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Tratado de Técnica

Operatória em
Neurocirurgia
Direitos reservados à Editora atheneu
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Neurologia e neurocirurgia
Outros livros
de interesse
Alvarez e Taub – Série Usando a Cabeça Vol. 1 Memória Lottenberg – A Saúde Brasileira Pode Dar Certo
Alves – Dicionário Médico Ilustrado Inglês-Português Magalhães – Ressonância Magnética no Sistema Nervoso Central
APM-SUS – O Que Você Precisa Saber sobre o Sistema Único de Saúde Marcopito Santos – Um Guia para o Leitor de Artigos Científicos na Área da Saúde
APM-SUS – Por Dentro do SUS Marlus – Tratamento Coadjuvante pela Hipnose
Araújo – Avaliação Clínico-Neurológica do Recém-Nascido Matthes – Epilepsia 2a ed.
Brandão Neto – Prescrição de Medicamentos em Enfermaria Medronho – Epidemiologia
Caixeta – Demências: Abordagem Multidisciplinar Mello – Exercícios Terapêuticos em Neurologia Infantil
Caramelli – Neuropsiquiatria Geriátrica Mello – Hipnose – Mecanismos Neuropsicofisiológicos e Suas Manifestações Clínicas
Carvalho, Lee e Mângia – Cuidados Neurológicos em Terapia Intensiva Pediátrica Morales – Terapias Avançadas – Células Tronco
CBC Kowalski – Afecções Cirúrgicas do Pescoço Moura Ribeiro e Gonçalves – Neurologia no Desenvolvimento da Criança
Coelho – Avaliação Neurológica Infantil nas Ações Primárias da Saúde (2 vols.) Nóbrega Manzano – Manual de Eletroneuromiografia e Potenciais Evocados Cerebrais para Prática
Decourt – A Didática Humanista de um Professor de Medicina Clínica
Diament e Cypel – Neurologia Infantil 4a ed. (2 vols.) Nitrini – A Neurologia Que Todo Médico Deve Saber 2a ed.
Doretto – Fisiopatologia Clínica do Sistema Nervoso – Fundamentos da Semiologia 2a ed. Novais – Como Ter Sucesso na Profissão Médica – Manual de Sobrevivência 3a ed.
Drummond – Dor – O Que Todo Médico Deve Saber Perrotti-Garcia – Curso de Inglês Médico
Drummond – Dor Aguda – Fisiopatologia, Clínica e Terapêutica Perrotti-Garcia – Dicionário Português-Inglês de Termos Médicos
Drummond – Medicina Baseada em Evidências 2a ed. Perrotti-Garcia – Grande Dicionário Ilustrado Inglês-Português de Termos Odontológicos e de
Ferraz – Série Neurologia – Diagnóstico e Tratamento – Doença de Parkinson Especialidades Médicas
Figueiró e Bertuol – Depressão em Medicina Interna e em Outras Condições Pinto – Neurofisiologia Clínica
Médicas – Depressões Secundárias Protásio da Luz – Nem Só de Ciência se Faz a Cura 2a ed.
Flehming – Texto e Atlas do Desenvolvimento Normal e seus Desvios no Reimão – Sono – Estudo Abrangente
Lactente – Diagnóstico e Tratamento do Nascimento até o 18o Mês Rodrigues – A Estimulação da Criança Especial em Casa – Um Guia de Orientação para os Pais de
Gesell – Psicologia do Desenvolvimento – Do Lactente e da Criança Pequena – Bases como Estimular a Atividade Neurológica e Motora
Neuropsicológicas e Comportamentais Sanvito – O Mundo das (Minhas) Reflexões
Goldenberg – Coluna: Ponto e Vírgula 7a ed. Sanvito – Propedêutica Neurológica Básica 5a ed.
Gottschal – Do Mito ao Pensamento Científico 2a ed. Sanvito – Série Neurologia – Diagnóstico e Tratamento
Herlon e Velasco – Emergências Clínicas Baseadas em Evidências Vol. 1 Tilbery – Esclerose Múltipla no Brasil – Aspectos Clínicos e Terapêuticos
Hospital Israelita Albert Einstein – Protocolos de Conduta do Hospital Israelita Albert Einstein Vol. 2 Ferraz – Doença de Parkinson – Prática Clínica e Terapêutica
Ivan Lemos – Dor Crônica – Diagnóstico, Pesquisa e Tratamento Sanvito – Síndromes Neurológicas 2a ed.
Jacobsen Teixeira – Dor – Manual para o Clínico Sanvito e Monzilo – O Livro de Cefaléias
Jatene – Medicina, Saúde e Sociedade Segre – A Questão Ética e a Saúde Humana
Julio Cruz – Neuroemergências Soc. Bras. Clínica Médica – Série Clínica Médica Ciência e Arte
Knobel – Memórias Agudas e Crônicas de uma UTI Lopes – Equilíbrio Ácido-Base e Hidroeletrolítico 2a ed. revista e atualizada
Knobel – Série Terapia Intensiva Vol. 3 Neurologia Valle – O Coma na Infância
Knobel – Terapia Intensiva – Neurologia (em espanhol) Vilela Ferraz – Dicionário de Ciências Biológicas e Biomédicas
Lemos – Dor Crônica Vincent – Internet – Guia para Profissionais da Saúde 2a ed.
Lent – Cem Bilhões de Neurônios – Conceitos Fundamentais de Neurociência Wajnsztejn – Patologias Neurológicas da Infância
Leonardo Caixeta – Demências: Abordagem Multidisciplinar Walter Tavares – Antibióticos e Quimioterápicos para o Clínico (Livro Texto e Livro Tabelas)
Levy – Reabilitação em Doenças Neurológicas Xenon – Xenon 2008 – O Livro de Concursos Médicos (2 vols.)
Lira Brandão – Psicofisiologia – As Bases Fisiológicas do Comportamento 2a ed. Zago Covas – Células-Tronco
Lopes – Clínica Médica – Equilíbrio Ácido-base e Distúrbio Hidroeletrolítico 2a ed.

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Tratado de Técnica
Operatória em
Neurocirurgia
Editores
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Professor livre-docente pela disciplina de Neurocirurgia do Departamento de Neurologia da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Neurocirurgião da equipe de emergência do
Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Hospital São Camilo, Hospital Santa Paula e Hospital Israelita Albert
Einstein, de São Paulo.

Apio Claudio Martins Antunes


Professor adjunto da disciplina de Neurocirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul (UFRGS). Chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital de Clínicas de Porto
Alegre, Rio Grande do Sul. Neurocirurgião do Serviço de Neurocirurgia Dr. Mario Coutinho do Hospital
Beneficência Portuguesa de Porto Alegre.

Hélio Rubens Machado


Professor titular de Neurocirurgia, coordenador do Setor de Neurocirurgia Pediátrica do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HC-FMRP-SP).

Ricardo Ramina
Diretor do Departamento de Neurocirurgia do Instituto de Neurologia de Curitiba. Professor do curso
de pós-graduação em Cirurgia da PUC-Pr. Presidente do capítulo de Base do Crânio da Federação
Latino-Americana de Neurocirurgia. Doutor em Neurociências pelo Departamento de Neurologia da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Manoel Jacobsen Teixeira


Professor titular da disciplina de Neurocirurgia do Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo (FMUSP). Diretor da Divisão da Neurocirurgia Funcional do Instituto de
Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.

José Carlos Esteves Veiga


Professor adjunto da disciplina de Neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa
de São Paulo (FCMSCSP). Chefe do Serviço de Neurocirurgia do Complexo Hospitalar Santa Casa de
Misericórdia de São Paulo. Doutor em Medicina pelo Departamento de Neurologia da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

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Direitos reservados à Editora atheneu

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EDITORA ATHENEU São Paulo — Rua Jesuíno Pascoal, 30
Tel.: (11) 2858-8750
Fax: (11) 2858-8766
E-mail: atheneu@atheneu.com.br

Rio de Janeiro — Rua Bambina, 74


Tel.: (21) 3094-1295
Fax: (21) 3094-1284
E-mail: atheneu@atheneu.com.br

Belo Horizonte — Rua Domingos Vieira, 319 — Conj. 1.104

Produção editorial: Sandra Regina Santana


Revisão: Lilian Garrafa

CRIAÇÃO/ELABORAÇÃO DE CD-ROM: Mauricio Ribeiro Borges (Doutorando e Mestre em Neurologia pela Universidade Federal do
Estado do Rio de Janeiro, UNIRIO).

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Tratado de técnica operatória em neurocirurgia / editores Paulo Henrique Pires


de Aguiar [et al.] . – São Paulo : Editora Atheneu, 2009.

Outros editores: Apio Claudio Martins Antunes, Hélio Rubens Machado,


Ricardo Ramina, Manoel Jacobsen Teixeira, José Carlos Esteves Veiga.

Bibliografia.
ISBN 978-85-388-0021-7

1. Neurocirurgia I. Aguiar, Paulo Henrique Pires de. II. Antunes, Apio


Claudio Martins. III.Machado, Hélio Rubens. IV. Veiga, Jose Carlos Esteves.
V. Teixeira, Manoel Jacobsen.

CDD-617.48
08-12259 NLM-WL 368
Índices para catálogo sistemático:
1. Neurocirurgia 617.48
2. Sistema nervoso 617.48

Aguiar, P.H.P.; Antunes, A.C.M.; Machado, H. R.; Ramina, R.; Teixeira, M. J.; Veiga, J.C.E.
Tratado de Técnica Operatória em Neurocirurgia
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Direitos reservados à Editora atheneu — São Paulo, Rio de Janeiro, Ribeirão Preto, Belo Horizonte, 2009
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Direitos reservados à Editora atheneu
Colaboradores

Albert L. Rhoton Jr.


Professor do Departamento de Cirurgia Neurológica da Universidade da Flórida, Gainesville, Flórida, Estados Unidos.

Alessandro Machado
Médico-residente do Serviço de Neurocirurgia Dr. Mario Coutinho do Hospital Beneficência Portuguesa de Porto Alegre.

Alexandros Theodoros Panagopoulos


Professor instrutor do Serviço de Neurocirurgia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo e responsável pelo Ambulatório
de Neuroncologia. Mestrado em Ciências pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP).
Neurocirurgião do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e Hospital São Camilo, São Paulo.

Américo Rubens Leite dos Santos


Doutor em Medicina. Professor instrutor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP). Médico-
assistente da disciplina de Neurocirurgia da Santa Casa de São Paulo. Neurocirurgião do Hospital Santa Isabel, São Paulo.

Andréa Sucena
Biomédica do Serviço de Neurofisiologia do Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo.

Andrei Fernandes Joaquim


Residente de Neurocirurgia pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM/Unicamp).

Anne E. Getz
Médica-assistente da Divisão de Rinologia do Departamento de Otorrinolaringologia e Cabeça e Pescoço da Universidade de
Stanford, Califórnia, Estados Unidos.

Antonio Carlos dos Santos


Professor-associado dos Setores de Imagem, Patologia e Neurocirurgia Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP).

Antônio João Tedesco Marchese


Professor-assistente da disciplina de Neurocirurgia do Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo (FMUSP). Médico neurocirurgião do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e Hospital Nove de Julho, São Paulo.

Antonio Nogueira Almeida


Médico-assistente doutor da Divisão de Clínica Neurocirúrgica do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). Neurocirurgião do Grupo de Tumores Encefálicos e Metástases da
Divisão de Clínica Neurocirúrgica do Instituto Central do HC-FMUSP. Neurocirurgião do Hospital São Joaquim da Real e
Benemérita Beneficência Portuguesa.

Ayrton Custódio Moreira


Professor titular da disciplina de Endocrinologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP).

Carlos Eduardo Barros Jucá


Médico-assistente da Divisão de Neurocirurgia Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão
Preto da Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP).
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Direitos reservados à Editora atheneu
Carlos Eduardo Martinelli
Professor-associado da disciplina de Endocrinologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP).

Carlos Henrique Ribeiro


Médico-assistente doutor do Serviço de Neurocirurgia do Hospital da Força Aérea do Galeão, Rio de Janeiro.

Carlos Umberto Pereira


Professor adjunto do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal de Sergipe (UFS).

Celso Agner
Professor-assistente do Departamento de Neurocirurgia da Universidade de Illinois, Chicago, Chicago/Provena St. Joseph’s
Medical Center, Joliet, IL., Estados Unidos.

Donizeti César Honorato


Professor adjunto da disciplina de Neurocirurgia do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp).

Eda Zanetti Guertzenstein


Médica psiquiatra do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(IPq-HC-FMUSP).

Eduardo Mello Rodrigues


Neurocirurgião do Hospital Centenário de São Leopoldo, Rio Grande do Sul.

Edward R. Laws
Professor de Neurocirurgia do Departamento de Neurocirurgia da Universidade de Harvard, Boston, Massachussetts, Estados
Unidos.

Eimir Perez-Arjona
Professor-assistente do Departamento de Neurocirurgia da Wayne State University, Detroit, Michigan, Estados Unidos.

Emiliano Vialle
Professor-assistente do Grupo de Cirurgia da Coluna, Hospital Universitário Cajuru, Pontifícia Universidade Católica do
Paraná (PUC-PR). Grupo de Cirurgia da Coluna, Hospital Ecoville, Curitiba, PR.

Erich Talamoni Fonoff


Médico neurocirurgião. Médico-assistente da Divisão de Neurologia Funcional do Instituto de Psiquiatria do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPq-HC-FMUSP). Neurocirurgião do Hospital Sírio-
Libanês, São Paulo.

Evandro de Oliveira
Professor-assistente do Departamento de Cirurgia Neurológica da Universidade da Flórida, Gainsville, Flórida, Estados
Unidos. Professor-assistente do Departamento de Neurocirurgia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Diretor
do Instituto de Ciências Neurológicas de São Paulo.

Fabio Veiga Sparapani


Médico-assistente doutor da disciplina de Neurocirurgia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Doutor em
Neurociências pelo Departamento de Neurologia da Universidade de São Paulo (USP).

Fátima Griz
Médica-assistente do Serviço de Neurocirurgia do Hospital da Restauração, Recife, PE.

Fernando Campos Gomes Pinto


Médico-assistente doutor do Grupo de Neurocirurgia Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). Doutorando em Ciências pela FMUSP. Médico-assistente do Serviço de
Neurocirurgia do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo. Chefe do Grupo de Hidrodinâmica da Divisão de
Neurocirurgia do HC-FMUSP.

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Flávio Key Miura
Médico-assistente doutor da Divisão de Clínica Neurocirúrgica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). Professor instrutor do Serviço de Neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas
da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP). Neurocirurgião do Hospital Sírio-Libanês e Hospital Santa Cruz de São Paulo.

Gabriel Kuhl
Professor adjunto da disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS).

Gilberto Machado de Almeida


Professor de Neurocirurgia pelo Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(FMUSP). Diretor do Serviço de Neurocirurgia do Hospital Nove de Julho, São Paulo.

Guido Nikkhah
Professor titular de Neurocirurgia dos Departamentos de Neurocirurgia e de Neurocirurgia Funcional e Estereotaxia da
Universidade Albert Ludwig, Freiburg Bresgau, Baden Wurtemberg, Alemanha.

Guilherme Borges
Professor-associado da disciplina de Neurocirurgia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Guilherme Lepski
Medico supervisor do Departamento de Neurocirurgia da Universidade de Tubingen, Alemanha.

Gustavo Novelino Simão


Médico-assistente dos Setores de Imagem, Patologia e Neurocirurgia Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP).

Gustavo Rassier Isolan


Neurocirurgião-assistente doutor do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (HC-UFRGS).
Professor da pós-graduação do Departamento de Cirurgia da UFRGS. Neurocirurgião do Hospital Cajuru de Curitiba.
Professor da pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).

Hector Navarro Cabrera


Médico neurocirurgião-assistente supervisor das Enfermarias da Divisão de Neurocirurgia Funcional do Instituto de Psiquiatria
do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPq-HC-FMUSP). Neurocirurgião do
Hospital Israelita Albert Einstein e Hospital Sírio-Libanês, São Paulo.

Helder Tedeschi
Professor-assistente do Departamento de Cirurgia Neurológica da Universidade da Flórida, Gainsville, Flórida, Estados Unidos.
Professor-assistente do Departamento de Neurocirurgia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Neurocirurgião
do Instituto de Ciências Neurológicas de São Paulo.

Helder Zambelli
Neurocirurgião chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital Regional de Sumaré da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp). Neurocirurgião infantil da disciplina de Neurocirurgia do Hospital de Clínicas da Unicamp. Neurocirurgião do
Grupo de Pesquisas em Medicina Fetal pela Unicamp. Professor pleno da pós-graduação do Departamento de Pediatria da
Unicamp.

Hen Park
Pesquisador médico da Universidade Wayne State, Biomechanics Laboratory, Detroit, Michigan, Estados Unidos.

Igor de Castro
Médico-assistente do Serviço de Neurocirurgia do Hospital da Força Aérea do Galeão, Rio de Janeiro.

Jefferson Walter Daniel


Professor instrutor da disciplina de Neurocirurgia do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa
Casa de São Paulo (FCMSCSP). Médico-assistente do Serviço de Neurocirurgia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.

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Jerônimo Buzetti Milano
Neurocirurgião-assistente do Instituto de Neurologia de Curitiba, PR. Doutorando em Neurociências do Departamento de
Neurologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

João Jarney Maniglia


Professor de Otorrinolaringologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Otorrinolaringologista do Instituto de
Neurologia de Curitiba, PR.

Jorge Luiz Kraemer


Neurocirurgião-assistente doutor do Serviço de Neurocirurgia da Santa Casa de Porto Alegre. Vice-presidente da Sociedade Brasileira
de Neurocirurgia. Doutor em Medicina pela disciplina de Neurocirurgia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Jorge R. Paschoal
Neurocirurgião-assistente do Instituto Neurológico de Curitiba, PR.

José Alberto Landeiro


Chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital da Força Aérea do Galeão, Rio de Janeiro. Professor adjunto da disciplina de
Neurocirurgia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Rio de Janeiro.

José Arnaldo Motta de Arruda


Neurocirurgião-assistente doutor do Serviço de Neurologia do Hospital Universitário Walter Cantídio da Faculdade de Medicina
da Universidade Federal do Ceará (UFC). Doutor em Neurocirurgia pela disciplina de Neurocirurgia da Universidade Federal
de São Paulo (Unifesp).

José Cláudio Marinho da Nóbrega


Mestre em Neurocirurgia e Neurocirurgião-assistente do Serviço de Neurocirurgia Funcional do Instituto de Psiquiatria do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPq-HC-FMUSP).

Juan Antonio Castro Flores


Neurocirurgião-assistente do Serviço de Neurocirurgia Funcional do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPq-HC-FMUSP). Professor instrutor do Serviço de Neurocirurgia da
Faculdade de Ciências Medicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP). Médico-assistente do Serviço de Neurocirurgia do
Hospital do Servidor Público Estadual.

Leonidas Quintana Marín


Professor titular de Neurocirurgia da Universidade de Valparaiso, Chile. Presidente da Federação Latino-Americana de
Neurocirurgia. Coordenador do Capítulo de Neurocirurgia Vascular da FLANC.

Leopoldo N. Pfeilsticker
Otorrinolaringologista do Departamento de Otorrinolaringologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Neurocirurgião-assistente do Instituto Neurológico de Curitiba.

Luciano Neder
Professor-associado dos Setores de Imagem, Patologia e Neurocirurgia Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP).

Luis Renato Mello


Mestre e doutor em Neurocirurgia pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Professor titular de Neurocirurgia
da Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB). Chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital Santa Isabel,
Blumenau, SC.

Luiz Fernando Pinheiro Franco


Professor doutor pela disciplina de Neurocirurgia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Presidente da Academia
de Medicina de São Paulo. Presidente do Capítulo de Neurocirurgia do Estado de São Paulo pela Academia Brasileira de
Neurocirurgia.

Luiz Roberto Vialle


Professor-assistente do Grupo de Cirurgia da Coluna, Hospital Universitário Cajuru, Pontifícia Universidade Católica do
Paraná (PUC-PR). Grupo de Cirurgia da Coluna, Instituto de Neurologia de Curitiba, Hospital Ecoville, Curitiba, PR.
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Manuel Dujovny
Professor de Neurocirurgia da Universidade Wayne, Detroit, Michigan, Estados Unidos.

Marco Aurélio Marzullo


Coordenador da Comissão de Aperfeiçoamento da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia. Diretor Geral do Hospital
da Beneficência Portuguesa de Petrópolis. Chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital da Beneficência Portuguesa de
Petrópolis, RJ.

Marcos Vinícius Calfat Maldaun


Médico-assistente doutor da Divisão de Clínica Neurocirúrgica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). Coordenador do Grupo de Tumores Encefálicos e Metástases da Divisão de Clínica
Neurocirúrgica do HC-FMUSP. Neurocirurgião do Hospital Sírio-Libanês.

Margareth de Castro
Disciplina de Endocrinologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
(HC-FMRP-USP).

Maria Elvira Borges Calazans


Advogada. Doutoranda na área de Direito Internacional da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).
Assessora jurídica, voluntária do Grupo de Dor da Divisão de Clínica Neurológica das Unidades Médicas e de Apoio e do
Instituto Central do Departamento de Neurologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.

Mário Alberto Lapenta


Medico neurocirurgião do Serviço de Neurocirurgia do Hospital da Força Aérea do Galeão, Rio de Janeiro.

Mario Octavio Lourenzi


In memoriam – Professor-assistente da Divisão de Neurocirurgia Funcional do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPq-HC-FMUSP). Neurocirurgião do Instituto Neurológico de São
Paulo e do Hospital da Real e Benemérita Beneficência Portuguesa de São Paulo, Hospital São Joaquim, SP.

Mario Pena Dias


Médico-assistente da Divisão de Clínica Neurocirúrgica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo (HC-FMUSP), Grupo de Neurocirurgia de Coluna Vertebral. Neurocirurgião da Real e Benemérita Beneficência
Portuguesa, Hospital São Joaquim, SP.

Marlo Steiner Flores


Neurocirurgião-assistente do Serviço de Neurocirurgia do Hospital da Força Aérea do Galeão, Rio de Janeiro.

Maurício Coelho Neto


Neurocirurgião-assistente do Instituto Neurológico de Curitiba, PR. Coordenador do Grupo de Neuroncologia do Instituto
Neurológico de Curitiba, PR.

Mauro A. Tostes Ferreira


Neurocirurgião-assistente doutor do Hospital Madre Tereza de Belo Horizonte. Membro-associado do Departamento de
Neurocirurgia do Barrow Neurological Institut, Fenix, Arizona, Estados Unidos.

Michelle Lavinski
Otorrinolaringologista. Fellow em Rinologia, Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, RS.

Milton Hikaru Toita


Médico-assistente e preceptor da disciplina de Neurocirurgia do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas
da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP).

Nelson de Azambuja Pereira Filho


Neurocirurgião do Serviço de Neurocirurgia Dr. Mario Coutinho do Hospital Beneficência Portuguesa de Porto Alegre, RS.

Nelson Saade
Professor instrutor da disciplina de Neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP).
Médico coordenador da Neurotraumatologia do Serviço de Neurocirurgia, São Paulo.
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Oswaldo Ignacio Tella Junior
Professor livre-docente pela disciplina de Neurocirurgia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Neurocirurgião do
Hospital Samaritano e Gastroclínica de São Paulo.

Paulo Sergio S. de Cerqueira Dias


Médico-assistente do Serviço de Neurocirurgia de Emergência da Divisão de Clínica Neurocirúrgica do Hospital das Clínicas
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP).

Pedro Augustto de Santana Júnior


In memoriam – Neurocirurgião-assistente do Grupo de Tumores Encefálicos e Metástases, do Pronto-Socorro e da Unidade
de Terapia Intensiva Neurológica da Divisão de Clínica Neurocirúrgica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). Neurocirurgião da Clínica de Neurologia e Neurocirurgia Pinheiros, dos Hospitais
Santa Paula, São Camilo e Sírio-Libanês, São Paulo.

Peter Hwang
Médico-assistente da Divisão de Rinologia do Departamento de Otorrinolaringologia e Cabeça e Pescoço da Universidade de
Stanford, Califórnia, Estados Unidos.

Ricardo Fontes
Neurocirurgião Preceptor da disciplina de Neurocirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
Fellowship pelo Departamento de Neurocirurgia da Universidade de Iowa, Estados Unidos.

Ricardo Santos de Oliveira


Médico-assistente do Setor de Neurocirurgia Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto
da Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP).

Roger Schmidt Brock


Médico-assistente do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP).
Neurocirurgião da Equipe DFV Neuro, São Paulo.

Rui Ferreira
Neurocirurgião do Hospital da Restauração de Recife, PE.

Sebastião Gusmão
Professor titular de Neurocirurgia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professor-associado da Universidade
de Amiens, França.

Sérgio Rosenberg
Professor-associado do Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

Silvia Mazzali-Verst
Médica fisiatra. Doutoranda em Neurocirurgia pelo Departamento de Neurocirurgia do Hospital das Clínicas da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP).

Sonir Roberto Rauber Antonini


Médico-assistente da disciplina de Endocrinologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP).

Starlynn Freire dos Santos


Residente de Neurocirurgia do Departamento de Neurologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (HC-FMUSP).

Tae Mo Chung
Médico Fisiatra Assistente na Divisão de Medicina de Reabilitação do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (HC-FMUSP).

Tatiana Tanaka
Acadêmica de Medicina da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

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Tobias Alécio Mattei
Médico-residente em Neurocirurgia do Instituto de Neurologia de Curitiba, PR.

Valter Ângelo Cescato


Médico neurocirurgião. Diretor técnico de Divisão da Neurologia Funcional do Instituto de Psiquiatria do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPq-HC-FMUSP).

Vera Cristina Terra Bustamante


Médica-assistente de Neurofisiologia do Centro de Cirurgia de Epilepsia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina
de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP).

Vinícius Monteiro de Paula Guirado


Médico neurocirurgião do Hospital Estadual de Francisco Moratto, São Paulo.

Wen Hung Tzu


Médico-assistente doutor da Divisão de Neurocirurgia Funcional do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). Professor-assistente do Departamento de Cirurgia Neurológica da Universidade da
Flórida, Gainsville, Flórida, Estados Unidos. Doutor em Neurociências pelo Departamento de Neurologia da USP.

Yvens Barbosa Fernandes


Médico-assistente doutor do Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Diretor do Serviço
de Neurocirurgia do Hospital Mario Gatti de Campinas. Doutor em Neurociências pelo Departamento de Neurologia da
Unicamp.

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Dedicatória

Aos pacientes, que são nosso objetivo final e razão profissional de vida.
A todos aqueles cujos sintomas ajudamos a melhorar,
àqueles em que conseguimos ter a percepção de cura
e àqueles que infelizmente faleceram ou ficaram sequelados,
apesar de nossos esforços e preces

Agradecimentos

Nossos mais sinceros agradecimentos ao Dr. Paulo Rzezinski, diretor-médico da Editora Atheneu
que sempre confiou na realização desta obra e em sua importância para a neurocirurgia brasileira
e que, sem dúvida, demonstrou uma sensibilidade ímpar ao se entusiasmar com os capítulos aqui
desenvolvidos.
À excepcional produtora editorial Sandra Regina Santana, que esteve ao nosso lado capítulo
a capítulo, corrigindo, sugerindo, implementando, demonstrando sua competência e capacidade
profissional.
 À secretária do Instituto Neurológico de Curitiba, Marli Uchiro, que, sempre quando solicitada,
nos enviou as correções e as alterações de capítulos necessárias ao desenvolvimento desta obra.
À Dra. Renata Faria Simm, neurologista  que elaborou parte da correção bibliográfica e nos
auxiliou com críticas e sugestões.
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Direitos reservados à Editora atheneu
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Prefácio

Tratado de Técnica Operatória em Neurocirurgia é um livro de grande amplitude de informações que


busca auxiliar a formação dos neurocirurgiões jovens com uma linguagem simples e iconografias adequadas
para tal proposta.
Em uma sequência diferente da maioria dos livros de neurocirurgia, procura estabelecer posições de
importância equidistantes entre suas várias subespecialidades, contemplando epilepsia como primeiro módulo e
neurocirurgia funcional como o último, porém com ênfase, em cada um dos capítulos, no diagnóstico, na técnica
cirúrgica e nas complicações do tratamento. Tópicos em neuroncologia, cirurgia de base do crânio, coluna, sistema
nervoso periférico e neurocirurgia vascular também foram discutidos e mostrados neste tratado.
Nos capítulos escritos por autores do exterior, procuramos manter a língua nativa, no caso espanhol e
inglês, de forma a respeitar com fidelidade o seu pensamento, evitando erros de tradução, conceitos, definições
e do texto propriamente dito, lembrando também que o espanhol e o inglês são línguas de conhecimento básico
do neurocirurgião brasileiro.
A distribuição dos capítulos procurou alcançar profissionais de diferentes regiões do país e seus estados
(Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Sergipe, Pernambuco,
Ceará, entre outros), em que a riqueza de experiências de cada um dos autores pôde ser explorada e transmitida
ao longo destas páginas.
Trata-se de uma obra ímpar na esfera nacional que possui como um dos seus principais objetivos a atualização
contínua mediante novas edições e que certamente servirá de permanente base de consultas para a comunidade
neurocirúrgica deste país.

São Paulo, Junho de 2009.


Paulo Henrique Pires de Aguiar

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Direitos reservados à Editora atheneu
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Apresentação

The book edited by Paulo Henrique Aguiar, Ricardo Ramina and colleagues represents a major step in
the Luso-Hispanic literature in neurosurgery. It is an excellent compilation of chapters written in a clear and
complete manner by the individual authors, who have spent a great effort to present difficult concepts in a
concise and yet complete and thorough manner. The book entirely written in clear Portuguese is a major step
in the development of the Latin American Scientific literature in Neurosurgery.
The book is divided in clear and well organized sections which the authors call modules. As such, each
module is composed of groups of neurosurgical conditions divided in chapters which are very intelligently
grouped together to present clinical concepts with similar backgrounds, and present the reader with a clearly
written sequence of clinical conditions, diagnostic procedures, surgical alternatives, expected outcomes, and
potential complications.
Module one is dedicated to the various aspects pertinent to epilepsy, its surgical evaluation, and possible
surgical alternatives. A detailed review of the surgical techniques which go from the very simple temporal
lobectomy for partial complex seizures to the very complicated process of a hemispherectomy for patients with
intractable seizures caused by a clearly abnormal and non functional hemisphere is given in great detail. The
module is well illustrated with drawings and anatomical specimens to review the various approaches used in
selective brain resections to treat epilepsy. The surgical management of adult and pediatric epilepsy management
is made, emphasizing the differences in evaluation and treatment needed for pediatric patients. The module
concludes with an in depth review of the selective use of callosotomies and stimulation procedures including
peripheral vagal nerve stimulators as well as central deep nuclei stimulating devices placed stereotactically.
Module two is dedicated to vascular diseases. A review of the pathophysiology and clinical presentation
of patients with a spontaneous intraparenchymal hematoma is given with a concise and logical approach to
the management of the patient. It is noted that not all patients need to or should be operated on just because a
hematoma is found. A non operative approach is still a surgical option for these unfortunate patients. A review
of the techniques of surgical decompression for unilateral hemispheric edema secondary to a unilateral ischemic
process is given with emphasis for prompt intervention once the diagnosis is made, and the importance of a
wide decompression to prevent further venous compromise. The module includes a review of the concepts
needed to perform a carotid endarterectomy for patients with extracranial carotid artery disease, including the
historical background and highlighting the benefit of surgery over non surgical or endovascular procedures.
Their description presents a clearly detailed step by step process used for a safe endarterectomy, presented
with clear surgical diagrams and intraoperative procedures. An analysis of the management of postoperative
complications and their avoidance is well presented. A detailed review of the management of all intracranial
arteriovenous malformations is given with emphasis on the difficult surgical aspects that are present in some
of these patients, which can be compounded by the surgical techniques chosen.
A clear and elegant review of the presentation and evaluation of patients with giant and complex intracranial
aneurysms, and their possible management including direct clipping, intracranial aneurysm resection with direct
vascular reconstruction, and supplemental management with low and high flow intracranial to extracranial
anastomosis is given with clear illustrations, and excellent diagnostic studies using state of the art imaging
techniques. A thorough review of the surgical management of patients with distal basilar aneurysms follows
with a detailed anatomical review of the region including an analysis of the various perforating arteries, and
their relationship to the surgical anatomy. The presentation is clearly illustrated with acrylic infused anatomical
specimens, contrasted with equivalent intraoperative photographs. The various surgical corridors are reviewed
with special attention given to the various potential complications encountered with the different approaches.
A review of the use of high flow intracranial to extracranial anastomosis for the treatment of giant intracranial
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aneurysms is presented with clearly illustrative anatomical and surgical photographs of the procedure,
complemented by conventional angiography and CT angiography. No significant effort is made to contrast the
benefits of surgery over endovascular procedures. The module is completed with an excellent review of Moya-
Moya disease, including its clinical presentation, evaluation, medical and surgical management.
Module three reviews the various approaches to skull base surgery and emphasizes the need for a clear
anatomical understanding needed to perform any of the very difficult skull base approaches reviewed. The
authors present an elegant review of the evaluation and management of patients with petroclival tumors
including meningiomas, and their various approaches, emphasizing potential surgical complications that may
be encountered in their management and how to avoid them. They then review the management of patients
with cavernous sinus lesions, and with acoustic shwanomas, including the surgical and non surgical alternatives
such as radiosurgery. They highlight the great technical improvements achieved in the surgical management of
patients with skull base tumors which have resulted from the use of microsurgical techniques, complemented by
an exhaustive understanding of the anatomy of the skull base. The authors point out that to date the only truly
curative approach to some of these problems is surgical, but recognize the difficulty of achieving a total resection
of some of the lesion found on these patients, and agree that radiosurgery may complement their management.
Module four is dedicated to a review of the surgical management of gliomas and metastatic intracranial
tumors. An excellent review is given of the state of the art imaging techniques available to complement
the evaluation of these patients including functional magnetic resonance and anatomical tractography.
A detailed analysis of the surgical techniques is given, including the use of various approaches such as awake
craniotomies, electrocorticography, intraoperative tractography, ultrasound, and neuro-navigation techniques.
The authors clearly point out that the management of patients with malignant lesions remains a vexing problem
to the surgeon, since the survival of many of these patients is still very limited, but point out the need for an
aggressive approach including the use of chemotherapy and radiation to maximize the patient’s survival.
Module five is dedicated to pediatric neurosurgery. A clear review of modern approaches to treat
craniosynostosis is given, including suture decompression, cranial advancement techniques, and cranial
remodeling through surgical and nonsurgical means. A clear review of the various dysraphic states is presented,
illustrated with excellent drawings, imaging studies and anatomical specimens. The reader is clearly made
aware of the severity of many of these lesions, and the great limitations that still present the neurosurgeon with
unsolved problems. Emphasis needs to be made in the value of pre-partum evaluation and counseling for some
of these unfortunate families.
Module six is dedicated to the management of spinal problems. An excellent review of intervertebral
disc disease of the lumbar and cervical spine is presented, emphasizing the need for detailed preoperative
evaluation including clinical and psychological analysis, diagnostic techniques, non-operative intervention
through multiple means such as physiotherapy, muscle reconditioning, biofeedback, epidural injections, facet
blocks, and drug management. Surgical techniques are reviewed including microdiscectomy, decompression
for spinal stenosis, anterior and posterior fusion techniques, and arthroplasty. Non conventional approaches
such as laser and radiofrequency lesions are reviewed in comparison to the other alternatives. An excellent
review is presented of the various fusion techniques used for the cervical, thoracic and lumbar spine, to treat
patients with developmental scoliosis, degenerative problems of the spine, trauma and metastatic disease of
the spine. All aspects of instrumentation are clearly reviewed, illustrated, and presented, with attention to the
possible complications that may be encountered and their prevention.
Module seven is dedicated to the treatment of peripheral nerves and their surgical management. A clear
presentation of the management of carpal tunnel syndrome is given emphasizing open and minimally invasive
approaches. Treatment of other peripheral nerve problems is presented including the use of decompressions,
neurolysis, end to end anastomosis, simple and complex grafting techniques. The module is somewhat
limited, and does not go into detail in some of the more complex approaches including alternative sources for
reconstruction from regions other than the one affected.
Module eight presents a review of the surgical treatment of neuro-trauma. An extensive review of the
management of post traumatic spinal fluid fistulas is given, noting the various possible alternatives in their
management. A limitation on this review is the lack of any illustrative material to emphasize the excellent
description presented. A clear review of the need to evaluate and treat aggressively the patient with sudden post
traumatic visual loss is presented, reviewing the anatomical basis for the treatment, and the various surgical
alternatives available. Post traumatic chronic subdural hematomas, and acute intracerebral hematomas are
reviewed with attention to the need for rapid assessment and treatment.

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Module nine reviews some technical advances in monitoring and surgical techniques. A review of
intracranial pressure management is presented directed to the patients with intracranial hypertension following
trauma, subarachnoid hemorrhage, cerebral ischemia and some intracranial tumor and inflammatory problems.
An excellent review of the basic technique to place a ventricular catheter is given, with illustrations that should
be used to teach those who are not familiar with the technique. Intraoperative monitoring with somatosensory,
motor, and visual evoked potentials are presented in the context of aiding the surgeon to perform safer surgery.
The reader needs to be aware of the limitations of these procedures and the potential for false positive and
false negative results that may complicate the operative approach. Endoscopic techniques for treatment of
hydrocephalus, and pituitary tumors are presented. More emphasis is needed for the obvious requirement
of additional training in this biplane surgical environment which is not familiar to most neurosurgeons. An
interesting review of a minimally invasive cranioplasty is presented.
Module ten presents the surgical management of pain and functional disorders. Psychosurgery is discussed
with a detailed review of the various surgical techniques used, and their indications in this controversial aspect
of surgery. A very nice review of the clinical and surgical management of spasticity is presented with attention
given especially to the evaluation process needed for these complicated patients. A clear description of surgical
alternatives for the treatment of spasticity is presented, highlighting the benefits and potential complications that
can arise with these techniques. A masterful review of the surgical treatment of Parkinson’s disease completes
the module, with attention to the highly sophisticated diagnostic techniques needed for the surgical planning,
the use of ablative and stimulation techniques as well as the potential benefit of neuro-transplantation.
Overall, this book is an excellent addition to the library of any Latin American neurosurgeon. It presents
the reader with a well coordinated review of the many aspects of current neurosurgery, analyses the most
common problems seen by any neurosurgeon in a manner that is intelligible, easy to read, clear and complete.
The book provides neurosurgeons in Latin America with a state of the art review of topics which is presented
in a very competitive and articulate manner by all the contributors, and which is on par with any neurosurgical
text currently available. The authors of these chapters should be complemented for an outstanding review of
the material.

Fernando G. Diaz, MD, Ph.D


Chairman Neurological Surgery
Beaumont Hospitals
Royal Oak, Michigan, USA

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Apresentação

The Editors should be complimented for putting together such a comprehensive text of operative neuro-
surgery. They were able to secure the collaboration of the experts in each particular area that happened to be
also the most eminent neurosurgeons in Brazil today.
I have enjoyed reading the different chapters that I found particularly informative. They are clearly writ-
ten; the review of the pertinent literature is balanced and insightful; the discussion of the treatment philosophy
is methodical and very helpful.
The radiological images, the anatomical dissections, the intra-operative pictures and the drawing are of
excellent quality and particularly effective in illustrating the various topics. Even the charts detailing the treat-
ment choices were clear, easy to understand and useful in clinical practice.
In summary, this is an excellent textbook that should be considered a worthy companion for the student
and the practicing neurosurgeon.

Daniele Rigamonti, MD, FACS


Salisbury Family Professor of Neurosurgery,
Vice Chairman Department of Neurosurgery
Director Stereotactic Radiosurgery
Director Hydrocephalus Program
The Johns Hopkins Hospital,
Johns Hopkins Medical Education, Baltimore, Maryland

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Apresentação

É com grande satisfação que me cabe apresentar este livro de Neurocirurgia que aborda, de maneira
bastante abrangente, os mais variados capítulos da nossa rica especialidade e mostra contundentemente que
a Neurocirurgia brasileira está muito bem representada nos seus diversos segmentos. Tenho certeza de que o
presente trabalho se prestará tanto para o aprendizado de residentes como para a atualização de neurocirurgiões
já experientes no assunto. Os autores conseguiram reunir nesta edição clareza e abrangência, ao mesmo tempo
com textos muito bem ilustrados, o que torna a leitura bastante agradável.
Faço votos de que a presente obra contribua para o implemento da formação profissional no Brasil.

Marcos Tatagiba, MD, Ph.D


Chairman and Director
Department of Neurosurgery
Eberhard Karls University Tuebingen
Tubingen, Germany

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Apresentação

En este libro excepcional escrito con una objetividad sorprendente, editado por Paulo Henrique Pires de
Aguiar, Apio Claudio Martins Antunes, Hélio Rubens Machado, Ricardo Ramina, Manoel Jacobsen Teixeira e
José Carlos Esteves Veiga se pone de manifiesto el nivel alcanzado por de la neurocirugía brasileña que es un
orgullo para todos nosotros como latinoamericanos.
En efecto estos queridos colegas a los cuales aprecio y admiro desde hace muchos años han sido sin duda
las personas indicadas para llevar adelante una tarea laboriosa como es la publicación de este libro indispensa-
ble. Han sabido además rodearse de los mejores para dar a luz una obra que sin duda representa en idioma por-
tugués un hito que combina los conocimientos más modernos con la evidencia como basamento y desarrollo a
lo largo de los diferentes capítulos.
Es un libro bien escrito, bien ilustrado y bien documentado como debe ser un tratado dedicado funda-
mentalmente a los jóvenes colegas en formación pero también un texto de consulta para aquellos que quieran
actualizarse en los modernos conceptos de nuestra especialidad.
Estoy seguro que los especialistas en todas las disciplinas relacionadas con la patología quirúrgica del
sistema nervioso y por que no, los clínicos y cirujanos en general, le darán la mejor bienvenida a esta obra que
llena un vacío en la literatura medica en lengua portuguesa.

Prof. Dr. Armando Basso


Director Instituto de Neurociencias
Facultad de Medicina Universidad de Buenos Ayres
Ex Presidente de la Federación Mundial
de Sociedades de Neurocirugía (WFNS)

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Sumário

VolumeParte
1 1
Epilepsia

1 Hemisferectomias: Análise Crítica das Técnicas, 3


Wen Hung Tzu

2 Tratamento Cirúrgico da Epilepsia na Infância, 15


Vera Cristina Terra Bustamante
Hélio Rubens Machado

3 Tratamento Cirúrgico da Epilepsia do Lobo Temporal: Indicações e Técnicas, 27


Wen Hung Tzu

4 Calosotomia, 41
Antonio Nogueira Almeida

5 Técnicas de Estimulação do Sistema Nervoso para o Tratamento das Epilepsias, 45


Antonio Nogueira Almeida

Parte 2
Neurocirurgia Vascular

6 Hematomas Intraparenquimatosos Espontâneos, 51


Jorge Luiz Kraemer

7 Técnica da Descompressão Cirúrgica no Tratamento de Isquemia Cerebral no Território


da Artéria Cerebral Média, 57
Paulo Henrique Pires de Aguiar

8 Endarterectomia de Artéria Carótida Cervical: Considerações Técnicas, 63


Apio Claudio Martins Antunes
Eduardo Mello Rodrigues

9 Angiomas Cerebrais, 73
Gilberto Machado de Almeida

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10 Tratamento Cirúrgico dos Aneurismas da Circulação Anterior, 83
Paulo Henrique Pires de Aguiar

11 Aneurismas Paraclinóideos, 117


José Alberto Landeiro
Igor de Castro
Sebastião Gusmão
Mário Alberto Lapenta
Marlo Steiner Flores

12 Aneurismas Gigantes e Complexos, 127


Helder Tedeschi
Mario Octavio Lourenzi
Evandro de Oliveira

13 Aneurismas Basilares Distais, 137


Helder Tedeschi
Mauro A. Tostes Ferreira
Evandro de Oliveira
Albert L. Rhoton Jr.

14 Anastomose de Alto Fluxo Extra-intracraniana no Tratamento de Aneurismas


Complexos, 153
Juan Antonio Castro Flores

15 Tratamiento Quirúrgico de la Enfermedad Moyamoya, 161


Leonidas Quintana Marín

Parte 3
Cirurgia de Base do Crânio

16 Tratamento Cirúrgico dos Tumores Hipofisários, 177


Apio Claudio Martins Antunes
Oswaldo Ignacio Tella Junior

17 Tumores Petroclivais – Diagnóstico, Tratamento e Resultados, 191


Ricardo Ramina
Yvens Barbosa Fernandes
Maurício Coelho Neto
Guilherme Borges
Donizeti César Honorato

18 Tratamento Cirúrgico das Lesões do Seio Cavernoso, 205


Ricardo Ramina
Yvens Barbosa Fernandes
Maurício Coelho Neto
Donizeti César Honorato
Guilherme Borges

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19 Schwanoma do Nervo Vestibular – Diagnóstico e Tratamento, 217
Ricardo Ramina
Maurício Coelho Neto
Yvens Barbosa Fernandes
Guilherme Borges
João Jarney Maniglia

20 Tratamento Cirúrgico dos Schwanomas do Nervo Trigêmeo, 231


Paulo Henrique Pires de Aguiar
Alexandros Theodoros Panagopoulos

21 Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas do Forame Magno, 243


Paulo Henrique Pires de Aguiar
Ricardo Fontes
Gustavo Rassier Isolan

22 Tratamento Cirúrgico dos Tumores do Forame Jugular, 257


Ricardo Ramina
João Jarney Maniglia
Yvens Barbosa Fernandes
Jorge R. Paschoal
Maurício Coelho Neto
Leopoldo N. Pfeilsticker

23 Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas de Goteira Olfativa, 271


Paulo Henrique Pires de Aguiar
Antonio Nogueira Almeida

24 Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas do Tubérculo e Diafragma Selar, 287


Paulo Henrique Pires de Aguiar
Antonio Nogueira Almeida

25 Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas com Origem na Asa do Osso Esfenóide, 297
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Gustavo Rassier Isolan

26 Abordagem Neurocirúrgica da Base Anterior do Crânio, 313


Apio Claudio Martins Antunes
Nelson de Azambuja Pereira Filho
Alessandro Machado
Gabriel Kuhl
Michelle Lavinski

27 Técnicas de Ressecção da Odontóide: Abordagem Transoral, 325


José Alberto Landeiro
Igor de Castro
Marlo Steiner Flores
Carlos Henrique Ribeiro

28 Tratamento Cirúrgico das Malformações de Chiari, 333


José Arnaldo Motta de Arruda

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Parte 4
INFLAMAÇÕES E NEOPLASIAS EM NEUROCIRURGIA
29 Cirurgia dos Gliomas de Baixo Grau de Malignidade, 347
Alexandros Theodoros Panagopoulos
José Carlos Esteves Veiga

30 Gliomas Malignos: Aspectos Cirúrgicos, 355


Marcos Vinícius Calfat Maldaun
Paulo Henrique Pires de Aguiar

31 Tratamento Cirúrgico das Metástases Cerebrais, 365


José Carlos Esteves Veiga
Alexandros Theodoros Panagopoulus
Marcos Vinícius Calfat Maldaun
Paulo Henrique Pires de Aguiar

32 Técnica Cirúrgica do Implante de Câmara de Ommaya para Instilação de Quimioterápicos


no Espaço Liquórico para Tratamento de Carcinomatose Meníngea, 373
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Marcos Vinícius Calfat Maldaun
Alexandros Theodoros Panagopoulus

33 Tratamento Cirúrgico dos Tumores Epidermóides, 377


Paulo Henrique Pires de Aguiar
Hector Navarro Cabrera

34 Tratamento Cirúrgico dos Tumores das Regiões Pineal e Posterior do Terceiro


Ventrículo, 391
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Hector Navarro Cabrera
Antonio Nogueira Almeida

35 Tratamento Cirúrgico dos Tumores da Fossa Posterior, 403


Pedro Augustto de Santana Júnior
Paulo Henrique Pires de Aguiar

36 Meningiomas de Convexidade, 411


Luis Renato Mello

37 Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas Parassagitais, 423


Pedro Augustto de Santana Júnior
Paulo Henrique Pires de Aguiar

38 Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas Falcinos, 429


Pedro Augustto de Santana Júnior
Paulo Henrique Pires de Aguiar

39 Meningioma Torcular e Peritorcular, 437


Marco Aurélio Marzullo

40 Abscesso Cerebral, 445


Carlos Umberto Pereira
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Parte 5
NEUROCIRURGIA PEDIáTRICA

41 Craniossinostose Precoce, 455


Ricardo Santos de Oliveira
Hélio Rubens Machado

42 Malformações Congênitas: Correlação entre Exames de Imagem e Anatomia


Patológica, 473
Gustavo Novelino Simão
Hélio Rubens Machado
Ricardo Santos de Oliveira
Luciano Neder
Antonio Carlos dos Santos

43 Derivação Ventriculoperitoneal, 485


Fernando Campos Gomes Pinto
Tatiana Tanaka

44 Tratamento Cirúrgico das Craniossinostoses, 491


Helder Zambelli
Paulo Henrique Pires de Aguiar

45 Tratamento Cirúrgico da Mielomeningocele, 501


Helder Zambelli
Marcos Vinícius Calfat Maldaun

46 Craniofaringiomas na Infância, 505


Carlos Eduardo Barros Jucá
Ricardo Santos de Oliveira
Carlos Eduardo Martinelli
Sonir Roberto Rauber Antonini
Margareth de Castro
Ayrton Custódio Moreira
Hélio Rubens Machado

Parte 6
NEUROCIRURGIA DA COLUNA VERTEBRAL E MEDULA ESPINHAL

47 Hérnia do Disco Lombar, 515


Jefferson Walter Daniel
José Carlos Esteves Veiga

48 Acesso Cirúrgico Anterior às Hérnias de Disco Cervicais, 555


Mario Pena Dias

49 Estenose do Canal Lombar, 563


Jerônimo Buzetti Milano

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50 Instrumentação da Coluna Vertebral, 573
Luiz Roberto Vialle
Emiliano Vialle

51 Tratamento Cirúrgico das Metástases da Coluna Vertebral, 595


Marcos Vinícius Calfat Maldaun
Helder Zambelli

52 Infiltração Perirradicular Percutânea, 605


Luiz Fernando Pinheiro Franco

Parte 7
NEUROCIRURGIA DOS NERVOS PERIFÉRICOS

53 Síndrome do Túnel do Carpo, 613


Fabio Veiga Sparapani

54 Técnicas Cirúrgicas para Nervos Periféricos, 621


Guilherme Lepski
Guido Nikkhah
Antônio João Tedesco Marchese

55 Compressão do Nervo Ulnar no Cotovelo, 629


Fátima Griz
Rui Ferreira

Parte 8
NEUROCIRURGIA NO TRAUMATISMO CRANIOENCEFÁLICO

56 Fístulas Liquóricas, 635


Flávio Key Miura
Vinícius Monteiro de Paula Guirado

57 Descompressão Neurovascular do Nervo Óptico nas Lesões Traumáticas, 651


Tobias Alécio Mattei
Paulo Henrique Pires de Aguiar

58 Hematoma Subdural Crônico – Técnicas Cirúrgicas, 659


Paulo Sergio S. de Cerqueira Dias
Roger Schmidt Brock

59 Hematomas Intracranianos Traumáticos Agudos, 667


Helder Zambelli
Marcos Vinícius Calfat Maldaun
Andrei Fernandes Joaquim

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Parte 9
AVANÇOS TÉCNICOS EM NEUROCIRURGIA

60 Terceiro-ventriculocisternostomia Endoscópica, 673


Américo Rubens Leite dos Santos

61 Hidrocefalia, 679
Milton Hikaru Toita
Jose Carlos Esteves Veiga

62 Monitoração da Pressão Intracraniana, 685


Nelson Saade
José Carlos Esteves Veiga

63 Cranioplastia Minimamente Invasiva, 693


Celso Agner
Manuel Dujovny
Hen Park
Eimir Perez-Arjona

64 Monitoração Neurofisiológica Intra-operatória, 697


Silvia Mazzali-Verst
Tae Mo Chung
Andréa Sucena

65 Endoscopic Endonasal Approach for Treatment of Pituitary Adenomas, 705


Edward R. Laws
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Anne E. Getz
Peter Hwang

Parte 10
Neurocirurgia Funcional e da Dor

66 Tratamento Cirúrgico dos Transtornos Psiquiátricos, 717


Manoel Jacobsen Teixeira
Erich Talamoni Fonoff
Eda Zanetti Guertzenstein
Maria Elvira Borges Calazans

67 Tratamento Neurocirúrgico da Espasticidade, 723


Manoel Jacobsen Teixeira
Erich Talamoni Fonoff

68 Tratamento Cirúrgico da Doença de Parkinson, 735


Manoel Jacobsen Teixeira
Erich Talamoni Fonoff

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69 Tratamento Cirúrgico da Dor Oncológica, 751
Manoel Jacobsen Teixeira

70 Tratotomia de Lissauer e Lesão do Corno Posterior da Substância Cinzenta da Medula


Espinhal, 767
Manoel Jacobsen Teixeira

71 Técnicas de Biópsia Estereotática das Lesões Encefálicas, 775


Manoel Jacobsen Teixeira
Valter Ângelo Cescato
Starlynn Freire dos Santos
Sérgio Rosenberg

72 Neuroestimulação no Tratamento da Dor, 781


Manoel Jacobsen Teixeira

73 Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico, 793


Manoel Jacobsen Teixeira

74 Radiocirurgia Intersticial para Tumores Cerebrais, 817


Guilherme Lepski
Manoel Jacobsen Teixeira

75 Tratamento Neurocirúrgico Funcional das Dores Faciais, 823


Manoel Jacobsen Teixeira
José Cláudio Marinho da Nóbrega

Índice Remissivo, 843

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Parte 1
Epilepsia

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Hemisferectomias
Análise Crítica das Técnicas
Wen Hung Tzu

Introdução dores de hemiplegia infantil e epilepsia refratária2.


Desde então a hemisferectomia tem sido aplicada em

A
excisão ou desconexão de um hemisfério para pacientes que apresentam convulsão, hemiplegia ou
controle de convulsões farmacologicamente hemiparesia grave com a mão não funcionante e he-
incontroláveis em pacientes que apresentam mianopsia.
anormalidade hemisférica difusa unilateral teve iní- Várias etiologias estão relacionadas a essa lesão
cio em 1938 com o neurocirurgião canadense Ken- hemisférica unilateral: hemimegalencefalia, síndro-
neth McKenzie1. Entretanto esse procedimento pas- me de hemiconvulsão-hemiplegia-epilepsia, distúr-
sou a ganhar maior popularidade somente a partir de bios de desenvolvimento cortical extenso, seqüelas
1950, com a publicação dos resultados animadores de isquemias extensas, seqüelas de meningite, sín­
de hemisferectomias realizadas pelo neurocirurgião drome de Sturge-Weber e síndrome de Rasmussen
sul-africano R. A. Krynauw em 12 pacientes porta- (Fig. 1.1A a C).

A B C

Fig. 1.1 – Exemplos de patologias associadas à síndrome epiléptica hemisférica que freqüentemente requerem a hemisferectomia.
(A) Síndrome de Rasmussen acometendo o hemisfério cerebral direito em paciente feminino de 11 anos. (B) Seqüela de isquemia
neonatal acometendo o território da artéria cerebral média direita em paciente masculino de 17 anos. (C) Hemimegalencefalia em pa-
ciente feminino de 4 anos.

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3
Parte 1 – Epilepsia

As principais modalidades cirúrgicas utilizadas parte da drenagem venosa até a fase final da cirurgia,
para ressecção do hemisfério acometido são: hemis- quando então as veias são sacrificadas.
ferectomia anatômica, hemidecorticação e hemisfe- Procede-se à abertura das cisternas carotídeas, das
rectomia funcional e suas variantes3-13. lâminas terminal e sylviana. Além de drenar liquor das
Entre 1950 e meados da década de 1970, a técnica cisternas basais e promover relaxamento do cérebro,
cirúrgica predominante foi a hemisferectomia ana- as artérias carótida interna, cerebral anterior e cere-
tômica, com a ressecção de quase todo o hemisfério bral média são dissecadas e identificadas nesta etapa
acometido, deixando intacta apenas a porção central da cirurgia. O trato olfatório ipsilateral é coagulado e
do hemisfério. cortado. A artéria cerebral média é isolada e clipada
A seguir serão descritas as técnicas cirúrgicas de após o seu joelho (ao nível de M2) (Fig. 1.3), com o
hemisferectomia mais utilizadas atualmente. objetivo de preservar as artérias lentículo-estriadas la-
terais que se originam da parede posterior ou superior
Hemisferectomia anatômica do segmento M1 e se destinam ao núcleo central do
clássica hemisfério cerebral já referido anteriormente.
A etapa seguinte é a dissecção da artéria cerebral
O posicionamento e a incisão cirúrgica do pacien- anterior, que pode ser realizada seguindo a A1, iden-
te são demonstrados na Fig. 1.2. Após craniotomia tificada na etapa anterior, abertura da fissura inter-
fronto-têmporo-parietal e abertura dural, há exposi- hemisférica ainda por via pterional, identificação do
ção ampla do hemisfério cerebral. complexo comunicante anterior e, finalmente, iden-
Existem várias maneiras para remoção de prati-
camente todo o hemisfério cerebral, preservando-se
o núcleo central do hemisfério, constituído por gân-
glios da base, tálamo e as cápsulas interna, externa e
extrema14-16. Porém o princípio comum entre as di-
ferentes técnicas para remover o tecido cerebral é a
interrupção precoce do suprimento arterial, seguida
de ressecção do tecido cerebral, preservando a maior

Fig. 1.3 – Disseccão anatômica com abertura da fissura syl-


viana e exposição da artéria cerebral média esquerda. A ponta
da seta indica o local da clipagem da artéria cerebral média,
distal à origem das artérias lentículo-estriadas. 1 = trato olfa-
tório esquerdo; 2 = nervo óptico esquerdo; 3 = artéria cerebral
anterior esquerda (A1); 4 = artéria carótida interna supracli-
Fig. 1.2 – Posicionamento e incisão cirúrgica adotados na nóidea esquerda; 5 = lobo temporal esquerdo; 6 = ínsula; 7 =
hemisferectomia anatômica. giro de Heschl.

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1 – Hemisferectomias Análise Crítica das Técnicas

tificação do segmento A2 ipsilateral e sua clipagem


após a origem da artéria recorrente de Heubner (em
78% dos casos tal artéria nasce na porção proximal do
A2, logo após o complexo comunicante anterior)17. A
artéria cerebral anterior também pode ser identificada
ao dissecar-se a porção anterior da fissura inter-he-
misférica, retraindo-se a convexidade do lobo frontal,
separando-a inicialmente da foice; depois procede-se
à separação dos dois giros do cíngulo e à identifica-
ção da artéria cerebral anterior ipsilateral (segmento
A3, ao nível do joelho do corpo caloso), que é isola-
da e clipada antes da emissão da artéria calosomargi-
nal. Ao se retrair o lobo frontal separando-o da foice,
freqüentemente há necessidade de sacrificar algumas Fig. 1.5 – Vista medial e basal do hemisfério cerebral direi-
veias em ponte que drenam a convexidade frontal ao to. A seta demonstra o local da clipagem da artéria cerebral
posterior. 1 = pré-cúneo 2 = istmo do cíngulo 3 = sulco e
seio sagital superior (Fig. 1.4). artéria parietoccipital 4 = sulco e artéria calcarina 5 = artérias
O passo seguinte é a abordagem subtemporal, com temporais inferiores
elevação do lobo temporal, dissecção e clipagem da
artéria cerebral posterior, entre os segmentos P3 e P4
(na transição entre o trajeto na cisterna quadrigeminal
e sua entrada no sulco calcarino anterior), após a ar- medialmente à artéria pericalosa contralateral, desde
téria cerebral posterior ter emitido ramos importantes o joelho até o esplênio, acessando, assim, o corno
para o mesencéfalo e o tálamo. A abordagem da arté- frontal, o corpo e a porção superior do átrio do ven-
ria cerebral posterior também pode ser realizada com trículo ipsilateral. Geralmente se coloca um cotonói-
a ressecção do lobo temporal segundo a técnica des- de no forame de Monro ipsilateral para evitar que o
crita no capítulo 3, e a artéria cerebral posterior então sangue passe do ventrículo ipsilateral para o terceiro
pode ser clipada e coagulada entre seus segmentos P3 ventrículo ou para o ventrículo lateral contralateral.
e P4 (Fig. 1.5). O septo pelúcido é mantido intacto, evitando também
Em todas as etapas procura-se preservar a drena- a passagem de sangue para o ventrículo contralateral.
gem venosa. Após abrir o ventrículo lateral, cria-se um plano de
Após a ligadura das três principais artérias do dissecção a partir do ângulo formado pelo corpo ca-
cérebro, procede-se à ressecção do tecido cerebral: loso e a cabeça do núcleo caudado no corno frontal e
os lobos frontal e parietal são retraídos para expor a pelo ângulo formado entre o corpo caloso e o tálamo
fissura inter-hemisférica e o corpo caloso é exposto no corpo e no átrio do ventrículo lateral. A dissecção
desde o joelho até o esplênio. A artéria pericalosa prossegue em direção à fissura sylviana, medialmente
contralateral é protegida e a calosotomia é realizada aos ramos M2 da artéria cerebral média (Fig. 1.6).

Fig. 1.4 – Face medial do hemifério cerebral direito, corte sa- Fig. 1.6 – Vista coronal do cérebro. A linha tracejada demons-
gital. A seta preta indica o local da clipagem da artéria cerebral tra o trajeto da desconexão na hemisferectomia anatômica. 1 =
anterior por via inter-hemisférica, e a seta branca indica o local da giro do cíngulo; 2 = corpo caloso; 3 = corpo do caudado; 4 =
clipagem da artéria cerebral anterior por via pterional. 1 = lóbulo tálamo; 5 = ínsula, fissura sylviana e artéria cerebral média; 6 =
paracentral; 2 = giro frontal superior; 3 = giro do cíngulo; 4 = núcleo lentiforme; 7 = coluna do fórnice; 8 = comissura anterior;
corpo do corpo caloso; 5 = fórnice; 6 = giro reto. 9 = artéria carótida interna supraclinóidea.

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Parte 1 – Epilepsia

A ressecção na região frontal é realizada no nível paresia congênita, oclusão da artéria cerebral média,
do rostro do corpo caloso, à frente da cabeça do núcleo Sturge-Weber, pós-trauma ou pós-infeccão. Di Roc-
caudado, em direção à asa menor do osso esfenóide. co relata nunca haver casos de hemossiderose na sua
A ressecção da porção posterior do hemisfério cere- série e questiona se essa complicação tardia descrita
bral pode ser realizada seguindo-se a fissura coróidea. historicamente seria realmente decorrente do fenô-
A resseção do lobo temporal também pode ser realiza- meno de hemossiderose tardia ou seriam casos de hi-
da seguindo-se a técnica descrita no capítulo 3. drocefalia pós-operatória de difícil diagnóstico numa
era pré-tomografia. Esse mesmo autor recomenda a
técnica de hemisferectomia anatômica, porque, após
Comentário a década de 1970, não houve mais registro sobre he-
Trata-se de procedimento altamente eficaz quando mossiderose como complicação pós-operatória de he-
a origem das crises está restrita a um hemisfério cere- misferectomia anatômica. Ele também argumenta que
bral; 81% a 85% dos pacientes ficam livres de crises seria muito difícil comparar os pacientes operados há
ou têm redução significativa na freqüência destas7,18. 50 anos com os atuais, em razão do progresso ocorri-
Entretanto a ressecção extensa de tecido cerebral do na técnica cirúrgica, nos equipamentos cirúrgicos,
apresenta algumas complicações que levaram muitos na hemostasia, no uso de microscópio cirúrgico, me-
serviços neurocirúrgicos a abandonarem essa técnica lhoria no cuidado pós-operatório etc.
a partir da década de 1970. O autor (WHT) compartilha da mesma opinião, na
As complicações decorrentes da hemisferectomia série pessoal de 17 casos submetidos à hemisferec-
anatômica começaram a ser publicadas a partir da tomia ou hemisferotomia: tanto o êxito (controle das
década de 196019,20. A principal complicação, a he- crises) quanto o aparecimento de hidrocefalias pós-
mossiderose cerebral superficial, que foi inicialmen- operatórias são bastante dependentes da etiologia das
te descrita por Noetzel em 194021, ocorria em 15% a crises e não dependentes da técnica utilizada, tendo a
30% dos casos, dependendo da série8. A hemosside- hemimegalencefalia os piores resultados cirúrgicos.
rose cerebral superficial caracteriza-se clinicamente Outras séries mais recentes de hemisferecto­mias
pelos sinais de aumento da pressão intracraniana e anatômicas também não relataram com­pli­cações13,18,23.
deterioração progressiva do estado neurológico que Adams3 introduziu a modificação técnica visando
ocorria tardiamente, geralmente 4 anos ou mais de- reduzir o espaço subdural, suturando a dura na foice,
pois da hemisferectomia anatômica. A hemossidero- no tentório, no assoalho das fossas anterior e média.
se cerebral superficial é atribuída a pequenas, porém Também introduziu a colocação de um pedaço de mús-
numerosas, hemorragias agudas ou crônicas, prove- culo no forame de Monro ipsilateral, com o objetivo
nientes de capilares frágeis presentes na membrana de isolar a cavidade subdural do sistema ventricular.
subdural que “atapeta” o espaço subdural, tendo sido
considerada a responsável pela deterioração neuro- Hemisferectomia funcional ou
lógica tardia e óbito em alguns casos. Essas peque- hemisferectomia funcionalmente
nas hemorragias podem ser causadas por pequenos total, porém anatomicamente subtotal
traumas cranianos ou por aumentos fisiológicos da
pressão intracraniana, como ocorre na ocasião da De modo resumido, a técnica de hemisferectomia
tosse e evacuação. funcional consiste em: promover desconexão de todo
o tecido cerebral localizado à frente do joelho do cor-
Na série de Montreal, esse tipo de complicação po caloso, e outra do tecido cerebral localizado atrás
ocorreu em 25% a 30% dos casos, raramente antes do esplênio do corpo caloso; remover todo o tecido
dos 3,5 anos de pós-operatório, podendo ocorrer até cerebral localizado entre essas duas linhas de desco-
25 anos depois da cirurgia. Rasmussen reportou esse nexão acima da ínsula e acima das artérias pericalosas
tipo de complicação em 11 dos 31 pacientes operados associadas à remoção do lobo temporal.
entre 1952 e 1968. Dos 11 pacientes, 5 faleceram ape- Como o fenômeno de aumento tardio da pressão
sar da derivação, 3 ficaram com seqüelas adicionais intracraniana foi atribuído à presença de um grande
apesar do tratamento e 3 permaneceram inalterados espaço subdural causado pela remoção extensa de te-
após o tratamento. De acordo com Rasmussen, essa cido cerebral, a partir da década de 1970 foi desen-
complicação tardia é explicada pelo acúmulo gra­dual volvida pelo Dr. Theodore Rasmussen a técnica de
de fluido com alto teor de ferro na cavidade criada hemisferectomia funcional, visando atingir a mesma
pela ressecção extensa de tecido cerebral. eficácia de uma hemisferectomia anatômica, porém
De acordo com Di Rocco e Ianelli22, a hemisfe- preservando-se mais tecido cerebral.
rectomia anatômica não está associada a maior mor- A descrição clássica da técnica de hemisferecto-
bidade. A ocorrência de hidrocefalia pós-operatória mia funcional é a seguinte:
depende mais da patologia, havendo maior incidên- O posicionamento é o mesmo da hemisferectomia
cia em hemimegalencefalia do que os casos de hemi- anatômica e a incisão é em formato de “U”, estando

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1 – Hemisferectomias Análise Crítica das Técnicas

uma das “pernas” do “U” localizada na linha media- próxima à fissura sylviana e, depois, é aprofundada em
na. Realiza-se craniotomia fronto-têmporo-parietal ex- direção à ínsula. A incisão continua ao redor da ponta
tensa. Após a abertura dural, procede-se à coagulação do lobo temporal e do unco; a incisão no giro temporal
dos vasos e à remoção dos opérculos frontal, central superior é estendida posteriormente até a incisão pa-
e parietal (Fig. 1.7). A incisão, então, é aprofundada rietal posterior e, depois, desce em direção à porção
com o aspirador até expor a ínsula. Depois é estendida inferior do lobo temporal. Prossegue-se com a incisão
superiormente através dos lobos frontal e parietal em anteriormente até se encontrar a outra incisão cortical
direção à linha mediana. Nesta etapa freqüentemente na ponta do temporal. Geralmente nessa fase abre-se o
se abre o ventrículo lateral, em especial quando este corno temporal do ventrículo lateral, e o abaulamento
se encontra dilatado. As incisões frontal e parietal são, na parte medial da ponta do corno temporal causado
então, estendidas inferiormente na superfície medial pelo núcleo amigdalóide é identificado e aspirado. O
do hemisfério cerebral até atingir o topo do giro do hipocampo (cabeça e corpo) também é removido de
cíngulo, e essas duas incisões são conectadas na borda modo subpial até que se encontre a leptomeninge sobre
superior do giro do cíngulo. O objetivo de deixar o giro o tronco encefálico. A cirurgia prossegue com a remo-
do cíngulo intacto nessa fase da cirurgia é proteger as ção de qualquer substância cinzenta remanescente (giro
artérias cerebrais anteriores que correm na superfície temporal superior, região de Heschl e unco. Não é ne-
do corpo caloso. cessário remover a ínsula, que geralmente se encontra
Procede-se, a seguir, à remoção da parte posterior bastante atrófica e de difícil identificação. Na técnica
do lobo frontal, parte anterior do lobo parietal e de original, Rasmussen clipa e coagula os vasos sylvianos
todo o lobo central “en bloc”, seccionando a porção e promove a remoção da ínsula (Fig. 1.9).
profunda da substância branca desses lobos.
A etapa seguinte é a remoção subpial do giro do
cíngulo e do giro subcaloso, expondo as artérias cere-
brais anteriores cobertas pela leptomeninge.
A substância branca do lobo frontal é então seccio-
nada inferiormente, com o aspirador à frente do rostro
do corpo caloso, até se visualizar a leptomeninge sobre
a foice. A substância branca do lobo parietal é seccio-
nada inferiormente de modo semelhante atrás do esplê-
nio do corpo caloso até a visualização da leptomeninge
sobre a foice e a tenda. Desse modo, as regiões frontal
anterior, parietal posterior e occipital são desconecta-
das da porção superior do tronco encefálico e do corpo
caloso (Fig. 1.8). O lobo temporal é removido comple-
tamente, tendo como limite posterior a incisão parietal
posterior. A incisão cortical é realizada inicialmente Fig. 1.8 – Vista medial do hemisfério cerebral direito. As
linhas tracejadas mostram a direção das desconexões na face
medial do hemisfério.

Fig. 1.7 – Vista lateral do hemisfério cerebral esquerdo. A


etapa inicial da hemisferectomia funcional consiste na remo-
ção do córtex central supra-sylviano, anteriormente ao joelho
e posteriormente ao esplênio do corpo caloso (entre as duas Fig. 1.9 – Fotografia intra-operatória após hemisferectomia
linhas tracejadas). funcional.

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Parte 1 – Epilepsia

Rasmussen ressalta que, dependendo do tamanho substância cinzenta cortical, com preservação dos
dos ventrículos, da presença e da localização do cis- ventrículos e da substância branca. A técnica consiste
to porencefálico quando presente, a remoção do lobo na remoção de quase toda a substância cinzenta corti-
temporal pode ser realizada na fase inicial da cirurgia. cal do hemisfério cerebral doente, deixando uma fina
Ao final da cirurgia, remove-se o plexo coróide de camada de substância branca cobrindo o ventrículo
modo mais completo possível. Um dreno extradural lateral4.
ou subgaleal é deixado por 12 horas. O procedimento inicia-se com lobectomia tempo-
ral standard24, seguida de lobectomias frontal, parie-
Resultado tal e occipital. Como durante a lobectomia temporal
há abertura sistemática do corno temporal, essa aber-
De acordo com Rasmussen, é comum haver um tura geralmente é ocluída no final da cirurgia com a
pequeno aumento transitório da pressão intracrania- aplicação de Gelfoam® e Surgicel®, com o objetivo de
na no período pós-operatório imediato, com duração reconstruir a parede do ventrículo.
de 7 a 10 dias, em praticamente todos os pacientes
Um dos grandes problemas enfrentados pelos
submetidos à remoção de uma porção extensa de he-
autores ao realizar esse tipo de ressecção lobo por
misfério cerebral, provavelmente pelo déficit de reab­
lobo é o sangramento intra-operatório abundante,
sorção liquórica. Quando esse aumento da pressão
principalmente considerando que a maior parte dos
intracraniana for persistente, durando mais do que 4
pacientes pertence à faixa etária infantil ou até lacten-
semanas, ele preconiza a cirurgia de derivação ventri-
te. Esse problema aparentemente foi resolvido pelos
cular. Como complicação tardia de hemisferectomia
autores com a clipagem precoce da artéria cerebral
funcional, 1 dos 14 pacientes operados necessitou de
média após a origem das artérias lentículo-estriadas;
shunt 3 anos após a cirurgia.
com essa manobra há diminuição significativa do
sangramento intra-operatório. Os autores não acham
Comentário necessária a clipagem das artérias cerebral anterior e
Na sua publicação8, Rasmussen mencionou várias posterior, como é descrita na técnica de hemisferecto-
vezes o termo “aumento da pressão intracraniana”, mia anatômica clássica por duas razões: 1. a simples
porém não especificou o parâmetro usado para deter- clipagem da artéria cerebral média já seria suficiente
minar esse aumento, se apenas pelo quadro clínico, para diminuir o sangramento intra-operatório; 2. mui-
ou pelos exames radiológicos disponíveis numa épo- tas vezes, como ocorre nas hemimegalencefalias, há
ca pré-tomografia. aumento do volume do hemisfério, dificultando a re-
Em termos de controle das crises, ele apresentou tração do hemisfério para a clipagem da artéria cere-
resultados de todos os pacientes operados pela técnica bral posterior (via subtemporal) ou para clipagem da
de hemisferectomia anatômica com a hemisferectomia artéria cerebral anterior (via inter-hemisférica).
funcional: num total de 41 pacientes (14 por hemis-
ferectomia funcional e 27 por hemisferectomia anatô- Resultado
mica), 51% deles ficaram livres de crises e 32% com Numa série de 50 pacientes de Carson et al.4, dos
melhora significativa das crises. Entretanto ele não es- 22 portadores de síndrome de Rasmussen, 16 fica-
pecifica a natureza de lesão dos pacientes da sua série. ram sem crises e 6 melhoraram das crises (taxa de
Dos 34 pacientes submetidos à hemisferectomia pacientes livres de crise é de 80%). Dos 20 portadores
funcional operados em Montreal após 1974, a taxa de de distúrbios de desenvolvimento cortical, 7 ficaram
pacientes livres de crise é de aproximadamente 84%. sem crises (35%), 12 apresentaram melhora (60%) e
Dois pacientes morreram no pós-operatório precoce, 1 permaneceu inalterado. Dos 2 portadores de Sturge-
2 desenvolveram hidrocefalia, necessitando de shunt Weber, 1 ficou livre de crises (50%) e outro apresen-
e 1 paciente desenvolveu abscesso cerebral. tou melhora. Dos 4 portadores de patologia vascular
Mais uma vez, nessa série não houve melhor dis- não especificada, 2 ficaram livres de crises (50%), 1
criminação dos pacientes em relação à etiologia. apresentou melhora e 1 permaneceu inalterado.
A mesma série apresentou como complicação 4
Hemidecorticação óbitos, sendo 3 perioperatórios (relacionados à cirur-
gia) e 1 ocorrido 9 meses após a cirurgia, decorrente de
O termo hemisferectomia aplica-se às cirurgias crises convulsivas originadas no hemisfério remanes-
em que há remoção de todo ou grande quantidade de cente. Dos 22 portadores de síndrome de Rasmussen,
tecido cortical de um hemisfério cerebral, incluindo 3 apresentaram infecção com cultura positiva (13,6%)
os giros sensitivo e motor. e 5 apresentaram hidrocefalia (22,7%). Dos 20 por-
A hemidecorticação ou hemicorticectomia é uma tadores de distúrbios de desenvolvimento cortical, 6
variante da hemisferectomia quando há remoção de apresentaram infecção comprovada (30%) e 10 de-

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senvolveram hidrocefalia (50%). Dos 2 pacientes com


Sturge-Weber, 1 manifestou hidrocefalia (50%).

Comentário
Trata-se de um procedimento teoricamente mais
trabalhoso (remover a substância cinzenta cortical de
todo um hemisfério, preservando os gânglios da base
e o tálamo), causa mais sangramento intra-operatório e
aparentemente apresenta um resultado cirúrgico global
pior do que as outras séries que utilizam outras técnicas
cirúrgicas.
Apresenta elevada percentagem de hidrocefalia
pós-operatória, talvez pela extensa remoção do es-
Fig. 1.10 – Vista lateral do ventrículo lateral esquerdo. O nú-
paço subaracnóide, responsável pela reabsorção de cleo central do hemisfério foi preservado. A ínsula é o envoltório
liquor. externo do núcleo central do hemisfério cerebral. 1 = corpo do
Entretanto, diferentemente de outras séries apre- corpo caloso; 2 = septo pelúcido; 3 = forame de Monro; 4 = bulbo
sentadas na literatura, é a série4 que separa os seus do caloso; 5 = corno frontal; 6 = calcar avis; 7 = hipocampo.
pacientes por etiologia, tendo melhores resultados
cirúrgicos em portadores de síndrome de Rasmussen Hemisferotomia Periinsular
e piores resultados em portadores de distúrbios de de- Coloca-se o paciente em decúbito dorsal, horizon-
senvolvimento cortical. tal com coxim abaixo do ombro ipsilateral. A incisão
A especificação da etiologia causadora das crises cefálica pode ser do tipo question mark ou em “T”
é absolutamente importante no relato de resultado ci- como havia sido descrito para hemisferectomia ana-
rúrgico em hemisferectomia, porque provavelmente tômica. Após a craniotomia fronto-têmporo-parietal e
o resultado cirúrgico (controle das crises) e a com- a abertura dural, procede-se à parte intradural do pro-
plicação (principalmente a hidrocefalia) estão direta- cedimento, que é dividida nas seguintes etapas:
mente relacionadas não somente à técnica cirúrgica a. janela supra-sylviana: coagulação dos va-
empregada, mas também à habilidade do cirurgião e sos supra-sylvianos, aspiração dos opérculos
à etiologia. Em todas as séries, há maior número de frontal e parietal até expor toda a superfície
hidrocefalias pós-operatórias em portadores de dis- da ínsula; depois a dissecção prossegue acima
túrbios de desenvolvimento cortical. do sulco circular superior da ínsula para atin-
gir o corpo do ventrículo lateral (Fig. 1.11).
A partir do rostro do corpo caloso, a desconexão
Hemisferotomia periinsular da superfície basal do lobo frontal é orientada
e Deaferentação hemisférica seguindo-se a asa menor do osso esfenóide.
São variantes da hemisferectomia funcional que b. calosotomia por dentro do ventrículo: uma vez
foram descritas praticamente ao mesmo tempo9,12, atingido o corpo do ventrículo lateral, realiza-se
entretanto o princípio básico é o mesmo em ambas calosotomia, aspirando o teto do ventrículo la-
técnicas, ou seja, promovem a desconexão do núcleo teral (corpo caloso), 3 a 5 mm lateralmente à li-
central do hemisfério das suas aferências e eferên- nha mediana, em direção à linha mediana até a
cias corticais e a desconexão entre os dois hemisfé- exposição da artéria pericalosa. A calosotomia,
rios cerebrais. Entende-se por núcleo central do he- então, é guiada pela artéria pericalosa desde o
joelho-rostro do corpo caloso até o esplênio,
misfério cerebral o conjunto formado pelos gânglios
desconectando inclusive a parede medial do
da base, tálamo, núcleo lentiforme, cápsulas interna, átrio do ventrículo até atingir a linha mediana.
externa e extrema, claustro, e recobrindo externa-
c. janela infra-sylviana: acessa-se o corno tempo-
mente todo esse conjunto como uma capa, a ínsula.
ral, ou através do átrio (que já estaria aberto na
Os limites anterior, inferior, superior e posterior da etapa anterior da cirurgia), ou através do giro
ínsula, numa visão lateral, correspondem aos mes- temporal superior (como descrito nas lobecto-
mos limites desse núcleo central do hemisfério cere- mias temporais standard). Promove-se a ressec-
bral16 (Fig. 1.10). ção da amígdala e a cabeça do hipocampo25-27.
A hemisferotomia periinsular e a deaferentação Segundo os autores, não há necessidade de re-
hemisférica consistem em desconectar todas as estru- mover todo o hipocampo, basta realizar a des-
turas (fibras) ao redor da ínsula e consequentemente conexão do fórnice (principal via eferente da
ao redor desse núcleo central descrito anteriormente, formação hipocampal) ao nível do átrio do ven-
desde a convexidade lateral até a linha mediana. trículo. É opcional a remoção da ínsula.

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9
Parte 1 – Epilepsia

quanto infra-sylviana. A não-preservação da vascula-


tura do tecido cerebral remanescente promoverá in-
variavelmente a reabsorção deste ao longo do tempo,
então o grande objetivo da técnicas da hemisferecto-
mia funcional e seus variantes, que era de deixar mais
tecido cerebral viável dentro da caixa craniana, não
teria sido atingido.

Deaferentação Hemisférica
O paciente é colocado em posição de park bench
e a craniotomia deve ser pequena, porém suficiente
para englobar toda extensão do corpo caloso (anterior
e posteriormente) ou toda a extensão da fissura syl-
viana na superfície lateral9. Com o uso de neuronave-
gador, segue-se o procedimento: etapa 1: abertura da
fissura sylviana e, através do sulco circular inferior
da ínsula, atinge-se o corno temporal do ventrículo
lateral, realizando-se a lobectomia temporal stan-
dard ou a amígdalo-hipocampectomia seletiva. Nos
Fig. 1.11 – Vista coronal do cérebro. Um corte coronal foi casos de hemimegalencefalia, os autores realizam a
realizado no nível de lâmina terminal, atingindo a porção
posterior do corno frontal. A área sombreada em azul de- lobectomia temporal como prevenção de uma hérnia
monstra a “janela supra-sylviana”, onde o ventrículo lateral uncal decorrente do eventual inchaço cerebral no pe-
é acessado após a remoção dos opérculos frontal e parietal. 1 ríodo pós-operatório. Etapa 2: a partir da abertura no
= coroa radiada; 2 = corpo caloso; 3 = tálamo; 4 = cápsula ventrículo lateral deixada pela lobectomia temporal,
interna; 5 = núcleo lentiforme; 6 = segmento M2 da artéria amplia-se a incisão no córtex cerebral atrás da fissura
cerebral média.
sylviana, seguindo o trajeto do ventrículo lateral (átrio
do ventrículo lateral), continuando em direção ao cor-
po do ventrículo lateral até o corno frontal. Uma pe-
Resultado quena porção do giro temporal superior e do opérculo
frontal é deixada intacta neste momento. Os ramos
Na série de Villemure e Mascott12 11 pacientes fo-
principais da artéria cerebral média que atravessam
ram submetidos à hemisferotomia periinsular, sendo a linha de dissecção e as principais veias superficiais
3 portadores de hemimegalencefalia, 4 de hemiple- devem ser preservados. Etapa 3: após a dissecção
gia infantil, 2 de encefalite crônica, 1 de seqüela de da fissura coróidea no corno temporal, a dissecção
meningite e 1 de embolia cardiogênica. A descrição prossegue em direção ao átrio do ventrículo lateral,
do resultado cirúrgico é vago, relatando que 9 dos 11 através da substância branca da porção médio-basal
casos ficaram livres de crises, 2 outros tiveram me- do lobo temporal, atravessando a indentação do sulco
lhora de 95% das crises e 1 desenvolveu hidrocefalia calcarino (calcar avis), preservando-se a artéria cere-
precocemente. Porém não especifica quais pacientes bral posterior e depois atravessando o bulbo do calo-
permaneceram com crises (a etiologia) e qual teve hi- so (parte do esplênio do corpo caloso). A calosotomia
drocefalia. prossegue por dentro do ventrículo lateral, passando
pelo corpo e corno frontal. A desconexão da superfí-
Comentário cie basal do lobo frontal é igual ao que foi descrito na
hemisferotomia periinsular. É opcional a remoção ou
Sem dúvida trata-se de uma ótima técnica para não da ínsula.
promover a desconexão de todo um hemisfério cere-
bral. É bastante facilitado quando há dilatação ventri-
cular importante. Os autores ressaltam a importância Resultado
de promover desconexão em vez da remoção de teci- De acordo com Schramm9,10, o quadro de febre
do cerebral, salientando a simplicidade e, principal- pós-operatória foi menos intensa nas key hole hemis-
mente, a rapidez com que o procedimento pode ser ferotomias do que nas transcorticais, porém não se
realizado, evitando em especial a perda de sangue especificam em termos numéricos. Foram operados
intra-operatoriamente. O tempo médio da parte intra- 20 pacientes, apresentando dois óbitos, sendo um no
dural relatado pelos autores foi de 1,5 a 3 horas de quinto dia pós-operatório, outro devido a acidente
duração. Em nenhum momento os autores ressalta- não relacionado à cirurgia 4 meses após a cirurgia e
ram a importância da preservação dos vasos (artérias 2 pacientes perderam seguimento. Dos 16 pacientes
e veias) durante a realização tanto das janelas supra remanescentes, 14 ficaram sem crises, um em Classe

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II e um em Classe III (redução de mais de 75% das acessar o ventrículo lateral; inicia-se pelo corpo do
crises). Na sua série houve complicações precoces: ventrículo lateral, ressecando os opérculos frontal e
um óbito já descrito previamente de um menino de 6 parietal, ou pelo corno temporal por meio de uma
anos, portador de hemimegalencefalia no quinto pós- lobectomia temporal. Outras pequenas diferenças
operatório, cuja autópsia revelou lesões neuronais que possam existir quanto às diversas técnicas de
generalizadas de origem isquêmico-hipóxica. A causa hemisferotomia referem-se à coagulação ou não dos
mais provável foi aspiração decorrente da convulsão vasos da artéria cerebral média, à ressecção ou não
ou da piora do nível de consciência devido ao inchaço da ínsula.
cerebral. Houve um caso de coleção liquórica subga- Como o próprio autor Schramm9,10 aponta, as prin-
leal, um caso de meningite e um caso de “infecção cipais dificuldades da sua técnica são: pequena expo-
profunda” requerendo reoperação. A única complica- sição, manipulação transventricular (ampla abertura
ção tardia na sua série9 foi o aparecimento de um cisto dos ventrículos), inchaço cerebral pós-operatório,
no corno temporal que precisou ser reoperado para dificuldade na orientação intra-operatória seguindo
a remoção da membrana. O mesmo autor recomen- os parâmetros anatômicos. Tudo isso poderia ser con-
da craniotomias pequenas para eliminar o risco de tornado fazendo-se uma craniotomia suficientemen-
lesão acidental dos seios venosos e das granulações te grande, sem expor os seios venosos, permitindo
de Pacchioni ou veias em ponte e, conseqüentemente, maior exposição do parênquima cerebral, facilitando
menor possibilidade de sangramento e transfusões de o reconhecimento intra-operatório dos parâmetros
sangue. O próprio autor relata as limitações da sua anatômicos, permitindo maior espaço para o cirur-
técnica: pequena exposição devido à craniotomia li- gião trabalhar, causando menor manipulação do pa-
mitada, manipulação transventricular (ampla abertura rênquima cerebral, acarretando um menor ou nenhum
dos ventrículos), ocorrência de inchaço cerebral pós- e­dema cerebral pós-operatório.
operatório e a dificuldade na orientação intra-opera-
tória seguindo os parâmetros anatômicos, provavel-
mente pela limitada exposição cerebral em razão da Técnica de hemisferotomia
craniotomia pequena. utilizada no HCFMUSP
Foram operados pelo autor (WHT), entre 1998 e
Comentário 2003, 17 portadores de síndrome epiléptica hemisfé-
As diversas variantes da hemisferotomia com- rica, sendo 6 portadores de síndrome de Rasmussen,
partilham os seguintes princípios28: interrupção da 3 portadores de hemimegalencefalia, 5 portadores de
cápsula interna e da coroa radiada, ressecção das lesões vasculares perinatais e 3 portadores de seqüela
estruturas temporais mesiais, calosotomia transven- de meningite.
tricular e desconexão das fibras horizontais frontais, Cinco pacientes foram submetidos à técnica de
e diferem fundamentalmente em relação ao modo de dea­ferentação hemisférica (Figs. 1.12 a 1.16).

Fig. 1.12 – Vista intra-operatória do corno temporal es- Fig. 1.13 – Vista intra-operatória do corno temporal e do
querdo acessado via giro temporal superior. 1 = hipocampo; átrio esquerdo. Os principais ramos da artéria cerebral média
2 = fímbria do fórnice; 3 = plexo coróide. foram preservados (setas). 1= eminência colateral; 2 = ramos
da artéria cerebral média; 3 = transição entre o corpo e a cau-
da do hipocampo.

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11
Parte 1 – Epilepsia

Fig. 1.14 – Calosotomia intraventricular. As setas indicam o Fig. 1.15 – Aspecto final após a deaferentação do hemisfé-
trajeto da calosotomia realizada por dentro do corpo do ven- rio cerebral esquerdo.
trículo lateral esquerdo.

A B

Fig. 1.16 – (A) RNM pré-operatória. (B) RNM pós-operatória.

Conclusão próximos ao normal, como nos casos de hemimega-


lencefalia, e alguns casos incipientes de síndrome de
Quando se faz a análise dos resultados cirúrgicos Rasmussen. Como as patologias citadas podem não
com a finalidade de comparar as diferentes técni- estar inteiramente confinadas a apenas um hemisfé-
cas utilizadas para hemisferectomia, alguns fatores rio cerebral, a eventual persistência de crises no se-
fundamentais devem ser levados em consideração: guimento pós-operatório pode não necessariamente
algumas etiologias malformativas, como a hemime- significar a falha da técnica cirúrgica, mas sim mani-
galencefalia, podem não estar restritas apenas a um festação do hemisfério remanescente, que pode even-
hemisfério cerebral. Como exemplo, a técnica de he- tualmente ser responsável pelas crises.
misferectomia anatômica geralmente é empregada Por outro lado, a técnica de hemisferotomia periin-
nas ressecções em que há abundante tecido cerebral, sular e suas variantes são mais empregadas nos casos
com ventrículos laterais pequenos ou de tamanhos em que há uma maior dilatação do sistema ventricu-

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1 – Hemisferectomias Análise Crítica das Técnicas

lar, como nos casos de infartos isquêmicos extensos 4. Carson BS, Javedan SP, Freeman JM, Vining EPG,
peri ou neonatais, principalmente no território da ar- Zuckerberg AL, Lauer JA, Guarnieri M. Hemisphe-
téria cerebral média, associados a hemiparesia con- rectomy: a hemidecortication approach and review of
tralateral e hemianopsia. Nesses casos há maior pro- 52 cases. J Neurosurg. 1996;84:903-11.
babilidade de que o comprometimento seja de apenas 5. Delalande O, Pinard JM, Basevant C, et al. Hemis-
um dos hemisférios. Nesse caso, um melhor controle pherotomy: a new procedure for central discon-
pós-operatório das crises pode não ser inteiramente nections [abstract]. Epilepsia. 33(Suppl 3):99-100,
atribuído à técnica em si, mas sim à patologia29. 1992.
6. Kanev PM, Foley CM, Miles D. Ultrasound-tailored
Provavelmente não há uma única técnica cirúrgi-
functional hemispherectomy for surgical control of
ca adequada para todas as patologias. Com o avanço seizures in children. J Neurosurg. 1997;86:762-7.
das técnicas microcirúrgicas, do aperfeiçoamento dos 7. Rasmussen T. Hemispherectomy for seizures revisi-
equipamentos cirúrgicos, da neuroimagem, da aneste- ted. Can J Neurol Sci, 1983;10:71-8.
sia e dos cuidados pré, intra e pós-operatórios, esta- 8. Rasmussen T. Cerebral hemispherectomy: indica-
mos diante de uma realidade muito diferente daquela tions, methods, and results. In: Schmidek HH, Sweet
da década de 1950, em que a maioria dos casos de he- WH, editors. Operative neurosurgical techniques. In-
misferectomia anatômica foi realizada. A hemisfereto- dications, methods, and results. 2. ed. Orlando: Gru-
mia funcional de Rasmussen e, eventualmente, a he- ne & Stratton; 1988, vol. 2, p. 1235-41.
misferectomia anatômica, provavelmente são as mais 9. Schramm J, Behrens E, Entzian W. Hemispherical
indicadas nos casos de um aumento do tamanho do he- deafferentation: an alternative to functional hemis-
misfério, com ventrículos laterais de tamanhos reduzi- pherectomy. Neurosurgery. 1995;36:509-16.
dos, como nos casos de hemimegalencefalia. Quando 10. Schramm J, Kral T, Clusmann H. Transsylvian
há dilatação moderada ou acentuada dos ventrículos keyhole functional hemispherectomy. Neurosurgery.
laterais, provavelmente a técnica de hemisferotomia 2001;49:891-901.
é a mais indicada. Entretanto, a indicação de uma ou 11. Shimizu H, Maehara T. Modification of periinsular
outra técnica depende também da familiaridade que o hemispherotomy and surgical results. Neurosurgery.
cirurgião tem com a técnica. 2000;47:367-73.
Em relação ao controle das crises, dados recentes 12. Villemure JG, Mascott C. Periinsular hemisphero-
indicam que provavelmente não esteja relacionado tomy: surgical principles and anatomy. Neurosur-
somente à técnica cirúrgica empregada, mas tam- gery. 1995;37:975-81.
bém fundamentalmente à etiologia, tendo os piores 13. Villemure JG, Adams CBT, Hofman HJ, et al. Hemis-
resultados em hemimegalencefalia. Em relação às pherectomy. In Engel Jr J, editor. Surgical treatment
complicações decorrentes da cirurgia, especialmen- of the epilepsies. New York: Raven Press; 1993, p.
511-19.
te a síndrome febril pós-operatória, mais comumen-
te chamada de síndrome de meningite asséptica, e a 14. Rhoton Jr AL. The cerebrum. In: Apuzzo MLJ, edi-
tor. The supratentorial cranial space: microsurgical
hidrocefalia também não estão associadas somente
anatomy and surgical approaches (Suppl). Neurosur-
à técnica cirúrgica empregada, mas também à etio- gery. 2002;51(4):30-51.
logia, ambas as complicações sendo mais freqüentes 15. Rhoton Jr AL. The cerebrum. In: Apuzzo MLJ, edi-
na hemimegalencefalia. tor. Rhoton cranial anatomy and surgical approaches.
Os princípio gerais da neurocirurgia e o bom-sen- Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2003,
so devem continuar a prevalecer. Uma craniotomia p. 29-79.
adequada, não demasiadamente pequena, que permi- 16. Wen HT, Mussi ACM, Rhoton Jr AL. Surgical ana-
ta adequado manuseio cirúrgico e boa visualização tomy of the brain. In: Winn HR, editor. Youmans
dos parâmetros anatômicos, associada ao domínio neurological surgery. 5. ed. Philadelphia: Saunders;
da anatomia e da técnica microcirúrgica, com pre- 2003, vol 1, p. 5-44.
servação das artérias e veias e boa hemostasia, ainda 17. Perlmutter D, Rhoton AL Jr. Microsurgical anatomy
constituem a técnica minimamente invasiva quando of the anterior cerebral-anterior communicating-re-
a desativação de um hemisfério se faz necessária. current artery complex. J Neurosurg. 1976;45:259-
72.
18. Davis KG, Maxwell RE, French LA. Hemispherec-
Referências bibliográficas tomy for intractable seizures: long-term results in
1. McKenzie KG. The present status of a patient who 17 patient followed for up to 38 years. J. Neurosurg.
had the right cerebral hemisphere removed. Proc Am 1993;78:733-40.
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13
Parte 1 – Epilepsia

21. Noetzel H. Diffusion von Blutfarbstoff in der inner- to amygdalohippocampectomy. In: Ohata K, editor.
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22. Di Rocco C, Iannelli A. Disconnective hemispherectomy 27. Yasargil MG, Teddy PJ, Roth P. Selective amygda-
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25. Wen HT, Rhoton Jr AL, Oliveira E, et al. Microsur- J Neurosurg. 2002;97:423-31.
gical anatomy of the temporal lobe: Part 1: Mesial 29. Holthausen H, May TW, Adams CTB, Andermann F,
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gical anatomy of the mesial temporal lobe as applied p. 749-73.

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2
Tratamento Cirúrgico
da Epilepsia na Infância
Vera Cristina Terra Bustamante
Hélio Rubens Machado

Introdução ção ao tempo de tratamento, deve-se considerar o


diagnóstico sindrômico. Assim, crianças com crises

A
epilepsia é uma doença crônica que atinge diárias devem ser consideradas candidatas ao trata-
indivíduos de todas as faixas etárias. A inci- mento cirúrgico mais precocemente.
dência de epilepsia na infância varia de acor-
do com a faixa etária, sendo considerada em torno A redução do tempo de epilepsia pode acarretar
de 100 casos/100.000 crianças nascidas vivas no pri- redução significativa nas seqüelas neurológicas e so-
meiro ano de vida, caindo para 40 casos/100.000 na ciais dessas crianças, sugerindo-se que deva ser indi-
primeira década (excluindo o primeiro ano) e 20% cado o tratamento mais precoce. Infelizmente, grande
casos/100.000 na adolescência. Em 75% dos casos as parte da classe médica ainda desconhece a existência
crises serão controladas no primeiro ano de tratamen- de tratamento cirúrgico eficaz e seguro para controle
to. Entre os pacientes que evoluirão com epilepsia, da epilepsia, levando ao encaminhamento tardio des-
20% a 25% dos casos apresentarão epilepsia refra- ses pacientes aos centros especializados.
tária ao tratamento clínico. Nas crianças, a taxa de
remissão está em torno de 10% a 20%. Nos Estados Quadro Clínico e Eletrográfico
Unidos, a prevalência de pacientes com crises intratá- das Epilepsias na Infância
veis é de 2 a 3 casos/1.000 habitantes, o que significa
a existência de 700.000 pacientes1. As crises intratá- Crianças e adolescentes epilépticos apresentam
veis são mais freqüentes na infância e em 60% dos maior complexidade na análise do padrão clínico e
casos há algum prejuízo intelectual ou retardo mental eletrográfico das crises epilépticas. Contribuem para
franco e a incidência de morte súbita pode chegar a 2 esse fato um maior número de casos com lesões extra-
a 5 casos/1.000 pacientes ao ano. Retardo mental as- temporais neocorticais, patologias mais difusas e anor-
sociado à epilepsia intratável leva a uma menor chan- malidades do desenvolvimento cortical. Assim, crises
ce de controle das crises epilépticas. tônicas, ausências, mioclonias, crises tônico-clônicas
A princípio, são considerados intratáveis todos e crises parciais complexas ou motoras podem coe-
os pacientes que permanecem com crises epilépti- xistir no mesmo paciente, dependendo da localização
cas a despeito de um tratamento ótimo. Para que o da lesão e da sua extensão. No entanto, crises com
tratamento seja considerado ideal, as drogas devem caráter aparentemente generalizado podem ter início
ser adequadas à síndrome epiléptica, com uso de focal, havendo possibilidade de indicação cirúrgica
doses também adequadas ao peso e à idade do pa- curativa e não apenas paliativa. A melhora das técni-
ciente. Deve-se, portanto, considerar que crianças cas de investigação de neuroimagem tem contribuído
abaixo de 5 anos usualmente necessitam de doses para a indicação cirúrgica nesses casos. Em relação
mais elevadas de drogas antiepilépticas do que ado- aos achados eletrográficos interictais e ictais, estes
lescentes ou adultos, porque apresentam absorção tendem a ser menos localizatórios do que em adultos,
mais errática e maior indução hepática. Em rela- predominando os padrões multifocais ou difusos.

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Parte 1 – Epilepsia

Síndromes especiais na infância Esclerose Tuberosa


e adolescência A esclerose tuberosa (ET) é uma doença heredi-
As principais causas de epilepsia intratável na in- tária, autossômica dominante, neurocutânea e multi-
fância e adolescência são as facomatoses, as desordens sistêmica. Tem incidência de 1/10.0002. Está asso-
do desenvolvimento cortical, a encefalite de Rasmus- ciada à mutação nos cromossomos 9q34 e 16p13.3.
sen, os tumores benignos do sistema nervoso central O diagnóstico clássico baseia-se na tríade de Vogt,
(como os tumores disembrioplásicos neuroepiteliais, composta por epilepsia, retardo mental e angiofibro-
DNTs), as lesões hipóxico-isquêmicas, além da epi- matose facial, observada em apenas 29% dos casos.
lepsia mioclono-astática e a síndrome de Ohtahara. O sistema nervoso central é o mais afetado, mas cora-
A esclerose mesial temporal está presente em apro- ção, rins, pulmões, pele e retina também podem estar
ximadamente 21% dos casos de epilepsia na infância, envolvidos.
havendo aumento da sua incidência com a progressão Em 30% dos casos há angiofibroma facial e 80%
da idade em direção à adolescência mais tardia. têm epilepsia. As síndromes de West e de Lennox-
Gastaut são encontradas com freqüência e os espas-
Síndrome de West mos infantis ocorrem em 36% a 69% dos casos3. Em
80% as crises são de difícil controle e 60% apresentam
A síndrome de West é uma epilepsia grave, cur- retardo mental. A ressonância magnética de encéfalo
sando com crises do tipo espasmos em flexão ou ex- permite identificar os hamartomas não calcificados e
tensão, retardo mental e hipsarritimia ao eletrencefa- os astrocitomas de células gigantes.
lograma (EEG). A incidência de síndrome de West é
Embora existam múltiplas lesões cerebrais na ET,
de 1/2.000 a 1/4.000 nascimentos. A idade de início
o tratamento cirúrgico pode controlar as crises, sendo
das crises varia de 3 a 7 meses de vida. Aproxima-
essencial a identificação do túber epileptogênico.
damente 93% dos casos surgirão antes dos 2 anos de
vida. Outros tipos de crises podem estar associados.
Pode ser decorrentes de lesões focais ou difusas, ou Síndrome de Sturge-Weber
de natureza idiopática. Doença neurocutânea, não hereditária, caracteri-
O prognóstico da síndrome de West é geralmente zada por angioma leptomeníngeo no córtex cerebral
ruim. Após os três anos de idade, a maioria das crian- e angioma capilar na face ipsilateral (em 15% dos
ças evolui com outros tipos de crises, sendo a mais casos), geralmente em território de distribuição do
comum a síndrome de Lennox-Gastaut. nervo trigêmeo.
O tratamento da síndrome deve ser agressivo, vi- Clinicamente os pacientes apresentam desenvolvi-
sando à resolução das crises e das alterações eletro- mento atrasado, dificuldade de aprendizado ou retardo
gráficas. O tratamento cirúrgico e a dieta cetogênica mental, hemiparesia progressiva, glaucoma e crises
podem ser indicados em alguns casos. epilépticas. Alguns pacientes têm envolvimento facial
bilateral, ou envolvimento de áreas mais extensas. As
Síndrome de Lennox-Gastaut crises epilépticas são geralmente de difícil controle. A
ressonância magnética revela atrofia cerebral inespe-
Com início entre 1 e 8 anos, essa síndrome tem cífica focal ou hemisférica. A tomografia de crânio e a
como critérios diagnósticos: múltiplos tipos de crises, radiografia simples podem evidenciar áreas de calcifi-
retardo mental, alterações de comportamento e ele- cações. A arteriografia tem valor controverso.
trencefalograma com complexos ponta-onda lentos O tratamento inclui drogas específicas para o tipo
e ritmo recrutante. A ausência atípica é o padrão de de crise observada. O tratamento cirúrgico geralmen-
crises mais freqüente, ocorrendo dezenas a centenas te proporciona bons resultados.
de vezes ao dia e podendo caracterizar estado de mal
epiléptico de ausência. As crises tônicas, atônicas,
parciais complexas, tônico-clônicas generalizadas e Encefalopatia de Rasmussen
crises mioclônicas estão presentes. Doença de causa desconhecida, descrita por Ras-
Eletrograficamente se observa atividade de base mussen em 1958, caracteriza-se por crises epilépticas
acentuadamente desorganizada, tomada por paro- que envolvem um dimídio e evoluem com hemipare-
xismos epileptiformes do tipo ponta, ondas agudas sia progressiva. O início das crises ocorre, na maioria
multifocais, complexos ponta-onda lenta, polipontas dos casos, entre 3 e 7 anos de vida, existindo relatos
difusas e ritmo recrutante. O tratamento é feito com de início na idade adulta. Retardo mental e distúrbios
politerapia racional, visando impedir a instalação de de comportamento são observados na evolução da
estado de mal epiléptico. A calosotomia pode ser in- síndrome.
dicada na tentativa de redução das crises com quedas. Clinicamente se observa epilepsia parcial contí-
O prognóstico a longo prazo é ruim. nua. A hemiparesia tem evolução variável, podendo

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2 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia na Infância

demorar meses ou anos para instalar-se. Quando en- anos de idade tendem a apresentar crises epilépticas
volve o hemisfério dominante, distúrbios de lingua- do lobo temporal semelhantes às observadas em adul-
gem podem ser observados. A ressonância magnética tos. A cirurgia leva ao controle das crises em aproxi-
inicialmente normal progride com edema cortical e madamente 80% dos casos ou melhora significativa
atrofia cerebral progressiva. em 10%.
O tratamento de escolha é a cirurgia hemisférica,
devendo ser considerada a presença de déficit motor Hamartomas Hipotalâmicos
e de linguagem.
Hamartomas hipotalâmicos representam tecido ce-
rebral normal, localizado em situação aberrante, ge-
Síndrome de Landau-Kleffner ralmente aderido ao túber cinéreo e hipotálamo. Essas
Síndrome caracterizada por afasia e crises epilép- lesões hamartomatosas geralmente se manifestam por
ticas, de etiologia desconhecida e relativamente rara. puberdade precoce e por um tipo bastante peculiar de
Há afasia adquirida e EEG com atividade epileptifor- crises epilépticas, caracterizadas por riso (ou choro)
me máxima nas regiões têmporo-rolândicas. O início imotivado, chamadas de crises gelásticas.
dos sintomas ocorre entre 3 e 8 anos de idade. A afasia As crises são de rápida duração e podem ser se-
aparece antes dos 6 anos de idade, em crianças pre- guidas de perda de consciência ou movimentos anor-
viamente normais. A evolução é rápida e inclui perda mais, evoluindo como crises parciais complexas,
da linguagem até atingir ocasionalmente o mutismo, eventualmente associadas à generalização secundá-
perda da compreensão verbal, agnosia auditiva, dis- ria; provocam atraso de desenvolvimento e alterações
túrbios cognitivos, epilepsia, hiperatividade, agressi- comportamentais, sendo consideradas de difícil tra-
vidade e, às vezes, regressão do tipo autístico, sem tamento medicamentoso. Em alguns casos, notam-se
antecedentes de comprometimento intelectual ou de distúrbios de desenvolvimento cortical concomitan-
desenvolvimento. tes. A origem das crises pode estar ligada à própria
O registro eletrográfico interictal em vigília tende atividade neuronal do hamartoma.
a ser normal ou apresenta raros paroxismos epilepti- O tratamento clínico é superior no que diz respei-
formes. Em sono evidenciam-se paroxismos epilep- to à puberdade precoce. Com base nesses relatos e
tiformes nas regiões rolândicas, uni ou bilaterais em na pejorativa evolução da epilepsia, Machado et al.
mais de 80% do tempo de traçado. Enquanto forem preconizaram a cirurgia com indicação exclusiva para
observadas as descargas ao EEG interictal não have- alívio da epilepsia5.
rá recuperação da linguagem. A ressonância magné-
tica geralmente é normal, ou em casos esporádicos Objetivos do tratamento cirúrgico
há associação com lesões focais. da epilepsia
O tratamento com drogas antiepilépticas é geral-
mente eficaz no controle das crises. Preconiza-se o Em crianças, a finalidade da cirurgia para epi-
uso de corticosteróides precocemente para resolução lepsia não se restringe ao controle total das crises
do déficit de linguagem4. Em crianças que não res- epilépticas. Embora isso seja desejável, a melhora
pondem adequadamente ao tratamento medicamento- cognitiva e comportamental pode ser obtida por re-
so a cirurgia com a transecção subpial múltipla deve dução significativa das crises e diminuição substan-
ser considerada. cial da quantidade de medicamentos ingeridos pela
criança diariamente. A melhora global está associa-
da à precocidade da indicação cirúrgica, embora não
Epilepsias Focais se possa prever com exatidão qual a melhor idade
Em crianças as epilepsias focais podem estar as- para a indicação cirúrgica; além disso, quando a ci-
sociadas a um grande número de patologias, como rurgia é bem-sucedida, há importante ganho social e
as anormalidades do desenvolvimento cortical, as o custo benefício torna-se evidente. Para que esses
doenças hipóxico-isquêmicas, os tumores benignos, objetivos sejam alcançados, é essencial uma crite-
o tumor neuroepitelial desembrioplástico e a própria riosa seleção dos pacientes, associada a um progra-
síndrome da esclerose mesial temporal. O prognósti- ma de reabilitação, incluindo equipe multidiscipli-
co nos pacientes operados é variável e o controle de nar experiente e integrada no tratamento cirúrgico
crises depende diretamente da possibilidade de res- da epilepsia infantil.
secção completa ou não da lesão. Outro fator a ser considerado na infância é a plas-
As crises epilépticas originadas no lobo temporal ticidade cerebral, que acarreta recuperação extraordi-
compõem uma entidade clínica diferente da observa- nária. Estima-se que 90% do crescimento e matura-
da em adultos, podendo ocorrer crises tônicas, mio­ ção cerebral estejam completos até os 5 anos de idade
clônicas e espasmos infantis em crianças com lesões e, pelo menos até os 7 anos de vida, ocorre intensa
no lobo temporal. Geralmente, crianças acima dos 6 atividade sinaptogênica e dendrítica, sendo este, por-

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Parte 1 – Epilepsia

tanto, o melhor período de recuperação. Após isso serviço de epilepsia deve considerar questões básicas
muitas das conexões neuronais entram em regressão, para que a indicação cirúrgica seja adequada, avalian-
processo que deve durar, em média, até os 14 anos. do-se a real intratabilidade clínica, identificação do
Crises freqüentes na infância interferem diretamen- local de início ictal, sua etiologia e possibilidade de
te na maturação cerebral e podem ser interrompidas remoção total com a cirurgia. Deve ser, ainda, possí-
com o tratamento cirúrgico. A ressecção do hemis- vel determinar o prognóstico cirúrgico para que uma
fério dominante e a recuperação da linguagem são decisão adequada seja tomada pelos responsáveis pe-
exemplos marcantes da capacidade de recuperação na los pacientes6. Pacientes com epilepsias catastróficas,
criança e podem ocorrer até cerca de 9 anos de idade. como síndrome de West, encefalite de Rasmussen,
No entanto, a recuperação de algumas funções, como síndrome de Sturge-Weber e hemimegalencefalia
a linguagem e a motricidade, depende diretamente do podem ser considerados intratáveis clinicamente em
fator etiológico, da idade de início das crises e da sua poucas semanas, interrompendo sua evolução inexo-
evolução, sendo tanto maior quanto mais precoce for rável pela cirurgia7.
a intervenção. No que diz respeito à localização, o EEG interictal
A neuroplasticidade pode agir ainda no sentido in- pode oferecer dados conflitantes, com falsas idéias da
verso, quando o início da epilepsia for muito precoce, localização, não devendo ser usado para excluir um
podendo haver maior dano ao tecido cerebral. Assim, paciente da investigação para cirurgia da epilepsia8.
um dano cerebral que ocorra ao final do período ges- Um exemplo são as crianças com espasmos infan-
tacional ou no primeiro mês de vida será muito mais tis e que apresentam traçado típico de hipsarritimia.
grave que após o primeiro ano de vida. Nesses casos, quando se consegue localizar o córtex
Contrariamente à incidência em adultos, em que epileptogênico, o tratamento cirúrgico pode ser pro-
mais de 70% dos casos correspondem à cirurgia do posto. O vídeo-EEG permite a confrontação das cri-
lobo temporal, nas crianças a maioria das ressecções ses típicas, atividade eletrográfica e comportamento
é extratemporal, e essa tendência é tanto maior quanto ictal, sendo necessária a correlação com os exames
mais jovem é a criança. Entretanto, quando se consi- de neuroimagem.
deram separadamente os diferentes tipos de cirurgias, A ressonância magnética é o exame de escolha na
percebe-se a prevalência da cirurgia do lobo temporal,
definição das lesões epileptogênicas na infância, uma
seguida pelas hemisferotomias (Tabela 2.1). Estas re-
vez que as anomalias corticais do desenvolvimento
presentam, pela sua complexidade técnica associada à
e migração neuronal podem ser diagnosticadas com
peculiaridade e complexidade de suas indicações típi-
precisão, sendo estas as lesões mais freqüentemente
cas, as epilepsias catastróficas, o verdadeiro símbolo
encontradas na epilepsia infantil.
da cirurgia da epilepsia na infância.
Outro exame valioso é a tomografia computadori-
zada por emissão de fóton único (SPECT) ictal e inte-
Tabela 2.1 – Procedimentos cirúrgicos realizados rictal. Nas epilepsias temporais, o SPECT crítico está
em crianças no Cirep (Hospital das Clínicas de bem estabelecido e mostra hiperfluxo correspondente
Ribeirão Preto – FMRPUSP), entre 1996 e 2004 ao local de início ictal, mas nas epilepsias extratem-
Procedimentos  Casos
porais a interpretação do exame é mais complexa. As-
sim, o SPECT ictal pode evidenciar hiperfluxo focal
Lobectomia temporal 43 em algumas patologias, como a esclerose tuberosa e
Hemisferotomia 33
as polimicrogirias ou áreas de hipoperfusão, como na
síndrome de Sturge-Weber.
Lobectomia frontal 26

Calosotomia 14 Técnica e tática operatórias


Quadrantectomia posterior 11
Preparo do Paciente
Lesionectomia 10
Todo o preparo do paciente para a cirurgia deve ser
Ressecção multilobar 5 feito no ambiente cirúrgico, seguindo os padrões já es-
tabelecidos na prática neurocirúrgica pediátrica. Espe-
Total 142 cialmente em crianças abaixo de 12 anos, a presença
da mãe até a sedação inicial na entrada do bloco ope-
ratório é fundamental para minimizar o estresse. Igual-
mente na sala de recuperação ou, logo que possível, na
Seleção de pacientes Unidade de Terapia Intensiva, a mãe deve ser estar ao
A seleção cuidadosa e criteriosa dos pacientes é lado da criança. O preparo dos pais é fundamental para
fator determinante do êxito do tratamento. Um bom a recuperação e a reabilitação posteriores.

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2 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia na Infância

Dentro da sala de cirurgia os procedimentos ini- lobos ou a hemisferotomia: inicia-se na região frontal
ciais sempre tomarão tempo e constituem-se de: na linha de inserção dos cabelos e segue paramediana
1. Acesso venoso e arterial. e posteriormente ultrapassando a sutura lambdóidea e
2. Procedimentos anestésicos habituais, infusão é interceptada por uma incisão que parte logo à frente
de drogas, entubação orotraqueal, ajuste do do trago até o meio da incisão superior descrita.
respirador, cobertor térmico, monitores cardía­ Finalmente, a abordagem do lobo frontal e que
cos e respiratórios, sondagem nasogástrica e também expõe a área motora inclui uma incisão sobre
vesical. Proteção de extremidades e da placa a sutura coronal, do trago até a linha dos cabelos, na
do bisturi elétrico. região frontal contralateral, e do meio desta uma in-
3. Posicionamento do paciente, o qual deve cisão parassagital como a descrita anteriormente, em
prever boa exposição cirúrgica, mas também direção posterior.
acesso à face e membros contralaterais pelos
neurofisiologistas quando da estimulação da Passos Técnicos
área motora. Da mesma forma, a colocação
dos campos cirúrgicos deve levar em conta a A craniotomia propriamente dita é feita nos moldes
estimulação motora, além da colocação de pla- tradicionais, devendo ser ampla para permitir um bom
cas e estrias e seu cabeamento próprio. estudo intra-operatório e/ou a implantação de eletro-
4. A instalação do paciente deve prever também dos subdurais. Deve-se ainda levar em conta que mui-
um número maior de pessoas na sala e alguns tas dessas crianças e adolescentes apresentam variados
equipamentos extras, como o eletrencefalógra- graus de atrofia cerebral, o que tem duas conseqüên-
fo, estimuladores, potencial evocado etc. cias práticas: o desvio da linha média (e do seio veno-
so sagital) e a exagerada espessura da tábua óssea.
Acessórios à Cirurgia
Lesionectomias
O crescente acesso a novas tecnologias nos per-
Ressecções focais devem ser consideradas quando
mite o uso de aparelhagem que vai facilitar o pro-
possível nos casos de displasia cortical focal, DNT e
cedimento cirúrgico. Cabe ao cirurgião escolher, de
angioma cavernoso, desde que os dados eletrofisio-
acordo com a tática operatória a ser empregada, os
lógicos sejam concordantes em apontar a região da
equipamentos indispensáveis:
lesão como a área epileptogênica. Nos casos de dis-
• Neurofisiologia: eletrencefalógrafo, estimula- plasia cortical focal, deve-se levar em conta a pos-
dor cortical, potencial evocado. sibilidade de lesão não visível nas margens da lesão
• Neuronavegação (quando disponível). estruturalmente evidenciada à ressonância magnéti-
• Ultra-sonografia: equipamento simples, de ca. Nesses casos, o estudo com eletrocorticografia ou
custo razoável e fácil emprego. Equipamen- o registro de crises com eletrodos subdurais permite
tos portáteis, com imagem de alta resolução melhor delimitação da área a ser ressecada.
e foco variável, contam com recursos pode-
rosos, como, o power Doppler, que permite a Lobectomia Temporal
visualização de artérias e veias previamente à
ressecção cirúrgica. O uso racional da ultra- A discussão e controvérsia usual sobre ressec-
sonografia possibilita o acompanhamento da ção padronizada ou tailored sempre terá espaço. Em
ressecção cirúrgica tanto lesional como não crianças a esclerose mesial temporal (EMT) represen-
lesional (como na lobectomia temporal e he- ta 40% dos casos, a DC outros 40% e os tumores 20%
misferotomia) e a aferição final dos limites da do total (Fig. 2.1). Portanto, na maioria dos casos,
ressecção cirúrgica. o limite da cirurgia geralmente é o limite da lesão,
• Aspirador ultra-sônico: equipamento indispen- havendo extensão da ressecção posteriormente até a
sável, uma vez que são extensas as ressecções cauda do hipocampo, incluindo o neocórtex numa ex-
cirúrgicas e envolvem a proximidade de áreas tensão suficiente. A ressecção temporal anterior deve
eloqüentes e estruturas vasculares. estender-se de 4 a 4,5 cm no hemisfério não dominan-
te e 3 a 3,5 cm no hemisfério dominante.
Para melhor compreensão da epilepsia do lobo tem-
Incisão poral em crianças, Adelson9 subdividiu os pacientes em
Três tipos de incisão cirúrgica são mais usados. três grupos. No primeiro grupo estão os casos típicos
A clássica incisão em “ponto de interrogação inverti- de crianças portadoras de esclerose mesial temporal,
do” é empregada na abordagem do lobo temporal ou que apresentam crises originárias de estruturas mesiais
hemisferotomias. A incisão descrita como barn-door incluindo hipocampo e amígdala. Bom controle de cri-
facilita extensas abordagens envolvendo múltiplos ses é obtido em cerca de 70% dos casos. Mohamed

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19
Parte 1 – Epilepsia

et al.10, estudando 17 crianças que foram submetidas extensão da ressecção cirúrgica nesses casos persiste
à cirurgia do lobo temporal na Cleveland Clinic, ob- controversa e sempre optamos por lobectomia asso-
servaram elevada incidência de patologia dupla (dual ciada a hipocampectomia e amigdalectomia, ultrapas-
pathology), uma vez que em 79% do material observa- sando os limites do tumor, como observado com a ul-
do havia leve a moderada displasia cortical associada tra-sonografia intra-operatória conforme especificado
aos achados da esclerose mesial temporal. Esse fato é anteriormente. Iannelli et al.12 relataram 37 pacientes
fundamental quando se discute a melhor abordagem pediátricos com tumores temporais, e a epilepsia foi
para a ressecção temporal, uma vez que abordagens a única manifestação do tumor em 62% dos casos,
seletivas têm sido propostas a crianças11. e bons resultados (Engel I) foram observados em 26
O segundo tipo de patologia encontrado no lobo dos 32 casos. Quanto à extensão da cirurgia, os auto-
temporal em crianças é representado por tumores9, res relatam que o fator mais importante com relação a
como gliomas de baixo grau e tumor disembrioplá- crises epilépticas pós-operatórias é a possibilidade de
sico neuroepitelial (Fig. 2.2). A questão relacionada à ressecção total da lesão.

A B

Fig. 2.1 – AMV, 14 anos. Crises parciais complexas causadas por esclerose mesial temporal. (A) Ressonância magnética T2
mostrando hipersinal no hipocampo e amígdala à direita. (B) Corte coronal do mesmo exame na seqüência FLAIR, mostrando
hipersinal nas mesmas estruturas.

A B

Fig. 2.2 – DOM, 17 anos. Crises parciais complexas, causadas por tumor disembrioplásico neuroepitelial. O exame por resso-
nância magnética em cortes axial (A) e coronal (B) na seqüência FLAIR mostra hipersinal em região de hipocampo/amígdala e
região para-hipocampal.

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2 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia na Infância

O terceiro tipo de patologia encontrada na epi- a estimulação cortical em crianças abaixo de 10 anos
lepsia temporal é constituído pela displasia cortical9. costuma ser insuficiente para a localização do córtex
A displasia cortical é uma das patologias mais freqüen- motor. Consideramos, portanto, válido e de extrema
temente encontradas em crianças e o início ictal, em utilidade um delineamento correto da área motora (e
geral, localiza-se na extensa anomalia cortical, quase da linguagem, eventualmente) fora do ambiente cirúr-
sempre ligada a defeitos de migração neuronal. gico e da premência da resolução cirúrgica, com tem-
po suficiente para um bom planejamento operatório,
Ressecções Extratemporais o qual será realizado alguns dias após. A própria placa
e seus contatos servirão como pontos de reparo para
Incluem ressecções frontais, parietoccipitais e a identificação do córtex eloqüente e para se dese-
multilobares. A localização exata da área a ser res- nhar os limites cirúrgicos no momento da reoperação.
secada dependerá da identificação correta dos limi- A ultra-sonografia intra-operatória será de utilidade
tes das áreas eloqüentes. O emprego de monitora- na busca dos pontos anatômicos e o aspirador ultra-
ção invasiva, sem dúvida, é bem maior em crianças sônico facilita a ressecção cirúrgica, ganhando tempo
do que em adultos. A monitoração invasiva, com e reduzindo a perda sangüínea.
placas e estrias, tem como finalidade a localização Os processos patológicos mais encontrados na epi-
exata do início ictal e do córtex eloqüente (motor e lepsia extratemporal são as displasias corticais, neo-
linguagem). plasias, esclerose tuberosa, áreas de gliose ou atrofia,
Embora a monitoração durante o procedimento ci- síndrome de Sturge-Weber (Fig. 2.3) e síndrome de
rúrgico, em mãos experientes, seja quase sempre sufi- Rasmussen (Fig. 2.4). O resultado pós-operatório
ciente para o planejamento cirúrgico imediato, espe- global tende a ser ligeiramente inferior quando com-
cialmente em crianças que apresentam crises diá­rias, parado com a epilepsia temporal.

a b

Fig. 2.3 – DMS, 1 ano. Crises parciais complexas e vários episófios de status epilepticus. (A) Angioma da hemiface. Angioma
leptomeníngeo hemisférico (síndrome de Sturge-Weber) e resultado final após hemisferotomia. (B) Visão do cirurgião, ou seja, o
lobo temporal situa-se no alto da figura).

Fig. 2.4 – RAS, 9 anos. Epilepsia parcial contínua. Encefalite de Rasmussen. Hemisferotomia. Ressonância magnética axial
FLAIR mostrando hipersinal hemisférico, mais concentrado nas regiões insular e periinsular.

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21
Parte 1 – Epilepsia

Hemisferectomias e Hemisferotomias
As diferentes técnicas empregadas nas hemisfe-
rectomias podem ser subdivididas em dois grandes
grupos: hemisferectomias e hemisferotomias.

Hemisferectomias
Correspondem às técnicas tradicionais de ablação
de todo o hemisfério ou de parte dele. Dandy13 foi o
primeiro a realizar esse procedimento ablativo, que
logo foi empregado em crianças14, sendo posterior-
mente abandonado devido às múltiplas complica-
ções ligadas à hemossiderose superficial. Entretan-
to Falconer15, o iniciador da moderna cirurgia para
epilepsia em crianças, já relatara que o problema
poderia ser contornado com a remoção de membra-
nas seguida de derivação liquórica. Em seguida inú- Fig. 2.5 – Esquema demonstrando a técnica cirúrgica da
meros autores relataram cada qual sua experiência hemisferotomia. A seta superior mostra a calosotomia trans-
e incorporaram múltiplos detalhes tanto na remoção ventricular, a seta horizontal mostra a abordagem através do
opérculo frontoparietal e insulectomia, e a seta inferior mostra
do hemisfério “em bloco” como em fragmentos. A a amígdalo-hipocampectomia.
hemidecorticação foi uma técnica empregada na
tentativa de prevenir outra freqüente complicação, A hemimegalencefalia é outro exemplo em que a
a hidrocefalia. técnica cirúrgica a ser empregada dependerá da defor-
Rasmussen16 introduziu uma técnica elegante, des- midade estrutural sofrida pelo cérebro21. A síndrome
crita por ele mesmo como “anatômica subtotal, mas de Sturge-Weber (Fig. 2.3), apesar do aspecto assus-
fisiologicamente completa...” em que parte do hemis- tador do angioma leptomeníngeo extenso, hemisféri-
fério era ressecada e parte desconectada, dando início co, permite a hemisferotomia. Aqui, veias profundas
a uma nova era nessa cirurgia radical. periventriculares podem representar um grande risco
cirúrgico. Outra patologia intrigante é a encefalite de
Rasmussen (Fig. 2.4) e, neste caso, embora o sistema
Hemisferotomias ventricular esteja apenas pouco dilatado, a hemisfero-
Villemure17 foi o introdutor do conceito de tra- tomia pode ser empregada com êxito. Por outro lado,
totomia ou cirurgia desconectiva total, com enorme a porencefalia representa um exemplo típico em que
vantagem técnica e, de certa forma, simplicidade, ao a hemisferotomia periinsular deve ser usada: aqui o
propor a hemisferotomia periinsular. Nesse procedi- próprio processo patológico já provocou uma exposi-
mento o menor volume de cérebro é removido para ção do sistema ventricular bastante ampla, o que faci-
permitir uma completa desconexão hemisférica. Qua- lita sobremaneira o procedimento cirúrgico.
se ao mesmo tempo em que Villemure descreveu esta O resultado cirúrgico nesses casos tende a ser ani-
técnica, Delalande et al.18 também utilizaram o termo mador, embora a complexidade cirúrgica seja eviden-
hemisferotomia para designar outro procedimento te qualquer que seja a técnica empregada.
desconectivo, mas com uma abordagem parassagital,
atingindo o sistema ventricular e através dele, pro- Outros procedimentos
cedendo à total desconexão do hemisfério. Schramm
et al.19 propuseram uma técnica em tudo semelhante Calosotomia
à de Villemure, entretanto adicionando a lobectomia Calosotomia total ou parcial é um procedimento
temporal à desconexão. paliativo indicado para o tratamento de crises com
É nossa opinião e de outros20 que a escolha da téc- freqüentes quedas (crises tônicas, atônicas e mioclô-
nica adequada dependerá muito da experiência do ci- nicas), podendo até ocorrer melhora de outros tipos de
rurgião, mas também deverá ser empregada de acordo crises22. Sua importância diminuiu consideravelmente
com o processo patológico em questão e a conseqüente nos últimos tempos, em parte devido ao aparecimento
deformação do cérebro. A técnica por nós empregada de novas drogas, mas também pela complexidade da
consiste no acesso ao sistema ventricular através do cirurgia ante os resultados pouco animadores que ela
opérculo frontoparietal, seccionando a cápsula interna proporciona, associado a complicações cirúrgicas liga-
e coroa radiada e, em seguida, calosotomia transven- das à retração cerebral, risco de lesão venosa na região
tricular, secção das fibras frontais horizontais e res- parietal posterior, com concomitante seqüela motora e
secção das estruturas mesiais temporais (Fig. 2.5). formação de hematomas. Esse risco é minimizado em

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2 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia na Infância

crianças nas quais a calosotomia pode ser feita em um Em recente publicação Patwardhan et al.29 relata-
único tempo, por via anterior, através de pequena cra- ram os resultados de 38 crianças submetidas a esti-
niotomia realizada logo atrás da sutura coronal, conse- mulação vagal, e as respostas foram animadoras em
guindo-se a secção em torno de 90% do corpo caloso 70% dos casos, compreendendo crianças com idades
preservando-se apenas o esplênio, posteriormente. Al- variando de 11 meses a 18 anos.
guns autores são francamente favoráveis à utilização Embora alguns grupos relatem eficácia satisfatória
da calosotomia em crianças e relatam importante me- e a técnica seja praticamente desprovida de complica-
lhora do ponto de vista neuropsicológico23. ções, o custo do equipamento ainda é elevado, cau-
sando significativa limitação no uso dessa técnica.
Transecção Subpial Múltipla
Cirurgia desconectiva utilizada quando o foco epi- Evolução
léptico está localizado em área cortical eloqüente e, Morbidade e Mortalidade
portanto, não passível de ressecção cirúrgica como em
córtex motor ou de linguagem. Pode também ser in- A cirurgia de epilepsia da infância está associada
dicado quando a área a ser ressecada é muito extensa a um maior risco perioperatório do que o observado
e difusa. Shimizu e Maehara24 relataram essa técnica em adultos. Isto se deve particularmente às caracterís-
em 25 pacientes pediátricos entre 158 casos operados, ticas próprias do paciente pediátrico e das patologias
com bons resultados em 10 casos (Engel I e II), 12 ca- encontradas. Nesse grupo de pacientes, existe um
sos Engel III e 3 casos sem benefício (Engel IV), não predomínio de cirurgias extratemporais, com amplas
encontrando mortalidade e morbidade em seus casos. exposições e, muitas vezes, amplas ressecções. Além
A transecção subpial múltipla é o procedimento de disso, quanto mais precoces as cirurgias, menores são
escolha em casos de síndrome de Landau-Kleffner, as crianças operadas, oferecendo maior risco. Assim,
apresentando resultados controversos25. hematomas e déficits neurológicos são mais comu-
mente observados em crianças30.
Estimulação Vagal Por outro lado, a mortalidade de pacientes com epi-
lepsias intratáveis é até nove vezes maior do que em
A estimulação vagal é realizada através de eletrodo epilépticos controlados, sendo tal tendência revertida
implantado no tronco do nervo vago esquerdo na região com o controle das crises após a cirurgia. Em rela-
cervical e conectado a estimulador (Neurocybernetic ção à morbidade, freqüentes crises epilépticas trazem
Prosthesis – Cyberonics, Inc. – Houston, Tex., Estados maior risco de desenvolvimento de déficits intelec-
Unidos). A capacidade de a estimulação vagal inibir tuais, neoplasias, traumas, afogamentos, osteoporose,
a ocorrência de crises epilépticas explica-se pelo fato infertilidade, entre outros. Esses déficits devem ser
de que mais de 90% das fibras vagais carreiam infor- confrontados com os possíveis déficits ocasionados
mações aferentes viscerais e somáticas, que terminam pelo procedimento cirúrgico e, embora muitas vezes
difusamente no cérebro, atingindo áreas cerebrais que a realização da cirurgia não seja totalmente inócua à
provavelmente são responsáveis pela epileptogênese criança, crises epilépticas recorrentes causam graves
incluindo cerebelo, diencéfalo, amígdala, hipocampo,
danos, principalmente do ponto de vista cognitivo.
córtex insular e múltiplos centros do tronco cerebral.
Embora não se possa definir quais centros são respon-
sáveis pela ação da estimulação vagal, o locus ceru- Prognóstico
leus e núcleo da rafe parecem estar envolvidos26. O prognóstico cirúrgico depende essencialmente
Essa forma de tratamento cirúrgico inicialmente da etiologia e do tamanho da ressecção, e, nos casos
foi correlacionada com redução substancialmente do em que é possível a ressecção completa da área epi-
número de crises em crianças, promovendo melhora leptogênica, existe melhor prognóstico. Nos casos
cognitiva e comportamental também pela redução do com esclerose hipocampal, o prognóstico observado
efeito tóxico medicamentoso. é semelhante ao dos adultos. A reoperação deve ser
Um fator observado em várias séries é a redução considerada sempre que houver manutenção das cri-
progressiva de crises com o passar do tempo, chegan- ses20, desde que a melhora da qualidade de vida da
do à mediana de 44% em 3 anos27. Embora as indica- criança e da família esteja relacionada principalmen-
ções cirúrgicas relacionadas aos tipos de crises não te com o controle das crises, e não com a sua causa.
estejam ainda bem definidas, a estimulação vagal tem
sido empregada em portadores de síndrome de Len-
nox-Gastaut e em crianças que não obtiveram êxito
Conclusão
com outros procedimentos, inclusive calosotomia, e Os resultados da cirurgia para tratamento da epi-
em pacientes com esclerose tuberosa, embora nesses lepsia são encorajadores. A indicação cirúrgica é o fa-
casos a cirurgia ressectiva seja superior28. tor fundamental e deve ser feita por equipe treinada e

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23
Parte 1 – Epilepsia

habituada ao tratamento de crianças. As peculiarida- 9. Adelson PD. Temporal lobectomy in children with
des dessa faixa etária iniciam-se no modo de apresen- intractable seizures. Pediatr Neurosurg. 2001;
tação clínica da epilepsia, nos fatores etiológicos, no 34(5):268-77.
diagnóstico por imagens e na abordagem cirúrgica: 10. Mohamed A, Wyllie E, et al. Temporal lobe epi-
não se pode tratar a criança como se fosse um adulto lepsy due to hippocampal sclerosis in pedia-
pequeno sem se incorrer em falhas importantes. tric candidates for epilepsy surgery. Neurology.
2001;56(12):1643-9.
Embora a epilepsia extratemporal seja mais fre-
11. Park TS, Bourgeois BF, et al. Subtemporal trans-
qüente que a epilepsia do lobo temporal, esta ainda parahippocampal amygdalohippocampectomy for
predomina quando se considera isoladamente a lo- surgical treatment of mesial temporal lobe epilepsy.
calização da epilepsia. O aumento das indicações de Technical note. J Neurosurg. 1996;85(6):1172-6.
cirurgias hemisféricas, observado recentemente nos 12. Iannelli A, Guzzetta F, et al. Surgical treatment of
centros especializados, testemunha o aumento do nú- temporal tumors associated with epilepsy in children.
mero de casos graves, com extraordinário êxito, uma Pediatr Neurosurg. 2000;32(5):248-54.
vez que em crianças não é necessário o total desapa- 13. Dandy WE. Removal of the right cerebral hemis-
recimento de crises para uma melhora clínica e com- phere for certain tumors with hemiplegia. JAMA.
portamental: a redução das crises associada à redução 1928;90:823-5.
da toxicidade medicamentosa são os fatores que per- 14. Krynaw RA. Infantile hemiplegia treated by remo-
mitem uma recuperação cognitiva impressionante. ving one cerebral hemisphere. J Neurol Neurosurg
Nossa grande aliada na recuperação pós-operatória Psychiatry. 1950;13:243-67.
da criança é a plasticidade cerebral, desde que a cirur- 15. Rasmussen T. Cerebral hemispherectomy: indica-
gia seja indicada no momento certo. Entretanto há a tions, methods, and results. In: Schmidek HH, Swe-
necessidade de se estimular o desenvolvimento neu- et WH, editors. Operative neurosurgical techniques.
Philadelphia: WB Saunders; 1983; p. 1235-41.
romotor no período pós-operatório e um tratamento
16. Falconer MA. Delayed complications associated
intensivo de reeducação motora, equilíbrio, marcha,
with ventricular dilatation following hemispherec-
linguagem etc., associado à mudança e enriqueci- tomy. Dev Med Child Neurol. 1969;20(Suppl):96-7.
mento do meio ambiente, e o uso de realidade virtu- 17. Villemure JG, Mascott CR. Hemispherotomy: the
al (computadores) deve ser instituído precocemente. periinsular approach – technical aspects. Epilepsia
Um verdadeiro treinamento, envolvendo a mãe e res- [abstract]. 1993;34(Suppl 6):48.
ponsáveis, tem de ser desencadeado para que o fe- 18. Delalande O, Pinard JM, et al. Hemispherotomy: a
nômeno da plasticidade cerebral possa ser realmente new procedure for central disconnection. Epilepsia.
observado e vantajosamente aproveitado. 1992;33(Suppl 3):99-100.
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2 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia na Infância

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Tratamento Cirúrgico da
Epilepsia do Lobo Temporal
Indicações e Técnicas
Wen Hung Tzu

Introdução Avaliação pré-operatória

O
tratamento cirúrgico das epilepsias difere do não invasiva
de microcirurgias intracerebrais para tumo- História Clínica
res, malformações arteriovenosas, aneuris-
mas, porque nestes o tratamento resume-se na sim- É importante diferenciar, na história clínica, se o
ples ressecção da lesão, porém no caso de cirurgia de paciente é epiléptico, ou seja, portador de mais de uma
epilepsia, a simples ressecção da lesão nem sempre crise epiléptica, não ocorrendo em condições febril ou
leva ao controle das crises e, muitas vezes, embora o tóxico-metabólica, ou se buscou auxílio médico logo
paciente apresente crises epilépticas, não se evidencia na sua primeira crise. Isso tem relevância porque,
lesão nos exames radiológicos habituais. Portanto a em pacientes epilépticos, especialmente naqueles de
cirurgia de epilepsia necessita de uma avaliação pré- longa data, o circuito neural que gera e que perpetua
operatória adequada para determinar: as crises já está bem estabelecido e provavelmente
• se as crises descritas pelo paciente são real- não será afetado com a simples ressecção da lesão,
mente de natureza epiléptica; quando esta estiver presente. Já em pacientes com
• o hemisfério cerebral responsável pelas crises; história recente de crise, provavelmente esse circuito
• a região do hemisfério responsável pelas crises; neural ainda não teve tempo para ser formado, então
• se há lesão detectada nos exames radiológicos; a ressecção simples da lesão provavelmente seria su-
• se a lesão detectada nos exames radiológicos ficiente. A história clínica e a descrição detalhada da
justifica o tipo da(s) crise(s) do paciente; crise também podem sugerir se a crise é de origem ou
• se o paciente tem indicação cirúrgica; apresenta envolvimento temporal ou extratemporal.
• se o paciente pode ou não ser submetido à ci- As crises de origem no lobo temporal podem ser di-
rurgia (avaliação quanto aos possíveis prejuí­ vididas didaticamente em temporal lateral e temporal
zos decorrentes da cirurgia, seja nas esferas mesial. As crises temporais laterais podem apresentar
motora, linguagem ou cognitiva); como aura bloqueio súbito e precoce da fala no início
• se a simples ressecção da lesão seria suficiente da crise, ilusões ou alucinações auditivas, pseudover-
para controlar as crises ou se ressecção deve tigem ou alucinações visuais complexas associadas
incluir outras áreas do cérebro além da lesão; a movimentos (indicativo de envolvimento do lobo
• a(s) área(s) adicional(is) do cérebro que temporal posterior e inferior). As crises temporais
deva(m) ser ressecada(s). mesiais são a forma mais comum da epilepsia parcial
O tratamento cirúrgico das epilepsias provenientes em adultos e têm sua origem na amígdala, hipocampo
do lobo temporal também requer avaliação pré-opera- e giro para-hipocampal, podendo apresentar aura epi-
tória criteriosa; o tipo de cirurgia e a extensão da res- gástrica, psíquica, autonômica ou não apresentar aura,
secção são planejados e realizados “sob medida” para porém a característica mais importante que denota o
cada caso, de acordo com os resultados da avaliação envolvimento da porção mesial do lobo temporal é a
pré-operatória que será brevemente descrita a seguir. crise parcial complexa. Em razão das numerosas co-

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Parte 1 – Epilepsia

nexões que existem dentro do lobo temporal, a forma Teste de Wada (Teste do Amital Sódico)
temporal lateral pura é muito rara, geralmente haven-
do imbricamento e propagação rápida envolvendo a Consiste na anestesia transitória de um hemisfério
porção mesial do lobo temporal1,2. cerebral com amital sódico, um barbitúrico de curta
duração, para avaliação de funções cognitivas no he-
misfério contralateral, por meio de cateterização sele-
Ressonância Nuclear Magnética (RNM) tiva da artéria carótida interna por punção femoral. As
Introduzida na década de 1980, permite a iden- principais indicações do teste são a determinação da
tificação de lesões responsáveis pelas crises epilép- dominância hemisférica de linguagem (quando o pla-
ticas. A RNM facilitou o diagnóstico de lesões que nejamento cirúrgico envolve a ressecção de áreas que
são dificilmente reveladas pela tomografia computa- possivelmente medeiem funções de linguagem; o tes-
dorizada (TC) ou angiografia cerebral, como esclero- te do amital indica qual dos hemisférios é dominante
se de hipocampo, dos distúrbios do desenvolvimento para linguagem ou se ocorre representação bilateral
cortical, de pequenos tumores de crescimento lento e desta) e a avaliação da reserva funcional da memória.
cavernomas. A RNM revolucionou a cirurgia de epi- Avalia-se a reserva funcional de memória quando, ao
lepsia porque cada vez mais se detectam lesões na se planejar ressecção de estruturas temporais mesiais
RNM e conseqüentemente se descobre que mesmo de um hemisfério, há suspeita de que estruturas con-
um quadro clínico que sugere crise do tipo prima- tralaterais possam não estar funcionalmente íntegras,
riamente generalizada na verdade tem origem focal, o que implicaria risco de desenvolvimento de amné-
muitas vezes perto da linha mediana. Muitos dos pa- sia grave. São exemplos dessa situação: evidência
cientes que foram submetidos à calosotomia na era pela RNM de lesão temporal mesial bilateral, registro
pré-ressonância talvez seriam submetidos a ressec- de crises originadas em ambos os lobos temporais,
ções focais na era pós-ressonância. suspeita de disfunção temporal mesial bilateral na
avaliação neuropsicológica.
Monitoração por Vídeo-eletroencefalograma
Consiste no registro simultâneo de crises por vídeo SPECT (Tomografia Computadorizada por
e por eletroencefalograma (EEG). A vídeo-EEG per- Emissão de Fóton único)
mite análise pormenorizada da semiologia clínica das
Consiste na injeção de radiofármaco lipofílico
crises, em fases iniciais e tardias, o que auxilia na de-
hexametil-propilenoaminaoxima (HM-PAO) ou ECD
terminação das regiões cerebrais envolvidas no início
(dímero de etilcisteinato) marcado com tecnécio (Tc-
e na propagação das crises. A semiologia clínica isola-
99m) na hora da crise (SPECT ictal) ou fora da crise
damente pode sugerir a localização do foco ou, como
(SPECT interictal). Por apresentar meia-vida de 6,04
em muitos casos, determinar o hemisfério cerebral
horas, o radioisótopo pode ser injetado na hora da cri-
onde as crises têm origem. O EEG ictal habitualmente
se e a leitura poderia ser feita horas após, não havendo
permite determinar a região de início da crise. Porém
necessidade de fazê-la imediatamente. A SPECT for-
pode ocorrer o fenômeno de falsa localização da área
nece informações em relação ao fluxo sangüíneo ce-
de início ictal, com o ritmo ictal sendo mais bem visu-
alizado no hemisfério contralateral ao hemisfério onde rebral regional. Acredita-se que, durante a fase ictal,
a descarga se originou. No caso de falsa localização na haja aumento e, durante a fase interictal, diminuição
epilepsia do lobo temporal, supõe-se que ocorra rápi- do fluxo sangüíneo na zona epileptogênica4-7.
da propagação para o hemisfério contralateral3. A SPECT ictal também pode ser útil na avaliação do
padrão de propagação da crise. A SPECT ictal apresen-
ta sensibilidade de 97% e de 50% a 70% no pós-ictal.
Avaliação Neuropsicológica Havendo falsa lateralização em 4% a 10% dos casos,
São aplicados testes que estudam as diversas esfe- porém, não ocorre em SPECTs ictais. A SPECT pode
ras cognitivas, incluindo eficiência cognitiva global, ser útil na avaliação de epilepsia do lobo temporal, es-
processos atencionais, capacidade de planejamento pecialmente quando as imagens da RNM não são diag-
e resistência à interferência, memória operacional e nósticas.
funções executivas (relacionados anatomicamente à Os resultados dos testes indicados na avaliação
rede subcortical frontal), memória, linguagem e habi- pré-operatória podem ser congruentes, apontando
lidades visuoespaciais e visuoconstrutivas. para a mesma região do mesmo hemisfério como a
Essa avaliação permite identificar não somente défi­ provável zona epileptogênica, ou podem ser incon-
cits focais em cada uma dessas esferas, mas também gruentes, apontando diferentes regiões do mesmo he-
auxiliar na correlação anatômico-funcional (que pode misfério, ou até mesmo diferentes hemisférios como
au­xiliar na regionalização/lateralização do foco) e na zona epileptogênica. Nesse caso, entre os diversos
previsão de prejuízos funcionais pós-operatórios que itens da avaliação pré-operatória, a presença de uma
podem ocorrer em uma ou mais esferas cognitivas. lesão na RNM recebe a maior ponderação.

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3 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia do Lobo Temporal Indicações e Técnicas

Avaliação pré-cirúrgica invasiva de início ictal e o córtex eloqüente determinados. Com


esses dados, são elaborados o mapa cerebral e o pla-
Consiste na colocação de placas ou estrias sub- nejamento cirúrgico. Durante todo o período em que o
durais na superfície do córtex cerebral. É indicada paciente permanece na unidade de vídeo-EEG, recebe
quando, após a avaliação não invasiva se tenha con- cobertura antibiótica. Esse procedimento dura, no má-
seguido determinar a região responsável pelo início
ximo, sete dias, quando a craniotomia é reaberta e a
das crises, porém sem especificar com segurança a
ressecção cirúrgica é realizada de acordo com o mapa
área de início ictal, principalmente em casos de epi-
cerebral. A vantagem da colocação das placas é per-
lepsia focal sem lesão evidente na RNM. A avaliação
mitir tempo maior para estudo, possibilitando analisar
pré-cirúrgica invasiva também está indicada quando a
não somente a atividade interictal, mas também a iden-
área de início ictal está próxima ao córtex eloqüente.
No caso da epilepsia temporal, esta dificuldade ocorre tificação das áreas responsáveis pela gênese das crises.
quando a área de início ictal situa-se próximo à área
de linguagem no hemisfério dominante (Figs. 3.1
e 3.2). Nesse caso, além de determinar o registro do
início ictal, os eletrodos invasivos permitem o mapea-
mento, por estimulação cortical por corrente elétrica, das
áreas de linguagem. As placas ou estrias subdurais são
constituídas por contatos de platina ou aço inoxidável
prensados entre duas lâminas maleáveis de silicone.
Os contatos são enumerados para melhor identificação
e servem tanto para registrar a atividade elétrica ce-
rebral como para realizar a estimulação elétrica. Por
meio de craniotomia ampla, a região suspeita é expos-
ta, e uma ou mais placas, ou a combinação de placas
e estrias, são colocadas sobre o córtex cerebral (Fig.
3.3). A colocação correta das placas e o fechamento
hermético da dura-máter e da ferida cirúrgica depen-
dem do planejamento cirúrgico pré e intra-operatório,
bem como da habilidade técnica da equipe cirúrgica.
Após a cirurgia, o paciente é reconduzido à unidade de
vídeo-EEG, onde são registradas as crises e as áreas

Fig. 3.2 – RNM, corte coronal, da mesma paciente da Fig. 3.1


demonstrando a alteração da substância cinzenta ao redor do
sulco temporal superior (seta).

Fig. 3.1 – RNM, corte axial, de uma paciente de 40 anos com


história de crises parciais complexas de difícil controle desde
15 anos, demonstrando imagem (seta) sugestiva de displasia Fig. 3.3 – Placa subdural de 64 contatos colocada sobre a
cortical na região temporal posterior esquerda. superfície lateral do lobo temporal esquerdo.

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29
Parte 1 – Epilepsia

Devido ao fato de o paciente estar acordado sem qual- giro denteado pelo sulco hipocampal. Na porção an-
quer efeito anestésico, as condições sob registro inva- terior, o giro para-hipocampal desvia-se medialmente
sivo crônico se assemelham às condições habituais. e recurva sobre si próprio para formar o unco. O giro
As desvantagens são: obrigatoriedade de duas cirur- para-hipocampal é separado do giro fusiforme pelo
gias, risco de infecção, de fístula liquórica e dificulda- sulco colateral. O unco estende-se da incisura rinal
de de ser realizada em crianças pequenas8. anteriormente até o giro intralímbico posteriormente
e apresenta um formato triangular com três elemen-
Indicação cirúrgica em epilepsia do tos: segmento anterior, ápice e segmento posterior.
O segmento anterior apresenta a superfície ântero-
lobo temporal medial, composta por giro semilunar, giro ambiens e
O melhor momento para o tratamento cirúrgico de- córtex pré-piriforme. A superfície ântero-medial do
pende da etiologia da epilepsia. A cirurgia é indicada unco está relacionada à artéria carótida interna su-
precocemente aos casos de etiologia sintomática, como praclinóidea e ao segmento M1 da artéria cerebral
nas epilepsias associadas a neoplasias ou a lesões de média. O ápice do unco é formado pelo giro ambiens
fácil acesso e ressecção cirúrgica que eventualmente anteriormente e pelo giro uncinado posteriormente.
possam provocar hemorragias intracerebrais, como a O ápice do unco está relacionado ao nervo oculo-
maioria dos cavernomas. Nas lesões neoplásicas com motor (o nervo oculomotor no seu trajeto da fossa
caráter evolutivo, muitas vezes a indicação cirúrgica interpeduncular ao teto do seio cavernoso passa por
é oncológica, independentemente da presença ou não baixo do ápice do unco). O segmento posterior do
de epilepsia refratária. Na ausência de lesões citadas, unco é constituído por três giros: giro uncinado, ban-
o tratamento cirúrgico é indicado a portadores de epi- da de Giacommini e giro intralímbico. O segmento
lepsia refratária. Embora o critério de refratariedade posterior apresenta duas superfícies: a inferior e a
seja subjetivo para cada paciente, para muitos autores, póstero-medial; a superfície inferior constitui o teto
o não-controle ou o controle incompleto das crises do sulco hipocampal ou incisura hipocampal; a su-
após uso de pelo menos duas drogas anticonvulsivan- perfície póstero-medial do unco está relacionada à
tes consideradas de primeira linha, sendo uma delas base do pedúnculo cerebral. A porção inferior da
a CBZ ou a PHT, por um período de 1 ano ou mais, superfície póstero-medial está relacionada à artéria
caracteriza a epilepsia de difícil controle9. cerebral posterior (segmento P2A). Os giros do seg-
mento posterior do unco são na verdade digitações
Anatomia microcirúrgica do lobo hipocampais vistas por fora do hipocampo. O seg-
temporal mento anterior do unco pertence ao sistema do giro
para-hipocampal, e o segmento posterior, ao sistema
Como citado anteriormente, a técnica cirúrgica e a do hipocampo. O córtex entorrinal, bem conhecido
extensão da ressecção em epilepsias do lobo tempo- na fisiopatologia das epilepsias do lobo temporal me-
ral devem ser planejadas e realizadas “sob medida” sial, ocupa a superfície ântero-medial do unco e con-
para cada caso. Entretanto, para poder realizar essas tinua na porção anterior do giro para-hipocampal até
ressecções “sob medida”, o conhecimento da anato- aproximadamente 2 cm atrás do unco, sendo a sua
mia microcirúrgica do lobo temporal é de fundamen- remoção ou desconexão importante no tratamento ci-
tal importância. Aqui será feita uma breve revisão da rúrgico das epilepsias temporais mesiais. O giro den-
anatomia microcirúrgica do lobo temporal. teado está localizado acima do giro para-hipocampal
O lobo temporal apresenta quatro superfícies: me- e abaixo da fímbria do fórnice, sendo separado do
sial, superior, lateral e basal. A superfície mesial do primeiro pelo sulco hipocampal e do segundo pelo
lobo temporal estende-se da incisura rinal anterior- sulco fimbrodentado. O sulco hipocampal é mais pro-
mente até a junção dos sulcos parietoccipital e calcari- eminente na sua porção anterior, próximo ao unco e o
no posteriormente. A porção mesial do lobo temporal sulco fimbrodentado, na sua porção atrás do unco. A
é composta de elementos extra e intraventriculares. membrana de aracnóide passa pelos sulcos hipocam-
Os elementos extraventriculares são constituídos pal e fimbrodentado, acompanhada de vasos que vão
pelo giro para-hipocampal, unco e giro denteado; os suprir a formação hipocampal (artérias e veias hipo-
elementos intraventriculares, pelo hipocampo, amíg- campais). A identificação dessa membrana de arac-
dala, fórnice e fissura coróidea. nóide e, conseqüentemente, dos vasos hipocampais,
O giro para-hipocampal é a circunvolução do constitui importante ponto de referência nas cirurgias
lobo temporal situada mais medialmente e circunda envolvendo a porção mesial do lobo temporal. O giro
o tronco encefálico. Na porção posterior, o giro para- denteado termina no segmento posterior do unco, es-
hipocampal é interceptado pelo sulco calcarino ante- pecificamente na banda de Giacommini (Fig. 3.4). O
rior, que o divide em duas porções: giro lingual, infe- hipocampo, que significa “cavalo marinho” é com-
riormente, e istmo do giro do cíngulo, supe­riormente. posto por 3 partes: cabeça, corpo e cauda (Fig. 3.5).
O giro para-hipocampal é separado superiormente do A cabeça do hipocampo tem seu principal eixo orien-

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3 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia do Lobo Temporal Indicações e Técnicas

pal eixo orientado látero-medialmente até fundir-se


macroscopicamente com a parede medial do átrio
do ventrículo lateral. A amígdala constitui a pare-
de anterior do corno temporal do ventrículo lateral
e situa-se acima e à frente da cabeça do hipocam-
po; a amígdala continua superiormente com o globo
pálido. Em termos práticos, a remoção da amígdala
significa a remoção do unco, seguindo os parâme-
tros anatômicos já citados. A estrutura que “separa”
aproximadamente o globo pálido da amígdala é o
trato óptico (Fig. 3.6). A fímbria do fórnice é for-
mada pelo álveo, a substância branca subcortical que
reveste a superfície intraventricular do hipocampo. A
Fig. 3.4 – Vista medial do lobo temporal direito. 1= esplê- fímbria inicia-se na borda medial do hipocampo, no
nio do corpo caloso; 2 = giro denteado; 3 = istmo do giro do nível do ponto coróideo inferior, e continua poste-
cíngulo; 4 = substância perfurada anterior; 5 = fímbria; 6 = riormente em direção ao átrio do ventrículo lateral,
artérias lentículo-estriadas laterais do segmento M1 da artéria constituindo a principal via eferente da formação
cerebral média; 7 = sulco calcarino anterior; 8 = segmento hipocampal, sendo sua remoção ou desconexão im-
anterior do unco; 9 = segmento posterior do unco; 10 = giro portante para o êxito da cirurgia de epilepsia do lobo
lingual; 11 = giro para-hipocampal; 12 = sulco hipocampal;
13 = incisura rinal. temporal mesial. A fissura coróidea é uma fissura
embrionária, localizada entre o tálamo e o fórnice, e
constitui dois terços posteriores da parede medial do
corno temporal. O plexo coróide, importante ponto
de referência na cirurgia da porção mesial do lobo
temporal, está aderido ao tálamo por meio de tênia
coróidea e ao fórnice por meio de tênia fimbriae. As
tênias coróidea e fimbriae são compostas por epên-
dima (Fig. 3.7). Nas cirurgias envolvendo a porção
mesial do lobo temporal, as estruturas que devem

Fig. 3.5 – Vista lateral do hipocampo esquerdo. A parede


lateral do corno temporal e do átrio foi removida. 1 = corpo do
fórnice; 2 = forame de Monro; 3 = cabeça do núcleo caudado;
4 = núcleo lentiforme; 5 = tálamo; 6 = cauda do hipocampo;
7 = bulbo do caloso; 8 = corpo geniculado lateral e ponto
coróideo inferior (artéria coróidea anterior em vermelho e veia
ventricular inferior em azul); 9 = fímbria; 10 = corpo do hipo-
campo; 11 = recesso uncal; 12 = cabeça do hipocampo; 13 =
trígono colateral.

tado látero-medialmente e apresenta as digitações hi-


pocampais características (“pés hippocampi”), que
se assemelham muito ao aspecto de uma pata de leão.
A cabeça do hipocampo localiza-se à frente do ponto
coróideo, sendo, portanto, desprovida de plexo corói-
de, e dirige-se medialmente para ocupar o segmento
posterior do unco intraventricularmente, constituindo
o terço anterior da parede medial do corno temporal.
A presença do plexo coróide marca o início do corpo
do hipocampo e também marca o início da fissura
coróidea. O corpo do hipocampo tem seu principal Fig. 3.6 – Vista coronal do núcleo lentiforme e da amígdala
esquerda. 1 = tálamo; 2 = sulco circular superior da ínsula;
eixo orientado ântero-posteriormente e é mais largo 3 = cápsula interna; 4 = putame; 5 = ínsula; 6 = globo pálido; 7
na sua porção anterior do que na posterior. A cauda = claustro; 8 = giro de Heschl; 9 = trato óptico; 10 = amígdala;
do hipocampo é a porção mais fina e tem o princi- 11 = ápice do unco; 12 = cabeça do hipocampo.

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31
Parte 1 – Epilepsia

Fig. 3.7 – Vista intra-operatória do hipocampo esquerdo.


1 = eminência colateral; 2 = trígono colateral; 3 = corpo do Fig. 3.8 – Vista medial do lobo temporal direito, com preser-
hipocampo; 4 = cauda do hipocampo; 5 = fímbria; 6 = cabeça vação das principais artérias relacionadas à região mesial do
do hipocampo; 7 = tênia fimbriae; 8 = plexo coróide. lobo temporal. 1 = segmento P3 da artéria cerebral posterior;
2 = substância perfurada anterior e o segmento M1 da artéria
cerebral média; 3 = segmento cisternal da artéria coróidea ante-
ou podem ser removidas localizam-se lateralmente rior cursando sobre a superfície ântero-medial do unco e sobre a
porção superior da superfície póstero-medial do unco; 4 = seg-
à fissura coróidea. A porção mesial do lobo temporal mento plexular da artéria coróidea anterior; 5 = segmento P2P
é suprida por ramos provenientes da artéria carótida da artéria cerebral posterior; 6 = superfície póstero-medial do
interna supraclinóidea, segmento M1 da artéria cere- segmento posterior do unco, relacionada ao segmento P2A da
bral média, artéria coróidea anterior e artéria cerebral artéria cerebral posterior; 7 = artéria cerebral anterior; 8 = arté-
posterior. A porção distal da artéria carótida interna ria carótida interna, porção supraclinóidea; 9 = artéria comuni-
cante posterior; 10 = segmento P1 da artéria cerebral posterior.
supraclinóidea, a metade proximal do segmento M1
da artéria cerebral média e a porção proximal do
segmento cisternal da artéria coróidea anterior estão
relacionadas à superfície ântero-medial do unco. O Na abordagem às lesões localizadas na ínsula, su-
nervo oculomotor, o recesso uncal e a amígdala es- perfície superior do lobo temporal ou qualquer lesão
tão relacionados ao ápice do unco. A porção distal do localizada na fissura sylviana, torna-se obrigatória a
segmento cisternal da artéria coróidea anterior está abertura da fissura sylviana. Seguindo a técnica de
relacionada à porção superior da superfície póstero- dissecção intracisternal, abre-se a fissura sylviana.
medial do unco, e o segmento P2A da artéria cerebral As principais dificuldades das cirurgias envolvendo a
posterior está relacionado à porção inferior da super- fissura sylviana são o domínio da técnica microcirúr-
fície póstero-medial do unco (Fig. 3.8). As principais gica, para que a fissura sylviana seja aberta de manei-
dificuldades nas ressecções das estruturas temporais ra atraumática, e a abordagem cirúrgica à região re-
mesiais são a proximidade com o tronco encefálico e troinsular (onde a porção posterior do giro de Heschl
a artéria cerebral posterior, a dissecção intracisternal encontra o sulco circular inferior da ínsula devido à
com manipulação das artérias e veias, freqüentemen- proximidade da perna da cápsula interna).
te envolvida na ressecção de um tumor, e o desco- A superfície lateral do lobo temporal é constituí­
nhecimento da anatomia pelo cirurgião. da pelos giros temporais superior, médio e inferior
A superfície superior do lobo temporal é repre- (Fig. 3.10). Na superfície lateral o lobo temporal é
sentada pelo opérculo temporal da fissura sylviana, separado dos lobos frontal e parietal pelo ramo pos-
o qual é composto de três partes: planum polare, giro terior da fissura sylviana e linha temporoccipital e
de Heschl e planum temporale (Fig. 3.9). O giro de separado do lobo occipital pela linha parietotemporal
Heschl está relacionado à audição, e o planum tem- lateral. A região do cérebro relacionada à linguagem
porale à linguagem (compreensão) no hemisfério do- (compreensão) pode compreender a porção posterior
minante. O planum temporale está justaposto ao giro do giro temporal superior e médio e giros supramar-
supramarginal, o giro de Heschl ao giro pós-central e ginal e angular do hemisfério dominante. A superfí-
o planum polare ao giro pré-central, pars opercularis, cie lateral do lobo temporal é suprida pelos ramos
pars triangularis e pars orbitalis do giro frontal in- das artérias cerebral média e cerebral posterior, sen-
ferior. O ponto no ramo posterior da fissura sylviana do que o limite geralmente ocorre ao nível do giro
onde o giro temporal superior encontra o giro de Hes- temporal inferior. A superfície lateral do lobo tem-
chl está projetado no mesmo plano coronal do meato poral é formada por neocórtex. Dentre os diversos
acústico externo. A superfície superior do lobo tem- fascículos que compõem a substância branca do lobo
poral é suprida pelos ramos da artéria cerebral média. temporal, destaca-se a radiação óptica. A radiação

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3 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia do Lobo Temporal Indicações e Técnicas

óptica estende-se do corpo geniculado lateral (tála-


mo) ao córtex visual do lobo occipital. De acordo
com a direção de suas fibras, a radiação óptica pode
ser dividida em 3 partes: anterior, média e posterior.
Na parte anterior, também chamada de alça de Meyer,
as fibras seguem inicialmente para frente no teto do
corno temporal, geralmente alcançando até a ponta
do corno temporal, e depois, se curva posteriormente,
constituindo as paredes lateral e inferior do átrio do
ventrículo lateral e do corno occipital, para terminar
no lábio inferior da fissura calcarina. A porção ante-
rior representa o quadrante superior do campo visual.
Na parte média da radiação óptica, as fibras seguem
inicialmente para o lado no teto do corno temporal
e depois prosseguem para trás, na parede lateral do
átrio e do corno occipital. A parte média da radiação
óptica contém as fibras da mácula. Na parte posterior,
as fibras seguem diretamente para trás na parede la-
teral do átrio e do corno occipital, para terminar no
lábio superior da fissura calcarina. As fibras da par-
te posterior são responsáveis pelo quadrante inferior
do campo visual. As cirurgias envolvendo a porção
lateral do lobo temporal são, geralmente, de fácil
execução por causa da localização superficial dessa
região, entretanto é preciso saber que a radiação óp-
tica está localizada imediatamente abaixo do fundo
de qualquer sulco profundo da superfície lateral do
lobo temporal (substância branca). Outro problema
comum em relação às cirurgias envolvendo a porção
posterior do lobo temporal do hemisfério dominante
é o emprego de placa subdural, ou a realização de
Fig. 3.9 – Vista superior do lobo temporal direito (opérculo cirurgia sob anestesia local para determinação exata
temporal da fissura sylviana). 1 = átrio do ventrículo lateral; 2 da área de linguagem.
= planum temporale; 3 = giro de Heschl; 4 = giro para-hipo-
campal; 5 = temporal stem; 6 = planum polare; 7 = segmento A superfície basal do lobo temporal é formada
anterior do unco; 8 = incisura rinal. pelo giro temporal inferior lateralmente, sulco occi-
pitotemporal, giro fusiforme, sulco colateral e giro
para-hipocampal (Fig. 3.11). O limite posterior da
­superfície basal do lobo temporal é determinado por
uma linha imaginária que interliga a incisura pré-
occipital à junção dos sulcos parietoccipital com o
sulco calcarino. O sulco rinal separa o giro para-hi-
pocampal e o unco do pólo temporal. A superfície
basal do lobo temporal é formada pelo mesocórtex.
As cirurgias envolvendo a superfície basal do lobo
temporal geralmente requerem abordagem subtem-
poral, retraindo-se o lobo temporal, o que é difícil na
porção basal posterior do lobo temporal, onde exis-
tem veias (geralmente de grande calibre) transitando
pela superfície basal do temporal para drenar a tenda
do cerebelo, nos seios tentoriais. Assim, a aborda-
gem subtemporal requer retração do lobo temporal
e o estiramento dessas veias em ponte. A linguagem
Fig. 3.10 – Vista lateral do lobo temporal esquerdo. 1 = também está representada na superfície basal do
ramo posterior da fissura sylviana; 2 = giro temporal superior; lobo temporal, porém os distúrbios de linguagem
3 = sulco temporal superior; 4 = giro temporal médio; 5 = sul- provocados pela ressecção dessa área geralmente são
co temporal inferior; 6 = giro temporal inferior.
transitórios10-13.

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33
Parte 1 – Epilepsia

Epilepsia temporal refratária

Avaliação pré-operatória

Lesão à RNM

Sim Não

Próxima à área
de linguagem?

Não Sim

Crises e EEG Placa


compatíveis? subdural?

Sim Não

Lesão adjacente à Provavelmente


amígdala apenas
ou hipocampo? lesionectomia

Sim Não

Lesionectomia + Atrofia amígdala


amígdalo- e/ou
hipocampectomia hipocampo?

Fig. 3.11 – Vista basal do lobo temporal direito. A linha pa- Sim Não
rietotemporal basal conecta a junção dos sulcos parietoccipital
e calcarino à incisura pré-occipital e separa o lobo temporal do
lobo occipital. 1 = sulco rinal; 2 = sulco hipocampal; 3 = giro Lesionectomia +
temporal inferior; 4 = sulco occipitotemporal; 5 = giro fusifor- ressecção adicional
me ou occipitotemporal lateral; 6 = giro para-hipocampal ou com ECoG
occipitotemporal medial; 7. sulco colateral; 8 = giro lingual.
Fig. 3.12 – Conduta cirúrgica para epilepsia temporal de
difícil controle.
Planejamento cirúrgico
Existe controvérsia quanto à conduta cirúrgica amígdalo-hipocampectomia pode ser dividida em três
na epilepsia temporal lesional. A principal dúvida partes: neocorticectomia, hipocampectomia e amigda-
se refere à extensão da ressecção, podendo ser feita lectomia. O paciente é posicionado em decúbito dorsal
lesionectomia simples ou associada à ressecção de horizontal, com a cabeça rodada contralateralmente a
parênquima temporal, guiada pela eletrocorticogra- aproximadamente 30o (Fig. 3.13). Após a dissecção in-
fia ou, ainda, lesionectomia associada à remoção do terfascial e rebatimento do músculo temporal, realiza-se
complexo amígdalo-hipocampal. a craniotomia frontotemporal18,19 dentro dos limites da
A Fig. 3.12 apresenta o algoritmo de conduta face linha temporal superior. Após a abertura dural, o lobo
à epilepsia temporal lesional, baseando-se na experi- temporal é exposto (Fig. 3.14). A ressecção neocorti-
ência do autor e na literatura. cal é realizada poupando-se o giro temporal superior
quando o hemisfério é o dominante para linguagem, ou
Técnica cirúrgica incluindo o giro temporal superior quando o hemisfério
não é o dominante, sendo o limite posterior da ressec-
Será demonstrada a técnica cirúrgica mais comu- ção cortical de aproximadamente 3,5 cm da ponta do
mente empregada para realização de ressecções tem- lobo temporal. O objetivo principal dessa fase da cirur-
porais mesiais: a lobectomia temporal anterior ou gia é atingir o corno temporal, para depois ressecar o
córtico-amígdalo-hipocampectomia12,14-17. A córtico- neocórtex lateralmente à eminência colateral. A dissec-

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3 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia do Lobo Temporal Indicações e Técnicas

calizado lateralmente à eminência colateral é removido


(Fig. 3.15). A hipocampectomia “en bloc” consiste em
quatro etapas: abertura da fissura coróidea, desconexão
anterior, desconexão medial e desconexão posterior. O
plexo coróide e a fissura coróidea são identificados na
parte medial do assoalho do corno temporal. A presen-
ça de plexo coróide indica existência do corpo do hipo-
campo e, mais posteriormente, da cauda do hipocampo
(Fig. 3.16). A fissura coróidea é aberta rompendo-se a
tênia fimbriae com a tesoura ou mesmo com a ponta do
bipolar e, após a abertura da fissura coróidea, pode-se
visualizar a membrana aracnóide do sulco hipocam-
pal, acompanhada de vasos hipocampais (Fig. 3.17). A
desconexão anterior consiste na separação da cabeça
do hipocampo da amígdala, desconectando-se o reces-
so uncal anterior e inferiormente e desconectando-se o
terço anterior da parede medial do corno temporal, à
frente do ponto coróideo inferior.­A remoção do terço­
anterior da parede medial do corno temporal correspon-
de à remoção da porção inferior do segmento do unco e
vai expor a membrana de aracnóide localizada medial-
mente ao ápice e ao segmento posterior do unco; con-
seqüentemente o nervo oculomotor e o segmento P2A
da artéria cerebral posterior podem ser visualizados.
A desconexão medial consiste na separação das es-
truturas temporais mesiais daquelas localizadas na
Fig. 3.13 – Posicionamento do paciente para realização de cisterna crural. Essa desconexão é realizada identifi-
córtico-amígdalo-hipocampectomia direita.
cando-se a membrana de aracnóide dos sulcos hipo-
campal e fimbrodentado e os vasos que acompanham
essa membrana. Os vasos hipocampais são identifi-
cados, coagulados e cortados (Fig. 3.18). A descone-
xão posterior é realizada seccionando-se o hipocam-
po ao nível da transição entre o corpo e a cauda do
hipocampo e também ­ seccionando a porção poste-
rior do giro para-hipocampal. Um bom parâmetro
para estimar a extensão posterior da ressecção é ob-
servar a morfologia da artéria cerebral posterior, que

Fig. 3.14 – Exposição do cérebro após a abertura dural.

ção a partir da superfície do giro temporal superior di-


reciona-se ao assoalho da fossa média, identificando a
substância cinzenta que margeia o fundo dos sulcos ce-
rebrais da base do lobo temporal (provavelmente sulco
occipitotemporal ou colateral) e, a partir desse sulco,
atingindo o corno temporal (os sulcos da superfície ba-
Fig. 3.15 – O corno temporal do ventrículo lateral direito é
sal apontam para o corno temporal). Uma vez identifi- identificado após corticotomia via giro temporal superior. 1 =
cado o corno temporal, todo o parênquima temporal lo- eminência colateral; 2 = veia sylviana superficial.

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35
Parte 1 – Epilepsia

cursa ao redor do mesencéfalo e vai apresentar uma


curva mais acentuada quando a artéria atinge o nível
do sulco lateral mesencefálico (o sulco que separa a
porção posterior da base do pedúnculo cerebral do
tegmento do mesencéfalo). Se o objetivo for a ressec-
ção total do hipocampo, o parâmetro anatômico que
deve ser observado é junção da cauda do hipocampo
com o calcar avis. Após a remoção do neocórtex, hi-
pocampo, fórnice e giro para-hipocampal, as estruturas
neurais e vasculares da cisterna ambiens podem ser vi-
sualizadas. A amigdalectomia consiste na remoção do
unco seguindo os parâmetros anatômicos citados pre-
viamente: artéria carótida interna supraclinóidea ante-
riormente, base do pedúnculo cerebral medialmente,
trato óptico superiormente e o ponto coróideo inferior
Fig. 3.16 – O plexo coróide e a fissura coróidea são iden- póstero-superiormente. Abre-se a cisterna carotídea,
tificados na borda medial do hipocampo. 1 = hipocampo; com a identificação da artéria carótida interna supra-
2 = amígdala; 3 = plexo coróide. clinóidea e seus ramos, e a dissecção prossegue com
a identificação do trato óptico; a remoção da amígdala
é feita seguindo-se o trato óptico até o ponto coróideo
inferior. Quando a remoção da amígdala é realizada
de modo subpial, segue-se a linha carótido-coróidea
(a linha traçada a partir da bifurcação da artéria caró-
tida interna supraclinóidea ou o segmento proximal
da M1 até o ponto coróideo inferior), que mimetiza o
trajeto do trato óptico. Após a remoção completa das
estruturas temporais mesiais, é possível visualizar as
seguintes estruturas: artérias carótida interna supracli-
nóidea, comunicante posterior, coróidea anterior e ce-
rebral posterior, nervo oculomotor, base do pedúnculo
cerebral, sulco e veia lateral mesencefálica, tegmento
do mesencéfalo e, ocasionalmente, nervo troclear, veia
basal e artéria cerebelar superior (Figs. 3.19 e 3.20).
A RNM de controle de algumas patologias ope-
Fig. 3.17 – Abertura da fissura coróidea após romper a tênia radas utilizando esta técnica é demonstrada nas Figs.
fimbriae. 1 = corpo do fórnice; 2 = cabeça do hipocampo; 3 =
fímbria do fórnice; 4 = plexo coróide; 5 = membrana aracnói- 3.21 a 3.26.
dea do sulco hipocampal; 6 = pulvinar do tálamo.

Fig. 3.19 – Vista intra-operatória após a remoção das es-


Fig. 3.18 – Preparação anatômica demonstrando a desco- truturas temporais mesiais. 1 = nervo oculomotor; 2 = artéria
nexão medial, que é realizada por meio da identificação, coa- carótida interna supraclinóidea; 3 = artéria comunicante pos-
gulação e secção dos vasos hipocampais. 1 = hipocampo; 2 = terior; 4 = artéria cerebral posterior (P2A); 5 = artéria coróidea
artéria hipocampal; 3 = veia hipocampal; 4 = artéria cerebral anterior; 6 = base do pedúnculo cerebral; 7 = trato óptico;
posterior; 5 = giro para-hipocampal. 8 = plexo coróide.

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3 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia do Lobo Temporal Indicações e Técnicas

Fig. 3.20 – Preparação anatômica demonstrando as estru-


turas visualizadas após a remoção das estruturas temporais
mesiais. 1 = nervo oculomotor; 2 = nervo troclear; 3 = nervo
óptico; 4 = artéria carótida interna supraclinóidea; 5 = artéria
cerebral posterior (segmento P2A); 6 = base do pedúnculo ce-
rebral; 7 = artéria coróidea anterior; 8 = ponto coróideo infe-
rior; 9 = pulvinar do tálamo.

Fig. 3.22 – RNM pós-operatória. A paciente foi submetida à


ressecção total da lesão e das estruturas temporais mesiais ad-
jacentes. O exame anatomopatológico revelou ganglioglioma.
A paciente evoluiu sem crises em seguimento de 30 meses.

Fig. 3.21 – RNM pré-operatória de uma paciente de 13 anos,


com história de crises iniciadas aos 10 anos, caracterizadas por
taquicardia, sensação de distorção das imagens (que pareciam
estar se desviando para a esquerda), seguidas de perda de con-
tato e automatismos orais e manuais, bilateralmente, com dura-
ção máxima de 2 minutos, e sonolência pós-ictal, sem distúrbio
da fala. Apresentava uma a duas crises por dia, fazendo uso de
carbamazepina 1.200 mg/dia após já ter usado topiramato. O
EEG interictal mostrou ondas agudas e, principalmente, ondas
Fig. 3.23 – RNM pré-operatória de um paciente de 24 anos,
com história de crise febril na infância e crises parciais com-
lentas de grande amplitude de projeção na região frontal direita
plexas regulares de difícil controle a partir dos 13 anos. A
(F4-F12), linha mediana (Fz) e região temporal direita ântero-
RNM evidencia esclerose mesial temporal esquerda (com redu-
medial (T2-F8-F10), com difusão para a região subtemporal. A
ção do volume e hipersinal no hipocampo esquerdo).
RNM evidencia processo expansivo temporal mesial posterior à
direita, na topografia do giro para-hipocampal e hipocampo.

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37
Parte 1 – Epilepsia

Fig. 3.24 – RNM pós-operatória. O paciente foi submetido


à córtico-amígdalo-hipocampectomia esquerda. O exame ana-
tomopatológico confirmou o diagnóstico de esclerose mesial Fig. 3.26 – RNM pós-operatória. O paciente foi submetido à
temporal e o paciente evoluiu sem crises em seguimento de ressecção dos lobos temporal e occipital esquerdos. O exame ana-
6 anos. tomopatológico mostrou displasia cortical focal do tipo Taylor. O
paciente evoluiu sem crises em seguimento de 33 meses.

Amígdalo-hipocampectomias seletivas
Dependendo do resultado da avaliação pré-cirúrgi-
ca e do planejamento cirúrgico, a ressecção temporal
pode estar limitada apenas à porção mesial do lobo
temporal, preservando sua porção lateral; esse tipo de
ressecção constitui a amígdalo-hipocampectomia se-
letiva. O princípio básico da amígdalo-hipocampecto-
mia seletiva consiste em acessar o corno temporal do
ventrículo lateral por meio de uma corticectomia se-
guida de ressecção das estruturas temporais mesiais20.
Existem basicamente três maneiras de acessar o
corno temporal para a realização de amígdalo-hipo-
campectomia seletiva: via transylviana21, com uma
craniotomia pterional ampliada para a região temporal
posterior, abre-se toda a extensão da fissura sylviana;
em seguida identifica-se o sulco circular inferior da
ínsula e a corticectomia é realizada no sulco circu-
lar inferior da ínsula, através do temporal stem até se
atingir o corno temporal. O corno temporal também
pode ser acessado via sulco temporal superior22, ou via
giro temporal médio23. Na teoria, por preservar mais
neocórtex temporal, as amígdalo-hipocampectomias
Fig. 3.25 – RNM pré-operatória de um paciente de 11 anos,
com história de crises iniciadas aos 40 dias de vida, caracte- seletivas deveriam ser superiores à córtico-amígdalo-
rizadas por hipertonia dos quatro membros, cianose perioral, hipocampectomia quando o desempenho cognitivo
versão ocular para a esquerda e liberação esfincteriana. Evo- pós-operatório dos pacientes submetidos a ambas téc-
luiu com retardo do desenvolvimento neuropsicomotor e he- nicas fosse comparado. Entretanto não existem evi-
mianopsia homônima direita. Fazia uso de valproato de sódio, dências que comprovem essa hipótese na literatura. A
carbamazepina e fenitoína e apresentava mais de 10 crises por
dia. O teste de Wada revelou linguagem no hemisfério direi- RNM de controle de um paciente portador de ganglio-
to. A RNM mostrou malformação do desenvolvimento cortical glioma temporal mesial operado utilizando a técnica
acometendo lobos temporal e occipital esquerdo. transylviana é demonstrada nas Figs. 3.27 e 3.28.

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3 – Tratamento Cirúrgico da Epilepsia do Lobo Temporal Indicações e Técnicas

culdade de Medicina da Universidade de São Paulo


(HCFMUSP) e Hospital Samaritano, 186 pacientes,
sendo que ressecções temporais isoladas representa-
ram 68,8% da casuística e ressecções multibolares,
inclusive temporal, representaram 79% da casuística.
Portanto, em aproximadamente 80% dos nossos ca-
sos cirúrgicos de epilepsia houve ressecção total ou
parcial do lobo temporal, mostrando a sua importân-
cia no tratamento cirúrgico das epilepsias.
Dos 128 casos exclusivamente temporais, 96 (75%)
eram de portadores de esclerose mesial temporal, 19
(14,8%) de tumor de crescimento lento, 5 (3,9%) de
displasia cortical, 2 (1,5%) de cavernoma e 6 (4,7%)
de portadores de outras etiologias.
Dos 19 casos de tumor de crescimento lento, 15
(79%) eram de ganglioglioma, 2 (10,5%) de ganglio-
citoma, 1 tumor neuroepitelial disembrioplástico e 1
xantoastrocitoma.
Dos 96 casos de esclerose mesial temporal, 86
(89,6%) evoluíram sem crises (Engel I), 8 (8,3%) em
Engel II e 3 (3,1%) em Engel III. Dos 19 casos de tu-
mor de crescimento lento, 17 (89,4%) evoluíram sem
Fig. 3.27 – RNM pré-operatória de um paciente de 17 anos crises (Engel I) e 2 (10,1%) evoluíram em Engel III.
com história de crises parciais complexas de difícil controle a O resultado global do tratamento cirúrgico dos
partir dos 11 anos de idade. A imagem evidencia um processo 128 casos de epilepsia do lobo temporal com lesão
expansivo na topografia da amígdala esquerda.
detectada na RNM foi: 115 (89,8%) pacientes evoluí-
ram sem crises (Engel I), 8 (6,25%) com raras crises,
Engel II) e 5 (3,9%) com crises, porém com melhora
significativa em relação ao pré-operatório (Engel III).

Conclusão
De modo geral, o êxito do tratamento cirúrgico
da epilepsia, incluindo a epilepsia do lobo temporal,
depende de quatro fatores principais:
1. investigação pré-operatória adequada realiza-
da por neurologistas, neurofisiologistas, neu-
ropsicólogos, neurradiologistas, especialistas
em medicina nuclear e conseqüente indicação
cirúrgica correta;
2. planejamento cirúrgico apropriado envolven-
do principalmente neurofisiologista e cirur-
gião, porém a decisão quanto às estruturas a
serem ressecadas e a extensão da ressecção ge-
ralmente é determinada pelo cirurgião antes da
cirurgia;
3. o domínio da técnica microcirúrgica e da ana-
tomia microcirúrgica do cérebro pelo cirur-
Fig. 3.28 – RNM pós-operatória. O paciente foi submetido
à ressecção do processo expansivo e das estruturas temporais gião, para indicar o melhor acesso cirúrgico e o
mesiais. O exame anatomopatológico revelou ganglioglioma. tipo de ressecção a ser realizado para cada caso
O paciente evoluiu sem crises em seguimento de 32 meses. em particular. As cirurgias de epilepsia, apesar
de inclusas na categoria de cirurgia funcional,
não deixam de ser microcirurgia e devem ser
Casuística executadas com os mesmos refinamentos téc-
Entre janeiro de 1997 e novembro de 2002, foram nicos de uma cirurgia para aneurisma ou tumor
operados pelo autor no Hospital das Clínicas da Fa- cerebral;

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39
Parte 1 – Epilepsia

4. cuidado pós-operatório imediato adequado, 12. Wen HT, Rhoton Jr AL, Oliveira E, et al. Microsur-
com reposição imediata das drogas antiepi- gical anatomy of the temporal lobe. Part 1: Mesial
lépticas, além de minucioso seguimento em temporal lobe anatomy and its vascular relationships
longo prazo. as applied to amygdalohippocampectomy. Neurosur-
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4
Calosotomia
Antonio Nogueira Almeida

Introdução As desconexões de fibras inter-hemisféricas para


tratamento de epilepsias foram preconizadas na dé-

A
epilepsia é um dos distúrbios neurológicos mais cada de 1940. Inicialmente, a calosotomia era reali-
prevalentes no mundo. Conceitualmente, ela se zada em conjunto com a interrupção dos feixes da
caracteriza pela predisposição estrutural do cére- comissura anterior, do fórnice e da comissura hipo-
bro em gerar crises epilépticas. Seu diagnóstico implica campal5. Esse procedimento ficou conhecido como
ocorrência de pelo menos uma crise epiléptica, definida comissurotomia total. Desde os primeiros trabalhos,
como sinais ou sintomas transitórios decorrentes da ati-
a recorrência das crises epilépticas foi reconhecida
vidade anormal, excessiva e sincrônica dos neurônios
como fato freqüente, o que confere um caráter palia-
cerebrais1. De maneira simplificada, podem-se dividir
tivo ao procedimento6. Embora Wilson et al.7 tenham
os fatores que predispõem o cérebro a desenvolver cri-
relatado resultado surpreendente em casos de crises
ses em dois grupos: focais e generalizados. Fatores fo-
atônicas, aceita-se hoje que apenas 5% dos pacientes
cais são os que afetam inicialmente apenas uma região
submetidos a calosotomia permaneçam totalmente li-
restrita do cérebro, enquanto os generalizados envolvem
vres de crises8.
todo o córtex de forma virtualmente simultânea.
Ainda persistem dúvidas sobre a extensão da des-
Aproximadamente 1,2% da população de São Pau-
conexão necessária para o melhor controle das crises
lo apresenta epilepsia2. Cerca de um terço apresenta
epilépticas. Marino et al.9 relataram o uso de eletrocor-
epilepsias generalizadas3. Historicamente, o desenvol-
vimento da cirurgia para epilepsia pode ser dividido ticografia intra-operatória para se determinar o tama-
em três fases distintas4. Inicialmente, no século XIX, nho da secção do corpo caloso. Esses autores usaram
as cirurgias se restringiam ao tratamento das crises a perda da sincronização entre os hemisférios como
de origem focal, com a ressecção de lesões cerebrais, parâmetro para interromper a calosotomia. Cukiert et
usualmente cicatrizes ou tumores. Na década de 1930, al.10, por sua vez, preconizam de forma pragmática
após a introdução do eletroencefalograma, as cirur- a calosotomia mais extensa possível. Outros autores
gias passaram a ser direcionadas para a remoção de sugerem um procedimento em dois tempos, inician-
áreas corticais com atividade elétrica potencialmen- do com a secção do terço anterior do corpo caloso
te geradora de crises. Recentemente, a cirurgia para e, depois, se necessário, estendendo o procedimento
epilepsia se dividiu em duas linhas principais. Uma posteriormente até o esplênio11.
vertente retornou ao princípio da remoção de lesões Atualmente, as indicações para o uso de caloso-
cerebrais focais, enquanto a outra buscou interferir tomia se restringem aos pacientes que possuam cri-
nos circuitos cerebrais de geração e propagação das térios de intratabilidade medicamentosa associados
crises, sem necessariamente remover a área anormal. a crises atônicas, ou como medida paliativa em epi-
A calosotomia é um exemplo da segunda abordagem, lepsias multifocais com generalizações freqüentes do
em que a interrupção das conexões inter-hemisféricas tipo da síndrome de Lennox-Gastaut12. Este capítulo
é utilizada para controle de crises generalizadas. abordará a técnica de calosotomia em dois tempos.

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41
Parte 1 – Epilepsia

Preparo local corpo caloso. Os pontos negativos dessa abordagem


incluem a possibilidade de o flap cutâneo ficar muito
O preparo local da cabeça é semelhante ao exigido pequeno ou deslocado para frente ou para trás, o que
em outros procedimentos neurocirúrgicos. O corte de dificulta o acesso cirúrgico. Como alternativa, uma
todo o cabelo do paciente não é necessário nem dese- incisão reta pode ser utilizada em cima da sutura co-
jado. Usualmente o paciente é orientado a lavar bem ronal com o limite lateral um pouco abaixo das linhas
os cabelos com produto degermante (por exemplo, superiores temporais (Fig. 4.2). Esse formato de inci-
PovidineTM) algumas horas antes da cirurgia. Ao che- são também permite ótima vascularização das bordas
gar ao centro cirúrgico, o cabelo do paciente é pen- do flap cutâneo. Apresenta, no entanto, vantagem ao
teado com várias mechas, cortado apenas nos locais aumentar a possibilidade de preservação do cabelo do
onde o couro cabeludo é exposto no local da incisão. paciente de forma esteticamente mais aceitável.

Posicionamento da cabeça
A
Para se realizar a calosotomia anterior pode-se
posicionar a cabeça a 0o ou 90o. A escolha depende
da experiência e preferencia do cirurgião. A posição
neutra (com a face apontada para cima, fletida apro-
ximadamente 45o) apresenta a vantagem de facilitar a
a identificação do giro do cíngulo sem deslocamentos
laterais (Fig. 4.1). Por outro lado, a movimentação do b
instrumental acontece no sentido vertical (um instru-
mento usualmente posicionado acima ou abaixo do
outro) com pouco espaço lateral para o trabalho bi-
manual. Quando a cabeça se encontra a 90o, o hemis-
fério que fica por baixo cede com o peso e facilita a
dissecção do corredor ao longo da foice. Ao contrário
da posição neutra, a movimentação do instrumental
ocorre no sentido lateral. No entanto, a queda do he-
misfério contralateral junto ao limite inferior da foice B
pode dificultar a dissecção do espaço entre os giros
do cíngulo dos dois hemisférios, onde o corpo caloso
deve ser identificado.

Fig. 4.2 – (A) Posicionamento da incisão de pele para acesso


inter-hemisférico. A letra a mostra a incisão clássica em U com
a base sobre o seio sagital para preservar a irrigação arterial. A
letra b mostra a incisão reta, ao longo da sutura coronal, que
Fig. 4.1 – Posicionamento do paciente em posição neutra permite melhor resultado estético e preservação do cabelo. (B)
com a cabeça fletida cerca de 45o, o que facilita a visão e secção Posicionamento da craniotomia cruzando a linha média, com
do corpo caloso pelo acesso inter-hemisférico. as trepanações sobre o seio sagital.

Incisão da pele Craniotomia


A incisão clássica para a exposição da região do O lado direito é o preferido para a abordagem ci-
corpo caloso consiste em um arco (em formato de U), rúrgica do corpo caloso, uma vez que a retração ou
com a abertura voltada à base do lobo temporal e o lesão do hemisfério esquerdo podem levar a déficits
platô em cima da sutura sagital. Esse formato de in- de linguagem. A craniotomia deve-se posicionar de
cisão favorece a irrigação vascular do flap cutâneo e forma a possibilitar o acesso inter-hemisférico. Des-
possibilita boa exposição de toda a parte anterior do sa forma, sua borda medial pode-se localizar sobre

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4 – Calosotomia

o seio sagital ou, preferenciamente, próxima do seio, Após a exposição do seio sagital, a dura-máter
paralela à sutura sagital, posicionada no hemisfério deve ser gentilmente retraída sobre a borda lateral
contralateral (Fig. 4.2). A extensão ântero-posterior do seio para permitir uma abordagem mais vertica-
deve ter aproximadamente 10 cm. Embora o corre- lizada do espaço inter-hemisférico (Fig. 4.3). A pri-
dor cirúrgico possa ter apenas poucos centímetros, meira parte do acesso, onde o lobo frontal é retraído
a craniotomia maior permite lidar com variações no da foice, é facilmente realizada pois usualmente não
padrão de drenagem venosa. Assim, o cirurgião pode há aderências entre essas duas estruturas. Na região
escolher fazer a dissecção anterior ou posterior à en- mais profunda, onde a tenda deixa de ser um divisor
trada de veias calibrosas no seio sagital. O uso do entre os hemisférios, pode ocorrer alguma dificuldade
neuronavegador, com visualização do padrão venoso para se encontrar o limite entre os giros do cíngulo
antes da abertura da pele, possibilita o uso de cranio- dos dois hemisférios, e todo cuidado deve ser tomado
tomias menores e mais bem posicionadas. para se evitar a dissecção do sulco do cíngulo no lu-
Em relação ao limite medial da craniotomia, al- gar do espaço inter-hemisférico. Ao fundo do giro do
guns cirurgiões preferem realizar a craniotomia res- cíngulo deve-se identificar uma superfície branca bri-
trita ao lado onde será o acesso cirúrgico e retirar o lhante que corresponde ao corpo caloso. Nesse mo-
osso sobre o seio sagital com o uso de goiva. Essa mento é necessário identificar as artérias pericalosas
medida diminui o risco de lesão ao seio sagital, mas, e afastá-las para expor o corpo caloso de forma mais
muitas vezes, cria a necessidade de uma cranioplastia extensa. Como regra, as artérias pericalosas enviam
no mesmo ato cirúrgico. ramos apenas para o hemisfério a que pertencem, as-
Em nosso serviço, normalmente realizamos ape- sim, as aderências entre as duas artérias usualmente
nas duas trepanações sobre o seio sagital (uma cer- se resumem através de aracnóide e, em menor escala,
ca de 3 cm anterior à sutura coronal e outra cerca de pequenas veias sem significado clínico que podem ser
7 cm posterior à sutura) e completamos a craniotomia sacrificadas. Um padrão raro, mas importante, é o pa-
drão ázigo, onde as artérias pericalosas formam uma
com o uso do craniótomo após descolar a dura-máter
ponte anastomótica que as impede de ser afastadas.
do flap ósseo. Caso exista alguma dificuldade para se
descolar a dura-máter, outras trepanações são acresci- O corpo caloso deve ser exposto entre as artérias
das para facilitar esse trabalho. Caso a broca para tre- pericalosas em sua porção anterior até o seu joelho.
panação não seja de excelente qualidade (ou não seja Normalmente, isso pode ser obtido sem uso de espá-
descartável), as trepanações podem ser posicionadas tulas. Caso espátulas sejam indispensáveis, deve-se
lateralmente ao seio sagital para evitar sua lesão nesse tomar muito cuidado para evitar retração excessiva
momento da cirurgia.
A
Corredor cirúrgico
Após a retirada do flap ósseo, a dura-máter deve
ser ancorada junto às bordas da craniotomia para evi-
tar a formação de hematomas extradurais no pós-ope-
ratório. A abertura da dura-máter pode ser realizada
Giro do cíngulo
em U e rebatida em direção ao seio. Durante a dissec-
Artéria pericalosa
ção entre a dura-máter e o lobo frontal, todo cuidado Corpo caloso
deve ser tomado para evitar danos às veias que desen-
bocam no seio sagital. Deve-se lembrar que a parte
posterior da craniotomia se encontra próxima à área B
motora primária e parte das veias presentes no campo
cirúrgico pode estar drenando essa região. No entanto,
muitas vezes os complexos venosos estão firmemente
aderidos à pia-máter sem possibilidade de dissecção.
Nesses casos, o cirurgião deve avaliar se o espaço ob-
tido sem o sacrifício venoso é suficiente para o acesso
cirúrgico. Caso não seja possível continuar a cirurgia
sem sacrificar alguma veia, o cirurgião deve avaliar
cuidadosamente qual a melhor maneira de se reduzir
ao máximo o comprometimento da drenagem venosa.
Essa decisão é essencial para o transcorrer da cirurgia Fig. 4.3 – (A) Seio sagital, giro do cíngulo e artérias perica-
losas em suas posições originais. (B) Ilustração da necessidade
e para a boa evolução do paciente no pós-operatório. de retração do seio sagital para se obter um acesso mais ver-
Infartos venosos podem gerar lesões cerebrais graves ticalizado ao corpo caloso, com menor retração do hemisfério
e inesperadas. cerebral.

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43
Parte 1 – Epilepsia

por tempo prolongado, que pode levar à rotura de Referências Bibliográficas


veias ponte fora do sítio cirúrgico ou à isquemia nas
1. Fisher R, van Emde Boas W, Blume W, Elger C,
áreas de circulação terminal dos ramos das artérias Genton P, Lee P, et al. Epileptic seizures and epilep-
cerebrais anterior e média, localizadas na região do sy: definitions proposed by the international league
giro frontal superior. Espátulas mal posicionadas against epilepsy (ILAE) and International Bureau for
também podem causar lesão ou compressão da artéria Epilepsy (IBE). Epilepsia. 2005;46(4):470-2.
pericalosa com conseqüente isquemia a jusante. 2. Marino Jr R, Cukiert A, Pinho E. Aspectos epidemio-
Essa abordagem dá acesso cirúrgico ao joelho do lógicos da epilepsia em São Paulo. Arq Neuropsi-
corpo caloso anteriormente e, posteriormente, à re- quiatr. 1986;44:243-54.
gião onde o corpo caloso se encontra, como as fibras 3. Engel Jr J, Shewmon AD. Overview: Who should be
do fórnice. Não é possivel aspirar o esplênio do corpo considered a surgical candidate? In: Engel J Jr, edi-
tor. Surgical treatment of the epilepsies. 2. ed. New
caloso com esse acesso. Alguns autores preconizam York: Raven Press; 1993, p. 23-34.
que a bissecção do corpo caloso deve preservar o 4. De Almeida AN, Martinez V, Feindel W. The first
epêndima ventricular com o intuito de evitar entrada case of invasive EEG monitoring for the surgical tre-
de sangue no sistema ventricular. atment of epilepsy: historical significance and con-
text. Epilepsia. 2005;46:1082-5.
Acesso ao esplênio do corpo caloso 5. Luessenhop AJ. Interhemispheric commissurotomy:
(the split brain operation) as an alternative for hemis-
Caso seja necessário, por motivos clínicos e neu- pherectomy for control of intractable seizures. Am
rofisiológicos, o esplênio pode ser acessado em um Surg. 1970;36(5):265-8.
segundo tempo cirúrgico com o paciente posicionado 6. Akelaitis AJ. A study of gnosis praxis and language
em park bench com a cabeça tombada lateralmente following section of the corpus callosum and anterior
com o hemisfério direito para baixo. Para essa abor- comissure. J Neurosurg. 1944;1:94-102.
dagem, a craniotomia dever ser posicionada na re- 7. Wilson DH, Culver C, Waddington M, Gazzaniga M.
gião parietal posterior. Os princípios cirúrgicos são Disconnection of the cerebral hemispheres. An alter-
native to hemispherectomy for the control of intrac-
os mesmos para abordagem do corpo caloso ante- table seizures. Neurology. 1975;25(12):1149-53.
riormente, mas alguns detalhes anatômicos merecem 8. Andermann F. Clinical indications for hemispherectomy
consideração. and callosotomy. Epilepsy Res. 1992;5(Suppl):189-99.
A região mais posterior da foice chega muito pró- 9. Marino Jr R, Radvany J, Huck FR, De Camargo CH,
ximo do corpo caloso e usualmente não há proble- Gronich G. Selective electroencephalograph-guided
mas na identificação dele por essa visão. Além disso, microsurgical callosotomy for refractory generalized
as artérias pericalosas não chegam até o esplênio e epilepsy. Surg Neurol. 1990 Oct;34(4):219-28.
não há riscos maiores de lesá-las. No entanto deve-se 10. Cukiert A, Buratini JA, Mariani PP, Câmara RB, Seda
lembrar que a porção inferior do esplênio tem íntimo L, Badauf CM, Argentoni M, et al. Extended one-stage
contato com o seio reto e a veia de Galeno, cuja lesão callosal section for treatment of refractory secondarity
generalized epilepsy in patients with Lennox-Gastaut and
pode ser catastrófica para o paciente. Lennox-like syndromes. Epilepsia. 2006; 47(2):371-4.
11. Tinuper P, Andermann F, Villemure JG, Rasmussen
Conclusão TB, Quesney LF. Functional hemispherectomy for
treatment of epilepsy associated with hemiplegia:
A calosotomia é um procedimento relativamente rationale, indications, results, and comparison with
simples. Por outro lado, as complicações cirúrgicas po- callosotomy. Ann Neurol. 1988;24(1):27-34.
dem causar graves seqüelas. Detalhado conhecimento 12. Wyler AR. Corpus callosotomy. In: Wyllie E, editor.
da anatomia associado a delicada técnica microcúrgica The treatment of epilepsy: principle and practice, 2. ed.
são essenciais para a boa evolução do paciente. Baltimore: Williams & Wilkins. 1997; p. 1097-102.

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5
Técnicas de Estimulação do
Sistema Nervoso para o
Tratamento das Epilepsias
Antonio Nogueira Almeida

A
s epilepsias generalizadas podem ser divididas paliativos, que não visam ao controle total das cri-
em dois grupos: síndromes idiopáticas e sinto- ses, mas à melhora dos sintomas e da qualidade de
máticas. As síndromes idiopáticas são as epi- vida dos pacientes. O mais antigo é a calosotomia4.
lepsias que acometem indivíduos sem lesões estrutu- O corpo caloso é a principal via de conexão entre os
rais no cérebro detectáveis pelos métodos atuais. Sua hemisférios cerebrais, e a cirurgia objetiva a secção
origem é creditada a fatores genéticos e, usualmente, parcial dessa estrutura. O procedimento impede que a
sua sintomatologia varia com a idade dos pacientes. atividade elétrica das várias lesões corticais se sincro-
Por outro lado, a origem das crises nas síndromes ge- nize, o que impede a generalização das crises epilép-
neralizadas sintomáticas está associada à existência ticas. Por outro lado, menos de 5% dos pacientes ob-
de uma ou mais lesões corticais1. têm controle total das crises, uma vez que a atividade
As síndromes generalizadas idiopáticas mais co- epileptogênica focal tende a permanecer.
muns no adulto são a ausência juvenil, a epilepsia Por esses motivos, outras abordagens cirúrgicas
mioclônica juvenil e a epilepsia somente com crises que têm ganhado atenção nos últimos anos são as
tônico-clônico-generalizadas2. Atualmente, as teo- técnicas de estimulação do nervo vago e núcleos pro-
rias mais aceitas sobre a fisiopatologia da síndromes fundos cerebrais5,6. Esses procedimentos se baseiam
idiopáticas consideram a existência de distúrbios nos no princípio de que a estimulação de determinados
circuitos talamocorticais ou anomalias nos canais iô- circuitos neuronais pode alterar a atividade elétrica
nicos que aumentam a excitabilidade neuronal, o que do foco epileptogênico e reduzir o surgimento de cri-
predispõe o córtex a apresentar crises epilépticas3. ses epilépticas. Existe grande variação nos pontos e
O tratamento, nesses casos, é eminentemente clíni- parâmetros de estimulação utilizados, porém os tra-
co-medicamentoso. No momento, ainda não existem balhos mostram resultados modestos no que se refere
opções consagradas de tratamento cirúrgico para es- ao controle da epilepsia, semelhantes aos obtidos pela
ses pacientes. calosotomia. As principais vantagens da estimulação
No caso das epilepsias generalizadas sintomáticas, estão relacionadas à reversibilidade e flexibilidade do
as crises usualmente estão associadas à sincronização método, uma vez que os parâmetros e alvos podem
da atividade epileptogênica proveniente das várias le- ser mudados com o intuito de melhorar o quadro clí-
sões corticais existentes. De forma alternativa, uma nico do paciente. A desvantagem é o alto custo de im-
dessas lesões corticais pode propagar sua atividade plantação e manutenção do sistema.
epileptogênica para o tálamo, que, por sua vez, se Neste capítulo será descrita a técnica de implan-
encarrega de distribuí-la rapidamente para todo o cé- tação do sistema de estimulação vagal e serão discu-
rebro. As síndromes mais comuns que se encaixam tidos brevemente alguns alvos utilizados, relaciona-
nessa categoria são as de Lennox-Gastaut e West. dos à estimulação cerebral profunda no tratamento
Para esses casos, existem procedimentos cirúrgicos das epilepsias.

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45
Parte 1 – Epilepsia

Estimulador vagal Posicionamento do Eletródio Vagal


Posicionamento do Estimulador A técnica de implantação do eletródio do estimu-
lador vagal é relativamente simples. O paciente é po-
O estimulador vagal é normalmente posicionado sicionado em decúbito dorsal, com a região cervical
em uma bolsa no subcutâneo, localizada na região do levemente estendida. O lado de escolha para posicio-
tórax, logo abaixo da clavícula. Recomenda-se que namento do estimulador é a esquerda. Após adequa-
tanto o gerador como o eletródio sejam posicionados da assepsia e posiconamento dos campos cirúrgicos,
no lado esquerdo do corpo. Após o implante, o ge- identifica-se o músculo esternocleidomastóideo. A in-
rador deve ser fixado para evitar deslocamentos ao cisão da pele pode ser feita ao longo da borda medial
longo do tempo. Um túnel subcutâneo deve ser feito do músculo (o que favorece uma ampliação da inci-
para conectar o gerador ao eletródio (Fig. 5.1). são, caso seja necessário), ou perpendicular ao múscu-
lo (o que confere melhor resultado estético). O múscu-
lo masseter é seccionado, e o espaço entre o músculo
A esternocleidomastóideo e o esôfago é dissecado com
exposição da artéria carótida. O nervo vago se localiza
em uma reentrância, posteriormente à artéria carótida
e a veia jugular, junto a essas estruturas vasculares.
Devem-se expor, pelo menos, 3 cm do nervo vago
Eletródio em toda sua circunferência para a adaptação do eletró-
dio. O eletródio só pode ser implantado no nervo vago
abaixo da saída dos ramos cardíacos superiores e in-
feriores, pois a estimulação de um desses ramos pode
causar bradicardia grave ou mesmo assistolia (Fig.
Gerador 5.2). Dissecção cuidadosa e conhecimento detalhado
da anatomia do nervo normalmente são suficientes
para evitar esse tipo de erro. A manipulação do nervo
também deve ser o mais cuidadosa possível no intui-
to de evitar rouquidão no pós-operatório. No entanto,
mesmo nos casos em que distúrbios de voz ocorrem,
usualmente há remissão dos sintomas sem qualquer in-
tervenção médica, após alguns dias ou semanas.

Pontos de ancoramento
Nervo vago
Nervo vago

Fio Ramo cardíaco cervical


Eletródios superior do nervo vago
Ancoramento
dos eletródios
Ramo cardíaco cervical
inferior do nervo vago
Eletródio

1 cm

3 cm

Fig. 5.1- (A) Posicionamento do eletródio de estimulação va-


gal e gerador. (B) Detalhes do eletródio vagal com seus conta- Fig. 5.2 – Divisões do nervo vago e local de posicionamento
tos posicionados ao redor do nervo vago (figuras baseadas em do eletródio abaixo dos ramos cardíacos (figura baseada em
ilustrações originais da Cyberonics Inc. Huston, Texas). ilustrações originais da Cyberonics Inc. Huston, Texas).

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5 – Técnicas de Estimulação do Sistema Nervoso para o Tratamento das Epilepsias

Todo cuidado deve ser tomado para manter o ner- 2. Nordli Jr DR. Idiopathic generalized epilepsies rec-
vo vago umedecido durante o procedimento, pois a ognized by the international league against epilepsy.
desidratação pode causar lesão e edema no nervo. Epilepsia. 2005;46(Suppl 9):48-56.
O eletródio deve ser cuidadosamente enrolado ao 3. Chang BS, Lowenstein DH. Mechanisms of disease:
redor do nervo e fixado para evitar deslocamentos. epilepsy. NEJM. 2003;349(13):1257-66.
Recomenda-se deixar parte do fio de conexão em re- 4. Cukiert A, Burattini JA, Mariani PP, Câmara RB,
dundância para se evitar tensão mecânica no gerador Seda L, Baldauf CM, et al. Extended, one-stage cal-
ou eletródio devido a movimentos na região cervical. losal section for treatment of refractory seconda­
rily generalized epilepsy in patients with Lennox-
O uso de antbiótico durante o procedimento é re-
Gastaut and Lennox-like syndromes. Epilepsia.
comendado pelo fabricante, no entanto, o uso no pós- 2006;47(2):371-4.
operatório deve ser ditado pelas comissões de infec-
5. George MS, Nahas Z, Bohning DE, Kozel FA, An-
ção hospitalares locais. derson B, Chae JH, et al. Vagus nerve stimulation
Os parâmetros de estimulação utilizados são cor- therapy: a research update. Neurology. 2002;59(6
rente de 3,5 mA, freqüência de 30 Hz e amplitude Suppl 4):S56-61.
de pulso de 500 ms. O aumento da corrente deve ser 6. Loddenkemper T, Pan A, Neme S, Baker KB, Rezai
gradual, variando em 0,25 mA, de acordo com a tole- AR, Dinner DS, et al. Deep brain stimulation in epi-
rância do paciente. lepsy. Clin Neurophysiol. 2001 Nov;18(6):514-32.
7. Andrade DM, Zumsteg D, Hamani C, Hodaie M,
Estimuladores de núcleos profundos Sarkissian S, Lozano AM, et al. Long term follow up
of patients with thalamic deep brain stimulation for
Existem atulamente vários alvos cerebrais profun- epilepsy. Neurology. 2006;66:1-3.
dos, cuja estimulação altera a atividade cortical em 8. Velasco AL, Velasco F, Jimenez F, Velasco M, Castro
pacientes com epilepsia. Os mais estudados são o nú- G, Carrillo-Ruiz JD, et al. Neuromodulation of the
cleo anterior do tálamo, o núcleo centro-mediano do centromedian thalamic nuclei in the treatment of
tálamo, o núcleo subtalâmico e os hipocampos7-11. generalized seizures and improvement of the quality
Os alvos são localizados com métodos estereotá- of life in patients with Lennox-Gastaut syndrome.
ticos habituais (a maioria dos autores ainda prefere o Epilepsia. 2006;47(7):1203-12.
uso do frame estereotático), com o posicionamento 9. Handforth A, DeSalles AAF, Krahl SE. Deep brain
do eletródio no alvo desejado. O gerador, assim como stimulation of the subthalamic nucleus as ad-
nos estimuladores vagais, é posicionado na região junct treatment for refractory epilepsy. Epilepsia.
abaixo da clavícula, no subcutâneo, e um túnel sub- 2006;47(7):1239-41.
cutâneo conecta o eletródio ao gerador. 10. Velasco M, Velasco F, Velasco AL. Centromedian-
thalamic and hippocampal electrical stimulation for
the control of intractable epileptic seizures. J Clin
Referências Bibliográficas Neurophysiol. 2001;18(6):495-513.
1. Engel Jr J. A proposed diagnostic scheme for people 11. Kerrigan JF, Litt B, Fisher R, Cranstoun S, French
with epileptic seizures and with epilepsy: report of JA, Blum DE, et al. Electrical stimulation of the an-
the ILAE task force on classification and terminol- terior nucleus of the thalamus for the treatment fo
ogy. Epilepsia. 2001;42(6):796-803. intractable epilepsy. Epilepsia. 2004;45(4):346-54.

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Parte 2
Neurocirurgia Vascular

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6
Hematomas Intraparenquimatosos
Espontâneos
Jorge Luiz Kraemer

CONCEITO degenerativas, descritas como “lipo-hialinose”, “fi-


brino-hialinose” ou “angionecrose”, comprometem

A
s causas de hemorragia cerebral, em geral, são: a camada média das artérias cerebrais e predispõem
hipertensão arterial, rotura de aneurisma ou à rotura do vaso, mesmo em pacientes normotensos,
malformação vascular, traumatismo, discrasia principalmente nas pequenas artérias que emanam
sangüínea, hemorragia em tumor cerebral, infarto ce- diretamente das principais e onde a pressão intralu-
rebral, infarto hemorrágico ou em tronco cerebral no minal é maior.
deslocamento axial, inflamação, diversas causas da as-
sim chamada púrpura cerebral (avitaminoses, embolia
gordurosa, causas alérgicas ou tóxicas), iatrogenia (he- TOPOGRAFIA
parina, ácido acetilsalicílico, dicumarol etc.) e causas Os HIE ocorrem: 1. no estriado (50%), com
indeterminadas. O conceito de hemorragia intraparen- compro­metimento do putame (mais comum), globo
quimatosa espontânea (HIE) se restringe aos casos de pálido, núcleo lenticular ou cápsula interna; 2. no tála-
hematomas que não se tenham originado no período mo (15%) (Fig. 6.1); 3. na substância branca cerebral
neonatal nem provenham de traumatismo, rotura de (10% a 20%), caracterizando um comprometimento
aneurisma ou malformação arteriovenosa, neoplasia lobar; 4. no cerebelo (10%); e 5. no tronco cerebral
ou distúrbio hematológico que favoreça sangramento. (10%). Eventualmente o hematoma pode envolver to-
Incluem-se nesse conceito os hematomas relacionados dos os gânglios da base, desde a parede ventricular
à hipertensão arterial sistêmica (HAS) e os de etiologia
indeterminada. Os demais, devido à etiopatogenia di-
versa, não são considerados espontâneos.

EPIDEMIOLOGIA
A HIE corresponde a aproximadamente 10% de to-
dos os acidentes vasculares cerebrais e acomete 12 a 15
em cada 100.000 habitantes, por ano, nos Estados Uni-
dos. O prognóstico desses pacientes é reservado, com
mortalidade próxima dos 44% em 30 dias e elevada in-
cidência de seqüelas entre os sobreviventes.

PATOLOGIA
A HAS é responsável por 66% das HIE, tanto por
efeito direto nos vasos como por alterações degene- Fig. 6.1- Pequeno hematoma talâmico, sem indicação de tra-
rativas provocadas cronicamente. Essas alterações tamento cirúrgico.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

até o córtex da ínsula, incluindo porções do tálamo, miparesia, quando a cápsula interna é envolvida. Com
cápsulas interna, externa e extrema e claustro; nesse grandes hematomas, os pacientes podem apresentar-
caso, o hematoma é chamado quadrilateral (Fig. 6.2) se em coma profundo. Há paralisia do olhar vertical,
e corresponde a 27% das hemorragias basais. nistagmo de retração e desvio do olhar; anormalida-
des pupilares podem ocorrer quando a hemorragia se
estende para o mesencéfalo.
As hemorragias cerebelares se manifestam carac-
teristicamente por cefaléia de início abrupto e fre-
qüentemente suboccipital, acompanhada de náusea,
vômito, vertigem, dormência na face, disartria, alte-
rações na motilidade ocular, nistagmo e hemiataxia.
Apesar de, no início, geralmente não haver compro-
metimento de consciência, os pacientes podem sofrer
deterioração rapidamente em algumas horas.
As hemorragias pontinas geralmente se apresen-
tam com coma imediato. As outras manifestações
clínicas que sugerem essa topografia incluem pupi-
las punctiformes e pouco fotorreagentes, quadripare-
sias, rigidez de descerebração e alterações oculares.
A maioria dos pacientes evolui para o óbito após uma
hemorragia pontina.

DIAGNÓSTICO
As manifestações clínicas, isoladamente, não
são suficientes para se estabelecer o diagnóstico de
Fig. 6.2 – Hematoma quadrilateral. HIE.
A tomografia computadorizada é o exame de
es­colha para a confirmação do diagnóstico, já que
permite obter o maior número de informações com
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS pouco risco para o paciente. A extensão e a topo-
As manifestações clínicas estão relacionadas grafia das lesões podem ser estabelecidas de forma
com a topografia do hematoma, o volume da he- precisa, e o grau de comprometimento do sistema
morragia e as condições prévias do paciente. Po- ventricular e das cisternas podem propiciar elemen-
dem apresentar-se de forma abrupta ou instalar-se tos prognósticos. A evolução do hematoma, pelas
gradualmente. modificações de densidade, pode ser acompanhada
Os sintomas mais freqüentes são cefaléia (28% a por exames periódicos. O volume do hematoma tem
62%), vômito (29% a 65%), tontura (18%), distúr- grande valor prognóstico e pode ser estimado pela
bio da motricidade e da consciência. À internação, o tomografia computadorizada, diretamente, por meio
paciente geralmente apresenta comprometimento da do software do tomógrafo, ou indiretamente, por
consciência e hemiplegia, que pode ser flácida (64%) medidas obtidas dos filmes, considerando o volume
ou espástica (24%). A síndrome meníngea está pre- total como o somatório dos volumes de uma série
sente em 71% dos casos e os distúrbios da motilidade de cilindros e cones (Fig. 6.3): em cada corte tomo-
ocular são observados em 22% a 35% dos casos. As gráfico onde se identifica o hematoma‚ calcula-se a
manifestações convulsivas, menos freqüentes, ocor- área ocupada pela imagem, que, multiplicada pela
rem em 7% a 11% dos pacientes. espessura do corte tomográfico, fornece o volume
A hemorragia putaminal pode-se estender para os de um cilindro; nas extremidades (cranial e caudal),
lobos frontal ou temporal, destruir os tratos pirami- os autores consideram essas porções do hematoma
dais na cápsula interna e romper para os ventrículos. como cones (cujo volume corresponde a um terço do
Os pacientes apresentam-se com hemiparesia pro- volume do cilindro).
gressiva, que pode ser acompanhada de hemianopsia, A tomografia computadorizada deve ser realizada
disfasia (se o hemisfério dominante é o envolvido) ou o mais precocemente possível e a decisão de utiliza-
hemi-hipoestesia. A maioria dos pacientes não desen- ção de contraste intravenoso deve ser tomada pelo
volve cefaléia ou síndrome meníngea. radiologista em conjunto com o médico assistente ou
As hemorragias talâmicas classicamente se apre- plantonista. O exame deve ser repetido a cada modifi-
sentam com hemianestesia e, eventualmente, com he- cação do quadro clínico.

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6 – Hematomas Intraparenquimatosos Espontâneos

possuírem maior complacência cerebral e, portanto,


tolerarem melhor a expansão do hematoma, com me-
nor impacto sobre a pressão intracraniana, apresen-
tam mortalidade superior à dos jovens, principalmen-
te acima dos 50 anos de idade. As doenças prévias,
especialmente o alcoolismo, também pioram o prog-
nóstico.
Espessura do corte
O nível de consciência na fase inicial é o fator de
Área
prognóstico mais importante. Os pacientes com bom
nível de consciência (14 ou 15 pontos na escala de
Fig. 6.3 – Para cálculo do volume, o hematoma pode ser Glasgow) geralmente evoluem bem, independente-
representado por um conjunto de cilindros e cones. mente do tipo de tratamento adotado, ao passo que os
pacientes em coma profundo (3 ou 4 pontos na escala
A ressonância magnética é um valioso instrumen- de Glasgow) quase invariavelmente evoluem para o
to para o enriquecimento do diagnóstico inicial já óbito ou estado vegetativo persistente. Isso se deve
estabelecido pela tomografia computadorizada. Tem ao maior ou menor efeito direto do sangramento no
limitado valor prático para o primeiro momento por- tecido encefálico no momento em que ocorre, e da
que exige mais tempo para sua realização, traz difi- topografia e do volume da hemorragia.
culdades para o acesso ao paciente e não é tão precisa A topografia exerce um papel significativo no
quanto a tomografia computadorizada nas primeiras prognóstico e na escolha do tratamento. Os casos com
horas, além de ter um custo maior. É reservada para HIE do tronco cerebral geralmente evoluem mal e, tal
a pesquisa de diagnósticos de angiopatia amilóide, como os do tálamo, não são acessíveis à cirurgia. Os
cavernoma ou outras entidades mal definidas pela HIE lobares e cerebelares são os que mais se benefi-
tomografia computadorizada, geralmente em comple- ciam da drenagem cirúrgica. Os estriatais apresentam
mento desta. maior variabilidade e controvérsia no manejo. A in-
A arteriografia é um exame invasivo, que deve ser vasão ventricular também é fator de agravamento, e o
reservado para os casos em que é necessário inves- preenchimento com dilatação do IV ventrículo geral-
tigar a presença de malformação vascular, especial- mente é indicativo de evolução para o óbito.
mente em pacientes jovens e sem fator de risco para O volume do hematoma pode ser utilizado como
HIE e nos casos de hematomas de topografia lobar. A parâmetro na escolha do tratamento, em conjunto
arteriografia pode ser dispensada em pacientes idosos com as outras variáveis. Enquanto HIE de volume re-
e hipertensos com HIE em gânglios da base, já que, duzido não merecem abordagem cirúrgica (Fig. 6.1),
nesses casos, a probabilidade de se encontrar malfor- pacientes com hematomas volumosos podem ser be-
mação não supera os riscos do procedimento. neficiados com a drenagem, especialmente na topo-
A punção lombar diagnóstica não deve ser realiza- grafia lobar ou cerebelar.
da se houver suspeita de HIE, pelo risco de se provo-
car herniação transtentorial em processos volumosos
e, nos de reduzido volume, o liquor se apresentar lím-
Tratamento Conservador
pido, tornando inócua a investigação. Os cuidados de rotina de um centro de tratamento
intensivo devem ser observados na fase aguda. A uti-
TRATAMENTO lização de corticóides, com a finalidade de combater
o edema cerebral, não traz efeito benéfico. A incidên-
O tratamento do HIE ainda é motivo de contro- cia de convulsões no HIE é da ordem de 7% a 11%
vérsia. Não há estudo metodologicamente válido que dos casos e a prescrição de anticonvulsivante deve ser
comprove a maior eficácia de determinado tratamento considerada, especialmente em hematomas lobares.
sobre os demais, principalmente no que concerne à Doenças sistêmicas como infecções, diabetes
escolha entre uma abordagem conservadora e alguma melli­tus e HAS grave, entre outras, podem contribuir
modalidade de cirurgia. para maus resultados em uma grande proporção de
A história natural do HIE depende de diversas va- pacientes e merecem tratamento específico. O au-
riáveis que modificam o prognóstico dos pacientes1-5. mento da pressão arterial, na fase aguda, acarreta um
As principais são: idade e condições clínicas do doen­ ressangramento6.
te, nível de consciência, topografia e volume do he- O tratamento de HAS em pacientes com HIE deve
matoma. Os estudos que avaliam os resultados dos visar a um controle dos níveis tensionais pró­ximos
diversos tratamentos geralmente não conseguem con- aos níveis normais, evitando elevações ou quedas
templar todas essas variáveis ao mesmo tempo. significativas. A utilização de drogas que provocam
A idade é um fator que modifica o prognóstico. vasodilatação, como nitroprussiato de sódio e ni-
Apesar de os pacientes em faixa etária mais avançada fedipina, deve ser feita criteriosamente, já que elas

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

podem piorar a hipertensão intracraniana. Há indi- Pacientes com hematomas de volume menor que
cação de primeiro se reduzir a pressão intracraniana, 10 ml não devem ser operados, já que normalmente
antes de­se reduzir a HAS. Fatores individuais, como evoluem de modo favorável com o tratamento con-
idade, HAS crônica prévia e hipertensão intracrania- servador (níveis de evidência II a V, grau de reco-
na, devem ser considerados. Recomenda-se que, em mendação B)7.
hipertensos prévios, a pressão arterial média seja A hipertensão intracraniana incontrolável pode ser
mantida abaixo de 130 mmHg (nível de evidência V, uma indicação de remoção cirúrgica do hematoma,
recomendação grau C). Deve-se evitar pressão arterial antes de haver deterioração do nível de consciência.
média acima de 110 mmHg no período pós-operatório Os pacientes com idade mais avançada têm maior
(nível de evidência V, recomendação grau C)7. complacência cerebral (pela atrofia cortical) e geral-
A maioria dos pacientes em coma, com HIE, apre- mente toleram melhor as expansões volumétricas in-
senta hipertensão intracraniana. Apesar de as mani- tracranianas, que podem cursar sem hipertensão.
festações clínicas não refletirem os níveis de pressão A deterioração da consciência pode ser decorrente
intracraniana, eles podem ser estimados a partir de de:
dados da tomografia computadorizada. Em geral, a 1. complicação sistêmica (infecção, disfunção
indicação de monitoração da pressão intracraniana metabólica);
é baseada no nível de consciência (Glasgow < 9) e
quando ocorre piora decorrente da hipertensão intra- 2. isquemia por queda do fluxo sangüíneo cere-
craniana (nível de evidência V, recomendação grau bral (neste caso deve ser corrigida a pressão
C)7. Diversos sistemas de monitoração podem ser de perfusão cerebral para valores acima de
utilizados, dando-se preferência à cateterização do 60 mmHg);
ventrículo, o que permite o controle da hidrocefalia 3. hérnia cerebral. Nas situações de piora da
quando presente e auxilia no tratamento com a opção consciência causada por hérnia cerebral, há in-
de drenagem liquórica8. dicação de drenagem cirúrgica.
Em HIE está provado que a queda da pressão de Pacientes com hematoma cerebelar com diâmetro
perfusão cerebral (com valores abaixo de 60 mmHg) superior a 3 cm e que desenvolvem deterioração neu-
aumenta a mortalidade, provavelmente em decorrência rológica ou sinais de compressão de tronco cerebral e
da isquemia. Além disso, as elevações de pressão intra- hidrocefalia obstrutiva devem ser submetidos à remo-
craniana, com freqüência, se acompanham de deterio- ção cirúrgica do hematoma tão logo seja possível (ní-
ração clínica. É importante, portanto, obter-se o contro- vel de evidência III a V, grau de recomendação C)7,¹¹.
le da pressão intracraniana desses pacientes, tratando As técnicas clássicas incluem craniotomia osteo-
os casos que apresentem níveis acima de 20 mmHg. plástica com aspiração a céu aberto dos coágulos. A
O tratamento da hipertensão intracraniana pode abordagem frontal tem sido preferida para hemato-
ser feito mediante a infusão de solução de manitol, mas de cápsulas externa, enquanto a parietotemporal
drenagem liquórica, hiperventilação ou coma barbitú- é indicada para os de cápsula interna. A utilização da
rico, entre outras medidas de tratamento intensivo. abordagem transylviana, com uso de microscópio ci-
rúrgico visando reduzir o dano operatório, também é
Tratamento Cirúrgico referida, da mesma forma que a transinsular.
As técnicas que utilizam procedimentos estereotá-
O tratamento cirúrgico da HIE não tem indicações xicos para a aspiração do hematoma podem ser rea­
universalmente aceitas9,10. Enquanto alguns autores lizadas com auxílio da tomografia computadorizada
referem resultados idênticos com cirurgia ou trata- ou sem esse recurso. Tais procedimentos permitem
mento conservador, outros indicam remoção cirúrgica
a remoção parcial dos coágulos, transformando he-
em todos os casos. Alguns critérios, no entanto, têm
matomas grandes em pequenos, sem necessidade, na
sido apontados, baseados nos fatores de prognóstico.
maioria dos casos, de anestesia geral. De forma si-
Pacientes com bom nível de consciência (Glasgow milar, pode-se utilizar endoscópio para a evacuação
> 13) não necessitam ser operados, assim como os pa-
de hematomas. Há relatos de infusão de trombolíti-
cientes em coma profundo (Glasgow ≤ 4).
cos (uroquinase ou rtPA) no hematoma, com bons
A topografia é outro fator importante na decisão resultados¹².
da indicação de cirurgia. Os hematomas talâmicos em
geral não devem ser operados, enquanto os lobares, Não há, até o momento, comprovação da superio-
com maior volume, devem ser operados. Os hemato- ridade de determinado tratamento cirúrgico sobre os
mas estriatais provocam maior controvérsia com rela- demais, como também não há critérios absolutos para
ção à indicação de drenagem cirúrgica: são operados a seleção dos pacientes que devem ser operados.
os casos com hematomas volumosos (> 50 ml), com O fluxograma sintetiza alguns critérios para apli-
deterioração do nível de consciência ou hipertensão cação nos casos de hematomas supratentoriais (Fig.
intracraniana incontrolável. 6.4).

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6 – Hematomas Intraparenquimatosos Espontâneos

Glasgow Glasgow Glasgow


3-4 5-13 14-15

Topografia Topografia Monitoração


Suporte
estriatal lobar clínica

< 50 ml > 50 ml > 30 ml < 30 ml

Monitoração
da PIC

HIC Piora Piora HIC


refratária consciência consciência refratária

Cirurgia

Fig. 6.4 – Alguns critérios para aplicação nos casos de hematomas supratentoriais.

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Técnica da Descompressão Cirúrgica
no Tratamento de Isquemia Cerebral no
Território da Artéria Cerebral Média
Paulo Henrique Pires de Aguiar

INTRODUÇÃO qualidade de vida na avaliação da escala de Rankin


modificada, alcançando o escore médio de 2,6 (varia-

A
mortalidade após isquemia cerebral é cau­sada, ção de 1 a 4)7. A rationale para a craniectomia des-
normalmente, por lesão expansiva de­cor­rente compressiva é permitir a expansão extracraniana do
de edema cerebral maligno is­quêmico, refratá- tecido edematoso e evitar herniação cerebral e colapso
rio a tratamento clínico para contenção da hipertensão da microcirculação cerebral. Esse conceito baseia-se
intracraniana. O quadro clínico, já bastante conheci- em estudos experimentais8, mostrando que em estu-
do, é constituído por hemiplegia e redução do padrão dos clínicos há queda significativa na mortalidade9,10.
respiratório normal, alterações da motricidade ocular e
diminuição do nível de consciência em 24 a 48 horas1.
O paciente deve ser submetido a manobras de con- Timming da craniectomia
tenção da hipertensão intracraniana, como elevação descompressiva
do decúbito toracocefálico, evitar hipo ou hiperter- No passado indicava-se a cirurgia se o paciente
mia, utilização de manitol ou glicerol para diminuir apresentasse sinais reversíveis de herniação ou des-
osmoticamente o inchaço cerebral, evitar hipotensão vio importante das estruturas da linha mediana pelo
diminuindo o fluxo sangüíneo cerebral, sedação e edema cerebral isquêmico9,10.
coma induzido com barbituratos, benzodiazepínicos Atualmente não se esperam mais esses sinais de her-
e propofol para se diminuir segura e rapidamente a niação, e a indicação precoce é a tendência encontrada
hipertensão intracraniana²-4. na literatura mundial. Por meio de exames de imagem
Quando essas manobras são ineficazes e há dete- com tomografias repetidas e ressonância magnética com
rioração do nível de consciência ainda que com sinais estudo de difusão e perfusão é possível a identificação
e sintomas incipientes, a craniectomia descompressi- precoce da extensão do infarto6 (Figs. 7.1 a 7.3). A as-
va pode ser indicada4. sociação desses dados precoces de imagem à síndrome
clínica é suficiente para a indicação da craniectomia
Rationale para a Craniectomia descompressiva6. Os critérios clínicos e radiológicos
atuais na literatura, usados para se considerar a indica-
descompressiva ção de hemicraniectomia descompressiva, são11:
Edema cerebral fatal ocorre em 1% a 5% dos pa- • Infarto com extensão maior que 50% no terri-
cientes com infarto supratentorial5. tório da artéria cerebral média, definida na TC
Pacientes com infartos hemisféricos e edema ce- de crânio e/ou RNM com sintomas e sinais clí-
rebral ocupando espaço têm prognóstico ruim nas sé- nicos agudos correspondentes
ries prospectivas, com mortalidade em torno de 80%6. • Evidência neurorradiológica de inchaço cere-
No tratamento cirúrgico, há mortalidade em 34,4%7. bral local obliterando as cisternas basais e apa-
Entre os sobreviventes, há melhora surpreendente da gamento de sulcos corticais.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

idade e lado do infarto como


Fatores decisórios na indicação
e prognóstico
Resultados do tratamento cirúrgico em pacientes
com menos de 50 anos, submetidos a hemicraniec-
tomia descompressiva, são melhores do que em pa-
cientes com mais de 50 anos11. Em relação ao lado
do infarto, não há relevância prognóstica quando se
analisa esse fator isoladamente. Porém, tem impor-
tância prognóstica nos pacientes com idade superior
a 50 anos11.
Fatores como doença neurológica prévia, doença
terminal, ou hemorragia cerebral concomitante preju-
dicam o prognóstico11.

Doppler transcraniano como


indicador precoce de descompressão
e seguimento perioperatório
Fig. 7.1 – TC de crânio mostra extenso ACVI (acidente isquê- O Doppler transcraniano é muito importante para
mico vascular cerebral) de território de artéria cerebral média.
o diagnóstico precoce de falência da microcirculação
por inchaço cerebral decorrente de isquemia cerebral
A B e ajuda a dimensionar o prognóstico e a gravidade
pós-operatória.
O incremento do índice de pulsatilidade em decor-
rência do aumento da resistência vascular da micro-
circulação pode ser um indicativo de hipertensão in-
tracraniana e ser utilizado como fator de indicação da
descompressão. O vasoespamo em casos de hemor-
ragia meníngea que precede uma isquemia completa­
pode ser diagnosticado pelo Doppler transcraniano,
bem como a orientação terapêutica pode-se basear no
seu seguimento na unidade de terapia intensiva (Figs.
7.4 a 7.6).
Fig. 7.2 – (A e B) TC mostra parênquima encefálico aparen-
temente sem alterações por ocasião do ictus, em paciente de 72
anos de idade, do sexo feminino.

A B

Fig. 7.3 - (A e B) TC mostra após 72 horas a evolução com is-


quemia significativa com desvio das estruturas da linha mediana
e área de transformação hemorrágica profunda após trombólise Fig. 7.4 – A tela do Doppler transcraniano em paciente com
realizada logo depois do ictus. Paciente em escala de coma de hemorragia meníngea mostra vasoespasmo grave, com au-
Glasgow igual a 10 pontos, com alteração pupilar compatível mento da amplitude das ondas demonstrando uma velocidade
com anisocoria do lado direito maior que o esquerdo. de 135 cm/s.

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7 – Técnica da Descompressão Cirúrgica no Tratamento de Isquemia Cerebral no Território da Artéria Cerebral Média

Fig. 7.5 – A tela do Doppler mostra diminuição da veloci-


dade pela obstrução arterial, 27 cm/s (índice de pulsatilidade
de 1,72)

Fig. 7.6 – A tela do Doppler mostra melhora com aumento


da velocidade e conseqüente reperfusão, após a craniectomia
descompressiva, velocidade de 66 cm/ (índice de pulsatilidade
de 0,95).

Craniectomia Descompressiva
A craniectomia descompressiva deve ser ampla e
apropriadamente denominada hemicraniectomia des-
compressiva. (Figs. 7.7 a 7.11). A extensão deve al-
cançar do frontal ao osso occipital (Fig. 7.12). Quanto
maior a idade do paciente, maior a chance de aderên-
cia dural ao osso, e durante a craniotomia aumenta o
risco de laceração dural. Por essa razão deve-se fazer C
um número de orifícios de trepanação maior que o
habitual para se descolar a dura-máter. O enxerto du-
ral durante a duraplastia deve ser realizado com a uti-
lização preferencial de pericrânio, fáscia lata, fáscia
temporal e, por fim, como última escolha, pericárdio
bovino e dura-máter de cadáver liofilizada. O fecha-
mento dural deve ser o mais hermético possível, po-
rém algumas vezes há lacerações durais extensas e,
devendo-se fazer uso de colas biológicas (Beriplast®,
Tissucol®) substitutos sintéticos de dura-máter como
Dura Dry®, Duragen® e outros.
De todo modo, os principais fatores para uma boa
evolução pós-operatória residem na indicação pre-
coce, pacientes com idade menor que 50 anos, sem Fig. 7.7 – (A e B) TC de crânio pós-operatória mostra extensa
comorbidades graves e craniectomia com grande craniectomia fronto-têmporo-parietoccipital. (C) TC helicoidal,
extensão1,6,7,12-23. com reconstrução em 3D, mostrando extensão da craniectomia.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Fig. 7.8 – Aspecto cirúrgico, após a craniectomia, mostra


cérebro pálido, com aumento de volume acima do nível da
craniotomia (inchaço cerebral).
Fig. 7.10 – Doppler de carótidas mostra oclusão completa da
A carótida comum, abaixo da bifurcação instalada, mesmo após
a trombólise com RTPA.

Fig. 7.9 – (A e B) Aspecto final após finalização da plástica


dural com pericrânio autólogo.

Fig. 7.11 – (A e B) TC pós-operatória mostra descompres-


são cirúrgica interna, com lobectomia temporal e craniectomia
descompressiva.

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7 – Técnica da Descompressão Cirúrgica no Tratamento de Isquemia Cerebral no Território da Artéria Cerebral Média

A 7. Riecke K, Schwab S, Krieger D, von Kummer R,


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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

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8
Endarterectomia de Artéria
Carótida Cervical
Considerações Técnicas
Apio Claudio Martins Antunes
Eduardo Mello Rodrigues

INTRODUÇÃO lidades da cirurgia vascular. Contudo, somente a partir


de 1951, com a publicação de um estudo correlacio-

N
a década de 1980 foram discutidas tanto as nando a doença cerebrovascular com a oclusão caro-
indicações quanto as técnicas cirúrgicas na
tídea, por um neurologista canadense, Miller-Fisher,
endarterectomia carotídea. Mudanças signi-
passa-se a creditar-lhe a base de uma visão moderna
ficativas na prática da reconstrução cerebrovascular
dessa doença, surgindo então as primeiras cirurgias de
extracraniana ocorreram em poucos anos. As novas
indicações e dados coletados em estudos cooperati- reconstrução para a insuficiência cerebrovascular.
vos estão sendo recentemente discutidos. Este capítu- O incremento das novas técnicas de imagem,
lo tem o objetivo de revisar os avanços mais recentes como angiografia por subtração digital, angior-
na monitoração cirúrgica e técnicas cirúrgicas da úl- ressonância magnética e Doppler colorido, assim
tima década. como a introdução do uso do shunt temporário2,
A abordagem cirúrgica dos vasos extracranianos contribuí­ram de modo decisivo para que houvesse
tem como meta a resolução dos sintomas neurológi- grande aumento no número de cirurgias realizadas.
cos e a prevenção dos ataques isquêmicos maiores. Contribuíram também para esse aumento a moni-
Na ausência de métodos clínicos mais eficazes para toração intra-operatória com eletrencefalograma
tratar e prevenir o desenvolvimento do acidente vas- (EEG)3, o uso do exame de potenciais evocados,
cular encefálico isquêmico na doença carotídea este- além da possibilidade do uso da anestesia locorre-
nosante e em face da importância dessa afecção, dos gional em larga escala.
seus riscos e dos seus custos sociais, é que a cirurgia
veio definitivamente, com segurança e eficácia, con- INDICAÇÕES PARA ENDARTERECTOMIA
tribuir decisivamente para a redução desses custos CAROTÍDEA
como um todo.
A cirurgia de endarterectomia carotídea é o pro-
cedimento cirúrgico com maior número de estudos
Revisão Histórica – Atualização cooperativos demonstrando sua eficácia. Os critérios
A palavra carótida deriva do termo grego karoti- para indicação cirúrgica em pacientes assintomáticos
de ou karos, que significa sono profundo. De acordo portadores de placas de ateroma na artéria carótida
com Rufus em Ephesus (100 a.C.), o termo foi aplica- baseiam-se sobretudo no estudo ACAS (Asymptoma-
do para as artérias do pescoço, porque a compressão tic Carotid Atherosclerosis Study). Segundo esse es-
desses vasos produzia estupor ou sono. tudo, pacientes em bom estado clínico, com estenose
Em 1927, Egas Moniz1 realiza a primeira angiogra- carotídea igual ou superior a 60%, são bons candida-
fia cerebral por punção direta e, dez anos depois, pu- tos ao tratamento cirúrgico, desde que a morbimorta-
blica uma série de 537 arteriografias, nas quais foram lidade do cirurgião seja inferior a 3%.
encontrados quatro casos de oclusão da artéria carótida Os critérios de seleção para pacientes sintomáti-
interna. Este foi o principal marco das futuras possibi- cos foram determinados principalmente pelo estudo

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

cooperativo NASCET (North American Symptomatic Os doentes hipertensos submetidos à endarterec-


Carotid Endarterectomy Trial), segundo o qual os pa- tomia da carótida extracraniana têm maior risco de
cientes neurologicamente estáveis com estenose ca- desenvolver hipertensão arterial sistêmica pós-opera-
rotídea igual ou superior a 70% se beneficiam com a tória, que se associa a maior morbidade neurológica e
cirurgia em serviços que a realizem com morbimorta- mortalidade. Portanto, tais doentes devem ter a pres-
lidade inferior a 6%. Quanto maior o grau de esteno- são arterial sistêmica estabilizada no pré-operatório e
se, maior o benefício da cirurgia. Já em pacientes com continuar com suas medicações anti-hipertensivas até
estenose entre 50% e 69%, a cirurgia só deveria ser a manhã da cirurgia, voltando a elas tão logo possível
indicada em serviços com morbimortalidade inferior no pós-operatório. Todavia, não é aconselhável redu-
a 2%. zir rapidamente a elevação crônica da pressão arterial
A endarterectomia não deve ser realizada em fase sistêmica antes da cirurgia, pelo risco de hipotensão
aguda pós-isquemia encefálica, aguardando-se 2 a 4 e complicações cerebrais e cardíacas. A mensuração
semanas para o procedimento, e os pacientes devem da pressão arterial pré-operatória diariamente ajuda a
ser operados em uso de ácido acetilsalicílico (AAS) determinar a faixa de valores que o doente é capaz de
ou outro antiagregante plaquetário, para reduzir o ris- tolerar durante a operação, devendo ser medida em
co de isquemia miocárdica ou cerebral. ambos os braços, já que os doentes com doença vas-
Resumidamente, as indicações atuais das cirurgias cular periférica têm alta incidência de discrepância
de carótida a pacientes sintomáticos e assintomáticos da pressão arterial entre os braços direito e esquerdo.
encontram-se na Tabela 8.1. Existem evidências sugerindo que a hiperglicemia
aumenta a gravidade da lesão neurológica causada
pela isquemia cerebral. Assim, é prudente controlar
rigorosamente a glicemia dos doentes diabéticos e
Tabela 8.1 – Indicações de Cirurgias Baseadas nos evitar a prescrição de solução glicosada durante a en-
Estudos NASCET e ACAS darterectomia da carótida extracraniana.
Indicações da cirurgia de carótida (Consenso) Deve-se recomendar a interrupção do tabagismo
pelo maior tempo possível antes da cirurgia (duran-
Sintomáticos Assintomáticos te esse período o doente está exposto ao maior risco
Indicação provada: Indicação provada:
de AVC). A interrupção do tabagismo em pelo menos
AIT e estenose de 50-70% Estenose ≥ 60%
oito semanas diminui as complicações respiratórias
após revascularização do miocárdio. Os doentes com
Ictus moderado e estenose doença pulmonar obstrutiva crônica também podem
≥ 70% beneficiar-se da fisioterapia e do uso de broncodila-
tadores. Recomendava-se um intervalo de 6 semanas
entre o acidente vascular cerebral e a cirurgia carotí-
São consideradas contra-indicações: oclusão es- dea, para evitar o desenvolvimento de um infarto he-
tabilizada da carótida interna, ictus em fase aguda morrágico que, não raro, é uma complicação fatal.
com alteração do estado de consciência e em casos Tanto o estudo NASCET (1991) quanto o ECST
de prognóstico reservado, em razão da limitação do (1991) orientam a realização rotineira de arteriogra-
tempo de vida. fia convencional pré-operatória para estimar o grau
da estenose arterial, embora a angiografia tenha ris-
FATORES DE RISCO PARA co avaliado de 0,4% a 1% de AVC. Espera-se que os
progressos nos métodos de imagens não invasivos,
ENDARTERECTOMIA CAROTíDEA incluindo a angiografia por ressonância magnética e
A idade não parece ser fator limitante para indi- a angiotomografia, possam eliminar a necessidade da
cação de endarterectomia, desde que o doente esteja angiografia convencional como um pré-requisito para
em boas condições clínicas e com sobrevida esperada a endarterectomia da carótida extracraniana.
maior que o risco da operação. A arteriografia continua sendo o padrão ouro na
Além da doença vascular cerebral, os doentes que decisão de endarterectomia (ECST, 1996; NASCET,
serão submetidos à endarterectomia carotídea extra- 1998; SBACV, 1998), porém muitos serviços no mun-
craniana costumam ter outras doenças associadas que do indicam equivocadamente a endarterectomia de
devem ser minuciosamente avaliadas antes da opera- carótida extracraniana somente com estudo por eco-
ção. Em dois estudos, com um total de 1.546 doentes doppler de vasos cervicais, o que presume o risco de
submetidos à endarterectomia da carótida cervical, deixar de diagnosticar lesões localizadas no vasos su-
50% a 56% tinham antecedentes de hipertensão, 41% pra-aórticos e nas artérias do polígono de Wyllis, com
a 49% tinham coronariopatia, 13% a 18% apresenta- o que o risco cirúrgico fica altamente comprometido.
vam diabetes mellitus e 42% a 61% relataram história A arteriografia é o padrão-ouro na decisão do tipo
de tabagismo4,5. de tratamento, operatório, angioplastia ou tratamento

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8 – Endarterectomia de Artéria Carótida Cervical Considerações Técnicas

clínico (ECST, 1996; NASCET, 1999), sendo o ma- local são a impossibilidade de se utilizar proteção
peamento duplex (scan duplex) o método de escolha cerebral com barbitúricos durante a clampagem e o
para seleção inicial e seguimento pós-operatório. maior desconforto para o paciente e para o cirurgião.
A tomografia cerebral é de extrema importância
nos casos sintomáticos e assintomáticos. Nos sinto- Técnicas de Monitoração
máticos, avalia se a lesão cerebral é estável, ajudando
na decisão do momento operatório e excluindo even- Com o objetivo de reduzir a morbimortalidade
tuais lesões expansivas. Nos pacientes assintomáticos perioperatória na cirurgia da artéria carótida cervical,
é importante no caso de detecção de lesão isquêmica uma variedade de técnicas de monitoração foi desen-
sem repercussão clínica maior e como exame de refe- volvida com o objetivo de aumentar a proteção cere-
rência para o período pós-operatório. bral.
Ressonância magnética é indicada nos casos de Basicamente, há duas categorias de monitoração:
alergia ao contraste iodado; também para melhor
avaliar o evento isquêmico, utilizando-se das técni- Testes da Integridade Vascular
cas de perfusão e difusão. A angiorressonância, com
a melhor resolução de imagem, é capaz de substituir 1. Medida da pressão na porção distal da artéria
a arteriografia digital, especialmente nas informações carótida interna.
quanto às lesões da carótida cervical. 2. Doppler transcraniano.
3. Angiografia transoperatória.
CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS E TÉCNICAS
DE MONITORAÇÃO Testes da Função Cerebral
A anestesia geral continua sendo a anestesia de es- 1. Eletrencefalograma.
colha para a endarterectomia carotídea na maioria dos 2. Potencial evocado somatossensitivo.
grandes centros.
Os agentes anestésicos associados a barbitúricos Medida da Pressão da Artéria Carótida
intravenosos reduzem significativamente o metabo- A medida da pressão residual na topografia da por-
lismo cerebral de oxigênio, proporcionando vantagem
ção distal da artéria carótida comum (ACC), ou arté-
significativa na proteção cerebral contra a isquemia.
ria carótida interna (ACI), após a ligadura da porção
proximal da ACC e artéria carótida externa (ACE),
Anestesia na Endarterectomia Carotídea foi proposta como indicador da necessidade de shunt
A endarterectomia carotídea cervical pode ser fei- intraluminal.
ta com anestesia geral ou locorregional. A maioria Atualmente, as medidas de pressão da artéria ca-
dos serviços de neurocirurgia e de cirurgia vascular rótida não são critérios tão utilizados na avaliação
utiliza a anestesia geral, que possui a vantagem de da necessidade de shunt, devido à substituição por
ser mais confortável para o paciente e para o cirur- outros parâmetros fisiológico-funcionais, tais como
gião, além de permitir a utilização de proteção cere- exame de ecodoppler colorido, angiografia cerebral e
bral com barbitúricos. Outras vantagens da anestesia monitoração com EEG e potencial evocado.
geral: melhor controle dos parâmetros respiratórios;
controle rigoroso da pressão parcial de CO2 e con- Doppler Transcraniano (DTC)
trole da pressão arterial. A desvantagem da anestesia
geral é a eventual necessidade de monitoração com É útil para predizer a necessidade de shunting por
eletrencefalograma e/ou potencial evocado ou da uti- meio das velocidades de fluxo na artéria cerebral mé-
lização de shunt. dia (ACM). Esse exame tem a vantagem de ser não-
A anestesia locorregional é um método simples, invasivo e com a capacidade de demonstrar indícios
confiável e praticamente isento de complicações. Per- indiretos de estenose da artéria carótida. Um aumento
mite a monitoração do exame neurológico do paciente da velocidade de fluxo sangüíneo na artéria cerebral
durante todo o procedimento, possibilitando o diag- média ocorre quando há estenose na artéria carótida
nóstico precoce de complicações isquêmicas e a ins- interna. Esse exame tem também a habilidade de ava-
tituição imediata de tratamento adequado. Possibilita liar a efetividade do shunt após sua instalação, veri-
a realização da cirurgia em pacientes com problemas ficando as velocidades de fluxo na ACM e na artéria
clínicos nos quais a anestesia geral aumentaria muito carótida.
o risco ou estaria contra-indicada. A realização do tes- Se a velocidade de fluxo na ACM diminuir durante
te de tolerância à clampagem da artéria carótida inter- a endarterectomia, a patência de fluxo na ACI deverá
na permite determinar com precisão quais pacientes ser revisada, bem como avaliada a possibilidade de
necessitarão de shunt. As desvantagens da anestesia evento embólico transoperatório.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

O exame de Doppler transcraniano é útil para ava- TÉCNICAS DE ARTERIOTOMIA


liar a possível passagem de êmbolo intracraniano e
também para prevenir erros técnicos na cirurgia da Princípios Gerais
artéria carótida. É de grande importância a dissecção anatômica
meticulosa e a identificação de estruturas cervicais.
Angiografia Transoperatória Não se considera o tempo decorrido na dissecção
um fator de performance na cirurgia da artéria caró-
A angiografia transoperatória é muito útil quando tida: em média, são necessárias 2 horas a 2 horas e
utilizada por cirurgiões familiarizados com a técnica meia de cirurgia e, em média, o tempo de oclusão da
do exame; esse exame, atualmente, é pouco difundido artéria carótida é de 30 a 40 minutos. Não existe dife-
nos grandes centros, devido aos riscos e dificuldades rença estatística significativa entre as técnicas de en-
técnicas na sua realização, como o risco de injeção darterectomia utilizando o retalho e a endarterectomia
subintimal na parede vascular e conseqüente trombo- tradicional sem o uso do retalho vascular (safena).
se do vaso, sendo, portanto, discutível a sua aplicação
como rotina transoperatória.
Heparinização
Testes da Função Cerebral Heparina intravenosa é rotineiramente administra-
da antes do fechamento e reparo da artéria carótida.
1. Eletrencefalograma. Em pacientes que já se encontram heparinizados de-
2. Potencial evocado somatossensitivo. vido a eventos anteriores de acidente isquêmico tran-
sitório (AIT) ou trombo intraluminar, a cirurgia é roti-
Monitoração com Eletrencefalograma neiramente realizada com anticoa­gulação plena, sendo
necessária atenção meticulosa na hemostasia no tran-
A monitoração com EEG tem sido defendida soperatório para prevenir hematomas e hemorragias.
por diversos centros como um importante parâme-
tro da necessidade de shunting tanto em paciente
acordados quanto anestesiados. O traçado do EEG
Técnica Operatória
no paciente acordado possui maior chance de in- Incisão cutânea longa na margem anterior do
terferências e alterações não relacionadas com músculo esternocleidomastóideo, após posicionar o
dano encefálico, em comparação com o paciente paciente de forma bastante confortável: extensão do
submetido à anestesia geral. Em diversos estudos pescoço a mais ampla possível, mantendo-se o mem-
defende-se que, sob anestesia geral, todos os pa- bro superior homolateral colado ao corpo e o contra-
cientes devam ser monitorados com EEG e poten- lateral a 90°, permitindo, assim, maior conforto e boa
cial evocado. aproximação da equipe cirúrgica (Fig. 8.1).
Em geral, a isquemia transoperatória é documenta- Observando-se sempre o cuidado de promover
da no traçado eletrencefalográfico como uma lentidão uma boa hemostasia durante a abordagem do plano
e diminuição da amplitude no hemisfério homolateral subcutâneo e platisma, afasta-se lateralmente o mús-
ao procedimento. culo esternocleidomastóideo, expondo-se a fáscia ca-
O EEG computadorizado apresenta avanços que rotídea; depois da eventual secção do tronco venoso
quantificam a informação no traçado, demonstrando
de forma mais acessível para cirurgiões e anestesis-
tas, com isso eliminando a necessidade de um profis-
sional treinado especificamente para a interpretação
do traçado do EEG tradicional.

Monitoração com Potencial Evocado


Somatossensitivo (pess)
Os critérios que indicam isquemia no PESS in-
cluem tanto prolongamento do tempo da condução
central (latência) como redução da amplitude no tra-
çado, porém atualmente a monitoração cerebral com
esse método é motivo de aplicação discutível.
O EEG transoperatório é considerado a técnica
padrão para a monitoração cerebral na cirurgia da ar- Fig. 8.1 – Demonstração do correto posicionamento do pa-
téria carótida. ciente e linha de incisão cirúrgica.

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8 – Endarterectomia de Artéria Carótida Cervical Considerações Técnicas

tíreo-línguo-facial, mobiliza-se lateralmente a veia da coagulação bipolar. Outra causa menos comum de
jugular interna, de modo a bem visualizar a bifur- lesão do nervo hipoglosso é a tração de suas fibras
cação carotídea. A dissecção periadventicial reduz o descendentes. Outra forma de lesão deve-se à coagu-
risco de lesão dos nervos auricular, vago, frênico e lação do ramo recorrente da artéria occipital, que se
hipoglosso, devendo-se também manter a integridade dirige ao músculo esternocleidomastóideo, passando
da cápsula parotídea (Fig. 8.2). sobre o nervo hipoglosso. Recomenda-se, na técnica
A bifurcação carotídea se apresenta ao cirurgião cirúrgica, a identificação e a separação do ramo recor-
com uma variabilidade anatômica considerável, seja rente da artéria occipital e os ramos descendentes do
no que se refere à sua altura em relação ao ângulo da nervo hipoglosso.
mandíbula como também quanto à posição da ACI
mais anterior, lateral ou posterior, fatores estes que Nervo Vago
condicionam maior ou menor facilidade cirúrgica.
O principal tronco do nervo vago geralmente pas-
sa posteriormente à artéria carótida, portanto entre a
artéria carótida e a veia jugular. Em algumas situa-
Clipes temporários nas ções, uma pequena variação anatômica pode ser um
artérias tireoidéia problema: quando o nervo vago passa anteriormente
superior, carótidas à artéria carótida e, em raros casos, no lado direito,
interna e externa
quando o ramo recorrente do nervo laríngeo aflora
no nível da bifurcação carotídea e segue ao longo da
laringe. Na maioria das vezes, o ramo recorrente do
nervo laríngeo é lesionado pela tração exagerada e
profunda e, tipicamente, na porção medial do afas-
tador (junto à traquéia). Para evitar tal lesão, deve-
ser ter cuidado no posicionamento da porção medial
do afastador auto-estático e procurar posicionar a sua
porção medial o mais superficialmente possível.
O nervo laríngeo superior pode ser lesionado se a
dissecção for iniciada pela porção medial da carótida
para a porção lateral. Os ramos desse nervo saem da
Veia jugular interna porção mais alta cervical do nervo vago e descem me-
dial e posteriormente a ambas ACI e ACE: as varia-
ções anatômicas existem, apesar de muito raras. Esse
Fig. 8.2 – Esquematização demonstrando o início da arterio- nervo é mais visualizado em exposições em casos de
tomia na artéria carótida comum e exposição da placa ateros-
clerótica. Evitar a realização de arteriotomia muito proximal,
bifurcação alta da artéria carótida, como em cirurgia
ou muito lateralmente, na artéria carótida comum, o que difi- de aneurismas e tumores da artéria carótida. A lesão
culta o fechamento posterior. do nervo laríngeo superior resulta em dificuldade de
engolir – disfagia com risco maior de aspiração.
Lesão dos Nervos Cranianos ENDARTERECTOMIA CAROTÍDEA
Cada vez mais tem-se a preocupação quanto ao LONGITUDINAL (Padrão)
problema de lesão dos nervos cranianos na endarte-
rectomia carotídea. Entretanto, não existem muitos Existem diversas técnicas para endarterectomia e
trabalhos na literatura sobre tal assunto, e os relatos reconstrução carotídea a partir da endarterectomia
de casos são escassos. A incidência de comprome- convencional longitudinal padrão, com ou sem uso do
timento dos nervos cranianos não é insignificante, retalho, ou a técnica de eversão, e a escolha da técnica
tendo em algumas séries na literatura uma taxa de a ser utilizada depende da familiaridade do cirurgião
complicação de 12% a 17% (disfunção temporária ou com a técnica e da confiança nos resultados, do ca-
definitiva). Em geral, os nervos mais acometidos são libre da ACI e da tolerância do paciente à clipagem
laríngeo recorrente, hipoglosso, mandibular marginal carotídea. Há uma tendência nos últimos anos, pelo
e laríngeo superior. menos na Europa, a utilizar-se a técnica de eversão
como primeira escolha. A endarterectomia longitudi-
nal seria reservada aos casos de intolerância do pa-
Nervo Hipoglosso ciente à clipagem carotídea, em que necessariamente
Lesão do nervo hipoglosso é geralmente resultado se torna prioritário o uso do shunt; na técnica de ever-
da coagulação monopolar do plexo venoso perineu- são existe um risco aumentado de microembolizações
ral, que se elimina quase completamente com o uso ou descolamento de placas com o uso de shunt.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

A pressão arterial média deve ser mantida acima


de 90 mmHg durante o clampeamento; a hepariniza- Dissector de Penfield
ção sistêmica adequada e eficaz deve ser realizada du-
rante a dissecção carotídea e suspensa após a abertura
do vaso (Fig. 8.3).
Após o clampeamento carotídeo na seqüência: Art. carótida
externa
1. ACI; 2. ACE; 3. ACC, faz-se uma arteriotomia
longitudinal com bisturi de lâmina 11 ao nível do
bulbo, prosseguindo-se proximal e distalmente com
a tesoura de Potts, até a porção mais distal da pla-
ca, para que se promova de maneira mais segura e
completa sua remoção, ou que seja facilitada a ne- Art. carótida
cessidade de fixação com pontos de Kunlin, numa interna
eventual presença de placa residual. Uma vez com- Dissecção de Veia jugular
pleta a arteriotomia, é necessário encontrar o plano placa distal interna
exato da retirada da placa que se encontra no extrato
externo da túnica média, utilizando-se pequena es- Fig. 8.4 – Técnica de eversão da placa aterosclerótica. A por-
pátula ou dissector; contorná-la, deve-se proceder à ção distal restante da placa aterosclerótica na artéria carótida
secção proximal da placa com tesoura ou bisturi, de interna é dissecada cuidadosamente, evitando-se a lesão na
maneira que essa placa residual proximal permane- camada íntima vascular.
ça aderida à parede do vaso. Devem-se retirar todos
os fragmentos da placa aterosclerótica com rigor,
lavando-se o campo operatório com solução salina,
e evitando-se resíduos de placas ou debris (a retirada
da placa da carótida externa deve ser realizada prin- Art. carótida externa
cipalmente no seu segmento proximal, e normal-
mente ocorre na retirada da placa como um todo),
prevenindo-se microembolizações (Fig. 8.4).
A reconstrução é, então, realizada com sutura dire-
ta quando o calibre da carótida interna é igual ou supe-
rior a 4 mm, ou utilizando-se plástica com segmento Art. carótida interna
de veia ou material sintético quando o calibre é redu- Veia jugular interna
zido, em situações em que haja laceração da margem
da arteriotomia, angulação excessiva ou alongamento
do vaso pós-arteriotomia e nos casos de reestenose
em que o tratamento cirúrgico tenha sido indicado.
Finalizada a cirurgia, procede-se à retirada dos clam-
pes em ordem inversa, de preferência mudando-se de
posição o clampe da carótida interna para a posição
mais proximal possível, justa-bifurcação, antes da se-
qüência do desclampeamento final (Fig. 8.5).
Fig. 8.5 – Após a sutura da parede arterial, o desclampea-
mento deve ser muito cuidadoso, com o intuito de se retirar
qualquer êmbolo gasoso ou debris no lúmen vascular.

É essencial a utilização da drenagem, mesmo sen-


do retirada precocemente, 12 a 24 horas após a cirur-
gia (Fig. 8.6).
Quando da utilização de shunt, inicia-se pela caró-
tida interna, aguardando o seu enchimento por refluxo
e só então inseri-lo na carótida primitiva, permitindo-
se maior segurança quanto à possível embolização
gasosa (movimentos bastante delicados com a utili-
zação de pinças podem evitar complicações por des-
Fig. 8.3 – Clampeamento e exposição dos vasos (ACI, ACE, ACC). colamentos de placas).

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8 – Endarterectomia de Artéria Carótida Cervical Considerações Técnicas

é vastamente documentada e ainda restrita a poucos


centros.

PÓS-OPERATÓRIO DE ENDARTERECTOMIA
CAROTÍDEA
Rotineiramente o paciente é mantido na CTI nas
primeiras 24 horas de pós-operatório. Mantêm-se
monitoração invasiva da pressão arterial, eletrocar-
diograma e oximetria de pulso contínuos.
O uso de antiagregante plaquetário é mantido (em
geral AAS), sem alterações na dose da medicação.
É importante controlar a pressão arterial nas pri-
meiras horas, evitando-se tanto a hipertensão arterial,
que pode ser causa de infarto hemorrágico reperfu-
Fig. 8.6 – Dreno porto-vac no período pós-operatório. sional, quanto a hipotensão, que pode levar à trombo-
se da artéria carótida operada e à isquemia cerebral.
Deve-se ter bastante cuidado também com a possibi-
ENDARTERECTOMIA CAROTÍDEA lidade de formação de hematoma na região cervical,
POR EVERSãO com obstrução de vias aéreas e conseqüente óbito,se
não devidamente tratado.
Representa a técnica de escolha nos casos em que A incidência de hematoma cervical é de aproxi-
a carótida interna se apresenta longa ou tortuosa, sen- madamente 3% a 5%. Felizmente, a grande maioria
do mais utilizada nos últimos quatro anos em muitos desses hematomas são pequenos e de rápida resolu-
países da Europa e atualmente após a publicação dos ção (em poucos dias). Existem situações em que os
resultados tardios dos estudos EVEREST (eversion hematomas continuam a crescer e, algumas vezes,
versus conventional carotid endarterectomy), em que requerem intervenção cirúrgica. Se a via aérea for
os casos de reestenose foram significativamente me- comprimida, a entubação traqueal imediata é ne-
nores: essa técnica vem sendo utilizada como primeira cessária. Uma radiografia da coluna cervical em AP
opção, exceto nos casos já anteriormente descritos de pode demonstrar o grau de desvio da traquéia. Após
intolerância ao clampeamento. Ela reduz a incidência a remoção do hematoma, deve ser efetuada inspeção
de trombose pós-operatória, porque repete a anatomia cuidadosa da linha de sutura na artéria carótida, bem
normal do bulbo, tendo como desvantagens: com adequada hemostasia. Diversos estudos foram
1. dificuldade de posicionamento do shunt, só realizados avaliando o uso de protamina para reverter
sendo possível apenas depois da endarterecto- a ação da heparinização: os resultados são controver-
mia da interna antes da redução da eversão; sos, sugerindo que reversão completa da hepariniza-
2. maior possibilidade de obstrução sobre a caró- ção pode predispor o paciente a evento tromboembó-
tida interna, sendo obrigatório o controle an- lico no período pós-operatório.
giográfico intra-operatório.
CONSIDERAÇÕES GERAIS
ENDARTERECTOMIA CAROTÍDEA COM
• Afastadores são superficialmente colocados na
ANESTESIA REGIONAL porção medial da artéria carótida para prevenir
A prática da endarterectomia carotídea com anes- retração dos nervos laríngeos, porém, lateral-
tesia regional constitui-se na realização da cirurgia mente, são posicionados mais profundamente.
com o uso de bloqueio cervical anestésico. O paciente • Veias faciais comumente atravessam o campo
permanece acordado ou levemente sedado, no intuito cirúrgico, podendo ser necessário ligá-las e
de se avaliar qualquer déficit neurológico no transo- dividi-las.
peratório. Essa prática apresenta diversas dificuldades • A dissecção da ACI deve ser realizada até
técnicas, como seleção criteriosa dos pacientes para tal adiante da visualização da placa de ateroma na
procedimento anestésico, uma vez que o paciente não sua porção distal, para que a oclusão possa ser
pode realizar movimentos bruscos durante a cirurgia. realizada nesse vaso com tranqüilidade.
A falta de prática por parte dos anestesistas e também • Se for necessária dissecção mais alta, o mús-
cirurgiões desencoraja a execução de tal técnica em culo digástrico poderá ser seccionado sem
nosso meio. Alguns poucos centros de neurocirúrgia e maiores problemas, embora isso seja necessá-
cirurgia vascular nos Estados Unidos aplicam-na, ob- rio somente em uma pequena parcela dos pa-
tendo bons resultados. Em nosso país, a técnica não cientes.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

• Na dissecção da ACI é importante ressaltar de fragmentos de placa e pelo uso de shunt interno,
que o local do posicionamento do clipe na ACI quando necessário.
deve ser amplo, sendo necessário, algumas ve- A hemorragia cerebral, quando ocorre no pós-
zes, abrir uma pequena “janela” para facilitar o operatório, é conseqüência da síndrome de hiperfluxo
rápido posicionamento de shunt intraluminal, cerebral e/ou hipertensão arterial; para evitá-la, os pa-
quando necessário. cientes devem ter a pressão arterial controlada rigoro-
• Uma linha de incisão no vaso pode ser dese- samente nas primeiras 24 horas de pós-operatório.
nhada com caneta estéril, para prevenir cortes Deve-se ter sempre o cuidado de evitar lesões ia-
excessivos ou curvas. trogênicas aos nervos cervicais e a melhor forma de
• O fechamento da ACC pode ser realizado com evitar é conhecendo a anatomia: com uma dissecção
clampe DeBakey vascular, e a oclusão da ACI cuidadosa, realizar sempre hemostasia criteriosa para
e da ACE, com clipes de aneurisma ou clam- se evitar hematomas cervicais, utilizando sempre
pes do tipo Bulldog. coa­gulador bipolar, e não monopolar, além de sistema
• Ao ser incisada a artéria e o lúmen identificado, fechado de drenagem pós-operatório.
utiliza-se tesoura de Pott para realizar a secção A infecção na ferida operatória após a endarterec-
da sua parede, até uma porção normal da ACI. tomia carotídea é extremamente rara. Na maioria dos
• Alterações no EEG indicam necessidade de in- centros, administra-se uma única dose de antibiótico
dução de hipertensão arterial: não sendo possí- profilático. Pacientes com cirurgia prévia do triângulo
vel elevar a pressão arterial ou se sintomas is- anterior cervical, com história de irradiação do pesco-
quêmicos permanecem, é necessária colocação ço ou outra comorbidade importante – aos quais hoje
de shunt intraluminal. se indica o tratamento endovascular com angioplas-
• Dissecção cuidadosa da placa de ateroma – tia – podem apresentar risco aumentado de infecção e
sempre com pequena tração. a administração de antibiótico deve ser considerada.
• Importante: remover todos os pequenos frag- Quando ocorre infecção da ferida operatória, esta em
mentos residuais de trombo aterosclerótico geral é superficial, requerendo uso de antibióticos por
• Se a placa não for cuidadosamente dissecada e via oral.
retirada, inclusive da ACE, pode ocorrer trom- Em razão de sua raridade, o tratamento da infec-
bose deste vaso com conseqüente oclusão re- ção profunda da ferida operatória pós-endarterecto-
trógrada da ACC. mia carotídea não é bem documentado na literatura.
• Sutura dupla com fio Prolene® 6-0 vertical- As complicações em cirurgia da artéria carótida
mente, de dentro do vaso para fora da sua pa- diminuíram gradativamente com o tempo, tendo em
rede, passando pela sua camada íntima e indo vista que a técnica cirúrgica adequada e a evolução
externamente até a camada adventícia. dos métodos anestésicos e de monitoração permitem
• O vaso é preenchido com heparina em solu- melhor conduta do paciente. Entretanto, mesmo em
ção salina, e neste processo, com punção com grandes serviços de cirurgia vascular e de neurocirur-
agulha fina, todo o ar é evacuado de dentro do gia, as complicações graves, como o acidente vascu-
lúmen do vaso. lar cerebral e o óbito, ocorrem numa freqüência que
• Quando os clampes são retirados, as linhas varia de 3% a 6%.
de suturas devem ser cuidadosamente inspe- O acidente vascular encefálico (AVE) é a tercei-
cionadas para possíveis sangramentos. Nesse ra causa de óbito nos países desenvolvidos, sendo a
momento, a pressão arterial do paciente deve doença da artéria carótida extracraniana a causa mais
ser elevada; havendo algum ponto sangrante, comum. A indicação da endarterectomia da artéria
efetuar novo ponto de sutura. carótida era, inicialmente, baseada em resultados ob-
• Sempre que possível, realizar DTC para con- tidos de séries individuais, com baixa comprovação
firmar a patência do vaso, assim como a velo- científica. Somente após os grandes estudos multicên-
cidade de fluxo na ACM. tricos (NASCET, ACAS, ECST) pôde-se comprovar
o real benefício da endarterectomia carotídea em pa-
cientes com estenose carotídea superior a 60% a 70%.
COMPLICAÇÕES PÓS-OPERATÓRIAS
Entretanto, a escolha da técnica cirúrgica permanece
As complicações mais freqüentes são isquemia muito particular, e algumas particularidades ainda
cerebral, hemorragia intracerebral, infarto do miocár- sem evidência de comprovação estatística. Uma das
dio, lesões dos nervos cranianos na região cervical, divergências é em relação à reversão ou não da ação
hematomas e infecção. da heparina pela protamina.
A isquemia cerebral pós-operatória pode ser pre- Problemas comuns após endarterectomia de caró-
venida com heparinização precoce e dissecção cuida- tida são aparecimento de nova disfunção neurológica,
dosa da artéria carótida, evitando-se embolia a partir instabilidade hemodinâmica e insuficiência respira-

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8 – Endarterectomia de Artéria Carótida Cervical Considerações Técnicas

tória. A síndrome de hiperperfusão muitas vezes não eram os que tinham as menores pressões retrógradas
ocorre até vários dias após a cirurgia. A incidência pré-pinçamento. Esses pacientes possuíam uma pobre
de episódios hipertensivos e hipotensivos depois da reserva colateral (pobre circulação colateral) e, con-
endarterectomia pode ser superior a 60%, sendo a hi- seqüentemente, necessitariam de uso de shunt para
pertensão mais comum que a hipotensão. Taquicardia evitar complicações isquêmicas cerebrais.
e/ou hipertensão agudas podem precipitar isquemia Na mesma linha, Sbarigia et al.7 e Jorgensen et al.8
miocárdica e insuficiência cardíaca aguda, podendo demonstraram, por Doppler transcraniano associado
acarretar edema cerebral e/ou hemorragia. As causas a testes com acetazolamida e reatividade ao CO2 (am-
de hipertensão pós-operatória não estão claras. Geral- bos com ação vasodilatadora cerebral), alterações na
mente, o episódio hipertensivo tem seu máximo em 2 auto-regulação do fluxo sangüíneo cerebral nos pa-
a 3 horas após a cirurgia, mas em alguns casos pode cientes que apresentavam lesões estenóticas das ar-
persistir por 24 horas. térias carótidas, principalmente quando superiores a
90%. Esse teste da reatividade ao CO2, assim como
LESÃO CEREBRAL POR ISQUEMIA o teste da acetazolamida, foi utilizado para avaliar
a capacidade de auto-regulação cerebrovascular, ou
E REPERFUSÃO seja, para determinar se há vasodilatação adicional
Discutem-se amplamente na literatura médica as le- ou se a circulação cerebral encontra-se em um estado
sões cerebrais relacionadas à cirurgia da artéria carótida. de vasodilatação crônica máxima. No estudo de Sba-
Alguns autores defendem que episódios de isquemia e rigia et al.7, os autores concluíram que os pacientes
reperfusão e, em especial, a síndrome de hiperperfusão com reserva cerebral reduzida (baixa auto-regulação
pós-operatória (SHPO) possam causar sérios danos ce- cerebral), provavelmente, tinham o aporte sangüíneo
rebrais. Diversos mecanismos estariam envolvidos na do hemisfério cerebral acometido oriundo apenas de
produção dessas alterações como, por exemplo, meta- circulação colateral pobre. No estudo de Jorgensen et
bólitos de ácidos graxos livres e de purinas, formação al.8, os pacientes que desenvolveram a SHPO apre-
de óxido nítrico e ação de leucócitos. As lesões de- sentavam pressões retrógradas mais baixas e reativi-
correntes de isquemia e reperfusão em tecido cerebral dade ao CO2 menor que os indivíduos sem complica-
foram demonstradas em estudos clínicos e experimen- ções pós-operatórias.
tais. Embora úteis e importantes, a grande variedade de A complicação grave durante a endarterectomia
modelos experimentais utilizados e a diversidade de re- de carótida é a embolização de placa aterosclerótica.
sultados encontrados refletem a necessidade da criação Isto pode ser prevenido com dissecção cuidadosa e
de um modelo experimental de isquemia e reperfusão dose adequada de heparina no transoperatório. Após
cerebrais que seja simples, reprodutível e consistente, endarterectomia, a complicação mais séria é trombo-
com o intuito de testar tratamentos que visam atenuar se carotídea, quando o paciente desperta com déficit
lesões decorrentes desse tipo de intervenção. neurológico significativo. Recomenda-se que seja en-
Com ou sem o uso de derivação temporária, é ine- caminhado imediatamente ao centro cirúrgico, com
rente ao ato cirúrgico da endarterectomia de caróti- reabertura da ferida operatória, pois uma arteriografia
da um período variável de isquemia cerebral seguida pode determinar se a artéria ocluiu. Havendo oclusão
de reperfusão. Estudos do fluxo sangüíneo cerebral arterial, deve-se reabri-la e realizar sangria retrógrada
durante e após a endarterectomia de carótida chama- da carótida interna para remoção dos trombos. Antes
ram a atenção para a importância do conhecimento de restabelecer fluxo na ACI, recomenda-se outra ar-
da SHPO: essa síndrome caracteriza-se por um es- teriografia: havendo trombos distais na ACI ou arté-
tado de vasodilatação crônica cerebral, associado à rias cerebrais, deve-se realizar terapia regional com
perda da capacidade de regulação do fluxo sangüíneo trombolítico (estreptoquinase, uroquinase, ativador
após a retirada da estenose crítica carotídea, levando tecidual do plasminogênio rTPA). Essa terapia requer
ao aparecimento de edema cerebral no período pós- trabalho conjunto com neuroradiologista com expe-
operatório. Clinicamente, se manifesta por cefaléia riência em terapia trombolítica cerebral regional. Se
importante, dor ocular e facial e convulsões, podendo aplicada a terapia trombolítica, o enxerto só pode ser
ocorrer hemorragia intracraniana. Os fatores de risco venoso para evitar sangria. Deve-se ter cuidado espe-
associados ao aparecimento dessa síndrome são hi- cial com a hemostasia na ferida operatória para evitar
pertensão arterial sistêmica de longa data, estenose hematoma, que é a complicação mais freqüente.
carotídea acima de 90%, pobre circulação colateral Uma década depois do início da operação de ca-
ou oclusão contralateral da carótida. rótida para prevenção de acidente vascular cerebral,
Naylor et al6. verificaram, por meio de ultra-sono- Breutman et al.9 relataram seis casos de hemorragia
grafia Doppler transcraniana, que, após a liberação do cerebral pós-endarterectomia carotídea.
pinçamento da artéria carótida, os pacientes que apre- Sundt et al.10 notaram que a estenose crítica da caróti-
sentavam as maiores velocidades de fluxo sangüíneo da é um fator de risco importantíssimo para hemorragia
na ACM (característica da síndrome de hiperperfusão) intracraniana pós-endarterectomia. É totalmente impos-

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

sível prever a ocorrência de hemorragia intracraniana, e ry closure in carotid endarterectomy. J Neurosurg.


seu mecanismo de ação não é bem compreendido, uma 2006;59:822-9.
vez que a barreira hematoencefáfica cerebral pode ser 13. Back MR, Harward TR, Huber TS, Carlton LM, Flynn
alterada com aumento do fluxo sangüíneo cerebral, que TC, Seeger JM. Improving the cost-effectiveness of
acontece depois da endarterectomia da carótida. carotid endarterectomy. J Vasc Surg. 1997;26:456-62.
14. Ballard JL, Deiparine MK, Bergan JJ, Bunt TJ,
Doentes com estenose crítica de carótida têm fre-
Killeen JD, Smith LL. Cost-effective evaluation
qüentemente má auto-regulação cerebral. Retorno ao and treat¬ment for carotid disease. Arch Surg.
fluxo normal nesses doentes é normalmente associado 1997;132:268-71.
com hiperfluxo no hemisfério cerebral durante vários 15. Becquemin JP, Qvarfordt P, Castier Y, Melliere D.
dias até que a auto-regulação seja restabelecida; parti- Carotid angioplasty: is it safe? J Endovasc Surg.
cularmente nos que tiveram apresentação neurológica 1996;3:35-41.
instável, hemorragia intracerebral de hiperfluxo pode 16. Collier PE. Are one-day admissions for carotid en-
acontecer, com o que o controle cuidadoso da pressão darterectomy feasible? Am J Surg. 1995;170:140-3.
sangüínea é a profilaxia. 17. Collier PE. Carotid endarterectomy: a safe cost effi-
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Angiomas Cerebrais
Gilberto Machado de Almeida

A
s classificações dos angiomas cerebrais foram Quando situadas nos lobos parietal ou frontal, o no-
sempre confusas, porque comumente há le- velo costuma apresentar forma cônica, com base na
sões associadas e os patologistas nem sempre superfície cerebral e ápice dirigido para o ventrículo
consideram as correlações clínicas1,2. Com finalidade lateral. As artérias aferentes e as veias de drenagem
didática abordaremos malformações arteriovenosas, apresentam paredes alteradas, provavelmente pelo
angiomas cavernosos (cavernomas), teleangiectasias alto fluxo. A associação das MAV com aneurismas
capilares e malformações venosas. Para estas últimas (6% a 20%), arteriais ou venosos, aparentemente está
preferimos o termo anomalias do desenvolvimento correlacionada com as lesões das paredes dos vasos.
venoso (ADV), mais de acordo com sua importân- Muitos pacientes evoluem sem manifestação clí-
cia clínica. As fístulas arteriovenosas durais são pa- nica, e o diagnóstico é feito em algum estudo de ima-
tologias adquiridas, muitas vezes estudadas entre os gem. Esses angiomas podem provocar: hemorragias
angiomas. intracranianas, convulsões e, mais raramente, cefaléia
ou déficit neurológico progressivo.
Conceitos e quadros clínicos Hemorragia cerebral é encontrada em mais de
50% dos pacientes e, na maioria das vezes, ocorre
Malformações Arteriovenosas (MAV) antes de 40 anos de idade3. Embora sangramentos
São as malformações vasculares mais encontradas em idosos sejam menos freqüentes, já observamos
na clínica, devido à tendência de provocar hemorra- a primeira hemorragia após os 70 anos. O quadro
gias intracranianas e convulsões. Com o advento da neurológico depende da intensidade e da localização
tomografia computadorizada (TC) e da ressonância do sangramento, que pode ser parenquimatoso, in-
nuclear magnética (RNM), muitas MAV têm sido traventricular, meníngeo ou combinado. Muito im-
diagnosticadas antes de provocar sintomatologia. Es- portante para estabelecer a conduta terapêutica é o
tudos baseados em necropsias mostraram incidência conhecimento da história natural da doença. Os da-
entre 0,5% e 1% da população1. dos estatísticos sobre mortalidade e morbidade são
As malformações arteriovenosas caracterizam-se imprecisos3, variando de acordo com o método de
pela comunicação direta de uma ou várias artérias seleção. Na maioria das estatísticas, a mortalidade
com uma ou várias veias, sem a existência de capi- da primeira hemorragia está entre 10% e 30% dos
lares. Elas são constituídas por três componentes: casos, e a morbidade entre 10% e 40%. Na literatura,
artérias aferentes, novelo e veias de drenagem. Por vários trabalhos procuram estabelecer o risco de san-
sua constituição anatômica, caracterizam-se pelo alto gramento ou de ressangramento3,4. Infelizmente, as
fluxo sangüíneo. Quando muito volumosas, o alto flu- casuísticas são selecionadas e persistem dúvidas. De
xo pode acarretar roubo circulatório, podendo causar maneira geral, podemos dizer que o risco de sangra-
déficit de irrigação de áreas normais do encéfalo. As mento está em torno de 1,5% a 4% ao ano. Talvez a
MAV podem ser encontradas em qualquer região do incidência de ressangramento seja maior no primeiro
encéfalo, apresentando formas e tamanhos variados. ano. Considerando-se a incidência de mortalidade e

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

morbidade referidas é lógico considerar que a ida- Os cavernomas foram incluídos entre as malfor-
de é fator fundamental para estabelecer a conduta mações; entretanto, estudos mais recentes têm evi-
a ser tomada. Muitos autores procuram estabelecer denciado lesões adquiridas (de novo), diagnostica-
relação entre a arquitetura das MAV e o risco de he- das em pacientes com exames anteriores que não as
morragia. Brown Jr3 fez excelente revisão dos dados apresentavam5,6. Além disso, o crescimento de caver-
existentes na literatura. Considera-se que pequeno nomas tem sido observado em ressonâncias sucessi-
tamanho, localização para ou intraventricular, dre- vas6. Nos últimos anos, a patogenia dessas lesões foi
nagem venosa profunda, oclusão de veias de drena- bastante discutida. Alguns dados sugerem, inclusive,
gem e associação com aneurismas sejam fatores que etiologia viral. Existe a hipótese de que o cavernoma
aumentam o risco. Por outro lado, existem trabalhos tenha origem em pequena hemorragia, provocada por
que não confirmam esses dados. No que se refere a anomalia do desenvolvimento venoso ou teleangiec-
mulheres grávidas, temos a impressão de que o risco tasia capilar. Notou-se, também, o aparecimento de
de hemorragia aumenta no final da gravidez ou no AC relacionados à radioterapia convencional ou ra-
puerpério; entretanto, os dados estatísticos são tam- diocirurgia7. O crescimento das lesões parece ser cau-
bém controversos. sado por sangramento, recanalização e trombose de
Convulsão pode ser o primeiro sintoma. A inci- vasos neoformados. As hemorragias podem ocorrer
dência de crises varia entre 20% e 40% dos doentes. dentro da cápsula ou fora dela, quando a sintomatolo-
Não está comprovado se a existência de convulsões gia costuma ser mais agressiva.
aumenta o risco de sangramento ou ressangramento. Os episódios recorrentes de trombose e hemor-
Cefaléia, como primeiro sintoma, tem sido obser- ragia levam à deposição de hemossiderina e outros
vada em cerca de 15% dos casos4 e pode ter caracte- produtos da degradação sangüínea. Esses depósitos
rísticas semelhantes às da enxaqueca. Muitas vezes são responsáveis pelo aspecto característico das le-
está relacionada com a existência de componente du- sões nas RNM e, aparentemente, justificam a grande
ral. Evidentemente, a cefaléia costuma acompanhar freqüência de convulsões.
as hemorragias intracranianas. Convulsões e hemorragias são as principais conse-
Déficit neurológico progressivo ocorre em menos qüências dos AC. Os sangramentos podem não causar
de 10% dos casos e é geralmente imputado ao fenô- sintomas. Isso é confirmado pelo aspecto característi-
meno do roubo circulatório. A importância desse fe- co na RNM, que mostra sinais de hemorragia pregres-
nômeno é posta em dúvida por outros autores. sa. Nos AC hemisféricos ou cerebelares, as hemorra-
As chamadas malformações da veia de Galeno gias sintomáticas costumam ser menos graves do que
apresentam características anatomopatológicas, clíni- as observadas em MAV ou aneurismas cerebrais. Já
cas e terapêuticas peculiares. Do ponto de vista anatô- nos AC profundos ou no tronco cerebral, a sintomato-
mico, podem apresentar fístulas diretas entre artérias logia costuma ser mais grave.
coróideas e cerebelares superiores, com a ampola de A história natural tem sido muito estudada nos últi-
Galeno dilatada (tipo 1), ou podem estar associadas mos anos. Até o momento não se dispõe de dados pre-
a uma verdadeira MAV, que drena para a ampola de cisos quanto ao risco de sangramento sintomático3,4,8.
Galeno (tipo 2). O diagnóstico é geralmente feito logo Isso se deve à seleção natural das diversas casuísticas
após o nascimento ou na infância. Quando do tipo 1, e à possibilidade de existirem lesões adquiridas e não
costumam manifestar-se no recém-nascido, pela in- apenas congênitas. A incidência de sangramentos sin-
suficiência cardíaca causada pela grande fístula arte- tomáticos estaria entre 1,5% e 2,6% por lesão1. Em
riovenosa. Quando o quadro clínico é mais tardio, a cavernomas múltiplos o risco é maior. Num estudo
hidrocefalia pode ser importante. relatado por Aiba et al.9, avaliando 110 pacientes, en-
tre os AC assintomáticos ou que apresentaram con-
Angiomas Cavernosos ou Cavernomas vulsão (48 casos), o risco de hemorragia foi de 0,39%
ao ano. Entretanto, entre os que já tinha apresenta-
Os angiomas cavernosos (AC) são lesões circuns- do hemorragia sintomática (62 casos), o risco foi de
critas, constituídas por vasos sinusoidais, de paredes 22,9% por ano, por lesão. Na casuística de Porter et
finas. Característica importante é a ausência de parên- al.8, os cavernomas profundos apresentaram maior
quima cerebral no interior. Os sinusóides estão geral- risco (4,1% por ano entre os incidentais e 10,6% en-
mente trombosados. Trabalhos baseados em necropsia tre os que já tinham sangrado) do que os superficiais
mostraram incidência entre 0,4% e 0,5%1, mas lesões (0,4%). Aparentemente, na gravidez e no puerpério, o
sintomáticas são menos freqüentes. Os cavernomas risco de hemorragia é maior1.
podem ser únicos ou múltiplos. Quando múltiplos,
costumam apresentar caráter hereditário bastante ní-
tido. A incidência familiar é observada em cerca de Teleangectasias Capilares
2,5% a 30% dos casos1,5,6, sendo a transmissão do tipo São malformações vasculares constituídas por
autossômica, dominante. aglomerados de capilares dilatados, com existência

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9 – Angiomas Cerebrais

de parênquima cerebral normal no interior. As telean- não sejam malformações, mas que se constituam em
giectasias são encontradas principalmente na ponte, e processos adquiridos a partir de oclusão de veias ou
não costumam causar sintomatologia. São geralmente seios durais.
diagnosticadas ao se realizar ressonância magnética As manifestações clínicas são variadas. Para as
ou como achado de necropsia (0,1% a 0,8% do total localizadas em torno dos seios sigmóides, o sintoma
de malformações vasculares). Podem fazer parte de mais comum é o aparecimento de tinido, relaciona-
síndromes hereditárias, associadas com outras mal- do com a pulsação arterial. Nestes casos a ausculta
formações vasculares, como na doença de Osler-We- do crânio é bastante característica, ouvindo-se sopro
ber-Rendu. característico. As FAVD relacionadas com o seio
Na literatura são referidos poucos pacientes sin- cavernoso podem acarretar exoftalmia ou outros
tomáticos. Na prática as teleangiectasias capilares problemas visuais. Qualquer que seja a localização,
representam achados de exame e não requerem qual- essas lesões podem ocasionar hemorragia intracra-
quer tratamento. Estudos anatomopatológicos têm niana. Isto ocorre quando existem veias de drena-
mostrado a associação com ADV, MAV ou AC, que gem que cruzam o espaço subaracnóideo. Mais rara-
podem ter sido a causa da sintomatologia. mente podem surgir cefaléia, convulsões ou déficit
neurológico.
Anomalias do Desenvolvimento Venoso
Diagnóstico
São constituídas por um conjunto de veias dis-
tribuídas radialmente, que se dirigem para uma veia Malformações Arteriovenosas
maior. O aspecto final tem sido comparado com cabe-
Quando a MAV se apresenta com sangramento,
ça de medusa ou guarda-chuva. Embora estudada en- a TC simples mostra o sangue, que pode ser paren-
tre malformações, essas lesões têm sido consideradas quimatoso, intraventricular ou subaracnóideo. Fora
anomalias do desenvolvimento venoso. Raramente, do período agudo, ou em pacientes que não tenham
são associadas com hemorragias sintomáticas. Por ou- sangrado, a TC sem contraste pode ser normal ou evi-
tro lado, em estudos post-morten, consistem na ano- denciar calcificações, cavidades císticas ou áreas hi-
malia vascular mais encontrada em necropsias (2,6% poatenuantes. Com o contraste iodado, a TC permite
dos casos), representando cerca de 63% de todas as fazer o diagnóstico. Esse exame é especialmente útil
malformações vasculares encefálicas. É bastante co- para controle das diversas formas de tratamento: após
mum encontrar ADV próximas a cavernomas. Alguns a cirurgia, evidenciando sangramento, área isquêmica,
autores acreditam que exista hipertensão venosa nas edema cerebral, hidrocefalia ou trombose venosa; após
veias anômalas, o que causaria pequenas hemorragias tratamento endovascular, localizando êmbolos radio-
no parênquima cerebral, originando os cavernomas. pacos e após radiocirurgia mostrando alterações tar-
Vários trabalhos clínicos procuraram relacionar dias causadas pela irradiação ou por oclusão venosa.
as ADV com hemorragia, infarto venoso, cefaléia ou A angiografia cerebral dos quatro vasos permite
convulsão. Para Brown Jr3, muito excepcionalmen- estudar todas as características da lesão. Ela também
te causam sintomas neurológicos. Quando presente, é necessária para analisar o resultado de qualquer tra-
junto a uma hemorragia intracraniana, deve ser feita tamento. Após cirurgia, o ideal seria realizar o con-
pesquisa exaustiva, para procurar lesão associada que trole pós-operatório logo a seguir (no mesmo dia ou
seja responsável pelo sangramento. Excelente estudo nos dias seguintes) e passados alguns meses. O exa-
sobre o assunto foi feito por Henn et al.1 Na nossa ex- me precoce pode evidenciar restos da MAV, indican-
periência pessoal, nunca encontramos ADV que tenha do reoperação imediata. É importante lembrar que a
provocado sintomas. angiografia nessa fase evidencia anomalias arteriais e
venosas devido à adaptação ao novo regime circula-
Fístulas Artériovenosas Durais tório. O exame tardio pode mostrar restos, não detec-
tados na angiografia precoce. Na prática, nem sempre
As fístulas arteriovenosas durais (FAVD) envol- é possível realizar os dois controles angiográficos. A
vem pequenas artérias que drenam diretamente para angiografia intra-operatória tem sido empregada em
seios ou veias da dura. As localizadas em volta da me- alguns serviços de neurocirurgia. O método, bastante
dula não serão tratadas neste capítulo. A localização interessante do ponto de vista teórico, na prática apre-
craniana mais freqüente é em torno dos seios trans- senta alguns inconvenientes: é dispendioso, aumenta
versos e sigmóides (30% a 50% dos casos). Outras o tempo cirúrgico e as imagens nem sempre são con-
vezes as fístulas drenam para o seio cavernoso, para o fiáveis. É mais prático realizar uma angiografia ime-
seio sagital superior ou para veias e seios do tentório. diatamente após a cirurgia.
Tivemos oportunidade de tratar casos curiosos, com A RNM geralmente complementa o estudo por
fístula a partir da artéria oftálmica ou da artéria verte- imagem. Esse exame é superior à TC para demonstrar
bral, na entrada no crânio. Acredita-se que as FAVD o tamanho e a localização precisa da lesão. Recen-
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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

temente a ressonância magnética funcional tem sido nítida, o que permite o diagnóstico diferencial com
utilizada para a orientação terapêutica. Tanto a RNM cavernomas. Nas técnicas de gradiente eco são hi-
como a TC permitem diagnosticar MAV que ainda pointensas, de maneira uniforme. O diagnóstico de
não causaram sintomas. Na nossa experiência tanto a teleangiectasia capilar na ponte, onde ela é mais fre-
angiorressonância como a angiotomografia têm con- qüentemente encontrada, é fácil. Para lesões situadas
tribuído pouco para orientar o tratamento. É possível em outros locais é preciso lembrar dessa possibili-
que, com o tempo, venham a substituir, pelo menos dade, mesmo porque elas podem estar associadas a
em parte, a angiografia cerebral, especialmente no MAV, cavernomas ou ADV.
controle pós-tratamento.
Anomalias do Desenvolvimento Venoso
Cavernomas O diagnóstico pode ser feito pela TC, RNM ou
O aspecto tomográfico não é muito característico. estudo angiográfico. Na tomografia sem contraste as
Alguns AC apresentam calcificações identificáveis na ADV não são observadas. Com contraste aparece o
tomografia. Na fase aguda, podem mostrar sinais de aspecto característico de veias formando a chamada
hemorragia cerebral. Fato importante é que os caver- “cabeça de medusa”, drenando para veia de grosso
nomas não captam contraste. calibre. Na RNM podem-se observar, mesmo sem
A ressonância magnética é o exame ideal para contraste, as veias características, hipointensas (flow
diagnosticar AC, assim como para avaliar as possibi- void), que realçam com o gadolínio. O estudo an-
lidades terapêuticas. Além de permitir a localização giográfico é bastante característico: o tempo arterial
perfeita do processo, fornece imagens características. é normal e nos tempos venosos o aspecto é típico.
Em T1 e T2 as lesões são bem demarcadas, arredon- O importante é que não existe curto-circuito arterio-
dadas ou lobuladas, com a região central apresentan- venoso, com aparecimento precoce de veias. Temos
do áreas hiper e hipoatenuantes, de aspecto irregu- observado angiografias, realizadas com injeção pro-
lar (pipocas), e área periférica hipointensa, devido à longada do contraste, que fornecem aspecto duvido-
hemossiderina e ferritina. Quando o sangramento é so, causando confusão com o diagnóstico de MAV.
recente, existem os sinais característicos de hemor- As angiorressonâncias e angiotomografias também
ragia e do edema, em torno da lesão. Com a técnica permitem fazer o diagnóstico.
gradiente-eco, as hemorragias recentes e antigas po-
dem ser avaliadas com mais precisão. O aspecto dos Fístulas Arteriovenosas Durais
cavernomas em RNM é bastante típico, mas, confor-
me a fase do sangramento, podem ocorrer dificulda- Na TC e nas RNM as FAVD podem passar desper-
des no diagnóstico diferencial com: pequenas MAV cebidas. Em algumas ocasiões, especialmente com a
ou metástases que sangraram recentemente. Os AC RNM, é possível observar vasos dilatados ou trom-
não captam gadolínio. A ressonância magnética fun- bosados. Quando ocorre sangramento, a TC permite
cional permite relacionar as áreas eloqüentes com a localizar sangue meníngeo ou intraparenquimatoso.
A angiotomografia ou angioressonância permitem
lesão, o que pode orientar a terapêutica. A RNM deve
diagnosticar essas lesões, mas o exame fundamental
ser realizada no pós-operatório para confirmar que a
é a angiografia cerebral por cateterismo, que deve ser
remoção cirúrgica foi total.
feito por meio de injeções seletivas nas carótidas in-
Os AC não aparecem na angiografia. A realização ternas, carótidas externas e vertebrais.
desse exame pode ser indicada apenas para estudar
lesões associadas, especialmente anomalias do desen-
volvimento venoso. Antes do advento da TC o diag- Tratamento
nóstico dos cavernomas era difícil porque eles não Malformações Arteriovenosas
são visualizados na angiografia cerebral. Por isso os
AC estavam incluídos entre as chamadas malforma- Várias opções terapêuticas existem atualmente. No
ções vasculares ocultas. Alguns autores continuam a início do século XX o tratamento cirúrgico das MAV
empregar essa expressão, com a qual não concorda- era considerado praticamente impossível. Cushing e
mos, por ser confusa. Bailey, em histórica monografia de 1928, ao descreve-
rem o caso VIII, consideraram que “seria inconcebível
remover a lesão sem hemorragia fatal”. Esses autores
Teleangectasias Capilares recomendam tratamentos alternativos: radioterapia,
As teleangiectasias não são identificáveis na TC. descompressão cirúrgica ou ligadura de carótida; to-
Já na RNM apresentam características definidas, que dos eles com resultados precários. No mesmo ano,
permitem o diagnóstico diferencial com outros pro- Dandy estabeleceu conhecimentos importantes sobre
cessos. Nas aquisições em T1 e T2 são mal definidas: as MAV mas considerou que o “tratamento cirúgico
entretanto, elas captam contraste de maneira bastante é acompanhado de tão suprema dificuldade e é tão

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9 – Angiomas Cerebrais

excepcionalmente perigoso que deve ser contra-indi- A técnica cirúrgica é simples, mas exige muita pa-
cado, exceto em certos casos selecionados”. Cushing ciência, para que se obtenham bons resultados. Para
e Dandy não dispunham da angiografia cerebral, exa- as lesões superficiais, deve-se posicionar a cabeça de
me que logo depois permitiu o desenvolvimento de maneira que a MAV fique o mais alto possível. A cra-
técnicas operatórias que facilitaram o tratamento das niotomia deve ser ampla, expondo o melhor possível
MAV. Olivecrona, aproveitando-se do estado avança- a lesão. Nas superficiais, a abertura deve ultrapassar
do que a angiografia atingiu na Suécia, já em 1936 os limites corticais da MAV. Quando localizadas pró-
conseguia resultados favoráveis, inclusive para MAV ximo à linha média (giro do cíngulo, corpo caloso,
volumosas. Em trabalhos subseqüentes, Olivecrona interior dos ventrículos laterais), uma via de acesso
firmou as bases do tratamento operatório das MAV, contralateral (Fig. 9.1) pode facilitar a abordagem,
estabelecendo o conceito, ainda válido, de que a lesão exigindo menor retração cerebral. Lesões pequenas,
necessita ser totalmente removida, para evitar novos situadas profundamente, podem requerer localiza-
sangramentos. Antes do advento da microscopia ci- ção com métodos estereotáticos ou, quando dispo-
rúrgica, apesar do grande impacto dos trabalhos de nível, com a neuronavegação. O uso da ressonância
Olivecrona, poucos cirurgiões obtinham resultados magnética intra-operatória talvez venha a ser útil no
satisfatórios. Nesse período salientamos os trabalhos futuro. Expostas à lesão, as artérias devem coagula-
de Kunck, que demonstrou que MAV localizadas em das. Progressivamente, vamos dissecando em volta
áreas eloqüentes podiam ser removidas, sem acarre- da MAV, ocluindo os vasos aferentes, poupando ao
tar seqüela neurológica. Com o desenvolvimento dos máximo as veias de drenagem. A oclusão precoce
exames de imagem, da microscopia cirúrgica e de vá-
rios acessórios, o tratamento operatório ganhou muito
em eficiência e segurança. Os livros de Yasargil assim A
como os trabalhos de Spetzler e Stein, foram funda-
mentais nesse período.
Foram desenvolvidas classificações para avaliar
as dificuldades na realização do ato cirúrgico. Maior
aceitação prática teve a desenvolvida por Spetzler e
Martin, por sua simplicidade. Essa classificação, bas-
tante divulgada, baseia-se em: tamanho da lesão, área
atingida e drenagem venosa.

Tamanho
menor que 3 cm....................................1 ponto
entre 3 e 6 cm.......................................2 pontos
maior que 6 cm.....................................3 pontos

Área
não eloqüente.......................................0 ponto
eloqüente...............................................1 ponto

Drenagem B
superficial..............................................0 ponto
profunda................................................1 ponto

A soma das pontuações dá um valor de 1 a 5.


A dificuldade cirúrgica aumenta proporcionalmente
ao grau da lesão. Na nossa experiência pessoal (mais
de 300 casos), como na literatura, os resultados têm
sido ótimos quando são operadas MAV de graus 1 e
2. A mortalidade cirúrgica é praticamente nula, e a
morbidade, inferior a 2%. A cirurgia, quando indi-
cada, tem sobre as outras possibilidades terapêuticas
a vantagem de ser mais eficiente e definitiva, quase Fig. 9.1 – Em A, acesso contralateral para angioma do giro do
sempre resolvendo o caso de imediato, com apenas cíngulo, mostrando que a retração cerebral é menor e o acesso
um ato terapêutico. mais amplo do que o obtido quando a via é homolateral (B).

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

de vasos eferentes pode ocasionar aumento da turgi- originados em restos dos angiomas. Procuramos sem-
dez e sangramento grave da lesão. Alguns cirurgiões pre evitar sangramentos importantes, entretanto, isto
usavam clipes para ocluir as artérias. Atualmente se nem sempre se consegue. Para facilitar a hemostasia
emprega quase sempre a coagulação bipolar. Artérias nessas ocasiões pode-se usar a hipotensão controlada.
calibrosas são de difícil coagulação. Nessas ocasiões Completada a retirada da lesão, costumamos colocar,
usamos dois clipes e abrimos com tesoura a artéria, no leito cirúrgico, Surgicel® e algodão, pedindo ao
que é então coagulada facilmente. O bisturi bipo- anestesista que aumente a pressão arterial por alguns
lar é o instrumento fundamental para a cirurgia das minutos, para testar a hemostasia. Em alguns casos,
MAV. Há necessidade de aparelhos de boa qualidade essa técnica permite verificar a existência de restos do
e, especialmente, de aparelhos de reserva. Isto por- angioma. Para MAV volumosas, com roubo sangüí-
que, após algumas horas de uso quase ininterrupto, o neo, especialmente quando as artérias são calibrosas
instrumento aquece e deixa de funcionar de maneira e longas, o anestesista abaixa a pressão arterial mé-
ideal, havendo necessidade de troca. Costumamos es- dia cerca de dois pontos, como medida profilática da
tabelecer uma trincheira entre a MAV e o cérebro nor- sobrecarga circulatória. Essa hipotensão controlada
mal. Progressivamente aprofundamos essa trincheira deve ser mantida no pós-operatório, por alguns dias.
de maneira a desenhar uma espiral em torno da lesão Em certos casos fica difícil determinar exatamente os
(Fig. 9.2). Em alguns momentos pode ocorrer san- limites da lesão. Isto é especialmente comum quando
gramento em determinado ponto. Uma prática muito são operados angiomas embolizados há muito tempo.
usada é tamponar esse sangramento com algodão e Os restos de angiomas, diagnosticados pela angiogra-
tentar prosseguir a dissecção em outro local. Tal tática fia pós-operatória, dificilmente são encontrados numa
é perigosa, pois pode desencadear sangramento difu- reoperação. Para facilitar a localização dos resíduos
so, de difícil controle. É preferível evitá-la. Muitas angiomatosos, colocamos, no leito cirúrgico, um ou
vezes, para facilitar a exposição das regiões profun- dois clipes pequenos, que poderão ser úteis em uma
das, torna-se necessário interromper alguma veia de nova cirurgia.
drenagem, antes de ocluir todas as artérias. É acon- Em pacientes com MAV extremamente difíceis, a
selhável escolher veias de menor calibre, que, antes circulação extracorpórea pode ser usada. Tal técnica
de serem coaguladas e corta­das, devem ser clipadas só é justificada em clínicas com grande experiência
transitoriamente. Observa-se se não há aumento do em neurocirugia vascular, nas quais o método possa
turgor da MAV. Só após observação por alguns mi- ser utilizado com regularidade.
nutos essas veias podem ser ocluídas definitivamente A angiografia intra-operatória para verificar pre-
e cortadas. Nas MAV superficiais, quase sempre há sença de restos da lesão foi discutida anteriormente.
necessidade de atingir os ventrículos laterais para re- A embolização das MAV também tem apresenta-
mover toda a lesão. Nessas regiões profundas é que do evolução. O agente usado com mais freqüência é
costumam ocorrer sangramentos de difícil controle, o bucrilato. Infelizmente, poucas lesões são comple-
tamente tratadas por esse método (15% a 20% dos
casos). De maneira geral, quando isso é possível, a
cirurgia também é indicada e é mais eficiente. Antes
de tentar o tratamento endovascular, é difícil afirmar
se será possível ocluir toda a malformação, em etapa
única. Já para MAV mais difíceis de operar, a embo-
lização pode ser usada, com a finalidade de preparar
o paciente para a cirurgia ou radiocirurgia. Na nossa
experiência, o tratamento endovascular tem contribu-
ído pouco para o ato cirúrgico, das MAV de grau 3.
Outras vezes, quando existe roubo circulatório, pode-
rá propiciar melhora da circulação cerebral. É preciso
salientar que as técnicas endovasculares geralmente
requerem várias etapas, o que, além de aumentar o
custo, representam, para o paciente, uma agressão psi-
cológica repetida. Os métodos endovasculares, tanto
por via arterial como por via venosa, se mostraram es-
pecialmente úteis no tratamento dos chamados aneu-
rismas da ampola de Galeno, apresentando resultados
Ventrículo muito superiores aos observados com a cirurgia.
A radiocirurgia, iniciada na Suécia com Lecksell,
Fig. 9.2 – MAV hemisférica mostrando a maneira de abor- tem sido bastante usada. Esse método tem sua maior
dagem em espiral. aplicação para MAV pequenas (menores do que 3 cm.

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9 – Angiomas Cerebrais

de diâmetro) e situadas profundamente. Para lesões da do angioma não ocasiona déficit. Para angiomas de
maiores, o tratamento é ineficaz e mais arriscado, por- graus 1 e 2, o tratamento endovascular tem o inconve-
que são necessárias altas doses de irradiação. Por não niente de não ser completo em mais de 50% dos ca-
exigir tratamento cruento, a radiocirurgia é bastante sos, tornando necessária cirurgia definitiva. Lesões de
aceita pelos pacientes, mas não pode ser considerada grau 3, superficiais, podem ser submetidas à cirurgia,
inócua. Durante 2 ou 3 anos, continua a haver risco de precedida ou não pela embolização. Lesões do grau 3,
hemorragia, talvez até maior do que o observado sem profundas, podem ser tratadas pela radiocirurgia, por
tratamento. Mesmo passado esse período, dependendo associações ou mesmo conservadoramente. Pacientes
da seleção de casos, 15% a 30% das MAV não ficam com MAV enquadradas nos graus 4 e 5 são, muitas
curadas. Temos observado complicações cerebrais vezes, tratados conservadoramente, mas, também,
graves após radioterapia, o que tem sido referido na podem ser submetidos à associação de métodos, ou,
literatura10-13. Nataf et al.11, em revisão da maior esta- raramente, apenas à cirurgia. Cada caso deve ser ana-
tística sobre radiocirurgia e MAV (705 casos), mostra- lisado cuidadosamente, levando em consideração as
ram resultados bastante insatisfatórios com o método. dificuldades dos tratamentos e o quadro clínico.
Obliteração da lesão foi observada em apenas 55% A existência de aneurismas arteriais, venosos ou
dos casos. Além disso, as ressonâncias magnéticas re- no interior da MAV, pode complicar a escolha do
alizadas após o tratamento mostraram alterações im- tratamento ideal. Aparentemente, o ideal é tratar os
portantes em 59% dos pacientes: 38% com alterações aneurismas arteriais primeiro e depois o angioma. Em
notadas em T2, 9% com alterações em T2 associadas teoria, a abordagem da MAV poderia aumentar o risco
a captação de contraste em T1 e 13% com radione- de sangramento do aneurisma. Na prática, em algumas
crose. Mesmo em pacientes incluídos nos graus 1 e 2 ocasiões, o tratamento do angioma acarretou cura de
de Spetzler-Martin, a incidência de insucesso (36%) aneurismas localizados nos vasos aferentes. Quando
e de complicações, não foram baixas. Recentemente há hemorragia cerebral, a TC pode mostrar a origem
tivemos oportunidade de acompanhar paciente de 24 da hemorragia e indicar a conduta a ser seguida.
anos, que tinha duas MAV profundas, situadas nos
núcleos da base e interior dos ventrículos. Vários neu-
rocirurgiões desaconselharam qualquer forma de tra-
Cavernomas
tamento (grau 5 na classificação de Spetzler-Martin). Só existem duas possibilidades: tratamento sinto-
Foi realizada radiocirurgia (gama-knife). Cerca de seis mático ou cirurgia.
meses após o tratamento o paciente apresentou piora Alguns autores defendem a radiocirurgia, o que
progressiva, tendo sido transferido para o nosso hos- não parece justificado. Não existe prova de que esse
pital para fazer tratamento em câmara hiperbárica. O tratamento diminua o risco de sangramento. Mesmo
paciente apresentava-se tetraplégico, sem contac­tuar. Kondziolka, grande defensor da radiocirurgia, refere
A RNM mostrava lesões actínicas graves, bilateral- que o risco de hemorragia aumenta nos dois primei-
mente. A oclusão de artérias normais pelo tratamento ros anos e demonstra ter dúvidas quanto à utilidade
também tem sido verificada14, inclusive com o apare- dessa terapêutica14. O grupo sueco, liderado por Stei-
cimento do quadro de Moya Moya. ner16, com vasta experiência, conclui que a radioci-
Finalmente, para alguns pacientes o ideal é optar rurgia não se justifica para essas lesões. O aspecto
pelo tratamento conservador, sintomático. anatômico, sinusóides trombosados, não sugere que o
Para a indicação da conduta, vários fatores devem tratamento possa ter efeito benéfico. Tem-se, inclusi-
ser considerados: idade, sintomatologia (principal- ve, demonstrado o aparecimento de cavernomas com
mente se houve ou não sangramento), classificação a radioterapia. Por outro lado, a radiocirurgia não é
da dificuldade cirúrgica, tamanho e localização da inócua, como temos observado na clínica e trabalhos
MAV. Temos observado que neurologistas, e mesmo recentes têm demonstrado11. Além disso, a redução
neurocirurgiões, com pouca experiência com essa pa- de tamanho ou mesmo desaparecimento de AC, sem
tologia, encaminham pacientes para radiocirurgia ou qualquer forma de tratamento, têm sido observados.
embolização. A nosso ver, o ideal é que esses casos A cirurgia é a única forma de tratamento que per-
sejam discutidos por equipe multidisciplinar, com mite livrar o paciente do risco de hemorragias. Pode,
possibilidade de realizar as diferentes modalidades também, contribuir para o controle de crises convul-
terapêuticas, com segurança. sivas. Quando o paciente apresenta poucas crises, a
Em princípio, a conduta que tem sido seguida em simples retirada do cavernoma costuma resolver o
nosso Serviço é a seguinte: para MAV de graus 1 e 2, o quadro convulsivo. Quando existem crises de difícil
tratamento cirúrgico é indicado, por ser seguro e defi- controle com o tratamento medicamentoso, recomen-
nitivo. Estatísticas numerosas mostraram que para es- damos empregar técnicas de cirurgia de epilepsia.
ses pacientes o resultado da cirurgia é melhor do que o A técnica cirúrgica é relativamente simples.
obtido com a radiocirurgia16,17. Isso vale também para Quando possível, deve-se dissecar em torno da le-
lesões localizadas em áreas eloqüentes, pois a retira- são, que é retirada em bloco. Para alguns cavernomas

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

profundos pode-se retirar a lesão aos poucos, para cessária. Após hemorragias intracranianas ou quando
evitar comprometimento do sistema nervoso. Para os as veias de drenagem cruzam o espaço subaracnóideo
cavernomas hemisféricos, subcorticais, a cirurgia é ou o parênquima cerebral, há necessidade de trata-
bastante segura e eficiente. Como costumam situar- mento invasivo.
se abaixo do córtex, raramente são identificáveis ao De maneira geral, o tratamento inicial é feito por mé-
abrir a dura-máter. Quase sempre há necessidade de todos endovasculares. Atualmente há preferência pela
se usar métodos auxiliares como estereotaxia, ultra- embolização por via venosa, entretanto, a via arterial
sonografia ou navegação, para ajudar na localização. também tem suas indicações. A radiocirurgia tem sido
Mesmo quando muito próximos à superfície, podem usada, mas os resultados ainda não são bem conhecidos.
não ser vistos quando o córtex é exposto. Quando o tratamento endovascular não consegue
Para AC nos núcleos da base ou no tronco cerebral, ocluir a fístula, a cirurgia é outra opção. A técnica ci-
a cirurgia é mais necessária, porque esses pacientes rúrgica varia com a localização do processo e consiste
têm maior risco de má evolução. Entretanto, a difi- em ocluir a fístula. Para alguns pacientes, como os que
culdade operatória é, evidentemente, maior. Para es- apresentaram fístula a partir de ramos da artéria oftál-
ses casos, aceitava-se, há alguns anos, que a cirurgia mica (para o seio sagital superior), o ato cirúrgico é es-
deveria ser feita apenas quando o cavernoma pudesse pecialmente fácil. Outras vezes a intervenção é bastante
ser atingido sem que houvesse necessidade de lesar difícil e trabalhosa, especialmente para FAVD grandes.
tecido nervoso, isto é, quando as lesões afloravam nos Em princípio se deve seccionar a dura em volta do seio
ventrículos ou na superfície do tronco cerebral. Nos venoso comprometido, até que não se observem mais
últimos anos, AC mais profundamente situados têm veias ou seios venosos com sangue arterializado.
sido operados com êxito.
O tratamento sintomático, conservador, pode ser in- Complicações
dicado a alguns pacientes. Aqui, como para as MAV, a
indicação cirúrgica depende de vários fatores: idade do Malformações Arteriovenosas
paciente, sintomatologia, experiência do neurocirur- Complicações podem surgir durante o ato cirúrgico,
gião, recursos hospitalares. É evidente que cavernoma por dificuldade no controle de hemorragias, por obs-
de ponte, em paciente idoso, assintomático, não deve trução precoce de veias de drenagem ou por oclusão
ser operado ou submetido a qualquer terapêutica. acidental de artéria que irriga cérebro normal. Nos úl-
timos anos, com maior experiência e melhora dos mé-
Teleangiectasias Capilares todos de diagnóstico, essas complicações são raras.
As teleangiectasias capilares não necessitam de Recentemente, Morgan et al.10 fizeram excelente
revisão das complicações cirúrgicas tardias.
tratamento. O diagnóstico correto é importante para
se evitar confusão com angiomas cavernosos. Spetzler, Wilson et al. descreveram a sobrecarga
circulatória (breakthrough) como causa de compli-
cações no pós-operatório ou, mesmo, durante o ato
Anomalias do Desenvolvimento Venoso cirúrgico. Para esses autores, as artérias do cérebro
Qualquer consideração a respeito do tratamento normal permanecem em regime de hipotensão e per-
cirúrgico ou radiocirúrgico precisa ser avaliada com dem a capacidade de auto-regulação. Quando a MAV
muito cuidado, em razão do risco do infarto veno- é retirada ou ocluída, esses vasos sofrem sobrecarga,
so. Não há qualquer necessidade de tratamento para ocasionando edema cerebral e sangramentos. Essa
ADV. Na literatura existem considerações pouco cla- teoria tem sido posta em dúvida. Autores com larga
ras sobre o tratamento cirúrgico ou radiocirúrgico. A experiência acreditam que sejam causadas por restos
oclusão das veias de drenagem pode acarretar com- de lesão, que ficaram sem drenagem venosa. Na nossa
plicações graves, e mesmo a morte, por causar hiper- experiência, observamos pacientes que se enquadram
tensão venosa. Ao operar pacientes com cavernomas, nas duas hipóteses. Em uma ocasião, ao recolocar
tivemos a oportunidade de observar complicações a calota óssea, após remover MAV frontal, ocorreu
causadas pela manipulação e ulterior oclusão de veias grande edema cerebral e sangramento. Explorando
de drenagem de ADV. Não vemos, portanto, razões novamente o leito cirúrgico, encontramos pequeno
para operar ou irradiar essas anomalias. resto do angioma e, ao retirá-lo, desapareceram ede-
ma e hemorragia. No pós-operatório o paciente desen-
volveu hemiparesia transitória. Em outras ocasiões, a
Fístulas Arteriovenosas Durais evolução apresentada indicou ter ocorrido sobrecarga
A terapêutica conservadora é justificada em al- circulatória. A sobrecarga circulatória é mais obser-
guns casos, porque as FAVD podem ficar estabiliza- vada quando as MAV são volumosas, com artérias e
das. Quando a sintomatologia (tinido, exoftalmo etc.) veias longas. A existência de roubo circulatório tam-
é muito prejudicial, alguma forma de tratamento é ne- bém sugere que o risco é maior.

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9 – Angiomas Cerebrais

Outras complicações tardias da cirurgia podem Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 1999.
ser observadas por trombose retrógrada de artérias p. 129-48.
aferentes10,11 ou por oclusão tardia de veias de dre- 4. Jane JA, Kassell NF, Torner JC, Winn HR. The na-
nagem10. Na nossa experiência, trombose arterial tem tural history of aneurysms and arteriovenous malfor-
sido constatada raramente, quase sempre sem conse- mations. J Neurosurg. 1998;62:321-23.
qüências clinicamente detectáveis. Tivemos oportu- 5. Brunereau L, Levy C, Labarge S, Houteville JP, Labau-
ge P. De novo lesions in familial form of cerebral ca-
nidade de observar um caso em que a má evolução vernous malformations: clinical and MR features in 29
foi determinada por obstrução venosa. Esse problema non-hispanic families. Surg Neurol. 2000;53:475-83.
pode ser mais comum após embolizações, pois temos 6. Houteville JP. Brain cavernoma: a dynamic lesion.
observado, durante o ato cirúrgico, êmbolos em veias Surg Neurol. 1997;48:610-4.
de drenagem. Outra complicação referida, mas bas- 7. Larson JJ, Ball WS, Bove KE, Crone KR, Tew Jr JM.
tante rara, é o espasmo arterial. Formation of intracerebral cavernous malformations
O estudo angiográfico sugere quais pacientes es- after radiation treatment for central nervous system
tão mais sujeitos a complicações no pós-operatório. neoplasia in children. J Neurosurg. 1998;88:51-6.
A sobrecarga circulatória é geralmente observada em 8. Porter PJ, Willinsky RA, Harper W, Wallace MC. Ce-
MAV volumosas, com aferentes longos e roubo cir- rebral cavernous malformations: natural history and
prognosis after clinical deterioration with or without
culatório evidente. Artérias e veias alongadas suge- hemorrhage. J Neurosurg. 1997;87:190-7.
rem risco de tromboses progressivas. MAV próximas 9. Aiba T, Tanaka R, Koike T, Kameyama S, Takeda N,
ao círculo de Willis podem acarretar espasmo cere- Komata T. Natural history of intracranial cavernous
bral. Baseando-se nesses dados, podem ser indicadas malformations. J Neurosurg. 1995;83:56-9.
manobras profiláticas: embolização pré-operatória, 10. Morgan MK, Sekhon LHS, Finfer S, Grinnell V. De-
vários tempos cirúrgicos e hipotensão controlada no layed neurological deteriorations following resection
pós-operatório, para evitar sobrecarga circulatória; of arteriovenous malformations of the brain. J Neu-
anticoagulantes, para evitar trombose; bloqueadores rosurg. 1999;90:695-701.
de cálcio e evitar hipotensão arterial, para espasmo. 11. Nataf F, Merienne L, Schlieger M, Lefkopoulos
D, Meder J-F, Touboul E, et al. Resultats de la sé-
rie de 705 malformations artério-veneuses céré-
Angiomas Cavernosos brale traitées pela radiochirurgie. Neurochirurgie.
Para os AC hemisféricos ou cerebelares, compli- 2001;47(Suppl);268-82.
cações pós-operatórias são incomuns. Os situados 12. Yamamoto MA, Hara M, Ide M, Ono Y, Jimbo M,
mais profundamente, ou no tronco cerebral, muitas Saito I. Radiation–related adverse effects observed
on neuro-imaging. Several years after radiosurgery
vezes são submetidos à cirurgia em condições clíni- for cerebral arteriovenous malformations. Surg Neu-
cas e neurológicas precárias e podem apresentar um rol. 1998;49:385-98.
pós-operatório mais acidentado. Um de nossos pa- 13. Yamamoto MA, Ide M, Jimboi M, Ono Y. Middle cere-
cientes, com cavernoma no mesencéfalo e parte su- bral artery stenosis caused by relatively irradiation with
perior do bulbo, foi operado por via supracerebelar. stereotactic radiosurgery for cerebral arteriovenous mal-
A abordagem mostrou-se imprópria, pois não permi- formations. Case report. Neurosurgery. 1997;41:475-8.
tiu boa exposição do processo e a remoção foi apenas 14. Miyasaka Y, Yada K, Ohwada T, Kitahara T, Endor
parcial. No pós-operatório ocorreu nova hemorragia, M, Saito M, et al. Retrograde thrombosis of feeding
que acarretou o óbito. arteries after removal of arteriovenous malforma-
tions. J Neurosurg. 1999;72:540-5
15. Kondziolka D. Lunsford LD. Radiosurgery for ca-
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1. Henn JS, Coons S, Zabramski. Pathology and clas- senwasser RH. Vascular malformations of the central
sification of central nervous system vascular mal- nervous system. Philadelphia: Lippincott Williams &
formations. In: Jafar JJ, Awad IA, Rosenwasser RH. Wilkins; 1999. p. 479-84.
Vascular malformations of the central nervous sys- 16. Karsson B, Kihlström L, Linquist C, Ericson K, Stei-
tem. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; ner L. Radiosurgery for cavernous malformations. J
1999, p. 71-93. Neurosurg. 1998;88:293-7.
2. Lee S, Awad IA. Central nervous vascular malfor- 17. Pikus H, Beach ML, Harbaugh RE. Microsurgical
mations through history. In: Jafar JJ, Awad IA, Ro- treatment of arteriovenous malformations: analy-
senwasser RH. Vascular malformations of the central sis and comparison with stereotactic radiosurgery. J
nervous system. Philadelphia: Lippincott Williams & Neurosurg. 1998;89:641-6.
Wilkins; 1999, p. 3-18. 18. Porter PJ, Shin AY, Detsky AS, Lefaive L, Wallace
3. Brown Jr RD. Epidemiology and natural history of WC. Surgery versus stereotactic radiosurgery for
vascular malformations of the central nervous sys- small, operable cerebral arteriovenous malforma-
tem. In: Jafar JJ, Awad IA, Rosenwasser RH. Vas- tions: a clinical and cost comparison. Neurosurgery.
cular malformations of the central nervous system. 1997;41:757-66.

