Sei sulla pagina 1di 8

A BALADA DE NAN GOLDIN

Resenha Por Nathalia Ronfini Rafael Pereira do Rego

Pornográfico x erótico/ impróprio x necessário

Pouco mais de um mês antes da exposição de Nan Goldin, a fundação Oi Futuro


decidiu cancelar a exibição dos trabalhos por considerar impróprias para o seu público
algumas das imagens de “The Ballad of Sexual Dependency”. A curadora Ligia
Canongia, que trabalhou durante dois anos para trazer o trabalho de Nan ao Brasil
considerou esse um ato de censura e um grande desrespeito ao trabalho da artista.
A polêmica ficou por conta principalmente da discussão sobre o que é
pornográfico e o que é erótico. O Oi Futuro, por seu lado, considerou o trabalho
pornográfico, e a curadora, com o apoio da classe artística nacional considera erótico,
portanto apropriado para exposição pública, desde que as imagens mais fortes venham
com indicação anterior da adequação por faixa etária e sobre o conteúdo com cenas de
nudez, sexo, violência e drogas, como aconteceu em várias partes do mundo.
Entre o Oi futuro e Lígia Canongia não houve conciliação. Entretanto, o curador
do Museu de Arte Contemporânea (MAM), Luiz Camillo Osorio, conseguiu, de última
hora, abrigar a exposição no museu. Agora, o público carioca, entre 11 de fevereiro e 8
de abril de 2012, vai poder avaliar por si mesmo se os trabalhos são próprios ou não para
exposição.
O trabalho a seguir faz uma análise de algumas das imagens mais polêmicas de
“The Ballad of Sexual Dependency” e pode ajudar a quem ainda não conhece o trabalho
de Nan Goldin decidir se vale ir a exposição, se esses trabalhos poderão ser bem digeridos
ou não – a segunda opção talvez seja um indicador mais forte de que a visita terá serventia.
Afinal, só aquilo que nos incomoda de alguma forma é que nos traz reflexões e epifanias.

Pensando na “balada”
Elemento bastante presente em “The Ballad of Sexual Dependency” é a marca
física da violência nos corpos apaixonados das imagens. Numa delas, chegamos a ver
uma ode ao amor, mostrando como o limiar entre prazer e dor é muito tênue. O embate
entre a autonomia e a dependência que permeia as relações amorosas é retratado com
crueza e visceralidade. Em várias fotografias da série, a violência, o sexo, o prazer, o
amor, a dor estão intimamente ligados- contrapondo-se à típica idealização romântica
expressa na mídia e na arte clássica.
É interessante perceber essa relação entre amor e dor- e melhor, entre arte e dor-
que pode parecer estranha à primeira vista, já que a arte classicamente era vista como
campo da fruição do belo. Como afirma Lebrun hoje, “a arte, por princípio, não é mais
uma forma de cultura que nos convoca à contemplação e ao recolhimento” (LEBRUN,
G. A; p.21). Nan Goldin nos mostra uma postura que hoje é muito importante para arte
contemporânea: lugar do incômodo, do reestabelecimento dos limites, de cruzamento de
fronteiras, local de abalo das idéias que mantêm a coesão social. O seu trabalho se situa
na “marginalidade”- e não nos referimos apenas às figuras do undergroundnova-iorquino
retratadas em suas imagens, mas a sua própria arte e postura política. Tudo que é colocado
para “periferia”, para as “margens” da sociedade, tudo que é posto de lado, para baixo,
em nossa sociedade voltada para outras questões, pode ressurgir e “aparecer”, se
manifestar com liberdade- e, quando isso acontece, ao mesmo tempo, as margens voltam-
se contra a esse recalque da vida cotidiana. Esse pensamento nos lembra A ordem do
discurso de Foucault quando ele reflete que “em toda a sociedade a produção do discurso
é simultaneamente controlada, selecionada, organizada e redistribuída por um certo
número de processos que têm por papel exorcizar-lhe os poderes e os perigos, refrear-lhe
o acontecimento aleatório, esquivar-lhe a pesada, temível materialidade.”(FOUCAULT,
Michel) Esse tipo de trabalho artístico então faz ressurgir aquilo que foi posto em zonas
de penumbra nos discursos cotidianos – e acaba sendo um manifesto contra o senso
comum da vida moderna.
A questão da “representação” é teoricamente muito discutida em termos de
fotografia. Pensando nisso, o que vemos no trabalho da Nan Goldin talvez seja não mais
uma “re-presentação”, mas sim uma “apresentação” da dor, do amor, do prazer e assim
da ironia (romântica) corrosiva e auto-reflexiva.
No intuito de registrar seu mundo de maneira tão crua, Nan também se torna objeto
de seu próprio trabalho artístico e mostra momentos íntimos de sua vida, como quando
foi espancada por seu namorado e ficou com o rosto cheio de hematomas. Em uma
entrevista (http://www.danielblaufuks.com/webmac/EXPRESSO.pdf) Nan Goldin conta
como, ao olhar para imagem, se lembrou do que sentiu naquele momento e a memória
dessa sensação passada misturou-se com o sentimento de revolta. Goldin utiliza a
fotografia para inscrever a vida, para que a sua imagem (da vida) seja mais do que uma
marca, uma cicatriz. Através da fotografia, ela abre a privacidade da vida e revela
situações “proibidas”: ressignifica os tabus.

