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R38 Te ve ae Me CLAS a. DEDALUS - Acervo - FEA COE 20800036658 José Marcio Rego (org.) RETORICA NA ECONOMIA Pérsio Arida Mark Julian R. Gs ulani Antonio M. Silveira Bento Prado Jr. Preficio de Bento Prado Jr. NA IPASTAN®.: 7 | : editorall34 TYAS (1972), “The End of Laisse2-Faice”. Essays in Persuasion, Collected Writings of fobn Maynard Keynes, London, MacMillan. Vol. 9. KLUBACK, W. e BECKER, M. (1975), “The Significance of Chaim Perelman’s Philosophy of Rhetoric”. Revue Internationale de Philosophie, pp. 127-8. LAKATOS, I (1970). “Falsfication and the Methodology of Scientific Research Programmes”, In: LAKATOS, ,e MUSGRAVE, A. Criticiem and the Growth of Knowledge, Cam= bridge, Cambridge University Press MACHLLP, F. (1978). Methodology of Economic and other Social Sciences. New York, Aca demic Press. -MARGET, A.W. (1938). The Theory of Prices, New York, Kelley (1960). 2 vol. MARX, K. (1978). Capital. London, Penguin, Vol. 2. MeCLOSKEY, D.N. 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Berkeley, © University of California Press. Vol I. ae Pérsio Arida A RETORICA DA ECONOMIA* D.N. McCloskey Traduca de Maria Socorro Silva L IntRopucAO. Se “traduzissemos” a maior parte do que dizem os economistas, quan- do conversam, soaria bastante plausivel aos poetas, jornalistas, homens de negécios e outras pessoas respeitdveis que nao se dedicam a economia, As. sim como em qualquer conversa¢io— por exemplo, entre projetistas de barcos caficcionados de beisebol —, a conversagao em economia é dificil de seguir. quando nao se adquiriu o costume de ouvi-la durante um tempo. No fundo os habitos de conversa¢ao sdo similares. A cconomia utiliea modelos mate. maticos, contrastes estatisticos ¢ argumentos de mercado, que parece es. teanhos mente litera. Nao obstante, ao examinarmos cow eae ioe sao to estranhos, pois podem se considerar figuras ret6ricas: metdforas, analogias ¢ argumentos de autoridade. : As figuras retoricas nao sao meros adornos: pensam por nds. Conside- Far 0 mercado como uma “mio invisivel”, as organizagbes do trabalho como tuma “fangao de produgao” e seus coeficientes como “significativos”, tal come fazem 08 economistas, é dar a linguagem uma enorme responsabilidade, Pa rece uma boa idéia, pois, examinar com rigor sua linguagem, Descobrir que a conversacao econémica depende em grande medida das formas orais ndo quer dizer que a economia nao seja uma ciéncia, ou s6 uma questéo de opiniao ou algum tipo de jogo confidencial. Os bons poctas, ain. da que no sejam cientistas, si0 sérios pensadores de seus simbolos; os bone historiadores, sérios pensadores de seus dados, Os bons cientistas também fazem uso da linguagem, e mais ainda, empregam a sutileza da linguagem sem ropé-la de forma especial. A linguagem empregada é um objeto social, ¢ utilizar a linguagem € um ato social; necessita-se de habilidade e que se pres. te atengio as pessoas que estao presentes quando se fala, © prestar atensdo a0 proprio piblico se denomina “retérica”, uma pa- lavra que empregarei com assiduidade. Naturalmente, a retdrita € utilieada “Adapado para eta edi pelo aurora pat dos : Or pate do dis primeios cpl de The Rhetoric of Economics (Madison, The University of Wisconsin Press, 1985) " ‘A Retorica da Economnia a7 para avisar da existéncia de incéndio em um teatro ou para provocar a xe- nofobia entre o eleitorado, Este tipo de vociferacio é o significado vulgar da palavra, o mesmo que a “retérica acalorada” do presidente em uma con- feréncia de imprensa, ou a “simples retérica” a que se rebaixam 0350s ini migos. Nao obstante, desde os gregos, a palavra é utilizada em um sentido mais amplo e atrativo para referir-se ao estudo de todos os meios para con- seguir coisas com a linguagem: incitar a multidao a que linche um acusado, bem como convencer os leitores de um romance de que os personagens estio vvivés, ou fazer com que 0s eruditos aceitem 0 melhor argumento e rechacem opior. A questio é se o crudito — que geralmente se imagina como um anun- ciador de “resultados” ou um expositor de “conclusies” livre de retorica — fala retoricamente. Tenciona convencer? Assim parece. Acabo de dizer que a linguagem nao é um empreendimento solitario, © erudito nao fala no vazio para si mesmo, Fala para uma comunidade de vozes. Deseja que o tenham em conta, que Ihe ougam, que se publique seu trabalho, que lhe imitem, que the rendam homenagem e que lhe concedam o prémio Nobel. Todos estes so seus desejos. Os meios so os recursos da linguagem, A retérica é uma adequacdo dos meios aos desejos da conversagio. A re- t6rica €a economia da linguagem, o estudo de como se adequam meios escas- 808 a0s insaciaveis desejos que as pessoas tém de que as ougam. A vista disso, parece uma hipétese razoavel ade que os economistas si como as demais pessoas a0 conversarem e que desejam que os escutem tanto quando vao 4 biblioteca ou a0 laboratério como quando vao a oficina ou vorar. Meu objetivo é com provar se isto é verdade e se é titi: estudar a retérica da erudigao econdmica, © tema é a erudicao, ndo a economia ou a adequagio da teoria econd- mica como uma descrigio da economia, nem sequer 0 papel do economista na economia, O tema é a conversacao que os economistas mantém entre si com © fim de convencer-se mutuamente. Desgracadamente, no entanto, as conclusdes tém um interesse mais que académico. As conversagdes dos estudiosos dos classicos ou dos astronomos raras vezes influem na vida dos demais. Nao é assim com as dos economistas, ‘que o fazem em grande escala. Uma anedlota muito conhecida descreve o desfile de Primeiro de Maio na Praga Vermelha com a quantidade habitual de solda- dos, projéteis teledirigidos e langa-foguetes. No final da marcha surge um ‘numeroso grupo de pessoas em trajes cinzas, e uma pessoa do piiblico pergun- ta: “Quem sao estes?”