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Tratamento Cirúrgico dos
Aneurismas da Circulação Anterior
Paulo Henrique Pires de Aguiar

INTRODUÇÃO coróidea anterior, e termina se bifurcando nas artérias


cerebrais anterior e média.

A
neurismas que se originam da circulação da
Ainda assim, a artéria carótida interna do seio ca-
artéria carótida interna representam 85% de to-
vernoso até sua bifurcação tem comprimento e número
dos os aneurismas1,2. As relações com os nervos
de ramos variáveis. Ao lado da artéria oftálmica e da
cranianos, encéfalo e a distribuição do fluxo da artéria
artéria comunicante posterior e artérias coróideas, há
carótida interna tornam imprescindível a sistematiza-
ramos perfurantes diretamente para a substância per-
ção das vias de acesso aos aneurismas dessa região,
furada anterior e, em alguns casos, um ramo proximal
devido ao seu potencial de complicações possíveis.
para o pólo temporal ou para a área frontal inferior3-6.
O entendimento da anatomia do sistema circula- Os ramos perfurantes saem diretamente da artéria ca-
tório carotídeo facilita o êxito do tratamento desses rótida interna, geralmente da parede posterior antes ou
aneurismas. Há várias abordagens aos aneurismas depois da bifurcação, e não propriamente da bifurca-
dessa região: ção. Os ramos perfurantes da artéria cerebral anterior
• Ligadura extracraniana da carótida interna. podem se originar de um tronco em comum ou como
• Acesso pterional. vários ramos pequenos que se dirigem diretamente
• Acesso pela convexidade cortical. para a substância perfurada anterior4,5. Os ramos per-
• Acesso inter-hemisférico. furantes da artéria cerebral média se originam também
• Técnicas endovasculares. como um tronco único ou como vários pequenos ra-
A anatomia microcirúrgica pertinente, o preparo mos perfurantes7,8. Esses perfurantes da artéria cerebral
pré-operatório, os procedimentos intra-operatórios, média podem se originar da porção medial da artéria,
os acessos cirúrgicos e as potenciais complicações próxima à sua origem (37%), ou do terço médio do seg-
serão discutidas ao longo deste trabalho. mento M1 (47%). Os vasos perfurantes remanescentes
se originam da porção mais lateral de M1 (16%). O pa-
drão de suprimento arterial da substância perfurada an-
ANATOMIA MICROCIRÚRGICA terior está sob a dominância da artéria cerebral anterior
A artéria carótida interna penetra no crânio atra- ou da artéria cerebral média, sendo os ramos oriundos
vés do forame lacerado, emergindo dentro da cavi- de outras artérias pequenos e em número reduzido5,6,8.
dade craniana ao ultrapassar o canal petroso dentro Em alguns casos3, um ramo mais largo e definido
do seio cavernoso. Muitos ramos se originam da pode se originar da porção distal do segmento A1 e se
artéria carótida interna na sua porção intracaverno- dirigir para a substância perfurada anterior retrogra-
sa, incluindo a artéria hipofisária inferior, o tronco damente, substituindo a artéria recorrente de Heubner.
meningo-hipofisário, meningotentorial e artéria para Quando os territórios de perfurantes se sobrepõem, a
o clivo. Após deixar o seio cavernoso, a artéria caró- oclusão permanente de uma perfurante pode não ser
tida interna atravessa o espaço subarcnóideo, dando de grande importância e sem significância clínica.
origem às artérias oftálmica, comunicante posterior e Entretanto, quando o vaso perfurante é dominante, a

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

oclusão permanente pode ser seguida por déficit neu- convexidade: as duas maiores são as temporais poste-
rológico grave e definitivo. riores ou veias de Labbé, as quais drenam para o seio
A artéria cerebral anterior, ao emergir da bifurca- transverso, e a veia médio-parietal ou veia de Trolard,
ção da carótida interna em direção à fissura inter-he- drenando para o seio sagital superior. Veias da conve-
misférica, dá origem a vários ramos para a substância xidade podem ser seccionadas em alguns pacientes,
perfurada anterior e área frontal inferior, como artéria especialmente naqueles em que a secção ocorreu no
frontopolar, artéria de recorrente de Heubner, artérias terço anterior do seio sagital superior. A remoção ou
perfurantes do septo e artéria comunicante anterior. A secção de mais de uma veia no terço médio do seio sa-
artéria cerebral anterior segue seu caminho pela fissu- gital superior ou a secção da veia de Trolard ou Labbé
ra inter-hemisférica em direção à convexidade. A arté- podem acarretar estase venosa ou infarto venoso.
ria recorrente de Heubner tem origem variável3-5,9. Na Yasargil et al.11 descreveram as cisternas subarac-
maioria dos casos, se origina do segmento proximal A2 nóideas na base do encéfalo como pequenos envelopes,
(65%), imediatamente após a origem da artéria comu- que circundam todas as estruturas contidas no espaço
nicante anterior. Em 25%, a artéria recorrente se origina subaracnóideo. Na região da carótida supraclinóidea
do segmento A1. Os remanescentes 10% têm origem há cisternas em torno da artéria carótida interna e sua
na artéria comunicante anterior. A artéria recorrente de bifurcação, artérias cerebrais média e anterior e do
Heubner e os ramos perfurantes septais são os ramos nervo e quiasma ópticos, como a cisterna pré-quias-
mais importantes da porção proximal da artéria cerebral mática, cisterna da lâmina terminal e confluência da
anterior, nutrindo a margem anterior da cápsula interna, fissura sylviana maior com a cisterna cerebral média.
da comissura anterior, região septal, porção anterior do Abertura ampla e dissecção cortante dessas cisternas
fórnice e hipotálamo e porção anterior do tálamo3-5,9. são necessárias para a exposição dos aneurismas da
A artéria cerebral média segue na fissura sylviana artéria carótida interna com segurança.
após a bifurcação da carótida, e se divide em um ou
dois troncos primários principais, dos quais irão se AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA
originar ramos para o córtex cerebral7,8. Particular-
mente, os ramos da área rolândica, giro angular e área Aneurismas com origem na artéria carótida inter-
opercular são os mais importantes; lesões em um des- na são responsáveis por 80% de todas as hemorragias
ses ramos são pouco toleradas. A dissecção cuidado- intracranianas não-hipertensivas, e vários tipos de
sa dos componentes da fissura sylviana é necessária malformações arteriovenosas compõem o restante12-19.
para identificar cada ramo da artéria cerebral média, A maioria dos aneurismas intracranianos sangra di-
previamente à colocação do clipe10. As veias do lobo retamente no espaço subaracnóideo, embora alguns
temporal e frontal drenam para as veias sylvianas e possam sangrar apenas no parênquima cerebral. Um
cerebral média na fissura sylviana. A veia sylviana é pequeno número de aneurismas que se origina na ar-
composta de várias veias tributárias, as quais se ori- téria comunicante posterior pode sangrar no espaço
ginam do lobo frontal, porção anterior, incluindo o subdural e se apresentar como hematomas subdurais
pólo frontal, superfície orbital, área opercular anterior espontâneos agudos2.
e porções anterior e inferior do lobo insular. Tributá- Tomografia computadorizada (TC) de crânio e
rias venosas do lobo temporal são variáveis e incluem ressonância nuclear magnética (RNM) do encéfalo
ramos do pólo temporal na sua porção mais anterior são necessárias para se descartar hematomas intra ou
dos giros temporais médios e superiores e porção extraparenquimatosos, extensão da hemorragia suba-
sylviana do lobo temporal. Veias aferentes dos lobos racnóidea, hidrocefalia e formação de coágulo intra-
frontal e temporal se juntam e formam um ou dois aneurismático13,15,20. Uma falsa sensação de seguran-
troncos venosos principais primários sylvianos, ou ça pode ser dada por uma angiografia que revela um
veia cerebral média, podendo variar de um a quatro. aneurisma pequeno, quando na realidade o aneurisma
Os troncos venosos primários drenam diretamente no é largo e afilado, com coágulo em seu interior12,13,21,22.
seio esfenopetroso. As veias sylvianas situam-se pre- As imagens de ressonância facilitam a localização de
dominantemente no lado temporal da fissura e podem leões hemorrágicas dentro do parênquima cerebral e
ser facilmente identificadas e poupadas durante a dis- podem sugerir anormalidades vasculares. A modalida-
secção. Em alguns casos, as veias sylvianas podem-se de de diagnóstico definitivo permanece a angiografia
situar do lado frontal da fissura, apresentando proble- cerebral12. A angiografia seletiva cerebral de quatro va-
mas na sua dissecção e preservação. Na maioria dos sos pode ser realizada em todos os pacientes com sus-
casos com predominância da veia sylviana do lado peita de aneurisma para se determinar sua localização
temporal, pode-se até coagulá-la e cortá-la, mas em e descartar múltiplos aneurismas, os quais ocorrem em
alguns casos poderá haver congestão venosa, infarto 20% dos casos, além de excluir vasoespasmo12,13,15,20.
venoso e edema cerebral11. A angiotomografia com reconstrução em 3D pré-
A drenagem venosa da convexidade cerebral retor- operatória atualmente tem sido mais divulgada e cer-
na à circulação sistêmica por meio de várias veias da tamente irá substituir a angiografia digital em alguns

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anos. Ela permite, com boa resolução, um planeja- A


mento mais elaborado para clipagem do aneurisma23,
além de conseguir detectar aneurismas de até 2 mm
e constituir método não invasivo e mais rápido, com
um índice muito menor de complicações24.
Drake25 classificou os aneurismas em três catego-
rias de acordo com seu tamanho:
• Diâmetros menores que 12 mm: pequenos.
• Diâmetros entre 12 e 25 mm: largos ou bul-
bares.
• Diâmetros maiores que 25 mm: gigantes.

CRANIOTOMIA PTERIONAL E
ABERTURA CISTERNAL
O amplo espectro de estruturas neurais e vascu- B
lares que podem ser acessadas pela via pterional in-
clui: ínsula, gânglios basais, ventrículo lateral, artéria
cerebral média, opérculo temporal, frontal e parietal,
unco, órbita, fossa craniana anterior, nervo óptico, ca-
rótida interna e seus ramos, lâmina terminal e fossa
interpeduncular26.

Posicionamento
Cerca de 80% dos aneurismas da circulação ante-
rior podem ser tratados com bom resultado pela via
pterional27-29. O posicionamento do paciente é crítico
para o êxito do procedimento. O paciente é colocado
em posição supina, com a cabeça sustentada por cabe-
Fig. 10.1 – (A) Rotação da cabeça, que varia de acordo com a po-
ceira de fixação (tipo Mayfield ou Mizuho), com a ca- sição do aneurisma, de 15° a 45°. (B) Deflexão da cabeça, colocan-
beça rodada 15° para o lado oposto a ser operado e 15° do o malar no ponto mais elevado do campo de visão cirúrgica.
de extensão, com o osso malar na região mais elevada
em relação ao cabeça (Fig. 10.1). Nessa posição, a asa Dissecção Interfascial
esfenoidal fica perpendicular ao chão. Yasargil et al.29 A localização do ramo frontal do nervo facial em
recomendam rotação de 30° em relação à linha média, relação às paredes da fáscia do músculo temporal
tendo-se como referência o nariz. Sugita recomenda deve ser estabelecida durante a dissecção meticulosa
a mesma rotação para a circulação anterior e 45° em da fáscia. Há duas paredes na região temporal que es-
relação a aneurismas em torno da bifurcação da artéria tão relacionadas com o ramo frontal do nervo facial:
basilar30.
1. Fáscia temporal superficial.
2. Fáscia temporal profunda, a qual é composta
Incisão cutânea de uma parede profunda e outra superficial.
A incisão deve ser feita atrás da linha do cabelo até A fáscia temporal superficial é contínua com o peri-
a altura do zigoma (< 1 cm à frente do trago), até li- crânio superiormente, com o músculo frontal anterior­
nha médio-pupilar ipsilateral ou mais extensivamente mente, e com o músculo occipital posteriormente. O
até a linha média passando pela linha temporal supe- ramo frontal do nervo facial corre nessa fáscia até o
rior (Fig. 10.2), sobre a crista temporal, atrás da linha nível do arco zigomático. A fáscia temporal superficial
de inserção do cabelo26. A artéria temporal superficial está intimamente aderida à fáscia temporal profunda,
pode ser dissecada e preservada na maioria dos casos, havendo apenas um tecido areolar entre elas. As duas
e a fáscia do músculo temporal deve ser mantida in- paredes da fáscia temporal estão fundidas até apro-
tacta durante a incisão da pele. Quando a incisão al- ximadamente 2 mm acima da borda superior do arco
cança a linha temporal superior, deve ser aprofundada zigomático, onde se misturam com camada superfi-
e incluir o pericrânio, o qual é defletido anteriormente cial e paredes profundas. As duas paredes da fáscia
com o retalho cutâneo. Deve-se expor com uma pe- temporal profunda comportam, entre seus limites, a
quena rugina a porção anterior do arco zigomático, ou gordura temporal, a qual é uma importante referência
o processo zigomático do osso frontal. anatômica para dissecção interfascial26,31,32.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

B
Fig. 10.3 – Dissecção interfacial. Remove-se o músculo tem-
poral da sua inserção anterior, retraindo-o posteriormente, após
separar o tecido gorduroso que contém o ramo frontal entre as
duas camadas da fáscia temporal. O músculo temporal deve ser
incisado, começando pelo processo zigomático no osso fron-
tal ao longo da linha temporal, e refletido inferiormente sobre
o arco zigomático. O músculo temporal deve ser inteiramente
destacado da linha temporal superior, ou uma pequena tira de
músculo pode ser deixada ao longo da linha temporal superior
para se proceder à sutura ao final durante o fechamento.

A
Fig. 10.2 – (A e B) A incisão deve ser curva, à frente do tra-
go, passando atrás da linha do cabelo, até a linha média.

A gordura bucal começa pouco depois, acima do


rebordo superior do arco zigomático, e se localiza
medialmente ao arco zigomático. A gordura bucal é
separada da gordura temporal pela parede profunda
da fáscia temporal profunda.
A incisão reta a 2 cm acima da borda superior do
arco zigomático é realizada na fáscia temporal super-
ficial e na gordura temporal, até a parede profunda da
fáscia temporal profunda ser exposta. Normalmente
há um sangramento venoso na gordura temporal em B
razão da secção esperada da veia temporal média e
seus ramos. A gordura temporal é separada da parede
profunda da fáscia temporal profunda e deve ser refle-
tida sobre o arco zigomático (Figs. 10.3 e 10.4).

Craniotomia e Abertura Dural


O retalho ósseo deve ser obtido com craniotomia
centrada no ptério (Fig. 10.5). O ptério é removido na
sua porção inferior em contato com a asa esfenoidal até
a emergência da artéria meningo-orbitária. A dura-máter
é ancorada com múltiplos pontos de ancoramento e, de-
pois, é refletida após incisá-la em hemiarco, com a por-
ção retilínea sobre a fissura sylviana. Fig. 10.4 – (A e B) Rebatimento do plano muscular e cutâneo.

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A A dissecção inicial se dá na sua porção superficial, na


porção opercular; deve-se orientar a dissecção medial
e inferiormente até se alcançar a artéria carótida in-
terna na sua porção supraclinóidea. Com o controle
proximal pode-se abrir amplamente a cisterna sylvia-
na. Todas as trabéculas aracnóideas devem ser seccio-
nadas (Fig. 10.6A e B), expondo-se o curso da artéria
carótida interna e sua bifurcação, o nervo óptico e o
quiasma óptico, a porção proximal da artéria cerebral
anterior (A1), e o tronco principal e a bifurcação da
artéria cerebral média ao nível do límen da ínsula.
A fissura sylviana é, então, inteiramente aberta,
com uma separação gravitacional do lobo frontal e
temporal, sem qualquer tração, como as pétalas da
flor de lótus. O lobo temporal é sustentado pela asa
esfenoidal e pelas veias sylvianas, e geralmente é
necessária apenas leve retração do lobo frontal com
B uma espátula. Muitas vezes, nem se requer qual-
quer retrator (Fig. 10.6C e D); desse modo evita-se
o trauma ao encéfalo e a drenagem venosa é, então,
minimizada11,29,33,34.
O líquido cefalorraquidiano deve ser drenado gra-
dualmente das cisternas para se obter um máximo de
relaxamento cerebral com mínima retração cerebral.
Quando for necessária uma drenagem adicional,
pode-se abrir a lâmina terminal acima do quiasma
óptico. Essa manobra traz menores complicações do
que a punção ventricular em casos eletivos34, porém
na urgência preferimos a punção, pois na fase aguda
o cérebro encontra-se tenso e mais friável.

Microdissecção e Clipagem do Aneurisma


A abertura incompleta da cisterna aracnóidea con-
C duz à tensão dos lobos frontais e temporais, requer
aumento da tensão das espátulas e proporciona menor
exposição da área a ser trabalhada. Dissecção incom-
pleta das cisternas pode provocar rotura precoce do
aneurisma pela tração do cérebro. A preservação das
veias é muito mais fácil quando há dissecção ampla
das cisternas. Quanto menor a pressão do retrator,
menor a chance de estase, lesão ou infarto venoso. A
colocação do clipe no colo aneurismático é também
facilitada com a abertura cisternal.
Atualmente, após uma certa experiência com a ci-
rurgia de aneurismas, tumores de base do crânio e tu-
mores encefálicos pericisternais, temos evitado o uso
de retratores e procurado apenas a tração intermiten-
Fig. 10.5 – (A) A linha em negro mostra a linha de incisão te com aspirador e o bipolar durante a dissecção.
para craniotomia unindo os orifícios de trepanação. (B) Retira-
da do retalho ósseo. (C) Abertura cisternal. A clipagem direta do colo aneurismático perma-
nece como o único tratamento definitivo dos aneu-
Abertura da Cisterna Sylviana rismas intracranianos. Para tal, obviamente são ne-
cessárias dissecção completa do colo do aneurisma
e Cisternas Basais
(Fig. 10.7), identificação de todos os ramos aferentes
A cisterna deve ser aberta por meio de dissecção e eferentes, dissecção e isolamento das artérias perfu-
cortante (bisturi lâmina 11 ou 15) e microtesouras. rantes importantes e aplicação do clipe de aneurisma

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

A B

C D

Fig. 10.6 – Técnica de abertura da cisterna sylviana. (A) Abertura da cisterna próximo ao opérculo frontal com dissecção
cortante. (B) Continuação ascendente e medial da dissecção. (C e D) Abertura ampla da cisterna de modo a facilitar a drenagem
de líquido cefalorraquidiano, além de expor-se todos os ramos da artéria cerebral média intra-sylviana. Note que não se utiliza
espátula para retrair o frontal ou o temporal e evitou-se coagular a veia sylviana quando ela está do lado temporal.

no colo aneurismático, terminando o fluxo sangüíneo


para o interior de seu saco. Cuidados devem ser to-
mados para se evitar estenose ou dobradura kinking
dos vasos aferentes e eferentes, devendo o clipe ser
colocado em paralelo ao vaso formador. O posicio-
namento de maneira perpendicular poderá manter um
colo residual fora da clipagem. Em pacientes com he-
morragia recente ou aneurismas gigantes, é mais se-
guro utilizar clipes temporários enquanto se disseca o
aneurisma, porém devem-se sempre poupar as perfu-
rantes até mesmo dos clipes temporários. O tempo de
aplicação dos clipes temporários é variável, podendo
ser alongado com a utilização de técnicas e drogas
anestésicas protetoras do metabolismo cerebral35.

ANEURISMAS DA ARTÉRIA CARÓTIDA


INTERNA
Aneurimas Clinóideos e Paraclinóideos
Fig. 10.7 – O esquema mostra como se separa, com dissec-
tores, as perfurantes e os ramos arteriais principais do fundo e Jefferson, em 1937, classificou os aneurismas
colo aneurismático. da artéria carótida interna (ACI) em infraclinóideos

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10 – Tratamento Cirúrgico dos Aneurismas da Circulação Anterior

e supraclinóideos, subdividindo-os em aneurismas A


proximais ao processo clinóideo, intracavernosos e
distais ao processo clinóideo dentro do espaço suba-
racnóideo36.
Os aneurismas dessa região podem ser classifica-
dos em quatro grupos23:
• Clinóideos (medial – cavo carotídeo e lateral).
• Oftálmico.
• Hipofisário superior (súpero-medial e póstero-
medial).
• Posterior (dorsal, paraclinóideo).
Os aneurismas da porção intracavernosa da caró-
tida normalmente causam sintomas por sua gradual
expansão, e não por rotura. Os que rompem levam à B
formação de fístula carótida cavernosa. Poucos casos
foram descritos como causadores de hemorragia me-
níngea, estando inteiramente em situação intracaver-
nosa e causando morte por hemorragia, mais raro ain-
da37. Uma classificação muito interessante, proposta
por Carvalho Filho e Carvalho38, segue a seguinte
descrição (Fig. 10.8):
• Tipo A: aneurismas carótido-oftálmicos com
origem na artéria carótida interna após o anel
proximal da artéria carótida interna, distais à
artéria oftálmica:
–– Subtipo A1: projeção dorsomedial.
–– Subtipo A2: projeção ventromedial.
–– Subtipo A3: projeção ventromedial tipo
carótido-cave. Aneurisma pequeno que
dificilmente atinge maiores proporções
(raro > 10 mm) por estar restrito em um
pequeno desdobramento dural ou bolsa C
chamada cave, tem projeção ventrome-
dial. Geralmente é confundido no estudo
angiográfico com aneurismas da carótida
interna segmento C4, ou seja, restrito ao
seio cavernoso (caso ilustrativo I – Figs.
10.9 a 10.11).
• Tipo B: aneurismas da artéria hipofisária su-
perior entre o anel distal da artéria carótida
interna e a origem da artéria comunicante pos-
terior.
–– Subtipo B1: projeção ventral (variante pa-
raclinóide de Day).
–– Subtipo B2: projeção ventral medial (va-
riante supra-selar de Day).
–– Subtipo B3: projeção ventral lateral.
• Tipo C: aneurismas da parede dorsal da artéria
carótida interna proximal sem vaso aparente
de origem. Fig. 10.8 – Alguns tipos de aneurisma paraclinóideos – estu-
• Tipo D: aneurismas fusiformes da artéria caró- do angiográfico. (A e B) Ventral medial e para baixo (subtipo
tida interna. A2 de Carvalho Filho e Carvalho38). (C) Ventral medial e para
cima (subtipo A2).

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Aneurismas Clinóideos intracavernosos. Segundo Guidetti e Nicole40, poderá


haver quatro formas:
Aneurismas clinóideos e paraclinóideos podem se • Aneurismas que se desenvolvem em direção
situar no seio cavernoso, em sua transição e fora dele. ascendente e se projetam anterior ou poste-
Aneurismas de clinóide podem se originar do es- riormente (caso ilustrativo II – Figs. 10.12 a
paço clinóideo e se projetar no espaço subarcnóideo. 10.18).
Aneurismas clinóideos mediais crescem na porção • Aneurismas que se desenvolvem medialmente
medial da artéria carótida. Esses aneurismas podem se projetam em um plano horizontal.
se projetar no espaço subaracnóideo, inferiormente
• Aneurismas que se desenvolvem medialmente
ao nervo óptico, através de pertuitos na dura-máter.
e se projetam anterior ou posteriormente.
Aneurismas clinóideos laterais crescem do espa-
• Aneurisma global.
ço ântero-lateral da artéria carótida, lateral ao nervo
óptico. Eles se projetam superiormente em direção ao A associação desses aneurismas com aneurismas
processo clinóideo anterior, erodindo a porção óssea, em outras localizações é de 14,8%45, sendo a associa-
e podem se projetar através da dura-máter em direção ção mais freqüente com aneurismas de artéria comu-
nicante posterior ipsi ou contralateral. Podem ainda
ao espaço subarcnóideo (caso ilustrativo II – Figs.
estar associados a tumores hipofisários e/ou da go-
10.12 a 10.18).
teira olfativa42. Cerca de 45% desses aneurismas são
grandes ou gigantes40.
Aneurismas Carótido-oftálmicos Em relação ao quadro clínico, apenas 42% apre-
Aneurismas carótido-oftálmicos se projetam, a sentam-se com quadro de hemorragia meníngea41,46,47.
princípio, superiormente, a partir da emergência da Sintomas visuais aparecem em menos de 25% dos
artéria oftálmica. À medida que crescem, projetam-se pacientes42, embora alguns autores citem uma inci-
no sentido superior e medial. Ao se tornarem gigan- dência muito menor39,41. Sintomas endócrinos costu-
tes, passam a incorporar a parede da carótida, sendo mam ser raros e podem estar relacionados a alteração
muito difícil, nesses casos, a determinação exata da do ciclo menstrual ou obesidade associada ou não a
origem do aneurisma. hirsurtismo40,44. Essas alterações são explicadas por
compressão direta sobre a haste hipofisária, ou por
Os aneurismas carótido-oftálmicos têm uma inci-
alterações do fluxo hipotálamo-hipofisário40. Déficits
dência que varia de 1,5% a 7,9%39,40. Esses aneuris-
motores ou de linguagem podem ocorrer, tanto por
mas são mais freqüentes no lado esquerdo sem que
compressão quando pela hemorragia subaracnóidea.
haja uma explicação fisiopatológica óbvia41, embora O diagnóstico deve ser realizado com angiografia di-
Yasargil et al.42 tenham encontrado resultados dife- gital ou angiotomografia, mas sem dúvida a RNM é
rentes. Aneurismas bilaterais podem estar presentes fundamental para se detectar trombos, e a TC para se
em até 20% dos casos40, havendo um predomínio detectar calcificações.
marcante desses aneurismas no sexo feminino, con-
forme as séries de Yasargil et al.42 e Sengupta et al.43
Em 80% dos casos, a idade varia entre 30 e 60 anos, e Aneurismas da Artéria Hipofisária Superior
a quinta década é responsável por 37% dos casos40. Originam-se da artéria carótida interna, distalmente
Thurel et al.44 classificaram esses aneurismas em à origem da artéria oftálmica, e normalmente se proje-
três grupos: tam nos planos posterior ou súpero-medial. No passado
• Látero-quiasmático (caso ilustrativo III – Figs. eram considerados aneurismas carótido-oftálmicos39.
10.19 a 10.21). Eles podem se projetar posterior e medialmente.
• Supraquiasmático.
• Subquiasmático. Aneurismas da Porção Posterior da Clinóide
Estas duas últimas formas se originam da arté- Crescem da parede posterior da artéria, carótida,
ria carótida e se projetam medialmente. Os autores diametralmente oposta ao espaço clinóideo anterior.
acrescentam uma forma adicional que pode ocupar a Esses aneurismas projetam-se inferior e posterior-
região parasselar inteira. Almeida et al.39 descrevem mente ou posteriormente e podem ser facilmente con-
a forma látero-quiasmática, que se origina da pare- fundidos com os aneurismas da artéria comunicante
de superior da artéria carótida e se projeta acima ou posterior. Nas projeções de perfil nas angiografias,
ao longo do quiasma, também descrita como forma seu aspecto diametralmente oposto ao espaço clinói-
subóptico-quiasmática, surgindo da parede medial da deo anterior pode ser verificado. A artéria comuni-
artéria carótida e se desenvolvendo abaixo do quias- cante posterior é vista superiormente a esse tipo de
ma óptico. aneurisma. Tais aneurismas freqüentemente erodem
Ainda de acordo com Yasargil et al.42, os aneu- a parede superior do seio cavernoso e podem estar
rismas carótido-oftálmicos podem ser parcialmente extremamente aderidos a ela.

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Aneurismas Gigantes da Artéria Carótida são individualizados e inteiramente abertos, por meio
Interna de um dissector em ângulo reto23,49,50.
Ocasionalmente a abertura do saco aneurismáti-
Aneurismas gigantes estão associados a alterações co é realizada para se proceder à trombectomia30,34,51.
ateroscleróticas ou calcificações distróficas da pare- Quando o aneurisma é muito grande com colo lar-
de da artéria carótida interna. Mesmo assim, poderá go, para facilitar a clipagem, pode-se descomprimir
haver sangramento onde a parede é mais afilada. Há retrogradamente o aneurisma por sucção e, assim,
grande incidência de aneurismas não rotos nessa re- procede-se à clipagem de modo mais seguro51,52.
gião, em virtude das paredes do seio cavernoso, ner-
vos ópticos e processo clinóideo anterior (PCA), que
tamponam as paredes enfraquecidas do aneurisma, ANEURISMAS DO SEGMENTO
conferindo-lhe suporte estrutural. COMUNICANTE POSTERIOR E CORóiDEO
Cerca de um quarto de todos os aneurismas incidentais
Acesso Cirúrgico ou rotos têm sua origem no segmento comunicante poste-
rior. Essa artéria é responsável pelo suprimento do túber
As artérias carótida cervical interna e externa de-
cinéreo, substância perfurada posterior, quiasma óptico,
vem ser expostas por cervicotomia no nível do pesco-
hipotálamo posterior e o braço posterior da cápsula inter-
ço. Caso bypass de alto fluxo esteja sendo considera-
na53. A artéria comunicante posterior assume padrão fetal
do uma opção cirúrgica (ver a seguir), um enxerto de
em uma incidência maior que na população normal quan-
veia safena magna deverá ser obtido previamente48.
do há um aneurisma de artéria comunicante posterior,
Os aneurismas clinóideos e paraclinóideos são opera-
respectivamente 14,6% para 33%54. Nesses pacientes a
dos por via pterional com orbitotomia e retirada intra-
clipagem não pode envolver a artéria fetal, com risco de
ou extradural da clinóide anterior. Nosso grupo geral-
haver comprometimento da irrigação do tronco cerebral55.
mente opta pela retirada extradural (Caso ilustrativo
Esses aneurismas normalmente crescem em direção su-
II, Figs. 10.12 a 10.18); a retirada das asas interna
perior e lateral em relação à origem da artéria comuni-
e externa do esfenóide obviamente precede a retira-
cante posterior, sendo seu fundo orientado posterior e la-
da da clinóide anterior. Quando o aneurisma erode o
teralmente, podendo haver uma relação com a superfície
lobo frontal, têm-se duas alternativas:
tentorial ou com o lobo temporal55. Em seu estudo clíni-
• O colo é visível, então procede-se à clipagem e co-anatômico para planejamento cirúrgico, Vander Ark et
depois à dissecção do fundo do aneurisma al.56 constataram que 35% desses aneurismas se projetam
• O colo é muito largo, disseca-se em torno do posteriormente, 24% se projetam acima da borda livre do
aneurisma, deixando tecido cerebral aderente tentório, 13% se projetam súpero-medialmente e somente
ao fundo para tentar, com clipes fenestrados 2% se projetam inferior e medialmente.
em L, ou até mesmo os clipes de Sugita núme- Os aneurismas da artéria coróidea têm origem na
ro 5, angulados, reconstruir uma nova carótida porção superior ou superior lateral da artéria corói-
(neocarótida)21,30. dea anterior. Essa artéria tem uma origem mais late-
Se o aneurisma está projetado posteriormente ou ral que a artéria comunicante posterior e se origina 2
fora da área do processo clinóideo anterior, pode- a 4 mm distal a ela, suprindo a porção medial do lobo
se retirar a clinóide anterior por via intradural após temporal, trato óptico, corpo geniculado lateral cáp-
abertura dural (caso ilustrativo I – Fig 10.10C e D, sula interna, tálamo lateral, e subtálamo, bem como
caso ilustrativo III – Figs. 10.19 a 10.21). Para a re- uma parte do pedúnculo cerebral e da substância
tirada da clinóide, utilizam-se drills de alta rotação negra57-59. Por sua origem mais lateral que a artéria
com brocas de diamante (Midas Rex, Highland, Ul- comunicante posterior, essa artéria é mais facilmente
trapower, Anspaach). Para a separação do processo visualizada que artéria comunicante posterior duran-
clinóideo da parede carotídea e da porção superior da te a dissecção da artéria carótida interna.
parede do seio cavernoso, um descolador delicado é
utilizado, e ao final pode-se usar um porta-agulhas
delicado para se luxar com cautela a clinóide anterior Apresentação Clínica
residual. Deve-se tamponar o sangramento venoso do Pacientes com aneurismas do segmento comuni-
seio cavernoso com Surgicel®, Helitene® ou Avitene® cante posterior podem apresentar quadro de hemorra-
ou até mesmo Gelfoam®, com cotonóide sobre estes gia meníngea, que varia desde uma cefaléia sentinela
por alguns minutos. O pilar óptico é, então, descom- até uma hemorragia fatal. A paralisia súbita do nervo
primido com retirada do seu teto com um Kerrison de oculomotor é um sinal importante de presença de um
2 mm em sua área cortante; o nervo óptico deve então aneurisma de artéria comunicante posterior. Aneuris-
ficar livre e descomprimido em uma circunferência mas que se projetam lateral ou póstero-lateralmente
incompleta de 270°. A bainha dural é, então, aberta e estão em íntimo contato com esse nervo; com seu sú-
os anéis durais interno e externo da carótida interna bito crescimento, há uma progressiva cefaléia retro-
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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

orbitária seguida por ptose, perda da função pupilo- clipe (caso ilustrativo V, Figs. 10.24 e 10.25)62. O fun-
motora e paralisia oculomotora. Hemorragia sobre a do aneurismático não deve ser dissecado antes da cli-
bainha nervosa ou na cisterna que circunda o terceiro pagem definitiva (caso ilustrativo VI, Fig. 10.26)62.
nervo pode produzir também paralisia oculomotora. Quando o aneurisma tem o colo proximal acima
Aneurismas da artéria cerebral posterior também po- da borda livre do tentório, a cirurgia torna-se mais
dem provocar paralisia oculomotora, uma vez que a difícil e muitas vezes faz-se necessária a abertura da
artéria cerebral posterior tem íntimo contato com o borda livre ou até mesmo a retirada da clinóide poste-
terceiro nervo na sua emergência junto ao tronco ce- rior. Durante essa dissecção, muitas vezes o IV e o III
rebral. Outro sintoma menos freqüente é a perda do nervo podem ser lesados.
campo visual nasal quando há uma dilatação da artéria
carótida interna devido ao grande volume dos aneu- ANEURISMAS DA BIFURCAÇÃO DA
rismas gigantes, levando a defeitos de campo visual ARTÉRIA CARÓTIDA INTERNA
homônimos. Hipopituitarismo também pode ocorrer
quando a hemorragia acomete o hipotálamo. A as- Apesar de a bifurcação da carótida interna ser
sociação de hipopituitarismo, com defeito de campo maior e freqüentemente tortuosa, é uma região rara
visual e sinais de acometimento do lobo f­rontal pode para o desenvolvimento de aneurismas. Normalmen-
ser indicativa de um aneurisma gigante de carótida in- te se projetam superiormente e, por vezes, superior e
terna60. Hemiplegia pode advir após sangramento do posteriormente. Pode haver um hematoma intracere-
aneurisma contra a cápsula interna. Crises focais ou bral putaminal, em geral anterior e inferior ao hemato-
generalizadas podem estar associadas a sangramento ma clássico e hipertensivo putaminal. Os aneurismas
sobre o lobo temporal ou ao vasoespasmo53. da artéria carótida interna podem ter colos bastante
A chance de ressangramento nos primeiros 6 me- largos e atingir grandes dimensões. Podem-se proje-
ses é de aproximadamente 60%61. O risco de ressan- tar em três direções63:
gramento agudo é maior nas mulheres e aumenta com • Superior: direção ao giro frontorbitário lateral
a presença de vasoespasmo e coágulos visíveis na ou à base dos tratos olfativos.
investigação radiológica. O tamanho do aneurisma • Posterior: em direção à substância perfurada
também influencia o risco de ressangramento. A taxa anterior, porção lateral da cisterna da lâmina
de ressangramento tardio é em torno de 3%61. terminal ou cisterna sylviana.
• Inferior: em direção às cisternas carotídea, inter-
peduncular ou, eventualmente, à cisterna crural.
Dilatação Infundibular
A artéria cerebral média é quase sempre deslocada
Dilatações infundibulares do segmento comuni- lateralmente, e a artéria cerebral anterior é desloca-
cante posterior são vistas em 7% das angiografias, en- da medialmente com o progressivo crescimento do
tretanto a incidência aumenta com a idade. Dilatações aneurisma.
infundibulares não excedem 3 mm, não têm colo e a
artéria comunicante posterior se origina do ápice da Craniotomia e Acesso
dilatação. As dilatações infundibulares são considera-
das pré-aneurismáticas53. O posicionamento é o mesmo usado para artéria
coróidea, ou seja, a cabeça deve ser um pouco mais
flexionada do que na cirurgia dos aneurismas da arté-
Craniotomia e Microdissecção ria comunicante posterior.
A via pterional é a de escolha para todos os aneu- Normalmente a craniotomia pterional é a de elei-
rismas do segmento comunicante posterior e da artéria ção; deve-se abrir amplamente a cisterna sylviana e se
carótida interna. A retirada da asa esfenoidal é muito identificar A1 e a porção mais distal de M1 antes da
importante para que a visão não seja obstruída durante bifurcação (caso ilustrativo VII, Figs. 10.27 e 10.28).
a dissecção da cisterna sylviana. Utilizamos retração Poderá haver uma aderência de vasos lenticuloestria-
intermitente sem espatulação contínua. Em aneurisma dos e ramos da porção distal da artéria coróidea e da
com colo bem individualizado na sua visão angio- artéria recorrente de Heubner. Deve-se ter cuidado
gráfica, preferimos o acesso direto ao aneurisma com com clipes cujas lâminas são muito compridas, para
dissecção da cisterna óptico-carotídea, quiasmática e não englobar as perfurantes durante a clipagem.
olfativa e abertura da membrana de Lilliquist; com o Se o aneurisma for muito grande, muitas vezes pode
relaxamento cerebral podemos acessar o aneurisma se considerar a clipagem do segmento A1 ipsilateral62.
com uma leve retração com o aspirador em uma mão Quando a artéria carótida interna for muito longa na sua
e dissecamos o colo com a outra mão e com esta mes- porção intracraniana, deve-se começar a dissecção re-
ma colocamos o clipe (caso ilustrativo IV, Figs. 10.22 trogradamente em M1 em direção à bifurcação. Deve-se
e 10.23). Após a clipagem, devemos ter certeza de que evitar, a todo custo, a retração do lobo frontal, com riscos
a artéria comunicante posterior não está englobada no elevados, neste caso, de sangramento do aneurisma.

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Caso Ilustrativo I
Paciente VA, 42 anos, sexo feminino, com quadro de cefaléia crônica, que durante investigação mostrou no estudo angiográfico
aneurisma de artéria cerebral média grande e artéria oftálmica.

A B C

Fig. 10.9 – (A, B e C) Angiografia digital mostra aneurisma paraclinóideo (subtipo A3 de Carvalho) – cavo carotídeo.

A B C D

Fig. 10.10 – (A e B) Retirada da clinóide por via intradural. (C) Tamponamento do sangramento venoso pelo seio cavernoso
com Surgicel®. (D) Aneurisma dissecado com seu colo proximal e distal.

A B

Fig. 10.11 – (A) Clipagem efetiva do aneurisma. (B) Paciente bem no pós-operatório, sem déficits motores, com discreto defeito
de campo visual, 8 meses após a cirurgia (com autorização).

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Caso Ilustrativo II
Paciente DC, 39 anos, sexo feminino; durante investigação de sinusopatia diagnosticou-se um aneurisma gigante paraclinóideo (sub-
tipo A2).

Fig. 10.12 – Artéria carótida cervical dissecada para o con- Fig. 10.13 – Tomografia de crânio mostra o volumoso
trole proximal. aneurisma paraclinóideo com projeção ventral medial e para
cima.

A B C

Fig. 10.14 – (A, B e C) Doppler transcraniano contínuo intra-operatório é fundamental para a clipagem.

A B C

Fig. 10.15 – (A e B) Tomografia de crânio e angiotomografia com reconstrução em 3D mostram o volumoso aneurisma para-
clinóideo com projeção ventral medial e para cima. (C) Posicionamento da cabeça pouco rodada e pouco defletida.

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A B C D

Fig. 10.16 – (A) Angiorressonância mostrando o volumoso aneurisma paraclinóideo. (B) Brocagem e retirada da clinóde anterior
por via extradural. (C e D) Dissecção do colos proximal e distal do aneurisma e aplicação do clipe.

A B

Fig. 10.17 – (A) Dissecção do colos proximal e distal do aneurisma e aplicação do clip. (B) Secção do fundo do aneurisma e
clipagem definitiva.

A B C

Fig. 10.18 – (A, B, C) As angiotomografias demonstram a clipagem do aneurisma gigante e a diminuição do efeito de massa
do colo do aneurisma, além da clipagem efetiva do aneurisma de comunicante posterior contralateral. O aneurisma no seio ca-
vernoso não foi clipado.

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Caso Ilustrativo III


Paciente AG, 68 anos, sexo feminino, com cefaléia súbita cuja tomografia e exame de líquido cefalorraquidiano foram normais.
A angiorresonância com reconstrução em três dimensões demostrou um aneurisma de artéria oftálmica.

A B

Fig. 10.19 – (A e B) Angiorressonância com reconstrução em 3D mostra o aneurisma de segmento oftálmico à direita.

A B C

Fig. 10.20 – (A, B e C) Craniotomia pterional clássica e abertura dural.

A B C

Fig. 10.21 – (A, B e C) Visão cirúrgica mostra nervo óptico com íntima relação com o aneurisma de oftálmica; em seguida
afasta-se o nervo com dissector, procede-se à dissecção do colo do aneurisma e clipagem do aneurisma de oftálmica ventral-
látero-quiasmático.

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Caso Ilustrativo IV
Paciente JS, 29 anos, sexo feminino. Cefaléia súbita há 2 dias. A tomografia computadorizada de crânio mostra-se normal, porém
o líquido cefalorraquidiano é compatível com hemorragia subaracnóidea. A angiografia demonstrou aneurisma do segmento
comunicante posterior bilateral.

A B C

Fig. 10.22 - (A, B e C) Angiografia digital, em posição oblíqua, perfil e ântero-posterior, mostra aneurisma de artéria comu-
nicante posterior à esquerda.

A B

C D

Fig. 10.23 – (A, B e C) Acesso subfrontal com dissecção da cisterna carótido-óptica, olfativa e abertura da membrana de
Liliquist, dissecção do colo aneurismático e clipagem do aneurisma. (D) Angiotomografia do encéfalo mostra clipagem efetiva
bilateral.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Caso Ilustrativo V
Paciente VLC, sexo masculino, 67 anos, apresentou cefaléia súbita de forte intensidade sem melhora com analgésicos. Compa-
receu ao serviço de emergência em hospital referenciado do convênio, tendo sido diagnosticado, por tomografia, hemorragia
meníngea, grau II de cisterna, segundo Fisher, e por angiografia aneurisma de comunicante posterior e comunicante anterior do
lado direito.

A B C D

Fig. 10.24 – (A, B e C) Angiografia digital mostra aneurisma do segmento artéria comunicante posterior sem padrão fetal da
artéria e aneurisma de segmento comunicante anterior. Aneurisma paraclinóideo à esquerda e do segmento comunicante poste-
rior à direita. (D) Tomografia de crânio mostra cisterna de grau II, com sangue apenas em cisterna sylviana.

A B C

D E

Fig. 10.25 – (A) Dissecção do colo do aneurisma de artéria comunicante posterior proximal e distal por acesso subfrontal.
(B) Aplicação do clipe. (C) Ressecção microcirúrgica do giro reto. (D) Dissecção do aneurisma e seu colo, expondo A1 bilteral e A2
ipsilateral, bem como a recorrente de Heubner. (E) Aplicação do clipe no colo do aneurisma do segmento comunicante anterior.

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Caso Ilustrativo VI
Paciente AMA, 55 anos, sexo feminino. Durante investigação radiológica de blefaroespasmo, foi detectado, na angiografia cere-
bral, um aneurisma de artéria comunicante posterior, voltado para o lobo temporal esquerdo.

A B C

Fig. 10.26 – (A) Acesso subfrontal mostrando os nervos ópticos e a carótida direita. (B) Dissecção do colo aneurismático.
(C) Clipagem definitiva do aneurisma.

Caso Ilustrativo VII


ASM, 39 anos, sexo feminino, apresentou cefaléia súbita há 20 dias, de forte intensidade. O estudo angiográfico revelou aneu-
risma de bifurcação de carótida à direita.

A B C

Fig. 10.27 – (A) Angiografia de perfil, mostrando aneurisma da bifurcação da carótida. (B) Angiografia em ântero-posterior
mostra o aneurisma voltado para cima e para frente. (C) Angiorressonância do encéfalo mostrando o aneurisma em região de
bifurcação de carótida

A B

Fig. 10.28 – (A e B) Abertura ampla do vale sylviano, com dissecção do colo proximal e distal. Pode-se visualizar o colo pro-
ximal do aneurisma junto a A1, e o distal junto a M1.

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ANEURISMAS DA ARTÉRIA CEREBRAL A


ANTERIOR
Artéria Comunicante Anterior
Incidência
Os aneurismas da artéria comunicante anterior não
são raros e em muitas séries são muito freqüentes, va-
riando de 25% a 38%65. O aneurisma da artéria comu-
nicante anterior oferece um desafio ao planejamento
neurocirúrgico pré-operatório. O tamanho do aneuris-
ma, tamanho do segmento A1, número de segmentos
de A2 e o tipo de projeção do aneurisma devem ser
sempre considerados. Os aneurismas do complexo
comunicante anterior, em sua maioria, são pequenos e
menores que 1 cm, provavelmente porque se rompem B
antes de se tornarem grandes (1 a 2,4 cm) e raramente
são gigantes nessa área (> 2,5 cm).

Classificação
Os diferentes tipos de projeção podem ser defini-
dos com a “face de um relógio” na angiografia em
perfil66.
• Tipo 1 – anterior inferior: aneurismas que se
projetam anterior inferiormente (6 horas) nor-
malmente estão aderidos ao nervo óptico.
• Tipo 2 – anterior superior: a projeção mais co-
mum é anterior e superior (9 a 12 horas). Fig. 10.29 – (A e B) Posicionamento de maneira clássica, exceto
• Tipo 3 – posterior superior: é o mais difícil de pelo menor grau de rotação para melhorar a visualização do seg-
mento A2 contralateral. Maior grau de extensão também é útil,
ser abordado devido às perfurantes e aderência já que projeta o complexo comunicante anterior mais superior e
a perfurantes hipotalâmicas. anteriormente em direção à linha de visão do cirurgião. Muitas
vezes, com essa manobra, a órbita pode se projetar no campo
operatório. A remoção do processo frontal do osso zigomático, do
Tratamento Cirúrgico teto e rima orbitária e a posterior retração anterior da periórbita
Para o tipo 1, melhor via é a pterional (Fig. 10.29), podem ser utilizadas para minimizar esse inconveniente.
com abertura ampla das cisternas, em especial a syl-
viana, onde se pode obter o controle proximal de A1
por meio de clipes bilaterais temporários, que podem
ser colocados em A1 ou no colo do aneurisma, até que A escolha do lado a ser abordado ainda é contro-
se proceda à total dissecção do aneurisma e colocação versa. Muitos cirurgiões preferem abordar pelo lado
do clipe definitivo. dominante (por onde o enchimento do aneurisma é
A via subfrontal deve ser usada se houver, de iní- predominante na angiografia) para se obter o controle
cio, um bom relaxamento cerebral, evitando trauma proximal, e outros sempre pelo lado direito. O clipe
ao encéfalo durante a retração. A via inter-hemisféri- temporário nunca deve exceder 20 minutos, pois há-
ca pode ser a opção em caso de aneurismas gigantes, risco de dano irreversível ao cérebro66.
porém é raramente usada. Essa via fornece boa visu- Segundo Yasargil e Carter68, o aneurisma de com-
alização da artéria cerebral anterior e das perfurantes plexo comunicante anterior localiza-se na junção da
hipotalâmicas, porém requer manipulação bifrontal e A1 mais desenvolvida com o segmento comunicante
retração, podendo acarretar contusões do pólo frontal anterior. Há três posições básicas na origem do aneu-
e conseqüente morbidade67. risma, que podem ser observadas durante a cirurgia68:
A abordagem frontal-orbitária pode oferecer o • Na junção da A1 direita e com complexo co-
campo de visão da via pterional e subfrontal e mui- municante anterior nos casos em que A1 à es-
tas vezes é possível se estender na dissecção propor- querda é hipoplásica. Trabalhos anatômicos
cionando uma abordagem inter-hemisférica66. Nesse mostram 78% de hipoplasias em algum seg-
caso a ressecção de parte do giro reto torna-se des- mento do polígono de Willis em adultos, 57%
necessária. em crianças e 75% em neonatos69,70.

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• Na junção de A1 esquerda. ARTÉRIA CEREBRAL ANTERIOR DISTAL


• Na porção média da artéria comunicante (ANEURISMAS DA ARTÉRIA PERICALOSA)
anterior, nos casos em que A1 bilateral são
iguais. Incidência
Aneurismas grandes ou gigantes são complexos Os aneurismas da artéria cerebral anterior do seg-
e se projetam em múltiplas direções, freqüentemen- mento distal representam 0,35% a 9% dos aneurismas
te com um colo largo que poderia abranger a artéria cerebrais73-81 e 5,6% dos aneurismas da artéria cere-
comunicante anterior sem definição exata dos limi- bral anterior11,82.
tes (caso ilustrativo VIII, Figs. 10.30 a 10.34). Feliz- Esses aneurismas estão relacionados provavelmen-
mente aneurismas múltiplos da artéria comunicante te ao fluxo e ocorrem nas bifurcações83-84. Dos aneu-
anterior são raros devendo-se ter alguns pontos como rismas da artéria cerebral anterior distal, 62% ocorrem
paradigma71: na origem da artéria calosa marginal, 20% na origem
• Em aneurismas bilobulares, projeções espe- da artéria frontal polar no ramo A2, 7% nos ramos da
ciais e angiotomografia com reconstrução em artéria calosa marginal, 2% nos ramos pericentrais e
3D ou angiografia digital com reconstrução 9% nos ramos superiores da artéria pericalosa85.
em 3D devem ser realizadas para se obter um
diagnóstico correto. A diferenciação de dois
aneurismas de um aneurisma bilobular é im- Quadro Clínico
portante para o planejamento cirúrgico pré- Os pacientes apresentam quadros de cefaléia sú-
operatório. bita, seguida de síndrome de irritação meníngea, cuja
• A detecção de rotura do aneurisma nesses ca- TC mostra hematomas em fissura inter-hemisférica
sos é freqüentemente difícil e improvável. anterior junto ao corpo caloso, lobo frontal e giro do
• Ressecção do giro reto é necessária para se ob- cíngulo; freqüentemente pode haver hemorragia intra-
ter boa exposição do campo operatório. ventricular associada. Após o advento da RNM, tem
• Seleção do clipe e seqüenciamento são impor- havido maior número de aneurismas incidentais73.
tantes. Clipes retos com braços curtos devem
ser preferidos para se evitar o estreitamento da Tratamento Cirúrgico e Endovascular
visão do cirurgião e colisão entre os clipes e
oclusão de A1 ou do segmento comunicante. Atualmente o tratamento conservador não tem
Geralmente não é necessário proceder à dissecção mais indicação devido à alta mortalidade, podendo
ao longo da artéria carótida interna até se encontrar chegar a 84,4%17,18. O tratamento endovascular por
a bifurcação, a fim de expor o segmento A165. Disse- molas especiais tem ganhado espaço no tratamento
cacando-se a aracnóide entre o parênquima encefálico desses aneurismas86.
e o nervo óptico, pode-se identificar o segmento A1 A craniotomia deve ser paramediana, desde fron-
ipsilateral, bem como a artéria recorrente de Heubner. tal basal até parietal, dependendo da localização do
Nessa área, às vezes, é muito útil aspirar-se 1 cm³ de aneurisma80,87 (Fig. 10.47). A posição da cabeça deve
tecido cerebral do giro reto para se expor a curvatura ser neutra. Deve-se acessar o espaço inter-hemisférico,
da cerebral anterior entre os segmentos A1 e A2 (caso de preferência, por craniotomia direita, retraindo o lobo
ilustrativo IX, Figs. 10.35 a 10.42). Com essa mano- frontal de maneira cautelosa, com proteção sob as espá-
bra simples, pode-se identificar o H conforme descre- tulas com cotonóides e Surgicel®. Nessa região a foice
ve Yasargil et al.68 formado pelos dois segmentos de do cérebro termina acima do corpo caloso e não separa
A1, comunicante anterior e os dois segmentos de A2, os dois giros do cíngulo, e estas estruturas podem es-
além de se identificar a artéria de Heubner no campo tar aderidas e ser confundidas com o corpo caloso. Os
de visão cirúrgica. giros do cíngulo devem ser cuidadosamente separados
A colocação de dois ou até mesmo mais clipes é e, então, pode-se encontrar o corpo caloso esbranquiça-
uma técnica útil para aneurismas de lobulações não do com as artérias pericalosas deitadas sobre ele81. Na
usuais, com colos não delimitáveis à visão intra- presença do aneurisma o fundo pode estar voltado para
operatória. Durante a cirurgia avaliam-se os clipes a superfície da cisterna, tornan­do-se perigosa a dissec-
e sua utilização, cuja escolha deve levar alguns mi- ção. Deve-se expor a porção proximal das artérias de
nutos30. origem ao aneurisma e, se necessário, realizar clipagem
Ao final da clipagem, pode-se embeber os vasos temporária. Deve-se efetuar a dissecção do colo aneu-
envolvidos na dissecção operatória com Surgicel® e risma e, depois, as aderências entre as duas pericalosas.
papaverina66. A via contralateral pode ser utilizada Então, clipa-se o aneurisma e procede-se à instilação
quando se estiver operando múltiplos aneurismas de papaverina sobre as artérias envolvidas na dissecção
(caso ilustrativo X, Figs. 10.43 a 10.46)72. (caso ilustrativo XI, Figs. 10.48 e 10.49).

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Caso Ilustrativo VIII


MP, 52 anos, sexo feminino. Cefaléia súbita há 1 semana, tratada em outro serviço inicialmente evoluiu com vasoespasmo impor-
tante e hidrocefalia, tendo sido submetida à craniectomia descompressiva. As angiografias convencional e digital demonstraram
aneurisma de artéria comunicante anterior, com enchimento pela direita, e aneurisma paraclinóideo restrito ao seio cavernoso.
Foi submetida à clipagem de aneurisma de comunicante anterior lobulada, com necessidade de aplicação de dois clipes, um reto
e um em baioneta.

A B

Fig. 10.30 – (A e B) Tomografia computadorizada de crânio


sem contraste mostra hematoma em giro reto e grau de hema-
toma cisternal tomográfico Fischer IV.

A B

Fig. 10.33 – Fase aguda, mostrando cérebro com hemor-


ragia pial e aneurisma multilobulado junto ao nervo óptico
(seta).

Fig. 10.31 – (A e B) Carótido-angiografia convencional mostra


aneurisma grande de complexo comunicante anterior multilobula-
do, e aneurisma grande paraclinóideo restrito ao seio cavernoso.

A B

Fig. 10.34 – Após clipagem com dois clipes fenestrados do


tipo Sugita.

Fig. 10.32 – (A e B) A angiografia digital mostra uma visão


mais detalhada dos aneurismas; em relação ao vasoespasmo
pode-se identificar uma redução de calibre dos vasos da artéria
cerebral anterior.

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Caso Ilustrativo IX
LL, 43 anos, sexo masculino, cefaléia súbita, intensa. Chegou ao pronto-socorro com rigidez nucal. A tomografia computadori-
zada de crânio diagnosticou hemorragia subaracnóidea, Fischer III.

Fig. 10.35 – Tomografia computadorizada de crânio de-


monstra inundação cisternal, sylviana e cisternas basais.
Fig. 10.38 – Após incisão curvilínea na pele e rebatimento
em plano único do músculo temporal, faz-se uma trepanação
A B frontal, com intuito de inserir um cateter no corno ventricu-
lar para drenar o líquido cefalorraquidiano para haver relaxa-
mento do cérebro antes de abrir a dura-máter. Deve-se lembrar
que normalmente na fase aguda o cérebro está inchado e essa
drenagem poderá melhorar a tensão do cérebro.

Fig. 10.36 – (A e B) A angiografia mostra volumoso aneu-


risma do segmento comunicante anterior, voltado para fissura
inter-hemisférica, que se enche por A1 à direita.

Fig. 10.39 – Visão panorâmica da craniotomia pterional e


do cateter ventricular inserido no ventrículo após trepanação
frontal.

Fig. 10.37 – Paciente em posição supina, com a cabeça fixa


em cabeceira, rodada 10o para esquerda, com o malar em posi-
ção mais alta e pouca deflexão da cabeça.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

A B C

D E F

Fig. 10.40 – (A) Após craniotomia e abertura dural, acessa-se por via subfrontal, a cisterna óptico-quiasmática e olfatória.
(B) Nesse passo cirúrgico drena-se a cisterna olfatória com o acesso subfrontal, identifica-se a bifurcação da carótida e segue-se
A1 até próximo do aneurisma. Coagula-se o giro reto. (C) Após ressecção do giro reto com coagulação bipolar e aspiração gentil
do tecido, disseca-se o colo do aneurisma com descolador microcirúrgico. (D) Visão cirúrgica mostra o aneurisma dissecado, e
com o bipolar é possível medir o colo e avaliar o tamanho do clipe. (E) Após dissecção, encontram-se A1 bilateral, colo aneuris-
mático dissecado e A2 esquerdo. (F) Visão cirúrgica mostra o primeiro clipe ocluindo o colo aneurismático junto a A1, do lado
direito. (G) Visão cirúrgica mostra os três clipes em paralelo ocluindo completamente o aneurisma.

A B

Fig. 10.41 – Angiografia cerebral pós-operatória mostra cli- Fig. 10.42 – (A) Pós-operatório imediato com completa fun-
pagem adequada do aneurisma e moderado grau de vasoes­ ção motora e nível de consciência. (B) TC de crânio mostra cli-
pasmo. pes em posição paralela e cisternas sem sangue após cirurgia.

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10 – Tratamento Cirúrgico dos Aneurismas da Circulação Anterior

Caso Ilustrativo X
Paciente AMNS, 65 anos. Durante investigação de cefaléia crônica diagnosticaram-se dois aneurismas, um de comunicante ante-
rior do lado direito e outro de comunicante posterior do lado esquerdo. Procedeu-se à craniotomia pterional, em que o aneurisma
à esquerda foi clipeado e, por acesso subfrontal, acessou-se o lado direito pela mesma via, tendo sido necessária a clipagem do
aneurisma de comunicante anterior, cujo enchimento se dava pelo lado direito conforme angiotomografia. A paciente não fez
angiografia cerebral por não concordar com o risco do procedimento diagnóstico.

A B C

Fig. 10.43 – (A) A angiotomografia ântero-posterior esquerda mostra aneurisma do segmento comunicante posterior.
(B) A angiotomografia ântero-posterior mostra aneurisma do complexo comunicante anterior que se enche pela direita. (C) A
angiotomografia em corte de perfil mostra aneurisma do complexo comunicante anterior voltado para frente junto à lâmina
terminal e fissura inter-hemisférica. Dissecção da cisterna valecular e olfativa.

A B C

Fig. 10.44 – (A) Posicionamento clássico, com a cabeça pouco rodada para direita, fixa em cabeceira de Mayfield, e incisão
curvilínea marcada. (B) Após rebatimento do plano musculocutâneo os orifícios de trepanação são feitos, na região frontotempo-
ral (key hole), supra-orbitária, temporal posterior e sobre a linha de inserção do músculo temporal junto ao frontal. (C) Verifica-se
a craniotomia ampla, com ressecção por brocagem da asa esfenoidal, processo clinóideo anterior, parcialmente, e teto orbitário

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

A B C

D E F

G H I

Fig. 10.45 – (A) Dissecção da porção opecular da cisterna sylviana. (B) Dissecção das cisternas basais com saída de líquido
cefalorraquidiano permite melhor relaxamento do cérebro. Consegue-se identificar o nervo óptico esquerdo, a carótida e parte
do colo aneurismático do segmento comunicante posterior. (C) Dissecção do colo aneurismático com o bipolar (ponta de 1 mm
– Kirwain, USA). (D) Preparo do colo com o microdissector (MIzuho, Japan) para aplicação do clipe. (E) Aplicação de clipe reto,
poupando a artéria comunicante posterior, verificando-se a abertura do aplicador de clipe após sua locação. (F) Muda-se o ângulo
de visão do microscópio e inicia-se o acesso contralateral seguido à frente da substância perfurada anterior, iniciando a dissecção
da bifurcação da carótida seguindo A1 até a sua junção com o segmento comunicante anterior. (G) Identificação do aneurisma
de comunicante anterior que se enche por A1 contralateral. (H) Visualização de A1 e A2 bilaterais. Coagulação do fundo do
aneurisma e clipagem com clipe semicurvo de titânio Sugita. (I) Colocação de dois clipes para a completa oclusão do aneurisma
sem obstrução da artéria comunicante.

Fig. 10.47 – Esquema de diferentes craniotomias possíveis para


acesso aos aneurismas da artéria pericalosa. Modificado de Meyer84.

Fig. 10.46 – Paciente em consulta ambulatorial, sem déficits


mostrando a cicatriz da sua incisão 1 ano após a clipagem
(com autorização).

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10 – Tratamento Cirúrgico dos Aneurismas da Circulação Anterior

Caso Ilustrativo XI
Paciente JG, 68 anos, sexo feminino, com cefaléia crônica que durante investigação mostrou aneurisma de artéria pericalosa.

A B

Fig. 10.48 – Angiografia cerebral digital mostra aneurisma de artéria pericalosa em perfil e ântero-posterior.

A B C

Fig. 10.49 – (A) Abertura da fissura inter-hemisférica. (B) Proteção do tecido cerebral com Surgicel® e cotonóides durante a
dissecção; visualização do aneurisma. (C) Dissecção do colo aneurismático e clipagem subseqüente.

Resultados e Complicações ladas dificultam a aplicação dos clipes, podendo pro-


duzir estenoses e oclusões importantes.
Os resultados em aneurismas rotos são piores do
que em não rotos pelos hematomas, hidrocefalia, va-
soespasmo, distúrbios hidroeletrolíticos associados e, ANEURISMAS DA ARTÉRIA CEREBRAL MÉDIA
por vezes, hipertensão intracraniana71. A mortalidade Incidência e Formas de Apresentação
nos graus 0 a III, segundo Hunt e Hess, é em torno de
0% quando operados após a primeira ou segunda sema- Aneurismas que se originam ao longo da arté-
na e de 3% quando operados precocemente11,73,74,76,79,80. ria cerebral média constituem de 19,3% a 25% dos
Os aneurismas múltiplos envolvendo a artéria cerebral aneurismas intracranianos operados88. A incidência
anterior distal devem ser tratados por duas abordagens de aneurismas bilaterais está em torno de 14,9% e
em tempos diferentes. O sangramento sobre o giro do a ocorrência de aneurismas múltiplos é de cerca de
cíngulo poderá acarretar uma síndrome de mutismo 35,1%. O aneurisma acomete o sexo feminino na pro-
caloso84. O infarto venoso pode advir de secção inad- porção de 2:188.
vertida de alguma veia importante na drenagem do Os aneurismas da artéria cerebral média se origi-
pólo frontal. As artérias pericalosas, sendo muito afi- nam normalmente na bifurcação ou na trifurcação,

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

normalmente na porção central da fissura sylviana. até uma grave hemiplegia. Hematoma intracerebral
Raramente têm origem no ramo temporal anterior ou está mais associado com aneurismas da artéria cere-
no ramo lenticuloestriado. Mais rara é sua posição em bral média do que com os outros aneurismas88 (caso
região distal, e estão associados a infecções forman- ilustrativo XII – Figs. 10.50 a 10.52)
do os aneurismas micóticos. Os aneurismas da artéria
cerebral média podem ser em espelho, e muitas ve- Craniotomia
zes apenas pela angiografia torna-se impossível saber
qual sangrou. Podem conter trombos em seu interior e A craniotomia pterional é a de escolha para casos
formar um padrão serpiginoso89. Podem ser múltiplos eletivos, todavia na fase aguda pode-se fazer uma
em uma mesma artéria cerebral média, e ser gigantes craniotomia mais ampla, envolvendo a órbita, o que
com o envolvimento de M1 e M2. ampliaria o campo cirúrgico e permitiria o acesso ao
controle proximal do aneurisma mais facilmente.
Considerações Anatômicas
Na sua origem, a artéria cerebral média representa
Exposição Intradural
duas vezes o diâmetro da artéria comunicante anterior. Deve ser ampla e a dissecção da cisterna é obriga-
O grupo de perfurantes lenticuloestriados se origina tória nos casos eletivos de aneurismas incidentais ou
no segmento proximal da artéria cerebral média, antes após a fase aguda. A cisterna deve ser aberta próxima
da bifurcação ou trifurcação (segmento M1) e penetra à porção orbital do lobo frontal e em sentido proxi-
na substância perfurada anterior que se localiza poste- mal para distal, lateral para medial; por fim deve-se
rior e superiormente. Estes ramos suprem a substância efetuar a abertura da porção distal da cisterna sylvia-
inominada, comissura anterior, putame, porção lateral na. Em múltiplos aneurismas, onde há um aneurisma
do globo pálido, metade anterior da cápsula interna e contralateral de artéria cerebral média (aneurisma em
a cabeça e o corpo do núcleo caudado90. espelho muitas vezes), este pode ser acessado, e tan-
De acordo com Rhoton et al.57, existem 4 a 19 to mais fácil será o acesso quanto mais curto for o
artérias lenticuloestriadas que, no seu curso, estão segmento M193. Na fase aguda, muitas vezes abrir a
intimamente ligadas aos ramos terminais da artéria cisterna torna-se impossível, e por isso procedemos à
recorrente de Heubner. Grand6 descreveu três tipos punção ventricular e acessos ao aneurisma por corti-
de perfurantes calibrosas de acordo com o ponto de cectomia entre o giro temporal superior e médio ou,
origem ao longo da artéria cerebral média: às vezes, pelo próprio hematoma no lobo temporal.
• 14% das perfurantes mais calibrosas são predo- O aneurisma deve ser inteiramente dissecado, as
minantes na primeira metade do segmento M1. perfurantes de M2 que se aderem ao colo ou fundo
• 39% delas se originam da metade distal de M1, aneurismático devem ser isoladas para não ser en-
pouco antes da sua divisão. volvidas pelo clipe. Muitas vezes procede-se à coa­
• 47% delas se originam como perfurantes cali- gulação bipolar do aneurisma (caso ilustrativo XIII,
brosas após a sua maior divisão. O sacrifício Figs. 10.53 a 10.55) para se diminuir a dimensão e fa-
de um ramo neste caso perfurante, com a clipa- cilitar a aplicação do clipe. Muitas vezes, em razão do
gem inadvertida, deve ser evitado91. tamanho demasiado, deve-se aplicar mais de um clipe
Lang e Dehling92 observam que, se o comprimento até se conseguir a clipagem eficaz sem obstrução da
da artéria cerebral média alcançar de 5 a 8 mm até o que artéria principal. Clipagem transitória pode ser neces-
se conhece por bifurcação (segmento M1 longo), então a sária e, então, procede-se à dissecção com dissectores
ocorrência de bifurcação será de 20%. Aguiar et al.70 en- em ângulo reto e microtesouras. Durante a clipagem
contraram uma freqüência de 90% de bifurcações e 10% transitória, o cérebro deve ser protegido com barbi-
de trifurcações, enquanto Lang e Dehling92 encontraram túrico, etomidato ou propofol, além de manter-se o
trifurcação à direita em 43% e à esquerda em 65,4%.
paciente em regime hipertensivo.
Quadrifurcações foram encontradas em cerca de 24% e
em pentafurcações 2,96%. Analisando-se a ramificação Em aneurismas gigantes com o colo séssil de di-
sob esse aspecto, Lang e Dehling encontraram 70% de fícil clipagem e embolização, deve-se pensar no pro-
bifurcações92, Umansky et al. encontraram 71%, com cedimento de bypass. Este pode ser feito também
predomínio maior à direita do que à esquerda8. A distân- utilizando-se a artéria temporal superficial e anasto-
cia da zona de ramificação à entrada da cisterna valecu- mosando-a na artéria cerebral média, ou com a veia
lar ou carotídea é de 24 mm (variação de 11 a 39 mm). safena interposta entre a carótida externa e ramo ca-
libroso da artéria cerebral média, ou ainda, por meio
da artéria radial em algum ramo superior a 2 mm de
Apresentação Clínica diâmetro da artéria cerebral média. Doppler contínuo
Disfunção neurológica pode advir de efeito de intra-operatório ou potencial evocado podem ser uti-
massa do aneurisma, por hemorragia ou vasoespas- lizados com o intuito de se monitorar a clipagem e o
mo, que variam desde uma leve paresia braquiofacial fluxo pós-clipagem94.

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Caso Ilustrativo XII


AG, 47 anos, sexo feminino, que, após discussão verbal e momento de instabilidade emocional, apresentou cefaléia forte e, em
seguida coma, tendo sido levada ao pronto-socorro em escala de coma de Glasgow igual a 4 e anisocoria do lado direito maior
que o esquerdo.

A B C D

Fig. 10.50 – (A) TC de crânio mostra hematoma temporal e insular à direita, profundo, com desvio importante das estruturas
da linha mediana. Paciente em Glasgow 4, com anisocoria e pupila direita maior que esquerda. (B) TC de crânio sem contraste
mostra o hematoma colapsando o ventrículo lateral e cisternas da base. (C e D) TC pós-operatória após drenagem do hematoma
por craniotomia e colocação de cateter para monitoração da pressão intracraniana.

A B C

Fig. 10.51 – (A e B) Angiografia cerebral digital em AP e oblíqua mostrando aneurisma na região da trifurcação da artéria cere-
bral média, com M1 alongado. (C) Angiografia cerebral em perfil mostra o aneurisma projetado para frente, invadindo a ínsula.

Fig. 10.52 – Paciente após drenagem do hematoma e colo-


cação de cateter de monitoração de pressão intracraniana. Foi
reoperada em fase aguda com clipagem do aneurisma.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Caso Ilustrativo XIII


Paciente VA, 42 anos, sexo feminino. Os exames de imagem são referentes a paciente com aneurisma de artéria cerebral média
grande e aneurisma paraclinóideo.

A B C

Fig. 10.53 – Angiografia digital mostra aneurisma de trifurcação de ACM direita, nas posições (A) AP, (B) perfil e (C) oblíqua.

A B

Fig. 10.54 – (A) TC com o uso de contraste iodado mostra aneurisma de artéria cerebral média. (B) A RNM do encéfalo con-
firma o achado.
A B C

D E

Fig. 10.55 – (A) A abertura cisternal inicia-se da porção proximal para a distal e deve ser cortante com bisturi de lâmina 11
e tesoura de microdissecção. (B) Abertura cisternal completa proximal e distal, com exposição do colo e fundo aneurismático.
(C) Com a dissecção proximal e distal do colo aneurismático e suas perfurantes, loca-se o segundo clipe. (D) Após clipagem
coagula-se com bipolar o fundo aneurismático para reduzir seu tamanho e aplicar um segundo clipe. (E) Locação do segundo
clipe, semicurvo em paralelo ao primeiro, ocluindo completamente o aneurisma.

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COMPLICAÇÕES DO TRATAMENTO A B
CIRÚRGICO DOS ANEURISMAS
Intra-operatórias
A rotura do aneurisma durante a dissecção do colo
muitas vezes acarreta hemorragia grave, e a conduta
inicial é colocar um aspirador de alta potência com a
ponta de sucção diretamente acoplada ao orifício de
rotura com uma das mãos enquanto se tenta completar
a dissecção ou clipar o aneurisma com a outra mão.
Segundo Leipizig et al.95 a rotura intra-operatória tem
uma freqüência muito baixa, e é mais provável que
aconteça em aneurismas da artéria cerebelar póstero-
inferior, artéria comunicante anterior e artéria comuni- Fig. 10.57 – (A) TC pré-operatória mostra hemorragia
cisternal esquerda em paciente de sexo feminino, 54 anos.
cante posterior. O risco de rotura é de 7,9% por cirur- (B) Após clipagem do aneurisma de comunicante posterior à
gia, 6,7% por aneurisma e 8,9% por paciente, e, caso esquerda, o outro à direita e no segmento comunicante ante-
se excluam pequenos sangramentos, esse índice cairá rior à direita, a paciente evoluiu com isquemia de tronco cere-
para 3,8% por cirurgia, 3,2% por aneurisma e 4,3% bral por provável obstrução da artéria comunicante posterior.
por paciente, e aumentará em aneurisma previamente
rotos do que em não rotos, 10,7% contra 1,2%. Quan- ANEURISMAS GIGANTES DA
do se usam clipes temporários, esse índice é menor
do que quando não se usam, 3,1% contra 8,6%; não
CIRCULAÇÃO ANTERIOR
houve diferença significativa entre os índices de rotu- Em aneurismas gigantes da circulação anterior,
ra de aneurismas operados até o terceiro dia e, após o deve-se ter o controle proximal em nível carotídeo
mesmo, 11,1% contra 10%, p = 0,623495. Atualmente cervical, estar preparado com clipes temporários1,21
o anestesista deve diminuir a pressão de perfusão ce- e preparado para realizar trombectomia eventual,
rebral neste momento, para permitir a clipagem segu- e para a clipagem definitiva do aneurisma23,62,66,89,97.
ra. Muitas drogas podem ser usadas, inclusive alguns O teste de oclusão deve ser realizado em pacientes
descrevem o uso de adenosina intravenosa neste mo- com aneurismas gigantes da carótida interna e com
mento96. monitoração de EEG contínuo. Esse teste de oclusão
Outra complicação a ser considerada é a obstrução permite um planejamento melhor para a cirurgia em
ou ligadura de perfurantes, ou clipagem de segmentos que há necessidade de realizar um bypass de alto flu-
arteriais com repercussões isquêmicas catastróficas xo, ou até mesmo quando não é possível proceder-se
(Figs. 10.56 e 10.57). à oclusão completa proximal ao aneurisma47,98,99.

Perioperatórias
O Doppler transcraniano pode detectar embolias
após cirurgia de aneurisma, e essa detecção pode ser
confirmada após exames de imagem com a tomografia
de crânio e a deterioração do quadro clínico. A porcen-
tagem de pacientes com embolia é pequena; 11 pacien-
tes de 123, em um período de 1 ano, foram detectados
como portadores de isquemia cerebral decorrente de
êmbolo derivado de coágulos intra-aneurismáticos por
Giller et al.100 Outra complicação que pode surgir no
período pós-operatório, relacionado ou não à cirurgia,
é a hidrocefalia. Normalmente surge 14 dias após a he-
morragia subaracnóidea por aneurisma. Para se evitar
essa complicação, pode ser utilizada a fenestração da
lâmina terminal, reduzindo a necessidade de derivação
ventricular após hemorragia subaracnóidea101.
Fig. 10.56 – Angiografia digital mostra aneurisma do seg-
mento comunicante posterior com colo largo, que abrange a TÉCNICAS ENDOVASCULARES
artéria comunicante posterior, cujo padrão é fetal.
O uso de filetes de cobre em espaço intravascu-
lar dos aneurismas realizado por Mullen et al.102,103

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

pode ser considerado o evento inicial para a fundação para preencher a cavidade aneurismática e diminuir o
das técnicas endovasculares modernas. Serbinenko et índice de recanalização dos aneurismas110. Nos casos
al.104 introduziram a técnica de embolização por meio em que a terapêutica clínica para vasoespasmo falha,
de balões para tratamento das lesões aneurismáticas. o balão intraluminal pode, por técnica endovascular
Balões podem ser usados para ocluir a porção pro- ou angioplastia, reverter a isquemia. Eskridge et al.111
ximal do aneurisma, na altura do colo do aneurisma, mostraram que 61% dos pacientes submetidos a an-
ou para preencher o saco aneurismático22,104,105. Ba- gioplastia por vasoespasmo melhoraram seus déficits
lões endovasculares têm tido uma ação limitada pela neurológicos em 72 horas, com 2% de mortalidade
incapacidade de, em muitos casos, se adaptar à confi- imediata por rotura do vaso. A característica patológi-
guração anatômica do aneurisma, pela necessidade de ca observada após a angioplastia é a rotura muscular
se usar um ou mais balões por procedimento, o poten- e dos componentes não musculares, principalmente
cial de formação de êmbolos que iriam ocluir regiões na camada média dos vasos espásticos112. Pode-se
indesejáveis e o risco de deslocamento precoce do instilar fármacos intraluminais como nimodipina, que
balão. Alguns balões podem preencher parcialmente oferece, em alguns casos, excepcional resultado.
o aneurisma, proporcionando um novo reenchimento Um grande problema que chama a atenção pelo
ou recanalização do aneurisma, acarretando sangra- grande número de aneurismas que vêm sendo embo-
mento incontrolável22,105,106. Índices de complicações lizados é a oclusão incompleta e a recanalização, que
alcançaram 20% em pacientes com graus I e II de he- muitas vezes necessitam ser submetidas à cirurgia
morragia subaracnóidea22. para clipagem. Os aneurismas mais freqüentes que
A grande virada, entretanto, desses índices de alta tiveram de ser operados após embolização por mo-
morbidade e mortalidade se deu com a introdução das las foram os de artéria comunicante anterior, cerebral
molas por Guglielmi et al.107 Pequenas molas metáli- posterior e carótida interna. A presença de molas tor-
cas são introduzidas pelos vasos cerebrais ou dentro na difíceis a dissecção do colo e a clipagem, sendo,
do aneurisma e preenchem todo seu interior, forman- em alguns casos, necessário o envolvimento do aneu-
do uma estrutura firme, moldada à configuração da risma com músculo113. Hoje, com técnica de balão re-
anatomia do aneurisma. As molas são trombogênicas modelador enquanto se inserem as molas, o índice de
em virtude de suas propriedades eletromagnéticas e recanalização é muito baixo.
podem eliminar o aneurisma da circulação. As mo-
las são mais eficazes quando o aneurisma tem 5 mm REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
de comprimento, com colo menor que 5 mm no seu
1. Ausman JI, Diaz FG, Malik GM, Andrews BT, Mc
diâmetro107. As indicações primárias destinam-se aos Cormick P, Balakrishnam G. Management of cere-
pacientes com graus elevados na escala de Hunt-Hess, bral aneurysms: further facts and additional myths.
ou com co-morbidades que os impedem de ser opera- Surg Neurol. 1989;32:21-35.
dos, ou mesmo pacientes que, conhecedores dos ris- 2. Diaz FG, Fessler RD, Vellardo B, Willner H. Anterior
cos do procedimento cirúrgico e da embolização (que circulation aneurysms:surgical approaches. Current
dependem substancialmente da experiência do serviço state of the art. Crit Rev Neurosurg. 1993;3:93-104.
nestas áreas), optam por um procedimento ou outro. 3. Gibo H, Lenkey C, Rothon AL. Microsurgical ana-
A inserção de microcateteres para aplicação das tomy of the supralinoid portion of the internal caroid
molas obedece a uma seqüência detalhada, com vistas artery. J Neurosurg. 1981;55:560-574.
a se evitar deslocamentos indesejáveis das molas. 4. Gomes F, Dujovny M, Umansky F, Ausman JI, Dias
FG, Ray WJ, et al. Microsurgical anatomy of the recur-
Henkes et al.108 em um estudo com oclusão de rent artery of Heubner. J Neurosurg. 1984;60:130-9.
aneurismas por meio de molas, analisaram 1.811 5. Gomes F, Dujovny M, Umansky F, Ausman JI, Dias
aneurismas tratados e obtiveram um índice de bons FG, Ray WJ, et al. Microsurgical anatomy of the an-
resultados em 42% dos pacientes tratados em esca- terior cerebral artery. Surg Neurol. 1986;26:129-41.
la de coma de Glasgow IV e V e um índice de bons 6. Grand W. Microsurgical anatomy of the proximal mi-
resultados de 90% de pacientes com aneurismas não ddle cerebral artery and internal carotid bifurcation.
rotos. O índice geral de complicações isquêmicas foi Neurosurgery. 1980;7:215-8.
de 9%, e de complicações hemorrágicas de 3%. O ín- 7. Umansky F, Montoya Juarez S, Dujovny M, Ausman
dice de morbidade precoce pelo procedimento foi de JI, Diaz FG, Gomes F, et al. Microsurgical anatomy
1,5%, e a mortalidade, de 4,4%108. of the proximal segments of the middle cerebral ar-
Em pacientes com aneurismas com o colo séssil ou tery. J Neurosurg. 1984;61:458-67.
largo, em que a embolização com molas falha, pode- 8. Umansky F, Gomes FB, Dujovny M, Diaz FG, Aus-
man JI, Mirchandanti HG, et al. The perforating
se usar stent como suporte para se evitar que as molas branches of middle cerebral artery: a microanatomi-
inseridas no aneurisma herniem para dentro do vaso cal study. J Neurosurg. 1985;62:261-8.
matriz; trata-se da embolização por molas com supor- 9. Yokoh A, Ausman JI, Dujovny M, Diaz FG, Berman
te de stent109. Atualmente, polímeros não-metálicos, SK, Sanders J, et al. Anterior cerebral artery recons-
como alginato de cálcio, têm sido usados com êxito truction. Neurosurgery. 1986;19:6-35.

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10 – Tratamento Cirúrgico dos Aneurismas da Circulação Anterior

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

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Aneurismas Paraclinóideos
José Alberto Landeiro
Igor de Castro
Sebastião Gusmão
Mário Alberto Lapenta
Marlo Steiner Flores

Introdução oftál­mica se origina da ACI, é de importância crucial


em relação à direção na qual os ACO irão projetar-se

A
grande maioria dos aneurismas intracranianos quando crescerem. A maior parte dos ACO pequenos
é denominada a partir da relação com a artéria se localiza lateralmente ao nervo óptico. Entretanto,
principal. Os aneurismas conhecidos como pa-
quando esses aneurismas se tornam maiores, tendem
raclinóideos (ao lado de) recebem essa denominação
a se projetar sob ou sobre o nervo óptico. Os ACO são
por manterem íntima relação com o processo clinói-
divididos em supra-opticoquiasmáticos – projetando-
de anterior (PCA). Todos os aneurismas da porção
se sobre o nervo óptico e o quiasma (podem se proje-
oftálmi­ca da artéria carótida interna (ACI) que estão
em contato com o PCA, mesmo perfazendo um gru- tar anterior ou posteriormente) e subopticoquiasmáti-
po heterogêneo de lesões, recebem a denominação de cos – projetando-se sob o nervo óptico e o quiasma e
paraclinóideos. em direção à haste hipofisária2.
A primeira descrição de aneurismas carótido-oftál­mi­ Quando uma parte da circunferência da ACI en-
cos (ACO) foi feita por Drake et al.1 em 1968. O ter- contra-se envolvida no colo do aneurisma, e quando
mo paraclinóde surgiu em publicações subseqüentes este é muito grande e preenche a maior parte do espa-
para os aneurismas da porção carótido-oftálmica que ço supra e retrosselar, ele é classificado como global.
tinham origem na parede ínfero-medial2. No entanto, Essas lesões são, provavelmente, as mais complexas
outras publicações dividiram os aneurismas paracli- em relação ao tratamento no território da circulação
nóideos em subtipos como os carotid cave aneurysms anterior.
devido à origem na lesão em relação à depressão ós- A maioria dos autores concorda que esse grupo
sea existente na base da porção intradural da ACI3 e o de aneurismas é especial tanto em relação às carac-
subclinóide. Freqüentemente essas denominações se terísticas clínicas quanto às dificuldades encontradas
misturam, tornando a descrição dos ACO na literatura no tratamento cirúrgico. A incidência de ACO varia
extremamente variável. muito entre as publicações, no entanto geralmente se
Por definição, os ACO são aneurismas da porção encontra em torno de 1,5% a 8%4. Esses aneurismas,
intradural da ACI, surgindo do segmento que é de- podem se manifestar por rotura, causando hemorragia
lineado proximalmente pelo anel dural distal e dis- subaracnóidea. Entretanto, a incidência de aneuris-
talmente por um círculo imaginário ao redor da ACI, mas da ACO não-rotos sintomáticos é muito maior do
imediatamente antes da origem da artéria comunican- que qualquer outro tipo de aneurisma. Nesses casos, a
te posterior. Ocasionalmente essas lesões possuem localização, a projeção e especialmente o tamanho da
dimensões tão grandes, que esses limites não são res- lesão são responsáveis pelos sinais e sintomas neuro-
peitados, podendo o orifício do aneurisma estender-se lógicos. Cerca de 25% a 50% dos ACO são grandes ou
proximalmente ao espaço extradural e distalmente até gigantes e em mais de 50% dos casos manifestam-se
a bifurcação da ACI. sem hemorragia subaracnóidea, mas por sintomas de
A distância entre a ACI e o nervo óptico, parti- compressão. Esses sintomas compressivos ocorrem
cularmente na porção mais anterior, onde a artéria de forma lenta e progressiva sobre a via óptica, po-

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

dendo acometer o nervo, o quiasma e o trato ópticos. Tomografia Computadorizada


A extensão da deterioração visual, que normalmente
se manifesta com defeito no campo visual, depende A TC de crânio é ferramenta diagnóstica na ava-
muito do tamanho e da projeção do aneurisma. Os liação inicial de todos os pacientes. Havendo múlti-
aneurismas subopticoquiasmáticos causam mais alte- plos aneurismas, a localização ou espessura do coá-
rações visuais que os supraopticoquiasmáticos. gulo ao redor das lesões e ou nas cisternas ajudam a
Os ACO subopticoquiasmáticos grandes ou gi- identificar a fonte mais provável da hemorragia. A TC
gantes podem comprimir a haste hipofisária, o hipo- mostra calcificação da parede aneurismática e por-
tálamo e até mesmo as porções mais superiores do ções trombosadas dentro do saco aneurismático. O
tronco encefálico, resultando em sintomas endocrino- reconhecimento desses dois detalhes é essencial para
lógicos ou sinais de compressão de nervos cranianos. evitar complicações devastadoras. Por meio da TC e
Aneurismas supra-opticoquiasmáticos gigantes, que da angiografia, o tamanho da luz do aneurisma pode
se projetam súpero-posteriormente em contato com o ser comparado com o tamanho total do aneurisma. A
encéfalo, podem causar crise convulsiva. Geralmente pneumatização do PCA deve ser pesquisada por cau-
lesões de grandes dimensões estão em contato com sa do risco maior de fístula liquórica no pós-operató-
os giros orbitais do lobo frontal e uma leve retração rio. Na abordagem à base do crânio, o conhecimento
pode determinar rotura precoce. Existem relatos de da anatomia óssea é fundamental, pois a presença
que aneurismas gigantes dessa localização e parcial- e a magnitude do PCA podem definir a escolha da
mente trombosados sejam a causa de embolização, abordagem, intra ou extradural. A anatomia do canal
causando ataques isquêmicos transitórios ou até aci- óptico também deve ser enfatizada. Recentemente, a
dentes vasculares encefálicos isquêmicos extensos. angiografia por TC atingiu alto grau de sensibilidade,
Raramente os aneurismas paraclinóides causam ero- permitindo a distinção entre ACO dos aneurismas do
são do assoalho do seio esfenoidal provocando epis- seio cavernoso6. Exames de última geração, como TC
taxe maciça. com cisternografia tridimensional e meio de contras-
te, também têm sido usados para avaliação da anato-
Um número considerável de ACO é descoberto mia cirúrgica dos aneurismas paraclinóideos7.
incidentalmente quando da realização de exames de
imagem solicitados por outras razões.Também não é
rara a descoberta de ACO em pacientes submetidos à Ressonância Nuclear Magnética
angiografia cerebral para investigação de aneurismas A RNM é o melhor método para demonstrar a ex-
rotos em outras localizações. Em uma análise recente tensão, localização e fases do trombo intra-aneuris-
realizada na Universidade da Virginia, os autores en- mático (Figs. 11.1 e 11.2). Existem publicações en-
contraram 24 aneurismas incidentais em 3.684 angio- fatizando a utilidade e a eficácia da angiografia por
grafias. Os exames haviam sido feitos na investigação RNM no delineamento da anatomia topográfica dos
diagnóstica de outras lesões. Dos 24 aneurismas en- aneurismas paraclinóideos8. Mesmo com o avanço
contrados, 3 eram do segmento carótido-oftálmico5. das técnicas por imagem utilizando TC ou RNM para
Mesmo depois de um quarto de século da primeira evidenciar os vasos cerebrais, a angiografia cerebral
publicação, existem muitas controvérsias a respeito
da definição, sintomas clínicos e tratamento dessas
difíceis lesões.

Diagnóstico
A investigação diagnóstica para ACO pequenos e
rotos é semelhante à realizada para qualquer tipo de
aneurisma roto. Nos aneurismas grandes e gigantes, a
avaliação inicial deve ser dirigida aos sintomas com-
pressivos sobre a via óptica e eixo hipotálamo-hipo-
fisário. O exame do campo visual deve ser sempre
solicitado, independentemente da abordagem cirúrgi-
ca direta, em razão dos riscos de dano da via óptica
durante a cirurgia. Por causa dos efeitos compressi-
vos que alguns desses aneurismas exercem sobre o
eixo hipotálamo-hipofisário, torna-se imprescindível
a avaliação endocrinológica.
As várias modalidades de exame de imagem são Fig.11.1 – RNM em corte coronal evidenciando massa hete-
fundamentais para estabelecer o diagnóstico, o plane- rogênea supra-selar com conteúdo hemático, em relação com
jamento cirúrgico e evitar as complicações. a artéria carótida interna.

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11 – Aneurismas Paraclinóideos

Angiografia Intra-operatória
A angiografia intra-operatória é extremamente im-
portante no tratamento dos ACO, especialmente nos
aneurismas grandes e gigantes. Ela permite avaliar a
obliteração adequada do saco aneurismático, evitando
estreitamento ou oclusão da artéria principal. Permite
avaliar a patência do fluxo, inclusive nos pacientes
submetidos a anastomoses (Figs. 11.3 e 11.4).Nume-
rosos problemas técnicos relacionados com resolução
e posicionamento do aparelho de raios X devem ser
suplantados antes que imagens confiáveis sejam obti-
das. O planejamento prévio e a obtenção de múltiplas
imagens são imprescindíveis para maximizar a técni-
ca e facilitar decisões durante o ato operatório2,10.

Fig. 11.2 – Arteriografia carotídea do mesmo paciente, ob-


servando-se aneurisma globoso parcialmente trombosado.

permanece como o método de escolha. Ainda hoje a


angiografia cerebral é utilizada para testar a sensibili-
dade e a especificidade das técnicas de angiotomogra-
fia e angiorressonância8.

Angiografia Digital
Na avaliação das angiografias cerebrais, um nú-
mero de pré-requisitos deve ser contemplado para se
maximizar as informações a serem obtidas. ACO são
mais comuns em mulheres e em mais de 25% das ve-
zes estão associados a outros aneurismas, principal-
mente lesões em espelho.
Algumas vezes, pequenas lesões no território caró- Fig. 11.3 – Arteriografia pré-operatória de portador de volu-
moso aneurisma intracavernoso, em visão ântero-posterior.
tido-oftálmico podem passar despercebidas. Incidên-
cias especiais, como oblíqua e vertex submentoniana,
são necessárias. A angiografia digital de alta definição
dos quatro vasos cerebrais é essencial para avaliação
completa. Estudos com compressão para a análise de
fluxo contralateral são obrigatórios. Ênfase especial
deve ser dada ao território das artérias comunicantes
anterior e posterior. Esses exames permitem avaliar
fontes potenciais de circulação colateral.
Nos casos de ACO grandes ou gigantes, a posição
e o tamanho do colo aneurismático são, muitas vezes,
de difícil avaliação. Imagens com enchimento rápido
de contraste e em incidência oblíqua podem mostrar
a entrada do jato de contraste em direção ao fundo do
aneurisma. A identificação da projeção do aneurisma e
sua relação com a carótida é fundamental.
Teste de oclusão temporária com balão na ACI du-
rante a angiografia fornece informação sobre o fluxo
de circulação colateral e deve ser considerado para
pacientes que necessitem de oclusão temporária ou Fig.11.4 – Imagem angiográfica em perfil no peroperatório
definitiva4,9. do paciente da Fig. 11.3, submetido ao bypass de alto fluxo,
antes da oclusão da carótida interna.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Tratamento Tratamento Cirúrgico Direto Combinado


As condutas terapêuticas em relação aos ACO vêm A técnica cirúrgica descrita a seguir se limitará à
sendo alteradas consideravelmente desde a publicação abordagem dos aneurismas complexos do tipo glo-
original de Drake1 de 1968, em que o autor preconizava bais, visto que muitos livros-texto de microcirurgia
a abordagem cirúrgica direta para esse tipo de aneuris- vascular já padronizaram as técnicas e táticas a serem
ma. Por causa das dificuldades técnicas na abordagem empregadas nos aneurismas convencionais12.
direta dessas lesões, muitos autores advogaram trata-
mento indireto, como ligadura da artéria carótida co-
mum no pescoço11.Outros adotaram a abordagem di-
Seleção do Paciente
reta com exclusão da lesão12. Com o desenvolvimento Qualquer discussão acerca do tratamento cirúrgico
de procedimentos intravasculares intervencionistas, implica várias decisões críticas a respeito da melhor
parecia que as abordagens cirúrgicas diretas dessas le- conduta a ser tomada. Mesmo a indicação cirúrgica
sões iriam cair em desuso. Mas, pelo contrário, devido mais óbvia deve levar em consideração as possibili-
à complexidade e localização, somadas à alta freqüên- dades de cura e risco anestésico. Isso irá influenciar
cia de lesões de grandes dimensões, ficou provado que na decisão da abordagem direta, indireta e endovas-
a terapia cirúrgica combinada com a endovascular é a cular. Um dos fatores mais importantes nessa decisão
mais eficiente. Essa forma mais atual de tratamento inicial se relaciona com a experiência não só do ci-
intervencionista, que permite oclusão temporária da rurgião mas também de toda a equipe de neurocirur-
ACI proximal ao aneurisma, com balão e aspiração gia vascular. Técnicas muito especializadas são vitais
retrógrada do conteúdo aneurismático, facilita enor- no tratamento de aneurismas gigantes dessa região.
memente a abordagem direta, promovendo exclusão A experiência da equipe de terapia endovascular terá
completa da lesão com cura imediata e definitiva por o mesmo peso na decisão a ser tomada com cada pa-
clipagem13-16 (Figs. 11.5 e 11.6). ciente. Geralmente a abordagem dos ACO gigantes
deverá ser praticada após adquirir experiência com
lesões menores e tecnicamente menos complexas. O
cirurgião deverá apresentar segurança e conforto na
exposição e conhecimento da anatomia da base do
crânio e seio cavernoso. Técnicas de descompressão
e retração do nervo óptico, uso de clipes fenestrados e
várias manobras de oclusão temporária deverão fazer
parte da estratégia cirúrgica.

Craniotomia e Exposição Inicial


A abordagem cirúrgica direta nos aneurismas
gigantes da porção proximal da artéria carótida re-
quer planejamento prévio rigoroso. As necessidades
Fig. 11.5 – Esquema revelando aneurisma paraclinóideo do de oclusão intermitente do vaso principal, proteção
tipo globoso e gigante. A seta mostra um cateter intravascular cerebral, monitoração eletrofisiológica e exposição
com o balão desinflado. máxima da lesão devem ser levadas em considera-
ção. A aplicação de campos estéreis, incluindo a re-
gião cervical, o posicionamento de eletrodos de ele-
troencefalografia e potencial evocado e a colocação
de drenagem lombar ou ventricular são manobras
pré-operatórias importantes. A craniotomia pterional
clássica é usada para as lesões pequenas que envol-
vem o segmento paraclinóide. Para os aneurismas
gigantes, usamos a craniotomia fronto-orbitozigomá-
tica (COZ) descrita por Arnautovic et al.17 Dissecção
ampla da fissura sylviana reduz a pressão de retra-
ção cerebral, prevenindo lesões isquêmicas do lobos
frontal e temporal. Essa exposição alargada facilitará
o manuseio e a aplicação de múltiplos clipes dentro
das cisternas sylviana e carotídea. Também facilita-
Fig. 11.6 – Após inflar o balão, coloca-se um clipe temporá-
rio pós-aneurisma. O aneurisma é esvaziado por sucção atra- rá a oclusão temporária da porção arterial distal ao
vés do balão, permitindo a aplicação de um clipe definitivo. aneurisma. Antes da exposição da porção proximal

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11 – Aneurismas Paraclinóideos

da artéria carótida e do processo clinóide, deve-se de terapia endovascular e aparelhos de raios X. Esse
avaliar, nos estudos de imagem, se o aneurisma está controle não só permite o tratamento de uma rotura
localizado dorsalmente. Se estiver, poderá ser vulne- inadvertida, mas também é utilizado como manobra
rável à colocação de afastador no lobo frontal, po- para esvaziar o conteúdo aneurismático que precede a
dendo romper durante a retração. Numa craniotomia clipagem. Proteção cerebral deve antecipar qualquer
ampla, como a COZ, a retração cerebral se torna mí- tipo de oclusão temporária. Utilizamos supressão
nima ou desnecessária. com barbitúricos associada ao etomidato e propo-
Quando se utiliza cateter lombar, ele permanece fol. Monitoração fisiológica com eletrencefalograma
fechado durante a abertura da fissura sylviana. O con- (EEG) permite verificar se a supressão está sendo par-
teúdo de liquido cefalorraquidiano (LCR) mantém o cial ou total. Quanto maior a supressão, maior o grau
espaço potencial da cisterna, facilitando a dissecação. de proteção. Nos casos de aneurismas grandes com
Quando a fissura encontra-se aberta, se pode abrir o conteúdo trombosado e parede calcificada, o controle
cateter lombar para obter-se maior relaxamento cere- proximal completo se torna crucial e a abertura com
bral. Essa manobra, adicionada ao uso de diuréticos, esvaziamento do saco aneurismático estará indicada.
permite redução significativa da pressão tecidual lo- Remoção completa das lâminas de coágulos pode ser
cal. Dissecação ampla da aracnóide na região da ACI obtida com o auxílio de irrigação do lúmen do aneu-
e do nervo óptico é realizada, de preferência, com ins- risma com solução heparinizada. Após essa manobra,
trumentos cortantes permitindo ampliar a exposição. os clipes definitivos poderão ser aplicados apropria-
damente sem risco de embolização.
Remoção do Processo Clinóide Anterior O controle proximal pode ser realizado em três
localizações, a mais simples no pescoço. Uma inci-
A retirada do PCA foi descrita por vários autores são de 5 cm transversa é realizada abaixo do ângulo
como manobra para ampliar a abordagem na porção da mandíbula, na porção anterior do músculo ester-
proximal da ACI4,6,9,18. Primeiramente, com auxílio da nocleidoocciptomastóideo. Esse músculo é afastado,
pinça bipolar, deve-se delinear um anel semicircular du-
a bainha carotídea é identificada e aberta longitudi-
ral na base de todo o PCA, assim como do canal óptico.
nalmente. Fitas cirúrgicas são colocadas nas artérias
Inspeção meticulosa do teto do canal óptico deve ser
carótidas comum, externa e interna.
feita com o intuito de não se lesar o nervo, muitas vezes
recoberto somente por dura-máter. O retalho dural é re- A segunda opção envolve exposição e oclusão
fletido sobre a ACI, nervo óptico e aneurisma, servindo temporária, seja com clipe, seja com balão na porção
de barreira protetora durante a drilagem do PCA. petrosa da ACI dentro do triângulo de Glasscock. A
O início da drilagem é realizado com brocas cor- dura do assoalho da fossa média é descolada e afas-
tantes, preferencialmente de 2 mm, por serem as mais tada com retratores auto-estáticos. A artéria menín-
seguras e adequadas. Assim que se aproxima do nervo gea média é seguida até o forame espinhoso, onde
óptico, ACI e aneurisma, passa-se a utilizar as brocas é coagulada e dividida. Os limites medial e anterior
de diamante, que, apesar de menos cortantes, apresen- são o nervo trigêmeo e o forame oval, respectiva-
tam a desvantagem de produzir mais calor. Irrigação mente. O nervo grande petroso superficial (NGPS) é
copiosa deverá ser instituída no intuito de prevenir identificado na goteira petrosa, sob a terceira raiz do
lesões térmicas. A remoção por inteiro do PCA for- trigêmeo. A ACI é exposta após a remoção de osso
nece vantagens na exposição tanto da ACI intradural entre o NGPS e o forame espinhoso. O NGPS pode
quanto da porção mais proximal do seio cavernoso. ser sacrificado para melhorar a exposição. A ACI é
A retirada do teto do forame óptico, incluindo o pilar descoberta lateralmente no ponto de intersecção do
óptico, permite a mobilização do nervo óptico sem músculo tensor do tímpano com a trompa de Eustá-
causar compressão contra as paredes ósseas. quio. A parte óssea posterior à artéria na porção la-
Usualmente ocorre pequeno sangramento veno- teral deverá ser preservada a fim de se evitar lesão
so após a retirada do PCA, por abertura do seio ca- da cóclea. Ocasionalmente a ACI poderá ser exposta
vernoso. Isso pode ser facilmente controlado com a sem muita remoção óssea devido à cobertura incom-
colocação de hemostáticos na abertura. A colocação pleta da artéria nessa região. Aproximadamente 10 a
demasiada de hemostático dentro do seio cavernoso 12 mm da ACI poderão ser expostos com drilagem
poderá acarretar lesões de nervos cranianos dessa re- adequada. Cuidados adicionais deverão ser tomados,
gião, sobretudo do nervo oculomotor. Nos casos de pois a extensão do plexo venoso cavernoso, que fre-
PCA pneumatizado, o uso de cera de osso é bastante qüentemente circunda a ACI na porção intrapetrosa,
eficaz na prevenção de fístula de LCR18. pode ser fonte de hemorragia.
A terceira região onde se pode obter controle pro-
ximal é a porção da ACI sob o PCA, entre os anéis
Controle da ACI carotídeos proximal e distal. Esse segmento da ACI é
O controle proximal da ACI influencia a colocação conhecido como segmento clinóideo. Logo após a re-
dos campos operatórios, o posicionamento da equipe tirada do PCA e abordagem do anel carotídeo distal, a

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

ACI poderá ser clipada temporariamente, oferecendo ção da origem da artéria oftálmica. A dissecação do
um controle proximal efetivo. aneurisma inicia-se com a identificação e liberação
O uso de balão endovascular, evitando a neces- do colo. Se este possui localização ainda mais pro-
sidade de exposição cirúrgica do pescoço, também é ximal, a exposição de parte do segmento carotídeo
preconizado. Mesmo com auxílio do balão intra-ar- dentro do seio cavernoso se faz necessária. As fibras
terial, deve-se realizar a clipagem da ACI proximal- aracnóides deverão ser dissecadas com instrumentos
mente à saída da artéria comunicante posterior. cortantes para evitar tração. A identificação da arté-
ria hipofisária superior e de ramos perfurantes para o
nervo óptico é necessária. A artéria oftálmica deve ser
Redução do Aneurisma por Sucção
liberada dissecada do colo aneurismático para preser-
Retrógrada var sua origem da clipagem. Antes da clipagem, a
Nos aneurismas globosos e volumosos, a redução manobra de sucção deverá ser realizada. A retração
do volume por aspiração constitui a manobra mais suave e intermitente do nervo óptico pode ser neces-
útil que antecede a clipagem definitiva do aneurisma. sária. A mobilização do nervo óptico é facilitada pela
Desde o relato técnico original descrito por Batjer e remoção do teto do canal e abertura do folheto dural
Samson, várias modificações surgiram com a mesma que o envolve.
finalidade: diminuir o volume do saco aneurismá- No tratamento dos aneurismas gigantes, a expo-
tico, evitando a rotura e facilitando a clipagem13,14. sição da origem das artérias comunicante posterior
O saco aneurismático também pode ser esvaziado e coroidéa anterior é obrigatória antes da clipagem.
com punção direta, mas isso requer a oclusão pro- Antes da clipagem definitiva, um dissector de pon-
ximal e distal da ACI. A manobra descrita por Ba- ta romba deverá ser introduzido nos locais onde as
tjer e Samsom, também conhecida como manobra de extremidades do clipe irão se posicionar, permitindo
Dallas, requer a oclusão temporária da ACI proximal a identificação da profundidade. Durante essa mano-
à artéria comunicante posterior. Em casos de artéria bra o aneurisma poderá ser esvaziado para facilitar a
comunicante posterior patente, o fluxo colateral para verificação. A causa mais freqüente de rotura decorre
as artérias cerebral média e anterior estará, pelo me- da tentativa precoce de clipagem antes da dissecação
nos teoricamente, preservado. No pescoço, a oclusão completa e apropriada do aneurisma.
das artérias carótidas comum, externa e interna iso- Aneurismas ateroscleróticos ou com a parede den-
lará o segmento que contém o aneurisma. A sucção samente calcificada devem ser dissecados com mais
poderá ser realizada com o auxílio de um angiocate- cuidado, pois a perfuração poderá ocorrer no colo, ar-
ter no 18. A pressão de sucção deverá ser suficiente téria principal ou ramos. Logo após a clipagem, pode-
para esvaziar o aneurisma, mas sem aspirar o san- se fazer a abertura do saco aneurismático e evacuação
gue retrogradamente distal à clipagem temporária. dos trombos. Os trombos mais duros podem ser reti-
Arnautovic et al.17 descreveram, em 1998, a técnica rados com o aspirador ultra-sônico.
de diminuição do saco aneurismático que apresenta o
mesmo princípio. O neurorradiologista intervencio- Aplicação Definitiva do Clipe
nista coloca um cateter, por via femoral (método de
Seldinger) no nível da ACI cervical; o balão da ponta Depois da dissecação e mobilização do colo aneu-
do cateter é inflado, ocluindo a artéria proximalmen- rismático, é feita a escolha do clipe. Entre as muitas
te. Após a clipagem da ACI distal ao aneurisma, o variantes, uma das mais relevantes é a orientação da
conteúdo é aspirado. Essa técnica, apesar de menos dimensão mais longa do colo aneurismático em rela-
invasiva, apresenta desvantagens quanto à necessi- ção ao eixo mais longo do vaso principal. Exceto nos
dade de heparinização por um certo período e, ainda, aneurismas de colo estreito, o clipe deve ser aplicado
em relação ao congestionamento de equipamento de ao longo do eixo do vaso principal, prevenindo seu
imagem ao redor da mesa cirúrgica. estreitamento. A clipagem não deve ser na base do
aneurisma, para evitar o estreitamento da ACI. A an-
giografia intra-operatória tem papel primordial nessa
Dissecação do Aneurisma questão. O uso de Doppler também é útil para ve-
O material de microcirurgia vascular deve ser o rificar o fluxo no vaso principal. A preservação dos
mais completo possível. As pontas de aspiradores vasos perfurantes que se dirigem para a haste hipofi-
utilizadas na drilagem do PCA deverão ser trocadas sária e nervos ópticos é essencial. Vários tamanhos e
por novas pontas. A rotura aneurismática parece estar configurações de clipes podem ser necessários para a
mais relacionada à dissecação romba que à cortante. obliteração completa do aneurisma sem comprome-
A exposição completa do segmento carotídeo no qual ter o lúmen da ACI. Os aneurismas gigantes são pro-
o aneurisma se encontra, às vezes, requer abertura do pensos a pulsar e expulsar clipes mal posicionados.
folheto interno da dura-máter ao longo da face late- A hipotensão arterial isoladamente não é suficien-
ral do nervo óptico. Isso proporciona melhor exposi- te para diminuir a tensão do aneurisma a ponto de

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11 – Aneurismas Paraclinóideos

facilitar a clipagem. Durante a obtenção de contro- bem posicionado, o aneurisma poderá encher intermi-
le proximal e distal, a hipotensão é contra-indicada. tentemente devido a uma pequena abertura no clipe.
Recomenda-se o uso de proteção cerebral no início Os clipes novos e com pressão adequada devem ser
das manobras de sucção, e desde a primeira oclusão empregados em aneurismas de parede espessa. Em
vascular. alguns casos, a colocação seriada de clipes pode ser a
Os aneurismas gigantes, invariavelmente, estão manobra mais adequada. Atenção redobrada deve ser
aderidos às estruturas circundantes, incluindo nervo dada à possibilidade de diminuição do calibre do vaso
óptico, quiasma, hipotálamo e nervo oculomotor. Ten- principal. Invariavelmente, clipes angulados fenestra-
tativas de obliterar o colo aneurismático sem proceder dos são requeridos para obliterar aneurismas gigantes
à liberação do fundo freqüentemente resultam em tor- globosos ventralmente posicionados, na tentativa de
ção ou compressão do vaso principal, ou até mesmo reconstruir o vaso principal (Figs. 11.7 e 11.8). Ori-
falha na oclusão do colo. Assim, a dissecação meticu- ginalmente publicada por Vadja et al.19, a abordagem
losa do fundo do aneurisma durante oclusão temporá- contralateral de aneurismas pequenos é possível e se-
ria com sucção é aconselhada. Apesar de o clipe estar gura (Fig. 11.9).

A B C D

Fig. 11.7 – Angiografia digital pré-operatória na qual se observam, em imagem ântero-posterior (A) e lateral (B), volumoso
aneurisma paraclinóideo globoso e outro menor, do tipo carótido-oftálmico. Angiografia digital no pós-operatório em visão
ântero-posterior (C) e lateral (D) após clipagem.

A B C D

Fig. 11.8 – Angiografia digital pré-operatória em posição ântero-posterior (A) e lateral (B), demonstrando volumoso aneurisma
paraclinóideo do tipo globoso e expansão infra-opticoquiasmática. No pós-operatório, imagens angiográficas em ântero-posterior
(C) e lateral (D). A carótida está preservada com fluxo normal e observa-se, na visão lateral, a artéria oftálmica.

A B C D

Fig. 11.9 – Imagens de angiografia digital obtidas no pré-operatório, observando-se, em visão lateral, do lado direito (A) aneu-
risma da artéria carótida interna no nível da artéria comunicante posterior que havia sangrado. No mesmo paciente, aneurisma
carótido-oftálmico dirigido medialmente, assintomático. No pós-operatório, imagens de angiografia em ântero-posterior direita
(C) e esquerda (D) após clipagem. O aneurisma carótido-oftálmico foi clipado contralateralmente no mesmo tempo cirúrgico da
clipagem do aneurisma do segmento carótida–comunicante posterior.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Complicações nativa para a opção de tratamento indireto, como, por


exemplo ligadura da artéria carótida comum no pesco-
As complicações devem ser prontamente tratadas e, ço. Existe pouca dúvida quanto à conduta nos aneuris-
preferencialmente, prevenidas. As complicações pós-
mas gigantes encontrados de forma incidental. Sabendo
operatórias de ACO cursam com alta morbidade e morta-
lidade. Dentre as mais freqüentes, destacam-se as lesões que esses aneurismas causam comprometimento visual
da via visual, principalmente o nervo óptico, as fístulas e distúrbios endócrinos e cursam com hemorragia su-
liquóricas e também as complicações isquêmicas. baracnóidea, a abordagem direta, na maioria das vezes,
Retração da via visual e remoção da clinóide an- é aconselhada. Esses pacientes devem ser operados em
terior são duas manobras que podem comprometer a centros onde as cirurgias vasculares e da base do crânio
visão. Isquemia é o mecanismo mais comum de le- são realizadas rotineiramente.
são durante a primeira manobra, e calor e trauma são Com o desenvolvimento de novas técnicas cirúr-
os mecanismos mais comuns relacionados à última. gicas para abordagem direta dos aneurismas para-
A descompressão completa do canal óptico diminui clinóideos se tornou possível não só excluir a lesão
a chance de comprometimento isquêmico. O instru- vascular com segurança e preservar o fluxo da artéria
mento-chave para remoção da clinóide anterior e des- principal, mas também preservar a função visual. A
compressão do canal óptico é a freza de alta rotação. piora da acuidade visual após a cirurgia de aneuris-
O uso de brocas cortantes intercaladas com brocas mas paraclinóides é pouco comum nos dias de hoje.
diamantadas, conjugado a copiosa irrigação, é fun- O tratamento atual dos aneurismas paraclinóideos
damental. A irrigação com solução salina fria evita não reflete somente o grau de refinamento em mi-
propagação e desprendimento de calor. A freza, mais croneurocirurgia, mas também demonstra e estimula
do que em qualquer outra área do sistema nervoso, as intervenções combinadas com a neurorradiologia
deve ser ergonomicamente adequada. Deve ser angu- intervencionista na abordagem de lesões complexas
lada e facilmente ajustável na mão do cirurgião. Pre- como os aneurismas paraclinóides.
ferencialmente, as frezas devem ser controladas por
pedais, permitindo maior liberdade no manuseio. As-
piradores com irrigação são excelente auxílio durante Referências bibliográficas
o procedimento de brocagem. 1. Drake CG, Vanderlinden RG, Amacher AL. Carotid-
As fístulas liquóricas podem surgir em diversas ophthalmic aneurysms. J Neurosurg. 1968;29:24-31.
circunstâncias. Uma clinóide anterior pneumatizada 2. Almeida GM, Shibata MK, Biaco E. Carotid-ophthal-
apresenta conexões com os seios esfenoidais ou, mais mic aneurysms. Surg Neurol. 1976;5:41-5.
raramente, etmoidais. Com a abertura do seio e lesão 3. Kobayashi S, Kyoshima K, Gibo H. Carotid cave
da mucosa, o caminho para a fístula está feito. Se a aneurysms of the internal carotid artery. J Neurosur-
mucosa encontrar-se intacta após a abertura do seio, a gery. 1989;70:216-21.
simples colocação de cera de osso será suficiente. Po- 4. Dolenc VV. A combined epi- and subdural direct
rém, se houver lesão da mucosa, deverá ser colocada approach to carotid-ophthalmic artery aneurysms. J
Neurosurg. 1985;62:667-72.
gordura autóloga e cola de fibrina. Recomenda-se o
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uso cateteres de drenagem liquórica lombar para tor- Prevalence of asymptomatic incidental aneu-
nar a correção mais segura. rysms: review of 4568 arteriograms J Neurosurg.
As complicações isquêmicas parecem ser muito 2002;96:43-9.
mais freqüentes nas abordagens indiretas, chegando 6. Gonzalez LF, Walker MT, Zambramski JM, Partovi
a cerca de 35% nos casos de ligadura planejada de S, Wallace RC, Spetzler RF. Distinction between
vaso proximal4,20. A morbidade em relação a fenôme- paraclinoid and cavernous sinus aneurysms with
nos tromboembólicos também é freqüente. Algumas computed tomographic angiography. Neurosurgery.
vezes a aparência peroperatória da aplicação ideal do 2003;52(5):1131-7.
clipe, com obliteração do aneurisma e manutenção da 7. Ito K, Hongo K, Kakizawa Y, Kobayashi S. Three-
permeabilidade da ACI, pode enganar. Existe relato dimensional contrast medium-enhaced computed
tomographic cisternography for preoperative evalua-
do surgimento de hiperfluxo após clipagem do colo
tion of surgical anatomy of intradural paraclinoid an-
de aneurisma paraclinóideo gigante. O uso de angio- eurysms of the internal carotid artery: technical note.
grafia peroperatória e/ou Doppler parece minimizar a Neurosurgery. 2002;51(4):1089-92.
incidência de tais complicações. 8. Nagasawa S, Degushi J, Tanaka H, Kawanishi M,
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11 – Aneurismas Paraclinóideos

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Aneurismas Gigantes e Complexos
Helder Tedeschi
Mario Octavio Lourenzi
Evandro de Oliveira

INTRODUÇÃO pelo aneurisma, manifestando-se como disfunção de


nervos cranianos, déficit visual, hemiparesias, crises

A
neurismas gigantes representam um subgru- convulsivas ou cefaléia.
po de aneurismas intracranianos cujo diâme-
tro alcança ou excede 25 mm nos exames de A apresentação clínica dos pacientes está relacio-
angiografia cerebral. Esses aneurismas representam nada com a localização e/ou o tamanho do aneurisma,
de 5% a 8% de todos os aneurismas intracranianos e sendo a “síndrome do seio cavernoso”, com dor facial
60% ocorrem na artéria carótida interna. Distribuem- e oftalmoplegia, o achado mais freqüente (aneurisma
se ainda de maneira semelhante pelo restante da cir- intracavernoso da artéria carótida interna). O segundo
culação cerebral, com discreto predomínio pelo topo achado mais freqüente é o comprometimento dos cam-
da artéria basilar (15%) e menor freqüência na artéria pos visuais, relacionado a aneurismas gigantes da arté-
vertebral (5%). ria carótida interna supraclinóidea (de longe os aneuris-
Essa entidade patológica apresenta grande varia- mas gigantes mais comuns). A história natural desses
bilidade em angioarquitetura, estrutura de parede e aneurismas após sua manifestação inicial é bastante
na sua hemodinâmica. Alguns desses aneurismas são sombria, e a grande maioria dos pacientes veio a óbito
saculares, com paredes finas e colos relativamente pe- ou sofreu morbidade grave ao cabo de poucos anos.
quenos, comportando-se como outros aneurismas ce- Aneurismas gigantes representam grandes desafios
rebrais, embora com tamanho avantajado. No entan- em termos de terapêutica. O espectro terapêutico é va-
to, outros se apresentam como entidades muito mais riável, assim como a resposta dessas lesões ao trata-
complexas, podendo alargar ou incorporar o vaso de mento. O tratamento dos aneurismas gigantes tem-se
origem, assim como seus ramos. Podem, ainda, se beneficiado dos avanços na angiografia e métodos de
apresentar com espessuras de parede variadas e vul- imagem, das técnicas endovasculares, da angiografia
nerabilidade para romper junto ao colo, ou estar asso- intra-operatória e dos avanços das técnicas anestési-
ciados a trombose intra-sacular (trombose e acidentes cas, proteção cerebral, terapia intensiva e reabilitação.
isquêmicos ocorrem em 2% a 5% dos aneurismas Assim, atualmente as opções de tratamento incluem a
gigantes) ou calcificações, dificultando sua oclusão cirurgia direta, técnicas endovasculares ou a combina-
pelos métodos tradicionais de clipagem. ção de ambos. O tratamento cirúrgico depende prin-
As formas de crescimento, assim como a propen- cipalmente de seu tamanho, localização, relação com
são à rotura (contrariamente ao que se supunha, esta é a circulação cerebral e suas características de parede.
semelhante à dos aneurismas menores) e os mecanis- Alguns aneurismas gigantes podem ser abordados
mos de manifestação não hemorrágica, são variados. cirurgicamente como aneurismas menores, utilizan-
Aneurismas gigantes podem causar efeito de massa do-se de métodos modernos de exposição e técnicas
afetando o parênquima adjacente, nervos cranianos microcirúrgicas (incluem-se aqui as técnicas de cli-
ou, ainda, distorcendo vasos sangüíneos. Setenta a pagem e ressecção da lesão, anastomose vascular e
setenta e cinco por cento dos pacientes apresentam aneurismorrafia com reconstrução arterial), proteção
sintomas decorrentes do efeito de massa causado cerebral, clipagem temporária e descompressão do

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

aneurisma. No entanto, em proporção considerável, As técnicas endovasculares utilizam-se de balões


os aneurismas gigantes, como é o caso daqueles da para obstrução vascular e trapping do aneurisma, nos
circulação posterior, continuam a apresentar dificul- casos em que tal obstrução é tolerada (principalmente
dades ao tratamento e a requerer o desenvolvimento utilizada nos aneurismas da artéria carótida interna,
de estratégias terapêuticas inovadoras. em especial os intracavernosos). Devido a sua mor-
De maneira alternativa, técnicas cirúrgicas indire- bidade, tal procedimento tem sido substituído pelos
tas incluem oclusão proximal e trapping do aneurisma. chamados coils destacáveis, desenvolvidos por Gu-
A ligadura do vaso de origem, descrita por Hunter1, é glielmi para oclusão intraluminal dos aneurismas gi-
ainda utilizada como forma de tratamento em algumas gantes. Fenômenos trombóticos a distância causados
situações devido aos riscos ou impossibilidade de uma pela migração inadvertida dos coils pela luz do vaso
cirurgia direta. A ligadura do vaso de origem possui têm sido contornados com o uso de stents arteriais e,
risco significativo de acidente vascular isquêmico. Tal embora ainda distantes de resultados definitivos, es-
risco com a ligadura abrupta da artéria carótida co- tes constituem uma promessa no tratamento de tais
mum era de 32% e com a ligadura da artéria carótida lesões.
interna de 59%. Com a oclusão gradual com o cha- Outra opção de tratamento para os aneurismas gi-
mado clamp de Selverstone® o risco era reduzido para gantes é o uso de técnicas combinadas. Assim, pode-
24% a 41%, respectivamente (Fig. 12.1)2. se utilizar bypass vascular para refazer-se a circula-
Nos casos em que o paciente é incapaz de tolerar ção de determinado território e realizar-se a oclusão
a oclusão vascular, pode-se lançar mão de procedi- subseqüente do vaso principal. De maneira alternati-
mentos em que se utiliza bypass vascular (arteriais ou va, pode-se combinar bypass vascular com trapping
com veia safena) com trapping ou oclusão vascular endovascular ou coilling de aneurismas gigantes em
subseqüente (Fig. 12.2). casos selecionados (Figs. 12.3 a 12.6).

A B C

D E F

Fig. 12.1 – Teste de oclusão com balão. (A) Angiografia cerebral com subtração digital de aneurisma gigante sintomático da
artéria carótida intracavernosa direita. (B) Angiografia cerebral com subtração digital, em que se observa o balão ocluindo a
artéria carótida interna direita. (C a F) Imagens subseqüentes à oclusão com intervalos de 1’’, mostrando a perfusão simétrica e
concomitante de ambos os hemisférios (teste positivo para tolerância à oclusão).

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12 – Aneurismas Gigantes e Complexos

A B

C D

Fig. 12.2 – Falha no teste de oclusão com balão. (A) Aneurisma gigante sintomático da artéria carótida intracavernosa es-
querda, submetido a teste de oclusão com balão. (B a D) Falha de perfusão concomitante de ambos os hemisférios após intervalo
superior a 15’’.

A B

Fig. 12.3 – Aneurisma global gigante, parcialmente trombosado, da artéria carótida interna esquerda. Angiografia cerebral
com subtração digital pré-operatória da artéria carótida interna esquerda. (A) Vista oblíqua anterior direita. (B) Vista em perfil.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

A A

B
B

C C

Fig. 12.5 – Angiografia por tomografia com reconstrução


Fig. 12.4 – Angiografia cerebral com subtração digital pós- tridimensional de 64 canais (multislice), mostrando o enxerto
operatória (A) e pós-oclusão endovascular da artéria carótida vascular entre as artérias carótida externa e cerebral média
interna, mostrando permeabilidade do enxerto e da circulação esquerdas em portador de aneurisma gigante (controle do caso
cerebral (B) e o posicionamento dos balões (C). anterior). (A) Visão oblíqua. (B) Visão coronal. (C) Visão axial.

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12 – Aneurismas Gigantes e Complexos

pacientes irão tolerar a oclusão vascular permanente.


Embora elegante como proposição clínica, o teste não
é isento de morbidades isquêmica e embólica, pois
mesmo os pacientes que tenham passado no teste de
30 minutos de oclusão com balão podem desenvolver
isquemia tardia. A formação de aneurismas de novo
em indivíduos que tenham sofrido ligadura arterial
não pode ser negligenciada e constitui entidade clí-
nica bem definida. A taxa de morbidade associada ao
bypass é pequena em mãos experientes, razão pela
qual alguns serviços mundiais adotam a revasculari-
zação universal, ou seja, realiza-se bypass na grande
maioria dos indivíduos cujo sacrifício vascular seja
previsto.
Entre as lesões patológicas nas quais o uso do
Fig 12.6 – Foto cirúrgica do enxerto vascular entre as arté- bypass pode ser útil, se encontram os aneurismas in-
rias carótida externa e cerebral média esquerdas. tracranianos, em particular os gigantes ou localizados
em áreas de difícil acesso cirúrgico. O tratamento en-
dovascular em aneurismas gigantes, particularmente
TÉCNICAS DE REVASCULARIZAÇÃO em casos de conduta cirúrgica difícil, tem-se mostra-
do ineficiente2.
CEREBRAL
Em nosso meio, o uso do bypass de alto fluxo, ar-
O risco de produzir-se isquemia nos territórios terial ou de veia safena, para aneurismas complexos
cerebrais nutridos por vasos afetados pelo aneurisma iniciou-se em 1992. Tinha como objetivo a revascula-
gigante levou ao desenvolvimento das técnicas de re- rização cerebral em situações em que a artéria de ori-
vascularização cerebral. gem do aneurisma deveria ser sacrificada e o territó-
A técnica de bypass como parte do tratamento de rio vascular não era irrigado por outro tronco arterial
afecções vasculares cerebrais não é recente. Yasargil de forma eficiente. Em 1997, introduzimos o conceito
desenvolveu a técnica experimentalmente e a introdu- de bypass profilático, cuja indicação se dá aos aneu-
ziu na prática clínica em 19693, realizando o bypass rismas complexos, em que se prevê a possibilidade
entre a artéria temporal superficial e a artéria cerebral de clipagem transitória prolongada. No mesmo pro-
média. A técnica passou por um uso indiscriminado cedimento cirúrgico interpõe-se um enxerto arterial
mundialmente e caiu em descrédito após a publicação ou de veia safena entre a artéria carótida externa e a
do estudo randomizado internacional sobre bypass cerebral média ou a artéria cerebral posterior, no caso
em 19854-7. de patologia do sistema vertebrobasilar. Essa técnica
A melhor seleção dos casos submetidos à técnica permite obter-se o tempo necessário para o tratamen-
tem, aos poucos, ressuscitado a utilização do bypass to adequado do aneurisma sem o risco de isquemia
vascular. Várias foram as técnicas descritas na litera- iatrogênica determinada por uma clipagem transitória
tura nesta última década, com diferentes experiências prolongada, já que o enxerto venoso assegura, des-
e muitas variações para o tratamento dos aneurismas de o primeiro momento, um alto fluxo semelhante ao
complexos, tanto da circulação anterior como da pos- da artéria cerebral média. O neurocirurgião é, então,
terior5-9. capaz de tratar o aneurisma sem o limite de tempo
Pode-se deduzir, da análise histórica desses proce- imposto pela clipagem temporária.
dimentos, que a escolha tanto do vaso doador como
do receptor do bypass, assim como a interposição de INDICAÇÕES PARA REVASCULARIZAÇÃO
enxerto, é muito variável e depende da afecção trata- CEREBRAL
da e do fluxo sangüíneo requerido10. Indivíduos com
doença vascular oclusiva cerebral ou com tumores A indicação para revascularização aos portadores
que requeiram revascularização já sofriam com um de aneurismas cerebrais gigantes é feita quando a ex-
estreitamento vascular crônico, promovendo o desen- clusão do aneurisma e a preservação do fluxo sangüí­
volvimento de uma circulação colateral. Diferente é neo distal à lesão não puderem ser realizadas pelas
o caso dos indivíduos cuja oclusão vascular se faz de técnicas usuais de clipagem e reconstrução arterial.
maneira aguda durante o tratamento de aneurismas Assim, consideram-se como fatores indicativos a lo-
cerebrais. O teste de oclusão temporária endovascu- calização, o tamanho e as características anatômicas
lar com balão, seguido de exame neurológico e estu- (calcificação parcial, trombo intra-aneurismático, ate-
dos de metabolismo de fluxo sangüíneo cerebral, tem romas, lobulações, inclusão de vasos no saco aneuris-
sido proposto como medida para se determinar quais mático, colo largo, emergência de vasos etc.).

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Como exemplos, podem-se citar: aneurisma sinto- diferença significativa no tempo de enchimento ve-
mático da artéria carótida interna em porções cervical noso (diferença maior que 4 segundos) no lado em
e petrosa não tratáveis; aneurismas da artéria caróti- que se interrompe o fluxo carotídeo, seja por meio da
da interna, porção cavernosa, com manifestação clí- aplicação endovascular de balão, seja por compressão
nica ou de crescimento rápido; aneurismas grandes carotídea externa manual.
e gigantes da artéria carótida interna supraclinóidea; Uma conduta geral conservadora, com a realiza-
aneurismas grandes e gigantes da artéria cerebral ção de bypass profilático em todos os pacientes nos
média, que geralmente apresentam ramos originados quais se prevê uma interrupção aguda do fluxo ca-
de sua parede; aneurismas de topo da artéria basilar rotídeo, pode-se basear no fato de que até 6% a 10%
que incorporam o segmento P1 da artéria cerebral dos pacientes com teste de oclusão por balão negativo
posterior ou a artéria cerebelar superior; aneuris- apresentam sinais de isquemia crônica.
mas grandes e gigantes da artéria cerebral anterior; e
A utilização do bypass profilático se faz, no mes-
aneurismas dissecantes da artéria vertebral, da junção
mo ato cirúrgico, em todos os pacientes com aneu-
vertebrobasilar, do tronco da basilar, artéria cerebelar
superior, artéria cerebelar ântero-inferior, artéria ce- rismas cerebrais complexos considerados operáveis,
rebelar póstero-inferior. com base na análise angiográfica pré-operatória, e
nos quais se prevê um tempo prolongado de clipagem
O bypass profilático foi idealizado como forma
temporária da artéria carótida interna.
de se evitar as complicações cirúrgicas de natureza
isquêmica ocorridas durante o tratamento de aneu-
rismas paraclinóideos complexos. Citam-se como Avaliação da Reserva Cerebrovascular
exemplo os aneurismas originados da parede inferior A avaliação neurorradiológica dos portadores de
da artéria carótida interna, cujo fundo se dirige infe- aneurismas gigantes deve incluir pelo menos TC de
riormente. Em razão da necessidade de reconstrução crânio sem contraste, RNM-difusão e angiografia ce-
do lúmen arterial, essa situação requer, na maioria das rebral digital dos quatro vasos com subtração. A an-
vezes, clipagem temporária prolongada, o que expõe giotomografia de crânio com reconstrução 3-D mul-
o paciente ao risco de complicações isquêmicas. O tislice tem-se mostrado excelente complementação à
bypass profilático tem como função assegurar um
angiografia digital e pode mostrar detalhes das rela-
fluxo sangüíneo adequado ao hemisfério cerebral em
ções da lesão com estruturas vasculares e ósseas im-
casos nos quais se prevê um tempo de clipagem tem-
portantes (por exemplo, clinóide anterior, no caso de
porária prolongado da artéria carótida interna.
aneurismas paraclinóideos, e dorso selar, no caso de
Medidas que visam permitir trabalhar-se com um aneurismas do ápice da basilar). A RNM ponderada
tempo de interrupção do fluxo sangüíneo mais prolon- em difusão pode detectar alterações isquêmicas sutis
gado, tais como a cirurgia com paciente hipotérmico e prever baixa tolerância à oclusão arterial prolonga-
e em parada cardíaca, foram descritas na literatura. da. Estudos quantitativos de fluxo pelo uso de SPECT
A cirurgia no paciente em parada cardíaca oferece
podem ser utilizados como medida adjuvante com re-
maior tempo de interrupção do fluxo sangüíneo du-
sultados preditivos semelhantes à RNM em difusão.
rante o qual se pode realizar o tratamento adequado
do aneurisma (clipagem, dissecção com ou sem res- Talvez o teste de avaliação da reserva cerebrovas-
secção do saco aneurismático, exérese de trombose, cular mais importante a ser realizado em portadores de
reconstrução arterial). A cirurgia no paciente em pa- aneurismas gigantes e, em especial, naqueles em que
rada cardíaca, no entanto, antevê um limite de tempo um período de oclusão vascular prolongado é anteci-
de aproximadamente 50 minutos, o que nem sempre pado, é o teste de oclusão vascular com balão realiza-
é suficiente; além disso, é tecnicamente complexa e do durante o exame de angiografia cerebral digital.
apresenta riscos inerentes ao próprio procedimento. Com o paciente consciente, em regime de normo-
Uma das vantagens do bypass é a possibilidade de tensão arterial, no qual uma artéria (geralmente a ar-
tratamento definitivo do aneurisma, sem o tempo téria carótida interna) é temporariamente ocluída por
como fator limitante, uma vez assegurada a circula- um balão endovascular não destacável por períodos
ção distal pelo enxerto venoso. de até 20 minutos, realiza-se monitoração de parâme-
O uso do bypass profilático se justifica, ainda, tros neurológicos e neurofisiológicos (EEG), atesta-
quando existe afecção carotídea bilateral (aneurismá- se a permeabilidade do polígono de Willis e o tempo
tica, oclusiva/ateromatosa, traumática, etc.) que pos- de perfusão comparativo de ambos os hemisférios
sa colocar esses vasos em risco de obstrução imediata cerebrais. Além disso, pode-se induzir a períodos de
ou futura. Outra situação que justifica a colocação do hipotensão controlada nos indivíduos que toleraram a
bypass de modo profilático é a ausência de fluxo san- oclusão na tentativa de prever isquemia tardia.
güíneo adequado pelo polígono de Willis, importante Os resultados do teste de oclusão com balão não
via de circulação colateral. Também se indica em ca- apenas permitem predizer a tolerância ao sacrifício
sos cuja angiografia cerebral com compressão mostra arterial, como nos auxiliam na escolha do melhor en-

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12 – Aneurismas Gigantes e Complexos

xerto vascular no caso de revascularização ser o tra- seus extremos e o tubo é deixado in situ, constituindo,
tamento de escolha. então, um túnel para a passagem do enxerto venoso.
O tubo pode ser, ainda, passado superficialmente atra-
TÉCNICA CIRÚRGICA vés do tecido celular subcutâneo da região cervical e
pré-auricular, ou por detrás do pavilhão auricular em
A seguir estão detalhadamente descritos os pas- direção à incisão cirúrgica.
sos da técnica cirúrgica empregada na confecção dos
bypass com veia safena.
Preparação do Vaso Receptor Intracraniano
Preparação do Vaso Receptor Cervical Depois de realizados o acesso cervical, a cranio-
tomia e o túnel, o cirurgião começa a exposição da
A bifurcação da artéria carótida comum é exposta artéria cerebral média por uma abordagem pterional.
usando como base a técnica descrita por Sundt em Ao mesmo tempo, realiza-se a obtenção do conduto
19824. Após a identificação do ângulo da mandíbula, vascular arterial ou venoso (ver preparação da arté-
ponto-chave de referência para localização da bifur- ria/veia). A aracnóide é aberta fazendo-se dissecação
cação carotídea, realiza-se uma incisão linear de mais ampla da fissura sylviana e cisternas basais, expondo
ou menos 5 cm, que segue a borda anterior do músculo o segmento M1 da artéria cerebral média, sua bifur-
esternocleidomastóideo. Com dissecação cuidadosa e cação e a porção mais proximal do segmento M2. O
hemostasia rigorosa, progride-se até a profundidade, lugar escolhido para a anastomose é um dos troncos
identificando-se superiormente o ventre posterior do de M2. Habitualmente o ramo superior é de mais fácil
músculo digástrico e o nervo hipoglosso, que cruza o acesso e, na maioria das vezes, é discretamente maior
plano da artéria carótida. Disseca-se, então, a artéria que o ramo inferior. Há serviços, no entanto, que uti-
carótida comum e, em seguida, as artérias carótidas lizam o ramo inferior, pois ele irriga uma área de me-
interna e externa. Expõem-se aproximadamente 3 cm nor eloqüência. Uma vez isolado de forma adequada,
de cada artéria, separando-as da veia jugular interna, coloca-se um pequeno fragmento de látex sob o vaso
e identificam-se, de forma clara, a carótida externa receptor para a anastomose distal.
em situação anterior e a artéria carótida interna em
situação posterior. O passo seguinte é isolarem-se as Preparação do Enxerto Vascular
artérias carótida comum, interna e externa com fios
de reparo. Nesta última será realizada a anastomose A preparação correta do enxerto vascular é de
proximal. grande importância, já que a falta de atenção aos de-
talhes inerentes a essa preparação é uma importante
causa de falha nesses procedimentos. Esse preparo é
Craniotomia feito por um cirurgião vascular ou cardiologista. No
Realizamos a abordagem pterional clássica. O pa- caso de utilização de enxerto arterial, a artéria radial
ciente é posicionado em decúbito dorsal com a cabeça é dissecada no antebraço concomitante à abertura da
discretamente rodada em sentido oposto, sofrendo im- fissura sylviana pelo neurocirurgião, e mantida com
portante extensão (deflexão) em relação ao solo. Esse seu fluxo normal in situ até o momento em que ambas
posicionamento visa facilitar a abertura da fissura syl- as bocas receptoras, proximal e distal, estejam pron-
viana, pois o segmento M1 da artéria cerebral média tas para a anastomose. Isso minimiza o vasoespasmo
assume uma posição perpendicular em relação à visão do enxerto. Em relação à retirada da veia, esta se faz
do cirurgião. Um aspecto importante é que a hemos- na face interna da perna, utilizando-se a veia safena
tasia nesse ponto deve ser rigorosa, já que o paciente parva no mesmo tempo da dissecação arterial (ver ex-
será anticoagulado para a realização da anastomose. posição intracraniana). Usa-se a perna e não a coxa
para extração da veia safena, pois neste local a veia
tem menor quantidade de válvulas e menor diâmetro.
Preparação do Túnel para o Enxerto Isso torna mais fácil a anastomose, pois a diferença
Introduz-se uma pinça hemostática de ponta rom- de diâmetro entre o vaso doador-enxerto e o enxerto-
ba por baixo do arco zigomático e, anteriormente ao vaso receptor é menor. Ao se retirar a veia, ligam-se
côndilo da mandíbula, perfura-se a inserção do mús- todos os afluentes com seda 4-0 perto de sua parede
culo temporal, seguindo-se lateralmente ao ramo as- para evitar a formação de pseudo-aneurismas. Como
cendente da mandíbula até seu ângulo. Nesse ponto, não usamos valvulótomo13, deve-se marcar o extremo
perfuram-se a inserção do músculo masseter e a apo- proximal da veia para evitar sua colocação invertida
neurose parotídea até a porção ântero-superior da in- durante a anastomose. Para isso, usa-se um cateter no
cisão cervical. Exposta a ponta da pinça hemostática, extremo distal o que também tem por função permitir
introduz-se neste canal um tubo endotraqueal número a irrigação interna do enxerto. Com um comprimento
7 com ponta romba, em sentido cefálico. Cortam-se de aproximadamente 15 a 20 cm, a veia é colocada

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

numa solução salina fria que contém heparina e sul- também em “boca de peixe”, e o segmento receptor
fato de magnésio e é, depois, distendida com pressão da artéria cerebral média ou da artéria cerebral pos-
baixa para reverter o espasmo mecânico. O espasmo terior é isolado entre dois clampes microvasculares.
mecânico é minimizado com a manipulação cuidado- Realiza-se, então, uma arteriotomia de aproximada-
sa do tecido venoso, evitando lesões da adventícia. É mente 8 a 10 mm com uma microtesoura, fazendo-se
importante mencionar que o tempo da artéria ou veia a anastomose com técnica semelhante àquela proxi-
como “vasos isolados” deve ser o mais breve possí- mal e utilizando-se náilon monofilamento ou Prole-
vel. Quando a veia está distendida, deve apresentar ne® 9-0 ou 10-0. Antes de fechar o último nó, libera-se
um diâ­metro entre 6 e 9 mm, e uma veia de diâmetro o fluxo através do enxerto e evita-se a ocorrência de
menor tenderá a ocluir-se e veias maiores que 10 mm embolia aérea. Pode-se também realizar a sutura com
são expressão de patologia venosa (varizes). Infecções pontos separados ou com pontos separados na porção
e ulcerações em qualquer ponto do membro inferior, frontal da anastomose e contínuos na porção tempo-
assim como varicosidade acentuada, são contra-indi- ral. O clampeamento é refeito e o último nó é, então,
cações absolutas para a retirada do enxerto. Nos casos fechado. A oclusão dos vasos é desfeita na seguinte
de contra-indicação do uso da veia, utilizamo-nos da seqüên­cia: porção distal da artéria cerebral média,
artéria radial. Diabetes mellitus constitui uma contra- porção proximal da artéria cerebral média, segmento
indicação relativa. distal da artéria carótida externa e, por último, seg-
mento proximal da artéria carótida externa. O fluxo é
Técnica de Anastomose Proximal restaurado e pontos de sangramento são identificados.
Com relativa freqüência é necessária a colocação de
Realiza-se anastomose término-lateral entre a ar-
um ou dois pontos de sutura adicionais. Isso é comum
téria carótida externa e o enxerto venoso. Este último
é preparado retirando-se cuidadosamente a adventícia nos casos em que há uma grande desproporção de es-
e cortando-se sua extremidade em “boca de peixe” pessura entre o enxerto venoso e a artéria receptora.
ou “ponta de flauta” para aumentar a área de anasto- Pode-se determinar se o enxerto é patente pela mera
mose. Todos os ramos da artéria carótida externa são palpação do pulso da veia, que é similar em qualida-
ligados transitoriamente, e o fluxo sangüíneo é inter- de ao pulso da artéria carótida, ou pode-se utilizar o
rompido com a aplicação de clampes ou amarrias de Doppler intra-operatório, que indica a velocidade do
seda zero. Realiza-se uma incisão no eixo da artéria fluxo através do enxerto.
de acordo com o diâmetro da extremidade da veia, já Com a experiência atual, observamos que a rea-
preparada, e procede-se à realização da anastomose lização da anastomose distal antes da anastomose
com sutura de náilon monofilamento ou Prolene® 6-0 proximal propicia uma série de vantagens: pode-se
ou 7-0, em sutura contínua. Inicia-se a sutura pelos mobilizar a artéria ou veia livremente durante a anas-
extremos; sutura-se a face posterior e finaliza-se com tomose sem ficar “preso” pela anastomose distal, o
a sutura da face anterior da anastomose. É da maior que facilita a anastomose e diminui sobremaneira
importância obter-se um livre fluxo através do enxer- o tempo de clipagem temporária da artéria cerebral
to venoso após restauração do fluxo pela artéria caró- média; além disso, após a realização da anastomose
tida externa. Se isso não for alcançado, a anastomose distal o enxerto pode receber clipagem temporária e
deve ser reavaliada. o fluxo sangüíneo na artéria cerebral média pode ser
Realizados todos os passos anteriores e depois de restabelecido deixando um tempo maior para a reali-
liberadas todas as ligaduras da artéria carótida exter- zação da anastomose distal.
na, procede-se à passagem do enxerto cheio de sangue É extremamente importante, na etapa de fecha-
pelo tubo endotraqueal (túnel). Essa manobra tem por mento, assegurar um canal livre para a passagem do
objetivo reduzir todas as possíveis torções do enxerto. enxerto venoso, evitando qualquer compressão ou do-
Após passada a veia, procede-se à retirada do tubo de bra que possa predispor à trombose do bypass. Como
polietileno. o enxerto está protegido sob o músculo temporal, pra-
ticamente não há risco de lesão (acotovelamento) no
Técnica de Anastomose Distal ponto de entrada no crânio, que é produzido por uma
craniectomia realizada na escama do osso temporal. É
Após a retirada do sangue do interior do enxerto importante frisar a hemostasia rigorosa para evitar a
venoso (perfunde-se retrogradamente com solução ocorrência de hematomas pós-operatórios.
heparinizada) mede-se seu comprimento final. Isto
se consegue mediante clampagem da artéria carótida
externa ao nível da anastomose. Uma medida com o Anestesia
enxerto cheio de sangue poderia resultar num compri- A anestesia se inicia com uso de midazolam 15
mento insuficiente ou desconfortável para a anasto- mg VO. A indução é feita com midazolam EV. Res-
mose distal. A extremidade distal da veia é preparada fria-se o paciente e induz-se à hipotermia em torno

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12 – Aneurismas Gigantes e Complexos

de 32º. Administra-se heparina antes de se iniciar a têm-se complicações relacionadas ao bypass profilá-
anastomose proximal em dose de 100 U/kg (5.000 tico e o fenômeno de proliferação intimal.
a 7.500 U) e a monitoração da anticoagulação é fei-
ta segundo o TTPA, que, no momento de fechar a CONCLUSÕES
carótida externa, deve ser aproximadamente duas
vezes o normal. No momento da clipagem transi- Apesar dos avanços das técnicas cirúrgica e endo-
tória da artéria cerebral média, realiza-se proteção vascular, os aneurismas gigantes ainda representam
cerebral com corticóides (dexametasona 0,3 mg/ riscos significativos em termos de tratamento e, em
kg), que também protegem o endotélio do enxerto. alguns pacientes, seguimento cuidadoso sem inter-
Aumenta-se a pressão arterial média em 20%, admi- venção pode ser a melhor opção. A melhor indicação
nistram-se vitaminas E e C, manitol e bloqueiam-se deve ser sempre precedida de extensivo estudo neu-
os canais iônicos de Ca++ e Na+ com uso de lidocaí­ rorradiológico e da reserva cerebrovascular. Em razão
na e fenitoí­na EV, além da utilização de tiopental da grande variedade de técnicas disponíveis para o
sódico, etomidato ou propofol em doses supresso- tratamento de aneurismas gigantes, parece apropria-
ras do EEG. Isto diminui o metabolismo cerebral do ajustar-se o tratamento a cada paciente. À medida
e aumenta o fluxo colateral. A anastomose distal é que novas técnicas são desenvolvidas estas devem ser
feita em condições de anticoagulação plena. Na fase incorporadas ao tratamento. Atuando-se de maneira
de reperfusão, após finalizada a anastomose distal, multidisciplinar, isto é, combinando-se os benefícios
reverte-se a anticoagulação com protamina, usando- das técnicas cirúrgica e endovascular, espera-se que a
se 50% da dose administrada de heparina. A pressão morbidade e a mortalidade dessas lesões possam ser
arterial média fica 20% acima da basal e a tempe- minimizadas.
ratura corporal é aumentada numa taxa de 2 ºC/h.
Realiza-se um balanço positivo de cristalóides, ad- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ministrando-se dextran 40.500 cc/dia, por três dias,
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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

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11. Regli L, Piepgras DG, Hansen KK. Late patency flow saphenous vein grafts for cerebral revasculariza-
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Aneurismas Basilares Distais
Helder Tedeschi
Mauro A. Tostes Ferreira
Evandro de Oliveira
Albert L. Rhoton Jr.

Introdução 40% das vezes. Em ordem decrescente de freqüência,


os aneurismas da circulação posterior ocorrem: na

A
neurismas que se originam da bifurcação da ar- bifurcação da artéria basilar; na emergência das ar-
téria basilar são lesões de resolução cirúrgica térias cerebelar superior e cerebelar póstero-inferior;
difícil, já que mantêm íntima relação com es- na junção vertebrobasilar; no tronco da artéria basilar
truturas anatômicas importantes e estão situadas pro- (geralmente em relação com a artéria cerebelar ânte-
fundamente na fossa interpeduncular. A cirurgia dessas ro-inferior); e na artéria cerebral posterior distal ao
lesões ainda representa risco significativo de morbida- segmento P14.
de e mortalidade, mesmo em mãos experientes. Aneurismas rotos da circulação posterior acarre-
O conhecimento detalhado da anatomia microci- tam alto risco de ressangramento e exigem tratamento
rúrgica, a familiaridade com a técnica microcirúrgica, o mais rápido possível. A maior parte dos óbitos se
a experiência em tratar lesões cerebrovasculares e a deve ao ressangramento, e estudos clínicos sugerem
criteriosa escolha do acesso cirúrgico mais adequado que a chance de ressangramento é duas a três ve-
são fatores fundamentais para o êxito do tratamento zes maior em aneurismas localizados na bifurcação
de portadores de aneurismas distais da artéria basilar. basilar do que naqueles encontrados na circulação
Neste capítulo os aspectos relacionados à inci- anterior2,5,6.
dência, história natural, fisiopatologia, manifestações Os aneurismas gigantes que se apresentam com
clínicas e diagnóstico são amplamente discutidos. O sinais de comprometimento de nervos cranianos ou
tratamento cirúrgico de aneurismas do terço distal da compressão do tronco cerebral acarretam o mesmo
artéria basilar, assim como a anatomia microcirúrgi- prognóstico ruim que os aneurismas gigantes da cir-
ca pertinente ao assunto e os acessos pré-temporal e culação anterior1.
transcavernoso transelar, utilizados atualmente para O risco cumulativo de rotura de aneurismas cere-
esses aneurismas, são descritos detalhadamente. brais incidentais situa-se entre 1% e 2%6-9. O estu-
do retrospectivo recente de 181 pacientes, publicado
Incidência, História Natural e por Juvela et al.8, mostra que esse risco é de 1,3%.
Várias publicações tentaram estabelecer uma relação
Fisiopatologia entre risco de sangramento e localização do aneuris-
Aneurismas da fossa posterior correspondem a ma. Apesar de não corroborado por outros estudos, o
aproximadamente 5% a 15% dos aneurismas cere- International Study of Unruptured Intracranial Aneu-
brais. Cerca de 5% a 8% dos aneurismas cerebrais rysms Investigators7 e o Stroke Council of the Ameri-
se localizam na bifurcação da artéria basilar1. Aneu- can Heart Association6 encontram como fator de risco
rismas basilares manifestam-se com freqüência maior significativo a localização dos aneurismas no ápice da
em mulheres na quinta e sexta décadas de vida2. É artéria basilar, junção vertebrobasilar e artéria cere-
comum a associação entre aneurismas basilares e bral posterior.
aneurismas em outras localizações. LeRoux et al.2 e De modo semelhante aos aneurismas da circula-
Yasargil3 descrevem que tal associação se dá em até ção anterior, os aneurismas da circulação posterior

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

guiam-se pelos seguintes princípios anatômicos: ma- pupila sem acometimento da musculatura ocular ex-
nifestam-se em locais de bifurcação arterial, em uma trínseca1. Paresia oculomotora unilateral associada a
curva do vaso, e apontam para a direção do fluxo cefaléia é também relatada. Sintomas de compressão
sangüíneo caso a mudança de direção do vaso não do quiasma óptico e do tronco cerebral são secundá-
esteja presente. Variações anatômicas da porção pos- rios a lesões grandes que se projetam respectivamen-
terior do círculo de Willis estão associadas com uma te ântero-superior e posteriormente1,3. Compressão
incidência maior de aneurismas basilares, como, do sistema óptico pode causar hemianopsia bitem-
por exemplo, a persistência de um padrão circula- poral por comprimir o quiasma óptico e mimetizar
tório fetal pela artéria comunicante posterior1,10,11. um tumor hipofisário. Compressão da face anterior
A associação entre aneurismas basilares e vasos pa- do mesencéfalo pode causar síndrome de Weber,
tológicos, como persistência de anastomoses caróti- que se constitui na paresia oculomotora associada a
do-basilares, entre elas artéria trigeminal e artéria do hemiparesia contralateral1,2. Outros sinais relatados
hipoglosso, também foi observada. Relata-se ainda em aneurismas basilares não rotos e parcialmente
a associação entre aneurismas basilares e malfor- trombosados incluem síndrome de Parinaud, oftal-
mações arteriovenosas nutridas pela artéria cerebral moplegia internuclear, riso patológico, hemiplegia
posterior, possivelmente causada por maior estresse isolada, déficit progressivo de memória e demência,
hemodinâmico. crises parciais complexas, hemianopsia bitemporal,
hidrocefalia e distúrbios de marcha, paresia supranu-
Manifestações Clínicas clear do olhar e síndromes hipertensivas que podem
mimetizar o feocromocitoma1. Esses sintomas com-
A grande maioria de pacientes com aneurismas da pressivos são mais freqüentes conforme o aumento
bifurcação da artéria basilar, aproximadamente 80%, do tamanho do aneurisma. De modo geral, sinais e
se apresenta com hemorragia subaracnóidea (HSA), sintomas oculares estão presentes em 50% dos casos
do mesmo modo que portadores de aneurismas da de aneurismas vertebrobasilares1, e este é, segundo
circulação anterior1,2. Assim como quadro clínico ca- McKinna, conforme citado por Wascher1, um fator
racterístico, não há um padrão típico da hemorragia preditivo de pior prognóstico. Neste estudo, foram
proveniente de aneurismas da bifurcação basilar12. Pa- incluídos 611 portadores de aneurismas da fossa cra-
cientes com rotura de aneurismas da circulação poste- niana posterior. Portanto, um alto grau de suspeição
rior tendem a apresentar-se em pior condição clínica clínica se faz necessário para adequado reconheci-
que aqueles com rotura de aneurismas da circulação mento de aneurismas basilares não rotos, que, even-
anterior2. Alterações profundas de consciência ocor- tualmente, podem ser tomados por uma lesão expan-
rem em metade dos casos. Parada cardiorrespiratória é siva da fossa posterior.
mais freqüente em aneurismas da circulação posterior.
Rotura de aneurismas basilares pode causar postura
de descerebração, paresia bilateral do nervo abducen-
Diagnóstico
te, dilatação pupilar ou pupilas pouco reativas, assim O diagnóstico clínico se faz, na maioria das vezes,
como uma síndrome Parinaud-símile. por ocasião da hemorragia meníngea, traduzida por
A presença de hemoventrículo, principalmente cefaléia súbita e de forte intensidade, náuseas e vô-
do terceiro ventrículo e dos ventrículos laterais não mitos, dor nucal e sinais de irritação meníngea, assim
é incomum, assim como de hidrocefalia12. Em estudo como alterações do nível de consciência1,2,12.
realizado com 3.251 pacientes, de fato, a hidrocefa- A tomografia computadorizada (TC) precoce, não
lia aguda foi observada em 29,7% dos portadores de contrastada, é o primeiro teste diagnóstico e deve ser
HSA da circulação posterior, já aqueles com HSA da realizada tão logo haja suspeita de quadro de hemorra-
circulação anterior apresentaram hidrocefalia em 9% gia meníngea2,12,14. Esse exame evidencia sangue nas
a 16% das vezes, o que contribui para uma apresenta- cisternas basais, no espaço subaracnóideo ou, even-
ção clínica mais grave desses pacientes (síndrome de tualmente, dentro do sistema ventricular. Lembramos
hipertensão intracraniana)13. A hemorragia do tronco que a hemorragia meníngea secundária à rotura de
cerebral é também relatada, porém de ocorrência rara. um aneurisma basilar não possui nenhum padrão de
Acredita-se que a consistência espessa da pia-máter localização típico12. Estuda-se ainda o aspecto do pa-
que envolve o tronco cerebral sirva como fator prote- rênquima cerebral e sistema ventricular. Aneurismas
tor em relação a este evento1,2. grandes e com paredes calcificadas podem ser vistos
Aneurismas basilares não rotos e sintomáticos na TC não contrastada12. A administração do contraste
podem apresentar-se por meio de diferentes graus endovenoso é desnecessária nesta fase, pois, uma vez
de acometimento do nervo oculomotor. Aneurismas estabelecido o diagnóstico de hemorragia meníngea,
basilares e cerebelares superiores com projeção la- o paciente é submetido à angiografia cerebral.
teral podem estar associadas a paresia oculomotora A angiotomografia computadorizada na fase aguda
unilateral isolada, incluindo dilatação transitória da se justifica em situações em que o paciente se encontra

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13 – Aneurismas Basilares Distais

com um quadro clínico instável (hemorragia paren- ideal; complexidade e eloqüência das estruturas ana-
quimatosa, por exemplo) e necessite de tratamento tômicas da fossa interpeduncular; profundidade do
cirúrgico imediato. Tomógrafos helicoidais podem campo cirúrgico; dificuldade em se obter controle ar-
processar imagens em períodos tão curtos quanto 30 a terial proximal; morfologia do aneurisma, muitas ve-
45 segundos após a injeção do contraste endovenoso, zes complexa, além de sua relação com artérias per-
evidenciando aneurismas muito pequeno, como de furantes. A estreita relação entre aneurismas basilares
2 a 3 mm, com sensibilidade de 77% a 92% e espe- e artérias perfurantes é, de fato, um dos principais
cificidade de 87% a 100%12. A angiotomografia com- fatores que aumentam a dificuldade técnica dessas
putadorizada com reconstrução tridimensional pode cirurgias e é, ainda, a principal causa de complicação
auxiliar, ainda, na avaliação da morfologia de aneu- pós-operatória grave.
rismas gigantes ou complexos, principalmente aque- O profundo conhecimento da anatomia microci-
les parcialmente trombosados. Pode também ser de rúrgica das estruturas da região anterior do hiato ten-
valor na avaliação da relação anatômica entre o aneu- torial é essencial para o adequado tratamento cirúrgi-
risma e as estruturas ósseas da base do crânio. co dos aneurismas distais da artéria basilar.
A angiorressonância magnética é menos sensível As relações neurovasculares da fossa interpedun-
que a angiotomografia computadorizada. A sensibili- cular e demais estruturas da porção anterior do hiato
dade para lesões entre 2 e 3 mm é descrita como infe- tentorial são descritas a seguir.
rior a 60%12. Não utilizamos, para fins diagnósticos,
a ressonância nuclear magnética ou a angiorressonân-
cia na fase aguda da HSA. Anatomia Microcirúrgica da Porção
O método de escolha para diagnóstico de aneuris- Anterior do Hiato Tentorial
mas cerebrais, incluindo os da artéria basilar, é a an- A porção anterior do hiato tentorial16 correspon-
giografia com subtração digital12. O estudo dos quatro de à face anterior do mesencéfalo e ponte. Seu limite
vasos cerebrais é obrigatório em casos de aneurismas superior, ou teto, é o assoalho do terceiro ventrículo,
da circulação posterior. Esse exame fornece infor- constituído, em sentido póstero-anterior, pela subs-
mação precisa quanto ao local da lesão, morfologia, tância perfurada porterior, pelos corpos mamilares,
tamanho, relação com estruturas vasculares vizinhas pelo túber cinéreo, pelo infundíbulo da haste hipofi-
e padrão de fluxo pelos vasos. Consideramos a angio- sária e pelo quiasma óptico1. O limite inferior corres-
grafia digital essencial para o diagnóstico e planeja- ponde a um plano axial infratentorial, constituído por
mento cirúrgico de aneurismas basilares. Utilizamos uma linha que une os pontos de entrada dos nervos
os outros métodos de imagem de modo complemen- abducentes na dura-máter do clivo17. O limite ante-
tar e apenas quando necessário, particularmente para rior é formado pelo clivo, pelo dorso da sela túrcica
melhor avaliar os limites e tamanho de aneurismas gi- e pelos processos clinóides posteriores. O espaço ten-
gantes e parcialmente trombosados, assim como sua torial anterior termina na região supra-selar, ao nível
relação com o cérebro ou com a base do crânio. da haste hipofisária. O limite lateral desse espaço é
Pacientes portadores de hemorragia meníngea formado pelo unco do giro para-hipocampal e pela
devem ser levados imediatamente para um centro extremidade anterior da tenda do cerebelo. O limite
de terapia intensiva, onde devem ser submetidos látero-posterior é constituído por um plano parassagi-
à rigorosa observação clínica e neurológica. Contro- tal que une os nervos troclear e abducente17.
le rigoroso de pressão arterial, monitoração cardíaca As principais cisternas da porção anterior do hia-
contínua, punção de veia de grosso calibre, controle to tentorial são as cisternas interpeduncular, quias-
hidroeletrolítico e gasométrico rigoroso são funda- mática e pré-pontina. A cisterna interpeduncular é
mentais tanto em fase pré como pós-operatória. A limitada anterior e inferiormente pelas membranas
utilização de Doppler transcraniano, eletroencefa- diencefálica e mesencefálica da membrana de Lillie-
lograma, monitoração de potenciais evocados, as- quiest18. Tem como limite superior o assoalho do
sim como utilização de exames radiológicos espe- terceiro ventrículo e como limite posterior a porção
cíficos para avaliação de fluxo sangüíneo cerebral, anterior do mesencéfalo (crus cerebri). As cisternas
se fazem em casos específicos, na maior parte das quiasmática e pré-pontina localizam-se anterior e
vezes em pacientes que desenvolvem vasoespasmo inferiormente à cisterna interpeduncular, respectiva-
cerebral15. mente11. As principais estruturas vasculares localiza-
das nesse espaço são: a bifurcação da artéria basilar,
Tratamento Cirúrgico dos que se divide em artérias cerebrais posteriores; as
artérias cerebelares superiores, ramos da artéria ba-
Aneurismas da Bifurcação Basilar silar; os ramos perfurantes, que incluem as artérias
Os aneurismas da bifurcação da artéria basilar talamoperfurantes posteriores; e a junção da artéria
constituem afecções de difícil tratamento cirúrgico. comunicante posterior com a artéria cerebral poste-
Para isto contribuem: falta de um acesso cirúrgico rior1 (Figs. 13.1 e 13.2).

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

artérias vertebrais pode ocorrer na linha média ou la-


teralmente. A junção vertebrobasilar pode estar acima
ou abaixo do sulco bulbopontino1,4,11,19,20.
Após sua origem à frente do sulco bulbopontino
e entre os nervos abducentes, a artéria basilar se di-
rige superiormente até o sulco pontomesencefálico,
para cursar dentro da cisterna pré-pontina. Sua bi-
furcação se dá, no entanto, na região da fossa e cis-
terna interpedunculares, geralmente acima do sulco
pontomesencefálico, algo superior e entre os nervos
oculomotores1,19. Saeki e Rhoton19 mensuraram a
extensão da artéria basilar e encontraram um valor
médio de 32 mm (variação entre 15 e 40 mm). Em
casos de artérias basilares muito longas, a bifurcação
arterial pode ocorrer no nível dos corpos mamilares
no assoalho do terceiro ventrículo. Em casos de arté-
rias basilares curtas, a bifurcação arterial pode estar
até 1,3 mm abaixo do sulco pontomesencefálico19,21
(Fig. 13.3). A análise pré-operatória do local exato da
bifurcação da artéria basilar é fundamental para a es-
colha do acesso cirúrgico mais adequado. Geralmente
se toma como referência a relação entre a bifurcação
arterial e o processo clinóide posterior quando se ana-
lisa a angiografia da circulação posterior em perfil.
Fig.13.1 – Preparado anatômico demonstrando o conteúdo A bifurcação arterial é considerada alta quando ocor-
da porção anterior do hiato tentorial: 1. nervo olfatório; 2. re 5 mm ou mais, acima do processo clinóide pos-
nervo óptico; 3. artéria carótida interna; 4. artéria comuni- terior, e baixa quando ocorre 5 mm ou mais, abaixo
cante posterior; 5. artéria corióidea anterior; 6. unco; 7. nervo do processo clinóide posterior4,17. A maior parte das
oculomotor; 8. artéria cerebral posterior; 9. artéria basilar; 10.
artéria cerebelar superior. bifurcações arteriais ocorre no espaço entre 5 mm aci-
ma e abaixo dos processos clinóides posteriores. Uma
bifurcação arterial alta ocorre em 32% dos casos, e
uma bifurcação baixa ocorre em 28%17.
Saeki e Rhoton19 observaram que a porção alta da
artéria basilar é um local importante de ramos perfu-
rantes para o tronco cerebral. Esses autores encon-
traram um número médio de oito artérias perfurantes
(variação de número entre 3 e 18) a se originarem do
centímetro distal da artéria basilar. Os ramos perfu-
rantes da artéria basilar, próximo à sua bifurcação, e
os ramos perfurantes do segmento P1 da artéria cere-

Fig.13.2 – Visão cirúrgica da mesma região da Fig. 13.1:


1. nervo óptico; 2. artéria carótida interna; 3. artéria cerebral
anterior; 4. artéria cerebral média; 5. artéria comunicante pos-
terior; 6. artéria corióidea anterior; 7. artéria basilar; 8. artéria
cerebelar superior; 9. artéria cerebral posterior; 10. nervo ocu-
lomotor; 11. unco.

Artéria Basilar
A artéria basilar origina-se no ponto de junção das
artérias vertebrais, na face anterior do tronco cerebral,
geralmente à altura do sulco bulbopontino, posterior-
mente à transição entre os terços inferior e médio da Fig. 13.3 – (A, B e C) Diferentes posições da bifurcação da
porção basilar do osso occipital (clivo). A junção das artéria basilar em relação ao processo clinóide posterior.

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bral posterior formam um rico e complexo conjunto Artéria Cerebral Posterior


de artérias perfurantes para o tronco cerebral na re-
gião da fossa interpeduncular. As lesões de artérias Um estudo detalhado sobre a anatomia microcirúr-
talamoperfurantes durante procedimentos cirúrgicos gica das artérias cerebrais posteriores é fornecido por
produzem imagem tomográfica de áreas de infartos Zeal e Rhoton, em 197820. A artéria cerebral posterior
talâmicos. Tais lesões acarretam risco de sério com- é dividida em quatro segmentos. O primeiro segmento,
prometimento do estado de consciência. ou P1, se estende desde a bifurcação basilar até a jun-
ção com a artéria comunicante posterior. O segundo
Aneurismas da bifurcação da artéria basilar, em ge-
ral, projetam-se superiormente, mas podem projetar- segmento, ou P2, se estende desde a junção da artéria
se posteriormente para o aspecto posterior da cisterna comunicante posterior até a face posterior do mesencé-
interpeduncular, anteriormente em direção ao dorso falo, cursando inicialmente na cisterna interpeduncu-
selar ou, mais raramente, para os lados (Fig. 13.4). lar e, posteriormente, na cisterna ambiente. Esse seg-
Na sua projeção mais comum, a superior, o domo do mento é subdividido em uma porção anterior (P2A)
aneurisma aponta para o assoalho do diencéfalo. As e outra posterior (P2P), cada uma com uma extensão
artérias perfurantes originadas do aspecto dorsal da aproximada de 25 mm20. P2A se origina na junção com
artéria basilar e segmento P1 da artéria cerebral poste- a artéria comunicante posterior e se estende posterior-
rior estão comumente relacionadas aos aspectos pós- mente até a superfície posterior do pedúnculo cerebral
tero-laterais do saco aneurismático. Aneurismas que (crus cerebri). Em seu trajeto lateral ao pedúnculo ce-
se projetam anteiormente são relativamente menos rebral, P2A se localiza inferiormente ao trato óptico e
complicados, já que se projetam na direção oposta à veia basal de Rosenthal, e medialmente ao unco e giro
das perfurantes. Aqueles aneurismas que se projetam para-hipocampal do lobo temporal, para então pene-
posteriormente, ao contrário, deslocam as perfurantes trar na cisterna ambiente. O segmento P2P se inicia
e dificultam sobremaneira a dissecção. na margem posterior do pedúnculo cerebral e se dirige
posteriormente à superfície posterior do mesencéfalo
Os ramos da artéria basilar que nutrem o cerebelo
(tectum). Em seu trajeto na cisterna ambiente, P2P lo-
são as artérias cerebelar superior (ACS) e cerebela-
res ântero-inferior (AICA) e póstero-inferior (PICA). caliza-se: inferiormente ao trato óptico e veia basal de
As artérias cerebelares superiores nutrem a superfície Rosenthal; ínfero-lateral em relação aos corpos geni-
tentorial do cerebelo, as artérias cerebelares ântero- culados laterais e pulvinar do tálamo; e súpero-medial
inferiores nutrem a superfície petrosa do cerebelo, em relação ao nervo troclear e à borda tentorial. O ter-
e as póstero-inferiores, sua superfície suboccipital. ceiro segmento, ou P3, se inicia na porção posterior do
A AICA se relaciona, ainda, com os nervos crania- mesencéfalo, posteriormente ao pulvinar talâmico, na
nos VI, VII e VIII e com a fissura cerebelopontina. A porção súpero-lateral da cisterna quadrigeminal. Este
ACS se relaciona com os nervos cranianos III, IV e segmento alcança a porção anterior da fissura calca-
V e com a fissura cerebelomesencefálica. As artérias rina, onde a artéria cerebral posterior dá origem às ar-
cerebelares superiores podem ter relação anatômica térias calcarina e parietoccipital. Estas constituem os
com lesões complexas do ápice basilar. Podem ainda segmentos P4 da artéria cerebral posterior.
dar origem, geralmente em sua emergência, a aneu- A artéria cerebral posterior dá origem a ramos per-
rismas saculares, que são tratados por vias cirúrgicas furantes diretos ou circunflexos que se dirigem para
semelhantes a aneurismas da bifurcação basilar. o tronco cerebral20. Os ramos perfurantes diretos são
as artérias talamoperfurantes posteriores, artérias ta-
lamogeniculadas e artérias perfurantes pedunculares.
As artérias talamoperfurantes posteriores se origi-
nam sempre das superfícies posterior ou superior da
porção proximal do segmento P1 da artéria cerebral
posterior; penetram na substância perfurada posterior,
fossa interpeduncular e bordas mediais dos pedúncu-
los cerebrais20. As artérias talamogeniculadas se origi-
nam diretamente do segmento P1, localizado inferior
e lateralmente ao tálamo, e penetram na superfície in-
ferior dos corpos geniculados. Essas artérias se origi-
nam tanto do segmento P2A quanto do segmento P2P
e nutrem a porção posterior da superfície lateral do
tálamo, ramo posterior da cápsula interna e trato óp-
tico. As artérias perfurantes pedunculares penetram o
Fig. 13.4 – (A, B e C) Diferentes projeções do saco aneuris- pedúnculo cerebral e se originam predominantemente
mático e sua relação com perfurantes em aneurismas da bifur- do segmento P2A. São responsáveis pela nutrição de
cação da artéria basilar. tratos corticobulbares, substância negra, núcleo ver-

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

melho, assim como outras estruturas do tegumento basilar. Hardy e Rhoton23,24 observaram que as arté-
mesencefálico. rias cerebelares superiores geralmente se originam
As artérias circunflexas circundam o tronco cere- como tronco arterial único. Originam-se, no entanto,
bral, cursando paralela e inferiormente à artéria ce- como troncos arteriais separados em 14% dos casos.
rebral posterior. São classificadas em artérias circun- Quando se originam como tronco único, as artérias
flexas curtas e longas. As artérias circunflexas curtas cerebelares superiores bifurcam-se na superfície ínfe-
se originam mais freqüentemente do segmento P1 e ro-lateral da ponte. O tronco arterial superior nutre a
terminam na superfície póstero-lateral do pedúnculo superfície adjacente do hemisfério cerebelar e verme
cerebral; as originadas de P2 nutrem apenas os cor- cerebelar. O tronco inferior irriga a superfície cortical
pos geniculados e o tegumento mesencefálico. As ar- cerebelar lateral à área de nutrição do tronco supe-
térias circunflexas longas se originam geralmente de rior. A artéria cerebelar superior dá origem a ramos
P1 e se dirigem posteriormente, circundando o tronco perfurantes diretos que penetram na região da fossa
cerebral para nutrir os colículos cerebrais e cisterna interpeduncular. Ramos circunflexos curtos alcançam
quadrigeminal20. o pedúnculo cerebral; ramos circunflexos longos al-
Os ramos da artéria cerebral posterior que alcan- cançam a região do tegumento mesencefálico, a jun-
çam o plexo corióideo dos ventrículos laterais (corno ção dos pedúnculos cerebelares superior e médio e os
temporal) e do terceiro ventrículo (velum interposi- colículos cerebrais24.
tum) são denominados artéria corióidea póstero-la-
teral e póstero-medial, respectivamente20,21. A artéria Artéria Comunicante Posterior
corióidea póstero-medial se origina, geralmente, de
P2A, e circunda o mesencéfalo medialmente à artéria A artéria comunicante posterior (ACoP) tem sua
cerebral posterior20,21. Na porção lateral da glândula origem na parede póstero-lateral da artéria carótida
pineal, a artéria corióidea póstero-medial se dirige an- interna, dentro da cisterna carotídea25. A AcoP se di-
teriormente em direção ao plexo corióideo do teto do rige posterior e medialmente abaixo do túber cinéreo
terceiro ventrículo, dentro da cisterna do véu interpó- e acima do nervo oculomotor para unir-se à artéria
sito. Essa artéria emite ramos para o pedúnculo cere- cerebral posterior (ACP) na cisterna interpeduncu-
bral, tegumento mesencefálico, corpos geniculados, lar11. Em seu trajeto posterior, a ACoP cursa perto da
calículos cerebrais, pulvinar do tálamo, glândula pi- dura-máter, que recobre o processo clinóideo poste-
neal e porção medial do tálamo. As artérias corióideas rior e pode, eventualmente, estar aderida a ela, o que
póstero-laterais se originam mais freqüentemente do pode dificultar sua mobilização durante a cirurgia11.
segmento P2P, embora possam se originar também O calibre desta artéria é altamente variável e é maior
dos segmentos P2A e P3. Elas se dirigem lateralmen- em crianças do que em adultos ou indivíduos idosos.
te à fissura corióidea para alcançar o plexo corióideo Isso sugere que tal artéria diminua o calibre conforme
do corno temporal e o átrio do ventrículo lateral. As se atinja a idade adulta11. Em indivíduos adultos, o
artérias corióideas póstero-laterais emitem, ainda, diâmetro da AcoP é geralmente menor do que o da
ramos que nutrem o pedúnculo cerebral, a comissu- artéria cerebral posterior ipsilateral. No entanto, pode
ra posterior, o fórnice, o corpo geniculado lateral, o ter um calibre igual ou maior do que a ACP. Nesses
pulvinar do tálamo, o núcleo talâmico dorsomedial e casos, a ACoP é denominada artéria comunicante fe-
corpo do núcleo caudado22. tal, em alusão ao padrão de circulação encontrado na
Os ramos corticais da artéria cerebral posterior vida fetal11,14,25. A presença de uma artéria comunican-
são: as artérias hipocampais, que cursam em direção te posterior fetal é geralmente associada com hipo-
ao sulco hipocampal do unco e nutrem o hipocampo plasia do segmento P1 da artéria cerebral posterior
e giro denteado; as artérias temporais anterior, média ipsilateral11,20. É de extrema importância durante a ci-
e posterior, que nutrem as superfícies mediobasal e rurgia preservar-se uma artéria comunicante posterior
inferior dos lobos temporal e occipital; a artéria parie- com padrão fetal. A interrupção do fluxo sangüíneo
toccipital, que cursa no sulco parietoccipital da face nesses pacientes pode ocasionar isquemia no territó-
medial do hemisfério cerebral e nutre a região paras- rio de irrigação da artéria cerebral posterior.
sagital posterior, o cúneo, o pré-cúneo e o giro occipi- A incidência de uma ACoP fetal é de 8% na popu-
tal lateral; a artéria calcarina, que se localiza no sulco lação adulta11. O padrão de circulação da artéria co-
calcarino e nutre o córtex visual; e as artérias perica- municante posterior também altera o trajeto do vaso25.
losas posteriores que circundam a superfície posterior Se a artéria for pouco calibrosa ou de calibre normal,
do esplênio do corpo caloso e se anastomosam com ela seguirá um curso póstero-medial e se unirá ao seg-
ramos da artéria pericalosa20. mento P1 da artéria cerebral posterior medialmente ao
nervo oculomotor. Se tiver um padrão fetal, a artéria
poderá cursar póstero-lateralmente, acima ou lateral
Artéria Cerebelar Superior em relação ao nervo oculomotor.
As artérias cerebelares superiores são ramos da A artéria comunicante posterior é local de origem
artéria basilar e se originam próximo à bifurcação de vários ramos perfurantes, as chamadas artérias ta-

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13 – Aneurismas Basilares Distais

lamoperfurantes anteriores. Tais artérias vão nutrir, poropolar-extradural39, zigomático40, transpetroso


em ordem decrescente de freqüência: a porção pré- anterior41, zigo­mático-temporopolar42 zigomático-
mamilar do assoalho do terceiro ventrículo, a subs- sub­­­temporal43, corredor lateral ampliado – PAVEL44,
tância perfurada posterior e fossa interpeduncular, o ressecção pacial do unco do giro para-hipocampal45,
trato óptico, a haste hipofisária e o quiasma óptico25. subtemporal anterior com petrosectomia medial46,
Essas artérias irrigam o tálamo, o hipotálamo, o sub- pterional associado ao acesso subtemporal47, aces-
tálamo e a cápsula interna. Uma dessas artérias tem so metade-metade ou half and half approach48, en-
um trajeto constante, se dirige à porção anterior dos tre outros, constituem variações e/ou extensões dos
corpos mamilares e é denominada artéria pré-ma- acessos clássicos pterional49,50 e subtemporal. A va-
milar ou talamoperfurante anterior ou talamotuberal riedade de acessos cirúrgicos propostos na literatura
(talamoinfundibular)1,11,25. Gibo et al.25 observaram reflete a dificuldade em se utilizar um acesso único
que a maior parte das artérias perfurantes se origina que seja útil para a maioria dos aneurismas basilares,
da metade anterior da ACoP (54% casos), enquanto se ou seja, reflete a falta de um acesso cirúrgico ideal.
originam em sua metade posterior em 25% das vezes. Todas essas vias descrevem extensões e/ou diferentes
Possuem origem igual, tanto a partir da metade ante- combinações dos acessos clássicos pterional e subtem-
rior quanto da posterior em 21% das vezes. Isso tem poral. Aneurismas de morfologia e posição diferentes
importância prática, principalmente quando se con- dentro do espaço tentorial anterior podem requerer
sidera a cirurgia para aneurismas da artéria basilar. acessos cirúrgicos ou ângulos de visão diferentes.
Quando se cogita a secção da ACoP, ela deve ocorrer Utilizam-se o acesso pré-temporal51, associado ou
o mais próximo possível da junção com a artéria ce- não a osteotomia orbitozigomática, e o acesso pré-
rebral posterior, o que preserva o fluxo pelas artérias temporal órbito-zigomático transcavernoso transelar17
talamoperfurantes anteriores3. para tratar aneurismas da bifurcação da artéria basilar.
O primeiro é utilizado para tratar aneurismas peque-
Indicação de cirurgia nos ou médios, situados em uma bifurcação basilar
de posição anatômica “normal”, ou seja, 5 mm acima
Em princípio, a maioria dos aneurismas rotos do ou abaixo do processo clinóide posterior. O acesso
ápice da artéria basilar, assim como aqueles das arté- pré-temporal é também utilizado para tratar-se os
rias cerebral posterior e cerebelar superior, são trata- aneurismas da artéria cerebelar superior e segmento
dos cirurgicamente. Aneurismas assintomáticos/inci- P1 (e eventualmente P2) da artéria cerebral posterior.
dentais da circulação posterior são tratados da mesma Associamos a osteotomia orbitozigomática em ca-
forma que os aneurismas incidentais da circulação sos de aneurismas “altos”, ou seja, naqueles situados
anterior. O tratamento cirúrgico é contra-indicado mais de 5 mm acima do processo clinóide posterior.
apenas em casos de comprometimento clínico ou Esses aneurismas projetam-se em direção aos corpos
por recusa do paciente. A cirurgia é realizada o mais mamilares na porção alta da fossa interpeduncular, no
precocemente possível. O risco de ressangramento assoalho do terceiro ventrículo, fazendo necessária
é particularmente alto em portadores de aneurismas uma visão mais basal do topo basilar. O acesso pré-
basilares distais2,6. O International Cooperative Stu- temporal orbitozigomático transcavernoso transelar é
dy on the Timing of Aneurysms Surgery13,26 mostra utilizado em casos de aneurismas gigantes ou com-
que o índice de complicações cirúrgicas é o mesmo plexos, e/ou em casos de bifurcação basilar baixa em
quando se analisam pacientes tratados precocemente relação ao dorso selar.
ou em fase mais tardia. Lesões grandes e complexas
Apesar de ser possível tratar aneurismas basilares
são operadas em uma fase algo mais tardia, quando
ou cerebelares superiores utilizando a via pterional
se pode obter um cérebro menos tenso, menos friá- transylviana, esse acesso fornece uma exposição li-
vel e menos edemaciado, o que permite melhor ma- mitada das estruturas neurovasculares na profundi-
nipulação cirúrgica e melhor identificação de artérias dade da fossa interpeduncular, principalmente de sua
perfurantes. porção mais alta. O acesso mostra-se limitado quando
Vários estudos recentes avaliaram o papel da te- se lida com lesões grandes e complexas e em casos de
rapia endovascular em pacientes em estado grave e bifurcações basilares baixas. Um processo clinóide
portadores de lesões complexas da circulação verte- posterior proeminente pode tornar esse acesso insu-
brobasilar27-34. Embora com resultados ainda longe do ficiente. Embora a visualização dos segmentos P1 de
ideal, essa técnica apresenta futuro promissor no tra- ambas as artérias cerebrais posteriores seja possível
tamento de aneurismas da artéria basilar. pela via pterional, a visualização dos ramos perfu-
Os acessos cirúrgicos mais utilizados e difundi- rantes posteriores é limitada, mesmo em lesões “sim-
dos na literatura são os acessos clássicos pterional ples”. Em casos de lesões grandes, a visualização da
e subtemporal, conforme concebidos e propostos relação entre P1 contralateral e a parte distal do colo
por Gazi Yasargil11,35 e Charles Drake36,37 respecti- do aneurisma, assim como dos vasos perfurantes é
vamente. Acessos tais como: temporopolar38, tem- bastante difícil (principalmente em lesões grandes)52.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Também particularmente difícil é a aplicação de pelo mesmo motivo de necessidade de grande retra-
um clipe temporário quando se deseja controle arte- ção da base do lobo temporal.
rial proximal ou menor tensão arterial sobre o saco A visualização do complexo de artérias perfurantes
de aneurismas grandes ou complexos. Essa manobra posteriores e do segmento P1 ipsilateral na fossa inter-
permite maior manipulação e melhor inspeção intra- peduncular é possível por meio do acesso subtemporal.
operatória tanto do colo do aneurisma quanto da rela- No entanto, a visualização do segmento P1 contrala­
ção entre o aneurisma e os vasos a ele relacionados, teral é difícil, e se faz sempre por meio de algum tipo
em especial ramos perfurantes. Devido ao espaço li- de tração e manipulação do saco aneurismático. Con-
mitado dessa exposição cirúrgica, a própria presença forme sugerido por Drake37, o clipe cirúrgico deve ser
de um eventual clipe temporário pode obstruir a visão selecionado antes da cirurgia e ter a mesma extensão
adequada das estruturas vizinhas. Por vezes, algum do colo do aneurisma, de modo a se evitar a inclusão
espaço para a colocação de um clipe proximal ao de P1 contralateral e/ou perfurantes entre as pernas do
aneurisma é simplesmente inexistente. As vantagens clipe. O tratamento de aneurismas basilares baixos e
do acesso pterional são: familiaridade com a via; boa o controle arterial proximal são possíveis por meio de
visualização da bifurcação basilar e dos segmentos secção da tenda do cerebelo na porção lateral do hiato
P1; e a possibilidade de tratamento de lesões coexis- tentorial. Drake indicava como local apropriado para
tentes na circulação anterior. colocação de um clipe temporário o espaço entre as
Em casos de aneurismas complexos, nos quais artérias cerebral posterior e cerebelar superior.
menor tensão arterial intra-aneurismática possa auxi-
liar a manipulação do colo do aneurisma, a cirurgia Acesso pré-temporal
com paciente em parada cardiorrespiratória, hipoter-
mia e proteção cerebral por meio de agentes barbitú- O acesso pré-temporal, originalmente publicado
ricos pode ser realizada53. Isto requer, no entanto, um por Sano em 198038, sob a designação de “acesso tem-
grupo altamente qualificado de anestesistas e perfeita poropolar”, permite ângulos de visão variáveis duran-
coordenação com a equipe de cirurgia cardíaca. te a cirurgia. A importância da dissecação ampla das
O acesso subtemporal foi utilizado com êxito cisternas basais e de aderências aracnóides entre o cé-
em um grande número de aneurismas da bifurcação rebro, nervos cranianos e artérias, obtendo-se assim
da artéria basilar por Charles Drake, em Ontário, ampla mobilização da ponta do lobo temporal (aces-
Canadá36,37,54. O acesso subtemporal tem como vanta- so pré-temporal) foi enfatizada por Oliveira et al. em
gens a realização de um acesso relativamente simples 199551. A fossa interpeduncular pode ser visualizada
e direto à região da fossa interpeduncular; fornece sob ângulos de vista transylviano, subtemporal, ou
uma via cirúrgica mais direta e mais curta quando pré-temporal, ou sob uma combinação variável des-
comparada à via pterional; possibilita a colocação de tes, a depender da localização, morfologia, ou proje-
um clipe cirúrgico em posição relativamente paralela ção do aneurisma, o que faz tal acesso mais versátil
ao colo do aneurisma, contrário ao acesso pterional quando comparado com os acessos “convencionais”.
onde a colocação do clipe se faz a partir de um ân- Esse acesso constitui-se basicamente de amplas expo-
gulo mais ântero-posterior; e permite o tratamento de sição do lobo temporal e dissecação da fissura lateral
aneurismas baixos em relação ao dorso selar. e cisternas basais. Após secção das fibras e aderências
Esse acesso requer, no entanto, retração da porção aracnóideas entre os lobos temporal e frontal, o unco,
média da base do lobo temporal, o que pode colo- o nervo oculomotor, a artéria carótida interna e seus
car em risco o complexo venoso de Labbè. A veia ou ramos, e a tenda do cerebelo, pode-se deslocar a ponta
complexo venoso anastomótico inferior possui pa- do lobo temporal da base da fossa média, permitindo
drões anatômicos extremamente variáveis, podendo maior ângulo de visão das estruturas profundas, parti-
ter um local de drenagem bastante anterior em relação cularmente por ampliar o ângulo de visão lateral51.
à transição entre os seios transverso e sigmóideo. A
retração superior do lobo temporal é ainda maior em Técnica cirúrgica
casos de aneurismas situados na porção mais alta da
cisterna interpeduncular. Drake37 utilizava uma via Posicionamento
ântero-lateral em casos de aneurismas basilares altos O paciente é colocado em decúbito horizontal dor-
e em casos de aneurismas coexistentes da circulação sal e a cabeça é posicionada acima do nível do tó-
anterior. O infarto venoso do lobo temporal secundá- rax. Utilizamos o fixador de cabeça do tipo Sugita®,
rio à lesão da veia de Labbè (rotura intra-operatória que fixa a cabeça em três ou quatro pontos. Evita-se
ou trombose secundária à tração excessiva e prolon- a colocação de pinos de fixação na fronte do paciente.
gada durante a cirurgia), especialmente no lado es- Fixam-se na cabeceira o processo mastóide do osso
querdo, constitui uma complicação cirúrgica séria e temporal ipsilateral à incisão cirúrgica e as regiões
eventual­mente fatal. A posição alta da bifurcação ba- frontal e parietal, acima da linha temporal superior
silar também torna a realização desse acesso difícil, contralateral, de modo a se evitar o músculo tempo-

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13 – Aneurismas Basilares Distais

ral. A cabeça é rodada aproximadamente 60º para o Craniotomia


lado oposto, estendida cerca de 10º e inclinada por
volta de 5º em relação ao solo. A cabeça é ainda de- A craniotomia é realizada de modo semelhante à
fletida, o que faz com que a eminência malar seja o craniotomia pterional clássica, exceto pela exposição
ponto mais alto da exposição. A deflexão da cabeça mais ampla da porção posterior da escama temporal, o
faz com que a asa menor do osso esfenóide se situe que permite ampla mobilização da ponta do lobo tem-
em um plano perpendicular em relação ao ângulo de poral após a dissecação aracnóide. Para isso, adicio-
vista do cirurgião, assim como a fissura sylviana e a namos um quinto orifício de trepanação nas porções
artéria cerebral média. posterior e inferior da escama temporal51. Atualmente,
e sempre que possível, evitamos o orifício de trepa-
nação na base do osso frontal, com o intuito de me-
Incisão Cutânea e Dissecação do Músculo lhor resultado estético. Os orifícios de trepanação se
Temporal localizam, portanto, nesta ordem: na parte lateral do
A incisão cutânea frontotemporal se inicia à frente osso frontal, inferior à porção mais anterior da linha
do trago, posteriormente à artéria e veia temporal su- temporal superior, superiormente ao início do proces-
perficial, atrás da linha do cabelo. A incisão segue su- so zigomático do osso frontal (o chamado key-hole);
periormente, contornando a orelha até seu ponto mais dois orifícios na base da escama do osso temporal (o
alto, para então prosseguir superior e medialmente primeiro logo abaixo do pterion e o segundo na parte
em direção à linha média na região frontal, posterior- inferior da escama temporal); um outro logo posterior
mente à inserção capilar. Caso a osteotomia orbitozi- à sutura coronariana, abaixo da linha temporal supe-
gomática seja planejada, estendemos a incisão cutâ- rior; e o último, se necessário, 2 a 3 cm medial ao key-
hole, na base do osso frontal, acima da rima orbitária.
nea rumo à região frontal contralateral, ultrapassando
a linha média em aproximadamente 2 a 3 cm. O flap Realizada a craniotomia, a dura-máter é ancorada
cutâneo é rebatido anteriormente junto com o periós- junto às bordas ósseas. Com o auxílio da broca de alta
teo frontal. O tronco da artéria temporal superficial e rotação, procedemos à ressecção ampla da asa menor do
seu ramo frontal são preservados. O ramo parietal é osso esfenóide, até o ponto onde a artéria meningo-or-
geralmente seccionado durante a incisão cutânea. A bitária penetra em direção à fissura orbitária superior11.
dissecação subgaleal deve prosseguir até ao nível do O teto orbitário é aplainado de modo a tomar o formato
ramo frontal da artéria temporal superficial, quando do globo ocular, e toda a escama do osso temporal é re-
então se inicia a dissecação interfacial do músculo movida, até se conseguir uma exposição basal, ao nível
temporal. do assoalho da fossa média. Essa ressecção óssea tem
como intuito expor de forma ampla toda a superfície da
A fáscia temporal superficial é seccionada, e o co-
porção anterior do lobo temporal. A associação desse
xim de gordura entre as membranas externa e interna acesso com a osteotomia orbitária ou orbitozigomáti-
da fáscia superficial é identificado. Tanto a membra- ca é possível, assim como extensões de ressecção ós-
na externa da fáscia quanto o coxim gorduroso são sea, tais como remoção extradural do processo clinóide
rebatidos inferiormente, com o intuito de proteger o anterior, ressecção óssea do assoalho da fossa média e
ramo frontal do nervo facial, que cursa em um plano ápice petroso (em casos de afecções que se estendem
subgaleal, superficialmente, à membrana externa da rumo à fossa infratemporal ou fossa posterior, respecti-
fáscia temporal. vamente), abertura da fissura orbitária superior e cavi-
Tanto o retalho cutâneo quanto a fáscia temporal dade orbitária e exposição da fossa média para acesso
superficial são rebatidos e mantidos em posição por ao seio cavernoso. Estas manobras são úteis quando se
meio de anzóis. O músculo temporal é, então, sec- lida com lesões complexas da região paraclinóide.
cionado aproximadamente 1,5 cm abaixo e paralelo
à sua inserção na linha temporal superior para rea-
proximação e sutura no final do procedimento. A dis- Abertura Dural
secação do músculo continua, agora de modo subpe- A abertura da dura-máter se faz de modo amplo e
riosteal e de forma cuidadosa, do modo a preservar a de maneira a expor toda a superfície cortical locali-
fáscia profunda do músculo, por sob a qual cursam zada sob a craniotomia. Utilizam-se, portanto, todos
os ramos profundos da artéria temporal profunda e os espaços fornecidos pela craniotomia. A abertura da
os ramos nervosos temporais profundos, provenien- dura-máter tem início no lobo frontal, na porção mais
tes do nervo trigêmeo. O músculo temporal é retraído anterior e superior da craniotomia, se dirige posterior-
inferior e posteriormente, em direção à raiz posterior mente rumo à margem posterior da craniotomia, para
do zigoma. No caso de músculos temporais demasia- então se curvar anteriormente logo abaixo da impres-
damente espessos, a osteotomia zigomática permite são dural da asa menor do osso esfenóide e seguir em
que o músculo temporal seja rebatido inferiormente direção à fissura orbitária superior. O segundo ramo
sem a necessidade de tração exagerada. da incisão dural se inicia logo acima da fissura or-

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

bitária superior e se curva inferior e posteriormente, Vias de Acesso Cirúrgico


seguindo a curvatura da ponta do lobo temporal e, ao Ápice Basilar
posteriormente, na sua superfície látero-basal. Des-
sa forma, a parte inferior da superfície lateral, toda a Após ampla dissecção das cisternas basais, a
ponta e a superfície lateral do lobo temporal são ex- membrana de Lilliequiest é seccionada e o ápice
postas. Quase toda a extensão do ramo posterior da da artéria basilar é visualizado. Quando se utiliza o
fissura lateral é exposta. acesso transylviano, o acesso microcirúrgico à fos-
sa interpeduncular se faz através dos intervalos en-
tre o nervo óptico e artéria carótida interna (ACI), e/
Dissecação Microcirúrgica ou entre a ACI e o nervo oculomotor. Esses espaços
A dissecação microcirúrgica inicia-se com a aber- são denominados opticocarotídeo e retrocarotídeo,
tura da porção mais superficial da fissura sylviana e respectivamente55,56. O espaço retrocarotídeo é, ainda,
prossegue anteriormente em direção às cisternas ba- subdividido em espaços medial e lateral, conforme a
sais. As cisternas carotídea e opticoquiasmática são inspeção da fossa interpeduncular se faça medial ou
dissecadas. As fibras que compõem e conectam as lateral à artéria comunicante posterior55. A dimen-
cisternas sylviana profunda, carotídea, opticoquias- são desses espaços é variável conforme a posição
mática, ambiente e interpeduncular são seccionadas, do quiasma óptico, extensão da ACI (e, conseqüen-
e todas as aderências entre os lobos frontal e tempo- temente, posição da bifurcação carotídea), extensão
ral, unco do giro para-hipocampal, nervo oculomotor, da artéria cerebral anterior e extensão e direção da
artéria carótida interna e seus ramos (artéria corióide artéria comunicante posterior (Figs. 13.5 e 13.6).
anterior e comunicante posterior) e a borda livre da
tenda cerebelar são seccionadas.
A veia sylviana superficial e as veias frontorbitá-
rias que drenam para o seio esfenoparietal são coa-
guladas e seccionadas. Veias-ponte que conectam os
lobos frontal e temporal e atravessam a fissura sylvia-
na também são seccionadas. Procedemos à disseca-
ção cuidadosa de veias sylvianas superficiais muito
calibrosas. Nesses casos, a veia sylviana superficial
é dissecada da superfície do giro temporal superior,
permitindo a mobilização do lobo temporal durante
a cirurgia, sem prejuízo à sua drenagem em direção
ao seio esfenoparietal. Contrário à nossa atitude ra-
dicalmente conservadora em relação ao complexo da
veia de Labbè, adotamos uma postura mais liberal em
relação às veias que drenam para o seio esfenoparie-
Fig. 13.5 – Visão cirúrgica dos espaços utilizados para aces-
tal. Ainda não observamos, em nossa série de pacien- so à bifurcação da artéria basilar: 1. nervo óptico; 2. artéria
tes, qualquer complicação cirúrgica que pudesse ser carótida interna; 3. nervo oculomotor; 4. espaço opticocarotí-
atribuída à ligadura dessas veias. Uma postura mais deo; 5. espaço supracarotídeo; 6. espaço retrocarotídeo.
conservadora é aconselhada, no entanto, em casos de
veias temporais muito calibrosas, que possam even-
tualmente significar uma drenagem venosa do lobo
temporal predominantemente em direção anterior,
rumo aos seios esfenoparietal ou cavernoso.
O uso de retratores é geralmente dispensável du-
rante a dissecação das cisternas basais. A secção pro-
gressiva e completa das fibras aracnóides permite a
mobilização do tecido neural sem necessidade de re-
tração. Sem as aderências aracnóides, o tecido neural
pode ser “deslocado”, em vez de “retraído”. Uma vez
seccionadas as aderências aracnóides nas cisternas
basais, a ponta do lobo temporal pode ser deslocada
posterior e lateralmente, como se fosse “elevada” do
assoalho da fossa média. As aderências aracnóides Fig. 13.6 – Acesso cirúrgico à bifurcação da artéria basilar
restantes entre o unco, o nervo oculomotor, o seg- através do espaço retrocarotídeo: 1. nervo óptico; 2. artéria ca-
mento P2 da artéria cerebral posterior e a tenda do rótida interna; 3. artéria basilar; 4. artéria cerebelar superior; 5.
cerebelo são, então, cortados. artéria cerebral posterior; 6. nervo oculomotor.

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Apesar de descrito na literatura, raramente utiliza- ACoP e P1, de modo a preservar a permeabilidade
se o espaço supracarotídeo, sobre a bifurcação da ar- dos ramos talamoperfurantes anteriores.
téria carótida interna, medialmente ao nervo óptico. Esses espaços podem ser utilizados em diferentes
Apresenta como desvantagens o fato de ser muito pe- combinações. Pode-se mesmo utilizar, por exemplo,
queno na maioria das vezes e requerer manipulação o espaço retrocarotídeo medial para visualização do
cirúrgica entre as artérias perfurantes que se dirigem aneurisma e o espaço retrocarotídeo lateral para apli-
da região da bifurcação carotídea até a substância per- cação do clipe cirúrgico ao mesmo tempo.
furada anterior. Esse espaço pode ser utilizado quando O deslocamento superior e lateral da ponta do lobo
os espaços retrocarotídeos medial e lateral proporcio- temporal permite exposição de maior extensão do
nam espaços inadequados; a artéria carótida interna nervo oculomotor e borda livre da tenda do cerebelo,
é por demais aterosclerótica para ser mobilizada; ou o que torna o espaço lateral ao nervo oculomotor mais
a artéria carótida interna é extremamente curta e sua amplo. Manobras que ampliam ainda mais o espaço
bifurcação muito baixa. entre o nervo oculomotor e a tenda do cerebelo in-
O intervalo opticocarotídeo é limitado ântero-late- cluem a secção da tenda ou ponto de sutura que se
ralmente pelo nervo e quiasma ópticos, lateralmente estende desde a borda livre da tenda até o assoalho da
pela artéria carótida interna, superiormente pela artéria fossa média37,57. A abertura desse espaço permite um
cerebral anterior (segmento A1) e posteriormente pelo ângulo de visão mais basal e mais perpendicular ao
processo clinóide posterior. Esse espaço é utilizado eixo da artéria basilar, além de melhor visão da por-
quando a artéria carótida interna possui uma curvatura ção superior da fossa interpeduncular, muito embora
lateral acentuada ou em casos de ACI extremamente não amplie a área de exposição cirúrgica na profun-
ateroscleróticas, o que torna seu deslocamento medial didade do campo operatório. A mobilização do lobo
difícil ou indesejável. O espaço pode estar compro- temporal fornece, portanto, a possibilidade de visão
metido no caso de uma artéria comunicante posterior subtemporal da região da fossa interpeduncular.
curta ou calibrosa, obstruindo o espaço ou na presença Além de tornar disponíveis os espaços opticocaro-
de um aneurisma da artéria carótida interna. tídeo e retrocarotídeo medial, o acesso pré-temporal
Manobras descritas na literatura para aumentar o fornece um maior ângulo de visão ao espaço retroca-
espaço ou intervalo opticocarotídeo incluem a aber- rotídeo lateral e proporciona, ainda, a oportunidade
tura do canal do nervo óptico e sua mobilização su- de exploração cirúrgica lateralmente ao nervo oculo-
perior e medial; ligadura e secção do segmento A1 da motor. Esse espaço é particularmente útil para a colo-
artéria cerebral anterior em casos de hipoplasia desse cação de um clipe cirúrgico proximal. Com o mesmo
segmento; e remoção do processo clinóide posterior. intuito de criar um espaço lateral ao nervo oculomo-
Na maior parte das vezes, utiliza-se o espaço re- tor, alguns autores preconizam a ressecção da porção
trocarotídeo para tratar aneurismas basilares, em es- anterior do unco, a qual julgamos desnecessária caso
pecial o espaço retrocarotídeo lateral. O espaço retro- a dissecação aracnóide se faça de modo amplo.
carotídeo tem como limite lateral o nervo oculomotor Embora difícil de ser medida quantitativamente,
e a borda livre da tenda do cerebelo. Visualiza-se a a ampliação do ângulo de visão à fossa interpedun-
artéria comunicante posterior (ACoP) cruzando oblí- cular, em particular por meio da abertura do ângulo
quamente o intervalo carótido-oculomotor, em seu de visão ao espaço retrocarotídeo lateral e espaço
trajeto entre as cisternas carotídea e interpeduncular. lateral ao nervo oculomotor, medial à tenda do cere-
Quando se utiliza o espaço retrocarotídeo medial, se belo, permite maior conforto em relação à manipu-
procede à inspeção da cisterna interpeduncular me- lação cirúrgica do aneurisma e identificação de es-
dialmente à artéria carótida interna e à artéria comu- truturas circunvizinhas. Uma lesão num espaço tão
nicante posterior, entre os ramos talamoperfurantes limitado quanto a fossa interpeduncular, associada
posteriores. A colocação do clipe cirúrgico se faz sob a clipes cirúrgicos temporários ou não, aplicador de
uma orientação mais ântero-posterior do que quando clipe, pinça, bipolar, microdissectores e microtesou-
se utiliza o espaço retrocarotídeo lateral. ra, pode fazer com que as manobras microcirúrgicas
O espaço retrocarotídeo lateral é geralmente mais sejam feitas de modo limitado ou mesmo cego, co-
amplo que o medial e é utilizado para colocação do locando em risco estruturas anatômicas importantes.
clipe cirúrgico. Esse espaço é limitado em casos de A possibilidade de inspeção da fossa interpeduncu-
artérias comunicantes posteriores muito curtas. Seu lar entre os diferentes espaços entre o nervo óptico,
limite lateral é o nervo oculomotor e a borda livre da ACI, ACoP, nervo oculomotor e tenda do cerebelo
tenda cerebelar. A aplicação do clipe no espaço re- torna esse acesso mais versátil que o subtemporal e
trocarotídeo lateral se faz de modo mais tangente ao o pterional clássicos utilizados de modo isolado. O
eixo da bifurcação basilar, de modo mais semelhante acesso pré-temporal é, na verdade, uma associação
à aplicação do clipe por via subtemporal. Caso neces- dos dois acessos anteriores, cuja combinação forne-
sário, para aumentar a exposição, pode-se seccionar ce, ainda, um ângulo de visão pré-temporal à fossa
a ACoP o mais próximo possível da junção entre a interpeduncular.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Acesso Pré-temporal Transcavernoso lacrimal que deve ser preservada. Resseca-se a por-
Transelar ção mais posterior e superior do teto orbitário para
obter-se um ponto de exposição inferior da periórbita,
O acesso transcavernoso transelar foi inicialmente procedendo-se à sua dissecação retrógrada. Realizada
concebido por Dolenc em 198758 e utilizado recen- a osteotomia orbitozigomática, pontos de sutura são
temente por outros autores17,46,59. A anatomia micro- colocados sobre a periórbita, o que fornece uma leve
cirúrgica do acesso transcavernoso-transelar foi de- tração anterior do globo ocular e alguns milímetros
talhadamente descrita por Seoane et al.17, em 2000. adicionais de exposição basal. A dura-máter é aberta
Esse acesso consiste na ressecção dos processos cli- do modo já mencionado, e as cisternas basais, ampla-
nóides anterior (PCA) e posterior (PCP), assim como mente dissecadas.
extensão variável do clivo ipsilateral e dorso selar. O A fissura orbitária superior e o processo clinóide
intuito dessa ressecção óssea é o de aumentar o cam- anterior (PCA) são identificados. O ponto de junção
po operatório profundo e obter acesso ainda mais ba- da periórbita com a dura-máter da fissura orbitária
sal até a cisterna pré-pontina. Pode-se dizer mesmo superior é identificado por meio da emergência da ar-
que esse acesso cirúrgico é a única via ântero-lateral téria meningo-orbitária. Por microtesoura, ou lâmina
que proporciona maior espaço cirúrgico em relação de bisturi número 11, a porção súpero-lateral da fis-
à porção anterior do hiato tentorial, por aumentar o sura orbitária superior é incisada. A membrana dural
diâmetro ântero-posterior na profundidade da expo- externa da parede lateral do seio cavernoso e fossa
sição cirúrgica e proporcionar visão mais ampla da média é identificada, e a partir do ápice da fissura
fossa interpeduncular e da cisterna pré-pontina. Todas orbitária superior a dura-máter pode ser descolada de
as variações e extensões dos acessos clássicos pterio- sua membrana interna por meio de dissecação rom-
nal e subtemporal, incluindo o acesso pré-temporal, ba. A identificação correta do plano de dissecação é
utilizam-se de diferentes osteotomias e ângulos cirúr- fundamental para se evitar lesão inadvertida do con-
gicos de visão variáveis, sem modificar a dimensão teúdo intra-orbitário ou dos nervos que passam na
do espaço cirúrgico profundo (porção anterior do hia- profundidade da fissura orbitária superior. Essa dis-
to tentorial). secação romba procede também no lado frontal rumo
A indicação desse acesso cirúrgico se faz para tra- à extremidade distal da asa menor do osso esfenóide
tar lesões grandes, complexas, ou que tenham loca- e processo clinóide anterior, e continua medialmen-
lização baixa em relação ao dorso selar. O conforto te de modo a expor a superfície superior do canal
proporcionado por uma exposição cirúrgica mais am- do nervo óptico. Tal manobra faz expor o processo
pliada, aliada à crescente curva de aprendizado em clinóide anterior. A exposição do processo clinóide
relação a essa via, tornará a indicação desse acesso anterior se completa pela incisão da dura-máter que
mais comum e, conseqüentemente, incluirá um nú- recobre sua margem súpero-lateral. Essa incisão du-
mero maior de casos. ral continua superiormente até encontrar a incisão
O acesso transcavernoso transelar inicia-se com dural, previamente realizada sobre a impressão dural
a craniotomia pré-temporal, previamente descrita. da asa menor do esfenóide. A exposição dural final
Acrescenta-se, ainda, a osteotomia orbitozigomática, se realiza por meio de uma secção dural transver-
que geralmente é realizada em duas etapas. Após a sal ao eixo do nervo óptico, proximal ao ligamento
dissecação do músculo temporal, o arco zigomático falciforme, deixando uma margem de dura exposta
é exposto e seccionado, e o músculo temporal é re- para sutura ao final do procedimento. Essa incisão
batido inferior e posteriormente, aderido ao arco zi- dural continua até aproximadamente 10 mm medial
gomático. Procura-se não dissecar o arco zigomático ao nervo óptico. Toda a dura-máter, que recobre a
inferior e medialmente por serem os pontos de fixa- base do lobo frontal e o assoalho da fossa craniana
ção do músculo masseter. Por isso, deixa-se o arco anterior, é rebatida medialmente.
zigomático aderido aos músculos temporal e masse- O passo seguinte constitui-se na remoção do PCA
ter. Essa manobra diminui o desconforto mastigatório e do teto do canal do nervo óptico. Utilizam-se bro-
pós-operatório ou subseqüente disfunção da articula- cas de diamante e irrigação copiosa de modo a evitar
ção temporomandibular observada após secções orbi- excesso de calor próximo à bainha do nervo óptico.
tozigomáticas. O excesso de calor durante esse passo pode ser um
Realiza-se a craniotomia pré-temporal, seguida possível mecanismo de lesão para explicar amauro-
de secção da rima orbitária e processo frontomalar. se pós-operatória ipsilateral. O pilar óptico, ponto de
Cuidado especial é dispensado à periórbita, cuja inte- inserção do PCA no corpo do osso esfenóide, é bro-
gridade tenta-se sempre preservar. Inicia-se sua disse- cado, e a ressecção do processo clinóide anterior é
cação nas porções superior e lateral da rima orbitária, completada.
com especial cuidado na região da sutura frontozigo- Após a ressecção do PCA, o segmento clinóide
mática, onde a periórbita se encontra bastante aderida da artéria carótida interna é exposto. Tal segmento se
ao osso. Nessa região, encontra-se ainda a glândula situa entre dois anéis durais60. O primeiro é denomi-

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13 – Aneurismas Basilares Distais

nado anel fibroso ou distal, e o segundo é chamado nal do nervo oculomotor, que é retraído lateralmente
de anel dural proximal. O primeiro circunda e adere junto com uma camada dural. Na segunda manobra,
à ACI e a fixa à base do crânio. É uma continuação utilizamos microdissector com ponta em ângulo reto,
da dura-máter que recobre o assoalho da fossa cra- que é progressivamente introduzido no canal do ner-
niana anterior, processo clinóide anterior e base da vo oculomotor, ao mesmo tempo em que a superfície
fossa média. O segundo é também denominado de súpero-medial do canal é aberta cuidadosamente com
membrana carótido-oculomotora, que se estende da lâmina de bisturi número 11. Neste caso, o próprio
porção medial do nervo oculomotor até a parede la- nervo oculomotor é deslocado lateralmente.
teral da artéria carótida interna61. Esse segundo anel A incisão se estende ainda posteriormente em di-
é, na verdade, o verdadeiro teto da porção anterior reção ao processo clinóide posterior (PCP). O san-
do seio cavernoso60. De modo diferente do anel dis- gramento proveniente do seio cavernoso é tamponado
tal, a membrana carótido-oculomotora não adere fir- com Surgicel®. O sangramento proveniente do seio
memente à parede da carótida e se comporta como cavernoso é eventualmente copioso, mas o conheci-
um manguito, que permite a passagem de conteúdo mento dos espaços venosos e seu preenchimento com
venoso do seio cavernoso. Esses canais venosos se material hemostático tipo Surgicel® permite tamponar
situam entre a membrana carótido-oculomotora e a o sangramento e não causar estenose inadvertida da
parede do segmento clinóide da ACI, formando um artéria carótida intracavernosa.
plexo venoso periarterial. O sangramento venoso O excesso de dura do teto do seio cavernoso é res-
proveniente do plexo venoso periarterial é facilmente secado. Expõe-se, dessa forma, o processo clinóide
controlado com Surgicel®. A bainha do nervo óptico posterior e porções adjacentes do clivo. Por meio de
é seccionada em sua face lateral, com cuidado para retração medial da carótida supraclinóide, cria-se um
evitar lesão da artéria oftálmica em seu trajeto rumo à espaço quadrangular que é limitado medial e supe-
cavidade orbitária. O nervo óptico é deslocado de seu riormente pela ACI supraclinóide, medialmente pela
canal e mobilizado medialmente. Para isso, aplica-se glândula pituitária, anteriormente pelo segmento cli-
um ponto de sutura com fio de náilon 4-0 na face su- nóide da ACI, lateralmente pelo segmento horizon-
perior da dura própria do canal do nervo óptico. A tal intracavernoso da ACI e borda superior da pare-
artéria oftálmica é identificada e o anel dural distal de lateral do seio cavernoso, e posteriormente pelo
é seccionado em toda sua circunferência, abaixo da processo clinóide posterior e dorso selar. Os limites
artéria oftálmica, permitindo mobilização da ACI em súpero-medial, anterior e lateral desse espaço são,
direção transversal17,62. portanto, constituídos pelos segmentos intradural,
O passo seguinte constitui a abertura da porção clinóide e intracavernoso da ACI, que descrevem
posterior do teto do seio cavernoso, no chamado uma concavidade posterior, voltada para o processo
triân­gulo do nervo oculomotor61. O nervo oculomo- clinóide posterior. O conteúdo intracavernoso desse
tor é identificado desde sua emergência na face me- espaço é o espaço medial, o segmento horizontal da
dial do pedúnculo cerebral até sua entrada na porção ACI e as artérias hipofisárias inferiores, ramos do
posterior do teto do seio cavernoso. A porção poste- tronco meningo-hipofisário. Não há nenhum nervo
rior do teto do seio cavernoso é limitada pelas pregas craniano a cursar neste espaço. Todos os nervos do
durais petroclinóide anterior, petroclinóide posterior seio cavernoso se situam lateralmente à ACI e, exceto
e interclinóide. O nervo oculomotor penetra no seio pelo nervo abducente, todos cursam na parede lateral
cavernoso por meio de um canal dural, cujo diâme- do seio cavernoso.
tro é ligeiramente maior que o nervo em sua porção O passo final do acesso transcavernoso transelar
proximal (cisterna oculomotora), mas que se estreita é a brocagem do processo clinóide posterior e dorso
e “se funde” à bainha do nervo oculomotor próximo à selar. O nervo oculomotor é deslocado lateralmente e
fissura orbitária superior. A incisão dural se inicia no a artéria carótida interna intradural é deslocada me-
ponto de entrada do III nervo no seio cavernoso, em dialmente. Todo o PCP é ressecado e, conforme sua
seu lado medial, e se dirige rumo à fissura orbitária extensão superior e lateral, parte da brocagem se faz
superior. Deve-se tomar extremo cuidado próximo à lateralmente ao nervo oculomotor, que dessa vez é
fissura orbitária superior, de modo a evitar-se lesão do mobilizado medialmente. Todo o osso clival adjacen-
nervo troclear, que se dirige medialmente na região do te, incluindo o dorso selar, é removido, e a ressecção
ápice orbitário, cruzando a superfície superior do ner- óssea continua até se obter o espaço desejado. A dura-
vo oculomotor, em seu trajeto rumo ao músculo oblí- máter da porção superior do clivo é coagulada e sec-
quo superior. A dissecação do nervo oculomotor pode cionada, expondo a região da cisterna pré-pontina.
se realizar de duas maneiras diferentes: incisando-se Este acesso permite exposição do tronco da artéria
a dura-máter medial ao canal do nervo oculomotor basilar. Seoane et al.7 encontraram 12,8 mm como um
no teto do seio cavernoso ou por meio de abertura valor de exposição proximal adicional da artéria basi-
do próprio canal do nervo oculomotor. A primeira lar obtida por meio da confecção dessa via. Consegue-
manobra mantém intacta a porção proximal do ca- se visualização adequada do ápice basilar, de ambos

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

os segmentos P1 (e geralmente de P2A ipsilateral), uma manipulação cirúrgica mais prolongada e tra-
das artérias talamoperfurantes posteriores de ambos balhosa em relação à confecção do acesso cirúrgico
os lados, das artérias cerebelares superiores, e de parte do que colocar em risco ramos arteriais principais ou
do tronco basilar entre a emergência da artéria cere- perfurantes, por falta de uma via operatória adequa-
belar superior e artéria cerebelar ântero-inferior. Esse da.
espaço adicional se traduz em maior conforto operató-
rio proporcionado por um maior espaço na profundi- Conclusão
dade do campo cirúrgico. Permitiu a possibilidade de
controle arterial proximal em todos os nossos casos, Aneurismas distais da artéria basilar ainda repre-
assim como clipagem adequada de lesões complexas sentam grande desafio aos métodos atuais de trata-
e grandes dessa região. Aneurismas baixos, pouco vi- mento. Do ponto de vista cirúrgico, compete ao neu-
síveis em situação retrosselar, puderam também ser rocirurgião treinar-se cada vez mais em microcirurgia
tratados com êxito após ressecção clival. e angariar suficiente conhecimento anatômico, de
Observa-se como única complicação pós-operató- modo a aprimorar a sua cirurgia e, conseqüentemente
ria atribuível ao acesso cirúrgico a paresia transitória seus resultados com lesões de tão difícil tratamento.
do nervo oculomotor, que ocorre geralmente em to- A técnica microcirúrgica deve progredir, assim
dos os pacientes operados. No entanto, a recuperação como progridem incessantemente outras modalidades
funcional integral do nervo oculomotor foi observada de tratamento, como a neurocirurgia endovascular e
em um período de 2 a 12 semanas. Esse déficit é atri- a radiocirurgia estereotática. Lesões primariamente
buído à manipulação do nervo durante a cirurgia e sua cirúrgicas devem ser tratadas por cirurgiões experien-
recuperação funcional se deve à preservação anatô- tes, cujos resultados sejam reconhecidamente bons.
mica do nervo. Modalidades complementares ou alternativas de tra-
A paresia oculomotora pré e pós-operatória é de tamento, por sua vez, devem ser discutidas com o
ocorrência comum. Wascher e Spetzler1 apontam neurocirurgião e escolhidas como alternativa de trata-
como complicação cirúrgica mais freqüente a paresia mento por este, jamais sendo escolhidas, no entanto,
oculomotora unilateral, que pode ocorrer em até 70% como alternativa à falta de preparo ou de treinamento
dos casos. Horikoshi et al.63 apontam como fatores de microcirúrgico do cirurgião.
risco aumentado de paresia oculomotora pós-opera-
tória os seguintes: cirurgia precoce; paciente jovem; REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
estado clínico neurológico ruim, aneurisma grande,
projeção póstero-superior de aneurismas basilares e 1. Wascher TW, Spetzler RF. Saccular aneurysms of the
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é possivelmente o dano vascular. O suprimento arte- 2. Le Roux PD, Winn R. Surgical approaches to basilar
rial do segmento cisternal do nervo oculomotor se faz bifurcation aneurysms. Neurosurg Clin North Am.
por meio de artérias provenientes da circulação pos- 1998;9:835-49.
terior. O dano vascular pode ser periférico ou central. 3. Yasargil MG. Microneurosurgery II: clinical consi-
Neste último, artérias perfurantes para o mesencéfalo derations, surgery of the intracranial aneurysms and
(artérias perfurantes interpedunculares) são lesadas, results. Stuttgart: Georg Thieme Verlag; 1984.
o que determina infarto isquêmico na área do núcleo 4. Ferreira MAT, Tedeschi H, Wen HT, Oliveira E. Pos-
e fascículo oculomotor. Esse tipo de lesão pode ser terior circulation aneurysms:guideline to manage-
acompanhado de hemiparesia contralateral. De modo ment. Operat Tech Neuros. 2000;3:169-78.
geral, a lesão periférica do nervo oculomotor deter- 5. Dederson J, Award IA, Wiebers DO, et al. Recom-
mina bom prognóstico de recuperação funcional, mendations for the management of patients with
conforme mostra nossa série de pacientes submeti- unruptured intracranial aneurysms: a statement
dos ao acesso transcavernoso transelar. Embora tam- for healthcare professionals from the stroke coun-
bém possam ter recuperação funcional satisfatória, a cil of the American Heart Association. Circulation.
2000;10:2300-8.
maior parte dos pacientes com lesões centrais não se
6. Brennan JW, Schwartz ML. Unruptured intracranial
recupera ou o faz de modo parcial.
aneurysms: appraisal of the literature and suggested
A vantagem de se obter uma exposição adequada recommendations for surgery, using evidence-based
para tratamento de lesão tão delicada quanto aneuris- medicine criteria. Neurosurgery. 2000;47:1359-72.
mas do ápice basilar seguramente ultrapassa a dificul- 7. International study of unruptured intracranial aneu-
dade de realização desse acesso. De fato, ele é mais rysms investigators. Unruptured intracranial aneu-
demorado e mais complexo que o acesso pré-tempo- rysms-risk of rupture and risks of surgical interven-
ral ou outros acessos convencionais. O conhecimento tion. N Engl J Med. 1998;339:1725-33.
profundo da anatomia microcirúrgica da região para- 8. Juvela S, Porras M, Poussa K. Natural history of
clinóide e do seio cavernoso é obrigatório. Prefere-se unruptured intracranial aneurysms: probability of

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13 – Aneurismas Basilares Distais

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14
Anastomose de Alto Fluxo
Extra-intracraniana no Tratamento de
Aneurismas Complexos
Juan Antonio Castro Flores
“A carotid is a terrible thing to waste…”
O. Al-Mefty

A
maior e mais temida complicação do trata-
Tabela 14.1 – Indicações para o Bypass de Alto Fluxo
mento de aneurismas complexos da artéria
carótida é, sem dúvida, a isquemia cerebral. Doença cerebrovascular oclusiva
Depen­dendo do calibre do vaso e do território vascu-
Aneurismas carotídeos complexos
lar acometido, a isquemia cerebral pode ser fatal.
Por esse motivo, devem-se considerar recursos te- Pseudo-aneurismas carotídeos traumáticos
rapêuticos que evitem a complicação isquêmica.
Os aneurismas complexos da artéria carótida, de-
vido à sua morfologia, tamanho e localização, even-
riam pacientes que persistem com sintomas isquêmi-
tualmente não são passíveis de tratamento cirúrgico
cos recorrentes na vigência de terapia medicamentosa
direto. Mesmo em mãos experientes, a morbidade é
plena – que inclui antiagregantes plaquetários, anti-
elevada. Nesses casos, deve-se considerar a exclusão
coagulantes, expansão volêmica e hipertensão induzi-
do aneurisma e da artéria que o origina, idealmente
da. Dessa forma, o bypass de alto fluxo constituiria o
com a realização prévia da revascularização cerebral.
último recurso. Mas a indicação poderia ser precoce,
O objetivo da revascularização cerebral é a ma- considerando-se o conhecimento atual da história na-
nutenção do fluxo sangüíneo cerebral para prevenção tural dessa doença.
da isquemia no tratamento de aneurismas carotídeos
Em casos de aneurismas carotídeos complexos e
complexos.
pseudo-aneurismas traumáticos, há indicação formal
A revascularização cerebral deve ser realizada nos do bypass de alto fluxo, devido à necessidade de sa-
casos em que há necessidade de oclusão terapêutica crifício terapêutico da artéria carótida.
aguda da artéria carótida. Existem várias técnicas
Pode-se agrupar os aneurismas complexos sinto-
de revascularização cerebral descritas na literatura.
máticos da seguinte forma:
A abordada aqui é a anastomose extra-intracraniana
com interposição de enxerto venoso, conhecida como • Aneurismas gigantes: causam sintomas neuro-
bypass de alto fluxo. lógicos devido à compressão neurovascular ou
cerebral (Fig. 14.1).
• Aneurismas parcialmente trombosados: causam
Indicações sintomas por tromboembolismo (Fig. 14.2).
Pode haver indicação de anastomose extra-intra- • Aneurismas rotos: causam hemorragia suba-
craniana para doenças de diversas etiologias, mas racnóidea.
com um denominador comum: risco de isquemia ce- • Pseudo-aneurismas traumáticos: causam he-
rebral (Tabela 14.1). morragia subaracnóidea e/ou epistaxe maciça
Na doença cerebrovascular oclusiva, a indicação (Fig. 14.3).
dessa técnica ainda é controversa. Os candidatos se- • Aneurismas carotídeos bilaterais.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

A B

Fig. 14.1 – (A) Angiografia cerebral ilustrando aneurisma gigante do segmento intracavernoso da artéria carótida interna, com
componente subaracnóideo, causando compressão nas estruturas do seio cavernoso e da região paraclinóidea. (B) Visão pterional
esquerda, observar o efeito compressivo do aneurisma sobre as estruturas neurovasculares circunjacentes. O retrator cerebral está
aplicado sobre o lobo frontal. 1. aneurisma; 2. artéria cariótida esquerda; 3. artéria comunicante posterior; 4. artéria corióidea
anterior; 5. segmento M1 da artéria cerebral média; 6. segmento A1 da artéria cerebral anterior; 7. nervo óptico esquerdo.

A B

Fig. 14.2 – (A) Angiografia cerebral e (B e C) angiotomografia ilustrando aneurisma gigante intracavernoso parcialmente
trombosado. Há trombo central no saco aneurismático, determinando fluxo sangüíneo periférico ao trombo, constituindo uma
fonte emboligênica.

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14 – Anastomose de Alto Fluxo Extra-intracraniana no Tratamento de Aneurismas Complexos

Aspectos Técnicos
A anastomose extra-intracraniana é um procedi-
mento de alta complexidade técnica. É necessário um
treinamento responsável prévio.
A cirurgia é iniciada com a cervicotomia, com ex-
posição da artéria carótida comum, carótida externa e
carótida interna.
A seguir, é realizada uma craniotomia pterional.
Os sítios cirúrgicos são, então, comunicados por
uma cânula de intubação colocada inferiormente ao
Fig. 14.3 – Angiografia cerebral ilustrando pseudo-aneu- arco zigomático.
risma traumático do segmento intracavernoso da artéria ca-
rótida.

Previamente à cirurgia, a angiografia cerebral


deve ser cuidadosamente analisada para avaliar as
particularidades anatômicas e a circulação colateral.
O estudo angiográfico deve ser realizado, incluindo
manobras de compressão da carótida cervical ou teste
de oclusão com balão. A análise da angiografia permi-
te obter dados sobre a patência do polígono de Willis
e a tolerância do paciente à oclusão temporária.

Fig. 14.6 – Posicionamento do paciente para o bypass de


alto fluxo.

Fig. 14.4 – Teste de oclusão da carótida esquerda com ba-


lão endovascular. Nota-se o retardo no tempo angiográfico
em relação ao território carotídeo direito, o que sugere in-
competência do polígono anterior e justifica a necessidade da
revascularização cerebral.
B

Fig. 14.7 – (A) Marcação do local da incisão cutânea e pon-


Fig. 14.5 – Teste de compressão das carótidas para avalia- tos de referência (ângulo da mandíbula e processo mastóide).
ção da competência do polígono posterior. Nota-se o enchi- (B) Cervicotomia direita: 1. artéria carótida comum; 2. artéria
mento do território da carótida através do ramo comunicante carótida interna; 3. artéria carótida externa; 4. artéria tireóidea
posterior. superior; 5. nervo glossofaríngeo; 6. mandíbula.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Fig. 14.10 – Safenectomia.


Fig. 14.8 – Craniotomia pterional. Nota-se a cânula posicio-
nada inferiormente ao arco zigomático, comunicando os sítios O tempo de duração dessa anastomose é de apro-
cirúrgicos (asterisco). ximadamente 35 a 45 minutos. A linha de anastomose
é coberta com fragmentos de Surgicel® e algodão ci-
Procede-se à dissecação microscópica ampla das rúrgico. Retiram-se os clipes temporários e verifica-
cisternas basais e sylviana, com exposição dos seg- se a patência do enxerto. Este é, então, introduzido na
mentos da carótida interna e cerebral média, com o cânula previamente colocada e exteriorizado ao nível
objetivo de selecionar o segmento receptor do enxerto da cervicotomia.
venoso. Simultaneamente realiza-se a safenectomia e A seguir são colocados clipes temporários no seg-
o preparo do enxerto venoso. mento inicial da carótida externa e realizada a arterio-
Após a seleção do segmento arterial receptor, ini- tomia. O enxerto venoso é anastomosado com pontos
cia-se a anastomose intracraniana. Administra-se, en- simples de Prolene® ou náilon 7 ou 8 zeros.
tão, um bolus de 3.000 UI de heparina e realizam-se Após a retirada dos clipes temporários, usualmen-
as manobras anestésicas de proteção cerebral. te ocorre um sangramento discreto que cessa após al-
Colocam-se clipes temporários no início e no fim guns minutos.
do segmento arterial receptor e realiza-se uma arte- Verificada a patência do enxerto venoso, geral-
riotomia linear nesse segmento. O enxerto venoso é, mente com uma angiografia intra-operatória, proce-
então, anastomosado com pontos simples de Prolene® de-se à oclusão da carótida interna cervical ao nível
ou náilon 9 ou 10 zeros, dependendo da espessura da da bifurcação, assim como no segmento carotídeo in-
parede arterial. tracraniano imediatamente distal ao aneurisma.

Fig. 14.9 – Dissecação microscópica da fissura sylviana e


cisternas basais, com exposição da carótida interna, cerebral
média e ramos, para seleção do segmento arterial receptor. 1.
nervo óptico direito; 2. artéria carótida interna direita; 3. seg-
mento A1 da artéria cerebral anterior; 4. segmento M1 da arté- Fig. 14.11 – Aspecto final da anastomose término-lateral
ria cerebral média; 5. bifurcação da artéria cerebral média. intracraniana. A microssutura foi realizada no segmento M2
da artéria cerebral média.

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14 – Anastomose de Alto Fluxo Extra-intracraniana no Tratamento de Aneurismas Complexos

Fig. 14.13 – Aspecto final do procedimento.

Fig. 14.12 – Aspecto final da anastomose término-lateral


extracraniana. A microssutura foi realizada na artéria carótida
externa. 1. artéria carótida interna; 2. artéria carótida externa;
3. artéria tireóidea superior; 4. enxerto venoso; 5. artéria ca-
rótida interna (ligada).

Exemplos
A B

Fig. 14.14 - (A) Paciente de sexo feminino, 56 anos, portadora de síndrome do seio cavernoso à esquerda, com dor trigeminal
de difícil tratamento por aneurisma intracavernoso gigante. (B) Tratada com bypass de alto fluxo e oclusão da carótida interna
cervical e supraclinóidea.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

A B

C D

Fig. 14.15 - Paciente de sexo feminino, 55 anos, com perda visual de evolução progressiva à esquerda, secundária à compres-
são por aneurisma carotídeo gigante localizado parcialmente no seio cavernoso com expansão subaracnóidea intracraniana (A
e B, AP e perfil pré-operatórios, respectivamente). Tratada com bypass de alto fluxo (C e D, AP e perfil pós-operatórios, respec-
tivamente). Note-se o clipe colocado distalmente ao aneurisma, com preservação da artéria corióidea anterior. O enxerto venoso
está anastomosado no segmento M2 da cerebral média esquerda.

A B

Fig. 14.16 - (A e B) Paciente de sexo feminino, 48 anos, portadora de aneurisma gigante parcialmente trombosado do seg-
mento oftálmico da carótida interna esquerda. Tratada com bypass de alto fluxo, seguido de oclusão da carótida interna ao nível
da bifurcação cervical e oclusão da carótida externa distalmente à anastomose do enxerto venoso. A anastomose intracraniana
foi realizada ao nível da bifurcação da cerebral média esquerda. Um clipe (1) oclui a carótida interna intracraniana distalmente
ao aneurisma. Outro clipe (2) oclui a carótida externa imediatamente após a anastomose proximal. A artéria carótida interna,
incluindo o aneurisma, foi excluída da circulação (3). O fluxo sangüíneo é garantido pelo enxerto venoso.

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14 – Anastomose de Alto Fluxo Extra-intracraniana no Tratamento de Aneurismas Complexos

A B

C D

E F

Fig. 14.17 - Paciente do sexo feminino, 56 anos, portadora de aneurisma gigante da carótida, tratada com bypass. (A e B)
Angiografias pré-operatórias. (C e D) Angiografias pós-operatórias. (E e F) Angiotomografias ilustrando o trajeto do enxerto e os
sítios da anastomose proximal e distal.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Cuidados Pós-Operatórios technique, and results in 29 patients. Neurosurgery.


2002;51(1):138-46.
Os cuidados de pós-operatório são similares aos Lawton MT, Hamilton MG, Morcos JJ, Spetzler RF.
de outros pacientes submetidos a craniotomias. É ad- Revascularization and aneurysm surgery: Current
ministrada heparina subcutânea na dose de 5.000 UI techniques, indications, and outcome. Neurosurgery.
a cada 8 horas, e após uma semana inicia-se o ácido 1996;38:83-92.
acetilsalicílico (AAS) na dose de 300 ou 325 mg por Morgan M, Sekhon LH. Extracranial-intracranial saphen-
dia, por via oral, suspendendo-se a heparina. ous vein bypass for carotid or vertebral artery dissec-
O controle da patência do enxerto, após a angio- tions: a report of six cases. J Neurosurg. 1994;80:237-
grafia pós-operatória inicial, geralmente é feito por 46.
angiografia por ressonância magnética, após três me- Quiñones-Hinojosa A, Du R, Lawton MT. Revasculariza-
ses, e então anualmente. tion with saphenous vein bypasses for complex in-
tracranial aneurysms. Skull Base. 2002;15(2):119-
31.
Complicações Sekhar LN, Kalavakonda C. Cerebral revascularization for
A oclusão intra-operatória do enxerto geralmente aneurysms and tumors. Neurosurgery. 2002;50(2):
321-31.
ocorre por razões técnicas, que devem ser corrigidas
Sekhar LN, Kalavakonda C. Saphenous vein and radial ar-
de imediato. tery grafts in the management of skull base tumors
As complicações pós-operatórias potenciais in- and aneurysms. Oper Tech Neurosurg. 1999;2:129-
cluem os hematomas extradurais, favorecidos pela 41.
anticoagulação intra-operatória, as contusões cere- Sekhar LN, Sen CN, Jho HD. Saphenous vein graft bypass
brais e a oclusão do enxerto. of the cavernous internal carotid artery. J Neurosurg.
1990;72:35-41.
BIBLIOGRAFIA Sekhar LN, Wright DC, Olding M. Brain revascularization
by saphenous vein and radial artery bypass graft. In:
Andrews BT, Chater NL, Weinstein PR. Extracranial-in- Sekhar LN, Olivera ED, editors. Cranial microsur-
tracranial arterial bypass for middle cerebral artery gery. New York: Thieme; 1999, p. 581-600.
stenosis and occlusion: Operative results in 65 cases. Sen C, Sekhar LN. Direct vein graft reconstruction of the
J Neurosurg. 1985;62:831-8. cavernous, petrous, and upper cervical internal ca-
Diaz FG, Ausman JI, Pearce JE. Ischemic complications rotid artery: lessons learned from 30 cases. Neuro-
after combined internal carotid artery occlusion and surgery. 1992;30:732-43.
extracranial-intracranial anastomosis. Neurosurgery. Spetzler RF, Schuster H, Roski RA. Elective extracranial-
1982;10:563-70. intracranial arterial bypass in the treatment of inoper-
Diaz FG, Pearce J, Ausman JL. Complications of cerebral able giant aneurysms of the internal carotid artery. J
revascularization with autogenous vein grafts. Neu- Neurosurg. 1980;53:22-7.
rosurgery. 1985;17:271-6. Story JL, Brown Jr WE, Eidelberg E, Arom KV, Stewart
Gelber BR, Sundt Jr TM. Treatment of intracavernous and JR. Cerebral revascularization: common carotid to
giant carotid aneurysms by combined internal carotid distal middle cerebral artery bypass. Neurosurgery.
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to-intracranial bypass grafting: indications, operative 1998;43:761-7.

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15
Tratamiento Quirúrgico de la Enfermedad
Moyamoya
Leonidas Quintana Marín

Introducción Esta enfermedad primero fue comunicada en 1957


por Takeuchi y Shimizu2, y posteriormente se han

L
a enfermedad moyamoya es una afección cere- publicado desde entonces numerosos otros casos y
brovascular oclusiva crónica, en que las porciones términos. Actualmente, la enfermedad se denomina
terminales de las arterias carótidas internas intra- con mayor frecuencia en la literatura mundial como
craneales y sus ramas principales, las arterias cerebra- enfermedad moyamoya (nombrada por Jiro Suzuki,
les media y anterior, se estenosan progresivamente, o Universidad de Tohoku)1 y también se le nomina en el
se ocluyen, y como consecuencia de ésta alteración el ámbito japonés, como la obstrucción espontánea del
flujo sangüíneo cerebral disminuye, y se desarrollan círculo de Willis (nombrada por Kudo T, Universidad
pequeños vasos perforantes de la base del cerebro de Keio)3.
que se dilatan para convertirse en vías de circulación
Aunque existen variados informes sobre la en-
sangüínea colateral. Estos pequeños vasos se llaman
fermedad moyamoya en todo el mundo, incluyendo
“vasos moyamoya”, porque el aspecto angiográfico de
Asia, Europa, Australia, y los Estados Unidos, los
éstos se asemeja a la “voluta” del humo del cigarrillo
casos son mucho más comunes en Japón4-6. En éste
que se difumina en el aire, lo cual se llama “moya-
país la incidencia es 3.16/100.000 habitantes/año en
moya” en lengua japonesa; también moya-moya es la
Japón, dónde se diagnostican cerca de 400 nuevos pa-
palabra japonesa para describir el aspecto nebuloso, o
cientes anualmente.
idea confusa o poco clara sobre algo1 (Fig. 15.1).
El cuociente de hombre/mujer es 1:1.8, que de-
muestra la mayor frecuencia en el sexo femenino.
La distribución de la edad de comienzo clínico
de la enfermedad moyamoya tiene dos picos, que se
describen con mayor frecuencia. En los niños bajo la
edad de 10 años, en un 47,8% del total de los casos,
en los cuales los síntomas de isquemia cerebral son
comunes; y en los adultos entre 30 y 40 años de la
edad, en los cuales los síntomas de hemorragia son
más frecuentes. Por supuesto, la hemorragia en los
niños y la isquemia en adultos pueden ocurrir, pero
son menos comunes7.
La etiología aún no se sabe con certeza. Actual-
mente, las etiologías más consensuadas son la com-
binación de la congénita y la adquirida: los factores
genéticos así como factores ambientales pueden de-
Fig. 15.1 – Placa lateral de angiografía carotídea derecha en sempeñar un papel importante en la presentación de la
que se señalan los vasos moyamoya. enfermedad moyamoya. Es obvio que las infecciones

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

por bacterias o virus no son la causa directa, así no vasos neoplásicos anormales, tales como los que ali-
existe la posibilidad de transmisión de la enfermedad a mentan un tumor (vasos de neovascularización debido
partir de una infección en forma directa, sin embargo, a la activación de procesos angiogénicos). Ellos son
ésta infección puede desencadenar procesos de tipo pequeños vasos normales, de la microcirculación en la
inmunológicos más acentuados en determinados indi- estructura profunda basal del cerebro, que tienen que
viduos, lo cual está determinado genéticamente8-10. “asumir” la función de vía colateral al cerebro isqué-
En especial en países occidentales, la enfermedad mico, y debido a la sobrecarga de perfusión cerebral
moyamoya se asocia con patología de tipo sistémico a que son sometidos, y a rangos de presión arterial
como son: sistólica para los cuales no están diseñados, ocasio-
• Infecciones: la leptospirosis y la tuberculosis nalmente se rompen y causan una hemorragia cerebral
• Desórdenes hematologicos: anemia aplástica, y/o intraventricular14.
anemia de Fanconi, anemia de células falcifor- Los vasos moyamoya son prominentes en niños,
mes, factor anticoagulante del lupus pero no tan acentuados en adultos, y se cree que éstos
• Sindromes congénitos: síndrome de Apert, sín- vasos en niños son más flexibles y plástico que en
drome de Down, síndrome de Marfan, esclero- adultos, de ahí su mayor potencial de desarrollo.
sis tuberosa, síndrome de Turner, enfermedad Pauta de diagnóstico para la obstrucción espon-
de von Recklinghausen, enfermedad de Hirs- tánea del círculo de Willis (enfermedad “moya-
chsprung. moya”), propuesta por el Comité de Investigación
• Enfermedades vasculares: enfermedad ate- del Ministerio de Salud, Trabajo y Bienestar del
rosclerótica, coartación de la aorta, displasia Japón
fibromuscular. 1. Hallazgos Clínicos
• Otras causas, como trauma craneal, lesión ce- 1.1. a) La edad de inicio varía, pero afecta con
rebral por radiación, tumores parasellares, hi- mayor frecuencia a los jóvenes y a las mujeres.
pertensión arterial y abuso de drogas simpati- La ocurrencia solitaria es común, pero la ocurren-
comiméticas. cia familial se observa ocasionalmente.
Sin embargo, en Japón, éstos casos de moyamoya 1.1. b) Los síntomas y la evolución varían, no
son catalogados como cuasi moyamoya, como se pre- presentándose síntomas en algunos casos (hallazgos
cisará más adelante. incidentales), alteraciones transitorias, o déficit neu-
La enfermedad moyamoya se caracteriza, al exa- rológico completado de grado leve a severo.
men microscópico de la pared arterial afectada, por 1.1. c) La isquemia cerebral es más común en
un engrosamiento de la íntima, en las paredes de las niños, mientras que la hemorragia intracraneal es más
porciones terminales de las arterias carótidas internas común en adultos.
en forma bilateral. El engrosamiento intimal puede 1.2. En niños, la hemiparesia, la monoparesia, el
contener depósitos lipídicos. Las arterias cerebrales compromiso sensitivo, los movimientos involunta-
anteriores, medias, y posteriores que configuran el rios, la cefalea, o las convulsiones aparece a menudo
círculo de Willis pueden demostrar distintos grados en forma repetitiva, y ocasionalmente en lados alter-
de estrechamiento desde la estenosis a la obstrucci- nantes. Se puede presentar retraso mental o déficit
ón. Esto se asocia al engrosamiento fibrocelular de neurológico fijado. A diferencia de los adultos, la he-
la íntima, sinuosidad o corrugamiento de la lámina morragia intracraneal es rara.
elástica interna, y adelgazamiento de la capa muscu- 1.3. En adultos, se pueden presentar síntomas simi-
lar media5-11. lares a los niños, pero la hemorragia intraventricular,
Se pueden visualizar numerosos canales vasculares la hemorragia subaracnóidea, o intracerebral de inicio
pequeños alrededor del círculo de Willis. Éstas son ar- ictal, ocurre con mayor frecuencia. En la mayoría de
terias perforantes y ramas anastomóticas. La piamadre los casos se observa recuperación de tal hemorragia
de la convexidad de los hemisferios cerebrales tambi- con o sin secuelas neurológicas, a excepción de ésas
én puede tener conglomerados reticulares de pequeños con curso severo y resultado mortal.
vasos sangüíneos. Debido a los cambios esteno-oclu-
2. La angiografía cerebral es imprescindible para
sivos progresivos de las arterias carótidas internas y/o
el diagnóstico, y presenta por lo menos los resultados
de las arterias cerebrales anteriores y medias, en la base
siguientes:
del cerebro, las arterias pequeñas normales, propias de
la microcirculación (diámetro: 100-300 micrones) se 2.1. Estenosis u oclusión de la porción terminal de
desarrollan y llegan a ser prominentes y aumentan su la arteria carótida interna y en la porción proximal de
diámetro, lo cual se puede reconocer fácilmente en las las arterias cerebrales anteriores y medias.
angiografías, como ya fue mencionado; a éstos vasos 2.2. Red vascular anormal vista en la vecindad de
se les denomina “vasos moyamoya”12,13. Es necesario la obstrucción arterial en fase arterial.
precisar que éstos pequeños vasos no son como los 2.3. Estos hallazgos se presentan en forma bilateral.

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15 – Tratamiento Quirúrgico de la Enfermedad Moyamoya

2.4. Cuando las imágenes de la RMN y de la an- 1 se llama “enfermedad moyamoya unilateral”, y
gio-RMN concuerdan con los criterios antedichos, la 2 se llama “cuasi moyamoya” o “akin moyamoya”.
angiografía cerebral no es obligatoria. Entre las enfermedades moyamoya unilaterales,
3. La etiología es desconocida. No debe existir algunos permanecen como unilaterales, pero algunas
ninguna de las enfermedades de base, tales como ar- se convierten en enfermedad bilateral.
terioesclerosis, enfermedades autoinmunes, menin- Porque las etiologías de las enfermedades unilate-
gitis, neoplasias, síndrome de Down, enfermedad de rales y del cuasi-moyamoya no están aun bien deter-
Recklinghausen, trauma o irradiación. minadas, se tratan generalmente de manera similar a
4. Resultados patológicos útiles para el diagnós- la enfermedad moyamoya definida.
tico:
4.1. Se observa engrosamiento intimal causante de
estenosis u oclusión del lumen de la porción terminal Tabla 15.1 – Resumen de criterios de diagnóstico
de la arteria carótida interna, generalmente en ambos 1. Cambios esteno-oclusivos en las porciones terminales de las
lados. El depósito de lípidos se considera ocasional- arterias carótidas internas intracraneales, y desarrollo de vasos
mente en la intima proliferante. “moyamoya” en la base del cerebro.
4.2. Las arterias que constituyen el círculo de 2. Los hallazgos antes mencionados se observan en forma
Willis tales como las arterias cerebrales anteriores, bilateral. Cuando la lesión es bilateral, el diagnóstico de la
medias y comunicantes posteriores demuestran a me- enfermedad moyamoya es definida, pero de otra manera es
nudo estenosis de grado variable u oclusión asociada probable.
Los criterios de exclusión incluyen arterioesclerosis, enferme-
al engrosamiento fibrocelular de la intima, ondulacio- dades autoinmunes, tumores cerebrales, encefalopatía actínica,
nes de la lámina elástica interna y adelgazamiento de enfermedad de von Recklinghausen, síndrome de Down, etc.
la media. Muchos pacientes de moyamoya comunicados en la literatura
4.3. Se observan numerosas pequeñas arterias mundial no siguen estas guías, y cuando la angioarquitectura
alrededor del círculo de Willis (ramas perforantes y es similar a la de la enfermedad moyamoya, se le llama síndro-
me moyamoya o fenómeno moyamoya.
anastomóticas).
4.4. Los conglomerados reticulares de pequeños (Estos criterios fueron propuestos por el Comité de investi-
vasos se ven a menudo en la piamadre de la convexi- gación de la Enfermedad Moyamoya del Ministerio de Salud
dad hemisférica. japonés).5,8,9

Criterios Diagnósticos Tratamiento


En referencia a 1. mencionado anteriormente, los Tratamiento de Emergencia
criterios de diagnóstico se clasifica como sigue: En la etapa aguda, el tratamiento es esencialmente
Los casos que llegan a la anatomía patológica igual que en el infarto o la hemorragia cerebral debi-
sin angiografía cerebral se deben investigar por se- do a otras causas.
parado en referencia a 4. En el infarto cerebral, se pueden administrar fár-
Caso definido: uno que concuerda totalmente con macos protectores cerebrales, fármacos anti-trombó-
los puntos 2. y 3. En niños, sin embargo, un caso que ticos o antiagregantes plaquetarios, y en general, el
concuerda con los puntos 2.1. y 2. en un lado y cla- manejo farmacológico convencional de la isquemia
ramente se presenta con estrechamiento luminal en cerebral.
la porción terminal de la arteria carótida interna en el En la hemorragia ventricular, si ésta es de evolu-
lado opuesto también se incluye. ción aguda con signos de hipertensión endocraneana,
Caso probable (unilateral): uno que concuerda se indica una derivativa externa de LCR (DVE).
con los puntos 2. y 3. a excepción de 2.3. En la hemorragia intracerebral, inicialmente se in-
Enfermedad unilateral y cuasi-moyamoya dica el manejo conservador, incluyendo control de la
A excepción de la enfermedad definida moya- presión arterial, generalmente cuando el hematoma es
moya, las condiciones clínicas similares no están bien pequeño (< 25 cc).
establecidas. Si el hematoma intracerebral es de mediano volú-
1. los resultados angiográficos típicos se observan men (25-50 cc) o grande (> 50 cc), y es de ubicación
solamente en un lado, pero el lado opuesto es total- lobar,ejerciendo efecto de masa sobre estructuras de
mente normal. línea media, se indica su evacuación quirúrgica. Fre-
2. los resultados angiográficos típicos se observan cuentemente se indica la infusión de agentes osmóti-
bilateralmente, pero se asocia a las enfermedades sis- cos para controlar la presión intracraneana, y agentes
témicas mencionadas anteriormente. anticonvulsivantes.
Otra condición es 1 + 2, es decir, la lesión es unila- No hay justificación de realizar cirugía de by pass
teral y se asocia con una enfermedad sistémica. en la etapa aguda.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Tratamiento en la Etapa Crónica tiples agujero de trépano sobre la calota craneana, es-
perando el desarrollo de anastomosis espontáneas4,18.
Pacientes con Isquemia Cerebral Otra cirugía menos frecuente es el autotransplante de
No hay consenso en el tratamiento médico utili- omentum19, y la transposición de omentum20.
zando aspirina, otros fármacos antiagregantes plaque- En la enfermedad moyamoya ambos hemisferios
tarios, anticoagulantes, o fármacos vasodilatadores cerebrales se encuentran isquémicos, de tal forma
para prevenir los cuadros isquémicos futuros. que la cirugía de bypass se realiza bilateralmente,
efectuándose generalmente, la operación al lado
del hemisferio más isquémico, y posteriormente,
Anastomosis Quirúrgica algunos meses después se efectúa el bypass con-
La cirugía de bypass se acepta como una opción tralateral.
de tratamiento para prevenir o eliminar síntomas is- Las técnicas de revascularización indirectas más
quémicos recurrentes. El sitio de la anastomosis es difundidas y utilizadas son la encéfalo-duro-arterio-
determinado ocasionalmente por los resultados del sinangiosis y la encéfalo-mio-sinangiosis21-23.
exámen de flujo sangüíneo cerebral.(Xe133-CT Scan, Hay muchas otras técnicas de anastomosis indi-
SPECT, PET Scan)15,16. rectas. En el trabajo de T. Matsushima24, tales técni-
Las anastomosis vasculares se clasifican como di- cas se revisaron y se anotan a continuación:
rectas o indirectas.
En la anastomosis directa, la arteria temporal 1. Procedimientos usando arterias del cuero ca-
superficial se diseca de la galea aponeurótica y se belludo
anastomosa con una rama de la arteria cerebral media 1.0.Encéfalo-duro-arterio-sinangiosis (EDAS).
en la superficie cerebral, bajo microcirugía. Este mé- Matsushima Y (1980)
todo quirúrgico proporciona bastante flujo sangüíneo 1.1. Cerebroarteriosinangiosis (CAS). Balagura S
inmediatamente después de la cirugía17 (Fig. 15.2). (1985)
Sin embargo, en los casos pediátricos los diáme- 1.2. EDAS modificada = sinangiosis pial. Rooney
tros de las arterias corticales son muy pequeños, y CM (1991), Adelson PD (1995)
ésta técnica anastomótica requiere, para su correcta 1.3. Encéfaloarteriosiangiosis (EAS). Lesoin F (1983)
ejecución, arterias corticales de un mínimo de 1 milí- 1.4. Encéfalo-arterio-sinangiosis (EAS). Nakaga-
metro de diámetro. wa Y (1983)
En la anastomosis indirecta, el periostio, la du- 1.5. EAS (ideado para la porción frontal). Ichika-
ramadre, la galea o el músculo temporal se colocan wa A (1989)
directamente sobre la superficie del cerebro, espe-
1.6. EDAS Múltiple. Tenjin H (1977)
rando el desarrollo espontáneo de nuevas anasto-
mosis entre la circulación extracraneana e intracra-
neana, requiriéndose un cierto período para que tal 2. Procedimientos usando la galea
anastomosis se produzca y funcione con utilidad. 2.1. Encéfalo-galeo-sinangiosis (EGS). Ishii R
Así, el parénquima cerebral es provisto de circu- (1986)
lación colateral proveniente, a través de éstas es- 2.2. Procedimiento de la cinta (cinta EDAMS).
tructuras, de las arterias temporal superficial (ATS), Tokunaga K (1993)
arteria temporal profunda, arteria meníngea media
y anterior. Durante la técnica quirúrgica (sinangio- 3. Procedimientos usando la duramadre
sis), éstas arterias deben ser preservadas (Figs. 15.3 3.1. Durapexia. Tsubokawa T (1964)
y 15.4). En algunos casos, y para asegurar el es- 3.2. Encéfalo-duro-sinangiosis (EDS). Wakuta Y
trecho contacto de la ATS y galea circundante a la (1964), Ikeda Y (1984)
corteza cerebral, se efectúa la extirpación de la pia- 3.3. Orificio de trépano craneano. Endo M (1989)
madre en zonas o “ventanas”, suturando los bordes
3.4. Duropexia invertida. Fujimoto T (1993)
de la galea a la piamadre12. Si bien, mediante éstas
técnicas indirectas, no se efectúa un aporte alto de 3.5. Múltiples orificios de trépano craneanos. Ka-
flujo sangüíneo cerebral de inmediato, es frecuente waguchi T (1996)
visualizar revascularización precozmente, entre los 3.6. Duroencéfalosinangiosis separadas. Kashiwa-
3 a 6 meses siguientes a la intervención, especial- gi S (1996)
mente en los casos pediátricos que cursan con is- 3.7. Procedimiento de inversión de la duramadre.
quemia cerebral. Dauser RC (1997)
Es común agregar un bypass indirecto cuando se 3.8. Incisión e inversión del borde dural. Kinugasa
programa efectuar un bypass directo17. En otras oca- K (1993)
siones, se realiza la técnica quirúrgica de efectuar múl- 3.9. Inserción de pedículo dural. Hara Y (1994)

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15 – Tratamiento Quirúrgico de la Enfermedad Moyamoya

4. Procedimientos usando los músculos tempo- en el cerebro, en las zonas de circulación colateral
rales u otros terminal, vecina a la pared ventricular. Sin embargo,
4.1. Encéfalo-mio-sinangiosis (EMS). Karasawa J la ventaja del tratamiento quirúrgico de bypass con
(1997) las técnicas antes señaladas aún se debe probar. De
4.2. Encéfalo-mio-sinangiosis (EMS). Takeuchi S acuerdo a esto, se encuentra en pleno desarrollo un
(1983) ensayo clínico en Japón. En los casos hemorrágicos,
4.3. Trasplante del músculo gracilis. Touho H los pacientes hipertensos, se tratan con fármacos an-
(1995) tihipertensivos, y no se administran fármacos antia-
4.4. Transposición de colgajo libre del músculo gregantes plaquetarios.
Serratus anterior. Yoshioka N (1996)
4.5. Transposición de colgajo libre del músculo Ensayo Japonés de Moyamoya del Adulto
Latissimus dorsi. Yoshioka N (1997) Hemorrágico (JAM)
El estudio doble ciego aleatorizado comenzó en
5. Procedimientos usando el omentum Japón en Enero de 2001, para evaluar la eficacia de
5.1. Trasplante omental. Karasawa J (1980) la cirugía bypass en los pacientes de moyamoya con
5.2. Trasplante omental. Havlik N (1997) presentación hemorrágica.
5.3. Transposición de omentum. Goldsmith H Se diseñaron dos grupos: el mejor tratamiento mé-
(1994) dico vs. el mejor tratamiento médico y de cirugía by
pass. Los criterios de inclusión son como sigue:
6. Procedimientos usando la combinación de 1. Pacientes con Moyamoya de presentación he-
los anteriores morrágica (hemorragia intracerebral, hemorragia
6.1. EMAS (EMS + EAS). Nakagawa Y (1983) intraventricular, y hemorragia subaracnóidea), que
6.2. Sinangio-duro plastía (SDP). Wanibuchi H ocurrió en el plazo de un año antes del ingreso al es-
(1985) tudio.
6.3. Encéfalo-duro-arterio-mio-sinangiosis (EDA- 2. Pacientes funcionalmente independientes en sus
MS). Kinugasa K (1993) vidas diarias.
6.4. Revascularización combinada. Sato H (1991) 3. Edades entre 18 y 60 años.
6.5. Galeo-encéfalo-duro-arterio-mio-sinangiosis Los métodos quirúrgicos deben incluir la cirugía
(GEDAMS). Nishimoto A (1991) directa de bypass bilateral, y los pacientes no deben
6.6. Encéfalo-mio-arterio-sinangiosis frontal. recibir antiagregantes plaquetarios ni anticoagulantes.
Inoue T (1992) En los 5 años de estudio el número previsto de pa-
6.7. Cinta EDAMS. Tokunaga K (1993) cientes, para cada grupo es de 80, así el número total
6.8. Bypass no anastomótico usando el músculo de los pacientes previsto que ingresarán al estudio es
temporal, galea, y duramadre. Hara Y (1993) de 160.
6.9. Bypass indirecto combinado fronto-temporo- Detallaremos las técnicas que más se han utiliza-
parietal. Matsushima T (1995) do, y con las cuales se han demostrado los mejores
6.10. Cirugía vascular reconstructiva indirecta ex- resultados.
tensa en una etapa. Kohno K (1997)
6.11. S-EDAS (EDAS separada). Matsushima Y Bypass Arteria Temporal Superficial –
(1998)
Arteria Cerebral Media (ATS-ACM)
6.12. Transposición de colgajo libre del músculo
serratus anterior y de omentum. Yoshioka N (1996) El primer bypass ATS-ACM para tratar una en-
fermedad moyamoya fué efectuado en 1972 por Ya-
7. Anastomosis combinada directa e indirecta sargil25, y desde entonces se han comunicado varias
7.1. Anastomosis ATS-ACM y encéfalo-mio-si- series, que demuestran buenos resultados en forma
nangiosis. Karasawa J (1977) rápida en el postoperatorio inmediato, ya sea cómo
técnica única o combinada con otra técnica de revas-
7.2. Anastomosis ATS-ACM y encéfalo-duro-ar-
terio-mio-sinangiosis. Houkin K (1997) cularización indirecta.
En relación a generalidades quirúrgicas, los pa-
cientes se posicionan con la cabeza sobre el nivel del
Pacientes con Hemorragia Cerebral atrium cardíaco para disminuir la congestión venosa
Se cree que la hemorragia ocurre como conse- cerebral. Por su efecto vasoconstrictor no se reco-
cuencia de la sobrecarga hemodinámica a que son miendan la hiperventilación y los fármacos alfa-adre-
sometidas las arterias colaterales finas (moyamoya) nérgicos, pero la hipotermia moderada (32-34°C) y

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

los barbitúricos, o anestésicos similares como el pro- dor. Usualmente hay 2 ramas de la ATS, la frontal y
pofol, se utilizan como protectores cerebrales durante la parietal; ambas deben ser marcadas para permitir la
los tiempos de oclusión arterial temporal. La presión elección del vaso durante el procedimiento. Luego de
arterial media se debe mantener en rangos normales la preparación del campo estéril, se hace una incisi-
o discretamente elevados (90-100 mmHg), y en el in- ón comenzando sobre el cigoma con un bisturí No15;
traoperatorio se deben utilizar expandidores plasmá- se identifica la ATS y se esqueletoniza mediante di-
ticos para prevenir algún evento isquémico. La mo- sección mixta con el bisturí y tijeras de punta roma.
nitorización intraoperatoria con EEG y/o potenciales Cuando es necesario, se puede utilizar un aparato de
evocados somatosensoriales permite la detección de Doppler estéril para comprobar el trayecto de la ATS.
alteraciones isquémicas en forma precoz, utilizando Se pueden utilizar la rama frontal o parietal, depen-
los fármacos antes mencionados. El microscopio ope- diendo del diámetro y largo más conveniente; de pre-
ratorio e instrumental de microcirugía se utilizan de ferencia usar la rama de mayor diámetro, con la ex-
rutina en los procedimientos de revascularización. cepción ocasional de una rama frontal más ancha pero
Se deben seleccionar vasos donantes con un diá­ que pase muy baja sobre la frente. Es recomendable
metro exterior igual o superior a 1 mm, porque los dejar un manguito de tejido colágeno de sostén alre-
vasos de menor diámetro tienen un alto porcentaje de dedor de la arteria para evitar lesionarla, disminuye
oclusión, entregan un flujo sangüíneo bajo y no útil el vasoespasmo mecánico sobre la arteria, y permite
y son más difíciles de anastomosar. Para prevenir el al cirujano manipular la arteria sin lesionar sus pare-
vasoespasmo mecánico es útil la papaverina tópica Se des. Las ramas colaterales pequeñas son coaguladas
pueden, en algunos casos, utilizar autoinjertos venosos con el bipolar y cortadas, y las de mayor diámetro son
los cuales proporcionan una dilatación vascular inme- ligadas y cortadas. El largo de la arteria requerida de-
diata al aumentar en forma importante el flujo sangü- pende de la distancia desde el orígen visible de la ATS
íneo a la arteria receptora. En los casos necesarios se al sitio del bypass. Se separa y protege la arteria, y se
utiliza la vena temporal superficial y mayormente la procede a efectuar una craniotomía temporal media
vena safena interna. Se disecan meticulosamente los superior, de tal manera que cruce la proyección ante-
segmentos venosos, ligando las venas colaterales, a ro-posterior de la fisura sylviana. Se abre la durama-
la vez que se evita lacerar la pared venosa. La vena dre y se instala el microscopio para elegir a la arteria
es irrigada con solución salina heparinizada y se le receptora, la cual debe tener un diámetro externo ideal
inspecciona cuidadosamente en búsqueda de alguna de 1 mm o más. También se debe tomar en cuenta la
laceración de la pared que requiera reparación quirúr- orientación de la arteria receptora y la localización de
gica previa a su utilización; a ésta vena se le mantie- la rama de la ACM en relación a la fisura sylviana,
ne inmersa en una solución salina heparinizada hasta ya que mientras más cercana a ésta permite un mejor
que se le utilice para efectuar el bypass. flujo sangüíneo de retorno hacia la bifurcación de la
El control hemodinámico es la meta principal en arteria carótida interna; por lo tanto, es preferible ele-
el postoperatorio inmediato. Las principales compli- gir una rama M3 que recién emerge desde la fisura
caciones son la hipertensión arterial y la perfusión sylviana. La exposición del vaso se efectúa mediante
cerebral aumentada, las cuales pueden provocar fil- la prolija disección de un segmento de aracnoides de
traciones entre los nudos de la anastomosis, y como 6 a 10mm de longitud sobre la arteria. Las pequeñas
consecuencia, un hematoma subdural en el sitio del colaterales que emergen del vaso se coagulan y cor-
bypass. Contrariamente, la hipotensión arterial pue- tan. Es preferible colocar un pequeño trozo de plásti-
de causar oclusión del injerto, desencadenando una co estéril por debajo de la rama de la ACM como un
isquemia clínica; ésta complicación requiere efectuar campo operatorio de buena visibilidad. Se coloca un
una angiografía de urgencia y revisión quirúrgica del clip temporal en el segmento proximal de la ATS y el
bypass. Otra potencial complicación es la fístula de extremo distal se liga y corta; el flujo sangüíneo de
líquido cefalorraquídeo, debido a que el cierre dural la ATS se puede examinar soltando transitoriamente
no se realiza a tensión, para evitar el colapso del by- el clip temporal. Luego se procede a irrigar el lúmen
pass, pero esto es extremadamente raro. Luego, en el de la ATS con suero salino heparinizado para evitar la
primer día postoperatorio se comienza con aspirina, formación de coágulos en su interior. La porción dis-
como antiagregante plaquetario. tal de la ATS es confrontada y adecuada a una longi-
El paciente es colocado sobre la mesa quirúrgica tud apropiada para llegar al vaso receptor sin tensión,
con la cabeza rotada hacia el lado contralateral, y el y se procede a remover el manguito distal de tejido
hueso temporal paralelo al piso, mantenida en ésa po- conectivo alrededor de la arteria en un largo aproxi-
sición mediante el sostenedor de cabeza con tres pun- mado de 3 a 5 mm, preparando éste segmento para la
tas. Después que el cuero cabelludo es rasurado, se anastomosis.El extremo distal de la ATS se corta en
utilizan el Doppler ultrasónico standard y la angiogra- forma oblícua. Luego, se instalan microclips a cada
fía preoperatoria para localizar la ATS, cuyo trayecto lado del segmento disecado de la arteria receptora, y
es pintado con sus ramas mediante un lápiz marca- se procede a incindir la pared de éste vaso en forma de

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15 – Tratamiento Quirúrgico de la Enfermedad Moyamoya

diamante utilizando tijeras de microcirugía. Posterior- En la tecnica quirúrgica, se diseca primero la ATS,
mente, bajo microscopio se procede a la anastomosis como en la técnica descrita anteriormente, pero se deja
utilizando sutura monofilamento 10-0; se colocan pri- en continuidad, no se secciona. Luego se le desplaza
mero los puntos de los extremos o ángulos, y luego se cuidadosamente, y se procede a incindir el músculo
colocan usualmente 5 puntos separados por la pared temporal. Se efectúa una craniotomía con 2 orificios
más oculta o distal, y se repite el procedimiento con de trépano que se sitúan en la dirección del trayecto de
5 puntos en la pared más cercana. Se incluye siempre la ATS, y se completa la craniotomía en forma de dia-
a la íntima en la sutura, evitando cualquier estrechez mante o bicóncava. Se abre la duramadre, respetando
en el sitio suturado. Se recomienda utilizar puntos los vasos de circulación colateral extra-intracraneanos
separados, pero algunos autores prefieren una sutu- espontáneos; algunos autores2,26 efectúan pequeñas
ra contínua. Luego se procede a retirar el microclip ventanas en la duramadre y pia-aracnoides para per-
distal y luego el proximal de la arteria receptora, y mitir una mayor y estrecha superficie de contacto de
finalmente el clip temporal de la ATS. Habitualmente, la ATS directamente sobre la corteza cerebral. Luego,
el tiempo de clipaje temporal de la arteria receptora el manguito de tejido conectivo que rodea a la arteria
no debe ser más de 20 a 30 minutos. Luego de retirar se sutura a los bordes de la duramadre con puntos mo-
los clips se efectúa una suave presión con cottonoides nofilamento 5-0 separados. Se debe poner cuidado de
sobre el sitio de la anastomosis, y los sangramientos que el trayecto de la arteria ya suturada a la duramadre
mayores son índice de que se debe colocar una sutura no quede acodada sobre los bordes de la craniotomía,
adicional, y los menores habitualmente cesan con la los cuales deben ser rebajados para impedir ésta com-
presión y colocando Surgicel® sobre el sitio anasto- plicación. Se puede utilizar papaverina tópica para
mosado. Una vez que la anastomosis se ha completa- evitar el vasoespasmo mecánico, y se puede utilizar el
do, se puede utilizar el Doppler para examinar que la Doppler, una vez que se ha repuesto la plaqueta de la
anastomosis quedó patente. Luego, se procede a sutu- craniotomía para comprobar que existe flujo adecua-
rar la duramadre cuidadosamente para evitar estrechar do por la arteria en su extremo distal. Luego de fijada
la ATS, y la plaqueta ósea también es adecuada para la plaqueta, se procede a suturar el músculo, galea y
evitar cualquier presión sobre la ATS. Finalmente se piel de forma convencional (Figs. 15.3 y 15.4).
sutura el músculo temporal, galea y piel en forma
convencional (Fig. 15.2). A

Fig. 15.2 – Anastomosis clásica arteria temporal superficial


- rama de arteria cerebral media.

Encefaloduroarteriosinangiosis (EDAS)
La EDAS, descripta por Matsushima et al.21,22, es
otra técnica alternativa al bypass ATS-ACM, para au-
mentar en forma indirecta el flujo sangüíneo colateral
al cerebro isquémico. Si bien, mediante ésta técnica
indirecta, no se efectúa un aporte alto de flujo san-
güíneo cerebral de inmediato, es frecuente visualizar
revascularización precozmente, entre los 3 a 6 meses
siguientes a la intervención, especialmente en los ca- Fig. 15.3 – EDAS. (A) Apertura dural. (B) Sutura de arteria tem-
sos pediátricos que cursan con isquemia cerebral. poral superficial con bordes de galea a los bordes de la duramadre.

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

A B

C D

E F

Fig. 15.4 – (A a F) Demuestra las etapas de la EDAS, descrita por Matsushima (según texto).

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15 – Tratamiento Quirúrgico de la Enfermedad Moyamoya

Los autores que abogan por la EDAS señalan que EDAS – Encéfalogaleosinangiosis (EGS)
en ésta operación no se requiere efectuar clipaje tem-
poral sobre ramas de la ACM, se respetan las anasto- La cirugía se efectúa en 2 etapas, inicialmente en
mosis extra-intracraneanas ya desarrolladas a través el hemisferio cerebral más afectado hemodinámica-
de la duramadre, y es mucho más fácil de efectuar. mente; siendo el lapso promedio entre el primer y se-
Además, la EDAS se puede indicar en los casos en gundo procedimiento de 6 a 8 meses.
que no se encuentra una arteria donante o receptora de La EDAS se efectúa según la técnica ya descrita
un calibre adecuado, situación que puede suceder por por Matsushima e Inaba22. Asociada a ésta técnica,
la enfermedad de base. Matsushima et al.22 comunica- y para obtener mayor circulación colateral hacia el
ron sus resultados tratando la enfermedad Moyamoya territorio de la arteria cerebral anterior, se completa
en 38 casos pediátricos (70 hemisferios), y en su ex- con la encéfalogaleosinangiosis (EGS), en la región
periencia, se obtuvo un 100% de revascularización, bifrontal que a continuación se detalla. Así, el cuero
con la mayoría de los pacientes demostrando mejoría cabelludo se incinde en forma separada para la EDAS
de su sintomatología debido a la isquemia cerebral. y la EGS. En el sitio de la EGS se efectúa una inci-
sión en S itálica 2 cm anterior a la sutura coronal.
Luego se diseca la galea y/o el periostio, y se incinde
Encefalomiosinangiosis (EMS) en S romana en sentido anteroposterior, como un zig­
En la encéfalomiosinangiosis, se sutura un colgajo zag. Luego se efectúa una craniotomía de aproxima-
del músculo temporal al defecto dural quirúgico, apro- damente 4 por 8 cm, cruzando el seno longitudinal
ximando así el músculo a la superficie cerebral. Como superior, para luego incindir la duramadre, en ambos
en la EDAS, se efectúa una craniotomía frontotemporal, hemisferios, con 2 colgajos separados, de base hacia
y se abre la aracnoides sobre la superficie cerebral en la el seno venoso, extirpando la aracnoides subyacente
forma más extensa posible. Luego, se suturan los bor- para exponer la superficie cerebral directamente a la
des de la duramadre a los bordes del colgajo muscular. galea que se va a sobreponer. Los colgajos de galea
La neovascularización se produce desde el mús- y/o periostio se sobreponen sobre la corteza cerebral
culo hacia el parenquima cerebral, aportando mayor e insertan lo más profundo posible en la fisura inter-
flujo sangüíneo colateral. Como en la EDAS, la EMS hemisférica, suturándolos a la duramadre. Luego se
es más fácil de efectuar que el bypass ATS-ACM, se repone la plaqueta y se cierra la galea y piel en forma
efectúa sin identificar una arteria receptora, y se pue- convencional. (Fig. 15.6)27
de combinar con un bypass ATS-ACM. Sin embargo,
éste procedimiento ha sido asociado con mayores po- Revascularización con Omentum
sibilidades de que el paciente presente y desarrolle un El omentum se puede utilizar como un colgajo nu-
foco epileptógeno. Varias series han demostrado que trido por los vasos gastroepiploicos directamente, o
la EMS mejora la condición clínica de los pacientes, como un cogajo libre autotransplantado y vasculari-
así como el llene de las ramas propias de la ACM en zado por arterias y venas del cráneo. En ambos casos,
un 70% a 80% de los casos13 (Fig. 15.5). el omentum se obtiene a traves de una laparotomía
mediana supraumbilical.
Anastomosis
ACM Autotransplante de Omentum
Músculo Laparotomía media supraumbilical, a traves de
temporal la cual se diseca y expone el omentum, preservan-
ATS do el pedículo vascular gastroepiploico, disecando y
rama ant. aislando cuidadosamente la arteria y vena gastroepi-
ploica. El omentum es separado con su pedículo vas-
cular inmediatamente antes del autotransplante para
ATS preservar la perfusión del omentum el mayor tiempo
rama post posible. El autoinjerto es preservado humedo, y se
seccionan las arteria y vena gastroepiploicas las cua-
les son irrigadas con solución salina heparinizada. La
ATS (o la arteria occipital) se diseca cómo se ha des-
crito anteriormente, pero para el autotransplante de
omentum, también se debe disecar la vena temporal
superficial (VTS) (o la vena occipital). Se efectúa una
Fig. 15.5 – EMS. Esquema demuestra la sutura del colgajo mus- craniotomía sobre la región en que se va a efectuar
cular temporal a los bordes de la duramadre, y una anastomosis la revascularización, y se procede a una anastomo-
ATS-ACM (según texto). sis término-terminal o término-lateral entre la ATS (o

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Incisión cutánea Incisión galeal

Incisión dural Inserción galeal inter-hemisférica

Hoz inter-hemisférica Seno longitudinal superior

Duramadre
Colgajo galeal

Fig. 15.6 – EDAS y encéfalo-galeosinangiosis (según Kim SK et al.27). Demuestra las etapas de ésta operación (según texto).

arteria occipital) donante y la arteria gastroepiploica, del pabellón auricular. El omentum con su pedículo
así como también entre la VTS (o vena occipital) y la no deben quedar bajo tensión, luego de la tunelizaci-
vena gastroepiploica, utilizando sutura monofilamen- ón, cómo tampoco deben quedar acodados en ningún
to 10-0; primero se efectúa la anastomosis arterial, segmento del túnel subcutáneo; se efectúan varias in-
colocando un clip temporal sobre la arteria donante cisiones en la piel a lo largo del túnel para facilitar el
durante la anastomosis venosa. Luego de ésta opera- pasaje del injerto. Una vez en el cráneo, se coloca el
ción, el omentum se extiende sobre la superficie ce- omentum sobre la superficie cerebral cómo se descri-
rebral y bajo los bordes de la duramadre expuesta. El bió anteriormente20 (Fig. 15.8).
injerto se sutura a los bordes de la duramadre, y se
repone la plaqueta ósea cuidando de no comprimir el
pedículo vascular19 (Fig. 15.7). Craniectomías Mínimas Múltiples
(Orificios de Trépano)
Transposición del Omentum La operación se efectúa bajo anestesia local en
Esto implica alargar el omentum, mediante técnica adultos, y bajo anestesia general en niños; y técni-
quirúrgica, con el fin de alcanzar el cráneo mientras camente es similar a los orificios de trépano que se
permanece unido a su pedículo vascular natural, con efectúan para instalar un drenaje ventricular externo.
la ventaja de preservar el drenaje linfático y evitando Para evitar la injuria de la ATS durante las incisio-
una anastomosis vascular adicional. Se deja el omen- nes, se localiza a la arteria mediante Doppler. Des-
tum unido a su pedículo gastroepiploico normal, y pués de practicar los orificios de trépano (de 2 a 4) ,
se lleva a cabo su alargamiento dividiendo el omen- se abren ampliamente la duramadre y la aracnoides,
tum con incisiones en forma de L. Luego, se tune- preservando las arterias meníngeas bajo microscopio.
liza en forma subcutánea al omentum, con un largo Luego, se sutura la piel con material monofilamen-
suficiente para transitar por el celular subcutáneo del to 2-0, dejando los puntos estrechamente cerrados4,18
tórax, cuello y cuero cabelludo, pasando por detrás (Fig. 15.9).

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15 – Tratamiento Quirúrgico de la Enfermedad Moyamoya

Vena gastroepiploica
Arteria gastroepiploica
A.V. gastroepiploica

Vena occipital Goma de campo


Arteria occipital

Omentum
A

Omentum

Fig. 15.7 – Autotransplante de omentum. (A) Exposición de omentum con trozo a injertar. (B) Craniotomía occipital derecha, con
región a ser tratada. (C) Anastomosis de arteria y vena gastroepiploica a arteria y vena occipitales. En parte superior se muestran los
detalles de la anastomosis.

A B

C D

Fig. 15.8 – Transposición de omentum. (A) Exposición del omentum a través de una laparotomía media supraumbilical. (B) Alarga-
miento del omentum mediante incisiones en forma de L , preservando la vascularización. (C) Paso del omentum, tunelizado por el tejido
celular subcutáneo desde el abdomen al cráneo. (D) Sutura de los bordes del omentum a los bordes de la duramadre (según texto).

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Parte 2 – Neurocirurgia Vascular

Recientemente, Nomura et al.28 comunicaron su


experiencia para prevenir complicaciones isquémicas
perioperatorias. Su protocolo es como sigue:
1. Sedación oral antes de la instalación de una
línea intravenosa. Sedación intravenosa pre-
via al estudio de neuroimágenes. Sedación y
control del dolor inmediatamente después del
exámen neurológico postoperatorio.
2. Técnicas del manejo de la herida quirúrgica en
el postoperatorio. Utilizar sutura subcuticular
reabsorbible, sellando la cicatriz con Steristrip.
Dejar una sutura no anudada para el cierre de
la incisión del drenaje, luego de su retiro. Apli-
car una gasa suave con parafina estéril sobre la
herida, con un vendaje suave para la fijación de
los apósitos.
3. Otras. Aplicar gel de lidocaína reabsorbible a
la piel antes de la punción venosa. Mantener
un catéter venoso central hasta 1 semana des-
pués de la cirugía.
Los procedimientos antes mencionados no se re-
Fig. 15.9 – Revascularización a través de orificios de trépano. quieren necesariamente en cada paciente pediátrico,
Esquema de los sitios de orificios de trépano (2 a 4) para lograr la y lo mejor es la confianza cercana y mutua entre los
revascularización indirecta (según texto).
pacientes y el personal médico y de enfermería.

Complicaciones Quirúrgicas Resultados de la anastomosis


La incidencia de la complicación quirúrgica es quirúrgica (bypass)
muy baja, sin embargo, no es nula. Las complicacio-
nes incluyen hemorragia postoperatoria del lecho qui- El propósito del método quirúrgico de anastomo-
sis, ya sea directa o indirecta, es esencialmente pre-
rúrgico (subcutánea, epidural, subdural, e intracere-
venir la enfermedad cerebrovascular recurrente. Esto
bral), anemia, infarto cerebral (como consecuencia de
significa que no hará desaparecer el déficit neurológi-
una hipotensión perioperatoria, de una hipocapnia por
co que está ya presente, como consecuencia por Ej, de
hiperventilación no controlada, y al clipaje temporal un infarto cerebral ya completado.
prolongado de la arteria recipiente), crisis isquémica
transitoria, necrosis del cuero cabelludo, infección de En los casos de inicio isquémico, el propósito es
la herida operatoria y sindrome convulsivo. prevenir eventos isquémicos recurrentes. Aunque no
hay trabajos que lo comprueben científicamente, la
Los efectos de la operación no aparecen inmediata- mayoría de los neurocirujanos con experiencia en el
mente, sin embargo, generalmente la frecuencia de los tema opinan que éste tratamiento es un aporte impor-
eventos isquémicos tienden a reducirse gradualmente tante en la evolución natural de la enfermedad, y real-
hasta desaparecer. Por lo tanto, la evolución postope- mente, muchos pacientes con antecedentes de eventos
ratoria es variable y depende del incremento de flujo isquémicos experimentan la reducción o desaparición
sangüíneo cerebral, del método de operación, etc. de los síntomas gracias a la cirugía.
La anestesia general para la enfermedad moyamo- En los casos de inicio hemorrágico, el propósito
ya tiene, en general, un riesgo bajo de producir un de la anastomosis es prevenir la hemorragia recurren-
infarto cerebral, tanto en la cirugía de bypass como te. Las ventajas de la cirugía en éstos casos son más
durante la angiografía cerebral en los niños. discutibles, y existe mayor controversia, comparados
con los resultados de los casos de inicio isquémico,
Manejo Perioperatorio de la Enfermedad por lo que actualmente se encuentra en pleno desa-
Moyamoya Pediátrica rrollo un Ensayo Clínico Japonés sobre éstos casos
hemorrágicos, que se detalló anteriormente.
La mayor complicación perioperatoria en la enferme-
dad moyamoya pediátrica es la isquemia cerebral causa-
da por el llanto, debido al dolor y a la ansiedad. Sucede Referencias Bibliograficas
ocasionalmente después de una cirugía de bypass exi- 1. Suzuki J, Takaku A. Cerebrovascular “moyamoya”
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15 – Tratamiento Quirúrgico de la Enfermedad Moyamoya

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Parte 3
Cirurgia de Base
do Crânio

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16
Tratamento Cirúrgico dos
Tumores Hipofisários
Apio Claudio Martins Antunes
Oswaldo Ignacio Tella Junior

CLASSIFICAÇÃO • Adenomas pluri-hormonais:

D
–– misto GH/PRL;
entre as inúmeras classificações dos tumores
da hipófise, a mais importante distinção existe –– células mamossomatotróficas;
entre tumores não-funcionantes – aqueles sem –– célula primitiva acidófila;
atividade endócrina – e funcionantes, que produzem –– GH/PRL/glicoproteínas.
excesso de hormônio ativo. Nos não-funcionantes –– outros
eventualmente pode ocorrer hipopituitarismo ou leve • Adenomas não imunorreativos:
hiperprolactinemia por compressão da haste hipofi- –– célula não secretante;
sária. Nos funcionantes, há produção aumentada de –– oncocítico puro.
um ou mais hormônios hipofisários, constituindo a
No que se refere ao tamanho, são divididos em
acromegalia por excesso de hormônio de crescimento
(GH), síndrome de amenorréia – galactorréia em mu- microadenomas (10 mm ou menos), macroadenomas
lheres e impotência em homens, por excesso de prolac- (maiores que 10 mm) ou, ainda, gigantes (com gran-
tina (PRL) sérica, doença de Cushing por aumento de de extensão supra e parasselar). Ainda segundo Jules
atividade de células secretoras de hormônio adrenocor- Hardy, quanto às características do seu crescimento,
ticotrófico (ACTH), hipertireoidismo por hipersecre- esses tumores são divididos em localizado ou invasi-
ção de hormônio tireoestimulante ou, ainda, adenomas vo (quanto à eventual invasão dural e/ou óssea); os
produtores dos hormônios glicoprotéicos folículo-esti- macroadenomas, quanto à sua extensão supra-selar,
mulante (FHS) e luteinizante (LH) que se comportam classificam-se em tipos A, B, C, D e E, referentemen-
clinicamente como não-secretantes. Os adenomas po- te à relação com o terceiro ventrículo2,3:
dem, ainda, pertencer ao grupo dos pluri-hormonais,
sendo a associação GH-PRL a mais comum. Grau de extensão Supra-selar
A classificação dos adenomas hipofisários mais A Menor que 10 mm
usada segundo Frankel e Tindall1 é:
B Até 20 mm, elevando o recesso
• Adenomas mono-hormonais: anterior do terceiro ventrículo
–– produtores de GH;
C Até 30 mm, ocupando a porção
–– produtores de PRL; anterior do terceiro ventrículo
–– produtores de ACTH; D Maior que 30 mm, acima do forame
–– produtores de FSH/LH; de Monro
–– produtores de TSH; E Maior que 30 mm, expansão lateral
–– produtores de subunidade alfa; ou múltipla
–– produtores de glicoproteínas. C, D e E Macroadenomas gigantes

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Parte 3 – Cirurgia de Base do Crânio

MANIFESTAÇÃO CLÍNICA Pacientes com deficiência tireoidiana têm atividade


reduzida, intolerância ao frio, pele seca e mialgias.
Os tumores hipofisários manifestam-se clinica- Deficiência do hormônio do crescimento pode provo-
mente por excesso na produção de hormônio, efeito car fadiga e baixa performance, menor função cardía­
expansivo ou são diagnosticados acidentalmente, po- ca. Deficiência do ACTH, quando de forma gradual,
dendo apresentar-se de forma clínica combinada. manifesta-se por fadiga, anorexia e depressão; quan-
do de forma aguda, no caso de apoplexia hipofisária,
Síndromes Hiperfuncionantes manifesta-se por crise addisoniana (torpor, colapso
Os adenomas secretores de prolactina manifestam- cardiovascular, hiponatremia e hipocalemia)2-4.
se mais comumente em mulheres por amenorréia e O crescimento do tumor para fora do conteúdo
galactorréia. Em homens, embora possam apresentar- selar pode provocar compressão do quiasma óptico,
se com galactorréia, mais comumente surgem como levando à hemianopsia bitemporal; com maior ex-
déficit visual e hipopituitarismo. A hipofunção hipo- tensão, pode haver compressão da porção anterior do
fisária pode se manifestar por redução da libido, fadi- terceiro ventrículo e hidrocefalia obstrutiva. O cres-
ga e perda de vitalidade. A existência de amenorréia cimento lateral, em direção ao seio cavernoso, pode
e galactorréia isoladamente não significam haver tu- provocar paresia da motilidade ocular e/ou dor facial.
mor secretor de prolactina, já que qualquer tumor que Maior expansão lateral, com compressão do lobo tem-
comprima a haste hipofisária, bloqueando o efeito dos poral, pode produzir déficit motor contralateral2-4.
inibidores hipotalâmicos, pode provocá-la2-4.
Adenomas secretores de GH causam tanto acro- Adenomas Incidentais
megalia no adulto como gigantismo, se a doença se Com o uso mais disseminado da ressonância
instalar antes da fusão das cartilagens de crescimento. magnética, um número maior de pacientes teve diag-
Tais pacientes progridem com nítidas manifestações nóstico de adenomas hipofisários assintomáticos ou
cosméticas, como aumento da bossa frontal, progna- oligossintomáticos. É importante considerar que, em-
tismo, macroglossia e aumento de mãos e pés. Hiper- bora os microadenomas assim diagnosticados tenham
tensão arterial, intolerância à glicose e insuficiência pequeno risco de crescimento, mais de um terço dos
cardíaca podem ocorrer, bem como alterações psiquiá­ macroadenomas pode crescer de modo significativo.
tricas e, pela hipertrofia tecidual, estenose lombar e Portadores de adenomas de achado ocasional apre-
síndrome do túnel do carpo. No adolescente, o exces- sentam disfunção hipofisária em até 15%, requerendo
so de hormônio provoca aumento da estatura2-4. reposição hormonal5.
A produção excessiva de ACTH leva à hipercorti-
solemia e, quando essa produção aumentada se origi-
DIAGNÓSTICO
na na hipófise, temos a doença de Cushing, diferente-
mente da síndrome de Cushing, quando originada na Avaliação Endócrina
glândula supra-renal. À semelhança da acromegalia,
ocorrem também inúmeras alterações cosméticas, Prolactinomas
como ganho de peso com distribuição centrípeta, fá- Nos adenomas secretores de prolactina usualmen-
cies de “lua cheia “ e deposição de gordura na região te se encontram níveis séricos superiores a 200 ng/
supraclavicular e cervical alta. Ocorre também hiper- ml. Quando esses níveis são menores que 150 ng/ml,
pigmentação cutânea, estrias abdominais, hirsutismo a hiperprolactinemia pode dever-se a lesões que com-
e fragilidade capilar. Também, dado o aumento sérico primam a haste hipofisária, bloquean­do a inibição hi-
de cortisol, podem ocorrer hipocalemia, osteoporose, potalâmica.
hipertensão arterial e diabetes2-4.
Acromegalia
Efeito Expansivo
As dosagens séricas de GH isoladas têm pouco va-
Além da disfunção hormonal, os tumores hipofi- lor no diagnóstico, sendo as dosagens de IGF-1 mais
sários podem produzir sintomas e sinais, deslocando acuradas. O teste de tolerância à glicose costuma con-
estruturas vizinhas, seja a haste hipofisária, a hipófi- firmar o diagnóstico, observando-se falha na supres-
se ou as estruturas circunjacentes. A compressão da são do GH a menos de 1 mg/l.
glândula produz disfunção, sendo mais suscetíveis as
células gonadotróficas, seguidas pelas tireotróficas,
somatotróficas e corticotróficas. Em mulheres, a dis- Doença de Cushing
função gonadotrófica provoca amenorréia, diminui- Constitui-se na doença endócrina de diagnóstico
ção da libido e osteoporose. Em homens, a redução da mais difícil: começando pela dosagem urinária de
testosterona provoca redução da libido e impotência. cortisol livre, usualmente acima de 220 a 330 nmol/

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16 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Hipofisários

24 h, segue-se pelo teste de supressão com baixa dose drogas como cetoconazol, mithotano ou metirapona,
de dexametasona, normalmente negativo. A confir- mas esses tratamentos não têm efeito sobre a doen-
mação da origem central da secreção aumentada de ça subjacente, reduzindo apenas os níveis séricos de
cortisol em geral é feita pelo teste de supressão com cortisol. A grande desvantagem da terapêutica médica
alta dose de dexametasona, ocorrendo supressão na é ela ser fundamentalmente supressiva, ocorrendo re-
doença de Cushing e não na origem ectópica. Ainda é cidiva tumoral com a suspensão do tratamento, além
possível realizar as dosagens de ACTH bilateralmen- de requerer uso prolongado. Mais ainda, sua eficácia
te nos seios petrosos, com o intuito de confirmar sua depende da tolerabilidade do paciente à droga2-4.
origem central, bem como para identificar o lado do
tumor no interior da glândula. A dosagem de cortisol Tratamento Radioterápico
tem sido realizada também na saliva, facilitando o es-
tudo do ritmo circadiano do cortisol O tratamento radioterápico se baseia no fato de
Realizado o diagnóstico de adenoma hipofisário, é muitos tumores não serem ressecados totalmente e,
importante avaliar a atividade da glândula, dosando- como tal, tenderem a recidivar. Assim, a radioterapia
se os níveis séricos de PRL, GH, IGF-1, ACTH, corti- fracionada convencional e, mais recentemente, a ra-
sol, LH, FSH, TSH, tiroxina, testosterona e estradiol. dioterapia estereotática e a radiocirurgia podem ser
utilizadas para obter a normalização dos níveis hormo-
Avaliação oftalmológica, por meio de exame da
nais e evitar recorrências, especialmente nos portado-
acuidade visual e da campimetria, é indicada a todos
res de doença de Cushing com ressecções incompletas
os adenomas com crescimento supra-selar ou aos pa- e níveis pós-operatórios elevados de cortisol sérico. A
cientes com queixas visuais. vantagem do tratamento estereotático sobre o tradicio-
O diagnóstico por imagem hoje é feito fundamen- nal é a redução dos efeitos sobre estruturas vizinhas,
talmente feito pela ressonância nuclear magnética estando indicado especialmente ao tratamento de le-
(RNM), devendo considerar-se que, na doença de sões residuais que comprometam o seio cavernoso7-12.
Cushing, a imagem da hipófise pode ser normal.
Lembre-se de que alteração na RNM pode não
significar a presença de adenoma, já que uma parte Tratamento Cirúrgico
da população abriga adenomas incidentais, em torno Os primeiros tratamentos cirúrgicos remontam
de 10%, e ainda que 27% das pessoas autopsiadas po- ao início do século XX, entre 1907 e 1910, com os
dem apresentar um microadenoma. trabalhos de Kocher, Schllofer e Hirsch, seguindo-se
a grande experiência de Harvey Cushing, todos por
TRATAMENTO via transesfenoidal. As vias transcranianas também se
desenvolveram à época de Cushing, mantendo-se até
Considerações Gerais hoje, embora mais sofisticadas. As técnicas transes-
As várias modalidades de tratamento têm, como fenoidais foram revividas na década de 1960, com os
fator de avaliação, a evolução pós-operatória. O pri- trabalhos de Gerard Guiot e Jules Hardy em Paris,
meiro deles é a sobrevida, medida pela longevidade com a adição do microscópio cirúrgico2,5,13. Mais re-
após o tratamento. O segundo é, além de fornecer ma- centemente, técnicas endoscópicas foram introduzi-
terial para confirmação histológica, a normalização das ao armamentarium da via transesfenoidal14-19 bem
da função endócrina, seja na redução da hiperfunção, como as abordagens estendidas da base do crânio às
seja na normalização da atividade da glândula. Ou- vias transcranianas, eventualmente associadas às téc-
tro fator é o desaparecimento dos efeitos secundários nicas de neuronavegação20.
das hiperfunções, como no excesso de secreção de
hormônio do crescimento ou do hormônio adrenocor- INDICAÇÕES
ticotrófico. Por último, o desaparecimento do efeito
expansivo e sinais e sintomas dele decorrentes, bem As indicações cirúrgicas diferenciam, de acordo
como prevenção das recidivas2,6. com o tipo de tumor, manifestação clínica e impacto
sobre o paciente.
Em tumores não-funcionantes, a maioria dos pa-
Tratamento Clínico cientes apresenta cefaléia de caráter evolutivo, bem
Há terapêutica clínica efetiva para alguns tipos de como perda visual e hipopituitarismo progressivos21,22.
tumores, tais como a maioria daqueles secretores de Cada uma das apresentações é indicação potencial de
prolactina, com o uso de drogas agonistas dopaminér- tratamento operatório. Nos casos de perda aguda de
gicas, e para alguns dos tumores secretores de hormô- visão e insuficiência supra-renal aguda, por hemor-
nio do crescimento, como os análogos da somatosta- ragia ou necrose aguda de tumor hipofisário não-
tina. Os níveis séricos de cortisol em pacientes com funcionante, caracteriza-se intervenção de urgência
doença de Cushing podem ser reduzidos com o uso de (apoplexia hipofisária).

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179
Parte 3 – Cirurgia de Base do Crânio

Nos tumores secretores de hormônio do cresci- tuída pela hipofisectomia total, nos casos em que a
mento com acromegalia, a cirurgia é o tratamento de abordagem transesfenoidal tenha sido ineficaz7.
escolha, por permitir redução imediata da secreção
de GH, interrompendo os efeitos deletérios do hormô- ABORDAGENS CIRÚRGICAS
nio sobre o sistema cardiovascular, ossos e articula-
ções e, ainda, metabolismo da glicose. Saliente-se que Duas abordagens cirúrgicas são utilizadas para o
as manifestações clínicas eventualmente presentes, à tratamento dos tumores da hipófise: a via transesfe-
semelhança dos tumores não-funcionantes, incluindo a noidal e a craniotomia.
apoplexia, também são motivo de indicação cirúrgica. A abordagem transesfenoidal foi sendo refina-
A maioria dos tumores secretores de prolactina é da ao longo do tempo, se constituindo em método
tratada adequadamente com algum dos agonistas do- eficiente e bastante versátil para tratar as lesões
paminérgicos, dispensando-se o tratamento cirúrgico. hipofisárias e da região da sela túrcica. As vias de
Considera-se que 5% a 12% dos pacientes submeti- acesso para tal incluem a via transeptal sublabial
dos à droga apresentem intolerância ou resistência21. (hoje pouco utilizada), a transeptal transnasal, a en-
Frankel e Tindall1 propõem tratamento cirúrgico donasal direta com deslocamento do septo e a endo-
dos prolactinomas por acesso transeptoesfenoidal nasal endoscópica2-4,17,18,22. O endoscópio pode ser
para: utilizado, conjuntamente com o microscópio, em
• Pacientes com intolerância à bromoergocriptina; todas as outras vias de abordagem transesfenoidal14-19.
• Pacientes que não aceitam tomar medicação O uso combinado do microscópio e do endoscó-
por tempo prolongado; pio permite manter o benefício da visão binocular
• Prolactina sérica entre 150 e 500 ng/mL; e do uso bimanual de instrumentos (microscópio),
• Prolactinoma com grandes cistos ou em casos associando-se a visão panorâmica do endoscópio
de apoplexia; para exame da cavidade do seio esfenoidal e da sela
• Prolactinomas com efeito expansivo causan- túrcica, especialmente para confirmação da remo-
do sintomas visuais ou pan-hipopituitarismo, ção completa do tumor. Além do uso tradicional da
mesmo após tratamento clínico por uma ou fluoroscopia, métodos modernos como a neurona-
duas semanas; vegação guiada por computação podem ser adicio-
• Recorrência do prolactinoma após tratamento nados à abordagem transesfenoidal, bem como o
clínico ou radioterápico; uso transoperatório da RNM, associada ou não às
• Pacientes com fístula liquórica após tratamen- técnicas de neuronavegação25,26. Ainda, abordagens
to com bromoergocriptina; transesfenoidais estendidas à base do crânio podem
• Mulheres com prolactinoma que desejam en- ser utilizadas em grandes lesões da linha média3,20.
gravidar; Considerações importantes quanto à abordagem
• Mulheres grávidas com prolactinoma com iní- do esfenóide incluem tamanho do nariz e da narina,
cio de perda visual; presença de desvio ou perfuração de septo e história
• Prolactinomas que não respondem ao trata- de doença ou infecção sinusal2-4,24.
mento clínico. O posicionamento adequado é crítico nesta abor-
Entre os pacientes com prolactinomas, são melho- dagem: o paciente é colocado em decúbito dorsal com
res candidatos à normalização imediata dos níveis sé- o ombro direito junto ao canto superior da mesa cirúr-
ricos de prolactina os portadores de microadenomas gica. Eleva-se a cabeceira da cama 25o a 30o, de modo
ou macroadenomas não-invasivos, com dosagens a melhorar a drenagem venosa, permitindo um campo
pré-operatórias abaixo de 200 ng/ml23. cirúrgico limpo por eventual sangramento, com o que
Para portadores de adenomas secretores de ACTH é necessário o tamponamento das vias aéreas. A cabe-
produzindo doença de Cushing, a cirurgia é a melhor ça é apoiada no suporte em “ferradura “do Mayfield,
forma de tratamento, por permitir reduzir imediata- com flexão lateral do pescoço em 20o (aproximando
mente os níveis séricos de ACTH e normalizar a se- a orelha esquerda do ombro esquerdo). A mesa é po-
creção de cortisol. Em casos de lesões muito peque- sicionada de tal maneira que o dorso do nariz per-
nas, existe a opção do tratamento com a radiocirurgia maneça paralelo ao solo e que a cabeça permaneça
estereotática, porém com a ressalva de que o período paralela às paredes da sala, com isto permitindo que o
necessário para a normalização do ACTH pode ultra- cirurgião opere em posição reta, e não inclinado sobre
passar 1 ano, razão pela qual tais pacientes necessitam o paciente (Fig. 16.1).
ser mantidos com terapia supressiva com cetocona- A abordagem transeptal transnasal se inicia por
zol5. Ainda, nos casos de doença de Cushing clinica- uma incisão vertical da mucosa nasal curvilínea, jun-
mente muito avançada, pela demora em exercer seus to à columela, podendo estender-se levemente em di-
efeitos, a radiocirurgia estereotática deve ser substi- reção posterior, paralelamente à maxila (Fig. 16.2).

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16 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Hipofisários

Cabeça do paciente
paralela à parede da sala

Enfermeiro
4 1

Cirurgião

5 Intensificador paralelo
à parede da sala
Assistente

6 Dorso nasal paralelo ao chão


3 2

1. Ombro do paciente junto à lateral da mesa cirúrgia


2. Bos do fixador de crânio
3. Suporte de crânio rotado lateralmente
4. Cabeça do paciente abduzida em direção ao ombro esquerdo
5. Posição do intensificador
6. Posição do dorso nasal
7. Cabeceira da mesa elevada 30o

Fig. 16.1 – Posicionamento adequado do paciente na sala cirúrgica.

Para facilitar a dissecção e reduzir o sangramento, a do septo cartilaginoso, facilitando e reduzindo o tem-
mucosa nasal é infiltrada com solução de lidocaína po cirúrgico do procedimento (Fig. 16.5). Neste caso,
a 2% com vasoconstritor, provocando-se a retração o septo cartilaginoso, protegido de ambos os lados
dos cornetos nasais com cotonóides embebidos com por mucosa, é luxado, atingindo-se o seio esfenoidal.
oximetazolina. A dissecção submucopericondral da Como tal, pela mínima dissecção da mucosa, não se
mucosa expõe o septo cartilaginoso, que é liberado e faz necessária oclusão nasal pós-operatória. O bene-
luxado contralateralmente (Fig. 16.3). A remoção do fício dessa técnica – menor tempo operatório e menor
vômer permite a colocação do espéculo até o assoalho dissecção da mucosa – é contraposto pela menor ex-
esfenoidal, com manutenção da integridade da muco- posição, requerendo espéculo menor15,19,27.
sa nasal (Fig. 16.4). Identificados os óstios do seio es- A via endoscópica transnasal utiliza o endoscópio
fenoidal, realiza-se a remoção do assoalho com pinça a 0, geralmente introduzido na narina esquerda, com
de Kerrison, de modo a permitir ampla visualização afastamento lateral da concha média (Fig. 16.6), até
da cavidade do seio e do assoalho selar. Nesse ponto atingir a parede anterior do esfenóide, mais especifi-
é fundamental conhecer a existência de septo esfenoi- camente o seu óstio (Fig. 16.7). Aqui também é am-
dal e sua posição, o que permitirá adequada identifica- plamente removido o assoalho com pinça de Kerrison
ção do assoalho da sela. Em pacientes já submetidos (Fig. 16.8), sendo, então, o procedimento continuado
a procedimento semelhante, em portadores de doença com técnica endoscópica ou com o uso combinado do
de Cushing e em crianças, a incisão da mucosa pode microscópio e do endoscópio: neste momento é útil
ser feita mais posteriormente, junto à porção posterior o endoscópio com lentes de 30o e 70o. As vantagens

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Parte 3 – Cirurgia de Base do Crânio

A B

Fig. 16.2 – (A e B) Incisão da mucosa nasal, com dissecção subcondral junto ao septo nasal.

A B

Fig. 16.3 – (A e B) Exposição do septo ósseo, com afastamento lateral da mucosa nasal e do septo cartilaginoso.

do uso do endoscópio6,17,18 – observação mais ampla,


especialmente lateral, do seio esfenoidal e da cavi-
dade selar (Fig. 16.9) – contrapõem-se à necessida-
de repetida de retirada para limpeza e pela utilização
permanente de uma das mãos pelo endoscópio, o que
não ocorre com o microscópio.
A via sublabial, inicialmente a técnica preferida, é
hoje utilizada somente em casos nos quais está con-
tra-indicada a via transnasal (necessidade de proce-
dimentos com extensão à base do crânio, pacientes
com pequenas aberturas nasais ou pacientes pediá-
tricos que não suportem o uso do espéculo). À inci-
são sublabial, segue-se o descolamento da mucosa,
até atingir os óstios nasais bilateralmente: a mucosa é
dissecada do septo cartilaginoso e da maxila, devendo
ser preservada a extremidade anterior do septo – para
Fig. 16.4 – Exposição da crista esfenoidal, após remoção evitar deformidades – e também o orifício da cavida-
do vômer. de piriforme.

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16 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Hipofisários

A B

Fig. 16.5 – (A e B) Acesso endonasal, com incisão da mucosa nasal em sua região posterior.

Fig. 16.8 – Imagem esquemática do endoscópio e da pinça


Fig. 16.6 – Acesso endoscópico: meato médio e septo nasal de Kerrison, utilizados simultaneamente para abertura do as-
expostos. soalho selar.

A exposição da fossa pituitária deve ser con-


firmada pela fluoroscopia ou, mais recentemente,
por método guiado por imagem computadorizada.
É fundamental lembrar que uma abertura excessiva
do espéculo pode provocar fratura do maxilar, do
corpo do esfenóide ou dos forames ópticos ou, ainda,
parestesias faciais permanentes nas divisões oftálmi-
ca e maxilar do trigêmeo; a remoção da mucosa do
seio parece reduzir a possibilidade de mucoceles pós-
operatórias.
A abertura do assoalho selar deve ser ampla, ex-
pondo o limite anterior do seio cavernoso direito e es-
querdo e a borda inferior do seio intercavernoso. Uma
objetiva com distância focal de 350 a 375 mm permi-
te incluir toda a sela túrcica como o campo cirúrgico
Fig. 16.7 – Identificação do óstio do seio esfenoidal. (Fig. 16.10). Exposta a dura-máter (Fig. 16.11), esta é

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Parte 3 – Cirurgia de Base do Crânio

A B

Fig. 16.9 – (A e B) Endoscópio posicionado dentro da sela túrcica, expondo os limites do tumor e do quiasma óptico.

aberta precedida de coagulação, sendo indicada uma com cola de fibrina e uso de drenagem lombar contí-
abertura ampla, geralmente em forma oblíqua e cruza- nua por 48 ou 72 horas.
da, produzindo quatro pequenos retalhos (Fig. 16.12). A craniotomia, seja ela qual for, é limitada às le-
Um dissector em ângulo reto é posicionado ao redor sões que apresentem grandes crescimentos na fos-
do tumor, permitindo dissecção inicial da dura-máter sa frontal ou temporal ou, ainda, na fossa posterior;
subjacente (Fig. 16.13). Preferentemente a remoção é também nas lesões cuja histologia seja incerta pelos
feita com cureta em anel – 45o – nas porções laterais métodos diagnósticos. Em algumas situações, a com-
e inferiores, deixando que o pulsar normal do liquor binação de uma craniotomia e uma abordagem trans-
provoque a descida da porção superior do tumor (Fig. esfenoidal está indicada, sejam elas concomitantes ou
16.14); ao contrário, a remoção inicial começada pela estadiadas.
parte superior da lesão provoca descida do diafrag-
ma selar, dificultando a remoção do restante da lesão
(Fig. 16.15). Eventualmente injeção de ar ou solução
salina através de cateter lombar pode facilitar o des-
censo da lesão residual, o que pode também ser obti-
do com manobra de Valsalva. Concluída a retirada do
tumor (Fig. 16.16), incluindo-se por vezes a retirada
da pseudocápsula (Fig. 16.17), a hemostasia é feita
com hemostáticos e compressão leve. Não havendo
evidência de saída de liquor (Fig. 16.18), o fechamen-
to não exige uso de cola de fibrina, sendo de escolha
pessoal a oclusão do assoalho selar com fragmento de
cartilagem nasal ou septo nasal ósseo, que, quando
utilizada, facilita uma eventual reoperação. Fig. 16.10 – Exposição do assoalho da sela túrcica (s), da
Nos casos de doença de Cushing, a busca da le- eminência carotídea (c) e da eminência óptica (o).
são pode ser muito trabalhosa, especialmente quan-
do os métodos de imagem não mostram claramente
o tumor, exigindo dissecção sistemática da glândula,
observando-se suas variações de textura e cor. Não
sendo identificado tumor, indica-se a hipofisectomia
parcial ou total, tema que, obviamente, já deverá ter
sido discutido com o paciente28.
Nos casos de acromegalia, é conveniente lembrar
que os instrumentos devem ser mais longos, podendo
ser mais difícil a intubação e a anestesia29.
Nos casos de saída evidente de liquor no transo-
peratório, deve-se realizar a plastia do assoalho selar:
das inúmeras formas, preferimos o uso de gordura ou Fig. 16.11 – Assoalho selar removido: exposição da dura-
aponeurose obtida da parede abdominal superposta máter (dm) e do seio esfenoidal (sf ).

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16 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Hipofisários

B
Fig. 16.12 – Dura-máter aberta. Tumor exposto ocupando
grande parte do campo operatório.

Fig. 16.14 – Duramater aberta: (A) tumor claro à esquerda,


com tecido normal róseo à direita; (B) cavidade resultante da
remoção tumoral.

Fig. 16.15 – Remoção do tumor com cureta em anel.

aponeurótico (Fig. 16.21) e craniotomia (Fig. 16.22).


A abordagem inter-hemisférica bifrontal, bem como
Fig. 16.13 – Dura-máter aberta: (A) tumor exposto à es- a transcalosa, podem ser utilizadas, especialmente
querda; (B) tumor sendo removido com dissector.
quando há grande crescimento supra-selar vertical,
com compressão ou bloqueio do terceiro ventrículo.
A via de acesso utilizada na craniotomia depen- A extensão da craniotomia pterional, com a ressecção
de fundamentalmente das características anatômicas do teto orbitário – craniotomia frontorbitária – ou
da lesão, em especial no que se refere à posição do com a ressecção associada do zigoma – craniotomia
nervo e quiasma óptico. Geralmente, a abordagem fronto-orbitozigomática –, pode permitir, nos casos de
subfrontal é altamente efetiva para a maioria dos grandes tumores, uma abordagem da lesão com menor
tumores, excetuando-se os casos de pré-fixação do afastamento cerebral e melhor ângulo de visão5.
quiasma. Pacientes que apresentem tumores com ex- A técnica chamada minimamente invasiva inclui
tensão parasselar lateral, em geral, são tratados por uma abordagem supraciliar, com pequena incisão e
via pterional, especialmente os que se expandem ao craniotomia reduzida, utilizando-se do microscópio
seio cavernoso (Fig. 16.19): a abordagem cirúrgica e/ou do endoscópio para a retirada do processo ex-
compreende os passos relativos à incisão de couro pansivo. Sua vantagem residiria no menor tempo ope-
cabeludo (Fig. 16.20), dissecção do plano musculo- ratório e incisão esteticamente aceitável.

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185
Parte 3 – Cirurgia de Base do Crânio

Fig. 16.18 – Exposição completa do diafragma selar.

Fig. 16.16 – (A e B) Cavidade resultante da ressecção do


tumor.

Fig. 16.19 – Esquema de acesso transcraniano, via cranio-


tomia pterional.

Fig. 16.17 – (A e B) Dissecção da pseudocápsula, expondo


o diafragma selar.

Fig. 16.20 – Incisão marcada no couro cabeludo à direita.

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16 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Hipofisários

Fig. 16.23 – Ressonância magnética (corte coronal): adeno-


ma hipofisário com extensão supra-selar e compressão quias-
mática.

Fig. 16.21 – Retalho musculoaponeurótico removido, ex-


pondo a área óssea para a craniotomia.

Fig. 16.24 – Ressonância magnética (corte coronal): ima-


gem pós-operatória, com remoção completa da lesão e exposi-
ção da hipófise e da haste hipofisária em posição normal.

Nos portadores de tumor secretor de hormônio


de crescimento, com acromegalia, a cirurgia transes-
fenoidal promove remissão em 70% deles, definida
por rigorosos critérios endócrinos: normalização do
IGF-1, dosagem sérica de GH de menos de 2,5 ng/
Fig. 16.22 – Craniotomia realizada, dura-máter exposta, asa ml e nadir do GH durante teste de tolerância à glicose
do esfenóide por ser removida.
menor que 1 ng/ml. O índice de remissão da doen-
ça é de 88% nos microadenomas, reduzindo-se para
RESULTADOS E EVOLUÇãO 65% nos macroadenomas. A melhora dos sintomas
Relativamente aos tumores não-funcionantes, os de acromegalia e dos sintomas expansivos ocorre em
resultados devem considerar melhora dos sintomas 95%, estando a função hipofisária preservada em 97%
visuais e da cefaléia, preservação ou normalização dos casos. A recidiva, após 10 anos, ocorre em 1,3%
da atividade hipofisária e redução da possibilidade de e, considerando-se os tratamentos adjuvantes, 72%
recidiva (Figs. 16.23 e 16.24). Segundo Laws e Jane6, dos pacientes vivem bem, sem evidência de doen­ça
em sua série pessoal, a visão é melhor em 87% e se ativa6.
estabiliza em 9%; a melhora da cefaléia ocorre em Portadores de tumores secretores de prolactina fre-
95% dos pacientes; a secreção hormonal é normali- qüentemente apresentam tumores de grande tamanho,
zada em 27%, sendo necessária reposição hormonal muitas vezes sem resposta ao tratamento clínico. Nos
nos demais. A mortalidade é inferior a 2%, sendo este microadenomas, a normalização pós-operatória da
índice o maior dentre os tumores hipofisários, visto prolactina é de 87%, reduzindo-se para cerca de 50%
o tamanho e o grau de invasão dos tumores não-se- nas formas invasivas. A redução do efeito expansivo
cretores. O índice de recidiva é de 16% em 10 anos, gira em torno de 95%, sendo preservada a função pi-
embora apenas 6% deles requeiram procedimento ci- tuitária em 97% dos casos. O índice de recidiva em
rúrgico adicional. Na evolução a longo prazo (mais 10 anos é de 13% e, dada a existência de tumores in-
de 10 anos), 83% dos pacientes vivem bem, sem evi- vasivos neste grupo, apenas 65% dos pacientes vivem
dência de doença. bem na evolução de 10 anos6.

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187
Parte 3 – Cirurgia de Base do Crânio

Para os portadores de doença de Cushing, o índi- 10. Shin M, Kurita H, Sasaki T, Tago M, Morita A, Ueki
ce de remissão é de 95% nos microadenomas, caindo K, et al. Stereotactic radiosurgery for pituitary ad-
para 65% no caso de macroadenomas. A redução do enoma invading the cavernous sinus. J Neurosurg.
efeito expansivo é de 95% e a preservação da função Dec 2000;93(Suppl 3):2-5.
da glândula, de 97%. O índice de recidiva em 10 anos 11. Zhang N, Pan L, Wang EM, Dai JZ, Wang BJ, Cai PW.
é de 12%, sendo bem maior em crianças (42%), em- Radiosurgery for growth hormone – producing pituitary
bora hoje a utilização adicional da radiocirurgia este- adenomas. J Neurosurg. Dec 2000;93(Suppl 3):6-9.
reotática produza maiores índices de remissão6. 12. Petrovich Z, Yu C, Gianotta SL, Zee CS, Apuzzo MLJ.
Gamma knife radiosurgery for pituitary adenoma:
early results. Neurosurgery. July 2003;53(1):51-9.
COMPLICAÇÕES 13. Lanzino G, Laws Jr ER, Feiz-Erfan I, White WL.
As complicações são focadas na cirurgia transes­ Transsphenoidal approach to lesions of the sella tur-
cica: historical overview. Barrow Quart. 2002;18(3).
fenoidal, já que pequeno número de pacientes é sub-
14. Alfieri A , Jho HD. Endoscopic endonasal approaches
metido à craniotomia. A taxa de mortalidade é de
to the cavernous sinus surgical approaches . Neuro-
0,5% a 1,5%, e a morbidade gira em torno de 3,5%, surgery. Aug 2001;49(2):354-62.
incluindo-se a fístula liquórica, meningite, acidentes 15. Cohen RS, Stamm AC, Bordasch A. Endonasal mi-
vasculares cerebrais, hemorragias intracranianas, le- croscopic transseptalsphenoidal approach to sellar
são de vasos intracranianos e das vias ópticas. A fís- and para sellar lesions. In: Stamm AC, Draf W, edi-
tula liquórica pode ser tratada com drenagem lombar tors. Micro-endoscopic surgery of the paranasal si-
contínua ou, se necessário, com reintervenção, ocluin- nuses and the skull base. Berlin: Springer; 2000,
do-se o local da fístula com gordura ou fáscia lata, re- chap. 44, p. 543-54.
cobertos com cola de fibrina. Complicações menores 16. Divitis E, Cappabianca P, Cavallo LM. Endoscopic
podem ocorrer, tais como sinusopatias, perfuração de transsphenoidal approach: adaptability of the proce-
septo nasal e epistaxe, com índices menores que 5%. dure to different sellar lesions. Neurosurgery. Sept
Fatores de risco incluem procedimento transesfenoi- 2002;51(3):699-707.
dal prévio, radioterapia prévia, tumores invasivos e 17. Jho HD. The expanding role of endoscopy in skull-
fatores de risco clínico, tais como diabetes mellitus e base surgery . Clin Neurosurg. 2000;48:287-305.
doenças cardiovasculares6. 18. Jho HD, Alfieri A. Endoscopic transsphenoidal pitu-
itary surgery: various surgical techniques and recom-
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16 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Hipofisários

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27. Zada G, Kelly DF, Cohan P, Wang C, Swerdloff R. tos neurocirúrgicos. Arq Neuropsiquiatr (São Paulo).
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Feb 2003;98(2):350-8. Arq Neuropsiquiatr (São Paulo). 2002;60(1):123-8.

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17
Tumores Petroclivais – Diagnóstico,
Tratamento e Resultados
Ricardo Ramina
Yvens Barbosa Fernandes
Maurício Coelho Neto
Guilherme Borges
Donizeti César Honorato

INTRODUÇÃO do crânio da fossa posterior se originariam em uma li-


nha da região petroclival e os classificou como: clivais,

V
árias lesões podem se originar na região petro- petroclivais, esfenopetroclivais, do forame magno e do
clival. Entre os tumores, os meningiomas são ângulo pontocerebelar. Desde essa época, várias outras
os mais freqüentes, seguidos pelos condrossar- classificações foram propostas. Quando se analisam os
comas, cordomas, schwanomas dos nervos cranianos resultados cirúrgicos de portadores de meningiomas da
V e, mais raramente, VII, cistos epidermóides, cistos base do crânio da fossa posterior, deve-se diferenciar
de colesterol, cistos ósseos aneurismáticos, gliomas os tumores localizados anteriormente aos nervos cra-
do tronco cerebral e tumores malignos (carcinomas, nianos daqueles localizados posteriormente, denomi-
sarcomas)1-5. Entre as lesões vasculares, encontram-se nados meningiomas do ângulo pontocerebelar. Esses
os aneurismas da artéria basilar e seus ramos, malfor- tumores deslocam os nervos cranianos anteriormente e
mações arteriovenosas e cavernomas. Os meningio- sua remoção cirúrgica é mais simples do que nos casos
mas são as lesões mais freqüentes e que apresentam dos tumores localizados anteriormente (clivais e petro-
maior dificuldade no tratamento. Por tal motivo, este clivais).
capítulo abordará principalmente os meningiomas A remoção radical de um meningioma petroclival ex-
petroclivais, uma vez que os acessos cirúrgicos uti- tenso, com preservação das importantes estruturas envol-
lizados no tratamento desses tumores são os mesmos vidas, representa grande desafio para o neurocirurgião e,
para outras lesões dessa região. possivelmente, encontra poucas outras cirurgias na medi-
Meningiomas petroclivais são, na maioria dos cina que ofereçam dificuldades técnicas similares.
casos, lesões benignas da fossa posterior que podem A mortalidade resultante da ressecção desses tu-
envolver a fossa média, as estruturas ósseas da base mores era extremamente elevada até a década de
do crânio, o seio cavernoso, o tronco cerebral e to- 19703,7-13. Os avanços tecnológicos obtidos com novos
das as estruturas vasculares e nervosas importantes métodos diagnósticos e cirúrgicos reduziram drasti-
dessas regiões. As lesões são relativamente raras e camente a mortalidade e a morbidade desses casos.
costumam apresentar sintomas apenas quando já são Tumores como os schwanomas do nervo trigêmeo
extensas e envolvem nervos cranianos. que se apresentam em formato de “ampulheta”, com
Em 1953, Castellano e Ruggiero6, analisando uma uma porção na fossa média e outra na fossa posterior,
série de meningiomas da fossa posterior operados por são lesões petroclivais cuja remoção radical é possí-
Olivecrona, propuseram uma classificação para esses vel na quase totalidade dos casos. Remoção radical
tumores em cinco diferentes grupos: da convexidade de cordomas e condrossarcomas petroclivais é muito
cerebelar, do tentório, da superfície posterior do osso rara, uma vez que esses tumores têm características
petroso, do clivo e do forame magno. O aparecimen- invasivas. Cistos epidermóides, de colesterol e ós-
to de novos métodos diagnósticos, como a tomografia seo aneurismático da região petroclival, são lesões
computadorizada, tornou possível compreender me- benignas que permitem uma remoção radical com
lhor a origem desses tumores. Assim sendo, em 1980, preservação das estruturas vasculonervosas envolvi-
Yasargil et al.7 sugeriram que os meningiomas da base das. Tumores primários do SNC, como os gliomas de

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191
Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

baixo grau do tronco cerebral (mesencéfalo), podem,


em casos mais delimitados, ser removidos por meio
de abordagens específicas para a região petroclival.
Tumores com alto grau de malignidade como os car-
cinomas não são passíveis de remoção radical.

DEFINIÇÃO DE REGIÃO E MENINGIOMA


PETROCLIVAL
A região petroclival é formada pelo corpo do osso
esfenóide, pela porção central do osso occipital, limi-
tada lateralmente pelo ápice do osso petroso e supe-
riormente pelo tentório e pelo ligamento petroclival.
Importantes estruturas vasculares e nervosas, como a
artéria basilar e seus ramos, veia petrosa, nervos cra-
nianos III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X e XI podem
ser envolvidas ou mesmo infiltradas por lesões que se
originem nessa região.
Meningiomas petroclivais são definidos como tu-
mores que têm sua origem medialmente aos nervos
cranianos V, VII, VIII, IX, X e XI e se estendem para o Fig. 17.2 – Meningioma do ângulo pontocerebelar.
tentório ou mesmo para a fossa média e seio caverno-
so (Fig. 17.1). Esses tumores devem ser diferenciados
daqueles que se originam posteriormente a esses ner-
vos (Fig. 17.2). Lesões originárias de outras regiões
como a asa do esfenóide (meningiomas mediais da asa
do esfenóide) podem se estender ou infiltrar essa re-
gião, causando dificuldades semelhantes ou até mes-
mo maiores na remoção desses tumores (Fig. 17.3).

Fig. 17.3 – Meningioma da asa do esfenóide com extensão


para a região petroclival.

