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Uma igreja complicada, de Augustus Nicodemus Lopes © 2011 Editora Cultura Crista. Todos os direitos reservados. 1 edicdo 2011 -- 3.000 exemplares Conselho Editorial | Adao Carlos do Nascimento Ageu Cirilo de Magalhies Jr. Cliudio Marra (Presidente) Fabiano de Almeida Oliveira Francisco Solano Portela Neto Heber Carlos de Campos Jr. Jer Corréa Batista Jailto Lima Mauro Fernando Meister Tarcizio José de Freitas Carvalho Valdeci da Silva Santos Revisdo: Edna Guimaraes Claudete Agua Editoragao. Rissato Capa: Magno Paganelli L8641i Lopes, Augustus Nicodemos ‘Uma igreja complicada / Augustus Nicodemos Lopes. _ Sao Paulo: Cultura Crista, 2011. 176 p.: 16x23 cm ISBN 978-85-7622-372-6 1. Igreja 2. Lideranga I. Titulo CDD 278 & €DITORA CULTURA CRISTA R. Miguel Teles Jr., 384 ~ Cambuci - SI 15040-040 — Caixa Postal 15.136 Fone (011) 3207-7099 — Fax (011) 3279-1255 ou ligue gratis 0800-0141963 waww.editoraculturacrista.com.br - cep@cep.org.br Superintendente: Haveraldo Ferreira Vargas Editor: Claudio Anténio Batista Marra DIGITALIZADO POR- Alex Machado EDITADO POR - PASTOR DIGITAL SUMARIO APRESENTACAO 9 INTRODUGAO 11 1, UMA RELACAO COMPLICADA 13 A fundagao da igreja... 13 A primeira carta — a carta perdida 15 A segunda carta — 1Corintios . 16 A segunda visita... 17 A terceira carta — a “carta severa” 18 A quarta carta — 2Corintios.. 19 Conclusio 19 2. PAULO, CEFAS, APOLO E CRISTO 21 Os partidos... A ameaga de ruptura ..... Influéncia da filosofia grega A “sabedoria” dos corintios O culto a personalidade Antagonismo a Paulo Conclusiio ..........-. CORINTO, A IGREJA DE DEUS (1.1-9) A saudagao (1.1-3) Gratidio pela igreja (1 Conclusio ...... ad > APELO A UNIDADE (1.10-17) Parem com as divisdes! (1.10-12) .. Paulo se exime de culpa (1.13-17) Conclusio .... 6 UMA IGREJA COMPLICADA 5. ASABEDORIA DE DEUS E A SABEDORIA HUMANA (1.18-3 2 51 A pregagio da cruz e a sabedoria humana (1.18-25) 52 A vocacao dos corintios (1.26-31)... 59 Conclusio . 61 6. A PREGACAO DE PAULO EM CORINTO (2.1-5) 63 Nao em linguagem ostensiva (2.1-2).. Em demonstracao do poder do Espirito (2.3-5) Conclusao 7.0 MISTERIO DE DEUS (2.6-13)....... O mundo nao conhece o mistério de Deus (2.6-9) O Espirito revela o mistério de Deus (2.10-13) Conclusio .... 8. NATURAL, ESPIRITUAL E CARNAL (2.14-3.4) O homem natural (2.14) O homem espiritual (2.15-16) .. Crentes carnais (3.1-4) Conclusio .... 9. COMO CONSIDERAR OS PREGADORES (3.5-11) A natureza e o sucesso do ministério cristo (3.5-9) Apéstolos ¢ pastores (3.10-11) Conclusées...... 10. 0 FOGO DO JUIZO E A GLORIA DOS HOMENS (3.12-23) .. O Dia do Juizo (3.12-15).... Adverténcia aos que estavam dividindo a igreja (3.16-17) . Nao se gloriem nos homens! (3.18-23) Conclusio ...... 11.0 JULGAMENTO DOS MINISTROS DO EVANGELHO (4.1-5) 127 O que Paulo espera dos corintios (4.1) O que Deus espera dos lideres (4.2) O que Paulo espera de si mesmo (4.3-4) O que os corintios deveriam esperar de Deus (4.5) Conclusio ..... 12. COMO ENFRENTAR A ARROGANCIA (4.6-10) O motivo da pastoral (4.6-7) A lista irénica (4.8-10) Conelusio . SuMARIO 7 13. AS AGRURAS DO MINISTERIO APOSTOLICO (4.11-13) Lixo ¢ escéria do mundo (4.11-13) Tratando das ovelhas (4.14-17) .. Tratando dos bodes (4.18-21) Conclusaio CONSIDERAGOES FINAIS NOTAS ....... APRESENTACAO livro que vocé tem em maos é um comentario muito pratico sobre os primeiros quatro capitulos da primeira carta do apés- tolo Paulo aos corintios. Alguém poderia pensar: por que so- mente sobre quatro capitulos? A resposta é que o assunto desses quatro ca- pitulos é primordialmente 0 apostolado de Paulo e atualmente surgiram va- tios lideres que se autodenominam “apdstolos”, colocando sobre