. “Ah”, respondem, “esses so economistas, no sabem © dano que podem fazer!” Sao as conversas dos economistas que provocam. este tipo de comentario, an DIN MeClaeker Nio sto somente os economistas de Moscou ou de Washington os que fazem danos. Inclusive fora do alcance dos congressistas e dos burocratas, a ncias, J. M. Keynes assi- nalou este fato em outra observacao citada & exaustio: “As idéias dos eco- nomistas e dos filésofos politicos, canto quando so certas como quando esto equivocadas, tém mais forga do que se cré normalmente. Na realidade, 0 mundo esti governado fundamentalmente por elas [...] Os loucos que detém © poder, que escutam vores no ar, estio destilando sua loucura a partir de alguns ‘escritorzinhos’ académicos de uns poucos anos atrés” © propésito de pensar sobre como conversam os economistas é ajudar a que se amadurega este campo, ¢ nao atacé-lo. Apesar de todas as piadas, desde Sham a L. J. Peter (“Se pusessem em fila todos 0s economistas, nio alcangariam nenhuma conclusio”; “um economista é um perito que saberd maneira como falam os economistas tem conseq amanhi por que as coisas que predisse ontem nao ocorteram hoje”), a eco- nomia tem éxito. Nao tem éxito como uma meteorologia social, um papel que a ret6rica da politica e do jornalismo Ihe impuseram, mas 6 tem, sit, como hist6ria social. A economia, como a geologia, a biologia evolutiva ow mesmo a historia, € uma ciéncia histérica mais do que uma ciéncia premo- nitéria. Ainda que ndo seja considerada geralmente como uma criagio im- pressionante da mente humana, de fato o é. E uma autocompreensio social (uma teoria critica, de fato, como o marxismo ou a psicanlise), mais impor- fante, inclusive, que a antropologia ou a histéria No vo dos foguetes espaciais, o profano pode ver as maravilhas da sica, € no aplauso do piblico as maravilhas da miisica, Ninguém entende bem as maravilhas da economia se nao a tiver estudado com atengao. Este fato deixa sua reputagio nas maos dos politicos e personalidades, que tém outras coisas na cabega. O resultado & criticar-se equivocadamente a economia pot ser demasiadamente matemiética, por nao ser suficientemente “realista”, ot por nao salvar o mundo de sua loucura. Esta desinformacio é uma pena ¢ realmente é interessante tratar de compensé-la. Contudo, nao se pode cul- ar aos observadores da economia alheios a ela de entendé-la mal, pois a economia tampouco se entende demasiadamente bem a si mesma. Se com- reendesse sua propria maneira de conversar — sua ret6rica — talver dei- xassem de existic alguns de seus comportamentos neurdticos, como sta es- Quiva compulsiva das responsabilidades nos procedimentos estatisticos, O servigo que a literatura pode prestar & economia é oferecer a critica literdria como um modelo para seu préprio entendimento. A critica literéria ‘do julga dizendo simplesmente se algo é bom ou maui na sua forma mais recente, este tema mal parece colocar-se. A critica literdria se preocupa prin- cipalmente em fazer com que os leitores vejam como 0s poetas ¢ os roman- cistas conseguem seus resultados. Uma critica econémica como a que se rea- liza em seguida nfo é uma maneira de julgar a economia, mas sim é uma forma de mostrar como ela obtém seus resultados. Aplica os recursos da eritica li- terévia @ literatura da economia. Nao ha muitos economistas que pensem deste modo, ainda que exista uma maior proporsio, embora pequena, de cientistas sociais que o faga. Esta linha de pensamento nao é desconhecida nem na antropologia nem na socio- logia. O que os franceses denominam geralmente “cincias humanias” podem reunir hoje em dia bastante pessgas que pensam de forma critica, neste sen: tido. E numerosos especialistas em matematica, fisica, informatica, biologia, paleontologia, comunicagao, ciéncias politicas, direito, sociologia, antropo- logia, histéria da ciéncia, filosofia, teologia e literatura comparada tém visto ‘qualidades especiais na critica ret6rica. A seguir se examinara, pois, a ret6ri ca da investigagao da economia. IL. A POBREZA.DO MODERNISMO ECONOMICO ‘Os economistas esto de acordo em mais coisas do que normalmente se #8, Sua discordancia sobre a previsio e a politica econdmica Ihes dé uma ma reputagao, e, no entanto, coincidem em muitas coisas: 0 problema dos nt- meros-indices, a lei da demanda, a légica da oferta... Estdo de acordo, sobretu- do, em falar como economistas. Quer descendam de Marx ou de Menger ou de Marshall, entre 0s netos de Adam Smith, todos participam de uma con- versa¢o que comecou ha dois séculos, uma conversagdo claramente separa- ida em seu estilo de conversagdes vizinhas sobre histéria, sociologia ou ética, “A conversagio econdmica tem escutado discursos muito elogiientes, mas suas passagens mais convincentes tém sido matemiticas. Especialmente des- de a década de 1930, os economistas de todas as tendéncias encantam-se com anova maneira cientifica de falar. Atualmente, a maior parte das revistas de economia parecem revistas de matemética aplicada ou de estatistica teérica. Ao contrario, a American Economic Review dos anos 30 contém ape- nas uma equago; os pressupostos nao se formalizam, os gréficos represen- jam séties, mas no eram muito comuns; 0 ajuste de uma reta a uma nuvern de pontos era raro. A conseqiiéncia desta maquinaria primitiva para conver- sar foi uma incapacidade para falar de forma clara. Os economistas nao pu- deram esclarecer, por exemplo, a diferenca entre o movimento de uma curva em seu conjunto e o movimento ao longo dela. Pela caréncia de conhecimen- 50 D.N. MeCloskey tos matematicos, nao puderam falar em metéforas curvilineas. Podiam pen- sar, como fez Harry A. Millis em seu discurso inaugural da reuniao da Ame- rican Economic Association eelebrada em dezembro de 1934, que o proble- ‘ma do trabalho tinha algo que ver com a produtividade marginal (pp. 4-5). Apés lerem o livro de JR. Hicks publicado em 1932, A Teoria dos Salarios, podiam, como havia dito Millis, admirie que a produtividade marginal influta ‘tos salérios. Mas, antes de utilizar a matemdtica, os economistas cafram de cabega, assim como Millis, em;confusdes que se podiam ter resolvido com tum pouco de matematica: confusdes sobre as condigbes teabalhistas ou