Outro momento de exposição de intimidade foi quando abriu ao público o


momento após uma relação sexual sua (ao menos é o que indica o cigarro que está sendo
fumado pelo seu parceiro, sentado na cama). E no seu olhar, podemos ver claro o embate
entre o amor e a dor presente em todo seu trabalho, e toda fragilidade e solidão presentes
nas relações retratadas.
Questões formais como iluminação, granulação e qualidade do foco são deixadas
de lado em detrimento da liberdade de captar o momento e toda a sua força no momento
da erupção, e a aparente “sujeira” torna-se um recurso expressivo que dá força ao trabalho
e cria uma identidade visual para as fotografias de Nan. De forma alguma isso exclui a
beleza e poesia das imagens.

Mesmo nas polêmicas fotografias que mostram nudez ou um ato sexual, o apelo não é
pornográfico, e sim erótico e político. A idéia é mostrar cenas cotidianas (pouco
retratadas, porém muito comuns) que são escondidas das lentes ou que quando que são
mostradas, perdem a dimensão através do achatamento de significados que a camada de
pornografia traz. Sobre a polêmica do cancelamento da exposição de Nan Goldin, que
aconteceria no Oi Futurto, a curadora Ligia Canongia elucidou: “Está havendo um grande
equívoco na leitura da obra de arte e da dimensão poética das imagens da Nan, que jamais
podem ser confundidas com pornografia, pedofilia ou outras perversidades dessa ordem.
Isso demonstra um despreparo absurdo no lidar com as questões da arte, o que assusta a
todos os que respeitam e legitimam seu discurso. O trabalho dela discute o amor, o
sofrimento, a universalidade do drama humano, e isso soluções formais que lhe
conferiram uma linguagem inigualável em todo o mundo”.
(http://oglobo.globo.com/cultura/fotos-polemicas-fazem-exposicao-de-nan goldin-
mudar-de-lugar-3342672#ixzz1gTsGOaYq acessado em 12 de dezembro de 2011).

No trabalho de Nan Goldin, as cenas do mundo underground ganham vida e nos


invadem, eliminando as fronteiras entre o público e o privado. Essa invasão pode chocar
o expectador e de fato causar incômodo, um papel que a arte contemporânea parece buscar
para se aproximar do lugar da verdade, o “desvelamento” defendido por Heidegger.
Desvelar significa trazer ao descobrimento: conservar o
desvelado no desvelamento. [...] A verdade é contra o velamento
porque ela essencializa o velamento no desvelado. Esse contra é
nele mesmo uma luta a partir da qual a verdade é, e a partir da
qual ela se inicia. [...] O desvelar é o deixar aparecer no aberto ou
o que já é livre a partir de si. A essência velada do aberto enquanto
o abrir-se inicial é a liberdade. (HEIDEGGER, M. Parmênides.
Retirado de
http://www.ppgf.ufba.br/producao/Arte_no_%20pensamento_de
_%20Heidegger.pdf)

Com o desenvolvimento das artes performáticas, vemos cada vez mais a


importância dos “corpos” como objetos por excelência nos trabalhos contemporâneos.
“Uma arte de corpos” se mostra cada vez mais presente, e é impossível não vincular o
trabalho de Nan Goldin a essa referência da performance. Temos uma modalidade de arte
que funciona como exercício de desconstrução da representação – tanto a representação
ilusionista (como proposto nas vanguardas) quanto às diversas representações dos papéis
atribuídos aos “personagens” de suas fotografias.
A identidade no mundo contemporâneo tornou-se uma vestimenta que pode ser
trocada a qualquer momento, conforme a ocasião, como uma roupa. As identidades são
instáveis dentro de uma modernidade líquida, como afirmaria Baumann(2001) “A
existência é moderna na medida em que contém a alternativa da ordem e do caos.”.
(BAUMAN, Zygmunt). Ou como afirma Stuart Hall:
“O sujeito, previamente vivido como tendo uma identidade unificada e
estável, está se tornando fragmentado; composto não de uma única, mas
devárias identidades, algumas vezes contraditórias e não resolvidas.
Correspondentemente, as identidades, que compunham as paisagens
sociais ‘lá fora’ e que asseguravam nossa conformidade subjetiva com
as‘necessidades’ objetivas da cultura, estão entrando em colapso, como
resultado de mudanças estruturais e institucionais. O próprio processo
de identificação, através do qual nos projetamos em nossas identidades
culturais, tornou-se mais provisório, variável e problemático.” (HALL,
p. 2)