si mesmos a capa de autoridade apostdlica. Coisas semelhantes ocorreram antes na his- tria da igreja, mas quase sempre se descobriu que esses ditos “apdstolos” ensinavam doutrinas nao apostdlicas, e que em muitos assuntos se desvia- vam do fundamento da fiel Palavra de Deus. Quando tive o privilégio de servir como reitor do Semindrio Presbite- riano do Norte, no Recife, PE, os estudantes decoravam anualmente doze “versiculos Obadias”. Nao eram versiculos do livro do profeta Obadias. E que esse nome hebraico significa “servo do Senhor”. E, sendo o seminario uma escola onde se procura preparar bons servos do Senhor, nossos estu- dantes tinham como dever decorar no inicio de cada semestre esses versiculos que podiam ser de grande utilidade para o seu ministério. Esses versiculos visavam 4 formagao do cardter cristo dos servos do Senhor. Assim, por exemplo, 0 salmo 69.6, um dos versiculos Obadias, Ihes ensinava a orar: “Nao sejam envergonhados por minha causa os que esperam em ti, 6 SENHOR, Deus dos Exércitos”. E uma oragdo num salmo messianico (cf. vs. 9 ¢ 21!). E se o grande SERVO DO SENHOR precisou orar assim, quanto mais os seus servozinhos! Ao escrever este prefacio, lembrei-me desses doze “versiculos Obadias”, porque trés deles se encontram nesses capitulos iniciais de 1Corintios. Uma das tarefas principais dos mensageiros da paz é que entreguem a mensagem do seu Mestre fielmente. Por isso decoravamos 1Corintios 4.2, que “... cada um deles seja encontrado fiel”. No grego, 0 vocabulo “fiel” é pistds. Esse foi o bonito nome que nossos filhos colocaram em um belo cachorro que tinhamos, Pistds! Afinal, nao é 0 cachorro considerado 0 amigo mais fiel do homem? E qual é 0 maior elogio que Deus faz aos seus servos sendo “‘... servo fiel” (Mt 24.45-46; Hb 3.5)? Por isso, os pregadores devem explicar e aplicar fielmente a Palavra de Deus e nao “inventar coisas” com base nesse fundamento. Seria contra a ordem explicita do apdstolo, no mesmo capitulo, em que ele diz: “Nao ultrapasseis o que esta escrito” (1Co 4.6, outro “versiculo Obadias”). 10 UMA IGREJA COMPLICADA Mas Paulo sabia que, apesar de pregar fielmente, outro perigo poderia sur- gir, a saber, procurar a propria gloria gabando-se da sua eloquéncia. Por isso ele advertiu: “E que tens tu que nao tenhas recebido?” (1Co 4.7, 0 terceiro “versiculo Obadias” nesses capitulos). Pois a vangléria ¢ como balao incha- do e essa repreensao apostélica é como o alfinete que faz explodir a nossa arrogancia e qualquer soberba ministerial. Por isso, a explicagao fiel desses quatro capitulos que vocé tem em suas maos é de grande importancia, sobretudo se vocé for um “V.D.M.”, um Verbi Divini Minister. Essa era a expresso que muitos pastores usaram de- pois da Reforma. Tinham a sabedoria de se lembrar com frequéncia que eram somente “servos”, embora fosse uma grande honra serem “servos da Palavra de Deus”! Minha esposa e eu somos gratos pelo fato de o autor deste livro, um dos nossos genros, ter como desejo maior ser, também em seus livros, um servo fiel do seu Senhor e Salvador Jesus Cristo. Willow Grove, PA, 25/9/2010 Francisco Leonardo Schalkwijk 3Joao 4 INTRODUGAO ste livro é 0 resultado de anos de pregacdo sobre os primeiros quatro capitulos de 1Corintios. Varias razdes me levaram a ex- ‘por essa passagem com frequéncia, especialmente quando era convidado para falar a pastores e lideres das mais diversas denominacées. Uma das razées, e talvez a mais importante, é que nesses capitulos 0 apdstolo Paulo trata de algumas questées relacionadas as igrejas locais que sao particu- larmente relevantes para 0 momento que estamos vivendo no evangelicalismo brasileiro, a saber, divis6es nas igrejas ¢ o ministério pastoral. Percebi