DIAGNÓSTICO
Freqüentemente, os sintomas são insidiosos e o
diagnóstico em grande número de casos é tardio com
o paciente já apresentando uma lesão extensa. Bri-
colo et al.8 estimam, em média, 2,5 a 4,5 anos entre
o início dos sintomas e o diagnóstico. Os sintomas
Fig. 17.1 – Meningioma petroclival. clínicos podem ser agrupados em quatro categorias,

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17 – Tumores Petroclivais – Diagnóstico, Tratamento e Resultados

dependendo do envolvimento de nervos cranianos, vimento dos principais vasos dessa região. Exames
compressão do cerebelo ou do tronco cerebral e au- de angiografia cerebral digital são feitos apenas em
mento da pressão intracraniana. Cefaléia, alteração casos muito vascularizados, em que se considere uma
da marcha e de nervos cranianos são as queixas mais embolização pré-operatória dos pedículos vasculares.
freqüentes. Os nervos trigêmeo, abducente, glossofa- Esses tumores são nutridos, na maioria das vezes, por
ríngeo e vago são os mais freqüentemente afetados. ramos da artéria carótida externa e ramos cavernosos
Muitas vezes causa surpresa o fato de o paciente apre- da artéria carótida interna (ramos tentoriais, artéria de
sentar um extenso schwanoma do nervo trigêmeo sem Bernasconi-Cassinari).
maiores déficits neste. Cistos epidermóides podem
causar dores faciais com características de neural- HISTÓRIA NATURAL
gia trigeminal “típica”. Cistos de colesterol causam
sintomas auditivos, como perda auditiva e zumbidos. A história natural de meningiomas se caracteriza
Paralisia facial em meningiomas petroclivais é mais por um progressivo crescimento tumoral, ocasionan-
rara, porem mais freqüente que em casos de schwano- do compressão e infiltração de estruturas vizinhas.
ma do nervo vestibular. Dores em região do ouvido e Em recente estudo, Van Havenberg et al.13 analisaram
paralisias de nervos cranianos de rápida evolução são a evolução de 21 pacientes portadores de meningio-
sintomas observados com freqüência em pacientes mas petroclivais, tratados conservadoramente. Esses
com lesões malignas. Hidrocefalia e sinais de com- pacientes foram acompanhados clinicamente, com
pressão do tronco cerebral com hemiparesia são si- exames de imagem e um seguimento de, no mínimo,
nais de lesões benignas mais extensas. quatro anos. Observaram um crescimento tumoral em
Exames de imagem devem ser realizados em pa- 76% dos pacientes, com piora clínica em 63%.
cientes que apresentem as queixas anteriores. A tomo- Em pacientes submetidos à ressecção subtotal do
grafia computadorizada mostra com maior clareza o tumor, Jung et al.14 observaram em uma série de 38
envolvimento das estruturas ósseas da base do crânio casos, crescimento linear de 0,37 cm/ano e aumento
e calcificações tumorais. Em meningiomas podem de volume de 4,94 cm³/ano. Relataram, no entanto,
ocorrer hiperostose e, em alguns casos, erosão óssea. taxa de 60% sem progressão da doença em 5 anos.
Em schwanomas do nervo trigêmeo, uma erosão ós- Concluíram também que o crescimento do tumor re-
sea regular da ponta do rochedo é um achado típico, sidual foi menor em pacientes mais idosos (acima de
enquanto destruição óssea irregular é observada em 50 anos).
carcinomas. No exame sem contraste, meningiomas
são levemente hiperintensos em relação ao parênqui- TRATAMENTO
ma cerebral, podendo apresentar áreas císticas. Nes-
ses tumores observa-se forte impregnação pelo meio Possibilidades de Tratamento
de contraste. Uma base de implantação larga com in-
filtração da dura-máter é encontrada na maioria dos O tratamento de lesões petroclivais inclui três pos-
pacientes. O exame de ressonância magnética, reali- sibilidades: tratamento conservador, com a simples
zado nas seqüências T1 e T2, com e sem contraste, é observação clínica; tratamento cirúrgico, com remo-
de extrema valia para o diagnóstico e o planejamento ção radical; e tratamento radioterápico, associado ou
cirúrgico das lesões petroclivais. As relações da le- não à cirurgia prévia.
são com o tronco cerebral, nervos cranianos, condu- Tratamento conservador é indicado a pacientes
to auditivo interno, forame jugular, forame magno, sem condições clínicas para se submeter a cirurgia,
seio cavernoso e vasos são mais bem demonstradas pacientes com idade acima de 70 anos e lesões pe-
com esse exame do que com exames de tomografia quenas de características benignas e em casos em que
computadorizada. Meningiomas e schwanomas im- o paciente se recuse a submeter-se a uma cirurgia de
pregnam-se intensamente pelo gadolínio, observan- grande porte.
do-se, na maioria dos casos de meningiomas, uma A remoção cirúrgica radical da lesão é o tratamen-
infiltração da dura-máter da base do crânio (“dura to de escolha na grande maioria dos tumores benig-
Tail”). A presença de edema e bordos pouco nítidos nos, como meningiomas e schwanomas, bem como
nas seqüências de T2 pode significar infiltração da nos casos de cistos epidermóides, de colesterol e
pia-máter e grande dificuldade na remoção radical da ósseo aneurismático. Essa é a única forma de trata-
lesão, com preservação das estruturas nervosas. Tu- mento que oferece cura aos pacientes. Nos casos de
mores primitivos do SNC como os gliomas são mais meningiomas extensos, uma remoção cirúrgica radi-
bem avaliados por exames de ressonância magnéti- cal pode, no entanto, ocasionar novos déficits devido
ca. Cistos epidermóides podem ser diferenciados de ao envolvimento de importantes estruturas anatômi-
cistos de colesterol mediante técnicas de ressonância cas dessa região (por exemplo, tronco cerebral, vasos
magnética, como a difusão. Angiorressonância é rea­ perfurantes e nervos cranianos baixos). Nesses casos,
lizada para demonstrar a vascularização e o envol- deve-se considerar uma remoção subtotal, seguida ou

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

não de tratamento adjuvante. Em nossa opinião, me- Seleção do Acesso Cirúrgico


ningiomas petroclivais pequenos devem ser removi-
dos com a maior rapidez possível, uma vez que esses As abordagens cirúrgicas utilizadas no tratamento
tumores oferecem grande possibilidade de ressecção desses tumores são: acesso pela fossa média (fronto-
total sem novos déficits. Consideramos equivocada orbitozigomático), acessos petrosos e acesso retros-
a atitude de acompanhar radiologicamente pequenos sigmóideo. A associação do acesso da fossa média
meningiomas da base do crânio em pacientes com com o retrossigmóideo, realizada em duas cirurgias
com intervalo de 2 a 3 semanas, tem sido utilizada
condições cirúrgicas, uma vez que esses tumores,
com freqüência em nosso serviço nos casos de me-
mesmo apresentando um pequeno crescimento, po-
ningiomas extensos que comprometam a fossa média,
dem envolver estruturas importantes, impossibilitan-
seio cavernoso e fossa posterior.
do sua remoção radical sem novos déficits neurológi-
cos. Muitas vezes o crescimento de meningiomas é
linear envolvendo forames, sendo negligenciado nos Acesso Fronto-orbitozigomático
exames de controle. Indicações
Radioterapia como forma primária de tratamento
ou após uma remoção parcial pode ser considerada Utilizamos essa abordagem cirúrgica para tumo-
em alguns casos. Tumores de alta malignidade, como res da região petroclival que apresentem maior ex-
os carcinomas, são tratados primariamente com ra- tensão na fossa média e invadam o seio cavernoso.
dioterapia. Pequenos meningiomas ou restos tumorais Nos casos de schwanomas do nervo trigêmeo, esse
em pacientes mais idosos podem receber indicação acesso pode ser inteiramente extradural, quando a
para radiocirurgia ou radioterapia conformacional es- lesão encontra-se predominantemente no gânglio de
tereotática. Cordomas e condrossarcomas podem ser Gasser e na fossa média. Em nossa experiência, essa
abordagem não expõe adequadamente lesões clivais
tratados com radiocirurgia (preferencialmente com
que ultrapassem a linha média ou extensões tumorais
energia de prótons) para obtenção de um controle no
abaixo dos nervos cranianos VII e VIII, mesmo com
crescimento da lesão. Não indicamos radioterapia
abertura do tentório. As principais indicações para
(radiocirurgia) nos casos de schwanomas. Gliomas
essa abordagem são meningiomas e schwanomas do
de baixo grau, na maioria das vezes, não recebem ra- trigêmeo (Figs. 17.4 e 17.5).
dioterapia pós-operatória.
Nos pacientes com meningiomas petroclivais em
que não tiver sido possível uma remoção radical da Técnica Cirúrgica
lesão, nossa conduta é seguir o paciente com exames Posicionamos o paciente em decúbito dorsal, com
de imagem (preferencialmente ressonância magné- a cabeça levemente estendida e girada 30º para o lado
tica) de controle, com intervalo de 6 meses. A des- oposto ao da lesão. A cabeça é fixada em apoio de
vascularização obtida com a cirurgia freqüentemente três pinos. A incisão de pele em forma de “C” inicia-
inibe ou retarda o crescimento da lesão. se na região pré-auricular, cerca de 1 cm abaixo do

A B

Fig. 17.4 – Pequeno meningioma petroclival. (A) Pré-operatório (seta). (B) Remoção radical através de acesso fronto-orbitozigomático.

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17 – Tumores Petroclivais – Diagnóstico, Tratamento e Resultados

A B

Fig. 17.5 - Extenso tumor petroclival. (A) Pré-operatório. (B) Pós-operatório. Acesso fronto-orbitozigomático.

articulação para não prejudicar sua função. Quando


a articulação temporomandibular é aberta, a maioria
dos pacientes apresenta trismo durante três meses no
período pós-operatório. O próximo passo cirúrgico
consiste na remoção com drill de alta rotação da gran-
de asa do esfenóide, parede lateral da órbita e base da
fossa média. A artéria meningoorbitária é coagulada
e seccionada. Os forames espinhoso, oval e redondo
são expostos. A artéria meníngea média é coagulada
e seccionada. A fissura orbitária superior é exposta.
A artéria carótida interna, em sua porção intratem-
poral, pode ser exposta usando como parâmetros o
forame espinhoso, a articulação temporomandibular
Fig. 17.6 - Posição do paciente e incisão de pele utilizada e o nervo petroso maior. Essa artéria encontra-se me-
para o acesso fronto-orbitozigomático
dialmente a essas estruturas e à tuba de Eustáquio.
arco zigomático, estendendo-se até a região frontal Nos casos em que o tumor envolva essa artéria e um
atrás da linha de implantação dos cabelos (Fig. 17.6). controle proximal seja necessário, nossa preferência
Com o objetivo de preservar o ramo frontal do nervo é expor a artéria carótida interna na região cervical.
facial, incisamos a fáscia temporal 1 cm anteriormen- Schwanomas do nervo trigêmeo, cistos de colesterol,
te ao conduto auditivo interno, e o retalho de pele é alguns casos de condrossarcoma e extensões tumorais
rodado anteriormente com a fáscia temporal, expon- extradurais são removidos sem a necessidade de aber-
do o músculo temporal. Preferimos essa técnica à dis- tura da dura-máter.
secção interfascial, pois oferece maior segurança para A grande maioria das lesões petroclivais é, no en-
o nervo facial. O arco zigomático, a articulação tem- tanto, predominantemente intradural. Com o auxílio
poromandibular e o rebordo da órbita são totalmente do microscópio cirúrgico, a dura-máter é incisada, em
expostos. O músculo temporal é dissecado com sua forma de arco da região frontal até a região tempo-
fáscia interna delgada e rodado inferiormente. Uma ral. A fissura sylviana é exposta e amplamente aberta
craniotomia frontotêmporo-orbitozigomática é reali- identificando-se a artéria cerebral média e seus ramos,
zada, e o retalho ósseo, retirado em uma única peça. a artéria carótida interna, seus ramos e sua bifurcação,
O arco zigomático pode ser removido com o teto da os nervos olfatório, óptico e oculomotor. O tumor é
articulação temporomandibular para expor toda a exposto e, com freqüência envolve as estruturas ana-
base da fossa média. Deve-se preservar o menisco da tômicas citadas (Fig. 17.7). Os meningiomas podem
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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

pondo a extensão da lesão na fossa posterior e clivo.


O ápice petroso e o processo clinóide posterior são
removidos com broca de diamantes para ampliar a
exposição na região petroclival e identificação da
artéria basilar e seus ramos. Em nossa experiência,
o limite posterior inferior dessa abordagem é o poro
acústico interno. Os nervos facial e vestibulococlear
encontram-se, na maioria desses tumores, desloca-
dos inferiormente.
Após remoção da lesão, a dura-máter é suturada
hermeticamente, e o retalho ósseo, fixado com sutu-
ras não absorvíveis ou microplacas.

Fig. 17.7 – Extenso meningioma petroclival envolvendo a


Acessos Petrosos
artéria carótida interna (TU), nervo óptico (n.o.), bifurcação ca- Indicações
rótida (seta).
Utilizamos os seguintes acessos petrosos para es-
envolver ou mesmo infiltrar vasos e nervos. Nossa ses tumores: acesso pré-sigmóideo retrolabirintino,
estratégia para sua preservação é, inicialmente, iden- acesso pré-sigmóideo translabirintino e petrossecto-
tificá-los em regiões em que não estejam infiltrados e mia total. Esses acessos são utilizados quando a lesão
segui-los até a porção comprometida. Nos pacientes tem extensões para as fossas média e posterior (Figs.
em que a função pré-operatória dos nervos ópticos e/ 17.8 e 17.9). Em pacientes com audição preservada,
ou oculomotor esteja preservada, é fundamental man- utilizamos o acesso pré-sigmóideo retrolabirintino,
ter esse estado. Se houver infiltração tumoral e a fun- com conservação do bloco labiríntico. Quando o pa-
ção estiver preservada, deixam-se pequenas porções ciente não apresenta audição pré-operatória e também
da cápsula tumoral ao redor desses nervos. Com bro-
nos casos de tumores que ultrapassam a linha média,
cas de diamantes, o canal óptico é aberto e o processo
utilizamos o acesso pré-sigmóideo, translabirintino/
clinóide anterior, removido, expondo a porção clinói-
transcoclear. Lesões gigantes são abordadas através
de da artéria carótida interna e a artéria oftálmica. As
extensões tumorais na fossa média, anterior e região de uma petrossectomia total, com transposição do
supra-selar são totalmente ressecadas. nervo facial e identificação da porção petrosa da arté-
ria carótida interna.
Nos casos de infiltração do seio cavernoso (fre-
qüente em meningiomas), a dura-máter da parede la-
teral do seio é incisada em forma de arco e rebatida Acesso Pré-sigmóideo: Técnica Cirúrgica
inferiormente (peeling). O nervo oculomotor é iden- O paciente é posicionado em decúbito dorsal, com
tificado em sua porção extracavernosa e dissecado a cabeça rodada cerca de 45° para o lado oposto, e o
do tumor na parede lateral. Os ramos oftálmico e ombro elevado com um coxim. A região malar deve
maxilar do nervo trigêmeo são identificados e pre-
estar elevada em relação ao coração. Utilizamos uma
servados. Quando se trata de meningioma com ori-
incisão semicircular de pele da região temporal, pas-
gem na porção posterior do seio cavernoso e clivo,
sando cerca de 3 cm do conduto auditivo externo até
a preservação do nervo abducente é bastante difícil,
devido à infiltração desse nervo. Tanto o nervo ab- cerca de 2 cm atrás da ponta da mastóide (Fig. 17.10).
ducente como a artéria carótida interna encontram- Para evitar fístula liquórica pós-operatória, desenvol-
se na luz do seio cavernoso e podem estar totalmente vemos um retalho miofascial composto pelas fáscias
englobados pelo tumor. Ramos intracavernosos da temporal e craniocervical e os músculos temporal e es-
artéria carótida interna podem estar com seu calibre ternocleidomastóideo. Após o desenvolvimento deste
aumentado irrigando a lesão. A utilização de micro- retalho, não observamos fístulas liquóricas em nossos
doppler intra-operatório pode ajudar na identifica- pacientes. A fáscia temporal é incisada e dissecada
ção desse vaso. Quando a artéria carótida interna juntamente com a fáscia craniocervical e o músculo
encontra-se infiltrada por um tumor benigno que esternocleidomastóideo formando um plano vascula-
ofereça condições de remoção radical, em pacien- rizado para o fechamento. O músculo temporal é inci-
te jovem, realizamos inicialmente um bypass entre sado em seu terço posterior. Essa porção do músculo
a artéria carótida externa, em sua porção cervical e temporal, ainda pediculada, será rodada no final da ci-
a artéria cerebral média (M2), com enxerto de veia rurgia sobre o defeito cirúrgico (Fig. 17.11). Expõem-
safena ou artéria radial. A borda livre do tentório é se, assim, os ossos temporal, occipital, mastóide, arco
incisada posteriormente ao nervo oculomotor, ex- zigomático e a articulação temporomandibular.

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17 – Tumores Petroclivais – Diagnóstico, Tratamento e Resultados

A B

Fig. 17.8 – Meningioma petroclival (A) removido através de acesso pré-sigmóideo (B).

A B

Fig. 17.9 – Cisto dermóide da região petroclival (A), removido através de acesso pré-sigmóideo (B).

Fig. 17.10 – Incisão de pele utilizada para o acesso pré- Fig. 17.11 - Retalho de músculo temporal (MT), fáscia cer-
sigmóideo. vical e músculo esternocleidomastóideo (setas).

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

O próximo passo cirúrgico consiste em uma mastoi-


dectomia com exposição do antro da mastóide, o teg-
me da mastóide e o seio sigmóideo. O bloco labirínti-
co é identificado e preservado. O canal do nervo facial
não é aberto. Uma craniotomia é realizada após duas
trepanações acima e duas abaixo do seio sigmóideo.
A porção óssea remanescente sobre o seio sigmóideo
(entre os orifícios de trepanação) é removida com
maior segurança utilizando-se uma pinça de Kerrin-
son. O retalho ósseo da craniotomia é removido em
uma peça única para obter-se melhor resultado esté-
tico pós-operatório (Fig. 17.12). As células retrofa-
ciais são removidas e os seios transverso, sigmóideo e
petroso superior são expostos. A dura-máter anterior
ao seio sigmóideo é dissecada até o bulbo da veia ju- Fig. 17.12 – Craniotomia pré-sigmóideo (T) temporal, (M) mas-
tóide e (O) occipital.
gular. As células zigomáticas e supralabirintinas são
removidas, preservando-se o bloco labiríntico. O seio
petroso superior é ligado com duas suturas.
Com o auxílio do microscópio cirúrgico, realiza-
se a abertura da dura-máter anteriormente ao seio sig-
móideo estendendo-se paralelamente ao assoalho da
fossa média e, posteriormente, paralela ao seio trans-
verso (Fig. 17.13). O seio petroso superior é seccio-
nado, e o tentório, incisado inicialmente, perpendicu-
lar a esse seio e, a seguir, posteriormente para expor
a superfície superior do cerebelo. A veia de Labbé
(complexo venoso de anatomia variável que penetra o
seio transverso cerca de 10 mm posteriormente à sua
junção com o seio sigmóideo) deve ser identificada
e preservada em todos os casos. Um estudo pré-ope-
ratório por angiorressonância, ou mesmo angiografia Fig. 17.13 – Incisão da dura-máter anterior ao seio sigmóideo.
digital, permite identificar possíveis variações anatô-
micas. Algumas veias anteriores à veia de Labbé e na
porção posterior da fossa temporal, são coaguladas e
seccionadas. O tentório é incisado até a incisura tento-
rial, preservando-se o IV nervo craniano (Fig. 17.14).
A região petroclival é totalmente exposta após re-
tração dos lobos temporal e occipital. Esse acesso
permite ampla abordagem do III nervo craniano até
os nervos coclear e facial. Graças a essa remoção do
osso petroso, a lesão se torna mais superficial. O ner-
vo trigêmeo encontra-se freqüentemente envolvido
pelo tumor e deslocado súpero-posteriormente.
Nos casos de meningiomas, realizamos, inicial-
mente, uma desvascularização da base tumoral através Fig. 17.14 – Após incisão do tentório identifica-se o IV nervo
de coagulação bipolar. Uma ampla ressecção intracap- craniano (seta) na incisura, (TU) tumor.
sular é o próximo passo cirúrgico. A cápsula é, a se-
guir, dissecada dos nervos cranianos e das artérias ce- casos de meningiomas, esses envolvimento ocorre por
rebelar superior, cerebral posterior e tronco da artéria intermédio das fibras do nervo trigêmeo e por infiltra-
basilar. Deve-se ter grande cuidado para não provocar ção da dura-máter. A parede lateral do seio cavernoso
lesão de ramos perfurantes da artéria basilar. O nervo é aberta, e o tumor, removido com preservação da ar-
abducente encontra-se, com freqüência, aderido à cáp- téria carótida interna. Após remoção radical da porção
sula tumoral, tornando difícil sua dissecção em muitos intradural da lesão, realiza-se um broqueamento do
casos. O canal de Dorello encontra-se medialmente osso petroso e clivo com brocas de diamantes. Após
em relação aos nervos VII e VIII, e essa região só é cuidadosa hemostasia, a dura-máter é hermeticamente
abordada após ampla ressecção tumoral. O seio ca- suturada, e o retalho miofascial é utilizado para uma
vernoso freqüentemente se encontra envolvido e, em reconstrução segura e estética da base do crânio.

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17 – Tumores Petroclivais – Diagnóstico, Tratamento e Resultados

Acesso Pré-sigmóideo Translabirintino, Acesso Retrossigmóideo


Técnica Cirúrgica Técnica Cirúrgica
Essa abordagem cirúrgica é similar ao acesso an-
Esse é o acesso mais utilizado em nossa série de
teriormente descrito, porém com a remoção dos ca-
meningiomas petroclivais e está indicado para tumo-
nais semicirculares. A remoção do bloco labiríntico,
res localizados principalmente na fossa posterior e
segundo nossa experiência, ocasiona perda auditiva
que apresentem pequena extensão para a fossa média
total em todos os pacientes e, por esse motivo, uti-
e seio cavernoso (Fig. 17.15). Trata-se de uma abor-
lizamos essa abordagem apenas nos pacientes com
dagem cirúrgica mais simples e rápida.
perda auditiva muito importante ou total. Esse acesso
possibilita uma exposição adicional de 1,5 a 2 cm e O paciente é operado em decúbito dorsal, com a
facilita a remoção de tumores que ultrapassem a linha cabeça rodada para o lado oposto ou em posição se-
média. mi-sentada. Nos últimos 15 anos utilizamos apenas o
decúbito dorsal com a elevação do ombro ipsilateral
por meio da colocação de um coxim e discreta flexão
Petrosectomia Total, Técnica Cirúrgica e extensão da cabeça. A incisão de pele inicia-se cerca
Nessa abordagem realiza-se um acesso pré-sig- de 2 cm atrás e 4 cm abaixo da ponta da mastóide,
móideo com remoção da cóclea, canais semicircula- estendendo-se até cerca de 4 cm acima do conduto
res, transposição do nervo facial e exposição de toda auditivo externo. Essa incisão deve expor o astério e
a porção petrosa da artéria carótida interna. Utiliza- a região retrossigmóide do osso occipital (Fig. 17.16).
mos essa técnica cirúrgica para lesões muito extensas Em pacientes mais jovens (até os 60 anos de idade),
que ultrapassam a linha média na região do clivo. A realizamos uma craniotomia, nos pacientes mais ido-
transposição anterior do nervo facial causa paralisia sos realizamos uma craniectomia. Tanto a cranioto-
facial transitória em praticamente todos os pacientes. mia como a craniectomia têm cerca de 5 cm de diâ-
Na grande maioria dos pacientes ocorre uma recupe- metro e devem expor os seios sigmóideo e transverso.
ração da função facial para um grau 1 a 2 na escala Veias emissárias da mastóide devem ser coaguladas e
de House e Brackmann15 em um período de cerca de seccionadas.
3 meses após a cirurgia. Nessa abordagem deve-se A dura-máter é incisada com o auxílio do micros-
ocluir a tuba de Eustáquio para evitar o aparecimen- cópio cirúrgico, cerca de 0,5 cm posteriormente aos
to de fístula liquórica pós-operatória. Uma ligadura seios sigmóideo e transverso. A cisterna cerebelome-
e transecção do seio sigmóideo podem ser realizadas dular é aberta, e a drenagem do liquor relaxa total-
apenas nos casos em que uma venografia pré-operató- mente o cerebelo, permitindo a visualização das es-
ria demonstrar que esse seio não é o dominante e que truturas do ângulo pontocerebelar. Identificam-se os
existam colaterais venosas. nervos cranianos bulbares (IX, X e XI), VII, VIII e V.

A B

Fig. 17.15 – Meningioma petroclival com pequena extensão para a fossa média (A), removido através de acesso retrossigmóideo (B).

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 17.16 – Craniotomia para o acesso retrossigmóideo. Em ver-


melho, área da mastóide removida.
B
O tumor localiza-se, na maioria das vezes, anterior-
mente a esses nervos, podendo, no entanto, envolvê-
los (Fig. 17.17). Os nervos cranianos encontram-se
deslocados posteriormente, e sua clara identificação
é de extrema importância para sua preservação. O VI
nervo craniano encontra-se anteriormente aos nervos
VII e VIII, estando freqüentemente envolvido em sua
penetração no canal de Dorello. A artéria vertebral e
a artéria cerebelar posterior inferior são dissecadas da
cápsula tumoral. Observa-se, na maioria dos casos,
um plano de aracnóide que deve ser cuidadosamen-
te dissecado para preservar as estruturas vasculares
e nervosas. Nos casos de meningiomas, iniciamos a
desvascularização da lesão pela coagulação bipolar da
dura-máter na base de implantação tumoral. A cápsula
tumoral é coagulada, realizando-se uma remoção in-
tracapsular entre os nervos bulbares, VII e VIII, entre
os nervos VII, VIII e V e entre o V e o tentório. Após
uma descompressão intracapsular adequada, com
clara identificação e liberação dos nervos cranianos,
realizamos a dissecção da cápsula tumoral do tron-
co cerebral e dos ramos arteriais. A artéria basilar e
seus ramos encontram-se freqüentemente envolvidos
pela lesão. A técnica de preservação dessas estrutu-
ras consiste em expor a porção não envolvida do vaso Fig. 17.17 – (A) Meningioma petroclival abordado através de
e, a seguir, dissecá-lo da cápsula tumoral. Quando o acesso retrossigmóideo (TU). (B) Após remoção da lesão.

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17 – Tumores Petroclivais – Diagnóstico, Tratamento e Resultados

tumor se estende para a fossa média e seio caverno- mas. A avaliação do grau de ressecção baseia-se não
so, realizamos uma incisão do tentório para expor e somente nos achados intra-operatórios, mas princi-
remover o tumor. A remoção do tubérculo suprame- palmente nos estudos de ressonância pós-operatória,
atal com uma broca de diamantes facilita essa expo- realizados rotineiramente em todos os pacientes.
sição. O IV nervo craniano encontra-se envolvido na As complicações cirúrgicas estão demonstradas
porção supratentorial da lesão e sua identificação na na Tabela 17.2. Portadores de meningiomas foram os
borda livre do tentório permite sua preservação. Após que apresentaram maior incidência de novas parali-
retirada do tumor, realiza-se cuidadosa hemostasia sias de nervos cranianos. Não ocorreu mortalidade
e fechamento da dura-máter com sutura contínua. A pós-operatória imediata. Dois pacientes foram a óbito
utilização de cola biológica sobre a linha de sutura e (4 e 6 semanas) após a cirurgia. Uma paciente com
sobre enxertos de músculo utilizados para fechar cé- extenso meningioma petroclival apresentou quadro
lulas abertas da mastóide ajuda a evitar a formação de de embolia pulmonar fulminante 4 semanas após o
fístulas liquóricas. procedimento cirúrgico. Outro paciente sofreu grave
hemorragia subaracnóidea e intraventricular (III ven-
CASUÍSTICA trículo) pós-operatória, possivelmente pela ruptura de
um aneurisma da artéria comunicante anterior. Esse
No período de 1987 a 2003, 113 pacientes com paciente evoluiu para óbito 6 semanas após a remo-
tumores petroclivais foram operados em nosso servi- ção radical de meningioma petroclival. Um pacien-
ço (Tabela 17.1). Os meningiomas petroclivais foram te com condrossarcoma gigante do clivo apresentou
as lesões mais freqüentes (57 casos) seguidos pelos quadro clínico de extenso infarto do tronco cerebral
condrossarcomas (12 casos) e schwanomas do nervo devido à trombose da artéria basilar, confirmado com
trigêmeo (9 casos). Paralisia de nervos cranianos VI, estudo angiográfico. Esse paciente sobreviveu à com-
IX e X, alterações auditivas e do equilíbrio foram os plicação tornando-se, porém, totalmente dependente
sintomas mais freqüentes em nossos pacientes. Todos de ajuda externa. Uma paciente portadora de um ex-
foram submetidos a investigação pré-operatória com tenso meningioma petroclival teve pequeno infarto de
tomografia computadorizada e, após 1990, com to- tronco cerebral devido à lesão de ramos perfurantes
mografia computadorizada e ressonância magnética. da artéria basilar. Essa paciente apresentou progres-
Exames pós-operatórios de ressonância magnética siva melhora no período pós-operatório sendo atual-
são realizados antes da alta hospitalar, 3 meses após e mente capaz de deambular sem auxílio. Paralisias de
anualmente nos casos de lesões benignas e removidas nervos cranianos (III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X e
radicalmente. XI) foram observadas (Tabela 17.2), e na maioria dos
casos foram transitórias com progressiva melhora dos
sintomas.
Tabela 17.1 – Tumores petroclivais
Tumores No
Tabela 17.2 – Complicações Pós-operatórias
Meningiomas 57
Infarto de tronco 3 (2,6%)
Condrossarcomas 12
Hematoma 3 (2,6%)
Schwanomas V 9
Hemorragia subaracnóidea/intraventricular 1 (0,8%)
Schwanomas VII 3
Novas paralisias de nervos cranianos
Cisto epidermóide 6
Nervo oculomotor 8 (7%) – 3*
Cisto de colesterol 4
Nervo troclear 5 (4,4%) – 3*
Cisto ósseo aneurismático 3
Nervo trigêmeo 6 (5,3%) – 3*
Gliomas do tronco cerebral 4
Nervo abducente 9 (8%) - 6*
Tumores malignos 9
Nervo facial 10 (8,8%) – 5*
Total 113
Nervo vestibulococlear 11 (9,7%)
Nervos bulbares 6 (5,3%) – 3*

RESULTADOS E COMPLICAÇÕES * Paralisias definitivas

Nos portadores de meningiomas petroclivais, a re-


moção radical da lesão (graus I e II de Sympson) foi DISCUSSÃO
possível em 31 pacientes (55%). Uma remoção radical O tratamento cirúrgico de tumores petroclivais con-
da lesão foi possível em todos os casos de schwano- tinua sendo um grande desafio para os neurocirurgiões.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

O envolvimento do tronco cerebral, de importantes mais importantes na escolha da abordagem cirúrgica


estruturas vasculares e de nervos cranianos dificulta, são: localização, natureza do tumor, extensão da in-
em muitos casos, uma remoção total sem mortalidade filtração dural, função auditiva pré-operatória e ex-
e morbidade. Meningiomas petroclivais são as lesões periência do cirurgião. Com o aumento da experiên­
mais freqüentes encontradas nessa região. Seu cres- cia cirúrgica, o neurocirurgião tende a utilizar, com
cimento é lento, poucos sintomas são observados no maior freqüência, um determinado acesso cirúrgico.
início e, quando é feito o diagnóstico, a maioria das No início de nossa série, utilizávamos freqüentemen-
lesões já apresenta grande volume. Em nossa opinião te o acesso pré-sigmóideo. Atualmente nossa conduta
constitui-se em grave erro de conduta aguardar que nos casos de lesões mais extensas é a abordagem da
um meningioma da base do crânio de pequeno volume lesão através de acesso retrossigmóideo e, em uma
cresça nos exames de controle para que se possa indicar segunda cirurgia realizada cerca de 2 semanas após
uma remoção cirúrgica. Os menores tumores oferecem a primeira, retirar o restante do tumor através de uma
chance de cura com preservação de todas as estrutu- craniotomia orbitozigomática. Essa estratégia reduz
ras envolvidas. Em pacientes mais idosos (acima de 65 significativamente o tempo cirúrgico e é bem tolera-
anos de idade) a decisão cirúrgica é ainda mais difícil, da pelo paciente. O acesso retrossigmóideo é o mais
sendo a condição clínica do paciente um dos fatores utilizado quando o tumor se localiza predominante-
mais importantes. Indicar um tratamento conservador, mente na fossa posterior sem uma expansão muito
nesses pacientes em bom estado geral, pode muitas importante para a fossa média e seio cavernoso. A
vezes significar que quando a cirurgia se tornar abso- abertura do tentório e a remoção do tubérculo supra-
lutamente necessária devido à compressão cerebral, o meatal permitem uma melhor exposição do tumor na
paciente não apresentará mais condições cirúrgicas. porção posterior do seio cavernoso. O acesso orbito-
Radioterapia (radiocirurgia) pode ser uma alternativa zigomático é utilizado comumente nos tumores com
para pacientes idosos com tumores progressivos. principal extensão para a fossa média. Em pacientes
com crânio braquicefálico, essa abordagem oferece
Com o advento de novas técnicas de cirurgia da
vantagens uma vez que a distância até o ápice petroso
base do crânio e novos métodos diagnósticos, a mor- é mais curta nesses casos.
talidade cirúrgica diminuiu drasticamente. Segundo
As novas técnicas diagnósticas e de cirurgia da
nossa experiência, os fatores mais importantes para a
base do crânio reduziram drasticamente a mortali-
obtenção de uma remoção radical com baixa mortali-
dade operatória. A morbidade pós-operatória, prin-
dade e morbidade são: tamanho da lesão, sua consis-
cipalmente relacionada a lesões de nervos cranianos,
tência, grau de infiltração da pia-máter, envolvimento
permanece, porém, ainda bastante elevada, principal-
de vasos perfurantes e do seio cavernoso e o com- mente nos casos de meningiomas (Tabela 17.3).
portamento biológico do tumor. Nos casos de menin-
Tratamentos alternativos e pós-operatórios, como
giomas muito extensos com infiltração das estruturas
radioterapia (radiocirurgia) e quimioterapia, têm in-
ósseas da base do crânio, pode-se indicar uma remo-
dicações e resultados ainda discutíveis. Tanto a ra-
ção subtotal da lesão. Samii e Sekhar16,17 referem que
diocirurgia como a radioterapia conformacional são
apenas um em cinco pacientes com remoção radical
métodos de radioterapia que procuram reduzir ao
irá apresentar crescimento do tumor residual. Coul-
máximo a irradiação sobre as estruturas vizinhas.
dwell et al.18, no entanto, observaram um crescimento Todos os pacientes submetidos a essas formas de ra-
tumoral em 12 dos 14 pacientes que apresentavam tu- dioterapia apresentam tumores residuais que, em uma
mor residual no seio cavernoso. Em nossos casos foi porcentagem ainda não conhecida, podem continuar
possível uma remoção radical em 34 dos 57 pacientes crescendo. Lesões de nervos cranianos, cerebrais e
com meningiomas petroclivais (59%). Os fatores li- vasculares, são descritas em pacientes submetidos à
mitantes de uma ressecção radical são: tamanho da radioterapia. Casos de neoplasia maligna secundária
lesão, extensão para seio cavernoso com infiltração à radioterapia são relatados na literatura19-21. Subach
de nervos cranianos, envolvimento dos ramos perfu- et al.22 apresentaram uma série de 62 pacientes trata-
rantes da artéria basilar e tumores invasivos da pia- dos com radiocirurgia, obtendo controle de 100% do
máter e outras estruturas. crescimento da lesão em um período de 38 meses de
O planejamento pré-operatório deve ser adequado seguimento. Em nossa opinião é necessário um segui-
e, para isso, são necessários estudos de ressonância mento pós-radioterapia de, no mínimo, 10 anos para
magnética com gadolínio, angiorressonância e to- poder avaliar o real efeito dessa forma de tratamento.
mografia computadorizada quando o tumor invade Indicamos radioterapia (radiocirurgia e radioterapia
as estruturas ósseas. Angiografia cerebral é indicada conformacional) a pacientes sem condições cirúrgi-
aos casos de tumores com grande vascularização para cas, com tumores de diâmetro menor que 3 cm e a
uma eventual embolização pré-operatória. pacientes com tumor residual (seio cavernoso), que
Vários acessos cirúrgicos foram utilizados para re- nos exames pós-operatórios apresentem sinais de
mover esses tumores. Em nossa experiência os fatores crescimento tumoral. Utilizamos quimioterapia com

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17 – Tumores Petroclivais – Diagnóstico, Tratamento e Resultados

Tabela 17.3 – Séries de Meningiomas petroclivais tratados cirurgicamente


Séries No de casos Remoção radical Mortalidade Morbidade (%) Nervos cranianos
(%) (%) Pós-op (%)
Yasargil et al.7 20 35 10 30 50
Mayberg e Simon 23
35 26 9 34 54
Al-Mefty et al. 24
13 85 8 31
Hakuba et al.9 8 75 12 38 100
Samii et al.12 24 71 17 46
Bricolo et al. 8
33 79 9 18 76
Kawase et al. 10
42 76 12 36
Sekhar et al. 17
75 60 3 16 60
Couldwell et al. 18
109 69 3,7 15 33
Abdel Aziz et al.25 35 37 9 31
Presente estudo 57 59 3,5 12 33

hidroxiuréia em dez pacientes com extensos menin- 2. Ramina R, Coelho Neto M, Meneses MS, Pedrozo
giomas da base do crânio. O valor dessa terapia não AA. Management of chordomas and chondrosarco-
ficou claramente demonstrado, uma vez que mais da mas of the skull base. Critical Review in Neurosur-
metade dos casos apresentou progressão da doença. O gery. 1997;7:141-8.
tratamento hormonal com mifiprestone foi utilizado 3. Ramina R, Maniglia JJ, Coelho Neto M, Pedrozo A,
há alguns anos e o benefício dessa terapia também Fernandes YB. Meningiomais petroclivais. In: Perei-
não pode ser demonstrado com clareza. O tratamen- ra CU, Aguiar PHP, Ramina R, editores. Tópicos em
neurocirurgia. Rio de Janeiro: Revinter; 2001, cap 4,
to cirúrgico permanece como a melhor alternativa de p 33-40.
tratamento, sendo o único que pode oferecer cura aos
4. Samii M, Migliori M, Tatagiba M. Surgical tre-
portadores de meningiomas, schwanomas e outras le- atment of trigeminal schwannomas. J Neurosurg.
sões benignas petroclivais. 1995;82:711-8.
5. Spetzler RF, Hamilton MG, Daspit CP. Petroclival
CONCLUSÃO lesions. Clin Neurosurg. 1994;41:62-82.
6. Castellano F, Ruggiero G. Meningiomas of the poste-
Meningiomas petroclivais são tumores benignos, rior fossa. Acta Radiol. 1953;104 (Suppl):1-177.
de crescimento lento e que se constituem em uma das 7. Yasargil M, Mortara R, Curcic M. Meningiomas of
mais difíceis lesões a serem tratadas cirurgicamente basal posterior cranial fossa. Adv Tech Stand Neuro-
em medicina quando volumosos. O advento de novas surg Viena. 1980;7:3-115.
técnicas diagnósticas e de cirurgia da base do crânio 8. Bricolo AP, Turazzi S, Talachi A, Christofori L. Mi-
tem permitido uma remoção mais radical e segura crosurgical removal of petroclival meningiomas. A
desses tumores. A mortalidade, outrora proibitiva, report of 33 patients. Neurosurgery. 1992;31:813-28.
tornou-se muito baixa. A morbidade cirúrgica relacio- 9. Hakuba A, Nishimura S, Jang BJ. A combined ret-
nada a lesões de nervos cranianos permanece ainda roauricular and preauricular transpetrosal-transtento-
elevada e muito dependente da experiência do cirur- rial approach to clivus meningiomas. Surg Neurol.
gião. Em relação à qualidade de vida pós-operatória, 1988;30:108-16.
questiona-se se o déficit ocasionado por lesão de ner- 10. Kawase T, Shiobara R, Toya S. Middle fossa trans-
vo craniano é pior que a necessidade de cirurgias de petrosal-transtentorial approaches for petroclival
repetição para controle do tumor. O diagnóstico pre- meningiomas: selective pyramid resection and radi-
coce, associado a uma técnica cirúrgica adequada, é cality. Acta Neurochir (Wien). 1994;129:113-20.
o principal fator para se obter a cura do paciente com 11. McElveen Jr JT, Dorfman BE, Fukushima T. Pet-
mortalidade e morbidade mínimas. roclival tumors: a synthesis. Otol Clin North Am.
2001;34(6):1219-30.
12. Samii M, Ammirati M, Mahran A, Bini W, Sephernia
Referências Bibliográficas A. Surgery of petroclival meningiomas: report of 24
1. Aguiar PHP, Rotta JM, Pereira CU. Cistos epider- cases. Neurosurgery. 1989;24:12-7.
móides cranianos. In: Pereira CU, Aguiar PHP, Ra- 13. Van Havenberg T, Carvalho G, Tatagiba M, Plets C,
mina R, editores. Tópicos em neurocirurgia. Rio de Samii M. Natural history of petroclival meningiomas.
Janeiro: Revinter; 2001, cap. 7, p 53-7. Neurosurgery. 2003;52:55-64.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

14. Jung HW, Yoo H, Paek SH, Choi KS. Long term out- report and review of the literature. J Neurosurg.
come and growth rate of subtotally resected petro- 2001;94:816-21.
clival meningiomas. Experience with 38 cases. Neu- 20. Shin M, Ueki K, Kurita H, Kirino T. Malignant trans-
rosurgery. 2000;46:567-75. formation of a vestibular schwannoma after gamma
15. House JW, Brackmann DE. Facial nerve grading sys- knife radiosurgery. Lancet. 2002;360:309-10.
tem. Otolaryngol Head Neck Surg. 1985;93:146-7. 21. Yu JS, Yong WH, Wilson D, Black KL. Glioblastoma
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17. Sekhar LN, Swamy KS, Jaiswal V. Surgical exci- Flickinger JC. Management of petroclival menin-
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postoperative functional deterioration. J Neurosurg. 23. Mayberg MR, Symon LD. Meningiomas of the cli-
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18. Couldwell WT, Fukushima T, Giannotta SL, Weiss Neurosurg. 1986;65:160-7.
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19. Shamisa A, Bance M, Nag S, Tator C, Wong S, No- 1988;22:510-7.
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18
Tratamento Cirúrgico das
Lesões do Seio Cavernoso
Ricardo Ramina
Yvens Barbosa Fernandes
Maurício Coelho Neto
Donizeti César Honorato
Guilherme Borges

INTRODUÇÃO Alguns estudos procuram definir a história natu-


ral de algumas neoplasias que também se originam

O
tratamento cirúrgico de lesões tumorais ou ou invadem o seio cavernoso. Iwai et al.22 em recente
vasculares que envolvem o seio cavernoso estudo de meningiomas assintomáticos, demonstram
(SC) é controverso e dependente de vários fa- que 43% dos pacientes portadores de tumores assin-
tores. O comprometimento do seio cavernoso, seja por tomáticos apresentaram um crescimento tumoral em
lesões primárias dessa região ou por lesões originárias 5 anos. Meningiomas da base do crânio parcialmente
em outros locais, sempre constituiu um fator limitante ressecados apresentam alta taxa de crescimento (25%
de remoção cirúrgica radical, mesmo em lesões benig- a 45%) em seguimento de 5 anos pós-operatório23.
nas. Até o início dos anos 80, relatos de ressecção de
tumores e lesões vasculares do seio cavernoso eram Em geral, aceita-se que a maioria desses tumores
bastante raros e com altas taxas de mortalidade e mor- apresenta um crescimento progressivo, levando a uma
bidade1-4. Um maior interesse pela anatomia cirúrgica oftalmoplegia definitiva, muitas vezes dolorosa por com-
do seio cavernoso, associado ao desenvolvimento de prometimento do nervo trigêmeo24. Muitas formas de
novas técnicas diagnósticas e, principalmente, a novas tratamento, como a radioterapia, devem levar em conta a
técnicas de cirurgia da base do crânio, fizeram com história natural dessas lesões para avaliar sua eficácia.
que ocorresse um grande desenvolvimento no trata- Os sintomas clínicos apresentados pelos pacien-
mento dessas lesões5-15. tes com lesões no seio cavernoso são, em geral, rela-
Novas técnicas de tratamento endovascular e de cionados ao comprometimento dos nervos cranianos
radioterapia (radiocirurgia, radioterapia conforma- dessa região. Já em 1938, Jefferson25 apresentou três
cional estereotática) abriram novas perspectivas no diferentes síndromes relacionadas a aneurismas da
tratamento de lesões do seio cavernoso16-21. porção intracavernosa da artéria carótida interna: uma
Apesar de todo esse desenvolvimento tecnológi- síndrome posterior do seio cavernoso com compro-
co, o tratamento de vários tumores e aneurismas do metimento do nervo trigêmeo e do nervo abducente;
SC permanece ainda controverso e com alta morbi- uma síndrome da porção média do seio cavernoso
dade. Grande número de lesões que envolvem essa com sinais de envolvimento da primeira e da segun-
região é benigno e passível de cura. A escolha do mé- da divisão do nervo trigêmeo, associados a paralisias
todo de tratamento que ofereça as melhores chances oculares, e uma síndrome da porção anterior do seio
de remoção radical do tumor ou exclusão de um aneu- cavernoso com o envolvimento da primeira divisão do
risma com baixa morbidade depende principalmente nervo trigêmeo e de nervos motores oculares. Atual-
da experiência do cirurgião. mente, com o desenvolvimento de novos métodos de
imagem, o envolvimento do seio cavernoso é determi-
nado com grande precisão. Dores retro-oculares, em
HISTÓRIA NATURAL E DIAGNÓSTICO território do nervo trigêmeo, diplopia e alterações pu-
A história natural dos tumores do seio cavernoso é pilares são sintomas freqüentemente observados em
muito mal definida na literatura. portadores de tumores do seio cavernoso. Alterações

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

endócrinas relacionadas a compressão ou invasão do deve ser considerada em tumores agressivos. Pode
eixo hipófise-hipotálamo podem ocorrer em casos de também ser indicada como tratamento inicial em
adenomas hipofisários e meningiomas com extensão determinados meningiomas e como tratamento com-
extracavernosa. Crises convulsivas de lobo temporal e plementar em meningiomas removidos parcialmente.
sinais de hipertensão intracraniana podem manifestar- Várias complicações relacionadas a lesões de nervos
se em pacientes com tumores mais extensos. Tumores cranianos, eixo hipotálamo-hipofisário e vasos têm
malignos da nasofaringe e angiofibromas juvenis do sido relatadas com radioterapia.
nasofaringe podem provocar sintomas de obstrução e Tratamentos adjuvantes com químio e hormono-
sangramento nasal. terapia são utilizados em casos excepcionais; seus re-
sultados ainda não foram bem definidos e a validade
POSSIBILIDADES DE TRATAMENTO de sua utilização ainda é questionável.
E INDICAÇÕES
ANATOMIA CIRÚRGICA
As opções de tratamento para as lesões do seio ca-
vernoso são as seguintes: simples observação clínica, A possibilidade de tratamento cirúrgico de lesões
biópsia, remoção cirúrgica parcial, remoção cirúrgica do seio cavernoso fez com que numerosos estudos
total, radioterapia (radiocirurgia) como terapia inicial anatômicos fossem realizados para definir, com maior
ou complementar pós-cirurgia, quimioterapia e trata- precisão, as alternativas de exposição cirúrgica dessa
mento hormonal. A decisão sobre qual a melhor for- região. Em um estudo anatômico que realizamos em
ma de tratamento a ser empregada depende de vários 50 espécimes de cadáveres, utilizando o microscópio
fatores, como: sinais e sintomas, idade e condição clí- cirúrgico, foram estudadas as relações entre as diver-
nica do paciente, natureza da lesão e suas caracterís- sas estruturas anatômicas do seio cavernoso26. O seio
ticas nos exames de imagens, grau de envolvimento cavernoso é uma estrutura extradural, lateralmente lo-
das estruturas adjacentes e experiência do cirugião. calizada à região da sela túrcica, por onde transitam
Tumores benignos não invasivos como schwano- importantes vasos e nervos. Estudos realizados em fe-
tos demonstraram ser o seio cavernoso, na realidade,
mas do nervo trigêmeo, angiofibromas juvenis da na-
um plexo venoso e não um lago venoso3,4. Esse deta-
sofaringe, alguns meningiomas, cistos epidermóides e
lhe anatômico permite a abertura do seio cavernoso
dermóides, condromas e outros, são lesões que ofere-
e seu tamponamento, sem grande sangramento. Em
cem a chance de remoção radical com cura do paciente
nossos espécimes adultos, encontramos, nos exames
e baixa morbidade. Meningiomas invasivos, apesar de
histológicos, trabéculas ao redor da artéria carótida
serem lesões benignas, não são passíveis de ressec-
interna e dos nervos cranianos, não revestidas por
ção radical sem a remoção de estruturas vasculares e endotélio. O seio cavernoso se comunica com várias
nervosas infiltradas. Nesses pacientes, um dos prin- estruturas venosas: as veias oftálmicas, o plexo pteri-
cipais fatores na decisão da forma de tratamento é a góideo, os seios petrosos inferior e superior, o plexo
sintomatologia pré-operatória. Quando, por exemplo, venoso basilar e o seio esfenoparietal. Essas comuni-
o paciente já apresenta uma lesão completa do nervo cações venosas podem ser uma via para dissemina-
oculomotor, pode-se considerar uma remoção comple- ção de processos neoplásicos e infecciosos. A artéria
ta de todas as estruturas do seio cavernoso. Um bypass carótida interna pode estar medialmente localizada,
da artéria carótida interna, com a utilização de enxerto junto à sela túrcica, na porção média da luz do seio
de veia safena ou artéria radial, é realizado permitindo cavernoso, ou lateralmente junto à parede lateral (Fig.
a remoção desse vaso infiltrado pelo tumor. Esse pro- 18.1). Quando a artéria carótida interna está junto à
cedimento diminui o risco de um infarto cerebral. sela túrcica, pode ser lesada ao se utilizar um acesso
Deve-se considerar uma cirurgia mais agressiva transesfenoidal para tumores hipofisários. Os princi-
apenas nos casos em que se antecipa uma remoção pais ramos intracavernosos da artéria carótida interna
radical do tumor. Pacientes com lesões altamente ma- são: o tronco meningo-hipofisário, a artéria inferior
lignas, como os carcinomas invasivos de nasofarin- do seio cavernoso, a artéria capsular e, em cerca de
ge e seios paranasais, devem ser tratados de maneira 8% dos casos por nós estudados, a artéria oftálmica
mais conservadora com biópsia e radioterapia, uma (Fig. 18.2). Esses ramos podem estar hipertrofiados
vez que a remoção radical desses tumores não é pos- para suprir tumores, como meningiomas petroclivais
sível. Lesões de baixo grau de malignidade, como os e meningiomas intracavernosos. Na região do proces-
condrossarcomas e carcinomas adenóide císticos, são so clinóide anterior, antes de a artéria carótida inter-
tratadas de maneira mais agressiva. Como uma remo- na tornar-se subdural, encontramos um anel fibroso.
ção total desses tumores não é possível, só é aceitável Aneurismas da porção clinoidal da artéria carótida in-
uma mínima morbidade cirúrgica. terna são clipados após a abertura desse anel fibroso.
A radioterapia (radiocirurgia não é um procedi- Os nervos cranianos III, IV, V1 e V2 encontram-se
mento cirúrgico e, sim, uma forma de radioterapia) na parede lateral (Fig. 18.3). O VI nervo craniano é

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18 – Tratamento Cirúrgico das Lesões do Seio Cavernoso

o único que transita dentro da luz do seio cavernoso, TÉCNICA CIRÚRGICA


podendo ser mais medial ou lateral dependendo da
posição da artéria carótida interna. A identificação do Acessos Cirúrgicos
ponto de penetração do III nervo craniano, na porção Em nossa experiência, três acessos cirúrgicos di-
súpero-posterior do seio cavernoso, é um importante ferentes são utilizados para o tratamento das lesões
reparo anatômico para a preservação desse importante tumorais e vasculares do seio cavernoso. O acesso
nervo craniano durante a dissecção da cápsula tumoral. anterior (degloving e transesfenoidal), o acesso late-
ral (podendo ser totalmente extra ou intradural) e o
acesso posterior (abertura da porção posterior do seio
cavernoso através de um acesso retrossigmóideo ou
de um acesso petroso).

Acesso Anterior
O acesso anterior via degloving é utilizado quase
que exclusivamente para a remoção de angiofibromas
juvenis, cordomas do clivo e condrossarcomas, com
extensão para o seio cavernoso. A técnica de deglo-
ving ou transmaxilar bilateral é bem conhecida dos
otorrinolaringologistas e permite ampla exposição do
tumor em sua porção extracraniana dentro dos seios
Fig. 18.1 – Posição da artéria carótida interna (ACI) na luz paranasais e fossa infratemporal. Após a remoção da
do seio cavernoso. parte extracraniana do tumor, obtém-se uma visuali-
zação adequada do seio cavernoso e da fossa média.
Como a grande maioria dos angiofibromas juvenil
é extradural, o tumor pode ser totalmente removido
com o auxílio do microscópio cirúrgico (Fig. 18.4).
Outro acesso anterior utilizado é a abordagem
transesfenoidal. Tumores hipofisários invasivos da
parede medial do seio cavernoso podem ser aborda-
dos através desse acesso, desde que essa invasão seja
pequena e não englobe a artéria carótida interna. Evi-
tamos essa forma de abordagem nos casos de invasão
mais extensa, englobando a artéria carótida interna,
por oferecer uma exposição limitada e não se obter
um controle proximal adequado desse vaso.

Fig. 18.2 – Ramos intracavernosos da artéria carótida in- A B


terna

Fig. 18.4 – Extenso angiofibroma juvenil (A) removido to-


talmente através de degloving (B).

Acesso Lateral
Fig. 18.3 – Espécime anatômico mostrando os nervos cra- Essa é a abordagem cirúrgica mais utilizada para
nianos na parede lateral do seio cavernoso. tumores do seio cavernoso.

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207
Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Realiza-se uma craniotomia fronto-orbitozigomá- Em caso de tumores com extensão intradural, a


tica com a remoção do retalho da craniotomia em uma dura-máter é incisada e a fissura sylviana, dissecada
única peça (Fig. 18.5). Faz-se inicialmente uma ampla amplamente para expor toda a região selar, parasselar,
dissecção extradural com exposição da fissura orbitá- fossa média, tentório e, após a abertura deste, a fos-
ria superior, assoalho da fossa média com exposição sa posterior. O processo clinóide anterior é removido
dos ramos maxilar e mandibular do nervo trigêmeo. para expor a porção clinoidal da artéria carótida inter-
A artéria meníngea média é coagulada e seccionada. na (Fig. 18.7). O seio cavernoso é explorado através
Quando existe infiltração do rochedo, a artéria caró- de uma abertura de sua parede lateral. A remoção do
tida interna em sua porção petrosa é exposta, usando- tumor é realizada entre os nervos cranianos e a artéria
se como parâmetros anatômicos para sua localização carótida interna (Fig. 18.8). Em casos de infiltração
a articulação temporomandibular, o nervo petroso desse vaso e com indicação para remoção radical da
maior, o ramo mandibular do nervo trigêmeo e a tuba lesão com a artéria carótida, realizamos um bypass
de Eustáquio. Schwanomas do nervo trigêmeo limi- com enxerto de veia safena magna ou artéria radial
tados à fossa média, condromas, cistos dermóides e (Fig. 18.9). Exames pré-operatórios de tolerância à
outros tumores extradurais são removidos através da oclusão da artéria carótida interna, bem como o estu-
abertura da parede lateral do seio cavernoso sem ne- do da circulação colateral, são muito importantes em
cessidade de explorar o espaço subdural (Fig. 18.6). todos os casos em que esse vaso encontra-se envolvi-
Extensão tumoral para o seio esfenóide pode ser re- do. Nossa preferência é por comunicar a artéria caró-
movida após a abertura deste, inferiormente à porção tida externa ou interna na região cervical com ramos
horizontal da artéria carótida interna. (M2) da artéria cerebral média. A anastomose com a
porção petrosa da artéria carótida interna é mais di-
fícil de ser executada, e o tempo de oclusão do vaso
necessário para tal procedimento é mais prolongado.
Um fechamento adequado com oclusão de todas as
comunicações, como o seio esfenóide e seio frontal,
deve ser efetuado para evitar fístulas liquóricas. Uti-
lizamos, para esse fim, fáscia temporal e enxertos do
músculo temporal com cola biológica. Evitamos o uso
de gordura abdominal devido à necessidade de nova
incisão no abdome, aumentando o risco de infecção.

Acesso Posterior
A principal indicação para essa abordagem do
Fig. 18.5 – Retalho ósseo da craniotomia fronto-orbitozi- seio cavernoso são os meningiomas petroclivais
gomático. T = temporal, O = rebordo orbitário, Z = arco zigo- com pequena extensão intracavernosa e schwano-
mático. mas do nervo trigêmeo com maior extensão para a

A B

Fig. 18.6 – (A) TC pré-operatória de schwanoma do nervo trigêmeo. (B) Remoção cirúrgica extradural. TU = tumor.

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18 – Tratamento Cirúrgico das Lesões do Seio Cavernoso

Fig. 18.7 – Remoção intradural do processo clinóide ante- Fig. 18.8 - Remoção radical de meningioma do seio caver-
rior (seta branca). ACI = artéria carótida interna. noso. V2 e V3 = ramos do trigêmeo. ACI = artéria carótida
interna.

Fig. 18.9 - Meningioma invasivo do seio cavernoso. Remoção radical com artéria carótida após bypass (A).

fossa posterior. O acesso retrossigmóideo é o mais MÉTODOS ALTERNATIVOS E COMPLEMENTARES


utilizado nesses casos. A remoção do tubérculo su-
prameatal e a abertura do tentório ampliam a exposi- A grande maioria das lesões vasculares do seio
ção da porção posterior do seio cavernoso. O nervo cavernoso (aneurismas intracavernosos e fístulas
troclear é identificado na cisterna ambiente, e o ner- carótido-cavernosas) é tratada, nos dias atuais, por
vo abducente, em sua entrada no canal de Dorello. métodos endovasculares. Tratamento radioterápico
A preservação do nervo abducente é, muitas vezes, (radiocirúrgico) é utilizado, na maioria das vezes
bastante difícil devido à infiltração da dura-máter na para tumores malignos ou benignos residuais que
região do canal de Dorello. A abertura da dura-máter mostrem crescimento nos exames de imagem de con-
do gânglio de Gasser permite uma exposição e remo- trole pós-operatório. Radiocirurgia como tratamen-
ção da lesão. Uma remoção radical de meningiomas to inicial para meningiomas do seio cavernoso tem
petroclivais com pequena extensão para o seio ca- sido utilizada com maior freqüência devido à maior
vernoso é possível com essa abordagem (Fig. 18.10). precisão dos métodos diagnósticos e de radioterapia.
Outros acessos petrosos, como o pré-sigmóideo e Tratamentos alternativos, como químio e hormono-
petrosectomia total, também podem ser utilizados, e terapia, são indicados mais raramente para tumores
a porção posterior do seio cavernoso é abordada da malignos ou meningiomas de comportamento mais
mesma forma. agressivo.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

A B A B

Fig. 18.11 – (A e B) Fístula carótido-cavernosa embolizada


com balão (seta).

A B

Fig. 18.10 – Meningioma petroclival com extensão intraca-


vernosa. (A) Pré-operatório. (B) Pós-operatório.

Métodos Endovasculares
Os métodos endovasculares, atualmente muito Fig. 18.12 – (A e B) Aneurisma intracavernoso embolizado
empregados para o tratamento de aneurismas, fístulas com molas (seta).
arteriovenosas e embolização de malformações arte-
riovenosas e tumores, foram inicialmente desenvolvi- A B
dos por Serbinenko27. As fístulas carótido-cavernosas
podem ser ocluídas por via arterial ou venosa (veia
orbitária superior, seio petroso superior), com a uti-
lização de molas destacáveis, balões ou mesmo cola
acrílica28,29. O objetivo principal desse tratamento é
ocluir a fístula, preservando a luz da artéria carótida
interna (Fig. 18.11).
Os aneurismas da porção intracavernosa da ar-
téria carótida interna (Fig. 18.12) são embolizados
com molas destacáveis e balões30. Esses aneurismas,
quando não apresentam uma extensão para fora do Fig. 18.13 – (A e B) Aneurisma gigante intracavernoso tra-
seio cavernoso, não ocasionam hemorragia suba- tado com bypass e oclusão da ACI.
racnóidea. A indicação para tratamento dessas le-
sões ocorre quando se observa um crescimento do
aneurisma e o paciente passa a apresentar sintomas A embolização pré-operatória para tumores muito
relacionados à compressão de nervos cranianos. A vascularizados, como os angiofibromas juvenis, au-
abordagem direta dessas lesões, preconizada por Do- xilia na remoção cirúrgica, diminuindo consideravel-
lenc31, é extremamente controversa, uma vez que os mente o sangramento operatório33.
resultados desses procedimentos são inferiores aos
obtidos com métodos endovasculares, considerando- Radioterapia e Radiocirurgia
se a taxa de oclusão do aneurisma e a perservação da
permeabilidade da artéria carótida interna. Aneuris- Radioterapia e radiocirurgia têm sido utilizadas
mas gigantes são tratados com um bypass inicial en- com crescente freqüência no tratamento das lesões
tre a artéria carótida externa cervical e a porção M2 tumorais do seio cavernoso. Radiocirurgia nada mais
ou porção supraclinóide da artéria carótida interna, é do que uma radioterapia de alta dosagem, realizada
com interposição de veia safena ou artéria radial32 em um só procedimento, sobre uma área com um diâ­
(Fig. 18.13). metro máximo de 3 cm. Como na região selar encon-

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18 – Tratamento Cirúrgico das Lesões do Seio Cavernoso

tram-se importantes estruturas nervosas e vasculares, A


existe a possibilidade de uma lesão actínica dessas
estruturas, tanto no período pós-radioterapia imediato
como após vários anos16,34. Estudos recentes17,20 de-
monstraram a eficácia da radiocirurgia no tratamento
de meningiomas do seio cavernoso, com um controle
do crescimento tumoral variando entre 90% e 97%
em um período de 3 a 5 anos de seguimento. Esse se-
guimento pós-radioterapia é, no entanto, insuficiente
para analisar a eficácia do tratamento, uma vez que
muitos desses tumores apresentam crescimento lento,
principalmente aqueles submetidos anteriormente a
tratamento cirúrgico com desvascularização da lesão.
Tumores como adenomas hipofisários invasivos do
seio cavernoso, não prolactinomas e condrossarco-
mas são tratados após a cirurgia com radioterapia ou B
radiocirurgia35,36.

Outros Tratamentos Adjuvantes


Outras opções de tratamento são utilizadas para tu-
mores malignos e tumores benignos submetidos à re-
moção parcial e que não responderam à radioterapia.
Esses tratamentos complementares (quimioterapia ou
tratamento hormonal) são, na maioria das vezes, pa-
liativos e seus efeitos colaterais devem ser avaliados
com bastante critério37-39.
Adenomas hipofisários invasivos do seio caverno-
so, secretores de prolactina, são tratados com agonis-
tas da dopamina, obtendo-se, na maioria das vezes,
uma resposta terapêutica bastante satisfatória40.

CASUÍSTICA Fig. 18.14 – (A) Meningioma intracavernoso não-invasivo.


(B) Remoção radical.
Entre janeiro de 1987 e outubro de 2003, 146
pacientes com lesões do seio cavernoso foram
submetidos a tratamento cirúrgico no Instituto de
Neurologia de Curitiba e no Hospital das Clínicas
da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Tabela 18.1 – Lesões do seio cavernoso tratadas
(disciplina de Neurocirurgia). Na Tabela 18.1 são cirurgicamente
apresentadas as lesões tratadas nesse período. Os Tipo de lesão Número de
meningiomas foram as neoplasias mais freqüente- pacientes
mente encontradas (53 casos, 36,3%). Adenomas
hipofisários constituíram o segundo maior grupo, Meningiomas 53
com 20 casos. Desses casos, cinco pacientes apre- Adenomas hipofisários 20
sentaram tumores secretantes de prolactina não res- Schwanomas do trigêmeo 12
ponsivos ao tratamento com agonistas da dopamina
e foram submetidos a tratamento cirúrgico. Esses Angiofibromas juvenis 12
pacientes receberam tratamento radioterápico pós- Condrossarcomas 9
operatório. Angiofibromas juvenis e schwanomas Tumores malignos 9
do nervo trigêmeo formaram o terceiro maior grupo
dessa série de tumores do seio cavernoso. No grupo Diversas 15
de lesões diversas, encontramos tumores dermóides, Lesões vasculares 16
hemangiomas cavernosos, condromas (Fig. 18.14),
Total 146
cordomas, carcinomas adenóide císticos ou cilindro-
mas e processos inflamatórios e infecciosos.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Quatro diferentes origens de meningiomas foram A


encontradas (Tabela 18.2): tumores com origem den-
tro do seio cavernoso, denominados meningiomas
intracavernosos (15 casos), na região petroclival ou
meningiomas petroclivais (19 casos), na asa do esfe-
nóide (17 casos) e no tubérculo da sela (2 casos).

Tabela 18.2 – Meningiomas do seio cavernoso


Tipos de meningiomas Número de casos
Petroclival 19
Asa do esfenóide 17
Intracavernoso 15
Tubérculo da sela 2 B
Total 53

RESULTADOS E COMPLICAÇÕES
Uma remoção radical da neoplasia foi possível
em todos os casos de schwanomas do nervo trigêmeo
e angiofibromas juvenis do nasofaringe. Entre os me-
ningiomas a remoção radical foi possível em apenas
45% dos casos (Tabela 18.3). Esses meningiomas que
puderam ser removidos radicalmente eram não inva-
sivos (Fig. 18.15) ou invasivos que já apresentavam
lesão pré-operatória do III nervo craniano. Nesses
últimos foi realizada uma remoção radical de todo o
conteúdo do seio cavernoso.
Fig. 18.15 – (A) Condroma do seio cavernoso. (B) Remoção
radical.
Tabela 18.3 – Grau de remoção cirúrgica em
meningiomas
lisia do nervo oculomotor ocorreu em 21 (40%) pa-
Tipos de meningiomas Total Parcial cientes, sendo, no entanto, quase sempre transitória.
Petroclival 9 10 A grande maioria dos pacientes apresentou regressão
total do déficit do III nervo craniano em um período
Asa do esfenóide 9 8
que variou de 3 a 6 meses. Apenas dois pacientes
Intracavernoso 6 9 permaneceram com paralisias definitivas do nervo
Tubérculo da sela 0 2 oculomotor. Lesões de outros nervos cranianos são
mais bem toleradas pelos pacientes. Dois pacientes
Total 24 (45%) 29 (55%) com lesão do nervo facial foram submetidos a anas-
tomose hipoglosso-facial.

Ocorreu um óbito nessa série. Tratava-se de um DISCUSSÃO


paciente com meningioma petroclival submetido à
ressecção radical da lesão através de um acesso re- O tratamento cirúrgico das lesões neoplásicas ori-
trossigmóideo. Esse paciente foi a óbito no período ginárias no seio cavernoso ou em regiões vizinhas,
pós-operatório devido a uma grave hemorragia suba- comprometendo o seio cavernoso, constitui grande
racnóidea e intraventricular, provavelmente devido desafio para o neurocirurgião, principalmente quan-
à ruptura de aneurisma da artéria comunicante an- do o objetivo é uma remoção radical do tumor com
terior. As complicações pós-operatórias observadas preservação dos nervos cranianos e da artéria caró-
nos portadores de meningiomas são apresentadas na tida interna. A preservação do nervo oculomotor é
Tabela 18.4. Novas paralisias de nervos cranianos de fundamental importância, pois a lesão desse ner-
foram a complicação cirúrgica mais freqüente. Para- vo implica perda funcional do olho correspondente.

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18 – Tratamento Cirúrgico das Lesões do Seio Cavernoso

Tabela 18.4 – Complicações em cirurgia de meningiomas


Paralisias de nervos cranianos Outras complicações

Nervo oculomotor
Transitória 21 (40%) Fístula liquórica 5
Definitiva 2 Infecção 5

Nervo troclear 6 Hemiparesia 4

Nervo abducente 8 Hematoma 2

Nervo trigêmeo 7 Hemorragia subracnóidea (HSA) 1

Nervo facial 2 Convulsões 2

Nervo vestibulococlear 4 Óbito 1

HSA = hemorragia subaracnóidea

A reconstrução do nervo oculomotor não traz resul- a dura-máter. Uma remoção radical desses tumores
tados favoráveis, uma vez que músculos antagônicos é possível na maioria dos casos. Adenomas hipofisá-
são inervados. Estudos experimentais demonstraram rios, apesar de benignos, podem invadir a dura-máter
que ocorre reinervação após anastomose do III nervo e as estruturas ósseas. Quando secretam prolactina,
craniano, porém os resultados funcionais não foram são tratados inicialmente com agonistas da dopami-
satisfatórios41. Infiltração tumoral ou envolvimento na. Uma atitude cirúrgica mais agressiva nos casos de
importante da artéria carótida interna é outro fator tumores invasivos deve ser analisada com cuidado,
limitante. Entretanto, nesses casos, existe solução ci- uma vez que muitos desses tumores respondem bem
rúrgica, uma vez que a realização de bypass entre a à radioterapia.
artéria carótida interna ou externa na região cervical Tumores malignos de baixo grau de agressividade,
e vasos intracranianos, com a interposição de enxer- como os condrossarcomas, cordomas e carcinomas
tos de veia ou artéria, tornou-se uma técnica cirúrgica adenóide císticos, são submetidos à remoção cirúrgica
bem estabelecida. A natureza da lesão, a infiltração de o mais radical possível. No entanto, apesar de essas
estruturas ósseas da base do crânio e de nervos cra- neo­plasias não estarem muito aderidas aos nervos cra-
nianos constituem os principais fatores limitantes de nianos, é muito difícil conseguir-se uma remoção radi-
uma remoção dessas neoplasias. cal devido à infiltração das estruturas ósseas da base do
As maiores séries publicadas mostram que uma crânio. Em geral, esses tumores são radiorresistentes
remoção radical da lesão é possível nos portado- quando se empregam técnicas convencionais de radio-
res de lesões benignas, excluindo-se os casos de terapia. O tratamento com radiocirurgia (principalmen-
meningiomas13,24. Esses tumores benignos incluem te com prótons) tem demonstrado melhor resultado.
casos de schwanomas do nervo trigêmeo, heman- Os meningiomas originários no interior do seio
giomas cavernosos, craniofaringiomas, condromas, cavernoso (intracavernosos), bem como os originá-
tumores dermóides e adenomas hipofisários não in- rios em outras regiões (asa do esfenóide, região pe-
vasivos. Schwanomas do nervo trigêmeo são lesões troclival e tubérculo da sela) com invasão secundária
benignas e encapsuladas que, quando limitadas à fos- do seio cavernoso, devem ser considerados separa-
sa média, podem ser removidas por acesso extradural. damente das outras lesões neoplásicas dessa região
Uma remoção radical é possível em praticamente to- por apresentarem particularidades específicas. Esses
dos os casos. O desafio para o neurocirurgião, nesses tumores são, na maioria das vezes, benignos, ocorrem
casos, consiste em preservar o maior número de fibras com maior freqüência em mulheres, podem invadir a
nervosas do nervo trigêmeo, principalmente do ramo dura-máter da base do crânio e a bainha de dura-máter
oftálmico. Complicações pós-operatórias permanen- e aracnóide, que acompanha os nervos cranianos em
tes de déficits de nervos cranianos são raras nesses seu trajeto na parede lateral do seio cavernoso. A arté-
pacientes. Hemangiomas cavernosos são muito vas- ria carótida interna pode estar infiltrada ou totalmente
cularizados, têm uma aparência típica nos exames de englobada pela lesão. Esses fatores fazem com que
ressonância magnética e, quando não são muito ex- seja impossível uma exérese radical desses tumores
tensos, podem ser totalmente removidos. Angiofibro- sem lesar os nervos envolvidos13,24,42,43. Existem, no
mas juvenis da nasofaringe são tumores exclusivos de entanto, meningiomas que, apesar de nos exames de
crianças e adolescentes do sexo masculino, muito vas- imagem aparentarem ser invasivos, na realidade não
cularizados e que, na maioria dos casos, não invadem invadem as estruturas adjacentes e pode estar presen-

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

te um plano de aracnóide. Nesses casos, é possível Meningiomas agressivos e outros tumores benig-
remoção radical com preservação das estruturas vi- nos que já tenham ocasionado uma paralisia definitiva
zinhas. do III nervo craniano, em pacientes jovens, desde que
Um dos fatores relacionados à conduta terapêuti- seja possível uma remoção radical, podem ser trata-
ca dos meningiomas do seio cavernoso é a história dos de maneira agressiva. Nesses casos, realizamos
natural da evolução desses tumores. Na grande maio- inicialmente um bypass da artéria carótida interna, e,
ria das vezes, ocorre um crescimento progressivo a seguir, uma remoção de todo o conteúdo do seio
ocasionando oftalmoplegia completa irreversível e cavernoso. Os testes de oclusão da artéria carótida
infiltração de estruturas vizinhas. O prognóstico com interna com balão não têm se mostrado confiáveis.
a descompressão cirúrgica desses nervos, quando já Um elevado número de pacientes apresenta infarto
tenham ocorrido paralisias ou paresias de nervos cra- cerebral, mesmo tendo tolerado o teste de oclusão.
nianos, é muito pior do que quando a função desses Por esse motivo recomendamos sempre a realização
nervos ainda se encontrava preservada. Assim sendo, de uma cirurgia de revascularização antes da oclusão
temos um grande dilema com relação à conduta a ser definitiva da artéria carótida interna.
adotada. Uma atitude conservadora, sem cirurgia ou Tumores com alto grau de malignidade são tra-
apenas com a remoção da porção externa ao seio ca- tados apenas com biópsia e rádio ou quimioterapia.
vernoso levará invariavelmente a um crescimento do Uma ressecção radical dessas lesões não é possível e
resto tumoral e ao envolvimento de todas as estru- os riscos de uma cirurgia mais radical não se justifi-
turas vizinhas. Uma atitude mais agressiva pode, no cam devido ao péssimo prognóstico desses pacientes.
entanto, ocasionar uma paralisia definitiva do nervo
oculomotor. A conduta do nosso serviço tem sido a de CONCLUSÃO
explorar cirurgicamente o seio cavernoso o mais pre-
cocemente possível, com o objetivo de realizar uma Lesões neoplásicas comprometendo o seio caver-
ressecção radical da lesão e determinar o tipo his- noso constituem grande desafio aos neurocirurgiões.
tológico do tumor. Quanto menor for o tumor, mais A preservação da função dos nervos cranianos e da
provável será sua remoção radical. Em pacientes com artéria carótida interna são objetivos a serem alcan-
uma boa função pré-operatória do nervo oculomo- çados quando se indica uma atitude cirúrgica mais
agressiva. A remoção radical de lesões benignas
tor, esse nervo é preservado mesmo que a remoção
permanece ainda como a única forma de tratamento
cirúrgica não possa ser radical. A simples manipula-
capaz de curar o paciente. Novas técnicas de radio-
ção cirúrgica do III nervo craniano, mesmo sem lesão
cirurgia podem oferecer um controle de crescimento
anatômica deste, provoca, na maioria dos pacientes,
tumoral a elevado número de portadores de menin-
uma paralisia pós-operatória, que regride totalmente
giomas benignos, porém sem o objetivo de cura e
em um período de 3 a 6 meses. Lesão intra-operatória
com efeitos tardios ainda desconhecidos. Experiência
dos nervos troclear e abducente é mais bem tolerada
cirúrgica, conhecimento da anatomia da região e da
pelos pacientes e passíveis de correção com técnicas
literatura pertinente são fatores decisivos para obter-
oftalmológicas. Déficits do nervo trigêmeo podem
se bons resultados.
ocasionar o aparecimento de úlceras de córnea e do-
res faciais. A experiência acumulada no tratamento
desses tumores nos últimos 20 anos fez com que nos- Referências Bibliográficas
sa conduta se tornasse mais agressiva. 1. Dolenc VV. Direct microsurgical repair of intracavern-
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resultados. Esse tratamento deve, em nossa opinião, cavernous sinus meningiomas. Report of twelve
ser indicado para pacientes mais idosos e em casos cases and review of the literature. Neurochirurgia.
de restos tumorais que demonstrem crescimento nos 1985;28:195-8.
exames de controle. O tempo de seguimento desses 3. Parkinson D. A surgical approach to the cavernous
pacientes ainda é curto para poder avaliar sua eficácia portion of the carotid artery: Anatomical studies and
case report. J Neurosurg. 1965;23:474-83
em tumores benignos. Se os resultados obtidos com
4. Taptas JN. The so-called cavernous sinus: a review
essa forma de tratamento forem confirmados após
of the controversy and its implications for neurosur-
um período mais prolongado (cerca de 10 anos), se geons. Neurosurgery. 1982;11:712-7.
tornará o método de escolha para o tratamento des- 5. Al-Mefty O, Ayoubi S, Gaber E. Trigeminal schwan-
ses pacientes. Deve-se, no entanto, sempre informar nomas: removal of dumbbell-shaped tumors through
ao paciente que não se obtém uma cura tumoral, que the expanded Meckel cave and outcomes of cranial
os efeitos deletérios da radioterapia podem ocorrer nerve function. J Neurosurg. 2002;96(3):453-63.
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19
Schwanoma do Nervo Vestibular
Diagnóstico e Tratamento
Ricardo Ramina
Maurício Coelho Neto
Yvens Barbosa Fernandes
Guilherme Borges
João Jarney Maniglia

INTRODUÇÃO House7 (otorrinolaringologista de Los Angeles, EUA)


e Rand e Kurze8 (neurocirurgiões de Los Angeles,
Schwanomas do nervo vestibular são os mais fre- EUA) deram início a uma nova era no tratamento dos
qüentes entre os schwanomas intracranianos. Todas schwanomas vestibulares. O desenvolvimento da mi-
as idades são afetadas, com pico de incidência entre crocirurgia fez com que a remoção radical, associada
a quarta e a sexta década. Existe uma leve predileção a uma alta taxa de preservação do nervo facial e baixa
pelo sexo feminino, com uma taxa de 2:1 sobre o sexo mortalidade, se tornasse um procedimento de rotina
masculino. Schwanomas do vestibular podem apare- nos melhores serviços de neurocirurgia e otorrinola-
cer de forma isolada, associados à neurofibromatose ringologia. Uma das grandes dificuldades ainda en-
tipo 2 e à síndrome de schwanomatose. Schwanomas contrada era o fato de que a maioria dos pacientes só
do vestibular bilateral estão normalmente associados recebia um diagnóstico correto tardiamente, quando
a neurofibromatose do tipo 2 (NF2). Estudos genéti- os tumores eram volumosos. Nos anos de 1980, os
cos demonstraram alterações do cromossomo 22 em métodos diagnósticos sofreram grande desenvolvi-
casos esporádicos de pacientes com schwanomas ves- mento com o aparecimento de novas técnicas, como
tibulares sem NF21. O diagnóstico deve ser sempre a tomografia computadorizada, a ressonância magné-
presumido em casos de queixa da diminuição unilate- tica e os exames de potencial evocado do tronco ce-
ral da acuidade auditiva. rebral. Graças a esses métodos, o diagnóstico de pe-
O tratamento cirúrgico dos schwanomas do vesti- quenos schwanomas do vestibular pôde ser realizado,
bular (neurinomas do acústico) acarretava alta mor- e muitos desses pacientes ainda apresentam audição
bidade e mortalidade inaceitável no início do século útil no ouvido afetado pelo tumor9-11. A preservação
passado2-4. Nessa época, Cushing propunha uma re- da audição passou a ser um novo objetivo a ser alcan-
moção subtotal da lesão com o objetivo de reduzir çado no tratamento cirúrgico desses pacientes. Esses
a mortalidade e as seqüelas pós-operatórias2. Alguns métodos não agressivos permitiram, também, que se
anos mais tarde, entretanto, Dandy4 publicou uma pudesse conhecer melhor a história natural e o com-
série de casos em que foi realizada a ressecção ra- portamento biológico dos schwanomas do vestibular.
dical da lesão, obtendo a cura dos pacientes com Tratamentos de radioterapia (denominados de radio-
uma mortalidade aceitável para aquela época. Uma cirurgia e radioterapia conformacional estereotática)
das principais causas de mortalidade cirúrgica era a com novos protocolos foram utilizados em casos se-
lesão da artéria cerebelar inferior anterior, como de- lecionados de tumores com menor diâmetro.
monstrado pelo trabalho de Atkinson5. A preservação
da função do nervo facial era raridade nessa época,
tendo Olivecrona6 publicado a primeira grande série DIAGNÓSTICO
com baixa mortalidade e preservação do nervo facial. Apesar de todo o desenvolvimento tecnológico, o
Novas perspectivas no tratamento desses tumores diagnóstico dos schwanomas vestibulares ainda é rea­
foram introduzidas com a utilização do microscópio lizado tardiamente em grande número de pacientes.
cirúrgico. Os trabalhos pioneiros e independentes de As principais razões para esse fato estão relacionadas

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

aos poucos sintomas que muitos pacientes apresen- captam bastante o contraste iodado, podendo apre-
tam, à não-valorização desses sintomas pelo médico sentar áreas císticas.
assistente (na maioria das vezes um otorrinolaringo- A ressonância magnética é o exame que oferece
logista), à solicitação inadequada de exames comple- o maior número de informações nos casos de schwa-
mentares para confirmação de diagnóstico e a exames nomas vestibulares, permitindo que se estudem, em
complementares de má qualidade. O diagnóstico detalhes, as relações do tumor com o tronco cerebral,
precoce é, possivelmente, o fator mais importante no conduto auditivo interno, outros nervos cranianos,
resultado do tratamento. Tumores com menos de 1,5 vasos e a vascularização da lesão. A avaliação das
cm de diâmetro apresentam alta taxa de preservação estruturas nervosas dentro do conduto auditivo inter-
dos nervos facial e coclear, praticamente sem morta- no e da relação do tumor com o “fundo do canal” é
lidade. mais bem realizada utilizando-se a seqüência em T2.
Deve-se suspeitar da presença de um schwanoma Pode-se, também, avaliar estruturas como os canais
do nervo vestibular sempre que o paciente queixar-se semicirculares, cóclea, bulbo da jugular, ventrículos
de diminuição da acuidade auditiva unilateral, asso- cerebrais e a presença de outras lesões associadas
ciada ou não a zumbidos. Sintomas como hipoestesia (como, por exemplo, em casos de neurofibromatose).
da face, paresia facial, alterações da deglutição, do Na maioria das vezes, os tumores apresentam impor-
equilíbrio e alterações motoras das extremidades, são tante captação do meio de contraste, com pouco ou
encontrados apenas nos casos de tumores mais exten- nenhum edema perilesional. Exames pós-operatórios
sos, com comprometimento dos nervos correspon- de ressonância magnética costumam apresentar uma
dentes e do tronco cerebral. Exames como radiografia captação linear dentro do conduto auditivo interno.
simples do poro acústico, bem como cisternografia Essa captação não significa tumor residual. Quando
área e com contraste iodado, têm valor apenas histó- se observa, no entanto, uma captação “arredondada”
rico, não trazendo informações úteis nos dias atuais. dentro do canal auditivo interno, deve-se suspeitar de
Exames otorrinolaringológicos, como audiometria resto tumoral.
com discriminação verbal e de potencial evocado do
tronco cerebral, devem ser realizados em todos os pa- HISTÓRIA NATURAL
cientes e fornecem informações importantes não só A história natural e o comportamento biológico
quando há suspeita da presença da lesão, mas também dessas lesões não são bem conhecidos. Com o ad-
para indicação cirúrgica e controle pós-operatório, vento de métodos diagnósticos não agressivos e mais
como será descrito adiante. Na audiometria tonal em precisos, como a ressonância magnética, pôde-se ava-
pacientes com schwanoma do vestibular, encontra-se liar melhor o comportamento biológico desses tumo-
como achado típico uma perda auditiva neurossenso- res. O conhecimento da história natural dessas lesões
rial para altos tons. Em tumores pequenos e alguns e seu comportamento biológico são importantes na
casos raros de tumores maiores pode-se, no entanto, indicação da cirurgia e na avaliação do tratamento
encontrar uma audiometria normal. A discriminação radioterápico. Muitos tumores submetidos à radioci-
verbal deve ser avaliada, e uma diminuição de mais rurgia e considerados como êxito de tratamento por
de 50% é considerada como sinal de uma audição não terem apresentado crescimento em um período
“não útil”. A avaliação dos potenciais evocados do de tempo específico, poderiam ter a mesma evolução
tronco cerebral (BERA) permite diferenciar lesões sem esse tratamento. A maioria dos autores descreve
cocleares das retrococleares. O aumento da latência um crescimento lento, que varia de 0 a 10 mm por
entre as ondas III e V é um achado característico dos ano12,13. Pacientes mais idosos apresentam um cres-
schwanomas vestibulares. Diminuições de amplitu- cimento mais lento, enquanto portadores de NF2
des e até mesmo perda da onda V indicam alterações apresentam um crescimento tumoral mais rápido. Um
relacionadas ao tronco cerebral. Esse exame é bastan- acompanhamento mais prolongado desses pacientes
te útil e sensível, exigindo, porém, que a audição do é, no entanto, necessário para que se obtenham me-
paciente esteja preservada. lhores informações.
A tomografia axial computadorizada é um exame
muito útil para avaliar as estruturas ósseas do ouvido PATOLOGIA, IMUNOISTOQUÍMICA
interno – como os canais semicirculares, células da
mastóide –, as características do conduto auditivo in-
E GENÉTICA
terno e a posição do bulbo da veia jugular. Evidencia O schwanoma vestibular é composto por células
também hidrocefalia. Tumores intracanaliculares e as de Schwann (spindle-shaped Schwann cells), com
relações da lesão com o tronco cerebral não são mui- áreas alternadas de células alongadas. Pode ter um
to bem demonstrados por esse método diagnóstico. padrão compacto de crescimento (Antoni A) ou pa-
É rea­lizada como controle pós-operatório na maioria drão com menos compactação das células, freqüente
dos pacientes. Schwanomas vestibulares, em geral, degeneração lipídica e formação cística (Antoni B).

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19 – Schwanoma do Nervo Vestibular – Diagnóstico e Tratamento

Formas malignas são muito raras. Pleomorfismo nu- são tratados simplesmente com acompanhamento clí-
clear e raras figuras mitóticas podem estar presentes nico ou com radiocirurgia.
sem significar malignidade. Portadores de neurofibromatose merecem atenção
Forte expressão da proteína S-100 e freqüente ex- especial e vários fatores influenciam as indicações
pressão do marcador Leu-7 são os achados imunois- cirúrgicas. A história natural desses tumores é bas-
tológicos mais freqüentes. O gene tumoral supressor tante variável. Observamos pacientes com tumores
NF2, localizado no cromossomo 22q12, codifica uma de crescimento muito lento e outros com crescimento
proteína chamada Merlin (ou schwanomina), que tem rápido. Em nosso serviço, os seguintes parâmetros
função reguladora do citoesqueleto por meio da acti- são utilizados na indicação do tratamento cirúrgico
na. Mutações inativas do gene NF2 foram demonstra- e radioterápico: a. classificação do tumor como uni
das em 60% dos casos de schwanomas. ou bilateral; b. existência e extensão de outros tumo-
res cerebrais e medulares; c. qualidade da audição de
TRATAMENTO ambos os ouvidos; d. tamanho da lesão; e. presença
de hidrocefalia; f. cirurgia ou radioterapia prévia; g.
As formas de tratamento de schwanomas do ves- função do nervo facial e h. a atividade profissional do
tibular incluem três possibilidades: conservador (ob- paciente.
servação clínica), cirúrgico e radioterápico. Tamanho Situações específicas são tratadas da seguinte ma-
da lesão, idade e condição clínica do paciente, pre-
neira:
sença de neurofibromatose associada, função auditiva
pré-operatória, experiência do cirurgião e desejo do • Pacientes com tumores extensos unilaterais:
paciente são os fatores mais importantes envolvidos indicamos a remoção radical da lesão, sabendo
na decisão da forma de tratamento. Em casos excep- que a preservação do nervo facial é de extre-
cionais pode-se associar o tratamento cirúrgico ao ma importância, uma vez que um novo tumor
tratamento radioterápico pós-operatório. pode desenvolver-se no outro lado.
• Pacientes com tumores bilaterais e surdez bi-
lateral, sendo um dos tumores muito extenso,
Conservador comprimindo o tronco cerebral: indicamos a
O tratamento conservador consiste no acompanha- remoção radical dessa lesão. A preservação do
mento clínico do paciente e no controle da evolução nervo facial é fundamental nesses casos. A res-
da lesão com exames de imagem, preferencialmen- secção da outra lesão é realizada com intervalo
te exame de ressonância magnética. Esses controles de alguns meses após a primeira cirurgia.
por imagem são realizados com intervalo de 6 meses, • Pacientes com tumores bilaterais sem compres-
inicialmente, e na seqüência anualmente. Indicamos são do tronco cerebral e surdez unilateral: indi-
esse tipo de conduta aos pacientes sem condição de camos a remoção do lado da surdez com intuito
tratamento cirúrgico e aos idosos que apresentem tu- de curar essa lesão e preservar o nervo facial.
mores intracanaliculares sem audição. Pacientes que Sabemos que essa preservação está relacionada
nos exames de controle demonstram aumento da le- ao tamanho do tumor. O tumor do lado opos-
são devem ser tratados com remoção cirúrgica da lesão to é acompanhado com exames de ressonância
ou, eventualmente, com radiocirurgia. magnética de controle; em caso de progressão
da doença, podemos indicar uma remoção par-
Cirúrgico cial da lesão com monitoração intra-operatória
O tratamento cirúrgico com remoção radical de de potenciais evocados de tronco.
um schwanoma do vestibular é a única forma de tra- • Pacientes com tumores bilaterais, audição
tamento que oferece a chance de cura desse tipo de preservada (audição útil) de até 1,5 cm de diâ­
tumor. A localização do tumor em uma região que metro: indicamos a cirurgia o mais precoce-
contém importantes estruturas vasculares e nervosas mente possível, escolhendo o lado com melhor
exige grande conhecimento anatômico, treinamento qualidade auditiva ou menor alteração no po-
com microcirurgia e experiência. tencial evocado. Caso seja possível preservar
a audição, indicamos tratamento cirúrgico do
lado oposto. Se a preservação da audição ti-
Indicação para Cirurgia ver sido possível, indicamos conduta expec-
O tratamento cirúrgico com remoção radical da tante com exames de ressonância magnética
lesão é, segundo nossa experiência, o tratamento pri- e audiometria de 6 em 6 meses. Em caso de
mário de escolha para todos os schwanomas do ves- aumento progressivo da lesão e piora da qua-
tibular. Pacientes com contra-indicações clínicas para lidade auditiva, indicamos remoção subtotal
o procedimento cirúrgico ou acima dos 65 anos de do tumor com monitoração intra-operatória de
idade, com tumores intracanaliculares e sem audição potenciais evocados de tronco cerebral.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

• Tumores bilaterais, audição preservada, de querer retração cerebelar e identificar o nervo facial
mais de 1,5 cm de diâmetro, sem compressão precocemente dentro do conduto auditivo interno. As
do tronco cerebral: indicamos a cirurgia no desvantagens dessa abordagem são relacionadas ao
lado em que a audição estiver mais comprome- maior tempo necessário para expor a lesão, à perda
tida, uma vez que a possibilidade de preservá- da audição, campo cirúrgico limitado pelo seio sig-
la é menor do que em tumores de até 1,5 cm móideo, seio petroso superior e canal do nervo facial,
de diâmetro. exposição limitada das estruturas da fossa posterior,
• Tumor em ouvido útil único: indicamos ci- maior dificuldade na reconstrução do nervo facial e
rurgia apenas se a lesão estiver aumentando, impossibilidade de fechamento primário da dura-má-
devendo considerar-se uma cirurgia com re- ter, requerendo incisão cirúrgica adicional no abdome
moção subtotal do tumor com monitoração para remoção de gordura abdominal para fechamento
intra-operatória da função auditiva. da abertura dural.
O acesso retrossigmóideo-transmeatal tem como
Aspectos Radiológicos Pré-operatórios desvantagem relativa o fato de ser um acesso intradu-
ral, exigir retração do cerebelo e não expor adequa-
Os estudos radiológicos pré-operatórios são de damente o fundo do canal. Discordamos dessas des-
extrema importância tanto na indicação cirúrgica vantagens, pois acessos intradurais fazem parte dos
como na escolha do acesso a ser utilizado. Esses procedimentos neurocirúrgicos e, quando realizados
exames permitem também a identificação de outras com técnica adequada, não implicam complicações.
lesões associadas e de hidrocefalia. A anatomia ós- Com a abertura da cisterna cerebelomedular, a retra-
sea da região petrosa é mais bem demonstrada com ção cerebelar é mínima ou inexistente. A exposição
exames de tomografia computadorizada. A posi- do fundo do canal auditivo interno é adequada na
ção dos canais semicirculares em relação ao poro grande maioria dos casos e, eventualmente, a utiliza-
acústico interno, a presença de células da mastóide ção de endoscopia pode melhorar a visualização des-
na região da abertura do poro acústico interno e sa região. As vantagens dessa abordagem são inúme-
a posição do bulbo da jugular são demonstrados ras e estão relacionadas à rapidez do acesso cirúrgico,
adequadamente com estudos de tomografia com- ser adequada para expor e ressecar schwanomas de
putadorizada. O diagnóstico de tumores intraca- qualquer tamanho, permitir a identificação do nervo
naliculares, a relação com o fundo do canal audi- facial dentro do canal auditivo interno, preservação
tivo interno, as relações com o tronco cerebral, a da audição, obtenção de excelente controle das es-
presença de cistos e a vascularização da lesão são truturas vasculares da fossa posterior e do tronco ce-
mais bem estudados com exames de ressonância rebral, possibilidade de reconstrução do nervo facial
magnética. e fechamento primário da dura-máter sem a necessi-
dade de enxerto de gordura abdominal. Um acesso
Acessos Cirúrgicos pré-sigmóideo também pode ser utilizado, porém, é
uma abordagem cirúrgica que necessita de uma expo-
A escolha do acesso cirúrgico é de fundamen- sição mais ampla da fossa média, do bloco labiríntico
tal importância em relação à preservação da função e do seio sigmóideo. Em nossa opinião, esse acesso
auditiva, controle do tronco cerebral e das estrutu- é desnecessário para a remoção de schwanomas ves-
ras vasculares da fossa posterior e possibilidades tibulares.
de preservação e reconstrução do nervo facial. Três
acessos são os mais utilizados: o retrossigmóideo-
transmeatal, o translabiríntico e o da fossa média ou Posição do Paciente
subtemporal. Cada um desses acessos tem vantagens As posições utilizadas para a ressecção desses
e desvantagens. O acesso da fossa média é utiliza- tumores com o acesso retrossigmóideo-transmeatal
do quase exclusivamente para tumores pequenos de são: semi-sentada, ventral, lateral, park bench e
até 1,5 cm de diâmetro em pacientes que apresentem dorsal com a cabeça girada (posição de mastóide).
audição. A vantagem desse acesso é permitir a pre- As principais vantagens da posição semi-sentada
servação da audição e ser uma abordagem extradu- são relacionadas à dissecção dos nervos cranianos
ral. As desvantagens desse acesso estão relacionadas no tronco cerebral devido à drenagem de liquor e
à limitação do tamanho da lesão, exigência de uma sangue. As desvantagens são relacionadas às difi-
retração do lobo temporal que pode ocasionar epilep- culdades no posicionamento, instabilidade hemodi-
sia, afasia e hemiparesia. Necessita também de maior nâmica em pacientes idosos e obesos, ser incômoda
manipulação do nervo facial dentro do conduto audi- ao cirurgião e, principalmente, pelo risco de em-
tivo interno, pois esse nervo é a primeira estrutura a bolia gasosa. A posição que utilizamos é a dorsal,
ser dissecada dentro do conduto para expor o tumor. com a cabeça do paciente rodada para expor a fos-
O acesso translabiríntico tem a vantagem de não re- sa posterior e a mastóide (Fig. 19.1). As vantagens

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19 – Schwanoma do Nervo Vestibular – Diagnóstico e Tratamento

Fig. 19.1 – Posição do paciente. Fig. 19.2 – Monitoração dos nervos VII e VIII.

dessa posição estão relacionadas à facilidade no po- Técnica Cirúrgica Utilizada


sicionamento, evitar instabilidade hemodinâmica e
facilitar a dissecção dos nervos cranianos dentro do De início, realizávamos craniectomia retros-
conduto auditivo interno, ao conforto para o cirur- sigmóidea e, desde 1995, passamos a realizar uma
gião e à redução significativa do risco de embolia craniotomia em pacientes jovens para obter melhor
gasosa. A principal desvantagem dessa posição é efeito estético e evitar uma possível complicação de
o acúmulo de liquor e sangue na região do tronco cefaléia pós-operatória. Em pacientes idosos, devido
cerebral e nervos cranianos, necessitando de aspira- à aderência da dura-máter, realizamos craniectomia
ção contínua. Portadores de neurofibromatose, que de fossa posterior. A craniotomia com cerca de 5 cm
apresentem lesões cervicais altas associadas, são de diâmetro deve expor o seio sigmóideo e a junção
operados em posição lateral para evitar a rotação com o seio transverso. A dura-máter é aberta em for-
da região craniocervical e compressão da medula ma de arco paralelo aos seios sigmóideo e transverso.
espinhal. Após a abertura da cisterna cerebelomedular, é pos-
sível a exposição do tumor e do conduto auditivo in-
terno sem retração do cerebelo (Fig. 19.3). Os nervos
Material Cirúrgico Necessário bulbares são identificados e dissecados da cápsula
Para a realização de cirurgia de um schwanoma tumoral. O plano de aracnóide que cobre a lesão é
vestibular é necessário de material cirúrgico especí- dissecado para preservar as estruturas do tronco ce-
fico. O microscópio cirúrgico deve permitir uma ilu- rebral. Em pacientes com tumores restritos ao canal
minação suficiente e ter mobilidade adequada. Para auditivo interno ou que permitem sua identificação
a abertura do conduto auditivo interno requer-se um precoce, realiza-se inicialmente a abertura do canal.
drill de alta rotação com brocas cortantes e diamanta- Deve-se evitar a lesão do canal semicircular poste-
das, material de microcirurgia como pinças, tesouras, rior nos pacientes que têm audição. Parâmetros para
dissectores em forma de baioneta e, se possível, aspi- a localização dessa estrutura são obtidos dos exames
rador ultra-sônico e equipamentos para monitoração pré-operatórios. Células de mastóide devem ser iden-
dos nervos VII e VIII. tificadas e ocluídas com cera óssea e fragmento de
músculo e cola biológica para evitar fístulas liquóri-
cas. A abertura do conduto auditivo interno é realiza-
Monitoração intra-operatória da inicialmente com brocas cortantes e finalizada com
A monitoração intra-operatória da função do ner- brocas diamantadas, evitando-se lesão do bulbo da ju-
vo facial e do nervo coclear é realizada de rotina (Fig. gular na porção inferior do canal (Fig. 19.4). Após a
19.2). O nervo facial é monitorado por meio de ele- remoção parcial do tumor intracanalicular, identifica-
trodos colocados nos músculos faciais que são esti- mos o nervo facial superior e anteriormente à cápsula
mulados mecanicamente ou através de estímulo elé- tumoral e o nervo coclear inferior e anteriormente. O
trico durante a dissecção do tumor. O nervo coclear nervo vestibular que origina a lesão é seccionado no
é monitorado por registro de potenciais evocados de fundo do canal e o tumor é dissecado desses nervos.
tronco cerebral. A desvantagem dessa monitoração é A seguir, realiza-se remoção intracapsular do tumor
que o registro dos potenciais evocados não ocorre em e a cápsula tumoral é dissecada do tronco cerebral,
tempo real. Alterações das ondas III e V durante a dis- identificando-se os nervos trigêmeo superior e ante-
secção podem fazer com que o cirurgião seja alertado riormente à lesão e aos nervos vestibulares, coclear e
e evite a lesão da função do nervo coclear. facial no tronco cerebral. O nervo facial encontra-se

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

mais vulnerável na região do poro auditivo interno e


a dissecção final dessa estrutura só é realizada com
controle dentro do canal auditivo e no tronco cerebral
(Fig. 19.5). Evita-se coagulação bipolar e realiza-se
com precisão para impedir lesão dos nervos. Após re-
moção radical da lesão (Fig. 19.6), faz-se minuciosa
hemostasia e o poro acústico interno é reconstruído
com um retalho de dura-máter previamente rodado
sobre os nervos bulbares, enxerto de músculo e cola
biológica. A dura-máter é fechada com sutura contí-
nua e o fragmento ósseo recolocado.

Fig. 19.6 – Remoção total do tumor com preservação dos


nervos VII e VIII.

Complicações
Várias complicações foram descritas na literatura
(Tabela 19.1).

Tabela 19.1 – Complicações em cirurgia de schwanoma


vestibular
1. Perda auditiva

2. Alterações vestibulares
Fig. 19.3 – Exposição do tumor sem retração do cerebelo.
3. Paralisia facial

4. Alterações do nervo trigêmeo

5. Paralisia dos nervos bulbares

6. Sangramento intracraniano

7. Fístula liquórica

8. Meningite

9. Infecção de ferida operatória

10. Hidrocefalia

11. Hemiplegia

12. Cefaléia
Fig. 19.4 – Abertura do poro acústico.
13. Óbito

14. Tumor residual

Em nossa série, essas complicações são, no entan-


to, bastante raras. Nenhum de nossos pacientes apre-
sentou hemiplegia, lesão definitiva de nervos bulba-
res ou do nervo facial. As complicações que ocorrem
com maior freqüência são: perda da audição, lesões
do nervo facial e fístulas liquóricas. A perda da audi-
ção ocorre em todos os pacientes operados através de
acesso translabirintino e, na grande maioria dos pa-
cientes, com tumores maiores que 3 cm de diâmetro.
As fístulas liquóricas podem ocorrer através da ferida
Fig. 19.5 – Dissecção dos nervos VII e VIII. cirúrgica ou por células da mastóide abertas no bro-

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19 – Schwanoma do Nervo Vestibular – Diagnóstico e Tratamento

queamento do conduto auditivo interno. Essas fístulas de radioterapia, observou-se melhora dos resultados e
são tratadas inicialmente de maneira conservadora: essa forma de tratamento tem sido utilizada em vários
repouso no leito, curativo compressivo e drenagem serviços como terapia primária ou após remoção par-
lombar contínua. Se, após 3 dias de tratamento con- cial de um schwanoma vestibular.
servador, não ocorrer remissão do quadro, indicamos
reabordagem para fechamento da fístula. Em casos Radioterapia Conformacional Estereotática
de lesão do nervo facial em que tiver sido possível
identificar o coto proximal no tronco cerebral, reali- É uma forma de radioterapia em que a dose total
zamos uma reconstrução fácio/facial, com ou sem a é fracionada, e o alvo, localizado com técnicas de es-
interposição de enxerto do nervo sural. Quando não tereotaxia. Pode ser utilizada em tumores com mais
se identifica o coto do nervo facial, realiza-se uma de 3 cm de diâmetro, embora não existam séries com
anastomose hipoglosso/facial cerca de 10 dias após a número suficiente de pacientes e período prolongado
cirurgia. Nos casos de preservação anatômica do ner- de seguimento para verificar a eficácia e a segurança
vo facial, mas com paralisia completa pós-operatória, desse método. Da mesma forma que a radiocirurgia,
realizamos uma tarsorrafia e aguardamos até 12 me- esse método não oferece a possibilidade de cura para
ses para sua regeneração. Os pacientes são extubados nenhum paciente.
no centro cirúrgico ou pouco após sua admissão na
UTI. Se o paciente permanecer sonolento ou apresen- MATERIAL e RESULTADOS
tar dificuldades para acordar da anestesia, realizamos
imediatamente um exame de tomografia computado- No período de janeiro de 1990 a agosto de 2003
rizada para excluir a possibilidade de um hematoma foram operados 192 pacientes com schwanomas do
de fossa posterior. vestibular em nosso serviço. A idade dos pacientes
variou entre 16 e 81 anos. Vinte pacientes tinham sido
submetidos à cirurgia anterior em outros serviços,
Radioterápico com remoção parcial da lesão, e 12 pacientes apresen-
O tratamento radioterápico pode ser dividido em tavam lesão completa do nervo facial. Radioterapia
radioterapia convencional, radiocirurgia e radiotera- convencional foi realizada em dois desses pacientes e
pia conformacional estereotática. Tratamento com radiocirurgia em outros dois. Todos os pacientes dessa
radioterapia para os schwanomas vestibulares deve série foram submetidos a exames de tomografia compu-
ser, em nossa opinião, uma exceção, reservado apenas tadorizada, ressonância magnética e audiometria com
para casos excepcionais em que uma remoção radical discriminação antes da cirurgia. O tamanho das lesões
da lesão com cura do paciente não seja possível. operadas em nosso serviço é demonstrado na Tabela
19.2, utilizando-se a classificação de Hannover14.
Radioterapia Convencional
A radioterapia convencional com campos parale- Tabela 19.2 – Schwanomas vestibulares operados
los não tem indicação nos dias atuais para tratamen- entre 1990 e 2003
to dos schwanomas vestibulares devido ao risco de
Tamanho Número %
lesões cerebrais e do tronco cerebral por irradiação
secundária. T1 11 5,72

T2 16 8,33
Radiocirurgia
T3 a 17 8,85
A radiocirurgia nada mais é do que uma radio-
terapia de alta energia localizada e mais precisa. O T3 b 26 13,54
método tem sido utilizado para o tratamento desses T4 a 52 27,08
tumores desde a década de 1950, quando foi desen-
volvido por Leksell, na Suécia. O tratamento é li- T4 b 70 36,45
mitado a tumores de menor diâmetro (normalmente Total 192
de até 3 cm de diâmetro) e tem como objetivo um
controle do crescimento da lesão. Pode ser realiza-
do tanto com o acelerador linear (LINAC) como com
fontes de cobalto (“Gama-knife”). As primeiras séries O tumor era maior que 3 cm na maioria dos pa-
publicadas mostravam complicações de paralisia fa- cientes (148 casos), mesmo assim a função do nervo
cial, perda auditiva, lesão actínica do nervo trigêmeo facial pôde ser preservada (Graus I a III de House
e hidrocefalia, com incidência não aceitável quando e Brackmann15) em 85% dos pacientes com função
comparado às séries cirúrgicas. Com o advento de no- facial pré-operatória, independentemente do tamanho
vas técnicas mais precisas e utilizando-se menor dose da lesão (Figs. 19.7 e 19.8). Em pacientes com tumo-

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

res menores que 3 cm de diâmetro, houve preserva- A


ção do nervo facial em 100% dos casos (Figs. 19.9
e 19.10). O acesso retrossigmóideo-transmeatal foi
utilizado em todos os casos. A preservação da audi-
ção foi possível em 40% dos pacientes com tumores
de até 1,5 cm de diâmetro que apresentavam audição
pré-operatória. Quatro pacientes foram a óbito nessa
série (2%). Todos eles apresentavam tumores maiores
que 5 cm de diâmetro (T4 b). Em dois casos, a mor-
talidade ocorreu por hematomas de leito operatório,
que, apesar de drenados, levaram os pacientes a óbi-
to por lesão secundária do tronco cerebral. Os dois
outros casos de mortalidade deveram-se à trombose
da artéria basilar; em um paciente, por compressão
da artéria vertebral pelo posicionamento na mesa ci-
rúrgica e em outro por lesão da artéria vertebral na
região C1/C2 durante a abertura. Apesar de suturado
com técnicas microcirúrgicas, o paciente apresentou
trombose secundária da artéria basilar evoluindo para B
óbito por infarto de tronco cerebral. Fístula liquórica
foi observada em 12 (6,2%) pacientes, dentre os quais
7 (3,6%) apresentaram quadro de meningite. Reabor-
dagem cirúrgica para fechamento da fistula liquórica
foi necessária em 5 pacientes, os outros foram tra-
tados com curativo compressivo e drenagem lombar
contínua durante três dias. Os casos de meningite
foram tratados por antibióticos com êxito. Todos os
pacientes foram submetidos a exames de ressonância
magnética no período pós-operatório, e aqueles com
preservação do nervo facial, à audiometria. Remo-
ção total da lesão foi obtida em 190 casos (98,9%).
Mesmo tumores gigantes submetidos a cirurgia em
outros serviços puderam ser removidos completa-
mente com a técnica cirúrgica descrita (Fig. 19.11).
Em dois casos a remoção radical não foi possível. O
primeiro foi de um paciente com schwanoma cístico Fig. 19.7 – Ressonância magnética de schwanoma vestibu-
lar (T4 a). (A) Pré-operatório. (B) Pós-operatório.
com cerca de 5 cm, submetido à remoção radical da
lesão, confirmada com exame de ressonância magné-
tica pós-operatória. No exame de controle realizado
2 anos após a cirurgia, observou-se pequena recidiva A B
tumoral, possivelmente um fragmento da cápsula do
cisto. O paciente recusou novo procedimento e tem
sido acompanhado com exames de imagem. O tumor
residual tem-se mantido estável. Outro paciente com
remoção subtotal tinha 78 anos de idade e um tumor
cístico de cerca de 4 cm de diâmetro. Visto não apre-
sentar condições clínicas favoráveis à cirurgia, foi
submetido à aspiração estereotática do cisto. Esse
paciente permaneceu assintomático durante 3 anos,
falecendo devido à cardiopatia grave com o tumor re-
sidual estável. Todos os pacientes com lesão do nervo
facial foram submetidos à anastomose hipoglossofa-
cial e obtiveram recuperação da função facial de grau
III ou IV. Em dois casos foi possível realizar uma B
anastomose facio-facial e a recuperação da função foi Fig. 19.8 –Ressonâncias (A) pré e (B) pós-operatório de
para grau II/III. schwanoma vestibular T4 b.

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19 – Schwanoma do Nervo Vestibular – Diagnóstico e Tratamento

Fig. 19.9 – Schwanoma vestibular T3. Fig. 19.10 – Schwanoma vestibular T2.

A B

C D

Fig. 19.11 – Schwanomas vestibulares gigantes em cirurgias anteriores. (A e C) Pré-operatório. (B e D) Pós-operatório.

DISCUSSÃO das vezes, dos nervos vestibulares. O termo neurino-


Inicialmente devemos esclarecer a terminologia ma do acústico é, no entanto, o mais utilizado, ape-
utilizada para esses tumores16. O termo schwanoma do sar de não descrever com exatidão a origem e com-
nervo vestibular deve ser utilizado no lugar do termo posição da lesão. Schwanomas do vestibular são, na
neurinoma do acústico, uma vez que esses tumores se maioria das vezes, unilaterais. Lesões bilaterais estão
originam das células de Schwann e, na grande maioria normalmente associadas a neurofibromatose do tipo 2.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Nesses casos é freqüente a associação com outros tu- fatores, como: tamanho da lesão, idade e condição
mores. Perda auditiva unilateral, com ou sem zumbi- clínica do paciente, função pré-operatória dos nervos
dos, é o sintoma mais freqüente desses pacientes. Uma facial e coclear, experiência da equipe cirúrgica, dis-
investigação com exames audiológicos e de imagem ponibilidade de técnicas de monitoração intra-opera-
deve ser realizada sempre que houver suspeita da pre- tória de nervos cranianos e potenciais evocados, bem
sença da lesão. como técnicas adequadas de radioterapia.
O grande desenvolvimento tecnológico observado Indicamos tratamento conservador sem cirurgia
nos métodos diagnósticos e o aprimoramento das téc- a pacientes idosos com lesões assintomáticas e de
nicas cirúrgicas modificou, de maneira decisiva, o tra- pequeno diâmetro; a condição clínica do paciente é,
tamento desses tumores. A primeira cirurgia de êxito no entanto, mais importante que a idade. Em pacien-
na remoção de um schwanoma vestibular é creditada tes mais jovens com lesões intracanaliculares, que
a Charles Ballance, em 1894. O paciente sobreviveu, já estejam surdos, pode-se inicialmente acompanhar
apesar de a remoção ter sido realizada com o dedo e a evolução do crescimento tumoral com exames de
sem técnicas de cirurgia com antissepsia17. ressonância magnética de controle a cada 6 meses.
A mortalidade cirúrgica era extremamente alta no Se o paciente, no entanto, ainda apresentar audição
início do século passado (acima de 80%). Essa mor- conservada no ouvido correspondente, indicamos o
talidade, inaceitável mesmo para aquela época, fez tratamento cirúrgico com a maior brevidade possível
com que Cushing passasse a realizar remoção intra- como melhor chance de preservar o nervo coclear e
capsular subtotal da lesão obtendo resultado cirúrgico sua função. Em casos de neurofibromatose, a decisão
melhor, com mortalidade de 11%2. cirúrgica é, muitas vezes, mais complexa e outros fa-
Não satisfeito com a remoção parcial de uma lesão tores devem ser considerados. A preservação do ner-
potencialmente curável com cirurgia, Dandy3,4 publi- vo coclear é mais difícil nesses casos e é freqüente
cou, em 1941, seus resultados com ressecção radical a associação de outros tumores. Pacientes com tu-
do tumor e uma mortalidade de 2,4%. mores pequenos (até 3 cm de diâmetro) bilaterais,
O diagnóstico de um schwanoma vestibular era com audição preservada, recebem indicação para
realizado, na maioria dos casos, quando o tumor já tratamento cirúrgico do lado que apresente melhor
apresentava grande volume, causando sintomas neu- audição ou menor alteração no exame de potencial
rológicos significativos e hidrocefalia. A cirurgia des- evocado. Se no período pós-operatório a audição foi
ses tumores implicava grande número de pacientes conservada, indicamos a remoção cirúrgica do outro
com lesão dos nervos cranianos VII, VIII e muitas tumor. Em casos de pacientes com um único ouvi-
vezes, V, IX, X e XI. do funcionante e com tumor nesse lado, indicamos
O tratamento atual desses pacientes com mortali- tratamento conservador e, em casos de crescimento
dade praticamente nula, associada a uma morbidade tumoral, ressecção parcial da lesão com monitora-
baixa, iniciou em 1964 e 1965 com os trabalhos de ção intra-operatória de potencial evocado auditivo.
William House7, otorrinolaringologista de Los Ange- A preservação do nervo facial é de fundamental im-
les, e Rand e Kurze18, neurocirurgiões dessa mesma portância nos casos de tumores bilaterais, uma vez
cidade americana. William House publicou uma série que a diplegia facial traz graves conseqüências para
de pacientes com remoção microcirúrgica da lesão e os pacientes.
preservação do nervo facial em 95% dos casos. Rand Os objetivos da cirurgia são: cura do paciente com
e Kurze introduziram o acesso retrossigmóideo/trans- remoção radical da lesão, mortalidade zero, preserva-
meatal obtendo excelentes resultados. Desde então ção do nervo facial e preservação do nervo coclear. A
grande número de autores publicou suas séries com remoção radical da lesão é possível na quase totalida-
remoção radical da lesão e preservação do nervo facial de dos casos. A preservação do nervo facial é possível
e nervo coclear, com uma mortalidade extremamente em mais de 90% dos tumores e muito dependente do
baixa10,11,18-24. O tratamento radioterápico (radiocirúr- tamanho da lesão. A preservação da função auditiva
gico) dessas lesões tem sido utilizado há longa data. depende do tamanho da lesão, qualidade pré-operató-
Os resultados iniciais com essas técnicas eram muito ria da audição, grau de extensão tumoral para o fundo
piores que os cirúrgicos. Com a melhora dos métodos do canal auditivo interno e presença de NF2.
diagnósticos e maior precisão no tratamento radiote- A abordagem cirúrgica dessas lesões é realizada pre-
rápico, os resultados melhoram consideravelmente, ferencialmente por três acessos cirúrgicos: subtemporal
porém, um seguimento de maior prazo é necessário (fossa média), translabirintino e retrossigmóideo-trans-
para avaliar a eficácia desses métodos25-30. meatal. Excelentes resultados foram publicados com a
Opções de tratamento para esses pacientes in- utilização dessas três abordagens7,34-40.
cluem: observação clínica com exames de imagem de O acesso subtemporal é utilizado principalmente
controle, remoção cirúrgica e radioterapia11,14,16,20,30-34. nos tumores de pequeno diâmetro (até 1,5 cm), com
A melhor estratégia de tratamento depende de vários audição preservada.

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19 – Schwanoma do Nervo Vestibular – Diagnóstico e Tratamento

O acesso translabirintino popularizado pelos otor- O aparecimento de fístula liquórica através do na-
rinolaringologistas tem como principal vantagem a riz (fístula paradoxal) ou através da ferida cirúrgica foi
identificação precoce do nervo facial dentro do ca- observado em cerca de 4% a 10% dos pacientes16,20,45-47
nal auditivo interno e pode ser utilizado para tumores utilizando-se tanto o acesso retrossigmóideo trans-
com maior diâmetro. meatal quanto o acesso translabiríntico. A meningite
Na nossa experiência, o acesso retrossigmóideo- ocorre, nesses casos, com uma freqüência de 3%25.
transmeatal permite uma exposição adequada de Com a utilização da cola de fibrina e reconstrução do
schwanomas do acústico de todos os tamanhos. Rá- poro acústico interno com retalho de dura-máter e en-
pida exposição da lesão, preservação da audição, xerto de músculo, conseguimos reduzir drasticamente
identificação do nervo facial dentro do canal auditivo o número de fístulas liquóricas em nossos casos48.
interno, controle adequado das estruturas vasculares Tratamento radioterápico com técnicas de radio-
e nervosas da fossa posterior e do tronco cerebral e cirurgia ou radioterapia conformacional foi utilizado
fechamento primário da dura-máter são as principais como terapia primária ou após a remoção subtotal da
vantagens desse acesso cirúrgico. lesão25,29,30,49,50. O objetivo dessa forma de tratamen-
A remoção radical da lesão, com cura do paciente e to é a obtenção do controle do crescimento tumoral.
sem mortalidade, é o principal objetivo do tratamento Todos os pacientes submetidos à radiocirurgia ficam
cirúrgico. Esse objetivo pode ser alcançado em prati- com tumor residual, que pode permanecer inaltera-
camente todos os casos, independentemente do tama- do, diminuir ou aumentar de tamanho. Os resultados
nho do tumor. Tumores menores com diâmetro de até dessa forma de tratamento devem ser avaliados com
3,5 cm oferecem a melhor chance de cura do paciente cautela. Os resultados relatados por autores suecos
e preservação da função dos nervos facial e coclear. inicialmente apresentavam complicações elevadas e
A preservação do nervo facial varia de 54% a 89% não aceitáveis para os padrões atuais. Novas séries
dos casos, independentemente do tamanho da lesão, com doses menores de irradiação foram publicadas,
segundo revisão da literatura10,16,20,34,41. O tamanho do porém o tempo de seguimento desses pacientes ainda
tumor é, no entanto, um dos principais fatores para a é curto. Um seguimento de poucos anos não se apli-
preservação do nervo facial. Em nossa experiência, ca a tumores benignos ou de crescimento lento. Um
pacientes com tumores de até 3 cm de diâmetro tive- período de, no mínimo, 10 anos é necessário para
ram 100% de preservação do nervo facial22. que se obtenha uma confirmação de que não ocorreu
o crescimento do tumor. Em uma série recente de pa-
A preservação da audição é dependente principal- cientes tratados com radiocirurgia, observou-se que
mente do tamanho da lesão, mas também do acesso 60% dos casos não mostraram crescimento da lesão,
cirúrgico e da experiência do cirurgião10,11,37,38,42-44. 34% apresentaram diminuição do tamanho do tumor,
Gardner et al.36 realizaram uma revisão da literatu- e 6% crescimento30. Outra complicação relacionada
ra e encontraram uma preservação de 33% em 621 a essa forma de tratamento é o desenvolvimento de
pacientes que apresentavam audição pré-operatória. tumor maligno secundário no campo irradiado ou
A preservação da audição tem sido considerada por mesmo a transformação maligna de um schwanoma
muitos autores apenas quando o paciente apresenta benigno24,51,52. Esses casos são raros e possivelmente
uma audição pré-operatória considerada útil. A defi- mais freqüentes em portadores de neurofibromato-
nição de audição útil é muito controversa, e a maioria se53. Comparando os resultados de radiocirurgia rea-
dos autores ainda considera o parâmetro 50/50, ou lizada em pacientes com tumores de até 3 cm e os da
seja, até 50 dB de perda auditiva e até 50% de perda nossa série com tumores desse tamanho, observamos
da discriminação de palavras. Nossa filosofia difere que a taxa de preservação do nervo facial e da audi-
da desses autores, pois achamos que se deve tentar ção foi semelhante. Não observamos, nesse grupo de
preservar o nervo coclear e a audição apresentada pacientes, uma alteração trigeminal pós-operatória;
pelo paciente no pré-operatório. Mesmo a audição não ocorreu mortalidade cirúrgica e todos foram
classificada como não útil ainda é, muitas vezes, su- curados com ressecção total do tumor. A preservação
perior à obtida com implantes cocleares e muito su- do nervo facial em pacientes previamente tratados
perior à obtida com implantes de tronco cerebral. A com radiocirurgia e que apresentaram crescimento
preservação do nervo coclear poderá, no futuro, com tumoral, tem sido descrita como mais difícil devi-
novas tecnologias, oferecer a esses pacientes alguma do à fibrose. Essa foi a nossa experiência com dois
chance de restauração da audição. Os defensores do pacientes submetidos previamente a tratamento de
acesso translabiríntico para pacientes com audição radiocirurgia.
“não útil” argumentam que a preservação do nervo
coclear pode resultar em uma recidiva tumoral ou no
aparecimento ou persistência de zumbido no período CONCLUSÃO
pós-operatório31. Essas complicações não foram en- Schwanomas vestibulares são tumores benignos
contradas em nossos pacientes. que podem ser curados com remoção radical. Bai-

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

xas taxas de mortalidade e morbidade são alcançadas 17. Ballance CA. Some points in the surgery of the brain
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riente e bem equipada. O tratamento de radioterapia 18. Rand R, Kurze T. Preservation of vestibular, cochlear
(radiocirurgia) deve ser reservado apenas para casos and facial nerves during microsurgical removal of
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20
Tratamento Cirúrgico dos
Schwanomas do Nervo Trigêmeo
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Alexandros Theodoros Panagopoulos

INTRODUÇÃO trigeminal até as raízes nervosas. Esta é a provável


razão pela qual o tumor não se expande além do cavo

O
s schwanomas que nascem do nervo trigêmeo dilatado, na maioria dos casos. A massa tumoral pres-
compreendem 0,1% de todos os tumores e siona a porção normal do quinto nervo, o que geral-
entre 0,8% e 8% dos schwanomas intracra- mente determina a clínica da doença.
nianos1-16. Foram primeiramente descritos por Dixon Na fossa posterior, neurinomas trigeminais são
em 1846. Podem estar presentes como manifestação geralmente intradurais. A porção próxima ao tronco
fenotípica da neurofibromatose do tipo II, NF2, prin- cerebral é, na maior parte das vezes, como qualquer
cipalmente nos schwanomas múltiplos. Neurinomas outro tumor extra-axial, com um plano de clivagem
do nervo craniano V são raros e assumem variadas bem definido. Geralmente, esses tumores envolvem
formas de acordo com o seu tamanho. O nervo tri- nervos, vasos e tecido cerebral adjacentes apenas por
gêmeo (V) é o segundo mais comum a desenvolver deslocamento e não por invasão.
neurinomas, e as características desse tumor são pa-
As primeiras abordagens cirúrgicas convencionais
recidas com as do neurinoma do acústico (VIII) – par
utilizadas para a retirada desse tipo de tumor eram,
craniano mais acometido por esse tumor. A posição
inevitavelmente, relacionadas a baixas taxas de remo-
do tumor também é bem típica, e a maioria dos neu-
ção total e a altos índices de complicações pós-ope-
rinomas do trigêmeo se apresentam como massas que
ratórias. Com o advento das técnicas microcirúrgicas
se estendem desde o cavo de Meckel (trigeminal) até
e desenvolvimento de abordagens à base do crânio,
a fossa posterior, ao longo do trajeto do quinto nervo tornou-se possível a remoção total desse tumor com
craniano. Em outros casos, o tumor é encontrado ape- uma taxa aceitável de complicações.
nas na porção medial da fossa média do crânio. Como
o cavo de Meckel é lateral à porção ascendente da ar-
téria carótida, que entra no crânio pelo seio caverno- EPIDEMIOLOGIA
so, os neurinomas do quinto par craniano, situados na Acomete igualmente ambos os sexos, com predo-
fossa média, deslocam a carótida medialmente, mas mínio na quarta década (média = 45 anos)15. Há uma
não tendem a comprimir esse vaso. associação com neurofibromatose.
Esses tumores se originam de um determinado
segmento do nervo, e o restante deste é acometido
por deslocamento, devido ao crescimento da massa. A
CLASSIFICAÇÃO ANATÔMICA
maioria dos neurinomas trigeminais tem relação com Os schwanomas de trigêmeo podem crescer em
a região do cavo de Meckel. O tumor se expande e qualquer ponto do trajeto neural, tronco ou ramos: 50%
ocupa espaços disponíveis. O cavo de Meckel é ca- na fossa craniana média, 25% na fossa posterior exclu-
paz de acomodar grande quantidade do tumor, o que sivamente e 25% em ambas, assumindo o formato de
amplia o cavo. Sendo de consistência macia, o tumor ampulheta1,14. Uma pequena porcentagem se situa extra-
é incapaz de expandir a lâmina dural além do gânglio cranialmente em ramos distais. Podem ser classificados:

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

• Tipo I: fossa anterior – derivado da divisão of-


talmica do trigêmeo.
• Tipo II: fossa média – derivado da porção do
cavo de Meckel, podendo ou não se extender à
porção interna do seio cavernoso.
• Tipo III: fossa posterior – com origem na saída
junto ao tronco cerebral ou como estensão da
sua origem na fossa média.
Os esquemas anatômicos mostram as possíveis
origens do schwanoma de nervo trigêmeo Jefferson6
classificou esses tumores em três tipos:
• Fossa média, com origem no gânglio de Gasser.
• Fossa posterior com origem na zona de entrada
do nervo no tronco cerebral.
• Componentes nas fossas média e posterior e
formato de ampulheta.
A classificação que nos parece mais completa é a
de Yoshida e Kawase15 (Fig. 20.1):
• Tipo E: epidural, extracraniano:
–– Na órbita Fig. 20.2 - A figura mostra as principais estruturas da fossa
média. Q = quiasma óptico, I = nervo óptico, CI = artéria caró-
–– Fossa pterigopalatina e extracraniana tida interna, Cl.a = clinóide anterior, Cl.p = clinóide posterior,
• Tipo M: no espaço interdural. VI = nervo abducente, IV = nervo troclear, V1 = ramo oftálmi-
co do nervo trigêmeo, V2 = ramo maxilar do nervo trigêmeo,
• Tipo P: na fossa posterior, no espaço sub­ V3 = nervo mandibular do nervo trigêmeo, GNPS = grande
dural. nervo petroso superfical, E = forame espinhoso, GL = triângulo
• Tipo MP: formato de ampulheta que se estende de Glassock, KW = triângulo de Kawase.
nas fossas média e posterior.
• Tipo ME: formato de ampulheta que se esten- CLASSIFICAÇÃO PATOLÓGICA
de da fossa média ao espaço extra­craniano.
• Tipo MPE: envolve todos os compartimentos. Neurinomas de trigêmeo são lesões normalmente
de características benignas, porém poucos casos de
A Fig. 20.2 mostra as estruturas mais importantes
malignidade foram descritos5,8.
da fossa média que poderão estar envolvidas na ci-
rurgia desses tumores e, em especial, os triângulos de
Glassock e Kawase (póstero-medial) são mostrados. DIAGNÓSTICO
O grande nervo petroso superficial é muito importan-
te na definição dos espaços anatômicos.
Quadro Clínico-neurológico
O quadro clínico cursa com dor facial atípica,
disestesia facial, diminuição do reflexo córneo pal-
pebral e fraqueza do músculo masseter2,4,13. Paresia
facial está presente em 45% dos casos4. A extensão
anterior do tumor na fossa média craniana pode resul-
tar em compressão de nervos dentro do seio caverno-
so, levando à diplopia. Isolamento do VI nervo pode
ocorrer como conseqüência da extensão do tumor à
porção média do ápice petroso, comprimindo o nervo
abducente no canal de Dorello13. Extensão do tumor
na fissura orbitária superior pode causar exoftalmo. A
compressão do tronco cerebral pode acarretar sorriso
patológico9 (Fig. 20.3). Os tumores com predomínio
Fig. 20.1 - Desenho esquemático mostrando os tipos de de- em fossa posterior podem causar ataxia, cefaléia, per-
senvolvimento dos schwanomas do nervo trigêmeo: Tipo E – da auditiva e tinido1. Devido a discretos sintomas que
epidural, extracraniano: 1. Na órbita, 2. fossa pterigopalatina e duram por longos períodos e à negligência dos sinto-
extracraniana; Tipo M: no espaço interdural; Tipo P: na fossa mas iniciais, em muitos casos pela baixa escolaridade
posterior, no espaço subdural; Tipo MP: formato de ampulheta, e desconhecimento por parte dos pacientes, a maioria
que se estende nas fossas média e posterior; Tipo ME: formato
de ampulheta que se estende da fossa média ao espaço extra- dos tumores atinge grandes dimensões antes de serem
craniano; Tipo MPE: envolve todos os compartimentos. diagnosticados.

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20 – Tratamento Cirúrgico dos Schwanomas do Nervo Trigêmeo

A ressonância mostrará sinal dependente da con-


sistência do tumor, sendo hipersinal em T2 se mais
amolecido (Fig. 20.4) e isossinal em T2 se mais endu-
recido, porém ambos com hipersinal em T1, quando
contrastado com gadolínio. Eventualmente, pode-se
apresentar na sua forma cística (Figs. 20.5 a 20.9).

Fig. 20.3 – Paciente do sexo feminino, 45 anos, portadora de


sorriso patológico decorrente de schwanoma do trigêmeo (foto
autorizada formalmente pela paciente para divulgação científica).

A apresentação clínica é comumente uma pares-


tesia, atingindo, na maioria das vezes, mais de uma
divisão do nervo. A paralisia dos músculos temporal e
pterigóideo (mastigadores) é encontrada com freqüên­ Fig. 20.4 - RNM mostra lesão em forma de ampulheta,
cia. Neuralgia pode ocorrer, mas é incomum. Outro schwanoma de V nervo do tipo MP, hipersinal em T2.
sintoma também possível é depressão ou ausência
do reflexo corneano, porém, a completa ausência de
sensação da córnea é um evento raro, que geralmente
sugere transformação maligna do tumor.
Sintomas de envolvimento de nervos cranianos
adjacentes no seio cavernoso e no ângulo pontocere-
belar são freqüentemente relatados na literatura.
Outra ocorrência possível é a risada patológica.
Esse sintoma, apesar de incomum, parece ser impor-
tante e precoce nos casos de schwanomas trigeminais
maciços.
As características clínicas de lenta progressão dos
sintomas, associadas à predominância de enfraqueci-
mento ou paralisia de músculos relacionados ao ner-
vo trigêmeo, são normalmente diagnósticas.

Diagnóstico por Imagem


Erosão rugosa do ápice petroso é o achado na radio-
grafia simples de crânio mais clássica e pode ser cons-
tatada em até 45% dos exames13. A tomografia com-
putadorizada de crânio pode revelar erosão óssea em
33% dos casos11, lesão expansiva com formato carac-
terístico de ampulheta ou ovalada9 , normalmente ho- Fig. 20.5 - Neurinoma cístico de fossa posterior na emer-
mogênea à captação de contraste endovenoso iodado. gência do V nervo, tipo P, hipossinal em T1.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 20.6 - RNM em corte coronal mostra neurinoma cístico Fig. 20.7 - RNM em corte coronal mostra neurinoma cístico
de fossa média, cístico, hipossinal em T1. de fossa média, cístico, hipersinal em T2.

Fig. 20.8 - RNM em corte axial mostra neurinoma cístico de Fig. 20.9 - RNM em corte axial mostra neurinoma cístico de
fossa média, cístico, hipersinal em T2. fossa média, cístico, hipersinal em T1.

TRAtaMENTO CIRÚRGICO Abordagem Subtemporal


Abordagens Permite acesso intra e extradural até o ápice pe-
troso, dentro da fossa média e, ao se incisar o ten-
Classicamente, pode-se dividir a abordagem aos tório, alcança-se a extensão da fossa posterior. Esta
schwanomas do nervo trigêmeo em intra e extra­ abordagem está em desuso pela retração excessiva do
dural. lobo temporal, podendo lesar, por tração, estruturas
A abordagem intradural, mais utilizada nos anos vasculonervosas e mesmo danificar o lobo temporal
8010,13,14,16, pode ser realizada por muitos acessos, al- pelo tempo excessivo de retração com as espátulas
guns dos quais são a seguir descritos. (Fig. 20.10).

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20 – Tratamento Cirúrgico dos Schwanomas do Nervo Trigêmeo

Fig. 20.10 - Peça anatômica mostra que, após dissecação


do músculo temporal e craniotomia subtemporal, pode-se ter
acesso à fossa média e cisterna interpeduncular. A retirada
do zigoma pode facilitar a visualização da porção abaixo da
bifurcação da artéria basilar.
Fig. 20.12 - A imagem cirúrgica mostra que, após rebati-
mento do plano musculocutâneo, o rebordo orbitário deve ser
Abordagem Fronto-orbitozigomática exposto, bem com a fossa temporal e o zigoma em sua exten-
são ântero-medial.
Permite o acesso intra e extradural a tumores que se
estendem da fossa média à fossa posterior, sem a ne-
cessidade da brocagem do ápice petroso (Figs. 20.11 a
20.14). Tumores que se estendem até a fossa infratem-
poral ou pterigopalatina são removíveis após remoção
do assoalho da fossa média entre o forame redondo e a
fissura orbitária superior. Mesmo em tumores com ex-
tensão para a fossa posterior, esta via pode permitir re-
moções radicais seguindo-se apenas o trajeto do tumor,
durante o esvaziamento intratumoral (debulking) (Figs.
20.15 e 20.16).

Fig. 20.13 - O retalho ósseo em sua totalidade pode ser feito


em bloco único ou em duas partes.

Fig. 20.11– As figuras cirúrgicas demonstram o posiciona- Fig. 20.14 - Após abertura dural com a prévia retirada do
mento da cabeça defetida e pouco rodada. A incisão na pele de retalho fronto-orbitozigomático, pode-se conseguir uma expo-
ve ser ampla e centrada no ptério. sição rasante da fossa temporal.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Abordagem Retrossigmóideo ou Suboccipital


Unilateral
Está relacionada a tumores localizados predomi-
nantemente na fossa posterior, tipo P ou MP. Esse aces-
so será mais bem discutido em outros capítulos. A in-
cisão retromastóidea deve ter como orientação a linha
tangente à porção inferior da órbita ao meato acústico
interno e, perpendicular a esta, uma linha longitudinal
tangente à porção lateral da mastóide (Fig. 20.17). A
Fig. 20.18 mostra esquematicamente que a exposição
do seio transverso e sigmóideo deve ser obtida para se
efetuar uma craniectomia ou craniotomia bem ampla,
que possa expor a superfície petrosa do cerebelo em
toda sua extensão, além de permitir acesso à porção
inferior da cisterna do ângulo pontocerebelar, para
drenagem de líquido cefalorraquidiano antes de se
iniciar a resseção do tumor mais acima. Deve-se fazer
uma retração do cerebelo e expor as porções média
e superior da cisterna do ângulo pontocerebelar e a
superfíe externa do tumor, na fossa posterior já em
situação intradural (Fig. 20.19).
As ressonâncias expressas pelas imagens nas Figs.
20.20 e 20.21 demonstram um tumor multilobulado,
com predomínio em fossa posterior, em paciente sem
Fig. 20.15 - A ressonância magnética pré-operatória mostra déficit de audição e sem paresia facial, apresentan-
tumor cístico, que progride até fossa média. do somente dor trigeminal em território de V1 e V2.
A remoção total pode ser conseguida por essa via por
meio de aspiração ultra-sônica e retirada em peque-
nos pedaços (piece meal) (Figs. 20.22 e 20.23).

Fig. 20.16 - A ressonância magnética mostra a remoção Fig. 20.17 - A figura cirúrgica mostra a incisão para expo-
total do tumor utilizando-se a via fronto-orbitozigomática. sição da região retromastóidea.

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20 – Tratamento Cirúrgico dos Schwanomas do Nervo Trigêmeo

Fig. 20.18 - A craniectomia retromastóidea deve expor os Fig. 20.21 - A ressonância magnética do encéfalo em corte
seios transverso e sigmóideo, e a incisão dural (em tracejado) coronal, com gadolínio, mostra a extensão do schwanoma em
deve ser rente à margem interna dos seios citados. toda a cisterna do ângulo pontocerebelar.

Fig. 20.19 - O desenho esquemático mostra que, após


abertura dural, o tumor (Sch) encontra-se na porção superior
da cisterna do ângulo pontocerebelar, próxima à veia petrosa Fig. 20.22 - A ressonância magnética do encéfalo, em corte
superior ou Dandy (VP). Deve-se retrair o cerebelo (Ce) com axial, mostra a ressecção total pela via retromastóidea.
espátulas autostáticas, e as estruturas neurovasculares devem
ser identificadas. A porção inferior da cisterna do ângulo pon-
tocerebelar deve ser drenada a fim de se diminuir a tensão do
cerebelo durante a sua retração.

Fig. 20.20 - A ressonância magnética do encéfalo em corte axial, Fig. 20.23 - A ressonância magnética do encéfalo, em corte
com gadolínio, mostra a extensão do tumor para a fossa posterior. coronal, mostra a total remoção do schwanoma.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Abordagem Combinada Subtemporal


Pré-sigmóidea
É indicada para tumores muito volumosos exten-
sivos à fossa média e fossa posterior10,14. Essa abor-
dagem será mais bem discutida em outros capítulos,
uma vez que não é a que preconizamos para via in-
tradural. As Figs. 20.24 a 20.26 identificam os passos
necessários e as dificuldades técnicas do acesso. A
Fig. 20.27 mostra ressonâncias pré e pós-operatórias
de casos cirúrgicos em que se usou a via combinada.

Fig. 20.26 - Após a abertura dural, o tumor (Sch) pode ser


identificado na porção superior da cisterna do ângulo ponto-
cerebelar, junto ao tronco cerebral (Tr). Note que, no acesso
pré-sigmóideo, o seio petroso é ligado (SP). O tentório (Te)
deve ser aberto com bisturi de lâmina 16 ou 11, tomando-se o
devido cuidado com o nervo troclear.
Fig. 20.24 - O acesso combinado é mostrado em tracejado A B
e identifica a extensão das fossas média (FM) e posterior (FP).
O músculo temporal encontra-se rebatido caudalmente (Mte).
A mastóide é identificada por Ms.

Fig. 20.27 - (A) Ressonância magnética do encefálo pré-


operatória mostra tumor em fossa posterior, que se estende à
fossa média e seio cavernoso, que contrasta com gadolínio.
(B) A ressonância magnética pós-operatória mostra que, após a
utilização da via combinada, conseguiu-se uma remoção par-
cial, restando tumor no seio cavernoso.

A via extradural, ou pilling de fossa média, con-


siste em via extremamente anatômica e permite aces-
sar estruturas vasculonervosas na sua porção extra-
dural, bem como abordar diretamente o neurinoma
de trigêmeo no cavo de Meckel. Recentemente a via
extradural está sendo extremamente utilizada para
Fig. 20.25 - O esquema mostra que, após abertura do ten- tumores extradurais com extensão intradural11, le-
tório (Ten), o tumor na fossa média pode ser visualizado, e a sões do gânglio de Gasser e pequenas lesões da fossa
remoção deve se iniciar na porção intradural situada na FP e posterior em combinação com acesso transpetroso12.
na porção infradural na fossa média (FM); os nervos cranianos
são representados por IV, V, VI, VII, VIII, IX, X, e o tronco O acesso transpetroso e o acesso à fossa média po-
cerebral Tr. Visualizam-se o lobo temporal (Te) e o seio sig- dem ser vistos na dissecação anatômica exposta na
móideo na outra extremidade (Si). Fig. 20.28.

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20 – Tratamento Cirúrgico dos Schwanomas do Nervo Trigêmeo

Fig. 20.28 - A dissecção e exposição do espaço extradural,


a que se denomina pilling da fossa média, podem ser visua-
lizadas nesta dissecação anatômica, e a transição para fossa
posterior pode ser identificada pela pinça. À direita, pode-se
identificar V3 com sua entrada no forame oval junto ao cavo
de Meckel.
Técnica Microcirúrgica
Consiste no esvaziamento subcapsular interno
com aspirador ultra-sônico, ou mesmo em pequenos
pedaços, protegendo-se os nervos oculomotor, tro-
clear, abducente, facial e esteato-acústico, seguido Fig. 20.30 - A exposição com maior aumento mostra que
por dissecação cuidadosa da cápsula das estruturas a dura-máter está adelgaçada e no ponto de maior afilamento
adjacentes10,15. As Figs. 20.29 a 20.31 demonstram a deve ser aberta microcirurgicamente.
seqüência cirúrgica necessária para identificar o tu-
mor no espaço de Meckel.

Fig. 20.29 - A exposição cirúrgica por via intradural de-


monstra a superfície dos lobos temporal e frontal após abertu- Fig. 20.31 - A abertura da dura-máter da fossa média sobre
ra da cisteran sylviana em uma via fronto-orbitozigomática, a a região do cavo de Meckel demonstra o tumor em maior au-
entrada do terceiro nervo no teto do seio cavernoso no triân- mento, e este deve ser retirado em pequenos pedaços ou com
gulo do nervo oculomotor e artéria carótida e o segmento co- aspiração ultra-sônica.
municante posterior. A dura-máter da fossa média está abaula-
da, pois o schwanoma encontra-se em plano infradural.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Caso Ilustrativo I
Paciente de 55 anos, do sexo feminino, mostrava atrofia do músculo temporal esquerdo, cefaléia orbitária. A RNM em cortes A
e B mostra tumor exofítico, que se estende do seio cavernoso até fossa média, heterogêneo, com grande vascularização, como
pode-se ver em C. A imagem em D mostra tomografia pós-operatória com contraste revelando remoção adequada. A via de
acesso utilizada foi o pilling de fossa média com retirada da clinóide por via extradural.

A B C D

Caso Ilustrativo II
Paciente de 54 anos, do sexo feminino, mostrava fraqueza do músculo temporal esquerdo, cefaléia orbitária e diplopia. A resso-
nância do encéfalo em cortes A e B mostra tumor exofítico cístico, que se estende do seio cavernoso até a fossa média. A imagem
em C mostra RNM pós-operatória com contraste e remoção adequada. A angiografia mostra tumor pouco vascularizado em D.
A via de acesso utilizada foi o pilling de fossa média, com retirada da clinóide por via extradural. Vemos em E e F, respectiva-
mente, a craniotomia utilizada e a remoção do tumor em bloco na fossa média. Em G verificamos a hemostasia completa. A
imagem H mostra a monitoração por potencial evocado da musculatura ocular extrínseca, imprescindível para o procedimento
em questão.

A B C D

E F G H

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20 – Tratamento Cirúrgico dos Schwanomas do Nervo Trigêmeo

Caso Ilustrativo III


Paciente de 44 anos, do sexo masculino, com diplopia e perda auditiva, apresentou atrofia temporal ao exame neurológico do
VI nervo à esquerda (A). A ressonância pré-operatória mostrava tumor que se estendia da fossa média até a fossa posterior em
formato típico de ampulheta, compatível com schwanoma de trigêmeo (B). Foi submetido à abordagem combinada pela fossa
média (acesso subtemporal), visível em C e pela fossa posterior (acesso pré-sigmóide), visível em D, com ressecção adequada do
tumor, como se vê na ressonância pós-operatória (E).

A B C D

COMPLICAÇÕES 4. Bordi L, Compton J, Symon L. Trigeminal neuroma.


Surg Neurol. 1989;31:272-76.
A mortalidade cirúrgica por ressecção do schwa- 5. Hedeman LS, Lewinsky BS, Lochridge GK, et al. Pri-
noma de trigêmeo tem decrescido a aproximadamen- mary malignant schwannoma of Gasserian ganglion.
te 2%4,13,14. Remoção subtotal foi relatada como causa Report of two cases. J Neurosurg. 1978;48:279-83.
de sangramento do leito tumoral, em conseqüência 6. Jefferson G. The trigeminal neurinomas with remarks
da alta morbidade e mortalidade e elevado índice de on malignant invasion of the Gasserian ganglion.
recorrência13. As principais complicações são defor- Clin Neurosurg. 1955;1:11-54.
midades faciais decorrentes do acesso inadequado, 7. Krisht AF. Transcavernous approach to diseases of
infecções do retalho cirúrgico pelo tempo prolonga- anterior upper third of posterior fossa. Neurosurg Fo-
do, fístulas liquóricas e meningites pós-operatórias, cus. 2005;19(2):E2.
déficits de nervos cranianos, em especial III, V e IV1. 8. Levy WJ, Ansbacher L, Byer J, et al. Primary ma-
Hematomas de leito cirúrgico podem ser encontrados lignant nerve sheath tumor of Gasserian ganglion:
principalmente na via intradural e hematomas extra- report of two cases. Neurosurgery. 1983;13:572-76.
durais, bem como lesão do complexo de Labbé, na 9. Machado AG, Aguiar PH, Marino Jr R. Pathological
via extradural. laugher in a patient with trigeminal neurinoma. Arq
Neuropsiquiatr. 2002;60:1000-2.
10. Mc Cormick PC, Bello JA, Post KD. Trigeminal
Referências Bibliográficas schwannoma: surgical series of 14 patients and a re-
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nomas: removal of dumbbell – shaped tumors through 11. Osborn AG. Diagnostic neuroradiology. St Louis:
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2. Arseni C, Dumitrescu L, Constantinescu A. Neurinoma Non meningeal tumours of the cavernous sinus: a sur-
of the trigeminal nerve. Surg Neurol. 1975;4:497-503. gical analysis. J Clin Neurosci. 2006;13(6):626-35.
3. Benrami M, Dafiri R. What is your diagnosis? 14. Pollack IF, Sekhar LN, Jannetta PJ, Janecka IP.
Schwannoma of the trigeminal nerve. J Radiol. Neurilemmomas of the trigeminal nerve. J Neuro-
2005;86(7-8):969-71. surg. 1989;70:737-45.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

15. Samii M, Migliori MM, Tatagiba M, Babu R. Surgi- 17. Youssef S, Kim EY, Azis KM, Hemida K, Keller JT,
cal treatment of trigeminal schwannomas. J Neuro- Van Loveren HR. The subtemporal interdural ap-
surg. 1995;82:711-8. proach to Dumbbell-shaped trigeminal schwannomas.
16. Yoshida K, Kawase T. Trigeminal neurinomas ex- Cadaveric prosection. Neurosurgery. 2006;59(Suppl
tending into multiple fossae: surgical methods and 2)4: ONS270-8.
review of literature. J Neurosurg. 1999;91:202-11

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21
Tratamento Cirúrgico dos
Meningiomas do Forame Magno
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Ricardo Fontes
Gustavo Rassier Isolan

INTRODUÇÃO apud George et al.9 Desde então, relatos de casos iso-


lados e pequenas séries têm sido descritos.

A
cirurgia do forame magno tem sido atualmen-
te alvo de grande interesse devido aos acessos Em estudo de 102 casos de tumores extra-axiais
anatômicos e mais seguros à porção anterior e benignos do forame magno, operados de 1924 a 1982,
lateral do forame magno1-4. Meyer et al. encontraram 78 meningiomas, 23 neuro-
Meningiomas do forame magno constituem um gran- fibromas e 1 teratoma10.
de desafio aos neurocirurgiões mais experientes. A loca- Na série da Sociedade de Neurocirurgia de língua
lização não favorável desses tumores, próximos às estru- francesa9, em 1993, foram analisados 230 casos de tu-
turas vasculares e neurais importantes, poderia tornar a mores extramedulares dessa região, entre os quais 106
ressecção radical difícil e, muitas vezes, impossível. eram meningiomas, 49 neurinomas, 28 cordomas, 32
As abordagens a esses tumores compreendem tumores ósseos (19 primários e 13 metástases) e 15
acessos transorais até acessos posteriores da linha casos considerados como tumores incomuns (4 me-
mediana. O objetivo da abordagem é sempre promo- lanomas, 3 hemangioblastomas, 3 tumores dermóides
ver uma ressecção o mais ampla possível com míni- ou epidermóides, 2 ependimomas, 1 cavernoma, 1 an-
mas seqüelas, e sem efeitos sobre a estabilidade da giomiolipoma e 1 granuloma de colesterol).
junção craniocervical.
Geralmente a base de implantação e origem dos EPIDEMIOLOGIA
meningiomas na região do forame magno compreen-
de a dura-máter ântero-lateral5. A dura-máter em tor- A idade média dos pacientes tem sido de 47 anos
no do forame magno é nutrida por ramos meníngeos de idade, com predominância do sexo feminino11 de
da artéria faríngea ascendente e artérias occipitais. O 1,5/1. Em crianças foram descritos anteriormente e
suprimento sangüíneo dos tumores dessa região de- alguns como grandes massas nesta região12,13.
pende destas artérias3.
Os meningiomas da transição craniocervical cons- QUADRO CLÍNICO
tituem 1,2% a 3,2% dos meningiomas intracranianos
O sintoma mais freqüente observado nos pacien-
e intra-raquianos6,7. A série de Olivercrona apud Cas-
tes acometidos por tumores da transição craniocervi-
tellano, Ruggiero mostrou uma percentagem de 4%
cal é a cervicalgia refratária à medicação analgésica,
dos tumores de fossa posterior, seguido por meningio-
mas da porção posterior do osso petroso, 42%; tentó- antiinflamatórios e exercícios fisioterápicos11,14,15.
rio, 30%; clivo 11%; convexidade cerebelar, 10%8. A “síndrome do forame magno” é constituída por:
dor cervicooccipital, rigidez nucal, fraqueza muscu-
lar das extremidades superiores e membros inferiores
HISTÓRICO e alteração da marcha, estando normalmente associa-
O primeiro relato de ressecção de tumor do fora- da à neoplasia na transição craniocervical e coluna
me magno data de 1874 e foi descrito por Hallopeau, cervical superior11.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

A dor facial crônica pode ser um sintoma associa- Compressões extra-axiais anteriores com defor-
do, embora raramente descrito16, ou também raro sob mação da porção ventral da medula e ponte podem
a forma de hemorragia subaracnóidea por sangramen- ser facilmente visíveis por meio de ressonância nu-
to do tumor17. clear magnética (RNM) da transição5,24,25 (Fig. 21.1).
A ausência, no quadro inicial, de rouquidão e di- Atualmente o planejamento cirúrgico dessas lesões
ficuldade para deglutir, sintomas comuns em tumores ocupando a região do forame magno na sua face ven-
intramedulares da transição bulbomedular e pontobul- tral deve ser ponderado, tendo em mãos as imagens
bar18, pode nos ajudar na diferenciação das lesões ex- de tomografia computadorizada reconstruídas em três
tra-axiais da transição craniocervical das intra-axiais. dimensões e com uso de contraste iodado (Fig. 21.2).
A disestesia em mãos pode ser freqüente sintoma Assim, pode-se verificar a relação do tumor com o
sensitivo10,15,18. tubérculo jugular, bem como sua posição em relação
O intervalo médio de aparecimento dos sintomas ao côndilo occipital26.
e o diagnóstico do tumor é cerca de 2 anos e 3 meses, A angiografia digital é imprescindível para se
e varia de 6 a 96 meses10,19. averiguar a natureza vascular do tumor, bem como
Os meningiomas de grande volume situados na as artérias nutrientes e sua relação com estruturas de
face ventral do forame magno mostram-se com dete- drenagem venosa26 (Fig. 21.3). O conhecimento da
rioração neurológica mais grave e rapidamente pro- posição das artérias vertebrais e seus ramos é funda-
gressiva6. mental para o planejamento cirúrgico, todavia a em-
Muitas vezes o quadro neurológico pode ser su- bolização pré-operatória de neoplasias nessa região
perponível ao quadro neurológico da esclerose late- está sendo cada vez mais abandonada5.
ral amiotrófica, o que torna necessárias provas fun-
cionais eletrofisiológicas e exames de imagem para
elucidar o diagnóstico diferencial20. Outras doenças
neurológicas que podem ser incluídas no diagnóstico
diferencial são esclerose múltipla, espôndilo-discoar-
trose cervical, tumores intramedulares, siringomielia,
síndrome do túnel do carpo, e mesmo hidrocefalia de
pressão normal7.
O exame neurológico normalmente revela hiper-
reflexia, déficit motor em mãos e braços, sinal de
Babinski, marcha espástica, alterações sensitivas pro-
fundas e/ou superficiais e quase sempre envolvimento
do XI nervo craniano10, além da atrofia de mão, que Fig. 21.1 – RNM mostrando tumor extra-axial ventral e
pode ser um sinal difícil de se notar, mas que deve ser ponte e bulbo no nível do forame magno.
sempre pesquisada bilateralmente21.
Apesar desses achados, aproximadamente 40% dos
pacientes podem ter o exame neurológico normal10.
Quadros de tetraparesia e paraparesia espástica
com reflexos vivos e/ou exaltados de evolução pro-
gressiva devem ser avaliados sempre por meio de
ressonância magnética da coluna cervical e transição
craniocervical para se excluir doenças degenerativas
desmielinizantes, como esclerose múltipla, tetrapare-
sia espástica tropical progressiva, tumores intramedu-
lares e tumores extra-axiais da junção craniocervical22.
As imagens em T2 oferecem maior sensibilidade na
detecção de lesões em placa.

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico de tumores extra-axiais da junção
craniocervical era difícil antes da era da ressonância
magnética, e muitas vezes tardio, oferecendo erros de
interpretação e falsos diagnósticos, quando se anali-
savam tomografias computadorizadas e exame mielo- Fig. 21.2 – Tomografia computadorizada de crânio mostran-
do lesão no nível de forame magno e seu componente cístico
gráfico seguido de tomografia23. posterior.

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21 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas do Forame Magno

Fig. 21.4 – Esquema anatômico mostra, após dissecação dos


músculos da região suboccipital, a ponta da mastóide, o nervo
facial à frente da mastóide, as lâminas de C2 e o arco posterior
de C1, bem como a artéria vertebral na porção lateral do arco
de C1.

Fig. 21.3 – Angiografia digital demonstra afastamento pos-


terior da artéria basilar e compressão do tronco cerebral no
nível do forame magno com tumor de pouca vascularização.

TRATAMENTO MICROCIRÚRGICO
Anatomia Microcirúrgica
Os limites do forame magno compreendem, na
sua porção anterior, o terço inferior do clivo com o
limite superior da junção vertebrobasilar e o sulco
bulbo pontino, o arco anterior do atlas e o processo
odontóide. Posteriormente, a ponta do osso occipital
e o arco posterior do atlas com o limite inferior na li-
nha superior da lâmina de C2. Lateralmente, têm-se o
tubérculo jugular, o côndilo occipital e a massa lateral
do atlas, incluindo as articulações do côndilo occipi- Fig. 21.5 – Esquema anatômico mostra, após dissecação
dos músculos da região suboccipital, craniectomia suboccipi-
tal com C1 e de C1-C211,27 (Figs. 21.4 e 21.5). tal unilateral e brocagem do côndilo occipital e da ponte da
mastóide. Pode-se identificar a entrada do nervo hipoglosso
no canal do hipoglosso no côndilo remanescente, a artéria ver-
Classificação Anatômica tebral e sua entrada na fossa posterior e o tubérculo jugular
Os meningiomas no forame magno são classifica- parcialmente brocado.
dos, de acordo com sua localização anatômica em:
anteriores, ântero-laterais, dorso-laterais e posterio-
res. George et al. encontraram 70 meningiomas em
Classificação Baseada na Orientação da
posição anterior, 142 casos em posição lateral, poste- Expansão
rior em 24 casos na série de 230 casos da Sociedade De acordo com sua orientação de crescimento,
de Neurocirurgia de língua francesa27. pode-se classificar3:
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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

• Cranioespihal: originário da dura-máter ante-


rior do forame e cresce em direção caudal ao
forame magno.
• Espinhocranial: originário da região cervical
superior em direção à cisterna cerebelar
Os acessos cirúrgicos são escolhidos segundo a
posição do tumor, com o objetivo de se evitar rotação
do tronco cerebral, torção ou retração para se conse-
guir uma exposição adequada e conseqüente ressec-
ção apropriada28,29.

Tipos de Tratamento Cirúrgico


A cirurgia dos tumores localizados no forame
magno está indicada quando há piora dos sintomas
neurológicos5.
O conhecimento anatômico é fundamental e as es-
truturas venosas e arteriais devem ser reconhecidas,
expostas e preservadas. A estrutura óssea não deve
atrapalhar a exposição e, sempre que necessário, o côn-
dilo occipital, túberculo jugular e massa lateral do atlas
devem ser cogitados para ressecção1,30,31 (Fig. 21.8). Fig. 21.6 – Tomografia de crânio helicoidal com reconstru-
O uso de técnica microcirúrgica e terapia adicional ção em 3D, pós-operatória de ressecção de um meningioma
com laser é fundamental segundo alguns autores14,32. do forame magno, mostra a área óssea após a craniectomia e
O Nd-YAG laser permite uma desnaturação precisa brocagem total do côndilo e o ângulo de visualização.
das proteínas do tecido neoplásico sem haver descon-
trole de sua ação na profundidade, adequada delinea­
ção do tumor em relação ao tecido cerebral normal
devido às propriedades absortivas diferentes entre
os tecidos, além de excelente coagulação de tumores
altamente vascularizados e retração conseqüente do
tecido neoplásico14.
A vascularização do tumor deve ser interrompida
por meio da coagulação da sua inserção, previamente
vista por meio de angiografia pré-operatória. O es-
vaziamento do tumor, independentemente do acesso
cirúrgico prévio, deve, na medida do possível, ser
realizado por meio de aspirador ultra-sônico e coa-
gulação bipolar. Durante a dissecação aracnóidea, o
tumor deve ser coagulado para se obter uma retração
e ser dividido em dois pólos por entre os nervos cra-
nianos (Fig. 21.9). O esvaziamento do tumor antes da
dissecação de suas margens facilita a técnica micro-
cirúrgica. A artéria espinal anterior está normalmente
aderida à porção posterior do tumor e deve ser disse-
cada no espaço subaracnóideo cuidadosamente.
O XI nervo craniano tem trajeto longitudinal des-
cendente e se adere à margem lateral do tumor, de-
vendo ser dissecado ao longo de seu trajeto3 (Figs.
21.10 a 21.12). A artéria vertebral é freqüentemente
deslocada para trás e lateralmente, o que aumenta a
distância entre as duas artérias vertebrais, e pode ser
totalmente envolvida pelo tumor no seu ponto de en-
trada na fossa posterior. A artéria cerebelar póstero-
inferior é normalmente deslocada para cima3. A arté- Fig. 21.7 – O desenho mostra a área óssea a ser resseca da
ria vertebral é transposta de acordo com sua posição, após brocagem do côndilo occipital e craniectomia suboccipi-
deslocamento pelo tumor e grau de envolvimento3. tal, bem como o ângulo de visualização.

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21 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas do Forame Magno

Fig. 21.8 – Esquema anatômico demonstra que a exposição


ampla do forame magno pode ser conseguida com brocagem
do côndilo e da massa lateral do atlas tanto quanto o necessá-
rio para se poder individualizar a artéria vertebral e sua entra-
da na fossa posterior, bem como ter acesso amplo à face lateral
do tronco cerebral.

Fig. 21.10 – A foto cirúrgica mostra a relação do tumor com


os nervos bulbares baixos e com o nervo espinhal acessório,
o que desce em sentido longitudinal. Os dois pólos do tumor
devem ser identificados após microdissecação.

NC
IX, X, XI

NC XII

NC XI
Fig. 21.9 – A dissecação microcirúrgica deve se iniciar pela
coagulação bipolar da aferência vascular, esvaziamento do tu-
mor com aspirador ultra-sônico ou em pequenos pedaços. Fig. 21.11 – O desenho mostra uma visão caudocranial do
acesso, da relação do tumor com os nervos identificados na
figura. NC = nervo craniano.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 21.12 – Após remoção radical do tumor, pode-se visua­


lizar o nervo acessório espinhal com seu trajeto longitudinal, Fig. 21.13 – A RNM mostra lesão póstero-lateral direita,
o nervo hipoglosso e suas radículas e a artéria vertebral se comprimindo tronco cerebral no nível do forame magno, ima-
dirigindo da porção lateral para a anterior medial. gem em T1 com gadolínio.

O uso de potencial evocado somatossensitivo é


aconselhável desde o posicionamento do pólo cefáli-
co, detectando compressões cervicais por osteófitos e
também durante a manipulação cirúrgica evitando le-
sões contínuas às vias piramidais e sensitivas33. O uso
do PES utilizando-se os nervos mediano e tibial pode
nos ajudar a detectar a variação de potenciais intra-
operatórios e aqueles provenientes do tronco cerebral
(P14 obtido com transdutor cutâneo na porção mé-
dia da fronte à nasofaringe) e da medula espinhal (N
13 obtido com transdutor cutâneo na porção inferior
do pescoço), superiores aos obtidos pelos potenciais
convencionais por monitoração cervical “N13”34.
Monitoração direta de nervos cranianos é uma al-
ternativa de controle dos potenciais de núcleos de
nervos intratronco cerebral e da manipulação desses
nervos. Assim, eletrodos inseridos para monitoração
intra-operatória auditiva devem ser providenciados,
bem como monitoração por eletromiografia (EMG)
dos nervos VII, X, XI e XII3.

Vias de Acesso
Dorsal Mediana
Para os meningiomas localizados na porção pos- Fig. 21.14 – TC de controle pós-operatória com contraste
terior, na linha média, a craniectomia suboccipital iodado de outro caso semelhante ao da Fig. 21.13 revela res-
mediana, com ampla abertura da porção posterior do secção radical do tumor e tronco cerebral absolutamente livre
forame magno, e laminectomia das primeiras cervi- de qualquer compressão.
cais são suficientes para dissecação e ressecção des-
ses meningiomas posteriores (Figs. 21.13 a 21.16)35.

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21 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas do Forame Magno

do Samii et al., é o que determina o grau de resseca-


bilidade. Os meningiomas em placa e aqueles com
importante aderência à aracnóide devem ser tratados
com extrema cautela durante a ressecção. A mortali-
dade por essa via pode alcançar 3,5%7.
Para Cantore et al.36, Samii et al.29 e Yamakami
et al.37, a abordagem que melhor permite acesso para
todos os tipos de meningiomas do forame magno, in-
clusive os ventrais, é a suboccipital lateral, e a neces-
sidade de se ampliar a extensão óssea dependerá da
necessidade observada durante o ato cirúrgico, sendo
infreqüente a real necessidade de se retirar todo o côn-
dilo occipital e/ou o tubérculo jugular (Figs. 21.17 a
21.21). Se houver brocagem de todo o côndilo, deve-
se proceder à fusão entre o osso occipital e a lâmina
acessível de C2 e/ou C3 e manter o paciente com Halo
Vest para estabilizar a fusão3.
A instrumentação nessa área deve ser feita com
titânio para se minimizar os artefatos adquiridos em
Fig. 21.15 – Foto cirúrgica mostrando craniotomia de fossa imagens por meio de ressonância magnética3 (Figs.
poserior e ressecção do arco posterior de C1 para acesso de me- 21.22 e 21.23).
ningiomas do forame magno póstero-laterais e posteriores. Abordagens laterais e posteriores para meningio-
mas localizados na porção ventrolateral na região do
forame magno, apesar de sua simplicidade, oferecem
exposição pobre e requerem retração ou rotação da jun-
ção espinomedular38. A incisão em “bastão de hockey”,
seguida de craniectomia suboccipital (Figs. 21.24 e
21.25) e laminectomia cervical superior, é indicada se
o tumor se estender ântero-lateralmente ou em direção
anterior ao forame jugular ou ângulo pontocerebelar31.

Fig. 21.16 – Foto cirúrgica mostrando o retalho ósseo da


craniotomia de fossa posterior clássica (Fig. 21.15).

Dorsolateral ou Suboccipital Lateral


Samii et al. acreditam que a abordagem padroni-
zada mediana ou suboccipital lateral com abertura do
forame magno e laminectomia dos segmentos cer-
vicais envolvidos são suficientes para se ressecar a
grande maioria dos tumores desta região29. Somente
em 7 casos da sua casuística, de 38 pacientes porta-
dores de 40 meningiomas, a brocagem do terço pos-
terior do côndilo occipital foi necessária. Doze de 15
meningiomas espinocraniais e 13 de 25 meningiomas
craniocervicais em sua casuística foram ressecados
totalmente, havendo 0% de mortalidade, 30% de
complicações pós-operatórias, sendo necessária a ins-
talação de derivação ventriculoperitoneal em apenas Fig. 21.17 – O desenho mostra a linha de osteotomia em
1 caso. A relação do tumor com estruturas vizinhas, tracejado a ser realizada para abordagem extremo-lateral. Ve
por exemplo a artéria vertebral em particular, segun- = artéria vertebral.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 21.18 – O desenho mostra esquematicamente, após a Fig. 21.20 – O desenho mostra que, após abertura dural me-
craniectomia suboccipital, brocagem do côndilo occipital e re- dialmente à entrada da artéria vertebral (Ve), o tumor pode ser
tirada do arco posterior de C1. A entrada da artéria vertebral facilmente identificado à frente e lateralmente ao tronco cere-
na fossa posterior pode ser identificada. bral (TR), sendo necessário para melhor visualização o uso da
espátula afastando-se o cerebelo (Ce) no sentido caudocranial.

Fig. 21.19 – Foto cirúrgica mostra o campo cirúrgico de


acesso extremo-lateral, após brocagem da massa lateral de C1
e côndilo occipital.

O posicionamento preferencial da via dorsolateral


é a posição semi-sentada, todavia deve-se sempre es-
tar preparado para evitar embolia aérea, complicação Fig. 21.21 – A artéria vertebral (Ve) deve ser identificada no
não infreqüente nesse tipo de abordagem39,40. Alguns seu trajeto intradural e separada do tumor em sua extensão la-
teral. O esvaziamento intratumoral deve ser iniciado para que
autores preferem a posição em pronação para esse se possa luxar o tumor lenta e progressivamente e se dissecar
tipo de acesso3,5. os nervos aderidos a sua pseudocápsula

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Fig. 21.22 – A figura mostra posicionamento paralelo das Fig. 21.24 – O desenho mostra incisão em forma de J inver-
placas de titânio para inserção dos parafusos de massa lateral tido ou em bastão de Hockey, utilizada para se expor ampla-
nos pacientes com instabilidade occipitocervical pós-broca- mente a musculatura cervico-suboccipital e permitir a abor-
gem total do côndilo. dagem extremo-lateral.

Fig. 21.25 – A foto cirúrgica mostra a incisão já cicatrizada


em paciente submetido a abordagem extremo-lateral.
Fig. 21.23 – Mostra-se que a fixação com os parafusos da
massa lateral pode ser complementada com amarria com ca-
bos de titânio. de fístula liquórica é muito importante nesse tipo de
abordagem21.
A abordagem exige traqueostomia prévia, e deve-
se tentar fechar o defeito dural por meio de colas bio-
Transoral
lógicas, fáscia muscular e Gelfoam®, colocados sobre
A abordagem direta transoral para as lesões ante- a falha dural21,41,42. Se houver suspeita intra-operatória
riores no forame magno, sem grandes expansões late- de instabilidade iatrogênica da coluna cervical, deve-
rais é muito eficiente, todavia, quando utilizada para se proceder à fusão posterior e utilizar Halo-Vest21.
tumores nessa posição, mas com grande extensão uni As artérias vertebrais e nervos cranianos nesse acesso
ou bilateral, é muito limitada oferecendo poucas pos- não estão interpostos entre o cirurgião e o tumor, fa-
sibilidades de ressecção total18,38. Além disso, o risco cilitando a ressecção35,41.
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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Ântero-lateral extrafaríngea, parafaríngea e


retrofaríngea
A abordagem ântero-lateral extrafaríngea é restri-
tiva quando se necessita alcançar a porção superior
do espaço escondido pelo côndilo occipital38 (Fig.
21.26). Acesso semelhante, conhecido como para-
retrofaríngeo, tem a mesma limitação anatômica35.

Extremo-lateral
O acesso mais lateral a essa região pode ser defini-
do por duas vias principais43,44:
• Extremo-lateral retrocondilar
• Extremo-lateral transcondilar (Figs. 21.27 e
21.28).
A abordagem extremo-lateral oferece excelente
Fig. 21.27 – RNM de crânio com contraste mostra tumor
exposição, tendo como obstáculos anatômicos a por- ântero-lateral que contrasta homogeneamente e desloca o
ção horizontal da artéria vertebral e o côndilo occipi- tronco cerebral lateralmente.
tal com sua articulação com a massa lateral do atlas.
Essa via requer a exposição e o controle da artéria ver-
tebral e do seio sigmóide e, se necessária ampliação
do campo cirúrgico, procede-se à ressecção da porção
inferior do petroso27. Deve ser usada em tumores situ-
ados na face ventral e naqueles recidivados, em que a
abordagem por via posterior tiver sido ineficiente45.
Na casuística de Kratimenos e Crockard38, houve
ressecção total em 12 de 15 casos e 3 subtotais, sem
comprometimento da estabilidade da coluna cervical,
nem complicações com fístula liquórica ou infecções
de ferida cirúrgica. George et al. analisaram 40 por-
tadores de meningiomas de forame magno, e o índice
de ressecção completa foi de 94%, havendo melhora
das condições clínicas em 90%, inalterada em 2,5% e
piora em 7,5% dos casos e 3 casos de óbito, sendo 2
por embolia aérea46.
Fig. 21.28 – TC de crânio de controle de outro caso com
meningioma ântero-lateral mostra ressecção total do menin-
gioma com a preservação do tronco cerebral, por via transcon-
dilar. A ressecção total do côndilo occipital e o ângulo de visão
que esta propicia permitem a visualização da porção anterior
do forme magno.

Extremo-lateral Combinada
Vários autores, contudo, defendem uma aborda-
gem mais ampla, extremo-lateral combinada, infra e
supratentorial por exposição e visão superior e infe-
rior das estruturas vasculares e neurais, o que visa di-
minuir a mortalidade por lesão vascular e dificuldade
na hemostasia4.

Extremo-lateral Transcondilar
Fig. 21.26 – Dissecação anatômica mostra acesso anterior à A abordagem dorsolateral, suboccipital, transcon-
coluna cervical alta, abaixo do ângulo mandibular, com eleva-
ção da glandular submandibular, mostrando C3 e C2 e acesso dilar à porção inferior do clivo e porção anterior da
limitado a lesões mesiais anteriores pequenas. junção craniocervical é outra via que pode ser utiliza-

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21 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas do Forame Magno

da, e a técnica operatória inclui a exposição da artéria ficuldade em deglutição, ambas decorrentes de para-
vertebral a nível de C1 e ressecção parcial do côndilo lisias de pares cranianos baixos, deve-se intensificar a
occipital e massa lateral do atlas, e brocagem extradu- fisioterapia pós-operatória, fazer uso de gastrostomias
ral do tubérculo jugular. Essa via oferece uma visão e traqueostomias, precocemente no pós-operatório3,43.
direta da rima anterior do forame magno sem retra- A mortalidade cirúrgica pode alcançar 11% dos ca-
ção do tronco cerebral43,47-51 (Figs. 21.27 e 21.28). O sos em grandes séries, como a de Guidetti e Spallone6.
tumor freqüentemente desloca a medula para trás e As seqüelas pós-operatórias incluem perda de
para o lado oposto, facilita a exposição e manuseio da função dos pares cranianos baixos, com piora da dis-
porção ventral do tumor3. fagia, tosse e aspiração de alimentos e secreções. O
A real necessidade de retirar o tubérculo jugular e/ tratamento requer fisioterapia, traqueostomia e anas-
ou de se retirar a porção posterior do côndilo occipital tomose traqueoesofágica53,57.
pode ser avaliada pré-operatoriamente por tomogra- A corda vocal paralisada pode ser aproximada com
fia computadorizada e reconstrução de imagens em Gelfoam®, injeção de Teflon® e medianização com tu-
três dimensões26. As principais complicações dessa bos de silicone (Silastic®) para se proteger as vias aé-
via são fístula liquórica e piora da paresia dos nervos reas até haver a recuperação do nervo paralisado ou o
cranianos baixos47. paciente aprender a compensar esse déficit3.
A revascularização deve ser cogitada pré-operato- Déficit neurológico tardio pode ser decorrente de
riamente quando, por meio da angiografia, se identi- vasoespasmo das artérias envolvidas na via escolhi-
fica o envolvimento do sistema vertebrobasilar pelo da, e devemos nos disciplinar a evitar acúmulos de
meningioma52. Muitas vezes pela extensão do tumor coágulos nos bordos do campo cirúrgico e evitar o es-
há envolvimento da carótida, sendo necessário enxer- corrimento de sangue durante o fechamento da dura-
to com veia safena invertida, ligando a artéria caróti- máter para o leito cirúrgico proveniente dos planos
da interna até o seguimento M2 ipsilateral43. superficiais do acesso cirúrgico43.
Não há uma abordagem ideal totalmente isenta
TRATAMENTO COMPLEMENTAR OU de riscos perioperatórios, esse estudo anatômico visa
ALTERNATIVO comparar a facilidade de ressecção apresentada por
cada acesso e também dentro da abordagem extremo-
A ressecção microcirúrgica total é o tratamento de lateral, grau de ressecabilidade do côndilo occipital e
escolha para os portadores de meningiomas do fora- benefício ao acesso ao tumor.
me magno, todavia em pacientes em que a ressecção
tumoral tiver sido parcial ou subtotal (tumores resi-
duais), tumores recidivados, a radiocirurgia estereo- Referências Bibliográficas
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21 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas do Forame Magno

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22
Tratamento Cirúrgico dos
Tumores do Forame Jugular
Ricardo Ramina
João Jarney Maniglia
Yvens Barbosa Fernandes
Jorge R. Paschoal
Maurício Coelho Neto
Leopoldo N. Pfeilsticker

INTRODUÇÃO mas e os condrossarcomas, ou de alto grau de malig-


nidade, como os carcinomas e os sarcomas.

O
forame jugular (FJ) é formado pelos ossos
Os sintomas clínicos estão principalmente rela-
occipital e temporal, localiza-se profunda-
cionados às alterações da audição (tinido pulsátil) e
mente, é coberto por músculos do pescoço e
déficits de nervos cranianos bulbares. O advento de
comunica a região cervical alta com a fossa posterior. novos métodos diagnósticos facilita, nos dias atuais,
Através desse forame passam vasos e nervos crania- o diagnóstico, fornecendo até informações precisas
nos. Outras estruturas anatômicas importantes, como quanto ao tipo histológico da lesão.
a artéria carótida interna, o nervo facial e o tronco
A remoção cirúrgica dos tumores do forame ju-
cerebral, apresentam relação direta com o FJ. Tumo-
gular resultava, anteriormente, em uma ressecção
res primários originados das estruturas ósseas, vascu-
parcial associada a importantes déficits neurológicos
lares, nervosas e das meninges dessa região causam
pós-operatórios. Com o desenvolvimento de novas
sintomas típicos e dificuldades cirúrgicas semelhan-
técnicas de cirurgia da base do crânio e a criação de
tes. Tumores de regiões vizinhas, tanto da porção equipes multidisciplinares, tornou-se possível o trata-
extracraniana da base do crânio como da porção in- mento cirúrgico desses tumores com ressecção radi-
tradural, podem comprometer secundariamente o FJ. cal e baixa morbidade.
Essas lesões não devem ser consideradas tumores do
Neste trabalho serão apresentados os achados
FJ, visto que tanto os sintomas clínicos como as difi-
diagnósticos, as possibilidades terapêuticas, a técnica
culdades encontradas no tratamento são diferentes em
cirúrgica empregada em nosso serviço e os resultados
relação aos tumores primários.
do tratamento dos tumores primários do FJ.
As primeiras descrições e definições dos tumores
da região do forame jugular iniciam-se em 19411. Le-
sões vasculares muito sangrantes, comprometendo o ASPECTOS ANATÔMICOS
ouvido, eram conhecidas pelos otologistas, embora A anatomia do FJ é complexa e pouco compreen-
sua verdadeira origem histológica e extensão per- dida. Realizaram-se estudos anatômicos com o obje-
manecessem desconhecidas. Os trabalhos de Guild1 tivo de esclarecer a anatomia cirúrgica desta região3.
e Rosenwasser2 permitiram que se conhecessem as A formação óssea e o formato do FJ, associados aos
reais características dessas neoplasias. numerosos nervos cranianos e canais venosos que
Paragangliomas do FJ, muitas vezes chamados de passam através dele, tornam o entendimento da sua
tumores do glomo jugular, originam-se da camada anatomia cirúrgica particularmente difícil. Para abor-
adventícia do bulbo da veia jugular e constituem-se dagem cirúrgica segura do FJ, é necessário não ape-
na neoplasia primária mais freqüente dessa região. nas um conhecimento preciso da sua anatomia, mas
Schwanomas dos nervos bulbares e meningiomas também de regiões vizinhas, tais como: osso tempo-
são os outros tumores benignos mais comuns do FJ. ral, fossa posterior e região cervical alta.
Neoplasias malignas encontradas nessa região podem O FJ, localizado entre os ossos occipital e tempo-
possuir baixo grau de malignidade, como os cordo- ral, forma-se ao redor do seio sigmóideo, bulbo da

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

veia jugular e seio petroso inferior. Estruturas vas- XI nervo craniano acarreta atrofia do músculo ester-
culares (artérias e veias) e nervosas (nervos crania- nocleidomastóideo, que freqüentemente não é notada
nos) passam através do forame jugular. As estruturas pelo paciente, e também do músculo trapézio, que
vasculares são: seio sigmóideo, bulbo da veia jugu- causa maior desconforto, fazendo com que o paciente
lar, seio petroso inferior e os ramos meníngeos das se queixe mais precocemente. De acordo com nossa
artérias faríngea ascendente e occipital. Os nervos experiência, na maioria das vezes, essas paralisias de
cranianos são: glossofaríngeo, vago e acessório, com nervos cranianos baixos só são notadas pelo paciente
seus respectivos gânglios, ramo timpânico do nervo quando o tumor já atingiu grande volume. Em tumores
glossofaríngeo (nervo de Jacobson) e ramo auricular malignos e alguns meningiomas, os sintomas de para-
do nervo vago (nervo de Arnold). Dura-máter e arac- lisias de nervos cranianos evoluem mais rapidamente,
nóide envolvem a saída dos nervos cranianos do FJ3. causando maior desconforto e levando o paciente a
O FJ é classicamente dividido em duas porções: procurar um diagnóstico mais cedo. Alterações dos
uma nervosa, que contém o nervo glossofaríngeo, o nervos cranianos VII, VIII e XII são mais raras e, na
seio petroso inferior e ramos meníngeos da artéria maioria das vezes, só aparecem em tumores extensos.
faríngea ascendente; e uma porção venosa composta Sinais de hipertensão intracraniana (cefaléia, edema
pelo seio sigmóide, nervos vago e acessório. Kat- de papila e vômitos), bem como hidrocefalia e ataxia,
suta et al.3, em recente estudo da anatomia cirúrgi- ocorrem em lesões que comprimem o tronco cere-
ca, subdividem o FJ em três porções: duas venosas bral. Massa cervical é observada em paragangliomas,
(porção sigmóide e porção petrosa) e uma porção schwanomas e outros tumores com grande extensão
nervosa ou intrajugular. A porção nervosa ou intra- extracraniana.
jugular localiza-se entre as duas porções venosas e A dor cervical é notada particularmente em tumores
contém os nervos acessório, vago e glossofaríngeo. com comportamento agressivo e schwanomas do ner-
Traves de dura-máter delimitam os três comparti- vo IX4. Todos os pacientes com tumores, com sinais
mentos do FJ. de comportamento agressivo em nossa série, apresen-
As artérias carótida interna (porção petrosa) e ver- tavam dor cervical como um dos sintomas iniciais.
tebral estão em íntima relação com o forame jugular,
podendo estar envolvidas nas patologias dessa região. ESTUDOS DE NEUROIMAGEM
A artéria vertebral, em sua porção craniocervical, é dis-
secada durante a abordagem cirúrgica dessa região. Os modernos estudos neurorradiológicos forne-
O nervo facial em sua porção mastóidea e parotí- cem dados importantes relativos à extensão da lesão,
dea, os canais semicirculares, o espaço paralátero-fa- ao comprometimento das estruturas da junção cranio-
ríngeo e a fossa infratemporal guardam estreita rela- cervical, região cervical alta, do ângulo pontocerebe-
ção com o FJ. Um conhecimento preciso da anatomia lar, bem como o envolvimento das artérias carótida
dessas estruturas é muito importante nos acessos ci- interna e vertebral.
rúrgicos ao FJ. Estudos radiológicos simples para a visualização
do forame jugular (posição de Schausse II) atualmen-
te já não são mais realizados, tendo sido suplantados
ASPECTOS CLÍNICOS por exames mais específicos.
Nos casos de paragangliomas, os sintomas clínicos A tomografia computadorizada de alta resolução
mais freqüentes são: tinido unilateral pulsátil; perda permite uma visualização muito mais precisa das es-
auditiva; dores em região do ouvido com sensação truturas ósseas da base do crânio e do ouvido interno
de bloqueio do canal e tonturas. Esses sintomas estão e médio. Calcificações, erosões ósseas e hiperostoses
relacionados com a hipervascularização da lesão e a são bem demonstradas com esse exame. O tumor e
invasão de estruturas vizinhas. Tumores com invasão suas relações com o tecido cerebral e outras estruturas
do ouvido médio apresentam, na otoscopia, um tumor da base do crânio podem ser visualizados pela injeção
muito vascularizado, facilmente visualizado abaixo de contraste iodado, porém a ressonância magnética
da membrana timpânica. Nessa fase o paciente pro- é superior e oferece detalhes mais precisos. Menin-
cura inicialmente o otorrinolaringologista, que, por giomas, schwanomas e paragangliomas captam bem
meio de um simples exame clínico, pode diagnosticar o contraste iodado, enquanto outras lesões como os
a lesão. cordomas e os condrossarcomas não se impregnam
Tumores benignos do FJ, na maioria dos casos, com grande intensidade. A hidrocefalia é facilmente
crescem lentamente, levando a um comprometimento detectável por esse exame.
lento e progressivo dos nervos cranianos baixos (IX, Exame de ressonância magnética com injeção de
X e XI). Muitos pacientes não valorizam a presença contraste é de extrema importância para o diagnóstico
de alterações discretas da fala (rouquidão) e da de- e o planejamento cirúrgico. Esse exame permite uma
glutição, atribuindo esses déficits a processos infec- perfeita demonstração das relações do tumor com as
ciosos ou inflamatórios da nasofaringe. A paralisia do estruturas vizinhas da base do crânio. O grau de vas-

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22 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores do Forame Jugular

cularização da lesão, suas características e extensão nutridores da lesão e o envolvimento das artérias
são avaliados com precisão por meio de um exame de vertebral e carótida interna. Paragangliomas são tu-
ressonância magnética. Paragangliomas (Fig. 22.1) mores bastante vascularizados, nutridos, na maioria
são tumores com grande vascularização, que se im- dos casos, pela artéria faríngea ascendente. Por meio
pregnam bem com gadolínio e apresentam um aspecto desse exame realizam-se testes de oclusão da artéria
heterogêneo (“sal com pimenta”). Schwanomas cap- carótida interna ou da artéria vertebral. Esses testes
tam bastante o contraste, podendo ser císticos e, na são úteis quando se antecipa a necessidade de sacri-
maioria das vezes, apresentam um contorno bastante ficar um desses vasos. A embolização pré-operatória
regular (Fig. 22.2). Meningiomas impregnam-se bem é realizada nos casos de tumores com grande vascu-
com o contraste, porém menos intensamente que os larização, como os paragangliomas e alguns menin-
schwanomas (Fig. 22.3). Esses tumores podem apre- giomas5. Embolizações de tumores da base do crânio
sentar calcificações e freqüentemente se observa uma podem, no entanto, causar edema local, bem como
base larga de implante dural com captação linear da oclusão de ramos intracranianos e nutridores de ner-
dura-máter (dura-tail). Cordomas e condrossarcomas vos cranianos.
(Fig. 22.4) são heterogêneos, com algumas áreas cap-
tantes e outras não. Esses tumores podem ser císticos. A
Na seqüência T2 apresentam-se claros, sem causar
grande edema cerebelar ou no tronco cerebral.
A vascularização do tumor, assim como sua rela-
ção com os vasos da base do crânio e os ramos nu-
tridores da lesão são bem demonstrados por exames
de angiorressonância ou, preferencialmente, por uma
angiografia digital. A angiografia cerebral digital
é realizada de rotina em todos os casos de tumores
muito vascularizados. Esse exame, além de confir-
mar o diagnóstico nos casos de paragangliomas, per-
mite visualizar com bastante precisão os pedículos

Fig. 22.1 – Ressonância magnética mostrando paraganglio- Fig. 22.2 – Ressonânica magnética de schwanoma do FJ.
ma do FJ. (A) Pré-operatório. (B) Pós-operatório.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 22.3 – TC mostrando extenso meningioma do FJ com Fig. 22.4 – Exame de ressonância magnética mostrando ex-
extensão intra e extracraniana. tenso condrossarcoma do FJ.

A oclusão do bulbo jugular pela massa tumoral e o primeiro a correlacionar esses tumores do ouvido
a permeabilidade dos seios venosos contralaterais são médio aos corpúsculos do glomo jugular.
bem demonstradas na fase venosa da angiografia. Um Os paragangliomas são um grupo mal definido
bulbo jugular com volume aumentado, por variante de tumores que, histologicamente, se assemelham
anatômica, pode causar sintomas e sinais radiológi- aos feocromocitomas não cromafínicos de estrutu-
cos na tomografia computadorizada, semelhantes aos ras extra-adrenais, encontradas no corpo carotídeo,
encontrados em tumores do forame jugular. A fase ve- em estruturas paraganglionares aorticopulmonares e
nosa da angiografia cerebral permite esclarecer com nervos cranianos bulbares. O glomo da veia jugular é
segurança essa condição. formado por um grupo de células situadas na adven-
A angiografia cerebral também permite diagnosti- tícia do bulbo da jugular, inferiormente ao assoalho
car lesões como tumores da bifurcação da artéria ca- do ouvido médio. O glomo timpânico é associado aos
rótida comum (quimiodectomas) e tumores do glomo ramos timpânicos do nervo glossofaríngeo, dentro do
do nervo vago. ouvido médio. O corpúsculo vagal tem relação com o
As informações obtidas com os exames de neu- perineuro do nervo vago na região do gânglio nodoso.
roimagem permitem definição diagnóstica em muitos Paragangliomas são também encontrados na órbita,
tumores do FJ. laringe e pulmões.
Paragangliomas são mais freqüentes em mulheres
TIPOS HISTOLÓGICOS (4:1). Podem ter incidência familiar: nesses casos, em
geral, são bilaterais. Trata-se de lesões histologica-
Paragangliomas (Tumores do Glomo mente benignas, e os raros casos malignos apresen-
Jugular) tam invasão local com metástases para linfonodos
Os paragangliomas são os tumores mais freqüen- cervicais, do mediastino, pulmonares e ósseas.
tes e devem ser sempre considerados no diagnóstico Essas lesões raramente secretam quantidades va-
diferencial das lesões do FJ. Guild1, em 1941, des- riáveis de noradrenalina, dopamina e 5-hidroxitripta-
creveu estruturas semelhantes aos corpos carotídeos mina. A maioria desses tumores é, no entanto, farma-
no osso temporal e denominou-os de corpúsculos do cologicamente inativa.
glomo jugular. Rosenwasser2, em 1942, descreveu Várias classificações para os paragangliomas fo-
a remoção de um tumor muito sangrante do ouvido ram propostas. As mais utilizadas são as descritas por
médio, que se exteriorizava pelo ouvido externo. A Jackson e Glasscock7, em 1982 (Tabela 22.1), e Fis-
análise histológica desse tumor demonstrou ser uma ch, em 1978. Essa classificação foi alterada em 1981
lesão idêntica às encontradas nos tumores benignos para incluir os tumores com extensão intracraniana
dos corpos carotídeos6. Rosenwasser2, em 1945, foi (Tabela 22.2)8.

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22 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores do Forame Jugular

Tabela 22.1 – Classificação de tumores glômicos Segundo Jackson e Glasscock7


Glomo timpânico
Tipo I Pequena massa limitada ao promontório
Tipo II Tumor preenchendo totalmente o ouvido médio
Tipo III Tumor no ouvido médio com extensão para a mastóide
Tipo IV Tumor preenchendo o ouvido médio, estendendo-se para a mastóide ou através da membrana timpânica,
preenchendo o canal auditivo externo; pode estender-se anteriormente à artéria carótida interna
Glomo jugular
Tipo I Pequeno tumor envolvendo o bulbo jugular, ouvido médio e mastóide
Tipo II Tumor com extensão abaixo do canal auditivo interno; pode apresentar extensão intracraniana
Tipo III Tumor com extensão para o ápice petroso; pode apresentar extensão intracraniana
Tipo IV Tumor com extensão além do ápice petroso para o clivo e fossa infratemporal; pode apresentar extensão
intracraniana

Tabela 22.2 – Classificação de paragangliomas do osso temporal segundo Fisch


Tipo A Tumor limitado ao ouvido médio
Tipo B Tumor limitado à area timpanomastóidea sem envolvimento infralabiríntico
Tipo C Tumor com envolvimento infralabiríntico com extensão para o ápice petroso
Tipo D1 Tumor com extensão intracraniana menor que 2 cm de diâmetro
Tipo D2 Tumor com extensão intracraniana maior que 2 cm de diâmetro

Em nossa opinião essas classificações são de di- Tabela 22.3 – Paragangliomas do osso temporal -
fícil compreensão e não definem bem as dificuldades Classificação Curitiba 1988
cirúrgicas das diferentes lesões. Assim, desenvolve-
mos em 19889 uma nova classificação (Tabela 22.3), Tumor Localização
que se baseia na localização e extensão do tumor. Essa E (ouvido) Tumor limitado ao ouvido
classificação é simples, fácil de memorizar e antecipa EN (ouvido e pescoço) Tumor envolvendo o ouvido e
as dificuldades cirúrgicas que serão encontradas. A o pescoço
equipe cirúrgica necessária é definida com base nes- ENI (ouvido/pescoço/ Tumor envolvendo o ouvido, o
ses dados. Os tumores são divididos em: intradural) pescoço e o espaço intradural
• Tipo E: limitados ao ouvido e tratados exclusi- M (miscelânea)
vamente por otologistas. – N (pescoço) Tumor no pescoço
• Tipo EN: tumores que, além do ouvido, inva- – I (intradural) Tumor somente intradural
dem o bulbo e a veia jugular interna, reque- – C (combinação) Combinaçãodostiposanteriores
rendo uma dissecção de pescoço, realizada por
cirurgião de cabeça e pescoço e/ou neurocirur-
gião.
• Tipo ENI: são os tumores mais extensos, que Schwanomas
apresentam invasão da dura-máter e exigem a Schwannomas do FJ se originam dos nervos cra-
participação de um neurocirurgião. nianos glossofaríngeo, vago e acessório. Podem ser
• Miscelânea: consiste na combinação de um císticos, dificultando a preservação dos nervos envol-
dos três tipos anteriores ou a forma isolada N vidos durante sua remoção10. A cadeia simpática cer-
(pescoço) ou I (intradural/intracraniano). vical presente dentro do FJ pode também, raramente,

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

originar schwanomas. Esses tumores podem ser pura- procedimento cirúrgico é o objetivo de tratamento a
mente intracranianos, intra e extracranianos e extra- ser alcançado. Os melhores resultados cirúrgicos são
cranianos com extensão para região cervical alta. Em obtidos quando o tratamento é realizado por um grupo
nossa série, os tumores intra-extracranianos corres- multidisciplinar composto de neurocirurgiões, otorri-
pondem à quase totalidade dos casos. Schwanomas nolaringologistas, cirurgiões de cabeça e pescoço,
do FJ correspondem a apenas 2,9% dos schwanomas neuroanestesistas, neurointensivistas, neurorradio-
intracranianos11-13 e raramente são malignos14. Entre logistas e neurofisiologistas. Embolização pré-ope-
nossos casos de tumores do FJ, a freqüência detectada ratória com partículas de Ivalon® ou Gelfoam® é de
foi de 14% (13 casos). Samii et al.15 classificam os grande valia em tumores muito vascularizados como
schwanomas do FJ em quatro tipos: os paragangliomas. Tumores que infiltrem a artéria
• Tipo A: tumor do ângulo pontocerebelar com carótida interna de pacientes jovens são tratados com
mínima invasão do FJ. bypass, com enxerto de veia safena ou artéria radial e,
• Tipo B: tumor primário do FJ com extensão a seguir, remoção da lesão com o vaso infiltrado (Fig.
intracraniana. 22.5). Todos os pacientes com tumores do FJ que
• Tipo C: tumor primário extracraniano com ex- apresentem extensão extra-intracraniana são operados
tensão ao FJ. em nosso serviço com a seguinte técnica cirúrgica:
• Tipo D: tipo “ampulheta”, com componentes
extra e intracraniano.
A
Meningiomas
Menigiomas do FJ originam-se de granulações de
aracnóide presentes no bulbo da veia jugular ou em
seios venosos. São extremamente raros16, com apenas
40 casos relatados na literatura17,18. A grande maioria
desses tumores é histologicamente benigna, porém,
em nossa experiência, 50% dos meningiomas do FJ
apresentaram um comportamento biológico agressi-
vo. Como esses tumores freqüentemente apresentam
características infiltrativas, a preservação dos nervos
cranianos é extremamente difícil quando se realiza
uma ressecção cirúrgica radical. Tratamento comple-
mentar com radioterapia deve ser considerado nos ca-
sos de remoção subtotal. Meningiomas de outras re-
giões, como, por exemplo, do ângulo pontocerebelar,
podem estender-se para o FJ em até 8% dos casos19.
B
Outras Lesões
Condrossarcomas, cordomas, tumores do saco en-
dolinfático, tumores de células gigantes e metástases
são outras lesões que, em menor freqüência, envol-
vem o FJ20-26. Tumores com baixo grau de malignidade
podem ser amplamente removidos e, após tratamento
complementar de radioterapia, apresentam prognós-
tico mais favorável. Neurofibromas são associados à
neurofibromatose do tipo 2 e, mais raramente, à do
tipo 1. Entre os nossos casos, encontramos ainda cis-
tos ósseos aneurismáticos, colesteatomas e linfangio-
mas. Tumores malignos como sarcomas e carcinomas
não são passíveis de remoção cirúrgica e são tratados
com biópsia seguida de rádio e/ou quimioterapia.

TRATAMENTO CIRÚRGICO
A remoção radical da lesão, com preservação das Fig. 22.5 – Angiografia cerebral mostrando (A) infiltração da
estruturas vasculonervosas da base do crânio, em um artéria carótida interna (setas) e (B) bypass com veia safena.

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22 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores do Forame Jugular

Preparo do Paciente e Anestesia extensa remoção óssea. A fáscia temporal é disse-


cada, seccionada e rodada posterior e inferiormente
O paciente é posicionado em decúbito dorsal, com a fáscia craniocervical e o músculo esternoclei-
com a cabeça rodada para o lado oposto da lesão e domastóideo, formando o primeiro plano vasculari-
levemente estendida. Deve-se ter o cuidado de não zado (Fig. 22.7). O músculo temporal é dividido e ro-
comprimir a veia jugular oposta. A anestesia é geral, dado inferiormente, mantendo-se pediculado, sobre a
com entubação endotraqueal, de preferência através região da craniotomia e mastoidectomia, constituindo
do nariz, antevendo a possibilidade de posterior ex- o segundo plano vascularizado (Fig. 22.8). No final
tubação. Parâmetros gerais como pressão arterial mé- do procedimento, o retalho de fáscia e músculo es-
dia, pressão venosa central e concentração de CO2 são ternocleidomastóideo é novamente suturado sobre o
rotineiramente realizados. Os nervos VII, IX, X, XI e músculo temporal, mantendo o contorno estético.
XII são monitorados com o registro de eletromiogra-
fia intra-operatória. O nervo vestibulococlear é moni-
torado com potencial evocado de tronco cerebral.

Incisão de Pele
T
A incisão de pele deve ser ampla o suficiente para
permitir uma exposição adequada do FJ e a reconstru-
ção da base do crânio. Iniciamos a incisão da pele na
região temporal, cerca de 4 cm acima do arco zigomá-
tico, contornando o conduto auditivo externo e se pro-
longando até a região anterior do pescoço (Fig. 22.6). MSM FCC
O retalho de pele e subcutâneo é rebatido anteriormente,
tomando-se o cuidado de não lesar a fáscia do músculo
temporal e o nervo auricular maior, que é identificado
sobre o bordo anterior do músculo estenocleidomas-
tóideo. Nos casos em que a audição pré-operatória está
conservada, o canal auditivo externo não é seccionado.
Quando existe perda auditiva, o canal auditivo externo Fig. 22.7 – Retalho de fáscia temporal (T), fáscia craniocer-
é seccionado na junção osteocartilaginosa e suturado vical (FCC) e músculo esternocleidomastóideo (MSM).
com fio absorvível. O local da sutura é recoberto com
um retalho do músculo retroauricular.
A B

MT

Fig. 22.8 – (A e B) Rotação do músculo temporal (MT) para


cobrir o defeito cirúrgico.

Fig. 22.6 – Posição do paciente e incisão de pele para ci-


Dissecção de Pescoço
rurgia do FJ. O próximo passo cirúrgico consiste na dissecção
de pescoço. O bordo anterior do músculo esternoclei-
Retalho Miofascial para Reconstrução da domastóideo é identificado, e o nervo auricular maior,
Base do Crânio seccionado antes de sua bifurcação. Esse nervo pode
ser utilizado como enxerto para reconstrução do nervo
Esse retalho miofascial foi desenvolvido em nosso facial. O músculo digástrico é um importante parâmetro
serviço para prevenir fístulas liquóricas e obter um anatômico para identificação das principais estruturas
excelente resultado estético do defeito resultante da no pescoço. Esse músculo é dissecado até sua inserção
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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

na ranhura da mastóide, sendo desinserido nessa região


e utilizado ao final da cirurgia como enxerto para ocluir
o forame jugular e enventuais orifícios durais. Os prin-
cipais vasos (artérias carótida comum, externa e interna
e a veia jugular interna) são identificados (Fig. 22.9).
A artéria carótida interna é dissecada superiormente
em direção à base do crânio, podendo estar envolvi-
da nessa região. Os nervos cranianos vago, acessório
e hipoglosso são identificados. O nervo glossofaríngeo
encontra-se anterior e medial à artéria carótida interna.
Os nervos cranianos e a veia jugular são dissecados
superiormente em direção ao forame jugular. A artéria
occipital é coagulada e seccionada. Ramos da artéria
carótida externa nutridores do tumor são coagulados e
seccionados. A artéria vertebral é dissecada em todos
os casos, utilizando-se a porção lateral do arco de C1
como parâmetro anatômico.

Fig. 22.10 – Espécimen anatômico mostrando os parâme-


tros para identificação do nervo facial.

Fig. 22.11 - Nervo facial infiltrado pelo tumor (A) e após


reconstrução com enxerto de nervo grande auricular (B).

Fig. 22.9 – Dissecção anatômica mostrando a artéria caró-


Mastoidectomia
tida interna (ACI) e a veia jugular interna (VJI). Realiza-se mastoidectomia radical expondo-se o
canal do nervo facial, o seio sigmóideo, o bulbo da
jugular e o seio petroso superior. A dura-máter é ex-
posta na fossa média e na fossa posterior, anterior e
Nervo Facial posteriormente ao seio sigmóideo. O antro da mastói-
O nervo facial é identificado no forame estilo- de, os canais semicirculares posterior e lateral, bem
mastóideo usando-se como parâmetros o músculo como os ossículos do ouvido são identificados. Infe-
digástrico e a ponta da mastóide inferiormente, a car- riormente ao canal do nervo facial, as células retrofa-
tilagem do conduto auditivo externo superiormente ciais são removidas. Se o nervo facial não estiver in-
e a sutura timpanomastóidea póstero-superiormente filtrado pela lesão, seu canal ósseo não será aberto. O
(Fig. 22.10). Em alguns casos, o nervo facial pode tumor é removido anterior e posteriormente ao canal
estar envolvido pela lesão, exigindo uma neurólise. do nervo facial, evitando-se sua transposição anterior.
Quando o nervo encontra-se infiltrado, realiza-se um O processo estilóide pode ser removido para melhor
enxerto com nervo auricular maior ou nervo sural exposição da artéria carótida interna, medialmente ao
(Fig. 22.11). osso timpânico.

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22 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores do Forame Jugular

Exposição do Tumor no Canal Auditivo


Externo
Meatoplastia e remoção da membrana timpânica
expõem o tumor dentro do canal auditivo externo.
Paragangliomas freqüentemente invadem o ouvido B
médio e o conduto auditivo externo através do hipo-
tímpano. Os vasos carotidotimpânicos suprem essa
porção do tumor e são controlados por meio da coa-
gulação bipolar. Um controle distal da artéria carótida A
interna é possível após a remoção do osso timpânico.
A tuba de Eustáquio é visualizada e ocluída no final
do procedimento com enxerto livre de músculo para
evitar fístula liquórica. Fig. 22.12 – (A) Exposição cirúrgica de paraganglioma ex-
tra e intradural. (B) Após ressecção da lesão.
Craniectomia
subtotal. Monitoração dos nervos cranianos baixos
Realiza-se uma craniectomia occipital lateral, com
pode auxiliar na sua preservação durante a dissecção.
cerca de 3 cm de diâmetro, expondo o bulbo da veia
Envolvimento da artéria vertebral ocorre em alguns
jugular. Os seios tranverso, petroso superior e sigmói- pacientes, sendo necessário controle proximal extra-
deo são expostos. Invasão tumoral dentro do seio sig- craniano para dissecção e preservação desse vaso.
móideo é freqüente em paragangliomas e alguns me-
ningiomas. Esse seio é ocluído abaixo da emergência
do seio petroso superior com dupla ligadura. A veia Fechamento
jugular interna é ocluída com uma sutura-ligadura. Após cuidadosa hemostasia, a dura-máter é her-
meticamente suturada. Sobre a linha de sutura e no
Remoção Extradural do Tumor forame jugular, são fixados fragmentos do músculo
digástrico com cola biológica como primeiro plano
Após todos esses preparos iniciais, com identifica- para evitar uma fístula liquórica. A ferida é, a seguir,
ção das estruturas envolvidas, a porção extradural da fechada com os retalhos miofasciais descritos ante-
lesão pode ser removida. O forame jugular é ampla- riormente (dois planos vascularizados).
mente exposto. O seio sigmóideo é incisado em sua
parede posterior, e o tumor dentro da luz do seio é
dissecado e removido do bulbo da jugular junto com TRATAMENTO ADJUVANTE
a veia jugular previamente ligada no pescoço. Com a Radioterapia como tratamento único ou após uma
remoção do tumor, o seio petroso inferior pode apre- remoção cirúrgica é controversa em portadores de
sentar um intenso sangramento, sendo tamponado paragangliomas. As indicações e doses de irradiação
com Surgicel® ou Gelfoam®. não estão bem definidas27-29. Em lesões malignas e
nos casos de meningiomas histologicamente benig-
Remoção Intradural do Tumor nos, embora com comportamento agressivo, a radio-
terapia apresenta resultados benéficos. Várias técni-
Após remoção radical da porção extradural, a dura- cas de radioterapia têm sido utilizadas. A radioterapia
máter é incisada na parede medial do seio sigmóideo, conformacional estereotática e a radiocirurgia são
permitindo um acesso intradural com mínima retra- indicadas para tumores parcialmente ressecados, nos
ção do cerebelo. A lesão invade a cavidade intradural quais possa ter ficado um pequeno resto tumoral ade-
através do FJ, acompanhando os nervos cranianos. A rido a nervos ou vasos30. Tratamento com radioterapia
identificação desses nervos junto ao bulbo e a ponte de paragangliomas pode ser realizado em pacientes
é de extrema importância para sua preservação. O FJ mais idosos, sem condições de se submeter à cirur-
é amplamente exposto. Os nervos cranianos bulbares gia, quando se observa crescimento tumoral ou piora
são dissecados em seus trajetos extra e intradural (Fig. dos sintomas. Em outros tumores devem-se avaliar
22.12). O tumor intradural em geral é extremamen- os benefícios levando-se em consideração: o com-
te vascularizado, e o sangramento é controlado com portamento biológico da lesão, as condições clínicas
coa­gulação bipolar. Quando apenas algumas fibras do paciente e os efeitos da radioterapia sobre os ner-
nervosas estão infiltradas pela lesão, são seccionadas vos cranianos16. Não existem séries controladas que
e removidas. Se, no entanto, for muito intensa a infil- mostrem efetividade de quimioterapia para tumores
tração dos nervos cranianos e o paciente ainda apre- primários do FJ como paragangliomas, schwanomas
sentar boa função destes, realiza-se uma ressecção e meningiomas. Lesões que respondem à quimiote-

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

rapia, como linfomas e outros tumores malignos, são Tabela 22.4 – Grau de ressecção em 94 lesões do FJ
tratadas após um diagnóstico histológico. (1986-2003)
Grau de ressecção
CASUÍSTICA, RESULTADOS E Tipo histológico
Número cirúrgica
COMPLICAÇÕES de casos
Total Subtotal
No período de janeiro de 1986 a dezembro de Paragangliomas 55 43* 12**
2003, 94 pacientes com lesões do FJ foram operados
Schwanomas 13 13 0
no Instituto de Neurologia de Curitiba e no Hospi-
tal de Clínicas da Universidade Estadual de Campi- Meningiomas 10 5 5
nas (Unicamp) (Fig. 22.13). Paragangliomas foram Cistos ósseos aneur. 3 3 0
os tumores mais freqüentes (55 casos), seguidos Condrossarcoma 5 1 4
pelos schwanomas de nervos bulbares (13 casos) e
Tumores malignos 5 0 5
meningiomas (10 casos). Quatro pacientes com pa-
ragangliomas apresentavam tumores malignos com Colesteatomas 2 2 0
metástases para linfonodos cervicais. Dois pacientes Linfangiomas 1 1 0
apresentavam paragangliomas na bifurcação da arté- Total 94 68 (73%) 26 (27%)
ria carótida comum (quimiodectomas). Seis pacientes
com meningiomas apresentavam tumores malignos * Três pacientes apresentaram recidivas. ** Quatro tumores ma-
lignos e dois tumores recidivados.
ou com comportamento biológico agressivo.
As complicações observadas em nossos pacientes
5 5
3 2 1 são demonstradas na Tabela 22.5. Lesões de nervos
10
cranianos bulbares (IX, X e XI) consistem na com-
plicação mais freqüente e uma das mais graves do
13 tratamento cirúrgico dessas lesões. Pneumonia por
55
aspiração e infecção pulmonar podem decorrer des-
se tipo de complicação, ocasionando, em alguns ca-
sos, o óbito do paciente. Em nossa série, 10 pacientes
(10,6%) apresentaram paralisia pós-operatória dos
nervos cranianos bulbares. Houve paralisia definitiva
Paragangliomas
em seis pacientes. Traqueostomia foi necessária em
Schwanomas
três pacientes. Paralisias dos nervos facial e vestibu-
Meningiomas
lococlear foram observadas em oito pacientes (8,5%).
Condrosarcomas Cinco pacientes com lesão permanente do nervo fa-
Tumores malignos cial foram submetidos à anastomose com enxerto do
Cistos ósseos nervo grande auricular (três casos) e à anastomose
Colesteatomas hipoglossofacial (dois casos). O resultado obtido foi,
Linfangiomas segundo a classificação de House e Brackmann31,
grau II nos casos com enxerto e grau III com anas-
Fig. 22.13 – Tumores do FJ operados entre 1986 e 2003, no tomose VII/XII. Quatro casos (4,2%) apresentaram
Instituto de Neurologia de Curitiba e na Universidade Estadual
de Campinas, 94 casos.
fístula liquórica. Esses pacientes foram tratados com
reabordagem cirúrgica (um caso) e drenagem lombar
O objetivo do tratamento cirúrgico foi ressecar to- contínua (três casos). Três pacientes desenvolveram
talmente a lesão e preservar os nervos cranianos em quadro de meningite, que foi tratado com antibióti-
um procedimento cirúrgico. Em portadores de tumores cos. Ocorreu hemiparesia por lesão de vasos perfu-
benignos não invasivos obteve-se remoção radical em rantes do tronco cerebral em um paciente.
84% dos casos (Tabela 22.4). Doze pacientes com pa-
ragangliomas não obtiveram ressecção total da lesão Tabela 22.5 – Complicações pós-operatórias
por apresentarem tumores malignos (quatro casos) ou
infiltrarem nervos cranianos. Pacientes com tumores Paralisias de nervos cranianos
malignos foram submetidos à radioterapia pós-operató- VII .................................................................8 (4 infiltrados p/ tumor)
ria. Tratamento radioterápico também foi indicado aos VIII ................................................................8
IX, X, XI ........................................................10
casos de paragangliomas benignos invasivos, quando Fístula liquórica........................................4
em exames de imagem de controle se tenha observado Hemiparesia..............................................1
um crescimento do resto tumoral. Todos esses pacien- Mortalidade ..............................................4 (4,2%)
tes encontram-se vivos e com a doença controlada.

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22 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores do Forame Jugular

Quatro pacientes morreram. Os óbitos foram oca- bulbares esteja preservada. Em casos de disfunção
sionados por embolia pulmonar (um caso), pneumonia importante desses nervos, deve-se realizar uma tra-
aspirativa e septicemia (dois casos) e hematoma de re- queostomia. Mesmo nos casos em que não se observa
gião cervical com alteração respiratória (um caso). paralisia da orofaringe, deve ser feita avaliação da
deglutição nos primeiros dias de pós-operatório para
DISCUSSÃO maior segurança. Deve-se fazer uma medialização da
corda vocal paralisada por meio de tireoplastia ou in-
Lesões do forame jugular apresentam dificuldades jeção de silicone, para evitar a aspiração e melhorar
no tratamento cirúrgico devido à sua localização pro- a qualidade da voz.
funda, ao envolvimento e infiltração de importantes Tumores com grande extensão no osso temporal e
estruturas nervosas e vasculares, acentuada vascula- no ângulo pontocerebelar podem envolver ou mesmo
rização de muitos tumores e dificuldade em obter-se infiltrar o nervo facial. Para se obter uma remoção
uma reconstrução adequada da base do crânio. O de- radical, esse nervo deve ser ressecado com a lesão.
senvolvimento de novas técnicas de cirurgia da base A reconstrução do nervo facial é realizada, preferen-
do crânio por equipes multidisciplinares, compostas cialmente, por enxerto do nervo sural ou do nervo
de neurocirurgiões, otorrinolaringologistas e cirur- grande auricular. Quando não é possível essa recons-
giões de cabeça e pescoço, fez com que se tornas- trução facio-facial, realizamos uma anastomose com
se possível a remoção radical de lesões benignas do o nervo hipoglosso. Em pacientes com dificuldades
FJ com preservação da função dos nervos cranianos de deglutição, devido a paralisias dos nervos IX e X,
bulbares. Algumas lesões, como os paragangliomas, uma lesão adicional do nervo hipoglosso pode piorar
são muito vascularizadas, exigindo uma embolização o quadro clínico.
pré-operatória. O envolvimento ou mesmo a infiltra- O acesso cirúrgico e, principalmente, a remoção
ção da artéria carótida interna podem requerer uma da dura-máter e das estruturas ósseas infiltradas pela
reconstrução desse vaso com enxerto de veia safena lesão provocam grande defeito cirúrgico. O apareci-
ou da artéria radial. A artéria vertebral também pode mento de fístulas liquóricas é uma complicação fre-
estar envolvida e um controle proximal desse vaso é qüente em cirurgias do FJ, podendo acarretar quadros
necessário à sua preservação. graves, e mesmo fatais, de meningites. Várias técni-
Tumores benignos não infiltrativos podem ser cas de reconstrução têm sido preconizadas. Enxerto
totalmente removidos. Os schwanomas dos nervos livre de gordura abdominal e rotação de retalhos mus-
bulbares são os tumores que, em nossa casuística, culares são as mais freqüentes32. A técnica cirúrgica
apresentaram o melhor prognóstico. Outros autores de reconstrução da base do crânio, por nós desenvol-
relatam experiência semelhante15. Nos casos de para- vida e anteriormente descrita33,34, oferece, no entanto,
gangliomas não infiltrativos, a abordagem extra e in- as melhores chances de um fechamento adequado da
tracraniana possibilita uma ressecção total na grande fossa posterior (Tabela 22.6).
maioria dos casos16. Tumores benignos, porém com
características infiltrativas, como alguns meningio-
mas e paragangliomas, não são passíveis de remoção Tabela 22.6 - Estudo comparativo entre várias
radical e preservação dos nervos cranianos infiltra- técnicas
dos. Nesses casos, se o paciente apresentar uma boa Autor Nº de Fístulas %
função desses nervos, a remoção deve ser subtotal, casos
deixando-se apenas uma pequena porção da cápsula Kempe35 (1982) 36 8 18,18
tumoral junto a essas estruturas. Tumores malignos
de baixo grau de agressividade, como condrossar- Robertson et al.36 (1990) 36 4 10
comas e cordomas, costumam infiltrar as estruturas Raquet et al. (1991)
37
31 2 6,06
ósseas da base do crânio, impedindo uma ressecção Mann et al. (1991)
38
7 1 12,5
radical. Indica-se radioterapia pós-operatória nesses Jackson et al. (1993)
32
84 28 25
casos. Tumores malignos agressivos, como sarcomas
e carcinomas, não são ressecáveis e o tratamento pro- Watkins et al. (1994)
39
49 8 14,03
posto consiste em biópsia e/ou quimioterapia. Green et al.40 (1994) 15 2 11,76
As complicações cirúrgicas são relacionadas Ramina32 (2002) 86 4 4,7
principalmente a lesões dos nervos cranianos bul-
bares que ocasionam distúrbios da deglutição. A
pneumonia aspirativa decorrente dessas paralisias é
uma complicação que deve ser evitada, visto que a
gravidade do quadro pode levar ao óbito por septice- O fechamento do seio sigmóideo pode ocasionar
mia. A extubação desses pacientes deve ser realizada edema de cerebelo e tronco cerebral e infarto venoso
assegurando-se de que a função dos nervos cranianos nos casos em que esse seio for dominante e não esteja

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

ocluído pelo tumor. Na grande maioria dos casos, po- 3. Katsuta T, Rhoton Jr AL, Matsushima T. The jugular
rém, o seio encontra-se obstruído pela lesão e já exis- foramen: microsurgical anatomy and operative ap-
te compensação do fluxo sangüíneo através de veias proaches. Neurosurgery. 1997;41:149-202.
colaterais. Descreveu-se uma técnica de reconstrução 4. Kinney SE. Jugular foramen neurilenoma. In: Sekhar
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radioterapia conformacional estereotática proporcio- sions. Arch Otolaryngol. 1982;108:401-6.
nam maior segurança e melhor controle do crescimen- 8. Jackson CG, Glasscock ME III, Nissen AJ, et al. Glo-
to tumoral. O efeito da radioterapia parece ser sobre mus tumor surgery: the approach, results, and problems.
os vasos e elementos fibrosos do tumor42. Propôs-se Otolaryngol Clin Noth America. 1982;15:897-916.
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ria, curáveis com tratamento cirúrgico adequado16, a 10. Carvalho GA, Tatagiba M, Samii M. Cystic schwan-
análise dos resultados e a indicação dessa forma de nomas of the jugular foramen: clinical and surgical
remarks. Neurosurgery. 2000;46:560-6.
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com a artéria carótida interna. Descreveu-se a ruptura JCJ. Schwannomas of the parapharyngeal space and
desse vaso durante a dissecção cirúrgica e mesmo no jugular foramen. Laryngoscope. 1979;89:1405-14.
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22 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores do Forame Jugular

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23
Tratamento Cirúrgico dos
Meningiomas de Goteira Olfativa
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Antonio Nogueira Almeida

INTRODUÇÃO microcirúrgicas são fatores de decisão importantes.


Outros artigos publicados previamente mostraram

M
eningiomas da goteira olfativa (MGO) se várias abordagens que podem ser usadas nestes tu-
manifestam na linha média sobre o plateau mores6-8. Em relação a pacientes com meningiomas
cribriforme e sutura frontoesfenoidal1-3. Es- de grande a pequeno volume, a craniotomia pterio-
ses tumores podem ocupar o assoalho da fossa cra- nal estendida é nossa preferida (Figs. 23.1 a 23.5).
niana anterior, estendendo-se da crista galli ao tu- Essa abordagem pode proporcionar remoção total,
bérculo selar4. Entretanto há algumas similaridades
preservando estruturas vasculares em torno do tumor.
entre meningiomas de goteira olfativa com extensão
A extensão frontobasal anterior deve alcançar a linha
posterior e meningiomas do tubérculo selar (MTS). A
media (foice e crista galli). A dissecção da cisterna
característica mais importante que difere os dois tipos
sylviana é muito importante, seguida pela abertura
de meningiomas é a localização em relação ao nervo
óptico. MGO deslocam o quiasma para baixo e poste- das cisternas carotídeas e interpeduncular. Esses pro-
riormente, à medida que crescem; já os MTS elevam cedimentos técnicos permitem drenagem apropriada
o quiasma óptico súpero-lateralmente, ocupando uma do líquido cefalorraquidiano (LCR) e conseqüente
posição subquiasmática. relaxamento do cérebro, minimizando a retração ce-
rebral. A abordagem pterional permite a visualização
Spektor et al.5 descrevem sua experiência em
das estruturas vasculares precocemente e facilita sua
um período de 13 anos, durante o qual operaram
dissecção. O controle da porção posterior do tumor
80 pacientes com MGO, em 81 cirurgias. Esse arti-
go descreve as diferentes técnicas para o acesso aos em relação às estruturas mais importantes (nervos óp-
meningiomas de goteira olfativa. Os autores avaliam ticos e artéria carótida interna) pode ser acessado por
as vantagens e desvantagens associadas a cada tipo essa via. Dissecção das artérias cerebrais anteriores
de abordagem, bem como a evolução, o potencial de da cápsula pode ser difícil por causa da aderência ou
complicações e a taxa de recorrência. Na sua série, envolvimento. A artéria recorrente de Heubner deve
as principais abordagens foram craniotomia bifron- ser sempre preservada durante a dissecção. O aces-
tal, abordagem subfrontal unilateral, pterional, com so bifrontal é o mais direto para se acessar os MGO,
expansão frontoorbitária e por via subcraniana. Con- porém, em nossa opinião, a visão posterior das estru-
seguiu-se ressecção total em 90% dos pacientes e res- turas ópticas e do complexo da artéria cerebral ante-
secção subtotal em 10%. Não houve mortalidade ope- rior é um ponto negativo a ser considerado na escolha
ratória e não foi descrito nenhum déficit permanente desta via9.
além da anosmia, embora 31,3% tenham desenvolvi- O crescimento lento desses tumores provoca gran-
do complicações relacionadas à cirurgia. A evolução des volumes antes da sua detecção. Desse modo, quan-
surpreendente desses pacientes prova que a seleção do diagnosticados, podem estar invadindo a base do
da abordagem apropriada e a evolução das técnicas crânio e envolvendo as estruturas neurovasculares.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 23.1 – Esquema de craniotomia com os quatro orifícios Fig. 23.2 – Esquema de craniotomia com extensão pterional
de trepanação na craniotomia pterional clássica. abrangendo rima e teto orbitário e parte do zigoma (cranioto-
mia frontoorbitária).

Fig. 23.3 – Craniotomia bifrontal com extensão craniofacial Fig. 23.4 – Craniotomia frontal unilateral rasante ao rebordo
até o etmóide, útil para os tumores com invasão dos seios pa- orbitário. Nesse caso a incisão cutânea pode ser supraciliar e o
ranasais. retalho ósseo pode ser bem pequeno. Não recomendamos para
tumores médios e grandes e de linha média.

AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA
Geralmente, os pacientes com MGO podem apre-
sentar cefaléia, perda visual, crise convulsiva, men-
tal ou alterações de personalidade e, ocasionalmente,
perda da olfação. Deve-se realizar avaliação neurof-
talmológica detalhada; estudos com RNM com gado-
línio têm sido importantes para o diagnóstico. Usual­
mente o tumor mostra uma contrastação densa, na
qual desloca o lobo frontal para cima e está associada
com edema significativo. Angiograma por meio de
RNM pode ser útil para se detectar a posição das ar-
térias etmoidais. Embolização pré-operatória não está
indicada na maioria dos casos, em nossa opinião.

ANATOMIA
Fig. 23.5 – Craniotomia bifrontal clássica, com quatro ori-
fícios de trepanação, útil em tumores de linha média de médio MGO se localizam na linha média da fossa an-
e grande volume. terior, sobre a placa cribriforme do osso etmóide e

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23 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas de Goteira Olfativa

na área de sutura que une essa estrutura e o plano Uma incisão curvilinear é feita atrás da linha do
esfenoidal1,10. O tumor pode envolver a área da crista cabelo (Figs. 23.6 e 23.8). A incisão deve ser justa-
galli no plano esfenoidal posterior e pode ser simétri- posta ao trago da orelha e deve estender-se abaixo do
co em torno da linha média, ou se estender predomi- zigoma para proteger os ramos do nervo facial.
nantemente ao lado da fossa anterior.
Os nervos olfativos são deslocados lateralmente
na superfície de pequenos tumores, o que torna pos-
sível a preservação de pelo menos um dos nervos
olfativos. Em tumores volumosos, o trato olfativo e
a área cribriforme estão destruídos e invadidos pelo
meningiomas, afetando os dois nervos. Desse modo,
a olfação pode não ser preservada. Em tumores muito
volumosos, os nervos ópticos e quiasma são desloca-
dos inferior e posteriormente.
O suprimento primário sangüíneo vem das artérias
etmoidais anteriores e posteriores, ramos da artéria
oftálmica, ramos arteriais meníngeos, através da li-
nha média da base do crânio. Os segmentos de A2 das
artérias cerebrais anteriores são deslocados posterior- Fig. 23.6 – Incisão curvilínea que atinge a linha média atrás
mente pelo tumor, entretanto eles têm um plano de da linha de inserção do cabelo até o trago.
clivagem, onde tecido cerebral e aracnóide estão pre-
sentes entre essas duas estruturas (Figs. 23.9 a 23.11).
Em tumores muito grandes, a cápsula poderá envol-
ver os segmentos de A2 da artéria cerebral anterior,
tornando a remoção total do tumor um procedimento
muito arriscado. Os ramos frontopolares e pequenos
ramos podem estar aderidos à porção posterior e su-
perior da cápsula tumoral.

ACESSOS CIRÚRGICOS
Muitos acessos cirúrgicos podem ser usados para
se tentar a remoção dos MGO. Tradicionalmente, são
feitos por craniotomias frontais, ou bifrontais com
abordagem subfrontal ao tumor4,6,10-17. Em alguns ca-
sos, parte da órbita pode ser removida para aumen- Fig. 23.7 – Malar (maxila) no ponto mais alto da cranio-
tomia.
tar a exposição frontobasal. A via pterional tem sido
recomendada por muitos autores e, em nossa opi-
nião, é a primeira escolha para tumores de pequeno
e médio tamanho6,9,18-22. Abordagens agressivas são
usadas na cirurgia de MGO que se expandem para os
seios paranasais e órbitas e, entre elas, a transbasal23,
subcranial24,25 e frontoorbitária26, frontal ou por cra-
niotomia bifrontal associada com osteotomia nasal ou
orbital2,8 e ressecção craniofacial27 (Figs. 23.1 a 23.5).

Craniotomia Fronto-temporopterional
para Meningiomas da Goteira Olfativa de
Pequeno e Médio Tamanhos
O paciente deve ser colocado em posição supina,
com a cabeça fixa em fixador de Mayfield ou Sugita.
A cabeça é rodada 30° em direção ao ombro contrala-
teral. Maior rotação pode ser usada para meningiomas
mais anteriores e menor rotação para meningiomas mais Fig. 23.8 – Foto cirúrgica mostra incisão curvilínea atrás
da linha do cabelo, frontotemporal esquerda. Os eletrodos do
posteriores. A maxila deve ficar no ponto mais alto do po- potencial evocado são visíveis na figura para os nervos III, IV,
sicionamento e da visão do cirurgião (Figs. 23.6 e 23.7). V, VI e motor-sensitivo.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Deve-se evitar seccionar a artéria temporal su- e carótido-oculomotora são facilmente visíveis com
perficial e seus ramos. O retalho cutâneo é rodado uma fácil retração. Com o uso de dissectores micro-
anteriormente ao longo do pericrânio. O rebordo cirúrgicos delicados, pode-se abrir a aracnóide entre
orbitário deve ser acessado, poupando-se o nervo o lobo frontal e o nervo óptico. A dissecção da arac-
supra-orbitário e os vasos que passam no forame su- nóide continua ao longo da artéria carótida à região
pra-orbitário. Na medida em que o retalho cutâneo é do III nervo, abrindo as cisternas correspondentes. A
fletido anteriormente, a gálea aponeurótica é exposta, técnica microcirúrgica consiste na dissecção da cáp-
seguindo a fáscia do músculo temporal. Uma incisão sula tumoral desde o nervo óptico, à frente e atrás do
curvilinear poderá ser feita na fáscia no ponto-chave nervo óptico do lado da visão cirúrgica. O lobo fron-
de trepanação junto ao ptério e contínua ao longo do tal é elevado com retrator, e a superfície entre o tumor
arco zigomático. A elevação anterior dessa fáscia e e o lobo frontal, dissecada. Os ramos nutrientes arte-
gordura por meio de anzóis, puxados com elásticos, riais pequenos que vão para o tumor são coagulados
separando-os da porção mais profunda da parede do por meio de bipolar e seccionados em seguida com
músculo temporal, evita lesão ao ramo frontal do ner- microtesoura, ao longo da cápsula tumoral. Procede-
vo facial que corre no plano de gordura nesse nível. se à abertura da cápsula tumoral por meio de incisão
O músculo temporal é elevado e puxado por anzóis com bisturi de lâmina 11, seguida pela coagulação da
após ter sido raspado da superfície óssea do osso superfície. O esvaziamento do centro ou core tumoral
temporal, de modo que a rima orbitária seja exposta. pode ser feito com aspirador ultra-sônico, ou em pe-
A craniotomia deve ser realizada com quatro orifí- quenos pedaços com a pinça de retirar tumor (piece
cios de trepanação, feitos com drill de alta rotação meal) (Fig. 23.13). A ressecção do tumor pode ser fa-
e brocas cortantes e unidos por meio de craniótomo. cilitada quando se luxa sua cápsula com o fórceps de
Usamos drill de alta rotação da Midas Rex, Anspach, segurar tumor com a mão esquerda e se disseca com
Highland ou Ultrapower. Tipicamente, a dura-máter pinça em baioneta com ponta de 1 mm a aracnóide
é aberta em forma de C, com a base ao longo da asa que envolve a cápsula; além disso, podemos luxar a
esfenoidal, sendo dobrada anteriormente e presa por porção superior para baixo e, em seguida, a inferior
suturas de ancoramento. para cima. A hemostasia pode ser realizada com coa­
Sob visão microscópica, a fissura de Sylvius é gulação bipolar e Surgicell®. A dura-máter na crista
aberta, da posição lateral para medial, ou medial galli deve ser cortada e coagulada, e a superfície ós-
para lateral, com lâmina 11 e aspiração de baixa sea, brocada com broca esférica de diamante. Esse
potência. Dissecção lateral para medial envolve a método permite o acesso ao outro lado da crista galli,
seguinte seqüência: as veias são refletidas para o onde pedaços de tumor podem ser expostos. O defeito
lado temporal, e as que cruzam a fissura sylviana ósseo da base do crânio deve ser fechado com retalho
são sacrificadas com coagulação bipolar e secção de pericrânio rodado, mantendo a vascularização, su-
microcirúrgica. À medida que a fissura é aberta, os turando-se microcirurgicamente a dura-máter livre de
ramos distais da artéria cerebral média, a bifurca- tumor. Pode-se fechar o orifício na lâmina cribriforme
ção de M1 e, finalmente, a bifurcação da carótida com retalho ósseo conseguido no osso da craniotomia
podem ser expostos. Dissecção posterior permite a ou com fragmento da asa esfenoidal, prendendo-o à
visualização do triângulo carótido-óptico e caróti- base do crânio com miniplaca ou com cola biológica
do-oculomotor. (Fig. 23.12, A e B), e sobre estes vem o pericrânio su-
A dissecção medial para lateral da cisterna envol- turado à dura-máter. Deve-se manter drenagem lom-
ve o uso de um auto-retrator abaixo do pólo frontal, bar no período pós-operatório por 5 dias.
para expor o nervo olfativo. Segue-se a superfície do A via pterional tem a desvantagem da dificuldade
tumor para trás e, posteriormente, é possível uma fácil de se fazer a hemostasia do limite superior e posterior
identificação do nervo óptico e da artéria carótida dei- do tumor, muitas vezes verificando-se sufusão he-
tados lateralmente a ele. As cisternas carótido-óptica morrágica nessas regiões (Figs. 23.14 a 23.35).

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23 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas de Goteira Olfativa

Caso Ilustrativo I
Paciente do sexo feminino, 57 anos, com cefaléia e distúrbio visual à direita, fez exames de imagem que mostraram meningioma
de fossa anterior lateralizado para a direita.

Fig. 23.9 – RNM em corte coronal, imagem em T2, mostra


meningioma na linha média, invadindo a lâmina cribriforme,
lateralizado para a direita.
B

Fig. 23.12 – (A e B) TC de crânio sem contraste iodado


Fig. 23.10 – RNM em corte axial mostra meningioma em mostra craniotomia pterional, ressecção total.
fossa anterior, que invade o seio frontal, e edema significativo.

Fig. 23.11 – RNM em corte coronal, com lesão implantada Fig. 23.13 – Visão cirúrgica, após ressecção cirúrgica, com
em fossa anterior e invasão do seio frontal. o nervo óptico à frente.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Caso Ilustrativo II
Paciente do sexo feminino, 76 anos, com cefaléia, tontura, perda visual e dificuldade para andar. Exame neurológico: hiposmia.

A B

Fig. 23.17 – O angiograma mostra pronunciada elevação do


Fig. 23.14 – RNM em corte coronal, T1 com gadolínio, complexo comunicante anterior e desvio posterior, denotando
mostra tumor volumoso de fossa anterior. o efeito do tumor sobre a circulação anterior.

Fig. 23.15 – RNM em corte coronal mostra lesão extensa


que vai da lâmina cribriforme até o dorso selar, com grande
área de edema peritumoral.

Fig. 23.18 – Paciente posicionada com os eletrodos da mo-


nitoração por potencial evocado, dos nervos III, IV, V e VI.

Fig. 23.16 – RNM em densidade de prótons mostra grande Fig. 23.19 – Paciente posicionado com a cabeça rodada e
área de edema peritumoral, com desvio de estruturas da linha estendida, com o malar no ponto mais alto do campo; faz-se a
mediana, justificando a hipertensão intracraniana. marcação da incisão curvilínea atrás da linha do cabelo.

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23 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas de Goteira Olfativa

Fig. 23.20 – Rebatimento do retalho cutâneo e fixo com Fig. 23.23 – Através de botões cirúrgicos, mostram-se os ori-
anzóis cirúrgicos. fícios de trepanação necessários para a craniotomia pterional.

Fig. 23.21 – Deve-se realizar incisão do músculo temporal Fig. 23.24 – Após a retirada da asa esfenoidal, procede-se à
de modo a se manter filete de fáscia e músculo para sutura e abertura dural em arco voltado para baixo (notar a laceração
osteossíntese. dural). Desse modo pode-se acessar as cisternas da base.

Fig. 23.22 – Após a dissecção interfascial, em que se prote- Fig. 23.25 – Sem o uso de retratores com boa drenagem
ge o nervo facial entre as duas camadas de gordura abaixo da liquórica foi possível expor os limites do tumor e proceder à
fáscia temporal profunda, rebate-se o músculo temporal para remoção.
trás e lateralmente.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 23.26 – Visão cirúrgica mostra que, após a remoção do


tumor, pode-se brocar a lâmina cribriforme do osso etmoidal e
proceder a uma remoção mais radical, incluindo a infiltração
dessa estrutura e possíveis hiperostoses. Fig. 23.28 – TC em corte axial de crânio pós-operatória
mostra remoção radical.

Fig. 23.27 – Após a remoção, verifica-se o complexo co-


municante anterior com as duas artérias cerebrais anteriores,
segmento A1, comunicante anterior, e as duas cerebrais ante-
riores, segmento A2.
Fig. 23.29 – TC em corte axial mostra sufusão hemorrágica
na base do pólo frontal, sem outras alterações.

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Caso Ilustrativo III


Paciente de 62 anos, do sexo feminino, com distúrbio de comportamento e crise convulsiva, procurou nosso hospital com queixa
de perda visual.

Fig. 23.30 – RNM em corte coronal, imagem em T1 com ga- Fig. 23.33 – TC de crânio sem contraste mostra ressecção
radical do tumor pela via pterional.
dolínio, mostra lesão em fossa anterior com erosão do assoa­
lho da fossa anterior.

Fig. 23.31 – RNM em corte sagital mostra meningioma de


fossa anterior, que vai da lâmina cribriforme até o dorso selar Fig. 23.34 – TC de crânio sem contraste, em corte axial,
e eleva o aparato arterial comunicante anterior. mostra sufusão hemorrágica frontal na região correspondente
ao pólo superior do tumor, à qual, obviamente, através da
via pterional, não se pode ter acesso, porém sem repercussões
clínicas para o paciente.

A B

Fig. 23.35 – (A) Visão cirúrgica de craniotomia pterional


ampliada em que foi possível a remoção radical conforme as
figuras anteriores (B). Visão cirúrgica com a inter-relação do
tumor com o tecido cerebral, visão possível através da via pte-
Fig. 23.32 – RNM em corte axial mostra tumor homogêneo, rional, podendo-se acessar a cisterna valecular e outras cisternas
em fossa anterior, com limites laterais na região clinóidea. da base.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Craniotomia Bifrontal para Grandes Caso Ilustrativo IV


Meningiomas da Goteira Olfativa MLG, sexo feminino, 44 anos, com volumoso tumor de fossa
anterior elevando o pólo frontal. Apresentava como sintomas
Indicamos a craniotomia bifrontal para remover cefaléia crônica, que se seguiu com apatia, desatenção e, pos-
tumores de grande volume. Se a craniotomia bifrontal teriormente, perda visual. Exame neurológico: hiposmia, perda
for basal, o cirurgião poderá trabalhar em ambos os de campo visual e síndrome cerebral psíquica.
lados do tumor, frontal e temporal, com acesso à fis-
sura sylviana. Isto permite a preservação dos nervos
olfativos, todavia, em tumores volumosos, a preser-
vação é praticamente impossível. A incisão deverá ser
feita logo atrás da linha do cabelo, muitas vezes apre-
sentando a forma de “orelha do Mickey” (Fig. 23.36).
Os pacientes deve ser postos em posição supina, com
a cabeça em posição neutra e levemente estendida
em direção ao chão. Após a craniotomia bifrontal
com quatro orifícios de trepanação, o retalho ósseo
é cortado com o uso de craniótomo (Midas Rex, ou
Anspach, ou Highland ou Ultrapower).
A dura-máter é aberta em forma de C com a base
voltada para a região orbital, e o seio sagital é liga-
do com fio de Prolene® 2-0. Ambos os lobos frontais
são elevados gentilmente com lâminas de retratores Fig. 23.37 – A RNM em corte axial mostra volumoso tumor
em paralelo, simétricas. A cisterna inter-hemiférica cribriforme, com área de edema que invade a lâmina cribriforme.
é dissecada, permitindo a saída de LCR, lentamente
com melhor relaxamento do cérebro. Após essa etapa
tenta-se a dissecção do nervo olfativo bilateralmente
e de forma simultânea, desde a sua origem no encé-
falo até a entrada na base do crânio, procedimento
praticamente impossível com tumores volumosos no
plateau cribriforme (Caso ilustrativo IV, Figs. 23.37
a 23.39).

Fig. 23.38 – RNM em corte coronal mostra volumosa lesão


ocupando o andar anterior.

Fig. 23.36 – Incisão em forma de “orelha de Mickey”, jus-


taposta à linha de inserção do cabelo.

Fig. 23.39 – TC de crânio, sem contraste, pós-operatória,


mostra ressecção adequada.

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23 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas de Goteira Olfativa

A técnica microcirúrgica consiste na proteção dos


dois pólos frontais com cotonóides, abaixo das lâmi-
nas do auto-retrator, abertura da cápsula tumoral com
bisturi de lâmina 11, retirada de fragmentos para con-
gelação e análise histológica, esvaziamanto intratumo-
ral com aspirador ultra-sônico ou em pequenos peda-
ços com pinça para tumor e secção com microtesoura
(Figs. 23.40 a 23.43). À medida que se esvazia o tumor,
a cápsula é virada e tracionada para baixo com a pinça
tumor, e disseca-se o plano de clivagem entre a cápsula
e o cérebro na porção superior. O mesmo procedimento
é feito na inferior, com a ressalva de que os nutrientes
arteriais serão encontrados nessa região entrando na
cápsula tumoral, devendo ser coagulados com bipolar.
O implante na crista galli é ressecado e coagulado, ou Fig. 23.42 – Lesão extensa com invasão dos seios etmoidal,
esfenoidal e frontal.
brocado acessando, desse modo, o seio etmoidal (Figs.
23.43 a 23.49). Pode-se, nesses casos, tentar remover
fragmentos tumorais dos seios paranasais.

Fig. 23.43 – A visão cirúrgica mostra meningioma frontal


Fig. 23.40 – RNM em corte axial, densidade de prótons, mos- com plano de clivagem em relação ao parênquima, plano que
tra meningioma em fossa anterior com grande área de edema. deve ser estabelecido microcirurgicamente.

Fig. 23.44 – Após remoção do tumor, a dura-máter da base


Fig. 23.41 - RNM em corte coronal mostra invasão do seio deve ser retirada com Dissectron™, que, além fazer o corte,
esfenoidal e parede medial da órbita. permite coagulação da base.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 23.45 – Retirada do tumor do seio esfenoidal pode ser


conseguida através desse acesso, em pequenos pedaços.

Fig. 23.48 – RNM mostra remoção adequada com altera-


ções pós-operatórias compatíveis.

Fig. 23.46 – A extensão da ressecção óssea pode ser conse-


guida por meio de brocagem da fossa anterior.

Fig. 23.49 – RNM pós-operatória mostra remoção total do


tumor, imagens em T1 com gadolínio.

Fig. 23.47 – Após a remoção radical incluindo os seios


paranasais, estabelece-se a hemostasia com Surgicel® e coa-
gulação bipolar.

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23 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas de Goteira Olfativa

Caso Ilustrativo V
JV, sexo masculino, 55 anos, distúrbio de cognição e olfação, com perda visual progressiva.

Fig. 23.50 – A craniotomia bifrontal permite acesso à fossa Fig. 23.52 – Notar, na visão cirúrgica, o pericrânio pedi-
anterior e aos seios etmoidal e esfenoidal. Notar a retração dos culado rodado suturado junto à margem dural do orifício de
pólos frontais com as espátulas de retração. remoção do tumor.

Fig. 23.51 – O assoalho do andar anterior pode ser ocluído


com Surgicel®, sulfa cristalizada e pericrânio pediculado.

Fig. 23.53 – Osteossíntese com miniplacas e miniparafusos,


além da colocação de retalho ósseo para preencher a falha
óssea na fossa anterior.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

As curetas de hipófise são úteis para retirar esses


tumores da cavidade etmoidal. Os seios etmoidal e
frontal devem ser ocluídos com sulfadiazina, Surgi-
cel® e retalho muscular ou gordura. Pode-se fechar
a abertura desses seios para o crânio com a rotação
do retalho pediculado de pericrânio que será sutu-
rado à dura-máter da base. O fechamento deve ser
hermético e, para isso, deve-se fechar a falha óssea
bilateral, usando fragmento ósseo do retalho ósseo de
craniotomia, preso por miniplacas ou cola biológica
(Figs. 23.50 a 23.53). O pericrânio pediculado deve
ser rodado sobre a fossa anterior e suturado à mar-
gem livre dural com auxílio de microscópio, o que
nem sempre é fácil (Figs. 23.52 e 23.53). O uso de
substitutos durais tem nos auxiliado para as suturas
basais da dura-máter com excelente resultado, como
as membranas de politetrafluoretileno (Gore Preclude
MVP dura substitute, Flagstaff, Arizona, USA)28,29,.
Drenagem externa lombar deve permanecer no perío-
do pós-operatório por 5 dias.
Fig. 23.54 – A TC de crânio pós-operatória mostra isquemia
COMPLICAÇÕES pós-operatória em território de artéria pericalosa direita. O ca-
teter de derivação ventriculoperitoneal está bem locado.
As complicações devem ser evitadas sempre que
possível em cirurgia de base do crânio. Por isso, técnica
microcirúrgica, monitoração por potencial evocado, pro- servar, ocasionalmente, hipopituitarismo e diabetes
cedimentos neuroanestesiológicos e cuidados de terapia insipidus. Se houver fístula liquórica pelos seios es-
intensiva pós-operatória, têm ajudado o neurocirurgião fenoidais e etmoidais, por defeito persistente na sua
a diminuir o índice de complicações3,5-7,13,15,20,30-33. As parede óssea, estes devem ser reparados por via endo-
complicações mais importantes revisadas na literatura e cópica transnasal, deixando-se drenagem lombar por,
baseadas em nossa experiência são: perda definitiva da pelo menos, mais 5 dias após esse procedimento. Se
olfação, epilepsia, rinorréia liquórica, infecção e com- a fístula persistir, tenta-se um acesso transesfenoidal
plicações clínicas. Perda visual eventual pode ser obser- clássico ou reabordagem da craniotomia.
vada em volumosos tumores em que a tração excessiva As principais infecções incluem meningite, celuli-
poderá danificar o trato e nervos ópticos, hematoma de te, osteomielite do retalho ósseo e, com antibioticote-
leito cirúrgico e hidrocefalia. Em pacientes com tumo- rapia, raramente há necessidade de remoção em uma
res volumosos poderá ocorrer síndrome do lobo frontal limpeza cirúrgica.
causada por edema ou isquemia cerebral (Fig. 23.55). Pode-se observar hidrocefalia em decorrência de
Se o paciente não se recuperar prontamente da anes- trombose de seios venosos intracranianos, após is-
tesia, deve-se fazer uma TC de crânio para descartar a quemia cerebral, hematomas; em idosos a hidrocefa-
possibilidade de hematoma de leito, edema, hidroce- lia de pressão intermitente pode ser concomitante. A
falia, infarto no território da artéria cerebral anterior e derivação ventriculoperitoneal deve ser feita e indi-
pneumocéfalos. Para tumores de pequena dimensão, o ca-se o uso de válvulas programáveis. Complicações
acesso pterional é extremamente adequado e diminui o clínicas são mais comuns em pacientes idosos, obe-
risco de complicações (Figs. 23.55 a 23.59). sos, diabéticos e hipertensos mal controlados. Para
Crise convulsiva pós-operatória é incomum, mas prevenir trombose venosa de membros inferiores e
pode ocorrer. Podem-se administrar corticosteróides tromboembolismo pulmonar, usam-se meias elásticas
pós-operatórios por pelo menos duas semanas depois em membros inferiores ou pneumáticos no período
da cirurgia. Em tumores volumosos, podem-se ob- perioperatório.

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23 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas de Goteira Olfativa

Caso Ilustrativo VI
SV, 47 anos, sexo feminino, cefaléia holocraniana.

Fig. 23.58 – TC de crânio pós-operatória mostra a ressecção


Fig. 23.55 – RNM em corte axial, T1 com gadolínio, mostra total, pela craniotomia pterional.
pequeno tumor de goteira olfativa.
A

B
Fig. 23.56 – RNM em corte sagital, T1 com gadolínio, mos-
tra a extensão diminuta do tumor pela fossa anterior e sua
base de implantação dural.

Fig. 23.59 – (A a C) A visão microcirúrgica mostra o tu-


Fig. 23.57 – TC de crânio com contraste iodado mostra o mor à frente dos nervos ópticos e totalmente exposto pela via
mesmo tumor, eqüidistante das órbitas. pterional.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

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24
Tratamento Cirúrgico dos
Meningiomas do Tubérculo
e Diafragma Selar
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Antonio Nogueira Almeida

INTRODUÇÃO

A
primeira ressecção completa de um meningio-
ma de tubérculo selar foi realizada em 1916
por Cushing e Eisenhardt e é mencionada em
um artigo publicado em 19291. Cushing e Eisenhar-
dt classificaram os meningiomas de tubérculo selar
como meningiomas supra-selares. Essa classificação
é ainda usada por muitos autores2-10. Na maioria das
vezes, consideram-se esses tumores isoladamente em
relação aos originados na porção posterior da região
supra-selar, como, por exemplo, os originados na re-
gião dorsal da sela. Alguns autores11 acreditam que Fig. 24.1 – A região do tubérculo selar compreende o espaço
os meningiomas do tubérculo selar e do diafragma pertencente ao osso esfenoidal entre as duas clinóides ante-
da sela são indistinguíveis e devem ser denominados riores (círculo vermelho), limitado posteriormente pelo dorso
da sela e anteriormente pelo julgo e plano esfenoidal. O pilar
meningiomas de tubérculo selar. óptico e o canal óptico de cada lado formam o limite lateral
Al-Mefty e Smith12 classificaram como menin- posterior (círculos pretos).
giomas do tubérculo selar aqueles originados na por-
ção anterior da região supra-selar, tanto aqueles com
origem no tubérculo quanto com origem na lamina
esfenoidal, na fissura quiasmática e no diafragma da
sela, embora sugiram que este último seja considera-
do separadamente.

ANATOMIA
A região do tubérculo selar compreende o espaço
pertencente ao osso esfenoidal entre as duas clinóides
anteriores, limitado posteriormente pelo dorso da sela
e anteriormente pelo julgo e plano esfenoidal. O pilar
óptico e o canal óptico de cada lado formam o limite
lateral posterior (Fig. 24.1). As estruturas vasculares
relacionadas com a região são as artérias cerebrais an- Fig. 24.2 – A angiotomografia com reconstrução em 3D
mostra bem a relação das artérias com o tubérculo selar. A2
teriores, comunicante anterior e recorrentes de Heub- = segmento distal à artéria cerebral anterior; A1 = segmento
ner (Fig. 24.2). proximal da artéria comunicante anterior; Coa = artéria comu-
nicante anterior; Tu = tubérculo selar.

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287
Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

INCIDÊNCIA no pré-operatório e ocorreriam mais tardiamente15,24.


Entretanto, hiperprolactinemia causada por alteração
Os meningiomas de tubérculo selar, junto com hipotalâmica tem sido relatada12,25.
os da goteira olfativa, são os meningiomas mais fre-
Anosmia ou hiposmia é um sintoma não muito co-
qüentes em fossa anterior. Os meningiomas de tubér-
mum nos meningiomas de tubérculo selar. Poppen9
culo selar estão entre 5,5% e 10% dos meningiomas
afirma que anosmia é um sintoma inicial nos menin-
intracranianos1,8,13-15. Esse tumor incide mais na quin-
giomas de goteira olfativa, no entanto os distúrbios
ta década de vida, com predominância em mulheres.
visuais aparecem mais tardiamente, em oposição aos
meningiomas de tubérculo selar, os quais se apresen-
QUADRO CLÍNICO tam inicialmente com distúrbios visuais e somente
O meningioma de tubérculo selar caracteriza-se pela mais tarde com anosmia ou hiposmia.
síndrome quiasmática (atrofia óptica primária com per-
da do campo visual bitemporal em pacientes com sela Diagnóstico por Imagem
normal), descrita por Holmes e Sargent16 e, posterior-
Como regra, longo período separa o início dos sin-
mente, divulgada por Cushing e Eisenhardt1. Devido à
tomas e o diagnóstico. O período entre o início dos
sua origem no tubérculo selar, esses tumores deslocam
sintomas e o tratamento cirúrgico, na maioria dos pa-
o quiasma superior e posteriormente e causam sinto-
cientes, excede dois anos. Quando o tamanho do tu-
mas mais cedo que os tumores da goteira olfatória.
mor é maior que 4 cm e a compressão de importantes
Os principais sintomas observados por Solero et estruturas neurovasculares é evidente, as possibilida-
al.15, em ordem de freqüência, foram: déficit visual, des de remoção completa são limitadas e as chances
distúrbios mentais, epilepsia, hiposmia e déficits mo- de melhora da função visual são baixas.
tores. Após os exames neurológicos, os autores ob-
servaram algum tipo de perda visual em 98% dos pa-
cientes, atrofia óptica em 78%, hemiparesia em 15%, Radiografia Simples
anosmia em 11% e síndrome de Foster-Kennedy Os meningiomas de tubérculo selar normalmente
(caracterizada por atrofia óptica primária e escotoma provocam densa hiperostose do tubérculo selar, que
central no lado da lesão e edema de papila no lado pode ser vista na radiografia simples de crânio em
oposto) em 5% dos pacientes. projeção ântero-posterior e de perfil. Meningiomas
Geralmente, esses tumores manifestam-se por per- de tubérculo selar podem apresentar hiperostose, com
da insidiosa, progressiva e assimétrica da visão, ini- o aspecto de pincel e sua implantação na base do crâ-
ciando com decréscimo da acuidade visual unilateral nio26. Outra alteração característica desses tumores é
ou redução concêntrica do campo visual, seguida por a compressão em “bolha” do osso cortical superior
perda bilateral da visão. Eventualmente a perda visual das células etmoidais posteriores e do seio esfenoidal
pode ser intermitente e variar ao longo da história da anterior, o que normalmente está associado a hiperos-
doença17-20. No exame neuroftalmológico são encontra- tose no plano esfenoidal, no plano do tubérculo selar
dos distúrbios assimétricos e incongruentes do campo ou da hiperostose em formato de pincel.
visual, atrofia óptica primária com escotoma central,
distúrbios bitemporais e assimétricos do campo vi­sual Angiografia Carotídea
e, excepcionalmente, perda visual bitemporal simétri-
ca. Devido à anatomia peculiar, Schlezinger et al.21 A angiografia carotídea constitui um exame impor-
afirmaram que essas lesões não são homogêneas. O tante na avaliação pré-operatória dos meningiomas de
déficit visual pode piorar com a gravidez e melhorar tubérculo selar e fornece a localização das artérias ca-
sensivelmente após o parto2,17,20,22, o que sugere uma rótidas e cerebrais anteriores em relação à superfície
dependência hormonal das lesões. Edema de papila é do tumor, o que permite verificar o envolvimento des-
menos freqüente e ocorre mais tardiamente12. Cefaléia tas pela massa neoplásica. Esses tumores apresentam
é o segundo sintoma mais encontrado (em 50% dos características de lesões subfrontais10, entre as quais:
casos de Al-Mefty e Smith12) e predomina na região • Elevação da artéria cerebral anterior e de seus
frontal ou na região retrorbitária17,20.. Distúrbios men- ramos. Esses vasos são esticados e empurra-
tais como perda de memória, alterações de personali- dos superiormente, formando um arco com
dade, depressão e ansiedade podem ocorrer em 10% concavidade voltada para a base do crânio. O
dos pacientes15,23,24. Raramente o quadro se inicia por tamanho do arco indica o tamanho do tumor
meio de crises convulsivas19. A síndrome de Foster- naquele ponto.
Kennedy e os déficits motores são incomuns12. • A artéria cerebral anterior é centrada ou deslo-
Quando crescem posteriormente, os tumores do cada, deslocação rotatória, em relação à linha
tubérculo selar comprimem o hipotálamo e a hipó- mediana, dependendo da localização mediana
fise. Sinais de insuficiência pituitária não são usuais ou paramediana do tumor.

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24 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas do Tubérculo e Diafragma Selar

• Sifão carotídeo normalmente deslocado infe- normalmente significa edema cerebral em 60% a 70%
riormente, em arco fechado. dos casos27,29-32. A presença de edema perilesional é
• Bifurcação da artéria carótida interna, desloca- proporcional ao tamanho da lesão31. Outras lesões,
da posteriormente como uma linha perpendi- como encefalomalacia, desmielinização, represa-
cular ao nível da bifurcação, passa posterior- mento de liquor, cistos aracnóideos, cistos protéicos
mente à porção intracavernosa da carótida. e gliomas, podem apresentar-se também como áreas
• Eventualmente, nos tumores de tubérculo selar hipodensas ao redor dos meningiomas33 sem signifi-
que crescem posteriormente, a artéria basilar car edema.
pode estar deslocada.
A artéria oftálmica irriga, pelo menos parcialmen- Ressonância Nuclear Magnética
te, esses tumores, através de seus ramos etmoidais A ausência de artefatos causados pelo osso e a
posteriores, e está alargada mesmo na ausência de possibilidade de melhorar a visualização dos menin-
retenção de contraste pelo processo expansivo. Para giomas com contraste paramagnético fazem da resso-
definir a artéria oftálmica como anormal, é necessária nância nuclear magnética (RNM) o exame que mais
a visualização de seus ramos etmoidais na junção des- informações fornece sobre tumores intracranianos,
tes com os ramos meníngeos no assoalho orbital10. o que facilita a identificação de lesões que passaram
O envolvimento das grandes artérias pela neopla- despercebidas na TC26,34,35.
sia pode ser observado nas angiografias por meio de Os meningiomas, na maioria das vezes, têm isos-
constrições locais na parede dos vasos e, até mesmo, sinal em relação ao cérebro, em T1 e T2. A seqüência
obstruções em alguns casos. de pulso com saturação parcial e recuperação inver-
Nas fases arterial e venosa, os meningiomas de tu- tida (T1-pesada) permite melhor resolução espacial e
bérculo selar geralmente apresentam retenção homo- mostra a localização extra-axial de alguns tumores,
gênea do contraste, o que determina o tamanho exato bem como seus efeitos de massa e deslocamentos es-
da neoplasia. truturais com compressão da substância branca5 (Fig.
Na fase venosa, a veia septal quase sempre está 24.3). O edema ao redor dos tumores pode ser facil-
deslocada superiormente, e a porção anterior da veia mente detectado na seqüência T2-pesado. A RNM
cerebral interna pode estar deslocada posteriormente também mostra deslocamentos, oclusões e envolvi-
e com seu arco aumentado10. mento de vasos pelo tumor, melhor que a TC e, possi-
velmente, melhor que a angiografia convencional35,36.
Tomografia Computadorizada Em relação à TC, a RNM é inferior na identifica-
ção de calcificações associadas ao meningioma e
A tomografia computadoriza (TC) de crânio é o hiperostoses36,37. A injeção de contraste paramagné-
exame isolado mais sensível para a detecção de me- tico (gadolínio-DTPA) permite melhor visualização
ningiomas intracranianos13. A TC sem contraste per- dos meningiomas e a distinção entre meningiomas de
mite o diagnóstico de meningioma em 63% dos casos tubérculo selar e outras lesões supra-selares.
e, com a injeção de contraste, esse número sobe para Apesar dos recentes avanços em imagens neuro-
90%28. Tumores menores que 1 cm, principalmente diagnósticas, pode ser difícil diferenciar um meningio-
os de localização parasselar, orbital ou parassagital, ma de tubérculo selar de um macroadenoma pituitário.
podem não ser detectados pela TC13. Sem contraste, A RNM suplanta a tomografia e é a primeira escolha
os meningiomas apresentam-se como lesões hiper- para lesões selares e supra-selares, entretanto RNM
densas em 75% dos casos, hipodensas em 14,4% e,
ocasionalmente, isodensas. A TC é mais sensível que
a radiografia simples de crânio para a detecção de A B
depósitos de cálcio e mostra calcificações em 10% a
26% dos meningiomas29,30. As calcificações variam
de pequenos pontos a grandes áreas formadas pela
confluência de psamomas.
Após a injeção de contraste iodado, esses tumores,
quando não muito calcificados, apresentam retenção
homogênea do contraste, com um contorno nítido e
regular, algumas vezes lobulado, e uma grande área
de contato com a dura-máter na região do plano es-
fenoidal. Em 15% dos pacientes com meningiomas, Fig. 24.3 – (A) Corte sagital de RNM evidenciando mas-
sa com hipersinal em região de sela túrcica, arredondada, de
podem-se encontrar, na TC, necrose, sangramentos, limites bem definidos, com base de implantação extensa na
lesões císticas e degeneração gordurosa. A TC mos- dura-máter do tubérculo selar. (B) Corte axial de RNM de-
tra áreas hipodensas ao redor do meningioma, o que monstra a mesma lesão.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

sem contraste não é confiável para a distinção entre me- são ressecáveis por meio de craniotomias unilaterais.
ningiomas de tubérculo selar e macroadenomas pituitá- A craniotomia pterional ampliada pode fornecer acesso
rios38. A distinção acurada entre esses dois diagnósticos amplo, principalmente após drenagem liquórica com
de massas supra-selares é importante, pois, enquanto a dissecção da cisterna sylviana (Figs. 24.6 a 24.8).
um meningioma de tubérculo selar sempre requer uma A porção posterior do tumor pode ser alcançada pelo
craniotomia, a via transesfenoidal é preferível na remo- espaço carótido óptico (Fig. 24.9) e mais liquor pode
ção da maioria dos macroadenomas pituitários. ser drenado pela abertura da membrana de Liliquist.
Três características distinguem os meningiomas O acesso à fossa interpeduncular, bem como à cisterna
de tubérculo selar dos macroadenomas pituitários38: crural, pode ser conseguido por essa via. A porção an-
• Contrastação homogênea e brilhante com ga- terior do tumor pode ser atingida sem dificuldades.
dolínio, em oposição à contrastação pobre e A extensão e a duração dos sintomas visuais, en-
heterogênea. volvimento do complexo da artéria cerebral anterior e
• Um epicentro do tumor mais supra-selar que tamanho do tumor são fatores importantes que afetam
selar. a cirurgia4.
• Extensão paralela à base da dura-máter. O tratamento ideal dos meningiomas frontobasais
Cada um desses achados pode ser sutil, mas o é a ressecção completa do tumor, com descompressão
exame cuidadoso de imagens da região parasselar em de vasos e do tecido nervoso e ressecção da dura. No
secções coronal e sagital, de alta qualidade e contras- entanto, antes de tomar a decisão, devem-se conside-
tadas com gadolínio, permitem um diagnóstico pré- rar os riscos e benefícios, uma vez que, na maioria
operatório correto. das vezes, o tumor cresce lentamente. Dessa maneira,
é inaceitável que um paciente idoso com exames neu-
rológicos normais, por exemplo, após uma cirurgia
Tratamento Cirúrgico radical, apresente graves seqüelas, como perda visual
Os tumores frontobasais têm sido operados pe- significativa, para o resto de sua curta vida.
las vias unilateral e bifrontal (Tabela 24.1). Vários
autores9,12,13,19,39-41 preferem realizar uma craniotomia
lateralizada direita, com menor ou maior extensão
através de ressecções ósseas (frontal, frontotem-
poral ou pterional, com ou sem ressecção do arco
supra-orbital), e através da via frontal9,13,19,40,41 ou do
arco esfenoidal37,39. Na via bifrontal8,42 o acesso é
feito através da fissura inter-hemisférica (Figs. 24.4
e 24.5). Alguns autores recomendam a craniotomia
frontotem­poral com ressecções não-radicais para tu-
mores parasselares e radiocirurgia para tumores re-
siduais e recorrentes43,44, enquanto outros afirmam
que a remoção radical dos tumores pode resultar em
menores taxas de recorrência sem aumentar as com- Fig. 24.4 – Paciente posicionado com a incisão marcada
plicações cirúrgicas45. Operações radicais em tumores bicoronal para se realizar craniotomia bifrontal
próximos à haste pituitária são contra-indicadas46.
A decisão sobre a via de acesso aos tumores fron-
tobasais deve ser considerada tendo como base prin-
cipal sua localização em relação aos eixos ântero-
posterior e axial. Os meningiomas de tubérculo selar
maiores são mais facilmente ressecados por meio de
uma craniotomia bifrontal, já os tumores menores,
especialmente os posicionados mais posteriormente,

Tabela 24.1 – Acessos possíveis para abordagem do


tubérculo selar
• Craniotomia bifrontal
• Craniotomia pterional
• Craniotomia pterional ampliada
• Craniotomia bifrontal transetmoidal
Fig. 24.5 – Acesso inter-hemisférico para abordagem de me-
ningiomas do tubérculo selar.

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24 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas do Tubérculo e Diafragma Selar

Fig. 24.6 – Posicionamento do paciente para a abordagem Fig. 24.9 – Visão intra-operatória mostrando a dissecção do
frontotemporal, tumor junto ao nervo óptico direito em branco.

CRANIOTOMIA
Os detalhes técnicos da craniotomia pterional e
pterional ampliada, bem como bifrontal, são discu-
tidos no capítulo referente ao tratamento cirúrgico de
meningiomas de goteira olfativa. A Fig. 24.10 mostra
as opções de acesso de acordo com tamanho e sinto-
ma. A craniotomia fronto-orbitozigomática também
poderá ser usada em tumores com extensão importan-
te na base do crânio33. Em casos de tumores muito vo-
lumosos que envolvem a carótida, pode-se proceder a
uma anastomose da carótida interna cerebral média,
com enxerto venoso cuja técnica será mais bem expli-
cada no capítulo de bypass de alto fluxo33.

Opções para os meningiomas do tubérculo selar

Fig. 24.7 – Craniotomia pterional. Pequeno e assintomático Grandes (2,5 a 3,5 cm)

Seguimento Craniotomia bifrontal

Craniotomia pterional

Fig. 24.10 – Este diagrama mostra nossa conduta em rela-


ção aos meningiomas de fossa anterior, tubérculo selar e go-
teira olfativa.

TÉCNICA MICROCIRÚRGICA
O parâmetro da ressecção deve ser a acessibilida-
de à superfície que separa o nervo óptico da pseudo-
cápsula do tumor. Com descolador microcirúrgico,
deve-se separar esse espaço virtual. Da mesma for-
Fig. 24.8 – Acesso transylviano e subfrontal pode ser possí- ma, a aderência do tumor à carótida deve ser desfei-
vel pela abordagem frontotemporal. ta com um dissector em ângulo reto. O debulking ou

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

esvaziamento central do tumor poderá ser feito com


aspirador ultra-sônico, ou mesmo ser retirado em pe-
quenos pedaços por meio de pinça tumor e tesoura
microcirúrgica47. A coagulação bipolar deve ser evita-
da se próxima aos nervos e quiasma ópticos. A porção
inferior junto ao tubérculo selar deve ser destacada do
tubérculo com cureta plana, cortante, microcirúrgica
(Sammii curete ou Tellermesser, Aesculap, Germany),
devendo-se coagular a superfície cruenta onde havia o
implante tumoral. A porção superior junto ao terceiro
ventrículo e quiasma deve ser removida com luxação
gentil com pinça tumor em uma mão e pinça angulada
microcirúrgica em outra, fazendo-se dissecção com as
duas mãos. O auxiliar, nesse momento, deverá provi-
denciar a aspiração do leito cirúrgico sob visão mi-
croscópica, enquanto o cirurgião remove o tumor.

Resultados
As cirurgias de meningiomas de tubérculo selar Fig. 24.12 – A TC de crânio do mesmo paciente mostra re-
moção total, porém com aumento da dilatação ventricular.
têm índice importante de mortalidade (20%)17, em-
bora a introdução das técnicas microcirúrgicas tenha
diminuído significativamente a mortalidade.
Os distúrbios visuais observados no pré-operatório Alguns estudos demonstraram que um tumor de
melhoram em 25% a 79% dos pacientes após o trata- diâmetro maior que 4 cm é um fator crítico para a
mento cirúrgico6,6-8,11,17-19,24,28,36,48,49. Diversos fatores in- função visual. Também se demonstrou que o tamanho
terferem favoravelmente no prognóstico pós-operatório da lesão é extremamente importante, pois influencia
da visão, entre eles duração da sintomatologia menor na quantidade de tumor que pode ser ressecada (Figs.
que 2 anos, tumores menores que 3 cm, perda visual 24.13 a 24.19)44.
pré-operatória menor que 50% e presença de papilas A mortalidade, em séries mais recentes,12, 36,37,48,51,,
normais no exame neurológico2,8,15,24,36,50. Idade avança- foi reduzida para 5% a 11%. A ressecção total do tumor
da e tumores com extensão para o diafragma selar são visível acontece em 40% a 100% dos casos1,2,6-8,22,15,17-
indicadores de pior prognóstico (Figs. 24.11 e 24.12).
19,24,28,50,52,53,
. A razão mais importante para ressecção
parcial foi a possibilidade de lesão vascular7,8,19. Ape-
sar da ressecção total, ocorrem recidivas em 3% a 25%
dos pacientes, em um período de 2,5 anos15,18,24,54.

Fig. 24.13 – RNM em corte sagital T1, com contraste, mos-


Fig. 24.11 – A RNM em cortes axiais com administração de tra lesão em tubérculo selar e diafragma com invasão da sela
contraste demonstra meningioma de tubérculo selar em pa- em paciente do sexo feminino, de 62 anos, com distúrbio vi-
ciente de 63 anos, do sexo masculino. sual pré-operatório.

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24 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas do Tubérculo e Diafragma Selar

Fig. 24.17 – Visão microcirúrgica por craniotomia pterio-


Fig. 24.14 – RNM em corte sagital T1, pós-operatória, mos- nal, com o tumor comprimindo o quiasma óptico.
tra ressecção total, restando o componente intra-selar.

Fig. 24.15 – RNM em corte coronal T1, com contraste, pré- Fig. 24.18 – Visão microscópica da dissecção no espaço
operatória, mostra a extensão supra-selar do tumor. entre o nervo óptico e o tumor.

Fig. 24.16 – RNM em corte coronal, pós-operatória, mostra Fig. 24.19 – Visão microscópica mostra a remoção total,
a remoção radical. com preservação do nervo óptico, haste hipofisária.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

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25
Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas
com Origem na Asa do Osso Esfenóide
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Gustavo Rassier Isolan

Introdução ou hidrocefalia. Podem manifestar-se, inicialmente,


com crises epileptiformes pela sua extensão ao lobo

O
s meningiomas da asa do esfenóide são parte temporal. Essas crises são normalmente parciais,
de um grupo maior chamado meningiomas de complexas, secundariamente generalizadas e facil-
fossa média, o qual inclui também os menin- mente controláveis com carbamazepina.
giomas do seio cavernoso e os meningiomas selares1-3.
Quando invadem a órbita ou a fissura esfenorbitá-
Neste capítulo serão abordados apenas os meningio-
ria, podem provocar proptose exuberante, facilmente
mas com base de implantação na dura-máter que reco-
identificável ao exame clínico (Figs. 25.2 a 25.5).
bre a asa do osso esfenoidal e serão brevemente discu-
tidos aqueles que invadem o seio cavernoso.
Os meningiomas que se originam em qualquer
porção da asa do esfenóide representam aproximada-
mente de 14% a 31% dos meningiomas intracrania-
nos, estando entre as três localizações mais comuns
descritas na literatura1-18.
Os meningiomas da asa do esfenóide podem ser
subdivididos em três grupos, conforme sua localiza-
ção: terço interno, terço médio e terço externo. Estes
dois últimos são abordados em conjunto, dada a se-
melhança da estratégia cirúrgica.
A
QUADRO CLÍNICO
A cefaléia temporal pode ser o sintoma mais fre-
qüente, mas, sem dúvida, é inespecífica para se diag-
nosticar tal doença se analisada isoladamente. Os
meningiomas do terço interno podem invadir o ca-
nal óptico (Fig. 25.1) e o seio cavernoso e provocar
exuberante sintomatologia e sinais neurológicos de
nervos cranianos, entre eles o II, III, IV, V e VI3,4. Se
volumosos, podem provocar a atrofia óptica e edema
de papila contralateral por hipertensão intracraniana,
como acontece em meningiomas do tubérculo selar e B
da goteira olfativa, ocasionando a síndrome de Foster Fig. 25.1 – (A e B) Campimetria comparativa demonstra
Kennedy. Menos freqüentemente, provocam distúr- déficit de campo visual por compressão do nervo óptico por
bios endócrinos pela compressão da haste hipofisária tumor esfenorbitário.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 25.2 – Proptose exuberante, visível durante inspeção Fig. 25.4 - Proptose exuberante, visível durante inspeção
clínica em paciente do sexo feminino de 35 anos, com perda clínica em paciente do sexo feminino, de 52 anos, com perda
de campo visual. de campo visual

Fig. 25.3 – TC de crânio sem contraste demonstra extensa Fig. 25.5 – TC de crânio sem contraste demonstra extensa
hiperostose com infiltração tumoral da órbita e da região esfe- hiperostose com infiltração tumoral da órbita e da região esfe-
norbitária esquerda, relativa à paciente da Fig. 25.1. norbitária esquerda, relativa à paciente da Fig. 25.1.

CLASSIFICAÇÃO dos, que deslocam ou envolvem estruturas adjacentes,


como nervos e artérias. Geralmente apresentam um
Os meningiomas originados da asa do esfenóide são ponto de implantação por onde se dá a sua irrigação.
bastante complexos, graças à sua intrincada anatomia, Nos meningiomas em placa, as suas células patológi-
apresentando íntima relação com as artérias da circula- cas preenchem os canais ósseos de Havers e podem
ção anterior, nervos oculomotores e vias ópticas3,4,11,12. disseminar-se para o ptério, órbita, malar, zigoma, fos-
Diversas classificações foram propostas no decorrer sa média e osso temporal. Essa infiltração óssea resulta
dos anos a fim de padronizar o estudo dos meningio- em hiperostose, produzindo exoftalmo e abaulamento
mas da região3,4,6. Os meningiomas dessa área podem temporal1-18.
apresentar-se como nodulares ou em placa. Os tumo- A classificação mais usada divide os meningiomas
res nodulares são encapsulados, de tamanhos varia- nodulares de acordo com a localização de sua implan-

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25 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas com Origem na Asa do Osso Esfenóide

tação, localizados no terço interno, terço médio (alar)


ou terço externo (esfenotemporal)2,18. Os tumores lo-
calizados no terço interno subdividem-se em clinói-
deos ou esfenocavernosos. Em determinados tumores
volumosos que ocupam toda a extensão da asa do es-
fenóide pode ser difícil a correta localização de seu
implante tumoral. Petit-Dutaillis4 dividiu-os em tumo-
res da asa menor e da asa maior. Bonnal e Brotchi3,4 os
classificaram de acordo com sua implantação e forma-
to, a saber: clinóideos ou esfenocavernosos, menin-
giomas em placa com acometimento do terço médio,
globosos do terço médio, globosos do terço lateral e,
finalmente, os pterionais (Figs. 25.6 a 25.8).
Al-Mefty1,2 subdividiu os tumores clinóideos em
três categorias. Na primeira categoria encontram-se
os tumores com origem na porção inferior da clinóide
anterior, proximal à cisterna carotídea, englobando a
artéria carótida interna e sem plano de clivagem. No
segundo grupo o tumor envolve a artéria carótida, po-
rém apresenta plano de clivagem, originando-se súpe-
ro-lateralmente à clinóide anterior. O terceiro grupo
refere-se aos tumores, geralmente pequenos, que se Fig. 25.7 – TC (tomografia computadorizada) de crânio, com
originam no canal óptico e englobam o nervo óptico. contraste iodado endovenoso, mostra lesão em terço médio da
Quanto aos meningiomas do seio cavernoso, asa do esfenóide, com íntima relação com artéria cerebral média.
Sekhar13-16 propôs uma classificação de acordo com o
grau de dificuldade de remoção do tumor. Os tumores
do primeiro grupo apresentam contato com a artéria
carótida interna sem envolvê-la. Os do segundo gru-
po envolvem a artéria carótida, porém não causam
estenose. Os tumores do terceiro grupo envolvem a
artéria e causam sua estenose.

Fig. 25.6 – RNM (ressonância nuclear magnética) do encé- Fig. 25.8 – TC de crânio, com contraste iodado endovenoso,
falo, imagens em T1, com gadolínio, mostra meningioma em mostra lesão em terço interno da asa do esfenóide, com envol-
terço externo de asa do esfenóide, com origem na sua porção vimento da artéria cerebral média, carótida interna e comuni-
lateral e superior. cante posterior.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

ANATOMIA MICROCIRÚRGICA DA ASA DO


ESFENÓIDE
O osso esfenoidal é anatomicamente complexo e
integra diversas regiões do crânio, formando as bases
anterior e média. A base anterior do crânio, formada
pelos ossos etmoidal, esfenoidal e frontal, é dividida
em duas porções: uma porção medial, formada pela
crista galli e placa cribriforme do osso etmoidal ante-
riormente e pelo plano do corpo esfenoidal posterior-
mente, recobrindo a cavidade nasal superior e o seio
esfenoidal.
Sua porção lateral, formada pelo osso frontal e asa
menor do esfenóide, recobre a órbita e o canal óptico.
A base média do crânio pode ser dividida em uma
porção medial, formada pelo corpo do osso esfenoi-
dal, onde se encontram o tubérculo da sela, fossa pi- Fig. 25.9 – Bases cranianas anterior e média. ClAn = clinóide
anterior; D = dorso selar; Ma = asa maior do esfenóide; Me = asa
tuitária, processos clinóideos anterior e médio, sulco menor do esfenóide; P = fossa pituitária; T = tubérculo selar.
carotídeo e dorso da sela. A porção lateral é formada
pelas asas maior e menor do osso esfenoidal. A asa
maior do esfenóide forma a maior parte do assoalho
da fossa média, sendo esta complementada pela por-
ção escamosa e petrosa do osso temporal.
A asa do esfenóide é uma crista óssea, que, a partir
da clinóide anterior, descreve uma curva ântero-late-
ral no plano horizontal até a porção lateral da caixa
craniana (Figs 25.9 e 25.10). Essa estrutura anatômi-
ca, que delimita a fossa anterior e a fossa média, pode
ser dividida em três segmentos: interno ou clinoidal,
médio ou alar e externo ou pterional12.

Meningiomas do Terço Médio e


Externo da Asa do Esfenóide
Esses meningiomas são de abordagem mais fácil Fig. 25.10 – Porções da asa do esfenóide: interna (verme-
e não apresentam grandes dificuldades cirúrgicas . O lho), média (verde), externa (azul).
posicionamento em decúbito dorsal horizontal exige
um extensão e leve rotação da cabeça contralateral
ao tumor. A craniotomia pterional ampliada é a reco-
mendada e a brocagem do terço externo da asa do es-
fenóide facilita interromper a nutrição do tumor pela
artéria meníngea média (Figs. 25.11 a 25.16).
A embolização prévia dessas lesões permite sua
retirada praticamente sem sangramento. Quando a
embolização não for realizada, o ataque direto na
base de implantação do tumor vai progressivamente
diminuindo sua irrigação e, portanto, o sangramento.
O ponto de implantação desses tumores na asa
do esfenóide merece atenção especial, para se evitar
as recidivas. A dura-máter envolvida deve ser resse-
cada e o osso invadido pelo tumor deve também ser
ressecado com auxílio do drill de alta rotação. Em
alguns casos, os tumores restringem-se ao osso esfe-
noidal, porção externa, podendo estender-se à órbita
(meningiomas esfenorbitários), sendo necessária uma Fig. 25.11 – A RNM mostra meningioma volumoso com
remoção dessas estruturas ósseas por brocagem (Figs. implante na superfície externa do osso esfenóide e na conve-
25.17 e 25.18). xidade temporal e frontal, que contrasta com gadolínio.

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25 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas com Origem na Asa do Osso Esfenóide

Fig. 25.12 – O paciente deve ser colocado em decúbito dor- Fig. 25.15 – Após a craniotomia, a dura-máter deve ser
sal horizontal com a cabeça fixada com cabeceira de Mayfield, exposta da base da fossa média até o teto orbitário. Pode-se
pouco rodada e defletida com o malar acima do nível da órbita. notar a brocagem da asa do esfenóide.
A incisão deve cobrir o osso pterional, parte do temporal e fron-
tal, conforme a figura cirúrgica. Notar os fios dos sensores do
potencial evocado, instalados na órbita, para monitoração do III,
IV, V e VI nervos, A incisão é infiltrada com marcaína a 0,5%.

Fig. 25.16 – A abertura dural deve ser em arco invertido,


voltado para a base esfenoidal e em torno do tumor.
Fig. 25.13 – A craniotomia pterional deve ser feita de ma-
neira habitual, com quatro orifícios de trepanação e, em de- Os defeitos da dura-máter, normalmente de peque-
corrência da aderência dural do tumor, deve se evitar o cranió­
tomo, optando-se pela serra de Gigli tradicional. A brocagem na extensão, são reconstruídos usando-se pericrânio ou
da asa do esfenoide com drill de alta rotação é indispensável e substitutos durais (Duracys®, Duradry®, Duragen®, Pre-
deve-se coagular a artéria meníngea média na sua emergência, clude® e outros no mercado). Para defeitos basais e quan-
no forame espinhoso. do o fechamento da dura-máter não puder ser hermético,
fragmentos de músculo ou pericrânio embebidos em
cola biológica conseguem selar os orifícios, evitando-se,
assim, fístulas liquóricas (Tissucol® ou Beriplast®).
Quando o osso é largamente envolvido, sua retirada
pode provocar grandes defeitos no crânio (Fig. 25.18),
que podem ser corrigidos no mesmo ato cirúrgico por
meio da cranioplastia com acrílico. O esvaziamento
intratumoral deve preceder a dissecação externa do tu-
mor na sua face pial e sua luxação. Esse esvaziamento
pode ser realizado com aspirador ultra-sônico ou em
pequenos pedaços (piece meal). Quando o componente
de implantação na asa do esfenóide é pequeno, pode-
se proceder a uma remoção em bloco, com separação
cuidadosa microcirúrgica da superfície tumoral e da
pia-aracnóide adjacente, colocando-se cotonóides nesse
Fig. 25.14 – O retalho ósseo deve ser amplo de modo a per- plano, com objetivo de separação dos tecidos e hemos-
mitir uma visualização de toda a margem do tumor. tasia (Fig. 25.19 a 25.22).

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 25.19 – Abrindo-se a dura-máter, as superfícies tumo-


ral e pial podem ser facilmente identificadas e a dissecação
cuidadosa deve ter início com tesoura microcirúrgica e ime-
diata coagulação, seguida de colocação cuidadosa de cotonói-
de separando as duas superfícies e auxiliando a hemostasia.

Fig. 25.17 – RNM de crânio, em corte coronal, mostra a


invasão esfenorbitária de meningioma em placa.

Fig. 25.20 – Em casos em que a base de implantação é res-


trita no osso esfenóide, pode-se proceder à remoção em bloco.

Fig. 25.18 - TC de crânio pós-operatória demonstra a res-


secção radical, após brocagem e retirada de todo o osso aco-
metido.
Fig. 25.21 – Pode-se proceder ao esvaziamento do tumor
com aspirador ultra-sônico.

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25 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas com Origem na Asa do Osso Esfenóide

Fig. 25.22 – A maioria dos tumores esfenoidais têm, ao Fig. 25.23 – Angiografia por RNM em posição ântero-pos-
fundo do leito cirúrgico, uma invasão da pia-máter na profun- terior mostra também comprometimento da artéria cerebral
didade e, como se pode ver ao final da remoção radical, o mais média em bifurcação de M1 e as setas mostram a área hiper-
freqüente é encontrar-se uma superfície cruenta. vascularizada onde está o meningioma da asa interna.

Meningiomas do Terço MÉDIO E


InTERNO da Asa do Esfenóide
Os meningiomas do terço interno da asa do esfe-
nóide e os meningiomas cavernosos são estudados
juntos, pois a tática cirúrgica de ambos possuem se-
melhanças. Nesses casos, a angiografia convencional
ou por RNM é imprescindível para determinar o grau
de comprometimento das artérias do polígono de
Willis (Figs. 25.23 e 25.24)
O grande problema desses tumores é a sua relação
com a carótida interna e seus ramos e com os nervos
cranianos II, III, IV, V e VI17. Além disso, a presença
do tumor em torno das artérias lenticuloestriadas e ar-
téria corióidea anterior torna a cirurgia mais arrisca-
da, pois lesões desses vasos podem ocasionar déficits
motores significativos. Esses tumores serão discuti-
dos em capítulo à parte.
Os meningiomas do terço médio da asa do esfe- Fig. 25.24 – RNM do encéfalo do paciente da Fig. 25.23, em
nóide são mais facilmente acessados e sua relação la- corte coronal, mostra a correspondência do tumor abrangendo
teral com as estruturas neurovasculares permite uma a asa do esfenóide.
sistematização da abordagem (Figs. 25.25 a 25.39).
déficits da motilidade ocular por paresia do IV, V ou
A técnica cirúrgica utilizada no caso da pacien-
III nervos (Figs. 25.40 a 25.43).
te das Figs. 25.25 a 25.36 consistiu de craniotomia
pterional, ampliada para região posterior, com reti- A extensão do meningioma é um dos parâmetros
rada do processo clinóideo por via extradural e teto usados para se indicar a ressecção desses tumores den-
orbitário e brocagem da asa esfenoidal até o proces- tro do seio cavernoso5,7,8,9,13,18. Esses tumores podem ser
so clinóideo anterior; após abertura da dura-máter e subdivididos, segundo esse critério, em cinco grupos:
identificação do tumor que se estendia desde a porção • Grau I: envolvimento de apenas uma área do
interna do osso esfenoidal até a porção externa, dis- seio, sem envolver a artéria carótida
secamos os seus limites com dissector microcirúrgico • Grau II: envolvimento de mais de uma área do
e procedemos ao esvaziamento do seu centro com as- seio, desviando a artéria carótida, sem envol-
pirador ultra-sônico. Luxamos a pseudocápsula com ver o vaso.
fórceps microcirúrgico e ressecamos a dura-máter • Grau III: envolvimento da artéria carótida.
basal comprometida (Figs. 25.32 a 25.36). • Grau IV: envolvimento com estenose ou oclu-
A retirada do tumor, quando este invade o seio são da artéria carótida
cavernoso, é uma tarefa de execução muito difícil e • Grau V: envolvimento bilateral, com envolvi-
está associada a alguma morbidade, especialmente mento da artéria carótida.
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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 25.25 – RNM de crânio (paciente de 37 anos, do sexo Fig. 25.26 – RNM de crânio pré-operatória, em cortes coro-
feminino, no puerpério, com quadro de alterações visuais e nais, mostra cavidade cística da lesão implantada no terço médio,
cefaléia), com contraste, mostra lesão esfenoidal com edema e com área de edema e desvio das estruturas da linha mediana.
desvio das estruturas da linha mediana. Trata-se de meningio-
ma de terço médio da asa do esfenóide.

A B

Fig. 25.27 – (A e B) TC de crânio, com contraste do pós-operatório imediato, mostra ressecção radical. Após ressecção tumoral,
visualiza-se a melhora do desvio das estruturas da linha mediana.

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25 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas com Origem na Asa do Osso Esfenóide

Fig. 25.28 – RNM do encéfalo, em pós-operatório tardio Fig. 25.30 – Paciente no pós-operatório imediato (com au-
(2 anos de seguimento), mostra a remoção completa sem re- torização).
cidivas.

Fig. 25.29 – RNM em corte coronal com gadolínio, pré-ope- Fig. 25.31 – Após 2 anos da ressecção tumoral, em índice
ratória, em que se pode ver a grande extensão do tumor. de Karnofsky de 100%, com retorno às suas atividades profis-
sionais, completamente curada (com autorização).

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 25.32 – Visão cirúrgica demonstra a grande extensão Fig. 25.35 – Visão cirúrgica que mostra a coagulação do
do tumor junto à asa do esfenóide após a abertura dural. implante e ressecção da dura-máter basal.

Fig. 25.33 – Visão cirúrgica – procede-se ao esvaziamento Fig. 25.36 – Visão cirúrgica que mostra a ressecção da du-
intratumoral com aspirador ultra-sônico. ra-máter comprometida.

Teste de Oclusão
No teste de oclusão14,15,17, realiza-se uma angiogra-
fia para estudar a circulação cerebral. A seguir, um
cateter de angioplastia é colocado na artéria carótida
e insuflado. O paciente é constantemente examinado
para se detectar qualquer déficit neurológico. Se hou-
ver falha do paciente no teste de oclusão, isso signi-
fica que a lesão da carótida, durante a cirurgia, pode
trazer-lhe déficits importantes. Nesses casos, se a ca-
rótida estiver envolvida pelo tumor, deve-se realizar
um bypass da carótida cervical para a cerebral média
ou interna supraclinóidea2,14,15,17.

Fig. 25.34 – Visão cirúrgica – verifica-se o plano posterior


do tumor e, com dissector, desfazem-se as aderências com te-
cido cerebral.

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25 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas com Origem na Asa do Osso Esfenóide

A B

Fig. 25.37 – (A e B) RNM, imagens em T1 com gadolínio, mostra meningioma de terço médio esfenoidal, com efeito de massa
provocando herniação. Localiza-se lateralmente à artéria carótida, implantado junto ao osso esfenoidal com íntima relação com
a artéria cerebral média esquerda.

Fig. 25.38 – TC de crânio mostra o resultado pós-operatório Fig. 25.39 – Paciente no período pós-operatório sem défi-
com ressecção total e melhora do desvio das estruturas da li- cits (com autorização).
nha mediana.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 25.40 – Foto cirúrgica mostrando meningioma do terço Fig. 25.43 – Foto cirúrgica mostra a fossa média e a área
médio do osso esfenoidal. Na porção superficial, deve-se fazer esfenoidal após a ressecção total do tumor, bem como os lobos
a separação do meningioma do tecido cerebral com microdis- frontal e temporal.
secção sob visão microscópica e colocar cotonóide separando
as duas superfícies.
Técnica Cirúrgica para os Meningiomas do
Terço Interno
Para a abordagem dos tumores do terço interno da
asa do esfenóide, uma craniotomia pterional é sufi-
ciente. Quando o tumor se estende para o canal óptico
ou para a fossa anterior, pode-se associar uma osteo-
tomia orbitária.
Para a abordagem dos meningiomas da asa do es-
fenóide que invadem o seio, utiliza-se uma cranioto-
mia pterional associada a uma osteotomia orbitozigo-
mática e retirada da clinóide anterior1,2,5,7-9,13,16.

Craniotomia Pterional com Osteotomia


Orbitozigomática
A osteostomia orbitozigomática é uma variante da
Fig. 25.41 – Foto cirúrgica mostrando a dissecção da cister- craniotomia pterional. Duas secções ósseas distintas
na sylviana a fim de se visualizar, na sua porção mais interna, são, então, criadas: a parte livre frontotemporal do
a artéria carótida, o nervo óptico e o III nervo. esfenóide (pterional) e as bordas superior e lateral da
órbita, com o arco zigomático acoplado (Figs. 25.44
a 25.46).
Deve-se prestar atenção para evitar a lesão da
periórbita, pois isso implicaria a protrusão de tecido
gorduroso intra-orbitário para a área da craniotomia
(Fig. 25.46). A retirada da clinóide é mais facilmen-
te realizada por via extradural. O ponto principal de
fixação da clinóide é o pilar óptico, que forma o as-
soalho do canal óptico3. Com o uso de uma broca de
diamante é possível separar a clinóide do pilar antes
de se tentar retirá-la por completo.
No caso de invasão tumoral do canal óptico, este
pode ser acessado tanto por via extra quanto intradu-
ral. Quando se usa a broca de diamante nas proximi-
Fig. 25.42 – Foto cirúrgica mostra que o esvaziamento tu- dades do nervo óptico, deve-se fazer uma irrigação
moral deve ser realizado em retirada de pequenos fragmentos,
seguidos de imediata coagulação ou por meio de esvaziamen- profusa, para se evitar a propagação do calor com
to intracapsular com aspirador ultra-sônico. possíveis danos ao nervo óptico.

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25 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas com Origem na Asa do Osso Esfenóide

Fig. 25.46 – A fotografia de dissecação anatômica mostra


a exposição após a retirada do retalho ósseo, bem como a
visualização da periórbita após retirada do teto orbitário e da
clinóide anterior.

Fig. 25.44 – O desenho mostra as linhas de osteotomias que


devem ser realizadas para se efetuar uma craniotomia fronto-
orbitozigomática.

Fig. 25.47 – Dissecação anatômica demonstra a exposição


extradural de toda a fossa média, dos ramos do nervo trigê-
meo no cavo de Meckel, da asa do esfenóide a ser brocada e
a clinóide anterior com seu pilar justaposto à carótida e ao
nervo óptico.

Fig. 25.45 – A fotografia de dissecação anatômica mostra o


retalho em bloco único, fronto-orbitozigomático.

A reconstrução cranioorbital é realizada utilizando


a tábua interna da secção óssea pterional. Esse acesso
permite ampla exposição da órbita e bases anterior
e média do crânio, de maneira a facilitar a remoção
de grandes tumores da órbita e tumores envolvendo o Fig. 25.48 – Após o pilling da fossa média ou acesso extra-
ápice da órbita, a asa do esfenóide, e as fossas infra- dural à fossa média, pode-se ter acesso à carótida intrapetrosa
por meio de brocagem do triângulo de Glassock. Podem-se
temporal e pterigopalatina. Pode-se conseguir o aces- identificar dois ramos do nervo trigêmeo originados no gân-
so à carótida intrapetrosa pelo triângulo de Kawase e glio de Gasser e no cavo de Meckel, a eminência arqueada e a
Glassock3,6 (Figs. 25.44 a 25.49). artéria carótida intrapetrosa após a brocagem.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 25.49 – O triângulo maior delimitado pelas linhas ver-


des mostra o triângulo de Glassock ou póstero-lateral do seio
cavernoso, medialmente limitado pelo nervo grande petroso
superficial (GSPN), lateralmente pela linha do forame espinho-
so à eminência arqueada, e sua base é formada pela margem
lateral da divisão mandibular do trigêmeo V3. O triângulo
menor representado por linhas verdes demonstra o triângulo
de Kawase, ou póstero-medial do seio cavernoso. Seu limite
medial é representado pelo seio petroso superior, lateralmente
pelo GSPN, e sua base por V3.

Acesso Transpetroso
A complementação da cirurgia pterional ou fronto- Fig. 25.50 – Tomografia de crânio de paciente operado de
orbitozigomática pode ser feita por um acesso trans- meningioma de asa de esfenóide, que apresentou como com-
petroso, quando necessária. plicação trombose da artéria cerebral média no pós-operatório,
Essa abordagem é indicada quando a lesão se es- conseqüente infarto cerebral do território da artéria menciona-
da, tendo sido necessária uma craniectomia descompressiva.
tende para a fossa média, posterior ou região do cli-
vo. Se o paciente apresentar boa acuidade auditiva no
pré-operatório, utiliza-se um acesso pré-sigmóide, re-
trolabiríntico. Se a audição pré-operatória estiver per- Referências Bibliográficas
dida ou em casos de tumores grandes que cruzam a li- 1. Al-Mefty O. Supraorbital-pterional approach to skull
nha média, realiza-se uma abordagem pré-sigmóidea, base lesions. Neurosurgery. 1987;21:474-7.
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25 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas com Origem na Asa do Osso Esfenóide

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26
Abordagem Neurocirúrgica da
Base Anterior do Crânio
Apio Claudio Martins Antunes
Nelson de Azambuja Pereira Filho
Alessandro Machado
Gabriel Kuhl
Michelle Lavinski

P
or vários anos, tumores que invadem a região que inclui o seio frontal, à qual denominou aborda-
medial da base do crânio foram considerados ir- gem transbasal estendida; recentemente, Iman Feiz-
ressecáveis, em razão da dificuldade de acesso. Erfan et al.6 propuseram a abordagem transbasal ra-
Os tumores que acometem a fossa anterior da base dical, que consiste em uma craniotomia bifrontal com
do crânio com freqüência se estendem intracranial- osteotomia fronto-orbitonasal.
mente, envolvendo a dura-máter e para estruturas na-
sais e paranasais, tornando imprescindível a conduta ABORDAGEM TRANSBASAL
interdisciplinar. Meningiomas da goteira olfatória e
esfenoidais são os tumores benignos mais encontra- Objetivos da Via Transbasal
dos na fossa anterior. Adenocarcinomas e estesioneu- O objetivo principal é a remoção tumoral comple-
roblastomas são exemplos típicos de tumores que se ta. Existe uma diferença básica entre ressecção de um
originam em cavidades paranasais e, secundariamen- tumor benigno e maligno na base do crânio: o tumor
te, envolvem a base anterior do crânio. A displasia benigno deve ser ressecado completamente com a má-
fibrosa costuma evoluir de modo lento, quase sem- xima preservação da função, podendo-se remover frag-
pre adquirindo grandes proporções antes de se tornar mentos até a completa ressecção; tumores malignos de-
sintomática. Outras lesões não neoplásicas incluem vem ser removidos em bloco, juntamente com margens
encefalocele frontal e traumatismos. A maioria das adequadas de tecido livre de doença. Anosmia, que
abordagens ocorre por pequenas exposições, resul-
freqüentemente está presente antes do procedimento, é
tando em ressecção incompleta do tumor. Os dife-
achado comum no pós-operatório. Cirurgias que obje-
rentes tipos de acesso a afecções que envolvem essa
tivam a manutenção do olfato envolvem a preservação
região refletem o fato de não haver uma abordagem
de estruturas da lâmina crivosa do etmóide, estando
uniforme, sendo as inúmeras adaptações realizadas
impossibilitadas em tumores originados nessa área.
resultado de preferências pessoais e condições impos-
tas pelo processo patológico de base. Um dos precur-
sores na abordagem transbasal foi Frazier1, que em Técnica Cirúrgica
1913 descreveu uma abordagem hipofisária via fos-
sa craniana anterior. Em 1958, Unterberger2 utilizou Preparação
essa abordagem para reparo de lesões traumáticas da Antibióticos profiláticos são fortemente recomen-
fossa anterior. Descrito em 1973 por Tessier et al.3 dados, sendo iniciados na indução anestésica e con-
como opção de correção para hipertelorismo orbital, tinuados por 24 horas. O paciente é colocado em de-
o termo abordagem transbasal se popularizou com a cúbito dorsal com a cabeça sobre um fixador de três
descrição técnica de Patrick Derome, na década de pontos. Em algumas situações, a cabeça do paciente
1980, que a utilizou como acesso a tumores da base pode não ser fixada e, assim, há a possibilidade de re-
do crânio4. Desde então, foram publicadas modifica- posicioná-la durante a cirurgia. O microscópio cirúr-
ções: Kawakami et al.5 incluíram a remoção em bloco gico deve ser utilizado, pelo menos, para a dissecção
do teto da órbita através de uma osteotomia bilateral de estruturas vasculares e nervosas. Para adequada

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

retração do lobo frontal, objetivando a exposição da Exposição da Base do Crânio


base do crânio, o uso de manitol e drenagem liquórica
lombar contínua intra-operatória podem ser medidas Realiza-se uma incisão bicoronal, logo posterior à
auxiliares. O paciente deve ser mantido em normoter- linha do cabelo. O escalpo é rebatido anteriormente
mia, com perdas sangüíneas cuidadosamente repostas com o cuidado de não lesar o ramo frontotemporal do
e com hemostasia adequada em cada etapa cirúrgica. nervo facial. A incisão do pericrânio segue ambas as
linhas temporais, lateralmente, até alcançar a sutura
coronal. Se uma exposição mais lateralizada for neces-
Plano Mucoso sária, o músculo temporal será dissecado da fossa tem-
A preservação do plano mucoso é sempre difícil. poral e área retromalar do arco zigomático. Remove-
Com uma abordagem cranial, a mucosa do seio aé- se o flap ósseo bifrontal, tendo como margem inferior
reo é ressecada após a retirada do tumor. Dependendo a porção supra-orbital (Fig. 26.2). Se o seio frontal for
do tipo de tumor, a mucosa pode estar envolvida pela amplo, sua parede posterior e mucosa serão removidos
doença. A melhor alternativa para o fechamento des- e seu óstio será coberto com o enxerto ósseo. Poste-
sa área é o uso de um retalho de pericrânio anterior riormente, disseca-se a dura-máter subfrontal e expõe-
já preparado no início do procedimento. O retalho é se a fossa anterior. O momento mais delicado dessa
seccionado ao longo da crista temporal e rebatido an- dissecção é junto às goteiras olfatórias. Com uma res-
teriormente, mantendo-se sua vascularização supra- secção primária do processo crista galli e secção cui-
orbital. No final do procedimento, o retalho é dispos- dadosa das fibras do nervo olfatório, é possível evitar
to sobre a base do crânio, revestindo a fossa nasal e os a laceração meníngea. A dissecção deve alcançar os
defeitos basais, sendo fixado na dura-máter subfron- limites posteriores da fossa anterior, a margem poste-
tal (Fig. 26.1). O enxerto ósseo, quando indicado, é rior da asa menor do esfenóide, o tubérculo da sela e
inserido no defeito da base do crânio, sendo sua mar- a base do processo clinóide anterior. A invasão parcial
gem posterior fixada junto à dura-máter subfrontal. A da dura-máter ou o crescimento tumoral através das
inserção desse enxerto ósseo costuma ser suficiente meninges é causa de problemas. As porções subfron-
para correção dos defeitos ósseos gerados pela res- tal e intraparenquimatosa do tumor são removidas por
secção tumoral. uma abordagem intradural clássica, antes da dissecção
da dura-máter subfrontal que circunda o tumor.

Flap cutâneo A B

Retalho
periósteo
Defeito da
base do crânio

Nervos ópticos

Fig. 26.2 – Representação gráfica (em vermelho) da cranio-


Enxerto pericrânio tomia na abordagem transbasal. (A) Vista frontal. (B) Perfil.
Fonte: Feiz-Erfan I, et al.6

Flap
Reparo Meníngeo
Substituto dural
cutâneo Após a exposição da base do crânio, os defeitos
durais devem ser corrigidos antes da ressecção óssea
e abertura dos seios aéreos. Podem ocorrer três situa-
Seio ções possíveis de reparo:
esfenoidal
1. A dura-máter foi preservada, mas com peque-
Seio frontal Enxerto ósseo
nas lacerações na região da goteira olfatória.
Esses defeitos devem ser corrigidos com su-
tura, sendo aconselhável o uso de materiais de
Fig. 26.1 – Disposição anatômica do retalho de pericrânio. reforço dural.

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26 – Abordagem Neurocirúrgica da Base Anterior do Crânio

2. Existe um defeito dural que deve ser corrigido o corpo do osso esfenóide são ressecados. Após dis-
com um substituto dural com tamanho de, no secção ampla, a base do crânio apresenta um aspecto
mínimo, duas vezes o do defeito. Esse substi- diferente: o tecido ósseo desaparece e as partes moles
tuto é suturado na porção mais lateral da dura- da órbita estão fixadas apenas na dura-máter frontal
máter subfrontal dissecada. e temporal pelos nervos ópticos e fissura esfenoidal,
3. Defeito excepcionalmente grande, com a du- havendo entre eles um grande espaço morto delimita-
ra-máter posterior não visualizada adiante da do pela mucosa rinofaríngea. A extensão da ressecção
cisterna óptico-quiasmática. Nesse caso fica basal depende do tipo de tumor.
impossibilitada a sutura posterior do substituto
dural. Isso freqüentemente ocorre com tumo- Reparo da Base do Crânio
res que invadem a região posterior da fossa an-
terior. Nesse caso, o enxerto é suturado apenas O reparo da base do crânio não é necessário se os
lateralmente, sendo disposto sobre o terço pos- defeitos forem relativamente pequenos. Contudo, a
terior da base do crânio. Em poucas semanas ou reconstrução do plano ósseo previne o risco de fístula
meses, a dura-máter subfrontal será totalmente liquórica e protege as estruturas intracranianas durante
reconstituída e uma nova abordagem transba- a cirurgia transfacial, se esta for necessária. O reparo
sal extradural permitirá a remoção do tumor da base do crânio deve definitivamente ser realizado
invadindo a base do crânio e a fossa nasal sem em três situações: um grande espaço morto medial,
qualquer fístula liquórica intra-operatória. grande remoção lateral da órbita (evitando enoftalmia
A escolha do material para substituto dural depen- e pulsação ocular) e uma extensão da dissecção em
de de algumas variáveis. O material deve ser espesso direção à margem orbitofrontal, margem supra-orbital
o suficiente para prevenir fístulas e infecção ascen- e área frontal (por motivos estéticos). Osso autólogo é
dente, devendo ser elástico para permitir a reexpansão o melhor material para reconstrução quando as cavi-
cerebral e bem vascularizado de forma a possibilitar dades aeradas da face são abertas. O enxerto pode ser
a rápida aderência junto à base do crânio e nutrir o obtido do osso ilíaco, que possibilita oferecer grande
enxerto ósseo utilizado na reconstrução. O enxerto de quantidade de material. O enxerto ilíaco tem a vanta-
pericrânio é preferível ao material prostético ou fáscia gem adicional de fornecer pouco osso cortical, mas
lata. O passo seguinte na ressecção tumoral que invade enxertos obtidos da tábua interna da calota craniana
a base do crânio depende da qualidade do reparo du- têm sido usados. Quando toda a fossa anterior tiver
ral. A cirurgia em dois tempos é recomendável quando sido ressecada medial e lateralmente, após a correção
não se obtém um reparo dural adequado após a remo- com enxerto ósseo da parede medial e o teto da órbi-
ção do tumor intracraniano. Uma espera de dois a três ta, o espaço morto deverá ser preenchido com osso
meses é necessária para o completo fechamento dural. medular. O osso esfenoidal poderá ser utilizado para
Durante esse período de espera, uma porção de mate- o fechamento da área etmoido-esfenoidal, devendo
rial inerte é inserida entre a base do crânio e o retalho ser implantado entre o násio e o clivo, abaixo da por-
de pericrânio. Isso protege o retalho de pericrânio de ção horizontal do assoalho selar. O nervo óptico deve
uma hipotética invasão tumoral e facilita a segunda permanecer completamente livre. Tal reconstrução é
abordagem extradural, para retirada tumoral. necessária após ressecção óssea, principalmente nos
casos de displasia óssea extensa. Comumente, con-
tudo, o reparo basal é de fácil realização; um enxerto
Remoção do Tumor Basal
ósseo é disposto sobre a falha basal, abaixo do retalho
A dificuldade de remover o tumor da base do crâ- de pericrânio, fechando a fossa nasal. Após, insere-
nio depende da localização, extensão e consistência se pó de osso com o objetivo de preencher espaços
tumoral. Tumores na região etmoidal podem ser facil- mortos abaixo do retalho de pericrânio para reparar
mente removidos, pois não há estruturas que possam os defeitos subfrontais.
ser lesadas. A fossa nasal é rapidamente acessada,
onde a mucosa dos septos e turbinas é identificada e Fechamento
preservada se não ocorrer invasão tumoral. Na região
esfenoidal o primeiro passo é identificar ambos os Recoloca-se o retalho ósseo bifrontal. Caso tenha
nervos ópticos. A ressecção parcial do teto da órbita havido comprometimento de parte do retalho, a parte
é o primeiro passo, após a periórbita ter sido sepa- óssea patologicamente envolvida deverá ser resse-
rada por uma abordagem orbital. Quando o forame cada, e a cranioplastia, realizada no mesmo estágio.
supra-orbital está fechado, a ressecção de sua borda Um enxerto ósseo é preferível ao material protético
inferior ajuda na preservação dos vasos e nervos su- (a possibilidade de reconstrução deve ser antecipada,
pra-orbitais. Os canais ópticos são abertos e a porção e o enxerto, previamente preparado). Se não tiver sido
extradural do nervo óptico é identificada. Após res- utilizado para o fechamento da fossa nasal e reparo do
secção intratumoral, a margem de ambas as órbitas e plano mucoso (cirurgia em dois tempos), o retalho de
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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

pericrânio será disposto de modo a cobrir o flap ósseo


bifrontal. Dois drenos são colocados antes da sutura
da gálea: um extradural, na área subfrontal, e outro na
área parietal onde o enxerto pericrânio foi obtido.

Limitações da Abordagem Transbasal e


Abordagens Combinadas
Inicialmente descrita como osteotomia basal nas
malformações craniofaciais, a abordagem subfrontal
foi utilizada com êxito para remoções de lesões ós-
seas ou tumores extra e intracranianos que invadam
ou destruam a base anterior do crânio. Dois aspectos Fig. 26.4 – Região do clivo com possibilidade de ressecção
desse processo patológico devem ser considerados: as pela via transbasal.
possibilidades para ressecção óssea e o alcance dos li-
mites tumorais. A ressecção óssea não apresenta pro- Inúmeras modificações foram propostas para aumen-
blemas. Toda fossa anterior e a maior parte da fossa tar o campo cirúrgico posteriormente, sem uma excessi-
média podem ser ressecadas: isto é possível com a va retração frontal. Todas essas abordagens ampliam a
liberação de vasos e nervos que penetram nos fora- ressecção óssea ou osteotomias em direção facial medial
mes da base do crânio. O limite posterior é o osso e órbitas. Dependendo de sua extensão, elas são chama-
petroso, o qual também pode ser abordado por um das de subfrontal, subfronto-extradural, frontonasal,
acesso póstero-lateral. Os problemas começam quan- fronto-orbitonasal e abordagem basal estendida. Outra
do partes moles adjacentes estão envolvidas. Na re- possibilidade é a combinação, em um tempo cirúrgico,
gião orbital, a abordagem transbasal oferece excelen- das abordagens transbasal e transfacial, particularmente
te exposição. As porções anteriores e ínfero-mediais para tumores com extensão inferior ou facial lateral. A
do seio cavernoso podem ser acessadas por via extra- combinação das vias rinosseptal e transbasal tem aplica-
dural, mas, exceto para lesões pouco encapsuladas, ção a tumores que invadem a base anterior do crânio e
seu envolvimento é uma das limitações da abordagem região clival posterior, como condromas ou cordomas.
transbasal simples. Inferiormente, podem-se abordar
tumores mediais que se estendam lateralmente para o
seio maxilar (Fig. 26.3). A abordagem transbasal per- Indicações da Abordagem Transbasal
mite uma extensa ressecção do clivo, excetuando-se a O uso da abordagem transbasal depende do local
região ínfero-posterior à sela (Fig. 26.4). anatômico exato da lesão, devendo ser usada quando
acrescentar chances de ressecção tumoral completa.
A opção por ressecar completamente o tumor, des-
comprimir ou realizar tratamento radioterápico sem
cirurgia deve basear-se nas características histológi-
cas e extensão da lesão. Essas características devem
ser obtidas no pré-operatório. Se a natureza da lesão
for desconhecida, sugere-se uma biópsia rinossep-
tal ou fibroscópica para o diagnóstico, com o que se
previnem erros posteriores de conduta. Alguns ade-
nomas invasivos ou mucoceles esfenoidais são com
freqüência confundidos, clínica e radiologicamente,
com cordomas destrutivos.
Lesões envolvendo a base do crânio podem ser
classificadas em três grupos: tumores de origem in-
tracraniana, como meningiomas; tumores ósseos pri-
mários e tumores de origem rinofaríngea, sendo estes
usualmente malignos.

Meningiomas
Invadem a base do crânio de três diferentes manei-
ras. Primeiro, a fossa anterior pode ser invadida em
Fig. 26.3 – Limites de ressecção através da via transbasal. sua região mais delicada, a área etmoidal e a lâmina
cribriforme, com extensão intranasal de meningiomas

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26 – Abordagem Neurocirúrgica da Base Anterior do Crânio

olfatórios. Segundo, com um meningioma em placa, a Tumores de Origem Rinofaríngea


hiperostose acaba sendo mais importante que o acome-
timento dural, a qual não é apenas uma reação óssea, Dos tumores da rinofaringe que invadem a base
mas uma invasão tumoral verdadeira. A hiperostose do crânio, muito poucos são benignos (como placói-
é a responsável pelo quadro clínico por comprimir o de olfatório benigno, fibroma nasofaríngeo). Esses tu-
nervo óptico no seu canal. A placa dural e o osso de- mores freqüentemente são carcinomas ou epiteliomas
vem ser removidos para evitar recorrência. A aborda- malignos, devendo-se adaptar a estratégia cirúrgica.
gem transbasal é necessária e útil para lesões que aco- Se ocorrer extensão tumoral para a fossa anterior,
metem o canal óptico e a área esfenoidal medialmente. indica-se a abordagem transcraniana, combinada com
Terceiro, o acometimento ósseo pode ser encontrado a via transfacial. A extensão da remoção nesses casos
junto à inserção basal de um meningioma. é mais importante que a reconstrução.

Tumores Ósseos Primários Envolvendo ABORDAGEM TRANSBASAL


a Base do Crânio ESTENDIDA
Os tumores ósseos incluem vários tipos de lesões. A abordagem transbasal estendida compartilha
Alguns são malignos, como sarcomas ou metástases, princípios com a abordagem transbasal convencio-
outros benignos, como osteomas, osteoblastomas, he- nal, objetivando menor retração cerebral no acesso às
mangiomas, fibromas ossificantes e displasia fibrosa. A lesões da base anterior do crânio. Consiste em uma
história natural da displasia fibrosa é incomum e usual- modificação da abordagem transbasal de Derome4,
mente progressiva. Pode ser aguda, especialmente em na qual, além de uma craniotomia bifrontal, se rea-
pacientes jovens com displasia fibrosa do tipo fibrocís- liza a osteotomia em bloco bilateral do teto da órbita
tica. Existe a recomendação de tratamento cirúrgico se e seio frontal (Fig. 26.5). Inicia-se pela craniotomia
a lesão apresentar caráter progressivo ou ocorrer envol- bifrontal, com o cuidado de preparar o retalho de
vimento do canal óptico. Alguns tumores ósseos são pericrânio do mesmo modo que a abordagem trans-
de difícil classificação devido ao seu dúbio potencial basal convencional. A fáscia periorbital é dissecada
patológico. Alguns deles são malignos, tais como tu- seguindo o plano subperiosteal do escalpo, devendo
mores de células gigantes, condromas e cordomas, mas ser realizada com extremo cuidado, evitando perda
sua malignidade é local e freqüentemente há impossi- de gordura periorbital. Algumas vezes, é necessária a
bilidade de ser ressecção total. Neste último, a cirurgia abertura do forame supra-orbitário para preservar va-
é indicada, pois a radioterapia é ineficaz. Esses tumores sos e nervos que transitam através dele. A dissecção
são mais ou menos encapsulados e, na maioria dos ca- da região medial da órbita é a que apresenta maior di-
sos, realiza-se uma remoção quase completa, mesmo ficuldade, quando comparada com a parede superior,
quando alcançam o seio cavernoso. Com cordomas, pois a porção medial é fixada pelo ligamento cantal
indica-se uma estratégia cirúrgica agressiva. Aborda- medial. A mucosa do seio frontal deve ser removi-
gens combinadas são quase sempre necessárias. Radio- da completamente, tão logo se proceda à abertura do
terapia adjuvante com feixe de prótons ou radioterapia seio pela craniotomia. Uma serra óssea microssagital
estereotática, além da radioterapia convencional, são é utilizada na osteotomia da base frontal. A extensão
indicadas, com aumento nas chances de sobrevida. da craniotomia difere para cada caso. Se anosmia está

A B C

Fig. 26.5 – Representação esquemática das linhas de osteotomia na abordagem transbasal estendida. Vistas (A) frontal, (B)
perfil, (C) superior e (D) anterior do teto da órbita removido em bloco. Fonte: Feiz-Erfan I, et al.6

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

presente no pré-operatório ou for inevitável, a osteo- crânio é preparado para posterior correção dural e da
tomia margeia posteriormente o processo crista galli. base do crânio. Realiza-se uma craniotomia bifrontal
Em situações que requerem a preservação dos nervos padrão. A osteotomia do bloco fronto-orbitonasal, in-
olfatórios, o limite posterior da osteotomia deve ser cluindo a parede medial e lateral da órbita, teto da
anterior ao processo crista galli, com ressecção du- órbita e osso nasal é realizada cuidadosamente com o
ral limitada nas proximidades da linha média da base uso de serra óssea e osteótomo. A serra óssea é inseri-
anterior. Essa abordagem permite amplo acesso ao da dentro da órbita. A osteotomia inicia-se na fissura
espaço extradural, permitindo ao cirurgião manipular orbital inferior e segue em direção à fossa temporal,
confortavelmente o plano esfenoidal. Se um defeito paralelamente ao teto da órbita (Fig. 26.6, A). A se-
dural for observado na região subfrontal, será corri- guir, a serra é colocada entre a fissura orbital inferior
gido com uso do retalho pediculado de pericrânio. e a fossa temporal, sendo o corte realizado num plano
Defeitos maiores podem requerer uso de outros subs- perpendicular ao teto da órbita e processo zigomático,
titutos durais. O osso medular ilíaco é utilizado para em sentido cranial (Fig. 26.6, B). A fossa média não
reparo ósseo da base craniana quando necessário. deve ser violada. A osteotomia segue na fossa anterior
Após reconstrução da base frontoorbitária, a barra em direção à margem posterior da lâmina cribriforme
frontal é recolocada de modo a não permitir desloca- do etmóide (Fig. 26.6, C). Na região intra-orbital o
mentos, com seus bordos adequadamente coaptados. corte margeia superiormente a fissura orbital superior.
Antes da reposição do osso frontal, posiciona-se o re- Ao se atingir a lâmina crivosa, a serra é voltada an-
talho de pericrânio conforme exposto na abordagem teriormente, com uma linha de corte que acompanha
transbasal convencional. Nos casos em que é neces- o limite lateral da lâmina crivosa. Ao se alcançar a
sário o uso de enxerto ósseo, deposita-se o retalho de porção mais anterior na fossa frontal, a serra é fle-
pericrânio sobre este, interpondo-se entre a superfície tida 90° em direção à linha média. A osteotomia do
dural subfrontal e a base do crânio reconstituída. Uma lado oposto é realizada da mesma forma (Fig. 26.6,
bandagem elástica é aplicada na região próxima das C). Para incorporar o osso nasal e a parede medial da
pálpebras para prevenir o edema pós-operatório. órbita no bloco fronto-orbitonasal, a serra deve ser
inserida dentro da abertura piriforme. O corte segue
para cima da abertura piriforme e atravessa a porção
Abordagem transbasal radical
superior da fossa lacrimal, terminando no nível da
A abordagem transbasal radical é uma das formas artéria etmoidal anterior. Essa artéria deve ser caute-
mais estendidas dentre as modificações da via trans- rizada e cortada antes de a osteotomia iniciar. Além
basal. Consiste em uma craniotomia bifrontal e uma disso, a glândula lacrimal deve ser elevada da fossa
osteotomia fronto-orbitonasal. A osteotomia envolve lacrimal e retraída temporariamente para evitar lesões
a remoção em bloco das paredes mediais e laterais durante a osteotomia. Finalmente, um osteótomo es-
das órbitas juntamente com os ossos nasais (Fig. 26.6, treito é colocado ao longo da borda anterior da lâmina
A). Isso possibilita a retração lateral dos globos ocu- crivosa do etmóide, num ângulo de 90° com o assoa-
lares, o que fornece uma exposição ampla da linha lho da fossa anterior. Então, delicadamente, com uso
média e estruturas paramedianas da base do crânio. O de martelo, descola-se a porção óssea do septo nasal.
paciente é colocado em posição supina, com a cabeça Antes de a osteotomia ser realizada, o ligamento can-
em posição neutra e fixada em três pontos. Procede-se tal medial é descolado com a elevação do periósteo.
a uma incisão bicoronal do escalpo. O retalho de peri- Os globos oculares são retraídos lateralmente. Se a lâ-

A B C

Fig. 26.6 – Representação gráfica das linhas de osteotomia (em vermelho) na abordagem transbasal radical. (A) Vista frontal,
(B) vista lateral e bloco fronto-orbitonasal em vista (C) superior e (D) frontal. Fonte: Feiz-Erfan I, et al.6

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26 – Abordagem Neurocirúrgica da Base Anterior do Crânio

mina cribriforme não estiver envolvida pela doença, a ratórios para posterior angiografia e eventual emboli-
preservação do olfato pode ser conseguida com uma zação das artérias nutridoras. Uma das importâncias
osteotomia ao longo da junção da lâmina crivosa do de um estudo de imagem pré-operatório bem condu-
etmóide com o osso frontal lateralmente e com o osso zido é a posterior comparação pós-operatória, que
esfenóide posteriormente. permite informações sobre resultado cirúrgico, bem
A cantopexia medial deve ser realizada no mo- como definição da existência de afecção residual ou
mento da reposição do bloco fronto-orbitonasal. Para recorrente.
tal, dois pequenos orifícios são efeitos imediatamente
atrás e acima da fossa lacrimal. Pelos orifícios passa- ABORDAGENS OTORRINOLARIGOLÓGICAS
se um fio que posteriormente será ancorado na pele,
mantendo o tecido sobrejacente fixado ao tecido ós- Abordagem por Rinotomia Lateral
seo, restituindo assim o ligamento cantal medial. Em A rinotomia lateral consiste em uma incisão ex-
seguida, procede-se à fixação do bloco orbitofron- terna que aborda lesões pequenas envolvendo a parte
tonasal na ossatura facial, com uso de miniplacas e inferior da cavidade nasal9,10. Quando há a necessi-
parafusos. Segundo o trabalho de Iman Feiz-Erfan dade de incluir no acesso cirúrgico também os seios
et al.6, numa série de 41 pacientes submetidos a essa maxilares, etmoidais ou frontal, a rinotomia lateral
abordagem, nenhum apresentou alterações visuais, pode ter extensões que permitem a melhor exposição
o que poderia ser esperado pela retração lateral do
dessas estruturas (Fig. 26.7).
globo ocular. A principal complicação associada foi
fístula liquórica. Lesões com expansão para o canto
lateral superior do seio maxilar, seio cavernoso, fossa Técnica Cirúrgica
infratemporal e dorso da sela requerem uma exposi- A incisão na pele é realizada iniciando-se junto ao
ção adicional através de uma abordagem transfacial, filtro labial superior, próximo à columela, estenden-
ântero-lateral ou transcraniana lateral. do-se em torno do vestíbulo nasal e da asa nasal, su-
bindo lateralmente à pirâmide nasal. A incisão cutâ-
Complicações nea é aprofundada, incisando-se a parede lateral da
cavidade nasal com entrada nesta. Com o afastamento
A principal complicação é a ocorrência de fístula
da asa nasal, temos uma exposição da porção inferior
liquórica, comunicando o espaço subaracnóide com
da cavidade nasal. Freqüentemente são necessárias
os seios da face7,8. Laceração meníngea ou defeito
dural geralmente ocorrem, resultando em pneumato- abordagens com exposições mais amplas incluindo,
cele, fístula liquórica, infecção ascendente e menin- além da cavidade nasal, seios maxilar, etmoidal e
gite. As três estruturas entre o espaço intradural e as frontal. A extensão da rinotomia lateral com a inci-
cavidades aéreas da face são a dura-máter, o osso e são de Weber-Ferguson é muito usada (Fig. 26.7). A
a mucosa rinofaríngea. Após a remoção tumoral, es- incisão inicia-se na linha média do lábio superior e
sas estruturas devem ser reparadas cuidadosamente atravessa o filtro labial até a columela e continua com
para prevenir complicações. A dura-máter deve ser a incisão da rinotomia lateral clássica. Ainda, pode-se
fechada cuidadosamente, o que freqüentemente exi- lançar mão da incisão de Lynch, que consiste em ex-
ge o uso de enxerto de pericrânio. Na base do crânio tensão da rinotomia lateral cranialmente até a borda
deve-se ter o cuidado de não permitir a ocorrência medial da sobrancelha (Fig. 26.7). A incisão de Lynch
de espaços mortos, evitando o surgimento de menin- é usada quando é necessária exposição adicional das
gocele ou encefalocele, hematoma extradural pós- células etmoidais. Após a incisão cutânea ampliada, o
operatório e infecções. O plano mucoso deve ser pre- descolamento do retalho da face é realizado expondo-
servado ou reconstituído para o fechamento da fossa se estruturas como a parede anterior do seio maxilar,
nasal. É necessário tecido vascularizado para nutrir o nervo infra-orbitário e parede lateral nasal. A entrada
enxerto ósseo usado no reparo da base do crânio. Os na cavidade nasal é realizada como descrito anterior-
exames que fornecem informações pré-operatórias mente, e a parede anterior do seio maxilar adjacente
adicionais são a tomografia computadorizada (TC) e é removida usando formão ou serra elétrica, podendo
a ressonância nuclear magnética (RNM). O melhor ser preservada para posterior reposicionamento.
estudo da base do crânio é feito com TC de crânio A abordagem descrita proporciona exposição am-
com cortes axiais e coronais, com e sem contraste pla e adequada de lesões envolvendo fossa nasal com
e com janela óssea, podendo ser útil a reconstrução extensão para o seio maxilar.
óssea tridimensional. A RNM é auxiliar no estudo As complicações relacionadas à abordagem são
das estruturas intracranianas, como encéfalo, nervo formações de crostas na cavidade nasal e parestesias,
óptico e estruturas não ósseas adjacentes. A angior- que usualmente regridem de forma gradual nos pri-
ressonância fornece informações sobre estrutura e meiros dois meses após o procedimento. A incisão ex-
suprimento arterial. Esses estudos podem ser prepa- terna geralmente traz resultados estéticos favoráveis.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 26.7 – Desenho esquemático demonstrando a incisão de rinotomia lateral e as possíveis extensões para acesso ampliado.
Fonte: Feiz-Erfan I, et al.6

A Fig. 26.8 ilustra o caso de uma paciente com his- A seguir, realiza-se uma incisão sublabial desde a
tória de obstrução nasal crônica e crescimento de lesão linha média até a tuberosidade maxilar, uni ou bila-
em fossa nasal esquerda nos últimos anos, com abau- teralmente, dependendo da extensão da lesão. Disse-
lamento da pirâmide nasal ipsilateral. A TC e a RNM cam-se as estruturas remanescentes entre a columela
evidenciaram lesão expansiva envolvendo as fossas e a espinha nasal anterior, comunicando a cavidade
nasais, com extensão ao seio maxilar esquerdo. O aces- nasal e a incisão sublabial. O próximo passo consis-
so cirúrgico foi realizado via rinotomia lateral com ex- te no descolamento subperiosteal da parede anterior
tensão de Weber-Ferguson, demonstrada na Fig. 26.9. do seio maxilar, do ramo ascendente da mandíbula e
da fossa piriforme. O acesso por degloving é, então,
Abordagem Médio-facial – Degloving completado pela elevação dos tecidos moles do lábio
superior, dorso nasal e região maxilar superior, obten-
Trata-se de um acesso que utiliza incisão sublabial do-se uma exposição favorável das estruturas ósseas
combinada com incisões intercartilaginosas e transfi- do terço médio da face. A exposição da cavidade do
xantes, semelhantes às usadas em procedimentos de seio maxilar através da remoção de suas paredes ante-
rinoplastia. Os tecidos moles da face e do dorso são
rior e medial pode ser realizada com osteótomo, serra
elevados, expondo as paredes anteriores dos maxi-
elétrica ou pinça de Kerrisson, preservando as estru-
lares sem incisão externa, evitando cicatrizes. É um
turas para reposicionamento no final da cirurgia.
acesso com características versáteis para exposição
das estruturas do terço médio da face, podendo ser O acesso médio facial proporciona uma excelente
ampliada ou mais econômica, dependendo da exten- visualização das estruturas do terço médio da face,
são da lesão a ser abordada11. base anterior do crânio e grande parte do clivo. Os
resultados estéticos costumam ser muito favoráveis,
com a vantagem da ausência de incisão externa.
Técnica Cirúrgica A complicação mais freqüente relacionada com
A cirurgia inicia-se com a transfixação completa esse acesso é a formação de crostas nasais e pareste-
do septo membranoso. A incisão intercartilaginosa é sias infra-orbitárias ou dentárias, que geralmente têm
realizada com extensão até a abertura piriforme. Re- regressão gradual em até dois meses após o procedi-
aliza-se a dissecção dos tecidos moles do dorso nasal mento. Outras complicações menos freqüentes des-
seguindo um plano subpericondral e subperiosteal. critas são epistaxe e estenose de vestíbulo.

