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Dezembro de 2007
Maria Ivete Pinto de Azevedo
Dezembro de 2007
É AUTORIZADA APENAS A CONSULTA DESTA TESE
PARA EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO
ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE
Ainda no que diz respeito ao apoio científico, e tendo em conta que uma fatia
significativa do trabalho é a análise dos dados, agradeço o permanente apoio à, também
amiga, Prof. Deborah Bandalos e, em momentos importantes de decisão, ao Prof. Doutor
Leandro de Almeida e ao Prof. Doutor José António Maia.
i
ii
Criatividade e Percurso Escolar: Um estudo com jovens do Ensino Básico
Ivete Azevedo (Tese de Doutoramento em Educação, Universidade do Minho)
iii
criativa dos alunos por eles avaliados. Por seu lado, as discriminações realizadas pelos
professores acerca da criatividade dos alunos, tal como as correlações encontradas entre as
diferentes fontes de informação, mostraram depender dos parâmetros em avaliação: a
Elaboração, a Flexibilidade e as Associações Remotas surgiram como os parâmetros
ondeos professores estabeleceram uma maior diferenciação dos alunos; a Fluência, a
Flexibilidade e a Elaboração reuniram maior acordo entre os vários professores; a
Fluência foi o que obteve um maior número de correlações estatisticamente significativas
(apesar da sua baixa magnitude) com a realização criativa dos alunos. As avaliações
destes três grupos de professores variaram também com o género dos alunos, tendo as
raparigas sido vistas como melhorando as competências criativas ao longo dos anos de
escolaridade analisados e na maioria dos parâmetros. Os dados obtidos no
TTCT-Figurativo traduzem que a variável género aparece igualmente distribuída em
número de parâmetros, mas as raparigas são melhores na Abstracção dos Títulos,
desempenhando melhor os rapazes em Originalidade. Tomando o percurso escolar, os
diferentes grupos de professores percepcionaram melhoria dos alunos ao longo dos anos
de escolaridade, o que foi ao encontro da sua própria realização no TTCT-Figurativo: os
alunos do 9º ano desempenharam melhor do que os colegas do 5º ano a nível da
Abstracção dos Títulos e do Vigor Criativo. Observando agora o que expressaram os
alunos desta amostra acerca da sua criatividade, constatou-se que foi a Fluência o único
parâmetro a discriminar diferentes desempenhos, percebendo-se os alunos como
melhorando nesta competência ao longo da escolaridade. Quanto à relação entre o que os
alunos pensam e o que eles realizam a nível de criatividade esta é fraca havendo nela
oscilações pontuais face a parâmetros avaliados e a magnitudes, em função do ano de
escolaridade e do género, destacando-se, nesta última variável, o facto de que as raparigas
se percepcionam de uma forma mais aproximada do que realizam, em comparação com os
rapazes. Verifica-se então, genericamente, afastamento dos diferentes personagens
educativos, aqui estudados, em relação à temática criatividade: professores e alunos não
têm o mesmo entendimento em relação à expressão de criatividade destes últimos e, por
outro lado, os próprios alunos não se conhecem a esse nível. Deste estudo emergem
necessidades de intervenção ao nível da formação, reportando-nos aos alunos e,
sobretudo, aos professores, assim como algumas informações para a avaliação de
criatividade.
iv
Creativity and school courses: A study with Middle School students
Ivete Azevedo (Doctoral Dissertation in Education, University of Minho)
v
parameters of evaluation: the Elaboration, the Flexibility and the Remote Associations
appeared as the parameters where teachers established a larger discrimination of the
students; the Fluency, the Flexibility and the Elaboration gathered larger agreement
among teachers; the Fluency obtained a greater number of positively related significant
statistically (in spite of its low magnitude) with the students creative acting. The
evaluation done by these three groups of teachers vary. Teachers see girls as improving
their creativity accomplishment along the years and in most parameters. The data obtained
in the TTCT-Figurative shows that boys and girls appear equally distributed in number of
parameters, but girls are better in Abstraction of Titles while boys are better in Originality.
As far as the school course is concern, teachers understood that all students improve along
the years they frequent middle school, as TTCT-Figurative students also showed: students
frequenting 9th grade carried out the test better than 5th grade students as far as Abstraction
of Titles and Creative Strength is concerned. The students of this sample expressed
Fluency in different parameters, but they improved it along the years, in middle school.
There is a weak relationship between what students think and what they accomplish in
creativity. There are different oscillations in parameters, according to the grade students
frequent but, in general, girls think and accomplish better in creativity. We were able to
verify too aspects: generally, students and teachers do not agree about how students
express their creativity and students do not recognize on it themselves. This investigation
states a need for both students and teacher’s education about this subjects and bring us
some information about the evaluation of creativity.
vi
Índice
INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 1
PARTE I: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ....................................................................... 9
CAPÍTULO 1: CRIATIVIDADE E CONTEXTO ESCOLAR..................................... 11
O CONCEITO DE CRIATIVIDADE ................................................................................. 11
Historial da criatividade ............................................................................................... 11
Definições de criatividade ............................................................................................ 16
A pessoa criativa ..................................................................................................... 20
O processo criativo .................................................................................................. 22
O produto criativo ................................................................................................... 24
O contexto social ..................................................................................................... 26
Integração de dimensões ......................................................................................... 29
Teorias explicativas da criatividade ............................................................................. 31
Abordagem Mística ................................................................................................. 31
Abordagem Pragmática ........................................................................................... 32
Abordagem Psicodinâmica ...................................................................................... 33
Abordagem Humanista ............................................................................................ 35
Abordagem Factorial / Psicométrica ...................................................................... 37
Abordagem Cognitivista .......................................................................................... 40
Abordagem Associacionista .................................................................................... 44
Abordagem Gestaltista ............................................................................................ 46
Abordagem Integradora .......................................................................................... 47
A Perspectiva Componencial de Amabile ........................................................... 48
A Perspectiva Sistémica de Csikszentmihalyi ...................................................... 50
A Perspectiva Interactiva da Criatividade de Gardner....................................... 52
A Teoria da Criatividade como Investimento de Sternberg e Lubart.................. 53
A CRIATIVIDADE EM CONTEXTO ESCOLAR ............................................................ 57
A relevância da criatividade no contexto escolar ......................................................... 57
Contexto escolar e criatividade dos alunos .................................................................. 61
O Sistema Educativo, a escola e o currículo ........................................................... 61
Os professores, o ambiente em sala de aula e os colegas ....................................... 69
A família .................................................................................................................. 76
Variáveis intra-individuais ...................................................................................... 79
A idade ................................................................................................................. 82
O género .............................................................................................................. 91
A PROMOÇÃO DA CRIATIVIDADE .............................................................................. 97
Métodos e técnicas de estimulação da criatividade ...................................................... 99
Programas de desenvolvimento da criatividade ......................................................... 111
vii
CAPÍTULO 2: A AVALIAÇÃO DA CRIATIVIDADE .............................................. 117
PERSPECTIVA HISTÓRICA DA AVALIAÇÃO DA CRIATIVIDADE ........................ 117
INSTRUMENTOS E POLÉMICAS NA AVALIAÇÃO DA CRIATIVIDADE................. 120
Testes psicométricos ................................................................................................... 120
Testes de pensamento divergente .......................................................................... 120
Inventários de atitudes e interesses ....................................................................... 122
Inventários de personalidade ................................................................................ 123
Inventários biográficos .......................................................................................... 124
Opinião de especialistas ............................................................................................. 125
Avaliação pelos professores .................................................................................. 125
Avaliação pelos pares ............................................................................................ 127
Avaliação pelos supervisores ................................................................................ 127
Avaliação dos produtos ......................................................................................... 128
Estudo de pessoas eminentes ................................................................................. 130
Auto-registo de actividades e realizações criativas ................................................... 131
Biométrica .................................................................................................................. 132
Outras categorias ........................................................................................................ 133
Polémicas na avaliação da criatividade ...................................................................... 135
A AVALIAÇÃO DA CRIATIVIDADE EM CONTEXTO ESCOLAR ............................ 139
O Teste do Pensamento Criativo de Torrance (TTCT) .............................................. 144
Paul Torrance e a sua perspectiva de criatividade ............................................... 144
TTCT: História do seu desenvolvimento, propósitos e descrição ......................... 147
TTCT: Vantagens e desvantagens ......................................................................... 156
Estudos psicométricos do TTCT: Fidelidade e validade ....................................... 162
As percepções de criatividade: Professores e alunos ................................................. 173
A relevância das percepções acerca de criatividade por professores e alunos no
contexto educativo ................................................................................................. 174
As representações do conceito de criatividade por professores e alunos ............. 179
As representações do aluno criativo por professores e alunos ............................. 187
As representações de professor criativo por professores e alunos ....................... 193
Alteração de representações sobre criatividade em professores: Lacunas e
necessidades .......................................................................................................... 197
SÍNTESE DA FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA............................................................. 202
PARTE II - ESTUDO EMPÍRICO SOBRE CRIATIVIDADE REALIZADA E
PERCEBIDA POR ALUNOS DO ENSINO BÁSICO ..................................................... 205
CAPÍTULO 3: METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO .......................................... 207
OBJECTIVOS, QUESTÕES E HIPÓTESES .................................................................. 207
AMOSTRA........................................................................................................................ 209
INSTRUMENTOS ............................................................................................................ 213
Teste de Pensamento Criativo de Torrance (Figurativo)............................................ 213
Avaliação das percepções de criatividade .................................................................. 216
PROCEDIMENTOS .......................................................................................................... 218
viii
CAPÍTULO 4: APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ............... 221
ESTUDO PSICOMÉTRICO DOS INSTRUMENTOS .................................................... 222
Escala de autoavaliação de criatividade ..................................................................... 222
Escala de avaliação de criatividade dos alunos pelos seus professores ..................... 226
Teste de Pensamento Criativo de Torrance (Figurativo)............................................ 228
A IDENTIFICAÇÃO DE DIFERENÇAS NA CRIATIVIDADE PERCEBIDA E
MANIFESTADA AO LONGO DA ESCOLARIDADE .................................................. 233
Autoavaliação de criatividade .................................................................................... 234
Avaliação de criatividade pelos professores .............................................................. 238
Avaliação de criatividade dos alunos a partir do TTCT- Figurativo .......................... 250
RELACIONAMENTO ENTRE OS RESULTADOS DAS DIFERENTES FONTES DE
AVALIAÇÃO DE CRIATIVIDADE ............................................................................... 259
TTCT-Figurativo e Autoavaliação de criatividade..................................................... 260
Avaliação de criatividade dos alunos pelos professores ............................................ 264
Autoavaliação de criatividade pelos alunos e a avaliação de criatividade pelos
professores ................................................................................................................. 280
Avaliação de criatividade pelos professores e pelo TTCT-Figurativo ....................... 289
SÍNTESE DO ESTUDO EMPIRICO ............................................................................... 302
CONCLUSÃO.................................................................................................................. 305
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 319
ANEXOS .................................................................................................................... 31985
ix
Lista de Abreviaturas
x
Índice de Quadros
Quadro 3: Distribuição da amostra por género, anos de escolaridade e zona do País...... 212
Quadro 6: Comunalidades dos resultados nos itens de Autoavaliação de criatividade ... 224
Quadro 10: Análise descritiva dos itens de avaliação de criatividade pelos professores de
Ed. Visual ......................................................................................................................... 227
Quadro 11: Análise descritiva dos parâmetros avaliados pelo TTCT-Figurativo ............ 228
Quadro 13: Análise descritiva da Originalidade após a ponderação com a Fluência....... 232
xi
Quadro 18: Médias e desvios-padrão dos resultados da Autoavaliação, no parâmetro
Associações Remotas, em função do género e do ano de escolaridade ........................... 235
Quadro 21: Análise de variância da Autoavaliação dos alunos, numa classificação global,
em função do género e do ano de escolaridade ................................................................ 237
xii
Quadro 33: Análise de variância da avaliação dos professores de Português, em função do
género e ano de escolaridade ............................................................................................ 243
Quadro 34: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Ed.
Visual, no parâmetro Fluência, em função do género e do ano de escolaridade .............. 245
Quadro 35: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Ed.
Visual, no parâmetro Flexibilidade, em função do género e do ano de escolaridade ...... 246
Quadro 36: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Ed.
Visual, no parâmetro Originalidade, em função do género e do ano de escolaridade...... 246
Quadro 37: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Ed.
Visual, no parâmetro Elaboração, em função do género e do ano de escolaridade.......... 246
Quadro 38: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Ed.
Visual, no parâmetro Associações Remotas, em função do género e do ano de
escolaridade ...................................................................................................................... 246
Quadro 47: Análise de variância da avaliação de criatividade dos alunos pelo TTCT-
Figurativo, em função do género e ano de escolaridade.................................................. 253
xiii
Quadro 49: Coeficientes de correlação entre os resultados no TTCT-Figurativo e a
Autoavaliação de criatividade - amostra total .................................................................. 260
xiv
Quadro 64: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos
professores de Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Originalidade – 5º ano
.......................................................................................................................................... 267
xv
Quadro 79: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos
professores de Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Fluência – 9º ano...... 272
xvi
Quadro 93: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos
professores de Português nos diferentes parâmetros – por género .................................. 277
xvii
Quadro 109: Coeficientes de correlação entre a Autoavaliação e a avaliação de
criatividade pelos professores de Português nos diferentes parâmetros - género masculino
.......................................................................................................................................... 287
xviii
Quadro 124: Coeficiente de correlações entre os resultados no TTCT-Figurativo e a
avaliação de criatividade pelos professores de Ed. Visual - 9º ano .................................. 295
xix
xx
Azevedo, Maria Ivete Pinto (2007). Criatividade e percurso escolar: Um estudo
com jovens do Ensino Básico. Braga, Instituto de Educação e Psicologia/Universidade do
Minho.
xxi
xxii
INTRODUÇÃO
1
Ford, 2007). Mitra (1980) afirma ainda a este respeito: “tem-se agora consciência que
para uma sociedade ser salva da estagnação e para o indivíduo atingir o seu pleno
desenvolvimento, qualquer sistema de Educação deve encorajar a criatividade”.
Olhando documentos internacionais que abordam a temática da Educação, verificamos
que o desafio vai no mesmo sentido. Como exemplo, The Partnership for 21st Century
Skills, constituída por líderes políticos, gestores e responsáveis educacionais, e cujo
objectivo é apresentar orientações de modo a assegurar que a Educação seja promotora
do sucesso das crianças enquanto cidadãos, afirmou em Novembro de 2006, através do
seu Presidente Ken Kay “é chegado o momento de preparar os jovens para os desafios
do séc. XXI, promovendo as suas competências de adaptação e inovação” ( Partnership
for 21st Century Skills, 2006, p.10).
2
“o desenvolvimento das habilidades do pensamento criativo não deve ser
desperdiçado”. Por seu lado, algumas experiências envolvendo métodos deliberados
para potenciar a criatividade, mostram a veracidade destas afirmações ao atingirem
resultados muito positivos (Meador, Fishkin & Hoover, 1999; Parnes & Meadow, 1960;
Torrance, 1960; Vinha, 2007).
3
enquanto processo (porque trabalhável) e enquanto produto (porque facilitador do
cruzamento de informações operacionalizadas) e queremos, como objectivos principais,
analisar oscilações da criatividade (realizada e percebida) ao longo do percurso escolar e
relacionamentos entre diferentes fontes da sua avaliação nesse mesmo contexto educativo.
Face à primeira fonte de avaliação, se por um lado é claro que criatividade não é
pensamento divergente (Baer, 1993; Eysenck, 1994; Sternberg & Lubart, 1999), por
outro é consensual que a avaliação do processo criativo e, em especial no contexto
escolar, é feita maioritariamente através da avaliação psicométrica tomando este
conceito (Plucker & Renzulli, 1999). Assim sendo, utilizámos o mais
internacionalmente conhecido e estudado teste de pensamento divergente, Torrance Test
of Creative Thinking-Figural, form A (Torrance, 1998), para obtermos a identificação
da realização criativa dos alunos. Na escolha deste instrumento presidiu também a
convicção de que, não sendo possível ter uma resposta inquestionável de qual o melhor
modo de avaliar a criatividade em contexto escolar (Callahan, 1991; Khatena, 1982), e
estando interessados em contribuir para que os alunos utilizem o seu potencial criativo,
sabendo como estão e para onde podem ir (Davis, 1982), a avaliação a realizar pudesse
ser também um elemento potencialmente orientador para o desenvolvimento da
criatividade. Isto acontece com o teste escolhido, já que fundamentou a
conceptualização de um modelo de intervenção específico que se aplica aos alunos em
função dos seus resultados (Torrance & Safter, 1990). Considerámos ainda ser
importante encontrar um instrumento que, se por um lado, leva em conta que os
aspectos culturais influenciam e determinam os modos de expressar a criatividade
(Hunsaker & Frasier, 1999; Runco & Johnson, 2002; Timmel, 2001; Torrance, 1973),
por outro permite-nos ir além das barreiras geográficas, a partir de vários estudos
transculturais com ele efectuados (Prieto, López, Ferrándiz & Bermejo, 2003; Raina,
2000; Wechsler & Richmond, 1982). Por último, nesta opção pesou o facto de este teste
(na sua versão figurativa), apesar de habitualmente rotulado de avaliador do pensamento
4
divergente, reunir informações de diferentes dimensões influenciadoras da criatividade,
como a cognitiva e a emocional, na sua variedade de parâmetros de avaliação.
5
informação são procurados em função do ano de escolaridade (5º, 7º e 9º), género dos
alunos e área de leccionação dos professores (de Matemática, de Português e de
Educação Visual). Face a estes mesmos objectivos, hipotetiza-se que se verificam
diferenças estatisticamente significativas tomando a realização criativa dos alunos, as suas
auto-avaliações de criatividade e as percepções que os professores têm deles a este nível,
em função do ano de escolaridade, do género dos alunos e da área de leccionação dos
professores. Por seu lado, espera-se encontrar correlações estatisticamente significativas
entre estas diferentes fontes de avaliação ainda em função das variáveis anteriores.
6
Na segunda parte, e concretamente no terceiro capítulo, especificamos a
metodologia da investigação, começando por apontar os seus objectivos, levantar
questões e formular hipóteses. Segue-se neste capítulo a descrição da amostra e dos
instrumentos de avaliação utilizados, assim como a explicitação dos procedimentos
subjacentes à sua aplicação.
7
especificamente no que respeita à avaliação da criatividade e consequente seu
desenvolvimento nos alunos, nomeadamente fazendo surgir preocupações orientadoras
para a formação de professores e de educadores em geral.
8
PARTE I: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
9
Mais uma vez, aparecerá uma distinção – importa tomar a questão da avaliação
da criatividade em termos genéricos e enquadrar teoricamente a um nível mais
específico as opções de avaliação que conduzem este estudo. Desta forma,
apresentamos algumas informações sobre a evolução desta preocupação avaliativa
(historial da avaliação), ilustramos a diversidade de metodologias e de instrumentos que
têm sido propostos para tal avaliação (instrumentos de avaliação), reflectimos algumas
questões e problemas que a revestem (polémicas da avaliação) e terminamos
focalizando a avaliação da criatividade em contexto escolar, coerentemente com a
lógica interna do primeiro capítulo. Analisamos ainda com algum detalhe o instrumento
de avaliação do pensamento criativo usado nesta investigação, assim como a opção de
avaliação das percepções de criatividade por parte de alunos e professores. Fazemos,
então, da fundamentação teórica um percurso sempre direccionado de um nível mais
geral para um mais específico e também mais operacionalizado nas preocupações
empíricas: vamos do conceito à avaliação do mesmo, do conceito na sua natureza vasta
à sua presença em contexto escolar, da possibilidade genérica de avaliação às avaliações
nesse mesmo contexto escolar e aos instrumentos escolhidos neste trabalho em função
de tal fundamentação.
10
CAPÍTULO 1:
CRIATIVIDADE E CONTEXTO ESCOLAR
O CONCEITO DE CRIATIVIDADE
Historial da criatividade
11
Referindo a época medieval, o termo Dark Age adequa-se à atitude de povos tais
como os Huns, os Vikings, os Visigodos que, desprezando tudo o que era intelectual ou
espiritual, destruíram, durante as suas conquistas, todos os materiais escritos e
expressões artísticas. Tal como Dawson diz: “apesar de não haver qualquer razão para
supôr que a Dark Age foi “escura”, (…) não é difícil de imaginar a sua escuridão, ao
observar a ausência de trabalhos científicos e o perfeito afastamento das criações da
Golden Age” (Dawson, 1954, p. 247).
12
estavam convencidos que as capacidades mentais eram herdadas e que a sua
transmissão, de pais para filhos, obedecia a leis passíveis de serem determinadas por
observação. Para estes investigadores, o génio residia em pessoas que herdaram
qualidades excepcionais, recusando-se a acreditar que experiências prévias ou o
ambiente tivessem um papel importante no acto criativo (Bulmer, 2003; Gillham, 2001).
Por outro lado, também só durante o século XX é que “se falaria abertamente em
criatividade como atributo humano” (Morais, 2001, p.30). A partir de 1920, os estudos
psicológicos centrar-se-iam, especificamente, no conceito de inteligência. Contudo, este
conceito revelou-se insatisfatório para justificar muitas das realizações humanas
(Webberly & Litt, 1980), o que levou ao estudo da criatividade, não tendo esta, contudo,
13
inicialmente conseguido uma identificação própria, isto é, tendo sido entendida como
um aspecto da inteligência, tal como o demonstram os trabalhos de Binet e Simon
(Binet, 1974; Binet & Simon, 1896).
Porém, foi com Guilford que o estudo do pensamento criativo ganhou um novo
fulgor (Alencar, 1986; Brown, 1989; Gomes, 1975), tendo inclusivamente dirigido
durante vinte anos (de 1949 a 1969) as investigações do Aptitudes Research Project,
com vista a estudar as aptidões cognitivas. Assim, o seu trabalho esteve sempre
vocacionado para o estudo das diferenças individuais, tendo desenvolvido uma
taxonomia descritiva das capacidades intelectuais (SOI) e sendo, algumas destas
capacidades, conectadas com a criatividade. Complementarmente, constatou que os
tradicionais testes de inteligência eram inadequados, pelo que criou os seus próprios
testes (Webberly & Litt, 1980). Além disso, em 1950, na sua tomada de posse na
presidência da Associação Americana de Psicologia (APA), Guilford fez um discurso
historicamente marcante (Vernon, 1972), onde alertou para a reduzida importância que
estava a ser dada ao estudo da criatividade e lançou alguns temas que dariam origem a
posteriores investigações, tais como a importância da descoberta do potencial criativo
na infância, as baixas correlações entre a avaliação da criatividade e a da inteligência, a
baixa fidelidade de testes sobre criatividade, a existência de um continuum na
distribuição das aptidões criativas (Guilford, 1950).
14
Com o intuito de autonomizar o conceito de criatividade do conceito de
inteligência, foram realizados vários estudos (cf. Pereira, 1996; Pope, 2005), sendo
alguns deles, como exemplos, os realizados por Getzels e Jacksons em 1962, por
Torrance em 1968, por Wallanch e Kogan em 1965, por Lovell e Shields em 1967, por
Wallanche em 1993 não sendo, contudo, convergentes em termos de conclusões. Até
mesmo Burt (Webberly & Litt, 1980), que não concordava com a independência destes
dois conceitos, foi um dos autores que acabou por reconhecer que algumas das
actividades reveladas pelos testes de criatividade não eram evidenciadas nos tradicionais
testes de inteligência.
Esta elevada produção científica sobre a criatividade manteve-se até ao final dos
anos 70, altura em que entra num período moribundo (Runco, 1993a) com uma drástica
diminuição de publicações sobre o tema (Urban, 1990). Tal facto não estará apenas
relacionado com o interesse científico, mas também com a dimensão social
envolvente, em particular com o enfraquecimento dos movimentos libertadores das
décadas de 60 e de 70 (Urban, 1990).
15
valores, espera-se, pois, que o mercado continue a valorizar as acções deste tema,
continuando a promover o investimento no seu estudo.
Definições de criatividade
16
com outras terminologias. Assim, e no que diz respeito aos mitos, há quem defenda,
mesmo na actualidade, que a criatividade está associada à doença mental (Eysenck,
1995; Holden, 1987; Karlsson, 1978; Kaufman, 2001; O'Reilly, Dunbar & Bentall,
2001; Schlesinger, 2002), existindo, porém, muitos estudos que associam criatividade e
sanidade mental (Bowerman, 1947; Cropley, 1990) e chegando a ser afirmado que
“a criatividade é sinónimo de saúde mental e de auto-realização” (Weisberg, 1993, p. 9).
Por seu lado, há o mito de que a criatividade se reflecte em todas as acções de um
criador, não podendo nunca ser-lhe imputada mediocridade, recebendo esta versão a
oposição de muitos estudos que mostram ser restrito o número de criadores que
produzem só obras-primas (Simonton, 1993, 1997b; Weisberg, 1987); existe ainda o
mito da inspiração súbita, sem trabalho e sem explicação prévios, o qual foi contrariado
fortemente por Weisberg (1987) ou Grubert e Barret (1974) ou mesmo por trabalhos de
pesquisa mais recentes (cf. Sternberg & Davidson, 1995).
17
confusão tem aparecido na literatura. Contudo, se por um lado é claro que não são
sinónimos (Baer, 1993; Eysenck, 1994; Sternberg & Lubart, 1999), aliás, como afirma o
próprio autor do termo produção divergente de respostas (Guilford, 1976); por outro
lado, é consensual que a avaliação da criatividade é feita maioritariamente por testes de
pensamento divergente (Brown, 1989; Plucker & Renzulli, 1999; Runco, 1991a) sendo
estes últimos uma boa possibilidade de operacionalizar a primeira. Além disso, assume-se
que o pensamento divergente pode ser uma das mais significativas dimensões da
criatividade (Bachelor & Michael, 1997; Morais, Almeida & Maia, 1999; Runco, 2003).
Deste modo, criatividade pode ser definida, como sendo, nomeadamente: uma
quebra de barreiras entre o inconsciente e o consciente, da qual surgem processos
primários, sendo estes sujeitos a elaboração consciente (Kris, 1952); o aparecimento de
um produto original devido à tendência auto-realizadora (Rogers, 1983); um processo
cognitivo pelo qual o sujeito produz informação que não possuía (Guilford, 1976); a
capacidade para produzir novas associações (Wallach & Kogan, 1965); a ruptura de
uma gestalt a favor de uma mais eficaz (Wertheimer, 1991); uma resolução, implicadora
de diferentes fases e processos, de um problema mal estruturado (Mayer, 1996; Newell,
Shaw & Simon, 1962), entre tantas outras definições, consoante o paradigma teórico
que tomamos.
18
em produtos tangíveis e a que desenvolve respostas para as situações do quotidiano
(Schubert & Biondi, 1975). Rudowicz (2003) propôs também uma categorização com
dois grupos, em função de conceitos explícitos e implícitos de criatividade, incluindo
assim, no primeiro grupo, as definições que consideram a influência social, cultural e
histórica e, no segundo, as que contemplam as questões individuais. Os elementos mais
comummente utilizados nas definições explícitas são a Originalidade e a Novidade de
ideias ou comportamentos, assim como o facto destes serem aceites e julgados como
Apropriados. Nas definições implícitas estão consideradas as que descrevem
características das pessoas criativas.
Taylor (1988) recorre ainda à constituição de seis classes, cada uma delas
agrupando várias definições, relacionadas com a teoria da Gestalt, a Psicanálise, as que
realçam o produto final e inovador, as que valorizam o processo expressivo e a sua
dimensão estética, as que dizem respeito a um processo de pensamento orientado para a
resolução de problemas e as que dificilmente são integráveis numa categoria.
Por fim, uma distinção inicialmente proposta por Rhodes (1961), mas que é
extensivamente utilizada na actualidade (Adams, 2006; Hallman, 1981; Mackinnon,
1978; Runco & Pritzker, 1999; Welsh, 1973), ajudando a fornecer um quadro de
referência no estudo da criatividade, considera quatro categorias designadas por quatro
P’s (mais frequentemente referidos como 4 P´s), que estão habitualmente presentes na
actividade criativa: o estudo da Pessoa criativa, do Processo criativo, do Produto
criativo e do Press ou, tal como designa Simonton, persuasão. A cada uma destas
dimensões estão conectadas questões cuja resposta levam à compreensão do que está
envolvido neste conceito, por exemplo: Qual é a natureza do processo criativo? Quais
são os tipos de processos psicológicos associados ao encontro de uma solução criativa?
O que são produtos criativos? Quais as qualidades que os identificam? Quais são os
traços e as características que distinguem as pessoas criativas? Quais as características
sociais que favorecem uma situação criativa?
19
elementos. Passaremos a descrever, sucintamente, cada uma das categorizações, assim
como a apresentar algumas das definições de criatividade a elas associadas.
A pessoa criativa
20
Nas épocas seguintes ao incentivo de Guilford (1950), surgiram muitos estudos
relacionando as características de personalidade e a realização criativa, quer em
pessoas comuns (Barron, 1968; Carrol, 1941; Chambers, 1964) quer em criadores
eminentes (Gruber, 1974; Roe, 1951a, 1951b, 1953). Apesar de terem sido obtidos
resultados contraditórios, provavelmente motivados quer pela não muita exactidão na
recolha e tratamento de dados, quer pela não linearidade deste factor como definidor de
criatividade, o estudo da criatividade centrada na pessoa foi alvo de diversas
aproximações, como é o caso das pesquisas efectuadas desde tempos mais remotos
(Barron, 1963b, 1969, 1976, 1978; Gardner, 1988; MacKinnon, 1976, 1978; Maw &
Maw, 1965; Mednick, 1962; Torrance, 1979c, 1981a; 1984b; Torrance & Myers, 1962)
até à actualidade (Albert & Runco, 1989; Alencar, 1997b; Csikszentmihalyi, 1988a;
Dollinger, Urban & James, 2004; Ewing, Napoli & West, 2001; Eysenck, 1993;
Galloway, 1994; Gluck, Ernst & Unger, 2002; Kaufman, 2002; Morais, 2001; Naudé,
2006; Osche, 1990; Weschler, 1998). Desses estudos, essencialmente ressaltaram como
características das pessoas criativas: autonomia, autoconfiança, tolerância à
ambiguidade, atracção pela complexidade e mistério, facilidade em arriscar,
curiosidade, gosto em correr riscos ou Type T (Farley, 1991), vastidão de interesses,
abertura a novas experiências, sentido de humor, sensibilidade estética, persistência,
percepção de beleza no trabalho e paixão pelo que fazem, entusiasmo, espontaneidade,
muita energia, necessidade de privacidade em paralelo com o interesse em estabelecer
relações. Mais especficamente, no estudo que Torrance e Aliotti (1958a) conduziram
em 167 estudantes, descobriram que os indivíduos mais criativos diferem
significativamente dos menos criativos nos seguintes pontos: são menos autoritários,
mais curiosos, mais sensíveis às relações interpessoais, mais concordantes,
cuidadosos e prestáveis e mais hábeis em identificar analogias.
21
tipo de corpo podem também afectar o tipo de expressão criativa, sendo que a primeira é
favorável à criação musical, a segunda pode ser responsável pela qualidade de um pintor
e o tipo de competência física limita ou potencia a criação cinestésica – por exemplo,
uma pessoa com 100kg tem dificuldade em ser bailarina ou trapezista (Cramond, 2007;
Ribeira, 2005). Saliente-se, porém, que tais características não são imprescindíveis,
tomando como exemplo Beethoven que criou algumas das suas melhores obras quando
estava completamente surdo.
O processo criativo
22
Neste contexto, a criatividade surge por vezes descrita como o estabelecimento
de ligações entre informações que aparentemente não se encontram relacionadas, sendo
de extrema importância, para alguns autores, as contradições que se apresentam durante
o processo criativo (Rothenberg, 1976). Porém, neste ponto, as definições dividem-se:
uns autores apontam mais para a ocorrência de criatividade através de associações
aleatórias e outros para uma junção intencional. São exemplo desta discrepância, por um
lado, a posição pioneira de John Watson (1928) que salientava a aparente aleatoriedade
no caso da produção de poemas ou trabalhos literários brilhantes, nos quais a resposta
criativa consistiria na manipulação e na recorrente troca de palavras até que surgisse um
novo padrão. Por seu lado, mais recentemente, podemos ver a posição de Simonton com
a sua Chance Theory em que a aleatoriedade joga o seu papel, apesar de não ser
suficiente enfatizando também a selecção crítica da informação ao serem consideradas
as associações mais relevantes (Simonton, 2002a). Koestler (1989), por outro lado
ainda, defendeu que a criatividade deveria envolver um processo bissociativo, no qual
existiria uma junção intencional de duas matrizes de pensamento previamente
desconexas, para dar origem a um insight ou a uma invenção, ao invés de se efectuarem
associações ao acaso. Este autor salientou ainda que o processo inclui a mudança de
atenção para algo que passava despercebido anteriormente (que era irrelevante no
passado, mas que adquiriu relevância no novo contexto) e a consequente descoberta de
analogias ocultas. Tal posição continua a ser defendida por alguns investigadores
(Dasgupta, 2004; Mumford & Whetzel, 1996).
23
Para além do variadíssimo leque de propostas de definição, e na sequência da
proposta por Wallas (1926), um dos percursores da explicação da criatividade enquanto
processo, são consideradas, quase unanimemente, quatro fases no processo criativo:
Preparação, Incubação, Iluminação e Verificação. Na primeira fase, o indivíduo
apercebe-se da existência de um problema a ser resolvido, de uma deficiência ou
necessidade e investe na resolução dessa situação, adquirindo e organizando o
conhecimento. Trabalha a investigação do problema a partir de diferentes recursos
(lendo, anotando, questionando, discutindo, indagando, explorando) começando, a partir
daqui, a formular hipóteses mas sendo, nesta fase, ainda mal sucedidas. Na segunda fase
(não consensual, porém, na actualidade), o sujeito desiste do problema; contudo,
continua ainda com um trabalho a nível inconsciente sobre o mesmo. Algures, num
determinado momento dessa incubação, ocorre a iluminação, o aha, o insight, flash ou
o clímax do processo de criação, um processo imediato e espontâneo. O sujeito pode ter
parado de se preocupar com o problema, mas não parou de viver, ou seja, de absorver
muita informação que, num dado momento, analogicamente se conectou com
informações já armazenadas e trabalhadas. Perante esta nova ideia, e constituindo a
quarta fase do processo, há um esforço deliberado de analisar, rever, avaliar, verificar e
eventualmente aperfeiçoar a sua ideia, até ter a certeza que está perante algo válido
(Gardner, 1978; Langley, Simon, Bradhaw & Zytkow, 1987; Martindale, 1989). Por
tudo isto, subscrevemos a posição de Einstein de que a criatividade advém “de 95% de
transpiração e 5% de inspiração” (Einstein, 1956, p.20).
O produto criativo
24
Contudo, apesar de muitos investigadores reconhecerem a importância desta
linha de investigação, parece existir alguma escassez de trabalho empírico sobre tal
matéria. Isaksen (1987) avança com uma explicação possível, referindo o facto de ser
considerada, muitas vezes e um pouco levianamente, a classificação de um produto
como criativo, um problema de fácil resolução, considerando-se algo demasiado óbvio.
Esta postura, de acordo também com MacKinnon (1975), contribui para a falta de
investigação científica sobre a produção criativa. Não é verdade, então, que esta
identificação da criatividade nos produtos seja tão fácil. A resposta a questões, tais
como o que é um produto criativo, para quem o produto deve ser considerado criativo,
que tipo de valor deve ter o produto criativo, quem deve ser o avaliador e em que
condições este deve avaliar, tem sido a orientação dos investigadores que se
interessaram por esta temática, (Amabile, 1983b; Amabile, 1996a; Besemer & O'Quin,
1991; Besemer & Treffinger, 1981; Dollinger, Urban & James, 2004; Hennessey, 1994;
Morais, 2001; Ward & Cox, 1974) não tendo sido, contudo, encontrada resposta única.
Assim, há várias listas de critérios para que um produto possa ser considerado
criativo. Por exemplo, para Mackinnon (1978) um produto é criativo se for original,
adaptado à realidade, elaborado, mostrando uma solução elegante e uma transformação
de princípios antigos. Já Besemer, Treffinger e O’Quin (Besemer & O'Quin, 1986,
1991, 1987; Besemer & Treffinger, 1981) listam outros atributos, a saber, a novidade, a
resolução, a elaboração e a síntese, sendo que há coincidências entre alguns dos autores
destes dois estudos. Quando se assenta nesta definição de produtos criativos a partir de
critérios, está a falar-se na Avaliação Conceptual da criatividade. Por outro lado, quando
a avaliação desses produtos se deve essencialmente ao acordo subjectivo, mas
controlado metodologicamente, entre juízes, familiarizados com a tarefa a avaliar,
falamos na Avaliação Consensual (Finke, Ward & Smith, 1992; Olea Díaz, 1993).
25
válida. Vernon (1989), por seu lado, define criatividade como a capacidade de um
indivíduo para produzir ideias novas ou originais, insights, reestruturações, invenções
ou objectos artísticos que sejam aceites pelos especialistas como de valor científico,
estético, social ou tecnológico. Salienta assim, de novo, a novidade e a eficácia,
tomando a alta criatividade. Esta ênfase na simultaneidade e na diferença dos dois
critérios, e não só no da Originalidade, é também sublinhada por Sternberg e Lubart
(1999), os quais caracterizam o conceito de criatividade como a capacidade de produzir
trabalho que seja ao mesmo tempo inovador e apropriado aos constrangimentos da
tarefa. Briskman (1980, p. 95) afirmava ainda neste sentido que “a novidade de um
produto é claramente apenas uma condição necessária para criatividade, não uma
condição suficiente”, ou seja, tal como explicou Stokes (2001, p. 277) “todas as
respostas criativas são novas, mas nem todas as novas são criativas”.
O contexto social
26
forma o afectam, e como podem ser usadas como facilitadoras da criatividade (Ibanez-
Martin, 1990; Isaksen, 1987; Mouchiroud & Lubart, 2002).
27
Bach que só quase um século após a sua morte foi reconhecido como criativo
(Simonton, 1980).
28
É também de salientar que estamos a referir-nos a características promotoras de
um clima criativo em geral. Em próximas oportunidades (cf. capítulo 2),
especificaremos com mais detalhe o clima criativo em contexto educativo.
Integração de dimensões
Assim, por exemplo, para Sternberg e Lubart (1996) são três os aspectos básicos
que interagem na actividade criativa: falam num Modelo Tri-facetado. O primeiro
aspecto refere-se à capacidade de redefinir um problema, ou seja, de ver o problema sob
um novo ângulo. O segundo envolve a capacidade analítica de reconhecer, dentro das
próprias ideias consideradas, aquelas que valeria a pena investir. O terceiro refere-se à
capacidade prática-contextual de persuadir as outras pessoas sobre a validade das ideias
seleccionadas.
29
criatividade envolve mais do que apenas uma soma de componentes, ou seja, requer a
confluência de seis componentes distintas mas interrelacionadas: os processos
intelectuais, o conhecimento, o estilo intelectual, a motivação, a personalidade e o
contexto ambiental (ver detalhes posteriormente neste capítulo). Mantendo uma
orientação sistémica, Csikszentmihalyi (1998, p. 47) define criatividade como sendo
“qualquer acto, ideia ou produto que muda um Campo já existente, ou que transforma
um Campo já existente num novo”.
30
Teorias explicativas da criatividade
O presente sub-capítulo procura dar resposta ou, pelo menos, apresentar algumas
pistas, às seguintes questões: como pode ser explicado o fenómeno da criatividade?