que tratar desses assuntos por meio da exposigao das palavras de Paulo sempre foi muito util para pastores e lideres evangélicos em varias partes do Brasil. Em todo lugar, os pastores que querem seguir um modelo biblico de ministério esto enfrentando questionamentos dos membros de suas igrejas, que tomaram como padrao e referencial de pastorado bem- sucedido aquele dos bispos, missionarios e apdstolos que dominam a midia evangélica hoje. Diariamente ocorrem divisdes nas igrejas e a formacao de novas co- munidades e denominagées inteiras, divisdes essas causadas pelos préprios lideres em busca de espago, pader, prestigio e dinheiro.' Muitas novas co- munidades de crentes sio formadas em busca de alimento espiritual e de lideranga biblica. Nao é a esses que aqui me refiro. Assistimos assombrados ao surgimento e crescimento em menos de duas décadas dos ministérios apostélicos e a verdadeiros impérios religio- sos de homens que reivindicam e exigem de seus seguidores absoluta fideli- dade e compromisso financeiro. E, o que é 0 mais estarrecedor, usando para isso 0 nome de Cristo e um evangelho deturpado, que nao é um evangelho, mas uma mensagem de escraviddo ¢ cegueira, que vem tirar nao somente a fé, mas o dinheiro dos incautos. Quando Paulo escreveu esses capitulos, a igreja de Corinto estava pres- tes arachar-se em quatro grupos por causa da concep¢ao errada que os crentes daquela cidade desenvolveram quanto ao ministério cristao. Para eles, os mi- nistros de Cristo deveriam ser pessoas influentes, cultas, que fossem mestres de retorica e versados na sabedoria deste mundo, nobres e respeitaveis. Pelos critérios deles, Paulo era um apéstolo inferior, talvez até indigno de ser considerado apéstolo, comparado, por exemplo, a Apolo e Pedro Com paciéncia pastoral e profundidade teoldgica, Paulo expde a natureza do evangelho de Cristo e da pregagio crista, a natureza do ministério cristio 12 UMA IGREJA COMPLICADA e faz um profundo apelo a unidade da igreja. Ao defender o proprio ministé- tio, ele nos dé uma das melhores exposigdes do que significa realmente ser um despenseiro dos mistérios de Deus. Este livro é uma tentativa de dar maior alcance 4 mensagem de Paulo a respeito dos temas contidos na sua primeira carta aos corintios. Espero que a receptividade desta obra seja tio boa quanto a receptividade das prega- gdes que the deram origem. E com oracioe expectativa que cometi essas pregacGes a escrita. Quem sabe, pela providéncia e misericérdia de Deus, esta obra sera util aos leito- res que desejam conhecer as causas ¢ os remédios biblicos para a crise de lideranga que se instalou em nosso meio evangélico. Augustus Nicodemus Lopes Sao Paulo, setembro de 2010 1 UMA RELACAO COMPLICADA igreja de Corinto foi provavelmente uma das mais dificeis entre as igrejas com as quais 0 apéstolo Paulo manteve um relacio- namento. Essa é a impresséo que temos da sua correspondéncia aos crentes dessa cidade e do relato do livro de Atos. Nas duas cartas escritas por ele, e que foram preservadas, percebemos, especialmente na segunda, uma tensdo crescente entre 0 fundador ¢ pai espiritual da comunidade e os seus membros. Ao que parece, a causa maior da tensao foi a crescente rejei- g&o por parte dos corintios da autoridade de Paulo como apéstolo, causada pela influéncia corrosiva de mestres judaizantes e pelo espirito faccioso de- corrente da formagao de partidos na igreja relacionados com outros lideres (ver o capitulo seguinte) Os judaizantes costumavam entrar nas igrejas plantadas por Paulo en- tre os gentios e minar a autoridade dele, diminuindo-o por nao ser um dos. Doze apéstolos originais. Além disso, acusavam-no de pregar um evange- Iho diferente daquele de Pedro