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26 – Abordagem Neurocirúrgica da Base Anterior do Crânio

A B

Fig. 26.8 – (A) Lesão expansiva protraindo pela fossa nasal esquerda, abaulando a pirâmide nasal ipsilateral. (B) A ressonância
magnética demonstra lesão ocupando ambas as fossas nasais e o seio maxilar esquerdo, sem invasão intracraniana.

A B

Fig. 26.9 – (A) Visão transoperatória após rinotomia lateral com extensão de Weber-Ferguson permitindo excelente visualiza-
ção e acesso a lesão. (B) Visão após a remoção do tumor.

Abordagem Endoscópica ca dos seios paranasais e a familiaridade com a ins-


trumentalização endoscópica, o uso dos endoscópios
O grande avanço na abordagem dos tumores na- em cirurgias para regiões adjacentes aos seios da face
sais foi, sem dúvida, a introdução dos endoscópios na (base do crânio e órbita) tornou-se um passo natural.
prática cirúrgica12. Conceitualmente a cirurgia endonasal endoscópi-
Os endoscópios proporcionam excelente ilumina- ca reporta-se ao acesso à base anterior do crânio, as-
ção e um melhor entendimento da patologia intranasal. sistido por endoscópios, exclusivamente através das
Com a melhor compreensão da anatomia endoscópi- narinas, sem qualquer incisão externa. O acesso pode
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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

ser limitado às regiões extracraniana e extradural, ou A


apresentar extensão extra ou intradural.
O acesso endonasal endoscópico é vantajoso por
evitar incisões externas extensas, reduzindo a morbi-
dade e o trauma cirúrgico. As lentes anguladas possibi-
litam ao cirurgião uma eficiente exploração do campo
cirúrgico, expondo regiões muitas vezes inatingíveis à
visão, mesmo quando assistido por microscopia.
O acesso endonasal endoscópico para tumores
deve ser escolhido dependendo da experiência da
equipe cirúrgica com a instrumentalização dos en-
doscópios e da possibilidade de remoção completa da
lesão por essa via. Seu uso para a obtenção de teci-
do para diagnóstico histológico de lesões intranasais
(bió­psias) é muito favorável, já que evita traumas ci-
rúrgicos maiores.
A abordagem endoscópica pode ser combinada
com abordagens externas acrescentando-se ilumina-
ção, detalhamento e magnificação da imagem, o que
facilita a determinação de limites cirúrgicos e a abor-
dagem da lesão.
É importante que o cirurgião esteja familiarizado
com a prevenção e manejo de complicações possíveis
nessa abordagem, tais como hematoma intra-orbitá-
rio, dano ao sistema nasolacrimal, fístula liquórica e
epistaxe.
A seguir serão descritos, de forma sucinta, dois
casos clínicos em que a via endoscópica foi utilizada B
com objetivos diferentes.
A Fig. 26.10 ilustra o caso de um paciente de 24
anos com história de leucemia e sinusite crônica fron-
toetmoidal, já tendo sido submetido à cirurgia endos-
cópica nasossinusal no passado. A imagem na tomo-
grafia atual revela lesão expansiva ocupando fossa
nasal direita com extensão para etmóide e seio frontal
ipsilateral e erosão de lâmina papirácea. O aspecto to-
mográfico sugeria o diagnóstico de mucocele. O aces-
so escolhido foi o endoscópico, que permitiu um fácil
alcance à lesão, revelando um aspecto de lesão expan-
siva sólida que histologicamente demonstrou tratar-
se de recidiva de leucemia. A cirurgia endoscópica
permitiu a remoção da lesão aderida à órbita, que foi
seguida de radioterapia com controle da patologia.
A Fig. 26.11 demonstra lesão avançada com exten-
são intracraniana, que necessitou de abordagem com-
binada envolvendo equipe de otorrinolaringologistas
e neurocirurgiões. O acesso escolhido foi o bicoronal
para a abordagem intracraniana. A lesão nasossinu-
sal foi abordada pela mesma via. O endoscópio foi
utilizado como complemento para visualização mais
Fig. 26.10 – Recidiva de leucemia em fossa nasal direita com
detalhada dos limites cirúrgicos. A Fig. 26.11 revela erosão da lâmina papirácea – aspecto tomográfico e macros-
uma visão transoperatória superior da cavidade nasal cópico.
após a remoção da lesão tumoral e do septo nasal.

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26 – Abordagem Neurocirúrgica da Base Anterior do Crânio

A via de acesso mais adequada para cada caso. O uso


do microscópio e, mais recentemente, do endoscópio
trouxe marcante contribuição aos neurocirurgiões e
otorrinolaringologistas. O trabalho em conjunto des-
sas especialidades é de grande importância para a
abordagem de lesões invasivas, proporcionando tra-
tamentos mais efetivos, aumentando as chances de
ressecabilidade e, acima de tudo, melhorando o prog-
nóstico dos portadores de lesões nasossinusais com
extensão intracraniana.

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ser empregada para a abordagem de tumores nasos- of nasal and paranasal-sinuses tumors. In: Stamm
sinusais. A localização e a extensão da lesão, assim AC, Draf W. Micro-endoscopic surgery of the para-
como a experiência das equipes assistentes envolvi- nasal sinuses and the skull base. Berlin: Springer-
das, são os principais determinantes na escolha da Verlag; 2000, p. 481-8.

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27
Técnicas de Ressecção da Odontóide
Abordagem Transoral
José Alberto Landeiro
Igor de Castro
Marlo Steiner Flores
Carlos Henrique Ribeiro

INTRODUÇÃO de lesão adquirida5,12. Vários processos expansivos,


como cordomas, condrossarcomas, metástases, plas-

E
mbora haja descrição de uma série de aborda- mocitomas e carcinomas de nasofaringe podem ocor-
gens à face anterior da junção craniocervical rer nessa região.
por via posterior1-3, póstero-lateral e ântero-
lateral extrafaríngea4, a abordagem transoral é o
acesso mais direto para as patologias situadas na INDICAÇÕES DO ACESSO
face ventral da junção crâniocervical5-7. A junção O acesso transoral permite a visualização direta da
craniocervical compreende um canal ósseo formado face anterior da junção craniocervical (JCC) e uma
pelo forame magno, atlas e áxis, passagem da junção adequada descompressão da medula cervical alta, da
bulbomedular, bem como de vasos e nervos. Daí as junção bulbomedular e da ponte. Na maioria dos ca-
patologias compressivas da região produzirem uma
sos, o acesso permite uma exposição desde a porção
constelação de sinais e sintomas que vão desde uma
inferior do clivo até o bordo inferior da segunda vér-
simples nucalgia até quadriplegias, paralisia de ner-
vos cranianos baixos e disfunção respiratória. A re- tebra. Lateralmente o acesso é limitado pelos proces-
moção do bordo inferior do clivo e do arco anterior sos pterigóideos internos, a junção petroclival, o fora-
do atlas permite o acesso às patologias compressivas me jugular e o canal do hipoglosso. A distância média
dessa região, como tumores, anormalidades ósseas, entre os processos pterigóideos de 15 mm e os limites
processos inflamatórios e infecciosos, promovendo a anatômicos acima citados tornam esse acesso restrito
descompressão da junção bulbomedular e da ponte. às lesões da linha média. Ocasionalmente anomalias
Embora alguns artigos mencionem a remoção de le- craniofaciais e intra-orais como macroglossia, perda
sões intradurais8-11, o risco de fístula liquórica, a di- da mobilidade da articulação temporal e mandibular
ficuldade de reconstrução da dura, o espaço exíguo implicam na via transoral ampliada. Essa extensão
e a extrema dificuldade de controlar hemorragias de pode ser conseguida por meio de maxilotomia14, mio-
grandes vasos tornaram esse acesso restrito ao trata- tomia do palato mole, osteotomia do palato duro, os-
mento das lesões extradurais com compressão ven- teotomia mediana da mandíbula e osteotomia sagital
tral irredutível4-7,12,13. bilateral da mandíbula15. O acesso transoral alargado
As lesões da junção craniocervical são classifica- permite melhor abordagem para lesões mais extensas
das em quatro tipos: congênita, adquirida, traumática dessa região, embora a incisão do palato e/ou osteo-
e neoplásica. tomia tenham um percentual maior de complicações,
Entre as lesões congênitas temos invaginação ba- como disfagia, disfonia e regurgitação nasal14. Este
silar, platibasia, síndrome de Chiari, siringomielia, capítulo enfatiza o acesso anterior mediano à junção
instabilidade ligamentar da síndrome de Down1,2,4, craniocervical, por meio da abordagem transoral sim-
enquanto a artrite reumatóide é um clássico exemplo ples e ampliada por divisão do palato mole.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

SINTOMATOLOGIA dência de infecção orofaríngea, condição nutricional


do paciente e estado funcional dos nervos cranianos
A sintomatologia da compressão da junção cra- baixos. Cultura da orofaringe é obtida, no mínimo,
niocervical é variada. Usualmente esses sintomas não 3 dias antes da cirurgia. Se não for encontrada flora
são específicos, podendo variar de nucalgia a parali- bacteriana, oferece-se 1 g de cefalotina durante a ope-
sia dos nervos cranianos baixos. Uma síndrome bas- ração e a cada 4 horas nas próximas 24 horas. Pacien-
tante característica nas lesões da JCC é a paralisia de tes desnutridos devem ser tratados previamente com
Bell, que se caracteriza por fraqueza ou paralisia dos nutrição enteral. Por outro lado, pacientes com lesão
braços e mãos e relativa preservação da força das ex- de nervos cranianos baixos são passíveis de traqueos-
tremidades inferiores. Essa síndrome clínica é mais tomia pré-operatória eletiva.
encontrada nas patologias traumáticas Em algumas
circunstâncias, os sintomas que prevalecem depen-
dem basicamente da origem da patologia, se a com- TÉCNICA CIRÚRGICA
pressão é ventral ou dorsal e se existe instabilidade Intubação
na região. No caso de tumores extradurais, o sintoma
mais comum é a dor na nuca, agravada pelo movi- Na maioria dos pacientes não é necessária a tra-
mento, podendo associar-se ao torcicolo. Os sinais queostomia. A intubação oral é feita com auxílio de
motores mais comuns são fraqueza das mãos e espas- fibra óptica com o mínimo de mobilização. O pacien-
ticidade dos membros. A espasticidade é causada por te é operado sob anestesia geral e o uso de tubo ara-
compressão piramidal. mado (Mallinkrodt) permite uma adequada via aérea,
podendo ser mobilizado para melhor exposição do
campo cirúrgico sem prejuízo do seu lúmen. O tubo é
AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA
deixado por, no mínimo, 48 horas para proporcionar
O acesso transoral é principalmente indicado no segurança e cuidados pós-operatórios, como aspira-
tratamento das compressões ventrais irredutíveis ção e ventilação. Aos pacientes com paralisia bulbar
da junção craniocervical, dentre as quais a mais co- que precisarão de intubação prolongada, a traqueos-
mum é a invaginação basilar e alterações causadas tomia eletiva estará indicada.
pela artrite reumatóide, como a subluxação anterior, Passa-se uma sonda nasogástrica para prevenir
compressão ventral por pannus e lesões traumáticas regurgitação pós-operatória de conteúdo gástrico,
irredutíveis do processo odontóide2,5,7. Vários tumo- que pode comprometer a ferida operatória faríngea,
res da região como cordomas, condrossarcomas, cis- e para alimentar o paciente por 3 a 5 dias no pós-
tos epidermóides, sarcomas e metástases podem ser operatório.
abordados pelo acesso transoral, desde que restritos
ao espaço extradural e linha média7.
O tipo de procedimento cirúrgico, a necessidade
Exposição
ou não de ampliação do acesso através da incisão do Coloca-se o paciente em posição supina, com a
palato mole, osteotomia do palato duro, ou eventual cabeça levemente estendida. Pacientes já submetidos
necessidade de maxilotomia, dependerão da análise do à cirurgia prévia da região, principalmente craniecto-
quadro clínico e do estudo de imagem pré-operatória. mia de fossa posterior, devem ser operados ou com a
A tomografia computadorizada com janela óssea e re- cabeça fixada em suporte de Mayfield ou sob tração
construções tridimensionais, associada à ressonância cervical de, no máximo, 2kg, com o halo da tração de
magnética, permite uma perfeita compreensão da fi- preferência compatível com ressonância magnética, e
siopatologia da lesão16. Também é possível estabelecer a mesa cirúrgica em leve Trendelemburg. O cirurgião
a relação do processo odontóide com os palatos duro e se posiciona atrás ou à direita do paciente. O uso do
mole, a extensão da migração vertical, o grau de sublu- retrator oral de Crockard facilita o procedimento, com
xação e a condição do tecido neural, assim como de- a língua e o tubo orotraqueal retraídos para baixo, e
terminar um prognóstico. Extensa migração vertical da as bochechas afastadas lateralmente (Fig. 27.1). O pa-
odontóide pode implicar a utilização da via transoral lato mole é elevado usando-se duas sondas passadas
ampliada. O estudo de imagem deve ser dinâmico, se através do nariz e suturadas junto à úvula, permitindo,
possível, uma vez que a instabilidade pode influenciar assim, a retração do palato para trás e para cima. Se,
no procedimento. A angiografia e a angioressonância mesmo assim, as imagens no pré-operatório demons-
podem ser utilizadas para confirmar anormalidades das trarem que a odontóide se encontra em posição mais
artérias carótidas e vertebrais nos casos de instrumen- elevada, a miotomia do palato mole se tornará neces-
tação craniovertebral e de embolização pré-operatória sária. A miotomia deverá ser feita através de incisão
para alguns tumores hipervascularizados da região. paralela à úvula, dividindo o palato mole em metades
Na avaliação pré-operatória, além do exame neu- que são afastadas lateralmente pelo retrator de palato
rológico, deve-se incluir o estudo dos dentes, evi- (Figs. 27.1 e 27.2).

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27 – Técnicas de Ressecção da Odontóide Abordagem Transoral

Ressecção da Odontóide
A cirurgia é realizada sob visão microscópica e
monitorada sob escopia. O uso de instrumentais lon-
gos e a profundidade do campo requer objetivas de
350 mm. Com qualquer objetiva menor, o neuroci-
rurgião terá a visão prejudicada, pois haverá a inter-
posição do instrumental e da mão do cirurgião entre
o microscópio cirúrgico e o campo operatório (Fig.
27.3). O uso de protetores dentários ajuda na fixação
do retrator oral, principalmente nos pacientes com
falta de dentes. Obtêm-se imagens intra-operatórias
Fig. 27.1 – Aplicação do retrator oral de Crockard e abai- para verificar a extensão proximal e distal do campo
xamento da língua. Paciente submeteu-se a traqueostomia por operatório após o posicionamento do retrator oral. A
causa da pequena abertura de boca. palpação e a localização do tubérculo anterior do atlas
é uma importante referência para a incisão, uma vez
que usualmente está localizado no centro da lesão. A
cirurgia deve ser restrita à linha média. Não há espaço
para o controle proximal dos grandes vasos da região
em caso de desastres cirúrgicos.
Uma incisão de 3 cm centrada no tubérculo do
atlas é, normalmente, suficiente para alcançar o bordo
inferior do clivo e o corpo do áxis. Após infiltração
local com solução de 1:200.000 de adrenalina, a inci-
são na linha média da mucosa e dos músculos farín-
geos é feita em um só plano até o ligamento longitu-
dinal anterior. Após a incisão, a musculatura faríngea
e a mucosa são afastadas lateralmente em plano único
com afastadores autostáticos de Crockard. A fáscia
Fig. 27.2 – O desenho mostra a incisão paralela à úvula, pré-vertebral e o músculo longus colli são dissecados
após colocação do retrator oral. de suas inserções ósseas. Com dissectores de periós-
teo, o ligamento longitudinal é separado, liberando a
face anterior do corpo de C2, o arco de C1 e o bordo
inferior do clivo. A porção média do arco de C1 é re-
movida na projeção da odontóide (Figs. 27.4 a 27.6).
Quando a ressecção do bordo inferior do clivo é
necessária, a dura é dissecada da face posterior do
clivo para prevenir sangramentos e ruptura com con-
seqüente fístula liquórica. Depois que o tecido mole
ventral à odontóide é ressecado, a odontoidectomia
é realizada no sentido proximal-distal com fresa de
alta rotação, angulada. O uso de fresas retas é contra-
indicado, pois a mão do neurocirurgião irá interpor-se
entre o campo operatório e o microscópio cirúrgico,
prejudicando a visão. Durante todo o processo de fre-
sagem, a irrigação com salino deverá ser contínua, por
causa da alta liberação de calor, principalmente com
as brocas de diamante. A odontóide é ressecada com
o uso de uma broca cortante de 4 mm até a cortical
posterior, substituindo-se, nesse momento, por broca
de diamante. A brocagem deve ser feita no centro do
processo odontóide, evitando-se a brocagem na base
inicialmente, pois, ao soltar-se, da base do áxis, pode-
rá haver migração vertical do processo odontóide por
causa da fixação do vértice pelo ligamento apical. A
Fig. 27.3 – Imagem obtida durante a cirurgia na qual se próxima etapa é a tração do vértice do odontóide, sec-
observa a face anterior do clivo após abertura da úvula, parede ção dos ligamentos alar e apical e ressecção, por bro-
posterior da rino e orofaringe. cagem ou com pinça Kerrinson (Figs. 27.7 e 27.8).

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Fig. 27.4 – Incisão mediana da parede posterior da faringe


até alcançar as estruturas osteoligamentares.
Fig. 27.7 – Fotografia intra-operatória observando-se a base
da odontóide, após ressecção de parte do arco de C1.

Fig. 27.5 – Após abertura da faringe e afastamento lateral,


nota-se o ligamento longitudinal anterior e os arcos anteriores
de C1C2.

Fig. 27.8 – Imagem intra-operatória após ressecção da odon-


tóide. O arco anterior de C1 foi parcialmente preservado.

Pós-operatório Imediato
No pós-operatório, os pacientes devem ser colo-
cados em unidades de terapia intensiva, intubados,
sedados e sob analgesia, pois há o risco de obstrução
de vias aéreas por causa do edema dos tecidos moles
e formação de hematoma no leito operatório. Além
disso, pacientes com doenças de longa duração, como
artrite reumatóide e invaginação basilar, têm baixa re-
serva respiratória.
Fig. 27.6 – Ressecção da porção mediana do arco anterior de Um colar cervical rígido do tipo Filadélfia deve
C1, com exposição da odontóide.
ser utilizado até que novos estudos da estabilidade
craniocervical sejam realizados. O paciente permane-
A dura-máter é visualizada após dissecção e sec- ce intubado por um período de 24 a 48 horas, com o
ção do ligamento transverso e da membrana tectória. tubo sendo retirado após estudo funcional da laringe
A cavidade é, então, irrigada com solução de antibió­ e orofaringe. Indica-se traqueostomia no caso de in-
tico e a hemostasia é revista. A faringe e o palato são tubação prolongada.
suturados de modo contínuo, em dois planos, com O processo de cicatrização não costuma apresentar
Vicryl® 3.0. problemas, no entanto deve-se dar meticulosa aten-

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27 – Técnicas de Ressecção da Odontóide Abordagem Transoral

ção à higiene. Qualquer medicamento deve ser ad-


ministrado por via endovenosa, e a nutrição enteral,
por sonda orogástrica, deve começar após o primeiro
dia de pós-operatório e continuar por um período de
3 a 5 dias. Nos casos de miotomia e/ou osteotomia do
palato mole e duro, nutrição oral só após uma semana
da cirurgia. Corticosteróides intravenosos devem ser
administrados até a regressão do edema labial, língua
e faringe. O trabalho de reabilitação oral deve ser rea­
lizado por fonoaudiólogo.

INSTABILIDADE E TÉCNICAS DE FIXAÇÃO


As seguintes situações tornam o complexo atlan-
to-axial vulnerável ao deslocamento:
• Mudança de decúbito do paciente.
Fig. 27.9 – TC com reconstrução em paciente submetido
• Transferir pacientes para o leito ou para a mesa à fixação com sistema inside-outside, já operado. Observa-se
cirúrgica ampla craniectomia do forame magno.
• Durante a intubação endotraqueal.
• Enquanto se aguarda a fusão, principalmente RESULTADOS CIRÚRGICOS E
se o paciente está sem tração cervical ou halo. COMPLICAÇÕES
• Pequenas quedas.
Uma análise da instabilidade da junção craniocer- A recuperação dos pacientes submetidos à odontoi-
vical é imprescindível no pós-operatório imediato17. dectomia está relacionada à gravidade dos déficts neu-
Quase todos os pacientes com artrite reumatóide ne- rológicos no pré-operatório. Pacientes com mielopatia
cessitam de estabilização posterior, e a grande maio- leve, que deambulam no pré-operatório, têm melhor
ria dos portadores de malformações congênitas que probabilidade de recuperação. Pacientes incapazes de
se submetem à odontoidectomia torna-se instável e deambular no pré-operatório têm poucas possibilida-
necessita de colar cervical duro até que a fixação in- des de andar após a cirurgia. Em pacientes com avan-
terna seja realizada17,18. çados sinais de mielopatia, a cirurgia pode proporcio-
nar a estabilização da doença, mas não a melhora.
O tipo de fixação depende de uma série de fato-
res. Para os pacientes em que o arco anterior do atlas Diversos tipos de patologias foram operados pelos
tiver sido ressecado, pode-se esperar uma instabi- autores (Tabela 27.1). Em 51 pacientes, a patologia
lidade, porém a fixação pode ser restrita a C1-C2. mais comum foi a invaginação basilar seguida pela
Nos pacientes submetidos à ressecção do ligamento artrite reumatóide, trauma e tumores (Figs. 27.10 a
transverso ou em quem o arco do atlas tenha sido re- 27.12). A maioria dos pacientes apresentou-se com
movido, a fixação é obrigatória. Embora alguns ar- nucalgia, déficit motor dos membros superiores e in-
tigos mencionem a fixação ventral, incluindo o uso feriores, incoordenação motora, nistagmo e perda da
de placas e parafusos2,15 as técnicas de estabilização deambulação. Mais raramente ocorreu déficit de ner-
posterior são mais práticas e seguras5,19,20. Embora vos cranianos e sintomas de compressão vascular. No
possível, os enxerto ventrais colocados na falha óssea pós-operatório, após descompressão transoral, o exa-
após odontoidectomia são associados com alto nível me neurológico mostrou melhora efetiva em mais da
de infecção, deslocamento e reabsorção. metade dos pacientes, e os outros tiveram seu estado
neurológico estabilizado (Tabela 27.2).
Várias métodos de estabilização foram propostos:
occipito-atlanto-axial com amarração interlaminar,
fixação com haste de Luque ou de Ransford e todos Tabela 31.1 – Sumário dos casos operados
tendo que incluir o segmento occipital. Acontece que, Patologia Nº de pacientes: 51
nos casos de invaginação basilar associados à má- Impressão basilar 26
formação de Chiari, alguns pacientes já foram sub-
Impressão basilar e síndrome de Chiari 7
metidos à descompressão do forame magno, a qual
consiste, na maioria das vezes, em craniectomia occi- Impressão basilar, Chiari, siringomielia 3
pital ampla, laminectomia C1, C2. Como os métodos Artrite reumatóide 7
de fixação descritos necessitam da integridade anatô- Cordomas 2
mica dessas estruturas, os sistemas de instrumentação
com fixação por meio de parafusos transarticulares Metástase 2
têm tido grande aplicação19-21 (Fig. 27.9). Trauma 4

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

Tabela 31.2 – Sinais e sintomas neurológicos nos As complicações mais freqüentes no pós-operató-
pacientes com compressão ventral do forame magno rio foram pneumonia, que acometeu quatro pacientes,
e infecção urinária.
Sinais e sintomas Nº de pacientes
Complicação diretamente relacionada à cirurgia
Nucalgia 47 ocorreu em cinco pacientes. Houve um caso de fístula
Mielopatia 35 liquórica, sem meningite, reoperado com êxito, cuja
Distúrbios da marcha 23 cirurgia consistiu em enxerto de fáscia lata e drena-
gem liquórica lombar. Dois pacientes desenvolveram
Déficits de nervos cranianos 6 fístula oronasal e foram reoperados para oclusão da
Nistagmo 5 fístula e dois pacientes com deiscência de sutura da
Síncope 2 mucosa faríngea também foram reoperados. Um pa-
ciente, enquanto aguardava cirurgia de estabilização,
Radiculopatia 2
morreu devido à comprovada embolia pulmonar.

CONCLUSÕES
O acesso transoral é uma técnica segura e eficaz
nas abordagens das lesões situadas ventralmente en-
tre o bordo inferior do clivo e o corpo de C2. Trata-se
de cirurgia que lida com tecidos moles, como mucosa
e musculatura faríngea, e estruturas ósseas e cartilagi-
nosas. Não há envolvimento vascular quando se ope-
ram patologias extradurais.
Fig. 27.10 – TC com reconstrução sagital, demonstrando
a invaginação basilar com desvio posterior da apófise odon- O alto risco de fístula liquórica com conseqüente
tóide. A linha determina apenas o limite superior da apófise e meningite, por causa da dificuldade de se obter uma
não representa nenhuma marca anatômica. oclusão dural, tornaram essa via indicada para o tra-
tamento das lesões extradurais.
Nos casos de impressão basilar com migração ex-
cessiva, o acesso pode ser ampliado para cima por
miotomia do palato mole, osteotomia do palato duro e
osteotomia bilateral com divisão sagital da mandíbu-
la, embora esses procedimentos adicionais aumentem
a morbidade da cirurgia.
A instabilidade pós-operatória é ocorrência espe-
rada após odontoidectomia, especialmente em pacien-
tes com artrite reumatóide e anomalias congênitas.
Em pacientes com grandes déficits no pré-opera-
tório, a recuperação neurológica é reduzida; já os pa-
cientes com pequenos déficits submetidos à descom-
pressão precoce têm excelente recuperação.

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28
Tratamento Cirúrgico das
Malformações de Chiari
José Arnaldo Motta de Arruda

História e revisão da literatura • MC tipo III: deslocamento das tonsilas cere-


belares para a região cervical (encefalocele

A
primeira definição de um IV ventrículo alon- posterior).
gado com herniação das tonsilas cerebelares
Em 1896, Chiari descreveu um tipo IV de malfor-
e associados com siringomielia foi feita por
mação que não tinha relação com os três previamente
John Cleland.
descritos, sendo esta última uma hipoplasia cerebelar
Coube ao austríaco Hans von Chiari a descrição sem extensão para o canal medular.
das anomalias que têm como epônimo o seu nome.
Com o advento da ressonância nuclear magnética
Chiari, que foi professor de anatomia patológica na
(RNM), a tendência é de não se fazer diferença entre
Tchecoslováquia, observou, em 1891, com base em
a MC de tipos I e II em pacientes que não apresen-
material de necropsia, três graus de deformidade do tam mielodisplasia ou hidrocefalia1. Assim, a malfor-
rombencéfalo, fazendo menção, em sua publicações,
mação de Chiari tipo II ocorreria principalmente em
ao trabalho pioneiro de Cleland, de 1883. Em 1894, crianças, estando associada à mielomeningocele.
Julius Arnold observou um caso de espinha bífida e
alongamento da porção inferior do cerebelo, que na São diversas as teorias que tentam explicar a gêne-
verdade consistia em uma malformação do tipo II de se da malformação de Chiari. A primeira a ser levada
Chiari. Em 1907, dois discípulos de Arnold propuse- em consideração defende a idéia de que a causa da
MC é a tração contínua da junção bulbocervical em
ram o epônimo Arnold-Chiari para designar a malfor-
conseqüência do ancoramento caudal da medula em
mação do rombencéfalo. Dessa maneira, a contribui-
crescimento. A segunda teoria a ser lembrada é a que
ção pioneira de Cleland foi esquecida.
postula a presença de um cone de pressão no sentido
Mais de um século após a descrição de Chiari, craniocaudal, levando à herniação das estruturas do
tem-se tentado fazer justiça à Cleland, denominando rombencéfalo através do forame magno. Outra teoria
a malformação do rombencéfalo de malformação de atribui ao traumatismo do parto a responsabilidade
Cleland-Arnold-Chiari, ou, simplesmente, malforma- pela hérnia das tonsilas cerebelares. A compressão
ção de Chiari (MC), designação usada neste capítulo. violenta do encéfalo, causada pelo cavalgamento
A classificação da malformação descrita por Chia- dos ossos parietais, poderia provocar impactação das
ri é a que se segue: amígdalas no forame magno.
• MC tipo I: deslocamento inferior das tonsilas Uma quarta teoria sobre a patogênese da MC
cerebelares e da porção medial dos lobos ce- propõe a malformação primária do tronco cerebral e
rebelares (verme posterior; úvula, nódulo, pi- cerebelo. A formação incompleta ou inexistente das
râmide). flexuras cerebrais, em especial a flexura pontina, re-
• MC tipo II: deslocamento inferior das tonsilas sultaria em um tronco cerebral alongado para o canal
cerebelares e de parte do IV ventrículo alon- cervical. A essa teoria de malformação primária do
gado (os nervos cervicais apresentam projeção tronco e cerebelo podem-se somar as alterações con-
cranial). gênitas do basicrânio.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

O desenvolvimento do basicrânio, constituído por • MC tipo III: herniação do rombencéfalo com


clivo, côndilos occipitais e escama occipital, e junção encefalocele occipital.
craniovertebral, composta pelo atlas, áxis e seus liga- Ao se estudar as condições patológicas da MC,
mentos, envolve os quatro somitos occipitais caudais freqüentemente nos deparamos com condições pa-
e os dois primeiros somitos cervicais2. tológicas da siringomielia (SM), pois são vários os
Cerca de 70% dos pacientes com MC tipo I apre- dados comuns à patogênese das duas condições. O
sentam anomalias da base do crânio, como clivo curto, estudo dessas duas patologias, quando associadas, faz
ângulo basal aumentado, impressão basilar, assimila- com que o examinador encontre um número muito
ção do atlas e/ou do áxis, fusão de vértebras cervicais, grande de sinais e sintomas, o que torna difícil a ava-
atlas bífido etc. Essas anomalias ósseas acarretam, liação dos resultados cirúrgicos das duas condições.
freqüentemente, uma fossa posterior de pequenas di- A SM e a MC parecem não se constituir de síndromes
mensões. Assim, uma das causas de herniação do ce- únicas, pois apresentam o acometimento associado de
rebelo para o canal cervical seria a desproporção entre uma considerável gama de elementos neurais, o que
o condrocrânio, que não se desenvolveu satisfatoria- dificulta ainda mais a abordagem do problema.
mente, e o cerebelo, com seu maior desenvolvimento A primeira descrição de cavitação na medula foi,
no final da gravidez, quando a maioria das outras es- muito provavelmente, a de Charles Estienne, que vi-
truturas do sistema nervoso já estão formadas. veu entre 1503 e 15646. O primeiro a usar o termo
A segmentação correta das células dos escleró- siringomielia para designar as cavitações na medula
tomos derivados dos quatro somitos occipitais e dos foi Charles Prosper Ollivier d’Anger. A primeira defi-
dois somitos cervicais é vital para o desenvolvimento nição da síndrome clínica da siringomielia é creditada
normal do embrião, sendo provavelmente induzida e à Schultz, que, em 1882, fez a correlação clinicopa-
regulada por genes3. O gene Pax-1 é importante na tológica entre os cistos da medula e a sintomatolo-
segmentação dos somitos e diferenciação adequada gia clínica, enfatizando particularmente a redução da
dos esclerótomos. O calor e o ácido valpróico foram sensibilidade para dor e temperatura.
utilizados como agentes teratogênicos para a demons- Entre as teorias existentes para explicar a forma-
tração da disfunção do gene Pax-1 em modelos de ção, progressão e manutenção da siringomielia, as que
malformações vertebrais4. têm os seus fundamentos fisiopatológicos mais aceitos
Os diversos relatos de famílias com MC do tipo I são as relacionadas à dificuldade da livre circulação
fazem com que seja muito provável uma base genéti- de líquido cefalorraquidiano (LCR), especialmente
ca para essa doença. A agregação familiar é uma das no nível do forame magno, como ocorre nos casos
características das doenças que têm traço genético de malformação de Chiari. A teoria hidrodinâmica de
na sua patogênese. Existem evidências na literatura Gardner, se não conseguiu explicar todas as questões
de agregação familiar de MC do tipo I, com ou sem quanto à patogênese da SM, especialmente as cavi-
siringomielia associada, estabelecendo que deve ha- tações medulares pós-traumáticas e as associadas a
ver componente genético para essa anomalia em pelo tumores medulares, conseguiu chamar a atenção para
menos um subgrupo de famílias3. Finalmente, existe a dinâmica do liquor e as alterações congênitas rela-
um grupo de pacientes que desenvolveu MC do tipo cionadas ao rombencéfalo e à transição occipitocer-
I após a colocação do sistema de derivação lombope- vical. A grande contribuição de Gardner foi comple-
ritoneal do liquor, após punções lombares repetidas mentada por Williams, que introduziu o conceito de
ou mesmo adquiridas devido a hematoma subdural dissociação pressórica cranioespinhal. As diferenças
crônico bilateral. Na avaliação inicial, esses pacientes principais entre a teoria hidrodinâmica e a teoria de
não tinham hérnia de tonsilas cerebelares, podendo- dissociação pressórica cranioespinhal consistem em
se presumir que tenham sido causadas pelo gradiente que, na teoria de Gardner, a obstrução ao livre fluxo
de pressão através do forame magno. do liquor é conseqüência da obstrução dos orifícios
Diante do exposto, a modificação da classificação de saída do IV ventrículo. A onda de pressão respon-
de MC apresentada por Moufarrij e Awad5 é bastante sável pela formação e manutenção da cavidade me-
útil por levar em conta o fator causal da malformação. dular é derivada do pulso arterial expandido à medula
por transmissão de forças que agem do interior da
• MC tipo I: herniação do rombencéfalo (tonsi-
medula para fora. Na teoria de Williams, a obstrução
las e parte do tronco cerebral) sem mielome- do fluxo do liquor ocorre no espaço subaracnóideo,
ningocele lombar. no nível do forame magno. A pressão é, a princípio,
–– Tipo Ia: congênita. exercida externamente sobre a medula, comprimin-
–– Tipo Ib: adquirida (aracnoidite basal; pun- do a cavidade siringomiélica e, secundariamente, de
ções lombares repetidas; derivação lombo- dentro para fora, expandido a medula. As teorias de
peritoneal). Ball e Dayan, em 1972, Aboulker, em 1979 e Oldfield
• MC tipo II: herniação do rombencéfalo com et al., em 1994, defendem que o liquor penetraria na
mielomeningocele lombar. medula não pela comunicação do IV ventrículo com

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28 – Tratamento Cirúrgico das Malformações de Chiari

o canal ependimário medular, comunicação esta mui- a assimilação do atlas, o atlas bífido, a platibasia, a
tas vezes inexistente, e sim através do próprio parên- síndrome de Klippel-Feil, os ângulos cranianos ba-
quima medular edemaciado, seguindo o trajeto das sais alargados e clivo curto.
raízes dorsais ou através do espaço perivascular de O quadro clínico de compressão do tronco cere-
Virchow-Robin. bral no nível da transição occipitocervical, represen-
As teorias que defendem a passagem do liquor tada mais comumente pela malformação de Chiari, se
através do parênquima medular têm o mérito de ex- manifesta em adulto jovem, podendo, no entanto, se
plicar as SM associadas a tumores medulares, as ca- manifestar em qualquer idade, inclusive após a sexta
vitações pós-traumáticas e as relacionadas a aracnoi- década de vida. Menos de um terço dos pacientes são
dites. A turbulência e a diferença de pressão causada pediátricos na época do aparecimento dos sintomas,
pelo bloqueio parcial do liquor no nível da lesão se- que geralmente se prendem a alterações respiratórias
riam responsáveis pela origem da cavitação na medu- com estridor laríngeo.
la pelo mesmo mecanismo definido por Ball e Dayan, Basicamente, todos os nervos cranianos baixos
Aboulker e, mais recentemente, por Oldfield et al. podem estar comprometidos nos pacientes com mal-
Parece evidente que, em muitos casos, mais de formação de Chiari, por estiramento e/ou compressão
um mecanismo possa estar envolvido, se não na for- direta dos nervos ou pela compressão e deformidade
mação, pelo menos na manutenção e progressão da dos núcleos do tronco cerebral. As alterações cere-
SM. Todas as teorias traduzem o progresso do conhe- belares também são freqüentes e, muitas vezes, con-
cimento e constituem um nível a mais no esclareci- fundem-se com fenômenos vestibulares. Os sintomas
mento da patogênese das cavitações medulares, uma mais comuns decorrentes da compressão do tronco
vez que nenhuma teoria, isoladamente, explica todos cerebral, dos nervos cranianos e do cerebelo são: ce-
os casos. faléia occipital, nucalgia, tontura, diminuição da audi-
De maneira resumida e didática, pode-se classifi- ção, disfagia, apnéia do sono, disartria, tumores, pal-
car a siringomielia em5: pitações, incoordenação motora, dor ou parestesias na
• Siringomielia comunicante com o IV ventrículo. face, síncope, hipertensão, dismetria, paralisia de cor-
• Siringomielia não comunicante com o IV ven- da vocal, ataxia de tronco, insuficiência respiratória,
trículo. atrofia de língua e paralisia facial7-10. O aumento da
–– Por bloqueio do liquor no nível do forame pressão intracraniana leva à impactação das tonsilas
magno. cerebelares no forame magno. Essa pressão aumenta-
da não pode ser dissipada para o espaço subaracnói-
–– Por bloqueio do liquor no nível da medula.
deo medular devido à obstrução no nível do forame
• Cavitações primárias do parênquima medular. magno, causando, dessa maneira, o aparecimento ou
• Cavitações atróficas da medula. agravamento dos sinais e sintomas já citados. Caso
• Siringomielia associada a tumores medulares. esse aumento pressórico seja muito intenso ou mais
• Siringomielia idiopática. demorado, pode haver até perda da consciência. Uma
As siringomielias comunicantes com o IV ventrí- das características da cefaléia e nucalgia na MC é a
culo e as não comunicantes por bloqueio do liquor no tendência à piora com manobra de Valsalva, exercício
nível do forame magno constituem mais de 70% de físico e alteração súbita de postura.
todas as siringomielias. Na formação e progressão da Os sintomas neurotológicos também são muito
SM, na maioria dos casos, as malformações ósseas freqüentes e muito sensíveis ao aumento súbito de
no nível da transição occipitocervical e a ectopia das pressão intracraniana. Algumas vezes é muito difícil
tonsilas cerebelares constituem o substrato anatômico se fazer uma separação semiológica entre os qua-
para o desenvolvimento da cavitação na medula. dros vestibulares e cerebelares, mesmo porque, com
Entre as alterações ósseas que freqüentemente freqüên­cia, essas síndromes encontram-se associadas.
acompanham a MC, uma das mais comuns é a impres- Muitas vezes, a malformação de Chiari associa-
são basilar, que consiste numa invaginação da base do se a alterações ósseas no nível da transição occipi-
crânio, dando a impressão de que a coluna cervical tocervical, sendo a mais comum dessas alterações a
estaria sendo empurrada para o interior da cavidade impressão basilar (IB). Como a compressão se faz
craniana. Doenças como osteíte deformante ou do- no forame magno, os sintomas decorrentes da MC e
ença de Paget, osteomalacia, osteogênese imperfeita, da IB tendem a se confundir, e nos casos de IB sem
cretinismo, entre outras, causam o amolecimento ós- a associação de MC, a compressão no nível da por-
seo, que poderia acarretar invaginação basilar. ção anterior do bulbo, ao contrário da malformação
Em 1940, Gustafson e Oldberg publicaram a pri- de Chiari pura, na qual a compressão é predominan-
meira ocorrência de impressão basilar e siringomie- temente posterior, compromete, principalmente, as
lia. Outras malformações ósseas da transição cranio- vias longas do feixe piramidal. Assim, os pacientes
vertebral que podem acompanhar a MC e/ou SM são com IB pura apresentam basicamente uma síndrome
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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

piramidal deficitária ou de liberação associada a um possam vir a elucidar os sintomas do paciente e de-
distúrbio da sensibilidade proprioceptiva. Nos casos monstrar outras alterações que podem vir associadas
de MC isolada, o quadro clínico é representado por e ser importantes para o planejamento do tratamento
uma síndrome cerebelovestibular associada ao envol- cirúrgico. Após o advento da RNM, este tornou-se
vimento dos nervos cranianos baixos. o exame ideal para o diagnóstico da MC e/ou SM e
A síndrome siringomiélica caracteriza-se por dis- das diversas condições que podem coexistir no nível
sociação sensitiva, distúrbio do neurônio motor infe- da transição occipitocervical e da medula. A Tabela
rior, principalmente das porções distais dos membros 28.1 apresenta achados radiológicos realizados em 60
superiores e tronco, comprometimento das funções pacientes com MC e SM de uma casuística pessoal,
dos tratos longos e desordens tróficas da pele. Em al- tratados no período de 1981 a 2000.
guns casos, o quadro é acompanhado, desde o início, As várias teorias para explicar a formação da sirin-
por comprometimento do sistema nervoso autônomo, gomielia associada à hérnia das tonsilas cerebelares
dor intercostal, paraparesia, escoliose e artropatias. não permitem o consenso no tratamento dessas condi-
A cavitação medular na siringomielia tem prefe- ções, uma vez que as diversas opções cirúrgicas se ba-
rência pelo terço inferior da medula cervical, particu- seiam na fisiopatologia não completamente elucidada
larmente pela face da porção anterior, estendendo-se da síndrome siringomiélica. A grande quantidade de
à porção central da substância cinzenta e à comissura sinais e sintomas presentes nos pacientes com cavita-
anterior da medula. Como conseqüência, há interrup- ção medular e MC torna muito complexa a avaliação
ção do cruzamento das fibras espinotalâmicas, res- dos resultados do tratamento cirúrgico, sendo neces-
ponsáveis pela transmissão da sensibilidade térmica e sária a utilização de um protocolo que leve em conta o
dolorosa, ocasionado a abolição dessas modalidades comprometimento nas diversas áreas do sistema ner-
sensitivas com preservação da sensibilidade tátil, vi- voso e a existência de sintomas e sinais que possam
bratória e de noção de posição segmentar, já que os ter sua origem no nível da transição occipitocervical
cordões posteriores estão poupados, pelos menos no e/ou medular. Um protocolo com essas características
início do doença. Essa dissociação sensitiva é chama- permitiria a elaboração de estudos prospectivos de
da de dissociação termoalgésica da sensibilidade. grupos de pacientes com malformação de Chiari e si-
Estima-se a prevalência de herniação cerebelar em ringomielia, possibilitando, dessa maneira, com base
aproximadamente 3,5% da população11. nos resultados dessas séries, escolher a melhor forma
Em uma população composta por 22.591 pacientes de tratamento e ter melhor conhecimento da respos-
submetidos à RNM, demonstrou-se que 175 (0,77%) ta de cada sintoma e sinal ao tratamento empregado.
apresentavam hérnia de tonsilas cerebelares de 5 cm O protocolo multicêntrico foi criado com a ajuda de
ou mais abaixo do forame magno. Desses pacientes, neurologistas e neurocirurgiões de várias instituições
25 (14%) eram clinicamente assintomáticos12. universitárias no Brasil13 e está exemplificado nas ta-
Uma vez feita a suspeita clínica de MC e/ou SM, belas de resultados do tratamento cirúrgico (Tabelas
impõe-se a realização de exames de imagem que 28.2 e 28.3).

Tabela 28.1 – Achados radiológicos


Exames e achados No de casos Percentual
Radiografia de crânio e coluna cervical: 60 100
Impressão basilar 43 71,6
Fusão atlantoccipital 18 30
Diâmetro ântero-posterior aumentado 17 28,3
Espinha bífida em C1 8 13,3
Klippel-Feil 1 1,6
Mielografia: 21 35
Amígdalas abaixo do forame magno 18 85,7
Contraste na cavidade 6 28,5
Tomografia computadorizada do encéfalo: 20 33,3
Hidrocefalia 4 6,6
Mielotomografia computadorizada: 8 13,3
Diagnóstico confirmado 6 75
Ressonância nuclear magnética: 41 68,3
Diagnóstico confirmado 41 100

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28 – Tratamento Cirúrgico das Malformações de Chiari

Tabela 28.2 – Modo de pontuação A escala quantitativa tem como objetivo facilitar
a análise estatística e permitir uma rápida avaliação
Presença do sintoma ou sinal 2 pontos
dos resultados do tratamento, mesmo em caráter am-
Sintoma ou sinal inalterado no pós-operatório 2 pontos bulatorial, uma vez que a análise dos resultados do
Ausência do sintoma ou sinal (cura no 0 ponto tratamento de uma patologia com tantos sintomas e
pós-operatório) sinais pode ser muito demorada e, freqüentemente,
Melhora do sintoma ou sinal 1 ponto dificultada pelas queixas do paciente, que se prendem
aos sintomas e sinais que pioram ou permaneceram
Piora do sintoma ou sinal 3 pontos
inalterados.

TRATAMENTO CIRÚRGICO DA
Tabela 28.3 – Exemplo do sistema de pontuação MALFORMAÇÃO DE CHIARI ASSOCIADA
No pré-operatório, o paciente apresentava: À SIRINGOMIELIA E/OU IMPRESSÃO
Cefaléia (2 pontos) Dor cervical (2 pontos) BASILAR
Disfagia (2 pontos) Diplopia (2 pontos) O tratamento da SM vem evoluindo com o melhor
Nistagmo (2 pontos) Hipoacusia (2 pontos) entendimento da patogênese das cavitações medula-
Hiper-reflexia de membros Fasciculações (2 pontos) res. Nos casos de SM associada à MC e/ou impressão
inferiores (2 pontos) basilar, o objetivo do tratamento consiste em descom-
Total: 16 pontos primir a charneira occipitocervical, tendo como meta
principal eliminar os mecanismos que, ao alterar a
No pós-operatório, o mesmo paciente apresentava:
circulação do liquor, produzem e perpetuam a SM.
Cefaléia (melhora – 1 ponto); Dor cervical (cura – 0 ponto) Há um consenso na literatura no sentido de que os
Disfagia (melhora – 1 ponto); Diplopia (inalterado – 2 ponto) sintomas causados pela compressão das tonsilas cere-
Nistagmo (piora – 3 pontos); Hipoacusia (cura – 0 ponto) belares sobre a medula são significativamente melho-
rados pela descompressão craniovertebral9,14-16.
Hiper-reflexia de membros Fasciculações (inalterado –
inferiores (melhora – 1 ponto) 2 pontos) A necessidade de saber quais os sinais e sintomas
freqüentes na SM e na MC efetivamente melhoram
Total: 10 pontos
com o tratamento cirúrgico levou-nos a desenvolver
Modo de pontuação que permite uma rápida avaliação dos uma metodologia de avaliação que foi empregada em
resultados do tratamento cirúrgico.
60 pacientes operados no período de 1981 a 2000 e
que faziam parte de um universo de 129 pacientes
O sinal “fraqueza muscular”, que é avaliado pela com malformação no nível da transição occipitocer-
escala de força do Conselho Britânico de Pesquisa vical. Em todos os pacientes, o exame neurológico foi
Médica, também consta na lista de sintomas, pois al- realizado antes da cirurgia, antes da alta hospitalar e,
gumas vezes, mesmo sem poder evidenciar alterações no mínimo, 6 meses após o procedimento cirúrgico.
da força, o paciente refere “fraqueza muscular”. Os sintomas mais comumente apresentados no
Paralelamente à elaboração do protocolo, criamos início da doença foram os relacionados à dificuldade
um sistema de pontuação que permitiu a rápida ava- para realizar atividades que exigiam movimentos fi-
liação dos resultados do tratamento. Nesse sistema nos e coordenados das mãos. A diminuição da força
de pontuação, a presença do sintoma ou sinal vale ou atrofias musculares, uni ou bilaterais, da porção
2 pontos, tanto no pré como no pós-operatório, caso distal dos membros superiores, estava presente em
não haja alteração clínica. A ausência de sintoma ou 56,6% dos casos e se manifestava das mais diversas
sinal corresponde à ausência de pontuação; a melhora maneiras, sendo as mais comuns a dificuldade para
clínica a 1 ponto; e a piora, após a cirurgia, é indi- escrever ou costurar. A dor cervical e a cefaléia foram,
cada pelo aumento da pontuação para 3. Assim, um em ordem de freqüência, os sintomas iniciais que se
paciente que apresentou cefaléia, dor cervical, diplo- seguiram às parestesias e paresias nos membros su-
pia, nistagmo, hipoacusia, hiper-reflexia de membros periores. O tempo médio de evolução da doença por
inferiores e fasciculações tinha um total de 16 pontos ocasião da cirurgia foi de 6,2 anos, com extremos de
no pré-operatório. No pós-operatório, esse mesmo 6 meses e 21 anos.
paciente estava melhor da cefaléia (1), da disfagia (1)
e da hiper-reflexia de membros inferiores (1). Apre- Histórico da Evolução do
sentava inalteradas a diplopia (2) e as fasciculações
(2). Não demonstrava mais dor cervical (0), mas en-
Tratamento Cirúrgico
contrava-se pior do nistagmo (3), tendo, portanto, um Os procedimentos cirúrgicos dirigidos às malfor-
total de 10 pontos no pós-operatório. mações da transição occipitocervical, obstruída pela

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

impactação das tonsilas cerebelares no nível do fo- tada. A partir de 1987, todos os indivíduos foram
rame magno, iniciaram-se com Penfield e Coburn, operados em decúbito ventral, com a cabeça fixada
em 1938. Gardner e Goodall, em 1950, descreveram pelo suporte de Mayfield. Em alguns casos nos quais
a técnica cirúrgica que consistia na descompressão os pacientes apresentavam pescoço muito curto, foi
do forame magno, abertura do forame de Magendie e necessária a retração dos ombros. Para isso utilizou-
obstrução do óbex com músculo. A cirurgia de Gard- se uma larga faixa de esparadrapo para tracioná-los
ner sofreu várias modificações, como a de Peerless no sentido caudal, ou, ainda, um ponto com fio de
e Dunward, em 1983, que, além de tamponarem o algodão ou absorvível grosso (número 2), para retrair
óbex, derivavam o IV ventrículo para o espaço suba- a pele e a gordura da transição cervicotorácica no sen-
racnóideo da região cervical. tido caudal, “criando-se”, assim, espaço para realizar
Gilles Bertrand, de Montreal, em 1973, descreveu a incisão cervical (Fig. 28.1).
a ressecção subpial das tonsilas cerebelares como
modificação da técnica de descompressão cranio-
vertebral. A técnica de Bertrand também sofreu mo-
dificações feitas por Batzdorf, em 1991, vindo a se
constituir na base da técnica que foi empregada no
tratamento dos 60 pacientes desse estudo.

Material e Métodos
O tratamento cirúrgico utilizado nos pacientes
com MC associada à SM e/ou IB baseia-se na evi-
dência de piora progressiva do quadro neurológico e
nas teorias aceitas para explicar a fisiopatologia da
formação, progressão e manutenção da cavidade si-
ringomiélica.
Todos os pacientes foram submetidos à descom-
pressão craniocervical com tonsilectomia cerebelar e Fig. 28.1 – Paciente com impressão basilar, siringomielia e
plástica de dura-máter. malformação de Chiari. Notar prega da pele na região occipi-
tal, que dificulta a incisão cirúrgica ou mesmo a assepsia da
região.
Técnica Cirúrgica
Os pacientes dessa série foram submetidos à ava- A incisão da pele é vertical, mediana, estendendo-
liação clínica pré-operatória, que consistiu na avalia- se da projeção do processo espinhoso de C5 até cerca
ção da função pulmonar e cardíaca, assim como no de 3 cm acima da protuberância occipital externa. A
estudo da bioquímica sangüínea. A partir do primeiro incisão da musculatura é mediana, seguindo-se a li-
dia de pós-operatório, iniciou-se a fisioterapia respi- nha nucal. A remoção do osso occipital deve abranger
ratória. Todos os pacientes foram encaminhados para os dois terços inferiores da escama occipital e a borda
fisioterapia motora, por volta da segunda semana após posterior do forame magno, estendendo-se o mais la-
a cirurgia. teralmente possível a esse nível, para que se possa ter
A descompressão craniovertebral com tonsilecto- um bom controle das artérias vertebrais e da porção
mia e plástica de dura-máter foi realizada seguindo-se lateral das tonsilas. A laminectomia engloba o atlas
as seguintes etapas8: que, geralmente, é malformado, parte ou toda lâmina
Anestesia: utilizou-se a narcose endovenosa ina- do áxis e, eventualmente, parte ou toda lâmina de C3
latória sob respiração controlada com sistema fecha- para que se possa atingir, sem dificuldade, a margem
do. Toma-se muito cuidado durante a entubação do inferior das tonsilas herniadas.
paciente, para que não haja hiperextensão do pes- A laminectomia deve estender-se lateralmente,
coço. No posicionamento para suporte de cabeça de sem necessariamente atingir as facetas articulares,
Mayfield, deve-se tomar cuidado com a hiperflexão que não devem ser removidas. Nessa fase da cirurgia,
do segmento cervical. Os pacientes no pré-operatório o uso de luz fria frontal e lupa de magnificação de
são solicitados a realizar hiperflexão e hiperextensão 2,5× são de grande ajuda. A dura-máter deve ser aber-
da cabeça para que se possa avaliar a extensão do mo- ta em Y, com a porção vertical sobre a medula e a por-
vimento que o paciente suporta antes de referir algum ção com formato de V, rebatida e ancorada no sentido
desconforto. da tórcula. Geralmente não há necessidade de maior
Os dois primeiros casos da série foram operados exposição, devendo-se evitar as aberturas laterais na
em decúbito lateral. Após os primeiros casos, os pa- dura-máter por sobre os hemisférios cerebelares, para
cientes foram submetidos à cirurgia em posição sen- minimizar o risco de ptose cerebelar (Fig. 28.2).

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28 – Tratamento Cirúrgico das Malformações de Chiari

Fig. 28.3 – Aracnóide espessa recobrindo a transição occi-


pitocervical

Fig. 28.2 – Hérnia do biventre cerebelar ou ptose cerebelar.


A dura-máter deve ter os lagos vasculares, que co-
mumente se encontram nesses pacientes, coagulados
ou ligados com miniclipes de titânio, ancorando-se
a meninge à musculatura. Dessa fase cirúrgica em
diante é necessário o uso do microscópio cirúrgico.
A abertura da aracnóide é, algumas vezes, trabalhosa
devido às aderências da região (Fig. 28.3).
Caso seja possível, deve-se suturar a aracnóide late-
ralmente junto com a dura-máter. Essa manobra ajuda Fig. 28.4 – Tonsilas herniadas e aracnóide muito espessa,
a não ter sangue no campo cirúrgico e evita o descon- que deve ser suturada lateralmente.
forto de ter fragmentos de leptomeninge sendo aspira-
dos pelas microcânulas dos aspiradores cirúrgicos, o
que produz um som alto e desagradável (Fig. 28.4).
Para realizar a tonsilectomia, procede-se à coagu-
lação bipolar dos microvasos da pia-máter da porção
do dorso inferior das tonsilas cerebelares que, a seguir,
são incisadas com bisturi de lâmina 11, permitindo a
aspiração do conteúdo das amígdalas. O saco aracnói-
deo assim esvaziado é facilmente dissecado da alça
da artéria cerebelar póstero-inferior e das aderências
da linha média, podendo ser levantado lateralmente e
suturado com fio 7-0 à aracnóide que recobre o cere-
belo no nível do forame magno (Fig. 28.5).
Fig. 28.5 – Saco aracnóideo suturado lateralmente. Cavida-
A partir de 1996, não foi mais tentada com muito de do IV ventrículo comunicando-se livremente com o espaço
empenho a ressecção total, ou mesmo o esvaziamento subaracnóideo.
subpial das tonsilas cerebelares quando estas se apre-
sentavam relativamente soltas. Nesses casos, é necessá-
ria, somente, a coagulação bipolar das amígdalas, o que
promove excelente retração, permitindo, dessa maneira,
a desobstrução do forame de Magendie (Fig. 28.6).
Oito pacientes, correspondendo a 13,3% da série,
tiveram essa forma de tonsilectomia. Muitas vezes,
o forame de Magendie encontra-se ocluído por uma
membrana que deve ser fenestrada para que possa haver
livre comunicação do IV ventrículo com o espaço suba-
racnóideo. O fechamento da dura-máter deve ser her- Fig. 28.6 – Cavidade do IV ventrículo aparente após a coa­
mético e sem tensão, realizando-se, com esse propósito, gulação e retração da tonsila esquerda (asterisco). Alça da ar-
plástica da meninge, que deve ser suturada com náilon téria cerebelar póstero-inferior (PICA) acompanhando a tonsi-
5-0 neurocirúrgico sob magnificação óptica (Fig. 28.7). la direita herniada (seta).

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

da linha biauricular, e peso inicial de 3 kg, podendo


chegar até 5 kg. No ato cirúrgico o paciente posicio-
nado em decúbito ventral é mantido em tração, o que
ajuda a evitar a hiperflexão e impossibilita a fixação
occipitocervical em posição defeituosa. Cinco casos,
correspondendo a 8,3% da casuística, foram submeti-
dos à fixação occipitocervical com o enxerto ósseo de
costela, utilizando-se, para isso, a oitava hemicostela
esquerda que foi retirada com o paciente já posicionado
na mesa cirúrgica em decúbito ventral17 (Fig. 28.8).
Três pacientes tiveram a fixação occipitocervical
realizada com a utilização de cabos de titânio mul-
tifilamentados e alça occipitocervical pré-moldada,
Fig. 28.7 – Plástica da dura-máter. modelo Ransford, também de titânio. Os pacientes
submetidos à fixação occipitocervical foram manti-
Nos primeiros oito casos operados, utilizou-se a dos com colar cervical com apoio mentoniano pelo
fáscia lata para a plástica da meninge. No período de período de 3 meses.
1989 até 1991, a plástica foi realizada em doze pacien- Três casos tiveram o processo odontóide do áxis
tes utilizando-se pericárdio bovino. Em dez pacien- retirado por via transoral, em um período que variou
tes, utilizou-se fragmento de gálea subaponeurótica, de 2 semanas a 3 meses após a descompressão cranio-
obtido da porção superior da incisão da pele que foi vertebral com fixação occipitocervical. Os pacientes
estendida cerca de 3 cm acima da protuberância occi- foram operados em decúbito dorsal, com a cabeça
pital externa, justamente para possibilitar a retirada da levemente estendida. O palato mole foi seccionado
gálea. A partir de 1995, todos os pacientes foram ope- lateralmente à úvula e ancorado lateralmente com
rados com o uso do pericárdio bovino para a plástica fios absorvíveis. Após a infiltração com lidocaína a
da meninge. Em 1999 e 2000, utilizou-se um produto 2% com adrenalina, a parede posterior da faringe é
adesivo selante de fibrina em seis pacientes, na ten- incisada longitudinalmente. Depois da dissecção dos
tativa da vedação completa da sutura da dura-máter. músculos longo da cabeça e longo do pescoço, coloca-
Todos os pacientes tiveram dreno a vácuo extradural se o afastador autostático. Com broca de alta rotação
com saída por contra-abertura na região occipital e longa e peça de mão semicurva, foi retirado o arco do
permaneceram com esse dreno por um período que atlas e o processo odontóide. O odontóide do áxis foi
variou de 24 a 48 horas. A síntese deve ser realizada retirado sempre no sentido do ápice para a base com
com utilização de fios absorvíveis para o plano muscu- o intuito de evitar que uma fratura da base provoque
lar e subcutâneo, usando-se náilon para a pele. Todos a retração do osso puxado pelos ligamentos. No fe-
os pacientes foram mantidos com entubação traqueal chamento, após aproximação da musculatura e sutura
até estarem bem despertos, o que ocorreu na maioria dos músculos e mucosa da faringe, tomou-se um cui-
dos casos até 4 horas após o término da cirurgia, sen- dado especial com o fechamento do palato mole, para
do estimulados a movimentar-se e/ou deambular, se evitar a formação de fístulas de difícil tratamento.
possível, logo no primeiro dia de pós-operatório. A musculatura e a mucosa devem ser suturadas sepa-
Nove pacientes, correspondendo a 15% da casuísti- radamente com pontos absorvíveis. Todos os pacien-
ca, foram submetidos à fixação occipitocervical com a
utilização de hastes metálicas. Quatro casos foram fixa-
dos com o uso de haste curva occipitocervical moldada
no transoperatório a partir de um fio de aço de Steiner,
com ranhuras, usando-se para a moldagem um peque-
no torno esterilizado. A haste assim moldada foi fixada
ao occipital com fios de Luque 1,2, passados por dois
orifícios de trepanação feitos na escama occipital a 2,5
cm da linha média e cerca de 3 cm acima do forame
magno. Os fios de aço foram passados bilateralmente
em situação sublaminar nas vértebras C2, quando ainda
existentes, ou C3 e C4, executando-se, a seguir, o amar-
rilho. Para possibilitar a artrodese, enxertou-se osso do
ilíaco e fragmentos ósseos da escama occipital e da la-
minectomia. Todos os nove pacientes foram submeti-
dos previamente ao procedimento, à tração transesque-
lética cervical, com o cabo de tração amarrado no nível Fig. 28.8 – Fixação occipitocervical e enxerto de costela.

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28 – Tratamento Cirúrgico das Malformações de Chiari

tes submetidos à técnica transoral tiveram traqueosto- orofaringe, a sonda nasogástrica e o traqueóstomo fo-
mia realizada imediatamente antes do procedimento. ram retirados. No período pós-operatório, um pacien-
Esses pacientes só foram alimentados no segundo te do estudo foi mantido em haloveste por 5 meses.
dia de pós-operatório através de sonda nasogástrica Os resultados do tratamento cirúrgico dos 60 pa-
passada antes de o paciente recuperar-se da anestesia. cientes com malformação de Chiari e siringomielia
Somente após a completa cicatrização do palato e da encontram-se nas Tabelas 28.4 a 28.6.

Tabela 28.4 – Sintomas no pré e pós-operatório


Sintomas No de casos % No de casos %
no pré no pós
1. Cefaléia 37 61,6 07 11,6
2. Diplopia 21 35 05 08,3
3. Disfagia 27 45 04 06,6
4. Vertigem 39 65 07 11,6
5. Colapso das pernas 34 56,6 10 16,6
6. Diminuição da audição 15 25 06 10
7. Dor nos membros e tórax 47 78,3 15 25
8. Fraqueza muscular 58 96,6 17 28,3
9. Ausência da sudorese 23 38,3 13 21,5
10. Dissociação termoalgésica 52 86,6 44 73,3
11. Voz anasalada 20 33 3 5
12. Dor na face 13 21,6 3 5
13. Impotência sexual 20* 71,4 14 23,3
14. Marcha cambaleante 40 66,6 17 28,3
15. Dor no pescoço 56 93,3 18 30
16. Disestesias 59 98,3 33 55
*Sexo masculino, total de 28 pacientes
Os sintomas de 1 a 6 são atribuíveis à compressão do tronco; de 7 a 10 são atribuíveis à siringomielia; de 11 a 16 podem ser
atribuíveis ao comprometimento do tronco e/ou à siringomielia.

Tabela 28.5 – Sinais no pré e pós-operatório


Sinais No de casos no % No de casos no %
pré pós
1. Nistagmo 21 35 5 8,3
2. Lesão do hipoglosso 8 13,3 3 5
3. Hipoacusia 15 25 4 6,6
4. Comprometimento do reflexo do véu e nauseoso 21 35 6 10
5. Hiporreflexia de membros superiores 22 36,6 17 28,3
6. Hiporreflexia de membros inferiores 00 0 0 0
7. Atrofias musculares 44 73,3 34 56,6
8. Fasciculações 45 75 11 18,3
9. Hipotonia de membros superiores 24 40 12 20
10. Hipotonia de membros inferiores 9 15 1 1,6
11. Lesão do nervo espinhal acessório 36 60 33 21,6
12. Fraqueza muscular 59 98,3 9 15
13. Hiper-reflexia de membros superiores 27 45 19 31,6
14. Hiper-reflexia de membros inferiores 55 91,6 45 75
5. Compromentimeto da própriocepção
1 37 61,6 14 23,3
Os sinais de 1 a 4 são atribuíveis ao comprometimento do tronco cerebral; de 5 a 10 são atribuíveis à siringomielia; de 11 a 15 são
atribuíveis à siringomielia e ao comprometimento do tronco.

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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

DISCUSSÃO
Nos casos de SM associada à MC e/ou IB, o obje-
tivo do tratamento consiste em descomprimir a char-
neira occipitocervical, tendo como meta principal eli-
minar os mecanismos que, ao alterar a circulação do
liquor, produzem e perpetuam a SM e comprometem
a função do tronco cerebral.
Os procedimentos cirúrgicos com objetivo de des-
comprimir o forame magno obstruído pelas tonsilas
cerebelares iniciaram-se com Penfield e Coburn em
1938. No entanto, existem diversas formas de trata- Fig. 28.9 – O afastamento das tonsilas expõe amplamente
mento da SM, tais como: craniectomia ou cranioto- o IV ventrículo. Ao soltar o afastador, as tonsilas voltam a
obstruir a cavidade ventricular.
mia suboccipital com ou sem laminectomia, com ou
sem abrir a dura-máter, com ou sem abrir a aracnóide,
com ou sem plástica da meninge, com ou sem alguma Nos pacientes que apresentavam IB sintomática
forma de tonsilectomia, com obstrução do óbex com associada à MC e SM também sintomáticas, realizou-
músculo ou qualquer outro material, com derivação se a fixação occipitocervical. A fixação com enxerto
do IV ou do III ventrículo para as cisternas subarac- ósseo, inicialmente do ilíaco e, mais recentemente,
nóideas, com ou sem derivação ventriculoperitoneal com costela, foi realizada como uma preparação para
em casos associados a hidrocefalia, com derivações a eventual retirada transoral do odontóide.
siringossubaracnóidea, siringopleural, siringoperito- A escolha da tática cirúrgica de realizar primei-
neal, lomboperitoneal ou ventriculostomia terminal. ramente a descompressão craniovertebral, seguida
Os procedimentos que envolvem derivações liquó- da fixação occipitocervical, se prende ao fato de que,
ricas, no entanto, apresentam um percentual de mau de nove pacientes nos quais essa tática foi usada,
funcionamento ou complicações por volta de 50%18,19. somente três necessitaram da retirada transoral do
Provavelmente, em muitos casos, os pacientes não processo odontóide do áxis. É verdade, no entanto,
melhoram de alguns sinais ou sintomas tão satisfato- que, em alguns casos com instabilidade occipitocer-
riamente como é desejado, em decorrência de lesões vical associada, a descompressão por via posterior
irreversíveis da medula, causadas pela compressão pode agravar o quadro neurológico do paciente, que
crônica do tecido nervoso. passa a necessitar de cirurgia transoral para descom-
A tonsilectomia cerebelar foi utilizada em todos os primir anteriormente o forame magno. É importante
pacientes deste trabalho, algumas vezes com coagula- ter em mente que o oposto também é verdadeiro. Em
ção e retração das tonsilas, outras, com extirpação sub- alguns casos, após a cirurgia transoral, é necessária a
pial do tecido cerebelar herniado, e outras vezes, ainda, descompressão craniocervical. Assim, nos pacientes
com extirpação total da porção herniada das amígda- com IB pura, a cirurgia transoral, seguida de fixação
las. Em 52 casos (86,6%), foi enviado tecido da tonsila occipitocervical, num segundo tempo, seria o trata-
cerebelar para exame histopatológico, que mostrou al- mento de escolha, ao passo que, nos pacientes com
terações profundas da arquitetura cerebelar da região, associação de MC, a descompressão craniovertebral
inclusive com perda neuronal na camada de Purkinje, seria suficiente20. Vale ressaltar que, na nossa casu-
o que aponta para a inviabilidade desse tecido. ística, os pacientes que apresentaram sinais de com-
Parece evidente que, se o desejo é manter livre o pressão anterior e posterior no forame magno foram
pertuito entre a cavidade do IV ventrículo e o espaço submetidos à tração cervical transesquelética no pré-
subaracnóideo, uma simples abertura do forame de operatório, com intuito de identificar os pacientes que
Magendie não seria suficiente. As amígdalas alonga- melhoram e necessitam de fixação occipitocervical.
das e aderidas à medula pela espessa aracnóide que, Um dos pacientes, mesmo com a retirada do odontói-
invariavelmente, é encontrada na região, impedem de e a fixação occipitocervical, voltou a piorar, sendo
que as tonsilas migrem no sentido da cavidade cra- necessária uma nova tração cervical que fez regredir
niana. Ao se fechar a dura-máter, mesmo com plástica os sintomas e levou à colocação de haloveste que foi
da meninge, as tonsilas herniadas voltam a obstruir o mantido por 5 meses. O paciente, após a colocação do
forame de Magendie (Fig. 28.9). haloveste, voltou a deambular e apresentou significa-
Assim, a tonsilectomia parcial ou total, com libe- tiva melhora de sua sintomatologia.
ração do saco aracnóide vazio da superfície da medu- A pseudomeningocele foi a complicação cirúrgica
la, é o método que permitiu mais segurança quanto à mais freqüente dos nossos pacientes. De um total de
descompressão definitiva da charneira occipitocervi- 60 pacientes, 14 (23,3%) apresentaram pseudome-
cal e quanto à livre comunicação da cavidade do IV ningocele occipital no pós-operatório. Um pacien-
ventrículo com o espaço subaracnóideo. te necessitou de cirurgia para corrigir o problema e

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28 – Tratamento Cirúrgico das Malformações de Chiari

três foram tratados com drenagem liquórica através ca craniocervical, em razão da presença de coágulos,
de cateter colocado no espaço subaracnóideo lombar existentes no pós-operatório, no espaço subaracnói-
pelo período de 7 dias. Seis pacientes submeteram-se deo medular cervical, ou mesmo em virtude de uma
a punções percutâneas, no máximo três, com aspira- descompressão insatisfatória, do que da técnica de fe-
ção dos cistos. Dois pacientes, após se submeterem chamento da dura-máter. Assim, obstrução ao trânsito
a essas punções, desenvolveram quadro de infecção liquórico poderia levar o liquor a procurar uma área
meníngea. Nos outros casos, houve regressão espon- de menor resistência, que, no caso, seria o espaço cer-
tânea dos cistos em um período que variou de 4 dias vical suboccipital criado pela desinserção dos múscu-
a 2 semanas. los da escama occipital e dos processos espinhosos e
Na tentativa de se evitar pseudomeningocele, ade- lâminas das vértebras cervicais altas. Após o restabe-
rências com o tecido cerebelar e infecção, utilizou-se lecimento do equilíbrio hidrodinâmico, como com a
plástica da dura-máter em todos os casos, usando-se, absorção de coágulos, essa coleção liquórica tenderia
nos primeiros casos, a fáscia lata, prática abandona- a desaparecer espontaneamente.
da em razão do grau de desconforto relatado pelos Quatro pacientes do estudo apresentaram meningi-
pacientes no sítio doador. A técnica utilizada nos ca- te bacteriana no pós-operatório. Os quatro pacientes
sos seguintes incluía o uso de dura-máter liofilizada, recuperaram-se sem seqüelas atribuíveis ao quadro de
com ou sem colocação de acrílico sobre os pontos de infecção meníngea.
náilon 5-0, realizando-se a sutura sob magnificação A partir de 1987, todos os pacientes passaram a ser
do microscópio ou lupa. A partir de 1994 até 1998, operados em decúbito ventral, não só pelo conforto e
utilizou-se gálea subaponeurótica para a plástica de facilidade de posicionamento, mas também porque se
dura-máter. Essa gálea parece ser o material ideal, evitam a embolia gasosa e a hérnia do biventre cere-
pois minimiza os riscos de infecção e permite uma belar, que podem ocorrer ao se abrir a dura-máter que
sutura mais hermética do que a feita com a dura-má- recobre os hemisférios. A hérnia cerebelar, ou ptose
ter liofilizada, além da vantagem de se obter a fáscia cerebelar, foi diagnosticada por ressonância nuclear
da mesma incisão cirúrgica, bastando, para isso, alon- magnética em um paciente que se submeteu a uma
gar a incisão cerca de 2,5 cm acima da protuberân- nova intervenção para corrigir a ptose cerebelar e
cia occipital externa. O problema encontrado com a desfazer aderências no nível da transição occipitocer-
retirada da gálea diz respeito à criação de uma área vical que estavam levando a um recrudescimento da
com menor elasticidade e tensão na região occipital síndrome siringomiélica.
do couro cabeludo, que fica propenso a coletar liquor A hérnia do biventre cerebelar é pouco relatada
com maior facilidade que outras regiões. Com a faci- na literatura, embora fosse descrita por Williams, em
lidade de se obter o pericárdio bovino, os pacientes, a 1978, com o nome de cerebellar slump. Batzdorf, em
partir de 1998, passaram a ter a plástica de dura-máter 1991, denominou a complicação de “ptose cerebelar”,
realizada com utilização dessa membrana serosa. A chamando atenção para o fato de que essa complica-
formação das bolsas liquóricas na ferida cirúrgica pa- ção, por si só, poderia vir a comprimir a transição oc-
rece dever-se muito mais a uma dissociação pressóri- cipitocervical, fazendo persistir a dissociação pressó-
rica craniocervical. Holly e Batzdorf16 apresentaram
Tabela 28.6 – Complicações cirúrgicas a técnica de cranioplastia suboccipital para correção
do problema.
Complicação No de casos Percentual
Um paciente que permaneceu com haloveste por 5
Pseudomeningocele 14 23,3a meses apresentou saída de liquor pelo orifício frontal
Meningite 4 6,61 esquerdo de fixação do halo craniano, no momento da
Ptose cerebelar 1 1,61 retirada dos pinos, sendo necessária somente a sutura
da pele para a correção do problema. Uma paciente
Compressão por fibrose 1 1,61
que demonstrava estado geral muito comprometido
Saída de liquor pelos pinos da 1 1,61 por ocasião da sua cirurgia apresentou exposição da
tração cervical haste de fixação occipitocervical, sendo necessário
Exposição da haste de fixação 1 1,6b refazer a sutura no nível occipital. Essa mesma pa-
occipitocervical ciente teve fístula do palato após a retirada do odon-
Pneumotórax 1 1,6c tóide por via transoral, necessitando de gastrostomia.
Fístula do palato 1 1,6d
Um paciente apresentou pneumotórax após a retirada
da oitava hemicostela posterior esquerda, para enxer-
a
Um caso necessitou de cirurgia e três foram tratados com dreno to ósseo da fixação occipitocervical, necessitando de
lombar. drenagem do tórax por 2 dias. Embora o fato não es-
b
11,1% das fixações occipitocervicais.
c
20% dos pacientes fixados com costela. teja relacionado como complicação da cirurgia, con-
d
33,3% dos pacientes submetidos à ressecção transoral do vém relatar que, em um caso, houve recrudescimento
odontóide. de tuberculose pulmonar que havia sido tratada de
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Parte 3 – Cirurgia de Base de Crânio

maneira incompleta 3 anos antes. Esse paciente, ao nois: American Association of Neurologic Surgeons;
receber alta, ainda estava fazendo uso do esquema te- 1997, p. 1-26.
rapêutico para tuberculose. 7. Jacob PR, Rhoton Jr AL. The Chiari I malformation.
Na série em questão, não houve óbitos em nenhum In: Anson JA, Benzel EC, Awad IA, editors. Neuro-
dos 60 pacientes operados com a associação de MC e surgical topics: syringomyelia and Chiari malforma-
tions. Illinois: The American Association of Neuro-
SM. Convém, no entanto, ressaltar que os 60 pacien- logic Surgeons; 1997, p. 57-67.
tes desse estudo foram retirados de um universo de 8. Milhorat TH, Chou MW, Trinidad EM, Kula RW, Man-
129 pacientes com malformações no nível da char- dell M, Wolpert C, et al. Chiari I malformation rede-
neira occipitocervical, operados no período de 1981 a fined: clinical and radiographic findings for 364 symp-
2000. Nesse universo de pacientes, tivemos nove óbi- tomatic patients. Neurosurgery. 1999;44:1005-17.
tos (6,9%), concentrados na década de 1980, quando 9. Ellenbogen RG, Armonda RA, Shaw DWW, Winn
ainda não se dispunha dos cuidados de pós-operatório RH. Toward a rational treatment of Chiari I mal-
com os quais se conta atualmente. Dos casos mais re- formation and syringomyelia. Neurosurg Focus.
centes que foram a óbito, destaca-se o caso de um pa- 2000;8(3):Article 6.
ciente tetraparético com insuficiência respiratória de- 10. Tubbs RS, McGirt MJ, Oakes WJ. Surgical experi-
corrente de importante compressão anterior à junção ence in 130 pediatric patients with Chiari I malfor-
bulbo pontina, sem SM ou MC, que foi submetido à mations. J Neurosurg. 2003;99(2):291-6.
retirada transoral do odontóide e mantido na unidade 11. Cavender RK, Schmidt JH III. Tonsilar ectopia and
de terapia intensiva sob tração cervical, vindo a fale- Chiari malformations: monozygotic triplets. Case re-
cer no 5o dia de pós-operatório, vítima de pneumo- port. J Neurosurg. 1995;82:497-500.
nia e sangramento digestivo alto. Outro caso recente 12. Meadows J, Kraut M, Guarnieri M, Haroun RI, Car-
son BS. Asymptomatic Chiari type I malformations
(1997) foi o de uma paciente com IB e MC, que foi identified on magnetic resonance imaging. J Neuro-
submetida à descompressão craniovertebral com fixa- surg. 2000;92:920-6.
ção occipitocervical e apresentou parada respiratória 13. Arruda JAM, Costa CMC, Tella Jr OI. Avaliação de
súbita no 2o dia de pós operatório. pacientes com siringomielia associada à malforma-
ção de Chiari: proposta de um protocolo multicêntri-
Referências Bibliográficas co. J Bras Neurocir. 1999;10(3):93-6.
14. Sahuquillo J, Rubio E, Poca MA, Rovira A, Rodri-
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Chiari I malformation with or without syringomyelia. 16. Holly LT, Batzdorf U. Management of cerebellar
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Parte 4
Inflamações e
Neoplasias em
Neurocirurgia

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29
Cirurgia dos Gliomas de
Baixo Grau de Malignidade
Alexandros Theodoros Panagopoulos
José Carlos Esteves Veiga

O
s gliomas são as neoplasias encefálicas pri- lecular dos gliomas são capazes de classificar esses
márias mais comuns e correspondem à se- tumores, avaliar sua resposta ao tratamento e estimar
gunda causa de morte ocasionada por doen- a sobrevida dos pacientes, como é observado na asso-
ças de origem neurológica, com taxa de mortalidade ciação da perda dos alelos dos cromossomos 1p e 19q
inferior somente à determinada pelas afecções ence- com relação aos oligodendrogliomas, tornando-os
falovasculares. Essas neoplasias, quanto à sua história quimiossensíveis. Já essa associação não é vista em
natural, podem ser de alto ou baixo grau de maligni- pacientes com astrocitomas e gliomas mistos7-11. Mu-
dade, dependendo do seu padrão histológico e do seu tações no cromossomo TP53 são eventos comuns na
comportamento clínico. Os gliomas difusos de baixo patogênese de astrocitomas e oligoastrocitomas, as-
grau são classificados pela Organização Mundial da sim como a presença de componente histológico ge-
Saúde em grau II e compreendem os astrocitomas, os mistocítico é considerado fator de mau prognóstico12.
oligodendrogliomas e os oligoastrocitomas (gliomas
mistos)1. Afetam preferencialmente adultos jovens e AVANÇOS EM NEUROIMAGEM
apresentam taxa média de sobrevida entre 5 e 7 anos.
Correspondem a 15% dos gliomas nos adultos e 25% A ressonância magnética com uso de contraste pa-
nas crianças. Têm crescimento lento quando compa- ramagnético (gadolínio) tem grande valor na caracte-
rados aos gliomas de alto grau, porém durante a sua rização de tumores cerebrais e é mais sensível do que
história natural, em algum momento, sofrem transfor- a tomografia computadorizada. Os gliomas de baixo
mação maligna. Alguns pacientes passam anos sem grau tipicamente não são realçados ao contraste, têm
sinais de progressão da doença, e outros morrem em infiltração difusa e mostram hipersinal em T2 e hipos-
1 a 2 anos após o início dos sintomas2,3. sinal em T1 (Figs. 29.1 e 29.2). A técnica de T2 echo
O tratamento desses tumores é controverso, não ha- pode fornecer informação complementar sobre a vas-
vendo evidências de que a cirurgia radical ou a radio- cularização neoplásica, sendo útil no pré-operatório,
terapia previnam a transformação maligna ou aumen- especialmente por mostrar áreas anormais de perfusão
tem a taxa de sobrevida4,5. Alguns autores adotam uma não visíveis na ressonância magnética convencional.
postura de tratamento mais conservadora, “aguardar e A tomografia com emissão de pósitrons tem sido
observar evolução”. Fazem o seguimento dos pacien- usada para o diagnóstico de gliomas de baixo grau. O
tes que estão neurologicamente intactos, em casos de traçador mais utilizado é o fluordeoxiglicose (FDG),
tumores difusos afetando áreas eloqüentes do cérebro, porém sem bons resultados, pois esses gliomas têm
sem alteração clínica ou radiológica e que não mostrem baixo consumo de glicose13. A integração funcional
progressão da doença, como originariamente sugerido obtida com a magnetoencefalografia, a ressonância
por Recht et al.6, que tal conduta possa interferir no funcional e o sistema neuronavegador são recursos
prognóstico de pacientes com gliomas de baixo grau4. úteis na identificação e preservação de áreas eloqüen-
A moderna prática da neuroncologia é altamente tes do cérebro. Isso resulta na redução de déficits neu-
dependente da classificação da neoplasia para guiar o rológicos no pós-operatório. Entretanto, essas moda-
tratamento e o prognóstico. Estudos da biologia mo- lidades só podem ser usadas na identificação de áreas

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

funcionais na superfície cortical2,14-17. Para se evitar desse modo, o planejamento cirúrgico18-21. Obvia-
lesões pós-operatórias é necessário preservar os tratos mente o melhor método diagnóstico é o anatomopa-
da substância branca, tal como o trato piramidal (Fig. tológico. Entretanto, os recursos de imagem são úteis
29.3). A ressonância magnética por tensor de difusão para monitorar a progressão do crescimento tumoral e
(DTI) é um novo método de imagem que pode ser avaliar a resposta ao tratamento. A ressonância mag-
usado para estudar a anatomia dos tratos da substân- nética com espectroscopia mostra a concentração de
cia branca (tratografia) (Figs. 29.4 e 29.5), auxiliar no metabólitos, enquanto a imagem por perfusão mede
diagnóstico diferencial entre glioma e metástase cere- o fluxo sangüíneo cerebral regional e o volume de
bral (Fig. 29.6) e na diferenciação entre edema peri- sangue, sendo útil na compreensão da evolução dos
tumoral e infiltração tumoral (Fig. 29.7), facilitando, gliomas de baixo grau13.

Fig. 29.1 – Corte axial de tomografia computadorizada cra- Fig. 29.2 – Imagens por ressonância magnética do encéfalo,
nioencefálica sem contraste, mostrando grande área hipoden- ponderadas em T1 e com contraste paramagnético-gadolínio.
sa, com pouco efeito de massa, correspondendo a glioma de Notar o discreto realce.
baixo grau de malignidade.

A
B

Fig. 29.3 – (A) Relação anatômica de vários tratos da substância branca, em corte coronal dos hemisférios cerebrais. (B) Mapa
direcional referente à figura A. O giro do cíngulo é identificado em verde com as setas amarelas; a seta branca maior mostra
o corpo caloso; as cabeças de seta brancas indicam o fascículo occipitofrontal superior; as flechas brancas estreitas mostram o
fascículo occipitofrontal inferior; as cabeças de setas amarelas mostram o fascículo longitudinal superior. Como o corpo caloso,
as fibras da comissura anterior são orientadas da esquerda para a direita em direção à linha média, resultando nas características
vermelhas (nas imagens por setas abertas) no DTI. Mais lateralmente as fibras divergem e se misturam com outros tratos, não
podendo mais ser identificados pela técnica DTI, mas apenas pela tratografia. Modificado de Jellison et al.18

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29 – Cirurgia dos Gliomas de Baixo Grau de Malignidade

A
B

Fig. 29.4 – (A) As fibras corticoespinhais originam-se ao longo do córtex motor, convergindo através da coroa radiada e da
por­ção posterior da cápsula interna, indo para o funículo lateral da me­dula espinhal. (B) Mapa direcional coronal. As fibras do
trato corticoespinhal são identificadas em azul no mapa do DTI devido predominantemente à sua orientação súpero-inferior.
As fibras se tornam violetas à medida que se tornam mais mediais para entrarem nos pedúnculos cerebrais, tornando-se azuis
quando têm orientação descen­dente no tronco encefálico. As fibras corticoespinhais passam através dos tratos corticobulbares
e cor­ticopontinos, que não podem ser vistos no mapa direcional, mas podem ser observados na técnica de tratografia. (C) Tra-
tograma. Modificado de Jellison et al.18

A B

C D
Fig. 29.5 – (A) Dissecção macroscó­pica. (B) Vista medial da coroa radiada. (C) Mapa direcional, três cortes paras­sagitais, com
a coroa radiada identifi­cada em azul (setas). As fibras da coroa radiada se misturam lateral­mente com as fibras do corpo caloso,
resultando em diferentes colorações em seus cruzamentos. (D) Tratograma que proporciona visualização de diferentes porções da
coroa radiada para iniciar o algoritmo tratográfico de diversas localizações. Modificado de Jellison et al.18

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

A B
A B

C D C D
Fig. 29.6 – (A a D) Astrocitoma infiltrativo caracterizado Fig. 29.7 – (A a D) A imagem hiperintensa em T2 representa
pela diminuição da anisotropia e anormalidade de coloração
edema vasogênico ao redor de uma pequena metástase. Apesar
(seta) no mapa direcional, sugerindo comprometimento impor-
da diminuição da anisotropia nessa região e da mudança de co-
tante das fibras da substância branca. Notar que a mudança de
loração no mapa direcional, os tratos mantêm a sua cor normal
coloração não se deve ao efeito de massa ou puramente pelo
(fascículo longitudinal superior – verde (seta); coroa radiada em
desvio dos tratos. Modificado de Jellison et al.18
azul (seta). Isto é compatível com edema vasogênico, aumentan-
do o espaço extracelular, sem lesar a membrana celular, deixando
A Utilidade da Ressonância Magnética a organização direcional intacta. Modificado de Jellison et al.18
Funcional na Cirurgia dos Gliomas
A integração da anatomia dos sulcos e giros e a in- A Utilidade da Craniotomia com Paciente
formação funcional pelo sistema de neuronavegação Acordado e a Estimulação Cortical nas
durante a ressecção cirúrgica foi descrita por Jannin et Cirurgias dos Gliomas
al.16 Com o uso da ressonância magnética funcional e
da magnetoencefalografia, os referidos autores pude- A prática usual neurocirúrgica para remoção de le-
ram selecionar sulcos corticais e correlacionar com da- sões intra-axiais supratentoriais é realizada sob anes-
dos funcionais, os quais, acoplados ao sistema de neu- tesia geral. No passado, a craniotomia com paciente
ronavegação e ao microscópio cirúrgico, permitiram acordado era reservada para cirurgias de epilepsia e
informações de referências anatômicas intra-operató- remoção de lesões em áreas eloqüentes do cérebro24.
rias, estabelecendo correlação entre estimulação corti- Em estudo realizado para a ressecção de gliomas lo-
cal direta, em pacientes operados sob anestesia geral, calizados no giro frontal superior, em pacientes acor-
e as informações funcionais no córtex motor primário dados e com estimulação cortical, observou-se que a
em cerca de 87% dos casos estudados. Schiffbauer et proximidade da margem de ressecção da área funcio-
al.22 avaliaram especificamente a questão de áreas fun- nal é importante. Se a ressecção for a 0,5 cm da área
cionais em gliomas de alto e baixo graus e encontraram eloqüente, o déficit neurológico no pós-operatório
áreas com atividade funcional em 18% dos gliomas de será significativamente menor25. A despeito dos avan-
grau II, 17% nos gliomas de grau III e 8% nos gliomas ços nos sistemas de neuronavegação, o uso da estimu-
de grau IV. Esses dados mostram que as lesões intra- lação cortical intra-operatória é um recurso de valor
axiais devem comprometer as bordas do córtex funcio- e deve ser lembrado no planejamento operatório. As
nal, e esse comprometimento é maior nos gliomas de dificuldades técnicas na ressecção cirúrgica de neo-
baixo grau do que nos de alto grau. Recomendam-se o plasias intrínsecas continuam e foram bem demons-
estudo pré-operatório funcional e a estimulação corti- tradas por Lang et al.26. Em uma série de 22 pacientes
cal intra-operatória após a realização de craniotomia operados por tumores insulares e operculares usando
sob sedação, possibilitando o despertar do paciente, a a via transylviana, 36% dos pacientes tiveram compli-
fim de minimizar os déficits pós-operatórios23. cações pós-operatórias imediatas. Entretanto, 3 meses

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29 – Cirurgia dos Gliomas de Baixo Grau de Malignidade

após, somente dois pacientes permaneceram com dé- A Utilidade da Ultra-sonografia


ficit neurológico. A disfunção da fala e a motora foram Intra-operatória
relacionadas à excessiva retração opercular, à mani-
pulação da artéria cerebral média, à lesão das artérias Quando a ultra-sonografioa se tornou comercial-
lenticuloestriadas ou de vasos perfurantes do segundo mente viável na década de 1970, havia uma expec-
segmento da artéria cerebral média. Desse modo, o tativa de ser um importante recurso nas cirurgias que
planejamento pré-operatório adequado e a compreen­ comprometiam o córtex cerebral. Depois desse perío­
são da anatomia cirúrgica da região minimizam as do de entusiasmo, a ultra-sonografia foi pouco utili-
complicações neurológicas pós-operatórias22,27. zada devido aos resultados ineficientes por conta da
A utilidade da craniotomia com o paciente acor- baixa qualidade da imagem. Em 1995, reiniciaram-
dado e a estimulação cortical intra-operatória podem se as pesquisas explorando a capacidade tecnológica
auxiliar em questões como somatotopia e plasticidade desse exame e seu uso em neurocirurgias.
cerebral induzida pelo tumor, as quais foram explo- Recentemente, o emprego da ultra-sonografia com
radas por Fontaine et al.28 e Duffau et al.29 A soma- a finalidade de guiar a ressecção tumoral tem se pro-
totopia da área motora suplementar foi estudada em vado cada vez mais eficaz por proporcionar uma ima-
pacientes com glioma na região pré-central medial, gem intra-operatória em tempo real, tornando-se um
onde a ressecção resultava em alterações transitórias meio alternativo em relação à ressonância magnética
motora e da linguagem. A topografia e a gravidade intra-operatória45,46. A exérese de neoplasias cerebrais
do déficit foram correlacionadas com a extensão da intra-axiais depende da habilidade do cirurgião em
ressecção da área motora suplementar. A representa- localizar o tumor, definir as suas margens e em verifi-
ção dos membros superiores e inferiores, da face e da car a presença de lesão residual. Nesse contexto a uti-
lidade da ultra-sonografia é limitada a casos em que a
linguagem localizou-se no sentido póstero-anterior.
margem tumoral pode ser bem definida. Em tumores
Essa somatotopia também se observa nos exames de
sólidos a ultra-sonografia pode diferenciar o edema
ressonância magnética funcional28. Embora a ínsula
peritumoral, muitas vezes difícil de ser identificado
do hemisfério dominante seja essencial à fala, há rela-
nas imagens por tomografia e ressonância magnética.
to de completa remoção dessa região em um paciente
Chacko et al.47 mostraram que a ultra-sonografia é ca-
com glioma, sem causar déficit de linguagem30. O uso
paz de definir com clareza a margem tumoral em vá-
da estimulação cortical intra-operatória em pacientes rias neoplasias, exceto nas que já tenham sido previa-
acordados31-34 e a ressonância magnética funcional mente irradiadas. A presença de coágulos na cavidade
pré-operatória35,36 mostraram que há uma reorganiza- tumoral, mesmo com a irrigação de solução salina,
ção funcional depois da ressecção tumoral. A origem pode resultar em uma imagem hiperecogênica pas-
da plasticidade cerebral induzida pelo tumor ainda é sível de ser interpretada como tumor. Isso contribui
incerta. A despeito da plasticidade cerebral, mecanis- para falsos-positivos na imagem por ultra-sonografia
mos de compensação são limitados, motivo pelo qual em gliomas de baixo e alto graus. Irregularidades no
os estudos prévios de tais pacientes registram déficits leito tumoral formadas durante a incisão cirúrgica
irreversíveis. Inicialmente, nota-se que a reorganiza- possibilitam múltiplas interfaces, que resultam no
ção pode ser mais importante em uma área secundária aumento da ecotextura, indistinguíveis da ecotextura
do que na área primária eloqüente, se a região lesada neoplásica.
puder ser compensada por outra. Porém, uma lesão A principal vantagem da ultra-sonografia em re-
dessa região recrutada pode induzir à seqüela perma- lação à ressonância magnética intra-operatória é seu
nente. Conseqüentemente, a ressecção cirúrgica deve baixo custo e a facilidade de uso, podendo proporcio-
evitar o envolvimento de uma estrutura eloqüen- nar uma imagem em tempo real e possibilitar ressec-
te se a área compensatória não estiver funcionando ção mais ampla.
perfeitamente28,37-40.
Em suma,o uso da craniotomia em pacientes acor-
dados e a utilização de mapeamento cerebral é uma
Mapeamento Intra-operatório das Vias Ópticas
excelente maneira de abordar lesões intra-axiais su- As lesões pós-operatórias determinadas no campo
pratentoriais que envolvem áreas eloqüentes do cór- visual e ocasionadas por injúria nas radiações ópticas
tex cerebral, evitando-se anestesia geral. Essa técnica são freqüentemente registradas depois de ressecções
pode ser aplicada a tumores em várias localizações envolvendo o lobo temporal, particularmente em ci-
e com diferentes características histológicas. É bem rurgia de epilepsia, com limites de variação entre 52%
tolerada, havendo relatos desses procedimentos em e 100%. Mesmo déficits visuais menores podem ter
crianças de até 9 anos de idade41. A craniotomia com maior repercussão clínica, principalmente em pacien-
paciente acordado apresenta taxas menores de mor- tes que atuam profissionalmente como aviadores ou
bidade e mortalidade, além de diminuir o tempo de motoristas. Embora o quadrante superior seja afetado
internação hospitalar23,42-44. preferencialmente, grandes ressecções temporais de-

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

vem também estar associadas ao comprometimento metastatic oligodendroglioma. J Neurooncol. 2004


do quadrante inferior. As lesões mais posteriores en- Feb;66(3):265-71.
volvendo a junção temporoparietoccipital têm maior 9. Ino Y, Betensky RA, Zlatescu MC, Sasaki H, Ma-
risco de ocasionarem hemianopsia homônima. A cdonald DR, Stemmer-Rachamimov AO, et al. Mole-
despeito da freqüência do uso do mapeamento fun- cular subtypes of anaplastic oligodendroglioma: im-
cional em cirurgias que envolvem áreas eloqüentes, plications for patient management at diagnosis. Clin
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a identificação de estruturas visuais é raramente fei-
ta. Descreve-se o uso da estimulação elétrica intra- 10. Thiessen B, Maguire JA, McNeil K, Huntsman D,
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operatória mapeando as vias visuais em pacientes loci on chromosome arms 1p and 10q in oligoden-
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ma de neuronavegação e ao potencial evocado visual tic impact of TP53 mutation status for adult patients
intra-operatório, constitui recurso útil nas cirurgias de with supratentorial World Health Organization Gra-
neoplasias que envolvem o sistema visual posterior de II astrocytoma or oligoastrocytoma: a long-term
aferente na tentativa de preservar as vias ópticas48. analysis. Cancer. 2004 Sep 1;101(5):1028-35.
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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

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30
Gliomas Malignos
Aspectos Cirúrgicos
Marcos Vinícius Calfat Maldaun
Paulo Henrique Pires de Aguiar

INTRODUÇÃO importância da avaliação fisiológica e funcional pré


e intra-operatória, preconizando, sempre que possí-

O
s gliomas malignos constituem o grupo mais vel, oferecer a ressecção radical, mas respeitando li-
freqüente dos tumores primários do sistema mites funcionais e as relações com áreas eloqüentes
nervoso central (SNC) na idade adulta. Os e, assim, minimizando a morbidade cirúrgica e pro-
tipos histológicos mais comuns incluem o astrocito- piciando ao paciente dar continuidade ao tratamento
ma anaplásico e o glioblastoma multiforme (GBM), adjuvante.
seguidos pelas variações anaplásicas do oligodendro-
glioma e ependimoma. Tais tumores são associados
a uma importante causa de morbidade e mortalida- EPIDEMIOLOGIA
de em indivíduos, geralmente na meia-idade adul- Os tumores primários malignos do SNC corres-
ta, acarretando um grande impacto social e pessoal. pondem a aproximadamente 1,4% de todos os cân-
Atualmente, têm sido motivo de intensiva pesquisa ceres e estão associados a 2,3% de todas as mortes
e discussão, abrangendo campos molecular, genético, relacionadas a câncer. Em 1999, a American Cancer
investigatório com vários métodos de imagem, pre- Society registrou 16.800 casos novos de tumores ce-
paração pré-operatória adequada, técnicas cirúrgicas rebrais malignos1. Mais de 60% de todos os tumores
com enfoque funcional e terapêutica pós-operatória. primários do SNC são gliomas, a grande maioria des-
Nas últimas décadas uma série de avanços nesses tes astrocitomas, e sem dúvida o glioblastoma multi-
tópicos propiciou aos profissionais que assistem pa- forme é o tipo histológico mais comum. Dependendo
cientes com tal patologia uma melhor compreensão da faixa etária, há uma incidência de até 7,5/100.000
da fisiopatogenia desses tumores, a otimização do ar- pessoas por ano. O pico etário mais freqüente de glio-
senal terapêutico, a diminuição da morbidade perio- blastoma multiforme ocorre entre 45 e 60 anos, mas
peratória, mas infelizmente ainda consiste em gran- pode ocorrer praticamente em qualquer idade. Os
de desafio ao neurocirurgião, permitindo excelente gliomas malignos costumam acometer mais homens
resultados (com qualidade de vida e sobrevida mais que mulheres (1,6 M/F) e são encontrados com mais
prolongada) apenas para um reservado grupo de pa- freqüência em indivíduos de cor branca do que negra.
cientes. Indubitavelmente, à medida que as pesquisas A exposição à radiação ionizante é um dos fatores
atuais clarearem o mapeamento gênico e molecular de risco para o surgimento dessas lesões. Apesar de
dos tumores, da barreira hematoencefálica, da angio- meningioma maligno ser o tipo mais freqüente de tu-
gênese, da invasividade do tumor em áreas normais, mor induzido por radioterapia, a ocorrência de gliomas
haverá melhor utilização dos recursos diagnósticos malignos está bem descrita na literatura. Crianças que
e terapêuticos, e talvez mudança na sombria histó- vivem próximas a áreas de exposição a campos mag-
ria natural dessa patologia. Não há dúvidas de que a néticos têm risco 50% maior de desenvolver tumores
extensão da ressecção cirúrgica seja um importante cerebrais, assim como trabalhadores da rede elétrica.
fator prognóstico. Neste capítulo serão enfatizados os O uso contemporâneo de celulares em nosso dia-a-
aspectos cirúrgicos desses tumores, com enfoque na dia, que possuem um pequeno transmissor que emite

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

radiação com baixa radiofreqüência, trouxe uma série BIOLOGIA, GENÉTICA E INVASIVIDADE
de questionamentos sobre a sua associação com tu- DOS GLIOMAS MALIGNOS
mores cerebrais. As publicações até a data de hoje não
estabeleceram nenhum vínculo associativo2,3, mas são É fundamental o conhecimento da biologia mole-
trabalhos com poder estatístico limitado. Trabalhado- cular e genética dentro da fisiopatogenia dos gliomas
res com exposição a solventes químicos industriais, malignos nos dias atuais. Uma boa compreensão de
que parecem afetar a oncogênese em certos indiví­ alguns conceitos ajuda a interpretar as modalidades
duos, têm maior incidência de tumores malignos do diagnósticas, o panorama evolutivo e racionalização
SNC que a população geral4. Ainda não está bem defi- terapêutica. Será feita uma breve demonstração desse
nido o papel protetor ou supressor de certos alimentos, extenso assunto.
medicamentos e viroses na carcinogênese cerebral. A sobrevida média de pacientes com GBM é de 9 a
12 meses, mas pouco mais de 5% vivem mais de 3 anos
QUADRO CLÍNICO após a cirurgia e tratamento complementar com rádio e
quimioterapia. Histologicamente, o GBM caracteriza-se
Os sintomas e sinais neurológicos refletem a lo- por rápida proliferação celular, presença de alterações
calização do tumor e seu efeito de massa sobre es- vasculares indicativas de angiogênese, necrose celular
truturas adjacentes. Sintomas como cefaléia, náuseas e invasão difusa do tecido adjacente. O GBM secundá-
e vômitos, alterações de comportamento e da função rio (observado em pacientes com diagnóstico prévio de
psicomotora são comuns. Aproximadamente 20% dos glioma de baixo grau) costuma ocorrer em indivíduos
pacientes com tumores cerebrais terão crises convul- mais jovens. No período de 5 a 10 anos, até 85% dos
sivas. Crise focal em paciente com mais de 40 anos pacientes com glioma de baixo grau irão desenvolver
deve ser considerada secundária a tumor cerebral até GBM. Os pacientes com GBM secundário costumam
que se prove o contrário. Tumores frontais podem ser ter um padrão de alterações gênicas diferente de pacien-
assintomáticos ou causar dificuldade na movimenta- tes com GBM primário. Os GBM “de novo” costumam
ção da mão contralateral, hemiplegia espástica con- apresentar amplificação do fator de crescimento epider-
tralateral, alteração do humor, perda da iniciativa e móide (EGFR), ao passo que, nos GBM secundários,
disfasia (no caso do hemisfério dominante). são mais freqüentes mutações do p53. Mesmo diante de
Lesões localizadas no lobo temporal podem causar um mesmo diagnóstico histológico, há vários padrões
perda da memória recente, quadrantanopsia homôni- gênicos, e maior número de mutações está associado a
ma, alucinações auditivas e comportamento agressi- pior comportamento biológico, com maior agressivida-
vo. No caso do hemisfério não dominante, os indiví- de e progressão tumoral, pior resposta ao tratamento e
duos podem ser paucissintomáticos ou ter pequenos menor sobrevida. Pacientes com oligodendroglioma ou
problemas perceptivos ou de desorientação. No caso astrocitoma anaplásico com mutações no braço 1p ou
de tumor no hemisfério dominante, pode haver disno- 19q costumam ter melhor resposta à quimioterapia. A
mia, alteração da percepção a comandos verbais ou Tabela 30.1 mostra as alterações mais comuns encon-
afasia do tipo Wernicke. tradas nos gliomas malignos.
Tumores localizados nos lobos parietais podem As alterações na expressão do fator de crescimen-
causar alteração nas funções perceptivas e sensoriais, to endotelial vascular (VEGF), os receptores VEGFR
hemiparesia, algumas apraxias, como disgrafia e ale- 1 e 2, e angiopoetina 1 e 2 levam ao desenvolvimento
xia. Já lesões localizadas no lobo occipital podem da angiogênese, processo importante no desenvol-
produzir hemianopsia homônima contralateral, ou al- vimento vascular e necrose tumoral, efetividade das
terações visuais como percepção de cores, tamanho e drogas terapêuticas e alvo de estudo para futuros blo-
localização de objetos. queios dessa cadeia com novos medicamentos5.
Lesões profundas podem, além de hidrocefalia, Os gliomas malignos, com sua população celular
causar alterações talâmicas e em núcleos da base, geneticamente instável e heterogenia, são invasivos
apresentando síndromes hemissensitivas ou, mais ra- por natureza. O processo de invasividade e a capa-
ramente, tremores e movimentos disautonômicos. cidade migratória das células tumorais envolvem as
Em torno de 5% a 10% dos gliomas malignos po- moléculas de adesão, proteinases e inibidores das pro-
dem apresentar hemorragias intratumorais, mais es- teinases da matriz extracelular, a capacidade de an-
pecificamente em 6,3% dos GBM e 8,3% dos oligo- giogênese, além da capacidade de crescimento e mo-
dendrogliomas. Pacientes com diagnóstico de GBM tilidade celular. Todo esse processo celular e estromal
com história prolongada de crise convulsiva e lenta ocorre de maneira coordenada e permite a progressão
deterioração neurológica sugerem uma possível ma- da lesão pela matriz extracelular, extensão via sube-
lignização de tumor de baixo grau e, segundo alguns pendimal ventricular, corpo caloso, comissura hipo-
autores, podem ter um comportamento menos agres- campal, pelos tratos e vias subcorticais, principal-
sivo, com melhor prognóstico do que pacientes com mente cápsula interna. Os tumores podem ter aspecto
GBM “de novo”. mais circunscrito, misto de circunscrito e infiltrativo,

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30 – Gliomas Malignos Aspectos Cirúrgicos

Tabela 30.1 – Relações entre sobrevida, alterações moleculares e genética para cada tipo histológico
Tipo Invasividade Angiogênese Necrose Sobrevida média Gene/ Freqüência (%)
cromossomos
GBM +++ +++ +++ 9-12 meses EGFR (a,m) 30-40
CDK4 (a) 10-15
MDM2 (a) 5-10
TP53 (d,m) 20-30
CDKN2A (d) 30-40
PTEN (d,m) 25-30
RB (d,m) 10-15
Astrocitoma ++ – – 2-3 anos EGFR (a,m) 10-15
anaplásico TP53 (d,m) 30-40
CDK4 (a) 10-15
PTEN (d,m) 10
RB (d,m) 10-15
DMBT1/mxi (d)

Oligodendro –/+ –/+ –/+ 3-6 anos Cromossomo 40-90


anaplásico 1p(d) 50-80

19q(d)

ou predominantemente infiltrativo. Mesmo em tumo- desse panorama, preconiza-se, sempre que possível,
res bem delimitados é comum encontrar-se células uma ampla ressecção cirúrgica, visto seu impacto no
tumorais com até 7 a 9 cm do epicentro tumoral e no prognóstico. Por outro lado, muitas vezes o limiar en-
hemisfério contralateral em até 50% dos casos6. tre ampla ressecção e seqüelas funcionais pós-opera-
Geralmente são associados como fatores prognós- tórias é tênue. Torna-se fundamental uma investigação
ticos idade, KPS (Karnofsky), extensão de ressecção, e preparação operatória adequada, com elucidação dos
radioterapia, quimioterapia, grau de necrose pré-ope- limites da ressecção com áreas eloqüentes funcionais e
ratória, menor expressão de MDM2, menor índice de das possibilidades de abordagem cirúrgica radical. Sa-
proliferação Ki-67. Como brevemente descrito, as waya et al. revisaram 400 craniotomias para tumores
complexas alterações gênicas, moleculares, vasculares intracranianos, com mortalidade cirúrgica de 1,7%8.
e as propriedades de invasividade dessas lesões evi- Separando os tumores de acordo com sua relação com
denciam uma dificuldade num possível controle tu- a localização funcional cerebral (Tabela 30.2), temos
moral, comprovada na prática clínica. Uma ressecção taxas de complicações maiores neurológicas de 3%,
radical permite diagnóstico histológico mais correto 8% e 13%, respectivamente para tumores em áreas
(já que amostras limitadas podem não ser suficiente- não eloqüentes (grau I), próximas à eloqüente (grau II)
mente representativas, visto a natureza infiltrativa e e áreas eloqüentes (grau III). Por outro lado, obteve-se
a heterogenia desses tumores), prolonga a sobrevida ressecção radical em 91%, 70% e 63% respectivamen-
com melhora dos efeitos de massa, além das vanta- te para lesões de graus I, II e III. Ressecção cirúrgica
gens oncológicas. Lacroix et al. demonstraram, em radical não está automaticamente contra-indicada de
uma análise multivariável de 336 pacientes com GBM acordo com a proximidade com áreas eloqüentes, ape-
operados7, que a ressecção de mais de 96% do tumor sar de lesões localizadas ou próximas a áreas funcio-
causa significativa melhora na sobrevida dos pacien- nais terem maiores risco de complicações cirúrgicas.
tes. Em análise de 78 pacientes com astrocitomas ana-
plásicos operados no hospital MD Anderson Cancer DIAGNÓSTICO POR IMAGEM
Center (dados ainda não publicados), a sobrevida mé-
dia após ressecção de 80% ou mais, entre 20% e 80% A tomografia de crânio (TC), que geralmente serve
e menos de 20% da lesão foi de 75, 54 e 19 meses, como exame de triagem de manifestações clínicas de
respectivamente. Sabidamente, quanto menor o volu- origem neurológica, pode evidenciar padrão de imagem
me tumoral e de células neoplásicas, mais fácil fica o sugestivo de glioma maligno. Além do diagnóstico da
controle do processo de progressão, além de minimi- lesão tumoral, evidencia o grau de edema e de efeito de
zar os efeitos deletérios da rádio e quimioterapia, que massa causada pelo crescimento da lesão e, eventual-
obviamente produzirão menos fator de necrose tumo- mente, hérnia cerebral, que indica tratamento imediato
ral, outros produtos decorrentes da apoptose celular, da lesão. A TC ainda evidencia calcificações, que são
menor edema e alterações perilesionais e utilização mais comuns em oligodendrogliomas, e o padrão de
racional do tipo e dosagem de quimioterápicos. Diante captação de contraste, componente cístico e proximi-

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Tabela 30.2 – Graduação dos tumores intraparenquima­ A ressonância nuclear magnética (RNM) de crânio
tosos/intra-axiais, de acordo com a localização cerebral é o método de escolha para analisar-se a localização da
funcional* lesão, suas relações com áreas eloqüentes (como área
da fala, visual e córtex motor), seu grau de captação
Grau Localização funcional de contraste e necrose, multicentricidade dos GBM
I Área cerebral não eloqüente (ocorre em 10% dos casos), idealizar a real extensão
Lesões polares frontal e temporal da lesão (com possível progressão pelos tratos sub-
parietoccipital direita
dos hemisférios cerebelares
corticais, corpo caloso, epêndima etc.) e diferenciar
de outras lesões como metástases cerebrais, linfomas
III Área cerebral próximo à área eloqüente ou processos infecciosos9. A literatura sugere que,
Lesões próximas ao córtex motor ou sensitivo**
próximas à fissura calcarina quanto maior o grau de necrose, pior o prognóstico10.
próximas aos centros da fala Além disso, a RNM deve ser realizada nos primei-
no unco ou hipocampo ros dias de pós-operatório, mostrando a extensão da
no corpo caloso ressecção (Figs. 30.1 e 30.2) e, assim, auxiliando no
próximas à cápsula interna planejamento da continuidade terapêutica. Geralmen-
próximas ao núcleo denteado
próximas ao tronco cerebral te, imagens em T1-W com gadolínio mostram área
nos ventrículos central ou irregular de hipossinal, áreas necróticas
III Área cerebral eloqüente
hipointensas e com heterogeneidade de captação de
Lesões no córtex motor ou sensitivo contraste que aparece como hipersinal. Imagem em
nos centros da fala T2-W revela a extensão tumoral mostrada com hipe-
no centro da visão rintensidade heterogênea e edema perilesional. RNM
na cápsula interna com métodos para perfusão mapeiam o volume sangü-
nos núcleos da base
no hipotálamo ou tálamo
íneo cerebral focal, podendo sugerir áreas de maligni-
na pineal zação e direcionando alvo a biópsias esterotáticas. As
no tronco cerebral imagens seqüenciais da perfusão evidenciam áreas de
no núcleo denteado ou pedúnculos cerebelares microvascularização, com ou sem quebra de barreira,
* Adaptado de Sawaya et al.8 sendo mais sensível que a captação de contraste em
** Inclui tumores no córtex motor suplementar. T1-W, que mostra quebra de barreira com ou sem hi-
perplasia vascular 9,11. As imagens em difusão-W, em
dade de áreas eloqüentes. Geralmente, GBM apresen- virtude da natureza anisotrópica da difusão da água
ta-se como área hipodensa, com captação irregular de dentro dos tratos, são úteis para avaliar profundidade
contraste e padrão infiltrativo do córtex. Lembramos da lesão e suas relações com tratos subcorticais. O
que 4% dos GBM não captam contraste, valor que che- melhor exame para analisar a relação do tumor com
ga até 20% nos casos de astrocitomas anaplásicos. substância branca e seus tratos é a tratografia.

A B

Fig. 30.1 – (A) RNM pré-operatória com lesão de pólo temporal esquerdo com importante componente necrótico. (B) Imagem
pós-operatória com ressecção completa da lesão.

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30 – Gliomas Malignos Aspectos Cirúrgicos

A B

Fig. 30.2 – (A) RNM pré-operatória temporal periinsular, com áreas heterogêneas de captação de contraste. (B) Imagem pós-
operatória com ressecção completa da lesão.

RM funcional serve para identificação das áreas da que distúrbios neuropsicológicos, incluindo alteração
fala e motora e suas relações com o tumor. A corres- de memória, funções executivas, linguagem e veloci-
pondência entre anatomia somatotópica e funcional dade de processamento de informações, podem inci-
com a estimulação intra-operatória ocorre em mais de dir em pelo menos 50% dos pacientes com astrocito-
90% dos casos12. ma maligno e glioblastoma multiforme14. Entretanto,
A espectroscopia geralmente evidencia, nos casos tais distúrbios, por serem sutis, na maioria dos casos,
de gliomas malignos, diminuição do NAA (N-acetil- acabam sendo negados pelo paciente e familiares. Al-
aspartato), elevação dos níveis de colina, diminuição terações de memória episódica são comumente asso-
da creatina/fosfocreatina. Pode ou não ocorrer pico ciadas a tumores que se originam no lobo temporal
de lactato. Analisando metodologicamente as taxas ou frontotemporal; de memória imediata, às regiões
de pico, observa-se comumente elevação das taxas de frontais, frontoparietais e giro do cíngulo; alterações
colina/creatina e colina/NAA relativamente ao tecido de personalidade geralmente estão vinculadas a loca-
cerebral normal9. lização de tumores em região frontal e corpo caloso.
A tomografia por emissão de pósitrons (PET) mostra Como o objetivo principal da cirurgia no trata-
captação anormal com relação ao córtex e geralmente mento desses casos é remover a maior quantidade
varia de acordo com o grau histológico do glioma. O possível de tumor com o mínimo distúrbio funcional
mapeamento com tálio mostra captação aumentada, di- ou estrutural para o cérebro, é de grande importância
ferentemente do córtex normal e em áreas necróticas, a quantificação objetiva do funcionamento neuropsi-
sendo útil no diagnóstico das recorrências tumorais13. cológico pré-cirúrgico. Com base nesses resultados,
a cirurgia pode ser planejada, deixando preservadas
áreas cerebrais que possuem papel fundamental na
AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA
qualidade de vida desses pacientes. Além disso, os
A maioria dos pacientes adultos que recebem o resultados obtidos nos exames neuropsicológicos,
diagnóstico de glioma maligno encontra-se em um tanto pré como pós-cirúrgicos, são indispensáveis
período produtivo da vida. Esse dado é agravado pelo na monitoração do quadro neurocognitivo, espe-
fato de que a identificação desse tumor pode ser prece- cialmente se o paciente for submetido à terapia
dida por história prévia de anos de convulsões. Entre- multimodal agressiva. À medida que as técnicas
tanto, estudos recentes demonstram que tais pacientes neurocirúrgicas se desenvolvem e novos métodos
podem apresentar alterações neuropsicológicas sutis de tratamento adjuvante surgem, conseqüentemente
que antecedem achados positivos de neuroimagem. o número de sobreviventes a longo prazo começa a
Por essa razão, é importante considerar o exame neu- aumentar e, nesse contexto, a qualidade de sobrevi-
ropsicológico como instrumento complementar no da e funcionamento cognitivo torna-se uma questão
diagnóstico desses tumores. Vários autores relatam fundamental.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

TRATAMENTO CIRÚRGICO tema retrator, sempre no sentido do tumor, evitando


retrações para áreas eloqüentes ou sobre sistemas vas-
Diante de um quadro clínico e radiológico suges- culares. Cirurgias transgirais, com pequena dissecção
tivo de glioma maligno, deve-se realizar o diagnósti- cortical e ressecção intralesional do tumor, devem ser
co histológico. Como já foi descrito, há uma grande
limitadas para lesões profundas e áreas eloqüentes pró-
variação gênica entre pacientes com o diagnóstico de
ximas. Pode-se ou não utilizar aspirador ultra-sônico
astrocitoma anaplásico, oligodendroglioma e glioblas-
(CUSA) para aspiração tumoral nesses casos. Muitas
toma, que repercute na escolha e resposta à terapêutica
vezes, pode haver dificuldade para identificação das
adjuvante, bem como na sobrevida. Para a confirmação
margens da lesão e de focos de sangramentos do tumor
diagnóstica, pode-se realizar uma biópsia estereotática
ou aberta. O diagnóstico histológico ainda serve para e córtex adjacentes. Lembramos, ainda, que a tumo-
diferenciar de linfomas, metástases, meningiomas atí- rectomia dificilmente permite a ressecção completa
picos ou, ainda, processos infeccioso-inflamatórios. da lesão em virtude do seu caráter infiltrativo e que
a girectomia e a lobectomia parcial trazem resultados
A grande vantagem da biópsia estereotática reside
mais satisfatórios do ponto de vista oncológico, desde
no fato de ser um procedimento rápido, podendo ser
que não haja prejuízo funcional ao paciente. A melhor
realizado com anestesia local e com baixa morbidade.
opção da técnica a ser empregada varia de acordo com
Contudo, em virtude do pouco material e por limitar-se
a experiência do cirurgião, disponibilidade de monito-
apenas a áreas restritas da lesão, podem-se encontrar
discrepâncias diagnósticas quando o paciente subme- ração intra-operatória adequada, cirurgia com paciente
te-se à ressecção da lesão. Na literatura a imprecisão acordado e possibilidade de otimizar uma ressecção to-
diagnóstica varia de 10% a 38% dos casos. A biópsia tal da lesão. Em geral, a mortalidade cirúrgica varia de
estereotática deve ser realizada sempre que não hou- 1% a 3%, e a morbidade chega até a 12%, dependendo
ver o planejamento de ressecção do tumor, quando o da localização da lesão7,8. Técnicas com neuronavega-
paciente apresentar lesões pequenas, profundas e pró- ção são essenciais para lesões profundas, com margens
ximas a áreas eloqüentes ou quando houver suspeita próximas ao trato corticoespinhal, tálamo, tronco cere-
de tumores químio/radiossensíveis, como linfomas ou bral ou lesões insulares.
germinomas. Sempre que possível, deve-se obter o A ultra-sonografia intra-operatória é um método
maior número de amostras (pelo menos 6). barato, de fácil utilização e um excelente recurso no
Como já se discutiu, a extensão da ressecção é fator arsenal terapêutico para maximizar a ressecção do
prognóstico em pacientes com glioma maligno. A cra- tumor. Geralmente, podem-se identificar referências
niotomia deve ser idealizada para remover maior quan- anatômicas como a foice e ventrículos, edema, mar-
tidade de tecido tumoral e possíveis áreas adjacentes gens e profundidade tumoral, planejar a ressecção
infiltradas com o mínimo de seqüelas funcionais. Além utilizando sulcos corticais como referência e avaliar
de permitir a ressecção com melhora do efeito de mas- a ressecção realizada. Com um transdutor adequado e
sa, deve ser grande o suficiente para identificar refe- freqüências entre 5 e 7,5 MHz, tem-se uma boa resolu-
rências anatômicas fundamentais para o mapeamento tividade das estruturas apresentadas pela craniotomia.
cirúrgico, como fissura sylviana, foice, seios venosos, Os tumores geralmente são hiperecóicos em relação
pólos frontal e temporal, veias de Trolard e Labbé. ao edema e córtex ao redor (Fig. 30.3). Hammoud et
Também deve ser adequada para eventual utilização al. descreveram eficácia de 100% na localização da
da ultra-sonografia intra-operatória, mapeamento mo- lesão, 83% de ótima definição de margens e 100% de
tor/sensitivo com potencial evocado e estimulação definição da extensão da ressecção15.
cortical para identificação da área da fala em pacientes O mapeamento funcional da área motora intra-ope-
acordados. A ressecção deve se iniciar utilizando “vias ratória pode ser feito por estimulação cortical ou pelo re-
naturais”, como espaço aracnóideo, sulcos e fissuras, gistro de potenciais evocados somatossensitivos (Figs.
aprofundando a dissecção ao redor da lesão de maneira 30.4 e 30.5). Com a monitoração intra-operatória, o sur-
uniforme, evitando afunilamentos e permitindo visão gimento de déficits sensorimotores transitórios ocorre
adequada no eixo superfície–profundidade, devascula- em 13% dos casos, permanentes em até 5% dos casos e
rizando a irrigação tumoral e evitando sangramentos melhora do quadro clínico em até 30% dos casos. Nos
da massa tumoral, que geralmente possui neovascula- casos de reoperação, mesmo com monitoração, novos
rização anárquica decorrente da angiogênese. Sempre déficits neurológicos permanentes ocorrem em 12%
que possível, deve-se realizar a ressecção transulcal, dos casos16-18. Pacientes com lesões próximas ou na área
utilizando um sulco como margem ao redor do tumor, motora são candidatos à monitoração, assim como le-
com coagulação voltada para a massa a ser retirada, sões na porção distal do giro temporal superior (porção
tentando a retirada de uma peça em bloco, que per- supra-sylviana do córtex motor). No caso do hemisfério
mite ao patologista melhor qualificação diagnóstica. A dominante, a cirurgia deve, sempre que possível, ser rea-
retração cerebral durante a ressecção deve ser sempre lizada com o paciente acordado, assim permitindo iden-
a menos traumática possível, de preferência com sis- tificação dos centros de linguagem durante a cirurgia.

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30 – Gliomas Malignos Aspectos Cirúrgicos

A B

Fig. 30.3 – (A e B) Fotos de ultra-sonografia e intra-operatória mostrando imagem de lesão tumoral sob superfície cortical e
suas relações com sulcos adjacentes.

A B

Fig. 30.4 – (A e B) Identificação da área motora e sensitiva na superfície cortical exposta pela craniotomia, utilizando poten-
ciais evocados somatossensitivos com inversão de curva na transição da área motora/sensitiva.

A B

Fig. 30.5 – (A e B) Fotos cirúrgicas mostrando a importância na identificação das relações entre giro motor e sensitivo com
lesão tumoral para sua ressecção completa, preservando estruturas eloqüentes.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Feitas todas as considerações funcionais e identi- O paciente deve estar consciente e inicia-se avaliação
ficação de áreas eloqüentes, o cirurgião pode iniciar da fala. Deve-se iniciar a estimulação cortical com
a abordagem da lesão, visando máxima extensão de caneta bipolar usando corrente com amplitude de
ressecção e mínimos déficits funcionais. A aborda- 2 até 8 mA, com freqüência de pulso de 60 Hz, com
gem a ser realizada depende da localização da lesão e 1 ms de duração. Durante a estimulação cortical, o
suas relações com a eloqüência das áreas adjacentes. paciente deve realizar contagens e interpretar figuras.
A estimulação deve ser feita em todos os giros expos-
Cirurgia com Paciente Acordado tos, de maneira seqüencial e a cada 1,5 cm. Se a esti-
mulação for positiva em três ocasiões, tal área deverá
A literatura tem mostrado variações com relação ser considerada funcional para a fala. Sempre que
ao tradicional modelo Broca-Wernicke dos centros possível, deve-se realizar mapeamento motor com
corticais da fala. Matz et al.21 mostraram, em 117 pa- potencial evocado. A ultra-sonografia intra-operatória
cientes, que os centro primários da fala distribuíram- serve para identificar as margens da lesão. Durante a
se além dos giros temporais superior e inferior, sen- ressecção o paciente deverá permanecer realizando os
do encontrados em outras áreas dos lobos temporal, testes, e a dissecção sempre começa nas bordas pró-
frontal e parietal. Além disso, em geral o centro da ximas à área eloqüente identificada. A ressecção não
fala apresenta-se em mosaico, e um paciente pode deve se estender até 0,7 cm do córtex motor/sensiti-
ter duas ou mais áreas em mais de 60% dos casos. O vo e 1,5 cm dos centros da fala. Caso ocorram crises
próprio crescimento tumoral pode causar mudanças parciais ou generalizadas, o córtex deve ser irrigado
funcionais no paciente com recrutamento de áreas ad- com soro frio e medicado. Dores durante a ressecção,
jacentes. Nesse contexto de variabilidade individual principalmente quando se manipula a dura-máter nos
e com o intuito de permitir máxima ressecção preser- pólos frontais e temporais, devem ser tratadas com
vando funções cognitivas, a cirurgia com o paciente analgésicos e opióides. Utilizando a cirurgia com pa-
acordado possibilita o mapeamento de áreas eloqüen- ciente acordado, mais de 95% dos casos não apresen-
tes, tornando-se um importante recurso terapêutico. tam déficits permanentes no pós-operatório, e a res-
O preparo do paciente para tal procedimento secção pode ser de 50% a 100% da lesão em mais de
inicia-se no pré-operatório, com avaliação neuro­ 80% dos casos, mesmo com proximidade com áreas
psicológica, discussão do procedimento com equipe eloqüentes16-18.
de anestesiologia, neurocirurgia, neurofisiologista,
neuropsicólogo, com o paciente e familiares. Todas Tratamento Complementar
as vantagens e possíveis complicações devem ser ex-
postas ao paciente. O tratamento com radioterapia é fator prognóstico,
O procedimento começa com posicionamento ade- com melhora da sobrevida desses doentes. Com ra-
quado. A fixação da cabeça com pinos é fundamental, dioterapia, a sobrevida média de pacientes com GBM
visto o desconforto em relação à duração de algumas é de 9 a 10 meses, sendo que até 6% vivem mais de 3
cirurgias e o risco de crise convulsiva durante a res- anos. Nos casos de pacientes com astrocitoma anaplá-
secção, que varia de 3% a 8%. Os pinos devem ser sico, a sobrevida média varia de 13 a 19 meses (MRC
colocados após anestesia local com 3 a 5 ml de bupi- Working Group 2001). Em geral, utiliza-se a dose de
vacaína a 0,25%, com 0,5% lidocaína e epinefrina a 60 Gy, distribuída em 1,8 até 2 Gy por dia. Não há,
1:200.000. O couro cabeludo também deve receber a aparentemente, melhora da sobrevida se irradiar todo
mesma solução. Pontos como supra-orbitário e nervo o cérebro ou áreas restritas. Como mais de 40% dos
occipital também podem receber bloqueio anestésico. sobreviventes com mais de 2 anos após tratamento
Nos passos iniciais da cirurgia, o paciente pode rece- que receberam tratamento em todo córtex apresen-
ber fentanil endovenoso (EV), 2 a 3 µg/kg. A cabeça tarão seqüelas funcionais, principalmente síndromes
deve estar voltada lateralmente, permitindo acesso demenciais, a realização de radioterapia conforma-
contínuo à região facial do doente, diálogo e testes de cional é uma boa opção. Outras alternativas de tra-
vocalização durante a estimulação, além de eventual tamento são a realização de braquiterapia intersticial,
necessidade de entubação. Os membros devem estar radiocirurgia e radiação com emissão de fóton.
dispostos de maneira a permitir visualização de mo- A quimioterapia pós-operatória e pós-radioterapia
vimentos com estimulação e ficar confortáveis para o também é um fator prognóstico com aumento do tem-
período da cirurgia. Após o rebatimento do escalpe, a po de sobrevida. Pacientes com menos de 60 anos
musculatura deve ser anestesiada. A craniotomia deve têm resposta melhor a carmustina que idosos. A com-
ser realizada seguindo os passos tradicionais. A dura- binação mais utilizada é de procarbazina, carmusti-
máter deve ser infiltrada com até 10 ml da solução na e vincristina (PCV). Outras opções são CCNU e
preparada. Durante a craniotomia, pode ser feito pro- BCNU, sendo esta última menos neurotóxica quando
pofol na dose de 20 a 40 µg/kg por minuto. Durante a não há uma redução volumétrica adequada com cirur-
abertura dural, a sedação EV deve ser descontinuada. gia. A temozolamida tem-se mostrado uma alternati-

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30 – Gliomas Malignos Aspectos Cirúrgicos

va terapêutica, com melhor resposta principalmente e um bom método para o diagnóstico diferencia lesão
na recidiva tumoral. Uma série de estudos está em an- causada por radiação de recidiva tumoral. Tal método
damento com novas associações e agentes. Em geral, mostra curva de captação bem distinta entre os dois
a resposta do tumor ao tratamento quimioterápico e a grupos. Geralmente responde bem ao corticóide, mas
neurotoxicidade dependem da extensão da ressecção muitas vezes há necessidade de cirurgia para alívio do
e a conformação gênica do paciente19. efeito de massa.
Outras formas de tratamento, como a geneterapia
com adenovírus ou herpesvírus, ainda estão em estu- CONCLUSÃO
dos, assim como drogas antiangiogênicas.
Os gliomas malignos consistem em um grupo de
tumores primários do SNC associado com sobrevida
Tratamento das Recidivas Tumorais limitada. O diagnóstico patológico e molecular ade-
Pela sua natureza infiltrativa e comportamento quado permite distinguir grupos de comportamento
agressivo, mais de 90% dos gliomas malignos recor- oncológico diferente, com diferente prognóstico e
rem na área tratada. É importante definir que a ima- otimizar o tratamento. A extensão da ressecção é um
gem consiste de resíduo tumoral, recidiva tumoral ou importante fator prognóstico. Todos os recursos pré
radionecrose. Torna-se imprescindível realização de e intra-operatórios devem ser utilizados para maxi-
RNM no pós-operatório imediato (dentro de 48 ho- mizar a extensão da ressecção, ao passo que tentam
ras), com 1 mês após cirurgia e, depois, a cada três me- minimizar seqüelas funcionais decorrentes do trata-
ses ou quando necessário. Uma nova cirurgia deve ser mento agressivo. Apesar de apenas 6% dos pacientes
considerada uma boa opção terapêutica, com impacto viverem mais de 3 anos após a cirurgia, cabe ao neu-
na sobrevida, desde que o paciente apresente bons fa- rocirurgião oferecer todas os recursos disponíveis,
tores prognósticos, como KPS > 80 e pacientes jovens. utilizando uma terapêutica agressiva com racionali-
Duas ou mais craniotomias para ressecção do tumor dade, visando a um tratamento oncológico satisfató-
recorrente não implicam maior morbi-mortalidade7,8. rio, com preservação funcional cortical e conseqüente
Os princípios cirúrgicos de ampla ressecção e manu- manutenção da qualidade de vida, mesmo com uma
tenção funcional do paciente devem ser preconiza- abordagem radical. Esperamos que, em breve, o es-
dos também nas reoperações. Existem ainda opções tudo e melhor compreensão genética e molecular nos
de quimioterapia como temozolamida, tamoxifeno, permita mudar o panorama atual, oferecendo melhor
BCNU (bromo-etil-nitrosouréia) e 5-FU (5-fluoroura- sobrevida aos pacientes com gliomas malignos.
cil). Caso haja sinais clínicos e radiológicos de glio-
matose meníngea, o prognóstico se tornará limitado.
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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

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31
Tratamento Cirúrgico
das Metástases Cerebrais
José Carlos Esteves Veiga
Alexandros Theodoros Panagopoulus
Marcos Vinícius Calfat Maldaun
Paulo Henrique Pires de Aguiar

INTRODUÇÃO em 90% dos casos as fontes de neoplasia maligna pri-


mitiva mais freqüentemente relacionadas à produção

A
s metástases são neoplasias malignas secundá- de doença metastática cerebral em ordem decrescente
rias, que se propagam, em geral, para tecidos encontram-se a seguir discriminadas:
distantes daquele de origem da neoplasia pri- 1o Carcinoma de pulmão, em particular o de pe-
mária. No cérebro, o mecanismo principal de propa- quenas células e o adenocarcinoma.
gação é a via hematogênica. As lesões ou invasões
por contigüidade não serão aqui consideradas. 2o Carcinoma de mama. As mulheres jovens, no
período pré-menopausa, desenvolvem mais
As metástases cerebrais constituem as neoplasias
metástase cerebral do que aquelas no período
intracranianas mais freqüentes em adultos1,2. Estima-
da menopausa ou em idade avançada.
se que de 15% a 30% dos pacientes com diagnóstico
de câncer desenvolverão metástases cerebrais durante 3o Melanoma maligno. Geralmente determinam me-
o curso de sua doença. Correspondem às complica- tástases múltiplas, freqüentemente hemorrágicas.
ções mais comuns no câncer sistêmico, apresentando 4o Carcinomas do sistema digestório, particular-
elevadas taxas de morbidade e mortalidade. mente as neoplasias de colo e reto. As metás-
As lesões metastáticas intracranianas apresentam tases de câncer de intestino incidem também
particularidades segundo o local de envolvimento do preferencialmente na fossa posterior.
sistema nervoso, podendo comprometer: o parênqui- 5 Carcinomas do trato genitourinário. Princi-
o

ma encefálico, o espaço subaracnóideo (constituindo palmente o hipernefroma ou carcinoma de cé-


a carcinomatose leptomeníngea) e a dura-máter. Nes- lulas claras do rim. Outros incluem o câncer
te capítulo serão consideradas as metástases para os de próstata e o seminoma. Nas mulheres, o
hemisférios cerebrais. carcinoma de órgãos do sistema reprodutor, tal
A incidência de metástases cerebrais tem aumen- como o coriocarcinoma.
tado gradativamente à proporção que o tempo de so- Outras neoplasias malignas menos comuns, que podem
brevida dos pacientes com câncer se prolonga e a par- produzir metástases intracranianas, incluem: carcinoma
tir do advento de melhores recursos de neuroimagem, de órgãos situados na cabeça/pescoço, linfomas, sarcomas
possibilitando o diagnóstico precoce das lesões. e algumas variedades de carcinomas embrionários.
As metástases cerebrais podem ser únicas ou múl- Dentre as lesões mencionadas, as metástases que
tiplas (quando apresentam mais de uma lesão). A dis- mais sangram espontaneamente são: carcinoma de
tribuição de freqüência relativa das metástases múl- pequenas células do pulmão, melanoma, coriocarci-
tiplas varia com o tipo de neoplasia primária. Assim, noma e hipernefroma. Podem produzir hemorragias
o melanoma tem maior tendência em produzir lesões intraparenquimatosas importantes com manifestações
múltiplas, já no hipernefroma as metástases invaria- clínicas e sinais agudos de hipertensão intracraniana.
velmente são únicas. Em suma, qualquer câncer pode originar metástase
A despeito de discrepâncias entre trabalhos clíni- cerebral, havendo vários relatos na literatura de lesões
cos e de resultados de necropsia, de maneira geral, provenientes de neoplasias sistêmicas raras1-5. Desse

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

modo, em todo paciente com diagnóstico de câncer e cerebrais, 10% a 15% nos hemisférios cerebelares e
com sinais e/ou sintomas de comprometimento cere- de 3% a 5% no tronco encefálico.
bral, deve ser sempre considerada a possibilidade de
metástase cerebral. Macroscopia
Macroscopicamente se apresentam como nódulos
PATOGENIA únicos ou múltiplos, circunscritos, sólidos ou parcial-
O mecanismo de formação das metástases cere- mente císticos, com superfície bem definida e edema
brais resulta do transporte de células neoplásicas pela perilesional.
corrente sangüínea, em geral através da circulação A formação de metástase cerebelar com aparên-
arterial, atingindo a rede capilar como se fossem êm- cia cística deve-se ao resultado da necrose central do
bolos. Esses clones celulares, estacionando em outro nódulo tumoral. Por vezes pode-se encontrar a forma
local, começam a se multiplicar, determinando a re- abscedada na qual ocorre a formação de um verdadei-
produção do processo em outro território, dando ori- ro abscesso produzido por êmbolo séptico provenien-
gem a um novo crescimento tumoral que constitui a te do tumor primário, encontrado, por exemplo, no
metástase (do grego metá = depois + stasis = parar). carcinoma broncogênico.
Por mecanismos de adesão célula-endotélio, tem iní- Múltiplos focos hemorrágicos ou sangramentos
cio o processo de angiogênese para nutrição da nova maciços intratumorais podem ser encontrados em de-
colônia celular. Saliente-se que a cascata de eventos corrência de desarranjo na nutrição vascular no inte-
na formação da metástase pode ser regulada pelo hos- rior dos tumores e por deficiência na angiogênese.
pedeiro por meio de oncogenes facilitadores e inibi- Embora de ocorrência rara, as lesões metastáticas
dores do processo, explicando por que determinados podem apresentar calcificações em cerca de 3% a 5%
doentes desenvolvem metástases e outros não. dos casos, quase sempre em meio a tecido necrótico.
Portanto, na patogenia da disseminação do câncer
podem-se identificar três etapas, a saber:
1. Penetração e propagação das células cancerí-
Microscopia
genas no tecido normal subjacente e penetra- O aspecto histológico é semelhante ao tecido da
ção nos vasos sangüíneos de pequeno calibre. neoplasia de origem. A reação do parênquima cerebral
A integridade dos capilares é lesada pela ação circunvizinho demonstra edema do tipo vasogênico,
enzimática das células neoplásicas (proteases). além de congestão vascular e reação glial. Embora
A liberação destas substâncias deve-se ao fato macroscopicamente o nódulo metastático apresente
de as células neoplásicas não apresentarem a uma superfície bem delimitada do tecido cerebral, à
qualidade de adesão recíproca necessária à for- microscopia óptica essas neoplasias podem infiltrar o
mação de tecidos com estrutura fixa. parênquima justificando a recidiva da lesão encontra-
2. Uma vez que as células ou clones liberados na da em alguns casos e o emprego da radioterapia após
circulação sangüínea espalham-se, realiza-se o extirpação cirúrgica da metástase6.
mesmo mecanismo das embolias, interagindo
com elementos constituintes do sangue. QUADRO CLÍNICO
3. Nessa fase ocorre proliferação autônoma das
Os sinais e sintomas neurológicos podem se apre-
células no tecido cerebral, uma vez esgotadas
sentar de forma aguda ou crônica, dependendo do
as reações de defesa do hospedeiro. A partir
volume, da localização e do número das metástases
daí, com a evolução do processo, tem-se a ori-
associadas ao montante de edema perilesional.
gem de um tumor secundário que reproduz a
estrutura histológica da célula primitiva. Cerca de dois terços de todas as metástases intra-
cranianas tornar-se-ão sintomáticos em algum mo-
 No parênquima cerebral as metástases localizam-
mento da vida do paciente com câncer. Em pacientes
se preferencialmente na transição entre substância
sem o diagnóstico de câncer e que se apresentam com
cinzenta-branca e na região da junção temporoparie-
uma lesão cerebral única, trata-se de metástase em
toccipital, onde se localizam os ramos principais da
10% a 15% dos casos.
artéria cerebral média. É o local de aprisionamento
dos êmbolos tumorais na rede vascular cerebral. A forma lentamente progressiva é a apresentação
clínica mais freqüente com sinais e sintomas clássicos
da hipertensão intracraniana crônica (os principais:
ANATOMIA PATOLÓGICA cefaléia, vômitos, diplopia por paresia do VI nervo
Localização craniano e edema de papila) associados às queixas e
aos déficits neurológicos localizatórios. A hemipare-
No sistema nervoso central intracraniano, as me- sia desproporcionada evolutiva é o déficit mais fre-
tástases distribuem-se de 80% a 85% nos hemisférios qüente.

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31 – Tratamento Cirúrgico das Metástases Cerebrais

Com base em estudos que avaliem as imagens por ma é mais bem avaliada em T2 do que nas imagens
ressonância nuclear magnética (RNM), em torno de ponderadas em T1. Na maioria dos casos a RNM é
60% a 80% das metástases cerebrais são múltiplas. suficiente para estabelecer o diagnóstico e conduta,
Por outro lado, pacientes com sinais e sintomas de le- dispensando a realização de outros métodos.
são neurológica mostram, na tomografia computadori- A tomografia axial computadorizada (TAC) cranio-
zada, metástase única em 50% dos casos, enquanto na encefálica é extremamente útil nos casos de urgência,
ressonância magnética esse achado ocorre em 30%. na investigação de pacientes com hipertensão intra-
As crises convulsivas constituem sintoma inicial craniana aguda. É superior à RNM no diagnóstico de
freqüente, principalmente quando focais, do tipo hematoma agudo ou tecido hemorrágico intratumoral.
Bravais-Jackson. Representam um sinal de alerta im- Demonstra também, mais precisamente, a presença de
portante quanto à presença de metástase cerebral em lesões líticas ósseas, tanto na abóbada quanto na base
paciente com diagnóstico de câncer sistêmico. do crânio, como encontramos em caso de carcinoma
A forma de apresentação da doença do tipo hiper- de mama. A tomografia, além de método diagnóstico,
tensão intracraniana aguda com quadro clínico de for- é útil no seguimento evolutivo. A impregnação pelo
mação de hérnia cerebral interna aparece na presença meio de contraste ocorre praticamente em todos os
de convulsões, com descompensação de hipertensão casos de metástase cerebral. O exame de tomografia
intracraniana crônica ou pelo quadro ictal e deteriori- não deve ser solicitado quando se deseja determinar
zação súbita do nível de consciência em decorrência o número de metástases cerebrais, situação em que a
de hemorragia maciça intratumoral e formação de le- RNM é extremamente superior.
são rapidamente expansiva. A radiografia simples de crânio tem o seu valor
Cerca de 60% das metástases encefálicas ocorrem nas investigações de lesões ósseas cranianas. Avalia a
na faixa etária entre 50 e 70 anos, sendo rara após os presença de lesões líticas do tipo em “saca-bocado”.
80 anos de idade. As clássicas alterações em decorrência de hiperten-
A classificação dos aspectos clínicos dos pacientes são intracraniana crônica aparecem em fases tardias
com câncer é importante para proporcionar informa- da doença, quando seguramente o diagnóstico foi pre-
ções quanto ao prognóstico e orientar a terapia. A me- viamente estabelecido pela RNM ou TAC.
dida estenográfica mais utilizada na avaliação clínica A angiografia digital cerebral só se justifica em si-
do estado de desempenho de um paciente com neo- tuações especiais, em auxílio ao diagnóstico ou em
plasia histologicamente ou de comportamento malig- casos de hipervascularização da lesão, com participa-
no é a escala de Karnofsky4. Para adequar a termino- ção de ramos calibrosos da artéria carótida externa na
logia em relação a metástases cerebrais, analisando irrigação do tumor, onde a embolização pré-operató-
a contribuição das variáveis que afetam a sobrevida ria dos principais nutrientes é de grande valia.
do paciente com o tratamento aplicado, Gaspar et al.7
subdividiram os pacientes em classes 1, 2 e 3. Os pa- DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
cientes RPA 1 são aqueles com menos de 65 anos, A fim de se estabelecerem protocolos de conduta
apenas com metástases cerebrais, com Karnofsky e tratamento, a comprovação histopatológica é fun-
(KPS) > 70% e doença primária controlada. Os com damental em lesões intracranianas metastáticas. Des-
RPA classe 3 com KPS < que 70%; os RPA classe 2 se modo, devem-se excluir outras possibilidades no
todos os outros. Em seu estudo, a sobrevida dos pa- diagnóstico diferencial:
cientes classificados com RPA 1 e 2 foi significativa-
mente maior que os RPA de classe 3.
Neoplasia Primária
DIAGNÓSTICO As manifestações clínicas e os aspectos de neu-
roimagem podem ser semelhantes a meningiomas,
A RNM do encéfalo com uso de contraste é o mais gliomas e linfomas. Por serem bem delimitados e
sensível e específico método de diagnóstico por ima- apresentarem, em geral, bastante edema perilesional,
gem em metástases. As imagens ponderadas em T1 os meningiomas de convexidade e parassagitais são
surgem como um foco de aumento de intensidade de incluídos entre as principais possibilidades no diag-
sinal, circundado por edema perilesional que aparece nóstico diferencial.
com baixa intensidade de sinal. Na fase contrastada,
em lesões tumorais grandes, há realce periférico de
contraste. Havendo necrose central, esta não capta Doença Encefalovascular Hemorrágica
contraste. Já nas imagens ponderadas em T2, as me- Os pacientes com câncer em uso de quimioterapia
tástases geralmente têm diminuição da intensidade poderão apresentar manifestações hemorrágicas do
de sinal, enquanto o edema vasogênico aparece hipe- tipo: hemorragias subaracnóideas, ou intraparenqui-
rintenso. A presença e a extensão desse tipo de ede- matosas.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Abscesso Cerebral festação paraneoplásica. Os sintomas e sinais


evoluem durante semanas, com disfunção ce-
Conforme já comentado anteriormente, em de- rebelar bilateral e simétrica, tanto em membros
terminadas situações, até mesmo a lesão metastática superiores quanto em inferiores. Geralmente há
pode absceder. disartria grave, vertigens, diplopia e sinais de
liberação piramidal. Em 50% dos casos ocorre
Lesões Granulomatosas demência. Caracteristicamente, não desenvol-
ve sinais de hipertensão intracraniana, o que a
Ocorrem com maior freqüência nos pacientes imu-
diferencia das metástases com efeito de massa.
nodeprimidos ou imunossuprimidos. As principais
Em geral, na degeneração cerebelar subaguda
lesões infecciosas que entram no diagnóstico dife-
as manifestações clínicas e as alterações de
rencial das metástases são: toxoplasmose, granuloma
exame neurológico precedem a descoberta do
tuberculoso e lesões fúngicas (criptococose).
câncer por períodos de semanas até meses. Os
exames de neuroimagem mostram acentuada
Efeitos Não Metastáticos do Câncer atrofia cerebelar.
no Sistema Nervoso – Síndromes • Síndrome de opsoclono-mioclônico: manifesta-
Paraneoplásicas se por movimentos oculares aberrantes quando
da movimentação da cabeça, associados a ata-
Surgem quando os pacientes com câncer sistêmi- xia cerebelar e mioclonias em regiões toraco-
co manifestam disfunção do sistema nervoso que não abominais e membros. É mais freqüentemente
foi causada por metástase. Esses efeitos também são
encontrada em crianças.
designados como síndromes paraneoplásicas. Geral-
mente de causa desconhecida, admite-se que esses • Comprometimento de nervos periféricos, mús-
efeitos sejam respostas do tipo auto-imune, desenca- culos e junção neuromuscular: as infiltrações
deadas pelas células cancerígenas. das raízes nervosas por metástases que se di-
fundem às leptomeninges podem determinar
A maioria dos casos se manifesta com fraqueza e
uma polineuropatia periférica sensitivomotora
atrofia dos músculos proximais, em associação à au-
distal paraneoplásica ou até a síndrome mias-
sência ou diminuição dos reflexos tendinosos profun-
tênica de Eaton-Lambert.
dos. Em seqüência, evoluem para caquexia.
De acordo com Posner5, discriminamos a seguir
as principais síndromes paraneoplásicas que entram TRATAMENTO
no diagnóstico diferencial de lesões metastáticas in- Os protocolos de tratamento sempre se iniciam pela
tracranianas: avaliação do número de metástases (única ou múlti-
• Síndrome demencial: caracteriza-se por per- plas). Aproximadamente 30% dos casos apresentam
da da memória recente e alterações afetivas nódulo único no momento do diagnóstico, comprova-
(ansiedade ou depressão). Alguns pacientes do após investigação por RNM do encéfalo.
desenvolvem também convulsões. Quando há A história natural da doença mostra que pacientes
outros sinais neurológicos associados, usual- não tratados, considerados fora de possibilidade te-
mente apresentam sinais mistos de compro- rapêutica, têm sobrevida, em média, de um mês. Os
metimento em tronco encefálico, cerebelo ou casos tratados exclusivamente com corticosteróides,
nervos periféricos. Em alguns doentes não preferencialmente a dexametasona, reduzindo o ede-
são encontradas alterações histopatológicas ma perilesional, elevam o índice de sobrevida para 2
no cérebro, enquanto em outros surgem des- ou 3 meses. Outras opções de tratamento são a radio-
população neuronal disseminada e infiltrados cirurgia e/ou radioterapia. Tanto para metástases úni-
perivasculares de linfócitos, sobretudo nos lo- cas como múltiplas não se estabeleceu qual a melhor
bos temporais, porção mesial. Por isso, nesses opção terapêutica, variando da experiência de cada
casos, a entidade clínica é também chamada de serviço como decisão multidisciplinar1,3,8-13.
encefalite límbica.
• Encefalite bulbar: apresenta demência e sinais
de disfunção de tronco encefálico caracteriza-
Tratamento Cirúrgico das Metástases
dos por vertigens, nistagmo, disfagia, oftalmo- Cerebrais
plegia e, às vezes, ataxia e sinal de Babinski. A indicação de cirurgia deve ser tomada em con-
As alterações histopatológicas encontradas junto com a equipe multidisciplinar, abrangendo neu-
consistem em infiltrados linfocitários na ponte rocirurgião, oncologista e radioterapeuta, conside-
e no bulbo. rando tamanho e localização lesão (acessibilidade e
• Degeneração cerebelar subaguda: esta sín- ressecabilidade da lesão), efeito de massa, radiossen-
drome é clinicamente característica de mani- sibilidade e quadro clínico do paciente, ressaltando

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31 – Tratamento Cirúrgico das Metástases Cerebrais

que pacientes RPA 1 têm melhor resultados que os zada por ultra-sonografia e/ou neuronavegador. O neu-
demais. Podem-se extirpar lesões múltiplas próximas ronavegador tem sido aplicado a todas craniotomias
com baixa morbidade11,14. oncológicas em muitos centros americanos e recente-
A cirurgia é obrigatória e de urgência nos casos com mente vem ganhando espaço no Brasil. Sua tecnolo-
hipertensão intracraniana e lesão com efeito de massa. gia utiliza pontos referenciais ou fiduciais, montando
Novas técnicas neurocirúrgicas permitem ressec- a imagem da RNM ao paciente posicionado. Com o
ção da lesão, mesmo lesões relacionadas com áreas probe, pode-se otimizar a craniotomia (Fig. 31.2), lo-
eloqüentes. Com a melhora das técnicas neurocirúr- calizar margens tumorais e, principalmente, posicionar
gicas a partir da década de 1980, a mortalidade caiu o cirurgião durante a ressecção, principalmente na pro-
de 20%, em média, para valores que variam entre 1% fundidade. Seu uso deve ser somado à ultra-sonografia
e 3% nas séries mais recentes. A sobrevida média ob- e não substituí-la, principalmente lembrando que a
tida com a cirurgia nas recentes publicações varia de anatomia cortical cirúrgica muda durante a ressecção,
10 a 20 meses, de acordo com a histologia. Sawaya devido à melhora do edema ou após corticectomias.
et al.2,12 subdividiram os tumores cerebrais em grau I A ultra-sonografia intra-operatória permite locali-
(localizados em áreas não eloqüentes), grau II (pró- zar lesões não superficiais, suas relações com sulcos
ximo a áreas eloqüentes) e grau III (para aqueles em e giros e controle pós-ressecção de doença residual.
áreas eloqüentes). Em sua série com 194 lesões tra- Hammoud et al.15 estudaram prospectivamente 70 ca-
tadas, obteve complicações neurológicas para lesões sos de tumores cerebrais, utilizando ultra-sonografia
de graus I, II e III em 1%, 10% e 7% respectivamen- intra-operatória e ratificaram que seu uso permite lo-
te. A Fig. 31.1 mostra caso de lesão relacionada com calizar todas bordas da lesão, sua profundidade e suas
área eloqüente com ressecção completa, sem piora relações com sulcos, giros superficiais, ventrículo,
do quadro no pós-operatório. Outras séries recentes foice, corpo caloso. Além disso, permite determinar
mostram morbidade de 5% em média, mas não deta- com precisão a extensão da ressecção, bem como
lhando relações das lesões com áreas funcionais. confirmar eventuais sangramentos após o fechamento
Séries da literatura mostraram que a reoperação para dural. A ultra-sonografia intra-operatória é de rápido
metástases recorrentes também prolonga a sobrevida e fácil acesso ao cirurgião, além de não representar
dos pacientes e melhora a qualidade de vida2,5,9,11,12. significativos gastos ao procedimento.
O paciente com metástase cerebral deve ter cuida-
dos pré-operatórios de um paciente oncológico, com
ressalvas para eventuais alterações de coagulação, in-
fecções concomitantes e deficiências hepáticas, renais
ou cardiopulmonares. A cirurgia deve ser feita respei-
tando-se as técnicas clássicas neurocirúrgicas, com
craniotomia de tamanho apropriado para abordagem,
realizada o mais breve e seguramente. Após posiciona-
mento adequado, a incisão deve ser precedida de infil-
tração de subcutâneo com anestésico com vasoconstri-
tor, para minimizar sangramentos. A craniotomia pode
ser realizada com craniótomo, sem necessidade de ser
ampliada, pois, na maioria das vezes, o inchaço cere-
bral melhora de imediato após remoção da metástase.
Uma vez aberta a dura-máter, a lesão deve ser locali-

Fig. 31.1 – Lesão em área eloqüente com importante edema Fig. 31.2 – Probe determinando a localização exata do tu-
e exame pós-operatório, mostrando ressecção completa. mor, precisando a craniotomia.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

O mapeamento cortical com potencial evocado possível, circundar a lesão pela área de gliose ao re-
possibilita a exata localização das áreas motora, mo- dor, podendo utilizar-se da técnica em “margarida”
tora suplementar e sensitiva, permitindo a ressecção com colocação de cotonóides ao redor da lesão, o que
da lesão com segurança, preservando tais áreas ana- facilita remoção completa com menor sangramento
tômicas (Fig. 31.3). Lembramos que o crescimento intratumoral (Fig. 31.4). A ultra-sonografia pós-res-
tumoral e o edema decorrente da presença da lesão secção permite confirmar ressecção de toda a lesão,
podem modificar a anatomia. Uma vez encontrada a evitando-se deixar lesão residual, ou formação de he-
inversão de onda, correspondendo ao sulco central, matoma no leito cirúrgico.
conseqüentemente se localiza o giro motor e sensi- A cirurgia com paciente acordado é um recurso
tivo, tornando-se mais fácil elaborar uma estratégia bem utilizado para ressecção de lesões relacionadas
cirúrgica mais segura para lesões próximas a áreas com áreas eloqüentes. Com essa técnica, permite-se
eloqüentes. Além disso, durante a ressecção da lesão localizar a área da fala com a estimulação cortical,
demonstra eventuais alterações no padrão da curva possibilitando a ressecção com segurança de lesões
com possível alteração funcional, exigindo que o ci- próximas às respectivas áreas eloqüentes. As gran-
rurgião atente para espatulação adequada ou coagula- des séries de cirurgia de tumor cerebral com paciente
ção inapropriada de pequenos vasos2,13,16. acordado, desde a publicação de Ojemann em 1979,
A melhor técnica de ressecção é aquela mais fami- evidenciam importantes variações individuais dos
liar ao cirurgião. Em geral, preconiza-se a abordagem centros de linguagens, localizadas principalmente
transulcal até atingir bordas da lesão, lembrando que nos giros frontal inferior, médio, temporal superior e
as metástases raramente são infiltrativas, estabele- médio e, em muitos casos, sendo multicêntricos. Re-
cendo um plano favorável para ressecção. Uma vez centemente, notamos ainda diferenças na localização
abordada a margem tumoral, deve-se, sempre que de áreas eloqüentes em até 10% dos casos quando
comparamos a ressonância magnética funcional e a
estimulação cortical intra-operatória. Após cranioto-
mia com paciente sob anestesia local com bupivacaí-
na 0,25% e sedação leve endovenosa, realiza-se infil-
tração dural e, a seguir, o despertar pleno do paciente.
Inicia-se estimulação cortical com gerador de corren-
te contínua (Fig. 31.5), realizando testes de neurolin-
güística e estabelecendo áreas motora/sensitiva, área
da fala e suas relações com lesão, bem como planeja-
mento adequado de ressecção da metástase.

AGRADECIMENTOS
A Raymond Sawaya, do Chairman Department of
Neurosugery, MD Anderson Cancer Center, Houston
–Texas.

Fig. 31.3 – Grid mostrando inversão de curva, correspon- Fig. 31.4 – Metástase de sarcoma altamente vascularizada,
dendo ao sulco central. sendo ressecada com técnica em “margarida”.

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31 – Tratamento Cirúrgico das Metástases Cerebrais

Fig. 31.5 – Estimulação cortical com identificação da área da fala permitindo ressecção segura com paciente acordada.

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Técnica Cirúrgica do Implante
de Câmara de Ommaya para Instilação de
Quimioterápicos no Espaço Liquórico para
Tratamento de Carcinomatose Meníngea
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Marcos Vinícius Calfat Maldaun
Alexandros Theodoros Panagopoulus

INTRODUÇÃO o primeiro sinal e pode estar associado por infiltração

A
tumoral do tronco encefálico, ou bicortical ou pela
carcinomatose meníngea constitui uma com-
própria hidrocefalia8.
plicação grave oncológica que representa a
disseminação de células neoplásicas no espaço Segundo Sandberg et al.2, a média de sobrevida dos
aracnóideo, bainhas neurais e estruturas meníngeas pacientes com metástases leptomeníngeas é de 9 meses14.
a partir de um tumor metastático cerebral com foco
primário em órgão extracraniano1,2. É considerada DIAGNÓSTICO
uma metástase leptomeníngea. Alguns autores consi- A ressonância magnética de encéfalo permite
deram a disseminação liquórica de lesões primárias avaliar espessamentos meníngeos, e, em tomadas su-
cerebrais como carcinomatose meníngea like, como perpesadas em T2 com reconstrução em 3D, pode-
no caso dos gliomas anaplásicos e linfomas primários se verificar a infiltração da bainha neural9,10. A coleta
do sistema nervoso central. de líquido cefalorraquiano lombar deverá evidenciar,
Os tumores metastáticos principais que produzem em pelo menos 1 de 6 coletas, a presença de células
carcinomatose meníngea são originários de: leuce- neoplásicas, e/ou atipia celular, além de proteinorra-
mia3, mama4, linfomas, melanomas4 e pulmão2,4. quia importante5-7,9,10. A tomografia computadorizada
A quimioterapia intratecal convencional exige um de crânio com contraste pode mostrar espessamento
risco diário nas punções, além de ser extremamente dural8 (Fig. 32.1)
desconfortável para o paciente oncológico. Por isso
a implantação de um sistema com cateter no espaço TÉCNICA CIRÚRGICA
liquórico e uma câmara de acúmulo pode ser uma so-
lução interessante5-7. Procuramos, sempre que possível, acessar o ven-
Há várias opções de câmaras no mercado, mas a trículo lateral, no seu corno frontal, através da pun-
que normalmente usamos é da Johnson, Estados Uni- ção por trepanação no ponto de Kocher, ou através
dos ou Medtronic, Estados Unidos. dos parâmetros propostos por Ghajar11. Atualmente
escolhemos um ponto de trepanação a 2,5 cm da li-
nha média (sutura sagital) e a 1 cm à frente da sutura
QUADRO CLÍNICO coronária1,11. O paciente é colocado em posição supi-
A carcinomatose meníngea normalmente cursa na, sob anestesia geral, de preferência com entubação
com quadro de hipertensão intracraniana por ventri- orotraqueal e após assepsia e anti-sepsia (Fig. 32.2),
culomegalia por obstrução e irritação das vias de ab- e a marcação da incisão é feita em arco pequeno no
sorção liquórica e pelo aumento da produção liquóri- ponto supracitado (Figs. 32.3 e 32.4); obviamente
ca diária. Aparecimento de nervos cranianos pontinos instilamos com a agulha fina anestésico local, do tipo
e bulbares indica um prognóstico reservado em razão Marcaína®, para facilitar a dissecção junto ao pericrâ-
da implantação de células neoplásicas junto à bainha nio e promover auxílio à analgesia. A trepanação é
nervosa desses nervos1,5-7. Estado comatoso pode ser realizada com broca cortante, de preferência do lado

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

direito frontal, porém poderá ser feita à esquerda, se


houver procedimentos anteriores do lado direito, em
que a cicatriz da incisão poderá ter sua nutrição ar-
terial comprometida. A hemostasia da cortical óssea
visível no orifício de trepanação após a osteotomia é
realizada com cera de osso, e, após coagulação bipo-
lar da dura-máter, procede-se à abertura dural em X,
coagulando os ângulos. Por meio de neuronavegação
ou por parâmetros anatômicos no ponto virtual da li-
nha que liga a pupila ao meato acústico interno, dire-
cionamos a punção com cateter ventricular, inserindo
até 5 cm no máximo, e observamos a saída de líquido
cefalorraquidiano, que imediatamente é colhido para
exame em tubo especial. Conectamos o cateter à câ-
mara de Ommaya e a sepultamos abaixo da pele e
subcutâneo (Fig. 32.5). Não se deve esquecer de re- Fig. 32.2 – Paciente referido na Fig. 32.1 em posicionamen-
tirar o ar de dentro sistema e, para isso, pode-se usar to supino, com assepsia e anti-sepsia rigorosa.
uma pequena agulha de insulina em seringa de 5 cc,
A sutura da pele e do plano subcutâneo deve ser feita
em plano único com pontos inabsorvíveis.
Uma tomografia computadorizada de crânio de
controle deve ser realizada imediatamente após o
procedimento para verificação do posicionamento do
cateter (Fig. 32.6). Em alguns serviços, a ressonância
intra-operatória já exerce essa função. Até recente-
mente usamos fluoroscopia para confirmar a posição
do cateter junto ao forame de Monro.

Fig. 32.3 – Incisão curvilínea frontal para punção no ponto


de Kocher.

Fig. 32.1 – Tomografia computadorizada de crânio, pré-


operatória, com contraste iodado, mostrando o realce menín-
geo, em paciente do sexo masculino, de 76 anos, com diag-
nóstico de linfoma não-Hodgkin de células B, operado por Fig. 32.4 – Paciente posicionado após colocação dos campos
craniotomia previamente para remoção de massa dural, cujo cirúrgicos e marcação da incisão.
líquido cefalorraquidiano mostra 10% de células neoplásicas e
proteinorraquia de 170 mg%.

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32 –Técnica Cirúrgica do Implante de Câmara de Ommaya para Instilação de Quimioterápicos no
Espaço Liquórico para Tratamento de Carcinomatose Meníngea

COMPLICAÇÕES
As complicações mais freqüentes do procedimento
são: infecção, mau posicionamento do cateter ventri-
cular e hemorragia intracraniana, alcançando em tor-
no de 9,3%2,14. Os agentes bacterianos mais freqüen-
tes nesse tipo de infecção são Staphylococcus aureus
e Staphylococcus coagulase negativa2. A hemorragia
intracraniana está associada a pacientes com discra-
sias sangüíneas, como trombocitopenia, pacientes
com anticoagulação oral e pacientes com leucemia.
Alguns têm evolução rápida para hidrocefalia agu-
da após instilação do quimioterápico, havendo neces-
sidade de realizar, do lado contralateral, um procedi-
mento de derivação ventriculoperitoneal com válvula
Fig. 32.5 – Incisão com o retalho cutâneo afastado com programável.
auto-retrator de Jahnsen, trepanação e cateter ventricular co- Complicações pertinentes à instilação do quimio-
nectado à câmara de Ommaya. terápico fora do espaço ventricular podem acarretar
leucoencefalopatia grave, inclusive estados neuro-
lógicos com grave comprometimento do nível de
consciência5,15

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

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Tratamento Cirúrgico dos
Tumores Epidermóides
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Hector Navarro Cabrera

INTRODUÇÃO sinal em T2, nas cisternas pré-pontinas e do ângulo


pontocerebelar respectivamente. No espaço intradu-

T
umores de origem cutânea perfazem menos de ral, localiza-se normalmente nas cisternas ventrais do
1% dos tumores do sistema nervoso central. Não tronco cerebral5,12,13.
há predileção por sexo, e o início dos sintomas
se dá entre a terceira e quarta década1,2. Na cisterna inter-hemisférica sobre o seu corpo
caloso e interventricular constituem localização ainda
Representam ninhos de células do tecido tegu-
mais infreqüente. Na cisterna do ângulo cerebelopon-
mentar, heterotópicas, que durante a embriogênese
tino localizam-se quase 50% dos casos dos pacientes
não migraram adequadamente, encontrando-se na li-
com tumores da região cerebelopontina14-17.
nha de diferenciação neurocutânia odontogênica1,3.
Os tumores epidermóides são constituídos por epité-
lio escamoso estratificado e se diferenciam histologica-
mente dos tumores dermóides por não possuírem fâne-
ros da pele e tecido adiposo4. Tufos de cabelo e dentes
são comumente encontrados nos tumores dermóides5.
Raramente têm comportamento maligno e podem
se diferenciar em carcinomas escamosos epidermói-
des6, bem como em hidradenomas atípicos3,7.
A maioria dos autores considera os tumores epi-
dermóides mais como malformações congênitas do
que propriamente neoplasias verdadeiras3,8,9.
Apesar de sua origem embriogênica ou congênita,
esses tumores aparecem tardiamente, em razão de seu
lento crescimento e potencial proliferativo10.

LOCALIZAÇÃO
Podem-se localizar no espaço intra ou extradural,
no compartimento infra ou supratentorial. Na fossa
posterior, eles podem ser extradurais (localizados na
díploe óssea ou na escama occipital), transdurais com
formação disráfica11, ou puramente intradural4. As
Figs. 33.1 e 33.2, A e B exemplificam um tumor epi-
dermóide em cisterna sylviana, visível neste caso por Fig. 33.1– RNM do encéfalo mostra lesão de hipossinal em
meio de ressonância nuclear magnética (RNM) do T1, com localização em região de ângulo pontocerebelar e cis-
encéfalo com conteúdo de hipossinal em T1, hiper- terna pré-pontina.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

A Como guardam relação com estruturas neurovas-


culares nas cisternas liquóricas, há relatos de sangra-
mentos aneurismáticos em cistos epidermóides20.
Na cisterna da lâmina quadrigêmea, podem provo-
car síndrome de Parinaud. Tique doloroso e hemies-
pasmo facial podem ter como causa cistos epidermói-
des da região do ângulo cerebelopontino17,21-25. Muitas
vezes são assintomáticos e dificultam a decisão de in-
dicação cirúrgica26-29.

EXAMES DE IMAGEM
O diagnóstico de cistos epidermóides requer a utili-
zação da tomografia computadorizada de crânio e res-
sonância magnética, sendo de pouca utilidade cranio-
grama simples de crânio e estudo angiográfico2,12,28,29.
Com os avanços técnicos de neurorradiologia,
pode-se, com segurança, ter o diagnóstico pré-opera-
tório facilitado. Todavia, a diferenciação em relação a
cistos de aracnóides, cistos racemosos, pode ser difí-
cil, mesmo com a utilização da ressonância magnéti-
ca em T1, DP (densidade de prótons) e T22,10,29.
B Na TC, aparecem como lesões hipoatenuantes que
não se contrastam e são bem delineadas2,29 (Fig. 33.3).
Cistos dermóides possuem uma hipoatenuação mais
acentuada, pelo conteúdo de gordura maior que no cis-
to dermóides10,21. Em cistos epidermóides, todavia, no
exame de TC, não é infreqüente encontrar-se lesões com
contrastação periférica, hiperatenuação e calcificação
na parede do cisto8,30-33, como nas Figs. 33.18 e 33.19,
que mostram tumor epidermóide em região opérculo-
insular. Uma impregnação de contraste na parede do
cisto pode representar malignização da lesão31,34.
Na fossa posterior à TC, em virtude do efeito de vo-
lume parcial e artefatos, pode-se tornar difícil a dife-
renciação em relação a megacisternas, sendo necessá-
ria a utilização de RNM para esse fim5. Anteriormente
aos avanços tecnológicos dos exames de imagem, a
cisternografia era utilizada para esse fim11,27,35,36,
Fig. 33.2 – (A e B) Hipersinal em T2 em tumores na mesma
localização à esquerda e em outro paciente à direita.

QUADRO CLÍNICO
Os sintomas podem ser muito sutis e, às vezes,
esses tumores só são descobertos como achado de
exame em pesquisa de outras doenças neurológicas.
Quando nas cisternas supratentoriais, podem causar
crises convulsivas; hipertensão intracraniana se den-
tro dos ventrículos; distúrbios cognitivos se em áreas
correlatas e próximas ao sistema límbico. Na fossa
posterior, na região do ângulo cerebelopontino, sin-
tomas de acometimento de nervos cranianos como o
V18,19, VII e o VIII; e quando no limite inferior da cis- Fig. 33.3 – Tomografia computadorizada de crânio mostra
lesão hipoatenuante em cisterna pré-pontina, causando dilata-
terna, sinais e sintomas de nervos bulbares. ção ventricular.

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33 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Epidermóides

A RNM de encéfalo é o exame mais específico res que consideram a remoção dessa pseudocápsula
e sensível e as imagens em T1 fornecem uma idéia fator de risco para a formação de foco epileptogênico
importante da forma e delineação da lesão. As ima- e de aumento da morbidade e mortalidade na primeira
gens em densidade de prótons (DP), brilho intenso semana pós-operatória, quando a cirurgia for no com-
nos exames de difusão e em T2 ajudam a obter uma partimento supratentorial38.
sugestão diagnóstica pré-operatória, porém apenas o Para os tumores corticais frontotemporais ou inse-
achado intra-operatório seguido de análise patológica ridos na cisterna sylviana (espaço opérculo insular),
confirmará o diagnóstico10,15,21,26,27,33. a craniotomia pterional é a indicada (Caso Ilustrati-
Os diagnósticos diferenciais incluem: cistos race­ vo II, Figs. 33.18 a 33.20). Para aqueles em situação
mosos8,19, megacisternas, cistos de aracnói­des10,21,34,36, interpeduncular, retroquiásmatico e/ou com extensão
astrocitomas císticos e lipomas intracranianos. até a porção alta e média da ponte clival, a cranioto-
mia pré-temporal é a recomendada.
TRATAMENTO Nos tumores epidermóides intraventriculares, si-
tuados no terceiro ventrículo, a abordagem transca-
O tratamento cirúrgico é de escolha. A indicação losa é a que preferimos. Na cisterna quadrigêmea, a
deve ser feita aos casos em que se tenha constatado
abordagem que indicamos é infratentorial supracere-
crescimento do cisto pelos exames de imagem, sinais
belar em posição semi-sentada.
e sintomas incapacitantes, e que influem na qualidade
de vida, como neuralgia do trigêmeo, pacientes jovens No ângulo pontocerebelar, a lesão é extremamen-
em boas condições clínicas com volumosos tumores2. te aderida a nervos e estruturas vasculares (ver Figs.
33.12 a 33.14) e, muitas vezes, estas passam dentro
Más condições clínicas, pacientes idosos e acha-
das lamelas concêntricas do tecido epitelial, tornando
dos incidentais de cistos epidermóides em pacientes
assintomáticos são as contra-indicações ao tratamen- difícil sua visualização17,39. As veias normalmente es-
to cirúrgico. Nesse caso, o tratamento conservador tão estiradas em torno do tumor e quando, o esvazia-
consiste na observação e no seguimento por meio de mos, pode haver sangramento das veias. A extensão
tomografias e ressonâncias seriadas6. por meio do forame oval pode ser um fator de recidi-
va, o que torna necessária uma segunda abordagem.
Craniotomias amplas facilitam a identificação de
A via suboccipital é a preferida e pode nos ajudar em
estruturas anatômicas e permitem uma melhor disse-
quase todos os casos, porém, em tumores com exten-
cação, principalmente nas lesões situadas na base do
são mais baixa até o forame magno, a via extrema
crânio9,37. O aspecto cirúrgico é de material descama-
lateral retroncodilar pode ser necessária. A extensão
tivo perláceo, que facilmente se desarranja quando se
aspira ou se pinça com fórceps para biópsia de tumor. à porção mais caudal do clivo pode indicar uma via
Deve-se retirar a lesão centrifugamente em pequenos pré-sigmóidea20,40,41. Tumores situados na cisterna
pedaços, com aspirador ou fórceps, tomando o cuida- magna causam compressão do tronco póstero-ânte-
do de se identificar estruturas neurovasculares em seu rior, e hidrocefalia42. O acesso, nesses casos, deve ser
interior, uma vez que esses cistos ocupam geralmente a via suboccipital bilateral (Caso Ilustrativo III, Figs.
as cisternas liquóricas. Sempre que possível, devem- 33.21 a 33.24). Os tumores epidermóides da lâmina
se abrir as cisternas o mais amplamente possível, no quadrigêmea devem ser operados em posição semi-
intuito de drenar liquor e melhorar as condições do sentada, que facilita a remoção do tumor, com a ajuda
encéfalo para a manipulação cirúrgica, muitas vezes da gravidade, podendo-se fazer uma via combinada
prejudicada pela loculação das cisternas pela obstru- supra e infratentorial. As Figs. 33.25 a 33.36, caso
ção pelo tumor9. Após o esvaziamento intratumoral, ilustrativo IV, mostram tumor na lâmina quadrigêmea
a dissecação da pseudocápsula36, com espaçamento e átrio ventricular que foi operado em posição semi-
da aracnóide pela inflamação perilesional, causando sentada, com acesso supratentorial.
grande aderência de estruturas adjacentes), deve ser Em nossa experiência e na de outros autores, a ne-
lenta e contínua, normalmente por meio de dois fór- cessidade de uma segunda cirurgia, por recidiva, ou
ceps, podendo ser um deles a pinça bipolar e com as- por lesão residual, não necessariamente implica uma
piração realizada pelo auxiliar de cirurgia. cirurgia mais difícil13,43. As recidivas devem ser ope-
Com essa técnica pode-se proceder à remoção radas quantas vezes forem necessárias, mas há que se
completa da lesão, inclusive da pseudocápsula (caso apurar os fatores de recidiva: inflamação do ouvido
ilustrativo I, Figs. 33.4 a 33.17), reputada por muitos médio, osso petroso, resíduos capsulares importantes
como fator proeminente de recidiva. Todavia há auto- e malignização não diagnosticada histologicamente.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Caso Ilustrativo I
Paciente do sexo masculino, de 29 anos, com cefaléia crônica e paralisia facial discreta à esquerda. A RNM do encéfalo revela
tumor epidermóide em cisterna do ângulo pontocerebelar e região pré-pontina.

A B

Fig. 33.4 – (A e B) RNM do encéfalo em corte axial, em T2, demonstra tumor epidermóide de região pré-pontina , lesão
de hipersinal e de ângulo pontocerebelar,

Fig. 33.6 – Lesão de hipersinal em que se podem identificar


estruturas vasculares em seu interior.
Fig. 33.5 – RNM em corte coronal mostra lesão de hipos-
sinal em T1.

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33 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Epidermóides

Fig. 33.9 – Angiorressonância mostra-se normal.

Fig. 33.7 – RNM pós-operatória, em corte axial, mostra lesão


ressecada totalmente, com descompressão do tronco cerebral.

Fig. 33.10 – Visão do paciente previamente à cirurgia, anes-


tesiado com os transdutores do potencial evocado de tronco
cerebral, auditivo, facial e somatossensorial instalados.

Fig. 33.8 – TC de crânio pós-operatória mostra a ressecção


da lesão e melhora da dilatação ventricular pós-operatória.

Fig. 33.11 – Paciente posicionado em posição semi-sentada,


com incisão retroauricular marcada em região suboccipital.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Fig. 33.12 – Visão intra-operatória da craniectomia suboc- Fig. 33.15 – Visão intra-operatória mostra superfície tento-
cipital, com o tumor perláceo entre os nervos facial e bulbares. rial do cerebelo após a retirada de todo o tumor.
Após se afastar o cerebelo com espátula apropriada (Mizuho,
Japan), visualiza-se o nervo facial.

Fig. 33.13 – Visão cirúrgica, em que se visualiza o nervo Fig. 33.16 – Pós-operatório imediato mostra o paciente com
facial e o tumor atrás do nervo. paresia facial à esquerda moderada.

Fig. 33.14 – Visão cirúrgica, após a retirada do tumor em


pequenos pedaços, visualizando-se os nervos facial e bulba-
res. Fig. 33.17 – Pós-operatório após 1 ano, com recuperação
completa do nervo facial (com autorização).

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33 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Epidermóides

Caso Ilustrativo II
Paciente de 22 anos, do sexo masculino, com crises parciais complexas há mais de 10 anos, secundariamente generalizadas há 2
anos, de difícil controle. Após remoção do tumor epidermóide da cisterna sylviana e região opérculo-insular, houve controle das
crises com baixa dosagem de anticonvulsivantes.

Fig. 33.18 – A tomografia computadorizada de crânio sem Fig. 33.19 – A RNM mostra imagem heterogênea em T1
contraste mostra tumor de hipossinal com calcificações em sua com algumas áreas dermóides pela hiperintensidade em T1.
parede.

Fig. 33.20 – A TC de crânio pós-operatória mostra a cra-


niotomia pterional realizada e a ressecção da lesão e sua cáp-
sula, pela ausência da calcificação pré-operatória.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Caso Ilustrativo III


Paciente de 37 anos, do sexo feminino, com cefaléia crônica de forte intensidade occipital, que há 3 semanas vem seguida de
vômitos e turvação visual. A RNM revelou tumor de fossa posterior.

Fig. 33.21 – RNM do encéfalo, em corte coronal, mostra Fig. 33.22 – RNM do encéfalo, em corte axial, em T1, de-
tumoração cística de hipersinal em T2, que se estende do IV monstra hipossinal.
ventrículo até a cisterna magna, com ventriculomegalia acima
da tumoração.

Fig. 33.23 – RNM em T2, em corte axial, demonstra hiper- Fig. 33.24 – RNM do encéfalo, pós-operatória mostra ressec-
sinal. ção completa da lesão por craniotomia suboccipital bilateral.

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33 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Epidermóides

Caso Ilustrativo IV
Paciente de 27 anos, do sexo feminino, com histórico de cefaléia, náuseas e turvação visual, além de arritmia cardíaca, fez RNM
que mostrou tumor da lâmina quadrigêmea.

Fig. 33.25 – A RNM do encéfalo, em corte axial, mostra tu- Fig. 33.26– RNM evidencia a expansão para a lâmina qua-
mor com hipossinal em T1, em região de carrefour ventricular drigêmea.
e lâmina quadrigêmea.

Fig. 33.27 – RNM em corte coronal, em T1 sem contraste,


mostra a lesão de hipossinal no carrefour ventricular, no átrio
ventricular.

Fig. 33.28 – RNM, em corte axial, em T2, mostra hipossinal.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Fig. 33.29 – A RNM do encéfalo em corte sagital mostra a Fig. 33.30 – A RNM por difusão mostra a lesão com brilho
lesão na área pineal e facilita o planejamento do acesso intenso, compatível com tumor epidermóide.

Fig. 33.31 – Visão cirúrgica do paciente em posição semi- Fig. 33.32 – Craniotomia occipital esquerda, expondo tór-
sentada. cula, seio transverso e sagital; com espátula afasta-se o lóbulo
occipital de baixo para cima, da porção medial para lateral, o
que permite visualizar a região falcotentorial.

Fig. 33.33 – A visão microcirúrgica mostra lesão perlácea, próxi- Fig. 33.34 – Visão microcirúrgica após a resseção do tumor em
ma a velo interpósito, a qual pode ser retirada em pequenos pedaços pequenos pedaços.
com pinça tumor ou fórceps, por meio de aspiração.

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Fig. 33.35 – Após a ressecção total da lesão, observa-se a


região falcotentorial intacta.

A B

Fig. 33.36 – (A e B) TC de crânio em corte axial mostra remoção total da lesão.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

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33 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores Epidermóides

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Tratamento Cirúrgico dos Tumores
das Regiões Pineal e Posterior
do Terceiro Ventrículo
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Hector Navarro Cabrera
Antonio Nogueira Almeida

INTRODUÇÃO retos, exige seu conhecimento amplo e, sem dúvida,


uma habilidade ímpar para não os lesar (Fig. 34.1).

O
s tumores de células germinativas da região A dificuldade técnica e as complicações têm sido des-
pineal constituem 3% dos tumores primários critas desde Cushing na década de 1930, bem como
do encéfalo e produzem sintomatologia va- por Dandy na década de 19204,5.
riada, bem como sinais exuberantes. Há uma incidên-
A região corresponde à área mesencefálica poste-
cia mais pronunciada na Coréia e no Japão1.
rior, lâmina quadrigêmea, superfície tentorial do ce-
Os tumores de células germinativas intracranianos rebelo e tentório.
constituem 70% dos tumores da região pineal2. A Ta-
bela 34.1 mostra a classificação dos tumores de célu- Os tipos de abordagens cirúrgicas básicos são dois:
las germinativas intracranianas e marcadores séricos • Supracerebelar, infratentorial6-8.
de cada tipo histológico. Esses tumores são mais fre- • Suboccipital inter-hemisférico justofalcotento-
qüentes na segunda década de vida1,3 e apresentam um rial ou transtentorial9.
predomínio importante no sexo masculino1,3 e há uma O posicionamento no primeiro, normalmente, é
ligeira dominância feminina na localização supra-se- semi-sentado e exige monitoração cardíaca com Do-
lar2. A complexidade cirúrgica torna esse grupo de tu- ppler transesofágico, acesso venoso central com o ob-
mores um capítulo importante para a análise detalhada jetivo de se prevenir uma embolia aérea. O segundo
de todos os aspectos pertinentes às suas abordagens. consiste em três quartos de pronação com a cabeça
A complexidade da interação entre esses tumores e rodada para baixo. No primeiro, a incisão é mediana
as veias e sistemas venosos adjacentes, como as veias e retilínea, e no segundo, é curvilínea com a base vol-
basais de Rosenthal, veias cerebrais internas, seios tada para baixo.

Tabela 34.1 – Classificação dos tumores de células germinativas intracranianos e marcadores séricos de cada tipo
histológico.
Tipo histológico β-hCG α-fetoproteína
Germinoma Normal/moderadamente elevada Normal
Carcinoma embrionário Normal/moderadamente elevada Normal/moderadamente elevada
Tumor do seio endodérmico Normal Elevada
Coriocarcinoma Elevada Normal
Teratoma maturo Normal Normal
Teratoma imaturo Normal Normal/moderadamente elevada
Teratoma maligno Normal Normal/moderadamente elevada
Tumores germinativos mistos Elevada/normal Elevada /normal

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

gem associada à quimioterapia. Todavia as taxas de


recidivas foram maiores nos pacientes com radiote-
rapia de baixa dosagem. A quimioterapia isolada se
associa a taxa de recidivas muito elevadas, e seu uso
não é recomendado.
Os teratomas maduros são tumores de células ger-
minativas benignas que são controlados, em mais de
90% dos casos, com cirurgia exclusiva.
Os tumores de células germinativas não germino-
mas constituem um grupo heterogêneo de tumores
que incluem tumores agressivos, tais como as formas
puras e mistas de coriocarcinoma, tumor do seio en-
dodérmico e carcinoma embrionário e tumores com
Fig. 34.1 – O esquema anatômico mostra o corte sagital e agressividade intermediária, tais como os tumores
a relação da superfície tentorial do cerebelo, tentório, glându- mistos com germinoma e teratoma, os teratomas ima-
la pineal, lâmina quadrigêmea, todas abrangidas pelo círculo turos, e os teratomas com transformação maligna.
vermelho. Tanto a radioterapia exclusiva como a quimioterapia
exclusiva produzem taxas baixas de controle tumoral,
Os principais tumores primários dessa região são: e os esquemas de tratamento atuais incluem químio
gliomas, pineoblastomas, pinealomas, disgermino- e radioterapia, com ressecção cirúrgica do tumor12,
mas, pinealocitomas, meningiomas, tumores epider- ou até mesmo biópsia estereotática diagnóstica13.
móides, teratomas, linfomas primários, cistos parafi- As Figs. 34.2 a 34.6 mostram os exames pré e pós-
sários entre outros. Os secundários, bem mais raros, operatórios de imagem de um tumor misto de células
normalmente constituem metástases de mama, pul- germinativas.
mão, hipernefromas, melanomas, coriocarcinomas,
tumores embrionários do saco vitelínico e linfomas
primários de células B. Em relação à extensão, po-
dem ser originários da própria glândula pineal, ou por
extensão da parede posterior do terceiro ventrículo,
da área tectal e pré-tectal, colicular, ou do pulvinar
talâmico, atingindo a região pineal.
O único tumor passível, em alguns serviços de
neurocirurgia, de ser irradiado previamente com do-
ses baixas, para terapia de prova é o disgerminoma, do
qual há suspeita mesmo quando há segunda lesão na
região supra-hipofisária, puberdade precoce, diabetes
insipidus em paciente com massa tumoral lobulada,
com isossinal em T1 e hipersinal em T2, líquido ce-
falorraquidiano positivo para célula neoplásica e au-
mento da fosfatase alcalina placentária e alfa-fetopro-
teína. A alfa-fetoproteína e o β-hCG, se aumentados
no sangue e no líquido cefalorraquidiano, auxiliam no
diagnóstico de tumor de células germinativas.

TUMORES DE CÉLULAS GERMINATIVAS


O tratamento dos pacientes com tumores germi-
nativos do sistema nervoso central está em evolução
e não se alcançou um padrão definitivo10,11. Os dados
de muitas séries indicam que a radioterapia exclusiva
consegue taxas de sobrevida em torno de 90% nos pa-
cientes com germinomas12. Vários estudos prospecti-
vos mostram resultados satisfatórios da combinação Fig. 34.2 – Tomografia de crânio sem constraste mostra
de radioterapia em baixa dosagem e quimioterapia. lesão hipoatentuante em região de lâmina quadrigêmea, com
efeito obstrutivo sobre o aqueduto e ventriculomegalia acima
As taxas de sobrevida foram similares no grupo com da compressão.
radioterapia exclusiva e radioterapia em baixa dosa-

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34 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores das Regiões Pineal e Posterior do Terceiro Ventrículo

Fig. 34.4 – A RNM do encéfalo em corte coronal mostra o


mesmo aspecto da Fig. 34.3, com falha de enchimento no in-
terior, que sugeria durante a cirurgia, realizada com o acesso
supracerebelar infratentorial, tratar-se de dente.

Fig. 34.3 – A ressonância magnética em corte axial mostra


lesão fortemente contrastada com gadolínio em T1, com hete-
rogeneidade em seu interior, cujo exame anatomopatológico
revelou tratar-se de tumor misto de células germinativas.

Fig. 34.5 – A RNM do encéfalo em corte sagital demonstra


que a escolha das vias de acesso supracerebelar e infratentorial
residiu no fato de grande parte do tumor estar na porção infe-
rior da lâmina quadrigêmea.

Fig. 34.6 – A tomografia computadorizada de crânio com


contraste iodado demonstra o aspecto após a remoção total e
a melhora da dilatação ventricular.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

TUMORES PRIMÁRIOS DO TECIDO


GLANDULAR
Os pineocitomas são tumores benignos que apre-
sentam cifras altas de controle com a extirpação cirúr-
gica radical ou com ressecção cirúrgica parcial asso-
ciada a irradiação local12.
Os esquemas de tratamento atual dos pineoblas-
tomas incluem cirurgia, quimioterapia e irradiação
cranioespinhal com uma sobredose local. A quimio-
terapia exclusiva tem tido pouco êxito em estudos de
crianças muito pequenas em que a radioterapia tenha
sido postergada12.
A radiocirurgia pode ser uma opção importante
para os pineocitomas e os pineoblastomas, como trata-
mento primário ou adjuvante, levando à sobrevida de
75% em 5 anos após o diagnóstico, com 29% apresen-
tando remissão completa e 57% remissão parcial14.
As Figs. 34.7 a 34.9 mostram os exames pré e pós- Fig. 34.8 – A RNM do encéfalo, em cortes sagitais, mostra
operatórios de portador de pinealoma submetido à re- extensão anterior do tumor para o terceiro ventrículo.
moção radical por via occipitoparietal inter-hemisfé-
rica, transfalcina em três quartos de pronação.

Fig. 34.7 – A ressonância magnética do encéfalo demons-


tra, em cortes axiais e T1 com gadolínio, lesão de hipersinal,
heterogênea. Fig. 34.9 – A tomografia computadorizada de crânio com
contraste mostra remoção completa do tumor, usando-se a
via occipitoparietal e inter-hemisférica, com três quartos de
pronação. O anatomopatológico demonstrou tratar-se de pi-
nealoma.

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34 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores das Regiões Pineal e Posterior do Terceiro Ventrículo

GLIOMAS PERIAQUEDUTAIS vamente com cirurgia, seguidos de irradiação e qui-


mioterapia18. Germinomas puros, os quais são muito
Os gliomas periaquedutais e tectais são, normal- radiossensíveis, podem ser curados com radioterapia
mente, astrocitomas de grau II, do tipo protoplasmáti- convencional apenas, porém há serviços em que a bi-
co, com episódios de cefaléia e síncope. Normalmente ópsia estereotática deve preceder a radioterapia19.
a ressonância mostra uma hidrocefalia triventricular.
O acesso preferido para esses tumores é a via supra-
cerebelar infratentorial com abertura da área tectal15. Via Supracerebelar Infratentorial
Via conhecida desde o século XIX8 e usada para
QUADRO CLÍNICO tumores da região pineal situados com sua maior por-
ção no espaço infratentorial15,20,21, abaixo do nível da
O quadro clínico mais comum é a hipertensão in- incisura tentorial, quando se visualiza a imagem nos
tracraniana causada por hidrocefalia, decorrente de cortes sagitais na RNM do encéfalo (Figs. 34.10 a
obstrução do aqueduto de Sylvius. Ocorre também 34.12). Essa via tem sido divulgada e enfatizada por
síndrome de nervos cranianos, principalmente alte- Bruce et al. e Stein na Columbia University, Nova
ração da musculatura ocular extrínseca, como sín- York, desde a década de 1980, e segue até o presente
drome de Parinaud por acometimento da área tectal. momento2-5,26.
Nervos cranianos bulbares podem sugerir o quadro Em posição semi-sentada, com monitoração car-
quando houver disseminação liquórica produzindo díaca e Doppler transcraniano para se evitar embolia
uma síndrome de carcinomatoses meníngeas like. O aérea, com a cabeça fixa em fixadores de Mayfield
acometimento talâmico pode produzir síndromes sen- ou Sugita (Fig. 34.13), procede-se a uma incisão
sitivo-motoras e síndromes álgicas, como Degerinne mediana, de 3 a 4 cm acima do ínion até o processo
Roussy, por comprometimento da artéria tálamo-ge- espinhoso da vértebra cervical C2. A musculatura da
nicular posterior. região deve ser dissecada observando-se a linha me-
Sintomas endócrinos associados são característi- diana e, após afastamento com afastadores de Gelpi,
cos dos disgerminomas com extensão à região supra- procede-se à craniotomia suboccipital mediana, que
quiasmática. deve expor os seios transversos e tórcula (Fig. 34.14).
Após craniotomia, deve-se realizar manobra de Val-
DIAGNÓSTICO salva, para se detectar possível laceração em algum
componente do sistema venoso e, após, identificar-
O diagnóstico por imagem deve ser feito por meio se o pertuito, deve-se tamponá-lo com Gelfoam® ou
de ressonância nuclear magnética (RNM), que mos- Surgicel®. A craniotomia não precisa se estender até
tra claramente a lesão e nos orienta quanto à origem o forame magno, nem o arco posterior de C1 precisa
da lesão e extensão. A análise de líquido cefalorra- ser ressecado.
quidiano quanto à presença de células neoplásicas e A abertura dural deve ser em Y ou em formato de
de antígeno carcinoembrionário, alfa-fetoproteína e taça de champanhe. A dura-máter deve ser rebatida e,
fosfatase alcalina placentária é fundamental para di- usando-se o acesso sobre a superfície tentorial do ce-
ferenciação diagnóstica entre os tipos histológicos em rebelo, as veias vermianas superiores centrais podem
definição (ver Tabela 34.1). O angiograma por resso- ser coaguladas com bipolar e seccionadas com micro-
nância magnética permite estudar o sistema venoso tesoura. Desse modo há uma ptose lenta e progressiva
profundo e auxiliar na escolha da via de acesso16. do cerebelo se direcionarmos a luz do nosso micros-
cópio ao velo interpósito, sendo possível identificar
VIAS DE ACESSOS CIRÚRGICOS a tumoração abraçada pelas veias cerebrais internas
(Fig. 34.15). Devem-se dissecar as veias da pseu-
Ressecção total ou parcial dos tumores da região docápsula do tumor e, em pequenos pedaços ou por
pineal pode ser conseguida com baixa morbidade na meio de aspiração ultra-sônica, procede-se à remoção
maioria dos casos17. A escolha entre os dois acessos microcirúrgica. Pode-se efetuar o tamponamento com
principais, supracerebelar infratentorial e occipitopa- Surgicel®. Em casos em que há uma hidrocefalia pro-
rietal inter-hemisférico, depende do tamanho do tu- nunciada, a inserção de derivação ventricular externa
mor e da localização da lesão na região pineal, relação poderá ser útil no período pré e/ou intra-operatório.
com o sistema ventricular, linha média e esplênio16,17. O uso de cotonóides longos e material de microdis-
Segundo Konovalov et al., que detêm a maior ca- secção longo é imprescindível. No caso de inchaço
suística na literatura, com 700 pacientes tratados de cerebral intra-operatório, pode ser necessária a cate-
1976 a 1999 no Burdenko Neurosurgery Institute, terização do corno occipital do ventrículo lateral vol-
em Moscou, Rússia, os tumores benignos da região tado para cima, e procede-se à drenagem liquórica até
pineal podem ser curados com cirurgia apenas, e os que haja um relaxamento adequado para se continuar
tumores malignos devem ser tratados mais agressi- a cirurgia (Fig. 34.16).

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Fig. 34.12 – RNM mostra o tumor da Fig. 34.10 em corte


sagital com extensão infra e supratentorial.

Fig. 34.10 – TC de crânio mostra tumor em região pineal


com características de meningioma.

Fig. 34.13 – Paciente em posição semi-sentada, com moni-


toração cardíaca e Doppler transcraniano para se evitar em-
bolia aérea, com a cabeça fixa em fixadores de Mayfield ou
Sugita.

Fig. 34.11 – TC de crânio mostra pós-operatório do mesmo


caso da Fig. 34.10 com remoção completa.
Fig. 34.14 – Craniotomia suboccipital mediana, que deve
expor os seios transversos e tórcula.

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34 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores das Regiões Pineal e Posterior do Terceiro Ventrículo

quatro oríficos e craniótomo, expondo-se o seio sa-


gital posterior, tórcula, transverso. A dura-máter é
rebatida e auto-retratores possibilitam a locação das
espátulas afiladas em sua extremidade para se afastar
a porção mesial do lobo occipital e porção inferior do
lobo occipital para delinear um acesso inter-hemisfé-
rico, junto à confluência falcotentorial e seio reto. Po-
de-se abrir foice junto ao seio reto em paralelo, para
se ter melhor visualização da região pineal e lâmina
quadrigêmea. Sob visão microscópica, dissecam-se
facilmente as estruturas venosas em torno do tumor
e procede-se ao esvaziamento intratumoral com as-
pirador ultra-sônico ou com microtesoura em peque-
nos pedaços (Figs. 34.17 a 34.24). Via semelhante era
usada por acesso intraparenquimatoso, supratentorial,
o que não nos parece mais plausível se podemos evi-
tar o parênquima cerebral e acessar a pineal por via
inter-hemisférica28-31.
Fig. 34.15 – Esquema mostra a visão sagital do acesso, em
que, após a secção das veias cerebelares sobre a superfície
tentorial do cerebelo, há uma ptose lenta e progressiva do
cerebelo se direcionarmos a luz do microscópio para a o velo
interpósito, sendo possível identificar a tumoração abraçada
pelas veias cerebrais internas.

Fig. 34.17 – Paciente em posição de três quartos de prona-


ção, com a face voltada para baixo.

Fig. 34.16 – No caso de inchaço cerebral intra-operatório,


pode ser necessária a cateterização do corno occipital do ven-
trículo lateral voltado para cima, e procede-se à drenagem
liquórica até que haja um relaxamento adequado para conti-
nuar a cirurgia.

Via Supratentorial Transfalcina


Inter-hemisférica e Suboccipital
Usada para tumores da região pineal com sua
maior porção situada no espaço supratentorial, acima
do nível da incisura tentorial. Em posicionamento de
três quartos de pronação, conforme preconizado por
Ausman et al.27, com a cabeça rodada para baixo, pro-
cede-se à fixação da cabeça em cabeceira de Mayfield
ou Sugita, e realiza-se uma incisão curvilínea com a
base voltada inferiormente. Rebate-se o plano mus- Fig. 34.18 – Esquema mostra a extensão da incisão, que
culocutâneo com anzóis e realiza-se craniotomia com permite expor o seio transverso, tórcula e seio sagital.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Fig. 34.19 – Esquema mostra a elevação do pólo occipital Fig. 34.20 – RNM axial do encéfalo de paciente do sexo
para cima, com auto-retrator e a exposição do espaço falco- feminino, de 40 anos, mostra volumoso meningioma de região
tentorial, onde, através de incisão tentorial, se pode retirar o posterior de terceiro ventrículo.
tumor também do compartimento infratentorial.

Fig. 34.21 – Angiografia cerebral de fase venosa, com de-


monstração do contorno tumoral na sua fase venosa.

Fig. 34.22 – RNM em corte coronal mostra a localização


exata do tumor na região posterior do terceiro ventrículo, onde
parte está em região supratentorial e parte está em região in-
fratentorial.

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34 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores das Regiões Pineal e Posterior do Terceiro Ventrículo

mente a região, através de craniectomia suboccipital


clássica, expondo-se a tórcula e o seio transverso,
além de craniotomia occipital bilateral32-34. A dura-
máter do compartimento supratentorial é aberta rente
ao seio sagital superior ipsilateral ao tumor, e em Y no
compartimento infratentorial. O seio transverso não
dominante angiograficamente deve ser clipado tem-
porariamente para se verificar se há inchaço cerebral
ou ingurgitamento importante do seio. Não havendo
inchaço, corta-se o seio transverso e amplia-se a área
de exposição do campo. Uma espátula deve ser colo-
cada empurrando-se a superfície tentorial do cerebelo
para baixo, de modo que se possa ver o tentório, o
qual é aberto a partir da ligadura do seio transver-
so até próximo ao seio reto em direção à ampola de
Galeno. Outra espátula do retrator deve ser colocada
medialmente ao lobo occipital e afastando-o lateral-
mente, expondo-se a região falcotentorial e o seio
reto ipsilateral à ligadura do seio transverso. Desse
modo, conseguimos acessar o tumor no seu limite in-
ferior, superior e lateralmente, possibilitando maior
Fig. 34.23 – RNM de encéfalo em corte sagital, mostrando
o tumor com expansão infra e supratentorial. chance de preservar a veia de Galeno, veias cerebrais
internas e as veias basais de Rosenthal (Figs. 34.25
a 34.31). Para meningiomas de grande volume, e até
mesmo gigantes, há relatos na literatura da necessi-
dade de ligadura de seios e veias, que aparentemente
não resultaram em complicações35,36.

Fig. 34.24 – TC de crânio com contraste mostra ressecção


total do tumor.

Via Supratentorial e Infratentorial


Transinusal Transfalcina Inter-hemisférica
e Suboccipital Supracerebelar
Fig. 34.25 – Esquema gráfico mostra o tumor visível após
Esta via está indicada para grandes meningiomas secção do seio transverso em tracejado, com o tentório aberto
da região pineal, onde se acessa supra e infratentorial- e o cerebelo tracionado para baixo por meio de espátula.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Fig. 34.28 – Foto cirúrgica mostra acesso infratentorial


com a superfície cerebelar exposta.

Fig. 34.26 – Após acesso combinado com craniectomia


suboccipital e craniotomia occipital ipsilateral, visualiza-se a
tórcula, seio transverso e sagital superior.

Fig. 34.29 – TC de crânio com contraste mostra volumoso


meningioma em região pineal, com hidrocefalia obstrutiva do
aqueduto.

Fig. 34.27 – Abertura supratentorial dural pela craniotomia


parietoccipital.

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dade ocular. A embolia aérea é muito rara hoje em dia,


em razão das precauções neuroanestésicas, e pode ser
revertida imediatamente após sua detecção com a aspi-
ração do ar junto ao cateter central locado no átrio.
Os shunts ventriculares perioperatórios podem
auxiliar a minimizar o impacto da hidrocefalia aguda
pós-operatória, ou mesmo evitá-la, além de ser útil em
casos de hemorragia no leito cirúrgico. Hoje a endos-
copia e a estereotaxia podem auxiliar na ventriculosto-
mia. A reoperação para drenagem do hematoma deve
ser imediata após o seu diagnóstico, pois a mínima
compressão do mesencéfalo pode levar a conseqüên­
cias desastrosas. A Fig. 34.32 mostra sumariamente a
nossa conduta atual em tumores da região pineal.

Imagem compatível com tumor na região


pineal sem tumor na região selar

Fig. 34.30 – RNM do encéfalo mostra volumoso tumor com


distorção do tronco cerebral e visível localização em região
pineal.
LCR com alfa-fetoproteína + LCR com alfa-fetoproteína +
LCR com fosfatase alcalina LCR com fosfatase alcalina

Radioterapia de prova Cirurgia e/ou biópsia


20 cGy

Redução do
volume tumoral

DVP + RDT dose plena do


cérebro e neuroeixo

Sem redução do
volume tumoral
e aumento do
volume

DVP + cirurgia e/ou


biópsia

Fig. 34.32 – O diagrama mostra a conduta em relação a


tumores da região pineal proposta pelos autores. DVP = de-
rivação ventriculoperitoneal – se houver hidrocefalia conco-
mitante.

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Tratamento Cirúrgico dos
Tumores da Fossa Posterior
Pedro Augustto de Santana Júnior (in memorian)
Paulo Henrique Pires de Aguiar

INTRODUÇÃO dimomas, os papilomas de plexo corióideo e metás-


tases – neuroblastoma, rabdomiossarcoma, tumor de

A
fossa posterior corresponde ao compartimento Wilms2,3. Por sua vez, quando a faixa etária adulta é
encefálico localizado abaixo da tenda cerebe- considerada, as metástases ocupam o primeiro lugar,
lar ou tentório, que contém elementos neuro- seguindo-se pelos hemangioblastomas, astrocitomas
vasculares de extrema importância à manutenção da pilocíticos e gliomas do tronco cerebral e cerebelares
vida per se, destacando-se o tronco cerebral, nervos (extremamente raros)3 (Fig. 35.2).
cranianos, cerebelo, sistema vascular arterial verte-
brobasilar, entre outros.
Entre as patologias encontradas na região infra-
QUADRO CLÍNICO
tentorial, os tumores da fossa posterior representam Sinais e sintomas compatíveis com a síndrome de hi-
45% a 60% de todas as neoplasias que acometem o pertensão intracraniana (SHIC) decorrente, por sua vez,
sistema nervoso central (SNC) de crianças com mais da obstrução do fluxo liquórico (hidrocefalia não comu-
de um ano de vida1, destacando-se, em ordem decres- nicante), com a síndrome cerebelar, de nervos cranianos
cente de freqüência2, os tumores neuroectodérmicos e/ou decorrentes do acometimento direto do tronco en-
primitivos (PNET) incluindo os meduloblastomas cefálico (rebaixamento do nível de consciência, déficits
(27%)3,4, os astrocitomas cerebelares (27%) (Fig. sensitivos e/ou motores etc.) compreendem as principais
35.1), os gliomas de tronco cerebral (28%), os epen- queixas e achados de anamnese e exame neurológico.

A B C

Fig. 35.1 – Astrocitoma pilocítico de fossa posterior. Visão à tomografia de crânio contrastada (A), ressonância nuclear mag-
nética (B) e intra-operatória (C).

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

A B

Fig. 35.2 – (A e B) Tumores da fossa posterior em adultos: metástase de adenocarcinoma pulmonar (mais comum) e glioblas-
toma cerebelar (mais raro).

DIAGNÓSTICO ACESSOS CIRÚRGICOS À FOSSA POSTERIOR


O diagnóstico da lesão lato sensu pode ser obtido As lesões expansivas na fossa posterior, a depen-
basicamente por meio da tomografia computadoriza- der da sua localização, podem ser abordadas por meio
da (TC) sem e com contraste e da ressonância nu­clear dos acessos suboccipitais – lateral, paramediano e
magnética (RNM). Ademais, a espectroscopia e a mediano – ou combinadas, supra e infratentoriais1,5.
cintilografia ganham importância no diagnóstico di- Na presença de hidrocefalia não comunicante e/
ferencial com os processos inflamatório-infecciosos, ou efeito de massa tumoral significativo, sugere-se
enquanto a angiorressonância ou a angiografia con- a passagem de derivação ventricular externa frontal
vencional também podem ser úteis no planejamento para eventual drenagem liquórica intra-operatória
cirúrgico quando estruturas vasculares (seios veno- (após abertura da fossa posterior, evitando-se, com
sos, por exemplo) estão acometidas. isso, herniação central ascendente), tornando possí-
vel a ressecção do processo neoplásico sem excessiva
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO manipulação cerebelar, reduzindo-se complicações
pós-operatórias – contusões, por exemplo.
O tratamento clínico baseia-se essencialmente na Seqüencialmente, quanto à posição do paciente, al-
corticoterapia (redução do edema vasogênico perile- guns defendem o posicionamento semi-sentado (Fig.
sional), com indicação da prescrição de drogas an- 35.3), ou sentado, em detrimento da posição prona, in-
tiepilépticas no caso de hidrocefalia. Quanto ao tra- dependentemente do acesso escolhido, uma vez que per-
tamento cirúrgico, visa-se à ressecção total da massa mitem melhor retorno venoso pela menor pressão intra-
tumoral ou de seus fragmentos (diagnóstico anatomo- torácica, com conseqüente relaxamento cerebral e uma
patológico) e correção da hidrocefalia (derivações). É drenagem do sangue oriundo das bordas musculares
importante ressaltar que, nas últimas décadas, com o para fora da extremidade inferior da incisão, ao invés de
aprimoramento da microcirurgia e desenvolvimento cair no campo operatório, além de facilitar uma melhor
de técnicas auxiliares, como neuronavegação, ultra- orientação do cirurgião (especialmente para os menos
sonografia, monitoração de potencial evocado intra- experientes). Em contrapartida, há risco aumentado de
operatório, neuroendoscopia, entre outros, tornou-se embolia aérea, pneumoencéfalo e colapso cerebral (com
possível a preservação anatomofuncional, com mais conseqüente higroma ou hematoma subdural), tornan-
acurácia, das estruturas constituintes da tão nobre re- do obrigatórias a passagem de acesso venoso central, a
gião em apreço, contribuindo de modo significativo utilização do Doppler transtorácico e, quando possível,
para a redução da morbimortalidade. do ecocardiograma transesofágico. Detectada embolia
O prognóstico é determinado pela histopatologia tu- aérea, a aspiração do ar pelo cateter central deve ser fei-
moral, grau de ressecção cirúrgica e resposta à terapêuti- ta imediatamente pelo anestesista, cabendo ao cirurgião
ca complementar – químio e radioterapia (quando indica- detectar e ocluir a(s) fonte(s) da embolia (geralmente
das). O seguimento deve ser feito por meio de exames de borda do músculo, díploe ou veias da junção craniocer-
imagem, por pelo menos cinco anos após o diagnóstico. vical e aquelas localizadas entre C1 e C2).

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35 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores da Fossa Posterior

A B

Fig. 35.3 – (A e B) Paciente em posição semi-sentada para realização de procedimento cirúrgico na fossa posterior, por meio
de acesso suboccipital mediano.

Ademais, podem ser confeccionadas craniotomias Acesso Suboccipital Lateral


(Fig. 35.4) ou craniectomias, sendo aquelas mais van- (Retrossigmóideo)
tajosas, especialmente se houver necessidade de reo-
perações (identificação dos planos cirúrgicos). Uma vez posicionado o paciente, após adequada
monitoração do potencial evocado de nervos crania-
A nos e do tronco cerebral, sua cabeça é levemente fle-
tida (tendo-se o cuidado de não comprimir a traquéia
ou comprometer o retorno venoso, em geral a uma
distância de dois dedos entre o manúbrio esternal e
a mandíbula) e rodada cerca de 20º a 30º ipsilateral-
mente ao lado operatório, sendo rigorosamente fi-
xada por meio de cabeceira (Mayfield, Sugita, entre
outras). Incisão cutânea em “C” invertido é feita cer-
ca de 2,5 a 3,5 cm medialmente à mastóide, contem-
plando uma altura que vai da extremidade superior
do pavilhão auditivo aos processos espinhosos de
C1 ou C2. Realiza-se a dissecção dos componentes
cutâneo e muscular em plano único, expondo-se a
mastóide. A craniotomia ou craniectomia deve ser
feita de forma a expor a borda inferior do seio trans-
verso e a borda medial do seio sigmóide. A abertura
B dural é feita nos sentidos medial-lateral e inferior-
superior (correspondentes aos seios venosos). Após
ancoragem dural com fio de Prolene® 4-0 ou 5-0,
pode-se fazer delicada tração do hemisfério cerebe-
lar no sentido látero-medial, permitindo-se a visua­
lização da cisterna pontocerebelar com seus com-
ponentes, forame de Luschka e sulco pontobulbar.
Lesões aí localizadas, especialmente neurinomas do
acústico4,6-8, meningiomas, cistos dermóides e epi-
dermóides, metástases etc. podem ser ressecados por
essa via, sendo possível, inclusive, entre outras coi-
sas, com o auxílio da monitoração intra-operatória
do potencial evocado somatossensorial e auditivo, a
preservação da acuidade auditiva, a despeito do ta-
manho do tumor.
Fig. 35.4 – (A) Craniotomia de fossa posterior. (B) Detalhe
do flap ósseo.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Acesso Suboccipital Paramediano Acesso Suboccipital Mediano


Do ponto de vista acadêmico, o acesso suboccipital A incisão é feita medialmente, em geral do ínion
paramediano compreende os acessos paramediano su- até a região correspondente ao processo espinhoso
perior (ou supracerebelar) e paramediano inferior9. de C2 ou C3. Com o auxílio de gelpes superficiais,
afastam-se as bordas cutâneas (pele, tecido celular
Acesso Suboccipital Paramediano Superior subcutâneo e gordura). Recomenda-se a identifica-
ção e abertura da fáscia entre os feixes musculares
(Supracerebelar) direito e esquerdo, havendo, com isso, menor san-
O resultado final desse acesso é a exposição gramento. Progressivamente, na medida em que a
confortável da porção superior dos hemisférios ce- abertura é aprofundada, tornam-se necessários gelpes
rebelares e verme, regiões mesencefálicas dorsal e profundos. Com o auxílio do monopolar, por sua vez,
dorsolateral e áreas parapineais. A incisão cutânea descolam-se as fibras musculares do osso occipital e
linear estende-se mais ou menos de 3 cm acima e dos processos espinhosos e lâminas de C1 e/ou C2,
pouco lateral à protuberância occipital externa até 6 estando contra-indicado o seu uso nas regiões próxi-
a 8 cm da base do occipício, usualmente cruzando o mas à junção craniocervical, evitando-se, entre outras
plano entre a mastóide e a linha média. Realiza-se coisas, lesão térmica da membrana atlantoccipital e
dissecção em plano único, expondo-se inclusive uma de estruturas neurovasculares aí localizadas, preconi-
área acima do seio transverso. Com isso, procede-se zando-se a dissecção romba por meio de tesouras. A
à realização de trepanação 1,5 a 2 cm acima do seio craniotomia ou craniectomia deve estender-se rostral-
transverso e, com o craniótomo (após adequado des- mente 1 a 2 cm abaixo da tórcula e do seio transverso
colamento da dura), à realização de craniotomia, pri- e, lateralmente, 1 a 1,5 cm do seio sigmóide. A remo-
vilegiando toda a área exposta. Tumores das regiões ção óssea deve ser, ainda, estendida lateralmente aos
da pineal e dorsal mesencefálica com extensão infra- côndilos occipitais. A depender da extensão caudal do
tentorial e tumores da porção superior do cerebelo e tumor, pode também ser realizada laminectomia de
verme podem ser abordados por essa via após dre- C1 e/ou C210,11. Uma vez exposta a dura-máter, pros-
nagem liquórica da porção lateral da cisterna magna segue-se com a ancoragem lateral, bilateral desta (em
por meio de incisão dural inferior inicial e, secun- média, dois pontos de cada lado) que, preferencial-
dariamente, incisão dural unilateral, supracerebelar, mente, após troca de luvas por parte da equipe cirúr-
semilunar, com base voltada para o seio transverso. gica, deve ser aberta em cálice (em “Y”), sendo suas
Não há, nessa região, veias de drenagem do hemis- bordas reparadas com fios de Prolene® 4-0 ou 5-0.
fério cerebelar para o referido seio, enfatizando-se Em alguns pacientes, podem ser necessárias ligaduras
a presença de uma veia única em topografia do lobo proximal e distal do seio venoso mediano (occipital)
quadrangular posterior9. para que haja um mínimo sangramento. Estando ex-
posto o compartimento subdural, procede-se medial-
mente à abertura microcirúrgica da aracnóide (Fig.
Acesso Suboccipital Paramediano Inferior 35.5), com conseqüente abordagem da lesão tumoral.
Lesões intrínsecas da metade inferior dos hemis- Nessa etapa cirúrgica, pode ser necessária drenagem
férios cerebelares ou extrínsecas da região cerebelo- liquórica por meio da abertura da cisterna magna e/
pontina inferior podem ser ressecadas por essa via. A ou do sistema de derivação ventricular externa com
cabeça do paciente deve estar rodada 10° a 20° para o intuito de se ganhar espaço, manipulando-se menos
o lado ipsilateral, estando ainda levemente fletida. In- os hemisférios cerebelares (ver anteriormente).
cisão cutânea inicia-se 1 a 2 cm acima da linha nucal
superior, estendendo-se 5 cm inferiormente. Trepana-
ção inicial é feita na altura da incisão, 1 a 2 cm abai-
xo da referida linha nucal, realizando-se craniotomia
que privilegie o máximo possível a região lateral para
exposição adequada e ampla a posteriori da cisterna
cerebelopontina por meio da retração cerebelar late-
ral, obtida de modo confortável após drenagem de li-
quor da cisterna magna (incisão linear dural inferior).
O flap dural deve ser voltado para baixo, tendo sido
evitada, medialmente, a abertura do seio occipital.
Durante a etapa microcirúrgica, devem-se tomar cui-
dados no intuito de se proteger o IX, X e XI nervos
cranianos, bem como a artéria vertebral, a artéria ce- Fig. 35.5 – Abertura microcirúrgica da aracnóide com auxí-
rebelar póstero-inferior (PICA) e seus ramos9. lio de pinça e tesoura.

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35 – Tratamento Cirúrgico dos Tumores da Fossa Posterior

DETALHES TÉCNICOS MICROCIRÚRGICOS ral (debulking) no intuito de se colapsar o tumor, re-


RELACIONADOS A TIPOS duzindo-se a necessidade de retração cerebelar. Com
HISTOPATOLÓGICOS ESPECÍFICOS isso, é possível “dobrar” o tumor sobre ele mesmo,
realizando-se ressecção satisfatória, ressaltando-se a
Astrocitomas Pilocíticos Cerebelares necessidade de, muitas vezes, “liberá-lo” do véu me-
Após a abertura dural, as folhas do cerebelo de- dular superior com auxílio de aspiradores e bipolar5.
vem ser inspecionadas, uma vez que as que recobrem Na maioria dos meduloblastomas, o assoalho do
a cavidade cística estão geralmente afastadas e alar- quarto ventrículo não se encontra infiltrado. No en-
gadas. Após coagulação por meio da pinça de bipolar, tanto, devem-se procurar e ressecar remanescentes
deve ser feita uma incisão paralelamente às folhas tumorais na superfície inferior do verme cerebelar e
com o auxílio de bisturi com lâmina 15 ou 11. Uma em sua extensão ao véu medular superior, bem como
vez identificada e aberta a parede do cisto, a drena- qualquer aracnóide espessada suspeita.
gem do fluido xantocrômico tumoral leva ao relaxa-
mento imediato do cerebelo. A cura cirúrgica é obtida Ependimoma
quando se resseca a massa nodular com aspecto de
carne, localizada em uma das paredes do cisto, sen- De modo semelhante ao que foi exposto anterior-
do distinta do tecido cerebelar gliótico. Por medidas mente, após a abertura dural deve ser também feita
de segurança oncológica, sugere-se a ressecção com drenagem de liquor da cisterna magna para redução
margem de cerca de 0,5 cm da borda do referido nó- da pressão na fossa posterior. Separa-se e disseca-se
dulo mural5. a porção caudal do tumor que se encontra aderida,
muitas vezes, à junção cervicobulbar, sendo coloca-
dos cotonóides nas interfaces tumor/bulbo e tumor/
Meduloblastoma cisterna magna. Recomenda-se o afastamento lateral
Freqüentemente é possível, logo após a abertura de cada amígdala para que a cápsula do tumor possa
dural, visualizar o tumor abaulando a aracnóide, se- ser separada do cerebelo suprajacente, sendo tam-
parando as duas amígdalas cerebelares lateralmente. bém colocados cotonóides nesse plano de clivagem.
Procede-se à abertura da aracnóide (Fig. 35.6) sobre Procede-se à descompressão interna (esvaziamento)
a cisterna magna, havendo melhora das condições lo- tumoral por meio de bipolar, aspiradores comuns,
cais após a drenagem liquórica. Recomenda-se a se- pinça tumor e/ou aspirador ultra-sônico (Fig. 35.8).
paração do pólo inferior tumoral do bulbo por meio Uma vez originados do assoalho do quarto ventrícu-
de dissector. Após dissecção do assoalho do quarto lo, é freqüente a presença de remanescentes tumorais
ventrículo, este deve ser protegido por meio de co- aderidos, sendo de grande valia, no momento da sepa-
tonóides. Segue-se à identificação de um plano entre ração, a monitoração dos nervos cranianos baixos por
a cápsula lateral do tumor e o parênquima cerebelar, meio de potencial evocado, evitando-se, com isso, le-
devendo este também ser protegido por meio de coto- são de estruturas do tronco cerebral tais como o trígo-
nóides (Fig. 35.7). Orienta-se o esvaziamento tumo- no do facial e do vago, aí localizados5,11.

A B

Fig. 35.6 – (A e B) Ressecção microcirúrgica de meduloblastoma de fossa posterior. Abertura das traves de aracnóide (espessa-
das) para posterior retração lateral dos hemisférios cerebelares e exposição da lesão (mediana e inferior).

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

A B

Fig. 35.7 – (A e B) Separação da lesão do hemisfério cerebelar direito (periferia, interface tumoral) e, após sua ressecção, he-
mostasia com auxílio de Surgicel®.

A B

Fig. 35.8 – (A e B) Ependimoma de fossa posterior (visão microcirúrgica): lesão em topografia de IV ventrículo, sendo esva-
ziada no intuito de, com a redução, serem expostos os seus limites.

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Metástase Cerebelar REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


Muitas vezes a inspeção da superfície cerebelar não 1. Bruce JN, Stein BM. Infratentorial approach to pine-
revela a localização exata da lesão metastática, sendo al tumors. In: Wilson CB. Neurosurgical procedures.
Personal approaches to classic operations. Philadel-
necessário o uso da estereotaxia, neuronavegação ou
phia: Williams & Wilkins; 1992, p. 63-76.
ultra-sonografia intra-operatória. Uma vez identificado
2. Costa MO. Estudo por imagens convencionais e es-
o ponto onde a lesão está mais próxima da corticali-
pectroscopia de prótons por ressonância magnética
dade, deve-se fazer uma incisão (após coagulação, por dos tumores da fossa posterior da faixa etária pediá-
meio de bisturi lâmina 11 ou 15) paralela às folhas, trica. Radiol Bras. 2003;36(2):76.
com extensão de 1 a 1,5 cm. A retirada da lesão se faz 3. Greenberg MS. Handbook of neurosurgery. 6. ed.
na direção tecido normal–lesão, sendo esta separada New York: Thieme; 2005.
daquele com bipolar e aspirador microcirúrgico 5 ou 7, 4. McNatt SA, Giannotta SL. Angiomatous acoustic
colocando-se cotonóides nessa interface, com vistas à neuroma. In: Kobayashi S, editor. Neurosurgery of
hemostasia do leito, efetivada, por sua vez, com coagu- complex vascular lesions and tumors. New York:
lação (bipolar), Surgicel®, arista, entre outros. Quando Thieme; 2005, p. 149-51.
a metástase é volumosa e cística, a punção central e o 5. Meyer FB. Atlas de neurocirurgia. Acessos básicos
esvaziamento como etapa inicial auxiliam de modo sig- ao crânio e procedimentos vasculares. Rio de Janei-
nificativo na identificação da periferia e realização da ro: DiLivros; 2005, p. 225-94.
técnica cirúrgica adequada. Estando o cerebelo muito 6. Ojemann RG. Suboccipital approach to acoustic neu-
inchado ao final da microcirurgia, deve-se realizar plás- romas. In: Wilson CB. Neurosurgical procedures.
tica dural com pericrânio, fáscia lata ou sintéticos5. Personal approaches to classic operations. Philadel-
phia: Williams & Wilkins; 1992, p. 77-86.
7. Tamiya T, Ohmoto T. Total removal of a large ves-
Hemangioblastoma Cerebelar tibular schwannoma with hearing preservation. In:
Os hemangioblastomas da fossa posterior são os Kobayashi S, editor. Neurosurgery of complex vas-
tumores primários mais freqüentes em adultos, sendo cular lesions and tumors. New York: Thieme; 2005,
encontrados como casos esporádicos ou fazendo parte p. 152-5.
da síndrome de Von-Hippel Lindau. Na sua maioria, 8. Taneda, M. Removal of vestibular schwannoma in
estão associados com um grande cisto e um nódulo the internal auditory canal with the aid of neuroen-
mural extremamente vascularizado. As folhas cerebe- doscopy. In: Kobayashi S, editor. Neurosurgery of
complex vascular lesions and tumors. New York:
lares quase sempre estão alargadas e afastadas sobre o
Thieme; 2005, p. 156-8.
epicentro da lesão, sendo efetuada uma incisão de 1 a
9. Yasargil MG. Microneurosurgery of CNS tumors.
1,5 cm sobre uma dessas folhas, em sentido paralelo.
New York: Thieme; 1996, p. 29-68.
A drenagem do conteúdo cístico permite o relaxamen-
10. Ohata K, Takami T, Goto T. A case of cavernous he-
to do cerebelo. Trabalhando-se por dentro da cavidade mangioma in the brachium pontis. In: Kobayashi S,
cística, identifica-se o hemangioblastoma propriamen- editor. Neurosurgery of complex vascular lesions and
te dito (lesão nodular mural), sendo coaguladas e sec- tumors. New York: Thieme; 2005, p. 284-8.
cionadas as artérias nutridoras (interface), fazendo-se 11. Mizuno J, Nakagawa H. A large ependymoma with
a retração da lesão com auxílio de pinça tumor, aspi- intratumoral hemorrhage in the medulla oblongata.
radores microcirúrgicos 5 ou 7 e, com bipolar, sepa- In: Kobayashi S, editor. Neurosurgery of complex
ração da cavidade cística circunjacente. Hemostasia vascular lesions and tumors. New York: Thieme;
final com Surgicel® ou análogos e cotonóides5. 2005, p. 145-8.

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Meningiomas de Convexidade
Luis Renato Mello

INTRODUÇÃO I II III

O
s meningiomas que crescem na convexidade
são os mais freqüentes e de melhor prognós-
tico, uma vez que sua remoção completa,
junto com a dura-máter envolvida, é quase sempre
possível. Por essa razão, todo neurocirurgião de mé-
dia experiência já operou alguns casos, com poucas
dúvidas em relação às possibilidades de curar seu Fig. 36.1 – Desenho baseado na descrição de Cushing, mos-
paciente. No entanto, observando-se a literatura, nos trando os tipos de meningiomas: I – convexidade; II – paras-
sagitais; III – falcinos.
últimos 7 anos, não se encontrou nenhuma grande ca-
suística, específica de meningiomas de convexidade
(MC), que analisasse as variáveis que interferem no
resultado de seu tratamento, se operados com os re-
EPIDEMIOLOGIA
cursos atuais de diagnóstico e técnica cirúrgica. Mes- A incidência geral de meningiomas no Brasil é
mo sendo tumor benigno, muitas vezes seu tratamen- de 15% a 16%, entre todos os tumores cerebrais, e a
to apresenta algumas questões não respondidas, como compilação de várias estatísticas mundiais indica uma
o grau de edema peritumoral, a relação com as veias, incidência de 20% de meningiomas entre todos os tu-
o plano de clivagem, a infiltração cerebral, a capaci- mores intracranianos2. O cálculo para cada 100.000
dade de recorrência e sua atividade epileptogênica. O pessoas em Rochester Minnesotta foi de 7,3, incluindo
objetivo deste capítulo é tentar preencher tal lacuna, as necropsias, nas quais freqüentemente são achados
adicionando algumas idéias baseadas na experiência pequenos meningiomas. Em Manitoba no Canadá, em
do autor, tomando-se o cuidado de referir sempre o séries cirúrgicas, a incidência foi de 2,3 por 100.000
estado da arte na cirurgia desses tumores. habitantes3. Em 55 anos de observação epidemiológica
O termo “convexidade” foi proposto por Cushing na Dinamarca, Christensen et al. verificaram aumento
em 1922, no início de sua carreira, quando caracteri- da incidência de meningiomas intracranianos de 0,61
zou os meningiomas como parassagitais, de convexi- para 2,4 por 100.000 habitantes, demonstrando a me-
dade (Tipo I da Fig. 36.1) e de foice. Denominou tu- lhora dos meios diagnósticos. Os parassagitais são os
mores de convexidade aos que não têm contato direto mais freqüentes, seguindo-se os de convexidade com
com o seio sagital ou outros seios durais, alojam-se 15% entre todos os meningiomas4.
sobre o córtex e não se originam da dura-máter da A irradiação do crânio, mesmo em dose baixa,
base do crânio1. pode aumentar a incidência de MC com um tempo de

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

latência de 10 a 20 anos. Vírus que atuam no DNA, mais raramente. Ao longo do crescimento tumoral,
como o papovavírus, podem provocar crescimento de algumas alterações sensitivo-motoras se associam,
meningiomas e outros tumores em humanos. Fatores acompanhando os episódios convulsivos. A compres-
físicos, como eletricidade de alta tensão, uso de co- são do terceiro nervo craniano, pelo deslocamento
rantes para o cabelo e trauma cranioencefálico, não medial do lobo temporal, provoca estrabismo diver-
estão seguramente ligados ao aparecimento de tumo- gente e ptose palpebral, decorrentes do grande volu-
res em convexidade5. me assumido pela lesão, levando a risco de descom-
pensação da hipertensão intracraniana.
CLASSIFICAÇÃO Meningiomas de convexidade média, localizados
na área rolândica, manifestam-se por meio de sinto-
A classificação mais utilizada é a preconizada pela mas sensitivo-motores precoces. Em lesões de evo-
Organização Mundial da Saúde, que divide as lesões lução lenta nos idosos, pode-se encontrar hemiatro-
em: Grau I, definidas como tumores benignos sem fia associada a hemiparesia, muitas vezes atribuída
atipias ou mitoses; Grau II, com raras mitoses e algu- a seqüela de icto cerebral isquêmico. As crises con-
mas atipias celulares; Grau III, que são os anaplásicos vulsivas são freqüentes, porém a cefaléia é de menor
com mitoses numerosas, vascularização abundante e intensidade, uma vez que o volume alcançado pelos
presença de atipias celulares.
tumores dessa região é sempre menor, em virtude de
Outra maneira de agrupar os MC baseia-se na to- sua importância funcional. Dependendo da extensão,
pografia. Em 1938 Cushing e Eisenhardt propuseram se localizados na região parietal, determinam distúr-
a classificação em pré-coronal, coronal ou para-rolân- bios de campo visual pelo edema que se propaga até
dico e pós-coronal, em razão da sintomatologia apre- a região occipital.
sentada e conforme o grau de operabilidade, uma vez
MC posteriores incluem as lesões que comprimem
que lesões mais próximas à área rolândica têm sua
ressecção completa comprometida pela importância os lobos occipitais causando especialmente altera-
funcional da região1,2. Na prática clínica tal classifi- ções visuais, que variam desde quadrantanopsia até
cação não é utilizada por esse autor, privilegiando-se hemianopsia. Quando há invasão óssea nessa região,
a localização anatômica como referência para divi- algumas vezes crescem silenciosamente, invadindo a
dir em meningiomas de convexidade anterior, mé- fossa posterior e o seio transverso. Pela adaptação ao
dia e posterior. Por convexidade anterior entende-se crescimento lento e falta de recursos de investigação,
os situados nas regiões frontal e frontotemporal. Os alguns casos desse tipo de crescimento tumoral po-
situados nas áreas rolândica e parietal são denomi- dem levar à cegueira.
nados MC médios. Os temporais têm características Em algumas casuísticas, cerca de 20% dos menin-
próprias e são analisados isoladamente. Os localiza- giomas são achados incidentais, geralmente em ido-
dos na região occipital são os posteriores. Tumores sos, em que os tumores assintomáticos mais freqüen-
da convexidade da fossa posterior crescem na dura- tes são os de convexidade e de seio cavernoso6.
máter da escama occipital, envolvem por vezes o seio
transverso e não serão considerados neste capítulo. DIAGNÓSTICO POR IMAGEM
Na suspeita de lesão expansiva intracraniana, o
QUADRO CLÍNICO exame de imagem inicial deve ser a tomografia com-
Meningiomas frontais superficiais podem assumir putadorizada (TC), que irá mostrar a massa tumoral
grandes proporções antes de provocar manifestação ocupando espaço, cercada ou não de área hipoden-
neurológica. Freqüentemente apresentam cefaléia sa, de dimensões variáveis, que corresponde a ede-
como sintoma inicial, mas, em idosos, os distúrbios ma cerebral. A radiografia simples de crânio apre-
de conduta são muito comuns. A compressão pro- senta várias alterações, mas seu uso em semiologia
gressiva do tecido cortical determina fenômenos irri- para investigação de tumor cerebral deve ser abolido.
tativos, levando à epilepsia focal, que habitualmente O uso de contraste na TC provoca acentuação da le-
desencadeia a primeira visita ao médico. Perto dos 40 são, em razão da lentidão circulatória no interior do
anos de idade, quando a complacência ainda é baixa, tumor. A extensão do comprometimento ósseo é cla-
o crescimento tumoral pode manifestar mais preco- ramente demonstrada, informando se a lesão é única
cemente distúrbios de cognição, memória, concentra- ou múltipla (Figs. 36.2 a 36.4).
ção, convulsões e cefaléia. O edema cerebral associa- A angiografia cerebral digital com subtração é im-
do à lesão acentua as manifestações clínicas. portante para determinar a origem da vascularização
Na região temporal, o crescimento lento também tumoral. A injeção da carótida externa leva ao apare-
determina cefaléia, distúrbios de memória, alterações cimento de blush na área central do tumor, de tama-
de campo visual e crises convulsivas do tipo parcial nho variável, com esvaziamento lento (Figs. 36.5 a
simples ou complexa. Alucinações podem ocorrer 36.9).

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36 – Meningiomas de Convexidade

Fig. 36.5 – Meningioma cortical simulando hematoma sub-


dural quando injetado contraste na carótida interna.

Fig. 36.2 – Tomografia computadorizada de meningioma


temporal com edema moderado na porção medial. Esta pa-
ciente de 37 anos apresentou grave edema temporal no pós-
operatório decorrente de lesão venosa.

Fig. 36.6 – Contrastação acentuada da lesão pela injeção da


artéria carótida externa. Paciente no pré-operatório com pa-
resia de grau 3 no hemilado esquerdo, com déficit acentuado
após a remoção tumoral.

A identificação da origem meníngea ou pial/corti-


cal da vascularização do MC é importante na avalia-
Fig. 36.3 – Ressonância magnética mostrando dois menin- ção de operabilidade e quebra de barreira aracnóidea
giomas de convexidade em paciente de 34 anos, operada, 3
anos antes, de dois meningiomas parassagitais. Em razão de entre o tumor e o córtex. Meningiomas de convexida-
recidivas múltiplas, foi operada de nove meningiomas antes de de, vascularizados por ramos da carótida interna, apre-
ser submetida à radioterapia para controle de recorrência. sentam maior volume de edema cerebral peritumoral e
representam maior risco cirúrgico em relação a seqüe-
las funcionais. Quando há vascularização de origem
pial muito acentuada, deve-se cogitar a presença de
meningiomas atípicos ou hemangiopericitomas.
A ressonância nuclear magnética é o exame de
eleição para estudar os MC. Além da RNM conven-
cional, a espectroscopia de prótons e a difusão contri-
buem para maior exatidão do diagnóstico diferencial,
especialmente com tumores gliais. Na RNM conven-
cional os MC apresentam intensidade heterogênea,
variando conforme a presença de calcificações, hiper-
vascularização, cistos ou atipias histológicas (Figs.
36.5 a 36.7). Tipicamente é hipointenso em T1 e hi-
perintenso em T2, mais acentuadamente quando há
Fig. 36.4 – Portadora de meningioma com invasão óssea edema ao redor da lesão. Há grande hiperintensidade
frontotemporal esquerda. pela injeção do gadolínio. A extensão do envolvimen-

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

A B

Fig. 36.7 – (A e B) RNM de meningioma frontal.

Fig. 36.8 – Grande componente vascular meníngeo, proce- Fig. 36.9 – Não há componente vascular pial-cortical de-
dente da artéria meníngea média. monstrável à injeção da carótida interna.

to da dura-máter no local de inserção da lesão é deli- de convexidade e de fossa média8 e Ildan et al. con-
mitado pela RNM através do sinal da “cauda” do me- firmaram a ausência de plano de clivagem aracnóideo
ningioma (Figs. 36.14 e 36.15). A comparação entre a quando havia vascularização pial e cortical9.
arteriografia com subtração digital e a RNM é capaz Recursos de imagem tridimensional na ressonân-
de demonstrar coexistência de maior quantidade de cia magnética auxiliam na caracterização mais acura-
vascularização pial/cortical, com maior volume de da da relação anatômica do tumor com o seio sagital
edema peritumoral. Blitzer et al. demonstraram cor- (Fig. 36.16).
relação entre edema mais acentuado com maior quan- O estudo complementar por espectroscopia é im-
tidade de vasos de origem pial/cortical7. Tamya et al. portante para o diagnóstico diferencial em relação aos
verificaram maior volume de edema em meningiomas tumores gliais. A espectroscopia por RNM mostra pre-

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36 – Meningiomas de Convexidade

sença de alanina, concentração moderadamente eleva- rados em decúbito ventral, apoiando-se a cabeça na re-
da de colina e glutamato e baixa concentração de crea- gião frontal do lado contrário ao do tumor.
tina, n-acetil aspartato e lipídeos. Essas características A tricotomia deve ser local, realizada dentro da sala
ocorrem em cerca de 90% de meningiomas, mesmo de preparo cirúrgico, após a anestesia, embora alguns
quando são histologicamente atípicos (Fig. 36.17)10. autores recomendem não fazer tricotomia. A incisão
pode ser retilínea ou em forma de ferradura. Defen-
TÉCNICA OPERATÓRIA sores da incisão retilínea alegam maior simplicidade,
porém o afastamento dos bordos deve ser feito com
Critérios de Remoção ganchos pequenos, do tipo anzol, uma vez que afasta-
A remoção deve ser sempre completa, seguindo os dores autostáticos dificultam o isolamento adequado
critérios de Simpson, que indicam ressecção de Grau do campo operatório11. A incisão em ferradura possi-
bilita maior utilização do espaço e rebatimento do re-
I quando for extirpado o tumor de forma completa,
talho cutaneomuscular mais amplo, expondo-se o sítio
incluindo-se a dura-máter e o osso comprometidos.
presumível da lesão, de forma cuidadosa, preservando
Grau II corresponde à ressecção tumoral total e co-
o pericrânio para eventual plástica de dura-máter.
agulação de toda a dura-máter visivelmente compro-
metida. Grau III é a remoção macroscópica completa
do tumor intradural, mantendo-se intacta a dura-máter Craniotomia
comprometida e uma eventual porção tumoral extra- A craniotomia é ampla e sua extensão engloba toda
dural. Grau IV é a remoção parcial tumoral, deixan- a tumoração. Os orifícios de trépano são programados
do-se tumor intradural. Grau V é a simples descom- conforme a extensão da lesão, geralmente em número de
pressão tumoral, com ou sem biópsia5. 4 a 5. Caso se aproxime da linha média, deve-se realizar
Recentemente foi proposta a adição de Grau 0, orifício mediano. Muitas vezes é mais prudente realizar
que se caracteriza pela ressecção total do tumor e orifício 1 a 2 cm contralateral à linha média, para se ter
da dura-máter adjacente, com 2 cm de margem de adequado controle do seio sagital durante a abertura.
segurança5,11, A pequena quantidade de séries relata- Para se interligar os orifícios, pode-se utilizar o
das, a maioria consistindo em tumores de convexi- craniótomo, que proporciona maior agilidade e rapi-
dade, demonstrou menor índice de recidiva quando dez. Apesar dessas vantagens, o autor prefere o uso
utilizada essa tática cirúrgica. da serra de Gigli, em vista da maior regularidade e
menor extensão do corte do osso obtidas por esse
Preparo, Posicionamento e Incisão antigo e barato instrumento. O efeito plástico após
a recolocação da pastilha óssea é sempre constante,
Todos os procedimentos diagnósticos devem ter não sujeito a oscilações determinadas pela espessura
sido completados e o paciente deve ser levado à sala variável das fresas dos craniótomos disponíveis no
cirúrgica acompanhado do prontuário completo, exa- mercado brasileiro.
mes pré-operatórios e de imagem, que serão afixados Muitas vezes o procedimento de elevação do osso
para consulta eventual durante o procedimento. deve ser realizado com rapidez em decorrência de
A sala de operações deve dispor de microscó- sangramento epidural abundante, oriundo da vascula-
pio com equipamento de fotografia ou vídeo para rização meníngea do tumor. Caso haja lesão da dura-
documentação. O aspirador ultra-sônico é útil em máter no decorrer da craniotomia, esse sangramento
alguns casos, agilizando a ressecção de tumores de pode ser maior. O cirurgião deve ser ágil nessa fase
consistência fibrosa e elástica. Algumas lesões são da operação, retirando a pastilha óssea com cuidado,
endurecidas e só podem ser retiradas em bloco ou eliminando, a seguir, os focos de sangramento arte-
com pequena alça metálica de coagulação unipolar. rial ou venoso com o coagulador bipolar. Em deter-
Qualquer coagulação com alça metálica, próxima a minadas circunstâncias, o sangramento é violento, e
áreas eloqüentes, deve ser evitada. Ao contrário dos somente cessa com compressão digital ou introdução
meningiomas de base, a ressecção em bloco é mais de cotonóide entre o osso e a dura-máter, na altura do
comumente executada nos MC, porém nunca deve ser vaso sangrante, promovendo compressão suficiente
a meta ideal do cirurgião. para a hemostasia.
No início do procedimento cirúrgico deve-se injetar O sangramento abundante de meningiomas hiper-
manitol 20%, até 2 g por kg, em bolo, para reduzir o vascularizados pode ser controlado com embolização
volume intracraniano e proporcionar cérebro mais rela- pré-operatória de ramos da carótida externa, com
xado. A posição ideal é o decúbito dorsal, com a cabe- microcateteres pelos quais é injetado polivinil ál­cool
ça rodada, elevada acima do átrio direito e posicionada isoladamente ou associado a molas destacáveis de
de tal forma que a região a ser operada esteja em nível Guglielmi (GDC). A cirurgia deve ser realizada após
mais alto que as outras regiões do crânio (Fig. 36.18). 24 horas do procedimento para que o efeito da embo-
Meningiomas parietais e occipitais são mais bem ope- lização seja mais eficiente12,13.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Caso o tumor envolva isolada ou associadamente seio esfenoparietal, aderida à veia que drena o lobo
o osso, devem ser tomados alguns cuidados cruciais temporal (Figs. 36.24 e 36.25). O estudo angiográfico
durante a craniotomia. Vários orifícios devem ser prévio e a atenção na dissecção final, antes da retirada
rea­lizados em torno da área afetada, a uma distância em bloco, podem evitar uma evolução pós-operatória
mínima de 2 cm da borda tumoral presumida. A inter- desastrosa.
ligação é realizada com serra de Gigli ou craniótomo, Quando os tumores invadem o tecido cerebral, ra-
conforme a preferência do cirurgião. Durante a rea- mos da artéria cerebral média podem estar presentes
lização dos orifícios, o pó do osso pode ser coletado em seu interior e devem ser cuidadosamente iden-
a fim de ser colocado nos defeitos ósseos, conforme tificados para evitar déficit neurológico pós-opera-
mostram as Figs. 36.4, 36.19 a 36.23. tório. Se houver invasão tumoral do osso, deve-se
Ao completar-se o isolamento da pastilha óssea, observar atentamente o estudo angiográfico e ver se
deve-se tomar cuidado no descolamento da dura- há vasos sylvianos transitando pela massa tumoral.
máter, já que, com muita freqüência, os meningiomas Com essa informação, deve-se tomar cuidado desde
que comprometem o osso estão aderidos ao córtex e a craniotomia até o total isolamento desses vasos,
seu descolamento, com manobras bruscas, pode de- prevenindo dano neurológico e até risco de morte
terminar lesão vascular grave, sangramento e isque- após a cirurgia.
mia irreversível. Uma vez verificado o local aderente
do tumor, isola-se com o craniótomo toda essa área,
a fim de deixá-la fixa, mobilizando o osso intacto já
destacado. Procede-se, a seguir, à abertura dural e, cui-
dadosamente, disseca-se em bloco a porção contendo
osso comprometido, dura e tumor, sob visão direta do
microscópio, evitando lesão tissular e vascular.

Abordagem da Lesão
A abertura da dura-máter é circunferencial, expon-
do toda a extensão tumoral. O rebatimento do retalho
dural será planejado conforme a disposição da lesão.
Em tumores próximos à linha média, recomenda-se
rebater para a linha média. Evitar aberturas em forma
de letra X e sempre recortar com 2 cm de distância
da porção dural envolvida por tumor, possibilitando
menor recorrência.
Na fase intradural, a lesão deve ser abordada com
uso de microscópio, mantendo-se sempre o plano
aracnóideo na dissecção, evitando-se lesar artérias Fig. 36.10 – TC de meningioma médio, localizado na área
e veias corticais. O plano de clivagem será mantido rolândica.
com o auxílio do estudo angiográfico seletivo e da
difusão por ressonância magnética pré-operatórios,
que auxiliam no diagnóstico de vascularização pial
e meníngea. Para seguir melhor o plano aracnóide,
traciona-se o tumor pela porção dural onde o me-
ningioma está aderido, seguindo-se com a coagula-
ção e corte das aferências vasculares, introduzindo
cotonóides úmidos para isolar a massa, culminan-
do com a retirada em bloco. Tumores muito san-
grantes, de grandes dimensões ou de consistência
amolecida, são retirados em pedaços (Figs. 36.10
a 36.13).
Durante essa fase, deve ser especial o cuidado no
manuseio das veias de drenagem, preservando seu tra-
jeto até os seios sagital e esfenoparietal. Meningiomas
laterais temporais, próximos ao ptério, considerados
muito fáceis pela maioria dos cirurgiões, apresentam
como armadilha a fase final da ressecção em bloco, Fig. 36.11 – Blush tumoral demonstrando participação me-
quando a veia de drenagem tumoral desemboca no níngea na vascularização.

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36 – Meningiomas de Convexidade

Fig. 36.12 – Ressecção em bloco, tracionando-se o tumor


pela área de implantação.

Fig. 36.14 – RNM de meningioma parietal de convexidade,


próximo à linha média.

Fig. 36.13 – Lesão após a remoção.

Fechamento Dural e Ósseo


A sutura dural raramente é fácil nos MC em fun-
ção da remoção da dura infiltrada. O melhor tecido
para a duraplastia ainda é a fáscia pericranial ou gálea
aponeurótica, possuidora de extensão suficiente para
a correção de defeitos pequenos e médios. Em gran-
des defeitos ou em reoperações, pode-se utilizar fás- Fig. 36.15 – Perfil mostra as “caudas” superior e inferior tu-
morais, provocadas pela extensão da invasão dural pelo tumor.
cia lata ou materiais sintéticos reabsorvíveis ou não,
existentes no mercado. Dura-máter liofilizada não
tem sido mais empregada pelo risco de transmissão
da doença de Kreutzfeldt-Jacobs.
A reposição do osso é convencional na maio-
ria dos casos, sempre que não tenha havido invasão
óssea. Em casos de ressecção óssea, a cranioplastia
pode ser imediata ou tardia. Este autor reserva o pó
do osso obtido durante a craniotomia com vários ori-
fícios, para suprir o defeito ósseo. Tal substituição fi-
siológica acarreta neoformação de osso sadio na área
descoberta, sem a inconveniência dos implantes sin-
téticos (Figs. 36.21 a 36.23). O material mais utiliza-
do para cranioplastia é o metacrilato em forma de pó
estéril, que polimeriza e se torna rígido, podendo ser
moldado por ocasião do fechamento ou tardiamente,
se houver alguma dificuldade com a hemostasia ou Fig. 36.16 – Imagem tridimensional de RNM, em que se ob-
edema cerebral. serva claramente não haver invasão do seio sagital pelo tumor.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Fig. 36.17 – Espectroscopia de prótons por RNM mostrando


presença de alanina, moderada elevação da colina com baixa
concentração de creatina, N-acetil aspartato e lipídeos.

Fig. 36.20 – Envolvimento da dura-máter da transição da fos-


sa média com a fossa posterior, incluindo-se o seio transverso.

Fig. 36.18 – Posicionamento correto da cabeça, com o local


da cirurgia mais elevado que o átrio direito e que o restante
do crânio.

Fig. 36.21 – Técnica cirúrgica para remoção de tumores com


invasão óssea. Craniotomia com vários orifícios interligados
com serra de Gigli. Observar o local da invasão ósseaindicado
pelas setas.

Fig. 36.19 – RNM de paciente com múltipla invasão óssea Fig. 36.22 – Remoção com o craniótomo da porção do osso
tumoral nas regiões frontal e temporal posterior. invadida pelo tumor.

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36 – Meningiomas de Convexidade

Fig. 36.23 – Recolocação do osso após a remoção da lesão


e plástica de dura-máter com pericrânio. Observar a utiliza-
ção do pó de osso obtido durante a confecção dos orifícios de
trépano (setas demarcam a extensão do defeito ósseo).

Fig. 36.25 – Preservação da veia após a ressecção tumoral


(setas).

COMPLICAÇÕES PÓS-OPERATÓRIAS
A freqüência de problemas no pós-operatório rela-
ciona-se aos cuidados durante as diversas fases da téc-
nica cirúrgica. Na maioria dos casos há boa evolução.
A complicação mais temida é a acentuação do defeito
neurológico no pós-operatório imediato, situação que
pode ser provocada pela presença de hematoma no leito
tumoral ou no espaço epidural, edema cerebral localiza-
do ou efeito da manipulação cirúrgica da área tumoral.
Ao se detectar a piora neurológica, uma TC de
emergência esclarecerá o caso. Quando presente, o
hematoma deverá ser imediatamente operado. Se
houver edema cerebral, o paciente deverá ser mantido
entubado com sedação e ventilação mecânica, sendo
medicado com manitol em doses de 1 g por kg a cada
6 horas até resolução do edema. Deve-se recomendar
fisioterapia intensiva desde o início para acelerar a re-
cuperação funcional.
A profilaxia rotineira pós-operatória com anticon-
vulsivantes evita o aparecimento de crises convulsi-
Fig. 36.24 – Foto pré-ressecção do tumor descrito na Fig. vas imediatamente após a cirurgia. O uso judicioso
36.16, observando-se veia de drenagem (setas). de heparina ou derivados, iniciado 24 horas após a ci-

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

rurgia, previne o aparecimento de tromboses venosas e, como a melhor opção, somente a remoção total
ou tromboembolismo pulmonar. Cefazolina, na dose (77%). Ao contrário de outros autores liderados por
de 1 g para indução anestésica e ao final do procedi- Al Mefty5, que detectaram ausência de recidiva em
mento, prolongando-se a cada 6 h nas primeiras 24 h, meningiomas de convexidade com remoção Grau 0,
previne eventos infecciosos no sítio cirúrgico. esses autores observaram que a localização na base
Os cistos liquóricos pós-operatórios, verificados do crânio estava associada a maior sobrevida em re-
abaixo do retalho de pele, devem ser tratados de forma lação à convexidade. A metodologia complexa des-
conservadora, com curativos compressivos, evitando- se estudo estatístico certamente prejudicou a análise
se a punção. Caso se refaça apesar de compressão ou da variável localização do tumor14. Resultado mais
poucas punções, deve-se verificar como está o local consistente obtiveram Palma et al., ao estudar 71
da cirurgia por meio de TC de controle e exame do meningiomas atípicos e anaplásicos, detectando so-
liquor retirado. Infecções meníngeas e hidrocefalia brevida geral, em 5 e 10 anos, de 95% e 79% res-
são as causas mais comuns da manutenção dos cistos pectivamente. Na análise multivariada desse grupo,
e deverão ser tratadas adequadamente. os autores puderam perceber que meningiomas de
Em muitos casos operados, surge epilepsia não convexidade atípicos e malignos atingiram melhor
existente antes da operação. Embora o uso da micro- resultado pelo fato de que um maior número de ca-
cirurgia nos anos recentes tenha reduzido a incidência sos pode ser submetido a ressecção completa tipo
de crises convulsivas pós-operatórias, autores como Simpson Grau I16.
Lieu e Howny, verificaram que meningiomas de con-
vexidade com edema grave provocam mais epilepsia RADIOCIRURGIA EM TUMORES DE
que outras localizações. Cerca de 60% dos portado- CONVEXIDADE
res de epilepsia têm suas crises controladas após a
cirurgia. Aproximadamente um quinto dos casos sem Tumores recidivantes ou múltiplos de convexi-
epilepsia prévia desenvolveram epilepsia após a res- dade são de difícil tratamento com cirurgia e vários
secção e 70% destes controlaram suas crises após 1 estudos confirmam a resposta à radioterapia conven-
ano de tratamento14. Por essa razão, recomenda-se cional, reduzindo a recorrência. Os tumores menín-
uso de medicação anticonvulsivante como difenil-hi- geos para os quais a radioterapia é mais preconizada
dantoína, 200 mg ao dia, durante um período mínimo são os da base do crânio, com anaplasia ou em pa-
de dois anos, com controles eletroencefalográficos cientes com estado clínico comprometido para sub-
perió­dicos. A medicação poderá ser suspensa após meter-se à cirurgia, raramente como primeira opção
esse período, com a ressalva de que nova crise deter- terapêutica. Recentemente foram publicadas séries
minará tratamento mais prolongado. de casos tratados com radiocirurgia estereotática,
em que se incluem casos de tumores de convexi-
dade em 7% a 10% dos casos relatados, com 80%
RESULTADOS TARDIOS E RECORRÊNCIA de controle de crescimento tumoral. A inclusão de
Estudos direcionados especificamente à recor- tumores de convexidade para radioterapia deve ser
rência de meningiomas de convexidade são escassos sempre criteriosa e considerada como recurso acei-
nos últimos 7 anos. As curvas de sobrevida e recor- tável somente em tumores múltiplos, recidivantes e
rência são estimadas em relação ao comportamento com anaplasia17.
biológico do tumor, analisando-se conforme os me-
ningiomas sejam benignos, atípicos ou anaplásicos, ANGIOGÊNESE E EDEMA CEREBRAL EM
de acordo com a classificação da Organização Mun- MENINGIOMAS DE CONVEXIDADE
dial da Saúde. A estatística de sobrevida de menin-
giomas mais completa foi a realizada por McCarthy A presença de edema cerebral associado aos MC
et al.15, em 1998, baseada em mais de 9.000 casos correlaciona-se com vascularização pial, procedente
procedentes do National Cancer Data Base (NCDB), da artéria carótida interna, determinando dificuldades
agrupando meningiomas de convexidade junto com na manutenção do plano aracnóide durante a dissec-
os parassagitais e falcinos. Interpretou os resultados ção tumoral7-9. Além de fatores vasculares, estudos
de acordo com o tratamento realizado somente com demonstram aumento de fatores de angiogênese, as-
cirurgia, cirurgia e radioterapia adjuvante, somente sociado a tumores com maior quantidade de edema,
radioterapia ou nenhum tratamento. Analisando a representados pelo aumento de mediadores químicos,
sobrevida dos meningiomas intracranianos em ge- como o fator de crescimento do endotélio vascular
ral, os autores observaram, em 5 anos, pior resulta- (VEGF). Analisando vários tipos de localização de
do nos casos submetidos somente à radiação (25%), meningioma e comparando a quantidade de edema,
seguindo-se aqueles sem nenhum tratamento (50%), Souto et al. demonstraram que os MC ocupam, jun-
remoção parcial e irradiação (65%), remoção total tamente com os parassagitais, a quarta colocação em
e irradiação (57%), somente remoção parcial (75%) relação à presença de edema, sendo superados em or-

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36 – Meningiomas de Convexidade

dem decrescente pelas localizações na pequena asa,


goteira olfatória e foice. Dos 21 tumores submetidos
a técnicas imuno-histoquímicas, 11 tinham expressão
aumentada de VEGF18.

FORMAS RARAS DE MENINGIOMAS DE


CONVEXIDADE
Meningiomas Císticos
Podem ocorrer cistos com relativa freqüência em
torno de meningiomas, porém raramente ocorrem
dentro do tumor, levando à confusão diagnóstica com
tumores gliais e metástases. As localizações preferen-
ciais da forma cística são a convexidade e, mais rara-
mente, a pequena asa do esfenóide, em uma percen-
tagem total de cerca de 5%. Clinicamente apresentam
evolução lenta, com distúrbio de comportamento, Fig. 36.27 – Aspecto cirúrgico em que se observam grumos
convulsões e alterações sensitivo-motoras. A tomo- tumorais amolecidos que circundavam o cisto. Este paciente
grafia computadorizada e a ressonância magnética de 67 anos foi reoperado 2 anos após por recidiva tumoral.
mostram lesão cística próxima à dura-máter, com ou
sem acentuação pelo uso de contraste. Meningiomas Secretantes
A remoção deve ser completa tanto do tumor
como da parede do cisto, observando-se células tu- São formas raras de meningioma, de predomínio
morais em ambos os locais. Os pacientes devem ser na convexidade frontal e na pequena asa do esfenói-
observados com TC de maior freqüência após a ope- de, ocorrendo mais raramente em outros locais Têm
ração, pelo fato de mostrarem tendência a recidivas predomínio absoluto em mulheres com idade média
mais precoces (Figs. 36.26 e 36.27)19. de 65 anos. A maior parte apresenta edema moderado
em torno da lesão à ressonância magnética e raramen-
te edema severo. A ressecção total não mostra maior
tendência à recorrência. No exame imuno-histo­
químico de todos os casos descritos houve reação po-
sitiva para antígenos de membrana epitelial (VEGF)
e carcinoembriogênico20.

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13. Bendszus M, Martin Schrader I, Schlake HP, Solymosi HM. Secretory meningiomas: clinical and imu-
L. Embolisation of intracranial meningiomas without nohistochemical observations. Neurosurgery.
subsequent surgery. Neuroradiology. 2003;45(7):451-5. 2001;48(2):297-302.

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37
Tratamento Cirúrgico dos
Meningiomas Parassagitais
Pedro Augustto de Santana Júnior (in memorian)
Paulo Henrique Pires de Aguiar

INTRODUÇÃO

E
m 1938, Cushing e Eisenhardt1 propuseram
subclassificar os meningiomas parassagitais em
pré-coronais, coronais, pós-coronais, paracen- Terço anterior
trais, parietais e occipitais, havendo, no entanto, nos
dias atuais2-5, uma tendência a criar classificações mais
simples e facilmente aplicáveis. Neste ínterim, surgem
os anteriores (localizados à frente da sutura coroná-
Terço médio
ria, incluindo os meningiomas do ptério, que crescem
principalmente em direção ao lobo frontal), os media-
nos (mais freqüentes, que compreendem os localizados
entre as suturas coronária e lambdóide, que mantêm
relação com a fissura rolândica e as áreas 1, 2, 3, 4 e 5
de Brodmann ou córtex sensitivo-motor primário) e os Terço inferior
posteriores (localizados em regiões parietal posterior e
occipital), enfatizando-se que, quando acometem mais
de um desses sítios, prepondera a região onde se en-
contra maior volume de tumor (Fig. 37.1). Percebe-se Fig. 37.1 – Divisão do seio sagital superior (SSS) em terços
que as classificações expostas não estabelecem parâ- anterior, médio e posterior.
metros que definam quando um meningioma é paras-
sagital falcino ou de convexidade junto à foice. Des- QUADRO CLÍNICO
sa forma, os autores deste capítulo propuseram nova
classificação dos meningiomas parassagitais6, que
Meningiomas Parassagitais Anteriores
considera, em conjunto, as extensões ântero-posterior Meningiomas dessa topografia costumam, por
e látero-lateral do tumor, seu nível de profundidade e o conta do grande volume que podem alcançar, asso-
grau de obstrução do seio sagital superior (SSS), per- ciando-se ao edema peritumoral, determinar sinais e
mitindo, entre outras coisas, adequado planejamento sintomas de síndrome de hipertensão intracraniana
do procedimento cirúrgico (Tabela 37.1). (SHIC), exemplificando-se por cefaléia, vômitos e

Tabela 37.1 – Classificação dos meningiomas parassagitais, proposta por Aguiar et al.6
Lateralidade hemisférica Segmentos do SSS Locais durais acometidos Grau de obstrução do SSS
1 (unilateral) a (anterior) I (ângulo parassagital) Ts (total)
2 (bilateral) b (médio) II (parede lateral do SSS + foice) Ps (parcial)
c (posterior) III (foice) Ns (lúmen livre)

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

papiledema. Déficits motores também são descritos, deste9,10. A TC de encéfalo é o exame isolado mais
acometendo preferencialmente face e membro supe- sensível, permitindo o diagnóstico, quando contrasta-
rior (lado contralateral à lesão). Quanto a alterações da, de aproximadamente 90% das lesões4. À RNM, os
cognitivas, habitualmente não determinam deteriora- meningiomas apresentam-se normalmente isodensos
ção mental, diferindo daqueles localizados no terço em relação ao cérebro, tanto em T1 quanto em T2. Por
anterior da foice ou na goteira olfatória. fim, a angiografia tem por finalidade não só demons-
trar a vascularização do tumor, mas também o envol-
Meningiomas Parassagitais Medianos vimento do seio sagital, sua patência, a relação do me-
ningioma com as veias corticais (dentre elas, a veia de
Neste contexto, prevalecem sinais e sintomas Trollard, que faz a drenagem da veia sylviana para o
precoces sensitivos e/ou motores, também podendo SSS, é a principal colateral), permitindo também, em
ocorrer crises epilépticas jacksonianas (acometendo alguns casos, a embolização pré-operatória11.
inicialmente a face ou a mão), ou distúrbios paroxís-
ticos ou definitivos da fala, quando localizados no he- TRATAMENTO E PROGNÓSTICO
misfério dominante (Fig. 37.2).
A adequada condução clínica dos pacientes no
pré-operatório é fundamental para que haja resulta-
Meningiomas Parassagitais Posteriores dos satisfatórios no intra e no pós-operatório. Ressal-
Meningiomas nessa localização podem determinar ta-se, por exemplo, a importância da introdução de
desde sinais e sintomas de SHIC até quadros visuais glicocorticóides (dexametasona) em altas doses, por
(hemianopsia homônima), além de sintomas sensiti- vários dias (uma semana em média) antes da cirur-
vos e/ou motores. gia, principalmente em pacientes com edema cerebral
peritumoral significativo. O uso de drogas antiepilép-
DIAGNÓSTICO ticas (especialmente a fenitoína) se faz obrigatório,
procurando-se evitar situações de aumento da pressão
O diagnóstico por imagem pode ser feito por meio intracraniana (PIC). O uso de manitol a 20% (1 g/
da radiografia simples, ultra-sonografia (Doppler), to- kg em 15 minutos) nas primeiras etapas da cranioto-
mografia computadorizada (TC), ressonância nuclear mia também é medida eficaz, facilitando-se a aber-
magnética (RNM) e/ou angiografia convencional. tura dural a posteriori, com manuseio facilitado do
A radiografia de crânio pode mostrar hiperostose parênquima encefálico em pacientes com hipertensão
(quase sempre da tábua interna), aumento da vascula- intracraniana significativa.
rização (especialmente no trajeto da artéria meníngea No pós-operatório, é essencial a realização de
média), calcificação (em torno de 18%) e destruição tomografia computadorizada sem e com contraste
óssea7,8. A ultra-sonografia com Doppler, método me- (quando possível), no intuito de se descartar presença
nos invasivo que a angiografia convencional, pode de coleções sangüíneas, entre outras complicações12,
ser realizada no intra-operatório para avaliação da principalmente em pacientes que não recobrem nível
permeabilidade do seio sagital superior, possibili- de consciência depois de cessado efeito anestésico,
tando melhor estimativa dos limites de preservação que apresentem déficits neurológicos focais e/ou cri-

A B C

Fig. 37.2 – (A a C) Meningioma mediano. Pela classificação de Aguiar et al.6, 2bIIps (bilateral, terço médio, parede lateral do
SSS + foice, obstrução parcial do seio).

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37 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas Parassagitais

ses epilépticas. A manutenção de corticóide5,13 com es- Meningiomas anteriores ou medianos podem ser
quema progressivo de desmame nas 72 h que sucedem ressecados estando o paciente em decúbito dorsal
o ato cirúrgico é válida na redução do edema vasogê- horizontal, com a cabeça levemente fletida sobre o
nico. Introdução de heparina de baixo peso molecular tronco, lateralizada, se necessário, para o lado oposto
profilática a partir do primeiro pós-operatório reduz o ao da lesão. Meningiomas posteriores, por sua vez,
risco de trombose venosa profunda (TVP) e trombo- podem ser abordados com o paciente em decúbito
embolismo pulmonar (TEP) em idosos e/ou pacientes ventral ou em três quartos prona. Independentemente
restritos ao leito por conta de déficits motores14,15. An- da posição, a cabeça deve ser fixada com o auxílio de
ticonvulsivantes são mantidos rotineiramente por pelo cabeceiras (Mayfield, Sugita, entre outras).
menos 6 a 12 meses após a cirurgia, principalmente em As incisões cutâneas variam desde a coronal clás-
pacientes que cursavam com crises epilépticas previa- sica (para os tumores mais anteriores), até aquelas em
mente ou nos portadores de meningiomas anteriores ferradura (para os meningiomas medianos ou poste-
ou medianos. Infarto venoso pode-se instalar como riores). O importante é que estas permitam a realiza-
conseqüência da coagulação inadvertida de veias im- ção de craniotomias que exponham adequadamente
portantes, ou até mesmo trombose do SSS, sendo, em tanto o seio sagital superior (a dissecção do tumor da
alguns casos, indicada craniectomia descompressiva foice próximo à linha média pode, entre outras coisas,
com plástica dural quando há importante desvio de levar à trombose sinusal por compressão do seio sagi-
estruturas da linha média por conta do inchaço desen- tal contra a borda da craniotomia, algo evitado quan-
cadeado pelo comprometimento da drenagem veno- do o retalho ósseo cruza transversalmente os limites
sa. Coleções subgaleais de líquido cefalorraquidiano medianos) quanto a superfície cortical adjacente e/ou
(LCR) podem ocorrer, sendo necessária drenagem lo- contralateral ao tumor. Infiltração da pele com solução
cal ou uso de cateter de derivação lombar externa por de lidocaína a 2% com vasoconstritor pode ser feita na
cerca de 5 a 7 dias com enfaixamento compressivo. Em marcação da incisão, com o intuito de diminuir perdas
alguns casos, faz-se necessária reabordagem cirúrgica sangüíneas da pele e subcutâneo, abundantes nos me-
para localização do sítio fistuloso com sua correção. ningiomas. Dá-se preferência ao emprego de pinças
Infecções são complicações inerentes a qualquer ato
Kelly para conter o sangramento das partes moles ex-
cirúrgico, destacando-se osteomielite ou as relaciona-
tracranianas, evitando-se ao máximo o uso de cautério
das ao flap cirúrgico, devendo-se descartar a presença
devido ao maior risco de necrose do couro cabeludo.
de meningite (coleta de LCR quando possível), reque-
rendo, muitas vezes, antibioticoterapia prolongada e/ Em meningiomas parassagitais com extensão in-
ou retirada do osso. tra e extracraniana (Fig. 37.3), a craniotomia deve ser
orientada por múltiplos orifícios de trepanação em
A recorrência e a epilepsia são os tópicos mais
abordados no quadro das complicações tardias, asso- torno do abaulamento tumoral extracraniano, unidos
ciando-se a primeira à histopatologia e ao grau de res- com o auxílio do craniótomo ou por meio de serra
secção tumoral (gradação de Simpson), sendo neces- de Gigli, deixando-se a porção medial para o fim,
sário o seguimento do paciente por meio de exames evitando-se, assim, um sangramento do seio inadver-
de imagem, em caráter ambulatorial, por pelo menos 5 tidamente logo no início da craniotomia.
anos16-18, estimando-se, por sua vez, uma incidência de Nos tumores paramedianos e medianos, a cranioto-
cerca de 48% de persistência de crises epilépticas em mia com trepanações além da linha média resulta em
indivíduos que com elas cursavam no pré-operatório e uma série de vantagens: o seio sagital pode ser clara-
de 80% caso tenha havido considerável manipulação mente visualizado; infiltrações podem ser extirpadas;
de grandes veias de drenagem cortical. Dessa forma, o seio, se necessário, pode ser reparado, facilitando o
a preservação dos vasos de drenagem parece reduzir o enxerto com veia por permitir a perfeita identificação
número de doentes com epilepsia no pós-operatório. dos cotos a serem refeitos19,21. Tantos furos quantos
necessários devem ser feitos, sendo efetuada a cra-
niotomia com todo cuidado, com curetas, passadores
TÉCNICA CIRÚRGICA PARA RESSECÇÃO de serra e serra de Gigli, com a finalidade de não le-
DOS MENINGIOMAS PARASSAGITAIS sar a dura-máter, o seio sagital superior nem o tumor
Como regra geral, considerando-se o posiciona- (geralmente aderido a essas estruturas), evitando-se
mento do paciente, o sítio tumoral deve corresponder sangramento abundante em hora inapropriada. Ao
ao ponto mais alto do crânio3,19,20. Uma vez estando a contrário dos da foice, os meningiomas parassagitais
cabeça mais alta do que o coração, há redução do san- já são visíveis na superfície, direcionando a abertura
gramento venoso intra-operatório (retorno facilitado dural, cuja base deve estar voltada para o seio sagital.
por ação da gravidade) com aumento, entretanto, do Na maioria dos casos não é possível a coagulação do
risco de embolia aérea, recomendando-se a monito- pedículo vascular de modo inicial (redução do supri-
ração por meio do Doppler e a passagem de acesso mento sangüíneo tumoral), preconizando-se a exposi-
venoso central para eventual aspiração de bolhas. ção de uma parte do tumor com separação deste e, por

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

conseguinte, do parênquima cerebral (delimitação do nóide e esvaziamento tumoral (debulking) por meio
plano de clivagem). Procede-se à coagulação (bipolar) de aspiração ultra-sônica ou técnica comum (se a con-
e luxação centrípeta da pseudocápsula (pinça tumor), sistência o permitir) ou com o uso de tesouras ou alça
dissecção progressiva da superfície tumor-pia a rac- monopolar quando endurecidos (Figs. 37.4 a 37.6).
A B C

Fig. 37.3 – (A a C) Paciente do sexo masculino, de 36 anos, com volumoso meningioma parassagital intra e extracraniano
(HCFMUSP).
A B

Fig. 37.4 – (A e B) Procedimento cirúrgico referente ao paciente das imagens apresentadas na Fig 37.3. Primeiramente, visão
do meningioma após ter sido rodado o flap cutâneo. Seqüencialmente, redução tumoral (componente extracraniano) com o
auxílio do monopolar.

A B

Fig. 37.5 – (A e B) Realização de múltiplos orifícios de trepanação ao redor do componente extracraniano. Confecção da cranio-
tomia, sendo o flap ósseo levantado progressivamente com o auxílio de goiva, expondo-se o componente intracraniano tumoral
e comprometimento significativo da dura-máter.

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37 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas Parassagitais

A B

Fig. 37.6 – (A e B) Imagem operatória após ressecção macroscópica total do tumor. Notar depressão cortical por conta do
efeito de massa exercido pelo tumor, além de preservação da drenagem venosa cortical. Por fim, aspecto final após hemostasia
do leito cirúrgico com auxílio de Surgicel®.

Nos tumores grandes e na maioria dos da foice, a gia (para tumores residuais ou recidivas de até 35 mm
porção mais inferior freqüentemente está relacionada de diâmetro médio e/ou quando há patência do SSS).
à artéria pericalosa, que, com cuidado, deverá ser dis- Dessa forma, o adequado conhecimento da anatomia
secada e separada da superfície tumoral. Por vezes, da região a ser operada, bem como dos passos cirúrgi-
há a ressecção da região da foice correspondente ao cos referentes à técnica preconizada, torna-se impres-
implante dural, ressaltando-se que se evita a remoção cindível para a obtenção de resultados satisfatórios.
total quando há invasão do seio sagital superior, es-
tando este ainda patente, à exceção se corresponder REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ao terço anterior que pode ser ligado e excisado jun-
tamente com o tumor sem comprometer a drenagem 1. Cushing H, Eisenhardt L. Meningiomas: their clas-
venosa a ponto de causar infartos cerebrais. Por outro sification, regional behavior, life history, and surgical
end results. Springfield: Charles C. Thomas; 1938.
lado, se houver recrescimento tumoral com trombose
lenta e progressiva do seio, será possível a remoção 2. Giombini S, Fornari, M. Convexity meningiomas. In:
Al-Mefty O, editor. Meningiomas. New York: Raven
“en bloc” do tumor e da porção sinusal não funcio- Press; 1991, chap. 27, p. 321-8.
nante, sem prejuízos adicionais ao paciente em decor-
3. Maxwell RE, Chou SN. Convexity meningiomas and
rência da readaptação vascular local (colaterais). general principles of meningioma surgery. In: Schim-
Depois de adequada hemostasia22 do leito tumo- idek HH, Sweet WH, editors. Operative neurosurgi-
ral (coagulação por meio do bipolar, Surgicel®, arista, cal techniques: indications, and methods. New York:
etc.), não se deve proceder ao fechamento dural sob Grune & Stratton; 1982, v. 1, p. 491-501.
tensão. Mesmo que esta seja mínima, prefere-se, nes- 4. Nakasu S, Hirano A, Shimua T, Llena JF. Inciden-
ses casos, realizar um enxerto dural, com pericrânio tal meningiomas in autopsy study. Surg Neurol.
ou fáscia lata se houver possibilidade de radiotera- 1987;27:319-22.
pia pós-operatória ou caso tenha havido embolização 5. Santana Jr PA, Nakagawa EY, Aguiar PHP. Meningio-
pré-operatória. Neste último caso, o risco de necrose mas parassagitais e de convexidade. In: Aguiar PHP,
do flap cirúrgico existe e, se evitarmos a utilização do Ramina R, Veiga JCE, Tella Jr O, editors. Meningio-
pericrânio, poderemos minimizar o risco de necrose mas. Diagnóstico e tratamento clínico e cirúrgico. As-
do couro cabeludo e adjacências. Nas situações em pectos atuais. Rio de Janeiro: Revinter; 2006, p. 103-7.
que o tumor tenha infiltrado a dura-máter e o osso, es- 6. Aguiar P, Santana P, Amorim R, Paiva W, Alho E.
Meningiomas que acometem o seio sagital superior:
tes deverão ser retirados e substituídos por materiais
proposta de uma nova classificação baseada nos seg-
alternativos, tais como patchs quando há comprome- mentos envolvidos e implicação prognóstica. In: Tra-
timento da dura (pericrânio, fáscia lata, análogos du- balho apresentado no XXXII Congreso Latinoame-
rais sintéticos etc.) e placas de titânio e metacrilato ricano de Neurocirurgía, 39 Congreso Argentino de
nos casos de infiltração óssea. Neurocirurgía, 2006; Buenos Aires, Argentina.
Nota-se que a ressecção completa do tumor é, sem 7. Camp JD. Significance of intracranial calcifications
dúvida, o tratamento mais eficaz, em comparação a in the roentgenolobic diagnosis of intracranial neo-
outras possibilidades de tratamento, como a radiotera- plasms. Radiology. 1950;53:639-68.
pia23 – geralmente indicada a pacientes com tumor re- 8. Heick A, Mossdal C, Jorgensen K, Kliniken L. Lo-
sidual ou aos que apresentam recidiva – ou radiocirur- calized cranial hyperostosis of meningiomas: a result

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

of neoplastic enzymatic activity? Acta Neurol Scand. 16. Chan RC, Thompson GB. Morbidity, mortality, and
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based on data from angiography and intraoperative 17. Skudas G, Tamasauskas A. Prognosis of the surgi-
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Rotta JM, Marino Jr R. Supratentorial meningiomas. New York; Thieme; 1996, p. 29-68.
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Tratamento Cirúrgico dos
Meningiomas Falcinos
Pedro Augustto de Santana Júnior (in memorian)
Paulo Henrique Pires de Aguiar

INTRODUÇÃO o discernimento entre eles, ressalta-se que 50% dos


meningiomas parassagitais estão secundariamente

O
s meningiomas falcinos, como a própria de- aderidos à foice1-3. Com o intuito de melhor definir
nominação já o diz, têm a sua origem (im- se um meningioma é puramente falcino (Figs. 38.1 a
plante) voltada à estrutura dural denominada 38.4), parassagital falcino ou de convexidade junto à
foice. Encontram-se com freqüência encobertos por foice, os autores propuseram uma classificação4 que
uma camada cortical, acometem preferencialmente considera, conjuntamente, diferentemente daquelas
um hemisfério cerebral, podendo, no entanto, crescer propostas por Cushing e Einsenhardt5 e por Brotchi6,
bilateralmente e, quando volumosos, por atingirem o as extensões ântero-posterior e látero-lateral do tu-
seio sagital superior, podem ser confundidos com os mor, seu nível de profundidade e o grau de obstrução
meningiomas parassagitais. Para dificultar ainda mais do seio sagital superior (SSS) (Tabela 38.1).

Tabela 38.1 – Classificação dos meningiomas parassagitais, proposta por Aguiar et al.
Lateralidade hemisférica Segmentos do SSS Locais durais acometidos Grau de obstrução do SSS
1 (unilateral) a (anterior) I (ângulo parassagital) Ts (total)
2 (bilateral) b (médio) II (parede lateral do SSS + foice) Ps (parcial)
c (posterior) III (foice) Ns (lúmen livre)

A B

Fig. 38.1 – Meningiomas puramente falcinos. Pela classificação proposta por Aguiar et al.4, em A está representado
um tumor III1 (falcino, unilateral) e em B um tumor III2 (falcino, bilateral). S = seio sagital superior; T = tumor.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Fig. 38.2 – Meningioma falcino. Tomografia computa- Fig. 38.3 – Meningioma falcino. Corte coronal de res-
dorizada de crânio, corte coronal, de paciente feminino, sonância nuclear magnética de paciente masculino, 52
50 anos, mostrando lesão com captação homogênea de anos, evidenciando lesão tumoral bilateral, que também
contraste, unilateral, deslocando a foice para a esquerda. apresentava captação homogênea de contraste.

Levando-se em conta que tanto os meningiomas (comprometimento dos lobos occipitais). Mais rara-
falcinos quanto os parassagitais estão relacionados mente, podem simular quadros clínicos compatíveis
direta ou indiretamente às estruturas durais da linha com acidente vascular isquêmico10, dor facial atípi-
média e que apresentam características outras em ca6 ou estar associados a sangramentos intracranianos
comum – são muito vascularizados, lobulados, bem – hematomas intraparenquimatosos11,12 ou hemor-
delimitados, exercendo efeito compressivo sobre o ragia subaracnóidea típica, secundária à ruptura de
parênquima encefálico adjacente – normalmente, por aneurismas7,13.
sua vez, são analisados em conjunto2,3,7,8.
DIAGNÓSTICO
QUADRO CLÍNICO O diagnóstico é feito preferencialmente por meio
O paciente com meningioma falcino geralmente de exames de imagem, destacando-se a tomografia
costuma procurar auxílio médico em razão de sinto- computadorizada (TC), que mostra lesões iso ou hi-
mas compatíveis com síndrome de hipertensão intra- perdensas na fase não contrastada, multilobuladas,
craniana (cefaléia, náuseas, vômitos, entre outros), adjacentes à foice, por vezes heterogêneas (presença
crises epilépticas parciais ou generalizadas – ocorren- de calcificações, necrose, degeneração cística, hipe-
do em cerca de 26% dos pacientes no pré-operatório, rostose etc.)11, com captação intensa de contraste8.
sendo mais freqüentes nos tumores que apresentam A ressonância nuclear magnética (RNM) evidencia
edema associado e naqueles de localização mais processos expansivos hipo ou isointensos em T1,
cortical5,9, déficits motores (hemiparesia contralate- hiper ou isointensos em T2, com captação uniforme
ral de predomínio crural nos tumores unilaterais e até de contraste, sendo freqüente o sinal da cauda dural,
mesmo paraparesia crural nos bilaterais) e/ou sensiti- correspondente à infiltração da dura-máter adjacente,
vos (especialmente nos meningiomas de terço médio além de ser mais bem visualizado o edema peritumo-
da foice por conta da sua íntima relação com os giros ral na seqüência FLAIR. Calcificações e hiperostose
pré e pós-central), déficits cognitivos (quadro demen- também podem ser bem evidenciadas à radiografia
cial), alterações lentas e progressivas da personalida- simples de crânio11,14. Nos tumores falcinos e paras-
de, incontinência urinária quando a lesão neoplásica sagitais, a patência do seio sagital superior e a relação
se localiza no terço anterior da foice (da crista galli destes com veias corticais (especialmente as veias
até a sutura coronária) e alterações do campo vi­sual de Labbé e Trollard) são informações extremamen-
quando o tumor se localiza no terço posterior da foice te importantes para o planejamento cirúrgico, justi-

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38 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas Falcinos

ficando-se a solicitação da angiografia convencional nos casos em que há importante nutrição tumoral ad-
(padrão-ouro) e/ou angiotomografia ou angiorresso- vinda de ramos da artéria carótida externa, pode vir
nância, sendo também de grande valia a avaliação a ser indicada embolização pré-operatória12, reduzin-
intra-operatória da patência do seio sagital superior do-se de modo significativo o sangramento durante a
por meio de ultra-sonografia4,16, evitando-se, entre as ressecção tumoral, o que torna a angiografia um pro-
complicações possíveis, o infarto venoso. Ademais, cedimento também terapêutico.

A B

C D

Fig. 38.4 – Paciente feminino, 50 anos, com diagnóstico à TC (A) e à RNM (B e C) de provável meningioma falci-
no, comprometendo ambos os hemisférios. TC pós-operatória (D) mostra bom resultado pós-operatório (ressecção
macroscópica total).

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

TRATAMENTO E PROGNÓSTICO considerando-se obviamente a técnica e a tática fami-


liares ao cirurgião3, o local onde haja uma menor dis-
O tratamento clínico consiste essencialmente na tância entre a neoplasia e o córtex deve corresponder
instalação de medidas que reduzam a pressão intra- ao ponto mais alto (posicionamento do paciente)1,3,22,
craniana, facilitem o manuseio cirúrgico das estru- reduzindo-se, com isso, o sangramento intra-operatório
turas encefálicas e que previnam complicações pós- pela melhora do retorno venoso, podendo ocorrer, no
operatórias. Nesse ínterim, destaca-se essencialmente entanto, embolia aérea, requerendo monitoração cau-
a administração de corticóides (no intuito de reduzir telosa de parâmetros gasométricos/hemodinâmicos por
o edema cerebral vasogênico peritumoral17; idealmen- parte do profissional anestesiologista, sendo de grande
te, se as condições clínicas do(a) paciente permitirem, valia o uso do Doppler contínuo intra-operatório.
altas doses de dexametasona – em torno de 24 mg/
Semelhantemente à abordagem dos meningiomas
dia – por cerca de 5 dias, em muito contribuiriam para
parassagitais, levando-se em conta as porções do seio
que houvesse um cérebro menos “friável” durante a
sagital superior, meningiomas anteriores ou medianos
manipulação operatória), anticonvulsivantes e manitol
podem ser ressecados, estando o paciente em decúbi-
a 20% (1 g/kg em 15 min, momentos antes da abertura to dorsal horizontal, com a cabeça levemente fletida
dural, em pacientes cuja pressão intracraniana aumen- sobre o tronco, lateralizada, se necessário, para o lado
tada dificultaria a performance cirúrgica inicial). oposto ao da lesão. Meningiomas posteriores, por sua
A realização de tomografia de crânio no pós-ope- vez, podem ser abordados com o paciente em decúbito
ratório imediato visa principalmente ao diagnóstico ventral ou em três quartos prona. Independentemente
precoce de coleções hemorrágicas e/ou sinais compa- da posição, a cabeça deve ser fixada com o auxílio de
tíveis com infarto venoso, podendo, nesse caso, vir a cabeceiras (Mayfield, Sugita, entre outras)1,2.
ser indicada craniectomia descompressiva. Sendo ne- As incisões cutâneas variam desde a coronal clás-
gativa para tal, procede-se à prescrição de heparina de sica (para os tumores mais anteriores), até aquelas em
baixo peso mediante a profilaxia de trombose venosa ferradura (para os meningiomas medianos ou poste-
profunda / tromboembolismo pulmonar13,18. É válida, riores). Infiltração da pele com solução de lidocaína a
ainda, a manutenção de corticóides em altas doses 2% com vasoconstritor pode ser feita na marcação da
nos três primeiros dias pós-operatórios, instalando- incisão, com o intuito de diminuir perdas sangüíneas
se esquema de redução progressiva que, por sua vez, da pele e subcutâneo, abundantes nos meningiomas.
pode ser concluído em nível ambulatorial (prevenção Dá-se preferência ao emprego de pinças Kelly para
de síndrome de Addison). Geralmente, os anticonvul- conter o sangramento das partes moles extracranianas,
sivantes devem ser mantidos por um período de, pelo evitando-se ao máximo o uso de cautério em razão do
menos, 6 meses, podendo ser progressivamente reti- maior risco de necrose do couro cabeludo. Sendo um
rados nos pacientes sem história de crises epilépticas tumor volumoso e/ou que acometa ambos os hemis-
e que não apresentaram complicações cirúrgicas, tais férios, idealmente se deve confeccionar craniotomia
como contusões por manipulação, entre outras. bilateral com o maior número possível de trepanações,
Inerente ao procedimento neurocirúrgico, podem visando-se adequado descolamento dural, expondo-se
advir coleções subgaleais / fístula liquórica incisional, o seio sagital superior, permitindo ainda menor retra-
podendo ser necessário o uso de cateter de derivação ção cerebral com conseqüente apresentação da foice
lombar externa ou a reabordagem cirúrgica. Infecções em etapas cirúrgicas posteriores, além de visualização
são outro tópico desagradável a ser sempre colocado, inicial da drenagem venosa cortical superficial para o
enfatizando-se a profilaxia (adequadas assepsia e an- referido seio. Uma vez retirado o flap ósseo, devem ser
tissepsia, entre outros) como elemento principal. coagulados a artéria meníngea média e seus ramos, di-
O prognóstico, não obstante a patologia em questão, minuindo-se parte do suprimento sangüíneo tumoral.
é avaliado mediante a classificação histopatológica do Na maioria dos casos não é possível, inicialmente,
meningioma (graus 1 a 3, OMS, 2000) e o grau de res- a coagulação do pedículo vascular principal (redução
secção cirúrgica. O acompanhamento seqüencial por considerável do suprimento sangüíneo tumoral), pre-
meio de ressonância nuclear magnética visa à detecção conizando-se a exposição de uma parte do tumor por
precoce8,19 de possível recorrência20. Nos meningiomas meio de retração do parênquima cerebral, idealmente
atípicos ou anaplásicos, que invadam estruturas sinu- feita em região pouco distante de qualquer veia em
sais e/ou cuja ressecção tenha sido parcial, justifica-se ponte calibrosa após dissecção da aracnóide e do cór-
a indicação de radioterapia pós-operatória21. tex cerebral adjacentes à referida estrutura vascular,
que, por sua vez, deve ser preservada, impedindo-se a
TÉCNICA CIRÚRGICA PARA RESSECÇÃO instalação de hiperemia, edema e sangramento22. Com
isso, procede-se à separação do tumor do parênquima
DOS MENINGIOMAS FALCINOS cerebral (delimitação do plano de clivagem), coagu-
Tendo-se como paradigma a remoção da maior lação (bipolar) e luxação centrípeta da pseudocápsu-
quantidade possível de tumor de modo seguro e rápido, la (pinça tumor), dissecção progressiva da superfície

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38 – Tratamento Cirúrgico dos Meningiomas Falcinos

tumor-pia aracnóide e esvaziamento da neoplasia (de- tensão. Mesmo que esta seja mínima, prefere-se, nes-
bulking) por meio de aspiração ultra-sônica ou técnica ses casos, realizar um enxerto dural, com pericrânio
comum (se a consistência o permitir), ou com o uso de ou fáscia lata se houver possibilidade de radioterapia
tesouras ou alça monopolar quando endurecidos (Figs. pós-operatória ou caso tenha havido embolização pré-
38.5 e 38.6). Estando o seio sagital acometido, pode operatória. Neste último caso, o risco de necrose do
ser feita sua ligadura (porção anterior) ou ressecção da flap cirúrgico existe e, se evitarmos a utilização do pe-
porção invadida com realização de bypass com enxer- ricrânio, poderemos minimizar o risco de necrose do
to venoso (reconstrução), sem prejuízos adicionais24. couro cabeludo e adjacências. Nas situações em que
A porção mais inferior freqüentemente está relacionada o tumor tenha infiltrado a dura-máter e o osso, estes
à artéria pericalosa, que, com cuidado, deverá ser disse- devem ser retirados e substituídos por materiais alter-
cada e separada da superfície tumoral. nativos, como patchs quando há comprometimento da
Depois de adequada hemostasia do leito tumoral dura (pericrânio, fáscia lata, análogos durais sintéticos
(coa­gulação por meio do bipolar, Surgicel®, Arista® etc.) e placas de titânio e metacrilato nos casos de in-
etc.)25, não se deve proceder ao fechamento dural sob filtração óssea.

A B
Dura

Flap dura

SSS Seio sagital


superior

Foice

C D
Dura

Tumor

SSS

Tumor

Fig. 38.5 – Passos cirúrgicos na ressecção dos meningiomas falcinos23. (A) Após craniotomia parassagital, abertura
dural em arco voltado para o seio sagital, visualizando-se, após retração do parênquima, a foice. (B) Exposição mais
acurada do tumor, sua irrigação (falcina) e drenagem venosa local. (C) Coagulação das artérias nutridoras e dissec-
ção da interface tumor/foice. (D) Após desvascularização, debulking, facilitando-se, após esvaziamento, exposição
da superfície tumoral para sua adequada separação do parênquima encefálico.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

A B

C D

E F

Fig. 38.6 – (A) Após adequada abertura dural, colocação de Surgicel® sobre o seio sagital superior, permite-se, com
essa medida hemostática, melhor exposição da foice e do tumor, sendo possível, após coagulação das artérias nu-
tridoras, seu esvaziamento com auxílio de bisturi e pinça (B, C e D). Peça tumoral sendo ressecada “en bloc” (tumor
+ dura-máter infiltrada).

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Tratamento Cirúrgico dos
Meningiomas Falcinos
Pedro Augustto de Santana Júnior (in memorian)
Paulo Henrique Pires de Aguiar

INTRODUÇÃO o discernimento entre eles, ressalta-se que 50% dos


meningiomas parassagitais estão secundariamente

O
s meningiomas falcinos, como a própria de- aderidos à foice1-3. Com o intuito de melhor definir
nominação já o diz, têm a sua origem (im- se um meningioma é puramente falcino (Figs. 38.1 a
plante) voltada à estrutura dural denominada 38.4), parassagital falcino ou de convexidade junto à
foice. Encontram-se com freqüência encobertos por foice, os autores propuseram uma classificação4 que
uma camada cortical, acometem preferencialmente considera, conjuntamente, diferentemente daquelas
um hemisfério cerebral, podendo, no entanto, crescer propostas por Cushing e Einsenhardt5 e por Brotchi6,
bilateralmente e, quando volumosos, por atingirem o as extensões ântero-posterior e látero-lateral do tu-
seio sagital superior, podem ser confundidos com os mor, seu nível de profundidade e o grau de obstrução
meningiomas parassagitais. Para dificultar ainda mais do seio sagital superior (SSS) (Tabela 38.1).

Tabela 38.1 – Classificação dos meningiomas parassagitais, proposta por Aguiar et al.
Lateralidade hemisférica Segmentos do SSS Locais durais acometidos Grau de obstrução do SSS
1 (unilateral) a (anterior) I (ângulo parassagital) Ts (total)
2 (bilateral) b (médio) II (parede lateral do SSS + foice) Ps (parcial)
c (posterior) III (foice) Ns (lúmen livre)

A B

Fig. 38.1 – Meningiomas puramente falcinos. Pela classificação proposta por Aguiar et al.4, em A está representado
um tumor III1 (falcino, unilateral) e em B um tumor III2 (falcino, bilateral). S = seio sagital superior; T = tumor.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Fig. 38.2 – Meningioma falcino. Tomografia computa- Fig. 38.3 – Meningioma falcino. Corte coronal de res-
dorizada de crânio, corte coronal, de paciente feminino, sonância nuclear magnética de paciente masculino, 52
50 anos, mostrando lesão com captação homogênea de anos, evidenciando lesão tumoral bilateral, que também
contraste, unilateral, deslocando a foice para a esquerda. apresentava captação homogênea de contraste.

Levando-se em conta que tanto os meningiomas (comprometimento dos lobos occipitais). Mais rara-
falcinos quanto os parassagitais estão relacionados mente, podem simular quadros clínicos compatíveis
direta ou indiretamente às estruturas durais da linha com acidente vascular isquêmico10, dor facial atípi-
média e que apresentam características outras em ca6 ou estar associados a sangramentos intracranianos
comum – são muito vascularizados, lobulados, bem – hematomas intraparenquimatosos11,12 ou hemor-
delimitados, exercendo efeito compressivo sobre o ragia subaracnóidea típica, secundária à ruptura de
parênquima encefálico adjacente – normalmente, por aneurismas7,13.
sua vez, são analisados em conjunto2,3,7,8.
DIAGNÓSTICO
QUADRO CLÍNICO O diagnóstico é feito preferencialmente por meio
O paciente com meningioma falcino geralmente de exames de imagem, destacando-se a tomografia
costuma procurar auxílio médico em razão de sinto- computadorizada (TC), que mostra lesões iso ou hi-
mas compatíveis com síndrome de hipertensão intra- perdensas na fase não contrastada, multilobuladas,
craniana (cefaléia, náuseas, vômitos, entre outros), adjacentes à foice, por vezes heterogêneas (presença
crises epilépticas parciais ou generalizadas – ocorren- de calcificações, necrose, degeneração cística, hipe-
do em cerca de 26% dos pacientes no pré-operatório, rostose etc.)11, com captação intensa de contraste8.
sendo mais freqüentes nos tumores que apresentam A ressonância nuclear magnética (RNM) evidencia
edema associado e naqueles de localização mais processos expansivos hipo ou isointensos em T1,
cortical5,9, déficits motores (hemiparesia contralate- hiper ou isointensos em T2, com captação uniforme
ral de predomínio crural nos tumores unilaterais e até de contraste, sendo freqüente o sinal da cauda dural,
mesmo paraparesia crural nos bilaterais) e/ou sensiti- correspondente à infiltração da dura-máter adjacente,
vos (especialmente nos meningiomas de terço médio além de ser mais bem visualizado o edema peritumo-
da foice por conta da sua íntima relação com os giros ral na seqüência FLAIR. Calcificações e hiperostose
pré e pós-central), déficits cognitivos (quadro demen- também podem ser bem evidenciadas à radiografia
cial), alterações lentas e progressivas da personalida- simples de crânio11,14. Nos tumores falcinos e paras-
de, incontinência urinária quando a lesão neoplásica sagitais, a patência do seio sagital superior e a relação
se localiza no terço anterior da foice (da crista galli destes com veias corticais (especialmente as veias
até a sutura coronária) e alterações do campo vi­sual de Labbé e Trollard) são informações extremamen-
quando o tumor se localiza no terço posterior da foice te importantes para o planejamento cirúrgico, justi-

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ficando-se a solicitação da angiografia convencional nos casos em que há importante nutrição tumoral ad-
(padrão-ouro) e/ou angiotomografia ou angiorresso- vinda de ramos da artéria carótida externa, pode vir
nância, sendo também de grande valia a avaliação a ser indicada embolização pré-operatória12, reduzin-
intra-operatória da patência do seio sagital superior do-se de modo significativo o sangramento durante a
por meio de ultra-sonografia4,16, evitando-se, entre as ressecção tumoral, o que torna a angiografia um pro-
complicações possíveis, o infarto venoso. Ademais, cedimento também terapêutico.

A B

C D

Fig. 38.4 – Paciente feminino, 50 anos, com diagnóstico à TC (A) e à RNM (B e C) de provável meningioma falci-
no, comprometendo ambos os hemisférios. TC pós-operatória (D) mostra bom resultado pós-operatório (ressecção
macroscópica total).

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

TRATAMENTO E PROGNÓSTICO considerando-se obviamente a técnica e a tática fami-


liares ao cirurgião3, o local onde haja uma menor dis-
O tratamento clínico consiste essencialmente na tância entre a neoplasia e o córtex deve corresponder
instalação de medidas que reduzam a pressão intra- ao ponto mais alto (posicionamento do paciente)1,3,22,
craniana, facilitem o manuseio cirúrgico das estru- reduzindo-se, com isso, o sangramento intra-operatório
turas encefálicas e que previnam complicações pós- pela melhora do retorno venoso, podendo ocorrer, no
operatórias. Nesse ínterim, destaca-se essencialmente entanto, embolia aérea, requerendo monitoração cau-
a administração de corticóides (no intuito de reduzir telosa de parâmetros gasométricos/hemodinâmicos por
o edema cerebral vasogênico peritumoral17; idealmen- parte do profissional anestesiologista, sendo de grande
te, se as condições clínicas do(a) paciente permitirem, valia o uso do Doppler contínuo intra-operatório.
altas doses de dexametasona – em torno de 24 mg/
Semelhantemente à abordagem dos meningiomas
dia – por cerca de 5 dias, em muito contribuiriam para
parassagitais, levando-se em conta as porções do seio
que houvesse um cérebro menos “friável” durante a
sagital superior, meningiomas anteriores ou medianos
manipulação operatória), anticonvulsivantes e manitol
podem ser ressecados, estando o paciente em decúbi-
a 20% (1 g/kg em 15 min, momentos antes da abertura to dorsal horizontal, com a cabeça levemente fletida
dural, em pacientes cuja pressão intracraniana aumen- sobre o tronco, lateralizada, se necessário, para o lado
tada dificultaria a performance cirúrgica inicial). oposto ao da lesão. Meningiomas posteriores, por sua
A realização de tomografia de crânio no pós-ope- vez, podem ser abordados com o paciente em decúbito
ratório imediato visa principalmente ao diagnóstico ventral ou em três quartos prona. Independentemente
precoce de coleções hemorrágicas e/ou sinais compa- da posição, a cabeça deve ser fixada com o auxílio de
tíveis com infarto venoso, podendo, nesse caso, vir a cabeceiras (Mayfield, Sugita, entre outras)1,2.
ser indicada craniectomia descompressiva. Sendo ne- As incisões cutâneas variam desde a coronal clás-
gativa para tal, procede-se à prescrição de heparina de sica (para os tumores mais anteriores), até aquelas em
baixo peso mediante a profilaxia de trombose venosa ferradura (para os meningiomas medianos ou poste-
profunda / tromboembolismo pulmonar13,18. É válida, riores). Infiltração da pele com solução de lidocaína a
ainda, a manutenção de corticóides em altas doses 2% com vasoconstritor pode ser feita na marcação da
nos três primeiros dias pós-operatórios, instalando- incisão, com o intuito de diminuir perdas sangüíneas
se esquema de redução progressiva que, por sua vez, da pele e subcutâneo, abundantes nos meningiomas.
pode ser concluído em nível ambulatorial (prevenção Dá-se preferência ao emprego de pinças Kelly para
de síndrome de Addison). Geralmente, os anticonvul- conter o sangramento das partes moles extracranianas,
sivantes devem ser mantidos por um período de, pelo evitando-se ao máximo o uso de cautério em razão do
menos, 6 meses, podendo ser progressivamente reti- maior risco de necrose do couro cabeludo. Sendo um
rados nos pacientes sem história de crises epilépticas tumor volumoso e/ou que acometa ambos os hemis-
e que não apresentaram complicações cirúrgicas, tais férios, idealmente se deve confeccionar craniotomia
como contusões por manipulação, entre outras. bilateral com o maior número possível de trepanações,
Inerente ao procedimento neurocirúrgico, podem visando-se adequado descolamento dural, expondo-se
advir coleções subgaleais / fístula liquórica incisional, o seio sagital superior, permitindo ainda menor retra-
podendo ser necessário o uso de cateter de derivação ção cerebral com conseqüente apresentação da foice
lombar externa ou a reabordagem cirúrgica. Infecções em etapas cirúrgicas posteriores, além de visualização
são outro tópico desagradável a ser sempre colocado, inicial da drenagem venosa cortical superficial para o
enfatizando-se a profilaxia (adequadas assepsia e an- referido seio. Uma vez retirado o flap ósseo, devem ser
tissepsia, entre outros) como elemento principal. coagulados a artéria meníngea média e seus ramos, di-
O prognóstico, não obstante a patologia em questão, minuindo-se parte do suprimento sangüíneo tumoral.
é avaliado mediante a classificação histopatológica do Na maioria dos casos não é possível, inicialmente,
meningioma (graus 1 a 3, OMS, 2000) e o grau de res- a coagulação do pedículo vascular principal (redução
secção cirúrgica. O acompanhamento seqüencial por considerável do suprimento sangüíneo tumoral), pre-
meio de ressonância nuclear magnética visa à detecção conizando-se a exposição de uma parte do tumor por
precoce8,19 de possível recorrência20. Nos meningiomas meio de retração do parênquima cerebral, idealmente
atípicos ou anaplásicos, que invadam estruturas sinu- feita em região pouco distante de qualquer veia em
sais e/ou cuja ressecção tenha sido parcial, justifica-se ponte calibrosa após dissecção da aracnóide e do cór-
a indicação de radioterapia pós-operatória21. tex cerebral adjacentes à referida estrutura vascular,
que, por sua vez, deve ser preservada, impedindo-se a
TÉCNICA CIRÚRGICA PARA RESSECÇÃO instalação de hiperemia, edema e sangramento22. Com
isso, procede-se à separação do tumor do parênquima
DOS MENINGIOMAS FALCINOS cerebral (delimitação do plano de clivagem), coagu-
Tendo-se como paradigma a remoção da maior lação (bipolar) e luxação centrípeta da pseudocápsu-
quantidade possível de tumor de modo seguro e rápido, la (pinça tumor), dissecção progressiva da superfície

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tumor-pia aracnóide e esvaziamento da neoplasia (de- tensão. Mesmo que esta seja mínima, prefere-se, nes-
bulking) por meio de aspiração ultra-sônica ou técnica ses casos, realizar um enxerto dural, com pericrânio
comum (se a consistência o permitir), ou com o uso de ou fáscia lata se houver possibilidade de radioterapia
tesouras ou alça monopolar quando endurecidos (Figs. pós-operatória ou caso tenha havido embolização pré-
38.5 e 38.6). Estando o seio sagital acometido, pode operatória. Neste último caso, o risco de necrose do
ser feita sua ligadura (porção anterior) ou ressecção da flap cirúrgico existe e, se evitarmos a utilização do pe-
porção invadida com realização de bypass com enxer- ricrânio, poderemos minimizar o risco de necrose do
to venoso (reconstrução), sem prejuízos adicionais24. couro cabeludo e adjacências. Nas situações em que
A porção mais inferior freqüentemente está relacionada o tumor tenha infiltrado a dura-máter e o osso, estes
à artéria pericalosa, que, com cuidado, deverá ser disse- devem ser retirados e substituídos por materiais alter-
cada e separada da superfície tumoral. nativos, como patchs quando há comprometimento da
Depois de adequada hemostasia do leito tumoral dura (pericrânio, fáscia lata, análogos durais sintéticos
(coa­gulação por meio do bipolar, Surgicel®, Arista® etc.) e placas de titânio e metacrilato nos casos de in-
etc.)25, não se deve proceder ao fechamento dural sob filtração óssea.

A B
Dura

Flap dura

SSS Seio sagital


superior

Foice

C D
Dura

Tumor

SSS

Tumor

Fig. 38.5 – Passos cirúrgicos na ressecção dos meningiomas falcinos23. (A) Após craniotomia parassagital, abertura
dural em arco voltado para o seio sagital, visualizando-se, após retração do parênquima, a foice. (B) Exposição mais
acurada do tumor, sua irrigação (falcina) e drenagem venosa local. (C) Coagulação das artérias nutridoras e dissec-
ção da interface tumor/foice. (D) Após desvascularização, debulking, facilitando-se, após esvaziamento, exposição
da superfície tumoral para sua adequada separação do parênquima encefálico.

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A B

C D

E F

Fig. 38.6 – (A) Após adequada abertura dural, colocação de Surgicel® sobre o seio sagital superior, permite-se, com
essa medida hemostática, melhor exposição da foice e do tumor, sendo possível, após coagulação das artérias nu-
tridoras, seu esvaziamento com auxílio de bisturi e pinça (B, C e D). Peça tumoral sendo ressecada “en bloc” (tumor
+ dura-máter infiltrada).

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Meningioma Torcular e Peritorcular
Marco Aurélio Marzullo

INTRODUÇÃO

H
erophilus estudou o cérebro, o cerebelo e os
ventrículos, distinguiu nervos sensitivos de
motores e ficou particularmente conhecido
pela descrição da tórcula que une os seios sagital su-
perior, reto e transverso e que atualmente leva o seu
nome1.
A tórcula de Herophilus aparece na porção inferior
do seio sagital superior, que se dilata e se une com o
seio reto. São freqüentes as variações na confluência
dos seios. Neste ponto, se originam os seios laterais
(transversos), que podem ser iguais bilateralmente,

Ilustração: Edson Pacheco.


maiores e abaixo do lado direito e faltarem, em al-
gumas ocasiões, do lado esquerdo. A tórcula situa-se
em um dos lados da protuberância occipital interna,
geralmente mais à sua direita2-5.
Meningiomas torculares foram descritos como en-
tidade individual por Cushing e Eisenhardt em 1938. Fig. 39.1 – Desenho mostra localização do meningioma tor-
Eles dividiram a área peritorcular em quatro quadran- cular e peritorcular.
tes como possível invasão de meningiomas: tentorial,
terço parassagital posterior, falcotentorial e fossa pos-
terior. Essa divisão dificulta o achado específico na MENINGIOMA TORCULAR E PERITORCULAR
literatura para tumor primitivo torcular6. A posição anatômica dos meningiomas segue a
Meningiomas adjacentes ou na confluência dos distribuição das vilosidades aracnóideas, portanto
seios correspondem a 1% a 4% dos meningiomas in- nesta ordem têm-se8,9:
tracranianos6 (Fig. 39.1). • Área parassagital.
Meningiomas nesta área levam os cirurgiões a um • Área cavernosa.
grande dilema, pois pode haver fragmentos que inva- • Tubérculo selar.
dem a tórcula com grande risco de recidiva. O trata-
• Lâmina crivosa.
mento é problemático. Se a remoção total ocorrer, os
seios venosos e as veias aferentes deverão ser poupados, • Forame magno.
senão complicações catastróficas poderão aparecer7. • Área da tórcula.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

A área da tórcula é a que menos apresenta implan-

Ilustração: Edson Pacheco.


tação de meningiomas, entretanto os parassagitais do
terço posterior podem expandir-se para essa região.
Há casos também de meningiomas que são da foice e
estão adjacentes à tórcula sem, entretanto, envolvê-la.
Seu crescimento é lento, há tempo de formação co-
lateral e dificilmente se encontram sinais clínicos de
insuficiência circulatória. Podem estar uni ou bilate-
rais, ficando a tórcula englobada na região central da
tumoração. Como crescem amplamente antes de apa-
recerem os sintomas neurológicos, torna-se difícil, às
vezes, estabelecer-se a origem, se no tentório, na foice,
no seio sagital, ou até mesmo na convexidade da dura-
máter. À medida que vai havendo invasão ou compres-
são pelo tumor, o retorno venoso fica comprometido. Fig. 39.2 – Desenho mostra envolvimento peritorcular pelo
Como mencionado, a evolução é lenta, havendo tem- meningioma.
po de formação anastomótica venosa entre as veias da
córtex com os seios. Quando isso ocorre, o prognóstico
cirúrgico melhora. A parte arterial que nutre o tumor
pode ser a mesma dos parassagitais do terço posterior
e da foice, que são ramos da artéria pericalosa e ramos

Ilustração: Edson Pacheco.


terminais da artéria cerebral média4,8-11.
Sindou usa uma classificação de invasão dos seios
que pode ser empregada também nesta área, depen-
dendo do envolvimento4,10,11.
• Tipo I: o tumor toca somente a parede externa.
• Tipo II: invasão de um lado (recesso lateral).
• Tipo III: a parede lateral e o teto são invadidos.
• Tipo IV: toda a parede lateral é invadida.
• Tipo V: a tórcula é ocluída, mas com uma parte
intacta.
• Tipo VI: totalmente ocluída e as duas paredes
comprometidas.
Sekhar usa uma classificação específica para me- Fig. 39.3 – Desenho mostra envolvimento ou invação par-
ningiomas na área peritorcular19. cial de tórcula pelo meningioma.
• Infratentorial: localizado na parte inferior da
tórcula, na superfície inferior do tentório, no
seio transverso e reto.
• Supratentorial: na parte superior da tórcula, na
superfície superior do tentório, no seio trans-
Ilustração: Edson Pacheco.

verso e sagital superior.


• Supra e infratentorial: normalmente tumores
gigantes.
Ilustramos nas Figs. 39.2 a 39.4 o envolvimento
na área peritorcular pelos meningiomas.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Em contraste com os tumores nos terços anterior e
médio, os do terço posterior e da tórcula apresentam
sintomas silenciosos, daí tornarem-se grandes no mo-
mento de sua detecção8,12.
• 36% cursam com cefaléia.
• 21% cursam com sintomas visuais. Fig. 39.4 – Desenho mostra invasão total de tórcula pelo
• 21% cursam com crises focais. menin­gioma.
• 21% cursam com alterações mentais.

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39 – Meningioma Torcular e Peritorcular

DIAGNÓSTICO POR IMAGEM o aportam. Há um retardo na drenagem venosa e uma


reversão do fluxo da circulação colateral13,14.
Radiografia
Em desuso nos dias atuais. Uma das característi- Ressonância Nuclear Magnética com
cas dos meningiomas é a ocorrência de hiperostose Espectroscopia e Funcional
decorrente de uma neoformação reativa no osso do
crânio. Esse processo acontece primariamente na tá- • Difusão: geralmente apresentam discreta res-
bua interna do crânio, no espaço diplóico e na tábua trição à difusão por se tratar de tumores de alta
externa, respectivamente. É mais comum nas porções celularidade.
finas, sendo um processo de depósito de laminas ós- • Perfusão: são tumores que apresentam alta
seas múltiplas e paralelas13. perfusão.
• Espectroscopia de prótons: por não se tratar
Tomografia Computadorizada de tumores neuronais, não apresentam pico de
N-acetil-aspartato (NAA) e creatinina. A pre-
Os meningiomas podem aparecer iso ou hiperden- sença de picos de alamina e glutamina não é
sos na fase sem contraste e se realçar intensamente com específica, porém altamente sugestiva de me-
o iodo, mostrando uma interfase nítida entre o tumor e o ningioma, que, por vezes, podem se apresentar
cérebro. Alterações na textura óssea podem ocorrer e são apenas por uns picos de lipídios-lactato. Há
mais bem visualizadas na TC do que na radiorafia12,13. também elevação da colina (o que é inespecífi-
co), pois ocorre em todos os tumores em razão
Angiografia do turnover da membrana.
É mais utilizada quando há necessidade e se co-
gita fazer embolização no pré-operatório. Determina PLANEJAMENTO CIRÚRGICO
o estado do seio e sua relação com as veias corticais. O planejamento pré-cirúrgico é indispensável para
Meningiomas são tumores ricamente vascularizados. um bom resultado operatório em neurocirurgia, prin-
A angiografia pode ajudar na verificação do tumor com cipalmente em meningiomas na região da tórcula e
a invasão do espaço subpial. Quando há vasos subpiais seios transversos. Calcular previamente o local em
irrigando a lesão, há indícios de que o plano de cliva- que deverá ser realizada a abertura do crânio (cranio-
gem deste com a superfície cerebral não seja perfeito9. tomia) reduz as chances de lesões iatrogênicas8,15-17.
A uni ou bilateralidade da localização do tumor, suas
Ressonância Nuclear Magnética relações com as artérias pericalosas, cerebral média
e seus ramos terminais, a topografia e a grandeza das
Ajuda no planejamento cirúrgico. A ressonância veias corticais, suas anastomoses e a permeabilidade
nuclear magnética (RNM), com ou sem contraste, dos seios também são de muita importância no planeja-
mostra com detalhes a relação do tumor com estruturas mento cirúrgico de tumores que invadem a tórcula.
vizinhas e realça, na fase contrastada, as infiltrações
da dura-máter pelo tumor. A despeito do tipo histoló- A abordagem dessa região exige um conhecimen-
gico, a maioria dos meningiomas é iso ou levemente to anatômico muito importante de vários pontos, tais
hipointenso em relação ao córtex cerebral, nos estudos como: ínion, astério, protuberância occipital externa
pesados em T1, embora o sinal nos cortes pesados em (POE), protuberância occipital interna (POI), linha
T2 seja variável. Podem apresentar-se com sinal se- nucal superior (LNS), inserção do músculo semi-
melhante ao da cortical óssea em todas as seqüências espinhal da cabeça (MSC), são de suma importância
quando calcificados. Quase todos os meningiomas se para conhecimento do trajeto do seio transverso e da
reforçam rápida e intensamente com o uso de contras- localização da tórcula6,18-20.
te. As veias de drenagem e os vasos piais dilatados Gusmão, em sua publicação Pontos referenciais
e deslocados podem ser marcantes. É recomendável nos acessos cranianos, descreve o ponto paratorcular
fazê-la em três planos (axial, coronal e sagital). Mos- superior que se localiza imediatamente superior e late-
tra também a permeabilidade dos seios9,12-14. ral ao ínion (ápice da protuberância occipital externa).
Internamente corresponde ao ângulo formado pela
união dos seios sagital superior e seio transverso.
Angioressonância O ponto paratorcular inferior localiza-se imedia-
Mostra a permeabilidade dos seios sagitais supe- tamente inferior e lateral ao ínion, correspondendo
rior, inferior, reto e transversos e suas relações com internamente ao ângulo formado pela união dos seios
as artérias e veias adjacentes. A circulação colateral occipital e transversos15.
venosa secundária a uma oclusão do seio caracteriza- Há outros pontos conhecidos como uma linha tra-
se pela não-visualização de um segmento de um dos çada entre o ínion e o astério, que internamente cor-
seios e a falência das veias corticais de drenagem que responde ao trajeto do seio transverso.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

Para Tubbs, o ínion (parte central da POE) nem microscopia 2 cm por fora dos bordos tumorais, com
sempre é o local determinante para demonstrar a flaps de base para os seios. Coagulam-se os vasos da
união do seio transverso com a tórcula, pois alega dura que irrigam o tumor, com atenção especial em
que o ínion está abaixo da POI, onde comumente está preservar as veias aferentes aos seios, principalmen-
a tórcula. Também despreza como referência a LNS te na porção posterior do seio sagital superior, bem
e considera muito importante o ápice da inserção do como as localizadas no seio transverso e as corres-
MSC (Fig. 39.5) – à direita, tem uma média de 2,5 mm pondentes para veia de Labbé.
entre a inserção e o bordo inferior do seio transverso, Faz-se uma incisão na aracnóide (esses tumores
e à esquerda, uma média de 3,5 mm – para determinar estão separados do tecido cerebral pela aracnóide),
o bordo inferior do seio transverso no terço médio, estabelecendo um plano de clivagem entre o tumor
sendo a metade do seio correspondente à tórcula20. e o cérebro, o que evita entrar na pia-máter. Coagu-
Atualmente, tem-se a neuronavegação que ajuda lam-se e cortam-se os pequenos vasos, que se diri-
a localizar o tumor, demonstrar o envolvimento da gem aos tumores, preservando-se ao máximo os va-
dura-máter, localizar estruturas neurovasculares, de- sos corticais. Com o uso do aspirador ultra-sônico,
lineando, assim, o tamanho da craniotomia. esvazia-se o tumor internamente, exceto nos altamen-
te vascularizados6,21-23.
Descrição Cirúrgica Se os seios estão permeáveis, o tratamento pode
Tumores na região peritorcular podem ser aborda- ser limitado somente à microcoagulação em suas áreas
dos nas posições prona (concorde), semiprona, sen- de fixação. Para Al-Mefty, um seio completamente
tados ou semi-sentados, dependendo da preferência obstruído pode ser extirpado em qualquer localização,
do neurocirurgião. Nós preferimos a posição oblíquo- entretanto a preservação da circulação venosa é extre-
prona, descrita por Al-Mefty (Fig. 39.6), com o lado mamente importante, chegando a ser uma parte vital
mais afetado na parte mais baixa, de maneira que a da intervenção. Lembramos que fístulas liquóricas
gravidade ajude a retrair o cérebro e separá-lo suave- podem ocorrer quando uma parte do seio é extirpado
mente do tumor. A incisão cutânea é bilambdóidea. A em virtude da diminuição das vilosidades aracnói­
craniotomia pode ser occipital, suboccipital ou occi- deas. A possibilidade de uma oclusão tardia ocorrer
pital combinada, dependendo do local da lesão ultra- com um enxerto venoso é de 50%, por isso, às vezes,
passando a linha média (Fig. 39.7), permitindo, as- é melhor deixar a obstrução espontânea por restos tu-
sim, a visualização de ambos os lados do seio sagital morais aparecer e fazer nova intervenção. Deixar uma
superior e dos transversos, tomando o cuidado de não tira de tumor junto ao seio ou à tórcula e avaliar o
usar craniótomo sobre estes. Abre-se a dura-máter sob paciente periodicamente é uma conduta possível.

Ilustração: Edson Pacheco.


Borda inferior do
seio transverso
Inserção do músculo capitulus
Tórcula

Linha nucal superior

POI

Ínion

Fig. 39.5 – Desenho mostra a disposição dos músculos suboccipitais e os reparos ósseos.

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39 – Meningioma Torcular e Peritorcular

DISCUSSÃO – PROGNÓSTICO

Ilustração: Edson Pacheco.


Em linhas gerais, um meningioma não se recidi-
va se conseguirmos extirpar sua base de implantação.
Simpson alega que, quanto mais dura se extirpar ao
redor do tumor e quanto menos restos tumorais fica-
rem aderidos às partes venosas, menor será o risco de
recidiva. Ele relata que, na excisão total da fixação du-
ral, pode haver uma recidiva de 6% comparada com
a exérese total mais coagulação, na qual pode haver
recidiva de 16%. De maneira geral, deve-se considerar
um percentual de recidiva de 9% em 5 anos, percentual
que chega a quase 40% quando a extirpação não é to-
tal. A coagulação bipolar da zona de implantação pode
diminuir a recidiva. Discrepâncias ocorrem nas taxas
de recidivas e devem-se aos vários tipos histológicos
Fig. 39.6 – Desenho mostra o posicionamento do paciente existentes. Não há certeza da validade da radioterapia
para cirurgia. como coadjuvante no tratamento. Às vezes a recidiva
e o crescimento tumoral lento acarretam uma obstru-
Ilustração: Edson Pacheco. ção total do seio, e este é o momento das extirpações.
A tentativa de se extirpar todo o tumor, usando
as mais variadas técnicas como faz Sindou, que na
oclusão da tórcula usa um patch do seio sagital supe-
rior ao seio transverso, ou a jugular externa, além de
outros autores que, conforme retiram o tumor, abrem
o seio e posteriormente o suturam, ou bypass após
a extirpação são variantes técnicas existentes. Essas
variantes técnicas são de resultados duvidosos4,7,10,11.
Há um axioma que diz que as pessoas podem mor-
rer por um meningioma, porém também podem morrer
com um meningioma.
A neuronavegação estereotática já em uso, quan-
do em conjunto com a RNM transoperatória, em de-
senvolvimento, nos levará, em breve, à identificação
intra-operatória de estruturas vasculares, da perfusão,
de tecidos anormais e ao reconhecimento de áreas de
trato funcionalmente importantes1.

Fig. 39.7 – Desenho mostra a craniotomia proposta para


acessar a tórcula.

A região da tórcula sangra muito e usualmente


pode ser controlada com pressão direta, elevação da
cabeça e monitoração para embolia gasosa. Ultra-so-
nografia intra-operatória pode ser usada para verificar
a permeabilidade dos seios caso a angiografia tenha
sido insuficiente6,21,24.
Caso se resolva fazer enxerto no seio, é mais reco-
mendável usar a safena, obedecendo-se o sentido das
válvulas ou o uso da jugular, lembrando que o índice
de trombose com graves conseqüências é alto. Uma
vez retirado o tumor e feitas as hemostasias, fecha-
se a dura hermeticamente com enxerto de pericrânio,
fáscia lata ou qualquer outro material específico. Fe- Fig. 39.8 – RNM de encéfalo, em corte axial, que mostra lesão
cha-se a pele em dois planos9,17,25. expansiva de terço sagital posterior com invasão da tórcula.