s0- bre 0 poder de negociagao (no se deram conta de que estava determinado pela produtividade marginal agfegada e pela curva da ofecta de trabalho}. As metéforas mateméticas todavia nao estavam A disposigio da maioria dos economistas. Agora estao disponiveis a. grangl, especialmente para os economistas burgueses de fala inglesa que dominam a profissio (e deles sou um exemplo) Dos 159 artigos regulares publicados na American Economic Review durante 1981, 1982 e 1983, somente seis utilizaram unicamente palaveas e somente quatro acrescentaram as suas palaveas unicamente tabelas estatisticas, 0 tnico recurso formal existente em 1931-1933. As técnicas matematicas c estatfsti- as, 08 graficos e as simulagdes explicitas, que em um tempo os economistas consideraram initeis ¢ arcaicas, se tém feito rotineiras, Dois tergos dos artigos empregavam explicitamente a matematica, ¢ a maior parte dos demais falavam em um entorno saturado de matematica no qual as palavras “fungio de produgao” e “curva de demanda” reportavam de todos os modos & matematica. Quase a metade dos artigos utilizavam gréficos da maneira que os economistas os usam, desconcertando a outros estudiosos da sociedade ao falaf categoricamente de curvas que nao tém for- ‘mas definidas. Cerca de um tergo dos artigos empregavam anilise de regres- So, freqitentemente de modo bastante complexo. Mais de uma décima par- te deles faziam uso de simulacdes explicitas que somente engenheiros superio- res ¢ fisicos podiam ter conseguido ha cinglienta anos atrés. A aflise mate- ‘matica|ilustrada mediante gréficos (e sem fatos, de acordo com o cardter abs- trato dh conversagao econdmica) foi utilizada em 60 dos 159 artigos. Qual- quer déstas técnicas haveria deslumbrado e desalentado um piiblico de eco- nomistas em 1934, No entanto, este éxito, como qualquer outro, teve um precd. Os livros sobre economia técnica ja no sfo acessiveis, nem sequer de forma superficial, ppara of leigos no tema; e os econoinistas jovens superestimam uma pequena, © as veres absurda, engenhosidade da téenica. Mas 0 custo principal nao se A Retétiea da Economia si percebe. Este custo procede de que, a0 converterem-se a um modo matemati- co de falar, os economistas adotaram uma fé propria das cruzadas, um con- junto’de doutrinas filos6ficas que thes torna agora propensos ao fanatismo 3 inplesinia, Esta fs compte docenifismo, do beharorsmo, do ope- racionalismo, da economia positiva ede oustos entusiastas quantificadores da déeada de 1930. A maneira da fé das cruzadas, estas doutrinas se tém conso- lidado num cerimonial c, agora, existem freiras, bispos ¢ catcdrais. ‘Mas agora, tanto tempo depois da vitdria, é preciso perguntar-se se a f& que se achava detrés dela segue tendo uma fungio social. E preciso pergun: tar-se a si metmo se a coriversa estridente sobre a ciéncia em economia, quue ajudou muito a acrescentar clarera ¢ rigor a este campo, tem sobrevivido em sua usilidade. ILI, A METODOLOGIA OFICIAL DA ECONOMIA E MODERNISTA Os economistas tém duas atitudes a respeito de seu discurso, a oficial e a nao oficial, a explicita ea implicita. A maior parte do que tenho a dizer tem aver om a atindes nfo ofa expostes na manera como ot economies argtimentam realmente. Nao obstante, 0s economistas valorizam em muito sua sracedor SON, al is coe as pein do malar peewee 3 t6ria ¢ da filosofia da ciéncia. A atitude oficial dificulta que vejam Ba nella: ‘como argumentam. Nao podem ver como o fazem porque o cendrio est cea por eerasilosofias, Portant, devo atar temo de que forma bas. tanite extensa — de como eles descrevem oficialmente o que fazer. Suas regras oficiais de falar bem, as quais os economistas rendem ho- menagem na reflexio metodol6gica e na educacio aos jovens, os declaram cientificos 8 sua maneira moderna. O credo da metodologia ientfica, conhe cido por seus criticos como a “visdo recebida” é, basicamente, o “positivismo”. Este'mantém que o conhecimento tem de seguir 0 modelo de entendimento de comegos do século XX, de certos temas do século XIX e, especialmente, da fisica do século XVII. ‘Nao obstante, para rever a penetracao do positivismo no pensamento atual, vamos denominé-lo “modernismo”, © modernismo brilha como um diamante de muitas facetas, e a palavra s6 se pode definir completamente usando-a. Mas se pode afirmar de forma preliminar que é, como tem dito 0 critico literrio Wayne Booth, a nogao de que conhecemos unicamente 0 que indo podemos por em dlivida e de que nao podemos conhecer realmente aquilo que somente podemos sentir. E a atitude de que 0 tinico conhecimento real & na fala corrente, 0 “cientifico”, ou seja, 0 conhecimento contrastado me- diante certos tipos de ceticismo rigoroso. Filosoficamente falando, o moder- nismo é0 programa de Descartes, dominante na filosofia desde o século XVII, ara construir 0 conhecimento sobre a base da dtivida radical, © modernismo é coerente em todas as suas facetas. Hé fildsofos moder- nistas, arquitetos modernistas, mtisicos modetnistas, politicos modernistas ¢ economistas modernistas, Este é o motivo de empregar uma palavra tao mul. tifacerada: a mesma coisa é multifacetada, Pode-se detectar 0 modernismo tanto no Symphony Hall e no Museu de Arte Moderna como nos tempos da engenharia social de Washington ou Londres. © modernismo que os econo- mistas tém abracado se reforsa por todos os lados, A medida que, nos séculos XIX e XX, diminuia a f religiosa entre a intelligentsia, intcoduz-se uma fé modernista. Toda sua influéncia se mostra ‘na mancira pela qual falamos. Nas ruas se escuta: “Isto € somente a sua opi- nido”; “cheguei aesta conclusdo baseando-me em fatos”; “voce nao esta sendo objetivo”; “essa é uma opiniao muito subjetiva”; “isso é somente teologia”; “isso é unicamente um juizo estético”; “se no pode medi-lo, nao ereio que seja objetivo”; “se ndo esta sendo cientifico, por que teria de escuté-lo?”