e Tiago e de incitar os judeus convertidos a abandonar os costumes instituidos por Moisés para serem observados pelos judeus, como a circuncisao, a dieta religiosa e as datas do calendario judeu. Observamos tracos nas duas cartas de Paulo aos corintios do resultado dessa campanha maliciosa contra 0 apdstolo. As frequentes defesas que Paulo faz de seu ministério, inclusive nessas duas cartas, séo prova disso. Contudo, o apéstolo nao desistiu da igreja rebelde, carnal e herética. Suas cartas esto cheias de exortages amorosas, orientagdes ¢ conselhos de um lider espiritual que nao se deixou abater e desanimar pela incompreensao ¢ rebelido de seus filhos na fé. A FUNDACAO DA IGREJA Conforme lemos no livro de Atos dos Apéstolos, Paulo chegou a Corinto apés uma passagem com pouco sucesso por Atenas (At 18.1; cf. 17.32-34). O apéstolo ja tinha passado por Filipos e Tessal6nica, pregando a Palavra e fundando igrejas. Agora, apés Atenas, chegava a Corinto, uma cidade co- nhecida pela imoralidade e vida libertina, além da profusao de religides e escolas de filosofia. O préprio nome da cidade estava relacionado com a ideia de imorali- dade, 0 que era bem adequado. Conforme uma antiga referéncia feita pelo 14 UMA IGREJA COMPLICADA gedgrafo Strabo, no ano 20 d.C., no templo da deusa A frodite, localizado no topo do monte chamado Acro-Corinto, havia mais de mil sacerdotisas que eram também prostitutas.? Sendo uma cidade portuaria, Corinto era um caldeirao de ragas e lin- guas. Ela ficava estrategicamente localizada na rota maritima entre Roma e a Asia e distante somente 80 quilémetros de Atenas, Além disso, era a capi- tal da provincia romana senatorial da Acaia. Por tudo isso, a cidade era a sede dos Jogos istmicos, que rivalizavam com os Jogos Olimpicos realiza- dos em Atenas. Jronicamente, a cidade sé perdia para Atenas em amor 4 filosofia. Havia uma grande comunidade de judeus em Corinto. Isso nao era de se estranhar. Eles estavam em todo lugar do Império Romano onde houves- se oportunidade para o comércio. E Corinto era uma das principais cidades comerciais da Grécia, Assim, foi entre os judeus que Paulo comegou a pre- gacao da Palavra na cidade, conforme era seu costume (cf. At 9.20; 13.5; 13.14; 14.1; 17.1; ete.). A porta que Deus lhe abriu foi o encontro com Aquila, um judeu que tinha escapado do decreto de expulsdo do imperador Claudio em Roma (At 18.2).3 Tanto ele quanto Paulo faziam tendas, uma profisséo comum entre os judeus naqueles dias.* Paulo foi morar e trabalhar com ele e sua esposa, Priscila (At 18.3). Foi por intermédio de Aquila, provavelmente, que Paulo teve acesso a sinagoga de Corinto, onde pregou durante alguns sdbados (At 18.4).° Com a chegada de uma oferta da Maced6nia, trazida por Silas e Timoteo (cf. 1Ts 3.6; 2Co 11.9; Fp 4.15), Paulo péde parar de fazer tendas e se dedicar mais intensamente & pregagio, provavelmente durante os dias da semana (At 18.5). A intensificacado do ministério de Paulo, com o provavel aumento de conversées de judeus a Cristo, provocou uma reagao violenta dos lideres da sinagoga, como geralmente acontecia onde Paulo pregava, obrigando-o a ir pregar aos gentios (At 18.6). A porta que se lhe abriu foi por intermédio de um grego temente a Deus que havia se convertido naquelas semanas. Seu nome era Ticio Justo € sua casa ficava ao lado da sinagoga, a qual serviu de local de reunides, onde Paulo passou a pregar (At 18.7). Deus abengoou a prega¢ao de Paulo, e muitos judeus e corintios se converteram a Cristo e foram batizados, entre eles o proprio chefe da sinagoga, chamado Crispo (At 18.8).’ Entre os con- vertidos havia impuros, idélatras, adulteros, efeminados, sodomitas, ladrées, avarentos, bébados, maldizentes e roubadores — a propria escoria de uma sociedade corrompida como Corinto (6.9-11). UMA RELAGAO COMPLICADA 15 E curioso que o livro de Atos nao narra qualquer milagre realizado por Paulo ali. Sabemos por 2Corintios que eles aconteceram. Paulo escreveu aos que questionavam sua autoridade apostélica em Corinto que “... as credenciais do apostolado foram apresentadas no meio de vés [...] por sinais, prodigios e poderes miraculosos” (2Co 12,12; ver Rm 15.19; Hb 2.4). Todavia, o surgimento de uma igreja numa cidade como Corinto foi o maior de todos os milagres, e € um monumento ao poder do evangelho e a graga de Deus. Encorajado pelo proprio Senhor em uma visdo a noite, Paulo conti- nuou a ministrar ali por mais um ano e meio (At 18.9-11). As conversdes devem ter sido numerosas, a ponto de enfurecer ainda mais os judeus, que um ano ¢ meio apés a primeira revolta contra Paulo, tentaram amotinar o povo contra ele e os cristéos de Corinto diante das autoridades da cidade e representantes de Roma (At 18.12-17). Apesar da violéncia, Paulo ainda permaneceu muito tempo em Corinto ~alguns acham que seu ministério ali durou trés anos no total, até finalmen- te deixar a cidade rumo a Efeso, para la pregar. A PRIMEIRA CARTA — A CARTA PERDIDA, Algum tempo depois de ter deixado a cidade, Paulo escreveu uma pri- meira carta aos corintios, mencionada em 5.9: “Jé em carta vos escrevi que no vos associasseis com os impuros”. Essa carta foi escrita antes da que conhecemos como 1Corintios, em data e local desconhecidos. O uso do ar- tigo definido (no grego, a frase é “na carta”) e a falta de maiores explicagdes deixam claro que os corintios sabiam a que carta Paulo se referia. O resumo que Paulo nos da dessa carta em 5.9 sugere que ela tratava, pelo menos em parte, dos problemas relativos 4 comunhao dos crentes com os sexualmente impuros (imorais). Essa seria certamente uma questao crucial para os crentes corintios, devido 4 natureza da sociedade em que viviam. Paulo havia sido mal-entendido pelos corintios nessa primeira carta, pois concluiram que o apéstolo queria a separacdo apenas dos imorais deste mundo, ¢ nao dos imorais que estavam dentro da igreja passando-se por cristios. Paulo, entdo, ao escrever a carta seguinte (que nés conhecemos como 1Corintios) explica melhor 0 que ele queria dizer (5.9-11). No entanto, onde esta a que é realmente a primeira carta de Paulo aos corintios? Diante do fato de que nao possuimos uma cépia sequer da mes- ma, a conclusdo légica € que ela se perdeu e nao foi preservada pelos cris- tdos apostdlicos. Nao sabemos 0s motivos disso. Existe outra hipétese, defendida por alguns estudiosos, de que um pedaco dela foi preservado e posteriormente interpolado em 2Corintios como 6.14~7.1 no processo de colecionamento ¢ transmisséo do Corpus Paulinus. Os principais argumentos em favor dessa hipétese sao estes: 16 UMA IGRFJA COMPLICADA (1) 2Corintios 6.14-7.1 quebra a linha de argumento da passagem; (2) intro- duz abruptamente um assunto novo; (3) 2Corintios 6.13 continua normal- mente em 7.2; (4) 0 conteudo se assemelha a “carta perdida”. Todavia, nao ha qualquer evidéncia textual para a hipotese mencionada. Em todos os manuscritos existentes de 2Corintios no texto de 6.14~-7.1, o suposto fragmento da carta perdida est4 presente. Nao ha nenhuma versio conhecida de 2Corintios que tenha circulado sem essa parte, 0 que toma a hipotese da interpolacdo improvavel. Além disso, essa parte se encaixa per- feitamente no contexto, pois Paulo esta exortando os corintios a nao ter comunhio alguma com os falsos mesires que estavam se infiltrando na co- munidade. E por ultimo, a carta perdida tratava dos imorais, enquanto aqui em 2Corintios Paulo trata dos incrédulos (cf. 2Co 6.14). Portanto, o mais provavel é que a primeira carta tenha realmente se per- dido. A carta que conhecemos como Primeira aos Corintios ¢, em realidade, a segunda que ele havia escrito. O que nos interessa no momento é perceber que desde cedo a igreja de Corinto se mostrou problematica, obrigando o apéstolo a escrever sobre questées relacionadas 4 imoralidade sexual. AseGuNDa Carta — 1CorinTI0s Ao que parece, a primeira carta (perdida) enviada por Paulo nao surtiu 0 efeito desejado pelo apdstolo. Algum tempo apés, ele recebeu informa- ges sobre a situacio critica da igreja pelos membros da casa de uma senho- ra crista chamada Cloe (1.11), ¢ por uma comissao de irmaos vindos da igreja de Corinto com uma oferta e uma carta contendo perguntas (16.17). Essa carta mandada pelos corintios tornou-se outra fonte de informa- gGes de Paulo sobre a situacdio da igreja deles. Bla parece ter sido preparada pela comunidade sobre questées praticas. Paulo se refere claramente a essa carta em 7.1, “Quanto ao que me escrevestes”, uma formula que ele repete, de maneira abreviada, em 7.25; 8.1; 12.1; 16.1 € 16.12. Podemos concluir que nesses pontos ele esta respondendo as perguntas enviadas pelos corintios. Essa carta havia sido possivelmente trazida pela mesma delegagaio que ele menciona em 16.17, composta de Estéfanas, Fortunato e Acaico, e que tal- vez tivesse trazido para Efeso uma oferta dos corintios para 0 apéstolo.* Por essas fontes de informagao (pode ter havido outras), Paulo tomou conhecimento do estado espiritual da igreja que ele fundara havia poucos anos — e ndo era um quadro agradavel. A igreja estava dividida em pelo menos quatro grupos ou partidos, criados em torno dos lideres que tinham influenciado a histéria recente da igreja, e da propria pessoa de Cristo (1.12). Havia frouxid&o por parte da igreja na hora de lidar com os problemas de imoralidade, 0 mesmo proble- ma que ja ocasionara o envio da primeira carta perdida (5.1-2,9). UMA RELAGAO COMPLICADA 17 Um irmio estava processando outro diante dos tribunais seculares ¢ trazendo escAndalo para o evangelho (6.1). Alguns deles ainda praticavam a prostitui¢do cultual no templo de Afrodite (6.15). Havia discussdo na igreja quanto ao que seria mais espiritual, ficar solteiro ou casar, bem como dividas quanto a possibilidade de separagao dos cénjuges crentes e descrentes (7.1,10,13). Dois grupos surgiram em toro da discussao sobre comer carne sacrificada aos idolos, os fracos e os fortes, gerando debate e mais uma divisao dentro da igreja (8.4). Todos esses problemas acabavam se refletin- do no culto. As mulheres nado queriam mais usar o véu no culto, quando oravam ou profetizavam, como simbolo de que estavam debaixo de autori- dade, como era o costume em todas as igrejas (11.5,10,16). Um grupo de “espirituais” (12.1) monopolizava os cultos, falando em linguas ao mesmo tempo, sem interpretagao; outros, profetizavam sem que houvesse qualquer critério ou juizo da parte da igreja, causando confusdo nos ouvintes (14.27-31).° E para piorar tudo, havia um grupo da igreja que negava a ressurrei¢io dos mortos (15.12). Nao podendo regressar a Corinto naquele momento para tratar desses problemas pessoalmente, como certamente teria preferido, Paulo entio es- creveu uma segunda carta, que ficou conhecida como a Primeira Carta aos Corintios. Aceita-se, em geral, que Paulo escreveu 1Corintios no fim de seus trés anos de residéncia em Efeso (cf. 16.5-9; At 19.10; 20.31). Uma data provavel, aceita pelos estudiosos, em geral, ¢ 55 d.C.'" Paulo escreveu 1Corintios para restaurar a unidade da igreja, respon- der as questdes praticas, ¢ corrigir as varias irregularidades em termos de pensamento e conduta. Seu tom