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

B
Fig. 39.9 – RNM de encéfalo, em corte axial, que mostra
exérese total da lesão expansiva (meningioma).

Fig. 39.10 – RNM de encéfalo, em corte coronal, que mostra Fig. 39.12 – (A e B) RNM de encéfalo, em cortes sagital
lesão expansiva de terço sagital superior, com acometimento e axial, que revelou recidiva de meningioma parassagital em
da tórcula e seio transverso. terço posterior, com invasão da tórcula bilateralmente.

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Abscesso Cerebral
Carlos Umberto Pereira

INTRODUÇÃO anos, dos quais 25% destes são portadores de doença


cardía­ca congênita cianótica14-16. Acomete três vezes

C
onceitua-se abscesso cerebral (AC) como a co- mais o sexo masculino que o feminino, porém não
leção de material purulento no interior do pa- existe uma explicação para o fato2,13,17-19.
rênquima cerebral. O diagnóstico, tratamento e
prognóstico de pacientes com AC têm melhorado du-
rante as duas últimas décadas, fato devido ao avanço ETIOPATOGENIA
tecnológico, como uso de tomografia computadoriza- Os agentes infecciosos atingem o tecido cerebral
da (TC) e de ressonância nuclear magnética (RNM), por: (1) extensão direta, a partir de infecção nos seios
que tem proporcionado detecção precoce do AC, do paranasais, ouvido médio e mastóide; (2) dissemina-
refinamento nas técnicas microbiológicas, que tem au- ção hematogênica de um foco infeccioso à distância,
xiliado no uso adequado de novos antibióticos1. Com silencioso ou não, sendo as fontes de infecção primária
esses melhoramentos, a combinação de intervenção mais freqüentes abscesso pulmonar, bronquiectasias
médica ou cirúrgica tem diminuído drasticamente as e empiema pulmonar. Outras fontes são cardiopatia
taxas de mortalidade de 40% a 60% na era pré-TC2-5 congênita cianótica, abscesso dentário e endocardite
para o estado atual de 0% a 10%6-8. A utilização de bacteriana; (3) traumatismos cranioencefálicos aber-
aspiração guiada por estereotaxia para o tratamento tos; e (4) hospedeiro imunodeprimido. Em aproxima-
de AC profundos ou múltiplos também tem contri- damente 40% dos AC, a origem do foco primário do
buído bastante na redução das taxas de morbidade e processo infeccioso é desconhecida18.
mortalidade6,9-11. Os AC que se desenvolvem por contigüidade são
geralmente solitários e tendem a localizar-se super-
EPIDEMIOLOGIA ficialmente no parênquima cerebral; assim, os pro-
cessos infeciosos que acometem os seios paranasais
A incidência do AC varia de 1% a 2% entre as le- desenvolvem-se predominantemente no lobo frontal,
sões expansivas intracranianas12. Estima-se que, em enquanto infecções do ouvido médio localizam-se
um hospital geral, se detecte um paciente com AC no lobo temporal e/ou cerebelo5. Os AC decorrentes
em cada 10.000 internamentos e também se conside- de disseminação por via hematogênica localizam-
ra que um serviço de neurocirurgia atenda de 4 a 8 se profundamente na junção das substâncias branca
pacientes com AC por ano. A maioria dos AC ocorre e cinzenta. Esses abscessos estão distribuídos mais
nas primeiras décadas da vida, porém, pode acometer freqüentemente no território da artéria cerebral mé-
qualquer idade2,5,13. O AC causado por sinusopatias é dia (lobo parietal). São, geralmente, múltiplos (6%
comum entre os 10 e 30 anos de idade. Os AC de ori- a 22% dos casos)13,20,21. A cápsula geralmente é fina
gem otogênicas são mais freqüentes em adolescentes do lado do ventrículo, comparado com a porção adja-
e após os 40 anos de idade. Vinte e cinco por cento cente da superfície cortical, favorecendo, assim, seu
dos casos de AC ocorrem na infância. O AC na in- rompimento intraventricular e, com isso, um aumento
fância tem um pico de maior incidência entre 4 e 7 da mortalidade (Fig. 40.1)7,22. Os AC secundários ao

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

traumatismo cranioencefálico (TCE) ocorrem entre ginosa30. Em pacientes dependentes de drogas e dia-
3% e 17%, podem estar associados à não-remoção de béticos, podem-se encontrar fungos, incluindo Cryp-
fragmentos ósseos afundados, fragmentos de projé- tococcus neoformans, Candida, Mucor e Aspergillus
teis de arma de fogo no parênquima cerebral, ou às sp19. Os microorganismos Streptococcus e Hemophi-
cirurgias para remoção do tecido cerebral contundido lus são comuns em casos de AC decorrente de cardio-
e fratura da base do crânio com fístula liquórica21,23-26. patia congênita cianótica31. Os microorganismos mais
Pacientes imunodeprimidos são os portadores de dia- comuns em pacientes aidéticos, que desenvolvem AC,
betes, sarcoidoses, doenças malignas, pacientes trans- são Toxoplasma gondii, Cryptococcus neoformans
plantados e uso prolongado de corticosteróides. e Mycobacterium tuberculosis. O acometimento do
O AC pode ser de origem bacteriana, fungo ou pa- sistema nervosos central, sobretudo na forma de AC,
rasitário. Em um grande número de casos o AC de ori- tem sido causado, em 15% a 40% dos portadores de
gem bacteriana possui mais de um microorganismo. lesões múltiplas, por Nocardia sp32.
No adulto, microorganismos aeróbicos, microaerofí-
licos e estreptococos anaeróbicos, incluindo Strepto- PATOLOGIA
coccus millieri, são encontrados em 60% a 70% dos
casos e são mais comuns em AC decorrentes de si- As áreas do parênquima cerebral comprometidas
nusopatias ou infecção dentária19,27. Bacteroides sp e por um abscesso foram classificadas, segundo sua
bactérias Gram-negativas, incluindo Escherichia coli, anatomia patológica, em zona 1 (centro necrosado),
Proteus sp e Pseudomonas sp, estão presentes em zona 2 (borda inflamada), zona 3 (cápsula de coláge-
20% a 40% dos casos. Em 10% a 15%, o Staphylo- no) zona 4 (cerebrite e neovascularização adjacente) e
coccus aureus é encontrado nos casos de AC associa- zona 5 (gliose reativa e edema cerebral circundante)18.
dos com TCE ou procedimentos neurocirúrgicos19,28. A evolução do processo de formação foi dividida em
AC em neonatos é uma complicação freqüente de me- quatro fases:
ningites, e os microorganismos mais comuns são os • Fase 1 – fase inicial (1 a 3 dias): distingue-
Gram-negativos e, entre eles, incluem-se Proteus mi- se por uma encefalite localizada ou cerebrite
rabilis, Escherichia coli, Serratia marcescens e Citro- séptica precoce na transição das substâncias
bacter sp, especialmente o Citrobacter diversus14,29. brancas e cinzenta (região de transição vascu-
Em crianças e adultos jovens imunodeprimidos são lar – vascularização pobre), caracterizada pelo
freqüentes Enterobacteriaceae e Pseudomonas aeru- embainhamento perivascular pelas células in-
flamatórias adjacentes a uma área central de
necrose em desenvolvimento, circundada por
uma área de acentuado edema cerebral.
• Fase 2 – cerebrite tardia (4 a 9 dias): caracteri-
za-se pelo aparecimento dos fibroblastos, que
são os primeiros elementos de formação da
cápsula, pelo aumento progressivo do centro
de necrose e pelo aparecimento de neovascula-
rização ao redor da lesão.
• Fase 3 – início da formação da cápsula (10 a
14 dias): caracteriza-se pela resolução da ce-
rebrite e contração do centro necrótico e pelo
aumento progressivo do número de macrófa-
gos e de fibroblastos, que iniciam a formação
de uma cápsula que circunda a lesão e que,
geralmente, é menos desenvolvida do seu lado
ventricular.
• Fase 4 – formação da cápsula (após 14 dias):
nesta fase o centro necrótico está bem defini-
do e delimitado, circundado por uma zona de
células inflamatórias (macrófagos e fibroblas-
tos), por uma cápsula de colágeno espessa e
uma camada de neovascularização associada à
cerebrite, astrócitos reacionais, gliose e edema
cerebral, ao redor da cápsula (Fig. 40.2).
Fig. 40.1 – Tomografia computadorizada do crânio com A evolução anatomopatológica do AC varia com a
contraste, demonstrando abscesso encapsulado, localizado na
região frontal esquerda e com invasão intraventricular esquer- origem da infecção, com a interação parasita–hospe-
da, com grande efeito de massa. deiro e com o uso de antibióticos e corticosteróides18.

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do equilíbrio, ataxia cerebelar, dismetria, hipotonia


muscular, adiadococinesia, nistagmo e tremor36-38.
Em neonatos, o AC geralmente se apresenta com au-
mento do perímetro cefálico, fontanelas tensas, disjun-
ção de suturas cranianas, vômitos, irritabilidade, crises
convulsivas e anorexia39,40. A febre é incomum e geral-
mente não apresenta sinais neurológicos focais39,40.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
O AC pode simular um quadro de meningite bac-
teriana, empiema extra ou subdural. Em casos de AC
localizado no lobo temporal, pode imitar um quadro
de encefalite pelo vírus da herpes simplex. Em casos
de AC de desenvolvimento lento, pode ser confundido
com tumores primários ou secundários. Seu diagnósti-
co torna-se ainda mais difícil nos casos em que se apre-
senta sem febre e sem sinais neurológicos focais33.

EXAMES COMPLEMENTARES
O hemograma pode demonstrar leucocitose acima
Fig. 40.2 – Tomografia computadorizada craniana com con-
traste, apresentando abscesso encapsulado na região parietal de 10.000 leucócitos, com desvio para a esquerda, in-
direita e edema perilesional. dicando processo infeccioso bacteriano agudo, ines-
pecífico18. Cultura do sangue geralmente é estéril. Ve-
locidade de hemossedimentação apresenta-se elevada
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS na metade dos casos3,41. O exame do líquido cefalorra-
A sintomatologia depende do tamanho, localização, quidiano (LCR) pouco ajuda no diagnóstico do AC. O
multiplicidade da lesão, virulência do microorganis- LCR geralmente apresenta achados inespecíficos. Po-
mo, resposta do hospedeiro e da gravidade do edema de-se encontrar uma pressão elevada, pleocitose leve
cerebral12. Os sintomas de um AC são similares aos ou moderada, com predomínio de linfomonucleares e
apresentados por um tumor ou outra lesão que ocupa hiperproteinorraquia33. A cultura do LCR é estéril en-
espaço. A tríade clássica de um AC, composta por fe- tre 50% e 80% dos casos. Sua realização é invasiva e
bre, cefaléia e sinais neurológicos focais, ocorre em perigosa em razão do desenvolvimento de herniação
um pequeno número de pacientes33,34. Os sintomas en- cerebral interna pelo efeito de massa do AC5.
contram-se presentes por menos de duas semanas em A radiografia simples de crânio pode evidenciar fo-
75% dos casos de AC. Cefaléia de evolução progres- cos infecciosos (mastoidite, otite, sinusite, osteomielite
siva ocorre em 70% a 90% dos casos17, naúseas e vô- craniana e presença de bolha de gás em correspondência
mitos em 25% a 50%19,35. Há febre em 50%, que con- com o abscesso). Em casos de pessoas jovens, a radio-
siste, portanto, em um diagnóstico raro para AC, sendo grafia simples de crânio poderá mostrar sinais indiretos
geralmente atribuída ao foco infeccioso primário. Al- de hipertensão intracraniana (disjunção de suturas, im-
teração do nível de consciência ocorre em 50%5,6,13. pressões digitiformes e alargamento da sela túrcica33.
Crises convulsivas de 30% a 50% são do tipo generali- A ultra-sonografia transfontanelar tem sido utili-
zada e geralmente são associadas ao abscesso do lobo zada em crianças de até 1 ano de idade e, nos adul-
frontal3,5. Há rigidez de nuca em 25% e papiledema tos, após realização de uma janela óssea. O exame,
em 25% dos casos. Em crianças portadoras de cardio- de custo operacional baixo, é isento de radiação e de
patia congênita cianótica, a ocorrência de cefaléia e/ fácil realização, podendo ser utilizado no momento
ou crises convulsivas levanta sempre a suspeita de um da intervenção cirúrgica para uma melhor delimita-
AC em desenvolvimento31. Segundo Lu et al.21, em sua ção do abscesso e como orientador da punção esva-
série de 123 casos de AC, as manifestações clínicas ziadora33. O AC se mostra hiperecogênico.
mais comuns eram febre, cefaléia, alteração nível de A tomografia computadorizada (TC) do crânio
consciência e hemiparesia, ocorrendo em 58%, 55%, com contraste é, sem dúvida, o método de diagnóstico
50% e 44% dos seus pacientes, respectivamente. complementar mais usado em virtude do custo rela-
Em casos de abscessos cerebelares, a síndrome focal tivamente pequeno e de rápida execução. Através da
neurológica, na maioria dos casos, surge tardiamente TC, podem-se obter, com precisão, a localização, o
ou é mascarada pela síndrome de hipertensão intracra- estágio da supuração, a multiplicidade de lesões e sua
niana. Quando presente, manifesta-se por alterações associação com hidrocefalia por bloqueio16,33,38,41,42. As

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

principais características do AC na TC são: (1) fase de


cerebrite: zona de baixa atenuação, de bordos irregula-
res, que não capta contraste ou o faz de forma difusa e
irregular; (2) fase de abscesso: com prévia administra-
ção de contraste, há uma imagem de baixa densidade,
tanto na zona central necrótica, como na zona edema-
tosa perilesional (Fig. 40.3). Em certas oca­siões, apa-
rece um anel periférico, de forma redonda ou ovalada,
de espessura uniforme ou, em outras, ligeiramente
diminuída na parte medial da lesão. Eles podem ser
múltiplos e, em alguns, mostram multiloculações (Fig.
40.4). Esses achados não são específicos dos AC e
devem ser diferenciados das imagens observadas em
neoplasias com centros necróticos (gliomas e metásta-
ses), hematomas intraparenquimatosos em reabsorção,
infarto cerebral em fase de resolução e radionecrose
cerebral. Resultados falsos-negativos são raros.
A ressonância nuclear magnética (RNM) tem-se
tornado o método de neuroimagem na atualidade. A
RNM é mais sensível que a TC para detectar absces- Fig. 40.4 – Tomografia computadorizada craniana apre-
sos pequenos, além de caracterizar melhor o local sentando abscessos cerebrais múltiplos no hemisfério cerebral
anatômico do abscesso. As características do AC ao direito.
exame de RNM são: (1) edema perilesional produzin-
do discreta hipointensidade em T1 e acentuada hipe- TRATAMENTO
rintensidade em T2; (2) necrose central hipointensa,
em T1 em relação à substância branca e hiperinten- Apesar dos avanços das técnicas diagnósticas, dos
sa, em T2 em relação à substância cinzenta; (3) iso meios de isolamento de microorganismos e do avanço
ou hipointensa em T2 (decorrente de fibrose e efeito no campo da antibioticoterapia, muitas discussões e
paramagnético de radicais livres e macrófagos fa- dúvidas ainda existem entre os diversos autores sobre
gocitando ativamente na parede do abscesso); e (4) o tratamento adequado dos AC18,22,44-47. O tratamento
disseminação intraventricular ou subaracnóidea, mais do AC requer a combinação de drogas antimicrobia-
facilmente identificada que no exame de TC, como nas, intervenção cirúrgica e erradicação do foco de
sinal mais intenso que o LCR em T1 e T243. infecção primária21.
O tratamento médico foi relatado inicialmente por
Heineman et al.48 As indicações para o tratamento
médico são: (1) abscesso múltiplos; (2) péssimas con-
dições gerais do paciente; (3) abscesso em localiza-
ções anatômicas críticas; e (4) ventriculite/meningite
concomitante. Essas condições são relativas. A me-
lhor resposta ao tratamento médico é obtido quando
se inicia o tratamento no estágio de cerebrite precoce,
quando as lesões são menores que 3 cm, quando a
duração dos sintomas é menor que 2 semanas e se o
paciente apresentar melhora clínica na primeira se-
mana de tratamento. O tempo de terapia antibiótica é
de 4 a 8 semanas18,22. A lesão em anel pode persistir
algumas semanas após o início da antibioticoterapia.
Recomenda-se o uso de difenil-hidantoína como pro-
filático de crises convulsivas em AC localizado na re-
gião supratentorial e heparina em casos de trombose
venosa. Os critérios de cura do AC em casos de tra-
tamento clínico são apirexia, exame neurológico nor-
mal, hemograma e velocidade de hemossedimentação
normais, exames de imagens normais ou estabilizadas
e foco primário curado.
Fig. 40.3 – Tomografia computadorizada craniana com
contraste, demonstrando abscesso encapsulado, localizado no Corticosteróides: devem-se usar somente quando
hemisfério cerebelar direito. existe efeito de massa e um acentuado déficit neuroló-

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40 – Abscesso Cerebral

gico. Podem ser usados de maneira cuidadosa na fase


aguda e subaguda18. É provável que o corticosteróide
diminua a fibrose da cápsula do AC e, ainda, diminua
a intensidade do reforço com contraste iodado nos
exames de neuroimagens. Outros fatores associados
com o uso de corticosteróides em pacientes com AC
são: reduz grandemente o edema perilesional; reduz
a resposta celular; diminui o número de fibroblastos;
retarda a formação da cápsula, o que não parece ter
efeito adverso no resultado clínico; pode ter papel no
desenvolvimento de infecções oportunistas49.
Vários procedimentos têm sido utilizados no tra-
tamento cirúrgico do AC, como drenagem contínua,
aspiração a céu aberto ou através de estereotaxia,
marsupialização e craniotomia com excisão completa
do abscesso46. A escolha do procedimento pode ser
influenciada pela experiência da equipe médica, ida-
de do paciente, condições neurológicas, localização
e estágio do abscesso e presença de abscessos múlti-
plos22. A cirurgia tem sido indicada como procedimen-
to inicial por eliminar o efeito expansivo, confirmar a
suspeita diagnóstica e identificar os microorganismos
para antibioticoterapia específica.
Atualmente a aspiração ou excisão representam
os métodos de escolha para o tratamento cirúrgico
do AC. Aspiração combinada com antibioticoterapia Fig. 40.5 – Tomografia computadorizada craniana, revelan-
adequada tem sido um procedimento de escolha50,51. do volumoso abscesso cerebral.
Aspiração apresenta vantagens, como: atravessar um
simples orifício de trépano, em pacientes gravemente A instilação direta de antibióticos na cavidade do abs-
enfermos e sob anestesia local; confirmação diagnós- cesso tem sido empregada, mas sua eficácia na prática
tica; diminuição da pressão intracraniana e identifica- não está bem definida. A instilação direta de antibió-
ção dos microorganismos. Em alguns casos de lesões ticos pode e deve ser feita com precaução, pois a alta
múltiplas, apenas um orifício de trépano pode permi- concentração de alguns antibióticos, como betalactâ-
tir sua drenagem, podendo ser realizado em qualquer micos, pode ocasionar crises convulsivas. Uma vez
estágio da lesão 4. Em casos de abscessos volumo- que o foco infeccioso primário seja identificado, ele
sos, permite uma descompressão rápida por redução deve ser drenado, de preferência em cirurgia conco-
imediata do efeito de massa e possibilita a instilação mitante à drenagem do AC. A manutenção do foco
de antibióticos diretamente na cavidade do abscesso primário possibilita a recidiva do AC33.
após sua drenagem46,52 (Fig. 40.5). Excisão completa
do abscesso está particularmente indicada quando ele
está encapsulado, em casos de AC de origem traumá- PROFILAXIA
tica e na presença de corpos estranhos que podem ser Na profilaxia, deve-se conscientizar a população
removidos, prevenindo, com isto, sua recidiva26. Em sobre a prevenção de TCE abertos. Também se faz
casos de AC localizados na fossa posterior, vários necessário o controle da sepse, em casos de quadros
autores indicam craniotomia suboccipital e aspiração infecciosos graves de afecções primárias do pulmão,
ou excisão do abscesso sob visualização direta, com do tratamento eletivo das crianças portadoras de car-
resultados excelentes. Com o advento das técnicas es- diopatias congênitas cianóticas, do diagnóstico pre-
tereotáticas guiadas por imagem, apresenta vantagens coce e tratamento adequado das afecções otorrino-
em casos de abscessos localizados profundamente, laringológicas. São necessários cuidados no uso de
abscessos múltiplos, abscessos localizados em áreas antibióticos no que se refere a suas indicações, dosa-
eloqüentes do cérebro em que a sua exérese pode ser gens e duração54.
desastrosa9,53. A complicação mais comum desse mé-
todo é hemorragia intracerebral, que tem sido obser-
vada na região em que se desenvolveu a cápsula de
PROGNÓSTICO
colágeno, a qual é bastante vascularizada e friável, O prognóstico dos AC é considerado bom quando
tendo-se relatado ser mais comum em casos de AC o diagnóstico é precoce, na fase em que não existem
decorrentes de cardiopatia cianótica congênita22,39. alterações do nível de consciência, geralmente pro-

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Parte 4 – Inflamações e Neoplasias em Neurocirurgia

duzida por hipertensão intracraniana grave, idade do 15. Kaplan K. Brain abscess. Med Clin North Am.
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Parte 5
Neurocirurgia
Pediátrica

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41
Craniossinostose Precoce
Ricardo Santos de Oliveira
Hélio Rubens Machado

INTRODUÇÃO do Hôpital Foch, Paris, França, foram fundamentais


para o desenvolvimento dessa nova área (Tessier et

A
craniossinostose precoce pode ser definida
al., 1967). Rougerie (Rougerie et al., 1972), usando
como o fechamento precoce de suturas cra-
esses novos conceitos de cirurgia craniofacial, des-
nianas, que ocorre no período intra-uterino;
creveu sua técnica pessoal para o tratamento específi-
assim, o diagnóstico desse problema pode ser feito
co das craniossinostoses não sindrômicas: este autor
logo após o nascimento da criança, de acordo com o
aspecto clínico (conformação do crânio), corroborado obtinha excelentes resultados estéticos pela superpo-
por exames de imagem. Uma radiografia simples do sição de retalhos ósseos após a realização das cra-
crânio, que demonstre bem as suturas, pode ser su- niotomias. Entretanto, segundo sua técnica, a arcada
ficiente para o diagnóstico por imagens, atualmente orbitária não era retirada. A simples superposição de
complementada por exame tomográfico tridimensio- fragmentos até hoje é um detalhe técnico, fácil de ser
nal. Apenas as oxicefalias podem ser de aparecimento empregado, permitindo, às vezes, obtenção de um
mais tardio, a partir do primeiro ano de vida (além perfeito contorno orbitário quando usada como com-
dos raros casos de recidiva, invariavelmente sob o plemento do avanço frontoorbitário.
aspecto de oxicefalias, independentemente do diag- Devemos, entretanto, a outra dupla, também egres-
nóstico inicial)1,2. sa do grupo do Hôpital Foch, o mérito da criação do
A primeira intervenção relacionada ao tratamento conceito do frontal flutuante. Dominique Renier (neu-
da craniossinostose foi publicada em 1890, por Lan- rocirurgião pediátrico) e Daniel Marchac (cirurgião
nelongue, para “o tratamento cirúrgico da microcefa- plástico), do Hôpital Necker-Enfants Malades, Paris,
lia” por meio de descompressão óssea3. França, foram os mentores dessa idéia, que permite o
Matson4, o grande iniciador da neurocirurgia pediá­ relaxamento da arcada orbitária, totalmente exterio-
trica, em seu monumental livro relata sua experiência rizada, manipulada e reposicionada. O próprio cres-
sobre a cirurgia da craniossinostose, introduzindo as cimento cerebral, acelerado no primeiro ano de vida,
ressecções lineares com interposição de lâminas de será o responsável pelo contorno final do crânio6.
polietileno entre os bordos livres da craniectomia a Esses conceitos revolucionaram o tratamento da cra-
fim de evitar recidivas; esse método, entretanto, não niossinostose e são utilizados internacionalmente, em
corrigia adequadamente as deformidades e permitia diversos centros de cirurgia craniomaxilofacial, com
recidivas em até 30% dos casos4,5. resultados extremamente satisfatórios e com período
A moderna era da cirurgia para correção da cra- de seguimento dos pacientes superior a 20 anos7.
niossinostose iniciou-se efetivamente a partir da dé- A escafocefalia, entretanto, a mais freqüente das
cada de 1960, quando houve a união entre neurocirur- craniossinostoses, raramente sindrômica, tem resulta-
giões e cirurgiões plásticos, criando assim um novo do estético pós-operatório muito bom, apesar de dife-
campo de atuação médica: “a cirurgia craniofacial”. rentes técnicas empregadas ao longo do tempo. Em
A brilhante união de Paul Tessier (cirurgião plástico), nosso serviço, durante duas décadas e em quase uma
Gerard Guiot e Jacques Rougerie (neurocirurgiões), centena de casos (91 pacientes), empregamos a técni-

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Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

ca descrita por Epstein et al.8, que consiste na ressec- O crescimento craniano é estabelecido precoce-
ção total do vértice craniano (Fig. 41.1), ultrapassando mente, e o fator mais importante para defini-lo, além
linhas de sutura e contando com o enorme poder os- da herança genética, é o desenvolvimento cerebral.
teogênico da dura-máter e periósteo, que em algumas Uma criança que tenha apresentado um quadro de
semanas já permite a reconstrução óssea e remodela- anóxia no período neonatal poderá apresentar lesão
mento: entretanto, em alguns pacientes o excesso de cerebral e, conseqüentemente, microcefalia.
reossificação forçava o aparecimento tardio de discre- Deve-se diferenciar o quadro de microcefalia com
ta elevação ao nível da fontanela anterior, chamando a a craniossinostose verdadeira, em que existe restrição
atenção das mães, mas sem significado clínico. do crescimento craniano, em decorrência do fecha-
A freqüência de craniossinostose na população ge- mento precoce de suturas.
ral tem sido estimada em 1.2.100 nascidos vivos9. O crânio cresce através da interposição óssea ao
longo das linhas de sutura. Quando há fechamento de
A uma das suturas, o crânio não se desenvolve num sen-
tido perpendicular a essa sutura. Essa regra foi esta-
belecida pelo patologista austríaco Virchow, no sécu-
lo XIX, e permite o diagnóstico clínico dos diferentes
tipos de craniossinostose. Muitas teorias para a com-
preensão do fechamento de suturas foram publicadas,
e o leitor pode ter uma visão global em Moss10.

QUADRO CLÍNICO
O fechamento normal das suturas cranianas se faz
ao longo da vida do indivíduo, em diferentes idades
B
cronológicas (Tabela 41.1). As suturas da face podem
permanecer abertas durante toda a vida em razão da
tensão que a musculatura facial e mastigatória sofre11.
O fechamento da fontanela anterior (bregmática)
se faz relativamente de modo precoce, ao redor de
12 a 18 meses de idade, e a fontanela posterior (lam-
bdóide), ao redor de 3 a 6 meses de idade. O fecha-
mento precoce da fontanela anterior nada tem a ver
com a craniossinostose verdadeira, uma vez que as
suturas cranianas permanecem abertas e o crescimen-
to craniano continua a se desenvolver adequadamen-
te. Esse é um motivo freqüente de encaminhamentos
para o especialista (neurocirurgião pediátrico).
C A deformidade craniana é o sinal clínico mais impor-
tante em uma craniossinostose e pode ser identificado
logo após o nascimento. Algumas deformidades pós-na-
tais podem ser relacionadas à posição fetal, tipo de parto
(fórceps), e uma radiografia simples do crânio pode ex-
cluir ou confirmar uma craniossinostose verdadeira.
A deformidade craniofacial varia em função do
tipo de craniossinostose.

Tabela 41.1 – Idade de fechamento das suturas


cranianas
Sutura Idade (anos)
Metópica 2
Sagital 22
Coronal 24
Fig. 41.1 – (A a C) Escafocefalia. Técnica cirúrgica descrita
por Epstein et al. , mostrada de forma esquemática (craniec-
8 Lambdóidea 26
tomia total do vértice), durante cirurgia e radiografia simples Escamosa 35
do crânio, 6 meses após a cirurgia, demonstrando contorno
craniano arredondado e reossificação completa. Faciais > 35

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41 – Craniossinostose Precoce

Em casos suspeitos de craniossinostose, uma ava- Trigonocefalia


liação genética deve ser realizada sistematicamente,
bem como um inquérito familiar com vistas à iden- Fechamento da sutura metópica. Esse tipo de cra-
tificação de uso de drogas durante a gestação, princi- niossinostose produz um crânio triangular na região
palmente a utilização de ácido valpróico (Oliveira et frontal, associado a hipotelorismo (Fig. 41.3).
al, 2004).
Plagiocefalia Anterior
CLASSIFICAÇÃO Fechamento da sutura coronal anterior unilateral
As craniossinostoses podem ser classificadas em e das suturas da base frontoetmoidal e frontoesfe-
isoladas ou sindrômicas. Essa classificação é impor- noidal. A região frontal do lado da sutura afetada
tante do ponto de vista de aconselhamento genético. apresenta uma depressão, e contralateral à sutura
Mais de 50 síndromes já foram descritas, as quais in- afetada, a região frontal fica abaulada. Existe uma
cluem craniossinostose entre seus sinais clínicos11. elevação da órbita ipsilateral e desvio do dorso na-
sal (Fig. 41.4).
Escafocefalia
Fechamento da sutura sagital. Significa um crânio
Braquicefalia
alongado no sentido ântero-posterior e estreito láte- Fechamento das suturas coronais bilaterais. A
ro-lateral, podendo ocorrer abaulamento nas regiões região frontoorbitária apresenta uma retração, bem
frontal e occipital (bossas). É o tipo mais freqüente de como do dorso nasal. A região temporal apresenta um
craniossinostose observada (Fig. 41.2). abaulamento bilateral (Fig. 41.5).

A B

C D

Fig. 41.2 – Escafocefalia. (A) Radiografia simples do crânio em perfil. (B) TC de crânio com reconstrução em 3D, mostrando
a ausência da sutura sagital. (C) Criança de 3 meses com bossa frontal evidente. (D) Crânio alongado ântero-posteriomente e
retração lateral.
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Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

A B

Fig. 41.3 – Trigonocefalia. (A) TC de crânio 3D, mostrando a fusão da sutura metópica. (B) Criança de 4 meses com hipotelo-
rismo, “quilha” frontal e lábios finos (síndrome de Baller-Gerold).

A B C

Fig. 41.4 – Plagiocefalia anterior. (A) Criança de 11 meses com desvio nasal importante. (B) Criança de 3 meses com plagioce-
falia esquerda. (C) Radiografia simples do crânio mostrando a elevação da órbita à direita (apontada com a seta).

A B C

Fig. 41.5 – Braquicefalia. (A) Criança com retração da região frontoorbitária. (B) Criança de 5 meses com braquicefalia não
sindrômica. (C) TC em 3D mostrando a fusão bilateral das suturas coronais.

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41 – Craniossinostose Precoce

Oxicefalia com a plagiocefalia postural, que é uma deformidade


adquirida na região posterior, não estando associada à
Fechamento das suturas coronais e sagital. A re- fusão da sutura lambdóide (Figs. 41.7 e 41.8).
gião frontoorbitária permanece retraída. Existe uma
abertura do ângulo frontonasal (Fig. 41.6).
QUADROS SINDRÔMICOS
Plagiocefalia Posterior As craniossinostoses sindrômicas (facecraniossi-
Fechamento da sutura lambdóide (uni ou bilate- nostoses) estão presentes em 15% das séries publi-
ral). É uma forma rara de craniossinostose, acarretan- cadas. Essas síndromes são de herança autossômica
do um achatamento da região occipital e desvio da dominante com alta penetração e variável expressi-
mastóide e pavilhão auricular do lado afetado. Essa vidade fenotípica. Mutações foram descobertas nas
forma de craniossinostose não deve ser confundida síndromes mais freqüentes.

A B

Fig. 41.6 – (A e B) Oxicefalia em criança de 4 anos.

A B

Fig. 41.7 – Plagiocefalia posterior verdadeira. (A) TC em 3D, mostrando plagiocefalia posterior com fusão da sutura lambdóide.
(B) Representação esquemática das alterações cranianas observadas na plagiocefalia posterior verdadeira12.
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459
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

A Síndrome de Pfeiffer
A síndrome de Pfeiffer está relacionada com de-
formidades em mão e pé, além das alterações cranio-
faciais. A braquicefalia é a craniossinostose mais fre-
qüente e está associada às alterações no terço médio
da face, resultando em hipoplasia maxilar. O polegar
e o hálux são largos e com desvio em varo, possivel-
mente associado a sindactilia.
Existem várias formas de apresentação, sendo a
mais grave a síndrome de Pfeiffer tipo II (crânio em
trevo). A transmissão é autossômica dominante, com
penetração completa e expressão variável. Os cro-
mossomos afetados foram 8p1115 e 10q2616. Foram
descobertas diversas mutações afetando o FGFR1 e
FGFR29 (Fig. 41.10).

Síndrome de Apert
Essa síndrome pode ser facilmente reconhecida
pela presença de sindactilia em mãos e pés. O envolvi-
mento craniofacial está presente desde o nascimento,
com braquicefalia e alteração do terço médio da face.
B Anomalias do sistema nervoso central podem estar
presentes nessa síndrome. Moloney et al.17 identifica-
ram que todas as mutações (FGFR2) foram oriundas
do pai. O rebaixamento mental é associado à síndro-
me e foi demonstrado por Renier et al.18 (Fig. 41.11).

INDICAÇÕES DA CIRURGIA
Uma vez confirmado o diagnóstico de craniossi-
nostose, o tratamento deve ser o cirúrgico, baseado
em quatro fatores, a seguir descritos.

Estética/Reparadora
Fig. 41.8 – Plagiocefalia postural. (A) Criança de 4 anos com
achatamento occipital decorrente de má postura adquirida em Estudos psicológicos em pacientes com craniossi-
decúbito dorsal. (B) Representação esquemática das alterações nostose não operados na infância confirmam a perda
cranianas na plagiocefalia posterior postural12.
da auto-estima, dificuldade de aceitação pela socieda-
de, pelos próprios pais, parentes e por ele mesmo; as-
sim, a indicação cirúrgica deve ser feita com objetivo
Síndrome de Crouzon de reparar a deformidade craniofacial instalada19.
Nessa síndrome observa-se, geralmente, o fecha-
mento bilateral das suturas coronais, proptose, órbi- Oftalmológica
ta rasa (exorbitismo) e estrabismo. Hipertelorismo e
hipoplasia maxilar podem estar presentes, levando Alterações orbitárias estão presentes em alguns
ao quadro grave de obstrução respiratória. Retardo tipos de craniossinostoses. A proptose ocular pode
mental ocorre em 10% dos casos. Alterações dentá- acarretar exposição da córnea, traumatismo e, conse-
rias com má-oclusão podem ser observadas nos casos qüentemente, perda visual. O envolvimento das sutu-
em que exista hipoplasia maxilar. O principal ponto ras da base do crânio (frontoetmoidal e frontoesfenoi-
a ser considerado nessa síndrome é a progressão da dal) está associado ao aparecimento de deformidades
sinostose. orbitárias, principalmente nas facecraniossinostoses.
A localização para a síndrome de Crouzon foi O objetivo da correção cirúrgica é o avanço fron-
identificada no cromossomo 10q2613. Essa condição toorbitário em um primeiro tempo para proteção ocu-
é decorrente de mutações no gene do receptor do fator lar e, posteriormente, o avanço do terço médio da face
de crescimento fibroblástico (FGFR2)14 (Fig. 41.9). (monobloco).

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41 – Craniossinostose Precoce

A B C

Fig. 41.9 – Síndrome de Crouzon. (A e B) Nota-se retração do terço médio da face com hipoplasia maxilar e exorbitismo bila-
teral. (C) TC em 3D mostrando sinais de hipertensão intracraniana em paciente com síndrome de Crouzon.

A B C

Fig. 41.10 – Síndrome de Pfeiffer. (A e B) Crânio em trevo (cloverleaf skull ou Kleeblattschädel) associado à síndrome de
Pfeiffer do tipo II. (C) Alteração típica observada no polegar (alargamento).

A B C

Fig. 41.11 – Síndrome de Apert. (A) Braquicefalia com retração do terço médio da face. (B) TC de crânio evidenciando esquí-
rolas ósseas na fossa posterior. (C) Sindactilia em mão de paciente com síndrome de Apert.

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Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

Compressão Cerebral Alguns fatores são fundamentais para o êxito do


procedimento em crianças com idade inferior a 1 ano:
A principal indicação do tratamento cirúrgico da peso da criança suficiente para suportar uma cirurgia
craniossinostose é o risco de hipertensão intracraniana de grande porte (> 6 kg); neuroanestesia, preparo de
crônica e conseqüente sofrimento cerebral causado por hemoderivados antes do início do procedimento, cui-
hipóxia crônica, provocando, assim, alterações cogniti- dados intensivos no pós-operatório (preferencialmen-
vas e regressão do desenvolvimento neuropsicomotor. te em UTI pediátrica).
O crescimento acelerado do cérebro, principal-
mente no primeiro ano de vida, associado à restrição ESTRATÉGIA CIRÚRGICA
óssea decorrente da sinostose, pode originar hiperten-
são intracraniana. O protocolo operatório do Setor de Neurocirurgia
A hipertensão intracraniana é mais freqüente em Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de
casos de facecraniossinostose (sindrômicas), varian- Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP-USP), para
crianças com craniossinostose, consiste nos procedi-
do segundo a síndrome: Crouzon (62%), Apert (45%)
mentos seguintes.
e 29% em outros tipos.
A perda visual é a conseqüência do papiledema
crônico, decorrente da hipertensão intracraniana. Se Pré-operatório
não tratada adequadamente, a hipertensão intracra- • Avaliação genética.
niana pode acarretar atrofia óptica e amaurose. • Radiografia de crânio AP/P (todos os casos) e
Em 1982, Renier et al. demonstraram os efeitos do Towne (quando houver suspeita de fechamento
aumento da pressão intracraniana em crianças com cra- de sutura lambdóidea).
niossinostoses submetidas a correção cirúrgica por meio • TC em 3D em casos selecionados.
de registros pré e pós-operatórios. Os autores confir- • Avaliação pediátrica e, se o paciente estiver
maram que mesmo craniossinostoses isoladas podiam com alteração respiratória, realização de polis-
apresentar índices elevados da pressão intracraniana20. sonografia.
• Prescrição de sulfato ferroso profilático (1 mg/
Retardo Mental kg/dia).
• Avaliação neuropsicólogica para teste de QI.
O risco de regressão do desenvolvimento neuropsi­ • Avaliação oftalmológica.
comotor está associado ao tipo de craniossinostose e • Questionário familiar (Tabela 41.2).
à idade da criança no momento do diagnóstico e cor-
• RNM de encéfalo em casos sindrômicos (pes-
reção da deformidade7. quisa de alterações encefálicas/Chiari do tipo I).
Em casos sindrômicos, a síndrome de Apert apre- • Documentação fotográfica pré-operatória.
senta os maiores índices de regressão mental. Renier
et al.18 demonstraram que três fatores foram funda-
mentais para determinar o déficit cognitivo em pa- Intra-operatório
cientes com síndrome de Apert: idade da correção A criança deve ser posicionada preferencialmente
cirúrgica e descompressão cerebral (após o primeiro em decúbito dorsal para que o anestesista tenha aces-
ano de vida), crianças abandonadas e/ou instituciona- so fácil, caso haja necessidade.
lizadas e alterações cerebrais (malformações) obser- • Ferradura + coxim sobre o dorso
vadas em exames de neuroimagem. • Semi-sentado para escafocefalia (Fig. 41.12).
Renier et al. demonstraram que QI > 70 esteve • Hemoderivados na sala cirúrgica.
presente em 50% dos pacientes operados antes de 1 • Acesso venoso adequado.
ano e somente em 7,1% dos casos operados após o
primeiro ano (p = 0,01).
Pós-operatório
As anormalidades mais observadas em exames de
neuroimagem (RNM e TC) foram: ventriculomegalia, • Hemodinâmica do sangramento (hematimetria
hidrocefalia, Chiari do tipo I, displasias, alterações do controle).
corpo caloso etc. • Monitoração em UTI pediátrica (24 h).
• Retirada do dreno no 1º ou 2º pós-operatório.
Época da Cirurgia • Analgesia endovenosa e/ou oral de horário.
Pelas razões apresentadas, torna-se evidente que a in-
dicação cirúrgica deve ser precoce. Em craniossinostoses Compensação da Perda Volumétrica
simples não sindrômicas, indica-se a cirurgia preferen- Volume estimado segundo a quantidade do sangra-
cialmente entre 6 e 12 meses. Em casos de escafocefalia, mento: valor de PVC (se existir), curva de pressão
procuramos operar as crianças entre 3 e 6 meses. arterial média (PAM) e freqüência cardíaca (FC).

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41 – Craniossinostose Precoce

Colóides sem passar 20 a 30 ml/kg A


Concentrado de hemácias (10 a 20 ml/kg peso)
Albumina 20% se necessário
Quantidade: estimada sobre o valor do hematócrito
Qualidade: Ht desejado – Ht conhecido = volume
do transfusado × peso do paciente

Alta Hospitalar
Em geral, as crianças permanecem internadas
após a intervenção cirúrgica por um período total de
três dias.
B
Retorno em 1 semana para verificação da cicatri-
zação (utilização de sutura absorvível Vicryl Rapide
Ethicon® 3.0)
Reposição com sulfato ferroso 1 mg/kg/dia + vita-
mina C (doses: 125 mg se < 10 kg; 250 mg, se 10 a 15
kg; 500 mg se > 15 kg), durante o período de 1 mês.
Programar acompanhamento com neuropsicóloga
para realização de teste de QI com 6 meses e 1 ano.
Radiografia simples de crânio AP/perfil e Towne
no 1º mês, 6º mês e 1 ano. TC em 3D para controle
em casos selecionados
Documentação fotográfica.
Após o 1º ano, retorno bianual com radiografia Fig. 41.12 – (A e B) Posição utilizada para operação em
simples de crânio AP/perfil. crianças com escafocefalia em decúbito dorsal (semi-sentado).

Tabela 41.2 – Questionário familiar – craniossinostose


Local de nascimento:
Endereço atual: Peso ao nascimento:
Gestação:
Gemelar 
Metrorragia 
Oligoâmnio 
Poliidrâmnio 
Drogas antiepilépticas 
Droga utilizada:
Dose utilizada e tempo:

Malformações associadas:
SNC 
Cardíaca 
Genitourinário 
Fenda labial 
Hipertelorismo 
Ossos longos 

Antecedente familiar:

Malformações de extremidades:
Polegar largo 
Hálux alargado 
Sindactilia 
Braquidactilia 

Avaliação oftalmológica: Acuidade visual / Fundo de olho / Oftalmometria

Idade do pai: Local de nascimento:


Idade da mãe: Local de nascimento:
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463
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

TÉCNICA CIRÚRGICA Escafocefalia (N = 120)


No período de 1979 a 2006, 252 pacientes (265 O objetivo da cirurgia é a obtenção de um com-
procedimentos) foram submetidos a tratamento cirúr- pleto remodelamento da calota craniana. Nos casos
gico no HCFMRP-USP (Fig. 41.13). em que o abaulamento frontal é muito acentuado,
A escafocefalia foi o tipo mais freqüente de cranios- realiza-se o remodelamento frontal sem a osteotomia
sinostose observada, correspondendo a 47% dos casos. orbitária.
A maioria dos pacientes (70%) foi submetida a A técnica cirúrgica consiste na realização de os-
tratamento cirúrgico entre 4 e 8 meses de idade. teotomias parassagitais, posterior à sutura coronal e
As craniossinostoses sindrômicas foram presentes anterior à sutura lambdóide (Fig. 41.15). O resultado
em 43 pacientes, com predomínio de Crouzon (Fig. alcançado com a correção cirúrgica é extremamente
41.14). O tipo de craniossinostose mais freqüente as- satisfatório, sendo suficiente uma única intervenção
sociado à síndrome foi a braquicefalia (p < 0,05). cirúrgica.

Sindromicas

Recidivada

Múltipla

Trevo

Plágio posterior

Oxicefalia

Trigonocefalia

Plágio anterior

Braquicefalia

Escafocefalia
0 20 40 60 80 100 120

Fig. 41.13 – Casuística do HCFMRP-USP no período de 1979 a 2006.

Trevo 5 5

Plágio posterior 8 4 Sindrômicas

Oxicefalia 8 4

Trigonocefalia 37 6

Plágio anterior 38 7

Braquicefalia 28 16

Escafocefalia 119 1
0 25 50 75 100
Fig. 41.14 – Distribuição de casos sindrômicos em função do tipo de craniossinosotose identificada.

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41 – Craniossinostose Precoce

A B

C D

Fig. 41.15 – (A e B) Técnica de remodelamento craniano para correção de escafocefalia. Esquema reproduzido com permissão7.
(C e D) Fotografias de pré e pós-operatórios imediatos mostrando o bom resultado que se pode obter com a técnica.

Não preconizamos a utilização de distratores crania- Trigonocefalia (N = 37)


nos e/ou molas para correção de escafocefalia. Sob nosso
ponto de vista, a utilização desse instrumental apresenta O objetivo da reconstrução em pacientes com tri-
vários fatores negativos, que inviabilizam o método para gonocefalia é o completo remodelamento da região
tratamento da escafocefalia de maneira segura: frontal e da barra supra-orbitária em forma de V. Para
• Elevado custo/benefício. tanto, utilizamos um novo frontal que pode ser obtido
de uma região exposta do crânio, geralmente anterior
• Necessidade de nova intervenção para retirada à fontanela (quando presente) e a remoção da barra
do distrator. Somente distratores com implan- supra-orbitária com osteotomia mediana para resse-
tes absorvíveis (em desenvolvimento) podem car a sinostose metópica (Fig. 41.16).
minimizar esse risco.
• Aumento do risco de infecção.
• Redução do tempo cirúrgico e menor taxa de Plagiocefalia Anterior (N = 38)
transfusão sangüínea são questionáveis. O objetivo da correção cirúrgica da plagiocefalia
• Idade para colocação dos distratores (em geral anterior é o completo remodelamento da região fron-
> 1 ano). toorbitária.
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465
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

A B

C D

Fig. 41.16 – (A e B) Técnica de correção de trigonocefalia por remodelamento completo da região frontal e barra supra-
orbitária com ressecção da “quilha” frontal. Esquema reproduzido com permissão7. (C) TC em 3D pré-operatório. (D) Fotografia
de pós-operatório tardio de correção de trigonocefalia mostrando correção satisfatória com a técnica utilizada.

Utilizamos a técnica do remodelamento frontoor- porém o preço ainda é alto e o SUS não disponibiliza
bitário bilateral com avanço unilateral da barra supra- recursos para o uso rotineiro em hospital público.
orbitária, que deverá ter um ponto de apoio na região Existem outras técnicas que podem ser utilizadas
temporal unilateral. Para tanto, utilizamos os mode- para correção da plagiocefalia anterior. Machado e
los em metal padronizados por Daniel Marchar e Do- Hofman21 descreveram uma técnica de correção uni-
minique Renier para confecção de um novo frontal lateral, por meio da realização de fratura em “galho
(Figs. 41.17 e 41.18). verde” da junção frontoorbitária do lado afetado. Essa
Utilizamos fio de aço (aciflex) para a fixação do técnica apresenta limitações quanto à idade (< 6 me-
novo frontal à barra supra-orbitária. Fios absorvíveis ses) e resultado final obtido. Pode ser utilizada em
podem ser utilizados para fixação de outros retalhos casos selecionados, em que exista uma deformidade
ósseos. As placas absorvíveis podem ser utilizadas, leve, em crianças com idade inferior a 6 meses.

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41 – Craniossinostose Precoce

A B

Fig. 41.17 – (A) Técnica de correção de plagiocefalia anterior por meio do completo remodelamento frontoorbitário com
avanço unilateral. (B) Modelos em metal padronizados por Marchac e Renier para confecção do novo frontal.

A A fixação do frontal e barra supra-orbitária pode


ser obtida com placas absorvíveis, quando disponí-
veis, ou fios de aço (aciflex).
O avanço frontoorbitário permite uma proteção
ocular, em casos em que haja proptose acentuada,
além de permitir uma descompressão cerebral ade-
quada, minimizando os riscos de hipertensão intra-
craniana.
O abaulamento da região temporal é corrigido por
B inversão do retalho ósseo temporal.
Em casos em que exista retração do terço médio
significativa, o avanço frontoorbitário será insuficien-
te para promover melhora da passagem de ar, sendo
necessárias cirurgias de avanço do terço médio e/ou
traqueostomia.

Plagiocefalia Posterior (N = 8)
Os casos de plagiocefalia posterior verdadeira são
C raros (0,3/10.000 nascimentos) na maioria das séries
publicadas, correspondendo a 1% a 3% dos casos22.
Deve-se tomar extremo cuidado ao se fazer o diag-
nóstico diferencial em relação à plagiocefalia postu-
ral. A deformidade postural teve aumento significati-
vo a partir de 1992, quando a Sociedade Americana
de Pediatria publicou uma recomendação para que os
bebês ficassem em decúbito dorsal, evitando, assim,
Fig. 41.18 – (A a C) Remodelamento da barra supra-orbitária casos de morte súbita do lactente23. Essa medida foi
por realização de osteotomias para obtenção do formato final. eficaz, porém trouxe significativo aumento das defor-
midades posturais e o risco de procedimentos cirúrgi-
cos desnecessários para correção occipital.
Braquicefalia (N = 28) O tratamento das deformidades posturais deve-se
basear na identificação de possíveis causas, como:
O princípio fundamental para a correção da bra- doenças neuromusculares, torcicolo congênito etc.
quicefalia baseia-se no conceito do frontal flutuante A orientação aos pais quanto à mudança na posição
postulado por Marchac e Renier6. da criança é a medida mais importante a ser adotada.
A idéia é a realização de um avanço frontal bila- A utilização de órtese (capacete) para remodelamen-
teral por meio da confecção de um frontal e avanço to craniano tem sido questionada pelo alto custo do
da barra supra-orbitária (2 cm), fixando-a nas regiões tratamento, porém nos Estados Unidos é um método
temporais bilateralmente (Figs. 41.19 e 41.20). bastante utilizado.
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467
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

Fig. 41.19 – Técnica de correção de braquicefalia por remo- Fig. 41.21 – Técnica cirúrgica para correção da plagiocefalia
delamento frontal e avanço frontoorbitário bilateral. Esquema posterior verdadeira (tongue and groove). Esquema reproduzido
reproduzido com permissão7. com permissão7.

A
A

Fig. 41.20 – (A) Aspecto do conjunto frontoorbitário e fi-


xação com fio de aço. (B) Avanço obtido com a técnica apre-
sentada.

Na plagiocefalia verdadeira, o tratamento cirúrgi-


co baseia-se na expansão occipital, por meio de téc-
nica de transposição óssea ou da técnica do tongue
and groove24. Deve-se tomar extremo cuidado na ava-
liação pré-operatória, por meio de exame de imagem
para identificação de esquírola óssea e da posição dos Fig. 41.22 – (A) Pré e (B) pós-operatório de correção de
seios venosos (Figs. 41.21 e 41.22). plagiocefalia

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41 – Craniossinostose Precoce

Oxicefalia (N = 8) Em pacientes submetidos apenas ao avanço do tipo


Le Fort III, os índices de recorrência da obstrução
A barra supra-orbitária deve ser retirada e repo- respiratória e apnéia são elevados, principalmente pe-
sicionada com uma rotação anterior. O novo frontal las forças de tração exercidas pela musculatura facial
deve ser retirado em uma área do crânio exposta para e mastigatória (Figs. 41.24 e 41.25).
obtenção de avanço bifrontal adequado.
Além do remodelamento frontoorbitário, a técnica A
do morcelamento pode ser realizada para descom-
pressão cerebral adequada, com redução da hiperten-
são intracraniana crônica (Fig. 41.23).
A oxicefalia pode ser vista em casos de recidiva
de craniossinostose, inicialmente diagnosticada como
formas simples.

Fig. 41.23 – Técnica para reconstrução da região frontoor-


bitária em oxicefalia. Esquema reproduzido com permissão7.

Facecraniossinostoses (N = 43)
O objetivo da estratégia cirúrgica em pacientes
com facecraniossinostoses é minimizar os danos po-
tenciais decorrentes da hipertensão intracraniana crô-
nica, comumente observada nesses pacientes. B
A estratégia de tratamento deve ser subdividida
em duas etapas. Inicialmente procuramos realizar um
avanço frontoorbitário bilateral, com o fito de alcan-
çarmos uma descompressão cerebral adequada.
A maioria dos pacientes apresenta braquicefa-
lia como forma de craniossinostose, assim a técnica
cirúrgica deve seguir os princípios já demonstrados
anteriormente.
A cirurgia para o avanço frontoorbitário deve ser
feita preferencialmente antes do primeiro ano de vida.
O avanço frontoorbitário permite uma melhora na
proptose ocular, com subseqüente proteção ocular.
Em uma segunda etapa, o avanço do terço médio
da face deve ser planejado, nos casos em que haja
comprovadamente o prejuízo funcional da respiração,
decorrente da obstrução respiratória por hipoplasia
maxilar.
Temos indicado a cirurgia de monobloco, a qual
consiste no avanço frontoorbitário e osteotomias na
face do tipo Le Fort III em pacientes com idade entre
4 e 6 anos7.
O avanço em monobloco deve ser sustentado por Fig. 41.24 – (A) Paciente com síndrome de Crouzon. Nota-
se grave hipoplasia maxilar e dificuldade respiratória. (B) Ra-
intermédio da utilização de distratores (externos ou diografia simples do crânio mostrando sinais de hipertensão
internos), que permitem a manutenção do avanço25,26. intracraniana crônica.
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469
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

A Somente em casos graves, sindrômicos, com idade


inferior a 1 ano, que apresentem insuficiência respi-
ratória, indicamos a traqueostomia, para proteção da
via aérea. O ideal nesses casos seria a realização de
cirurgias do tipo monobloco, porém o risco cirúrgi-
co é extremamente elevado, em decorrência do baixo
peso das crianças e o porte da cirurgia.
O tratamento do hipertelorismo, quando presente,
deve ser planejado posteriormente.
Essas crianças, em geral, necessitam de várias
intervenções cirúrgicas para obtenção de resultados
satisfatórios ao longo da vida.

Hidrocefalia
A associação de craniossinostose e hidrocefalia é
uma situação rara, porém de difícil condução. Existe
um conflito fisiológico, pois o objetivo da cirurgia da
craniossinostose é a expansão cerebral, e o objetivo
do tratamento da hidrocefalia é a redução do tamanho
dos ventrículos.
A meta é determinar quando realizar derivação no
paciente que apresenta dilatação ventricular. Se a di-
latação ventricular for considerada progressiva, indi-
camos a terceiroventriculostomia endoscópica, após
B
o estudo anatômico por RNM de encéfalo.
A derivação ventriculoperitoneal deve ser reser-
vada aos casos em que haja falha no funcionamento
da terceiroventriculostomia, pois existe um risco de
hiperdrenagem e, conseqüentemente, formação de
hematomas crônicos e/ou cefaléia refratária.
Cinalli et al.27 determinaram a fisiopatologia da di-
latação ventricular, presente principalmente em face-
craniossinostoses. A Fig. 41.26 sintetiza o mecanismo
proposto pelos autores.

Obstrução do forame jugular


Fusão progressiva de suturas da base do crânio

Restrição do tamanho da Aumento da pressão do


fossa posterior (Chiari tipo I) sistema liquórico

Aumento da PIC
Dilatação ventricular

Fig. 41.26 – Organograma representando o mecanismo en-


volvido na dilatação ventricular em pacientes com craniossi-
nostoses.

Fig. 41.25 – (A) Pós-operatório tardio de cirurgia do tipo


monobloco (9 meses) após remoção dos distratores internos CONCLUSÃO
(esquerdo). (B) Radiografia simples do crânio mostrando a po-
sição dos distratores internos (superiores e inferiores) utiliza- Apesar de grandes movimentações ósseas, obser-
dos para manutenção do avanço craniofacial obtido por meio vamos um número reduzido de complicações, tais
do monobloco. como: reabsorção óssea, osteomielite etc.

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41 – Craniossinostose Precoce

Na nossa casuística, a taxa de complicações foi in- 12. Hopper RA, Grant GA, Ellenbogen RG. Controver-
ferior a 3%: infecções superficiais em 2/252, tratadas sies in the management of craniosynostosis. Semi-
com curativo e antibiótico; hemorragia significativa nars in Neurosurgery. 2002;13(1):81-95.
em 5/252; fístula liquórica em 1/252. A mortalidade 13. Preston RA, Post JC, Kerts BJB. A gene for Crouzon
observada na nossa série foi de 1%, correspondente a craniofacial dysostosis maps to the long arm of chro-
3 pacientes (escafocefalia, crânio em trevo, comple- mosome 10. Nat Genet. 1994;7:149.
xa). Todos os casos foram relacionados à reposição 14. Reardon W, Winter RM, Rutland P, Pulleyn LJ, Jones
volêmica insuficiente. O último caso de óbito foi re- B, Malcolm S. Mutations in the fibroblast growth
gistrado em 1992. factor receptor 2 gene cause Crouzon syndrome. Nat
Genet. 1994;8:98.
As técnicas anestésicas modernas e, especialmente
15. Robin NH, Feldman GJ, Mitchell HF, Lorentz P,
os cuidados intensivos no pós-operatório, foram fun- Wilroy RS, Zackai EH, et al. Linkage of Pfeiffer syn-
damentais para a redução de complicações graves. drome to chromosome 8 centromere and evidence for
O tratamento cirúrgico deve ser indicado precoce- genetic heterogeneity. Hum Mol Genet. 1994;3:2153.
mente, de preferência antes do primeiro ano de vida. 16. Schell U, Hehr A, Feldman GJ, Robin NH, Zackai
O acompanhamento das crianças deve ser feito de EH, et al. Mutations in FGFR1 and FGFR2 cause
maneira organizada e multidisciplinar, para definir a familial and sporadic Pfeiffer syndrome. Hum Mol
estratégia no tratamento e eventuais cirurgias de que Gen. 1995;4:323.
elas necessitem. 17. Moloney DM, Slaney SF, Oldridge M, Wall SA, Sahlin
Os resultados funcionais e estéticos obtidos com téc- P, Stenman G, et al. Exclusive paternal origin of new
nicas tradicionais e consagradas apresentam um índice mutations in Apert syndrome. Nat Genet. 1996;13:48.
satisfatório (ótimo/bom) em mais de 80% dos casos. 18. Renier D, Arnaud E, Cinalli G, Sebag G, Zerah M,
Marchac D. Prognosis for mental function in Apert’s
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42
Malformações Congênitas
Correlação entre Exames de Imagem e
Anatomia Patológica
Gustavo Novelino Simão
Hélio Rubens Machado
Ricardo Santos de Oliveira
Luciano Neder
Antonio Carlos dos Santos

INTRODUÇÃO tubo neural. Entre as malformações que ocorrem nes-


se período do desenvolvimento embrionário encon-

N
este capítulo, serão descritos os principais tram-se anencefalias, encefaloceles, meningoceles e
elementos diagnósticos das malformações do malformação de Chiari II.
sistema nervoso central dos seres humanos, na
primeira metade da embriogênese, correlacionando
achados de neuroimagem com os da neuropatologia. Anencefalias
As malformações do sistema nervoso central são Anencefalia foi definida por Lemire et al.3 como
classificadas de acordo com a época em que ocorre o “um termo geral, utilizável em todos os espécimes
distúrbio do desenvolvimento. Até 4 semanas de gesta- com ausência parcial ou completa da calota craniana,
ção são as malformações relacionadas com a indução assim como dos tecidos que a recobrem e graus va-
dorsal. Entre 5 e 10 semanas, são relacionadas à indu- riáveis de malformação e destruição dos rudimentos
ção ventral. E de 2 a 5 meses de vida intra-uterina, as cerebrais expostos”. O envolvimento da coluna pode
alterações relacionadas com a migração e a organiza- variar da falha no fechamento da coluna vertebral su-
ção cortical, que não serão abordadas neste capítulo. perior até a craniorraquisquise. Normalmente o diag-
nóstico é feito no exame ultra-sonográfico, durante
EMBRIOGÊNESE fases precoces da gestação (Fig. 42.1).
O sistema nervoso central é formado a partir do
neuroectoderma. Aproximadamente no 18o dia de
gestação, inicia-se a diferenciação de uma região do
ectoderma em neuroectoderma, induzido pelas célu-
las da notocorda.
O neuroectoderma desenvolve dobras nas re­giões
laterais, que se aproximam e se juntam em um pro-
cesso denominado de neurulação. O processo de fe-
chamento do tubo neural provavelmente apresenta
múltiplos locais de fechamento1, iniciando-se no dia
22 na região cervical alta, com a abertura cefálica, o
neuroporo rostral, se fechando no 25º dia. O neuropo-
ro caudal se fecha após dois dias2.

DEFEITOS DO FECHAMENTO DO TUBO NEURAL


Fig. 42.1 – Anencefalia. Hipoplasia da calota craniana com
Distúrbios relacionados à neurulação primária conteúdo caracterizado por tecido irregular e avermelhado, a
também são denominados defeitos de fechamento do cerebrovasculosa. Pescoço curto e globos oculares protrusos.

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473
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

Os achados macroscópicos incluem: A B C


• Ausência ou hipoplasia da calota craniana.
• Conteúdo intracraniano substituído por uma
massa vascular e irregular, a cerebrovasculosa.
• Base do crânio espessada ou plana.
• Órbitas rasas com protrusão dos globos oculares.
• Sela rasa.

Encefaloceles
As cefaloceles são herniações do conteúdo intra-
craniano por um defeito ósseo na calota craniana. In-
cluem as meningoencefaloceles, as meningoceles, as Fig. 42.4 – Encefalocele parietal. (A) Foto pré-operatória de
paciente com extensa herniação superior, extracraniana, na
encefaloceles atrésicas e as glioceles e, geralmente, linha média da região parietal, de conteúdo intracraniano. (B e
ocorrem na linha média4. C) Imagens sagital T1 e coronal FLAIR de ressonância magné-
O defeito ósseo pode manifestar-se na base do tica do mesmo paciente, demonstrando elementos meníngeos
crânio (osso endocondral) e, provavelmente, decorre e do parênquima cerebral, caracterizando uma encefalocele.
da falha de fechamento do tubo neural ou da falha
em centros de ossificação. As alterações no calvário Malformação de Chiari II
(osso membranoso) podem se originar do defeito na Em 1891, Chiari descreveu três malformações no
indução óssea, erosão compressiva ou na falha do fe- rombencéfalo associadas com hidrocefalia. A malfor-
chamento do tubo neural5,6. mação de Chiari I pode ser definida simplesmente
As encefaloceles (Figs. 42.2 a 42.7) são classifica- como o deslocamento inferior das tonsilas cerebelares
das de acordo com o local do defeito ósseo no crânio. (está descrita nesta parte do capítulo apenas por con-
Tradicionalmente são divididas em quatro grandes veniência, já que não se enquadra nas desordens de fe-
categorias: occipitais, parietais, frontoetmoidais e ba- chamento do tubo neural). Pode resultar de várias cau-
sais, sendo as occipitais as mais freqüentes7. sas, incluindo malformações da junção craniocervical,
podendo decorrer, em alguns casos, de um quadro de
hidrocefalia transitória intra-uterina, alterações na base
A B do crânio como platibasia e invaginação vertebrobasi-
lar, aumento da pressão intracraniana não relacionada à
hidrocefalia e, ainda, um grupo de pacientes com shunts
liquóricos espinhais ou fístula liquórica espinhal8.
A malformação de Chiari II (Figs. 42.8 a 42.14) é
mais complexa e sua etiologia ainda não é totalmente
compreendida. Teorias relacionadas à tração parecem
óbvias, porém não conseguem explicar vários acha-
dos. Alterações no mesoderma primário9 e defeitos
na neurulação10 têm sido colocados como possíveis
causas da malformação de Chiari II.
Fig. 42.2 – Encefaloceles. (A) Encefalocele occipital, de pe- Pacientes com essa anomalia apresentam uma mie-
quenas dimensões, recoberta por pele. (B) Encefalocele anterior,
frontoetmoidal não recoberta por pele, apenas tecido meníngeo. lomeningocele ao nascimento e normalmente, após a
correção cirúrgica, desenvolvem um quadro de hidro-
cefalia. A fossa posterior é pequena, com implantação
A B baixa do tentório. As estruturas do rombencéfalo estão
comprimidas, com redução dos espaços liquóricos da
fossa posterior. Outras alterações geralmente estão pre-
sentes: aspecto em bico do teto do mesencéfalo, deslo-
camento inferior do tronco cerebral, com redução do
diâmetro ântero-posterior da ponte, o bulbo abaixo do
forame magno, acotovelamento da junção bulbocervi-
cal: seio reto em posição vertical e fenestrações da foice
cerebral com interdigitação de giros cerebrais. Outras
Fig. 42.3 – Encefalocele. (A e B) Ressonância magnética alterações também podem ser observadas, como hipo-
durante o período gestacional, sagital e axial T2, demonstran- plasia do corpo caloso, aumento da cabeça dos núcleos
do falha óssea na região posterior, com extensa herniação do caudados e da massa intermédia, anomalias de migração
parênquima cerebral occipitoparietal. neuronal, estenose de aqueduto e siringo-hidromielia8.

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42 – Malformações Congênitas Correlação entre Exames de Imagem e Anatomia Patológica

A B C

Fig. 42.5 – Encefaloceles occipitais. (A a C) Exames de ressonância magnética, com imagens sagitais em T2, de três pacientes,
com herniação occipital, de diferentes dimensões, com conteúdo cerebral e cerebelar.

A B C

Fig. 42.6 – Encefelocele anterior. (A) Exame de tomografia computadorizada da face, demonstrando falha óssea na região
frontonasal. (B e C) Seqüências axial T2 e sagital T1 de exame de ressonância magnética, caracterizando a herniação de conteúdo
intracraniano pela falha óssea. A tomografia computadorizada caracteriza melhor o defeito ósseo e a ressonância magnética o
conteúdo herniado.

A B C

Fig. 42.7 – Encefaloceles atrésicas. (A e B) Radiografia frontal do crânio e seqüência sagital T1 em ressonância magnética do
mesmo paciente, demonstrando pequena falha óssea arredondada na região occipital, preenchida por pequena formação com
sinal intermediário, caracterizada por um tecido glioependimário vascularizado. (C) Imagem sagital T2 de outro paciente com
herniação de conteúdo intracraniano por falha óssea occipital. Há alteração na orientação normal do tentório.
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475
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

A B

Fig. 42.9 – Malformação de Chiari II. (A) Fossa posterior


em que se nota o deslocamento interior das tonsilas cerebela-
Fig. 42.8 – Malformação de Chiari II. Esquemas demons- res e as impressões no cerebelo em decorrência das pequenas
trando os achados típicos da malformação, que incluem a fos- dimensões da fossa posterior. (B) Corte coronal do cérebro de-
sa posterior de pequenas dimensões, com herniação inferior monstrando ausência do septo pelúcido, dilatação ventricular
das tonsilas cerebelares, e associação com mielomeningocele e espessamento da massa intermédia.
lombossacra.

A B C

Fig. 42.10 – Malformação de Chiari II. Ressonância magnética: (A) sagital em T1, demonstrando a fossa posterior de pequenas
dimensões, com inserção baixa do tentório, deslocamento inferior das tonsilas cerebelares, mesencéfalo pontiagudo e o corpo
caloso deformado e afilado; (B e C) axiais em T2 e T1, demonstrando a deformidade cerebelar decorrente das pequenas dimensões
da fossa posterior e interdigitação de giros na região parietal, por fenestração na foice cerebral.

A B C

Fig. 42.11 – Malformação de Chiari II. Ressonância magnética: (A) sagital em T1, demonstrando a fossa posterior de pequenas
dimensões, com inserção baixa do tentório, deslocamento inferior das tonsilas cerebelares, mesencéfalo pontiagudo, dilatação
ventricular supratentorial e arqueamento do corpo caloso. (B e C) Axiais em T2, demonstrando a fossa posterior de pequenas di-
mensões, com redução difusa dos espaços liquóricos e deslocamento inferior das tonsilas cerebelares através do forame magno.

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42 – Malformações Congênitas Correlação entre Exames de Imagem e Anatomia Patológica

A B

Fig. 42.14 – Malformação de Chiari II. Ressonância mag-


nética sagital em T1 do encéfalo com vários achados caracte-
rísticos dessa malformação. A fossa posterior tem pequenas
Fig. 42.12 – Malformação de Chiari II. (A) Vista posterior da dimensões, com compressão das estruturas cerebelares e do
região da coluna apresentando defeito de fechamento posterior quarto ventrículo. Aspecto pontiagudo do teto do mesencé-
com alargamento do espaço interpedicular na região lombossa- falo. O corpo caloso está alongado e afilado. Há aumento do
cra e herniação posterior de elementos meníngeos. (B) Imagem espaço liquórico em regiões posteriores, após derivação ventri-
da fossa posterior, em que se observa deslocamento inferior das cular. O padrão de giros na região posterior está alterado, com
tonsilas cerebelares em paciente com mielomeningocele. uma configuração denominada de estenogiria.

A malformação de Chiari III é uma alteração rara,


originalmente descrita como o deslocamento inferior
do bulbo e a herniação do cerebelo, inicialmente pelo
forame magno e dorsalmente através do disrafismo
cervical aos níveis de C1 e C2. Posteriormente, al-
guns autores estenderam a definição, incluindo casos
de herniação do cerebelo, ponte e bulbo em encefalo-
celes occipitais baixas e cervicais altas11.

MALFORMAÇÕES RELACIONADAS À
DIVERTICULAÇÃO E SEGMENTAÇÃO
O tubo neural cefálico ao quarto par de somitos
vai-se transformar no encéfalo. Durante a quarta se-
mana, formam-se três vesículas encefálicas primá-
rias: o encéfalo anterior ou prosencéfalo, o encéfalo
médio ou mesencéfalo e o encéfalo posterior ou rom-
bencéfalo. Na quinta semana, o prosencéfalo divide-
se parcialmente em duas vesículas, o telencéfalo e o
diencéfalo, e o romboencéfalo divide-se parcialmente
em metencéfalo e mielecéfalo. Dessa maneira, for-
mam-se as cinco vesículas cerebrais2.
Algumas anomalias estão relacionadas com essa
Fig. 42.13 – Malformação de Chiari II. Ressonância mag-
nética sagital em T1 da transição craniocervical, demonstran- época do desenvolvimento embrionário, a fase da
do a extensão posterior do bulbo formando o kink cervico- indução ventral. Entre as malformações, estão as re-
bulbar. lacionadas com o crescimento e a separação das ve-
sículas encefálicas, assim como no desenvolvimento
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477
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

das comissuras incluem-se as holoprosencefalias, a A B


displasia do septo óptico, a agenesia do corpo caloso
e as malformações cerebelares.

Holoprosencefalias
Anomalia estrutural do cérebro, em que há uma
alteração no desenvolvimento do prosencéfalo, com
falha na clivagem do telencéfalo nos dois hemisférios
cerebrais e, algumas vezes, na separação do telencé-
falo e do diencéfalo. Atualmente é considerada mais
como uma falha na indução do prosencéfalo. Freqüen-
temente anomalias faciais (Fig. 42.15) acompanham
as intracranianas. As holoprosencefalias são divididas
em três subcategorias: alobar, semilobar e lobar, que
dependem da gravidade das alterações. Não há uma Fig. 42.16 – Holoprosencefalia alobar. (A) Visão ventral,
demonstrando a fusão completa dos hemisférios cerebrais e
distinção nítida entre as categorias e, na verdade, re- ausência da foice e da fissura inter-hemisférica. (B) Visão pos-
presentam um espectro de alterações8. terior, em que se observa uma cavidade ventricular única e a
fusão das estruturas diencefálicas.
Categorias de Holoprosencefalias
Holoprosencefalia alobar (Figs. 42.16 a 42.20):
forma mais grave, normalmente associada a deformi-
dades faciais na linha média e hipotelorismo. O siste- A B C
ma olfatório muitas vezes não é formado.
• Fusão dos tálamos (Fig. 42.21).
• Ausência da fissura inter-hemisférica e da foi-
ce cerebral.
• Ventrículo único.
• Cisto dorsal.
• Ausência do corpo caloso e do septo pelúcido.
Fig. 42.17 – Holoprosencefalia alobar. (A) Vista anterior.
Fusão completa dos hemisférios cerebrais com ausência da fis-
sura e da foice inter-hemisférica. Há giros rudimentares. (B
e C) Vistas posteriores. Em C, dentro da água, observa-se a
membrana que forma o cisto dorsal. Em B, onde foi retirada
a membrana posterior, há apenas um ventrículo e a fusão das
estruturas diencefálicas.

A B

Fig. 42.18 – Holoprosencefalia alobar. (A e B) Ressonância


magnética durante o período gestacional, sagital e coronal em
T2, demonstrando uma formação liquórica posterior, o cisto
Fig. 42.15 – Holoprosencefalia. Dismorfias craniofaciais que dorsal, com o parênquima apenas na região anterior. A ima-
acompanham a holoprosencefalia, caracterizadas pelo hipoteloris- gem coronal evidencia a fusão completa dos hemisférios cere-
mo ocular e nariz com narina única, caracterizando a cebocefalia. brais e a cavidade ventricular única.

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42 – Malformações Congênitas Correlação entre Exames de Imagem e Anatomia Patológica

A B A B

C D

C D

Fig. 42.21 – Fusão diencefálica e de núcleos da base. (A) Vista


posterior do encéfalo, com separação dos hemisférios cerebrais,
observando-se a fusão das estruturas do diencéfalo e dos núcle-
os da base. (B a D) Imagens coronal e axial em T2 de ressonân-
cia magnética, demonstrando fusão das estruturas do diencéfalo
e dos núcleos da base. Há separação dos hemisférios cerebrais,
Fig. 42.19 – Holoprosencefalia alobar. (A) Exame de resso- presença da foice inter-hemisférica e dilatação ventricular com
nância magnética sagital em T1, demonstrando grande cisto comunicação com o espaço subaracnóide. (D) Coronal em T2,
dorsal e parênquima cerebral na região anterior. Não se indi- demonstrando a separação dos hemisférios cerebrais.
vidualiza o corpo caloso. (B e C) Coronal em T1 e axial em T2.
Não há fissura inter-hemisférica. Presença de cavidade ven-
tricular única. (D) Axial T2. Há fusão da região dos tálamos e
núcleos da base. A B

A B C

C D
Fig. 42.20 – Holoprosencefalia alobar. (A) Vista posterior do
encéfalo com cavidade ventricular única e fusão dos tálamos.
(B e C) Ressonância magnética coronal em T1 e corte coronal
de exame de ultra-sonografia transfontanela, demonstrando
as alterações observadas na visão posterior do encéfalo.

Holoprosencefalia semilobar (Fig. 42.22): forma


intermediária com face normal ou alterações leves.
• Fusão das regiões anteriores do cérebro.
Fig. 42.22 – Holoprosencefalia semilobar. (A) Vista poste-
• Fissura inter-hemisférica e foice cerebral par- rior de encéfalo com separação posterior, em que membranas
cialmente presentes. caracterizavam um cisto dorsal. Na profundidade da imagem
• Fusão parcial dos tálamos (terceiro ventrículo pode-se evidenciar a fusão anterior dos hemisférios cerebrais.
de pequenas dimensões). (B a D) Imagens de exame de tomografia computadorizada de
inferior para superior demonstrando a separação dorsal dos
• Presença apenas do esplênio do corpo caloso. hemisférios cerebrais, com cisto interposto. Há fusão anterior
• Ausência do septo pelúcido. do parênquima cerebral.
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479
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

Holoprosencefalia lobar (Figs. 42.23 e 42.24): semana12, porém seu desenvolvimento não ocorre ao
forma mais leve, com cérebro praticamente normal. mesmo tempo. O primeiro segmento definido é a jun-
• Fusão apenas na região dos lobos frontais, com ção entre a parte dorsal do joelho e a anterior do corpo.
hipoplasia dos lobos e dos cornos frontais dos Segue-se com a formação do joelho, a parte anterior
ventrículos laterais. do corpo, a parte posterior do corpo, o esplênio e, por
• Presença da porção posterior do corpo caloso. último, o rostro13. O corpo caloso se forma entre 12 e
• Hipoplasia da região anterior da foice cerebral. 20 semanas de gestação14, o mesmo período em que
• Terceiro ventrículo normal. todo o encéfalo está se formando, o que pode explicar
a associação freqüente das anomalias do corpo caloso
• Ausência do septo pelúcido.
com outras malformações encefálicas13.
A agenesia do corpo caloso causa uma série de al-
Malformações do Corpo Caloso terações estruturais em comparação ao encéfalo nor-
O desenvolvimento das comissuras cerebrais de- mal (Figs. 42.25 a 42.28). São elas:
pende do crescimento de axônios de ambos os hemis- • A presença de bandas de substância branca,
férios em uma região denominada de lamina reuniens, as fibras de Probst, que percorrem a margem
uma área dorsal de espessamento da lamina termina- medial dos ventrículos laterais, determinando
lis. As primeiras fibras do corpo caloso começam a uma forma crescente aos ventrículos em um
cruzar a linha média por volta da décima segunda corte coronal.

A B C

Fig. 42.23 – Holoprosencefalia lobar. (A a C) Imagens de ressonância magnética em axial T1, axial T2 e sagital T1, demons-
trando fusão frontal dos hemisférios cerebrais, com os cornos frontais dos ventrículos laterais de pequenas dimensões. Observa-
se apenas a região do esplênio do corpo caloso

A B C

Fig. 42.24 – Holoprosencefalia lobar dorsal. (A a C) Imagens de ressonância magnética em axial T2, coronal T1 e sagital T1,
demonstrando fusão dos hemisférios cerebrais na região na transição frontoparietal, com alteração na morfologia dos giros cere-
brais e do córtex na região. Observam-se região do joelho e esplênio do corpo caloso. Na região onde há a fusão dos hemisférios
cerebrais não se observa o corpo caloso.

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42 – Malformações Congênitas Correlação entre Exames de Imagem e Anatomia Patológica

A B C

Fig. 42.25 – Agenesia do corpo caloso. (A) Vista anterior, com separação dos hemisférios cerebrais, não sendo visualizado o
corpo caloso. (B) Corte sagital do encéfalo na linha média, demonstrando a ausência completa do corpo caloso e o aspecto con-
vergente dos sulcos para o terceiro ventrículo e a ausência da formação do sulco do cíngulo. (C) Corte coronal do encéfalo, com
a ausência da união dos hemisférios cerebrais por agenesia do corpo caloso. Há na margem dos ventrículos laterais uma banda
de substância branca que deforma sua face medial, denominada de fibras de Probst.

A B C

Fig. 42.26 – Agenesia do corpo caloso. Ressonância magnética: (A) sagital em T1, na linha média, observando-se ausência
completa do corpo caloso e o aspecto convergente dos sulcos para o terceiro ventrículo, com ausência da formação do sulco do
cíngulo; (B) coronal em T1, com ausência da união dos hemisférios cerebrais por agenesia do corpo caloso. Há, na margem dos
ventrículos laterais, uma banda de substância branca que deforma sua face medial, denominada de fibras de Probst; (C) axial
em T1, demonstrando o paralelismo dos ventrículos laterais, que se apresentam mais proeminentes nas regiões posteriores, a
colpocefalia. Na margem medial dos ventrículos laterais observam-se as fibras de Probst.

• Alargamento e extensão superior do terceiro superior do tentório, hipoplasia do verme cerebelar


ventrículo. e dilatação cística do quarto ventrículo que preen-
• Aspecto de colpocefalia, causado pela dilata- che quase toda a fossa posterior15,16 (Figs. 42.29 a
ção da região dos trígonos ventriculares e do 42.31). A alteração primária parece ser a obstrução
corno occipital dos ventrículos laterais. intra-uterina dos forames de drenagem do quarto
• Eversão do giro do cíngulo, não se formando ventrículo, causando seu aumento e deslocamento
o sulco do cíngulo e dando o aspecto radial da superior, impedindo a fusão dos hemisférios cere-
disposição dos giros cerebrais na linha média belares e, conseqüentemente, a formação do verme
em uma visão sagital. cerebelar. A malformação clássica de Dandy-Walker
• Paralelismo dos ventrículos laterais. está relacionada com hidrocefalia em cerca de 75%
dos pacientes.
A síndrome foi denomina de “Dandy-Walker” por
Malformação de Dandy-Walker Benda17 e seis são os achados:
A malformação de Dandy-Walker consiste em • Dilatação cística do quarto ventrículo.
uma fossa posterior aumentada com deslocamento • Hipoplasia do verme cerebelar.
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481
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

A B C

D E F

Fig. 42.27 – Agenesia do corpo caloso. (A a C) Corte de cérebro na linha média, imagem sagital de exame de ultra-sonografia
transfontanela e sagital em T1 do encéfalo em ressonância magnética, demonstrando a ausência do corpo caloso e convergência dos
giros em direção ao terceiro ventrículo. (D a F) Corte coronal do encéfalo, imagem coronal de exame de ultra-sonografia transfonta-
nela e corte coronal em T1 do encéfalo em ressonância magnética, demonstrando a ausência do corpo caloso e a alteração na morfo-
logia habitual dos ventrículos laterais que apresentam aspecto pontiagudo em decorrência das fibras de Probst na sua face medial.

A B

C D E

Fig. 42.28 – Corpo caloso. Imagens sagitais de ressonância magnética do encéfalo em T1. (A) Aspecto habitual do corpo calo-
so, com as quatro diferentes regiões: rostro, joelho, corpo e esplênio. (B) Agenesia do corpo caloso. (C a E) Hipoplasias do corpo
caloso em diferentes graus de acometimento.

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42 – Malformações Congênitas Correlação entre Exames de Imagem e Anatomia Patológica

A B

Fig. 42.29 – Malformação de Dandy-Walker. (A) Vista in-


ferior evidencia aumento do quarto ventrículo e hipoplasia do
verme cerebelar. (B) Corte na linha média demonstra a hipo-
plasia do verme, com deslocamento superior da porção rema-
nescente e alargamento do quarto ventrículo. Há agenesia do
corpo caloso. Fig. 42.31 – Malformação de Dandy-Walker. Esquema na
linha média demonstra a hipoplasia do verme, com desloca-
mento superior da porção remanescente, associado a formação
cística posterior.

A B

Fig. 42.32 – Malformação de Dandy-Walker. (A e B) Ima-


gens axial T2 e sagital T1 demonstram a hipoplasia do verme
cerebelar, com presença de um lobo apenas, aumento das di-
mensões da fossa posterior, preenchida por grande formação
liquórica.

A B
Fig. 42.30 – Malformação de Dandy-Walker. Vista inferior
evidencia aumento do quarto ventrículo e da fossa posterior,
associado à hipoplasia do verme cerebelar.

• Elevação do tentório cerebelar, dos seios trans-


verso e laterais e da tórcula.
• Obstrução dos forames de Luschka e Magendie.
• Aumento das dimensões da fossa posterior. Fig. 42.33 – Malformação de Dandy-Walker. (A) Imagem
sagital em T1 demonstrando hipoplasia e deslocamento su-
• Hidrocefalia. perior do verme cerebelar, com aumento da fossa posterior,
Nem todos esses achados estão presentes em todos preenchida por formação liquórica. Há dilatação ventricular
os pacientes, mas dois achados são considerados es- supratentorial. (B) Corte sagital de exame de ultra-sonografia
transfontanela, com dilatação ventricular supratentorial, hipo-
senciais, a hipoplasia do verme cerebelar e a dilatação plasia do verme cerebelar e formação liquórica na fossa poste-
cística do quarto ventrículo (Figs. 42.32 a 42.34). rior, que se apresenta com dimensões aumentadas.
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483
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

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(A e B) Imagens axial e sagital em T1 demonstram hipoplasia
do verme cerebelar, aumento das dimensões da fossa posterior,
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que se apresenta preenchida por grande formação liquórica. 11. Castillo M, Quencer RM, Dominguez R. Chiari III
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43
Derivação Ventriculoperitoneal
Fernando Campos Gomes Pinto
Tatiana Tanaka

ASPECTOS GERAIS 2. Mecanismo: bola-mola e diafragma suportam


melhor liquor com proteína elevada.

O
s três elementos fundamentais de uma deri-
3. Pressão:
vação ventriculoperitoneal (DVP) são: cate-
ter proximal (ou cateter ventricular), válvula –– Baixa para crianças com fontanela aberta,
e cateter distal (ou cateter peritoneal). para evitar aumento do crânio.
–– Alta quando houver lesão expansiva em
A válvula tem duas funções: evitar o refluxo e es-
fossa posterior, para evitar herniação as-
tabelecer um gradiente mínimo de pressão para aber-
cendente por hiperdrenagem.
tura, permitindo o fluxo. Existem três mecanismos
básicos de funcionamento das válvulas: fenda (por –– Média nas demais situações.
exemplo, Holter®), diafragma (por exemplo, PSMe-
dical®) ou bola-mola-cone (por exemplo, Hakim®) TÉCNICA CIRÚRGICA
(Fig. 43.1). Preconiza-se o banho na véspera e no dia da cirurgia
Conforme a pressão de trabalho, as válvulas po- com sabão degermante (Povidine® ou Clorexidina®).
dem ser classificadas como de alta (> 8 cmH2O), mé- A posição correta do paciente facilita a implanta-
dia (4 a 8 cmH2O) ou baixa pressão (< 4 cmH2O). ção da DVP. A cabeça é virada para o lado oposto da
A Fig. 43.2 descreve a resposta, em termos de fluxo, incisão e elevada para o acesso occipital, enquanto
de diferentes válvulas quando submetidas a diferentes o pescoço e o tronco devem estar estendidos com a
gradientes de pressão. colocação de um coxim abaixo dos ombros.
Considerando que cada reta corresponda a uma Depois de anestesiado e posicionado, o pacien-
válvula, observa-se que: te deve ser lavado com degermante por 10 minutos.
1. A relação pressão × fluxo é linear, ou seja, para Aplica-se, então, a solução alcoólica correspondente
determinado aumento no gradiente de pressão ao tipo do degermante utilizado. Colocados os cam-
ocorrerá um aumento diretamente proporcio- pos, a utilização de adesivo estéril sobre a pele (por
nal no fluxo. exemplo, Iobam®) é aconselhável (Fig. 43.3), bem
2. Para gerar um fluxo de 10 ml/h, a válvula de alta como a troca de luvas cirúrgicas por todos os mem-
pressão precisa de um gradiente de 10 cmH2O, a bros da equipe no momento do contato com a prótese
de média precisa de 6 e a de baixa, de 2. (cateteres e válvula).
Para escolher uma válvula devem ser considera- A colocação de uma DVP pode ser dividida em
dos: três tempos1-3:
1. Formato: para recém-nascido, escolher válvula 1. Preparo dos acessos (crânio e abdome).
pequena e delgada para evitar isquemia da pele 2. Passagem do cateter distal e conexão à válvula.
por compressão. 3. Punção ventricular e conexão à válvula.

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Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

Holter

Hakin

PS medical

Fig. 43.1 – Exemplos de válvulas.

350

300
Válvula de
250 alta pressão
Pressão (mmH2O)

200
Válvula de média
150 pressão

100
Válvula de baixa
pressão
50

0
5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
Fluxo (ml/h)

Fig. 43.2 – Gráfico de correlação entre pressão e fluxo.

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43 – Derivação Ventriculoperitoneal

A (ponto de Frazier: 3 cm lateral e 7 cm cranial à pro-


tuberância occipital externa). A incisão é arciforme,
com a base voltada para a região retroauricular, onde
ficará a válvula, de modo que o cateter não cruze a
linha de sutura.
A vareta metálica é passada no plano do tecido sub-
cutâneo, da ferida abdominal à ferida no crânio. O cirur-
gião disseca uma loja subgaleal retroauricular, criando
espaço para a válvula. O cateter distal é preso à ponta da
vareta e tracionado por esse trajeto até sair pela ferida
B abdominal. A válvula é conectada ao cateter distal.
A seguir, realiza-se a punção ventricular, com co-
leta de liquor para exame. Conecta-se o cateter ventri-
cular à válvula, e esta é acomodada ao interior da loja.
Confirmado gotejamento distal adequado, o cateter é
colocado dentro da cavidade peritoneal e fecham-se
as feridas por planos (Fig. 43.4).

Fig. 43.4 – Esquema final de DVP parietal posterior à es-


querda em paciente pediátrico.

COMPLICAÇÕES
D
As complicações são geralmente tardias4,5. O porta-
dor de DVP procura o serviço de urgência geralmente
em decorrência dos sintomas a seguir relacionados.

Hiperdrenagem
Fig. 43.3 – Preparo de assepsia e antissepsia. (A) Posiciona- É um fenômeno que ocorre em toda DVP, mas nem
mento com rodilha sob o crânio e coxim sob o ombro, man- sempre gera sintomas. Quando o paciente fica em po-
tendo a transição craniocervicotorácica linear para facilitar a sição ortostática, o cateter distal funciona como uma
passagem da vareta metálica. (B) Degermação com PVPI por coluna líquida de até 40 cm, gerando um gradiente
10 min. (C) Marcação das incisões craniana e abdominal e
aplicação do PVPI alcoólico. (D) Colocação dos campos e ade-
de pressão sobre a válvula muito superior à pressão
sivo estéril sobre a pele. de trabalho. Ocorre, portanto, um esvaziamento dos
ventrículos e todo o sistema passa a funcionar sob
pressão inferior à atmosférica. Os sintomas da hiper-
Os acessos são preparados simultaneamente, no drenagem são cefaléia e vômitos, dependentes da po-
crânio pelo cirurgião e no abdome pelo auxiliar. A sição ortostática. Pode haver complicações, como a
partir de uma incisão transversa paramediana no qua- formação de hematomas extra-axiais ou a síndrome
drante superior do abdome, o auxiliar disseca plano dos ventrículos colabados.
por plano até abrir o peritônio. Esses planos são o te-
cido subcutâneo, a aponeurose superficial do músculo
reto abdominal, o músculo e a aponeurose profunda. Hipodrenagem
A trepanação pode ser realizada no osso frontal Ocorre por falha mecânica em qualquer ponto do
(ponto de Kocher: 2,5 cm lateral à sutura sagital e sistema, geralmente por obstrução (debris) ou desco-
1 cm anterior à sutura coronária) ou no osso parietal nexão. A investigação envolve TC de crânio e radio-
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487
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

grafia de trajeto (Figs. 43.5 e 43.6), considerando que a voso central (meningite e/ou ventriculite), infecção
infecção relacionada ao sistema por vezes se manifesta peritoneal (pseudocisto ou peritonite) ou infecção ao
com hipodrenagem e poucos sinais inflamatórios. longo do trajeto. A contaminação ocorre no ato cirúr-
gico, por germes de pele (do paciente ou do cirurgião)
Infecção Relacionada à Derivação e progride pela presença de material estranho (a pró-
tese de DVP). Ocorre geralmente antes de 2 meses
Ventriculoperitoneal de cirurgia, mas pode levar até 1 ano. O tratamento
Refere-se a qualquer uma das seguintes situações: consiste em retirada do sistema, derivação ventricular
infecção da ferida cirúrgica, infecção do sistema ner- externa e antibióticos por 21 dias.

A B

C D

Fig. 43.5 – Radiografias para investigação da integridade do sistema de DVP e de suas conexões. (A) Crânio em AP; notar o
cateter ventricular intracraniano à esquerda. (B) Crânio em perfil; notar a conexão dos cateteres distal e proximal com a válvula.
(C) Toracoabdominal em AP; notar o trajeto do cateter distal. (D) Abdominal em perfil; notar o cateter intra-abdominal.

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43 – Derivação Ventriculoperitoneal

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Fig. 43.6 – Tomografia de crânio. Corte axial evidenciando


o cateter ventricular parietal posterior à esquerda, com sua
ponta dentro do ventrículo lateral esquerdo.

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489
44
Tratamento Cirúrgico das Craniossinostoses
Helder Zambelli
Paulo Henrique Pires de Aguiar

Introdução nostoses simples quanto complexas, e as aberrações


cromossômicas geralmente resultam em craniossi-

A
s craniossinostoses compreendem um grupo nostoses complexas1-5.
heterogêneo de patologias de origem multifa-
As craniossinostoses complexas são quase total-
torial. A fusão prematura de suturas cranianas
mente causadas por mutações gênicas. A mais comum
pode estar associada a deformidades grosseiras do
é a da família dos receptores do fator de crescimento
crânio e da face e, também, pode causar séria constri-
do fibroblasto. A mutação dos genes dessa família de
ção ao cérebro em desenvolvimento (cranioestenose),
receptores vem sendo relacionada às síndromes de
aos olhos (orbitoestenose) e às vias aéreas superiores.
Apert, Crouzon e Pfeiffer, todas apresentando cra-
A cranioestenose pode resultar em aumento da pres-
niossinostose complexa. Aquele fator de crescimento
são intracraniana, prejudicando a visão e o funciona-
está envolvido no controle da osteogênese nas suturas
mento cerebral. A orbitoestenose pode resultar em ex-
cranianas5.
trusão dos olhos e conseqüente lesão das córneas. Já
a constrição das vias aéreas superiores pode acarretar
dificuldades respiratórias. CLASSIFICAÇÃO
A fusão prematura das suturas não é uma entidade Classicamente as cranioestenoses podem ser divi-
única, e sim um processo patológico não específico de didas em:
causas variadas. A craniossinostose primária, ou sim- • Escafocefalia
ples, é familiar para a maioria dos neurocirurgiões; o • Plagiocefalia
termo se refere a sinostoses de uma única ou de múl-
• Anterior
tiplas suturas em crianças que são neurologicamente
normais. Esses casos são geralmente esporádicos, po- • Posterior
rém podem ocorrer em formas familiais. As craniossi- • Trigonocefalia
nostoses sindrômicas, ou complexas, são aquelas que • Oxicefalia
ocorrem em síndromes de malformações congênitas • Braquicefalia
complexas. O termo “craniossinostose secundária” se • Disostoses craniofaciais
refere às craniossinostoses causadas por teratógenos, • Crouzon
alterações metabólicas ou doenças hematológicas. As • Apert
craniossinostoses secundárias também podem ser de- • Chotzen
correntes da falta de crescimento nas linhas de sutura,
causada por microcefalia, encefalocele ou hidrocefa- • Pfeiffer
lia derivada. • Carpenter
Causas genéticas das craniossinostoses primárias • Kleeblattschädel
(simples e complexas) incluem defeitos mendelianos As malformações associadas mais comuns são:
– monogênicos – e aberrações cromossômicas. Os • Sindactilia
defeitos mendelianos podem causar tanto craniossi- • Atrofia de coana

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491
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

• Lábio fendido
• Palato fendido
• Holoprosencefalia
• Agenesia de corpo caloso
• Hidrocefalia
• Doença cardíaca congênita
• Espinha bífida
• Malformação de Arnold Chiari
• Criptorquidismo
• Hipogenitalismo

Epidemiologia
Como já mencionado anteriormente, a maioria dos
casos de craniossinostose simples é esporádica. Esti-
ma-se que cerca de 8% das sinostoses coronais e 2%
das sinostoses sagitais (Figs. 44.1 a 44.8) (o tipo mais
comum de sinostoses primárias) sejam de origem fa-
milial. As famílias afetadas podem ter os membros
com sinostoses em diferentes suturas e, em casos de
sinostose da sutura coronal, pode haver acometimento
uni ou bilateral. O caráter dominante de transmissão
da doença é mais comum que o recessivo.
As craniossinostoses complexas, como também já
foi descrito, são causadas, em sua maioria, por mu-
tações gênicas. E são menos prevalentes que as cra-
niossinostoses simples. A prevalência de cada tipo de Fig. 44.2 – Criança de 6 meses de idade, do sexo feminino,
com fusão de sutura coronal, escafocefalia, posicionada para a
craniossinostose está especificada no item a seguir. cirurgia, visão superior.

Fig. 44.1 – Caso 1: criança de 6 meses de idade, do sexo Fig. 44.3 – Marcação da incisão, bicoronal extensa.
feminino, com fusão de sutura sagital, escafocefalia, posicio-
nada para a cirurgia.

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44 – Tratamento Cirúrgico das Craniossinostoses

Fig. 44.4 – Rebatimento do plano musculocutâneo.

Fig. 44.7 – (A e B) Aspecto estético final aos 8 meses.

Fig. 44.5 – Suturectomia sagital.

Fig. 44.8 – Aspecto estético aos 3 anos de idade.

FISIOPATOGENIA
O fechamento precoce das suturas provoca, se-
Fig. 44.6 – Suturectomia e osteotomias descompressivas gundo Moss1:
nos ossos frontais e parietais após remodelagem e recolocação • Toda expansão óssea em direção perpendicular
(morcelação). à sutura cessa.
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493
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

• O volume de expansão da massa neural é redi-


recionado de maneira compensatória.
Em relação aos aspectos genéticos, pode-se aferir,
segundo Cohen2:
• Não há evidência em fusão prematura de cra-
nioestenose simples.
• Há freqüências de casos de modo autossômico
dominante ou autossômico recessivo em casos
de sutura simples.
• Parte de síndromes genéticas de múltiplas
malformações – 11 síndromes cromossômicas,
27 síndromes monogênicas (Apert, Crouzon,
etc.), 2 síndromes induzidas teratogenicamente
(aminopterin), 18 síndromes de origem desco-
nhecida.

Quadro clínico
A sutura mais comumente acometida na craniossi-
nostose primária é a sagital (escafocefalia) (Figs. 44.1 Fig. 44.10 – TC com reconstrução helicoidal em 3D mostra
a 44.8), que corresponde de 45% a 50% dos casos. fusão precoce da sutura coronária unilateral (plagicefalia) em
Nesta apresentação da doença, os homens represen- criança de 6 meses.
tam de 73% a 80% dos pacientes. Também, o caráter
familial é pouco presente, sendo de apenas 2%.
Plagiocefalia frontal, causada por sinostose uni-
lateral da sutura coronal, é a segunda maior causa
de craniossinostose primária, com prevalência entre
20% e 25% (Figs. 44.9 a 44.14). A maioria dos casos
ainda é esporádica, porém, são mais associados a sín-
dromes clínicas do que os casos de escafocefalia. Pla-
giocefalia occipital é causada por sinostose unilateral
da sutura lambdóide e corresponde a 1,3% de todos
os casos de craniossinostoses.

Fig. 44.11 – Paciente posicionado para a cirurgia, que con-


siste em suturectomia e avanço orbitário.

Fig. 44.9 – Caso 2: Tomografia computadorizada (TC) de


crânio mostra fusão precoce da sutura coronária unilateral Fig. 44.12 – Paciente com seu aspecto estético aos 2 anos
(plagicefalia) em criança de 6 meses. de idade.

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44 – Tratamento Cirúrgico das Craniossinostoses

Sinostose isolada da sutura metópica (5% dos


casos de craniossinostose) (Figs. 44.15 a 44.22) foi
raramente descrita em famílias. Está normalmente
associada a síndromes, apresentando-se juntamente
com outras malformações.

Fig 44.13 – TC com reconstrução em 3D pré-operatória mos-


tra a fusão precoce da sutura coronal, bem como a órbita rasa.

Fig. 44.15 – Caso 3: TC de crânio de criança do sexo mas-


culino, de 6 meses, mostrando fusão de sutura metópica e tri-
gonocefalia.

Fig. 44.14 – TC com reconstrução em 3D pós-operatória mos- Fig. 44.16 – Criança com posicionamento cirúrgico mos-
tra a craniotomia e suturectomia, bem como o avanço orbitário. trando a marcação da incisão.
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495
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

Fig. 44.17 – Rebatimento do plano musculocutâneo e expo-


sição da sutura metópica estenosada.

Fig. 44.20 – Aspecto estético aos 12 meses de idade.

Fig. 44.21 – Aspecto aos 5 anos de idade.

Fig. 44.18 – Visão superior do segmento cefálico da criança


mostrando em evidência o formato de trigonocefalia.

Fig. 44.19 – Retirada do arcabouço orbitário em bloco para Fig. 44.22 – RNM do encéfalo mostra malformação encefá-
a feitura do avanço orbitário lica com micropoligiria.

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44 – Tratamento Cirúrgico das Craniossinostoses

A turricefalia caracteriza-se por uma cabeça alta A


e larga e, como entidade isolada, representa de 5%
a 10% das craniossinostoses primárias. A sutura co-
ronal é acometida bilateralmente, junto com a sutura
esfenofrontal. Formas familiais foram descritas, com
um possível caráter dominante.
Fusão simultânea de diferentes suturas causa a oxi-
cefalia, caracterizada por cabeça em forma de cone,
que representa de 5% a 10% das craniossinostoses.
Essa situação é heterogênea em sua origem e pode es-
tar associada à síndrome de Crouzon. Tal síndrome é
a mais comum das síndromes craniofaciais. Além de
deformidade no crânio, ocorrem deformidades faciais
e exoftalmia.
A segunda síndrome craniofacial mais prevalente é
a síndrome de Apert, cujas manifestações são turrice-
falia, retardo mental, hipoplasia maxilar, hiperteloris-
mo, além de anormalidades vertebrais e esqueléticas.

Diagnóstico B
Na prática diária, o diagnóstico de craniossinosto-
se é eminentemente clínico e confirmado com exames
de imagem como radiografia e tomografia computa-
dorizada (TC) (Figs. 44.23 e 44.24). O diagnóstico
precoce possibilita melhor abordagem terapêutica,
portanto os pediatras devem estar atentos aos pos-
síveis sinais clínicos da doença, como formação de
crista óssea no trajeto das suturas, fechamento preco-
ce das fontanelas, entre outros. Um importante diag-
nóstico diferencial é a microcefalia.
O avanço da radiologia, principalmente da TC, e
o desenvolvimento de imagens em 3D a partir dos
dados da TC, permitiram um estudo morfológico de-
talhado dos vários tipos de craniossinostoses. Não só
as anormalidades nas suturas foram bem analisadas, Fig. 44.23 – (A e B) Aspecto clássico da bossa frontal en-
mas também as deformidades da base do crânio fo- contrada na escafocefalia.
ram visualizadas, e os desvios da normalidade e as
mudanças no desenvolvimento, observados.
Esses avanços permitiram melhor avaliação dos
pacientes, permitindo ao cirurgião ter uma melhor
idéia de como a deformidade deve ser cirurgicamente
corrigida. Não há dúvida de que aprimoramento diag-
nóstico resulte numa grande diferença na avaliação
da patologia e no planejamento cirúrgico.
A crescente acurácia para o diagnóstico intra-ute-
rino por meio de ultra-sonografia e a possibilidade de
diagnóstico genético ainda não têm implicação práti-
ca em nosso meio, porém poderão vir a ter importân-
cia no futuro.
A síndrome de Crouzon (Fig. 44.25) caracteriza-se
por:
• Sinostose coronal bilateral.
• Órbita rasa.
• Exoftalmo. Fig. 44.24 – Confirmação do diagnóstico por tomografia de
• Fácies de periquito ou papagaio. crânio em cortes helicoidais e reconstrução em 3D.
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497
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

• Deformidade nasal. TRATAMENTO E PROGNÓSTICO


• Prognatismo.
Três períodos de crescimento determinam a evolu-
• Encurtamento do lábio superior. ção do paciente diagnosticado com craniossinostose.
• Palato arqueado alto. O período precoce vai do nascimento até os 12
• Atresia de coana. meses de idade. Nessa fase, o crescimento cerebral é
A síndrome de Carpenter está ligada à herança au- acelerado, e os efeitos da craniossinostose neste órgão
tossômica dominante, e em 25% dos pacientes tem podem ser muito maléficos. Originalmente, o objeti-
história familiar negativa, podendo sugerir possíveis vo cirúrgico era excisionar a(s) sutura(s) prematura(s)
mutações livres. A síndrome de Carpenter caracteri- por uma craniectomia linear, permitindo a expansão
za-se por: do cérebro em crescimento. Essa técnica foi substituí­
• Sinostose coronal bilateral. da por um avanço frontoorbital, aliado à cirurgia da
• Polissindactilia. abóbada craniana, que são mais radicais e, portanto,
• Epicanto lateralizado. condizentes com o radical crescimento cerebral. En-
• Herança autossômica recessiva em 75% dos tretanto, cada caso merece considerações específicas.
casos. Como generalização, pode-se dizer que deformidades
A síndrome de Apert advém, normalmente, de calvárias podem e são, em geral, tratadas cirurgica-
herança dominante autossômica ou está associada a mente, enquanto, em alguns casos de deformidade
mutações livres. A síndrome de Apert caracteriza-se facial, toma-se uma conduta expectante. Quando há
por: cranioestenose definida, uma descompressão urgente
torna-se necessária.
• Sinostose coronal bilateral.
No período intermediário, que vai de 1 a 10 anos
• Hipoplasia do maxilar. de idade, o crescimento cerebral é lento. Entretanto,
• Sindactilia. craniossinostose grave pode, ainda, causar cranio-
• Espessamento da falange distal do polegar e do estenose, acarretando papiledema e, possivelmente,
hálux. prejuízos da visão. A simples excisão da sutura não
• Anquilose de cotovelo. surte efeito, sendo necessárias craniotomias bilaterais
• Estenose de piloro. descompressivas ou por generosos avanços frontoor-
• Defeito do septo ventricular. bitais ou, ainda, associação dessas técnicas. Talvez
• Aplasia pulmonar. seja necessária também a correção de orbitoestenose,
• Fibroelastose endocárdica. se houver comprometimento ocular.
• Rins policísticos. O período tardio, dos 10 anos em diante, é uma
época em que cirurgias faciais definitivas podem ser
realizadas. Complicações cerebrais são de ocorrência
improvável.
As escafocefalias podem ser tratadas por diversas
técnicas, mas a Tabela 44.1 sumariza as mais utiliza-
das e a idade de indicação (Fig. 44.26).
O acompanhamento prolongado de pacientes ope-
rados permitiu a avaliação da eficácia dos métodos
disponíveis para o tratamento da craniossinostose,
sendo que o tratamento das craniossinostoses simples
obteve considerável progresso.
As sinostoses coronais respondem bem ao avan-
ço frontoorbital, uni ou bilateral. Essa técnica obteve
tanto sucesso que permaneceu praticamente inaltera-
da nos últimos 25 anos.

Tabela 44.1 – Sumário das técnicas cirúrgicas aplicadas


à escafocefalia
Calvarectomia Até 6 meses (Fig. 44.5)
Técnica π 6 a 18 meses (Fig. 44.26)
Morcelação Acima de 18 meses (Fig. 44.6)
Fig. 44.25 – Criança com Crouzon, mostrando palato fen-
dido, exoftalmo e outras anomalias clínicas.

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44 – Tratamento Cirúrgico das Craniossinostoses

substituída por um avanço frontoorbital bilateral, as-


sociado ao remodelamento da abóbada craniana.
Grandes avanços vêm sendo realizados na com-
preensão dos mecanismos biomoleculares envolvidos
nas suturas cranianas. Fatores de crescimento regio-
nais, liberados pela dura-máter adjacente, controlam
a osteogênese nas suturas. Com o aprofundamento
desses conhecimentos, em um futuro próximo, a uti-
lização de técnicas de terapia gênica permitirá uma
abordagem menos invasiva no tratamento da fusão
prematura de suturas cranianas.

Referências Bibliográficas
1. Moss ML. Functional anatomy of cranial synostosis.
Child’s Brain. 1975;1:22-33
Fig. 44.26 – Esquema modificado da técnica conhecida
como π pelo formato das osteotomias. 2. Cohen Jr MM. Craniosynostosis and syndromes with
cranio synostosis: incidence, genetics, penetrance,
variability, and new syndrome updating. Birth De-
fects. 1979;15:13-63.
Por outro lado, o tratamento das sinostoses sagi-
3. David DJ. Advances in the management of the cra-
tais sofreu considerável evolução. As craniectomias niosynostoses ANZ J Surg. 2003;73:949-57.
sagitais ou parassagitais, populares na década de 4. Rosenberg P. The role of the cranial base in fa-
1970, mostraram eficácia em apenas 50% dos casos, cial growth: experimental craniofacial synosto-
fazendo com que técnicas mais agressivas fossem de- sis in the rabbit. Plastic & Reconstructive Surgery.
senvolvidas. 1997;99(5):1396-407.
A intervenção na sinostose metópica sofreu seme- 5. Youmans JR. Youmans’ Neurological Surgery. 4. ed.
lhante evolução. A craniectomia simples da sutura foi Philadelphia: WB Saunders; 1997.

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45
Tratamento Cirúrgico da Mielomeningocele
Helder Zambelli
Marcos Vinícius Calfat Maldaun

A
mielomeningocele representa alteração con- ativa permitem que, em até 75% dos casos, a criança
gênita classificada como espinha bífida aberta, consiga deambular com a ajuda de aparelhos e, em
caracterizando-se por placódio não recoberto 80%, um desenvolvimento intelectual aceitável ou
por tecido meníngeo e exposto aos agentes externos. muito bom, permitindo o acompanhamento de esco-
Quanto mais caudal a lesão, menor o déficit neuroló- las normais4,5.
gico. Ao nascimento, a criança apresenta, na região Contudo, a abordagem do portador de mielome-
dorsal, a clássica malformação cística, que pode ser ningocele continua sendo controversa. Inicialmente,
fechada (sem saída de liquor do saco meníngeo) ou podem-se citar as discussões acerca do parto dessas
aberta (com saída de liquor do espaço dural); e, como crianças. O diagnóstico pré-natal de fetos com mielo-
conseqüência do déficit dos músculos da loja anterior meningocele focalizou a atenção de Hill e Beattie6 no
da perna, o recém-nascido pode apresentar pé torto cuidado perinatal, elegendo o parto cesárea como um
(Fig. 45.1). possível método de preservar a função neurológica.
O tratamento cirúrgico dos recém-nascidos porta- Neste estudo, 25 crianças com mielomeningocele fo-
dores de mielomeningocele foi, durante muito tempo, ram estudadas, 10 nascidas por parto cesárea e 15 por
sujeito de calorosas discussões científicas: aventa- meio de outros métodos. Nenhuma diferença na fun-
vam-se o peso econômico e social que essas crianças ção motora foi observada após o nascimento, com 50%
trariam aos pais e à sociedade. No início da década de cada grupo com níveis neurológicos abaixo de L3.
de 1960, estimava-se que somente 1 entre 7 crianças Com esses resultados preliminares, não se teve respos-
teria chance de freqüentar uma escola, e apenas 1 em ta se o parto cesárea melhorava o resultado neurológi-
70 poderia seguir uma escola normal. Em relação ao co em casos selecionados de espinha bífida aberta.
conjunto de pacientes, 90% morriam entre 6 e 12 anos
e, destes, 26% tinham óbito relacionado a complica-
ções infecciosas, respiratórias precoces e hidrocefalia
aguda, e o restante deles apresentava complicações e
evoluía a óbito após longos períodos, até mesmo vá-
rios anos, em decorrência de hidrocefalia de evolução
lenta ou de complicações renais1,2.
A partir de 1970, com a disponibilidade de válvu-
las mais eficazes no tratamento da hidrocefalia, com-
plicação mais freqüente e mortal, as indicações foram
confluindo para o tratamento precoce da mielome-
ningocele, demonstrando que a correção dentro das
primeiras 24 h após o nascimento, proporciona boa
chance de melhora no prognóstico motor2,3. Assim, Fig. 45.1 – Paciente com mielomeningocele e hidrocefalia
uma intervenção precoce e uma atitude terapêutica grave.

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501
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

Contudo, grande parte dos estudos defende a reali- colchão térmico e enfaixamento de membros
zação de cesárea previamente ao início do trabalho de superiores e inferiores.
parto, alegando que, desse modo, seriam evitadas as 2. Assepsia e antissepsia, evitando-se a utilização
lesões traumáticas decorrentes do parto vaginal e as le- de substâncias à base de iodo e álcool, que pos-
sões mecânicas causadas pelo trabalho de parto. Entre- suem ação lesiva sobre o tecido nervoso.
tanto, alguns estudos recentes contestam essa conduta, 3. Incisão na transição entre a derme e a membra-
apresentando dados que não indicam vantagem, na evo- na epitelial, com retirada do tecido que forma a
lução a médio e longo prazos, da realização de cesárea chamada zona epiteliosa.
previamente ao trabalho de parto sobre o parto vaginal 4. Separação da pele e do tecido subcutâneo adjacen-
ou sobre a realização de cesárea após o início do traba- te até se identificar a musculatura paravertebral.
lho de parto. Esses estudos também alegam que a cesá-
rea apresenta maiores riscos maternos, tais como com- 5. Dissecção através da musculatura paraverte-
plicações tromboembólicas e anestésicas, e que deve bral até chegar ao espaço subaracnóide, quan-
ser realizada apenas quando há indicação obstétrica7. do sai o líquido cefalorraquidiano.
Outro ponto discutível é acerca da realização do 6. Abertura da dura e da aracnóide, dissecando
fechamento da lesão dorsal, que tem como objetivo a medula malformada e epitelizada das raízes,
eliminar a perda de líquido cefalorraquidiano, preve- transformando a medula num tubo por sutura
nir infecção, preservar as funções neurais e prevenir o contínua.
ancoramento secundário da medula no local de reparo 7. Redução das raízes e da medula intacta para
cirúrgico. O consenso geral é que o reparo seja feito dentro do canal espinhal, se possível.
entre 24 e 72 h após o parto, permitindo avaliação 8. Fechamento das meninges, da fáscia e da pele,
inicial geral e neurológica do recém-nascido. As téc- com sutura direta ou utilização de zetaplastia,
nicas cirúrgicas mudaram pouco nos últimos 25 anos. dependendo da disponibilidade de pele.
O procedimento cirúrgico consiste em três passos: se-
paração do tecido nervoso na mielomeningocele, dis- COMPLICAÇÕES
secção da dura-máter e aproximação das camadas dos
tecidos até a linha média, criando um saco dural para A cirurgia corretiva da mielomeningocele foi rea-
prevenir ancoramento secundário. Quando o defeito lizada numa série de 80 casos no Centro de Atenção
na pele é largo, técnicas de cirurgia plástica podem Integral à Saúde da Mulher (CAISM), da Unicamp,
ser necessárias para permitir aproximação sem tensão utilizando-se a técnica anteriormente descrita. Em re-
dos tecidos na linha média. Há que se ressaltar que o lação ao dia em que os pacientes foram submetidos à
tecido nervoso da mielomeningocele deve ser preser- cirurgia de correção da mielomeningocele, temos: no
vado, dedicando-se especial atenção na preservação mesmo dia do nascimento em 20 casos (25%), dentro
do suprimento vascular, já que este último apresenta das primeiras 24 horas em 62 casos (77,5%); de 24 a
variações na região da mielomeningocele1,2,3,8. 48 h após o nascimento em 11 casos (13,75%), de 48
Em casos particulares, há anomalias acompanhan- a 72 h em três casos (3,75%) e entre 8 e 10 dias após
do a mielomeningocele, como cifose grave, diastema- o nascimento em 2 casos (2,5%), que foram trazidos
tomielia ou ancoramento do filamento terminal. Estas ao CAISM-Unicamp somente vários dias após o nasci-
requerem procedimentos cirúrgicos adicionais, como mento. Em relação às complicações cirúrgicas, das 80
cifectomia, remoção do osso ou da fibrose ou secção cirurgias para correção de mielomeningocele realizadas
do filamento terminal caudal à mielomeningocele no nesta série não se observou nenhum caso de infecção
primeiro fechamento1. da ferida cirúrgica, contudo foi observado em 12 casos
O tratamento cirúrgico da mielomeningocele con- (15%) (p < 0,05) algum tipo de necrose em pequenos
siste no fechamento da placa neural e na cobertura do pontos da pele após o fechamento, sem sinais de in-
tecido nervoso com planos de tecidos dural, muscular fecção e sem a necessidade de reabordagem. Dos 80
e cutâneo, de modo a fornecer uma adequada proteção casos operados, 4 casos (5%) (p < 0,05) apresentaram
à medula espinhal malformada2. A abertura entre o fístula liquórica na cicatriz cirúrgica após a cirurgia da
canal espinhal e o meio ambiente é fechada, trazendo correção da mielomeningocele, todas tratadas e resol-
elementos de tecidos conectivo e neural de fora para vidas com a colocação de derivação ventriculoperito-
dentro do canal espinhal. Isso sela a saída de líquido neal ou derivação ventricular externa. Ocorreram três
cefalorraquidiano do canal e impede que nele entrem casos (3,75%) (p < 0,05) de meningite diagnosticada e
substâncias estranhas e bactérias (Fig. 45.2)4,9. tratada durante a primeira internação10.
Em relação aos dias em que os recém-nascidos
permaneceram internados na primeira internação:
PROCEDIMENTO CIRÚRGICO 11,2% dos pacientes permaneceram de 1 a 5 dias in-
1. Anestesia geral com posicionamento em de- ternados; 22,44% de 6 a 10 dias internados; 24,48%
cúbito ventral e aquecimento do paciente por de 11 a 15 dias; 19,38% de 16 a 20 dias; 10% de 21 a

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45 – Tratamento Cirúrgico da Mielomeningocele

A B

C D

E F

Fig. 45.2 – (A a F) Estágios do fechamento cirúrgico num recém-nascido com mielomeningocele (Grupo de Medicina Fetal –
Unicamp).

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503
Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

30 dias. A freqüência de alta vivo foi de 88,75% (71 Referências Bibliográficas


casos)10.
1. Quinn TM, Adzick NS. Fetal surgery. Obstet Gyne-
Das 77 crianças que desenvolveram hidrocefalia, col Clin North Am. 1997;24(1):143-57.
59 (76,62%) necessitaram de derivação ventriculope- 2. Perry VL, Albright AL, Adelson PD. Operative nu-
ritoneal em algum momento da evolução, e o perío- ances of myelomeningocele closure. Neurosurgery.
do de colocação da primeira derivação foi, na grande 2002;51(3):719-23.
maioria das vezes, entre a segunda e a terceira semana 3. Wagner W, Schwarz M, Perneczky A. Primary my-
de vida após o nascimento em 50/59 casos (84,74%). elomeningocele closure and consequences. Curr
Houve necessidade de troca da derivação por não fun- Opin Urol. 2002;12(6):465-8.
cionamento adequado ou por infecção em 28/59 casos 4. Lapras C, et al. Spina Bifida. Neurochirurgie.
(47,45%) já no primeiro ano de vida, com uma média 1988;34(Suppl 1).
de uma a duas revisões por paciente. A mortalidade 5. Honorato DC. Disrafismo espinhal oculto com com-
durante os anos de seguimento (mínimo de 2 anos e prometimento medular na infância: da identificação
máximo de 11 anos) dos 80 nascidos vivos foi de 15 ao momento exato do tratamento cirúrgico. [disser-
casos (18,75%), e todos os óbitos ocorreram antes de tação]. Campinas: Universidade Estadual de Campi-
se completar 5 anos de seguimento10. nas; 1994.
Portanto, com a intervenção cirúrgica precoce, 6. Hill AE, Beattie F. Does caesarean section delivery
improve neurological outcome in open spina bifida?
a preservação das funções nervosas ainda presentes
Eur J Pediatr Surg. 1994;4(Suppl 1):32-4.
e, eventualmente, a recuperação, ao menos parcial,
7. Lewis D, Tolosa JE, Kaufmann M, Goodman M, Far-
daquelas perdidas, a prevenção de infecções secun- rell C, Berghella V. Elective cesarean delivery and
dárias que possam atingir o espaço intratecal através long-term motor function or ambulation status in in-
da malformação, a obtenção de uma melhor relação fants with meningomyelocele. Obstet Gynecol. 2004
anatômica entre as estruturas nervosas e as ósseas, Mar;103(3):469-73.
podem resguardar uma possibilidade maior de desen- 8. Van Allen MI, Kalousek DK, Chernoff GF, Juriloff
volvimento espinhal normal no curso dos anos5. D, Harris M, McGillivray BC, et al. Evidence for
A maioria das crianças com mielomeningocele multi-site closure of the neural tube in humans. Am J
(cerca de 80% a 85%) desenvolve hidrocefalia, neces- Med Genet. 1993;47(5):723-43.
sitando de derivação liquórica, havendo aumento da 9. McLone DG. Spinal dysraphism: pathogenesis and
necessidade de derivação quanto mais alta for a lesão. treatment. Spinal Surg. 1991;5:3-20.
O mau funcionamento da derivação, principalmente 10. Zambelli H. Avaliação da evolução neurocirúrgica de
em razão de problemas mecânicos ou infecção, é com- crianças com diagnóstico intra-uterino de mielome-
plicação freqüente (Fig. 45.3). É comum a necessidade ningocele e elaboração de protocolo de cirurgia fetal
de diversas revisões da derivação ventriculoperitone- para prevenção de hidrocefalia. [dissertação]. Cam-
pinas: Universidade Estadual de Campinas; 2006.
al. A meningite e outras infecções relacionadas à de­
11. Youmans JR. Neurological Surgery. 4. ed. Philadel-
rivação ventriculoperitoneal têm influên­cia negativa
phia: WB Saunders; 1994.
no desenvolvimento intelectual desses pacientes11,12.
12. McLone DG. Continuing concepts in the manage-
ment of spina bifida. Pediatr Neurosurg. 1992;18(5-
6):254-6.

Fig. 45.3 – Obstrução de cateter ventricular em paciente


com hidrocefalia e mielomeningocele.

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46
Craniofaringiomas na Infância
Carlos Eduardo Barros Jucá
Ricardo Santos de Oliveira
Carlos Eduardo Martinelli
Sonir Roberto Rauber Antonini
Margareth de Castro
Ayrton Custódio Moreira
Hélio Rubens Machado

INTRODUÇÃO PATOLOGIA

O
craniofaringioma é uma neoplasia relativa- Do ponto de vista anatomopatológico, podem-se
mente incomum, localizada, na quase tota- distinguir dois tipos histológicos: adamantinomatoso
lidade dos casos, nas regiões selar e supra- e escamoso papilífero, mas podem ocorrer tipos tran-
selar, constituindo 6% a 9% dos tumores cerebrais sicionais e exemplos mistos4. A denominação adaman-
em crianças, faixa etária na qual cerca de metade dos tinomatoso deve-se a semelhanças histológicas entre
casos se manifesta. esses tumores e os adamantinomas, tumores primários
O pico de incidência se dá dos 5 aos 10 anos de da região oral derivados de células precursoras na for-
vida, havendo relato de incidência aumentada em mação dos dentes, apontadas por Erdheim em 1904.
crianças japonesas1. A localização preferencial é Há evidências de que o tipo escamoso papilífero so-
supra-selar com componente selar. Pode ser tam- mente ocorra em adultos, não se calcifique, não inva-
bém intra-selar (5%) ou estender-se para as fossas da o cérebro e esteja associado a melhor prognóstico,
anterior (30%), média (23%) e posterior (25%)2. embora seja menos freqüente que o tipo adamantino-
Há, ainda, relatos anedóticos de ocorrência em matoso. De qualquer forma, não há diferença estatis-
outras topografias, como região da lâmina quadri- ticamente significativa quanto à invasão ou recidiva
gêmina, fissura sylviana, faringe e ângulo ponto- quando se comparam ambos os tipos histológicos4.
cerebelar. Discute-se a origem dos craniofaringiomas, ha-
A primeira descrição patológica foi fornecida por vendo diversas teorias, como, por exemplo, o desen-
Zenker, em 1857, em uma autópsia na qual identifi- volvimento neoplásico a partir de remanescentes de
cou lesão cística supra-selar com cristais de colesterol tecido faríngeo deixado para trás na embriogênese
e epitélio escamoso. O termo craniofaringioma foi in- (no caso dos adamantinomatosos) ou de evolução
troduzido por Cushing3, em 1932, que, após proceder metaplásica a partir de células da adeno-hipófise e da
a um total de 180 operações num grupo de 87 pacien- haste (no caso dos papilíferos), embora todas as hipó-
tes, classificou tal neoplasia como a mais desafiadora teses aventadas tenham argumento em oposição.
e “proibitiva” com a qual um neurocirurgião pode se Trata-se de neoplasia benigna incidindo na infância
deparar. e em adultos jovens principalmente, em geral císticas,
Em 2009, o tratamento de crianças portadoras com conteúdo viscoso marrom ou amarelado, e par-
desse tipo de tumor ainda se apresenta desafiador e cialmente calcificadas, com componente sólido e ad-
carregado de perguntas que ainda esperam por uma jacente aos vasos do polígono de Willis, hipotálamo,
resposta definitiva, tendo em vista as dificuldades da nervos ópticos, quiasma e haste pituitária, tornando-a
abordagem cirúrgica, o envolvimento pela lesão de de difícil acesso e de remoção completa quase sempre
estruturas eloqüentes, como o hipotálamo e as vias impossível (Fig. 46.1). Em razão da baixa freqüência,
ópticas, e o surgimento de novas propostas de alter- requer-se uma longa curva de aprendizado para os
nativas terapêuticas. que desejam dedicar-se ao seu tratamento.

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Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

falia ou a grandes crescimentos tumorais, espe-


cialmente de sua porção cística. Sinais focais
são pouco freqüentes, assim como crises con-
vulsivas. Estas ocorrem em 5% a 15% dos ca-
sos, embora possam ter a freqüência aumentada
quando há hipertensão intracraniana associada.
Na casuística do Hospital das Clínicas da Faculda-
de de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de
São Paulo (USP), de 1980 a 2002 (57 casos), a ocor-
rência de hipertensão intracraniana se deu em 80%
dos casos, o acometimento endocrinológico em 60%
e déficits oftalmológicos em 45%.
Entre os sintomas endocrinológicos, os mais fre-
qüentes foram atraso de crescimento e diabetes insi-
Fig. 46.1 – Espécime de necropsia mostrando lesão expan- pidus, seguidos por obesidade e puberdade atrasada.
siva de componentes sólido e cístico em região selar, com ex- Isto é concordante com a literatura, que coloca como
tensão supra-selar (craniofaringioma). principal déficit encontrado em crianças o do hormô-
nio somatotrófico (70%).
A variante adamantinomatosa apresenta-se ma­ Do lado da visão, a maioria tinha déficit da acui-
croscopicamente mais heterogênea e irregular. Micros­ dade visual, perda de visão unilateral ou, menos fre-
copicamente, há células queratinizadas em ambos os qüentemente, alteração de campo visual e diplopia.
tipos. Na subdivisão papilar, a área de gliose reacio- Além das síndromes descritas, outra manifestação
nal no parênquima vizinho não contém ilhotas de cé- clínica possível é a alteração de comportamento, que
lulas neoplásicas freqüentemente vistas na variação pode ter natureza endocrinológica ou resultar de efei-
adamantinomatosa. Isso serve como tentativa de ex- to de massa da lesão, acarretando hidrocefalia / hiper-
plicação para o fato de esta última apresentar maior tensão intracraniana ou compressão dos lobos frontais
tendência à recidiva. e temporais, ou outras estruturas do sistema límbico.
Em crianças, o diagnóstico diferencial deve ser Apesar de a hidrocefalia obstrutiva por obliteração
feito em relação a gliomas quiasmáticos ou hipotalâ- dos forames de Monro e/ou do aqueduto estar presente
micos, germinomas, dermóides, cistos da bolsa de na maioria dos casos, a colocação imediata de derivação
Rathke e cistos aracnóides. liquórica foi exigida em 25% desses pacientes, mesma
porcentagem encontrada por Choux em 1991. Isso carac-
QUADRO CLÍNICO teriza condição que implica tratamento de urgência, a fim
de evitar rápida deterioração neurológica do paciente.
Os portadores de craniofaringiomas apresentam- Outra condição que caracteriza situação de urgên-
se com uma das três seguintes síndromes clínicas (ou cia é o acometimento grave da visão por compressão
combinações delas): das vias ópticas, mormente do quiasma óptico, com
• Síndrome endocrinológica, em que predomina o risco de perda adicional iminente ou de este déficit
o déficit de crescimento, diabetes insipidus e tornar-se definitivo. Tal quadro também exige pronto
acometimento variado dos eixos hipotálamo- tratamento, por abordagem direta do tumor ou, even-
hipofisários. No pós-operatório existe tendên- tualmente, por punção da cavidade cística para des-
cia à piora do quadro hormonal, eventualmente compressão, como será discutido adiante.
acrescido de outros graves problemas metabó-
licos, como hipo ou hipernatremia e secreção
inapropriada de hormônio antidiurético. DIAGNÓSTICO RADIOLÓGICO
• Síndrome oftalmológica, causada pelo compro- Radiografias simples de crânio costumam apre-
metimento de vias ópticas, acarretando classi- sentar anormalidades em crianças portadoras de cra-
camente a perda de campo visual do tipo he- niofaringiomas, principalmente alargamento da sela
mianopsia bitemporal, mas o acometimento não e calcificações anormais (em 85% dos casos na in-
uniforme pode provocar perdas visuais de pa- fância). Embora tenha tido algum papel no passado,
drão irregular. A perda da acuidade visual tam- tal exame não se encontra incluído na propedêutica
bém é freqüente. Outros pares cranianos podem radiológica de rotina para esses casos em 2009.
eventualmente estar lesados, e o resultado será Tomografia computadorizada (TC) de crânio e res-
evidente, como alterações da motilidade ocular. sonância nuclear magnética (RNM) são necessárias
• Síndrome neurológica, em que predomina a para um correto diagnóstico e planejamento cirúrgi-
hipertensão intracraniana associada à hidroce- co. A TC, geralmente, é o primeiro exame realizado

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46 – Craniofaringiomas na Infância

após as manifestações clínicas e permite identificar as possíveis dificuldades cirúrgicas. Entretanto, cranio-
porções sólida e cística, as calcificações, fornecendo faringiomas são lesões relativamente pouco vascu-
informação sobre as dimensões da lesão e a ocorrên- larizadas e pequenos vasos nutridores são de difícil
cia ou não de hidrocefalia com sinais de hipertensão visualização, mesmo à angioressonância. A RNM
intracraniana. A porção cística geralmente se apresen- pós-operatória, realizada dentro de 48 h após o ato
ta hipodensa à TC, embora isso possa variar de acordo cirúrgico para evitar artefatos advindos da degrada-
com o teor de colesterol e proteínas. Após injeção de ção da hemoglobina, seria desejável para detalhar a
contraste endovenoso, há realce da porção sólida e da extensão da ressecção, embora a possibilidade de rea-
parede do cisto, quase sempre com pouco ou nenhum lização desse exame para todos os casos seja de difícil
reforço de seu conteúdo. Ademais, uma TC pós-ope- operacionalização no Brasil, em razão de dificuldades
ratória deve ser realizada no dia seguinte à cirurgia para agendar o exame.
para identificar precocemente virtuais complicações
cirúrgicas, hidrocefalia e restos tumorais. AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA
Disponível na maioria dos serviços somente a
partir da década de 1990, atualmente a RNM é in- Antes da abordagem do tumor propriamente dito, é
dispensável para evidenciar as relações da lesão com necessária uma avaliação completa e, sobretudo, mul-
estruturas eloqüentes com o quiasma óptico, o in- tidisciplinar. Um exame oftalmológico deve incluir
fundíbulo, o hipotálamo e os vasos do polígono de campimetria, avaliação da acuidade visual e verifica-
Willis, fornecendo base de dados anatômicos para ção da ocorrência de papiledema. Tais dados podem
uma desejada exérese completa (Fig. 46.2). Em ima- fornecer valiosas informações que auxiliem na esco-
gens pesadas em T1, o conteúdo cístico costuma apa- lha do momento correto da cirurgia, além de servirem
recer hipointenso, embora isso também possa variar como base e ponto de partida para a avaliação da evo-
de acordo com o conteúdo lipoprotéico. A aquisição lução pós-operatória. O estudo do comprometimento
após injeção de gadolínio mostra realce das paredes visual também ajudará na escolha da tática operatória
do cisto e realce costumeiramente heterogêneo da no que concerne ao lado da abordagem.
porção sólida. Imagens pesadas em T2 mostram tanto Uma avaliação endocrinológica também deve ser
a porção sólida como a cística hiperintensas em rela- efetuada, com medidas hormonais que evidenciem a
ção ao parênquima cerebral. Áreas calcificadas apa- situação de cada eixo. Isto servirá para nortear os cui-
recem sempre como hipointensidades localizadas11. A dados anestésicos e no pós-operatório imediato, além
complementação com angiorressonância, raramente de fornecer os valores de referência para o seguimen-
utilizada, pode fornecer informação adicional sobre to e a reposição hormonal, sempre que necessária.
a relação do tumor com grandes vasos e sobre des- Avaliação psicológica, tanto da criança quanto da
locamentos destes pela massa tumoral, antecipando família, ainda não é rotina na maioria dos serviços,
mas deverá adquirir um papel sempre mais impor-
tante num futuro próximo, na medida em que houver
tendência a valorizar não somente a mortalidade e a
morbidade, mas também a qualidade de vida, confor-
me defendido por Sainte-Rose et al.5 Ademais, é ne-
cessário fornecer à família apoio psicológico e identi-
ficar seus anseios e expectativas quanto ao tratamento
e seguimento da doença.

TRATAMENTO CIRÚRGICO
Abordagem Cirúrgica de Urgência
Duas situações já citadas implicam na necessidade
de tratamento em caráter de urgência ou emergência: a
hidrocefalia descompensada com hipertensão intracra-
niana e a existência de uma lesão muito volumosa que
tenha efeito de massa ou que exerça importante com-
pressão sobre as vias ópticas, levando a déficit visual.
A primeira condição geralmente é abordada com
a colocação de derivação ventriculoperitoneal, resol-
vendo o problema mais imediato da hipertensão intra-
Fig. 46.2 – RNM (FLAIR) mostrando craniofaringioma com craniana até que seja feita uma avaliação pré-operató-
efeito de massa significativo. ria mais adequada para a abordagem do tumor em si.
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Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

O craniofaringioma torna a anatomia local inadequa-


da para intervenções endoscópicas da hidrocefalia,
visto que pode deslocar ou ocupar o terceiro ventrí-
culo, impossibilitando a realização de terceiro-ven­
triculostomia endoscópica. Tampouco seria desejável
a fenestração endoscópica do cisto para a cavidade
ventricular, devido ao conteúdo viscoso da lesão.
A situação em que uma grande cavidade cística
exerce importante efeito de massa por si só e pode
levar à hipertensão intracraniana ou déficit visual por
compressão das vias ópticas também requer tratamen-
to de urgência. Pode ser feito por craniotomia ime-
diata ou pela punção da cavidade cística, deixando-se
um reservatório subcutâneo. Esta segunda opção, de-
fendida por Kahn et al.6 e praticada em casos sele-
cionados no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, Fig. 46.3 – Aspecto de abordagem pterional mostrando a
relação do tumor com as vias ópticas.
além de representar maior agilidade no tratamento e
resolução rápida do problema agudo, torna possível
uma avaliação melhor do caso, tanto em termos de
exames de imagem como no estudo endocrinológi-
co e oftalmológico, propiciando uma abordagem de-
finitiva mais segura e adequada, com a reunião dos
melhores recursos tanto materiais quanto humanos.
Kahn descreve melhora da acuidade visual em meta-
de dos pacientes cujos cistos foram puncionados6.
Ademais, esse mesmo reservatório poderá, em ca-
sos selecionados, servir para administração de subs-
tâncias como propostas alternativas de tratamento,
discutidas adiante.

Técnica Cirúrgica
Levando-se em conta que o padrão-ouro no trata-
mento do craniofaringioma ainda é sua exérese total,
preservando-se as importantes estruturas que dele se
avizinham, a via de acesso cirúrgico dependerá das
variações de sua localização, conforme evidenciado
pela RNM, e do grau de acometimento visual. Fig. 46.4 – Aspecto cirúrgico de abordagem inter-hemisfé-
No Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, em con- rica após retirada total da lesão.
cordância com a maioria das séries já publicadas, a via de
acesso preferencial tem sido a frontopterional (Fig. 46.3), COMPLICAÇÕES
mas outras vias também foram empregadas, como trans-
calosa, transesfenoidal, subfrontal e outras (Fig. 46.4). Além de emergências como hidrocefalia e hemor-
A tática operatória sempre foi a mesma: exposição ragia, ambas muito raras, as principais complicações
ampla das cisternas, abertura da lâmina terminal, dis- pós-operatórias se referem à piora da função endó-
secção cuidadosa das aderências da cápsula do tumor crina, principalmente nos casos em que há seção da
com nervos ópticos, quiasma, artérias, seio cavernoso, haste hipofisária, com conseqüente distúrbio hidro-
hipotálamo e haste hipofisária, além de leve e progres- eletrolítico (destacando-se o diabetes insipidus) e a
siva tração da cápsula do tumor, curetando-se a porção piora do déficit visual.
calcificada que ocasionalmente teve de ser retirada A possível descompensação endocrinológica re-
após morcelamento com drill e fresas de diamante. força a necessidade de pós-operatório em unidade de
Um aspecto muito importante a ser ressaltado e que terapia intensiva pediátrica com pessoal habilitado a
terá forte implicação no seguimento endocrinológico é corrigir rapidamente os distúrbios iônicos que por-
a tentativa de preservação da haste hipofisária. Entre- ventura ocorram.
tanto, esta é excepcional, visto que o próprio tumor está O déficit visual pode piorar no pós-operatório ime-
intimamente aderido a ela. O êxito nessa preservação diato, sobretudo se for utilizada a via interopticocaro-
tem relação inversa com o grau de ressecção tumoral. tídea e o espaço entre a carótida e o nervo óptico não

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46 – Craniofaringiomas na Infância

tiver sido suficientemente “dissecado” pelo tumor. Outras substâncias que vêm sendo empregadas
Essa piora, entretanto, pode ser reversível. são isótopos radioativos e o interferon alfa9.

PAPEL DA RADIOTERAPIA CIRURGIA RADICAL VERSUS EXÉRESE


Atualmente não se recomenda radioterapia como SUBTOTAL: QUAL A TENDÊNCIA ATUAL?
tratamento primário para o craniofaringioma. Tam- A abordagem cirúrgica com vistas à ressecção ra-
pouco ela é necessária nem previne recorrências em dical, conduta indubitável até poucas décadas atrás,
casos de exérese completa. A radioterapia ou, mais passou a ser questionada ante a morbidade acarretada
recentemente, radiocirurgia, é reservada aos casos em por lesões do hipotálamo e das vias ópticas, poden-
que não tenha sido possível a ressecção completa ou do trazer seqüelas como obesidade mórbida, déficit
aos casos de recidiva em que uma reabordagem traria cognitivo e comportamental, distúrbios psiquiátricos
riscos inaceitáveis. graves, infertilidade e piora visual. Nesse sentido, al-
De fato, Regine et al.7 descrevem um aumento na guns grupos vêm advogando uma ressecção não tão
sobrevida após 20 anos quando a radioterapia é feita agressiva seguida de radioterapia.
logo depois da primeira abordagem com ressecção Sainte-Rose et al. (2007) propõem um sistema de
subtotal. classificação guiado pelo exame de ressonância magné-
Entretanto, deve-se levar em conta que a radiotera- tica que avalia o grau de envolvimento hipotalâmico e
pia pode acarretar complicações como deficiência en- indica uma abordagem radical ou uma exérese subtotal
dócrina, neurite óptica, déficit cognitivo e ocorrência de seguida de radioterapia. Segundo esses autores, o trata-
novas neoplasias, como gliomas. A radiocirurgia, por mento baseado nessa estratificação resulta numa melhor
sua vez, necessita de que o alvo esteja a uma distância qualidade de vida dos pacientes ao longo do seguimen-
de, no mínimo, 5 mm de estruturas nobres como as vias to do que a clássica exérese macroscópica total.
ópticas, os nervos cranianos e o tronco cerebral, além O tema é ainda controverso e desprovido de res-
de também poderem induzir a origem de gliomas. postas definitivas. No Hospital das Clínicas de Ribei-
Dessa forma, o papel da radioterapia está limitado rão Preto preconiza-se a exérese total da lesão sempre
a casos selecionados de impossibilidade de remoção que possível, porém levando-se em conta os riscos
total, estando longe de constituir alternativa inicial à de seqüelas importantes em casos de grande envol-
abordagem cirúrgica. vimento hipotalâmico, optando-se, nesses casos, por
uma exérese subtotal.
OUTRAS ALTERNATIVAS DE TRATAMENTO
As dificuldades técnicas oferecidas pela cirurgia EVOLUÇÃO E PROGNÓSTICO
do craniofaringioma e a morbidade acarretada em A cirurgia para tratamento do craniofaringioma en-
muitos casos levou a um esforço no desenvolvimento volve pouca ou nenhuma mortalidade perioperatória
de propostas de alternativas terapêuticas. Entretan- na maioria das séries publicadas. Entretanto, a mor-
to não há, até o momento, trabalhos suficientes que bidade pode ser significativa, conforme já citado. A
comprovem que alguma dessas alternativas possa cirurgia radical é a finalidade do tratamento, embora
substituir com vantagem a abordagem cirúrgica em dependa, de modo decisivo, da experiência do cirur-
mãos experientes. gião, adquirida ao longo do tempo devido à relativa
Entre as propostas, encontra-se a injeção, dentro raridade do craniofaringioma (Hoffman et al., 1999).
da lesão, de substâncias que levariam à sua regressão. Fahlbusch et al. (1999) analisaram uma série de 168
Essa injeção é feita com o uso de cateter, que pode ser pacientes operados, uma das maiores da literatura, e
implantado através de punção direta, por estereotaxia concluíram que, em seus casos, a abordagem pterio-
ou por endoscopia. Entre as substâncias empregadas, nal predominou e a ressecção total foi conseguida em
a de maior utilização é a bleomicina10, antibiótico e praticamente 50% dos casos, embora surpreendente-
antineoplásico já previamente usado no tratamento mente, quando a via transesfenoidal foi empregada, a
de vários carcinomas e linfomas. O primeiro relato ressecção total foi considerada em 86% dos casos. Na
desse tipo de tratamento foi feito por Takahashi et al. série apresentada por esses autores (Fahlbusch et al.,
em 1985, e, desde então, diversas séries vêm sendo 1999), 86,5% dos casos em que a ressecção foi con-
publicadas, porém ainda com número insuficiente de siderada total estavam livres de tumor após 5 anos de
pacientes para conclusões definitivas. Ademais, são follow-up, contra 48,8% em que a excisão foi parcial.
apontadas complicações desse tipo de tratamento, Longo prazo de acompanhamento é necessário para
como vazamento de conteúdo cístico para o espaço que se conclua que um tratamento foi efetivo ou não.
subaracnóideo, erros de punção, deslocamento do ca- Quanto a recidivas, há grande variação na literatu-
teter, cefaléia e febre em decorrência da administra- ra, indo de 7% a 53%. Há freqüentes relatos de recidi-
ção de bleomicina8. va mesmo após ressecção total, e parece haver maior
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Parte 5 – Neurocirurgia Pediátrica

tendência a recidiva de tumores grandes, independen- Alterações cognitivas e comportamentais foram


temente da estratégia de tratamento. No Hospital das avaliadas em poucas séries. Na série de Hoffmann,
Clínicas de Ribeirão Preto, todos os pacientes são 26% das crianças que passaram por exérese radical
acompanhados por exames de imagem. Nesta casuís- das lesões apresentavam QI menor que 89, 57% ti-
tica, em 57% dos casos não houve recidiva tumoral; nham déficit de memória, 33% tinham algum sinal
em 7% notavam-se restos tumorais que se mantiveram de síndrome do lobo frontal e 13% tinham problemas
estáveis ao longo do tempo; em 23% houve recidi- comportamentais. A sobrevida a longo prazo costu-
va e óbito em 12% dos casos ao longo do período de ma ser boa, e as séries históricas mostram uma média
acompanhamento. As recidivas (sete pacientes) foram de 79% tanto para ressecção total como para exérese
tratadas por reoperações (16 cirurgias): em três de sete subtotal seguida de radioterapia.
pacientes obteve-se ressecção total (follow-up de 9,7 Em suma, o prognóstico depende de forma deci-
anos) e um paciente com resquício tumoral encaminha- siva da experiência do cirurgião. Embora a cirurgia
do para radioterapia. Os três pacientes restantes com radical seja desejável (Fig. 46.5), não se pode per-
recidivas faleceram 3,4 e 7 anos após a cirurgia inicial. der de vista que, em longo prazo, as seqüelas podem
Do ponto de vista endocrinológico, apenas 6% dos ser comprometedoras: deficiência endocrinológica e
pacientes não tinham déficits de eixos endocrinológicos metabólica, alterações cognitivas, visuais e neuroló-
no pós-operatório; a grande maioria apresenta déficits gicas. Trata-se de neoplasia benigna e as implicações
de um ou mais eixos. Na metade dos pacientes, a perda terapêuticas devem ser responsáveis; a intervenção
visual foi mantida, em um quarto dos casos houve me- cautelosa do neurocirurgião tem a intenção de mini-
lhora e em um quarto, piora, especialmente quando no mizar o sofrimento dessas crianças, sem acrescentar
pré-operatório já havia grave comprometimento. novos déficits.

A B

Fig. 46.5 – (A) Imagem de ressonância magnética (T1 com contraste) de craniofaringioma. (B) Tomografia pós-operatória
mostrando exérese total após abordagem inter-hemisférica.

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46 – Craniofaringiomas na Infância

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Parte 6
Neurocirurgia da
Coluna Vertebral e
Medula Espinhal

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Hérnia do Disco Lombar
Jefferson Walter Daniel
José Carlos Esteves Veiga

HISTÓRICO conhecimentos, modalidades terapêuticas e as técni-


cas cirúrgicas para tratamento da hérnia do disco in-
O Início tervertebral.

A
história do tratamento da hérnia do disco lom-
bar intervertebral iniciou-se com o estudo da Procedimentos de Localização e
dor ciática como síndrome clínica. O disco in- Diagnóstico
tervertebral foi descrito pela primeira vez por Andreas
Vesalius, em 1555, e Domencio Contugno (1736- Citado por Sonntag4, tentativas de relacionar o
1822), relacionando a dor ciática à dor no membro nível da lesão traumática na coluna vertebral ao ní-
inferior, denominando-a de dor ciática ou doença de vel da lesão neurológica iniciaram-se com Hipócra-
Contugno. Ernest Lasègue (1816-1883) relacionou tes, Aretaeus e Galeno, porém, foi Morgagni (1682-
o aumento da dor ciática à manobra, realizada pelo 1771), o pai da anatomia patológica moderna, quem
examinador, de elevar o membro inferior doloroso relacionou a presença de “massas pressionando a me-
com o doente em decúbito dorsal longitudinal, tendo dula espinhal, as quais provocavam paralisia das per-
este sinal o seu nome. A primeira associação entre a nas”. Macewen (1848-1924) foi o primeiro a localizar
ruptura traumática do disco intervertebral com déficit e operar “uma neoplasia fibrosa da teca”, localizada
neurológico foi relatada por Virchow em 1857 e cor- entre os níveis de T5 e T7 da coluna torácica, com
roborada por Kocher em 18961. base no exame neurológico, relacionando o nível da
Em 1911, Goldthwaite relatou o caso de um pa- lesão neurológica com o nível da lesão anatômica do
ciente que tinha dor ciática recorrente e foi operado tumor.
por Harvey Cushing, não tendo sido observada ne- A punção lombar foi introduzida por Corning
nhuma lesão no ato cirúrgico; postulou-se que o disco (1855-1923) e popularizada por Quinck (1842-1922),
intervertebral tinha um deslocamento recorrente para e Queckenstedt (1876-1918) relacionou o aumento da
dentro do canal vertebral, produzindo sintomas inter- pressão do líquido cerebroespinhal à compressão ma-
mitentes de lombalgia e dor ciática. Elsberg, em 1915, nual das veias jugulares no pescoço.
e Dandy, em 1919, operaram doentes com dor ciática Roentgen (1845-1923) revolucionou a prática da
por meio da discectomia, resultando em melhora dos medicina com a introdução dos raios X com finalida-
sintomas de dor. Até essa época, acreditava-se que a de diagnóstica, permitindo os primeiros procedimen-
hérnia do disco era uma neoplasia cartilaginosa1,2. tos de mielografia, realizados por Dandy, em 1919, e
Credita-se a Mixter e Barr, em 1934, o conceito da Bingel, em 1921, com o uso de ar no espaço subarac-
etiologia da hérnia do disco por motivo traumático ou nóideo como agente de contraste. O ar foi substituído
degenerativo e a relação entre o alívio da dor ciática e por lipiodol, contraste lipossolúvel, em 1922, por Si-
a discectomia, assim como a sistematização do diag- card e Forestier e, novamente substituído por contras-
nóstico e do tratamento com êxito dessa afecção1,3. A te hidrossolúvel, por Arnell e Lïdstrom, em 1931. A
partir dessa época, iniciou-se o desenvolvimento dos discografia foi descrita por Lindblom em 1948.
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Em 1972, o primeiro paciente foi submetido ao com a técnica da “coblação” e, com radiofreqüência,
diagnóstico de imagem com a tomografia axial com- por Barendse em 2001. Saal, em 2000, descreve o
putadorizada, desenvolvido por Oldendorf e Houns- mesmo princípio, porém utilizando a radiofreqüência
field. Mallard e Hutchinson iniciaram estudos para a para destruir terminações nervosas no interior do ânu-
aplicação clínica da ressonância magnética em 1974, lo fibroso1,3,5.
construíram o primeiro aparelho em 1976 e aplicaram Procedimentos minimamente invasivos anteriores,
o método com a finalidade de diagnóstico por ima- realizados por endoscopia pelas vias trans e retrope-
gem em humanos em 19804. ritoneal, se tornaram populares à medida que a tecno-
logia dos endoscópios evoluiu, no início dos anos de
Cirurgias 1990. Métodos para a fusão óssea e o emprego dos
discos artificiais estão em constante desenvolvimento,
Citado por Sonntag1, Yasargil, em 1967, introdu- especialmente no início dos anos de 2000. Métodos
ziu técnicas de microcirurgia e uso do microscópio de estabilizações móveis da coluna vertebral por via
cirúrgico no tratamento da hérnia do disco lombar e posterior foram descritos no final da década de 1990.
publicou os resultados de 105 doentes operados em
1977. Caspar, em 1977, aplicou as técnicas microci-
rúrgicas de Yasargil e associou a facetectomia medial O Futuro
à abordagem cirúrgica. Williams, na década de 1970, O uso de implante de prótese de núcleo pulposo
popularizou a técnica microcirúrgica com a apresen- utilizando hidrogéis com características similares às
tação de instrumentos cirúrgicos, possibilitando a re- do núcleo pulposo normal, com silicone ou poliure-
alização do procedimento com pequenas incisões na tano, com a finalidade da fusão óssea intersegmen-
pele. Os conceitos dos procedimentos minimamen- tar, iniciou-se nos anos de 2000 com séries limitadas
te invasivos posteriores e abertos para o tratamento de resultados clínicos. As técnicas para regenerar o
da hérnia do disco lombar iniciaram-se com Pool disco intervertebral apresentam os objetivos de tratar
em 1938, usando o endoscópio para visualização do as causas da doença degenerativa do disco interverte-
nervo espinhal no interior do canal vertebral. Smith bral, utilizando terapias com genes e células-tronco,
e Foley, em 1998, e Destandau, em 1999, apresenta- restaurando as características normais do disco. Essas
ram sistemas de endoscopia e afastadores musculares técnicas encontram-se nas fases pré-clínicas de desen-
apropriados para os procedimentos de discectomia, volvimento, iniciadas no começo dos anos de 2000. O
com o objetivo de ocasionar mínimos traumatismos tratamento biológico, isto é, transplante celular, ad-
aos tecidos musculares e nervosos1,3,5. ministração de fatores de crescimento e transferência
Os conceitos dos procedimentos minimamente genética, poderá alterar a evolução natural da história
invasivos posteriores e percutâneos, os quais utili- da degeneração do disco intervertebral, antecipando
zam agulhas apropriadas para punção e realização as deficiências nutricionais das placas cartilaginosas
de procedimentos terapêuticos no interior do disco e prevenindo o início da degeneração do disco inter-
intervertebral, iniciaram-se com a discografia diag- vertebral8.
nóstica, previamente mencionada e, para finalidades
terapêuticas, com Smith, em 1963, utilizando a téc- EPIDEMIOLOGIA
nica da quimionucleólise do núcleo pulposo para o
tratamento químico da hérnia de disco6. Outros pro- De acordo com Deyo et al.9, lombalgia é o segundo
cedimentos intradiscais foram descritos para o trata- motivo, após as infecções das vias aéreas superiores,
mento da doença degenerativa do disco intervertebral de consultas médicas. Aproximadamente 70% dos
em sua fase inicial, porém por métodos diferentes. adultos já tiveram lombalgia durante sua vida, porém
Os métodos por aspiração do núcleo pulposo foram em apenas 14% ocorreu episódio de duração superior
descritos por Hijikata, em 1975, e Onik, em 1984, o a duas semanas, e somente 1,5% com dor ciática as-
primeiro por técnica manual de aspiração e o segun- sociada9. Custos diretos e indiretos no tratamento são
do, automatizada. A técnica da vaporização do núcleo elevados e as abstinências no trabalho ocorrem em
pulposo por raio laser7 iniciou-se em 1986, com as 2% a 5% dos funcionários10.
descrições de Ascher e Choy, porém não se popu- A evolução natural da doença discal, na maioria
larizou possivelmente em razão do alto custo desse dos casos, inicia-se com lombalgia aguda e, após
método. A microdiscectomia percutânea endoscópica aproximadamente 1 mês de evolução, há melhora da
por agulha foi descrita por Mayer e Brock em 1993, e dor, da incapacidade funcional e retorno ao trabalho
complementos técnicos de melhora da qualidade dos para, a seguir, obter melhora adicional mínima nos
endoscópios, por Smith e Foley no final dos anos de três meses seguintes; depois desse período, a maio-
1990. A eletrocoagulação intradiscal com finalidade ria permanece estável, com recorrência da dor dentro
de reduzir o volume do núcleo pulposo e a melhora dos primeiros 12 meses. A lombalgia geralmente é de
dos sintomas de dor foi relatada por Eggers em 1997, evolução benigna e por período limitado, existindo

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47 – Hérnia do Disco Lombar

grande variedade de intervenções terapêuticas para o As articulações das vértebras são segmentares e
tratamento, não havendo consenso quanto à utiliza- em três pontos, duas simétricas nas facetas articulares
ção da maioria dessas modalidades11. posteriores e o espaço discal intervertebral. As facetas
Analisando-se as doenças musculoesqueléticas, a articulares originam-se dos pedículos dos arcos verte-
lombalgia é a entidade mais freqüente, seguida das brais, oriundas das lâminas dos arcos vertebrais, aos
afecções do joelho. Em 40% dos indivíduos com pares, das vértebras superiores e inferiores, encap-
lombalgia, ocorre dor em coluna cervical associada suladas por tecido fibroso, contendo líquido sinovial
com outra articulação12. Glaser et al. relacionaram as no seu interior, avasculares e nutridos por difusão e
condições climáticas às dores de origem musculoes- com terminações neurais, passíveis de originarem dor
quelética e concluíram que a pressão barométrica ele- quando há disfunção delas. Duas são as alterações das
vada da atmosfera é a única variável estatisticamente facetas articulares na doença degenerativa: destruição
significativa no aumento da dor na coluna vertebral, da cartilagem articular e proliferação reacional de
porém de importância clínica mínima13. cartilagem protetora, porém incompetentes para man-
A lombalgia prevalece na faixa etária de 45 a 54 terem as funções articulares prévias. Osteófitos são
anos de idade, sem relação com o sexo e raça, porém formados na tentativa de estabilizar o aumento de am-
a probabilidade de causar hospitalização e cirurgia é plitude dos movimentos articulares. Essas alterações
maior nos homens14. Os fatores predisponentes para a da estabilidade segmentar vertebral posterior refletem
hérnia do disco lombar são semelhantes àqueles para desequilíbrio no espaço intervertebral localizado an-
a lombalgia, como ocorre nas profissões que exigem teriormente, com conseqüente diminuição do espaço
o levantar repetitivo de pesos, associado a movimen- discal e disfunção metabólica do disco, propiciando
tos de rotação axial do tronco, tabagismo, obesidade, o desenvolvimento da sua degeneração e da hérnia
canal vertebral estreito e traumatismos15. do disco intervertebral, também com a formação de
Embora a lombalgia sempre tenha acometido in- osteófitos nas margens dos espaços discais18.
divíduos em todas as épocas, apenas após 1934, com A orientação anatômica das facetas articulares de
a associação por Mixter e Barr da hérnia do disco L1, L2 e L3 tende a ser oblíqua e, em L4 e L5, ho-
provocando a lombociatalgia e a sistematização do rizontal. Assim, os movimentos de flexão, extensão
tratamento cirúrgico, foi reconhecida como entidade e rotação axial são mais amplos em L4-L5 e L5-S1,
clínica. Os motivos para o aumento da lombalgia in- justificando a maior incidência de hérnias nestes dois
capacitante nos últimos 30 anos são atribuídos a fa- últimos segmentos2,19.
tores sociais, industrialização e leis que compensam
financeiramente o afastamento do trabalho14,16. Ligamentos
São cinco os ligamentos da coluna lombar, clas-
CONSIDERAÇÕES ANATÔMICAS SOBRE A sificados em: longitudinal anterior; longitudinal pos-
COLUNA VERTEBRAL terior; amarelo ou flavum; interespinhal; supra-espi-
nhal. Os dois ligamentos mais importantes na doença
Vértebras e Suas Articulações degenerativa da coluna vertebral são os ligamentos
Normalmente são cinco as vértebras lombares, longitudinal posterior e o amarelo, em virtude da re-
ocorrendo em poucos indivíduos, como variante lação anatômica direta com os nervos espinhais e o
anatômica, a sacralização da quinta vértebra lombar saco dural lombar, podendo causar fenômenos com-
(fixa) ou a lombalização da primeira vértebra sacral pressivos.
(móvel). Essas duas variantes, por si só, não são pa- Os ligamentos longitudinais anterior e posterior
tológicas, porém podem predispor os indivíduos a al- são um único ligamento, iniciando-se ao nível de C1
terações da biomecânica da coluna lombar e ao início e inserindo-se em S1, circundando os corpos verte-
precoce da doença degenerativa da coluna. Sacraliza- brais, sendo mais espessos anterior do que posterior-
ção da quinta vértebra lombar é denominada de vérte- mente, e delgados lateralmente. Localizado na região
bra transicional lombossacra e definida como a fusão dorsal do corpo vertebral, o ligamento longitudinal
parcial ou total, uni ou bilateral, do processo transver- posterior está aderido intimamente ao disco interver-
so da última vértebra lombar ao sacro. Luoma et al.17 tebral e aos corpos vertebrais de maneira cruciforme,
utilizaram imagens da ressonância magnética da co- sendo mais fino nas regiões laterais e mais espesso
luna lombar, relacionando a vértebra lombossacra de medialmente em relação ao disco intervertebral. Por
transição com a degeneração do disco intervertebral esses motivos, protrusões discais são geralmente pos-
cranial e caudal à vértebra de transição e concluíram teriores e laterais em relação ao canal vertebral com a
que o disco cranial tem predisposição à degeneração possível compressão do nervo espinhal. Os ligamen-
precoce em relação ao disco caudal, possivelmente tos longitudinais anterior e posterior são elementos
em razão de a carga mecânica e a mobilidade serem importantes na estabilidade da coluna vertebral no
menores no disco caudal. sentido axial2,20.
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Os ligamentos amarelos se inserem nas faces inter- deformado durante forças de tensão ocasionadas por
nas e inferiores das lâminas vertebrais superiores e nas movimentos articulares fisiológicos das vértebras.
margens superiores das lâminas vertebrais inferiores, O núcleo pulposo é o remanescente embrionário da
sendo delgados em suas junções medianas. A tendência notocorda, composto por proteoglicanos na forma
de instabilidade progressiva da coluna vertebral ocasio- líquida. Assume a forma esférica, apresenta consis-
nada na doença degenerativa acarreta substituição das tência gelatinosa e localiza-se no centro do ânulo fi-
fibras elásticas do ligamento amarelo por proliferação broso com propriedades de deformação e adaptação
de fibras de colágenos, conseqüente hipertrofia e cal- uniforme às variações das pressões impostas ao disco
cificação do ligamento amarelo e possível compressão intervertebral durante a aplicação de cargas fisiológi-
dos nervos espinhais dentro do canal vertebral, recessos cas à coluna vertebral2,24,25. As funções do disco são
laterais e forames vertebrais, com sintomatologia radi- permitir a movimentação segmentar intervertebral e a
cular e de compressão da cauda eqüina21. Os ligamen- absorção dos impactos impostos à coluna vertebral22.
tos amarelos limitam a flexão da coluna vertebral22. Os eventos degenerativos alteram a bioquímica e a
estrutura da matriz extracelular do disco interverte-
Disco Intervertebral bral, com a conseqüente perda da hidratação do disco,
diminuição da altura discal, desorganização lamelar
Localizado no espaço intervertebral dos corpos do ânulo fibroso e diminuição da concentração dos
vertebrais, constitui-se por três estruturas: placa car- proteoglicanos do núcleo pulposo25.
tilaginosa, ânulo fibroso e núcleo pulposo, distintos
em suas estruturas e funções mecânicas. Qualquer
modificação na integridade dessas estruturas resulta
Canal Vertebral
no comprometimento da função do disco interverte- É formado dorsalmente pelas lâminas dos arcos
bral23. Placas cartilaginosas são lâminas delgadas de vertebrais e ventralmente pelos corpos e discos inter-
cartilagem hialina, aderidas às superfices superiores vertebrais. Os limites laterais são formados pelos pe-
e inferiores dos corpos vertebrais, com as funções de dículos dos arcos vertebrais e suas respectivas facetas
fixar o disco aos corpos vertebrais, impedir que o nú- articulares, sendo esse espaço anatômico chamado
cleo pulposo seja projetado para o interior dos corpos de recesso lateral, por onde o nervo espinhal passa
vertebrais e reguladores da difusão dos nutrientes e até sua saída pelo forame intervertebral26. O recesso
catabólitos, pois o disco intervertebral é avascular e lateral, por sua vez, é dividido em três partes: zona
depende da vascularização das placas cartilaginosas de entrada do nervo espinhal, que é o recesso lateral
para manter a integridade da matriz discal. O ânulo propriamente dito, zona intermediária, onde o nervo
fibroso é formado por camadas concêntricas lamina- espinhal encontra-se abaixo do pedículo e facetas
res de fibras de colágenos densas e duras, aderidas articulares, e zona de saída do nervo espinhal pelo
firmemente às faces vertebrais superior e inferior, forame intervertebral22. Dependendo do local da com-
cujas funções são manter o núcleo pulposo em seu pressão do nervo espinhal no recesso lateral, a tática
meio e dar sustentação anatômica ao disco, o qual é cirúrgica é modificada27 (Figs. 47.1 e 47.2).

L3
Lâmina do arco vertebral L3

Saco dural Nervo espinhal L4

L4 Artérias radiculares

Facetas articulares L4-L5


Hérnia do disco L4
Processo transverso Compressão do nervo espinhal L5

Processo espinhoso
L5
Ligamento amarelo L5-S1 Recesso lateral

Sacro
Fig. 47.1 – Vista posterior das vértebras lombares de L3 a S1 e a relação com as estruturas anatômicas, com destaque para a
hérnia do disco do espaço intervertebral de L4 com a compressão do nervo espinhal de L5, localizado em situação posterior e
lateral à esquerda em relação ao canal vertebral. Modificado de Winter et al.28

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47 – Hérnia do Disco Lombar

Ânulo fibroso

Núcleo pulposo

Recesso lateral
Nervo espinhal

Cauda eqüina

Fig. 47.2 – Vista axial da vértebra lombar, com evidência à zona de entrada do nervo espinhal no recesso lateral. O nervo
espinhal é afastado na figura. Modificado de Winter et al.28

Nervos Espinhais tervertebral, inervando a dura-máter do saco dural,


o ligamento longitudinal posterior e o ânulo fibroso.
O cone medular geralmente está localizado na re-
O núcleo pulposo não é inervado2.
gião dorsal do corpo vertebral de L1 onde, a partir
daí, se inicia a cauda eqüina, formada por nervos es-
pinhais motores e sensitivos. No interior do saco du-
ral as radículas dorsais sensitivas se unem às radículas
ventrais motoras para formar o nervo espinhal que sai Pedículo do
do envoltório dural e caminha através do recesso late- arco vertebral
ral até a saída da coluna pelo forame intervertebral.
Disco L3
O nervo espinhal correspondente à mesma vértebra
Vértebra L4
sai do canal vertebral através do forame intervertebral
superior ao disco intervertebral do mesmo nível. Por
exemplo, correspondem ao mesmo nível segmentar Hérnia L4
Nervo espinhal L4
o nervo espinhal L4, a vértebra L4 e o disco L4. É o Nervo espinhal L5
nervo espinhal de um nível segmentar inferior que se
relaciona anatomicamente com o disco intervertebral, Hérnia L5
sendo este nervo espinhal comprimido na hérnia do Nervo espinhal S1
disco. Assim, a hérnia do disco L4 irá comprimir o
nervo espinhal de L5. Utilizando o mesmo exemplo,
não é freqüente a hérnia migrar cranialmente e com- Sacro
primir o nervo espinhal de L4 ou migrar caudalmente
e comprimir o nervo espinhal S120. (Fig. 47.3)

Inervação
O nervo recorrente de Lushka origina-se no ramo Fig. 47.3 – Aspecto posterior das vértebras lombares L3, L4,
dorsal do nervo espinhal, inervando a vértebra cor- L5 e sacro. A hérnia do disco L4 comprime e deforma o nervo
respondente. Esse nervo sensitivo inicia seu trajeto espinhal L5. O nervo espinhal L4 é cranial ao disco L4. Modi-
logo após a saída do nervo espinhal do forame in- ficado de Rengachary e Wilkins20.

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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Vascularização por Kirkaldy-Willis em1983, a degeneração da colu-


na vertebral ocorre em três fases. Na primeira fase,
Arterial há disfunção da fisiologia e bioquímica das três arti-
Origina-se da aorta, via artérias lombares, aden- culações do segmento vertebral funcional (vértebras
trando a coluna vertebral pelos forames interverte- cranial e caudal e disco intervertebral), apresentando
brais através das artérias radiculares anteriores e pos- clinicamente manifestações dolorosas. Na segunda
teriores, em pares e em cada nível vertebral. Menção fase, as disfunções prévias alteram as funções biome-
especial é dada à artéria de Adamkiewicz (artéria ra- cânicas segmentares, permitindo pequenos movimen-
dicular anterior magna) por sua importância. Origina- tos do segmento vertebral funcional e instabilidade
se em 85% dos indivíduos de T9 a L2 e é o principal sintomática. A terceira fase descreve a deformidade
suprimento arterial da medula de T8 até o cone medu- fixa segmentar por meio da formação de osteófitos
lar. A lesão dessa artéria causa paraplegia29. como tentativa fisiológica de compensar a instabili-
dade existente18.
O processo degenerativo da coluna vertebral ini-
Venosa cia-se aproximadamente aos 25 anos de idade e será
O plexo venoso interno peridural anterior e pos- progressivo durante toda a vida do indivíduo, apre-
terior (ou de Batson) drena o sangue através dos fo- sentando como etiologias a predisposição genética e
rames intervertebrais para o plexo venoso externo e, a do desenvolvimento18,30.
posteriormente, para a veia cava inferior. Em 98% dos casos, as hérnias ocorrem nos espa-
ços de L4-L5 e L5-S132; isto se deve ao fato de todo
FISIOPATOLOGIA DA DOENÇA o peso do tronco estar depositado nesses dois seg-
mentos e de estes serem também os mais móveis em
DEGENERATIVA DA COLUNA VERTEBRAL decorrência da tendência horizontal das facetas arti-
Processo Degenerativo culares nesses níveis31.
A nosologia da doença degenerativa da coluna
vertebral compreende três entidades: hérnia do disco, Mecanismos da Dor
espondiloartrose ou espondilose e o conjunto espon- O Comitê de Taxonomia da Associação Interna-
dilólise-espondilolistese. Por motivos didáticos, são cional para o Estudo da Dor32 define dor como uma
estudadas separadamente, porém representam a mes- experiência sensorial e emocional desagradável, as-
ma doença em diferentes fases de evolução, poden- sociada a dano tecidual potencial ou real. O aprendi-
do predominar uma das entidades sobre a outra, com zado da sensação da dor ocorre durante toda a vida,
aspectos clínicos característicos para cada uma das sendo variável, a depender dos aspectos psicológicos,
doenças. A degeneração acomete a coluna vertebral sociais, duração e a lesão tecidual existente32.
em seus elementos ósseos, articulares, ligamentares
e os discos intervertebrais, sendo caracterizada por Os dois sintomas principais na hérnia do disco lom-
alterações destrutivas as quais não são compensadas bar são a lombalgia e a ciática, porém os mecanismos
pela regeneração. É diferente do envelhecimento da fisiopatológicos de suas origens não são bem conhe-
coluna vertebral, processo normal e fisiológico de to- cidos, visto que, em indivíduos assintomáticos, pode
dos os indivíduos, no qual, conforme a faixa etária, haver uma hérnia de disco com evidente compressão
existem alterações anatômicas características, por ve- do nervo espinhal e, em outros com lombalgia e dor
zes não provocando sintomas clínicos por haver um ciática incapacitante, podem não ocorrer alterações
equilíbrio biomecânico compensatório entre as altera- anatômicas vistas na ressonância nuclear magnética
ções e a estabilidade segmentar da coluna vertebral19. (RNM) da coluna lombar33. Deve-se lembrar que há
Diferenciação entre o envelhecimento e degeneração outras causas de dor lombar e ciática, tais como: lesões
do disco intervertebral é difícil por não haver uma de- musculoesqueléticas, espondiloartrose, degeneração
finição padrão-ouro23. das facetas articulares, anormalidades anatômicas da
Definições para a degeneração do disco interverte- coluna (escoliose), infecções (discite) e doenças visce-
bral não são uniformes por se tratar de um fenômeno rais de origem pélvica, renal ou gastrointestinal9.
não bem compreendido30. Historicamente, aceita-se Dor lombar: a distorção anatômica do ânulo fibroso
ser no disco intervertebral o início do processo de- por fissuras e a conseqüente compressão do ligamento
generativo, resultando em alterações secundárias longitudinal posterior pela hérnia do disco são as cau-
nas facetas articulares e nos ligamentos, porém há sas principais da dor lombar. Na lombalgia recorrente,
evidências de que o início desse processo se dê nas acredita-se que a distorção e a reparação por fibrose do
facetas articulares, com a conseqüente instabilidade ânulo fibroso ocorram de forma repetitiva. Todos os
segmentar e degeneração discal secundária. Utilizan- elementos anatômicos da coluna vertebral e da muscu-
do o conceito das três articulações (espaço interver- latura lombar podem provocar dor, porém suas vias não
tebral e as duas facetas articulares), como proposto são bem conhecidas tampouco sua fisiopatologia34.

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47 – Hérnia do Disco Lombar

Dor ciática: decorre da compressão mecânica do no espirro, na tosse e no esforço realizado ao evacuar.
nervo espinhal pela hérnia do disco e/ou por irritação Ao realizar a expiração forçada com a glote fechada,
química. Aparentemente, a principal causa da dor é a há aumento da pressão intra-abdominal com conse-
irritação química por aminas e proteoglicanos vindos qüente aumento da pressão venosa, a qual é transmiti-
do núcleo pulposo não íntegro, pois ocorre uma rea- da para o plexo venoso epidural, associada ao aumento
ção inflamatória inespecífica do nervo espinhal e no da pressão intradiscal com abaulamento maior e tran-
espaço epidural regional35. A compressão mecânica sitório da protrusão discal, acarretando compressão do
do nervo espinhal pela hérnia do disco nem sempre nervo espinhal e distensão do ligamento longitudinal
provoca dor ciática. Em situação de compressão crô- posterior. Esse sintoma está presente em 74% dos pa-
nica, haverá prejuízo da microcirculação e do trans- cientes com hérnia do disco lombar38. A dor pode ser
porte axonal de nutrientes com conseqüente edema e aliviada na flexão do membro inferior acometido pela
perpetuação da dor ciática36. dor ciática; isso se deve à diminuição do estiramento
do nervo espinhal em contato com o disco protruso,
ocorrendo apenas para hérnias discais localizadas em
DIAGNÓSTICO CLÍNICO NA HÉRNIA DO L4-L5 e L5-S1. Os movimentos do paciente são len-
DISCO LOMBAR tos e realizados com cuidado, como se estivesse prote-
Anamnese gendo a região lombar e o membro inferior acometido
pela dor ciática. Há troca de posições a cada 5 a 10 mi-
Não há história típica ou única. Depende da fase nutos, alterando movimentos de flexão e de extensão
da doença degenerativa da coluna vertebral, em es- do tronco e as posições ortostática e sentada39.
pecial da disfunção do disco intervertebral, da quan-
tidade de disco herniado, do intervalo em que ocorre Exame Físico
o processo de formação da hérnia e da conformação
anatômica do canal vertebral. Os achados clínicos dependem da situação ana-
A queixa inicial mais freqüente é de lombalgia, tômica do disco protruso em relação ao canal verte-
geralmente relacionada pelo paciente a esforços rea- bral, forame intervertebral e nervo espinhal. A hérnia
lizados, traumatismo ou vícios de postura. Há melho- do disco em situação posterior e lateral é a mais fre-
ra espontânea na maioria dos casos, em poucos dias, qüente, em decorrência de a conformidade anatômica
independentemente de qualquer tratamento. À medi- do ligamento longitudinal posterior ser mais espes-
da que ocorre degeneração discal com a conseqüen- sa medialmente e delgada e estreita lateralmente. A
lombalgia é menos importante do que a dor ciática no
te protrusão lenta e progressiva, outras crises de dor
diagnóstico da hérnia do disco. Quando persistente
lombar se manifestam, diminuindo o intervalo entre
como único sintoma, outras doenças devem ser in-
os episódios dolorosos e aumentando de intensida-
vestigadas. A estimativa de a lombalgia ser o único
de, assim como a sua duração. Esse processo ocorre
sintoma e ser causada por uma hérnia do disco é de 1
durante meses ou anos. A dor, em geral, é localizada para 1.000. Exceções são para as hérnias discais pos-
entre as regiões dorsal inferior e glútea. teriores e mediais, as quais simulam sintomatologia
A dor ciática costuma ocorrer após o início de epi- de estenose do canal vertebral, cuja expressão clínica
sódios de lombalgia, provavelmente relacionada ao é de claudicação neurogênica da marcha ou síndrome
aumento do volume do disco herniado e de compres- da compressão da cauda eqüina9. Na inspeção, a cro-
são do nervo espinhal. A lombalgia torna-se menos nicidade do processo pode ocasionar diminuição da
importante para o paciente, pois a dor ciática é a quei- curvatura lordótica lombar, ocorrendo retificação da
xa principal atual9. Em 50% dos casos, a dor ciática coluna lombar. Pode haver escoliose na tentativa de
melhora em 6 semanas e, em 5% a 10%, há recidiva afastar o nervo espinhal do disco protruso. A situação
da dor37. Quase sempre nessa fase, a lombalgia é asso- anatômica mais freqüente da hérnia do disco é cranial
ciada à dor ciática, ocorrendo nos episódios dolorosos e lateral em relação ao nervo espinhal, em que o pa-
à medida que o processo degenerativo do disco pro- ciente assume a atitude antálgica de desviar o tronco
gride. Os nervos espinhais de L4 a S3 formam o nervo para o lado contralateral à hérnia e, quando a hérnia
ciático e a dor segue seu trajeto pelo membro inferior localiza-se na axila do nervo espinhal, a tendência é
acometido. A dor inicia-se na região posterior e lateral lateralizar-se para o mesmo lado, a fim de diminuir a
do músculo glúteo, irradiando-se para a face posterior compressão mecânica no nervo espinhal pela hérnia e,
e lateral da coxa e da perna, podendo estar associada conseqüentemente, diminuir a dor2 (Figs. 47.4 e 47.5).
a parestesias no primeiro pododáctilo, no caso de a A báscula do quadril surge também como tentativa de
hérnia do disco L4 comprimir o nervo espinhal L5, ou diminuir a dor lombar e ciática. A palpação da muscu-
do quinto pododáctilo na hérnia de L5-S1. latura lombar pode evidenciar espasmo muscular do-
A lombalgia e a dor ciática podem ser exacerbadas loroso, e a região da vértebra lombar correspondente à
quando realizada a manobra de Valsalva, como ocorre hérnia pode ser dolorosa à percussão manual lombar.
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521
Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Síndromes dos Nervos Espinhais e Sinais de


Compressão do Nervo Espinhal
O exame neurológico na pesquisa de sinais e na
reprodução dos sintomas decorrentes da compressão
do nervo espinhal se divide em síndromes dos nervos
espinhais e sinais de compressão do nervo espinhal.

Síndromes dos Nervos Espinhais


Dor: deve-se caracterizar o trajeto da dor no mem-
bro inferior como do tipo ciático ou difuso.
Motricidade: os grupos musculares são examina-
dos e medidos com fita métrica, sendo comparados
com o lado oposto, a fim de se observar hipotrofia
muscular. Os grupamentos musculares devem ser
testados com movimentações ativas e passivas. Por
Fig. 47.4 – Quando a hérnia localiza-se no “ombro” do ner- exemplo, a paresia da flexão dorsal do pé indica lesão
vo espinhal, o tronco é desviado para o lado contralateral à do nervo espinhal L5 e, quanto à diminuição da flexão
hérnia, com melhora da dor ciática. Modificado de Hardy2. plantar, é indicativa de lesão do nervo espinhal S1.
Sensibilidade: as alterações sensoriais nos dermá-
tomos do membro inferior são mais evidentes quanto
mais distais, principalmente nos pododáctilos.
Reflexos: diminuição ou abolição dos reflexos pa-
telar e aquileu. A manobra de Jendrassik potenciali-
za a resposta do reflexo, realizado quando o paciente
puxa com força as mãos uma da outra no momento
em que é pesquisado o reflexo.
Os principais locais, a distribuição de freqüência
e os sinais e sintomas mais relevantes das síndromes
dos nervos espinhais encontram-se sumariados na Ta-
bela 47.1 e na Fig. 47.6.

Síndromes de Compressão dos Nervos Espinhais


Manobra de Lasègue (ou straight leg raising test):
citado por Dyck40 e descrito em 1864, é o exame mais
importante por ser o mais sensível, estando presente
em 94% dos pacientes com hérnia do disco38. O sinal
Fig 47.5 – Quando a hérnia localiza-se na “axila” do nervo é positivo quando ocorre dor ou parestesias no trajeto
espinhal, o tronco é desviado para o mesmo lado da hérnia,
com melhora da dor ciática. Modificado de Hardy2. radicular em questão; serve, também, para diferenciar

Tabela 47.1 – Síndromes dos nervos espinhais15


Espaço discal; L3-L4; L4-L5; L5-S1;
freqüência 5% 40%-45% 45%-50%
Disco herniado; L3; L4; L5;
nervocomprimido L4 L5 S1
Dor Lombar, nádega e face anterior da Lombar, nádega, face lateral e pos- Lombar, face posterior e lateral da
coxa terior da coxa e anterior e lateral da coxa e perna
perna
Parestesias Face anterior da coxa e da perna Face anterior e lateral da perna e o Face externa da perna e o quinto
primeiro pododáctilo pododáctilo
Paresia Quadríceps femoral e diminuição da Diminuição da flexão dorsal do pé e Diminuição da flexão plantar do pé
extensão da perna da extensão do primeiro pododáctilo
Reflexos Diminuição do reflexo patelar Normal Diminuição do reflexo aquileu

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47 – Hérnia do Disco Lombar

Dor

Parestesias

L4 L5 S1

Fig. 47.6 – Regiões das alterações dos sintomas de dor e Fig. 47.7 – Manobra de Lasègue: hérnia posterior e lateral,
alterações sensitivas nas síndromes dos nervos espinhais. com produção da dor ciática ao levantar o membro inferior
doloroso.
de dor com origem nas afecções do quadril. O exame é
realizado com o paciente em decúbito horizontal dor-
sal, em que o examinador levanta o membro inferior
com dor à altura do tornozelo, em extensão, até o apa-
recimento da dor ciática ou de parestesias. O exame é
considerado positivo quando, até 60° de elevação do
membro inferior, ocorrem os sintomas iguais aos da
dor ciática de que o paciente se queixa, pois os estira-
mentos dos nervos espinhais L5 e S1 não ocorrem aci-
ma de 60°. Essa manobra pode ser sensibilizada com
dorsoflexão do pé durante a extensão do membro infe-
rior, aumentando a dor e as parestesias2 (Fig. 47.7).
Sinal de Fajersztan ou manobra de Laségue cruza-
da: citado por Dyck40 e descrito em 1901, é um exame
menos sensível, porém mais específico que a mano-
bra de Lasègue, sendo relacionado à hérnia de disco
na situação posterior e medial. Realiza-se de modo
semelhante à manobra de Lasègue, só que no membro
inferior sem dor. É considerada positiva quando há
dor no membro inferior contralateral2 (Fig 47.8).
Sinal de Gower (ou cram test): citado por Dyck40 e
descrito em 1902, é realizado com o paciente em de-
cúbito horizontal dorsal, sendo estendido o membro
inferior sintomático com discreta flexão do joelho; Fig. 47.8 – Manobra de Lasègue cruzada: hérnia posterior
e medial, reproduzindo a dor ciática no membro inferior do-
em seguida, estende-se o joelho, com compressão di- loroso, ao levantar o membro inferior sem dor. Modificado de
gital na fossa poplítea no trajeto do nervo ciático. É Hardy2.
positivo quando ocorre dor e a interpretação é similar
à da manobra de Lasègue.
Manobra da flexão do joelho (ou femoral stretch da perna sobre a coxa. É positiva quando provoca dor
test): é realizada com o paciente em decúbito hori- no membro inferior com dor ciática, sendo sensível
zontal ventral, com a mão do examinador na fossa para compressões dos nervos espinhais nas hérnias
poplítea e com compressão digital do nervo ciático em L2, L3, L4 e, geralmente negativa para hérnias
em seu trajeto poplíteo; a seguir, é realizada a flexão em L5 e S1.
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523
Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Manobra da extensão do joelho: com o paciente lares crônicas no lado da concavidade da escoliose.
sentado e com flexão do quadril e dos joelhos, o exa- Espinha bífida oculta, sacralização das vértebras e
minador estende lentamente o membro inferior com espondilólise/espondilolistese podem comprometer
dor, sendo positiva ao provocar dor ciática. Seu signi- a biomecânica da coluna lombar, instabilizando-a e
ficado é similar ao da manobra de Lasègue. provocando sobrecarga de forças em determinadas
Sinal de Patrick (ou FABER, acrônimo para vértebras, propiciando a formação da degeneração
Flexion, ABduction, External Rotation): citado por discal. Fraturas recentes ou antigas também podem
Dyck40 e descrito em 1924, é utilizado no diagnóstico ser avaliadas.
diferencial com afecções do quadril e é negativo para Estreitamento do canal vertebral por espondilo-
compressões dos nervos espinhais. O tornozelo é po- artrose, espondilolistese, osteófitos e diminuição do
sicionado no joelho contralateral à dor e o joelho do espaço intervertebral evidenciam processo degenera-
mesmo lado à dor é deslocado lentamente em direção tivo da coluna vertebral, sugerindo, porém não confir-
à maca. Com essa manobra, aumenta a tensão articu- mando, o nível da possível hérnia discal.
lar do quadril; havendo comprometimento, surge dor Alterações osteoblásticas podem ocorrer, como na
no quadril. neoplasia metastática do adenocarcinoma da prósta-
Sinal de Trendelemburg: o examinador observa o ta e lesões líticas nos istmos e facetas articulares ou,
quadril do paciente posteriormente na posição ortos- ainda, diminuição da altura dos corpos vertebrais cau-
tática, sendo levantado em flexão o membro inferior sada por destruição óssea da neoplasia2.
sem dor. Normalmente, o quadril permanece na posi- Na avaliação pré-operatória, sempre devem ser
ção horizontal. O sinal é considerado positivo quando solicitadas radiografias simples da coluna lombar
o quadril se desloca para o lado do membro inferior para auxiliar no planejamento da cirurgia. O espaço
elevado, indicando paresia dos adutores contralaterais discal L4-L5 coincide com a região mais elevada da
da coxa. É sugestivo de radiculopatia L5. crista ilíaca. A musculatura que reveste a crista ilíaca
Sinal do manequim: descrito por Westbrook et coincide com o espaço discal L3-L4; é referência na
al.41 em 2005. É realizado observando-se o paciente determinação do espaço discal a ser operado. A lom-
em posição ortostática, considerado positivo quando balização da vértebra S1 e a sacralização da vértebra
ocorre flexão espontânea do membro inferior com dor L5 podem confundir o cirurgião quanto ao nível a ser
ciática. Essa posição antálgica é assumida na tentati- operado. A contagem das vértebras é feita no senti-
va de diminuir a dor produzida na compressão do ner- do caudal para cranial, podendo-se utilizar o termo
vo espinhal pela hérnia do disco. É reproduzido em vértebra de transição. Sinais de cirurgia prévia, por
100% dos casos e sensitivo no diagnóstico em 80% exemplo, laminectomia e possíveis segmentos ins-
nas compressões dos nervos espinhais localizados em táveis, são informações importantes que podem ser
L5 e S1. reveladas a partir das radiografias simples com estudo
dinâmico. Após cirurgias onde são utilizados implan-
EXAMES COMPLEMENTARES NO tes, realizam-se radiografias a fim de constatar o po-
sicionamento de parafusos pediculares, espaçadores
DIAGNÓSTICO DE HÉRNIA DO DISCO intersomáticos (cages) e de enxertos ósseos.
LOMBAR Miller et al.42 analisaram a relação custo versus
Radiografia Simples benefício da utilização da radiografia simples nos pa-
cientes com queixa de lombalgia de até 6 semanas de
Não é considerada método diagnóstico pelo fato duração, justificando a sua utilização pelo baixo custo
de o disco intervertebral ser radiotransparente, porém e índice de satisfação de 80% dos pacientes, prova-
é indicada para a visualização óssea lombossacra de velmente em razão do efeito placebo na sensação de
forma panorâmica. A radiografia simples é útil no tratamento. Não se demonstrou melhora dos resulta-
diagnóstico das alterações encontradas nas doenças dos funcionais ou de saúde.
degenerativas da coluna vertebral, com freqüência as-
sociadas à hérnia do disco intervertebral e para afastar
ou confirmar outras doenças que produzem alterações Ressonância Nuclear Magnética
ósseas. As incidências solicitadas são ântero-posterior Ressonância nuclear magnética (RNM) é o exame
e os perfis nas posições neutra, extensão e flexão, in- de escolha para o diagnóstico radiológico de hérnia do
dicados para o estudo da biomecânica e sinais de ins- disco43. Causas para a origem da dor lombar e/ou ciáti-
tabilidade segmentar. A visualização do pars interar- ca são musculares, ósseas, ligamentares e do disco in-
ticulares (istmo) é apreciada nas incidências oblíquas tervertebral, nas várias fases da doença degenerativa.
direita e esquerda, indicada na pesquisa de espondi- A RNM permite relacionar alterações das estruturas
lólise e avaliação dos forames intervertebrais. Esco- anatômicas da coluna vertebral com a sintomatologia,
liose pode indicar posição antálgica decorrente de dor evidenciando irregularidades da conformação do nú-
lombar e/ou ciática crônica por contraturas muscu- cleo pulposo, hidratação do disco, redução da altura

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47 – Hérnia do Disco Lombar

do disco, fissuras do ânulo fibroso, contornos e tipos zação das placas cartilaginosas. O ânulo fibroso per-
das hérnias discais, compressões dos nervos espinhais, de contato com os ligamentos longitudinal anterior e
irregularidades das placas cartilaginosas, alterações posterior, desestrutura a sua configuração laminar e
do tipo Modic, estenoses do canal vertebral e forames fissuras se formam. O interior do disco pode apresen-
espinhais, degenerações e assimetrias das facetas arti- tar, em algum período da degeneração, pressão nega-
culares e ântero e retrolisteses das vértebras44. tiva no seu meio e difusão de nitrogênio para dentro
Comparando-se a precisão diagnóstica entre os do disco, depositando-se próximo às placas cartila-
exames de imagem, a RNM é a mais precisa, com ginosas. Esse processo é denominado “fenômeno do
76,5% de acurácia, seguida pela mielotomografia vácuo”. As alterações descritas facilitam o extravasa-
(76%), tomografia (73,6%) e mielografia (71,4%)43. mento de material discal através do ânulo fibroso e,
Nem sempre há relação clínica entre as alterações conseqüentemente, a formação da hérnia47.
anatômicas encontradas, pois a hérnia pode exercer Jones et al.78 relacionam as alterações degenera-
evidente compressão no nervo espinhal e o paciente es- tivas das placas cartilaginosas e da medula óssea dos
tar assintomático, assim como um paciente apresentar corpos vertebrais descritas na classificação de Mo-
lombociatalgia incapacitante e imagem à RNM, sem dic, com a presença de lombalgia. Modic 1 (sinal da
alterações que justifiquem a intensidade da dor33,45. RNM: T1 hipointeso e T2 hiperintenso): é a reação
de granulação inflamatória não específica nas placas
cartilaginosas e na medula óssea das vértebras adja-
Técnicas de Imagens Funcionais da centes ao disco degenerado. Trata-se da única fase
Ressonância Nuclear Magnética associada à dor lombar. Modic 2 (sinal da RNM: T1
Haughton et al.46, em publicação de revisão de li- hiperintenso e T2 iso ou hiperintenso): é a fase se-
teratura, descreve técnicas de imagens funcionais da guinte e ocorre substituição de tecido medular ósseo
RNM para a visualização da degeneração discal. Os por gordura. Modic 3 (sinal da RNM: T1 hipointenso
objetivos dessas técnicas são relacionar as alterações e T2 hipointenso): fibrose da medula óssea vertebral.
anatômicas incidentais das sintomáticas. Observa-se, porém, que as alterações morfológicas
nem sempre são relacionadas a sintomas de dor.
Espectroscopia por RNM: as estimativas das con-
centrações de alguns metabólitos em amostras de te- Wagner et al.49 relacionam as extrusões discais
cidos podem sugerir doença degenerativa do disco, agudas através das placas cartilaginosas para o in-
como o aumento do ácido láctico. terior dos corpos vertebrais, denominados nódulos
de Schmorl, com a lombalgia. Descrito em 1927,
Imagem por difusão: determina a direção e a mag-
Schmorl relata a ocorrência de formação crônica de
nitude da difusão da água, evidenciando a fase inicial
hérnias, extrusões ou invaginações do disco interver-
da degeneração e desestruturação do disco.
tebral para o interior do corpo vertebral através da
Neurografia: identifica a desmielinização do ner- placa cartilaginosa. São apreciadas nas seqüências
vo espinhal em pacientes com radiculopatia crônica sagitais na RNM de sinal similar ao do disco interver-
por meio de hipersinal na RNM. tebral, estendendo-se através de defeito da placa car-
Imagem dinâmica da RNM: estudo dos movimen- tilaginosa e com sinal hipointenso nas fases T1 e T2.
tos e estabilidade da coluna vertebral, assim como Presentes em 38% a 75% dos indivíduos como acha-
deformidades do disco quando cargas ou torções são dos incidentais no exame de imagem e sem ocasionar
impostas às vértebras ou a alterações de posições as- lombalgia crônica, porém responsáveis por períodos
sumidas pelo paciente durante o exame. É utilizada limitados e transitórios de lombalgia, constatados du-
no diagnóstico nas seguintes situações: “hérnia de rante a investigação da história do paciente.
disco oculto”, evidenciada em posição ortostática
com carga axial na coluna, “desaparecendo” na posi- Nomenclatura para a Hérnia do Disco
ção supina sem carga; alterações das dimensões dos
forames vertebrais e canal vertebral com carga axial, Lombar e Suas Variantes na Ressonância
flexão e extensão; medidas dos movimentos relativos Nuclear Magnética
das vértebras. Classificação, Definições e Conceitos de Imagem
na Ressonância Nuclear Magnética
Fisiopatologia da Degeneração Discal na
Faz-se necessário utilizar terminologia padroni-
Imagem da Ressonância Nuclear Magnética zada nas condições normais e patológicas das doen-
O núcleo pulposo é gelatinoso e deformável, com ças degenerativas da coluna vertebral, especialmente
o início do processo degenerativo ocorrendo na subs- quando se trata do disco intervertebral, utilizando
tituição gradual de tecido normal por tecido fibroso e definições precisas e aceitas entre médicos na prática
cartilaginoso, com limites imprecisos entre o núcleo clínica, pacientes, familiares, empregadores, segura-
pulposo e ânulo fibroso. Ocorrem fissuras e hialini- doras, juristas, planejadores sociais e pesquisadores50.

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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Serão utilizados os conceitos de Fardon et al.50 no Fissuras do ânulo fibroso: separações entre as fi-
trabalho publicado: “Nomenclatura e Classificação da bras, avulsão das fibras das inserções nas faces dos
Patologia do Disco Intervertebral: Recomendações corpos vertebrais, desorganizações ou quebras das
da Combinação das Forças Tarefas das Sociedades fibras, com extensões radiais, transversas, concêntri-
Norte-Americana de Coluna, Americana de Radiolo- cas e envolvendo uma ou várias camadas das lâminas
gia Espinhal e Americana de Neurorradiologia”. As (Fig. 47.9).
definições são relacionadas à anatomia radiológica Zona de alta intensidade do ânulo fibroso: definida
normal e patológica da coluna vertebral e não aos as- como área focal de alto sinal de intensidade dentro da
pectos etiológicos, dos sintomas ou do tratamento. região posterior do ânulo fibroso do disco degenerado
Os Quadros 47.1 e 47.2 mostram a classificação não herniado, sendo sugestivo de origem de dor51.
das hérnias discais intervertebrais, definições e os Degeneração do disco intervertebral: desidrata-
conceitos radiológicos. ção, fibrose, diminuição do espaço discal, extensão
difusa do ânulo fibroso além do espaço discal, fissu-
ras do ânulo fibroso, degeneração mucosa do ânulo
Quadro 47.1 – Classificação das hérnias50
fibroso, defeitos e esclerose das placas cartilaginosas
Classificação das lesões dos discos intervertebrais e osteófitos. Essas alterações são, ainda, subdivididas
em: espondilose e osteocondrose intervertebral, ca-
• Congênita/variante do desenvolvimento
• Degenerativa/traumática
racterizadas por diminuição do espaço intervertebral,
− Fissura do ânulo fibroso forma irregular do disco, osteófitos multidirecionais
− Hérnia: envolvendo o canal vertebral e forames vertebrais,
 Protrusa/extrusa erosões das placas cartilaginosas com osteosclerose
 Intravertebral reacional e alterações crônicas da medula óssea dos
− Degenerativa:
 Espondilose deformante
corpos vertebrais (Modic).
 Osteocondrose intervertebral Hérnia do disco intervertebral: termo geral prefe-
• Inflamatória/infecciosa rido em virtude da simplicidade e uso comum. Deslo-
• Neoplásica camento localizado de material discal além dos limi-
• Variante morfológica de significado desconhecido tes do espaço intervertebral. O material pode incluir
núcleo pulposo, cartilagem, fragmentos de osteófitos
e ânulo fibroso. Pode ser localizada e difusa quando
Quadro 47.2 – Definições e conceitos50 maior que 50% (180°) da periferia do disco.
Descrição dos aspectos de imagem da hérnia do disco Espaço discal ou intervertebral: as extremidades
intervertebral cranial e caudal são as placas cartilaginosas das faces
dos corpos vertebrais, e a periferia do espaço discal
• Morfologia são as margens dos corpos vertebrais, excluindo for-
− Protruso
− Extruso mações de osteófitos.
− Intravertebral Hérnia protrusa: quando a base do disco é maior
• Contenção que o material discal deslocado do espaço interverte-
• Continuidade bral. Focal quando o fragmento do disco é menor que
• Relação com o ligamento longitudinal posterior
• Volume
25% da base do disco, e difuso ou de base larga quan-
• Composição do de 25% a 50% em relação à base (Fig. 47.9).
• Localização Hérnia extrusa: quando o material discal desloca-
do do espaço intervertebral é maior do que as margens
da base do disco, ou quando não há continuidade entre
Descrições dos Aspectos de Imagem na o material discal deslocado e o disco mãe (Fig. 47.9).
Ressonância Nuclear Magnética50 Hérnia seqüestrada ou fragmento livre: subdivi-
são da hérnia extrusa. Ocorre separação completa do
Etiologia degenerativa e traumática: não implica fragmento discal do disco mãe.
necessariamente associação do trauma como origem Hérnia migrada: subdivisão da hérnia extrusa.
da degeneração e vice-versa. Referência de posição e não de continuidade. O ma-
Disco normal: formação completa, sem alterações terial discal deslocado está separado do local do disco
traumáticas, degenerativas, doenças ou de envelheci- extruso, podendo ser disco seqüestrado ou não. O ma-
mento, considerando apenas aspectos morfológicos e terial discal, quando contido pelo ligamento longitu-
não clínicos. dinal posterior, apresenta, na imagem axial, situação
Envelhecimento discal: aspectos morfológicos similar à do disco protruso e, na imagem sagital, dis-
próprios da idade, de difícil diferenciação da doença co migrado, devendo ser considerado hérnia extrusa
degenerativa. nesse caso.

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47 – Hérnia do Disco Lombar

Compressão da cauda eqüina e nervo espinhal

Disco protruso

Fissuras do ânulo fibroso Disco extruso


Núcleo pulposo

Fig. 47.9 – Fases da degeneração do disco. Inicialmente ocorrem quebras das fibras do ânulo fibroso e fissuras. O núcleo pul-
poso não contido insinua-se através das lâminas fibrosas do anel e origina a hérnia do disco, no exemplo, de maneira protrusa
ou extrusa. Modificado de Wilkins20.

Hérnia intravertebral: deslocamento cranial ou A mielotomografia foi bastante utilizada antes da era
caudal de material discal para o interior do corpo ver- da RNM. Consiste na realização da mielografia com
tebral, causado por descontinuidade da placa cartila- contraste iodado, seguido da realização da tomografia
ginosa do corpo vertebral (nódulo de Schmorl). axial computadorizada, permitindo identificação da
Hérnia contida e não contida: relativa à integrida- compressão do nervo espinhal pelo disco herniado45.
de do ânulo fibroso, contendo ou não material discal
deslocado. Orientação de Imagem por Método
Relação da hérnia do disco com o ligamento lon- Esterotático Computadorizado
gitudinal posterior: importância relativa (radiológi-
ca). Classifica-se em subligamentar, extraligamentar, O objetivo do método é de orientar o procedimento
transligamentar ou perfurada. cirúrgico com imagens reconstruídas por tomografia
axial computadorizada em tempo real, permitindo a
Volume do material deslocado: relativo ao com- “navegação” no campo operatório. Imagens tomográ-
prometimento do canal vertebral com o material discal ficas prévias à cirurgia são obtidas dos segmentos da
deslocado, classificado como: “leve”, quando menor coluna de interesse para o procedimento e reconstruí­
do que um terço do diâmetro do canal; “moderado”, das em três dimensões durante o ato operatório. Na
quando entre um e dois terços; “grave”, quando supe- sala de cirurgia, uma estação de trabalho do compu-
rior a dois terços. A mesma terminologia é utilizada tador com software adequado reconstrói imagens nos
no comprometimento do forame intervertebral. planos coronais, sagitais e axiais da coluna vertebral.
Composição do material deslocado: depende de Em algum ponto fixo na coluna vertebral (geralmente
aspectos clínicos e não morfológicos, porém são uti- a apófise espinhosa da vértebra) adapta-se um sen-
lizados termos como núcleo pulposo, cartilaginoso, sor de referência para o raio infravermelho emitido
ósseo, calcificado, gasoso e liquefeito. da estação de trabalho, externo ao campo operatório,
Localização: utilizam-se parâmetros anatômicos na para reconhecer a anatomia da coluna naquele local
coluna vertebral, denominados “zonas” e “níveis”, rela- específico, produzindo imagens novas reconstruídas
cionados ao material discal herniado (Fig. 47.10, A a C). em cima das imagens tomográficas previamente ob-
tidas. O cirurgião utiliza um sensor (probe) manual
Tomografia Axial Computadorizada em conexão à estação de trabalho, para obter imagens
dos acidentes anatômicos da coluna vertebral, per-
Após a ressonância magnética, é o exame de es- mitindo a navegação do procedimento. É aplicável
colha, por ser de realização mais rápida e menos cus- a todos os segmentos da coluna vertebral, especial-
tosa43. Tem indicação absoluta no estudo das degene- mente na orientação anatômica ao aplicar parafusos
rações ósseas e articulares das vértebras, pois é mais pediculares nos procedimentos de fixação segmentar
específica para a visualização óssea do que a RNM. vertebral52.

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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Zona extraforaminal (zona extremolateral)

Zona foraminal (zona pedicular)

Zona subarticular (recesso lateral)

Zona central do canal

B
Nível suprapedicular

Nível pedicular

Nível infrapedicular

Nível do disco

Zona central do canal

Nível do disco
Zona subarticular
Nível suprapedicular
Nível do pedículo Zona foraminal
Nível infrapedicular Zona extraforaminal

Fig. 47.10 – Parâmetros anatômicos da vértebra e do disco intervertebral usados na classificação da hérnia do disco interver-
tebral. (A) Imagem axial das zonas anatômicas do disco intervertebral relacionadas às hérnias. (B) Imagem em perfil e posterior
à vértebra, dos níveis anatômicos das hérnias. (C) Relação das estruturas anatômicas com as zonas e níveis anatômicos. Modi-
ficado de Fardon e Milette50.

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47 – Hérnia do Disco Lombar

Mielografia Aplicações Medicamentosas em


É pouco utilizada atualmente por ser um exame Articulações Sinoviais
invasivo e por possíveis efeitos colaterais do con- Método diagnóstico para confirmar a origem da dor
traste iodado. Foi substituída pela RNM e pela tomo- lombar como proveniente das articulações sacroílíacas
grafia axial computadorizada. Tem indicação para o e facetas articulares, realizado por aplicações anesté-
estudo dinâmico do contraste intratecal ao percor- sicas nessas articulações, pois não há cirurgia, estudo
rer o espaço subaracnóideo da coluna lombar e da anatômico ou história clínica padrão ouro para esse
transição torácica e lombar, delineando bloqueios de fim. A denervação percutânea por radiofreqüência das
contraste completos ou parciais e preenchendo com articulações zigoapofisárias na região lombar pode pro-
contraste cistos de raiz (cistos de Tarlov) e cistos porcionar alívio da dor em pacientes selecionados53.
aracnóideos. A desvantagem maior é a possível rea-
ção alérgica ao contraste iodado, podendo ocasionar Injeções Seletivas Epidurais dos Nervos
choque anafilático, a incômoda cefaléia pós-ráqui
e convulsões. Após o exame, o paciente deve per-
Espinhais
manecer no hospital, aumentando, assim, o custo do Quando são necessários os diagnósticos diferen-
procedimento43. ciais das compressões dos nervos espinhais sintomá-
ticos dos assintomáticos, informações clínicas confli-
Eletroneuromiografia tantes e com múltiplos níveis de alterações anatômicas
degenerativas vistas nos exames de imagens, injeções
Exame para evidenciar a disfunção fisiológica de seletivas epidurais são utilizadas na determinação do
nervos periféricos e músculos. Não é diagnóstico para nível sintomático. O raciocínio do funcionamento é
hérnia do disco, porém útil para documentar radicu- de que o anestésico utilizado age apenas no nervo es-
lopatias decorrentes da compressão crônica de nervos pinhal implicado na origem da dor56.
espinhais pela hérnia discal15. É utilizada no auxílio
do diagnóstico diferencial das miopatias, neuropatias Termografia
periféricas, plexites, mielopatias e lesões agudas e
crônicas de nervos periféricos. Consiste na reprodução de imagens termográficas
da coluna vertebral e dos membros inferiores, com-
parando diferenças de temperatura dos dermátomos.
Discografia Reprodutiva Não é diagnóstico para as radiculopatias e não se re-
Foi descrita por Lindblom em 1948, para o estudo comenda seu uso57.
anatômico do disco intervertebral e substituída para
esse fim atualmente pela ressonância nuclear magné- DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DA HÉRNIA
tica e tomografia axial computadorizada. É utilizada DO DISCO LOMBAR
para o estudo da fisiologia do disco intervertebral. O
raciocínio do uso é provocar os sintomas dolorosos A importância da medicina baseada em evidências jus-
do paciente durante a injeção do contraste iodado no tificou aproximadamente 500 publicações de vários países
núcleo pulposo do disco, identificando o disco dege- sobre a formulação de diretrizes no tratamento de lombal-
nerado responsável pela sintomatologia. Irritação das gia nas várias fases de evolução, com vistas aos diagnósti-
terminações nervosas, normalmente ausente no inte- cos diferenciais nas doenças graves com a hérnia do disco,
rior do disco e do ânulo fibroso interno, porém pre- sem consenso, porém, em decorrência das metodologias
sente na doença degenerativa, origina a dor lombar variadas e por não serem reproduzidas de maneira univer-
obtida por esse método53. sal58. Há controvérsia a respeito dos métodos diagnósticos
e tratamento na lombalgia10. Classificar pacientes com
É um exame com controvérsias quanto à indi-
lombalgia é difícil em razão do curso recorrente e variável
cação e realização, embora seja de alta especifici-
da dor e da incapacidade funcional potencial. A triagem
dade na identificação do disco doente. É invasivo,
para os sintomas chamados de red flags é necessária para
doloroso e com riscos, como discite e alergias ao
os diagnósticos diferencias das doenças graves59.
uso do contraste43. Jackson e Glah54, no diagnóstico
de hérnias foraminais, utilizaram esse procedimen- A depender do período de evolução da dor lombar,
determinadas doenças, próprias de cada fase, devem
to em todos os seus 174 pacientes, por considerar
ser afastadas37:
necessário na avaliação do disco afetado. Mayer e
Brook55 confirmaram a presença de hérnia do disco • Lombalgia aguda: de 0 a 6 semanas.
contido com discografia, já na mesa de cirurgia, para • Lombalgia subaguda: de 6 a 12 semanas.
o prosseguimento da discectomia percutânea endos- • Lombalgia crônica: superior a 12 semanas.
cópica, confirmando a indicação desse procedimen- • Lombalgia recorrente.
to cirúrgico. • Sinais não orgânicos ou psicológicos.
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529
Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Lombalgia Aguda do nervo ciático em outros locais, como na síndrome


do músculo piriforme61, neoplasias do próprio nervo
O objetivo é afastar a possibilidade de doenças gra- ciático e neurite ou trauma do nervo, também podem
ves ou potencialmente graves da coluna vertebral ou ocasionar lombalgia e dor ciática.
de outros sistemas. A Agency for Health Care Policy
and Research15 recomenda a classificação descrita no
Quadro 47.3 para o início da pesquisa da causa da lom- Lombalgia Crônica
balgia aguda, baseado no histórico e no exame físico. A dor persistente após 12 semanas acomete apenas
Em 80% dos casos, não há diagnóstico específico 5% dos pacientes. Os diagnósticos diferenciais são os
quanto à causa da lombalgia. A melhora ocorre em mesmos das fases prévias, acrescentando-se doenças
90% dos pacientes dentro de quatro semanas, mesmo degenerativas crônicas da coluna vertebral, afecções
sem tratamento. As causas mais freqüentes são espas- do quadril, espondilite anquilosante (teste positivo
mo muscular e/ou contusões musculoligamentares. para o antígeno IILA-B (27)) e síndrome dolorosa
Dor lombar incapacitante de início súbito geral- miofascial, sendo esta última de difícil diferenciação
mente decorre de doença intra-abdominal ou vascular. em relação à clínica da hérnia do disco lombar62,63.
Dor em repouso é preocupante, pois, na doença dege-
nerativa da coluna vertebral, o repouso geralmente me- Lombalgia Recorrente
lhora a lombalgia. Devem-se investigar neoplasias ou
infecções da coluna vertebral, como discite aguda, abs- No prazo de 1 ano, 60% dos pacientes terão novos
cesso epidural, osteomielite e pielonefrite, principal- episódios de lombalgia. Excluindo-se a existência
mente em dependentes químicos, imunossuprimidos das doenças graves citadas, as doenças degenerativas
ou complicações de cirurgias do abdome ou da coluna da coluna vertebral e os espasmos musculares são as
vertebral recentes. Outras causas são fraturas patológi- causas mais freqüentes de lombalgia recorrente.
cas decorrentes de osteoporose e traumatismos.
Déficits motores, sensitivos e dos esfíncteres de Sinais Não Orgânicos ou Psicológicos
forma aguda devem sempre ser investigados e trata- Além das causas orgânicas, as dores lombar e ciá-
dos imediatamente. As causas mais freqüentes são: tica podem ser de causas psicossomáticas. De acordo
abscesso epidural, hemorragia epidural ou intradural, com Deyo et al.9, os seguintes sinais sugerem doen-
neoplasia intra ou extradural ou hérnia do disco lom- ças psicológicas:
bar extrusa aguda.
• Dores não apropriadas, superficiais ou genera-
lizadas.
Quadro 47.3 – Pesquisa da etiologia da lombalgia • Dor ao simular força axial no vértice da cabe-
aguda15 ça, com irradiação da dor para a coluna verte-
bral ou na rotação simulada do tronco.
Categoria clínica Descrição
• Não-coerência dos resultados ao exame neu-
Condição potencialmente Neoplasia, infecção, fratura espi- rológico nas provas de compressão do nervo
grave nhal ou síndrome da cauda eqüina
espinhal (por exemplo, manobra de Lasègue).
Dor ciática Dor no trajeto do nervo ciático, ge- • Não-coerência dos resultados ao exame neuro-
ralmentedecorrentedacompressão
do nervo espinhal
lógico na avaliação das síndromes dos nervos
espinhais (por exemplo, trajeto radicular atípi-
Sintomas não específicos Sintomas ocorrem primariamente co da dor).
na região lombar, não sugerindo
compressão do nervo espinhal ou
condição patológica grave TRATAMENTO NÃO CIRÚRGICO
O princípio básico do tratamento conservador é de
proporcionar repouso ao disco intervertebral degene-
Lombalgia Subaguda rado, evitando sobrecarga mecânica. Na fase aguda da
Em 10% dos pacientes, a lombalgia persiste por hérnia do disco, ocorre um processo inflamatório não
mais de 6 semanas. As causas são as mesmas da fase específico do nervo espinhal e da região peridural, em
prévia, podendo ter passado despercebidas doenças decorrência da saída do conteúdo do núcleo pulpo-
incipientes à investigação inicial. Além da hérnia do so através do ânulo fibroso lesado. A esse processo
disco lombar, doença degenerativa da coluna vertebral atribuem-se as dores lombar e ciática, além da com-
mais freqüente, outras causas de dor devem ser inves- pressão mecânica do nervo espinhal. À medida que o
tigadas, como a síndrome do recesso lateral encontra- processo inflamatório diminui, associado à fibrose e à
da na espondilose, espondilólise/espondilolistese e os desidratação do disco, a dor diminui. Saal et al.64, no
cistos sinoviais das facetas articulares60. Compressões estudo do tratamento não cirúrgico da hérnia do disco

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47 – Hérnia do Disco Lombar

lombar, sugerem a fisiopatologia descrita, porém não so é relativo. O repouso restrito ao leito é de menor
definem em quanto tempo isto ocorre. eficácia para os indivíduos com lombalgia aguda do
Atlas et al.65, em 2001, compararam os resultados que a permanência nas atividades e, em relação aos
do tratamento cirúrgico e não cirúrgico da hérnia do pacientes com dor ciática, não há diferença entre o
disco lombar, cujo sintoma principal era de dor ciá­ repouso e a permanência das atividades diárias habi-
tica, após o acompanhamento de 5 anos. Concluíram tuais71. Repouso e fisioterapia não são mais eficazes
que a melhora dos sintomas ocorreu em 70% dos do que manter as atividades habituais diárias na fase
pacientes tratados com cirurgia versus 56% tratados de recuperação72.
sem cirurgia na fase inicial do acompanhamento e,
no final do período de estudo, os resultados eram si- Mudanças de Hábitos Físicos
milares. Os mesmos autores publicaram, em 2005, as
mesmas comparações do trabalho prévio, divulgando O objetivo é o indivíduo conciliar suas atividades
os resultados após 10 anos de acompanhamento. Na diárias à dor e permanecer na ativa. Devem ser dimi-
maioria dos doentes operados, realizou-se discecto- nuídos os esforços físicos como a rotação lombar de
mia por via aberta para a retirada de discos extrusos repetição, a extensão ou flexão forçadas, o levantar
e discectomia percutânea em apenas 4,3% dos casos. de pesos, vibrações intensas, evitando-se permanecer
Os tratamentos clínicos foram: exercícios físicos, nas posições sentada ou ortostática por períodos pro-
fisioterapia, repouso, manipulação espinhal (quiro- longados. No caso de dor intensa, as atividades do pa-
praxia), analgésicos narcóticos e aplicações de este- ciente devem ser interrompidas temporariamente para
róides epidurais. Ao término do período de estudo, a depois reassumir gradativamente suas funções15.
melhora ocorreu em 69% dos doentes operados ver-
sus 61% dos doentes não operados. Os doentes ope- Terapias Físicas
rados apresentavam sintomas e estados funcionais de
incapacidade mais graves prévios à cirurgia e, após o Educação da Postura
período dos 10 anos, estavam mais satisfeitos e com Correções na postura, no sentar, técnicas corretas
estado funcional de capacidade melhores em compa- para levantar pesos, posição na cama durante o sono
ração aos não operados. Os autores concluíram que e perda de peso corpóreo, quando necessária, são efi-
os resultados são similares e o tratamento conserva- cazes para melhorar a lombalgia. As escolas de edu-
dor deve ser realizado por pelo menos 4 a 6 semanas cação de postura são recomendadas15,73.
antes da indicação da cirurgia, salvo se houver déficit
neurológico66.
Intervenção Educacional
Há controvérsias na literatura quanto à eficácia
das várias modalidades do tratamento conservador, Com base em informações sobre os sintomas re-
em relação à evolução natural da doença discal. O feridos e as causas das dores, mostrar que a dor é por
fundamental é o bom relacionamento entre o médico período limitado e a evolução é favorável na maioria
e o paciente, com explicações sobre sua doença, suas dos casos, e incentivar a permanência da realização
limitações, prognóstico e possível cirurgia. O trata- das atividades diárias74.
mento depende da idade do paciente, do período de
evolução da doença, da associação da dor lombar e/ Exercícios Físicos
ou ciática, dos aspectos psicológicos, das atividades
profissionais e das expectativas quanto à sua reabili- A fisioterapia ativa e passiva é eficaz na melhora
tação. O bom senso deve prevalecer. da dor lombar devido a técnicas de relaxamento mus-
A seguir são descritas as modalidades do trata- cular e fortalecimento das musculaturas lombar e ab-
mento não cirúrgico. dominal, os quais melhoram a mobilidade do pacien-
te80. A fisioterapia ativa melhora a condição geral do
paciente, função social, ansiedade, sintomas depressi-
Mudanças das Atividades Físicas vos, saúde mental e a vitalidade, quando comparada a
Repouso apenas manutenção das atividades diárias habituais74.
A reeducação postural global (RPG) é indicada em
Indicado quando há dor intensa e incapacitante. processos crônicos de lombalgia e a hidroterapia em
Não deve exceder quatro dias, pois, após esse período, qualquer fase da dor.
o repouso absoluto provoca rigidez muscular, dores
no corpo, desconforto e depressão. O colchão deve
ser de consistência firme e uniforme67,68. O motivo da Medicamentos
melhora da dor se deve à diminuição da pressão do O tratamento medicamentoso da dor lombar e ci-
disco protruso sobre o nervo espinhal69 e por diminuir ática, afastadas causas específicas como neoplasias,
a pressão intradiscal70. Na maioria dos casos, o repou- fraturas, doenças infecciosas e/ou inflamatórias, deve
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

ser centrado no controle sintomático da dor para Glicocorticóides


proporcionar a recuperação funcional o mais rápido
Embora não referenciados por ensaios clínicos
possível. Será seguida a orientação preconizada pelo
randomizados e controlados, em casos selecionados
Primeiro Consenso Brasileiro sobre Lombalgias e de lombalgia aguda com radiculopatia, os glicocor-
Lombociatalgias75. ticóides podem oferecer vantagens adicionais, pelo
fato de a inibição do processo inflamatório ser mais
Analgésicos completa do que com os AINH. Em razão dos poten-
ciais efeitos adversos, o uso prolongado desses fár-
Não Opióides macos deve ser evitado.
Acetominofeno (paracetamol): na dose de 500 mg,
4 a 6 vezes ao dia, é eficaz na dor de intensidade dis- Relaxantes Musculares
creta a moderada. O risco de utilização é considerado
baixo, mas deve ser usado com cautela em hepatopa- Carisoprodol, benzodiazepínicos e ciclobenzapri-
tias e em pacientes em uso concomitante de antiinfla- na são opções no tratamento por curto prazo na lom-
matórios. balgia aguda, demonstrando eficácia superior à do
placebo. O uso em associação com outros analgésicos
Dipirona: mesmo não existindo estudos randomiza-
e antiinflamtórios é controverso. Reações adversas
dos avaliando sua eficácia, é utilizada com freqüên­cia
incluem sonolência, tontura e constipação intestinal.
no nosso meio. Dose de 500 mg, até 4 vezes ao dia.
O uso prolongado não é recomendado. Os benzodia-
Acido acetilsalicílico: é utilizado em doses anal- zepínicos são indicados como segunda escolha no tra-
gésicas, de até 2 g ao dia em adultos. Não é recomen- tamento da lombalgia mecânica comum.
dado pelo risco de agressão à mucosa intestinal e não
é indicado na prática clínica.
Outros analgésicos: disponíveis no mercado: clo- Antidepressivos
nixinato de lesina, viminol e flupiritina. Não são recomendados para lombalgia aguda. Os
antidepressivos tricíclicos são opção para as lombal-
Opióides gias crônicas, mesmo quando não associados à de-
pressão.
Não são recomendados na lombalgia crônica
em razão da possibilidade de dependência química;
quando indicados, devem ser utilizados por período Calcitonina
limitado. São opção no tratamento da lombalgia agu- É recomendada apenas em caso de fratura osteo­
da e em casos restritos.
porótica recente associada à dor, na dor da doença
Fosfato de codeína: dose de 30 mg, 3 a 4 vezes metastática e na doença de Paget.
ao dia. Sonolência, déficit de atenção e constipação
intestinal são os principais efeitos colaterais.
Cloridrato de tramadol: dose de 100 a 400 mg ao Medicações Tópicas
dia. Sonolência, déficit de atenção e constipação in- Não são recomendadas.
testinal são os principais efeitos colaterais.
Napsilato de propoxifeno: é comercializado em
combinação com ácido acetilsalicílico. Infiltrações
Sulfato de morfina: é opção restrita para o tra- Não há evidências quanto à utilidade de infiltra-
tamento das lombalgias e lombociatalgias intensas, ções das partes moles e das articulações facetárias.
secundárias a hérnias discais resistentes à medicação As infiltrações epidurais e intratecais com esteróides
habitual, fraturas e metástases. na dor ciática aguda podem promover alívio transitó-
rio durante poucos dias. Na lombalgia crônica, não há
Antiinflamatórios Não Hormonais melhora. Não oferecem benefício por período longo e
não diminuem a necessidade de cirurgia. Podem pro-
Na prática clínica, os antiinflamatórios não hormonais vocar aracnoidite na modalidade intratecal76. São uti-
(AINH) são os medicamentos mais utilizados. Depen- lizadas como provas terapêuticas da origem da dor.
dendo da dose utilizada e em intervalos regulares, têm
efeitos analgésicos e antiinflamatórios. Todas as classes
de AINH podem ser úteis no tratamento da lombalgia, Outros Procedimentos
desde que usadas com precaução em pacientes de risco Terapia de Manipulação Espinhal
(idosos). Os efeitos adversos desses medicamentos po-
dem causar sérios problemas para o paciente, devendo- É definida como uma terapia manual, em que car-
se considerar, na sua escolha, tolerabilidade e segurança, gas de forças são aplicadas à coluna vertebral utili-
assim como a sua interação com outros medicamentos. zando métodos de alavancas curtas e longas em deter-

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47 – Hérnia do Disco Lombar

minados segmentos da coluna, levando a articulação (circuitos de energias vitais) restaura o equilíbrio do
à sua movimentação fisiológica, seguida de outra corpo. Existem vários estilos e técnicas com caracte-
carga de força manual. Pode ser útil para pacientes rísticas distintas entre si, mas todos similares à acu-
com lombalgia aguda sem dor ciática no primeiro puntura chinesa tradicional. Indica-se para lombalgia
mês de dor, não excedendo 1 mês de terapia15. Não não específica subaguda e crônica. O alívio da dor
deve ser utilizada na presença de déficit neurológico ocorre por mecanismos não esclarecidos, havendo três
progressivo, doenças neoplásicas ou inflamatórias da conceitos: sugere-se que a “teoria por comportas” seja
coluna vertebral. A prática da manipulação é relatada responsável pelo controle da dor, em que uma moda-
como forma do alívio das dores originárias da coluna lidade de entrada de dor (lombalgia) pode ser inibida
vertebral, pelos gregos na época antes de Cristo. Re- no sistema nervoso central por outra modalidade de
alizada por indivíduo não necessariamente médico, entrada de dor (“agulhamento”). Outro conceito des-
não possui credibilidade científica para ser indicada creve que, quando dor é provocada em algum local do
como rotina77. Giles et al.78 analisaram o tratamento corpo, ocorre modulação e alívio da dor no local re-
clínico da dor lombar crônica, comparando os bene- ferido pelo paciente, denominado “teoria do controle
fícios de medicamentos, acupuntura e a manipulação difuso da inibição da dor”. O último demonstra algu-
(quiropraxia), utilizados de maneira independente, e ma evidência sobre o efeito analgésico da acupuntu-
concluíram que, destes métodos alternativos de trata- ra, atribuída à estimulação da produção de endorfinas,
mento para a dor lombar crônica, a manipulação re- serotonina e acetilcolina no sistema nervoso central.
sultou em melhora clínica em período menor do que Há evidência de alívio da dor e melhora funcional por
acupuntura e medicação (AINH). período breve após o seu emprego quando compara-
do a nenhum tipo de tratamento e associado a outras
Tração Pélvica modalidades de tratamentos convencionais; é benéfi-
co11. A real eficácia dessa modalidade de tratamento,
Para ocorrerem modificações no disco lombar por porém, ainda precisa ser provada15,43.
intermédio da tração, tem de haver uma carga de tra-
ção de, pelo menos, 60% do peso corporal do pacien-
te. Não há provas de que a hérnia do disco se reduz, Biofeedback
nem de sua eficácia15. É indicado para lombalgia crônica, mas sua efi-
cácia não foi provada.Utiliza o transe hipnótico para
Coletes e Cintas de Suporte Muscular alterar funções fisiológicas, como tensão muscular,
temperatura da pele ou pressão arterial enquanto o
Na fase aguda da dor lombar, são úteis como su- paciente é exposto a estímulos sonoros ou luminosos
porte muscular e psicológico. O colete de Putti pode pelo terapeuta15,43.
ser utilizado por período de 8 semanas, a fim de di-
minuir a flexão, extensão e rotação da coluna lombar,
promovendo o repouso muscular parcial. O uso pro- Hipnose
longado do colete pode predispor à atrofia muscular, à Indica-se para dor aguda, mas sua eficácia não foi
contratura dos músculos para-espinhais e abdominais, provada. Proporciona alívio da dor pelo relaxamento
à irritação da pele e à dependência psicológica73,79. muscular e psicológico15,43.

Estimulação Elétrica e Transcutânea Analgésico Local em Pontos-gatilho e


Nervosa (TENS) “Agulhamento a Seco”
A eficácia não foi provada e é pouco melhor que a Técnica utilizada para o tratamento de dor de
do placebo80. Consiste na estimulação de nervos su- origem miofascial em qualquer região do corpo,
perficiais por eletrodos aderidos à pele e gerados por inclusive região lombar. Após a identificação dos
bateria, acarretando alívio da dor por aumentar os ní- pontos-gatilho miofasciais, estes são desativados,
veis de endorfinas no líquido cerebrospinhal15,77. utilizando-se: métodos de relaxamento muscular; me-
dicamentos sistêmicos; toxina botulínica; antidepres-
Acupuntura sivos; massagem para grupos musculares profundos
(shiatsu); injeções locais de substâncias analgésicas
É uma das formas mais antigas de terapias, com (lidocaína e esteróides); “agulhamento a seco” (sem
raízes baseadas em filosofias chinesas em épocas ar- injeção de substâncias). As agulhas são aplicadas nos
caicas. O conceito filosófico postula que a manifesta- pontos dos músculos onde a dor se origina, desativan-
ção da doença é um sinal de desequilíbrio das forças do esses pontos-gatilho e, após a retirada das agulhas,
do organismo, e a escolha apropriada dos 361 pontos realizam-se exercícios de alongamento e ergomé-
clássicos de acupuntura localizados em meridianos tricos com o propósito de restaurar a amplitude dos
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

movimentos e evitar a recorrência da dor. A síndro- o cirurgião da indicação da cirurgia. Quando apenas
me dolorosa miofascial é a doença do músculo que um ou dois fatores são apreciados, resultados insatis-
produz dor localizada e referida. Caracteriza-se por fatórios são esperados.
anormalidades motoras (região de banda de tensão • Fatores desfavoráveis:
dentro do músculo) e sensitivas (dor à palpação do –– A não-tentativa do tratamento conservador
músculo e dor referida). É classificada como uma sín- para o primeiro episódio de lombociatalgia.
drome dolorosa musculoesqulética, aguda ou crônica, –– Lombalgia recorrente, associada à dor oca-
regional ou generalizada, primária (causando síndro- sional de origem duvidosa, irradiando para
mes de dor local ou regional) ou secundária (doença os membros inferiores e com exame de ima-
degenerativa da coluna lombar). As técnicas descritas gem não convincente.
sugerem utilidade quando associadas a outras moda- –– Dor lombar e ciática recorrente, com o exa-
lidades terapêuticas para o tratamento da lombalgia, me de imagem evidenciando a hérnia do
porém sem recomendações claras11. Os benefícios no disco no lado do membro inferior não do-
alívio da dor são transitórios15,81. loroso.
–– História de lombalgia crônica e recorrente,
TRATAMENTO CIRÚRGICO com o exame de imagem não convincente.
–– Melhora da dor na ausência de déficit neuro-
Indicações e Contra-indicações lógico progressivo.
Neurológicas Quando a cirurgia é realizada em intervalo durante
Os dois grandes desafios para o médico assistente o qual o doente tenha melhorado da dor, principalmen-
são: saber qual doente irá beneficiar-se com o proce- te da dor ciática, os sintomas residuais serão menos to-
dimento cirúrgico e quando indicar a cirurgia. Não lerados, mesmo a cirurgia transcorrendo tecnicamente
há, na literatura, um protocolo de consenso, porém há sem intercorrências. Pode haver o questionamento da
diretrizes básicas e aceitas por todos como indicado- real necessidade da cirurgia. A decisão pelo tratamen-
res de bons resultados cirúrgicos82. to cirúrgico deve ser clara para o médico assistente e
O Quadro 47.4 traz critérios para a indicação da para o seu paciente, sendo compartilhada por ambos a
cirurgia para a hérnia do disco lombar83. responsabilidade quanto à indicação cirúrgica.
Aproximadamente 85% dos doentes com hérnia
do disco aguda melhoram com o tratamento não ci-
Quadro 47.4 – Critérios de indicação cirúrgica da rúrgico em cerca de 6 semanas (70% em 4 semanas)85,
Associação Americana dos Cirurgiões Neurológicos e devendo-se aguardar pelo menos de 5 a 8 semanas
Academia de Cirurgia Ortopédica83 desde o início da dor ciática antes de se considerar
• Falha do tratamento não cirúrgico. a cirurgia86. O tratamento cirúrgico é mais eficiente
• Estudo de imagem com anormalidades demonstrativas de do que o não cirúrgico para as dores lombar e ciática
compressão do nervo espinhal e/ou instabilidade segmentar,
compatíveis com os sinais e sintomas do doente.
decorrentes da hérnia do disco lombar70.
• Conformidade da queixa de dor radicular com padrões nor- Existem três indicações cirúrgicas em regime de
mais fisiológicos, dos dermátomos e miótomos. urgência para a hérnia do disco lombar:
• Isolados ou associados os seguintes achados: Síndrome da cauda eqüina: ocorrem e 1% a 2%
– Déficit sensitivo.
– Déficit motor.
dos casos de hérnia do disco lombar. Em 70% dos do-
– Reflexos tendíneos profundos anormais nos segmentos entes, há história prévia de dor lombar crônica, com
correspondentes. ou sem dor ciática, e em 30% a síndrome da cauda
• Exclusão de causas extra-espinhais de dor. eqüina é a primeira manifestação clínica da hérnia do
disco lombar. É mais freqüente nos homens entre a
Finnenson84 postulou fatores favoráveis e desfavo- quarta e a quinta década, ocorrendo na ordem decres-
ráveis na indicação da cirurgia visando ao bom resul- cente de freqüência nos níveis L4-L5, L5-S1 e L3-
tado clínico final: L4. Fatores predisponentes são a estenose do canal
vertebral adquirida ou congênita e a “medula presa”
• Fatores favoráveis:
(tethered cord)87.
–– Dor ciática mais intensa do que a lombar. Em 85% dos doentes, as manifestações clínicas
–– A clínica ser compatível com a alteração de ocorrem em poucas horas, caracterizadas por déficits
imagem vista na RNM da coluna lombar. sensitivo e motor em 80%. A alteração sensitiva mais
–– Sinal de Lasègue estar presente em até 60°. freqüente é a “anestesia em sela”, ocorrendo em 75%
–– Déficit neurológico. dos casos, e a alteração motora mais freqüente é a
Se todos esses fatores estiverem presentes, o re- hipotonia do esfíncter anal, em 80% dos doentes9.
sultado cirúrgico deverá ser satisfatório. Se algum fa- O tratamento é cirúrgico e de urgência, sendo in-
tor estiver ausente, os outros três deverão convencer dicada a laminectomia em vez da laminotomia com

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47 – Hérnia do Disco Lombar

microdiscectomia, a fim de diminuir a manipulação ci- Microdiscectomia Clássica


rúrgica da cauda eqüina e para descompressão ampla
do canal vertebral. Se a hérnia do disco lacerar e pene- Histórico
trar ventralmente o saco dural e encontrar-se no seu in- Citado por Maroon3, em 1934, William Jason
terior, pode ser necessária a realização de durotomia, a Mixter, neurocirurgião da Universidade de Harvard,
fim de retirar o material discal extruso. Mesmo com o e Joseph Barr, ortopedista, elucidaram os aspectos
tratamento cirúrgico precoce, as seqüelas são freqüen- fisiopatológicos da lombalgia e dor ciática, relacio-
tes, sendo a incontinência urinária a mais comum64. nando-os à hérnia do disco lombar de etiologia dege-
Déficit motor progressivo: a manifestação clínica nerativa e traumática, e sistematizaram o tratamento
mais freqüente é a “queda do pé”, de maneira aguda, por meio da cirurgia, cuja técnica consistia na lami-
podendo ser revertida se tratada cirurgicamente em nectomia ampla e durotomia para retirada da hérnia
até 48 horas após a instalação. Não há comprovação do disco. Modificações e refinamentos das técnicas e
do benefício da cirurgia para o déficit motor insta- instrumentos cirúrgicos surgiram rapidamente, sendo
lado cronicamente, porém pode ser contemplada a substituída a laminectomia segmentar completa por
cirurgia70,134. hemilaminectomia, laminotomia e o procedimen-
Dor intratável: quando refratária à medicação nar- to intradural para a retirada do disco intervertebral
cótica. pela via extradural. Contribuições de Love (1939),
Semmes (1939), Spurling (1953) e Scoville e Corkill
Opções Cirúrgicas (1973) reduziram a morbidade e houve melhora dos
resultados clínicos. Os conceitos atuais da utilização
Irwin et al.89 analisaram a relação entre a escolha do microscópio cirúrgico e de instrumentos e técni-
da abordagem cirúrgica para as doenças degenerativas cas microcirúrgicas são creditados a Yasargil (1977),
da coluna lombar e fatores específicos aos cirurgiões Williams (1978) e Caspar e Iwa (1979).
espinhais, comparando os procedimentos cirúrgicos
indicados por 22 ortopedistas e 8 neurocirurgiões, de
Indicações
idades variadas e procedências regionais diferentes.
Os resultados evidenciaram que os ortopedistas re- Todas os tipos morfológicos de hérnias do disco
comendaram a fusão e a fixação espinhal com maior intervertebral (contida, protrusa, extrusa, seqüestrada
freqüência e os mais jovens indicaram mais proce- e migrada), estenose do canal vertebral (central e do
dimentos com instrumentação do que os colegas recesso lateral), degeneração das facetas articulares
“mais experientes”. Concluíram que os critérios para (hipertrofia e cistos sinoviais), degeneração dos liga-
indicar determinada modalidade cirúrgica podem es- mentos amarelos (hipertrofia e calcificação).
tar relacionados às condições clinicas dos pacientes
operados, fatores relacionados aos cirur­giões, como Técnica
idade, treinamento e região geográfica de atuação
profissional. Citado por DeLong90, a definição do termo “dis-
O Quadro 47.5 classifica as modalidades cirúrgicas cectomia microcirúrgica” permite várias interpreta-
para o tratamento da hérnia do disco lombar com base ções, incluindo a retirada apenas do fragmento discal
na via de acesso, técnicas cirúrgicas, funções biome- extruso, até descompressões ósseas e ligamentares
cânicas do implante e finalidade do procedimento. completas. Os objetivos são minimizar a incisão ci-
rúrgica, o trauma muscular e ligamentar, a perda de
sangue, a manipulação de estruturas neurais e aumen-
Quadro 47.5 – Classificação dos métodos cirúrgicos tar e iluminar a imagem do campo operatório com a
para a hérnia do disco lombar utilização do microscópio cirúrgico3. É denominado
de “clássico” por ser reproduzido com resultados sa-
• Microdiscectomia clássica tisfatórios por todos que se dedicam à cirurgia espi-
• Procedimentos minimamente invasivos posteriores: nhal e por ser o padrão de comparação de todos os
− Percutâneos
− Abertos outros métodos para o tratamento cirúrgico da hérnia
• Procedimentos minimamente invasivos anteriores e do disco lombar de origem degenerativa.
laterais: A anestesia é geral, com o doente em decúbito ho-
− Endoscópico transperitoneal rizontal ventral, com flexão da região lombar e dos
− Endoscópico retroperitoneal
• Procedimentos de estabilizações segmentares: joelhos e antibioticoterapia com ceftriaxona, iniciada
− Fixas: alif, plif, tlif 2 horas antes do procedimento e mantida por 48 ho-
− Dinâmicas: disco artificial e estabilizações ras91. O nível segmentar a ser operado é confirmado e
posteriores flexíveis documentado com a utilização de fluoroscopia e mar-
• Implante de prótese de núcleo pulposo cado o nível correspondente do espaço intervertebral
• Técnicas de regeneração do disco intervertebral
na pele. O tamanho da incisão é de aproximadamente
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

2 a 7 cm, a depender do panículo gorduroso do doente gundo dia após a cirurgia, salvo intercorrências clíni-
e da disponibilidade dos afastadores e retratores mus- cas, fatores psicológicos desfavoráveis à recuperação
culares a serem utilizados. Os tempos cirúrgicos são: ou co-morbidades existentes do doente.
incisão mediana em relação aos processos espinho-
sos do nível segmentar em questão; abertura da fás- Complicações
cia muscular lombar ipsilateral à hérnia; dissecação
subperiosteal da musculatura paravertebral, com ex- As complicações cirúrgicas ocorrem em 1,6% a
posição das lâminas das vértebras, ligamento amarelo 15,8% dos casos88, sendo 4% um índice aceitável92.
e margens mediais dos processos articulares cranial e
caudais em relação ao espaço intervertebral da hérnia; Complicações Intra-operatórias
aplicação do retrator muscular; início da utilização do
microscópio cirúrgico com objetiva de 300 mm; reti- Posicionamento inadequado do doente: é o mais
rada parcial ou total do ligamento amarelo; laminoto- freqüente. O decúbito horizontal ventral utilizado
mia com a utilização do drill ou rugina de Kerrison; para realizar o procedimento cirúrgico pode ocasio-
recessotomia e facectectomia medial na ocorrência de nar compressões do tórax, abdome, globo ocular, ner-
estenose do canal vertebral; foraminotomia descom- vos periféricos e lesões da coluna cervical93.
pressiva do nervo espinhal; discectomia dos fragmen- Durotomia não intencional: a incidência é de 0% a
tos do disco extruso, se houver; abertura do ligamento 14%, podendo ocorrer à lesão do nervo espinhal, cau-
longitudinal posterior e do ânulo fibroso; discectomia da eqüina, fístula liquórica pós-operatória, meningo-
parcial ou completa no espaço intervertebral; hemos- cele e aracnoidite crônica94. Black95 recomenda o uso
tasia bipolar; sutura da fáscia lombar, tecido adiposo de gordura autóloga para o reparo de eventuais lesões
e pele; curativo compressivo2,20 (Fig. 47.11). da dura-máter em virtude da facilidade da aquisição
O doente permanece em repouso no leito de 12 a durante os procedimentos cirúrgicos, por ser imper-
24 horas, e a alta hospitalar ocorre no primeiro ou se- meável à água e ocasionar mínima fibrose.

Ligamento amarelo retirado


Laminotomia

Posição antálgica

Processo espinhoso
Discectomia

Facectomia medial

Tempos cirúrgicos para a discectomia lombar


Nervo espinhal

Saco dural

Fig. 47.11 – Tempos da cirurgia para discectomia. Após a laminotomia, o microscópio cirúrgico deve ser utilizado na disse-
cação e identificação do nervo espinhal, saco dural e da hérnia do disco. Modificado de Wilkins20.

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47 – Hérnia do Disco Lombar

Lesões vasculares: Bingol et al.96 citam as com- culino prevalecem em 55% a 70%, a média de idade
plicações sintomáticas de lesões vasculares como ra- é de 45 anos e os níveis segmentares mais freqüentes
ras, de 0,0016% a 0,17% das operações para a hérnia operados são: L5-S1 (55%) e L4-L5 (35%)91,92,101,102.
do disco lombar, porém com mortalidade elevada, de Thomé et al.103 compararam os resultados cirúrgicos
15% a 61%. O alerta para a equipe cirúrgica é de san- entre 84 doentes submetidos a microdiscectomia, 42
gramento local abundante e hipotensão refratária às doentes com a retirada completa da hérnia do disco,
medidas habituais de estabilização hemodinâmica. O e o restante, com apenas o fragmento extruso, como
tratamento é imediato, com a correção do choque he- na técnica proposta por Williams em 1978. Observa-
morrágico, posicionamento do doente para o decúbito ram índice de reoperação para hérnias recidivantes de
horizontal dorsal e laparotomia para reparar a lesão 10% no grupo dos doentes com a retirada completa
vascular. As complicações tardias são fístula arterio- do disco e de 5% para a retirada apenas do fragmento
venosa e pseudo-aneurisma, ocasionados na perfura- discal extruso, sem explicação aparente para esses fa-
ção inadvertida do ligamento longitudinal anterior, e tos. Tradicionalmente, a discectomia é completa, pre-
esses doentes devem ser acompanhados por período sumindo-se que a possibilidade de recidiva será tanto
longo, utilizando métodos de imagem no diagnósti- menor quanto maior a quantia de material discal reti-
co e tratamento pertinente dessas lesões. Os grandes rada. Fountas et al.104, em publicação com objetivos
vasos intra-abdominais são pouco móveis, porém, no similares aos da citação anterior, observaram, em sua
decúbito horizontal ventral, esses vasos se aproxi- série de 106 doentes, não haver diferença dos resul-
mam da coluna vertebral, aumentando a possibilidade tados clínicos e do índice de complicações pós-ope-
de lesões. A bifurcação da aorta ocorre à esquerda, ratórias, em relação à quantidade de material discal
inferior e anterior ao corpo vertebral de L4, e as arté- retirado, e concluíram ser controverso o aspecto da
rias ilíacas situam-se logo abaixo. A veia cava inferior necessidade da retirada máxima de material discal.
localiza-se à direita, superior e anterior ao corpo ver-
tebral de L493,97. As vísceras mais comumente lesadas
são o íleo, ao abordar o espaço intervertebral L5-S1,
Procedimentos Minimamente Invasivos
e o ureter, ao abordar L4-L5. Ambas as complicações Posteriores – Percutâneos e Abertos
são raras98. Procedimentos Minimamente Invasivos
Operação do nível errado: minimizado com a Posteriores Percutâneos
confirmação radiológica antes da cirurgia2,84.
Esses procedimentos compartilham aspectos téc-
nicos comuns a todos os métodos posteriores e per-
Complicações Pós-operatórias
cutâneos. São realizados com as técnicas habituais de
Infecções: ocorrem em 0,9% a 5% das cirurgias, assepsia, com as funções vitais do paciente monito-
podendo ser superficiais ou profundas. O agente etio- radas, com a opção de utilizar sedação leve, permi-
lógico mais freqüente é o Staphylococcus aureus. A tindo a necessária comunicação entre o examinador e
maioria das infecções, quando presentes, ocorrem em o paciente a fim de obter as respostas de dor quando
período inferior a três meses da cirurgia, e os indica- ocorrem. A posição é o decúbito ventral ou oblíquo,
dores de risco são: idade superior a de 60 anos; taba- com anestesia local, e a punção é percutânea na região
gismo; diabetes; infecção cirúrgica anterior; índice de lombar posterior e lateral em relação à linha média,
massa corporal elevado; etilismo99. com agulha, sonda ou cânula de trabalho apropria-
Manipulação excessiva ou lesão do nervo espi- da para o procedimento em questão e com o auxílio
nhal: pode ocasionar dor, parestesias, disestesias e de fluoroscopia ou tomografia axial computadorizada
impotência funcional93. para localização do disco degenerado e realização do
Repouso prolongado: complicações clínicas, procedimento. Complicações ocorrem com a punção
como trombose venosa profunda dos membros in- não intencional do nervo espinhal, espaço intradural
feriores, embolia pulmonar e pneumonia, quando (fístula liquórica), vasos sangüíneos intra-abdominais
presentes, são mais freqüentes nos idosos ou doentes e discite3,105.
debilitados92,93.
Síndrome de Ogilvie: descrita em 1948, de etiolo- Quimionucleólise
gia não conhecida, consiste na pseudo-obstrução do
cólon com distensão cecal, podendo ocasionar ruptu- Histórico: Jansen e Balls, em 1941, isolaram a
ra intestinal se não diagnosticada e tratada62. quimiopapaína da papaína, derivada, por sua vez, da
fruta papaia. Em 1956, Thomas injetou a papaína em
uma veia na orelha de um coelho e observou a queda
Resultados da orelha, em comparação com a orelha-controle do
De acordo com Maroon3, os resultados apresen- coelho, atribuindo esse fato ao amolecimento da car-
tam êxito em 88% a 98,5%. Pacientes do sexo mas- tilagem. Com base nessas observações e investiga-
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

ções, Smith, em 1963, injetou a quimiopapaína para o de material para análise anatomopatológica. Com
interior do disco intervertebral de um paciente e, nos a retirada de material intradiscal, há diminuição da
anos seguintes, tentou provar a eficácia e segurança pressão no interior do disco e alívio da compressão
desse método. Em 1975, a Food and Drug Adminis- do nervo espinhal pela hérnia3.
tration (FDA) retirou a Discase® (nome comercial) Complicações: aspiração do nervo espinhal e da
do mercado pela falta de provas quanto à eficácia do cauda eqüina106.
produto. Em 1983, foi aprovado para o uso clínico Resultados: Maroon relatou êxito de melhora
outra quimiopapaína, a Chymodactin® (nome comer- dos sintomas de lombalgia e dor ciática em 59% dos
cial), porém também retirada do mercado em 1999 doen­tes utilizando a nucleotomia automatizada, po-
em razão da inviabilidade comercial do produto pela rém, quando comparada, com a microdiscectomia
má reputação desse método nos Estados Unidos. Os clássica, seu índice de êxito foi de 90%3.
resultados insatisfatórios são atribuídos, provavel-
mente, às más indicações do procedimento e técnica
insatisfatória na utilização do método3,6. Discectomia a Laser
Indicações: fase inicial da degeneração do disco, Histórico: Ascher (físico) e Choy (radiologista)107,
ainda hidratado e contido no interior do ânulo fibroso. em 1986, utilizaram uma sonda locada no interior do
A injeção da quimiopapaína para o interior do núcleo disco e, através dela, um cabo de fibra óptica capaz de
pulposo ocasiona proteinólise, diminuição do conteú- transmitir raio laser para o interior do disco interverte-
do hídrico do disco, da pressão intradiscal, do volume bral a fim de vaporizar seu conteúdo. Desde então, vá-
da hérnia, da compressão do nervo espinhal e melho- rias freqüências e modalidades do raio laser vêm sen-
ra dos sintomas. É indicada principalmente quando a do aplicadas, porém o uso é restrito em razão do alto
dor ciática predomina em relação à lombalgia3,6. custo do sistema, curva de aprendizagem e possíveis
Complicações: decorre do extravasamento da qui- complicações, que, quando ocorrem, são graves3,107,108.
miopapaína para o espaço peridural, subaracnóideo e Indicações: fase inicial da degeneração discal, ain-
musculatura, com a conseqüente irritação e proteinó- da hidratada e contida no interior do ânulo fibroso. A
lise das estruturas neurais acometidas. Há relatos de eficácia do laser depende da capacidade de sua con-
choque anafilático, discite, lesões nervosas e mielite dução através da fibra óptica, das propriedades abla-
transversa3,37. Os riscos e benefícios devem ser leva- tivas e absortivas e da transmissão da energia térmica
dos em conta em cada caso6. gerada para os tecidos. A vaporização do material dis-
Resultados: há melhora da dor lombar e ciática em cal diminui a pressão no seu interior e do volume da
58% a 90% dos casos37. hérnia do disco, diminuindo os efeitos compressivos
sobre o nervo espinhal.
Nucleotomia Manual e Automatizada Complicações: lesão térmica dos nervos espinhais,
da cada eqüina e das vísceras intra-abdominais.
Histórico: Hijikata (ortopedista), em 1975, deno- Resultados: poucas séries foram publicadas em ra-
minou de “nucleotomia percutânea” o método manual zão do uso restrito desse método, porém são relatados
para a retirada de material intradiscal através de cânu- índices de êxito para o alívio da dor lombar e ciática
las de trabalho locadas no interior do disco, utilizando de 60% a 85%3.
fórceps e curetas, orientado por fluoroscopia. O méto-
do original foi modificado nos anos seguintes com o
desenvolvimento de outros instrumentos, porém pou- Microdiscectomia Endoscópica
co utilizado atualmente em razão de: diâmetro largo Histórico: método descrito por Mayer55 em 1993
da cânula (5 a 8 mm); risco de lesão neural e vascular; e aprimorado no final da década de 1990 por Foley e
penetrações repetitivas no interior do disco com o au- Smith. Yeung, em 2000, desenvolveu sistema de en-
mento da possibilidade de infecções; impossibilidade doscopia acoplando raio laser, radiofreqüência e ca-
de acesso ao espaço discal no nível de L5-S1. nal de trabalho para a retirada de pequenos fragmen-
Onik (radiologista), em 1984, desenvolveu a técni- tos de osso e disco e o denominou de “discectomia
ca automatizada da nucleotomia, utilizando uma son- seletiva endoscópica”. De todos os procedimentos
da de 2 mm de diâmetro de ponta romba e munida de percutâneos, é o mais semelhante à técnica de micro-
“guilhotina”, permitindo a fragmentação de material discectomia de abordagem aberta109.
intradiscal e a aspiração simultânea desse ma­terial. Indicações: degeneração discal inicial (hérnia
Tal método vem sendo desenvolvido desde então e contida); discos protrusos e pequenos fragmentos ex-
atualmente existem vários sistemas de vários fabri- trusos contíguos com o espaço discal intervertebral;
cantes com vantagens e desvantagens entre si3,106. estenose do canal vertebral e dos forames vertebrais,
Indicações: fase inicial da degeneração discal, na fase degenerativa espondilótica inicial, permitindo
ainda hidratada e contida no interior do ânulo fibroso; a realização da foraminotomia para a descompressão
níveis segmentares L3-L4, L4-L5 e L5-S1; obtenção do nervo espinhal109.

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47 – Hérnia do Disco Lombar

Resultados e complicações: Mayer et al.55, em fibroso temperatura de aproximadamente 60 a


1993, compararam os resultados da discectomia per- 65°C durante 13 minutos, conforme orientação
cutânea endoscópica aos da discectomia microci- do fabricante. O raciocínio do uso consiste em
rúrgica a céu aberto. Quarenta doentes selecionados destruir, por calor local, terminações nervosas
(20 em cada grupo) apresentavam sintomas similares do ânulo fibroso degenerado com fissuras, os
anteriores à cirurgia, de dor ciática predominando a quais são responsáveis por dor, e diminuir o
lombalgia. As hérnias eram contidas (ânulo fibroso colágeno discal110,111.
íntegro) ou com pequenas extrusões subligamenta- • Eletrocoagulação intradiscal: é feita de modo
res no nível do espaço intervertebral, nos níveis das semelhante à técnica do IDET, porém com a
vértebras de L2 a L5, e acompanhadas clinicamente extremidade térmica locada no interior do nú-
durante 2 anos. Os resultados são similares entre si, cleo pulposo, no mesmo lado do membro infe-
com os pacientes retornando às atividades prévias em rior com dor ciática. A temperatura transmitida
72,2% dos casos tratados por discectomia microcirúr- é de aproximadamente 70°C durante cerca de
gica versus 95% submetidos à discectomia percutâ- 15 minutos, variando conforme a orientação
nea endoscópica. Seguindo seus critérios de seleção dos fabricantes dos sistemas. O raciocínio de
dos doentes para o tratamento cirúrgico de hérnia do funcionamento é de desidratar o núcleo pul-
disco lombar, apenas 10% a 15% eram candidatos à poso em aproximadamente 5% a 10% do seu
técnica percutânea posterior endoscópica. volume e a conseqüente diminuição do efeito
Método em desenvolvimento, com resultados pre- compressivo no nervo espinhal pela hérnia do
liminares satisfatórios de 86% de melhora dos sinto- disco105.
mas da dor e possíveis complicações similares aos • Nucleoplastia: é semelhante às técnicas pre-
demais procedimentos posteriores e percutâneos. viamente descritas, utilizando agulha específi-
ca do próprio sistema, ipsilateral à dor ciática,
Eletrocoagulação Intradiscal locada no interior do núcleo pulposo, com ele-
vação de temperatura para aproximadamente
Histórico: métodos desenvolvidos no final da dé- 70°C durante cerca de 13 a 15 minutos, e em
cada de 1990, com os objetivos de lesões térmicas cinco ou seis pontos distintos no interior do
controladas nas fibras internas e médias do ânulo fi- núcleo pulposo, com degradação dos protei-
broso ou a desidratação interna do núcleo pulposo, a noglicanos, processo denominado pelo fabri-
depender do método utilizado. O sistema mais bem cante de “coblação” (coagulação e ablação). O
estudado é o “tratamento eletrotérmico intradiscal”, processo diminui em 5% a 10% o volume do
conhecido com as siglas do inglês “IDET”, intradis- núcleo pulposo e os efeitos compressivos da
cal electrothermal therapy, aplicado por Saal et al. hérnia do disco sobre o nervo espinhal105.
em 2000. Barendse, em 2001, apresentou método uti- Indicações: degeneração discal inicial (hérnia
lizando a eletrocoagulação intradiscal por radiofre- contida), ainda hidratada, com o ânulo fibroso ínte-
qüência e Eggers em 1997, a eletrocoagulação intra- gro, sendo dor ciática o sintoma principal. É opção
discal utilizando a técnica da “coblação”, cujo nome de tratamento para doentes submetidos a terapias
comercial é de “núcleoplastia”. A discografia é opção conservadoras clínicas, sem melhora dos sintomas de
prévia ao procedimento, com os objetivos de certificar lombalgia e dor ciática, por período não inferior a 6
que o disco intervertebral a ser tratado “provoca dor” meses.
quando injetado material de contraste e para a locali- Complicações: lesão térmica do nervo espinhal;
zação e a definição da morfologia do núcleo pulposo. punção acidental do nervo espinhal e do saco dural;
Quando realizada a discografia provocativa no disco discite; lesão dos vasos sangüíneos intra-abdominais.
não patológico, dor não ocorre e é pouco provável ser Resultados: método recente e com período de
o disco responsável pelos sintomas, não devendo o acompanhamento de 6 meses a 2 anos na maioria das
paciente ser tratado por estes métodos22,93,130. séries. É indicado com critérios rigorosos; a melhora
Técnica: da dor lombar e, especialmente, da dor ciática ocorre
• IDET: a punção é percutânea e posterior com em 60% a 90% dos casos105,110-112.
agulha de 17 gauge para o interior do disco
intervertebral no lado contra lateral à dor do
Crioablação
membro inferior, orientado por fluoroscopia. O
cateter flexível com dispositivo térmico em sua Encontra-se em fase experimental não humana,
extremidade é movido para o lado doloroso do sendo avaliada para o possível uso no tratamento da
disco, curvado em seu próprio eixo e locado lombalgia aguda de origem discal, utilizando energia
dentro das fibras do ânulo fibroso. O dispositi- fria intradiscal. Há indícios de reversão das lesões
vo térmico na extremidade do cateter é aqueci- morfológicas nos tecidos, diferente do IDET, em que
do a 90°C, transmitindo para as fibras do ânulo ocorrem alterações estruturais do colágeno112.
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Procedimentos Minimamente Invasivos Posteriores mento e da curva de aprendizado inicial. Poucas são
Abertos – Endoscopia as séries de resultados cirúrgicos publicadas, porém
são similares à microdiscectomia clássica, com apro-
Histórico ximadamente 90% de sucesso clinico3,114,115.
Citado por Maroon3,113, Pool, em 1938, utilizou
o endoscópio com a finalidade de acessar a doença
discal e o nervo espinhal dorsal. Nos anos seguintes, Procedimentos Minimamente Invasivos
ocorreram modificações e adaptações dos endoscó- Anteriores e Laterais – Endoscopia
pios e das técnicas de sua utilização. Smith e Foley, Transperitoneal e Endoscopia
em 1998, utilizaram o endoscópio com adaptações Retroperitoneal
para cirurgias abertas, posteriores e minimamen-
te invasivas, para hérnias discais da região lombar. Os objetivos são as incisões cirúrgicas reduzidas
Desenvolveram o sistema de endoscopia MED e mo- no abdome, apenas o suficiente para a introdução dos
dificaram posteriormente, no início dos anos 2000, portais de trabalho e o menor trauma tecidual intra-
para o sistema METRx (Medtronic Sofamor Danek, abdominal durante o procedimento. São indicadas
Menphis,TN), diferente do anterior por utilizar dila- para doença degenerativa anterior da coluna vertebral
tadores musculares progressivos no portal de trabalho lombar, para a fusão vertebral (ALIF) e implante de
e aprimoramento técnico do endoscópio. Destandau, prótese de disco intervertebral (disco artificial). O
em 1999, apresentou sistema de endoscopia (Karl acesso cirúrgico para a exposição da coluna verte-
Storz, Tuttlingen, Alemanha), instrumentos microci- bral é geralmente efetuado pelo cirurgião do aparelho
rúrgicos apropriados e afastadores musculares, facili- digestivo ou vascular, trabalhando em equipe com o
tando o procedimento lombar posterior (comunicação cirurgião da coluna vertebral.
pessoal). Husain et al.114, em 2005, publicaram traba- A seguir estão os aspectos técnicos resumidos.
lho sobre um de sistema alternativo de endoscopia,
menos custoso e simples, justificado pelos autores em Procedimentos Minimamente Invasivos
razão de recursos financeiros não favoráveis em seu Anteriores - Endoscopia Transperitoneal
país de trabalho, a Índia.
Técnica Indica-se para os níveis segmentares vertebrais
de L5-S1 (principalmente) e L4-L5, cranialmente a
É a mesma descrita para a microdiscectomia clás-
esses níveis; a artéria aorta e a veia cava inferior são
sica, com as seguintes diferenças: incisão cirúrgica
mobilizadas com dificuldade e suscetíveis a lesões
menor, de 2 a 3 cm; utilização interna do cone de tra-
durante o ato da cirurgia espinhal. O doente é posicio-
balho para a passagem dos instrumentos cirúrgicos e
nado em decúbito dorsal horizontal, com a mesa de
endoscópio e a face externa do cone, para afastar a
cirurgia inclinada na posição de Trendelenburg entre
musculatura; dissecação transmuscular e não subpe-
20° e 30°, e a cirurgia é orientada por fluoroscopia,
riostal3.
sendo utilizados três ou quatro portais de trabalho, a
A endoscopia como procedimento minimamente depender da técnica empregada, para a inserção do
invasivo por via posterior utiliza os seguintes equipa- endoscópio, afastadores das vísceras intra-abdomi-
mentos cirúrgicos e conceitos: possibilidade da redu- nais e dos vasos sangüíneos e para a administração
ção da lesão tecidual dos acessos cirúrgicos maiores, de gás (dióxido de carbono) para distender a cavidade
mantendo os objetivos do tratamento; orientação por abdominal e afastar as vísceras intra-abdominais da
imagem durante a cirurgia, com fluoroscopia ou to- coluna vertebral109,116.
mografia esterotática; acesso (portal) cirúrgico, com
incisões de 2 a 3 cm; lesão muscular mínima durante
a dissecação para exposição adequada do alvo cirúr- Procedimentos Minimamente Invasivos Laterais
gico; magnificação e iluminação com o uso do mi- – Endoscopia Retroperitoneal
croscópio cirúrgico ou endoscópio apropriado; instru- Indica-se para os níveis segmentares de L1-L5, não
mentos microcirúrgicos em “baioneta”, em razão de o sendo possível o acesso a L5-S1 devido à crista ilíaca.
cone de trabalho oferecer espaço reduzido de 14 a 26 O decúbito é horizontal e lateral, orientado por fluo-
mm de diâmetro115. roscopia, utilizando-se três portais de trabalho para a
Indicações e Complicações inserção do endoscópio e afastadores para as vísceras
São as mesmas da microdiscectomia clássica des- intra-abdominais, vasos sangüíneos e músculo psoas,
crita previamente2,84,92-99. havendo a opção do uso de gás para insuflar o espaço
Resultados retroperitoneal e aumentar o espaço de trabalho109,116.
Trata-se de método cirúrgico pouco utilizado, pro- O Quadro 47.6 lista as comparações entre os aces-
vavelmente em virtude do custo elevado do equipa- sos retro e transperitoneal109,116.

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47 – Hérnia do Disco Lombar

Quadro 47.6 – Aspectos técnicos do acesso retro­ ro de cirurgias para a fusão aumentou após o ano de
peritoneal109,116 1996, coincidindo com a aprovação pela FDA dos
espaçadores intersomáticos; além disso, o aumento
Vantagens e desvantagens do acesso retroperitoneal em do número dos procedimentos não está associado a
relação ao transperitoneal evidências das indicações e à eficácia da fusão para
• Vantagens: a doença degenerativa da coluna lombar, sugerindo a
–– Os órgãos intra-abdominais afastam-se do campo necessidade de mais estudos.
operatório em decorrência do decúbito lateral
–– Possibilidade de ejaculação retrógrada reduzida Mummaneni et al.118 citam as indicações e contra-
–– Acesso facilitado ao espaço discal indicações relativas dos procedimentos ALIF, PLIF e
–– Possibilidade da correção de pequenos graus de TLIF, representadas nos Quadros 47.7 e 47.8.
escoliose e lordose
–– Canal vertebral paralelo à linha de trabalho
• Desvantagens: Quadro 47.7 – Indicações das fusões intersomáticas-
–– A exposição ao espaço L4-L5 pode requerer retirada
parcial da crista ilíaca
lombares118
–– A retração prolongada do músculo iliopsoas pode Indicações do ALIF,PLIF e TLIF
causar neuropraxia ao nervo genitofemoral
• Espondilolistese de graus I e II
• Lombalgia secundária à doença degenerativa discal
• Hérnia do disco lombar recorrente com lombalgia de origem
Procedimentos de Estabilizações mecânica
Segmentares da Coluna Vertebral – Fixas e • Diminuiçãodoespaçointervertebralsecundáriaàdiscectomia
Dinâmicas anterior, com estenose foraminal e radiculopatia
• Terceira cirurgia ou mais recorrências da hérnia do disco
Procedimentos de Estabilizações Segmentares lombar, com radiculopatia associada ou não a lombalgia
• Tratamento da pseudoartrose
Fixas da Coluna Vertebral – ALIF, PLIF e TLIF • Tratamento da cifose secundária à laminectomia
• Tratamentodedeformidadelombarsecundáriaaodesequilíbrio
O objetivo desses procedimentos é a fusão óssea do balanço sagital e/ou coronal da coluna vertebral
vertebral segmentar em nível único ou múltiplo. As
opções de acesso à coluna vertebral lombar são as
vias: anterior; posterior; transversal (transforaminal); Quadro 47.8 – Contra-indicações das fusões interso-
combinada (associação das vias). As técnicas opera- máticas lombares118
tórias consistem em sistemas por endoscopia e aberto Contra-indicações relativas do ALIF, PLIF e TLIF
(laparotomia). A artrodese da coluna vertebral é reali-
• Doença degenerativa discal superior a três níveis segmenta-
zada por meio da fusão óssea e/ou da fixação por sis- res (exceto na deformidade espinhal)
temas de placas de contenção e parafusos. A nomen- • Radiculopatia sem lombalgia mecânica ou ausência de ins-
clatura consagrada pelo uso para designar as fusões tabilidade em nível único segmentar, secundária à doença
intersegmentares lombares provém do inglês: ALIF, degenerativa discal
PLIF e TLIF (anterior, posterior, transversal (trans- • Osteoporose grave (possível penetração intravertebral do
implante)
foraminal) lumbar interbody fusion). A modalidade
da artrodese, acesso e técnica cirúrgica dependem do
sexo, idade, fatores anatômicos da coluna vertebral,
da fase da doença degenerativa e da presença de cica- Fusão Lombar Intersegmentar Anterior – ALIF
triz cirúrgica anterior. Histórico: citado por Burkus et al.119, o primeiro
Deyo et al.117 analisaram as tendências das fusões relato na literatura para o tratamento dos sintomas
das vértebras lombares no tratamento das doenças de- da doença degenerativa do disco intervertebral utili-
generativas da coluna lombar nos Estados Unidos de zando a fusão lombar intersegmentar anterior foi de
1988 a 2001, a fim de determinar se houve aumento Lane e Moore em 1948. Desde então, outros autores
desses procedimentos no período descrito em com- descrevem aprimoramentos da técnica, dos instru-
paração com outros procedimentos de fusões esque- mentos cirúrgicos e dos implantes utilizados para a
léticas. Os resultados revelam que, durante o período fusão óssea; Obenchain, em 1991, e Zucherman, em
apurado, houve aumento de 220% dos procedimen- 1995, descreveram o método minimamente invasivo
tos para fusões lombares para as doenças degenera- utilizando o endoscópoio para este fim120.
tivas, comparado até o ano de 1990; após a aprovação Indicações: os objetivos são: artrodese dos corpos
da FDA para o uso dos espaçadores intersomáticos vertebrais; restauração do espaço intervertebral; redu-
(cage) para a fusão em 1996, o numero de cirurgias ção de deformidades do balanço sagital e/ou coronal;
com fusões aumentou em 113%, enquanto houve au- descompressão do canal vertebral e dos forames in-
mento de 13% e 15% para as artroplastias do quadril tervertebrais119; diminuição da incidência de hérnias
e do joelho, respectivamente. Concluem que o núme- e atonia da parede abdominal118. É utilizada para as
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

doenças degenerativas da coluna vertebral nos espa- parafusos pediculares e placas de fixação a fim de au-
ços intervertebrais de L4-L5 e L5-S1118. mentar a estabilidade segmentar, permitindo maior
Técnica: Kaiser et al.120 compararam a laparosco- descompressão óssea e melhor visualização do cam-
pia à minilaparotomia para os procedimentos ALIF. po cirúrgico para diminuir a possibilidade de lesões
Concluíram que ambos os métodos são eficientes, sen- aos tecidos nervosos.
do a laparotomia superior em relação aos resultados, Indicações: lombalgia secundária à doença dege-
em virtude de o aspecto da técnica cirúrgica ser mais nerativa do disco, espondilolistese, pseudo-artrose,
simples, mais rápido, oferecer melhor acesso ao espa- escoliose lombar e para as deformidades do balanço
ço intervertebral, ser mais eficiente para discectomia, sagital e coronal122. A abordagem por via posterior
apresentar maior facilidade para locar o enxerto ósseo oferece vantagem em relação à via anterior por per-
e/ou implante e haver menor incidência de ejacula- mitir tratar desordens anteriores e posteriores da colu-
ção retrógrada. Após a cirurgia para a artrodese com na vertebral em único tempo cirúrgico, possibilitando
enxerto de osso ou espaçador intersomático nos ca- a artrodese intersomática dos corpos vertebrais por
sos de espondilolistese, deve ser adicionado à fixação meio de enxertos ósseos e/ou espaçadores e fixação
por via posterior com parafusos pediculares a fim de com parafusos pediculares posteriores. É indicada
evitar a migração do enxerto ósseo e/ou espaçador in- para os níveis segmentares vertebrais de L1 a S1.
tersomático utilizado118. No espaço intervertebral, as Técnica: a extensão da incisão cirúrgica posterior
opções de implantes são: espaçadores (cages), disco e medial lombar depende do objetivo da cirurgia, da
artificial, materiais osteoindutores, osteocondutores e doença degenerativa em questão e dos níveis segmen-
osso autólogo. tares a serem tratados, podendo interessar a extensão
Complicações: a retração dos vasos ilíacos duran- completa da região lombossacra e dorsal inferior.
te o procedimento cirúrgico (especialmente no nível Quando o objetivo da cirurgia implica necessidade
de L4-L5) aumenta a possibilidade de trombose e de da artrodese dos corpos vertebrais, a laminectomia
lesões desses vasos. As placas de contenção do enxer- deve ser ampla, com ressecção das facetas articula-
to não devem ter contato com os vasos ilíacos, aorta res e exposição dos processos transversos. Após a
e veia cava inferior devido à possibilidade de lesões e discectomia, instala-se o enxerto ósseo ou os espa-
pseudo-aneurismas. Ejaculação retrógrada decorre da çadores intersomáticos. Os parafusos pediculares são
lesão do plexo nervoso hipogástrico em até 45% dos aplicados nos pedículos vertebrais com o auxílio da
pacientes masculinos, devendo ser evitado o ALIF fluoroscopia a fim de minimizar lesões aos nervos es-
quando há o desejo da procriação. Outras intercor- pinhais e do saco dural. Essa modalidade de fusão é
rências próprias dos procedimentos intracavitários denominada circunferencial, por fixar o segmento ou
abdominais são: lesão da bexiga; infecções; íleo tran- segmentos da coluna vertebral nas regiões anteriores
sitório; hematomas no retroperitôneo118. Conversão e posteriores.
da técnica laparoscópica para a laparotomia por expo- Técnicas minimamente invasivas para a fusão
sição cirúrgica inadequada e lesões vasculares ocorre espinhal vêm sendo desenvolvidas a fim de evitar
em 10% a 20% dos casos121. a necessidade de incisões cirúrgicas grandes na re-
Resultados: Kaiser et al.120 compararam os resul- gião lombar, diminuir a dissecação muscular ampla
tados dos seus 98 pacientes, em que o método por e para preservar os elementos ósseos e ligamentares
laparoscopia foi utilizado em 47 e minilaparotomia da coluna. Há duas técnicas percutâneas para a fixa-
em 51 pacientes. A preparação para o ato operatório ção intersomática posterior: parafusos pediculares e
foi maior quando se utilizaram laparoscopia e tempo para as facetas articulares. Permite apenas a utiliza-
operatório mais prolongado (especialmente no nível ção de parafusos na região posterior das vértebras,
L5-S1). As complicações pós-operatórias imediatas sem a possibilidade de fixar ou de fundir com osso a
foram maiores nos procedimentos por minilaparo- região anterior das vértebras. Métodos para viabilizar
tomia (17,6% versus 4,3%), porém a incidência de a interposição somática anterior com enxertos estão
ejaculação retrógrada é maior quando se utiliza a la- sendo desenvolvidos para essas duas técnicas descri-
paroscopia (45% versus 6%). tas123. São indicados em casos de instabilidade ape-
nas posterior da coluna ou para a suplementação da
Fusão Lombar Intersegmentar Posterior – PLIF artrodese anterior (ALIF) previamente realizada. As
incisões na pele da região lombar são paramedianas
Histórico: citado por Foley et al.121, Cloward, em aos processos espinhosos das vértebras, aproximada-
1943, foi o pioneiro desse método, com os objeti- mente de 4 a 5 cm da linha média bilateralmente, em
vos de conseguir simultaneamente a descompressão número equivalente aos parafusos a serem utilizados,
do nervo espinhal e fusão intersomática utilizando orientando-se a colocação dos parafusos com o uso
enxerto de osso da crista ilíaca locado no espaço in- da fluoroscopia. As particularidades técnicas desses
tervertebral após a discectomia. Steffee e Sitkowski, métodos dependem da instrumentação utilizada e do
em 1988, popularizaram a utilização suplementar de fabricante.

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47 – Hérnia do Disco Lombar

Complicações: a dissecação muscular ampla, Quadro 47.9 – Vantagens da TLIF quando comparadas
com a necessidade da exposição dos processos trans- a ALIF e PLIF
versos das vértebras, provoca dor lombar, havendo
TLIF versus ALIF
possibilidade de instabilidade segmentar decorrente • Fusão circunferencial realizada em tempo operatório único.
da dessecação subperiosteal da musculatura e dos • Não ocorrem lesões vasculares, ejaculação retrógrada, cica-
ligamentos. Durante o processo de locar o enxer- trizes abdominais, atonia da parede abdominal ou hérnia
to ósseo ou espaçador intervertebral, faz-se neces- incisional
sária significativa retração dos nervos espinhais e TLIF versus PLIF
do saco dural, com possíveis lesões anatômicas e/ • Evita retrações do nervo espinhal e saco dural.
ou funcionais dessas estruturas e fístula liquórica. • Diminuem as possibilidades das lesões às estruturas ner-
A laminectomia e a retirada das facetas articulares vosas
• Realizado até o nível de L1 sem risco de lesão do cone
podem ocasionar instabilidade segmentar, mesmo medular
na presença da fixação posterior e fusão anterior. • Mínima cicatriz epidural
Outras complicações são relativas aos enxertos e • Sangramento mínimo
parafusos, como o possível deslocamento posterior
do implante com lesão do saco dural e/ou nervo
espinhal. Lai et al.124 relacionaram a instabilidade
segmentar adjacente à artrodese, após procedimen- Complicações: lesão do nervo espinhal e do saco
tos com laminectomia, seguidos de fusão e fixação dural, fístula liquórica, deslocamento do implante in-
em 70 pacientes. Concluíram que o segmento cra- tersomático com lesão nervosa.
nial à artrodese apresentou 24,3% de instabilidade, Resultados: poucas publicações existem e são com
e o segmento caudal, 5,6%. séries reduzidas de pacientes, porém são similares à
Os métodos minimamente invasivos posteriores PLIF115.
percutâneos apresentam riscos de lesões às estruturas
nervosas, por não permitirem a visualização direta no Procedimentos de Estabilizações
momento da inserção dos parafusos pediculares ou
facetários. Segmentares Dinâmicas Anteriores e
Resultados: Bono e Lee147 analisaram as tendên- Posteriores da Coluna Vertebral – Disco
cias da fusão espinhal para a doença degenerativa dis- Artificial e Estabilizações Posteriores
cal dos últimos 20 anos e concluíram não ser possível Flexíveis
evidenciar o benefício clínico por não haver sistema
Estabilizações Segmentares Dinâmicas
uniforme de apresentação de resultados relacionados
a fatores demográficos, pré-operatórios e informações Anteriores – Discoplastia Lombar com Disco
pós-operatórias. Artificial
Os resultados dependem da doença degenerativa e Histórico: citado por Guyer125, Fernström, em 1966,
da opção cirúrgica escolhida, não sendo possível ge- substituiu o disco intervertebral por uma esfera de aço
neralizar os resultados122. inoxidável após a discectomia em 125 pacientes, ocor-
rendo em 1 doente (0,7%) deslocamento da esfera e
Fusão Lombar Intersegmentar Transversal ou 1 caso de déficit neurológico transitório (0,7%). Em
Transforaminal – TLIF 1972, McKenzie e Fernström publicaram os resulta-
dos clínicos de 67 doentes com o implante do sistema
Histórico: citados por Mummaneni et al.118, Harms de esfera de aço inoxidável no espaço intervertebral e
e Rolinger, em 1982, apresentaram a técnica TLIF a os acompanharam durante o período de 10 a 20 anos,
fim de evitar as complicações das técnicas de ALIF e com resultados bons e excelentes em 83% dos casos.
PLIF. A variante técnica minimamente invasiva está Atualmente, os três tipos principais de discos arti-
sendo desenvolvida desde o início dos anos 2000115. ficiais são: SB Charité; ProDisc; Maverick.
Técnica: a via é posterior e lateral à coluna verte- SB Charité (fabricante: Waldermar Link, Ham-
bral na região lombar, com exposição do forame in- burg, Germany): é a prótese de uso mais freqüente,
tervertebral, efetuando-se a descompressão do nervo desenvolvida na Alemanha no início dos anos de
espinhal e a discectomia, inserção de enxerto ósseo 1980 e atualmente comercializada e usada à terceira
ou implante no espaço intervertebral, adicionando-se geração do disco, desde 1987, o Charité III. Constituí­
parafusos pediculares para a fixação posterior. do por duas placas de metal (cobalto-cromo) e inter-
Indicações: comparada às modalidades de fusão posto por uma esfera de polietileno deslizante, que,
intersegmentar anterior e posterior, a TLIF apresen- quando locadas no espaço intervertebral, se fixam nas
ta as diferenças e vantagens descritas no Quadro placas cartilaginosas das faces das vértebras cranial
47.9118. e caudal.
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

ProDisc (fabricante: Spine Solutions, New York, funções das facetas articulares; manter a estabilidade
New York): utilizada desde 1990, formada por três segmentar e a amplitude dos movimentos127.
peças, duas placas de metal e uma esfera interposta de Complicações: complicações são esperadas quan-
polietileno, a qual é fixa na placa cartilaginosa da face do uma prótese nova é apresentada para o uso huma-
do corpo vertebral caudal. no, porém são poucas as informações fornecidas a
Maverick Disc (fabricante: Medtronic Sofamor esse respeito sobre a artroplastia123. Citadas por Ger-
Danek, Minneapolis, MN): em fase de testes clínicos man e Foley123, as complicações relacionadas com o
na Europa, com sistema de implante de duas placas uso do disco artificial e a artroplastia são:
de metal sobrepostas e fixas nas placas cartilaginosas Déficit neurológico: comparando com os procedi-
das faces dos corpos vertebrais por quilhas, seme- mentos de fusão, a freqüência é igual ou menor, ocor-
lhante ao do ProDisc. rendo radiculopatia e ejaculação retrógrada.
Indicações: o uso do disco artificial por artroplas- Projeção intravertebral da prótese: atenção espe-
tia mostra as seguintes vantagens teóricas: manter a cial é recomendada no preparo das superfícies de aco-
amplitude dos movimentos das vértebras; evitar a de- modação da prótese nas faces dos corpos vertebrais,
generação discal e facetária dos segmentos adjacen- devendo permanecer íntegras. A prótese necessita
tes; reconstruir a altura do espaço intervertebral e o de apoio amplo e deve ocupar toda a área das placas
alinhamento espinhal; manter as características bio- terminais (cartilaginosas) das faces dos corpos verte-
mecânicas da coluna vertebral; diminuir a morbidade brais, incluindo a periferia, mais compacta e resisten-
cirúrgica quando comparada à fusão; evitar compli- te do que a região central da placa terminal, esponjosa
cações secundárias da instrumentação com placas de e pouco resistente.
contenção e parafusos; retorno precoce do paciente às Deslocamento e falha mecânica da prótese de dis-
atividades habituais126. co: raros e não documentados.
Os sistemas Charité e ProDisc possuem protoco- Fadiga da prótese de disco: definida como um
los próprios para os critérios de inclusão e exclusão processo físico causado por movimentos repetidos
de doentes para a indicação do uso dos respectivos de atrito em uma superfície. Fadiga da prótese está
sistemas, mas o critério mais importante é não haver associada à formação de detritos (debris), diminuição
doença degenerativa das facetas articulares, a fim da altura do espaço intervertebral e fadiga do sistema
de manter a amplitude dos movimentos do segmen- de funcionamento da prótese. Os detritos induzem a
to vertebral após a artroplastia. De acordo com es- uma reação inflamatória no local do implante e com-
ses protocolos, apenas 5% dos doentes com doença prometimento do funcionamento do sistema e conse-
degenerativa discal são candidatos a se submeter a qüências indesejáveis para o paciente, incluindo dor,
artroplastia com o implante de disco artificial123. Os osteólise, pannus e deslocamento da prótese126.
estudos prospectivos atuais indicam a realização de Revisão cirúrgica: há poucas informações a esse
artroplastia em doentes com lombalgia incapacitan- respeito, mas potencialmente com riscos elevados,
te e crônica, estabilidade segmentar da coluna verte- devido à possibilidade de ocasionar lesões vascula-
bral, presença da doença degenerativa restrita a um res durante a dissecação através da fibrose residual
ou dois níveis segmentares e, pelo menos, 6 meses da operação prévia, especialmente no nível de L5-S1.
de tratamento conservador clínico sem a melhora dos Fusão e fixações suplementares posteriores e/ou late-
sintomas da dor. Contra-indicações do procedimen- rais, na eventualidade de falhas de funcionamento do
to incluem doentes com distúrbios psicossomáticos, sistema, são de 1,9% a 7,8% no sistema ProDisc II e,
obesidade, osteoporose e infecções126. 1,1% a 17,4% para o sistema SB Charité. Os resulta-
Técnica: o trato gastrintestinal é esterilizado antes dos clínicos da artroplastia seguida de fixação suple-
do procedimento cirúrgico. Este é realizado sob anes- mentar são desfavoráveis123.
tesia geral, com o doente posicionado em decúbito ho- Resultados:
rizontal dorsal com hiperlordose lombar e os membros Charité III: é o de uso mais freqüente e o único
inferiores em abdução e abaixados. Faz-se a laparoto- aprovado para uso nos Estados Unidos. A prova de
mia, geralmente paracentral, inferior e à esquerda. A utilização, US Food and Drug Administration Trial,
via para a exposição da coluna vertebral pode ser a ex- possui 304 pacientes inscritos para o acompanhamen-
traperitoneal ou intracavitária. Efetua-se a discectomia to clínico. A cirurgia foi restrita aos níveis segmenta-
e, a seguir, implanta-se a prótese do disco intervertebral res de L4-L5 ou L5-S1. Os relatos preliminares indi-
com os sistemas e aparelhos próprios fornecidos pelo cam melhora da dor e incapacidade funcional após a
fabricante do disco artificial escolhido. Os implantes cirurgia. O índice de complicações relatado é de 10%
são oferecidos em vários tamanhos, diferindo entre si a 17%. O grupo-controle é formado por doentes sub-
na altura, ângulo da lordose e dimensões das placas. metidos à fusão com cages BAK e osso ilíaco123.
Os objetivos são: restaurar a altura discal do espaço ProDisc: alguns centros de tratamento implan-
intervertebral e dos forames neurais; normalizar as tando o sistema ProDisc nos Estados Unidos estão

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47 – Hérnia do Disco Lombar

iniciando um estudo prospectivo e randomizado de-


Quadro 47.10 – Modalidades das estabilizações seg-
nominado US Food and Drug Administration Trial,
mentares posteriores flexíveis128
comparando o ProDisc à fusão circunferencial (fusão
óssea anterior e fixação com parafusos pediculares • Sistemas de distração interespinhosa:
na região vertebral posterior). Relatos preliminares − Sistema de distração de silicone de Minns (1997)
desse estudo revelam dados favoráveis quanto à me- − Sistema Wallis (1998)
− X-Stop (2003)
lhora da dor e da incapacidade funcional com o Pro-
• Sistemas de ligamentos interespinhosos:
Disc123. − Ligamento elástico do processo espinhoso de
Análises preliminares: os estudos prospectivos Bronsard (2002)
não estão concluídos comparando a artroplastia a − Sistema de alça (2002)
grupos-controle. A artroplastia é efetuada em pacien- • Ligamentos através dos parafusos pediculares:
tes jovens e existe a necessidade do funcionamento − Ligamento de Graf (1992)
adequado do sistema por décadas. A doença adjacente − Sistema Dynesis (2002)
− Sistema FASS (1999)
segmentar, secundária à artroplastia, revelou ser, após
• Sistema metálico semi-rígido através dos parafusos
2 anos de acompanhamento de um estudo isolado, de pediculares:
4,6% a 25,6% e não se sabe se esse dado significa a − Sistema DSS (2003)
necessidade de um segundo procedimento cirúrgico
no futuro123.

Estabilizações Segmentares Posteriores • Descrições dos mecanismos de funcionamento:


Sistemas de distração interespinhosa: o implante é
Dinâmicas – Estabilizações Posteriores Flexíveis
móvel e locado entre dois processos espinhosos con-
Histórico: o desenvolvimento dessa modalidade tínuos, de maneira a permitir movimentos de peque-
para o tratamento cirúrgico da doença degenerativa nas amplitudes, porém diminuindo os movimentos de
discal iniciou-se no começo dos anos de 1990. Os extensão da coluna vertebral nesse determinado seg-
resultados clínicos encontram-se na fase preliminar mento. É indicado na estenose do canal vertebral.
de análise e os sistemas de estabilizações posterio- Sistemas de ligamentos interespinhosos: o implan-
res e flexíveis não obtiveram a aprovação, por ora, te consiste em cordões de polietileno fixos, entre ou
da FDA. Vários sistemas de estabilizações flexíveis circundando os processos espinhosos, diminuindo os
estão sendo utilizados, ainda sem as definições das movimentos de flexão e de extensão.
bases teóricas biomecânicas de funcionamento ou de Ligamentos através dos parafusos pediculares:
eficácia clinica comprovada128. Os termos flexíveis e parafusos pediculares são aplicados bilateralmente
dinâmicos de estabilizações são usados para designar no(s) segmento(s) da coluna vertebral na região da
o mecanismo de funcionamento, e o termo “poste- doença degenerativa em questão, com a finalidade de
rior”, a via de acesso cirúrgico para a aplicação dos diminuir os movimentos de flexão e de extensão, e
sistemas de estabilizações. os parafusos pediculares são conectados por meio de
Indicações: a popularidade desses sistemas é fun- cordões de polietileno em linha e de cada lado das
damentada mais no descontentamento com os resul- vértebras.
tados de fusão segmentar lombar do que na supe- Sistema metálico semi-rígido através dos para-
rioridade desses métodos. A diferença entre o disco fusos pediculares: similar ao sistema de ligamentos
artificial e os sistemas de estabilizações flexíveis é através dos parafusos pediculares anteriormente des-
a distribuição das cargas mecânicas nas três articu- critos, porém, no lugar dos cordões, usam-se molas ou
lações do segmento vertebral, não compartilhada no metais deformáveis, a fim de diminuir os movimentos
primeiro e compartilhada no segundo. de flexão e de extensão do segmento vertebral128.
Os sistemas de estabilização flexíveis são defini- • Complicações e resultados: os sistemas des-
dos como sistemas que alteram de maneira favorável critos estão em desenvolvimento e com indicações
movimentos e transmissões das cargas de determina- não definidas. O desafio é manter a estabilidade e os
dos segmentos espinhais, sem a intenção de fusões movimentos do segmento vertebral posterior e criar
desses segmentos. A estabilização flexível tem como ambiente favorável à regeneração do disco interver-
sinônimo estabilização macia e estabilização dinâmi- tebral. As complicações possíveis são a perda das fi-
ca. Os objetivos são alterar os padrões das cargas no xações interespinhosas e a saída dos parafusos pedi-
segmento espinhal e controlar os movimentos anor- culares das vértebras128.
mais no segmento128. Na fase atual de desenvolvimento desses sistemas,
Os diferentes sistemas de estabilizações flexíveis não são possíveis comparações das modalidades, tam-
são de uso posterior na coluna vertebral e separam-se pouco com os métodos de fusão e fixação da coluna
em quatro categorias (Quadro 47.10). vertebral129.

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Implante de Prótese de Núcleo Pulposo mecânicas semelhantes às dos discos normais e ca-
pazes de regular o conteúdo de água em seu interior.
Histórico A característica mais importante desse material é ab-
Em fase clínica de estudo. São materiais e drogas sorver e eliminar a água, a depender da carga aplica-
com a finalidade de serem aplicadas como próteses da em sua estrutura (função semelhante à do disco
de discos intervertebrais e encontram-se em proces- normal).
so de desenvolvimento. Não são aprovadas para essa Polímeros curáveis in situ: compostos líquidos
finalidade pela FDA e não são comercializadas para de silicone ou poliuretano que assumem consistência
uso clínico. A prótese de núcleo pulposo encontra-se dura após o implante. São indicados quando a inten-
em fase de testes-controle e em séries limitadas de ção é a fusão do segmento intervertebral.
doentes há aproximadamente 10 anos130. • Técnica:
Implante intradiscal: a abordagem é feita por via
Indicações posterior e lateral da região lombar, através de agu-
lha de punção tecidual adequada, com penetração in-
A tendência do tratamento cirúrgico para a doença tradiscal e injeção do hidrogel no interior do núcleo
degenerativa do disco intervertebral é diminuir a dis- pulposo, retirado previamente ou não, a depender da
secação dos tecidos moles e preservar os movimentos marca de fabricação do hidrogel usado. Dependendo
do segmento espinhal. Nesse contexto, o implante in- do fabricante do hidrogel, existem variações da técni-
tradiscal de núcleo pulposo apresenta uma alternativa ca na aplicação do produto. O implante de núcleo pul-
aos procedimentos de fusão e de fixação da coluna poso mais bem estudado é o Prosthetic Disc Nucleus®
vertebral. (fabricante: Raymedica, Inc., Bloomington, MN). É
As funções da prótese do núcleo pulposo são: re- uma pastilha de hidrogel com invólucro de polieti-
construir o núcleo pulposo; manter a biomecânica e leno com a função de absorver água em 80% do seu
diminuir as forças de tensão do ânulo fibroso; preser- peso e inchar, mantendo, dessa maneira, a altura do
var as funções de nutrição das placas cartilaginosas disco intervertebral130.
das faces dos corpos vertebrais; manter o equilíbrio Polímeros curáveis in situ: a técnica da administra-
dos movimentos; aumentar o espaço intervertebral; ção do implante é similar à anteriormente descrita, sen-
estabilizar os ligamentos da coluna vertebral. do necessária a retirada do núcleo pulposo do interior
As indicações são: dor lombar, que não melhora do disco. No momento da injeção, o material está na
com o tratamento clínico de, no mínimo, 6 meses; fase líquida e é moldado na cavidade nucleotomizada,
ressonância magnética da coluna lombar compatível ocorrendo, a seguir, polimerização e endurecimento
com espondilolistese menor que grau I no nível sin- do material. O ânulo fibroso deve estar intacto a fim de
tomático, altura do espaço discal superior a 50% do diminuir a possibilidade de extravasamento do líquido
valor normal e ausência de nódulos de Schmorl intra- para o meio externo ao espaço intervertebral130.
vertebrais; fase inicial da degeneração discal; altura
• Complicações e resultados: citadas por Di Mar-
discal superior a 5 mm.
tino et al.130, as complicações e resultados foram ana-
Os objetivos do implante de núcleo pulposo são lisados nos poucos sistemas disponíveis e em séries
sumariados no Quadro 47.11130. limitadas de doentes. As complicações mais freqüen-
tes são de penetração do implante para o interior do
Quadro 47.11 – Funções e requisitos do implante de corpo vertebral e a extrusão do implante, externa ao
núcleo pulposo130 espaço intervertebral. Resultados clínicos obtidos em
• Restaurar as funções biomecânicas do ânulo fibroso uma série limitada de 51 pacientes, em 1999, eviden-
• Manter e recriar as funções características do disco ciaram melhora de 91% dos sintomas da dor da doen-
• Compatibilidade biológica com o organismo ça degenerativa.
• Resistir ao desgaste do uso prolongado (superior a 40 anos)
• Formação mínima de resíduos (debris)
• Características físicas semelhantes às do disco Técnicas de Regeneração do Disco
• Compatibilidade com as placas cartilaginosas Intervertebral – Terapia com Genes e
• Preenchimento de todo o espaço intervertebral
• Aplicação intradiscal por métodos minimamente invasivos Terapia Celular
Ambas as terapias estão em fases laboratoriais e
pré-clínicas de estudos e não aplicáveis em humanos
• Modalidades e mecanismos de ação dos implan- até a presente data. Essas modalidades são indicadas
tes de núcleo pulposo35: nas fases iniciais da doença degenerativa do disco
Implantes intradiscais: similares às características intervertebral e têm como objetivos tratar as causas,
normais do disco. São usados materiais viscosos sin- diferentemente das opções cirúrgicas, que tratam as
téticos denominados de hidrogéis, com propriedades conseqüências131,132.

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47 – Hérnia do Disco Lombar

Técnicas de Regeneração do Disco Intervertebral através de vetores virais e não virais, a fim de sin-
– Terapia com Genes tetizar proteínas específicas (fatores de crescimento)
no interior dessas células. Fatores de crescimento são
Histórico peptídeos com funções reguladoras na reparação dos
Citada por Shimer et al.131, a terapia com base de ge- tecidos do sistema musculoesquelético, estimulando
nes proposta por Friedmann e Robin em 1972 envolve a a proliferação, migração, síntese da matriz celular e
transferência de material genético (DNA ou RNA) para diferenciação celular. O objetivo é manter ou recons-
o interior de uma célula-alvo com algum tipo de defei- truir a concentração dos proteinoglicanos no interior
to da seqüência genética, a fim de modular seu sistema do disco, alterando o desequilíbrio entre a diminuição
imune ou produzir substâncias benéficas para essa célu- da síntese e o aumento do catabolismo dos proteino-
la. O uso da tecnologia com genes para o tratamento da glicanos. A estratégia é sustentar o metabolismo da
doença degenerativa do disco intervertbral iniciou-se no matriz do disco durante período prolongado, alteran-
intervalo dos anos de 1999 a 2000, introduzindo genes do o curso da doença degenerativa.
contendo fatores de crescimento capazes da sintetizar Vetores são divididos em duas categorias: siste-
proteoglicanos nas células do disco, in vitro e in vivo. mas virais e não virais. Os vetores virais, por sua vez,
são, ainda, divididos em genomas que incorporam o
retrovírus e análogos e genomas que não incorporam
Indicações plasmídeos e análogos.
O fator mais importante na terapia por genes da Os vírus transferem o material genético para o in-
doença degenerativa do disco intervertebral é a es- terior das células-alvo e alteram a replicação, trans-
colha do gene terapêutico.Os genes terapêuticos são crição e translação do DNA. Os vetores não virais
divididos em genes estruturais ou reguladores. introduzem, nas células, mensagens transgênicas sem
Genes estruturais estimulam a produção de várias os aspectos desfavoráveis dos sistemas de transferên-
linhagens de células do disco intervertebral e necessi- cias por vetores virais, incluindo mutações, infecções
tam de quantia grande e variada de genes terapêuticos sistêmicas e imunogenicidade protéica viral131.
para a transformação celular, sendo essa técnica pou-
co pesquisada para o tratamento da doença degenera- Técnicas de Regeneração do Disco Intervertebral
tiva do disco intervertebral.
– Terapia Celular
Genes reguladores são de duas modalidades: mo-
léculas anabolizantes formadoras de novas células no O processo degenerativo do disco intervertebral é
interior do disco; moléculas capazes de diminuírem considerado a causa principal da lombalgia crônica. Es-
o catabolismo celular. Citoquinas apresentam proprie- tratégias novas estão sendo desenvolvidas para cura ou
dades anabolizantes para o disco e são classificadas diminuição dos sintomas como opções dos tratamentos
em mitogênicas e morfogênicas. Não se conhece o be- cirúrgicos existentes. Encontram-se em fase inicial de
nefício do aumento das mitoses das células do disco estudo possibilidades de transplantar células autólogas
na doença degenerativa, reservando-se as citoquinas e maduras do disco, condrócitos ou células-tronco para
mitogênicas para aplicações não clínicas. As citoqui- o interior do disco intervertebral, a fim de regenerar
nas morfogênicas (por exemplo: TGF-beta1; BMP-2; ou diminuir a degeneração do disco intervertebral por
BMP-7; LMP-1) promovem a diferenciação celular meio da produção de proteinoglicanos135. O conheci-
com mínima ação mitótica, aumentando a síntese e a mento atual sugere haver tipos de células com capaci-
produção dos proteinoglicanos no interior do disco132. dade de sobreviver, proliferar e participar na formação
Outra aplicação dos genes reguladores é para a da matriz celular do disco durante breves períodos136.
formação de osso pela introdução de fatores de cres- As terapias celulares para a degeneração do disco inter-
cimento ósseo no local da fusão (in vivo) ou de osso vertebral não são aplicadas no humano até o momento.
retirado do paciente para posterior implante no local Os requisitos em terapia celular são citados no
da fusão, após o tratamento com fatores de cresci- Quadro 47.12136.
mento ósseo (ex vivo)133.
A terapia com genes apresenta a perspectiva de
uma nova modalidade de tratamento para a doença Quadro 47.12 – Objetivos das pesquisas em terapia
degenerativa do disco vertebral, a reparação biológi- celular do disco intervertebral136
ca dos tecidos, situada entre a terapia conservadora • Definir a célula ideal para a reparação do disco
(não cirúrgica) e a cirurgia134. • Determinar se plataformas de células são necessárias ou be-
néficas
• Determinar qual é o ambiente mecânico e biológico ideal para
Técnica a proliferação celular e a produção de proteinoglicanos
A terapia com genes consiste em introduzir, no • Conhecer quais fatores de crescimento ou genes podem ser usa-
dos no incremento do desempenho das células implantadas
interior de uma célula-alvo, seqüências genéticas
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

As modalidades da terapia celular do disco em sem fusão ou fixação, e compararam os resultados


pesquisa são: transplante total e de tecidos do disco; pós-operatórios entre pacientes que recebiam e não
transplante da cultura de células do disco; implante recebiam benefícios financeiros previdenciários por
de célula de disco e plataformas de células; uso da incapacidades físicas, antes e depois da cirurgia. Os
engenharia celular para obter derivados de tecidos de pacientes que recebem compensações financeiras pre-
origem não discal4. videnciárias, quando comparados àqueles sem bene-
fícios, permanecem inativos por período, em média,
FAILED BACK SURGERY SYNDROME 69% maior; obtiveram apenas 21% de resultados ex-
celentes e bons, apesar dos mesmos esforços físicos
A tradução da expressão idiomática failed back ocupacionais, e 100% não retornaram ao trabalho.
surgery syndrome ou failed back syndrome é síndro- Obter dados clínicos e radiológicos anteriores à
me do fracasso e da reprovação dos resultados clíni- primeira cirurgia, conhecer a evolução clínica após a
cos obtidos após uma ou mais cirurgias para doenças cirurgia, pesquisar sobre os motivos e em quais si-
degenerativas da coluna lombar. As características tuações retornou ou não às atividades profissionais,
clínicas são de sintomas persistentes ou recorrentes saber aspectos da vida social e desportiva, quais as
de dor lombar e/ou em membros inferiores, distúrbios modalidades terapêuticas utilizadas e os motivos de
psicológicos e incapacidade funcional. outras intervenções cirúrgicas e seus resultados são
Reoperações causadas por discos recorrentes, fís- aspectos fundamentais na investigação das causas dos
tulas liquóricas, infecções e outras causas ocorrem resultados não favoráveis e na decisão do tratamento.
em 3% a 18% dos casos91,101,102,137,138. Lewis et al.101 North et al.137 descreveram os fatores relacionados
reoperaram 18% dos seus pacientes (15 de uma ca- com resultados não favoráveis na cirurgia para a hér-
suística de 83), após, pelo menos, 2 anos, em média, nia do disco lombar, demonstrados no Quadro 47.13.
de sintomatologia, com índice de 66% de melhora da
dor. North et al.137 reoperaram 23% dos seus pacien-
tes (23 de um total de 102) após, pelo menos, 2 anos Quadro 47.13 – Motivos de resultados cirúrgicos
da primeira cirurgia, relatando melhora clínica em um insatisfatórios na hérnia do disco lombar137
terço dos doentes. Österman et al.148 analisaram a pos- Causas do failed back surgery syndrome
sibilidade de novas intervenções cirúrgicas em 35.309 • Diagnóstico inadequado
pacientes operados para hérnia do disco lombar. Os • Má indicação cirúrgica
resultados desse estudo são: 14% dos doentes foram • Descompressão inadequada, devido ao não-reconhecimento
reoperados e 2,3% destes passaram por duas ou mais e tratamento da estenose do recesso lateral, hérnia do disco
extremo lateral e fragmento de disco livre seqüestrado
cirurgias; 63% das reoperações foram discectomias, • Hérnia de disco recorrente no mesmo nível operado ou em
14% fusões, 23% descompressões. Concluíram que outros níveis
doentes submetidos a discectomias e posteriormen- • Instabilidade segmentar
te reoperados apresentam 25% de possibilidade de • Evolução natural da doença degenerativa
se submeterem a outras cirurgias no intervalo de 10 • Artrodese cirúrgica inadequada ou pseudo-artrose
• Complicações cirúrgicas
anos, especialmente se a reoperação tiver sido feita em
perío­do inferior a 1 ano após a primeira. A necessidade
de reoperações precoces pode refletir a gravidade do Zeidman83 relaciona sintomas persistentes após a
processo degenerativo, dificuldades técnicas nas cirur- cirurgia com as possíveis causas do fracasso:
gias e a seleção inadequada dos candidatos à cirurgia. • Ausência de melhora da dor imediatamente
Indicadores prognósticos sugerem resultados re- após a cirurgia: sugestiva de descompressão
gulares ou ruins quando candidatos à cirurgia apre- inadequada do nervo espinhal, lesão do nervo
sentam idade superior a 50 anos, dor lombar crôni- espinhal ou indicação cirúrgica inapropriada.
ca e persistente36, dor ciática contínua por período • Melhora inicial da dor, seguida de aumento
maior que 8 meses139,140, insatisfação e afastamento progressivo de paresia e de parestesias: se
do trabalho, ganho de benefícios previdenciários, so- houver intervalo assintomático entre 1 e 6 me-
matização psicológica141,142 e doenças musculoesque- ses após a cirurgia e progressivamente ocor-
léticas associadas, como a síndrome miofascial e a rerem alterações da sensibilidade, aumento de
espondiloartrose12. Spurling e Grantham143, em 1949, dor e déficit motor, a formação de tecido cica-
reconheceram que, quando o doente recebia compen- tricial poderá ser a causa.
sações financeiras anteriores e posteriores à cirurgia • Melhora inicial completa dos sintomas com pe-
em razão de inatividade do trabalho, o grau de insa- ríodo de meses ou anos assintomático, seguida
tisfação com o resultado da cirurgia era maior. Daniel de dor: sugestivo de hérnia recidivante no mes-
et al.91 analisaram os resultados econômicos e funcio- mo nível ou em outro nível segmentar, instabi-
nais obtidos após a cirurgia de 47 pacientes operados lidade e pseudo-artrose, tecido cicatricial e/ou a
de hérnia do disco lombar de origem degenerativa, evolução natural da doença degenerativa.

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47 – Hérnia do Disco Lombar

A lesão funcional ou anatômica do nervo espinhal representada pelo enxerto ósseo e o corpo vertebral.
ocasionada pela hérnia do disco ou a sua manipulação É mais freqüente em fusões de dois níveis em relação
cirúrgica excessiva comprometem a vascularização a um nível segmentar e mais comum no segmento de
do nervo espinhal com a conseqüente reação inflama- L5-S1, em razão da maior mobilidade nesse nível83.
tória não específica, fibrose e diminuição da mobili- Zeidman descreve critérios para o auxílio no diag-
dade do nervo espinhal, porém necessariamente não nóstico da instabilidade segmentar vertebral (Quadro
há dor. É a fibrose residual a causa mais freqüente de 47.14)83.
dúvidas quanto à necessidade de nova cirurgia devida
ao seu efeito aparentemente compressivo envolvendo
o nervo espinhal. Relacionando a persistência da dor Quadro 47.14 – Critérios sugestivos de instabilidade
ciática e a fibrose epidural e radicular vista à resso- segmentar pós-cirúrgica83
nância magnética da coluna lombar no período pós- • Movimentos das vértebras adjacentes em radiografias dinâmi-
operatório, em 70% dos casos a fibrose é observada cas (flexão/extensão)
e, após 6 meses, 43% desses pacientes ainda terão fi- • Deformidadeespinhalprogressiva(escoliose,espondilolistese)
brose, porém, em 84%, os pacientes estão assintomá- • Destruição cirúrgica iatrogênica de mais de uma articulação
ticos102. A ressonância magnética com contraste é o zigoapofisária completa
• Pseudo-artrose com movimentos no local da fusão óssea prévia
exame de imagem mais sensível ao diagnóstico dife-
rencial entre a hérnia do disco recidivante e a cicatriz
cirúrgica (fibrose) que envolve o nervo espinhal e o O objetivo do procedimento cirúrgico, quando in-
saco dural. O disco intervertebral não capta o contras- dicado, depende de fatores do paciente, da técnica e
te, ao contrário da fibrose. Outros sinais radiológicos da modalidade da cirurgia anterior e da lesão do teci-
são o efeito de massa que o disco produz no nível do do nervoso associado, prevalecendo o bom senso do
espaço discal afastando o nervo espinhal, ao contrário médico assistente à luz dos dados clínicos, radiológi-
da fibrose, que o retrai144. cos e técnicas e materiais disponíveis para efetuar a
cirurgia.
Tratamento Não Cirúrgico
CONSIDERAÇÕES SOBRE A HÉRNIA DE
Hérnia do disco recorrente, instabilidade segmen- DISCO NA INFÂNCIA
tar ou estenose do canal vertebral são lesões mecâni-
cas da coluna vertebral com possíveis efeitos com- A ocorrência de hérnia do disco lombar em idade
pressivos nos tecidos nervosos e corrigidos por meios inferior a 18 anos é rara, manifestando-se em 0,5% a
cirúrgicos. Condições não mecânicas de dor lombar 3% dos doentes operados. O disco intervertebral nesta
e radicular devem ser tratadas por meios não cirúrgi- faixa etária difere daquele do adulto quanto às carac-
cos, como as doenças sistêmicas e o tecido cicatricial terísticas físicas e químicas. O ânulo fibroso é mais
que envolve o nervo espinhal após procedimentos ci- elástico, o núcleo pulposo possui conteúdo líquido
rúrgicos para a hérnia do disco lombar83. maior e há epífise anular no local da futura placa car-
Nos pacientes em que persiste a dor lombar sem tilaginosa do corpo vertebral. A formação completa
dor ciática, com o exame neurológico normal ou igual do disco ocorre, aproximadamente, entre 20 e 25 anos
ao do pré-operatório, a conduta deve ser conservado- de idade. Por esses motivos, as causas da hérnia do
ra, mesmo sendo vistos, à RNM da coluna lombar, disco na infância diferem em relação à do adulto2.
sinais de aracnoidite ou fibrose. O tratamento é igual Traumas repetidos à coluna vertebral são mais sig-
ao da lombalgia de origem não específica, ou seja, nificativos para a origem da hérnia do disco nessa fai-
repouso por períodos curtos, analgésicos não narcó- xa etária do que a doença degenerativa do disco, fato
ticos, antiinflamatórios não hormonais, fisioterapia e observado durante o ato operatório, onde os discos são
psicoterapia de apoio quando necessário. de consistência firme e aderidos às faces dos corpos
vertebrais145. O deslocamento traumático da epífise
Tratamento Cirúrgico anular pode facilitar o desenvolvimento da hérnia do
disco, geralmente na margem inferior do corpo ver-
Deve-se considerar cirurgia apenas se houver com- tebral de L4, em virtude de as forças de torção e de
pressão mecânica do nervo espinhal ou cauda eqüina tração serem maiores nessa região. Outra causa para o
por instabilidade segmentar com pseudo-artrose ou se desenvolvimento da hérnia é a discite espontânea ju-
existir déficit neurológico progressivo secundário à evo- venil, rara, de origem hematogênica, secundária à in-
lução natural da doença degenerativa da coluna lombar. fecção distante da coluna vertebral. A infecção inicia-
Pseudo-artrose é uma complicação secundária a se no núcleo pulposo, com envolvimento secundário
falhas técnicas do procedimento cirúrgico ou a defi- da epífise anular e em sua inserção localizada na face
ciências biológicas do paciente e consiste em fusão do corpo vertebral. A espondilolistese displásica ou
incompleta de duas interfaces ósseas, podendo ser ístmica é a entidade congênita da espondilolistese e
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

pode ocasionar o início do processo degenerativo do of the American Association of Neurosurgeons, Park
disco intervertebral, geralmente nas vértebras de L5 e Ridge, Ill.; 1997, chap. 19, p. 355-71.
S1, devido ao desequilíbrio biomecânico do segmento 2. Hardy RW. Extradural cauda eqüina and nerve root
somático. Outras anormalidades estruturais da coluna compression from benign lesions of the lumbar spi-
vertebral podem desencadear a doença degenerativa ne. In: Youmans JR. Neurological surgery. 4. ed.
Philadelphia: WB Saunders; 1996, v. 3, chap. 103,
do disco intervertebral, como a espinha bífida oculta,
p. 2357-74.
a lombalização da vértebra S1 (móvel), a sacralização
3. Maroon JC. Current concepts in minimally invasive
da vértebra L5 (fixa) e a estenose congênita do canal discectomy. Neurosurg. 2002;51(Suppl 2):S137-45.
vertebral. Os níveis segmentares mais freqüentes das 4. Gobo DJ. Localization techniques: neuroimaging and
hérnias do disco são nos espaços intervertebrais de L4- electroencephalography. In: Greenblatt SH, editor. A
L5 e L5-S1 e os diagnósticos diferenciais são similares history of neurosurgery. Publications Committee of
aos do adulto: discite; neoplasia; espondilolistese. the American Association of Neurosurgeons. Park
O sintoma mais importante da hérnia de disco no Ridge, Ill.; 1997, chap. 14, p. 223-46.
período da infância e da adolescência é a lombalgia, 5. Jaikumar S, Kim DH, Kam AC. History of minimally
raramente fator limitante às atividades diárias habi­ invasive spine surgery. Neurosurg. 2002;51(Suppl
tuais, porém, quando persistente e recorrente, deve 2):1-4.
ser investigado com exames de imagem, devido à 6. Gogan WJ, Fraser RD. Chymopapain. Spine.
possibilidade de doença neoplásica ou infecciosa. A 1992;17(4):388-94.
manifestação clínica mais freqüente da hérnia do dis- 7. Sazy JA, Sherk HH. Laser surgery. In: White AH,
co é a lombalgia, geralmente aguda e incapacitante, editor. Spine care: operative treatment. St. Louis:
associada ao espasmo da musculatura da região lom- Mosby-Year Book; 1995, v. 2, chap. 76, p. 1046-54.
bar e, quando persistente, tende a retificar a lordose 8. An HS, Anderson PA, Haughton VM, Iatridis JC,
fisiológica lombar, ocasionar escoliose e claudicação Kang JD, Lotz JC, et al. Introduction: disc degenera-
tion: summary. Spine. 2004;29(23):2677-78.
da marcha. Dor ciática e déficits sensitivo e motor
não são achados comuns como nos adultos. Durham 9. Deyo RA, Rainville J, Kent D. What can the history
and physical examination tell us about low back
et al.146 analisaram 29 pacientes operados entre as pain? JAMA. 1992;268(6):760-6.
idades de 12 e 17 anos (média de 15 anos de idade),
10. Margarido MS, Kowalski SC, Natour J, Ferraz MB.
não havendo predominância de sexo, apresentando Acute low back pain: diagnostic and therapeutic
sintomatologia de 2 semanas a 3 anos (média de 8,9 practices reported by Brazilian rheumatologists. Spi-
meses) de evolução prévia à cirurgia, havendo, na ne. 2005;30(5):567-71.
maioria dos casos, relato de trauma na história rela- 11. Furlan AD, Van Tulder M, Cherkin D, Tsukayama H,
cionada geralmente às atividades desportivas. Lao L, Koes B, et al. Acupuncture and dry-needling
A investigação por imagem deve incluir radiografias for low back pain: an updated systematic review wi-
dinâmicas da coluna lombar, em decorrência de associa- thin the framework of the Cochrane Collaboration.
ção de doenças estruturais da coluna vertebral e RNM. Spine. 2005;30(8):944-63.
O tratamento não cirúrgico segue os princípios já 12. Cunningham LS, Kelsey JL. Epidemiology of mus-
descritos para o adulto e deve ser sempre tentado; an- culoskeletal impairments and associated disability.
tes, porém, ao contrário do adulto, a resposta é pior Am J Public Health. 1984;74(6):574-9.
em relação à melhora dos sintomas. Persistindo a dor 13. Glaser JA, Keffala V, Spratt K. Weather conditions
and spinal patients. Spine. 2004;29(12):1369-73.
e ocorrendo déficit neurológico, deve-se indicar e rea­
lizar a cirurgia. As modalidades e técnicas cirúrgicas 14. Frymoyer JW, Cats-Baril, WL. An overview of
the incidences and costs of low back pain. Orthop
são as mesmas efetuadas nos adultos. Não há estudos Clin N Am. 1991;22(2):263-71.
quanto aos procedimentos intradiscais. 15. Bigos S, Boyer O, Braen G. Acute low back problems
De modo geral, os resultados cirúrgicos são me- in adults: assessment and treatment. Clinical practice
lhores nessa faixa etária do que nos adultos, porém guideline. Quick reference guide for clinicians (14).
são necessários muitos anos de acompanhamento clí- US Deparment of Health and Human Sevices. Public
nico para a confirmação desses resultados145. Os tra- Health Service. Agency for Health Care Policy and
tamentos cirúrgicos para a doença do disco interver- Research, AHCPR. Pub. 95-0643, December, 1994.
tebral nessa faixa etária não predispõem à dor lombar 16. Greennough MA, Fraser RD. The effects of com-
crônica e também não prejudicam o estado de saúde pression on recovery from low-back injury. Spine.
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Acesso Cirúrgico Anterior às
Hérnias de Disco Cervicais
Mario Pena Dias

INTRODUÇÃO pressão das estruturas nervosas adjacentes, sendo a


causa mais comum das cervicobraquialgias.

A
herniação do núcleo pulposo dos discos in-
tervertebrais cervicais é uma afecção comum
na prática clínica, sendo a principal causa de EPIDEMIOLOGIA
cervicobraquialgia entre a população economicamen- Estima-se que 1% a 2% da população que procura
te ativa. Entretanto, apenas um pequeno número de os hospitais gerais em algum momento da vida o faça
pacientes necessita submeter-se a tratamento cirúrgi- em decorrência da sintomatologia determinada por uma
co para alívio da sintomatologia, uma vez que a dor hérnia de disco cervical. Proporcionalmente, a preva-
radicular tende a melhorar em aproximadamente 96% lência em relação às herniações lombares é de 1:6.
dos casos, desde que instituídos tratamento medica- As hérnias de disco cervicais podem se manifes-
mentoso e fisioterápico adequados. tar em qualquer idade e não há predileção de sexo. A
O acesso cirúrgico por via anterior para tratamen- exceção são as hérnias discais associadas à doença
to da hérnia de disco cervical, desde Smith-Robson espondilótica cervical, em que a incidência é maior
(1955) e Cloward (1958), ganhou popularidade cres- acima dos 50 anos e o sexo masculino é notadamente
cente, tornando-se uma via cirúrgica bastante segura, mais acometido.
embora exija do cirurgião domínio importante sobre Não há prevalência maior em relação aos vários
a anatomia do pescoço, pois trata-se de uma região grupos raciais, sendo novamente a exceção as hérnias
rica em vasos (carótida, jugular e seus ramos), ner- de natureza degenerativa, que apresentam maior inci-
vos como vago e seus ramos, laríngeo superior e la- dência na raça amarela, seguida pela caucasiana (indo-
ríngeo recorrente inferior e medialmente as vísceras europeus). A raça negra, comparativamente, é pouco
(faringe-esôfago, laringe-traquéia), além das glân- afetada pelas herniações de cunho degenerativo.
dulas tireóide e parótidas. Deve-se considerar como
opção de tratamento cirúrgico da hérnia discal cervi-
cal lateral ou extraforaminal o acesso ântero-lateral
ETIOLOGIA
à coluna cervical, tão bem estudado por Verbiest e As hérnias de disco cervicais podem ser de etio-
posteriormente, entre outros autores, por Bernard logia traumática e degenerativa, associadas ou não a
George. doença espondilótica da coluna vertebral.