. Os estudantes universitérios falam desta maneira. Seus professores também fa. lam assim, ainda que de forma mais literdria: somente as hipéteses que se podem refutar tém sentido; a evidéncia € consistente com a hipotese; de gus- tibus non est disputandum — sobre gostos nao ha, obviamente, nada escrito. O modernismo contempla a ciéncia como axiomatica e matematica considera que seu campo est separado da forma, do valor, da beleza, da bonidade e de todas as quantidades ndo mensurdveis. Ao ser funcionalista e dadp & engenharia social e a0 utilitarismo, 0 modernista 6 anti-histérico e se ‘mostra pouco interessado em tradigées culturais ou intelectuais, a0 menos enguanto esti na “igreja”. A “fe” pode ser vista em alguns cientistas e espe- cialmente em muitos que desejam ser cientistas. No melhor dos casos, o mo- demismo produz um investigador desinteressado e eficiente; no pior um doutor Strangelove. Hé que se assinalar que o modernista se apresenta em outra forma irracio- nal: no melhor dos casos é um artista, no pior um frivolo amarrado ao diltimo misticismo. O racionalismo e 0 itracionalismo rezam 20 mesmo “Deus”. Um irracionalista se eré diferente do racionalista, e, as vezes, o éna mancira de cortar © cabelo, mis ndo em sua teoria do conhecimento. F simplesmepte um pro- festante, irritado pelos rituais da igreja da ciéncia e desdenhoso de sua venda de indulgéncias, se bem que compartilhe sua crenga em uma trindade de fato, definigio e valor sagrados. De acordo comeste ponto de vista, cada parte da trindade pode ter seus préprios devotos: o cientifico, o matematico e o litera- A Mehtn de to. Da perspectiva modernista, quer seja racionalista ou irracionalista, estes distintos oradores no tém por que entorpecer-se. Cada um pode se especializar ‘emuum tipo de pensamento. Estes nao se entrecruzam: o PNB deste ano é uma coisa, um axioma de eleigao social 6 outra, ¢ ter compaixio pelos pobres outra. ‘A reago A teoria modernista do conhecimento é muito extensa. Suas ptincipais figuras vao desde filésofos profissionais (Willard Quine, Nelson ‘Goodman, Stephen Toulmin, Paul Feyerabend ¢ Richard Rorty) até uma di versidade de profissionais da quimica (Michael Polanyi), do direito (Chaim Perelman) e da critica literria (Wayne Booth} convertidos em filésofos. O alcance da idéia de que o fato é algo mais que um experimento e de que 0 argumento é algo mais que um silogismo jé é grande, como, por exemplo, no hicido tratamento que dela fazem Glen Webster, Ada Jacox e Beverly Baldwin em “Teoria da educacio ¢ 0 fantasma da visio recebida” (1981, pp. 25-35) ‘Nao obstante, esta idéia nao esta suficientemente estendida na econo: mia, € nao alcangou a economia neoclissica. Naturalmente, os economis- tas austriacos, os institucionalistas ¢ os marxistas tém atacado durante um séeulo certas partes do positivismo como base do conhecimento econémi- co. Mas se apegaram a outras com esforgos redobrados e expressaram o resto de suas dividas de forma obscura. A sua mancira, tém sido to limitados como 0s sisudos positivistas: a rejeigao da econometria por parte dos eco- nomistas austriacos, por exemplo, seria razoavel somente se as afirmagées mais ingénuas da econometria fossem tomadas a sério. Pelo que se refere 20 resto, 08 economistas tém deixado que ‘escritorzinhos’ de filosofia de uns poucos anos atras Ihes proporcionarem seu pensamiento oficial sobre um bom argumento. ‘A marca do modernismo é evidente na economia anglo-americana a partir da década de 1930. Apesar de seus lampejos terem um brilho de ago, ja produziram numerosos economistas aleijados. Muitos esto fartos da his- t6ria, depreciam outros cientistas sociais, ignoram sua civilizagio, no tomam € sio irreflexivos quanto ao método. Inclusive aos emi consideragao a sabios e bons da congregagio, que sio numerosos, Ihes parece dificil recon- ciliar sua f€ com as ceriménias que lhes pedem os domingos. Somente a religido pode ser assim: nobre ¢ corrupta ao mesmo tempo. (Os dez mandamentos ¢ a regra de ouro do modernismo em economia ¢ em outras cigncias sa 1. A previsio e 0 controle sao os fins da ciéncia. 2. Somente as implicagdes observaveis (ou previsdes) de uma teoria im- portam para afirmar que é verdadeira. sa D.N, MeCloskey seo cach gomprovacio incu experimentosobjetivosereproduatvess os sim- ples questiondrios que interrogam as pessoas sio ints, jd que estas podem 4, Se e somente se a implicagao experimental de uma teori ser falsa,ateoia também o6. ne oor demonstra 3 fe aue ie a objetividade; a “observagao” subjetiva (intros- Peesio} nao é um conhecimento cientifico, porque a objetividade e a subjeti vidade nao se podem unit. oe mee 6. A maxima de Kelvin: “Quando nao pod 4 6 a lo no podes expressi-lo com niimeros, teu conhecimento é pobre e insatisfatorio”.! meee __7-A introspeccio, a crenca metafisica, a estética, ete., podem ter impor- tancia no descobrimento de uma hip6tese, mas ndo em Sua justifcativas a6 justificativas nao esto condicionadas pelo tempo ¢ a comunidade de ci que as rodeiam é irrelevante pata sta verdade. 8. E a metodologia que tem de separar 0 pensamento cientifico do nfo ico, © positivo do normativo, clas 9. Uma explicacio cientifica de um fato o ampara como ui = plicagao cientifica de um f . ima lei pro- 10. Os cientistas — por exemplo, os economistas— no devem ter nada gue dizer como ciemtistas sobte valor moral ow artistico. Ea regra de ouro (0 “garfo de ouro” de Hume): “Quando formos as bibliotecas convencidos por estes principios, que estragos deveremos fazer Se escothemos qualquer livro, de divindade ou metafisica, por exemplo, per- suntemos: Contém algum pensamento abstrato relative a quantidades ou ni- imeros? Nao, Contém algum pensamento experimental relative a fatos reais? 