Quais as teorias psicológicas que lhe servem de suporte?
Abordagem Mística
Tal como referimos em pontos anteriores, a criatividade nem sempre foi vista
como um objecto científico. Assim, afirmou-se por muitos anos que o aparecimento de
uma ideia criativa era algo extremamente misterioso, até para a pessoa que a produziu
(Weisberg, 1986).
31
tendo pois sido escolhido este humano para expressar a voz divina. Assim, o indivíduo
criativo começa de repente a produzir algo completo, sem saber a sua origem. Esta foi
uma visão também partilhada pelos Gregos, que acreditavam que os deuses ou as
Musas1 segredavam ideias criativas aos artistas (Weisberg, 1986). Alguns artistas
criativos falam mesmo como se fossem os deuses que lhes dessem ideias criativas.
Prova disso é um artigo publicado no The New York Times, no qual o poeta Anthony
Hetcht foi citado por dizer o seguinte: “A Musa esteve comigo, colaborando com grande
fervor” (Weisberg, 1986, p.2).
Abordagem Pragmática
Talvez o mais notável defensor desta perspectiva seja Edward De Bono (1970,
1985, 1992) com os seus trabalhos sobre o pensamento lateral e inúmeros exercícios
práticos de estimulação do mesmo. Usa diversas ferramentas práticas, tais como a
metáfora dos chapéus pensantes (De Bono, 1994).
1
Musa é uma das nove filhas de Zeus, protectora da poesia.
32
Abordagem Psicodinâmica
33
Alguns dos seguidores de Freud, os autores neopsicanaliticos, consideram,
contudo, que o comportamento criativo pode não ser apenas resultado de conflitos
inconscientes ou de origem sexual, substituindo a importância do consciente pela do
pré-consciente. Por outro lado, acreditam que é possível o indivíduo desenvolver um
trabalho facilitador ou mesmo provocador de momentos criativos (por exemplo, através
da fantasia ou do relaxamento), isto é, sendo o pré-consciente um espaço de conteúdos
acessíveis voluntariamente à consciência, pode ser mais fácil e voluntariamente
utilizado. No processamento pré-consciente, não há rigidez da crítica lógica nem um
inconsciente impositivo de funcionamentos repetitivos e inacessíveis. A partir daqui,
não havendo obstáculos por parte dos dois extremos do aparelho psíquico, o acesso às
funções associativas será facilitado, tornando-se mais provável a manifestação criativa
(Osche, 1990). Por outras palavras, para os neopsicanalistas, o processo criativo ocorre
em duas fases, sendo o inconsciente o percursor da primeira fase e, na segunda fase,
resultante de um estado pré-consciente, é a pessoa criativa que elabora as ideias de uma
forma consciente e lógica.
34
medos ou culpas, seriam prejudiciais e repressores da criatividade. Ainda nesta
perspectiva, Otto Rank (1996) identifica três tipologias no desenvolvimento humano: o
adaptado, o neurótico e o criativo. Complementarmente, e aqui como Kubie (1958),
defende que a neurose é uma falha nas reais capacidades criativas.
Abordagem Humanista
35
plena do potencial de um indivíduo. Assim sendo, uma pessoa criativa será uma pessoa
auto-realizada, integrada e saudável em termos psicológicos.
36
prejudiciais. Da mesma forma, é fundamental que o sujeito se sinta compreendido e
aceite enquanto quem é. Para além desta segurança, o contexto deverá permitir também
liberdade psicológica, a qual favoreça a emergência de pensamentos, de sentimentos e
do jogo de associações mentais (Rogers, 1959a, 1983).
Esta perspectiva, tal como as outras, foi alvo de algumas críticas, nomeadamente
relacionadas com a desconsideração da dimensão psicológica no que respeita ao
processo criativo (Ochse, 1990), chegando mesmo a ser esquecido em Rogers ou
diluído no conceito de auto-realização em Maslow. Discutível é também a distinção
efectuada por Maslow entre criatividade primária e criatividade secundária, tal como
refere Morais (2001, p. 102), salientando que “mesmo ignorando o domínio científico e
a subvalorização respectiva do indivíduo criativo, parece algo problemático a separação
afirmativa entre outras realizações criativas (artísticas, por exemplo) e a auto-realização
do criador”.
37
O Modelo Estrutural da Inteligência (SOI) de Guilford (1986), consiste num
modelo factorial não hierárquico, utilizado para explicar a realização intelectual,
recorrendo a variadas aptidões. As diferentes aptidões são simbolizadas por pequenos
cubos, todos iguais, os quais integram um cubo maior, representativo deste modelo.
Cada uma destas aptidões é o resultado da conjugação de três parâmetros: produtos,
conteúdos e operações que, quando combinados, se designam por factores mentais.
Cada combinação dos três parâmetros resulta num factor ou aptidão, que é
representado por três letras (exemplo: CFI é a cognição de implicações figurativas).
Este modelo era composto, em 1956, por 120 aptidões, sendo alargado em 1982 para
150 e, em 1988, para 180 aptidões (Bachelor & Michael, 1997; Baer, 1993).
38
diferentes categorias de resposta, Originalidade ou raridade das respostas e Elaboração
ou colocação de detalhes nas respostas (Guilford, 1956, 1967b, 1986).
Apesar do modelo ter sido alvo de muitas críticas, continua a ser uma fonte de
investigação rica, nomeadamente no que respeita ao pensamento criativo. Salientando
essencialmente a dimensão do produto, no conceito de criatividade, lançou pistas para a
sua investigação, avaliação e intervenção (Bachelor & Michael, 1997).
39
testes de papel e lápis foi criticado por alguns investigadores, que os consideram triviais
e inadequados para medir a criatividade. Outros críticos sugeriram ainda que a cotação
em termos de Fluência, Flexibilidade, Originalidade e Elaboração não abrange todas as
dimensões do conceito de criatividade (Alencar, 2003; Amabile, 1983a). Estes aspectos
serão retomados, contudo, posteriormente (cf. capítulo 2).
Uma outra crítica é ainda levantada por autores que rejeitam a hipótese de que as
amostras de pessoas não eminentes possam fornecer informações para os níveis
eminentes de criatividade (Weisberg, 1993), partindo da questão ainda em aberto se a
criatividade eminente (Big C) traduz o mesmo fenómeno da criatividade do dia-a-dia
(Little C), ou mesmo se podemos utilizar o termo criatividade em ambos os níveis
(Sternberg, 1997c).
Parece-nos pois oportuno tecer dois comentários finais a esta abordagem. Por um
lado, a produção divergente de respostas não é sinónimo de criatividade, tendo até o
próprio Guilford salientado que a criatividade é mais ampla (Guilford, 1970c). Por outro,
a associação da criatividade ao pensamento divergente abriu e abre uma possibilidade de
operacionalizá-la, e disso é prova a multiplicidade de testes de pensamento divergente e o
seu uso frequentíssimo e actual (Plucker, 1999; Runco, 1991b; Runco & Runco, 2003).
Abordagem Cognitivista
40
A distinção entre os termos Psicologia Cognitiva, Teoria do Processamento da
Informação e Resolução de Problemas trará algum esclarecimento aos conteúdos deste
sub-tópico. A primeira, Psicologia Cognitiva, corresponde a uma posição teórica global,
que se debruça sobre o estudo dos processos internos, procurando assim perceber o
funcionamento cognitivo. O Processamento da Informação trata-se de uma postura com
contornos mais específicos, integrável na Psicologia Cognitiva (Casey & Moran, 1989;
McShane, 1991; Palmer & Kimchi, 1986), podendo ser encarada como uma linguagem
que materializa o estudo da cognição partindo da analogia do computador. A Resolução
de Problemas, mais especificamente ainda, advém do desenvolvimento dessa linguagem
e que envolveu diferentes preocupações e, consequentemente, o aparecimento de
diferentes metodologias de estudo da cognição. Nela, estão implicados os processos
cognitivos básicos (inicialmente estudados), o encadeamento de vários processos
(básicos e complexos) na realização de uma tarefa e, por último, já estando também
integrados as estratégias de resolução, a experiência do realizador e os contornos do
problema a resolver (Morais, 1996).
41
desenvolvimento contínuo da ideia, acedendo-se ao conhecimento anterior para criar
novas versões do estímulo inicial. O cérebro processa um estímulo, o
conhecimento-base é alterado e daí surgem novas relações, logo, potencialmente
criativas.
O modelo de Wallas foi, todavia, alvo de algumas críticas que acabaram por
contribuir para o desenvolvimento da abordagem da Resolução de Problemas, como a
da ausência da fase dedicada ao problem finding, uma das dimensões mais actualmente
associadas à criatividade (Chand & Runco, 1992; Getzels, 1987; Jay & Perkins, 1997).
Note-se, porém, que este continua a ser um dos modelos mais frequentemente
42
referenciados pela literatura e ainda detentor de validade conceptual (Csikszentmihalyi,
1996b; Runco, 1994; Russ, 1993; Torrance, 1988), tornando-se num dos suportes para a
compreensão da resolução criativa de problemas em particular.
Tudo isto deu algum suporte a uma visão computacional que abarcou o
objectivo da produção de pensamento criativo por um computador, numa simulação do
que os humanos fazem (Boden, 1992) como, por exemplo, a criação de programas
computacionais para análise do pensamento científico ou artístico, tal como
improvisações no jazz (Johnson-Laird, 1988). Contudo, o processamento da
informação deverá ser entendido tal como no contexto em que nasceu:
analogicamente face ao ser humano.
43
Abordagem Associacionista
44
Tendo como dado adquirido que as associações remotas são o suporte que vai
permitir a formulação de uma ideia criativa, Mednick (1962) apresenta-nos três métodos
para que tal aconteça. O primeiro diz respeito à serendipidade entre os elementos a
associar, o segundo relaciona-se com a semelhança dos elementos a associar e o
terceiro, e mais importante (Ochse, 1990), refere-se à mediação levada a cabo por um
elemento externo (mas com características próximas aos que irão ser associados) e que,
ao intervir, promove a combinação criativa.
45
ainda a importância da conjugação entre a quantidade e a originalidade patente nessa
mesma produção. Também os trabalhos de Koestler sobre a Teoria da Bissociação
(1989), os de Rothenberg (1976) sobre a proposta do Pensamento Janusiano
(consideração de opostos) e os de Simonton (2002a) sobre a produção/selecção de
ideias, viriam a ser igualmente influenciados por esta perspectiva.
Abordagem Gestaltista
46
Continuando a explicação do acto criativo nesta perspectiva, é historicamente
essencial referir que Christian von Ehrenfels, em 1890, publicou um artigo famoso,
Über Gestaltqualitäten ou, em português, Das qualidades gestálticas, introduzindo
assim o termo gestalt para evidenciar que os mesmos elementos podem vir a constituir
diferentes conjuntos dada a forma como estão organizados (Ash, 1995). Para ilustrar a
sua posição, podemos tomar como exemplo as notas musicais, ou seja, através da
combinação das mesmas notas musicais, podemos obter inúmeras melodias. Desta forma,
o conceito de gestalt é sinónimo de estrutura, forma ou configuração. Nas palavras de
Michael Wertheimer, filho do pioneiro desta perspectiva, gestalt é “um todo articulado,
um sistema, no qual as partes estão em dinâmica inter-relação, entre elas e entre cada
uma e o todo, uma totalidade integrada na qual cada parte e subparte têm lugar, um
papel, uma função requerida pela natureza do todo” (Wertheimer, 1991, p. 195).
Ligado a este conceito de gestalt, está ainda o facto de que o indivíduo tem
internamente a tendência de se direccionar para o que é simples, estável, compreensível
(Lei da Pregnância), surgindo como princípios organizadores desta percepção também o
fechamento (tendência a completar formas incompletas), a continuidade (tendência a
perceber uma forma como contínua) e a similaridade (elementos parecidos ou próximos
são mais facilmente percebidos e tendencialmente agrupáveis) (Wertheimer, 1991).
Também estes conceitos vieram a mostrar-se importantes para a resolução criativa de
problemas.
Abordagem Integradora
47
& Puccio, 1993; Sternberg, 1985a; Sternberg & Lubart, 1991; Urban, 1990; Wechsler,
1998). Passaremos, contudo, a referir as quatro perspectivas mais preponderantes nesta
visão de criatividade, a saber, a Componencial (de Amabile), a Sistémica (de
Csikszentmihalyi), a Interactiva (de Gardner) e a Teoria do Investimento (de Sternberg
e Lubart).
48
julgamentos inibidores), o estilo de trabalho (facilitando, por exemplo, longos períodos
de concentração e de esforço, a capacidade de abandonar o problema por algum tempo)
e características de personalidade. O terceiro e último componente é, para Amabile, o
mais importante dos três, mantendo-se em todo o processo criativo porque pode ajudar a
minimizar as deficiências dos outros dois enquanto que o contrário não sucede: a
motivação para a tarefa (task motivation).
Cada um dos grupos de competências intervém, como que se de um teatro se
tratasse: entram sozinhos ou em grupo, saem e voltam a entrar, num ritmo frenético,
mantendo como pano de fundo o objectivo de encontrar uma solução criativa e tendo
como personagem principal a motivação intrínseca. Assim, e sucintamente, o modelo de
Amabile preconiza que, após o problema ser lançado, a motivação intrínseca em
paralelo com as competências específicas do domínio encetam a procura da resposta.
Intervêm, depois, as componentes ligadas ao segundo grupo de componentes, as
criativas, com a presença permanente da motivação interna. Quando surge uma hipótese
de resposta, segue-se a validação da resposta encontrada, reentrando as componentes
associadas ao domínio, sendo aqui o momento da tomada de decisão sobre a paragem ou
a continuação da realização e estando, mais uma vez, presente a motivação (Amabile,
1996a; Hennessey & Amabile, 1988; Hill & Amabile, 1993). Então, de acordo com a
conceptualização do modelo de Amabile, e nas suas próprias palavras, “quanto mais
elevado é o nível do domínio de realização, das aptidões criativas e da motivação, mais
elevado é o nível de criatividade envolvido” (Amabile, 1995, p. 394).
Sabendo o papel preponderante que a autora dá à motivação intrínseca, iremos
deter-nos um pouco neste aspecto. Assim, é afirmado frequentemente que a
manifestação criativa só acontece quando os sujeitos se envolvem nas tarefas pelo
interesse que elas lhes despertaram (Amabile, 1983b; Crutchfield, 1962; Deci, 1975).
Apoiada nos trabalhos realizados por Rogers (1954) e Crutchfield (1962), Amabile
avançou mesmo com as ideias de que um envolvimento intrinsecamente motivado para
a tarefa é conducente à criatividade e que um envolvimento extrinsecamente motivado
lhe é prejudicial (Amabile, 1983a). Outros investigadores, acompanhando a linha
orientadora de Amabile, nomeadamente Runco e Chand (Collins & Amabile, 1999;
Runco & Chand, 1994) também salientaram a necessidade da motivação intrínseca no
processo criativo, apesar de lhe atribuírem um papel secundário face à dimensão
cognitiva. Note-se, porém, que trabalhos mais recentes de Amabile (Hennessey &
Amabile, 1988; Hill & Amabile, 1993) demonstram que apesar da motivação intrínseca
49
ter um papel determinante no acto criativo, ela pode coexistir com a motivação
extrínseca. Sternberg e Lubart (1995, p. 241) afirmam também neste sentido que
“algumas coisas na vida são a preto e branco, mas não muitas. A relação entre
motivação extrínseca e intrínseca com a criatividade não o é. Embora a pesquisa inicial
tenha pintado o quadro da motivação extrínseca como o mau da fita e a intrínseca como
o bom, a verdade tem provado ser mais complexa”.
Esta teoria tem como base conceptual o facto de que as ideias ou produtos
merecedores da adjectivação de criativos, são decorrentes da sinergia de muitas fontes e
não somente de uma dimensão isolada, sendo o seu percursor Mihailli Csikszentmihalyi
(1988b, 1990, 1997). Nas suas próprias palavras, “a criatividade não se produz dentro
das cabeças das pessoas mas na interacção entre os pensamentos de uma pessoa e um
contexto sócio-cultural. É um fenómeno sistémico, mais do que individual”
(Csikszentmihalyi, 1996a, p. 41). Este autor, tendo iniciado o seu percurso de
investigação na área da criatividade questionando-se, tal como todos os investigadores
até então, sobre o que é a criatividade avançou, mais recentemente, com a questão
alternativa onde está a criatividade e provocando assim um redireccionamento na sua
abordagem (Csikszentmihalyi, 1990; Getzels & Csikszentmihalyi, 1968, 1976)
Assim, para tentar clarificar o termo criatividade, faz a distinção entre três tipos
de pessoas que são descritas frequentemente como criativas: as brilhantes, ou seja, as
pessoas que expressam pensamentos incomuns, interessantes e estimulantes; as pessoas
com personalidade criativa que expressam o mundo de maneiras inovadoras e originais;
e os criativos, ou seja, as pessoas que efectuam mudanças significativas na sua cultura,
dando como exemplos Picasso, Leonardo Da Vinci, Einstein. Salienta que todos estes
tipos de pessoas são formas de se ser criativo e em larga medida estão relacionados uns
com os outros (Csikszentmihalyi, 1996a; Fernandes, 2004).
50
Percepcionando a insuficiência da pessoa criativa para explicar a criatividade,
propôs então um modelo dinâmico onde destaca a interacção de três subsistemas
indispensáveis para que surja uma ideia, produto ou descoberta criativos: Indivíduo,
Domínio e Campo. Para este autor, o Indivíduo tem como ponto de partida a informação
que recebe num determinado Domínio (por exemplo, arte, ciência, invenção,…), tendo
depois o poder de transformá-la ou alargá-la através dos seus processos cognitivos,
traços de personalidade e através da sua motivação. O Campo refere-se a um conjunto
de pessoas ou instituições que exercem controlo ou influência no Domínio (por
exemplo, críticos de arte, associações profissionais) e que vão avaliar e seleccionar as
novas ideias recorrendo a uma série de regras e procedimentos simbólicos, estando
interligado com uma dada cultura ou conhecimento partilhado por uma sociedade em
particular. O Domínio é então um sistema simbólico culturalmente definido, que
preserva e transmite os produtos criativos a outros indivíduos, assim como às gerações
vindouras, sendo essa preservação, alteração ou transmissão sempre orientada pelo
Campo (Csikszentmihalyi, 1999).
51
A Perspectiva Interactiva da Criatividade de Gardner (1988, 1996, 2000)
52
Gardner propõe também o Nível Multipessoal, referindo que em torno do
indivíduo ou produto potencialmente criativos se encontram muitos outros indivíduos
ou até instituições que, além de estarem habilitados para avaliar a adequação e
qualidade de uma dada contribuição, também exercem uma influência vasta. Este nível
diz respeito às normas, aos papéis, aos comportamentos ou aos valores associados à
criatividade num contexto sócio-histórico específico Trata-se, pois, de uma perspectiva
de natureza essencialmente sociológica e aproxima-se do Campo do Csikszentmihalyi.
Em suma, do ponto de vista de Gardner, o estudo da criatividade deve realizar-se
congregando múltiplas perspectivações: neurobiológica, psicológica, peritagem nos
diversos domínios e sociológica (Gardner, 1996).
Consequentemente à adopção deste modelo, Gardner considera, tal como outros
investigadores (eg. Simonton, 2000) que a criatividade envolve a solução de problemas
e que está relacionada com a aceitação (imediata ou posterior) da novidade. Além disso,
defende que um indivíduo pode ser criativo num domínio, mas não em todos (sendo que
assuir tal desafia a conceptualização psicométrica da criatividade como traço), que os
indivíduos criativos manifestam com regularidade a sua criatividade (desafiando os
criadores de uma única obra) e que o reconhecimento social das actividades criativas é
determinante para que sejam consideradas como tal e, neste sentido, a criatividade
implica um julgamento eminentemente cultural (Gardner, 2000).
53
(Sternberg & Lubart, 1997). Assim, um produto é original quando estatisticamente
é pouco comum, ou seja, é diferente dos produtos que outras pessoas tendem a produzir.
Porém, deverá também desempenhar adequadamente a função (adequação) para a qual
foi criado e, além de ser útil, deve dar uma resposta apropriada a certa pergunta ou
necessidade (importância).
Uma pessoa criativa é então aquela que regularmente idealiza produtos criativos,
ou seja, qualquer pessoa tem potencial para ser criativo, mas as que podem ser
nomeadas enquanto tal diferem amplamente quanto ao grau em que realizam esse
mesmo potencial. Nas suas próprias palavras, Sternberg e Lubart (1997, p. 29) afirmam
que “uma coisa é ter um potencial para ser criativo e outra muito distinta é sê-lo”.
Para a sustentação desta teoria foram desenvolvidas pesquisas empíricas,
recorrendo-se a várias tarefas: escrever histórias curtas com títulos invulgares; criar
publicidade criativa para produtos desinteressantes e resolver problemas científicos
incomuns. Nas conclusões, os investigadores afirmam que na manifestação criativa está
presente a confluência de seis recursos: competências cognitivas, o conhecimento do
indivíduo sobre o domínio que vai abordar, estilos intelectuais ou de auto-governo
mental, características de personalidade, motivação individual e meio ambiente
estimulante (Sternberg & Lubart, 1996).
Tomando um estudo piloto realizado com adultos (Lubart & Sternberg, 1995),
para verificar a confluência dos recursos individuais nos domínios da escrita, desenho,
problemas de ciência e realização de anúncios publicitários, chegou-se à conclusão que
todos os recursos avaliados contribuíram de forma independente para a realização
criativa. De entre as competências cognitivas, destacam-se essencialmente três: a
capacidade sintética (permite analisar os problemas de forma diferente, não ficando
preso ao pensamento convencional), a capacidade analítica (permite identificar, de entre
as novas ideias, quais é que se deve perseguir e quais é que devem ser abandonadas) e a
capacidade contextual prática (a habilidade de saber persuadir o outro e vender aos
outros o valor das suas ideias). Segundo estes mesmos autores, só então na confluência
destas três capacidades cognitivas pode surgir a manifestação de criatividade. Para
ilustrar este ponto de vista, dizem-nos que se apostarmos numa das capacidades em
detrimento das outras duas arriscamos a, respectivamente: produzir um pensamento
extraordinariamente crítico, mas nunca criativo; em obter novas ideias mas que não
funcionam; e a aceitar ideias não porque são boas, mas porque foram apresentadas de
modo convincente (Sternberg & Lubart, 1996).
54
Em relação ao conhecimento do indivíduo sobre o domínio que vai abordar, para
estes investigadores é claro que se por um lado, é necessário saber o suficiente para
poder seguir em frente, por outro lado, esse mesmo conhecimento poderá contribuir para
perspectivas fechadas e castradoras, se o conhecimento está organizado de forma rígida
e convencional (Frensch & Sternberg, 1989). Por seu lado os estilos intelectuais
(Sternberg, 1988b) são as formas individuais de utilizar as próprias capacidades.
Considerando importante o estilo legislativo (responsável pela construção de novas
regras ou informações) não é de desmerecer, para a criatividade, o estilo executivo
(capacidade de aplicar o pensamento na realização de tarefas segundo regras
estabelecidas e já demonstradamente funcionais): alguém pode criar regras novas para
conduzir um automóvel, e até serem mais funcionais do que as já existentes; porém, são
impossíveis de ser aplicadas per si. Também a preferência pela globalidade ou pela
especificidade são facetas distintas, mas complementares, quando se trata de
criatividade: é indispensável pensar globalmente e conseguir distinguir os pormenores
importantes (Sternberg & Lubart, 1995).
Quanto aos atributos de personalidade, as investigações realizadas demonstraram
que o funcionamento criativo depende da auto-eficácia, da vontade de superar
obstáculos, da facilidade em correr riscos e da tolerância à ambiguidade (Lubart, 1994;
Sternberg & Lubart, 1991). Outra variável importante, e ainda individual para a
produção de trabalho criativo, é a motivação intrínseca centrada na tarefa, tal como já
tinha sido notado por Amabile (1983b). Estes autores voltam a realçar que dificilmente
as pessoas fazem um trabalho verdadeiramente criativo, numa área específica, se não
amarem o que fazem, sendo também importante que se centrem mais no trabalho do que
nas recompensas que eventualmente daí advêm (Sternberg & Lubart, 1996).
Na Teoria do Investimento encontramos ainda outro elemento que concorre para
a produção criativa e que diz respeito não ao indivíduo, mas ao ambiente que o envolve:
sem um ambiente que suporte e apoie as ideias criativas, como por exemplo um fórum
para explanação das novas ideias, dificilmente elas chegarão a ser divulgadas.
Lubart e Sternberg (1996) consideram então as teorias de confluência uma
promissora linha de entendimento do complexo tema que é a criatividade. Porém, em
jeito de conclusão, os autores salientam que esta visão multidisciplinar da criatividade
não substitui as abordagens unidisciplinares, nem representa um caminho único para o
futuro da investigação em criatividade.
55
Após uma incursão teórica em várias perspectivas de análise da criatividade,
procurando mostrar o seu carácter plural, o caminho percorrido em termos de
investigação e as dificuldades de conciliação entre perspectivas, ficamos com a
perspectiva de que a criatividade, apesar de frequente e facilmente referida a nível do
senso comum, tem inúmeros e complexos componentes, onde a interligação é uma
necessidade para o seu entendimento (Alencar & Fleith, 2003). Recorrendo à analogia
com uma romã, Paula Fernandes (2004, p. 94) afirma que “todos juntos, estes
compartimentos formam a romã, emprestando-lhe uma beleza singular, que somente é
desvendada por quem ousa saborear tal fruto... mas todos sabemos o quão difícil é
descascar uma romã!”. Espera-se, então, que desta parte do primeiro capítulo dedicada
ao conceito de criatividade, fique o eco da simultânea dificuldade e riqueza,
complexidade e importância, desse mesmo conceito.
56
A CRIATIVIDADE EM CONTEXTO ESCOLAR
"A criatividade é a chave para a Educação e, num sentido mais lato, é a solução
para a maioria dos problemas sérios da Humanidade" - assim concluíu J. Guilford
(1967ª, p. 4), no Journal of Creative Behavior, no qual salientou a premente
necessidade da investigação científica se dedicar ao tema da criatividade. Observando a
História da Humanidade, constata-se a veracidade desta posição tendo em conta que,
inclusivamente, o fracasso em aplicar tácticas criativas e inteligentes na resolução dos
problemas humanos, conduziu ao declínio de várias sociedades (Chagas, Aspesi &
Fleith, 2005). Por exemplo, a magnanimidade da Idade Clássica, protagonizada pela
Grécia, colapsou ao não acatar advertências criativas, tais como as de Sócrates
(Torrance, 1962a).
Ora, tal fragmentação tem vindo a promover uma abordagem escolar por
disciplinas e também por fragmentadas metodologias, produzindo o especialista. Por
outro lado, a valorização destas mesmas disciplinas não se tem revelado igualitária no
contexto escolar ou, por outras palavras, “Inglês não é História, História não é Ciência,
Ciência não é Arte, Arte não é Música, Arte e Música são matérias de menor
importância, Inglês, História e Ciência são matérias importantes” (Ferguson, 1995,
p. 267). Com efeito, a Educação Ocidental, ao longo dos últimos séculos, tem-se
empenhado quase exclusivamente no desenvolvimento de competências específicas e
57
relacionadas, sobretudo com funções privilegiadamente associadas ao hemisfério
cerebral esquerdo, sobrevalorizando aptidões racionais, lógicas e analíticas (Prieto,
2007). O Sistema de Ensino formal tende, assim, a dar mais relevância ao hemisfério
predominantemente associado à realização verbal e lógica e a negligenciar as funções
mais tradicionalmente associadas ao hemisfério direito, como a visualização, as
emoções, o sentido de humor, a metaforização ou a criatividade (Barchard, 2003; Bono,
1971; Gardner, 1993a). Porém, esta fragmentação não parece existir no funcionamento
cerebral de uma forma tão radical e há a necessidade de usar todas as competências que
esse funcionamento nos permite (Elliott, 1986; Hines, 1991; Mario & Ken, 2007). Tal é
coerente com a afirmação de Bruner: “O pensamento não é (…) apenas um exercício de
lógica formal. O pensamento reside na esfera global da consciência de cada indivíduo
que inclui crenças, desejos, expectativas, emoções e intenções” (Bruner, 1962, p. 26).
58
2º, ponto 5, encontramos uma referência clara à criatividade quando afirma que devemos
formar “cidadãos capazes de julgarem com espírito crítico e criativo, o meio social em
que se integram e de se empenharem na sua transformação progressiva”. O seu artigo 5º
salienta que um dos objectivos da Educação Pré-escolar é "desenvolver as capacidades de
expressão e comunicação da criança, assim como a imaginação criativa e estimular a
actividade lúdica". E o artigo 7º determina que um dos objectivos do Ensino Básico é
"assegurar uma formação geral comum a todos os portugueses que lhes garanta a
descoberta e o desenvolvimento dos seus interesses e aptidões, capacidade de raciocínio,
memória e espírito crítico, criatividade, sentido moral e sensibilidade estética (...)".
59
Parece, pois, ser consensual a importância da criatividade, quer nos diversos
sectores da sociedade quer na Educação em particular, havendo inclusive não só
variadíssimos estudos que demonstram as vantagens educativas das capacidades
criativas (Barron, 1963a; Cropley, 1972; Getzels & Jackson, 1958; Oliveira, 1992;
Torrance, 1962a; Virgolim, 2004; Wallace, 1992), como também uma panóplia de
literatura no sentido de estratégias para desenvolver o pensamento criativo (cf. capítulo 2).
As implicações destas informações para a Educação são óbvias: não pode ser
entregue ao acaso a realização do potencial humano (Rubin, 1974), pelo que temos que
inserir a criatividade, de um modo consciente e intencional, nos contextos educativos e,
em particular, na escola (Alencar, 2001; Fleith, 2001; James, Gerard & Vagt-Traore,
2004; Noller, 1992). Contudo, apesar de estar clara a pertinência da criatividade na
Educação, não significa que seja uma tarefa fácil a resposta às dúvidas dos educadores:
de que modo a escola pode contribuir para a criatividade dos alunos e quais as variáveis
a serem levadas em conta neste objectivo, quer elas influenciem directa ou
indirectamente a criatividade?
60
Thinking, havendo inúmeros estudos, desde há muitas décadas, sobre criatividade e
contexto escolar a partir dele (Hu & Adey, 2002; Oliveira, 1992; Prieto, 2007).
Paulo Freire (1970, p. 15) diz que “educar é consciencializar”; por outro lado, e
de acordo com Torrance (1963e, p. 35), “afirma-se que as escolas existem para se
aprender (…) contudo, as escolas do futuro deverão ser concebidas não só para
aprender, mas para pensar (…). Este é o desafio criativo para a Educação”. À escola é,
pois, pedido que assuma como função ensinar a pensar.
61
Além disso, a escola é o local onde ocorre grande parte do processo educativo,
acompanhando as pessoas ao longo da sua vida (Davis, 2000; De La Torre, 1995),
sendo por isso natural que à Educação Formal seja também atribuído o papel de
transmissão da cultura. E, se assim é, o Sistema Educativo tem de ponderar quais os
valores que tem estado a transmitir e quais os que são necessários nessa função de
transmissão. Por exemplo, fazia sentido vigorar numa sociedade que valorizava o poder
da racionalidade “uma Educação concebida como concêntrica, convergente, unitária,
disciplinada, estruturada” (De La Torre, 1995, p. 61) onde se cultivasse “os traços da
obediência, passividade e dependência, (…) na concepção (…) do aluno ideal”
(Alencar, 2002, p. 15). Porém, os valores a transmitir pelo Sistema Educativo deverão
acompanhar os tempos modernos que “solicitam pessoas com um perfil marcado
sobretudo pela autoconfiança, independência de pensamento e acção, persistência,
coragem para arriscar e habilidade em resolver problemas novos” (Alencar, 2002,
p. 15). Por outro lado, a denominada massificação do ensino (ou democratização do
ensino) trouxeram à realidade escolar a diversidade, a diferença, a multicultura,
realidade essa que impede a escola de “continuar a preparar para a cultura de submissão;
não pode rejeitar a diferença, não pode desconhecer a natural diversidade das pessoas e
permanecer num modelo fabril de educação” (Delors, 1996, p. 15).
Por tudo isto, o Sistema Educativo está perante um desafio, colocado pela
própria sociedade que “necessita e exige uma renovação de meios educativos, que
integrem o desenvolvimento da criatividade, como norte e motor de novas orientações
metodológicas. Não se trata de uma qualidade rara e inatingível para muitos (....) mas
sim a fonte de energia mais poderosa que a Humanidade possa imaginar” (De La Torre,
1995, p. 18). Assim sendo, e também de acordo com a opinião do National Advisory
Commitee on Creative and Cultural Education (1999), a escola tem uma grande
responsabilidade no que toca ao desenvolvimento dos seus alunos, designadamente em
termos das suas capacidades, conhecimentos, e qualidades pessoais, por forma a
prepará-los para fazer face aos desafios futuros impostos frequentemente pela sociedade
(Alencar, 1993; Craft, Jeffrey & Leibling, 2001; Davis, 2000; Noller, 1992).
62
de possibilidades a partir do erro, a suposição e a experimentação, a persistência após a
falha (Alencar & Fleith, 2006; Torrance, 1963c). Além disso há a persistência na
atribuição de papéis sociais em função do género, conduzindo ao facto de, por exemplo,
as meninas serem mais relutantes a experimentar materiais e os rapazes a demonstrar
a sua sensibilidade, sendo que a criatividade precisa de ambas as competências
(McDougall, Drescher & D' Ercole, 2003). Também é esta cultura que desde a
infância inibe as crianças de contar histórias demasiado fantasiosas, típicas do
pensamento divergente, alegando que são impossibilidades ou tolices (Garner, Brown,
Sanders & Menke, 1992; Torrance, 1970); que insiste na dicotomia entre
trabalhar-brincar, sendo o conceito social de que trabalhar, em oposição ao de brincar,
é mau e desagradável, quando pode e deve ser encarado como divertimento (Westby &
Dawson 1995); cultura essa que dá também excessiva ênfase às competências verbais,
em particular à escrita e à leitura, em vez de valorizar de igual forma, por exemplo, o
que se sabe independentemente do conteúdo da expressão, como se aplica tudo o que se
sabe, como se reutiliza em novos contextos a informação (Craft, 2000). Ora, todos estes
contornos culturais se insimuam no Sistema Educativo e, consequentemente, na escola.
63
Nesta perspectiva de um macro-contexto fundamental, mas potencialmente
inibidor da criatividade, autores em diferentes eras, tais como Holt (1964), Silberman
(1970) e Baer (2002), salientam ainda que a escola, por vezes, com falhas no incentivo
dos alunos, destrói as capacidades criativas das crianças, suprimindo-lhes tanto a
espontaneidade natural como o prazer criador. Por isso, o Sistema Educativo deverá
criar condições para que, desde muito cedo, a criança receba recompensa sempre que
manifeste a sua curiosidade ou que apresente informação de um modo diferente, para
que a própria aprendizagem seja, por si só, recompensadora. Esta seria, pois, uma forma
de orientar para uma sociedade criativa, capaz de resolver os seus próprios problemas
(Guilford, 1970b). Porém, não podemos esquecer que essa mesma recompensa necessária
tem regras a serem respeitadas tendo em conta que, em certas condições, a motivação
extrínseca pode ser inibidora da criatividade, ou seja, tem um custo escondido (Lepper,
Greene & Nisbett, 1973), particularmente se for transmitido que o trabalho vai ser avaliado
ou se a recompensa for prometida na condição de realização do trabalho (Amabile, 1983b).
64
Quanto às referidas tarefas a incentivar no sentido criativo, abordá-las-emos mais
pormenorizadamente no sub-tópico Promoção da Criatividade; contudo, deixaremos
aqui, e apenas, um alerta: as tarefas a serem consideradas e as exigências curriculares
devem também ter em conta que “as pessoas são mais criativas quando trabalham num
domínio que apresenta alguma novidade. Porém, se a tarefa é demasiado nova necessita
ter alguns conhecimentos de base para poder avançar. Por outro lado, se é demasiado
fácil ou familiar, então existe pouca oportunidade para ser criativo” (Sternberg &
Lubart, 1995, p. 259).
65
Se o conhecimento é importante, então há que ponderar o tipo de currículo que o
Sistema Educativo determina (Brewer, 2002; Fleith & Alencar, 2005). Sánchez,
Martinéz e García (2003) dizem-nos que qualquer currículo que inclua o ensino da
criatividade se adequa não só aos alunos criativos, como a todos os outros,
acrescentando que se fosse possível conceber um currículo ideal, estariam contemplados
os seguintes elementos (Sanchez, Martínez & García, 2003, p. 128): “uma base teórica
sólida para reconhecer as oportunidades de transferência da informação aprendida;
actividades que estimulem a capacidade para responder de diversas formas a uma
situação ou a um problema; procedimentos para melhorar o pensamento crítico e a
solução de problemas complexos; um modelo de avaliação sólido”.
Por outro lado, e ainda em relação ao tempo lectivo, seria fundamental que fosse
repensado e redistribuído a fim de proporcionar aos alunos oportunidade de realizar, ao
seu próprio rítmo, e em todo o seu tempo do dia, a aprendizagem de matérias e a
experimentação prática, visto que “só assim se pode exigir responsabilidade pelo modo
como os alunos ocupam o tempo que têm disponível” (De La Torre, 1995, p. 65).
66
As condições físicas na escola podem também determinar a expressão de
criatividade (Bruno-Faria & Alencar, 1996; Ribeira, 2005; Shaughnessy, 1991) – sendo
estas, quer a nível global quer das salas de aula, em particular, da absoluta
responsabilidade do Sistema Educativo. É fundamental que, por exemplo, existam
recursos materiais diversos para o processo de produção de ideias (Bruno-Faria &
Alencar, 1996), recursos tecnológicos adequados à produção criativa (Csikszentmihalyi,
1996a), bibliotecas com suficiente possibilidade de pesquisa e salas com recursos áudio-
visuais (Marani & Alencar, 2005). É necessário também que o espaço escolar seja
preparado de modo a ser cómodo, independentemente das variações climatéricas (Dunn,
1987), mobilado com peças de utilização versátil (Amabile, 1999), possua áreas quer
para trabalho individual e autónomo quer para trabalhos multidisciplinares e de multi-
competencias onde possam estar envolvidos grandes grupos (Craft, 2000; Fasko, 2002;
Holland, 1967; Sternberg & Weihua, 2003).
Assim sendo, outras figuras ou variáveis se destacam pela grande influência que
exercem no meio escolar, nomeadamente no professor: a gestão da escola, a figura do
psicólogo e todos os outros profissionais que são parte integrante de cada instituição
escolar (Wechsler, 1993). Por exemplo, salientando mais uma vez a interligação entre
variáveis, Torrance (1976a, p. 209) afirma que “se o administrador da escola ou o
professor não respeitar genuinamente o estudante, haverá pouca probabilidade de
qualquer estratégia ou técnica melhorar a sua eficiência”. Por outro lado, abordando
ainda o papel dos supervisores, Torrance salienta que “um supervisor que não tolera um
espírito independente, terá dificuldades em canalizar a energia de professor criativo que
fica completamente absorvido no trabalho e, nesse momento, rejeita completamente
qualquer interferência. A melhor estratégia é esperar um pouco até ter uma abertura para
apresentar sugestões” (Torrance, 1976a, p. 11). Além disso, o professor criativo trabalha
melhor quando tem de lidar com dificuldades e situações desafiadoras, evitando a rotina que
67
lhe possa ser imposta (Foster, 1971). Também o professor criativo não espera maior
recompensa do que a própria realização do projecto ou ideia, pelo que não se debate pelo
poder; porém, isto tem, por outro lado, a grande desvantagem de não se moldar às ordens do
chefe, só para agradar. Em suma, os supervisores que não entendam tais características
como positivas, tendencialmente reagem com críticas ou penalizações inibidoras da
criatividade (Torrance, 1963e; Torrance, 1979b).