DEFINIÇÃO Etiologia Traumática


A hérnia de disco cervical consiste na alteração Os traumatismos mais comumente encontrados
anatômica do disco intervertebral por processo de- são provocados por acidentes automobilísticos, que-
generativo ou traumático, levando à deformação ou das (acidentes de trabalho e quedas da própria altura)
ruptura do ânulo fibroso e conseqüente protrusão ou e esforços em tração dos membros superiores, geral-
extrusão do núcleo pulposo, o que resulta na com- mente relacionados a levantamento e manipulação de
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

pesos. A prática inadequada de esportes é causa menos que a medula espinhal possa se acomodar diante de
comum, mas também observada. uma herniação discal; portanto, os que apresentam
estreitamento congênito do canal raquiano estão pre-
Etiologia Degenerativa dispostos à mielopatia causadas por hérnias discais.
A compressão medular cervical por hérnia discal
Não foi estabelecido, até o momento, qualquer pa- traumática pode levar à instalação aguda de síndrome
drão de transmissão genética ou tendência familiar na de secção medular completa ou incompleta, quadro
manifestação das hérnias discais de caráter degene- clínico conhecido como choque medular. O acometi-
rativo, embora se admita uma predisposição indivi­ mento neurológico agudo traduz um quadro de disfun-
dual, ou constitucional, que tornaria o indivíduo mais ção medular devido ao impacto do trauma, em que se
suscetível à degeneração discal e ao aparecimento das instala processo inflamatório edematoso e alterações
hérnias. Se ela está vinculada a falha de natureza bio- circulatórias no parênquima medular. À medida que
química ou estrutural geneticamente determinada é regride, os déficits neurológicos tendem a melhorar
ainda objeto de especulação. Indivíduos teoricamen- em proporção variável, dando lugar a um quadro clí-
te predispostos desenvolveriam doença degenerati- nico que pode caracterizar uma lesão centromedular,
va discal em idade mais precoce quando expostos a ou outras síndromes medulares incompletas (Brown-
fatores ambientais desfavoráveis. Do ponto de vista Sèquard, síndrome da artéria espinhal anterior). Even-
estritamente etiológico, entretanto, essa relação ainda tual e excepcionalmente, o quadro clínico de choque
não pode ser estabelecida. medular pode evoluir para a recuperação neurológica
completa na presença de uma herniação discal.
QUADRO CLÍNICO Em situações crônicas associadas à espondilose, a
A herniação discal pode comprimir as raízes ner- compressão gradual da medula espinhal por hérnias de-
vosas e/ou a medula espinhal em nível cervical, deter- generadas e complexos osteofitários leva à instalação
minando quadro clínico compatível com radiculopa- insidiosa da mielopatia, de expressão clínica variá­vel.
tia, mielopatia ou mielorradiculopatia. A associação com cervicobraquialgia é comum, carac-
Na radiculopatia cervical, a cervicobraquialgia é o terizando mielorradiculopatia espondilótica à medida
sintoma mais freqüente e mais evidente, seguido por que o processo degenerativo se torna crônico.
alterações sensitivas e motoras relacionadas ao der-
mátomo e miótomo correspondentes à raiz afetada. SEMIOLOGIA
A ocorrência de déficit neurológico sensitivo ou motor
Nas hérnias discais cervicais, o nível mais comu-
depende da intensidade e da persistência da compres-
mente acometido é o C5-C6, com compressão da raiz
são, que determinam quadros de radiculite variáveis.
de C6, seguido pelos níveis C6-C7 e C4-C5, com
Na fase inicial da crise é comum o paciente referir compressão das raízes de C7 e C5, respectivamente.
dor lancinante no pescoço e na porção proximal da
A compressão da raiz de C6 acarreta cervicobra-
extremidade superior, que piora com o esforço (tossir,
quialgia irradiada pela face lateral do membro supe-
espirrar, evacuar, levantar peso) e melhora com postu-
rior, até o polegar. Se houver acometimento motor,
ras antálgicas, como flexão do pescoço homolateral-
este se traduzirá por diminuição de força à flexão e
mente, flexão do membro superior posteriormente ao
extensão do antebraço e extensão do punho e do pole-
pescoço, homolateralmente à dor e, por último, com a
gar, com hiporreflexia profunda bi e tricipital.
imobilização do pescoço. O quadro álgico poderá vir
acompanhado por parestesias no membro afetado. Na A compressão da raiz de C7 resulta em dor irra-
evolução, a cervicobraquialgia tende a diminuir lenta diada pelo terço médio do membro superior, em di-
e progressivamente, havendo remissão espontânea da reção aos dedos indicador e médio. Pode haver aco-
crise em um período variável entre 30 e 90 dias, na metimento dos extensores do punho e dos dedos, bem
maior parte dos casos. A recorrência do quadro do- como dos pronadores e supinadores do antebraço,
loroso é freqüente quando o acometimento radicular com hiporreflexia estilorradial.
é provocado por doença espondilótica, em que a pre- O acometimento da raiz de C5 leva a cervicobra-
sença de osteófitos marginais e barras osteofitárias quialgia irradiada para o ombro e metade lateral do bra-
tende a tornar crônico o processo inflamatório. ço. Fraqueza muscular pode ocorrer à abdução do bra-
As hérnias de disco cervicais podem se deslocar ço e flexão do antebraço, com hiporreflexia bicipital.
em sentido mediano e posterior e determinar com- Dor irradiada pela borda medial do antebraço e da
pressão da medula espinhal, caracterizando quadro mão em direção aos dedos anular e mínimo traduz
de mielopatia cervical. A mielopatia se instalará mais acometimento da raiz C8 e herniação C7-T1, menos
facilmente quando existir um canal raquiano estreito comum.
congênito, pois, quanto menor for o diâmetro ântero- No choque medular, o paciente apresenta altera-
posterior do canal raquiano, menor será o espaço para ções motoras e sensitivas abaixo do nível da lesão,

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com freqüente acometimento esfincteriano. Na mielo- –– Acesso anterior.


patia espondilótica a apresentação usual é um quadro –– Acesso posterior.
insidioso de tetraparesia e liberação piramidal global, –– Acessos ântero-laterais.
com hipotonia em membros superiores e espasticida- –– Acessos combinados (posterior e anterior).
de nos inferiores, provocando alterações na marcha
(parética-espástica). A cervicobraquialgia que se as-
socia ao quadro nas mielorradiculopatias espondilóti- Acesso Cirúrgico Anterior (C3-T1)
cas tem caráter insidioso e multirradicular, com crises Considerações Gerais
variáveis em localização e intensidade da dor.
Descompressão anterior e descompressão ântero-
lateral subaxial são procedimentos freqüentemente
DIAGNÓSTICO indicados em várias condições clínicas que provocam
A anamnese detalhada e o exame neurológico compressão ventral das raízes cervicais ou da me-
pormenorizado são fundamentais no diagnóstico das dula. Essas condições incluem hérnia discal aguda,
hérnias de disco cervicais, tanto no que se refere à e as degenerativas, neoplasias ventrais e ventrolate-
natureza e instalação da lesão quanto à determinação rais e processos infecciosos. Embora seja um pro-
do nível radicular ou medular acometido e sua inten- cesso cirúrgico que provoque boa descompressão e
sidade. Escalas funcionais podem ser utilizadas para relativamente seguro, suas complicações são bastante
apreciação clínica das mielopatias. As de Frankel e da sérias. A melhor maneira de evitá-las consiste, como
ASIA são as mais utilizadas. em qualquer outro ato cirúrgico, em estabelecer cor-
Avaliação diagnóstica complementar envolve o retamente o plano cirúrgico – realizando “a cirurgia
estudo radiológico da lesão para a qual a ressonân- certa para o paciente certo”. Portanto, devemos nos
cia nuclear magnética (RNM) é o exame de eleição. valer, na indicação cirúrgica, da avaliação completa
Radiografias simples e dinâmicas da coluna cervical, do paciente, desde história, exame clínico aos exames
bem como mielografia e tomografia computadorizada radiológicos e laboratoriais de que se dispõe.
são exames complementares e não excludentes. O acesso anterior à coluna cervical subaxial é
As radiografias simples e dinâmicas são úteis por observado tendo-se como elemento-chave o múscu-
ocasião do trauma para apreciação de fraturas e liste- lo esternocleidomastóideo, que, juntamente com os
ses dos corpos vertebrais. A diminuição dos espaços músculos digástrico e omo-hióideo, vão formar o
intervertebrais na incidência em perfil sugere a pre- triângulo carotídeo. É o procedimento mais indicado
sença de hérnia traumática. Nos processos degenera- nas discectomias anteriores, corpectomia, fusão e ins-
tivos, o achado radiológico revela osteófitos e barras trumentação da coluna cervical.
osteofitárias reduzindo o diâmetro do canal raquiano A descompressão ântero-lateral está indicada para
(perfil) e dos forames intervertebrais (oblíquas). procedimentos na artéria vertebral, discectomias ex-
Na mielografia, a presença da hérnia discal deter- traforaminais e alguns tumores ventrais ou ventrola-
mina imagem negativa na coluna de contraste pos- terais.
terior aos corpos das vértebras (perfil) e ausência da Dentro da literatura, entre outras técnicas utiliza-
imagem correspondente às raízes nos forames inter- das (como de Hodgson), a mais conhecida é a Ver-
vertebrais (oblíquas). Detalhamento do conteúdo do biest, que, ao longo dos anos, apresenta algumas
canal raquiano e forames intervertebrais pode ser modificações (Bernard George). Trata-se de proce-
obtido com mielotomografia, sobretudo nos cortes dimento semelhante ao acesso anterior, porém com
axiais e com reconstrução sagital. afastamento medial do feixe vasculonervoso, expo-
A ressonância magnética permite melhor visuali- sição no sentido látero-medial do músculo longo do
zação de protrusões dos discos, lesões ligamentares e pescoço ipsilateral ou mesmo sua dissecção, facili-
acometimento da medula espinhal, no caso das mie- tando a visualização da lamela costotransversa que
lopatias. As incidências sagitais em T1 e T2 mostram forma o teto do forame transverso por onde passa a
diminuição da coluna liquórica posteriormente aos artéria vertebral.
corpos das vértebras no local da herniação, com di-
minuição do diâmetro ântero-posterior do canal ra- Pré-operatório
quiano. Nas mielopatias, o acometimento medular se
traduz por imagem caracterizada por hipointensidade Paciente estará posicionado na mesa cirúrgica em
de sinal em T1 e hiperintensidade em T2. decúbito dorsal, com pescoço em extensão suave. A
hiperextensão em pacientes com comprometimento do
TRATAMENTO canal vertebral deverá ser evitada pelo anestesista no
momento da intubação, o que poderá provocar, nesses
• Clínico. casos, piora do quadro neurológico. Alguns autores
• Cirúrgico: descrevem, como medida de segurança, a extensão do
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

pescoço durante 30 minutos, no tempo pré-cirúrgico; multinível (acima de três níveis), a incisão na pele
caso não haja piora dos sintomas sensitivo-motores, será longitudinal, observando-se o bordo anterior do
a cirurgia poderá ser realizada com segurança, com músculo esternocleidomastóideo ipsilateral.
pescoço em hiperextensão. Após abertura da pele e subcutâneo, o músculo pla-
Fitas adesivas ou esparadrapo deverão ser coloca- tisma é exposto com dissecção do plano subcutâneo
das nos ombros, provocando sua tração. Esse proce- craniocaudal (Fig. 48.2). Ramos da veia jugular ex-
dimento facilita a visualização das vértebras cervicais terna poderão ser observados. Se necessário, deverão
mais baixas, tanto no acesso cirúrgico como na radios- ser ligados ou cauterizados, para evitar sangramento.
copia. Uma tração excessiva dos ombros poderá pro- Tanto o músculo platisma como a fáscia superficial,
vocar lesões ao nível do ombro e do plexo braquial. que envolvem o músculo esternocleidomastóideo, se-
Deve-se observar ou mesmo palpar o pescoço, rão divididos longitudinalmente. (Fig. 48.3). Quanto
à procura dos relevos anatômicos, como: C3C4 – mais extensa a dissecção da fáscia, maior será a expo-
corresponde ao osso hióide; C4C5 – cartilagem da sição das estruturas profundas (Fig. 48.4).
tireóide; C6 tubérculo carotídeo (processo de Chas- Após a abertura da fáscia superficial e o afasta-
saignac), ou utilizar material metálico (como agulha mento lateral do músculo esternocleidomastóideo,
longa), posicionado ântero-lateralmente ao pescoço observaremos a fáscia pré-traqueal que envolve os
com realização da radioscopia, o que orientará quanto músculos da porção inferior do hióide, cujo represen-
ao nível da incisão. A marcação da pele para efeito de tante principal é o músculo omo-hióideo, feixe vascu-
incisão será realizada com caneta cirúrgica ou similar lonervoso e vísceras. Esse espaço é chamado de tri-
(Fig. 48.1). ângulo carotídeo. A fáscia pré-traqueal será dissecada
com tesoura romba no sentido longitudinal, liberando
o músculo omo-hióideo, que poderá ser afastado ou
seccionado. Os vasos tireóideos poderão ser ligados
e isolados.
Após ligadura ou afastamento dessas estruturas,
abre-se um espaço entre as estruturas da linha média
(faringe - esôfago, laringe - traquéia) e a bainha da
carótida, de situação lateral. Nesse momento o cirur-
gião, com o dedo indicador, palpa a porção anterior
da coluna vertebral, deslizando o dedo em sentido
longitudinal, craniocaudal, para soltar os tecidos mo-
les e poder introduzir afastadores rombos em posição
lateral e medial, anterior à coluna cervical, deslocan-
do respectivamente a artéria carótida ipsilateral e as
vísceras (Fig. 48.5).
Visualiza-se a fáscia pré-vertebral recobrindo os
músculos longos do pescoço, que são observados por
Fig. 48.1 – Marcação na pele (lado direito do pescoço) do transparência, assim como o ligamento anterior, dis-
nível da incisão, sob controle radioscópico. cos e corpos vertebrais. Na linha média, a fáscia pré-
vertebral será seccionada em sentido cranial e caudal,
até a exposição do disco e corpos vertebrais subja-
Intra-operatório centes. Seu descolamento do ligamento anterior será
feito através de gaze montada em uma pinça Kelly
O acesso cirúrgico é praticado, preferencialmente, Halis, até que os bordos mediais dos dois músculos
pelo lado direito do pescoço, o que tornará a cirurgia longos do pescoço fiquem bem expostos. Alocamos
mais fácil para o destro. A complicação mais temida os nossos afastadores rombos e introduzimos uma
no acesso pela face anterior direita do pescoço é a le- agulha no disco-alvo (Fig. 48.6). Retiram-se os afas-
são do nervo laríngeo recorrente inferior. Felizmente, tadores rombos e faz-se o controle com radioscopia.
essa complicação é rara (cerca de 1% dos casos). O Há autores que realizam essa marcação após disse-
acesso cirúrgico realizado pelo lado esquerdo não en- car o bordo medial dos músculos longos do pescoço
contraria essa barreira, contudo poderia ocorrer lesão e introduzir afastadores com gaze. Acreditamos que
do ducto torácico, quando o objetivo forem vértebras a opção anterior para a marcação do nível desejado
mais baixas. produza imagens de melhor qualidade e evite um des-
Sempre que possível, a incisão transversa para o colamento extenso desnecessário dos músculos lon-
acesso até três níveis é a preferencial, observando-se gos do pescoço, principalmente em pescoços curtos,
as linhas de força na pele, para melhor resultado cos- grossos e em níveis cirúrgicos baixos (C6C7 C7T1).
mético. Em pacientes com pescoço mais curto e lesão Após esse controle radiológico (quando não for pos-

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sível, fazer radiografia), faz-se uma pequena janela


no disco desejado, para “não perder” a marcação. O
descolamento em sentido lateral do bordo medial dos
músculos longos do pescoço é realizado com bisturi
bipolar e/ou cureta tipo Cobb.
A seguir colocam-se os retratores denteados (Fig.
48.7) presos no espaço entre o músculo longo do pes-
coço e o corpo vertebral, nas posições lateral e me-
dial, promovendo a distração das estruturas, sem pro-
vocar lesões nas vísceras ou artéria carótida. Uma vez
exposta a coluna vertebral (Fig. 48.8), o ligamento
anterior é ressecado sobre os corpos vertebrais subja-
centes ao disco-alvo e colocam-se parafusos de Cas-
par nesses corpos, de forma alinhada, com penetração
deles no meio do corpo vertebral. Esses parafusos
receberão o afastador de Caspar, que produzirá a dis- Fig. 48.4 – Exposição dos planos mais profundos após
tração do espaço discal desejado (Fig. 48.9). abertura da fáscia. Na ponta da pinça observa-se o músculo
omo-hióideo direito.

Fig. 48.2 – Exposição do músculo platisma. Fig. 48.5 – Visão da região anterior da coluna cervical com
os músculo longos do pescoço. Afastam-se feixes vasculoner-
vosos lateralmente e vísceras medialmente.

Fig. 48.3 – Abertura longitudinal do músculo platisma Fig. 48.6 – Determinação do disco-alvo.
acompanhando o bordo ântero-medial do músculo esterno-
cleidomastóideo.

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cadas ou mesmo brocas, de alta velocidade (drill), de


aço e diamante. Pinças de disco do tipo Love retira-
rão a maior parte do disco, curetas delicadas retas e
anguladas serão utilizadas para expor o periósteo do
bordo superior e inferior das vértebras desejadas, as-
sim como curetar o bordo posterior dessas vértebras,
descomprimindo o saco dural de fragmentos de disco;
curetas delicadas e anguladas de Kerrinson retirarão
os fragmentos profundos dos discos e osteófitos. A
abertura do ligamento longitudinal posterior será pra-
ticada com descolador apropriado, retirando-o com o
uso de pinças Kerrinson, produzindo descompressão
medial nos casos de mielopatia. Nos casos em que há
radiculopatia, a descompressão deverá dirigir-se late-
ralmente até a exposição das raízes (Fig. 48.10).
Fig. 48.7 – Retratores do tipo Caspar. A utilização do potencial evocado sensitivo-motor
é util quando se pratica essa descompressão, orien-
tando e não limitando o cirurgião quanto à forma de
abordar as estruturas mais nobres. O campo cirúrgico
estará pronto para a colocação de enxerto autógeno
(zona doadora → ilíaco) ou exógeno (hidróxido de
apatita e similares), ou próteses intersomáticas e pla-
ca cervical anterior de materiais sintéticos. O contro-
le radioscópico é realizado durante todo o tempo de
colocação e fixação desses materiais. O fechamento
dos músculos platisma e subcutâneo será feito após
revisão da hemostasia. É aconselhável a utilização de
drenos. No fechamento da pele, o aspecto cosmético
deverá ser observado.

Fig. 48.8 – Região anterior da coluna cervical com afasta-


mento dos músculos longos do pescoço.

Fig. 48.10 – Visualização do saco dural descomprimido.

COMPLICAÇÕES INTRA-OPERATÓRIAS
As complicações intra-operatórias no acesso à co-
luna cervical estão relacionadas com:
Fig. 48.9 – Parafusos do tipo Caspar inseridos nas vértebras • dificuldade no uso de material para dissecção
e espaço discal interposto.
das estruturas anatômicas.
Na realização da discectomia será utilizado o mi- • inabilidade na colocação dos retratores, princi-
croscópio cirúrgico ou, caso nao seja possível, lupa palmente os denteados.
cirúrgica. A discectomia é praticada com curetas deli- • desconhecimento anatômico da região cervical.

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O edema da laringe, provocado pela dificuldade COMPLICAÇÕES PÓS-CIRÚRGICAS


de intubação anestésica ou hiperextensão do pesco-
ço, é a complicação mais freqüente no período pós- As complicações pós-cirúrgicas mais comuns
cirúrgico, geralmente revertida com corticóides. Nos estão relacionadas a hematomas, infecções pós-
casos extremos, poderá haver necessidade de traque- operatórias, colocação de enxerto e descompressão
ostomia, por tempo relativamente longo. insuficiente.
A lesão direta da laringe/traquéia, provocada pelos
afastadores ou pela dissecção cirúrgica, é menos ha- Hematomas
bitual e deverá ser reparada de imediato.
Os hematomas pós-cirúrgicos estão relacionados
A disfagia quase sempre está relacionada com com hemostasia intra-operatória deficiente. Para evi-
edema local. O sintoma desaparece, geralmente, em tar sua formação, devemos realizar uma hemostasia
alguns dias, sem procedimento especifico; caso isto
cuidadosa e colocar o dreno a vácuo no espaço pré-
não ocorra, há necessidade de investigação mais
vertebral até débito negativo.
aprofundada.
Caso o hematoma seja pequeno, não provocando
A mais temida das lesões, e nem sempre percebi-
da de imediato, é a perfuração da parede do esôfago, distúrbios de respiração e deglutição, a conduta será
provocada pela dissecção ou colocação dos retratores expectante; caso contrário, haverá necessidade de re-
denteados. Para evitá-la, indica-se ressecção romba e abordagem cirúrgica.
colocação dos afastadores denteados entre os múscu-
los longos do pescoço e a vértebra. Quando esta ocor- Infecções Pós-operatórias
rer, deverá ser suturada de imediato. A ferida cirúrgica
A infecção pós-operatória ocorre em cerca de
será drenada. O uso da sonda nasogastrica é obrigató-
1,5% a 2% dos casos.
rio, sendo mantida, no mínimo, por 7 a 10 dias.
A lesão mais freqüente do feixe vasculonervoso é O agente etiológico mais freqüente dessas infec-
a que compromete os nervos laríngeo superior e larín- ções é o Staphylococcus sp. O diagnóstico é realizado
geo recorrente inferior (ramos do nervo vago). O ramo por exames laboratoriais e de imagem. Seu tratamen-
laríngeo superior atravessa o campo cirúrgico com a to é feito com antibióticos e, nos casos em que há
artéria tireóidea superior (ramo da artéria carótida ex- coleção purulenta, será necessária a limpeza cirúrgica
terna) para inervar o músculo cricotireóideo. Sua lesão com colocação de dreno.
provocará, principalmente, dificuldade na emissão das Fístula: a principal é a esofágica, porém não se
notas altas e voz fatigada. Como medida preventiva, a pode esquecer da traqueal e/ou liquórica. Os sinais
ligadura da artéria tireóidea superior deverá ser o mais de lesão esofágica são, na maioria dos casos, tardios,
distante possível da glândula tireóidea. em torno do 15o dia cirúrgico, evoluindo com fístula
O ramo laríngeo recorrente inferior apresenta va- e abscesso local, mediastinite ou mesmo septicemia.
riação anatômica: no lado esquerdo, o nervo faz um A presença de massa no local cirúrgico com crepita-
laço abaixo do arco da aorta e fica protegido pela ca- ção à palpação sugere perfuração esofágica. Há de
lha esofagotraqueal; à direita, ele atravessa ao redor da se confirmar o diagnóstico por radiografia cervicoto-
artéria subclávia, passando dorsomedialmente ao lado rácica, endoscopia ou tomografia computadorizada
da traquéia e do esôfago, estando, nessa passagem, pós-deglutograma. O tratamento implica antibiotico-
desprotegido. A dissecção do plano entre esôfago e terapia, reabertura do local cirúrgico, fechamento da
traquéia deverá ser evitada, pois poderá trazer lesão perfuração esofágica, drenagens local e nasogástri-
do nervo laríngeo recorrente inferior, a qual acarretará ca, que deverão ser realizadas por equipe cirúrgica
dificuldade de deglutição e alteração na voz. especializada.
A lesão do nervo vago é rara, estando relaciona- Meningite e abscesso epidural são raros e estão re-
da com dissecção da artéria carótida e seus ramos. A lacionados com a lesão da dura-máter.
lesão do plexo simpático poderá ocorrer nas exposi-
ções mais laterais, ocasionando síndrome de Claude
Bernard-Horner.
Colocação de Enxertos
Lesões da artéria carótida e veia jugular interna O deslocamento do enxerto autógeno, ou não, nas
estão relacionadas com a dissecção intempestiva ou corpectomias e discectomias, provocará desde disfa-
colocação errada dos afastadores. Lesão da artéria gia até perfuração esofágica com expulsão do enxerto
vertebral é mais freqüente no acesso ântero-lateral da por via oral. A pseudo-artrose indica uma deficiência
coluna cervical. Raramente ocorre no acesso anterior, técnica na interposição e fixação do enxerto aos cor-
podendo estar relacionada à remoção óssea vertebral pos vertebrais. Essa situação levará a uma alteração
muito lateral ou dissecção agressiva do músculo lon- biomecânica da coluna cervical com a presença ou
go do pescoço. não de sinais clínicos.
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Descompressão Insuficiente Allred CD, Sledge JB. Irreducible dislocations of the cervi-
cal spine with a prolapsed disc – preliminary results
Geralmente produz a persistência dos sinais clíni- from a treatment technique. Spine. 2001;26(17):1927-
cos, assim como formação de osteófitos e alteração 31.
biomecânica da coluna cervical. Barros T, Taricco M, et al. Hérnia discal traumática da
coluna cervical. Rev Hosp Clin Fac Med S Paulo.
CONCLUSÃO 1991;46(6):276-9.
Chiu J, Clifford T et al. Percutaneous microdecompres-
A discectomia cervical anterior, com ou sem fusão, sive endoscopic cervical discectomy with laser ther-
é um procedimento consagrado na rotina da cirurgia modiskoplasty. The Mount Sinai Journal of Medi-
de coluna e sua evolução pós-operatória será tranqüi- cine. 2000;67(4):278-82.
la desde que alguns preceitos sejam observados: Cho D, Liau W, et al. Preliminary experience using a poly-
• Seleção pré-operatória do paciente realizada etheretherketone (PEEK) cage in the treatment of cer-
de forma adequada, compreendendo a avalia- vical disc disease. Neurosurgery. 2002;51(6):1343-50.
ção clínica geral do paciente (exemplo: diabe- George B, Blanquet A, et al. Surgical exposure of the ver-
tes, imunossuprimidos, fumantes crônicos), tebral artery. Operative Techniques in Neurosurgery.
exame neurológico minucioso, laboratoriais e 2001;4(4):182-94.
estudo de imagem. Gómez-Gonzalez J. Discopatías cervicales. Neurol Col.
• Bom conhecimento das estruturas anatômicas 1980;4:528-32.
que compõem a região do pescoço, evitando Hamburger C, Festenberg F, et al. Ventral discecetomy
complicações cirúrgicas causadas por trauma- with PMMA interbody fusion for cervical disc dis-
tismo local. ease. Spine. 2001;26(3):249-55.
Rodrigues M, Hanel R, et al. Posterior approach for soft
Quando ocorrer sinais de complicações no pós-ope-
cervical disc herniation: a neglected technique? Surg
ratório, sua causa deverá ser determinada de imediato Neurol. 2001;55:17-22.
e tratada. Assim, complicações neurológicas pós-ope-
Schofferman J, Garges K, Goldthwaite N, Koestler M,
ratórias estão, em geral, relacionadas com descompres- Libby E. Upper cervical anterior diskectomy and fu-
são insuficiente. O estudo radiológico será realizado e, sion improves discogenic cervical headaches. Spine.
se necessário, nova abordagem cirúrgica praticada. 2001;27(20):2240-4.
A continuidade da dor cervical no pós-operatório Sherk HH, Larson SJ, et al., editors. The cervical spine:
sugere fusão óssea inadequada, e seu acompanhamento an atlas of surgical techniques. Philadelphia: JB Lip-
radiológico torna-se importante. A imobilização cervical pincott; 1994.
por colar não está indicada na discetomia em nível único. Szpalski M, Gunzburg R, editors. Coluna cervical degene-
Quando o procedimento cirúrgico ocorrer em dois ou mais rativa. Rio de Janeiro: Reichmann & Affonso Edito-
níveis, o uso do colar cervical será de 8 a 12 semanas. res; 2003.
Paciente que tenha sido submetido à discectomia Wang J, McDonough W, et al. Increased fusion rates with
cervical anterior, com ou sem fusão, será controlado clí- cervical plating for three-level anterior cervical dis-
nica e radiologicamente no prazo mínimo de 3 meses. cectomy and fusion. Spine. 2001;26(6):643-47.
Winter RB, Lonstein JW, Denis F, Smith MD. Atlas de ci-
rurgia da coluna vertebral. Rio de Janeiro: Revinter;
leitura recomendada 1999.
Alanís-Cruces JM, De la Fuente RL. Uso de nueva placa en Wirth F, Dowd G, et al. Cervical discectomy–a prospective
pacientes con discartrosis cervical. Rev Mex Ortop analysis of three operative techniques. Surg Neurol.
Traum. 2000;14(1):77-9. 2000;53:340-8.

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Estenose do Canal Lombar
Jerônimo Buzetti Milano

INTRODUÇÃO Além das alterações biomecânicas, processo in-


flamatório crônico parece estar relacionado com hi-

D
efine-se estenose do canal vertebral como pertrofia do ligamento amarelo, através do acúmulo
qualquer tipo de estreitamento do canal ver- progressivo de tecido cicatricial (fibrose)3. Tanto o
tebral per se, do recesso lateral ou do forame processo cicatricial como as alterações biomecânicas
intervertebral. O estreitamento pode ser causado por acontecem ao longo de vários anos, justificando-se
tecido conjuntivo (isto é, ligamento amarelo, disco o fato de que a maioria dos sintomas acabam por
intervertebral etc.), ósseo (osteófitos, encurtamento ocorrer tardiamente, entre a sexta e sétima décadas
de pedículos) ou por combinação de ambos. O seg- de vida.
mento lombar é o mais comumente acometido; neste,
o nível L4-L5 é o mais afetado, seguido pelo L3-L4 e,
então, L2-L3 e L5-S1, sendo raro em L1-L2. QUADRO CLÍNICO
A primeira descrição clínica da síndrome do canal A apresentação clínica clássica da estenose do canal
lombar estreito data dos anos 1950, quando Verbiest lombar lombar é a chamada claudicação neurogêni-
observou alívio dos sintomas radiculares após lami- ca, também denominada pseudoclaudicação para que
nectomia em quatro pacientes1. Mais tarde, o mesmo se diferencie da claudicação vascular (ou claudicação
autor caracterizou duas formas de estenose do canal intermitente). Caracteriza-se por desconforto uni ou
lombar: a congênita, caracterizada por pedículos cur- bilateral na região glútea, quadris, coxas e ocasional-
tos gerando diâmetros sagitais menores que 10 mm mente até pernas, desencadeado por deambulação.
(como no nanismo acondroplásico, ou de forma idio- Freqüentemente, o desconforto caracteriza-se como
pática – encurtamento congênito de pedículos), e a sensação de “peso”, “formigamento” e “fraqueza”,
forma adquirida (ou relativa), que ocorre por nature- sendo dor menos freqüente. A distância percorrida até
za degenerativa, espondilótica ou metabólica (como o início dos sintomas costuma ser variá­vel entre os
na doença de Paget, entre outras)2. Acredita-se que a dias, e inclusive na mesma caminhada. Tipicamente,
forma degerativa superimposta a uma estenose con- os sintomas melhoram lentamente com a posição sen-
gênita seja a mais comum. Com o passar do tempo, tada ou com a simples flexão anterior da coluna; da
as alterações bioquímicas que ocorrem no interior do mesma forma, exercício com a posição fletida (bici-
disco intervertebral levam à redução de sua capaci- cleta, subidas) não costumam desencadear sintomas.
dade de suporte das cargas axiais, com formação de Os pacientes podem desenvolver a chamada “postura
fissuras anulares, protrusões discais e osteófitos. A antropóide”, com flexão exagerada a fim de se rever-
redução da altura do disco intersomático acarreta mu- ter a lordose lombar, abrindo o canal, aumento do
danças biomecânicas significativas, com transferên- fluxo sangüíneo, aliviando temporariamente os sinto-
cia de cargas axiais para os elementos posteriores. A mas. Um estudo recente demostrou que a carga axial
sobrecarga facetária gera erosão articular, frouxidão foi mais importante que a posição no aparecimento de
capsular e subseqüentes hipertrofia facetária e forma- sintomas4; na prática, as duas costumam ser relatadas
ções osteofitárias. como fatores desencadeantes.
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Acredita-se que a claudicação neurogênica seja


causada por uma isquemia relativa das raízes lomba-
res, uma vez que a demanda metabólica encontra-se
aumentada durante os exercícios, enquanto o supri-
mento sangüíneo sofre redução dada a compressão
das raízes lombares pelas estruturas adjacentes.
Embora dor lombar e/ou radicular esteja presente
em cerca de metade dos pacientes, não costuma ser
sintoma preponderante, e os sinais radiculares clássi-
cos podem estar ausentes. Quando ocorre dor lombar
significativa, deve-se chamar a atenção para a pos-
sibilidade de instabilidade segmentar (por exemplo,
na espondilolistese degenerativa). Comprometimento Fig. 49.1 – Investigação por radiografia simples. Esquerda:
vesical subclínico é freqüente e deve ser sempre in- espondilolistese de L4 sobre L5. Direita: incidência oblíqua re-
vestigado, visto que apresenta índices piores de recu- velando ruptura da pars interarticularis (espondilolise).
peração de quando crônicos.
O diagnóstico diferencial deve ser feito em espe-
identificação de defeitos na pars é possível. A injeção
cial em relação à claudicação vascular. Nesta, os sinto- de contraste hidrossolúvel no saco tecal (“mielotomo-
mas são causados por isquemia de grupos musculares grafia”) é provavemente o exame de maior acurácia
solicitados durante atividade física. Outras entidades para diagnóstico da estenose do canal, porém tem sua
clínicas que podem simular a claudicação neurogêni- utilização reduzida por ser método mais invasivo (as-
ca incluem bursite trocantérica, artrite degenerativa sim como a mielografia clássica).
(quando envolve articulações coxofemorais), neu-
A imagem por ressonância magnética tem sido o
ropatias periféricas (como diabetes mellitus), com-
método de escolha para o diagnóstico da estenose do
pressão por tumores intra-espinhais ou metastáticos
canal lombar (Fig. 49.2). Possui as vantagens de não
para vértebras, hérnias discais, entre outras menos
emitir radiação, imagens em vários planos, caracte-
comuns.
rização excelente das estruturas neurais, discos e li-
Deve-se ter em mente que cerca de 20% dos pa- gamentos, além de afastar tumores e outras doenças
cientes com estenose do canal lombar apresentam es- que não seriam visíveis em tomografias; além disso,
treitamento em outro ponto do canal vertebral, isto é, dispensa o uso de contraste intratecal para visualizar
nos segmentos cervical e torácico. Sinais clínicos de o saco tecal e seu conteúdo. Mais recentemente, o uso
mielopatia devem ser sempre investigados. Na popu- da mielografia por ressonância (“mielorressonância”
lação oriental, cabe ainda citar a ossificação do liga- – Fig. 49.2) tem-se mostrado ainda mais útil, conse-
mento longitudinal posterior, que pode estar presente guindo reconstruir as imagens adquiridas de forma a
em qualquer segmento do canal vertebral. Amiloidose se isolar o conteúdo do saco tecal das demais estru-
e espondilite anquilosante devem ser lembradas como turas e permitindo melhor visualização de estenoses
potenciais contribuintes para a estenose. foraminais5. As duas modalidades apresentam limi-
tações pelas suas contra-indicações formais devido
DIAGNÓSTICO ao campo magnético (marcapassos, clipes metálicos
etc) e os artefatos de pós-operatórios com implantes
Embora a maior parte dos casos tenha diagnóstico metálicos (como parafusos pediculares). Os materiais
clínico de fácil realização, investigação complementar mais modernos, em titânio, minimizam os artefatos e
é sempre necessária para se avaliar os níveis acome- não apresentam riscos de realização de ressonância;
tidos, o grau de estenose, sua localização em um seg- esses fatos justificam seu uso rotineiro. A avalição de
mento e para o diagnóstico de doenças associadas. instabilidade do segmento por ressonância tem sido
Apesar de a identificação da estenose propriamente também estudada por meio de carga axial durante o
dita ser difícil, as radiografias simples (Fig. 49.1) devem exame6; esse método necessita ainda de validação.
ser solicitadas com o intuito de se revelar alterações Exames de neurofisiologia (como eletroneuro-
subjacentes como espondilolistese e escoliose degene- miografia) apresentam papel secundário na avaliação,
rativas. As incidências oblíquas podem identificar es- devendo ser reservados para dúvidas de diagnóstico
pondilólise (defeito na pars interarticularis), enquanto diferencial (neuropatia diabética, entre outros), e não
as radiografias dinâmicas podem revelar instabilidade necessitam ser solicitados rotineiramente. Alguns estu-
segmentar, mudando substancialmente a terapia. dos demostram superioridade em relação aos índices de
A tomografia computadorizada é o método que falsos-positivos da ressonância magnética7; entretanto,
permite a melhor caracterização das estruturas ósseas. dentro do contexto clínico, os achados de imagem ten-
O canal apresenta aspecto “em trevo” clássico, e a dem a ser suficientes para a decisão terapêutica.

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49 – Estenose do Canal Lombar

A B

C D

Fig. 49.2 – Investigação por ressonância magnética. (A) Corte sagital em T2 revelando estenose no segmento L4-L5. (B) Corte
axial do mesmo segmento. (C) Imagem de mielorressonância. (D) Corte sagital revelando espondilolistese degenerativa.

TRATAMENTO cios de flexão (de Williams) são prescritos quando há


dor facetária e espondilolistese, além da estenose do
Clínico canal lombar. Havendo patologia da coluna anterior
Pacientes com estenose do canal lombar leve a (isto é, herniação discal aguda ou colapso vertebral
moderada e oligossintomáticos podem ser tratados osteoporótico) associada, devem ser proscritos. Tera-
clinicamente com sucesso8. O tratamento medica- pia manual e exercícios físicos podem ter algum be-
mentoso pode aliviar os sintomas não apenas tempo- nefício adicional10.
rariamente, mas evitar a necessidade de uma inter- Injeções epidurais de analgésicos e corticosterói-
venção cirúrgica. Alguns autores sugerem que o uso des têm papel discutível no tratamento das dores lom-
contínuo e prolongado de antiinflamatórios não hor- bares; os resultados, em geral, são conflitantes, pois
monais (AINH) possa ter utilidade na prevenção da incluem diferentes diagnósticos num mesmo estudo,
hipertrofia do ligamento amarelo, fator importante da confundindo a avaliação dos resultados e gerando evi-
deterioração clínica3. Recentemente, demonstrou-se dência limitada no tratamento da dor por estenose do
que a gabapentina, anticonvulsivante classicamente canal lombar11. Pode-se obter alívio temporário dos
utilizado para dores de origem neuropática, foi eficaz sintomas, com uma pequena parcela de pacientes al-
na melhora dos sintomas de claudicação e das alte- cançando alívio definitivo12. Para as dores radiculares,
rações sensitivas quando acrescentado ao esquema a injeção transforaminal de corticosteróide parece ser
clássico de tratamento9. mais eficaz, pelo menos a curto e médio prazos11,13.
Em associação com o tratamento farmacológico, Embora órteses de diversos modelos venham sen-
costuma-se utilizar tratamento fisioterápico. Exercí- do utilizadas, não há dados que sustentem seu uso
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

rotineiro. Melhora temporária dos sintomas, espe- pressão intra-ocular. Embora rara, a síndrome compar-
cialmente da dor, pode ser obtida, porém às custas de timental ocular deve ser lembrada em qualquer cirurgia
atrofia muscular significativa. Para se obter imobili- espinhal, pois sua ocorrência pode ser catastrófica para
zação eficaz abaixo do segmento L3-L4, é necessária a qualidade de vida do paciente23. A face deve estar
a extensão da órtese para a coxa, sendo desconfortá- livre de pressão. Atenção especial deve ser dada para
vel a ponto de ser de difícil adesão. o posicionamento da coluna cervical; como muitos
pacientes apresentam estenose concomitante do canal
Cirúrgico cervical, estes podem merecer imobilização com colar
rígido durante anestesia, posicionamento e cirurgia.
O tratamento cirúrgico para a estenose do canal Nos membros superiores, atentar quanto à compres-
alcança grande suporte na literatura, superando os são do nervo ulnar e abdução excessiva dos ombros,
resultados com tratamento conservador14-16 e sendo complicadores do pós-operatório. Coxins devem ser
indicado para os casos que não tenham respondido posionados em pontos de pressão (mamas, espinhas
inicialmente com as terapias introduzidas. Pacientes ilíacas anteriores etc.), e o abdome deve estar livre de
com bloqueio completo em mielogramas tendem a compressão, reduzindo o retorno venoso pelo plexo de
não responder ao tratamento conservador, podendo- Batson e o sangramento epidural. A genitália masculi-
se propor cirurgia já na primeira avaliação8; isso tam- na deve ser rigorosamente checada. Ao contrário das
bém se aplica a pacientes com sintomas neurológicos cirurgias para discectomias, para as quais se preferem
mais graves. É importante citar que, uma vez indica- posições que aumentem os espaços interespinhosos,
da, a operação não deve ser postergada por período na laminectomia deve-se evitá-las, e a posição deve ser
prolongado, pois a duração dos sintomas tem impacto o mais fisiológica possível, pois compressões podem
negativo na evolução pós-operatória17,18. ser subestimadas e se tornar clinicamente relevantes
O objetivo do tratamento cirúrgico da estenose do quando o paciente retornar à posição funcional. Quan-
canal lombar é a descompressão das estruturas neu- do fusões estão planejadas, os quadris devem ser man-
rais afetadas. A operação clássica é a laminectomia19, tidos com alguma extensão, a fim de se promover uma
procedimento mais comumente indicado, que será posição lordótica mais fisiológica da coluna lombar.
agora detalhado. A identificação inicial dos níveis a serem aborda-
dos pode ser feita por radioscopia ou pela palpação
Preparo do Paciente das cristas ilíacas; em geral, o primeiro espaço a ser
palpado abaixo do nível destas é o L4-L5; variações
Seguindo as recomendações do Centro para Con- podem ser identificadas nas radiografias simples em
trole e Prevenção de Doenças (CDC, Atlanta, Estados perfil. A palpação simples costuma ser suficiente, mi-
Unidos)20, utiliza-se rotineiramente cefalosporina de nimizando-se a exposição à radiação.
primeira geração (por exemplo, cefazolina) no dia Após degermação adequada e posionamento dos
da cirurgia; a eficácia da profilaxia em dose única foi campos operatórios, pode-se lançar mão de inflitra-
confirmada por estudos recentes21. ção local com anestésico e vasocontritores para mi-
Embora anestesia espinhal com sedação tenha-se nimizar sangramento subcutâneo e muscular. Sua
mostrado segura e, possivelmente, com menos compli- utilização é discutível, pois pode aumentar o risco de
cações que a anestesia geral em cirurgias espinhais22, infecção superficial.
ainda utilizamos anestesia geral com mais freqüência.
Acreditamos que esta se justifique por dois motivos:
conforto do paciente e melhor controle respiratório Técnica Cirúrgica
em decúbito ventral, especialmente em pacientes mais Sobre os níveis previamente identificados, a pele é
idosos, que constituem a maioria. No estudo citado, incisada com lâmina de bisturi de número 10 a 12, na
a mediana de idade foi de 47 anos, diferente do que linha mediana. O sangramento subcutâneo pode ser
se observa na prática. Monitoração não invasiva, em coagulado com cautério bipolar ou Bovie. Afastador
geral, é suficiente, e monitoração eletrofisiológica não auto-estático (Weitlaner, Gelpi) pode ser posiciona-
é utilizada rotineiramente nas cirurgias puramente do, e os processos espinhosos são palpados; cautério
descompressivas. Não há necessidade de sondagem monopolar pode ser usado para dissecção através da
vesical rotineira, pois a maioria das cirurgias é de gordura subcutânea até a fáscia lombar, bem como
curta duração (exceção nas estabilizações longas ou para a exposição das pontas dos processos espinho-
deformidades associadas). Não utilizamos hipotensão sos, por toda a extensão da incisão da pele.
controlada nas cirurgias puramente descompressivas. Dá-se, então, início à dissecção dos processos es-
O posicionamento do paciente deve ser cuidadoso, pinhosos e lâminas. Esta deve ser subperiosteal, evi-
otimizando-se o procedimento e prevenindo complica- tando-se lesões musculares e sangramento excessivo.
ções. A cabeça deve ser mantida no nível ou um pouco Para tanto, pode-se utilizar o cautério monopolar ou
acima do nível do coração para se evitar aumento da descoladores do tipo Cobb, como preferimos, para se

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49 – Estenose do Canal Lombar

minimizar a coagulação tecidual; uma vez descolada


de sua inserção nos processos espinhosos, a elevação
da musculatura para-espinhal tende a ser fácil. Deve-se
dar atenção ao seguimento do plano ósseo, evitando-
se violar os espaços interlaminares e dura. A dissecção
subperiosteal deve ser percorrida através da lâmina até
a articulação; quando se planeja fusão, os processos
transversos também requerem exposição para enxertia
e posicionamento correto de parafusos. Checam-se os
níveis a serem descomprimidos, por radioscopia ou
pela palpação e identificação do sacro; esta, em geral,
é suficiente, mas a menor incerteza justifica a radios-
copia transoperatória. Deve-se lembrar que anomalias
transicionais de vértebras caudais (lombalização de
S1 ou sacralização de L5) não são infreqüentes.
Os ligamentos interespinhosos são, então, remo-
vidos acima e abaixo do nível a ser descomprimido;
os processos espinhosos são removidos com saca-bo-
cados (Goiva, Leksell); parte do processo espinhoso
do nível acima do limite superior da descompressão
muitas vezes precisa ser retirado para melhor expo- Fig. 49.3 – Ilustração da técnica de ressecção óssea preser-
sição. Descolamento cuidadoso do interespaço abai- vando-se a superfície articular
xo da lâmina mais inferior a ser retirada é realizado
com cureta delicada ou descolador do tipo Penfield
A B
ou Tönnis. Inicia-se a laminectomia com uso de pin-
ças de Kerrison, em sentido caudal-cranial; quando
a lâmina é muito espessa para a Kerrison, reduz-se
o tamanho do saca-bocados. Aderências da dura ao
ligamento amarelo e lâmina são freqüentes e devem
ser cuidadosamente descoladas com dissectores apro-
priados, evitando-se a todo custo lacerações durais.
Após descompressão adequada da linha média, pode- C D
se colocar cera óssea lateralmente para hemostasia.
Com a mesma técnica de dissecção seguida de
ressecção óssea com Kerrison, dá-se início à descom-
pressão lateral. Sempre que possível, a ressecção das
facetas articulares deve ser minimizada. Uma manei-
ra de se conseguir êxito é a ressecção do ligamento
amarelo e osteófitos que se encontram profundamente
sem ressecção superficial da articular (Fig. 49.3). As Fig. 49.4 – Aspecto cirúrgico após laminectomia. (A) Mo-
bilização da raiz nervosa e ressecção óssea com Kerrison.
pinças de Kerrison (em especial as anguladas – 45°) (B) Exploração do disco intervertebral, com protrusão exer-
podem ser introduzidas no interior do forame para cendo estenose adicional. (C) Aspecto após ampla liberação da
descompressão adicional. O uso de microscópio ci- raiz nervosa. (D) Radiografia pós-operatória.
rúrgico é útil neste momento, permitindo melhor vi-
sualização, com maior segurança. A inspeção do saco
tecal e das raízes expostas é sugestiva de uma des- Durante a descompressão, a musculatura paraver-
compressão adequada (Fig. 49.4); retorno da pulsa- tebral pode ficar retraída por longos períodos; estudos
ção da dura é um dado indicativo de êxito. Cada raiz demonstraram que retrações maiores que 60 minutos
nervosa é identificada ao longo da borda medial de podem acarretar isquemia muscular e maiores índices
cada pedículo. O disco intervertebral é, então, inspe- de dor pós-operatória24; por isso, indica-se relaxamento
cionado, assegurando-se não haver compressão adi- dos afastadores de tempos em tempos durante a descom-
cional por ele. Ao final, deve ser possível a manipu- pressão, quando se espera duração maior da cirurgia.
lação da raiz nervosa de modo a retraí-la 1 cm medial Hemostasia é, então, realizada com cautério bipo-
e lateralmente sem tensão na zona de entrada. Além lar, devendo ser rigorosa dado o sangramento que o
disso, a passagem de um probe junto à raiz dentro do plexo venoso vertebral interno promove. Agestes he-
forame neural sem resistência evidencia descompres- mostáticos (como Surgicel ® e Gelfoam®) podem ser
são adequada. auxiliares, evitando-se, sempre que possível, deixá-

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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

los sobre a dura e raízes. Dreno de sucção é deixa-


do rotineiramente para se evitar hematoma epidural A
pós-operatório. A aponeurose é aproximada com fios
absorvíveis espessos (poligalactina no 1 – Vicryl®),
sutura contínua ou pontos separados; o subcutâneo
pode ser aproximado com fio absorvível fino (2-0 ou
3-0), e a pele, com fio não absorvível 3-0 (náilon mo-
nofilamentar – Mononylon®) ou sutura intradérmica
com fio absorvível de longa duração (poliglecaprone
3-0 – Monocryl®).
A extensão da ressecção óssea é fator determi-
nante na decisão cirúrgica. Por um lado, sabe-se que, B
quanto maior a ressecção das facetas articulares,
maior o risco de instabilidade no pós-operatório. Por
outro, reconhece-se que o principal fator de insuces-
so cirúrgico é a estenose foraminal restante de uma
descompressão insuficiente25. Os exames de imagem
pré-operatórios podem auxiliar na decisão por meio
da identificação dos locais de maior compressão. A C
divisão em zonas de compressão é útil nesse sen-
tido. A Fig. 49.5 ilustra essa divisão: para casos de
compressão na Zona 1 (recesso lateral ou zona subar-
ticular), em que a compressão deve-se apenas à hi-
pertrofia da articular superior, a descompressão pela
linha média com preservação da cápsula articular
costuma ser possível com a técnica descrita, sem ris-
co adicional de instabilidade. Na estenose localizada
na Zona 2 (foraminal ou pedicular), freqüentemente
por protrusões discais associadas, pode ser necessária
descompressão mais agressiva, com maior remoção
da articulação, e muitas vezes do próprio disco inter- Fig. 49.5 – Ilustração das zonas de estenose. (A) Zona 1
vertebral, aumentando o risco de instabilidade. Nas (recesso lateral ou zona subarticular), com compressão por hi-
pertrofia da articular superior. (B) Zona 2 (foraminal ou pedi-
estenoses da Zona 3 (laterais ou extraforaminais) a cular), com protrusão discal associada. (C) Zona 3 (lateral ou
descompressão pela linha média exige remoção mui- extraforaminal), com estenose decorrene de osteófito e hiper-
to extensa da articulação. Nas situações em que des- trofia da faceta articular.
compressão mediana não é necessária, utilizamos o
acesso para-espinhal (de Wiltse). Através de incisão
mediana semelhante à descrita anteriormente, a gor-
dura subcutânea é divulsionada até a fáscia lombar.
Esse plano é separado lateralmente por cerca de 3 a 4
cm da linha mediana e, então, a fáscia é incisada no
sentido craniocaudal, sem incisão inicial da muscu-
latura propriamente dita; o simples afastamento das
bordas da fáscia incisada por afastador auto-estático
(Gelpi ou Wietlaner) costuma ser suficiente para a
identificação do plano anatômico entre os músculos
multífido e longuíssimo (Fig. 49.6). Divulsão digi-
tal desse plano leva diretamente à articular, possibi-
litando ampla exposição da zona lateral sem maior
desinserção muscular; além disso, a exposição dos
processos transversos é facilitada sem afastamento
agressivo (podendo reduzir dor pós-operatória, con-
forme citado anteriormente), possibilitando sítio de
enxertia óssea mais amplo e melhor identificação dos
parâmetros anatômicos para introdução de parafusos Fig. 49.6 – Ilustração do acesso paramediano de Wiltse. A
dissecção digital se dá entre os músculos multífido e longuís-
pediculares, além de melhor triangulação destes, nos simo, dirigindo-se diretamente para a faceta articular, sem ex-
casos de necessidade de fusão. posição da linha média.

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Há grande controvérsia a respeito da necessidade guns autores têm indicado a laminotomia unilateral
de fusão após laminectomia. Os índices de instabili- com descompressão bilateral, com resultados anima-
dade após descompressão são baixos na maioria dos dores39-40. A técnica demanda treinamento específico
estudos19,26, e os resultados clínicos são expressivos e tempo cirúrgico prolongado, e real benefício clíni-
mesmo a longo prazo27, sem necessidade de fusão; a co carece de confirmação. Entretanto, menores ma-
fusão não mostrou melhor resultado clínico em um nipulação e remoção de estruturas anatômicas deve
estudo28. Entretanto, estudos comparando a quali- ser consideradas, especialmente em pacientes idosos
dade de vida sugerem melhores resultados29-30, com e com complicações clínicas41. Não há estudos com-
índices de complicações semelhantes mesmo em pa- parando-se os métodos; os resultados e índices de
cientes idosos31. Em guideline recentemente publi- complicações parecem semelhantes, e os resultados
cado, Resnick et al. não recomendaram associar fu- com laminectomia, mesmo em pacientes, idosos são
são à descompressão em pacientes com estenose de extremamente positivos42.
canal sem evidência de instabiliade ou deformidade Outro método em discussão atualmente é a inter-
associada32. posição de dispositivos interespinhosos43. Teorica-
Na presença de espondilolistese degenerativa as- mente, a prevenção de estreitamento do canal lombar
sociada a estenose do canal lombar também há discus- à extensão seria responsável pela melhoria clínica44.
são sobre a necessidade de fusão associada a descom- Estudos comparativos apenas com tratamento con-
pressão19. Entretanto, a maioria dos estudos revelou servador revelaram bons resultados45, mantendo-se a
vantagem clínica na realização de fusão póstero- médio prazo46. As reais indicações ainda precisam ser
lateral associada a descompressão30,34; esta foi tam- determinadas43, e não dispomos de experiência com
bém a recomendação do mesmo guideline já citado33. essa técnica.
Discute-se a necessidade de suplementação da fusão
póstero-lateral com parafusos pediculares; embora se
tenha considerado evidência Classe III (indicando-se Pós-operatório
apenas para instabilidade pré-operatória ou iatrogê- Não há consenso quanto aos cuidados pós-opera-
nica), esse guideline avaliou a literatura até 2003. tórios de descompressões do canal lombar. Analgé-
Um trabalho clássico, merecedor do prêmio Volvo de sicos são administrados de acordo com a necessida-
1997, revelou melhores índices de artrodese quando de; mantém-se profilaxia antitrombótica enquanto o
se adicionaram parafusos pediculares à fusão póste- paciente estiver no leito. Indicamos rotineiramente
ro-lateral; entretanto, tal vantagem não se refletiu em repouso relativo, evitando-se deambulação nos dois
melhora clínica significativa35. Os mesmos autores, primeiros dias de pós-operatório. Não há evidência
em 2004, publicaram a reanálise dos dados referentes de necessidade de repouso, havendo grupos que
a seguimento por longo período (5 a 14 anos, média rea­lizam a cirurgia em regime ambulatorial42. O uso
de 7 anos); desta vez, os índices de artrodese radio- de coletes também é controverso, e utilizamos na-
gráfica sólida refletiram-se em melhor estado clíni- queles em que remoção da articular tiver sido mais
co (86% de resultados bons ou ótimos, contra 56% ampla, ou se houver dores lombares significativas.
nos casos de pseudo-artrose)36. Suplementação com Os pontos, quando necessário, são retirados em 7 a
enxertos intersomáticos (PLIF – posterior lumbar in- 10 dias.
terbody fusion –, ou TLIF – transforaminal lumbar
interbody fusion) aumenta o índice de fusão, porém
os resultados clínicos não são conclusivos. Complicações
As indicações de fusão foram estudadas por al- Os índices de complicações variam de acordo com
guns autores37. Descompressões multissegmentares a série consultada e com a técnica utilizada. A prin-
apresentam risco de deformidade tardia (flat back) cipal complicação intra-operatória é a lesão acidental
e instabilidade; a presença de escoliose degenera- da dura-máter. Nas laminectomias, os índices variam
tiva per se não parece gerar estenose do canal nem de 3%47 a 14%48, sendo maiores nas reoperações49.
foraminal, e a compressão por hipertrofia ligamentar As técnicas minimamente invasivas não reduzem
ou facetária não tem relação com o grau de escolio- este risco de modo significativo, ocorrendo duroto-
se (ângulo Cobb)38; indivíduos sintomáticos devem mia inadvertida em 6,8% em uma série39. Preferimos,
ser avaliados para determinar quais níveis venham a como outros autores48, a correção imediata do defeito,
necessitar de descompressão, pois desestabilização com fio não absorvível (Prolene®) 5-0 e enxerto de
importante pode ocorrer, e a maioria dos pacientes fáscia quando necessário. Em geral, a longo prazo, os
merecerá artrodeses longas. resultados são os mesmos48, porém o risco de infec-
A fim de se minimizar a extensão do procedimento ção e a necessidade de reoperações devem ser levados
cirúrgico e as morbidades cirúrgicas, procedimentos em consideração. Os índices de infecção são extre-
“minimamente invasivos” têm sido desenvolvidos mamente variáveis e são maiores em cirurgias com
para o tratamento da estenose do canal lombar. Al- instrumentação21.

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PROGNÓSTICO 10. Whitman JM, Flynn TW, Childs JD, Wainner RS,
Gill HE, Ryder MG, et al. A comparison between
A grande maioria dos pacientes apresenta me- two physical therapy treatment programs for patients
lhoria quase imediata dos sintomas, com índices de with lumbar spinal stenosis: a randomized clinical
satisfação entre 70% e 90% após o primeiro ano. trial. Spine. 2006;31(22):2541-9.
Melhora a longo prazo da dor (lombar e radicular) 11. Abdi S, Datta S, Lucas LF. Role of epidural steroids
e ganho funcional tendem a se manter, com pequena in the management of chronic spinal pain: a system-
deterioração a longo prazo50, especialmente do status atic review of effectiveness and complications. Pain
social. Diversas tentativas de se estabelecer os fato- Physician. 2005;8(1):127-43.
res que prejudicam o prognóstico foram realizadas. 12. Delport EG, Cucuzzella AR, Marley JK, Pruitt CM,
Depressão é freqüentemente associada a mau prog- Fisher JR. Treatment of lumbar spinal stenosis with
nóstico51. Alguns estudos demonstram mais dores em epidural steroid injections: a retrospective outcome
study. Arch Phys Med Rehabil. 2004;85(3):479-84.
pacientes do sexo feminino e idosos52; outro estudo
13. Cooper G, Lutz GE, Boachie-Adjei O, Lin J. Effec-
não revelou idade como fator negativo31. Conforme tiveness of transforaminal epidural steroid injections
citado anteriormente, a duração dos sintomas pré- in patients with degenerative lumbar scoliotic stenosis
operatórios interfere significativamente no prognós- and radiculopathy. Pain Physician. 2004;7(3):311-7.
tico17-18, e cirurgia tende a ser indicada precocemente 14. Athiviraham A, Yen D. Is spinal stenosis better treat-
a pacientes muito sintomáticos e sem resposta inicial ed surgically or nonsurgically? Clin Orthop Relat
ao tratamento. Res. 2007;458:90-3.
15. Chang Y, Singer DE, Wu YA, Keller RB, Atlas SJ.
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

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50
Instrumentação da Coluna Vertebral
Luiz Roberto Vialle
Emiliano Vialle

INTRODUÇÃO A estabilização da coluna por via posterior é a uti-


lizada na cirurgia de coluna, no tratamento das mais

O
s sistemas de estabilização de coluna sofre- diversas patologias, mas com o objetivo geral de imo-
ram grandes mudanças nos últimos anos, bilizar um segmento específico, até que este esteja ci-
assim como os conceitos aplicados no trata- catrizado ou que se consolide uma artrodese. Para que
mento das doenças da coluna. As vias de acesso mi- isso ocorra, é necessário que a montagem seja capaz
graram da tradicional via posterior para acessos an- de suportar as cargas fisiológicas a que a coluna ver-
teriores, cada vez menos agressivos, ou cirurgias por tebral é submetida, não apenas em condições normais,
vias combinadas.
mas em situações especiais, como em defeitos de su-
Os sistemas posteriores, baseados em amarrias su- porte da coluna anterior, ruptura da banda de tensão li-
blaminares e sistemas de ganchos, que necessitavam gamentar posterior, ou suporte ósseo de má qualidade,
de imobilização prolongada no pós-operatório, foram nas patologias tumorais e na osteoporose.
substituídos por montagens com parafusos pedicula-
Os sistemas de fixação posterior podem dividir-se
res. Estes permitiram aos cirurgiões aumentar sua ca-
em sistemas de amarrias, ganchos e parafusos.
pacidade de correção de deformidades e incluir um nú-
mero menor de níveis em suas artrodeses. Os próprios Os sistemas de amarria foram os primeiros a serem
parafusos pediculares sofreram grandes mudanças em utilizados com finalidade de estabilização da coluna
seu design, tornando-se mais versáteis e resistentes. por via posterior. Seu uso sempre implicou a necessi-
A evolução da cirurgia por via anterior viu surgir dade de imobilização externa até que se confirmasse
inicialmente as placas cervicais, que depois tiveram uma artrodese, e não era raro identificar ruptura des-
suas correspondentes para coluna torácica e lombar, ses sistemas, com conseqüências muitas vezes devas-
mas também uma grande quantidade de espaçadores tadoras. Os sistemas de amarrias empregam fios de
intersomáticos e substitutos do corpo vertebral, redu- aço ou cabos de amarria.
zindo a morbidade da retirada de enxerto tricortical, Amarrias sublaminares são úteis no tratamento da
assim como as complicações relacionadas ao posicio- população esqueleticamente imatura, mas possuem
namento deste. pouca aplicação na coluna do adulto. A resistência de
A cirurgia da coluna agregou, recentemente, o con- montagens com amarrias sublaminares é superior se
ceito de preservação de movimento como opção à tradi- comparada a amarrias através dos processos espinho-
cional artrodese. Novos implantes surgiram para todos sos, mas não há grande diferença, do ponto de vista
os segmentos da coluna vertebral com esse objetivo, e biomecânico, entre a configuração ou montagem des-
resultados a longo prazo são aguardados para que se sas amarrias1.
estabeleça a segurança e a eficácia desses dispositivos. Como toda técnica que invade o canal medular, há
Este capítulo tem por objetivo revisar os princi- um risco potencial de lesão neurológica, mas o res-
pais sistemas de fixação da coluna, avaliando suas peito à técnica, com preparo da lâmina, desinserção
propriedades biomecânicas, vantagens e limitações do ligamento amarelo com visualização adequada do
de uso. canal medular e modelagem da amarria podem mini-

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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

mizar esse risco. O tensionamento das amarrias tam- pediculares para fraturas e espondilolistese degenera-
bém requer experiência, a fim de evitar que o material tiva, não encontrou diferença significativa para essas
ou o osso sejam danificados. Nesse aspecto, diversos complicações, ou para taxa de infecção pós-operató-
sistemas de cabos possuem tensionadores que contro- ria3. Quanto ao tratamento de deformidades, as taxas
lam as forças aplicadas. de malposicionamento podem chegar a 25% no ápice
Os sistemas de gancho seguiram as amarrias su- das curvas4. O uso da navegação cirúrgica computa-
blaminares na evolução da cirurgia de coluna, e a as- dorizada pode, potencialmente, minimizar os riscos
sociação com barras e um sistema de distração (hastes envolvidos na inserção de parafusos pediculares, mas,
de Harrington) permitiu que se agregasse a função de como toda tecnologia em evolução, requer validação
correção de deformidades à instrumentação da colu- em diversos aspectos.
na. Isto fez também com que esses materiais fossem Além do conhecimento da anatomia tridimensional
submetidos a cargas maiores e, apesar de serem mais da coluna e do respeito à curva de aprendizado, algu-
resistentes que as amarrias sublaminares, também mas considerações podem auxiliar no uso desse méto-
apresentaram quebras quando submetidos a cargas do. O uso de um probe de ponta romba seguido de um
superiores às fisiológicas. Na tentativa de aumentar palpador de pedículo permite confirmar a integridade
a rigidez da fixação, uma associação entre ganchos do pedículo. O retorno de sangue com gotículas de
e amarrias sublaminares foi desenvolvida, reduzindo gordura através do orifício no pedículo apresentou um
as falhas de instrumentação, contemplando o objetivo valor preditivo positivo de 84% e um valor preditivo
inicial dos sistemas de fixação, que era o de eliminar negativo de 95% na verificação da integridade da pa-
o movimento do segmento tratado até que a consoli- rede do pedículo, no estudo de Kosay et al.5
dação óssea ocorresse. Apesar de permitir correção Apesar do avanço na fabricação dos pedículos, mi-
de deformidades, era evidente que, ao apoiar um sis- nimizando episódios de fadiga do metal, a estabilida-
tema apenas nos elementos posteriores, a capacidade de da montagem reside na interface osso–parafuso6,
de realinhar a coluna era limitada. sendo relacionada a diversos fatores, como preenchi-
Então surgiu o conceito de fixação transpedicu- mento da porção mais estreita do pedículo, diâmetro
lar, de acordo com o qual o instrumental englobaria do parafuso, inserção com profundidade superior a
a maior parte da vértebra, permitindo corrigir defor- 80% do corpo vertebral, torque de inserção e densida-
midades em três planos, além de substituir, de forma de da medular óssea7-13. A fixação bicortical aumenta
mais eficaz, as amarrias e ganchos. A princípio, o uso significativamente a resistência da montagem, mas
de parafusos pediculares era restrito à coluna lombar, apresenta o risco de lesão vascular13.
mas a evolução natural do método fez com que fosse Outras formas de aumentar a resistência das mon-
utilizado na transição toracolombar, coluna torácica tagens pediculares incluem a triangulação dos para-
alta e, mais recentemente, na coluna cervical. fusos, o uso de conectores transversais, respeito aos
Quando se fala sobre parafusos pediculares, é im- conceitos de transmissão de cargas através da colu-
portante conhecer as características dos pedículos, as na vertebral14, e evitar modelagem in situ das barras
diferentes técnicas de inserção e os diversos concei- sempre que possível15.
tos de parafusos pediculares disponíveis atualmente. Este capítulo tem por objetivo apresentar os con-
Os parafusos pediculares são utilizados no auxílio ceitos de fixação na coluna vertebral e as técnicas
à artrodese póstero-lateral, imobilizando o segmento, mais empregadas na atualidade. Para facilitar a leitu-
ou com o objetivo de preservar segmentos móveis, ra, os autores dividem o texto nos seguintes itens:
nas fixações dinâmicas. São inseridos a partir do as- • Instrumentação da junção occipitocervical e
pecto póstero-lateral da junção entre o processo trans- coluna cervical alta.
verso e a faceta articular, atravessando o pedículo e • Instrumentação da coluna cervical baixa.
estendendo-se até a porção anterior do corpo verte- • Instrumentação da coluna torácica e toraco-
bral. O respeito à técnica de inserção é fundamental, lombar.
especialmente em pacientes com variações da anato- • Instrumentação da coluna lombar e lombossacra.
mia, como nas escolioses congênita e idiopática.
Com cerca de 30 anos de aplicação clínica, as INSTRUMENTAÇÃO DA JUNÇÃO
complicações desse método de fixação são bem co-
nhecidas. Um estudo realizado por Esses et al. iden- OCCIPITOCERVICAL
tificou uma taxa de complicações próxima aos 10%. A estabilização cirúrgica da região craniocervical
Malposicionamento (5%), fratura do pedículo e le- era inicialmente realizada com técnicas de aposição
são da dura-máter (ambos com cerca de 2%) e lesão de enxerto seguidas de imobilização com aparelhos
vascular (0,1%) são as intercorrências mais freqüen- gessados (tipo minerva) ou halogesso. Essa mon-
temente associadas à inserção de parafusos2. Outro tagem evoluiu para uma combinação com amarrias
estudo, comparando a artrodese com e sem parafusos através da junção craniovertebral e, posteriormente,

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50 – Instrumentação da Coluna Vertebral

essas amarrias passaram a ser fixadas em hastes ou prática, pode-se esperar uma sobrecarga da articula-
parafusos, com o objetivo de aumentar a estabilidade ção C3C4, secundária ao bloqueio mecânico da ar-
e reduzir as elevadas taxas de pseudo-artrose e com- ticulação C2C3. Outra consideração nesse aspecto é
plicações inerentes a cirurgias de revisão. Todos esses quanto à modularidade do sistema, permitindo exten-
sistemas não eliminaram o uso da imobilização ex- são a níveis caudais, caso haja necessidade, e even­
terna, e ainda assim apresentavam taxas elevadas de tual conexão com fixação da coluna torácica, em ca-
soltura do material (até 30%)16. sos mais extensos. (Fig. 50.1).
A maioria dos métodos convencionais utiliza fi-
xação com parafusos occipitais e cervicais bilateral-
mente, unidos a placas ou barras modeladas à posição
desejada do segmento.
Outro avanço foi a introdução da técnica de fixa-
ção transarticular C1-C2 (técnica de Magerl)17, que
permite grande estabilidade à fixação e reduz o nú-
mero de níveis caudais instrumentados. É importante
ressaltar que esse método é tecnicamente difícil, com
risco significativo de lesão à artéria vertebral.
O uso de parafusos poliaxiais nas massas laterais
de C1 e através do pedículo de C2 reduz o risco de
lesão à artéria vertebral, além de perimtir manobras
de redução após o posicionamento dos parafusos18.
Puttlitz et al. realizaram uma avaliação biomecâ-
nica comparando a fixação occipitocervical com as
técnicas de parafuso transarticular C1-C2 e parafusos
em C1 e C2. Ambas reduziram a mobilidade do seg-
mento em mais de 90%, sem diferença significativa
entre elas19.
É importante, na escolha da montagem, a deci-
são entre utilizar sistemas com placas ou hastes. Os
sistemas com placas, apesar de mais rígidos, neces-
sitam de modelagem prévia à colocação dos parafu-
sos e, muitas vezes, prévia à redução ou alinhamento
do seguimento. Isto faz com haja pouco espaço para
variação da técnica de inserção dos parafusos. As
montagens com haste permitem maior maleabilidade, Fig. 50.1 – Fixação occipitocervical com extensão à coluna
torácica.
mas a interface que conecta os parafusos à haste é
evidentemente mais frágil, com maior risco de fadiga
do material em caso de retardo na consolidação. Os FIXAÇÃO C1C2
riscos de pseudo-artrose e de cifose residual devem As opções para fixação da coluna cervical alta in-
ser levados em consideração quando da escolha do cluem o uso de sistemas de amarrias/cabos associados
implante a ser utilizado. a enxerto tricortical, como nas técnicas de Brooks e
A fixação ao osso occipital merece atenção espe- de Galie. A técnica de Galie é a mais simples, mas sua
cial. À medida que a inserção dos parafusos occipitais rigidez é mínima e requer associação com outras téc-
se afasta da linha média, aumenta a taxa de penetra- nicas e imobilização externa prolongada. Já a fixação
ção da cortical interna, mesmo quando se utilizam de Brooks (Fig. 50.2) utiliza enxerto entre as lâminas
os menores tamanhos de parafusos. Isto é importan- de C1 e C2, preso por amarrias sublaminares. Apesar
te quando se corrigem posturas cifóticas, em que os de críticas ao uso de amarrias no canal medular, é im-
parafusos estão sob tensão constante no período pós- portante lembrar que o espaço na região cervical alta
operatório precoce. é amplo, salvo raras exceções pela presença de panus
Em pacientes jovens, deve-se fazer outra consi- ou lesões expansivas. Essa técnica também depende
deração quanto à utilização da fixação transarticular da qualidade óssea e de sua consolidação, e por isso
na artrodese occipitocervical. Pelo ponto de entrada sua indicação é limitada a pacientes mais jovens e
desse parafuso, a placa occipitocervical fica obrigato- com boa qualidade óssea.
riamente sobre a articulação C2-C3, reduzindo signi- Técnicas modernas incluem a fixação transarti-
ficativamente a mobilidade do segmento em relação cular C1C2, e a fixação com parafusos em C1 e C2
à coluna normal19. Apesar de não haver comprovação unidos por barras. A fixação transarticular C1C2 foi
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

impedir a realização dessa técnica, sendo fundamen-


tal a avalição tomográfica pré-operatória.
Uma variação interessante dessa técnica é a utili-
zação de um parafuso translaminar em C2, tecnica-
mente mais simples que o parafuso pedicular e que
permite conexão rígida ao parafuso da massa lateral
de C1. Apesar disso é importante saber que nem to-
das as lâminas de C2 são largas o suficiente para aco-
modar um parafuso laminar. O estudo de Wang et al.
identificou que 37% das lâminas avaliadas em seu es-
tudo não apresentavam área suficiente para acomodar
um parafuso de 3,5 mm de diâmetro em sua área mais
estreita. Estudos futuros demonstrarão qual a real in-
dicação e utilidade dos parafusos laminares em C222.
A fixação C1C2 apresenta menos riscos que a fi-
xação transarticular, mas também tem limitações. O
ponto de entrada do parafuso na massa lateral de C1
requer exposição do processo articular inferior de C1,
onde muitas vezes um plexo venoso pode necessitar de
dissecção cuidadosa e, por vezes, apresentar sangra-
mento abundante. Ainda o trajeto da raiz de C2 pode
dificultar a angulação do parafuso, que deve ser leve-
mente cranial, e sua retração excessiva pode ser causa
de dor ou de hipoestesia pós-operatória (Fig. 50.3)18.
Outro estudo biomecânico compara seis métodos
de fixação C1C2: amarria pela técnica de Galie, pa-
Fig. 50.2 – Imagem transoperatória de amarria pela técnica rafusos transarticulares com e sem amarria de Galie,
de Brooks. parafusos transarticulares com um gancho no atlas,
parafusos em C2 com gancho no atlas e parafusos
descrita por Magerl em 1987, e comprovadamente é em C2 e nas massas laterais de C1. Os resultados
mais rígida que as técnicas de amarria utilizadas pre- mostraram que a estabilidade obtida pela técnica de
viamente20. O ponto de entrada para o parafuso é de- Galie é insuficiente e que as fixações em três pontos,
terminado pela anatomia, enquanto a direção do pa- como a transarticular com gancho no atlas, apresen-
rafuso é guiada por fluoroscopia transoperatória. Na tam maior estabilidade, sem necessidade de amarrias
prática, a colocação do parafuso é perigosa, porque sublaminares ou imobilização externa. Esse estudo
os pontos de entrada podem variar ou estar distorci- mostrou, de forma interessante, que a fixação apenas
dos pela patologia do paciente; a identificação fluo- com parafusos transarticulares não fornecia estabili-
roscópica do trajeto nem sempre é ideal e há grande dade suficiente em flexo-extensão, necessitando de
variação no trajeto da artéria vertebral. Uma opção complementação (amarria ou ganchos). Outro acha-
crescente é o uso de planejamento tomográfico pré-
operatório e auxílio de neuronavegação transoperató-
ria. Weidner et al. compararam a sua experiência com
a cirurgia guiada pela fluoroscopia (78 casos) e com
auxílio da neuronavegação. Em ambos os grupos, a
maioria dos parafusos foi inserida corretamente, sem
diferença no tempo cirúrgico. Houve uma lesão da ar-
téria vertebral no grupo fluoroscópico e dois parafu-
sos não foram inseridos no grupo de neuronavegação
pelo risco detectado no planejamento pré-operatório.
Ainda no grupo de fluoroscopia, seis parafusos foram
considerados curtos no controle pós-cirúrgico21.
A técnica tradicional baseia-se na identificação da
articulação C2C3 e confecção do ponto de entrada de
2 a 3 mm lateral ao bordo medial dessa articulação. A
trajetória deve ser diretamente sagital à linha média, e
a inclinação cranial guiada pela fluoroscopia. Em até Fig. 50.3 – Radiografia pós-operatória demonstrando a fi-
20% dos casos, a localização da artéria vertebral pode xação nos maciços laterais de C1 e no pedículo de C2.

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50 – Instrumentação da Coluna Vertebral

do interessante foi o de que a fixação com parafusos do maciço articular, as técnicas de posicionamento
em C1 e C2 fornecia menor estabilidade em rotação, em lateral do parafuso – Magerl, Anderson e An –, apre-
comparação às técnicas transarticular e parafuso em sentam risco de entrar em contato com a raiz de 95%,
C2 associado a gancho no atlas23. 90% e 65%, respectivamente33.

INSTRUMENTAÇÃO DA COLUNA CERVICAL Tabela 50.1 – Referências para a inserção de parafusos


BAIXA no maciço articular cervical
Amarria Interespinhosa Técnica Ponto de entrada Angulação Angulação
cranial lateral
Esse sistema ainda é muito utilizado no tratamen-
Roy-Camille- Centro do ml 0° 10°
to da instabilidade cervical ligamentar, agindo como Louis
uma banda de tensão, que resiste à distração e flexão.
Magerl 1 mm medial e caudal 45 a 60° 25°
A resistência a forças de cisalhamento e torsionais de- ao centro do ml
pende da integridade das facetas articulares e, haven-
do lesão da porção anterior da coluna, não é possível An 1 mm medial ao ml 17° 33°
conter momentos de flexão e cifose secundária. Anderson 1 mm medial ao ml 30 a 40° 10°
O principal cuidado com esse método está no con- ml = maciço lateral.
trole da tensão aplicada sobre a amarria, evitando hi-
perextensão da coluna e estenose secundária do canal Parafusos Pediculares na Coluna Cervical
medular. Uma opção é o uso de enxerto tricortical
interespinhoso, que bloquearia a extensão excessiva O uso desse método está indicado na presença de
da coluna. defeitos ósseos, como hipoplasia do maciço lateral,
A técnica original, descrita por Rogers em 1942, erosão por infecção ou tumores, fratura da faceta, ou
utilizava amarria extra-óssea, ao redor dos processos remoção cirúrgica desta. Sua vantagem reside no fato
espinhosos, com enxerto sobreposto, o que não blo- de fornecer fixação a ambas as colunas de sustentação
queava a extensão cervical, com risco de soltura da (anterior e posterior), com uma rigidez importante em
amarria24,25. O método de Bohlman (amarria tripla) e casos altamente instáveis, como fraturas graves, ar-
suas modificações envolvem uma alça dupla, passada trite reumatóide, deformidade cifótica cervical. Em
por um orifício na base do processo espinhoso em cada lesões disco-ligamentares em um nível, não há van-
nível, com enxerto tricortical interespinhoso26. Atual- tagem evidente sobre a fixação nos maciços laterais,
mente, as amarrias na coluna cervical são utilizadas amarrias, ou combinação dessas técnicas.
como método complementar às fixações mais rígidas. A experiência de Abumi et al. com parafusos pe-
diculares cervicais deve ser revisada por todos os
Parafusos na Coluna Cervical Baixa interessados nessa fixação34-38. Em sua série de fra-
turas cervicais, relatam 100% de consolidação, sem
Estabilização rígida da coluna cervical pode ser falhas do implante e nenhuma complicação clínica
obtida com o uso de parafusos sobre as massas late- envolvendo medula, raiz nervosa ou artéria vertebral,
rais, transpediculares ou transarticulares, unidos entre apesar de algumas rupturas da integridade pedicular
si por diferentes sistemas de placas, hastes e ganchos. terem ocorrido (cerca de 7% dos casos).
Diversas técnicas foram descritas para o posicio- Diversas técnicas de inserção foram testadas, ha-
namento dos parafusos nas massas laterais, incluindo vendo consenso sobre a ausência de pontos de refe-
a de Roy-Camille, Louis, Magerl, Anderson e An27-31. rência anatômica que guiem o trajeto com segurança.
(Tabela 50.1) O auxílio da fluoroscopia e da navegação cirúrgica
Cada uma apresenta um ponto de entrada e trajeto não reduziu sensivelmente as dificuldades do méto-
específicos. À exceção das técnicas de Roy-Camille e do, tendo Ludwig et al. determinado que a inserção
Louis, o trajeto dos parafusos é direcionado superior de parafusos está contra-indicada se o pedículo for
e lateralmente. A raiz nervosa, incluindo seus ramos inferior a 4,5 mm em seu menor diâmetro39.
ventral e dorsal, fica anterior, superior e lateral ao Jeanneret calculou o comprimento ideal para o
ponto central do maciço articular cervical e, portan- parafuso pedicular cervical, sendo de 26 mm para
to, um parafuso direcionado ântero-lateralmente pode C3-4, 28 mm para C-5, 30 mm para C-6 e 32mm para
colocar em risco essa raiz. Heller et al. sugerem que C-740.
a incidência de lesões radiculares é maior com a téc-
nica de Magerl do que com a de Roy-Camille. Esta,
entretanto, apresentava maior risco de penetração da Fixação Intersegmentar
faceta articular32. O estudo em cadáveres de Xu et al. Em casos de abertura do canal através de lamino-
mostrou que, uma vez ultrapassada a cortical anterior plastia, há a opção de estabilizar cada segmento com
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577
Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

o uso de pequenas placas de reconstrução. Na técnica cações. Essas placas, porém, não permitiam variação
descrita por Hirabayashi, as lâminas eram mantidas da angulação em que os parafusos eram inseridos
na posição desejada através de suturas inabsorvíveis, (placas estáticas), e alguns casos de pseudo-artrose
desde os processos espinhosos até a cápsula articular foram atribuídos à rigidez do sistema, que levaria a
e musculatura vertebral. Muitos atribuem a essa sutu- uma falta de adaptação em caso de subsidiência ou
ra a presença de dor cervical e limitação de movimen- reabsorção parcial do enxerto.
to após laminoplastias41. Em resposta a essa necessidade, surgiram placas
As vantagens do uso de miniplacas estão na mobi- chamadas dinâmicas, com o objetivo de adaptar-se
lização precoce do pescoço e na redução da dor pós- às acomodações do enxerto ósseo. Estas podem ser
operatória. Atualmente, existem sistemas pré-molda- divididas em rotacionais, em que há uma variação
dos que facilitam a inserção de parafusos nas lâminas no ângulo dos parafusos, ou translacionais, haven-
(Fig. 50.4). do apenas a angulação do parafuso, mas também seu
deslocamento através da placa. Apesar de permitirem
manutenção do contato entre superfícies em caso de
reabsorção do enxerto, levantaram-se questões quan-
to à estabilidade fornecida por tais placas.
Brodke et al., em uma análise biomecânica, com-
parou a distribuição de cargas e a estabilidade de três
diferentes sistemas de fixação cervical anterior (placas
estática, dinâmica rotacional e dinâmica translacional)
em duas situações distintas, com o enxerto em altu-
ra normal e após subsidiência de 10% do enxerto. Na
placa estática, a distribuição de cargas através do en-
xerto caiu de 60% para 17%, não tendo havido redu-
ção significativa nas placas dinâmicas. Quanto à mo-
bilidade, houve aumento de 60% na flexo-extensão na
placa estática (p < 0,01), enquanto as placas dinâmicas
mantiveram o segmento estável. Apesar desses dados
Fig. 50.4 – Sistema de microfragmentos aplicado na estabi- encorajadores, os autores não recomendam o uso de
lização pós-laminoplastia. placas dinâmicas isoladas em casos em que há instabi-
lidade evidente ou lesão dos elementos posteriores, até
Coluna Cervical Anterior que sua segurança nesses casos seja comprovada44.
Placas
Cages Cervicais
A cirurgia anterior para a coluna cervical foi introdu-
zida por Smith e Robinson42 e por Cloward43 nos anos Recentemente, o desenvolvimento de espaçadores
de 1950, com o objetivo de descomprimir estruturas intersomáticos (cages) cervicais surgiu como uma
neurais, reduzir deformidades, fornecer estabilidade e, opção cirúrgica dentro do tratamento da doença dis-
finalmente, criar um ambiente no qual a artrodese ocor- cal degenerativa (DDD) cervical. As formas e com-
resse com êxito. Os sistemas de placa anterior foram ponentes dos cages cervicais variam na literatura,
criados com a expectativa de melhorar os resultados como os compostos de PEEK (poli-éter-éter-cetona),
após discectomias ou corpectomias para o tratamento carbono ou titânio e ainda os que apresentam a forma
de problemas degenerativos, traumáticos ou oncológi- cilíndrica ou em caixa. De modo geral, eles apresen-
cos. Seus proponentes apresentam diversas vantagens, tam as vantagens teóricas de impedir o colapso do en-
incluindo mobilização precoce, relação custo-benefí- xerto, além de reduzir a morbidade da retirada deste,
cio, menor taxa de colapso e deslocamento do enxerto, já que não há necessidade de enxerto tricortical, per-
melhor taxa de fusão. Essas vantagens potenciais são mitir descompressão foraminal indireta e restaurar a
mais evidentes quando a cirugia envolve múltiplos ní- lordose cervical. Ainda, a incidência de complicações
veis do que nos casos de cirurgia em um nível apenas. é inferior à das placas cervicais45-47. Inicialmente, os
O desenho das placas cervicais evoluiu muito, par- cages cervicais foram usados em associação com pla-
tindo de sistemas que necessitavam de fixação bicor- cas cervicais, e na ausência de instabilidade seu uso
tical, uma vez que os parafusos não se fixavam à pla- isolado (stand-alone) passou a ser mais comum.
ca, para depois passar a sistemas constritos. Nestes, a Poucos estudos na literatura visam à avaliação fun-
fixação dos parafusos à placa (por diversos métodos) cional dos pacientes submetidos a tratamento cirúrgico
permitiu o uso de parafusos unicorticais, com conse- da DDD cervical com cages isolados em um único ní-
qüente redução do risco neurológico, além de elimi- vel ou em múltiplos níveis. A incidência e o papel das
nar os riscos de soltura dos parafusos e suas compli- complicações associadas ao uso do cage nas atividades

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50 – Instrumentação da Coluna Vertebral

da vida diária também são pouco compreendidos. Ape- mento observado no presente estudo, nenhum pacien-
sar de relatos na literatura quanto à subsidiência e que- te apresentou perda da lordose cervical54.
bra de cages sem placa, a experiência dos autores com
essa técnica é positiva. Em uma revisão de 52 casos INSTRUMENTAÇÃO DA COLUNA TORÁCICA
operados por cervicobraquialgia com cages cervicais
retangulares em um ou dois níveis, observou-se apenas Por suas características específicas – postura cifó-
uma pseudo-artrose e uma melhora média de 50% no tica, menor espaço livre para a medula espinhal, re-
Neck Disability Index. Vinte por cento dos pacientes lação íntima com coração e pulmões –, e pela rigidez
apresentaram acomodação do cage na placa vertebral, secundária à caixa torácica, a coluna torácica recebe
sem haver diferença no resultado clínico entre pacientes instrumentação com freqüência menor do que os seg-
com e sem acomodação. Não houve deslocamento ou mentos cervical e lombar.
quebra do implante em nenhum dos casos48 (Fig. 50.5). O primeiro sistema de fixação desenvovido para
Hacker et al. atingiram uma elevada taxa de fusão esse segmento foi o de Harrington, um sistema não
e resultados predominantemente bons ou excelentes segmentar de ganchos unidos por uma haste, com o
com utilização de cages cervicais isolados49. Os ca- objetivo de corrigir deformidades por meio de distra-
ges cervicais proporcionam fixação interna enquanto ção do segmento. As limitações desse sistema eram a
a fusão ocorre com a produção de osso no interior e possibilidade de correção em um plano apenas, reti-
em torno do implante. Isso permite que osso esponjo- ficando excessivamente o plano sagital, e a tração a
so, incorporado mais rapidamente do que o osso cor- que era submetida a medula espinhal, com evidente
tical, sirva como substrato para fusão50,51. risco neurológico. Por utilizar apenas dois pontos de
Comparando o cage cervical de fibra de carbono fixação em cada haste, fraturas da lâmina e soltura
com o procedimento de Cloward, Vavruch relata re- dos ganchos eram complicações freqüentes. Ainda,
sultados funcionais semelhantes, mas melhor alinha- as hastes de Harrington apresentavam quebra em até
mento em lordose e manutenção da altura discal com 10% dos casos, geralmente na junção entre o gancho
o cage. Como desvantagens com o uso deste último, e a haste55.
cita o índice superior de pseudo-artrose (38%)52. A evolução natural do sistema de Harrington foi
Gercek relata uma série consecutiva de oito casos a associação com amarrias sublaminares em todos os
tratados com cage cervical de titânio e o desenvol- segmentos, com o objetivo de estabilizar melhor o seg-
vimento de afundamento em cinco dos nove níveis mento e de reduzir a distração utilizada para alinhar
abordados com a quebra subseqüente em um desses a coluna. A invasão do canal medular torácico pelas
níveis. O autor alerta sobre a avaliação criteriosa do amarrias sempre levantou a preocupação quanto à com-
paciente e a necessidade de complementação do cage pressão ou irritação de estruturas nervosas (Fig. 50.6).
com placa cervical anterior53. O conceito de fixação segmentar decorrente da as-
Kao compara o uso de auto-enxerto, aloenxerto e sociação das técnicas de Harrington e de Luque evo-
cage isolado quanto à capacidade de manutenção da luiu para o uso de ganchos em toda a coluna torácica,
altura discal, lordose cervical e taxas de fusão. Os três de forma segmentar, mas evitando o canal medular,
grupos apresentaram resultados funcionais e índices com apoio nos pedículos e processos transversos.
de fusão semelhantes, entretanto o cage cervical foi A utilização de parafusos pediculares na coluna
superior em relação à manutenção da altura discal e torácica fez com que estes substituíssem os ganchos,
lordose cervical. Apesar do índice elevado de afunda- que atualmente são utilizados em casos específicos.
Essa associação entre parafusos e ganchos é interes-
sante principalmente no ápice de uma fixação, em que
a postura cifótica da coluna torácica, associada a uma
menor qualidade óssea, ou a forças de tensão decor-
rentes da correção cirúrgica, podem predispor ao ar-
rancamento dos parafusos e perda da correção.
Diversos estudos comparam o uso de parafusos e
ganchos na coluna torácica, principalmente quanto à
capacidade de corrigir deformidades. Suk et al. com-
pararam três montagens no tratamento da escoliose
torácica: ganchos, parafusos pediculares, ou combi-
nação de parafusos distais e ganchos craniais, e mos-
traram a capacidade superior de correção da deformi-
dade nos planos coronal e sagital, mas com vantagem
superior quando compararam a correção rotacional.
Fig. 50.5 – Radiografia controle de cage cervical isolado Esta foi de 59% nos casos operados com parafusos
com um ano de seguimento. pediculares apenas, caindo para 26% e 19% nas mon-
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Fig. 50.6 – Correção parcial de deformidade torácica com a Fig. 50.7 – Instrumentação da coluna torácica com parafu-
técnica de Harrington. sos pediculares em todos os níveis na concavidade da curva e
nas extremidades e ápice da convexidade.

tagens híbridas e com ganchos, respectivamente. Suk


et al. também enfatizam que a aparência estética e A abordagem posterior apresenta a vantagem de
o alinhamento do tronco também são melhores com ser familiar à maioria dos cirurgiões, evitando os va-
parafusos pediculares, mas a diferença na estética não sos sangüíneos abdominais e as complicações gerais
foi tão importante quanto a radiográfica56. da cirurgia abdominal, com íleo paralítico e bridas in-
testinais. Os relatos iniciais da artrodese intersomática
Lenke et al. realizaram estudo semelhante, confir-
foram promissores, mas seu uso em larga escala apre-
mando a melhor correção com parafusos pediculares
sentou altas taxas de morbidade e de complicações,
e mostrando melhor manutenção dessa correção aos 2
incluindo lesões durais e radiculares, sangramento
anos de seguimento, além de melhor função pulmonar
epidural excessivo, fibrose epidural e aracnoidite59,60.
no grupo de pacientes que recebeu parafusos apenas57.
Outras limitações seriam a dificuldade para remoção
O uso de parafusos pediculares em todos os ní- completa do disco intervertebral, uma vez que não
veis da coluna torácica também reduziu a necessidade há visualização completa da área operada, além de a
de liberação e de instrumentação por via anterior de presença de material discal residual ser comprovada-
deformidades graves, além de preservar a função da mente uma causa de pseudo-artrose61-65.
caixa torácica em pacientes nos quais geralmente há
À medida que o acesso anterior passou a ser mais
redução da capacidade pulmonar58 (Fig. 50.7).
utilizado para a cirurgia da coluna lombar, complica-
ções se tornaram menos freqüentes. Esse acesso traz a
ESTABILIZAÇÃO ANTERIOR DA COLUNA vantagem de preservar a musculatura paravertebral e
LOMBAR o canal vertebral, além de permitir visão direta do es-
paço discal e remoção completa do tecido discal (citar
Acesso Anterior à Coluna Lombar cadever study)65.
A estabilização intersomática pode ser realizada Os autores preferem o acesso retroperitoneal aber-
através do tradicional acesso posterior, seja por via pos- to, com auxílio de uma afastador autostático fixo à
terior ou póstero-lateral, ou por acesso anterior. O aces- mesa cirúrgica (Synframe®, Synthes), que permi-
so anterior pode ser realizado por via laparoscópica, ou te boa visualização através de uma pequena incisão
através de um acesso aberto, minimamente invasivo. (Fig. 50.8). Vantagens da cirurgia aberta são o fato de

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50 – Instrumentação da Coluna Vertebral

não haver limitação quanto ao nível operado, menor xerto estruturado (tricortical, por exemplo); eles tam-
curva de aprendizado e tempo de cirurgia, além da bém oferecem estabilidade segmentar inicial devido
redução dos custos por não haver necessidade do uso ao tensionamento dos ligamentos. Existem, entretan-
de instrumentos especiais descartáveis. to, relatos de colapso, migração e quebra desses es-
paçadores.
A B O design desses cages pode ser dividido em ci-
líndrico e retangular. Cages cilíndricos (também co-
nhecidos como rosqueados) são inseridos através de
fresagem da placa vertebral, geralmente em pares,
fazendo com que seu diâmetro seja, no mínimo, duas
vezes maior que sua altura, o que limita a distração
do espaço intervertebral. Cages retangulares podem
ser únicos ou duplos, e sua inserção se dá pela re-
moção da cartilagem da placa vertebral, sem violar
o osso. Os cages retangulares permitem melhor po-
sicionamento do enxerto em relação aos cilíndricos,
Fig. 50.8 – (A) Afastador auto-estático fixado à mesa cirúr-
gica. (B) Lâminas permitem visão completa através de pequena como demonstrado por Steffen et al.74, e podem ter
incisão. uma área aberta maior sem comprometer a rigidez do
dispositivo. Outro estudo do mesmo grupo comparou
Opções para Estabilização Intervertebral: cages quanto à sua capacidade de estabilizar o seg-
mento lombar operado, determinando que a distração
Enxertos, Cages e Biomecânica axial e o diâmetro lateral são os fatores preditores
Enxerto Autólogo mais importantes de estabilidade75.
Apresenta altas taxas de colapso, além da morbi-
dade de sua retirada na área doadora. Enxertos homó- Cages Isolados versus Estabilização
logos apresentam colapso tardio, o que pode repre- Posterior Complementar
sentar um baixo potencial de consolidação, apesar do Apesar de a idéia de evitar a dissecção muscular
bom aspecto radiográfico inicial66-68. para inserção de parafusos pediculares ser tentadora,
existem dados suficientes na literatura para desenco-
Cages rajar o uso de cages isolados76. O posicionamento de
um cage anterior estabiliza de forma insuficiente a
Cages cilíndricos rosqueados coluna em rotação, inclinação e extensão, levando à
Apresentaram resultados iniciais promissores69,70, necessidade de fixação adicional, seja ela anterior ou
mas estudos recentes, com seguimento a longo prazo, posterior.
mostraram taxas de pseudo-artrose e colapso eleva- O uso de parafusos translaminares ou transface-
das. Esses cages tendem a atravessar a placa vertebral tários é uma boa opção para estabilização posterior,
superior e, em geral, não recuperam ou mantêm o ali- quando não há necessidade descompressão ou corre-
nhamento sagital da coluna lombar71,72. ção de deformidades. Com o auxílio de fluoroscopia e
de um dispositivo-guia, esse procedimento é seguro e
apresenta dissecção mínima do tecido paravertebral.
Cages Retangulares e Cuneiformes
Estudos biomecânicos mostram aumento em nove ve-
Apresentam quarto vantagens bem definidas73: res- zes da estabilidade dos espaçadores após a inserção
tauram a lordose lombar; apresentam ampla área de dessa estabilização posterior77 (Fig. 50.9).
contato com a placa vertebral nos seus limites, em que A combinação de espaçadores intersomáticos com
a densidade óssea é maior, e o colapso, menos prová- parafusos translaminares apresenta bons resultados
vel; a área central aberta ou fenestrada permite bom a longo prazo, sem evidência de colapso e uma taxa
contato entre o enxerto e a placa vertebral; sua inser- de artrodese de 98%. Resultados funcionais também
ção é possível através de uma pequena incisão, com melhoraram significativamente em relação ao esta-
auxílio de instrumental específico, permitindo identi- do pré-operatório, com resultados mantidos aos dois
ficação segura das estruturas abdominais adjacentes. anos de seguimento73.

Biomecânica dos Cages Metálicos Considerações Técnicas


Anteriores Dados experimentais mostram que o principal
Cages recuperam a altura intervertebral e ofere- suporte ocorre na periferia da placa vertebral e que
cem suporte axial, eliminando a necessidade de en- o posicionamento do dispositivo intersomático deve
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

fusos pediculares) e eventual descompressão da raiz


nervosa.

INSTRUMENTAÇÃO DA COLUNA
LOMBOSSACRA
A junção lombossacra é a região onde a coluna
lombar, móvel e lordótica articula-se ao sacro, imó-
vel, e onde as forças e cargas do corpo são transmiti-
das aos membros inferiores. Artrodese da região lom-
bossacra pode ser obtida por acesso anterior, posterior
ou combinado81.
Apesar dos avanços nas técnicas cirúrgicas, a
incapacidade de se obter uma artrodese na junção
lombossacra permanece como importante problema,
Fig. 50.9 – Espaçador intersomático implantado por via an- especialmente em longas artrodeses que se esten-
terior e complementação minimamente invasiva com parafu- dem ao sacro, tais como as utilizadas no tratamento
sos translaminares. de escolioses neuromusculares, pacientes osteopo-
róticos com escoliose degenerativa e na escoliose do
buscar contato nessa área, deixando a parte central da adulto. Complicações, incluindo falha da interface
placa vertebral para contato do enxerto78. metal-osso, quebra do implante, perda de redução e
A orientação do espaçador também é importante. pseudo-artrose, têm sido relatadas com freqüência. A
Estudos biomecânicos não mostram diferença na es- taxa de pseudo-artrose na junção lombossacra pode
tabilidade de cages rosqueados inseridos lateralmen- ultrapassar os 30% se dois ou três níveis craniais são
te versus inserção no sentido ântero-posterior, com a incluídos sem fixação adicional82-86.
vantagem de preservar o ligamento longitudinal an- Diversos estudos recentes comparam as proprie-
terior. Na prática, é extremamente difícil inserir dois dades biomecânicas de vários implantes utilizados na
cages rosqueados pela via lateral, e a inserção de um fixação lombossacra. O uso de enxerto ósseo anterior,
cage criará um movimento rotacional ao redor deste, instrumentação anterior, pontos de fixação sacral su-
com colapso tardio79. plementares, ou extensão à pelve tem demonstrado
Outra preocupação é quanto ao tamanho dos es- melhora significativa da estabilização nessa área de
paçadores. Enquanto um dispositivo pequeno pode transição. McCord et al. introduziram o conceito de
não atingir os objetivos de descompressão indireta e um ponto (pivot point) localizado no ângulo posterior
recuperação da lordose, um cage muito grande pode do disco intervertebral L5-S187. Nesse estudo, a fixa-
causar estiramento radicular, distração da cápsula fa- ção ao ílio, estendendo-se anteriormente a esse ponto,
cetária e dor referida nos membro inferiores. É im- demonstrou ser a mais eficaz na suplementação da es-
portante que a abertura do espaço discal seja cuidado- tabilidade de montagens por via posterior. Ainda, um
sa, principalmente em casos em que há instabilidade segundo ponto de fixação sacral também demonstrou
posterior, como na espondilolistese. Havendo dor nos ser mecanicamente mais eficaz quando comparado à
membros inferiores após a cirurgia, devem ser le- fixação única em S188.
vantadas as hipóteses de trauma direto pela inserção A artrodese para a região lombossacra pode ser in-
excessiva do cage ou distração excessiva do espaço dicada por diversos motivos. Estes incluem escoliose
discal, irritação local por resíduos discais (irritação neuromuscular com obliqüidade pélvica, escoliose
que pode ser química ou direta). degenerativa, perda da lordose lombar pós-cirúrgica
Taylor et al. realizaram um estudo em cadáveres (flat back syndrome) e degeneração do disco interver-
para avaliar o risco de violação do neuroforame com tebral L5-S1 abaixo de uma artrodese82,84,86,89-91.
cages inseridos por via anterior, em relação a sua dis- Os aspectos técnicos da fixação interna podem,
tância da linha média. Determinaram uma zona de ainda, ser complicados por osteopenia, que é intrínse-
segurança de 5 mm para cada lado da linha média, ca ao sacro e freqüentemente encontrada em pacientes
onde não há risco de contato com a raiz. Quanto mais com doenças neuromusculares e em pacientes idosos
lateral a posição do cage, maior o risco de penetração com escoliose degenerativa.
do neuroforame80.
A inserção centralizada dos cages retangulares é Anatomia Aplicada da Região Sacropélvica
fundamental para evitar complicações e, para isso, o
controle fluoroscópico em dois planos é obrigatório. A faceta articular inferior de L5 se sobrepõe à fa-
Se o posicionamento final do cage for lateral, reco- ceta articular superior de S1. O ápice desta situa-se
menda-se optar por fixação estável posterior (para- 5 mm acima do platô vertebral de S1; sua largura e

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50 – Instrumentação da Coluna Vertebral

altura variam de 15 a 20 mm, oferecendo uma super- res pedículos da coluna, medindo cerca de 20 mm no
fície para artrodese facetária de 3 a 4 cm. As facetas plano horizontal e 25 a 30 mm no plano vertical98. Um
articulares de L5-S1 são planas em 86% dos casos, e parafuso pode ser inserido em S1 em inclinações que
sua orientação é de 45° em relação ao plano frontal92- vão de 0° (inserção direta) a 60° de inclinação medial
94
. Devido à sua obliqüidade, essas facetas resistem a quando inseridos a partir da asa do ilíaco. Entretanto,
forças de cisalhamento neste nível. na maioria dos casos, a saliência da asa do ilíaco li-
As asas sacrais são estruturas profundas que pos- mitará a angulação medial em 20 a 30° (Fig. 50.11)97.
suem uma área de 2 cm em sua superfície para artro- Um parafuso direcionado à asa do sacro pode ter uma
dese. A distância de L5 ao ápice dos processos trans- inclinação lateral de 30 a 45°. As dimensões dos pe-
versos é menor que 1 cm, dificultando o acesso a essa dículos de S1 permitem a inserção de um parafuso in-
área através da linha média; a exposição é mais fácil clinado medialmente, em direção ao promontório, e
através do acesso paraespinhal de Wiltse95. A profun- outro lateralmente, em direção à asa do sacro.
didade da porção superior da asa sacral cria um espa- O comprimento máximo dos parafusos em S1 de-
ço para o posicionamento de enxerto corticoesponjo- pende da sua inclinação. Um parafuso inserido direta-
so; apesar disso, esse espaço raramente é explorado mente pode ter até 30 mm, enquanto um parafuso in-
como área para artrodese, sendo mais utilizado para serido em direção ao promontório pode ter de 45 a 50
fixação de ganchos, como no instrumental de Har- mm e um parafuso em direção à asa sacral terá de 35 a
rington. A inclinação da asa sacral é bem explorada 40 mm99. Um parafuso transacrolombar (utilizado para
pelo método descrito por Dunn e McCarthy para fixa- espondilolistese) pode ter até 70 mm de comprimento.
ção em escoliose paralítica96 (Fig. 50.10). As referências anatômicas para a inserção de para-
A asa do ilíaco se sobrepõe à asa do sacro e ao fusos pediculares em S1 devem ser bem conhecidas.
processo transverso de L5. É possível realizar uma Se o canal vertebral estiver aberto (por laminectomia
osteotomia da porção posterior da asa ilíaca, a fim ou flavotomia em L5-S1), a borda medial do pedículo
de obter uma área de artrodese lombopélvica. Essa poderá ser identificada com um retrator de raiz curvo,
sobreposição, que é mais pronunciada no sexo femi- após identificação da raiz de S1. Essa técnica é extre-
nino, pode dificultar o posicionamento de parafusos mamente útil na inserção de parafusos iliossacrais100.
convergentes em S1; esta área é, ainda, o ponto de Se o canal não estiver exposto, o ponto de entrada
inserção de parafusos sacroíliacos97. do parafuso irá variar de acordo com a orientação do
Os pedículos de S1 têm formato trapezoidal, sendo parafuso, podendo ser distal, a fim de permitir uma
delimitados medialmente pelo canal vertebral ou por inclinação ascendente de 10 a 20°, de acordo com a
uma linha imaginária entre o primeiro forame sacral técnica descrita por Jackson, medial, caso o objetivo
dorsal e o aspecto medial da articulação L5-S1, late- seja atingir a asa do sacro, ou até lateral, no caso de
ralmente pela articulação sacroilíaca e inferiormente parafuso iliossacral88,98,101.
pelo primeiro forame sacral dorsal. Estes são os maio- A arquitetura óssea interna e a densidade mineral
óssea (DMO) do sacro foram avaliadas de maneira
extensa102-105. A espessura do osso cortical no sacro
varia individualmente, mas permanece praticamente
a mesma, de 0,5 a 2,5 mm, ao nível de S1 e S2, com
exceção da zona de condensação. Esta é uma área de
maior densidade do córtex anterior, entre o corpo e a
asa do sacro, logo acima do forame sacral anterior. A

30o C B

D
Fig. 50.10 – Fixação Dunn-McCarthy ao sacro. (A) Radio-
grafia pré-operatória lateral; (B e C) Radiografias pós-opera- Fig. 50.11 – Posicionamento do parafuso pedicular em S1.
tórias mostrando correção da deformidade e posicionamento (A) Pontos de entrada. (B a D) Ângulos para inserção direta
das hastes. (B), lateral (C) e medial (D).

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espessura não varia por idade ou sexo e, ao nível do pouco utilizada atualmente, ou para fixação transilíaca
promontório, a espessura do osso cortical permanece e suas variações, com ou sem parafusos em S1100,108,109.
a mesma103. Entretanto, a geometria do promontório O método de Galveston tem sido utilizado desde
permite que um parafuso que atinja essa região tenha o início dos anos de 1980 e sua aplicação requer co-
fixação aumentada por estar em contato com o córtex nhecimento preciso da geometria dos ossos da pelve.
superior e anterior do sacro97. A melhor área do ilíaco para inserção da haste é num
As trabéculas do corpo de S1 apresentam um pa- trajeto a partir da espinha ilíaca póstero-superior, na
drão cruciforme no plano transversal, sendo mais altura da lâmina de S2, 2 a 3 cm acima da incisura
densas no corpo e abaixo da placa vertebral. São es- isquiática, em direção à espinha ilíaca antero-inferior,
parsas no pedículo em si, e na asa sacral um vão ten- que corresponde à maior espessura do ílio. Acima
de a aparecer em pacientes idosos. A DMO do sacro dessa área, a asa ilíaca é extremamente fina (algumas
é maior nas proximidades da placa vertebral de S1 vezes medindo 1 ou 2 mm), enquanto a região abaixo
(30% maior), e em idosos esta chega a atingir níveis traz o risco de lesar estruturas da incisura isquiática
40% inferiores aos do adulto jovem. Essas diferenças ou de penetrar o acetábulo. Recomenda-se que o diâ­
explicam as falhas da interface osso-implante em pa- metro mínimo da haste seja de 6 mm na criança e 8
cientes idosos105. mm no adulto, podendo chegar até a 15 cm de com-
O pedículo de S2 é estreito e tem uma altura que primento. Para modelagem adequada da haste, deve-
vai de 15 a 20 mm. Sua profundidade é muito limita- se ter em mente que o ílio tem uma inclinação de 20 a
da e não ultrapassa 20 mm. As referências anatômicas 30° em relação ao plano sagital106,110.
que delimitam o pedículo são o aspecto inferior do Outras técnicas para fixação pélvica são usadas
forame dorsal de S1 e o aspecto superior do forame com menor freqüência. O ílio pode ser fixado em al-
de S2. Devido à limitação da profundidade, a única gumas malformações lombopélvicas com ganchos na
direção possível para a colocação de parafusos pedi- incisura isquiática e na crista ilíaca, geralmente utili-
culares é a lateral, visando à asa do sacro, e o compri- zando ganchos laminares em pacientes pediátricos, já
mento de um parafuso inclinado lateralmente 20° é de que no adulto a espessura dessas estruturas varia de
cerca99 de 30 mm. 18 a 30 mm97.

Massas Laterais do Sacro Sistemas de Fixação Lombopélvica


De acordo com Jackson, as massas laterais são Diversas técnicas foram descritas para tentar con-
suficientemente grandes para permitir a inserção de trolar as forças que atuam sobre a junção lombossa-
uma haste sacral de 7 mm de diâmetro, no mínimo até cra. Métodos utilizando placas já foram descritos e
o nível de S288. A menor distância entre a borda late- utilizados, mas atualmente sistemas utilizando pa-
ral do forame de S1 e a articulação sacroilíaca é 17 rafusos e hastes são o método de escolha111, por sua
mm (média de 28 mm). A posição da haste deve ser, maior capacidade de fixação ao osso.
então, abaixo do parafuso pedicular em S1, lateral aos O’Brien dividiu a unidade sacropélvica em três
forames sacrais, indo em direção ao ângulo ântero- zonas de fixação. A Zona I é formada pelo corpo de
inferior da articulação sacroilíaca. S1 e a porção cefálica da asa do sacro; a Zona II in-
clui a asa do sacro, S2, e se estende ao cóccix; a Zona
Ilíaco III inclui o ílio bilateralmente. Essa divisão permite
melhor compreensão das propriedades biomecânicas
Este é o único ponto de fixação pélvica que permi- de cada método de fixação e suas aplicações112. Os
te a colocação do implante anteriormente ao centro da autores incluem nessa divisão uma quarta zona de fi-
coluna osteoligamentar. Miller et al.106 compararam a xação, que consiste no espaço discal, utilizado para
arquitetura do ílio à de um osso longo, com compo- dar suporte à coluna anterior. A Tabela 50.2 descreve
nentes metafisários localizados anteriormente (da cú- os métodos de fixação mais utilizados na região lom-
pula do acetábulo até a crista ilíaca anterior) e poste- bossacra, divididos por zona de fixação.
riormente (entre as espinhas ilíacas posteriores), com
uma porção diafisária central (da incisura isquiática à
fossa ilíaca). A altura média dessa porção diafisária é Parafusos Pediculares em S1
32,1 mm (de 23 a 42 mm), e a distância média entre Estes podem ser inseridos na asa do sacro lateral-
a crista ilíaca posterior e a incisura isquiática é 70,8 mente, na asa anterior de modo direto, ou no corpo
mm (de 60 a 82mm). vertebral e promontório medialmente113 (Fig. 50.11).
A espessura da espinha ilíaca póstero-superior é va- Estudos biomecânicos demonstraram que há pouca di-
riável, mas pode atingir 35 mm na altura de S2, enquan- ferença quando se compara a inserção medial ou late-
to em S1 a espessura é cerca de 17 mm. Esta foi utili- ral, e que a inserção direta é significativamente menos
zada por Luque107 na sua técnica de fixação transilíaca, resistente, em testes de tração axial (pullout test)111,114.

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Tabela 50.2 – Métodos de fixação para estabilização em risco durante a inserção lateral e direta de para-
lombossacra fusos no sacro. Na técnica direta, o tronco simpático
e a veia íliaca comum esquerda apresentavam-se no
Zona Região anatômica Método de fixação
trajeto do parafuso; a técnica lateral colocava em ris-
I Corpo de S1, porção Parafusos pediculares em S1 co o tronco lombossacro em S1, e em S2 o parafuso
superior da asa do Método Dunn-McCarthy colocava em risco a raiz de S2.
sacro Parafusos transfacetários em
L5-S1
II Asa do sacro, S2 e Parafusos pediculares na asa Método Dunn-McCarthy (Fig. 50.10)
sacro distal do sacro Também conhecido como o método das hastes em
Ganchos, amarrias
sublaminares “S”, é adequado para pacientes pediátricos que neces-
Método de Jackson sitam de forte resistência contra flexão ou pacientes
III Ílio Método de Galveston
não deambuladores com escoliose neuromuscular.
Parafusos ilíacos Sua desvantagem é não oferecer resistência à distra-
Barra iliossacral ção axial, rotação e inclinações laterais, o que invia-
IV Espaço discal L5-S1 Enxerto autólogo tricortical
biliza seu uso em pacientes deambuladores96,112. A
Enxerto homólogo femoral técnica deve ser utilizada apenas para pacientes com
Dispositivos intersomáticos nível funcional cranial a L2, pois a inserção da haste
posteriores no forame de L5-S1 e seu posicionamento pré-sacral
Dispositivos intersomáticos podem lesar a raiz de L5 e o plexo lombossacro. A
anteriores
melhor indicação desse método é, na nossa opinião,
a fixação lombossacra após “correção de cifose em
pacientes com mielomeningocele. Essa técnica pode
Outros estudos compararam o posicionamento medial ser reforçada por parafusos pediculares na coluna
e lateral de parafusos pediculares em S1, com uma pe- lombar, aumentando a resistência da montagem em
quena vantagem a favor da inserção medial115-117. flexão, principalmente em pacientes que se sentam
É consenso que o uso de instrumentação deve au- apoiados no ílio em vez do ísquio.
mentar a taxa de consolidação, além de aumentar a
capacidade de correção de uma deformidade e impe-
dir sua progressão118. McNulty e McAffee118 afirma- Parafusos Transfacetários L5-S1 (Fig. 50.12)
ram que a habilidade de corrigir uma deformidade é A orientação coronal das facetas articulares L5-S1,
uma combinação de flexibilidade, liberação cirúrgica, em conjunto com a fina lâmina de L5, dificulta o uso
qualidade e número de pontos de fixação óssea e esta- de parafusos translaminares. Apesar disso, a inserção
bilidade fornecida pela instrumentação. de parafusos diretamente nas facetas articulares, de
Carson estabeleceu que 80% da carga compressiva acordo com Boucher, é segura nesse nível. O para-
da coluna é transmitida através dos corpos vertebrais, fuso deve ser direcionado de proximal para distal e
numa montagem pedicular adequada em três níveis. lateralmente, visando a asa do sacro. Esses dois tipos
Quando o compartilhamento de carga através dos cor- de parafuso oferecem pouca estabilidade intrínseca à
pos vertebrais é eliminado, seja por discectomia, mo- montagem lombossacra97,126.
delagem longitudinal inadequada ou distração entre
níveis instrumentados, o momento de flexão nos para-
fusos pediculares superiores aumenta em sete vezes119. A B C

Há várias maneiras de ampliar a resistência da fi-


xação pedicular na coluna lombossacra. Um torque de
inserção mínimo de 4 libras/polegada, por exemplo, é
uma indicação melhor de boa interface osso-implante
do que estimativas com densidade mineral óssea120.
Triangulação eficaz dos parafusos pediculares e uso
de conectores transversais, assim como penetração
do córtex anterior (ou ao menos da metade anterior
do corpo vertebral), também aumentam a rigidez das
montagens lombossacras121-123.
Leong et al.124 compararam a rigidez de um pa-
rafuso sacral único à de dois parafusos divergentes Fig. 50.12 – Exemplos de suporte à coluna anterior na fi-
xação lombossacra. (A) Dispositivo intersomático posterior e
num modelo cadavérico e identificaram um aumento parafusos translaminares. (B) Cages de titânio em artrodese
de 100% da rigidez da montagem com dois parafusos. longa ao sacro. (C) Suporte à coluna anterior utilizando cages
Licht125, também em cadáveres, avaliou as estruturas de titânio e fixação posterior com parafusos pediculares.

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Heggeness e Esses realizaram um estudo biomecâ-


nico em que aplicaram cargas cíclicas a colunas ins-
trumentadas com parafusos translaminares, demons-
trando que a coluna instrumentada exigiu uma carga
nove vezes maior que a não instrumentada para sofrer
deslocamento. Cargas repetidas mostraram pequena
alteração na rigidez dos segmentos instrumentados
após 5.000 ciclos127.
Kornblatt et al. compararam parafusos facetários
à técnica de Galveston quanto à capacidade de estabi-
lização da coluna lombossacra, demonstrando maior Fig. 50.13 – Ilustração da fixação de Jackson ao sacro.
resistência em flexão com a técnica de Galveston e
concluindo que fixações que se estendem distalmente
fornecem melhor resistência biomecânica84. Técnica de Galveston
Nesse método, uma haste é moldada a fim de
Ganchos e Amarrias Sublaminares constituir uma extensão longitudinal da instrumenta­
O método de Luque, com amarrias sublaminares ção lombar e lombossacra, sendo introduzida no
fixadas à haste metálica, pode ser estendido à pelve ílio obliquamente, acima da incisura isquiática bila­
ao direcionar a porção distal da haste através da pel- teralmente82,131. Essa técnica oferece boa resistência
ve, fornecendo inserção bicortical107. à flexão, mas, por utilizar uma haste lisa, há pouca
O´Brien demonstrou que, apesar de oferecerem resistência à tração axial. Isso resulta em micromovi-
firme fixação ao sacro, ganchos não fornecem um mentos no ílio que, em conjunto com os movimentos
aumento significativo na resistência das montagens, da articulação sacroilíaca, pode acarretar erosão do
por estarem posicionados posteriormente ao eixo de ílio e perda da fixação132. Tendo essa desvantagem em
rotação para flexão e extensão112. mente, permanece como uma boa opção para pacien-
tes com baixa demanda funcional133.
Fixação de Jackson (Fig. 50.13) Emami et al. compararam as complicações de ins-
trumentações longas ao sacro em adultos, utilizando
Jackson e McManus88 propuseram que uma haste a técnica de Galveston (n = 11), fixação sacral (n =
sacral, posicionada através de um parafuso pedicu- 12) e fixação ilíaca e sacral combinada com parafu-
lar em S1 em direção à asa do sacro, ofereceria um sos pediculares (n = 36), encontrando uma taxa de
benefício duplo. Primeiro, por estender a montagem pseudo-artrose elevada (36%) no grupo que utilizou a
distalmente ao parafuso S1, aumentaria a resistência técnica de Galveston, e concluíram que esta não deve
em relação ao eixo de rotação lombossacro quando ser utilizada na correção de deformidades da coluna
comparada ao parafuso em S1 isolado. Segundo, o no adulto134.
ílio posterior se sobrepõe ao sacro, servindo como es-
tabilização adicional (buttress) ao osso relativamente
fraco da asa sacral128. Parafusos Ilíacos
Apesar de estudos relatarem bons resultados clíni- O ílio oferece uma eficiente âncora à fixação lom-
cos, essa técnica foi pouco avaliada do ponto de vista bossacra, principalmente no caso de montagens tora-
biomecânico. Num estudo feito por Glazer et al.129, a colombares112. A inserção de um parafuso pedicular
haste sacral de Jackson mostrou maior rigidez que a longo (de até 10 cm) no ílio permite fixação com re-
fixação de uma haste ao ilíaco (técnica de Galveston) sistência à flexão comparável à da técnica de Galves-
em compressão, extensão e inclinações laterais. ton, com a vantagem de possuir diâmetro maior (7
De acordo com Arlet et al.97, apesar do suporte do ílio a 9 mm) e melhor fixação à coluna ilíaca posterior
à haste sacral, a posição deste acaba sendo muito medial (Fig. 50.14). Mais de um parafuso pode ser inserido
para correção de obliqüidade pélvica, pois esta requer caso seja necessária fixação adicional, em casos de
uma alavanca mais longa e fixação óssea mais lateral. patologia sacral, com defeitos congênitos, tumores,
Lebwhol et al. compararam pontos de fixação sa- infecção ou trauma112,135,136.
cral, incluindo a haste de Jackson, a parafusos ilíacos Miller et al.106 determinaram que a melhor ade-
para estabilização lombossacra, e não encontraram rência do parafuso ocorre 2 cm acima da incisura
aumento significativo na resistência de montagens isquiática. Entretanto, os autores citam a dificuldade
que utilizavam a haste sacral ou parafusos em S2 de posicionamento nessa área, com 25% das perfura-
como extensão. Os parafusos ilíacos, por sua vez, au- ções penetrando o acetábulo, determinando que o lo-
mentaram significativamente a resistência da fixação cal mais adequado para fixação pélvica seria o centro
em relação às técnicas citadas130. do ílio, numa linha que vai do ponto de entrada, na

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A B

C
Fig. 50.15 – Ilustração do posicionamento correto dos pa-
rafusos iliossacrais.
D

A B

Fig. 50.14 – Parafusos ilíacos para fixação lombossacra. (A)


Tomografia pré-operatória mostrando metástase de carcino-
ma renal no sacro. (B) Radiografia lateral com a fixação após
ressecção do tumor. (C) Tomografia pós-operatória mostrando
o posicionamento dos parafusos no ílio. (D) Radiografia mos-
trando a inserção de dois parafusos ilíacos no lado esquerdo.

altura de S2-S3, em direção à espinha ilíaca ântero-


inferior. Essa linha é paralela ao disco intervertebral
do sacro no plano coronal e tem 25° de inclinação em
relação à linha média no plano sagital. A profundidade
média do ílio nessa trajetória é de 14 cm (variando de
11 a 15 cm). Outros estudos sustentam os achados de
Miller, demonstrando a superioridade da fixação lom- Fig. 50.16 – Exemplo do uso de parafusos iliossacrais na
bossacra com parafusos ilíacos em relação a outros obliqüidade pélvica. (A) Radiografia pré-operatória. (B) Ra-
métodos87,110. diografia pós-operatória mostrando correção da obliqüidade
pélvica.

Fixação Iliossacral (Figs. 50.15 e 50.16) Montagem “M-W” (Fig. 50.17)


Dubousset foi o primeiro a relatar o uso de parafu- Essa montagem foi descrita como uma combina-
sos iliossacrais na correção da obliqüidade pélvica108. ção entre parafusos iliossacrais e parafusos ilíacos100
Parafusos de 7 mm são inseridos em S1, a partir da e é facilitada pelo uso de parafusos e ganchos com
asa do ílio, num ângulo de 45 a 60°. A orientação me- abertura lateral, tais como os do AO Universal Spine
dial do parafuso pedicular em S1 oferece resistência System. O uso de ganchos acima ou abaixo dos pa-
elevada à tração, aumentando a qualidade da fixação, rafusos iliossacrais permite que estes seja deslizados
como demonstrado em estudos por Zindrik et al.114, lateralmente quando da inserção dos parafusos ilía-
Kraemer et al.137 e Camp et al.138. Camp também de- cos; os ganchos laminares e os parafusos permitem
monstrou que a falha do parafuso iliossacral ocorre um off-set de 4 mm quando posicionados de maneira
por regressão e rotação da conexão haste-parafuso, e oposta em relação à haste, facilitando a montagem.
não de falha na interface entre o osso e o parafuso138. A melhor indicação para essa técnica é a correção de
Para melhor posicionamento dessa técnica, reco- obliqüidade pélvica grave. O primeiro passo é corrigir a
menda-se uma pequena laminotomia de S1, permitin- deformidade da mesma maneira que na técnica de Gal-
do identificação da raiz de S1 e inserção do parafuso veston, permitindo que, em seguida, a pelve seja corri-
no pedículo sobre visão direta. Freqüentemente um gida ao utilizar a haste como alavanca. As hastes são,
vaso epidural deverá ser coagulado ou tamponado então, conectadas à coluna, seguida de manobras alter-
nessa área. nadas de compressão e distração para alinhar a pelve.
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A B C 7 mm, geralmente dois, são necessários para estabili-


zar a junção lombossacra, além de haver a necessida-
de de imobilização externa pós-operatória para evitar
quebra do parafuso.

Suporte à Coluna Anterior (Fig. 50.12)


Glazer et al.129 foram os primeiros a avaliar os
D
efeitos da estabilização da coluna anterior sobre a fi-
xação lombossacra, demonstrando que o uso de anéis
femorais homólogos, enxerto autólogo tricortical, ou
dispositivos metálicos aumenta significativamente a
rigidez intervertebral da coluna instrumentada por via
posterior, tanto em compressão quanto em rotação. Ao
comparar as montagens anteriores entre si, os autores
Fig. 50.17 – Montagem MW. (A) Radiografia pré-operatória. determinaram que dispositivos metálicos rosqueados
(B) Radiografia pós-operatória. (C) Tomografia demonstrando (threaded cages) são mais rígidos em rotação axial, e
o posicionamento dos parafusos. (D) Radiografia com a mon-
tagem MW em detalhe.
que os anéis femorais são mais resistentes à compres-
são. A retirada da instrumentação posterior reduziu
significativamente a estabilidade da montagem.
Barra Sacra Closkey et al.141 demonstraram, em seu estudo
O modelamento das hastes, permitindo que atuem biomecânico, que a área mínima para estabilização
como uma barra sacra ao estender a fixação lombar e anterior é de aproximadamente 30% da placa verte-
auxiliar na correção da obliqüidade pélvica, foi o ob- bral e que, em casos de densidade mineral óssea re-
jetivo de Marchesi et al.135 e de King et al.109, com suas duzida, há necessidade de uma área maior para evitar
respectivas técnicas. Ambos afirmam que esse méto- acomodação do enxerto.
do seria similar ao de Galveston, porém de execução Lee e Lagnara142 afirmaram que, em simulações
mais simples e rápida. Biomecanicamente, a técnica de carga fisiológica, a artrodese intersomática resulta
STIF (spinopelvic transiliac fixation) demonstrou ser em melhor imobilização da unidade vertebral móvel
superior ao método de Galveston em carga axial e em quando comparada com artrodese posterior e inter-
flexão, mas não em extensão109. A principal limitação transversa. Entretanto, os autores também relatam au-
desse método é a necessidade de uma asa ilíaca bem mento das forças que atuam sobre os níveis adjacen-
desenvolvida, geralmente ausente em pacientes com tes que não passaram por artrodese, principalmente
deformidade neuromuscular139. em comparação à artrodese intertransversa.
Outras indicações da fixação transilíaca incluem Apesar de estudos demonstrarem resultados clíni-
tumores da região lombossacra, ou como comple- cos satisfatórios de até 92% e taxas de artrodese acima
mento à fixação sacral pedicular tradicional.
A B
Fixação em Delta
Esse método só está indicado para espondilolistese
e se utiliza da projeção de L5 sobre o sacro. Inserem-
se parafusos de até 80 mm, sob fluoroscopia, do as-
pecto inferior do pedículo de S1, atravessando a placa
vertebral de S1 em direção ao corpo de L5. Em ra-
zão da dificuldade em delimitar o aspecto inferior do
pedículo de S1, recomendamos um laminotomia do
sacro nessa região. Apesar de não haver estudos bio-
mecânicos envolvendo essa técnica, Grob140 relatou
sua experiência com 18 pacientes, atingindo 100%
de consolidação em casos em que havia degeneração
avançada do espaço discal L5-S1.

Parafuso Anterior L5-S1 (Fig. 50.18)


Fig. 50.18 – Parafuso anterior L5-S1 para espondilolistese.
Seu uso é limitado à estabilização de espondilolis- (A) Radiografia pós-operatória. (B) Radiografia após 6 meses,
tese, sendo submetido a grandes cargas. Parafusos de com o parafuso quebrado (círculo).

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de 90%, alguns autores enfatizam a alta morbidade Implantes que não contemplaram essa necessidade
e taxas de complicação dos procedimentos para ar- apresentaram altas taxas de colapso e migração. Uma
trodese intersomática por via posterior (PLIF). Essas segunda necessidade, para evitar colapso e migração,
complicações incluem sangramento excessivo, lesão é que a superfície de contato entre implante e osso
à raiz nervosa, retropulsão do enxerto, fibrose epidu- não seja móvel e que tenha capacidade de osteointe-
ral, aracnoidite e instabilidade iatrogênica143-147. Shi- gração. Questões menos definidas são o material da
rado et al.147 demonstraram, num modelo cadavérico prótese, o tipo de eixo de rotação (móvel ou fixo) e a
para espondilolistese, que o uso de PLIF isoladamen- relação da superfície móvel com a fixa do implante
te não reduzia de modo significativo a mobilidade do (não constrita, semiconstrita ou constrita)148.
segmento; a menor mobilidade foi observada com o
uso de fixação transpedicular.
Estabilização Interespinhosa
A complexidade tanto anatômica quanto biomecâ-
nica da junção lombossacra expõe sistemas de fixação Os dispositivos interespinhosos apresentam duas
a longos eixos de força e a cargas de cisalhamento, aplicações distintas: aumentar o espaço do canal in-
dificultando a compressão necessária à consolidação tervertebral em portadores de estenose lombar e redu-
da artrodese. A evolução das técnicas de fixação per- zir as cargas que atuam sobre o disco intervertebral na
mite fixação rígida dessa área, especialmente com a doença discal degenerativa.
extensão das montagens à asa do ilíaco. O suporte à Apesar de estar disponível em diversos modelos,
coluna anterior, como complemento à fixação poste- há pouca diferença biomecânica entre eles e raros es-
rior, reduz as forças de cisalhamento e as cargas que tudos com metodologia aceitável. Um estudo recente
atuam sobre os implantes posteriores. demonstrou vantagem no uso de um espaçador inte-
respinhoso (X-Stop) em comparação com o manejo
ESTABILIZAÇÃO DINÂMICA DA COLUNA conservador no tratamento da estenose lombar149.
Outros dispositivos, utilizados no tratamento e até
Opção cada vez mais presente no dia-a-dia do ci-
rurgião de coluna, a estabilização dinâmica pode ser mesmo na prevenção da degeneração discal interver-
dividida em próteses discais, espaçadores interespi- tebral, possuem poucos estudos que demonstrem seus
nhosos e sistemas pediculares. resultados e validem suas aplicações.
Os implantes que têm esse propósito devem ser
projetados para suportar cargas fisiológicas por toda a Sistemas de Estabilização Pedicular
vida, reproduzindo o eixo de rotação da unidade fun- Podem ser divididos em implantes flexíveis ou rí-
cional da coluna. A falha em suprir tais necessidades gidos, de acordo com o tipo de material que une os pa-
acarretará sobrecarga ligamentar e facetária, com pos- rafusos pediculares. Os sistemas flexíveis têm como
sível hipertrofia dessas estruturas. Outro objetivo dos seus representantes mais conhecidos o Dynesys, que
dispositivos dinâmicos é a distribuição de cargas de utiliza barras de policarbonato, e o sistema de Graf,
maneira homogênea entre os segmentos adjacentes, com ligamentos de fibra sintética, que tensionam a
e para tal o arco de movimento da unidade funcional montagem. Apesar de diversas publicações sobre o
(de 9 a 14°) deve ser mantido. assunto, o tempo de seguimento é curto, as indicações
de uso são variáveis, e não há, na maioria dos estudos,
Próteses Discais um grupo-controle para comparação148. Os sistemas
rígidos vieram como alternativa para mesclar artro-
A substituição do disco intervertebral degenerado deses e fixações dinâmicas, com o objetivo teórico de
é objetivo de pesquisa há mais de meio século, porém limitar a degeneração de discos adjacentes à fusão148.
apenas nos últimos dez anos é que estudos biomecâ-
nicos e clínicos começaram a definir adequadamente
as reais indicações para esse procedimento. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Atualmente, a substituição do disco pode ser di- 1. Drummond D, Guadagni J, Keene JS, et al. Inters-
vidida em total, em que todo o disco é removido, e pinous process segmental spinal instrumentation. J
parcial, onde apenas o núcleo pulposo é substituído. Pediatr Orthop. 1984;4:397-404.
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

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Tratamento Cirúrgico das Metástases da
Coluna Vertebral
Marcos Vinícius Calfat Maldaun
Helder Zambelli

INTRODUÇÃO Tabela 51.1 – Revisão da incidência das metástases

A
s metástases ósseas para a coluna são freqüen- espinhais
temente encontradas na prática médica. Com Localização primária Porcentagem de todas as
o envelhecimento da população mundial, as metástases espinhais
novas técnicas diagnósticas e o tratamento adequa- Mama 30,2
do com prolongamento da sobrevida dos pacientes,
Pulmão 20,3
o câncer passou a ser uma doença com alta taxa de
mortalidade de adultos, sendo superada apenas pe- Hematológica 10,2
las doenças cardiovasculares. Em 2004, a Socie- Próstata 9,6
dade Americana de Câncer estipulou em mais de Trato urinário 4
1.350.000 casos novos diagnosticados nos Estados
Unidos nesse ano, com aproximadamente 550.000 Pele 3,1
óbitos decorrentes da doença (quase 1.500 óbitos Desconhecido 2,9
ao dia), principalmente por complicações da doen- Cólon 1,6
ça metastática. Após pulmão e fígado, o esqueleto
Outros 18,1
é o terceiro local mais comum de metástase, sendo
a coluna espinhal o local mais comum das metásta- Adaptado de Gokaslan et al. 2

ses para o esqueleto. Nas séries de autópsia, cerca de


90% dos casos apresentarão metástases em coluna, MANIFESTAÇÃO CLÍNICA E DIAGNÓSTICO
ao passo que entre 10% e 30% dos pacientes desen- A partir da coluna, a lesão pode estender-se para
volverão metástases espinhais sintomáticas durante a estruturas vizinhas, como parede torácica, mediastino
evolução da doença1-4. ou, ainda, forame radicular e canal medular. O quadro
Cerca de 80% das metástases localizam-se no corpo clínico varia de acordo com a localização da doença,
vertebral, ao passo que 20% acometem os elementos estruturas acometidas e/ou alteração biomecânica da
posteriores. Ressaltamos que células tumorais sofrem coluna. A principal manifestação clínica desses pacien-
metástase principalmente para estruturas ósseas alta- tes é dor. Dor em região da coluna em pacientes on-
mente vascularizadas, como corpo vertebral, costela e cológicos corresponde a metástase espinhal, até que se
osso longos proximais. No eixo espinhal, em torno de prove o contrário1,5. A Tabela 51.2 sintetiza as principais
70% acometem coluna torácica, 20% lombar e 10% a características do tipo de dor que pode ser apresentado
cervical. Os cânceres que mais comumente atingem por esses pacientes. A fisiopatogenia da dor decorre dos
a coluna são de mama, pulmão e próstata1,2. A Tabela efeitos biológicos causados pelo tumor, pelas alterações
51.1 sumariza a incidência das principais histologias. mecânicas e por alterações estruturais espinhais.

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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Tabela 51.2 – Características da dor em pacientes com metástases e coluna


Dor local Dor espinhal axial Dor radicular
• Constante • Mecânica • Geralmente constante
• Sem piora com movimento ou posição • Piora com movimento • Pode piorar ou melhorar com
prona • Melhora com repouso movimento
• Sem alívio ao deitar • Colapso vertebral e/ou deformidade • Segue distribuição radicular
• Sem colapso vertebral ou deformidade espinhal • Associado com disestesias ou paresias
espinhal • Causada por instabilidade espinhal • Causado por compressão da raíz nervosa
• Causada por estiramento periosteal

Sinais e sintomas neurológicos variam de acordo dula óssea, como o mieloma múltiplo. A tomografia
com a compressão direta das estruturas neurais pelo permite avaliar o grau de acometimento ósseo, tendo
tumor e/ou pelas alterações mecânicas da fratura ins- menor sensibilidade que a ressonância na avaliação
tável, podendo ser desde radiculopatias (compressão da extensão da doença intra e extracanal5,6.
das raízes nervosas), com parestesias e paresias de A ressonância magnética é o exame de escolha por
acordo com o território da raiz acometida, bem como ser mais sensível e específico que as demais modali-
compressão medular. A mielopatia geralmente come- dades no diagnóstico e planejamento terapêutico des-
ça com sinais de liberação piramidal, com hiper-re- ses pacientes. As imagens permitem avaliar, ainda, o
flexia, sinal de Babinski ou clônus, podendo progre- grau de acometimento epidural, foraminal e paraespi-
dir para sinais deficitários como fraqueza, perda da nhal, com seus possíveis efeitos compressivos sobre
sensibilidade proprioceptiva, térmica e tato do nível as estruturas neurais. Geralmente em T1W a imagem
abaixo da lesão, além de alterações esfincterianas. é hipointensa comparativamente com o sinal da me-
O exame neurológico é imprescindível para direcio- dula, ao passo que em T2W torna-se hiperintensa5,6. A
namento do tratamento, especialmente em pacientes Fig. 51.1 evidencia as alterações ósseas e seus efeitos
com doença em vários níveis. Outro dado importante compressivos medulares e radiculares.
é a graduação funcional desses doentes, sendo a es-
cala de Frankel amplamente utilizada pela literatura3
(Tabela 51.3).

Tabela 51.3 – Escala funcional de Frankel


Grau Característica
A Completa perda da função sensitiva e motora
B Perda motora completa e sensitiva parcial
C Função sensitiva alterada e alteração motora parcial,
mas não funcional
D Alterações sensitivas mínimas, fraqueza motora, mas
funcional
E Neurologicamente preservado

Apesar dos avanços diagnósticos das últimas dé-


cadas, nenhum exame é ainda 100% sensitivo para
detecção da doença metastática em coluna. Radio-
grafias simples constituem exame pobre na detecção
da doença, uma vez que necessitam de mais de 50%
de destruição do corpo vertebral para visualização da
alteração radiográfica. A radiografia simples torna-se
útil para programação da estratégia cirúrgica, ava-
liando o grau de deformidade causado pela doença,
bem como o controle de eventuais instrumentações
cirúrgicas. A cintilografia óssea torna-se útil por loca-
lizar lesões osteoblásticas em todo o corpo, mas tem Fig. 51.1 – Ressonância magnética de paciente com metás-
sensibilidade baixa para lesões predominantes da me- tases de carcinoma de mama em coluna cervical.

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51 – Tratamento Cirúrgico das Metástases da Coluna Vertebral

TRATAMENTO As principais contra-indicações da radioterapia


são:
O tratamento das metástases em coluna deve ser
sempre abordado em caráter multidisciplinar com on- • Tumores radioinsensíveis.
cologista, radioterapeuta e neurocirurgião. As diversas • Radiação prévia.
possibilidades de apresentação clínica e radiológica, • Instabilidade significativa.
bem como o acometimento sistêmico do câncer faz • Compressão óssea de elementos neurais
com que esses pacientes devam ser avaliados de ma-
neira individualizada. Consideramos que o tratamen- Tratamento Cirúrgico
to deve preconizar: (1) qualidade de vida do paciente;
(2) alívio dos sintomas neurológicos e da dor; (3) con- As indicações clássicas de cirurgia para pacientes
trole oncológico da doença na coluna. Sempre devem com metástase em coluna são o comprometimento
ser considerados a natureza da metástase, o potencial neurológico (radiculopatia e/ou mielopatia), dor in-
metastático, a resposta ao tratamento complementar, tratável, instabilidade e/ou deformidade e, quando a
a extensão da doença sistêmica e do tratamento pré- cirurgia pode causar impacto prognóstico (por exem-
vio e a estimativa da sobrevida de cada paciente. plo, em casos com doença sistêmica controlada e me-
O uso de esteróides deve ser preconizado para o con- tástase única em coluna). Preconiza-se que a cirurgia
trole da dor biológica e do edema vasogênico, visando deva resolver tais problemas e ter efeito duradouro.
estabilizar ou melhorar sintomas neurológicos, sem- Torna-se imprescindível saber que a gravidade da
pre lembrando dos possíveis efeitos colaterais, como compressão medular, com seus respectivos sintomas,
miopatia, sangramento gastrointestinal, hiperglicemia determina a urgência do procedimento e o direciona-
e necrose da cabeça do fêmur. A quimioterapia como mento do tratamento. Além disso, compressão medu-
tratamento da doença metastática em coluna é ainda li- lar sintomática é um problema cirúrgico com exceção
mitada, com exceção de alguns tumores quimiossensí- em casos rádio e/ou quimiossensíveis. Inicialmente,
veis, como neuroblastoma, linfoma, tumores de células deve-se considerar o estado clínico do paciente e se
germinativas e sarcoma osteogênico e de Erwing. Mais ele suporta o procedimento anestésico, coagulação e
recentemente, empregam-se terapias hormonais para tu- fatores de hemograma adequados e previsão de so-
mores mama e próstata. Seu uso em geral é limitado para brevida mínima (mortalidade não iminente).
tumores que causem nenhum ou mínimos sintomas. O O tipo de cirurgia pode ser descompressiva por via
uso de bifosfonados foi associado com menor taxa de posterior com laminectomia clássica dos níveis com-
fraturas e complicações relacionadas com esqueleto1,7,8. primidos, com ou sem estabilização. Já a ressecção
pode ser em bloco (ao redor do tumor), com remoção
Radioterapia total ou intralesional. Apesar de a primeira opção ter
um conceito oncológico mais adequado, não signi-
Várias modalidades podem ser aplicadas como a ra- fica que funcionalmente seu resultado seja diferente
dioterapia externa Standard, de intensidade modulada do das demais. Ressaltamos os dados da Tabela 51.4,
(IMRT), radiocirurgia esterotática e radioterapia com que mostra resultados aceitáveis e similares entre
proton beam. A dose clássica de tratamento é de 30 descompressão com estabilização e cirurgia mais ra-
Gy em 10 frações, com margem de 1 a 2 níveis acima dical com vertebrectomia, sem aumento significativo
e abaixo da lesão. Diversos trabalhos, principalmente da morbimortalidade. A melhor forma de abordagem
na década de 1970, mostraram a eficácia desse método cirúrgica depende do grau de ressecabilidade da le-
como modalidade terapêutica, mesmo em pacientes são, de reconstrução e estabilização, bem como loca-
com doença compressiva. A Tabela 51.4 mostra o re- lização da doença na coluna. A Tabela 51.5 mostra as
sultado da análise de vários trabalhos publicados com- opções de abordagem com os respectivos níveis da
parando os efeitos da radioterapia, laminectomia com coluna acessíveis.
ou sem radioterapia, laminectomia mais estabilização
e corpectomia mais establização em pacientes com Como já foi dito, a técnica cirúrgica varia de acor-
compressão da medula9-14. Já no clássico estudo de Pa- do com a localização da lesão. Lembramos que toda
tchell (apresentado na ASCO de 2003), evidenciou-se cirurgia de coluna deve, sempre que possível, ser rea­
melhor sobrevida para pacientes tratados com cirurgia lizada com monitoração funcional contínua soma-
mais radioterapia do que radioterapia apenas. tossensitiva e potencial evocado motor de membros
inferiores e superiores. Todos os casos devem receber
As principais indicações de radioterapia são:
antibiótico profilático 30 min antes da incisão. No
• Tumores radiossensíveis. nosso serviço preconizamos o uso de cefalosporina
• Quadro neurológico estável. de segunda geração. A embolização pré-operatória
• Dor radicular ou local. para minimizar sangramentos pode ser aplicada para
• Expectativa de vida limitada. tumores hipervasculares, como leiomiossarcomas,
• Impossibilidade de cirurgia. carcinoma renal, carcinoma papilar tireóide, 1 ou 2
• Doença em múltiplos níveis. dias antes do procedimento.
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

Tabela 51.4 – Análise de pacientes com compressão medular tratados com radioterapia, laminectomia, estabilização
com instrumental ou corpectomia com estabilização
Modalidade Média: ano da Nº de pacientes Melhora da dor Melhora motora Piora motora Mortalidade
publicação/ (média) (%) (%) (%) (%)
Nº trabalhos
estudados
RT apenas 1980 / 12 18-209 (64) NA 44 17 NA
Laminectomia 1981 / 20 17-465 (97) NA 47 13 7
com ou sem RT
Laminectomia 1987 / 11 12-200 (51) 89 67 2 8
com estabilização
Vertebrectomia 1989 / 12 15-101 (48) 85 76 4 10
com estabilização
Nº = número; NA = não avaliado; RT = radioterapia.

cipalmente se realizada em mais de um nível, pode


Tabela 51.5 – Tipos de abordagem e níveis acessíveis
ocorrer cifose e aumento da dor mecânica e déficit
Abordagem Níveis neurológico.
Posterior: laminectomia Todos A cirurgia para tumores da região atlantoaxial1,18,19
Póstero-lateral: é reservada para casos em que não há melhora dos
Transpedicular Todos sintomas com rádio e quimioterapia e colar cervical.
Costotransversectomia Torácicos A cirurgia é reservada para pacientes com subluxação
Lateral: do odontóide associada a fratura (> 5 mm) e/ou an-
Lateral extracavitário Torácicos gulação > 11° ou nos casos de falha terapêutica com
Ântero-lateral:
radioterapia. A cirurgia consiste em fixação occipito-
Toracotomia póstero-lateral Torácicos cervical associada a laminectomia de C1. Deve-se,
Retroperitoneal L2-L4 inicialmente, ter o cuidado de intubação anestésica
Toracoabdominal T11-L1 apropriada, de preferência com fibroncoscopia para
Anterior: evitar extensão cervical intensa. Segue o posiciona-
Esternotomia mediana T1-T3 mento adequado com cabeça com posição neutra. A
Transperitoneal L5-S1 técnica preconizada segue os preceitos da laminecto-
mia de C1 já descrita, com exposição das estruturas
ósseas por via posterior e do osso occipital. A fixação
A abordagem clássica de laminectomia15 pode pode ser feita por fios sublaminares em C2 e C3 e
ser realizada em qualquer nível da coluna e consiste passagem do fio por orifícios ósseos realizados bilate-
em incisão linear mediana da pele, descolamento do ralmente com drill 2 cm acima do forame magno. Co-
subcutâneo e abertura do ligamento supra-espinhoso loca-se a haste bilateral ou em U invertida e amarram-
com monopolar, seguida de descolamento subperios- se os fios de titânio. Como todos os casos de tumor,
tal da musculatura paravertebral. Realiza-se retirada deve-se evitar enxerto ósseo autólogo, podendo-se
do tecido periosteal. Uma vez ratificado o nível com usar granulado ósseo ao redor do sistema. A Fig. 51.2
escopia, realiza-se laminectomia com pinça Kerri- mostra um resultado cirúrgico de tal fixação. As prin-
son apropriada com descompressão medular e fora- cipais complicações são infecção, fratura das laminas
minectomia com descompressão radicular em casos pela tração da artrodese ou lesão dural ou medular. O
específicos. Eventualmente, resseca-se a porção dor- uso do colar Philadelphia deve ser preconizado por
sal epidural do tumor. O fechamento da musculatura até 2 meses após a cirurgia. Outra opção é a utiliza-
paravertebral e da aponeurose deve ser feito com fio ção de parafusos cranianos ou de massa lateral para a
não absorvível, seguida de aproximação do subcutâ- fixação da haste, com a ressalva de não os utilizar em
neo e pele. Esta deve ser fechada com fios de náilon corpos vertebrais acometidos pela doença.
com pontos simples ou contínuos não ancorados. As Para a região cervical subaxial1,16-18, deve-se, em
principais complicações são lesão dural ou medular primeiro lugar, definir se o acesso será por via ante-
durante a retirada da lamina e infecção. No caso de rior, posterior ou ambas. No acesso por via posterior,
lesão dural, esta deve ser suturada com Prolene® 4-0, seguem-se os preceitos já destacados de posiciona-
podendo ou não utilizar cola biológica e tecido gordu- mento e acesso à coluna por via posterior. Pode ou
roso para evitar fístulas. Em casos de doença signifi- não ser realizada laminectomia dos níveis desejados
cativa nos elementos anteriores à laminectomia, prin- com descompressão das estruturas neurais. Uma vez

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51 – Tratamento Cirúrgico das Metástases da Coluna Vertebral

gulação de 10 até 25° lateralmente, 20 a 40° cefálico


com relação ao eixo facetário e seguindo o trajeto da
pars facetária. Em casos especiais, pode-se colocar
unilateralmente. Para C7, a angulação lateral e caudal
deve ser um pouco maior. Após colocação dos parafu-
sos, põe-se a placa lateral. Segundo a literatura, a taxa
de lesão neurovascular varia de 1% a 3% dos casos e
de falha da artrodese de 1% a 5%.
O acesso por via anterior cervical é freqüente-
mente utilizado para casos com compressão anterior
de 1 até 2 níveis da coluna. A corpectomia por via
anterior pode ser feita de C3 até C7 por esse acesso.
A incisão na pele pode ser feita de forma transversa,
seguindo as pregas cutâneas cervicais, ou na borda do
músculo esternocleidomastóideo para casos de cor-
pectomia de mais de um nível. Alguns referenciais
para marcação da incisão são interessantes, como o
osso hióideo ao nível de C2-3, a porção superior da
cartilagem tireoidiana, estimada entre C3 e C4, a por-
ção inferior desta entre C4 e C5, anel cricóide entre
C5 e C6 e o espaço C7-T1 estimado de 1 a 2 cm acima
da clavícula. É mais confortável ao cirurgião realizar
o acesso pela direita do paciente, lembrando da maior
suscetibilidade de lesão do nervo laríngeo recorrente,
pelo seu trajeto mais ântero-lateral comparativamente
com o lado esquerdo. Após incisão da pele, realiza-
se abertura do platisma. Identificam-se bordas do
esternocleidomastóideo e traqueoesofágica. Realiza-
se dissecção romba pelas fáscia cervicais superior e
Fig. 51.2 – Radiografia de controle de fixação occipitocer- média. Identifica-se a carótida e a veia jugular inter-
vical com amarria de titânio. na lateralmente ao acesso e o esôfago medialmente.
Segue-se dissecção subperiosteal do músculo longo
exposta a coluna via posterior, podem-se utilizar ca- do pescoço, com hemostasia adequada. Colocam-se
bos de titânio ou ganchos sublaminares 2 níveis aci- afastadores auto-estáticos, com exposição da porção
ma e abaixo do nível acometido. A colocação destes anterior da coluna. Sob escopia, identifica-se o nível
deve ser feita de maneira cuidadosa, realizando-se acometido e realiza-se discectomia dos níveis supe-
pequenas fenestrações nos espaços entre as laminas, rior e inferior após colocação de parafuso de Caspar
retirando-se o ligamento amarelo para a passagem e respectivo afastador, com leve retração da coluna.
do fio ou colocação adequada de gancho sem com- Inicia-se a corpectomia sob microscopia até identifi-
pressão medular. Conectam-se os fios e/ou ganchos cação do ligamento longitudinal anterior. Este deve
nas hastes longitudinais, devendo-se utilizar cross- ser aberto com total exposição da dura para evitar re-
link entre as hastes para manter estabilidade entre síduos da doença subligamentar. A corpectomia deve
estas. Mais uma vez, o uso de granulado ósseo deve ser feita com drill, com extensão lateral até a porção
ser preconizado para melhor artrodese do material pedicular, com cuidado de não lesar o canal vertebral.
de prótese com osso. Outra opção de artrodese é a Uma vez feitas a discectomia e a corpectomia, o osso
utilização de parafuso de massa lateral em vez dos do corpo vertebral superior e inferior deve ser “drilla-
cabos ou ganchos, principalmente nos casos em que do” para preparar a cortical para receber a artrodese.
as laminas (elementos posteriores) estão fragilizadas Como já foi descrito, nos casos oncológicos devem-
pela doença. A técnica de abordagem com parafusos se evitar os enxertos autólogos. Deve ser introduzida
de massa lateral é a mesma já descrita, com o cuidado uma gaiola de titânio, preenchida por granulado ós-
de uma exposição mais lateral da estrutura óssea. A seo, e uma vez desfeita a detração retira-se os para-
colocação do parafuso deve ser feita de maneira bem fusos dos corpos vertebrais superior e inferior. Para
cuidadosa em razão do risco de lesão medular, radi- evitar possível expulsão anterior da artrodese, pre-
cular ou da artéria vertebral. O parafuso, com 14 a coniza-se o uso de placa cervical colocada com pa-
18 mm de comprimento, deve ser inserido guiado por rafusos inseridos paralelos ao platô ósseo nos níveis
escopia 1 a 3 mm acima do limite inferior da faceta, superior e inferior. A adequada colocação da gaiola e
1 a 3 mm lateral ao limite medial da faceta, com an- da placa deve ser confirmada por escopia. Uma vez
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

feita a hemostasia, o platisma deve ser fechado com anteriormente ao forame e próximos ao disco supe-
Monocryl® 3-0 e a pele com 5-0, podendo ser utili- rior, ao passo que na coluna lombar essa medida deve
zados pontos intradérmicos. As principais complica- ser de 8 mm. Uma vez locada a prótese, esta deve
ções dessa abordagem são lesão dos ramos do nervo ser protegida de migração utilizando-se uma placa
vago (principalmente o laríngeo recorrente), disfagia, de titânio colocada nos corpos vertebrais adjacentes.
lesão radicular ou medular, fístula dural, falha na ins- Os parafusos de fixação da placa devem ser inseridos
trumentação com migração posterior do enxerto ou de maneira bicortical, com angulação de, no máxi-
anterior da placa, lesões traqueoesofágicas ou vascu- mo, 10°, ficando paralelos ao canal medular, mas evi-
lares e infecção. Muitas vezes esse acesso pode ser tando atravessar por completo a cortical (Fig. 51.3).
complementado por um acesso por via posterior. A recuperação desses casos deve ser feita em UTI.
Como exposto, a Tabela 51.5 resume as opções As complicações dos acessos ântero-laterais podem
de abordagem para tumores das regiões torácica e ocorrer em qualquer fase da cirurgia, na exposição,
lombar1,20-26. O acesso por via anterior é utilizado descompressão, reconstrução e fixação ou fechamen-
para ressecção por via transcavitária de um ou dois to. Lesões de órgãos como pulmões, rins, ureteres,
níveis de comprometimento do corpo vertebral. Ge- veia cava ou aorta são incomuns, mas podem ocorrer.
ralmente esse acesso oferece excelente descompres- Eventual lesão dural deve ser suturada com Prolene®
são medular e possibilita ressecção completa da le- 4-0. No pós-operatório imediato podem ocorrer ate-
são, mas deve ser complementado por instrumentação lectasia, pneumonias, pneumotórax ou derrame pleu-
ativa posterior. No acesso ântero-lateral transtorácico ral, devendo ser tratados de imediato.
ou toracolombar, o paciente deve ser entubado de ma- Já o acesso por via posterior permite alcançar os
neira a propiciar colapso pulmonar do lado a ser abor- elementos da coluna posterior já descritos na técnica
dado para facilitar a exposição da coluna, bem como de laminectomia e até abordagem do corpo vertebral
toda a preparação anestésica de uma cirurgia cardio- por via transpedicular com possível ressecção de le-
vascular. Para regiões de T1-T2, o melhor acesso é são epidural. Tal acesso torna-se mais viável a pacien-
por esternotomia mediana e de T3-11 por toracotomia tes não candidatos ao acesso por via anterior, devido
póstero-lateral. Lesões de T3-5 devem ser abordadas a suas co-morbidades. A desvantagem desse acesso é
pelo lado direito para se evitar saco cardíaco e lesões a não-visualização da dura-máter ventral. Após expo-
de T6-10, pelo lado esquerdo, em virtude da facilida- sição das estruturas ósseas posteriores e identificação
de em se isolar e mobilizar a aorta, veia cava e fígado. do corpo vertebral acometido com escopia, realiza-
Lesões de T11-L1 devem ser abordadas de maneira se laminectomia desse nível. Sob microscopia faz-se
combinada com acesso por toracotomia póstero-late- descompressão radicular com abertura do forame e
ral e retroperitoneal, com abertura do diafragma. Já realiza-se “drilagem” do pedículo correspondente,
lesões de L2-4 podem ser acessadas por via retroperi- bem como a retirada da pars interarticulares e faceta
toneal, preconizando-se o lado esquerdo para evitar- adjacente para permitir acesso ao corpo vertebral sem
se a veia cava inferior. O paciente deve ser posicio- espatulação da medula. Deve-se lembrar que nervos
nado em decúbito lateral, com proteção axilar, com torácicos podem ser ligados e cortados para melhorar
coluna perpendicular em relação à mesa cirúrgica. Os a janela de abordagem ao corpo vertebral. São raros
acessos descritos devem ser realizados por cirurgião os pacientes oncológicos com tumores em coluna
treinado em tais abordagens. Uma vez exposta a por- que desenvolvem dor disestésica após ligadura do
ção do corpo vertebral acometida e confirmado o ní- nervo. A remoção do corpo acometido pode ser feita
vel com escopia, permite-se o acesso no nível acima e
abaixo para eventual artrodese. A inserção da costela
pode ser removida para permitir melhor acesso ao fo-
rame. A ressecção do corpo vertebral e dos discos in-
tervertebrais deve ser feita sob microscopia com au-
xílio de drill pneumático até total descompressão do
saco dural. Deve-se identificar e remover o pedículo
correspondente, permitindo liberação lateral do saco
dural e dos nervos foraminais. Uma vez confirmada
total descompressão, o local da corpectomia deve ser
preparado para artrodese, com retirada de disco ou
cartilagem remanescente. Como tratamos de doença
oncológica, recomenda-se o uso de enxertos de titâ-
nio do tipo gaiola ou, na indisponibilidade destes, o
uso de tubo de silicone com acrílico. Segue-se a cor-
reção eventual de desníveis com o uso de parafusos Fig. 51.3 – Artrodese após descompressão torácica por via
detratores, lembrando que estes devem ficar 4 mm anterior.

600
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51 – Tratamento Cirúrgico das Metástases da Coluna Vertebral

com cureta e pinça de Cushing. Deve-se ter cuidado A B


para não remover o ligamento longitudinal posterior
medial, que serve de barreira protetora entre tumor
e dura-máter. A técnica de instrumentação com colo-
cação de gaiola ou tubo com metacrilato é similar à
anteriormente descrita, com exceção que se faz por
via póstero-lateral. Já a instrumentação por via poste-
rior pode ser feita com colocação de ganchos subla-
minares ou, ainda, sob os processos transversos com
a vantagem de que a haste fica locada mais lateral-
mente, adjacente às articulações costofacetárias, com
menor risco de trauma medular e menor artefato nos
C D
exames de imagem de controle. Ainda pode ser feita
por via sublaminar, com os fios de titânio e amarria às
hastes longitudinais, similares à descrita para coluna
cervical. Outra forma amplamente utilizada de instru-
mentação por via posterior é com parafusos transpe-
diculares. Tal técnica distribui melhor a cinética so-
bre a coluna, uma vez que utiliza as colunas anterior,
média e posterior, diferentemente dos ganchos e fios.
Existem vários sistemas de fixação, cabendo ao cirur-
gião a escolha de qual é mais conveniente com a sua
experiência. O primeiro passo consiste em identificar
o ponto de referência para introdução do marcador. Fig. 51.4 – (A a D) Tumor acometendo estruturas posterio-
Geralmente, este se localiza, em relação ao plano res, tratado com ressecção por via posterior e artrodese com
axial, 1 cm medial à inserção do processo transverso, parafusos transpediculares.
mas sempre deve ser confirmado com escopia em AP.
Uma vez localizados todos os pedículos em AP com rada uma modalidade terapêutica ideal de tratamento
marcadores, lateraliza-se a escopia e inicia-se o pro- para mieloma múltiplo pelo aspecto desfavorável do
cesso de decorticação óssea com penetrador ósseo. osso para as outras opções cirúrgicas. Ainda tem uma
Muito se discute com relação ao uso do drill nesse possível ação na prevenção de piora da deformidade
processo, mas atribui-se uma possibilidade de menor do corpo e no possível colapso. Tal procedimento é
aderência do parafuso ao osso. A introdução do para- contra-indicado quando há compressão medular ou
fuso deve ter uma angulação medial de 5 a 10° para radicular pela fratura, extensão epidural de tumor,
coluna torácica até L1, 15° para L2, 15 a 20° de L3 parede posterior do corpo incompetente, instabilidade
até L5 e 25° para o sacro. A orientação rostrocaudal significativa ou processo infeccioso vigente. A técni-
deve ser feita por escopia lateral contínua. Uma vez ca consiste em paciente em pronação, sob anestesia
colocados os parafusos, colocam-se as hastes longi- geral no centro cirúrgico, com uso de escopia ou na
tudinais, ligadas por cross-link e o enxerto com gra- sala de tomografia. Realiza-se assepsia adequada com
nulado ósseo (Fig. 51.4). Recentemente a técnica de colocação de campos estéreis e localizam-se os níveis
instrumentação com parafusos transpediculares pode desejados. Podem ser realizados em qualquer parte da
ser feita com neuronavegador, principalmente para coluna torácica ou lombar e vários níveis podem ser
coluna torácica. Além disso, pode-se efetuar monito- tratados no mesmo procedimento. Estabelecida a li-
ração somatossensitiva dos membros inferiores, bem nha média da coluna, introduz-se a cânula de cerca de
como estimulação elétrica do parafuso, se houver dú- 5 a 7 cm lateralmente, com angulação de 45° para a
vida de eventual proximidade com raízes nervosas. coluna torácica e 7 a 9 cm para a coluna lombar. Guia-
As principais complicações da instrumentação por do sob escopia ou preferencialmente pela tomografia,
via posterior são falha do sistema de artrodese, inade- realiza-se introdução da cânula no corpo, podendo ser
quada colocação dos parafusos, infecção ou lesão de por via transpedicular (possível T5-L5), extrapedicu-
estruturas neurais ou até intracavitárias pelo sistema. lar (qualquer nível torácico) ou póstero-lateral (colu-
Desde a década de 1980, técnicas minimamente na lombar). Com agulha de 11 gauge, pode-se realizar
invasivas têm adquirido espaço como boas opções biópsia, com possibilidade de se utilizar contraste para
no tratamento dessas lesões. Dentre estas, destaca- localização da agulha (não necessário quando feito na
mos a vertebroplastia e a kiphoplasty. A vertebro- tomografia). Caso a agulha esteja localizada em lago
plastia consiste no aumento do corpo vertebral pela venoso, deverá ser recolocada. Após confirmação ra-
injeção do metacrilato27. A taxa de melhora da dor diológica da cânula localizada no terço anterior do
varia de 70% a 95% pela literatura, sendo conside- corpo, aplica-se injeção de 1 em 1 ml de metacrilato.
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601
Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

O cimento ósseo deve preencher os dois terços ante- American Spinal Injury Association. 1982 (revised
riores do corpo (Fig. 51.5). O cimento particulado tem 1996).
taxa de extravasamento menor que o convencional. 5. Gundry CR, Fritts HM. Magnetic resonance imaging
A aplicação pode ser uni ou bilateral, sendo, nesses of the musculoskeletal system: the spine. Clin Or-
casos, mais fácil a distribuição adequada do cimento. thop. 1998;346:262-78.
Pode ainda ser feita no intra-operatório ou em coluna 6. Algra RR, Heimansjj, Valk J, et al. Do metastases in
que já tenha passado por artrodese com instrumen- vertebrae begin in the bogy or pedicles? Imaging study
tal27. Já a kiphoplasty é considerada mais segura em in 45 patients. Am J Roentgenol. 1992;158:1275-9.
virtude da menor chance de extravasamento por causa 7. Marshall lF, Langfit TW. Combined therapy for
metastatic extradural tumors in the spine. Cancer.
do balão, além de utilizar pressão gradual e possibi-
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litar melhor correção das deformidades (Fig. 51.5). A
8. Mundy GR, Yoneda T. Facilitation and suppression
grande complicação desses métodos é a fístula, com of bone metastasis. Clin Orthop. 1995;312:34-44.
compressão neural pelo cimento (varia de 1% a 67% 9. Maranzano E, Latini P. Effectiveness of radiation
na literatura, com média de 8%). therapy without surgery in metastatic spinal cord
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51 – Tratamento Cirúrgico das Metástases da Coluna Vertebral

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52
Infiltração Perirradicular Percutânea
Luiz Fernando Pinheiro Franco

CONSIDERAÇÕES GERAIS da ação, a metilprednisolona age entre 12 e 36 horas,


e a dexametasona, entre 36 e 72 horas. Quanto à dose,

A
infiltração de raízes nervosas foi utilizada 40 mg de metilprednisolona equivalem a 7,5 mg de
como método para avaliar a origem radicu- dexametasona6. No que se refere ao uso terapêutico,
lar da dor, porém sem finalidade terapêutica1. uma única dose de corticóide, mesmo grande, é pra-
Com injeções de Pantopaque® seguidas de teste tera- ticamente destituída de efeitos prejudiciais, e a corti-
pêutico com 1 ml de lidocaína a 1% nas raízes ner- coterapia durante alguns dias, na ausência de contra-
vosas, tentava-se esclarecer a causa da dor e a raiz indicações específicas, também não apresenta efeitos
comprometida. Se esses procedimentos fossem escla- colaterais significativos6.
recedores, o paciente era operado. O método utilizado
Sabe-se que, no processo de cicatrização, o reparo
foi o descrito por MacNab2,3 e Schutz et al.4
é precedido de fugaz reação inflamatória asséptica.
Gangi et al.5 referem que a infiltração perirradicu- No local cirúrgico ocorre deposição de plasma sangüí­
lar com esteróides e anestésicos produz alívio signifi- neo e de fibrina. Os fibroblastos dos limites do campo
cativo da dor lombar a curto e longo prazos. Acentuam cirúrgico ativam-se, multiplicam-se, mobilizam-se e,
ser um procedimento minimamente invasivo, redu- com o plasma e a fibrina presentes neste local, for-
zindo também o risco de invalidez. Enfatizam ser, na mam fibras colágenas. Também as células endoteliais
atualidade, um dos procedimentos mais promissores dos capilares limítrofes proliferam e constituem bro-
na redução da lombociatalgia por hérnia discal e que tos capilares. Estes, de um e de outro lado do local
é cada vez mais utilizado na prática médica. operado, unem-se. As células da margem crescem so-
Quando a infiltração é feita com dexametasona, bre o defeito e completam a cicatrização7.
existe inibição da proliferação dos fibroblastos e di- A lidocaína aumenta o fluxo sangüíneo intra-radi-
minuição do edema no tecido cicatricial, reduzindo cular, efeito este que pode ser mediado pelo sistema
o volume da compressão. Os corticóides inibem não nervoso simpático. O efeito terapêutico é conseqüen-
apenas os fenômenos iniciais do processo inflamató- te ao aumento do metabolismo intraneural e remoção
rio (edema, deposição de fibrina, dilatação capilar, mi- de substâncias inflamatórias8.
gração de leucócitos para a área inflamada e atividade
fagocítica), mas também suas manifestações mais tar-
dias, como proliferação de capilares e fibroblastos, de- INDICAÇÕES PARA A INFILTRAÇÃO
posição de colágeno e, posteriormente, cicatrização6. A dor radicular recorrente ou iatrogênica não é
No que se refere à potência relativa e doses equi- incomum após cirurgia por hérnia discal3,9,10. Várias
valentes de corticosteróides, a metilprednisolona, condições podem ser responsáveis por isso, como, por
numa escala iniciando em 0, tem uma potência antiin- exemplo, a migração de um fragmento discal para o
flamatória de número 5, e a dexametasona, potência forame radicular, compressão pelo processo articular,
25. Quanto à potência relativa de retenção do sódio dobra da raiz no pedículo, estenose do canal, hérnia
numa escala semelhante, a metilprednisolona tem o extraforaminal e fibrose hipertrófica. Entre os critérios
número 0,5, e a dexametasona, 0. Quanto à duração para a indicação da infiltração, enfatiza-se a importân-
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Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

cia de haver dor radicular associada a sinais físicos no TÉCNICA DA INFILTRAÇÃO


exame neurológico e dados de neuroimagem concor-
dantes com as queixas e o quadro clínico (correlação O procedimento é executado com o uso de tomó-
clínico-radiológica)11. Os pacientes com dor discogê- grafo computadorizado (Fig. 52.1), podendo-se tam-
nica, facetária, miofascial, determinada por instabili- bém usar o intensificador de imagem, com anestesia
dade da coluna, espondilólise e/ou listese, assim como local. Se for utilizado o intensificador de imagem, re-
a dor psicogênica pura, devem ser bem identificados, comenda-se colocar o paciente na posição ventral, po-
pois para eles não há indicação do procedimento. Os rém oblíqua em 45°, com o lado da dor para cima. As-
pacientes com dor psicogênica pura podem ser bastan- sim, facilita-se a penetração da agulha. Para quem usa
te convincentes, confundindo muitas vezes o cirurgião. o intensificador de imagem, localiza-se o forame de
A adição de esteróide a anestésico aumenta a eficácia conjugação com uma pinça, sob visão fluoroscópica, e
da infiltração perirradicular no combate ao processo marca-se na pele o local de penetração da agulha. Com
inflamatório12. Segundo El-Khoury e Renfrew13, as uma agulha BD de no 80 × 7 ou no 100 × 8, alcança-se
principais indicações para a infiltração perirradicular o forame facilmente com uma punção vertical. Quan-
são a lombociatalgia aguda sem déficit motor, que é do o procedimento é realizado por meio de tomógrafo,
resistente ao tratamento clínico usual, e a síndrome o paciente é colocado em decúbito ventral, sendo lo-
pós-discectomia. Lutze et al.14 indicam a infiltração calizado o espaço discal de interesse (Fig. 52.2). A se-
perirradicular para pacientes com hérnia discal não guir, faz-se o corte tomográfico na posição do forame
operada e para pacientes com fibrose epidural. radicular que se quer infiltrar. São marcados na pele
dois pontos fundamentais: o primeiro sobre o processo
espinhoso, e o segundo a x centímetros lateralmente ao
CONTRA-INDICAÇÕES PARA A primeiro, medida esta dada pelo computador, de acor-
INFILTRAÇÃO do com a angulação adequada para o nível radicular.
Praticamente não existem contra-indicações absolu- No forame de L4-L5, a inclinação da agulha é de 45º
tas para as infiltrações, que podem ser repetidas várias (acesso transforaminal), e no L5-S1 é de 90º (acesso
vezes. Caso não haja melhora significativa após a ter- dorsal paramediano)15 (Figs. 52.3 a 52.5). Em algumas
ceira infiltração, não se deve prosseguir. Caso o pacien- circunstâncias pode haver compressão de duas raízes
te se beneficie, o método pode ser repetido em outras no mesmo espaço intervertebral (Fig. 52.6), quando a
ocasiões, desde que a dor radicular volte a incomodar. hérnia discal está localizada nas porções médio-lateral
É necessário cuidado especial com pacientes diabéti- e foraminal17. Nesses casos, a infiltração perirradicu-
cos e hipertensos graves. É fundamental a colaboração lar pode beneficiar duas raízes ao mesmo tempo18. Em
do clínico, estando atento às alterações da glicemia e algumas circunstâncias, além da infiltração no nível
pressóricas, reajustando temporariamente, se for ne- radicular onde a raiz S1 é comprimida (forame L5-
cessário, a dosagem da medicação usada. Obviamente, S1), pode-se também infiltrar a raiz S1 colocando-se
outras situações em que os corticóides não devem ser a agulha diretamente no primeiro forame sacral. O
usados, como no glaucoma, osteoporose grave e úlcera mesmo raciocínio vale para o espaço radicular L4-L5,
ativa, merecem parecer do especialista11,15,16. Também podendo-se atingir a raiz L5, puncionando-se abaixo
na gravidez, distúrbios da coagulação, doenças infla- do processo transverso do corpo de L51. A infiltração
matórias agudas, intolerância a anestésicos ou corti- perirradicular faz com que as dores veiculadas através
cóides, em pacientes só com lombalgia e na síndrome do nervo recorrente, que passa pelo forame radicular e
pseudo-radicular o procedimento é contra-indicado14. inerva a dura-máter e o ligamento longitudinal poste-
rior, sejam também tratadas18.
CONSIDERAÇÕES ANATÔMICAS
APLICADAS À INFILTRAÇÃO
Deve-se lembrar que, pelo forame de conjugação
L4 e L5 passa a raiz L4, mas a raiz mais freqüente-
mente comprometida pela hérnia discal nesse nível é
a L5. Esta cursa em torno da face medial do pedículo
de L5, passa entre esse pedículo e o processo articular
superior de S1 e emerge do forame intervertebral en-
tre o corpo de L5 e o segmento S1 do sacro. Da mes-
ma forma, entre os níveis L5-S1 cursa a raiz L5, mas
a raiz mais freqüentemente comprimida pela hérnia
discal nesse nível é a S1. Deve-se lembrar também
que a raiz S1 se encontra no canal sacral e atravessa o
forame sacral anteriormente. Fig. 52.1 – Técnica da infiltração sob controle tomográfico.

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52 – Infiltração Perirradicular Percutânea

Fig. 52.2 – Marcação no computador do espaço L4-L5.

Fig. 52.5 – Agulha no forame de conjugação L4-L5 na to-


mografia.

Fig. 52.3 – Agulha no forame de conjugação L4-L5.

Fig. 52.6 – Compressão simultânea de L5 e S1 tratada numa


única infiltração.

portantes da dor radicular21. Até 1992 não se conhecia


bem o mecanismo da eficácia terapêutica da lidocaí-
na, apesar dos estudos anatômicos, eletrofisiológicos
e morfológicos8. Já tinha sido sugerido, por essa oca-
sião, que o mecanismo da melhora clínica da dor seria
por aumento do fluxo sangüíneo intra-radicular22,23.
Fig. 52.4 – Posição perpendicular da agulha no forame L5-S1. Yabuki e Kikuchi8 investigaram os mecanismos do
efeito terapêutico da infiltração perirradicular, ava-
liando mudanças no fluxo sangüíneo intra-radicular.
Com uma infiltração de lidocaína a 2% na raiz, ob-
FISIOLOGIA servaram aumento do fluxo sangüíneo intra-radicular,
Como já mencionado, MacNab3 mostrou a im- efeito este que pode ser mediado pelo sistema nervo-
portância da infiltração da raiz nervosa para fins de so simpático. O estudo de Yabuki e Kikuchi8 mostrou
diagnóstico. Desde então, ela foi largamente utiliza- mudanças no fluxo sangüíneo intra-radicular após um
da, porque permitia identificar a raiz responsável pela bloqueio simpático, visto que os nervos simpáticos
aferência nociceptiva19,20. A infiltração perirradicular têm papel importante na regulação do fluxo sangüí-
somente com lidocaína também tem sido usada para neo intraneural dos nervos periféricos24-27.
tratamento, pois, após os testes para diagnóstico, hou- Yabuki e Kikuchi8 também mostraram que os ner-
ve número apreciável de pacientes com melhoras im- vos simpáticos têm papel importante no mecanismo
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607
Parte 6 – Neurocirurgia da Coluna Vertebral e Medula Espinhal

de aumento do fluxo sangüíneo e que a infiltração causadas pela compressão direta têm papel importan-
da raiz nervosa produz efeito similar ao do bloqueio te na assim chamada “síndrome da raiz contundida”.
simpático, por bloqueio das fibras simpáticas que pas- A raiz nervosa é mais suscetível a lesões por com-
sam pelo ramo comunicante cinzento. No quadro clí- pressão do que os nervos periféricos, porque a rede
nico da radiculopatia lombossacra, às vezes ocorrem vascular nas raízes espinhais é menos desenvolvida
sintomas que podem estar relacionados ao sistema do que nos nervos periféricos, e elas não têm um su-
nervoso simpático, como, por exemplo, a sensação de primento vascular regional32,33. Além disso, a bainha
frio nas pernas. Esses sintomas clínicos mostram que nervosa das raízes é composta somente de uma a nove
a compressão radicular pode provocar respostas do camadas de células. Essas características anatômicas
sistema nervoso simpático. Admitiu-se que os nervos são fatores importantes na isquemia por compressão
simpáticos têm importância no fluxo intraneural dos das raízes nervosas.
nervos periféricos26,27. Analisando os trabalhos cita- Teoricamente, a lesão radicular permanente da
dos, pode-se concluir que a compressão radicular via “síndrome da raiz contundida” seria evitada se a re-
sistema nervoso simpático induz à diminuição de flu- tração excessiva fosse eliminada por meio de uma
xo sangüíneo intra-radicular8. O bloqueio simpático laminotomia mais ampla. A retração delicada, inter-
induz à diminuição da resposta simpática e, por con- mitente e pelo tempo mais curto possível minimiza
seqüência, ao aumento do fluxo sangüíneo nos vasos a lesão radicular durante operação de hérnia discal
radiculares. Esse aumento do fluxo acarreta remoção lombar28.
das substâncias inflamatórias e melhora do metabolis-
mo intraneural8. Nos pacientes com dor radicular, geralmente se
aconselha um certo período de observação clínica
O uso de corticóide visa diminuir o edema radi- antes de se indicar a cirurgia. O aparecimento de dis-
cular e, nos casos de pacientes já operados, levar à
funções neurológicas por compressão radicular, in-
reorganização e inibição da proliferação dos fibro-
cluindo alterações dos reflexos, distúrbios sensitivos
blastos6, de maneira a aliviar a pressão sobre a raiz
e especialmente déficits motores indicam o tratamen-
nervosa. Em relação à compressão radicular durante
to cirúrgico. Nos casos duvidosos quanto à indicação
operação, Matsui et al.28 estudaram a relação entre a
pressão de retração em uma raiz e as mudanças no cirúrgica, esperando-se três meses com tratamento
fluxo sangüíneo radicular. Relataram que o fluxo san- clínico, chega-se à conclusão de que 80% dos casos
güíneo na raiz é reduzido em 70% a 80%, quando ela melhoram. Entretanto pelo menos 40% dos pacientes
é submetida a pressão ao redor de 70 a 110 g/cm2 (3 apresentam intenso sofrimento com disfunções psí-
mm de retração). Pressão de retração de 35 g/cm2 (1 quicas imprevisíveis, decorrentes da demora no alívio
mm de retração) leva à redução de 50% do fluxo san- adequado da dor34.
güíneo radicular. Existe diminuição abrupta do fluxo Loeser et al.35, Modic e Ross36, Gangi et al.5 re-
sangüíneo radicular mesmo em retrações pequenas (1 ferem que o conhecimento atual das causas da dor
a 2 mm) da raiz, durante uma operação. O limiar de lombar e seu tratamento são rudimentares e que o
estimulação de uma raiz sem compressão é mínimo, diagnóstico preciso é possível em apenas uma peque-
um pouco aumentado nos casos de compressão com na parcela de pacientes. Pinheiro-Franco et al.18 en-
déficit sensitivo, e muito aumentado nos casos com fatizam o uso da infiltração perirradicular tão rápido
déficit motor e sensitivo28. Após a discectomia, o li- quanto possível aos primeiros sinais da pouca melho-
miar de estimulação da raiz nervosa com déficit sen- ra com o tratamento clínico, exatamente para evitar
sitivo e/ou motor diminui. os sofrimentos relatados.
Nas cirurgias de hérnia discal geralmente ocorre
isquemia durante a retração da raiz, por menor que REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Parte 7
Neurocirurgia dos
Nervos Periféricos

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Síndrome do Túnel do Carpo
Fabio Veiga Sparapani

DOENÇA O retináculo flexor, que já foi também denomi-


nado ligamento transverso do carpo, é uma estrutura

A
síndrome do túnel do carpo é a mononeuro- fibrosa, ligamentar, que se insere na sua porção ulnar
patia periférica mais comum, respondendo por no osso pisiforme e no hâmulo do hamato e radial-
aproximadamente 90% de todas as neuropatias mente na tuberosidade do escafóide e na borda do
compressivas periféricas. osso trapézio.
Apesar de Pfeffer et al. afirmarem que a síndrome Alguns estudiosos propõem que o retináculo fle-
do túnel do carpo é a “neuropatia compressiva mais xor seja constituído de três partes distintas e contí-
freqüentemente diagnosticada, mais bem compreen- nuas, que se estenderiam da porção distal do rádio à
dida e mais facilmente tratada”, seu tratamento pode base do terceiro metacarpo.
apresentar complicações muito mais incapacitantes
A primeira parte seria a porção proximal, na qual o
que a própria queixa primária1.
retináculo flexor é contínuo com a porção posterior da
É definida como a compressão do nervo mediano dentro fáscia profunda do punho, localizada profundamente
do túnel do carpo, e qualquer condição que reduza o conti- aos músculos flexor ulnar do carpo, flexor radial do
nente do túnel ou aumente seu conteúdo pode causá-la. carpo e palmar longo (quando presente) e à fascia an-
A prevalência da doença na população geral varia tebraquial, conseqüentemente.
de 0,125% a 5,8% da população2. Segundo Nord­strom A segunda parte, a porção central, seria o ligamen-
et al., casos novos, prováveis ou definitivos ocorrem to transverso propriamente dito, delimitado pelas suas
numa taxa de 3,46/1.000/ano3. inserções ósseas já citadas.
A importância dessa síndrome se reflete nos aspec- A terceira parte, a porção distal, seria composta pela
tos econômicos e trabalhistas associados a ela. Sua in- aponeurose entre os músculos tênares e hipotênares.
cidência aproximadamente quadruplicou nas últimas
Superficialmente, o retináculo flexor se funde com
três décadas e essa tendência é mais visível princi-
a aponeurose palmar, cujas fibras longitudinais pro-
palmente relacionada com os trabalhadores. Pessoas
fundas também se fundem com a fáscia antebraquial
cujas suas ocupações envolvam esforço manual, com
proximalmente na sua porção anterior e mediana,
flexões e extensões repetidas do punho, intensa for-
através do ligamento volar do carpo.
ça de preensão ou inadequada flexão de punho, como
carregar máquinas pesadas, utilizar ferramentas ma- Já na porção ulnar, o ligamento volar do carpo tor-
nuais ou autopropulsoras e digitar, estão numa situa- na-se mais superficial, envolvendo o nervo e a artéria
ção propícia para desenvolver essa síndrome. ulnar, constituindo-se no teto do canal de Guyon.
Superficial, mas distalmente, o retináculo flexor se
funde com a fáscia palmar.
ANATOMIA O túnel do carpo em si contém o nervo mediano,
O retináculo flexor delimita anteriormente o túnel o tendão do músculo flexor longo do polegar e oito
do carpo, que é um canal osteoligamentar delimitado tendões flexores (quatro superficiais e quatro profun-
posteriormente pelos ossos do carpo. dos) dos dedos. O nervo mediano localiza-se imedia-
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Parte 7 – Neurocirurgia dos Nervos Periféricos

tamente posterior ao retináculo flexor e anterior aos DIAGNÓSTICO


nove tendões flexores. Anomalamente, alongamentos
dos ventres musculares dos músculos flexor superfi- A síndrome do túnel do carpo é a causa mais co-
cial dos dedos, palmar longo e a origem proximal de mum de dor, parestesias e hipoestesias nos quatro pri-
meiros dedos, portanto o diagnóstico dessa síndrome
um músculo lumbrical podem comprimir as estrutu-
deve ser considerado em todos os pacientes que apre-
ras contidas nesse túnel.
sentarem parestesias no território do nervo mediano
na mão ou fraqueza nos músculos oponente do pole-
Anatomia do Nervo Mediano gar ou abdutor curto do polegar.
No antebraço, o nervo mediano se localiza no epi- Acomete principalmente o sexo feminino, na ra-
mísio do músculo flexor superficial dos dedos, na sua zão de 3 mulheres para 1 homem. O diagnóstico ge-
porção volar e palmar em relação ao músculo flexor ralmente é feito entre a terceira e a quinta década.
profundo dos dedos. Distalmente, ao se aproximar do Os sintomas da síndrome podem ser obscurecidos
punho, posiciona-se radialmente para superficializar- pela presença de algumas outras doenças, como dia-
se entre os tendões dos músculos flexor radial do car- betes mellitus, artrite reumatóide etc.
po e flexor superficial dos dedos, penetrando no túnel Nas fases iniciais, o diagnóstico deve-se basear
do carpo sob a borda radial do tendão do músculo na história, pois o paciente pode apresentar somente
palmar longo4. queixas subjetivas, sem sinais físicos que a corrobo-
A anatomia do nervo mediano e de seus ramos rem, já que as alterações sensitivas podem preceder
pode ser extremamente variada, geralmente sendo em semanas ou meses as alterações motoras.
considerado normal o seguinte padrão: o ramo cutâ- Geralmente referem uma história progressiva de
neo palmar do nervo mediano costuma se destacar de parestesias e fraqueza enquanto usam as mãos em
3 a 11 cm (média de 5 cm) proximalmente à prega suas atividades diárias, associadas a hipoestesias no
do punho e, na sua porção radial, acompanhando a território inervado pelo nervo mediano.
borda do tendão do músculo flexor radial do carpo, e Deve-se levar em conta que o ramo cutâneo pal-
penetra a camada superficial do retináculo flexor na mar desse nervo, geralmente, tem sua origem proxi-
topografia do escafóide. Esse ramo inerva porções va- mal ao flexor do retináculo, sendo, portanto, poupado
riáveis de pele da região tênar. nesse quadro, o que leva a uma preservação da sensi-
Distalmente ao retináculo flexor, o nervo mediano bilidade na região radial da palma da mão.
se divide em seus ramos terminais: lateral, medial e Raramente os pacientes queixam-se de atrofia pro-
recorrente tênar. gressiva na mão e se dão conta de que apresentam
O ramo recorrente tênar inerva os músculos opo- uma discreta atrofia na região tênar quando o médico
nente do polegar, abdutor curto do polegar e a cabeça chama-lhes a atenção para esse aspecto da doença.
lateral do flexor curto do polegar. Isso ocorre mesmo nos pacientes que “sentem fra-
queza” na preensão e dificuldades com movimentos
O ramo lateral torna-se o primeiro nervo digital finos, como costurar ou tricotar.
palmar comum, que se divide em três nervos digitais
Caracteristicamente a dor e a parestesia são pio-
palmares próprios, sendo que os dois primeiros iner-
res à noite, levando o paciente a acordar com dor em
vam o polegar e a eminência tênar, e o terceiro, a face
queimação, formigamentos e choques, muitas vezes
lateral do indicador, fornecendo, também, um ramo não restritos ao território do mediano, podendo aco-
motor para o primeiro lumbrical. meter a mão toda e, inclusive, braço, ombro, pesco-
O ramo medial se divide formando o segundo e o ço e até tórax. Os dedos podem parecer “inchados” e
terceiro nervos digitais palmares comuns. O segun- todo o braço, “pesado”. Burke et al.6 propõem que a
do ramo inerva o segundo lumbrical e se bifurca em queixa subjetiva de “inchaço” na mão afetada, referi-
dois nervos digitais próprios, que inervam a pele para da por alguns pacientes, seria um sintoma importante
os lados adjacentes do segundo e terceiro dedos. O tanto diagnóstico como prognóstico para a doença.
terceiro, enquanto isso, inerva a pele para os lados Referem que essas queixas podem ser aliviadas
adjacentes do terceiro e quarto dedos. pelo chacoalhar da mão, por deixar o braço elevado e
Todos os nervos digitais próprios são ramos sen- por levantar-se e exercitar a mão.
sitivos que inervam a superfície palmar do primeiro, As razões dessa piora noturna podem ser: vasodi-
segundo, terceiro e face anular do quarto dedo e para latação e edema decorrente da retenção de dióxido de
a porção dorsal da falange distal desses dedos. carbono, diminuição do retorno venoso pela imobili-
Apesar de este padrão ser considerado o anatomi- dade muscular e pressão direta no nervo por flexão do
camente normal, é tamanho o grau de variação na por- pulso ou por deitar-se sobre ele.
ção distal do nervo mediano que, segundo Mumford5, Os sinais apresentados pelos pacientes serão divi-
45% dos espécimes estudados por eles apresentavam didos em três categorias: motores, sensitivos e auto-
a anatomia descrita nos livros. nômicos.

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53 – Síndrome do Túnel do Carpo

Sinais Motores pleta flexão dos pulsos. Isto deve desencadear, dentro
de um minuto, parestesias no território do mediano. Já
Os sinais motores possíveis são: atrofia tênar, que é o chamado “Phalen invertido” espera obter o mesmo
a presença de uma concavidade nos músculos tênares, resultado, porém com os pulsos estendidos. Este sinal,
com melhor visibilidade quando a mão é examinada apesar de receber tal denominação, é colocado entre
lateralmente, ou paresia na abdução do polegar, que é aspas, pois não era considerado fidedigno pelo próprio
testada solicitando-se ao paciente que movimente seu Phalen, que preferia o sinal por ele descrito a este7.
polegar em um ângulo reto em relação à palma da mão, O teste de Tinel consiste na percussão sobre o
contra uma resistência imposta pelo examinador. nervo mediano na porção distal da prega do pulso,
O músculo flexor curto do polegar pode ser iner- obtendo-se parestesias no território do mediano.
vado por fibras do nervo ulnar, que possibilita sua O teste de Durkan, ou de compressão direta, é
movimentação em um plano perpendicular à palma considerado positivo quando se obtêm parestesias no
da mão, em oponência; além desse movimento, tam- território do mediano após compressão do pulso do
bém pode ocorrer por deslizamentos anômalos do paciente na região do túnel do carpo por um minuto8.
músculo abdutor longo do polegar, inervado pelo ner-
vo radial. Há outros sinais menos utilizados, descritos para
auxiliar o diagnóstico, como o sinal do punho cerra-
Assim sendo, a presença da oponência do polegar do, no qual o paciente relata parestesias no território
não pode ser considerada sinal de função dos múscu- do mediano após fletir ativamente os dedos, forman-
los tênares inervados pelo mediano. do um punho cerrado por 60 segundos.
O sinal do quadrado do punho é obtido por men-
Sinais Sensitivos suração de sua distância ântero-posterior e médio-
A hipoestesia, tátil ou dolorosa, deve ser exami- lateral, medidas estas realizadas com compasso na
nada comparando a porção palmar do segundo dedo prega distal do punho, e a posterior divisão da pri-
com o quinto dedo ipsilateral. meira pela segunda. É considerado anormal um valor
A capacidade de discriminação de dois pontos maior que 0,70.
é feita de dois modos: a estática e a móvel. Na pri- Já o sinal do “chacoalhar” pode ser valorizado se
meira, o examinador toca o paciente com o aparelho o paciente, ao ser inquirido sobre o que faz quando os
a diferentes distâncias entre suas pontas; a falta de sintomas do quadro o afligiam de maneira intensa, re-
discriminação entre pontos distantes 5 mm ou menos produz um movimento semelhante a “chacoalhar um
caracterizaria essa deficiência. Na segunda, o teste é termômetro”. Qualquer outra resposta é considerada
realizado da mesma forma, porém o aparelho é deslo- negativa.
cado distalmente durante o teste, e o resultado é inter- Outro teste, o do torniquete, visa o mesmo ob-
pretado de forma similar. jetivo, e é realizado com auxílio de um esfigmoma-
A hipoestesia parestésica deve ser examinada nômetro, que é inflado acima da pressão sistólica do
comparando-se a articulação interfalangeana distal paciente por um minuto.
do segundo dedo com o quinto dedo ipsilateral, com Tetro et al., em 1998, descreveram um sinal que
um diapasão padrão de 128 ou 256 hertz. deriva da associação do sinal de Phalen e de Durkan,
Já o teste com monofilamentos de Semmes-Weinstein o chamado sinal da flexão do punho e compressão
é considerado positivo se o limiar do paciente na polpa carpal, cujo resultado positivo é a presença de pares-
do segundo dedo for maior que o filamento de 2,83. tesias no território do mediano após um minuto9.
Katz e Stirrat descrevem padrões de distribuição
da dor, parestesias e hipoestesias, denominados: clás-
Sinais Autonômicos sico, possível, provável e improvável, que podem
O nervo mediano é o carreador mais importante ser relatados por pacientes cuja suspeita clínica é a
das fibras simpáticas, sendo que sua lesão pode levar síndrome. No padrão clássico, os sintomas afetam,
a: alterações na coloração da mão, desordens na sudo- no mínimo, dois dos três primeiros dedos, permitin-
rese e alterações ungueais. do também sintomas no quarto e quinto dedos, dor
no punho e irradiada proximalmente a este, mas ex-
Testes Clínicos clui sintomas na palma ou dorso da mão. No padrão
provável, os sintomas são semelhantes aos clássicos,
Os testes desencadeantes mais comuns do quadro porém pode haver sintomas na palma da mão desde
são: o de Phalen, o chamado “Phalen invertido”, o que não sejam restritos à sua borda ulnar. No padrão
teste de Tinel, o teste de pressão direta ou de Durkan possível, os sintomas afetam somente um dos três pri-
e o teste do torniquete. meiros dedos, além da distribuição permitida no pa-
O sinal de Phalen consiste em manter os antebra- drão provável. Já no padrão improvável, os sintomas
ços verticalmente, e pedir que o paciente faça a com- não acometem nenhum dos três primeiros dedos10.

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Parte 7 – Neurocirurgia dos Nervos Periféricos

Todos esses testes podem estar ausentes, como os radiografia simples, a ultra-sonografia tanto na forma
achados físicos, e mesmo assim o paciente pode ser de imagem como de teste para indução da sintomato-
portador da síndrome do túnel do carpo. logia, a tomografia computadorizada tridimensional e
a ressonância magnética.
Diagnósticos Diferenciais A radiografia simples torna-se obrigatória para
os pacientes com história prévia de trauma ou com
A causa mais comum associada à síndrome é o es- deformidades na região, porém dificilmente mostrará
pessamento ou fibrose da sinóvia dos tendões flexores, alguma alteração no contorno ósseo dos demais pa-
os quais, quando submetidos à biopsia, revelam fibro- cientes.
se crônica da sinóvia ou inflamação crônica, compatí- A ultra-sonografia é considerada uma técnica sim-
vel com sinovite associada à doença reumática. ples para avaliar o nervo mediano e o conteúdo do
O espessamento do próprio ligamento transverso túnel do carpo. A anatomia do nervo pode ser bem
do carpo pode ocorrer relacionado a doenças sistêmi- definida e medidas precisas dele podem ser obtidas
cas, como o mixedema do hipotireoidismo e a acro- por esse método.
megalia11. O nervo apresenta uma forma elíptica nos cortes
Causas como gravidez ou uso de anticoncepcional transversais e achata-se progressivamente conforme
oral, que acarretam alteração do balanço hídrico, po- adentra o túnel.
dem predispor à doença. As anormalidades que podem ser encontradas nos
Diabetes mellitus, freqüentemente, está associado casos da síndrome são: edema no nível do osso pi-
a essa doença, atribuindo-se tal condição à possível siforme ou na porção distal do rádio; alterações do
predisposição de um nervo mediano, afetado pela neu- contorno ou achatamento do mesmo no nível do osso
ropatia diabética, que o tornaria mais suscetível às al- hamato; abaulamento do flexor do retináculo, que
terações no túnel do carpo que um nervo não afetado. normalmente é reto ou algo convexo e redução da
Causas mais raras também são descritas e, no nos- capacidade de excursão do nervo, sob o retináculo,
so meio, o mal de Hansen sempre deve ser pensado durante a flexão ou extensão do segundo dedo13.
como diagnóstico diferencial em pacientes com mais A ultra-sonografia também teria a vantagem de
de um nervo acometido. evidenciar compressões extrínsecas causadoras da
Os traumas também podem propiciar o apareci- síndrome, como tenossinovite, presença de músculos
mento do quadro, que pode compreender queimadu- acessórios, além de, com o uso da técnica de Doppler,
ras, fratura de Colles, fratura ou deslocamento carpo- identificar na persistência da artéria mediana outra
metacarpal e fratura antiga do escafóide. possível causa da síndrome.
Não devem ser esquecidas as causas iatrogênicas, A tomografia computadorizada tridimensional é
como a injeção de corticóides por via intracarpal e considerada mais útil que a radiografia simples ou a
a utilização de fragmentos ósseos para artrodese do tomografia computadorizada convencional, pois pode
punho12. detectar fraturas e deslocamentos não perceptíveis
nesses exames, além de analisar linhas de fratura com-
Exames Subsidiários plexas, deformidades nos ossos do carpo, identificar
pequenos fragmentos ósseos ainda na sua topografia
O exame subsidiário mais utilizado para essa do- habitual e diagnosticar pseudo-artrose do escafóide14.
ença é a eletroneuromiografia, que, além de diagnos-
A ressonância magnética pode ser superior aos
ticá-la, pode diferenciá-la de uma síndrome de dupla
demais exames de imagem na possível diferenciação
lesão. É considerada, em conjunto com o exame físi-
das causas às quais pode secundar a síndrome, além
co, fundamental para o diagnóstico da síndrome.
de apresentar quatro sinais sugestivos dela: edema do
A velocidade de condução nervosa sensitiva do mediano, achatamento do nervo no nível do hamato,
mediano é considerada a medida mais sensível no uma curvatura palmar do flexor do retináculo e hi-
diagnóstico, uma vez que as fibras sensitivas são as persinal do mediano em T2. Em termos de imagem,
inicialmente acometidas. a ultra-sonografia apresenta boa acurácia diagnós-
Finalmente, realiza-se a eletromiografia do mús- tica, porém perde para a ressonância magnética em
culo abdutor curto do polegar, que só apresentará al- termos de diferenciação diagnóstica secundária e nas
terações nos casos mais graves, em que ocorre perda compressões menores do nervo. A tomografia com-
axonal importante, quando então se observam sinais putadorizada tridimensional, com o seu alto custo e o
de desnervação na fase de repouso muscular e sinais grande tempo despendido para sua realização, ainda
de reinervação e de perda de unidades motoras perifé- tem utilidade limitada.
ricas funcionantes na contração muscular. Na prática, o diagnóstico se baseia na apresentação
Entre outros exames que podem ser utilizados para clínica, no exame neurológico e a confirmação é feita
o melhor diagnóstico dessa síndrome se encontram a com a eletroneuromiografia na maioria dos casos.

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53 – Síndrome do Túnel do Carpo

TRATAMENTO Chow utiliza a técnica de Dois Portais, que se ba-


seia na realização de duas incisões através das quais
O tratamento da síndrome do túnel do carpo pode seria introduzido o endoscópio. A primeira incisão é
ser dividido em dois tipos: o conservador e o cirúrgi- feita a 1 cm proximal e 1 cm radial do osso pisiforme,
co, sendo este último subdividido em cirurgia tradi- e a segunda, imediatamente após a borda distal do li-
cional e cirurgia endoscópica. gamento transverso do carpo. Na primeira, introduz-
As indicações mais comuns do tratamento conserva- se uma cânula através da qual lâminas serão guiadas
dor são: sintomas leves com ausência de sinais de com- para a secção única ou de forma múltipla do retináculo
prometimento motor; gravidez, na qual se espera que a flexor, de proximal para distal e vice-versa. A câmera
compressão, tal como a sintomatologia, melhore após o é introduzida pela segunda abertura do lado oposto,
parto. Indica-se também quando há uma causa sistêmica permitindo a visualização das bordas seccionadas.
ou traumática da síndrome ou quando decorre de traba- Agee aboliu a incisão palmar, sendo denominada
lho manual excessivo, sendo possível uma readequação de Técnica de Um Portal. Sua incisão é feita na prega
do esforço, constituindo uma melhora no quadro. distal do punho, entre os tendões dos músculos flexor
O tratamento conservador geralmente consiste no radial do carpo e flexor ulnar do carpo. Em uma única
uso de tala (em posição neutra) durante o dia todo, in- incisão, introduz-se uma cânula através da qual lâmi-
clusive para dormir; mudanças da atividade manual, nas serão guiadas para a secção única ou de forma
uso de antiinflamatórios não hormonais e vitamina B6 múltipla do retináculo flexor, de proximal para distal.
(piridoxina). O uso de injeções locais com corticoste- O tratamento endoscópico apresenta contra-indica-
róides permanece controverso e tem suas indicações ções, como: a presença de alguma lesão expansiva in-
cada vez mais limitadas. tracarpal, artrite reumatóide, cirurgia prévia, neuropatia
O uso de corticosteróides de forma injetável intra- ulnar concomitante no punho e tenossinovite grave.
carpal foi advogado por muitos autores, sendo utiliza- O tratamento aberto apresenta muitas variações
da a técnica que consiste na injeção de corticóides (de- descritas.
xametasona, hidrocortisona ou metilprednisolona em
Em um trabalho de 1997 de Hudson et al., soli-
doses variáveis) de forma intracarpal, medialmente ao
citou-se a 12 renomados especialistas que descre-
tendão do músculo palmar longo e ao nervo mediano.
vessem como operavam seus pacientes, nunca antes
Porém, com o passar do tempo e a descrição de operados; no que tange ao tipo de incisão a ser feita,
complicações e de resultados fugazes, a injeção de simplesmente nenhuma foi coincidente. Variavam
corticóide foi perdendo espaço. de forma, localização, tamanho, transpassar ou não
Geralmente se reserva a injeção de corticóides a prega distal do punho e até quanto ao uso de duas
para as seguintes situações: incisões combinadas17.
• gravidez, pacientes com causas sistêmicas da Quanto à necessidade de neurólise interna ou epi-
doença, como diabéticos e hipotireóideos mui- neurólise, reconstrução do retináculo flexor por zeta-
to sintomáticos, pacientes muito idosos ou que plastia, ou sua biópsia, geralmente não se utilizam,
apresentem alguma causa local que postergue a pois aumentam o tempo cirúrgico e não trazem bene-
cirurgia. As complicações associadas à injeção fícios para o paciente.
de corticóides são: infecção local, ruptura de Assim, a maioria refere que a cirurgia deve limi-
tendão, aumento do déficit do nervo mediano, tar-se à secção total do ligamento transverso do car-
injeção intraneural e distrofia simpático-reflexa. po, sendo a exploração do nervo restrita a situações
especiais, como presença de sinais de compressão
Tratamento Cirúrgico unicamente do ramo recorrente tênar. Essa tendên-
As indicações do tratamento cirúrgico geralmente cia é sintetizada por Hudson, que se refere à cirurgia
são os casos leves ou moderados nos quais tenha havi- como “uma cirurgia simples e que deve ser mantida
do falha no tratamento clínico ou se apresentam dor in- como tal”.
tolerável, formigamento constante ou qualquer paresia.
Nos casos graves com atrofia muscular ou nos Descrição do Procedimento
quais haja déficit motor ou sensitivo progressivo, o O procedimento cirúrgico é realizado sob aneste-
tratamento cirúrgico pode ser indicado em primeira sia local, com o paciente monitorado (oximetria de
instância. pulso, pressão arterial média não invasiva e eletrocar-
O tratamento cirúrgico pode ser dividido em dois diograma contínuo), em decúbito dorsal horizontal e
grupos: o endoscópico e o aberto. com o membro superior abduzido e estendido, apoia-
As técnicas endoscópicas mais utilizadas são do numa mesa do tipo violão.
as de Chow e Agee, que são as mais largamente A incisão é curvilínea, com extensão de 4 a 5
empregadas15,16. cm, distal ou desde a prega distal do pulso em dire-

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Parte 7 – Neurocirurgia dos Nervos Periféricos

ção à borda radial do quarto dedo ou de uma linha


imaginária, que o dividiria ao meio, paralela à prega
tênar, evitando-a. Inicia-se radialmente ao tendão do
músculo palmar longo e medialmente ao tendão do
músculo flexor radial do carpo e termina numa linha
transversal, obtida por meio da extensão completa do
primeiro dedo e desenhada a partir do ângulo forma-
do entre este e a palma da mão (Fig. 53.1).
Disseca-se o plano da fáscia palmar até a visua-
lização das fibras transversas, características do li-
gamento transverso do carpo e, a seguir, este é sec-
cionado em toda a sua extensão. Não se procede à
sinovectomia e o nervo não é manipulado além do
necessário para a confirmação da sua total descom-
pressão. O fechamento é realizado em dois planos,
subcutâneo e pele, com fio poliglecaprone 4-0 e com
fio de mononáilon 4-0 respectivamente, com pontos
simples e separados (Figs. 53.2 a 53.4).
Fig. 53.3 – Início da secção do ligamento transverso.

Fig. 53.1 – Incisão padrão.

Fig. 53.4 – Nervo mediano totalmente exposto com o reti-


náculo flexor seccionado.

Após o ato operatório, a mão era enfaixada com


faixa crepe nº 10, de tal forma que os dedos permane-
cessem móveis, e o punho, em posição neutra.
A bandagem era retirada 48 horas após, durante a
troca do curativo, com medidas de anti-sepsia.
Após isto, somente permanecia um curativo com
gaze por mais três dias, quando o paciente retorna
para controle do quadro. Os pontos eram retirados
entre 10 e 14 dias.
O paciente é orientado a movimentar os dedos
desde o pós-operatório imediato, evitando esforços
locais até a retirada dos pontos.
Solicita-se que se abstenham de esforços físicos
Fig. 53.2 – Visualização da fáscia palmar e suas fibras lon- maiores, como carregar pesos ou realizar trabalhos
gitudinais.
manuais excessivos, por um mês, em média.

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53 – Síndrome do Túnel do Carpo

Os pacientes são acompanhados semanalmente dia de 5 dias contra 13 do outro método, tal como ao
até o fim do primeiro mês, quinzenalmente no segun- trabalho, em média de 16,5 contra 45,5 dias.
do mês e mensalmente até a alta. Esses trabalhos também não levam em conta a
As complicações da cirurgia tradicional podem ser curva de aprendizado necessária para se obter os re-
divididas em intra-operatória e pós-operatória, sendo sultados satisfatórios, similares aos procedimentos
estas últimas subdivididas em recentes ou tardias. abertos, pois vários trabalhos mostram que cirurgiões
As intra-operatórias seriam divididas em dois em treinamento falham em 38% a 50% para obter a
grupos: as lesões iatrogênicas do nervo mediano, do secção completa do ligamento e que mesmo um cirur-
ramo palmar, do ramo recorrente tênar ou dos ramos gião experiente não o conseguiu em 4 dos 13 cadáve-
digitais; e a descompressão inadequada do túnel do res operados.
carpo, por secção parcial do retináculo flexor. Como fator complicador, os limites do canal de
As pós-operatórias podem ser divididas em recen- Guyon têm sido questionados recentemente, sendo
tes, tardias e a recorrência do quadro. As recentes são: encontrado em trabalhos de dissecção que a fáscia
hematoma, edema, deiscência da ferida e infecção. As que o recobre se estenderia radialmente ao hâmulo
tardias são: fraqueza na preensão, enrijecimento dos do hamato, o que permitiria que tanto o nervo como
dedos ou do pulso, dor, hipertrofia da cicatriz com re- a artéria ulnar fossem lesados durante o método en-
tração, fasciite palmar e distrofia simpático-reflexa. doscópico.
Já a recorrência pode ser causada por fibrose em Em contrapartida os defensores do método tradi-
torno do nervo mediano, hiperplasia da sinóvia dos cional questionam a necessidade de se utilizar um mé-
tendões ou aderência do nervo mediano à cicatriz. todo caro, dependente de material de alta e específica
Katz et al. descrevem a evolução dos sintomas pré- tecnologia para se tratar uma doença que apresenta
operatórios após o tratamento cirúrgico e relatam que um método mais simples e tão eficaz de tratamento.
a dor noturna, as parestesias e hipoestesias melhoram Porém, ainda segundo os mesmos defensores, o
em um período de seis semanas após a cirurgia, e a principal problema do método endoscópico seriam as
paresia e status funcional melhoram paulatinamente. complicações, já que, se não há um aumento no nú-
A preensão e aperto, inicialmente pioram, retornam mero global destas19, isso não ocorreria em relação à
ao status pré-operatório em três meses e melhoram sua gravidade com o uso do endoscópio com um pe-
por volta de dois anos. O sinal de Tinel e Phalen, tal queno percentual a mais de neuropraxia, transecção
como a discriminação de dois pontos, pode permane- do nervo mediano e de seus ramos ou do nervo ulnar
cer mesmo após estes dois anos10. e lesão do arco palmar.
Após quase 50 anos de cirurgia tradicional, a in- Descreve-se também que há casos nos quais o
trodução do método endoscópico foi uma grande procedimento endoscópico é abortado e transforma-
modificação no sistema de tratamento, já consagra- do em cirurgia tradicional, o que ocorreria em 2% a
do, dessa doença. Seus defensores relatam que esse 5% dos casos, mesmo em grandes séries20 e que estes
método apresenta resultados clínicos comparáveis em não seriam contabilizados como fracassos do primei-
eficiência à cirurgia tradicional e que a abertura do ro método; além disso, em todos os casos nos quais
ligamento transverso pode ser comprovada por meio há persistência ou sequer ocorre algum alívio da sin-
da ressonância magnética. Como vantagens, relatam tomatologia com este tratamento, o tratamento de
uma redução na morbidade pós-operatória pela me- eleição é a cirurgia tradicional e não a repetição do
nor agressão tecidual envolvida. Isto resultaria, com- endoscópico.
parando-se os métodos, em menor taxa de “dor pilar” Mesmo com estes e outros argumentos, trabalhos
(a dor que freqüentemente acomete a eminência tênar que analisaram retrospectivamente a maioria dos tra-
ou hipotênar após a cirurgia tradicional) e da hiper- balhos publicados sobre evolução dos pacientes ope-
sensibilidade da cicatriz. Essas complicações do mé- rados por um outro método não chegaram a encontrar
todo tradicional decorreriam da não-preservação dos diferenças significativas entre eles.
nervos cutâneos que cruzam a palma da mão e de que
não existiria um plano ou um local em que ocorreria Há trabalhos, porém, que, utilizando-se de refe-
uma “divisão de águas” entre o nervo mediano e o rências escolhidas e baseando-se em um ou outro as-
ulnar, como levaria a crer a linha longitudinal traça- pecto de cada método, podem induzir às “conclusões”
da a partir do quarto dedo na marcação da incisão do acima descritas pelos defensores deste ou daquele
método tradicional18. método.
Estudos mostram haver maior capacidade de pre-
ensão e aperto, no período pós-operatório precoce REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
nos pacientes submetidos ao método endoscópico e, 1. Pfeffer GB, Gelberman RH, Boyesj H, Rydevic B.
principalmente, que esses pacientes podem retornar The history of the carpal tunnel syndrome. J Hand
às suas atividades diárias mais precocemente, em mé- Surg (Br). 1988;13:28-34.

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Parte 7 – Neurocirurgia dos Nervos Periféricos

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entrapment neuropathies in the upper limbs. Muscle verse carpal ligament and flexor tenosynovium in
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3. Nordstrom DL, Destefano F, Vierkant RA, Layde PM. Surgery Surg. 1998;23A:1015-24.
Incidence of diagnosed carpal tunnel syndrome in a 12. Choudary S, Krishna A. Mohan D. Less common
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e tratamento In: Ferreira AS, editor. Lesões nervo- 13. Martinolli C, Serafini G, Bianchi S, et al. Radiologic
sas periféricas. Diagnóstico e tratamento. São Paulo: Clinics Of North America. 1999;37:700-51.
Livraria Santos Editora; 1999. 14. Buitrago-Téllez CH, Horch R, Allmann KH, Stark GB,
5. Mumford J, Morecraft R, Blair WF. Anatomy of the Langer M. Three-dimensional computed tomography re-
thenar branch of the median nerve. J Hand Surg. construction of the carpal tunnel and carpal bones. Plas-
1987:12A:361-5. tic and Reconstructive Surgery. 1998:101(4):1060-4.
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Técnicas Cirúrgicas para
Nervos Periféricos
Guilherme Lepski
Guido Nikkhah
Antônio João Tedesco Marchese

INTRODUÇÃO geral, devendo o médico estar atento a diversas con-


dições clínicas que cursam com afecções de nervos

A
cirurgia racional dos nervos periféricos teve periféricos e que comumente são subdiagnosticadas,
progresso a partir do século XIX. No entanto, como vasculites, doenças reumáticas, intoxicações
foi a partir da introdução da anastomose térmi-
exógenas, doenças metabólicas e infecções. A seguir,
no-terminal por Langley e Hashimoto1, em 1917, que
deve-se realizar o exame neurológico detalhado e
a possibilidade de restauração significativa de função
completo, com o intuito de se detectar lesões em ou-
em lesões completas de nervos se tornou real. A partir
tros sistemas, permitindo o diagnóstico de síndromes
de então, Millesi et al., em 1972, introduziu a anas-
que cursam com acometimento periférico e central,
tomose interfascicular e numerosos outros autores,
bem como a precisão topográfica dos segmentos ner-
entre eles Samii, a partir de 1975, Levinthal et al.3,
vosos comprometidos (Fig. 54.1). O avaliador deve
em 1977, e Kline e Nulsen4, a partir de 1980, presta-
ram valiosas contribuições para o aprimoramento das estar apto a realizar a distinção semiológica entre po-
técnicas de reparação nas lesões de nervos periféri- lineuropatias, mononeurites múltiplas, radiculopatias,
cos e cranianos, desenvolvendo-se enxertias e trans- polirradiculoneurites ou mielites. Quando se trata de
posições, que hoje em dia possibilitam recuperação lesão plexular, a distinção entre lesão de tronco, de
funcional bastante satisfatória, mesmo em condições fascículos ou porções proximais dos principais ramos
clínicas graves para as quais antigamente não se dis- nervosos é imprescindível. Freqüentemente, o que de-
punha de qualquer opção terapêutica razoável. nominamos lesão de tronco superior se revela ser uma
lesão fascicular ou mesmo proximal dos nervos do bra-
Vale lembrar que o tratamento de doentes com afec-
ço. A radiculopatia L5 se confunde com a neuropatia
ção de nervos periféricos é multidisciplinar, devendo
obrigatoriamente albergar fisiatras, fisioterapeutas, te- compressiva do nervo ciático na coxa, que por sua vez
rapeutas ocupacionais, neurologistas e neurocirurgiões se confunde com a síndrome miofascial do músculo
especializados no tratamento de nervos periféricos e, piriforme. Assim sendo, a precisão semiológica é de
inclusive, da dor, eletrofisiologistas clínicos e ortopedis- fundamental importância no tratamento clínico desses
tas. Somente o atendimento holístico pode permitir real doentes, para se evitar correções cirúrgicas desneces-
ganho de função ao doente, com retorno ao trabalho e sárias ou abordagens anatomicamente errôneas.
às atividades da vida diária. Nesse contexto, a reparação Somente de maneira complementar, após deta-
anatômica pura e simples dos nervos lesados desempe- lhada avaliação clínica, deve-se recorrer aos exames
nha um papel de menor importância perante o grande de propedêutica armada, tais como eletroneuromio-
desafio que a verdadeira reabilitação representa. grafia, radiografias simples para avaliação das es-
truturas ósseas e articulares, ressonância magnética
idealmente com o recurso da neurografia e, eventual­
CUIDADOS PRÉ-OPERATÓRIOS mente, o estudo vascular com angiografia digital,
Na avaliação pré-operatória das lesões de nervos angiotomografia ou angiorressonância. A escolha do
periféricos, é de suma importância o exame clínico método complementar deve ser feita à luz das evi-

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Parte 7 – Neurocirurgia dos Nervos Periféricos

dências científicas e não do empirismo ou bom senso. litus, hipotireoidismo, além das causas traumáticas
Por exemplo, para o diagnóstico da avulsão de raiz e microtraumáticas, agudas ou crônicas). Assim
na lesão do plexo braquial, Penkert et al.5 reportaram sendo, o diagnóstico e investigação com exames
que a mielografia por TC tem acurácia de 85%, ao complementares são extremamente úteis na abor-
passo que a RNM tem somente 52%, confirmando- dagem das lesões de nervos periféricos a fim de
se, nessa série, a avulsão por inspeção intra-operató- se precisar a etiologia da afecção. Entre as lesões
ria. Quanto à eletroneuromiografia, vale lembrar que, traumáticas se subdividem as lesões por compres-
a despeito de o exame ser atividade de especialista, são, causadoras de microtraumatismo repetitivo e
o médico cuidador de doentes com lesão de nervos crônico, das lesões provocadas por traumatismos
periféricos deve estar apto a interpretar e, mais im- agudos, que por sua vez são subdivididos em per-
portante, criticar as condições do exame realizado. furantes (agulhas de punção venosa), cortantes
Com muita freqüência, as eletroneuromiografias (bisturi, faca), contusos (quedas, impactos diretos,
realizadas são feitas por pessoas com treinamento arma de fogo), lacerantes (esfoliações, grandes
inadequado e formação neurológica superficial, o traumatismos), por tração (acidente motociclístico
que acarreta erros de interpretação diagnóstica que com lesão de plexo braquial), ou mesmo mistos. A
culminam em condutas equivocadas na prática clíni- classificação anterior é importante por pressupor
ca. Dizer ao eletrofisiologista as dúvidas relativas ao tratamentos distintos.
exame neurológico, ou o objetivo do exame solicita- Funcional e anatomicamente, as lesões podem ser
do ajuda a aumentar a precisão do método. Deve-se ainda classificadas em neuroapráxicas, axonotímicas
avaliar se todos os grupos musculares de interesse e neurotímicas. A neuroapraxia (Sunderland I) foi um
foram agulhados de forma sistemática, buscando-se termo cunhado por Seddon5, em 1943, para designar
a descrição dos achados patológicos como atividade as lesões por estiramento ou compressão que atingem
de inserção aumentada, potenciais polifásicos, au- a bainha de mielina, sem, no entanto, causar descon-
mento de amplitudes, fasciculações, em detrimento tinuidade axonal. Por lesar a bainha, sobrevém perda
da leitura pura e simples da conclusão do exame. Ve- da condutividade elétrica e disfunção motora e sensi-
locidades de condução sentitiva e motora devem ser tiva, que dura de semanas a poucos meses, reverten-
relativizadas em relação ao normal esperado, bem do espontaneamente. Lesões esquêmicas por torni-
como a morfologia dos potenciais. O exame de gru- quete ou paralisia do sábado à noite (compressão do
pos musculares anatomicamente distantes do sítio de radial no braço) são exemplos de lesões apráxicas. O
lesão, como, por exemplo, o exame da musculatu- termo axonotmese (Sunderland II) se refere à lesão
ra paravertebral cervical na lesão do plexo braquial, que provocou perda da continuidade axonal, sem, no
pode dar indícios relevantes de avulsão de raiz e in- entanto, causar lesão do envoltório endoneural, mais
fluir na terapêutica.
resistente ao traumatismo, o que permite regeneração
Além disso, o tempo transcorrido da lesão ao re- adequada das fibras. O termo neurotmese (Sunder-
paro tem importância ímpar para a recuperação fun- land III a V) refere-se às lesões do axônio acompa-
cional dos doentes. Lesões cortantes devem ser abor- nhadas de seus envoltórios conectivos. A regenera-
dadas precocemente, no momento do trauma ou no ção espontânea não ocorre em razão da formação de
dia subseqüente, ao passo que lesões contusas devem tecido cicatricial, fazendo-se necessária a reparação
ser abordadas após esfriamento do processo lesional cirúrgica. Sunderland diferencia os graus III, quando
e estabilização anatomofuncional do defeito. Lesões perineuro e epineuro estão intactos, grau IV, quando
por estiramento do plexo braquial devem ser aborda- o epineuro está intacto, e V, quando há lesão do epi-
das idealmente entre 3 e 6 meses após o traumatismo;
neuro. Porém, a classificação clínica dessas entidades
abordagem precoce pode ser desnecessária por tratar
é impossível, o que diminui seu valor classificatório
possível neuropraxia, ao passo que abordagem tardia
na tomada de decisões.
compromete a recuperação ao permitir degeneração
fibroblástica do leito distal. Com base no que foi exposto, define-se o mo-
mento ideal do reparo de uma lesão traumática em
função do tipo de lesão, revelado pela sua evolução
TIPOS DE LESÃO clínica. Lesões cortantes limpas devem ser sanadas
Uma ampla gama de doenças pode causar neu- cirurgicamente de maneira imediata. Lesões cortan-
ropatias, as quais podem ser agrupadas em neoplá- tes contaminadas ou infectadas devem ser abordadas
sicas (neurinomas, neurilemomas, neurofibromas e após resolução ou descarte de um quadro infeccioso.
fibrossarcomas), inflamatórias (polimialgia reumá- Lesões contusas, no entanto, devem ser abordadas
tica, arterites e periarterites, lúpus eritematoso sis- tardiamente, após 3 meses, pelo fato de que a lesão
têmico, dermatomiosite etc.), infecciosas (sífilis, se estabelece de maneira subaguda, com isquemia,
mal de Hansen, herpes zoster), tóxicas (intoxicação necrose e fibrose. Pode ainda, nesses casos, haver re-
por chumbo, tálio etc.), metabólicas (diabetes me- generação e recuperação funcional tardias.

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54 – Técnicas Cirúrgicas para Nervos Periféricos

A B

Fig. 54.1 – (A) Exemplo de lesão contundente, notando-se uma dilatação endurecida da porção do nervo acometida, que im-
pede a progressão das fibras durante o processo normal de regeneração. (B) Lesão cortante completa, notando-se a retração que
os cotos neurais sofrem após a lesão.

TÉCNICAS DE REPARO
Neurólise Externa (Fig. 54.2)
A neurólise externa costuma ser o primeiro proce-
dimento a ser realizado na tentativa de reparo de um
nervo com lesão parcial. Quando a lesão tiver ocor-
rido há menos de 6 meses, não tendo havido recu-
peração funcional, encontrando-se o nervo com sua
continuidade preservada, deve-se indicar a neurólise
externa. Comumente se observa ausência de melhora
nas lesões fechadas, o que na maioria dos casos se
deve à formação de um tecido cicatricial que impede
a regeneração ou o crescimento das fibras nervosas.
A remoção cirúrgica dos tecidos cicatriciais circun-
vizinhos à lesão promove a descompressão local do Fig. 54.2 – Foto cirúrgica mostrando a neurólise externa,
com liberação do tecido cicatricial ao redor do nervo.
nervo, permitindo a passagem das fibras em recupe-
ração, além de restaurar a irrigação normal do nervo.
Também nos casos de neuropatias compressivas, o Neurólise Interna (Fig. 54.3)
procedimento descrito costuma ser curativo. A neurólise interna é a dissecção dos fascículos ner-
O procedimento envolve a ressecção da cicatriz vosos por meio do microscópio cirúrgico. Normalmen-
epineural, progredindo-se de uma área normal prefe- te é indicada nas lesões parciais, nos tumores de nervos
rencialmente proximal à lesão para distal, com mi- e na neurite hansênica, principalmente quando há dor
croscópio ou lupa cirúrgica, tomando-se o cuidado refratária. Deve-se abrir o epineuro com bisturi e proce-
de coagular fontes de sangramento importantes para der à dissecção de proximal à distal, através da área de
evitar a nova formação de escaras. Deve-se notar, no lesão, tomando-se cuidado com as conexões interfas-
entanto, que ferida seca não é sinônimo de menos ciculares, mais exuberantes proximalmente. Durante o
agressão, muito embora possa parecer mais bonito procedimento, indica-se a monitoração eletrofisiológica
para o observador leigo ou pouco familiarizado com para máxima preservação de fascículos funcionalmente
a cirurgia de nervos periféricos. Coagulação extensa relevantes ou suas conexões, evitando-se traumatismo
com o bipolar pode causar necrose importante e tanta maior às estruturas nervosas. Interrupção à passagem
ou mais fibrose quanto o sangramento despercebido. dos potenciais após a neurólise extensa implica neces-
Após a liberação extensa do território acometido, de- sidade de um reparo com interposição de enxertos.
ve-se proceder à pesquisa de potenciais de ação dos
nervos (NAP). Se não tiver havido passagem de es- Reparo Término-terminal
tímulos pelo local da lesão, deve-se pensar em lesão
completa, o que implica outros métodos reparadores. O reparo término-terminal está indicado quando o
Espera-se, após o procedimento, crescimento de fi- nervo tiver sofrido secção completa ou quando a le-
bras a uma velocidade de 1 mm por dia, observando-se são em continuidade for de pequena extensão. Caso
reinervação de proximal a distal. A ausência de recupe- a lesão em continuidade seja extensa, ou se os cotos
ração implica lesão completa e, conseqüentemente, um lesados estiverem muito retraídos, será necessária a
procedimento mais invasivo deve ser considerado. interposição de enxertos. Deve-se identificar a área

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Parte 7 – Neurocirurgia dos Nervos Periféricos

segmento de comprimento desejado. A extremidade


proximal deve estar situada na profundidade da mus-
culatura, para se evitar dor causálgica no pós-operató-
rio. Os ramos devem ser incluídos na dissecção e, por
ocasião do implante, o enxerto costuma ser invertido,
embora a prática careça de confirmação de sua melhor
eficácia. Dois a quatro pontos de fio mononáilon 8-0
a 9-0 são aplicados em cada extremidade do enxerto,
e estes são apostos aos fascículos do coto nervoso.
Deve-se evitar a remoção excessiva do epineuro da
extremidade, pois é sobre este que a sutura é aplicada,
Fig. 54.3 – Exemplo intra-operatório de neurólise interna, garantindo-se, assim, a sua firmeza. Aplicação de cola
mostrando-se os fascículos nervosos expostos. de fibrina, embora preferida por alguns autores, mos-
trou-se associada a uma pior regeneração das fibras
motoras, com potenciais de ação motores mais len-
do nervo acometida, facilmente percebida pelo seu as- tos em relação à sutura convencional com fios7. Além
pecto intumescido e rígida à palpação. Resseca-se o disso, deve-se tomar cuidado para que a cola não se
neuroma completamente, o que pode ser feito incisan- difunda para a área entre os cotos, impedindo, assim,
do-se pequenas e sucessivas secções transversais do a regeneração nervosa. A aplicação de material sin-
nervo, até a identificação de todos os seus fascículos. tético sobre a sutura, em nossa opinião, preconizada
Segue-se a hemostasia cuidadosa de pontos arteriais por alguns autores por impedir fibrose pós-operatória,
de sangramento com bipolar delicado. Após a hemos- impede, na verdade, a revascularização do enxerto,
tasia, a sutura poderá ser realizada por meio da aproxi- que é feita por embebição e não tem embasamento.
mação dos epineuros dos dois cotos com dois a quatro Após a cirurgia, o membro deverá ser imobiliza-
pontos de fio mononáilon 8-0 ou 9-0. Aplicação de do por cerca de 2 semanas, para permitir adequada
vários pontos leva à cicatrização prejudicial. Quando aderência da sutura. No entanto, deve-se notar que
for necessária leve flexão do membro, a ressecção de tal recomendação está associada a um marcante au-
uma proeminência óssea ou mesmo a sua transposição mento da ocorrência de dor complexa regional, o que
podem permitir a adequada aproximação sem tensão. compromente intensamente a recuperação funcional
Esses procedimentos podem impedir a rotura da sutu- dos doentes. Entendemos que a mobilização deve ser
ra no pós-operatório. Caso não sejam possíveis, será tentada na segunda semana, com cuidado e limitada
preferível a interposição de enxertos a se arriscar uma pela dor e fenômenos parestésicos. Conquanto estes
sutura término-terminal. A identificação dos fascícu- não ocorram, a mobilização é livre.
los sensitivos ou motores deve ser tentada por meio de
Na série de Samii et al.8, mais de 400 doentes com
eletrofisiologia, o que influencia a recuperação funcio-
lesão traumática de plexo braquial foram sistematica-
nal. Pequena mobilização do segmento após o reparo
pode ser feita para se avaliar a firmeza da sutura. mente analisados e seguidos por até 15 anos; destes,
63 foram submetidos a implantes visando à restaura-
ção do nervo musculocutâneo, e as estruturas doadoras
Reparo com Interposição de Enxertos (Fig. 54.4) foram as raízes C5, C6 ou C7, o tronco superior ou o
Quando a distância entre os cotos normais do ner- fascículo lateral, ou mesmo o próprio nervo musculo-
vo é excessiva e a aproximação término-terminal não cutâneo, interpostas com um ou dois enxertos de sural.
é possível sem tensão exagerada, deve-se realizar a Sessenta e sete por cento dos doentes apresentaram si-
interposição de enxertos. Para tanto, o membro é po- nais clínicos de reinervação com retorno da flexão do
sicionado em extensão, para se permitir máxima mo- cotovelo. Melhores resultados foram observados nas
bilidade sem o risco de rotura da sutura; o segmento lesões mais distais, e com menor tempo de evolução
a ser enxertado é medido, avaliando-se a quantidade até o momento da reparação (melhor resultado com
de enxertos necessária para aquele trecho de nervo, menos de 6 meses). Nos 53 pacientes em que se obje-
o que varia em função do seu diâmetro e do número tivou a recuperação do nervo axilar, as estruturas doa­
de fascículos. Todo o reparo é feito com auxílio do doras foram as raízes C4, C5 ou C6, tronco superior,
microscópio cirúrgico. Nervos doadores são geral- fascículo posterior ou o próprio nervo axilar. Sessenta
mente o nervo sural, o cutâneo lateral do antebraço e três por cento dos doentes mostraram sinais clíni-
ou da coxa, o ramo superficial do radial ou o nervo cos de reinervação com abdução do ombro. Devido
ulnar. O nervo sural localiza-se na linha média entre à menor resposta clínica em termos de força motora
o maléolo lateral do tornozelo e o tendão de Aquiles. após reinervação do axilar, preconiza-se atualmente
Identificando-se o nervo distalmente, amplia-se a in- o transplante conjunto no nervo supra-escapular, para
cisão proximalmente em etapas até que se obtenha o resposta clínica mais exuberante.

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54 – Técnicas Cirúrgicas para Nervos Periféricos

A B

Fig. 54.4 – (A e B) Exemplo de lesão completa e interposição de múltiplos enxertos para restauração da continuidade neural.
Nota-se a ausência de tensão na linha da sutura.

Neurotizações ou Transferências perda de função associada não é significativa do pon-


to de vista clínico. Em uma revisão de 110 pacientes
O primeiro autor a considerar a transferência ner- submetidos à neurotização do musculocutâneo com
vosa para restauração de lesões foi Tuttle9, em 1913, intercostais na série de Samii10, pacientes operados
que usou o nervo acessório para restauração de uma até 6 meses após a lesão evoluíram com melhora sig-
lesão no plexo braquial. Utiliza-se a transferência ou nificativa em em relação àqueles em que uma inter-
neurotização quando o segmento proximal do nervo venção precoce não foi possível. Paralelamente, o uso
lesado está comprometido ou não-acessível. É bas- de três ou quatro nervos doadores implicou uma res-
tante comum nas lesões traumáticas do plexo bra- posta muito melhor que um ou dois segmentos, pelas
quial com avulsão de raízes. Pode ser realizada com razões já expostas. Quando a interposição de enxerto
ou sem interposição de enxertos. Devido à menor foi necessária, a eficácia clínica caiu pela metade. Em
distância a ser reconstituída, as lesões de tronco supe- geral, 53% dos pacientes mostraram sinais clínicos de
rior (Erb-Duchenne) têm melhor prognóstico que as reinervação, e em 42% um grau de força motora 3 ou
lesões do tronco inferior (Dèjerine-Klumpke); além mais foi atingido.
disso, devido às características da neurocondução, re-
cuperação distal da sensibilidade dolorosa e tátil, sua O nervo acessório é outro comumente usado para
ocorrência é mais fácil que a da recuperação da mo- neurotizações. Costuma ser seccionado após a emer-
tricidade distal. Com base nessas evidências, as estra- gência do ramo para o músculo esternocleidomas-
tégias terapêuticas devem ser direcionadas a quatro tóideo e após a emergência da primeira aste para o
objetivos, nesta ordem: (1) recuperação da flexão do músculo trapézio, sendo, a seguir, anastomosado por
cotovelo; (2) recuperação da abdução do ombro; (3) meio de um enxerto de sural no nervo axilar, no mus-
recuperação da extensão do cotovelo; (4) recuperação culocutâneo ou no supra-escapular. A taxa de reiner-
da sensibilidade de defesa da região distal do membro vação se situa entre 60% e 70%, com força muscular
superior. Deve-se considerar, para o êxito da estraté- de 3 ou mais.
gia escolhida, a relação entre o número de axônios do Também partes do plexo cervical podem ser utili-
nervo doador e do nervo receptor. Por exemplo, um zadas para transferências, principalmente para recu-
nervo intercostal possui, em média, 500 axônios, en- peração motora ou sensitiva da mão. Para recupera-
quanto um musculocutâneo, geralmente usado como ção motora, pode-se utilizar o nervo hipoglosso, ou
receptor, 6.000; um nervo acessório 1.500, e um um ramo do acessório para trapézio. Para recuperação
axilar, outro receptor, 3.000; o nervo frênico, 2.000, sensitiva, pode-se empregar o nervo auricular magno,
enquanto o radial, 10.000. O sucesso terapêutico de- supraclavicular ou transverso do pescoço, anastomo-
penderá do tempo transcorrido da lesão, do número sados no nervo mediano.
de axônios do nervo doador e do cumprimento do en- O nervo frênico é empregado como doador nas
xerto. Vale lembrar que a revascularização do enxerto neurotizações para o musculocutâneo, principalmen-
livre, no entanto, não depende do cumprimento do te. Possui, em geral, 2.000 axônios motores e está as-
enxerto, mas, sim, do seu diâmetro e da vitalidade da sociado a 85% de reinervação numa série de 49 doen-
área receptora, visto que se dá por embebição. tes de Samii10, com força motora 3 ou mais. Implica
Os principais nervos usados para transposições uma diminuição da função pulmonar, que em geral é
são os intercostais (de 3 a 7), pioneriamente utilizados totalmente compensada 2 anos após o procedimento.
por Seddon em 1963. Em primeiro lugar, esses nervos Outra fonte menos empregada para neurotizações
não são acometidos nas lesões de plexo e, depois, a é a raiz C7 contralateral, introduzida por Gu et al.11,

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Parte 7 – Neurocirurgia dos Nervos Periféricos

em 1992, anastomosada ao nervo musculocutâneo lesões do sistema nervoso periférico. Algumas vezes
por intermédio de um enxerto de sural ou ulnar. Se- a dor está associada à ocorrência de hematomas ou
gue-se leve distúrbio de sensibilidade na mão sadia, infecções que complicam a evolução clínica, mas,
que pode ser reduzido sacrificando-se o ramo poste- no mais das vezes, deve-se à própria lesão nervosa
rior do tronco médio em vez da raiz C7. Iniciativa (dor neuropática) ou à imobilização prolongada, por
semelhante foi introduzida em nosso meio por Tedes- meio das quais ocorre perda de aferências sensitivas
co et al., com a interposição de enxerto de sural para que normalmente atuam suprimindo a informação do-
anastomose plexo-plexular término-lateral no plexo lorosa. A dor complexa regional é a expressão mais
doador de fibras. Segundo Viterbo et al.12, após 1 ano marcante dos quadros álgicos imputáveis à disfun-
de sutura término-lateral em ratos, com ou sem janela ção do sistema nervoso periférico, diferenciando-se
epineural, ocorre brotamento de 20% do número de o tipo I, sem lesão do nervo, ou o tipo II ou causalgia,
fibras contadas com a sutura término-terminal con- com lesão nervosa. Caracterizam-se por dor em quei-
vencional. mor ou choque, intensas e contínuas, sem fatores de
Vale lembrar que existe enorme interesse e espaço melhora, associadas a fenômenos vegetativos locais,
para novos avanços na cirurgia restauradora de ner- como calor ou esfriamento do membro, perda da pi-
vos periféricos, principalmente no desenvolvimento lificação e amiotrofia. A inutilidade do membro, com
da viabilidade de longos enxertos, nos transplantes ou sem lesão nervosa, acarreta retrações tendíneas e
bioartificiais e no conhecimento sobre neurotropis- perversão da representação cortical do membro, com
mo, que viabilizarão contribuições criativas de nos- compromentimento do prognóstico. Muitas vezes nos
sos antecessores10,13-18. defrontamos com um quadro de dor neuropática, em
choque ou queimor, sem os fenômenos vegetativos da
dor complexa regional.
TRATAMENTO DA DOR
Para dor neuropática, o uso de analgésicos, antiin-
O tratamento da dor é de suma importância para o flamatórios e mesmo morfínicos e opiáceos é inefi-
cirurgião que deseja se aprofundar no tratamento das caz, fazendo-se necessário o uso de neurolépticos,

A B

Fig. 54.5 – (A e B) Exemplo de neurotizações dos nervos intercostais para o musculocutâneo ou do acessório para o axilar.

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54 – Técnicas Cirúrgicas para Nervos Periféricos

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Fig. 54.6 – Lesão da zona de entrada em paciente com avul- 12. Viterbo F, Franciosi LF, Palhares A. Nerve graftings
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mento adequado. Freqüentemente, no entanto, um 13. Luedemann W, Hamm M, Blomer U, Samii M, Tata-
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Compressão do Nervo
Ulnar no Cotovelo
Fátima Griz
Rui Ferreira

N
o cotovelo, o nervo ulnar é exposto a uma Com a progressão da compressão, o músculo fle-
compressão dinâmica, decorrente das mudan- xor ulnar do carpo começa a perder fibras, uma vez
ças que ocorrem nas relações anatômicas du- que é o primeiro músculo a receber inervação do ner-
rante a flexão e a extensão1. vo ulnar após sua saída do canal ulnar. A compressão
A neurite crônica do nervo ulnar no cotovelo foi prolongada leva à perda de massa muscular intrínseca
descrita por Buzard em 1922; Learmonth, em 1930 e da mão, resultando em hipotrofia da eminência hipo-
1940, reconheceu a neurite e popularizou a técnica para tênar, primeira comissura e musculatura interdigital
descompressão e transposição do nervo2. Em 1958, foi (Fig. 55.2).
introduzido o termo “síndrome do túnel ulnar”. Na A incidência dessa neurite só é menor que a do
mesma época, Osborne descreveu a borda do músculo nervo mediano no canal do carpo. O diagnóstico é
flexor ulnar do carpo como outro ponto de compres- clínico, com sinal de Tinel positivo, sintomatologia
são desse nervo. Durante a flexão do cotovelo, ocorre de dor e parestesias no território do nervo ulnar na
diminuição do espaço do túnel em torno de 55%, com mão (Fig. 55.1). A eletroneuromiografia é freqüente-
conseqüente aumento de pressão sobre o nervo2. mente negativa. Os testes provocativos, com pressão
O nervo ulnar pode ser comprimido em quatro lo- no túnel e movimentos de flexão e extensão, são bem
cais diferentes, durante seu curso da região cervical específicos, como demonstrou MacKinnon2.
até à mão: arcada de Struthers, túnel ulnar, fáscia do
flexor ulnar do carpo e canal de Guyon. A localização A B
mais freqüente é no túnel ulnar. Os sintomas iniciais
são formigamento e disestesia no território do nervo
ulnar (Fig. 55.1).
O tratamento pode ser conservador, com orienta-
ção para o paciente evitar posições e atividades que
combinem flexão do cotovelo e pressão no nervo
ulnar, tais como dirigir, falar ao telefone ou durante
o sono. As modificações de postura para melhorar a
sintomatologia só são efetivas após algum tempo. Di-
ferentemente da síndrome do túnel do carpo, existem
algumas patologias que podem ser confundidas com
a síndrome do túnel ulnar, como a síndrome do neu-
rônio motor ou a síndrome de Guillain-Barré, além de Fig. 55.1 – Territórios cutâneos dorsal (A) e palmar (B) do
nervo ulnar.
hérnia de disco e esclerose lateral amiotrófica2.

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Parte 7 – Neurocirurgia dos Nervos Periféricos

cotovelo, situa-se posterior ao epicôndilo medial,


sendo coberto por uma arcada fibrosa (ligamento de
Osborne). Ao sair do túnel ulnar, corre entre os dois
ventres do músculo flexor ulnar do carpo, emitindo
ramos para este músculo, e 5 cm distalmente ao epi-
côndilo lateral, emitindo ramos para o músculo flexor
profundo dos dedos (4 e 5 quirodáctilos).

TRATAMENTO
Dellon, em 1989, fez uma revisão dos tratamen-
tos para a neurite do nervo ulnar no cotovelo, em 50
trabalhos publicados entre os anos de 1898 e 1988,
envolvendo mais de 2.000 pacientes. Os resultados do
Fig. 55.2 – Paralisia ulnar típica por aumento e destruição tratamento conservador foram considerados excelen-
nervosa produzida por hanseníase.
tes em 50% dos casos e em quase 100% dos operados
por uma das cinco técnicas cirúrgicas. Para uma mo-
derada compressão, a transposição submuscular ante-
ANATOMIA rior mostrou ser mais eficaz, com mínima recorrência,
O nervo ulnar origina-se de fibras anteriores das ao passo que, para uma compressão grave, a transpo-
raízes C8 e D1 (Fig. 55.3). Após o fascículo medial sição intramuscular anterior mostrou os piores resul-
dar a sua contribuição ao nervo mediano, continua na tados, com maior índice de recidiva. A revisão suge-
axila com as artérias e veia axilares e profundamente riu, ainda, que uma neurólise interna, combinada com
com o peitoral maior. Na axila, localiza-se superfi- uma transposição submuscular anterior, seria a me-
cialmente aos tendões de inserção dos músculos su- lhor combinação. Em 2003, Dellon publicou trabalho
bescapular, redondo maior e grande dorsal, no úmero. apresentando os resultados com o alongamento fascial
Numa distância aproximada de 10 cm, proximamente do músculo para a transposição submuscular do nervo
ao epicôndilo medial, o nervo ulnar penetra no sep- ulnar. Por falta de estudo prospectivo randomizado,
to medial intermuscular, entrando no compartimento comparando as mais diferentes técnicas, a escolha do
posterior do braço (Fig. 55.4), onde entra em conta- método de tratamento baseia-se na experiência e trei-
to com o bordo anterior da porção média do tríceps. namento do cirurgião. Alnot3 indica a cirurgia baseada
Uma fáscia espessa conecta essa porção média do na classificação de Mac Gowan (Tabela 55.1).
tríceps ao úmero, 8 cm proximamente ao epicôndi- Um velho axioma em cirurgia diz que, quando
lo medial (arcada de Struthers), encontrada em 70% existem várias técnicas para tratamento de uma deter-
da população. Esta é mais comum que o ligamento minada patologia, é sinal de que nenhuma delas é boa
de Struthers, responsável pela compressão do nervo o suficiente. Isto é verdade no tratamento da compres-
mediano, presente em apenas 1% da população. No são do nervo ulnar, no cotovelo.

Tronco superior
Tronco médio
Nervo subescapular

Fascículo lateral
Nervo músculo cutâneo

Nervo axilar

Tronco inferior
Nervo radial
Fascículo posterior

Fascículo médio
Nervo mediano Nervo ulnar

Fig. 55.3 – Esquema do plexo braquial direito, mostrando a formação do nervo ulnar.

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55 – Compressão do Nervo Ulnar no Cotovelo

Tríceps

Nervo ulnar

Epicôndilo medial

FCU

Fig. 55.5 – Paciente com calcificação no canal ulnar por gota.

Fig. 55.4 – Aspectos anatômicos do nervo ulnar no cotovelo.

Tabela 55.1 – Classificação de Mac Gowan, utilizada


por Alnot para indicar o tipo de cirurgia3
Grau I Sintomas subjetivos + hipoestesia
Grau II Sintomas subjetivos + fraqueza e perda de
volume dos membros interósseos
Grau III Anestesia
Atrofia dos membros interósseos
Atrofia dos membros da eminência hipotenar

As técnicas variam, desde uma simples descom- Fig. 55.6 – Aspecto peroperatório da calcificação.
pressão, a diferentes tipos de transposição nervosa,
com e sem epineurectomia e/ou epicondilectomia. Em
teoria, apenas a transposição poderia mudar a tensão
sobre o nervo ulnar, dentro do túnel. A presença de
calcificações na fáscia de Osborne, provocadas pela
gota, é uma importante causa de compressão do nervo
ulnar, devendo ser removidas (Figs. 55.5 a 55.8).

Descompressão
Trata-se de descompressão do nervo ulnar no tú-
nel, com vista direta do nervo, na arcada de Struthers
até a fáscia de Osborne (Fig. 55.8). Freqüentemente
se observa o nervo ulnar com o sinal da ampulheta,
sendo necessária a realização de epineurectomia, sob
microscopia. Benoit4, em 1987, publicou trabalho em
que usa um tubo de silicone após a neurólise, o que, Fig. 55.7 – Aspecto final da ressecção da calcificação e
na nossa experiência, nunca foi necessário. epineurectomia do nervo ulnar.

Epicondilectomia Transposição Nervosa


Foi introduzida na literatura em 1950, por King e Várias técnicas foram propostas para a transposi-
Morgan, para tratamento da neurite do nervo ulnar. ção do nervo ulnar, sejam subcutânea, intramuscular
Os 16 pacientes descritos nessa série eram portadores ou submuscular.
de neurite pós-traumática. Essa técnica proporciona Teoricamente, uma transposição anterior pode corri-
pequena transposição do nervo ulnar, sem muita dis- gir a neurite do nervo ulnar, tomando-se cuidado para
secção2 (Fig. 55.9). não produzir uma outra compressão, proximal ou distal.

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Parte 7 – Neurocirurgia dos Nervos Periféricos

A transposição intramuscular foi introduzida em


1918 por Adson e usada também por Kleinman. Seus
proponentes advogam que o nervo fica mais reto e
mais protegido, ao passo que seus críticos defendem
que proporciona mais cicatrizes em torno do nervo.

Arcada de Struthers REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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Fig. 55.9 – Epicondilectomia e transposição do nervo ulnar.

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Parte 8
Neurocirurgia
no Traumatismo
Cranioencefálico

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Fístulas Liquóricas
Flávio Key Miura
Vinícius Monteiro de Paula Guirado

INTRODUÇÃO grupo das não-traumáticas está associado com tumo-


res encefálicos, defeitos congênitos da base do crânio

F
ístula é uma palavra derivada do latim fístula e e meningoceles ou meningoencefaloceles2.
significa canal. No sentido médico, designa a A revisão da literatura demonstra que, em relação,
comunicação entre dois órgãos/sistemas ou com às causas documentadas das fístulas liquóricas, 80%
o meio externo. são decorrentes de traumatismos cranioencefálicos,
As fístulas liquóricas representam uma situação 4% são espontâneas e 16% decorrem de procedimen-
clínica grave e potencialmente fatal, tendo em vista tos cirúrgicos relacionados ou próximos ao comparti-
a exposição do tecido nervoso estéril ao meio exter- mento liquórico3.
no contaminado. Uma vez que o liquor circula pelo Embora 75% de todos os casos de fístulas liquó-
neuroeixo através do espaço subaracnóideo, essas ricas sejam causados pelo trauma, somente 3% dos
fístulas podem ocorrer em qualquer localização que pacientes com traumatismo cranioencefálico fechado
coloque o compartimento liquórico em continuidade as desenvolvem4. As fístulas liquóricas ocorrem em
com o meio externo e, menos freqüentemente, com cerca de 12% a 30% das fraturas de base de crânio4,
outras cavidades e espaços orgânicos internos. Por- 9% a 11% das lesões por projétil de arma de fogo na
tanto, podem surgir em conseqüência de afecções que população civil e 26% das lesões por projétil de arma
acometam tanto o crânio quanto a coluna vertebral. de fogo em casuística militar5. Nas crianças, as fístu-
O êxito no diagnóstico e no tratamento das fístulas las liquóricas são vistas em somente 1% dos trauma-
liquóricas depende fundamentalmente da compreen- tismos cranioencefálicos fechados. A razão para isso
são dos aspectos anatômicos e fisiopatológicos dessas se deve ao desenvolvimento tardio dos seios parana-
lesões. No planejamento terapêutico, a localização, o sais nas crianças e também ao maior conteúdo cartila-
tamanho e o tempo de persistência das fístulas liquó- ginoso da base do crânio, onde as fraturas são menos
ricas são os principais fatores norteadores das condu- comuns e, quando ocorrem, apresentam-se com me-
tas. A maioria dos casos resolve-se espontaneamente nor desnivelamento e, conseqüentemente, com me-
com medidas não-cirúrgicas e sem complicações in- nos probabilidade de ocasionar lesões da dura-máter
fecciosas. com fístula liquórica6-8. A relação de incidência adul-
No presente capítulo serão enfatizados os aspectos to : criança para as fístulas liquóricas traumáticas é de
do diagnóstico e do tratamento das fístulas liquóricas aproximadamente9 10:1. Além disso, nas crianças nas
de origem traumática. quais as quedas são causas comuns de traumatismo
cranioencefálico, pela alta freqüência de fraturas da
base média do crânio, as fístulas liquóricas nessa to-
EPIDEMIOLOGIA pografia são mais comuns10. Lane e Kenna11 relataram,
As fístulas liquóricas podem ser divididas em em 15 anos de seguimento de crianças hospitalizadas
traumáticas e não traumáticas. O grupo das traumáti- por traumatismo cranioencefálico, uma freqüência de
cas pode ser dividido em acidentais e iatrogênicas1. O meningite pós-traumática de 0,38%.

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

Brawley e Kelly12 descrevem uma freqüência de Fraturas da Base Anterior do Crânio


24% de fraturas de base de crânio em 1.250 trauma-
tismos cranioencefálicos. Einhorn e Mizrahi13, em um Sakas et al.20, em 1998, utilizando a tomografia
estudo de 1.300 traumatismos cranioencefálicos em computadorizada, descreveu quatro tipos diferentes
crianças, relatam uma freqüência de 3,5% de fraturas de fraturas da base anterior do crânio:
localizadas na base do crânio. • Tipo I – fratura cribriforme: esta é uma fratura
O desenvolvimento da fístula liquórica pode linear através da placa cribriforme, sem o en-
ocorrer no segundo dia de trauma em 55% dos ca- volvimento dos seios aéreos etmoidal e frontal.
sos, após uma semana em 15% dos casos e após três • Tipo II – fratura frontoetmoidal: essas fraturas
semanas em 10% dos casos. As fístulas liquóricas se estendem através da porção medial do asso-
podem se apresentar diretamente como meningite alho da fossa craniana anterior e envolvem as
em 20% dos pacientes. O aparecimento tardio da fís- paredes do seio aéreo etmoidal e/ou seio fron-
tula pode ocorrer secundariamente à dissolução do tal medial.
coagulo sangüíneo no trajeto fistuloso, ao aumento • Tipo III – fratura frontal lateral: essas fraturas
da pressão intracraniana, ou mesmo por um trauma se estendem através do seio aéreo frontal late-
secundário14,15. ral (parede súpero-medial da órbita), as quais
As fístulas liquóricas de início tardio são mais podem envolver as paredes superior e/ou late-
raras e geralmente ocorrem dentro de três meses do ral do seio aéreo frontal lateral.
trauma16. A freqüência de fístula liquórica recorrente • Tipo IV – fraturas complexas: este grupo con-
após o fechamento inicial espontâneo é de aproxi- siste de qualquer combinação das fraturas dos
madamente 7%17. Já foram relatadas ocorrências de tipos de I a III.
fístulas liquóricas após 1418 e 27 anos14 do trauma. Choi e Spann21 descrevem 52% de fístulas liquóri-
A fístula de início mais tardio já publicada foi de 34 cas nasais associadas às fraturas frontoetmoidais.
anos após o trauma17. As fístulas liquóricas persisten- Em geral, cerca de 15% a 30% das fraturas dos seios
tes podem trazer riscos, tais como o desenvolvimento aéreos frontais estão associadas com rinorréia22,23.
de pneumoencéfalo, com ou sem efeito hipertensivo,
Nas fraturas fronto-orbitárias as fístulas podem
e também aumento da freqüência de infecção no trau-
ocorrer através da órbita, sendo algumas vezes inter-
matismo cranioencefálico fechado em cerca de 15%
pretada como lágrima. Também nas fraturas frontais
a 25% e em mais de 50% nos casos de ferimento por
ou temporais localizadas na pirâmide petrosa a perda
projétil de arma de fogo16.
liquórica pode drenar pela orofaringe com deglutição
Nos adultos, os locais mais comuns de fístulas li- de liquor.
quóricas decorrentes de traumatismos cranioencefáli-
cos são o osso etmóide, a placa cribriforme e a parede
posterior do seio aéreo frontal19. Fraturas da Base Média do Crânio
Classicamente, três tipos de fraturas do osso tem-
FISIOPATOLOGIA poral têm sido descritas24:
As fístulas liquóricas resultam da solução de con- • Fraturas longitudinais: estas fraturas ocorrem
tinuidade das meninges, e a maioria das fístulas ocor- paralelas ao eixo axial da pirâmide petrosa.
re na base do crânio. Os ossos que formam a base do Elas geralmente se iniciam na porção esca-
crânio são cinco: a placa cribriforme do osso etmóide, mosa do osso temporal e se estendem inferior-
o plano orbitário do osso frontal, o osso esfenoidal, a mente para a mastóide ou, mais anteriormente,
porção petrosa e escamosa do osso temporal e o osso alcançando o canal auditivo externo e a orelha
occipital. A vulnerabilidade dessa área é determinada média.
pelo fato de a barreira óssea entre os seios paranasais • Fraturas transversas: estas fraturas ocorrem
e o encéfalo ser bastante fina, além da íntima aderên- perpendicularmente ao longo do eixo axial da
cia da dura-máter aos assoalhos das fossas cranianas porção petrosa do osso temporal. A incidência
basais. Na presença de fraturas, mesmo com mínimos de fraturas transversas é encontrada com me-
desnivelamentos, a ruptura dural é bastante provável. nor freqüência do que a de fraturas longitudi-
Os seios aéreos, que estão contíguos com a base do nais. As fraturas transversas estão associadas
crânio, comunicam-se com a nasofaringe, permitindo com graves lesões do sistema nervoso central e
a saída de liquor através deles, com as conseqüentes altas taxas de mortalidade imediata e precoce.
manifestações clínicas. • Fraturas combinadas: consistem na combina-
As fraturas da base do crânio podem ser classifi- ção das fraturas longitudinais e transversas. As
cadas em fraturas da base anterior, base média e base fraturas da sela túrcica são raras e classificadas
posterior. Em cada uma dessas regiões, elas ainda po- como um tipo de fratura da base média do crâ-
dem ser subclassificadas. nio25. Vinte e um por cento dos pacientes com

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56 – Fístulas Liquóricas

fraturas esfenoidais também têm fraturas da sela para a fissura petroclival oposta. A mortalidade é
sela túrcica25. Essas fraturas estão associadas alta nos pacientes com fraturas longitudinais (devido
com alta mortalidade e uma taxa significativa às lesões associadas do tronco encefálico), compa-
de complicações: lesões vasculares, lesões de radas com as fraturas transversas ou oblíquas. Tipos
nervos cranianos, lesões hipofisárias – rela- incomuns de fraturas do clívus, como as fraturas do
cionadas às endocrinopatias pós-traumáticas e baixo clívus que se estendem aos côndilos occipitais,
lesões do quiasma óptico. Em uma série de 48 também têm sido relatadas34,35. As mesmas fraturas
autópsias de pacientes com fraturas transver- das margens do clívus podem comprimir diretamente
sas da sela túrcica e do osso petroso temporal, os nervos cranianos, principalmente os nervos VI e
somente 10 deles foram admitidos nos servi- VII, tronco encefálico, ponte ou artérias vertebral e
ços hospitalares com vida26. basilar. Além disso, essas fraturas podem englobar e
As fraturas longitudinais são ocasionadas, na ocluir a artéria basilar33,36. Outro tipo de fratura são
maior parte das vezes, por traumatismo direto da as fraturas em anel da base do crânio37. Estas fratu-
região temporal ou parietal, com freqüente lesão do ras orientadas transversalmente circundam o forame
conduto auditivo externo, da membrana timpânica e magno, ocorrendo mais comumente nos motociclistas
do ouvido médio afetando a cadeia ossicular. Os pa- com capacete que sofrem um impacto no vértex ou
cientes podem apresentar-se com disacusia por altera- próximo deste38. As fraturas cominutivas extensas da
ções da condução óssea, além da perda liquórica27. base do crânio podem ocorrer associadas com lesões
As fraturas transversas decorrem mais comumente dos grandes ramos do polígono de Willis37. Krantz39
de traumas na região occipital. Geralmente as fraturas relatou 11 fraturas em anel da base do crânio em 38
originam-se no osso occipital e seguem anteriormen- motociclistas que estavam utilizando capacete com
te, formando ângulos agudos com o eixo longitudinal proteção de toda a face. Somente seis dessas fraturas
do osso petroso27. A membrana timpânica geralmente foram observadas em um grupo de 64 motociclistas
permanece intacta, com disacusia causada por lesão que estavam utilizando capacete sem proteção de toda
do labirinto, da cóclea ou do VIII nervo craniano, a face. Esse autor especulou a possibilidade de que o
portanto neurossensorial. A paralisia facial ocorre em esqueleto facial absorveria a energia do impacto e re-
mais de 50% dos casos27. As fraturas longitudinais duziria as lesões da abóbada craniana e do encéfalo;
são quatro a seis vezes mais freqüentes do que as fra- e que um capacete com uma barra rígida de proteção
turas transversais, mas provocam muito menos lesões da face protegeria a face e transmitiria a energia do
impacto diretamente para a abóbada craniana e o en-
do nervo facial. Ambas mantêm a mesma incidência
céfalo. Krantz39 sugeriu que o capacete pode também
de fístula liquórica27.
promover essas lesões pelo aumento da massa do seg-
Para que ocorra drenagem de liquor pela orelha é mento cefálico.
preciso que haja fratura do osso petroso, ruptura da
Em decorrência do fato mencionado sobre as fra-
aracnóide e da dura-máter sobre o osso petroso e perfu-
turas da base do crânio, as fraturas da fossa posterior
ração da membrana timpânica. Em geral, cerca de 20%
e as fraturas dos côndilos occipitais também deverão
a 25% dos pacientes com fraturas temporais desenvol-
ser consideradas como fraturas da base posterior do
vem otorréia28,29. Cooper30 descreve que as fístulas li-
crânio.
quóricas decorrentes de lesões da fossa média cessam
espontaneamente na imensa maioria dos pacientes. Anderson e Montesano40 descreveram as fraturas
do osso occipital, em três tipos:
• Fratura do côndilo occipital Tipo I: são fratu-
Fraturas da Base Posterior do Crânio ras impactadas do côndilo occipital, ocorrendo
As fraturas da base posterior do crânio podem en- como resultado de uma carga axial sobre o crâ-
volver o clívus, a base do osso occipital e os côndilos nio e o atlas.
occipitais. As fraturas do clívus são raramente encon- • Fratura do côndilo occipital Tipo II: esse tipo
tradas, tendo Joslyn et al.31 encontrado uma freqüên- de fratura occipital ocorre como uma extensão
cia de 0,5%. Dependendo de seu aspecto nas imagens das fraturas do osso occipital.
de tomografia computadorizada, as fraturas do clívus • Fratura do côndilo occipital Tipo III: este tipo
são classificadas em três tipos32,33. Estas são fraturas de fratura do occipital é uma fratura avulsão do
longitudinais, transversais e oblíquas. As fraturas côndilo do occipital pelo ligamento alar.
longitudinais se estendem do corpo do osso esfenói- Acrescentando-se aos tipos incomuns de fra-
de para o forame magno em sentido ântero-posterior. turas da base posterior do crânio, como as fraturas
As fraturas transversas geralmente se estendem atra- do côndilo occipital e as fraturas dos forames jugu-
vés do clívus e de um canal carotídeo ao outro. As lares41, outros tipos menos comuns de fraturas têm
fraturas oblíquas ou oblíquas transversas se angulam sido descritos. Estas incluem as fraturas bilaterais
de um lado para outro do aspecto lateral do dorso da dos côndilos occipitais associadas à fratura do clívus

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

inferior34,35, fratura unilateral do côndilo occipital as- respectivamente por perdas liquóricas pelo nariz e pelo
sociada a fraturas do clívus superior e fraturas do osso ouvido. Otorrinoliquorréia e otorrinoliquorragia são as
petroso42, impressão basilar traumática caracterizada denominações decorrentes de fraturas temporais, com
pela indentação intracraniana do atlas e do processo lesão dural e membrana timpânica intacta, com a con-
odontóide com uma fratura deprimida ao redor do fo- seqüente passagem do liquor pela tuba de Eustáquio e
rame magno43. exteriorização do fluido liquórico através do nariz.
As fístulas liquóricas pós-traumáticas sintomáticas Provas de sensibilização clínica ainda podem ser
para o espaço subgaleal são bastante incomuns, mas utilizadas para ativar fístulas intermitentes na tenta-
são especialmente raras quando decorrentes de fratu- tiva de se confirmar o diagnóstico de forma direta.
ras da base posterior do crânio. Goel et al.44 descreve- O vazamento dá-se durante esforços físicos, manobra
ram um caso de pseudomeningocele occipitocervical de Valsalva e mudanças de posição corporal; uma vez
pós-traumática em uma criança de 8 anos, causado por que o liquor se encontre coletado nas cavidades dos
trauma fechado. A lesão formou-se poucas horas após seios, os movimentos posturais causam sua mobiliza-
o trauma, sendo inicialmente considerada hematoma ção. A chamada posição de prece maometana favo-
subgaleal. Pela persistência da coleção e surgimento de rece a drenagem liquórica e pode ser utilizada como
cefaléia, diagnosticou-se a coleção liquórica, sem le- teste para verificar a presença de fístula.
sões ósseas nos exames de imagem. O paciente foi sub- Ainda clinicamente, nos pacientes com preserva-
metido a uma derivação lomboperitoneal com sucesso. ção do nível de consciência, identifica-se a queixa de
cefaléia, que pode decorrer da hipotensão liquórica, da
Fraturas da Base do Crânio Causadas por hipertensão intracraniana causada pelo pneumocrânio
asso­ciado e mesmo de meningite. Também nos pa-
Projéteis de Arma de Fogo cientes conscientes, com bom conteúdo de consciên­
As fraturas da base do crânio causadas por projé- cia, pode-se questionar a deglutição inter­mitente de
teis de arma de fogo são categorizadas como fraturas líquido com sensação de gosto salgado49.
diretas ou indiretas. Nas fraturas diretas, as linhas de Nos casos de dúvida, o primeiro questionamen-
fratura estão em contato com os defeitos primários to deve ser o de identificar se a perda de líquido é
de entrada no osso. As linhas de fraturas que não têm ou não conteúdo liquórico. O liquor normalmente é
contato com os defeitos de entrada dos projéteis são claro, aquoso, não mucóide e tem sensação gustati-
denominadas fraturas indiretas, causadas pelo aumen- va salgada49. Na maior parte das vezes ocorrem nos
to da pressão intracraniana45. casos de trauma, quando o liquor encontra-se mistu-
Quando os pacientes não sucumbem às lesões di- rado ao sangue e nos casos de rinites alérgicas, com
retas provocadas pelo trauma, as fístulas decorrentes copiosa secreção nasal. Nessas situações, podem-se
dessa etiologia são de difícil condução clínica e geral- buscar parâmetros clínicos e laboratoriais para a dife-
mente necessitam de tratamento cirúrgico. renciação. Clinicamente, para facilitar o diagnóstico
de uma fístula liquórica, poucas gotas do fluido são
HISTÓRIA E EXAME FÍSICO colocadas em um tecido de algodão branco. O liquor
tem um padrão de difusão mais rápido que o sangue,
O sinal clínico mais proeminente e que define a fís- o que determina a formação de um claro e grande anel
tula é o débito liquórico, que pode se exteriorizar atra- de liquor circundando um pequeno anel central de
vés do nariz (rinoliquorréia) e orelha (otoliquorréia). sangue. Esse achado clínico é chamado de “sinal do
Pacientes com queixa de perda de líquido pelo duplo anel”, “sinal do halo” ou “sinal do alvo”. Nos
nariz ou orelha após um trauma craniano devem ser casos de saída exclusiva de sangue, esse halo não se
considerados portadores de uma fístula liquórica, par- forma ou é muito pequeno.
ticularmente se houver evidências clínicas de fratura Uma vez confirmada a presença de liquor, o próxi-
de base de crânio. mo passo é definir a etiologia da perda liquórica. Com
Normalmente o conteúdo do líquido exteriorizado dados da história, o diagnóstico etiológico fica mais fa-
encontra-se misturado com sangue. O sangue geral- cilmente definido. Nos casos idiopáticos, deve-se bus-
mente desaparece em dois a três dias, e o liquor pode car a história de traumas antigos pouco valorizados.
ser identificado com maior facilidade. Assim sendo, Definida a etiologia, busca-se o local da fístula. A
denomina-se a perda liquórica proveniente do nariz perda liquórica nasal unilateral define o lado da le-
como rinoliquorréia e, quando acompanhada de san- são em 95% dos casos49. Quando o débito liquórico
gue, como rinoliquorragia. Denomina-se a perda li- ocorre pelas duas narinas, a lesão dural é bilateral em
quórica proveniente da orelha como otoliquorréia e, somente metade dos casos. A rinorréia contralateral é
quando acompanhada por sangue, como otoliquorra- observada nas fraturas etmoidais, nos desvios de sep-
gia. Na prática diária são freqüentes as denominações to nasal ou nas lesões contralaterais do osso temporal
rinorréias, rinorragias, além de otorréias e otorragias, com membrana timpânica íntegra.

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56 – Fístulas Liquóricas

Os sinais clínicos de suspeita de fraturas da porção liquóricas. A identificação desses sinais clínicos deve
petrosa do osso temporal incluem hemotímpano, per- trazer a atenção para o risco da passagem de sondas
furação da membrana timpânica com sangue dentro nasais, que podem inadvertidamente adentrar o crâ-
do canal auditivo externo, disacusia, disfunção vesti- nio com conseqüências devastadoras, já descritas na
bular, paralisia facial periférica, equimose retromas- literatura, com prognóstico fatal em 64% dos casos47.
tóidea (sinal de Battle), além da própria otoliquorréia. Nas situações clínicas de traumatismos craniofaciais
Anosmia, equimose periorbitária bilateral (sinal do e na presença de sinais clínicos de fraturas da base do
guaxinim) e rinorréia são manifestações de fraturas crânio, dá-se preferência à passagem de sondas orais.
da base anterior do crânio, envolvendo os ossos fron- O desenvolvimento, diagnóstico e o tratamento da
tal, etmoidal e esfenoidal. fístula são da maior importância clínica. O reconheci-
A sintomatologia neurológica pode auxiliar na loca- mento precoce dessas lesões pode evitar meningite ou
lização topográfica do sítio fistuloso. A anosmia indica pneumocrânio. O intervalo entre a lesão traumática e
uma lesão da fossa anterior próxima ou no trajeto da via o desenvolvimento da fístula liquórica pode levar um
olfatória periférica. A olfação normal, no entanto, não tempo significativo, variando de dias e mesmo anos
exclui a fratura na região da placa cribriforme48. Alte- mais tarde48.
rações visuais direcionam para lesões do nervo óptico,
geralmente localizadas no canal óptico, no tubérculo DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
selar, seio aéreo esfenoidal ou seio etmoidal posterior.
Disfunções cocleares ou vestibulares, assim como do Dois testes laboratoriais podem ser utilizados para a
nervo facial, sugerem uma fratura no osso temporal. identificação do líquido proveniente do nariz ou da ore-
Diminição da sensibilidade nas duas primeiras divi- lha em busca de definir se o conteúdo é ou não liquor.
sões do nervo trigêmeo sugere lesão na fossa anterior São eles a dosagem de glicose e de beta-2 transferrina.
ou média, respectivamente. As síndromes do pares A detecção de níveis de glicose é um método útil
cranianos baixos, IX, X, XI e XII também facilitam a para se identificar uma fístula liquórica. Os níveis de
localização e auxiliam na suspeita dessas lesões. glicose da secreção nasal normal são menores que 10
O próximo passo é definir o débito liquórico. Fís- mg/dl. Mede-se a concentração de glicose do fluido,
tulas de alto débito geralmente são provenientes de em que os valores deverão ser comparados com os
grandes defeitos durais, sendo mais propensas a in- níveis séricos de glicose, e quantidades maiores de
fecção e a persistência por mais que duas semanas4. 30 mg/dl são geralmente compatíveis com a presença
Considerando-se que a produção liquórica normal do de liquor49, lembrando-se que a glicorraquia normal
adulto é de cerca de 20 ml/h, fístulas com débito aci- é de aproximadamente dois terços da glicemia. Em
ma desse valor são consideradas de alto débito. Essas nosso meio, a glicorraquia freqüentemente é dosada
fístulas são mais propensas a desenvolver complica- com o uso de fitas de análise rápida de urina ou fitas
ções como o pneumoencéfalo, por produzirem efeito de análise de glicemia.
sifão, com entrada unidirecional de ar dentro da caixa Apesar de o teste da glicose oxidase apresentar
craniana. Recomenda-se a coleta do liquor drenado resultado negativo tendo a pretensão de eliminar a
em coletores (bolsa de Karaya) posicionados junto à possibilidade de rinorréia, estes não são considerados
orelha para controle do fluxo das otorréias. confiáveis, já que uma reação positiva ocorre em 45%
Fístulas com duração maior que 10 a 14 dias são a 75% das secreções nasais normais50,51.
consideradas persistentes e devem ser conduzidas ci- Um teste mais específico para identificar a presen-
rurgicamente30. ça de liquor é o da imunofixação de beta-2 transferri-
nax50. Existe alta proporção de transferrina no liquor
como uma isoforma de carboidrato livre, ou beta-2
DIAGNÓSTICO CLÍNICO
transferrina, que não está presente nos exsudatos da
Com freqüência, o atendimento a esses pacientes é lágrima, ouvido e nariz. A detecção de beta-2 trans-
feito nos serviços de urgências e, menos comumente, ferrina no fluido em questão indica a presença de
nos serviços ambulatoriais. liquor. Somente uma pequena amostra é necessária
Para os pacientes politraumatizados, o atendi- (< 1 ml) sem necessidade de cuidados específicos ou
mento inicial deve ser realizado nos setores de emer- refrigeração50.
gência, devendo seguir as recomendações propostas Estudos recentes demonstraram que o teste da
pelo ATLS®. A história é sempre fundamental, pois as beta-2 transferrina é o método de escolha para a con-
características do evento traumático podem oferecer firmação de liquor, sendo eficaz, altamente sensível e
pistas para a identificação de 90% das lesões sofridas específico, além de acessível e de baixo custo53,54.
pela vítima46. Após a análise e confirmação pelos testes labora-
A história e os sinais clínicos sugestivos de fraturas toriais apropriados de que o fluido fistuloso atual é
da base do crânio devem suscitar a busca por fístulas liquórico, uma avaliação radiológica pré-operatória

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

dos pacientes com fístula liquórica é necessária para Ainda permanece a dúvida sobre qual o melhor
se identificar o sítio fistuloso. momento para se indicar o exame, pois pacientes com
trauma recente e aumento da pressão intracraniana po-
DIAGNÓSTICO RADIOLÓGICO dem não manifestar fístula liquórica pela compressão
do espaço subaracnóideo e pelo efeito do mecanismo
A localização do pertuito fistuloso pode ser difícil, protetor de transferência do conteúdo liquórico para o
mas representa o passo fundamental para o êxito do espaço subaracnóideo espinhal. Assim, recomenda-se
tratamento. que o exame seja indicado quando os sinais de hiper-
Várias combinações de exames radiológicos são tensão intracraniana tenham desaparecido57.
sugeridas. As mais utilizadas são a tomografia con- Muitos autores demonstraram as vantagens da cis-
vencional e a multiplanar, as cisternografias por to- ternografia por ressonância magnética, que elimina
mografia, por radioisótopos e por ressonância magné- a necessidade de uma punção lombar e não depende
tica16. A injeção simultânea de radioisótopos e agentes da presença ativa de fístula liquórica, além de atingir
de contraste tomográficos proporciona informações a sensibilidade maior que 90%58,59.
respeito da presença e da localização anatômica das Havendo uma fístula liquórica diagnosticada cli-
fístulas liquóricas. Recentemente, algumas manobras nicamente, a combinação de cisternografia por res-
são sugeridas para maximizar o fluxo da fístula e, com sonância magnética e tomografia computadorizada
isso, aumentar a sensibilidade dos métodos, como o de alta resolução é o método mais acurado para a
posicionamento em Trendelemburg55,56. As desvanta- localização do sítio e extensão do orifício fistuloso,
gens dos estudos por radioisótopos encontram-se na devendo ser considerado como o estudo mais viá-
baixa especificidade, pois não proporcionam a exata vel, menos invasivo e alternativo à cisternografia por
tomografia59,60.
localização do pertuito fistuloso apesar de confirmar
a presença da fístula. Uma vez que a maioria das fís- A cisternografia por tomografia e por radioisóto-
tulas é intermitente, a sensibilidade da cisternografia pos atualmente está reservada para os pacientes aos
quais os dois exames descritos anteriormente não es-
é dependente da atividade destas.
tejam acessíveis ou não tenham sido suficientes para
A tomografia computadorizada de alta resolução é identificar os orifícios fistulosos ou para pacientes
uma técnica de triagem de fístulas liquóricas que eli- com fraturas múltiplas que tragam dúvidas a respeito
mina o uso de agentes de contraste, é rápida, de custo da lesão dural principal16.
acessível, com menos desconforto para o paciente e
não depende de fístula ativa. A tomografia computa-
dorizada de alta resolução com cortes de 1 mm é mais
OUTROS RECURSOS DIAGNÓSTICOS
precisa na identificação de pequenos defeitos ósseos. Algumas substâncias podem ser injetadas no es-
O único inconveniente desse método é a maior car- paço liquórico e, então, recuperadas no espaço extra-
ga de radiação despendida sobre o paciente durante craniano para provar a existência de fístula liquórica.
a realização do exame. As projeções de imagens nos Os agentes citados são azul de metileno, fenossulfo-
planos coronal e axial são as preferenciais53. naftalina, índigo carmine e fluoresceína. O azul de
Resultados dos estudos de Eberhardt et al.57 com- metileno e a fenossulfonaftalina são tóxicos e não são
pararam a cisternografia por tomografia (TC) e por mais utilizados. O índigo carmine é um corante tra-
ressonância nuclear magnética (RNM). A sensibi- çador mais visível que a fluoresceína a olho nu, mas
pouco utilizado pelo custo elevado. A fluoresceína é
lidade da tomografia em detectar múltiplas fístulas
geralmente o agente preferido16.
durais concomitantes ou lesões menores que 2 mm
foi significativamente menor quando comparada às A injeção intratecal de fluoresceína é um método
bastante difundido para a localização do sítio fistulo-
técnicas de ressonância. O estudo demonstra, ainda,
so nos casos de difícil diagnóstico. Em geral, o teste é
diferenças nas técnicas de ressonância, em que a se-
realizado com o paciente sob anestesia geral, cerca de
qüência CISS (3 D Constructive Interference Steady- 30 min antes da programação da correção endoscópica
State) é superior à seqüência 3 D PSIF (time-inversed da fístula. Procede-se à punção lombar com aspiração
fast imaging with steady-state precession, FISP), de 10 ml de liquor. A solução estéril de fluoresceína a
devendo ser utilizada para pacientes com fístulas li- 5% é, então, injetada no espaço subaracnóideo. Para
quóricas de alto fluxo. As diferenças de sensibilidade se evitar complicações é utilizado somente 0,1 ml/kg,
entre a cisternografia por tomografia e as técnicas de com dose máxima de 1 ml da solução de fluoresceína
cisternografia por ressonância são 72,3% para TC, a 5%. Os pacientes são posicionados na mesa cirúr-
89,9% para MR PSIF e 93,6% para RNM CISS. A gica com a cabeça ligeiramente abaixo do nível do
RNM ainda apresenta as vantagens de ser um método coração. Utiliza-se um filtro de luz azul adicionado
não invasivo e o paciente pode realizar o exame em ao endoscópio para identificar a saída do traçador no
decúbito ventral. orifício fistuloso61.

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56 – Fístulas Liquóricas

TRATAMENTO Em relação aos procedimentos invasivos, os pa-


cientes com mais de três dias de débito fistuloso são
Após o diagnóstico e a localização do sítio fistulo- os candidatos à drenagem lombar externa30.
so, deve-se considerar a escolha do tratamento entre
Acikbas et al.63 descrevem a seqüência da condu-
conservador ou cirúrgico.
ção dos pacientes com drenagem lombar externa. Os
pacientes são orientados a permanecer em repouso
Tratamento Clínico absoluto, sendo permitida a mudança de decúbito de
Uma vez que a maioria das fístulas liquóricas um lado para o outro, mas não podem elevar a cabe-
fecha espontaneamente, em geral são utilizadas ini- ceira do leito por mais que 45°. A taxa de drenagem
cialmente as medidas clínicas, exceto nos casos com liquórica pode ser ajustada conforme a posição da
indicações imediatas para cirurgia, as quais serão dis- cabeça do paciente. Modifica-se a posição da cabeça
cutidas mais adiante. com angulação da cabeceira do leito, controlando, as-
Andrade et al.62 propõem as seguintes medidas sim, a taxa de drenagem liquórica com atenção para
para o tratamento clínico dos pacientes com fístula evitar-se a superdrenagem. A taxa de variação da dre-
liquórica pós-traumática: nagem varia de 5 a 15 ml/h ou 120 a 360 ml/dia. No
primeiro, dia inicia-se com uma taxa de 120 ml/dia
• Medidas clínicas
e controla-se o débito conforme a observação do pa-
–– Repouso em decúbito dorsal horizontal com ciente sobre a atividade da fístula. Fístulas liquóricas
elevação da cabeceira do leito a 30°. profusas necessitam de alta taxa de drenagem, poden-
–– Coletor plástico para controle do débito li- do, em alguns casos, superar os 360 ml/dia. O sistema
quórico. é mantido por 5 a 10 dias. Nos casos de disfunção
–– Antibioticoterapia. do sistema, avalia-se a possibilidade de um bloqueio
–– Hidratação. agudo ou de oclusão por debris. Em alguns casos em
–– Rinoscopia endoscópica diagnóstica e/ou que o bloqueio ou os debris permanecem impedin-
otoscopia. do a drenagem de liquor e não são solucionados por
–– Oclusão ocular noturna + pomada e colírio manipulação do sistema, procede-se à troca deste.
oftálmicos na paralisia facial periférica. Não se utiliza profilaxia antibiótica durante o proce-
–– Observação por 2 dias. Se houver remissão dimento, no entanto o liquor é avaliado diariamente,
do débito, observar por mais 3 dias antes da monitorando-se o diagnóstico precoce de uma possí-
alta. vel infecção. Fecha-se o sistema ao final do programa
de tratamento, mantendo-o em observação por 24 ho-
–– Fístula sem débito com pneumocrânio à TC
ras. Não havendo recorrência da fístula, remove-se o
– acompanhar com punções e análises do lí-
sistema. Havendo recorrência, indica-se a abordagem
quido cefalorraquidiano (LCR).
cirúrgica direta da fístula.
• Drenagem liquórica
–– Punção lombar de repetição com múltiplas
perfurações durais (se a TC não for sugesti- Antibióticos
va de hipertensão intracraniana) por 3 ou 5 A eficácia da antibioticoterapia profilática perma-
dias, com coleta de 20 ml de LCR, no má- nece controversa64. Dois artigos são bastante citados
ximo. Se houver remissão em 3 dias, manter na literatura contra o uso de antibióticos profiláticos65.
o paciente em observação por mais 2 dias MacGee et al.66 relatam incidência de 8,5% de desen-
antes da alta. volvimento de meningite sem o uso de antibióticos
–– Derivação lombar externa com válvula profiláticos e de 2,4% com uso destes. No entanto,
(DLE) por 3 dias. os dados desse estudo não demonstram significância
–– Quando houver recidiva após DLE, efetuar estatística em razão do número limitado de pacientes.
derivação lomboperitoneal com cateter de Lewin67 concluiu que o risco de infecção na presença
James (Codemann®). de rinorréia não pode ser acuradamente avaliado em
–– Tratamento endoscópico otorrinolaringoló- sua série de casos. Minchy68 encontrou uma incidên-
gico. cia de 100% de meningite nos pacientes com fístula
–– Craniotomia uni ou bilateral para correção liquórica que persistiram por mais de um mês e rela-
direta intra ou extradural. tou incidência de 12,5% de meningite nos pacientes
com fístula liquórica com menos de um mês.
• Pneumocrânio hipertensivo
Nos pacientes com fraturas do osso temporal sem
–– Oxigenação com máscara de oxigênio.
fístula liquórica, o uso de antibióticos profiláticos não
–– Oxigenação com FiO, a 100%. é recomendado. Contudo, alguns estudos demons-
–– Oxigenação hiperbárica. tram um risco aumentado para o desenvolvimento
–– Punção da bolha gasosa por trepanação. de meningite nos pacientes com fraturas temporais e

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

fístula liquórica69-71. Há um significativo aumento do Nos casos em que se opte pela administração dos
risco de desenvolvimento de meningite nos casos de antibióticos, sugere-se seguir alguns princípios bási-
fístulas persistentes. Pacientes com fístula liquórica cos, descritos por Tasdemiroglu e Patchell16: lembrar
por mais de 7 dias têm 8 a 10 vezes mais risco de que, embora o tratamento conservador das fístulas
desenvolver meningite72,73. Conseqüentemente, se o seja indicado, os antibióticos não deverão ser dados
tratamento conservador falhar dentro de 7 a 10 dias, indefinidamente à espera de que a fístula possa fe-
indica-se o tratamento cirúrgico, a despeito da anti- char; evitar o uso de antibióticos de largo espectro,
bioticoterapia prolongada74. optar pela escolha de antibióticos bactericidas (pre-
Em 1997, Brodie75, examinando estudos de meta- ferencialmente monoterapia) direcionados à flora
nálise, avaliou a questão do uso de antibióticos pro- comunitária já conhecida da nasofaringe. No caso de
filáticos nos pacientes com fratura de base de crânio meningite estabelecida, a despeito de o paciente já
e fístula liquórica. Ele concluiu que não se pode estar recebendo antibióticos, deve-se colher e enviar
responder em definitivo sobre a eficácia da antibio- liquor para cultura e os antibióticos poderão ser alte-
ticoterapia profilática para as fístulas liquóricas. A rados conforme os resultados.
revisão é limitada pela falta de detalhes adequados
sobre a escolha, a dosagem e a duração dos antibió­ Tratamento Cirúrgico
ticos, assim como sobre a incidência de infecção
concomitante, duração das fístulas e latência da me- McCormack e Cooper78 descreveram que as indi-
ningite. Está claro que um estudo definitivo sobre cações para a abordagem cirúrgica direta das fístu-
a administração de antibióticos profiláticos para o las liquóricas são os hematomas intracranianos com
tratamento das fístulas liquóricas ainda necessita efeito de massa associados às fraturas com afunda-
ser realizado. Um estudo prospectivo, randomizado, mentos cranianos expostos, meningite, abscessos ou
duplo-cego, multiinstitucional, com um adequado empiemas intracranianos, fraturas frontobasais exten-
número de pacientes, é necessário para que a ques- sas, fístulas persistentes por 1 a 2 semanas, fístulas de
tão da eficácia dos antibióticos profiláticos seja re- início tardio e pneumoencéfalo persistente (maior que
solvida no tratamento das fístulas liquóricas durante 2 semanas) ou com efeito de massa.
a primeira semana. Além disso, nas fístulas decorrentes de lesão por
As premissas de que as fraturas da base do crâ- projétil de arma de fogo, recomenda-se intervenção
nio predispõem os pacientes a meningite em razão cirúrgica de urgência4.
da possibilidade do contato direto das bactérias dos De acordo com Sakas et al.20, fraturas da placa
seios paranasais, nasofaringe ou orelha média com o cribriforme do tipo I e fraturas frontoetmoidais do
sistema nervoso central e de que as fístulas liquóricas tipo II com rinorréia prolongada (maior que 8 dias)
estão associadas com um risco maior de desenvolvi- deverão ser corrigidas cirurgicamente assim que a tu-
mento de infecção, estimulam a utilização profilática mefação cerebral diminuir. No seu estudo, as fraturas
de antibióticos como medida preventiva. No entanto, da base anterior do crânio com variáveis específicas
essa conduta ainda não está respaldada pela literatura. foram associadas com alto risco para o desenvolvi-
Ratilal et al.76, em 2006, por meio de uma revisão, mento de meningite pós-traumática20. Essas variáveis
pela Cochrane, dos trabalhos publicados entre 1966 foram: (1) proximidade da linha média (isto se aplica,
a 2005, concluíram que as evidências avaliadas até em primeiro lugar, às fraturas da placa cribriforme do
aquela data sobre os estudos randomizados controla- tipo I e, em menor grau, as fraturas frontoetmoidais
dos não sustentam o uso de antibióticos profiláticos do tipo II; (2) grandes fraturas com deslocamento (> 1
nos pacientes com fraturas da base do crânio, com ou cm) e (3) rinorréia prolongada (maior que 8 dias).
sem fístulas liquóricas associadas. Declaram, ainda Se as linhas de fratura invadirem a placa cribri-
no estudo, que, até que mais pesquisas sejam conclu- forme ou os seios aéreos frontal e esfenoidal, Karl et
ídas, a efetividade dos antibióticos nos pacientes com al.17 recomendam o tratamento cirúrgico, pois encon-
fraturas da base do crânio não pode ser determinada traram uma freqüência de laceração dural de 96% dos
porque os estudos publicados até o momento não são casos. No entanto, as fraturas lineares restritas ao teto
confiáveis. orbitário não necessitam de correção cirúrgica.
Apesar dos dados mencionados, alguns autores, O tratamento das fraturas do seio aéreo frontal
como Stendel e Hacker77, recomendam o uso de anti- demonstra considerável variabilidade na literatura
bióticos profiláticos em casos selecionados. neurocirúrgica e otorrinolaringológica. Embora as
Uma das razões para não os utilizar é a de que fraturas da parede anterior do seio aéreo frontal sejam
o tratamento com antibióticos profiláticos iniciados do domínio dos otorrinolaringologistas e não estejam
durante o período de espera para a cirurgia pode al- associadas com complicações significativas, as fra-
terar a flora natural da nasofaringe de cada paciente, turas da parede posterior deverão chamar a atenção
selecionando germes resistentes9. dos neurocirurgiões. O objetivo do tratamento pri-

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56 – Fístulas Liquóricas

mário das fraturas da parede posterior do seio aéreo oferecer melhor exposição das regiões esfenoidal, pa-
frontal é a correção da ruptura dural para prevenir rasselar e etmoidal posterior, além de excelente visua-
as potenciais complicações a longo prazo, como as lização das fístulas da parede posterior do seio frontal,
infecciosas mais comuns, osteomielite, meningite e placa cribriforme e fóvea etmoidal. A maior desvan-
mucopiocele, além de corrigir os defeitos estéticos79. tagem refere-se à impossibilidade de visualização das
O risco de meningite é alto após fraturas do seio aéreo lesões encefálicas pós-traumáticas adjacentes78.
frontal, com rápido início e progressão muitas vezes As desvantagens da via endonasal endoscópica
fulminante. Uma preocupação adicional nas fraturas são a impossibilidade de acessar a parede posterior
da parede posterior é a diminuição da integridade da do seio aéreo frontal, que necessita de outro acesso
dura-máter sob os fragmentos fraturados. extracraniano ou mesmo o transcraniano, e também
Em razão desses dois problemas, quase todas as a impossibilidade de corrigir defeitos ósseos maiores
fraturas da parede posterior do seio aéreo frontal são que 2,5 cm de diâmetro. Para a técnica, é necessário
conduzidas cirurgicamente, exceção feita às diminu- claro conhecimento dos pontos de risco anatômico,
tas fraturas lineares da parede posterior desse seio. como as artérias etmoidais anterior e posterior, a lâ-
No entanto, alguns neurocirurgiões preferem o tra- mina papirácea e as células de Onodi61,81.
tamento conservador, exceto nos casos em que haja Quando um paciente tem uma lesão dural locali-
franca evidência de fístula liquórica, de pneumoen- zada sobre a placa cribriforme, mas com o olfato pre-
céfalo ou de fratura cominutiva com múltiplos frag- servado, o cirurgião deverá decidir quanto o acesso
mentos, ou com afastamento dos fragmentos maiores endonasal ou o acesso transcraniano. Na opinião de
que 3 a 4 mm16. Schick et al.61, para a correção das fístulas durais na
placa cribriforme, com olfação intacta, o acesso endo-
Escolha dos Acessos Cirúrgicos nasal tem alto risco de lesão das fibras olfatórias, sen-
do a melhor escolha a via transcraniana intradural.
A escolha do acesso cirúrgico depende da etiolo-
O acesso endonasal pode também ser utilizado em
gia, da localização e do tamanho da lesão dural, assim
combinação com as vias extranasais. Nos pacientes
como dos recursos técnicos disponíveis e, por fim, da
com fraturas frontobasais extensas que se associem
preferência e domínio técnico do cirurgião.
a fístulas localizadas nas paredes posterior e lateral
O planejamento terapêutico e os acessos cirúrgicos do seio aéreo esfenoidal, podem-se combinar as vias
podem ser discutidos conjuntamente entre neuroci- de acesso transcraniana extradural com reforço com
rurgiões, otorrinolaringologistas, cirurgiões plásticos tecido gáleo-periósteo e o acesso endonasal para cor-
e cirurgiões maxilofaciais, conforme a necessidade. reção das lesões do seio aéreo61.
Para as lesões localizadas na base anterior do crâ- Vários estudos comprovam a eficiência das téc-
nio, Tosun et al.80 descrevem as indicações para os di- nicas de correções das fístulas liquóricas da base
ferentes procedimentos. Assim sendo, as craniotomias anterior do crânio por via endonasal2,19,80-84, mas a
são indicadas para as fraturas cominutivas extensas
utilização das várias opções ou dos tipos de enxer-
da base anterior do crânio associadas a lesões encefá-
to disponíveis não parece ser crítica para o êxito do
licas e para as lesões causadas por projétil de arma de
tratamento. Por outro lado, a precisa localização da
fogo. A sinusotomia frontal osteoplástica extradural é
lesão dural e a clara exposição do sítio fistuloso são
indicada para os defeitos durais localizados na parede
essenciais para se assegurar seu correto fechamento.
posterior do seio aéreo frontal. O acesso endoscópico
Uma exposição incompleta ou uma lesão dural não
endonasal é indicado para as fístulas liquóricas não
reconhecida podem acarretar recorrência e necessida-
complicadas, localizadas no teto etmoidal anterior e
de de uma revisão cirúrgica61.
posterior e no seio esfenoidal.
Os acessos e a escolha do tratamento descritos a
O acesso transcraniano anterior permite a visuali-
seguir são ordenados e propostos por Tasdemiroglu
zação direta da lesão dural e o tratamento das lesões
e Patchell16:
encefálicas adjacentes, particularmente nos traumas
com lesões abertas e na presença de hematomas intra- • Acessos extradurais extracranianos:
cranianos com indicação cirúrgica. As desvantagens A. Acesso rinocirúrgico frontoorbitário.
são a grande dificuldade de alcançar as fístulas do B. Acesso extradural craniofacial lateral com-
seio esfenoidal pela proximidade das estruturas neu- binado com correção dural (correção de fra-
rais e vasculares adjacentes, a necessidade de retração turas cominutivas do seio maxilar, órbita,
encefálica para a exposição da base anterior do crâ- esfenóide e escama temporal).
nio, com risco significativo de anosmia, hemorragia e C. Correção primária de fraturas de face (Le
edema cerebral pós-operatórios78. Fort tipos II e III) associadas à correção
As vantagens do acesso extracraniano são: causar dural (pode necessitar correção do seio ou
menor morbidade, praticamente sem causar anosmia; ablação).

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

D. Correção de fístulas do seio esfenoidal ricas confinadas ao seio esfenoidal e sela túrcica. A
Obs.: os acessos B e C são geralmente realizados visualização do interior do seio esfenoidal é difícil,
por otorrinolaringologistas, cirurgiões plásticos ou mesmo com o microscópio binocular. O fluxo fre-
cirurgiões maxilofaciais e não serão discutidos neste qüentemente rápido das fístulas liquóricas próximas
capítulo. às cisternas basais nas regiões próximas aos seios aé-
• Acessos intracranianos extra ou intradurais reos dificulta a fixação dos materiais utilizados para o
A. Base anterior do crânio. fechamento destas.
B. Base média do crânio. A remoção de fragmentos ósseos ligeiramente
C. Base posterior do crânio. móveis é contra-indicada em razão da proximidade
e conseqüente risco de lesão da artéria carótida inter-
• Acessos combinados (acessos extra e intracra-
na, seio cavernoso e os nervos cranianos II, III, IV e
nianos): o tratamento da maioria dos fragmentos
VI. Uma saliência da tenda mucosa no assoalho dos
intracranianos deslocados com múltiplas lesões
seios aéreos ou a herniação do parênquima cerebral
durais deverá consistir em uma combinação de
são uma evidência conclusiva de uma ruptura dural,
acessos transfrontais extracranianos realizados
mesmo sem a presença de fístula liquórica. Após o
com a colaboração de otorrinolaringologistas e
fechamento dural, o seio esfenoidal é obliterado com
cirurgiões maxilofaciais (os acessos combina-
músculo autólogo ou tampão de gordura. Uma cola de
dos não serão discutidos neste capítulo).
fibrina é utilizada para a fixação nessas áreas. Samii
• Correção endoscópica de fístulas liquóricas e Draf85 descrevem uma técnica de bolsa facial. Nes-
• Outros procedimentos (punção lombar, deri- sa técnica, a mucosa do seio esfenoidal é totalmente
vação ventriculoperitoneal, drenagem lombar removida. A linha de fratura é coberta com um peda-
externa) ço de fáscia, e a cavidade do seio é preenchida com
músculo livre ou um enxerto de gordura. Em vez de
Acesso Rinocirúrgico gordura livre ou enxerto de músculo, a cavidade do
seio pode ser preenchida com uma “bolsa de tabaco”,
Uma incisão uni ou bilateral sobre as sobrancelhas
que consiste em fáscia lata autógena preenchida com
é conduzida para atingir o teto etmoidal, o plano es-
cola de fibrina ensopada com esponja gelatinosa85. A
fenoidal da sela e o defeito dural localizado na região
bolsa é inserida na cavidade do seio e ensopada com
mediana ou paramediana da base do crânio.
solução antibiótica; toda a cavidade do seio é vedada
As fraturas da parede posterior do seio aéreo pela tumefação da bolsa de tabaco. A cavidade na-
frontal podem ser fechadas por um fragmento ósseo sal é preenchida com um maço ungüento por aproxi-
osteo­plástico removido ou substituído da parede ante- madamente duas semanas até o material de enxerto
rior do seio aéreo frontal após a cranialização total ou ter-se fixado ao tecido de granulação. O enchimento
parcial da cavidade desse seio. Remove-se completa- nasal também retém o enxerto posicionado e inibe
mente a mucosa e retira-se osso suficiente da parede a infecção local. O êxito do repouso do enchimento
posterior do seio aéreo frontal para expor o defeito transesfenoidal é hábil para obliterar não somente o
dural. A dura-máter pode ser corrigida e/ou sutura- seio esfenoidal, mas também os recessos pterigóides,
da. Dependendo da extensão da lesão, os fragmentos que são laterais à extensão do seio esfenoidal no osso
ou a parede posterior podem ser substituídos ou to- esfenoidal.
talmente removidos, promovendo a cranialização do
seio frontal. De outra forma, o seio é preenchido com
gordura e a parede anterior é substituída. Acessos Intracranianos Extra/Intradural
O defeito dural pode ser fechado por sutura primá- Base Anterior do Crânio
ria ou com enxertos de fáscia lata, fáscia do múscu-
lo temporal ou com a própria dura-máter. Se houver Dois acessos têm ganhado apoio para o uso na fos-
possibilidade, dá-se preferência a um enxerto dural de sa craniana anterior: acesso intracraniano extradural e
maior tamanho para fechar a lesão sem tensão. Um acesso intracraniano intradural. O acesso intracrania-
enxerto de dupla camada embebido em cola de fibrina no extradural tem várias desvantagens:
é o mais eficiente. • Durante a dissecação extradural, a firme ade-
O diagnóstico e o tratamento das fístulas liquóri- rência da dura-máter ao assoalho do seio esfe-
cas provenientes do seio esfenoidal são difíceis. Essas noidal e à placa cribriforme pode causar inevi-
fístulas podem ser uni ou bilaterais e muitas vezes es- táveis lesões durais.
tão associadas com fraturas circunscritas do seio esfe- • A herniação do parênquima cerebral através da
noidal e fraturas cominutivas da base do crânio. ruptura dural nas falhas ósseas não é facilmen-
O acesso transeptal por via sublabial ou transnasal te identificada com o acesso extradural.
ou o acesso rinocirúrgico por via transesfenoidal são • O fechamento dural hermético permanente não
os mais escolhidos para a correção das fístulas liquó- é realizado com segurança.

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56 – Fístulas Liquóricas

• A preservação da sensação olfatória somente gordura autógena uma forma de tampão mais durável
é possível com o acesso intradural transfrontal que o tecido muscular. Mesmo nos simples defeitos
por dissecção microcirúrgica dos nervos olfa- durais, o fechamento hermético da lesão dural nessa
tórios. região geralmente não pode ser obtido somente por
Em razão dos fatores mencionados, se o acesso in- sutura direta das margens durais, pela aderência ós-
tracraniano for indicado, a técnica intradural deverá sea; lesão dural adicional usualmente ocorre duran-
ser considerada. Há duas razões para o acesso intra- te a sutura. Uma vez que o simples fechamento do
craniano intradural ser o preferido. Primeiro, se há defeito dural com tecido adesivo não é suficiente, a
uma fístula liquórica em comunicação com uma fra- sutura da dura-máter deverá ser combinada com repa-
tura da base anterior do crânio, geralmente existe uma ro plástico sempre que possível85. Se nenhuma fístu-
lesão dural extensa e prolapso cerebral. A lesão dural la discreta for visualizada, um flap grande e livre ou
nesses casos, muitas vezes, se estende através da áerea um flap pediculado pericraniano deverá ser colocado
de acesso de outros acessos extracranianos. Segundo, no espaço intracraniano e refletido sobre todo o as-
se há uma lesão intracraniana com efeito de massa soalho da fossa frontal, incluindo a placa cribriforme
como um hematoma, a descompressão cirúrgica pode e o limbo esfenoidal. As suturas de fixação do flap
ser combinada com o fechamento da lesão dural. são reforçadas com adesivo de fibrina. Essas suturas
Realiza-se uma incisão bicoronariana e, em segui- deverão ser colocadas para obter o máximo de apro-
da, procede-se a uma craniotomia unilateral, identifi- ximação em busca de um fechamento hermético. Os
cando-se as fraturas cominutivas frontais basais e os lobos frontais são, então, recolocados sobre a fossa
orifícios fistulosos. No entanto, a grande maioria das anterior e a dura-máter é fechada.
fraturas cominutivas da base anterior do crânio requer Com o acesso intracraniano extradural, a firme
uma exposição através de craniotomia bifrontal. Se aderência dural é mobilizada da base anterior do crâ-
houver penetração no seio aéreo frontal, toda a mu- nio na direção de lateral para medial. Além disso, o
cosa é removida e invertida para a cavidade nasal na seio venoso sagital superior deverá ser preservado
área do óstio. A parede posterior do seio aéreo frontal enquanto a dura é mobilizada e não requer ligação.
é removida inferiormente, promovendo a cranializa- A abertura da mucosa do seio aéreo frontal é abor-
ção do seio. O seio é tampado com gordura autógena dada com o cuidado das fases mencionadas. A dura-
ou enxerto de músculo; sutura-se um flap do pericrâ- máter é retraída seguindo-se posteriormente até toda
nio refletido do couro cabeludo sobre a abertura do a linha de fratura ser exposta. Depois de se expor a
seio aéreo na dura-máter da base anterior do crânio. área de lesão, a base do crânio é coberta com um flap
Os instrumentos utilizados para o fechamento do seio de pericrânio subgaleal ou por outro substituto de
são considerados contaminados e são substituídos. dura-máter. Vários métodos de reparo do assoalho da
Após a incisão bilateral da dura-máter na borda infe- fossa frontal e da dura-máter de revestimento foram
descritos86. O flap pericraniano é o mais comumente
rior da craniotomia, o seio venoso sagital superior é
utilizado para o reparo primário, como mencionado
ligado e dividido. A foice do cérebro é, então, exposta
previamente. O uso de pele, gálea e vários flaps de
e seccionada atrás da crista galli. O seio venoso sa-
músculo livre tem sido descrito em pacientes que não
gital inferior é coagulado e dividido. Ambos os lobos
têm tecido nativo suficiente. Para proporcionar maior
frontais são retraídos para expor a base anterior do
fixação, alguns autores relataram o uso de enxerto ós-
crânio. Ambas as asas esfenoidais, a fossa cribrifor-
seo e malhas metálicas como as de titânio86 em con-
me e o teto orbitário podem ser explorados com esse
junto com o reparo dos tecidos moles adjacentes. O
acesso. A técnica também permite a exposição de am- lobo frontal é, então, reposicionado, e o flap ósseo é
bas as clinóides. fechado.
A base do cérebro é separada microcirurgicamente Se necessário, a descompressão do nervo óptico
do trato olfatório para preservar a sensação olfató- pode também ser realizada pela mesma via de acesso.
ria. A fístula é geralmente detectada como um defei- Após a elevação da dura-máter sobrejacente, o canal
to dural palpável ou visível ou como uma contusão, óptico é aberto por uma broca de alta velocidade e os
adesão, ou herniação do tecido cerebral. A fístula é fragmentos ósseos são removidos; quando a exposi-
fechada pela inserção de um tampão de gordura ou ção alcança o ápice da órbita, a bainha dural do nervo
músculo e o defeito é revestido com um flap dural li- óptico é incisada longitudinalmente para descompri-
vre ou refletido ou um substituto de dura-máter. Bons mir o nervo óptico.
resultados são obtidos com dura-máter heterogênea,
fáscia lata autóloga, pedículo musculoperiosteal, gá-
lea pericraniana ou substituto de dura-máter. Em de- Base Média do Crânio
corrência da fibrose e do encolhimento muscular, o A craniotomia é a rota preferida para alcançar o
tecido gorduroso permanece viável pelo desenvolvi- assoalho da fossa temporal. Para as fístulas da fossa
mento de um novo suprimento sangüíneo, tornando a média, o assoalho temporal pode ser exposto, prefe-

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rencialmente por um acesso intradural. O acesso ex- para baixo através desse acesso, realizando-se uma la-
tradural requer uma dissecação extradural, entretanto, birintectomia quando necessário. Também o nervo fa-
que carrega alguns riscos de lesão ao nervo facial e cial pode ser explorado no ângulo pontocerebelar. Se
gânglio geniculado. As fístulas liquóricas que envol- a audição estiver intacta, esse acesso estará contra-in-
vem o osso petroso e a margem posterior da fossa dicado para a exploração do canal auditivo interno ou
temporal são mais bem acessadas por via extradural para a exposição das fraturas situadas medialmente,
ou com uma combinação delas. Os princípios de fe- porque causam diminuição da audição e desequilíbrio.
chamento são idênticos aos descritos para a base ante- A maior vantagem desse acesso é a facilidade de se
rior do crânio. Um flap pericraniano livre é mais fácil expor as porções basal média e posterior da pirâmide
de se manipular que os flaps da dura-máter na fossa petrosa simultaneamente. A dura-máter atrás da linha
média. Além disso, por ser a fossa média circundada de fratura é exposta por meio de uma brocagem óssea.
por seios venosos, a dissecção de um flap de qualquer As lesões durais são completamente exploradas com
tamanho não é possível. Para cobrir o defeito dural, margens rodeadas de dura intacta. O tecido cerebral
toda a base média do crânio é recoberta com substi- necrótico é removido. O defeito é, então, fechado com
tuto dural. material autógeno ou alógeno colocado entre a base
As principais indicações para o acesso transtem- do crânio e a margem dural.
poral extradural à superfície anterior da pirâmide e
do canal auditivo interno são as fístulas persistentes Fechamento Endoscópico das Fístulas
e a paralisia facial irreversível associada às fraturas Liquóricas
longitudinais e transversas da pirâmide petrosa. Após
a realização de uma craniotomia temporal osteoplás- A primeira descrição do fechamento endoscópico
tica, a dura-máter é mobilizada sobre a base média do com êxito de uma fístula liquórica foi feita por Wi-
crânio. A aderência dural da sutura petroescamosa é gand87 em 1981. A baixa morbidade e a alta taxa de
coagulada e dividida. Iniciando-se posteriormente, a bons resultados no acesso endoscópico têm feito des-
dura é separada da base do crânio. Isto proporciona se procedimento o método de escolha para o reparo
melhor exposição da superfície anterior da pirâmide, das fístulas liquóricas não associadas com patologias
assim como do gânglio geniculado, dos nervos pe- intracranianas. Para esse procedimento, os endoscó-
queno e grande petroso e do nervo facial. A elevação pios nasais têm sido desenvolvidos com diferentes
dural é estendida anteriormente o mais distante do ângulos de lentes para facilitar a exposição do teto do
forame espinhoso e posteriormente o mais distante trato sinonasal. Pela mesma técnica, a precisa loca-
possível do seio petroso superior. A dura-máter é dei- lização das fístulas liquóricas pode ser determinada.
xada sobre o hiato facial e forame espinhoso para pre- Para melhorar a visualização das fístulas, procede-se
venir um sangramento venoso e a ruptura da artéria à injeção intratecal de fluoresceína. Um conceito co-
meníngea média, respectivamente. A linha de fratura mum de todas as técnicas é o de que a mucosa ao re-
contendo a dura-máter e o cérebro é dissecada e libe- dor do defeito deverá ser removida para permitir que
rada de pequenos fragmentos ósseos por cuidadosa o enxerto possa aderir firmemente à base do crânio88.
e delicada remoção. Se o nervo facial apresentar-se O material de enxerto pode ser utilizado como re-
íntegro, a dura-máter será reparada com uma armaze- talho ou tampão abaixo (underlay) (entre a dura e o
nagem de enxerto dural fixado à base do crânio com crânio) ou acima (overlay) (no lado nasal do defeito)
cola de fibrina. O lobo temporal é, então, deixado so- para obliterar o seio aéreo afetado. A técnica overlay
bre a dura-máter e o flap ósseo é recolocado, estando será utilizada se houver risco de lesão dos nervos ou
o procedimento concluído. Se o nervo facial apresen- dos vasos quando o levantamento da dura-máter ao
tar-se lesionado, o canal de Falópio e o canal auditivo redor do osso ou quando o enxerto for inserido, ou se
interno poderão ser explorados. não for possível realizar a técnica local (inlay).
Uma ampla variedade de materiais de enxerto tem
sido utilizada para reparar as fístulas liquóricas, in-
Base Posterior do Crânio
cluindo materiais autólogos (como gordura abdominal,
As fístulas liquóricas na fossa posterior podem ser mucosa septal, osso dos cornetos, fáscia temporal, fás-
vistas depois de fraturas do osso petroso. Felizmente a cia lata, enxerto muscular livre), materiais homólogos
otorréia ou otorinorréia das fraturas petrosas em geral (como pericárdio, dura-máter e fáscia lata de cadáver)
cessam após uma drenagem lombar externa ou mes- e aloenxerto (como sementes de hidroxiapatita). Os
mo espontaneamente. A exploração dos traumatismos materiais podem ser fixados por malhas de celulose
da base lateral, média e posterior do crânio do aspecto (Surgicel®, Ethicon Inc., Johnson and Johnson, So-
caudal é realizada pelo acesso transmastóideo transla- merville, NJ), placas de gelatina (Gelfoam®, Ethicon)
biríntico. Se a audição estiver perdida com a associa- ou cola de fibrina (Bio Glue®, Tennesaw, GA). Recen-
ção à fístula liquórica, mesmo nas fraturas localizadas temente, Wormald e McDonough89 descreveram uma
medialmente distantes podem ser exploradas e tratadas técnica de “tampão de banho” (bath plug), que consis-

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56 – Fístulas Liquóricas

te na introdução de um tampão de gordura com uma reparo tiverem falhado ou quando não forem possí-
sutura firme de poliglactina (Vicryl®) no espaço intra- veis para identificar o sítio da fístula liquórica após
nasal. Utilizando essa técnica, o enxerto não é empur- extensa investigação. A derivação lomboperitoneal
rado para fora do defeito pela alta pressão liquórica. A tem sido útil no tratamento das fístulas liquóricas que
localização e o tamanho da lesão, a técnica e a escolha não puderem ser visualizadas95. As fístulas liquóricas
do material a ser utilizado no reparo não afetam de podem surgir novamente se as derivações falharem.
modo significativo os resultados cirúrgicos90. No en- No entanto, pode-se desenvolver pneumoencéfalo
tanto, a presença de hidrocefalia aumenta as chances hipertensivo quando o ar for aspirado para o interior
de recorrência. Por essas razões, todos os pacientes do crânio através da abertura das fístulas sob pressão
com hidrocefalia necessitam de um procedimento de negativa93.
derivação associado à correção endoscópica.
As contra-indicações para a correção endoscópica COMPLICAÇÕES
das fístulas liquóricas incluem lesões intracranianas,
seio aéreo esfenoidal muito pneumatizado, fratura da Pneumoencéfalo
parede posterior do seio aéreo frontal, extensão late- O pneumoencéfalo representa um bloqueio de ar
ral do seio aéreo frontal e esfenoidal e otorrinorréia sob pressão dentro da cavidade craniana, podendo
proveniente de lesões do osso temporal90,91. exercer efeito de massa e aumentar a pressão intra-
O fechamento endoscópico tem obtido êxito em craniana. Quando de grande volume ou com aumento
95% dos casos de correção das fístulas liquóricas progressivo, torna-se uma condição grave e que requer
como primeira opção90. A vantagem mais importante tratamento cirúrgico de urgência. O pneumoencéfalo
da correção endoscópica é que, mesmo se o procedi- em um paciente com traumatismo cranioencefálico é
mento falhar na correção das fístulas pelo acesso en- um sinal patognomônico de uma fratura craniana que
doscópico, ainda é possível tentar-se novo reparo em envolveu uma porção pneumatizada do crânio77,96,97.
segundo tempo pela mesma via e mesma técnica. O acúmulo de ar intracraniano pode ser epidural, sub-
dural, subaracnóide, intraventricular ou intraparen-
Outros Métodos de Tratamento das quimatoso98. Consideramos a denominação pneumo-
Fístulas Liquóricas crânio quando existe ar no interior da caixa craniana
em situação extra-axial e pneumoencéfalo quando o
Drenagem Lombar Contínua ar localiza-se no parênquima encefálico ou no interior
McCoy92 demonstrou que, sem uma drenagem dos ventrículos. A localização do ar na cavidade cra-
lombar contínua, as fístulas podem granular e fechar. niana afeta o prognóstico77. O achado de uma única
A drenagem lombar contínua é efetiva em deter as fís- bolha de ar localizada no espaço extra-encefálico in-
tulas liquóricas traumáticas agudas. A drenagem de- dica um bom prognóstico, embora múltiplas bolhas
verá continuar por 3 a 5 dias após a parada da fístula. de ar estejam associadas com um pior prognóstico,
Uma drenagem externa tem sido mantida em largas principalmente quando se encontram no interior dos
séries por mais de 10 dias sem infecção4. Se a fístula ventrículos77.
recorrer, torna-se obrigatório o fechamento cirúrgico. A freqüência de pneumoencéfalo traumático varia
A drenagem lombar contínua tem sido também uti- de 0,1% a 9,7% nos pacientes com traumatismo cra-
lizada após o fechamento da fístula liquórica como nioencefálico nas diferentes séries77,99. O pneumoencé-
tratamento adjuvante. falo traumático desenvolve-se por um mecanismo de
O acesso intradural utilizando drenagem lombar garrafa invertida. A hipertensão intracraniana causa di-
contínua diminui a pressão liquórica reduzindo a minuição do fluxo liquórico na ruptura traumática du-
compressão sobre o enxerto posicionado no defei- ral, permitindo que o ar entre na cavidade craniana100.
to dural e dificultando o fechamento da fístula. Se a
fístula liquórica for fechada pelo acesso extradural, Meningite
no entanto, uma drenagem lombar contínua auxiliará
no fechamento, promovendo a cura pela redução do Sem considerar as conseqüências da rinorréia, há
fluxo liquórico. Para prevenir a superdrenagem de li- um risco persistente de meningite (maior que 30%)
quor, que pode causar pneumoencéfalo iatrogênico93, nos pacientes com fraturas da base anterior do crâ-
um volume de drenagem de 10 ml/h é seguro como nio48. Também os pacientes com fístulas liquóricas
ponto inicial (350 a 420 ml por dia)94 . com mais de sete dias têm aumento do risco de 8 a
10 vezes para desenvolver meningite75. Nas menin-
gites simultâneas a fístula liquórica, os organismos
Derivações Liquóricas infectantes mais comumente isolados são os pneumo-
As derivações liquóricas podem ser tentadas nas cocos, seguidos pelos estreptococos e Haemophilus
fístulas de pressão normal quando outros meios de influenzae9.

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

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57
Descompressão Neurovascular do Nervo
Óptico nas Lesões Traumáticas
Tobias Alécio Mattei
Paulo Henrique Pires de Aguiar

INTRODUÇÃO DIAGNÓSTICO

A
compressão do nervo óptico é uma verdadeira A fisiopatologia celular e bioquímica decorrente da
emergência neuroftalmológica1. isquemia cerebral no trauma promove um mecanismo
Neuropatia traumática do nervo óptico que pode atuar no nervo óptico de forma drástica. A
é definida como uma perda visual (total ou parcial) conduta para a neuropatia óptica traumática baseia-se
traumática, com defeito pupilar na ausência de lesão em um diagnóstico acurado, que se inicia com a com-
direta ao globo ou nervo óptico. As principais cau- preensão clínica do doente e uma neuroimagem apro-
sas desse traumatismo incluem acidentes automobi- priada7. Acuidade visual inicial é um fator crítico que
lísticos, quedas, assaltos etc.2 A perda visual causa- afeta os parâmetros para a decisão da conduta em um
da pelo trauma no nervo óptico é reconhecida como paciente com neuropatia óptica traumática; por esse
uma seqüela de trauma craniomaxilofacial. Todos os motivo, é parte fundamental no diagnóstico inicial8.
pacientes podem ser tratados com corticosteróides Exames complementares adicionais são funda-
intravenosos. Os que não obtêm melhora são, então, mentais para o prosseguimento do tratamento cirúrgi-
levados à cirurgia descompressiva do canal óptico3,4. co: TC com reconstrução em 3D9 (Figs. 57.1 e 57.2),
Conceitos precisos e estratégias terapêuticas corretas RNM (Fig. 57.3), TC (Figs. 57.4 e 57.5), campimetria
são obrigatórias para detectar e tratar desordens vi- visual (Fig. 57.6), defeitos pupilares10, além de Dop-
suais. Necessita-se do conhecimento de mecanismos pler colorido nos vasos da órbita11.
patológicos do potencial traumático do nervo óptico,
investigações radiológicas primárias e demais medi-
das diagnósticas para o desenvolvimento dessas es-
tratégias5.
A terapêutica para neuropatia óptica traumática é
controversa. Em traumatologia craniomaxilofacial,
o tratamento cirúrgico interfere em vias visuais pré-
quiasmáticas, seja por acessos intra ou extradurais. O
tratamento clínico é inferido com altas doses de este-
róides. Essa conduta melhora quando há um rápido
diagnóstico e uma associação de tratamentos clínico e
cirúrgico6. Propusemos, neste capítulo, um tratamen-
to clínico coadjuvante ao tratamento cirúrgico reali-
zado por meio da técnica de Dolenc, uma clinoidec-
tomia anterior por via extradural. Relatamos adiante Fig. 57.1 – TC em 3D em um corte axial demonstrando
suas vantagens sobre a via intradural. Observamos e fratura de arco zigomático bilateral e fratura de teto de órbita
comparamos resultados a respeito de déficits visuais (setas) em um paciente com diagnóstico inicial de neuropatia
pré e pós-operatórios. óptica traumática.

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

A B

Fig. 57.2 – (A e B) TC em 3D em um corte coronal demonstrando fratura de teto de órbita no mesmo paciente.

A B

Fig. 57.3 – (A e B) RMN em T2 revela fratura do teto orbitário.

Fig. 57.4 – TC de crânio sem contraste apresentando pneu- Fig. 57.5 – TC de crânio após cirurgia de descompressão do
moencéfalo secundário à fratura da base do crânio. nervo óptico realizada pela técnica de Dolenc.

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57 – Descompressão Neurovascular do Nervo Óptico nas Lesões Traumáticas

Vale ressaltar que não há diferença significativa


quanto ao tamanho do nervo óptico entre um pacien-
te com neuropatia óptica traumática e um paciente
com o nervo óptico intacto. Dessa maneira, não se
pode usar o tamanho do nervo óptico como método
diagnóstico ou como fator preditor da presença ou
ausência de neuropatia óptica quando mensurado por
imagens de TC12.
Em razão das dificuldades neuroftalmológicas
do teste de funcionamento visual para detecção pre-
cisa de déficits visuais em pacientes envolvidos em
traumas graves, estabeleceu-se um potencial de flash
visual evocado e um eletrorretinograma para verifi-
cação de padrões confiáveis de métodos eletrofisioló-
gicos a fim de reunir informações específicas, como
avaliar se a função da via visual está intacta, e/ou se
está presente ou ausente.
Em primeiro lugar, a perda visual é documentada
por um exame neuroftalmológico e registrado como
um padrão visual reversível por intermédio do poten-
cial de flash visual evocado.
O eletrorretinograma é fundamental para diag-
Fig. 57.6 – Campimetria demonstrando déficit visual parcial. nóstico e prognóstico de quatro tipos de neuropatia
óptica: neurite óptica, atrofia óptica compressiva ou
hereditária e neuropatia óptica traumática.
A Relatos de casos demostraram que, subjetiva ou
objetivamente, a amaurose unilateral confirmada não
implica necessariamente perda visual irreversível. A
avaliação eletrofisiológica associada à TC com recons-
trução em 3D é importante para a imediata identifica-
ção do trauma no nervo óptico. Os resultados dessa
avaliação irão produzir a informação diagnóstica que
auxiliará na conduta tanto para a intervenção cirúrgica
e/ou terapia conservadora, como também para a pre-
venção de uma segunda lesão do nervo óptico13.

TRATAMENTO
Não há diferenças significativas quanto à idade,
B
causa do trauma e intervalo de tratamento para uma
conduta de intervenção terapêutica14. Identificação
precoce e início apropriado do tratamento poderão res-
taurar a visão do paciente ao menos parcialmente15,16.
O tratamento é controverso, já que há possibilida-
des de melhora clínica sem a intervenção cirúrgica.
Recomendações terapêuticas da literatura incluem
conduta expectante, altas doses de esteróides, inter-
venção cirúrgica ou terapia clínica combinada com a
descompressão cirúrgica1,16-24. Pacientes com neuro-
patia óptica por trauma podem ser tratados com este-
róides intravenosos. Aqueles que não melhoram com
tratamento conservador devem seguir para uma des-
compressão cirúrgica do canal óptico3,4,25. A mínima
invasão na abordagem cirúrgica pode melhorar ainda
mais o prognóstico visual do paciente traumatizado.
Fig. 57.7 – (A) Olho direito em abdução. (B) Cicatriz incisio- As indicações da descompressão cirúrgica do nervo
nal da craniotomia para descompressão do nervo óptico. óptico não são bem estabelecidas e devem ser consi-

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

deradas apenas no contexto específico da necessida- Cirurgia


de de cada paciente6. Porém, podem-se citar algumas
situações que já são consideradas obrigatórias para a O acesso neurocirúrgico tradicional para a descom-
intervenção cirúrgica. São casos das neuropatias ópti- pressão do nervo óptico é feito através de uma cranio-
cas traumáticas associadas a: tomia para exploração cirúrgica e pode ser realizado
• Evidência de fratura da base do crânio. de diversas maneiras. Entre elas pode-se citar a técnica
microcirúrgica endonasal, a descompressão extracra-
• Evidência de fratura ou estreitamento do canal
niana do canal óptico, a técnica descompressiva en-
óptico.
doscópica, o acesso extranasal (transetmoidal) através
• Deslocamento de fragmentos ósseos que atin- dos seios etmoidais e esfenoidais e o acesso extradural
jam o nervo óptico. (Dolenc). Essas abordagens podem ser utilizadas para
• Neuropatia óptica progressiva10. a total exploração do seio cavernoso, mas também para
• Hematoma retrobulbar. lesões que envolvem somente regiões limitadas desse
• Fratura da órbita. seio19,30. Cada uma dessas abordagens será discutida,
• Não-percepção luminosa após o trauma. apresentando-se suas vantagens e desvantagens, bem
• Ausência de fluxo sangüíneo na artéria central como a indicação para cada uma. Maior ênfase será
da retina ao Doppler11. dada ao acesso extradural de Dolenc.
Pacientes com acuidade visual inicial de 20/100, ou O acesso através dos seios etmoidais e esfenoidais
todos eles, têm resultados favoráveis de suas acuidades tem o mérito de ser relativamente seguro e apresentar
visuais ou são beneficiados com megadoses intraveno- um campo operatório maior, trazendo resultados sa-
sas de corticosteróides. Pacientes com visão inicial de tisfatórios pela sua baixa morbidade26,31.
20/200 pioram pela falha à resposta da corticoterapia. A terapia cirúrgica envolve a descompressão do
Estes devem obter melhora visual após intervenção ci- compartimento orbitário em caso de hematoma re-
rúrgica para descompressão do canal óptico3. trobulbar ou descompressão da parte intracanalicu-
Contudo, alguns estudos26,27 compararam o resulta- lar do nervo óptico no canal óptico traumatizado ou
do visual de neuropatia óptica traumática tratada com órbita posterior, como confirmado pelas tomografias
corticosteróides, com cirurgia para descompressão do computadorizadas32. Segundo a literatura internacio-
canal óptico, e observaram também pacientes sem ne- nal sobre lesões traumáticas do nervo óptico, o fator
nhum tratamento. Não houve nenhum benefício claro tempo para o início da terapia é frequentemente su-
nem para o tratamento conservador medicamentoso bestimado5.
nem para o tratamento cirúrgico. Esses autores defen-
dem que nem o tratamento corticoterápico, nem a cirur- Técnica Microcirúrgica Endonasal
gia devem ser considerados como standard para cuidar
de pacientes com neuropatia óptica traumática. É antes Essa técnica, comparada com o acesso transetmoi-
razoável analisar a base individual de cada paciente dal externo (transfrontal) ou o pterional, possui a van-
para a decisão de tratar cirurgicamente ou não27. tagem de proporcionar uma visão do aspecto medial
do canal óptico. O nervo é acessado a partir de um
ângulo de 60° a 90° e a aspiração contínua permite
Clínica uma retirada segura da região óssea.
A terapia conservadora de escolha para o trata- A cirurgia é realizada por via endonasal e, por-
mento das lesões da neuropatia óptica traumática é de tanto, possui menos complicações, comparada à via
megadose intravenosa de metilprednisolona (30 mg/ intracraniana, extra ou intradural. Deve-se evitar
kg de peso na 1a hora e 5,4 mg/kg de peso/h nas 47 h trauma adicional em razão da retração do parênqui-
seguintes)5,7,10,23. Está descrito na literatura que a subs- ma cerebral. As células etmoidais anteriores e o ducto
tituição de metilprednisolona por dexametasona intra- nasofrontal permanecem intactos evitando posterior
venosa, em doses equivalentes, na neuropatia óptica formação de mucocele33,34.
traumática não demonstra diferenças significativas em
relação à acuidade visual após o tratamento clínico28.
Técnica Extracraniana
A acuidade visual inicial é um fator estatistica-
mente importante que diz respeito à evolução da neu- A descompressão do canal óptico por via extracra-
ropatia óptica traumática. Pacientes tratados conser- niana pode ser benéfica em casos de trauma indireto do
vadoramente antes do 7º dia após a lesão têm um grau nervo óptico, com ou sem a fratura do canal. Apesar de
melhor de resultados (P = 0,056) quando comparados não haver critérios definitivos sobre o assunto, existem
aos que se submeteram ao tratamento após o 7º dia do diversas séries clínicas relatando a descompressão do
trauma. Pacientes do grupo cirúrgico com uma não- canal óptico para tratamento do trauma intracanalicular
percepção luminosa têm melhor taxa de melhora do do nervo óptico, as quais, entretanto, fornecem poucas
que os do grupo não cirúrgico (P = 0,272)29. informações sobre detalhes do procedimento35.