'o, Entreguemorlos pois as chamas, porque ndo podem conter nada exce- to sofismas e ilusdes” (Hume, 1748, ultima pagina). Eno Ambito da filosofia aplicada, ndo na tedrica, entre os economistas profissionais, nao entre os fl6sofos profissionais, que tém éxito estes man- damentos. Somente uns poucos filésofos créem agora, a0 menos, em metade dos mandamentos. Uma minoria substancial, respeitavel e em crescimento, ‘io cré em nenhum deles. Entretanto, a maioria dos economistas (e psic6lo. 80s, soci6logos, estudiosos das ciéncias politicas, cientistas médicos e outros io fildsofos encantados com o modernismo) créem em todos. Naruralmente, a geracio anterior de metodologistas da eepnomia acre- dirava neles. A metodologia ¢ sua busca da certeza tém contagiado a todas as faculdades de economia. Nao obstante, na economia norte-americana a metodologia do modernismo e do cientificismo se associam especialmente & Escola de Chicago. Os principais textos do modernismo cconémico apés a A Retérica da Bconomia 3s obra de Terence Hutchison, O significado e postulados bdsicos da teoria eco- némica (1938), tais como “De Gustibus Non Est Disputandum” (197) de Gary Becker e George Stigler e, sobretudo, “A Metodologia da Economia Positiva” (1953) de Milton Friedman, levam o emblema de Chicago; ¢ asi terprétacdes mais extremas dos textos aparecem entre os economistas que tém estudado em Chicago. Isso estranho. £ raro que um grupo que tanto molesta os outros eco- nnomistas na maioria de suas atividades deva ter seu consentimento na questo do método oficial. Mesmo assim, uma versio aguada do ensaio de Friedman de 1953 € parte da equipagem intelectual da maioria dos economistas norte- ss labios? américanos, e seus pensamentos aparecem com facilidade em st Escrever de forma premeditada sobre o método é geralmente mais agra- vel que fazer observagdes metodolégicas no curso de assuntos néo mexo- dolégicos. Nos preceitos se pode ser agradavelmente vago e obter 0 consen- ‘timento universal; na pratica se fazem inimigos. Para dar um exemplo tipico da metodologia prépria do primeiro capitulo no apogeu do modernismo, Kalman Cohen e Richard Gyert, em sua, 2 outro modo, admiravel obra, apre- sentam um esquema do modernismo e afirmam que o método é “empregado em todas as andlises cientificas” (1975: p. 17). “método” que expdem, com ‘uma bibliografia puxada ao positivismo e seus aliados, nao é muito mais que ‘uma chamada & honestidade e a seriedade. Unicamente quando a uma frase coma “a nao ser que em principio se possa contrastar mediante o experimento © sua observagio” (p. 23) se da contetido através da pritica, se faz evidente © quie est em jogo. Certo € que 0s preceitos agradavelmente vagos tém seu uso. Voltando a0 exemplo principal, quando em 1953 Friedman publicou seu ensaio, a pra- tica da economia estava dividida entre teoria sem fatos c fatos sem teoria. Seu canto modemnista, respaldado por coros de fildsofos encapucados, foram entio Provavelmente bons para a alma, Contudo, hé que perguntar novamente se no € hora de que cesse o canto. ensaio de Friedman é 0 documento fundamental do modernismo na ‘economia e merece tum exame respeitoso. Mesmo quando foi publicada inicial- mente, antes de que o modernismo se houvesse introduzido nas ciéncias hu- ‘mands, era mais p6s-modernista do que se poderia deduzir de um conheci- mento superficial do texto. Por exemplo, Friedman mencionou com aprova- ‘so 0s eritérios estéticos de simplicidade ¢ produtividade que um economis- ta-poide usar para eleger entre uma série de teorias com as mesmas previsdes, ainda que na frase seguinte trate de confina-los a questdes de previsio (p. 10) Aceitou que os questionarios, proibidos para os modernistas na economia, “ DN MeClnskew fossem titeis para sugerir hipéteses, se bem que na frase seguinte afirme que sao “quase totalmente intiteis como meio para contrastar a validade das hi- poteses econdmicas” (p. 31}. Fincou 0 pé no papel da comunidade a que se dirige o cientista para produzir a conviegio — jé esta composta de socidlo- g0s ou de economistas —, ainda que na frase seguinte volte a uma teoria “ob- jetiva” da avaliagao. Em resumo, Friedman, assim como Karl Popper, outra figura da transi- ‘so, parecia estar lutando para escapar do positivismo e de suas tradicdes, intelectuais, mas seu éxito foi somente esporadico. O locus classicus do moder- nismo econdmico contém muito antimodernismo, o que sugere que o moder- rnismo ndo pode sobreviver a uma discussio inteligente, nem sequer por pat te de seus melhores defensores. Abraham Hirsch e Neil de Marchi tém ar- sumentado convincentemente que a explicacao da dissonancia cognitiva de Friedman se deve a que, em seu ensaio, ele nao tentava ser positivista, nem sequer popperiano, mas sim que estava seguindo a Dewey. Seguir a John Dewey significa ser pragmético e norte-americano, estar mais interessado na utilizagao do conhecimento que em seus fundamentos. Esta é uma leitura mais agradavel de que Friedman também gosta. O problema esté, pois, em encon- {rar uma razao para o erro que tem associado durante tanto tempo Friedman 20 positivismo mais “europeu” de, digamos, Paul Samuelson. Talvez 0 que aconteceu foi que o pragmatismo, junto com algumas outras doutrinas nor- te-americanas, adquitica a princfpios da década de 1950 um cheiro de bolor, Como quer que se interprete a Friedman, o comentario improvisado no calor do pensamento econdmico tem geralmente um conteiido notadamente modernista, que parece utilizar as palavras de Friedman.# Um importante ar- tigo de Richard Roll e Stephen Ross sobre financas afirma, por exemplo, que “a teoria deve avaliar-se por suas conclusGes, nfo por seus pressupostos” ¢ que “do mesmo modo, nao se deve rechagat as conclusdes procedentes da maximizacao do beneficio por parte da empresa bascando-se em que os di- retores afirmam que sacrificam os beneficios do bem-estar social” (1980: p. 1093). © mesmo se pode encontrar em outros lugares, em termos quase iden. ticos, remetendo-se ao ensaio de Friedman. Willian Sharpe (1970: 77), por exemplo, escrevendo sobre o mesmo tema que Roll e Ross, toma como nor- ma de comportamento cientifico educado que o “realismo dos pressupostos importa pouco. Se as implicagdes sio razoavelmente consistentes com os fe- némenos observados se pode dizer que a teoria ‘explica’ a realidade”. Entoadas com tanta freqiténcia, em harmonia com outras, estas frases tém se converti- do em algo “juramentado”. © modernismo econdmico é uma fé revelada com rivuais proprios. 