68
Os professores, o ambiente em sala de aula e os colegas
69
de Stein (1997, p. 25) quando afirma que “os professores são apenas uma das fontes de
estímulo e de reforço da criatividade” e que, quando exteriormente julgados, é comum
que “se as coisas correm mal tornam-se alvos fáceis de crítica, mas quando as coisas
correm bem, raramente recebem o reconhecimento e a recompensa que merecem”.
70
cada aluno desenvolva as suas potencialidades; e a de ser laborioso, porque desperta a
curiosidade (Sánchez, Martínez & García, 2003).
71
reconhecer os seus progressos; manter uma atmosfera livre de pressão e que não possa
provocar ansiedade, mantendo, todavia, o sentindo de responsabilidade do aluno.
Para que o aluno se possa expressar livre e criativamente é ainda necessário que
exista uma boa relação professor-aluno, mas também um ambiente de sala de aula
adequado (Alencar, 2002; Matos & Fleith, 2006; Shaughnessy, 1991). Torrance e Myers
(1970), relacionando inclusivamente estas duas variáveis, colocaram a relação
professor-aluno como o factor indispensável ao ensino criativo e o ambiente de sala de
aula como responsabilidade do professor, devendo prevalecer nele alguma
72
sensibilidade, atenção e orientação para a criatividade. Na mesma linha de raciocínio,
Justo (2004) realça que, para que a criatividade aconteça, é necessário que haja uma
determinada forma de o professor se relacionar com os alunos e um determinado modo
de se envolver no processo de ensino aprendizagem: entregar-se aos seus alunos,
ajudá-los e valorizá-los, estando sempre presente quando os alunos precisam,
depositando neles grande confiança e orgulhando-se dos seus êxitos.
73
pensamento do aluno; incentivar os alunos a aumentarem o seu conhecimento através de
pesquisa fora do contexto escolar; relacionar o conhecimento académico com o
quotidiano dos alunos; abordar assuntos que sejam do interesse dos alunos.
Torrance (1976a), por outro lado, alerta-nos para a existência de dois tipos de
ambiente: ambiente amistoso caracterizado pela informalidade, acolhedor, seguro e
afável e, por oposição, o ambiente inamistoso, pautado pela rigidez, pela falta de
simpatia e de amizade e pela frieza de sentimentos e comportamentos. Apesar deste
autor acreditar que os professores raramente recorrem a esta última estratégia no seu
sentido mais puro, recorda que, pontualmente, e provavelmente devido às próprias
necessidades psicológicas dos professores, estes possam sentir a necessidade de não
demonstrar qualquer indício de afecto ou sentimento, temendo envolver-se demasiado
nos problemas dos seus alunos, apresentando-se, frios, objectivos e insensíveis. Porém,
diz com clareza que “segurança e afeição têm alta classificação na hierarquia de
necessidades do Homem e só de um ambiente amistoso se pode esperar crescimento
criativo de uma forma sadia” (Torrance, 1976a, p. 207).
Esta posição é reforçada ainda pelas palavras de Wechsler (1993, p.131) quando
afirma que “o desenvolvimento da criatividade depende muito do tipo de ambiente no
qual estamos inseridos, sendo difícil tentar ser criativo num ambiente hostil a novas
ideias e que reprime o que é diferente”. Também Eysenck (1997) subscreve este ponto
de vista porque, a partir dos relatos descritivos efectuados pelos indivíduos criativos,
concluíu que estes não se adaptam muito bem a ambientes não criativos. Amabile
(1991) defende ainda que a escola deveria ser um local menos rígido, onde se
colocassem em prática diferentes estilos de aprendizagem e interesses distintos.
Sanchez, Martínez e García (2003, p. 27) vão também ao encontro destas opiniões,
indicando que a criança precisa de um “ambiente estimulante, onde impere a
compreensão, a receptividade, o reconhecimento e a valorização das suas ideias geniais,
e onde estejam presentes todas as condições necessárias ao aparecimento de ideias
criativas, ao mesmo tempo que se criam situações dotadas de alguma ambiguidade,
promotoras de um desafio intelectual”. Essas situações são descritas por Tan (2003)
como advindas de um ambiente de aprendizagem que encoraje e combine o jogo com a
alegria, a descoberta, o trivial e o erro. Podemos ainda acrescentar o relacionamento
entre as variáveis professor e características pessoais dos alunos, sendo que os estudos
indicam que, para uma melhor expressão do potencial criativo, “é relevante que o
74
professor fortaleça atributos de personalidade dos alunos que se associam à criatividade
como, por exemplo, persistência, iniciativa, autoconfiança, curiosidade” (Fleith &
Alencar, 2006, p. 520).
75
Perante este cenário, os professores são confrontados com um dilema (Amabile,
1996a): na formação das turmas, ou outros grupos de trabalho, os alunos devem ser
distribuídos respeitando a heterogeneidade em termos de competências ou a
homogeneidade? Neste ponto as opiniões dividem-se: por um lado, temos os autores
defensores que nos grupos homogéneos os estudantes mais criativos desenvolvem
actividades mais criativas e encaram a escola de uma forma mais positiva e optimista
(Amabile, 1996a; Drews, 1961); por outro lado, temos as opiniões que defendem a
colocação de alunos proeminentes em grupos separados e trabalhando conjuntamente
com alunos não criativos como uma maneira de favorecer o desenvolvimento criativo
destes últimos (Marjoribanks, 1978).
A família
As crianças geralmente passam grande parte do seu tempo, quer com os pais
quer com os professores e, por isso, ambos assumem um papel fundamental na sua
educação e, consequentemente, no desenvolvimento da sua criatividade. (Sanchez,
Martínez & García, 2003). Contudo, antes mesmo de receberem as influências do
76
ambiente escolar, as crianças são impregnadas dos valores do seu meio familiar
(Alencar, 1985; Pohlman, 1996). Aliás, as interacções familiares são consideradas a
base de construção da estrutura psicológica da criança (Wechsler, 1993). Por esse
motivo “não nos sobra qualquer dúvida de que a família tem um papel tão decisivo, ou
mais, no desenvolvimento da criatividade, do que a escola” (De La Torre, 1995, p. 94).
Parece-nos pertinente, então, questionar: quais os aspectos familiares que podem
contribuir para o desenvolvimento da criatividade dos alunos, criatividade essa
obrigatoriamente expressa no contexto escolar?
Um dos autores que se interessou por esta matéria foi Mackinnon (1962, 1978).
O investigador estudou os lares de arquitectos criativos tendo detectado algumas
características familiares e educativas potencialmente participantes no contexto da
amostra: os pais tinham muito respeito pelos filhos e uma confiança inabalável nas suas
escolhas, pelo que lhes davam liberdade para explorarem o mundo à sua maneira,
confiando sempre no seu sentido de responsabilidade; não se observava autoritarismo;
existia uma comunicação eficiente; não existiam laços de paternalismo asfixiante; a
dinâmica familiar tinha diversos modelos de adultos autónomos; havia disciplina e
regras, sendo contudo mais relevante o cuidado na transmissão dos limites que daquilo é
correcto e incorrecto; apesar de não existir uma necessária identificação com uma
prática religiosa, havia a preocupação da transmissão de valores morais e éticos;
registavam-se frequentes mudanças de casa e de ambiente, conduzindo ao
enriquecimento da experiência pessoal e cultural e, de certa forma, conferindo às
crianças espírito aventureiro.
77
Aceitam-se as regressões dos filhos, libertando-os de qualquer sentimento de culpa pelas
suas infantilidades” (Weisberg & Springer, 1980, p. 172).
78
opinião partilha Amabile que, numa tentativa de incentivar os pais como estimuladores
da criatividade dos seus filhos, apresenta-lhes a seguinte recomendação poética: “Tente
visualizar a sua criança no futuro, certificando-se que a sua visão se adapta às
características individuais da sua criança. Trabalhe depois no sentido desta visão”
(Amabile, 1991, p. 4). A autora salienta ainda que esta visão deve atender a
determinados aspectos essenciais, tais como a existência de princípios e valores
orientadores, a personalidade, o carácter, os interesses de cada criança e a sua
visualização como uma pessoa independente e que gosta daquilo que faz. Todos estes
factores funcionarão como um fio condutor para que os pais decidam o que é melhor
para os seus filhos e lhes proporcionem tudo aquilo que eles necessitam. Todos estes
factores terão impacto, por um lado, na manifestação da criatividade na escola e, por
outro, deverão articular-se com o que a escola se propõe fazer nesse mesmo sentido.
Variáveis intra-individuais
Cada aluno traz para a escola e, em particular, para a sala de aula, as suas
características individuais: físicas, cognitivas e de personalidade (Wechsler, 2002b, p.
163). As capacidades ou deficiências, com as mais variadas causas, podem fazer com
que o aluno tenha de receber um tratamento especial. Analogamente, o seu nível
cognitivo e a sua idade vão condicionar as estratégias específicas de ensino. Do mesmo
modo, as necessidades emocionais do aluno requerem atenção por parte dos professores
e, consequentemente, uma atenção especial na relação professor-aluno e no ambiente de
sala de aula. Com isto estamos a querer recordar o quanto estão interligadas as variáveis
que abordamos até este ponto com as características particulares do aluno e a salientar
novamente a impossibilidade de explaná-las todas.
79
Continuamos pois nesta segunda parte do primeiro capítulo, a tentar encontrar
pistas visando a questão: para que a criatividade seja uma realidade em contexto escolar,
o que necessitamos ter em atenção? Para a consecução do mesmo objectivo, Sternberg
(2003) defende a sua convicção de que a criatividade não é apenas uma questão de
pensar de uma certa forma, mas sim uma atitude na vida (Sternberg & Lubart, 1995,
1996), isto é, as pessoas são criativas porque decidem ser criativas (Sternberg, 2002a).
Após isso, apresenta uma lista com algumas dessas decisões e relaciona-as com o
contexto escolar. Assim, sugere que se incentive os alunos a redefinirem o problema, a
analisarem as próprias ideias, a venderem as suas ideias, a tomarem consciência de que
o conhecimento é uma espada de dois gumes, a ultrapassarem obstáculos, a aceitarem
correr riscos sensatos, a terem vontade de mudar, a acreditarem em si próprios, a serem
tolerantes à ambiguidade, a encontrarem o que amam fazer e a fazerem-no, a darem
tempo a si mesmos e a permitirem-se errar (Sternberg, 2002b; Sternberg & Lubart,
1991; Torrance, 1983).
Sternberg considera, assim, que um dos grandes desafios para quem investiga e
para quem pretende desenvolver a criatividade, é descobrir contornos gerais sobre as
características das pessoas criativas, tendo em conta que “tantas coisas parecem ser
verdade para a maioria dos criativos, embora não necessariamente para todos. Por
exemplo, alguns são com plena certeza caracterizados pela sua elevada auto-estima;
porém, outros, o que mais os caracteriza é a sua baixa auto-estima” (Sternberg,
1997b, p. 1). Assim, assegura que talvez a única característica que é pertença de todas
as pessoas criativas seja a sua decisão de seguir esse caminho, explicando que “as
pessoas que criam, decidiram o seu próprio caminho e seguiram-no, para o melhor e
para o pior. Em alguns momentos a sua auto-estima poderá estar alta e em outros
momentos baixa… em alguns momentos podem sentir-se curiosos e em outras vezes
não. Mas, se se pretender entender e promover a criatividade não se deve começar por
um tipo de competência, nem pelos traços de personalidade, nem pela motivação e nem
pelas estados emocionais, mas sim por encorajar as pessoas a decidirem ser criativas,
por imprimir neles a alegria de tomar decisões e também inocular neles os desafios que
advêm das suas decisões” (Sternberg, 2002a, p. 1). Daqui advêm importantes reflexões
para o Sistema Educativo e, em particular, para os próprios alunos porque, tal como
reflecte Nickerson (1998, p. 416), estes “precisam entender que se realmente quiserem
ser criativos, de um modo significativo, precisam estar preparados para trabalhar nisso”.
80
Além disso, os alunos precisam ter consciência que pode haver bloqueios no
processo de desenvolvimento da criatividade relacionados com o seu próprio modo de
estar na vida e com o seu nível mental e/ou emocional, os quais podem ser, por
exemplo: dificuldade em identificar um problema; bloqueamento perante a resolução do
problema; não constatação das variantes envolventes do problema; dificuldade em
identificar associações remotas; dificuldade para formar e transferir conceitos; aceitar
como verdade inquestionável aquilo que é apenas aparentemente óbvio. Relativamente
aos bloqueios emocionais, estes não só poderão estar relacionados com insegurança
psicológica e com falta de autoconfiança, mas também com medo de exposição ao
ridículo e com o receio da opinião dos outros, o que consequentemente vai dificultar
qualquer tomada de decisão (Butcher & Niec, 2005; Sanchez, Martínez & García, 2003).
Se é verdade que os alunos têm de ser responsáveis pela sua própria criatividade,
também o é, e tal como já o demonstramos, que muitas vezes “a Educação é um dos
factores responsáveis para que [a criatividade] não se manifeste igualmente” (De La
Torre, 1995, p. 62) nos indivíduos, pelo que temos de actuar de modo consciente no
sentido oposto. Nem sempre a criatividade parece bem vinda pelos educadores (Westby
& Dawson, 1995), o que pode limitar as próprias capacidades dos alunos, tal como
afirma Alencar: “Tenho observado que, na escola, se cultiva em demasia o medo do erro
e do fracasso. É assim comum o professor dar destaque à incapacidade, ignorância e
incompetência do aluno, deixando de assinalar o que cada um tem de melhor em termos
de talentos e habilidades. Isso leva ao desenvolvimento de uma visão pessimista dos
recursos quase ilimitados que o aluno dispõe na sua mente e na sua capacidade de
visualizar novas possibilidades e opções diante de problemas e desafios”
(Alencar, 2002, p. 23).
81
Por tudo isto, pode-se constatar que a promoção da criatividade no contexto
escolar é da responsabilidade de todos os elementos nela envolvidos, inclusivamente
dos alunos, e que “é exequível mas não é fácil” (De La Torre, 1995, p. 41). Com esta
consciência, e com a exposição de características cognitivas e emocionais mais globais
e necessárias ao aluno, partiremos agora para uma leitura que traduza as oscilações da
sua produção criativa advindas, particularmente, das variáveis idade e género.
A idade
Anos pré-escolares
Os anos pré-escolares são considerados por Gardner como a idade de ouro da
criatividade (Gardner, 1993a). Contudo, há variações quer no modo de expressá-la, quer
na sua qualidade.
Assim, até aos dois anos de idade, a criança mostra-se ansiosa por experimentar
tudo, recorrendo ao tacto, paladar e visão. Começa também a desenvolver a sua
imaginação para expressar o mundo. Quando cria algo, só identifica a obra após
terminada, isto é, não premedita a construção. Poder-se-á estimular a criatividade, nesta
fase, essencialmente apoiando o desejo de explorar (Rego, 2001; Vygotsky, 1987a).
Dos dois aos quatro anos, a criança, recorrendo ao seu mundo imaginário,
expressa no jogo as experiências que viveu, manifestando assim os seus processos
criativos (Vygotsky, 1982). Nesta fase aprende a respeitar o mundo nas regras que vai
aprendendo; contudo, não tem sobre ele uma noção muito clara. Acredita que “as
cidades são de ouro com pérolas nos portões, as fontes são cristalinas e o céu é claro”
82
(McMillan, 1924, p. 105), acredita na fantasia. A sua capacidade de concentração é
curta, pelo que a criatividade é uma expressão momentânea, continuando a não ser
planificada (Vygotsky, 1987b). Começa a desenvolver a autonomia, mas inicia-se
também o medo de falhar. Contudo, a sugestão para os educadores é que incentivem as
crianças a explorarem sozinhas, a testarem os seus limites, mesmo encontrando
dificuldades. Contudo, deverão manter-se atentos para amparar as quedas, evitando
assim os desânimos à expressão criativa (Logan, 1980).
Depois, entre os quatro e os seis anos de idade, a criança mantém muito activo o
seu mundo imaginativo, jogando aqui um papel importante o seu investimento no jogo
simbólico (Vygotsky, 1987b); contudo, depara-se com a realidade e começa a
questionar por que razão há “tantas ruas que não são douradas, tantas fontes turvas e
tantos céus escurecidos” (McMillan, 1924, p. 105). Estes anos pré-escolares são
considerados como facilitadores da criatividade, acontecendo o primeiro declínio cerca
dos cinco anos (Gardner, 1993a; Smith & Carlsson, 1985). Começa a planificar a obra
criativa, a sua curiosidade leva-a a procurar o verdadeiro e o certo, mesmo em áreas que
sejam embaraçosas para os adultos. Começa a ser capaz de relacionar acontecimentos
isolados, embora nem sempre entenda a razão dessa relação. Nesta fase surge também
consciência dos papéis dos adultos, da vida social e dos sentimentos alheios (Lindqvist,
2003). Todas estas variáveis poderão então participar no primeiro declínio da expressão
criativa. O papel dos educadores nesta fase é muito importante, quer como sendo
incentivadores da persistência, da procura de respostas e da intervenção nas decisões,
como também sendo preventores da inibição, nunca criticando, ridicularizando ou
envergonhando a ingenuidade da curiosidade da criança (Gardner, 1996; Torrance,
1976a; Vygotsky, 1990).
83
Analisando de um modo comparativo toda esta fase etária, as actividades criativas
nos três primeiros anos são essencialmente expressões livres. A realização criativa
aumenta até ao terceiro ou quarto ano, segundo a opinião de Torrance (1969a, 1976a),
embora, para Smith & Carlsson (1985) e para Gardner (1993a), ela decresça nessa fase.
84
uma forte dependência em relação à opinião consensual e as ideias incomuns são
recebidas com risos, ridicularização e condenação.
Dos oito aos dez anos de idade, as crianças tornam-se cada vez mais capazes de
usar uma variedade de aptidões ao serem criativas e conseguem improvisar meios para
expressar as suas capacidades. Identificam-se, na sua imaginação, com heróis que
venceram obstáculos e, através deste jogo, disponibilizam-se a ajudar os amigos (Ligon,
1957). Além disso, ao fazerem a clara identificação dos papéis sociais, envolvem-se
regularmente em brincadeiras com simulação de profissões. Já são capazes de se
envolver em projectos estruturados e longos, que exijam alguma concentração e
persistência. Apercebem-se do que fazem diferentemente dos outros colegas, podendo
assim ser facilmente feridos pelos julgamentos e pelo que os outros dizem deles. É,
assim o momento para dar oportunidade à expressão da originalidade e engenhosidade
(Torrance, 1976a).
85
momento crucial em que a criança integra, nas suas experiências criativas, o ambiente
escolar e social. Nesta idade há uma maior independência aprendendo, assim, a ter
consciência da sociedade e de si mesmo: “a dinâmica da liberdade e da disciplina, a
integração e desintegração, a ordem e a desordem, a expressão e a restrição, fazem com
que a criatividade seja mais vivida nestes momentos críticos do trabalho” (Barron,
1976, p. 138). Tal vivência deve ser então aproveitada.
Dos dez aos doze anos de idade as crianças tornam-se menos inquietas e
começam a usufruir o prazer de explorar actividades mais tranquilas como, por
exemplo, ler. A concentração é então um aliado cognitivo, mantendo-se a criança por
longos períodos nas actividades de pensar, conjecturar, planificar. Se desafiada, tem
suficiente capacidade para a empatia e simpatia. É uma época para a exploração de
talentos, para aprender a persistir em tarefas difíceis, aprender os princípios universais
que regem a Natureza e as relações sociais e para ser dada experiência em planificar e
tomar decisões (Torrance, 1980).
86
surgindo um outro declínio de criatividade, comparável ao ocorrido entre o 1º ciclo e o
6º ano. Também poderemos atribuir como razão para este declínio, mudanças
fisiológicas, já que é uma época caracterizada pelos conflitos do início das mudanças da
puberdade (Torrance, 1976b). Por outro, os jovens dos doze aos catorze anos
entusiasmam-se facilmente pelas actividades do presente, raramente fazendo planos
para o futuro. Tendem a reagir mais prontamente à aventura do que à razão, inclusive no
que diz respeito ao mundo emocional e social. Começam a questionar a autoridade e a
querer tomar decisões. Ainda não há muita mistura com o sexo oposto. Sentem-se
inseguros, particularmente devido às mudanças fisiológicas e emocionais, mas já são
capazes de manter a sua própria posição, independentemente da opinião e da pressão do
grupo (Wallach & Kogan, 1965).
87
Dos dezasseis aos dezoito anos, os jovens estão capazes de separar, por si, o que
querem e o que não querem, estando assim preparados para orientar com firmeza a sua
carreira. Estão com plenas capacidades de pensar em termos de abstracção e traduzir as
suas ideias sociais em práticas específicas. Podem então também aprender a canalizar
criativamente a energia emocional, resolver problemas e participar activa e
produtivamente nas actividades de grupos. O papel dos educadores será agora
preferencialmente o de companheiros mais experientes e não de impositores de regras
(Wallach & Kogan, 1965).
Idade adulta
Alguns estudos indicam que o contexto do Ensino Universitário é limitador da
criatividade face ao Ensino Secundário, pelo que surge aqui, novamente, um declínio
(Alencar, 1995; Cheung, Rudowicz, Yue & Kwan, 2003; Oliveira, 1992). Contudo, a
maioria das investigações acerca do desenvolvimento da criatividade na idade adulta
focalizam mais frequentemente a Alta Criatividade. Assim, os estudos acerca desta
faixa etária que mais se destacam são os de Beard (1874), Lehman (1953), Dennis
(1966) e, mais recentemente, Simonton (1984a, 1992a, 1997b, 2002a).
88
com estas investigações iniciais. Por exemplo, Simonton (1984a) considera que há um
rápido crescimento na produção criativa entre os 20 e os 30 anos, um pico entre os 35 e
os 45 anos e um declínio gradual posterior. Parece assim que muitas das teorias da
criatividade apontam para o seu decréscimo com a idade (Vygotsky, 1987a).
Contudo, dois aspectos devem ser aqui realçados: estes investigadores não
atribuem à idade propriamente dita as oscilações na produção criativa, mas sim aos
factores que acompanham a mudança de idade; por seu lado, nem todas as investigações
subscrevem estas conclusões. Assim, e no que diz respeito a este último aspecto temos,
por exemplo, Dennis (1966), o qual nega um declínio final tão precoce como referido
nessas investigações, apresentando como contra-exemplos Picasso e Freud que
produziram obras criativas até bem tarde na idade. Assim, este autor apresentou a
meia-idade (40-50 anos) como o período de maior produtividade, começando o período
de declínio gradual a partir dos 50 anos. Esta posição é também defendida em alguns
estudos mais recentes, tais como os de Cohen (1989), de Lindauer (1993) e os de
Kaufman e colegas (Kaufman, Baer & Gentile, 2004).
89
Lehman (1953) realçou também que os resultados, anteriormente apresentados,
traduziam valores médios, salientando que há variações em função do domínio de
realização criativa, tendo sido tais constatações apoiadas por outros investigadores
(Charyton & Snelbecker, 2007; Dennis, 1966; Reese, Lee, Cohen & Puckett, 2001;
Simonton, 1975, 1988b). A título de exemplo, realça-se que entre os profissionais de
Química as maiores contribuições ocorrem entre os 26 e os 30 anos; já entre
matemáticos, músicos e actores cinematográficos, estas acontecem entre os 30 e os 40
anos, ocorrendo depois um claro declínio (Dennis, 1966; Lehman, 1953; Simonton,
1975; Van Heeringen & Dijkwel, 1987). Nos filósofos, o pico criativo ocorre dos 35 aos
39 anos, nos escritores este acontece na idade abaixo dos 45 anos e os líderes políticos
tendem a adquirir projecção entre os 50 e os 65 anos, sendo estes domínios tardios em
termos de picos e também caracterizados por um declínio pouco acentuado ou nulo
(Dennis, 1966; Lehman, 1953; Simonton, 1975, 2002a).
É também do consenso geral que os indivíduos que começam a criar mais cedo
tendem a ser os que obtêm maior longevidade em termos criativos, bem como maior
produtividade (Davis & Rimm, 1994; Davis, 1987; Lehman, 1953; Segal, Busse &
Mansfield, 1980; Simonton, 1975; Torrance, 1994). Ora, Merton (1968) esclareceu tal
aspecto utilizando a expressão rich getting rich, ou seja, quanto mais cedo se começa a
criar, maiores são as possibilidades de ser reconhecido, de produzir mais, de se ser mais
divulgado, de conhecer mais gente influente e, assim, ter maior e mais duradouro sucesso.
Por último, surge-nos a questão acerca de que relação existe entre a criatividade
demonstrada nos níveis etários mais baixos com a dos anos seguintes. Há estudos que
traduzem alguma consistência, quer na população normal quer na altamente criativa,
entre a produção criativa ao longo da vida: por exemplo, resultados na avaliação sobre o
pensamento divergente ao nível do Ensino Pré-escolar, correlacionaram-se com as
avaliações obtidas na pré-adolescência (Harrington, Block & Block, 1987; Torrance,
1969b); arquitectos criativos relataram que em criança tinham mais interesses artísticos
90
do que os seus colegas (MacKinnon, 1962); alguns indivíduos famosos, tais como
Picasso, Einstein ou Freud, demonstraram na infância e na adolescência as suas
orientações profissionais (Gardner, 1996); a realização criativa a nível universitário
correlacionou-se com a encontrada na adolescência (Holland & Nichols, 1964;
Schaefer, 1972).
O género
91
investigadores provam o contrário (Chan, Cheung, Lau, Wu, Kwong & Li, 2001;
Dudek, Strobel & Runco, 1993).
92
justificadas por estes factos, afirmando que este tipo de diferenças advém mais do jogo
de sociabilização e de estereótipos do que das diferenças biológicas (Kaufman, Baer &
Gentile, 2004) porque "as diferenças na organização do cérebro são dinâmicas, em vez
de terem um padrão cristalizado, colocado completamente através de genes" (Kimura,
1985, p. 58).
Outros autores (Eisler & Montuori, 1995; Kogan, 1974) sugerem que as
diferenças advêm do facto de durante muitos anos as afirmações sobre pessoas criativas
terem sido quase exclusivamente feitas a respeito de um dos géneros: o masculino
(Ghiselin, 1955; Helson, 1990; Nochlin, 1973; Ochse, 1991; Yachnes, Gershman &
Miller, 1973). A justificação apresentada dessa quase exclusiva referência era de que os
homens são mais criativos pelo facto de que a vasta maioria de escritores, artistas,
cientistas e inventores foram homens. Porém, esta parece ser uma razão questionável.
Por um lado, as contribuições de algumas mulheres criativas não foram registadas (Reis,
2002; Simonton, 1992b) - por exemplo, há indicações que foi Katherine Greene, e não
Eli Whitney, a verdadeira inventora do gim de algodão (Vare & Ptacek, 1988). Além
disso, até mesmo quando as contribuições das mulheres eram identificadas pelos seus
contemporâneos, por vezes só foram reconhecidas a longo prazo. Um bom exemplo é o
da artista italiana do Renascimento, Sofonisba Anguissola, que foi identificada pelo rei
de Espanha como criativa, tendo-lhe inclusivamente designado a tarefa de pintar o seu
retrato; contudo, manteve-se esquecida na História da Arte até ao momento em que, há
poucos anos atrás, o historiador Ilya Sandra Perlingieri mostrou o seu trabalho
publicamente (Perlingieri, 1992). Complementarmente, e tendo em conta que nos
modelos sociais onde prevalece o domínio do masculino (Eisler & Montuori, 1995), isto
é, a crença de que a produção dos homens é mais valiosa do que a das mulheres, as
próprias mulheres tendem a subvalorizar-se. Como prova disso temos o trabalho
realizado por Barron (1972), com estudantes de Arte, onde um número considerável de
mulheres (40%) expressou que o trabalho delas era inferior ao trabalho dos outros,
enquanto que a mesma proporção de homens (40%) afirmou que o trabalho deles era
superior ou igual ao dos outros. Estas diferenças não seriam assustadoras se traduzissem
a realidade; porém, quando os produtos, sem identificação do autor, foram avaliados por
um painel de juízes, o trabalho das mulheres foi considerado mais criativo. Isto
obviamente ajuda a explicar porque algumas mulheres criativas recorreram a nomes
masculinos enquanto artistas (por exemplo, George Sand, George Eliot). É também
curioso verificar que as meninas se autoavaliam como menos competentes
93
cognitivamente do que os rapazes – até mesmo as meninas entre os 10 e os 11 anos de
idade, sobredotadas, se consideram menos aptas do que os rapazes (Lee, 1998; Piers,
Daniels & Quackenbush, 1960), pelo que teremos de estar atentos ao seu bem-estar
emocional (Maccoby & Jacklin, 1974) e ao próprio processo de avaliação (Baer, 1997).
Há pois investigadores (Eisler, 1987a, 1987b; Miller, Vehar & Firestien, 2001;
Reis, 2002; Yachnes, Gershman & Miller, 1973) que alertam para a impossibilidade de
se analisar as diferenças entre géneros na expressão criativa, enquanto se mantiver como
critério avaliador uma definição de criatividade que conduz a um resultado
estereotipado, porque é precisamente no quotidiano que as mulheres sempre tiveram
possibilidade de dar mais provas de criatividade. Assim, por exemplo, tiveram, e
continuam a ter, a maior responsabilidade na educação dos filhos, o que requer
capacidades criativas tais como a flexibilidade (Salner, 1983), assim como cozinhar
uma refeição e decorar uma casa com parcos recursos exige originalidade (Chang,
1963). Em outras palavras, todos estes domínios são historicamente pertença da mulher
mas, ao mesmo tempo, desvalorizados enquanto produtos criativos (Yachnes, Gershman
& Miller, 1973). Sugere-se assim que a definição de criatividade seja revista de modo a
incluir uma multiplicidade de domínios, para que seja possível adquirir uma imagem
mais completa das competências de todos os indivíduos (Abra & Valentine-French,
1991; Ackoff, 1981; Kaufman & Baer, 2006; Reis, 2002). Espera-se assim que se
encaminhe para uma perspectiva holística (Eisler & Montuori, 1995), ajustada ao que se
94
poderá chamar de democratização da criatividade (Peterson & Sisson-Runyan, 1993), o
que pode ser enriquecido com a análise da polémica acerca da little/big C já referida.
95
que disso depende conseguirmos enfrentar os desafios que são actualmente colocados
pelas mudanças culturais.
Por tudo o que foi apresentado, constatamos que também a variável género se
interrelaciona com os diferentes níveis de variáveis anteriormente abordados, desde a
cultura mais vasta ou a família, até ao próprio auto-conceito do indivíduo. Assim, as
diferenças encontradas, ou não, na expressão de criatividade em função do género, não
sendo de natureza linear, devem constituir motivo de reflexão no contexto escolar.
Deste modo, quer os professores quer os alunos, podem apetrechar-se de ferramentas de
trabalho mais adequadas no sentido de construir uma identidade de género apropriada,
sem o sentimento de vítima ou de impotência face ao papel habitualmente atribuído às
mulheres (American Association of University Women, 2001).
Muito mais haveria a referir, neste ponto do primeiro capítulo, não só porque
muitas outras variáveis poderiam ser consideradas, como também pela multiplicidade
enorme de relações entre as componentes influenciadoras da expressão e do
desenvolvimento de criatividade em contexto escolar. Realce-se, porém, que era apenas
nossa intenção, neste ponto, transmitir a não linearidade da temática da criatividade em
contexto escolar, assim como trazer alguma informação para a questão educativa da
escola dever contribuir para o desenvolvimento das competências criativas dos
indivíduos e quais as principais variáveis que devem ser levadas em conta, quer elas
influenciem directa ou indirectamente tal desenvolvimento. O próximo ponto,
assumindo a natureza da criatividade enquanto mutável e, assim sendo, assumindo a sua
promoção como essencial em contexto escolar, dará algumas pistas para a questão de
podermos potenciar as competências criativas, nomeadamente nesse contexto.
96
A PROMOÇÃO DA CRIATIVIDADE
Aceitando o repto lançado, há já alguns anos, mas sempre com actualidade, por
De La Torre (1995), procuraremos, nas páginas seguintes, dar uma resposta às
interrogações: a capacidade para pensar criativamente é inata e estável ou é algo
passível de ser desenvolvido através do treino? Se este treino é possível, de que forma
podemos estimulá-la?
97
Parece, pois, ser possível assumir a perspectiva de que a criatividade não é algo
inato e, assim, responder afirmativamente à primeira questão formulada por De La
Torre, inicialmente. Porém, mesmo que tal perspectiva não fosse verdadeira,
partilhamos a opinião de Nickerson (1998): qual seria o maior erro? Investir no treino
da criatividade não sendo esse esforço eventualmente rentável ou não investir nesse
treino havendo a possibilidade de crescimento?! E, voltando então à postura de que
todos os indivíduos podem favorecer as suas competências criativas, não
esqueçamos as palavras de De La Torre (1995, p. 32) que, referindo-se aos
indivíduos que já “nasçam com esta potencialidade”, ela “deverá ser estimulada e
desenvolvida de forma adequada, para não correr o risco de atrofiar”. Em suma,
qualquer que seja a perspectiva teórica sobre a polémica, talvez não se justifique,
particularmente no contexto escolar, correr o risco de não treinar os indivíduos na sua
criatividade.
98
um ambiente influenciador até aos programas com técnicas que incrementam os estados
cognitivos ou os emocionais” (Amabile, 1996a, p. 244).
Método analógico
Trata-se de um método que, tal como o seu nome deixa transparecer, recorre a
analogias e é considerado como “uma espécie de bombardeamento de conceitos:
projecta-se sobre o objecto uma grande quantidade de ideias provenientes de todos os
cantos do horizonte e observa-se se nascem novos conceitos destas aproximações
inesperadas” (Fustier, 1988, p. 53). Assim, o conhecimento é adquirido através de um
processo de apreensão do desconhecido a partir do conhecido, ou seja, parte-se daquilo
que o indivíduo já conhece e com o qual está mais familiarizado, para encontrar algo
que o indivíduo desconhece (Caldeira, 2006; Hofstadter, Mitchell & French, 1987). De
La Torre (1995, p. 106) considera mesmo este método “um instrumento poderoso para
99
mergulhar no inconsciente” e Ribot (1901, p. 41) foi ainda mais longe, dizendo que “o
alcance fundamental e essencial da imaginação criadora em termos intelectuais é a
capacidade de pensar por analogia”, a qual é “por natureza, um instrumento quase
inesgotável da criação”. Também este método desenvolve a flexibilidade de
pensamento, dotando o sujeito de estratégias que lhe permitem encarar as várias
situações sob diferentes perspectivas e ajuda a desenvolver a capacidade imaginativa
(Fleith, 1994), ao mesmo tempo que permite manter a receptividade face a novas ideias
(Fustier, 1988).
Durante o trabalho com o Método Analógico, poderão ser utilizados vários tipos
de analogias: Analogia por Fantasia, Analogia Directa e Analogia Pessoal (Amabile,
1996a). Assim, perante um problema, enquanto que a Analogia por Fantasia procura
encontrar a solução a partir de ideias afastadas da situação, por mais estranhas que
possam parecer, a Analogia Directa, pelo contrário, procura situações reais, semelhantes
ao problema exposto. Nesta última, o objectivo é obter respostas baseadas em soluções
já existentes, tendo em conta problemáticas muito parecidas mas presentes em contextos
distintos. Relativamente à metodologia com recurso à Analogia Pessoal, procura-se que
o indivíduo se identifique com o problema, para melhor o compreender e resolver
(Gordon, 1961; Virgolim, Fleith & Neves-Pereira, 2003). Um bom exemplo de
aplicação útil deste último instrumento é o trabalho de Gray (1988) que, ao utilizá-lo na
aprendizagem da História, mostrou os próprios alunos a afirmarem que facilitou o
estabelecimento de relações entre as informações diferentes e o pensamento sob
diferentes pontos de vista.
Relacionadas com este método estão várias técnicas que passaremos a referir
sucintamente. A Biónica tem como base o estudo sistemático dos mecanismos
orgânicos, ou seja, da sua estrutura, funções e mecanismos (Davis & Scott, 1975).
Segue-se a transposição para modelos matemáticos e a posterior aplicação a diversas
áreas, tais como a tecnologia mecânica, a náutica, a aeronáutica e a medicina (Cuello &
Vizcaya, 2002). É uma técnica tão antiga quanto o Homem, visto que, consciente ou
inconscientemente, sempre foi utilizada. Porém, foi só em 1960 que Jack Steele, médico
e coronel nas Forças Armadas americanas, atribuíu uma definição e um termo a este
modo de criar. Assim, nas suas próprias palavras, a Biónica é a “ciência dos sistemas
naturais, os quais podem ser copiados e comparados” (Steele, 1960, p. 12).
100
Um dos primeiros criativos que utilizaram a Biónica foi Leonardo Da Vinci que
aplicou os seus estudos da Natureza aos seus desenhos, salientando-se, como exemplo,
o de um aparelho voador (ornitóptero) criado a partir do estudo anatómico dos pássaros
(Steele, 2007; June 17). O arquitecto Sir Joseph Paxton é outro bom exemplo de criador
com recurso à Biónica, tendo desenhado a cobertura do Palácio de Cristal do Hyde Park,
em Londres, baseado-se no estudo das estruturas de um nenúfar sul-americano (Paxton,
2007). Trata-se então de um processo que fornece algumas pistas e ideias para
actividades promotoras da criatividade, aplicáveis em contexto escolar; contudo, é algo
complexo e moroso, que pressupõe grandes meios de investigação e não estando assim
ao alcance de todos (De La Torre, 1995).
Existem dois processos sinéticos básicos, a saber: fazer com que o estranho
pareça familiar e vice-versa. O primeiro processo é facilmente utilizado pelos
professores para melhorar a capacidade de aprendizagem de novas matérias por parte
dos alunos. O que se pretende é ajudá-los a relacionar a informação nova, a informação
prévia e as experiências anteriores, com o objectivo de facilitar a compreensão e a
retenção da nova informação. O segundo processo sinético é útil, colocado em prática
no contexto escolar, na eventualidade de existirem problemas demasiado familiares para
o sujeito e que careçam de um certo afastamento da sua parte, já que esta familiaridade
poderá funcionar como um entrave ao despoletar de uma solução criativa (Boden, 1992;
Cropley, 1997b).
101
processos psicológicos envolvidos na criação e que, nesse processo, a componente
emocional é mais importante do que a intelectual e o irracional mais importante do que
o racional. Além disso, deixou claro que um dos condicionantes para o sucesso deste
método, a fim de encontrar uma solução elegante, é a permissão da intervenção conjunta
da personalidade, dos conhecimentos e dos interesses dos intervenientes (Wechsler,
2002). Desde sempre que este método é aconselhado para o desenvolvimento da
criatividade e, em particular, no contexto escolar (Gordon, 1961; Virgolim, Fleith &
Neves-Pereira, 2003; Weaver & Prince, 1990).
102
contexto de sala de aula depende, contudo, da manutenção de um ambiente adequado
(Caldeira, 2006) como, por exemplo, descontraído mas controlado e livre de
preconceitos. Recomenda-se, ainda, durante a sua aplicação, o recurso a determinadas
estratégias, tais como a representação directa do problema, o monólogo, o espelho, a
troca de papéis e as projecções futuras (De La Torre & Marín, 1991).