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57 – Descompressão Neurovascular do Nervo Óptico nas Lesões Traumáticas

A piora da visão não é descrita em nenhum caso na • Fácil identificação e menor dano aos nervos
literatura com a abordagem dessa técnica, porém po- cranianos.
dem-se observar complicações intra e pós-operatórias. • Redução de dano cerebral com a retração ex-
Um tratamento adjuvante com megadose de esteróides tradural limitada.
melhora a conduta terapêutica para esta afecção18. • Preservação da veia sylviana e do seio esfeno-
Essa técnica pode ser descrita como um acesso parietal.
transetmoidal/transorbital. Nesse método é possível • Menor sangramento intradural.
uma remoção maior que 180° do osso do canal ópti- • Menor tempo operatório.
co. Esse acesso também pode ser realizado por cirur- • Reconstrução fisiológica da parede lateral, pre-
giões oftalmológicos habituados à anatomia da região venindo fístula liquórica.
orbitária apical e microcirurgia orbitária. A experiên- • Acesso ao CSL contralateral38.
cia com a dissecção do ápice orbitário e a cirurgia em A técnica de Dolenc surgiu como uma alternativa
cadáveres pode ser útil para desenvolver a habilidade à clinoidectomia anterior intradural. Em 1985 Dolenc
do cirurgião nessa região crítica. Exposição cuida- propõe seu acesso, que consiste em uma completa cli-
dosa, visualização microscópica, técnica delicada e noidectomia anterior extradural. No início, o acesso
conhecimento anatômico minimizam o risco de com- de Dolenc era utilizado somente para ganhar espaço
plicações, como a penetração da artéria carótida ou a no seio cavernoso em cirurgias de fístula da carótida
laceração dural36. cavernosa e aneurismas intracavernos. Posteriormen-
te, ampliou-se a utilização dessa técnica para a res-
Técnica Descompressiva Endoscópica secção de tumores do seio cavernoso, aneurismas do
topo da artéria basilar e, mais recentemente, também
O método endoscópico transnasal esfenoetmoidal para tumores extracavernosos (craniofaringiomas,
para a descompressão do canal óptico é um bom méto- meningiomas periclinóideos e supra-selares e adeno-
do de tratamento de neuropatia óptica pós-traumática37 mas pituitários gigantes) bem como para a descom-
e oferece algumas vantagens sobre os acessos tradicio- pressão das neuropatias ópticas traumáticas39.
nais: diminuição da morbidade, preservação da olfa-
ção, resultados estéticos mais aceitáveis sem cicatri-
zes externas, isenção de risco para o desenvolvimento
Posicionamento e Craniotomia
dentário em crianças, menos estresse operatório em O paciente deve ficar na posição supina e a posição
um paciente que sofreu um trauma multissistêmico19. de sua cabeça é a mesma descrita para o acesso fron-
Melhoramento visual foi observado em 70% dos totemporal. O acesso pterional ipsilateral é, freqüente-
pacientes tratados pela técnica endoscópica antes do mente, usado para a descompressão do nervo óptico. A
7º dia da lesão, e apenas 24% dos pacientes obtiveram cabeça do paciente deve ser elevada de 25° a 45°, de-
melhora visual quando tratados endoscopicamente pendendo da estimativa de sangramento intra-operató-
após o 7º dia da injúria. A descompressão endoscópi- rio. Ela é rodada 45° para o lado contralateral e fixada
ca do nervo óptico é um procedimento minimamente com três ou quatro pinos. Uma incisão semicoronal na
invasivo e não causa nenhum efeito estético adverso. pele é realizada iniciando-se exatamente anterior ao
A taxa de risco/benefício sugere que a terapia com- trágus, atravessando a linha média atrás da linha de
binada de injeções de metilprednisolona e descom- implantação capilar até 4 cm do lado contralateral. O
pressão endoscópica do nervo óptico resulte em mais ramo frontal da artéria temporal superficial deve ser
benefícios visuais sem grandes riscos, ou seja, não preservado como doador para possíveis futuras anas-
aumenta a morbidade do paciente17,25. tomoses. A craniotomia frontotemporal é realizada
com três buracos de trépano. A expansão de 2 ou 3 cm
da craniotomia permite maior liberdade. Devem-se re-
Técnica Extradural – Acesso de Dolenc alizar os seguintes passos: craniotomia osteo­plástica,
O acesso extradural para o compartimento selar orbitotomia e remoção epidural do processo clinóideo
lateral (CSL, seio cavernoso) é fruto dos trabalhos anterior e das paredes do canal óptico.
por Parkinson, Dolenc e Hakubba neste tópico30. Os passos extradurais envolvem a remoção de os-
O acesso extradural baseia-se no desenvolvimento sos da fossa craniana média e anterior. Nessas áreas
anatômico do CSL e permite: ósseas estão contidas porções do seio cavernoso, as-
• Completa exposição de todo CSL (visualização sim como a órbita, fissura orbitária superior, cavo de
do nervo óptico e das estruturas ao seu redor, Meckel e artéria carótida petrosa.
da artéria carótida interna e do canal óptico). A remoção dessas áreas ósseas é a chave para a
• Mobilização e descompressão do nervo ópti- liberação de estruturas neurovasculares.
co e da artéria carótida interna, contribuindo • Passo 1a (teto da órbita): a dura é separada
para a prevenção do dano neurovascular intra- do assoalho da fossa craniana anterior. Os dois
operatório. terços posteriores do teto orbitário são remo-

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

vidos com um drill de alta velocidade e uma gulo de Glasscock é removido com uma broca
rugina convencional. A porção medial do teto de diamante, expondo a deflexão lateral da ar-
orbitário inclina-se inferiormente em direção à téria carótida interna (ACI) dentro do osso pe-
placa cribriforme e deve ser preservada para troso. A retirada do osso petroso sobre a artéria
evitar-se a invasão das células aéreas etmoi- carótida interna não deve estender-se posterior-
dais e esfenoidais. mente ao ponto onde a ACI torna-se vertical,
• Passo 1b (canal óptico): o teto ósseo do canal caso se pretenda evitar uma lesão coclear.
óptico é removido com uma broca de diaman- A exposição da ACI petrosa permite o controle ar-
te. Isso permite a mobilização do nervo ópti- terial proximal e oferece uma localização de um pos-
co, que é essencial para se evitar dano deste sível bypass vascular30.
durante a dissecção subseqüente do processo
clinóideo anterior.
• Passo 2 (processo clinóideo anterior): com
Pacientes Comatosos
uma broca de diamante o processo clinóideo Diagnósticos especiais e dificuldades terapêuticas
anterior é excisado, deixando-se uma fina ca- existem em pacientes comatosos sem acuidade visual
mada de osso cortical, o qual pode ser poste- definida e em pacientes com déficits de campos vi­
riormente fraturado. Isso também permitirá suais complexos com acuidade visual central suficien-
a exposição de estruturas ósseas abaixo do temente receptiva. Em decorrência desses resultados,
nervo óptico. A remoção da asa medial do es- a indicação de descompressão do nervo óptico deve
fenóide e estruturas ósseas desconecta o pro- ser especialmente considerada em pacientes comato-
cesso clinóideo anterior da base do crânio. sos e em casos de grave restrição do campo visual40.
O processo clinóideo anterior repousa sobre o A indicação cirúrgica a todos os pacientes baseia-
triângulo ântero-medial, cujo limite medial é o se no exame oftalmológico e no achado tomográfico
nervo óptico, e o lateral é o nervo oculomotor. da lesão no canal do nervo óptico e no ápice da órbita,
A deflexão anterior da artéria carótida repou- respectivamente41.
sa sobre o assoalho desse triângulo. Este é o
segmento clinóideo da artéria carótida interna,
que não é nem intracavernosa, nem intradural. PROGNÓSTICO
• Passo 3 (fissura orbitária superior): a remo- O tempo decorrido entre a lesão e o tratamento, o
ção da asa medial do esfenóide irá revelar a grau de perda visual e a evidência de fraturas canalicu-
dura que cobre a fissura orbitária superior. A lares e pericanaliculares em TC são fatores significa-
parede óssea lateral da fissura orbitária supe- tivos para um bom prognóstico21,25. A compressão do
rior é adelgaçada, fraturada e removida. quiasma óptico não é infreqüente na neuropatia óptica
• Passo 4 (forame redondo): uma pequena ilha traumática e traz um prognóstico reservado, já que é
de osso separa a porção inferior da fissura or- óbvia a alteração do campo visual nesta afecção42.
bitária superior do forame redondo. A borda Descompressão cirúrgica primária do nervo ópti-
ântero-lateral do forame é removida com uma co com 48 horas de lesão pode trazer resultados be-
broca de diamante, permitindo a mobilização néficos, principalmente se associado ao tratamento
da divisão maxilar do nervo trigêmeo. clínico. O teste de acuidade visual com 6 semanas
• Passo 5 (forame oval): a elevação da dura da pós-operatórias não serve para predizer de maneira
fossa média é estendida até a inclinação verti- fidedigna o prognóstico final43.
cal da pirâmide petrosa, revelando ambos os Para investigar uma possível correlação entre a acui-
forames, oval e espinhoso. A artéria meníngea dade visual final e a presença de vários sinais sistêmicos
média, que atravessa o forame espinhoso, é sa- e locais (orbital/ocular) afetados no paciente por uma
crificada. Os limites ântero-laterais do forame neuropatia óptica traumática indireta, avaliam-se quatro
oval são expandidos, permitindo a mobilização variáveis. Esses fatores denotam um aumento significa-
do ramo mandibular do nervo trigêmeo. tivo do risco para a não-melhora da acuidade visual:
• Passo 6 (triângulo de Glasscock): o triângulo • Presença de sangue nas células etmoidais pos-
de Glasscock, ou triângulo póstero-lateral, é li- teriores.
mitado lateralmente por uma linha que passa
entre o forame espinhoso e a eminência arquea­ • Idade maior que 40 anos21,44.
da e medialmente pelo sulco do nervo petroso • Perda da consciência associada à neuropatia
superficial maior; esse triângulo tem como base óptica traumática.
a porção dorsal da terceira divisão do nervo • Ausência de melhora após 48 horas de trata-
trigêmeo. O nervo petroso superficial maior é mento com corticosteróides.
sacrificado para evitar tração e dano do gânglio Esses quatro fatores negativos de prognóstico em
geniculado e do nervo facial. O osso do triân- pacientes afetados com neuropatia óptica traumática

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57 – Descompressão Neurovascular do Nervo Óptico nas Lesões Traumáticas

podem ser úteis para predizer o outcome visual de pa- 12. Robillard BG, Sires BS, Pinczower EF. Optic nerve
cientes que desenvolveram perda visual após trauma size in traumatic optic neuropathy. J Craniomaxillo-
craniano e também servirão para a decisão de um tra- fac Trauma. 1998;4(1):13-6.
tamento cirúrgico a ser abordado44. 13. Kaufman DI, Lorance RW, Woods M, Wray SH. The
Sinais clínicos também são avaliados comparati- pattern electroretinogram: a long-term study in acute
optic neuropathy.Neurology. 1998;38(11):1767-74.
vamente ao início do diagnóstico e ao final do trata-
mento para avaliação prognóstica. São a seguir rela- 14. Kitthaweesin K, Yospaiboon Y. Dexamethasone and
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• Percepção da contagem dos dedos16. 2003;15(3):302-4.
• Alguns padrões radiológicos também são con- 16. Wang BH, Robertson BC, Girotto JA, Liem A,
siderados fatores de prognóstico pobre em re- Miller NR, Iliff N, et al. Traumatic optic neuropa-
lação à acuidade visual, assim como: thy: a review of 61 patients. Plast Reconstr Surg.
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Hematoma Subdural Crônico
Técnicas Cirúrgicas
Paulo Sergio S. de Cerqueira Dias
Roger Schmidt Brock

CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO autores, o desenvolvimento da cápsula ocorre entre 7

O
e 28 dias após a hemorragia subdural inicial.
hematoma subdural crônico (HSDC) pode
ser conceituado como coleção hemorrágica Desse modo, considerando-se a história de trauma
situada entre a dura-máter e a aracnóide, re- freqüentemente não definida e o sangramento repe-
vestida por cápsula, apresentando graus variados de tido responsável pela HSDC aguda, julgamos que o
lise e organização1. critério cronológico pode não ser alicerce firme para
a definição da cronicidade da hemorragia subdural. O
Com o conceito assim apresentado, pode-se supor achado cirúrgico, notadamente pela presença da cáp-
que haja clara e precisa definição da patologia em sula, é fator diagnóstico dessa entidade.
análise; isto, porém, não ocorre, observando-se que
outros enfoques, formulados por diferentes autores,
sofrem variações referenciais. ETIOPATOGENIA
McKissock et al.2 propõem classificação segundo Apesar de ainda constituir matéria de discussão,
critério temporal evolutivo, relativamente ao TCE. O a etiopatogenia do HSDC encontra no sangramento
HSDC é, por esse ponto de vista, conceituado como repetido causa precípua para o crescimento e perpe-
aquele cujo início dos sintomas ocorre após 21 dias tuação da hemorragia. Na primeira metade do sécu-
do evento traumático. Outros autores consideram que lo XX, Gardner7, realizando trabalhos experimentais
a classificação com enfoque temporal falha por criar em cães, propôs teoria segundo a qual o comporta-
divisões artificiais que não deveriam existir. Reco- mento expansivo do volume do HSDC seria funda-
nhecidamente, os intervalos de latência do HSDC são mentado na elevação da pressão osmótica no inte-
muito variáveis e o padrão das manifestações clínicas rior do hematoma. Desde 1976 admite-se, de forma
é modificado por graus diferentes de intensidade da le- clara, a ocorrência de novos sangramentos no inte-
são cerebral inicial. Além disso, são freqüentes casos rior da coleção hemorrágica subdural; neste ano, Ito
de HSDC com cápsula envolvente bem constituída, et al.8 estudaram a dinâmica do HSDC mediante o
por ocasião da cirurgia, sendo muito curto o intervalo uso de eritrócitos marcados com cromorradioativos,
de tempo entre o TCE relatado e o diagnóstico3,4. concluindo que novos sangramentos são responsá-
Da conceituação inicial do HSDC depreende-se veis por aumento de 2% a 27% do volume total do
que outra maneira de se definir a anomalia seria a hematoma por dia. A presença de produtos da de-
presença de cápsula envolvente. Assim, Loew e Ki- gradação do fibrinogênio, com atividade fibrinolí-
velitz1 admitem ser definitiva a presença da cápsula tica da cápsula, seria o substrato para a ocorrência
para conceituação do HSDC. Fogelholm et al.5, assim de sangramentos repetidos na evolução do HSDC8.
como Potter e Fruin6, expressam a mesma opinião. Trabalhos recentes9 revelaram que o sangramento no
Fogelholm et al.5 ainda reforçam a necessidade de ser espaço subdural promove uma reação inflamatória
a cápsula bem constituída, tanto sua porção visceral com deposição de fibrina, seguida por organização
quanto a parietal, para se definir o HSDC. Para esses e formação de membranas subdurais com prolife-

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

ração de capilares neoformados. O plasminogênio em doenças hematológicas ou iatrogênicas (uso de


no interior do hematoma é, então, transformado em anticoagulantes orais e anti-adesivos plaquetários17.
plasmina pelo ativador tecidual do plasminogênio, A revisão de literatura mostra, de forma unânime,
o qual é extremamente abundante na neomembra- que o HSDC tem predomínio nítido em doentes do
na externa. Seqüencialmente, a lise da fibrina e do sexo masculino com relação1,2,16 de 3 para 1.
fibrinogênio resulta na produção de grandes quanti- A experiência clínica mostra que o HSDC pode
dades de produtos de degradação com liquefação de provocar as mais variadas manifestações neurológi-
coágulos, aumento da permeabilidade de capilares, cas em sua exteriorização sintomatológica. O título
interferência no mecanismo de desenvolvimento e de artigo publicado em 1977 por Potter e Fruin6, “He-
aumento progressivo do HSDC10. matoma subdural crônico: o grande imitador”, é opor-
Nomura et al.11 consideram que a hiperfibrinóli- tuno para expressar o polimorfismo com que o HSDC
se local impede a hemostasia completa e determina a pode expressar-se clinicamente.
tendência para novos sangramentos. A hiperfibrinó- Arseni e Stanciu18 descrevem vários padrões de
lise local do HSDC também tem sido caracterizada apresentação clínica do HSDC: (1) sinais neurológi-
por altas concentrações de ativador do plasminogê- cos focais de lenta progressão; (2) sintomas de hiper-
nio tissular e do complexo inibidor plasmina alfa-2- tensão intracraniana (HIC); (3) alterações cognitivo-
plasmina12. Trabalho recente enfoca o papel da trom- comportamentais; (4) síndrome de irritação meníngea;
bomodulina como inibidor da formação de trombos (5) síndrome ictal, simulando acidente vascular cere-
junto a capilares neoformados, determinando ciclos bral; (6) sintomas sugerindo acidente isquêmico tran-
renovados de sangramentos13 . sitório; (7) crises convulsivas focais ou generalizadas
Zouros et al.14, com experiência em crianças com e (8) alterações de marcha.
traumatismo cranioencefálico não acidental, sugerem Os sinais e sintomas decorrentes de HIC no HSDC
que algumas coleções de atenuação mista com hipo são mais freqüentemente encontrados em doentes
e hiperatenuações seriam resultantes de sangramen- pertencentes a grupos etários mais baixos5,6,15.
to mesclado com a presença de líquido cefalorraqui-
diano (LCR) no espaço subdural, conceituando-se,
então, a presença de hematoigroma. Desse modo, a DIAGNÓSTICO
partir de lesões das vilosidades aracnóideas haveria Tomografia Computadorizada
fluxo de LCR para o espaço subdural com aumentos
variáveis da coleção, independentemente da presença Anteriormente à tomografia computadorizada
de novos sangramentos. (TC) de crânio, mais de 30% dos doentes com HSDC
tinham o diagnóstico estabelecido por meio de acha-
dos de autópsia19. A TC deve ser considerada o proce-
QUADRO CLÍNICO dimento de escolha para avaliação inicial dos doentes
A grande maioria dos doentes com HSDC é repre- com suspeita de HSDC, notadamente por se tratar de
sentada por idosos. Svien e Gelety15 relatam que mais exame não agressivo e pela rapidez no fornecimento
de 75% dos doentes têm idade superior a 50 anos, do resultado.
tendo a média de 63 anos. A incidência específica por O aspecto tomográfico do HSDC constitui-se
idade de HSDC é de apenas 0,13/100.000/ano na ter- usual­mente por imagem em lente côncavo-convexa,
ceira década da vida, chegando a 7,4/100.000/ano na hipoatenuante em relação ao parênquima cerebral.
sétima década16. A incidência aumenta rapidamente Freqüentemente a imagem sugere fortemente a pre-
na faixa etária de 60 a 70 anos, estimando-se que 31% sença de cápsula envolvente após o realce dessa estru-
dos casos ocorram dentro dela1. tura determinado pelo meio de contraste endovenoso.
A causa identificável mais freqüente em HSDC é o Embora o comportamento mais típico do HSDC
trauma craniano, embora 25% a 50% dos doentes não seja traduzido na TC por coleção hipoatenuante,
relatem história de trauma16. Mesmo quando a histó- destaca-se a incidência importante da isoatenuação
ria de trauma é identificada, muitas vezes esta é tida e mesmo das coleções hiperatenuantes, resultado de
como trivial2. Segundo Fogelholm et al., até 50% dos sangramentos recentes em um leito já organizado de
doentes tinham história de alcoolismo crônico16. Em evolução crônica.
nosso meio, 30% dos pacientes apresentam história A análise do padrão homogêneo da coleção ou
de consumo contumaz de álcool, observando-se que do aspecto heterogêneo resultante da organização de
tal antecedente é muito mais freqüente entre os mais neo­membranas é importante para se orientar a técnica
jovens (42,5%) quando comparados a pacientes aci- cirúrgica (Fig. 58.1). Segundo Nakagushi et al.20, as
ma dos 60 anos (13%)17. Outros fatores associados ao coleções homogêneas apresentam índices de recidiva
desenvolvimento de HSDC envolvem shunts ventri- pós-operatória maiores do que as coleções heterogê-
culares, epilepsia e discrasias sangüíneas, de origem neas trabeculadas.

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58 – Hematoma Subdural Crônico Técnicas Cirúrgicas

A B compensação da pressão intracraniana (PIC), com


possibilidade da ocorrência imediata de lesões cere-
brais graves e irreversíveis17,24.

Tratamento Não Cirúrgico


O tratamento conservador do HSDC empregando-
se droga osmoticamente ativa foi preconizado por Su-
zuki e Takaku25. Esses autores empregaram manitol a
Fig. 58.1 – (A e B) Imagens de TC demonstrando HSDC com 20%, 500 a 1.000 ml/dia, administrados por via venosa
septações múltiplas e loculações isoladas. em 23 doentes. A duração média do tratamento foi de
41 dias. Os resultados satisfatórios relatados por esses
Ressonância Nuclear Magnética autores encontram dados antagônicos em Gjerris e
Schmidt26. Assim, esses autores descrevem, de modo
A imagem por ressonância nuclear magnética enfático, a ausência de benefício em sete doentes nos
(RNM) também pode ser útil para o diagnóstico do quais houve a tentativa do tratamento conservador
HSDC, particularmente quando a coleção torna-se com o uso de manitol. Bender29 e Bender e Christof30
isoatenuante relativamente ao parênquima cerebral. relatam experiência em 100 doentes com HSDC tra-
Geralmente o hematoma exibe hipersinal nas aquisi- tados com corticóide, associado, em alguns casos, a
ções T1 e T2, embora se descreva, em alguns casos, droga osmoticamente ativa; comentam estes autores
a presença de iso ou hipossinal na seqüência T119,21. que o uso do corticóide aumentou o número de do-
A imagem por ressonância teria também a vantagem entes em que a cirurgia foi desnecessária, advertindo,
de permitir a identificação do hematoma em múltiplos porém, que, em casos de comprometimento neuroló-
planos19. A perda da integridade dos eritrócitos e a for- gico mais grave, tal conduta deva ser encarada com
mação de metemoglobina seriam as responsáveis pela muita reserva. Mesmo o eventual êxito do tratamento
presença de hipersinal em ambas as seqüências (T1 e conservador deve incluir a postura crítica de hospi-
T2) na fase subaguda da hemorragia subdural. O acú- talização prolongada, efeitos nocivos secundários de
mulo de hemossiderina, registrado como hipossinal em altas doses de corticóide e de manitol e ainda o risco
T2, é aspecto freqüentemente descrito no HSDC22. contínuo de deterioração neurológica mais aguda e
Tsutsumi et al.23 descrevem aspectos da RNM em resultante do processo expansivo intracraniano17,19.
230 casos de HSDC, apontando como prevalentes as
imagens com hipersinal na seqüência T1. Os autores
relatam também imagens de isossinal e imagens hete- Tratamento Cirúrgico
rogêneas de iso e hipossinais (Fig. 58.2). Craniotomia
Em 1925, Putnam e Cushing31, embora emitin-
TRATAMENTO do opinião favorável ao emprego da craniotomia, já
O HSDC, quando não tratado, leva, quase sem- citam divergência de opiniões a respeito da melhor
pre, o doente ao óbito; raramente o processo torna-se forma de tratamento cirúrgico do HSDC. McKissock
espontaneamente inativo1,18. Uma vez diagnosticado, et al.2, baseados no estudo de doentes adultos, pro-
o HSDC exige prontas medidas terapêuticas, pois os põem craniotomia apenas quando as condições clíni-
sintomas freqüentemente já refletem o início da des- cas continuam a piorar apesar da drenagem mediante

A B C

Fig. 58.2 – (A a C) Imagens de RNM demonstrando HSDC com hipersinal em seqüências T1 e T2, expressão freqüente em
hemorragias subdurais recidivantes.

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

trepanação, fato ocorrido em 8% de seus casos. Loew o tratamento do HSDC, preferindo drená-lo mediante
e Kivelitz1 sugerem craniotomia apenas se os méto- trepanação; essa tendência foi mantida nos últimos
dos mais simples de tratamento falharem; comentam, anos20,38,39.
contudo, que mesmo craniotomia ampla com ressec- Com o paciente em posição supina, a cabeça é ro-
ção da cápsula não impede o ocorrência de recidiva. dada para o lado de forma a se realizar uma ou duas
Hamilton et al.32, em trabalho que propõe a rea- trepanações sobre as áreas de maior espessura do he-
valiação do papel da craniotomia, apresentam dados matoma. A localização da trepanação deve ser indi-
que permitem indicar craniotomia mediante a expe- vidualizada para cada doente, com base na localiza-
riência pessoal do cirurgião, aceitando a justificativa ção do hematoma, guiada pelos exames de imagem.
de que o procedimento mais amplo poderia conduzir A incisão cutânea deve ser planejada de forma a ser
a uma drenagem mais eficaz e melhor controle quanto incorporada na eventual necessidade de realização de
a eventuais sangramentos. craniotomia. Após abertura dural em forma de cruz e
Markwalder et al.33 relatam que, entre 31 doentes cauterização das folhas durais com bisturi bipolar, é
tratados por trepanação, apenas 1 necessitou de ulte- permitida a drenagem do hematoma liquefeito. A dre-
rior craniotomia, em virtude de sangramento repetido nagem brusca do hematoma deve ser evitada, uma vez
a partir de cápsula altamente vascularizada. McLau- que a rápida descompressão do parênquima adjacente
rin e McLaurin34, com experiência em crianças, con- pode levar à formação de hematomas intracerebrais18.
sideram a craniotomia com retirada de cápsula pro- A orientação de trepanação única ou múltipla deve
cedimentos desnecessários, acreditando ser muito ser norteada por aspectos da imagem tomográfica, evi-
improvável que a cápsula possa ter efeito deletério denciando coleções homogêneas de baixa atenua­ção
progressivo. ou coleções heterogêneas resultantes de graus varia-
Uma das razões para a indicação de craniotomia dos de novos sangramentos e organização; a presença
seria a presença de hematoma sólido, especialmen- de septações múltiplas e indícios de compartimentos
te em casos com sinais de agudização. Outra justifi- isolados aponta para a necessidade de mais de uma
cativa para a indicação de aberturas cranianas mais via de drenagem.
amplas seria a fenestração de múltiplas septações e A fisiopatogenia do HSDC, com hiperfibrinólise
retirada da cápsula envolvente. Entretanto, Svien e local e ressangramentos das neomembranas, deve
Gelety15 não encontraram diferenças evolutivas quan- ser levada em consideração no seu tratamento. Dessa
do os doentes submetidos à craniotomia e ressecção maneira, o principal objetivo após a diminuição do
de cápsula foram comparados aos tratados com pro- cone de pressão intracraniana visa à interrupção desse
cedimentos mais simples para a drenagem do hema- círculo vicioso, com a remoção de produtos de de-
toma. Para Chiles e Cooper19, mesmo os hematomas
gradação da fibrina do espaço subdural, por meio da
loculados podem ser tratados de modo convincente
lavagem exaustiva com solução fisiológica ou Ringer
mediante trepanações múltiplas. Esses autores consi-
lactato11,38,40,41.
deram como bastante improvável que o resultado final
do tratamento dependa da persistência da cápsula. Na seqüência de condutas e propostas de trata-
mento, outro aspecto a despertar opiniões controver-
sas refere-se à drenagem em sistema fechado do espa-
Drenagem Mediante Trepanação ço subdural no período pós-operatório imediato, 24 a
A drenagem do HSDC mediante trepanação úni- 48 h. Markwalder e Seiler38 recomendam a drenagem
ca ou múltipla tem demonstrado ser método seguro fechada do espaço subdural com vistas a diminuir a
e eficaz pelos bons resultados que proporciona e pela possibilidade da piora clínica no período pós-operató-
mortalidade e morbilidade de baixas incidências35. rio precoce, em decorrência do ressangramento ou do
Kempe36 propõe que a trepanação seja feita de acúmulo de liquor. Wakai et al., citados por Lind et
modo a permitir eventual craniotomia em caso de al.41, sugerem enfaticamente a drenagem fechada do
HSDC com cápsula espessa. Por outro lado, Svien espaço subdural no período pós-operatóro precoce.
e Gelety15 indicam a trepanação como método eleti- Esses autores relatam índices de recorrência sensivel-
vo e, em princípio, único na terapêutica do HSDC, mente mais expressivos em doentes que não foram
considerando que o objetivo principal do tratamento submetidos à drenagem pós-operatória do HSDC.
deva ser a drenagem pura e simples da coleção sem Lind et al.41 relatam a experiência de 407 doentes
remoção da cápsula envolvente. Outros autores, como tratados por trepanação e drenagem do espaço sub-
Iwabushi et al.37 e Loew e Kivelitz1, apontam também dural na maioria dos casos. Os resultados publicados
a trepanação única ou múltipla como modalidade te- favorecem a colocação do dreno. No entanto, sob um
rapêutica de primeira escolha. ponto de vista crítico, Markwalder e Seiler38 admitem
Durante as décadas de 1940 e 1950, houve uma a não-colocação do cateter de drenagem em circuns-
tendência, por parte de vários neurocirurgiões, de tâncias de dificuldade técnica, sendo a mais freqüente
abandonarem a craniotomia como via de acesso para representada pela expansão do hemisfério cerebral

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58 – Hematoma Subdural Crônico Técnicas Cirúrgicas

com o exíguo espaço resultante para drenagem. Nes- comuns. As principais complicações após a drenagem
sas circunstâncias, a insistência para posicionamento do HSDC consistem em reformação da coleção sub-
do dreno no espaço subdural pode resultar em com- dural, hemorragias intracerebrais, pneumocéfalo hi-
plicações adicionais, como desencadeamento de novo pertensivo, empiema subdural e crises convulsivas21.
sangramento da cápsula altamente vascularizada ou A persistência da coleção subdural pode resultar
mesmo a laceração da corticalidade cerebral21,38. da drenagem inadequada ou de novo sangramento a
O pressuposto aumento de complicações infeccio- partir da zona de incisão da cápsula. A descrição de
sas, como empiema subdural, relacionado à coloca- coleção residual com repercussão clínica varia con-
ção de dreno, não encontra substrato na experiência sideravelmente em relatos da literatura. McLaurin et
de Lind et al., que, ao contrário, evidenciam maior al.34, com experiência em crianças, referem recidiva
incidência, porém não significativa, de empiemas no ou presença de coleção residual em 12 de 15 doentes,
grupo não submetido à drenagem41. havendo deterioração neurológica apenas em um caso.
A revisão da literatura impõe a citação da possi- Índices de recidivas entre 12% e 37% dos casos são
bilidade do emprego da craniostomia por twist-drill relatados por vários autores1,15, 44. Chiles e Cooper19
como forma diversificada de acesso ao espaço sub- citam índices de recidiva de 20% e 37%, respectiva-
dural; seria o método mais simples e menos invasivo mente, em doentes tratados mediante trepanação ou
para a drenagem do HSDC, em especial àqueles com craniotomia. Ernestus et al.40 descrevem que 18,5%
aspecto homogêneo ao exames de imagem20,41. dos doentes tratados mediante trepanação apresenta-
ram recidiva e necessidade de nova cirurgia.
Derivação do Espaço Subdural Deve-se excluir a recorrência do HSDC em todos
os doentes que falharem em apresentar melhora ou
A derivação do espaço subdural é de indicação apresentarem deterioração neurológica no período
rara como técnica complementar para o tratamento pós-operatório. A TC crânio irá evidenciar a presença
cirúrgico do HSDC em adultos. Sua indicação encon- da coleção subdural com densidade mista ou maior
tra descrições mais freqüentes na população infantil, que as encontradas em TC pré-operatórias19.
particularmente nas crianças com coleção subdural
Complicações infecciosas podem ocorrer após
hemorrágica crônica e desproporção craniocerebral.
qualquer método de tratamento cirúrgico do HSDC,
McLaurin42 e McLaurin et al.34 indicam derivação do
sendo, porém, pouco freqüentes (menos de 5% dos
espaço subdural para a cavidade peritoneal apenas em
casos44). Cameron45 refere apenas 1 caso de empiema
casos de HSDC em crianças com hipertensão intracra-
subdural em um grupo de 114 doentes tratados me-
niana recidivante, pois essa técnica apresenta a vanta-
diante trepanação. Outros trabalhos relatam incidên-
gem de se evitar punções repetidas da fontanela.
cia de empiema subdural em aproximadamente 1%
destes doentes21. Svien e Geleti15 relatam a incidência
Medidas Adicionais para Provocar Expansão de complicações infecciosas, restritas à incisão cirúr-
Cerebral gica em cerca de 4% dos casos.
Nas décadas de 1940 e 1950 houve uma tendência O desenvolvimento de hipertensão intracraniana
de vários autores em propor medidas que pudessem (HIC), com instalação de quadro clínico de gravida-
diminuir a desproporção craniocerebral, no período de, no período pós-operatório imediato do HSDC,
pós-operatório imediato do HSDC. Desse modo, a tem sido reconhecido como complicação temível por
preocupação existente com a ausência de expansão do vários autores2,46. Tyson et al., mediante análise da
hemisfério cerebral, após a drenagem do HSDC, jus- TC no período pós-operatório, descrevem edema da
tificou o emprego da injeção de solução fisiológica ou substância branca em 6% dos doentes operados, ten-
de solução de Ringer no espaço subaracnóideo lom- do havido em todos grave deterioração neurológica46.
bar ou mesmo diretamente na câmara ventricular43. McKissock et al.2 descrevem vários casos de incidên-
Em anos ulteriores observou-se forte tendência a cia de crises convulsivas no período pós-operatório
se abandonar essas técnicas, consideradas ineficazes, imediato do HSDC, associadas a mau prognóstico;
antifisiológicas e, sobretudo, potencialmente lesivas. esses autores ressaltam a dificuldade de seu controle,
Além disso, a expansão do cérebro, após a drenagem o que leva freqüentemente o doente ao óbito, em de-
do HSDC, não parece guardar relação com o prog- corrência de tumefação cerebral e alteração grave da
nóstico do caso1,17,33,38. HIC. Outros autores sugerem a relação de tal fato ao
aumento do fluxo ou do volume sangüíneo cerebral,
secundário à descompressão, com conseqüente ede-
COMPLICAÇÕES CIRÚRGICAS ma vasogênico38,47.
Apesar da relativa simplicidade da drenagem do Pneumocéfalo hipertensivo tem sido relatado
HSDC por métodos como trepanação ou craniosto- como a causa de piora neurológica pós-operatória em
mia por twist drill, complicações não são de todo in- 2,5% a 16% dos doentes drenados por trepanação21.

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

Essa complicação deve ser evitada por meio do plane- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
jamento adequado do sítio da trepanação, do decúbito
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sempre que possível, o orifício de trepanação deve North-Holland; 1976, v. 24, p. 297-327.
situar-se no ponto mais alto da abóbada craniana. 2. McKissock W, Richardson A, Bloom WH. Sub-
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Na casuística de McKissock et al.24, os óbitos subdural hematoma in adults: influence of patient’s
verificados (6%) foram imputados principalmente à age on symptoms, signs and thickness of hematoma.
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gravidade do estado neurológico pré-operatório, em
6. Potter JF, Fruin A. Chronic subdural hematoma – the
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great imitator. Geriatrics. 1977;32:61-6.
A evolução rápida dos sintomas também se associou
7. Gardner WJ. Traumatic subdural hematoma with
a pior prognóstico. Concluindo, esses autores afir- particular reference to the latent interval. Arch Neu-
mam que o prognóstico depende, fundamentalmente, rol Psychyat. 1932;27:847-53.
dos distúrbios encefálicos causados pelo HSDC, dos 8. Ito H, Yamamoto S, Komait T, Mizukoshi H. Role
quais são reflexos a alteração do nível de consciência of local hyperfibrinolysis in the etiology of chronic
e a rapidez da evolução dos sintomas. A senilidade subdural hematoma. J Neurosurg. 1976;45:26-31.
atuaria como um fator a mais a influir negativamente 9. Tanikawa M, Mase M, Yamada K, et al. Surgical
sobre o resultado. Por outro lado, Potter e Fruin6 ve- treatment of chronic subdural hematoma based on
rificaram resultados notavelmente bons, mesmo para intrahematomal membrane structure on MRI. Acta
doentes com idade avançada. Neurochir. 2001;143:613-9.
Tabaddor e Shulman48 estabelecem também rela- 10. Naganuma H, Fukamachi A, Kawakami M, et al.
ção entre a mortalidade e o grau de comprometimento Spontaneous resolution of chronic subdural hemato-
neurológico pré-operatório. mas. Neurosurgery. 1986;19:794-8.
Markwalder et al.33 referem mortalidade nula em 11. Nomura S, Hashiwagi S, Fujisawa H, et al. Charac-
terization of local hyperfibrinolysis in chronic sub-
casuística de 32 doentes tratados mediante trepana-
dural hematomas by SDS-PAGE and immunoblot. J
ção. Esses autores não estabelecem relação entre a Neurosurg. 1994;81:910-3.
expansão cerebral pós-operatória e o prognóstico, 12. Saito K, Ito H, Hasegawa T, et al. Plasmin-alfa2-plas-
observando que a persistência da coleção subdural re- min inhibitor complex and alfa2 plasmin in chronic
sidual não interferiu significativamente na evolução subdural hematoma. J Neurosurg. 1989;70:68-72.
clínica dos doentes. 13. Murakami H, Hirose Y, Sagoh M. Why do chronic
Hamilton et al.32 analisam índices de mortalidade subdural hematomas continue to grow slowly and not
relatados antes e após o advento da TC de crânio e coagulate? Role of thrombomodulin in the mecha-
concluem que, após o diagnóstico mais precoce, por nism. J Neurosurg. 96:877-884, 2002.
meio de exame de imagem, a taxa de mortalidade di- 14. Zourus A, Bhargava R, Hoskinson M, et al. Further
minuiu sensivelmente. O diagnóstico tardio e o con- characterization of traumatic subdural collections of
seqüente quadro clínico mais grave seriam responsá- infancy – report of five cases. J Neurosurg (Pediatrics
veis por índices de mortalidade, atingindo 29% dos 5). 2004;100:512-8.
pacientes. Esses autores, analisando a incidência de 15. Svien HJ, Gelety JE. On the surgical management of
encapsulated subdural hematoma: a comparison of
distúrbios neurológicos residuais, descrevem índices
the results of membranectomy and simple evacua-
de incapacidade moderada ou grave em cerca de 12% tion. J Neurosurg. 1964;21:172-7.
dos doentes. 16. Fogelholm R, Waltimo O. Epidemiology of chronic sub-
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hematoma2,17. rações a propósito de 66 doentes operados [disserta-

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58 – Hematoma Subdural Crônico Técnicas Cirúrgicas

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59
Hematomas Intracranianos
Traumáticos Agudos
Helder Zambelli
Marcos Vinícius Calfat Maldaun
Andrei Fernandes Joaquim

INDICAÇÕES CIRÚRGICAS de imagem (desvio de linha média, compressão de

O
cisternas), localização da lesão (áreas eloqüentes) e
s fatores mais importantes na decisão da abor-
pressão intracraniana2,3.
dagem cirúrgica dos hematomas traumáticos
agudos são: o status neurológico do pacien- Pacientes com ECG de 3, pupilas fixas e dilata-
te, os achados nos exames de imagem e a extensão das, sem drive respiratório, bem como pacientes com
das lesões intracranianas. Um hematoma subdural ou ECG menor do que 5, com mais de 75 anos, podem
epidural com mais de 5 mm de espessura, com equi- não ser candidatos a descompressão cirúrgica, tendo
valente desvio de linha média, em um paciente co- em vista o prognóstico desfavorável4,5.
matoso, deve ser evacuado imediatamente. Em outra
situação, um hematoma subdural menor, associado a HEMATOMAS SUPRATENTORIAIS
extensa hiperemia hemisférica, com desvio discreto
de linha média, deve inicialmente ter seu tratamento
Craniotomia Básica do Trauma
inicial clínico, a partir do controle da hipertensão in- A maior parte dos hematomas traumáticos é sub-
tracraniana (HIC)1-3. dural, representando mais de 50% dos casos, seguidos
Hematomas agudos (epidural ou subdural), de 5 pelos hematomas intracerebrais e epidurais6.
a 10 mm de espessura, em pacientes com Escala de Lesões pequenas podem ser abordadas com inci-
Coma de Glasgow (ECG) inicial de 9 a 13, devem ser sões verticais e craniotomias limitadas, porém a maior
submetidos à evacuação cirúrgica acaso haja deterio- parte das lesões requer uma craniotomia ampla, fron-
ração do nível de consciência, presença de sinais neu- totemporoparietal, com acesso ao pólo frontal, tem-
rológicos focais ou compressão das cisternas basais / poral e ao vértex.
fossa média. Os hematomas subdurais inter-hemisfé- Hemorragia das veias pontes e das veias que dre-
ricos sem déficits neurológicos focais também podem nam para o seio sagital superior devem ser controla-
ter tratamento inicial clínico, em razão dos riscos ci- das. Fraturas, lesões durais e outras lesões vasculares
rúrgicos da abordagem do seio sagital. devem ser corrigidas.
Quanto aos hematomas intracerebrais e contusões O paciente é posicionado com lateralização da ca-
hemorrágicas, o tratamento cirúrgico é controverso. beça, quase em 90°, com leve elevação desta em rela-
Geralmente a cirurgia é resultante do não-controle ção ao coração. Um coxim sobre o ombro diminui a
clínico da HIC3. obstrução postural da drenagem venosa. Caso não se
A abordagem do hematoma intracerebral ou da tenha descartado lesão raquimedular, mantenha o pa-
contusão deve ser avaliada a partir de múltiplos fato- ciente com colar cervical e em decúbito lateral, com
res, como: tamanho da lesão, profundidade em rela- alinhamento do pescoço em relação à cabeça.
ção ao córtex (raramente se indica evacuação de he- A incisão inicia-se em frente ao trago, curvando-se
matomas profundos), presença de lesões associadas, posteriormente sobre a hélice da orelha e continuando
status neurológico prévio, características do exame em forma de ponto de interrogação (question mark

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

incision) da área parietal até a linha média frontal, Nas lesões inter-hemisféricas, há grande risco de
terminando atrás da linha do cabelo. lacerações no seio sagital superior. Nessas situações, o
Em pacientes com deterioração neurológica pro- anestesista e o neurocirurgião devem estar preparados
gressiva com lesões na fossa temporal, uma craniec- para grandes sangramentos. Caso o coagulador bipo-
tomia temporal deve ser realizada rapidamente. Após lar não seja capaz de reparar o problema, é necessário
breve incisão na pele, executa-se rápida craniectomia, o uso de Gelfoam® ou de retalhos musculares, após
com abertura da dura-máter para melhora temporária compressão com cotonóides por alguns minutos.
da pressão intracraniana. Então, completa-se a inci- Recomenda-se dispositivo de monitoração intra-
são, conforme descrito previamente, até a região fron- craniana para todos pacientes submetidos à evacuação
tal, cruzando a linha média por cerca de 1 a 2 cm. de hematomas com ECG menor do que 13, principal-
Ao se iniciar a craniotomia, deve-se evitar se atin- mente nos indivíduos cuja ECG inicial era menor ou
gir a linha média, em razão do risco de lesão no seio igual a 8, pois mais de 50% deles apresentarão hiper-
sagital superior ou em uma de suas tributárias. Reco- tensão intracraniana no pós-operatório7,8. Pela possi-
menda-se manter distância maior que 15 mm da linha bilidade de drenagem liquórica, os monitores intra-
média. Caso seja necessário, pode-se ampliar a cra- ventriculares são preferíveis aos demais para aferição
niotomia em direção à linha média sob visão direta, da pressão intracraniana. Recomenda-se a colocação
após a remoção do flap ósseo. Em casos especiais, a dos cateteres no corno frontal do ventrículo lateral do
asa do osso esfenóide pode ser retirada com drill para hemisfério direito ou ipsilateral ao hematoma evacu-
melhor visualização da fossa média. ado. Neuronavegadores podem ser úteis para reali-
Nos hematomas subdurais, a dura-máter deve ser zação da ventriculostomia, principalmente se houver
aberta inicialmente sobre a área de máxima espessura ventrículos pequenos e distorcidos. O ponto de entra-
do coágulo, permitindo acesso às fossas média e an- da situa-se cerca de 1 a 2 cm anterior à sutura coronal
terior e à área ao longo da linha média (Fig. 59.1). Na e 2 a 3 cm lateral à linha média. A externalização do
exploração do espaço subdural, a hemostasia deve ser cateter deve ser feita em nova incisão cutânea externa
rigorosa, podendo-se utilizar tanto o coagulador bipo- à da craniotomia.
lar quanto agentes hemostáticos, como Surgicel®.
Após rígida hemostasia, a dura-máter deve ser fe- Craniotomia no Hematoma Epidural
chada de forma rigorosa, primariamente ou por meio
O prognóstico dos hematomas epidurais em estu-
de retalho com gálea ou da fáscia lata. Suturas de
dos de revisão é favorável em 55% a 89% dos casos,
ancoramento da dura-máter na borda da craniotomia
com mortalidade variando entre 5% e 28%. Os fa-
devem ser realizadas, além de ancoramento no flap
tores prognósticos mais importantes são: a ECG ini-
ósseo, para impedir a formação de novos hematomas
cial e a associação com outras lesões intracranianas,
epidurais. Procede-se, então, à fixação do flap ósseo,
como contusões, lacerações e hematomas subdurais
geralmente com fios de sutura. Um dreno subgaleal ou
(em 24% a 75% dos casos)9-12. O diagnóstico e o tra-
epidural pode ser considerado após o procedimento,
tamento imediato consistem nos pontos-chaves da
principalmente em casos de importante sangramento,
melhora no prognóstico. Mais de 50% dos epidurais
sendo retirado após 12 a 24 horas. Realiza-se, por fim,
localizam-se na fossa temporal, estendendo-se, mui-
sutura do tecido celular subcutâneo, seguido da pele.
tas vezes, para a região parietal. De 15% a 20% são
localizados na região frontal e o restante nas regiões
parietal, occipital e fossa posterior (estes, com 5% de
freqüência)9,11-14.
A incisão cutânea deve expor completamente a le-
são. Uma craniotomia frontotemporal ou frontotem-
poroparietal é realizada na maioria das vezes, tendo
em vista expor a maioria dos hematomas. A trepana-
ção inicial deve ser feita na área de espessura máxima,
geralmente na região temporal inferior, com craniec-
tomia limitada de alívio, seguida pela complementa-
ção da craniotomia. O hematoma, então, é removido,
com irrigação do coágulo. A exposição ampla permite
hemostasia adequada. O sangramento, em geral, é se-
cundário à lesão de ramos da artéria meníngea média,
que são coagulados. Em fraturas do osso petroso, ex-
posição do tronco da artéria perto da região do forame
Fig. 59.1 – Visão cirúrgica mostra hematoma subdural volu- espinhoso é muitas vezes fundamental para o controle
moso, após craniotomia e retirada do retalho ósseo. do sangramento, geralmente com bipolar ou cera para

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59 – Hematomas Intracranianos Traumáticos Agudos

osso, e a não-visualização da origem da hemorragia não aparecerem nas tomografias computadorizadas


pode requerer o fechamento do forame espinhoso, iniciais20,23,24.
com cera para osso ou Gelfoam®. O espaço subdural A mortalidade no hematoma intracerebral varia de
deve ser inspecionado após remoção do coágulo, caso 27% a 50%, com resultados favoráveis em 25% dos
a dura-máter persista tensa ou com coloração escura. casos6,20,23.
Alguns cirurgiões preenchem o espaço subdural com Eventual craniotomia deve abranger toda a região
soro para diminuir o espaço epidural. A incisão na du- do hematoma ou das lesões associadas, e a remoção
ra-máter tem tamanho variável, mas seu fechamento deve ser menos agressiva em áreas eloqüentes. A he-
deve ser rigoroso. Após evacuação do hematoma, rea­ mostasia deve ser rigorosa, com bipolar ou mesmo
liza-se o ancoramento circunferencial da dura-máter Surgicel®. Mesmo reduções parciais resultam em di-
nas bordas da craniotomia e no flap ósseo. minuição da pressão intracraniana.

Craniotomia no Hematoma Subdural HEMATOMAS DA FOSSA POSTERIOR


Os hematomas subdurais são as lesões traumáticas Os hematomas traumáticos são menos comuns na
agudas expansivas com maiores taxas de morbidade e fossa posterior, com freqüências similares de lesões epi-
mortalidade. Isto se deve principalmente às lesões asso- durais, subdurais ou de hematomas intracerebelares25-27.
ciadas no parênquima, como contusões, lacerações cor- As lesões são decorrentes de trauma na região oc-
ticais e hematomas. O sangramento localiza-se, na maior cipital, com sinais de laceração ou fraturas (estas as-
parte das vezes, nos lobos frontais e temporais15-17. sociadas principalmente aos hematomas epidurais)28.
A mortalidade geral nos pacientes drenados varia Em 80% dos pacientes com hematoma na fossa
de 42% a 65%6,16-19. posterior há também um hematoma supratentorial
Uma ampla craniotomia frontotemporoparietal é concomitante. As fraturas occipitais geralmente en-
necessária para adequada remoção do hematoma, ge- volvem a tórcula e o seio transverso ou sigmóide,
ralmente bem maior do que os epidurais, e para aces- principalmente nos hematomas epidurais. A fonte de
so às lesões do parênquima. É de suma importância sangramento pode ser, além dos seios venosos, secun-
a exposição dos pólos frontal e temporal, bem como dária ao sangue da díploe, da sutura lambdóide e dos
a visualização do seio sagital, caso haja extensão do vasos meníngeos. Hematomas occipitais por contra-
hematoma para além da linha média. Nos pacientes golpe de impacto frontal são raros28.
comatosos, a craniectomia temporal de alívio deve
ser realizada invariavelmente para remoção parcial
do coágulo antes da craniotomia ampla definitiva. Craniotomia Básica do Trauma
A dura-máter deve ser aberta amplamente e deva- O tratamento conservador pode ser realizado em
gar, removendo-se o coágulo com irrigação. O espaço pacientes assintomáticos e neurologicamente está-
subdural deve ser inspecionado em busca de lesões veis. A grande maioria dos hematomas da fossa poste-
adjacentes. Contusões maiores do que 1 a 2 cm po- rior requer drenagem cirúrgica de urgência. Pacientes
dem ser aspiradas, exceto se em áreas eloqüentes. He- com ECG menor ou igual a 8 devem ser submetidos
morragias das veias pontes devem ser contidas com previamente a uma ventriculostomia (30% dos casos
bipolar ou com Gelfoam®. A desimpactação da porção possuem hidrocefalia obstrutiva na tomografia de crâ-
medial do lobo temporal do hiato tentorial pode ser nio), apesar do risco de herniação ascendente, mini-
tentada uma única vez, para evitar danos adicionais14. mizado com drenagem lenta do liquor28,30.
O fechamento da dura e os respectivos ancoramen- A maioria dos pacientes é colocada em posição
tos são realizados conforme descritos previamente. prona, com fixação do crânio em dispositivo do tipo
Mainfield. Um cateter venoso central deve ser locado
Craniotomia no Hematoma Intracerebral previamente à cirurgia para aspiração de ar perante
eventual quadro de embolismo. A cabeça deve ficar
A maior parte dos hematomas não requer evacua­ discretamente acima do nível do coração, exceto se
ção se não houver concomitante efeito de massa ou houver suspeita de embolismo aéreo.
hipertensão intracraniana. De 80% a 90% dos hema- Uma incisão mediana, paramediana ou em “S” deve
tomas ocorrem nos lobos frontal e temporal, sendo ser realizada, conforme a localização do hematoma.
menos comuns nas regiões parietal e occipital20-22. Em caso de um hematoma epidural, a trepanação deve
Em 56% a 93% dos casos há associação com ou- ser realizada na área de espessamento máximo do co-
tras lesões intracranianas20,22,23. águlo, mas evitando o seio venoso envolvido. A remo-
Cerca de 20% a 50% dos hematomas intracere- ção do fragmento ósseo sobre o seio deve ser realizada
brais ocorrem depois da evacuação de um hemato- por último, após craniectomia centrada na trepanação
ma, sendo ipsilaterais ou mesmo contralaterais, re- inicial. Após remoção do hematoma, lesões nos seios
feridos como hematomas intracerebrais tardios por devem ser reparadas com retalhos de músculo sutura-

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Parte 8 – Neurocirurgia no Traumatismo Cranioencefálico

dos sobre o defeito. Caso a dura-máter esteja tensa ou 14. Horwitz NH. Comment of Nussbaum ES, Wolf AL,
escura, o espaço subdural deverá ser explorado, assim Sebring L, et al. Complete temporal lobectomy for
como a superfície cerebelar. Fecha-se a dura rigorosa- surgical resuscitation of patients with transtentorial
mente, com ancoramentos generosos. Caso haja ede- herniation secondary to unilateral hemispheric swell-
ma cerebelar, podemos utilizar periósteo ou retalho da ing. Neurosurgery. 1991;29:62-6.
fáscia lata para a plastia. Fixa-se, então, o flap ósseo. 15. Jamieson KG, Yelland JDN. Surgically treat-
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remoção do hematoma, a superfície cerebelar é inspe- injury. J Neurosurg. 1981;54:289-99.
cionada e, se houver contusões, aspiração e cauteriza- 17. Wilberger JE, Harris M, Diamond DL. Acute sub-
ção devem ser consideradas. Surgicel® pode ser útil dural hematoma: morbidity, mortality, and operative
para a hemostasia. Descompressão adicional pode ser timing. J Neurosurg. 1991;74:212-8.
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Parte 9
Avanços Técnicos
em Neurocirurgia

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Terceiro-ventriculocisternostomia
Endoscópica
Américo Rubens Leite dos Santos

HISTÓRICO levando-o a idealizar outra forma de tratamento para


hidrocefalia, a terceiro-ventriculocisternostomia por

A
terceiro-ventriculocisternostomia ou terceiro- via subfrontal2-4.
ventriculostomia endoscópica, como usual-
No entanto, foi William Mixter, em 6 de fevereiro
mente referida, é atualmente o procedimento de 1923, quem realizou a primeira terceiro-ventricu-
de maior importância em neuroendoscopia. A história lostomia endoscópica numa criança com hidrocefalia
do desenvolvimento dessa técnica confunde-se com congênita5. O êxito de Mixter inspirou John E. Scarff,
a história do tratamento da hidrocefalia. Após longa em Nova York, em 1935, a repetir essa técnica6-8.
era de implantação rotineira de derivações ventricu- Tracy J. Putnam, em 1934, bem como Scarff aper-
loperitoneais ou ventriculoatriais para o tratamento feiçoaram a técnica da plexotomia endoscópica tendo
indiscriminado de todas as formas de hidrocefalia, reportados resultados satisfatórios9.
a terceiro-ventriculostomia endoscópica sofreu mar- A má qualidade dos instrumentos naquela época
cante renascimento no final da década de 1980 com o e o advento dos sistemas de derivação liquórica na
desenvolvimento tecnológico dos endoscópios. década de 1950 causaram progressivo desinteresse
A hidrocefalia obstrutiva ou não-comunicante tem pelas técnicas endoscópicas10.
como causa a obstrução do fluxo liquórico em algum A evolução óptica dos endoscópios levou Gerard
ponto desde o local principal de sua produção no ple- Guiot em 1963 a reviver a neuroendoscopia11,12. Mais
xo coróide até sua reabsorção nas granulações de Pac- recentemente o refinamento das técnicas de neuroi-
chioni. Alternativas para o tratamento dessa forma de magem, o aperfeiçoamento da estereotaxia, a intro-
hidrocefalia incluem a exérese da causa de obstrução dução da neuronavegação, a evolução da radiocirur-
quando possível ou o desvio da circulação liquórica gia e do tratamento endovascular, a idealização dos
para outro ponto de reabsorção, princípio das deriva- acessos key-hole criaram o conceito de neurocirurgia
ções ventriculares e da terceiro-ventriculostomia. His- minimamente invasiva, que renovou o interesse pela
toricamente a ablação ou coagulação do plexo coróide neuroendoscopia.
foi utilizada na tentativa de se diminuir a produção do A crescente insatisfação com sistemas valvulares
líquido cefalorraquidiano nas formas comunicantes decorrente das altas taxas de mau funcionamento e
de hidrocefalia. Esse método de tratamento foi uti- infecção destacaram a terceiro-ventriculocisternosto-
lizado pela primeira vez em 1904, em Chicago, pelo mia como procedimento de escolha para as hidroce-
urologista Victor L’Espinasse. Esse autor, utilizando falias obstrutivas13.
cistoscópio, realizou coagulação do plexo coróide em
duas crianças hidrocefálicas, tendo uma delas faleci-
do logo após o procedimento e a outra sobrevivido INDICAÇÕES
durante 5 anos1. Walter E. Dandy foi o primeiro neu- A terceiro-ventriculostomia endoscópica é indica-
rocirurgião a introduzir o termo ventriculoscópio e da a todas as formas de hidrocefalia obstrutiva, aguda
realizar coagulação endoscópica do plexo coróide. Os ou crônica, com quadro clínico e exames de neuroi-
resultados obtidos por Dandy foram desapontadores, magem compatíveis13,14.
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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

A ressonância magnética com estudo do fluxo li- versos autores relataram resultados favoráveis na hi-
quórico é fundamental para a seleção dos pacientes drocefalia de pressão normal20-22. A base teórica para
a serem operados por essa técnica, porém, em casos o funcionamento desse procedimento na hidrocefalia
de urgência, a cirurgia não deve ser postergada para comunicante ainda não é claro. É possível que, em
a realização do exame13. O conceito de hidrocefalia alguns casos, ocorra obstrução extraventricular cis-
obstrutiva não deve restringir-se à imagem de “hidro- ternal do fluxo liquórico causando hidrocefalia obs-
cefalia triventricular”. A desproporção da dilatação trutiva23. Ainda são necessários mais estudos para se
entre os três ventrículos superiores e o quarto ventrí- definir a real utilidade do tratamento endoscópico
culo sugere estenose do aqueduto cerebral, mas não é nesses pacientes.
o único achado a ser observado13. O “baloneamento” A eficácia da terceiro-ventriculostomia endoscópi-
e a projeção do terceiro ventrículo em direção ao dia- ca em menores de 6 meses aparenta ser menor do que
fragma da sela, o espaço na cisterna pré-pontina e a em crianças mais velhas14. Isto se deve possivelmente
distância do topo da artéria basilar ao clivo são acha- à imaturidade das granulações de Pacchioni, gerando
dos de imagem que, além de sugerir o diagnóstico de déficit de reabsorção liquórica. Diversos estudos en-
hidrocefalia obstrutiva, determinam a segurança para contram-se em andamento para definir essa questão.
a realização do procedimento (Fig. 60.1). De maneira geral, todos os pacientes com hidro-
Ausência de cisterna pré-pontina ou presença de cefalia devem ser considerados passíveis de receber
processo inflamatório nessa região, pequena distância tratamento endoscópico. Tendo em vista sua alta mor-
da artéria basilar ao clivo, tamanho diminuto e espes- bidade, deve-se evitar a instalação indiscriminada de
samento do assoalho do terceiro ventrículo são fatores derivações ventriculares, sendo seu uso reservado ex-
que podem contra-indicar a terceiro-ventriculostomia clusivamente aos pacientes que não são candidatos a
endoscópica. terceiro-ventriculocisternostomia endoscópica. A má-
A hidrocefalia tetraventricular, usualmente consi- xima The best shunt is no shunt ainda é válida.
derada como comunicante, pode ser causada por obstru-
ção nas vias de saída do quarto ventrículo, os forames
de Luschka e Magendie, sendo responsiva a terceiro- TÉCNICA CIRÚRGICA
ventriculostomia endoscópica13,15-18. Novamente o estu- O aprendizado da neuroendoscopia passa por es-
do do fluxo liquórico é fundamental para o diagnóstico tudo da anatomia endoscópica do sistema ventricular.
diferencial. Ocasionalmente a ventriculografia é neces- A perspectiva anatômica sofre grande variação con-
sária para se confirmar hidrocefalia obstrutiva. forme o instrumento óptico utilizado. A visão endos-
A hidrocefalia pós-hemorragia ou pós-infecciosa é cópica difere radicalmente da visão microcirúrgica. É
passível de tratamento por terceiro-ventriculostomia necessário o aprendizado de orientação espacial com
endoscópica, porém pacientes que apresentem ambas visão bidimensional reproduzida em tela de vídeo.
as causas são maus candidatos ao tratamento endos- Learning by doing pode gerar conseqüências fatais.
cópico19. O equipamento básico de neuroendoscopia, en-
A hidrocefalia comunicante é indicação questio- tre diversos modelos disponíveis no mercado, inclui
nável de terceiro-ventriculostomia endoscópica. Di- estação de vídeo composta por monitor, fonte de luz

A B

Fig. 60.1 – (A) Ressonância magnética T2 demonstrando hidrocefalia obstrutiva por tumor na região da pineal (*). (B) Estudo
do fluxo liquórico demonstrando ausência de fluxo no aqueduto cerebral.
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60 – Terceiro-ventriculocisternostomia Endoscópica

de xenônio, câmera do endoscópio e gravador de frontal e o corpo do ventrículo lateral. O plexo co-
vídeo ou DVD. Essa estação é comum a outras es- róide deve ser identificado e seguido anteriormente
pecialidades que realizam cirurgia videoassistida e para localização do forame de Monro (Fig. 60.2). O
pode ser compartilhada. O neuroendoscópio rígido forame de Monro é circundado pelo fórnice, que deve
propriamente dito é composto por óptica, camisa e ser preservado.
instrumentais diversos. A óptica pode ter angulações O endoscópio é, então, introduzido através do fo-
diversas, em geral 0°, 30° ou 70°. Quanto maior a rame e o terceiro ventrículo é visualizado. O manuseio
angulação da óptica, maior a dificuldade de orienta- do endoscópio pode ser feito “a mãos livres” ou por
ção espacial. A camisa do endoscópio possui encaixe meio de fixação em suporte conforme a preferência do
para óptica, canais de trabalho, irrigação e drenagem. cirurgião. Identificam-se, no assoalho do terceiro ven-
O diâmetro da camisa e o número de canais variam trículo, os corpos mamilares e adiante destes a chama-
conforme o modelo. Os instrumentais básicos são da membrana pré-mamilar, região do túber cinéreo,
compostos por tesoura, pinças, bipolar ou monopolar. onde será realizada a abertura endoscópica (Fig. 60.3)
O melhor equipamento de neuroendoscopia é aque- rostralmente ao topo da artéria basilar para se evitar
le que se está habituado a utilizar. A montagem do lesões acidentais das artérias talamoperfurantes.
neuroendoscópio deve ser realizada em condições Diversas técnicas são propostas para a abertura
absolutamente estéreis e preceder o ato cirúrgico. da membrana pré-mamilar, sendo esta a etapa mais
Preferencialmente o próprio cirurgião deve realizar a arriscada do procedimento. Pode-se utilizar o pró-
montagem do equipamento e regular sua orientação, prio endoscópio25-27, laser28-32, microprobe de contato
balanço de branco e foco. ultra-sônico33, eletrocoagulação34,35, entre outros. Em
A cirurgia é realizada com o paciente em anestesia nosso meio, preferimos a utilização de instrumento
geral, com o crânio fixado em apoiador standard de rombo como, eletrodo bipolar ou pinça, seguido de
3 pinos, e o local da trepanação deve ser posicionado dilatação da abertura com cateter de Fogarty 4 French
de forma a ser o ponto mais alto do paciente. O local (Fig. 60.4).
da trepanação é planejado utilizando-se imagens sagi- Realiza-se inspeção endoscópica da cisterna pré-
tais e coronais da ressonância magnética. Determina- pontina, que deve estar livre de membranas que obs-
se trajetória retilínea da trepanação ao assoalho do truam a circulação liquórica (Fig. 60.5).
terceiro ventrículo passando pelo forame de Monro.
Marca-se a trepanação utilizando-se a distância da
glabela e da linha média. Estereotaxia ou neuronave-
gação podem ser úteis, mas geralmente não são ne-
cessárias. Estudo estereotático realizado por Kanner
et al.24 determinou o local ótimo para realização da
trepanação a 28 mm da linha média e 8 mm anterior
à sutura coronal. Portanto, o tradicional ponto de Ko-
cher não oferece trajetória adequada para o procedi-
mento10. O estudo da anatomia de cada paciente pela
ressonância magnética é fundamental para se evitar
lesões no forame de Monro.
A marcação na pele é feita tendo a trepanação ao
centro de incisão retilínea de cerca de 3 cm. A trico-
tomia deve ser limitada ao local da incisão e feita no Fig. 60.2 – Imagem endoscópica do forame de Monro.
centro cirúrgico. Antibioticoprofilaxia deve ser feita
30 minutos antes do procedimento conforme proto-
colo de cada hospital. Após assepsia e antissepsia,
procede-se à incisão no local marcado, seguida da tre-
panação, que deve ser ampliada em todos os sentidos
para permitir a manipulação do endoscópio. Realiza-
se, então, abertura em cruz da dura-máter ampla o su-
ficiente para a passagem do endoscópio e hemostasia.
Segue-se pequena corticotomia e punção ventricular
com cânula própria. Deve-se evitar a perda de li­quor
e introduzir o endoscópio previamente montado,
seguindo o trajeto realizado pela cânula. Irrigação
com Ringer simples brandamente aquecido deve ser
iniciada, tomando-se a precaução de que o canal de Fig. 60.3 – Imagem endoscópica do terceiro ventrículo. M =
drenagem esteja aberto. Visualiza-se, então, o corno membrana pré-mamilar.
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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

Estas incluem lesão vascular na artéria basilar e seus


ramos38-40, bradicardia intra-operatória41-44, insuficiên-
cia respiratória45, diabetes insipidus46, epilepsia47,48,
pneumoencéfalo49, coleções subdurais50-53 e altera-
ções psiquiátricas54-56.
De modo geral as complicações intra-operatórias
são raras e associadas à curva de aprendizado. O pla-
nejamento da cirurgia baseado no estudo anatômico
pré-operatório de cada paciente e o treinamento em
neuroendoscopia são itens fundamentais para a segu-
rança do procedimento.

PROGNÓSTICO
Fig. 60.4 – Imagem endoscópica do cateter de Fogarty reali- O principal fator prognóstico a ser avaliado após a
zando dilatação da ventriculostomia à frente da artéria basilar.
realização da terceiro-ventriculostomia endoscópica é
a melhora clínica dos pacientes57. O tamanho dos ven-
trículos não é preditivo do êxito do procedimento10.
Não se deve esperar grande diminuição da dilatação
do sistema ventricular, como se observa freqüente-
mente com sistemas de derivação liquórica. Tal ex-
pectativa pode, por vezes, causar a falsa impressão de
mau resultado, acarretando mudança desnecessária
de conduta e adicionando morbidade de nova cirurgia
ao paciente.
A taxa de êxito reportada do procedimento endos-
cópico, aferida como independência de sistemas de
derivação liquórica, varia entre 50% e 90%58-68.
O acompanhamento dos pacientes deve ser feito
pela ressonância magnética, com estudo de fluxo li-
quórico, que demonstrará ou não a patência da ventri-
Fig. 60.5 – Inspeção endoscópica da cisterna pré-pontina. culostomia (Fig. 60.6).
Na ausência de fluxo na ventriculostomia, aumen-
to da dilatação ventricular e deterioração clínica do
Caso septações estejam presentes, estas devem ser paciente, deve-se considerar a realização de reventri-
abertas para assegurar o êxito do procedimento. Após culostomia. Pacientes com piora clínica e presença de
a realização da perfuração, pode-se observar pulsação fluxo liquórico na ventriculostomia devem ser sub-
do fluxo liquórico através dela, sinal de bom prog- metidos à derivação ventriculoperitoneal.
nóstico. O endoscópio é, então, lentamente trazido ao
ventrículo lateral, e a irrigação descontinuada para se
observar presença de eventuais focos de sangramen-
to que devem ser cauterizados. Retira-se o endoscó-
pio através do túnel cortical realizado, que pode ser
selado com esponja hemostática. Quando possível,
a dura-máter deve ser suturada, podendo ser utiliza-
dos, quando necessário, os diversos substitutos de
dura-máter disponíveis comercialmente. O orifício da
trepanação pode ser fechado com fragmentos ósseos
obtidos durante a abertura ou com uso de substitutos
ósseos sintéticos. A fim de se evitar fístula liquórica,
deve-se realizar sutura hermética em três planos: pe-
riósteo, tecido celular subcutâneo e pele.

COMPLICAÇÕES
Possíveis complicações associadas à terceiro-ven- Fig. 60.6 – Estudo do fluxo liquórico demonstrando patên-
triculostomia endoscópica variam de 6% a 20%36,37. cia da ventriculostomia (*).
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60 – Terceiro-ventriculocisternostomia Endoscópica

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Hidrocefalia
Milton Hikaru Toita
Jose Carlos Esteves Veiga

INTRODUÇÃO CLASSIFICAÇÃO

A
hidrocefalia é condição na qual há aumento A hidrocefalia interna pode ser classificada em:
exagerado da quantidade de líquido cefalor- • Comunicante: onde o trânsito liquórico se faz
raquidiano no compartimento intracraniano e sem interrupção, desde o local de produção até
conseqüente dilatação dos ventrículos1. Há autores o local de absorção.
que definem e consideram a entidade hidrocefalia • Não-comunicante: quando há um impedimen-
a qualquer aumento da quantidade de liquor intra- to da passagem de liquor entre os ventrículos
craniano, podendo ser intraventricular (hidrocefalia cerebrais e o espaço subaracnóideo.
interna) ou no espaço subaracnóideo (hidrocefalia • Essa classificação é importante para nortear o
externa)2. Do ponto vista fisiopatológico ocorre uma tratamento. Desse modo, a hidrocefalia não-
desproporção entre a produção e a absorção do líqui- comunicante pode ser tratada por procedimen-
do cefalorraquidiano. Neste capítulo, será discutida a to neuroendoscópico, enquanto na hidrocefalia
hidrocefalia interna. não comunicante, em geral, se utilizam os mé-
Historicamente, o tratamento da hidrocefalia se todos de derivação do liquor.
tornou aceitável após a padronização dos métodos
de antissepsia, com redução da morbi-mortalidade.
Foram descritos vários procedimentos visando à di- APRESENTAÇÃO CLÍNICA
minuição da produção de liquor3, tais como: punção No quadro clínico encontramos:
e esvaziamento do ventrículo; envolvimento da ca- • Na infância:
beça com bandagem; e desvio do trânsito liquórico. –– Aumento do perímetro craniano.
Em 1949, Nulsen e Spitz idealizaram um implante de
–– Irritabilidade.
sistema de derivação liquórica para a veia cava. Entre
1955 e 1960, surgiram vários sistemas com interpo- –– Fontanela abaulada e tensa.
sição de válvula: dispositivo de válvula em fenda po- –– Sinal do “sol poente” (paralisia do olhar
sicionada na extremidade distal do cateter peritoneal; conjugado para cima).
sistema valvular por fenda entre o cateter ventricular; –– Sonolência.
e o peritoneal e sistema de diafragma. Novos implan- –– Vômitos.
tes e materiais foram aperfeiçoados e incorporados ao –– Disjunção de suturas.
arsenal terapêutico, obtendo-se resultados mais pro- –– Ectasia das veias do couro cabeludo.
missores. Atualmente dispõe-se de cerca de 127 tipos –– Sinal de Macewen (som de “pote rachado” à
diferentes de sistemas valvulados3,4. percussão do crânio)5.
Recentemente, o tratamento neuroendoscópio por meio • Em adulto
da terceiro-ventriculostomia, em determinadas situações, –– Cefaléia.
sem a utilização do sistema de derivação, possibilitou a
–– Sonolência.
resolução de casos de hidrocefalia não comunicante.
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679
Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

–– Vômitos, principalmente matutinos. definidos. Os coeficientes são utilizados para se


–– Edema de papila. ter idéia do grau de hidrocefalia e na obtenção
–– Pode se apresentar de forma súbita, determi- de parâmetros para o seguimento do paciente.
nando hipertensão intracraniana aguda, com • O coeficiente CF/DI é > 0,5 (em que CF é a
alteração do nível de consciência, bradicardia maior distância entre as paredes laterais dos
e irregularidades respiratórias, necessitando cornos frontais e DI é o diâmetro interno da tá-
de tratamento em caráter de emergência. Em bua óssea interna frontal nesse mesmo nível).
outras situações evolui de forma progressiva O coeficiente isoladamente pode ser importan-
apresentando quadro de alterações cogniti- te se: CF/DI (< 40%: normal; de 40% a 50%:
vas, distúrbio da marcha (marcha a passos limítrofe; > 50%: sugere hidrocefalia).
curtos) e incontinência urinária, caracteri- • Coeficiente de Evans: coeficiente de CF em
zando a hidrocefalia de pressão intermitente relação ao diâmetro biparietal máximo > 30%
ou hidrocefalia crônica do idoso. (Fig. 61.1).
• Em crianças com menos de 1 ano de vida, ob-
ETIOLOGIA serva-se aumento desproporcional dos cornos
occipitais dos ventrículos laterais. Assim, há uma
As principais causas de hidrocefalia podem ser di- medida de proporção entre os ventrículos laterais
vididas em: nas suas porções occipital e frontal6 (Fig. 61.2).
• Congênita:
–– Malformação encefálica (porencefalia, DI
doen­ças vasculares, associado a mielome- CF
ningocele).
–– Estenose do aqueduto cerebral (é a principal
causa).
–– Malformação de Dandy-Walker (atresia dos
forames de Luschka e Magendie). CT
–– Malformação de Chiari.
• Adquirida:
–– Infecciosa.
–– Pós-hemorragia subaracnóidea espontânea.
–– Neoplasia.
–– Hemorragia intraventricular.

DIAGNÓSTICO
Fig. 61.1 – Medidas da avaliação da hidrocefalia em tomografia
Alterações na radiografia simples de crânio: axial computadorizada cranioencefálica em crianças e adultos.
• Disjunção de sutura.
• Sinal da prata batida (impressão digitiforme DI
das circunvoluções encefálicas na tábua inter-
CO
na do crânio).
• Desproporção craniofacial. CF
• Duplo contorno do assoalho da sela túrcica.
• Erosão das clinóides, principalmente as anteriores.

Tomografia Computadorizada Proporção entre os


ventrículos
Cranioencefálica frontal e occipital:
(CF + CO) / 2 DI
A hidrocefalia pode ser avaliada pela tomografia Para pacientes
de crânio por meio da verificação de: pediátricos, o
normal é 0,37 ± 0,026
• Dilatação dos cornos frontais dos ventrículos
laterais (ventrículos com aspecto de “Mickey
Mouse”) e terceiro ventrículo.
• Quando o tamanho dos cornos temporais é ≥ 2
mm em largura. As fissuras de Sylvius, inter-he- Fig. 61.2 – Tomografia demonstrando dilatação do corno
misféricas e os sulcos cerebrais tornam-se mal occipital do ventrículo lateral.
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680
61 – Hidrocefalia

TRATAMENTO local da inserção do cateter ventricular (Fig. 61.3).


Lavar bem a pele no local da cirurgia e fazer assepsia
O tratamento da hidrocefalia dever ser iniciado e antissepsia rigorosa, por 10 a 15 minutos. O sistema
com a identificação da etiologia. Se a causa puder de implante deve ser o de uso rotineiro pelo serviço,
ser tratada, esta deve ser a escolha inicial. Em casos com equipe cirúrgica treinada.
em que o tratamento por neuroendoscopia for indi-
cado, na presença de hidrocefalia com obstrução do
fluxo liquórico e com espaço subaracnóideo pérvio, Punção Ventricular
esta deve ser a primeira opção. Havendo indisponi- A trepanação pode ser parietal posterior ou fron-
bilidade de recursos técnicos avançados e, ainda, na tal. Nesta última posição, tratando-se de crianças
maioria dos casos utiliza-se a derivação do liquor por maiores ou adultos. Em crianças no primeiro ano de
sistemas com válvulas. As possibilidades são: deriva- vida, o ventrículo lateral é mais dilatado posterior-
ção ventriculoperitoneal, derivação ventriculoatrial, mente, devendo ser o local preferencial de punção. A
derivação ventriculopleural ou derivação ventricu- localização da incisão varia com o formato da cabeça
lovesical. Em casos selecionados pode-se empregar do paciente. Fica no ponto médio entre o ínion e a
a derivação lomboperitoneal, em situações de hidro- mastóide e aproximadamente no ponto médio entre a
cefalia comunicante, quando o ventrículo é de difícil bossa parietal e o ponto mais alto do pavilhão auricu-
cateterização ou na eventual impossibilidade de abor- lar8 (Fig. 61.4). Portanto, a trepanação parietal poste-
dagem craniana. Em situações de urgência pode ser rior deve ser feita aproximadamente 2 a 3 cm lateral
necessária a derivação ventricular externa, por exem- à linha mediana, demarcada pela sutura sagital e no
plo: em hemorragia aguda ou infecção, com dilatação sentido póstero-anterior, de 7 a 8 cm da proeminência
aguda dos ventrículos, onde se faz uma punção do occipital externa. A punção do ventrículo lateral por
ventrículo lateral com colocação de cateter no seu in- meio de trepanação parietal posterior deve ser feita
terior e exteriorização deste por contra-abertura. em direção à glabela e a introdução do cateter até que
Há vários tipos de válvula para derivação: em fen- sua extremidade distal se localize no meio do corpo
da única ou dupla, diafragma, por controle de dife- ou no corno frontal do ventrículo lateral ipsilateral.
rença de pressão e por controle de fluxo. Entretanto,
todos os sistemas têm performances semelhantes7.
A nossa primeira escolha tem sido:
• Terceiro-ventriculostomia: nos casos em que
houver dilatação dos ventrículos laterais e ter-
ceiro ventrículo, com estenose do aqueduto de
Sylvius.
• Derivação ventriculoperitoneal, em situações
nas quais a terceiro-ventriculostomia não te-
nha um desempenho adequado ou quando hou-
ver dificuldade na reabsorção liquórica, como
ocorre nas hemorragias subaracnóideas e pós- Fig. 61.3 – Posicionamento do paciente em decúbito hori-
zontal e com coxim sob o ombro.
meningite.

Derivação Ventriculoperitoneal
A derivação ventriculoperitoneal é a técnica mais
utilizada. O cateter ventricular é inserido através de
trepanação frontal ou parietal. O cateter peritoneal
tem trajeto subcutâneo e a extremidade peritoneal é
inserida na cavidade abdominal.

Planejamento
A inserção do cateter ventricular deve ser inicial-
mente no hemisfério cerebral direito, por ser este o
lado não dominante na maioria dos casos. O paciente
é colocado em posição supina com um coxim sob o
ombro procurando colocar o trajeto do cateter perito- Local da trepanação
neal desde o local da válvula até a incisão peritoneal Fig. 61.4 – Localização do local da trepanação parietal pos-
em linha reta. Virar a cabeça para o lado oposto ao terior.
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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

A orientação topográfica para a trepanação fron- Complicações


tal é 2 cm lateral à linha mediana imediatamente e à
As principais complicações das cirurgias de deri-
frente da sutura coronariana. A punção ventricular é
vação são:
orientada em direção à linha pupilar (ponto de Ko-
cker). Na punção frontal, o cateter deve ficar situado • Infecção do sistema (mais comum).
com a ponta acima do terceiro ventrículo. A longo • Obstrução mecânica do cateter peritoneal, do
prazo, a inserção do cateter ventricular frontal tem cateter ventricular ou da válvula.
um funcionamento melhor do que o posicionado em • Quebra do cateter peritoneal.
outros locais9. • Perfuração intestinal.
• Cisto abdominal.
Sistema com Válvula • Migração do cateter peritoneal.
• Hiperdrenagem14. Pela sua freqüência e condi-
De preferência utilizar o sistema com menor nú- ção, a hiperdrenagem merece comentário es-
mero de conexões. pecial. Pode apresentar as seguintes situações
clínicas:
Local da Válvula –– Síndrome de hipotensão liquórica: traduzin-
Quando a válvula se localiza entre o cateter ven- do-se por sensação de mal-estar e cefaléia
tricular e o cateter peritoneal, deve ser colocada no quando em posição ortostática ou sentado,
subcutâneo da região retroauricular. Porém há a op- melhorando com o repouso.
ção de ser posicionada na região frontal e passagem –– Síndrome do ventrículo colabado: sintomas
do cateter peritoneal na região à frente do trago, caso relacionados à hipertensão intracraniana15-18.
haja alteração cutânea que não permita a colocação na –– Cranioestenose.
região retroauricular. A conexão da válvula ao cateter –– Hematoma sub ou extradural19-26.
ventricular deve ser atada com sutura e o nó voltado
para o crânio. SEGUIMENTO DOS CASOS OPERADOS
A diminuição dos ventrículos cerebrais pode ocor-
Cateter Peritoneal rer de forma assimétrica, com diminuição do volume
O cateter peritoneal deve ser inserido no abdome, do ventrículo lateral do lado puncionado, em relação
na região do mesogástrio ou periumbilical, tendo-se o ao contralateral27. Essa assimetria ocorre mais fre-
cuidado de suturar a aponeurose dos músculos abdo- qüentemente nos primeiros dois anos após a interven-
minais a fim de se evitar hérnia incisional. O compri- ção. O seguimento após o período de dois anos sem
mento do cateter peritoneal inserido no abdome não a ocorrência de complicação pode ser feito anual­
tem relação com a incidência de complicação, porém mente28. O controle por neuroimagem pode ser por
deve-se inserir o cateter aproximadamente10 de 30 a 40 meio de ultra-sonografia de crânio, quando possível,
cm. A inserção do cateter peritoneal pode ser por tro- cerca de 2 a 4 meses após a cirurgia. Quando a ultra-
carte, guiado por laparoscopia11 ou a céu aberto através sonografia não for possível, realiza-se a tomografia
de uma pequena incisão. O método por laparoscopia computadorizada de crânio. A tomografia de crânio
deve ser empregado quando há dificuldades técnicas, realizada um ano após a cirurgia será o exame de refe-
isto é: na presença de bridas e aderências em decorrên- rência no seguimento do paciente. Assim, o controle
cia de cirurgia ou infecção abdominal prévia. futuro deve ser feito em relação a esse exame, realiza-
do com um intervalo de um ano após a cirurgia29.
Derivação Ventriculoatrial
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
A inserção do cateter ventricular é no mesmo local
1. Michaelis: moderno dicionário da língua portuguesa.
mencionado. A inserção do cateter atrial deve ser feita
São Paulo: Companhia Melhoramentos; 1998, p. 1091.
na veia facial ou na veia jugular externa. Na inserção
2. Youmans JR. Neurological surgery. 4. ed. 1996; v.
do cateter atrial deve-se ter cuidado para a extremi- 2, p. 927.
dade do cateter não ascender em direção ao crânio. A 3. Aschoff A, Kremer P, Hashemi SK. The scientific
correta localização do cateter atrial é na junção cavo- history of hyrocephalus and its treatment. Neurosur-
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tricular deve ser feita com precisão para diminuir os 4. Greenblatt SH. A history of neurosurgery. The
riscos de arritmias cardíacas, formação de trombo ou American Association of Neurological Surgeons.
lesão do músculo cardíaco. Essa inserção é mais bem 1997:345-54.
conduzida com o uso da ecocardiografia transesofági- 5. Menkes JH. Textbook of child neurology. 5. ed. Bal-
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61 – Hidrocefalia

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Monitoração da Pressão Intracraniana
Nelson Saade
José Carlos Esteves Veiga

INTRODUÇÃO A utilidade da monitoração relaciona-se direta-


mente à instalação de medidas terapêuticas específi-

O
s estudos atuais em neurotraumatologia con- cas para as causas da hipertensão intracraniana, sejam
cluem que a morbi-mortalidade não se rela- traumáticas ou não traumáticas, tais como infecções
ciona apenas diretamente à lesão primária1,2. cerebrais, alterações metabólicas (encefalopatia hepá-
Análises post-mortem sugerem que as lesões encon- tica, cetoacidose diabética, envenenamentos) e outras
tradas resultantes de traumatismo cranioencefálico condições clínicas, como pré-eclâmpsia.
são decorrentes de lesões hipóxico-isquêmicas3. Le- A hipertensão intracraniana é a causa mais freqüen-
vantou-se, então, a possibilidade de que a inadequada te de óbito nos pacientes neurocirúrgicos. Quarenta
perfusão cerebral na fase inicial pós-insulto contri- por cento dos pacientes com traumatismo cranioen-
buiria para o aumento da morbidade4-7. Diversos tra- cefálico que se apresentam inconscientes à admissão
balhos demonstram que a manutenção da hipertensão apresentam hipertensão intracraniana, sendo esta a
intracraniana contribui para um pior prognóstico1,8-10. causa em 50% dos óbitos1,9,10,16,19,20.
Estudos não randomizados sugerem que a morbidade O método ideal deve ser simples, preciso, seguro5
e a mortalidade relacionadas ao traumatismo cranio- e preferencialmente de baixo custo. Atualmente esse
encefálico podem ser reduzidas após manobras efeti- método ainda não existe, visto que os métodos de
vas de reanimação e controle precoce da hipertensão maior precisão necessitam de artefatos intracranianos
intracraniana1,8,10,11. Atualmente o foco das atenções e são de custo elevado.
não é somente o controle da hipertensão intracrania-
Apesar de inúmeros estudos, não há um consenso
na, mas a manutenção da pressão de perfusão cere-
sobre a real utilidade da monitoração da pressão intra-
bral, a qual é obtida pela diferença entre a pressão
craniana para o tratamento e prognóstico das doenças
arterial média e a pressão intracraniana (PPC = PAM neurocirúrgicas. As opiniões dividem-se entre aqueles
– PIC)2,3,12. que a julgam indispensável e outros que dizem que
Dentre os benefícios potenciais em se obter uma ela não influencia nos resultados16. A verdade deve re-
medida precisa e contínua da pressão intracraniana pousar entre esses extremos, lembrando que os resul-
inclui-se a possibilidade de detectar aumento dos va- tados dependem da infra-estrutura e treinamento de
lores desta em pacientes sob cuidados intensivos, se- pessoal especializado. No entanto, é inegável tratar-
dados, nos quais os parâmetros clínicos não são aces- se de um recurso importante em auxílio ao tratamento
síveis, permitindo optar pela intervenção terapêutica e controle da pressão intracraniana.
mais adequada e no momento ideal13.
Apesar do desenvolvimento de métodos menos HISTÓRICO
invasivos de monitoração da pressão intracraniana,
permanecem os riscos de infecções, hemorragias e Inicialmente, a pressão liquórica, a partir de pun-
outros, associados a métodos que permitem a coleta ção lombar, foi utilizada como medida indireta da
de dados precisos14-18. pressão intracraniana. Sharpe21, em 1920, publicou
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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

monografia e estabeleceu que a principal indicação res cervicocranianas com TC anormal; (6) paciente
para descompressão subtemporal em casos de trau- em coma com TC anormal e que necessitam de PEEP
ma seria a medida da pressão liquórica acima de 15 (até 5 cmH2O); (7) paciente em coma com exame de
mmHg. Jackson22 defendeu, em 1922, o uso da pun- Doppler transcraniano anormal; (8) tratamento de
ção lombar e a medida da pressão liquórica em trau- ventriculite associada à hidrocefalia pós-traumática.
matismos cranioencefálicos, porém havia desacordo Os critérios para exclusão são: (1) ECGl (Escala de
quanto aos riscos e confiabilidade do método e preci- Coma de Glasgow) = 15, sem sinais ou sintomas,
são da sua correlação com a pressão intracraniana. mesmo com TC anormal; (2) fístula liquórica com dé-
Os trabalhos de Langfitt20,23 foram particularmente bito ou presença de pneumocrânio na TC; (3) lesões
importantes em demonstrar a falta de correlação entre intracranianas com indicação de tratamento cirúrgico
a pressão intracraniana e a pressão liquórica, princi- imediato; (4) lesões por projétil de arma de fogo ou
palmente sob condições de hipertensão intracraniana. por arma branca sem correção acessível da lesão em
A punção ventricular é um dos procedimentos dura-máter; (5) processo infeccioso no sistema ner-
neurocirúrgicos mais antigos, porém seu uso para voso central ou sistêmico, exceto ventriculite com
mensuração da pressão intracraniana era pequeno em hidrocefalia; (6) distúrbios de coagulação ou plaque-
razão do risco elevado de infecções e da inexistência topenia não controlados35.
de manômetros adequados. A Tabela 62.1 demonstra a probabilidade de o pa-
O desenvolvimento de manômetros de tensão per- ciente com traumatismo cranioencefálico apresentar
mitiu mensurar diretamente a pressão intracraniana hipertensão intracraniana durante sua evolução36.
utilizando-se cateter ventricular e transdutor externo.
Os pioneiros no desenvolvimento desse sistema fo-
Tabela 62.1 – Indicações de monitoração associadas
ram Janny24, em 1951, e Lundberg25, em 1960. A par-
ao risco de evolução com hipertensão intracraniana
tir de então, a técnica foi amplamente utilizada, com
variações e desenvolvimentos subseqüentes14,16,26,27. Indicações para monitoração Risco de HIC
Trauma de crânio grave (ECGl 3-8) 
INDICAÇÕES Tomografia alterada 50-60%
A monitoração da pressão intracraniana é parte Tomografia normal 50-60%
Idade > 40 ou PA < 90 mmHg
de uma série de técnicas empregadas em unidades de Postura patológica
neurointensivismo que se complementam e permitem
otimização no emprego de medidas terapêuticas, vi- Tomografia normal 13%
Sem fatores de risco
sando à sua instituição precoce, de forma mais racio-
nal, minimizando-se os efeitos colaterais. Trauma de crânio moderado (ECGl 9-12) 
A principal indicação de seu uso é feita aos pa- Se anestesiado/sedado Aproximadamente 10-20%
cientes com hipótese de hipertensão intracraniana em Tomografia alterada deterioram para TCE grave
tratamento nas unidades de terapia intensiva que se Trauma de crânio leve (ECGl 13-15) 
encontram sedados, intubados e sob uso de drogas
Pouca indicação para Somente cerca de 3%
depressoras do sistema nervoso central, ficando im- monitoração deterioram
possibilitada uma avaliação neurológica completa28.
Temos como exemplos: hemorragia intracerebral
espontânea, hidrocefalia de pressão normal, hemor- TÉCNICAS OPERATÓRIAS
ragia subaracnóidea espontânea, infarto cerebral is-
quêmico29, meningite e encefalite30,31, encefalopatia Os métodos invasivos de monitoração da pressão
hepática32,33, síndrome de Reye34 e, principalmente, intracraniana pressupõem a locação de artefatos intra-
pacientes com traumatismo cranioencefálico, cujas cranianos, podendo ser inseridos no ventrículo lateral,
indicações específicas serão descritas a seguir. nos compartimentos subaracnóideo, subdural ou extra-
As indicações para monitorar a pressão intracra- dural e no parênquima cerebral, conforme Fig. 62.1.
niana em pacientes com traumatismo cranioencefá- O transdutor que converterá as medidas de tensão
lico são: (1) paciente em coma por mais de 6 horas em sinais elétricos poderá localizar-se externamente
ou que necessite de sedação, independentemente dos ou intracraniano, dependendo do sistema adotado.
achados na tomografia de crânio (TC); (2) lesões en- Os transdutores extracranianos comunicam-se com o
cefálicas localizadas pelo volume, área ou desvio das compartimento intracraniano usualmente por meio de
estruturas da linha média, não passíveis de cirurgia um sistema tubular preenchido por fluidos e devem
imediata; (3) lesões encefálicas difusas ou focais em ser nivelados constantemente com a extremidade dis-
pacientes em coma; (4) após tratamento cirúrgico tal do artefato intracraniano. Já os transdutores intra-
em pacientes com sinais e sintomas de hipertensão cranianos, como os que se utilizam de tecnologia de
intracraniana; (5) em pacientes com lesões vascula- fibra óptica, não necessitam de tal procedimento.
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686
62 – Monitoração da Pressão Intracraniana

Fig. 62.1– As localizações demonstradas são, da esquerda


para a direita: subaracnóidea, intraventricular, intraparenqui-
matosa e extradural.

A colocação de cateteres ventriculares requer am-


biente cirúrgico, antissepsia e assepsia, por meio de
tricotomia e utilização de álcool iodado ou clorexe-
dina. O paciente deve estar em decúbito dorsal, com
B
rotação da cabeça no máximo a 15°; a incisão cirúrgi-
ca compreenderá pele, tecido celular subcutâneo e pe-
riósteo, retilínea longitudinal frontal pré-coronariana
(Fig. 62.2), preferencialmente à direita, com cerca de
3 a 4 cm paralela ao plano sagital, cerca de 3 a 4 cm
lateralmente e imediatamente adiante da sutura co-
ronariana, denominado ponto de Kocher (Fig. 62.5).
Procede-se, então, após locação de afastador autostá-
tico de Jansen ou similar (Fig. 62.3), à realização de
orifício único de trepanação (Fig. 62.4) e, se neces-
sário, hemostasia com cera de Horsley, coagulação e
incisão da dura-máter com bisturi e lâmina número
11 (Fig. 62.6), hemostasia com eletrocautério bipo-
lar. Segue-se, então, corticotomia e punção do corno
anterior do ventrículo lateral com o cateter ventricu-
lar orientado de forma perpendicular (Fig. 62.7), em
direção à linha médio-pupilar, introduzindo o cateter
cerca de 5 a 7 cm, teoricamente, ao nível do forame
de Monro e fixando-o por contra-abertura (Fig. 62.8),
para logo após conectá-lo a um sistema de drenagem
ventricular externa e ao transdutor acoplado a mo-
nitor devidamente calibrado26,37. Esse método é tido
atualmente como gold standard, pois permite medi- Fig. 62.2 – (A e B) Preparo do campo operatório e incisão.
das precisas e confiáveis da pressão intracraniana e
da morfologia das ondas de pressão, além de permitir
realização de drenagem liquórica, teste de compla- A técnica cirúrgica para instalação da monitoração
cência cerebral e tratamento com antibioticoterapia utilizando sensor intraparenquimatoso pouco difere
intratecal. As desvantagens do método são: trauma- do que se expôs anteriormente, porém o orifício de
tismo cerebral pela passagem do cateter, hematomas, trepanação para locação deste é marcado na região
dificuldade de punção ventricular, bloqueio do cateter frontal direita ou esquerda, 2 a 3 cm adiante da sutura
e risco de infecções28. Caso não se obtenham bons coronariana, e lateralmente, 2 a 3 cm à linha sagital
resultados após três tentativas de punção ventricular, média, tendo como referência a linha mediopupilar.
deve-se locar o cateter no compartimento subdural ou Leva-se em conta que esses cateteres que se utilizam
intraparenquimatoso, dependendo do tipo de transdu- de tecnologia de fibra óptica devem ser introduzidos
tor utilizado37. até a profundidade de 5 cm no parênquima cerebral.
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687
Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

Fig. 62.3 – Locação do afastador autostático. Fig. 62.5 – Representação esquemática do ponto de Kocher.

Fig. 62.4 – Trepanação no ponto de Kocher.

Para monitoração com utilização do compartimen-


to subaracnóideo, fazia-se uso do parafuso subarac-
nóideo, que tinha como vantagens não lesar o tecido
cerebral, ser utilizado nos casos em que o ventrículo
apresentava dificuldades técnicas para punção e apre-
sentar baixa taxa de infecção, porém atualmente esse Fig. 62.6 – Abertura da dura-máter.
espaço pode ser monitorado com cateteres que utili-
zam sistema de fibra óptica, evitando as desvantagens dos, os valores menos precisos e fidedignos, apesar
relacionadas com o bloqueio do orifício e artefatos à da evolução dos equipamentos utilizados. As princi-
mobilização do sistema38,39. O uso do compartimento pais indicações desse método residem na existência
extradural, assim como o anteriormente descrito, tem de discrasias sangüíneas, como observadas nos casos
sido reduzido, pois apresenta, dentre todos os méto- de falência hepática. As principais dificuldades técni-
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688
62 – Monitoração da Pressão Intracraniana

cas devem-se à inelasticidade da dura-máter e à ne-


cessidade de o transdutor permanecer colinear à dura-
máter, caso contrário as medidas serão falseadas40,41.
Quanto à técnica, obedece à rotina de assepsia e
antissepsia. A localização utilizada pode ser a região
frontal direita ou sobre a maior lesão cerebral, e a me-
dida obtida é igual bilateralmente, mesmo na presen-
ça de lesão unilateral.
Finalmente, tem-se a utilização do compartimento
subdural, cuja técnica segue os preceitos de assepsia
e antissepsia já descritos, porém, quanto ao local de
instalação, podem ocorrer grandes variações, visto
que essa técnica preferencialmente é utilizada para
monitorar a pressão intracraniana após a realização
de craniotomia28.

Fig. 62.7 – Punção ventricular. COMPLICAÇÕES


São descritas diversas complicações, principal-
mente associadas ao método de monitoração da
pressão intracraniana, que utiliza punção e locação
A de cateter no interior do ventrículo lateral28. A prin-
cipal complicação é a infecção, variando de 1% a 5%
e apresentando maior incidência, em especial após o
quinto dia de manutenção do sistema17,38,42-44. Os tipos
de infecção incluem infecção de pele, osteomielite,
meningite, abscesso cerebral e ventriculite. Estudo
realizado demonstrou que a utilização de antibiotico-
terapia profilática prévia à inserção de artefatos para
monitoração da pressão intracraniana não só teve re-
sultados idênticos ao do grupo-controle (sem antibio-
ticoterapia), como apresentou maior taxa de morbi-
dade em decorrência de complicações septicêmicas e
pneumonia45; afirma ainda que, se for utilizada anti-
bioticoterapia, sua duração deve ser restrita ao tempo
de permanência da monitoração.
Os fatores de risco associados à maior incidência
de infecções são15: hemorragia intracerebral com ex-
tensão intraventricular, pressão intracraniana maior
que 20 mmHg, presença de cateter intraventricular
B por mais de 5 dias (o risco de infecção chega a 42%
no décimo primeiro dia)15, intervenção neurocirúrgica
e irrigação do sistema (com o objetivo de desobstru-
ção). Inserção prévia de cateter intraventricular, dre-
nagem de liquor e inserção de cateter intraventricular
(com métodos adequados de assepsia e antissepsia)
em unidade de terapia intensiva não foram fatores as-
sociados à maior incidência de infecção.
As hemorragias intracerebrais representam a segun-
da maior causa de complicação46, podendo ocorrer em
1% a 2% dos casos47,48, geralmente quando associadas
a ventriculostomias ou distúrbios de coagulação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Fig. 62.8 – (A e B) Fixação do cateter por contra-abertura e 1. Marshall LF, Smith RW, Shapiro HM. The outcome
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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

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62 – Monitoração da Pressão Intracraniana

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Cranioplastia Minimamente Invasiva
Celso Agner
Manuel Dujovny
Hen Park
Eimir Perez-Arjona

INTRODUÇÃO niana providenciava uma medida exata do defeito cra-


niano. A principal desvantagem dessa tecnologia era

C
ranioplastia mínima invasiva é a técnica de que, havendo infiltração dural ou subdural, a extensão
reconstrução de defeitos cranianos, feita com da ressecção óssea poderia produzir próteses crania-
mínima exposição da dura-máter ao ambien- nas não uniformes. A reconstrução tridimensional dos
te externo. Como conseqüência da queda do tempo filmes cranianos a partir de cortes finos e a transmis-
operatório, há uma queda significativa da morbidade são do software para estações de trabalho equipadas
associada ao procedimento, reduzindo o número de com CAD/CAM (Computed Aided Design/Computed
visitas ao hospital e revisões de cranioplastias para Aided Manufacture) permitiu um desenho perfeito do
defeitos cranianos grandes. defeito craniano, bem como sua reconstrução, basea-
Múltiplas técnicas foram desenvolvidas. Descreve- da em diferentes vetores de orientação no protótipo.
mos estereolitografia como um método para desenvolver O maior desenvolvimento da estereolitografia em
próteses cranianas pré-fabricadas com ajuste perfeito. medicina ocorreu no início dos anos de 1990, parti-
Correção de defeitos cranianos maiores que 100 cularmente nos campos da neurocirurgia, otorrino-
cm é associada a incidência de infecção, absorção
2 laringologia e cirurgia da cabeça e pescoço2-5. Enge-
e falha cosmética. Conseqüentemente, devem-se de- nharia de materiais foi inicialmente aplicada quando
senvolver métodos para aumentar a reprodutibilidade se desenvolveu a estereolitografia para as indústrias
do defeito anatômico, diminuir o tempo operatório mecânica, automobilística e naval. Resistência a trau-
e permitir menor exposição do cerebro à atmosfera. ma mecânico e temperatura estavam entre os aspectos
Quando todas essas medidas forem atingidas, os re- mais considerados da tecnologia médica incipiente. Cra-
sultados cosméticos serão otimizados. nioplastia para defeitos cranianos maiores que 100 cm2,
A utilização da estereolitografia para a manufatura subseqüentemente, sofreu grande transformação.
de próteses cranianas permitiu queda significativa do
tempo operatório, melhor reprodução do defeito anatô- MATERIAIS E MÉTODOS
mico, principalmente para grandes defeitos cranianos. Ao longo dos últimos 4 anos, seis pacientes em nos-
Estereolitografia foi utilizada, por muitas décadas, sa instituição tiveram cranioplastia com próteses pré-
para a manufatura de componentes automobilísticos, formadas. Fez-se cranioplastia como um procedimento
navais e aeroespaciais. A utilização de programas de tardio semanas ou meses após craniectomias grandes.
desenho permitiu melhor apreciação de contornos di- Os tamanhos dos defeitos cranianos variaram de 100 a
fíceis e o emprego dessa tecnologia em medicina. 180 cm2. Na maioria dessas situações, os defeitos cra-
Próteses cranianas pré-manufaturadas foram uti- nianos estavam situados em áreas nuas do crânio, em
lizadas pela primeira vez em 19891. Empregou-se a regiões com defeitos cranianos irregulares ou difíceis.
descontinuidade do contorno craniano interno no iní- Nessas circunstâncias, cranioplastia precoce acarreta
cio, já que supostamente representava a natureza do morbidade alta, resultados cosméticos pobres e maior
defeito craniano. Tomografia computadorizada cra- taxa de complicações do que a cranioplastia tardia.
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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

A topografia dos defeitos cranianos esta listada na Pró-engenharia


Tabela 63.1.
Essa técnica é utilizada para produzir o implante
final a partir do modelo pela engenharia reversa.
Tabela 63.1 – Topografia dos defeitos cranianos O material protético, mais freqüentemente metil-
Paciente Perído da cranioplastia Área do cérebro metacrilato, foi usado em cinco dos seis casos (em
após a cirugia inicial reparada um caso, utilizou-se cimento de hidroxiapatita). Este
1 3 semanas Temporal é misturado para formar um material macio e fácil
de moldar. A resina é cuidadosamente empacotada
2 2 meses Convexidade frontal
no molde para evitar seqüestro de ar, e as duas meta-
3 3 meses Occipital des (positiva e negativa) são aproximadas e mantidas
4 4 meses Suboccipital em aposição direta. A resina é processada com água
5 5 meses Céu orbitário quente. Processo no forno quente segue a primeira
fase para liberar monômero livre, mantido no inte-
6 6 meses Convexidade frontal
rior do implante. Após polimento e ajuste, o implante
7 7 meses Convexidade frontal final é enviado à sala de operações para esterilização
com gás de óxido de etileno.

Os múltiplos passos utilizados na construção de RESULTADOS


próteses cranianas estão descritos a seguir.
Em todas as situações, as próteses ainda se encon-
travam intactas depois de um ano da cranioplastia,
Estereolitografia não havendo sinais de coleção subdural ou outras
Estereolitografia é a tecnologia na qual o negativo complicações direta ou indiretamente associadas com
do defeito craniano é produzido no computador. Os o procedimento. Em um paciente, houve infecção da
pacientes tiveram as tomografias no GE High Speed prótese após resolução do insulto inicial.
Advantage scanner (GE Medical Systems Inc., Mil-
waukee, WI). A imagem tomográfica é transferida DISCUSSÃO
para um sistema de recoperação portátil (por exem-
plo, DAT) ou por uma rede para a estação principal, Realiza-se cranioplastia por razões cosméticas,
onde a informação é coletada e analisada. antropológicas e médicas. Relatou-se melhora neu-
Depois da aquisição da imagem, um programa es- rológica em pacientes submetidos à cranioplastia.
pecial de CAD/CAM (Surgicad Dallas, TX) é utiliza- Por muitas décadas, a síndrome do trefinado foi re-
do para processar e fragmentar os dados de imagem. lacionada à presença de grandes defeitos cranianos.
O arquivo de imagem resultante é convertido em um Assim que os procedimentos ficaram mais segu-
formato apropriado para estereolitografia, que produz ros, a sobrevivência de pacientes com tais defeitos
um modelo físico do defeito craniano em uma resina tornou-se uma realidade e o fenômeno começou a
foto-curável, que é enviada ao protesista para desen- ser observado mais freqüentemente. Manifestações
volvimento do modelo negativo do defeito craniano. neuropsiquiátricas, cefaléias e sinais neurológicos
focais foram correlacionados a quedas da perfusão
cerebral, mudança da hemodinâmica liquórica ou
Engenharia Reversa combinação de múltiplos fatores que levaram à di-
O processo de desenvolvimento da prótese com minuição do metabolismo cerebral6-8. Cobertura dos
base no modelo negativo do defeito craniano é cha- defeitos cranianos resultou em uma melhora signifi-
mado engenharia reversa. cativa dos sintomas observados no início, primaria-
Aplica-se gesso de moldagem ao modelo de es- mente relacionados ao aumento do fluxo sangüíneo
tereolitografia e molda-se para criar os contornos in- cerebral e, possivelmente, à alteração da anatomia
ternos cranianos. Um molde dessa superfície interna local e alteração da hemodinâmica liquórica local.
(cranio/cérebro) é esculpido em pedra dentária da arte As razões para cranioplastia estão além do foco des-
agregada. O implante final é esculpido em cera den- te capítulo e foram discutidas previamente na lite-
tária, capaz de manter uma forma mais consistente e ratura.
com mais detalhes, utilizados para esculpir o implan- Pode-se realizar cranioplastia de forma intensa
te final. A geometria óssea é cuidadosamente recons- ou tardia. Metilmetacrilato (MMA), hidroxiapatita
truída dessa forma. A segunda parte da pedra dentária (HAC) e osso autólogo foram utilizados no passado,
é colocada, os dois moldes são separados e a cera é com resultados que não necessariamente são reprodu-
removida, deixando o espaço negativo para receber o tíveis e de excelente cosmética3. Aspectos particula-
material de implante final. res do MMA e da HCA são listados na Tabela 63.2.
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63 – Cranioplastia Minimamente Invasiva

Tabela 63.2 – Características das prósteses de MMA e HCA


Materiais Vantagens Desvantagens
Metilmetacrilato (MMA) • Duro e forte • Reação exotérmica
• Carcinogenicidade
• Reação inflamatória
• Dificuldade de remoção
• Não pode ser usado em crânios em crescimento
Hidroxiapatita (HAC) • Reconstrução craniofacial • Resistência limitada ao estresse
• Porosidade • Fragilidade
• Crescimento de tecido • Risco limitado de infecção
• Biocompatibilidade • Dissolve-se em fluidos corpóreos
• Facilidade de utilização • Tamanho deve ser menor que 3 cm

A maioria dos materias disponíveis para cranio- bom material para correções de fossa posterior11,12.
plastia atualmente é de boa qualidade. Em grande Na nossa instituição, mistura de MMA e HCA, em
parte das vezes, depende do discernimento do cirur- adição a outros materiais, contribui para ótimos re-
gião a escolha do material que dará menor incidência sultados clínicos.
de infecções e recorrência. Os custos da manufatura pré-operatória são direta-
Em 1992, Costantino relatou sua experiência na mente relacionados ao tempo gasto na máquina de es-
manufatura de próteses para cranioplastia com HAC9. tereolitografia. Quanto maior for o tempo, maior será
As qualidades requeridas para uma boa cranioplastia o preço, de forma que defeitos complexos requerem
são relatadas no Quadro 63.1. mais tempo e custam mais.
A estereolitografia é utilizada em situações nas quais
Quadro 63.1 – Características de cranioplastias perfeitas o osso autólogo não está disponível. A escolha correta de
• Ajuste preciso materiais é crucial para resultados excelentes no final.
• Restauração da continuidade craniana
• Barreira de pressão entre atmosfera/cérebro REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
• Resistência a infecção
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Cranioplastia tardia ocorre após resolução do ata- 2. Andrews JC, Mankovich NJ, Anzai Y, et al. Stereo-
que inicial. Pode-se proceder à cirurgia para tais defei- lithographic model construction from CT for assess-
tos de duas formas: (1) aplicação de MMA à área do ment and surgical planning in congenital aural atre-
defeito craniano; (2) desenvolvimento pré-operatório sia. Am J Otol. 1994;15:335-9.
da prótese craniana utilizando MMA, HAC ou uma 3. Foroutan M, Fallahi B, Mottavalli S, et al. Stereoli-
combinação de ambos. Recentemente, Costantino et thography: application to neurosurgery. Critical Re-
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mais precisos e rápidos, permitiu a manufatura de applications of stereolithographic cranial models.
Technik und Anwendungsmoglichkeiten der stereo-
próteses mais exatas. A estereolitografia é importante
lithographischen Schadelmodellherstellung. Fortschr
para situações de defeitos cranianos grandes, em que Kiefer Gesichtschir. 1994;39:19-22.
a maioria das outras técnicas falham. 6. Dujovny M, Agner C, Aviles A. Syndrome of the tre-
Defeitos cranianos da fossa posterior são parti- phined: theory and facts. Critical Reviews in Neuro-
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configuração anatômica não permite uma reconstru- 7. Dujovny M, Aviles A, Agner C, et al. Cranioplasty: cos-
ção adequada e eficiente. metic or therapeutic? Surg Neurol. 1997;47:238-41.
Na reconstrução de defeitos cranianos grandes, o 8. Dujovny M, Fernandez P, Alperin N, et al. Post-cranio­­
prognóstico a longo prazo está diretamente relacio- plasty cerebrospinal fluid hydrodynamic changes:
nado às características da prótese craniana. MMA, magnetic resonance imaging quantitative analysis.
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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

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Monitoração Neurofisiológica
Intra-operatória
Silvia Mazzali-Verst
Tae Mo Chung
Andréa Sucena

O
uso da monitoração neurofisiológica intra- Atualmente, com a utilização da estimulação elé-
operatória (MNIO) tem-se mostrado uma trica transcraniana, a via motora descendente pode ser
poderosa ferramenta auxiliar nas neurocirur- estudada pela obtenção de potenciais motores muscu-
gias e cirurgias ortopédicas que trazem risco ao tecido lares ou do registro diretamente sobre a medula espi-
neurológico envolvido ou adjacente à patologia. Tem nhal por meio da onda D (direta). Nos casos em que
ainda um cunho didático, na medida em que os atos se realiza craniotomia sobre a área motora, utiliza-se
dentro do procedimento cirúrgico acarretam alteração uma estria de eletrodos siliconados que possibilita
nos registros neurofisiológicos, permitindo a correla- uma estimulação cortical direta com baixa voltagem.
ção entre a ação e a reação. Por ser o registro em tem- Os potenciais somatossensitivos (PESS) são obti-
po real, muitas vezes, os atos danosos ao tecido po- dos para o estudo do funículo posterior da medula es-
dem ser revertidos, evitando-se um dano permanente. pinhal, tronco cerebral e córtex sensitivo. A obtenção
Existem, ainda, situações nas quais se pode prever, dos potenciais N20 e P37 depende do regime anesté-
com muita exatidão, se haverá déficit pós-operatório sico, sendo os potenciais subcorticais mais estáveis,
imediato e se ele será definitivo ou não. porém necessitam de maior número de promediações,
A história da MNIO mudou completamente entre o que torna sua obtenção mais demorada. Técnica es-
o final da década de 1970 e a década de 1980, quan- pecífica de PESS possibilita a identificação segura do
do as vias acústicas, sensoriais e motoras se tornaram córtex sensitivo e motor nos casos de tumores adja-
passíveis de monitoração. A partir dessa época, foram centes a essas áreas, que provocam deformação nos
sugeridos os critérios de anormalidade da função do sulcos cerebrais (Fig. 64.1).
tecido nervoso e vencidas as primeiras dificuldades
com relação ao ambiente cirúrgico inóspito ao regis-
tro dos potenciais e às limitações anestésicas. Foram
feitas as primeiras correlações entre o ato cirúrgico
– coagulação, uso de retratores de tecido, isquemia,
alterações dos dados vitais, como pressão arterial,
temperatura corporal e drogas anestésicas e altera-
ções neurofisiológicas.
O grande desafio sempre foi tornar a função mo-
tora “monitorável”, pois a utilização da estimulação
magnética transcraniana resultava em potenciais in-
fluenciados pelo deslocamento e/ou aquecimento da
bobina. O tamanho da bobina impedia seu correto
posicionamento em cirurgias cranianas. O uso da es-
timulação elétrica, nos parâmetros então conhecidos,
era potencialmente epileptogênico. Fig. 64.1 – Mapeamento da área motora.
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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

O potencial evocado auditivo é utilizado quando medula espinhal e a ativação de um potencial motor
há abordagem do nervo coclear e ainda há função muscular (PEMm). Essa via, por ser polissináptica,
auditiva remanescente; e também em cirurgias para é sensível à ação de anestésicos e requer a não-utili-
tumores de tronco cerebral. zação de bloqueadores neuromusculares pós-indução
A estimulação nervosa direta permite a identifica- anestésica.
ção de feixes de nervos periféricos, do plexo braquial, Os pontos para estimulação cortical correspondem
de nervos cranianos e de seus núcleos motores em se aos do sistema 10-20 do eletroencefalograma (EEG)3
tratando do tronco cerebral. e são utilizados eletrodos de inserção angulados em
A eletromiografia contínua identifica atividade ir- forma de saca-rolhas. O trem (seqüência) possui de 3
ritativa que pode se seguir à manipulação de nervo, a 9 pulsos, com duração de 50 ms a 1 ms, com interva-
raiz e núcleo motor. lo entre os pulsos de 2 a 4 ms, e intensidade variável
O eletroencefalograma permite avaliar o nível de em corrente contínua ou amperagem4.
depressão anestésica, focos epileptogênicos e, duran- São estudados PEMm nas quatro extremidades
te a ressecção cirúrgica destes focos, avalia a exten- simultaneamente ou de forma sucessiva direita e es-
são da ressecção e previne a retirada de tecido nervo- querda, se necessário. São consideradas as variações
so normal. A eletrocorticografia acompanha algumas de latência e amplitude, sincronia e intensidade do
técnicas de mapeamento cortical1. estímulo necessário para a obtenção do potencial. Po-
O grande trunfo da MNIO é o emprego conjunto rém, o dado mais importante é a presença ou ausência
dessas técnicas, utilizadas alternadamente de forma do potencial ao longo da cirurgia.
compatível com cada momento da cirurgia, produzin- Em cirurgias de tronco cerebral, fossa média e ân-
do grande quantidade de informações sobre a função gulo pontocerebelar são acrescentados ao estudo mús-
neurológica imediatamente. Para o melhor aproveita- culos inervados pelos pares cranianos relacionados ao
mento dessas informações deve haver uma interação nível da patologia5,6. Em cirurgias medulares e radicu-
entre o cirurgião, o neurofisiologista e o anestesista, lares, acrescentam-se, ainda, músculos dos miótomos
para que haja a correta correlação entre o ato operató- correspondentes aos níveis abordados (Fig. 64.4).
rio, a estrutura anatômica sob risco, os dados neurofi- A percentagem de obtenção e de constância dos
siológicos e os sinais vitais do paciente.
potenciais motores ao longo da cirurgia é de 97,4%, o
A utilização da MNIO não retarda o início e nem que traduz a eficácia do método7.
prolonga a duração da cirurgia. A colocação de eletro-
A obtenção do potencial epidural onda D (direta)
dos e a preparação do paciente são feitas concomitan-
é independente do regime anestésico por não apre-
temente à atuação do anestesista e de forma integrada
a este. Quando o paciente estiver pronto do ponto de sentar sinapse. O neurônio motor superior estimula-
vista anestésico, o neurofisiologista já estará apto a do por 1 a 2 estímulos, desencadeia 1 a 2 respostas
fazer os primeiros registros. O material empregado descendentes, respectivamente, que são captadas di-
não atrapalha o campo cirúrgico e a equipe de moni- retamente sobre o trato corticoespinhal descendente.
toração pode permanecer afastada do paciente (Fig. Esse estudo é complementar à obtenção dos PEMm e
64.2). De fato, por conferir segurança ao cirurgião, a a análise conjunta de ambos permite traçar, com gran-
MNIO pode diminuir o tempo total de cirurgia, uma de segurança, o prognóstico motor pós-operatório8. A
vez que, não havendo alteração nos registros, o ci- variação na amplitude da onda D está diretamente
rurgião pode prosseguir tranqüilamente. Nos casos de relacionada à quantidade de fibras descendentes ínte-
tumores, está comprovado que a utilização da moni- gras, sendo uma queda de até 50% na sua amplitude,
toração aumenta a quantidade de massa ressecada, o tolerável. A partir daí, espera-se déficit motor pós-
que pode influir diretamente na sobrevida1,2. operatório (Tabela 64.1).
Em cirurgias de tronco cerebral no assoalho do
ESTIMULAÇÃO ELÉTRICA quarto ventrículo, a identificação dos núcleos motores
dos pares cranianos pode ser efetuada com estimula-
TRANSCRANIANA ção monopolar e registro em músculos inervados por
A estimulação elétrica transcraniana (TES), através eles. Esse mapeamento ajuda a identificar a zona si-
de um trem de pulsos, permite a ativação dos neurô- lenciosa, área segura na qual pode ser feita incisão
nios piramidais mais profundos do córtex motor e sua tecidual1,4 e já identificou padrões de deslocamento
condução descendente pelo trato corticoespinal até o dos núcleos de acordo com a localização da massa
neurônio motor inferior (Fig. 64.3). Se a intensidade tumoral2. A utilização de registro pela eletromiografia
da estimulação for suficiente, haverá a despolarização continua alerta sobre a proximidade dos núcleos du-
dos neurônios motores inferiores no corno anterior da rante a ressecção tumoral (Fig. 64.5).

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64 – Monitoração Neurofisiológica Intra-operatória

A B

C D

Fig. 64.2 – (A) Tumor de asa do esfenóide. (B) Paciente preparado. (C) Equipe de monitoração. (D) Primeiros registros*. (E)
Resultado pós-operatório. * Linhas verde e vermelha = PESS das quatro extremidades; linhas amarelas = PEM das quatro extre-
midades, III, IV, V e VI pares cranianos.

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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

Estimulação elétrica transcraniana


Registro epidural

Onda D
Estímulo único

Cz
C2 C1

C4 C3 Registro muscular
6 cm
Trem de 5 pulsos

4 ms

Fig. 64.3 – Fisiologia da estimulação elétrica transcraniana e dos potenciais resultantes.

PAM = 4,3 PAM = 9,8

Fig. 64.4 – Variação nos registros de PEMm em músculo tibial anterior, com a variação de pressão arterial média (PAM) em
criança do sexo masculino, 8 anos, com astrocitoma na transição cérvice-medula oblonga.

Tabela 64.1 – Correlação dos achados de PEM muscular e onda D e déficit pós-operatório
Registro
Onda D Inalterado Inalterado ↓↓ a partir de 50% amplitude
PEM muscular Inalterado ↓↓ amplitude/ ausência ↓↓ amplitude/ausência
Déficit Ausente Paresia transitória Plegia prolongada

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64 – Monitoração Neurofisiológica Intra-operatória

A B

C D

Fig. 64.5 – Paciente do sexo feminino, 17 anos, com perda auditiva à direita – 50% de discriminação da fala a 70 dB.
(A) Tumor do ângulo pontocerebelar. (B) Atividade irritativa do VII nervo durante manipulação tumoral, com concomitante
queda da amplitude do PEMm, VII nervo. (C) Déficit pós-operatório imediato. (D) Seis meses de pós-operatório com 90% discri-
minação da fala a 70 dB.

POTENCIAL EVOCADO SOMATOSSENSITIVO ração de função auditiva remanescente e de tronco


cerebral. O estímulo de alta freqüência e intensidade
O mapeamento indireto da área motora é realizado visa apenas identificar a onda V e acompanhar suas
com a utilização de PESS, com estimulação do nervo eventuais alterações8-11.
mediano ou ulnar contralateral. A estria de eletrodos é
alocada sobre o córtex sensorial e motor e é identificado
o ponto de inversão da onda N20/P25, que corresponde POTENCIAL EVOCADO VISUAL
à área motora. A partir daí, o ponto com melhor resposta
Existe muita controvérsia na literatura a respeito
motora sobre o membro superior ou inferior contralateral
é estimulado durante toda a ressecção tumoral adjacente. da correlação entre os achados de potencial evocado
por estimulação com flash e as alterações intra-opera-
tórias de nervo óptico. Isso porque existem situações
POTENCIAL EVOCADO AUDITIVO em que, apesar de não se registrar atraso ou queda de
Tem como objetivo a estimulação do nervo audi- amplitude no potencial P100, o paciente evolui com
tivo ipsilateral à intervenção cirúrgica, para monito- déficit visual imediato no pós-operatório8,12.
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701
Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

A estimulação se justifica, no entanto, pois há ca- ção. Seu efeito inibidor sobre o potencial motor, mais
sos em que a manipulação do nervo óptico, ou próxi- evidente com os halogenados e menos com o óxido
mo a ele, acarreta alterações de P100 imediatas, o que nitroso, pode ser parcialmente atenuado pela utiliza-
alerta o cirurgião para o risco de lesão. ção do trem de múltiplos pulsos, com intervalo de 2 a
5 ms entre eles5,11,13,14.
ELETROENCEFALOGRAMA Os opióides apresentam um efeito mínimo sobre
os potenciais corticais motores e somatossensitivos.
Tem como objetivo permitir uma melhor avalia- Geralmente são associados ao propofol na forma de
ção do efeito hipnótico das drogas utilizadas. A mo- infusão contínua. O etomidato, outra associação po-
nitoração do estado anestésico permite que se detecte sitiva, pode aumentar a amplitude dos potenciais re-
a possibilidade de o paciente despertar antes que isso gistrados. Outras drogas que facilitam a MNIO são a
ocorra durante o procedimento, avaliando-se o nível quetamina e o droperidol.
anestésico que pode variar de hipnose leve até chegar Tanto quanto possível, deve-se evitar o emprego
a uma supressão da atividade elétrica cerebral. de barbitúricos e benzodiazepínicos.
Em cirurgias de epilepsia, pode-se mapear a zona epi- Os bloqueadores neuromusculares devem ficar res-
leptogênica por meio da eletrocorticografia – EcoG (Fig. tritos ao período de indução anestésica e entubação.
64.6) – para indicar uma ressecção mais focal, evitando Apesar de serem descritas técnicas de controle do ní-
a retirada de tecido normal, poupando as vias e estruturas vel de bloqueio, a queda da amplitude dos PEMm não
anatômicas que não fazem parte da “epileptogênese”. é linear a esses testes14. Em pacientes que já apresen-
Podem-se utilizar também eletrodos de profundi- tam déficit motor, nos quais a amplitude dos PEMm
dade (subtemporal), que indicarão qual o nível da le- é reduzida, o conseqüente efeito inibitório sobre as
são, ajudando, assim, a limitar as ressecções e preser- placas mioneurais pode tornar as respostas inconsis-
vando o máximo de função sem abdicar do controle tentes e não monitoráveis. Além disso, em cirurgias
das crises. nas quais a identificação de atividade nervosa/ radicu-
lar irritativa é importante, o bloqueio neuromuscular
pode torná-la impossível.

CONTRA-INDICAÇÕES E COMPLICAÇÕES
Não há contra-indicações absolutas para a rea-
lização desse procedimento, porém pacientes com
histórico de epilepsia e crises convulsivas e de esti-
muladores implantados – marca-passo ou estimula-
Fig. 64.6 – Eletrocorticografia. dores profundos muito próximos do campo de esti-
mulação –, devem ter a TES suspensa imediatamente
MNIO E ANESTESIA caso apresentem algum problema. Contra-indicação
relativa inclui, ainda, pressão intracraniana elevada e
Deve haver uma grande interação entre o aneste- clipes vasculares9.
sista e o neurofisiologista. São inúmeras as situações Crise convulsiva e arritmias cardíacas inexplicá-
em que a atuação do primeiro interfere diretamente veis durante o procedimento devem acarretar sua sus-
nos registros do segundo e vice-versa4. Fatores fisio- pensão imediata.
lógicos, como pressão arterial, temperatura corporal, Pode ocorrer queimadura da área de estimulação
PCO2, fluidez do sangue e pressão intracraniana afe- elétrica, mordedura de língua e lábios pela contração
tam diretamente a função do sistema nervoso central. da musculatura mastigatória durante a estimulação
Associe-se a isto a ação dos anestésicos sobre as si- transcraniana, hematoma no ponto de inserção do ele-
napses e a condução axonal e o resultado final pode trodo de agulha e crise convulsiva (com estimulação
ser a abolição ou alteração dos potenciais8. direta do córtex).
Em ordem decrescente, os potenciais auditivos
são os menos afetados pela anestesia, seguidos dos REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
somatossensitivos, motores e visuais5. Quanto maior
o número de sinapses da via, maior a suscetibilidade 1. Berger MS et al. Brain mapping techniques to maxi-
maze resection, safety, and seizure control in children
aos anestésicos. with brain tumors. Neurosurgery. 1989;25(5):786-92.
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ser administrado de forma contínua e endovenosa, potentials monitoring for brain tumor resection. Neu-
evitando-se bolus (injeção em grande volume). Os rosurgery. 2001;48(5):1075-81.
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venosos, devem ser empregados em baixa concentra- twenty electrode system of the international federa-
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702
64 – Monitoração Neurofisiológica Intra-operatória

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Endoscopic Endonasal Approach for
Treatment of Pituitary Adenomas
Edward R. Laws
Paulo Henrique Pires de Aguiar
Anne E. Getz
Peter Hwang

INTRODUCTION Recently, however, discussions regarding the most

T
effective and least invasive way to perform pituita-
he evolution of transsphenoidal approaches has
ry surgery have been renewed. Attempts to improve
culminated in the endoscopic endonasal mini-
surgical outcomes, reduce the incidence of complica-
mally invasive approach. Technological advances,
such as improved endoscopic optics, cameras, moni- tions, and hasten the patient’s post-operative recovery
tors and instrumentation and the development and re- have led to the development of a minimally invasive
finement of image guidance, confirmed this paradigm. endoscopic transsphenoidal approach to remove pi-
The transseptal transsphenoidal approach came to be tuitary adenomas23-30. Developments in the field of en-
the procedure of choice for the surgical management doscopic surgery have prompted surgeons to attempt
of most pituitary lesions. Transcranial techniques were endoscope-assisted surgery of the pituitary gland via
reserved for use in the resection of large tumors with the traditional transseptal approach.
extensive parasellar and suprasellar invasion. Early reports using this technique highlighted the
Significant advances in the recognition and mana- endoscope’s superior visualization over the operating
gement of pituitary adenomas have occurred over the microscope, and have suggested that this minimally
last decade1,2. Highly sensitive hormonal assays and invasive technique allows for more complete tumor re-
magnetic resonance imaging with gadolinium enhan- section, and a reduced incidence of complications31-43.
cement have led to earlier and more frequent diagno- Recently, several centers have adopted an endos-
sis of pituitary adenomas1,2. copic transnasal-transsphenoidal procedure as an al-
The microscopic transsphenoidal approach for pi- ternative to the microscopic approach. However, the-
tuitary tumors has demonstrated excellent results with re have been very few endoscopic series to document
minimal morbidity and almost no mortality; and has the results of this procedure26,40.
become the therapy of choice for the majority of pi- In this paper, we describe our surgical technique and
tuitary adenomas1,3-12. Continued attempts to improve nuances in using endocopic endonasal transsphenoidal
surgical outcomes, reduce the incidence of complica- approach for the treatment of pituitary adenomas.
tions, and hasten the patient’s post-operative recovery
have led to the development of a minimally invasive TECHNIQUE
endoscopic transsphenoidal approach to remove pi-
tuitary adenomas. Indications
The modification of Hirch’s original endonasal Indications for fully endoscopic pituitary surgery
rhinoseptal route13-16 was first proposed by Griffth are identical to those for the traditional transseptal-
and Veerapen in 198717. It avoids an anterior nasal or transsphenoidal microscopic approach.
sublabial incision and dissection of the anterior sep-
tum, and limits the dissection to the posterior nasal
septum. This approach is better tolerated, with less Instrumentation
postoperative pain, than the more traditional subla- The instrumentation used in the endoscopic techni-
bial or rhinoseptal routes18-22. que includes a cold light source, an endoscopic video
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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

camera and a digital CD/DVD recorder. The endosco- ferior nasal corridor. Next, a Freer elevator is used to
pes are 0°, 30° and 45°, 4 mm in diameter and 18 cm displace the middle and superior turbinates laterally
long. A cleaning system with pedal control is used in (Figs. 65.1 and 65.2). A long straight suction devi-
order to reduce the necessity of extracting the telesco- ce may also be introduced to clear the nose of any
pe each time visualization is impaired by blood or de- blood or mucoid secretions. As the nasal passage is
bris. A mechanical holder for the endoscope may be widened, the endoscope is advanced further poste-
utilized to allow the neurosurgeon use of both hands, riorly. The lateral dislocation of the middle and supe-
however, but we prefer the two surgeon technique in rior turbinates allows the localization of the spheno-
which the otolaryngologist actively drives the scope ethmoidal recess and natural ostium of the sphenoid
during surgical resection. This collaboration is advan- sinus. Ultimately, the sphenoid ostia and the anterior
tageous in that it allows for a more dynamic resection wall of the sphenoid sinus are exposed, marking the
in which the endoscopist can actively assist by mo- extent of the intranasal dissection (Figs. 65.3 to 65.5).
difying the view as needed for optimal visualization, The opening of the sphenoid sinus starts with a me-
maneuvering the endoscope for increased ease of ins- dial and inferior enlargement of the natural ostium,
trument insertion, and efficiently utilizing the angled with a Kerrison or a Stammberger punch. The muco-
endoscopes to inspect completeness of resection. The sal lining of the anterior wall of the sphenoid sinus
camera zoom permits better definition of anatomical and posterior septum is dissected away from the bone
features and the positioning of the endoscope further to avoid disruption of the septal branch of the sphe-
away from the surgical field reduces the possibility of nopalatine artery and resultant epistaxis. Resection of
contamination of the tip of telescope by blood. the anterior wall of the sphenoid, the mucosal lining
The surgeon should have endoscopes of varying of the sinus and the floor of the sella (back wall of the
diameters and length available, and must improvise sinus) proceeds under endoscopic visualization (Figs.
intra-operatively depending upon the intranasal and 65.6 and 65.7). Currently, we advocate not routinely
skull base anatomy of the patient. resecting the mucosal lining of the sinus, because lea-
ving it in place allows for improved healing. In cases
Technique of Standard Endoscopic of difficult exposure of the sphenoid ostium, the entry
point to the sphenoid sinus may be obtained through
Transsphenoidal Approach a direct perforation of anterior wall at junction of the
Surgery is carried out under general anesthesia keel of the sphenoid bone and the posterior nasal sep-
using orotracheal intubation. The patient is placed in tum approximately 1.5 cm above the rim of choana
a supine position in gentle reverse Trendelenberg with and close to the septum. The preferred method is to
his or her head turned towards the right facing the sur- proceed with the identification of both sphenoidal os-
geon. The head may be resting freely in a horseshoe tia. After the sphenoidotomies are performed with the
head holder, or fixed in a three pin holder (Mayfield), Stammberger punch and Kerrison rongeurs, a poste-
if we use a navigation system. In our department we rior septectomy is performed. A Freer elevator is used
use the Medtronic Stealth TR navigation system (Ja- to make a through and through incision in the septum
cksonville, FL, USA). approximately 2 cm from the rostrum. The posterior
After general anesthetic is administered, bilateral septum is then resected and the sphenoid rostrum be-
transoral greater palatine foramen injections with 1.5 tween the sphenoidotomies removed. The surgical
cc 1% lidocaine with 1:200,000 epinephrine per side instruments are passed through the nostril, below the
are performed. This results in vasoconstriction of the shaft of the endoscope, and into the surgical field to
sphenopalatine arteries bilaterally and decreased ble- gain access to the sphenoid sinus and sella turcica.
eding in the posterior nose. We may proceed under The same principles of awareness of the limits of dis-
endoscopic guidance to inject the nasal mucosa of section apply. Injuries to the cavernous sinuses, caro-
the septum and middle turbinates with a 1:200,000 tid arteries, optic nerves and chiasm are still possible
epinephrine solution to induce vasoconstriction ho- if caution is not exercised while working within the
wever we prefer to insert topical pledgets soaked in sinus or sella (Figs. 65.6 and 65.7). The sella is remo-
1:1000 epinephrine between the nasal septum and ved with a pituitary rongeur or chisel depending on
middle turbinates for decongestion. We routinely the thickness of the bone.
dye the 1:1000 epinephrine on the field with a flu- After dural opening the pituitary adenoma is re-
oroscein strip to indicate topical use only and avoid moved with combined use of curettes and aspiration
inadvertent injection, which can have grave conse- (Figs. 65.8 to 65.10). Subsequently either the ope-
quences. ning of the medial wall created by the tumor is used
A zero degree endoscope is used to visualize the to enter the medial compartment of the cavernous si-
nasal cavity. A Boise elevator is used to out-fracture nus or an incision of the medial wall is performed in
the inferior turbinates if necessary to increase the in- a safe area30.
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65 – Endoscopic Endonasal Approach for Treatment of Pituitary Adenomas

Fig. 65.1 – The surgical endoscopic view shows the sepa- Fig. 65.4 – The nasal septum is dissected and in the depth is
ration between the nasal septum (2) and middle nasal turbine possible to see the both sphenoid ostia enlarged.
or concha (1) with a dissector, we identify the choana (3) and
about 1.5 cm superiorly the sphenoidal ostium can be visuali-
zed, and thus enlarged with small Kerrison.

Fig. 65.2 – Drawing show the structure of nare. CI = inferior Fig. 65.5 – Drawing shows the sphenoid ostia enlargement
turbinate; CM = middle turbinate. (OS) by small Kerrison (KR) and median septum (SM).

Fig. 65.6 – The surgical endoscopic view shows, after ope-


ning the sphenoidal sinus the median keel of sphenoid (1),
sometimes prominent as in this case, are the sphenoid planum
Fig. 65.3 – After enlarging both sphenoid ostia, with a Freer (2), floor of sella turcica (3), left and right carotid prominences
elevator is used to perform a posterior septectomy. (4), clivus (5).
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707
Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

Fig. 65.10 – After radical removal of the tumor, the diaphragm


can become visible, and care is taken to avoid opening it.
Fig. 65.7 – Drawing shows the sphenoid ostia (OS) bilate-
rally and the sphenoid kwel and median septum (SM). After the removal of tumor hemostasis is obtained
using Gelfoam cotton packing; free hand exploration
into the surgical field with angled 30° and 45° optic
scopes is recommended to localize and remove any
residual tumor. The surgical cavity is packed with
Gelfoam, after that fat in inserted in the tumor cavity
if a CSF leak was encountered during resection (Fig.
65.11). If no CSF leak is present, fat obliteration of
the sella is unnecessary. The sphenoid sinus may also
be packed with fat, Gelfoam, and fibrin or thrombin
glue, and the floor of sella is closed using a graft si-
milar such as, polytetrafluoroethylene plate or bone
(Fig. 65.12).. If a CSF leak is detected or suspected
autologous fat is applied in the sellar cavity and the
dura may also be closed with a turbinate-derived mu-
coperiostal graft. Lumbar external drainage may be
useful in cases with suspected CSF leak.
Fig. 65.8 – After the opening of the sella floor we enlarge Computer assisted navigation and a microdoppler
the lateral anterior superior limits with small Kerrinson ron- may be used when removing tumors from the caver-
geur. The sella dura can be widely exposed. nous sinus30.

Fig. 65.9 – After dural opening the tumor is removed in Fig. 65.11 – Fat is inserted inside the tumor cavity.
piecemeal fashion with a pituitary curette and with a 90° dis-
sector the spaces between the dura and the gland and between
the tumor and gland are also developed.
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65 – Endoscopic Endonasal Approach for Treatment of Pituitary Adenomas

resection7,35,46,52,53,. These new technologies provided


the transsphenoidal approach with significant advan-
tages over the transcranial procedure. The improved
visualization allowed for more complete tumor re-
moval, and reduced the incidence of complications.
In the ensuing 40 years several large series have es-
tablished the transsphenoidal approach as the proce-
dure of choice for all but the most massive pituita-
ry adenomas, demonstrating outcomes equivalent
to or better than those reported for the transcranial
procedure, with fewer complications1,4-9,11,12,31,58-61.
The use of rigid endoscopes for sinus surgery provi-
ded the inspiration for their application to pituitary
surgery1,5,6,10. Isolated reports of the use of endoscopes
to remove pituitary tumors appeared in the literature
Fig. 65.12 – An absorbable (polytetrafluoroethylene) plate as early as the 1970’s62. However, it wasn’t until the
is inserted to close the sellar floor. early 1990’s that technologic advances in optics, digi-
Summarizing the technique, Frank and Pasquini30 tal cameras, light sources, holding arms, and monitors
divided the functional endoscopic pituitary procedure have allowed endoscopes < 5 mm to provide high-
into 3 stages (Frank): stage I – localization of sellar quality panoramic exposure that surpasses the visu-
wall, stage II – adenectomy and stage III – final ex- alization provided by operating microscopes38,40,49.
ploration and closure of surgical field. Spencer compared and quantified the exposure pro-
vided by the 0° endoscope vs. the operating micros-
cope63.
DISCUSSION
In 1992 Jankowski provided the first description
Historical Aspects of fully endoscopic transnasal-transsphenoidal te-
chnique34. Since then experience with this approach
Horsley is credited with performing the first ope-
has for the most part been limited to a few subspe-
ration for a pituitary tumor in 1889 using a transcra-
cialty centers, while outcomes data for patients un-
nial approach44-46. In 1906 Schloffer reported the first
dergoing this procedure are just beginning to be
removal of a pituitary tumor through an extracranial
reported31,33,37,40,55,64,65.
transsphenoidal approach7,46,47. Hirsch later modified
this approach in 19097,46. In 1912, Cushing48 descri- Jho et al.40, in 1997, published a series of 44 trea-
bed the transseptal transsphenoidal approach to the ted pituitary adenomas along with a review of several
sella turcica. Guiot and Hardy49-52 refined the techni- other small series and suggested that in addition to
que and added intraoperative fluoroscopic guidance providing more complete tumor removal, the endos-
and the use of the surgical microscope. It wasn’t until copic technique may also result in a lower incidence
the late 1950’s when Guiot, who learned Cushing’s of complications related to blind dissection31,33,37-40,65.
transseptal-transsphenoidal method from Dott, rein- Currently endoscopic surgery is a safe and accep-
troduced this approach7,46,53. Guiot improved the ted method of sinus surgery23-29. Stankiewicz66,67 had
transsphenoidal approach with the addition of intra- described an endoscopic approach to the sphenoid si-
operative fluoroscopy to guide the insertion of instru- nus, and Gilain et al.68 described the results of endos-
ments into the sella, allowing for safer and more com- copic surgery for inflammatory, infectious, and poly-
plete tumor removal. Since then, this approach has poid conditions of the sphenoid sinus. Building on this
become the standard for lesions of the sella and those experience, otolaryngologists have reported pituitary
extending to the midline in a suprasellar direction. tumor resection aided by endoscopic techniques34,69,70,
The complications of the approach are well described even in children harboring skull base tumors.
and include septal perforation, septal deviation, tea- Catapano et al.71, through an anatomical study in
ring of the nares, persistent nasal discharge, recurrent 5 formalin fixed, silicone-injected adult cadaveric
nosebleeds, tooth analgesia, asymmetry of mucosal heads believed that an adequate exposure of the sellar,
contour, devitalization of the pulp of the anterior tee- suparsellar, and infrasellar/upper clival regions could
th, sinusitis, and mucocele, among others7,46,49,50,54-57 be achieved via a simple, direct endonasal approach.
It was Hardy, however, who deserves much of From a direct endonasal route, there is a preferential
credit for reestablishing the validity of the transs- visualization of the structures contralateral to the
phenoidal approach, when in the 1960’s he combi- approach. The endoscope affords a more panoramic
ned fluoroscopy and microsurgical techniques to view that extends the area covered by the operating
further augment transsphenoidal pituitary tumor microscope.
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Parte 9 – Avanços Técnicos em Neurocirurgia

Kassam et al.72 demonstrated that it is quite possi- Technique of Sellar Closure in the
ble and safe to perform a fully endoscopic expanded Endoscopic Endonasal Approach
endonasal approach to treat skull base lesions in pe-
diatric patients. The role of reconstruction of the sella turcica after
transsphenoidal surgery is a matter of some debate. In
the reconstructive matrix, the role of reconstructing
Endoscopic Technique the sellar dura has also been discussed. Many tech-
The safety of the approach described requires that niques for reconstruction have been attempted. As
the surgeon identify the posterior middle turbinate suggested by Hardy and Vezina53 in his classic des-
and the ostium of the sphenoidal sinus located in the cription, most neurosurgeons have used muscle, fat,
sphenoethmoidal recess between the septum and the or fascia lata to reconstruct the sella, with a piece of
superior turbinate. Care must be taken to identify nor- nasal bone or nasal cartilage to support these grafts.
mal intrasphenoidal anatomical landmarks74 and to be The surgical cavity may be packed with Gelfoam, if
cognizant of the positions of the optic nerves and ca- there is no CSF leak. The sphenoid sinus may also
rotid arteries at all times. Angled endoscopes allow be packed with fat, Gelfoam, and fibrin or thrombin
the surgeon added panoramic visualization. Entry to glue. The floor of sella is closed using a graft such as
the sphenoid sinus can also be accomplished directly Porex (Porex, München, Germany) or bone. The Po-
through the anterior wall of the sphenoid or via the rex is a sterile, off-white, moist, tough but flexible flat
ethmoidal bulla and sinus if the anatomy of the na- sheet of polyethylene dural substitute which provides
sal cavity, previous nasal surgery, or other limitations a safe and effective adjunctive method for reconstruc-
hinder access to the sphenoidal ostium. The technique tion of the sellar dura77.
can be also be performed transeptally, analogous to
the microscopic approach. Main Complications of the Transphenoidal
Endonasal endoscopic surgery may be performed Approach with the Microscope
through a single nostril, which acts as a portal for the
endoscope and the surgical instruments, however, the Complications in transsphenoidal pituitary sur-
dual-portal technique allows superior maneuvera- gery are typically related to blind dissection, inability
bility, flexibility, and efficiency over a single portal to distinguish normal gland from tumor, injury to the
approach. The endoscopic approach should be indi- optic tracts and chiasm, or aggressive tumor dissec-
vidualized to the patient and assessed preoperatively tion near the lateral and posterior aspects of the sella
by inspection of computerized tomography and mag- turcica54-57,78-83.
netic resonance imaging studies and ultimately by Improved visualization allows the surgeon to iden-
endoscopic assessment at the time of operation. The tify and avoid injury to the normal pituitary gland, ca-
endoscopic approach can also be used as an adjunct to rotid prominences, hypothalamus, and optic chiasm.
the microscopic approach in inspecting the operative Recognizing these structures during pituitary tumor
site for residual disease. Using the endoscope in this removal is critical to avoid catastrophic complica-
way can be particularly helpful in advancing sur­geons tions, which have been reported in several microsco-
along the learning curve in endoscopy. pic series55,56,78-81,83,84

Tumor Remission Main Complications of the Endoscopic


Evaluation of microscopic results for functioning Endonasal Approach
adenomas revealed early remission in the majority of Complications associated with endoscopic surgery
the cases of prolactin secreting adenomas, and in also for paranasal sinus disease may give clues as to some
growth hormone secreting adenomas9-12,59,60,75. of the complications that might be encountered using
There are few published reports documenting ear- this procedure for tumors of the sella turcica.
ly post-operative tumor remission rates for non-func- Although Stammberger85 reported no serious
tioning adenomas, as only recently have physicians complications in more than 2000 patients undergoing
begun to perform early post-operative MRI studies to functional endoscopic surgery, Wigand et al.42,43 repor-
ascertain residual disease and look for tumor recur- ted CSF leaks in 2% of 1000 patients. Stankiewicz66,67
rence. With a mean follow-up of only 11.4 months, reported an incidence of 3.9% of serious complica-
post-operative MRI imaging for an endoscopic series tions in 180 patients undergoing endoscopic proce-
revealed the remission rate for non-functioning ade- dures for ethmoidal sinus disease: two with massive
nomas to be 95% (18/19 cases). Two long-term reports hemorrhage, one with a CSF leak, one with tempo-
documenting outcomes for non-functioning adeno- rary blindness, and five with orbital hematomas that
mas with an average of 72 months follow-up noted an developed intraoperatively. Schaefer et al.86 reported
82% remission rate (based on tumor recurrence)58,76. that the most common complication following endos-
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65 – Endoscopic Endonasal Approach for Treatment of Pituitary Adenomas

copic sinus surgery for paranasal sinus disease was or magnetic resonance imaging (MRI) exploits the
synechia between the middle turbinate and the lateral whole concept of neuronavigation to its fullest90.
nasal wall in 6% of patients. Delayed epistaxis is a Frameless stereotaxy allows precise planning of the
complication characteristic of this approach for pitui- approach with reference to lesion perimeters, anato-
tary lesions. mic landmarks such as the carotid arteries, and other
potential operative hazards. Neuronavigation is
ADVANTAGES particularly helpful in reoperative pituitary surgery
where few anatomic landmarks remain. We believe
The main advantages of this approach include no that frameless stereotaxy adds greatly to surgeon
risk of air embolism, comfortable work position for comfort and confidence during the procedure. It is
the surgeon, spontaneous drainage of blood and irri- extremely important to emphasize that the surgeon
gation fluids, favorable trajectory for dissection of the using the technique must always remember that the
suprasellar part of tumor, and the risks of the endos- information used is based on navigation points that
cope or of other instruments falling into the operating are prerecorded and are only as accurate as the sys-
field due to their inclination inferiorly, as in the pure tem allows in a perfectly set-up state. Minor move-
supine position, are minimized23,26. Excellent lateral ment in the pin holders can result in significant loss
vision to the sides of the field is obtained. of accuracy91.
Other advantages include the absence of a nasal
speculum, reduction of the surgical trauma, lack of Image-guided Pituitary Tumor
sublabial or septal dissection, providing quick, mini- Resection
mally invasive, and easy access to the sphenoid, bet-
ter visualization of the structures of the sella turcica, In our opinion intraoperative MRI takes away the
and with angled endoscopes better visual operative reliance on experience and should be a major advan-
control of supra- and parasellar areas. Easy and wi- ce in resection control. Surgery is performed with the
dened maneuverability of the surgeon’s view allows patient lying directly on the table of MRI scanner91.
better access to various paranasal sinus regions, more After the endoscopic transsphenoidal or standard
radical removal of large lesions and better inspection transsphenoidal procedure, an intraoperative MRI is
of remote areas. Angled lenses allow the surgeon to performed while the operative exposure and sterile
see around corners, get closer to the pituitary gland field are both maintained so that if residual tumor is
and tumors, inserting the surgeon’s “eye” directly ad- seen, furher resection is undertaken.
jacent to the pathology allows an unobstructed view
of the operative field. With the lessened mucosal CONCLUSION
dissection, mucociliary transport may be better pre- It is a fact that the evolution of modern neuro-
served than the traditional approaches. Access to re- surgical techniques follows a continuous trend to-
currences is easier and safer because of the previous ward less traumatic procedures. The fully endosco-
sphenoidectomy and wider anatomical view87-89. In pic transnasal-transsphenoidal procedure may result
addition to the benefits to patient and surgeon, from in improved rates of complete tumor removal and
an educational perspective, the assistants, nursing a reduced incidence of complications, when com-
staff, and students actually observe the same field as pared to the microscopic transsphenoidal approach.
the surgeon, thus facilitating teaching and recording The early results of the endoscopic series reviewed
of events; often there is a reduction of length and cost in literature are quite encouraging. In our opinion
of hospital stay. the inherent advantages of endoscopic visualization,
along with continued refinement of the endoscopic
DISADVANTAGES technique and instruments will allow this method to
become the future gold standard surgical approach to
The main disadvantages are the inferior ability to pituitary adenomas. Currently, the endoscopic transs-
magnify the area being viewed as well as the possibi- phenoidal approach is the method for surgically trea-
lity of lenses being occluded by fogging or blood. ting pituitary lesions in adults at our center.

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714
Parte 10
Neurocirurgia
Funcional e da Dor

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66
Tratamento Cirúrgico dos
Transtornos Psiquiátricos
Manoel Jacobsen Teixeira
Erich Talamoni Fonoff
Eda Zanetti Guertzenstein
Maria Elvira Borges Calazans

INTRODUÇÃO experiência mundial no tratamento dos movimentos


anormais, com a grande vantagem da reversibilidade.

A
associação da mente humana com o encéfalo
é relativamente recente na história da huma-
nidade. Com o desenvolver do pensamento CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DOS DOENTES
filosófico, não só a sede mental sã do ser humano Essa modalidade de tratamento psiquiátrico deve
passou a ser o encéfalo, como as doenças mentais e ser realizada em ambientes de referência bem estrutu-
psiquiátricas também tiveram respaldo biológico no rados e multidisciplinares, incluindo sempre departa-
sistema nervoso central. No entanto, os estudos mor- mentos psiquiátrico, jurídico e cirúrgico. A avaliação
fológicos não mostraram grandes alterações cerebrais psiquiátrica especializada para a seleção de pacientes,
em pacientes com transtornos psiquiátricos. O avanço indicação da opção cirúrgica e seu tratamento pós-
no conhecimento da fenomenologia das doenças de operatório são fundamentais para o êxito da interven-
forma pormenorizada e a sua classificação transfor- ção terapêutica.
maram generalizações leigas em diagnósticos funda- A psicocirurgia é indicada para o tratamento do
mentados. Na atualidade as doenças psiquiátricas têm
transtorno depressivo maior – associado ou não a sin-
crescentes achados e estreitas correlações fisiopatoló-
tomas ansiosos ou psicóticos, transtorno afetivo bi-
gicas, especialmente no ramo da neuroquímica, bio-
polar, transtorno obsessivo-compulsivo, transtornos
logia molecular dos neurotransmissores e receptores.
fóbico-ansiosos, transtorno de ansiedade generaliza-
Recentemente, com novas técnicas eletrofisiológicas
da, comportamento suicida persistente, auto-agressão
e de neuroimagem funcional, alterações mais tênues
(Ballantine, 1991; Bridges, 1992) e heteroagressão.
de metabolismo cerebral, direcionamento regional de
fluxo sangüíneo cerebral e alterações da capacidade A cirurgia é indicada para doentes com transtornos
de sincronização entre áreas cerebrais ampliaram os psíquicos que:
horizontes das pesquisas em psiquiatria e psicofisio- • Preencham os critérios diagnósticos reconhe-
logia, sendo os transtornos psiquiátricos associados cidos, estabelecidos por psiquiatra licenciado
com alterações funcionais do encéfalo. para utilização do SCAN – Schedules for Clini-
A cirurgia do comportamento também evoluiu cal Assessment in Neuropsychiatry, para diag-
muito desde as primeiras intervenções de Egas Mo- nóstico dos transtornos depressivos e ansiosos.
niz, com as leucotomias frontais extensas. Com o Para diagnóstico da agressividade, deve ser
advento da estereotaxia e as monitorações funcionais aplicado o BGA – Life History Assessments:
intra-operatórias, técnicas de localização por imagens The Brown-Goodwin Assessment for Life
não invasivas, as intervenções cirúrgicas do compor- History of Aggression; a avaliação neuropsi-
tamento ganharam seletividade, segurança e acurácia. cológica funcional deve ser estabelecida por
Na atualidade, grande parte dos procedimentos rea- neuropsicólogo qualificado; a verificação do
lizados no mundo é ablativa, no entanto técnicas de consentimento deve ser estabelecida por advo-
neuroestimulação têm sido testadas respaldando-se na gado especialista na matéria.

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717
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

• Tenham doença que exceda a duração de 5 termo de consentimento, instrumento jurídico


anos. da manifestação de vontade do doente para sub-
• Passem por sofrimento substancial e redução meter-se ao tratamento cirúrgico. Sendo um ato
do funcionamento psicossocial, causados pelo jurídico que tem por fim imediato resguardar
transtorno psíquico. direitos, requer, para ser válido, além da capa-
• Tenham sido previamente submetidos, sistemá- cidade do agente e objeto lícito, que a declara-
tica e efetivamente, a todas as opções correntes ção de vontade, elemento essencial ao ato, te-
de tratamentos durante, no mínimo, 5 anos, nha sido emitida sem qualquer defeito, ou seja,
sem apreciável melhora dos sintomas, ou que que não tenham ocorrido os chamados vícios de
tenham tido o tratamento descontinuado em ra- consentimento: erro, ignorância, dolo e coação,
zão da intolerabilidade dos efeitos colaterais. além dos denominados vícios sociais, isto é,
A revisão da literatura demonstra que existem a simulação e a fraude. Para que não ocorram
muitos critérios para estabelecer padrões, escolher quaisquer desses vícios, só deve ser manifesta-
terapêuticas e determinar o conceito de transtorno da após o fornecimento de todas as informações
psíquico absolutamente resistente a tratamento para necessárias, adequadas, totais e inteligíveis, na
transtorno depressivo maior – associado ou não a sin- forma e linguagem compreensíveis ao doente,
tomas ansiosos ou psicóticos, transtorno afetivo bipo- devendo abranger: (a) avaliação diagnóstica;
lar, transtornos fóbico-ansiosos, transtorno de ansieda- (b) propósito, método, duração estimada e be-
de generalizada, comportamento suicida persistente, nefício esperado do tratamento proposto; (c)
auto-agressão e heteroagressão. Assim, a refratarieda- modos alternativos de tratamento, inclusive os
de a tratamentos deverá ser avaliada para cada doente, menos invasivos; (d) possíveis dores ou descon-
uma vez que não existe um conceito de intratabilidade fortos, riscos e efeitos colaterais do tratamento
para cada transtorno psiquiátrico. O tratamento neu- proposto. A liberdade de emissão da vontade
rocirúrgico da auto e heteroagressividade raramente para o tratamento é essencial à validade do Con-
é citado nas revisões da literatura como eticamente sentimento e o direito de desistir do tratamento
questionável em razão da suposta possibilidade de a qualquer momento é um elemento de autono-
tornar-se instrumento de controle político-social. mia da vontade. O doente não poderá renunciar
ao seu direito de emitir o consentimento. Sem
Um doente com transtorno psiquiátrico pode ser sua anuência não poderá ser tratado.
definido como absolutamente resistente a tratamento,
O consentimento só poderá ser validamente
apesar de: corretamente diagnosticado segundo crité-
emitido por pessoa juridicamente capaz, ou
rio diagnóstico; efetivamente tratado durante, no mí-
nimo, 5 anos; ter aderido aos tratamentos prescritos; seja, o doente com transtorno psíquico deve
ter apresentado as seguintes respostas e resultados aos ter capacidade para consentir. Essa capacidade
tratamentos, avaliados por escalas reconhecidas: está definida nas diversas legislações dos dife-
rentes países civilizados. Sob o aspecto jurí-
• Não mostra qualquer grau de remissão da sin- dico, os Artigos 3º e 4º do Código Civil Bra-
tomatologia. sileiro distinguem os relativamente incapazes
• Apresenta resposta positiva inicial aos trata- dos absolutamente incapazes de exercer pes-
mentos, seguida de sintomas precedentes, sem soalmente os atos da vida civil. Para contornar
que tenha havido redução da dose da medica- as dificuldades surgidas com a incapacidade
ção ou quando há aumento desta mesma, com legal do doente, o Código de Ética Médica
recaídas freqüentes e prejuízo psicossocial. Brasileiro (Artigo 46) prevê que um “respon-
• Após apresentar a remissão sintomatológica, sável legal” manifeste sua vontade pelo doen-
em tempo não superior a 3 meses, mantido sob te incapaz. Esse “responsável legal” seria não
o mesmo regime de tratamento, os sintomas só o “representante ou responsável legal”, no
reaparecem como se manifestavam antes do conceito da lei, mas qualquer “parente” do do-
início do tratamento; há recorrência freqüente ente. Na prática, portanto, o consentimento do
com prejuízo psicossocial. doente incapaz pode ser suprido pelo pai, mãe,
• Há remissão parcial dos sintomas; ocorre redu- tutor, curador, cônjuge ou algum parente pró-
ção da intensidade e/ou do número de sintomas, ximo. Na falta de qualquer dessas pessoas, o
porém o doente nunca retorna à condição anterior Ministério Público pode requerer judicialmen-
ao início do transtorno, havendo prejuízo da fun- te o suprimento de consentimento.
ção psicossocial e substancial sofrimento, após A psicocirurgia, regulamentada pelo Artigo 8º
ter sido submetido a tratamentos, fundamentados do Regulamento 1.408/94 do Conselho Federal
em dados publicados. de Medicina, exige, além do prévio consenti-
• Apresentem condições de autorizar o tratamen- mento esclarecido do doente, que um corpo de
to, por si, ou por responsável, assinando um profissionais externo, solicitado ao Conselho

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66 – Tratamento Cirúrgico dos Transtornos Psiquiátricos

Regional de Medicina, esteja convencido de de alvos cirúrgicos. Utiliza-se de método de imagem


que tenha havido genuinamente consentimento para delimitar estruturas anatomicamente constantes
esclarecido e de que o tratamento é o que melhor e facilmente identificáveis que sirvam de guia para
atende às necessidades de saúde do usuário. localização de regiões de interesse. No passado, uti-
Além das regras escritas, a conduta médica lizava-se a ventriculografia, que requer uma punção
deve ser norteada pelos princípios éticos da ventricular e injeção de contraste radiopaco nos ven-
beneficência e da autonomia, no nível privado, trículos, para determinação de seus contornos. Nos
e da utilidade, respeito e justiça, no nível pú- dias atuais esse método foi substituído inteiramente
blico. O médico deve garantir ao doente a con- pela estereotomografia computadorizada, que não re-
fidencialidade do tratamento, do diagnóstico, quer injeção de meio de contraste nos ventrículos. A
da doença e de todos os dados e informações estereorressonância também pode ser utilizada, com
a ele concernentes, conforme recomendam as a ressalva de haver distorção de imagem não previ-
normas éticas. sível, principalmente em alvos mais periféricos. A
• Tenham condições físicas de serem submeti- montagem tridimensional das imagens de estereoto-
dos ao tratamento cirúrgico e tenham avaliação mografia em programa computadorizado facilita não
funcional por neuroimagem por profissional só a identificação mais acurada do alvo, mas também
qualificado. a determinação do trajeto do eletródio e o local do
• O prognóstico sem o tratamento cirúrgico seja orifício da trepanação. São utilizados eletródio com
considerado desfavorável. diâmetro e área exposta padronizados e providos de
A opinião do psiquiatra do paciente sobre os cri- sistema de medida de temperatura em sua extremida-
térios de valor para indicação do tratamento acima de distal. O método utilizado para produzir lesões é
enumerados deverá coincidir com a avaliação do psi- a aplicação controlada de radiofreqüência, que, por
quiatra que irá autorizar a cirurgia. transferência de energia ao tecido adjacente, promove
As contra-indicações usualmente incluem: uma lesão circunscrita de cerca de 5 a 7 mm em torno
da extremidade do eletródio com forma elipsóide. A
• Doentes que não queiram submeter-se a trata- lesão é tão restrita que, por vezes, é necessário pro-
mento cirúrgico. duzir várias pequenas ablações adjacentes para se ob-
• Doentes com transtorno psíquico com dura- ter o efeito desejado. O paciente permanece, durante
ção inferior a 5 anos, mesmo que efetivamente todo o procedimento, sem efeito de anestésicos gerais
tratados, que preencham o critério de resistên- na maioria dos casos. Em paciente com agressividade
cia absoluta a tratamento, não sejam respon- proeminente, utiliza-se a anestesia geral para garantir
sivos ou sejam parcialmente responsivos, que tranqüilidade e condições técnicas satisfatórias sem
apresentem recorrência dos sintomas durante movimentos inesperados.
perío­do inferior a 3 meses ou recidiva sintoma-
Vários alvos foram utilizados desde as primeiras
tológica com prejuízo psicossocial.
intervenções cirúrgicas. Os alvos a seguir são em-
• Menores de 18 anos, com exceções individuais pregados correntemente em centros de referência no
de alto risco, que recomendem a cirurgia. mundo:
• Doentes com os seguintes diagnósticos, segun-
do o Eixo I do DSM-IV-TR 4th (A.P.A., 2000):
esquizofrenia, dependência de drogas, álcool, Cingulotomia
sedativos-hipnóticos ou ansiolíticos, transtor- O giro do cíngulo foi um dos primeiros alvos uti-
nos alimentares e/ou delirium. lizados em cirurgia do comportamento. As primei-
• Doentes com diagnóstico segundo o Eixo II do ras são datadas em 1948, quando Hugh Cairns, em
DSM-IV-TR 4th (A.P.A., 2000): personalidade Oxford, removeu a porção anterior do giro do cíngulo
paranóide, esquizóide, esquizotípica, anti-so- em procedimento cirúrgico a céu aberto. Na época,
cial, borderline e histriônica. a cingulotomia produziu sensível melhora em pa-
• Doentes diagnosticados segundo o Eixo III do cientes psiquiátricos. Aplicação da estereotaxia na
DSM-IV-TR 4th (A.P.A., 2000): lesão cerebral cingulotomia bilateral foi descrita por Foltz e White
que impeça a cirurgia. para o tratamento de dor. Ballantine iniciou o uso da
• Esteja preso ou tenha passado criminal. ventriculografia para guiar os procedimentos estereo-
táticos e, com isso, conseguiu maior seletividade com
PROCEDIMENTO CIRÚRGICO procedimentos menos invasivos. O alvo específico é
o giro do cíngulo de 20 a 30 mm posterior à ponta dos
A cirurgia do comportamento compartilha das ventrículos laterais, no centro do giro. A lesão deve
técnicas utilizadas em neurocirurgia funcional para ter aproximadamente 10 a 20 mm de comprimento e
localização e ablação de estruturas encefálicas. A 5 a 7 mm de largura, atingindo preferencialmente o
estereotaxia é o método de escolha para localização fascículo do cíngulo.

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719
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Tratotomia Subcaudata Amigdalotomia


Descrita por Knight, consiste em três ou mais le- O lobo temporal já era relacionado a alterações
sões nos lobos frontais bilateralmente, entre 10 e 15 mm comportamentais desde de 1939, nos trabalhos de Klu-
superior à base da fossa anterior, no plano coronal, e ver e Bucy em primatas. Estudos de Sweet em 1972,
15 a 20 mm da linha mediana. Em termos anatômicos utilizando estimulações da amígdala por telemetria em
topográficos, a lesão localiza-se na metade posterior pacientes vigis, evocam comportamentos agressivos
de segmento ventromedial do lobo frontal e abaixo associados temporalmente a paroxismos eletrográficos
do joelho do corpo caloso, da cabeça do núcleo cau- registrados no mesmo núcleo. Lesões dessa porção da
dado e das fibras mais ventrais da cápsula interna. O amígdala foram utilizadas no tratamento de agressi-
transtorno bipolar apresenta boa resposta a esse pro- vidade, com bons resultados, principalmente quando
cedimento segundo série de Kartsonius (1991), com associadas a epilepsia. O alvo para o componente me-
seguimento de 2 a 4 anos, especialmente nos sinto- dial da amígdala está a 18 mm da linha média, 3 a 5
mas maníacos. mm anterior à ponta do corno temporal do ventrículo
lateral e 5 a 7 mm superior ao assoalho ventricular. As
Capsulotomia Anterior dimensões da lesão devem atingir cerca de um terço
do volume do núcleo, com 5 a 10 mm de diâmetro e
Meyer e Beck mostraram que a maior porção das 10 mm de comprimento no plano coronal.
projeções talamofrontais está concentrada na subs-
tância branca médio-central e ventromedial dos lo-
bos frontais, logo à frente da ponta ventricular. De- Procedimentos Combinados
nominado capsulotomia anterior, esse procedimento Os três procedimentos foram, no passado, com-
é destinado a interromper tais vias. Coincide com o binados para proporcionar melhores resultados. A
braço anterior da cápsula interna. É utilizado no tra- cingulotomia associada à tratotomia subcaudata é de-
tamento de transtornos ansiosos, principalmente em nominada de leucotomia límbica. Em relato de Kelly
transtornos obsessivo-compulsivos, sendo mais efe- (1980), com melhora de até 84% em transtorno obs-
tivo do que cingulotomia, nesses casos. Pode haver sessivo-compulsivo e 63% em esquizofrenia.
efeitos temporários de mudança de personalidade e
iniciativa.
PROGNÓSTICOS E RESULTADOS
Hipotalamotomia Póstero-medial Os mecanismos pelos quais o tratamento neuroci-
rúrgico pode produzir efeitos benéficos não são bem
Conforme descrito por Sano, o alvo está localiza- conhecidos. No entanto, sabemos que as lesões pro-
do 2 mm lateralmente à parede do terceiro ventrícu- duzem interrupção em vias de alças córtico-corticais e
lo e 2 mm abaixo do ponto médio comissural. Esse córtico-subcorticais, portanto há, provavelmente, uma
procedimento é realizado sob anestesia geral super- relação dos sintomas psiquiátricos com circuitos pato-
ficial e intubação orotraqueal, monitoração cardíaca, lógicos. Existe constante busca de variáveis que predi-
de pressão arterial e de freqüência respiratória. Es-
zem bons resultados após tratamentos cirúrgicos e que
timulações intra-operatórias com eletródio próprio,
possibilitam selecionar doentes que potencialmente
em freqüências entre 50 e 100 Hz, provocam reações
possam apresentar benefícios significativos. Entretan-
tipicamente simpáticas, como elevação da pressão ar-
to, a única variável pré-operatória identificada como
terial, taquicardia, midríase, desvio inferior do globo
ocular ipsilateral e parada respiratória, seguida por indicativa de efeito favorável é o diagnóstico. Doentes
hiperpnéia ou taquipnéia. Relatos de estimulações com transtorno depressivo tendem a apresentar me-
desse sítio em pacientes vigis causam sensações lhores resultados que outros cirurgicamente tratados.
desprazerosas, como medo repentino e horror. Em A avaliação dos resultados pós-cirúrgicos é efetua­da
uma visão lateral à área que provoca tais respostas, logo após o procedimento, 3 meses após e semestral-
localiza-se no hipotálamo posterior delimitado por mente, pelos mesmos profissionais que fizeram a ava-
um triângulo de vértices no ponto médio comissural, liação pré-cirúrgica e comparando a evolução. Os ins-
corpo mamilar e na comissura posterior (extremidade trumentos de avaliação devem ser sempre os mesmos,
rostral do aqueduto cerebral). Sano denominou essa antes e depois da cirurgia. Os resultados obtidos no
região de trígono ergotrópico. Tal procedimento é primeiro ano do pós-cirúrgico são classificados seguin-
utilizado para tratamento de agressividade grave, que do os critérios básicos estabelecidos por J. Pip­pard, em
inviabiliza qualquer contato social, mesmo com os 1955, em sua Escala Global de Resultados, que é utili-
familiares mais próximos, não responsiva a medica- zada, com algumas variações, pela maioria dos centros
mentos. que oferecem tratamento neurocirúrgico aos portadores

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66 – Tratamento Cirúrgico dos Transtornos Psiquiátricos

de transtornos psiquiátricos. Os resultados nessa escala de substancial sofrimento e redução no funcionamen-


são classificados em cinco grupos, como se segue: to psicossocial. Atualmente, quando se admite que
I – Recuperado: sem sintomas e não requer ne- a primeira linha de tratamentos não cirúrgicos, para
nhum tratamento, função social normal. um determinado transtorno psíquico, é considerada
II – Bem: sintomas residuais leves, que pouco ou eficaz, sua eficiência foi testada em estudo prospec-
nada interferem na vida diária; a medicação pode ser tivo randomizado placebo-controlado e sua eficácia
necessária. é superior ao placebo. Para que fosse comprovada a
III – Melhora: porém, sintomas significativos per- eficácia do tratamento cirúrgico, deveria existir uma
manecem, os quais interferem na vida do doente; o alternativa terapêutica aceitável que não existe. Essa
tratamento que não trazia qualquer benefício poderá posição é reservada para o tratamento neurocirúrgico,
tornar-se eficaz. que é indicado somente quando as opções terapêuti-
cas correntes tenham sido sistemática e efetivamente
IV – Inalterado: também resistente ao tratamento ministradas sem efeito sobre os sintomas ou precisa-
cirúrgico. ram ser descontinuadas em razão da intolerabilidade
V – Piora. dos efeitos colaterais.
Os métodos mais empregados para o tratamento
dos transtornos psíquicos são cingulotomia anterior,
tratotomia subcaudata, capsulotomia anterior e leu- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
cotomia límbica. A revisão da literatura indica que 1. Appelbaum PS. Thinking the conduct of psychiatric
a leucotomia límbica e a capsulotomia anterior são research. Arch Gen Psychiatric. 1997;54:117-20.
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relação ao outro não foi constatada e não se realizou resource manual for human subjects protection. Am
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colhido para o tratamento, a remissão dos sintomas patients competent to consent to research? Arch Gen
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convulsivo, de acordo com a necessidade individual, surg. 2001;95(6):944-56.
por tempo que será determinado pela remissão dos 7. Fins JJ. From psychosurgery to neuromodulation and
sintomas. palliation: history’s lessons for the ethical conduct
Existem dificuldades na interpretação dos estudos and regulation of neuropsychiatric research.Neuro-
publicados em decorrência de: critério escolhido para surg Clin N Am. 2003;14(2):303-19.
avaliar os resultados; amostras incompletas; utiliza- 8. Grisso T, Frank E, O’Donnell SRN, Kupfer DJ. Com-
ção de notas de prontuário; avaliação subjetiva ou por petence of depressed patients for consent to research.
telefone em vez de entrevistas com o doente presente Am J Psychiatry. 1999;156:1380-4.
e dados fornecidos por informante; avaliações retros- 9. Hurley RA, Black DN, Stip E, Taber KH. Surgical
pectivas; falta de avaliadores de resultados indepen- treatment of mental illness: impact of imaging. J
dentes e poucos estudos de longo prazo. Neuropsychiatry Clin Neurosci. 2000;12(4):421-4.
10. Jenike MA. An update on obsessive-compulsive di-
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apresenta dificuldades metodológicas. O principal
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é a dificuldade de demonstrar a inequívoca eficácia surg. 2001;76(3-4):239-42.
do tratamento. A prova mais sólida dessa eficácia 12. Malhi GS, Bartlett JR. Depression: a role for neuro-
consistiria em avaliá-la em uma pesquisa prospec- surgery? Br J Neurosurg. 2000;14(5):415-22; discus-
tiva duplo-cego placebo controlada, no entanto, por sion 423.
várias razões, nenhum tratamento foi avaliado por 13. Marino Junior R, Cosgrove GR. Neurosurgical treat-
esse método. Primeiramente, porque o tratamen- ment of neuropsychiatric illness. Psychiatr Clin Nor-
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é eticamente aceitável. Segundo, da mesma forma, 14. Miguel EC, Rauch SL, Jenike MA. Obsessive-
é eticamente inaceitável não submeter um doente a compulsive disorder. Psychiatr Clin North Am.
tratamento indicado àqueles que, como ele, padecem 1997;20(4):863-83.

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Tratamento Neurocirúrgico da
Espasticidade
Manoel Jacobsen Teixeira
Erich Talamoni Fonoff

INTRODUÇÃO osteomuscular e a atividade do sistema nervoso cen-


tral. As forças inerciais estruturais e a elasticidade

E
spasticidade é a apresentação clínica mais comum estrutural dependem das características mecânicas
da lesão do neurônio motor superior. Essa condi- das fibras musculares, dos tendões, dos ligamentos,
ção afeta adultos e crianças com uma grande va- das articulações, do tecido conjuntivo e de outras es-
riedade de patologias agudas e crônicas, como acidente truturas que passivamente restringem a amplitude do
vascular cerebral, traumatismo raquimedular e cranio-
movimento. A atividade do sistema nervoso central
encefálico, esclerose múltipla, paralisia cerebral, entre
depende dos circuitos locais e da influência de centros
outros1,2. Registros históricos em ilustrações egípcias
superiores. Na espasticidade há perda ou desbalanço
de posturas e marchas espásticas demonstram que essa
das influências de centros supra-segmentares, deixan-
manifestação é, há séculos, reconhecida pela humani-
do o arco reflexo de estiramento responsivo apenas
dade. É conceituada como aumento da resistência mus-
aos estímulos segmentares ou proprioespinhais. O
cular à mobilização passiva, dependente da velocidade
que se observa é predominância da hiperatividade da
do movimento realizado e ocorrência de hiperatividade
via reflexa (Fig. 67.1).
dos reflexos miotáticos. Caracteriza-se pelo aumento
do tônus muscular, hiper-reflexia miotática, sinal do O circuito neuronal do reflexo de estiramento é o
canivete (maior resistência ao início de movimentação mais simples do sistema nervoso, com nível de in-
passiva brusca), atividade muscular exagerada, espas- tegração monossináptico. Consiste em uma unidade
mos musculares ante a estimulação sensitiva ou estira- motora, conceito introduzido por Sherrington em
mento passivo e ocorrência de clônus em doentes com 1925, ou seja, o motoneurônio e as fibras musculares
lesão do sistema nervoso central (encéfalo, medula es- por ele inervadas, associadas a um neurônio sensitivo
pinhal proximal). A espasticidade predomina em alguns que traz informações destas. O corpo celular do mo-
grupamentos musculares agonistas, especialmente nos toneurônio localiza-se no corno anterior da medula
antigravitários, e dela resultam alterações nas caracte- espinhal (lâmina IX de Rexed), e seus axônios dei-
rísticas mecânicas e funcionais dos músculos, tecido xam a medula pelas radículas anteriores. Esses neu-
conjuntivo, articulações e envoltório cutâneo. Escaras rônios ocupam posições específicas no corno ventral
de decúbito, retrações tendíneas, enrijecimento articu- e são organizados em núcleos motores de acordo com
lar, alterações tróficas teciduais e alteração na fisiolo- a inervação dos grupamentos musculares. O corpo ce-
gia da bexiga (bexiga espástica, bexiga automática) e lular do neurônio sensitivo está localizado no gânglio
do mecanismo de evacuação intestinal podem ocorrer da raiz dorsal. Esses aferentes originam-se do fuso
como complicações da espasticidade. neuromuscular, órgão especializado em sinalização do
grau de estiramento do músculo. Quando o músculo
é estirado, há um aumento na freqüência de disparos
FISIOPATOLOGIA desses aferentes, estimulando o motoneurônio por via
O tônus muscular depende da interação entre as monossináptica e provocando uma contração reflexa.
forças inerciais, a elasticidade estrutural do sistema O neurotransmissor que carreia essa informação é o

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

glutamato (aminoácido excitatório), que tem a carac- cução de atos motores e das influências ambientais
terística de rapidez e fugacidade de efeito pós-sinápti- de natureza variada. Exercem atividade excitatória
co. Apesar de o reflexo ser descrito isoladamente para no motoneurônio-α os aferentes dos fusos muscu-
fins didáticos, durante os comportamentos fisiológi- lares (tipo Ia) e as aferências sensitivas veiculadas
cos há interação entre as vias locais ipsi e contralate- por fibras III ou Aδ e IV ou C. Aferências oriun-
rais, com sistemas de retroalimentação positiva e ne- das dos órgãos tendíneos de Golgi (tipo II) atuam
gativa, assim como circuitos longos proprioespinhais em neurônios inibitórios segmentares, suprimindo
e com estruturas encefálicas. Por exemplo, enquanto a atividade do motoneurônio-α. Os sistemas inibi-
o agonista muscular deve contrair-se para realização tórios segmentares têm efeito preferencialmente
da ação, a musculatura sinergística o acompanha e, pós-sináptico, enquanto as vias rostrocaudais atuam
por sua vez, o antagonista deve relaxar promovendo inibindo o motoneurônio por atuação pré-sinaptica.
um movimento harmonioso. O sinergismo é mediado A interação de estímulos inibitórios e excitatórios
por ativação monossináptica de motoneurônios, e o nos interneurônios espinhais induzem à facilitação
antagonismo, por inibição recíproca via interneurô- ou supressão da atividade dos motoneurônios-α,
nios inibitórios aos motoneurônios antagonistas. O que transmitem momentaneamente o resultado do
neurotransmissor dos interneurônios da medula con- processamento medular diretamente aos músculos.
tém tanto GABA (ácido gama-aminobutírico) quan- Os motoneurônios-γ também recebem a resultante,
to glicina, por vezes na mesma célula. Na medula, regulando a sensibilidade dos fusos neuromuscula-
esses neurotransmissores têm ação inibitória ligada res aos estado de estiramento muscular. A hipoati-
a canais de cloreto que hiperpolarizam a membrana vidade dos interneurônios inibitórios, a depressão
pós-sináptica3 (Fig. 67.2). da atividade supressora rostrocaudal pré-sináptica, a
As vias corticoespinhais têm origem em várias hiperatividade dos interneurônios excitatórios, a hi-
regiões do córtex cerebral, como área motora pri- peratividade fusal, a modificação neuroplástica dos
mária, área pré-motora e regiões do córtex parietal, interneurônios excitatórios dos motoneurônios-α
que são importantes influências e têm função apa- e γ, o brotamento neuronal e o reforço de sinapses
rentemente inibitória no arco reflexo de estiramen- excitatórias são razões para ocorrência da espastici-
to. Não só o trato corticoespinhal exerce influência dade, ou seja, após a lesão das vias de projeção para
descendente na medula espinhal, mas também o ce- a medula é desencadeado um processo de transfor-
rebelo, formação reticular do tronco encefálico, os mação de circuitos com perda de sinapses e reforço
gânglios da base e os núcleos monoaminérgicos e de vias locais.
serotoninérgicos do tronco, loco cerúleo e núcleo
magno da rafe, respectivamente. Estes últimos estão AVALIAÇÃO DA ESPASTICIDADE
relacionados à manutenção de posturas axiais sem
a participação de informações corticodescenden- A avaliação do doente com espasticidade é funda-
tes ou esteroceptivas, por meio dos potenciais em mentada nos históricos, no exame clínico4,5, especial-
platô, que induzem os motoneurônios a dispararem mente quanto à ocorrência de escaras, miosite ossifi-
ininterruptamente, mantendo contrações musculares cante, limitações articulares e condições viscerais e
prolongadas. No entanto há também vias inibitórias no exame neurológico com atenção especial quanto à
nas partes segmentares, como inibição não recíproca ocorrência de déficits sensitivos e motores e funcio-
(tipo Ib), pelas fibras aferentes dos órgãos tendí­neos nalidade (marcha, equilíbrio, funções motoras, ato de
de Golgi, inibição pré-sináptica dos terminais Ia via higiene, de vestir, alimentar, autocuidado). A espas-
sinapses axo-axonais, inibição recíproca Ia (inibi- ticidade propriamente dita pode ser avaliada com a
ção aos músculos antagonistas) e inibição recorrente escala de Ashworth e de espasmos. A primeira quan-
mediada pelas células de Renshaw. Os interneurô- tifica o tônus muscular mediante a solicitação passiva
nios medulares, como os motoneurônios, são modu- do membro, e a segunda, a ocorrência de espasmos
lados tanto por aferências rostrocaudais, como por (Tabela 67.1). Há outras escalas que graduam a de-
aferências sensitivas oriundas dos tecidos, quer de pendência do indivíduo com espasticidade quanto ao
natureza esteroceptiva (dor, temperatura, tato), quer cuidado próprio e à manipulação de sonda vesical
proprioceptiva (fusos neuromusculares, órgãos neu- de alívio, como a Escala de Higiene Pessoal (Tabela
rotendíneos). Substâncias veiculadas pela circulação 67.2). O índice de Bartel (Tabela 67.3) leva em conta
sangüínea ou de efeito local, como as citocinas teci- atividades da vida diária, desde a capacidade de ali-
duais (interleucina 6) também sensibilizam neurô- mentar-se, higiene, posicionamento no vaso sanitá-
nios da medula espinhal e do encéfalo, induzindo a rio, banho, locomoção, até o controle esfincteriano. A
estados alterados de tônus muscular. O tônus sofre, escala de Tardieu gradua a rigidez elástica conforme
portanto, modificações em decorrência do alerta, dos o ângulo de maior resistência e presença de clônus
mecanismos de adaptação do indivíduo para a exe- como gravidade de espasticidade (Tabela 67.4).

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67 – Tratamento Neurocirúrgico da Espasticidade

S
1a

g a

Fig. 67.1 – Representação esquemática do arco reflexo de estiramento, desde o circuito na medula até o músculo. Os corpos
do neurônio α e γ e do neurônio sensitivo são localizados no corno anterior da medula e no gânglio sensitivo respectivamente.
O neurônio α inerva as fibras musculares extrafusais e o neurônio γ, as fibras musculares fusais. O neurônio sensitivo sinaliza o
grau de estiramento das fibras do fuso neuromuscular.

M2 M1

AHC1 1a1

AHC2 a2
a1

Fig. 67.2 – Representação esquemática do arco reflexo e estiramento com circuito acessório de inibição da musculatura anta-
gonista do movimento, neste exemplo, de extensão da perna. Há duas populações de motoneurônios: α1, que inerva a muscula-
tura agonista; e α2, responsável pela movimentação antagonista. O neurônio sensitivo sinaliza o grau de estiramento das fibras
do fuso neuromuscular, estimula diretamente o motoneurônio α1 e inibe o motoneurônio α2 via interneurônio inibitório.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Tabela 67.1 – Escala de Ashworth e de espasmos


Escala de Ashworth Escala de espasmos
1 Tônus normal Raros a estímulos intensos
2 Discreto aumento do tônus, principalmente ao início do Eventuais, facilmente desencadeados, não prejudicam a
movimento postura
3 Tônus mais aumentado, movimentos passivos dificultados 1 a 10 espasmos/hora prejudicam a postura
4 Tônus muito aumentado Mais que 10 espasmos/hora, impedindo a posição sentada ou
deitada
5 Membro permanentemente em flexão ou extensão

Tabela 67.2 – Escala de higiene pessoal


Nota Descrição
0 Independente com autocuidado
1 Uma pessoa limpa e que cateteriza a bexiga com facilidade
2 Uma pessoa limpa e que cateteriza a bexiga com dificuldade
3 Uma pessoa limpa e que cateteriza a bexiga com extrema dificuldade
4 Duas pessoas limpam e que cateterizam a bexiga com facilidade

Tabela 67.3 – Índice de Bartel


Descrição Com auxílio Sem auxílio
Alimentação (alimento que precisa ser cortado) 5 10
Traslado da cadeira de rodas para a cama e de volta (incluindo sentar-se na cama) 5 – 10 15
Higiene pessoal (lavar o rosto, pentear o cabelo, barbear-se e escovar os dentes) 0 5
Posicionamento no vaso sanitário (retirando as roupas, limpeza íntima e descarga) 5 10
Tomar banho com ajuda 0 5
Andar em superfície plana 10 15
Cadeira de rodas* 0* 5*
Subir e descer escadas 5 10
Vestir-se (incluindo amarrar sapatos e apertar cinto) 5 10
Controle esfincteriano anal 5 10
Controle esfincteriano vesical 5 10

Tabela 67.4 – Escala de Tardieu. Análise quantitativa da reação muscular


0 Sem resistência em toda a amplitude de movimento passivo
1 Discreta resistência no movimento passivo, sem rigidez clara em determinado ângulo
2 Interrupção clara de movimento passivo em determinado ângulo seguido de relaxamento
3 Clônus fatigável (< 10 s de pressão mantida) em determinado ângulo
4 Clônus não fatigável (> 10 s de pressão mantida) em determinado ângulo
Determinação do ângulo de resistência: medida relativa à posição de mínimo estiramento (correspondente ao ângulo 0°) para todas
as articulações, exceto o quadril, em que o ângulo 0º é a posição anatômica.

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67 – Tratamento Neurocirúrgico da Espasticidade

TRATAMENTO queia de forma definitiva a liberação de acetilcolina


na fenda sináptica. Cerca de três meses após a inje-
Clínico ção, os terminais sinápticos refazem a comunicação
Deve ser realizado por equipe interdisciplinar com- com o músculo por meio de novos brotamentos si-
posta por fisiatras, neurologistas, neurocirurgiões, nápticos. Com isso, há retorno ao tônus patológico. A
ortopedistas, urologistas, cirurgiões plásticos, procto- infiltração de pontos motores com toxina botulínica é
logistas, psiquiatras, psicólogos, enfermeiros, fisiote- recomendada em casos de hipertonia facial, podendo
rapeutas, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais, o bloqueio muscular seletivo ser titulável conforme
entre outros. A eliminação das causas (tumores, infec- as necessidades. Pode haver dor muscular, equimoses
ções, distorções, discinesias viscerais, artropatias, dor) nos locais de injeção e febre transitória no dia da inje-
que comprometem a via motora e a eliminação de fa- ção. É uma medicação segura e eficaz no tratamento
tores desencadeantes (escaras, infecções, discinesias da espasticidade de grupamentos musculares de volu-
viscerais, dor, artropatia, miosite ossificante) são a pri- me reduzido, pois não se pode exceder a dose tóxica
meira etapa do tratamento6. Programas fisiátricos de re- sistêmica (Tabela 67.8).
abilitação e órteses previnem complicações e eliminam
fatores agravantes e perpetuantes musculoesqueléticos, Procedimentos Cirúrgicos Funcionais
viscerais (urológicos, gastroenterológicos, proctológi-
cos) e tegumentares orientam o uso da função residual. Infusão de Fármacos no Compartimento
O tratamento medicamentoso consiste no uso de Liquórico Espinhal
miorrelaxantes; o baclofeno e os diazepínicos são os A infusão intratecal de miorrelaxantes é indicada
mais utilizados7. O baclofeno é um agonista GABA a doentes com atividade motora útil e quando a medi-
presente nos neurônios inibitórios que diminuem a cação miorrelaxante administrada por via oral não é
atividade das vias excitatórias mediadas por neuro- tolerada ou eficaz. Baclofeno, tizanidina, midazolam,
transmissores excitatórios, como ácido glutâmico ou clonidina ou morfina e derivados, administrados por
aspártico8-10. Na medula espinhal, inibe a bomba de
via intratecal, exercem efeito miorrelaxante e analgé-
Cl- e a recaptação de Ca++. É eficaz no tratamento das
sico. O baclofeno12, por via intratecal, suprime com-
crises espásticas e da dor. Os diazepínicos ligam-se ao
pletamente a hiperatividade segmentar medular e re-
complexo GABA e apresentam ação prolongada, sen-
duz a espasticidade e, portanto, os índices da escala de
do indicados especialmente em casos de hipertonia
Ashworth. A morfina10, por via intratetal, proporcio-
constante. Outros antiespásticos são menos utilizados.
na relaxamento muscular em casos de espasticidade,
A tizanidina, agonista α-2, reduz os reflexos espinhais
sem alterar as funções motoras, pois inibe a aferência
pós-sinápticos. As fenotiazinas deprimem o sistema
do sistema fusimotor γ, a atividade multissináptica e a
fusomotor e atuam em vias reticuloespinhais excitató-
hiperexcitabilidade dos interneurônios segmentares.
rias. O dantroleno atua inibindo a liberação do Ca++ do
retículo sarcoplasmático (Tabelas 67.5 a 67.7). O implante de bombas deve ser precedido de teste
de infusão epidural ou intratecal lombar da medicação
para avaliar a tolerabilidade e a eficácia dos agentes.
Bloqueios Periféricos Bombas eletrônicas (Syncromed®, Meditronic) ou a
O tratamento local com a injeção de fenol tem seu gás (Infusaid®; ANS®, Meditronic) são recomendá-
emprego indicado principalmente a pacientes com es- veis para a administração da maioria desses agentes.
pasticidade originária de lesão encefálica. O objetivo Bombas mecânicas (Algomed®; Cecor®) são úteis
do tratamento é, por meio de injeções locais, bloquear para a infusão de morfina ou midazolam (Fig. 67.3).
os nervos que são a via final comum da espasticidade.
As injeções podem ser utilizadas para bloquear gran- Eletroestimulação do Sistema Nervoso
des nervos de regiões específicas do corpo, acome- Central
tidas pela espasticidade. Como efeitos adversos que
podem limitar seu uso, estão as disestesias crônicas e A eletroestimulação da medula espinhal13 com ele-
a dor neuropática no território desaferentado. Outras tródio introduzido percutaneamente ou a céu aberto
complicações são edemas periféricos, descamação de no compartimento espinhal inibe a excitabilidade me-
pele e infecção local. Recentemente o emprego da to- dular segmentar. Entretanto, esse método não é eficaz
xina botulínica tipo A11, também utilizada localmente no tratamento da espasticidade grave (Fig. 67.4). A
por injeções intramusculares, tem proporcionado um estimulação do córtex cerebelar, do núcleo denteado,
bloqueio neuromuscular altamente seletivo. Logo do pedúnculo cerebelar, do loco cerúleo e a estimula-
após sua injeção, a toxina entra no terminal pré-si- ção elétrica transcutânea (FES) proporcionam benefí-
náptico e é clivada em um composto ativo, que blo- cios que ainda necessitam ser mais bem avaliados.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Tabela 67.5 – Agentes utilizados no tratamento da espasticidade


Agente Nome comercial Inicial Máxima Doses/dia Máxima em Mecanismos
pediatria
Dantroleno Dantrium 25 mg 100 mg 3 mg/kg Supressão da bomba da Ca++
Baclofeno (VO) Lioresal 5 mg 80 mg 3–4 30 – 60 mg Agonista GABA
Tizanidina Sirdalud 2 – 4 mg 36 mg 2–3 Agonista α-adrenérgico
Diazepam Valium; Diazepam 5 mg 60 mg 4 0,8 mg/kg Agonista GABA
Clorazepato Tranxilene 5 mg 5 mg 2 Agonista GABA
Cetazolam 10 mg 30 – 60 mg 1–3 Agonista GABA
Piracetam Nootropil 50 mg/kg Agonista GABA
Clonazepam Rivotril 0,5 mg 3 mg Agonista GABA
Progabida 45 mg/kg 3 Agonista GABA
Clonidina Atensina 0,05 mg 0,1 mg × 4 2–4 Agonista α-2 adrenérgico
Ciproeptadina Periatin 4 mg 36 mg 3 0,5 mg/kg Agonista de histamina e
serotonina
Timoxamina (IV) 0,1 mg/kg
Orfenadrina (IV) Dorflex 60 mg Agonista NMDA
Baclofeno Lioresal 25 µg 500 – 1.000 µg Agonista GABA
(intratecal)
Lamotrigina Lamictal 50 mg 700 mg 2 Supressão da bomba de Na+ e
da liberação de glutamato

Tabela 67.6 – Eficácia dos agentes antiespáticos


Esclerose Lesado Acidente Traumatismo Paralisia Observações
múltipla medular vascular encefálico cerebral
encefálico
Dantroleno + + ++ +
Baclofeno (VO) ++ + +/–
Tizanidina ++ + +
Diazepam + + +/– + Administração noturna
Clorazepato + +
Cetazolam + + +
Clorazepam +? Administração noturna
Piracetam + Melhora da marcha e da função
da mão
Progabida +
Clonidina +?
Ciproeptadina +? +?
Timoxamina (IV) + + Preparo para sessões de
fisioterapia
Orfenadrina (IV) + Redução da atividade flexora
Baclofeno (intratecal) + + +? +?
Lamotrigina Rash cutâneo

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67 – Tratamento Neurocirúrgico da Espasticidade

Tabela 67.7 – Efeitos colaterais dos antiespasmódicos


Redução da Fraqueza Sedação Outras complicações Precauções
velocidade muscular
da marcha
Dantroleno + + Hepatotoxicidade Monitorar função hepática
Baclofeno + + + Desencadeamento de epilepsia
Tizanidina +/– + Xerostomia, função hepática Monitorar função hepática
Diazepam + ++
Clorazepato –/–
Cetazolam +
Clorazepam ++
Piracetam Náuseas
Progabida 0 + Hepatotoxicidade Monitorar função hepática
Clonidina Depressão Monitorar pressão arterial
Ciproeptadina – + Xerostotomia
Timoxamina (IV) Hipotensão
Orfenadrina (IV) 0 0
Baclofeno + 0 + Convulsões
(intratecal)
Lamotrigina ++ Cefaléias, tonturas

Neurotomias
Foram introduzidas como tratamento da espasti-
cidade no início do século XX. Têm como substrato
o nervo obturador (adução das coxas), o ciático (fle-
xão do joelho), o tibial posterior na fossa poplítea (pé
eqüino), o fibular (hiperextensão do hálux) ou o fe-
moral (flexão da coxa) nos membros inferiores e o
nervo musculocutâneo (flexor do antebraço), o radial
(extensão da mão) ou o mediano (flexão da mão) nos
membros superiores. Sindou14 aperfeiçoou a técnica,
Fig. 67.3 – Bomba implantável de infusão de fármacos realizando microdissecção após eletroestimulação
(Accurx ANS).
para sacrificar apenas parte das fibras motoras e re-
duzir a espasticidade sem induzir a importante com-
prometimento motor ou amiotrofia ou anormalidades
da sensibilidade; pelo menos 20% das fibras motoras
devem ser preservadas.

Rizotomia Posterior Seletiva


No século IXX, Sherrington descreveu que a rigi-
dez em decerebração no gato era abolida por secção
das raízes espinhais tanto anteriores quanto posterio-
res. Definiu, então, que a rigidez em questão era de-
pendente do arco reflexo e não puramente induzida
pela perda da aferência supra-segmentar. No início
do século XX, Foerster publicou as primeiras apli-
cações desse conceito em tratamento de dor e crises
Fig. 67.4 – Visão radioscópica em posição ântero-posterior tabéticas. O mesmo autor descreveu rizotomia pos-
da coluna cervical durante a passagem de eletródio epidural terior de L2 a S2, poupando L3 e L4, que seriam
por punção.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Tabela 67.8 – Dose e locais de aplicação de toxina botulínica


Padrão clínico Músculos envolvidos Dose* de Botox Dose inicial Número de pontos
unid./sessão média/unidades de aplicação
MEMBROS SUPERIORES
Ombro aduzido/girado Complexo peitoral 75 – 150 100 2-4
internamente Grande dorsal 50 – 150 100 3-4
Redondo maior 25 – 100 50 1-2
Subescapular 50 – 100 75 1-2
Cotovelo flexionado Braquirradial 25 – 100 60 1-3
Bíceps 75 – 200 100 2-4
Braquial 40 – 100 60 2
Antebraço pronado Pronador quadrado 10 – 50 25 1
Pronador redondo 25 – 70 40 1-2
Punho flexionado Flexor radial do carpo 25 – 100 50 2
Flexor ulnar do carpo 20 – 70 40 2
Polegar na palma Flexor longo do polegar 10 – 30 20 1
Adutor do polegar 5 – 25 10 1
Flexor curto do polegar opositor 5 – 25 10 1
Punho cerrado Flexor profundo dos dedos 20 – 40 20 1
Flexor superficial dos dedos 20 – 40 20 1
Intrínseco mais mão Lumbricais - interósseos 5 – 10 10 1
MEMBROS INFERIORES
Quadril flexionado Iliopsoas 50 – 200 150 2
ƒ Para localização do psoas, Psoas 50 – 200 100 2
recomenda-se fluoroscopia/
ultra-sonografia Reto femoral 75 – 200 100 3
Joelho flexionado Jarretes mediais 50 – 200 100 3
Gastrocnêmicos 50 – 150 150 4
Jarretes laterais 100 – 200 100 3
Coxas aduzidas Adutores 75 – 300 200/perna 6/perna
Joelho rijo (estendido) Quadríceps 50 – 200 100 6
Pé equinovaro Gastrocnêmicos medial – lateral 50 – 250 100 4
Solear 50 – 200 100 2
Tibial posterior 50 – 150 75 2
Tibial anterior 50 – 150 75 2/mar
Flexor longo dos artelhos 50 – 100 75 3
Flexor curto dos artelhos 20 – 40 25 1
Flexor longo do hálux 25 – 75 50 2
Artelho estriado Extensor longo do hálux 20 – 100 50 2
Cabeça e pescoço Esternocleidomastóideo 25 – 100 40 3
Complexo escaleno 15 – 50 30 3
Esplênio da cabeça 50 – 150 60 3
Semi-espinhoso da cabeça 50 – 150 60 3
Longo da cabeça 50 – 150 60 3
Trapézio 50 – 150 60 3
Elevador da escápula 25 – 100 80 3
Masseter 20 – 60/lado 40/lado 2/lado
Temporal 20/lado 20/lado 1-2/lado
Dose total corporal máxima por Volume máximo por ponto = 0,5 – 1 ml
consulta = 400 - 600 Unidades, exceto em situações especiais.
exceto em situações especiais.

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67 – Tratamento Neurocirúrgico da Espasticidade

responsáveis pela sensação do quadril e manutenção somatotópico. Em 1984, Sindou observou resultado
de postura ortostática15,16. No entanto, não incluiu os excelente com essa técnica em 12 de 15 doentes com
efeitos da desaferentação excessiva. Por esse motivo, espasticidade grave. A rizotomia seletiva é indicada a
tal procedimento permaneceu abandonado até os anos doentes com preservação da atividade motora útil.
de 1960, quando Gros propôs dividir as radículas em A infusão de álcool ou fenol no compartimento es-
quintos e seccionar apenas quatro. Mais tarde, o mes- pinhal para realização de rizotomia química é méto-
mo grupo introduziu o mapeamento por eletroestimu- do abandonado, pois não há a seletividade necessária
lação intra-operátória para preservar raízes de terri- para evitar hipotonia e anestesia.
tórios motores específicos. Os melhores resultados
foram obtidos quando se estabeleceu um parâmetro
Rizotomia Percutânea
fisiológico para encolher as raízes que apresentavam
alterações à estimulação intra-operatória. A região do A rizotomia espinhal percutânea por radiofreqüên­
cone medular proporciona acesso a todas as raízes do cia foi proposta por Kenmore e Kasdon. É indicada
plexo lombossacral com laminectomia restrita. De- para tratar doentes debilitados e sem condições de
pois de expostas as raízes, utiliza-se um pulso único execução de procedimentos a céu aberto. Na Divi-
para determinar o limiar motor. Trens de estímulos são de Neurocirurgia Funcional, a rizotomia sacral
de freqüência crescente tendem a induzir a um blo- percutânea por radiofreqüência é utilizada para tratar
queio funcional do arco reflexo ao atingir 50 Hz. No bexiga espástica. A desvantagem do método é sua fu-
entanto uma porcentagem variável de raízes apresen- gacidade (Fig. 67.5).
tam uma exacerbação na resposta motora, portanto
são consideradas patológicas. A fisiopatologia exata Mielotomia Paracentral
desse fenômeno não é conhecida, porém a hipóte-
se é de perda de inibição pré-sináptica. A rizotomia A mielotomia paracentral14 foi introduzida por
posterior seletiva consiste na secção microcirúrgica Bishop. Consiste na secção longitudinal da substância
seletiva das raízes posteriores após laminectomia ou cinzenta da medula espinhal, de modo a desconectar
laminotomia cervical ou lombar sob anestesia geral. o corno anterior do posterior. Pode ser realizada com
Na indução anestésica não devem ser utilizados agen- bisturi ou com radiofreqüência (Fig. 67.6). Laitinen,
tes bloqueadores neuromusculares despolarizantes de em 1971, observou melhora em 60% dos seus casos.
longa duração, pois inviabilizam a estimulação intra- A técnica é reservada a paraplégicos com comprome-
operatória das raízes posteriores para mapeamento timento total da função sexual e esfincteriana.

Fig. 67.5. Representação artística de rizotomia percutânea por radiofreqüência de raízes espinhais.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Fig. 67.6 – Mielotomia paracentral por radiofreqüência.

Lesão do Trato de Lissauer e do Corno nicas imprecisas e pouco seletivas. Nas décadas de
Posterior da Medula Espinhal (CPME) 1960 e 1970, foram publicados os primeiros casos de
dentatotomia em humanos para tratamento da espasti-
A lesão do trato de Lissauer e do CPME reduz a cidade, por Seigfried e Nashold. Esses autores já utili-
aferência de estímulos periféricos para os interneurô- zaram as técnicas estereotáticas com auxílio da pneu-
nios excitatórios. Foi proposta inicialmente por Sin-
moencefalografia e estimulações intra-operatórias.
dou, em 1969, para o tratamento da dor e da espasti-
Segundo Nashold, há uma somatotopia identificável
cidade nos membros superiores. Após laminectomia
e sob microcirurgia, lesões por radiofreqüência são com estimulações profundas e o paciente consciente.
induzidas na zona de penetração das raízes na medula A região medial do núcleo denteado é relacionada ao
espinhal (Fig. 67.7). segmento cefálico e à musculatura axial, enquanto a
porção lateral, aos membros. Foram descritos efeitos
mais favoráveis na hipertonia e menos nos movimen-
Dentatotomia Cerebelar tos involuntários. O seguimento em longo prazo de-
Esse alvo foi utilizado no passado como tentativa nota perda dos efeitos ao longo dos anos, mas ainda
de tratamento para movimentos anormais sem grande com resultados funcionalmente melhores que a con-
êxito, provavelmente por terem sido utilizadas téc- dição patológica prévia.

A B

Fig. 67.7 – (A) Visão posterior longitudinal da medula espinhal e a dura-máter rebatida. Local de inserção do eletródio de lesão
por radiofreqüência junto à entrada das radículas na medula espinhal. (B) Secção transversa da medula espinhal com representa-
ção do H medular e a lesão no corno posterior da medula incluindo a substância gelatinosa.

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67 – Tratamento Neurocirúrgico da Espasticidade

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68
Tratamento Cirúrgico da
Doença de Parkinson
Manoel Jacobsen Teixeira
Erich Talamoni Fonoff

INTRODUÇÃO recorrência dos sintomas. A secção do pedúnculo ce-


rebral, proposta por Guiot e Pecker em 1949, melho-
O tratamento neurocirúrgico funcional da doença rava alguns sinais e sintomas da DP; a lesão do terço
de Parkinson (DP) abrange tanto as técnicas ablati- interno do pedúnculo cerebral, proposta por Walker
vas quanto a neuroestimulação. A neurorrestauração em 1949, resultou em melhora do tremor em 60%
(neurotransplante) e a neurorreposição ainda são al- dos casos, mas não da rigidez. Na década de 1940,
vos de pesquisas avançadas e não fazem parte da prá- observou-se acidentalmente que a exérese da cabeça
tica terapêutica corrente; mas teoricamente permitem do núcleo caudado durante procedimentos destinados à
restabelecer as unidades neuronais degeneradas1-4. lesão do braço anterior da cápsula interna resultava em
melhora da sintomatologia parkinsoniana; desde então,
HISTÓRICO a remoção cirúrgica da cabeça do núcleo caudado e
do putame e, ulteriormente, a indução de isquemia do
Segundo Teive e Meneses5, o tratamento cirúrgico globo pálido induzida pela ligadura da artéria coróidea
como estratégia de tratamento na DP e de outras anor- anterior passaram a ser regularmente realizadas para
malidades do movimento não é recente. Há alguns sé- controlar o tremor e a rigidez parkinsoniana. Meyers,
culos, procedimentos ablativos envolvendo estruturas em 1939, interrompeu as vias extrapiramidais por cra-
não neurais e elementos do sistema nervoso periféri- niotomia e às custas de mortalidade de 15%, do que
co, incluindo as rizotomias e as simpatectomias, foram resultou melhora do tremor e da rigidez; ressecou a
propostos para o tratamento dos movimentos anormais. cabeça do núcleo caudado e, ulteriormente, também o
Após James Parkinson ter observado que o tremor par­ braço anterior da cápsula interna, do que resultou pa-
kinsoniano havia sido suprimido após a instalação de resia transitória e alívio do tremor em 20% dos casos.
déficit motor em um doente com acidente vascular en- Ele também observou que a lesão das fibras pálido-
cefálico, a indução de lesão nas unidades sensitivas e talâmicas na ansa lenticularis melhorava o tremor e a
motoras na medula espinhal e no tronco encefálico e a rigidez em 40% dos casos. Fénelon, em 1950, coagu-
topectomia do córtex motor passaram a ser realizadas lou a ansa lenticularis após craniotomia, observando
nesses doentes, revelando-se eficazes no tratamento melhora do tremor e da rigidez em 72% dos doen-
do tremor, geralmente às custas de déficits motores e de tes. Essas técnicas revelaram-se eficazes e associadas
outras complicações. Bucy e Case, em 1939, e Klem- a menor freqüência de complicações neurológicas que
me, em 1940, ressecaram o córtex pré-motor e motor os procedimentos anteriores, mas ainda às custas de
(áreas 4 e 6) para tratar sintomas parkinsonianos. A elevada mortalidade. O advento da técnica estereotá-
cordotomia póstero-lateral proposta por Putnam em tica para realização de procedimentos neurocirúrgicos
1940 era eficaz no controle do tremor em 50% dos ca- no ser humano, por Spiegel em 1947, tornou os proce-
sos, à custa de déficit motor ipsilateral em 30% a 80% dimentos ablativos mais seguros, pois possibilitou que
dos casos, secção do trato piramidal no segmento da a localização anatômica dos alvos fosse mais precisa.
medula cervical proposta por Olivier em 1949, que Talairach et al., em 1949, realizaram corticectomia
resultava em melhora do tremor proporcional ao dé- frontal junto com a coagulação da ansa lenticularis e
ficit motor, mas a recuperação do déficit resultava em da região medial do globo pálido com estereotaxia, no

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735
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

tratamento do hemibalismo, com significativa melho- construção das imagens de estereotomografia computa-
ra dos sintomas. Spiegel e Wycis realizaram pálido- dorizada ou de estereorressonância magnética do encé-
ansotomia em 1950 para tratar doente com coréia de falo e sua fusão com as figuras dos atlas de estereotaxia
Huntington. Leksell, em 1951, realizou palidotomia proporcionadas pela computação gráfica tornaram o
ântero-dorsomedial, observando melhora da rigidez, método de localização anatômico mais simples e elimi-
mas não do tremor. Cooper, em 1954, injetou procaí- naram as complicações inerentes à ventriculografia6.
na no globo pálido interno para tratamento das disci- A reprodução animal da DP com o seu tratamento
nesias e observou que a lesão do núcleo ventrolateral com MPTP (1-metil-4-fenil-1,2,3,6-tetraidropiridina)
talâmico resultava em melhora do tremor e da rigidez. também possibilitou melhora da compreensão da fisio-
Svennilson et al., em 1960, observaram remissão do logia e da fisiopatologia dos gânglios da base, fato que
tremor em 82% e da rigidez em 79% dos casos com também contribuiu para o aperfeiçoamento dos procedi-
a palidotomia posterior. Narabayashi e Okuma, em mentos de tratamento farmacológico e operatório da DP.
1953, demonstraram que haveria melhora da rigidez
e do tremor após a palidotomia interna. Guiot e Brion, CRITÉRIOS PARA INDICAÇÃO DO TRATAMENTO
em 1953, trataram outros movimentos anormais com OPERATÓRIO
palidotomia. Hassler e Riechert, em 1954, indicavam
a palidotomia medial em casos de rigidez e talamoto- A indicação dos procedimentos terapêuticos em
mia ventrolateral em casos de tremor. Segundo Teive doen­tes com DP é baseada na condição clínica do do-
e Meneses5, Bravo e Cooper, em 1958, demonstraram ente e na expressão da doença perante os tratamentos
que a lesão do núcleo ventrolateral do tálamo abolia o medicamentosos e reabilitantes. O tratamento neuroci-
tremor e melhorava a rigidez dos doentes com DP. rúrgico deve ser considerado quando a terapia medica-
Tálamo-capsulotomia, lesão da região subtalâmi- mentosa é ineficaz ou não tolerada ou se gera adversi-
ca, da zona incerta, dos campos de Forel, da cápsula dades nos doentes em que as manifestações da DP são
interna ou do núcleo denteado do cerebelo passaram incapacitantes e condições físicas incluindo a pressão
também a ser empregadas para tratar DP ao longo das arterial, o estado metabólico e condições de coagulação
décadas de 1950 a 1970. No Brasil, em 1954, Nie- estejam normalizadas e as condições mentais não sejam
meyer realizou os primeiros procedimentos estereo­ comprometidas a ponto de capacitá-los a participar de
táticos e Longo et al., em 1962, realizaram lesões nos programas educacionais. Deve também ser opção para
gânglios da base. Teixeira, em 1984, fez a primeira doentes com sintomatologia unilateral e acometimento
neuroestimulação talâmica para tratamento de tremor, contralateral pouco expressivo, estável ou com evo-
e Marino, em 1986, o primeiro implante de mesencé- lução lenta durante período maior que cinco anos, ou
falo no núcleo caudado. quando o tremor seja o sintoma preponderante, mesmo
quando há melhora com a medicação. O candidato ideal
Segundo Teive e Meneses5, Ehringer e Hornykiewi- para talamotomia é o doente em bom estado físico e
cz, em 1960, descreveram a deficiência de dopamina mental e com tremor, rigidez e/ou bradicinesia predo-
na substância negra em doentes parkinsonianos, o que minantemente unilateral e nas extremidades, com pou-
induziu ao uso da levodopa por Cotzias, em 1967. O co envolvimento axial, normotenso, metabolicamente
advento da levodopaterapia, em 1968, resultou em estável e sem anormalidades psicorgânicas. O trata-
declínio gradativo da necessidade de cirurgia para tra- mento operatório controla também efeitos adversos da
tar doentes com DP. No entanto, o prolongamento da medicação, incluindo as discinesias induzidas pela le-
vida proporcionando avanço da sintomatologia, a to- vodopa7, é indicado para tratar alguns doentes. A Esca-
xicidade da levodopa e de outros fármacos antiparkin- la Unificada para Doença de Parkinson (UPDRS) e os
sonianos, a indução de discinesias, a maior precisão e métodos gráficos de avaliação do desempenho motor
segurança dos procedimentos neurocirúrgicos na atua­ são muito úteis para quantificar a condição clínica pré
lidade, incluindo aperfeiçoamento de estimulação e de e pós-operatória dos doentes (Figs. 68.1 e 68.2).
registro da atividade neural durante o ato cirúrgico e A idade não é contra-indicação para o procedimen-
da impedância tecidual do método da lesão química to. É necessário que o doente esteja em condições clíni-
ou por corrente anódica pelos métodos de coagula- cas satisfatórias para que a cirurgia possa ser realizada.
ção por radiofreqüência ou criocoagulação, implante Doentes hipertensos não controlados, doentes com
de eletródios para neuroestimulação e/ou implante do discrasias sangüíneas não corrigidas ou com intensas
tecido embrionário e de células-tronco para reabilita- anormalidades cognitivas não devem ser operados em
ção estrutural foram, entre outras razões, responsáveis razão do risco de apresentarem hemorragias ou agra-
pelo aumento do número de indicações de tratamento vamento das anormalidades preexistentes. A pressão
neurocirúrgico para DP observada nos anos recentes. sistólica deve ser mantida abaixo de 150 mmHg du-
A localização espacial das coordenadas de estereo­ rante pré, trans e pós-operatório. Antiinflamatórios
taxia era realizada com base na análise das mensura- não esteróides, anticoagulantes e antiagregantes pla-
ções dos diâmetros do III ventrículo encefálico durante quetários devem ser descontinuados, durante pelo
procedimento de ventriculografia. Recentemente, a re- menos 10 dias, antes do procedimento.

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68 – Tratamento Cirúrgico da Doença de Parkinson

Fig. 68.1 – Avaliação dos doentes candidatos à neurocirurgia. Equipamento analisador de movimento Micromar proporciona
análise das características de toque, velocidade, propósito do movimento e ocorrência de tremores. Avaliação da marcha pode
ser realizada em laboratório de marcha.

Fig. 68.2 – Escalas padronizadas incluindo a UPDRS (Unified Parkinson Disease Rating Scale), de qualidade de vida e análise
gráfica do movimento, de modo a quantificar a condição motora do paciente. Registros: (1) da força; (2) da precisão; (3) da ve-
locidade; (4) do deslocamento espacial; (5, 6) da tomada de decisões motoras; (7) dos movimentos e da amplitude do tremor.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

BASES ANATÔMICAS
CÓRTEX CEREBRAL
Segundo Arruda et al.8, o sistema extrapirami- + Glu
dal regula o tônus muscular e os movimentos auto- TÁLAMO
máticos e propositais. A anatomia e a fisiologia dos D2 PUTAME D1
PUTÂMEN
CM- Cm-vl
CM-PfCm-
VOapF VOp Vim
núcleos da base são complexas. Constituem-se pelo
- Enc -
núcleo caudado e putame (neo-estriado), globo páli- + Glu GABA
+
-
do interno (Gpi) e externo (Gpe), núcleo subtalâmico GPe SNC Din
sP Campos de Forel
GABA
de Luys (NST), substância negra e núcleo rubro. As GABA

-
vias sensitivas projetam-se principalmente no putame. NST GABA
Cerebelo

O núcleo caudado recebe, em especial, projeções da GPi/


GPi/SNr
área pré-frontal e origina fibras que se projetam na + Glu Vias
proprioceptivas
Tronco encefálico
substância negra, Gpe e GPi. O Gpe recebe aferências Medula espinhal NPP
do núcleo caudado e do putame e exerce atividade ini-
bitória no núcleo subtalâmico. O núcleo subtalâmico Fig. 68.3 – Representação artística do sistema modulador
recebe projeções do Gpe e Gpi e da área cortical 8. As do movimento. Nas setas vermelhas destacam-se os alvos de
aferências para o GPi originam-se no neo-estriado e intervenções.
no núcleo subtalâmico. Do globo pálido interno emer-
gem as principais eferências dos núcleos da base; seus
neurônios projetam-se via fascículo talâmico na subs- ALVOS NEUROCIRÚRGICOS
tância negra, núcleo habenular lateral, tegmento me- Os alvos para cirurgia ablativa são o globo pálido ven-
sencefálico e no núcleo ventral oral posterior (Voa) tral e posterior, os núcleos talâmicos Voa, Vop e Vim e a
do tálamo, e via alça lenticular no núcleo pedunculo- zona incerta. Os alvos da neuroestimulação são o globo
pontino, núcleo látero-polar (Lpo) e centromediano pálido ventral medial posterior, o tálamo, a zona incerta
(CM) do tálamo. Esse conjunto de fibras é chamado e o núcleo subtalâmico de Luys (NST). Os alvos para
de campo H-1 de Forel. Os neurônios do Lpo proje- implante de tecidos são o núcleo caudado e o putame.
tam-se na área cortical 6aβ. O núcleo Vop do tálamo A interrupção de unidades ou a estimulação das
recebe projeções do núcleo denteado do cerebelo di- unidades dentato e lemniscotalâmicas é eficaz para o
retamente ou via núcleo rubro e do globo pálido me- tratamento de tremor, e a das unidades palidotalâmicas
dial e origina projeções para a área 4 do córtex motor. para o tratamento de rigidez, bradicinesia, discinesias
O núcleo Voa do tálamo recebe aferências do Gpi, via e, menos expressivamente, de tremor. A neuroestimu-
fascículo lenticular, e origina projeções para o córtex lação com eletródios implantados foi fundamentada
pré-motor (área 6aα). O núcleo ventral intermediário no fato de a estimulação elétrica dos núcleos motores
(Vim) recebe projeções espinotalâmicas e vestibula- talâmicos com freqüências elevadas, especialmente
res e, via lemnisco medial, estímulos proprioceptivos do Vim, resultar agudamente em alívio do tremor. A
das articulações e músculos e, via trato dentatoru- estimulação do tálamo motor proporciona resultados
brotalâmico, projeções do cerebelo contralateral e semelhantes aos da talamotomia, a estimulação do
projeções para as áreas corticais 3 e 4. O núcleo CM GPi resulta em efeitos similares aos da palidotomia9,
origina projeções para o neo-estriado. Esses circuitos e a estimulação do NST em seres humanos10 em efeito
controlam a atividade das áreas corticais motoras e semelhante ao da lesão do NST em macacos. A esti-
pré-motoras e possibilitam a execução dos movimen- mulação NST é eficaz para o tratamento das mesmas
tos voluntários delicados. O núcleo pedunculopontino condições que implicam palidotomia; tem a vantagem
está relacionado ao controle da motricidade axial. As de melhorar anormalidades axiais. A estimulação do
vias talamocorticais, portanto, atuam em neurônios globo pálido e do NST também melhora anormalida-
que originam projeções corticoestriatais (Fig. 68.3). des cognitivas (Tabela 68.1).

Tabela 68.1 – Relação entre a natureza das anormalidades e os resultados das intervenções nos diferentes alvos
de estereotaxia
Natureza das anormalidades Localização dos alvos da lesão/estimulação Apenas estimulação
Campo de Forel Gpi Voa Vop / Vim Núcleo subtalâmico de Luys
Tremor ++ ++ – +++ ++
Rigidez +++ +++ +++ + +++
Bradicinesia + ++ +/– – +++
Alterações axiais – +/– – – ++
Resultado: excelente +++; moderado ++; regular +; discutível +/–; ineficaz –.

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68 – Tratamento Cirúrgico da Doença de Parkinson

PROCEDIMENTOS OPERATÓRIOS A

O procedimento operatório consiste na fixação,


sob a anestesia local, de um aparelho de estereotaxia
ao segmento cefálico do doente (Fig. 68.4). Após a
realização de estereotomografia ou de estereorresso-
nância magnética, os alvos anatômicos são identifi-
cados depois da reconstrução e fusão das imagens
com as dos atlas da estereotaxia (Figs. 68.5 a 68.8).
Por meio de trepanação localizada na região frontal B
ou occipital, introduz-se um eletródio e, através dele,
realizam-se registro da atividade neuronal (Fig. 68.9)
e estimulação elétrica para delinear as estruturas a se-
rem lesadas ou estimuladas. O contato do eletródio
com as células relacionadas ao tremor no tálamo ou às
fibras nos campos de Forel pode resultar em abolição
temporária no tremor do hemicorpo contralateral; a
estimulação à baixa freqüência costuma gerar aumen-
to da magnitude do tremor e elevada freqüência em
sua supressão. Quando o eletródio se situa no interior
da cápsula interna ou suas proximidades, a estimula-
ção com baixa amplitude resulta em contrações mus-
culares fásicas no hemicorpo contralateral correspon-
dentes à freqüência da neuroestimulação; quando se
localiza no interior ou nas proximidades dos núcleos
sensitivos do tálamo, gera sensações parestésicas no
hemicorpo contralateral; quando se encontra no inte-
rior ou nas proximidades do trato óptico, gera fosfe-
nas ou feixes de luz.

Fig. 68.4 – Fotografia do aparelho de estereotaxia (Micro- Fig. 68.5 – Fotografia da imagem estereotomográfica cap-
mar) fixado à cabeça de um manequim. Por meio de reparos turada em doente durante a intervenção do procedimento de
aplicados na superfície do equipamento (fiduciais) é possível, estereotaxia visando ao tratamento de movimentos anormais.
com a utilização de tomografia computadorizada ou resso- (A) Reconstrução sagital da tomografia e presença dos reparos
nância magnética e sua reconstrução espacial, a determina- que são utilizados para a localização das estruturas intracra-
ção de estruturas anatômicas no interior da caixa craniana, nianas. Fusão da imagem da estereotomografia com as ima-
incluindo-se comissura anterior, comissura posterior, forame gens da ressonância magnética, em cortes axiais (B) e em corte
de Monro, altura talâmica para a localização dos alvos de sagital (C). O método de fusão de imagem combina a precisão
estereotaxia. Os métodos de imagem incluindo a tomografia espacial da tomografia computadorizada com resolução ana-
computadorizada e a ressonância magnética possibilitam a lo- tômica da ressonância magnética.
calização anatômica do alvo do procedimento.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

A B

C D

Fig. 68.6 – (A a D) Fusão das imagens da estereotomografia com a dos atlas de estereotaxia, em que se podem localizar as
estruturas talâmicas; globo pálido, campo de Forel e núcleo subtalâmico de Luys são os alvos do procedimento.

PROCEDIMENTOS ABLATIVOS vidade neural autônoma nessa região, assim como da


via palidofugal e da aferência contralateral oriunda do
Para a ablação de estruturas encefálicas profundas,
cerebelo. A talamotomia da Voa interrompe as influên-
pode-se coagular o tecido nervoso com calor gerado
cias palidotalâmicas que trafegam pelo campo de Forel.
por radiofreqüência (Figs. 68.10 a 68.12) ou por frio
A ablação das regiões posteriores do VL, ou seja, dos
gerado por criocoaguladores; o primeiro método é o
mais utilizado porque é mais seguro e mais delica- núcleos Vop e Vim, é eficaz para controlar o tremor, a
do. Os métodos ablativos têm a vantagem de tornar lesão do Voa para o controle da rigidez, a lesão da re-
os doentes mais independentes da equipe de saúde. A gião rostral do Voa para o controle da bradicinesia apen-
lesão induzida pode ser irreversível; quando acomete dicular e a lesão associada dos núcleos Voa, Vop e Vim
estruturas funcionalmente importantes pode gerar in- é eficaz no tratamento do tremor, da rigidez e, eventual-
capacidade crônica (Figs. 68.13 a 68.15). mente, da bradicinesia apendicular. A talamotomia, en-
tretanto, não proporciona melhora dos sintomas axiais.
A talamotomia do VL parece reduzir a progressão da
Talamotomia do Núcleo Ventrolateral do doença e aliviar o tremor em até 91,5% dos casos; há
Tálamo recidiva em 5,6% dos casos durante os primeiros três
Cooper, em 1954 observou melhora do tremor após meses e em 10% a 20% dos casos durante o primeiro
talamotomia do núcleo ventrolateral do tálamo (VL). A ou segundo ano após a operação. Pode haver progressão
talamotomia interrompe o circuito mediador do tremor; da rigidez durante os primeiros cinco anos pós-opera-
seu mecanismo de ação não foi totalmente esclarecido, tórios. Há registro de manutenção do efeito terapêutico
mas está provavelmente associado à diminuição da ati- em 60% dos casos em 10 a 15 anos11. Morbidade tran-

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68 – Tratamento Cirúrgico da Doença de Parkinson

Fig. 68.7 – Reconstruções tridimensionais de estereotomografia do crânio e reconstruções planares do parênquima encefálico
para localização de alvo e determinação do trajeto do eletródio em relação e estruturas eloqüentes, como a cápsula interna.

Fig. 68.8 – Reconstrução tridimensional da imagem da cápsula interna e do globo pálido em tempo real durante a execução
do procedimento e da localização dos alvos estereotáticos.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

sitória, durando poucos dias, representada por confusão


mental, hemiparesia, apraxia, disartria e abulia, pode
ocorrer em até 80% dos casos; desequilíbrio, geralmen-
te associado à hipotonia e à ataxia apendicular, mani-
festa-se em até 13% dos casos, e disartria em 10% dos
casos de talamotomia é realizada no hemisfério domi-
nante. Complicações permanentes, representadas prin- Fig. 68.11 – Fotografia de eletródio (Micromar) de radiofre-
cipalmente por hipofonia, ocorrem em menos de 10% qüência que permite a lesão de estrutura cerebral.
dos casos de cirurgia unilateral; disartria, afasia discreta
e hipofonia manifestam-se em até 18% dos casos de ci-
rurgia bilateral. Taxa de óbito é de 0,3%.

Fig. 68.12 – Eletródio com extremidade flexível e curva


(Radionics).

Fig. 68.13 – Ressonância magnética em corte axial de doen­


te submetido a palidotomia bilateral.
Fig. 68.9 – Equipamento de registro por semimicro ou mi-
croeletródios para tro da atividade encefálica profunda.

Fig. 68.10 – Fotografia do aparelho de gerador de radiofre-


qüência que possibilita o registro da impedância tecidual, es- Fig. 68.14 – Ressonância magnética em corte coronal após
timulação com freqüência de amplitude e comprimento variá- palidotomia unilateral.
veis e da indução de lesões térmicas dos alvos selecionados.

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68 – Tratamento Cirúrgico da Doença de Parkinson

Segundo Johansson et al.12, Leksell em 1951 rea­


lizou a palidotomia ântero-dorsomedial e observou
melhora da rigidez. Em 1956, a palidotomia ventro-
posterior obteve melhora do tremor, da rigidez e da
bradicinesia. Hassler, em 1955, considerou o núcleo
Fig. 68.15 – Representação esquemática da lesão de radio- ventrolateral do tálamo o alvo de escolha no alívio
freqüência induzida no encéfalo. Note-se que a lesão apre- das discinesias e da rigidez e do tremor. Spiegel et al.,
senta aspecto elíptico e sua dimensão é relacionada mais ao em 1958, descreveram a pálido-ansiotomia, técnica
comprimento da superfície exposta e menos ao diâmetro do
eletródio utilizado. que proporcionava melhora do tremor em 71% dos
casos, da rigidez em 80% e da bradicinesia em pou-
cos casos, às custas de hemiplegia em 5% e de mor-
Talamotomia do Núcleo Ventral Intermediário talidade em 2%. A palidotomia ventral-póstero-lateral
foi revivida em 1985 por Laitinen, que observou sua
Os neurônios do Vim integram os impulsos sensiti-
eficácia no tratamento do tremor, rigidez e, especial-
vomotores envolvidos nos movimentos finos e atuam
como marca-passos para os movimentos, pois apresen- mente, da bradicinesia.
ta atividade neuronal espontânea caracterizada por
descargas rítmicas com o tremor contralateral. Palidotomia Dorsomedial
A talamotomia do Vim cessa o tremor em cerca de O conceito de que atividade excitatória do STN
90% dos casos durante os primeiros dois anos após a no GPi e na SNr resulta em excessiva atividade inibi-
operação e em 57% em 10 anos; quando não recorre tória pálido-talâmica e nigro-talâmica foi a razão do
em três meses, os resultados geralmente são perma- desenvolvimento da palidotomia para o tratamento de
nentes; caso recorra, nova intervenção pode ser pro- alguns aspectos da doença de Parkinson, como o con-
gramada. Há melhora da rigidez em 88% dos casos trole do período off, do tremor, da rigidez, da distonia
durante os primeiros dois anos pós-operatórios e em e das discinesias induzidas pela L-dopa, proporcio-
55% em 10 anos. Há melhora da discinesia induzida nando melhora mais evidente da rigidez que do tre-
pela levodopa, e a bradicinesia pode ser apenas tem- mor. A palidotomia ventral póstero-medial tem como
porariamente diminuída. Não se modificam as anor- objetivo a lesão da região sensitivomotora do Gpi e é
malidades ipsilaterais à lesão, assim como os sinto- eficaz no tratamento da rigidez, acinesia, discinesias
mas axiais. induzidas pela levodopaterapia e do tremor. É indi-
A morbidade, geralmente temporária, é de 3% a cada para tratamento de doentes em fases avançadas
10% em casos de cirurgias unilaterais. É mais freqüente da doença, quando há predomínio da rigidez e da aci-
quando as cirurgias são realizadas no hemisfério domi- nesia não controladas com levodopa ou outras medi-
nante. Ocorrem anormalidades cerebelares temporárias cações antiparkinsonianas, em casos de intolerância
em até 8,6% dos casos e confusão mental e/ou compro- à farmacoterapia e de discinesias induzidas pela le-
metimento da concentração temporariamente durante vodoterapia. Tem a vantagem de poder ser realizada
algumas semanas em 10%. Parestesias e comprome- bilateralmente, em casos especiais, em ato operatório
timento da sensibilidade tátil, geralmente transitórias, único. É contra-indicada a doentes com dificuldades
sediadas na região perioral e na mão contralaterais, cognitivas e para tratamento de outras formas de par­
podem manifestar-se em 1% a 2% dos casos. Em 8% kinsonismo, como paralisia supranuclear progressiva,
dos doentes, as complicações podem ser persistentes. atrofia de múltiplos sistemas e degeneração estriato-
nigral; sua indicação deve ser evitada a doentes com
Lesão da Zona Incerta ou Campotomia de Forel menos de cinco anos de evolução, para possibilitar
A lesão de zona incerta ou campotomia de Forel exclusão de outras doenças degenerativas. Resulta
consiste na lesão das fibras palidofugais, dentatotalâ- em melhora da rigidez em 76% a 92% dos casos, con-
micas e proprioceptivas, que se projetam nos núcleos trola o tremor em 60% a 93% e a bradicinesia em 76%
Vop, Voa e Vim. É muito eficaz para tratar tremor e a 91%. A experiência com o procedimento bilateral é
rigidez. Proporciona resultados discretamente supe- limitada. Há relatos de haver pouca melhora adicional
riores aos da talamotomia do núcleo VL ou do Vim. da bradicinesia com o procedimento contralateral (em
Hipotonia e hemiparesia são efeitos adversos em pou- torno de 10%) às custas da recuperação pós-operatória
cos doentes; movimentos coreoatetóicos e/ou hemi- mais alentecida e de maior morbidade13. Quando in-
balísticos transitórios podem ocorrer em até 1% a 3% dicada, a segunda cirurgia deve ser preferencialmente
dos casos em razão da proximidade do NST, podendo, realizada após seis meses transcorridos da primeira
portanto, ser parcialmente envolvido na área lesada. cirurgia. Deve-se considerar a estimulação palidal,
ipsilateralmente à palidotomia se ocorrerem discine-
sias persistentes e refratárias, freezing assimétrico,
Palidotomia

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

sintomas incapacitantes e anormalidades da marcha. vimento de equipamentos totalmente implantáveis


Há ainda questões sobre o prognóstico, a longo prazo, com circuitos híbridos providos de baterias, à possi-
e sobre a influência da palidotomia na progressão da bilidade do uso de sistemas de programação não in-
doença de Parkinson. vasiva que controlam o comprimento de onda, a am-
Em ordem decrescente, as melhores indicações da plitude e a freqüência dos estímulos e a combinação
palidotomia são: discinesias incapacitantes induzidas de acionamento de eletródios multipolares aplicados
por drogas; flutuações motoras; rigidez; bradicinesia; nos alvos de lesão tornaram a neuroestimulação am-
tremor; freezing; anormalidades da marcha. plamente aplicável, mesmo em alvos não apropriados
Quadrantopsia ocorre em cerca de 3% dos casos, para ablação, como o núcleo subtalâmico de Luys. A
e hemiparesia transitória, em menos de 3%. O ganho natureza conservadora da neuroestimulação e a possi-
de peso observado após a cirurgia é de origem des- bilidade de adaptação dos parâmetros elétricos às ne-
conhecida; talvez decorra da diminuição do consumo cessidades clínicas a tornam instrumento seguro, pois
energético provocado pelas discinesias. A prevalência apresenta complicações permanentes inferiores aos
das alterações neuropsicológicas após palidotomia é das cirurgias ablativas, especialmente em casos de
controversa; alguns autores não observaram com- DP. Segundo Teixeira15, no fim da década de 1950, a
prometimento estatisticamente significativo; outros estimulação encefálica profunda crônica em humanos
observaram comprometimento da fluência semânti- foi inicialmente aplicada nos núcleos sensitivos do
ca após o procedimento à esquerda e das habilidades tálamo e no mesencéfalo para tratamento da dor. De
construtivas visuoespaciais após lesão à direita. acordo com Teixeira2, passou a ser aplicado no trata-
mento dos movimentos anormais em 1984 por Tasker
e Sieg­fried6. Benabid et al. (1989) trataram doentes
Lesão do Núcleo Subtalâmico de Luys com tremor decorrente de doença de Parkinson por
A lesão espontânea do núcleo NST resulta em me- meio de estimulação talâmica. Enquanto a estimula-
lhora importante dos sinais parkinsonianos, às vezes ção do Vim revelou-se eficaz no tratamento do tremor,
associadamente a hemibaslimo discreto e temporá- a do globo pálido revelou-se eficaz no tratamento da
rio. A escassez de dopamina no estriado resulta em rigidez, oligocinesia, tremor e discinesias induzidas
redução do efeito inibitório da via palidal direta e em pela L-dopa e do núcleo subtalâmico no tratamento
aumento da atividade da projeção estriatopalidal indi- de sintomas cardinais da doença de Parkinson, in-
reta no NST, o que implica maior atividade excitatória cluindo as alterações axiais e cognitivas10,16.
do NST no GPi. Portanto, a interrupção da atividade
do NST pode reduzir a hiperatividade do GPi e aliviar Bases Fisiológicas da Neuroestimulação
mais intensamente as anormalidades motoras que a le-
são do GPi, tal como revelam os modelos animais. Há Segundo Teixeira2, a estimulação elétrica de alta
risco maior de a lesão induzir hemibalismo em ani- freqüência (superior a 100 Hz) do tecido nervoso
mais sadios. Aparentemente em indivíduos com DP modifica a atividade de neurotransmissores e exerce
ou em macacos com parkinsonismo, o hemibalismo é efeito semelhante ao do bloqueio da atividade espon-
mais raro em razão da degeneração das vias regulató- tânea da estrutura-alvo. Os mecanismos celulares da
rias do movimento; todos os sinais cardinais do par­ neuroestimulação são desconhecidos. Teoricamente,
kinsonismo em macacos tratados com MPTP podem a estimulação em baixa freqüência ativa neurônios e
ser abolidos após a lesão do NST. A estimulação das axônios vizinhos aos eletródios ou inativa quando a
regiões tremorgênicas do Vim, Vop e GPi pode blo- freqüência da estimulação é elevada. Os efeitos nas
quear os sinais oscilatórios anormais ou sobrepassar células podem ser diferentes daqueles dos axônios. A
os sinais oscilatórios com freqüência de sinal constan- ativação das fibras pode ser tanto antidrômica como
te. Entretanto, o desenvolvimento de movimentos ba- ortodrômica. Segundo estudo com PET, a estimulação
lísticos ou coréicos persistentes em animais limitou o efetiva do Vim em doentes com tremor causa altera-
interesse pela lesão do NST no tratamento da doença ções do metabolismo, o que não se observa quando
de Parkinson em seres humanos13, contrastando com a estimulação é ineficaz; a alteração do metabolismo
o observado com a estimulação do NST. parece dever-se ao efeito antidrômico da estimulação.
No GPi, o resultado é de redução, e não o bloqueio,
NEUROESTIMULAÇÃO dos potenciais de ação de neurônios isolados situados
até 3 mm do eletródio, achado cuja causa mais prová-
Os procedimentos ablativos realizados em doentes vel deve ser mais a ativação de terminações GABA-
com pouca reserva funcional ou quando aplicados bi- érgicas que se projetam-se no GPi do que o bloqueio
lateralmente associam-se a várias complicações neu- por despolarização dos neurônios vizinhos. Os efeitos
rológicas irreversíveis. Graças ao aperfeiçoamento de da estimulação crônica são ainda obscuros; há evidên-
eletródios implantáveis, à miniaturização dos dispo- cias de que a estimulação prolongada do Vim resulte
sitivos de geração de corrente elétrica, ao desenvol- apenas em discreta gliose ao redor do eletródio. Em

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68 – Tratamento Cirúrgico da Doença de Parkinson

animais, a estimulação crônica do tálamo ventrolate- no contralateral. A estimulação interrompe o circuito


ral resultou em proliferação sináptica no córtex mo- mediador do tremor no tálamo provavelmente porque
tor; é provável que a remodelação sináptica também reduz a atividade neuronal autônoma nessa região,
possa ocorrer em seres humanos. assim como antidromicamente da via palidofugal da
Os alvos e a indução da neuroestimulação são os aferência contralateral oriunda do cerebelo. Entretan-
mesmos dos procedimentos ablativos, ou seja, o glo- to, a talamotomia do Vim causa disartria em 10% dos
bo pálido ventral e posterior, os núcleos talâmicos Voa, casos quando é realizada no hemisfério dominante,
Vop e Vim, a zona incerta e o núcleo subtalâmico de desequilíbrio em até 13% dos casos, alterações cog-
Luys. A estimulação de unidades dentato e leminisco- nitivas (perda da iniciativa, redução da memória e da
talâmicas no tálamo é eficaz no tratamento do tremor. fluência da linguagem, em geral, temporárias. Entre-
A neuroestimulação do pálido ventral póstero-medial tanto, o número de complicações permanentes é ele-
é útil no tratamento da rigidez, bradicinesia, discine- vado, principalmente após procedimentos bilaterais;
sias e, menos expressivamente, do tremor. A neuroes- 9% são representados principalmente por hipofonia,
timulação dos campos de Forel é útil no tratamento disartria, afasia discreta e hipofonia em até 18%.
do tremor, rigidez, discinesias e, talvez, da oligocine- Portanto, a estimulação talâmica é indicada para
sia. A estimulação do NST é eficaz no tratamento da tratar tremor, seguindo os mesmos preceitos da in-
rigidez, oligocinesia, tremor, discinesias e das anor- dicação da talamotomia, ou seja, refratariedade ou
malidades axiais. intolerância à medicação, incapacidade suficiente
para interferir nas atividades de vida diária e prática
Seleção de Casos para Neuroestimulação e quando o tremor torna-se o sinal mais proeminente
e mais comprometedor da função; havendo predomí-
A neuroestimulação deve ser considerada quando nio de outros sintomas e sinais, outros alvos devem
a terapia medicamentosa tenha se tornado ineficaz, ser eleitos. Há alívio do tremor após a estimulação
não seja tolerada ou gere adversidades nos doentes, do Vim em 64% a 100% dos doentes com doença de
embora eles tenham condições mentais adequadas Parkinson durante período que varia de 3 a 8 anos.
para capacitá-los a participar de programas educacio- A qualidade de vida nas escalas Schwab e England
nais, capacidade moderada ou intensa gerada pela DP e UPDRS II melhora como conseqüência da função
e melhora, mesmo que parcial. A neuroestimulação motora; especialmente o item relacionado à escrita,
é indicada obedecendo às mesmas condições do mé- que correlaciona invalidez ao tremor, é beneficiado.
todo ablativo, ou seja, ocorrência de tremor, rigidez, Não há relato de recidiva do tremor após seguimento
bradicinesia ou discinesias secundárias à L-dopa. de longo prazo em doentes assim tratados. Segundo
Para muitas dessas condições, os alvos são similares Schurman et al.8, o estado funcional melhora mais
aos dos métodos ablativos, ou seja, o tálamo (VL), o nos doentes submetidos à estimulação que nos sub-
globo pálido póstero-lateral e a zona incerta. Faz ex- metidos à talamotomia. Ocorre melhora do estado
ceção o núcleo subtalâmico de Luys, cuja lesão ainda funcional em cerca de 65% dos casos17. Reposicio-
não pode ser realizada com segurança. Este alvo pro- namento dos eletródios podem ser necessários em até
porciona alívio de todos os sintomas da DP, incluindo 5% das vezes, devido aos resultados insatisfatórios.
as axiais (congelamento, marcha, posturas). A idade São mais raras alterações de atenção e cognitivas16
não é contra-indicação para o procedimento; é neces- (Tabela 68.2).
sário que o doente esteja em condições clínicas gerais e
mentais satisfatórias para que a cirurgia seja indicada.
São inconvenientes da neuroestimulação a neces-
sidade do freqüente comparecimento do doente à uni- Tabela 68.2 – Comparação entre a talamotomia e a
dade de assistência para regulação dos parâmetros de estimulação talâmica quanto a diversos aspectos
estimulação, a ocorrência de infecções que obrigam a Talamotomia Estimulação
remoção do sistema e o tratamento com antibióticos, talâmica
a erosão do tegumento que cobre o equipamento, des-
Tremor ++++ ++++
locamento do eletródio, quebra do eletródio ou cone-
xões, exaustão da bateria e defeito do gerador. Outros sinais de DP – –
Complicações + –
Estimulação Talâmica Reversibilidade – ++++
O núcleo Vim do tálamo integra impulsos sensi- Alterações de parâmetros – ++++
tivomotores envolvidos nos movimentos finos; seus Custo do sistema – ++++
neurônios atuam como marca-passos para o tremor; Corpo estranho – ++++
apresentam atividade neuronal espontânea caracteri-
Troca de fonte de energia – ++++
zada por descargas rítmicas com o tremor parkinsonia-

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

As complicações temporárias decorrentes do pro-


cedimento são raras. Algumas são semelhantes às da
talamotomia e representadas pela ocorrência de he-
matoma no leito cirúrgico ou extracerebral, crises
convulsivas, confusão mental, reações adversas rela-
cionadas à estimulação (parestesias, distonia, desequi-
líbrio, disartria e infecções). Hematoma de pequena
dimensão é observado em 3% dos casos, e geralmente
não exerce efeito da massa (semelhante ao que ocorre
em talamotomia); em 12% dos casos é detectado em
exames de imagem de rotina. Em longo prazo, outros
efeitos adversos descritos são parestesias contralate-
rais em 6% a 36%, distonia dos membros em 2% a
9%, anormalidades do equilíbrio em 3% a 8%, ataxia
em 6%, fraqueza nos membros em 4% a 8%18 e disar-
tria em 3% a 18% dos casos, ou seja, 51,7% nos doen-
tes submetidos à talamotomia contralateral e em 15%
dos casos unilaterais. A estimulação contínua pode
levar à tolerância do fenômeno em cerca de 3,5% dos
doentes, resultando em perda de eficácia19. As com- Fig. 68.16 – Ressonância magnética em corte sagital ence-
plicações “cerebelares gerais” correspondendo a di- fálica de paciente com implante de eletródio implantado no
sartria, ataxia e alterações da marcha são observadas núcleo subtalâmico.
em 26% dos casos6. Escalonamento de voltagem é
observado em cerca de um terço dos doentes6. Óbitos
são raros, ocorrendo em até 3% dos casos15. Compli-
cações permanentes são raras. A complicação mais
importante da estimulação talâmica é a disartria. As
complicações observadas são reduzidas ou elimina-
das quando a magnitude da estimulação é reduzida ou
a estimulação interrompida; são observadas em cerca
de um terço dos doentes submetidos previamente à
talamotomia contralateral, mais freqüentes em casos
de estimulação bilateral. Apesar de os efeitos colate-
rais serem reversíveis, muitos doentes preferem man-
ter a neuroestimulação, uma vez que a melhora do Fig. 68.17 – Radiografia do mesmo paciente da Fig. 68.16.
tremor sobrepassa o desconforto dos efeitos colate-
rais. Em doentes com tremor bilateral, a estimulação
talâmica no hemisfério dominante pode ser combina-
da à talamotomia no hemisfério não dominante, mas Eletródio
a morbidade associada à talamotomia provavelmente 1,5 mm
reduz a vantagem desse procedimento18. Pelo fato de
a estimulação do núcleo subtalâmico melhorar todos
os sintomas do doente com DP, a estimulação talâ-
mica é menos utilizada. Na Divisão de Neurocirurgia
Funcional do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo, os eletródios
são implantados no núcleo subtalâmico e são posi-
cionados de modo a fazer contato com o núcleo Vop;
quando houver necessidade de resgate do controle do
tremor, o mesmo sistema de estimulação poderá ser
utilizado (Figs. 68.16 a 68.19).

Estimulação Palidal
A estimulação palidal ativa o córtex motor e re-
produz fisiologicamente o que ocorre após a lesão do Fig. 68.18 – Representação artística da extremidade intra-
GPi, ou seja, resulta em melhora da rigidez, bradi- craniana do eletródio.

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68 – Tratamento Cirúrgico da Doença de Parkinson

Estimulação do Núcleo Subtalâmico de Luys


Sob o prisma fisiopatológico, o NST é o melhor
alvo de estimulação quando se visa à melhora das
anormalidades moduladas pelas conexões do NST
com os núcleos pedunculopontinos; relatou-se melho-
ra de todos sintomas motores parkinsonianos, inclusi-
ve das anormalidades axiais após a estimulação dessa
estrutura. A estimulação elétrica proporciona os mes-
mos resultados da lesão do NST, mas é mais segura e
reversível, o que o torna o procedimento de escolha
para manipulação dos doentes com DP10,16. Estudos
realizados com PET demonstraram que, em doen-
tes beneficiados, há aumento do fluxo sangüíneo na
Fig. 68.19 – Representação artística de geradores de pulsos área motora suplementar, cíngulo e córtex pré-frontal
elétricos que, por cabo, é acoplado ao eletródio implantado dorsolateral7, durante a estimulação do NST. Essas
no interior do encéfalo. Por meio de telemetria não invasiva é alterações são mais pronunciadas do que quando há
possível determinar parâmetros de estimulação. estimulação do GPi; e não alteram o fluxo no córtex
pré-frontal dorsolateral como ocorre em casos de es-
cinesia, tremor e discinesias conduzidas pela L-dopa timulação do NST. É provável que essa modificação
em 88% dos casos, mas sem as complicações carac- na atividade cortical se deva ao fato de o NST ativar
terísticas da neuroablação9,10,20. A melhora observada neurônios da região reticular do núcleo subtalâmico.
nas escalas motoras do UPDRS varia de 11% a 70%, A estimulação pode inibir diretamente neurônios do
valores, portanto, semelhantes aos observados após NST, reduzir a ativação do GPi e ativar antidromica-
a palidotomia unilateral16,21. A percentagem diária mente as projeções do NST no GPe e nos colaterais
em que o indivíduo permanece na fase on aumenta inibitórios destinados aos núcleos da base que dão
consideravelmente. Embora possa haver melhora das origem a projeções para outras estruturas. Além dis-
alterações axiais, essa observação ainda é matéria so, a estimulação na região NST também pode ativar
controversa. A maioria dos doentes mantém a dose diretamente as fibras palidotalâmicas e nigrotalâmi-
da L-dopa e alguns necessitam elevar o montante diá­ cas que são justapostas ao NST. Não apenas tremor,
rigidez e acinesia, mas também os sintomas axiais
rio da medicação9,20. Há relato de melhora do estado
como congelamento, anormalidades de marcha e do
mental após a estimulação palidal (Tabela 68.3).
equilíbrio são efetivamente aliviados, assim como
os fenômenos da fase off induzidos por drogas18. A
Tabela 68.3 – Comparação entre a palidotomia e a
estimulação do NST em doentes com oligocinesia e
estimulação palidal quanto a diversos aspectos. rigidez intensa resultou em melhora dos componentes
Palidotomia Estimulação motores do UPRDS de 42% a 82% (57,9%), três me-
palidal ses após o procedimento; essa melhora é comparável
Melhora dos sinais ++++ ++++ ou superior aos resultados da palidotomia unilateral12.
parkinsonianos A melhora da acinesia após um ano varia de 12,7% a
Discinesia ++++ ++++ 55,9%18. No estudo de Moro et al.18, ocorreu 33,3%
de melhora no desempenho da fala, 85,6% do tremor,
Estado mental Déficit cognitivo? Melhora
62,5% da rigidez, 42,9% da marcha e 35,3% da esta-
Complicações ++ + bilidade postural na fase off. O uso de neuroestimula-
Custo + ++++ ção durante a noite melhora a mobilidade do doente e
Visitas / ajustes < >
o sono, além de reduzir a distonia matinal. A distonia
da fase off também desaparece. Isso significa que o
Reversibilidade - ++++ procedimento melhora a qualidade de vida dos doen-
tes segundo várias escalas adotadas18. A estimulação
O alvo da estimulação é o mesmo da lesão, ou seja, do NST não alivia a discinesia induzida pela L-dopa,
o GPi ventral-póstero-lateral5, região que, segundo ao contrário do que ocorre com a palidotomia; os
estudos eletrofisiológicos, corresponde ao território doen­tes geralmente reduzem a dose diária da L-dopa
sensitivo-motor do globo pálido, onde a atividade de 40% a 100%11,18, resultando, de forma indireta, em
neuronal é modificada pela movimentação ativa ou melhora dessa sintomatologia.
passiva. Há evidências de que a estimulação de re­ É provável que a lesão ou a estimulação NST
giões mais anteriores que a que usualmente é alvo de proteja a porção compacta da substância negra con-
lesão proporciona resultados mais apropriados. tra a degeneração, pois reduz a liberação de amino-

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

ácidos excitatórios (ácido glutâmico) naquela região tauração anatômica das estruturas degeneradas com
por fibras dele oriundas. Hematoma intracraniano implante de tecidos capazes de produzir neurotrans-
pode ocorrer em 2% dos doentes e confusão mental missores necessários para a função neural nas estru-
durante alguns dias em até 15%19. Entre outros efei- turas deles carentes4.
tos colaterais da estimulação do NST, destacam-se: O emprego de células embrionárias homólogas,
movimentos coréicos ou balísticos no pescoço ou células heterólogas cultivadas de animais, células
membros contralaterais quando os parâmetros de es- amitóticas de tumores produtores de neurotransmis-
tímulos são elevados e que geralmente se revertem sortes e neuro-humores, células-tronco autólogas
quando os parâmetros são reduzidos ou a estimulação e cultivadas e tratadas com técnicas de engenharia
é desativada18,19; hemibalismo em menos de 1% dos genética é uma possibilidade promissora no trata-
casos agudos, que geralmente se resolve em 24 horas. mento de neuropatias degenerativas, incluindo a DP.
O balismo pode, entretanto, manifestar-se quando os Entretanto, muitas questões ainda necessitam ser so-
parâmetros de estimulação são semelhantes aos que lucionadas para que os implantes neurais sejam assi-
proporcionam alívio da sintomatologia. Ocorre au- milados no tratamento da doença de DP, incluindo o
mento do consumo de energia necessário para manter papel dos transplantes na recuperação funcional, os
a eficácia com o passar do tempo18. Em alguns casos, mecanismos pelos quais neurônios incorporados ao
movimentos hemibalísticos podem ocorrer e são dis- encéfalo dos hospedeiros contribuem para a melhora
cretos e não debilitantes22 (Tabela 68.4). funcional, como os fatores tróficos promovem me-
lhora funcional, quais fatores tróficos são envolvidos,
quais são as melhores fontes de células para o proce-
Tabela 68.4 – Comparação entre os diferente sítios de dimento e se células que induzem à regeneração são
estimulação para tratamento dos diversos sintomas da diferentes das envolvidas no processo degenerativo.
doença de Parkinson e demais aspectos A maioria dos estudos utilizou vários tecidos neurais
STN GPi Vim ou paraneurais para transplantes. Tanto enxertos de
tecidos dopaminérgicos como paraneurais da medula
Tremor +++ ++ +++
adrenal ainda não se revelaram eficazes no tratamento
Acinesia +++ ++ 0 da DP; em roedores e em primatas não humanos e hu-
Rigidez +++ ++ + manos, as células cromafins adrenais não sobrevivem
Marcha +++ ++ 0 apropriadamente no parênquima estriatal. A sobre-
vivência é boa em espécies não-humanas quando o
Discinesias – ou + +++ + (++ Voa) tecido implantado é tratado com fator de crescimento
(curto prazo)
++ (+) nervoso (FCN) ou co-enxertado com células produto-
(longo prazo) ras de FCN. A melhora funcional observada com im-
Distonia – off +++ ++ 0/+
plante de tecido fetal mesencefálico é mais consisten-
te e mais prolongada que com o implante de tecido da
Redução de L-dopa +++ +/0 +/0 medula adrenal; tecido mesencefálico embrionário é
Dificuldade de Grande Mínimo Mínimo mais viável e, após o implante, sua eficácia é melhor.
manejo PO Há dúvidas se o tecido embrionário pode constituir
Cognição +++ ++ – uma boa fonte de dopamina ou de fatores neurotrófi-
Consumo de bateria Baixo Grande Baixo a cos. Os efeitos tróficos são mais evidentes em camun-
moderado dongos jovens tratados com MPTP, nos quais não há
destruição de neurônios da substância negra, do que
em camundongos idosos nos quais o agente tóxico é
mais lesivo, mas há apenas redução da capacidade de
NEUROTRANSPLANTE sintetizar dopamina. O brotamento também é obser-
A doença de Parkinson caracteriza-se histopato- vado em macacos com DP gerado pela MPTP. Ocorre
logicamente pela degeneração de neurônios dopa- síntese de tirosina hidroxilase em macacos após a ad-
minérgicos que, da substância negra, projetam-se no ministração de MPTP, que induz à lesão de aproxima-
núcleo caudado e putame. Inicialmente, os doentes damente 50% dos neurônios da substância negra, de
apresentam melhora funcional com a administração modo que considerável proporção deles ainda man-
de levodopa ou agonistas dopaminérgicos; a médio tém a capacidade de responder a influências tróficas.
prazo, entretanto, os neurônios perdem a capacidade Em dois doentes nos quais a resposta trófica foi ob-
de converter a levodopa em dopamina e os efeitos servada havia população considerável de neurônios
adversos da medicação, especialmente representados viáveis no mesencéfalo ventral; nos demais, havia
pela condição on-off, tornando-se expressivos, o que poucos neurônios contendo melanina na substância
limita o seu emprego em muitos casos. Isto significa negra. Esses dados indicam que, se o objeto do tra-
que é lógico tratar a doença de Parkinson com a res- tamento com implante de tecido fetal é o aumento da

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68 – Tratamento Cirúrgico da Doença de Parkinson

atividade dopaminérgica por mecanismos tróficos nos 7. Sá DS, Sá PND, Lang AE. Indicações clínicas para a
neurônios dopaminérgicos remanescentes, apenas os cirurgia. In: Meneses MS, Teive HAG, editores. Do-
doentes que apresentam população residual significa- ença de Parkinson. Rio de Janeiro: Guanabara Koo-
tiva de neurônios dopaminérgicos seriam candidatos gan; 2003, cap. 36, p. 254-9.
a esse tipo de tratamento. Questões biológicas e éticas 8. Arruda WO, Meneses MS. Fisiologia dos núcleos da
não solucionadas limitam seu uso na prática clínica. base e estruturas correlatas. In: Meneses MS, Teive
HAG, editores. Doença de Parkinson. Rio de Janeiro:
As linhagens celulares desenvolvidas com finalidade
Guanabara Koogan; 2003, cap. 4, p. 22-32.
de liberar neurotransmissores específicos ou fatores
9. Gross C, Rougier A, Guehl D, et al. High-frequency
de crescimento apresentam várias vantagens em re-
stimulation of the globus pallidus internalis in
lação a outras fontes doadoras. Demonstrou-se que Parkinson’s disease: a study of seven cases. J Neuro-
células modificadas para produzir FCN são capazes surg. 1997;87:491-8.
de prevenir a morte de neurônios colinérgicos basais 10. Limousin P, Greene J, Pollak P, et al. Changes in ce-
do telencéfalo que se degeneram após a transecção rebral activity pattern due to subthalamic nucleus or
do fórnice. Fibroblastos modificados para produzir internal pallidum stimulation in Parkinson’s disease.
dopamina atenuam a alteração motora em modelos Ann Neurol. 1997;42:283-91.
parkinsonianos em ratos. Entretanto, vários estudos 11. Benabid AL, Benazzouz A, Hoffmann D, Limousin
demonstram a dificuldade de se transformar genetica- P, Krack P, Pollak P. Long-term electrical inhibition
mente células para produzir dopamina, uma vez que of deep brain targets in movement disorders. Mov
os genes para muitas enzimas ao longo da biossíntese Dis Soc. 1998;13(Suppl 3):119-25.
de catecolaminas necessitam ser inseridos para pro- 12. Johansson F, Malm J, Nordh E, et al. Usefulness of
dução de dopamina. Os riscos desses procedimentos pallidotomy in advanced Parkinson’s disease. J Neu-
de tecidos heterólogos tratados incluem oncogênese, rol Neurosurg Psychiatry. 1997;62:125-32.
infecções virais e priônicas. Há também preocupação 13. Lang AE, Lozano A, Duff J, Tasker R, Miyasaki
quanto à duração da expressão genética. O encarce- J, Galvez-Jimenez N, et al. Medial pallidotomy in
ramento de colônias celulares em resinas de acrílico late-stage Parkinson’s disease and striatonigral de-
para isolar tecidos implantados e que permitam o livre generation. The basal ganglia and new approaches
for Parkinson’s disease. In: Obeso JÁ, DeLong MR,
trânsito de nutrientes, excretas e de neuro-humores Ohye C, Marsden CD, editors. Advances in Neurolo-
e neurotransmissores e que impeçam a afluência de gy. Philadelphia: Lippincott-Raven; 1997, v. 74.
elementos responsáveis pela rejeição supriria os pre- 14. Starr PA, Vitek JL, Bakay RAE. Deep brain stimu-
ceitos biológicos e éticos relacionados aos transplan- lation for movements disorders. Surgical treatment
tes embrionários. Por fim, é provável que, em futuro of movement disorders. Neurosurg Clin North Am.
próximo, células e troncos autólogos passem a serem 1998;9:381-402.
implantados no parênquima encefálico com a finali- 15. Teixeira MJ. Estimulação elétrica do sistema nervo-
dade de suprir neurotransmissores e fatores tróficos so. In: Teixeira MJ, Braum Filho JL, Marquez JO,
para neurônios em degeneração. Lin TY, editors. Dor – contexto interdisciplinar. Curi-
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749
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

21. Fazzini E, Dogali M, Stereo D, et al. Stereotactic 22. Davis KD, Taub E, Houle S, et al. Globus pallidus
pallidotomy for Parkinson’s disease: A long-term stimulation activates the cortical motor system du-
follow-up of unilateral pallidotomy. Neurology. ring alleviation of parkinsonian symptoms. Nat Med.
1997;48:1273-7. 1997;3:671-4.

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69
Tratamento Cirúrgico da
Dor Oncológica
Manoel Jacobsen Teixeira

INTRODUÇÃO idiossincrasias ou adversidades dos procedimen-


tos terapêuticos, ou não ser relacionada ao câncer.

D
or é conceituada como “experiência sensiti- Ocorre quando o tumor ou suas metástases inva-
va e emocional desagradável, associada ou dem ou distorcem tecidos moles, incluindo vísceras
descrita em termos de lesões teciduais”1. É parenquimatosas ou ocas, cavidades naturais, ossos
fenômeno que alerta para a ocorrência de lesões te- e outras estruturas de sustentação, troncos nervosos
ciduais e induz a mecanismos de defesa ou de fuga, periféricos ou centrais, vasos sangüíneos, mucosas,
mas causa incapacidade e anormalidades biológicas tegumento ou causam fraturas ou obstrução de vasos
danosas no âmbito orgânico, psíquico e social, o que ou de vias urinárias, gastrointestinais etc. A dor pode
justifica a utilização de medidas que visem à sua pre- também decorrer de iatrogenias e/ou idiossincrasias
venção e controle. Dor evoca reações emocionais e associadas a procedimentos diagnósticos, aplicação
comportamentais físicas e psíquicas, que magnificam ou retirada de medicamentos (corticosteróides, opiói-
ou suprimem sua expressão. Da análise de sua ex- des, antiinflamatórios), intervenções antineoplásicas
pressão é que, independentemente dos métodos com- (injeções, procedimentos operatórios, quimioterapia,
plementares, o diagnóstico das condições causais ou radioterapia), infecções secundárias ou associadas,
secundárias é estabelecido e estratégias terapêuticas síndromes paraneoplásicas. Muitas das intervenções
objetivando seu controle ou a eliminação das condi- nos doentes com câncer proporcionam resultados de-
ções que as induzem são implementadas. sapontadores, causam mutilações e geram incapaci-
dades físicas e psicossociais, sofrimento, perdas ma-
EPIDEMIOLOGIA, ETIOLOGIA E SÍNDROMES teriais e sentimentais e medo da morte, que se somam
DOLOROSAS aos gerados pela condição oncológica. A espoliação
física provocada por vômitos, inapetência e menor
Em todo o mundo, cerca de 18 milhões de pessoas aproveitamento de nutrientes contribui para a inativi-
sofrem dor intensa relacionada ao câncer. Ocorre dor dade física e mental, comprometimento das atividades
em 30% a 70% dos doentes em todos os estágios da de vida diária e de vida prática, incapacidade física e
evolução da doença; é observada em 20% a 50% dos sofrimento, que reduzem o rendimento profissional,
casos quando do diagnóstico e em 70% a 90% quando social e cultural. A dor gera sofrimento e é influen-
a doença é avançada. É muito intensa em 25% a 30% ciada pelo medo, isolamento, ansiedade e depressão.
dos doentes; em 25% dos casos há duas ou mais dores. Os indivíduos com dor apresentam depressão, an-
As síndromes álgicas que se manifestam nos doentes siedade e hostilidade, adotam posturas particulares,
oncológicos são geralmente mais incapacitantes que as exageram as preocupações somáticas e prolongam o
manifestadas em outras condições, pois o câncer causa período de repouso. A incerteza quanto ao futuro, o
impacto emocional negativo e associa-se ao sentimen- medo da morte, da mutilação, o comprometimento da
to de que a expectativa de vida é de curta duração2. dignidade e as perdas socioeconômicas são causas e
A dor no doente com câncer pode decorrer do agravantes da ansiedade. A dor persistente, a incapa-
tumor, suas metástases ou suas conseqüências, de cidade física, a desesperança, a preocupação com a

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

incurabilidade da doença, a desfiguração, a perda da Os regimes analgésicos devem ser apropriados e


importância do indivíduo no ambiente social, profis- adequados aos aspectos clínicos e comportamentais
sional e familiar, as perdas econômicas, o desespero dos doentes e às competências, capacidades e possi-
e a sensação de abandono contribuem para a ocorrên- bilidades de cada ambiente onde o doente é atendi-
cia de depressão. A progressão da doença oncológica do. Em casos de dor aguda, as intervenções visam ao
e o desapontamento com os resultados das terapias alívio do desconforto e recorrem fundamentalmente
propostas e aplicadas são causas de hostilidade com à remoção das causas, à farmacoterapia e aos proce-
os cuidadores e profissionais envolvidos na assistên- dimentos simples de medicina física e de medicina
cia. Em muitos casos, especialmente quando a cura comportamental. Em casos de dor crônica, o obje-
é impossível, o controle da dor e de outros sintomas tivo do tratamento não é necessariamente a melho-
torna-se a razão da assistência. ra da dor, mas principalmente a funcionalidade dos
A dor pode decorrer da excitação e sensibilização doen­tes; recorre à medicação adjuvante e medidas de
dos neurônios do sistema nervoso periférico (SNP) medicina física, reabilitação e procedimentos psico-
ou central (dor por nocicepção) ou da desinibição comportamentais. A prescrição de medicamentos é,
e sensibilização neuronal por desaferentação (dor geralmente, a primeira atitude analgésica adotada.
neuropática)1.
Tratamento Farmacológico
AVALIAÇÃO DOS DOENTES COM DOR Os analgésicos antiinflamatórios não hormonais
A avaliação da dor possibilita o diagnóstico etio- (AAINH) e os opióides são os medicamentos mais
lógico, nosológico e topográfico da condição álgica, utilizados no tratamento da dor por nocicepção. Os
a identificação das repercussões da dor nas atividades anticonvulsivantes, os antidepressivos, os neurolép-
biológicas, funcionais, mentais e sociais do indivíduo ticos e os anticonvulsivantes são mais empregados
e a seleção das intervenções terapêuticas antiálgicas para o tratamento da dor neuropática, da dor crônica
em geral e da dor que ocorre na fase de reabilitação.
e constitui instrumento para aferir sua eficácia. Esca-
Anestésicos locais e gerais, inibidores de reabsorção
las analógicas, verbais ou de descritores possibilitam
óssea, inibidores do receptor NMDA, ansiolíticos,
quantificar a dor e escalas de atividade de vida diária,
miorrelaxantes, corticosteróides, anfetamínicos, anti-
atividades de vida prática e de comportamento possi-
histamínicos e moduladores adrenérgicos são indica-
bilitam avaliar suas repercussões. A dor pode ser re- dos em casos especiais. Os medicamentos devem ser
lacionada não apenas à lesão e/ou aos determinantes preferentemente de baixo custo, de fácil aquisição,
psicológicos, mas geralmente à interação de fatores prescritos segundo escala crescente de potência e ad-
biomédicos, psicossociais e comportamentais que ministrados segundo as técnicas mais convenientes2.
atuam na experiência dolorosa total3.
Bloqueios Anestésicos
PROFILAXIA DA DOR
São úteis no tratamento da dor aguda, síndrome
Vários procedimentos podem contribuir para re- complexa de dor regional, dor visceral e de algumas
duzir a dor e o sofrimento pós-operatório. Incluem a neuralgias e para a realização de procedimentos cirúr-
adequada orientação dos doentes, o uso de medica- gicos e manipulação de estruturas traumatizadas5.
mentos analgésicos antes das manipulações e cuida-
dos apropriados com os ferimentos e tecidos4.
Medidas Fisiátricas
TRATAMENTO DA DOR Visam ao alívio da dor, à melhora do desempenho
físico e à prevenção, ao tratamento e à minimização
Os procedimentos analgésicos devem ser insti- das anormalidades primárias e das repercussões tegu-
tuídos imediatamente após a sua apresentação para mentares, viscerais e neuropáticas geradas pela dor
prevenir a sensibilização das unidades nociceptivas. e pelo imobilismo; proporcionam reabilitação mais
O tratamento da dor visa ao resgate da interação bio­ rápida e mais apropriada dos doentes com incapaci-
psicossocial normal dos doentes (dor total), à elimi- dades motoras e neurovegetativas6.
nação ou minimização do desconforto, facilitação e
aceleramento do processo de recuperação, prevenção
dos efeitos adversos do desconforto e da reação de Procedimentos Psicocomportamentais
estresse (reações neuroendócrinas, neurovegetativas, Visam à eliminação dos comportamentos doentios
imunológicas, coagulopatias), transtornos vasculares, e de evitação, à melhor aceitação da doença, à melho-
respiratórios e musculoesqueléticos, à melhor mobi- ra da funcionalidade e à indução do uso de estratégias
lização, à redução do período e do custo e da estadia de enfrentamento mais adequadas. Muito contribuem
hospitalar e ao aumento da satisfação dos doentes4. para a reintegração dos doentes na vida produtiva4.

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69 – Tratamento Cirúrgico da Dor Oncológica

Procedimentos Oncoterápicos xulares em casos de neuropatia actínica podem resultar


em lesão adicional de estruturas nervosas ou vasculares;
As medidas antineoplásicas controlam a dor de até além disso, a cicatrização é freqüentemente inadequada
três quartos dos doentes. A radioterapia e a cirurgia nesses casos. A neurólise pode contribuir para a melhora
oncológica são indicadas quando a doença neoplásica funcional de doentes com neuropatias tronculares trau-
é localizada, ou a dor é localizada apesar de a doença máticas11. Ressecção e neurólise química dos neuromas
oncológica ser generalizada7. não aliviam a dor no coto de amputação12.
A cirurgia radical pode visar à cura do câncer ou à
correção das anormalidades anatômicas e funcionais
geradas pela neoplasia. A cirurgia paliativa é útil em Procedimentos Neurocirúrgicos Funcionais
casos de doença avançada quando o efeito expansivo Os procedimentos neurocirúrgicos funcionais an-
do tumor é localizado e causa compressão e dor; a tálgicos são indicados para o tratamento da dor refra-
remoção total ou parcial da lesão causal deve ser sim- tária à remoção de suas causas, farmacoterapia, tera-
ples e segura. A remoção de metástases e/ou a redu- pia física, psicoterapia e/ou aos bloqueios anestésicos.
ção do volume da neoplasia podem aliviar distensão A interrupção dos núcleos e vias nociceptivas centrais
ou deformação de raízes e troncos nervosos, medu- pode ser eficaz no controle da dor nociceptiva e da dor
la espinhal ou encéfalo, aliviar a suboclusão de vias neuropática paroxística. Cirurgia psiquiátrica é indi-
digestivas, urinárias e/ou genitais e as instabilidades cada quando há anormalidades psicocomportamentais
causadas por fraturas patológicas, aliviar a hidrocefa- rebeldes. Hipofisectomia é indicada no tratamento de
lia, melhorar a dor e a funcionalidade e a qualidade de metástases ósseas de tumores dependentes de hormô-
vida e prolongar a vida dos doentes2. nios. Indica-se estimulação elétrica do sistema supres-
A radioterapia alivia a dor de 73% a 83% dos doen- sor para o tratamento da dor neuropática. Implante de
tes com metástases ósseas ou com neoplasia limitada câmaras ou de bombas para infusão de drogas anal-
ao parênquima dos órgãos. A irradiação do encéfalo, gésicas no compartimento liquórico é indicado para
medula espinhal e/ou plexos nervosos freqüentemen- tratamento da dor nociceptiva ou neuropática13.
te proporciona melhora da dor neuropática durante Os procedimentos neurocirúrgicos que utilizam
longos intervalos em mais de 50% dos casos. Radio- técnicas percutâneas e que podem ser realizados sob
isótopos (131I, 32P, 89Sr, 153Sm, 186Re) administrados sedação são preferíveis àqueles a céu aberto, pois a
sistemicamente possibilitam irradiação focalizada de anestesia geral, muitas vezes necessária para a execu-
metástases ósseas com pouco comprometimento dos ção destes últimos, pode colocar em risco a vida ou a
tecidos a elas vizinhos8. função dos doentes com condições clínicas e nutricio-
A quimioterapia de tumores primários, recorren- nais comprometidas. Exceção feita às simpatectomias,
tes ou metastáticos geralmente não é satisfatória e a os agentes químicos (álcool, fenol, solução salina hi-
duração da melhora é limitada; remissão completa do pertônica) não devem ser utilizados com finalidade
quadro doloroso é observada em até 20% dos casos; neurolítica em razão das complicações relacionadas ao
melhora parcial ocorre em até 80% dos doentes3. seu uso; os meios físicos como frio (criocoagulação)
ou calor (radiofreqüência) (Fig. 69.1) são mais seguros
Procedimentos Neurorrestaurativos para interromper vias e/ou centros nervosos13.

A remoção dos elementos que distorcem ou res-


tauram as estruturas nervosas do SNP é apropriada
para tratar neuropatias compressivas9.

Descompressão de Raízes Espinhais e dos


Nervos Sensitivos
A exérese de hérnias discais, deformidades ósseas
ou lesões expansivas, a ampliação das vias de trânsito
das raízes nervosas ou troncos nervosos por osteotomia,
a remoção ou secção de ligamentos e as transposições
nervosas contribuem para melhorar a dor em casos de
angustiamento de nervos ou raízes nervosas10,11.
A neurólise do plexo braquial melhora a sintomatolo- Fig. 69.1 – Fotografia de gerador de radiofreqüência. Equi-
gia de poucos doentes com neuropatia actínica ou avul- pamento tem dispositivo que possibilita estimular, registrar a
impedância e induzir lesões por radiofreqüência na estrutura
são de raízes do plexo braquial e a dos nervos periféricos, a ser tratada com controle térmico de voltagem de corrente. O
em poucos casos de neuralgia traumática ou isquêmica. registro da corrente elétrica, voltagem e temperatura possibili-
A descompressão e a revascularização dos troncos ple- ta determinar o diâmetro da lesão térmica induzida.

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753
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Procedimentos Neuroablativos tendo-se o doente com o tronco inclinado de 30° e


com coxa fletida; após incisão transversal ou oblíqua
Simpatectomias no flanco e divulsão dos músculos oblíquo externo,
Segundo Santos e Teixeira14, as primeiras simpa- oblíquo interno e transverso e identificação, no es-
tectomias foram realizadas na década de 1890 para paço retroperitoneal, do ureter e do músculo psoas,
tratar epilepsia, hipertireoidismo e espasticidade; em realiza-se a remoção dos gânglios L2 a L4 e de seus
1916, Leriche idealizou a simpatectomia periarterial ramos comunicantes; a remoção bilateral do gânglio
para tratar a dor secundária à doença vascular obstruti- L1 causa ejaculação retrógrada.
va. Diez, em 1924, realizou a primeira simpatectomia Os nervos esplâncnicos são constituídos por fibras
lombar. Spurling e Flowtow, em 1930, respectivamen- eferentes viscerais pré-ganglionares que entram na
te aplicaram o método para tratar dor nos membros. constituição da cadeia simpática paravertebral e esta-
As fibras pré-ganglionares destinadas ao membro belecem sinapse nos gânglios pré-vertebrais. O nervo
superior originam-se das raízes T2 a T9 e fazem sinap- esplâncnico maior resulta da fusão de filetes nervosos
se na cadeia simpática paravertebral cervicotorácica. das raízes T5 a T8 e contém fibras aferentes e efe-
A desnervação cirúrgica do membro superior envolve rentes dos segmentos torácicos rostrais; cruza o dia-
a remoção dos gânglios de T2 e T3; o gânglio estrela- fragma entre os pilares medial e lateral e termina no
do deve ser poupado para evitar a síndrome de Claude gânglio celíaco. O nervo esplâncnico menor origina-
Bernard Horner. A simpatectomia torácica a céu aber- se das raízes T9 a T11, segue o trajeto do nervo es-
to pode ser realizada por várias vias: costotransver- plâncnico maior e projeta-se no gânglio aórtico-renal.
sectomia (acesso extrapleural, via incisão paraverte- A esplancnectomia é realizada com o doente em de-
bral do tegumento em arco ou mediana e após secção cúbito ventral; após incisão sobre a 11a costela até a
e retração medial dos músculos trapézio, rombóide e linha mediana e remoção do seu segmento posterior
serrátil posterior e remoção do processo transverso de acessa-se, por via extrapleural, a superfície lateral das
T3 e da cabeça da terceira costela), por via extrapleu- vértebras T10 a T12 para identificar os gânglios T9
ral supraclavicular (incisão 2 cm cranial e paralela- a T12 e, anteriormente a eles, os nervos esplâncni-
mente à clavícula, lateralmente ao bordo medial do cos maior, menor e mínimo (aderidos à pleura). Para
músculo esternocleidomastóideo, secção da inserção realizar a lise percutânea do plexo celíaco, deve-se
caudal do músculo omo-hióideo e do músculo escale- puncionar o quadrante ântero-lateral da primeira vér-
no anterior e retração caudal da artéria subclávia), ou tebra lombar onde se injetam-se de 20 a 30 ml de ál-
por via transaxilar (incisão no terceiro espaço inter- cool absoluto ou fenol (Fig. 69.2, A). A técnica por
costal, retração dos músculos peitoral maior e grande via transabdominal consiste na dissecção da artéria
dorsal, secção do músculo serrátil anterior, descola- celíaca e na administração, à direita e à esquerda da
mento da pleura parietal das costelas)14. artéria aorta, de 10 ml de álcool absoluto (Fig. 69.2,
Segundo Santos e Teixeira14, a simpatectomia por B). Para realizar a simpatectomia pélvica percutânea,
radiofreqüência foi idealizada por Wilkinson em 1979, uma agulha é introduzida na região da crista ilíaca e
para desnervação simpática dos membros superiores. dirigida para a face anterior do promontório, visando
Após anestesia local, sob radioscopia, eletródios são atingir o espaço pré-sacral, onde são administrados 5
introduzidos até alcançar os gânglios simpáticos T2 a 10 ml de álcool absoluto ou fenol a 5%9.
e T3, onde numerosas lesões por radiofreqüência são A simpatectomia tóracica foi muito utilizada para
induzidas, sendo o efeito monitorado por pletismo- tratar doentes com angina pectoris, hipertensão arte-
grafia e mensuração da temperatura cutânea. A sim- rial sistêmica e dor neuropática, incluindo a síndrome
patectomia química consiste em punção paraverte- complexa de dor regional; atualmente é opção para
bral guiada por radioscopia e injeção de contraste de doenças que resultam de anormalidades do sistema
iodado e de 3 ml de álcool absoluto ou fenol a 5% nervoso neurovegetativo simpático (SNNVS) e de
nos gânglios torácicos. Segundo Santos e Teixeira14, doenças em que a desnervação simpática pode aliviar
a simpatectomia por toracoscopia e lesão eletrolítica a anormalidade primária, como ocorre em doenças
foi descrita por Kux em 1954; atualmente, é realizada vasculares isquêmicas decorrentes da obstrução de
por diatermia, radiofreqüência ou por remoção cirúr- pequenos vasos ou de vasoespasmo macro ou micro-
gica do tecido nervoso15. circulatório, dor visceral ou mantida pela atividade
As fibras pré-ganglionares simpáticas destinadas simpática, hiperidrose etc. O papel da simpatectomia
ao membro inferior originam-se dos segmentos me- não foi definido para casos de doença ou fenômeno
dulares T10 a L3, e as pós-ganglionares, dos gânglios de Raynaud associados a doenças do tecido conjun-
L1 a L4. Estes últimos estão dispostos ao longo da tivo, condições em que a recorrência é freqüente; a
margem medial do músculo psoas maior e atrás da indicação parece ser mais apropriada em casos de le-
veia cava inferior à direita e da aorta à esquerda. A são trófica tecidual grave, mas não em casos de dor
simpatectomia lombar a céu aberto é realizada man- isquêmica. Proporciona resultados insatisfatórios em

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69 – Tratamento Cirúrgico da Dor Oncológica

A B

Fig. 69.2 – Representação artística da neurólise do plexo celíaco (A) por via percutânea lombar e (B) transabdominal.

casos de dor mantida pelo simpático, síndrome comple- em 70% a 100% de casos de dor decorrente de câncer
xa de dor regional e outras dores neuropáticas. O mé- de pâncreas e em 67% dos doentes com pancreatite
rito pode ser previsto com o bloqueio das estruturas crônica. Há recorrência em 33% dos casos durante os
do SNNVS; há melhora significativa em 50% a 90% primeiros 11 meses. A neurectomia do nervo hipogás-
dos casos de síndrome complexa de dor regional16 do trico superior alivia totalmente a dor visceral pélvica
tipo I após a execução de bloqueios simpáticos. Na decorrente do câncer em 58% a 88% dos doentes; o
maioria dos trabalhos, os resultados foram excelentes índice de recidiva e de complicações é baixo. Esse
quanto à dor em queimor em mais de 85% dos casos, método também é indicado no tratamento da disme-
mas houve persistência de desconforto residual em norréia secundária rebelde a tratamento medicamen-
um terço dos doentes. Não há alívio da dor profunda toso e da dor referida na linha mediana decorrente de
ou em choque e da dor musculoesquelética em casos endometriose ou de aderências13.
de síndrome complexa de dor regional tipo I. Há reci- A complicação funcional mais grave das simpa-
diva da dor em queimor em 45% dos doentes durante tectomias é a síndrome dolorosa pós-simpatectomia,
período de 2 a 8 anos de acompanhamento. A recor- que se manifesta em cerca de 20% dos casos. Trata-se
rência parcial ou total dos sintomas após a simpatec- de dor em peso e/ou queimor com predomínio notur-
tomia parece decorrer da regeneração de estruturas no, algumas vezes intensa, localizada proximalmente
do SNNVS; clipes metálicos aplicados nos ramos no membro, que se instala uma a duas semanas após
seccionados ou desvio da cadeia para a musculatu- o procedimento. Tende a desaparecer em 2 a 12 se-
ra esquelética parecem evitar a recorrência quando a manas e melhora pouco com o tratamento. Na de-
simpatectomia não é eficaz, devendo-se considerar a pendência da extensão da desnervação, síndrome de
possibilidade de a desnervação ter sido insuficiente. Horner (lesão de fibras oculopupilares oriundas dos
Nesses casos, reoperações ampliadas com ressecção segmentos C8 e T1), disfunção erétil, ejaculação re-
dos gânglios T1, T4, L1 e L5 proporcionam bons re- trógrada (lesão bilateral de L1), hiperidrose compen-
sultados. O registro da sudação (teste do iodo e amido) satória, hiperidrose gustativa (hiperidrose hemifacial
e da perfusão cutânea (termografia, pletismografia) é acompanhada de rubor após estímulos gustatórios)15,
útil para prever resultado pós-operatório; o bloqueio pneumotórax e neuralgia intercostal podem também
simpático, incluindo inicialmente os gânglios lesados ocorrer após a simpatectomia. Hipotensão postural,
e, a seguir, os adjacentes, possibilita identificar a ra- diarréia e/ou derrame pleural transitórios podem de-
zão da falha. Segundo Santos e Teixeira14, Furlan et correr da neurólise do plexo celíaco14.
al. (2001) observaram que havia alívio significativo
da dor em 44% dos casos de síndrome complexa de
dor regional, alívio não significativo em 19% e resul- Neurotomias de Nervos Somáticos
tados inclassificáveis em 23%, após análise de 66 de As neurotonias podem ser realizadas a céu aberto
13 estudos sobre simpatectomia. ou percutaneamente, por radiofreqüência. São indi-
Apesar de as vísceras do abdome rostral apresen- cadas no tratamento da neuralgia occipital, neuralgia
tarem aferências nociceptivas que trafegam via ner- genitofemoral, ilioinguinal, femorocutânea, ciática
vos esplâncnicos, a dor visceral crônica pancreática menor e/ou pudenda. Não são eficazes no tratamento
é a que melhor se controla com simpatectomia. Os da dor decorrente de avulsão de raízes nervosas, dor
resultados da lise de plexo celíaco são satisfatórios no coto de amputação e da neuralgia pós-herpética.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

A neurotomia dos ramos recorrentes posteriores das


raízes espinais é eficaz no tratamento das dores se-
cundárias às síndromes dolorosas miofasciais para-
vertebrais, lombares, dorsais e cervicais rebeldes aos
procedimentos fisiátricos13.
A neurectomia do nervo trigêmeo é indicada para
confirmação diagnóstica, para tratamento de doentes
idosos debilitados ou de neuralgia bilateral quando
há anestesia de uma hemiface secundária à rizotomia
contralateral. Avulsão, esmagamento, interposição de
material orgânico entre neurólise mecânica e rebati-
mento retrógrado dos cotos nervosos amputados pro-
porcionam benefício apenas temporário nos doentes
devido ao fenômeno de regeneração nervosa.
A neurotomia percutânea dos nervos occipitais é
indicada a casos de neuralgia do nervo occipital; con-
siste na punção percutânea dos nervos occipitais na
região da superfície lateral e distal da escama do osso
occipital, junto à artéria occipital, e de sua lesão, por
radiofreqüência.
A neurotomia do nervo pudendo é indicada a ca- Fig. 69.4 – Neurotomia percutânea por radiofreqüência
sos de neuralgia do nervo pudendo e de dor perineal; dos nervos recorrentes posteriores. Representação artística de
consiste na introdução percutânea de um eletródio na eletródio inserido ao longo da trajetória do nervo recorrente
posterior.
região perineal posterior, nas proximidades da espinha
isquiática e da estimulação, seguida de lesão, por radio-
freqüência, do tronco do nervo. Quando realizada bila-
teralmente, pode resultar em incontinência urinária12.
A neurotomia do nervo genitofemoral é indicada
a casos de neuralgia do nervo genitofemoral e a do
ilioinguinal, a casos de neuralgia ilioinguinal; são
rea­lizadas por acesso retroperitoneal.
A neurotomia do nervo femorocutâneo é indica-
da para tratamento da meralgia parestésica; o nervo é
acessado por incisão medial à espinha ilíaca ântero-
superior11.
A neurotomia dos nervos recorrentes posteriores
consiste na punção percutânea do trajeto dos nervos
recorrente posteriores das raízes espinais com eletró-
dio (Fig. 69.3) da sua lesão por radiofreqüência (Figs.
69.4 e 69.5).

Fig. 69.5 – Neurotomia percutânea por radiofreqüência dos


nervos recorrentes posteriores. Fotografia de doente em de-
cúbito ventral horizontal durante a realização de neurotomia
Fig. 69.3 – Conjunto de eletródios para lesão por radiofre- percutânea por radiofreqüência dos nervos recorrentes poste-
qüência de estruturas do sistema nervoso periférico. riores com a finalidade de tratar lombalgia.

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69 – Tratamento Cirúrgico da Dor Oncológica

Rizotomias A rizotomia sensitiva espinhal pode ser realizada


por secção mecânica, avulsão, massageamento, com-
São indicadas no tratamento da dor decorrente de pressão, esmagamento, meio térmico (frio, calor),
neuralgias paroxísticas ou de neoplasias em áreas res- agentes químicos ou radiação ionizante das raízes.
tritas do corpo, especialmente na face, crânio, região Segundo Oliveira Jr.17, em 1886, Dana idealizou a ri-
cervical, torácica e/ou perineal; não são eficazes no zotomia espinhal; Bennett e Abbe, respectivamente,
tratamento da dor no membro-fantasma, dor no coto em 1889, relataram os resultados das primeiras rizo-
de amputação, neuralgia pós-herpética, neuropatia ac- tomias com finalidade analgésica; Dogliotti, em 1930,
tínica, dor mielopática ou por lesão de cauda eqüina, descreveu a radicotomia espinhal química; Smith, em
avulsão de raízes nervosas, dor facial atípica, aneste- 1970, descreveu a rizotomia posterior, a gangliec-
sia dolorosa da face, etc.12 tomia espinhal transraquidiana e a interrupção dos
A rizotomia do nervo trigêmeo, glossofaríngeo e/ ramos comunicantes cinzentos para o tratamento da
ou intermediário é eficaz no tratamento da dor resul- síndrome complexa de dor regional em doentes com
tante de neuralgias essenciais ou de câncer da face, ou sem câncer, para reduzir a inervação simpática nos
faringe, loja amigdaliana, base da língua e/ou orelha territórios afetados. Uematsu et al., em 1974, descre-
interna. A rizotomia cervical, torácica e/ou sacral é veram a rizotomia percutânea por radiofreqüência das
eficaz em casos selecionados de dor neuropática peri- raízes espinhais. A rizotomia a céu aberto necessita de
férica paroxística e oligossegmentar ou decorrente do laminectomia ampla (Fig. 69.6).
câncer e restrita às regiões superficiais do corpo e a As gangliectomias consistem na remoção do gân-
poucos dermatômeros. glio sensitivo; possibilitam interromper a veiculação
As rizotomias espinais e as do nervo trigêmeo e do da dor pelas fibras que penetram pela raiz ventral. A
nervo glossofaríngeo são geralmente realizadas per- rizotomia química consiste na punção da raiz nervo-
cutaneamente; podem também ser realizadas a céu sa ou do compartimento liquórico e na administração
aberto, segundo técnica microcirúrgica. de álcool, fenol glicerinado, glicerol, soro fisiológico
A rizotomia posterior das raízes cervicais associa- gelado e/ou solução hipertônica de NaCl com moni-
da à neurotomia dos nervos sensitivos da face (V, VII, toração radiológica; déficits motores, anormalidades
IX, X) é útil no tratamento de dor secundária a tumo- esfincterianas e dor por desaferentação são possíveis
res avançados no segmento craniocervicofacial. A ri- complicações do método. A rizotomia percutânea por
zotomia do nervo trigêmeo ou glossofaríngeo deve ser radiofreqüência possibilita o mapeamento fisiológico
realizada por radiofreqüência ou a céu aberto em casos e seleção das raízes a serem sacrificadas graças à esti-
de dor decorrente de câncer. A rizotomia do nervo in- mulação elétrica; deve ser realizada após punção pa-
termediário é realizada após exposição e secção dessa ramediana para alcançar o espaço subaracnóideo ou o
estrutura nervosa por craniectomia retromastóidea. buraco de conjugação (Fig. 69.7).

Fig. 69.6 – Rizotomia a céu aberto.

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757
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

pinhal; visa a reduzir a transferência das informações


nociceptivas do corno posterior da substância cin-
zenta da medula espinhal (CPME) para as unidades
rostrais no neuroeixo. Segundo Nóbrega e Teixeira19,
baseando-se na observação de Spiller, que, em 1905,
observou abolição da sensação dolorosa e térmica na
metade contralateral do corpo em um doente com tu-
berculoma sediado no quadrante ântero-lateral da me-
dula espinhal, Schüller, em 1910, realizou a secção
do quadrante ântero-lateral da medula espinhal em
macacos; denominou tal procedimento de cordotomia
e o sugeriu para o tratamento de crises de dor gástri-
ca. Martin, em 1911, realizou a primeira cordotomia
ântero-lateral para tratamento da dor no ser humano.
Em 1963, Mullan descreveu a cordotomia cervical
Fig. 69.7 – Radiografia de doente sendo submetido a rizoto- percutânea, que consistiu no implante de agulha de
mia percutânea por radiofreqüência de raiz cervical estrôncio radioativo para irradiar intersticialmente o
quadrante ântero-lateral da medula espinhal. Obser-
As rizotomias sacrais bilaterais são eficazes no vou que tal procedimento aliviava gradativamente a
controle da dor pélvica de origem oncológica; quan- dor; ulteriormente, utilizou corrente elétrica durante o
do a dor é unilateral, a preservação unilateral da raiz procedimento. Em 1965, Rosomoff descreveu a cor-
S2 possibilita manter a função esfincteriana vesical; a dotomia cervical percutânea por radiofreqüência.
eletroestimulação e a cistometria melhoram a segu- O procedimento a céu aberto consiste em laminec-
rança do método. Nos membros, as rizotomias podem tomia e exposição do primeiro e segundo segmentos
causar ataxia sensitiva. cervicais da medula espinhal cervical ou do segundo
e terceiro segmentos da medula espinhal dorsal e da
Tratotomia de Lissauer e Lesão do Corno secção do quadrante ântero-lateral da medula com
bisturi (Figs. 69.8 e 69.9).
Posterior da Substância Cinzenta do Corno
Posterior da Medula Espinhal (CPME)
É indicada em casos de dor neuropática crônica,
como ocorre em neuropatias plexulares actínicas, dor
no membro-fantasma, dor mielopática, dor cervicofa-
cial resultante de câncer etc. Há melhora inicial mantida
na maioria dos doentes com dor decorrente de plexopa-
tia actínica. Há melhora imediata em 50% a 100% dos
doentes com dor no membro-fantasma logo após o pro-
cedimento e, a longo prazo, em 50% a 66,6%. O resul-
tado é mais insatisfatório no tratamento da dor no coto
de amputação. A lesão do trato de Lissauer e do CPME
beneficia cronicamente 45,5% a 80% dos doentes com
dor mielopática traumática e proporciona bom resultado
inicial em 8,5% a 100%; ocorre melhora significativa
da dor mielopática segmentar em 80% dos doentes, da
dor unilateral em 90% e da dor distal e sacral em ape-
nas 32%. Os resultados são insatisfatórios em menos
de 41% dos doentes. Há também alívio da dor gerada
pela estimulação da zona de gatilho. O método beneficia
imediatamente 71% dos doentes com dor por lesão da
cauda eqüina. A nucleotratotomia do trato espinhal do
nervo trigêmeo proporciona melhora da neuropatia tri-
geminal actínica e oncopática na maioria dos doentes18.
Fig. 69.8 – Cordotomia a céu aberto. Representação artística
Cordotomia da exposição da medula espinhal, após realização de lami-
nectomia, e da incisão, com bisturi, de seu quadrante ântero-
Cordotomia consiste na interrupção do trato espi- lateral, onde se situam os tratos espinotalâmicos e espinorre-
notalâmico no quadrante ântero-lateral da medula es- ticulares.

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69 – Tratamento Cirúrgico da Dor Oncológica

Fig. 69.11 – Cordotomia cervical percutânea por radiofreqüên­


cia. Doente em decúbito dorsal horizontal com agulha introdu-
zida lateralmente entre os interespaços vertebrais C1-C2.

Fig. 69.9 – Cordotomia a céu aberto. Representação artística


da secção transversal da medula espinhal onde é sinalizada a
secção dos tratos do seu quadrante anterior.

A cordotomia cervical percutânea por radiofreqüên­


cia é realizada sob anestesia local, com o doente des-
perto e sedado. Após procedimento perimielográfico
ou estereotomomielográfico para delineação da me-
dula espinhal e do ligamento denteado, introduz-se
um eletródio, por via lateral, no quadrante ântero-la-
teral da medula espinhal, entre a primeira e a segunda
vértebra cervical. Após estimulação elétrica, faz-se
lise do trato espinotalâmico por radiofreqüência. In-
tervalo de, pelo menos, três semanas é recomendado Fig. 69.12 – Cordotomia cervical percutânea por radio-
entre ambos os procedimentos, em casos de cordoto- freqüência. Incidência lateral de perimielografia da medula,
mia bilateral (Figs. 69.10 a 69.14). revelando contrastação do ligamento denteado.
A cordotomia é indicada para tratamento da dor
decorrente de câncer e que acomete unilateralmen-
te segmentos distais aos cervicais rostrais10, ou seja,
membros inferiores, hemiperíneo, hemiabdome, he-
mitórax e/ou membros superiores. Resulta em melho-
ra imediata da dor em 69% a 100% dos casos16. Não
pode ser completada em até 5,4% dos casos. Ocor-
re redução da freqüência de melhora de 90,2% para
62,5% durante período de acompanhamento, que va-
ria de 1 a 15 semanas. Os resultados do tratamento da
dor neuropática e da dor nociceptiva não decorrente
do câncer são desapontadores16.

Fig. 69.13 – Cordotomia cervical percutânea por radiofre-


qüência. Representação artística da punção cervical lateral C1-
Fig. 69.10 – Conjunto de agulha, cabo e eletródio para cor- C2, para administração de material de contraste e introdução
dotomia. de eletródio que gera lesão por radiofreqüência.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

aliviar temporariamente a dor radicular e no território


de transição de doentes com lesão raquimedular.
O procedimento a céu aberto consiste na realização
de laminectomia torácica ou lombar rostral, seguindo-
se de divisão sagital da medula espinhal (Fig. 69.15).
A mielotomia extralemniscal cervical estereotática
consiste na fixação de um aparelho de estereotaxia ao
crânio do doente e na realização de estereotomografia
ou estereorressonância magnética para delineação do
contorno da medula cervical na transição bulboespi-
nhal. A seguir, por via percutânea, é introduzido eletró-
Fig. 69.14 – Cordotomia cervical percutânea por radiofre- dio que, com trajeto mediano, é dirigido para a região
qüência. Representação artística da secção transversal da me- central da transição bulboespinhal, onde a estimulação
dula espinhal onde lesão por radiofreqüencia é induzida no elétrica gera sensação de calor que migra do períneo
trato espinotalâmico. para regiões proximais do corpo; por radiofreqüência,
são lesadas as fibras espinorreticulares que se projetam
A cordotomia cervical deve ser evitada em doentes na formação reticular do tronco encefálico, o que pror-
com insuficiência respiratória. Síndrome de Claude ciona alívio da dor com preservação da sensibilidade
Bernard Horner, retenção urinária, hipotensão arterial, discriminativa superficial12 (Figs. 69.16 e 69.17).
ataxia sensitiva, hipotonia e hemiparesia ipsilaterais
ao procedimento são suas complicações mais freqüen-
tes, mas, felizmente, temporárias ou pouco marcantes.
Déficits motores, esfincterianos e/ou sexuais manifes-
tam-se em menos de 10% dos casos. Outras compli-
cações menos freqüentes são disfunção respiratória
e apnéia do sono (síndrome de Ondine). Esta última
é mais comum quando o procedimento é realizado
bilateralmente ou quando a analgesia relaciona-se a
dermatômeros braquiais. Dor mielopática manifesta-
se em menos de 20% dos casos na região onde havia
dor pré-operatória (dor neuropática oncológica), na
área onde não havia dor (lesão de fibras espinotalâmi-
cas) ou nas áreas onde não havia dor, mas nas quais
a sensibilidade dolorosa recuperou-se parcialmente Fig. 69.15 – Mielotomia a céu aberto. Representação artísti-
(perda da eficácia do procedimento). Eventualmen- ca da secção na linha mediana da medula espinhal destinada à
te, dor contralateral à original (dor em espelho) pode interrupção de seus tratos sensitivos durante a ascensão pelos
quadrantes ântero-laterais da medula espinhal.
manifestar-se após a cirurgia unilateral13.

Mielotomia
Segundo Nóbrega e Teixeira19, mielotomia con-
siste em interrupção das fibras espinorreticulotalâ-
micas que cruzam a linha mediana em direção aos
quadrantes ântero-laterais da medula espinhal, ao se
deslocarem para estruturas supra-segmentares. É in-
dicada em casos de dor bilateral resultante de câncer
na região pelviperineal ou nos membros inferiores,
de dor visceral e, eventualmente, de dor neuropática,
especialmente quando a cordotomia cervical bilateral
apresenta risco. Resulta em analgesia suspensa bila-
teral. A mielotomia extralemniscal cervical é indicada
no tratamento da dor mielopática, da dor decorrente
de avulsão do plexo braquial, neuralgia pós-herpéti- Fig. 69.16 – Mielotomia. Fotografia de doente em decúbito
ca, da dor perineal ou da dor nos membros inferiores lateral esquerdo, com aparelho de estereotaxia fixado ao seu
segmento cefálico e com eletródio aplicado na região central da
nociceptiva oncológica ou neuropática. A mielotomia transição bulbo-medula espinhal, onde se concentram as fibras
transversa, realizada dois a três segmentos rostrais dos tratos espinorreticulares durante e a realização de mieloto-
àquele em que a lesão espinhal está presente, pode mia extralemniscal cervical estereotática por radiofreqüência.

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Sistema lemniscal

Tálamo
inespecífico Vias extralemniscais

Fig. 69.18 – Tálamo-mesencefalotomia. Eletródio de tala-


FRTE motomia.

Fig. 69.17 – Mielotomia. Representação artística da lesão em


doente sendo submetido à mielotomia extralemniscal cervical.

Mesencefalotomia e Talamotomia
Visam a interromper as vias espinorreticulotalâmi-
cas que se projetam nos núcleos talâmicos inespecífi-
cos mediais e que são envolvidas na sensação pares-
tésica e disestésica em doentes com dor neuropática e
nos componentes desagradáveis da dor por nocicep-
ção. Segundo Teixeira20, Spiegel et al., em 1947, de-
senvolveram a talamotomia basal com a finalidade de
interromper as vias caudorrostrais nociceptivas na re-
gião de entrada do tálamo. A talamotomia é indicada
para tratamento da dor resultante de lesão no sistema
nervoso periférico, da medula espinhal e/ou encéfa-
lo e da dor resultante de câncer, especialmente o que Fig. 69.19 – Tálamo-mesencefalotomia. Representação de
acomete a região cervicobraquial10. Ulteriormente, as aparelho de estereotaxia fixado ao segmento cefálico de ma-
lesões passaram a ser realizadas nos núcleos sensiti- nequim.
vos específicos do tálamo e, mais recentemente, nos
inespecíficos. A talamotomia do núcleo dorsomedia-
no e núcleos anteriores do tálamo com finalidade de
controlar as anormalidades emocionais associadas à
dor e a talamotomia dos núcleos sensitivos específi-
cos foram abandonadas em razão de complicações.
Atualmente, as lesões centram-se nos núcleos inespe-
cíficos (centromediano, parafascicular, intralamina-
res, limitans, pulvinar). A mesencefalotomia medial
consiste na lesão do trato palioespino e espinorreticu-
lotalâmico, que se destinam aos núcleos inespecíficos
do tálamo12.
O procedimento consiste na fixação, sob a aneste-
sia local, de um aparelho de estereotaxia ao segmento
cefálico do doente. Após a realização de estereotomo-
grafia ou de estereorressonância magnética, os alvos
anatômicos são identificados após a reconstrução e
fusão das imagens com as dos atlas da estereotaxia.
Por meio de trepanação localizada na região frontal
ou occipital um eletródio é introduzido e, através dele,
Fig. 69.20 – Tálamo-mesencefalotomia. Imagem estereo-
realiza-se registro da atividade neuronal e estimulação tomográfica axial do tálamo delineando os núcleos talâmicos
elétrica para delinear os núcleos talâmicos que são le- inespecíficos, onde é realizada lesão por radiofreqüência.
sados por radiofreqüência12 (Figs. 69.18 a 69.20).
A talamotomia alivia temporariamente a dor em em casos de lesões bilaterais e amplas. A talamotomia
40% a 70% dos casos de dor neuropática, e os resulta- propicia alívio imediato da dor em 0% a 100% dos
dos são freqüentemente insatisfatórios em longo pra- casos de dor central encefálica, em dois terços dos ca-
zo. Os melhores resultados parecem ser observados sos de neuralgia pós-herpética, em todos os casos de

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761
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

dor decorrente de cordotomia, lesão da cauda eqüina


e/ou cone medular e/ou de mielopatia, em 48% dos
casos de esclerose múltipla e em 50% dos casos de
dor no membro-fantasma e/ou no coto de amputação.
É questionável seu valor em casos de avulsão de raí-
zes nervosas ou de anestesia dolorosa da face; a taxa
de melhora imediata de casos de dor neuropática é
de 80%. Ocorrem complicações, geralmente tempo-
rárias, em todos os casos; as complicações são perma-
nentes em 20% dos doentes, especialmente após a ta-
lamotomia basal. Anormalidades cognitivas ocorrem
em 36% dos casos e anormalidades oculomotoras em
52%; em 16% dos casos são permanentes.
A mesencefalotomia proporciona melhora prolon-
gada em 77,8% dos doentes com dor neuropática du-
rante período que varia de 2 meses a 8 anos. Há me-
lhora em 70% dos doentes com anestesia dolorosa da Fig. 69.21 – Cingulotomia estereotática.
face, em 50% dos pacientes com síndrome talâmica,
em 69% dos doentes com avulsão de raízes do ple-
xo braquial e em 50% dos casos de dor no membro-
fantasma e/ou no coto de amputação. Questiona-se mantêm a síntese extragonadal de hormônios, o que
sua eficácia em casos de avulsão de raízes nervosas justifica a recorrência dos sintomas. Segundo Carva-
ou de anestesia dolorosa da face15. A mesencefaloto- lho et al.21, Luft et al., em 1953, observaram que a hi-
mia alivia inicialmente total ou parcialmente a dor pofisectomia aliviava a dor decorrente de metástases
de carcinoma de mama. A redução da dor pode decor-
em 65% dos doentes com dor central encefálica. Em
rer da regressão das lesões metastáticas ou da modifi-
longo prazo, há alívio em 20% a 66,7% dos casos e
cação de balanço de neurotransmissores supressores
melhora em 30%10. Proporciona alívio temporário da
(elevação de β-endorfina) e/ou da supressão da libera-
dor na maioria dos doentes com dor craniocervico-
ção de hormônios gonadotróficos, adrenocorticotrófi-
braquial decorrente de câncer. Os melhores resulta-
cos, somatotróficos, prolactina, ACTH e/ou testoste-
dos ocorrem quando as lesões são realizadas no plano
rona; a hipofisectomia química pode também causar
da comissura posterior, onde, entretanto, com eleva-
lesão do hipotálamo anterior (núcleo supra-ótico e
da freqüência, a lesão gera alterações oculomotoras,
paraventricular) ou póstero-medial16. A analgesia ge-
contrastando com as lesões realizadas no plano do
ralmente precede a remissão das metástases.
colículo superior, com as complicações ocorrendo em
somente 23% a 54% dos casos10. A mesencefalotomia Inicialmente, a hipofisectomia cirúrgica funcio-
apresenta como complicação mais freqüente a pare- nal era realizada por via subfrontal e, ulteriormente,
sia do olhar conjugado; esta se manifesta permanen- passou a sê-lo por via transnasoesfenoidal. A hipo-
temente em cerca de 30% dos doentes. Sonolência é fisectomia actínica com implante de isótopos ou ra-
também complicação comum do procedimento. Di- diocirurgia, a hipofisectomia química com álcool
sestesias ocorrem em 4,3% a 50% dos casos12. administrado por via transesfenoidal ou térmica este-
reotática por radiofreqüência são variantes da técnica
original.
Cirurgias Psiquiátricas Quando realizada por via transfenoidal, antibióti-
A hipotalamotomia póstero-medial, a cinguloto- cos (cefalotina, cefalexina) e corticosteróides (hidro-
mia e a capsulotomia anterior são indicadas a doentes cortisona, dexametasona) devem ser administrados
que apresentam componentes ansiosos, depressivos e previamente ao procedimento e mantidos durante o
obsessivos incapacitantes não controlados com medi- período pós-operatório imediato. O procedimento a
cação psicotrópica e psicoterapia. Os procedimentos céu aberto é realizado sob anestesia geral por via tran-
obedecem aos princípios da cirurgia estereotática. As sesfenoidal e com técnica microcirúrgica. A técnica
complicações são raras12 (Fig. 69.21). estereotática por radiofreqüência ou a hipofisectomia
química podem ser realizadas sob sedação e anestesia
Procedimentos Endocrinológicos local; após estereotomografia ou estereorressonância
magnética para calcular as coordenadas da sela túr-
A castração e a conseqüente supressão dos hormô- cica e da glândula hipófise, realiza-se antissepsia das
nios sexuais alentecem o crescimento tumoral e me- cavidades nasais com polivinilpirrolidona, e uma câ-
lhoram a dor em casos de câncer prostático ou mamá- nula é introduzida na cavidade nasal e, através dela,
rio; entretanto, as glândulas supra-renais e a hipófise uma broca para perfurar o assoalho do seio esfenoidal

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69 – Tratamento Cirúrgico da Dor Oncológica

e da sela túrcica. A seguir, um eletródio com 1,8 m


de diâmetro e 4 m de área exposta é introduzido no
seu interior para alcançar o seio da glândula hipófi-
se; o alvo é estimulado e lesões por radiofreqüência
a 70°C durante 60 s são nele induzidos (Figs. 69.22 e
69.23). Em casos de hipofisectomia química, o doente
é mantido na posição semi-sentada e uma agulha 15 F
longa é direcionada para a linha média do assoalho da
sela túrcica em um ponto situado 2 mm distalmente
ao processo clinóide posterior. Após injeção de 0,2
ml de contraste iodado para aferir possibilidade de
extravasamento do agente lítico para a cisterna óp-
tico-quiasmática. Injeta-se, sucessivamente, 0,2 ml
de álcool absoluto até atingir o volume total de 1 ml,
avaliando-se reflexos fotomotores. O álcool penetra
na hipófise e flui através de sua haste para o hipotála-
mo e para o líquido cefalorraquidiano (LCR). Após os
procedimentos percutâneos, deve-se ocluir o orifício
selar com cola biológica. Corticosteróides (dexame-
tasona, prednisona) devem ser administrados por via
oral prolongadamente após a hipofisectomia; reposi-
ção do hormônio tireoidiano pode ser necessária.
A hipofisectomia é recomendada no tratamento de
doentes com dor decorrente de metástases de tumores
de mama, próstata e/ou endométrio e para o tratamen-
to de doentes com dor secundária a metástases de tu-
mores não dependentes de hormônios (condições em
que os resultados são menos satisfatórios). Há quem
a indique para outras dores nociceptivas bilaterais
ou sediadas no segmento encefálico ou de dor neu-
ropática, incluindo a síndrome talâmica. Foi também
utilizada no tratamento da retinopatia diabética. Em
mais de 94% dos doentes com tumores dependentes
de hormônios e em 70% dos doentes com tumores Fig. 69.23 – Hipofisectomia estereotática por radiofreqüên-
não dependentes há alívio da dor; o alívio dura cerca cia. Radiografia na incidência lateral da sela túrcica de doente
sendo submetido à hipofisectomia por radiofreqüência.
de 6 meses em doentes com carcinoma de próstata e
18 meses em doentes com carcinoma de mama. Os
resultados são melhores em casos de metástase ós- apresentam imediatamente alívio da dor precedendo a
sea e/ou hepática. Cerca de 60% a 70% dos doentes remissão das lesões; o efeito analgésico pode ser tar-
dio. Há alívio total em 30% a 40% dos casos e parcial
em 30%. Cerca de 50% dos doentes apresentam dor
controlada durante quatro meses ou mais; 75% a 85%
Glândula hipófise deixa de usar opióides durante esse período. Pode
ocorrer remissão temporária das metástases de tumo-
res dependentes de hormônios. Há prolongamento da
sobrevida e melhora da qualidade de vida em 86% a
90% dos doentes. A sobrevida é mais prolongada na
pré-menopausa quando há melhora satisfatória após a
ooferectomia ou após o tratamento com andrógenos.
Quando a remissão da doença oncológica é superior
a 2 anos após o diagnóstico, a taxa de remissão é de
Eletródio 65% e, quando inferior, é de 43%. Há melhora em
60% a 85% dos doentes com metástases ósseas de
carcinoma de próstata que melhoraram após orquiec-
Fig. 69.22 – Hipofisectomia estereotática por radiofreqü- tomia ou uso de estrógeno. A sobrevida é de cerca de
ência. Reprodução artística de eletródio introduzido pela ca- 11 meses nos que melhoram e de 4 meses nos que não
vidade nasal no interior da sela túrcica. melhoram.

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763
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

As complicações mais freqüentes do procedimen- fármacos analgésicos no compartimento liquórico é


to são déficit hormonal, incluindo diabetes insipidus indicada caso tenha havido melhora da dor com doses
(5% a 20%), fístula de LCR (1% a 10%), paralisia elevadas desses analgésicos administrados sistemica-
ocular ou déficit visual (2% a 10%), infecções, in- mente, mas com tolerância ou efeitos adversos.
cluindo abscessos intra-selares (0,3%) e meningite
(0,5% a 1%), hemorragia selar e óbito (2% a 5%). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ESTIMULAÇÃO ELÉTRICA DO SISTEMA nociceptivas e supressoras da dor. In: Teixeira MJ,
NERVOSO Braum Filho JL, Marquez JO, Lin TY, editores. Dor
– contexto interdisciplinar. Curitiba: Editora Maio;
A estimulação elétrica do sistema nervoso usual- 2003, p.119-46.
mente não proporciona benefício a doentes com dor 2. Teixeira MJ. Dor no doente com câncer. In: Teixeira
nociceptiva. É indicada a pacientes com dor exclusi- MJ, Braum Filho JL, Marquez JO, Lin TY, editores.
vamente neuropática e com preservação, pelo menos Dor – contexto interdisciplinar. Curitiba: Editora
parcial, da sensibilidade22. Maio; 2003, p.327-42.
3. Teixeira MJ. Dor no doente com câncer. In: Teixei-
SISTEMAS IMPLANTÁVEIS ra MJ, Figueiró JAB, editores. Dor, epidemiologia,
fisiopatologia, avaliação, síndromes dolorosas e
A infusão prolongada de analgésicos no compar- tratamento. São Paulo: Editora Moreira Jr; 2001, p.
timento liquórico é recomendada quando os doentes 193-200.
beneficiam-se do uso desses agentes por via sistêmi- 4. Teixeira MJ, Valle LBS. Princípios do tratamento far-
ca, em doses elevadas em razão do fenômeno de tole- macológico da dor. In: Teixeira MJ, Braum Filho JL,
rância ou por ocorrerem efeitos sistêmicos indesejá- Marquez JO, Lin TY, editores. Dor – contexto inter-
veis23. A expectativa de vida dos doentes deve ser de, disciplinar. Curitiba: Editora Maio; 2003, p. 555-62.
pelo menos, três meses para serem empregados; caso 5. Cavalcante VO, Rocha RO, Teixeira MJ. Agentes
contrário, os cateteres epidurais são mais apropriados. anestésicos e toxina botulínica no tratamento da dor.
Opióides (morfina, meperidina, metadona, tramadol, In: Teixeira MJ, Braum Filho JL, Marquez JO, Lin
buprenorfina), agonistas noradrenérgicos α-2 (cloni- TY, editores. Dor – contexto interdisciplinar. Curiti-
ba: Editora Maio, 2003; p.725-38.
dina, tizanidina), somatostatina, agonistas do GABA
6. Lin TY, Teixeira MJ, Stump P, Kaziyama HHS, Bar-
(midazolam, baclofeno) e anestésicos locais (ropiva-
boza HFG. Medicina física e reabilitação em doente
caína, lidocaína) são os agentes habitualmente mais com dor crônica. In: Teixeira MJ, Figueiró JAB, edi-
empregados por via espinhal no tratamento da dor22. tores. Dor, epidemiologia, fisiopatologia, avaliação,
síndromes dolorosas e tratamento. São Paulo: Edito-
CONCLUSÃO ra Moreira Jr; 2001, p. 130-40.
7. Teixeira MJ, Pimenta CAM. Avaliação do doente
Os procedimentos cirúrgicos realizados em es- com dor. In: Teixeira MJ, Figueiró JAB, editores.
truturas do sistema nervoso periférico visando à eli- Dor – epidemiologia, fisiopatologia, avaliação, sín-
minação dos fatores causais ou agravantes da dor, à dromes dolorosas e tratamento. São Paulo: Editora
restauração anatômica de estruturas orgânicas ou à Moreira Junior, 2001, p. 58-68.
interrupção das vias nociceptivas são indicados para 8. Moura JFB, Melo ITV. Radioterapia no tratamento das
tratar dor oligossegmentar rebelde a procedimentos metástases ósseas. In: Teixeira MJ, Braum Filho JL,
conservadores. As neurotomias e as rizotomias podem Marquez JO, Lin TY, editores. Dor – contexto inter-
ser eficazes no tratamento da dor por nocicepção e de disciplinar. Curitiba: Editora Maio; 2003, p. 717-24.
algumas neuralgias sintomáticas. A simpatectomia é 9. Teixeira MJ. Tratamento cirúrgico funcional da dor.
útil para tratar a dor visceral abdominal, pélvica e ou In: Teixeira MJ, Figueiró JAB, editores. Dor – epi-
torácica. A cordotomia é o procedimento de eleição demiologia, fisiopatologia, avaliação, síndromes
no tratamento da dor decorrente do câncer em am- dolorosas e tratamento. São Paulo: Editora Moreira
Junior; 2001, p. 169-92.
plas regiões do corpo distais ao segmento cervical. A
10. Goldner JL, Hall RL. Nerve entrapment syndromes
lesão do trato de Lissauer e do CPME é eficaz no tra-
of the low back and lower extremities. In: Omer GE,
tamento da dor neuropática plexular actínica e/ou on- Spinner M, Van Beek OM, editors. Management of
copática, mielopática e da dor no membro-fantasma. peripheral nerve problems. Philadelphia: WB Saun-
A talamotomia ou mesencefalotomia é indicada para ders; 1998, p. 554-84.
tratamento da dor generalizada ou craniofacial, bra- 11. Spinner M, Spinner RJ. Management of nerve com-
quial. A cirurgia psiquiátrica é recomendada em casos pression lesions of the upper extremity. In: Omer GE,
de psicopatias rebeldes. A hipofisectomia é eficaz no Spinner M, Van Beek OM, editors. Management of
tratamento da dor decorrente de metástases ósseas de peripheral nerve problems. Philadelphia: WB Saun-
carcinomas dependentes de hormônios. A infusão de ders, 1998, p. 501-33.

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69 – Tratamento Cirúrgico da Dor Oncológica

12. Teixeira MJ. Tratamento neurocirúrgico da dor neu- 19. Nóbrega JCM, Teixeira MJ. Cordotomias e mielo-
ropática. Rev Med. 1999;78:305-36. patias no tratamento da dor. In: Teixeira MJ, Braum
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rúrgico funcional da dor. Rev Med. 2001;80:276-89. texto interdisciplinar. Curitiba: Editora Maio; 2003,
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Teixeira MJ, Braum Filho JL, Marquez JO, Lin TY, 20. Teixeira MJ. Talamotomia e mesencefalotomia. In:
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Braum Filho JL, Marquez JO, Lin TY, editores. Dor MK, Pimenta CAM, Corrêa CF, Teixeira MJ, editores.
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Lin TY, editores. Dor – contexto interdisciplinar. JL, Marquez JO, Lin TY, editores. Dor – contexto in-
Curitiba: Editora Maio; 2003, p. 797-804. terdisciplinar. Curitiba: Editora Maio; 2003, p. 821-6.

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70
Tratotomia de Lissauer e Lesão
do Corno Posterior da Substância Cinzenta
da Medula Espinhal
Manoel Jacobsen Teixeira

INTRODUÇÃO te medial veicula estímulos excitatórios oriundos nas


raízes aferentes e destinados a segmentos adjacentes,

A
tratotomia de Lissauer e a lesão do corno pos- e seu componente lateral veicula influências inibitó-
terior da medula espinhal consistem na lise do
rias oriundas da substância gelatinosa nos metâmeros
trato de Lissauer e na substância cinzenta do
vizinhos. A lesão de seu componente medial reduz a
corno posterior da medula espinhal (CPME), onde se
excitabilidade regional dos aferentes nociceptivos.
identifica hiperatividade neuronal em casos de dor por
A lâmina I (zona marginal) do CPME contém neu-
neuropatia1. Em autópsias e em estudos com animais,
rônios nociceptores e termorreceptores; a lâmina II
demonstrou-se que essa técnica resulta em lesão das
unidades celulares das lâminas I, II, III, IV, V e VI (substância gelatinosa), nociceptores, termorrecepto-
do CPME, do trato de Lissauer e dos tratos caudor- res e mecanorreceptores, que contribuem para a cons-
rostrais, que trafegam pelo quadrante póstero-lateral tituição do trato espinotalâmico; as lâminas III e IV
da medula espinhal, modificando o balanço entre os contêm neurônios mecanorreceptores de adaptação
estímulos excitatórios e inibitórios dos circuitos seg- lenta e rápida; a lâmina V, termorreceptores, quimior-
mentares desaferentados envolvidos nos mecanismos receptores e mecanorreceptores (neurônios multimo-
de facilitação e de inibição da atividade dos neurônios dais), que geram fibras para o trato espinotalâmico.
do CPME. Aferentes primários discriminativos da raiz sensitiva,
Segundo Teixeira2, após a penetração na medula constituídos por fibras A-delta de rápida velocidade
espinhal, as fibras dos aferentes primários constituem de condução, dirigem-se rostral ou caudalmente no
o trato de Lissauer; este é composto de fibras inter- trato de Lissauer ao penetrarem na medula espinhal,
segmentares com trajetória longitudinal e origina co- deslocam-se medialmente e penetram nas camadas
laterais para as lâminas I e II do CPME, situando-se IV e V do CPME e, a seguir, dirigem-se lateralmente
dorsolateralmente ao longo de toda a extensão da su- para penetrar na substância gelatinosa. As fibras dolo-
perfície do CPME na medula espinhal (Fig. 70.1). Fi- rosas aferentes C deslocam-se caudal ou rostralmente
bras aferentes de origem periférica são responsáveis alguns segmentos pelo trato de Lissauer e penetram
por 25% de seus constituintes; as demais 75% são ori- na zona marginal e na substância gelatinosa. A lesão
ginadas de neurônios localizados na substância gelati- neural periférica origina descarga contínua prolon-
nosa. Na sua porção medial, há fibras finas que se tri- gada no CPME dos segmentos desaferentados. Se a
furcam para alcançar o CPME segmentar e de dois ou atividade é intensa, ocorrem alterações plásticas nos
mais metâmeros caudais ou rostrais. Seu componente neurônios nociceptivos do CPME, em decorrência
lateral contém grande número de fibras longitudinais de lesão neurotóxica dos neurônios inibitórios e da
proprioespinhais, que interconectam diferentes seg- sensibilização neuronal, mediada por alterações bio-
mentos da substância gelatinosa. O trato de Lissauer químicas intracelulares, anormalidades dos canais iô-
exibe papel importante na modulação intersegmentar nicos e de receptores em neurônios responsáveis pelo
dos estímulos nociceptivos aferentes; seu componen- processamento de estímulos álgicos3.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Fibra Aβ
Fibra Aδ

Fibra Aβ Fibra C Fibra Aβ

I
Fibra Aδ II
Fibra Aδ
III
Fibra C
IV

VI

Fig. 70.1 – Representação artística da secção transversa da medula espinhal descrevendo as lâminas que compõem o corno
posterior da medula espinhal. As aferências nociceptivas predominam nas lâminas I, II e V do CPME.

Segundo Teixeira1, em 1942 Hyndman desenvol- NUCLEOTRATOTOMIA DO TRATO


veu a técnica de secção mecânica do trato de Lis- ESPINHAL DO NERVO TRIGÊMEO E
sauer, com a finalidade de ampliar a área de analgesia
induzida pela cordotomia. Em 1946, Pool, pela pri-
NUCLEOTRATOTOMIA TRIGEMINAL
meira vez, realizou a lesão da substância gelatinosa PONTINA
do CPME e do trato de Lissauer para tratamento da Segundo Teixeira4, Sjöqvist, em 1937, realizou,
dor. Em 1966, Kerr praticou experimentalmente a le- pela primeira vez, a secção do trato descendente do
são do núcleo do trato espinhal do nervo trigêmeo em nervo trigêmeo, na junção entre o terço médio e o ter-
animais, com a finalidade de bloquear a nocicepção ço inferior da oliva. Crue et al. em 1967, Todd et al.,
da face. Hitchcock, em 1970, demonstrou que a tra- em 1969, e Hitchcock, em 1970, descreveram a trato-
totomia e a nucleotomia do trato espinhal do nervo tomia trigeminal esterotática por lesão térmica gerada
trigêmeo eram úteis no tratamento da dor facial neu- por corrente anódica ou radiofreqüência e Fox, em
ropática. Hitchcock e Teixeira, em 1987, descreveram 1973, a tratotomia trigeminal percutânea a mão livre.
a técnica de nucleotratotomia trigeminal pontina es- A nucleotratotomia trigeminal pontina foi descrita
tereotática. Sindou, em 1972, baseando-se no meca- por Hitchcock e Teixeira em 1982.
nismo de comporta e visando a interromper os afe-
rentes primários nociceptivos na zona de entrada da Nucleotratomia Trigeminal Espinhal
raiz nervosa, preservando os aferentes discriminati-
vos de grosso calibre, que veiculam as sensibilidades Estereotática
discriminativas tátil e profunda, descreveu a técnica É realizada com os doentes sob anestesia local
de secção mecânica da porção ventrolateral da junção na posição sentada ou deitada (Figs. 70.2 a 70.5).
mielorradicular das raízes espinais e a empregou em Consiste na fixação do aparelho de estereotaxia ao
doentes com dor neuropática resultante de infiltração segmento cefálico do doente, seguida de aquisição
neoplásica das estruturas do sistema nervoso perifé- de imagens em ambiente de estereotomografia ou es-
rico (SNP). Em 1976, Nashold et al. descreveram a tereorressonância magnética e de sua fusão com as
técnica da lesão por radiofreqüência da zona de entra- figuras de atlas de estereotaxia. O alvo estereotático
da das raízes nervosas, ou seja, do trato de Lissauer e é posicionado 4 a 6,5 mm lateralmente em relação à
das lâminas superficiais do CPME. A técnica de lesão linha mediana, de acordo com a dor sediada no terri-
por laser, descrita por Levy et al. em 1983, e a téc- tório da terceira e da primeira divisões do nervo trigê-
nica por ultra-sonografia descrita por Jones em 1984, meo, respectivamente. A seguir, via agulha aplicada
revelaram-se insatisfatórias. na transição occipitocervical, um eletródio com par

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70 – Tratotomia de Lissauer e Lesão do Corno Posterior da Substância Cinzenta da Medula Espinhal

termoelétrico é introduzido no tecido nervoso bulbar mediante estimulação monopolar, a baixa voltagem,
e dirigido, de baixo para cima e de fora para dentro, com estímulos de ondas quadradas de 5, 10, 50 e 100
com inclinação de 20° em relação aos planos transver- Hz. Quando a estimulação elétrica gera desconforto
sal e sagital. O controle da penetração do eletródio na no local onde a dor é referida, realizam-se lesões por
estrutura nervosa é realizado mediante avaliação da radiofreqüência a 70°, de modo a gerar coagulação
impedância tecidual e sua localização é confirmada tecidual com o diâmetro de 2 mm (Figs. 70.6 a 70.8).

Núcleo mesencefálico

Nervo trigêmeo
Núcleo principal
Nucleotratotomia pontina
Pars oralis do núcleo do trato espinal

Nucleotratotomia caudal
Pars caudalis do núcleo do trato espinal

Fig. 70.2 – Nucleotratotomia trigeminal caudal. Representação artística do complexo sensitivo trigeminal onde são apontadas
a localização das lesões por radiofreqüência induzidas durante a operação.

A B

C D

Fig. 70.3 – (A a D) Nucleotratotomia trigeminal caudal. Coleta de informações e reconstrução da imagem estereotomográfica
durante procedimento de nucleotratotomia trigeminal caudal.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

A B

Fig. 70. 4 – (A e B) Nucleotratotomia trigeminal caudal. Representação da imagem tridimensional da localização da lesão por
radiofreqüência no núcleo do trato espinhal do nervo trigêmeo.

Fig. 70.5 – Fotografia de doente durante o procedimento de


nucleotratotomia trigeminal caudal.

Fig. 70.6 – Nucleotratotomia de Lissauer e lesão do CPME. Fig. 70.7 – Nucleotratotomia de Lissauer e lesão do CPME.
Fotografia do conjunto de eletródios destinados à lesão por Representação artística da exposição da face posterior da me-
radiofreqüência. dula espinhal após realização de laminectomia; destacam-se
os locais onde são realizadas lesões por radiofreqüência no
trato de Lissauer e no CPME.

