabo! É o
tal sono pesado e contínuo” (UB: 306), recebendo, por isso, do
solicitador Borges, um homem gritão e rude, “uma trovoada de
nomes, malandro, cabeça-de-vento, estúpido, maluco” (UB: 306).
Flechado por Eros, Inácio passa a ver D. Severina como
uma individualidade única e insubstituível, dotada de valor
absoluto e centro dos seus desejos lascivos nascentes. Inácio,
cada vez mais, se sente atraído pelo corpo, pela beleza física e
pelo fascínio que ela, mulher no momento de sua maturação, gera
nele e do qual ele não consegue escapar; e, pouco a pouco, o
narrador, ao apresentar D. Severina, insere, aqui e ali, umas
pitadas de erotismo, como se pode observar pela descrição dela
feita a partir de breves traços físicos:

Usava mangas curtas em todos os vestidos de casa, meio palmo


abaixo do ombro: dali em diante ficavam-lhe os braços à
amostra. Na verdade, eram belos e cheios, em harmonia com a
dona, que era antes grossa que fina, e não perdiam a cor nem a
maciez por viverem ao ar; mas é justo explicar que ela os não
trazia assim por faceira, senão porque já gastara todos os
vestidos de mangas compridas. De pé, era muito vistosa;
andando, tinha meneios engraçados; ele, entretanto, quase que
só a via à mesa, onde, além dos braços, mal poderia mirar-lhe o
busto. Não se pode dizer que era bonita; mas também não era
feia. Nenhum adorno; o próprio penteado consta de mui
pouco; alisou os cabelos, apanhou-os, atou-os e fixou-os. Ao
pescoço, um lenço escuro; nas orelhas, nada. Tudo isso com
vinte e sete anos floridos e sólidos (UB: 307).

Neste caso, os braços de D. Severina, bem à mostra, com


certa insistência tátil e visual matizada de fetichismo (MEYER,
1986), se torna quase uma obsessão para Inácio. E ele, sem poder
se acalmar nem se entender:

não estava bem em parte nenhuma. Acordava de noite,


pensando em D. Severina. Na rua, trocava de esquina, errava as
portas, muito mais que dantes, e não via mulher, ao longe ou

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ao perto, que lha não trouxesse à memória. Ao entrar no


corredor da casa, voltando do trabalho, sentia sempre algum
alvoroço, às vezes grande, quando dava com ela no topo da
escada, olhando através das grades de pau da cancela, como
tendo acudido a ver quem era (UB: 309).

Entretanto, quando se descobre desejada, D. Severina


passa a experienciar sentimentos ambíguos – espanto e satisfação
– que lhe trouxeram “uma complicação moral, que ela só
conheceu pelos efeitos, não achando meio de discernir o que era”
(UB: 308), pois ela não só se enleva com o fato de pressenti-lo
enamorado como também passa a desejá-lo: “E não era ela
bonita? Esta outra idéia não foi rejeitada, antes afagada e beijada”
(UB: 308), e inclusive chega a sonhar com ele: “Desde madrugada
que a figura do mocinho andava-lhe diante dos olhos como uma
tentação diabólica”. Diante dessa confusão de sentimentos, D.
Severina, para saber se é ou não desejada, “admitiu que se
iludisse, para o único fim de observá-lo melhor e averiguar bem a
realidade das coisas” (UB: 308). Ao agir assim, ela deseja poder
abandonar-se a uma doçura prolongada, pois “parecia fora do
natural, inquieta, quase maluca” e, por isso, resolve, ainda que por
um momento bastante efêmero, entregar-se àquele amor. Para
tanto, aproveitando-se do momento em que Inácio se encontrava
dormindo, ela, num dos momentos mais bonitos do conto, beija-
o:
Que não possamos ver os sonhos dos outros! D. Severina ter-
se-ia visto a si mesma na imaginação do rapaz; ter-se-ia visto
diante da rede, risonha e parada; depois inclinar-se, pegar-lhe
nas mãos, levá-las ao peito, cruzando ali os braços, os famosos
braços. Inácio, namorado deles, ainda assim ouvia as palavras
dela, que eram lindas, cálidas, principalmente novas – ou, pelo
menos, pertenciam a algum idioma que ele não conhecia, posto
que o entendesse. Duas, três e quatro vezes, a figura esvaía-se,
para tornar logo, vindo do mar ou de outra parte, entre
gaivotas, ou atravessando o corredor, com toda a graça robusta
de que era capaz. E tornando, inclinava-se, pegava-lhe outra
vez das mãos e cruzava ao peito os braços, até que, inclinando-
se, ainda mais, muito mais, abrochou os lábios e deixou-lhe um

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beijo na boca. Aqui o sonho coincidiu com a realidade, e as


mesmas bocas uniram-se na imaginação e fora dela (UB: 310).