O Circept contempla várias fases no que toca à sua aplicação. O primeiro passo
consiste na determinação de um tema que desperte o interesse do grupo. Parte-se de
seguida para a busca de Analogias Directas, ou seja, procuram-se semelhanças com o
objecto ou tema proposto, em termos da sua estrutura, funções, forma, componentes,
entre outras características. Segue-se uma fase de escolha e de classificação das
analogias, sendo aqui recomendável o funcionamento em subgrupos. Esta é considerada
a etapa mais complexa e morosa de todo este processo, encontrando-se ela própria
subdividida, ou seja, em primeiro lugar seleccionam-se as analogias mais importantes,
em segundo lugar reagrupam-se as analogias por categorias e, por último, extraem-se
delas os conceitos fundamentais. Com estes, coloca-se agora em prática o princípio da
oposição conceptual, representável através de uma estrutura circular, segundo a qual,
após a determinação dos conceitos fundamentais (ou eixos), se vão distribuindo e
escrevendo nesse círculo, na posição diametralmente oposta, os conceitos que sejam
considerados opostos. Os raios mais próximos representam, assim, as analogias mais
próximas, e os mais afastados as analogias mais distantes do problema de partida.
Retornando ao grande grupo, enceta-se a terceira e última fase, procedendo-se à análise
das analogias anteriormente classificadas (Cuello & Vizcaya, 2002; De La Torre, 1995;
Fustier, 1988). Deste modo, o Circept pode ser utilizado para apresentar o território
semântico em que está inserida uma palavra ou mesmo ser a representação dinâmica de
103
um projecto. É, pois, como uma bússula conceptual que permite orientar a reflexão e
facilitar a tomada de decisão em qualquer contexto, incluindo o escolar (Carre, 2001).
104
improvisada), focalização (por exemplo, escrita criativa, desenho/pintura, modelagem,
música e dança, criação de um álbum de trabalhos, natação ou jardinagem) e partilha de
experiências (Day, 1994; Gawain, 1995; Zamith-Cruz, 2005). Tendo em conta os
requisitos exigidos, não é esta a técnica mais utilizada em contexto escolar sendo,
todavia, fortemente aconselhada nos trabalhos de desenvolvimento da criatividade
envolvendo alunos com necessidades educativas especiais (Caldeira, 2006; Cuello &
Vizcaya, 2002).
Método antitético
105
preconcebidas (Alencar, 2004). Além disso, é fundamental que o ambiente estimule o
aparecimento de novas ideias, potenciadas através de factores tais como a motivação
grupal. Pretende-se, desta forma, desenvolver ideias criativas evocando a liberdade de
imaginação, o que é conducente à resolução de um problema (Torrance, 1974b;
Wechsler, 2002).
Osborn (1953) sugeriu que o processo criativo envolve dois passos – gerar a
ideia e avaliá-la. O processo de gerar ideias é a fase fundamental e característica do
brainstorming, na qual se constituem as equipas e se estabelecem as sessões de trabalho
(aproximadamente 30 minutos) para a produção intensiva e extensiva de ideias. Por seu
lado, a descoberta de soluções é feita através da avaliação das ideias (Cuello & Vizcaya,
2002), as quais durante o processo de Chuva de Ideias devem ser anotadas ou gravadas,
para permitir que a equipa escolha e analise as melhores em termos de viabilidade e de
aplicação prática.
106
relaciona com ela. É necessário reunir o máximo de informações acerca do tema e, a
propósito de um problema, considerar todos os seus aspectos”.
É de referir ainda que se trata de uma técnica muito utilizada em contexto escolar
(Crabbe, 1991; De La Torre, 1995; Polya, 1945) devido à sua fácil administração e ao seu
carácter proveitoso. De facto, o processo é simples e muito intuitivo. Parte-se de uma lista
de questões ou de palavras, como estimuladora do aparecimento de ideias. Como
exemplo, podemos pensar que se tivermos como intenção melhorar um determinado
produto (lápis, por exemplo), poderemos recorrer a uma lista de verbos, o mais exaustiva
possível, e aplicá-la ao produto: crescer, voar sem asas, comer arroz, furar plásticos. É
sugerida uma metodologia sequencial, começando por se escolher um objecto ou tema
para um possível trabalho, seguindo-se a listagem aleatória dos seus diversos atributos
com vista à concepção, descrição e representação do objecto ou situação que tentamos
resolver e, por último, seleccionando-se as características que o grupo entende serem
solução para o problema (Cuello & Vizcaya, 2002; De La Torre, 1995).
107
Método aleatório
108
flexibilidade e originalidade, assim como, segundo a opinião de Virgolin (2004, p. 5),
“o desenvolvimento do humor, que é um traço da personalidade criativa pouco
cultivado no Sistema Educacional tradicional”. Um exemplo de aplicação desta técnica
em contexto escolar é o de Adams (1986) no qual, com o objectivo de estimular a
linguagem não-verbal, desenvolveu diversos exercícios ligados ao uso da imaginação
onde se solicita ao sujeito para combinar diversos tipos de estímulos, como por
exemplo, a face de um amigo com a sensação muscular de estar a lançar uma pedra.
Nos anos posteriores, G.J. Puccio, M.C. Murdock e M. Mance associaram a cada
passo do método, referidos de seguida, uma competência de pensamento (Puccio &
Murdock, 2001). As competências foram delineadas “como uma forma de identificar as
diferenças qualitativas em cada fase, assim como de mostrar como o facto de se
aprender cada fase do CPS contribui para o desenvolvimento de competências criativas”
(Puccio, Murdock & Mance, comunicação pessoal, 14 Março, 2003). Assim, a grande
novidade neste método, segundo Alencar (2000b), é a utilização conjugada e
complementar dos dois tipos de pensamento divergente e convergente em cada uma das
seis etapas do processo de resolução de problemas (Encontrar o Problema, Encontrar
Factos, Definir Problemas, Encontrar Ideias, Encontrar Soluções e Encontrar
Aceitação). Este método parte do pressuposto de que todos os problemas são
solucionáveis, bastando para tal a adopção de uma atitude criativa (Fobes, 1993). O
termo problema aqui está relacionado com qualquer preocupação, desejo ou aspiração e
a resolução tem o sentido de modificação ou de adaptação de nós próprios ou da
situação (Piirto, 1998). É um método não só útil para desenvolver as competências
criativas, mas sim as competências cognitivas como um todo, ou seja, “aprender e
109
praticar o CPS pode ajudar a construir as competências intelectuais e a desenvolver
processos mentais que aumentam a capacidade do individuo para enfrentar as
mudanças, quer do quotidiano pessoal, quer profissional” (Switalski, 2003, p. 6).
Actualmente, os seus maiores investigadores estão conectados com o Creative
Education Foundation, sediada na Universidade de Buffalo em Nova York (Isaksen &
Treffinger, 1985; Treffinger, 2003).
110
Programas de desenvolvimento da criatividade
111
Contudo, algumas desvantagens foram atribuídas a este programa, associadas a
uma escassez de estudos que comprovem a sua eficácia. A explicação possível,
apresentada pelo próprio De Bono, para esta situação, poderá relacionar-se com o facto
das capacidades de pensamento treinadas serem extremamente difíceis de medir (De
Bono, 1976). Todavia, e trazendo alguma luz a este cenário, um estudo levado a cabo
por Edwards e Baldauf (1987), visando avaliar o impacto do CoRT em estudantes,
alcançou resultados positivos. Mostrou-se aqui significativo um aumento do número de
ideias em geral, da qualidade e estrutura das respostas relacionadas com assuntos
familiares, da originalidade e do número de ideias produzidas associadas a assuntos
desconhecidos, assim como uma melhoria em termos de desempenho cognitivo em
geral. Também Eriksson (1990) teve a oportunidade de constatar que este programa
conduzia a um desenvolvimento criativo nas áreas da fluência, flexibilidade e
originalidade e Guerreiro (1989) demonstrou que os alunos repetentes melhoraram, de
forma significativa, o seu rendimento escolar sendo ensinados através deste método.
112
participação neste programa conduzia a uma melhoria de resultados no TTCT (Torrance
Test of Creative Thinking), quer em termos verbais, quer em termos figurativos.
Paul Torrance e sua esposa, Pansy Torrance (Torrance, Torrance, Williams &
Horng, 1978), foram os criadores e primeiros utilizadores do Future Problem Solving
(FPS), em 1974, tratando-se de um programa cujo principal objectivo é o
desenvolvimento da criatividade dos participantes através da abordagem de questões
futuristas (Crabbe, 1991; Torrance, Goff & Kaufmann, 1989). Em termos práticos, isto
acontece dando aos alunos a oportunidade de exercitar as competências de resolução de
problemas, enquanto exploram temas relacionados com o futuro. Contudo, Torrance
advertiu que falar do futuro deverá ser sempre a partir do recurso aos “problemas do
quotidiano. O jornal está repleto de ideias” (Torrance, Torrance, Williams &
Horng, 1978, p. 15).
Este programa tem sido alvo de diversos estudos (Buckmaster, 1994; Crenwelge,
1992; Jatko, 1995; Olenchak, 1994; Tallent- Runnels, 1993). Daqui se tem concluído
que o FPS desenvolve nos seus utilizadores competências a nível da resolução de
problemas, da comunicação oral e escrita, do pensamento criativo, crítico e analítico.
Também se verifica, com a frequência do FPS, um aumento da apetência para trabalhar
em equipa e de competências de investigação (Alvino, 1993; Carroll, 1991; Connel,
1986; Czerwiec, 1992; Rimm & Olenchak, 1991). Ainda alguns dos participantes neste
programa afirmaram que o envolvimento no FPS durante a adolescência foi uma das
experiências mais estimuladoras e gratificantes da sua vida, tendo funcionado como
uma ajuda na escolha do futuro profissional, inclusivamente na escolha de profissões
desafiadoras (Flack, 1991). Além destas vantagens, e tendo em conta que pode ser
realizado em grupo, tal como a família, muitas outras vantagens são apontadas ao FPS
(Carroll, 1991; Crabbe, 1991; Flack, 1991; Hoomes, 1986; Torrance, 1974b). A título
de exemplo, podemos referenciar as vantagens que foram especificamente mencionadas
por Rimm e Olenchak (1991), os quais tiveram oportunidade de constatar que a
participação no FPS em família contribuiu para a resolução de problemas de mau
aproveitamento escolar, particularmente pelo facto de potenciar a motivação intrínseca.
113
potencialmente utilizado no contexto escolar, estando preparado para ser aplicado em
qualquer nível de ensino e disciplina, desde o grau pré-escolar até aos graus académicos
mais avançados, já demonstrou o seu valor em outras áreas e contextos (Torrance,
1993c; Torrance & Safter, 1990).
114
desenvolver, cada vez mais, a confiança nas suas capacidades de renovação e
transformação. Desta forma, podemos garantir um mundo mais harmonioso e um futuro
mais digno” (Virgolim, 2004, p. 15). Se estas afirmações são válidas em todos os
contextos, como o último autor referiu, particularmente elas se perspectivam como
indispensáveis e urgentes aplicadas ao contexto educativo, em geral, e ao escolar em
particular. A investigação conduzida neste trabalho, não tendo directamente a ver com a
promoção da criatividade, sustenta-se e projecta-se em função de tal objectivo.
Por outro lado, uma reflexão faz-se pertinente, neste ponto do trabalho,
relacionada com a avaliação dos programas de promoção da criatividade, ou seja, surge
a questão de como poderão os intervenientes educacionais e, particularmente, os
professores, ter feedback dos resultados das suas intervenções, sendo considerado este
tão importante (Daniels, 1997; Torrance, 1976a). Parece, pois, ser premente a existência
de instrumentos objectivos de avaliação da criatividade. A corroborar esta posição, e
acrescentando que a falta dos citados instrumentos poderá ser uma das razões para o
pouco investimento no desenvolvimento da criatividade na sala de aula, Siegal
(1986, p. 18) salienta: “usam-se certos conhecimentos que são facilmente mensuráveis,
isto é, aritmética e ortografia, para avaliar o sucesso ou fracasso do currículo, dos
professores e dos alunos. Como consequência, a aprendizagem mecânica é demasiadas
vezes confundida com inteligência. Presentemente, a importância dada a capacidades
mensuráveis e a não mensuração de todas as capacidaddes, dá pouca oportunidade à
criatividade na sala de aula”.
115
116
CAPÍTULO 2
A AVALIAÇÃO DA CRIATIVIDADE
A criatividade, nas últimas décadas, tem sido reconhecida como um dos aspectos
mais relevantes do desenvolvimento humano, sendo inclusivamente vista como um
instrumento indispensável para qualquer sociedade pelo facto de os indivíduos criativos,
ao se debruçarem constantemente na busca de novos caminhos, funcionarem como
impulsionadores da civilização. Ela está presente na História da Humanidade, desde
tempos remotos: os primeiros Homens das cavernas criaram (ou descobriram) o fogo e
a roda; desde então, nada foi capaz de travar o Homem criativo em todas as áreas do
conhecimento (Shaughnessy, 1995). Porém, em paralelo com a sua pertinência, está em
questão a sua identificação, ou seja, quais os critérios a utilizar para avaliar esta
dimensão tão importante.
117
funcionamento intelectual. Segundo o modelo de intelecto humano deste investigador
(Guilford, 1956), a criatividade estaria representada sobretudo na dimensão do
pensamento divergente, podendo ser estimada pela capacidade do indivíduo inventar
variadas e novas respostas (cf. Alencar & Fleith, 2001). Por este motivo, Guilford
considerou inadequados os tradicionais testes de inteligência, os quais avaliam
especialmente as capacidades do pensamento convergente, desenvolvendo mais tarde os
seus próprios testes de criatividade (cf. Conde, 2003; Gomes, 1975).
118
exemplo competências tais como o objectivo que rege o pensamento divergente
(Cropley, 2000).
119
INSTRUMENTOS E POLÉMICAS NA AVALIAÇÃO DA
CRIATIVIDADE
Testes psicométricos
120
& Guilford, 1969) e Consequences (Christensen, Merrifield & Guilford, 1958). Muitos
outros investigadores seguiram as pegadas de Guilford (Bachelor & Michael, 1997;
Hocevar & Bachelor, 1989; Urban, 1990), fazendo surgir vários instrumentos de
avaliação, dos quais se destacam os dois mais conhecidos, a saber, os Torrance Test of
Creative Thinking1 (Torrance, 1968b) e o Wallach e Kogan Test (1965). Neste grupo de
instrumentos de avaliação, podemos também evidenciar o Unusual Uses Test (Guilford,
Merrifield & Wilson, 1958); o Structure of the Intellect Test (Guilford, 1967a); o
Remote Associates Test (Mednick, 1962); e o Structure of the Intellect – Learning
Abilities Test (Meeker & Meeker, 1982), baseado no SOI de Guilford. Os trabalhos
levados a cabo por Chand e Runco (1992) culminaram também na concepção de vários
instrumentos neste sentido.
Os testes de Wallach e Kogan (1965) são compostos por três subtestes verbais
(Ilustrações, Usos alternados e Semelhanças) e dois subtestes que consistem em
estímulos figurativos ambíguos (Significado dos modelos, Significado das linhas). São
testes independentes face ao constructo de inteligência (Wallach, 1970, 1993), bem
como independentes de diferentes medidas de pensamento convergente com as quais
existe uma correlação média de .09 (Wallach & Kogan, 1965). Kogan (1983) listou
alguns estudos que apoiam a validade e fidelidade deste teste. Complementarmente,
Vosburg (1988) relatou correlações entre correctores (acordo de correctores) de .92 para
a Originalidade e de .83 para Utilidade, assim como uma boa consistência interna (valor
de alfa de Cronbach de .86). O conteúdo, a forma e a cotação do teste anteriormente
referido não diferem substancialmente do TTCT (Torrance, 1990c), surgindo as
diferenças no facto de Wallach e Kogan, ao contrário de Torrance, recomendarem a
manutenção, na sua administração, de um clima não-avaliativo, de uma atmosfera de
jogo e da ausência de tempo limite.
1
Ao qual nos referiremos, a partir deste ponto, como Teste de Pensamento Criativo de Torrance (TTCT).
2
cf. capítulo 2 para descrição e análise detalhada deste teste.
121
foi fechado com linhas irregulares) e a Abstracção dos Títulos (títulos que transmitem o
essencial de um modo profundo e rico), para além do Vigor Criativo (13 forças
criativas). Os Testes do Pensamento Criativo de Torrance estão disponíveis em duas
versões, uma Verbal e uma Figurativa. É assim composto por sete actividades verbais –
Interrogações, Adivinhando causas, Adivinhando consequências, Melhorando um
produto, Usos invulgares, Questões invulgares e Suposições – e por três actividades
figurativas – Construção de figuras, Complemento de figuras e Linhas e círculos
(Torrance, Ball & Saffer, 1992).
122
Assessment and Research e pelo Center of Research and Development para avaliar
criatividade (Heist, 1968). Outros inventários de atitudes e interesses que têm mostrado
ser úteis no estudo da criatividade são o Runner Studies of Attitudinal Patterns (Runner,
1954), o Childhood Attitude Inventory for Problem Solving (Covington, 1966) e o
Creative Behavior Disposition Scale (Taylor, Sutton & Haworth, 1974).
Inventários de personalidade
123
como a ausência de convencionalismo, o humor ou a afectividade estão presentes nas
produções de indivíduos criativos.
Inventários biográficos
124
sendo notório que os homens mais criativos optavam pelos campos da Matemática,
Física, Electrónica, Comunicação e outras Ciências Físicas. Além disso, Michael e
Colson (1979) desenvolveram o Life Experience Inventory (LEI), composto por 100
itens relacionados com informações de índole mais específica (por exemplo, número de
mudanças de residência na infância, composição familiar, educação, tempos livres).
Também Runco (1987) concebeu o Creative Activities Checklist, aplicável a crianças do
quinto ao oitavo ano de escolaridade. O teste simplesmente apela aos sujeitos para que
indiquem com que frequência participaram, recentemente, em actividades pertencentes
a seis áreas: Literatura, Música, Drama, Arte, Negócios e Ciência. Através da
contabilização dos resultados, podemos então calcular um nível de criatividade.
Opinião de especialistas
Tendo em conta o facto dos professores passarem uma grande parte do tempo
com as crianças e terem grande oportunidade para observá-las face a situações
potencialmente geradoras do comportamento criativo, justifica-se o grande número de
125
investigações sobre criatividade realizadas em contexto educacional. Assim sendo, as
avaliações pelos professores são um modo comum de avaliar a criatividade (Almeida &
Oliveira, 2000; Hocevar, 1981; Renzulli, Smith, White, Callahan & Hartman, 1976;
Piers, Daniels & Quackenbush, 1960; Yakamoto, 1963).
Ainda especialmente útil no Ensino Superior, e passível de ser utilizado quer por
professores quer por pais, o Creativity Assessment Packet (William, 1980) avalia a
frequência de comportamentos que indicam a presença da curiosidade, a facilidade em
correr riscos, o gosto por coisas complexas e a imaginação. Também muito frequentemente
é utilizada a escala de avaliação por professores Scales for Rating the Behavioral
Characteristics of Superior Students (Renzulli, Smith, White, Callahan & Hartman, 1976),
assim como o Teachers Evaluation of Student’s Creativity (Runco, 1984).
126
A avaliação pelos professores tem vindo a ter, também, um papel fundamental
na validação de vários testes de criatividade (cf. Hocevar & Bachelor, 1989; Olea Diaz,
1993), tais como o Mednick e Mednick´s (1967), Remote Associations Test (Karlins,
Schuerhoof & Kaplan, 1969; Mednick, 1963), e o Shaefer´s Biographical Inventory:
Creativity (Schaefer, 1969; Schaefer & Anastasi, 1968).
Na sua maioria, as avaliações feitas pelos pares são utilizadas com crianças no
contexto escolar e, não obstante a assumida limitação como critério de avaliação de
criatividade (Keller & Holland, 1978; Renzulli, Reis & Smith, 1981; Torrance, 1962a),
alguns autores tais como Torrance (1974c) são da opinião que estas avaliações podem
fornecer dados muito úteis para o seu estudo, dado o conhecimento que as crianças têm
dos seus colegas. Assim, com o intuito de reduzir a ambiguidade deste tipo de
avaliação, Torrance instruíu os alunos para basearem as suas nomeações em critérios
específicos, tais como: a fluência ideacional, ideias invulgares, capacidade de resolução
de problemas ou imaginação. Similarmente, Yakamoto (1964a, 1964b), Foster (1971) e
Reid, King e Wickwire (1959) recorreram à nomeação pelos pares como critério de
avaliação da criatividade.
Este critério pode também ser, contudo, utilizado fora do contexto escolar.
Exemplo disso é o estudo realizado por Specher (1964), o qual foi utilizado para a
identificação de engenheiros criativos.
127
estudo a partir da opinião anónima de supervisores sobre quem eram os trabalhadores
mais e menos criativos, numa amostra de investigadores de uma companhia petrolífera.
128
Considerando a variedade de opiniões face aos critérios a utilizar na avaliação de
produtos, Besemer e Treffinger (1981) fizeram uma proposta de sistematização da
informação, surgindo assim uma taxonomia (CPAM-Creative Product Analysis Matrix)
com catorze categorias organizadas nas três grandes dimensões acima referidas. Estes
mesmos autores salientam ainda que para um produto ser considerado criativo, terá de
ser avaliado positivamente nas três grandes categorias, mas não obrigatoriamente nas
catorze categorias específicas, dado que algumas delas são muito semelhantes a nível do
que por elas é avaliado. A partir deste modelo de agrupamento de critérios de avaliação
dos produtos criativos, Besemer e O’Quin (1986, 1987) propuseram um outro
instrumento de medida, o Adjective Cheklist.
Não existe absoluto consenso acerca de quem deve avaliar produtos, podendo
assim ser uma tarefa de especialistas ou de não-especialistas, com treino ou sem ele,
dependendo do investigador e do objectivo. Porém, quase todos os autores concordam
com a ideia de que os juízes devem ter experiência no domínio que vão julgar, tomando
investigadores representantes de diferentes perspectivas (Amabile, 1983a; Besemer &
O'Quin, 1999; Hennessey, 1994; Hocevar, 1981; Olea Diaz, San Martin & Varela,
1992).
129
Por seu lado, é uma limitação a este tipo de metodologia as exigências de
recursos requeridos a nível de tempo gasto na identificação de peritos e na ocorrência da
própria avaliação, assim como recursos a nível económico, dada a peritagem envolvida.
Também não é defensável a utilização da avaliação de um só produto criativo nem de
um só tipo de produto, acrescendo isto dificuldades a nível do que foi referido
anteriormente (Morais, 2001).
Na opinião de Olea Díaz e colegas (1989, 1992), este processo de avaliação não
tem sido muito utilizado; contudo, constatam que não é propriamente uma lacuna na
investigação, verificando-se vários trabalhos utilizando-o, sobretudo com o Método
Consensual de Amabile (1983b, 1996b), a partir de juízes familiarizados com a tarefa.
Inclusivamente no nosso País já algumas experiências têm sido conduzidas neste
sentido da avaliação de produtos criativos como, por exemplo, o trabalho de Morais
(2001) tomando diferentes tipos de produtos e metodologias, ou o trabalho de Miranda e
Viana (2007) a partir da classificação de Renzulli (1981).
130
Muitos outros estudos se debruçaram sobre a identificação de sujeitos altamente
criativos como, por exemplo, o de Roe (1951), o qual consistiu na selecção de um grupo
de cientistas da área da Física, que tinham de eleger 70 físicos como mais criativos
através de uma escala de excelência a partir de três pontos. Barron (1969), na Irlanda,
solicitou ao corpo directivo do Irish Managment Institute uma selecção de indivíduos
considerados líderes da vida económica irlandesa, para elegerem indivíduos que
consideravam inquestionavelmente criativos. Gruber (1974) analisou ainda diferentes
tipos de variáveis tendo como referência a vida e produção de Darwin. Por seu lado,
Gardner dedicou-se ao estudo de sete casos famosos, tendo relatado a sua investigação
no seu livro Mentes que criam (Gardner, 1996). Outros exemplos de trabalhos que
recorreram à Historiometria e, portanto, à análise de variadas personalidades criativas
tendo em conta um dado período histórico, são os de Cattell (1903), Cox (1926) e
Walberg (1988, 1969) e, mais recentemente e sendo os mais significativos, de Simonton
(1988c, 1993, 1994, 1997b, 1999).
131
avaliação: classificar-se em primeiro, segundo ou terceiro lugar num concurso regional
ou nacional sobre Ciências; ter construido uma obra de arte; ter histórias, artigos ou
poemas publicados num jornal público; ter inventado algo passível de ser patenteado;
ter papéis em peças teatrais. Por seu lado, alguns dos instrumentos medem
auto-percepções de alunos, por exemplo, a partir de frases ou adjectivos (Khatena &
Torrance, 1973; Wechsler, 2002).
Biométrica
132
tarefas criativas (Martindale, 1999). Todavia, tal como a abordagem psicométrica, é
alvo de algumas limitações principalmente relacionadas com a definição ou a
identificação de tarefas criativas apropriadas, que possam ser utilizadas como teste para
esse objectivo. Uma outra condicionante assenta no facto de que esta avaliação só pode
ser realizada em contexto de laboratório, sendo evidentes os custos e o tempo gastos e
que, por consequência, só será exequível num contexto reduzido ou durante um curto
período de tempo (El-Murad & West, 2004).
Outras categorias
133
problema como difusa e minuciosa, enquanto que os cientistas bem sucedidos, mas
menos criativos, descreviam a atenção como focalizada e acentuada. Depois do insight,
os cientistas criativos sentiam-se mais frequentemente contentes, exaltados, saciados e
excitados (Amabile, 1996b; Ghiselin, Rompel & Taylor, 1964).
Por tudo o que foi apresentado, verifica-se que a defesa de qualquer medida de
criatividade, quando utilizada de forma isolada, se revela insuficiente para predizer o
potencial de um indivíduo (Fishkin & Johnson, 1998). Lubart e Guignard (2004), por
exemplo, afirmam que a identificação do potencial criativo deve envolver
preferencialmente uma comparação entre o perfil de cada indivíduo, tendo em conta os
vários componentes da criatividade, e o perfil dos componentes criativos que são
necessários para execução de uma determinada tarefa. Também segundo Davis (1989),
decisões responsáveis para avaliar o potencial criativo das crianças requerem, no
mínimo, duas medidas, por exemplo um teste do pensamento divergente e um
inventário de atitudes, ou um teste do pensamento divergente e outro procedimento de
avaliação alternativo, que juntos vão mostrar evidências mais fiáveis da produção
criativa (Ohio Department of Education, 1992). Verificamos pois que a tendência no
domínio da criatividade caminha no sentido de nela se encarar o recurso a múltiplas
medidas, cujo cruzamento de informação nos vai permitir chegar a conclusões mais
profícuas (Fishkin & Johnson, 1998; Wechsler, 1998).
Por outro lado, alguns instrumentos mais recentes avançam já para uma
abordagem abrangente da criatividade, afastando-se das comuns polémicas entre
pensamento divergente e convergente. Assim, surge, por exemplo, o modelo Triarchic
Abilities Test (Sternberg, 1997a) face à concepção de que a criatividade poderá ser
melhor explicada se vista através de diversas facetas: competências analíticas,
competências práticas e competências sintéticas.
134
Polémicas na avaliação da criatividade
135
estabilidade da medida é também posta em causa pelos níveis de motivação,
persistência, auto-confiança e o impacto que as tarefas do teste vão ter nas actividades
da vida real (Fishkin & Johnson, 1998). Estes são factores aos quais todo o ser humano
se apresenta vulnerável (provavelmente mais em questão nas tarefas criativas) e que
podem explicar as incongruências apresentadas nos coeficientes de fidelidade
encontrados por diversos investigadores. Temos, como exemplo, os estudos realizados
com o Teste de Pensamento Criativo de Torrance que apontam níveis variáveis de
coeficientes de fidelidade teste-reteste, aplicados com intervalos de tempo similares
(Cropley & Clapson, 1971; Torrance, 1976d).
Segundo autores como Stein (1987), Brown (1989) e Runco (1993a), a validade
predictiva apresenta-se como um dos maiores obstáculos em termos de avaliação da
criatividade, chegando a ser apontada por Beaudot (1980b) como o seu elo mais fraco.
São vários os estudos que se relacionam com este aspecto. Um deles foi levado a cabo
por Milgram e Hong (1994), tendo verificado que as medidas psicométricas do
pensamento e da realização criativa alcançadas na adolescência funcionam como
predictores eficazes das realizações adultas, tendo constatado também que a capacidade
predictiva desses testes se revela superior à dos testes de inteligência ou à das notas
escolares. Torrance, salientado por Cramond (1994b), o qual estudou a validade
predictiva do TTCT em intervalos de 7, 12 e 22 anos, constatou no primeiro estudo
correlações que oscilam entre .46 e .51; volvidos 12 anos, verificou que as correlações
obtidas foram similares, sendo contudo evidente o impacto da variável género ao
136
estabelecer correlações médias de .59 para os homens e de .46 para as mulheres; no
último estudo, alcançou um coeficiente médio de correlação de .63. Contudo, há autores
que relativizam a capacidade predictiva destas medidas e que, de forma irónica,
declaram que os testes de inteligência são capazes de prever a criatividade com o
mesmo grau de eficácia que os instrumentos de avaliação da mesma (Hocevar, 1980).
Analogamente, Wallach (1993) põe em causa a validade preditiva destas medidas
quando faz referência a diversos estudos e aos respectivos resultados que reforçam esse
sentido.
137
Uma outra dificuldade surge aliada à distinção, por si polémica (Gardner, 1988;
Vernon, 1989), entre alta criatividade e criatividade quotidiana. Segundo Ocshe (1990)
e Cropley (1996), nem sempre os testes parecem reflectir a alta criatividade, sendo isso
espelhado em estudos tais como o de Bachtold e Werner (1970) em que indivíduos
altamente criativos obtiveram baixas avaliações por considerá-los sem sentido, banais
ou aborrecidos. Está, então, aqui questionada a própria validade facial dos testes de
criatividade (Sternberg & Lubart, 1995).
138
A AVALIAÇÃO DA CRIATIVIDADE EM CONTEXTO ESCOLAR
139
Creative Thinking-Drawing Production (Jellen & Urban, 1986) que mede, além das
competências inerentes ao pensamento divergente, competências como o humor, a
perspectiva invulgar e a independência (Hong & Milgram, 1991; Michael & Wright,
1989). Em Portugal, no contexto universitário, são ainda utilizadas as Provas de
Avaliação da Realização Cognitiva (Ribeiro, 1998) composta por provas de pensamento
divergente numérico, espacial, verbal e figurativo.
Este tipo de avaliação tem sido muito criticado, particularmente pelo facto de
apenas avaliar uma parcela do pensamento criativo (Mansfield, Busse & Krepelka, 1978);
contudo, estudos de meta-análise provam que os testes de pensamento divergente
proporcionam provas quantitativas da eficiência de alguns programas de desenvolvimento
da criatividade (Rose & Lin, 1984; Vaughn, Feldhusen & Asher, 1991).
140
Por sua vez, os defensores da avaliação da criatividade através de produtos,
escolhem mais facilmente The Creative Product Semantic Scale (Besemer & O'Quin,
1991), o qual analisa três grandes dimensões da criatividade (novidade, resolução do
problema, elaboração e síntese) e o The Student Product Acessement Form (Reis, 1981),
que analisa diferentes indicadores tais como o modo utilizado pelo aluno para iniciar a
criação, o tipo de materiais utilizados e, por último, a excelência do produto final. Em
Portugal, temos o trabalho de Morais (2001), centrado na relação entre variáveis
cognitivas e o desempenho criativo em alunos universitários e socorrendo-se de provas
sobre processos cognitivos criativos específicos (capacidade de insight, descoberta de
problemas e pensamento metafórico), mas tentando validá-las a partir da avaliação de
dois tipos de produtos criativos e utilizando critérios de Avaliação Consensual e de
Avaliação Conceptual.
141
facto de a recolha de dados e das situações propostas se aproximarem das experiências
do dia-a-dia dos alunos (Maeroff, 1991). Estas medidas alternativas foram
desenvolvidas com o objectivo de avaliar quer o processo criativo, quer o produto
criado, em situações que o aluno tenha possibilidade de demonstrar a complexidade e
variedade das suas respostas (Marzano, Pickering & McTighe, 1993). Enceta-se por
uma medida convencional de criatividade como, por exemplo, uma listagem de
atributos de uma situação real realizada em toda a turma (Jatko, 1995; Runco, 1993a,
1993b), sendo esta complementada por uma avaliação individual, sugerindo-se o
portfólio (Bahia & Nogueira, 2005a; Johnson & Ryser, 1997; Kingore, 1995).
142
Estamos conscientes de que não conseguimos apresentar uma resposta única e
inquestionável à pergunta “como avaliar a criatividade em contexto escolar?”. Não
podemos ou poderemos ter, nunca, neste ponto, verdades absolutas. Contudo,
guiamo-nos pela convicção de que se estivermos interessados em contribuir para que os
alunos utilizem o seu potencial criativo, é necessário sabermos como estão e para onde
podem ir (Davis, 1982). Poderemos, pois, minimizar tais incertezas ou polémicas através
da decisão de maximizar a consecução dos grandes objectivos do processo avaliativo, ou
seja, manter em mente que “avaliar a criatividade é, acima de tudo, uma forma de
despistar, identificar, fortalecer e avaliar aspectos importantes e, ainda, de verificar o
potencial do sujeito em questão, apoiando os seus pontos fortes e diagnosticando as
necessidades, tendo como objectivo último a avaliação dos esforços para aumentar a
criatividade e a utilização de uma linguagem comum sobre criativos que permita retirar a
aura de mistério e os mitos em torno deste processo” (Bahia & Nogueira, 2005a, p.344).
143
O Teste do Pensamento Criativo de Torrance (TTCT)
Ora, mesmo estando conscientes da sabedoria milenar bíblica que nos diz pelas
suas obras os conhecereis (Mateus 7:16), optamos por realizar o percurso inverso
falando primeiro um pouco do autor (Paul Torrance) para entendermos depois melhor a
sua grande obra (o TTCT). Assim, Ellis Paul Torrance nasceu em Milledgeville,
Geórgia, em 1915, e morreu em 2003 no mesmo local (Neumeister & Cramond, 2004).
A expressão “gentle genius from Georgia” traduz a sua personalidade dócil, humilde e
prestativa, e ser conhecido por “pai da criatividade” reflecte o seu valor científico
(Neumeister & Cramond, 2004, p. 2), particularmente ligado com a temática da
144
criatividade, tendo este autor publicado, além de vários livros, mais de 2.000 artigos
(Hébert, Cramond, Neumeister, Millar & Silvian, 2002).
O seu trabalho, a nível escolar, foi interrompido durante sete anos (1951-1957)
com a entrada na Air Force para participar num programa de formação. Porém, a sua
forte motivação para a investigação da criatividade não parou (Hébert, Cramond,
Neumeister & Millar, 2002; Miller, 1995). Assim, quando requerido para preparar os
pilotos a enfrentarem emergências e condições adversas, e tendo observado que os
sobreviventes demonstravam possuir a mesma faísca e outras características análogas
aos seus desafiadores alunos (Torrance, 1991), Torrance enveredou pela criação e
implementação de um programa que envolvia, além da aprendizagem dos habituais
conhecimentos técnicos (por exemplo, como lidar com condições atmosféricas
extremas), o desenvolvimento de competências criativas tais como a autodescoberta, a
autodisciplina e o uso da imaginação (Torrance, 1957).
Após este período, surgiu a oportunidade mais importante para Torrance investir
em criatividade, ao ter sido convidado para director do Gabinete de Investigação
Educacional na Universidade de Minnesota. O programa do Gabinete consistia em
desenvolver tarefas que, supostamente, envolviam processos criativos, seguindo-se a
análise dos produtos, a fim de se encontrarem indicadores de tipos de pensamento
(Torrance, 1976a). Foi aqui que Torrance sistematizou e aprofundou a temática da
criatividade. Em suma, Torrance nunca se desviou do desafio de perseguir a faísca
inicialmente descoberta, pelo que é internacionalmente conhecido pelos seus trabalhos
na área da Educação, particularmente a nível da valorização, da avaliação e do
145
desenvolvimento da criatividade nos seres humanos (Hébert, Cramond, Neumeister &
Millar, 2002; Neumeister & Cramond, 2004; Torrance, 2003).
146
culturas ou de baixos níveis socioeconomicos” (Torrance, 1966b, p. 6). Estes objectivos
mantiveram-se ao longo de toda a sua obra (Kaufman & Baer, 2006; Kim, 2002, 2006a).
Vários foram então os testes criados por Torrance, na sua busca incessante de
avaliar a criatividade – a nível corporal, musical, afectivo, de estilos criativos
(Wechsler, 2002). Nestes contextos, os mais frequentemente utilizados, essencialmente
com crianças e jovens, são o Creativity in Action and Movement (Torrance, 1981c), o
Thinking Creatively in Sounds and Words (Torrance, Khatena & Cunnington, 1990),
Something About Myself (Khatena & Torrance, 1971), What Kind of Person are You?
(Torrance & Khatena, 1970) e o Your Style of Learning and Thinking (Torrance,
McCarthy & Kolesinski, 1988).
Apesar de todos estes testes terem vindo a ganhar alguma relevância no mundo
da avaliação quantitativa da criatividade e, em particular, no contexto escolar, é o Teste
de Pensamento Criativo de Torrance (Torrance, 1990c; Torrance, 1998) que recebe o
maior destaque na literatura sobre este tema (Harvey, Hoffmeister, Coates & White,
1970; Oliveira, 1992; Wechsler & Nakano, 2002). Assim, já foram realizadas inúmeras
pesquisas com este teste – em 1990 já se ultrapassava as 2000 – conduzidas por
investigadores de diversos países e numa grande variedade de amostras (Torrance,
1993a, 1996) tendo sido, inclusivamente, traduzido em mais de 35 idiomas, padronizado
para vários países (Torrance, 2000) e, de “acordo com as estatísticas disponíveis, cerca
de 2000.000 crianças e adultos são avaliados com este instrumento, cada ano” (Raina,
2000, p. 37). Passaremos pois a descrevê-lo com algum pormenor.
147
Gowan, 1963), o qual veio a dar origem ao que hoje é conhecido como Torrance Test
of Creative Thinking (Torrance, 1990c; Torrance, 1998). Realce-se, porém, que este
teste difere dos de Guilford visto que, “sendo as actividades do TTCT analogias de
importantes tipos de pensamento necessários no quotidiano e para inovar, são
complexas” (Torrance & Ball, 1990a, p. 2): avaliam para além dos aspectos
intelectuais da criatividade. Também, nos testes de Guilford cada estímulo era utilizado
para avaliar apenas uma das dimensões de criatividade (Cramond, 1994a). Torrance
inspirou-se ainda na bateria de testes desenvolvida por Wallach e Kogan (1965),
mantendo a tendência da natureza das actividades, mas afastando-se das condições de
aplicação enquanto jogo e sem tempo limite (Haensly & Torrance, 1990).
148
sentido em que visa formular hipóteses e questões, enquanto que os testes figurativos
procuram medir o pensamento visual e espacial” (Bahia & Nogueira, 2005b, p. 8).