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70 – Tratotomia de Lissauer e Lesão do Corno Posterior da Substância Cinzenta da Medula Espinhal

de acompanhamento variando de 6 a 72 meses, a dor


mantém-se ausente em 25% a 50% dos doentes e a
melhora, em 31% a 50%. Os resultados parecem mais
satisfatórios em casos de dor paroxística que de dor
em peso constante e menor quanto maior o número de
divisões acometidas. Há melhora da neuropatia trige-
minal actínica e oncopática na maioria dos doentes
com câncer e em mais de 50% dos doentes com anes-
tesia dolorosa da face. Proporciona melhora da dor
em 75% dos doentes com síndrome de Wallemberg5,6.
Os resultados são insatisfatórios em doentes com dor
facial atípica. A nucleotratotomia pontina resulta em
melhora de aproximadamente 60% dos doentes com
dor facial atípica.
Quando a nucleotratotomia trigeminal é realizada
Fig. 70.8 – Nucleotratotomia de Lissauer e lesão do CPME. a céu aberto, a extensão e a intensidade das lesões são
Representação artística de corte transversal da medula espi- mais expressivas que quando se emprega a técnica
nhal demonstrando a localização das lesões por radiofreqüên- estereotática; referem-se, principalmente, a compro-
cia no trato de Lissauer e no CPME.
metimento dos funículos posteriores e tratos espino-
talâmicos. São permanentes, mas não incapacitantes
Nucleotratotomia Estereotática Pontina em 40% dos doentes tratados pela nucleotratotomia
trigeminal a céu aberto e, em 20%, dos tratados pela
Consiste na fixação do equipamento de estereo- técnica estereotática. Em casos de cirurgia a céu aber-
taxia ao segmento cefálico dos doentes e na realiza- to, ocorre ampliação da área de analgesia para o ter-
ção de estereotomografia e para delineação do quarto ritório da primeira raiz cervical, termoanalgesia con-
ventrículo cerebral. Após fusão das imagens com as tralateral em cerca de 17% a 25% dos casos, ataxia
dos atlas de estereotaxia, o alvo é delineado e, após dos membros inferiores em 30% a 39% e dos mem-
trepação realizada na escama do osso occipital, são bros superiores em 61%. Com o uso de eletródios
induzidas lesões por radiofreqüência na porção oral com conformação especial ou providos de ultra-som,
do núcleo do trato espinhal do nervo trigêmeo. a ocorrência de dismetria dos membros superiores
e inferiores reduziu-se de 74% para 39% e o déficit
Nucleotratotomia Trigeminal a Céu Aberto motor foi evidenciado em poucos casos. Infecções
urinárias, septicemia, infarto do miocárdio e acidente
É realizada sob anestesia geral. Após laminecto- encefálico com óbito são também descritos com a téc-
mia de C1 e C2 e de craniectomia occipital, lesões por nica a céu aberto. Esses achados sugerem que o pro-
radiofreqüência distanciadas de 1 mm entre si são in- cedimento estereotático percutâneo seja mais seguro,
duzidas no subnúcleo caudal trigeminal de um ponto principalmente quando indicado a idosos ou doentes
situado de 5 a 10 mm rostralmente ao óbex até o local debilitados.
da penetração da segunda raiz cervical. As lesões de-
vem ser precedidas de estimulação elétrica.
Tratotomia de Lissauer e Lesão do Corno
A nucleotratotomia trigeminal é eficaz no trata-
mento da dor facial neuropática (síndrome de Wal-
Posterior da Substância Cinzenta da Medula
lemberg, anestesia dolorosa da face, neuralgia pós- Espinhal
herpética, outras dores decorrentes de neuropatia É realizada para o tratamento da dor no membro-
trigeminal) ou decorrente de nocicepção (dor de cân- fantasma, da dor resultante de neuropatias plexulares
cer facial e ou cervical). actínicas, oncopáticas e traumáticas, neuralgia pós-
A secção apenas do trato descendente do nervo tri- herpética, dor mielopática e dor por lesão da cauda
gêmeo alivia inicialmente a dor facial nociceptiva em eqüina.
62% a 100% dos casos, mas não a dor neuropática, Sob anestesia geral e com o emprego de micros-
incluída a da neuralgia trigeminal. Em decorrência cópio cirúrgico e após laminectomia, visando a expor
da lesão do corpo restiforme e do nervo vago, mui- a zona de penetração na medula espinhal das raízes
tos doentes apresentam ataxia e déficit do nervo re- correspondentes à inervação das áreas onde a dor é
corrente. Além disto, a taxa de recorrência é elevada referida, assim como a dos seus respectivos derma-
(26% a 83,3%). Já a nucleotratotomia trigeminal cau- tômeros rostrais e caudais, por visualização direta, a
dal proporciona resultados imediatos excelentes em dura-máter é aberta na linha mediana ou paramedia-
57% a 100% dos doentes com neuralgia pós-herpé- na. A exposição da zona de entrada da raiz é realizada
tica no território do nervo trigêmeo; durante período em casos de avulsão de raízes do plexo braquial. A

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

disposição das raízes contralaterais e a linha de pe- 75% a 100% dos doentes com neuralgia pós-herpéti-
netração das raízes homolaterais constituem reparos ca8; entretanto, há recorrência parcial ou completa em
anatômicos que possibilitam identificar os locais onde até 50% dos doentes durante os primeiros seis meses,
a punção da medula espinhal deve ser realizada7. 38% em um ano, e 26% em 18 meses; a dor recorrente
Após a introdução na profundidade de 2 mm na zona apresenta características diferentes das do original em
de penetração das raízes correspondentes aos locais 50% dos casos, pois o queimor original é substituído
onde a dor é referida e no terço proximal às raízes por dor em peso, latejamento ou sensação de frio. Os
justapostas com eletródios providos de par termoe- resultados são maus em casos de síndrome complexa
létrico, e com 2 mm de superfície exposta, dirigidos de dor regional. Há melhora imediata em 50% a 100%
com inclinação de 25° de fora para dentro e de trás dos doentes com dor no membro-fantasma logo após
para frente, no plano transversal, visando a localizar o o procedimento e, a longo prazo, em 50% a 66,6%.
trato corticoespinhal, são realizadas estimulação elé- O resultado é menos satisfatório em casos de dor no
trica monopolar, lesões térmicas por radiofreqüência coto de amputação. Na casuística de Saris et al., não
a 70° a cada 2 mm durante 60 s. Em casos de mielo- houve melhora da dor no coto; ocorreu melhora em
patia traumática, devem ser realizadas lesões na zona 29% dos doentes quando havia associadamente dor no
de penetração das três raízes situadas rostralmente ao membro-fantasma. Quanto mais prolongado o tempo
segmento anatomicamente anormal. A impedância decorrido entre a intervenção cirúrgica e a amputa-
normal da medula espinhal varia de 1.000 a 1.200 Ω, ção, melhor o resultado. Houve alívio da dor em 50%
enquanto nas áreas anormais torna-se de 600 a 800 Ω. dos doentes quando esta durou mais de 15 anos, em
A área de lesão deve ser restrita ao CPME e ao trato 40% quando a dor teve duração de 6 a 15 anos e em
de Lissauer entre a porção medial do trato grácil e apenas 31% dos doentes quando a história foi inferior
cuneiforme, medialmente, e ao trato piramidal, late- a 6 anos. Quando o doente tem idade superior a 50
ralmente. anos e a amputação é resultante de doença oncológica
A técnica da lesão mecânica microcirúrgica con- ou isquêmica, o resultado é menos satisfatório que o
siste na incisão e coagulação bipolar da porção lateral observado em casos de amputação traumática.
das raízes posteriores no sulco intermédio-lateral e do Com raras exceções, a maioria dos autores não ob-
segmento medial do trato de Lissauer até o ápice do servou resultados satisfatórios em casos da neuropatia
CPME (correspondente até a lâmina VI do CPME). périférica traumática com essa técnica. Na casuística
A lesão deve apresentar 2 a 3 mm de profundidade e de Nashold et al., 51% dos doentes apresentaram re-
inclinação ventromedial variando de 10° a 35°, con- missão completa da dor e 37% de alívio parcial. Após
forme o segmento medular a ser operado. seguimento com duração média de oito anos, 95% dos
Laser de dióxido de carbono e ultra-som também doentes apresentava dor moderada a intensa, ou seja,
podem ser utilizados para lesar o trato de Lissauer e houve recidiva em 82% dos casos, na maioria das ve-
o CPME. zes, durante os primeiros sete meses pós-operatórios.
Os resultados imediatos são excelentes e bons em Sami e Moringlane observaram, imediatamente após
64,7% a 100% dos doentes em casos de avulsão de a cirurgia, que o resultado era excelente em doentes
raízes nervosas e regulares, em 8,3% a 24%7. Durante com neuropatia periférica.
período de acompanhamento que variou de 5 a 108 A lesão do trato de Lissauer e do CPME benefi-
meses, ocorreu declínio de resultados bons e excelen- cia cronicamente 45,5% a 80% dos doentes com dor
tes para 50% a 81% e elevação do número de resulta- mielopática traumática e proporciona resultado bom
dos regulares para 9,5% a 40%7. É indicada quando a inicial em 8,5% a 100%9. Há melhora significativa da
dor persiste durante um ou mais anos. Um ano após a dor mielopática segmentar em 80% dos doentes, da
cirurgia, 60% dos doentes mantêm-se sem dor, 35% dor unilateral em 90% e da dor distal e sacral em ape-
apresentam alívio satisfatório e 5% não apresentam nas 32%. Os resultados são insatisfatórios em menos
melhora. A longo prazo, cerca de 30% dos casos têm de 41% dos doentes. Há também alívio da dor gerada
remissão completa da dor, e 70% melhora expressiva, pela estimulação da zona de gatilho. O procedimen-
havendo redução de usuários de opióides de 80% para to é indicado quando a dor tem duração superior a 6
35% um ano após sua realização. Em cerca de 80% meses. Os resultados são melhores em casos de dor
dos casos, a recidiva é insidiosa e, em 20%, súbita. delimitada a alguns dermatômeros que em casos de
Há descrição de recorrência da dor até nove anos de- dor difusa e bilateral. A longo prazo, 66% dos doentes
pois do procedimento, embora, na maioria, a recidiva referem recidiva ou persistência da dor, mas a fun-
seja mais precoce. Geralmente, a dor que recidiva é ção torna-se significativamente melhor. A melhora é
significativamente mais amena que a original. relacionada ao padrão da dor pré-operatória. Segun-
Há melhora inicial, mantida na maioria dos doen- do Nashold et al., 74% dos doentes com dor na zona
tes com dor decorrente de plexopatia actínica. Ime- de transição beneficiam-se com o procedimento; tal
diatamente após o procedimento ocorre melhora em fato também se observa em somente 20% dos doentes

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70 – Tratotomia de Lissauer e Lesão do Corno Posterior da Substância Cinzenta da Medula Espinhal

com dor difusa em queimor. Os resultados são bons sexual são mais freqüentes quando se realiza o proce-
ou excelentes em 54% dos doentes e regular em 20%, dimento bilateralmente.
quando a dor é segmentar. Apenas 20% dos casos de Outras anormalidades devem-se ao acometimento
dor difusa distal ao nível da lesão beneficiam-se com dos tratos espinocerebelar, proprioespinhal, espinor-
o tratamento. Sindou e Dahler observaram resultados radicular ou retículo espinhal como representadas por
bons ou excelentes em 71% em casos em que a dor ataxia transitória ipsilateral, espasmos, dor refratária,
localizava-se nos membros inferiores. Powers et al. comprometimento da função vesical. A freqüência de
não observaram melhora da dor segmentar em dois complicações, que era comum no passado (40% a 50%),
doentes e da dor-fantasma em cinco de nove doentes reduziu-se para menos de 6% nas últimas casuís­ticas
tratados por essa técnica10. Ocorreu benefício em 95% devido ao desenvolvimento de eletródios com controle
dos casos de dor paroxística em choque. Em apenas de temperatura da lesão e com conformação espacial e
26% dos casos de dor contínua em queimor os re- com o controle de duração da lesão e medida da impe-
sultados são bons ou excelentes, sendo regulares em dância. Outras complicações operatórias incluem fístu-
37% destes. Quando a lesão é incompleta, a melhora las liquóricas, observadas em menos de 1% dos casos e
é mais expressiva que quando o déficit é completo. infecções10. Segundo Nashold et al., 79% dos doentes
Não se observou melhora significativa em doentes não apresentam intercorrência pós-operatória; 35% dos
com esclerose múltipla. Thomas e Jones não verifica- doentes mantêm seqüelas relacionadas ao procedimen-
ram melhora, e sim, piora do déficit neurológico em to ou instabilidade e/ou déficit sensitivo ou motor. Nu-
50% dos doentes durante o período pós-operatório. merosas complicações neurológicas são descritas após
O método beneficia imediatamente 71% dos doentes o tratamento de síndrome dolorosa pós-laminectomia
com dor decorrente de lesão de cauda eqüina. Na ca- lombar, incluindo-se, entre elas, hipoestesia da região
suística de Sindou et al.10, os resultados melhores fo- genital e/ou nos membros inferiores, déficit motor, in-
ram observados em casos de lesão no cone medular; continência esfincteriana e impotência sexual.
ocorreu melhora em todos os casos de lesão incom- Portanto, a lesão do trato de Lissauer e do CPME
pleta e em 50% de lesão completa; a longo prazo, en- é mais eficaz no tratamento de doentes com intensa
tretanto, apenas 29% é beneficiada. Não há melhora desaferentação em áreas extensas, como ocorre em
de casos com dor decorrente de traumatismo da cauda doentes com avulsão de raízes do plexo braquial ou
eqüina durante laminectomia destinada a exérese de lombar, neuropatia plexular actínica, dor segmentar
hérnia discal lombar. Menos de 10% dos doentes com em doentes com mielopatia paraplégicos ou com le-
fibrose lombossacral beneficia-se com essa técnica. são de cauda eqüina e cone medular. O procedimento
Resultados insatisfatórios também foram observa- é também útil no tratamento da espasticidade, espe-
dos em casos de dor monorradicular. Powers et al. cialmente dos membros superiores.
observaram que, de quatro doentes com neuralgia in-
tercostal, dois apresentaram melhora significativa e
CONCLUSÕES
dois não melhoraram.
A extensão e a intensidade do déficit sensitivo pré- A lesão do trato de Lissauer e do CPME visa à in-
operatório amplia-se sistematicamente após a lesão terrupção de estímulos álgicos decorrentes das altera-
do trato de Lissauer e do CPME; ocorre déficit motor, ções neuroplásticas e neuroquímicas que ocorrem na
geralmente discreto e temporário, em aproximada- medula espinhal em doentes com lesões neuropáticas
mente 10% dos doentes submetidos ao procedimento. ou nociceptivas. Os resultados ocorrem em casos de
O déficit motor ipsilateral à lesão pode ser decorrente dor gerada por câncer, limitada especialmente (tumor
de edema local, que acomete o trato corticoespinhal. de Pancoast), tumor facial, oral, faríngeo, cervical,
Síndrome cordonal posterior discreta e transitória ho- lesão do plexo braquial ou lombossacral, especial-
molateral à lesão é observada inicialmente em dois mente quando há avulsão, dor com lesão da medula
terços dos casos; é permanente em 10% a 30% deles. espinhal e dor segmentar, dor no membro-fantasma,
Parestesias na região dos dermatômeros vizinhos, hi- espasticidade associada à neuropatia plexular actíni-
perestesia na área de transição entre a região normal ca e oncopática e síndrome de Wallemberg, neuralgia
e a comprometida também podem ocorrer. A atrofia pós-herpética facial, anestesia dolorosa da face. Dé-
da medula espinhal em conseqüência da cicatrização ficit sensitivo ou motor, incontinência esfincteriana,
do tecido traumatizado proporciona maior risco de le- recrudescência da dor original, fístula liquórica e in-
são de tratos longos em casos de avulsão plexular. Há fecções são complicações possíveis.
maior possibilidade de comprometimento da função O índice de complicações reduz-se progressiva-
neurológica quando a lesão é realizada nos segmentos mente graças aos avanços técnicos que possibilitam
torácicos da medula espinhal. Em casos de lesados melhor controle das lesões realizadas e a experiência
no cone medular e cauda eqüina, as complicações in- dos neurocirurgiões. A probabilidade de melhora de-
cluindo o comprometimento da função esfincteriana e pende da indicação fundamentada e do domínio tanto

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773
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

da técnica cirúrgica como do tratamento decorrente Textbook of stereotactic and functional neurosurgery.
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71
Técnicas de Biópsia Estereotática das
Lesões Encefálicas
Manoel Jacobsen Teixeira
Valter Ângelo Cescato
Starlynn Freire dos Santos
Sérgio Rosenberg

INTRODUÇÃO BIÓPSIA ESTEREOTÁTICA

O
diagnóstico anatomopatológico das lesões Os métodos de biópsia a mão livre, por estereota-
encefálicas é muitas vezes necessário para a xia e com controle tomográfico, passaram a ser am-
instituição de tratamento adequado. Lesões plamente empregados, principalmente após o advento
localizadas em estruturas encefálicas profundas ou da tomografia por computador, que permitiu a precisa
em centros nervosos de grande importância funcio- localização espacial das lesões. O estudo angiográfi-
nal ou nas proximidades de vasos calibrosos não co é recomendado quando a correlação espacial entre
podem ser acessadas sem riscos por procedimentos as lesões e as estruturas vasculares é necessária para
neurocirúrgicos convencionais. Os métodos terapêu- tornar o método mais seguro. A ventriculografia pode
ticos ou adjuvantes de tratamento de afecções do ser útil em alguns casos para melhorar a precisão de
sistema nervoso ou de seus envoltórios não são des- configuração espacial das lesões ventriculares. A es-
providos de risco e a instituição tardia do tratamento tereotomografia e a ressonância magnética, ou seja, o
após período de expectância quanto à tomada de de- uso de técnica estereotática e de controle tomográfico
cisões ou após execução terapêutica de provas pode ou de ressonância magnética, intra-operatórios, cons-
possibilitar a progressão da sintomatologia e tornar o tituem refinamentos técnicos que tornaram as biópsias
prognóstico desfavorável. Estas, entre outras razões, percutâneas, ou por trepanação de lesões encefálicas,
justificam a necessidade da realização de estudo ana- sensíveis, específicas, simples e seguras. Quando se
tomopatológico apropriado para esclarecimento do relaciona a sensibilidade da ressonância magnética e
diagnóstico de muitas afecções que acometem o sis- a precisão espacial das imagens em ambiente de to-
tema nervoso. mografia computadorizada, a localização dos alvos
O tratamento baseado no diagnóstico presuntivo, cirúrgicos torna-se aprimorada.
fundamentado apenas na apresentação clínica, neu- Aparelhos de estereotaxia, alguns imprecisos, fo-
rorradiológica e laboratorial, de lesões neurológicas ram construídos especialmente para estereotomogra-
menos inacessíveis aos procedimentos cirúrgicos fia. A adaptação dos aparelhos convencionais para o
diagnósticos ou habituais, não mais se justifica graças procedimento estereotomográfico é pouco dispendio-
ao desenvolvimento dos métodos recentes de aquisi- sa. Além disso, melhora a precisão do método (Figs.
ção de imagens e de computação gráfica em ambiente 71.1 e 71.2).
neurocirúrgico; a biópsia percutânea, por trepanação, O procedimento consiste na fixação do aparelho de
ou a céu aberto, estereotática, neuronavegada ou não, estereotaxia ao crânio do doente sob anestesia local;
assistida pela tomografia computadorizada e/ou res- em doentes não cooperativos ou com anormalidades
sonância magnética possibilita o diagnóstico anato- cognitivas, ou na faixa pediátrica, a sedação (diaze-
mopatológico preciso, e este, o prognóstico e trata- pam, midazolam) ou anestesia geral (propofol, fen-
mento adequados. tanila, droperidol) podem ser necessárias, seguida da

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775
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

ambiente de computação gráfica e reconstruídas para


possibilitar o cálculo de coordenadas estereotáticas
das lesões e de suas vizinhanças e a delineação do
traçado do sistema de biópsia. Como a ressonância
magnética distorce as imagens, seus achados devem
ser fundidos aos da estereotomografia por técnica de
comparação ou fusão (Figs. 71.3 a 71.7). Via punção
percutânea, trepanação ou craniotomia delineadas na
superfície craniana de modo a tornar o acesso à lesão o
mais curto possível das lesões e de modo a prevenir a
transfixação de vasos sangüíneos e de tratos e centros
nervosos de grande importância funcional pelo instru-
mento de biópsia, cânula com pequeno diâmetro ex-
terno (inferior a 2,5 mm) deve ser conduzida à lesão.
A seguir, pinça com fenda lateral (Sedan), tipo saca-
bocados ou em espiral (Backlund) (Figs. 71.8 a 71.10)
é nela introduzida para possibilitar coleta seriada de
fragmentos de tecido ao longo de todo um hemi-eixo
da lesão e do tecido perilesional adjacente. Em casos
Fig. 71.1 – Aparelho de estereotaxia modelo MD Micromar de lesões polimorfas, deve ser colhido material de to-
com referenciais em N fixadas ao segmento cefálico de mane-
quim preparado para estudo estereotomográfico. Dispositivos dos os locais onde as características de imagem são
semelhantes podem ser utilizados para estereorressonância e diferentes entre si. Pode haver necessidade de vários
estereoangiografia. trajetos de exploração ou de várias trepanações para
contemplar essa exigência. A biópsia do tecido vizi-
nho à imagem lesional possibilita avaliar a graduação
da infiltração tecidual, elemento fundamental para o
estabelecimento da estratégia terapêutica em casos de
neoplasias (exérese, radioterapia intersticial, radioci-
rurgia, telerradioterapia, quimioterapia). Durante o
procedimento, os fragmentos de biópsia devem ser
examinados macroscopicamente e corados após exe-
cução de esfregaço, impressão ou cortes histológicos
por técnica de congelação. Corantes como hematoxi-
lina-eosina ou azul de toluidina são os mais utilizados
para tal mister. Para a congelação, o material deve ser
colocado em isopentano e resfriado em nitrogênio lí-
quido e, a seguir, cortado. Essa técnica possibilita me-
lhor análise da arquitetura tecidual. O esfregaço con-
siste na aplicação de fragmento de tecido (1 mm) em
uma lâmina para, a seguir, o material ser esmagado e
deslizado sobre superfície do vidro com outra lâmina
(para uniformizar sua espessura) e fixado em álcool
acético. Essa técnica possibilita análise da citologia e
destaca as fibras gliais e os vasos1. Parte do material
deve ser destinada a estudo histológico, histoquímico
Fig. 71.2 – Equipamento de estereotaxia fixado ao segmento e bioquímico; deve-se fixar em formol a 10% para
cefálico de manequim para simular biópsia estereotática. ser processado em parafina, congelando-se parte dele
para investigação da biologia molecular, fixando-se
realização de radiografia simples, angiografia digital outra parte em glutaraldeído para microscopia eletrô-
ou convencional, pneumoencefalograma, tomografia nica. Quando indicado, fragmentos do material colhi-
computadorizada, ressonância magnética, SPECT e do devem ser analisados por técnica bacterioscópica,
ou PET-Scan, para ambiente estereotático. A técnica assim como semeado em meio de cultura para bacté-
de estereotaxia com controle intra-operatório com to- rias, fungos ou vírus. A técnica de estudo anatomopa-
mografia computadorizada ou ressonância magnética tológico por esfregaço ou por congelação apresenta
é dispendiosa e demanda tempo prolongado. Após elevada freqüência de achados coincidentes aos dos
sua aquisição, as imagens devem ser processadas em preparados em parafina.

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71 – Técnicas de Biópsia Estereotática das Lesões Encefálicas

A B

Fig. 71.3 – (A e B) Fotografias de imagens reconstruídas em ambiente de estereotomografia. Imagens de fusão das aquisições
de cortes estereotomográficos axiais com imagens de ressonância magnética. O método de fusão possibilita combinar a precisão
espacial de estereotomografia com a sensibilidade da ressonância magnética.

Fig. 71.4 – Fotografia de imagem reconstruída em ambien- Fig. 71.5 – Fotografia de imagem reconstruída em ambiente
te de estereotomografia. Fusão de imagem estereotomográfica de estereotomografia. Reconstrução tridimensional da imagem
sagital de doente com imagem de ressonância magnética. estereotomográfica no plano axial do encéfalo e da caixa cra-
niana, com a finalidade de possibilitar melhor orientação do
instrumento de biópsia.

A biópsia estereotática proporciona resultados con- estereotáticas ou da inexperiência do neurocirurgião


clusivos em 80% a 99% dos casos (média = 91%), se- ou do patologista, seleção inadequada de alvos para
gundo a conclusão de 17 grandes casuísticas incluindo coleta de material ou uso de técnica histológica ou de
cerca de 7.500 doentes2-4. O diagnóstico é conclusivo cultura inapropriada. Em 1,35% das 518 biópsias de
em 88% a 100% dos casos de AIDS5,6. Os diagnósti- Soo et al.7, o tecido não revelou alterações histológi-
cos são diferentes dos suspeitados pré-operatoriamen- cas. Na maioria das casuísticas, o diagnóstico histo-
te em 1,7% a 28%. O diagnóstico é inconclusivo ou patológico mais comum é de tumor, seguindo-se os
falsamente-negativo em 5,4% a 10% dos casos, talvez processos inflamatórios ou infecciosos8,9. Observa-se
em razão da transferência indevida dos achados dos necrose em 3% dos casos. Gliose significa tecido alte-
exames de imagem para o sistema de coordenadas rado, associado à reação inflamatória ou não10.

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777
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

abscessos ou hematomas, implante de dispositivos


para instilação de antibióticos, quimioterápicos ou
imunoterápicos intralesionais, implante de isótopos
destinados à radioterapia intersticial, remoção de cor-
pos estranhos, imunoterapia etc.

BIÓPSIA A CÉU ABERTO


Em algumas circunstâncias é necessário mais vo-
lume de tecido para estudo anatomopatológico que o
proporcionado pela técnica de biópsia percutânea ou
por trepanação. É o que ocorre em casos em que se
realizam craniotomias à remoção de lesões expansivas
intracranianas, ou de focos de epilepsia, ou quando o
exame é indicado a doentes com síndromes demenciais,
afecções inflamatórias difusas do sistema nervoso, ou
seus envoltórios, ou com numerosas lesões corticais e/
ou subcorticais, ou com afecções sediadas na medula
espinhal ou seus envoltórios. Nessas eventualidades, o
material de biópsia deve ser coletado após a realização
de craniotomia com diâmetro variando de 4 a 10 cm2,
mantendo-se o doente sob sedação ou anestesia geral.
Em casos de doenças inflamatórias, devem-se coletar
Fig. 71.6 – Imagem final da reconstrução de imagem estereo­ fragmentos da dura-máter, da membrana aracnóide e
tomográfica fundida em imagem de ressonância magnética de de vaso cortical e, quando aplicável, do córtex e sub-
doente com lesão infiltrativa no pulvinar talâmico direito não córtex encefálico. Em casos de síndromes demenciais,
adequadamente delineada com a tomografia computadorizada deve-se ressecar segmento com pelo menos 1 cm de
do crânio. comprimento de um giro cerebral até a profundidade
do sulco, de modo a remover quantidade suficiente de
Elevada taxa de morbidade e mortalidade foi re- tecido cortical e subcortical que possibilite análise da
ferida no passado em casos de biópsia à mão livre ou arquitetura e morfologia celulares. Em casos de pro-
a céu aberto. A morbidade varia de 0% a 13% (média cessos meníngeos inflamatórios crônicos, pode ser su-
de 3,5%)2-4. As hemorragias evidenciadas aos exames ficiente apenas a coleta de fragmentos de membrana
de imagem são geralmente assintomáticas e ocorrem aracnóide; habitualmente, já há mais anormalidades na
em 12,5% dos casos. Field et al.9 observaram que, membrana aracnóide que reveste as cisternas da base
15 min após o procedimento, 8% de seus 500 doen- do crânio, especialmente na região optoquiasmática.
tes submetidos à biópsia estereotática apresentaram Quando a biópsia visa à avaliação de afecções da me-
hemorragia, sendo em 67,5% intraparenquimatosas, dula espinhal, deve-se realizar laminectomia e remover
12,5% intraventriculares e 7,5% sub ou epidurais. A fragmentos da dura-máter e da membrana aracnóide e,
hemorragia associou-se à instalação de déficit neuro- com muito critério, de outros tecidos anormais intra e
lógico em 1,2% dos casos e a óbito em 0,2% (doente ou extramedulares (Fig. 71.11).
com glioblastoma multiforme e hipertensão intracra-
niana). Ocorreram déficits neurológicos tardios (48 h CONCLUSÃO
após o procedimento) em 0,4% dos casos, apesar de as As técnicas neurocirúrgicas convencionais são in-
tomografias computadorizadas realizadas 15 min após dicadas para esclarecer o diagnóstico de lesões ence-
o procedimento terem sido normais. Em 11,5% dos fálicas e espinhais quando estas são passíveis de res-
casos de AIDS de Luzzati et al.5 e em 12,5% dos casos secção completa e insensível a pouco invasivos; além
de AIDS e de Gildenberg et al.10 ocorreram hemorra- do maior índice de complicações, as técnicas conven-
gia, sendo três quartos delas fatais. A mortalidade va- cionais são dispendiosas e não contribuem para me-
ria de 0,5% a 2,6% (média de 0,7%)2-4. A morbidade lhorar a qualidade de vida da maioria dos doentes12.
e a mortalidade conjuntamente podem alcançar 6,3% A biópsia por trepanação, principalmente quando rea-
e são relacionadas à hemorragia intraparenquimatosa lizada segundo técnica estereotomográfica, é precisa,
ou subaracnóidea ou à hipertensão intracraniana sem segura, de baixo custo e é especialmente indicada em
hemorragia7. O procedimento deve ser evitado em ca- casos de lesões encefálicas profundas ou inacessíveis
sos de hipertensão intracraniana em vias de descom- pelas técnicas neurocirúrgicas convencionais. Há
pensação ou quando a lesão é muito vascularizada. necessidade da assistência de patologista experiente
Além do diagnóstico das lesões, o ato operatório durante a realização do procedimento para minorar o
de biópsia possibilita drenagem de lesões císticas, montante de resultados inconclusivos.

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71 – Técnicas de Biópsia Estereotática das Lesões Encefálicas

Fig. 71.7 – Reconstrução tridimensional de lesão expansiva


(glioma) temporal posterior em doente durante ato de biópsia
estereotomográfica.

Fig. 71.8 – Fotografia de pinça de biópsia com fenda lateral Fig. 71.10 – Fotografia de pinça em espiral (Backlund), em-
para coleta de material pouco consistente (pinça de Sedan). pregada para biópsia de tecido com alta dureza.

A B

Fig. 71.11 – Biópsia percutânea de corpo vertebral. Brocas


finas e longas, cânulas e pinças possibilitam coleta de material
ósseo para estudo histológico.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

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72
Neuroestimulação no
Tratamento da Dor
Manoel Jacobsen Teixeira

INTRODUÇÃO A corrente galvânica ou contínua é gerada por pi-


lhas ou retificadores de corrente alternada ligados à

A
estimulação elétrica do sistema nervoso periféri- rede elétrica. Apresenta polaridade distinta (positiva e
co ou central com eletródios implantados visa à negativa), qualidade que lhe assegura a possibilidade
ativação das vias supressoras da dor e ao bloqueio de induzir migração e transporte de íons. A corrente
eletrofisiológico das unidades nociceptivas (Fig. 72.1). galvânica interrompida promove contração muscular.
Segundo Teixeira1,2, a estimulação elétrica gerada por A contração das fibras musculares desnervadas pela
peixes elétricos foi utilizada com finalidade terapêutica ação da corrente galvânica interrompida ou de cor-
há quase 3000 anos. A eletroterapia ganhou grande im- rentes diretas de longa duração permite a manutenção
portância entre os métodos de tratamento da dor, quando da nutrição tecidual e da elasticidade musculotendí-
geradores de eletricidade foram desenvolvidos, princi- nea, alentece a amiotrofia e previne a estase venosa. A
palmente após a segunda metade do século XVIII. iontoforese por corrente galvânica consiste na intro-
dução tegumentar de medicamentos ionizáveis, como
ESTIMULAÇÃO ELÉTRICA o salicilato de sódio, o diclofenaco de sódio ou de po-
tássio, o bicloridrato de histamina, a hidrocortisona,
TRANSCUTÂNEA
a dexametasona que promovem analgesia e redução
A eletroterapia, ou seja, a corrente elétrica, é bastante da inflamação, especialmente em casos de tenossino-
utilizada na reabilitação dos doentes com dor. A eletrote- vites, bursites, epicondilites e induzem à analgesia e
rapia promove analgesia porque melhora a circulação lo- vasodilatação, e os bloqueadores de fluxo axonal (al-
cal, ativa, por efeito contra-irritativo, o sistema supressor calóides de vinca, colchicina), que reduzem a alodinia
de dor, mantém o trofismo muscular, alentece a amiotro- e a hiperestesia em áreas afetadas pelas neuropatias
fia e constitui método de treinamento proprioceptivo e periféricas; esses fármacos devem ser apresentados
cinestésico. Alguns tipos de correntes geram contração como líquidos, géis ou pastas e aplicados sob placa
muscular, pois agem diretamente nas fibras musculares da mesma polaridade; por mecanismo de repelência,
ou nos pontos motores; dependendo das características tais agentes penetram na pele íntegra.
da corrente elétrica, ocorre contração de músculos sa- A corrente alternada estimula os nervos sensitivos,
dios ou parcial ou totalmente desnervados. A eletrote- causa vasodilatação e controla a dor. Pode reduzir o
rapia utiliza dois tipos de correntes (e suas variantes), edema graças à vasodilatação superficial e à remoção
a unidirecional ou constante, denominada galvânica ou de substâncias algiogênicas presentes nos processos
voltaica, ou a alternada, farádica, monofásica, bifásica inflamatórios e nas síndromes dolorosas miofasciais.
(simétrica ou assimétrica) ou polifásica. Os geradores A corrente farádica (corrente alternada com 1 ms de
de correntes dispõem de recursos que controlam os di- duração) gera contrações musculares necessárias para
versos parâmetros de estimulação, ou seja, natureza, for- a reabilitação de músculos debilitados ou parcialmen-
ma, largura de pulso, freqüência, intensidade, polaridade te desnervados e retarda a amiotrofia. As correntes de
e somação de corrente com finalidade de proporcionar baixa ou média freqüência geram despolarização das
variados efeitos fisiológicos (Figs. 72.2 e 72.3). fibras nervosas.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Córtex sensitivo-motor
Giro do cíngulo

Núcleos talâmicos específicos Núcleos da base

Hipotálamo

Substância cinzenta
periaquedutal mesencefálica

Formação reticular do tronco


encefálico

Tratos rostrocaudais supressores


Trato neo-espinotalâmico
e espinomesencefálico

Corno posterior da substância Aferente primário


cinzenta da medula espinhal

Fig. 72.1 – Representação artística do sistema supressor de dor. Ressalta-se a abundância de neurotransmissores envolvidos
na supressão da dor. As vias discriminativas neo-espinotalâmicas ativam as unidades neuronais que produzem e liberam neuro-
transmissores supressores de dor.

Fig. 72.2 – Equipamento de estimulação elétrica transcutâ- Fig. 72.3 – Equipamento de estimulação elétrica transcu-
nea. Doente durante a execução de estimulação elétrica trans- tânea. Doente com estimulador elétrico transcutâneo portátil
cutânea em unidade de reabilitação. para uso domiciliar.

A estimulação elétrica transcutânea (EET), ou didatos à estimulação elétrica epidural medular. Pro-
TENS, é o método que utiliza corrente elétrica de porciona analgesia e melhora a circulação tecidual.
baixa voltagem, aplicada no tegumento com finalida- Pode ser utilizada em doentes que apresentam dor lo-
de analgésica. Foi desenvolvida há mais de 30 anos calizada (entorses, espasmos musculares, lombalgias,
como instrumento de teste e seleção para doentes can- fraturas, artralgias, síndrome dolorosa miofascial),

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72 – Neuroestimulação no Tratamento da Dor

incluindo a causada por câncer ou por traumatismo tricas (correntes diadinâmicas, interferenciais, EET
operatório. É pouco eficaz no tratamento da dor ge- bifásica alternada, VIF) são transmitidas pelo cabeço-
neralizada. É contra-indicada a doentes com marca- te da ultra-sonografia, aumentando a profundidade de
passos cardíacos de demanda, mas não àqueles com rastreamento das áreas com maior impedância elétri-
freqüência fixa. Centenas de trabalhos demonstraram ca (onde há menor limiar doloroso). Quando o cabe-
haver eficácia da EET no tratamento da dor crônica. çote do instrumento é aplicado numa região onde há
O controle da freqüência, duração do pulso e inten- PG, induz-se mais sensibilidade à dor, mesmo quando
sidade permitem eletroanalgesia segura e eficaz. A a corrente é de baixa intensidade. Essas áreas podem
intensidade é determinada pela resposta dos doentes ser tratadas após o mapeamento com correntes pre-
em nível sensitivo (baixa intensidade) ou motor (alta viamente apresentadas em associação com os demais
intensidade). Usualmente, a EET de alta freqüência recursos terapêuticos.
é aplicada com baixa intensidade, sendo conhecida A EET é bastante eficaz no tratamento da dor
como EET convencional. A EET de baixa freqüência aguda. A maioria dos trabalhos avaliou apenas a in-
é tipicamente aplicada com intensidade elevada para tensidade da dor e não a atividade funcional e a so-
induzir à contração motora. A EET convencional com ciabilidade dos doentes em casos de dor crônica. Há,
elevada freqüência (cerca de 100 Hz) e comprimento entretanto, poucos trabalhos sobre o seu uso em longo
de pulso variando de 50 e 80 µs ativa fibras aferentes prazo. Parece ser eficaz em casos de dor de nature-
Aβ; é a mais utilizada no tratamento da dor aguda. A za diversa e rebelde ao tratamento com outros mé-
intensidade da corrente é regulada de acordo com a todos; o benefício, entretanto, é de curta duração em
sensação de conforto do doente. Em casos de dor crô- 50% dos casos, e de longa duração em apenas 25%.
nica, recomenda-se a EET com corrente do tipo burst, Os resultados não podem ser explicados apenas pelo
com largura de pulso variando entre 100 e 200 µs e efeito placebo. Houve modificação estatisticamente
trens de pulso de baixa freqüência (entre 1 e 4 Hz) significativa da interferência da dor no exercício das
sobre plataforma de 100 Hz de freqüência interna. atividades de trabalho, nas atividades domiciliares e
A atividade neural no corno posterior da medula sociais, melhora das atividades em geral e da socia-
espinhal (CPME), assim como do trato espinotalâmi- bilidade e do tratamento da dor com o uso de outros
co, é inibida tanto pela EET de baixa como de alta métodos, como medicina física, terapia ocupacional,
freqüên­cia em animais. A EET de baixa freqüência es- quiropraxia e medicamentos, em relação ao período
timula a liberação de β-endorfina que prolonga a anal- pré-tratamento. Entretanto, não houve diferença es-
gesia, enquanto a EET de elevada freqüência propor- tatisticamente significativa quanto ao consumo de
ciona mais conforto durante sua aplicação. A variação analgésicos entre os dois grupos após 1 ano de se-
de corrente alentece a acomodação das fibras nervo- guimento.
sas e, como conseqüência, proporciona mais analge- A EET demonstrou ser benéfica no tratamento de
sia; variação de intensidade e freqüência de corrente osteoartrite de joelho, desde que associada à cinesio-
(VIF), ou seja, o emprego de corrente variada quanto terapia, segundo estudo metanalítico. Ainda de acordo
à intensidade e freqüência, de acordo com a seleção com estudo desse tipo sobre os resultados relacionan-
feita pelo aplicador, impede a acomodação das fibras do 22 trabalhos sobre dor aguda pós-operatória, não
nervosas. Essa modalidade é eficaz, confortável, inó- houve diferença entre os resultados em doentes trata-
cua (sem risco de lesão térmica) e proporciona efeitos dos com EET ou EET Sham (placebo). Entretanto, os
analgésicos e excitomotores. As correntes de média resultados foram superiores quanto à redução do uso
freqüência podem ser de intensidades mais elevadas; de analgésicos em relação ao grupo não tratado. Um
como não induzem à hiperemia ou cauterização, são trabalho metanalítico envolvendo 117 estudos de-
adequadas no tratamento de afecções teciduais mais monstrou que a EET foi estatisticamente mais eficaz
profundas. A interação de duas correntes de média no controle da dor em relação aos doentes tratados
freqüência diferentes no mesmo equipamento resulta com placebo e grupo-controle. Todavia, o efeito foi
na produção da corrente interferencial que possibilita menos satisfatório no tratamento da dor crônica que
tratar áreas hiperestésicas, pontos dolorosos de fibro- da dor aguda. Esses dados indicam que a EET é apli-
mialgia e pontos-gatilho (PG) em casos de síndrome cável no tratamento da dor aguda e crônica. Os traba-
dolorosa miofascial (SDM). As correntes diadinâmi- lhos metanalíticos revelam que os resultados podem
cas de Bernard e as farádicas de baixa freqüência com ser variados na dependência da natureza do estudo.
elevada intensidade também são utilizadas para inati-
var PG das SDM.
O eletrodiagnóstico com finalidade de mapear os SISTEMAS IMPLANTÁVEIS
PG miofasciais e outras áreas com finalidade terapêu- Os eletródios podem ser curtos ou longos e ci-
tica pode ser realizado com a combinação, em um líndricos percutaneamente ou em placa para serem
mesmo equipamento, de gerador de corrente elétrica aplicados em procedimentos a céu aberto. São consti-
com o cabeçote de ultra-sonografia. As correntes elé- tuídos de platina iridiada e revestidos de poliuretano

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783
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

ou silicone. Os sistemas percutâneos apresentam a Os sistemas implantáveis podem ser alimentados


vantagem de serem aplicados com menos invasão e a por radiofreqüência quando não têm fonte própria
desvantagem da dificuldade para implantação, espe- de energia ou híbridos, quando contêm bateria jun-
cialmente no compartimento epidural de doentes com to ao sistema de geração de estímulos. Os sistemas
osteoartrose da coluna vertebral, de serem mais pro- alimentados por radiofreqüência apresentam a van-
pensos à migração, o que pode resultar em falha tera- tagem de maior longevidade do equipamento, pos-
pêutica. Os eletródios em placa apresentam a facilida- sibilidade de acionamento de vários eletródios ou
de de locação, maior estabilidade e de estimular áreas contatos, de poder utilizar vários programas e modos
mais específicas, mas a desvantagem de necessidade de estimulação, possibilidade de utilização de mais
de laminectomia, o que torna o procedimento mais in- energia e de terapêuticas mais amplas, maior poten-
vasivo. Estima-se que a necessidade de reposição dos cial de aliviar a dor e de participação do doente no
eletródios situe-se entre 5% e 30% das vezes (média controle de sua condição. Apresentam a desvantagem
= 15%); quanto maior o número de eletródios implan- da necessidade de fonte externa, da participação do
táveis, menor a necessidade de revisões (Fig. 72.4). doente e do uso de antena fixada à pele (Fig. 72.6).
Os eletródios cilíndricos induzem campos elétricos Os sistemas híbridos apresentam mais conveniência,
multidirecionais, o que os torna menos eficientes; menor número de problemas relacionados ao contro-
podem estimular estruturas não objeto do tratamento, le dos estímulos, menor participação do doente no
incluindo as fibras dolorosas ou o ligamento amarelo. controle da estimulação e ausência de componentes
Os eletródios em placa geram campos unidirecionais, exteriores sujeitos a perdas, quebras e a dificuldades
são mais eficientes (40%) e minimizam a estimulação de manutenção. São suas desvantagens a limitação
em estruturas não desejadas, incluindo as fibras dolo- da duração da bateria, a limitação da magnitude de
rosas e o ligamento amarelo (Fig. 72.5). energia liberada pelo sistema, as opções de progra-
mação limitadas e as limitações para o efeito tera-
pêutico (Figs. 72.7 e 72.8).

ESTIMULAÇÃO ELÉTRICA DO SISTEMA


NERVOSO PERIFÉRICO
A estimulação do sistema nervoso periférico
(SNP) com eletródios implantados consiste na apli-
cação de um eletródio sobre troncos nervosos pe-
riféricos, que se distribuem ao longo do território
desaferentado e de um gerador de pulsos, com pa-
râmetros modulados por radiofreqüência, no tecido
celular subcutâneo regional. Segundo Teixeira2, com
base na teoria de comporta idealizada por Melzack
e Wall em 1965, Wall e Sweet, em 1967, realizaram
Fig. 72.4 – Eletródios implantáveis por via percutânea ou a a estimulação elétrica dos nervos periféricos com
céu aberto destinados à estimulação da medula espinhal, cere- eletródios implantados, observando alívio da dor
bral profunda ou córtex cerebral. durante período prolongado. A analgesia parece de-
correr da inibição de neurônios que, da medula espi-
nhal, se projetam nas estruturas supra-segmentares,
do bloqueio da atividade espontânea dos neuromas
(A) Eletródio cilíndrico de amputação e da ativação de circuitos inibitórios
localizados no sistema nervoso central (SNC). Vias
nervosas que utilizam encefalina e β-endorfina pare-
cem estar envolvidas na analgesia gerada pela esti-
mulação de mecanoceptores de baixo limiar. Outros
neurotransmissores, como a serotonina e a noradre-
nalina, teriam sua atividade aumentada no SNC nos
doentes submetidos à neuroestimulação. A estimula-
ção do SNP é indicada em casos de dor mononeuro-
(B) Eletródio em placa
pática; usualmente o benefício é temporário, pois há
alívio de dor durante curto intervalo em menos de
Fig. 72.5 – (A e B) Configuração da dispersão de corrente 60% dos casos de neuropatia periférica traumática.
de acordo com a conformação cilíndrica ou em placa dos ele- É, entretanto, procedimento seguro e simples, mas
tródios. de custo elevado2.

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72 – Neuroestimulação no Tratamento da Dor

A B C

Fig. 72.6 – Geradores implantáveis acionados por radiofreqüência. (A) Fotografia de gerador de pulsos ANS acionado por
telemetria. (B) Antena e gerador de sinais de radiofreqüência Meditronic. (C) Representação artística de antena aplicada sobre
gerador ANS implantado no tecido celular subcutâneo.

A B C

D E

Fig. 72.7 – Geradores híbridos e seus programadores. (A e B) Sistemas Meditronic totalmente implantáveis com vários conta-
tos e um ou dois canais respectivamente. (C e D) Programadores Meditronic não invasivos de sistemas totamente implantáveis
de uso médico. (E) Programador para uso domiciliar.

A B C

Fig. 72.8 – Geradores híbridos e seus programadores. (A e B) Sistemas totalmente implantáveis ANS com vários contatos em
eletródios tubulares ou em placa e um canal. (C) Sistema totalmente implantável com vários contatos para dois canais; destaca-se
o cabeçote destinado à programação não invasiva de geradores ANS.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

ESTIMULAÇÃO ELÉTRICA DA dural é difícil. É também indicada a doentes não par-


MEDULA ESPINHAL ticipativos para que tomem parte em procedimentos
percutâneos. Para realizar a técnica a céu aberto, os
Segundo Teixeira2, a estimulação elétrica da me- doentes são submetidos à anestesia geral e operados
dula espinhal, com finalidade analgésica, foi proposta em decúbito ventral horizontal; após laminectomia, o
por Shealy et al. em 1967. Esse tratamento visa ati- espaço peridural é dissecado e um eletródio quadripo-
var circuitos inibitórios corticotalâmicos e unidades lar é implantado, e sua extremidade distal exterioriza-
neuronais do sistema supressor de dor sediadas no da por contra-abertura. Quando há melhora persistente
tronco encefálico que originam tratos rostrocaudais após período de testes em que a estimulação elétrica
e caudorrostrais, que inibem a atividade das unida- da medula espinhal com gerador externo é realizada
des nociceptivas segmentares na medula espinhal e durante 2 ou mais semanas, as conexões externas de-
no encéfalo, do que resulta abolição da hiperativi- vem ser removidas e, mediante cabo, o eletródio deve
dade neuronal evocada por estímulos que atuam em ser conectado a gerador programável ou acionado por
sistemas multissinápticos da medula espinhal e do radiofreqüência implantado no tecido celular subcu-
tronco encefálico3. A atuação nas unidades neuronais tâneo da face anterior do tórax ou abdome. Estes são
segmentares da medula espinhal parece decorrer da planejados via cabeçote de radiofreqüência conecta-
excitação antidrômica das fibras do funículo posterior do a programador para estimular a medula espinhal
ou ortodrômica das vias de condução sensitivas es- episodicamente, com intensidade necessária para pro-
pecíficas da medula espinhal. A participação das vias vocar parestesias suportáveis no segmento em que a
encefalinérgicas e endorfinérgicas e das que utilizam dor é referida. Quando a estimulação elétrica, durante
noradrenalina, dopamina, somatostatina, colecistoci- a fase de testes, não beneficia o doente, os eletródios
nina, peptídeo vasoativo intestinal, neurotensina e/ou são removidos (Figs. 72.9 e 72.10).
substância P como neurotransmissores no mecanismo A estimulação elétrica da medula resulta em me-
de analgesia induzida pela estimulação da medula es- lhora imediata de 40% a 60% dos doentes de dor de-
pinhal é controverso1. Os benefícios observados após corrente de avulsão plexular, que, entretanto, mantêm-
a estimulação elétrica da medula espinhal reduzem-se se entre 6 e 28 meses, em menos de 20% dos casos4.
com o passar dos meses. Por essa razão, o entusiasmo Proporciona melhora permanente ou durante longo
dos autores em relação a esse método de tratamento período em cerca de 50% dos doentes com síndrome
reduziu-se paulatinamente durante a primeira déca- complexa de dor regional tipo I5,6 e em 39% a 56%
da em que foi difundido2. Foi possível a prática de dos doentes com dor no coto de amputação, mas não
testes terapêuticos antes que implantes permanentes naqueles com dor no membro ou órgão-fantasma7. Os
fossem realizados com o desenvolvimento de técni- resultados iniciais são satisfatórios em menos de 50%
cas percutâneas; estes possibilitam prever o resultado dos doentes com dor mielopática segmentar e/ou nas
do tratamento em longo prazo, antes que o implante regiões parcialmente desaferentadas; após o primeiro
definitivo seja instituído2. ano, entretanto, apenas 20% dos doentes mantêm a
A técnica de estimulação elétrica medular epidural dor controlada; quando há secção da medula espinhal
percutânea é realizada sob anestesia local e com parti- e/ou da cauda eqüina o resultado é insatisfatório8. Há
cipação do doente. Sob controle radioscópico através melhora inicial em cerca de 50% dos doentes com
de uma agulha peridural, um eletródio multipolar é neuralgia pós-herpética e em grande número de doen-
introduzido percutaneamente e aplicado sobre a dura- tes com polineuropatia periférica9.
máter que cobre a face posterior da medula espinhal; O caráter pouco agressivo da estimulação do sis-
há evidências de que a estimulação dos tratos nervosos tema nervoso central torna esta a técnica preferencial
no quadrante ântero-lateral da medula espinhal tam- para tratar doentes em que há preservação, pelo menos
bém possa proporcionar analgesia. Com a estimulação parcial, da função neurológica em zonas restritas de
elétrica mono ou bipolar, realizada após conexão do desaferentação, tal como ocorre em casos de síndro-
eletródio via cabo com gerador de radiofreqüência, é me complexa de dor regional tipo I, mono ou oligor-
possível precisar a localização do implante. A posição radiculopatia, dor no coto de amputação, mielopatia
do eletródio é considerada satisfatória quando ocor- com comprometimento apenas parcial da função da
rem parestesias evocadas com mínima intensidade de medula espinhal. Deve ser também a primeira alterna-
estimulação no território em que a dor é referida. Os tiva em doentes idosos e em mau estado geral, pois é
eletródios são, a seguir, sepultados no tecido celular mais segura que os procedimentos ablativos. Os maus
subcutâneo e exteriorizados por contra-abertura, e o resultados observados com a técnica de estimulação
tegumento, fechado por planos. A técnica de implante epidural em doentes com neuropatias sensitivas gra-
a céu aberto é utilizada quando, por razões técnicas, o ves (avulsão de raízes nervosas, secção completa da
implante percutâneo não pode ser realizado, tal como medula espinhal e/ou cauda eqüina, dor no membro-
ocorre em doentes que se submeteram a amplas lami- fantasma) indicam que, para que o método seja eficaz,
nectomias, condição em que a punção do espaço peri- há necessidade de preservação, pelo menos parcial,

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72 – Neuroestimulação no Tratamento da Dor

Fig. 72.9 – Estimulação elétrica epidural espinhal. Radiogra- Fig. 72.10 – Estimulação elétrica epidural espinhal. Radio-
fia da coluna dorsal na incidência ântero-posterior, revelando grafia na incidência lateral.
eletródio epidural posicionado sobre a dura-máter que cobre
os funículos posteriores.

das unidades sensitivas discriminativas que da me- prolongado da dor e Ervin, em 1966, relatou melhora
dula espinhal projetam-se nas unidades modulatórias da dor em um doente após a estimulação do núcleo
sediadas no tronco encefálico e que deixam de ser caudado. Após 1969, a estimulação elétrica encefá-
atuantes devido a mecanismos de degeneração tran- lica com finalidade analgésica passou a receber mais
sináptica em casos de lesões graves que acometem o atenção, quando Reynolds observou que estímulos
SNP ou SNC. A técnica de estimulação, em que pese elétricos aplicados na substância periaquedutal me-
o custo relativamente alto dos dispositivos implanta- sencefálica em ratos gerava analgesia. Foi demons-
dos, em virtude de não acarretar complicações e não trado, a seguir, que a estimulação elétrica da região
requerer internação hospitalar prolongada, é vantajo- posterior da parede do terceiro ventrículo (substância
sa, pois pode ser realizada em regime ambulatorial e cinzenta periventricular), cápsula interna, septo, nú-
apresenta baixo custo em longo prazo1. cleos talâmicos específicos e inespecíficos e outros
alvos eram úteis no tratamento da dor neuropática e
que a estimulação elétrica da região parabraquial do
ESTIMULAÇÃO ELÉTRICA DO ENCÉFALO mesencéfalo e da substância periaquedutal mesence-
Estimulação Encefálica Profunda fálica aliviava a dor crônica nociceptiva de origem
oncológica ou não. Ainda não foi esclarecido o me-
Heath, em 1954, observou alívio significativo da canismo pelo qual há melhora da dor após a estimu-
dor após a estimulação elétrica da região septal an- lação encefálica profunda. Enquanto alguns autores
terior e da região lateral e medial das colunas do fór- demonstraram que ocorre liberação de neurotrans-
nice em doentes com psicopatologia. Mazars et al., missores opióides no líquido cefalorraquidiano após
em 1960, postularam que a estimulação dos núcleos a estimulação da substância periaquedutal mesence-
talâmicos sensitivos específicos resultava em alívio fálica e da substância cinzenta periventricular, outros

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

não confirmaram esses achados. Somatostatina, cole-


cistoquinina, peptídeo vasoativo intestinal, neuroten-
sina e monoaminas parecem não ter sua concentração
modificada após a estimulação da substância cinzenta
periventricular; a importante participação das vias
serotoninérgicas e noradrenérgicas na supressão da
dor induzida pela estimulação da substância cinzen-
ta periventricular e periaquedutal mesencefálica em
animais não foi confirmada no ser humano. A estimu-
lação da cápsula interna parece não modificar a con-
centração dos neurotransmissores neuromodulado-
res. O efeito da estimulação da região de substância
parabraquial é antagonizado por anticolinérgicos. A
estimulação elétrica do núcleo de Kolliker-Fuse, que
é associado à região parabraquial e localizado late-
ralmente ao núcleo do loco cerúleo e que incluiu o
núcleo pendúnculo-pontino, rostralmente, e a região
parabraquial, caudalmente, alivia a dor e inibe a ativi-
dade neuronal no corno posterior da medula espinhal,
efeito antagonizado pela reserpina. A estimulação da
substância cinzenta periventricular inibe neurônios
nociceptivos e não nociceptivos sediados no núcleo
ventral póstero-lateral e ventral póstero-medial do
tálamo e a do núcleo ventral póstero-lateral do tála-
mo inibe neurônios nociceptivos sediados no corno
Fig. 72.11 – Estimulação elétrica encefálica profunda. Radio-
posterior da substância cinzenta da medula espinhal grafia do crânio na incidência ântero-posterior revelando ele-
que originam fibras espinotalâmicas em animais de tródio implantado nos núcleos talâmicos sensitivos específicos.
experimentação1.
O ato operatório consiste em, sob anestesia local,
fixação do aparelho de estereotaxia ao segmento cefá-
lico do doente e na realização de exame estereotomo-
gráfico ou de estereorressonância magnética do encé-
falo. Mediante fusão dessas imagens com as dos atlas
de estereotaxia, determinam-se as coordenadas este-
reotáticas. Após trepanação sobre a sutura coronária,
a 2 cm da linha mediana, no lado contralateral àquele
em que a dor é referida, um eletródio multipolar de
platina iridiada é introduzido no encéfalo e exterio-
rizado por contra-abertura. Quando ocorre melhora
após período de teste com estimulação proporcionada
por gerador externo, as conexões externas são seccio-
nadas e o eletródio é conectado, por meio de um cabo,
a um gerador de pulsos implantado no tecido celular
subcutâneo (Figs. 72.11 e 72.12).
Recomenda-se intervalo mínimo de, pelo menos,
6 meses entre a instalação da síndrome dolorosa e a
realização da estimulação elétrica encefálica, a fim
Fig. 72.12 – Estimulação elétrica encefálica profunda. Ra-
de serem identificados os doentes que apresentam re- diografia do crânio na incidência lateral revelando eletródio
solução espontânea da dor ou que melhoram após a implantado no tálamo.
aplicação de outros métodos terapêuticos. A avaliação
psicológica rigorosa também deve ser realizada nos Recomenda-se a interrupção do uso de opióides antes
candidatos à estimulação encefálica; doentes com sín- da execução da estimulação da substância cinzenta pe-
dromes psicóticas não devem ser operados. Da mes- riaquedutal mesencefálica ou cinzenta periventricular;
ma forma, quando há forte componente emocional, os é possível, entretanto, que alguns doentes mantenham
doentes devem ser encorajados a permanecer durante o uso dos agentes sem que haja comprometimento
período mais prolongado em tratamento psicoterápi- do resultado. Quando há melhora da sintomatologia
co antes de se candidatarem à estimulação encefálica. após o teste de saturação da morfina, que consiste no

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72 – Neuroestimulação no Tratamento da Dor

aumento progressivo da morfina por via intravenosa tálamo em 80% desses casos. Observou-se melhora da
até ocorrer alívio da dor ou depressão respiratória, a dor central encefálica após a estimulação elétrica da
estimulação deve ser eficaz10. substância cinzenta periaquedutal mesencefálica10.
Há evidências de que a estimulação elétrica da Aproximadamente 20% dos doentes apresentam
substância periaquedutal mesencefálica ou da subs- complicações após estimulação encefálica profunda;
tância cinzenta periventricular alivie a dor de origem em apenas 4% eles são permanentes e em menos de
somática, mas não a dor por desaferentação e de que 1% há incapacidade ou óbito1.
a estimulação do núcleos talâmicos sensitivos espe-
cíficos e, principalmente, da cápsula interna seja efi-
caz no tratamento de grande número de casos de dor
Estimulação Cortical
neuropática. Entretanto, vários doentes apresentam Segundo Teixeira2, a estimulação do córtex motor
alívio da dor de ambas as origens após a estimula- cerebral foi descrita por Tsubokawa et al. em 1990.
ção da substância periaquedutal mesencefálica ou da Demonstrou-se que a estimulação do giro pré-central
substância cinzenta periventricular, enquanto outros proporciona melhora em considerável número de
requerem estimulação da substância periaquedutal doen­tes com dor neuropática, talvez em decorrência
mesencefálica e/ou da substância cinzenta periventri- da supressão da atividade talâmica. Há, entretanto, re-
cular e do tálamo1. corrência em 30% dos casos13. O procedimento con-
Foram descritos casos isolados de melhora de siste na realização de estimulação magnética trans-
doen­tes com dor mielopática ou decorrente de lesão craniana e de potencial evocado sensitivo, inversão
da cauda eqüina tratados com estimulação dos núcleos da fase para localizar a área motora, e sob controle
talâmicos sensitivos, lemnisco medial e/ou substância estereotomográfico ou estereorressonanciográfico da
periaquedutal mesencefálica; a estimulação do tálamo, realização de trepanação ou pequena craniotomia na
da cápsula interna e/ou do lemnisco medial beneficia região da convexidade contralateral ao lado onde a
cerca de um terço desses doentes11. A estimulação elé- dor sedia-se e na aplicação de um eletródio em pla-
trica dos núcleos sensitivos específicos do tálamo pro- ca sobre a dura-máter que cobre o giro pré-central.
porciona melhora inicial em 50% a 72% dos doentes Quando há melhora após período de testes com dura-
com avulsão de raízes nervosas e, em longo prazo, em ção de 1 a 2 semanas, um gerador de pulsos progra-
36%; quando há avulsão de mais de duas raízes nervo- mável é implantado no tecido celular subcutâneo da
sas e as áreas de anestesia são amplas, a estimulação região peitoral (Fig. 72.13).
talâmica é ineficaz; a estimulação de mais de um alvo,
como cápsula interna, lemnisco medial e/ou núcleos
talâmicos sensitivos resulta em melhora inicial em 65%
dos doentes, mas há recidiva em 50% deles, em longo
prazo; há relato de casos isolados da melhora após a
estimulação elétrica da substância cinzenta periventri-
cular; a estimulação dos núcleos talâmicos sensitivos
resulta em alívio ou melhora significativa da dor em
cerca de 30% dos casos4. A estimulação dos núcleos
talâmicos inespecíficos é útil no tratamento da neural-
gia pós-herpética12. Há poucos relatos sobre a eficácia
da estimulação encefálica no tratamento de doentes Fig. 72.13 – Estimulação elétrica do córtex motor. Radio-
com síndrome complexa de dor regional6. A estimu- grafia do crânio na incidência de perfil, revelando eletródio
lação dos núcleos talâmicos inespecíficos proporciona posicionado no giro pré-central.
resultados satisfatórios em 30% a 40% dos doentes
com anestesia dolorosa da face após a estimulação da CARACTERÍSTICAS DA NEUROESTIMULAÇÃO
substância cinzenta periventricular ou do lemnisco me- ELÉTRICA
dial1. A estimulação dos núcleos talâmicos sensitivos
específicos proporciona melhora significativa em 25% O objetivo do tratamento é gerar energia elétrica
a 50% dos casos de dor no órgão ou membro-fantasma para cobrir a área onde a parestesia deve superpor-se
e/ou no coto de amputação; a estimulação do lemnis- àquela onde a dor é situada. Os parâmetros de estimu-
co medial resulta em melhora em 75% dos doentes, a lação devem ser adequados para a máxima efetivida-
da cápsula interna em 50%, e a estimulação dos nú- de de estimulação, ou seja, proporcionar conforto do
cleos talâmicos sensitivos inespecíficos é ineficaz7. A doente, menor consumo de energia e melhor resulta-
estimulação do lemnisco medial alivia a dor em 50% do terapêutico. A precisão da estimulação é definida
dos doentes com síndrome talâmica ou com dor decor- como relação entre a área com dor coberta pela pares-
rente de lesão do córtex cerebral e da cápsula interna tesia gerada com os estímulos em relação à área total
em 40% desses doentes e do complexo ventrobasal do de parestesia induzida, incluindo a não coberta pela

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789
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

dor. Quanto maior o número de eletródios e maior pólo negativo ou cátodo, um positivo ou ânodo ou
a superfície de contato do eletródio, mais ampla é a pólo neutro. Para que a estimulação ocorra, pelo me-
área abrangida pela estimulação (Fig. 72.15). nos um pólo e um negativo devem ser acionados. A
Os pólos podem ser positivos, negativos ou neu- corrente flui do pólo positivo para o negativo, e a des-
tros, e o estímulo estático ou corrente. A corrente elé- polarização concentra-se na área do cátodo. A combi-
trica pode ser transferida para os tecidos por meio dos nação de ativação de cátodos e ânodos pode focalizar
elementos metálicos e alguns elementos líquidos (so- o estímulo ou desloca-se transversalmente. Para au-
luções salinas, água, fluidos corpóreos); não flui atra- mentar a concentração de energia no pólo negativo,
vés de elementos isolantes, incluindo a borracha, a deve-se aumentar o número de contatos positivos, e
madeira, o vidro e vários materiais plásticos. A ener- para reduzi-la, deve-se aumentar o número de conta-
gia pode ser gerada por baterias ou geradores de eletri- tos negativos. A quantidade de energia é mensurada
cidade. Há corrente quando os elétrons fluem em um em Coulombs. O comprimento de onda mensura a du-
circuito do pólo negativo para o positivo (Fig. 72.16). ração do pulso (milissegundos); quanto maior, mais
A voltagem é a magnitude da força que move a cor- amplo é o campo de estimulação e mais fibras nervo-
rente entre os dois pólos. A corrente significa fluxo de sas são acionadas com limiares maiores (recrutamento
eletricidade através de um circuito. A corrente é contí- seqüencial). Quanto mais curto o comprimento de
nua quando se desloca em uma direção e é alternada onda, mais estreito é o campo de estimulação, pois
quando ocorre reversão periódica da direção. Resis- menos fibras são polarizadas. Freqüência é o número
tência é o obstáculo ao fluxo de corrente elétrica con- de pulsos por unidade de tempo (segundos); quanto
tínua, e impedância é o obstáculo ao fluxo de corrente maior, mais potenciais de ação são gerados. As altera-
alternada. Pulso elétrico é a amplitude da corrente ções da freqüência resultam em modificação da sensa-
para compensar as variações da impedância. A corren- ção pulsátil para a sensação de queimor. A freqüência
te é constante quando se mantém independentemente modifica de modo importante o consumo de bateria.
da impedância. As variáveis manipuladas na neuroes- Em geral as estimulações destinadas ao tratamento da
timulação são a polaridade, amplitude, comprimento dor via estimulação da medula espinhal têm a média
de onda e freqüência dos pulsos. Ocorre ativação ner- de 56 Hz, sendo recomendável iniciá-las com 80 Hz.
vosa quando um estímulo elétrico com amplitude O limiar de estimulação é a menor voltagem que gera
apropriada é aplicado. A ativação depende da amplitu- parestesias no doente. Os eletródios aplicados no es-
de (voltagem) e da duração dos pulsos; quando a vol- paço epidural ativam o tecido nervoso quando aciona-
tagem e o comprimento de pulso são adequados, há dos com magnitudes variadas entre os indivíduos ou
despolarização e potenciais de ação propagam-se. Em locais, tendo em vista o montante do líquido cefalorra-
alguns nervos o potencial de ação gera parestesias. A quidiano e do tecido situado entre eles e a superfície
polaridade do eletródio determina a conformação e a da medula espinhal; constituem resistência o espaço
densidade do campo elétrico. Há despolarização na epidural, a gordura, fluidos (sangue, tecido cicatricial,
região do eletródio negativo. O comprimento de pulso dura-máter, dimensão do espaço epidural); quanto
é a média de duração do estímulo; quanto maior o maior a distância entre o eletródio e o tecido nervoso,
comprimento, maior o número de fibras nervosas ati- maior é a amplitude do sinal para gerar a parestesia. A
vadas. A amplitude mede a magnitude do sinal; quan- estimulação torna-se dolorosa quando a amplitude e a
to mais intensa, maior o número de fibras nervosas duração de pulso são elevadas, ou quando a distância
estimuladas. Freqüência refere-se ao número de estí- entre o ânodo e o cátodo é elevada, quando há estimu-
mulos liberados por unidade de tempo (segundos); lação do ligamento amarelo ou quando o eletródio
quanto maior a freqüência, mais vezes as fibras são está inadequadamente posicionado, ou seja, em conta-
ativadas. A eficiência do sistema consiste na organiza- to com raízes nervosas no compartimento liquórico,
ção de programas que maximizam o alívio da dor e ou, ainda, quando há comprometimento do isolamen-
minimizam o consumo de energia. A programação to elétrico. Para focalizar o local da estimulação, po-
pode controlar parâmetros de estimulação, mas não de-se reduzir o comprimento de onda. Para aumentar
possibilita corrigir locações inapropriadas dos eletró- ou ampliar a área de parestesia, pode-se aumentar a
dios, os aspectos físicos dos eletródios para contem- magnitude do pulso, aumentar o comprimento de onda
plar a estimulação e os problemas gerados com a fon- e adicionar outros cátodos na direção desejada. Para
te de energia; sistemas com vários eletródios deslocar a estimulação rostralmente, pode-se reposi-
apresentam melhor resultado em termos de efetivida- cionar o eletródio, ativar os eletródios mais rostrais,
de. A estimulação das raízes resulta em parestesias, adicionar mais ânodos sob os cátodos. Para dirigir a
muitas vezes dolorosas; em um ou mais dermatôme- estimulação no sentido caudal, pode-se deslocar o
ros a estimulação das raízes ventrais resulta em esti- ânodo caudalmente. Para deslocá-la lateralmente, de-
mulação motora, também freqüentemente dolorosa, e ve-se adicionar um ânodo ou desligar um cátodo.
a estimulação do ligamento amarelo também pode re- Quando um cátodo e um ânodo estão em contato, não
sultar em dor intensa. Cada eletródio apresenta um há estimulação (Fig. 72.16). Para aumentar a intensi-

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72 – Neuroestimulação no Tratamento da Dor

dade da estimulação, pode-se aumentar a amplitude e


o comprimento de onda ou adicionar um ou mais âno- 4 mm + -
dos à combinação (Fig. 72.17). Para reduzir a intensi-
dade da estimulação pode-se diminuir a amplitude e a
duração dos pulsos (Fig. 72.18). A estimulação é me-
nos eficaz quando a distância entre os eletródios é
muito grande no sentido longitudinal ou lateral, quan-
do há excesso de ânodo. A duração da bateria depende 6 mm + -
do número de ânodos, duração da estimulação da
magnitude da amplitude, comprimento dos pulsos e
uso de programas variáveis. Ocorrem despolarização
e propagação de potenciais de ação quando a volta-
gem aplicada é suficiente. Em alguns nervos os poten- Fig. 72.14 – Representação gráfica da densidade de corrente
ciais de ação podem gerar parestesias; a estimulação em eletródios com 4 mm (cinza) e 6 mm (negro), respectiva-
ocorre na região do eletródio negativo. A estimulação mente, de área exposta.
deve cobrir apenas as áreas afetadas para evitar a ge-
ração de desconforto em áreas sadias. A efetividade é
fundamentada na geração de parestesias eficazes e, no A
- +
máximo, do alívio da dor. Eficiência é a criação de
programas que maximizam o alívio da dor e minimi-
zam o consumo de energia (gasto da bateria). Para me- + - +
B
lhorar a eficiência é necessário zelar pela melhor loca-
lização do eletródio, evitando-se migração dos seus
componentes, e usar sistemas com baixa impedância
elétrica, número de eletródios e contatos insuficientes,
+
flexibilidade e a maleabilidade dos sistemas que deter- - C
minam a operacionabilidade da neuroestimulação. A
amplitude do sinal é fator limitante para que a eficácia
seja satisfatória; sistemas programáveis simples po- Fig. 72.15 – (A) Representação da direção da corrente do
dem não resultar em melhora. A posição do eletródio, ânodo (+) para o cátodo (–). (B) Representação da densidade de
portanto, também é crítica para a obtenção de resulta- corrente com a combinação +–+. (C) Representação da densi-
dos satisfatórios, uma vez que é necessária superposi- dade de corrente com a combinação +–.
ção do local onde a estimulação é realizada com aque-
le onde a dor é referida, o que torna o uso de sistemas -
com vários contatos mais apropriado que aqueles com
poucos. Isso significa que, para o tratamento da dor + -
complexa, sistemas com apenas uma linha de contatos +
podem ser insatisfatórios. O limiar de sensação é
aquele em que o doente sente a sensação da estimula-
ção; a tolerância máxima é aquela em que o doente Fig. 72.16 – Representação da densidade de corrente com a
refere que, ante a determinado tipo de voltagem, a combinação –+ em eletródios paralelos.
sensação é a máxima tolerável. Para aumentar as pa-
restesias, pode-se aumentar a amplitude do sinal, o
comprimento de onda; quando se torna desconfortá- A
+ + -
vel, devem-se adicionar mais cátodos na direção da
distribuição espacial da estimulação. Para reduzir a
região a ser estimulada, pode-se diminuir o compri-
mento de onda ou o número de cátodos ativados. Para
mover a parestesia rostralmente, pode-se reposicionar
o eletródio, ativar os eletródios mais rostrais e adicio-
nar mais ânodos sobre os cátodos. Para modificar a B + - -
amplitude do sinal, deve-se zerar o sistema, assim
como quando se modificar a polaridade. Para aumen-
tar a intensidade da estimulação, pode-se aumentar a
amplitude e o comprimento de onda ou adicionar um Fig. 72.17 – (A) Representação da densidade de corrente
ou mais ânodos ao original. Para reduzir a intensidade com a combinação ++–. (B) Representação da densidade de
da estimulação, pode-se reduzir a amplitude e o com- corrente com a combinação +– –.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

xms
2xms
xV x/2V

xms

2xms
xV 2xV

Fig. 72.18 – Representação da densidade de energia de acordo com a modificação da voltagem (V) ou duração do pulso (ms).
A elevação de um ou outro desses parâmetros (em azul) resulta em aumento da energia e liberação de energia (rosa).

primento de onda ou adicionar um ou mais cátodos na interdisciplinar. Curitiba: Editora Maio; 2003, p.
combinação de eletródios. Uma vez estando a estimu- 219-30.
lação coerente com a área de dor, deve se ajustar a 6. Lin TY, Teixeira MJ, Rogano LA. Síndrome comple-
freqüência para maximizar a satisfação do doente. xa de dor regional Tipo I e II. Rev Med. 1999;78:168-
Problemas podem ocorrer quando a distância é muito 89.
longa entre o ânodo e o cátodo no sentido longitudinal 7. Teixeira MJ, Imamura M, Calvimontes RCP.
ou lateral, ou são utilizados muitos ânodos ou cátodos. Dor fantasma e no coto de amputação. Rev Med.
A expectativa de duração da bateria depende do nú- 1999;78:192-6.
mero de ânodos, amplitude, comprimento de onda, 8. Rogano LA, Teixeira MJ. Dor e mielopatias. In: Tei-
freqüência ou programações múltiplas. xeira MJ, Braum Filho JL, Marquez JO, Lin TY, edi-
tores. Dor – contexto interdisciplinar. Curitiba: Edi-
tora Maio; 2003, p. 371-80.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 9. Silva CB, Teixeira MJ. Neuropatia diabética. Rev
1. Teixeira MJ. Tratamento neurocirúrgico da dor neu- Med. 1999;78:150-162,.
ropática. Rev Med. 1999;78:305-36. 10. Oliveira RAA, Teixeira MJ. Dor central encefálica.
2. Teixeira MJ. Estimulação elétrica do sistema nervo- In: Teixeira MJ, Braum Filho JL, Marquez JO, Lin
so. In: Teixeira MJ, Braum Filho JL, Marquez JO, TY, editores. Dor – contexto interdisciplinar. Curiti-
Lin TY, editores. Dor – contexto interdisciplinar. ba: Editora Maio; 2003, p. 381-8.
Curitiba: Editora Maio; 2003, p.827-834. 11. Teixeira MJ, Rogano LAC, Dobbro EL. Lesão
3. Teixeira MJ. Fisiopatologia da dor neuropática. In: da medula espinhal e cauda equina. Rev Med.
Teixeira MJ, Braum Filho JL, Márquez JO, Lin TY, 1999;78:200-7,.
editores. Dor – contexto interdisciplinar. Curitiba: 12. Teixeira MJ, Okada M. Neuralgia pós-herpética. Rev
Editora Maio; 2003, p. 155-70. Med. 1999;78:140-9.
4. Teixeira MJ. Dor por avulsão das raízes nervosas. 13. Tsubokawa AT, Katayama Y. Motor cortex stimula-
Rev Med. 1999;78:197-200. tion persistent pain management. In: Gildenberg PL,
5. Lin TY, Godinho FLF, Teixeira MJ. Síndrome com- Tasker RR, editors. Textbook of stereototactic and
plexa de dor regional In: Teixeira MJ, Braum Filho, functional neurosurgery. New York: McGraw-Hill;
JL, Marquez JO, Lin TY, editores. Dor – contexto 1996, p. 1547-56.

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73
Sistemas Implantáveis para Infusão
de Analgésicos no Compartimento
Liquórico
Manoel Jacobsen Teixeira

INTRODUÇÃO missores excitatórios, canais iônicos ou receptores;

O
absorvidos pela circulação sistêmica, atuam a distân-
controle da dor envolve utilização de nume-
cia, em outras regiões do SNC e sistema nervoso pe-
rosas estratégias nas áreas de farmacoterapia, riférico (SNP)3 (Figs. 73.1 e 73.2).
medicina física e/ou de saúde mental. Estas
devem ser adaptadas à condição nosológica, à loca-
lização da sintomatologia, à magnitude do sofrimen- SISTEMAS DE ADMINISTRAÇÃO
to, ao comprometimento funcional e à perspectiva de A administração de fármacos no líquido cefalorra-
vida dos doentes; devem basear-se nas características quidiano (LCR) via cateteres implantados no compar-
individuais, psicossociais e funcionais dos doentes e timento espinhal extradural ou intratecal ou ventricular
das doenças. O tratamento da dor crônica geralmen- cerebral pode ser realizada com sistemas exterioriza-
te não proporciona resultados satisfatórios, espe- dos ou implantáveis4. A localização da liberação do
cialmente quando é de natureza neuropática, o que agente deve corresponder ao local onde há o processa-
implica necessidade do desenvolvimento de novas mento sensitivo da dor para que seja mínima a dose do
estratégias ou de modificação das táticas analgésicas fármaco e, conseqüentemente, seus efeitos adversos2.
convencionais para melhor assistir os doentes que A administração pode ser como bolo isolado, infu-
dela padecem. são contínua com seringas ou bombas, atendendo ou
Embora muitos analgésicos possam ser adminis- não o programa de analgesia controlada pelo paciente
trados por via oral, a analgesia muitas vezes não é (ACP), ou de administração complexa (Fig. 73.3).
satisfatória em decorrência de efeitos adversos. A in- A administração de analgésicos no compartimento
fusão de fármacos no sistema nervoso central (SNC) espinhal via cateteres exteriorizados é boa opção para
objetiva, entre outras finalidades, a deposição da tratar a dor aguda ou decorrente do câncer durante
substância ativa próximo ao sítio de ação, redução alguns dias ou semanas, mas não a melhor opção no
da quantidade administrada com a conseqüente di- tratamento da dor crônica. O cateter é implantado por
minuição da ocorrência e da intensidade dos efeitos via percutânea, no compartimento espinhal epidural
colaterais e obtenção de efeitos mais satisfatórios e ou subaracnóideo; seu sepultamento reduz a freqüên-
com duração prolongada. Segundo Molloy et al.1, é cia do deslocamento e, talvez, de infecção (Fig. 73.4).
eficaz em casos de dor aguda ou dor crônica, dor no A via epidural associa-se a menos efeitos tóxicos que
doente com câncer ou não, de natureza neuropática e/ a intratecal, mas há perda marcante dos agentes devi-
ou nociceptiva2. A injeção espinhal pode ser realizada do à difusão; a magnitude dessa perda depende da na-
preventivamente, durante ou após procedimentos de tureza dos agentes. O volume do espaço epidural varia
manipulação ou de cirurgia. Os fármacos administra- segundo o segmento espinhal; tal variação influencia
dos por via intratecal atuam em vários sítios no SNC, a dispersão do fármaco administrado. É de 1,2 a 1,5
incluindo a medula espinhal, o tronco encefálico e o ml no segmento cervical, 2,1 a 2,4 ml no torácico e
hipotálamo, onde ativam as unidades do sistema su- de 2,5 ml no lombar; varia também de acordo com
pressor de dor ou inibindo a liberação de neurotrans- a ocorrência da obesidade, estado gestacional etc.5

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793
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Córtex sensitivomotor Serotonina, noradrenalina, acetilcolina, substância


P, calcitonina
Giro do cíngulo

Núcleos da base
Núcleos talâmicos específicos
Hipotálamo
Encefalinas
Substância cinzenta periaquedutal
mesencefálica

Encefalinas, GABA, serotonina,


noradrenalina,somastostatina,
calcitonina, glutamato,
aspartato, acetilcolina, dopamina
histamina, neurotensina
Formação reticular do tronco encefálico

Trato neo-espinotalâmico
Corno posterior da substância
cinzenta da medula espinhal
Aferente primário
Encefalinas, GABA, serotonina, noradrenalina
somastostatina, calcitonina, neurotensina,
adenosina, vasopressina, glicina, dopamina,
substância P

Fig. 73.1 – Representação artística do sistema supressor de dor. Destacam-se vários neurotransmissores que podem ser substituí-
dos por fármacos com finalidade de inibir a unidade neuronal, receptores e canais iônicos no sistema nervoso central e periférico.

Fig. 73.2 – Representação artística de um neurônio no corno posterior da medula espinhal. Estímulos excitatórios oriundos e
neurotransmissores são liberados pelos aferentes primários; na terminação nervosa periférica e na superfície do neurônio recep-
tor existem vários canais iônicos e receptores onde fármacos podem ligar-se e suprimir a dor.

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73 – Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico

A
Liberação em bolo (cateter epidural, bombas manuais)

Liberação contínua (bombas a gás, bombas de pressão contínua,


bombas eletrônicas

Liberação programada (bombas eletrônicas)


B

Fig. 73.3 – Representação do modo de liberação de fármacos


com diferentes dispositivos.

A distribuição dos fármacos do espaço peridural até


a medula espinhal ocorre por difusão passiva através
da dura-máter e da membrana aracnóide (responsá-
vel por 95% à difusão); fármacos com lipossolubili-
dade intermediária são mais permeáveis que os com
lipo ou hidrossolubilidade elevada Após atravessar a
membrana aracnóide, alcançam as raízes nervosas e a
pia-máter. Cruzando a pia-máter, penetram na medu-
la espinhal e difundem-se em sua substância branca
e alcançam a substância cinzenta do CPME, sede de
muitos receptores, sítios enzimáticos e canais iônicos
envolvidos no processamento da sensação dolorosa.
O compartimento medular capta razoável parcela dos
fármacos lipossolúveis e reduz a biodisponibilidade
espinhal das drogas mais apolares (fentanila, sulfen- C
tanila, clonidina). O local da inserção do cateter varia
de acordo com o local onde há dor (tórax, T2 a T8;
abdome rostral, T4 a L1; abdome caudal, T10 a L3;
extremidade superior, C2 a C8; extremidade inferior,
T12 a L3). Questiona-se o real sítio de ação de mui-
tas drogas administradas por via espinhal; é possível
que parte da analgesia se deva à ação sistêmica do
fármaco. A encapsulação do cateter no compartimen-
to epidural limita o uso desses sistemas em longo
prazo. Além disso, mesmo com o uso de filtros, há
maior probabilidade de infecção que com sistemas
totalmente implantáveis.
Quando a expectativa de necessidade de uso é su-
perior a 3 meses, os sistemas totalmente implantáveis
são mais apropriados. Há três tipos de sistemas im- Fig. 73.4 – Instrumental. (A) Agulhas. (B) Cateter. (C) Pa-
plantáveis6. ciente com cateter implantado no compartimento espinhal
epidural.
Alguns são constituídos exclusivamente de câ-
mara, que deve ser puncionada periodicamente para
liberar o(s) fármaco(s) em bolo (Fig. 73.5, A). Estes
apresentam a vantagem do baixo custo e a desvanta- eixo (Fig. 73.5, B). Os cateteres devem ser fixados
gem de haver necessidade da punção para que o(s) nos planos aponeuróticos para evitar-se o seu deslo-
fármaco(s) sejam administrados, o que os torna des- camento durante a movimentação dos doentes.
confortáveis e mais propensos a infecções. A punção As bombas auto-acionadas pelo doente consistem
da câmara deve ser realizada percutaneamente por em reservatório com capacidade de 11 ml (Cecor-
agulhas com extremidade tangente ao perfil de seu Cordis) ou 50 ml (Algomed, Medtronic) para reserva

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

de fármacos conectado por sistema valvular unidire-


cional a um cateter para fluxo da medicação ao com-
partimento liquórico; contém sistema de acesso para
instilação do agente farmacológico no reservatório. O
agente é liberado no LCR em bolo sempre que os bo-
tões são deprimidos por compressão digital realizada
pelo próprio doente ou seus cuidadores (Fig. 73.6). A
bomba Cecor é monobloco, o que facilita seu implan-
te, enquanto a bomba Algomed requer loja adicional
para acomodar o reservatório. Ambas são ideais para
tratar a dor incidental, pois são ativadas pelo próprio
doente, que auto-regula o número de administrações.
Apresenta a vantagem de ser de pequeno volume,
leve, pouco volumosa, pouco dispendiosa e ter a gran- Face anterior
de capacidade de seu reservatório e funcionalidade
ilimitada. São desvantagens a liberação em bolo, que
as torna inapropriadas para liberação de agentes que
necessitam de liberação contínua (baclofeno, fentani-
la), a impossibilidade de ajustamento do volume de
droga liberada, a necessidade da auto-administração,
o que acarreta insegurança no doente e constitui risco
de intoxicação, implicando a necessidade de treina-
mento prolongado do doente ou de seus cuidadores,
a necessidade de exigir várias incisões (Algomed) e a
necessidade de os dispositivos de ejeção serem visua­
lizados através do tegumento para serem acionados,
fato que impossibilita seu uso durante as primeiras
semanas pós-implante devido ao edema e coleção se-
rosa regional causados pelo procedimento operatório Face posterior
e que pode resultar em administração da carga na li- Fig. 73.6 – Sistemas de infusão de fármacos com aciona-
nha de ejeção e em intoxicação medicamentosa. mento digital. Modelo Cecor (Cordis) onde, no botão central é
acionada a câmara (11 ml) e a compressão dos botões laterais
ejeta 0,1 ml da medicação no compartimento liquórico.

Os sistemas de infusão contínua são acionados por


molas impulsionadas por gás freon, butano ou R114
(Isomed-Meditronic, Arrow M-3000, Tricumed-Ar-
chimedes, Micromedes-Tricumed) ou por diafragmas
de elastômeros distensíveis (Accu-Rx 5300-ANS).
Consistem em reservatórios com 20, 35 ou 60 ml de
capacidade e de sistema de liberação de 0,3; 0,5; 1;
1,5; 2; 2,5; 3; 3,5; 4 ml de solução analgésica/24 h (Iso-
med), 28 ml de capacidade para liberar 0,4; 0,6; 0,7;
0,8; 0,9; 1; 1,2; 1,5; 2,0; 2,6 ou 3,2 ml/24 h (Accu-
Rx), 16, 30 ou 50 ml de capacidade para liberar 0,5;
1,3; 1,7 ou 3,4 ml/24 h (Arrow) ou 20; 35; 40; 50
ou 60 ml de capacidade para liberar 0,4 a 4 ml/24 h
(Archimedes-Tricumed) continuadamente (Fig. 73.8
a 73.11). Contém reservatório, dispositivo de acesso
para instilação do agente farmacológico no reserva-
tório, cateter para veicular a medicação para o com-
partimento liquórico e câmara de acesso ao cateter in-
dependente e com volume limitado. O reservatório é
dispositivo com ampla capacidade de armazenamento
Fig. 73.5 – Fotografias de câmara que, implantada no tecido de substâncias que são liberadas continuadamente no
celular subcutâneo, possibilita a administração, após sua punção LCR. O sistema de acesso consiste em septo, ou seja,
com agulha, de fármacos no compartimento epidural espinhal. membrana que pode ser puncionada, e dispositivo

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73 – Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico

Fig. 73.8 – Bombas de infusão constante. Bomba Isomed


(Meditronic), que consiste em câmara de punção carregável
com o agente farmacológico, que é comprimida com mola de
titânio pressionada com gás.

Fig. 73.7 – Sistemas de infusão de fármacos com acionamen-


to digital. Bomba Algomed (Meditronic). Consiste em câmara Fig. 73.9 – Bombas de infusão constante. Sistema Arro-
(50 ml) conectada com cateter com conjunto que apresenta ws, que consiste em câmara carregada com agente analgésico
dispositivo com botão que permite seu carregamento com o que é pressionada com mola de titânio comprimida com gás
agente farmacológico e dois botões, central e contralateral, freon para administração contínua do agente farmacológico
para ejeção de 1 ml de solução em compartimento liquórico. no compartimento liquórico.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Fig. 73.10 – Bombas de infusão constante. Sistema Archi-


medes. Mecanismos de acionamento similares aos demais.

de freio para que a agulha não ultrapasse o limite da


câmara. O sistema de acesso ao cateter consiste em
câmara com volume e tem a finalidade de possibilitar
aspiração do fluido que é liberado e de administração
de fármacos rapidamente ou de contraste para ava-
liar o desempenho do sistema. A unidade de ejeção
é conectada a dispositivo capilar distal para restrição
ao fluxo (sistema de resistência ao fluxo). As bombas
de fluxo constante ejetam os fármacos obedecendo à
equação de Poiselle ou seja, fluxo = pressão na câma-
ra – pressão no cateter/resistência ao fluxo. A precisão
do fluxo é superior na bomba AccuRx 5300 que nas
demais; é menos precisa na bomba Arrows M-3000
e melhor na bomba Accu-Rx. A pressão da câmara é
maior na bomba Archimedes (2,45 bar) e Isomed (2,1
bar) que na Arrow (0,58 bar) ou AccuRx 5300 (0,55
bar); a pressão elevada dificulta a recarga e implica
necessidade de dispositivo para avaliar a pressão de
injeção durante seu preenchimento. Nas bombas a gás
há necessidade de pré-aquecimento antes do implan-
te. A pressão do vapor dos sistemas acionados a gás
aumenta à medida que a temperatura se eleva, o que
implica o aumento do fluxo. Quando a temperatu-
ra se eleva, a viscosidade da água reduz-se e o fluxo Fig. 73.11 – Bombas de infusão constante. Sistema ANS,
também se eleva em 11,5% por grau centígrado de au- que consiste em câmara que ejeta continuadamente agente far-
macológico no compartimento liquórico através de cateter.
mento da temperatura corpórea com o sistema Arrow
M3000, em 7% com o sistema Isomed, em 6,3% no

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73 – Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico

sistema Tricomed Arquimedes, mas em 2% nas bom- gramação é realizada pelo médico com telemetria não
bas Accu-Rx. Quando a pressão atmosférica reduz- invasiva (Fig. 73.12). A longevidade é superior, mas
se, o fluxo aumenta; o fluxo eleva-se em 18% a cada há menos precisão na bomba Micromedes Tricomed.
1.000 m de elevação da superfície do solo nas bombas Ambas necessitam de aquecimento pré-operatório,
Arrow, em 5,5% nas Isomed e em 5% nas Arquime- mas não podem ser hiperaquecidas ou superpressio-
des, e não se modifica nas bombas AccuRx. nadas. A bomba Synchromed tem a vantagem de pos-
Existem dois modelos de bombas programáveis. sibilitar a modificação do fluxo e das características
O eletrônico programável peristático Synchromed de liberação por métodos não invasivos, o que possi-
Meditronic apresenta uma câmara de gás, reservató- bilita a infusão complexa de fármacos, a titulação da
rio com capacidade para 10 a 18 ml, motor alimen- dose inicial (momento em que as doses normalmente
tado por bateria que colapsa, a cada revolução, tubo variam amplamente). A pressão no reservatório é ele-
da bomba de rolete e microprocessador para infun- vada em ambas, o que torna difícil seu preenchimento
dir 0,4 a 3 ml/24 h de volume com fluxos variados, e torna-as mais suscetíveis a variações da temperatu-
como bolo, contínua, intermitentemente ou de modo ra e da pressão atmosférica. Apresentam concepção
complexo (bolo associado à infusão contínua) e dis- mais avançada que as demais e a vantagem de regular
positivo que sinaliza que o reservatório está com vo- os fluxos e as características de liberação dos fárma-
lume pequeno. O modelo a gás Micromedes Trico- cos por telemetria não invasiva; são mais apropriadas
med, consiste em reservatório com capacidade de 10, quando é necessária titulação precisa da dose inicial
20 ou 30 ml e válvula controlada eletronicamente e da medicação e/ou infusão de modo complexo. Como
acionada por bateria que determina o fluxo contínuo não são primariamente acionadas a gás, são pouco
de 0,2 a 0,4 ml/24 h, sistema diagnóstico que facilita afetadas pela pressão e temperatura ambiental. Apre-
a identificação de anormalidades, mas não do local sentam a desvantagem de serem de grande volume
onde o cateter apresenta problema. Em ambas, a pro- e pesadas, terem reservatórios pequenos, serem mais

Fig. 73.12 – Fotografia da bomba eletrônica Syncromed (Meditronic) e dos seus programadores e representação artística do
seu sistema operacional (câmara que é carregada com agente analgésico que é ejetado por bomba de rolete movida por motor
controlado por microprocessador).

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

dispendiosas, terem atividade limitada devido à perda SELEÇÃO DOS DOENTES


da carga da bateria (quando isso ocorre, a bomba deve
ser substituída), por geralmente não haver necessida- As condições gerais e perspectivas de vida do
de de modificação dos fluxos ao longo do tempo, pois doen­te, as preferências particulares do médico e as
disponibilidades dos ambientes onde o doente é ava-
muitos fármacos como a morfina apresentam efeito
liado influenciam a seleção dos doentes e dos siste-
prolongado, e de haver necessidade de uso de progra-
mas. Há mais riscos de infecção em doentes debili-
mador, o que as torna mais complexas. Avanços na
tados ou com infecções regionais ou a distância e de
tecnologia devem possibilitar que as baterias desses
hipotensão liquórica devido ao extravasamento de
equipamentos atuem durante 5 a 7 anos e que o doen-
líquido cefalorraquidiano (LCR) quando há compro-
te tenha seu programador no domicílio. metimento da cicatrização da dura-máter, tal como
Os reservatórios das bombas necessitam ser carre- ocorre em locais onde previamente foi realizada a la-
gados a cada 1 a 3 meses, na dependência das necessi- minectomia. Todos os doentes devem ser avaliados
dades, velocidade do fluxo de ejeção e estabilidade da por equipe multidisciplinar que deve incluir médicos,
medicação; quando os medicamentos são combina- enfermeiras, psicólogos e assistentes sociais antes do
dos, o período para recarga das câmaras pode tornar- implante. Deve haver razão bem documentada para
se mais curto, mesmo quando as soluções utilizadas a ocorrência de dor de difícil controle; as anormali-
são concentradas. Portanto, a seleção do sistema deve dades evidenciadas devem ser compatíveis com as
basear-se em questões como volume e peso do dispo- queixas. Os doentes devem ter expectativas realísti-
sitivo implantado em relação ao peso e conformação cas e compreender que devem atuar ativamente no
corporal do doente, capacidade volumétrica, facilida- tratamento de suas condições, assim como do sistema
de de retornos periódicos para consultas, necessidade implantado; devem estar conscientizados quanto aos
de ajustamentos periódicos de infusão, custos, nature- riscos e benefícios dessa modalidade terapêutica7.
za do agente utilizado etc.
O implante de dispositivos nos ventrículos cere-
FÁRMACOS UTILIZADOS PARA INFUSÃO
brais laterais consiste na realização de trepanação e de
implante de cateter na cavidade ventricular; este é co- O fármaco ideal para administração no comparti-
nectado à bomba sepultada no tecido celular subcutâ- mento liquórico deve apresentar eficácia farmacoló-
neo da face anterior do tórax ou abdome (Fig. 73.13). gica, reversibilidade da ação, ausência de efeito teto
e de efeitos colaterais, início rápido de ação, duração
apropriada de efeito, não-indução de tolerância ou
de dependência, não-interação adversa com tecidos
locais e/ou com fármacos associados, baixo custo e
ser de fácil administração e acesso. Vários fármacos
podem ser administrados no compartimento epidural
ou subaracnóideo espinhal ou intraventricular para
aliviar a dor (Fig. 73.14). Entre os utilizados clinica-
mente destacam-se os anestésicos locais (AL) ami-
das (lidocaína, bupivacaína, ropivacaína), os opióides
(morfina, fentanila, sulfentanila, meperidina, bupre-
norfina), os agonistas adrenérgicos α-2 (clonidina,
tizanidina), os agonistas GABA-A (midazolam) ou
GABA-B (baclofeno), os glicocorticóides (metil-
prednisolona, triancinolona) e os anestésicos gerais
derivados da fenciclidina (cetamina)3 (Fig. 73.15). O
veículo da formulação pode ser neurotóxico (glicina
com remifentanila), o que inviabiliza o uso do me-
dicamento, ou não (polietileno a 3% a 8%, veículo
de corticosteróides) ou a neurotoxicidade pode ser
intrínseca ao fármaco (amitriptilina, antiinflamatórios
não hormonais). A farmacocinética das drogas injeta-
das é relacionada à polaridade dos fármacos e à per-
meabilidade das barreiras naturais (Tabela 73.1).

Anestésicos Locais
Fig. 73.13 – Representação artística de um cateter implan-
tado no ventrículo cerebral lateral para infusão de fármacos Os AL estabilizam as membranas neuronais e ini-
por bomba implantável. bem a geração e a condução dos potenciais de ação

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73 – Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico

AAINH
Cérebro
Opióides
anticonvulsivantes
Nadr
Serotonina ADTs neurolépticos
Opióides endógenos ISRSNadr-5HT
Opióides
AAINHs
anticonvulsivantes
AAINH
Opióides Canais de Na+ Canais de Ca++ : GBP, OXC?
Antagonistas NMDA: cetamina, dextrometorfana
SNP topiramato
CBZ
Agonistas GABA: baclofeno, midazolam
OXC
AAINHs
FENIT
Medula espinhal Opióides
ADT
Calcitonina
TPM
Mexiletina
Lidocaína
Lamotrigina

Fig. 73.14 – Representação artística dos locais de ligação e natureza dos fármacos utilizados no tratamento da dor.

Fig. 73.15 – Representação artística dos locais de ação dos fármacos analgésicos e adjuvantes na terminação nervosa espinhal
e nos neurônios do corno posterior da substância cinzenta da medula espinhal.

Tabela 73.1 – Interação opióide e anestésico local nos sítios de ação analgésica
Fármacos Via Encéfalo Medula espinhal Axônios de raízes espinhais
Opióide Intra-espinhal + +++ (neurônio) -
Anestésico local Intra-espinhal - + (axônio) +++
Opióide + anestésico local Intra-espinhal + +++ (neurônio - axônio) +++

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

nociceptivos porque bloqueiam os canais de Na+ re- sia regional podem ser magnificadas com a adição de
sistentes à tetrodoxina (TTX / unem-se ao segmento vasoconstritores (adrenalina), agonistas adrenérgicos
S6 do domínio IV da estrutura do canal), inibindo o α-2 (clonidina) e opióides à solução. Há relação entre
fluxo de Na+ necessário para a deflagração dos poten- a concentração plasmática e os efeitos tóxicos da lido-
ciais de ação; a inibição da condutância ao Na+ depen- caína e da bupivacaína. A transferência da lidocaína e
de da voltagem e da freqüência8. Atuam preferente- da bupivacaína do espaço peridural para o plasma e da
mente nos canais de Na+ no estado aberto e inativado. bupivacaína do espaço subaracnóideo para o plasma é
Há bloqueio diferencial de certas fibras nervosas com processo biexponencial, que envolve cinética de pri-
calibres e velocidades de condução diferentes; as fi- meira ordem com duas meias-vidas (t 1/2 x), a rápida
bras nociceptivas são mais sensíveis. Quando admi- e a lenta, enquanto a cinética de transferência da lido-
nistrados por via IV, geram analgesia central devido à caína do espaço subaracnóideo para o plasma ocorre
ação anestésica local, à inibição da liberação central por processo monoexponencial de primeira ordem
de neurotransmissores (sP, ATP) dos aferentes primá- com meia-vida longa. O acúmulo sistêmico tende a
rios nociceptivos, ao bloqueio central das unidades do ser rápido para AL de curta duração (lidocaína) admi-
sistema nervoso neurovegetativo simpático e à inibi- nistrados por via epidural; já o acúmulo local tende a
ção de reflexos vasoconstritores induzidos pela dor. ser maior e mais rápido com os AL de longa duração
A inflamação determina alterações conformacionais (bupivacaína, ropivacaína). O metabolismo de elimi-
nos canais de Na+, tornando-os insensíveis à TTX (in- nação da lidocaína é hepático. Os AL devem ser usa-
sensíveis a lidocaína) e ao bloqueio por AL. Vários dos com cautela em idosos, hipotensos, em doen­tes
são os anestésicos locais utilizados por via espinhal com insuficiência cardíaca congestiva (ICC) ou com-
(Tabela 73.2). A bipuvacaína é da classe amida; por prometimento da função hepática e em gestantes. São
via espinhal intratecal ou epidural apresenta perfil contra-indicados a doentes com bloqueio cardíaco de
favorável quanto à eficácia clínica e toxicologia9; é segundo e terceiro graus ou com história de alergia
segura em doses variando de 2 a 25 mg ao dia; do- aos AL. Náuseas, vômitos, diarréia, dor abdominal,
ses mais elevadas são associadas a efeitos adversos, hipotensão arterial, braquicardia, bloqueio da con-
como anormalidades da função vesical e fraqueza dução cardíaca, arritmias cardíacas, palidez cutânea,
muscular. A ropivacaína também é da classe amida e colapso circulatório, depressão respiratória, bronco-
causa menos bloqueio motor devido à grande afinida- espasmo, confusão mental, tonturas, tremores, alente-
de pelas fibras A-δ e C; não há, entretanto, trabalhos cimento do discurso, dormência perioral, parestesias,
sobre a segurança e eficácia de seu uso prolongado ansiedade, sonolência, inquietação, euforia, convul-
por via intratecal9. A duração e a qualidade da aneste- sões, borramento visual, diplopia, hipoacusia, zum-

Tabela 73.2 – Anestésicos locais mais utilizados no Brasil


Nome farmacológico Espinhal Epidural
Curta duração
Cloroprocaína 50-100 mg (0,5-5%) Bolo 200-750 mg (1,5-2 mg/kg); 10-25 ml/2%
Infusão 20-30 ml/h (20 mg/kg)
Duração 0,5-1 h 0,5-1h
Média duração
Lidocaína 50-100 mg (0,5-5%) Bolo 20-30 ml/1%; 200-400 mg (7-9 mg/kg)
Infusão 6-12ml/h (0,2-0,25ml/kg)/1-2%/h
Duração 0,5-1 h 1-3 h
Ropivacaína Bolo10-20 ml 0,2%
Infusão 4-14 ml/h
0,5-1,5 h
200-300 mg (6-9 mg/kg)/1-2%
Duração 1-3 h
Longa duração
Tetracaína 5-20 mg(0,4 mg/kg)
Duração 0,5-3 h
Bupivacaína 10-20 ml (0,25-0,5 mg/kg) 50-150 mg (1,5-2,5 mg/kg)
20-25 ml/0,25%-0,5%

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73 – Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico

bidos, nistagmo, eritema, edema, urticária, prurido, do hormônio antidiurético. O receptor OP3 ou µ é sub-
edema angioneurótico, reações anafiláticas, metemo- dividido em µ1 e µ2 e µ3. A ligação de opióides aos re-
globinemia, leucopenia, agranulocitose, aracnoidite, ceptores µ1 é associada à analgesia supra-espinhal e à
comprometimento da função vesical, déficits moto- dependência e a ligação aos receptores µ2, à analgesia
res e sensitivos, permanentes ou temporários, podem espinhal, miose, depressão respiratória, sedação, ini-
ocorrer quando a via intratecal é utilizada, especial- bição da motilidade gastrointestinal e bradicardia. O
mente com solução hiperbárica de lidocaína a 5%. As receptor orfamina, nociceptina ou ORL1 está presente
complicações devem ser tratadas com a suspensão ou na medula espinhal. O receptor sigma está relaciona-
redução da medicação, suporte ventilatório e cardio- do à disforia, alucinação, estimulação psicomotora
circulatório e acidificação urinária; benzodiazepíni- e à excitação mas o efeito analgésico. Os receptores
cos (diazepam 0,025 a 0,2 mg/kg IV; midazolam 0,25 delta relacionam-se à analgesia e à euforia. Por via
a 1 mg/kg IV) ou barbitúricos (tiopental sódico 0,5 a espinhal, induzem à analgesia quando interagem com
2 mg/kg IV) devem ser prescritos para o controle das receptores µ2, δ2 e κ1 das terminações das fibras C des-
convulsões; oxigenioterapia é recomendada; a mete- tinadas especialmente à lâmina I do CPME e na subs-
moglobinemia é tratada com azul de metileno (1 a 2 tância gelatinosa (receptores µ, seguindo-se os recep-
ml/kg IV/5 min)8. tores δ e κ). Por via encefálica, modulam a liberação
de dopamina nos núcleos da base e atuam no tronco
Opióides encefálico (ligam-se a receptores opióides da subs-
tância periaquedutal mesencefálica e periventricular),
Os opióides são seguros e eficazes no tratamento ativam o sistema inibitório rostrocaudal que modula a
da dor aguda e crônica de qualquer natureza. Os opiói- aferência nociceptiva na medula espinhal, ligam-se a
des ligam-se a um ou mais de seus receptores ligados receptores no sistema límbico, onde modificam as rea-
à proteína G (µ, δ, κ, Σ, σ, orl1) nos tecidos (muscu- ções emocionais à dor, tornando-a mais tolerável, e no
latura lisa), no sistema nervoso periférico (SNP) sen- córtex cerebral, onde modificam os processamentos
sitivo ou neurovegetativo simpático, no SNC (CPME, cognitivos associados à dor. Os opiói­des atuam como
substância cinzenta da formação reticular do tronco citocinas regulando as funções de granulócitos como
encefálico, núcleo caudado, amígdala), monócitos, de monucleares; a α-endorfina e as encefalinas atuam
os linfócitos T e B e macrófagos (receptores µ, δ, κ); como hormônios endócrinos quando secretados na
muitos são silenciosos até serem ativados por substân- circulação sistêmica. Podem, portanto, influenciar a
cias inflamatórias. Os opióides reduzem a duração dos atividade dos tecidos periféricos envolvidos na defesa
potenciais de ação, diminuem o potencial excitatório e na imunidade. A ação opióide manifesta-se multissi-
pós-sináptico, inibem a adenilato-ciclase (receptor µ) napticamente e resulta em analgesia e em relaxamento
e reduzem o AMPc-neuronal, o que concorre para a muscular. Seus efeitos farmacológicos dependem da
redução da síntese de prostaglandinas e ocorrência de natureza das características dos receptores onde se li-
hiperalgesia. A estimulação dos receptores κ e δ resul- gam10 (Tabelas 73.3 e 73.4).
ta em hiperpolarização (efluxo de K+ via canais retifi- Ocorre redução da eficácia dos opióides em al-
cadores internos de K+) das membranas pós-sinápticas gumas condições neuropáticas, paralelamente ao au-
das terminações nervosas na medula espinhal e em re- mento da produção de CCK nos aferentes primários
dução da liberação de neurotransmissores excitatórios devido à degeneração dos aferentes C, à depleção dos
(substância P, colecistocinina), principalmente em de- receptores opióides pré-sinápticos e à transmissão da
corrência da inibição dos canais de Ca++ dependentes dor por vias nervosas periféricas calibrosas. Há menor
de voltagem (bloqueio do influxo de Ca++). A ação dos possibilidade de a morfina controlar a hiperatividade
neurotransmissores opióides nos receptores ligados à dos neurônios de segunda ordem após a ativação dos
proteína G inibitória resulta na formação de segundos receptores NMDA pelos aminoácidos excitatórios en-
mensageiros relacionados à adenilciclase. O receptor volvidos na sensibilização neuronal. A euforia parece
OP2 (κ1) está envolvido na modulação da dor visceral ser atribuída aos receptores µ e, talvez, aos receptores
ou química e na expressão da abstinência à morfina; δ. A disforia parece ser atribuída aos receptores Σ e
induz à analgesia espinhal, sedação, miose e inibição κ ou a um desbalanço entre os receptores µ e κ. No

Tabela 73.3 – Natureza e localização dos receptores opióides


Receptor Localização
µ Substância cinzenta periquedutal mesencefálica, estriado, córtex cerebral, habênula, tálamo, corno posterior da
substância cinzenta da medula espinhal
κ Substância cinzenta periquedutal mesencefálica, claustro, corno posterior da medula espinhal, hipotálamo
δ Corno posterior da substância cinzenta da medula espinhal

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Tabela 73.4 – Natureza do receptor opióide e efeitos relacionados à sua ativação


Efeito/ µ1 µ2, OP3, MOR δ1, δ2, OP1, κ1, OP2, KOR κ2 κ3 Sigma ε N/OFQ
receptor DOR
Analgesia Supra- Espinhal Espinhal mo- Espinhal Supra- -
espinhal dulação da espinhal
analgesia µ
Depressão ++ + Estimula
respiratória respiração
Atividade Hipertonia
muscular
Pupila Constrição Miose Dilatação
Motilidade ↓ ↓ -
gastrointes-
tinal
Espasmo- ++ - -
gênese da
musculatura
lisa
Imunossu- ++
presão
Endocrino- ↑ Prolactina ↑ GH ↑ GH
patia
Antidiurese Supra-
espinhal
Diurese ++
Apetite Supra-espi- Supra-espi- Supra-espi-
nhal nhal nhal
Sedação Supra-espi- Supra-espi- Supra-espi-
nhal nhal nhal
Comporta- Euforia Euforia ++ Disforia + Baixo poten- Disforia ++
mento cial de abuso Efeito psico-
mimético
Cardiocircu- ++ Estimula
latório efeito vaso-
motor
Dependência ++ + - ++
física
Hiperalgesia
Prurido ++
Tolerância/ +++
dependência
Náuseas e ++
vômitos

hipotálamo, reduzem a reação à estimulação aferente cleo de Edinger-Westphal em segmentos autonômi-


sistêmica e aos estressores e reduzem a temperatura cos do nervo oculomotor. A tolerância aos exercícios
corpórea agudamente e a elevam cronicamente. Em também se modifica. A naloxona altera a liberação
doses terapêuticas, diminuem discretamente a ativi- de muitos hormônios hipofisários, aumenta a libera-
dade dos hormônios hipofisários; em doses elevadas, ção do hormônio luteinizante e folículo estimulante
reduzem os hormônios luteinizante, folículo estimu- e reduz a liberação de prolactina e do hormônio de
lante, adrenocorticotrófico (ACTH) e β-endorfina por crescimento. A concentração do hormônio antidiuré-
mecanismos relacionados à redução da liberação de tico eleva-se com opióides e reduz-se com naloxona.
fatores de liberação hormonal do hipotálamo. A mio- A depressão respiratória deve-se à ação dos opióides
se é resultante do efeito em receptores µ e κ no nú- nos receptores µ, κ e Σ; reduzem tanto a velocidade

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73 – Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico

da ventilação como o volume corrente e, desse modo, exercem atividade agonista δ e κ. As diferenças entre
a ventilação/minuto. O efeito mais importante é a re- os opióides potentes são fundamentadas na afinidade
dução na resposta dos centros respiratórios bulbares pelos receptores, lipossolubilidade e nas meias-vidas
ao CO2. A dor, em parte, contrapõe-se à depressão plasmáticas.
respiratória causada pelos opióides. Quando a dose A morfina é o agente opióide de escolha. Sofre ex-
é titulada gradualmente, a depressão respiratória não tensa difusão rostral determinando analgesia e efei-
se manifesta. A depressão ocorre quando são realiza- tos colaterais intensos, em oposição aos fármacos
dos procedimentos analgésicos, sendo mantida a dose hidrofóbicos, como a fentanila e a sulfentanila, que
original dos medicamentos ou em doentes que apre- exercem atividade mais localizada. Sua principal via
sentam apnéia do sono, doença pulmonar obstrutiva de metabolização é a glicuronidação hepática. Seus
crônica ou obesidade mórbida ou após cirurgias ab- principais metabólitos são: a morfina 3-glicuronídeo
dominais, condições em que a respiração pela muscu- e a morfina 6-glicuronídeo (apresenta ação analgési-
latura intercostal pode ser necessária e torna-se com- ca significativa). A desmetilação é de 5%, resultando
prometida pelos opióides. A tosse pode ser deprimida em normorfina e em pequena porção de codeína, que
devido à sua ação direta do centro da tosse no bulbo. pode ser formada a partir do metabolismo normal da
Em doentes com asma podem precipitar crises de morfina. A glicuronidação raramente é comprometida
broncoespasmo decorrentes, talvez, da liberação de em casos de lesão hepática. A morfina é bem tolerada
histamina, da depressão respiratória e da redução da em doentes com hepatopatias; nessas eventualidades
umidificação das secreções. Os opióides geram náu- a meia-vida pode aumentar e a dose da morfina neces-
seas e vômitos por agirem diretamente na zona qui- sária deve ser espaçada para 3 a 4 vezes ao dia. É bem
miorreceptora do bulbo; o aumento do tônus dos es- tolerada em casos de lesão renal; entretanto a morfi-
fíncteres também contribui para o vômito. Em doses na 6-glicuronídeo pode acumular-se em doentes com
terapêuticas não alteram a função do miocárdio em insuficiência renal, resultando em efeito exagerado.
indivíduos sadios; em coronariopatias tratadas com Alodinia e hiperalgesia podem ocorrer quando morfi-
doses terapêuticas reduzem o consumo de oxigênio, o na, morfina-3-glicuronida, morfina-6-glicuronida ou
trabalho cardíaco, a pressão do ventrículo esquerdo e nor-morfina são administradas nos ventrículos ence-
a pressão diastólica10. fálicos de animais; a morfina-3-glicuronida é cente-
Para uso epidural a dose, em geral é 1/10 da sis- nas de vezes mais potente que a morfina em relação a
têmica; por via liquórica espinhal, deve ser 1/10 da esses efeitos10.
epidural; por via ventricular, 1/2 da via intratecal es- A meperidina (petidina) é opióide sintético que
pinhal9. Os opióides mais polares (morfina) alcançam apresenta 1/8 da potência da morfina. Apresenta pro-
amplas áreas na medula espinhal, razão pela qual priedades anestésicas locais, depressora do miocár-
apresentam latência e duração de efeitos mais prolon- dio, discreto efeito vagolítico e espasmogênico. Pro-
gados e, portanto, efeitos colaterais mais intensos e porciona efeito antimuscarínico, não causa constrição
diversos. Os opióides apolares (fentanila) apresentam, pupilar, não apresenta efeito béquico, é menos obs-
geralmente, características opostas (Tabela 73.5). tipante e causa menos espasmo da musculatura lisa
O tramadol é opióde sintético que atua nos recep- (trato biliar, esfíncter de Oddi), prurido, mais vômi-
tores opióides; a forma dextrógira é 20 vezes mais tos e hipotensão arterial do que a morfina. Aumenta
específica para os receptores µ. Aumenta a liberação a freqüência cardíaca. Muito pouco de meperidina é
de serotonina (5-HT) e inibe a recaptura de noradre- excretada sem alteração; meperidina é hidrolisada a
nalina (Nadr) e de 5-HT e a sensibilização dos recep- ácido peptidínico, que é parcialmente conjugado ou
tores NMDA no SNC. Apresenta potência analgésica n-desmetilado a nor-meperidina, que pode ser hidroli-
semelhante à da codeína. É convertido no fígado em sada a ácido norpetidínico e conjugado. Cerca de um
O-desmetil-tramadol, que é duas a quatro vezes mais terço da dose é identificado na urina como derivado
potente do que o tramadol. Biotransformações ulte- n-desmetilado. A normeperidina também pode sofrer
riores resultam em metabólitos inativos excretados hidrólise e transformar-se em ácido nor-meperidíni-
pelos rins, mas 30% da droga é excretada inalterada. co. Os metabólitos ácidos são inativos e podem ser
Não deve ser associado a inibidores de monoamino- eliminados inalterados ou conjugados na urina. Me-
xidase (IMAO). Sua meia-vida reduz-se de 33% a nos de 5% é excretada sem metabolização através da
50% quando combinado à carbamazepina e eleva-se urina. A administração prolongada resulta no acúmu-
de 20% a 25% quando associado à cimetidina10. lo de nor-meperidina, que estimula o SNC, gerando
Entre os agonistas opióides potentes puros in- tremores, mioclonias, agitação, convulsões e prurido,
cluem-se a morfina, a metadona, a fentanila, a sul- principalmente quando há insuficiência renal. O fe-
fentanila e a alfentanila; entre os agonistas parciais, nobabital e a clorpromazina aumentam a produção
a buprenorfina; e, entre os agonistas-antagonistas, a de normeperidina. Interage com IMAO causando
nalbufina. A morfina, a fentanila e a sulfentanila são síndrome serotoninérgica, que se traduz por aumento
agonistas µ plenos; a morfina e a sulfentanila também na concentração de 5-HT no encéfalo, condição que

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Tabela 73.5 – Principais agentes e características farmacodinâmicas e farmacocinéticas dos opióides utilizados
no Brasil
Nome farmacológico/receptor Dose
Agonistas fracos
Cloridrato de tramadol Espinhal 10-40 mg/dia
µ +; δ +; κ +
Nadr; 5-HT
Agonistas potentes
Cloridrato de morfina Epidural
µ+++; δ+; κ++ Bolo 2-5 mg (40-100 µg/kg)
Infusão 0,1-1 mg/kg (2-20 µg/kg)/h
Espinhal 0,1-1 mg (2-20 µg/kg)
ACP-epidural
Bolo 0,1 mg (2 µg/kg)
Infusão 0,4 mg/kg (8 µg/kg)/h
Lock out 10 min

Meperidina/petidina Epidural
µ++; δ+; κ+ Bolo 50-100 mg (1-2 mg/kg)
Infusão 10-20mg (0,2-0,4mg/kg)/h
Espinhal
Bolo 10-50 mg 0,2-1 mg (4-20 µg/kg)
Infusão 5-10 mg (0,1-0,2 mg/kg)/h

Metadona Epidural
µ+++ Bolo 1-5 mg (0,02-0,1 mg/kg)
Inibidor NMDA
Citrato de fentanila Espinhal
µ+++; δ+ 5-20 µg (0,1-0,4 µg/kg)

Cloridrato de alfentanila Epidural


µ+++; δ+; κ+ Bolo 500-1.000 µg (10-20 µg/kg)
Infusão 100-250 µg (2-5 µg/kg)/h
Citrato de sufentanila Epidural
µ+++; δ+; κ1+ Bolo 10-50 µg (0,2-1 µg/kg)
Infusão 5-30µg (0,1-0,6 µg/kg)/h
Espinhal 0,02-0,08 µg

Agonistas parciais
Cloridrato de buprenorfina Epidural 0,15-0,30 mg
Agonista parcial µ+++
Antagonista κ1 ++
Agonistas-antagonistas
Cloridrato de nalbufina Epidural 2-5 mg (40-100 µg/kg)
Agonista κ++ Espinhal 1 mg (4-20 µg/kg)
Antagonista µ+
Antagonistas
Naloxona Reversão dos efeitos adversos dos morfínicos
κ IV/IM/SC 0,1-0,8 mg (1-5 µg/kg)
Antagonista µ+++; δ++; κ1++, κ3++ IV infusão 50-250 µg (1-5 µg/kg)/h
Depressão respiratória
IV/IM/SC 0,1-2 mg (10-100 µg/kg) 2-3/2-3 min até 10 mg
Naltrexona
Antagonista µ++; δ+; κ1+++; κ3++

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73 – Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico

pode ser fatal. A meperidina causa taquicardia e redu- Admite-se que a dose, a concentração plasmática e a
ção da contratilidade miocárdica e midríase (outros magnitude da analgesia e dos efeitos colaterais deter-
opióides causam miose)9. minadas pela fentanila ou sulfentanila por via peridu-
A metadona é agonista µ e bloqueador dos canais ral continuadamante sejam semelhantes às observa-
de NMDA e da recaptação de 5-HT eficaz no trata- das após administração IV; as atividades analgésicas
mento da dor neuropática e nociceptiva. Sua forma podem ser sistêmicas e ocorrer no encéfalo.
levógera é responsável por quase todos os seus efeitos A buprenorfina é opióide semi-sintético agonista
analgésicos; apresenta pouca afinidade pelo receptor parcial derivado da tebaína. É altamente lipofílica e
NMDA e mais afinidade pelo receptor µ. Sua forma agonista parcial µ, agonista δ e antagonista κ, 30 ve-
dextrógera é ativa nos receptores NMDA e apresenta zes mais potente que a morfina por via IM. A disso-
pouca afinidade pelo receptor µ, com efeito béquico. ciação lenta dos receptores µ é responsável pela anal-
Não demonstra metabólitos ativos. Liga-se à albumi- gesia prolongada, pela dificuldade da reversão dos
na e a outras proteínas plasmáticas e tissulares (60% seus efeitos pelos antagonistas opióides µ e δ, e pela
a 90%), o que explica seus efeitos cumulativos e a possibilidade de induzir à dependência física. Apesar
prolongada meia-vida plasmática. O nível plasmático de ser agonista parcial, a afinidade ao receptor µ é ex-
estabiliza-se em 2 a 3 semanas. A biotransformação tremamente elevada (50 vezes superior à da morfina).
ocorre no fígado e gera metabólitos inativos. Existem A ligação da buprenorfina às proteínas plasmáticas é
poucos estudos sobre a eficácia e segurança de admi- de 96%. Inibidores de proteases (ritonavir, indinavir,
nistração por via intratecal em longo prazo10. saquinavir) e metadona podem acarretar acúmulo de
O citrato de fentanila é potente agonista µ. Geral- buprenorfina que é n-desalquilada pela CYB3A3/4.
mente é utilizado durante procedimentos anestésicos. Em doses baixas, a buprenorfina e a morfina são adi-
É 75 a 125 vezes mais potente do que a morfina; apre- tivos em seus efeitos, mas, em doses elevadas, pode
senta rápido início de ação e efeito de duração curta. ocorrer antagonismo. O uso concomitante de fenta-
É empregado no tratamento da dor aguda e para anal- nila produz analgesia satisfatória e prolongada, com
gesia prolongada em regime ambulatorial ou hospi- pouca possibilidade de depressão respiratória. Causa
talar em doentes com câncer9 via bombas de infusão mais sedação e menos euforia, náuseas e vômitos e
ou cateteres peridurais. A lipossolubilidade elevada menos alentecimento do trânsito intestinal do que a
possibilita uma analgesia segmentar satisfatória por morfina. Não aumenta a pressão na árvore biliar e
ligar-se aos lipídeos do compartimento epidural. nos ductos pancreáticos. Pode induzir à síndrome de
O cloridrato de alfentanila é menos potente do que abstinência quando administrada a doentes sob uso
a fentanila. Apresenta início de ação rápido, curta du- prolongado de morfina. Pode alterar discretamente a
ração de efeito e metade da meia-vida da fentanila. É freqüência cardíaca, a pressão arterial, o volume cir-
utilizado por via intratecal ou epidural no tratamento culatório e o débito cardíaco10.
prolongado da dor em doentes com câncer ou com in- A nalbufina é opióide sintético, agonista-antago-
suficiência renal e que se tornam agitados com outros nista, com ação antagonista nos receptores µ e ago-
agentes. A alfentanila administrada por via epidural nista nos receptores κ. Reverte a depressão respirató-
exerce atividade após ser captada sistemicamente ria e reduz o prurido causado por agonistas µ. Causa
pelo plasma e redistribuída para o encéfalo. Não há, menos efeitos colaterais nos aparelhos digestivo gas-
portanto, fundamento para a utilização da droga por trointestinal e respiratório que a morfina10.
via epidural. Por via intratecal, sua ação instala-se ra- Os opióides são metabolizados no fígado e ex-
pidamente mas a duração de efeito é curta. A vida é cretados pelo rim e fígado. Devem ser usados com
intermediária entre a da alfentanila e a da sulfentanila; cautela, e a dose inicial deve ser reduzida em idosos,
prolonga-se à medida que a concentração plasmática debilitados, hepatopatas, nefropatas, em doentes com
eleva-se. Causa menos sedação do que a meperidina afecções tireóideas, supra-renais, abdominais agudas,
e a fentanila. Não causa prurido10. hipertrofia prostática, estenose uretral, hipertensão
O citrato de sulfentanila é duas a cinco vezes mais intracraniana e arritmias cardíacas. Cuidado especial
potente que a morfina por via epidural ou intratecal. é necessário em doentes com crises agudas de asma,
Por via epidural ou intratecal, proporciona analgesia doença pulmonar obstrutiva, diminuição da reserva
segmentar. Pode produzir bradicardia por estimulação respiratória, hipóxia, hipercapnia, tratamento conco-
do núcleo vagal no bulbo. Não causa prurido. Causa mitante com sedativos, narcóticos ou condições que
menos edema periférico que a morfina; doses elevadas predisponham à depressão respiratória. A hipotensão
desse fármaco por via intratecal (7,5 mg/kg) podem arterial (redução da resistência vascular periférica)
gerar agitação, rigidez, vocalização e fraqueza nos limita o seu uso em doentes hipovolêmicos ou com
membros e neuropatias (espondilose, cromatólise)1. tendência à hipotensão arterial ou com hipotensão
É útil na analgesia do parto, pois sua ação é espinhal; decorrente do uso de fenotiazinas ou anestésicos. O
a potência analgésica é inferior quando usada por via comprometimento das funções mentais pode interfe-
IV devido à reduzida biodisponibilidade espinhal. rir no desempenho durante a execução de tarefas que

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

exijam atenção. Cruzam a placenta e são excretados pinhal µ e causado por liberação de histamina, PG, sP,
no leite, podendo causar dependência física na crian- peptídeos, opióides, 5-HT, interleucinas), urticária,
ça que está sendo gerada ou amamentada. Doentes urticária hemorrágica e outras erupções são comuns
com insuficiência renal ou hepática ou que recebam com a via espinhal (especialmente em gestantes), pi-
doses elevadas de opióides podem apresentar convul- loereção, rubor facial e diaforese são manifestações
sões e mioclonias10. cutâneas comuns; palpitações, arritmias cardíacas,
Potencializam os efeitos depressores no SNC e nos bradicardia e hipotensão arterial (liberação de his-
aparelhos cardiocirculatório e respiratório dos sedati- tamina, vasodilatação em arteríolas periféricas e em
vos, álcool, anestésicos voláteis, neurolépticos, anti- veias) e choque hipovolêmico (estimulação ou de-
depressivos tricíclicos, anti-histamínicos, barbitúricos, pressão de várias estruturas no SNC envolvidas na re-
benzodiazepínicos, IMAO, clonidina e similares, em gulação cardiovascular) são complicações cardiocir-
particular nos doentes idosos. Os níveis plasmáticos e culatórias dependentes da dose e que constituem risco
os efeitos farmacológicos dos opióides são aumenta- para uso em doentes com cor pulmonale ou edema
dos com antidepressivos (fluoxetina) e cimetidina (ini- pulmonar; aumento do tônus e da amplitude da con-
bidores do citocromo P-450) e diminuídos com feni- tração do ureter, urgência urinária (aumento do tono
toína e rifampicina (indutores do citocromo P-450). O da musculatura detrusora da bexiga), retenção uriná-
clareamento é acelerado por alcalinizantes urinários, ria e redução da libido e da potência sexual (redução
havendo risco de síndrome de abstinência. A associa- da contração uterina e prolongamento do trabalho de
ção de opióides com adrenalina no compartimento parto) são as complicações urológicas mais comuns;
intratecal ou peridural pode resultar em aumento dos alterações da imunidade (comprometimento dos ele-
efeitos colaterais, como náuseas. São desaconselhadas mentos imunocompetentes celulares e humorais, di-
as associações de agonistas com os agonistas-antago- ferenciação das células-tronco pluripotentes da linha-
nistas (nalbufina) ou agonistas parciais (buprenorfina) gem mielóide e linfóide, bloqueio da proliferação dos
devido ao desencadeamento de sintomas de retirada e timócitos em resposta à interleucina-2 ou a mitógenos
de reversão parcial da analgesia10. através de células T), aumento da ocorrência de lin-
Sonolência, sedação, desorientação, euforia, disfo- fadenopatias, complicações infecciosas (aumento de
ria, delírios, tonturas, sensação de fraqueza, cefaléia, expressão por imunodeficiência a vírus), progressão
insônia, agitação, desmaios, síncopes, convulsões de doenças oncológicas, reativação do herpes simples
(meperidina), rigidez muscular (morfina, metadona, podem ocorrer após administração epidural ou espi-
propoxifeno), incluindo a da parede torácica (ação nhal da morfina; obstrução nasal, bocejos, laringoes-
na substância negra ou estriado), miose (ativação do pasmo, depressão respiratória (depressão respiratória
núcleo de Edinger-Westphal), mialgia, borramento é incomum em doentes que fazem uso prolongado de
visual, lacrimejamento e anorexia são as principais morfina mas pode manifestar-se em doentes virgens
complicações neurológicas do uso de opióides; xeros- de tratamento), apnéia e broncoespasmo são compli-
tomia, aumento do tono da musculatura lisa, depressão cações respiratórias com seu uso (a depressão respi-
da motilidade gastrointestinal (redução da peristalse ratória sucede o comprometimento do alerta; coma,
longitudinal das contrações segmentares não propul- parada cardíaca e morte são raros; trombocitopenia,
sivas, aumento do tono esfincteriano), prolongamen- síndrome de secreção inadequada do hormônio an-
to do tempo de esvaziamento gástrico (comprometi- tidiurético, edema e acidose metabólica e respirató-
mento da absorção das medicações administradas por ria são outras complicações possíveis de seu uso. Os
VO e aumento do risco de refluxo esofágico), redução opióides, em doses analgésicas, adequadamente titu-
da secreção do ácido clorídrico e da secreção biliar e lados, não alteram as funções psicomotoras. O fenô-
pancreática, redução da propulsão no intestino delga- meno de tolerância pode ocorrer em qualquer doente
do, especialmente do duodeno e com maior intensida- que faz uso de medicação opióide durante mais de 2
de em relação ao íleo, aumento da absorção de água e semanas; depende do fármaco, da dose, da freqüência
da viscosidade do quimo (devido ao período prolon- e da via de administração. A via espinhal predispõe
gado de permanência no intestino delgado), obstipa- mais ao desenvolvimento precoce de tolerância. A to-
ção intestinal (redução das contrações propulsoras no lerância à analgesia desenvolve-se mais lentamente
cólon por ação no SNC e no trato gastrointestinal), em indivíduos que usam ACP que a infusão contínua;
espasmos e aumento da pressão no trato biliar (devi- deve-se à distribuição da droga, modificações na ve-
do à constrição ou ao espasmo do esfíncter de Oddi) locidade do metabolismo resultantes da indução en-
condição mais comum e mais intensa com fentani- zimática, alterações farmacodinâmicas (alterações na
la, seguindo-se a meperidina e a morfina, e que pode densidade de receptores ou nos números relativos de
persistir durante 2 a 12h, náuseas, vômitos (ativação vários receptores), ação em receptores NMDA, δ, κ e
da área postrema) e cólicas abdominais são suas prin- de NO. O uso prolongado de opióides pode implicar
cipais complicações gastroenterológicas; prurido, ge- necessidade de aumento discreto e lento da dose em
ralmente na região dorsal (mediado pelo receptor es- muitos casos. Em alguns doentes, durante prolonga-

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73 – Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico

dos períodos não há necessidade do aumento de dose freqüência respiratória é inferior a oito por minuto e
e, freqüentemente, esta pode ser reduzida ou suspen- o doente é facilmente despertado e as próximas doses
sa. Muitas vezes, o aumento da dose é justificado pela devem ser suspensas ou reduzidas; quando a freqüên-
progressão da doença e não pela instalação de tole- cia respiratória é inferior a oito por minuto e o doente
rância. Dependência física (suspensão da medicação desperta com dificuldade ou está inconsciente e/ou
causa bocejos, lacrimejamento, espirros, agitação, cianótico, a naloxona deve ser administrada na dose
tremor, insônia, febre, taquicardia e hiperatividade de 0,1 a 2mg (10 a 100 µg/kg) / 2 a 3 min até 10 mg
neurovegetativa simpática) é comum. A dependência por via IV. Como sua meia-vida é curta (30 a 45 min),
psíquica (comportamento caracterizado por uso com- doses repetidas freqüentemente são necessárias.
pulsivo da medicação, uso da medicação para outros Após realização de procedimentos destinados ao
fins que o alívio da dor, apesar das conseqüências ad- tratamento da dor, é recomendável redução de 25%
versas e preocupação com a aquisição das drogas) é ou mais da dose prévia, pois é a dor que contribui
rara (2% a 18% dos casos em doentes que os utilizam para estimular a respiração nos doentes que fazem uso
para tratamento da dor). Os efeitos adversos manifes- de opióides. A naloxona também reverte o prurido, a
tam-se mais freqüentemente em doentes virgens de retenção urinária, as náuseas, os vômitos, o espasmo
tratamento. Após realização de procedimentos des- das vias biliares, a obstipação (por VO), a sedação,
tinados ao tratamento da dor, é recomendável redu- a hipotensão arterial e a vasodilatação causada pe-
ção de 25% ou mais da dose prévia, pois é a dor que los agonistas opióides e os efeitos psicomiméticos e
contribui para estimular a respiração nos doentes que disfóricos dos agonistas-antagonistas (nalbufina) sem
fazem uso de opióides. Os efeitos colaterais do uso reverter a analgesia da morfina administrada por via
da via espinhal são representados por retenção uriná- intra-espinhal. Não reverte a depressão respiratória
ria, obstipação, tonturas, prurido, náuseas e vômitos, causada pela buprenorfina. É adjuvante no tratamento
confusão mental, depressão respiratória e tolerância; da superdosagem de clonidina. A reversão dos efeitos
são geralmente temporários e minimizam-se com o colaterais dos opióides pode induzir à recorrência da
passar das primeiras semanas. A maioria das doentes dor e sintomas de retirada em doentes com dependên-
apresenta hipogonadismo hipogonotrófico; ocorre hi- cia física. Pode precipitar convulsões, especialmente
pocorticismo central em 15% dos casos e deficiência durante o tratamento com meperidina. A injeção rápi-
de hormônio de crescimento em 15%. Edema perifé- da pode causar náuseas, vômitos, taquicardia, hiper-
rico diaforese também é comum10. tensão arterial, edema pulmonar e/ou arritmia cardía-
A obstipação intestinal é tratada com laxantes (so- ca que são prevenidos quando é administrada em 2 a 3
luções salinas de sulfato de magnésio, leite de mag- min. Não exerce atividade farmacológica na ausência
nésia ou enema de fosfato de sódio, osmóticos como de opióides. A naltrexona é duas vezes mais poten-
lactulose ou glicerina, estimulantes do peristaltismo te do que a naloxona em indivíduos dependentes de
como fenolftaleína, bisacodil, antracenos, óleo de morfina; a duração de sua ação é de aproximadamente
rícino ou docusato, lubrificantes como óleo mineral, 24 h. Aumenta a letargia e a sonolência em doentes
formadores de massa como fibras de metilcelulose, tratados com fenotiazinas. Seu uso em gestantes deve
mucilóide, farelo, aumento da ingestão de líquidos, ser cauteloso; exerce efeito embriocida em animais.
cisaprida, e uso VO de naloxona. As náuseas e os vô- Durante sua administração, a pressão arterial necessi-
mitos são controlados com hidroxizina, haloperidol, ta ser monitorada. A dose deve ser reduzida em idosos,
proclorperazina, metoclopramida, escopolamina etc. hipovolêmicos, e em doentes com infarto agudo do
O aumento da pressão no trato biliar pode ser alivia- miocárdio, angina instável, hipertensão intracraniana
do com o uso de naloxona, relaxantes da musculatura ou que estejam usando outros sedativos ou narcóti-
lisa (nitroglicerina 0,6 mg SL) ou nitrato de amila. cos. Reversão da analgesia e aumento da atividade
O prurido é tratado com anti-histamínicos (difenidra- do sistema nervoso simpático na dependência da dose
mina) e antagonistas opióides (naloxona, nalbufina). e da velocidade da injeção (taquicardia, hiper ou hi-
A retenção urinária é tratada com a redução da dose, potensão arterial, edema pulmonar, arritmias cardía­
manobras de esvaziamento vesical, sondagem vesi- cas), náuseas, vômitos, diaforese e síndrome de reti-
cal, betanecol e/ou naloxona. A confusão mental pode rada (em doentes sob tratamento com opióides) são
ser controlada com a redução da dose. Em doentes adversidades do seu uso. A tolerância é um fenômeno
que apresentam hiperexcitabilidade induzida por opi- natural compensado com a elevação gradual da dose
óides, a metadona é o agente de escolha. A sonolência e da freqüência de administração. Doses mais eleva-
é tratada com a redução da dose e a administração, de das, muitas vezes, significam progressão da doença
metilfenidato ou naloxona. A hipotensão arterial pode ou instalação de afecções associadas mais que mani-
ser tratada com a infusão IV de fluidos e, quando ne- festação de tolerância propriamente dita. Para reduzir
cessário, com agonistas α-adrenérgicos. A depressão essa possibilidade, recomenda-se o uso associado de
respiratória implica necessidade da suspensão da me- medicações adjuvantes (AINE, antidepressivos) e ou-
dicação e instituição de vigilância intensiva quando a tras modalidades analgésicas. Em caso de síndrome

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

de retirada, os antagonistas (naloxona, naltrexona) do efeito é de 3 a 4 h12. A sedação observada após


devem ser evitados, os agonistas opióides e os benzo- o uso de clonidina epidural traduz a sua ação sistê-
diazepínicos devem ser administrados e o tratamen- mica; há correlação entre a concentração do fárma-
to da abstinência, instituído. Para a prevenção dessa co no LCR e a analgesia. A neostigmina potencia a
síndrome, a dose do agente deve ser reduzida lenta- ação da clonidina. Segundo Molloy1, Eisenach et al.,
mente (25% a cada 2 ou 3 dias) até sua suspensão em 1995, realizaram estudo duplo-cego randomizado
completa e agonistas adrenérgicos α-2 (clonidina) envolvendo 85 doentes e observaram que a adminis-
prescritos. Em casos de intoxicação, é recomendada tração epidural de clonidina proporcionou redução de
a descontinuação ou a redução da medicação, assis- 56% da dor neuropática em relação à redução de 5%
tência ventilatória e cardiocirculatória, administração proporcionada por placebo. O sítio de administração
de naloxona (0,4 a 2 mg IV a cada 2 ou 3 min; dose é determinante no aparecimento ou na magnitude dos
máxima de 10 a 20 mg), correção das anormalida- efeitos colaterais: a hipotensão arterial decorrente da
des hidroeletrolíticas, proteção das vias áreas contra administração de clonidina por via epidural é mais in-
vômitos, indução de vômitos com xarope de ipeca, tensa após a injeção na região torácica rostral que na
ingestão de água, lavagem gástrica e administração torácica caudal ou lombar.
de carvão ativado (quando houver ingestão da me- A tizanidina é agonista adrenérgico α-2, que, por
dicação). Como o efeito da metadona é prolongado via intratecal, reverte a alodinia e a hiperpatia resul-
(36 a 48 h), repetidas doses de naloxona (durante 1 a tantes de neuropatias. Exerce moderado efeito mior-
3 h) podem ser necessárias. A depressão respiratória relaxante. Potencializa a ação de outros anticolinérgi-
causada pela buprenorfina não cede com a naloxona, cos e antagoniza a ação de alguns anti-hipertensivos
mas sim com o doxapram (0,5 a 1,5 mg/kg IV, a cada (alfa-metildopa, guanetidina).
5 min; dose máxima de 2 mg/kg). As complicações
devidas à associação com IMAO podem ser tratadas
com hidrocortisona IV e clorpromazina IV (para con-
Bloqueadores NMDA
trole da hipertensão arterial). Em caso de síndrome A cetamina na forma racêmica ou na forma S é
de abstinência à buprenorfina, devem-se administrar anestésico dissociativo que atua como antagonista não
agonistas opióides e benzodiazepínicos10. competitivo do receptor NMDA ao bloquear a fenci-
clidina, sítio de ação dos aminoácidos excitatórios e
Agonistas Adrenérgicos dos neuropeptídeos; exerce potente efeito na alodinia
em casos de dor neuropática. Proporciona aumento da
A clonidina e a tizanidina apresentam perfil favo- pressão arterial e da freqüência cardíaca, mas a respi-
rável de eficácia e toxicologia em doentes com câncer ração não é afetada, mesmo em doses anestésicas. Sua
e com dor não resultante do câncer9,11. aplicação é limitada devido a seus efeitos colaterais
A clonidina potencializa os efeitos dos opióides e que incluem anormalidades motoras (fraqueza) e hipo-
dos anestésicos locais; atua pré e pós-sinapticamente tensão arterial. A longo prazo podem ocorrer compli-
(predomina nos pós-sinápticos) em receptores aco- cações, incluindo hepatopatia, úlcera gástrica e déficit
plados aos canais de K+, resultando em aumento da de memória. Os efeitos adversos parecem ser menos
condutância extracelular do K+ e induzindo à estabili- expressivos em crianças. O diazepam por via IV é in-
dade neuronal. Ativa o efluxo de K+ via canais inter- dicado em casos de excitação exagerada. A segurança
nos retificadores de K+ e canais operados de K+ e Ca++ de seu uso em longo prazo não foi estabelecida.
(hiperpolarização neuronal, bloqueio da deflagração
de potenciais), suprime o influxo de Ca++ via canais Agonistas do Ácido Gama-aminobutírico
de Ca++ dependentes de voltagem (diminuição da li-
beração de neurotransmissores (NT) e ativa o sistema
(GABA)
inibitório medular colinérgico e a liberação de NO. O baclofeno é agonista do receptor GABA-B pré-
Há um subtipo a e um b de receptores adrenérgicos sináptico acoplado positivamente à condutância ao K+
α-2 em neurônios do CPME; o receptor α-2-a é o res- ou negativamente a condutância ao Ca++, reduzindo a
ponsável pelas propriedades analgésicas da clonidina. liberação de neurotransmissores excitatórios mais in-
A clonidina é altamente lipossolúvel; administrada no tensamente nas terminações das fibras C que nas das
compartimento subaracnóideo, exerce efeito analgé- Aδ. O tratamento da espasticidade por via intratecal
sico intenso e mais seletivo que no compartimento pode ser realizado com doses 100 vezes inferiores
epidural. Após administração epidural (bolo de 150 àquela por via oral. O início da ação geralmente ocor-
a 500 µg; contínua de 10 a 40 µg ou de 0,2 a 0,8 µg/ re entre 30 min e 1 h após a administração em bolo,
kg/h), ocorre rápida transferência do fármaco para a e o espasmo é eliminado 4 h após. Há melhora 6 a 8
corrente sangüínea, onde há pico no sangue arterial h após a infusão contínua. Após período de teste, em
em 10 min e, no venoso, em 30 a 45 min. A dose em que 25 a 50 µg de baclofeno são administrados ini-
bolo por via intratecal é de 5 a 150 µg, e a duração cialmente por via intratecal espinhal, doses crescen-

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tes de 25 µg podem ser ulilizadas até haver melhora, 2 mg ou 0,02 mg/kg < 0,5 mg por minuto a cada 5 a
durando 4 a 8. O doente deve ser supervisionado con- 10 min por via IV) pode melhorar os efeitos adversos
tinuadamente quanto à função respiratória e a ressus- centrais, especialmente a sonolência e a depressão
citação pode ser necessária na fase de testes. Quando respiratória, mas pode causar convulsões e bradicar-
a eficácia é superior a 12 h, deve ser mantida a mes- dia. Doses repetidas de 1 mg podem ser administra-
ma dosagem do período de teste; quando inferior, a das a cada 50 e 60 min.
dose do período deve ser duplicada e distribuída ao O midazolam é agonista do complexo do receptor
longo de 24 h. O aumento geralmente necessário em GABA-A; despolariza os aferentes primários em con-
casos de espasticidade de origem espinhal é de 10% seqüência do aumento da condutância de Cl–, que re-
a 30% e de 5% a 15% em casos de espasticidade de sulta em redução na liberação de neurotransmissores
origem encefálica. Na maioria das vezes, a dose de excitatórios, hiperpolarização e redução da excitabi-
manutenção varia de 300 a 800 µg ao dia (< 2.000µg/ lidade neuronal. Bloqueia a neurotransmissão por vá-
dia). A dose média é de 276 µg durante os primeiros rios mecanismos, incluindo-se a inibição de canais de
12 meses e de 307 µg durante os primeiros 24 me- Ca++. A ativação dos receptores benzodiazepínicos al-
ses em casos de espasticidade de origem espinhal (< tera os efeitos da Nadr, 5-HT, dopamina e do GABA.
1.400 µg/dia). Doentes com idade inferior a 12 anos Pode ser usado por via intratecal no tratamento da dor
necessitam de doses médias de 274 µg/dia (< 1.199 em geral, incluindo lombalgia, e da espasticidade. A
µg/dia). A distribuição no volume é de 22 a 157 ml de analgesia depende do aumento da atividade opióide
LCR; a dose contínua diária de 50 a 1.200 µg asso- nos receptores NMDA e, menos intensamente, dos
cia-se a concentrações de 130 a 1.240 ng/ml no LCR receptores benzodiazepínicos. A administração intra-
lombar; a concentração é 1 de 8,7 na região lombar craniana não promove analgesia, abole a hipoalgesia
para 1 na cisternal. As concentrações são estáveis no e antagoniza o efeito antinociceptivo da morfina de-
LCR 1 a 2 dias após as concentrações plasmáticas vido à ativação de receptores GABA-A e NMDA. É
não excederem 5 nanogramas/ml. A meia-vida de eli- possível que o uso prolongado de benzodiazepínicos
minação após administração intratecal de 5 a 150 µg altere a atividade serotoninérgica e a função dos re-
varia de 1 a 5 h; a depuração no LCR é de 30 ml/h. ceptores benzodiazepínicos. O midazolam apresenta
A melhora do espasmo pode associar-se à melhora da meia-vida curta (< 6 h). Induz à sedação relacionada
dor. Cerca de 5% dos doentes tornam-se refratários a à dose. É metabolizado e eliminado pelos rins e fí-
doses crescentes; a sensibilidade pode ser restaurada gado. Deve ser usado com cautela em doentes com
em 10 a 14 dias com o uso intratecal. Pode causar glaucoma de ângulo fechado, em idosos ou quando os
sonolência, hipotensão arterial, hipotomia, náuseas, doentes fazem uso de outras medicações depressoras
vômitos, obstipação, xerostomia, diarréia, redução do do SNC. Doentes com insuficiência respiratória crô-
apetite, sialorréia, dispnéia, bradipnéia, pneumonia, nica são muito sensíveis (sedação e hipoventilação) à
incontinência ou retenção urinária, disfunção sexual, ação dos diazepínicos. Os efeitos depressores sobre o
urticária, prurido, edema facial ou periférico, dor, fe- SNC e circulatórios são potencializados pelo álcool,
bre, tremores etc. O baclofeno não deve ser suspenso opióides, sedativos, barbituratos, fenotiazinas, IMAO
abruptamente para evitar a síndrome de retirada (hi- e agentes anestésicos voláteis. São contra-indicados
peratividade, espasmos, aumento da rigidez, altera- em casos de hipersensibilidade aos diazepínicos. En-
ções neurovegetativas, hipertermia, confusão mental, tre suas principais reações adversas de seu uso citam-
alucinações, síndromes psicóticas, maníacas ou para- se: síndrome vago-vagal, hiper ou hipotensão arterial,
nóides, convulsões). Não é recomendada associação bradi ou taquicardia, complexos prematuros ventricu-
com outros produtos por via intratecal. Há mais seda- lares, sedação, tontura, fraqueza, depressão, agitação,
ção quando associado a outras drogas que atuam no amnésia, euforia, histeria, psicose, delírios, movi-
SNC (antidepressivos tricíclicos). Aumenta o efeito mentos tônico-clônicos, agitação psíquica, modifica-
dos anti-hipertensivos; na vigência da L-DOPA, au- ções do apetite, borramento visual, erupção cutânea,
menta a possibilidade de confusão mental, alucina- urticária, prurido, broncoespasmo, laringospasmo,
ções e agitação. Não causa irritação ou inflamação apnéia, hipoventilação, salivação, sensação de sabor
no compartimento liquórico. Em caso de intoxicação ácido na boca, depressão respiratória, apnéia, hipo-
podem ocorrer fraqueza muscular, sonolência, ton- tensão arterial, confusão mental, convulsões e coma.
turas, sensação de mal-estar, perda da consciência, Os efeitos adversos são mais intensos em idosos e
convulsões, dispnéia, sialorréia ou coma. Não existe em encefalopatas. Havendo intoxicação, a medicação
antídoto específico; o baclofeno deve ser removido da deve ser descontinuada ou a dose reduzida, o suporte
câmara e a bomba, quando eletrônica, desligada. De- circulatório e ventilatório instituído e a reversão do
vem-se também remover 30 a 40 ml de LCR. Quando efeito farmacológico induzida com flumazenil (0,2 a
necessária, a ventilação artificial deve ser instituída, 2 mg IV); a hemodiálise não é útil. Havendo síndro-
e a função cardiocirculatória, preservada. Havendo me de abstinência, a hiperatividade pode ser contro-
convulsões, administrar diazepam. Fisiosignina (1 a lada com barbituratos8.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Calcitonina gesia pode ser considerada multimodal quando os fár-


macos atuam em sítios semelhantes por mecanismos
A calcitonina é secretada principalmente pelas diferentes (opióides e AL) ou em sítios diferentes e
célu­las C da tireóide; exerce ação oposta à do hormô- intensidades diferentes (opióides pré-sinapticamente
nio paratireóideo (reduz o nível sérico de cálcio, inibe e agonistas adrenérgicos α2 pós-sinapticamente). Há
a atividade dos osteoclastos) e causa analgesia não interação importante entre opióides e AL ou agonis-
antagonizada pela naloxona ao ativar vias monoami- tas adrenérgicos α 2; AL e agonistas adrenérgicos α 2;
nérgicas e o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (efeito agonistas GABA (GABA-B), AL ou opióides; corti-
antiinflamatório periférico mediado pelo ACTH, libe- costeróides e AL e/ou opióides; a administração peri-
ração de β-endorfina). Os efeitos colaterais observa- dural conjunta de bupivacaína a 0,1% ou 0,05% e fen-
dos são náuseas, vômitos aumento da diurese. tanila a 0,0005% a 0,00025% com a técnica de ACP
é comum13. O mérito da combinação de drogas para
Somatostatina infusão intratecal prolongada é sustentado por estudos
de casos isolados; há pouca informação sobre seu uso
É um tetradecapeptídeo presente em vários órgãos
em longo prazo quanto à segurança, eficácia, compa-
que inibe a liberação do hormônio do crescimento
tibilidade com o dispositivo implantado, estabilidade
na hipófise. Por via espinhal liga-se a seus recepto-
das drogas, efeitos do pH e dos diluentes11. Segundo
res específicos na medula espinhal e inibe neurônios
o inquérito retrospectivo de Dalm et al.14 envolven-
nociceptivos. Induz à analgesia mesmo quando há to-
do 413 médicos atuando predominantemente nos
lerância a opióides; a analgesia não é revertida pela
Estados Unidos da América, foram tratados 13.342
naloxona. É neurotóxica8.
doentes com dor com sistemas implantáveis. A mor-
fina foi utilizada unicamente por 62% dos doentes, a
Corticosteróides hidromorfona foi a principal alternativa à morfina e
Os corticosteróides metilprednisolona, trianci- a bupivacaína foi o anestésico local mais freqüente-
nolona, betametasona ou dexametasona podem ser mente combinado à morfina, ou à hidromorfona. Ou-
administrados com finalidade antiinflamatória por tros regimes combinaram morfina com bupivacaína
via peridural ou intratecal. Exercem atividade anal- (68% dos que responderam), hidromorfona com bu-
gésica indireta porque bloqueiam enzimas e a produ- pivacaína (58% dos que responderam) ou morfina e
ção de vários mediadores pró-inflamatórios, inibem clonidina (55% dos que responderam). Somente 7%
a atividade da fosfolipase A2 (PLA2) e, portanto, a dos doentes haviam sido tratados com outros agen-
geração de substâncias hiperalgesiantes (PG, LT e tes, como fentanila, sulfentanila, baclofeno ou com-
Tx derivadas do ácido araquidônico), interferem na binações. Em caso de resultado insatisfatório, 42%
atividade das citocinas IL-1,2,3,6 e 8, do TNF-α e dos que responderam titulariam a mesma droga, 32%
do interferon-δ, que acarretam intensa hiperalgesia, usariam outro agente ou combinariam outros agentes
estabilizam as membranas e bloqueiam as descargas para tratar a dor inadequadamente controlada ou com
ectópicas nos neuromas, reduzem o edema, a deposi- os efeitos adversos inapropriados e 2% a 24% modi-
ção da fibrina, a migração leucocitária, a atividade fa- ficariam a dose e adicionariam nova droga. Na obser-
gocitária, a proliferação de fibroblastos e a deposição vação de Hassenbusch e Portenoy15, 38% dos doentes
de colágeno. A metilprednisona (80 a 120 mg/10 ml inicialmente tratados com morfina receberam drogas
de soro fisiológico ou AL), a cada 15 dias, é o agente diferentes da morfina (80% devido à falta de eficácia
dessa classe mais utilizado por via epidural8. e 20% a efeitos adversos). Os critérios utilizados para
avaliar a eficácia dos procedimentos são muito varia-
dos; alguns ensaios apenas quantificam a dor, enquan-
Possibilidades Futuras to outros, também a qualidade de vida dos doentes.
A zicolotida, ou SNX111, é antagonista dos canais Na Tabela 73.6 são apresentados os principais fár-
de cálcio dependentes de voltagem do tipo N, a neo- macos utilizados por via espinhal, suas doses habi­
estignina, inibe a colinesterase e a Aspirina®, a sínte- tuais e principais características.
se de prostaglandina9. Todas potencialmente são úteis
por via espinhal no tratamento da dor. DOR NÃO RELACIONADA AO CÂNCER
Segundo Molloy1, Winkelmuller e Winkelmuller,
Combinação de Fármacos em 1996, avaliaram restrospectivamente 120 doentes
Em muitas circunstâncias, o sinergismo é de poten- com dor não decorrente de câncer tratados com sis-
ciação e possibilita redução das dosagens, aumento do temas implantáveis durante 6 meses a 7 anos; a dose
efeito analgésico ou anestésico e redução dos efeitos de morfina inicial necessária, que era de 2,7 mg/dia
colaterais; no entanto, a interação pode ocorrer tanto (0,3 a 12 mg/dia), tornou-se 4,7 mg/dia (0,3 a 12 mg/
para o efeito desejado como para o colateral. A anal- dia) após período médio de 3,4 anos; ocorreu redução

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73 – Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico

Tabela 73.6 – Substâncias utilizadas nos sistemas implantáveis para infusão intratecal de fármacos com finalidade
analgésica
Grupo Natureza Média das doses por via Média das doses por Características
farmacológico peridural espinhal via intratecal espinhal
ao dia
Opióides Morfina 2-5 mg (0,03-1 mg/kg) 0,05 - 6 mg Ação prolongada
(0,01 - 0,02 mg/kg)
Meperidina 0,5-1 mg/kg
Tramadol 5 a 30 mg Poucos efeitos adversos
Metadona 1 a 5 mg/dia Ação opióide e inibidora NMDA
Fentanila 50-100 µg (0,5-1 µg/kg) 6 µg
Sufentanila 25 -75 µg 10 µg
Alfentanila 15 µg/kg
Buprenorfina 0,15-0,3 mg
Não opióides Lidocaína 5 mg/kg ou 7mg/kg Neurotoxicidade
(com adrenalina 1:200.000)
Bupivacaína 2 mg/kg ou 3 mg/kg
(com adrenalina 1:200.000)
Clonidina 3 - 15 mg (2-10mcg/kg) Pode causar hipotensão arterial
Midazolan 0,5 - 20 mg Ação miorrelaxante
Baclofeno 0,5 a 1 g Ação miorrelaxante e antineuráglica
Calcitonina 100 IU 1,5 mcg/kg
Somatostatina Variável Neurotoxicidade
metilprednisona 40 a 120 mg
Associações Clonidina e Clonidina aumenta a analgesia
morfina relacionada aos opióides
Baclofeno e Espasticidade associada a dor
opióides
Morfina e Dor mielopática, espasticidade
lidocaína

de 60% da magnitude da dor neuropática na escala mg/dia) e, em seis, doses mais elevadas (34 a 53 mg/
visual analógica e redução inicial de 77% da dor no- dia). Ocorreram problemas técnicos com as bombas
ciceptiva, valor este que se reduziu para 48% durante em seis doentes.
a última avaliação. Em 18 de 28 doentes durante mais Segundo estudo norte-americano de Dalm et al.14,
de 4 anos, a dose de morfina manteve-se constante, o implante de bomba é prescrito para o tratamento de
mas em 10 houve necessidade de aumento da dose dor relacionada ao câncer em 32,7% das vezes; a du-
para mais de 6 mg ao dia. Foi necessária remoção do ração média do tratamento em 67,3% dos casos foi de
sistema em 25 doentes devido a várias razões. A sa- 14,6 meses (8 a 94 meses); a melhora foi de 61% em
tisfação com o procedimento foi grande; em 81% dos média. Após ter sido titulada durante os primeiros 3
casos ocorreu melhora da qualidade de vida. meses, a dose média intratecal de morfina elevou-se
Segundo Molloy1, Hassenbusch et al. em 1995 em 13,19 mg/dia no 24o mês de acompanhamento. Os
avaliaram 18 doentes com dor neuropática submeti- doentes com dor decorrente de câncer necessitaram
dos a implante de bombas programáveis. A infusão de dose inicial mais elevada e a média das doses foi
de opióides por via intratecal resultou em melhora escalonada mais rapidamente; a média das doses nos
superior a 40%, variando de 25% a 39% em 61% dos doentes com dor não relacionada ao câncer apresentou
casos durante período de acompanhamento (média de aumento linear mais gradual. Ocorreu mau funciona-
2,4 anos); a redução média da intensidade da dor na mento do sistema, geralmente relacionado ao cateter,
escala visual analógica foi de 39%. Em cinco destes, em 21,6% dos casos. Cerca de 57% dos doentes referiu
foram necessárias menores doses de opióides (12 a 24 melhora para execução de atividades de vida diária.

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Tabela 73.7 – Características dos dispositivos de infusão implantáveis disponíveis em nosso meio
Volume Peso Segurança Espessura Facilidade Precisão Volume do Fluxo Pressão > fluxo > fluxo/ Custo
de uso de fluxo reservatório na câmara por oC 1.000 m
(bar)
Cateter epidural <1 ml + + + +++ + Variado +
Câmara < 20 ml + ++ + ++ + Variado ++
Cecor - Cordis ++ +++ + + + 0,1 +++

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Algomed - Meditronic ++ +++ ++ + + 1 +++


Arrow M -3000 81 137 ++++ ++++ ++++ ++ 16, 30 ou 50 0,5, 1,3, 1,7, 3,4 0,58 11,5% 18% +++
Isomed Meditronic 101 116 ++++ +++ ++++ +++ 20, 35, 60 0,3, 0,5, 1, 1,5, 2, 2,5, 2,1 7% 5,5% ++++
3, 3,5, 4
Archimedes - Tricumede 100 115 ++++ +++ ++++ +++ 20, 35, 40, 0,4, 4 2,45 6,3% 5% ++++
50, 60
AccuRx 5600 - ANS 59 95 ++++ +++ ++++ ++++ 28 0,4, 0,6, 0,7, 0,8, 0,55 2% Não ++++
0,9, 1, 1,2, 1,5, 2,0,
2,6, 3,2
Synchromed - Meditronic ++++ ++++ +++ ++++ 10, 18 0,4 – 3 +++++
Micromedes - Tricumed ++++ ++++ +++ +++ 10, 20, 30 0,2 - 0,4

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73 – Sistemas Implantáveis para Infusão de Analgésicos no Compartimento Liquórico

Angel et al.16 acompanharam 11 doentes tratados de complicações relacionadas ao cateter epidural que
com bombas implantáveis com idades variando de 29 intratecal (deslocamento 10%/4%, extravasamento
a 81 anos. A melhora foi insatisfatória durante 3 anos; 10%/0,9%, obstrução 28%/1%) e de complicações
o efeito analgésico foi bom ou excelente em 73% dos com cateteres e bombas eletrônicas (7% a 44% / 6% a
casos. A melhora foi insatisfatória nos doentes com 44%). Constataram também que não havia vantagem
síndrome dolorosa pós-laminectomia. em relação aos sistemas exteriorizados conectados a
Anderson e Burchiel17 avaliaram 40 doentes com bombas de infusão quanto ao alívio da dor, falha no
dor relacionada a condições não oncológicas; em 30 tratamento e complicações. Ocorre infecção em 8,1%
ocorreu melhora da dor durante o período de sele- dos doentes com câncer e em 27% dos doentes com
ção; 14 doentes receberam doses isoladas de 1 mg de dor não relacionada ao câncer.
morfina por via intratecal e apresentaram pelo menos Quando há agravamento da dor, redução da fun-
50% de melhora durante as 12 a 23 h subseqüentes; 23 ção e/ou escalonamento das doses, deve-se ajustar a
doen­tes foram submetidos durante 2 a 3 dias à infusão infusão, usar outros recursos disponíveis de tratamen-
de analgésicos por cateter epidural. Dos 22 doentes se- to e verificar se o sistema atua apropriadamente14. A
guidos durante 24 meses, 11 apresentaram pelo menos dose dos fármacos deve ser titulada e suplementada
25% de redução da dor segundo a escala visual analó- por analgésicos por via oral ou parenteral enquanto as
gica. Foi realizada adição de bupivacaína à solução ou investigações são realizadas. Muitos dos sistemas fa-
substituição da morfina por hidromorfona em alguns lham devido a problemas operacionais. Deve-se tes-
casos. Ocorreram complicações relacionadas ao siste- tar a operação da bomba e verificar os volumes espe-
ma implantável em 20% dos doentes, o que implicou rados na câmara. Quando necessário, deve-se avaliar
a necessidade de reintervenções. Houve melhora nos o sistema com radiografia dinâmica ou tomografia
índices do Questionário de dor de McGill e da inter- computadorizada, com ou sem uso de agente de con-
ferência da dor no enfrentamento e piora nas escalas traste, aferir desconexão, obstrução ou vazamento. A
de avaliação de doenças crônicas e do valor médio da necessidade inexplicável de doses elevadas de fár-
avaliação pelo Inventário de Depressão de Beck, que macos associadamente à ocorrência de novas dores,
se elevou de 15,5 para 17,3, após 24 meses. particularmente na região vertebral, deve levantar a
Dahm et al.14 revisaram 21 estudos sobre admi- suspeita da formação de tecido cicatricial na extre-
nistração epidural ou intratecal de opióides, com ou midade do cateter; a ressonância magnética pode ser
sem anestésicos locais (bupivacaína) em doentes com necessária para o diagnóstico dessa complicação18. Se
síndromes dolorosas não relacionadas ao câncer e o sistema atua apropriadamente e a analgesia é insa-
concluíram que a administração intratecal é superior tisfatória, deve-se titular a dose do fármaco ou adi-
à epidural quanto à satisfação, ocorrência de dor, fa- cionar outros agentes e avaliar fatores relacionados às
lhas técnicas e complicações. A adição de bupivacaí- drogas ou aos doentes.
na associou-se a melhor controle da dor. Os sistemas
eletrônicos associaram-se a maior freqüência de pro- CONCLUSÃO
blemas técnicos; estes ocorreram em 44% dos casos.
A administração epidural e intratecal de opióides é Os sistemas implantáveis para infusão intratecal
associada à redução da sensação dolorosa em doentes ou epidural espinhal de fármacos são opções eficazes
com câncer6,10. A eficácia é menos expressiva quando e seguras no tratamento da dor crônica nociceptiva,
a dor é neuropática ou resultante da movimentação neuropática ou mista. Dor decorrente de câncer, sín-
em decorrência de fratura ou isquemia2. A adição de drome dolorosa pós-laminectomia, dor neuropática
bupivacaína ou clonidina à morfina pode ser útil nes- periférica, dor mielopática, síndrome dolorosa mio-
ses casos. fascial e distrofia simpático-reflexa são algumas das
suas indicações. O método contempla a segurança e a
simplicidade da execução e a elevada taxa da eficácia,
COMPLICAÇÕES mas requer assistência interdisciplinar.
Como os sistemas são semi-abertos, há risco per-
manente de infecção8. Dahm et al.14 analisaram 21 es- refeRÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
tudos sobre administração intratecal de opióides, com
ou sem anestésicos locais, e concluíram que havia 1. Molloy AR. Implanted drug delivery systems: optimiz-
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Radiocirurgia Intersticial para
Tumores Cerebrais
Guilherme Lepski
Manoel Jacobsen Teixeira

INTRODUÇÃO CARACTERÍSTICAS FÍSICAS

T
erapia radioterápica se baseia na sensibilidade
DOS ISÓTOPOS
maior do tecido tumoral aos efeitos ionizantes Os radioisótopos mais comumente usados para
deletérios, em relação ao tecido cerebral normal, radiocirurgia intersticial são o iodine (I125) e o irídio
o que é conhecido como razão terapêutica. O meca- (Ir192). Essas partículas emitem radiação a uma baixa
nismo de ação da radiação ionizante envolve forma- taxa de dose de 5 a 100 cGy/h (geralmente 10 cGy/h
ção de radicais livres a partir do oxigênio, que, em para o iodine), em comparação com ±200 cGy/min
última instância, levam à peroxidação lipídica, lise na radioterapia convencional e ±5.000 cGy/min para
de membranas e morte celular. Portanto, o efeito te- radiocirurgia percutânea. Iodine tem sido preferido
rapêutico depende de uma certa perfusão tecidual e para braquiterapia, por emitir irradiação de baixa
não atinge centros necróticos tumorais, onde existem energia, da ordem de 27 a 35 KeV. Tal dose é calibra-
células viáveis com alta taxa de replicação. São as da para tratar um volume específico, definido pelas
células de alto potencial replicativo as que apresen- bordas da lesão captante de contraste na tomografia
tam maior radiossensibilidade e, portanto, tumores computadorizada (TC) ou ressonância magnética
de crescimento lento respondem insatisfatoriamente (RNM), poupando-se áreas sensíveis como hipotála-
à irradiação. Quando a radiossensibilidade do tumor é mo, nervos ópticos etc. Os implantes (uma ou mais
próxima à do cérebro normal, ocorre o risco de lesão sementes) permanecem até que seja atingida a dose
tecidual. Particularmente nessas lesões se faz neces- total, geralmente de 4 a 6 Gy na margem da lesão, o
sário o tratamento direto do tumor. Nesse sentido, o que usualmente ocorre entre 20 e 30 dias. Sobrevém
implante de sementes radioativas para o tratamento radionecrose, cuja ocorrência é esperada e desejada.
de tumores cerebrais (braquiterapia) vem sendo usa- Tal radionecrose costuma ser limitada e concêntrica
do desde 1914 (Bernstein, 1981). Em comparação, em relação às sementes implantadas e é removida
radiocirurgia estereotática percutânea foi descrita por por atividade macrofágica. Certa toxicidade perifocal
Lars Leksell somente em 1950. Segundo o conceito promove edema vasogênico e redução do fluxo san-
moderno de radiocirurgia, formulado por B. Lars- güíneo cerebral, o que explica a limitação do método
son, o termo significa qualquer forma de aplicação de em função do volume da lesão.
energia ionizante objetivando a completa destruição
de uma estrutura-alvo sem dano significativo aos teci- TÉCNICA CIRÚRGICA
dos adjacentes. Assim sendo, é mais preciso o termo
radiocirurgia intersticial para braquiterapia e radio- Os pacientes candidatos à braquiterapia são admi-
cirurgia estereotática percutânea para radiocirurgia tidos após confirmação diagnóstica por via aberta ou
com fonte externa de emissão. biópsia estereotática e após decisão multidisciplinar

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

da equipe médica composta de oncologistas, neurolo- toma anaplásico, observaram-se taxas de 1 e 2 anos
gistas, neurocirurgiões e radioterapeutas. Realiza-se de 49% e 36%, respectivamente; e para glioblastoma
RNM com cortes finos no dia do implante. A seguir, multiforme, 48 e 16%. É interessante notar que em 80
é fixado halo estereotático Micormar-Teixeira™ à ca- doentes foi necessária drenagem estereotática de cis-
beça do doente, que é então submetido à estereotomo- tos tumorais secundários à radionecrose, e que 88%
grafia computadorizada com contraste. Os cortes da dos doentes tiveram benefício pelo menos temporário
TC e RNM são fundidos em software apropriado, e decorrente dos implantes. A mortalidade perioperató-
as imagens resultantes são usadas para planejamento ria (30 dias) ficou em 0,9%, e a morbidade em 1,8%.
dosimétrico. Áreas particularmente nobres ou sensí- O principal fator relacionado a uma complicação ra-
veis são subtraídas. As sementes são, então, coloca- diogênica foi o tamanho do tumor, e por isso procura-
das no interior de tubos de Teflon® cortados conforme se evitar o procedimento braquiterápico para tumores
o planejamento, cujas pontas são tapadas com cola maiores que 4 cm. Recentemente, no entanto, temos
biocompatível, implantados por meio de uma cânula adquirido experiência em indicar tal procedimento
estereotática. O paciente a seguir é dispensado para para lesões maiores, tratadas com baixa energia, sem
suas atividades habituais, programando-se reinterna- maiores complicações (ver caso ilustrativo). Irradia-
ção após o período terapêutico (geralmente 21 a 25 ção de grandes superfícies tumorais promove quebra
dias), para retirada das sementes. da barreira hematoencefálica e edema vasogênico
progressivo, que usualmente se resolve em algumas
INDICAÇÕES semanas. O estudo preciso da volumetria tumoral, da
dose de referência e da taxa de dose diminui a ocor-
Gliomas rência de edema.
Gliomas cerebrais têm comportamento altamente Em nossa experiência de 138 doentes submetidos
recorrente, e isso justifica a busca por métodos alter- à braquiterapia9, reportamos média de sobrevida de 77
nativos de tratamento. Particularmente nos casos de meses para gliomas de baixo grau de malignidade (n
gliomas de baixo grau o tecido neoplásico e o tecido = 44), 50 meses para gliomas anaplásicos (n = 17), 22
normal têm radiossensibilidades muito semelhantes. meses para glioblastomas multiformes (n = 45) e de
São candidatos a tratamento braquiterápico pacientes 13 meses para metástases (n = 21). A Fig. 74.1 ilustra
com glioma de baixo grau de malignidade e com con- as curvas de Kaplan-Meier dos casos descritos.
tornos limitados. Lesões extensas, com muito edema Apesar do que foi exposto, alguns autores defen-
perilesional ou invasão contralateral ou do corpo ca- dem que o tratamento braquiterápico para gliomas
loso, ou mesmo lesões multifocais, não são suscetí- anaplásicos não implica aumento da sobrevida10,11 ou
veis a essa modalidade terapêutica. Gliomas malig- da qualidade de vida12. Nossa experiência, contudo,
nos são, em geral, não localizados, mas astrocitomas diverge da desses autores, principalmente pelo fato
anaplásicos sólidos e localizados e recorrências sóli- de nossos pacientes com gliomas anaplásicos serem
das de glioblastomas podem ser assim tratados. Está portadores de lesões de maiores dimensões que as re-
formalmente indicado tratamento braquiterápico, sob portadas pelos demais. Nessa série de doentes, acre-
essas condições, quando há evidências de progressão ditamos que a radioterapia intersticial tem um papel
radiológica da lesão, tumor que não excede 4 cm no relevante no arsenal terapêutico desses tumores e não
seu maior diâmetro e valor de Karnofsky maior de pode ser relegada.
70. Do ponto de vista prático, a decisão de tratar um Se, por um lado, o tratamento de gliomas anaplá-
paciente com glioma de baixo grau por cirurgia ou sicos com radioterapia intersticial permanece contro-
radiocirurgia intersticial se baseia mais na localização verso, isso já não pode ser dito quanto ao seu papel no
e no tamanho do tumor. tratamento de gliomas de baixo grau13. Nesse grupo
Na série de 455 pacientes de Ostertag, com segui- de doentes, o tratamento braquiterápico ocupa papel
mento de 10 anos1-8, composta de 97 pacientes com central, permitindo a redução volumétrica da lesão ou
astrocitoma pilocítico, 358 com gliomas de baixo o controle do seu crescimento14.
grau de malignidade e 109 pacientes com gliomas Quanto à definição de fluxogramas de tratamento,
malignos de graus III e IV, observaram-se taxas de lesões de menos de 4 cm em qualquer localização são
sobrevida em 5 e 10 anos de 84,9% e 83% para aque- os casos ideais para tratamento braquiterápico. Se a
les com astrocitoma pilocítico. Pacientes com oli- localização for em área eloqüente, deve-se preferir
goastrocitomas, oligodendrogliomas e astrocitomas o tratamento não-cirúrgico, evidentemente. Tumo-
gemistocíticos tiveram taxa de sobrevida em 5 anos res lobares pequenos são candidatos tanto a cirurgia
de 49% (mediana de 58 meses), 50% (61 meses) e quanto a braquiterapia, e em geral a opção é cirúrgi-
32% (37 meses). Pacientes com astrocitoma de grau ca. No entanto, se a suspeita diagnóstica recair sobre
II apresentaram taxa de sobrevida de 5 e 10 anos de uma lesão de baixo grau de malignidade, esses auto-
45% e 28%, respectivamente. Nos casos de astroci- res entenderão que a opção por braquiterapia é a mais

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74 – Radiocirurgia Intersticial para Tumores Cerebrais

1,0

,9

,8

,7

,6

,5

,4

,3 Diagnóstico
Metástase
,2
GBM
,1
Glio anaplásico
0,0 Glio de baixo grau
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120

Tempo de evolução (em meses) da doença

Fig. 74.1 – Curvas de Kaplan-Meier mostrando a evolução da porcentagem de sobrevida em função do tempo, em relação ao
diagnóstico anatomopatológico inicial.

conveniente. Principalmente caso se considere que de imagem intra-operatórios, o que não é largamente
isso implica menores riscos de morbi-mortalidade em disponível. Nesse sentido, o planejamento estereo-
decorrência do tratamento. Ademais, para os tumores tático torna a abordagem terapêutica mais acurada e
de baixo grau, em que o aspecto intra-operatório é em segura, permitindo a irradiação de todas as margens
muito semelhante ao cérebro normal, só se consegue da lesão definidas em estudos de estereoimagem pré-
definição precisa do grau de ressecção com métodos operatórios (Fig. 74.2).

Fig. 74.2 – Caso ilustrativo mostrando glioma anaplásico recidivado em região periventricular frontoparietal direita em uma
paciente do sexo feminino de 31 anos que recebeu o diagnóstico há 16 anos, tendo sido submetida a quatro procedimentos bra-
quiterápicos desde então, que permitiram um bom controle da evolução da doença. À direita vê-se a curva de isodose de 60 Gy
prescrita na margem da lesão, definida como a parte captante de contraste visualizada à RNM.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Metástases lesões metastáticas não foi justificado. Três meses


após o término da irradiação, 79% dos doentes nesta
É conhecimento corrente que pacientes com me- série apresentaram melhora na escala funcional, com
tástases cerebrais vivem por mais tempo e com me- redução do tumor em 82% e estabilidade em outros
lhor qualidade de vida quando submetidos a ressecção 16%. O edema peritumoral começou a reduzir já a
cirúrgica e telerradioterapia. No entanto, somente um partir da 4ª semana, e nenhum paciente apresentou
quarto dos pacientes com metástases cerebrais são radionecrose que requeresse descompressão cirúrgi-
candidatos à cirurgia, seja por concorrência de outras ca. A mortalidade em 30 dias foi zero e a morbidade
lesões cerebrais ou por descontrole sistêmico da doen­ somente 2%.
ça, ou ainda por más condições clínicas de uma ma- Esses resultados mostram-se comparáveis à res-
neira geral. Assim sendo, persegue-se há muito tempo secção cirúrgica e telerradioterapia, ou ainda a radio-
opções de tratamento que sejam menos invasivas e cirurgia com gama-knife ou aceleradores lineares16-18.
aplicáveis a uma maior gama de doentes. Assim sen- Conclui-se, portanto, que radiocirurgia intersticial es-
do, a possibilidade de tratamento braquiterápico para tereotática é uma opção segura e eficaz no tratamento
lesões metastáticas faz-se muito bem indicada para das metástases cerebrais e deve ser contemplada no
controle local nos casos de lesões situadas profunda- arsenal terapêutico do doente oncológico, principal-
mente, inacessíveis do ponto de vista cirúrgico, para mente nos não candidatos a tratamento cirúrgico.
aquelas lesões de baixa radiossensibilidade, ou para as
lesões recidivadas após cirurgia ou radioterapia. Pode
ser indicada tanto para lesões únicas quanto múltiplas, Tumores de Base do Crânio
a depender dos tamanhos e das condições de base. Meningiomas petroclivais, da asa do esfenóide ou
Em geral prescrevem-se 60 Gy na margem do tu- do seio cavernoso representam um desafio ao cirur-
mor15. Alguns autores preferem associar irradiação gião mais familiarizado com microcirurgia, e o avan-
percutânea de cérebro total (40 a 50 Gy). No entanto, ço dessa arte permite hoje em dia resultados bastante
como hoje em dia se dispõe de métodos de neuroi- aceitáveis. Não obstante, procuram-se métodos menos
magem bastante sensíveis para o diagnóstico de ou- invasivos e com menores taxas de morbimortalidade.
tras lesões metastáticas concomitantes, é tendência Nesse sentido, a braquiterapia tem contribuído para
tratar-se as lesões diagnosticadas e se evitar a irra- promover o controle da doença de base e descompres-
diação profilática, evitando-se assim os sérios efeitos são das importantes estruturas vizinhas, sem acrésci-
colaterais cognitivos da radioterapia agressiva. Na mo de déficits de nervos cranianos. Prescrevendo-se
eventualidade de remissão multifocal, múltiplos mé- 6.400 cGy na margem de meningiomas ou cordomas,
todos emergem atualmente como opção terapêutica, consegue-se redução do volume tumoral de 40% a
entre eles radiocirurgia, braquiterapia, além de novas 80%, sem disfunção de nervos cranianos, o que se
opções de quimioterapia, como também a telerradio- obtém às custas de uma taxa de dose em média 100
terapia de cérebro total. Respondem melhor ao trata- vezes menor que a empregada no tratamento radioci-
mento com radioterapia intersticial aqueles doentes rúrgico percutâneo. Devido às altas doses no centro
com boas condições clínicas, portadores de lesão ce- da lesão, consegue-se redução tumoral marcante mes-
rebral única, sem lesão sistêmica, e que tiveram longo mo naquelas lesões pouco radiossensíveis.
intervalo entre o diagnóstico do tumor primário e da Assim, nota-se que a opção de radioterapia inters-
lesão metastática. ticial para vários tipos de tumores cerebrais constitui
Na série de Ostertag de 416 doentes com metás- opção segura e eficaz de tratamento, e não deve ser
tases cerebrais (399 únicas) seguidos por 19 meses, preterida a favor de outras opções, que por vezes não
dividiram-se os grupos terapêuticos em três: aqueles estão bem indicadas em função do tamanho da lesão,
submetidos à braquiterapia mais telerradioterapia, de sua forma ou por proximidade de estruturas nobres
braquiterapia somente e braquiterapia nos casos de e radiossensíveis. Devido aos princípios físicos dessa
recidiva após cirurgia ou telerradioterapia. Observou- modalidade terapêutica, permite-se, por exemplo, que
se sobrevida média para os casos de terapia combina- se poupem tecidos circunjacentes à lesão, graças ao
da de 17 meses, de 15 meses para o grupo de braqui- rápido decaimento da radiação, ou ainda que se obte-
terapia e de apenas 6 meses para os casos de recidiva. nha redução de tumores radiorresistentes e de baixo
Com relação às curvas de sobrevida, verificou-se crescimento, graças às altas doses atingidas no cen-
89% e 66% de sobrevida após 6 meses e 1 ano, res- tro lesional. Paralelamente, as baixas taxas de dose
pectivamente, para o grupo de terapia combinada, e prescritas permitem boa tolerabilidade ao tratamento,
80% e 61% para o grupo de braquiterapia exclusiva. com mínima radiação ao tecido vizinho, permitindo
Comparação estatística em relação aos dois primeiros sua repetição tantas vezes quanto necessário. Essas
grupos não mostrou diferença significativa, ou seja, características tornam a radioterapia intersticial única
o acréscimo de telerradioterapia à braquiterapia para e insubstituível em neurooncologia.

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74 – Radiocirurgia Intersticial para Tumores Cerebrais

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75
Tratamento Neurocirúrgico Funcional das
Dores Faciais
Manoel Jacobsen Teixeira
José Cláudio Marinho da Nóbrega

INTRODUÇÃO ta como queimor, formigamento, ardor e peso. A dor


neuropática mista costuma combinar a dor constante

O
segmento cefálico é sede de numerosas es- de base com paroxismos de dor em pontada. Nesses
truturas fundamentais para a vida de relação casos, o exame pode revelar anormalidades da sen-
e para a função do organismo como um todo, sibilidade (hipoalgesia, hipoestesia, hiperalgesia, hi-
incluindo os órgãos dos sentidos, as estruturas que perpatia, alodinia) e de outra funções neurológicas.
exteriorizam os aparelhos respiratório e digestivo O tratamento das algias craniofaciais crônicas é
com o meio ambiente e o órgão fundamental para a fundamentalmente clínico. Os procedimentos neu-
vida, o encéfalo. Apresenta também situação espa- rocirúrgicos antiálgicos estão indicados quando os
cial estratégica, porém vulnerável a vários estressores procedimentos farmacoterápicos, fisiátricos, psicote-
ambientais. A elevada concentração de unidades no- rápicos e os bloqueios anestésicos não proporcionam
ciceptivas em um pequeno volume talvez seja a razão resultados satisfatórios3.
da instabilidade neuronal e da menor eficácia dos me- Entre os procedimentos descritos para o tratamen-
canismos supressores nas unidades nociceptivas no to cirúrgico das dores craniofaciais, os que utilizam
segmento cefálico e é sede de dores agudas, crônicas técnicas percutâneas e que podem ser realizados com
ou crônicas recorrentes com mais freqüência e maior o doente desperto sob sedação são preferíveis aos fei-
magnitude que em outras áreas perante estressores tos a céu aberto, porque são mais amplos, mais preci-
similares que albergam afecções clínicas não obser- sos e mais seguros4.
váveis em outras regiões do corpo, como as cefaléias Os procedimentos neurocirúrgicos destinados ao
funcionais e as neuralgias essenciais da face1. tratamento da algias craniofaciais podem ser neuror-
A dor no segmento cefálico pode decorrer de vá- restaurativos, neuromoduladores ou neuroablativos3,4.
rios mecanismos2: incluindo o neuropático, gerado Os neuroablativos consistem na destruição de nú­cleos
pela lesão de estruturas sensitivas discriminativas se- e/ou de vias nociceptivas centrais ou periféricas e
diadas no sistema nervoso central ou periférico, e o proporcionam melhor resultado em casos de dor no-
nociceptivo, conseqüente à ativação de unidades no- ciceptiva ou dor neuropática paroxística e os neuro-
ciceptivas periféricas, resultado da ação de estímulos moduladores em casos de dor constante. A infusão
físicos ou químicos teciduais. Muitas vezes a origem de fármacos no compartimento liquórico é indicada
é mista. A dor nociceptiva aguda é bem delineada no tratamento da dor nociceptiva e neuropática cons-
temporoespacialmente e descrita geralmente como tante ou da dor rebelde aos tratamentos prévios3. A
peso, pontada ou cólica e melhora com o tratamento neuroestimulação do sistema supressor é indicada no
da doença subjacente ou interrupção das vias noci- tratamento da dor neuropática quando há preservação
ceptivas. A dor neuropática pode expressar-se segun- parcial da sensibilidade4. A infusão de drogas modu-
do dois padrões, o paroxístico e o constante, ou como latórias da sensibilidade dolorosa no sistema liquóri-
combinação destes. A dor paroxística é geralmente co ventricular é recomendada no tratamento, quando
descrita como choque, pontada, facada, agulhada ou esta tiver sido aliviada, mas tenham ocorrido efeitos
eletricidade. A dor constante quase sempre é descri- adversos ou tolerância a eles3.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

ANATOMIA DAS UNIDADES SENSITIVAS DA da fossa craniana e contém líquido cefalorraquidiano


FACE (LCR). A aracnóide funde-se com a face convexa do
gânglio trigeminal e a raiz é coberta pela pia-máter e
O nervo trigêmeo processa a sensação tátil, a dor banhada pelo LCR. As fibras da divisão mandibular
e a temperatura da face, mucosa do nariz, boca, den- posicionam-se ínfero-lateralmente ao longo do curso
tes, orelha externa e de amplas áreas da dura-máter da raiz sensitiva maior na ponte; as fibras da divisão
craniana e a sensibilidade proprioceptiva dos dentes oftálmica são súpero-laterais, e as fibras da divisão
e periodonto, palato duro, músculos mastigatórios e maxilar situam-se em posição intermediária. Raízes
articulações temporomandibulares. Distalmente ao sensitivas aberrantes freqüentemente se originam na
gânglio trigeminal, origina os ramos oftálmico ou pri- ponte e, independentemente da raiz principal, unem-
meiro ramo, ramo maxilar ou segundo ramo e o ramo se às fibras da divisão oftálmica, o que justifica ser
mandibular ou terceiro ramo. O ramo oftálmico cursa esta divisão raramente afetada, isoladamente. Na
na parede lateral do seio cavernoso e penetra na órbi- raiz trigeminal e nas divisões do nervo trigêmeo, as
ta através da fissura orbitária superior, trifurcando-se fibras A-delta, mais calibrosas e mielinizadas, vei-
em três ramos (nervo lacrimal, frontal e nasociliar), culam informações táteis superficiais e gerais, e as
que são responsáveis pela inervação de parte do cou- fibras A-delta, mais finas, pouco mielinizadas, são
ro, região frontal, dorso do nariz e globo ocular. O responsáveis pelo processamento da sensação de dor,
ramo maxilar repousa entre a parede lateral do seio temperatura e tato; as fibras C, não mielinizadas, são
cavernoso e a base do crânio, emerge pelo forame re- responsáveis pela veiculação da informação dolorosa.
dondo e penetra, via fissura infra-orbitária, na fossa As fibras aferentes, exceto as proprioceptivas, têm os
pterigopalatina. Entre seus vários ramos, destaca-se corpos celulares localizados no gânglio trigeminal. A
o nervo infra-orbitário, que emerge através do forame raiz motora emerge do tronco encefálico medialmen-
infra-orbitário e que inerva o terço médio da face e te à raiz sensitiva, trafega abaixo da porção cisternal
os dentes da arcada dentária superior. O ramo man- desta, penetra no cavum de Meckel, localizando-se in-
dibular cursa lateralmente no seio cavernoso e emer- feriormente ao gânglio trigeminal e junta-se à divisão
ge no forame oval. A raiz motora não faz sinapse no mandibular no forame oval. A raiz motora inerva os
gânglio trigeminal e une-se ao nervo mandibular no músculos derivados do arco mandibular e origina dois
forame oval; no espaço nasofaríngeo divide-se em vá- ramos principais: o nervo mastigatório e o milo-hiói-
rios ramos, suprindo a sensibilidade do terço inferior deo; o primeiro inerva os músculos da mastigação, e o
da face e língua, o assoalho da boca e mandíbula. O último supre o músculo milo-hióideo, ventre anterior
nervo alveolar inferior penetra no forame mandibular do músculo digástrico e tensor do tímpano e do véu
e percorre o canal mandibular para emergir no forame palatino. A zona de entrada da raiz situa-se em um
mentoniano. O gânglio trigeminal ou de Gasser apre- ponto localizado entre a região de penetração da raiz
senta forma achatada. No seu lado convexo penetram na ponte e até 10 mm distalmente a este; corresponde
os três ramos periféricos e, no lado côncavo, emerge a à fronteira onde a bainha de mielina produzida pelas
raiz trigeminal. O gânglio está contido no interior do células de Schwann entra em contato com a bainha de
cavum de Meckel, bolsa de aracnóide que se protrai mielina produzida pela oligodendróglia (Fig. 75.1).

V1

Gânglio de Gasser

V2

Raiz

V3

Fig. 75.1 – Representação artística do gânglio trigeminal, de seus três ramos e da raiz sensitiva.

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75 – Tratamento Neurocirúrgico Funcional das Dores Faciais

Ao penetrar na ponte, a raiz sensitiva divide-se em lo e aqueduto de Sylvius. Seus neurônios originam o
trato rostral e caudal ou lemnisco descendente, que se trato mesencefálico, que em forma de foice, trafega
projetam, respectivamente, no núcleo sensitivo prin- caudalmente e dirige-se ao núcleo motor que modula
cipal e no núcleo do trato espinhal do nervo trigêmeo; a mastigação. O núcleo motor constitui uma coluna
o complexo nuclear envolvido no processamento da oval de neurônios situada medialmente à raiz motora
informação exteroceptiva da face e da cavidade oral e ao núcleo sensitivo principal. Recebe colaterais do
é subdividido, citoarquitetonicamente, em núcleos trato mesencefálico, estabelecendo duplo arco refle-
mesencefálico e principal, situados rostralmente, e xo. O núcleo do trato espinhal do trigêmeo origina
núcleo do trato espinhal do nervo trigêmeo, situado fibras que cruzam a linha média na porção caudal do
caudalmente. A última estrutura foi subdividida, com tronco encefálico e projetam-se no lemnisco trigemi-
base na sua composição celular, em subnúcleo cau- nal ventral ou trato trigeminotalâmico lateral. O nú-
dal, subnúcleo interpolar e subnúcleo oral. Até recen- cleo sensitivo principal origina axônios que cruzam a
temente, com base em dados anatômicos e clínicos, linha média, dorsalmente ao lemnisco medial contra-
considerava-se que o subnúcleo caudal fosse a única lateral, constituindo o trato trigeminotalâmico lateral
estrutura responsável pela nocicepção da face. Foram, que se projeta rostralmente, que consiste no lemnisco
entretanto, identificadas unidades nociceptivas nas trigeminal. O núcleo sensitivo principal origina axô-
porções superficiais e profundas do subnúcleo inter- nios com projeção ipsilateral, que constitui o trato tri-
polar e nos núcleos oral e principal. Presentemente, geminotalâmico dorsal, o qual se projeta rostralmente
admite-se que todo o complexo nuclear trigeminal es- junto à substância cinzenta central do mesencéfalo.
pinhal e o núcleo trigeminal principal estejam envol- Os três tratos projetam-se no núcleo ventral póstero-
vidos na nocicepção facial. A sensibilidade nocicepti- medial do tálamo, onde fazem sinapse com neurônios
va da face é principalmente, mas não exclusivamente, que, via segmento posterior da braço posterior da cáp-
processada no subnúcleo caudal. Este pode participar sula interna, se projetam no córtex cerebral do giro
da nocicepção mediante outras vias que não a pro- pós-central. As fibras trigeminais originadas do nú-
jeção trigeminotalâmica direta. O núcleo trigeminal cleo sensitivo principal e espinhal do nervo trigêmeo
rostral recebe fibras ascendentes do subnúcleo cau- projetam-se, também, ipsilateral e contralateralmente
dal. Aquele, por sua vez, pode modular a atividade no tálamo e formação reticular do tronco encefálico.
do núcleo caudal. A nocicepção da face deve ser co- Essas projeções são impropriamente denominadas de
dificada pela somação central de impulsos de muitos lemnisco trigeminal (Fig. 75.2).
aferentes do complexo nuclear trigeminal2. O conceito clássico sobre a representação rostro-
Fibras proprioceptivas projetam-se no núcleo me- caudal da projeção central nos aferentes trigeminais,
sencefálico do nervo trigêmeo. As fibras dolorosas de acordo com a sua origem na primeira, segunda
projetam-se, com organização topográfica, via trato ou terceira divisões do nervo trigêmeo, não é mais
espinhal do trigêmeo, no núcleo do trato espinhal do aceita5. Demonstrou-se que as três divisões do ner-
nervo trigêmeo; as projeções da divisão oftálmica e da vo trigêmeo estão representadas em todo o comple-
divisão mandibular são arranjadas da face ventral para xo trigeminal, podendo alcançar o CPME do quarto
a dorsal. Esse arranjo é resultado da rotação medial da segmento cervical. As divisões mandibular, maxilar
raiz sensitiva do nervo trigêmeo ao penetrar no tron- e oftálmica dispõem-se com arranjo dorsoventral,
co encefálico. O núcleo espinhal do nervo trigêmeo respectivamente. A representação sensitiva da face
constitui longa coluna de neurônios, sediados medial- é feita como lâminas concêntricas centradas sobre a
mente ao trato descendente; funde-se com o núcleo representação das regiões oral e nasal, que se situam
sensitivo principal, rostralmente, e com a substância nas porções mais centrais e rostrais do subnúcleo cau-
gelatinosa do corno posterior da substância cinzenta dal do trato espinhal do nervo trigêmeo. Existe gran-
da medula espinhal cervical, caudalmente. O núcleo de superposição das terminações centrais das divisões
sensitivo principal situa-se lateralmente à entrada da trigeminais no complexo nuclear6. As fibras de grosso
raiz trigeminal, no segmento rostral da ponte; recebe calibre, presentes no nervo trigêmeo, ao penetrarem
aferências das fibras A-delta que medeiam a sensação na ponte, dividem-se em ramos ascendentes, que se
tátil. As divisões oftálmica, maxilar e mandibular es- destinam aos núcleos principal e mesencefálico, e
tão arranjadas com a mesma organização dorsoven- ramos descendentes, que se projetam nos diferentes
tral do núcleo do trato espinhal do nervo trigêmeo. O componentes do complexo trigeminal descendente.
núcleo cuneiforme medial recebe fibras das três divi- Em animais, 80% das fibras de grosso calibre proje-
sões trigeminais e parece ser o sítio de convergência tam-se na porção rostral do núcleo caudal e somente
de estímulos sensitivos provenientes do segmento 10% alcançam o segundo segmento cervical. As fibras
cefálico e das regiões rostrais do corpo. O núcleo me- A fazem sinapses dentríticas e algumas, em gloméru-
sencefálico consiste em uma delgada coluna de neu- los, nas estruturas nucleares do complexo trigeminal,
rônios situados sobre a margem lateral da substância que correspondem às lâminas III, IV e V do CPME2.
cinzenta central da porção rostral do quarto ventrícu- Os potenciais aferentes de receptores mecânicos de

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Núcleo mesencefálico

Nervo trigêmeo
Núcleo principal

Pars oralis
Nervo glossofaríngeo
Nervo vago

Pars caudalis

Fig. 75.2 – Reprodução artística do complexo nuclear trigeminal e suas aferências.

adaptação rápida são conduzidos por fibras mielíni- TRATAMENTO POR MÉTODOS INDIRETOS
cas finas e alcançam a porção rostral da subdivisão
caudal do núcleo do trato espinhal do nervo trigêmeo. Segundo Teixeira5, Massa, em 1544 propôs a extra-
Vários colaterais, ao longo dessa via, projetam-se nas ção dentária como método de tratamento da neuralgia
unidades correspondentes às lâminas III, IV e V do do trigêmeo, procedimento amplamente empregado
CPME. Cerca de 50% dos aferentes primários das mesmo nos dias de hoje, na maioria das vezes porque
raízes trigeminais são representados pelas fibras C, o diagnóstico correto não é realizado. Wyburn-Ma-
que penetram no trato descendente trigeminal e al- son, em 1953, observou que a alcoolização ou a neu-
cançam a porção caudal do núcleo do trato espinhal e rotomia do nervo grande auricular alivia a neuralgia
do CPME cervical rostral. As aferências musculares, do trigêmeo em 50% dos doentes temporariamente.
veiculadas pelas fibras A-δ e C, projetam-se na por- Outros métodos empíricos, também ineficazes, tais
ção distal do subnúcleo interpolar e nas lâminas I e como ligadura da artéria carótida, diatermia, apen-
V da subdivisão caudal do núcleo do trato espinhal dicectomia, ressecção parcial do cólon, mastoidec-
do nervo trigêmeo e da medula cervical rostral. As tomia, hiperpirexia e simpatectomia cervical foram
aferências A-δ, nociceptivas, projetam-se nas lâminas também propostos.
I, II, III e V da medula cervical. A aferência visceral,
veiculada pelos nervos intermediário, vago e glosso- TRATAMENTO POR MÉTODOS
faríngeo, cursa pelo trato espinhal do nervo trigêmeo NEUROABLATIVOS
e projeta-se na subdivisão caudal do complexo nu-
clear e no núcleo do trato solitário. Do núcleo cau- Métodos Neuroablativos nas Unidades
dal do complexo trigeminal, as fibras projetam-se no Trigeminais Periféricas
complexo ventrobasal contralateral do tálamo e nos
núcleos intralaminares. As fibras do núcleo sensitivo Tratamento por Agentes Neurolíticos
principal projetam-se no complexo ventrobasal homo Segundo Teixeira7, a instilação de agentes neurolí-
e contralateral do tálamo2. ticos (clorofórmio, ácido ósmico, álcool, cocaína com
Os neurônios do subnúcleo caudal têm importân- álcool etílico, cromatos, glicerina formalizada, gliceri-
cia capital no processamento da dor facial. Há evi- na carbolizada, glicerina e álcool mentolado, éter, anti-
dências de que o subnúcleo caudal não origine fibras pirina, salicilato de sódio, sais de quininonas, uréia as-
trigeminotalâmicas diretas, tal como era aceito até re- sociada à quinina, formaldeído, álcool benzílico, fenol,
centemente, mas que influencie a dor secundariamente fenol glicerinado, sulfonamidas, glicerol, água aque-
mediante projeções para os núcleos sensitivos princi- cida) nas unidades trigeminais periféricas foi possível
pais. Há também evidências de que os núcleos rostrais após o desenvolvimento das agulhas com ponta aguda
meçam a dor da região oral e da porção central da face e das seringas na segunda metade do século XIX.
e de que o subnúcleo caudal esteja envolvido no pro- A lise química dos ramos periféricos foi especial-
cessamento da dor das regiões laterais da face4. mente indicada com finalidade diagnóstica quando a
dor localiza-se no segundo e terceiro ramos do ner-

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75 – Tratamento Neurocirúrgico Funcional das Dores Faciais

vo trigêmeo e para tratar doentes idosos, debilitados labial, hematoma na face e ulcerações nasais são mais
ou doentes com neuralgia bilateral; foi também re- raras. Há recorrência em 6% dos casos em três anos e,
comendada quando a dor ocorria na primeira divisão após período maior em 15% a 33%. Há necessidade
para evitar ceratite. Como o benefício perdura durante de reinjeções em 12% a 14,6% dos casos4.
poucos meses ou anos, possibilita que o doente habi- Segundo Teixeira9, Hakanson, em 1981, descreveu
tue-se à anestesia e às parestesias da face que ocorrem a técnica de gangliólise com glicerol, método bastan-
freqüentemente após a rizotomia. É contra-indicada te divulgado. Consiste na punção do gânglio trigemi-
quando há processo infeccioso nos tecidos transfixa- nal e, após realização da cisternografia com contraste
dos pela agulha. São complicações do método: diplo- iodado, na administração gradativamente de 0,6 a 0,8
pia transitória, disestesias e indução de cicatriz. ml de glicerol a 10%. Não é indicada em casos de in-
A injeção de substâncias neurolíticas no interior tervenção prévia no gânglio trigeminal. Proporciona
do gânglio trigeminal tornou-se possível após o ad- alívio inicial da dor em 88,9% a 98,7% dos casos e
vento das agulhas longas e resistentes no início do melhora em 1,3%. Entretanto, a taxa de recorrência
século XX. Schloesser, em 1903, puncionou o forame é elevada (17,8%) e há necessidade de reinjeção em
oval por via transoral. Ostwalt, em 1906, empregou 6,6% dos casos. Ocorre analgesia imediata em 60% a
a via infrazigomática para administração de agentes 84% dos doentes, lesões herpéticas, em 50%, diseste-
neurolíticos junto ao forame oval e redondo. Wright, sias em 18,6% e ceratite em 3,3%. Os resultados não
em 1907, e Sicard, em 1908, realizaram a exposição são satisfatórios em casos de neuralgia atípica e de
cirúrgica do forame oval para administração intra- neuralgia pós-traumática. Apesar das inúmeras ino-
neural de solução de ácido ósmico ou de álcool nas vações introduzidas na técnica de injeção e do uso de
proximidades do gânglio. Harris, em 1909, acidental- diferentes agentes neurolíticos, a neurólise do gânglio
mente puncionou o gânglio trigeminal por via lateral. trigeminal deixou de ser empregada na maioria dos
Taptas, em 1910, descreveu a técnica de punção do centros, pois é pouco precisa e associa-se a elevada
gânglio trigeminal por via lateral. Razumovsky, em taxa de recorrência e de seqüelas.
1910, realizou a secção intracraniana da segunda e
terceira divisões e a raiz do nervo trigêmeo, conco- Procedimentos Neurocirúrgicos Ablativos a Céu
mitantemente com a injeção de álcool no interior do
gânglio trigeminal. Härtel, em 1912, descreveu a téc- Aberto
nica de punção ganglionar por via transorbitária. Kir- Neurotomias Trigeminais
chner, em 1933, puncionou o gânglio trigeminal pela
via submentoniana. Os resultados e as complicações Segundo Teixeira9, George Marechal, cirurgião
da gangliólise foram variados; quando a injeção era do rei Louis XIV, pela primeira vez em 1730, tentou,
realizada na raiz, o déficit sensitivo era mais intenso sem sucesso, a neurectomia do nervo infra-orbitário
e, quando no gânglio, mais circunscrito e menos in- logo após a sua emergência para tratar dor facial. An-
tenso. Demonstrou-se que o agente neurolítico, além dré, em 1732, realizou procedimento similar e utili-
de entrar em contato com as raízes do nervo trigêmeo, zou substância cáustica para destruir o tecido nervoso
pode escoar-se para cisterna optoquiasmática, fossa e, em 1748, realizou a neurotomia do nervo infra-or-
posterior e canal raquidiano. Para reduzir a freqüên- bitário. Lizars, em 1821, descreveu a neurotomia do
cia de seqüelas e evitar a lesão sistemática da primei- nervo dentário inferior. John Bell, em 1828, preconi-
ra divisão foram propostas modificações nos métodos zou a secção do nervo facial para o tratar neuralgias
originais, incluindo a redução da quantidade de álcool intensas. Quando Mayo, em 1822, demonstrou que o
administrada e a injeção fracionada, mantendo-se o nervo trigêmeo era o responsável pela sensibilidade
doente desperto. O método proporciona alívio ime- da face, a neurotomia tornou-se o procedimento mais
diato da dor em 72% a 97% dos casos; os resultados utilizado para o tratamento da neuralgia do trigêmeo
finais são satisfatórios em até 93% dos casos durante durante cerca de sete décadas; avulsão, esmagamento,
período de até dez anos. Há déficit sensitivo inicial interposição de material orgânico entre os cotos sec-
em 94% dos casos. Na maioria das vezes, a anorma- cionados, neurólise mecânica ou por radiofreqüência
lidade sensitiva inicial cede lenta e progressivamente. e rebatimento retrógrado dos cotos amputados foram
Induz a disestesias em 41% dos casos, anestesia do- utilizados para tal finalidade. Entretanto, devido ao
lorosa em 7%, anestesia da córnea em 11% a 82%, fenômeno de regeneração nervosa, as neurectomias
ceratite em 4% a 7,3%, úlcera de córnea em 3%, opa- periféricas beneficiam temporariamente os doentes; a
cificação corneana em 1%, redução da acuidade vi- melhora mantém-se geralmente durante 3 a 30 meses;
sual em 0,3%, paralisia de nervos motores oculares a taxa de recorrência é de 17,7% durante período de
em 2% a 29%, paralisia da motricidade mastigatória observação superior a 14 meses. Infecção localizada
em quase todos os doentes, do nervo facial acústico e ocorre em 5,9% dos casos.
vestibular em 2%, meningite em 4,4% e acidente vas- A neurectomia periférica é indicada para confirma-
cular de tronco encefálico em 1,4%; cefaléia, herpes ção diagnóstica e para o tratamento de doentes idosos

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

ou debilitados ou com neuralgia bilateral ou do pri- via subtemporal e transtentorial para acesso à zona da
meiro ramo e quando há anestesia na hemiface secun- entrada da raiz do nervo trigêmeo a sua secção das
dária à rizotomia contralateral. A reoperação, quando fibras sensitivas preservando as fibras intermediárias,
necessária, é tecnicamente mais difícil porque a cica- para induzir à hipoalgesia e hipoestesia térmica na
triz dificulta a identificação dos ramos nervosos. face e preservar a sensibilidade tátil. Cecotto e Schia-
vi, em 1969, a rizotomia justa-ganglionar; Ley et al.,
Neurotomias Occipitais em 1975, descreveram a secção da raiz junto à ponte
com o uso de microscópio cirúrgico para preservar
A neurotomia percutânea ou a céu aberto dos ner- a sensibilidade da face. A rizotomia retrogasseriana
vos occipitais é procedimento útil para tratar doentes proporciona alívio imediato da neuralgia trigeminal
com neuralgia do nervo occipital. É ineficaz quando a em 80% a 99,2% dos casos e é muito eficaz no tra-
dor é constante ou decorre de síndrome dolorosa mio- tamento da dor facial decorrente do câncer e da dor
fascial craniocervical. O método a céu aberto consiste facial em mais de 85% dos casos de esclerose múlti-
na incisão transversal sobre o trajeto da artéria occipi- pla, mas não do tratamento da neuralgia atípica do tri-
tal e da secção de fibras do nervo occipital. O método gêmeo. Há recorrência da dor em 5,3% a 19,2% dos
percutâneo consiste na punção percutânea dos nervos casos; quanto mais preservada a sensibilidade, mais
occipitais em um ponto situado aproximadamente a elevada a taxa de recorrência; é mais freqüente quan-
2,5 cm da linha média logo abaixo do ínion na base de do a primeira divisão e o ramo motor são poupados.
escama do osso occipital, junto da artéria occipital, e Satisfaz-se e considera que o alívio da dor compensa
de sua lesão por radiofreqüência; a palpação da arté- a dormência da face em 30% dos doentes, 8% quei-
ria occipital maior auxilia a localizar o nervo4. xa-se de dormência e queimor na face; este é muito
intenso em 5% dos casos. Paralisia facial ocorre em
Rizotomias até 11% dos casos (é permanente em 20% dos casos),
anestesia da córnea em 10% a 11%, ceratite neuropa-
Rizotomia do Nervo Trigêmeo ralítica em 1,3% a 15,1%, úlcera da córnea em 3,7%,
Segundo Teixeira9, em 1858 Carnochan propôs a comprometimento da função visual em 0,4% a 5%,
remoção do gânglio trigeminal por via extracraniana, lesão dos nervos motores oculares, principalmente do
técnica desenvolvida por Abbé em 1889. Rose, em III e do IV nervos, em 0,4% a 2,5%, necessidade de
1890, descreveu a gangliectomia por via transesfe- tarsorrafia em 3,9% a 7,5%, necessidade de enuclea-
noidal extradural; Horsley et al., em 1891, a via tran- ção em 0,3% a 1,2%, parestesias discretas em 10,3%
sesfenoidal, intracraniana e extradural; Hartley, em a 57%, anestesia dolorosa em 2,8% a 26%, lesão da
1892, a gangliectomia extradural temporal; Krause, raiz motora inicialmente em 39,9% a 100%, ulcera-
em 1892, a via transtemporal extradural para secção ções faciais ou nasais com anestesia facial em 1,4% a
de uma ou mais divisões do nervo trigêmeo; Tiffany, 18% e erupção pelo vírus do herpes simples em 63%
em 1892, a gangliectomia parcial visando a poupar a 80%. Complicações mais raras são representadas
o continente do gânglio envolvido na sensibilidade por fístula carotidocavernosa, lesão da artéria caró-
do primeiro ramo e a raiz motora. A mortalidade ci- tida interna, hematoma devido a sangramento de va-
rúrgica decorrente de gangliectomia varia de 4,7% a sos diplóicos ou seio cavernoso, anacusia transitória,
14%, e as paralisias de nervos cranianos são muito zumbido, cefaléia e lacrimejamento. A taxa de morta-
freqüentes em conseqüência da lesão da parede do lidade varia de 0,3% a 1,9%; hematoma intracrania-
seio cavernoso. no, acidente vascular encefálico, infarto do miocárdio
Segundo Teixeira9, Korteweg, em 1899, realizou e do pulmão, meningite e broncopneumonia são cau-
a rizotomia do trigêmeo em substituição à avulsão da sas mais comuns de óbito.
raiz; Frazier, em 1901, a rizotomia após ressecção do A rizotomia retrogasseriana e suas variantes tor-
arco zigomático e de sua reposição ao final do pro- naram-se popularizadas e as suas complicações pro-
cedimento; Frazier, em 1915, descreveu a técnica de gressivamente menos freqüentes. Entretanto, não era
secção subtotal da raiz do nervo trigêmeo preservan- apropriada para tratar idosos ou doentes com sérios
do o seu terço interno, responsável pela inervação do problemas clínicos. A realização da cirurgia sob anes-
primeiro ramo e, a partir de 1918, a raiz motora (Fig. tesia local, associadamente a pequenas doses de bar-
75.3); Stookey, em 1928, descreveu a rizotomia re- bitúricos, tornou o método seguro.
trogasseriana superseletiva, ou seja, a secção apenas Segundo Teixeira9, Ramonède, em 1913, descre-
das fibras do ramo comprometido; Herman, em 1944, veu a via retromastóidea para o acesso e secção do
descreveu a via temporal transdural. Chiasserini Jr., nervo trigêmeo junto à ponte; Doyen, em 1917, de-
em 1958, a técnica de secção fascicular retrogasse- senvolveu a técnica de rizotomia via trepanação su-
riana, que consiste na interrupção de apenas algumas boccipital e endoscopia; Dandy, em 1925, descreveu
radículas do ramo comprometido; Pertuiset, em 1963, a técnica de secção da raiz sensitiva do nervo trigê-
Jannetta e Rand, em 1966, o uso de microscópio por meo via craniectomia suboccipital. A rizotomia pela

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75 – Tratamento Neurocirúrgico Funcional das Dores Faciais

A B

ramo
motor

Fig. 75.3 – Rizotomia trigeminal por via extradural subtemporal. (A) Descolamento do gânglio trigeminal da dura-máter da
base da fossa média. (B) Exposição do ramo motor.

fossa posterior resulta em alívio da dor de até 99% ram eletródio angulado com a finalidade de tornar o
dos doentes. Preserva mais freqüentemente a sensibi- método mais seletivo para realizar a rizotomia percu-
lidade no território do primeiro ramo; em 82,4% dos tânea do nervo trigêmeo, deve-se realizar a punção do
doentes não se percebe a hipoestesia da face. A taxa gânglio trigeminal à mão livre, com auxílio de equi-
de recorrência varia de 15% a 19,5%. Ceratite ocorre pamento de imagem.
em 2% dos casos, paralisia facial em menos de 3,1%, O procedimento na introdução de um eletródio
hiporreflexia corneopalpebral em 32% a 85%, aneste- (Fig. 75.4) é à mão livre, por via anterior, através do
sia de córnea ou abolição do reflexo corneopalpebral forame oval, no interior do gânglio trigeminal, sob
em 9,5% a 11,3%, anestesia dolorosa em 0% a 5% controle radioscópico (Fig. 75.5). Após a punção, os
e a lesão da raiz motora em 3,2% e 27,7%. Outras doentes são despertados e questionados sobre a locali-
complicações menos freqüentes são rinoliquorréia e zação da sensação parestésica evocada pela estimula-
meningite. A taxa de mortalidade varia de 2% a 10%. ção de trigeminais. Baseando-se nessas informações,
A craniectomia de fossa posterior é indicada a doen- o eletródio é mobilizado até que a sensação localize-
tes jovens ou quando há suspeita de lesões expansivas se no território da dor. Durante período de 60 s são
intracranianas. rea­lizadas lesões térmicas a 65° a 80°C, proporciona-
das por geradores de radiofreqüência (Fig. 75.6), que
Rizotomias Percutâneas com Meios Físicos devem ser repetidas com magnitude crescente, até
que sejam induzidas hipalgesia ou analgesia segmen-
De acordo com Teixeira9, Rathi, em 1913, pela tares com preservação da sensibilidade tátil.
primeira vez, utilizou a eletrocoagulação dos ramos
periféricos do nervo trigêmeo para tratar dor facial;
Kirschner, em 1931, foi o primeiro a empregar a
eletrocoagulação após punção semi-estereotática do
gânglio trigeminal; Thiry, em 1962, empregou a ele-
trocoagulação controlada; Schürmann et al., em 1972,
realizaram a eletrocoagulação sob neuroleptoanalge-
sia para facilitar o controle intra-operatório da sensi-
bilidade facial; White e Sweet, em 1969, empregaram
geradores de radiofreqüência, eletródios providos de
termômetros, estimulação elétrica e anestésicos de ul-
tracurta duração; Petuiset et al., em 1972, utilizaram Fig. 75.4 – Eletródios destinados à rizotomia percutânea por
eletródios bipolares; Tobler et al., em 1983, descreve- radiofreqüência.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

A B

Fig. 75.5 – (A) Fotografia de doente em decúbito dorsal horizontal e com eletródio introduzido no interior do gânglio trige-
minal durante a execução de rizotomia percutânea por radiofreqüência do nervo trigêmeo. (B) Reprodução artística de eletródio
no interior do gânglio trigeminal.

paroxismos, em 91% a 100% dos casos. A melhora


pode ocorrer dias após a rizotomia em alguns doentes.
O déficit sensitivo pode reverter-se semanas após o
procedimento. A analgesia e a preservação do tato é
observada em 61,7% dos casos, e a anestesia, em pelo
menos uma divisão, em 17%5. Ocorre escoamento de
sangue venoso pela cânula de punção em 2,9% dos
casos, punção da artéria carótida na maioria das vezes
inócua em 1% a 6,2%; hematoma facial em 0,4% a
4%, midríase, paralisia da motricidade ocular extrín-
Fig. 75.6 – Fotografia de gerador de radiofreqüência modelo seca, geralmente temporária, especialmente do nervo
MRFC Micromar Ltda (Diadema - São Paulo). troclear, em 0,1% a 2,4%; mal-estar no conduto audi-
tivo, atribuído à hipoestesia em 6%, sensação de baru-
Há dificuldades para a punção ganglionar em 3,2% lho no ouvido homolateral à rizotomia em 6%, déficit
dos casos, às vezes, devido à presença de barra pteri- auditivo em 7% a 27%, em decorrência de formação
goalar ou quando o forame apresenta dimensões redu- de hematoma resultante da punção da artéria carótida
zidas. Em 1% dos casos o eletródio pode penetrar em ou do traumatismo da trompa de Eustáquio, do mús-
forame situado à frente do forame oval (buraco inoni- culo tensor do tímpano ou do véu palatino, paresia ou
mado); pode também ocorrer punção acidental do bu- paralisia do ramo motor do nervo trigêmeo em 4% a
raco rasgado posterior ou da fenda orbitária inferior. 53% (mais comum em casos de rizotomia do tercei-
Os paroxismos são eliminados quando ocorre hipal- ro ou dos primeiros ramos), dificuldade para masti-
gesia ou analgesia na área onde há dor ou onde está gação e deglutição em 9%, dificuldade para abertura
situada a zona de gatilho; há alívio inicial da dor em da boca em 22%, hipoestesia da córnea em 1,6% a
91% a 100% dos casos. Anormalidades na motricida- 20%, anestesia da córnea em 8%, ceratite em 1,4%,
de ocular extrínseca, disestesias, anestesia dolorosa, úlcera de córnea, em 1% a 2%, redução significati-
paralisia motora do nervo trigêmeo e ceratite neuro- va da acuidade visual ou cegueira em 0,2% a 0,4%,
paralítica são as complicações mais comuns do méto- lacrimejamento excessivo, ressecamento e prurido
do. A mortalidade pela rizotomia por radiofreqüên­cia ocular em 5,3% a 7%, hipoestesia lingual em 80%,
é nula na maioria das casuísticas. Sangramento pode parestesias em 5,7% a 10,9%, disestesias dolorosas
decorrer da punção da artéria meníngea média, da em 0,5% a 5%, anestesia ou hipoestesia dolorosa em
artéria carótida ou do plexo venoso que circunda o 0% a 5%, dificuldade de adaptação a prótese dentária
cavum de Meckel. A rizotomia por radiofreqüência em 3%, aumento da salivação em 5% a 17%, redu-
do nervo trigêmeo proporciona analgesia ou hipal- ção da salivação em 3%, atrofia da mucosa nasal em
gesia e manutenção da sensibilidade tátil na maioria 1%, aumento da secreção nasal em 23% e redução em
dos casos. A indução de hipalgesia ou analgesia na 7%, erupção pelo vírus do herpes simples em simples
área onde a dor está localizada ou na área em que em 0,4%, anormalidades cardiovasculares (hipoten-
está situada a zona de gatilho elimina inicialmente os são arterial, arritmia cardíaca) em 1% dos doentes,

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75 – Tratamento Neurocirúrgico Funcional das Dores Faciais

e raramente precordialgia. Precordialgias são raras. nada ao câncer. Há melhora da hiperestesia cutânea,
Lesão do nervo hipoglosso, convulsão, hematoma mas não da dor por desaferentação em 71,4% dos do-
intratemporal, abscesso temporal e meningite assép- entes com neuralgia atípica; esta pode agravar-se em
tica ocorrem raramente. Ocorre lesão inadvertida das 22,5% dos casos de dor facial atípica, que também
divisões vizinhas àquela acessada em 12,3% a 46% pode agravar-se com o procedimento.
dos casos, principalmente quando a dor localiza-se no Segundo Teixeira9, Shelden et al., em 1955, Svien
segundo ramo do nervo trigêmeo. O reflexo corne- e Love, em 1959, e Stender e Grumme, em 1969, des-
opalpebral mantém-se presente, normal ou hipoativo creveram o tratamento da neuralgia do trigêmeo pela
em até 91% dos doentes submetidos à rizotomia do compressão do gânglio trigeminal. Tal método pro-
primeiro ramo. Ocorre lesão inadvertida do primeiro porciona alívio imediato da dor em 91% a 100% dos
ramo em 4,5% a 25% dos casos. Usualmente há me- doentes e gera déficit sensitivo em 17% dos casos. Há
lhora do déficit sensitivo semanas após o procedimen- recorrência precoce em 7,8% dos casos e durante o
to. Apesar da preservação da sensibilidade tátil, 30% primeiro ano em 24%. Manifesta-se persistência de
dos doentes têm, inicialmente, consciência do déficit déficit sensitivo e sensação de dormência, queimor ou
sensitivo, mas, com o passar do tempo, adaptam-se a formigamento em 76% dos doentes.
ela; dormência é desconfortável em 12% a 25% dos Segundo Souza11, Mullan e Lichtor, em 1983, des-
doentes. A preservação do tato reduz a ocorrência de creveram a técnica de compressão da raiz com balão
anestesia dolorosa ou de disestesias. Ocorrem analge- inflável posicionado na cisterna trigeminal, introdu-
sia e preservação do tato em 32% a 61,7% dos casos zindo percutaneamente através do forame oval. O
e anestesia, em pelo menos uma divisão, em 17%5. procedimento consiste em manutenção do doente sob
As anormalidades da sensibilidade são interpretadas bloqueio troncular do gânglio trigeminal com 0,4 a
como dormência nas primeiras semanas após a cirur- 0,6 ml de lidocaína a 1% ou sob anestesia geral (pro-
gia. A seletividade da lesão decorre do fato de as fibras pofol, midazolam, fentanila, droperidol) e monitora-
finas Aδ e C, nessa seqüência, serem mais sensíveis ção dos parâmetros hematodinâmicos e da punção
às lesões térmicas por radiofreqüência que as fibras percutânea guiada por radioscopia do forame oval
de grosso calibre. Disestesias desagradáveis ocorrem com agulha 14 G para introdução de balão de Fogar-
mais em doentes com dor facial atípica ou neuralgia ty número 4 no gânglio trigeminal (Fig. 75.7); sob
atípica do trigêmeo, mesmo quando o déficit sensitivo monitoração da pressão de insuflação, 0,7 a 1 ml de
induzido é discreto. Nesses casos, é recomendado o agente de contraste iodado é administrado para indu-
bloqueio anestésico prévio do nervo trigêmeo, a fim zir no balão conformação de pêra ou halter e causar
de o doente avaliar o desconforto associado à dormên- lesão mecânica, isquemia e descompressão extrínseca
cia pós-operatória; e déficit sensitivo pós-operatório das estruturas nervosas trigeminais (Fig. 75.8).
deve ser mínimo nesses casos.
O procedimento resulta em alívio inicial da dor
A recidiva da dor após a rizotomia por radiofreqü- em 92,5% dos doentes. Durante período de segui-
ência varia entre 4% e 80% dos doentes, ocorre em mento variando de 6 meses a 4,5 anos, ocorre reci-
5% dos doentes durante o primeiro ano, em 10% no
diva da dor em 15% dos casos; estima-se que a taxa
segundo e, progressivamente, em 5%, a cada ano. A
de recorrência em 5 anos seja de 20% a 40%11,12. A
recoagulação mantém a taxa de bons resultados ao
repetição do procedimento resulta em alívio da dor na
redor de 95%. A recidiva pode ocorrer em território
maioria dos casos. As complicações mais comuns são
diferente do acessado em 2% dos casos; a taxa de re-
hematoma facial, otalgia, erupção pelo vírus herpes
corrência é maior quanto mais prolongado o período
de acompanhamento e quanto mais preservada é a
sensibilidade facial. A recorrência precoce ocorre em
até 16% dos doentes; 75% das recorrências surgem
durante o primeiro ano. Há recorrência em 10% dos
doentes acompanhados durante 54 meses, em 22%
dos casos, 2 a 6 anos após a rizotomia, em 28% dos
casos durante 4 a 9 anos e, em 80%, 13,7 anos após3.
A dor facial associada à doença de Paget, ou con-
seqüente a traumatismo facial, acromegalia, síndro-
me da sela vazia, ou a processos inflamatórios intra-
cranianos, também pode ser aliviada após a rizotomia
por radiofreqüência. Há melhora da dor em 95% a
100% dos doentes com dor facial relacionada à escle-
rose múltipla; em 0% a 100% dos casos de neuralgia Fig. 75.7 – Equipamento de compressão percutânea do gân-
glio trigeminal, ou seja, agulhas, balão de Fogarty e seringa
facial pós-herpética, em 75% dos casos de cefaléia destinada a bloqueio anestésico troncular trigeminal e injeção
em salvas e em 80% dos casos de dor facial relacio- de agente de contraste no interior do balão.

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831
Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

ou “radiocirurgia”, significa localização estereo­tática


e administração de dose elevada de radiação durante
período mínimo de tempo. O isocentro deve ter di-
mensão de 4 a 5 mm na zona de entrada da raiz do
nervo trigêmeo. Usam-se 70 a 80 Gy no centro, man-
tendo a curva de isodose de 80% fora do tronco ce-
rebral. Há alívio completo da dor em 53% a 55% dos
casos e redução significativa da observada em 35%10
(Fig. 75.10 e 75.11).
Fig. 75.8 – Reprodução artística de balão de Fogaty número Entretanto, o método é complexo e dispendioso. É
4 no interior do gânglio trigeminal durante procedimento de
compressão trigeminal. indicado quando não há condições clínicas ou anatô-
micas para a realização de procedimentos cirúrgicos
percutâneos ou a céu aberto. A radioterapia também foi
simples labial, comprometimento da sensibilidade de utilizada para tratamento e profilaxia da neuralgia pós-
toda a hemiface, fraqueza da motricidade mastigató- herpética, da dor facial atípica, da neuralgia pós-herpé-
ria, disfunção da articulação temporomandibular e tica e da dor facial relacionada à esclerose múltipla.
meningite; disestesia ocorre em 10% dos casos. Esse
procedimento é, atualmente, bastante empregado por-
que é simples, pode ser realizado sob anestesia local Rizotomia do Nervo Glossofaríngeo a Céu
e associa-se a poucas complicações. Apresenta a van- Aberto
tagem de não causar, na maioria dos casos, anestesia Nos doentes submetidos a craniectomia de fossa
corneana ou ceratite, o que o torna ideal para o tra- posterior e subseqüente secção do IX nervo craniano
tamento da dor que acomete o primeiro ramo, e de e fibras rostrais do nervo vago, a recidiva da dor é
poder ser realizado sob anestesia troncular ou geral rara, quando ocorre secção total ou parcial do nervo
de curta duração, pois não necessita de colaboração vago que alivia definitivamente a dor. Hematoma de
do doente para sua execução, o que a torna apropriada fossa posterior, disfonia e disfagia são complicações
para doentes anacúsicos ou com anormalidades cog- possíveis do método. Ocorre óbito relacionado ao ato
nitivas. Apresenta, entretanto, a desvantagem de não cirúrgico em até 5% dos casos.
ser seletiva, associar-se a elevada taxa de recidivas,
de disestesias faciais, meningite e de neuropatia dos
nervos motores oculares. Além disso, o equipamento Rizotomia Percutânea por Radiofreqüência
utilizado é de grande dimensão. do Nervo Glossofaríngeo
Segundo Teixeira9, a radioterapia foi empregada Consiste na introdução de agulha no forame jugu-
pela primeira vez para tratar a neuralgia do trigêmeo lar através da qual eletródio com termistor é introdu-
por Gocht em 1897, mas os resultados não foram con- zido sob controle radioscópio e anestesia local com o
vincentes. A radiocirurgia da raiz trigeminal foi pro- doente sedado ou geral de curta duração e com moni-
posta recentemente como método de tratamento da toração cardíaca e pressórica. Após estimulação elé-
neuralgia do trigêmeo. A radioterapia estereotática, trica para precisar sua localização (geração de dor da

A B

Fig. 75.9 – Radiografia na incidência lateral do crânio de doente durante a execução de procedimento de compressão do
gânglio trigeminal. (A) Balão insulado com contraste e com forma de pêra; ou (B) de halter.

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75 – Tratamento Neurocirúrgico Funcional das Dores Faciais

Fig. 75.10 – Reconstrução da imagem do encéfalo e da raiz trigeminal durante a programação de rizotomia trigeminal radio-
cirúrgica.

A B

Alvo da lesão

Fig. 75.11 – (A) Reconstrução da imagem do tronco encefálico e da raiz trigeminal durante a programação de rizotomia tri-
geminal radiocirúrgica. (B) Representação da distribuição espacial dos feixes de irradiação durante o procedimento de rizotomia
radiocirúrgica.

faringe, base da língua e orelha interna), lesões a 65°C sa. Anormalidade da fonação e da deglutição podem
ou 70°C durante 60 s são repetidas subseqüentemente. decorrer da cirurgia; o posicionamento adequado do
Bradicardia e hipotensão arterial podem ocorrer du- eletródio permite resolver o paroxismo doloroso sem
rante a lesão e a fase de estimulação4. O procedimento lesar fibras de nervos vizinhos.
induz à hipoestesia ou anestesia no terço posterior da
língua, parede lateral da faringe e loja amigdaliana e
pode gerar paresia do palato mole e do esfíncter supe-
Tratotomia e Nucleotratotomia Trigeminal
rior do esôfago e originar disfonia e disfagia. Segundo Teixeira9, Serra e Negri, em 1936, reali-
Hipotensão arterial e bradicardia são repercus- zaram a secção do trato espinal do nervo trigêmeo no
sões que impedem o prosseguimento da lesão nervo- plano transversal que cruza o ângulo pontocerebelar;

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

Sjöqvist, em 1937, realizou a secção do trato descen- sensitivas cervicais, o que a torna de grande utilidade
dente do nervo trigêmeo, na junção entre o terço mé- em pacientes com dor decorrente de processos neoplá-
dio e o terço inferior da oliva. Hosobuchi e Rutkin, sicos orofaríngeos e cervicofaciais e para o tratamen-
em 1971, empregaram potencial evocado intra-opera- to da neuralgia do trigêmeo associada à neuralgia do
tório para delimitar a área da lesão e radiofreqüência glossofaríngeo. Além disso, pode ser realizado com
para induzir a lesão; Kunc, em 1979, propôs a incisão o doente consciente, o que possibilita o controle do
vertical do trato e do núcleo do trato espinhal do ner- resultado durante o ato operatório e sua indicação em
vo trigêmeo. Essas técnicas proporcionam alívio da doentes com risco de realização de anestesia geral.
dor facial em 62% a 100% dos casos de dor facial, ou O procedimento consiste em fixação de aparelho
seja, alívio em 83% dos pacientes com dor decorrente de estereotaxia ao segmento cefálico do doente, se-
do câncer, e em 53% dos pacientes com neuralgia do guida da realização de estereotomografia com fusão
trigêmeo pode haver melhora da anestesia dolorosa das imagens de atlas de estereotaxia com as de es-
da face. Não há melhora de dor facial atípica, da neu- tereotomografia ou estereorressonância magnética. O
ralgia pós-herpética e da dor decorrente de lesão do alvo estereotático é localizado 4 a 6,5 mm lateralmen-
sistema nervoso central. As complicações são mais te à linha média, de acordo com a ocorrência da dor
freqüentes quanto mais rostrais e profundas as lesões; no território do terceiro ou primeiro ramo do nervo
ocorre ataxia transitória em 16% a 33% dos casos, trigêmeo, respectivamente. Um eletródio, a seguir,
sendo permanente em 11%, nistagmo em 16%, aboli- via agulha, é introduzido na transição occipitocervical
ção ou comprometimento do reflexo corneopalpebral e dirigido de baixo para cima e de fora para dentro,
em 37,5% a 100%, ceratite em 0,3% a 1,6%, disfa- com inclinação de 20° respectivamente em relação
gia em 8,3%, lesão do trato espinotalâmico em 0,6% aos planos transversal e sagital. O controle da pene-
a 9%, disartria em 1,7%, soluços em 8,3% a 26,3%, tração do eletródio na estrutura nervosa é realizado
confusão mental em 16,7%, cefaléia transitória em mediante registro da impedância tecidual, e sua loca-
100%, paralisia do nervo recorrente em 6,4%, síndro-
lização é confirmada mediante estimulação monopo-
me de Claude-Bernard-Horner em 5%, disestesias em
lar, a baixa voltagem, com estímulos de ondas a 5, 10,
6,4% a 100% e erupção pelo vírus do herpes simples
50 e 100 Hz. No local em que a estimulação elétrica
em 50%. A mortalidade cirúrgica varia de 0% a 16%.
causa desconforto coincidente com o local onde a dor
A taxa de recorrência em casos de neuralgia do trigê-
é referida, são realizadas lesões por radiofreqüência
meo varia de 26% a 83,3%, e a de dor neoplásica é
de 30%; a dor recorre à medida que há recuperação de modo a coagular o tecido nervoso no diâmetro de
da sensibilidade dolorosa13. A hipoestesia tátil é rara aproximadamente 2 mm13 (Figs. 75.12 e 75.13).
após a tratotomia e o déficit sensitivo geralmente pou-
pa as regiões mediais da face; a sensibilidade costuma
ser preservada no lábio superior, região perinasal e
lingual, pois, no trato espinhal do nervo trigêmeo, as
fibras responsáveis pela inervação central da face são
mais mediais e fazem sinapse em segmentos rostrais
do núcleo do trato espinhal. A preservação do refle-
xo corneopalpebral deve-se ao fato de as fibras táteis,
responsáveis pela inervação da córnea, projetarem-
se nas porções rostrais do núcleo do trato espinal do
nervo trigêmeo. São vantagens da tratotomia a pre-
venção da paralisia motora do nervo trigêmeo e do
nervo facial, a preservação da sensibilidade tátil, a
baixa ocorrência de ceratite, a ausência de anormali-
dades da motricidade ocular e a pequena freqüência
de disestesias. São desvantagens do procedimento a Nucleotomia
elevada taxa de recorrência e das complicações. trigeminal oral
Segundo Nóbrega3, Crue et al., em 1967, Todd
et al., em 1969, e Hitchcok, em 1970, descreveram
Nucleotomia
a nucleotratotomia trigeminal estereotática, e Fox, trigeminal caudal
em 1973, a nucleotratotomia trigeminal percutânea à
mão livre. Potencial evocado e cisternoscopia foram
utilizados para melhorar a seletividade do método.
Além de aliviar a dor no território do nervo trigêmeo,
intermediário e glossofaríngeo, o procedimento pode Fig. 75.12 – Reprodução artística dos alvos da nucleotrato-
também aliviar a dor sediada no território das raízes tomia trigeminal caudal e oral.

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A B

C D

Fig. 75.13 – Reconstrução de imagens de estereotomografia da transição craniocervical de doente durante a execução de
nucleotratotomia trigeminal caudal. (A) Corte axial. (B) Corte coronal. (C e D) Reconstrução das imagens.

Apesar de ter sido demonstrada sua eficácia no alívio da hiperpatia associada à neuralgia pós-herpé-
tratamento da neuralgia do trigêmeo, os melhores re- tica em até 77,5% dos casos e da disestesia facial em
sultados ocorrem em casos de dor facial decorrente mais de 72% dos casos, da anestesia dolorosa da face
de câncer, neuralgia pós-herpética, disestesias decor- em até 66% dos doentes e da dor relacionada à sín-
rentes da lesão ou rizotomia do nervo trigêmeo ou da drome de Wallemberg em 75%. Portanto, a nucleo­
síndrome de Wallemberg. A eliminação dos neurô- tratotomia espinhal do nervo trigêmeo, ao eliminar a
nios hiperativos de segunda ordem nos núcleos trige- hiperatividade neuronal nuclear e a convergência de
minais espinhais relacionada às parestesias orofaciais informações sensitivas e nociceptivas de várias ori-
constantes em doentes com neuropatia trigeminal ou gens, é eficaz no tratamento da dor facial por desafe-
com dor por nocicepção é a razão da melhora14. Ocor- rentação15. As complicações da nucleotratotomia es-
re melhora na maioria dos doentes com dor cervicofa- pinal estereotática do nervo trigêmeo geralmente são
cial decorrente de câncer; a taxa de recorrência varia transitórias e consistem em ataxia sensitiva, soluços e
de 15,2% a 25%. Há melhora do desconforto facial e lesão do trato espinotalâmico.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

A nucleotratotomia trigeminal pontina estereotá- frontal ou occipital, um eletródio é inserido e guiado


tica é procedimento eficaz para o tratamento da dor para o alvo determinado. Realiza-se a estimulação do
facial por desaferentação não aliviado após a nucleo­ alvo, para detalhar a estrutura a ser tratada. Lesões térmi-
tratomia trigeminal estereotática. Consiste na fixação cas são, a seguir, realizadas por radiofreqüência13,16 (Fig.
do aparelho de estereotaxia no segmento cefálico dos 75.14). As complicações mais comuns da talamotomia
doentes, na realização de estereotomografia e na de- são: sonolência, déficit de memória, anormalidades da
lineação do quarto ventrículo cerebral. Após fusão motricidade ocular extrínseca, anormalidades motoras,
das imagens estereotomográficas com as dos atlas de sensitivas e/ou da fala, convulsões e meningite4,5.
estereotaxia, o alvo é delineado para que sejam in- A mesencefalotomia estereotática visa a interrom-
duzidas lesões por radiofreqüência na porção oral do per as vias espinorreticulotalâmicas que estão envolvi-
núcleo do trato espinal do nervo trigêmeo15. Resulta das na sensação parestésica e disestésica nos doentes
em melhora de aproximadamente 60% dos doentes com dor neuropática e na dor oncológica16. Propor-
com dor facial atípica15. ciona melhora funcional em 70% dos doentes com
anestesia dolorosa da face e em 50% dos doentes com
Talamotomia e Mesencefalotomia síndrome talâmica. A mesencefalotomia alivia inicial
ou parcialmente a dor central encefálica de 65% dos
Segundo Teixeira16, a tratotomia pontina foi pro- doentes. Em longo prazo, há alívio de 20% a 66% dos
posta por Dogliotti em 1938; Walker descreveu a me- casos e melhora de 30%. A mortalidade é de 7,4%. Os
sencefalotomia a céu aberto; Spiegel e Wycis reali- melhores resultados são obtidos quando as lesões são
zaram a primeira mesencefalotomia ou talamotomia realizadas no plano da comissura posterior, onde, com
basal estereotática em 1947. Desde então, a mesence- freqüência, geram alterações oculomotoras, contra-
falotomia e a talamotomia são indicadas especialmen- riando as lesões realizadas no plano do colículo supe-
te para o tratamento da dor facial por desaferentação rior, onde essas complicações ocorrem em 23% a 53%
e dor facial causada por câncer. Há melhora imediata dos casos16. Sonolência e dissinergia da motricidade
da dor facial neoplásica em 25% a 30% dos doentes ocular, temporárias, são complicações comuns, sendo
após talamotomia dos núcleos talâmicos inespecífi- a paresia do olhar conjugado para cima a mais freqüen-
cos ou mesencefalotomia; a médio prazo, entretanto, te e permanente em cerca de 30% dos doentes3,13,16.
há recorrência da dor. A melhora é consideravelmente
inferior em casos de dor facial por desaferentação e
de dor facial atípica. Outros Procedimentos Ablativos
O procedimento consiste na fixação, sob aneste- A lobotomia frontal, a leucotomia frontal e a cingu-
sia local, de um aparelho de estereotaxia ao crânio lotomia são úteis no tratamento da anestesia dolorosa
dos doen­tes. Após execução de estereotomografia, ou e da neuralgia pós-herpética; apesar de não causarem
estereor­ressonância magnética os alvos anatômicos são redução da intensidade da dor, promovem modifica-
identificados. Por meio de uma trepanação na região ção do componente afetivo associado à apresentação

Alvo do
procedimento

Fig. 75.14 – Talamomesencefalotomia. (A) Aparelho de estereotaxia TM-Micromar (Diadema – São Paulo) fixado à cabeça
de manequim. (B) Reconstrução de imagem estereotomográfica do encéfalo de doente fundida com a do atlas de estereoraxia
durante preparo do procedimento estereotático (seta aponta para os núcleos centromediano e parafascicular).

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75 – Tratamento Neurocirúrgico Funcional das Dores Faciais

do estímulo nociceptivo. Ruge et al., em 1958, empre- facial atípica. Aproximadamente 20% dos doentes
garam a ressecção cortical; Le Beau et al., em 1949, apresentam complicações após a estimulação cerebral
a ressecção das áreas corticais 9 e 10; Odon e Lyman, profunda, porém em apenas 4% são permanentes. Em
em 1946, a ressecção do giro pós-central7. menos de 1% há incapacidade ou morte4,5.
Segundo Teixeira17, a estimulação do córtex motor
TRATAMENTO POR NEUROESTIMULAÇÃO cerebral foi descrita por Tsubokawa et al. em 1990;
esse método proporciona melhora em considerável
A estimulação elétrica transcutânea e percutânea número de doentes com dor facial neuropática, talvez
foi recentemente aplicada para tratar doentes com em decorrência da supressão da atividade talâmica. O
neuralgia do trigêmeo. Os resultados foram inconsis- procedimento consiste na realização de estimulação
tentes. A estimulação mecânica intermitente do tegu- magnética transcraniana e na realização de potencial
mento pode beneficiar alguns doentes com neuralgia evocado sensitivo para localizar o local na convexi-
pós-herpética. dade do crânio onde há inversão da fase (área motora)
Segundo Teixeira4, Mazars et al., em 1979, descre- e de, sob controle estereotomográfico ou estereorres-
veram a estimulação elétrica do grupamento nuclear sonanciográfico, na realização de trepanação ou pe-
talâmico posterior para tratar doentes com neuralgia quena craniotomia na região da convexidade contra-
do trigêmeo. O procedimento operatório consiste na lateral ao local onde a dor sedia-se e na aplicação de
anestesia local, na fixação do aparelho de estereota- um eletródio em placa sobre a dura-máter que cobre o
xia no segmento cefálico; após fusão das imagens dos giro pré-central (Fig. 75.15, B).
atlas de estereotaxia com as imagens de estereotomo-
grafia ou estereorressonância magnética são realiza- TRATAMENTO POR INFUSÃO DE FÁRMACOS
dos os cálculos das coordenadas estereotáticas. Via
ANALGÉSICOS NO SISTEMA NERVOSO
orifício de trepanação, um eletródio de platina iridiada
é introduzido para possibilitar a estimulação elétrica CENTRAL
das estruturas nervosas (Fig. 75.15, A). Quando, após Trata-se de dispositivos de acionamento digital, a
período de teste com estimulação proporcionada por gás, e os eletrônicos para infusão de medicamentos
gerador externo, ocorre melhora, as conexões externas analgésicos (sulfato ou cloridrato de morfina, mepe-
são seccionadas e o eletródio é conectado, por meio ridina, tramadol) no compartimento ventricular18. O
de um cabo, a gerador de pulsos implantado no tecido procedimento é indicado no tratamento da dor gerada
celular subcutâneo da região peitoral (Fig. 75.15, C). por câncer, neuropatia no segmento cefálico ou cervi-
Em que pesem os resultados favoráveis iniciais, a ele- cal rostral, quando a administração sistêmica ou por
vada freqüência de recidivas tornou tal procedimento meio de cateteres de agentes opióides alivia a con-
pouco indicado. O método, entretanto, revelou-se ine- dição dolorosa, mas implica instalação de tolerância,
ficaz no tratamento da neuralgia do trigêmeo e da dor perda da efetividade ou outros efeitos colaterais não

A B C

Fig. 75.15 – Radiografia do crânio na incidência lateral revelando (A) eletródio localizado no núcleo ventral póstero-medial
do tálamo e (B) no córtex motor. (C) Gerador implantável de pulsos Itrel II Meditronic Inc. (Minneapolis).

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

controláveis. As cirurgias são realizadas sob anestesia TRATAMENTO POR ELIMINAÇÃO DAS CAUSAS
geral. Realiza-se, por trepanação frontal direita, se-
guido de punção à mão livre ou estereotática do ven- Descompressão do Nervo Trigêmeo
trículo lateral. O cateter ventricular é conectado com Segundo Teixeira9, em 1953, Lee, em 1937, suge-
a bomba implantada no tecido celular subcutâneo que riu que a neuralgia do trigêmeo fosse causada pela
cobre o gradeado torácico ou no tecido celular subcu- compressão da raiz ao cruzar o bordo da pirâmide
tâneo dos hipocôndrios (Fig. 75.16, A e B). do osso temporal; Taarnhφj, em 1951, postulou que
O procedimento é eficaz em 70% dos doentes com o nervo era comprimido no canal estreito formado
dor gerada por câncer da cabeça e do pescoço. Rea- pelo ligamento petroclinóideo e descreveu a descom-
ções adversas são geralmente temporárias e represen- pressão da dura-máter que envolve a raiz e o gânglio;
tadas por constipação (50%), retenção urinária (42%), Tenuto, em 1953, Gardner e Portugal Pinto, em 1953,
náusea (37%), comprometimento do desempenho se- Love e Svien, em 1954, e Taarnhφj, em 1954, descre-
xual (27%), vômitos (24%), pesadelo (23%), prurido veram a técnica de descompressão da raiz do nervo
(23%), diaforese (8,5%) e edema (6%). Em geral, são trigêmeo por via extradural. Stender, em 1954 propôs
controlados clinicamente com medicações sintomáti- a descompressão do gânglio e da porção triangular da
cas e sua magnitude reduz-se no decorrer do tempo. raiz por via extradural. Taarnhφj, em 1954, e Gardner
e Miklos, em 1959, propuseram a descompressão do
poro trigeminal via craniectomia suboccipital. Stender
A
e Grumme, em 1969, aplicaram álcool etílico a 70%
na raiz do nervo trigêmeo para reduzir a taxa de recor-
rência desse procedimento. As cirurgias descompres-
sivas são eficazes em 58% a 98,6% dos casos. A me-
lhora parece dever-se ao traumatismo cirúrgico e não
à descompressão5. A taxa de recorrência é elevada, ou
seja, de 7% a 65% dos doentes durante os primeiros
18 meses e de 65% a 75% durante os primeiros 48
meses. A aplicação de álcool etílico no gânglio e na
raiz ou indução da hipoestesia facial reduz a taxa de
recorrência. Ocorre lesão do nervo facial em 16% dos
doentes, afasia em 12%, disestesias faciais em 0% a
13%, déficit objetivo ou subjetivo da sensibilidade fa-
cial em 25% a 27,5%, anormalidades eletroencefalo-
gráficas são freqüentes. A mortalidade é rara.
Há anormalidades macroscópicas identificadas na
raiz trigeminal em mais de 60% dos doentes com neu-
ralgia do trigêmeo; incluíam-se entre eles processos
B
expansivos (neurinoma do acústico, colesteatoma,
osteoma, meningeoma, metástase), aneurisma da ar-
téria basilar, angioma cavernoso, distorção radicular
por ramos da artéria superior do cerebelo ou da veia
petrosa, malformações congênitas nervosas ou ósseas,
aderências entre o nervo trigêmeo e o tronco encefáli-
co, placa de esclerose múltipla, bandas de membrana
aracnóide. Ocorre neuralgia do trigêmeo em 2% dos
doentes com tumor na fossa posterior; tumores ocor-
rem em 1% a 5% dos doentes com neuralgia do trigê-
meo (neurinomas do acústico em 40% a 50%, cistos
epidermóides em 20% a 40%, meningioma em 20%
a 30%, neurinomas trigeminais em 0,1%, metástases,
granulomas)18. Segundo Teixeira9, Dandy, em 1929,
por craniectomia suboccipital, demonstrou haver ele-
vada freqüência de anormalidades na raiz trigeminal
representadas por processos expansivos em 4,2% a
5,6% dos casos, aneurisma da artéria basilar em 2,8%,
Fig. 75.16 – (A) Reprodução artística de cateter implantado angiomas em 2,3%, compressão da raiz por ramos da
no ventrículo lateral de doente. (B) Bomba eletrônica Synchro-
med para infusão de analgésicos no sistema nervoso central.
artéria superior do cerebelo em 30,7% e pela veia pe-

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75 – Tratamento Neurocirúrgico Funcional das Dores Faciais

trosa em 14%, malformações congênitas, ósseas e/ou 4% e por veias em 2%20; identifica também tumores
radiculares em 1%, aderências entre o nervo trigêmeo (neurinoma do acústico, meningioma, colesteatoma,
e o tronco encefálico em 3,2% e placas de esclerose glioma) em 4% a 12%, malformações arteriovenosas
múltipla em 4,6%. Segundo Teixeira3, Gardner e Mi- em 2% e placas de esclerose múltipla em 6%. Quan-
klos, em 1959, acessaram o nervo trigêmeo de um do a dor localiza-se ao primeiro ramo, a compressão
doente por via suboccipital e notaram a presença de ocorre na região ínfero-lateral da zona de entrada do
alça vascular aberrante acolada à raiz; a interposição nervo trigêmeo (local onde a bainha de mielina pro-
de substância inerte, entre a artéria e o nervo, aliviou duzida pelas células de Schwann encontra-se com a
permanentemente a dor. Jannetta, em 1967, utilizou o bainha de mielina produzida pela olingodendroglia)
microscópio cirúrgico para a descompressão neuro- por ramos da artéria anterior e inferior do cerebelo e,
vascular da raiz trigeminal por via transtentorial; de- quando localizada nas demais, pela artéria superior
vido a complicações operatórias e à dificuldade para a do cerebelo. Ocorre hipoestesia facial em 12% dos
mobilização vascular, essa via deixou de ser utilizada. doentes, anestesia de córnea em 3%. Cefaléia, ataxia,
Os doentes devem ser operados sob anestesia ge- paralisia do nervo troclear em 4,3% dos casos; pa-
ral, posicionados em decúbito lateral, com o tronco ralisia facial periférica; infarto cerebelar, hematoma
inclinado anteriormente de 45° e com a cabeça fle- cerebelar, ataxia, meningite bacteriana ou asséptica,
tida ântero-medialmente e rodada contralateralmen- déficit da acuidade auditiva e embolia gasosa são
te de 30° a 45°C (Fig. 75.17, A). Após craniectomia complicações possíveis. Ocorre óbito em 0,5% a
suboccipital retromastóidea com uso de microscópio 4,3% dos casos6,15.
cirúrgico, a veia petrosa é coagulada e seccionada e a A taxa de recorrência é de 2% a 10%, atribuída a
membrana aracnóide que envolve a cisterna trigemi- deslocamento do material isolante ou à presença de
nal é aberta. As veias acoladas à raiz são coaguladas outros vasos anormais não identificados durante a ci-
e as artérias descoladas da raiz trigeminal e fragmen- rurgia. As anormalidades sensitivas faciais pré-ope-
to de Teflon® ou Dacron® é interposto entra ambas. ratórias tornam-se menos intensas ou desaparecem
A dura-máter, a seguir, é fechada hermeticamente3,11 após o procedimento2. Quando não há manipulação
(Fig. 75.17, B). ou traumatismo da raiz, pode ocorrer dor durante os
Há melhora em 82,2% a 100% dos doentes sub- primeiros dias ou semanas após a cirurgia. Quando a
metidos à descompressão neurovascular. A explora- dor é causada por esclerose múltipla ou há dificulda-
ção microcirúrgica do nervo trigêmeo por craniecto- de para o isolamento das estruturas vasculares, reco-
mia suboccipital revela compressão vascular da raiz menda-se a secção do segmento ínfero-lateral da raiz
em mais de 88% dos casos, causada por ramos da sensitiva, junto à ponte; a secção da raiz sensitiva do
artéria superior do cerebelo em 82% dos casos, por nervo trigêmeo pode ser necessária em até 26% dos
ramos da artéria anterior e inferior do cerebelo em casos porque não se evidencia compressão ou porque

A B

Artéria superior
do cerebelo

Raiz do nervo trigêmeo

Ponte

Fig. 75.17 – (A) Reprodução artística de doente posicionado durante a execução de descompressão microcirúrgica vascular de
nervos cranianos. (B) Reprodução artística do nervo trigêmeo comprimido pela artéria superior do cerebelo.

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Parte 10 – Neurocirurgia Funcional e da Dor

a descompressão não é possível. A descompressão mastóidea, o cerebelo é retraído para linha mediana
neurovascular alivia a dor em 75% dos doentes com com espátula situada entre o nervo vestibulococlear
neuralgia atípica do trigêmeo2. Nesses casos, a com- e o facial; o LCR é drenado e é realizada dissecção
pressão ocorre em um ponto situado distalmente à da aracnóide da cisterna do ângulo pontocerebelar e
zona de entrada. Pode ocorrer melhora da dor e déficit visualizados os nervos facial, vestibulares, acústico
funcionais do nervo trigêmeo nos doentes com neuro- e intermediário. A seguir, alças vasculares anômalas
patia trigeminal idiopática submetidos à descompres- ou ramos da artéria anterior e inferior do cerebelo ou
são neurovascular. superior do cerebelo ou outras anormalidades que
A descompressão neurovascular do nervo trigê- porventura distorcem o nervo intermédio devem ser
meo é indicada para doentes com neuralgia idiopática corrigidos; não havendo anormalidade identificável o
trigeminal ou neuralgia atípica do trigêmeo com idade nervo intermediário deve ser seccionado3.
inferior a 70 anos sem fatores de risco significativos,
especialmente com neuralgia trigeminal do primeiro CONCLUSÕES
ramo ou com anestesia da hemiface contralateral ou
dor bilateral e que pretendem preservar a sensibilida- Em doentes com neuralgias do segmento cefálico,
de na face5,19. recomenda-se a pesquisa de eventual etiologia neo-
plásica ou inflamatória. Não havendo anormalidade
ao exame clínico e complementar, o tratamento far-
Descompressão do Nervo Glossofaríngeo macológico está indicado. Carbamazepina deve ser o
Consiste em craniectomia da fossa posterior e agente de primeira escolha. Em casos de resistência
microdissecção do nervo glossofaríngeo, seguida de à sua ação, recomenda-se associação com difenil-
isolamento de alças vasculares anômalas e/ou ramos hidantoína. Em casos de intolerância, a difenil-hi-
da artéria posterior e inferior do cerebelo entre a ori- dantoína, seguida da tentativa de controle da dor com
gem aparente dos nervos, no sulco lateral do bulbo clonazepam, baclofeno, gabapentina, topiramato ou
e o forame jugular. O doente deve ser posicionado lamotrigina, devem ser aplicada. Resistência da dor
em decúbito lateral, e o procedimento, conduzido sob ao tratamento clínico ou intolerância medicamentosa
anestesia geral e com monitoração cardíaca. Após a são critérios de indicação de tratamento cirúrgico. Em
craniectomia retromastóidea, a dura-máter é aberta doentes com menos de 65 anos e em bom estado geral
nos planos subcutâneos, e o hemisfério cerebelar, re- ou quando da suspeita de lesões associadas de outros
traído rostralmente. Sob visão microscópica, realiza- nervos cranianos, a descompressão neurovascular
se dissecção da cisterna lateral e liberam-se nervos por craniectomia retromastóidea isolada ou associada
bulbares da membrana aracnóide e expõe-se o forame à rizotomia seletiva está indicada. Em doentes com
jugular; o nervo glossofaríngeo situa-se anteriormen- mais de 65 anos ou jovens em mau estado geral ou
te e é separado do nervo vago por septo dural. Ele que não aceitem a cirurgia a céu aberto, a rizotomia
deve ser isolado das alças vasculares anômalas e/ou percutânea por radiofreqüência, a compressão da raiz
dos ramos da artéria posterior e inferior do cerebelo; a por balão ou a neurólise química por glicerol, nessa
interposição de Dacron® ou Teflon® entre essas estru- seqüência de prioridades, estão indicadas.
turas evita recorrência do contato. Quando não hou-
ver causa evidente, o nervo glossofaríngeo deve ser REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
parcialmente seccionado, assim como um terço das
fibras rostrais do nervo vago6. A descompressão mi- 1. Teixeira MJ, Shu EBS, Nóbrega JCM, Corrêa CF.
crocirúrgica neurovascular do nervo glossofaríngeo é Dor facial atípica: caracterização de uma amostra.
Arq Bras Neurocir. 2000;19:64-70.
eficaz. O aparecimento de seqüelas sensitivas ou mo-
2. Nóbrega JCM. Dor facial atípica e dor facial sinto-
toras decorrentes da cirurgia descompressiva é variá-
mática: caracterização diferencial quanto à apresen-
vel e relaciona-se à lesão de algumas fibras do nervo tação clínica [tese]. São Paulo: Universidade Federal
glossofaríngeo ou vago durante a microdissecção. A de São Paulo; 2002.
disfagia e a disfonia pós-operatória que ocorrem ini- 3. Teixeira MJ. Tratamento neurocirúrgico da dor neu-
cialmente em geral desaparecem no decorrer de dias. ropática. Rev Med. 1999;78:305-36.
A monitoração cardiovascular é recomendável duran- 4. Teixeira, MJ. Estimulação elétrica do sistema nervo-
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beça fletida ântero-medialmente e rodada de 45° para 6. Teixeira MJ. Fisiopatologia da nocicepção e da su-
o lado oposto. Após craniectomia suboccipital retro- pressão da dor. In: Siqueira JTT, Teixeira MJ, edito-

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75 – Tratamento Neurocirúrgico Funcional das Dores Faciais

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Índice Remissivo

A pré-sigmóideo e técnica cirúrgica, 196


translabirintino, 199
Abscesso cerebral, 368, 445-451 pré-temporal, 144
diagnóstico diferencial, 447 transcavernoso transelar, 148
epidemiologia, 445 retrossigmóideo, 199
etiopatogenia, 445 subfrontal, 291
exames complementares, 447 suboccipital, 405
manifestações clínicas, 447 supracerebelar, 399
múltiplos, 448 supracerebelar infratentorial, 395
patologia, 446 supratentorial transfalcina inter-hemisférica e
profilaxia, 449 suboccipital, 397, 399
prognóstico, 449 transoral, 251
tratamento, 448 transylviano, 291
ACAS, estudo, 63 Acidente isquêmico vascular cerebral, 58
Acesso(s) cirúrgico(s), 91, 194, 248, 273, 404 Ácido gama-aminobutírico, agonistas do, 810
anterior ás hérnias de disco cervicais, 555-562 Acromegalia, 178
complicações, 560 Acupuntura, 533
intra-operatórias, 560 Adenomas incidentais, 178
pós-cirúrgicas, 561 Afastador autostático, 688
definição, 555 Agenesia do corpo caloso, 481
diagnóstico, 557 Agentes
epidemiologia, 555 antiespáticos, eficácia dos, 728
etiologia, 555 neurolíticos, 826
quadro clínico, 556 Agonistas
semiologia, 556 adrenérgicos, 810
tratamento, 557 do ácido gama-aminobutírico, 810
ântero-lateral extrafaríngea, parafaríngea e retrofaríngea, 252 Alanina, 418
ao ápice basilar, 146 Amarria(s), 577
craniotomia, 273 ganchos e, sublaminares, 586
bifrontal, 280 interespinhosa, 577
fronto-temporopterional, 273 Amigdalotomia, 720
de Dolenc, 655 Amital sódico, teste do, 28
dorsal, 248 Analgésicos, 532
escolha dos, 643 local em pontos-gatilho e agulhamento a seco, 533
fronto-orbitozigomático, 194 sistemas implantáveis para infusão de, no
intracranianos extra e intradural, 644 compartimento liquórico, 793-816
paramediano de Wiltse, 568 complicações, 815
petrosectomia total e técnica cirúrgica, 199 de administração, 793
petrosos, 196 dor não relacionada ao câncer, 812

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843
Índice Remissivo

fármacos utilizados, 800 craniotomia, 85


agonistas adrenérgicos, 810 e abertura dural, 86
agonistas do ácido gama-aminobutírico, , 810 pterional e abertura cisternal, 85
anestésicos locais, 800 da artéria carótida interna, 88
bloqueadores NMDA, 810 da bifurcação, 92
calcitonina, 812 do segmento comunicante posterior e coróideo, 91
combinação de fármacos, 812 da artéria cerebral anterior, 100
corticosteróides, 812 da artéria cerebral média, 107
opióides, 803 dissecção interfascial, 85
possibilidades futuras, 812 gigantes, 111
somatostatina, 812 incisão cutânea, 85
seleção dos doentes, 800 microdissecção e clipagem, 87
tratamento por infusão de, no sistema nervoso central, 837 técnicas endovasculares, 111
Anastomose, 160 gigantes e complexos, 127-136
de alto fluxo extra-intracraniana no tratamento de indicações para revascularização cerebral, 131
aneurismas complexos, 153-160 técnica cirúrgica, 133
aspectos técnicos, 155 anestesia, 134
complicações, 160 complicações, 135
cuidados pós-operatórios, 160 craniotomia, 133
indicações, 153 de anastomose distal, 134
distal, técnica de, 134 de anastomose proximal, 134
proximal, técnica de, 134 permeabilidade do enxerto, 135
Anencefalias, 473 preparação do enxerto vascular, 133
Anestesia, 134 preparação do túnel para o enxerto, 133
na endarterectomia carotídea, 65 preparação do vaso receptor cervical, 133
Anestésico(s), 210 preparação do vaso receptor intracraniano, 133
locais, 800 técnicas de revascularização cerebral, 131
mais utilizados no Brasil, 802 intracavernoso embolizado com molas, 210
Aneurisma(s), 89 paraclinóideos, 117-125
basilares distais, 137-152 complicações, 124
acesso pré-temporal, 144 diagnóstico, 118
anatomia microcirúrgica da porção anterior do hiato angiografia digital, 119
tentorial, 139 angiografia intra-operatória, 119
artéria, 142 ressonância nuclear magnética, 118
basilar, 140 tomografia computadorizada, 118
cerebelar superior, 142 evolução, 124
cerebral posterior, 141 tipos de, 89
comunicante posterior, 142 tratamento, cirúrgico direto combinado, 120
diagnóstico, 138 aplicação definitiva do clipe, 122
incidência, história natural e fisiopatologia, 137 controla da artéria carótida interna, 121
indicação de cirurgia, 143 craniotomia e exposição inicial, 120
manifestações clínicas, 138 dissecção do aneurisma, 122
técnica cirúrgica, 144 redução do aneurisma por sucção retrógrada, 122
abertura dural, 145 remoção do processo clinóide anterior, 121
acesso ao ápice basilar, 146 seleção do paciente, 120
acesso pré-temporal transcavernoso transelar, 148 Angina pectoris, 754
craniotomia, 145 Angiofibroma juvenil, extenso, 207
dissecação microcirúrgica, 146 Angiogênese e edema cerebral em meningiomas de
incisão cutânea e dissecação do músculo temporal, 145 convexidade, 420
posicionamento, 144 Angiografia, 119
tratamento cirúrgico dos, 139 digital, 119
complexos, anastomose de alto fluxo extra- intra-operatória, 119
intracraniana no tratamento de, 153-160 Angioma(s), 21
aspectos técnicos, 155 cerebrais, 73-81
complicações, 160 complicações, 71
cuidados pós-operatórios, 160 cavernomas, 79, 81
indicações, 153 malformações arteriovenosas, 80
da circulação anterior, tratamento cirúrgico dos, 83-116 conceitos e quadros clínicos, 73
abertura da cisterna Sylviana e cisternas basais, 87 anomalias do desenvolvimento venoso, 75
anatomia microcirúrgica, 83 cavernosos ou cavernomas, 74
avaliação diagnóstica, 84 fístulas arteriovenosas durais, 75
complicações, 111 malformações arteriovenosas, 73

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Índice Remissivo

teleangectasias capilares, 74 infiltração da, 262


diagnóstico, 75 Artéria cerebral, 310
anomalias do desenvolvimento venoso, 76 aneurisma da, 100, 107, 141
cavernomas, 76 média, 58
fístulas arteriovenosas durais, 76 técnicas de descompressão cirúrgica no tratamento de
malformações arteriovenosas, 75 isquemia cerebral no território da, 57-62
teleangectasias capilares, 76 craniectomia descompressiva, 59
tratamento, 76 Doppler transcraniano como indicador precoce de
anomalias do desenvolvimento venoso, 80 descompressão e perioperatório, 58
cavernomas, 79 idade e lado do infarto como fatores decisórios na
fístulas arteriovenosas durais, 80 indicação e prognóstico, 58
malformações arteriovenosas, 76 rationale para a craniectomia descompressiva, 57
teleangectasias capilares, 80 timming da craniectomia descompressiva, 57
da hemiface, 21 trombose da, 310
Ângulo pontocerebelar, 377 Articulações, 517
meningioma do, 192 sinoviais, aplicações medicamentosas em, 529
Anomalias do desenvolvimento venoso, 75, 76, 80 vértebras e suas, 517
Antidepressivos, 532 Artrodese após descompressão torácica, 600
Antiespasmódicos, efeitos colaterais dos, 729 Ashworth, escala de, e de espasmos, 726
Antiespáticos, 728 Aspirador ultra-sônico, 301
Antiinflamatórios não hormonais, 532 Assepsia, 374
Anti-sepsia, 374 Assoalho selar, abertura do, 183
Anzóis cirúrgicos, 277 Astrocitoma(s), 403
Aparelho de estereotaxia, 739 infiltrativo, 350
MD-Micromar, 836 pilocítico(s), 407
TM-Micromar, 836 cerebelares, 407
Apert, síndrome de, 460 de fossa posterior, 403
Aqueduto cerebral, 674 Atividades físicas, 531
Aracnóide espessa, 339 Átrio ventricular, 385
Arco reflexo de estiramento, 725 Atrofia do músculo temporal, 240
Artéria(s), 142 Auto-retrator de Jahnsen, 375
aneurisma da, 140
basilar, 140 B
cerebelar superior, 142
cerebral, 107 Backlund, pinça de, 779
anterior, 100 Balão
média, 107 de Fogarty, 831
posterior, 141 teste de oclusão com, 128
comunicante posterior, 142 Baller-Gerold, síndrome de, 458
basilar, 140, 245, 676 Bartel, índice de, 726
Artéria carótida, 88 Bastão de Hockey, 251
cervical, endarterectomia de, 63-72 Bifurcação basilar, 139
com anestesia regional, 69 Biofeedback, 533
complicações pós-operatórias, 70 Biópsia, 779
considerações gerais, 69 a céu aberto, 778
considerações técnicas e técnicas de monitoração, 65 estereotática, técnicas de, das lesões encefálicas, 775
fatores de risco, 64 pinça de, 779
indicações, 63 Bisturi, 434
lesão cerebral por isquemia e reperfusão, 71 Biventre cerebelar, hérnia do, 339
longitudinal, 67 Bloqueadores NMDA, 810
por eversão, 69 Bloqueio anestésico, 752
pós-operatório de, 69 troncular trigeminal, 831
técnicas de arteriotomia, 66 Bomba(s)
interna, 90 de infusão, 797
aneurismas da, 88 eletrônica Synchromed, 838
acesso cirúrgico, 91 Bossa frontal, 457
carótido-oftálmicos, 90 Botões cirúrgicos, 277
clinóideos e paraclinóideos, 88, 90 Braquicefalia, 457, 467
da bifurcação, 92 Brooks, técnica de, 576
da porção posterior da clinóide, 90 Bypass, 153
gigantes, 91 com veia safena, 262
hipofisária superior, 90 de alto fluxo, indicações para o, 153

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Índice Remissivo

C história e revisão da literatura, 333


histórico da evolução do, 337
Cabeceira de Mayfield, 301 material e métodos, 338
Cages cervicais, 578 técnica cirúrgica, 338
Calcitonina, 532, 812 Cingulotomia, 719, 836
Calosotomia, 2, 41-44 estereotática, 762
acesso ao esplênico do corpo caloso, 44 Cintas, coletes e, de suporte muscular, 533
corredor cirúrgico, 43 Circulação anterior, aneurismas da, tratamento cirúrgico
craniotomia, 42 dos, 83-116
incisão da pele, 42 abertura da cisterna Sylviana e cisternas basais, 87
posicionamento da cabeça, 42 anatomia microcirúrgica, 83
preparo local, 42 avaliação diagnóstica, 84
Calota craniana, 473 complicações, 111
Câmara de Ommaya, 373, 375 craniotomia, 85
Campimetria, 653 da artéria carótida, 90
Campo interna, 88
de Forel, 740, 743 acesso cirúrgico, 91
visual, 297 carótido-oftálmicos, 90
Canal clinóideos e paraclinóideos, 88, 90
auditivo, tumor no, 265 da bifurcação, 92
lombar, estenose do, 563-572 da porção posterior da clinóide, 90
diagnóstico, 564 do segmento comunicante posterior e coróideo, 91
prognóstico, 570 gigantes, 91
quadro clínico, 563 hipofisária superior, 90
tratamento, 565 da artéria cerebral, 100
cirúrgico, 566 anterior, 100
clínico, 565 distal, 101
vertebral, 518 média, 107
Câncer no sistema nervoso, efeitos não metastáticos do, 368 dissecção interfascial, 85
Capsulotomia anterior, 720 gigantes, 111
Carcinomatose meníngea, tratamento de, 373 incisão cutânea, 85
Carpo, túnel do, síndrome do, 613-620 microdissecção e clipagem, 87
anatomia, 613 técnicas endovasculares, 111
diagnóstico, 614 Cirurgias psiquiátricas, 762
doença, 613 Cisterna
tratamento, 617 pré-pontina, 377
Carrefour ventricular, 385 inspeção endoscópica da, 676
Caspar, 560 Sylviana, abertura da, e cisternas basais, 87
parafusoso do tipo, 560 técnica, 88
retratores do tipo, 560 Cisto dermóide da região petroclival, 197
Cateter(es), 375 Clipagem, microdissecção e, 87
de derivação ventriculoperitoneal, 284 Coagulação bipolar, 282
de Fogarty, 676 Coletes e cintas de suporte muscular, 533
peritoneal, 682 Colina, 418
ventricular, 375 Coluna vertebral, 517
obstrução de, 504 considerações anatômicas sobre a, 517
Cavernomas, 74, 76, 79 canal vertebral, 518
Cavidade disco intervertebral, 518
nasal, 323 inervação, 519
ventricular, 342 ligamentos, 517
Cavo de Meckel, 239, 309 nervos espinhais, 519
Cebocefalia, 478 vascularização, 520
Cefaléia orbitária, 240 doença degenerativa da, fisiopatologia da, 520
Célula(s), 392 metástases da, 595-603
B, linfoma não-Hodgkin de, 374 manifestações clínica e diagnóstico, 595
germinativas, tumores de, 392 tratamento, 597
gigantes, tumores de, 262 procedimentos de estabilizações segmentares da, 541
neoplásicas, 374 dinâmicas anteriores, 543
Cérebro pálido, 60 fixas, 541
Chiari, malformação de, 338, 474 fusão lombar intersegmentar anterior, 541
tratamento cirúrgico das, 333-344 fusão lombar intersegmentar posterior, 542
associada a siringomielia e/ou impressão basilar, 337 fusão lombar intersegmentar transversal ou
discussão, 342 transforaminal, 543

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Coluna vertebral, instrumentação da, 573-594 complicações, 319


baixa, 577 estendida, 317
da junção occipitocervical, 574 otorrinolaringológicas, 319
estabilização da coluna, 580 endoscópica, 321
anterior, 580 médio-facial, 320
dinâmica, 589 por rinotomia lateral, 319
fixação C1 C2, 575 radical, 318
lombossacra, 582 transbasal, 313
anatomia aplicada da região sacropélvica, 582 exposição da base do crânio, 314
sistema de fixação lombopélvica, 584 fechamento, 315
barra sacra, 588 indicações, 316
fixação de Jackson, 586 limitações da, e abordagens combinadas, 316
fixação em delta, 588 objetivos, 313
fixação iliossacral, 587 plano mucoso, 314
ganchos e amarrias sublaminares, 586 preparação, 313
método Dunn-McCarthy, 585 remoção do tumor basal, 315
montagem M-W, 587 reparo da base do crânio 315
parafusos anterior L5-S1, 588 reparo meníngeo, 314
parafusos ilíacos, 586 técnica cirúrgica, 313
parafusos pediculares em S1, 584 retalho miofascial para reconstrução da base do, 263
parafusos transfacetários L5-S1, 585 Craniofaringiomas na infância, 505-511
suporte à coluna anterior, 588 avaliação pré-operatória, 507
técnica de Galveston, 586 cirurgia radical versus exérese subtotal, 509
torácica, 579 complicações, 508
Compartimento liquórico, infusão de fármacos no, 717, 793-816 diagnóstico radiológico, 506
complicações, 815 evolução e prognóstico, 509
de administração, 793 papel da radioterapia, 509
dor não relacionada ao câncer, 812 patologia, 505
seleção dos doentes, 800 quadro clínico, 506
tipos de, 800 tratamento, 507
Compressão alternativas de, 509
cerebral, 462 cirúrgico, 507
do nervo, 297 Cranioplastia minimamente invasiva, 693-696
espinhal, sinais de, 522 discussão, 694
óptico, 297 materiais e métodos, 693
ulnar no cotovelo, 629-632 perfeitas, características de, 695
anatomia, 630 resultados, 694
tratamento, 630 Craniossinostose, 491-499
Côndilo occipital, 246, 250 classificação, 491
Condroma do seio cavernoso, 212 diagnóstico, 497
Condrossarcomas, 260, 262 epidemiologia, 492
Contraste, 299 fisiopatogenia, 493
injeção de agente de, 831 quadro clínico, 494
iodado, 110, 299 tratamento e prognóstico, 498
paramagnético-gadolínio, 348 Craniossinostose precoce, 455-471
Cordomas, 262 cirurgia, 460
Cordotomia, 758 época da, 462
Corpo caloso, 481 estratégia cirúrgica, 462
acesso ao esplênico do, 44 indicações da, 460
agenesia do, 481 compressão cerebral, 462
malformações do, 480 estética, reparadora, 460
Córtex cerebral, 784 oftalmológica, 460
Corticosteróides, 812 retardo mental, 462
Costela, enxerto de, 340 técnica cirúrgica, 464
Cotovelo, compressão do nervo ulnar no, 629-632 braquicefalia, 467
anatomia, 630 escafocefalia, 464
tratamento, 630 facecraniossinostose, 469
Couro cabeludo, 186 hidrocefalia, 470
Craniectomia, 265 oxicefalia, 469
descompressiva, 57, 59, 310 plagiocefalia anterior, 465
Crânio, 263 plagiocefalia posterior, 467
abordagem neurocirúrgica da base anterior do, 313-323 trigonocefalia, 465

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classificação, 457 cirúrgica, técnicas de, no tratamento de isquemia


braquicefalia, 457 cerebral, 57-62
escafocefalia, 457 craniectomia descompressiva, 59
oxicefalia, 459 Doppler transcraniano como indicador precoce, e
plagiocefalia, 457 seguimento perioperatório, 58
anterior, 457 idade e lado do infarto como fatores decisórios na
posterior, 459 indicação e prognóstico, 58
trigonocefalia, 457 rationale para a craniectomia descompressiva, 57
quadro clínico, 456 timming da craniectomia descompressiva, 57
quadros sindrômicos, 459 de raízes espinhais e dos nervos sensitivos, 753
Craniotomia, 42, 92, 120, 133, 145, 291, 415, 655, 661 do nervo, 838
bifrontal, 272, 283, 290 glossofaríngeo, 840
clássica, 272 trigêmeo, 838
para grandes meningiomas da goteira olfativa, 280 neurovascular do nervo óptico nas lesões traumáticas, 651-658
e abertura dural, 86 diagnóstico, 651
frontal unilateral, 272 prognóstico, 656
frontoorbitária, 272 tratamento, 653
fronto-temporopterional para meningiomas de goteira cirurgia, 654
olfativa de pequeno e médio tamanhos, 273 clínica, 654
no hematoma, 669 pacientes comatosos, 656
epidural, 668 torácica, artrodese após, 600
intracerebral, 669 vascular do nervo intermédio, 840
subdural, 669 Desvio nasal importante, 458
occipital ipsilateral, 400 Diabetes mellitus, 64
parietoccipital, 400 Diafragma selar, 186
pré-sigmóideo, 198 meningiomas do tubérculo e, 287-295
pterional, 277, 285 anatomia, 287
clássica, 272 diagnóstico por imagem, 288
com osteotomia orbitozigomática, 308 incidência, 288
e abertura cisternal, 85 quadro clínico, 288
suboccipital, 382 tratamento cirúrgico, 290
bilateral, 384 craniotomia, 291
mediana, 396 resultados, 292
Creatina, 418 técnica microcirúrgica, 291
Crioablação, 539 Dilatação ventricular, 483
Crises epilépticas, 20 pós-operatória, 381
Crista esfenoidal, 182 supratentorial, 483
Crockard, retrator oral de, 327 Diplopia, 240
Crouzon, síndrome de, 460, 498 Discectomia, 536
Curvas de Kaplan-Meier, 819 a laser, 538
Cushing, doença de, 178 tempos da cirurgia para, 536
Discografia reprodutiva, 529
D Discoplastia lombar com disco artificial, 543
Dismorfias craniofaciais, 478
Dandy-Walker, malformação de, 481 Dispositivos de infusão, implantáveis disponíveis em
Defeitos nosso meio, 814
cranianos, topografia dos, 694 Dissecção, 85
do fechamento do tubo neural, 473 de pescoço, 263
Déficit visual, 297 interfascial, 85
parcial, 653 Doença(s)
Deformidade torácica, correção parcial de, 580 de Cushing, 178
Dentatotomia cerebelar, 732 de Parkinson, 735-750
Derivação alvos neurocirúrgicos, 738
do espaço subdural, 663 bases anatômicas, 738
liquóricas, 647 critérios para indicação do tratamento operatório, 736
ventricular, 292 histórico, 735
ventriculoatrial, 682 neuroestimulação, 744
ventriculoperitoneal, 401, 485-489, 681 bases fisiológicas da, 744
cateter de, 284 estimulação do núcleo subtalâmico de Luys, 747
complicações, 487 estimulação palidal, 746
técnica cirúrgica, 485 estimulação talâmica, 745
Descompressão, 840 seleção de casos para, 745

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neurotransplante, 748 cirurgias psiquiátricas, 762


procedimentos ablativos, 740 cordotomia, 758
lesão da zona incerta ou campotomia de Forel, 743 mesencefalotomia e talamotomia, 761
lesão do núcleo subtalâmico de Luys, 744 mielotomia, 760
polidotomia, 743 neurotomias de nervos somáticos, 755
talamotomia do núcleo ventral intermediário, 743 rizotomias, 757
talamotomia do núcleo ventrolateral do tálamo, 740 simpatectomias, 754
procedimentos operatórios, 739 tratotomia de Lissauer e lesão do corno posterior
degenerativa da coluna vertebral, fisiopatologia da, 520 de substância cinzenta da medula, 758
encefalovascular hemorrágica, 367 procedimentos neurocirúrgicos funcionais, 753
Dolenc, técnica de, 652 procedimentos neurorrestaurativos, 753
Doppler transcraniano, 58 procedimentos oncoterápicos, 753
Dor(es), 522 procedimentos psicocomportamentais, 752
ciática, 522 Drenagem, 662
neuroestimulação no tratamento da, 781-792 liquórica, 277
características da neuroestimulação, 789 lombar contínua, 647
estimulação elétrica da medula espinhal, 786 mediante trepanação, 662
estimulação elétrica do encéfalo, 787 venosa cortical, 427
cortical, 789 Dreno porto-vac, 69
profunda, 787 Dunn-McCarthy, método, 585
estimulação elétrica do sistema nervoso periférico, 784 Dura-máter, 198, 281, 302, 688
estimulação elétrica transcutânea, 781 aberta, 185
sistemas implantáveis, 783 plástica da, 340
Dor(es) facial(is), tratamento neurocirúrgico funcional
das, 823-841 E
anatomia das unidades sensitivas da face, 824
por eliminação das causas, 838 ECST, estudo, 64
descompressão do nervo, 838 Edema, 350
glossofaríngeo, 840 cerebral, angiogênese e, em meningiomas de
intermédio, vascular, 840 convexidade, 420
trigêmeo, 838 temporal grave, 413
por infusão de fármacos analgésicos no sistema nervoso vasogênico, 350
central, 837 Eletrocoagulação intradiscal, 539
por métodos indiretos, 826 Eletródio(s)
por métodos neuroablativos, 826 com extremidade flexível e curva, 742
a céu aberto, 827 destinados a rizotomia percutânea por radiofreqüência, 829
cingulotomia, 836 Eletroencefalograma, 701
leucotomia frontal, 836 Eletroestimulação do sistema nervoso central, 727
lobotomia frontal, 836 Eletrólitos, tipos de, 756
nas unidades trigeminais periféricas, 826 Eletroneuromiografia, 529
rizotomias, 828 Êmbolo gasoso, 68
do nervo glossofaríngeo a céu aberto, 832 Embriogênese, 473
do nervo trigêmeo, 828 Encéfalo, estimulação elétrica do, 787
percutânea por radiofreqüência do nervo cortical, 789
glossofaríngeo, 832 profunda, 787
percutâneas com meios físicos, 829 Encefaloceles, 474
talamotomia e mesencefalotomia, 836 Encefalopatia de Rasmussen, 16
tratotomia e nucleotratotomia trigeminal, 833 Endarterectomia de artéria carótida cervical, 63-72
Dor(es) oncológica(s), 751-765 com anestesia regional, 69
avaliação dos doentes com, 752 complicações pós-operatórias, 70
epidemiologia, 751 considerações gerais, 69
estimulação elétrica do sistema nervoso, 764 considerações técnicas e técnicas de monitoração, 65
etiologia, 751 fatores de risco, 64
profilaxia, 752 indicações, 63
síndromes dolorosas, 751 lesão cerebral por isquemia e reperfusão, 71
sistemas implantáveis, 764 longitudinal, 67
tratamento, 752 por eversão, 69
bloqueios anestésicos, 752 pós-operatório de, 69
farmacológico, 752 técnicas de arteriotomia, 66
medidas fisiátricas, 752 Endoscopia, 540
procedimentos endocrinológicos, 762 retroperitoneal, 540
procedimentos neuroablativos, 754 transperitoneal, 540

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Enxerto(s), 624 Espondilolistese, 564


autólogo, 581 Estenose do canal lombar, 563-572
colocação de, 561 diagnóstico, 564
de costela, 340 prognóstico, 570
vascular, preparação do, 133 quadro clínico, 563
Ependimoma, 407 tratamento, 565
Epicondilectomia, 631 cirúrgico, 566
Epilepsia, 3 complicações, 569
do lobo temporal, tratamento cirúrgico da, 27-40 pós-operatório, 569
amígdalo-hipocampectomias seletivas, 38 preparo do paciente, 566
anatomia microcirúrgica, 30 técnica cirúrgica, 566
avaliação pré-cirúrgica, 27 clínico, 565
invasiva, 29 Estereolitografia, 694
não invasiva, 27 Estereotaxia, aparelho de, 739
casuística, 39 MD-Micromar, 836
indicação, 30 TM-Micromar, 836
planejamento cirúrgico, 34 Estimulação, 786
técnica cirúrgica, 34 cortical, 350, 371
focais, 17 do sistema nervoso, técnicas de, 45-47
na infância, 15-25 estimulador vagal, 46
quadro clínico e eletrográfico das, 15 estimuladores de núcleos profundos, 47
síndromes especiais na infância e adolescência, 16 elétrica, 787
tratamento cirúrgico, 23 da medula espinhal, 786
calosotomia, 2 do encéfalo, 787
estimulação vagal, 23 cortical, 789
evolução e prognóstico, 23 profunda, 787
evolução, morbidade e mortalidade, 23 do sistema nervoso, 764
objetivos do, 17
periférico, 784
seleção de pacientes, 18
transcraniana, 698
técnica e tática operatórias, 18
transcutânea, 533, 781
transecção subpial múltipla, 23
palidal, 746
Epstein, técnica de, 456
Erosão da lâmina papirácea, 322 talâmica, 745
Escafocefalia, 456, 464, 492 vagal, 23
Escala Estimulador elétrico transcutâneo portátil, 782
de Ashworth e de espasmos, 726 Estiramento, arco reflexo de, 725
de Frankel, 596 Estudo
de higiene pessoal, 726 ACAS, 63
de Tardieu, 726 ECST, 64
Esclerose, 16 NASCET, 64
mesial temporal, 20 Exercícios físicos, 531
tuberosa, 16 Expansão cerebral, medidas adicionais para provocar, 663
Espaço
liquórico, instilação de quimioterápicos no, 373 F
subaracnóideo, 339
subdural, derivação do, 663 Face, anatomia das unidades sensitivas da, 824
Espasmos, escala de Ashworth e de, 726 Facecraniossinostose, 469
Espasticidade, 723-733 Fáscia, 618
avaliação, 724 cervical, 197
fisiopatologia, 723 palmar e suas fibras longitudinais, 618
tratamento, 727 temporal, retalho de, 263
clínico, 727 Fascículos nervosos, 624
procedimentos cirúrgicos funcionais, 727 Fibras, 481
dentatotomia cerebelar, 732 corticoespinhais, 349
eletroestimulação do sistema nervoso central, 727 de Probst, 481
infusão de fármacos no compartimento liquórico musculares, 725
espinhal, 717 Fissura sylviana, 4, 33
lesão do trato de Lissauer e do corno posterior da Fístula(s), 210
medula espinhal, 732 arteriovenosas durais, 75, 76, 80
mielotomia paracentral, 731 carótido-cavernosa embolizada com balão, 210
neurotomias, 729 Fístulas liquóricas, 635-650
rizotomia percutânea, 731 diagnóstico, 639
rizotomia posterior seletiva, 729 clínico, 639

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laboratorial, 639 mastoidectomia, 264


radiológico, 640 nervo facial, 264
epidemiologia, 635 preparo do paciente e anestesia, 263
fisiopatologia, 636 remoção extradural do tumor, 265
fraturas da base do crânio, 637 remoção intradural do tumor, 265
anterior, 636 retalho miofascial para reconstrução da base do
causadas por projéteis de arma de fogo, 638 crânio, 263
média, 636 discussão, 267
posterior, 637 Forame magno, 244, 329
história e exame físico, 638 meningiomas do, 243-255
recursos diagnósticos, 640 diagnóstico, 244
tratamento, 641 epidemiologia, 243
antibióticos, 641 histórico, 243
cirúrgico, 642 quadro clínico, 243
acesso rinocirúrgico, 644 tratamento complementar ou alternativo, 253
acessos intracranianos extra e intradural, 644 tratamento e complicações, 253
escolha dos acessos cirúrgicos, 643 tratamento e evolução, 253
fechamento endoscópico, 646 tratamento microcirúrgico, 245
clínico, 641 anatomia microcirúrgica, 245
complicações, 647 classificação anatômica, 245
derivações liquóricas, 647 classificação baseada na orientação da expansão, 245
drenagem lombar contínua, 647 tipos de, 246
Fixação, sistema de, 585 vias de acesso, 248
iliossacral, 587 vias de acesso ântero-lateral extrafaríngea,
lombopélvica, 584 parafaríngea e retrofaríngea, 252
barra sacra, 588 vias de acesso dorsal mediana, 248
de Jackson, 586 vias de acesso dorsolateral ou suboccipital lateral, 249
em delta, 588 vias de acesso extremo lateral transcondilar, 252
ganchos e amarrias sublaminares, 586 vias de acesso extremo-lateral combinada, 252
iliossacral, 587 vias de acesso extremo-lateral, 252
método Dunn-McCarthy, 585 vias de acesso transoral, 251
montagem M-W, 587 Fórceps, 386
parafusos, 586 Forel, campo de, 740, 743
anterior L5-S1, 588 Fossa
ilíacos, 586 nasal, 321
pediculares em S1, 584 leucemia em, 322
transfacetários L5-S1, 585 posterior, 669
suporte à coluna anterior, 588 hematomas da, 669
técnica de Galveston, 586 tumores da, 403-409
Fixadores de Mayfield, 396 acessos cirúrgicos, 404
Fogarty, 676 detalhes técnicos microcirúrgicos relacionados a
balão de, 831 tipos histopatológicos específicos, 407
cateter de, 676 diagnóstico, 404
Forame de Monro, 675 quadro clínico, 403
Forame jugular, tumores do, 257-269 tratamento e prognóstico, 404
aspectos anatômicos, 257 Frankel, escala de, 596
aspectos clínicos, 258 Fraqueza do músculo temporal, 240
estudos de neuroimagem, 258 Fusão lombar intersegmentar, 541
tipos histológicos, 260 anterior, 541
de lesões, 262 posterior, 542
meningiomas, 262 transversal ou transforaminal, 543
paragangliomas, 260
schwanomas, 261 G
tratamento, 262
adjuvante, 265 GABA (v. Ácido gama-aminobutírico)
casuística, resultados e complicações, 266 Galveston, técnica de, 586
cirúrgico, 262 Ganchos e amarrias sublaminares, 586
craniectomia, 265 Gânglio, 824
dissecção de pescoço, 263 de Gasser, 309
exposição do tumor no canal auditivo externo, 265 trigeminal, seus três ramos e da raiz sensitiva, 824
fechamento, 265 Genes, terapia com, 547
incisão de pele, 263 Geradores, 785

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híbridos e seus programadores, 785 tratamento não cirúrgico, 661


implantáveis acionados por radiofreqüência, 785 tratamento, 661
Gigli, serra de, 301, 418 meningioma cortical simulando, 413
Glassock, triângulo de, 309 volumoso, 668
Glicocorticóides, 532 supratentoriais, 55, 667
Glioblastoma cerebelar, 402 talâmico, 51
Gliomas, 818 Hemiface, angioma da, 21
de baixo grau de malignidade, cirurgia dos, 347-354 Hemisferectomias, análise crítica das técnicas, 3-14
avanços em neuroimagem, 347 anatômica clássica, 4
craniotomia com paciente acordado e a estimulação funcional ou hemisferectomia funcionalmente total,
cortical nas, 350 porém anatomicamente subtotal, 6
ressonância magnética funcional, 350 hemidecorticação, 8
ultra-sonografia intra-operatória, 351 hemisferotomia periinsular e deaferentação hemisférica, 9
malignos, 355-364 utilizada no HCFMUSP, 11
avaliação neuropsicológica, 359 Hemisférios cerebrais, 348
biologia, genética e invasividade dos, 356 Hemorragias subdurais recidivantes, 661
diagnóstico por imagem, 357 Hemostasia com Surgicel, 282
epidemiologia, 355 Hérnia, 339
quadro clínico, 356 de disco cervical, acesso cirúrgico anterior ás, 555-562
radionecrose, 363 complicações, 561
tratamento cirúrgico, 360 intra-operatórias, 560
periaquedutais, 395 pós-cirúrgicas, 561
Globo(s) definição, 555
oculares protrusos, 473 diagnóstico, 557
pálido, 740 epidemiologia, 555
Glomo jugular, tumores do, 260 etiologia, 555
Goteira olfativa, 285 quadro clínico, 556
meningiomas de, 271-286 semiologia, 556
anatomia, 272 tratamento, 557
avaliação pré-operatória, 272 do biventre cerebelar, 339
de pequeno e médio tamanhos, 273 Hérnia de disco lombar, 515-554
grandes, 280 cirurgias, 516
considerações anatômicas sobre a coluna vertebral, 517
tratamento cirúrgico e acessos cirúrgicos, 273
canal vertebral, 518
complicações, 284
disco intervertebral, 518
craniotomia bifrontal, 280
inervação, 519
craniotomia fronto-temporopterional, 273
ligamentos, 517
nervos espinhais, 519
H vascularização, 520
vértebras e suas articulações, 517
Hamartomas hipotalâmicas, 17
diagnóstico, 529
Harrington, técnica de, 580 clínico, 521
Hemangioblastoma cerebelar, 409 diferencial, 529
Hematoma(s), 561 exames complementares no, 524
epidural, craniotomia no, 668 aplicações medicamentosas em articulações
intracerebral, craniotomia no, 669 sinoviais, 529
intracranianos traumáticos agudos, 667-670 discografia reprodutiva, 529
intraparenquimatosos espontâneos, 51-55 eletroneuromiografia, 529
conceito, 51 injeções seletivas epidurais dos nervos espinhais, 529
diagnóstico, 52 mielografia, 529
epidemiologia, 51 orientação de imagem por método esterotático
manifestações clínicas, 52 computadorizado, 527
patologia, 51 radiografia simples, 524
topografia, 51 ressonância magnética, 524
tratamento, 53 termografia, 529
subdural, 413 tomografia axial computadorizada, 527
craniotomia no, 669 epidemiologia, 516
crônico, 659-665 failed back surgery syndrome, 548
conceito e classificação, 659 fisiopatologia da doença degenerativa da coluna
diagnóstico, 660 vertebral, 520
etiopatogenia, 659 na infância, 549
quadro clínico, 660 o futuro, 516
tratamento cirúrgico, 661 o início, 515

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Índice Remissivo

procedimentos de localização e diagnóstico, 515 I


tratamento cirúrgico, 534
implante de prótese de núcleo pulposo, 546 Implante, 546
indicações e contra-indicações neurológicas, 534 de câmara de Ommaya, técnica cirúrgica do, 373
microdiscectomia clássica, 535 de prótese de núcleo pulposo, 546
opções cirúrgicas, 535 Impressão basilar, 338
procedimentos de estabilizações segmentares da Inchaço cerebral, 60
coluna vertebral, 541 Incisão(ões), 280
curvilínica frontal, 374
dinâmicas, 543, 545
cutânea, 42, 85, 263
fixas, 541
e dissecação do músculo temporal, 145
fusão lombar intersegmentar, 542 em forma de J invertido, 251
procedimentos minimamente invasivos, 540 em forma de orelha de Mickey, 280
anteriores, endoscopia transperitoneal, 540 retroauricular, 381
crioablação, 539 Índice
discectomia a laser, 538 de Bartel, 726
eletrocoagulação intradiscal, 539 de Karnofsky, 305
laterais, endoscopia retroperitoneal, 540 Infância
microdiscectomia endoscópica, 538 craniofaringiomas na, 505-511
nucleotomia manual e automatizada, 538 avaliação pré-operatória, 507
posteriores abertos, 540 cirurgia radical versus exérese subtotal, 509
posteriores percutâneos, 537 complicações, 508
quimionucleólise, 537 diagnóstico radiológico, 506
técnicas de regeneração do disco intervertebral, 546 evolução e prognóstico, 509
terapia celular, 547 papel da radioterapia, 509
terapia com genes, 547 patologia, 505
tratamento não-cirúrgico, 530 quadro clínico, 506
acupuntura, 533 tratamento, 509
analgésico local em pontos-gatilho e agulhamento a alternativas de, 509
seco, 533 cirúrgico, 507
biofeedback, 533 epilepsia na, 15-25
coletes e cintas de suporte muscular, 533 quadro clínico e eletrográfico das, 15
estimulação elétrica e transcutânea nervosa, 533 síndromes especiais na infância e adolescência, 16
hipnose, 533 tratamento cirúrgico, 23
medicamentos, 531 acessórios a cirurgia, 19
mudanças das atividades físicas, 531 calosotomia, 2
terapia(s), 531 estimulação vagal, 23
de manipulação espinhal, 532 evolução, 23
físicas, 531 evolução e prognóstico, 23
tração pélvica, 533 evolução, morbidade e mortalidade, 23
Hiato tentorial, anatomia microcirúrgica da porção incisão, 19
anterior do, 139 lesionectomias, 19
Hidrocefalia, 470, 679-683 lobectomia temporal, 19
objetivos do, 17
apresentação clínica, 679
passos técnicos, 19
classificação, 679
preparo do paciente, 18
diagnóstico, 680 ressecções extratemporais, 21
etiologia, 680 seleção de pacientes, 18
grave, 501 técnica e tática operatórias, 18
obstrutiva do aqueduto, 400 transecção subpial múltipla, 23
seguimento dos casos operados, 682 hérnia de disco lombar na, 549
tratamento, 681 Infecção(ões), 488
Hiperdrenagem, 487 pós-operatórias, 561
Hiperostose com infiltração tumoral da órbita e da região relacionada a derivação ventriculoperitoneal, 488
esfenorbitária, 298 Infiltração(ões), 532
Hipertensão intracraniana, 686 da artéria carótida interna, 262
Hipnose, 533 perirradicular percutânea, 605-609
Hipodrenagem, 487 considerações anatômicas aplicadas a, 606
Hipofisectomia estereotática por radiofreqüência, 763 contra-indicações para a, 606
Hipotalamotomia póstero-medial, 720 fisiologia, 607
Hipotelorismo, 458 indicações para a, 605
ocular, 478 técnica de, 606
Hockey, bastão de, 251 tumoral da órbita, hiperostose com, e da região
Holoprosencefalias, 478 esfenorbitária, 298

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Índice Remissivo

Infusão, bombas de, 797 do trato de Lissauer, 732


Injeção(ões), 529 dos nervos cranianos, 67
de agente de contraste, 831 encefálicas, técnicas de biópsia estereotática das, 775
seletivas epidurais dos nervos espinhais, 529 granulomatosas, 368
Instrumentação da coluna vertebral, 573-594 traumáticas, descompressão neurovascular do nervo
baixa, 577 óptico nas, 651-658
da junção occipitocervical, 574 diagnóstico, 651
estabilização da coluna, 580 prognóstico, 656
anterior, 580 tratamento, 654
dinâmica, 589 clínico, 654
fixação C1 C2, 575 pacientes comatosos, 656
lombossacra, 582 tratamento cirúrgico, 653
anatomia aplicada da região sacropélvica, 582 posicionamento e craniotomia, 655
sistema de fixação lombopélvica, 584 técnica descompressiva endoscópica, 655
torácica, 579 técnica extracraniana, 654
Intubação, 326 técnica extradural, 655
Isquemia cerebral, 71 técnica microcirúrgica endonasal, 654
lesão cerebral por, e reperfusão, 71 Lesionectomias, 19
técnicas de descompressão cirúrgica no tratamento de, 57-62 Leucemia em fossa nasal, 322
craniectomia descompressiva, 59 Leucotomia frontal, 836
Doppler transcraniano como indicador precoce de Ligamentos, 517
descompressão e perioperatório, 58 Linfoma não-Hodgkin de células B, 374
idade e lado do infarto como fatores decisórios na Lipídeos, 418
indicação e prognóstico, 58 Líquido cefalorraquidiano, 374
rationale para a craniectomia descompressiva, 57 Lissauer, trato de, 758, 767, 771
timming da craniectomia descompressiva, 57 lesão do, 732
Lobectomia temporal, 19, 60
J Lobo temporal, epilepsia do, tratamento cirúrgico da, 27-40
amígdalo-hipocampectomias seletivas, 38
Jackson, fixação de, 586
anatomia microcirúrgica, 30
Jahnsen, auto-retrator de, 375
avaliação pré-cirúrgica, 27
Junção occipitocervical, instrumentação da, 574
invasiva, 29
não invasiva, 27
K casuística, 39
Kaplan-Meier, curvas de, 819 indicação, 30
Karnofsky, índice de, 305 planejamento cirúrgico, 34
Kawase, triângulo de, 310 técnica cirúrgica, 34
Kerrison, pinça de, 181 Lobotomia frontal, 836
Kocher, ponto de, 374, 688 Lombalgia, 530
aguda, 530
crônica, 530
L recorrente, 530
Lâmina papirácea, erosão da, 322 subaguda, 530
Landau-Kleffner, síndrome de, 17 Luys, núcleo subtalâmico de, 744
Lasègue, manobra de, 523 estimulação do, 747
Laser, discectomia a, 538 lesão do, 744
Lennox-Gastaut, síndrome de, 16
Lesão(ões) M
cerebral por isquemia e reperfusão, 71
do corno posterior da substância cinzenta da medula Malformação(ões)
espinhal, 758, 767, 771 arteriovenosas, 73, 75, 80
do núcleo subtalâmico de Luys, 744 congênitas, 473-484
do seio cavernoso, 205-216 defeitos do fechamento do tubo neural, 473
anatomia cirúrgica, 206 embriogênese, 473
casuística, 211 relacionadas a diverticulação e segmentação, 477
história natural e diagnóstico, 205 de Dandy-Walker, 481
técnica cirúrgica, 207 do corpo caloso, 480
tratamento, 212 holoprosencefalias, 478
discussão, 212 de Chiari, 338, 474
e métodos alternativos e complementares, 209 tratamento cirúrgico das, 333-344
possibilidades de, e indicações, 206 associada a siringomielia e/ou impressão basilar, 337
resultados e complicações, 212 discussão, 342

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história e revisão da literatura, 333 técnica microcirúrgica, 291


histórico da evolução do, 337 falcinos, 429-435
material e métodos, 338 diagnóstico, 430
técnica cirúrgica, 338 quadro clínico, 430
Manipulação espinhal, terapia de, 532 técnica cirúrgica para ressecção dos, 432
Manobra de Lasègue, 523 tratamento e prognóstico, 432
Marcaína, 301 frontal, 281
Massa olfatórios, 316
dural, remoção de, 374 parassagitais, 423-428
heretogênea supra-selar, 118 anteriores, 423
Mastoidectomia, 264 diagnóstico, 424
Mayfield, 301 medianos, 424
cabeceira de, 301 posteriores, 424
fixadores de, 396 quadro clínico, 423
Meckel, cavo de, 239, 309 técnica cirúrgica para ressecção dos, 425
Medula espinhal, 758 tratamento e prognóstico, 424
estimulação elétrica da, 786 petroclival, 192
Meduloblastoma, 407 pequeno, 194
Membrana pré-mamilar, 675 torcular e peritorcular, 437-443
Meningioma, 262 diagnóstico por imagem, 439
com invasão óssea frontotemporal, 413 manifestações clínicas, 438
com origem na asa do osso esfenóide, 192, 297-311 planjemanto cirúrgico, 439
anatomia microcirúrgica, 300 volumoso, 426
classificação, 298 em região pineal, 400
quadro clínico, 297 parassagital intra e extracraniano, 426
tratamento cirúrgico, 300 Meningioma do forame magno, 243-255
complicações, 310 diagnóstico, 244
do terço médio e externo, 300 epidemiologia, 243
do terço médio e interno, 303 histórico, 243
cortical simulando hematoma subdural, 413
quadro clínico, 243
de convexidade, 411-422
tratamento, 253
angiogênese e edema cerebral em, 420
complementar ou alternativo, 253
classificação, 412
complicações, 253
complicações pós-operatórias, 419
evolução, 253
diagnóstico por imagem, 412
epidemiologia, 411 tratamento microcirúrgico, 245
formas raras de, 421 anatomia microcirúrgica, 245
quadro clínico, 412 classificação anatômica, 245
radiocirurgia, 420 classificação baseada na orientação da expansão, 245
técnica operatória, 415 tipos de, 246
abordagem da lesão, 415 vias de acesso, 248
craniotomia, 415 ântero-lateral extrafaríngea, parafaríngea e
critérios de remoção, 415 retrofaríngea, 252
fechamento dural e ósseo, 417 dorsal mediana, 248
preparo, posicionamento e incisão, 415 dorsolateral ou suboccipital lateral, 249
tratamento cirúrgico, resultados tardios e recorrência, 420 extremo-lateral, 252
de goteira olfativa, 271-286 extremo-lateral combinada, 252
anatomia, 272 extremo-lateral transcondilar, 252
avaliação pré-operatória, 272 transoral, 251
de pequeno e médio tamanhos, 273 Meningite, 647
grandes, 280 Meningocele occipitocervical, 484
tratamento cirúrgico, 273 Mesencefalotomia, 761, 836
acessos cirúrgicos, 273 Metástase(s), 262, 820
complicações, 284 cerebelar, 409
do ângulo pontocerebelar, 192 cerebrais, 365-371
do tubérculo e diafragma selar, 287-295 anatomia patológica, 366
anatomia, 287 diagnóstico, 367
diagnóstico por imagem, 288 patogenia, 366
incidência, 288 quadro clínico, 366
quadro clínico, 288 tratamento, 368
tratamento cirúrgico, 290 da coluna vertebral, 595-603
craniotomia, 291 manifestações clínica e diagnóstico, 595
resultados, 292 tratamento, 597

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855
Índice Remissivo

de sarcoma altamente vascularizada, 370 neurotizações ou transferências, 625


Método Dunn-McCarthy, 585 término-terminal, 623
Microdiscectomia endoscópica, 538 tipos de lesão, 622
Microdissecção e clipagem, 87 tratamento da dor, 626
Micropoligiria, 496 sensitivos, descompressão de raízes espinhais e dos, 753
Mielografia, 529 somáticos, neurotomias de, 755
Mielomeningocele, 501-504 trigêmeo, 768
complicações cirúrgicas, 502 descompressão do, 838
procedimento cirúrgico, 502 nucleotratotomia do trato espinhal do, 768
Mielotomia, 760 rizotomias do, 828
Miniparafusos, osteossíntese com miniplacas e, 283 schwanoma do, 208
Monitoração, 701 ulnar, compressão do, no cotovelo, 629-632
da pressão intracraniana, 685-691 anatomia, 630
neurofisiológica intra-operatória, 697-703 tratamento, 630
contra-indicações e complicações, 702 vago, 46
e anestesia, 702 Nervo óptico, 99, 275, 293
eletroencefalograma, 701 compressão do, 297
estimulação elétrica transcraniana, 698 descompressão neurovascular do, nas lesões
potencial evocado, 701 traumáticas, 651-658
auditivo, 701 diagnóstico, 651
somatossensitivo, 701 prognóstico, 656
visual, 701 tratamento, 653
Monro, forame de, 675 tratamento cirúrgico, 654
Mucosa nasal, 182 posicionamento e craniotomia, 655
Músculo(s), 263 técnica descompressiva endoscópica, 655
esternocleidomastóideo, 197, 559 técnica extracraniana, 654
longos do pescoço, 560 técnica extradural, 655
platisma, 559 técnica microcirúrgica endonasal, 654
suboccipitais, 440 tratamento clínico, 654
temporal, 263 tratamento em pacientes comatosos, 656
atrofia do, 240 Nervo vestibular, schwanoma do, 217-242
fraqueza do, 240 classificação anatômica, 231
incisão cutânea e dissecação do, 145 classificação patológica, 232
retalho de, 197 diagnóstico, 217, 232
epidemiologia, 231
N história natural, 218
patologia, imunoistoquímica e genética, 218
N-acetil aspartato, 418 tratamento, 219
Nariz com narina única, 478 cirúrgico, 219, 234
NASCET, estudo, 64 abordagens, 234
Nervo(s), 264 acessos cirúrgicos, 220
craniano(s), 198 aspectos radiológicos pré-operatórios, 220
lesão dos, 67 combinada subtemporal pré-sigmóidea, 238
espinhal(is), 519 complicações, 222
acessórios, 247 complicações, 241
compressão do, sinais de, 522 fronto-orbitozigomática, 235
injeções seletivas epidurais dos, 529 indicação, 219
síndromes dos, 522 material cirúrgico necessário, 221
facial, 245, 264, 382 monitoração intra-operatória, 221
infiltrado pelo tumor, 264 retrossigmóideo ou suboccipital unilateral, 236
glossofaríngeo, 832 subtemporal, 234
descompressão do, 840 técnica microcirúrgica, 239
rizotomias do, 832 técnica utilizada, 221
a céu aberto, 832 conservador, 219
percutânea por radiofreqüência, 832 discussão, 225
intercostais, 626 material e resultados, 223
periféricos, técnicas cirúrgicas para, 621-627 radioterápico, 223
cuidados pré-operatórios, 621 Neuroestimulação, 744
de reparo, 623 bases fisiológicas da, 744
com interposição de enxertos, 624 estimulação, 745
neurólise externa, 623 do núcleo subtalâmico de Luys, 747
neurólise interna, 623 palidal, 746

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Índice Remissivo

talâmica, 745 acesso transpetroso, 310


no tratamento da dor, 781-792 complicações, 310
características, 789 craniotomia pterional com osteotomia
estimulação elétrica, 786 orbitozigomática, 308
da medula espinhal, 786 do terço médio e externo, 300
do encéfalo, 787 do terço médio e interno, 303
do sistema nervoso periférico, 784 técnica cirúrgica, 308
estimulação elétrica transcutânea, 781 teste de oclusão, 306
sistemas implantáveis, 783 tumor da asa do, 699
seleção de casos para, 745 Osteossíntese com miniplacas e miniparafusos, 283
Neurolíticos, 826 Osteotomia(s), 493
Neuropatia óptica traumática, 651 descompressivas, 493
Neurotomias, 729 orbitozigomática, craniotomia pterional com, 308
de nervos somáticos, 755 Oxicefalia, 459, 469
occipitais, 828
trigeminais, 827 P
Neurotransplante, 748
Núcleo Pacientes comatosos, 656
pulposo, implante de prótese de, 546 Palato fendido, 498
subtalâmico de Luys, 744 Palidotomia, 742
estimulação do, 747 Parafusos, 251, 283, 577
lesão do, 744 anterior L5-S1, 588
ventrolateral do tálamo, talamotomia do, 740 do tipo Caspar, 560
Nucleotomia manual e automatizada, 538 ilíacos, 586
Nucleotratotomia trigeminal, tratotomia e, 768, 833 iliossacrais, 587
na coluna cervical baixa, 577
pediculares, 577
O em S1, 584
Obstrução de cateter ventricular, 504 na coluna cervical, 577
Oclusão, teste de, 306 transfacetários L5-S1, 585
com balão, 128 translaminares, 582
Odontóide, técnicas de ressecção da, abordagem transoral, Paraganglioma(s), 260
325-331 do osso temporal, 261
avaliação pré-operatória, 326 extradural e intradural, 265
cirúrgica, 326 Parede arterial, sutura da, 68
exposição, 326 Parênquima encefálico, 58
instabilidade e técnicas de fixação, 329 Paresia facial, 382
intubação, 326 Parkinson, doença de, 735-750
pós-operatório imediato, 328 alvos neurocirúrgicos, 738
resultados e complicações, 329 bases anatômicas, 738
indicações do acesso, 325 critérios para indicação do tratamento operatório, 736
sintomatologia, 326 histórico, 735
Ommaya, câmara de, 375 neuroestimulação, 744
implante de, 373 neurotransplante, 748
Onda D, 700 procedimentos ablativos, 740
Opióides, 532, 803 procedimentos operatórios, 739
Órbita, 652 Pars interarticulares, ruptura da, 564
hiperostose com infiltração tumoral da, e da região Pele, incisão de (v. Incisão cutânea)
esfenorbitária, 298 Perda
teto da, fratura do, 652 auditiva, 241, 701
Osso(s), 301 de campo visual, 298
etmoidal, 278 Pericrânio, 283
frontais, 493 autólogo, 60
parietais, 493 pediculado, 283
pterional, 301 retalho de, 314
temporal, paragangliomas do, 261 Pescoço, 263
Osso esfenóide, 300, 308 curto, 473
meningiomas com origem na asa do, 192, 297-311 dissecção de, 263
anatomia microcirúrgica, 300 músculos longos do, 560
classificação, 298 Petrosectomia total, 199
quadro clínico, 297 Pfeiffer, síndrome de, 460
tratamento cirúrgico, 300 Pia-máter, 303

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857
Índice Remissivo

Pinça Rasmussen, síndrome de, 3, 16


de Backlund, 779 Receptores opióides, natureza e localização dos, 803
de Kerrison, 181 Região
de Sedan, 779 esfenorbitária, hiperostose com infiltração tumoral da
Pirâmide nasal, 321 órbita e da, 298
Placa(s), 578 falcotentorial, 387
aterosclerótica, 67 petroclival, cisto dermóide da, 197
subdural, 29 pineal, tumores das, e posterior do terceiro ventrículo, 391-402
Plagiocefalia, 460 cirurgia e complicações, 401
anterior, 457, 465 de células germinativas, 392
posterior, 459, 467 diagnóstico, 395
postural, 460 gliomas periaquedutais, 395
técnica de correção de, 467 primários do tecido glandular, 394
Plástica da dura-máter, 340 quadro clínico, 395
Plexo, 36 vias de acesso cirúrgicos, 395
celíaco, 755 supracerebelar infratentorial, 395
coróide, 36 supratentorial, 397, 398
Pneumoencéfalo, 647 volumoso meningioma, 400
Polidotomia, 743 sacropélvica, 582
Ponto de Kocher, 374, 688 Relaxantes musculares, 532
Potencial evocado, 66 Remodelamento craniano, técnica de, 465
auditivo, 701 Reparo meníngeo, 314
somatossensitivo, 361, 701 Ressecção(ões), 21
monitoração com, 66 da odontóide, técnicas de, abordagem transoral, 325-331
visual, 701 avaliação pré-operatória, 326
Pressão intracraniana, 109 cirúrgica, 326
monitoração da, 685-691 exposição, 326
instabilidade e técnicas de fixação, 329
complicações, 689
intubação, 326
histórico, 685
pós-operatório imediato, 328
indicações, 686
resultados e complicações, 329
técnicas operatórias, 686 indicações do acesso, 325
Probst, fibras de, 481 sintomatologia, 326
Prolactinomas, 178 extratemporais, 21
Proptose exuberante, 298 técnica de, em margarida, 370
Prótese(s), 589 Ressonância nuclear magnética, 28, 118
discais, 589 Retalho(s), 187
implante de, de núcleo pulposo, 546 de fáscia temporal, 263
Ptose cerebelar, 339 de músculo temporal, 197
Punção ventricular, 681, 689 de pericrânio, 314
miofascial para reconstrução da base do crânio, 263
Q musculoaponeurótico, 187
ósseo, 208, 249, 301, 668
Quiasma óptico, 184 Retardo mental, 462
Quimionucleólise, 537 Retrator(es), 560
Quimioterápicos, instilação de, no espaço liquórico, 373 do tipo Caspar, 560
oral de Crockard, 327
R Revascularização cerebral, 131
Rinotomia lateral, 319
Radiocirurgia, 420 Rizotomia(s), 757, 828
em tumores de convexidade, 420 do nervo, 828
intersticial para tumores cerebrais, 817-821 glossofaríngeo a céu aberto, 832
características físicas dos isótopos, 817 trigêmeo, 828
indicações, 818 percutânea, 731
da base do crânio, 820 com meios físicos, 829
gliomas, 818 por radiofreqüência do nervo glossofaríngeo, 832
metástases, 820 posterior seletiva, 729
técnica cirúrgica, 817 trigeminal por via extradural subtemporal, 829
Radiofreqüência, rizotomias percutânea por, do nervo Ruptura da pars interarticularis, 564
glossofaríngeo, 832
Radionecrose, 363 S
Radioterapia, 509
Raízes espinhais, descompressão de, e dos nervos Saco
sensitivos, 753 aneurismático, 141

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aracnóideo suturado lateralmente, 339 de Crouzon, 460, 498


dural descomprimido, 560 de Landau-Kleffner, 17
endolinfático, tumores do, 262 de Lennox-Gastaut, 16
Sacro, massas laterais do, 584 de Pfeiffer, 460
Sala cirúrgica, 181 de Rasmussen, 3
Sarcoma, metástase de, altamente vascularizada, 370 de Sturge-Weber, 16, 21
Schwanoma, 259, 261 de West, 16
do nervo trigêmeo, 208, 231-242 do túnel do carpo, 613-620
classificação anatômica, 231 anatomia, 613
classificação patológica, 232 diagnóstico, 614
diagnóstico, 232 doença, 613
epidemiologia, 231 tratamento, 617
tratamento cirúrgico, 234 dos nervos espinhais, 522
abordagens, 234 epiléptica hemisférica, 3
combinada subtemporal pré-sigmóidea, 238 hiperfuncionantes, 178
complicações, 241 paraneoplásicas, 368
fronto-orbitozigomática, 235 Siringomielia, 337
retrossigmóideo ou suboccipital unilateral, 236 Sistema
subtemporal, 234 de fixação (v. Fixação, sistema de)
técnica microcirúrgica, 239 nervoso central, 368
do nervo vestibular, 217-242 câncer no, efeitos não metastáticos do, 368
diagnóstico, 217 eletroestimulação do, 727
história natural, 218 estimulação elétrica do, 764, 784
patologia, imunoistoquímica e genética, 218 técnicas de estimulação do, 45-47
tratamento, 225 estimulador vagal, 46
conservador, 219 estimuladores de núcleos profundos, 47
discussão, 225 tratamento por infusão de fármacos analgésicos no, 837
material e resultados, 223 Somatostatina, 812
radioterápico, 223 SPECT (v. Tomografia computadorizada por emissão de
tratamento cirúrgico, 219 fóton único)
acessos cirúrgicos, 220 Status epilepticus, 21
aspectos radiológicos pré-operatórios, 220 Sturge-Weber, síndrome de, 16, 21
complicações, 222 Substância
indicação, 219 branca, 350, 481
material cirúrgico necessário, 221 cinzenta, 29
monitoração intra-operatória, 221 lesão do corno posterior da, da medula espinhal, 758,
técnica utilizada, 221 767, 771
Sedan, pinça de, 779 Sufusão hemorrágica frontal, 279
Seio(s) Sugita, fixadores de, 396
cavernoso, lesões do, 205-216 Sulfa cristalizada, 283
anatomia cirúrgica, 206 Surgicel, hemostasia com, 282
casuística, 211 Sutura(s), 68
história natural e diagnóstico, 205 cranianas, idade de fechamento das, 456
possibilidades de tratamento e indicações, 206 da parede arterial, 68
técnica cirúrgica, 207 Suturectomia sagital, 493
tratamento, 209 Synchromed, bomba eletrônica, 838
discussão, 212
métodos alternativos e complementares, 209 T
resultados e complicações, 212
esfenoidal, 183, 281 Tálamo, talamotomia do núcleo ventrolateral do, 740
etmoidal, 281 Talamomesencefalotomia, 836
frontal, 281 Talamotomia, 761, 836
paranasais, 272, 282 do núcleo ventrolateral do tálamo, 740
sigmóideo, 198 Tardieu, escala de, 726
Sela túrcica, 184, 289 Tecido
Septo, 182 cerebral, 107, 279
cartilagionoso, 182 glandular, tumores primários do, 394
ósseo, 182 Técnica(s)
Serra de Gigli, 301, 418 de arteriotomia, 66
Simpatectomias, 754 de biópsia estereotática das lesões encefálicas, 775
Síndrome(s) de Brooks, 576
de Apert, 460 de correção, 467
de Baller-Gerold, 458 de braquiocefalia, 468

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de plagiocefalia, 467 diagnóstico por imagem, 288


de trigonocefalia, 466 incidência, 288
de descompressão cirúrgica no tratamento de isquemia quadro clínico, 288
cerebral, 57-62 tratamento cirúrgico, 290
de Dolenc, 652 craniotomia, 291
de Epstein, 456 resultados, 292
de estimulação do sistema nervoso, 45-47 técnica microcirúrgica, 291
estimulador vagal, 46 Tubo neural, defeitos do fechamento do, 473
estimuladores de núcleos profundos, 47 Tumor(es), 315
de Galveston, 586 basal, remoção do, 315
de Harrington, 580 cerebrais, radiocirurgia intersticial para, 817-821
de remodelamento craniano, 465 características físicas dos isótopos, 817
de ressecção, 370 indicações, 818
da odontóide, abordagem transoral, 325-331 da base do crânio, 820
em margarida, 370 gliomas, 818
microcirúrgica endonasal, 654 metástases, 820
Teleangectasias capilares, 74, 76, 80 técnica cirúrgica, 817
Terapia(s) da asa do esfenóide, 699
celular, 547 da fossa posterior, 403-409
com genes, 547 acessos cirúrgicos, 404
de manipulação espinhal, 532 suboccipital lateral, 405
físicas, 531 suboccipital mediano, 406
Terceiro-ventriculocisternostomia endoscópica, 673-678 suboccipital paramediano, 406
complicações, 676 detalhes técnicos microcirúrgicos relacionados a tipos
indicações, 673 histopatológicos específicos, 407
prognóstico, 676 astrocitomas pilocíticos cerebelares, 407
técnica cirúrgica, 674 ependimoma, 407
Termografia, 529 hemangioblastoma cerebelar, 409
Teste(s) meduloblastoma, 407
de oclusão, 128, 306 metástase cerebelar, 409
de Wada, 28 diagnóstico, 404
Teto orbitário, fratura de, 652 quadro clínico, 403
Titânio, cabos de, 251 tratamento e prognóstico, 404
Tomografia computadorizada, 118, 527
das regiões pineal e posterior do terceiro ventrículo, 391-402
cranioencefálica, 680
cirurgia e complicações, 401
por emissão de fóton único, 28
de células germinativas, 392
Tonsilas herniadas, 339
diagnóstico, 395
Toxina botulínica, dose e locais de aplicação de, 730
gliomas periaquedutais, 395
Tração pélvica, 533
Transecção subpial múltipla, 23 primários do tecido glandular, 394
Transtornos psiquiátricos, tratamento cirúrgico dos, 717-721 quadro clínico, 395
critérios de seleção dos doentes, 717 vias de acesso cirúrgicos, 395
procedimentos, 719 supracerebelar infratentorial, 395
prognósticos e resultados, 720 supratentorial transfalcina inter-hemisférica e
Trato suboccipital, 397
de Lissauer, lesão do, 732 de células, 262
espinhal, nucleotratotomia do, do nervo trigêmeo, 768 germinativas intracranianas, 391
Tratotomia, 767 gigantes, 262
de Lissauer, 758, 767, 771 de origem rinofaríngea, 317
e nucleotratotomia trigeminal, 833 disembrioplásico neuroepitelial, 20
subcaudata, 720 do forame jugular, 257-269
Trepanação, drenagem mediante, 661 aspectos anatômicos, 257
Triângulo aspectos clínicos, 258
de Glassock, 309 estudos de neuroimagem, 258
de Kawase, 310 tipos histológicos, 260
Trigonocefalia, 457, 465, 495 meningiomas, 262
técnica de correção de, 466 paragangliomas, 260
Trombólise, 60 schwanomas, 261
Trombose da artéria cerebral, 310 tipos de lesões, 262
Tubérculo, 245 tratamento, 265
jugular, 245 adjuvante, 265
meningiomas do, e diafragma selar, 287-295 casuística, resultados e complicações, 266
anatomia, 287 discussão, 267

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tratamento cirúrgico, 262 V


craniectomia, 265
dissecção de pescoço, 263 Válvula, sistema com, 682
exposição do tumor no canal auditivo externo, 265 Vaso receptor, 133
fechamento, 265 cervical, 133
incisão de pele, 263 intracraniano, 133
mastoidectomia, 264 Vasoespasmo grave, 58
nervo facial, 264 Veia(s), 35
preparo do paciente e anestesia, 263 jugular interna, 264
remoção extradural do tumor, 265 safena, bypass com, 262
remoção intradural do tumor, 265 sylviana superficial, 35
retalho miofascial para reconstrução da base do Ventrículo, tumores das regiões pineal e posterior do
crânio, 263 terceiro, 391-402
do saco endolinfático, 262 cirurgia e complicações, 401
epidermóides, 377-389 de células germinativas, 392
exames de imagem, 378 diagnóstico, 395
localização, 377 gliomas periaquedutais, 395
quadro clínico, 378 primários do tecido glandular, 394
tratamento, 379 quadro clínico, 395
esfenorbitário, 297 vias de acesso cirúrgicos, 395
extra-axial ventral, 244 supracerebelar infratentorial, 395
glômicos, classificação de, 261 supratentorial transfalcina inter-hemisférica e
hipofisários, 177-189 suboccipital, 397, 399
classificação, 177 Ventriculomegalia, 384
diagnóstico, 178
Ventriculostomia, 676
manifestação clínica, 178
Verme cerebelar, 483
tratamento cirúrgico, 179
abordagens, 180 Vértebras, 518
complicações, 188 e suas articulações, 517
indicações, 179 Vertebroplastia bilateral, 602
resultados e evolução, 187 Via(s)
intraparenquimatosos, 358 de acesso cirúrgico (v. Acesso cirúrgico)
ósseos primários envolvendo a base do crânio, 317 ópticas, mapeamento intra-operatório das, 351
petroclivais, 191-204 Vídeo-eletroencefalograma, monitoração por, 28
casuística, 201 Vim, talamotomia de, 743
definição de região e meningioma petroclival, 192 Vômer, remoção do, 182
diagnóstico, 192
história natural, 193 W
tratamento, 193
Wada, teste de, 28
Weber-Ferguson, extensão de, 321
U West, síndrome de, 16
Úvula, 327 Wiltse, acesso cirúrgico paramediano de, 568

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