'A Retérica da Feonamia a A maior parte dos economistas, ao menos os de fala inglesa, se emocio- naram com o epiteto de cientistas modernistas. Isto é realmente uma prova de que 0s economistas sao filosoficamente modernistas. Existe outca prova: © predominio de declaragdes metodolégicas como as de Friedman e, especial- mente, as de seus seguidores; a sensago que qualquer um que saiba de eco. nomia tem de que o modernismo proporciona a gramitica para o discurso econdmico; € a reagio aos pensamentos antimodernistas, pelo que se pode contar com que alguém declare que “em iiltima instincia” a Gnica prova “fundamental” de uma afirmagao econémica sio os “exames” quantitativos “objetivos”. E dificil nao cret a priori no dominio do modernismo na econo. ‘mia; ainda que um exame quantitativo e objetivo do mesmo, ou de qualquer afirmagio, 0 fatia mais plausivel, pelo que mereceria a pena levar a cabo. Em qualquer caso, 0 modernismo domina, esta é a conclusao principal, IL2. O MODERNISMO £ UM MAU METODO, SUA FILOSOFIA ESTA OBSOLETA, Ha muitas coisas equivocadas no modernismo como metodologia para a ciéncia e para a ciéncia econdmica.S A primeira é que, como se sabe desde hha muito tempo, seus argumentos filoséficos nao so convincentes. Inclusi- ve, 08 economistas parecem ler tanto filosofia como os filésofos, economia Nao é surpreendente, portanto, que a noticia do ocaso do modernisimo nao tenha chegado a todos os ouvidos. Os positivistas lgicos da década de 1920 desprezaram em seu tempo 0 que denominaram “metatisica”. No entanto, desde © comego, o desprezo tem refutado a si mesmo. Se a metafisica fosse langada as chamas, entio as declaragdes metodolégicas da familia modernista desde Descartes a Russell, Hempel ¢ Popper, passando por Hume e Comte, seriam as primeiras a arder. Por isto, e por outras razdes, 0s filésofos coincidem em que o positivismo l6gico estrito est morto. O perfodo qué est morto co- loca a questo de se os economists sfo sensatos em seguir com sua necrofilia.6 Em economia se discute com torpeza a postura metafisica de forma si- milar 4 que faz o positivismo légico, provavelmente porque procede da filo- sofia de filésofos aficionados, desde Mach a Bridgeman, mais que do pen- samento patalelo dos préptios filésofos profissionais. Mach, Pearson, Duhem ¢ Ostwald, quer dizer, os cientistas com um interesse pela histéria da cién. ia, ressuscitaram 0 positivismo na década de 1890, se bem que o positivismo I6gico, a versio dos filésofos, tenha sido um acontecimento mais tardio, Portanto, na economia, as regras modernistas vigoram, ainda que raras vezes sejam discutidas. Consideram-se as regeas mestras. Tio freqiientemente como se tem repetido, € dificil perceber & primeira vista o atrativo das “afi 38 DN. McCloskey ‘mages significativas desde um ponto de vista operativo” (Samuelson, 1947.3 ao longo de toda a obra), das “previsdes vilidas e significativas sobre fend menos ainda nao observados” (Friedman, 1953) ou do “valor da previsdo da generalizagio hipotética” (Machlup, 1955: 1) como ctitérios com os quais € preciso julgar toda.afirmagio niio matematica. Nenhuma pessoa normal segue uma metodologia como esta no pensamento ordindrio, e seus defenso- tes no discurem por tratar alguns tipos de pensamentos como extraordindrios, O argumento que Hutchison, Samuelson, Friedman, Machlup e seus seguidores deram foi um argumento de autoridade. Afirmavam que isto era © que estavam dizendo os fil6sofos. A confianca na filosofia foi um erro ti. tico, jd que a prépria filosofia estava mudando no mesmo tempo em que fa. lavam (v.g., Quine, 1951). Como filésofo da economia, Alexander Rosenberg assinala em 1976: “Numerosos economistas tém descrito suas opinides come Positivistas ¢ eles mesmos se dio o descrédito que nas iltimas décadas este enfoque na filosofia da ciéncia adquiriu”.’ Atualmente, alguns filésofos tm diividas sobre a epistemologia, que afirma oferecer os fundamentos para 0 conhecimento; muito mais, como jé mencionei, duvidam dos presuncosos preceitos da epistemologia modernista TL.3. O PROPRIO MODERNISMO f IMPOSSIVEL f| NAO SE RESPEITA ‘Vamos considerar, de novo, 08 passos que é preciso dar até obter um Conhecimento modernista, desde a predicao até o garfo de Hume, pasando pela maxima de Kelvin, Se 08 economistas (ou 0s fisicos) se limitarem as Proposisées econdmicas (ou fisicas) que se ajustam literalmente a tais pas- S08, nio terdo nada que dizer. O ceticismo cartesiano ou o de Hume é um critério de fé demasiado corrosivo para um verdadeiro estudioso das cigncias humanas, como Descartes ¢ Hume sabiam. Como diz Polanyi (1962: 88), a metodologia do modernismo estabelece uns “critérios quixotescos de signi- ficado valido que, se forem seguidos de forma rigorosa, nos levatao a todos a imbecilidade voluncéria”. © modernismo promete um conhecimento sem diividas, sem metati ‘ca, sem moral ¢ sem convicgdes pessoais. O que é capaz de proporcionar dé ©.nome de metodologia cientifica exatamente 4 metafisica, 4 moral ¢ as con- viegdes pessoais do cientista e, sobretudo, do economista. Nao pode propor- cionar 0 que promete; provavelmente néo 0 deva fazer. Suspeitd, como mui- {0s que tém pensado sobre este assunto nos tiltimos anos, que 0 conhecimento sientifico nao é tao distinto de outros conhecimentos. Estou argumentando que a aplicacao literal da metodologia modernis- A Retorica da Econom . 