é pastoral, mas se percebe nas entrelinhas a preocupagao e tristeza que enchia seu coragao. Talvez a carta tenha sido levada a igreja pela mesma comitiva que de ld viera visita-lo (16.17). Ecom a carta, foram também as oragdes do apéstolo para que sua amada igreja aceitasse sua palavra apostdlica ¢ endireitasse seus caminhos. A SEGUNDA VISITA Na carta, ele menciona seus planos de visita-los em breve para tratar um foco de resisténcia hostil a seu ministério (4.18-20), instrui-los mais acerca da Ceia do Senhor (11.34), recolher e enviar da parte deles uma ofer- ta para os crentes pobres da Judeia (16.1-3), passar um tempo com eles e depois ser enviado por eles para os campos missionarios (16.6). Entretanto, 1Corintios nao surtiu todo 0 efeito esperado pelo apdstolo ea situagdo na igreja se deteriorou ainda mais. Paulo retornou a Corinto, num esforgo pessoal para remediar a situagdo (At 20.1-3). La, foi recebido com hostilidade pela igreja ou por um grupo dela, que queria provas de que 18 UMA IGREJA COMPLICADA ele era realmente um apéstolo de Cristo. Posteriormente, ele se referiu a essa segunda visita como tendo sido uma visita triste ou dolorosa (Cf. 2Co 2.1-3,5; 12.14; 13.1-4). A TERCEIRA CARTA —A “CARTA SEVERA” Depois de sair da cidade, em seguida ao fracasso da segunda visita, Paulo escreveu a terceira carta, de local ¢ data desconhecidos, denominada pelos estudiosos como a “carta severa”. Paulo faz mengao dela em 2Corintios (of. 2Co 2.4,9; 7.8-12). Paulo a escreveu com profunda tristeza no coracao e lagrimas nos olhos. Aparentemente, ela continha uma severa repreensdo de Paulo aos membros da igreja e produziu neles profunda tristeza, a ponto de o apéstolo quase arrepender-se de té-la escrito (2Co 2.4,9; 7.8-12). Essa carta possivelmente teve o propésito de consertar o que Paulo achara irregular na igreja em sua segunda visita, e que nao havia conseguido resolver a tempo. A carta con- tristou os corintios pelo tom severo com que Paulo escreveu, mas acabou por produzir arrependimento entre eles (2Co 7.8-10). Onde estaria essa carta hoje? Existem trés hipdteses principais sobre sua preservagao. Primeira, que boa parte da carta foi preservada e interpolada por um escriba em 2Corintios como sendo os capitulos 10-13. O principal argumento é que o tom dspero e severo desses capitulos difere radicalmente dos nove capitulos iniciais. Em 2Corintios 1-9, Paulo é positivo e encorajador. Em 2Corintios 10-13 (que seria a “carta severa” ou uma parte dela), ele muda o tom bruscamente, e passa a ameagar e a repre- ender severamente seus leitores. Contudo, a mudanga de tom em 2Corintios 10-13 tem recebido di- versas explicagées plausiveis por estudiosos comprometidos com a inte- gridade literaria da epistola. Entre elas, destacamos as seguintes; (1) Paulo muda de tom simplesmente porque muda de assunto. Nesses capitulos finais, Paulo repreende a receptividade que uma parte da igreja ainda estava dando aos falsos mestres, que tentaram minar a sua influéncia na comunidade, atacando sua autoridade apostdlica. (2) Ou ainda, ele teria escrito os capitulos 1-9 assim que recebeu boas noticias da parte de Tito quanto a igreja e os capitulos 10-13 foram escritos depois, quando ele se informou mais exatamente da situagao da igreja, que nao era tao boa quanto parecera no principio. (3) A sugestao de que Paulo teria mudado de tom ao escrever esses capitulos finais apds ter recebido noticias de Ultima hora sobre um grupo ainda resistente na igreja, também nio é de todo improvavel. Outra hipétese é que essa “carta severa” é, na realidade, |Corintios. Argumenta-se que dificilmente uma carta escrita por Paulo teria sido deixada

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