Daqui se infere que o TTCT não mede a “soma total da criatividade de uma
pessoa, tal como os teste de QI não medem a soma total das competências intelectuais”
(Cramond, 1999, p. 310), o que vai de encontro às intenções de Torrance. Ele deixou
claro que apenas tentava avaliar algumas das competências criativas, o pensamento
criativo (Torrance & Ball, 1990), assumindo-se como naive e ganancioso se almejasse
mais (Torrance, 1962b). Também, a própria estratégia de construção do TTCT traduz
esta determinação, a qual aliás está bem explícita nas suas palavras: “A estratégia foi
desenvolver tarefas complexas e não de factores-puros, as quais, se presume, envolvem
pensamento criativo, e depois examinar os produtos quanto a várias qualidades de
pensamentos que deles podem ser inferidos” (Torrance, 1976a, p. 83).
Por outro lado, ao analisarmos cada uma das provas do TTCT, infere-se que só
na combinação das duas provas (verbal e figurativa) se abrangem todos os objectivos
de Torrance, não excluindo uma a outra (Cramond, 1999). Neste sentido, Torrance
(1990a) encontrou correlações muito baixas (r=.06) entre as avaliações no teste verbal
e no figurativo. Contudo, se por um lado é importante obter o máximo de informação
possível; por outro, nem sempre é exequível aplicar as duas provas, sendo impeditivos
disso, por exemplo, a falta de tempo ou de recursos financeiros. Assim, o que se deverá
fazer passa por “se só for possível aplicar um dos testes, com um grupo de crianças, o
figurativo é o mais indicado” (Cramond, 1999, p. 314). Os motivos apontados para esta
escolha passou por: é o teste que mais se distingue das habituais provas escolares; a
maioria das crianças e jovens está intrinsecamente motivada para desenhar; minimiza
as dificuldades de escrita e de linguagem; demora menos tempo e tem menos
actividades; avalia um maior número de competências criativas (Cramond, 1999;
Cramond, Morgan & Bandalos, 2005; Cramond, Morgan, Torrance & Zuo, 1999b;
Neumeister & Cramond, 2004).
149
melhoramentos qualitativos nos seus testes, tentando resolver alguns problemas que
foram surgindo: a elevada correlação entre as cotações de Flexibilidade e de Fluência;
o gasto exagerado de tempo a cotar a Flexibilidade; a avaliação do parâmetro
Originalidade não estar devidamente ajustada; a necessidade de alargar a avaliação,
além do pensamento divergente, a atributos que os indivíduos criativos foram
demonstrando ter ao longo das suas investigações (Torrance, 1984a; Torrance, 2001).
Assim, em 1977, Torrance e outros investigadores, prepararam uma nova versão do
TTCT-Figurativo (Torrance, Ball, Runsinan, Rungsinan & Torrance, 1977) a que
chamaram streamlined scoring system, a qual foi publicada em 1984 (Ball & Torrance,
1984). Resolvendo os dois primeiros problemas, e nas palavras dos próprios autores
“não tendo encontrado uma forma melhor ou mais adequada para obter a cotação da
Flexibilidade, e tendo constatado que a Flexibilidade e a Fluência estão altamente
correlacionados” (Torrance, Ball, Runsinan, Rungsinan & Torrance, 1977, p. 5), foi
eliminada a Flexibilidade, manteve-se a Fluência, a Originalidade e a Elaboração, e
introduziram-se os parâmetros avaliativos de Abstracção dos Títulos (como uma
medida verbal no teste figurativo) e de Resistência ao Fechamento (que analisa a
abertura mental para o processamento da informação)3.
3
Parâmetros a serem descritos posteriormente neste capítulo.
150
uma média de .53 entre os dois critérios de cotação (Torrance & Sternberg, 1988). A
partir de 1990, o manual com as normas do TTCT- Figurativo, Norms-Technical
Manual (Torrance & Ball, 1990a) passou assim a apresentar um modo de cotação mais
simplificado ainda e a ser acompanhado de um livro específico para esse efeito –
Scoring Workbook (Torrance & Ball, 1990b).
O TTCT parece, então, ser um instrumento que permite avaliar além das
dimensões cognitivas, incluindo-se nele, por exemplo, a avaliação de emoções e
motivação (Bahia, no prelo). Este instrumento considera actualmente seis dimensões
normalizadas: a Fluência e a Originalidade (avaliadas pelos dois testes, verbal e
figurativo), a Flexibilidade (apenas medida no teste verbal), a Elaboração, a
Abstracção dos Títulos e a Resistência ao Fechamento (medidas apenas pelo teste
figurativo). Além destas medidas, no teste figurativo há a avaliação das Forças
Criativas. Assim, este instrumento de avaliação da criatividade aborda dezanove
dimensões (Torrance, Ball & Safter, 1992).
151
Ao referirmo-nos à Fluência, estamos a falar do número de ideias interpretáveis
e que foram expressas a partir da utilização significativa dos estímulos (Torrance, Ball
& Safter, 1992). Há bastante concordância entre os investigadores em como ser fluente
é condição indispensável para a produção criativa, visto que quantas mais alternativas
de resposta um sujeito ou grupo produz, maior é a probabilidade de sucesso na
resolução de determinado tipo de problemas (Clark & Mirels, 1970; Dixon, 1979; Hong
& Milgram, 1991; Milgran, 1981; Osborn, 1953; Parnes, Noller & Biondi, 1977;
Parnes, 1967a; Snyder, Mitchell, Bossomaier & Pallier, 2004).
Quanto à Originalidade, esta é definida como sendo a medida da capacidade do
sujeito para produzir ideias que se afastam do óbvio, do trivial, ou do que está
previamente estabelecido (Runco & Albert, 1985; Torrance, Tan & Allman, 1970). A
infrequência estatística da resposta, em comparação com as anteriormente
apresentadas por um grupo seleccionado de pessoas à mesma tarefa do teste, é o
principal critério de avaliação da Originalidade no TTCT (Hocevar, 1979). Neste
sentido, Rungsinan (1976) demonstrou na sua investigação que os guias de cotação
criados a partir das respostas de 500 pessoas produzem resultados estáveis e
fidedignos, até mesmo em diferentes culturas (Rungsinan, 1977, 1972).
O TTCT–Figurativo contempla ainda um Bónus de Originalidade,
fundamentando-se no facto de que a combinação de figuras repetidas é muito invulgar,
tendo sempre sido “reconhecido que estas respostas indicam um alto nível de
Originalidade. O formato e as instruções do teste estabelecem definitivamente uma
tendência para criar objectos separados. Contudo, a combinação de dois ou mais pares
não é proibida” (Torrance, 1968b, p. 15). Torrance argumenta também que uma pessoa
criativa será capaz de ver possibilidades que as outras colocaram de parte; por isso, ao
realizar os testes de repetição de figuras, poderá encontrar formas possíveis de combinar
duas ou mais figuras, com o objectivo de produzir uma resposta síntese (Torrance,
1972d; Torrance & Safter, 1990).
No que diz respeito ao recurso à avaliação através da Abstracção dos Títulos, o
TTCT-Figurativo apela aos sujeitos para darem títulos às figuras que desenharam, os
quais devem reflectir a essência da figura ou ajudar a contar uma história que se
relacione com a mesma (Torrance, 1998). Está aqui patente a intenção de identificar
pensamento abstracto associado à capacidade de síntese e organização, à anulação de
informação irrelevante ou errónea, ao abandono de soluções pouco viáveis, ao
aperfeiçoamento de ideias, à definição de prioridades e à permissão para que uma
152
determinada ideia ou problema se torne dominante (Berger & Guilford, 1969). Esta
característica é encarada como uma competência criativa, tendo em conta que muitos
indivíduos que não a possuem, embora dotados de elevada criatividade, não são bem
sucedidos na resolução de problemas ou na criação de produtos, devido a terem perdido
alguma perspicácia indispensável, nomeadamente para evidenciar pormenores
importantes na selecção da solução mais viável e, consequentemente, mais criativa
(Torrance & Safter, 1999).
A Elaboração é uma medida que consiste na adição de detalhes pertinentes à
figura, tais como elementos decorativos, sombra, posição do corpo, elementos
descritivos ou mesmo modificadores no título, os quais se apresentam como não
essenciais mas relevantes, e que foram incluídos pelo sujeito com o intuito de realçar o
seu significado ou para a tornar mais atractiva (Rungsinan, 1977; Torrance, 1998).
Espera-se então que os resultados obtidos na Elaboração figurativa reflictam a
capacidade do sujeito para desenvolver, embelezar ou completar ideias. Esta
capacidade é considerada como de primordial importância para a criatividade, visto
que o facto de completar um desenho com pequenos detalhes ou de construir um
objecto complexo e significativo, partindo de linhas simples, é uma questão de se
ser capaz de produzir muitas implicações (Guilford, 1967a) e, consequentemente,
de poder vir a produzir respostas criativas. São esclarecedoras, neste sentido, as
palavras de Kneller (1965), defendendo que a “criatividade não significa somente
novidade de forma isolada, como também novidade advinda de uma realização
criativa. Deste modo, a pessoa criativa não só tem ideias novas, como também as
acompanha. Por exemplo, se um indivíduo apresenta uma tendência poética, não
deita simplesmente fora algumas imagens, utiliza-as nos seus poemas. Se é criativo
com as suas mãos, em vez de simplesmente brincar com fios, constrói um rádio”
(Kneller, 1965, p. 64-65).
Outro dos parâmetros em avaliação no TTCT-Figurativo é a Resistência ao
Fechamento (Torrance, 1998). Este está associado com o Princípio do Fechamento da
Psicologia Gestaltista, o qual considera existir uma tendência natural para encarar uma
figura incompleta como completa, provocando no indivíduo uma tensão que o faz
querer completá-la da forma mais simples e fácil possível (Rungsinan, 1977; Kohler,
1947). Assim, a Resistência ao Fechamento pode ser definida como a medida desta
tendência, sendo o indivíduo criativo aquele que controla mais a sua tensão e atrasa a
gratificação que advém da satisfação de responder rapidamente a este impulso
153
(Torrance, 1963e). A pessoa criativa é pois capaz de manter aberta a questão e adiar
o fechamento, durante o tempo necessário para surgir a resposta original.
Quanto à Flexibilidade, avaliada no TTCT-Verbal, esta requer alguma
acção consciente visto que “a Humanidade tem o maldito hábito de rejeitar ver se
não for o óbvio, mesmo que esteja lá. Dizemos que queremos mudanças, porém
resistimos quando elas surgem” (Torrance & Safter, 1999, p. 72). Por esse motivo, a
Flexibilidade tem vindo a ser reconhecida como necessária ao pensamento criativo e,
consequentemente, como um dos ingredientes na sua avaliação. Contudo, é um
parâmetro muito moroso de cotar porque pressupõe a criação de categorias, a partir das
quais as respostas fornecidas são classificadas, não sendo fácil tal tarefa (Torrance,
1967a). Pelas razões já expostas, quando Torrance concebeu a nova forma de cotar o
TTCT-Figurativo (Streamlight Scoring), eliminou este parâmetro. Tendo consciência,
porém, de que algo poderá ter-se perdido, a “introdução de alguns dos indicadores de
criatividade – como por exemplo, colocando as ideias em contexto, estabelecer relações
entre elementos desconexos, resistência ao fechamento, combinando e sintetizando –
conseguiram minimizar os prejuízos” (Torrance & Safter, 1999, p. 74).
Para além destes critérios normativos, o TTCT–Figurativo também avalia a
criatividade recorrendo à observação da presença de características identificadoras de
pessoas criativas (Aliedin, 1978; Ashton, 1974; Hauck & Thomas, 1972; Hershey &
Kearns, 1979; Rungsinan, 1977; Simhai, 1977), isto é, a expressão de sentimentos ou
emoções através de títulos ou das figuras (Expressão Emocional); o poder de comunicar
uma ideia com detalhe e contextualização (Contando uma História); a expressão de
Movimento; a transformação da comunicação visual em expressões verbais embuídas de
sentimentos ou emoções (Expressividade dos Títulos); a descoberta de relações entre
elementos aparentemente desconexos (Síntese de Figuras Incompletas e Combinação de
Linhas ou Círculos); a capacidade de observar um objecto a partir de uma perspectiva
invulgar, visualizando o seu interior (Visualização Interna); capacidade de ir além dos
elementos estabelecidos pelos estímulos (Extensão dos Limites); a capacidade de
surpreender através de texto ou de desenhos com Humor; a expressão com diversidade e
intensidade, tornando a mensagem inesquecível (Riqueza de Imaginário); o apelo aos
cinco sentidos e à imaginação (Coloração do Imaginário), assim como à Fantasia
(Torrance & Ball, 1990; Torrance & Safter, 1999).
154
O TTCT está preparado para poderem ser utilizadas as cotações parcelares
referentes a cada um dos parâmetros ou ser usado o Índice Criativo correspondente a
um único valor obtido por composição de todos esses parâmetros4. Nenhuma destas
duas possibilidades é a opção mais adequada, até porque ambas “têm elevados valores
de validade” (Torrance, 1974c, p. 54). A selecção de um dos critérios depende apenas
dos objectivos da administração do teste. Quando se pretende um valor mais genérico,
representando “a energia criativa que a pessoa demonstrou” (Torrance, 1974c, p. 56),
por exemplo, para diferenciar grupos, o Índice Criativo é o ideal. As cotações por
parâmetros são recomendadas por Torrance sempre que os objectivos sejam de
diagnóstico, de avaliações comparativas mais específicas e de posterior
desenvolvimento das características individuais (Cramond, 1999; Kim, 2006b).
4
Calculado a partir da soma do valor obtido no Average Standard Score com o valor do Vigor Criativo.
155
também influenciadores da produção criativa no TTCT algumas condições ambientais:
assim, uma sala bem ventilada e confortável favorece a produção criativa, enquanto que
esta diminui se a sala for apertada e abafada; uma actividade de preparação (warm-up),
antes da aplicação do teste resulta numa pequena mas estatisticamente significativa
melhoria da realização criativa; porém, esta mesma actividade é inútil se for longa
demais ou apresentada com demasiada antecedência (Busse, Blum &. Gutride, 1971;
Torrance, 1979c; Yakamoto, 1962).
Por seu lado, a população a que o TTCT pode ser aplicado vai desde a idade pré-
escolar até à idade adulta (Torrance, 1998), sendo tal aplicação possível em grupo ou
individualmente. Por fim, este teste contem actividades com tempo limitado de
realização, principalmente porque foram preparadas de modo a poderem ser
administradas em situações formais de empresas ou de escolas (Miller, 1995) e porque
só assim poderiam ser normalizadas (Cramond, 1999).
156
muito claras, quer para a aplicação individual, quer em grupo (Torrance, 1988;
Wechsler, 1981).
Por seu lado, e sendo este aspecto importante para esta investigação, é o teste
mais aconselhado para utilizar em contexto educacional (Torrance, 1986b). É
defensável ainda o seu uso na identificação da alta criatividade, assim como da
criatividade quotidiana (Bermejo, Ferrándiz & Prieto, 2005), sendo útil também para o
desenvolvimento da criatividade (Torrance, 1987d, 1991; Torrance & Safter, 1990).
Contudo, e contrariamente à vontade de Torrance (Magyari-Beck, 1996), o TTCT tem
vindo a ser utilizado no contexto educativo principalmente como um dos instrumentos
para a abordagem da sobredotação (Castelló & Batlle, 1998; Collangelo & Davis,
1997; Davis & Rimm, 1994; Parra, Ferrando, Prieto & Sánchez, 2005; Prieto, 2004).
Ora, este instrumento está fundamentado na filosofia e teoria de Torrance, as quais
defendem ser pertença de todas as pessoas, em todas as idades, tanto a realização como
157
o potencial criativo, variando apenas a sua expressão (Bahia, 2007, March; Cramond,
Martin & Shaw, 1990; Cramond, Morgan & Bandalos, 2005; Hu & Adey, 2002;
Kaufman, 2006; Kim, 2002).
158
organização curricular e na adequação de estratégias em sala de aula. O TTCT permite,
pois, uma avaliação a partir de outra perspectiva, não só das competências dos alunos
como também das suas atitudes e expectativas (Prieto, 2007; Torrance, 1978).
Complementarmente, tendo em conta que a “percepção dos professores acerca da
criatividade dos seus alunos face à obtida no TTCT é geralmente mais baixa”, então o
recurso ao TTCT “pode ajudar os professores a ter consciência das potencialidades dos
alunos, que podem não estar a ser valorizadas” (Torrance, 1967b, p. 30).
159
no TTCT-Verbal, e apenas com a Originalidade no TTCT-Figurativo (Hocevar &
Michael, 1979). Esta mesma crítica surge associada ao facto de a fórmula para cotação
da Fluência pressupor a soma de todas as respostas que foram consideradas originais
ou flexíveis (Dixon, 1979), ou seja, as provas que não contêm muitas respostas
(Fluência) aparentemente têm menos probabilidade de conter um grande número de
respostas invulgares (Originalidade) e corresponderem estas respostas a diferentes
categorias de ideias (Flexibilidade). Porém, esta crítica, apesar de fundamentada, não é
linear, visto ter sido demonstrado que, em determinadas condições, é possível obter
menor Fluência e aumentar quer a Originalidade quer a Flexibilidade (Owen & Baum,
1985; Runco, 1993a). Por outro lado, a associação expressa pelo TTCT entre a
Fluência e outros parâmetros da criatividade, especialmente a Originalidade, está de
acordo com posturas teóricas de outros investigadores (Barron, 1963b; Simonton,
1988a), não sendo, portanto, lacuna específica deste instrumento de avaliação. Por
exemplo, Milgram (1983, p. 622) afirma que “a capacidade de gerar muitas ideias para
a resolução de um problema está fortemente conectada com a capacidade de produzir
soluções originais com elevada qualidade”.
Apesar de não poder ser encarado como uma crítica ou mesmo uma
desvantagem do TTCT, há um procedimento bastante utilizado com tal instrumento
que pode trazer algumas situações de incorrecção na avaliação da criatividade.
Estamos a referir-nos à utilização de apenas algumas das actividades de um dos testes,
à troca da ordem das actividades ou à combinação aleatória de algumas actividades a
nível do conteúdo (verbal e figurativo). Não sendo questionável que o uso de apenas
algumas das actividades pode trazer algumas informações sobre o potencial criativo do
160
indivíduo em análise, a fidelidade da informação pode ser afectada, tal como
aconteceria com qualquer outro teste normalizado, pelo que será impossível saber se a
avaliação obtida representa as competências criativas desejadas (Cramond, 1994b). Por
outro lado, sendo as actividades apenas uma parte da bateria, Cramond (1999, p. 313) é
muito incisiva afirmando que “investigadores e educadores responsáveis não usariam a
avaliação obtida numa prova de Matemática para determinar o aproveitamento de um
aluno. Da mesma forma, as actividades do TTCT, usadas isoladamente, dizem-nos
muito pouco sobre as competências criativas de um indivíduo”, acrescentando ainda
que “há um problema ainda mais sério no uso de sub-testes. As actividades foram
cuidadosamente criadas e ordenadas para providenciar o warm-up. Apagar algumas
actividades ou mesmo mudar a ordem das actividades, não permite qualquer
comparação com as normas publicadas e pode afectar adversamente a performance dos
inquiridos”.
Por último, salientamos que muito há ainda a fazer para aumentar a qualidade do
Teste de Pensamento Criativo de Torrance (Bastos, 1974; Kim, 2002; Torrance, 2000).
Porém, fazendo nossas as palavras de Bahia (no prelo), “o objectivo de olhar para o
TTCT e não para outros instrumentos de avaliação da criatividade não parte de uma
resistência à mudança; parte, sim, do princípio de que se trata de um instrumento com
potencial para efeitos de investigação e de intervenção por ser a medida de criatividade
mais utilizada e mais estudada em todo o mundo e por ter continuado a ser a principal
referência em termos de avaliação mesmo depois da concepção, aferição e divulgação
de outros instrumentos alternativos”. Podemos, pois, ter alguma tranquilidade na sua
161
utilização porque sabemos que continua a ser um teste “vivo e bom, neste novo
milénio” (Cramond, Morgan & Bandalos, 2005, p.283).
Fidelidade
162
reteste é fortemente influenciada por factores motivacionais nas situações de
aplicação das provas. Isto é provavelmente mais crítico neste tipo de testes do que em
testes de personalidade ou de inteligência, visto que o sujeito tem de produzir
respostas próprias, e isto requer um maior dispêndio de energia na primeira prova do
que na posterior” (Torranceb, 1967b, p. 25).
163
Em relação à precisão ou consistência da medida, ainda em relação ao
TTCT-Figurativo, há variadíssimos estudos que traduzem um nível de fiabilidade
adequado (Cooper, 1991; Cramond, 1994a; Cramond, 2002; Treffinger, 1985) para
poder ser utilizado como teste de criatividade. Por exemplo, Kim (2006a) encontrou
α=.79, valor esse considerado bastante adequado tendo em conta a complexidade do
pensamento criativo (Kim, 2006a; Treffinger, 1985).
Validade
164
e, quando utilizamos um instrumento, ele estar directamente relacionado com uma
definição específica de criatividade que vamos assumir, e não com uma definição
universal; a segunda razão prende-se com a existência de inúmeras formas de um
indivíduo poder adoptar um comportamento criativo e de não podermos partir do
pressuposto que um determinado constructo abrange todos esses comportamentos”
(Torrance, 1960, p. 25). Assim, Torrance sentiu a necessidade de restringir o campo da
medida de criatividade à forma na qual ela pudesse ser avaliada, assentando, neste
caso, na criatividade como um processo (cf. capítulo 1). Esta abordagem foi então a
utilizada pelo autor no desenvolvimento e validação dos testes de pensamento criativo.
Além disso, “podemos afirmar que o TTCT tem uma adequada validade de conteúdo
pelo facto de ter sido criado por um perito em criatividade que trabalhou neste campo
durante toda a sua longa vida” (Kim, 2002, p. 8).
A história de construção do TTCT faz com que tenha, analogamente, uma boa
validade facial (ou validade aparente). De facto, o aspecto visual, a sequência das
actividades, o modo como é aplicado, correspondem às expectativas dos sujeitos. Ou
seja, o TTCT tem demonstrado ser bem recebido pelos diversos públicos, desde as
crianças aos adultos, por indivíduos sobredotados e não sobredotados, sendo
percepcionado como adequado para avaliar o que diz avaliar: a criatividade (Torrance
& Aliotti, 1958a; Torrance & Hansen, 1965; Torrance & Witt, 1966).
165
este autor defende que “a ideia de um coeficiente de validade universal para os testes
de avaliação da capacidade criativa é muito inapropriada. Seria mais vantajoso pensar
numa grande variedade de tipos de critérios do comportamento criativo, e numa
diversidade de capacidades do pensamento criativo, que estejam integradas nesses
critérios de comportamento” (Torrance, 1974a, p. 474). Por outro lado, não é de
estranhar que os coeficientes de correlação sejam, geralmente, mais baixos do que em
outros estudos de testes psicométricos, tais como no caso dos testes de inteligência ou
de realização académica (Johnson & Fishkin, 1999), tendo em conta a diversidade de
definições de criatividade (Davis, 1997; Michael & Wright, 1989) e a dificuldade de
encontrar um critério externo adequado. Assim, por exemplo, se a medida critério não
for muito estável, tiver uma baixa consistência interna, os coeficientes de validade
poderão ser baixos (Michael & Wright, 1989; Pereira, 1998). A este respeito Torrance
alertou, traduzindo a sua consciência quanto às dificuldades a enfrentar, que “a
validade concorrente está minada pelos problemas de construção da medida de
critério” (Torrance, 1967b, p. 24). No mesmo sentido, outros investigadores
demonstraram haver baixas correlações entre os resultados no TTCT e as apreciações
quer de colegas quer de professores (Cramond, 1994a; Runco, 1984), o que “tanto
podem reflectir a fraca validade dos testes de criatividade, como podem traduzir a
fragilidade das medidas de critério. Ou seja, as apreciações dos professores ou dos
colegas não serão o melhor método para avaliar a criatividade” (Pereira, 1998, p. 277).
Há, contudo, vários estudos que atribuem ao TTCT uma elevada validade
concorrente (Clapham, 2004; Cooper, 1991; Duenk, 1966, 1966; Guillory & Kher-Durlabhji,
1995; Kanter, 1984; Voss, 1997). Já em 1967, Torrance afirmou que “existe uma
variedade indescritível de estudos que provam a validade concorrente” do TTCT,
especificamente em relação ao TTCT-Figurativo (Torrance, 1967b, p. 24). São um
exemplo disso as correlações estatisticamente significativas encontradas por Gonzalez e
Campos (1997) entre esse teste e os testes Spatial Test Primary Mental Abilities (PMA)
e o Gordon Test of Visual Imaginary Control. No caso da PMA, verificaram-se os
seguintes dados: com a Fluência, se QI>120, então valor de r=.18 e se QI<120, então
valor de r=.14**5; com a Originalidade, se QI>120, então valor de r=.36** e se QI<120,
então valor de r=.18**; com a Resistência ao Fechamento, se QI>120, então valor de
r=.33** e se QI<120, então valor de r=.02*. No caso do teste de Gordon, verificam-se
os resultados: com a Fluência, se QI>120, então valor de r=.20 e se o QI <120, então
5
* p<0.01 e ** p<0 .001
166
valor de r=.09; com a Originalidade, se QI>120, então valor de r=.30* e se QI<120,
então valor de r=.11*; com a Resistência ao Fechamento, se QI>120, então valor de
r=.26* e se QI<120, então valor de r=.02. Concluíram assim que a imagética se
correlaciona significativamente com vários aspectos do pensamento criativo medido
pelo TTCT-Figurativo, variando esta associação com o valor de QI do indivíduo
avaliado.
Um outro exemplo, no sentido da validade externa do TTCT, é o trabalho de
Weisberg e Springer (1961), o qual utilizou uma amostra de 32 indivíduos
sobredotados, a quem foram aplicadas as provas Perguntando e supondo, Círculos e
Usos invulgares. Foram criados dois subgrupos extremos de comparação, em função
dos resultados obtidos nestas provas aos quais se aplicou o teste de Rorschach, tendo
concluído que aqueles sujeitos que obtiveram melhores resultados nos testes de
criatividade deram mais respostas coloridas e com recurso a componentes humanos, do
que aqueles que obtiveram resultados inferiores. Ora, estas respostas, à luz do
Rorschach, são normalmente indicadoras da presença de capacidade criativa e de boa
imaginação. Foram também encontradas correlações estatisticamente significativas,
com o valor médio de .32, entre os diferentes aspectos avaliados pelo TTCT e outras
escalas de avaliação da criatividade (Prieto, López, Ferrándiz & Bermejo, 2003;
Prieto, 2007).
Em termos da validade predictiva, Torrance tentou identificar qual a capacidade
que o TTCT tem de predizer o comportamento futuro dos sujeitos em termos de
criatividade. Assim, desde 1958 que este teste tem vindo a ser alvo de uma série de
estudos longitudinais, tendo-se começado pela análise em pequenas amostras e com
curtos espaços de tempo (Cropley, 1971; Millan, 1995b; Torrance, 1972e; Torrance,
Tan & Allman, 1970; Torrance & Witt, 1966; Yamamoto, 1960). Porém, os mais
significativos foram os estudos realizados com alunos de três escolas de Minnesota
(Torrance, 1969b; Torrance, 1972b; 1972d; Torrance, 1981b), duas do Ensino Básico e
uma do Ensino Secundário.
O estudo realizado nas escolas do Ensino Básico pressupôs várias recolhas de
dados – em cada ano escolar de 1958 a 1964 – a todos os alunos do 1º ao 6º ano de
escolaridade (N=391), através da administração de várias actividades do TTCT
(Realização de perguntas, Adivinhar as causas, Adivinhar as consequências,
Aperfeiçoamento do produto, Usos invulgares de objectos e círculos), de um teste de
inteligência e outro de realização académica, assim como de um questionário
167
relacionado com o nível sócio-económico, a ocupação e o nível de educação destas
crianças (Torrance, 1968a; Torrance & Gupta, 1967).
Vinte e dois anos depois (Torrance, 1980), a 211 dos mesmos alunos (116 do
género feminino e 95 do género masculino), ou seja, a cerca de 75% dos alunos iniciais,
foram feitas entrevistas individuais, aplicado um questionário de avaliação da
criatividade não reconhecida (Creative Style of Life Achievement) e um questionário de
recolha de informação bibliográfica, demográfica, e sobre a qualidade e quantidade das
realizações criativas reconhecidas. Note-se que este último questionário foi considerado
fidedigno para avaliar a criatividade, com fidelidade inter-correctores de .81. A partir da
informação reunida por estes questionários, um grupo de juízes seleccionou cinco
indicadores da realização criativa: número de realizações criativas alcançadas durante o
Ensino Secundário, número de realizações criativas alcançadas depois do Ensino
Secundário, número de realizações criativas relativas ao estilo de vida, qualidade das
realizações criativas durante o Ensino Secundário e criatividade nas aspirações da sua
profissão futura. Todas os dados referentes ao TTCT, entre 1958 e 1964,
correlacionaram-se então significativamente (variando de r=.33 a r=.62, p <.01) com
estes indicadores externos de realização criativa (Torrance, 1981d). Um coeficiente de
.63 (p<.01) foi obtido numa correlação múltipla obtida entre o TTCT e os cinco
indicadores de critério (Torrance, 1981d). Apesar de estes valores serem habitualmente
considerados moderados (Cohen, 1988), “são muito mais altos do que se poderia
esperar, tendo em conta o tempo entre a aplicação dos predictores e as medidas de
critério, assim como a complexidade do constructo a ser medido (criatividade). Além
disso, os números não traduzem toda a história. Os números representam medidas
individuais das competências criativas, mas não as características facilitadoras da
utilização da criatividade e da inteligência” (Torrance, 1915, p. 157). Reforçando estas
posições sobre a validade do TTCT, Cramond e colegas (Cramond, Morgan &
Bandalos, 2005) recordam e acrescentam que houve dificuldades acrescidas aos
resultados, tais como a mudança de residência de Torrance para a Geórgia (exacerbando
o problema de encontrar os participantes) ou a grande quantidade de dados recolhidos
nos alunos do Ensino Básico.
O estudo que Torrance realizou de análise predictiva do TTCT, em 1959, a nível
do Ensino Secundário, envolveu 125 alunos do 7º ao 12º anos de uma escola de
Minnesota (University Minnesota Hight School), com recolhas de dados no início dos
anos lectivos de 1959, 1966, 1971 e 1989. Inicialmente foram administrados testes de
168
inteligência, de rendimento escolar, apelou-se à nomeação da criatividade pelos pares e
mediu-se a realização criativa pelo TTCT – nos parâmetros de Fluência, Flexibilidade,
Originalidade e Elaboração (Torrance, 1969b). Para encontrar o grau de previsibilidade
do TTCT, na segunda recolha de dados (1966), foi administrado ainda um questionário
que solicitava dados biográficos e demográficos, assim como auto-relatos indicando a
produção mais criativa, o tipo e grau desta realização criativa e aspirações face ao
futuro. A partir desta informação, cinco juízes indicaram três índices de realização
criativa: quantidade, qualidade e motivação criativa (Torrance, 1972b). A análise das
informações recolhidas demonstrou então que a Fluência, a Flexibilidade e a
Originalidade estavam significativamente correlacionadas com os três critérios externos
(oscilando os valores entre r=.37 e r=.48, p<.01), concluindo-se ainda “serem (estes
parâmetros) melhores predictores da realização criativa do que o rendimento académico,
o QI ou a nomeação pelos pares” (Cramond, Morgan & Bandalos, 2005, p. 285). Por
seu lado, os quatro parâmetros do TTCT explicaram 25% da variância da qualidade
criativa, 21% da quantidade criativa e 26% da motivação criativa (Torrance, 1969b,
1972d; Torrance & Cramond, 2002).
Doze anos depois do início destes dois estudos, em 1971, envolvendo alunos do
Ensino Básico e do Ensino Secundário, e tentando resolver o problema da não
representatividade da amostra por género, Torrance enviou o mesmo questionário
utilizado em 1959, a todos os alunos da Minnesota Hight School, tendo recebido
informação de 117 raparigas e de 119 rapazes (Torrance, 1972e, 1994). Estes dados
foram correlacionados com um índice criativo – advindo da combinação dos valores
obtidos no TTCT administrado em 1959 – tendo obtido um valor de .51 para a amostra
total, de .59 para o género masculino e de .46 para o feminino, com um nível de
significância de .01. Assim, ficou novamente demonstrado que o TTCT, como medida
de criatividade, administrado a nível da Escola Básica e Secundária, é capaz de predizer
a realização criativa em três dimensões: na sua quantidade e na motivação nela
envolvida (Torrance, 1972b, 1972d).
Em 1990, trinta anos após a primeira recolha de dados a nível do Ensino Básico
e Secundário, Torrance voltou a recolher informações sobre os indivíduos. Porém, aqui
a correlação encontrada entre o TTCT e os critérios de previsibilidade foi apenas de .25
(p<.02). Contudo, Torrance “não ficou surpreendido ao constatar que outros factores
desempenham um papel importante nas realizações criativas dos indivíduos, 30 anos
após a primeira recolha de dados” (Torrance & Cramond, 2002, p. 8) e estes dados
169
foram úteis na identificação de itens que melhor retratam os indivíduos criativos
(Torrance, 1993b). Então, por tudo apresentado, parece podermos pensar no TTCT
como um bom predictor da realização criativa (Millar, 2002; Torrance, 2002c; Torrance
& Wu, 1981).
Quarenta anos depois da primeira recolha de dados, em 1998, os participantes
neste estudo de Torrance voltaram a preencher um inquérito análogo ao inicial
(Torrance & Cramond, 2002), tendo participado 99 sujeitos (45 homens e 54 mulheres),
aproximadamente um quarto dos sujeitos iniciais e metade dos que participaram em
1980. Foi utilizado um índice de criatividade (partindo dos resultados dos três anos de
aplicação do TTCT), o mesmo questionário acrescido de alguns indicadores como, por
exemplo, ter tido um mentor, apaixonar-se pelo que faz, consciência do valor pessoal,
sucesso em ultrapassar a pressão exterior e os gostos pessoais (Torrance, 2002c). Por
seu lado, as variáveis critério finais passaram pela qualidade e pela quantidade de
realização criativa. Os resultados mostraram então que o TTCT continua sendo – porque
já tinha mostrado ser no estudo de 22 anos de follow-up (Cramond, 1994a) – um bom
predictor de criatividade, tendo-se encontrado ainda correlações estatisticamente
significativas entre o indice criativo deste último estudo e a quantidade da realização
criativa de .12 (p<.05) para o género masculino e de .29 (p<.05) para o género feminino;
em relação à qualidade de predição criativa, os valores encontrados foram de .45
(p<.01) para homens e de .41 (p<.01) para mulheres. Dois dos parâmetros do TTCT
mostraram-se aqui ser especialmente bons predictores da criatividade: a Originalidade
salientou face à qualidade de realização criativa sobretudo para o género feminino
(r=.40, p<.01) e o Vigor Criativo mostrou-se bom predictor da qualidade de realização
criativa para ambos os géneros (r=.45, p <.01, para os homens; r=.41, p <.01, para as
mulheres) e a um nível mais expressivo, da quantidade desta apenas para as mulheres
(r=.29, p <.05) (Torrance & Cramond, 2002). Complementarmente, e analisando os
dados do TTCT em combinação com os da inteligência, “apesar de esta ser um bom
preditor dos valores no TTCT, explica muito pouco da variância nestes valores
(r2=.085). Contudo, a combinação do TTCT com a inteligência explicam 54% da
variância da criatividade” (Cramond, Morgan & Bandalos, 2005, p.289).
Além do próprio Torrance, outros investigadores realizaram estudos acerca da
validade predictiva do TTCT, sendo dois dos exemplos o trabalho de Yamada e Tam
(1996) e o de Plucker (1999). Quanto ao primeiro, este centrou-se na re-análise dos
dados obtidos por Torrance em 1980. Com recurso à análise de regressão múltipla, os
170
autores procuraram os melhores predictores da realização criativa dos adultos, tendo
provado que 49% da variância na realização criativa dos adultos era explicada pela
combinação de quatro factores: avaliação no TTCT, inteligência, criatividade nas
aspirações da sua profissão futura e a existência de um mentor. Neste estudo ficou assim
claro que o TTCT é um bom predictor da criatividade (Torrance & Cramond, 2002). Por
seu lado, a investigação de Plucker (1999) consistiu também na reanálise das
informações recolhidas no estudo inicial de follow-up de Torrance, tendo constatado
que a correlação entre a realização criativa em adulto e os valores obtidos no TTCT
era de .60, enquanto que com os coeficientes de QI obtidos pela Standford-Binet,
Wechsler Intelligence Scale ou pelo California Test of Mental Maturity foi apenas de
.19. Assim, concluiu que as avaliações no TTCT predizem a realização criativa três
vezes mais do que o Coeficiente Intelectual.
Quanto à validade do constructo (ou validade de conceito), esta visa identificar o
“grau com que conhecemos aquilo que a prova está a medir” (Almeida & Freire,
1997, p. 159), pelo que se procura encontrar informações que ajudem a entender o que
o teste mede. Tais informações advêm, por exemplo, da análise dos resultados quando o
teste é aplicado em determinadas condições, da correlação com outras provas ou da
estrutura factorial dos resultados obtidos em grupos de testes (Cronbach, 1990;
Howell, 2002).
171
validade é o facto do teste reflectir a intervenção intencional no desenvolvimento da
criatividade (Alencar, Feldhusen & Widlak, 1976; Pyryt, 1999; Ribera, 2005; Rouse,
1965; Sommers, 1961).
Por outro lado, também a própria estrutura factorial do TTCT tem vindo a ser
analisada (Abedi, 2002; Hassan, 1986; Heausler & Thompson, 1988; Kazelskis, 1972;
Kim, Cramond & Bandalos, 2006; Lissitz & Willhoft, 1985; Plass, Michael & Michael,
1974). Assim, avaliando a estrutura latente do TTCT, isto é, as componentes que avalia,
alguns autores criticam a sua validade. Chase (1985), por exemplo, encontrou
coeficientes de correlação entre os valores obtidos nos parâmetros Fluência,
Flexibilidade e Originalidade, oscilando estes entre .74 a .80. Analogamente, Heausler e
Thompson (1988) concluíram que as correlações entre as diferentes sub-escalas são
demasiado elevadas para fornecerem informações significativas por si. Dixon (1979)
provou também que na avaliação da criatividade através do TTCT-Figurativo, a
Originalidade depende fortemente da Fluência e Hocevar e Michael (1979) concluíram
ainda que o TTCT só avalia a Fluência. Runco e Mraz (1992) criticaram igualmente o
poder discriminante do TTCT e, através da análise factorial, concluiram que a
Originalidade explica a maior parte da variância dos resultado, enquanto que Clapham
(1998) aponta, neste sentido, para a Resistência ao Fechamento. Porém, e tal como já
referimos, esta dependência da Originalidade (e da Flexibilidade) do número de
respostas, é uma questão de constructo inerente aos testes de pensamento divergente, tal
como o afirmou, e já foi ilustrado, por Milgram (1983).
172
proposto por Kirton (1976, 1989) como explicativo desse conceito. Os dados
demonstraram que ao factor denominado Inovador, estão associados a Fluência, a
Originalidade e a Resistência ao Fechamento e que, ao factor Adaptativo, se associa a
Elaboração, a Abstracção dos Títulos e a Resistência ao Fechamento. Assim sendo, esta
investigação demonstra que o TTCT não só proporciona mais informação acerca dos
pontos fortes e lacunas nas cinco dimensões do que a partir de um único factor, como
também permite encontrar valores para os tipos de criatividade inovadora ou adaptativa
num modelo explicativo do constructo que quer avaliar (Prieto, 2007). Este mesmo
estudo mostrou ainda, no que diz respeito à estrutura do TTCT, que há maiores
diferenças quando se considera o nível escolar do que o género dos sujeitos avaliados
(Kim, Cramond & Bandalos, 2006).