Depois de beijar Inácio, D. Severina, vexada e medrosa,


recua e foge, pois “não acabava de crer que fizesse aquilo, parece
que embrulhara os seus desejos na idéia de que era uma criança
namorada que estava sem consciência nem imputação [...]” (UB:
311). Para evitar que a cena se repetisse, ela cobre-lhe os braços
com um xale e, dias depois, Inácio é demitido sem nem sequer se
despedir daquela que lhe alimentou os sonhos embriagados de
erotismo. Porém “o estrago já fora feito”, pois, embora não
pudesse manter uma relação amorosa concreta, D. Severina já
havia suscitado um desejo, um amor que não se acha, uma vez
que Inácio, depois do que aconteceu, pensa nela (“Como é que,
de repente... Tanto pensou que acabou supondo de sua parte
algum olhar indiscreto, alguma distração que a ofendera; não era
outra coisa [...]” (UB: 311)) e continuará a pensar nela muitos
anos depois, pois “através dos anos, por meio de outros amores,
mais afetivos e longos, nenhuma sensação achou nunca igual à
daquele domingo, na rua da Lapa, quando ele tinha quinze anos”
(UB: 311).
Neste caso, D. Severina, no lugar de correr o risco de
amar – como se isso fosse possível naquela época em que a
máscara social, índice das contradições profundas da sociedade
burguesa e capitalista, exigia que o amor se restringisse à
idealização da alma e supressão do corpo – preferiu, ao fugir, a
certeza de continuar sendo amada, pois, segundo Alberoni (1989),
a sedução feminina tende a produzir uma emoção erótica
indelével acendendo no homem o desejo como se acende uma
tocha. Assim, a sedução feminina, ao querer produzir o
enamoramento do homem, almeja ser lembrada e fazer-se
desejada; por isso age no presente, visando ao futuro. Noutras
palavras, para continuar a ser amada por Inácio, D. Severina
precisou afastar-se definitivamente dele, para que ele jamais
pudesse tê-la, produzindo nele um desejo que se renova, como
nostalgia, para sempre, pois, neste caso, a relação erótica foi

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luminosa, profunda e extasiante, por isso ficou impressa na


memória de Inácio.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Escrevendo em uma época em que a sexualidade era


encarcerada, quase muda, Machado de Assis constrói em Uns
Braços um mundo ficcional onde a sexualidade, o erotismo, a
sensualidade estão sob a égide do regime das reticências e dos
recalcamentos. Por isso, neste conto, assim como em grande
parte de sua obra, a sensualidade, uma das formas assumidas pela
sexualidade enquanto representação singular do erotismo,
aparentemente tão discreta, começa na penumbra dos seus
segundos planos e vai dar uma sombra insondável, pois ela “é
como um rio profundo que parece muito manso, a um golpe de
vista panorâmico, e não obstante, possui os seus segredos de
correnteza, os seus caprichos de redemoinhos, toda uma
acidentação de curso longo” (MEYER, 1986: 216).
No caso específico do conto estudado neste trabalho,
podemos dizer que nele Machado de Assis, ao tentar desvendar
“o enigma do amor”, verbaliza um erotismo encoberto pela
palavra sensualidade, percorrendo uma trajetória marcada pelo
silêncio e pela fugacidade, eis aí, talvez, a razão de Bosi et al.
(1982) afirmarem que Uns braços é um conto tecido a partir da
gratuidade da paixão, do desejo interdito, da verdade do sonho
oposta aos enganos da consciência vigilante.

BIBLIOGRAFIA

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BATAILLE, Georges. O erotismo. Trad. Antonio Carlos Viana.
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feminino na obra de Parente Cunha. João Pessoa: Editora da
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