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Introdução
Esta pesquisa surgiu a partir de minha experiência etnográfica da 7ª edição dos “Gay
Games”1, em Chicago, Estados Unidos, 2006. O evento aconteceu na cidade americana, entre 15 e
22 de julho daquele ano e contou com cerca de 12.000 atletas participantes, oriundos de 70 países,
distribuídos em 40 modalidades. Além deste montante, havia também entre 1.500 e 2.000
voluntários, que eram da região metropolitana de Chicago, e que deram suporte aos jogos2.
O que me levou a Chicago foi a curiosidade em presenciar como aconteciam tais jogos. A
primeira versão destes jogos foi idealizada por Tom Waddell e ocorreu em São Francisco, 19823. As
demais versões alternaram-se entre Estados Unidos e Canadá e, na transição entre fins dos anos 90 e
a virada do milênio, a Holanda e a Austrália respectivamente em 1998 e 2002 estrearam como
sedes “fora do circuito”, por assim dizer4.
Lá duas dimensões me dividiam constantemente: como atleta participava em uma
olimpíada porque era a competição máxima da organização esportiva gay, principalmente pelo
volume de pessoas e da estrutura observada e, na pele de antropólogo, andava desconfiado e me
permitia “olhar, ouvir e escrever”5, tudo o que encontrava pela frente. E não conseguindo
compreender tais dimensões que se sobrepunham constantemente intrinsecamente, às vezes sem me
dar conta e estar atento, era traído pelo(s) desejo(s). Era seduzido pelo entusiasmo, pelo novo, ou
em uma palavra, pelo “exótico”.
O que de fato importou foi a identificação de traços interessantes do tema/assunto da
presente investigação quando resgatei minhas anotações de acontecimentos, impressões, frases ou
comportamentos e iniciei o processo curioso de análise e reflexão sobre o que tinha visto, ouvido e
coletado de “informantes esporádicos anônimos”, que encontrei durante os dias do evento.
Diante do que fora explicitado, o que se postula é um esforço intelectual de reflexão sobre
a materialização dos corpos e a produção de subjetividades dos gays esportistas, articuladas com as
distintas construções de masculinidades em cena, e a produção simbólica sobre uma suposta
“virilidade” engendrada e reproduzidas pelos agentes sociais, através das práticas esportivas.
Nesta pesquisa discutem-se as relações de gênero e “possíveis” definições de
masculinidades oriundas dessas6 e de suas negociações fluidas e hibridizadas. Como chaves-
2
conspiram pela própria dominação. Como antídoto propõe uma “análise materialista da ordem
simbólica”, isto é, “importar o modo materialista de pensar para a análise do universo simbólico”27.
Chama isso de “revolução simbólica”, e quando aplicada às relações de gênero, poderiam não
apenas subverter a ordem das estruturas materiais, como promover uma “sublevação mental”, ou
transformação das categorias de percepção sobre a ordem social existente. Isto, para ele, provocaria
uma autêntica revolução de gênero.
Atos de cognição não são conscientes, como o próprio autor salienta. E, por sua vez, a
violência simbólica baseia-se na “teoria disposicional da ação”, segundo a qual a ordem masculina
está inscrita nos agentes e nas instituições, nas posições e disposições, nas falas e nos corpos.
Portanto, se o universo dos gays esportistas, quando analisado, participa das correntes de estudos
que dão conta dos “problemas de gênero”, segundo a ótica de Bourdieu, tal universo e tais agentes
sociais reproduziriam, em menor escala, o que está “inscrito” na sociedade em geral (?). Tanto falas
quanto posturas e funcionamentos de instituições seriam meramente reproduzidos, mediante a
ordem masculina instituída e tomada como natural.
Referências Bibliográficas
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7
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WELZER-LANG, Daniel. A construção do masculino: dominação das mulheres e homofobia.
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1
Refiro-me aos “Jogos para Gays”, expressão reconhecida internacional e historicamente como Gay Games. Portanto,
no texto a utilizarei no original, sem tradução.
2
São dados coletados e resumidos dos seguintes jornais: “Windy City Times”, Chicago Free Press, Red Eye (publicação
do Chicago Tribune). Com exceção da edição de fim de semana do “Red Eye”, os outros dois são jornais da
Comunidade de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Transexuais e Travestis (GLBTT) de Chicago.
3
BOSCH & BRAUN, 2005.
4
Pode-se acompanhar o desenvolvimento histórico das versões dos jogos através da leitura de BOSCH, Heike e
BRAUN, Phillip. Let the Games beGay!. Stuttgart: Gatzanis Verlag, 2005, relacionada nas referências bibliográficas.
5
Nas palavras de Cardoso de Oliveira (1996).
6
CONNEL, 1995.
8
7
Foucault, Michel. História da Sexualidade. A vontade de saber I. 8ª edição. Rio de Janeiro: Graal, 1985.
8
BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2003.
9
BUTLER, 2003.
10
FOUCAULT, 1985.
11
BOSCO FILHO, 2006, p. 01.
12
BOECHAT, 1997, p. 19.
13
LEAL, 1990.
14
BOSCO FILHO, 2006, p. 2.
15
Judith Butler utiliza o termo no percurso de seu texto para “designar a grade de inteligibilidade cultural por meio da
qual os corpos, gêneros e desejos são naturalizados. Busquei minha referência na noção de Monique Wittig de ‘contrato
heterossexual’ e, em menor medida, naquela de Adrienne Rich de ‘heterossexualidade compulsória’” (p. 215-216). Esta
explicação está numa nota de rodapé da obra Problemas de Gênero.
16
ENG, 2006.
17
BUTLER, 2003, p. 21
18
SILVA, Elisa e RIAL, Carmen. Masculinidades prescritas, interditas e relativizadas em um grupo de pescadores da
Ilha de Santa Catarina. In: RIAL, Carmen Silvia de Moraes e GODIO, Matias. (orgs). Pesca e Turismo: etnografia da
globalização no litoral do Atlântico Sul. Florianópolis: NUPPE/CFH/UFSC, 2006.
19
Não pretendo, nesta investigação, discutir tipologias atuais do que se concebe por “família”.
20
BOURDIEU, Pierre. A Dominação Masculina. 5ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007.
21
LINS, 1998, p. 9.
22
Idem, ibidem, p. 10.
23
BOURDIEU, 1998.
24
Idem, ibidem, p. 18.
25
É possível elencar algumas delas: Jo Freeman, Julliet Mitchel, Donna Haraway, dentre outras.
26
BOURDIEU, op. cit., p.22
27
Idem, ibidem, p. 23-24.
28
WELZER-LANG, 2001.
29
RIAL, Carmen Silvia. Rugbi e Judô: esporte e masculinidade. In: Pedro, Joana; Grossi, Míriam. (Org.). Masculino,
Feminino, Plural. Florianópolis: Mulheres, 1998. Texto original (sem edição)
30
RIAL, 1988, p. 13
31
WACQUANT, 2004.
32
BOURDIEU, 1998, p. 23-24. [grifos do autor]
33
BUTLER, 2003, p. 25.
34
KNUDSEN, 2007, p. 84.
35
BUTLER, 2003, p. 11.
36
BRAZ, 2006, p. 06.
37
BUTLER, 2003, p. 59.
38
BRAZ, 2006, p. 08.
39
ENG, 2006, p. 59. Para a autora, a definição do que entende por “queering”: “Queering is used as a noun to describe a
process where queer existence in a certain context challenges and effects heteronormative structures and/or acts, speech
and identities, so that the heteronormative context, the culture, the discourses change over time” (p. 52)