Assim, apesar das críticas recebidas e das dificuldades que o TTCT tem
enquanto instrumento de avaliação da criatividade, este parece demonstrar
características a nível da fidelidade e da validade adequadas ao propósito para que foi
criado, sendo mesmo considerado o melhor instrumento comparativamente a outros
testes do mesmo género (Cooper, 1991; Kogan & Pankove, 1974; Treffinger, 1985).
173
processo” (Bahia & Nogueira, 2005a, p. 344). Além disso, há um reconhecimento
inequívoco de que a escola, e a sala de aula em particular, são um contexto privilegiado
para a promoção da criatividade (cf. capítulo 1) e, assim, do progresso e bem-estar social
e individual dos alunos (Feldhusen & Treffinger, 1975; Runco, 2004; Tan, 2001). Pelo
exposto, se pretendemos entender a criatividade dos alunos para desenvolvê-la, se para
isso é importante uma linguagem comum e se o melhor local para trabalhar tais
objectivos é a sala de aula, faz sentido que analisemos a criatividade dos alunos também
a partir das concepções dos principais agentes deste espaço, ou seja, das concepções dos
próprios alunos e dos seus professores (Pearlman, 1983). Faremos pois aqui uma
incursão pelas diferentes concepções (representações ou percepções) que estes dois
personagens educativos têm acerca da criatividade.
174
Sendo assim, as reconstruções da realidade que cada um de nós traz consigo
acerca do mundo, vão influenciar fortemente a forma como com ele interagimos, já que
uma vez constituída uma representação, os indivíduos procurarão criar uma realidade
que valide as previsões e explicações decorrentes dessa representação (Moscovici,
2003). Com isto podemos inferir que as representações orientam comportamentos,
conduzindo o que somos e o que fazemos (Costa, 2000; Gilly, 1997; Romo, 2001a,
2003). Se isto é verdadeiro para as vivências em geral, também o é no contexto escolar
(Kowalski, 1997). Realce-se, porém, que apesar da sua importância neste contexto, há
poucos trabalhos de investigação no domínio educativo em que se estude o campo das
significações, isto é, em que se busque entender além de factores externos (por exemplo,
a pertença a um determinado grupo social) o modo como o professor concebe o seu
papel, a comunicação pedagógica em sala de aula, ou a própria construção dos saberes
(Baird, 1976; Gilly, 1997; Vieira, 2004).
175
ou não de cada um, as teorias implícitas acerca de criatividade “são importantes e reais
porque fazem parte do que nós somos, influenciando o modo como vemos a
criatividade, assim como o comportamento criativo (ou comportamento não criativo) de
nós mesmos e das outras pessoas”.
176
auscultar representações nos professores acerca da criatividade, pode ajudar a perceber
necessidades específicas às quais se poderá responder, pode ajudar a captar ideias
erradas e mesmo prejudiciais para a orientação face à criatividade dos alunos, tal como
pode discernir crenças potencialmente positivas a reforçar e a operacionalizar em
futuras formações (Chan & Chan, 1999; Fryer, 1996; Fryer & Collings, 1991; Mack,
1987; Runco & Johnson, 2002). Sublinhe-se neste sentido, que mesmo as concepções
correctas têm de ser trabalhadas visto que aquilo em que as pessoas acreditam não se
torna necessariamente em realidade. No caso de concepções erradas, a inoperância das
crenças mais gritante é, tal como salientam Kaufman e Baer (2002a, p. 9), em modo
jocoso, “mesmo que todas as pessoas acreditem que comer três guardanapos de papel
todos os dias é uma cura para o cancro, isso não o fará”, pelo que propõem intervenções
conscientes e fundamentadas para a alteração e para a consolidação dos conceitos
interligados com a criatividade. Em concordância, existem já experiências frutíferas no
sentido do desenvolvimento da criatividade dos alunos, através do mero facto de se
trabalharem as representações dos professores (Eschenbach & Noland, 1981; Park, Lee,
Oliver & Cramond, 2006; Tan, 2001). As representações dos professores acerca de
criatividade são pois assumidas como um dos aspectos “especialmente críticos para o
desenvolvimento de competências criativas” dos alunos (Runco, Johnson & Baer, 1993,
p. 92) e, consequentemente, a ser pensado na planificação de objectivos e de actividades.
177
Atendendo a esta relevância do estudo das representações, algumas investigações têm
então feito eco do que professores e alunos pensam sobre a temática da criatividade, em
diferentes países e em vários contextos culturais (Candeias, David, Castel-Branco &
Neto, 2004; Marrinan, 1975; Vieira, 2004). Realce-se, contudo, que
desproporcionalmente à importância que tais representações têm para o contexto
escolar, há poucos estudos neste sentido (Fryer & Collings, 1991), sendo apontada a
ausência de instrumentos de avaliação adequados como possível causa.
178
dessa disciplina e de 21 alunos do 3º Ciclo do Ensino Básico. Veremos ainda os estudos
de Bahia (no prelo) que procuram padrões de criatividade, realizada e percepcionada,
em professores e alunos de diferentes áreas disciplinares e níveis de ensino.
Recorreremos, também, ao estudo de Morais e Azevedo (no prelo) com 576 professores
dos Ensinos Básico e Secundário, querendo identificar os conceitos de criatividade, de
professor e de aluno criativos, assim como a presença desta temática no quotidiano
escolar, tomando os alunos, os colegas, o currículo e a própria autoavaliação,
pretendendo ainda perceber a relevância que atribuem à promoção da criatividade, em si
e nos alunos, tal como o contacto obtido com espaços e materiais ligados ao tema em pesquisa.
179
uma margem de reacção, na qual estaria contemplada a influência genética, mas
também o espaço possível e potencial para o desenvolvimento da capacidade criativa.
180
Um outro mito normalmente associado à criatividade é o de esta se associar
essencialmente a um acto de inspiração súbita e inexplicável, logo incontrolável
(Weisberg, 1986). Mais uma vez, temos alguns ecos do que os professores pensam: o
estudo de Cheung, Tse e Tsang (2003) mostra-nos uma associação da inspiração à
criatividade feita por 72% dos professores, Fryer (1996) aponta um valor mais razoável
de 47% e, no estudo português de Morais e Azevedo (no prelo), há 31% dos professores
de acordo com a associação entre estes dois conceitos. Desta forma, também face a este
mito, se algo parece claro no sentido de não ser aceite por vários professores, também
algo pode ser ainda nebuloso em relação ao que é inspiração e ao que esta tem a ver
com criar, esperando, por exemplo e eventualmente, que alunos criativos só o sejam se
demonstrarem inequívocos, surpreendentes e inexplicáveis insights.
181
de Diakidoy e Kanari (1999), aparece uma ênfase na relação da criatividade com a
inteligência de 38%, apesar de, especificamente, o pensamento convergente ser-lhe
apenas associado em 10%. Será interessante comentar também que quando a questão é
colocada tomando uma perspectiva de inteligência mais dinâmica e cognitivista – e
talvez menos divulgada entre os professores em geral – numa formulação que
corresponde a “competências de resolução de problemas”, verifica-se que só 21% dos
professores do trabalho de Diakidoy e Kanari (1999) a associa à criatividade, mas já
45% da amostra de Cheung, Tse e Tsang (2003) faz essa associação. Também, e apesar
da muito fraca associação de criatividade com inteligência no estudo de Fryer (1996),
nele aparecem os processos cognitivos associados à criatividade em 52% dos
professores. Assim, parece que, na generalidade, a independência destes dois conceitos
é percepcionada pelos professores, parecendo estes também, em alguns casos, já
sensíveis ao papel mais amplo da cognição na criatividade; contudo, e como nas
problemáticas anteriores, parece ainda haver alguns ruídos a pacificar nas percepções
dos professores sobre esta associação. Esses ruídos poderão ter implicações importantes
para as atribuições que os professores fazem acerca dos alunos, as quais podem então
traduzir confusão entre criatividade, inteligência e mesmo sucesso escolar.
182
Outra questão bastante trabalhada no âmbito da concepção de criatividade, e que
pode ter repercussões importantes nas práticas lectivas, é a própria formulação do
conceito ou a definição das competências mais específicas que a ele estão associadas. É
interessante assim analisar as principais dimensões que têm sido mencionadas, quer
pelos professores quer pelos alunos, para conceptualizar criatividade. As mais
consensualmente referidas têm sido então a Originalidade e a Imaginação, seguidas da
Auto-expressão. No estudo de Fryer (1996), 89% dos professores refere a Imaginação,
80% a Originalidade e 74% a Auto-expressão. Neste mesmo sentido, apesar de estar em
causa um contexto cultural muito diferente, Cheung, Tse e Tsang (2003) encontraram
89% das respostas referindo a Imaginação, 64% a Originalidade e 46% a
Auto-expressão. Apenas neste estudo, a Inspiração recebe mais referências que estas
duas últimas dimensões, ficando assim, face à Imaginação, em segundo lugar (aspecto
acima comentado). Também no estudo de Vieira (2004), as dimensões de Originalidade
e de Imaginação caracterizaram preferencialmente o campo semântico analisado face à
criatividade, recebendo o apoio de professores e alunos – a Imaginação foi referida por
23% dos professores e por 26% dos alunos, a Originalidade por 45% dos alunos.
183
para eles é importante ter Imaginação, mas que esta não é suficiente: é necessário que
esta se concretize como resposta criativa a um problema de base.
184
terão para infundir o seu treino intencional em qualquer domínio que trabalhem
(Diakidoy & Kanari, 1999).
185
11% d voltadas para as Humanidades e 5% para as Ciências, sendo as restantes muito
pulverizadas por temas específicos. Ainda neste estudo, de entre as acções voltadas para
as Artes, 41% eram especificamente voltadas para a expressão plástica. Em oposição ao
exposto, e se tomarmos o estudo de Cheung, Tse e Tsang (2003), observamos que
apenas 14% dos professores associa aspectos estéticos (não necessariamente, contudo,
ligados às Artes) à criatividade e que, pelo contrário, 40% associa-a à descoberta e 39%
à invenção, ou seja, a aspectos mais científicos. Assim, surge um duplo questionamento:
o de estar presente, nestes resultados, a possibilidade da influência de diferenças
culturais e, observando particularmente os dois estudos portugueses, a de estarmos
perante um ciclo vicioso, isto é, a existência de formação sobre criatividade mais
voltada para as Artes reforçando a percepção distorcida da respectiva associação, ou,
por outro lado, ser esta formação mais procurada pelos professores por causa de tal
crença distorcida.
186
Por seu lado, as representações dos professores acerca da criatividade são mais
próximas das realizações dos alunos quando estão em causa produtos criativos de
natureza verbal (Dawson, D' Andrea, Affinito & Westby, 1999), podendo tal
eventualmente, reforçar a proximidade da representação de criatividade com a de
factores intelectuais ou de sucesso académico.
187
espírito de iniciativa. Complementarmente, Donnell (2005) demonstrou que os alunos
criativos se autoavaliam, e demonstram ser, sensíveis, amigáveis e com pensamento
divergente. Igualmente Kaltsounis (1976) verificou que os alunos mais elaboradores se
auto-descrevem como tendo um interesse manifesto pelos aspectos bonitos e
humorísticos das experiências, como tendo múltiplos recursos, como sendo
imaginativos e com preferências por aventuras mais do que pelas rotinas; por outro
lado, os alunos mais originais têm tendência para se descreverem principalmente como
respeitadores das ideias dos outros, gostando porém de reconstruir coisas ou fazer
mudanças e como sendo críticos do trabalho de outrém. Estes resultados vieram
corroborar o que Dauw, já em 1966, tinha demonstrado acerca dos alunos mais
elaborados, de ambos os géneros: estes autodescreviam-se como aventureiros, dispostos
a correr riscos, independentes em termos de pensamento, com sentido de humor e
frequentemente enfadáveis com as actividades rotineiras. Também neste estudo, a
maioria dos pensadores originais e elaboradores rejeitaram descrições relacionadas com
timidez, medo e conjecturas e as raparigas altamente elaboradoras viam-se como sendo
bastante fortes em termos emocionais.
Porém, estudos já clássicos afirmam que, independentemente da cultura, as
percepções dos professores valorizam sobretudo crianças delicadas, pontuais,
obedientes, populares e aceitantes das regras (Torrance, 1963d), assim como
inteligentes, persistentes, conscienciosos e bons alunos (Holland, 1959). Reforçando
esta posição, mais recentemente, Guncer e Oral (1993) encontraram correlações
negativas entre a criatividade e a conformidade à disciplina na escola, a partir das
avaliações dos professores. No mesmo sentido, vão os estudos de Marrinan (1975),
Cropley (1997a) e Westby e Dawson (1995), pedindo-se aos professores, neste último,
que indicassem as características do aluno criativo e que, tomando essas características,
seleccionassem os alunos mais e menos favoritos. Então, e apesar (como os próprios
autores chamam a atenção) de os professores reclamarem a importância da criatividade
na escola, os alunos menos favoritos continham preferencialmente as características
protótipo da criança criativa, previamente apontadas, mostrando estes professores
preferência pelos alunos obedientes, quietos e atentos na sala de aula, características não
associadas à criatividade. Analogamente, nas culturas indiana (Raina & Raina, 1971) e
árabe (Al-Sabaty, 1991) foram encontradas desvalorizações do comportamento
associado à criatividade no aluno. Ainda neste sentido da desvalorização do aluno
criativo, Scott (1999) encontrou correlação positiva e significativa (apesar de baixa)
188
entre um factor de criatividade e outro de comportamento disruptivo, a partir de uma
escala de representações preenchida por professores acerca do comportamento dos seus alunos.
Face a estas percepções que demonstram algum receio relativamente à
criatividade, pela associação desta com a eventual indisciplina, torna-se então curiosa e
pertinente a perspectiva de Woods (2001), sugerindo a gestão intencional da
criatividade em sala de aula, tornando assim os alunos mais criativos particularmente
como um método preventivo da indisciplina pois, deste modo, poder-se-à canalizar as
energias dos alunos potencialmente indisciplinados para o próprio processo de
ensino-aprendizagem, em vez de temê-los.
A afirmação de que os professores têm uma perspectivação negativa do aluno
criativo em sala de aula, associada à (in)disciplina, não é, porém, linear. Há trabalhos
que indicam o inverso. Runco, Jonhson e Bear (1993) verificaram que professores,
assim como pais, descreviam as crianças criativas de uma forma favorável e as crianças
não criativas de forma desfavorável. Assim, vários subgrupos de pais e de professores,
consensualmente percebiam a criança criativa como sendo activa, aventureira,
ambiciosa, artística, capaz, curiosa, sonhadora, energética, entusiasta e imaginativa. Um
menor consenso reuniu-se à volta da criança não criativa, mas os adjectivos mais
contabilizados como similares foram apático, frio, cínico, dull e restrito nos interesses.
Claro que, como os próprios autores indicaram nesse trabalho, podem existir diferenças
culturais quando se verificam resultados diferentes em contextos tão diferentes como a
Índia (Raina & Raina, 1971; Singht, 1987) ou a China. Neste último caso, Lau e Li
(1996) verificaram que o grupo de alunos mais rejeitado pelos professores era
considerado como o menos criativo e os alunos populares eram considerados como mais
criativos. Contudo, também Chan e Chan (1999), em Hong-Kong, encontraram
características socialmente indesejáveis atribuídas aos alunos criativos e afirmam
mesmo que, por um lado os professores chineses podem estar a olhar para os
comportamentos criativos de uma forma mais desfavorável que nos Estados Unidos e
que, por outro, na China a criatividade pode ser mais associada à vertente intelectual
(“rapidez da resposta”, “capacidades verbais”, “gosto por pensar”, por exemplo).
189
adjectivos considerados favoráveis e acontecendo o inverso para as segundas. Por
exemplo, ser imaginativo e artístico eram adjectivos qualificados elevadamente nos
factores de criatividade e de desejabilidade, enquanto que não ambicioso e shallow eram
vistos acentuadamente como características de crianças não criativas e indesejáveis.
Também Fleith (2000) aponta características aparentemente desejáveis, indicadas por
professores, para classificar os alunos criativos: capacidade de iniciativa, perseverança,
compromisso com a tarefa ou curiosidade. Aljughaiman e Mower-Reynolds (2005)
mostram ainda que os professores encaram o aluno criativo como sendo potencialmente
original, imaginativo, com prazer pelo risco, artístico e com vocabulário rico, sendo
ainda referidos o humor, o entusiasmo e a curiosidade. Por seu lado, Morais e Azevedo
(no prelo) identificaram que os professores portugueses percepcionam como alunos
criativos aqueles que apresentam “alternativas na resolução de problemas” (91%),
“ideias inesperadas e originais” (90%), “muitas ideias adequadas” (84%) e realizam
“transferência de conhecimentos” (79%). Como menos valorizadas aparecem as
características associadas à não-aceitação de regras (24%), embora 48% da amostra
refira face aos alunos criativos “ideias e comportamentos discrepantes do ritmo habitual
da turma” e o sucesso académico (27%), sobretudo se estiverem em causa “tarefas que
envolvam raciocínio” (58%). Características análogas são apontadas para o aluno
criativo pelos professores do estudo de Fernandes (2004) – especificamente, 37% da
amostra apontou a Originalidade e a Imaginação. Porém, põe-se o problema de nestes
últimos estudos, ao contrário dos trabalhos de Runco (Runco, 1989; Runco, Johnson &
Baer, 1993) não terem sido controlados os factores desejabilidade, isto é, como os
professores que indicaram tais características percepcionam mais ou menos
positivamente para a sua rotina de ensino o facto de terem alunos originais,
imaginativos, com prazer pelo risco ou artísticos, por exemplo.
Além destes aspectos que demonstraram a complexidade das percepções dos
professores sobre o aluno criativo, Bachtold (1974) apontou a não correspondência
entre o que os professores diziam e o que os seus alunos percepcionavam face ao que
eles valorizavam na sala de aula. Por exemplo, os professores referiam a curiosidade e a
independência de pensamento como características a realçar positivamente nos seus
alunos, enquanto que estes diziam que os mesmos professores valorizavam sobretudo a
obediência, ao contrário da colocação frequente de questões ou da auto-suficiência.
Dawson e colegas (Dawson, D'Andrea, Affinito & Westby, 1999) comentam que este
tipo de resultados não significa, necessariamente, um conflito intencional entre o que os
190
professores pensam e o que fazem, mas podem apenas traduzir que têm noções
diferentes da estimulação da criatividade em sala de aula ou ainda que têm
distorções – ou meramente diferentes concepções face às dos alunos – acerca do que é
percebido como criativo nas realizações avaliadas. Reforçando esta possível
discrepância entre conceitos e actuação, Fleith (2000) salienta que, apesar de os
professores, no seu estudo, definirem a criatividade em termos de processo, quando
descrevem o aluno criativo, fazem-no referindo-se a características de personalidade e
não em relação aos processos utilizados na realização dos respectivos produtos.
191
mostraram ser “abertos a novas experiências, menos convencionais, autoconfiantes,
autónomos, ambiciosos, dominantes, hostis e impulsivos” (Feist, 1999, p. 290). Por um
lado, domínios diferentes da experiência podem influenciar percepções de criatividade;
por outro, estas podem corresponder a diferenciações específicas e vividas nesses
diferentes domínios. Então, é compreensível que, embora as pessoas tenham “crenças a
respeito do que significa ser criativo e do que isso significa em diferentes domínios”
(Kaufman & Baer, 2002a, p. 9), as concepções dos professores acerca do que é a
criatividade ou das características que poderá esperar encontrar nos seus alunos
criativos, podem assim ser influenciadas pela área que leccionam.
Runco e colegas (Runco, Johnson & Baer, 1993) põem também como hipótese
de variável influenciadora das percepções dos professores face aos alunos, a idade dos
que são avaliados, considerando que, em relação aos alunos mais velhos (por exemplo:
no final da adolescência), os professores possam ter uma perspectiva diferente da
criatividade, partindo do princípio que o processo de socialização já está mais
desenvolvido neles e, por isso, não deixando o receio de disrupção de comportamentos
influenciar tão fortemente a sua avaliação de criatividade.
Também o género das pessoas analisadas ou dos avaliadores podem ser factores
influenciadores das percepções. No estudo de Vieira (2004), verificou-se que quer os
professores quer os alunos do género feminino dão maior ênfase às características
abstractas e subjectivas da criatividade, concretamente orientadas para a auto-expressão,
para a liberdade individual e para a beleza, enquanto que os elementos do género
masculino (professores e alunos) valorizam mais o pensamento analítico e concreto,
estando associado este a uma intensa actividade cognitiva. Neste estudo, o factor idade
foi também fonte de variação na opinião dos professores, mas não o foi no caso dos
alunos. Abordando ainda a variável género, alguns autores (Craft, 2005; Reis, 1998;
Torrance & Sisk, 1997) chamam a atenção para o facto de as mulheres apresentarem um
estilo de aprendizagem mais afectivo, o qual geralmente é negligenciado no contexto
escolar. Por esse motivo Craft (2005, p. 99), destaca que “a criatividade não é uma
habilidade específica de género, mas o seu reconhecimento e desenvolvimento são”. Da
mesma forma, Reis (1998) ressalta a influência do género na estimulação e
desenvolvimento do talento criativo, recordando que características específicas da
personalidade criativa, tais como a independência, a autonomia, a ousadia, a
autoconfiança e a curiosidade não são encorajadas, habitualmente, desde a infância, nas
192
mulheres. Por outro lado, segundo Alencar (1985), traços desejáveis e associados ao
comportamento criativo, são reforçados preferencialmente na educação dos indivíduos
do género masculino ao longo da sua vida. É compreensível então que tais orientações
diferentes face à estimulação da criatividade, em ambos os géneros, tenham
consequências a nível das percepções de professores e alunos, acerca da criatividade
manifestada por outrém ou por si mesmo.
193
ainda ser capaz de tolerar ambiguidades e de reflectir criticamente as suas práticas
quotidianas, quer a nível individual quer a nível colectivo com os colegas. O facto de o
professor demonstrar competências criativas poderá também ter um papel importante
enquanto promotor de criatividade nos alunos porque fará parte do seu papel modelador
(Abedi, 2002; Alencar & Fleith, 2004b; Conde, 2003; Craft, 1998; Fleith, 2000; Fleith
& Alencar, 2006; Sanchez, Martínez & García, 2003; Vieira, 2004).
194
mencionadas foram o uso de métodos de mera reprodução de conhecimento, o
relacionamento professor-aluno bastante precário, o conteúdo da disciplina muito
restrito e com poucas referências, a falta de interesse pela matéria ensinada e pela
aprendizagem do seu aluno, a preparação inadequada das aulas e pouco domínio da
disciplina leccionada. No mesmo sentido, no estudo de Vieira (2004), os alunos
referem como pertinentes para a criatividade o facto de o professor permitir fazer
coisas diferentes. Além disso, é referido que as estratégias de ensino devem ser mais
do que meros instrumentos transmissores de matérias e que “é importante uma
relação interactiva e dinâmica professor-aluno, como inerentes à criatividade, sendo
esta determinante para o estímulo e o desenvolvimento do potencial criativo dos
alunos” (Vieira, 2004, p. 67)
No estudo de Bull e colegas (Bull, Montgomery & Baloche, 1995), com 103
professores do Ensino Superior, é igualmente defendida a importância de se promover a
criatividade, recorrendo o professor ao humor, sendo aberto à experiência, curioso e
tentando incentivar a criatividade nos seus alunos. Por seu lado, aparece também a
195
importância de os professores encorajarem o questionamento dos alunos para 97% dos
professores no estudo de Fyer (1996) e para 79% da amostra de Diakidoy e Kanari
(1999). O tipo de tarefas proporcionado deve ainda promover a descoberta: 98% dos
professores na investigação de Diakidoy e Kanari (1999) o menciona, referindo estes
autores também tipos específicos de tarefas coerentes com essa opinião e com a
promoção da autonomia e do pensamento independente (tarefas de resposta aberta,
problemas mal-estruturados, situações de solução divergente e inusuais).
Um aspecto fica, porém, ambíguo neste tipo de estudos sobre as percepções dos
professores acerca do professor criativo: a existência de regras mais ou menos claras e
flexíveis na sala de aula. O trabalho de Fryer (1996) mostra, interessantemente, que
quase a mesma percentagem de professores acha que o estabelecimento de regras claras
inibe (23%) e ajuda (31%) a criatividade dos alunos, assumindo 15% que não estão
seguros quanto à resposta. No estudo português de Morais e Azevedo (no prelo) apesar
de só 8% da amostra considerar que o professor criativo não deve impôr regras, alguma
percentagem (17%) ainda hesita e ficam algumas dúvidas sobre o significado de 55%
considerar o professor criativo “amigo dos alunos” no que respeita à flexibilidade das
regras em sala de aula. Também não se fica a saber com precisão o que significará para
os professores do estudo de Bull, Montgomery e Baloche (1995) e para 83% dos
professores da amostra de Cheung, Tse e Tsang (2003) a referência à importância de um
ambiente livre. Genericamente, então, parece haver consenso na opinião de professores
e alunos acerca do que constitui um professor criativo. Contudo, ao lado de
representações próximas das teorias explícitas acerca deste tópico, vemos também
algumas oscilações e constatamos ainda algumas confusões a nível das representações
pelos professores. Um maior consenso quanto a ser professor criativo parece ainda
necessário para a segurança do desenvolvimento, por parte dos docentes, de práticas que
permitam a expressão criativa dos alunos em sala de aula.
196
Alteração de representações sobre criatividade em professores: Lacunas e
necessidades
Quando comparamos percepções de alunos e de professores, verificamos que não
existe forte concordância face a diferentes aspectos, como fomos observando; há, porém,
alguns aspectos em que esta discrepância é mais intensa e nos obriga a reflectir mais
intencionalmente a necessidade de pensar esforços interventivos face às
personagens-chave que são os docentes no que respeita às suas representações. Assim,
quanto às práticas em sala de aula promotoras de criatividade, Alencar e Fleith (2004b),
por exemplo, investigaram a percepção de professores e de alunos em relação à
ocorrência de tais práticas no Ensino Superior, tomando 35 professores e 874 alunos,
tendo os resultados indicado que os professores têm uma percepção mais favorável da
presença de práticas que contribuem para o desenvolvimento do potencial criativo do que
os alunos. Analogamente, pesquisas conduzidas por Alencar, Collares, Dias e Julião
(1993), Alencar (1997a), Fleith (2000) e Alencar e Fleith (2006) indicaram que, tanto no
contexto Universitário como no Ensino Básico, de acordo com a percepção dos alunos, a
criatividade é pouco incentivada pelos professores, havendo inclusivamente alunos a
afirmar que “eu sou criativo em casa, mas às vezes não quero meter-me em sarilhos: por
isso, não uso a minha criatividade na sala de aula” (Fleith, 2000, p. 5). Uma reflexão
pode então emergir destes últimos dados: por um lado, professores e alunos têm
representações, de acordo com as teorias explícitas, no sentido de ser importante um
ambiente de sala de aula adequado à expressão e desenvolvimento da criatividade e, por
outro, os alunos não consideram que tal está a acontecer. Parece-nos então premente
investir numa maior sensibilização dos professores para este mesmo facto, conscientes
de que a “criatividade não ocorre dentro dos indivíduos, mas é resultado da interacção
entre os pensamentos6 do indivíduo com o contexto sócio-cultural”, devendo pois ser
compreendida “não como um fenómeno individual, mas como um processo sistémico”
(Csikszentmihalyi, 1997, p. 23), no qual as representações de diferentes personagens
interagem.
Quanto ao facto de ser positivo, para a criatividade dos seus alunos, o professor
ser ele próprio criativo, no estudo de Vieira (2004) há apenas algumas indicações
semânticas de concordância dos professores, do mesmo modo que no estudo de Cheung,
Tse e Tsang (2003) apenas metade dos inquiridos (54%) defende essa premissa,
alertando ainda os autores para o facto de os professores estarem, aparentemente, mais
6
memes
197
disponíveis para desenvolver a criatividade dos seus alunos do que investir em si
próprios. Ainda neste sentido, se parecem consensuais as representações dos professores
face às teorias explicitas acerca do que deve constituir a figura de um professor criativo,
havendo mesmo a afirmação de algumas dessas características pelos próprios
professores, verificam-se dificuldades – até mesmo os alunos o afirmam, tal como
referimos – em estes operacionalizarem tais contornos no seu quotidiano. Parece assim
que os professores não se encontram ainda preparados para responder de forma
suficiente aos seus alunos a nível da necessidade criativa, tomando a sua
conceptualização e consequente avaliação e promoção (Slabbert, 1994). Também no
trabalho de Fryer (1996), independentemente da elevada motivação destes profissionais
para a temática e para a prática da criatividade, surgem dificuldades em como
pragmaticamente trabalhá-la. Talvez assim se explique a baixa auto-avaliação dos
professores enquanto pessoas criativas (Fryer, 1996), assim como algum receio em
assumir a responsabilidade de serem estes a treinar criatividade (Aljughaiman &
Mowrer-Reynolds, 2005), mesmo achando o seu papel importante e dizendo 74% desta
última amostra que usa métodos promotores de criatividade nas aulas.
Mais uma vez se constata que são necessários esforços intencionais no sentido de
clarificar o conceito de criatividade junto dos professores assim como sobre o que é
necessário para a sua promoção no contexto escolar e, assim, os desejos e as práticas
ficarem mais coerentes e ajustados a nível de sala de aula (Cropley, 1997b). Por seu lado,
os professores podem estar conscientes das características que promovem criatividade
nos alunos, mas a transferência para a prática ser ainda demasiado intuitiva, sendo então
necessário um conhecimento não só declarativo, como vimos, mas também
procedimental, o qual virá de um treino que ainda, genericamente, não possuem (Alencar
& Fleith, 2004a; Fleith, 2000).
198
nesses mesmos alunos. Verificou-se especificamente uma tendência para se avaliar os
alunos da mesma forma em Fluência, Flexibilidade e Originalidade (não havendo, assim,
discriminação das suas competências criativas) e, em alguns parâmetros, consoante os
anos de escolaridade surge o acordo em alguns e não nos outros, sendo a Originalidade o
mais polémico. No mesmo sentido da importância do reconhecimento da criatividade nos
alunos pelos seus professores, Khouri (1984) e Patto (1986) salientaram que estes se
encontram mal preparados para lidar com as diferenças individuais dos seus alunos,
desconhecendo as estratégias do ensino criativo e tendo certamente tal impreparação,
consequências na identificação de competências criativas prévias a eventuais
intervenções. Tal como já o afirmamos (cf. capítulo 1), o professor é considerado como
uma peça importante para a avaliação da criatividade, pelo próprio Sistema Educativo;
porém é-lhe pedido que exerça funções para as quais esses mesmo organismo não parece
preocupado em formar.
199
Estes resultados, no sentido de um contacto pobre dos professores face à
criatividade também se espelham nos estudo de Morais e Azevedo (no prelo) no qual,
apesar de 83% dos professores concordara com a necessidade de participar em acções de
formação sobre esta temática, há 69% dos mesmos que não tem conhecimento de
Associações ou eventos relacionados com a temática e 92% não refere conhecer “outros”
materiais ou informações. Ou seja, neste estudo, tal como no de Fryer (1996) e no de
Aljughaiman e Mower-Reynolds (2005) ou no de Conde (2003), os professores
mostraram-se muito motivados face ao conteúdo da criatividade, manifestando mesmo
interesse em ter formação nesse sentido; contudo, incoerentemente com tal motivação, a
maioria não tinha frequentado acções de formação acerca de tais conteúdos e mais de
metade não conhecia Associações ou eventos com eles relacionados.
Todos estes resultados vêm assim reforçar a necessidade de maior formação dos
professores acerca da criatividade, em geral, e mesmo, particularmente (como vimos
anteriormente), acerca da definição do conceito e do que é um aluno criativo. Tal
formação torna-se fundamental para que passos pragmáticos de identificação e de
promoção de competências criativas sejam efectuados com maior segurança no contexto
educativo.
200
específico de promover criatividade. Por último, revelou-se importante a possibilidade de
discutirem, entre si, sobre o que iam aprendendo, reforçando crenças acerca da
modificabilidade do pensamento criativo e da sua responsabilidade por isso, partilhando
soluções, desenvolvendo-se pessoal e profissionalmente em conjunto. Alguns dos
resultados positivos desta intervenção, a nível das representações dos professores, foram
a consciência da possibilidade de todos os alunos poderem alterar o seu potencial
criativo, da modificabilidade das competências criativas em detrimento da influência
genética nestas, da oportunidade que os conteúdos que leccionavam ofereciam para a
promoção da criatividade e dessa operacionalização poder ser feita por eles mesmos.
Estudos de follow-up confirmaram o sucesso da intervenção, dela saindo professores
mais aptos para avaliarem e desenvolverem criatividade nos alunos.
201
SÍNTESE DA FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
No que diz respeito à relação entre criatividade e contexto escolar, esta relação
surgiu como fundamental e estreita a um nível implícito de necessidades e a um nível
explícito de exigências formais, tomando o Sistema Educativo. Contudo, se a aposta da
presença de criatividade no contexto escolar surge como tendo já um grande historial,
evidenciam-se também, e ainda, lacunas que deverão ser alertas face a investimentos na
sua investigação e intervenção. Mais especificamente, esta relação entre criatividade e
contexto escolar revelou-se-nos como multifacetada na necessidade de tomar dimensões
mais latas e mais individuais, tocando variados elementos que compõem ou influenciam
este contexto de vida (por exemplo: o currículo, o sistema de avaliação, a gestão
escolar, os espaços, os professores, os pares, as variáveis intra-individuais). Todas estas
dimensões podem encorajar ou inibir a criatividade do aluno e, por isso, são necessários
e urgentes alvos de atenção.
Ainda no que diz respeito à natureza da criatividade, embora não haja uma
resposta, mais uma vez, pacífica a partir da investigação, esta parece permitir a aposta
na sua mutabilidade. Apesar de muitos mais dados serem necessários para que a
202
promoção da criatividade seja um esforço inequivocamente útil, não podemos descurar
todas as informações que se apresentam positivos e, portanto, a possibilidade de que não
promovendo criatividade estamos a desperdiçar recursos fundamentais. Coerentemente
com esta posição, surgiram variadas experiências de treino criativo, a maioria delas
aplicáveis também em contexto escolar e, também estas, sistematizáveis por taxonomias
gerais.
203
face a outrém ou face a si mesmo, analisaram-se alguns estudos acerca das percepções
de professores sobre criatividade e sobre os conceitos de professor e de aluno criativos.
Salientou-se aqui a necessidade a nível de uma maior definição e operacionalização de
tais representações dos professores, assim como a pertinência do trabalho sobre estas.
Por outro lado, e continuando a haver (como a nível dos professores) escassez de
literatura neste contexto, foram destacadas algumas características vindas da
autoavaliação de criatividade e do que é um professor e um aluno criativos, por parte
dos alunos. Tomando esta fundamentação e os resultados nela obtidos, apostou-se então
na utilização dos dois tipos de percepção neste trabalho.
204
PARTE II - ESTUDO EMPÍRICO SOBRE CRIATIVIDADE
REALIZADA E PERCEBIDA POR ALUNOS DO
ENSINO BÁSICO
205
assim como, em algumas das análises, alguns parâmetros apenas pertencentes a uma
delas e classificações totais de outras.
Para cada um destes dois tipos de dados, e após a respectiva descrição, foi feita
uma tentativa da sua leitura a partir da literatura e de questionamentos que os mesmos
façam surgir. Tenta-se ainda sistematizar os principais resultados obtidos, no final de
cada um destes passos centrais do trabalho empírico, para uma maior sistematização da
informação encontrada.
206
CAPÍTULO 3:
METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO
7
Para simplificação de escrita será sempre referido, neste trabalho, como Ed. Visual.
207
Como se relacionam a realização criativa (figurativa) dos alunos, a sua
autoavaliação de criatividade e as percepções que os professores têm da criatividade dos
seus alunos, em função de diferentes anos de escolaridade e do género dos alunos?
208
apresentados, assim como a criação das categorias de Originalidade para a população
portuguesa, na faixa etária em questão.
Outro objectivo complementar à investigação das hipóteses nucleares deste
trabalho, passou pela construção e estudo de escalas de avaliação das percepções de
professores face à criatividade dos seus alunos e das auto-percepções dos alunos. Duas
versões de um instrumento de avaliação saem, assim, desta tese e a um outro
possibilitou-se desenvolvimento.
Subjacentemente à investigação vemos então, como variáveis independentes, o
género e o ano de escolaridade dos alunos, assim como a área de leccionação dos
professores. Por seu lado, as variáveis dependentes são a realização criativa (figurativa)
dos alunos, a percepção de criatividade dos professores face aos alunos e a
autoavaliação de criatividade destes.
AMOSTRA
209
Quadro 1: Alunos matriculados no ano lectivo de 2003/2004 do Ensino Público Regular, por ano escolar e
zonas do País8
Ano de escolaridade
Zonas 5º 7º 9º
Norte 46502 47662 37247
Centro 17395 18239 15751
Lisboa & Vale do Tejo 36885 36597 29591
Sul 10593 11127 8417
Total 111375 113625 91006
A partir dos dados analisados (cf. quadro 1), e antes mesmo de se identificar
quais e quantos alunos deveriam constituir a amostra para o estudo empírico, foi
ponderado o facto de que a amostra para a criação das categorias de cotação da
Originalidade do TTCT-Figurativo teria de ser constituída no mínimo por 500 sujeitos,
para que fosse representativa da cultura em análise (Rungsinan, 1976; Torrance, 1999).
A amostra respeitaria, ainda, a proporção numérica face ao número de alunos no País
em função das variáveis ano escolar (5º, 7º e 9º) e zona em que a escola está inserida
(Norte, Centro, Lisboa & Vale do Tejo, Sul).
8
Fonte: Recenseamento Escolar Anual 2003/2004 – Inquérito Preliminar; Departamento de Avaliação Prospectiva e Planeamento
210
Quadro 2: Número total e % de alunos no 5º, 7º e 9º anos de escolaridade, por zona do País e
correspondente número de alunos para a amostra das categorias da Originalidade
Ano de escolaridade
5º 7º 9º
Zona A B C A B C A B C
Após esta clarificação da quantidade de sujeitos a considerar, por zona e por ano
de escolaridade, passámos à identificação das localidades a serem alvo de avaliação,
respeitando os critérios, sempre que possível, de equilíbrio entre zona Interior e zona
Litoral, assim como entre grande e pequeno centro urbano. A escolha dos
estabelecimentos de ensino nas localidades pré-estabelecidas foi aleatória,
correspondendo as escolas seleccionadas àquelas que se disponibilizaram a participar
nesta investigação.
9
Tentamos construir grupos de cerca de 20 alunos por aplicação, simulando-se assim o contexto de sala de aula.
211
imprescindível, levando em conta os condicionalismos, por um lado, do tempo
disponível para a investigação e, por outro, do tempo médio necessário para cotar,
integralmente, cada prova figurativa do TTCT. Constatamos então, a partir da leitura do
quadro 3, que tal amostra foi composta por 348 sujeitos, distribuídos proporcionalmente
por zona e ano de escolaridade e respeitando a equivalência entre os géneros.
Especificamente por ano de escolaridade, verifica-se que 35% da amostra frequentava o
5º ano de escolaridade, 36% o 7º ano e 29% o 9º ano. Quanto ao género, a amostra teve
uma distribuição equitativa (50% rapazes e 50 % raparigas).