E, nessas fotografias, vemos como ela “apresenta” uma arte que nasce dessa
cultura- mas sem legitimá-la e sim expondo o trauma e a dor dessa situação posta na pós-
modernidade. Pode-se criticar o trabalho da Nan Goldin justamente pela exposição desse
viés destrutivo da sociedade, por glamourizar o submundo e as drogas, como se fosse
colocada uma pura mise-em-scene neo-romatica nas fotografias. Mas a própria Nan
Goldin tem conhecimento dessa ideia e, até mesmo, a ironiza. Um trecho de seu livro,
The ballad of sexual dependency, é bem esclarecedor: “The notion of self-destruction as
glamorous became self-indulgent when people around us started dying: that romantic
vision of the self-destructive artist, having to suffer or induce pain in order to work, that
sense that creativity has to come out of euphoric crisis, or out of extreme excess, changed.
With the advent of death in our lives came a real will to survive, and help each other
survive, to show up for each other” (retirado de
http://drmelf.fatcow.com/Essays/nanchap.html em 15 de dezembro de 2011) .
Muitos dos “anti-heróis” colocados em suas imagens foram afetados pelo vírus da
AIDS, e de alguma maneira, a fotografia é usada aqui em sua função mais elementar, a
de registro da memória. Em “The ballad” vemos uma história que demonstra a força dos
laços íntimos que unem os seres humanos para além da morte- e a fotografia cumpre essa
função de permitir que a memória se abra de novo para que o tempo não dilua a verdade.
Sem dúvida, o trabalho de Nan Goldin é autobiográfico- evidenciado não apenas
na foto em que ela aparece com hematomas no rosto após ser agredida pelo namorado. E
esse “documentarismo” explicita ainda mais esse lugar político. Suas fotos revelam o
engajamento da artista no mesmo território que os retratados, evidenciam sua relação com
as pessoas fotografadas- muitas vezes, experiências assentadas na amizade. São amigos,
grupos, espaços e territórios freqüentados pela própria artista. As fotografias que retratam
personagens drag queens, transexuais e travestis estão, por exemplo, menos endereçadas
a uma reflexão sobre questões de gênero e sexualidade do que propriamente a abordar
uma espécie de vivência comum que as marcaria indistintamente: a da paixão, no sentido
latente, visceral.
As histórias retratadas em suas imagens são a história da própria artista. É o seu
diário, que ela compartilha, que deixa as outras pessoas lerem. Nesse sentido, ela rebate
a noção popular que associa o fotógrafo à figura do voyeur. Dois títulos de suas imagens
dizem muito sobre essa perspectiva: “eu serei seu espelho”, “falar de mim é falar de
muitos”.
O trabalho de Nan Goldin, de alguma maneira, também dialoga com a estética do
reality-show, no lugar das imbricações cada vez mais freqüentes entre público e privado,
na atual configuração de um universo de visibilidade em que se desenvolve um tipo de
interesse público pelos dramas da intimidade. Como Bauman (2001) já afirmou em
“Modernidade Líquida”, essas fotografias se inserem na contemporânea redefinição da
esfera pública, em que os dramas privados passam a ser publicamente expostos e
assistidos. Não é mais somente a vida de uma celebridade que interessa ao grande público,
mas também aquela “pessoa comum”- que cada vez mais parece querer compartilhar sua
vida íntima, através dos diversos dispositivos disponíveis no mundo virtual.
Bibliografia
LEBRUN, G. A mutação da obra de arte. In: Arte e Filosofia – Cadernos de Textos n.
04. FUNARTE/INSTITUTO NACIONAL DE ARTES PLÀSTICAS.

FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo, Loyola, 1996.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. 1.ed. Rio de Janeiro: J. Zahar Ed., 2001.

HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. 6.ed. Rio de Janeiro: DP&A,


1998.

Sites
http://www.danielblaufuks.com/webmac/EXPRESSO.pdf

http://oglobo.globo.com/cultura/fotos-polemicas-fazem-exposicao-de-nan goldin-
mudar-de-lugar-3342672#ixzz1gTsGOaYq acessado em 12 de dezembro de 2011

http://www.ppgf.ufba.br/producao/Arte_no_%20pensamento_de_%20Heidegger.pdf

http://drmelf.fatcow.com/Essays/nanchap.html

Potrebbero piacerti anche