38 ta niio pode produzir uma economia itil. Resta ver se, na pritica, os pensa- :mentos econémicos utilizam o modernismo como algo mais que wna fachada. Enquanto isso, a melhor evidéncia € hist6rica. Em seu Against Method (1975), Paul Feyerabend faz-uso de uma interpretagio da earreira de Galileu para atar as afirmages da metodologia prescritiva na fisica, que se pode aplicar i eco- nomia. Se os contemporiineos de Galileu houvessem adotado o critério mo- dernista de persuasio, mantém Feyerabend, a rese defendida por Galilew haveria fracassado. Um projeto de investigacao que consistia em utilizar a estranha premissa de que a Optica terrestre também se podia aplicar a esfera celeste, para afirmar as razdes de haver marés sobre uma Terra mével e pata supor que a borrada visio das pretendidas luas de Jipiter demonstrava, por uma analogia absurda, que também os planetas giravam ao redot do Sol, como © faziam as luas ao redor de Jépiter, nao haveria superado a primeira roda- da de avaliagdo. Este arrazoado se pode aplicar em termos gerais & histéria da fisica: as anomalias de observagio nos experimentos realizados para exa- ‘minar as teorias de Einstein foram deixadas de lado durante muitos anos até que se revelaram como erros de medigio, muito depois de se haver adotado as teorias sobre a base de “a razéo da questio”, como Einstein gostava de dizer (Feyerabend, 1975: 55-7). Os historiadores da biologia puseram as claras numerosos casos em que 0s résultados estatisticos foram arranjados para se ajustarem aos preceitos modernistas, o que esté em evidéncia desde Pasteur e Mendel até a atualida- de. Gerald Geison mostrou (Farley ¢ Geison, 1974) que Pasteur, entre outros, mentiu acerca dos resultados de suas investigagSes. Sabe-se hé muito tempo gue os experimentos de Mendel eram demasiado bons para ser verdade.® Desde o principio, a medicdo do coeficiente de inteligéncia supés uma frau- de e um engano em nome do método cientifico (Gould, 1981). © modernis- ‘mo parece ajustar-se mal as complexidades da biologia e da psicologia: ¢s- forcar-se por obter uma evidéncia de um tipo que somente se encontra 10s experimentos mais simples da fisica nfo di muito certo com estas cigncias. © modemmismo se adapta bastante mal a economia. Por bem ou mal, revolusdo keynesiana na economia, para falar do caso principal, no have- tia ocorrido sob a legislacio modernista da ciéncia. As idéias keynesianas nao se formularam como proposigdes estatisticas até comesos da década de 1950, quitize anos depois de a maioria dos economistas mais jovens estarem conven cidos de que etam verdade. No comeso dos anos 60, as nogdes keynesianas de liquidez ¢ de modelos de inversio baseados no acelerador, apesar das nu- ‘merosas falhas em sua estatistica posta em prética, eram ensinadas a0s estu- dantes de economia como uma questio de rotina cientifica, A metodologia 60 DIN MeClackew modernista faria com que elas cessassem em 1936: onde estava a evidéncia do tipo objetivo, controlado e estatistico? De fato, a contra-revolugo monetarista tampouco foi um éxito para a metodologia modernista. Na década de 1960, 0 modernismo dominava as mentes dos monetaristas, porque seu lider 0 adotara. Haviam se convencido de que as questées principais eram as de previsio e controle. No entanto, nio foram as certezas modernistas as que fizeram triunfar a opinido de que o di- nheiro importava; foram os experimentos pouco complexos e os grandes li- ‘ros, por sua facil compreensao e por sua amplitude de visdes, endo 0s rituais aparentemente modernistas levados a cabo pelas revistas profissionais. recorte impositivo de Kennedy, por exemplo, levou os keynesianos ao seu maximo prestigio; a inflagdo da década de 1970 fez com que 0 per- dessem, deixando os monetaristas como donos temporirios do castelo, O grande livro de Friedman e Schwarte, A Monetary History of the United States, 1867-1960, foi outta importante vit6ria nko modernista para o monetarismo. Estabeleceu uma correlagao entre dinheiro e renda monetéria, ainda que com muitas excegdes que se explicavam mediante distintos epiciclos nio mone- taristas. Os keynesianos ¢ outras pessoas contrarias ao monetarismo no negam a existéncia de tal correlacao, ¢ sim sua importdncia. A cottelagio seria importante se o dinheiro fosse a causa dos pregos. Nao seria importante se ‘08 pregos causassem o dinheiro, Em especial, para ir além do marco da eco- nomia fechada habitual do debate, o pensamento monetarista supde que 0 dinheiro pode ser controlado pela autoridade monetéria apesar da estrutura da economia norte-americana para comerciar em bens e em dinheiro. Em geral, Friedman ¢ Schwartz nao contestaram isso®, No entanto, o que tinha impor- Hincip no debate nao era a qualidade légica de suas respostas, mas sim o grande tamanho do livro de Friedman e Schwartz e a riqueza e inteligéncia de seus Pensamentos, por mais irrelevantes que tenham sido para a questo princi- pal. A metodologia modernista tinha pouco a ver com o resto. Em resumo, uma metodologia modernista utilizada de forma consistente frearia provavelmente os progressos da economia. Perguntem a qualquer economista: que anomalia empirica no relato tradicional inspirou a nova \ historia econdmica de comegos da década de 1960, ou a nova economia do \\trabalho de principios da década de 1970? Nenhuma. Simplesmente se de- ram conta de que a légica da economia nao se havia esgotado nos limites convencionais. Que implicagées observaveis justificam a grande ihversio de talento econdmico na teoria matematica do equilibrio geral desde 1950? Se- gundo o discurso modernista habitual entre seus tedricos, nenhuma; eo que mais? Podem as aplicagées da economia em relago a questies legais, a0 es- A Retirien da Bennamia - tilo do campo recém-aparecido do direito e da economia, depender comple- tamente de uma evidéncia objetiva? Nao. Mas por que se teria que desejar limjtar tanto 0 conhecimento? E assim sucessivamente. Nao ha nada a ga- nhar € muito a perder com a adogdo do modernismo na economia, __ A.questio é em si mesma econdmica. Ronald Coase assinala que para que uma afirmagao econémica seja contestada por alguns economistas é pre- ciso que se interessem por ela o suficiente para se incomodarem em fazé-lo, ‘Ao economista somente interessa quando outros economistas créem na afir- magaio — quer sejam seus aliados ou algum grupo significativo de oponen- tes, Unicamente quando vérios economistas créem nela passa a haver uma demanda de exames. Afortunadamente, “os economistas ou, em todo caso, muito deles, ndo esperam descobrir se as previsées de uma teotia sio exa~ tas para decidirem-se”; esperar, no estilo peopriamente