Ano de Escolaridade
5º 7º 9º Total
Zona Masc. Femi. Masc. Femi. Masc. Femi. Masc. Femi.
Norte 25 25 26 21 26 20 71 72
50 52 41 143
Centro 9 10 10 9 10 9 28 29
19 20 18 57
Lisboa & Vale do Tejo 20 20 20 16 20 17 57 56
40 40 33 113
Sul 7 6 6 5 6 5 18 17
13 12 10 35
Total 61 61 62 51 62 51 174 174
122 124 102 348
212
Quadro 4: Percentagem e respectivo número de professores, em uma das áreas disciplinares por anos de
escolaridade e zonas do País
Ano de escolaridade
5º 7º 9º
Zona % n % n % n
Norte 41 16 42 17 41 16
Centro 16 7 16 6 18 7
L. & V. T. 33 13 32 13 33 13
Sul 10 4 10 4 9 4
Total 100 40 100 40 100 40
INSTRUMENTOS
213
A prova figurativa consiste em três actividades, cada uma delas representando
um aspecto diferente da criatividade, nomeadamente apelando à construção de uma
figura, ao completamento de figuras e ao desenho a partir de linhas paralelas repetidas.
Dez minutos são requeridos para terminar cada actividade. Assim, na actividade 1,
intitulada Construindo uma figura, pretende-se o desenho de uma figura ou objecto, e a
atribuição de um título, usando como estímulo uma forma curva que deverá ser uma
parte integral da construção do desenho. Neste exercício é solicitado aos sujeitos que
pensem numa figura ou objecto que possam desenhar a partir dessa forma e que
adicionem novas ideias de modo a que o desenho conte uma história o mais completa
possível, encorajando-se com estas instruções a Elaboração. Ao ser também pedido para
apresentar ideias o mais interessante e diferente possível, e para imaginar o que mais
ninguém se iria lembrar de pensar, está-se a fazer esforços no sentido de conduzir à
produção original de respostas. Complementarmente é dito que apresente um título que
ajude a contar a história desenhada. Este exercício avalia pois a Originalidade, a
Elaboração e a Abstracção dos Títulos.
214
possas), à Originalidade (tenta pensar em coisas em que mais ninguém pensará), à
Elaboração (coloca também o maior número de ideias possível, em cada desenho) e à
Abstracção dos Títulos (escreve também títulos diferentes e interessantes).
10
Standard Score
215
Abstracção dos Títulos, 40-160; Resistência ao Fechamento, 40-160. A fim de se obter
um indicador médio do potencial criativo, é calculada a média dos cinco parâmetros
(ASS11). Para obter um valor de Vigor Criativo, é levada em conta a frequência das
forças criativas, marcando um "+" ou "+ +", de acordo com o facto de surgir a
característica em análise, uma ou mais vezes, ao longo das três actividades. O número
de "+s" é adicionado (a escala para as forças criativas é de 0-26) às contagens padrão
(ASS) calculadas para obter o Índice Criativo (CI12) (Torrance, 1998).
11
Average Standard Score
12
Creativity Index
216
Esta escala pretende avaliar algumas competências directamente relacionadas
com o constructo de criatividade, ou seja, a Fluência, a Originalidade, a Flexibilidade, a
Elaboração e as Associações Remotas, através das seguintes questões13,
respectivamente: quando é necessário resolver um problema, apresento muitas ideias;
as ideias que apresento são originais, isto é, fora do comum; quando uma solução não
resolve um problema, consigo ver esse problema de forma diferente, isto é, consigo
apresentar novas soluções; quando surgem várias ideias, as minhas são as que
apresentam mais informação detalhada; tenho ideias a partir de conhecimentos que
aprendi em situações diferentes (exemplos: em diferentes disciplinas, na escola, na
família).
13
Apresentam-se os itens da EACA-A sendo a sua formulação na EACA-P análoga, apenas diferindo na conjugação verbal.
217
PROCEDIMENTOS
Para garantir uma colaboração mais eficiente dos Concelhos Executivos, foram
marcadas reuniões prévias de esclarecimento dos objectivos do estudo e fornecidas as
informações solicitadas, em particular sobre os instrumentos a utilizar, os
procedimentos da recolha de dados e as garantias acerca da confidencialidade dos
mesmos. Complementarmente, procurou-se garantir a concordância dos Encarregados
de Educação, através da autorização escrita obtida pelos respectivos directores de turma.
218
espaço inicial nem que seja apenas “um breve warm-up inicial de 5 minutos”
(Torrance, 1979c, p.32).
Tendo em conta que o TTCT-Figurativo (Torrance & Ball, 1990) não está
validado para o contexto português, houve necessidade de realizar outros
procedimentos, nomeadamente a nível da sua tradução, criação das categorias para
cotação da Originalidade e o estudo psicométrico deste instrumento. Assim,
relativamente à tradução, foi contratada uma psicóloga bilingue, tendo sido a sua
tradução comparada com a tradução realizada pela autora deste estudo, e
consequentemente, sido feitos os devidos ajustes. Seguidamente, duas professoras da
disciplina de Inglês do Ensino Básico releram a tradução feita e verificaram a
adequação da linguagem ao contexto escolar. Após esta revisão, foi feita uma
retroversão para a Língua inglesa por um outro tradutor independente, garantindo assim
a não distorção do texto inicial. Verificada a concordância da tradução, a prova foi
realizada por cinco professores e vinte alunos do 7º ano de escolaridade. Depois de
analisadas e identificadas as dificuldades, foi dada como apta a tradução do
TTCT-Figurativo para o público de Língua portuguesa.
219
À semelhança de outros países, e tendo em conta a dependência cultural da
Originalidade, construiu-se um guia de cotação para este parâmetro, adaptado ao
contexto português (cf. anexo 3). Assim, este novo manual foi desenvolvido com
recurso aos mesmos procedimentos que Torrance usou no desenvolvimento das normas
iniciais (Torrance, 1966b): antes de dar a cotação em cada resposta realizou-se um
trabalho prévio de identificação das respostas válidas apresentadas por cada um dos 689
alunos; determinada a frequência estatística de cada uma dessas respostas, foi atribuída
a cotação de 0 pontos às respostas que apareceram em 5% ou mais elementos da
população em análise e 1 ponto às restantes. Após isto, as categorias de Originalidade
estavam criadas e foi possível avançar para a cotação das provas correspondentes à
amostra deste estudo. Realce-se que, tendo em conta a quantidade de respostas em cada
um dos testes, este procedimento, sendo absolutamente necessário, foi um consumidor
de tempo muito significativo nesta investigação. Toda a análise estatística dos dados foi
efectuada com o pacote estatístico SPSS, versão 14,0.
220
CAPÍTULO 4:
TTCT
Ano
escolaridade
Criatividade EACA-A
Género
EACA-P
221
ESTUDO PSICOMÉTRICO DOS INSTRUMENTOS
Tendo em conta que não existe um critério único que reúna consenso para a
determinação da unidimensionalidade, mas considerando que tal consenso existe quanto
ao facto de nos testes psicológicos esta ser uma questão de grau (Vitória, Almeida &
Primi, 2006), no nosso estudo foi considerado o Critério de Cattel (Hair, Anderson,
Tatham & Black, 1995) para fundamentar a decisão do número de factores a reter.
14 A Análise em Componentes Principais, apesar de ser matematicamente diferente da Análise Factorial, é usada no contexto
psicométrico com o mesmo objectivo; a saber, quer-se a identificação das dimensões ou componentes subjacentes ao conjunto de
itens ou, dito de outra forma, procura-se com este procedimento determinar de forma empírica como os itens se agrupam.
222
Neste critério, conhecido por Scree Plot, são retidos os factores que superam o ponto de
inflexão da curva. No nosso caso, a análise do Scree Plot aponta claramente para a
unidimensionalidade da escala (cf. gráfico 1).
2,4
2,1
Eigenvalue
1,8
1,5
1,2
0,9
0,6
1 2 3 4 5
Component Number
223
Quadro 5: Saturação factorial dos resultados nos itens de Autoavaliação de criatividade
Item Saturação
Fluência .71
Originalidade .74
Flexibilidade .69
Elaboração .77
Associações Remotas .59
Valor próprio 2.50
% Valor Explicado 49.50
15
A correlação corrigida é a correlação do item com o somatório de todos os itens do factor, excepto o item em análise, uma vez que
a ausência deste procedimento ocasionaria a correlação do item também consigo próprio e a correlação encontrada estaria
necessariamente inflacionada.
224
acima de .18, e que tal acontece neste estudo, concluímos terem os itens boas qualidades
métricas na avaliação do constructo em causa.
Ainda em relação ao estudo dos itens (cf. quadro 7), verificámos que as médias
(M) oscilaram entre 2.88 e 3.77 e os desvios-padrão (DP) entre 0.82 e 1.01, o que nos
indica um bom funcionamento dos itens, sendo a sua amplitude de resposta entre 1 e 5
(os valores mínimo e máximo da escala) para todos os itens.
16
Uma distribuição normal tem uma assimetria de zero. Quando se efectua o cálculo do rácio assimetria/erro obtem-se um valor
estandardizado da assimetria que, no caso de ser superior a dois, indica que a distribuição é estatisticamente assimétrica.
17
O teorema do limite central diz-nos que para valores grandes de n a variável aleatória converge em distribuição para a normal
padrão ou normal estandardizada (Reis, 1996).
225
estudos realizados, a potencial utilidade dos indicadores individuais (parâmetros) e a
legitimidade de utilizar o seu somatório para obter um valor total de autoavaliação de
criatividade, neste instrumento.
Neste estudo foi pedido aos professores de Matemática, Português e Ed. Visual,
de cada turma, que avaliassem a criatividade dos seus alunos nos mesmos parâmetros
que os alunos se auto-avaliaram (Fluência, Originalidade, Flexibilidade, Elaboração e
Associações Remotas). As áreas curriculares escolhidas correspondem a domínios
considerados na literatura sobre criatividade (De La Torre, 1993; Kaufman & Baer,
2002a). Tivemos um total de 360 professores, correspondendo 120 a cada área
curricular e 120 em cada ano de escolaridade (cf. quadro 4). Como cada professor avalia
alguns dos alunos da sua turma, não pode ser assumida a independência local destes
dados. A independência local entre duas variáveis implica que entre elas não exista
qualquer relação, ou seja, qualquer que seja o valor particular que uma delas tome, não
se altera a distribuição de probabilidade da outra. Esta circunstância torna
desaconselhável o cálculo da consistência interna deste instrumento pelo que serão
analisados apenas os itens individualmente. Também a interpretação dos resultados
levou este aspecto em consideração.
Tomando este comentário, fizemos então, e apenas, o estudo dos itens da escala,
tomando a respectiva amplitude, médias (M), desvio-padrão (DP) e as medidas de
curtose e assimetria, considerando cada um dos três grupos de professores (cf. quadros
8, 9 e 10).
Quadro 8: Análise descritiva dos itens da avaliação de criatividade pelos professores de Matemática
226
Quadro 9: Análise descritiva dos itens da avaliação de criatividade pelos professores de Português
Quadro 10: Análise descritiva dos itens de avaliação de criatividade pelos professores de Ed. Visual
227
Teste de Pensamento Criativo de Torrance (Figurativo)
Verificamos então que as médias oscilam entre 6.56 e 21.24, sendo estas
produções, mais ou menos elevadas, reforçadas pelos respectivos valores das
amplitudes, estando perfeitamente justificável a discrepância da Fluência, já que é o
parâmetro que mede a quantidade de respostas. A nível dos desvios-padrão, salientamos
apenas o caso da Abstracção dos Títulos, pela proximidade relativa deste face ao valor
228
da média. Observa-se a sensibilidade de cada parâmetro em termos da distribuição
normal dos resultados, a partir dos valores de curtose e assimetria. Parece, então,
verificar-se, na globalidade e em cada parâmetro, a adequabilidade do instrumento a
nível da caracterização dos seus parâmetros, a partir destes resultados.
18 Dada a variabilidade provocada pelo tempo de aplicação das provas, o Scolastic Testing Service aconselhou que esta fosse
realizada com uma distância temporal entre um e seis meses (Kaufman, comunicação pessoal, 10 Julho 2003).
229
correctores. As correlações entre ambos os correctores foram estatisticamente
significativas e elevadas, aproximando-se dos valores encontrados pelo próprio
Torrance (Torrance, Ball & Safter, 1992). Assim, encontrámos valores acima de .90
para a Fluência, Originalidade e Abstracção dos Títulos (respectivamente, .98, .99 e .96,
para p<.01) e de .85 para a Resistência ao Fechamento, .78 para a Elaboração e de .66
para o Vigor Criativo (p<.01)19. Mais uma vez encontrámos resultados que apontam
para a fidelidade da prova aplicada.
Ainda com o intuito de explorar a consistência interna dos itens da prova (aqui
correspondendo aos seis parâmetros), calculamos o alfa de Cronbach, o qual se mostrou
aceitável com um valor de .70, indo ao encontro de outras investigações acerca da
mesma prova (Kim, Cramond & Bandalos, 2006). Assim, este indicador parece reforçar
a estabilidade dos resultados obtidos por este instrumento.
Com a análise factorial pretende-se então obter uma leitura da estrutura interna
do instrumento de avaliação (TTCT-Figurativo) e identificar os factores comuns ou
variáveis latentes que emergem da correlação entre as variáveis observáveis. Assim, os
resultados expressos no quadro 12 indicam a existência de dois factores que explicam
68.97% da variância total. O primeiro factor é composto pelas variáveis Fluência,
Originalidade e Resistência ao Fechamento, que explicam 42.82% da variância, e o
segundo factor é composto pelas variáveis Vigor Criativo, Abstracção dos Títulos e
Elaboração, que explicam 26.15% da variância. Os dois factores têm entre si uma
correlação de .30 (p<.01), o que traduz uma associação moderada entre eles.
As saturações variam, no primeiro factor, entre .55 e .98, com uma média de .75
e, no segundo factor, entre .60 e .77, com uma média de .72. Estes valores superam
claramente o valor considerado adequado de .40 (Stevens, 1986). Quanto às
comunalidades, a maior parte delas superou .40, tendo sido a mínima de .31, com média
de .43, pelo que também se mostraram adequadas.
19
Para uma classificação total no TTCT-Figurativo, o acordo de correctores foi de .97 (p<.01)
230
Quadro 12: Saturação factorial e comunalidades da Análise de Componentes Principais do TTCT-
Figurativo
1,0
.6
Elaboração
.4
.2
Resistência ao Fechamento
Originalidade
.0
Fluência
-.2
Factor 1
231
A partir do estudo da realização desta amostra nos vários parâmetros
constituintes da prova (análise dos itens), assim como a partir da análise das diferentes
formas de explorar a fidelidade ou precisão da prova, e também de uma análise da sua
dimensionalidade, pensamos que este instrumento mostra reunir condições para
resultados fidedignos e válidos para esta amostra, condições essas imprescindíveis para
avançar com a parte empírica da investigação.
Na análise dos resultados constatamos que não existe dispersão dos mesmos,
sendo este dado confirmada pelo elevado valor de correlação de Pearson encontrado
(r=.94, p<.01). Perante este facto, e sendo por isso indiferente em termos avaliadores
tomar uma ou outra análise, optamos pelas notas brutas da Originalidade em todo o
estudo empírico.
232
A IDENTIFICAÇÃO DE DIFERENÇAS NA CRIATIVIDADE
PERCEBIDA E MANIFESTADA AO LONGO DA ESCOLARIDADE
20
A escolha de tal procedimento estatístico, Análise da Variância (ANOVA) prende-se com a sua natureza: um conjunto de técnicas
que permitem analisar dados dependentes de vários efeitos operando simultaneamente (factores). Na ANOVA, a variação nas
medidas observadas (resposta) é particionada em componentes que reflectem os efeitos de uma ou mais variáveis independentes.
233
multivariada), a homocedasticidade com o teste de Levene (na análise univariada) e,
sempre que esta não se confirmou, o teste de Bonferoni foi substituído pelo teste
Games-Howell. Foram consideradas significativas as diferenças entre médias que
tivessem associadas um valor de p<.05 (Howell, 2002).
Autoavaliação de criatividade
Quadro 14: Médias e desvios-padrão dos resultados da Autoavaliação, no parâmetro Fluência, em função
do género e do ano de escolaridade
234
Quadro 16: Médias e desvios-padrão dos resultados da Autoavaliação, no parâmetro Flexibilidade, em
função do género e do ano de escolaridade
Quadro 19: Médias e desvios-padrão dos resultados da Autoavaliação, numa classificação total, em
função do género e do ano de escolaridade
235
o 9º anos apenas nas Associações Remotas. Por seu lado, o 7º ano aparece como um
ponto de mudança na percepção dos rapazes em todos os parâmetros.
Quadro 20: Análise de variância da Autoavaliação dos alunos, em função do género e do ano de
escolaridade
21
Consultar o Anexo 4 para valores correspondentes aos Resíduos
236
Por outro lado, tomando uma cotação total22 obtida na Autoavaliação, não são
encontradas diferenças estatisticamente significativas entre géneros, entre anos de
escolaridade ou na interacção entre estas duas variáveis (cf. quadro 2123).
Quadro 21: Análise de variância da Autoavaliação dos alunos, numa classificação global, em função do
género e do ano de escolaridade
22
Tendo em conta que necessitávamos de um valor total tradutor da criatividade percepcionada e da criatividade realizada, e que tal
se mostrou possível a partir da análise dos respectivos instrumentos, recorremos à soma simples (José Maia, comunicação pessoal,
15 Maio 2005).
23
Consultar o Anexo 4 para valores correspondentes aos Resíduos
237
Avaliação de criatividade pelos professores
Quadro 22: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Matemática, no
parâmetro Fluência, em função do género e do ano de escolaridade
Quadro 23: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Matemática, no
parâmetro Flexibilidade, em função do género e do ano de escolaridade
238
Quadro 24: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Matemática, no
parâmetro Originalidade, em função do género e do ano de escolaridade
Quadro 25: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Matemática, no
parâmetro Elaboração, em função do género e do ano de escolaridade
Quadro 26: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Matemática, no
parâmetro Associações Remotas, em função do género e do ano de escolaridade
24
Consultar o Anexo 4 para valores correspondentes aos Resíduos
239
Quadro 27: Análise de variância da avaliação dos professores de Matemática, em função do género e ano
de escolaridade
240
Quadro 28: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Português, no
parâmetro Fluência, em função do género e do ano de escolaridade
Quadro 29: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Português, no
parâmetro Flexibilidade, em função do género e do ano de escolaridade
Quadro 30: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Português, no
parâmetro Originalidade, em função do género e do ano de escolaridade
Quadro 31: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Português, no
parâmetro Elaboração, em função do género e do ano de escolaridade
241
Quadro 32: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Português, no
parâmetro Associações Remotas, em função do género e do ano de escolaridade
25
Consultar o Anexo 4 para valores correspondentes aos resíduos
242
Quadro 33: Análise de variância da avaliação dos professores de Português, em função do género e ano
de escolaridade
243
Gráfico 4: Efeito da interacção, no parâmetro Flexibilidade da avaliação dos professores de Português,
tomando as variáveis género e ano de escolaridade
244
avaliado, tomando alguns estudos que identificam precisamente o incremento
observado, ao longo dos anos de escolaridade em causa (Fasko, 2002; Torrance &
Safter, 1999), parecendo indicar que os professores desta área disciplinar se aproximam,
pelo menos neste parâmetro, da realização dos alunos. Também se poderá pensar que
talvez os parâmetros Flexibilidade e Associações Remotas, entre o conjunto de todos os
parâmetros, diferenciem melhor os alunos para estes professores (como eventualmente a
Fluência o fazia nas autoavaliações).
Quadro 34: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Ed. Visual, no
parâmetro Fluência, em função do género e do ano de escolaridade
245
Quadro 35: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Ed. Visual, no
parâmetro Flexibilidade, em função do género e do ano de escolaridade
Quadro 36: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Ed. Visual, no
parâmetro Originalidade, em função do género e do ano de escolaridade
Quadro 37: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Ed. Visual, no
parâmetro Elaboração, em função do género e do ano de escolaridade
Quadro 38: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação dos professores de Ed. Visual, no
parâmetro Associações Remotas, em função do género e do ano de escolaridade
246
em todos os parâmetros; contudo, também para estes professores, os rapazes aumentam
a sua criatividade na Fluência, na Flexibilidade, na Elaboração e nas Associações
Remotas.
Quadro 39: Análise de variância da avaliação dos professores de Ed.Visual, em função do género e ano
de escolaridade
26
Consultar o Anexo 4 para valores correspondentes aos Resíduos
247
Em relação aos resultados anteriores, quer das auto-percepções de criatividade
pelos alunos, quer da avaliação percebida pelos professores de Matemática e de
Português, verificamos nos professores de Ed. Visual discrepâncias a nível dos
resultados médios, sendo esta, contudo, uma perspectiva de análise mais superficial: as
raparigas obtêm pontuações sempre superiores aos rapazes, tomando o ano de
escolaridade e não só as raparigas são vistas como melhorando a realização ao longo
dos anos, mas também tal acontece nos rapazes para quase todos os parâmetros. Assim
sendo, o único ponto solidamente coerente, entre a avaliação dos três grupos de
professores e a autoavaliação dos alunos, a nível destes resultados médios, é a melhoria
genérica das raparigas ao longo da escolaridade, tendo sido já apontadas possíveis
hipóteses explicativas para tal resultado.
248
Tentando agora entender os resultados encontrados e tomando a percepção de
criatividade mais diferenciada pelos professores de Português e de Ed. Visual face aos
seus alunos, comparativamente aos professores de Matemática, pode-se pensar que estes
últimos talvez não detectem tão discriminadamente a exigência de criatividade nas
actividades lectivas quotidianas por estas estarem mais ligadas à manifestação do
pensamento convergente do que as que decorrem nas aulas de Português e de Ed. Visual
(mais divergentes e de expressão pessoal). Também no caso dos professores de
Ed. Visual, a sua formação académica é mais intencionalmente voltada para a
criatividade (Conde, 2003; Morais, 2001) e isto pode ajudar a uma maior discriminação
na percepção pedida. Tomando agora as percepções dos professores de Português e de
Ed. Visual, e particularmente as respeitantes ao ano de escolaridade, parecem suscitar
alguma controvérsia os dados fornecidos pelos professores de Ed. Visual, tendo em
conta a sua percepção de Elaboração como sendo cada vez melhor do 5º para o 9º ano, o
que contraria os estudos de Torrance e Safter (1999) no que respeita a tal parâmetro.
Também os resultados fornecidos pelos professores de Português quanto à interacção do
ano de escolaridade com o género nos poderão levar a pensar que haja alguma confusão
entre as competências cognitivas verbais superiores das raparigas (Almeida, 1988;
Hedges & Nowell, 1995; Hyde, 1990) e as suas competências criativas.
249
respeito à quantidade de ideias (Fluência). Talvez os diferentes graus de exigência
envolvidos, a nível avaliativo e reflexivo por parte de professores e de alunos, explique
tal discrepância entre parâmetros mais e menos tomados em consideração nesta
avaliação.
Quadro 40: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação pelo TTCT-Figurativo, no parâmetro
Fluência, em função do género e ano de escolaridade
Quadro 41: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação pelo TTCT-Figurativo, no parâmetro
Originalidade, em função do género e ano de escolaridade
250
Quadro 42: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação pelo TTCT-Figurativo, no parâmetro
Elaboração, em função do género e ano de escolaridade
Quadro 43: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação pelo TTCT-Figurativo, no parâmetro
Resistência ao Fechamento, em função do género e ano de escolaridade
Quadro 44: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação pelo TTCT-Figurativo, no parâmetro
Elaboração dos Títulos, em função do género e ano de escolaridade
Quadro 45: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação pelo TTCT-Figurativo, no parâmetro
Vigor Criativo, em função do género e ano de escolaridade
251
Quadro 46: Médias e desvios-padrão dos resultados da avaliação pelo TTCT-Figurativo, numa
classificação global, em função do género e ano de escolaridade
27
Consultar o Anexo 4 para valores correspondentes aos resíduos
252
Quadro 47: Análise de variância da avaliação de criatividade dos alunos pelo TTCT-Figurativo, em
função do género e ano de escolaridade
Por outro lado, tomando uma cotação total obtida no TTCT-Figurativo não são
encontradas diferenças estatisticamente significativas entre géneros, entre anos de
escolaridade ou na interacção entre estas duas variáveis (cf. quadro 4828).
Quadro 48: Análise de variância dos resultados da avaliação no TTCT-Figurativo numa classificação
total, em função do género e ano de escolaridade
28
Consultar o Anexo 4 para valores correspondentes aos resíduos
253
Assim, a partir da avaliação de criatividade pelo TTCT-Figurativo, verificamos
a terceira hipótese deste trabalho, ou seja, os resultados obtidos por este instrumento
apresentam-se diferenciados em função do ano de escolaridade e do género, embora isto
só se verifique tomando os parâmetros de criatividade separadamente e não numa
classificação total do teste.
254
Tegano & Moran, 1989). Quanto ao ano de escolaridade, também como era esperado,
surgem diferenças no sentido de uma maior realização criativa em anos posteriores.
Assim, os alunos do 9º ano desempenham melhor do que os seus colegas do 5º ano a
nível da Abstracção dos Títulos, o que vai ao encontro dos resultados específicos para
este parâmetro nos estudos de Torrance e Safter (1999) e que se podem entender,
nomeadamente, pela sua provável maior capacidade de abstracção advinda do
desenvolvimento do pensamento formal nessa faixa etária (Piaget, 1952). Também face
ao Vigor Criativo, e sendo este índice um agrupamento com vários indicadores
emocionais (cf. capítulo 2), nos parece compreensível que os alunos do 9º ano
demonstrem uma maior realização do que os pré-adolescentes do 5º ano, já que a
experiência e maturidade emocional se foram tornando mais ricas com o
desenvolvimento implicado, nomeadamente a nível pessoal, interpessoal e da identidade
(Erikson, 1980; Kohlberg, 1984; Marcia, 1980; Selman, 1980).
O parâmetro que mais distinguiu os sujeitos nesta amostra face à sua realização
criativa no TTCT-Figurativo foi, então, a Abstracção dos Títulos (com diferenças
estaticamente significativas quer a nível do género quer do ano de escolaridade), o que
nos parece interessante se pensarmos na riqueza deste mesmo parâmetro a nível da
255
conjugação de exigências verbal e figurativa. Por seu lado, é também interessante
constatar que dos quatro parâmetros inicialmente constituintes do TTCT-Figurativo
(Torrance, 1962c, 1958) e ainda mais conhecidos e usados, pelo menos a nível nacional,
apenas a Originalidade se revelou significativa a diferenciar a amostra
(Mouchiroud & Lubart, 2001; Rungsinan, 1977), emergindo a relevância de outros
parâmetros: Abstracção dos Títulos, Vigor Criativo e Resistência ao Fechamento.
256
Em síntese
257
. A avaliação pelo TTCT-Figurativo, em alunos do 5º ao 9º ano de escolaridade,
mostra-se mais discriminativa de diferenças a nível de género e de ano de
escolaridade, tomando a sua cotação por parâmetros face a uma cotação total;
258
RELACIONAMENTO ENTRE OS RESULTADOS DAS
DIFERENTES FONTES DE AVALIAÇÃO DE CRIATIVIDADE
259
Para cada cruzamento de fontes de avaliação apresentamos e descrevemos os
resultados obtidos com a amostra total, em função do género e de cada ano de
escolaridade. Por último, faremos uma apreciação dos resultados tomando a literatura e
questões que tais resultados nos suscitam.
Autoavaliação de criatividade
TTCT Total
Fluência Originalidade Elaboração Flexibilidade A. Remotas EACA-A
Fluência .01 .06
Originalidade .10 .07
Elaboração .16* .20
Títulos .07
R. Fechamento -.02
Vigor Criativo .19**
Total TTCT .07 .15* .07 .13 .02 .13
** p< 0.01 * p< 0.05
260
Quadro 50: Coeficientes de correlação entre os resultados no TTCT-Figurativo e a Autoavaliação de
criatividade – 5º ano
Autoavaliação de criatividade
TTCT Total
Fluência Originalidade Elaboração Flexibilidade A. Remotas EACA-A
Fluência -.10 -.07
Originalidade -.80 -.01
Elaboração .39 ** .22
Títulos .05
R. Fechamento -.15
Vigor Criativo .26*
Total TTCT -.03 .01 .09 .05 .05 .04
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
TTCT Total
Fluência Originalidade Elaboração Flexibilidade A. Remotas EACA-A
Fluência .00 .04
Originalidade .16 .03
Elaboração .07 .26*
Títulos .07
R. Fechamento -.01
Vigor Criativo .07
Total TTCT .01 .22 .03 .06 .011 .12
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
TTCT Total
Fluência Originalidade Elaboração Flexibilidade A. Remotas EACA-A
Fluência .08 .20
Originalidade .24 .21
Elaboração .03 .14
Títulos .04
R. Fechamento .16
Vigor Criativo .15
Total TTCT .13 .19 .10 .28* .01 .21
** p< 0.01 * p< 0.05
261
Indicamos e analisamos, em seguida, os coeficientes de correlação obtidos entre
a Autoavaliação de criatividade e os resultados do TTCT-Figurativo, tendo em conta o
género dos alunos (cf. quadro 53 e 54)
Autoavaliação de criatividade
TTCT Total
Fluência Originalidade Elaboração Flexibilidade A. Remotas EACA-A
Fluência -.11 -.05
Originalidade .07 .03
Elaboração .18 .14
Títulos .12
R. Fechamento -.11
Vigor Criativo .26
Total TTCT -.03 .12 .12 .05 -.07 .06
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
TTCT Total
Fluência Originalidade Elaboração Flexibilidade A. Remotas EACA-A
Fluência .13 .04
Originalidade .11 .13
Elaboração .16 .07
Títulos .20*
R. Fechamento .07
Vigor Criativo .13
Total TTCT .15 .18 .22* .01 .10 .20*
** p< 0.01 * p< 0.05
Tomando agora todos os resultados obtidos pelo cruzamento destas duas fontes
de avaliação, verificamos que não existem muitas correlações significativas, sendo as
existentes positivas mas de fraca expressividade estatística. A nível da correspondência
de parâmetros de criatividade, apenas a Elaboração se destaca (na amostra global e
262
no 5º ano) e, tomando os parâmetros do TTCT-Figurativo, apenas a Elaboração, o
Vigor Criativo e a Abstracção dos Títulos obtiveram correlações estatisticamente
significativas com a auto-percepção dos alunos, salientando-se que os dois primeiros se
correlacionam com uma percepção global de criatividade destes (Total na EACA-A),
mas conseguindo o Vigor Criativo mais forte significância estatística. Se, por seu lado,
focalizarmos o parâmetro que maior número de correlações estatisticamente
significativas reúne, então evidencia-se o Total na EACA-A. Os resultados obtidos
acerca do relacionamento entre as duas fontes de avaliação mostram ainda oscilações
em função do ano de escolaridade e do género.
263
Avaliação de criatividade dos alunos pelos professores
Quadro 55: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Fluência - amostra total
Matemática -
Português .38** -
Ed. Visual .46** .24** -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 56: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Originalidade - amostra total
Matemática -
Português .27** -
Ed. Visual .30** .10 -
** p< 0.01 * p< 0.05
264
Quadro 57: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Flexibilidade - amostra total
Matemática -
Português .43** -
Ed. Visual .46** .29** -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 58: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Elaboração - amostra total
Matemática -
Português .40** -
Ed. Visual .38** .30** -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 59: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Associações Remotas - amostra total
Matemática -
Português .29 ** -
Ed. Visual .32** .30** -
** p< 0.01 * p< 0.05
265
Ainda tomando a amostra global e observando agora as correlações obtidas entre
os professores de cada área disciplinar, em cada um dos cinco parâmetros, encontramos
correlações estatisticamente significativas e positivas bastante mais elevadas
(cf. quadros 60 a 62).
Quadro 60: Coeficientes de correlação entre a avaliação de criatividade efectuada pelos professores de
Matemática nos diferentes parâmetros - amostra total
Quadro 61: Coeficientes de correlação entre a avaliação de criatividade efectuada pelos professores de
Português nos diferentes parâmetros - amostra total
Quadro 62: Coeficientes de correlação entre a avaliação de criatividade efectuada pelos professores de
Ed. Visual nos diferentes parâmetros - amostra total
266
Podemos então observar que os coeficientes de correlação obtidos oscilam
entre .74 e .89 (p<.01), demonstrando um alto grau de acordo por parte de cada grupo
de professores em relação aos diferentes parâmetros em avaliação. Este acordo
mostra-se ligeiramente mais baixo no parâmetro Associações Remotas e os maiores
índices de correlação surgem a nível da Flexibilidade.
Parece assim que os diferentes grupos de professores não fazem distinção entre
parâmetros que operacionalizam diferentemente a criatividade, isto é, quando um
professor avalia os seus alunos tende a não diferenciar as suas competências criativas
específicas.
Vamos agora focalizar a análise tomando o ano de escolaridade: apresentamos
primeiramente as correlações entre as avaliações de cada grupo de professores face a
cada parâmetro e, num segundo momento, as correlações entre as avaliações de cada
grupo de professores face a todos os parâmetros. Começaremos a apresentação destes
dados com o 5º ano de escolaridade (cf. quadros 63 a 67).
Quadro 63: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Fluência – 5º ano
Matemática -
Português .28** -
Ed. Visual .30** .07 -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 64: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Originalidade – 5º ano
Matemática -
Português .16 -
Ed. Visual .32** -.10 -
** p< 0.01 * p< 0.05
267
Quadro 65: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Flexibilidade – 5º ano
Matemática -
Português .36 ** -
Ed. Visual .30** .06 -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 66: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Elaboração – 5º ano
Matemática -
Português .29** -
Ed. Visual .19 .01 -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 67: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Associações Remotas – 5º ano
Matemática -
Português .16 -
Ed. Visual .30** .04 -
** p< 0.01 * p< 0.05
268
Quadro 68: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática nos diferentes parâmetros – 5º ano
Quadro 69: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Português nos diferentes parâmetros – 5º ano
Quadro 70: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Ed. Visual nos diferentes parâmetros – 5º ano
269
encontrados na avaliação realizada aos alunos do 5º ano. Contudo, os professores
de Ed. Visual não concordam com os professores de Português relativamente à
atribuição de Originalidade, Flexibilidade e Associações Remotas (correlações
estatisticamente não significativas), havendo, para os outros parâmetros, correlações
significativas mais baixas do que entre os seus colegas.
Quadro 71: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Fluência – 7º ano
Matemática -
Português .43** -
Ed. Visual .54** .23 * -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 72: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Originalidade – 7º ano
Matemática -
Português .27* -
Ed. Visual .23* -.07 -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 73: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Flexibilidade – 7º ano
Matemática -
Português .47** -
Ed. Visual .51** .19 -
** p< 0.01 * p< 0.05
270
Quadro 74: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Elaboração – 7º ano
Matemática -
Português .48** -
Ed. Visual .45** .32** -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 75: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Associações Remotas – 7º ano
Matemática -
Português .38 ** -
Ed. Visual .29 * .10 -
** p< 0.01 * p< 0.05
Se considerarmos agora as notas atribuídas nos cinco parâmetros por cada grupo
de professores face ao 7º ano de escolaridade, encontramos mais uma vez índices de
correlação estatisticamente significativos bastante elevados, oscilando estes entre
.53 e .94 (p<.01) (cf. quadros 76 a 78).
Quadro 76: Coeficientes de correlação entre as avaliaçãões de criatividade efectuadas pelos professores
de Matemática nos diferentes parâmetros – 7º ano
Quadro 77: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Português nos diferentes parâmetros – 7º ano
271
Quadro 78: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Ed. Visual nos diferentes parâmetros – 7º ano
Por último, observamos a apreciação que os professores fazem dos seus alunos
quando estes frequentam o 9º ano de escolaridade, analisando a concordância dos três
grupos de professores em relação a cada um dos parâmetros em avaliação (cf. quadros
79 a 83).
Quadro 79: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Fluência – 9º ano
Matemática -
Português .53** -
Ed. Visual .55** .48** -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 80: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Originalidade – 9º ano
Matemática -
Português .42** -
Ed. Visual .36** .50** -
** p< 0.01 * p< 0.05
272
Quadro 81: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Flexibilidade – 9º ano
Matemática -
Português .49** -
Ed. Visual .58** .68** -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 82: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuada pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Elaboração – 9º ano
Matemática -
Português .51** -
Ed. Visual .57** .59** -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 83: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Associações Remotas – 9º ano
Matemática -
Português .48 ** -
Ed. Visual .39** .59** -
** p< 0.01 * p< 0.05
273
Complementarmente, procedêmos à análise das correlações entre os vários
parâmetros em cada área disciplinar (cf. quadros 84 a 86). Verificamos, mais uma vez,
em cada grupo de professores, correlações muito elevadas entre os diferentes
parâmetros, oscilando os valores entre .72 e .92 (p<.01).
Quadro 84: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática nos diferentes parâmetros – 9º ano
Quadro 85: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Português nos diferentes parâmetros – 9º ano
Quadro 86: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Ed. Visual nos diferentes parâmetros – 9º ano
274
avaliação que cada grupo de professores atribuiu por parâmetro, em comparação com os
restantes colegas de diferentes áreas disciplinares, constatamos que o acordo oscila entre
valores de correlações estatisticamente significativos de .26 e .49 (p<.01), quando se
fala do género masculino (cf. quadros 87 a 91), e entre .23 (p<.05) e .50 (p<.01) nas
raparigas.
Quadro 87: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Fluência – por género
Matemática -
Português .42** .34** -
Ed. Visual .41** .50** .33** .15 -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 88: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Originalidade – por género
Matemática -
Português .26** .30** -
Ed. Visual .28** .34** .18 .01 -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 89: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Flexibilidade – por género
Matemática -
Português .40** .47** -
Ed. Visual .49** .46** .33** .23* -
** p< 0.01 * p< 0.05
275
Quadro 90: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Elaboração – por género
Matemática -
Português .43** .35** -
Ed. Visual .34** .42** .31** .27** -
** p< 0.01 * p< 0.05
Quadro 91: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática, Português e Ed. Visual no parâmetro Associações Remotas – por género
Matemática -
Português .26 ** .31 ** -
Ed. Visual .36** .28** .26** .16 -
** p< 0.01 * p< 0.05
276
Quadro 92: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Matemática nos diferentes parâmetros – por género
Quadro 93: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Português nos diferentes parâmetros – por género
Quadro 94: Coeficientes de correlação entre as avaliações de criatividade efectuadas pelos professores de
Ed. Visual nos diferentes parâmetros – por género
277
coeficientes de .71 e .87 (p<.01) no género masculino e entre .74 e .91 (p<.01) no
género feminino.
Vamos agora tomar todos os resultados obtidos a nível da percepção de
criatividade pelos três grupos de professores face aos seus alunos, entre o 5º e o 9º anos
de escolaridade e de ambos os géneros, numa análise sintética dos mesmos e tentando
também problematizá-los em função da literatura e dos questionamentos que eles nos
levantem. Assim, as avaliações feitas pelos diferentes grupos de professores traduzem
alguma concordância, visto que nas análises realizadas (tomando a amostra global, os
anos de escolaridade e o género) existem correlações estatisticamente significativas em
todos os parâmetros. Contudo, os valores encontrados não são elevados, mostrando que
a concordância traduzida não é forte e que a avaliação da criatividade dos alunos
estudados depende da área de leccionação dos seus professores. Isto parece coerente
com os trabalhos feitos sobre percepções de criatividade por parte dos professores, isto
é, se por um lado há conceitos e associações entre conceitos que reúnem grande
consenso dos professores em geral, por outro há influências particulares nestas
percepções a partir do domínio de trabalho do professor (Kaufman & Baer, 2002b;
Kershner & Ledger, 1985).
A constatação do pouco conhecimento por parte dos professores na área da
criatividade em geral e da avaliação desta em particular (Fryer, 1996; Fryer & Collings,
1991; Morais & Azevedo, no prelo), pode também ser uma explicação para os valores
não elevados de concordância encontrados. Contudo, salientamos que apesar de tal
concordância encontrada não variar com o género dos alunos, o que é análogo a outros
estudos (Sing & Wing-Ling, 1996), ela parece variar com o ano de escolaridade, sendo
esta mais forte quanto mais elevado é o grau de escolaridade analisado. Os professores
dos diferentes grupos disciplinares, nas suas avaliações de criatividade dos alunos,
concordam mais entre si no final do 3º Ciclo, podendo eventualmente ser razão para
este dado o maior conhecimento que têm dos seus alunos.
Curiosamente, surge também o desacordo entre os professores de Português e de
Ed. Visual, em vários parâmetros, em todas as análises feitas, excepto no que diz
respeito ao 9º ano de escolaridade. Por um lado, surpreende-nos tal desacordo, já que
talvez estes professores correspondam aos domínios lectivos em que mais tarefas
divergentes (mais explicitamente apelativas de criatividade) estão em causa (face à
Matemática), podendo assim estar mais atentos nas suas apreciações de criatividade dos
alunos (maior atenção essa que já parece ter estado em causa na identificação de
278
diferenças ao longo da escolaridade). Porém, e justamente porque potencialmente
estarão mais sensibilizados para a presença da criatividade dos alunos no seu quotidiano
lectivo, podem ter e aplicar diferentes padrões ou concepções de avaliação de
criatividade, dadas as influências do domínio de lecionação já referidas. Também a
diferença que existe a nível das suas formações académicas, havendo uma ênfase maior
na temática da criatividade no caso dos professores de Ed. Visual (Conde, 2003;
Morais, 2001), poderá eventualmente conduzir a desacordos.
Ainda tomando o acordo dos professores, apesar de não elevado e dependente da
área de leccionação, face à criatividade dos seus alunos, constatamos que os parâmetros
em que tal acordo mais se evidencia, e em todas as análises (apesar de não haver fortes
oscilações nos valores entre todos os parâmetros), são os de Flexibilidade, Fluência e
Elaboração, questionando-nos se tal facto estará relacionado com as concepções de
criatividade dos professores ou se advém de particularidades da própria formulação dos
itens da escala. Destes vários resultados, sublinharíamos, contudo, a dependência da
área de leccionação dos professores na avaliação de criatividade dos alunos. Porém,
sublinharíamos também que somente a comparação destas percepções dos diferentes
professores com a realização criativa dos alunos no TTCT-Figurativo, nos poderá dar
eventuais indicações para a maior ou menor pertinência de tais avaliações diferenciadas.
Por outro lado, a partir das correlações encontradas nos professores do mesmo
domínio disciplinar entre os diferentes parâmetros, verificamos valores muito elevados,
positivos e estatisticamente significativos. Há, então, uma forte concordância por parte
dos professores estudados na avaliação de cada aluno nas diferentes operacionalizações
de criatividade que os parâmetros proporcionam, o que parece indicar uma
indiferenciação conceptual dos parâmetros oferecidos ou a dificuldade em materializar
tais diferenças no momento da avaliação pelos professores. Este resultado parece, mais
uma vez, compreensível no contexto de lacunas e de necessidades que rodeiam as
percepções dos professores, em geral, sobre criatividade (cf. capítulo 2).
Particularmente, podemos pensar nas lacunas associadas à operacionalização do
conceito de criatividade por parte dos professores (Fryer, 1996; Fryer & Collings, 1991;
Morais & Azevedo, no prelo) tendo estes, no caso desta amostra, dificuldade em
distinguir quantidade, raridade e flexibilidade de ideias, assim como o desenvolvimento
elaborado das mesmas e a sua transferência entre diferentes domínios do saber.
279
Autoavaliação de criatividade pelos alunos e a avaliação de criatividade pelos
professores
280
Quadro 95: Coeficientes de correlação entre a Autoavaliação e a avaliação de criatividade pelos
professores de Matemática nos diferentes parâmetros - amostra total
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos Profs.
Total
Matemática
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .05 .19**
Originalidade -.04 .05
Flexibilidade .13 .12
Elaboração .13 .11
A. Remotas .18* .10
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs. Português
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A. Remotas EACA-A
Fluência .23** .36**
Originalidade .21** .35**
Flexibilidade .27** .34**
Elaboração .29** .35**
A. Remotas .33** .41**
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos Profs.
Total
Ed. Visual
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A. Remotas EACA-A
Fluência .03 .18**
Originalidade .01 .07
Flexibilidade .12 .15*
Elaboração .13 .12
A. Remotas .09 .14*
** p< 0.01 * p< 0.05
281
estatisticamente significativas (oscilando os valores entre .24 (p<.05) e .56 (p<.01). Por
outro lado, não se verificam correlações estatisticamente significativas tomando os
professores de Matemática. Quanto aos professores de Ed. Visual, apenas se verifica
uma correlação estatisticamente significativa com a auto-percepção de criatividade dos
alunos e a nível da Originalidade, sendo esta negativa (r= -.241, p<.05) e mostrando
assim que as percepções deste grupo de professores acontecem no sentido oposto à das
percepção dos alunos. Todas as correlações estatisticamente significativas encontradas
manifestam um valor baixo e moderado, oscilando entre .24 (p<.05) e .56 (p<.01).
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs. Matemática
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A. Remotas EACA-A
Fluência .10 .13
Originalidade -.20 -.17
Flexibilidade -.01 -.04
Elaboração .02 -.02
A. Remotas .03 -.03
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs.Português
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .42** .47**
Originalidade .37** .44**
Flexibilidade .24* .39**
Elaboração .35** .45**
A.Remotas .38** .56**
** p< 0.01 * p< 0.05
282
Quadro 100: Coeficientes de correlação entre a Autoavaliação e a avaliação de criatividade pelos
professores de Ed.Visual nos diferentes parâmetros - 5º ano
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs. Ed. Visual
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .03 .04
Originalidade -.24* -14
Flexibilidade -.05 -.09
Elaboração .02 -.14
A. Remotas -.02 .05
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs.Matemática
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência -.03 .25*
Originalidade .10 .16
Flexibilidade .20 .28*
Elaboração .30** .29*
A. Remotas .18 .15
** p< 0.01 * p< 0.05
283
Quadro 102: Coeficientes de correlação entre a Autoavaliação e a avaliação de criatividade pelos
professores de Português nos diferentes parâmetros - 7º ano
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs.Português
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .00 .25*
Originalidade -.02 .22
Flexibilidade .28* .26*
Elaboração .29* .24*
A. Remotas .25* .27*
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos Profs.
Total
Ed. Visual
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência -.07 .25*
Originalidade .18 .20
Flexibilidade .09 .31**
Elaboração .32** .27*
A. Remotas .02 .07
** p< 0.01 * p< 0.05
284
correlações estatisticamente significativas encontradas mostram magnitudes baixas ou
moderadas, oscilando entre .24 (p<.05) e .32 (p<.01).
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs.Matemática
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .10 .13
Originalidade -.02 -.17
Flexibilidade .22 -.04
Elaboração .02 -.02
As. Remotas .36** -.03
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs.Português
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .07 .25*
Originalidade .14 .16
Flexibilidade .31* .28*
Elaboração .22 .29*
A. Remotas .34** .15
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs.Ed.Visual
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .06 .25*
Originalidade .11 .25*
Flexibilidade .33** .18
Elaboração .02 .15
A.Remotas .26* .24
** p< 0.01 * p< 0.05
285
Pelo que podemos constatar, as percepções dos professores de Matemática
apenas se aproximam das auto-percepções dos alunos a nível das Associações Remotas
(r=.20, p<.05) e na relação entre as percepções de Fluência e o Total de Autoavaliação
dos alunos (r=.22, p<.05), tomando o género masculino. Não se identificou qualquer
correlação estatisticamente significativa entre as percepções destes professores e as
auto-percepções de criatividade das raparigas.
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs. Matemática
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .02 .22*
Originalidade -.07 -.02
Flexibilidade .13 -.15
Elaboração .19 .16
A. Remotas .20* -.15
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs.Matemática
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .07 .16
Originalidade -.01 .12
Flexibilidade .13 .09
Elaboração .03 .06
A. Remotas .15 .05
** p< 0.01 * p< 0.05
286
Fluência (r=.22, p<.05), Originalidade (r=.23, p<.05), Flexibilidade (r=.23, p<.05),
Elaboração (r=.24, p<.05) e Associações Remotas (r=.29, p<.01).
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs.Português
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .35** .50**
Originalidade .34** .49**
Flexibilidade .33** .47**
Elaboração .39** .46**
A. Remotas .35** .53**
** p< 0.01 * p< 0.05
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs.Português
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A. Remotas EACA-A
Fluência .14 .22*
Originalidade .20 .23*
Flexibilidade .21* .23*
Elaboração .15 .24*
A. Remotas .31** .29**
** p< 0.01 * p< 0.05
Quanto aos professores de Ed. Visual (cf. quadros 111 e 112), apenas existe
concordância entre a sua avaliação de Fluência e o Total de Autoavaliação de
criatividade (r=.21, p<.05) quando se referem às meninas.
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
A. Total
Profs. Ed.Visual
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração Remotas EACA-A
Fluência .04 .15
Originalidade -.06 .07
Flexibilidade .14 .18
Elaboração .15 .13
A. Remotas .14 .18
** p< 0.01 * p< 0.05
287
Quadro 112: Coeficientes de correlação entre a Autoavaliação e a avaliação de criatividade pelos
professores de Ed. Visual nos diferentes parâmetros - género feminino
Autoavaliação de criatividade
Avaliação dos
Total
Profs. Ed.Visual
Fluência Originalidade Flexibilidade Elaboração A.Remotas EACA-A
Fluência .04 .21*
Originalidade .08 .08
Flexibilidade .10 .14
Elaboração .08 .12
A. Remotas .05 .11
** p< 0.01 * p< 0.05
288
mostrando cada um deles apenas correlações de valor baixo ou com fraca significância
estatística.
289
referimos para justificar uma opção de apresentação de resultados, ao observarmos as
matrizes de correlação, verificamos existir uma regularidade: os parâmetros Abstracção
dos Títulos e Vigor Criativo reúnem um grande número de correlações estatisticamente
significativas, tomando a avaliação dos professores. Observamos ainda que a partir dos
parâmetros de avaliação dos professores, apenas a Fluência é tradutora, para os três
grupos, de correlações estatisticamente significativas com o TTCT-Figurativo.
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs.Matemática Fluência Elaboração Originalidade Titulo Vigor Total TTCT
Fluência .03 .18** .17* .12
Elaboração .13 .07
Originalidade .05 -.01
Flexibilidade .07
A. Remotas .01
** p< 0.01 * p< 0.05
290
Quadro 114: Coeficientes de correlações entre os resultados no TTCT-Figurativo e a avaliação de
criatividade pelos professores de Português - amostra total
TTCT - Figurativo
Avaliação dos
Profs.Português Fluência Elaboração Originalidade Titulo Vigor Total TTCT
Fluência -.06 .20** .19** .08
Elaboração .09 .22** .15* .03
Originalidade -.07 .20** .16* .05
Flexibilidade .20** .17* .05
A. Remotas .15* -.01
** p< 0.01 * p< 0.05
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Ed. Visual Fluência Elaboração Originalidade Titulo Vigor Total TTCT
Fluência .12 .20** .21** .16*
Elaboração .02 .22** .18** .13
Originalidade .04 .16* .15* .16*
Flexibilidade .17* .19** .14
A. Remotas .19** .2.2** .18**
** p< 0.01 * p< 0.05
291
Quadro 116: Coeficientes de correlação entre os resultados no TTCT-Figurativo e a avaliação de
criatividade pelos professores de Matemática - 5º ano
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Matemática Fluência Elaboração Originalidade Total TTCT
Fluência .02 .02
Elaboração .01 -.01
Originalidade .02 -.04
Flexibilidade -.06
A. Remotas -.11
** p< 0.01 * p< 0.05
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Português Fluência Elaboração Originalidade Titulo Total TTCT
Fluência -.27* -.13
Elaboração .10 -.14
Originalidade -.11 .24* -.09
Flexibilidade .24* -.15
A. Remotas -.19
** p< 0.01 * p< 0.05
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Português Fluência Elaboração Originalidade Total TTCT
Fluência .24* .13
Elaboração .14
Originalidade .06
Flexibilidade .12
A. Remotas .01
** p< 0.01 * p< 0.05
292
baixa significância. Além disso, considerando a equivalência de parâmetros, apenas a
Elaboração reúne concordância e somente no caso dos professores de Matemática
(r=.31, p<.01). Tomando os parâmetros do TTCT-Figurativo, são os de Abstracção dos
Títulos e de Vigor Criativo aqueles que apresentam maior número de correlações
estatisticamente significativas com a percepção dos professores, à semelhança do que
acontecia na amostra global. Porém, não se verificam correlações estatisticamente
significativas tomando a Abstracção dos Títulos nos professores de Ed. Visual e
tomando o Vigor Criativo nestes mesmos professores e nos de Português.
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs.Matemática Fluência Elaboração Originalidade Titulo Vigor Total TTCT
Fluência .01 .26* .23* .30** .30* .26*
Elaboração .31** .35** .34** .26*
Originalidade .12 .03
Flexibilidade .27* .30** .22
A. Remotas .26* .25* .18
** p< 0.01 * p< 0.05
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Português Fluência Elaboração Originalidade Titulo Total TTCT
Fluência -.05 .24* .14
Elaboração .16 .29* .10
Originalidade -.14 .27* .08
Flexibilidade .24* .18
A. Remotas .26* .13
** p< 0.01 * p< 0.05
293
Quadro 121: Coeficientes de correlações entre os resultados no TTCT-Figurativo e a avaliação de
criatividade pelos professores de Ed. Visual - 7º ano
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Ed. Visual Fluência Elaboração Originalidade Total TTCT
Fluência -.12 .07
Elaboração -.00 -.00
Originalidade .03 -.01
Flexibilidade .03
A.Remotas .18
** p< 0.01 * p< 0.05
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Matemática Fluência Elaboração Originalidade Total TTCT
Fluência .07 .09
Elaboração .00 -.04
Originalidade -.06 -.06
Flexibilidade -.03
A. Remotas -.06
** p< 0.01 * p< 0.05
294
Quadro 123: Coeficiente de correlações entre os resultados no TTCT-Figurativo e a avaliação de
criatividade pelos professores de Português - 9º ano
TTCT -Figurativo
Avaliação dos
Profs. Português Fluência Elaboração Originalidade Total TTCT
Fluência .10 .18
Elaboração -.03 .07
Originalidade .04 .14
Flexibilidade .05
A. Remotas .06
** p< 0.01 * p< 0.05
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Fluência Elaboração Originalidade Vigor Total TTCT
Profs. Ed. Visual
Fluência .22 .33** .26*
Elaboração -.07 .35** .20
Originalidade .02 .26* .24
Flexibilidade .35** .27
A. Remotas .40** .30*
** p< 0.01 * p< 0.05
295
A nível de parâmetros avaliados, mais uma vez se realçam a Abstracção dos Títulos e o
Vigor Criativo, por parte do TTCT-Figurativo (apesar de nem sempre expressarem
correlações estatisticamente significativas), obtendo vários parâmetros da avaliação
pelos professores correlações estatisticamente significativas, mas variando muito estas
com o grupo de professores em causa e o género dos alunos. É a Fluência, porém, o
parâmetro da avaliação feita pelos professores que reúne um maior número de
correlações com significância estatística nesta análise.
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Matemática Fluência Elaboração Originalidade Total TTCT
Fluência .02 .06
Elaboração .12 .04
Originalidade .01 -.06
Flexibilidade .01
A. Remotas .52
** p< 0.01 * p< 0.05
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs.Matemática Fluência Elaboração Originalidade Titulo Vigor Total TCT
Fluência .05 .32** .28** .20*
Elaboração .14 .11
Originalidade .07 .05
Flexibilidade .13
A. Remotas .08
** p< 0.01 * p< 0.05
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Português Fluência Elaboração Originalidade Titulo Vigor Total TCT
Fluência -.10 .20* .01
Elaboração .10 .22* -.06
Originalidade -.16 .23* -.03
Flexibilidade -.08
A. Remotas -.05
** p< 0.01 * p< 0.05
296
Quadro 128: Coeficiente de correlações entre os resultados no TTCT-Figurativo e a avaliação de
criatividade pelos professores de Português - género feminino
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Português Fluência Elaboração Originalidade Titulo Total TTCT
Fluência -.01 .21* .14
Elaboração .08 .13
Originalidade .07 .14
Flexibilidade .21* .17
A. Remotas .03
** p< 0.01 * p< 0.05
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Ed. Visual Fluência Elaboração Originalidade Titulo Total TTCT
Fluência .04 .20* .09
Elaboração .08 .24* .10
Originalidade -.04 .13
Flexibilidade .09
A. Remotas .10
** p< 0.01 * p< 0.05
TTCT-Figurativo
Avaliação dos
Profs. Ed. Visual Fluência Elaboração Originalidade Vigor Total TTCT
Fluência .22* .27** .24*
Elaboração -.03 .17
Originalidade .18 .19
Flexibilidade .20* .20*
A. Remotas .31** .27**
** p< 0.01 * p< 0.05
297
mais usado para avaliá-la (Cramond, Morgan, Torrance & Zuo, 1999). Tal observação,
contudo, parece compreensível se tivermos em conta as limitações apontadas na
literatura face ao relacionamento estudado. Por um lado, recordamos a divergência de
resultados entre diferentes fontes de avaliação da criatividade (Hocevar & Bachelor,
1989; Olea Diaz, 1993); por outro, as dificuldades que rodeiam as representações sobre
a concepção da criatividade pelos professores reflectir-se-ão na sua avaliação (Kaufman
& Baer, 2002a); finalmente, também há estudos confirmando valores de correlação
baixos entre entre a percepção de professores e a realização de alunos no TTCT-
Figurativo, oscilando estes entre .20 e .35 (Torrance, 1967b).
298
Matemática. Contudo, os professores de Matemática salientam-se na concordância das
suas percepções face à criatividade dos alunos no 7º ano, surgindo aqui o grupo de
professores de Ed. Visual como tendo percepções mais distanciadas da realização
criativa dos alunos. No 9º ano, nem os professores de Português nem os de Matemática
se aproximam, nas suas percepções, da realização criativa avaliada.
299
Em síntese
300
. Os professores de Português são os que emitem opiniões mais próximas das
dos alunos acerca da criatividade destes na amostra global, no 5º ano e em
função do género.
. São os professores de Ed. Visual que mais próximos estão nas suas percepções
da realização criativa dos alunos, na amostra global e, particularmente, no 9º ano
de escolaridade e face às raparigas.
301
SÍNTESE DO ESTUDO EMPIRICO
302
diferentes de leccionação, cada um destes grupos demonstrou uma forte equivalência
nas suas avaliações relativamente aos diferentes parâmetros, acontecendo esta
indiferenciação de avaliação face à criatividade dos seus alunos a nível da amostra
global, diferentes anos de escolaridade e para ambos os géneros.
Tomando ainda as percepções dos alunos face à dos professores, a relação entre
ambos é, mais uma vez, fraca verificando-se nela variações com o ano de escolaridade e
com o género dos alunos, assim como com a área de leccionação dos professores.
303
Salientamos uma regularidade, neste último caso, a qual corresponde a uma maior
proximidade das percepções dos professores de Português face às auto-percepções dos
alunos em geral.
304
CONCLUSÃO
Finalmente, faremos algumas reflexões sobre o que foi realizado neste trabalho,
pretendendo pois que as conclusões sejam um momento de síntese e de articulação entre
informações, assim como de interpretação e de questionamento sobre as mesmas.
Para dar resposta a tais questões, caminhámos de uma visão mais global até um
nível mais específico, o do contexto escolar, face ao conceito de criatividade, começando
este trabalho com uma análise de tal constructo. Esse primeiro momento corresponde
então à fundamentação teórica da tese, envolvendo esta dois pilares essenciais ao
entendimento que procurávamos: o conceito de criatividade e a sua avaliação.
305
revelando-se insuficientes as suas definições, não em quantidade, mas sim em unicidade
(Aleinikov, Kackmeister & Koening, 2000). Fizemos, por isso, uma abordagem
multifacetada de criatividade, indo desde as perspectivas organizadas em torno de uma
dimensão – pessoa, processo, produto e ambiente – até às que procuram
conceptualizá-la em função da confluência e da interacção de mais do que uma destas
dimensões (Amabile, 1983a; Csikszentmihalyi, 1998; Lubart & Guignard, 2004;
Simonton, 2004; Sternberg & Lubart, 1996; Urban, 1994). Continuámos, ainda no
mesmo capítulo, observando o constructo de criatividade numa retrospectiva das principais
teorias e modelos explicativos, tendo-se clarificado o seu carácter plural e evolutivo, assim
como as dificuldades de conciliação entre teorias. Ficámos, então, e mais uma vez, com a
perspectiva de que criatividade tem inúmeros e complexos componentes, onde a
interligação é uma necessidade para o seu entendimento (Adams, 2006; Aleinikov,
Kackmeister & Koening, 2000; Aleinikov, 2002; Cramond, 2001; Csikszentmihalyi, 1988b).
306
assim como a impossibilidade de isolar as variáveis nela envolvidas. Porém, surgiu
também o reconhecimento inequívoco de que a escola, e a sala de aula em particular,
são contextos privilegiados para o entendimento e para a promoção da criatividade e,
assim, para o progresso e bem-estar, social e individual, dos alunos (Feldhusen &
Treffinger, 1975; Runco, 2004; Tan, 2001).
307
Vieira, 2004), assim como consolidámos a consciência de que elas surgem como
pertinentes para a ponderação e planificação de posteriores intervenções (Eschenbach &
Noland, 1981; Tan, 2001) tendo em conta que as expectativas conduzidas pelas
representações, por parte dos professores, podem ser decisivas na realização dos
educandos (Morris, 1998; Rosenthal, 1991). Assim, evidenciou-se a relevância de
auscultar representações nos professores acerca da criatividade para poder perceber
necessidades específicas, às quais se poderá responder, desmistificando ou reforçando
crenças (Chan & Chan, 1999; Fryer, 1996; Fryer & Collings, 1991; Mack, 1987; Runco
& Johnson, 2002). As representações dos professores acerca de criatividade são, pois,
também por nós assumidas como um dos aspectos “especialmente críticos para o
desenvolvimento de competências criativas” dos alunos (Runco, Johnson & Baer, 1993,
p. 92) e, consequentemente, a ser estudado visando a rentabilização da identificação e
consequente promoção da criatividade nestes por parte dos professores.
308
Por seu lado, face às preocupações a nível da identificação de diferenças na
criatividade dos alunos ao longo do percurso escolar e quanto ao relacionamento das
informações obtidas por três fontes de avaliação de tal criatividade, os resultados
pareceram, na sua globalidade, confirmar e desenvolver conclusões de anteriores
investigações. Estes resultados são então agora sistematizados em função de dois tipos
de personagens do contexto educativo abordados neste trabalho – professores e alunos –
explanando-se, para cada um deles, os vários cruzamentos de informação feitos.
Começando pelos professores, verificou-se que estes discriminam diferenças no
desempenho criativo dos alunos ao longo da escolaridade analisada, estando estas
dependentes da sua área de leccionação, o que é coerente com a literatura (Kaufman &
Baer, 2002b; Kershner & Ledger, 1985). Assim, foram os professores de Português e os
de Educação Visual que apareceram como mais atentos às diferenças – em função do
género, do ano de escolaridade ou da interacção destas variáveis – no desempenho
criativo dos alunos, por contraposição ao grupo dos professores de Matemática. Talvez
tais resultados possam estar relacionados com o facto de as actividades lectivas
quotidianas, habitualmente desenvolvidas por estes dois grupos de professores, serem
mais facilmente ligadas à manifestação de pensamento divergente e de expressão
pessoal do que as decorrentes nas aulas de Matemática. Por outro lado, e no caso
específico dos professores de Educação Visual, a sua formação académica mais
intencionalmente voltada para a criatividade (Conde, 2003; Morais, 2001) pode fazer
com que sejam mais aptos a realizar uma discriminação nas percepções pedidas.
309
Além da área de leccionação, as discriminações realizadas pelos professores
acerca da criatividade dos seus alunos, tal como as correlações encontradas entre as
diferentes fontes de informação, mostraram depender dos parâmetros em avaliação.
Assim, a Elaboração, a Flexibilidade e as Associações Remotas surgiram como os
parâmetros nos quais os professores conseguem estabelecer uma maior diferenciação
dos alunos, tendo sido contudo a Fluência, a Flexibilidade e a Elaboração aqueles que
reúnem maior acordo entre eles, podendo-se perspectivar como possíveis tradutores de
representações comuns de criatividade por parte dos diferentes grupos de professores.
Porém, o parâmetro da avaliação feita pelos professores que obteve um maior número
de correlações estatisticamente significativas (apesar de serem de baixa magnitude) com
a realização criativa dos alunos, e a partir dos três grupos de docentes, foi a
Fluência – parece ser este então o parâmetro tradutor da concepção mais próxima de
criatividade por parte dos professores face aos alunos. Note-se, contudo, que os
parâmetros do TTCT-Figurativo que se salientaram relativamente à correspondência
com a avaliação dos professores, em qualquer das análises, são o Vigor Criativo e a
Abstracção dos Títulos, sendo tal facto possivelmente explicável pela própria natureza
dos parâmetros: o primeiro apela à conjugação de exigências criativas verbais e
figurativas e o segundo traduz um conjunto de tendências ou forças criativas,
condensando assim muita informação acerca do potencial criativo do aluno (Torrance,
Ball & Safter, 1992). Verificou-se ainda que as percepções dos professores se
aproximaram mais dos resultados do TTCT–Figurativo quando este é tomado em
função de parâmetros específicos do que a partir de uma classificação total.
310
Tomando o percurso escolar, os diferentes grupos de professores
percepcionaram uma melhoria dos alunos ao longo dos anos de escolaridade, o que foi
ao encontro da sua própria realização criativa, traduzida na diferenciação obtida em dois
parâmetros do TTCT-Figurativo. Assim, os alunos do 9º ano desempenharam melhor do
que os seus colegas do 5º ano a nível da Abstracção dos Títulos, o que é congruente
com os resultados específicos para este parâmetro nos estudos de Torrance e Safter
(1999) e que se podem entender, nomeadamente, pela provável maior capacidade de
abstracção advinda do desenvolvimento do pensamento formal nessa faixa etária
(Piaget, 1952). Também em relação ao Vigor Criativo, e sendo este índice um
agrupamento com vários indicadores emocionais, parece-nos compreensível que os
alunos do 9º ano tenham demonstrado maior realização do que os pré-adolescentes
do 5º ano, já que a experiência e maturidade emocional se foram tornando mais ricas
com o desenvolvimento implicado, nomeadamente a nível pessoal, interpessoal e da
identidade (Erikson, 1980; Kohlberg, 1984; Marcia, 1980; Selman, 1980).
311
é igualmente coerente, por um lado, com investigações onde os professores não distinguem
as competências criativas (Stoycheva, 1996) e, por outro, com as lacunas identificadas nas
representações dos professores acerca da criatividade em geral e da avaliação desta em
particular (Fryer, 1996; Fryer & Collings, 1991; Morais & Azevedo, no prelo).
312
torne mais claro para os alunos nesta faixa etária. O aumento de Fluência ao longo da
escolaridade corresponde, por seu lado, parcialmente, aos estudos de Torrance
(Torrance, Ball & Safter, 1992; Torrance & Safter, 1999), verificando-se neles um
aumento do 5º para o 7º ano, mas não havendo oscilações do 7º para o 9º ano.
Quanto à relação entre o que os alunos pensam e o que eles realizam a nível de
criatividade (no TTCT-Figurativo), esta é fraca havendo nela oscilações pontuais face a
parâmetros avaliados e a magnitudes, em função do ano de escolaridade e do género,
destacando-se, nesta última variável, o facto de que as raparigas se percepcionam de
forma mais aproximada do que realizam criativamente, em comparação com os rapazes.
Pensando ainda em opções pragmáticas de avaliação, se tomarmos as auto-percepções de
criatividade pelos alunos, a Elaboração salientou-se se quisermos uma correspondência
por parâmetro face ao TTCT-Figurativo; por outro lado, foi sublinhada uma nota global
(sobretudo) ou a Originalidade se quisermos a correspondência das autoavaliações de
alunos face a uma avaliação de realização criativa nesse teste (operacionalizada num
conjunto de forças criativas, o Vigor Criativo, e numa classificação total,
respectivamente). Inversamente, se o objectivo for destacar um parâmetro do
TTCT-Figurativo para se relacionar com uma autoavaliação genérica de criatividade
pelos alunos, então surge novamente o Vigor Criativo.
Por último, tomando agora as percepções dos alunos face às dos professores, a
relação entre ambas é, mais uma vez, fraca, verificando-se nela variações com o ano de
escolaridade e com o género dos alunos, assim como com a área de leccionação dos
professores. Salienta-se uma regularidade neste último caso, a qual corresponde a uma
maior proximidade das percepções dos professores de Português face às
auto-percepções dos alunos em geral. Parece, assim, globalmente, predominar a
ausência de uma linguagem comum, conduzindo esta eventualmente a um ruído
comunicacional entre estes dois personagens educativos – percebem de forma
relativamente distante uma característica que pressupostamente devia ser apelada no
313
desenvolvimento quotidiano dos alunos. Por seu lado, face ao género, o destaque na
conciliação entre percepções de professores e de alunos continua a manifestar-se para os
professores de Português. São estes os únicos que mostram concordância razoável em
relação à opinião expressa particularmente pelos rapazes, havendo correlações positivas
e estatisticamente significativas moderadas entre todos os parâmetros e entre os totais de
autoavaliação e tais parâmetros. Novamente, parece-nos de salientar o afastamento dos
principais actores do contexto escolar aqui estudados em relação à temática criatividade:
professores e alunos não têm o mesmo entendimento em relação à expressão de
criatividade destes últimos e, por outro lado, os próprios alunos não se conhecem a esse
nível. E, se assim é, novamente surgem necessidades de intervenção ao nível da
formação, agora reportando-nos aos alunos.
314
acordos fortes sobre parâmetros diferentes e acordos fracos sobre os mesmos
parâmetros, assim como aproximação ao que os alunos realizam, estando
consequentemente em causa um potencial mais rico de oportunidades de promoção da
criatividade. Neste espaço de formação necessário também seria importante, a partir dos
nossos resultados, não só reforçar as características associadas ao aluno criativo, tais
como a capacidade de iniciativa, a perseverança, o compromisso com a tarefa ou a
curiosidade, mas sobretudo consciencializar os docentes para os processos e os
contornos dos produtos criativos em causa nesses alunos, como nos diz Fleith (2000).
Outro contributo deste trabalho, poderá passar pelo entendimento das percepções
dos alunos face à sua criatividade. Não só estes pensam, em termos genéricos,
diferentemente dos seus professores, como não se aproximam do que realmente
realizam. Parece então necessário potenciar uma maior consciencialização do conceito
junto dos alunos e dar-lhes recursos para um melhor auto-conhecimento face a essa
competência fundamental para o seu bem-estar enquanto alunos e enquanto cidadãos em
formação. Também na resposta a esta necessidade, os professores podem ter um papel
essencial e, mais uma vez, a sua formação face à criatividade deverá ser investida para
que tal objectivo seja possível.
315
Por último, os resultados aqui obtidos poderão fornecer pistas para o campo da
investigação, tomando particularmente os dados relativos aos instrumentos utilizados na
avaliação da criatividade. Assim surge o alerta para as limitações do recurso às
autoavaliações de criatividade pelos alunos para a validação de instrumentos avaliadores
do potencial criativo: o discurso dos alunos acerca da sua criatividade parece
demasiadamente distante da prática criativa para tal exercício. Contudo, um instrumento
a nível das auto-percepções dos alunos foi criado e estudado neste trabalho, podendo
actualmente ser útil sobretudo para a análise das representações em causa. No futuro, se
o cenário do investimento acerca das representações de criatividade nos alunos mudar,
tal instrumento poderá ser rentabilizado como avaliador da criatividade dos mesmos e
nele deverá ser essencialmente tomada uma classificação global.
No que diz respeito à avaliação das percepções de criatividade pelos professores,
a situação é semelhante à anteriormente comentada face aos alunos. Também o
reconhecimento de criatividade por parte dos docentes nos seus alunos se distancia do
potencial demonstrado por estes, alertando-se de novo, para a limitação que pode
constituir usar tais representações para avaliar criatividade e sendo esta limitação maior
ainda se não se tiver em conta a área de leccionação. Também um instrumento de
análise de representações para professores está criado neste sentido; mais uma vez se
terá de esperar para que as representações avaliadas possam corresponder à realização
criativa – sendo utilizado nesse sentido, apenas a Fluência poderá ser tomado como
indicador.
Também a realização criativa dos alunos no TTCT-Figurativo, no âmbito deste
estudo, pode sugerir investimentos de promoção em variados parâmetros, nos quais não
se observou desenvolvimento ao longo da escolaridade. Por seu lado, sublinhamos
particularidades revelados acerca do TTCT-Figurativo na amostra analisada, tendo em
vista rentabilizar o seu uso futuro na população portuguesa. Assim, a sua análise por
parâmetros e o recurso àqueles ainda pouco utilizados entre nós (Vigor Criativo,
Abstracção dos Títulos, Resistência ao Fechamento) parecem ser recomendáveis.
Relativamente a este instrumento, recorde-se ainda que o desafio lançado passa
sobretudo pela sua validação para a faixa etária estudada, a nível nacional, nas provas
figurativa e verbal. Para tal, poder-se-á avançar com a cotação e análise das provas já
recolhidas pela autora deste trabalho de investigação. Entretanto, a lista de categorias de
Originalidade ficou já criada e poderá servir novos trabalhos.
316
Um percurso de estudo motivado por preocupações acerca da criatividade em
contexto escolar foi terminado. A partir dos seus resultados, interrogações,
potencialidades e lacunas, esperamos sobretudo o nascimento de curiosidades e de
percursos futuros.
317
318
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384
ANEXOS
385
Anexo 1
Escala de Avaliação de Criatividade nos Alunos – Autoavaliação
Escala de Avaliação de Criatividade nos Alunos
Este inquérito não é uma avaliação. Ninguém que te conhece vai saber as respostas
que deste. É apenas para nós podermos estudar como é que as pessoas da tua
idade pensam a “criatividade”, ou seja, como resolvem ou produzem situações de
forma diferente, original. É também para pensares um pouco no teu próprio nível
de Criatividade. Responde com sinceridade e com a maior exactidão possível.
1. ESCOLA:....……………………………………………………………………………………
2. Ano de escolaridade: 5º □ 7º □ 9º□
3. Turma: ………. Número: ……………..
4. Nome:……………………………………………………………………………………………
5. Sexo: Feminino □ Masculino □
12345
7.2 As ideias que apresento são originais, isto é, fora do comum
12345
7.3 Quando uma solução não resolve um problema, consigo ver esse
problema de forma diferente, isto é, consigo apresentar novas soluções
12345
7.4 Quando surgem várias ideias, as minhas são as que apresentam mais
informação detalhada
12345
7.5 Tenho ideias a partir de conhecimentos que aprendi em situações
diferentes (exemplos: em diferentes disciplinas; na escola e na família)
12345
N.º e Nome Quando é As ideias que Quando uma Quando surgem Tem ideias a partir
necessário resolver apresenta são solução não resolve várias ideias, as de conhecimentos
um problema, originais, isto é, um problema, dele são as que que aprendeu em
apresenta muitas fora do comum consegue ver esse apresentam mais situações
ideias problema de forma informação diferentes
diferente, isto é, detalhada (exemplos: em
apresenta novas diferentes disciplinas;
na escola e na família)
soluções
1 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
2 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
3 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
4 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
6 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
7 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
8 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
9 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
10 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
11 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
12 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
13 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
14 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
15 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
Escala de Avaliação de Criatividade nos Alunos por Professores ( EACA-P) Código Identificação: __________ - _________
N.º e Nome Quando é As ideias que Quando uma Quando surgem Tem ideias a partir
necessário resolver apresenta são solução não resolve várias ideias, as de conhecimentos
um problema, originais, isto é, um problema, dele são as que que aprendeu em
apresenta muitas fora do comum consegue ver esse apresentam mais situações
ideias problema de forma informação diferentes
diferente, isto é, detalhada
apresenta novas
(CONTINUAÇÃO) soluções
16 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
17 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
18 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
19 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
20 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
21 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
22 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
23 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
24 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
25 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
26 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
27 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
28 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
29 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
30 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
Professor da disciplina de _____________________ da turma ____ º_____ da escola ______________________
Agradecemos a sua colaboração
Estímulo 2
Arvore (tronco)
Flor (caule)
Estímulo 3
Estrada
Estímulo 4
Bigode
Caracol
Onda (de água)
Estímulo 5
Barco (casco)
Boca
Estímulo 6
Flor (pétalas)
Estímulo 7
Carro (rodas/chaci)
Chave
Estímulo 8
Figura humana não identificada
Figura humana (feminina)
Figura humana (estilizada)
Estímulo 9
Letra M
Montanhas
Estímulo 10
Camisola
Pato (todo o animal)
Pinheiro de Natal
Rosto humano (perfil)
ACTIVIDADE 3 - Linhas
Ampulheta
Armário (1D; com gavetas e portas; excepto guarda-vestidos)
Arvore (tronco)
Bandeira
Boneco e monstro (rosto)
Borracha
Caixa (1 dimensão)
Caixa presente
Calças
Cama
Camisola (T-shirt; sem golas)
Caneca (e chávena sem pires)
Carteira/mala (não mala de viagem)
Casa
Chaminé
Copo
Envelope
Embalagem e pacote (1 dimensão)
Escadas
Estojo
Estrada
Figura Humana (duas)
Figura humana (rosto)
Figuras geométricas (quadrado e rectângulo)
Flores (caules)
Foguetão
Folha de papel (com letras ou linhas)
Futebol (campo)
Garrafa
Grades (sem edifício)
Janela
Jogo do galo
Lápis
Letra H
Letra M
Linhas geométricas
Livro
Mesa
Mochila
Porta
Prédio
Quadro de escola
Quadro decorativo
Sinal e placas de transito
Sólidos geométricos (cilindro, cubos e paralelepípedos)
Telemóvel/ telefone (portátil)
Televisão
Vela
Anexo 4
Análise de variância Autoavaliação dos alunos, em função do género e do ano de
escolaridade (Resíduos e Valor Total)
Fonte de variação Parâmetro Soma dos gl Média dos
de EACA-A quadrados quadrados
158,476 204 ,777
Fluência
Originalidade 213,137 204 1,045
Resíduos Flexibilidade 207,384 204 1,017
Elaboração 133,032 204 ,652
A. Remotas
192,291 204 ,943
2626,589 210
Fluência
Originalidade 1998,625 210
Total Flexibilidade 2358,950 210
Elaboração 1793,332 210
A. Remotas
3169,232 210
1702,687 210
Fluência
Originalidade
1525,335 210
R. Fechamento
36630,000 210
16720,000 210
Vigor Criativo