modernista, “pro~ duziria a paralisagio da atividade cientifica” (Coase, 1982: 14), ja que nin- guém teria um incentivo para escolher e contestar uma hipétese, dentre nniimero infinito delas. Coase mantém que, inclusive os estudos quantitati- vos, dependem fundamentalmente das argumentagdes pré-quantitativas nas que se baseiam as crencas, e cita com aprovacao 0 comentario de Kuhn ao dizer que “o caminho da lei cientifica 4 medico cientifica poucas vezes se pode fazer na direcao contraria” (1977: 219 apud Coase, 1982: 18). As leis focedem de uma tradigao de conversagao, ¢, tanto em fisica como em eco- nomia, “os estuclos quantitativos (...] sio exploragdes com a ajuda de uma teotia” (Coase, 1982: 17). Ou seja, buscas de niimeros com os quais se es- pecifique uma teoria na qual jd se acreditava, baseando-se em outras coi- sas, Em resumo, 0 modernismo, ao negar aos cientistas os mecanismos men- tais Que, de fato, utilizam, é impraticavel. IIL. DA METODOLOGIA A RETORICA TILA. Toba METODOLOGIA LIMITADA POR REGRAS E CRITICAVEL A maior objecéo que se pode fazer ao modernismo na economia é que sustenta uma metodologia limitada por regras. O modernismo afirma que de- duz as leis para a ciéncia da esséncia do conhecimento ou de uma reconstru- ‘Go racional da histéria da ciéncia, Afirma que o filésofo da ciéncia pode dizer © qiie contribui para uma ciéncia boa, dil, frutifera e progressista. Afirma que pode limitar as argumentacSes que os mesmos cientistas fazem esponta- neainente, qualificando a algumas de nio cientificas, ou, como muitos, si- 6 D.N. McCloskey tuando-as com firmeza no “contexto do descobrimento”. O filésofo assume guiar a comunidade cientifica. Na economia, uma metodologia limitada por regras afirma que aquele que estabelece as regras é perito em todo 0 conhe- cimento econémico atual e também em toda a economia futura, limitando 0 erescimento da conversasio econdmica para ajusté-la a idéia filos6fica do bem E dificil tomar estas afirmagbes, feitas da fronteica, a sério. Einstein observou (1953: 38) que “quem quer que tente transformar-se em juiz no campo da Verdade eco Conhecimento sofreré um naufragio devido a ira dos deuses”. O criador de regras para a ciéncia econémica tem, supostamente, as mais nobres intengdes. Como o homem do governo, esta aqui para ajudar. Mas 0s economistas gostam de comentar sobre casos similares de interferéncia na ordem espontanea que as nobres intengdes no sio defesa nenhuma contra 08 resultados risiveis. O metodélogo considera-se a si mesmo 0 juiz do pro- fissional. Sua propria fungao, se é que tem alguma, é uma funcdo andrquica que resiste 4 rigidez ea pretensio das regras. I. A. Richards assinalou acerca a teoria da meréfora: “Seu objeto nao é substituir a prética, nem nos dizer como fazer que jd nao podemos fazer, mas sim proteger nossa capacidade natural da interferéncia de opinides necessariamente simples” (1936: 116). E lamentivel que a metodologia modernista, ou qualquer metodologia que conste de preceitos rigidos sejam tao simples. E pior, que se lhe permita interferir com a capacidade natural. Em economia, o costume dos artigos metodolégicos é reclamar dos economistas por nao permitirem que os meto- dologos interfiram mais. A dtil obra de Mark Blaug, The Methodology of Economics, que faz um resumo do estado da questio da metodologia eco- némica em 1980, um caso recente, Seu subritulo promete dizer “como ex- plicam os economistas”. Teria sido melhor “como o jovem Karl Popper ex- plicava”, porque ataca repetidamente pensamentos existentes em economia Por nio cumprirem as regras que Popper estabeleceu no livro A Logica da Investigagdo Cientifica, de 1934. , A introdugao de Blaug é tipica do melhor dos metodélogos da econo- mia: “Os cconomistas esto conscientes ha muito tempo da necessidade de defender prinefpios ‘corretos’ de pensamento em sua matéria; ainda que a pratica real possa tex pouca relacdo com 0 que se prediz, vale a pena consi- derar o que se predisse em seu proprio terreno” (Blaug, 1980: tii). Palavras como estas fluem com facilidade nos textos dos modernistas. Contudo, nao esti claro por que vale a pena considerar algo que no esté relacionado com 4 pratica real, Por que os economistas tém que defender em abstrato seus prin- A Retérica da Economia “6 cipios de pensamento, ¢ ante qual tribunal? Os metodélogos — quer sejam positivistas légicos, popperianos, austriacos ou marxistas— deveriam ter uma resposta, mas ndo a tém. © antigo sentido comum e a recente filosofia da cigncia sugerem que nao poderiam té-la. O discurso de Blaug é francamente prescritivo e toma as regras para a conversagao econdmica diretamente da filosofia: © que a metodologia pode fazer é proporcionar critérios para a aceitacao € a rejeigdo de programas de investigacao, estabelecer normas que nos ajudem a discriminar entre o trigo € 0 joio. A per- gunta iltima que podemos ¢, de fato, devemos formular acerca de qualquer programa de investigagio é a que Popper tornou fato conhecido: que acontecimentos, uma vez. produzidos, nos levariam ‘a rechagar esse programa? Um programa que nio pode responder a esta pergunta nao alcanga os altos niveis que 0 conhecimento cientifico pode obter. (p. 264) Soa muito bem, mas os deuses de Einstein estdo morrendo de rir. Por que, pergunta a voz do pragmatico, deve um duvidoso principio epistemol6- asico ser contraste de algo, quanto menos da pratica, e quanto menos contraste “Gltimo”? Nao aparece a ciéncia, a maior parte das vezes, muito antes deste contraste tltimo? A palavra essencial é “iltimo” e seus numerosos primos na epistemologia, coin “conceitualmente”, “idealmente”, “em prin “fundamentalmente” ou “no segundo advento”. “No fundo”, dizem os epis- temolégos, “a tinica maneira de saber é tal e tal”, Mas esta declaragio nao convence a gente normal nem os cientistas normais, jé que a estes Ihes parece ‘Sbvio que sabemos de muitas maneiras que nem sempre se podem reduzir & vista ou ser sintetizadas a priori. A maneira “

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